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Captulo 3
Bacteriologia
Joseli Maria da Rocha Nogueira Lucieny de Faria Souza Miguel 1. Introduo
A Microbiologia (do grego: mikros, pequeno; bios, vida e logos, cincia) o estudo dos organismos microscpicos e de suas atividades. Quando partimos para esta disciplina, devemos considerar que variados microrganismos podem provocar infeces, e que inmeras tambm so as formas de diagnstico e identificao dos agentes etiolgicos destas enfermidades. Para identific-los, devemos analisar sua morfologia, estrutura, reproduo, fisiologia e metabolismo. Dentro desta cadeira so avaliados tambm os conceitos de distribuio natural, suas relaes simbiticas e as alteraes fsicas e qumicas que provocam no meio ambiente. Neste caso, os microrganismos seguem as caractersticas comuns a todos os sistemas considerados biolgicos: habilidade de se reproduzir, capacidade de ingerir ou assimilar substncias (metabolizando-as para suas necessidades energticas e de crescimento), habilidade de excreo de metablitos, capacidade de reagir a alteraes ambientais (irritabilidade) e suscetibilidade a mutaes.
A Microbiologia pode tambm auxiliar na demonstrao dos princpios da Biologia, facilitando o estudo de sistemas especficos para a investigao das reaes fisiolgicas, genticas e bioqumicas, que so a base da vida. Os microrganismos so instrumentos ideais para a pesquisa dos fenmenos biolgicos, pois, alm de crescerem e se reproduzirem rapidamente, com metabolismo semelhante a de outros organismos mais complexos, em tubos de ensaio ou frascos, exigem menos espao e cuidados de manuteno. Os principais organismos estudados em Microbiologia so as bactrias, os fungos, as algas e os protozorios. Os vrus, apesar de no serem considerados vivos, tm algumas caractersticas de clulas vivas e por isso so estudados como microrganismos. Quando pensamos em desenvolver um captulo bsico de Bacteriologia geral, clnica e laboratorial, levamos em conta inicialmente os conceitos bsicos, aliados importncia destes microrganismos como participantes da microbiota e como causadores de doenas. Na parte do diagnstico bacteriano, a necessidade de comentar as metodologias simples e complexas, que permitem a obteno de resultados corretos (j que, na maioria das vezes, o paciente depende do resultado de um exame para o incio do tratamento), levou-nos no s a tratar os agravos em funo do microrganismo, mas a pesquisar, de acordo com a regio anatmica em que ele pode ocorrer.
2. Histrico da Bacteriologia
Uma das primeiras hipteses, associadas Bacteriologia, de que se tem notcia foi postulada no sculo XIII, por Roger Bacon, que sugeriu que as doenas eram produzidas por seres vivos invisveis. A ideia foi novamente recomendada por Girolamo Fracastoro de Verona (1483-1553), mas a primeira observao descrita e documentada dos organismos bacterianos foi realizada pelo naturalista holands Antony Van Leeuwenhoek (1632-1723), com a ajuda de um microscpio simples de sua prpria construo. Ele infor-
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mou sua descoberta Sociedade Real de Londres, em 1683, mas a Bacteriologia, como cincia, no se estabeleceu at meados do sculo XIX. Apesar das tentativas iniciais de associar as bactrias s doenas, como nos antigos trabalhos do pesquisador Marcus Anton Von Plenciz (17051786), que procurou estabelecer a natureza do contagium e do miasma (o primeiro, derivando do organismo doente, enquanto o segundo, que era gerado fora do corpo, se espalhava pelo ar), por vrios anos se acreditou que bactrias eram produzidas atravs de gerao espontnea. Foram requeridos os esforos de vrios qumicos e bilogos para provar que as bactrias, como todos os organismos vivos, s surgiam de outros organismos semelhantes. Este fato fundamental foi finalmente estabelecido em 1860, pelo cientista francs Louis Pasteur (1822-1895). Com seus trabalhos associados aos de Robert Koch (1843-1910), outro brilhante estudioso, praticamente inicia-se a era da Bacteriologia. Em 1840, depois dos primeiros trabalhos de Pasteur, Friedrich Gustav Jacob Henle (1809-1885), em uma notvel publicao, exps as suas ideias, estabelecendo condies bsicas para que um agente microscpico particular pudesse ser considerado causador de uma doena infecciosa ou infectocontagiosa. Estas condies correspondem aos Postulados de Henle:
O agente causador da infeco deve ser encontrado com constncia
no corpo do doente.
Deve ser possvel isol-lo e, com tal agente isolado, reproduzir expe-
rimentalmente a doena. Os dois postulados citados seriam aperfeioados e mais tarde impostos aos bacteriologistas pelos trabalhos de Robert Koch (primeiro a isolar o M. tuberculosis):
Um microrganismo especfico pode sempre ser encontrado em associ-
laboratrio.
A cultura pura produzir a doena quando inoculada em animal
sensvel.
possvel recuperar o microrganismo, em cultura pura, dos animais
experimentalmente infectados. Seguindo as ideias de Pasteur, que ao destruir a teoria da gerao espontnea, John Needham 1745, afirmou estar o ar cheio de micrbios, e levando em conta que as fermentaes e as putrefaes so tambm obras de microrganismos, o mdico Oliver W. Holmes (1809-1894) insistia que a febre puerperal era contagiosa e, provavelmente, ocasionada por um agente transmitido de uma me para outra, por intermdio dos mdicos e das parteiras. Quase na mesma poca, o mdico hngaro Ignaz P. Semmelweis (18181865) introduziu o uso de antisspticos na prtica obsttrica. Com base nestes estudos, o Dr. Joseph Lister (1827-1912) concluiu em 1867 que deveria ser possvel evitar as infeces ps-operatrias, desinfetando previamente os instrumentos cirrgicos, o campo operatrio e as mos do cirurgio. O perodo de 1880-1900 representa a poca urea da Bacteriologia, com a descoberta de vrias bactrias patognicas. Durante um congresso internacional, ocorrido em Londres em 1881, Louis Pasteur teve a oportunidade de tomar conhecimento da introduo, por Robert Koch, dos meios slidos (gelatina, gar, etc.) na Bacteriologia (at ento Pasteur s usava meios lquidos, o que praticamente impossibilitava o isolamento bacteriano). Koch tambm desenvolveu tcnicas de fixao e colorao, muitas das quais utilizamos at os dias de hoje. Nos ltimos anos, com o advento da Biologia Molecular, a Microbiologia evoluiu extraordinariamente e est se mostrando, cada vez mais, uma cincia multidisciplinar. Hoje, associamos velhos conhecimentos com os novos, facilitando os diagnsticos e os tratamentos.
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Com certeza, em poucos anos, teremos maiores avanos nesta rea, que no para de crescer, e contamos com vocs, estudantes, para, no futuro desenvolverem novas tcnicas e fazerem novas descobertas, auxiliando, assim, a evoluo desta cincia.
3. Morfologia e citologia bacteriana
Para iniciarmos nossos trabalhos em Bacteriologia importante reforar que o tamanho das bactrias da ordem de milsimos de milmetro, ou seja, micrmetros (mm), podendo, no entanto, serem observadas em microscopia pttica (ver captulo 3 - item sobre Microscopia), o que no ocorre com os vrus, que, possuidores de dimenses inferiores a 0,2 mm (limite de visibilidade do microscpio tico), no podem ser observados neste instrumento. A maioria das bactrias estudadas nos laboratrios de Microbiologia mede de 0,5 a 1,0 mm de dimetro por 2,0 a 5,0 mm de comprimento.
3.1. Morfologia
Outro dado relevante que as bactrias podem se apresentar em trs tipos morfolgicos fundamentais:
3.1.1. Bastonetes ou bacilos
Bastonetes longos ou curtos com extremidade reta ou de ponta arredondada, ou ainda curvos, em forma de vrgula.
3.1.2. Espirilos
Os cocos podem formar diferentes arranjos, de acordo com a sua diviso celular (em plano nico, ou em mais planos):
Diplococos Cocos agrupados 2 a 2 (diviso em um nico
plano).
Estreptococos Vrios cocos dispostos em cadeia, similar a um
ao formato de um cacho de uvas (diviso em muitos planos). Os bastonetes (ou bacilos) no se dispem em tantos arranjos como os cocos, sendo que, na sua grande maioria, se apresentam de forma isolada. Porm, ocasionalmente podem ocorrer aos pares (diplobacilos) ou em cadeias (estreptobacilos). Dependendo do gnero, fase de crescimento ou da composio do meio de cultura, estas bactrias podem tambm apresentar arranjos diferenciados, como crescimento em paliada ou letras chinesas ( Corynebacterium /Difteria). Quando os bastonetes so muito curtos, podemos encontrar alguns autores denominando-os cocobacilos. Os espirilos ocorrem, predominantemente, como clulas isoladas. Exibem, porm, ntidas diferenas em relao ao comprimento, largura, nmero e amplitude dos espirais.
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Bacilos ou Bastonetes
Cocos
Espirilo
Diplococos
Estafilococos
Estreptococos
Sarcina
Ttrade
3.2. Citologia
Quanto parte de Citologia bacteriana, no pretendemos nos estender neste assunto, porm gostaramos de comentar que as bactrias so seres procariticos, ou seja, desprovidos de membrana nuclear (tambm chamada de carioteca). Elas no possuem todas as estruturas internas das clulas eucariticas, sendo mais simples em todos os nveis, menos no seu envoltrio celular. Para se ter uma ideia, citaremos os principais elementos estruturais das bactrias:
3.2.1. Parede celular
Responsvel pela forma, rigidez bacteriana, diviso celular e muitas vezes manuteno osmtica, com uma espessura de aproximadamente 10 a 20 mm formada, entre outras substncias, por um complexo macromolecular, conhecido como mucocomplexo (tambm chamado de peptidoglicano, murena, mucopeptdio ou glicopeptdio), de importncia prtica na taxonomia bacteriana. Nas bactrias chamadas Gram-negativas (Figura 1), este complexo representa uma frao menor do total da parede em relao s Gram-positivas (Figura 2). A parede celular nas bactrias Gram-negativas quimicamente mais complexa, possuindo maior quantidade de aminocidos e de lipdeos. Sua frao de LPS (lipopolissacardio) externa determina sua toxigenicidade e antigenicidade. As bactrias Gram positivas possuem como poro caracterstica os cidos teicoicos. Algumas bactrias com paredes estruturalmente Gram-positivas possuem uma modificao importante que pode ser utilizada na taxonomia; nestas bactrias, os lipdios esto em maior quantidade e fortemente ligados (cerca de 60% do peso seco da parede), alm disso, elas possuem tambm em sua composio cidos miclicos. O gnero Mycobacterium o exemplo mais importante de microrganismo onde ocorre esta modificao, devido ao carter hidrofbico de sua parede, sua colorao pelo mtodo de Gram dificultada, mas ele poder ser diferenciado pela capacidade de lcool-cido resistncia (Ver item 5.2 deste captulo).
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Existe um grupo de bactrias chamado micoplasmas, que no possui parede celular nem peptidoglicano, apesar de estudos moleculares os colocarem prximos das bactrias Gram negativas, estes so incapazes de serem corados pelo mtodo clssico de Gram, j que no possuem parede. Alguns deles possuem esteris em suas membranas, diferenciando-os mais ainda dos outros procariotos. Outro fato interessante que eles acabam se tornando resistentes aos antibiticos, que tm a parede bacteriana comum como alvo (ver item 10 deste captulo). A parede celular das arqueobactrias (ver item 4 deste captulo) tambm no acompanha o mesmo esquema das bactrias comuns, podendo apresentar uma parede rgida (pseudomurena) ou uma simples camada S (geralmente glicoprotenas).
Tambm chamada de membrana plasmtica constituda de fosfolipdios e protenas, sua estrutura semelhante a dos organismos no procariticos, todavia, com exceo dos grupo bacteriano dos micoplasmas, no possuem esteris. Trata-se de uma membrana semipermevel, seletiva, sede de vrias enzimas, que limita o citoplasma. Importante, no s para o transporte de ons e metablitos (ex.: enzimas permeases e porinas), ela tambm atua em numerosos processos biossintticos. A membrana celular das arqueobactrias pode conter lipdios nicos e longos, sem grupamento fosfato. O que, segundo alguns autores, pode contribuir para suas atividades em ambientes incomuns (alta concentrao de sal, baixo pH ou altas temperaturas).
3.2.3. Citoplasma
A clula bacteriana apresenta no seu citoplasma diferentes regies, que podem ser divididas didaticamente. Uma rea chamada citoplasmtica, de aparncia granular e rica em RNA, uma rea chamada de cromatnica ou nuclear, rica em DNA, e uma poro fluda, com nutrientes dissolvidos. Na rea chamada citoplasmtica, temos, juntamente com o RNA, partculas proteicas, formando corpsculos com cerca de 20 nm de dimetro, chamados ribossomas. Estes possuem enzimas que atuam na biossntese da clula (so responsveis pela sntese proteica, possuindo em sua composio, aproximadamente, 60% de RNA e 40% de protenas). Como j dissemos, as bactrias no possuem membrana nuclear e nem aparato mittico. Na rea cromatnica, temos o chamado nuclolo ou nucleoide, composto por um cromossomo de DNA de dupla hlice, em sua grande maioria na forma de uma molcula nica circular (algumas bactrias, como o Vibrio cholerae, podem possuir mais de um cromossomo; e outras, como a Borrelia burgdorferi, possuem um cromossomo linear). O cromossomo possvel
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de ser caracterizado em cultura de clulas jovens tratadas com HCl, a fim de destruir o RNA citoplasmtico, seguido de colorao, pelo mtodo de Giemsa (Apndice 1).
3.2.4. Outras estruturas
Alguns elementos podem estar presentes, ou no, em determinados gneros bacterianos. Podendo, muitas vezes, alm de sua funo para a prpria clula, nos auxiliar na taxonomia:
Grnulos ou incluses citoplasmticas Podem ser visualizados atravs de
coloraes especiais, pois geralmente so refringentes. Sua natureza varia de acordo com o organismo, porm sua funo sempre de armazenamento. Encontrando-se reservas de glicognio, amido, fosfatos, enxofre, etc. Alguns destes grnulos podem auxiliar na identificao presuntiva da presena de determinadas bactrias, como no caso de Corynebacterium, que acumulam polifosfatos. Esses grnulos so s vezes denominados grnulos de volutina ou metacromticos, uma vez que, com corantes azuis, se diferenciam, corando-se em vermelho. Uma alternativa para realizar essa distino atravs do mtodo de Albert Laybourn (Ver item 5.3.1 deste captulo).
Plasmdeo - Estrutura de DNA circular extracromossomial, de duplica-
o independente (replicon), localizada no citoplasma da clula (menor que o cromossoma), que no responsvel por caractersticas essenciais da bactria. Geralmente se apresentam com vrias cpias, no possuindo homologia com o cromossomo, mas capacidade de conferir vrias vantagens seletivas (ex.: resistncia a antibiticos), podendo, inclusive, ser transferidos para outras bactrias. Essas estruturas tm sido largamente utilizadas, na atualidade, na engenharia gentica.
Glicoclice Camada externa viscosa que cerca a parede celular e
pode ocorrer em muitas bactrias. Sua natureza qumica, na maior parte polissacardica, variada, e depende da espcie bacteriana. Os termos
cpsula e camada limosa ou slime so usados, frequentemente, e alguns autores os diferenciam baseando-se na organizao mais ou menos definida de sua estrutura. Alm de fornecer um envoltrio protetor, possui seu papel ligado virulncia e imunogenicidade, j que pode atuar na defesa da bactria contra a fagocitose, bacterifagos e, principalmente, auxiliar na aderncia bacteriana a algumas superfcies Um bom exemplo o Streptococcus mutans, que forma a placa bacteriana dentria.
Flagelos So estruturas de locomoo formadas por apndices muito
finos, compostos de flagelina (protena), e se encontram presentes em algumas bactrias. O flagelo apresenta trs componentes: uma estrutura basal, uma similar a um gancho e um longo filamento externo parede celular. O seu comprimento geralmente vrias vezes o da clula, contudo, seu dimetro uma pequena frao do dimetro celular (10 a 20 nm). Podem ser nicos ou mltiplos, polares ou peritrquios (em todo corpo bacteriano), auxiliando, desta forma, em estudos taxonmicos. Apesar destas estruturas estarem categoricamente ligadas locomoo bacteriana, algumas bactrias podem se movimentar por outros meios, como, por exemplo, o deslizamento provocado pelo fluxo protoplasmtico.
Pili ou fmbria - So apndices filamentosos compostos de pilina (pro-
tena) encontrados em algumas bactrias Gram-negativas, mais finos, mais curtos e geralmente mais numerosos que os flagelos. De acordo com sua estrutura, podem desempenhar duas funes de grande importncia: a aderncia a superfcies (atravs das adesinas localizadas em suas extremidades) e como pili sexuais, permitindo a fixao de clulas doadoras e receptoras, servindo como porta de entrada para material gentico na conjugao bacteriana.
Esporos (endosporos) Essas estruturas so produtos de uma respos-
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(ex.: Bacillus e Clostridium), so refringentes aos corantes e altamente resistentes a agentes fsicos e qumicos. Formam-se quando o meio se torna inadequado para a sobrevivncia da bactria em sua forma vegetativa (ex.: escassez de gua ou nutrientes). Cada clula forma um nico esporo, que liberado quando a bactria morre. Sua composio se caracteriza por alto teor de clcio associado ao cido dipicolnico, relacionado desidratao e alta resistncia, inclusive trmica. Essas estruturas permitem a manuteno de microrganismos em forma esporulada (latente ou em repouso), por longos anos, no ambiente, sendo consideradas notveis estratgias de sobrevivncia, j que podem reverter forma vegetativa quando o local se torna vivel novamente para sua sobrevida.
4. T Taxonomia axonomia bacteriana
Taxonomia (do grego tassein = para classificar e nomos = lei, cincia, administrar) considerada a cincia da classificao. A classificao necessita da criao de um sistema que facilite identificar os seres. O primeiro sistema de classificao foi o de Aristteles, no sculo IV a.C., que ordenou os animais pelo tipo de reproduo e por terem ou no sangue vermelho. Vrios sistemas foram posteriormente criados a partir destas ideias. Inicialmente, os seres vivos eram divididos em dois reinos: Plantas e Animais. Como muitos seres simples no cabiam nesta diviso, Ernst Heinrich Haeckel props, em 1866, a categoria Protista, incluindo algas, fungos, protozorios e bactrias. Posteriormente, em 1959, a classificao mais aceita passou a ser a de Robert H. Whittaker (1920-1980), composta por cinco reinos: Protista (protozorios e algumas algas), Monera (bactrias procariontes e cianobactrias ou algas azuis), Fungi, Plantae e Animalia. Em 1987, a anlise filogentica molecular levou o microbiologista Carl Richard a mudar o rumo da taxonomia de procariontes e a propor em 1990 o domnio Archaea
para as arqueobactrias (consideradas representantes das formas mais primitivas de vida na terra) e mais dois outros domnios: as outras bactrias (Bactria) e os eucariontes (Eucarya) - fungos, protozorios, plantas e animais. Ento como estamos vendo, o paradigma atual da taxonomia para as bactrias, reside no entendimento das relaes evolutivas, fundamentado quase que exclusivamente na filogenia de sequncias de rRNA 16S e em novas metodologias moleculares que esto surgindo a cada dia. No h mais um consenso sobre o conceito estrito de espcie em procariontes, mas diferentes modelos evolutivos, de um lado baseados em seleo natural, e de outro na transferncia gentica horizontal. Para testar estes modelos, sero necessrias futuras pesquisas sobre evoluo, filogenia, e gentica de populaes procariontes com dados obtidos atravs de estudos moleculares como Multi Locus Sequence Analysis (MLSA) (Ver captulo 2 do volume 3) e outras tcnicas que esto sendo aperfeioadas para essas anlises.
4.1. Nomenclatura taxonmica
Considerando que todos os seres vivos, e mesmo objetos inanimados, podem estar dentro de vrios tipos de classificao, todos devero possuir um nome para que sejam reconhecidos como pertencentes quele txon ou categoria. A nomenclatura taxonmica se iniciou com este objetivo, em 1735, com os estudos de um sistemtico botnico sueco chamado Carolus Linnaeus (Carl Von Linn). Ele desenvolveu um sistema binominal, baseado em um plano de organizao, que serviria a todos os seres vivos, incluindo os organismos bacterianos. Esse sistema possua dois princpios bsicos: 1. O uso de palavras latinas, para nomear os grupos de organismos. 2. O uso de categorias de classificao, estabelecendo uma hierarquia. Inicialmente, as categorias propostas por Lineu foram: reino, classe, ordem, gnero e espcie.
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Devido evoluo das tcnicas taxonmicas e do grande nmero de organismos descritos aps as propostas de Linnaeus, foi necessria uma subdiviso das cinco categorias. Assim, atualmente usamos: reino, filo, classe, ordem, famlia, tribo, gnero e espcie. Alguns especialistas sugerem que, de acordo com cada caso, podem ser adicionadas outras categorias, como subfilo, superclasse e subespcie. A organizao taxonmica havia, ento, sido criada com o intuito de classificar, ordenar e identificar os microrganismos, passando a se dividir em classificao, nomenclatura e identificao: A. Classificao - Divide os microrganismos em grupos, de acordo com as caractersticas artificiais ou naturais. As classificaes artificiais so baseadas nas caractersticas fenotpicas (expresso), principalmente morfolgicas e fisiolgicas dos microrganismos. J as classificaes naturais, como j falamos, so baseadas nas relaes filogenticas moleculares das bactrias, atravs de comparaes na sequncia de vrias macromolculas ou genes (genotpica). B. Nomenclatura (no nosso caso bacteriana) - Refere-se ao nome do microrganismo, seguindo o Cdigo Internacional para Nomenclatura de Procariontes (International Committee on Systematic of Prokaryotes). Este contm todos os princpios e recomendaes para a descrio de uma nova unidade de classificao (ou txon, no plural taxa), em espcie, gnero ou famlia. As regras do cdigo internacional baseiam-se no sistema binominal desenvolvido por Linnaeus: O nome de uma espcie bacteriana proveniente da combinao, em latim, formada de duas partes, o nome do gnero, seguido pelo nome da espcie bacteriana. Como, por exemplo: Escherichia coli (Escherichia o gnero, e coli a espcie). Seguindo a regra, apenas a primeira letra do nome do gnero escrita em maiscula, e o nome completo dever ficar em itlico ou sublinhado. Exemplo: Escherichia coli ou Escherichia coli.
No caso de bactrias em que os sorotipos possuem grande importncia, eles so citados aps o nome da espcie, mas no se muda a grafia para itlico, o que poder causar confuso. Exemplo: Salmonella enterica, subespcie (subsp.) enterica sorotipo Typhi. Muitas vezes encontraremos escrito Salmonella Typhi. Para se estabelecer um nome de um txon, este dever ser avaliado pelo Cdigo Internacional para Nomenclatura de Procariontes. Aps validao, o novo nome divulgado comunidade cientfica atravs da revista International Journal of Systematic Bacteriology (IJSB). C. Identificao - um processo que determina as caractersticas do microrganismo, sua relao com microrganismos similares ou diferentes, e, posteriormente, com base nesses achados, indica-lhe o nome. Normalmente o nome da espcie determina uma caracterstica morfolgica ou bioqumica ou pode homenagear uma pessoa ou lugar. Para citar uma espcie que no tenha sido identificada, mas que conhecemos o gnero, faz-se uso da abreviatura sp., que significa espcie. Por exemplo, Klebsiella sp., ou seja, uma espcie qualquer do gnero Klebsiella. Se for necessrio fazer referncia a vrias espcies do gnero, a abreviatura a ser utilizada spp., espcies: Klebsiella spp. Deve ser observado que sp. ou spp. no so escritos em itlico ou sublinhados. Atualmente, a taxonomia e a nomenclatura so realizadas por determinaes genticas (homologia do DNA, anlise de sequncia do DNA, anlise do RNA 16S ribossmico). Permitindo sistemas taxonmicos mais estveis, onde as modificaes de nomes sejam menos frequentes. Nos ltimos anos, a classificao taxonmica ganhou apoio da Biologia computacional e da bioinformtica, empregando o mtodo das rvores filogenticas para facilitar a taxonomia dos seres vivos.
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Os nomes dos microrganismos podem ser modificados aps estudos mais detalhados (Biologia Molecular), e estes devem ser registrados no IJSB, de acordo com as seguintes regras: a. Quando se transferir uma espcie de um gnero para outro, a espcie ser mantida. Ex.: Campylobacter pylori mudou para Helicobacter pylori. b. Quando a cepa pura (cepa tipo) pertencer a outro gnero, o gnero desta cepa dever ser considerado nulo. Ex.: Enterobacter agglomerans mudou para Pantoeae agglomerans. c. Quando um microrganismo estiver em duas ou mais designaes de gnero e espcie, o nome do gnero/espcie da cepa tipo dever ser considerado como o nome vlido.
5. P rincipais mtodos de visualizao e colorao Principais comuns na prtica laboratorial
Considerando o captuuloMicroscopia, do volume 1 desta coleo, vimos que as bactrias s podem ser visualizadas com auxlio dos diferentes tipos de microscpio. Vamos tratar aqui das tcnicas associadas ao microscpio tico, forma mais simples e comum de se examinar estes microrganismos no laboratrio.
De uma maneira geral, as bactrias podem ser observadas de duas formas, a primeira a fresco, atravs de observao de suspenso bacteriana entre lmina e lamnula, ou pela gota pendente, e a segunda atravs de um esfregao fixado e corado. Geralmente, a observao a fresco utilizada para visualizao da mobilidade e morfologia de bactrias espiraladas (que podem ficar distorcidas se fixadas), ou mesmo em outras bactrias, para observar alteraes na diviso celular e formao de esporos. Neste caso, utiliza-se geralmente um microscpio de campo escuro, pois as bactrias ao microscpio de campo claro tendem a aparecer transparentes, sendo necessria, muitas vezes, a utilizao de filtros de densidade neutra para diminuir a intensidade luminosa e facilitar a visualizao. Quando utilizamos material fixado e corado, temos vrias vantagens, pois alm de as clulas ficarem mais visveis aps a colorao, podemos transportar estas lminas sem risco (pois o material est fixado), bem como diferenciar clulas de afinidades distintas aos corantes e de morfologia variada. O esfregao do material deve ser pouco espesso e homogneo. Deve ser feito em rea de segurana biolgica, a partir de um caldo preferencilamente, ou do material diludo em salina, espalhado com ala bacteriolgica em lmina de vidro limpa, desengordurada e seca. Posteriormente, a lmina dever ser seca ao ar. Aps a secagem, o material dever ser fixado lmina, atravs do calor ou quimicamente. A maioria das bactrias tem afinidade por um grande nmero de corantes, principalmente aqueles do grupo dos derivados bsicos da anilina (azul de metileno, violeta de genciana, tionina, fucsina bsica, etc.). Quando fazemos uma colorao com apenas um corante e observamos a morfologia da bactria, chamamos de colorao simples. Quando utilizamos mais de um corante ou reagente, com o intuito de evidenciar diferenas entre clulas bacterianas, damos o nome de colorao diferencial ou seletiva.
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Atravs do estudo das bactrias e de seu comportamento diante de diferentes corantes, verificou-se que h diferentes reaes caractersticas de determinados grupos bacterianos, o que facilita, neste caso, a identificao destes grupos, baseada na resposta da amostra ao determinado mtodo de colorao. Dentre os mtodos diferenciais existentes, aqueles que apresentam maior importncia dentro de um Laboratrio de Anlises Clnicas so o mtodo de Gram, o mtodo de Ziehl-Neelsen e o mtodo de Albert-Laybourn. A seguir explicaremos estas tcnicas comuns e tambm o mtodo de FontanaTribondeau, que apesar de no ser diferencial, ainda utilizado em alguns laboratrios, com certa frequncia. Existem ainda os mtodos de colorao pouco usados na rotina laboratorial, mas que podem ser teis quando se necessita corar alguma estrutura especfica, como a colorao de flagelos, esporos e cpsula, que discutiremos no final deste tpico.
5.1. Colorao de Gram
Desenvolvida pelo mdico dinamarqus Hans Christian Joachim Gram, em 1884. Tem como fundamento o fato de que as bactrias, quando coradas por derivados prximos da rosanilina (violeta genciana, cristal-violeta, metilvioleta, etc.) e depois de tratadas pelo iodo (soluo iodo-iodetada, conhecida como lugol), formam um composto de colorao escura, entre o iodo e o corante, chamado iodopararosanilina. Este composto, nas bactrias Gram-positivas, fortemente retido e no pode ser facilmente removvel pelo tratamento posterior com o lcool, ao passo que nas Gram-negativas este composto facilmente descorado pelo lcool. Aps a ao do lcool, feita uma segunda colorao pela safranina ou fucsina de Ziehl, diluda a 1/10. Neste caso, as bactrias Gram-negativas
aparecero vermelhas, devido a cor do corante de fundo, e as Gram-positivas aparecero roxas, pois conservam a cor do corante inicial (Figura 3). Esta distino muito importante na sistemtica bacteriana e ocorre com base nas diferenas existentes na parede celular das bactrias Gram-positivas e Gram negativas j estudadas em Citologia bacteriana. Todavia, importante sempre utilizar culturas jovens para no haver falsos resultados. Atravs de nossa experincia, podemos formular duas regras simples:
Os cocos geralmente so Gram +, com exceo do gnero Neisseria
(gonococo e meningococo).
Os bastonetes geralmente so Gram, com exceo de Corynebacterium,
a retirada do excesso de corante melhora a observao, contudo, esta etapa tambm no obrigatria.
Descorar com lcool absoluto ( 30 segundos)*. Lavar com gua (obrigatoriamente). Corar com safranina ou fucsina de Ziehl diluda a 1/10 ( 30 segun-
dos) Alguns autores sugerem que ao corar organismos anaerbios a opo seja a carbol-fucsina, que permite melhor penetrao.
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Lavar com gua (obrigatoriamente) e secar. Observar em objetiva de imerso (100 X).
* Em alguns livros, podemos encontrar modificaes utilizando lcool-acetona, mas a tcnica preconizada atualmente pelo Ministrio da Sade sugere a utilizao de lcool 99,5oGL e, como corante de fundo, a safranina.
A. Cristal Violeta Fenicada Cristal violeta (violeta de genciana)..............1,0 g lcool 95........................................10 mL Fenol fundido ......................................2,0 g H2O destilada..................................100 mL Dissolver o corante no lcool, adicionar o fenol fundido pouco a pouco e acrescentar a H2O destilada. Filtrar aps 24 horas de repouso. B. Lugol Iodo metlico.................1,0 g Iodeto de potssio............2,0 g H2O destilada...............300 mL Triturar e misturar o iodo metlico ao iodeto de potssio e adicionar a H2O destilada aos poucos.
Figura 3. Bactrias coradas pelo mtodo de Gram
C. Fucsina de Ziehl Usa-se diluda a 1/10 (vide fucsina fenicada de Ziehl) ou safranina diluda em gua. Safranina......................................2,5 g gua destilada............................500 mL Misturar bem o p na gua at a completa dissoluo.
5.2. Colorao de Ziehl-Neelsen
Desenvolvida pelo bacteriologista Franz Ziehl e pelo patologista alemo Friedrich Carl Adolf Neelsen, em 1882. Baseia-se na propriedade de poucos gneros bacterianos (Micobacterium e Nocardia) de resistirem ao descoramento com uma soluo de lcool-cido, aps tratamento pela fucsina fenicada aquecida, permanecendo coradas de vermelho (BAAR- Bacilo-lcool-cido-Resistente), diferentemente das outras bactrias, que, por no possurem esta propriedade, tomam a cor do corante de fundo, normalmente feita com azul de metileno ou cido pcrico saturado (Figura 4). A lcool-cido-resistncia est relacionada existncia na parede celular destas bactrias de lipdeos fortemente ligados (ex.: cido miclico), que provocam hidrofobicidade, dificultando a penetrao de corantes aquosos, a ao dos mordentes e dos diferenciadores, o que no ocorre em outros gneros bacterianos.
5.2.1. Mtodo de Ziehl-Neelsen
10 minutos, aquecendo com chama branda (evitar a fervura), at desprendimento de vapores (essa etapa pode ser realizada em banho-maria, todavia, o tempo de aquecimento dobra para at 20 minutos).
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drico a 1%.
Cobrir o esfregao com azul de metileno, por aproximadamente 30
segundos.
Lavar e deixar secar. Observar em objetiva de imerso (100 X).
5.2.2. Preparo dos corantes
A. Fucsina de Ziehl Fucsina bsica .........................1,0 g lcool absoluto (etanol)............10 mL Dissolver e acrescentar: Fenol aquoso (*) ......................5 mL H2O destilada ......................100 mL Repousar por 48 horas e filtrar em papel de filtro de mdia porosidade. B. Azul de Metileno Azul de metileno.................... 2,0 g lcool absoluto (etanol) ...........10 mL Dissolver e acrescentar: Fenol (*) aquoso..................... 2,2 g Agitar e completar com: H2O destilada ......................100 mL
(*) Fenol aquoso (relao): l00 g de fenol crist. para 100 mL de H2O.
Foi sugerida inicialmente por Henry Albert, em 1920, e modificada por Ross Laybourn, em 1924. Baseia-se no fato de algumas bactrias apresentarem corpsculos citoplasmticos localizados nas regies polares (corpsculos metacromticos ou corpsculos de Babes Ernst), que se coram pelo Lugol forte (de cor marrom), se evidenciando, em contraste com o corpo bacilar, que se cora em verde-azulado pela soluo de Laybourn (Figura 5). Tais caractersticas so observadas nas corinebactrias e sua presena associada aos sintomas clnicos caractersticos da difteria, o que possibilita um diagnstico presuntivo da doena, pela microscopia tica.
5.3.1. Mtodo de Albert-Laybourn
Layborn.
Escorrer (sem lavar). Cobrir com soluo Lugol forte, por aproximadamente 2 minutos. Lavar e secar. Observar em objetiva de imerso (100 X).
5.3.2. Preparo de corantes
A. Soluo de Albert-Laybourn Azul de toluidina.............0,15 g Verde de malaquita ........ 0,20 g cido actico glacial ...........1 mL lcool 95......................2 mL H2O destilada ..............100 mL
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B. Soluo de Lugol Forte Iodo metlico........................... 2,0 g Iodeto de potssio..................... 3,0 g H2O destilada ...................... 300 mL Guardar em frasco mbar ao abrigo da luz.
5.4. Mtodo de Fontana-Tribondeau
Desenvolvido em 1920, no um mtodo de colorao verdadeiro. Na realidade, trata-se de uma tcnica de impregnao pela prata usada para auxiliar a visualizao de bactrias espiraladas, as quais, geralmente, so muito finas e se coram de forma insuficiente pelo Gram (ex.: Treponema pallidum e Leptospira interrogans). A partir desta tcnica, as espiroquetas aparecem em cor marrom-escura ou negra, sobre um fundo amarelo-castanho ou marromclaro (Figura 6). Atualmente, os laboratrios tm utilizado mais a microscopia de campo escuro a fresco para visualiz-las, ou os mtodos de imunoflorescncia (Ver captulo 1 deste volume).
5.4.1. Tcnica de Fontana-Tribondeau
Secar o esfregao ao ar. Derramar sobre a lmina algumas gotas da soluo fixadora (renov-la
Aguardar 30 segundos.
Lavar em gua corrente. Tratar pela soluo impregnadora (nitrato de prata amoniacal), aque-
cendo ligeiramente a lmina at a emisso de vapores, deixando agir por 30 segundos (a preparao toma a cor marrom).
Lavar bem em gua corrente. Secar com papel de filtro. Examinar com objetiva de imerso.
5.4.2. Preparo de corantes
A. Lquido de Ruge (fixador): cido actico glacial....1 mL Formalina 40% .......................2 mL gua destilada.............. 100 mL B. Mordente cido tnico 5 g cido fnico (fundido)... 1 mL gua destilada............. 100 mL Dissolver o cido fnico na gua. Colocar o cido tnico em um balo, adicionar cerca de 10 mL da gua fenicada e misturar bem, para dissolver o mximo possvel. Acrescentar o restante da gua fenicada para completa dissoluo. Filtrar no dia seguinte, se necessrio. C. Nitrato de Prata Amoniacal (soluo impregnadora) Nitrato de prata... 5 g gua destilada..100 mL Reservar 5 mL da soluo acima e, aos 95 mL restantes, adicionar amnia, gota a gota (misturando sempre), at que o precipitado de cor castanho-acinzentada, que se forma, se dissipe. Adicionar, ento, as
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gotas da soluo de nitrato de prata reservada, at desenvolver uma leve opalescncia que persiste aps agitao. Armazenar em frasco escuro.
5.5. Colorao para flagelos
Os flagelos so estruturas bacterianas responsveis pela motilidade, as quais possuem, em sua constituio, molculas proteicas denominadas flagelinas. O flagelo formado por milhares de monmeros polimerizados desta protena, dispostos de forma a compor um nico flagelo (tpico 2). Algumas dificuldades podem ser encontradas quando se deseja demonstrar este tipo de organela atravs de microscopia tica, j que a produo bacteriana de flagelos no contnua e depende de diferentes fatores, como o meio de cultura usado, a temperatura, o estgio do crescimento, etc. Outro fato importante que, devido sua delicadeza, os flagelos podem ser acidentalmente extrados pela pipetagem ou homogeneizao vigorosa. Contribuindo ainda para essa dificuldade, os flagelos se despolimerizam com facilidade, isto , se dissociam em monmeros de flagelina com frequncia (temperaturas acima de 60C e pH cido ( pH 4,0), quando a bactria est em presena de solventes orgnicos, de lcalis e de ureia). Devido a esses problemas, necessrio aplicar algumas tcnicas para aumentar o dimetro dos flagelos, de forma a torn-los visveis pela microscopia. O cido tnico contido no corante se ligar ao flagelo tornando-o mais espesso. A demonstrao do flagelo ocorrer devido ligao do corante ao cido tnico. (Semelhante ao que acontece no Fontana Tribondeau). Por aparecerem muito tnues na lmina, no conseguimos obter nenhuma foto com nitidez suficiente para expor aqui.
em uma placa de gar infuso de crebro-corao (BHI) ou em gar soja tripticase (com ou sem sangue).
Coletar delicadamente uma alquota do crescimento com uma ala de
platina e transferi-la para um tubo, contendo cerca de 3 mL de gua destilada. Inverter o tubo uma vez para homogeneizar a suspenso. Colocar uma gota desta suspenso sobre uma lmina inclinada a 45 o e deixar secar ao ar.
Cobrir a lmina com uma mistura de corantes, que inclui fucsina e
cido tnico (frmula abaixo), e deixar por 5 minutos, at que um brilho metlico esverdeado cubra metade da rea. No deixar o corante secar sobre a lmina.
Retirar o corante, enxaguando com gua. Secar e observar ao micros-
Soluo A: Fucsina (certificada para colorao de flagelo) ........... 0,5 g lcool etlico a 95%......................................... 50 mL Misturar e deixar em repouso durante uma noite, para dissolver. Soluo B: Cloreto de sdio................... 0,75 g cido tnico ........................1,5 g gua destilada...................... 100 mL
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Misturar vigorosamente as duas solues. Esta mistura de corantes pode ser utilizada por at 2 meses, se mantida em refrigerao. Caso haja formao de precipitado, procurar no homogeneizar com o restante da soluo durante procedimento de colorao.
5.6. Colorao para esporos com verde malaquita (Wirtz-Conklin)
A parede dos esporos constitui uma barreira eficaz contra a entrada e sada de materiais do esporo, mas por sua impermeabilidade, geralmente refringente e de difcil colorao. A exposio prolongada ao corante verde malaquita, associado ao aquecimento, permite a penetrao do corante e a colorao do esporo por um verde intenso. Como contraste (contracorante), utiliza-se a safranina, que cora outras estruturas em vermelho, facilitando a diferenciao dos esporos (Figura 7).
5.6.1. Tcnica para colorao de esporos
Preparar esfregao e fixar pelo calor. Cobrir o esfregao com o corante verde malaquita; Aquecer gua em um bquer, at a emisso de vapores. Colocar a
lmina sobre este bquer, mantendo o corante aquecido por 5 minutos. Alternativamente, cobrir a lmina com verde malaquita e aproximar de uma chama at que desprenda vapor, sem deixar que o corante ferva. Afastar do fogo e, aps 1 a 2 minutos, repetir a operao por 3 a 4 vezes.
Lavar suavemente com gua, evitando o choque trmico, que poder
quebrar a lmina.
Adicionar a soluo de safranina por 30 segundos. Lavar e secar.
Soluo A: Verde malaquita a 5% Verde malaquita....................... 2,5 g gua destilada........................ 50 mL Misturar e deixar em repouso durante uma noite para dissolver. Soluo B: Safranina B.1 Soluo estoque Safranina ........................50 g Etanol a 95%.............2.000 mL B.2 Soluo de trabalho Soluo estoque de safranina (B.1)................300 mL gua destilada......................................2.700 mL
Figura 7. Esporos corados pelo mtodo de Wirtz-Conklin
A cpsula uma camada gelatinosa externa (polissacardeos, glicoprotenas ou polipeptdeos) produzida por algumas bactrias e que envolve a parede celular (ver item 2.2.4 - Glicoclice). No existe em todos os microrganismos, todavia, os que a apresentam, possuem maior capacidade de produzir doenas, uma vez que essa estrutura protege a bactria das atividades fagocticas das clulas do hospedeiro. A cpsula constitui um mecanismo de defesa das bactrias, e est relacionada com a patogenicidade bacteriana. A cpsula pode ser detectada por tcnicas imunolgicas, pois possibilita a reao de isolados bacterianos com anticorpos anticapsulares, o que vai
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conduzir ao aparecimento de uma entumescimento capsular (reao de Quellung), quando observada ao microscpio (ver captulo 1 deste volume). A colorao da cpsula no simples, j que o material capsular hidrossolvel e pode ser removido com a lavagem. Por outro lado, os esfregaos no devem ser aquecidos (fixados) porque a contrao da clula pode criar uma zona volta do microrganismo e produzir um artefato que pode ser confundido com a cpsula. Todavia, possvel visualizar bactrias produtoras de cpsula pela colorao negativa (tinta da China), pois a cpsula rejeita as partculas deste corante, permitindo a observao das clulas descoradas sobre fundo negro. Pode-se ainda adicionar fucsina diluda aos esfregaos j secos com tinta da China, neste caso, visualizamos as clulas coradas em rosa, rodeadas por halos incolores (cpsulas), no fundo negro. O mtodo de Hiss outra alternativa para visualizar essa estrutura.
5.7.1. Tcnicas de colorao de cpsula 5.7.1.1. Mtodo da tinta da China (colorao negativa)
cpsula em meio rico (BHI). Uma boa sugesto usar a Klebsiella pneumoniae que produz geralmente essa camada externa em abundncia.
Colocar 1 ou 2 gotas de cultura em uma lmina. Depositar na lmina uma gota de tinta da China ao lado das gotas
de cultura.
Cobrir com uma lamnula, comprimindo-a entre folhas de papel de
filtro, para se obter uma quantidade bem tnue de corante e material (no se esquecer de usar luvas e descartar o papel em local aonde ser autoclavado).
Observar ao microscpio ptico (40X).
secar ao ar.
Corar com fucsina diluda, durante 2 minutos, e lavar suavemente
com gua.
Secar e observar em imerso.
5.7.1.3. Mtodo de Hiss
Neste mtodo, desenvolvido em 1905, utiliza-se, como corante primrio, o cristal violeta aplicado a um esfregao no fixado (o material capsular aparece corado de roxo). Como descorante e corante de contraste, utiliza-se a soluo de sulfato de cobre a 20%. Ao contrrio da clula bacteriana propriamente dita, a cpsula neutra e, por isso, o corante primrio, embora tenha aderido, no absorvido. Uma vez que os constituintes da cpsula so hidrossolveis e podem ser perdidos durante a lavagem, o sulfato de cobre usado como descorante. Ele remove o excesso do cristal violeta que aderiu cpsula e, ao mesmo tempo, atua como corante de contraste, pois absorvido pelo material capsular que ele descorou. Assim, a cpsula aparece agora contrastando com o roxo da clula, como uma zona mais clara (Figura 8). Execuo prtica:
Preparar o esfregao para corar, sem o fixar. Cobrir o esfregao com cristal violeta, deixando agir por 5 a 7
minutos.
Lavar o esfregao com uma soluo de sulfato de cobre a 20%;
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Cristal violeta e fucsina diluda (veja colora- da cpsula bacteriana es anteriores) Soluo de sulfato de cobre a 20%: CuSO4, 5H2O..................20 g gua destilada..............100 mL
Figura 8. Visualizao
5.8. Consideraes
Outros mtodos diferenciais podem, e so, utilizados para evidenciar diversos gneros bacterianos, bem como modificaes dos mtodos aqui apresentados. Atualmente, por exemplo, em vez do cristal violeta, preconizado pelo Ministrio da Sade a violeta de metila que, inclusive, j fixa a amostra lmina sem necessitar da fixao na chama do bico de Bunsen. Todas as mudanas que so implementadas a esses mtodos e a criao de novas tcnicas tm o intuito de melhorar e clarificar a visualizao bacteriana no microscpio tico de campo claro, porm, temos a certeza de que, na rotina diria de um laboratrio de anlises clnicas, estes mtodos sero, sem dvida, os de maior utilizao e de aplicao mais global. Outro fator importante o controle de qualidade das substncias a serem utilizadas e das tcnicas. Sempre que for realiz-las, o ideal ter em mos bactriaspadro, com comportamento conhecido diante dos corantes/reagentes que sero usados no teste. Elas serviro de parmetro do funcionamento do mesmo, auxiliando tambm o observador na comparao do resultado esperado, com o obtido na amostra em pesquisa.
O cultivo dos microrganismos, em condies laboratoriais, um prrequisito para seu estudo adequado. Para que isto possa ser realizado, necessrio o conhecimento de suas exigncias fsicas e nutritivas. Estas informaes resultaram no desenvolvimento de numerosos meios de cultura. Por causa da grande diversidade das exigncias nutritivas das bactrias, h, tambm, grandes diferenas na composio dos meios utilizados.
6.1. Meio de cultura
qualquer substncia, slida, semisslida ou lquida, que possua um conjunto de fontes de nutrientes e que seja utilizada para o cultivo de microrganismos.
6.2. Classificao dos meios de cultura
Os meios de cultura podem ser classificados segundo o seu estado fsico, em funo da adio de agentes solidificantes, pela sua composio e pelo seu objetivo de utilizao.
6.2.1. De acordo com o agente solidificante (gelose ou gar-gar)
A partir de um meio lquido, pode-se adicionar gelatina (gelose) ou gar-gar para torn-lo mais ou menos consistente. A gelose, muito utilizada no passado, podia ser metabolizada por alguns microrganismos. Hoje, no entanto, se utiliza muito mais o gar-gar, que somente tem papel solidificante. O gar-gar uma substncia coloidal e hidroflica (grupo das mucilagens) extrada de algas vermelhas, que possui ponto fuso a aproximadamente 100oC e de solidificao a aproximadamente 40oC. A adio (de diferentes quantidades) ou no desta substncia no meio vai conferir-lhe diferentes consistncias.
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3,0 g % de gar (podem ser liquefeitos se aquecidos). A maioria dos microrganismos crescem formando colnias. Ex: gar nutritivo.
Meios Semislidos - Onde so adicionados, geralmente, de 0,1g a
0,7g% de gar. Servem, por exemplo, para visualizar a motilidade bacteriana ou, muitas vezes, como base de meio de transporte. Ex: Meio SIM e Cary & Blair.
Meios Lquidos - Sem adio de gar. So os chamados caldos. Sua
turvao sinal de crescimento bacteriano. Ex: Caldo nutritivo, caldo simples e caldo Casoy. O procedimento correto para obteno ideal de meio contendo gar exige, aps sua adio, o aquecimento para sua dissoluo em gua fervente at a soluo tornar-se cristalina e sem grumos. importante tambm no refundir vrias vezes o meio (alterao no valor nutritivo, percentual de gua, etc.). Outro detalhe importante que a aferio do pH, nos meios slidos e semisslidos, deve ser feita a 50 oC e, nos meios lquidos, temperatura ambiente.
6.2.2. De acordo com a composio qumica
ponentes desconhecida (geralmente quando se adiciona soro, sangue ou outro componente que no se tem total conhecimento da composio qumica). Os meios podem ser totalmente preparados no laboratrio, seguindo formulaes (receitas), ou a partir de meios dessecados (geralmente s adicio-
na-se gua). Em ambos os casos, a gua utilizada deve ser limpa, recmdestilada e neutra.
6.2.3. De acordo com o objetivo da utilizao
gue, soro, extratos de tecidos animais ou vegetais ao caldo, ou gar nutritivos, proporciona nutrientes acessrios, passando a permitir o crescimento de organismos heterotrficos fastidiosos (mais exigentes). Um exemplo clssico o gar chocolate, que permite o crescimento de diversas bactrias exigentes. No confundir meios enriquecidos com meios de enriquecimento, como os caldos tetrationato de Kauffman e selenito, que geralmente possuem produtos seletivos ou proporcionam somente o crescimento de determinado grupo bacteriano.
Meios Seletivos - A adio de substncias qumicas especficas ao
caldo ou ao gar nutritivo previne o crescimento de um grupo de bactrias sem agir sobre outro. Ex1: Cristal-violeta impedindo o crescimento de Gram-positivos, sem afetar o desenvolvimento dos Gram-negativos. Ex2: Alguns antibiticos adicionados podem inibir um grupo de bactrias sensveis e no afetar outro (resistentes).
Meios diferenciais ou indicadores - A adio de certos reagentes ou
substncias no meio pode resultar num tipo de crescimento ou reao, aps a inoculao e a incubao, que permite ao observador distinguir diferentes tipos de bactrias.
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Ex: Incorporao de lactose e um indicador de pH: fermentadores ou no deste acar, lactose (+) e lactose (-) formaro colnias com cores distintas.
Meios de dosagem - Meios de composio definida (meios sintticos).
determinar o contedo bacteriano de materiais, como, por exemplo, gua, urina, leite, etc. (podem ser ricos, seletivos ou diferenciais).
Meios de estocagem ou manuteno Geralmente meios mni-
mos. A manuteno da viabilidade e caractersticas fisiolgicas de uma cultura pode exigir um meio diferente do recomendado para um bom crescimento timo. Na preparao de um meio de estocagem, prefervel omitir a glicose e utilizar uma substncia tampo, evitando variaes de pH.
Meios de transporte Geralmente semisslidos, para evitar o
extravasamento. So semelhantes aos meios de manuteno e devem ter o mnimo de nutrientes para a manuteno das bactrias sem que estas se reproduzam ou acidifiquem o meio. Um ponto importante neste tpico o controle de qualidade dos meios, onde devemos observar os possveis erros na sua preparao e seu armazenamento de forma ideal.
6.3. Substncias usadas no preparo de meios de cultura
Os nutrientes do meio de crescimento devem conter todos os elementos necessrios sntese biolgica de novos organismos.
6.3.1. Fonte de carbono
O carbono um elemento indispensvel sntese dos compostos celulares, e deve ser fornecido bactria, seja na forma de composto orgnico,
como os acares, ou inorgnicos, no caso, o CO2. As bactrias capazes de utilizar CO2 como nica fonte de carbono so autotrficas; enquanto as que requerem, alm de CO2, uma fonte orgnica de carbono, so heterotrficas. Em muitos casos, um mesmo composto pode funcionar como fonte de carbono, doador de hidrognio e fonte de energia.
6.3.2. Fonte de nitrognio
O nitrognio tambm necessrio para a sntese de compostos indispensveis clula. Algumas bactrias necessitam de fontes orgnicas de nitrognio, como aminocidos ou sais orgnicos de amnio, enquanto outras so capazes de utilizar fontes inorgnicas de nitrognio, como nitratos, amnio ou o prprio nitrognio atmosfrico.
6.3.3. Outros compostos
As bactrias necessitam ainda de fontes de enxofre e fsforo, que so geralmente fornecidos na forma de sulfatos e fosfatos. Alm disso, devem estar presentes no meio, sais de sdio, potssio e magnsio, que so necessrios em concentraes relativamente elevadas. Outros elementos, tais como zinco, ferro e mangans, so necessrios em concentraes to baixas que so supridos como impurezas dos demais componentes utilizados no preparo do meio. As bactrias precisam tambm de vitaminas, que devero ser tambm incorporadas ao meio de cultivo. Todavia, muitas podem sintetiz-las e, nestes casos, as necessidades so supridas pelo prprio microrganismo.
6.4. Fatores ambientais que afetam o crescimento de microrganismos
Alm do conhecimento dos nutrientes apropriados para a cultura das bactrias, preciso saber quais as melhores condies fsicas ambientais para o desenvolvimento microbiano.
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Assim como as bactrias variam grandemente, no que diz respeito as suas exigncias nutritivas, tambm demonstram respostas diversas s condies fsicas do ambiente. Ex: Exigncias atmosfricas, pH, temperatura, presso osmtica (ver item 8 deste volume).
6.5. Seleo dos meios de cultura primrios
Para um timo isolamento bacteriano essencial inocular a amostra no meio de cultura primrio apropriado; porm, h vrias centenas de meios disponveis no mercado. Na seleo para o uso rotineiro deve-se optar por um nmero relativamente pequeno de meios seletivos e no seletivos. Um exemplo de meio no seletivo muito utilizado o gar sangue (permite o crescimento da maioria das bactrias). Podemos fazer outras opes mais seletivas, com base na fonte ambiental ou anatmica do material e no conhecimento das espcies bacterianas comumente encontradas nas amostras, observando sempre se h suspeita de algum microrganismo em particular. Uma populao microbiana, sob condies naturais, contm muitas espcies diferentes. Os microbiologistas devem ser capazes de isolar, enumerar e identificar as bactrias da amostra, para ento classific-las e caracteriz-las.
6.6. Isolamento e cultivo de culturas puras
Para determinarmos as caractersticas de um microrganismo, identific-lo e apont-lo como suspeito de causar ou no uma patologia, ele deve estar em cultura pura. Para realizar o isolamento, devemos optar pelo meio de cultura mais adequado no deixando de considerar os fatores-chave para esta escolha:
Consideraes sobre a origem do material a ser analisado. A espcie que se imagina estar presente nesta amostra. As necessidades nutricionais dos organismos.
O material a ser analisado deve ser cultivado em meio slido. Este processo pode ser feito das seguintes formas:
Tcnica de semeadura por espalhamento em superfcie, onde uma
quantidade definida da amostra diluda colocada na superfcie do gar e, com o auxlio de uma ala de semeadura de vidro (ala de Drigalsky - ver captulo 2 do volume 1), espalhada sobre todo o meio com movimentos repetidos at absoro total do lquido. Posteriormente a placa incubada. Essa tcnica muito usada para clculo de bactrias, pois permite a obteno das colnias isoladas de forma homognea sobre o meio, facilitando a contagem.
Mtodo de Pour-plate, ou placa derramada, onde a amostra diluda
em tubos contendo meios slidos liquefeitos (45 o C). Aps homogeneizao, o contedo do tubo distribudo em placa de Petri e aps a solidificao do meio, a placa incubada. As colnias se desenvolvero tanto acima quanto abaixo da superfcie (colnias internas). Esse mtodo tambm permite a contagem, j que o isolamento das colnias ocorre de forma bem distribuda na placa.
Tcnica de esgotamento por meio de estrias superficiais, onde a amos-
tra semeada na superfcie do meio solidificado com ala bacteriolgica, em movimentos de zigue-zague, para esgotar a populao, assim, em algumas regies do meio aps a incubao, colnias individualizadas estaro presentes. Em cada uma dessas tcnicas o objetivo diminuir a populao microbiana, assim, as clulas bacterianas individuais estaro localizadas a certa distncia umas das outras. As clulas individuais produziro, se estiverem distantes o suficiente, uma colnia que no entra em contato com outras colnias. Todas as clulas em uma colnia tm o mesmo parentesco. Para isolar uma
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cultura pura, uma colnia individual transferida do cultivo inicial para um tubo de ensaio (geralmente tambm com meio de cultura).
6.7. Conservao das culturas puras
Uma vez que os microrganismos tenham sido isolados em cultura pura, necessrio manter as culturas vivas por um perodo de tempo, com o objetivo de estud-las. Para armazenar por um perodo curto, as culturas podem ser mantidas temperatura de refrigeradores (4 a 10oC). Para armazenar por um perodo longo, as culturas so mantidas congeladas em nitrognio lquido (-196oC) ou em freezers (-70 a -20oC), podendo tambm ser desidratadas e fechadas a vcuo em um processo denominado liofilizao. Esses mtodos so de grande valia para manter a cultura armazenada em uma coleo. As colees de culturas so bancos de microrganismos e outras clulas que esto disposio de pesquisadores, professores, investigadores de patentes, e todos que necessitem estudar um tipo particular de organismo (no nosso caso, bactrias). As clulas so congeladas ou liofilizadas para resistirem a qualquer variao que possa destruir a identidade da clula original.
7. Reproduo bacteriana e fases de crescimento
Quando temos uma cultura bacteriana inoculada em meio adequado e incubada sob condies apropriadas vamos acabar tendo o aumento de clulas bacterianas que pode ser facilmente evidenciado atravs de diversos mtodos, como turvao do meio, determinao da massa celular, contagem de clulas, entre outros. O processo mais comum e mais importante que ocorre nestes microrganismos a diviso binria transversal ou simples, onde o aumento da popula-
o ocorre em progresso geomtrica (1 2 4 8 16 .....2 n), sendo n = no de geraes. O nmero de geraes em um determinado tempo varia de acordo com a bactria, podendo ser extremamente curto ( E.coli 15 minutos) ou bastante longo (M. tuberculosis 932 minutos). Atravs do estudo desta reproduo e de contagens praticadas a intervalos adequados, podemos traar uma curva de crescimento bacteriano in vitro e estabelecer, desta forma, as vrias fases deste processo:
7.1. Fase estacionria (1a) ou fase Lag
No h reproduo. Inicia-se aps o momento da semeadura. A populao permanece temporariamente inalterada. Nesta fase, as clulas no esto em repouso ou dormncia, elas aumentam no tamanho (alm do normal) e fisiologicamente esto muito ativas - podem estar deficientes em enzimas e/ou coenzimas que precisam sintetizar (Figura 9 A). No final desta fase, as clulas iniciam a diviso e aumentam gradualmente a populao at o trmino da fase Log.
7.2. Fase logartmica (fase Log ou exponencial)
A populao passa a ter capacidade de se dividir regularmente em ritmo constante (o logaritmo resultante uma linha reta). A velocidade de crescimento mxima nesta fase, com a populao uniforme - progresso geomtrica (Figura 9 B).
7.3. Fase estacionria (2a) ou fase Plat
A fase log comea a decrescer (gradualmente) tendendo para o fim do crescimento. Atribuda a uma srie de circunstncias, como exausto de alguns nutrientes e a produo de produtos txicos. A populao permanece constante, resultado do equilbrio entre reproduo (clulas neoformadas) e morte celular (Figura 9 C).
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A falta de nutrientes e de espao, aliada a toxidez do ambiente, leva os microrganismos a morrerem mais rpido do que produzem novas clulas extermnio progressivo at a cultura se tornar estril (Figura 9 D). Figura 9. Faces do crescimento bacteriano in vitro
Como j foi comentado, alm do conhecimento dos nutrientes apropriados para o cultivo das bactrias, necessrio saber que condies fsicas ambientais so melhores para o seu desenvolvimento. Assim como existe grande variao, no que diz respeito as suas exigncias nutritivas, estes organismos tambm demonstram respostas diversas s condies fsicas do ambiente.
8.1. Temperatura
Temperatura tima de crescimento: a temperatura de incubao, que possibilita o mais rpido crescimento, durante menor tempo de acordo com o perodo de gerao de cada gnero bacteriano (12 a 24 horas, para a maioria das bactrias comuns). A temperatura tima de crescimento pode no ser a temperatura tima de outras atividades celulares. Estes valores podem ser diferentes, dependendo dos autores consultados, porm, em mdia, obedecem ao critrio abaixo:
Bactrias psicrfilas So capazes de crescer a 0C ou menos,
embora seu crescimento timo esteja em temperaturas mais elevadas, 12C ou 20C. Diversas espcies de bactrias isoladas na Antrtica podem crescer a -7C, mas seu desenvolvimento timo ocorre entre 20C a 30C.
Bactrias mesfilas Crescem melhor de 25C a 40C. Neste
grupo est a maioria dos patgenos bacterianos de importncia clnica, j que esta temperatura coincide com a do nosso corpo.
Bactrias termfilas Crescem melhor de 45C a 60C. O limite
de crescimento de algumas bactrias termfilas se estende para a regio mesfila, recebendo a designao de termfilas facultativas ou euritermfilas. Outras espcies do grupo termfilo se desenvolvem melhor em temperaturas acima de 60C, no se desenvolvendo na faixa mesfila. So chamadas bactrias termfilas verdadeiras, obrigatrias ou estenotermfilas.
8.2. Oxignio
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a de oxignio, por utilizarem este composto como receptor final de eltrons. Ex.: Acinetobacter.
Bactrias anaerbias facultativas ou apenas facultativas Podem
inibidas ou mortas na presena de O2, que no utilizado em seu metabolismo. Ex.: Clostridium botulinum.
Bactrias microaerfilas - S crescem em atmosfera contendo concen-
traes de oxignio menores que as encontradas no ar atmosfrico. Ex.: Campylobacter No laboratrio, muito simples cultivar bactrias aerbias ou facultativas, visto que o oxignio est sempre no ar, contudo, para a obteno de atmosferas isentas ou pobres de oxignio, usamos mtodos especiais.
O emprego de meios redutores e frascos bem fechados, que so chamados comercialmente de jarras (Figura 10), juntamente com tcnicas para diminuir ou eliminar o oxignio do seu interior, possibilitaro o estudo das bactrias microaerfilas e anaerbias. Pode-se gerar uma reao qumica, combi- Figura 10. Jarra hermtica nando o O2 na formao de um novo composto. Isso pode ser conseguido pela simples queima de uma vela O2 dixido de carbono, ou atravs de geradores comerciais de atmosfera vendidos na forma de envelopes, como bicarbonato de sdio e borohidreto de sdio. Essas substncias combinadas com gua liberam dixido de carbono e hidrognio, que a partir de um catalisador de paldio contido na jarra forma gua. Alm disso, o dixido de carbono tambm estimula o crescimento de vrias bactrias. Poderemos ter uma atmosfera de microaerofilia ou anaerobiose, dependendo da tcnica e da forma de eliminar ou impedir a presena do oxignio. Outra possibilidade o emprego de meios especiais contendo agentes redutores, como o meio de tioglicolato, que capaz de se combinar com o oxignio dissolvido eliminando-o do meio de cultura. Pode-se tambm adicionar um indicador de presena de oxignio, como o azul de metileno. Pode-se realizar a remoo mecnica do oxignio de um frasco fechado, contendo tubos ou placas com meios inoculados o ar atmosfrico aspirado e substitudo por nitrognio, hlio ou por uma mistura de nitrognio e dixido de carbono.
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8.3. pH
A grande maioria das bactrias cresce bem em meios com pH ao redor de 6,5 a 7,5, apesar de muitas espcies tolerarem variaes de pH entre 4,0 e 9,0. Os meios de cultura so geralmente tamponados para evitar mudanas de pH, decorrentes da excreo de produtos do prprio metabolismo bacteriano. Os tampes so compostos que podem resistir s mudanas de pH. A combinao de KH 2PO4 e K2HPO4 largamente utilizada nos meios de cultivo, mas alguns ingredientes nutrientes do meio, tais como as peptonas, tambm possuem a capacidade de tamponamento.
8.4. Outros fatores
Presso osmtica- Meios de cultura com presses osmticas menores que o interior da bactria, geralmente no afetam sua viabilidade, uma vez que a rigidez da parede celular impede a entrada excessiva de gua. Todavia, meios de cultura com presses osmticas maiores que a encontrada no interior da bactria causam perda de gua intracelular (efeito bacteriosttico ou bactericida). Observao: Halofismo - Certas bactrias isoladas de salmouras, pacotes de sal, alimentos e gua do mar, chamadas bactrias haloflicas ou halfitas obrigatrias, crescem apenas quando o meio contm uma concentrao inusitadamente elevada de sal (10% a 15%). Isto representa uma resposta especial do microrganismo presso osmtica. Luminosidade - Alguns organismos autotrficos fotossintticos devem ser expostos a uma fonte luminosa, pois a luz sua fonte de energia. Outros liberam pigmentos quando expostos a luz, o que facilita na sua taxonomia.
Para proceder adequadamente ao controle dos microrganismos, lanamos mo de processos de esterilizao e desinfeco, que podem ser fsicos ou qumicos (ver captulo 2 do volume 1). Outras formas de controle bacteriano (principalmente in vivo) podem ser realizadas utilizando quimioterpicos e antimicrobianos (tpico 9).
10. Quimioterapia e antibioticoterapia (Mecanismos de ao dos antimicrobianos)
Graas aos trabalhos do mdico alemo Paul Erlich (1854 - 1915), com a descoberta de dois agentes quimioterpicos entre 1909 e 1912, o Salvarsan e Neosalvarsan (arsenobenzis), deu-se incio a era das substncias capazes de atingir o microrganismo causador da doena, sem prejuzo ao portador (doente). Erlich introduziu o ndice quimioterpico, que era expresso pela razo entre a dose mxima tolerada e a dose mnima curativa. De acordo com seus trabalhos, um alto ndice quimioterpico alcanado pelas substncias que apresentam um alto parasitotropismo e um baixo organotropismo. Sintetizada em 1908 pelo qumico Paul Gelmo, que estudava corantes, e pesquisada posteriormente em 1935 como substncia bacteriosttica pelo Nobel de Fisiologia e medicina (1939) Gerhard Johannes Paul Domagk (1895 1964), que batizou seu composto de prontosil, a sulfanilamida, resultou at 1945 em 5488 derivados. Utilizada at hoje, mais conhecida com o nome de sulfa (Figura 11): Figura 11. Configurao do Prontosil.
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A partir desta descoberta, vrios outros produtos foram sintetizados, com o objetivo de se encontrar preparaes cada vez menos txicas. Em 1929, Sir Alexander Fleming (Nobel de Fisiologia e Medicina, em 1945) observou, por casualidade, que um fungo contaminante no s estava crescendo em uma placa de cultura que havia sido deixada aberta por descuido, como tambm as colnias de estafilococos, crescidas na placa, prximas a este fungo, estavam sofrendo lise. O pesquisador concluiu ento que o Penicillium notatum (fungo que contaminou a placa) produzia uma substncia bacterioltica - o antibitico que veio a ser conhecido como Penicilina , dando incio a era dos antibiticos. No ano de 1940, Selman Waksman (descobridor da estreptomicina) definiu um antibitico como sendo uma substncia qumica produzida por microrganismos, que tem a capacidade de inibir o crescimento de bactrias (ao bacteriosttica), e at mesmo a de destruir bactrias e outros microrganismos (ao bactericida). Atualmente, a denominao dos antimicrobianos feita assim:
Antibiticos Antimicrobianos cuja produo (fabricao) se d a
partir de microrganismos (fungos, bactrias, etc.). Ex.: Penicilina - Produzida pelo fungo Penicillium notatum .
Quimioterpicos Antimicrobianos cuja produo (fabricao) se
d atravs de substncias sintetizadas em laboratrio. Ex.: Fluoquinolonas, Aspirina, etc. Em Microbiologia, nos dedicamos aos agentes antimicrobianos, que formam um grupo especial de agentes quimioterpicos usados para tratar doenas causadas por microrganismos.
Agentes antimicrobianos so frmacos ativos no tratamento de infeces em razo de sua toxidade seletiva (destroem o microrganismo invasor sem afetar as clulas do hospedeiro). Em muitos casos, a toxidade seletiva no absoluta, exigindo que a concentrao do antimicrobiano seja controlada cuidadosamente, de modo a afetar o microrganismo em nveis tolerveis para o hospedeiro. A terapia seletiva com antimicrobianos usa como vantagem as diferenas bioqumicas existentes entre os microrganismos e os seres humanos. Para se selecionar o agente antimicrobiano mais apropriado, deve-se ter conhecimento da identidade do microrganismo e sua sensibilidade aos agentes em particular, o stio de infeco, os fatores ligados ao paciente e o custo da terapia. Os antimicrobianos podem ser usados de trs maneiras gerais como terapia emprica, como terapia definitiva e como terapia preventiva ou profiltica. Na terapia emprica ou inicial, o antibitico dever cobrir todos os microrganismos provveis (Gram-positivos e Gram-negativos), visto que o patgeno, ou patgenos, que esto causando a infeco, no foram identificados. Esse tipo de terapia poder ser realizada com mais de um antimicrobiano (terapia combinada) ou com apenas um (monoterapia), e usada frequentemente com agentes de amplo espectro. No entanto, com o microrganismo j identificado, a terapia antimicrobiana definitiva dever ser iniciada com um esquema de espectro estreito e baixa toxicidade, baseado no resultado do antibiograma. Quando o uso de um antimicrobiano est indicado na terapia profiltica, como no caso de cirurgias ou extraes dentrias, devemos no s escolher aquele agente que seja ativo contra o microrganismo ou microrganismos, infectantes mais provveis, mas o que possua o menor potencial de causar toxidade ou reaes alrgicas no paciente que ser exposto ao risco de infeco.
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A combinao do trimetoprim com o sulfametoxazol (antimicrobiano pertencente a classe das sulfas), torna-o clinicamente eficaz, pois, quando dois frmacos atuam sobre diferentes etapas da reao enzimtica obrigatria nas bactrias, o resultado de sua combinao sinrgico. Na maioria dos pases, a combinao conhecida como cotrimoxazol, mas o trimetoprim est disponvel no mercado isoladamente (Figuras 12 e 13). A associao dos frmacos permite uma melhor ao no microrganismo do que quando administrados separados. A este fato chamamos de otimizao da ao do antimicrobiano. A ao destes antimicrobianos ocorre por inibio de duas etapas da via enzimtica, para sntese do cido tetraidroflico: A inibio da incorporao do cido p-aminobenzoico (PABA) no cido flico, pela sulfonamida, enquanto o trimetoprim impede a reduo do diidrofolato em tetraidrofolato (folato essencial para reaes de transferncia de carbono). A toxidade seletiva destes antimicrobianos se d atravs de:
Clulas de mamferos que utilizam folatos pr-formados da dieta e no
sintetizam o composto.
Trimetoprim, que um inibidor seletivo da diidrofolato redutase en-
contrada somente em organismos inferiores, logo, para este frmaco inibir a enzima redutase humana, necessria uma quantidade 100 mil vezes maior da que usada em bactrias. Outras sulfas tambm so comercializadas, como, por exemplo: sulfadiazina, sulfacetina, sulfamoxol, sulfametoxipiridazina, sulfaleno, sulfatalidina, nitrosulfatiazol, etc.
Na classe da sulfonas, temos como representante principal a dapsona (Figura 14). Esta famlia de frmacos possui o mesmo modo de ao das sulfas (inibio da incorporao do cido p-aminobenzico (PABA) no cido flico). As sulfas so ativas contra algumas espcies da famlia Enterobacteriaceae, Chlamydia, Pneumocystis e Nocardia. Enquanto a dapsona age com ao bacteriosttica em Mycobacterium leprae.
Figura 12. Sulfametoxazol (sulfa) Figura 13. Trimetoprim
10.2.2. Quinolonas
O cido nalidxico (Figura 15) o membro mais antigo dessa classe de antimicrobianos sintticos, sendo muito usado no tratamento de infeces do trato urinrio. Este frmaco no possui grande importncia, devido sua limitao teraputica e o desenvolvimento de resistncia bacteriana. Por esse motivo, foi necessrio adicionar, na molcula deste antimicrobiano, a 4-quinilona fluorada, dando origem a fluoquinolona. Representada pela ciprofloxacina, ofloxacina, norfloxacina, gatifloxacina, levofloxacina, moxifloxacina e lomefloxacina. Este fato representou um grande avano teraputico, visto que as fluoquinolonas possuem uma ampla atividade antimicrobiana e grande efic-
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cia aps administrao via oral no tratamento de diferentes infeces, causadas por microrganismos Gram-negativos (Figura 16). A ao destes antimicrobianos se d na DNA-girase (enzima responsvel pela forma espiral do DNA) e na topoisomerase IV (enzima que separa molculas-filhas de DNA interligadas (encadeadas), que so o produto da replicao do DNA) bacteriana. As quinilonas possuem uma excelente toxidade seletiva, pois s inibem a topoisomerase II das clulas eucariticas em concentraes bastante elevadas (100 a 1.000 mg/mL).
Figura 15. cido nalidixico (Quinolona) Figura 16. Norfloxacina (Fluoroquinolona)
10.2.3. Antisspticos
Em uma infeco do trato urinrio, inibem o crescimento de muitas espcies bacterianas, porm no podem ser utilizados no tratamento de infeces sistmicas, pois no se obtm concentrao eficaz no plasma com a administrao de doses seguras. Por se concentrarem nos tbulos renais, esses frmacos podem ser utilizados por via oral no tratamento de infeces urinrias. A nitrofurantona (Figura 17), representante desta classe, um nitrofurano sinttico utilizado na preveno e no tratamento de infeces urinrias. Inibe tanto bactrias Gram-positivas, quanto Gram-negativas, devendo ser utilizado em microrganismos comprovadamente sensveis a este frmaco.
O mecanismo de ao da nitrofurantona se inicia quando as bactrias reduzem (metabolizam) o antimicrobiano, produzindo um produto que inibe vrias enzimas, principalmente a acetil coenzima A (ciclo de Krebs), lesando o DNA bacteriano. Esta atividade maior quando a urina est com pH (potencial de hidrognio) cido. A nitrofurantona pode ter ao bacteriosttica ou bactericida dependendo da concentrao utilizada (bactericida 100 m g/mL; bacteriosttica 32mg/mL). As clulas de mamferos no reduzem to rapidamente a nitrofurantona quanto s clulas bacterianas, logo, acredita-se que esta seja a atividade antimicrobiana seletiva deste frmaco. Figura 17. Nitrofurantona
10.2.4. Betalactmicos
So antimicrobianos que possuem em sua molcula um anel b-lactmico (Figura 18A), importantssimo para sua atividade bactericida (ao que leva o microrganismo morte).
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Penicilinas
Fazem parte de um dos grupos mais importantes entre os antimicrobianos (Figura 18B), possuem grande eficcia e esto entre os frmacos menos txicos, sendo amplamente usado em diferentes doenas infecciosas.
Cefalosporinas
So antimicrobianos b-lactmicos correlacionados diretamente com as penicilinas, tanto do ponto de vista estrutural como funcional, e possuem anlogos estruturais, conhecidos por cefamicinas (cefoxitina). A produo das cefalosporinas semissinttica (adio qumica de cadeias laterais Figura 18C). As cefalosporinas so classificadas em: primeira, segunda, terceira, quarta e quinta gerao. Essa classificao foi criada levando-se em considerao os padres de sensibilidade bacteriana e a resistncia b-lactamases (enzimas que conferem resistncia s cefalosporinas de amplo espectro, penicilinas, monobactans e aztreonam). Estas enzimas foram denominadas ESBL b-Lactamases de Espectro Ampliado devido ao fato da maioria dessas enzimas serem codificadas por genes localizados em plasmdios, que geralmente carregam genes de resistncias a outros antimicrobianos. Os mecanismos de ao das penicilinas e cefalosporinas so:
Inibio da transpeptidase (impedem que a ltima molcula de glicina
se ligue ao quarto resduo do pentapeptdeo, assim prejudicando a formao de peptidoglicana que compe a parede celular).
Evitam a formao do glicopeptdeo da parede celular, atravs de sua
fixao nas protenas de ligao da penicilina (PBP). Logo, no h elongao posterior da cadeia glicopeptdica. De modo geral, podemos dizer que as cefalosporinas so inibidoras seletivas da sntese da parede celular bacteriana.
Carbapenens
Esse grupo possui um anel b-lactmico fundido a outro anel no blactmico de cinco membros (Figura 18D), se diferenciando das penicilinas por terem o segundo anel insaturado e conter um tomo de carbono em lugar do tomo de enxofre. Esse antimicrobiano possui espectro de atividade mais amplo do que outros antibiticos b-lactmicos. Esta classe representada pelo imipenem (Figura 18E), meropenem e ertapenem. Sua ao se unir s protenas de ligao da penicilina, interrompendo a sntese da parede celular bacteriana e provocando a morte dos microrganismos. muito resistente hidrlise pela maioria das b-lactamases. No mercado, comercializado em combinao com a cilastatina, um frmaco que inibe a degradao do imipenem por uma dipeptidase do tubular renal. Essa associao mostra-se eficaz no tratamento de infeces causadas por bactrias Gram-positivas, Gram-negativas fermentadoras e no-fermentadoras, e anaerbias. Figura 18. Betalactmicos
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Monobactmicos
Os representantes desta classe so o aztreonam (Figura 19), o carumonam, o tigemonam e o pirazmonam. Sendo o aztreonam um b-lactmico isolado da bactria Chromobacterium violaceum. Sua ao se d pela interao com as protenas ligadoras de penicilinas (PBP), interrompendo a sntese da parede celular. Possui ao contra bacilos Gram-negativos aerbios. Figura 19. Aztreonam (Monobactmico).
Os aminoglicosdeos possuem aminoacares ligados a um anel aminociclitol por ligaes glicosdicas. Estes frmacos so utilizados primariamente no tratamento de infeces causadas por bactrias Gram-negativas aerbicas, em pacientes alrgicos a penicilina, alm de tratarem infeces por Chlamydia, Mycoplasma, Ureaplasma, Corynebacterium diphtheriae e Legionella pneumophila. Por serem importantes drogas, amplamente utilizadas, a grave toxicidade dos aminoglicosdeos uma das principais limitaes de sua utilizao. As toxidades mais comuns so as nefrotoxicidade e a ototoxicidade. Seus principais representantes so a estreptomicina (Figura 20), a neomicina, a gentamicina, a canamicina (Figura 21), a tobramicina, a amicacina e a netilmicina. Sendo estes dois ltimos aminoglicosdeos sintticos e os outros naturais.
Os antimicrobianos aminoglicosdeos caracterizam-se pelo efeito psantibitico (persistncia de uma atividade bactericida aps a queda da concentrao srica). Agem inibindo a sntese de protenas e reduzindo a fidelidade da traduo do mRNA no ribossomo. Apesar da rpida ao bactericida, essas substncias no atuam sobre bactrias intracelulares, como o Mycobacterium, por exemplo. As tetraciclinas possuem quatro anis fusionados com um sistema de duplas ligaes conjugadas (Figura 22). Tm como representante desta classe a tetraciclina, a doxiciclina e a minociclina. Sua ao se d pela ligao do frmaco com a subunidade 30S do ribossoma bacteriano, bloqueando o acesso do aminoacil-RNAt ao complexo ribossoma RNAm, para, assim, inibir a sntese de protena pelo microrganismo. So eficazes contra bactrias e outros microrganismos ( Corynebacterium acnes , Haemophilus influenzae, Vibrio cholerae , Rickettsia rickettsii, Aspergillus spp., Nocardia spp., Chlamydia spp., Mycoplasma spp., etc.).
Figura 20. Estreptomicina. Figura 21. Canamicina.
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Os macroldeos so frmacos com estrutura lactnica macroltica. Sendo a eritromicina o primeiro antimicrobiano a ter aplicao clnica, em indivduos alrgicos aos b-lactmicos. A claritromicina, forma metilada da eritromicina (Figura 23), e a azitromicina possuem determinadas caractersticas comuns e algumas particulares. A azitromicina possui um anel lactnico maior, o que a torna superior a eritromicina. No mercado, foi lanada tambm a diritromicina, que possui similaridade com a eritromicina em espectro antibacteriano, tendo como vantagem o uso da dose unitria diria. As lincosamidas tm como representantes a lincomicina e a clindamicina . A clindamicina (Figura 24) usada em tratamentos de infeces causadas por bactrias anaerbias, como o Bacteroides fragilis. Tambm muito eficaz em cocos Gram-positivos no enteroccicos. Tanto os macroldeos quanto as lincosamidas possuem o mesmo mecanismo de ao, fazendo ligao com a subunidade 50S do ribossoma bacteriano, que inibem a translocao de RNAt, permitindo o bloqueio da unio de aminocidos (AA) para a sntese de protenas. Os anfenicis tm como principal representante o cloranfenicol (Figura 25). Este frmaco usado em infeces causadas por bactrias Grampositivas e Gram-negativas, mas, por serem muito txicos, so usados somente em infeces graves para as quais no haja outro antimicrobiano. Sua ao se d por inibir a fixao do RNAm aos ribossomos, ligando-se na subunidade 30S, alm de impedir a unio de aminocidos na formao do polipeptdeo.
10.2.7. Glicopeptdeos
Esta classe de antimicrobiano tem como principais representantes a vancomicina e teicoplanina. A vancomicina (Figura 26) produzida pelo
Streptomyces orientalis. J a teicoplanina produzida pelo Actinoplanes teichomyceticus. So muito utilizadas em infeces por bactrias Gram-positivas. Agem na inibio da sntese de parede celular por antagonizarem (interferncia de uma substncia na ao de outro composto) competitivamente a polimerizao das cadeias de peptidoglicano.
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10.2.8. Polimixinas
So antimicrobianos polipeptdicos (Figura 27) que possuem ao antimicrobiana por se ligarem a constituintes lipoproteicos da membrana plasmtica, destruindo sua barreira osmtica seletiva. Estes frmacos agem em bactrias Gram-negativas (incluindo Pseudomonas aeruginosa), no possuindo atividade sobre bactrias Gram-positivas. Figura 27. Polimixina.
A lise do anel b-lactmico, pode ocorrer por clivagem enzimtica (por ao da enzima b-lactamase) ou por cido, destruindo a atividade antimicrobiana.
Os frmacos que representam esta classe possuem um anel b-lactmico, porm, destitudos da atividade antimicrobiana. So capazes de inibir a clivagem enzimtica, impedindo, assim, a ao das b-lactamases e tornando-as inativas. Desta forma, estes antimicrobianos se tornam substratos para tais enzimas. No mercado estas substncias encontram-se em formulaes contendo derivados penicilnicos, que so protegidos pelos inibidores de b-lactamases. Esses inibidores so: cido clavulnico (Figura 28), sulbactam e tazobactam. Figura 28 cido clavulnico
Como j dissemos, diversos so os antimicrobianos utilizados na terapia das infeces, e o seu uso consciente ainda uma grande arma na batalha das infeces. Devemos, porm, evitar seu uso indiscriminado e, s vezes, desnecessrio. A seguir montamos um pequeno resumo da ao dos antibiticos discutidos aqui:
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Em 1929, Alexander Fleming observou, por casualidade, que um fungo contaminante no s estava crescendo em uma placa de cultura que havia sido deixada aberta por descuido, como tambm as colnias de Staphylococcus, crescidas na placa prximas a este fungo, estavam morrendo. O pesquisador concluiu ento que o Penicillium notatum (fungo que contaminou a placa)
produzia uma substncia que inibia as bactrias - a substncia que veio a ser conhecida como PENICILINA deu incio era dos antibiticos. Apesar da descoberta e sntese de diferentes antimicrobianos e seu uso cotidiano hoje em dia, o que pode ocorrer que, muitas vezes, o microrganismo que est causando determinada infeco resistente ao antimicrobiano prescrito, tornando a terapia inadequada. A partir dos estudos de Fleming, vrios mtodos foram criados para testar se os microrganismos isolados de uma doena so ou no sensveis ao tratamento com determinado antimicrobiano. a) Mtodo de Fleming da escavao em valeta (Figura 29) Remove-se uma tira de gar, de modo a formar uma valeta na placa, e coloca-se nela um meio de cultura contendo extratos de fungos (penicilina). A seguir, inocula-se os organismos em estudo em forma de estrias mltiplas perpendiculares ao sulco (A, B, C, D, E, F, G, H).
Este foi um dos primeiros
A B C D
E F G H
testes a serem processados, porm, s se testava um antimicrobiano; nenhum tipo de padronizao ou determinao de concentrao. b) Foster & Woodruff (1943) Comunicaram pela primeira vez o uso de tiras de filtro impregnadas com uma soluo de antibiticos.
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crorganismo isolado. c) Vicent & Vicent (1944) Introduziram os discos de papel, aumentando ainda mais o nmero de antibiticos. d) Morely (1945) Demonstrou que os discos de papel com soluo antibitica podiam ser secos e posteriormente utilizados sem perder sua atividade. Na atualidade, utilizamos basicamente dois mtodos, cada um com seus pontos, positivos e negativos:
Mtodos usados para a avaliao da sensibilidade aos
antimicrobianos: Testes de diluio Fornecem uma estimativa quantitativa da suscetibilidade ao antibitico. So utilizadas diferentes concentraes do antibitico em caldo. Testes de difuso Envolvem o cultivo dos organismos em uma placa com gar e a aplicao de discos de papel de filtro contendo os antibiticos.
Siglas usadas no teste de sensibilidade a antimicrobinos (TSA): Concentrao inibitria mnima (CIM) Menor concentrao de antibitico em mg/mL que inibe o crescimento in vitro das bact-
(ao bactericida).
Uma das primeiras tcnicas utilizadas para a avaliao da sensibilidade dos antimicrobianos, e que at hoje tem utilidade, o teste que envolve a preparao de diluies seriadas e logartmicas (log2) de antimicrobianos (ex: 1, 2, 4, 8, 16 mg/mL) em um meio de cultura lquido (com volume final de 1 a 2 mL por tubo), semeado com a bactria teste. Os tubos contento antimicrobianos, aps inoculao com uma suspenso bacteriana padronizada em torno de 5 X 105 UFC/mL (UFC Unidade Formadora de Colnia), passaro por um perodo de incubao de 16 a 20 horas, a 35C 2, dependendo do gnero bacteriano e do antimicrobiano testado. Passado este tempo, os tubos devero ser observados para se visualizar o crescimento bacteriano (presena de turbidez). Um tubo lmpido demonstrar que no houve crescimento bacteriano, e o primeiro tubo da srie com esta caracterstica representa a CIM, ou seja, a menor concentrao de antimicrobiano capaz de inibir o crescimento bacteriano (Figura 30). Figura 30. Teste de macrodiluio em tubo A figura ao lado mostra que a concentrao inibitria mnima (CIM) do antimicrobiano testado de 16 mg/ mL. Aps as diluies de 4, 8, 16 e 32 mg/mL serem inoculadas em placas, respectivamente com as letras A, B, C e D, e incubadas por 16 horas, foi observado que no houve crescimento bacteriano na placa D. Logo, a concentrao bactericida mnima (CBM) de 32 mg/mL.
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Vantagens:
Determinao de resultado quantitativo, a CIM.
Desvantagens:
A quantidade de reagentes utilizada. O espao necessrio para o armazenamento dos tubos. A possibilidade da ocorrncia de erros durante a preparao das
concentraes antimicrobianas.
O trabalho manual dispendioso na preparao do teste.
11.1.2. Teste da Microdiluio em caldo
Esta tcnica corresponde miniaturizao da tcnica de macrodiluio em tubos. Em vez de se utilizar vrios tubos com meio de cultura e antimicrobianos, usamos microdiluio em caldo, que so inoculados em placas plsticas estreis, com 96 cavidades e fundo em forma de U, para melhor visualizao do crescimento bacteriano. Na placa de microdiluio, pode ser colocado um nmero variado de at 12 antimicrobianos, em diferentes concentraes (4 a 8 diluies logartmicas). As placas podem conter o antimicrobiano liofilizado ou congelado, ou o prprio operador dever realizar a distribuio. Tanto os antimicrobianos como as bactrias a serem testadas so inoculadas com o auxlio de uma micropipeta (Figura 31), com o propsito de se obter uma concentrao bacteriana final de aproximadamente 5 x 10 4 - 105 UFC/mL por poo. Os painis de microdiluio devem ser incubados a 352C, por 16 a 20 horas (dependendo do gnero bacteriano e do antimicrobiano testado). Aps esse tempo, a leitura da placa ser realizada visualmente e, de preferncia, com luminosidade ambiente, para facilitar a leitura.
Vantagens:
A economia de espao e de reagentes. A possibilidade de preparar uma grande quantidade de placas a
fornecidos pelos fabricantes. Em alguns sistemas atuais automatizados permitido que se faa a identificao da espcie bacteriana paralelamente com o teste de sensibilidade, pela incorporao de provas bioqumicas s placas de microdiluio. Desvantagens:
A inflexibilidade na escolha dos antimicrobianos a serem testados,
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A partir deste mtodo, iniciou-se a ideia de standartizar (padronizar) os mtodos, permitindo a reprodutibilidade dos testes. Este mtodo realizado dispensando-se os discos de antimicrobianos sobre a placa e seguindo algumas recomendaes:
Padronizao dos discos com antibitico - Utilizou-se um nico
paqumetro ou rgua milimezeada padronizada. Os resultados so interpretados de acordo com uma tabela de converso.
11.2.2. Prova de Bauer-Kirby
Com a mesma normatizao para Figura 32. TSA em placa padronizao que o anterior. Este mtodo serviu de base para a maioria das padronizaes atualmente adotadas por organismos internacionais.
Com uma ala microbiolgica,
tocar a superfcie de quatro a cinco colnias bacterianas de uma cultura pura, isoladas em um meio de gar.
obter turvao equivalente ao do padro 0,5 de Mac Farland. (escala de turvao correspondente ao crescimento bacteriano em caldo).
Inocular o caldo com auxlio de um swab estril, em placa de gar
Meller-Hinton. Recomenda-se estriar o inculo por induto contnuo (semeadura prxima e contnua), em pelo menos trs direes.
Esperar pelo menos de 5 a 15 minutos para a secagem do gar,
antes da colocao dos discos com os antibiticos, que devero ter uma distncia mnima, para que no haja dificuldade na leitura posterior dos halos.
Incubar a 37C por 24 horas. Medio do dimetro das zonas de inibio com rgua milimetrada e
25923), o E.coli (ATCC 25922) e o P . aeruginosa (ATCC 27853). Como, atualmente, existem diversas padronizaes baseadas nesta prova, importante comentar que vrias modificaes foram implementadas para melhoria da qualidade do teste, mas que vrios parmetros ainda so usados. Considerando a tcnica e o que sabemos hoje, reforamos que a aplicao do inculo bacteriano realizada com aproximadamente 1 a 2 x 10 UFC/mL. As placas so incubadas por 16 a 24 horas, podendo ser mantidas a 5% de CO2 a 35 2C (dependendo do gnero bacteriano e do antimicrobiano testado). Os dimetros dos halos de inibio do crescimento bacteriano ao redor de cada disco, medidos em milmetros, so relacionados sensibilidade da amostra bacteriana e velocidade de difuso do antimicrobiano no gar. Atualmente, os resultados do teste de disco-difuso so interpretados comparando o valor do halo de inibio com os critrios publicados pelo CLSI
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(Clinical and Laboratory Standards Institute), que a cada ano atualiza suas edies. Desta maneira, as amostras bacterianas so categorizadas em sensveis (S), resistentes (R) ou intermedirias (I).
Vantagens do mtodo de disco-difuso em gar:
Execuo fcil. Reprodutibilidade. Utilizao de reagentes de baixo custo. Resultados de fcil interpretao. Flexibilidade de escolha dos antimicrobianos e sem exigncias especiais
para leitura e interpretao. Limitaes: Este mtodo no aplicvel a microrganismos de crescimento lento. Se for necessria uma incubao prolongada para alcanar o crescimento suficiente e obter uma zona de inibio detectvel, o antibitico pode deteriorar a ponto de fornecer leituras imprecisas. Tambm inadequado em antibiticos que se difundem lentamente em gar, tais como a polimixina B. O mtodo de Bauer-Kirby no til na determinao de sensibilidade dos anaerbios, pois estes possuem crescimento lento, tornando difcil estabelecer esquemas interpretativos confiveis. Muitos antimicrobianos so ativos contra os anaerbios (ampicilinasulbactam, cloranfenicol, imipenem e ticarcilina-clavulanato), apesar disso, outros podem no ter a mesma atividade, sendo interessante realizar o TSA (Teste de Sensibilidade aos Antimicrobianos) concomitantemente com o incio do tratamento.
11.2.3. Fatores importantes que influenciam no resultado da prova de sensibilidade em placa por difuso
Numa prova de sensibilidade por difuso com disco, a velocidade de difuso de uma droga no gar e o tamanho da zona de inibio do crescimento depende de vrios fatores associados ao meio:
Concentrao do gar - 1,5% a 2,0% de gar adequado para as
qualidade, o pH de cada lote do Meller-Hinton deve ser determinado, devendo estar entre 7,2 e 7,4. A incubao da prova no deve ser realizada sob concentraes elevadas de CO 2 e os carboidratos fermentveis no devem ser adicionados.
Concentraes de ons no gar - Concentraes de ctions Ca++ e Mg
alteradas influenciam na prova de sensibilidade da P. aeruginosa diante de aminoglicosdeos. Recomenda-se o ajuste da concentrao final de Mg++ para 25 a 30 mg/L e Ca++ para 50 a 100 mg/L de caldo Meller-Hinton para obter valores prximos dos nveis fisiolgicos in vivo.
++
em meios contendo altas concentraes de timidina usando trimetoprim ou combinaes de trimetoprim e sulfametoxazol. Pode ser adicionado ao meio de Meller-Hinton timidina fosfocilase, para inativar a timidina presente neste meio. O importante observar se pode haver alterao no crescimento dos microrganismos.
Altura da camada do gar depositado na placa de Petri - O
meio deve alcanar uma espessura de 4 mm. Em meios com espessura menor que esta, os antibiticos tendem a difundir mais em direo lateral, aumentando o tamanho das zonas de inibio. O inverso tambm pode ocorrer.
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es dirias no tamanho das zonas de inibio dos organismos. Quando a concentrao muito baixa, torna-se necessrio um perodo maior para as clulas proliferantes formarem uma massa suficientemente grande para resistirem ao efeito do antibitico na borda da zona de inibio. Perodos prolongados resultam em uma zona de inibio grande e inculo denso, alm de fornecer zonas falsamente pequenas.
Temperatura - Os dimetros das zonas de inibio aumentam medida
que a temperatura de incubao sofre uma elevao dentro da faixa fisiolgica. Isso acontece devido a uma diminuio da viscosidade do gar e um aumento intrnseco da sensibilidade dos microrganismos a certos antibiticos.
Discos com antibiticos - Os discos devem ser colocados a aproxima-
damente 20 mm um do outro e 15 mm da parede da placa, para evitar que as zonas de inibio de crescimento se sobreponham ou se estendam at a margem do gar.
11.2.5. Realizao do teste de sensibilidade aos antimicrobianos (TSA) por disco-difuso na atualidade Mtodo de suspenso direta da colnia:
mesma morfologia e inocul-las em 3 a 4mL de caldo de Trypticase Soy Broth (TSB), soluo fisiolgica a 0,9%, ou caldo de Meller-Hinton.
Comparar o inculo com tubo 0,5 da escala de McFarland.
Observao: Para obter o inculo desejado, incubar o Trypticase Soy Broth (TSB) ou o caldo Meller-Hinton 35 2C at a turbidez da cultura no caldo atingir 0,5 da escala de McFarland, o que geralmente ocorre entre 2 a 6 horas.
Inoculao da placa
ra, introduzindo um swab estril na suspenso bacteriana, ajustada a 0,5 da escala de McFarland. Comprimir o swab contra a parede interna do tubo para retirar o excesso do inculo e semear a superfcie do gar em trs direes diferentes. Deixar a placa semeada secar por Figura 33. A seta mostra a de5 minutos temperatura ambiente, formao na zona de inibio do disco, causada pelo deslizamento para que o inculo seja completado disco no meio mente absorvido pelo gar antes de aplicar os discos. No ultrapassar o perodo de 15 minutos entre a semeadura e a colocao dos discos. Caso o disco seja colocado com a placa ainda muito molhada, poder ocorrer o deslizamento deste no gar (Figura 33).
Aplicao dos discos
Placas de 150 mm: colocar no mximo 12 discos. Placas de 90 mm: colocar 5 discos. Para alguns microrganismos, como, por exemplo, Haemophilus spp.,
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discos nas placas de 150 mm, pois o dimetro dos halos de alguns antibiticos pode ser muito grande.
Somente retirar os discos da geladeira ou do congelador uma a duas
dos discos.
A temperatura mxima da estufa deve ser 352C. O tempo de incubao deve ser de 16 a 18 horas, com exceo
da avaliao da sensibilidade oxacilina, vancomicina para Staphylococcus spp., e vancomicina para Enterococcus spp., que deve ser de 24 horas.
As bactrias so incubadas em estufa aerbia, com exceo de alguns
da placa.
No gar Mller-Hinton sangue, abrir a placa e ler, com o auxlio de
uma rgua ou halmetro, o mais prximo possvel do crescimento, utilizando uma fonte de luz sobre a placa.
A leitura de oxacilina e vancomicina para Staphylococcus spp., e
de uma fonte de luz. Quando h colnias pequenas dentro dos halos, estas devem ser verificadas antes de ser liberadas como cepas resistentes a estes antimicrobianos, pois podem ser clones resistentes ou contaminao.
Considere os halos de inibio a partir do ponto onde no se observa
O E-test uma fita plstica que se encontra disponvel no mercado. Ela impregnada por concentraes crescentes de antimicrobiano na face ventral e marcada, na face dorsal, com a escala das concentraes testadas, a fim de facilitar a leitura do resultado. A base deste teste est fundamentada no gradiente de difuso do antimicrobiano existente na fita no gar, determinando, assim, a sensibilidade da amostra bacteriana ao antimicrobiano testado (Figura 34). O preparo do inculo desta tcnica o mesmo para o teste de disco difuso.
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Vantagens
testados.
A fcil execuo e o fornecimento de um resultado quantitativo (CIM).
Desvantagens
O alto custo das fitas. O nmero limitado de antibiticos testados por placa.
Resultados atpicos
cultivados em superfcies de gar, formando um vu fino que penetra nas zonas de inibio ao redor dos discos. Esta zona de invaso deve ser ignorada, devendo-se medir a borda externa (ex. Proteus).
A presena de colnias definidas dentro da zona de inibio no
representa invaso. Estas colnias podem representar mutantes mais resistentes ao antibitico do que a maior parte da cepa, onde esta no pura e as colnias separadas so de uma espcie diferente.
Pode ocorrer dificuldade da leitura dos dimetros quando existe
uma superposio de zonas de inibio ou quando estas se estendem para alm da borda do gar.
Se uma placa deficientemente inoculada e as estrias so irregula-
res, deixando espaos entre as reas de crescimento e tornando as bordas das zonas de inibio no ntidas, elas no devem ser lidas.
Muitas vezes, dois antimicrobianos podem ter uma combinao interessante ou desinteressante in vivo ou in vitro. importante o conhecimento deste fato, pois, no caso do antibiograma, dois agentes sinrgicos ou antagnicos entre si podem dificultar a leitura dos halos de inibio. O mesmo pode ocorrer in vivo, quando tratamos o paciente com antimicrobianos diferentes. Figura 35. Sinergismo SINERGISMO - Os antimicrobianos tornam-se mais eficazes do que quando utilizados em separado - aumento dos efeitos individuais (Figura 35). Reparem o aumento da espessura do halo
Figura 36. Antagonismo ANTAGONISMO - Menos efetivos do que quando usados individualmente. Um pode prejudicar o efeito do outro (Figura 36). Observem a inibio da sensibilidade prximo ao antimicrobiano B
O TSA, assim como toda tcnica realizada em laboratrio, dever seguir padres de controle da sua qualidade, permitindo a confiana nos resultados obtidos. No caso do antibiograma, so utilizadas periodicamente cepas padro, com sensibilidade e/ou resistncia conhecidas, que semeamos
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seguindo as normas j determinadas para esse ensaio. O resultado da leitura obtido aps a incubao necessria e comparado com uma tabela padronizada para este fim. Qualquer modificao do resultado esperado significa uma no conformidade no teste. As cepas padro para controle da qualidade de discos para TSA por difuso em gar so: E.coli ATCC 25922, S.aureus ATCC 25923 e P. aeruginosa ATCC 27853. As cepas controle para testes com anaerbios so: Bacteroides thetaiotaomicron ATCC 29741, C.perfringens ATCC 13124 e Eubacterium lentum ATCC 43055.
12. Gentica bacteriana
O conjunto das caractersticas de todos os seres que conhecemos influenciado por dados hereditrios atravs dos genes. A informao gentica, na maioria dos organismos, armazenada na forma de sequncia de bases nitrogenadas, chamada de DNA (cido desoxiribonucleico). Ocasionalmente, organismos como os vrus podem armazenar as informaes da forma de RNA, isso ser tratado no captulo 2 deste volume. Quando pensamos em evoluo e gentica, temos pensar em diversidade, j que esta uma condio prvia para a evoluo. Estudaremos, neste captulo, as bases deste processo, j que a mutao e a recombinao de genes aumentam a diversidade dos organismos e a seleo natural permite a manuteno dos mais bem adaptados a determinados ambientes.
12.1. Gentipo e fentipo
O gentipo de um organismo determinado pelo seu arcabouo gentico (informaes genticas) que no necessariamente esto ou estaro todas expressas. O fentipo, todavia, a sua manifestao, ou seja, as propriedades
genticas que podem ser evidenciadas naquele momento. Em outras palavras, o gentipo a coleo dos genes e o fentipo baseia-se direta ou indiretamente nas protenas que foram formadas. A informao gentica do DNA transcrita em mRNA, permitindo sua traduo em protenas, que vo gerar o que anteriormente chamamos de fentipo.
12.2. Genes e reproduo
Os organismos procariontes (com fitas duplas de DNA), na sua maioria, possuem os dados genticos codificados no cromossoma (disperso no citoplasma). Sendo que aproximadamente 90% destes genomas consistem em uma nica molcula de DNA circular bastante torcida e espiralada, que ocupa quase 10% do volume celular. Algumas poucas excees, como j comentado, podem ocorrer em algumas bactrias, como, por exemplo, Brucella e Burkholderia, que podem possuir mais de uma molcula de DNA, ou ento Streptomyces coelicolor que apresenta o cromossoma em forma linear. Alm disso, muitas bactrias podero possuir genes adicionais em plasmdeos (tpico1), que podem apresentar mais de 30 cpias em uma nica clula bacteriana. Outro dado interessante a variao do tamanho do cromossoma bacteriano, que pode conter de 580 kbp at mais de 5220 kbp, enquanto o DNA plasmidial tem no mximo uns 100 kbp. As informaes contidas nos plasmdeos, apesar de no serem essenciais ao crescimento bacteriano, podem ser extremamente importantes para o sucesso do espcime, podendo mediar desde resistncia antimicrobiana at as prprias informaes que possibilitam a transferncia, aquisio e rearranjo de DNA entre bactrias. A replicao do DNA possibilita o fluxo de informaes genticas para as novas geraes. Geralmente, os organismos bacterianos reproduzem-se assexuadamente por diviso binria transversa. Inicialmente ocorre a replicao do cromossomo, que se inicia em determinado ponto, prosseguindo em ambas
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as direes (replicao bidirecional). No processo, as duas fitas de DNA original so separadas e usadas como modelo para a sntese de novas fitas (replicao semiconservativa). Os nucleotdeos livres presentes no citoplasma so pareados com as bases expostas do DNA de fita simples, seguindo sempre a ordem da adenina se ligando a timina e da guanina se ligando citosina. Todo este processo, inclusive de correo, caso uma base errada seja encaixada, mediado por enzimas, incluindo a do DNA polimerase, que age colando s bases correspondentes. O ponto em que a replicao ocorre chamado de forquilha de replicao e, j que a replicao bidirecional, teremos nos cromossomos circulares duas forquilhas ocorrendo ao mesmo tempo. Logo aps o princpio da replicao, inicia-se o desenvolvimento de uma invaginao na membrana plasmtica e na parede celular (mesossoma), que posteriormente dividir a bactria original em duas novas clulas. Quando a nova parede formada no se separa completamente em duas paredes, podese formar uma cadeia (ou filamento) de bactrias. A fisso binria no o nico mtodo reprodutivo entre as bactrias, mas outras formas so menos comuns: O gnero Streptomyces pode produzir vrios esporos reprodutivos ao mesmo tempo, cada um originando um novo indivduo; bactrias filamentosas do gnero Nocardia podem aumentar seu filamento e fragment-lo em pequenas clulas bacilares ou cocoides; espcies do gnero Hyphomicrobium podem reproduzir-se por brotamento.
12.3. Mutaes
Como comentamos no incio deste tpico, os mecanismos que levam s mutaes genticas so de grande importncia evolutiva, aumentando a diversidade dos organismos. A mutao nada mais que uma alterao na sequncia de bases nitrogenadas do DNA, modificando o produto codificado. Essas mutaes ocorrem espontaneamente ou so induzidas com a presena de um
agente mutagnico (radiao ou agentes qumicos). Muitas das mutaes que ocorrem acabam no causando nenhuma modificao e so chamadas de neutras. Outras, porm, podero ser desvantajosas ou benficas, dependendo do produto gerado. Pares de bases do DNA podem ser deletados ou adicionados ao DNA, causando uma mutao chamada de troca de fase de leitura. Outro tipo de mutao aquela que acaba por causar a substituio de um aminocido ou que cria um cdon de finalizao, j que um par de bases pode ser substitudo por outro diferente. claro que vrias enzimas trabalham na reparao do DNA alterado, mas, apesar da eficincia destes sistemas, os erros, embora raros, na replicao natural existem e podem ser aumentados por exposio a agentes mutagnicos em at mil vezes. Esses agentes podem ser utilizados em engenharia gentica para fins comerciais. Um exemplo clssico pode ser evidenciado atravs das mutaes induzidas pela exposio do fungo Penicillium (produtor de penicilina) aos mutagnicos, resultando numa variante produtora de quantidades mil vezes maiores de penicilina que o fungo original.
12.4. Recombinao gentica
Alm destas possibilidades, direcionadas ou no, algumas bactrias podem realizar troca de informaes genticas. Tal recombinao gentica pode ocorrer por conjugao, transformao ou transduo. Na conjugao, duas bactrias geneticamente diferentes trocam DNA diretamente, ou seja, necessrio o contato entre os dois organismos, o que implica a transferncia de DNA plasmidial. A bactria Escherichia coli tem servido de modelo para estudar esse fenmeno, j que possui linhagens F- e F+. As clulas F+ possuem pili e contm um plasmdeo conhecido como fator F (fertilidade). Quando uma clula F+ entra em contato com uma clula F-, os pili organizam um tubo de conjugao oco (Pili sexual ou pili F), que
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conecta a clula F+ clula F-, permitindo que o DNA migre de uma bactria para outra. Na transformao, a clula bacteriana incorpora fragmentos de DNA livres, em soluo, geralmente liberados por outra bactria que se rompeu. Este mecanismo tem sido usado experimentalmente para mostrar que os genes podem ser transferidos de uma bactria para outra e que o DNA a base qumica da hereditariedade. Para que isso ocorra, a clula precisa estar competente para assimilar o DNA livre, e isso ocorre no s devido ao ambiente, mas a uma srie de fatores fisiolgicos da prpria clula que induzem esse processo. Esse processo foi demonstrado pela primeira vez em Streptococcus pneumoniae, mas no ocorre naturalmente em muitos gneros bacterianos. Na transduo, genes bacterianos so carregados de uma bactria para outra, dentro de um bacterifago (vrus que possui como alvo um organismo bacteriano). Quando o bacterifago entra numa clula bacteriana, o DNA do vrus mistura-se com uma parte do DNA hospedeiro, de modo que o vrus ao sair da clula passe a carregar parte do DNA bacteriano. Se o vrus infecta uma segunda bactria, o DNA da primeira pode incorporar-se com o DNA da segunda. Esta nova informao gentica ento replicada a cada nova diviso (ver vrus lticos e lisognicos, no captulo 2 deste volume). A transduo pode ser especializada (onde ocorre a transferncia de genes especficos) ou generalizada (onde qualquer gene pode ser transferido). Alm das formas de recombinao descritas, outros mecanismos podem levar a alteraes genticas, como os plasmdeos, j estudados anteriormente (item 3.2.4), e os transposons, tambm chamados de genes saltadores. Os transposons so pequenos segmentos de DNA, que podem se deslocar em baixa frequncia, para diferentes posies dentro do genoma de uma nica clula, ou mesmo para um plasmdeo num processo chamado transposio. Neste processo, h um intercmbio de material gentico, podendo causar mutaes e modificar a quantidade de DNA no genoma. Eles foram
descobertos por Barbara McClintock (Nobel em 1983). Como so capazes de se transportar para plasmdeos, podem tambm ser levados a outras clulas ou vrus, sendo considerados hoje como potenciais mediadores da evoluo entre organismos. Todos estes conhecimentos atuais sobre a gentica de procariotos levou a Bacteriologia e toda a Microbiologia a um patamar mais alto. Devemos lembrar que vrios dos alimentos que consumimos so produzidos por microrganismos, bem como antibiticos, diferentes substncias qumicas e enzimas utilizadas em processos industriais. Na atualidade, tcnicas de Biotecnologia propiciam, atravs do DNA recombinante, que uma bactria Escherichia coli seja capaz de produzir interferon gama, uma protena humana usada na medicina. Outros avanos esto ligados ao diagnstico molecular de vrias doenas, como a tcnica da PCR e vrios outros processos comentados no captulo 2 do volume 3, desta coleo.
13. Mecanismos de patogenicidade e defesa bacteriana
A capacidade que tem um agente infeccioso tem de, uma vez instalado no organismo do homem e de outros animais, produzir sintomas em maior ou menor proporo, chama-se patogenicidade. Portanto, microrganismos patognicos so aqueles capazes de causar enfermidades em condies apropriadas. O grau de patogenicidade dentro de um determinado gnero ou espcie chamado de virulncia. A virulncia no est atribuda a um nico fator, e sim, depender de vrios fatores relacionados com o microrganismo, ao hospedeiro e interao entre os dois. A virulncia envolve duas caractersticas de um microrganismo patognico: infecciosidade (capacidade de poder iniciar uma infeco) e a gravidade de condio da infeco. Podemos caracterizar as cepas em: com alto grau de virulncia, com mdio grau de virulncia ou sem virulncia (avirulentas), dentro de um gnero ou espcies de microrganismos que na maioria das vezes so considerados patognicos.
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Para se estabelecer um processo infeccioso, o microrganismo dever penetrar no hospedeiro e iniciar uma infeco. A capacidade do microrganismo de se aderir e sobreviver nas superfcies das mucosas do hospedeiro leva ao primeiro contato. A unio dos microrganismos em superfcies epiteliais, muitas das vezes no invade os tecidos mais profundos. Nesses casos, uma ou mais toxinas produzidas pelo patgeno so responsveis pela patologia. Os microrganismos aderem s clulas das mucosas epiteliais e em seguida atravessam esta barreira, posteriormente multiplicao em tecidos subepiteliais, causando a destruio dos tecidos. H organismos altamente invasivos que podem aderir e atravessar a superfcie epitelial, multiplicando-se e invadindo tecidos mais profundos, podendo eventualmente chegar corrente sangunea e causar infeco generalizada. Existem bactrias que se aderem, invadem, multiplicam-se, e se adaptam para continuarem no hospedeiro, mas normalmente dentro das clulas do sistema reticuloendotelial. Ex.: Micobactrias. H algumas bactrias que so especficas, pois infectam um determinado tipo de tecido. O Streptococcus pneumoniae, por exemplo, pode habitar a garganta e a nasofaringe, mas quando causa doena, infecta preferencialmente o trato respiratrio inferior. A afinidade tecidual pode estar relacionada com a presena de receptores especficos para aderncia bacteriana ou presena de nutrientes. Temos como exemplo da dependncia nutricional, a Brucella abortus, que causa abortos contagiosos no gado. Esta bactria necessita do lcool-acar eritritol, que est presente em elevadas concentraes nos tecidos uterinos e placentrios bovinos, logo, esse microrganismo poder habitar o trato genital bovino devido a essa preferncia nutricional.
Capacidade das bactrias de se fixar nas clulas e tecidos do organismo. A adeso se d pela presena de estruturas da superfcie da clula bacteriana, definida como adesinas. As adesinas funcionam quando interagem com os receptores que existem no organismo. Estes receptores se localizam na superfcie da clula ou so protenas da matriz extracelular. As adesinas bacterianas incluem fmbrias, componentes da cpsula, cidos lipoteicoicos (item 3 deste captulo) das bactrias Grampositivas, Gram-negativas, ou outro antgeno de superfcie celular. As bactrias podem se aderir, por exemplo, a superfcies de vasos sanguneos ou a diferentes dispositivos plsticos usados em medicina, onde formam os chamados biofilmes. Estes so microcolnias ou agregados bacterianos que so envolvidos por uma pelcula de exopolissacardeos produzida pela bactria que se forma na superfcie dos dispositivos plsticos, quando colocados no organismo. Funcionam como uma fonte permanente de bactrias que podem causar infeco em rgos distintos. Nos biofilmes, as bactrias esto bem resguardadas das defesas do organismo e da ao dos antimicrobianos. Estes podem se formar tanto em superfcies plsticas quanto em mucosas (fibrose cstica), nos dentes (placa dentria) e nas tubulaes em geral. Observe a figura abaixo, que mostra a formao de biofilme por uma bactria em um vaso sanguneo.
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13.2.2. Invaso
Alm de aderir, as bactrias tambm podem invadir diferentes clulas do nosso organismo para causar infeco. A penetrao bacteriana nas clulas do organismo se d pelo processo que chamamos de fagocitose (defesa inata mais eficiente (ver captulo 1 deste volume). H dois tipos de fagocitose: uma exercida por clulas fagocitrias e a outra pelas clulas epiteliais ou clulas no fagocitrias. A fagocitose exercida pelas clulas fagocitrias um processo que acontece naturalmente, com o objetivo de proteger o organismo da bactria. A fagocitose causada por clulas epiteliais ou por clulas no fagocitrias induzida pela bactria, e tem como objetivo proteg-las das defesas do organismo. Quanto aos mediadores das duas fagocitoses, temos, na fagocitose natural, o auxlio de anticorpos e do complemento. J na fagocitose induzida, temos a ao de diferentes protenas, chamadas de invasinas. As invasinas podem se localizar na membrana externa da bactria ou podem ser introduzidas no citosol. Podemos dizer que ambos os tipos de fagocitose envolvem o citoesqueleto de actina, tanto nas clulas fagocitrias como nas no fagocitrias, com projees de extenses celulares chamadas pseudpodos, que envolvem a clula bacteriana em vacolos. Cada bactria invasora dotada de diferentes mecanismos prprios de invaso e estes serviro ao propsito de cada uma delas. As respostas das clulas do nosso organismo podem ser vrias, as que mais conhecemos incluem a produo de citocinas e prostaglandinas. As citocinas, tambm chamadas de interleucinas, so produzidas por macrfagos ativados e estimulam o amadurecimento do linfcito. J as prostaglandinas podem causar morte celular por necrose (diminuio de nutrientes) ou por apoptose (morte celular programada).
Com relao s bactrias, o mais importante a necessidade de regular a expresso dos seus genes de virulncia para se adaptarem aos organismos onde vivem. Bactrias intra e extracelulares O crescimento e a multiplicao de clulas bacterianas podem ocorrer dentro (intracelular) ou fora (extracelular) das clulas do nosso organismo. Algumas bactrias so classificadas como intracelulares obrigatrias, por precisarem de nutrientes produzidos pela clula hospedeira. Sua localizao intracelular permite que sejam protegidas de anticorpos, da fagocitose e de alguns antimicrobianos. Siderforos ons metlicos, como o ferro, esto entre as necessidades do metabolismo bacteriano. Os siderforos so compostos de baixo peso molecular que tm grande afinidade por ferro e formam complexos importantes para as clulas. Dentro das clulas, o ferro reduzido a uma forma solvel (Fe II). O complexo siderforo-ferro necessrio porque Fe insolvel no pH fisiolgico e, portanto, no pode ser transportado entre clulas por meio de canais de ons. A produo de siderforos uma estratgia bastante interessante para as bactrias presentes em nosso corpo. Para que este processo no ocorra, o nosso organismo criou um mecanismo para retirar o ferro dos lquidos corpreos. Assim, o ferro que existe no sangue est quase que todo ligado hemoglobina nas clulas vermelhas (eritrcitos), transferrina no plasma e lactoferrina no leite e em outras secrees (lgrima, muco, etc.). Quando se inicia uma infeco, nosso organismo aumenta a produo de protenas que sequestram a maior quantidade de ferro, tornando-o pouco disponvel para a bactria. Desta forma, bactrias que no competem eficazmente com o hospedeiro pelo ferro disponvel so pouco patognicas e as que secretam os siderforos (com ferro ligado) possibilitam sua internalizao pela clula bacteriana, aps ligarem-se a receptores especficos.
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13.2.3. Toxinas
o termo usado em Microbiologia para nomear qualquer substncia de origem bacteriana capaz de causar danos no organismo animal. As toxinas bacterianas so classificadas, desde o sculo XIX, em: endotoxinas e exotoxinas.
13.2.3.1. Endotoxinas
O LPS (lipopolissacardeo) a endotoxina presente principalmente na membrana externa de membros da famlia Enterobacteriaceae. Sua estrutura composta por trs partes: lipdeo A (glicopeptdeo composto de dissacardeo que se liga aos cidos graxos), cerne (pequeno nmero de acares comuns, como o cido deoxioctanoico (KDO) e a heptose) e antgeno O (composto formado por uma variedade de resduos oligossacardicos, que protegem a bactria da ao de substncias hidrofbicas). O lipdio A a parte toxignica das bactrias Gram-negativas, como, por exemplo, Neisseria spp. O LPS induz a liberao de substncias vasoativas, ativa o sistema complemento pela via alternativa, atravs da ao sobre o componente C3 (ver captulo 1 deste volume), e ativa a cascata de coagulao, provocando obstruo intravascular. Todos estes processos podem resultar em instabilidade cardiovascular e hemodinmica, levando a uma septicemia. Manifestaes semelhantes podem ser causadas por bactrias Gram-positivas, devido a componentes de sua parede bacteriana.
13.2.3. Exotoxinas
As exotoxinas podem ser divididas em trs grupos ou tipos: I, II, III. Essa diviso de acordo s interaes com as clulas do hospedeiro.
Grupo I
As toxinas pertencentes a este grupo correspondem aos superantgenos e s toxinas da famlia ST (termoestveis).
Os superantgenos no sofrem a ao dos macrfagos, mas possuem a capacidade de se ligar s molculas de MHC da superfcie dos macrfagos e aos receptores na superfcie dos linfcitos. Isso permite que haja a produo de grandes quantidades de interleucinas, interferons e outras citocinas por outras clulas alm dos linfcitos. Um exemplo de bactria que produz superantgeno o Staphylococcus aureus. Assim como o superantgenos, as toxinas ST agem somente na superfcie das clulas. As toxinas ST compreendem uma famlia de pequenos peptdeos no imunognicos produzidos por algumas bactrias, como, por exemplo, a Escherichia coli.
Grupo II
As toxinas deste grupo tm como caracterstica lesar a membrana citoplasmtica, atravs da formao de poros, que leva a morte da clula. Como os glbulos vermelhos (hemcias) so as clulas mais estudadas em relao a essas toxinas, estas receberam o nome de hemolisinas, mas isso no quer dizer que outras clulas no possam ser lesadas. A virulncia dessas toxinas demonstrada, principalmente, pela capacidade de matarem os fagcitos, rompendo a membrana dos fagossomas, e lisar as hemcias para captura do ferro da hemoglobina. Outros mecanismos tambm podem estar envolvidos, como a presena de toxinas que retiram o fosfato dos fosfolipdeos (fosfolipases), desestruturando a membrana.
Grupo III
Este grupo possui o maior nmero de toxinas e fatores de virulncia, por esse motivo acreditamos ser o grupo mais importante. As toxinas deste grupo possuem uma caracterstica comum entre elas, que a presena das subunidades A e B em sua molcula. A subunidade A corresponde poro enzimtica e ativa da toxina, penetrando na clula e exercendo os efeitos biolgicos da toxina (na maioria das vezes, remove a ADP-ribose da NAD e as transfere
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para diferentes protenas das clulas, que perdem as suas funes normais). A subunidade B (vem de binding) responsvel pela ligao da toxina ao seu receptor celular. Essas toxinas tambm recebem o nome de toxinas A-B.
13.2.3.3. Enzimas hidrolticas
Enzimas como hialuronidase, colagenase e proteases so hidrolticas, sendo capazes de degradarem componentes da matriz extracelular, desorganizando toda a estrutura dos tecidos. Esta degradao forma vrios nutrientes que so utilizados pelas bactrias. Dificilmente se consegue distinguir o papel desenvolvido pelos fatores bacterianos daquele desenvolvido pelo processo inflamatrio, visto que os fagcitos tambm produzem enzimas hidrolticas.
14. Microbiota autctone
O conceito de microbiota autctone ou, como antigamente era conhecida, flora normal se refere aos microrganismos que habitam a pele e as mucosas de pessoas normais e sadias. A microbiota normal se origina inicialmente do ambiente, no momento do nascimento e da alimentao, podendo haver relativa variao entre indivduos com o passar do tempo, mas que geralmente engloba microrganismos frequentemente encontrados em determinado local, e numa determinada idade, entre indivduos saudveis. Sua presena no essencial vida, porm, ela desempenha um papel bem definido na manuteno da sade e das funes normais. Os microrganismos membros da microbiota podem ser extremamente benficos existindo como mutualistas, protegendo o hospedeiro, competindo pelos nichos onde se encontram e pelos nutrientes, de forma mais eficiente que os microrganismos externos, inibindo e dificultando a colonizao de outros microrganismos, produzindo nutrientes importantes (sntese de vitamina K e B) e tambm contribuindo para o desenvolvimento do sistema imunolgico.
Na grande maioria, a microbiota se compe de comensais, quando mantm associaes aparentemente neutras sem benefcios ou malefcios detectveis. Contudo, em algumas ocasies, esses microrganismos podem agir como oportunistas , quando causam doenas em indivduos imunocomprometidos (portadores de AIDS, pessoas que utilizam terapia imunossupressora, quimioterapia, radioterapia, que possuem queimaduras extensas, etc.). Ainda existem os casos em que se os microrganismos normais forem retirados por algum motivo do local onde so considerados comensais, e introduzidos em outro ambiente corpreo, eles podero agir como patognicos, j que neste outro nicho eles no fazem parte da microbiota. A microbiota normal pode ser classificada em dois grupos: A microbiota residente, que considerada fixa de uma determinada rea em determinada idade, e que, se perturbada, prontamente se restabelece. E a microbiota transitria, proveniente do meio ambiente, que pode permanecer no indivduo por algumas horas ou at mesmo semanas. Geralmente, se a microbiota residente se mantm intacta, a microbiota transitria no apresenta maiores problemas, principalmente porque ela no se mantm de forma permanente. Porm, se houver algum distrbio com a primeira, os microrganismos transitrios podero colonizar o local e, posteriormente, caso sejam patognicos ou oportunistas, virem a produzir doenas. A existncia de microrganismos residentes em determinado local do corpo vai depender de diversos fatores ambientais, como temperatura, umidade, pH, secrees, presena de lisozima, oxignio, etc. Existem ainda os locais de nosso corpo desprovidos de microbiota, como o crebro, a medula espinhal, os rins e os pulmes, onde qualquer microrganismo detectado deve ser considerado com cuidado.
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A composio da microbiota oral se altera com a idade, hbitos alimentares, hormnios, fluxo salivar, condies imunolgicas e outros fatores, como higienizao e ingesto de lcool. Todavia, de um modo geral, a alta umidade, o pH prximo da neutralidade, a temperatura constante (entre 34 e 36C) e a disponibilidade de nutrientes da boca possibilitam o estabelecimento de uma microbiota bacteriana bastante complexa que habita as diversas reas da cavidade oral. Entre as bactrias mais comuns, podemos identificar os Lactobacillus spp., os Streptococcus spp., os anaerbios e as espiroquetas . Muitas dessas bactrias podem estar associadas formao de cries e ocorrncia de doenas periodontais.
14.2. Nasofaringe
A faringe aprisiona a maioria das bactrias que so inaladas. Muitas bactrias orais tambm podem ser encontradas neste local. O trato respiratrio superior a porta de entrada para a colonizao inicial por muitos patgenos. Na nasofaringe podemos encontrar portadores sadios de vrios gneros bacterianos de importncia mdica, com Staphylococcus e Neisseria . J o trato respiratrio inferior (brnquios e alvolos) normalmente estril, porque partculas do tamanho de bactrias no conseguem atingi-lo prontamente.
14.3. Esfago
Quando est anatomicamente normal e sadio, o esfago um rgo praticamente estril e, se presentes, as bactrias da saliva e alimentos so apenas transitrias. Apesar disso, condies patolgicas podem alterar a anatomia do esfago e predispor o rgo ao estabelecimento de uma microbiota residente constituda de microrganismos potencialmente patognicos.
Devido s rigorosas condies ambientais, no estmago, os microrganismos so comumente transitrios e sua densidade populacional mantida baixa. A quantidade de bactrias imediatamente aps as refeies estimada em aproximadamente 103 a 106 bactrias por grama do contedo estomacal, sendo aps a digesto praticamente indetectvel. Todavia, quando consideramos as pores posteriores desse trato, sabemos da existncia de grande quantidade e variabilidade de espcies bacterianas habitando esses ambientes. A quantidade e o nmero de espcies presentes em dado segmento do trato gastrointestinal so afetados pelo pH e pelo tempo de reteno de seu contedo. Como j foi dito, o baixo pH do contedo estomacal e o fluxo rpido de contedo do intestino delgado tende a inibir o crescimento de muitas bactrias. Por outro lado, o pH relativamente neutro e a prolongada manuteno do contedo ingerido no intestino grosso permitem o desenvolvimento da grande diversidade microbiana comentada anteriormente. As bactrias residentes do trato gastrintestinal contribuem para a dieta fermentando carboidratos indigerveis, como a celulose em cidos graxos, que so fontes de energia para as clulas do epitlio intestinal e facilitam a absoro de sdio e gua, alm de sintetizarem protenas e vitaminas K e B.
14.5. Vagina
A microbiota vaginal varia de acordo com o indivduo, a idade, o pH local e os nveis hormonais. As maiores alteraes acontecem quando ocorre uma infeco bacteriana vaginal. As bactrias que colonizam a vagina formam um grupo multi-especfico e complexo de Gram-positivos e Gram-negativos, com predominncia de anaerbios. Prevalecem, no primeiro ms de vida, as bactrias do gnero Lactobacillus, mantendo o pH vaginal cido em torno de 5. A partir deste estgio at o
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incio da puberdade, a acidez vaginal diminui elevando o pH para 7, onde predominam S. epidermidis, Streptococcus spp. e Escherichia coli. Entre a puberdade e a menopausa, devido ao do hormnio estrognio, ocorre produo de glicognio e a microbiota passa a ser predominantemente de membros dos gneros Lactobacillus, Corinebacterium , Staphylococcus, Streptococcus e Bacteroides. Devido prevalncia da espcie Lactobacillus acidophilus, o pH do trato vaginal decresce novamente e se estabelece em torno de 5. Aps a menopausa, com a diminuio da produo de estrognio, a secreo de glicognio diminui e o pH vaginal se eleva novamente para chegar em torno de 7, neste perodo a composio da microbiota volta a ser aquela caracterstica da pr-puberdade.
14.6. Pele
Vrios nichos ecolgicos diferentes esto disponveis na superfcie da nossa pele j que possumos regies mais secas e mais midas, apresentando menores ou maiores quantidades da microbiota. Nas regies mais secas predominam Staphylococcus epidermidis e Propionibacterium acnes. Nas reas mais midas, como virilhas, axilas, espaos interdigitais, genitlia e perneo, predominam Staphylococcus aureus e Corynebacterium sp. Nesses locais, as condies ambientais, como umidade, maior temperatura e abundncia de lipdios cutneos, favorecem o crescimento bacteriano. De modo geral, ocorre a predominncia das bactrias Gram-positivas na superfcie corporal, j que estas possuem um alto grau de especificidade na adeso s superfcies epiteliais e nem todas as bactrias possuem esta habilidade.
14.7. Conjuntiva
A regio da conjuntiva, apesar da sua constante exposio ao ambiente externo e, consecutivamente, contaminao microbiana, apresenta mecanismos de proteo bastante eficazes. A ao de remoo da sujeira e dos
microrganismos que entram em contato com a conjuntiva pelas lgrimas atravs dos movimentos das plpebras um deles. A lgrima, alm de ser um meio de cultura pobre, possui em sua composio imunoglobulinas (IgG), que inativam vrios microrganismos; alm disso, possui lactoferrina, que atua sequestrando o ferro (essencial para o metabolismo bacteriano). A lgrima possui tambm lisozima, que uma enzima que dificulta a formao de paredes celulares bacterianas. Como j explicamos, quando ocorre o desequilbrio entre a microbiota residente e a transitria, pode haver o desenvolvimento de doenas. No caso da conjuntiva, o uso indiscriminado de colrios contendo agentes antimicrobianos ou corticoides pode levar a esse problema.
15. Seleo, coleta, transporte e processamento de lquidos biolgicos
A coleta para o laboratrio de anlises clnicas no s o ponto de partida do trabalho do bacteriologista, como tambm o mais importante. Se no fizermos uma coleta correta, todo restante do trabalho ter sido em vo. Portanto, necessrio que observemos alguns parmetros bsicos, que devem ser seguidos, sempre que possvel, na obteno de fludos biolgicos para anlise.
15.1. Parmetros bsicos para uma coleta correta Coletar as amostras direto do stio de infeco
A amostra dever ser colhida do local real da infeco, tendo o cuidado de no contamin-la nos stios adjacentes, a assepsia neste caso muito importante (existem algumas excees a esta regra quando a coleta se torna prejudicial ao paciente, como no caso de sinusite seios da face e nos casos de suspeita de Difteria, que comentaremos posteriormente).
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Para seguir esse parmetro, importante conhecer a fisiopatologia da doena, considerando quando e onde, de acordo com a rota esperada de aquisio e disseminao do microrganismo, devemos coletar o material para conseguirmos realizar o diagnstico com maior facilidade. Um exemplo clssico a coleta de material suspeito de Leptospirose, que dever ser feita por coleta de sangue no incio da doena (pesquisa pela PCR e pela hemocultura), e aps a primeira semana a pesquisa, passa para o soro onde detectaremos anticorpos.
Obter quantidades suficientes
O volume de material colhido dever ser suficiente para realizarmos todas as tcnicas necessrias ao cultivo. Aproveitando este tpico, importante comentar que, em alguns casos, o excesso de material tambm pode prejudicar o exame.
Utilizar dispositivos adequados
Devem ser utilizados recipientes estreis, que permitam uma colheita fcil, e adequados a suspeita indicada. Como um bom exemplo, o uso de swabs com hastes bem finas e de material atxico indicado para coletas de uretrite, no sendo necessrios para coleta comum de orofaringe (custo X benefcio). Outro excelente exemplo no caso de suspeita de microrganismos anaerbios, em que devemos utilizar dispositivos de coleta direcionados preservao destes agentes.
Obter amostras antes da administrao de antimicrobianos (se pos-
svel) O antibitico poder, em alguns casos, dificultar ou inviabilizar o isolamento do microrganismo. claro que tambm no se pode descartar qualquer amostra, principalmente aquelas de difcil coleta, como, por exemplo, o lquido cefalorraquidiano. Nestes casos, o profissional deve usar sempre o bom-senso.
Alm da rotulagem normal, em que devero constar o nome do paciente, data e forma da coleta, a especificao da suspeita extremamente importante, principalmente quando houver a possibilidade de isolamento de um microrganismo com exigncias especiais (ex.: anaerbio). Devemos lembrar que, em boa parte das vezes, o pessoal do laboratrio no tem contato com o paciente, mas somente com a amostra. Se no houver indicao da suspeita, fica muito mais difcil realizar o diagnstico.
15.2. Stios anatmicos
De um modo geral, devemos sempre nos preocupar, em primeiro lugar, com o uso de equipamentos de proteo individual (EPIs) adequados a estas atividades, como luvas, mscaras e material estril. O jaleco, ou guarda-p, somente deve ser utilizado no ambiente de trabalho, no devendo ser portado fora deste local para evitar contaminao cruzada (ver captulo 1 do volume 1 desta coleo).
15.2.1. Trato respiratrio superior
A microbiota da boca, garganta e nasofaringe bem numerosa. Na maioria dos casos, os swabs de orofaringe so realizados para isolar estreptococos b-hemolticos do grupo A que causam faringite. Nestes casos, deve-se dirigir um foco de luz brilhante para a cavidade oral aberta e tentar visualizar o foco de infeco, instruir o paciente para que respire profundamente, e abaixe a lngua suavemente com um abaixador. Neste momento, tocar com o swab delicadamente no local visualizado. Nos casos em que no houver nenhum indcio visual, desliza-se o swab entre os pilares tonsilares e atrs da vula. Aps a coleta, o swab deve ser colocado em um tubo estril adequado ao seu transporte para o laboratrio.
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Quando a infeco de orofaringe possui suspeita clnica de Difteria, alguns cuidados na coleta devem ser destacados, pois nestes casos no se deve coletar direto do stio de infeco (pseudomembrana), j que a toxina poder difundir-se no organismo do paciente agravando muito seu quadro (ver item 16 deste captulo). Existem ainda procedimentos um pouco diferenciados para colheita de material do trato respiratrio superior, como no caso de suspeita de portadores de alguns microrganismos, como Neisseria meningitidis (Meningite) e Staphylococcus aureus (MARSA entre outros), onde o material coletado da nasofaringe.
15.2.2. Trato respiratrio inferior
Escarro e coleta direta das vias respiratrias inferiores: A coleta do escarro deve ser feita preferencialmente pela manh, quando o paciente se levanta, e em jejum. De um modo geral, h muita dificuldade na coleta deste material, pois a contaminao das amostras pelos prprios microrganismos pertencentes microbiota muito comum. Os gargarejos com gua, imediatamente antes da coleta, ajudam a diminuir esta contaminao, todavia, no se recomenda o uso de antisspticos bucais ou dentifrcios antes deste procedimento. Em casos onde a produo de escarro insuficiente ou o paciente no tem condio de prover este material, lana-se mo de outras tcnicas, como, por exemplo, a nebulizao, a aspirao translaringeana ou mesmo a broncoscopia fibrtica (tcnica da escova bronquial).
15.2.3. Trato urinrio
Para uma coleta correta nas mulheres, deve-se lavar a rea periuretral e o perneo com gua e sabo e enxaguar completamente (de preferncia com gua
ou salina estreis). Enxugar bem a regio. Os lbios devem ser separados e o primeiro jato da urina desprezado. Colhe-se ento o jato mdio da mico em recipiente estril. Este deve ser mantido no gelo at a entrega no laboratrio. Em certas ocasies necessria a obteno de uma amostra de urina para cultura de outras formas. Para exemplificar estes casos, temos a coleta por aspirao suprapbica e as amostras obtidas atravs de cateterismo (ver item 18.2 deste captulo).
15.2.4. Trato genital
As culturas de amostras vaginais podem muitas vezes no apresentar resultados significativos. Em caso de vaginite supurativa, deve-se montar lminas a fresco logo aps a coleta e examinar. Geralmente no so boas amostras para deteco de agentes bacterianos, mas podem servir para visualizao de protozorios ou fungos (Trichomonas vaginalis ou Candida albicans). Nos casos suspeitos de endometrite, o mdico ginecologista deve obter amostras visualizando o local diretamente, atravs de um espculo vaginal e introduzindo a ponta de um swab para cultura, atravs de um cateter de luz estreita colocado na abertura cervical (reduo da contaminao).
15.2.5. Sangue
A maior chance de deteco de positividade para hemocultura ocorre quando o exame realizado no momento da bacteremia (presena da bactria no sangue). Nos casos de septicemia, esse cuidado menos importante, pois os microrganismos esto disseminados e se reproduzindo. Existe uma latncia de aproximadamente uma hora entre a ocorrncia do pico febril e da bacteremia (os microrganismos e seus produtos txicos atuam como pirognio exgeno e nossa resposta imune produz pirognio endgeno. Estas substncias, associadas a vrios processos fisiolgicos, iro estimular a produo de febre cerca de 60 a 90 minutos aps o desencadeamento do processo). Quando ocorre a
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febre, nosso organismo j est se defendendo, da a coleta ideal ser aquela anterior a este momento. As hemoculturas podem ser obtidas utilizando-se agulha e seringa ou mtodos de vcuo, como o sistema fechado. O local da puno deve ser descontaminado de forma adequada. A execuo de pelo menos trs hemoculturas em um perodo de 24 horas satisfatria, devendo ser obtidas de diferentes locais de puno com no mnimo 1 hora de diferena, colhendo sempre dois frascos, um aerbio e outro anaerbio, com o volume de 10 mL de sangue em adultos e 1 a 5 mL em crianas. Este sangue deve ser adicionado de caldo na proporo de 1:10 ou 1:5, dependendo da tcnica.
15.2.6. Lquido cefalorraquidiano (lquor)
Obtido por um mdico neurologista, por puno lombar, aps desinfeco conveniente da pele e anestesia local. colhido um volume total mximo de 10 mL (adultos) dividido em 3 tubos, o primeiro para Bioqumica, o segundo para bacteriologia e o terceiro hematologia. O tubo enviado para bacteriologia dever ser mantido temperatura ambiente ou na estufa, pois a refrigerao fatal para os microrganismos que mais comumente causam Meningite (Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae).
15.2.7. Leses cutneas
As superfcies das feridas geralmente no refletem a verdadeira causa do processo infeccioso, j que, frequentemente, esto colonizadas por bactrias do ambiente. Por esta razo, o mtodo mais aconselhvel a aspirao do material purulento localizado nas profundidades da ferida com agulha e seringa estreis. As margens da leso devem ser, sempre que possvel, descontaminadas com lcool 70%. Se houver atraso no procedimento, o material deve ser transferido para recipiente anaerbio. No caso da impossibilidade de obten-
o do material pela tcnica descrita, pode-se utilizar um swab de forma profunda, tendo o cuidado de separar as bordas da ferida (luvas), e transportlo em reagente anaerbio.
15.2.8. Olhos e ouvidos
O material supurativo ocular deve ser colhido do fundo do saco inferior ou do canto interno, realizando sempre colorao de Gram para determinar a presena e o tipo da bactria, antes da cultura. As culturas de material do canal auditivo externo dificilmente refletem a causa de uma otite mdia, a no ser que tenha havido rompimento da membrana timpnica. Nos casos agudos, o microrganismo causador pode ser cultivado a partir de material da nasofaringe posterior. A puno do material proveniente dos seios frontais no comum. Geralmente, o tratamento emprico. O material, se extremamente necessrio, colhido por aspirao do ps, e as culturas realizadas, buscando bactrias aerbias e anaerbias. Nos casos de sinusite crnica podem ocorrer infeces polimicrobianas, incluindo espcies anaerbias.
15.2.9. Trato gastrointestinal
A confirmao laboratorial de uma infeco intestinal efetua-se, usualmente, pela deteco de ovos e parasitas, por montagens de material fecal com soluo salina ou iodada, ou isolando-se bactrias de amostras de fezes. O material deve ser colhido em recipientes estreis de boca larga e com tampa hermtica, ou mesmo swabs retais e processadas o mais rpido possvel. Se for previsto atraso no transporte, o material deve ser colocado em conservante ou geladeira, dependendo do caso.
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O objetivo primrio do transporte manter a amostra o mais prximo possvel do estado natural e com mnima deteriorao, evitando condies ambientais adversas de temperatura, presso ou ressecamento. So recomendados meios mnimos, tais como o meio de Stuart, Amies e Cary-Blair, que preservam as bactrias sem multiplicao dos microrganismos durante o transporte. O tioglicolato de sdio adicionado como agente redutor para melhor isolamento de anaerbios, e o gar fornece consistncia, evitando a oxigenao e o extravasamento. Para o envio de materiais biolgicos pelo correio, existe uma srie de normas recomendadas pelo Departamento de Aviao Civil, pela Empresa Brasileira de Correios e Telgrafos, pela Diviso de Sade dos Portos e demais rgos competentes, que devem ser seguidas. Recomendaes que vo desde o uso de recipiente prova de choque e s alteraes de presso, at a correta rotulagem desta embalagem em que devero constar o nvel de risco do microrganismo, o smbolo do risco biolgico, advertncia ao transportador e recomendaes quanto manuteno (ex.: temperatura).
15.4. Processamento da amostra
Cada amostra recebida pelo laboratrio de Microbiologia deve ser analisada, micro e macroscopicamente, para avaliar se est adequada ao processamento. Se houver evidncia de coleta ou transporte inadequados, quantidade insuficiente, recipiente imprprio ou atraso na remessa, deve ser colhida uma segunda amostra. Existem critrios de excluso para as amostras biolgicas. claro, porm, que determinados materiais de difcil coleta, como o lquor, no podem ser excludos com os mesmos critrios que um de fcil coleta. Para tal,
necessrio que o profissional encarregado de receber os espcimens biolgicos seja devidamente treinado para agir nestas situaes, inclusive dando todas as informaes necessrias do porqu de o material estar sendo rejeitado e explicando como a segunda amostra deve ser colhida e transportada adequadamente.
16. Noes sobre as principais bactrias de importncia clnica
Neste tpico, abordaremos sucintamente os principais grupos bacterianos, importantes para o homem e os animais. Separamos os grupos de acordo com a morfologia e a colorao (baseada na estrutura da parede celular). Apesar de muitas vezes vocs encontrarem os nomes dos grupos bacterianos escritos de forma cotidiana (ex.: estafilococos), prestem ateno nos nomes dos gneros e espcies que devero sempre estar escritos em itlico (ou ento sublinhados).
16.1. Cocos Gram-positivos Staphylococcus
So esfricos, imveis, possuem aproximadamente 1m de dimetro e so encontrados predominantemente sob a forma de cachos irregulares. Alguns representantes destes microrganismos compem a flora normal da pele e das mucosas do homem, enquanto outros so responsveis por vrios tipos de infeces, podendo levar a septicemias fatais. O gnero Staphylococcus pertence famlia Staphylococcaceae e possui, atualmente, mais de 30 espcies, sendo que trs delas aparecem com frequncia como agentes importantes em bacteriologia mdica (S.aureus, S.epidermidis e S.saprophyticus). Alguns exemplares destas bactrias podem desenvolver resistncia a antimicrobianos, sendo responsveis por grande par-
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cela de multirresistncia em infeces hospitalares e criando problemas teraputicos de difcil soluo. Os estafilococos podem ser cultivados em grande parte dos meios de cultura, em condies de aerobiose. A temperatura ideal para o seu crescimento de 37oC. As colnias em meio slido so esfricas e brilhantes, podendo haver formao de vrias tonalidades de pigmentos. O Staphylococcus aureus, a espcie considerada como mais patognica do gnero, geralmente hemoltica, podendo produzir um pigmento amarelo. Caracteriza-se pela produo da enzima coagulase e fermentao do manitol. Por produzir vrias enzimas e toxinas extracelulares causa de vrias doenas, desde intoxicaes de fundo alimentar a sndromes gravssimas, como a do choque txico. A caracterstica da leso causada por esta bactria o aparecimento de abcessos localizados e de supuraes focais. A partir do foco, o microrganismo pode se disseminar por via linftica e sangunea para outras partes do corpo. Doenas como osteomielite, pneumonia, meningite e endocardite, podem ter associao com este microrganismo (mais informaes no item 22.1.1).
Streptococcus
Os microrganismos pertencentes a este gnero esto dentro dos integrantes da famlia Streptococcaceae. So esfricos, com aproximadamente 1 a 2m de dimetro, agrupando-se geralmente em cadeias, sendo o comprimento da cadeia varivel em funo das condies ambientais. Crescem bem em meios slidos, principalmente contendo sangue ou extratos de tecidos. A temperatura ideal da sua incubao de 37oC, formando colnias esfricas de 1 a 2 mm de dimetro. So considerados anaerbios tolerantes ao oxignio, pois apesar de crescerem em ambiente aerbio, s processam fermentao e nunca respirao.
So ainda responsveis por vrias doenas humanas, desde crie dentria, at febre puerperal, erisipela, escarlatina e mesmo septicemias. um grupo muito diversificado de bactrias. Sua capacidade de produzir hemlise em diferentes escalas constitui um dado importante na sua classificao laboratorial.
b-hemolticos Formao de hemlise total em torno da colnia
(lise dos eritrcitos de carneiro a 5%). Considerados os principais patgenos do gnero, so responsveis por vrias doenas (faringites, infeces dos tecidos moles e srias complicaes). Estas cepas so ainda subclassificadas em grupos, de acordo com diferentes polissacardeos de parede celular (A a V). Sendo as do grupo A, as mais importantes na clnica humana ( Streptococcus pyogenes), envolvidas em diferentes enfermidades; seguidas das do gupo B (S.agalactiae), envolvidas, principalmente, em meningites, septicemias neonatais e infeces ps-parto (ver diferenciao no tpico 20 e pelo hipurato no apndice).
a-hemolticos Hemlise parcial em torno da colnia (a hemoglobina
dos eritrcitos adquire colorao esverdeada). Podem causar, entre outros problemas, pneumonia, meningite (Streptococcus pneumoniae) e endocardite subaguda (grupo viridans).
g-hemolticos ou anemolticos No formam hemlise.
Mais informaoes sobre este gnero podero ser estudadas no item 22.2.2.
Enterococcus
Anteriormente descrito dentro do gnero Streptococcus (grupo D de Lancefield), este microrganismo elevou-se a categoria de novo gnero Enterococcus e hoje faz parte da famlia Enterococcaceae. Conforme indica sua
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denominao, estes organismos fazem parte da microbiota entrica e muitas vezes do trato genitourinrio, podendo ser encontrados como causadores de problemas nas vias urinrias (principalmente em pacientes com anomalias ou manipulados), ou mesmo em feridas e bacteremias, principalmente em imunodeprimidos. Podem apresentar diferentes tipos de hemlise ( a, b e g) e so considerados microrganismos extremamente resistentes, podendo crescer em condies de alta salinidade (pH 9,6) e temperaturas de 10 a 45C, bem como em detergentes e bile. Possuem uma resistncia intrnseca aos antimicrobianos, sendo, diferentemente dos estreptococos, somente inibidos pela penicilina e no mortos por ela. So resistentes as cefalosporinas e alguns tambm a aminoglicosdeos, quando administrados em monoterapia. Na dcada de 1980, comearam a aparecer algumas cepas com resistncia a vancomicina o que causa at hoje grande preocupao em hospitais, pois, apesar de ser considerado um patgeno de baixa virulncia, ele possui a capacidade de transferir sua resistncia atravs de plasmdeos para outros gneros bacterianos, como, por exemplo, o S. aureus.
16.2. Cocos Gram-negativos Neisseria
Gnero pertencente famlia Neisseriaceae. Apesar de compreender vrias espcies, que podem ser diferenciadas por meio de provas bioqumicas, enfatizamos duas espcies patognicas para o homem: a Neisseria meningitidis, conhecida tambm como meningococo (meningite) e a Neisseria gonorrhoeae, conhecida como gonococo (Gonorreia). Ambas se apresentam como diplococos Gram-negativos, com morfologia semelhante a rins (riniformes) ou a gros de feijo. Alguns autores sugerem, ainda, semelhana a gros de caf. Medem
aproximadamente 0,8m de dimetro e so imveis. As colnias apresentam-se convexas, brilhantes e mucoides, com 0,5 a 1 mm de dimetro. Substncias como sangue e protenas animais estimulam seu crescimento, sendo que uma atmosfera com 10% de CO2 ideal para seu total desenvolvimento. Ambas as espcies possuem resistncia natural vancomicina e polimixina, o que facilita a seleo de contaminantes quando adicionados ao meio de cultura para seu isolamento (meio de Thayer-Martin). O Meningococo, responsvel pela meningite, pode ser dividido em 10 grupos sorolgicos, sendo a maioria das infeces causadas pelos grupos A, B, C, Y e W/35. Ele inicia sua colonizao, geralmente, pela nasofaringe (onde pode ser encontrando em elevado percentual de indivduos normais) de onde pode ganhar a circulao e migrar para as meninges ou at causar outras infeces. O Gonococo, responsvel pela gonorreia, doena sexualmente transmissvel, tem na uretrite sua principal forma clnica no homem. Na mulher, apresenta principalmente cervicite, mas, eventualmente, pode causar em ambos protite, faringite gonocccica e conjuntivite neonatal. Ocasionalmente, pode invadir a circulao, causando artrites, endocardites, meningites e leses cutneas.
16.3. Bastonetes Gram-positivos Clostridium
O Gnero pertence Famlia Clostridiaceae. So anaerbios formadores de esporos resistentes, tendo como habitat natural o trato intestinal de animais e do homem. De maneira geral so bastonetes mveis, Gram-positivos, grandes e longos, com comprimento variando entre 3 a 8m. Os esporos so geralmente mais largos e de difcil colorao.
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Clostridium botulinum Responsvel pelo botulismo, doena que, na maioria das vezes, causada pela ingesto de alimentos contaminados com toxina botulnica (termolbil), que causa paralisia flcida. O tratamento consiste em aplicao de soro antitoxina, e o diagnstico se baseia na demonstrao da toxina. Clostridium tetani Responsvel pelo ttano, doena cuja causa a infeco de ferimento por esporos deste microrganismo, provenientes de solo ou poeira. Trata-se de uma bactria que produz potente toxina neurotrpica chamada tetanospamina, que causa paralisia esptica (trismo) e pode levar morte. O tratamento consiste, principalmente, em aplicao de soro antitoxina, remoo cirrgica do tecido necrosado e administrao de antibiticos. No diagnstico, a bacterioscopia com visualizao da formao de esporos terminais facilita sua identificao (forma de raquete). O agente causador pode tambm ser isolado em culturas anaerbias a partir da ferida, porm, o tratamento no deve esperar esta confirmao. Clostridium perfringens Tambm formador de toxina, este microrganismo, que se apresenta isolado ou aos pares, pode produzir vrias toxinas, causando quadros clnicos diversos. Entre eles, intoxicao alimentar, gangrena gasosa (mionecrose), infeces intra-abdominais, cutneas e subcutneas.
Na gangrena gasosa, o microrganismo introduzido sob forma de esporos em uma ferida. A infeco se alastra em 1 a 3 dias, com desprendimento de gases nos tecidos que circundam o ferimento. O diagnstico e o tratamento procedem da mesma forma que no caso anterior.
Clostridium difficile
Podendo ser encontrado como habitante normal do intestino humano, este microrganismo agente de doena entrica, associada a antibitico. Com quadros que variam de diarreia autolimitante a colite pseudomembranosa, capaz de produzir trs fatores principais de virulncia. Uma enterotoxina, uma citotoxina e uma substncia inibidora da motilidade intestinal. O diagnstico feito por coloscopia e tambm por isolamento e demonstrao de toxina nas fezes. O tratamento se baseia em antimicrobianos, com chance de recidivas de 30%.
Bacillus
O gnero Bacillus a espcie tipo da famlia Bacillaceae, compreende espcies facultativas e formadoras de esporos. Sua maioria saprfita, sendo apenas duas espcies consideradas importantes clinicamente para o homem.
Bacillus anthracis
Causador do antraz ou carbnculo (doena primria do gado), a contaminao se processa via contato com animal doente. A infeco adquirida via introduo de esporos atravs da pele ou mucosas lesadas e raramente inalao, causando, na fase vegetativa, edemas, congesto de tecidos, e se disseminando pelas vias linfticas. No homem, a forma mais comum a pstula maligna, uma mcula inflamada com vescula no centro, circundada por um edema. A evoluo
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lenta e possui letalidade de 20% em casos no tratados. A forma pulmonar bastante rara e mais grave, com elevada taxa de mortalidade pela dificuldade do diagnstico. A inalao de esporos que inicia com quadro gripal, evolui rapidamente para a disseminao, levando ao sistmica da toxina, choque e morte. O diagnstico feito por esfregaos das leses corados pelo Gram que revelam estes bacilos, se forem feitos quando a leso ainda recente. Quando no forem evidenciados, recorre-se ao cultivo deste material. No caso, disseminado, pode-se proceder cultura de sangue ou testes de ELISA.
Bacillus cereus
Este organismo pode estar associado de forma eventual a diferentes patogenias, como infeces cutneas, bacteremia e septicemia, entre outras. Porm, a sua importncia clnica, mais frequente relatada em casos de intoxicao alimentar. Por serem capazes de resistir coco dos alimentos e em condies de m conservao, os esporos desta espcie podem germinar e produzir enterotoxinas. Existem duas sndromes distintas. Uma ocorre geralmente aps a ingesto de carnes, vegetais, massas, bolos e leite, com perodo de incubao de 8 a 16 horas; e apresenta dores abdominais e diarreia (toxina produzida pela multiplicao bacteriana). A outra ocorre com perodo de incubao curto (@5hs), ocorrendo nusea e vmito aps ingesto de arroz, massas, leite e derivados (toxina termoestvel pr-formada). Seu isolamento feito em alimentos e fezes, com base em estudos quantitativos (105UFC/Mg).
Corynebacterium
Este grupo, de bastonetes Gram-positivos, pertence famlia Corynebacteriaceae e mede de 0,5 a 1m de dimetro, tendendo a se apre-
sentar em paliada ou letras chinesas, e em forma de clava, devido a grnulos metacromticos em seu interior. O gnero compreende um nmero relativamente grande de espcies, entre elas, muitos membros da microbiota humana. Algumas espcies podem ter correlao clnica para os seres humanos, principalmente como oportunistas. Todavia, somente uma espcie possui grande patogenicidade para o homem, o Corynebacterium diphtheriae, causador da Difteria.
Corynebacterium diphtheriae
Tambm conhecido como bacilo de Klebs-Loeffler, esta bactria se localiza nas amdalas, garganta e nariz, causando reao inflamatria local, e podendo formar falsas-membranas (bactrias, clulas epiteliais, leuccitos e fibrina) e se estender traqueia e brnquios. Este microrganismo elabora potente exotoxina, codificada por um fago lisognico. Esta exotoxina circulando no organismo pode lesar clulas do msculo cardaco, sistema nervoso e renal. O diagnstico final, aps testes de colorao, cultivo e provas bioqumicas, est na comprovao da atividade toxignica (teste de ELEK).
Mycobacterium
Apesar de sua composio de parede, sugerir que este gnero seja estudado entre as bactrias Gram-positivas, estes bastonetes finos, variando entre 0,3 a 0,6m por 0,5 a 4,0m, no se coram com facilidade por mtodos comuns, possuindo a caracterstica de ser lcool-cido resistentes (BAAR), devido a presena de cido miclico e outros lipdeos complexos em sua parede (Figura 4). Alm disso, no formam esporos e so aerbios. O gnero Mycobacterium pertence famlia Mycobacteriaceae e contm grande nmero de espcies, porm a maioria s apresenta importncia clnica como oportunistas de imunocomprometidos. Duas espcies, em especial, so responsveis por duas doenas importantes, a Hansenase e a Tuberculose.
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Mycobacterium tuberculosis
Causadora da tuberculose, doena infecciosa, crnica de longa durao, causa de mortalidade em muitos pases, que pode ser pulmonar, renal, ssea, cutnea, menngea ou genital. Esta bactria, tambm conhecida como bacilo de Koch, se apresenta de formas retas e delgadas, dispostas isoladamente ou em pequenos grupos. O ponto de partida para seu diagnstico sua deteco do escarro, lquor, lavados gstricos e outros, pela colorao de Ziehl-Neelsen. A cultura tambm pode ser feita concomitantemente, mas seu crescimento muito lento, portanto, o tratamento deve ser processado antes mesmo do microrganismo ser cultivado.
Mycobacterium leprae
Causador da Hansenase (ou Lepra, como antigamente era chamada), doena que provoca desfiguraes na pele, caracterizada por leses crnicas, s vezes mutilantes. Este bastonete, tambm conhecido como bacilo de Hansen, semelhante ao de Koch em sua morfologia, podendo dispor-se em aglomerados chamado globias que caracterizam este tipo de micobactria. O diagnstico principalmente pautado em exame clnico e provas bacterioscpicas, a partir da coleta de material proveniente de muco nasal e leses cutneas. Este material deve ser fixado em lminas e corado pelo mtodo de Ziehl-Neelsen. At o momento, esta bactria ainda no foi cultivada in vitro, sendo utilizado o tatu e o coxim plantar do camundongo para sua proliferao.
Listeria
Gnero pertencente famlia Listeriaceae. So bastonetes curtos, de 0,5 por 0,8 a 2,5 mm, considerados por muitos autores como cocobacilos, podem variar morfologicamente, tendendo algumas vezes para formas cocoides
ou mesmo filamentosas. No formam esporos, so catalase positivos, oxidase negativos e fermentam a glicose produzindo cido, mas no gs. Das diferentes espcies que constituem o gnero, atualmente, a mais importante a Listeria monocytogenes.
Listeria monocytogenes
Por ser ubiquitria, encontrada em diferentes habitats, incluindo microbiota normal de diferentes animais e homem, bem como fontes ambientais, como gua e solo. Sua transmisso ao homem ocorre pelo contato direto com o animal ou fezes infectadas, ou pelo consumo via alimentos como, por exemplo, verduras, queijos e leite. Pode causar infeces assintomticas em indivduos sadios, que podem se tornar portadores por curtos perodos de tempo. A ingesto de Listeria pode levar a casos de infeco alimentar, com ndice considervel de morte em casos no tratados, podendo causar ainda quadros de meningoencefalite, meningite e septicemia, principalmente em pacientes com doena de base ou imunossuprimidos. No caso de mulheres grvidas, a listeriose pode afetar a placenta e o feto, levando ao aborto. O microrganismo cresce bem em gar sangue e outros meios gerais, mas a conservao do material clnico a baixas temperaturas aumenta o percentual de isolamento, o que demonstra uma possibilidade real de manuteno e crescimento, em alimentos mantidos sobre refrigerao.
16.4. Bastonetes Gram-negativos
16.4.1. Entricos
Enterobacteriaceae
Esta famlia engloba vrios gneros e espcies de bastonetes Gram-negativos, com muitas propriedades comuns. Embora possam ser encontrados de forma ampla na natureza, a maioria habitante do intestino de
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animais e do homem. Seu diagnstico pautado na coprocultura, identificao bioqumica e sorologia de um modo geral. Sua preveno, de um modo geral, est na manipulao e preparo correto de alimentos, bem como a ingesto de gua fervida e filtrada. Devido riqueza de membros desta famlia, optamos por somente assinalar as principais espcies que podem estar envolvidas nas patogenias humanas.
Escherichia coli
Habitante constante do intestino normal humano, sua presena em gua, pode indicar contaminao fecal. A doena mais comum causada pela E.coli est relacionada ao trato urinrio, como no caso da UPEC ( Escherichia coli uropatognica). Sua ocorrncia maior em crianas e mulheres grvidas. Quando a bacteriria acusar contagem superior a 100 mil UFC por mL de urina confirmada a infeco urinria. Alm disso, tambm podem estar envolvidas em septicemias, meningites e outros tipos de infeco. Alguns biossorotipos de E.coli podem tambm causar problemas de ordem intestinal, como as ETEC (enterotoxignica), EPEC (enteropatognica), EIEC (enteroinvasora), EHEC (entero-hemorrgica), EAggEC (enteroagregativa) e DAEC (aderncia difusa).
Shigella
Aerbios e imveis, podendo ser encontrados no trato intestinal do homem, no formam cpsula ou esporos. Suas colnias so transparentes, circulares, com at 2mm aps 24 horas. Causam, a partir da ingesto de gua ou alimentos contaminados, a chamada shigelose ou disenteria bacilar, atravs de leses no leo e do clon, caracterizada por reao inflamatria. Devido invaso e destruio da mucosa, o paciente pode apresentar disenteria de incio sbito, espasmos abdominais seguidos de diarreia e febre, com sangue e muco nas fezes.
Salmonella
No esporulados, mveis, aerbios facultativos, com cerca de 0,5 a 0,7m, por 1 a 3m. Atualmente, o Gnero Salmonella dividido em duas espcies, S.bongori e S.enterica, mas os estudos de hibridizao molecular demostraram que existem sete grupos evolutivos. A maioria dos sorovares que infectam humanos so classificados no grupo I e raros no IIIa e IIIb. A Salmonella enterica dividida em vrias subespcies e sorotipos importantes com base na composio antignica com relao aos antgenos O (somtico), Vi (capsular) e H (flagelar). Baseado na nomenclatura atual, os nomes dos sorotipos de Salmonella da subespcie enterica no so mais escritos em itlico e aparecem com a primeira letra maiscula (ex.: Salmonella Typhi). Os sorotipos das outras subespcies de Salmonella enterica e aqueles de Salmonella bongori so designadas apenas por sua frmula antignica. A Salmonella Typhi causa a febre tifoide e a mais importante das Salmonelas causadoras de febres entricas. Caracterizada por febre contnua e grave hemorragia intestinal a febre tifoide, se no for tratada, pode ser fatal. O diagnstico compreende o isolamento do agente nas fezes ou sangue do paciente e tambm sorologia diante do antgeno em questo. De um modo geral, os demais sorotipos de Salmonella causam no adulto normal apenas uma enterocolite que geralmente de origem alimentar. Mas, em crianas, podem invadir a corrente sangunea (ex.: Salmonella Typhimurium), provocando infeco em outros rgos.
Yersinia
Bastonetes pequenos, considerados por muitos autores como cocobacilos, trata-se de um gnero facultativo, que compreende vrias espcies. Sendo as espcies pestis, enterocolitica e pseudotuberculosis as principais envolvidas nas infeces humanas.
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como seu reservatrio, roedores silvestres e domsticos. Sua principal via de transmisso ocorre pela picada de pulgas infectadas (peste bubnica), mas tambm pode ser transmitida pessoa-a-pessoa, via inalao direta de aerossis de pessoa infectada nos pulmes (peste pneumnica), podendo ou no ter proliferao sistmica (septicmica). um microrganismo considerado de alta letalidade.
Yersinia enterocolitica Pode causar diferentes doenas no
homem, como conjuntivite e osteomielites, mas tem na infeco intestinal sua sndrome mais comum e importante, caracterizada por febre e dor abdominal. Apresenta, algumas vezes, quadro semelhante a apendicite aguda, decorrente de intensa inflamao do leo terminal e gnglios mesentricos (enterocolite). Em casos de debilitados, a bactria pode ter disseminao sistmica, levando o paciente aps a cura da infeco intestinal a artrite e outras complicaes.
Yersinia pseudotuberculosis Embora primariamente considera-
da um patgeno animal, tambm pode estar envolvida em infeco intestinal, causando diarreia e linfadenopatia com necrose, podendo levar ao desenvolvimento de ndulos esbranquiados no fgado, bao e pulmes. A forma septicmica, embora no muito comum pode levar morte em at dois dias.
Outras Enterobacteriaceae
Como j foi dito anteriormente, este grupo possui diversos gneros bacterianos, sendo muito difcil descrever todos em apenas um tpico. Entre
aqueles considerados de mdia importncia, que fazem parte da microbiota humana, mas que eventualmente apresentam-se como oportunistas, podemos citar os gneros: Klebsiella, Edwardsiella, Citrobacter, Enterobacter, Hafnia, Serratia, Proteus, Morganella e Providncia.
Vibrio
O gnero Vibrio, pertence famlia Vibrionaceae, constitudo de bacilos Gram-negativos que diferem de outros bastonetes pela sua morfologia, lembrando uma vrgula. Crescem melhor em meios alcalinos, com comprimento aproximado de 2 a 4m. Este gnero compreende vrias espcies, sendo a mais importante o Vibrio cholerae, responsvel pela clera. Outra espcie bastante importante o Vibrio parahaemolyticus, que possui papel bastante definido nas toxinfeces alimentares.
Vibrio cholerae
Bactria causadora da clera, doena sem febre ou clicas, caracterizada por nuseas, vmitos e diarreia profusa, que pode levar em pouco tempo morte por desidratao, requerendo reidratao contnua do paciente. Esta patologia ocorre geralmente onde no h higiene, j que proveniente da ingesto de bactrias contidas na gua ou alimentos contaminados por fezes. Seu perodo de incubao varia de 2 a 3 dias, e a diarreia pode levar at 7 dias. J causou diversas pandemias e hoje se apresenta sob forma endmica, em vrios locais da terra. O diagnstico se baseia na coprocultura inicial em gua peptonada alcalina (APA) e posterior isolamento em meio de cultura prprio (TCBS), seguido de bioqumica e sorologia.
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Vibrio parahaemolyticus
Encontrado geralmente em gua e frutos do mar, pode causar infeco intestinal quando do consumo destes alimentos sem a coco necessria. Seu perodo de incubao varia de 8 horas a 2 dias, e a diarreia leva em mdia 3 dias. Diferentemente da clera, na diarreia por V.parahaemolyticus o paciente pode apresentar clica e febre, sendo a frequncia de eliminao muito menor. O diagnstico feito da mesma forma que o anterior.
Aeromonas
Pertencente a famlia Aeromonadaceae, esse gnero comumente encontrado em corpos dgua, solo, verduras, animais de sangue frio e aves, este gnero engloba microrganismos fermentadores da glicose, anaerbios facultativos, oxidase positivos, que podem causar infeces intestinais e extraintestinais. Possui cinco espcies de importncia clnica: A.hydrophila, A.sobria, A.caviae, A.veronii e A.schubertii, sendo as duas primeiras mais implicadas em doenas humanas.
Pseudomonas
Pertencente a famlia Pseudomonadaceae, compreende vrias espcies, com aproximadamente 25 destas com alguma implicao humana, o grupo se divide em diferentes gneros, sendo que o gnero Pseudomonas tornou-se bastante conhecido, atravs do isolamento hospitalar constante de uma de suas espcies.
Pseudomonas aeruginosa Encontrada em pelo menos 70%
dos casos de infeco por Pseudomonas, um patgeno tipicamente oportunista, podendo causar vrias doenas, principalmente em imunodeprimidos. Sua patogenia engloba desde infeces localizadas (processos cirrgicos ou queimados) at septicemias
severas. Atualmente, considerado um patgeno alerta em infeces nosocomiais, devido a sua caracterstica de manuteno em locais midos e elevada resistncia a muitos antibiticos e antispticos, sendo possvel sua transmisso nestes ambientes hospitalares, por desinfetantes, respiradores, cateteres, alimentos, etc. Podendo ser isolada facilmente pela cultura, a diferenciao feita com base em provas bioqumicas (no fermenta glicose e oxidase positiva) e na capacidade de algumas cepas produzirem um pigmento azul-esverdeado chamado piocianina.
Burkholderia
Anteriormente pertencente ao gnero Pseudomonas, a Burkholderia pertence hoje a uma famlia distinta (Burkholderiaceae), tendo como espcie mais importante a B.cepacia. um organismo oxidase e catalase positivos, mvel, aerbio, no fermentador, multirresistente e oportunista, geralmente associada a surtos intra-hospitalares. J foi relatada causando septicemias em neutropnicos e desmineralizao ssea em pacientes com fibrose cstica. Outra espcie de alta morbidade e letalidade para os equdeos e que pode acometer o homem a Burkholderia mallei, causadora do mormo, doena que causa leses nodulares nos pulmes e outros rgos, assim como danos ulcerativos na pele e em mucosas da cavidade nasal.
Campylobacter
Constitudo de vrias espcies, este gnero pertence famlia Campylobacteracea e apresenta-se incapaz de proliferar em presena do ar atmosfrico ou na ausncia de oxignio, sendo considerados microaerfilos estritos (crescem em 5% a 6% de O 2) e muitas vezes termoflicos. Morfologicamente, so bastonetes curvos ou em forma de S. Existe um grande reservatrio de Campylobacter em animais, principalmente aves, o que
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associa as infeces por esse patgeno, na maioria das vezes, ao consumo de alimentos contaminados. Este organismo tem a capacidade de causar diarreia do tipo disenteriforme, com sangue e muco, febre e dores abdominais, que pode evoluir para invaso e bacteremia, especialmente em recm-natos e debilitados. Entre as espcies termoflicas que acometem o homem, podemos destacar C. jejuni, C.coli e C. lari. O diagnstico feito pelo isolamento (microaerofilia) em meios seletivos e identificao por base na sua morfologia e propriedades bioqumicas (ver prova do hipurato no apndice).
16.4.2. No entricos
Brucella
O gnero Brucella, pertencente famlia Brucellaceae, congrega parasitas obrigatrios do homem, imveis, no formadores de esporos, e que, morfologicamente, se apresentam como bastonetes curtos. Estes microrganismos causam a Brucelose ou febre ondulante, que pode ser adquirida, principalmente, pela sua penetrao atravs de leses ou pelo trato alimentar (ingesto de leite ou queijos contaminados). considerada uma zoonose, por sua associao a animais como fonte primria. As espcies mais importantes para o homem so a B. melitenseis (caprinos), a B. suis (sunos) e a B. abortus (bovinos). So parasitas intracelulares, podendo se multiplicar no interior de macrfagos; sua disseminao aps a infeco linftica, podendo localizar-se nos rins, bao ou fgado. O diagnstico pode ser sorolgico (aglutinao em lmina ou tubo) ou bacteriolgico (hemocultura no pico febril ou materiais obtidos por bipsia, que devem ser incubados em 10% de CO2).
Bordetella
O gnero pertence a famlia Alcaligenaceae engloba trs espcies, sendo a mais importante para o homem a Bordetella pertussis (agente da coqueluche). A coqueluche uma infeco aguda transmitida por gotculas areas, com colonizao dos clios das clulas do trato respiratrio e liberao de diferentes toxinas, levando inicialmente a tosse catarral, que evolui para tosse seca e paroxstica (tosses curtas com produo intensa de muco), seguida de sibilos. Ocorre principalmente em crianas com at 10 anos, podendo complicar para anoxia do SNC, exausto e pneumonias secundrias. O diagnstico geralmente clnico, devido a caracterstica da tosse, mas a cultura pode ser feita por placa de tosse ou material da nasofaringe.
Legionella
Pertencente a famlia Legionellaceae, esse gnero engloba espcies aerbias, mveis e oxidase negativas. De difcil cultivo em meios rotineiros de laboratrio, esses organismos podem ser isolados em meios seletivos incubando-se a 5% de CO2 com umidade relativa elevada. Considerada uma bactria ambiental, este gnero pode ser adquirido por inalao do ar e poeira ou de gua contaminada. A espcie principal, L. Pneumophila, pode acometer o homem com sndromes semelhantes a gripe ou mesmo pneumonias atpicas (doena dos Legionrios), dependendo principalmente do estado imunitrio do hospedeiro.
Helicobacter
Esse gnero, atualmente, pertence a famlia Helicobacteraceae e constitui-se de bastonetes mveis, curvos ou helicoidais, com 0,3 a 1 mm de largura por 1,5 a 5 mm de comprimento, no esporulam e, em culturas velhas, podem se tornar cocoides.
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Capaz de resistir acidez estomacal, a espcie tipo H. pylori reside na camada de muco que reveste a mucosa gstrica, pois produz urease, convertendo ureia em amnia, o que aumenta o pH local. Pode causar um enorme espectro de problemas gastroduodenais, inclusive cncer de estmago, porm s causa doena clnica em 5% a 10% dos indivduos infectados. diagnosticado por exame histolgico, cultura, testes de deteco de urease e testes sorolgicos. Sendo tratado por combinao de antimicrobianos e drogas cido-redutoras.
Haemophilus
Gnero pertencente famlia Pasteurellaceae. Possui clulas pequenas a mdias, podendo apresentar pleomorfismo, exigentes no crescimento de fatores X e/ou V (gar chocolate) e timo de temperatura de 37 oC, compreende vrias espcies, sendo o Haemophilus influenzae principalmente relacionada ao homem. As principais doenas causadas por esta bactria esto ligadas ao trato respiratrio, j que esta se encontra normalmente na nasofaringe. O H.influenzae ainda a principal causa da meningite precedida de otite em crianas de 3 meses a 2 anos. O diagnstico feito por esfregaos corados pelo Gram e pela cultura precedida de identificao sorolgica do tipo capsular. Outra espcie de importncia humana o Haemophilus ducreiy, causador da doena sexualmente transmissvel cancro mole, caracterizada por ulceraes genitais necrticas dolorosas, acompanhadas ou no de adenopatia inguinal.
16.5. Espiroquetdios
Bactrias que ocorrem isoladas e possuem morfologia espiral, graas conformao do peptidoglicano da parede que, de um modo geral, no se coram bem pela tcnica de Gram.
So mveis, geralmente girando em seu eixo. Em virtude da dificuldade de observao dos espiroquetas no microscpio comum, aconselha-se o emprego da microscopia de campo escuro com preparao a fresco, permitindo a observao da motilidade caracterstica e facilitando o diagnstico. Sua visualizao ao microscpio luminoso feita pela impregnao da prata (mtodo de Fontana Tribondeau).
Leptospira
Principal gnero da famlia Leptospiraceae possui uma diviso fenotpica em duas espcies, Leptospira biflexa e L.interrogans, sendo a segunda espcie, patognica para o homem. Atravs de estudos moleculares, podemos decompor o gnero em vrias espcies com potencial patognico, e subdividilos em diferentes sorogrupos e sorovares, causadores da leptospirose, zoonose adquirida atravs do contato com a urina de animais infectados, principalmente ratos (portadores assintomticos). A doena pode variar muito no que diz respeito aos sintomas, podendo ocorrer estados semelhantes aos gripais, meningites, danos hepticos e renais (doena de Weill) e at problemas hemorrgicos graves, dependendo da virulncia do sorovar envolvido e do estado imunitrio do hospedeiro. Seu diagnstico realizado com base na tcnica da PCR (ver captulo 2 do volume 3 desta coleo), no cultivo bacteriano e nas reaes sorolgicas com as amostras dos pacientes suspeitos.
Treponema
Gnero pertencente famlia Spirochaetaceae . Entre as espcies patognicas, destacamos o Treponema pallidum , causador da sfilis. Esta doena, de aquisio por contato sexual, pode se manifestar em leses no pnis ou locais geniturinrios mais profundos, havendo a possibilidade da
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transmisso horizontal e vertical, j que este microrganismo capaz de ultrapassar a barreira placentria. Este microrganismo no cultivvel em meio de cultura. O diagnstico vai depender da fase da doena. Se a sfilis primria, o agente pode ser demonstrado na secreo da leso (cancro duro), por microscopia de campo escuro ou imunofluorescncia. Aps este estgio, o diagnstico sorolgico (VDRL).
Borrelia
Pertencente a mesma famlia do gnero anterior, este possui uma espiral irregular de 10 a 30 mm de comprimento e 0,3 mm de largura, altamente flexvel e com movimento rotatrio. Engloba duas espcies de importncia na clnica humana, a Borrelia recurrentis e a B.burgdorferi. A primeira o agente da febre recorrente, que tem este nome devido a sua caracterstica recidivante. Antigamente ocorriam surtos, mas na atualidade so registrados apenas casos espordicos, sem praticamente nenhuma ocorrncia no Brasil. transmitida pelo piolho humano e carrapatos que picam roedores e depois transmitem as bactrias para o homem. O diagnstico pode ser feito pelo cultivo e pela demonstrao bacterioscpica da bactria no sangue do paciente. A segunda o agente da doena de Lyme (cidade americana onde foi descrita). As principais manifestaes da doena so o eritrema migratrio e a artrite, podendo haver comprometimento neurolgico e cardaco. Possui tambm um animal invertebrado como vetor, o carrapato, que pica camundongos e cervdeos infectados e transmite depois os microrganismos para o homem. O diagnstico geralmente sorolgico atravs do ELISA (Ver captulo 1 deste volume).
Pertencentes famlia Mycoplasmataceae, estes microrganismos no apresentam parede celular verdadeira, nem rigidez, porm muitas espcies contm colesterol na membrana (no existe em outras bactrias). Espcies mais importantes para o homem:
Mycoplasma pneumoniae Espcie causadora de pneumonia atpica. Mycoplasma hominis e Ureaplasma urealyticum (ambos causadores
de infeces no trato genital, como uretrites no gonoccicas). A transmisso, em geral, interpessoal, sendo o M.pneumoniae de aquisio aergena e outros mycoplasmas e ureaplasmas por contato sexual. Possuem clulas variveis na morfologia e tamanho (100 a 250nm), no se corando, devido ausncia da parede, pelo mtodo de Gram. Usa-se o corante Diene ou Romanovsky (Giemsa) para visualizao (vide apndice), porm, o diagnstico est pautado na sorologia, pois so microrganismos exigentes, necessitando de meios complexos para seu cultivo, o que dificulta a cultura.
Rickettsiae
So bactrias pleomrficas, parasitas intracelulares estritas, que geralmente so transmitidas ao homem por artrpodes (com exceo da febre Q). O gnero Rickettsiae pertence famlia Rickettsiaeceae e geralmente no trabalhado em laboratrio clnico comum, necessitando de maiores requisitos de cultivo (cultura de clulas e/ou ovo embrionado) e normas mais rgidas de biossegurana na sua manipulao. So responsveis por doenas como o tifo, a febre maculosa e a febre Q, sendo na maioria das vezes seu diagnstico sorolgico.
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Chlamydia
Pertence famlia Chamydiaceae. Este gnero se compe de seis espcies que tambm no possuem peptdeoglicano em suas paredes. Alm de no se corarem pelo mtodo de Gram, so parasitas intracelulares estritos e imveis, que se reproduzem no interior do citoplasma da clula infectada. Podem ser cultivadas em ovos embrionados e culturas de clulas. Muitas vezes o diagnstico feito sorologicamente ou atravs de biologia molecular. O gnero Chlamydia , possui trs espcies de importncia humana:
C. trachomatis Espcie causadora de infeces oculares, genitais
e respiratrias.
C. pneumoniae Infeces nas vias respiratrias. C. psittaci Psitacose, pneumonia. 17. Diagnstico laboratorial das infeces bacterianas no trato respiratrio
Apesar de o trato respiratrio ser um sistema contnuo e muitos agentes infecciosos poderem se instalar em toda a sua extenso, geralmente o que percebemos que, em muitos casos, existe um local preferencial para o microrganismo ser encontrado. Deste local, ele pode ou no se disseminar, dependendo de diversos fatores, como sua virulncia, at caractersticas de resposta do prprio hospedeiro. Para facilitar nosso estudo, consideraremos o trato respiratrio superior e inferior em separado, lembrando que o trato superior (orofaringe, fossas nasais, nasofaringe, laringe e traqueia) possui microbiota autctone, que eventualmente pode agir como oportunista ou mesmo causar alguma confuso no momento do diagnstico.
Outro fato importante para lembrar que algumas infeces respiratrias (principalmente virais), podem se iniciar neste sistema e posteriormente se disseminar pelo corpo, como no caso da caxumba, rubola e sarampo. Como dificilmente em laboratrio clnico diagnosticamos viroses, vamos dar maior nfase s infeces bacterianas encontradas neste trato.
17.1. Trato Respiratrio Superior (TRS)
17.1.1. Faringite e tonsilite
Na maior parte das vezes no h necessidade de se fazer diagnstico laboratorial destas doenas, j que 70% delas so de origem viral, e mesmo as de origem bacteriana (Figura 37) tendem a no apresentar gravidade suficiente para que se recorra ao exame. Porm, em alguns poucos casos em que isso necessrio, o problema maior, no est na doena primria, e sim nas possveis complicaes que podem ocorrer aps esta infeco. As bactrias associadas a essas doenas so:
comum nestes casos (10% a 20% dos casos de faringite aguda), seu diagnstico necessrio devido s complicaes que podem ocorrer como febre reumtica, escarlatina, glomerulonefrite, otite e sinusite. Manifesta-se repentinamente, principalmente em crianas (veja tpico 20).
Corynebacterium diphtheriae - J citada no tpico 14.3, esta
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diftrica, poder causar uma doena chamada difteria, que produz obstruo da orofaringe e da nasofaringe, impedindo a respirao normal. A disseminao da toxina pelo corpo pode comprometer outros rgos e evoluir para forma fatal. Felizmente no ocorre com frequncia, principalmente aps as campanhas de vacinao, onde h a imunizao com o toxoide diftrico.
Haemophilus influenzae (tipo B) Alm das doenas citadas, as
complicaes causadas por esse microrganismo podem se associar a epiglotites graves e at mesmo a casos de meningite em crianas pequenas (veja item 21 deste captulo).
Borrelia Vincenti (Borrelia estirpe Vincenti) Essa espiroqueta,
que ocorre principalmente em adolescentes e adultos, forma um complexo fusoespiralar em associao com bacilos fusiformes. Pode causar lceras na garganta ou gengiva, mas geralmente no tem maiores complicaes.
17.1.2. Otite e Sinusite
Como no caso anterior, estas doenas so frequentemente de origem viral, podendo estar associadas secundariamente a agentes bacterianos. Apesar das otites no estarem diretamente associadas ao trato respiratrio, por sua localizao e ligao anatmica, bem como os agentes associados vamos consider-las neste tpico.
Otite mdia aguda Comum em crianas, devido ao fato de a
trompa de Eustquio ainda estar muito aberta, facilitando a invaso viral e de bactrias residentes na nasofaringe. Os sintomas so bem gerais, como febre, mas pode ocorrer at mesmo vmito e diarreia. Os vasos do tmpano podem estar dilatados e ocorrer secreo no ouvido mdio. O processo, se no tratado, pode levar ao rompi-
mento do tmpano e prejuzo audio (otite mdia crnica supurativa). As bactrias mais comumente envolvidas nesse processo so: S.pneumoniae, H.influenzae, S.pyogenes e S.aureus (todas j citadas anteriormente).
Otite externa O canal externo do ouvido (orelha externa)
possui microbiota bacteriana semelhante a da pele. Como o ambiente mido, favorece a colonizao por S. aureus e tambm pela levedura Candida albicans. Eventualmente pode ocorrer tambm a presena de bactrias Gram-negativas, como Pseudomonas aeruginosa e Proteus. Geralmente, problemas causados por estes microrganismos so facilmente tratados com preparados oto-oftlmicos contendo polimixina ou outro antibitico na frmula.
Sinusite aguda Clinicamente a Sinusite se associa a dor e
sensibilidade facial. Etiologicamente, semelhante Otite mdia. Geralmente o tratamento emprico ou feito com base no material colhido da nasofaringe, j que a aspirao do sinusoide no uma prtica comum.
17.2. Trato Respiratrio Inferior (TRI)
Os principais rgos do trato respiratrio inferior so os pulmes, os brnquios e os alvolos. Geralmente as infeces do TRI so mais graves, podendo ser classificadas em infeces agudas e crnicas.
17.2.1. Agudas
bactria Bordetella pertussis (ver item 16.4). O quadro clnico inicial duvidoso, mas, aps a manifestao da tosse seca e curta (estgio paroxstico), geralmente no h dvidas. Os organismos
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podem ser isolados de swab de garganta ou em placas de tosse, no meio de Bordet-Gengou ou gar-sangue-carvo, incubando-se por 3 a 5 dias em atmosfera mida. O atibitico de escolha a eritromicina, mas a preveno ocorre pela vacinao (trplice DPT).
Bronquite aguda uma inflamao aguda dos brnquios, geral-
mente causada por uma infeco. Resulta, geralmente, em tosse. Diversos vrus atuam neste tipo de patogenia, porm, bactrias como o Mycoplasma pneumoniae, Streptococcus pneumoniae e Haemophilus influenzae, tambm podem possuir importante papel nesta condio. Devido a esse fato, muitas vezes recomendado o uso de antimicrobianos.
Bronquiolite Doena exclusiva da infncia, causada frequente-
mente por vrus (75% so causadas pelo vrus respiratrio sincicial VRS e 25% por outros vrus ocasionalmente pode-se ter envolvimento de M.pneumoniae). Devido ao diminuto tamanho dos bronquolos infantis, qualquer edema celular obstrui a passagem de ar nos alvolos. Uma complicao comum deste tipo de doena a pneumonia intersticial.
Pneumonia uma infeco do parnquima pulmonar. Variados
microrganismos como bactrias, vrus e fungos podem causar pneumonia logo, ela no uma doena nica e sim um conjunto de infeces especficas, cada uma com sua epidemiologia, patognese, apresentao clnica e curso clnico. A Identificao etiolgica do microrganismo causador da pneumonia um elemento de extrema importncia, visto que ele a chave para um tratamento antibitico apropriado. Entretanto, devido natureza sria da infeco, os pacientes necessitam receber antibioticoterapia emprica, principalmente em casos de pneumonia grave, antes dos resultados
laboratoriais estarem disponveis. Alm disso, em cerca de um tero dos casos, o agente etiolgico no consegue ser evidenciado. As pneumonias virais so mais comuns em crianas e as bacterianas, em adultos, podendo ser causadas, na maioria das vezes, por S.pneumoniae e H.influenza. Podem ser ainda resultantes de alguns oportunistas ps-virais, como S.aureus e K.pneumoniae. Existem tambm as chamadas pneumonias atpicas bacterianas que so causadas por diversos outros agentes bacterianos, como, por exemplo, Mycoplasma pneumoniae, espcies de Chlamydia e Legionella.
17.2.2. Crnicas
tuberculosis (ver item 14.3). Apesar de ser uma doena primria dos pulmes, pode disseminar-se para outros locais do organismo ou mesmo evoluir para uma infeco generalizada (tuberculose miliar).
Muito sria em pases subdesenvolvidos e em desenvolvimento devido a problemas sociais como misria, desnutrio e moradias inadequadas. Tor na-se extremamente grave em indivduos imunocomprometidos. O bacilo de Koch se localiza intracelularmente nos macrfagos, o que possibilita sua persistncia por longos perodos no organismo. O diagnstico com base no teste cutneo de tuberculina no til em pases como o nosso, onde a maioria dos indivduos recebeu a vacina BCG. O diagnstico realizado inicialmente por bacterioscopia (mtodo de Ziehl-Neelsen - ver item 5.2) e confirmado posteriormente pela cultura (Loewenstein-Jensen - ver apndice) o mais confivel.
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A infeco urinria uma infeco em qualquer parte do trato urinrio, quer seja nos rins, ureteres, bexiga ou uretra. Pode atingir pessoas de qualquer sexo e qualquer idade, mas mais frequente em mulheres e bebs do sexo feminino. H uma estimativa de que 10% a 20% das mulheres contraem infeco urinria em alguma poca de suas vidas, sem considerar um nmero significante de infeces recidivantes. A maioria das infeces aguda e de curta durao, porm contribui para taxa significativa de morbidade na populao. Quando ocorrem infeces graves podem resultar em perda da funo renal e sequelas graves permanentes. Nas mulheres, pode-se fazer distino entre o tipo de infeco, entre cistite, uretrite e vaginite, porm o trato contnuo e os sintomas podem aparecer superpostos. O trato urinrio dividido em rins, ureteres, bexiga e uretra. Sendo que somente na uretra devemos encontrar microbiota normal. Quanto aquisio e etiologia, as infeces do trato urinrio so causadas principalmente por bactrias, mas, ocasionalmente, outros microrganismos, como vrus, fungos e parasitas, podem estar envolvidos.
18.1. Patognese das Infeces do TU
Um dos fatores predisponentes infeco urinria ser do sexo feminino, pois a uretra feminina mais curta que a masculina e est mais prxima ao nus. Alm disso, as relaes sexuais facilitam o movimento de microrganismos at a uretra. Nas mulheres, h tambm a ocorrncia de mudanas hormonais, afetando a mucosa do trato genitourinrio, sendo que na gravidez ocorre dificuldade de esvaziamento pela conformao anatmica da mulher.
Infeces Virais so bastante raras, mas os vrus podem ser isolados na ausncia de doena do trato urinrio. Como, por exemplo, o poliomavrus, o citomegalovrus e o adenovrus (ver captulo 16 de Virologia). Infeces fngicas tambm podem ocorrer, tendo como principais causadores a Candida spp. e o Histoplasma capsulatum (ver captulo 4 deste volume). Quanto aos parasitas, temos o protozorio Trichomonas vaginalis, que pode causar uretrite em homens e mulheres (considerado a causa de vaginite) e o helminto Schistosoma haematobium, que causa inflamao da bexiga (os ovos penetram na parede da bexiga).
Infeces urinrias bacterianas
As infeces urinrias bacterianas so geralmente adquiridas por via ascendente, passando inicialmente pela uretra e posteriormente pela bexiga e rins. Ocasionalmente, pode atingir a corrente sangunea e causar uma septicemia. Estas infeces so normalmente causadas por bacilos Gram-negativos, como a E.coli. A espcie Proteus mirabilis, por exemplo, de frequente associao com clculos urinrios, pois possui potente urease que, atuando na ureia, produz amnia e torna a urina alcalina. Klebsiella, Enterobacter, Serratia sp. e Pseudomonas aeruginosa tambm so bastante isolados, porm possuem associao a infeces hospitalares (resistncia). No grupo dos Gram-positivos, podemos citar o S.saprophyticus, em mulheres jovens sexualmente ativas, e o S.epidermidis e Enterococcus sp., associados a pacientes hospitalizados. A maioria dos patgenos do trato urinrio faz parte da microbiota fecal, pois somente espcies aerbias e facultativas, como E.coli, possuem os atributos necessrios para colonizar e infectar o trato urinrio, sendo necessrio para estes microrganismos ascender e se fixar (adesinas).
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Alguns sorogrupos de E.coli possuem capacidade de colonizar reas periuretrais, podendo possuir um tipo peculiar de fmbrias (pili) que permite sua adeso ao epitlio da uretra e da bexiga. Algumas bactrias produzem endotoxinas que diminuem a funo das vlvulas vesicouretrais, comprometendo o peristaltismo uretral e levando a um refluxo de urina com bactria para os ureteres (afluxo bacteriano). Outras possuem flagelos e podem mover-se contra a corrente (exceo: Enterococcus). A produo de determinadas substncias, como hemolisinas, leso renal (E.coli), e urase, pielonefrite (Proteus), tambm funcionam como fator de virulncia para estes microrganismos. Com exceo da mucosa uretral, o TU normal resistente colonizao bacteriana e geralmente elimina rpida e eficientemente os microrganismos. Como mecanismos de defesa, podemos citar o pH, o contedo qumico, os mecanismos normais de descarga, as prprias clulas da bexiga e do rim, que produzem IgG e IgA, e a fagocitose.
Caractersticas Clnicas e Complicaes
A infeco pode envolver diferentes partes do TU, podendo ser ento denominada as seguintes formas distintas, a saber: Cistite - Infeco da bexiga, caracterizada por frequncia e urgncia urinria e dificuldade de urinar (disria). Pielonefrite aguda - Envolve parnquima renal e sistema coletor, geralmente acompanha bacteremia, dor lombar localizada e sintomas sistmicos (febre e prostrao). Pielonefrite crnica - Termo confuso, pois se refere aparncia patolgica do rim resultante de inflamao progressiva do interstcio renal e tbulos.
Abcesso renal - um acmulo localizado de pus no tecido renal (manifestao incomum). Pode ser confundido com a pielonefrite, porm, no incio, os sintomas so mais acentuados. Prostatite aguda - Infeco bacteriana da prstata, com febre e dor perineal, associada a sintomas de disfuno irritativa e obstrutiva (a prostatite crnica uma condio subaguda). Urosepse - Bacteremia sintomtica, originria do trato urinrio. Pode ser causada por pielonefrite ou abcesso renal ou ser adquirida no hospital, geralmente devido instrumentao (ex: cateterizao).
18.2. Coleta do material
A coleta ideal feita antes da terapia antimicrobiana (se recebeu antibitico nas ltimas 48 horas, dever relatar).
Amostra de urina por coleta de jato intermedirio
A coleta ideal para a pesquisa de infeco bacteriana no trato urinrio dever ser realizada com a primeira urina da manh. Nos casos em que no podemos aguardar este momento, sugerimos que o paciente faa um repouso miccional de, no mnimo, 3 a 4 horas. Deve-se processar uma lavagem cuidadosa dos lbios femininos ou da glande masculina com sabo neutro e gua (no usar sabo antissptico), secar o local e, utilizando um frasco estril e de boca larga, colher o volume intermedirio da urina, desprezando o primeiro jato. Devemos considerar de forma especial a interpretao dos resultados nos pacientes idosos ou acamados com dificuldade maior de coleta, crianas e gestante. A obteno de amostras de fluxo intermedirio de bebs e crianas pequenas obviamente difcil, sendo que as amostras podem ser coletadas por colocao
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de uma bolsa plstica adesiva (saco coletor) no perneo (feminino) ou no pnis (masculino). Estas amostras, muitas vezes, so contaminadas pelas fezes. Em alguns casos, estes problemas so contornados pela aspirao suprapbica.
Amostra de urina por puno suprapbica
Desinfeta-se a pele da regio sobre a bexiga e injeta-se anestsico, tal como lidocana, por via subcutnea. Com a ponta de uma lmina cirrgica, faz-se um pequeno corte atravs da epiderme e, pelo corte, introduz-se cuidadosamente uma agulha espinhal calibre 18 de bizel curto e aspira-se com seringa 10mL de urina.
Amostra de urina de catter
Os pacientes no devem ser cateterizados simplesmente para obteno de amostras de urina. Nos que j possuem cateter in situ, amostras devem ser obtidas pela retirada com seringa e agulha do tubo do cateter. A coleta da bolsa do catter geralmente imprpria para cultura, pois a permanncia da urina na bolsa de drenagem propicia a multiplicao dos microrganismos no local, ocasionando falsos valores na contagem. Deve-se tomar precaues especiais para que no ocorra a contaminao da amostra. Amostragens diferentes para determinao de casos especiais:
Mycobacterium tuberculosis Coletar, em dias consecutivos, 3 amostras da urina da manh. Schistosoma haematobium Examinar os ltimos mililitros de uma amostra matinal de urina aps exerccios fsicos.
Pacientes com infeco prosttica - aps esvaziamento da bexiga devese fazer massagem prosttica. O final da urina sair com secrees prostticas que acumulam. Nestes casos uma alta concentrao de material j pressupe infeco prosttica.
Dever ser transportado ao laboratrio envolvido no gelo, com o mnimo de demora, pois a urina um excelente meio de cultura para muitas bactrias e a multiplicao bacteriana provocar distores no resultado.
18.4. Procedimentos
Os espcimes que no puderem ser examinados no perodo de 1 hora da coleta devem ser refrigerados, sendo que as contagens bacterianas permanecem viveis no mximo at 18 horas no refrigerador. No caso de espcimes recebidas sem refrigerao, o ideal descart-las e solicitar uma nova coleta (explicando ao paciente a forma correta de transporte).
Testes rpidos
O exame ao microscpico permite a emisso de um relato preliminar rpido e um controle presuntivo da qualidade da amostra. Colocar em uma lmina, sem espalhar, 10mL de urina homogeneizada, sem centrifugar (usar pipeta automtica ou ala calibrada), esperar secar, fixar e corar pelo Gram. Caso seja observada a presena de, pelo menos, 1 bactria por campo, em 20 campos analisados, trata-se de uma possvel bacteriria significante (105 UFC/mL). Estes casos geralmente acompanham picitos tambm. A observao de clulas epiteliais descamativas e uma cultura mista geralmente indica amostra proveniente do primeiro jato e contaminao, havendo nestes casos a necessidade de nova coleta. Existem outros mtodos rpidos no disponveis em todos os laboratrios como, por exemplo, os aparelhos automatizados, todavia, seu custo ainda inacessvel para laboratrios de pouca rotina ou de pesquisa.
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Urinocultura
O objetivo deste teste estimar o nmero de bactrias viveis por mililitro de urina e, nos casos considerados positivos ( 105 UFC/mL), realizar sua identificao.
a) Urinocultura quantitativa
1. Tcnica da ala calibrada (Mtodo de Hoeprich) Utiliza-se uma ala fabricada com diferentes calibragens: 0,1 mL (1/ 10), 0,01 mL (1/100) e 0,001 mL (1/1000). A ala inserida verticalmente na urina (j homogeneizada) e inoculada no centro da placa contendo meio de cultura. Faz-se ento um espalhamento com ala de Drigalski ou ala bacteriolgica. 2. Tcnica das diluies seriadas A urina diluda em salina 1:10 / 1:100 / 1:1000 Semeando-se sempre 0,1mL de cada diluio em placa de cultura. Pode-se semear em superfcie (Drigalski) ou pour-plate.
Meios utilizados
Para anlise quantitativa so utilizados meios ricos que propiciam o crescimento da maior parte dos microrganismos presentes nas infeces urinrias. O cultivo padro realizado no gar Brolacin, tambm conhecido como CLED (azul de bromotimol - lactose-cistena - eletrlitos deficientes). O meio alm de facilitar a contagem inibindo o swarm do gnero Proteus, permite a diferenciao presuntiva das bactrias presentes (lactose E.coli - azul/ amarelo azul intenso Proteus). Para anlise qualitativa (propicia a noo dos microrganismos presentes), pode-se usar meios como gar sangue e meios seletivos para determinados grupos (ex: gar MacConkey e EMB).
Incubao: as placas devero ser incubadas em estufa a 37 oC por 24 horas. Se no houver crescimento, devero ser incubadas mais 24 horas e se ainda no houver crescimento, o resultado dever ser o seguinte: ausncia de crescimento aps 48 horas de incubao. Se houver crescimento, o microrganismo dever ser identificado (provas bioqumicas) e posteriormente realizado o seu TSA.
Interpretao dos resultados (anlise quantitativa)
A contagem de placa dever ser feita naquela que tiver um nmero entre 30 e 300 colnias e dever ser feito com base no nmero de colnias contado X fator de diluio = nmero de microrganismos por mililitro. Se o resultado for menor que 104 colnias (10.000 UFC/mL), considera-se a amostra contaminada acidentalmente ou contedo da contagem proveniente de microbiota autctone (no identificar). Nestes casos, devemos reportar s o no total de UFC/mL. Porm, se no teste inicial pela colorao de Gram a contagem foi positiva, as placas devem ser reincubadas. Nos resultados com contagem maior ou igual a 105 colnias (100.000 UFC/mL), h indicao de infeco urinria. Nestes casos, as colnias devem ser identificadas e, posteriormente, deve ser feito o teste de sensibilidade aos antimicrobianos (TSA). Se mais de 1 tipo de colnia estiver presente em grande quantidade, ambas devero ser identificadas e o TSA de cada uma deve ser feito separadamente. Se foram isoladas mais de 2 espcies, h suspeita de contaminao do material, principalmente se na colorao de Gram no foi observado nenhum leuccito e houver presena de clulas epiteliais descamativas. A presena de culturas mistas geralmente indica contaminao, porm, pode ocorrer infeco mista, principalmente em pacientes fazendo uso de cateter com doena renal crnica ou com leso obstrutiva.
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Se o resultado estiver entre 104 e 105 UFC/mL (resultados intermedirios), este caso deve ser analisado com muito cuidado, pois pode tratarse de contaminao, incio ou final de infeco ou paciente que iniciou o tratamento com antimicrobiano. Como controle, devemos solicitar uma segunda coleta para comparao de resultados. Nos casos positivos, devemos sempre tentar identificar o microrganismo, podendo tambm seme-los aps triagem para checagem e confirmao bioqumica posterior.
Deteco de bacteriria significante
a caracterstica-chave para a certeza de infeco do trato urinrio. Estudos recentes sugerem que os dados de isolamento geralmente so mais precisos em mulheres e as consideraes utilizadas para determinar infeco (contagem igual ou acima de 100.000 UFC/mL) nem sempre podem ser plotadas para indivduos do sexo masculino. Nos homens, h uma tendncia atual de se considerar nmeros limites para urina mais baixos que nas mulheres, pois a contaminao menos frequente. Estes nmeros no se aplicam a amostras de urina coletadas de cateteres ou por aspirao suprapbica. Nestes casos, qualquer nmero de microrganismos pode ser significante, pois no h contaminao de microbiota.
b) Urinocultura qualitativa
Ao detectar a bacteriria significante na amostra, o profissional dever fazer a identificao bioqumica da colnia isolada e realizar o TSA de acordo com o item 11.
Como j comentado no item 15.2.5, o sangue desprovido de microbiota, sendo que a presena de bactrias no sangue (bacteremia) pode ocorrer de forma assintomtica com certa frequncia (mastigao vigorosa, escovao, etc.), sem que haja maiores implicaes para o indivduo, pois, possumos defesas especficas e inespecficas (ver captulo 1 deste volume) que nos auxiliam ao combate destes intrusos. Todavia, em algumas ocasies, a partir de focos intravasculares ou extravasculares, poder ocorrer bacteremia sintomtica (transitria, intermitente ou contnua), levando manuteno ou passagem de bactrias na nossa corrente sangunea. Essa situao, se no resolvida, poder evoluir para doenas em determinados locais (como no caso de uma meningite) ou infeces disseminadas (septicemia). Geralmente, quando desenvolvemos a septicemia (multiplicao de microrganismos no sangue), podemos apresentar uma srie de sinais e sintomas associados, que podem ser leves ou fatais, como febre e calafrios, leses de pele, diarreia, queda da presso arterial, aumento do ritmo cardaco e choque. Como uma infeco muitas vezes fatal, seu diagnstico deve ser realizado o quanto antes, pois o tratamento de suprema importncia para manuteno da vida do paciente. A Hemocultura ou exame bacteriolgico do sangue utilizado para demonstrar a presena de bactrias na corrente sangunea. Para se realizar essa pesquisa necessria uma metodologia correta na coleta deste sangue e a semeadura deste material em meios adequados (veja o item 15.2.5).
19.1. Diluio
Como o sangue dotado de poder bactericida, deve ser diludo no meio para que no haja inibio do crescimento bacteriano. De um modo
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A escolha do meio de cultura que ser utilizado vai depender do microrganismo que queremos isolar; os mais comuns so meios ricos, como tripcase soja, infuso de crebro e corao, columbia e gar Brucella. Podemos tambm utilizar meios semisslidos, como, por exemplo, na suspeita de Leptospirose, onde usamos o meio semisslido de EMJH ou Fletcher, na proporo de 1, 2 e 3 gotas para 5mL de meio. Alguns autores mais antigos preconizam o mtodo de Castaeda, onde h combinao de meio slido com lquido no mesmo frasco de cultura. O sangue introduzido, ao interior do frasco, atravs da rolha, por uma agulha e o meio lquido diariamente inclinado sobre o meio slido, permitindo o aparecimento de colnias, caso haja crescimento bacteriano. Atualmente, existem meios comerciais para os diferentes fins de isolamento, que podem ser semeados por sistema fechado a vcuo, de agulha dupla, evitando a contaminao do meio pelo ambiente. Estes frascos, geralmente, apresentam concentraes de 5% a 10% de CO2.
19.3. Formao de cogulos
Para evitar a formao de cogulos, aconselha-se o uso de prolas de vidro ou adio de anticoagulantes, como o citrato de sdio (1% a 2 %). H tambm um produto a base de polianetosulfonato de sdio (SPS, PSS ou Liquoid) que funciona nas concentraes de 0,025% a 0,05%, como anticoagulante e inibidor da ao bactericida do sangue (anticomplemento e lisozimas detm a fagocitose e inativam concentraes teraputicas de aminoglicosdeos). utilizado na proporo de 10mL sangue + 1mL do
produto a 1% em salina estril. Esta substncia, porm, pode inibir algumas cepas de N.gonorrhoeae, N.meningitidis e Gardenerella vaginalis, portanto, em pacientes suspeitos de septicemia por estes agentes, deve ser inoculado tambm o sangue sem anticoagulante.
19.4. Uso de antimicrobianos
importante, para o isolamento na hemocultura, saber se o paciente est fazendo uso de antimicrobianos. Em caso positivo, algumas providncias devero ser tomadas para diminuir a impedincia do crescimento bacteriano nos frascos. Nos casos onde h tratamento por sulfas, preconiza-se a adio de 5 mg de cido p-aminobenzoico a cada 100mL de meio (suficiente para neutralizar at 1,5 mg% da droga). J em casos onde o tratamento feito com base nas penicilinas, adiciona-se penicilinase em doses de 50 unidades (0,5 mL de soluo a 100 u/mL para 100mL de meio), porm este procedimento desaconselhado, pois o risco de contaminao do caldo muito maior.
19.5. Exames de hemoculturas e subculturas
Os frascos de hemocultura, de um modo geral, so incubados de 35 a 37 C e examinados visualmente todos os dias, a fim de se detectar sinais de crescimento. Deve-se realizar subculturas cegas em placas de gar sangue e de gar chocolate a partir de todas as hemoculturas dentro de 18 horas aps a coleta estas placas devem ser incubadas em 5% a 10% de CO2.
o
Todas as hemoculturas visualmente positivas devem ser subcultivadas em condies aerbias e anaerbias, e as negativas no devem ser descartadas com menos de 7 dias de incubao, quando se faz um subcultivo final, pois alguns microrganismos exigentes, como certas cepas de Neisseria e Haemophilus, podem requerer incubaes prolongadas.
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Alguns microrganismos possuem o crescimento extremamente lento e sua deteco no depende de subcultivos, como no caso das leptospiras, onde hemoculturas em meio semisslido s devem ser descartadas aps 90 dias da semeadura.
19.5.1. Interpretao dos resultados
Ao interpretar o resultado da hemocultura, importante avaliar a possibilidade de contaminao acidental por microrganismo do ar ou de superfcie cutnea, devendo sempre ter o cuidado de eliminar estes fatos. Preconiza-se a semeadura em duplicata, para excluso desta possibilidade, e tambm a coleta de locais diferentes (dois braos). O ideal, como j foi dito no tpico de coleta, a retirada da amostra no momento imediatamente anterior ao pico febril, o que difcil de precisar. Alm disso, como nem sempre possvel coletar neste perodo, fazemos as coletas de diferentes locais de puno venosa, com o espao de no mnimo uma hora (o tempo suficiente para as defesas normais retirarem as bactrias de circulao de 30 minutos), mas a repetio do exame em pelo menos trs vezes pode esclarecer algumas dvidas comuns nesta metodologia. Devemos avaliar se o isolamento est traduzindo uma septicemia verdadeira ou somente uma bacteremia, pois, no primeiro caso, o microrganismo, ou periodicamente lanado na corrente sangunea ou est se multiplicando nela; j no segundo, este veiculado transitoriamente ou lanado ocasionalmente. Na septicemia, como j comentado, acompanham-se sinais e sintomas clnicos, como calafrios e febre, mas que nem sempre so relatados ao profissional do laboratrio, que dever verificar se a positividade da amostra est de acordo com a suspeita mdica. De qualquer forma, o isolamento verdadeiro de qualquer microrganismo do sangue dever ser relatado, e a avaliao final dever ser feita pelo mdico,
j que alguns casos de bacteremia transitria possuem importncia clnica, como Streptococcus viridans e Streptococcus pneumoniae.
20. Diagnstico laboratorial das infeces bacterianas no trato gastrointestinal (coprocultura)
Uma ampla gama de patgenos capaz de infectar o trato gastrointestinal, sendo que as infeces variam em efeitos, desde crises brandas, autolimitadas a diarreias graves, fatais. Nos pases em desenvolvimento, a doena diarrica a principal causa de morbidade e mortalidade, principalmente em crianas de pouca idade. Nos pases desenvolvidos a diarreia ainda aparece como queixa comum, porm geralmente branda e autolimitada, com exceo nos pacientes muito jovens, idosos e imunocomprometidos. Podemos interrelacionar fatores socioeconmicos e ambientais como condicionantes da infeco intestinal, como, por exemplo, a desnutrio, causando prejuzos na imunidade e predispondo as pessoas infeco bacteriana. Quanto s nossas defesas contra as infeces do trato gastrintestinal podemos citar a nossa microbiota autctone (flora normal), pela sua competio, pois, se houver reduo da microbiota, a resistncia infeco intestinal tambm se reduz (ex. sndrome colite pseudomembranosa, causada por S.aureus, C. difficile e outros clostrdios aps administrao de antimicrobiano). Nossa acidez estomacal tambm um mecanismo de defesa, pois restringe o nmero e o tipo de microrganismo que penetra no TGI. O peristaltismo ajuda na remoo das bactrias (poucas chances de aderncia), permitindo que as fezes caminhem para o intestino grosso.
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Onde h mecanismo de invaso, com penetrao dos microrganismos nos entercitos, multiplicao, produo de citotoxina e destruio da clula, bactrias se localizando em nvel de submucosa. uma reao do tipo inflamatria (migrao de macrfagos e polimorfonucleares ao local). Por ser uma regio vascularizada e prxima dos plexos nervosos, as fezes aparecem com muco e sangue e o paciente sente clicas (ex.: Salmonella. Ultrapassa os entercitos sem destru-los, possui localizao no nvel das submucosas. Devido ao quadro de invasibilidade, pode ter localizao extraintestinal.)
20.1.2. Sndrome coleriforme
Onde h mecanismo toxignico, com ligao da clula bacteriana aos receptores dos entercitos (fator de colonizao - CFA I, II, III - pili ou fmbria), ocasionando liberao de toxinas, inverso do fluxo de absoro e eliminao de gua, aumentando o fluxo de gua na luz intestinal. (ex.: EPEC: as fezes apresentam-se aquosas e com muco. H fixao nas microvilosidades dos entercitos). Nesta sndrome geralmente no h dor, mas pode ocorrer desidratao, devido grande perda de lquidos e eletrlitos.
20.2. Patogenia da diarreia bacteriana
A porta de entrada sempre oral, e a partir desta penetrao no corpo se d a colonizao, sendo o mecanismo diferente, dependendo do microrganismo.
Sndrome disenteriforme Invaso ou Citotoxina E.coli (EIEC), E.coli (EHEC) Shigella Salmonella Campylobacter Yersinia enterocolitica V.parahaemolyticus
Sndrome coleriforme Enterotoxinas V.cholerae O1 V.cholerae no O1 E.coli (ETEC, EPEC) Aeromonas S.aureus Clostridium perfringens
Nas fezes:
Sndrome disenteriforme: Picitos, clulas mononucleares, muco e
hemcias;
Sndrome coleriforme: rara a presena de clulas, mesmo
descamativas.
20.3. Coprocultura
Nas fezes, habitam as mais variadas formas de bactrias (cerca de 10 bactrias por grama de fezes), alm de outros microrganismos. Devemos, portanto, nos deter no isolamento daquelas bactrias que so consideradas, atualmente, como patognicas mais comuns ao homem, ou seja, E.coli de sorogrupos especficos (ETEC, EPEC, EIEC e EHEC), Salmonella, Shigella, Yersinia, Campylobacter, Vibrio e, raramente, o S.aureus e Aeromonas. As outras bactrias so consideradas, na maioria dos casos, microbiota normal (Figura 38).
11
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As colnias obtidas, mediante o cultivo em meios de enriquecimento e meios seletivos, devem ser isoladas, antes de se proceder sua diferenciao exata, aps confirmar a pureza da cultura pela observao do crescimento colonial e, em alguns casos, como do Campylobacter, por uma anlise de seu aspecto morfotintorial (Gram). Seleciona-se uma colnia e procede-se a uma suspenso em salina para ento realizar a semeadura para uma srie de meios de cultura indicadores, que auxiliaro, posteriormente, na sua classificao bioqumica (tabela no apndice). Como uma possibilidade de confirmao do comportamento bioqumico do microrganismo, efetua-se a investigao sobre a classificao sorolgica do mesmo.
Uma srie de reaes fundamentais recomendvel para a diferenciao bioqumica das enterobactrias. Na maioria dos casos, na prtica, estas reaes, em combinao com a diferenciao sorolgica, conduzem a um diagnstico dentro de 48 horas, sempre que no existir um comportamento atpico. As mesmas provas podem auxiliar na identificao de membros de outras famlias bacterianas, mas na maioria das vezes devero sofrer algum tipo de adaptao, como no exemplo da famlia Vibrionaceae, onde devemos adicionar em suas composies 1% de NaCl para permitir seu crescimento.
Principais provas bioqumicas
Prova de oxidase
Vrias so as tcnicas sugeridas para este teste, cabendo ao tcnico escolher a menos dispendiosa para seu uso. 1- Pingar sobre a colnia soluo aquosa 1% de Dimetil p-fenilenodiamina cloridrato recm-preparada. A positividade da reao caracterizada pelo surgimento de colorao rsea. A colorao rsea, aps algumas horas, se tornar negra, o que caracteriza a morte dos microrganismos contidos naquela colnia. Sugerimos preparar a soluo e impregnar uma tira de papel de filtro (utilizar enquanto estiver mido). Esta tcnica economiza o reativo e permite testar vrias amostras em somente uma tira, podendo reutilizar a colnia pos-
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teriormente para outras anlises. Aps a impregnao, tocar na colnia em questo com um basto de vidro estril e depois pass-la tira impregnada para o teste. 2- Comercialmente existe o teste Bact-Ident Oxidase - lminas de ensaio, com a rea de reao impregnada com N,N-Dimetil para-fenilenodiamonio cloreto, onde se goteja uma suspenso bacteriana espessa, em estudo, na rea de reao. Os germes citrocromoxidase positivos tornaro a rea reativa com colorao azul-violeta. Observao: As Enterobacteriaceae so oxidase negativas, mas Campylobacter, Vibrio e Aeromonas so oxidase positivas.
Prova de fermentao de acares (gar de TSI ou gar de Kligler) -
Esta prova indica se o germe fermenta (degrada) um acar especifico incorporado ao meio de cultura, resultando em formao de cido e/ou formao de gs visvel. Para tal, o meio deve possuir um indicador da acidificao (indicador de pH), e a presena de gar-gar, que tornar o meio slido, permitindo que o gs formado fique retido em forma de bolhas. Esta prova detecta a liberao de H2S, por ao enzimtica, a partir de aminocidos sulfurados (com enxofre), que reage com os ons frricos do citrato de ferro amoniacal, existente na composio do meio, produzindo um precipitado negro de sulfeto ferroso.
Motilidade (meio de SIM, meio MILI) - Devido consistncia do Produo de H2S (gar de TSI, gar de Kligler ou meio de SIM) -
meio de cultura ser semisslido, permite a migrao das bactrias mveis para fora do ponto de repique.
Produo de indol (meio de SIM, meio MILI) - As bactrias que
possuem triptofanase hidrolizam e desaminam o triptofano produzindo indol, cido pirvico e NH3. O indol verificado pela formao de um complexo de colorao vermelha com o grupo aldedo de paradimetilaminobenzaldeido,
que est presente nos reagentes usados na prova. Devemos usar um meio de cultura rico em triptofano. Reativo de Braun & Silberstein (1940): p-dimetilaminobenzaldedo ................................. 5,0 g Metanol .................................................. 50,0 mL cido ortofosfrico ......................................10,0 mL Embeber tiras de papel de filtro e deixar secar em estufa a 37C por 2 a 3 dias. Usar no tubo com meio de SIM no momento da semeadura.
Degradao da ureia (caldo de ureia ou garureia) - A urease
uma enzima presente em muitas espcies de microrganismos e que degrada a ureia com liberao de amnia e CO 2. A amnia reage, em soluo, formando carbonato de amnio, que alcaliniza e aumenta o pH do meio. A alcalinizao do meio de cultura indicada pela mudana da colorao amarela para vermelha, mediante a presena de vermelho de fenol encontrado na composio do meio. Ou se o indicador de pH for outro, de acordo com sua colorao na faixa alcalina.
Prova vermelho de metila e de Voges-Proskauer - (caldo de VM-
VP seg. Clark e Lubs) - A prova vermelho de metila (VM) se baseia no uso de um indicador de pH, devido ao fato de o vermelho de metila em pH 6,0 ser amarelo e em pH 4,4 se tornar vermelho. Esse indicador revela o germe que produz ou no grandes quantidades de cidos a partir da glicose, atravs da via de fermentao. Somente os germes que mantm o pH baixo aps 24 a 48 horas, ultrapassando o sistema tampo do meio, podem ser considerados VM positivos.
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Indicador de VM: Vermelho de metila............................ 0,1 g lcool etlico 95........................... 300 mL H2O destilada ............................. 200 mL Gotejar no cultivo bacteriano: Resultado positivo - cor vermelha. A prova de Voges-Proskauer (VP) se baseia no fato de certas bactrias utilizarem glicose produzindo cido pirvico e que determinadas bactrias produziro butileno-glicol, que um produto de reao neutra. Antes, porm, de chegar ao butileno-glicol, h formao de acetil-metil-carbinol (acetona) que em presena de KOH se converte a diacetil, e que, em 24 a 48 horas, toma colorao vermelha. Para acelerar o processo, usa-se da ao cataltica do a-naftol e da creatina. Para 1mL da cultura, adicionar 0,6 mL da soluo de a-naftol e 0,2 mL da soluo de KOH. Agitar bem. Ler de 5 a 15 minutos: positivo - cor vermelha.
Degradao do Citrato (gar citrato seg. Simmons)
Algumas bactrias podem obter energia utilizando citrato como nica fonte de carbono. A prova verificada pela produo de produtos alcalinos. As bactrias que utilizam citrato retiram N 2 de sais de amnio, alcalinizando o meio e produzindo NH4OH. O indicador azul de bromotimol fica azul em pH acima de 7,6. Positivo - cor azul.
Descarboxilao da Lisina (meio de LDS, meio LIA, meio MILI)
O meio ajustado pH em 5,6 apresenta cor amarela, devido ao indicador prpura de Bromocresol que atua como indicador de pH. Neste pH as enterobactrias crescem escassamente. Porm, devido formao de cadaverina pela descarboxilao da lisina, o pH do meio se alcaliniza, dando melhores condies de crescimento (pH 7,0). Este efeito promove uma viragem do indicador que passa de amarelo para violeta (na parte profunda do tubo). Positivo - cor violeta.
Observao 1: Esta prova poder ser usada com a arginina e a ornitina, com resultados semelhantes. Observao 2: O meio poder ser adicionado de glicose e mantido com pH neutro a bactria ter ento que crescer, utilizar a glicose, gerando cido, para depois ocorrer o resto da reao. (neste caso, o meio no semeado apresenta cor prpura, como no resultado positivo).
Degradao do malonato (caldo malonato-fenilalanina)
Capacidade de uma bactria em utilizar malonato como nica fonte de carbono, alcalinizando o meio. O malonato liga-se competitivamente a desidrogenase succinica, impedindo sua ao cataltica sobre o cido succinio e impossibilitando seu desdobramento em cido fumrico. H um acmulo de cido succinio e uma interrupo do ciclo de Krebs, tirando da bactria sua principal fonte de energia e impedindo a formao de outros intermedirios necessrios ao metabolismo. Uma bactria s cresce em malonato se puder utiliz-lo como nica fonte de carbono. Positivo - cor azul.
Desaminao da fenilalanina (caldo malonato-fenilalanina)
Entre as enterobactrias, apenas o gnero Proteus e Providencia possuem a enzima capaz de desaminar a fenilalanina em cido fenilpirvico, que detectado pela adio de uma soluo de cloreto frrico a 10% (FeCl3-12 g; HCL-2,5 mL; H20 destilada-100 mL). Positivo - desenvolvimento de cor verde, ao contato do FeCl com a superficie do meio cultivado. Outras provas podem ser utilizadas, porm as provas descritas anteriormente so suficientes para uma identificao bastante precisa das enterobactrias. Para identificao de espcies do gnero Vibrio, sugerimos colocar uma concentrao de NaCl de 1% nos meios, para permitir seu crescimento, sendo que a prova do halofilismo (crescimento diante de diferentes concentraes salinas), facilita bastante a identificao de algumas destas espcies.
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Para auxiliar na possvel identificao do Staphylococcus aureus, observe a figura 39, onde h uma descrio das provas para esta espcie. Essas provas esto explicadas no item 22.2.1.
21. Diagnstico laboratorial nas infeces bacterianas do sistema ner voso cental
O crebro e o cordo espinhal so protegidos de presses mecnicas ou deformaes por estarem contidos em compartimentos rgidos (crnio e coluna vertebral) e tambm agem como barreiras na disseminao das infeces. Os vasos sanguneos e nervos que atravessam as paredes do crnio e da coluna vertebral so as principais vias de invaso, sendo a invaso via corrente sangunea a mais comum.
21.1. Membranas que revestem o SNC
O crebro e a medula so estruturas ocas e contm o lquido cfaloraquidiano. So recobertas por 3 membranas (as meninges), denominadas dura-mter, aracnoide e pia-mter.
21.2. Invaso do SNC Via corrente sangunea
Passagem atravs da barreira hematoenceflica, provocando encefalite, ou atravs da barreira hematoliqurica, produzindo meningite.
Via nervos perifricos
Principalmente utilizada por vrus. Estes penetram nos nervos perifricos e migram para o SNC, alcanando as clulas gliais e os neurnios, onde se multiplicam.
A meningite bacteriana, tambm conhecida como sptica, um processo inflamatrio que envolve as meninges. Resulta da introduo de microrganismos atravs de leses penetrantes, infeces no crnio, extenso de um foco primrio de infeco via hematognica durante, por exemplo, uma septicemia. Nestes casos, o lquor se mostra com turvao caracterstica. As meningites asspticas geralmente so virais, mas podem ser tambm causadas por leptospiras ou fungos. Nestas, o aspecto do lquor lmpido.
21.3.1. Principais agentes etiolgicos bacterianos associados s meningites
capsulado, pleomrficos;
Streptococcus pneumoniae - diplococos, Gram-positivos, capsulados.
No caso de imunocomprometidos, pode ocorrer tambm meningite por Listeria monocitogenes, (cocobacilo Gram-positivo).
21.4. Diagnstico laboratorial
O material de escolha o lquor, e sua coleta feita por puno lombar. O volume total do lquor de um indivduo adulto de 80 a 150 mL, e o material colhido de aproximadamente 10 mL. Este material colhido em 3 tubos, o primeiro ir para bioqumica, o segundo para cultura e lminas e o terceiro para citologia total e especfica. O aspecto normal do lquor lmpido, semelhante guas de rochas, mas, em condies patolgicas, pode apresentar anormalidades.
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No caso de retculo fibrinoso, o lquor se apresenta claro, porm, em repouso, forma-se um retculo fibrinoso semelhante teia de aranha. Pode tambm apresentar-se opalescente ou turvo. O transporte deste material e os procedimentos devem ser rpidos, porm se o lquido no puder ser processado imediatamente, dever ser mantido temperatura ambiente ou em estufa, pois a refrigerao letal para duas espcies que comumente causam meningite: N.meningitidis e Haemophilus influenzae. O lquor deve ser processado inicialmente pela centrifugao de 3 mil rpm por 15 a 30 minutos, com o objetivo de concentrar os microrganismos. Aps este procedimento, um profissional capacitado deve realizar um exame direto pelo mtodo de Gram. Uma colorao de Ziehl tambm indicada, pois, nas preparaes de Gram, os fragmentos de muitas amostras clnicas adquirem colorao vermelha, o que mascara os organismos em vermelho-alaranjados. Pode-se proceder em conjunto o teste de Quellung (H.influenzae tipo B, S.pneumoniae e N.meningitidis), onde se coloca uma gota de antissoro equivalente ao microrganismo, uma gota do sedimento obtido pela centrifugao e uma gota de soluo aquosa de azul de metileno. Cobrir com lamnula e em 10 minutos observar o intumescimento da cpsula (mudana no ndice de refrao), comparando com um controle negativo. Pode-se tambm detectar antgenos no lquor com ltex (aglutinao macroscpica). A partir da bacterioscopia, vamos escolher o tipo de meio de cultura a ser utilizado. No geral, dever ser semeado em um caldo rico, em placa de gar sangue de carneiro a 5% (que dever ser incubado a 37oC em estufa) e em gar chocolate 5% suplementado por isovitalex (incubado a 37oC em jarra com 3% de CO2 e umidade).
Aps observao do crescimento, so feitas provas bioqumicas e testes especficos para cada um dos possveis microrganismos, seguindo esquema de identificao (Figura 39). Figura 39. Esquema de identificao das bactrias no lquor
As doenas sexualmente transmissveis continuam, como no passado, um problema bastante preocupante do prisma da sade pblica e individual. As tcnicas corretas de coleta das amostras, bem como seu rpido processamento, podem ser o diferencial no que diz respeito ao diagnstico rpido e ao tratamento correto.
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O local e a forma de coleta das amostras vo depender da suspeita do mdico, elaborada a partir do exame clnico e anamnese, sempre obedecendo a uma abordagem sindrmica (de acordo com a sndrome que o paciente apresenta). Em pacientes do sexo masculino, colhemos a secreo uretral buscando o diagnstico de uretrite gonoccica/clamdia. Deve-se fazer exame a fresco, buscando Gardnerella vaginalis, Trichomonas sp. (protozorio) e Candida sp. (fungo). Existem novos testes com amostras de urina, porm esto em estudo e ainda sem a eficincia desejada. Em pacientes do sexo feminino colhemos a secreo endocervical e uretral. Somente em crianas e mulheres histerectomizadas a coleta de secreo vaginal indicada (ver item 15.2.4), da mesma forma que nos pacientes masculinos, nesta coleta busca-se o diagnstico de Gardnerella vaginalis, Trichomonas sp. e Candida sp.. A colheita da secreo uretral indicada em casos de uretrite e, havendo indicao, faz-se uma combinao com a coleta endocervical, aumentando a possibilidade de diagnstico de Neisseria gonorrohea (gonococo) ou Chlamydia trachomatis. Em alguns casos, outras amostras podero ser utilizadas para diagnstico laboratorial das DST, como a secreo ocular, necessria nos casos de oftalmia (Gonoccica ou por Chlamydia) em recm-nascidos, a secreo anal, em casos suspeitos de infeco gonoccica anal, e a secreo orofarngea, em pacientes com sintomas clnicos indicativos. Durante a coleta das amostras, devemos prestar muita ateno aos possveis impedientes e dificuldades na obteno do material para exame. Destacamos o uso de diferentes tipos de swab, dependendo da finalidade da coleta.
Nos casos de bacterioscopia, exame a fresco e algumas culturas bacteriolgicas, pode-se usar swab com haste plstica, alumnio ou madeira e algodo no tratado. Todavia, na cultura do gonococo, o swab dever ser montado com algodo alginatado ou com carvo, pois os cidos graxos do algodo comum inativam o gonococo e impedem seu crescimento em meios de cultura. importante saber tambm que no devemos utilizar swab tratado com carvo na coleta de amostras para pesquisa de Chlamydia trachomatis, pois o carvo deixa resduos que interferem na qualidade da amostra. Caso precise usar swab tratado com carvo na coleta para cultura de gonococo, colher antes a amostra para Chlamydia com outro swab, para no alterar o resultado. Para serem utilizados em testes, como imunofluorescncia direta IFD, ensaio imunoenzimtrico ELISA e cultura de clamdias, o swab dever ser de haste plstica ou de alumnio, pois o alumnio possui o dimetro mais adequado para coleta de secreo uretral.
22.1.2. Teste de escolha para o diagnstico da uretrite gonoccica
Para o sexo masculino, preconiza-se a bacterioscopia pela colorao de Gram, que rpida e econmica, com sensibilidade de 95% nos pacientes masculinos. A cultura do gonococo tambm pode ser feita, mas est reservada a casos de suspeita de resistncia bacteriana aos antimicrobianos e bacterioscopia negativa, porm com forte suspeita clnica. Nestes casos, tambm podemos semear as amostras de secreo anal, orofarngea e ocular. J nas mulheres, preconiza-se diretamente a cultura do gonococo, j que a bacterioscopia feminina apresenta baixa sensibilidade.
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O mtodo padro ouro a cultura celular, porm de difcil execuo e disponvel em poucos laboratrios do pas. O PN-DST/AIDS do Ministrio da Sade recomenda, em servios com pequeno nmero de amostras, o teste de imunofluorescncia direta (IFD); para servios com grande rotina, os testes imunoenzimticos do tipo ELISA e nas amostras reagentes, o teste confirmatrio por blocking (reao de bloqueio) ou IFD (ver captulo 1 deste volume).
22.1.4. Semeadura e armazenamento das amostras
22.1.4.1. Suspeitas de N.gonorrhoeae para cultura Geralmente utiliza-se o meio de Amies, que composto de sais balanceados e carvo, para transportar o material suspeito para o laboratrio. Este meio de transporte preserva o gonococo vivel para a semeadura, at no mximo 8 horas. A semeadura feita no meio de Thayer-Martin modificado, que possui, alm da base especfica para gonococos, hemoglobina, vitaminas e antibitico. Este meio, aps o preparo e semeadura, dever ser incubado a 35oC em local com umidade e atmosfera de 3% a 7% de CO2. 22.1.4.2. Suspeitas de outros agentes para cultura As uretrites, vaginites e cervicites so, na sua grande maioria (95%), causadas por Chlamydia trachomatis, Trichomonas vaginalis, Candida sp. e Gardnerella vaginalis. Para excluso de agentes, procede-se tambm semeadura em outros meios, como o tioglicolato, o gar sangue e o gar MacConkey. Geralmente utiliza-se o meio de Stuart no transporte de amostras no gonoccicas (bastonetes Gram-negativos e cocos Gram-positivos), pois preserva as bactrias vivas at 24 horas.
Entre os possveis agentes de infeces supurativas, na maioria das vezes, isolamos cocos Gram-positivos aerbios. Trataremos aqui, dos gneros e das espcies principais, de interesse para o laboratrio de anlises clnicas.
22.2.1. Staphylococcus
Como j foi comentado, este gnero possui trs espcies de importncia humana (S. aureus, S. epidermidis e S. saprophyticus). So microrganismos esfricos, imveis, Gram-positivos, que crescem geralmente formando cachos irregulares. Causam diferentes doenas supurativas no homem, tais como: furnculo, impetigo, osteomielite, abscessos de tecidos, pneumonia, meningite, artrite purulenta, etc. Algumas estirpes produzem uma enterotoxina, levando os pacientes a um quadro agudo de intoxicao alimentar (S. aureus), e outras causam infeces do trato urinrio (S. aureus, S. saprophyticus). Podem crescer em meios de cultura simples, mas em laboratrio clnico so normalmente cultivados em meio de gar sangue. O meio de gar sangue pode ser feito utilizando-se como base os meios de gar Casoy, gar crebro, corao ou gar sangue (base), e acrescentamos 5% de sangue desfibrinado estril de carneiro. muito utilizado tambm o meio de Chapmam-Stone, ou de manitol salgado, que possui concentrao de sal um pouco maior que os meios comuns, e o manitol, facilitando o diagnstico de algumas espcies deste gnero. Suas colnias so redondas, elevadas de 1 a 2 mm de dimetro, opacas, de colorao amarelo-dourado a branco. Crescem em presena de altas concentraes de NaCl, sendo este, inclusive, um fator de estimulao da produo da enzima coagulase. So inibidos pela presena de corantes (azul de metileno, violeta de genciana, etc.).
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Exame bacteriolgico O material suspeito semeado em gar sangue e incubado a 37C por 18 a 24 horas. Havendo o crescimento de colnias tpicas (descritas anteriormente), fazemos a colorao de Gram para observarmos a presena de cocos Gram-positivos dispostos em grupos ou isolados. Para diferenciarmos o Staphylococcus do Streptococcus, utilizamos a prova da Catalase.
Prova da catalase
Destina-se a verificar a presena da enzima catalase. A prova pode ser efetuada com os germes crescidos praticamente em qualquer meio de cultura, devendo-se somente evitar meios contendo sangue, para no interferir com falsos-positivos. Em uma gota de soluo fisiolgica, sobre uma lmina de vidro, emulsionamos a colnia de bactria em estudo. Sobre a suspenso, pingamos uma gota de gua oxigenada a 30%. A formao imediata de bolhas de O 2 indica prova positiva. GNEROS Estreptococos Estafilococos
Prova do manitol
CATALASE
Usar o meio de cultura gar manitol salgado. Distribuir em tubos inclinados ou em placas. Fazer semeadura da bactria em estudo, em estrias, e incubar por 18 a 24 horas a 37C. Leitura: Positivo - amarelo na zona de repique. Negativo - cor natural (vermelho).
UTILIZAO DO MANITOL
Prova de coagulase A prova verifica a capacidade do microrganismo em coagular o plasma atravs da enzima coagulase. A coagulase estafiloccica se apresenta em duas formas: coagulase ligada e coagulase livre. A coagulase ligada converte fibrinognio em fibrina diretamente, sem o envolvimento dos fatores de coagulao, e pode ser detectada em teste direto em lmina (suspenso de Staphylococus + 2 gotas de plasma citratado e em movimentos circulares, observar formao de cogulo num tempo de 1 a 2 minutos). Pode se tornar mais sensvel o teste em tubo, devido a este detectar tanto coagulase livre como coagulase ligada, sendo a prova de escolha. A coagulase livre reage com o fator de coagulao do plasma, o CRF, formando uma substncia semelhante (mas no idntica) trombina, que, agindo indiretamente, converte fibrinognio em fibrina. Utilizando plasma citratado humano ou de coelho, estril, dilumos numa proporo 1:4 em soluo fisiolgica e distribumos 0,5 mL em tubos 13 x 100. Segundo alguns autores, a produo da enzima coagulase se intensifica quando a bactria cultivada em meio com alta concentrao de NaCl, portanto, aconselhamos utilizar, para a prova, colnias crescidas em meio gar manitol salgado. Este procedimento aumentar a sensibilidade do teste. Semear uma alada do germe em estudo em um tubo contendo o plasma diludo e incubar a 37C por 24 horas.
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S.aureus
COAGULASE +
S.epidermidis
S.saprophyticus
A menor coagulao considerada prova positiva. Devem ser feitas leituras peridicas (a cada 2 horas), pois algumas espcies tambm produzem estafiloquinase, que ativa o fibrinognio gerando plasmina que dissolve a rede de fibrina (cogulo formado). Aconselhamos, tambm, utilizar sempre um teste-controle positivo com uma amostra de S.aureus previamente conhecida, como controle da qualidade do teste.
Prova DNase
A presena de DNA no meio de cultura facilita a deteco de DNase de bactrias, especialmente para a identificao de S.aureus, assim como para outras espcies bacterianas. Usar o meio de gar DNase, distribudo em placas de Petri. Colocar na superfcie do gar um ponto definido de semeadura (spot) com a bactria em estudo. Incubar em 35 a 37C, por 18 a 24 horas. Leitura: Gotejar, sobre o crescimento bacteriano, cido clordrico 1N e aguardar a turvao do meio. Caso o teste se apresente positivo, observaremos um halo claro ao redor do repique.
S.aureus
COAGULASE +
S.epidermidis
S.saprophyticus
Resumo:
S.aureus
CATALASE MANITOL DNase SENSIBILIDADE A NOVOBIOCINA SENSIBILIDADE A POLIMIXINA B + + + S R
S.epidermidis
+
S.saprophyticus
+
S R
R S
22.2.2. Streptococcus
O gnero apresenta como espcies de interesse mdico os Streptococcus viridans, os Streptococcus, produtores de hemlise b (Streptococcus pyogenes), o Streptococcus pneumoniae, e o Streptococcus faecalis (atualmente no gnero Enterococcus). Morfologicamente, se apresentam em forma de cadeia ou em pares e tintorialmente como Gram-positivos.
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Os Streptococcus foram descritos, em 1874, por Billroth, causando pus em leses de erisipela e em feridas. Em seguida, foram isolados do sangue de pacientes em estado febril e de garganta de criana com escarlatina. Em 1903, Schottmller props que os estreptococos fossem classificados conforme a capacidade de lisar hemcias in vitro e, em 1919, Brown chamou de alfa (a), beta (b) e gama (g) as lises observadas nas hemcias em placa de gar sangue (item 16.1 deste captulo). Os estreptococos alfa-hemolticos apresentam zonas de hemlise, possuindo hemcias ntegras, na parte mais interna junto a colnia, e hemlise maior, na parte mais externa. Frequentemente, aparece uma colorao esverdeada na rea de hemlise (devido alterao das hemoglobinas pelo sistema oxiredutor da clula bacteriana), que originou a qualificao estreptococos do grupo viridans. O Streptococcus pneumoniae apresenta hemlise alfa e uma colnia puntiforme, com um aprofundamento no pice da colnia (parecendo um pequeno vulco). Os estreptococos beta-hemolticos produzem uma zona de hemlise total, no se observando hemcias integras (microscpio tico com objetiva de 10 X). O Streptococcus pyogenes apresenta dois tipos de hemolisinas O e S. A hemolisina O inibida pela ao do oxignio atmosfrico e, portanto, s demonstrada em colnias crescidas em profundidade no gar sangue. A hemolisina S estvel ao oxignio do ar e produz hemlise, mesmo nas colnias crescidas na superfcie do meio de cultura. Como cerca de 15% dos Streptococcus apresentam hemolisina O, se torna necessrio a semeadura pela tcnica do gar-fundido ou pour plate (gar sangue resfriado a 45C e incorporado suspenso bacteriana em estudo). Alguns microbiologistas preferem produzir pequenas fendas nas placas ( stabs) para introduzir a bactria no interior do meio de cultura. Os estreptococos gama no produzem hemlise e a espcie associada patogenia humana foi para o gnero Enterococcus (Streptococcus faecalis).
Fazer uma suspenso do material colhido em um tubo contendo 1 mL de soluo fisiolgica estril e adicionar a uma placa de Petri estril. Juntar o gar sangue resfriado e promover movimentos circulares para espalhar o inculo por todo o meio. Incubar a 37C por 18 horas em atmosfera de microaerofilia (melhor rendimento), ou jarra com vela. Leitura: observao do tipo de hemlise em gar sangue:
Provas: A. Optoquina Colocar um disco de optoquina na superfcie do gar sangue (pode-se incluir no antibiograma). Havendo impedimento do crescimento das colnias ao redor do disco de optoquina (2 cm de dimetro), trata-se de teste positivo. B. Solubilidade da bile em caldo Usada para identificao do S. pneumoniae, atravs do desoxicolato (reagente biliar ) que ativa as enzimas autolticas do microrganismo (capazes de lisar seletivamente o S. pneumoniae, quando adicionados s clulas
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bacterianas em fase de crescimento). A prova realizada conforme esquema que se segue: a) A 1,0 mL de cultura em caldo, (18-24h/35C) adicionar uma gota de vermelho de fenol (1% em gua). b) Acertar pH em torno de 7,0 com NaOH 0,1 N (cor rsea). c) Adicionar aproximadamente 4 gotas (0,5 mL) de desoxicolato de sdio (10%) ou bile. Incubar juntamente com um tubo sem bile (adicionado de 0,5 mL de salina) em estufa ou banho maria a 35 oC por 3 horas, observando a cada hora. Resultado: Solvel em bile: Clareamento visvel da suspenso do tubo com desoxicolato (o outro fica inalterado) positivo. Insolvel em bile: Inalterado, idntico ao tubo controle negativo. C. Bacitracina Utilizar discos impregnados com bacitracina (0,05 U) colocados na superfcie do meio de cultura semeado com o germe em estudo (pode-se incluir no antibiograma) e incubar em 35 a 37 oC por 24h, em atmosfera com baixo teor de O2. Interpretao - Grupo A - sensvel a bacitracina. Demais grupos Resistentes. Na prtica do laboratrio, sabemos que 10% das cepas de estreptococos do grupo C e G e 5% das do grupo B tambm podem ser sensveis, por isso sugere-se fazer essa prova associada com a sensibilidade ao sulfametoxazol-trimetoprim, pois os microrganismos do grupo C e G so usualmente sensveis. D. Crescimento a 56C Para evitar dvidas entre estreptococos e enterococos, submeter a cultura a um aquecimento de 56C por 30 minutos. Somente os Enterococcus resistem a este tratamento.
E. Crescimento em meio de Chapman Os enterococos toleram altas concentraes de NaCl, como acontece com os estafilococos. Isso diferencia os enterococos de estreptococos do grupo D (S.bovis e S.equinus). Podemos tambm semear a amostra em meio lquido, porm, com 6,5% de NaCl, incubar de 18 a 24 horas e verificar o crescimento. F. Crescimento em gar EMB Os enterococos crescem na presena do corante azul de metileno. G. Teste de CAMP (Christie, Atkins e Mnch-Petersen) Usado para identificao presuntiva de estreptococos do grupo B (S.agalactiae). Este teste realizado usando uma cepa (ATCC 25923) de Staphylococcus aureus produtora de b-hemolisina, que tem sua atividade hemoltica intensificada por uma protena extracelular (fator CAMP), formada por estreptococos do grupo B (hemolticos ou no), produzindo uma hemlise sinrgica em gar sangue. Essa prova deve ser realizada em conjunto com outras, pois alguns estreptococos do grupo A tambm podem promover tal reao.
23. Apndice
A. Mtodo de Giemsa
O Giemsa um corante utilizado em Microbiologia, Hematologia e Histologia
minutos.
Aps o tempo necessrio, lavar com forte jato de gua e secar entre papel
de filtro.
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- Diluio do corante:
A soluo de Giemsa dever ser diluda com gua destilada neutra (pH 7 a
agitao vigorosa.
A diluio para a colorao de 30 minutos corresponde a 2 gotas por mL de
corante. B. Meio de Loewenstein-Jensen Utilizado para isolamento primrio de micobactrias, este meio vem sendo substitudo por outros mais sensveis para recuperao de amostras clnicas, como o gar 7H10 e 7H11 de Middlebrook, porm ainda usado em muitos laboratrios clnicos. Componentes: Fosfato monopotssico anidro....................................2,4 g Sulfato de magnsio 7 H2O....................................0,24 g Citrato de magnsio..............................................0,60 g L-Asparagina........................................................3,6 g Fcula de batata......................................................30 g Ovos homogeneizados........................................1000 mL Glicerina bidestilada...............................................12 mL gua destilada....................................................600 mL Soluo de verde de malaquita a 2%............................20 mL
Soluo de verde de malaquita 2% - Frmula: Verde de malaquita .................................................2 g gua destilada ...................................................100 mL Preparo da soluo de verde de malaquita: 1. Pesar o verde de malaquita e adicionar a gua. 2. Homogeneizar bem at dissolver o corante. 3. Esterilizar em vapor fluente durante 30 minutos. 4. Reservar a soluo. Preparo do meio: a) Dissolver os sais e a asparagina na gua (dissolver aquecendo lentamente); b) Juntar os outros componentes, menos os ovos e o verde de malaquita, e autoclavar a 120oC por 30 minutos. c) Resfriar a base 45 - 50C. d) Tomar 2 dzias de ovos frescos, lavar bem com gua e sabo, escovando cada ovo individualmente com uma escova macia, e imergir durante 30 minutos em lcool etlico a 70. Sec-los com pano estril. e) Quebrar os ovos semiassepticamente em frasco estril, tranferindo-os para uma proveta estril de 1000 mL at completar o volume. f) Agitar para homogeneizar (poder utilizar liquidificador estril ou balo estril com prolas de vidro). g) Filtrar em quatro camadas de gaze passando para o balo que contm a base fria. h) Adicionar o verde de malaquita. i) Homogeneizar bem. j) Deixar repousar durante 30 minutos para as bolhas da superfcie estourarem.
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k) Distribuir 10 a 12 ml por tubo de rosca estril. l) Colocar os tubos no coagulador, inclinados (ngulo de 45), durante 50 minutos a 85C - se no tiver coagulador, pode-se coagular os ovos em banho de areia 85C colocado em estufa de esterilizao, tambm por 50 minutos, tendo o cuidado de verificar a temperatura constantemente. Pode-se tambm usar o forno a 85 oC ou mesmo em autoclave fechada, sem expulso do ar (verificar temperatura). m) Incubar por 48h a 36oC (teste de esterilidade), proteger contra a evaporao e conservar em geladeira. Usar, no mximo, at um ms aps o preparo. C - Hidrlise do hipurato Verifica a capacidade do microrganismo de hidrolisar o hipurato de sdio em glicina e cido benzico. Pode ser utilizado para diferenciar distintos microrganismos como estreptococos do grupo B (S.agalactiae) ou mesmo espcies termoflicas de Campylobacter (C.jejuni + e C.coli -). O microrganismo semeado em caldo com o hipurato de sdio e incubado por 18 a 24h a 35C. Aps este perodo o caldo centrifugado e no sobrenadante (0,8 mL) adicionado 0,2 mL de cloreto frrico (FeCl) formando um precipitado abundante que, se perdurar por mais de 10 minutos, evidencia a presena do cido benzoico (prova do hipurato positiva).Outra alternativa usar o reagente de ninhidrina que detecta a glicina livre. Neste caso h a formao de colorao azul-escura. No caso de Campylobacter, suas exigncias de crescimento dificultam a incubao descrita, ento uma massa de clulas proveniente de crescimento anterior acrescentada ao caldo hipurato para realizao da prova.
D- Mtodos de teste de sensibilidade aos antimicrobianos para anaerbios sugerido pelo CLSI Mtodo de diluio em gar:
Escolher o antimicrobiano a ser testado. Diferentes concentraes dos antimicrobianos so misturadas ao gar Wilkins-
de Steers ou similar). Aps 48h em jarra hermtica tipo GasPak ou cmara de anaerobiose, faz-se a leitura (determina a CIM).
Este mtodo, apesar de muito funcional, complicado para Clostridium sp.
que apresentam crescimento disseminado. Mtodo de diluio em caldo em microtubos (DM) A CIM dos diferentes antimicrobianos determinada em placas de microtitulao. Os meios de escolha de acordo com o CLSI so o caldo BHI, o caldo de Schaedler modificado e o de Wilkins-Chalgren (WC) J outros rgos padronizadores, como o IUMC, sugerem Difco Anaerobe Broth.
O meio com as diferentes concentraes dos antimicrobianos (0,5, 1, 2, 4, 8, 16, 32 e 64 mg/mL) distribudo em placa de microtitulao - 0,1mL
para cada uma das 96 cubetas da placa com pipeta semiautomtica. Estas placas podero se armazenadas em plsticos e congeladas em freezer a -70 oC, de 4 a 6 meses.
No momento da utilizao, descongela-se a placa em temperatura ambiente
e adiciona-se o cultivo ativo (18 a 24hs) em caldo Schaedler, diludo 1:100 incuba-se por 48hs em anaerobiose. Podemos, ento, ler a CIM (menor concentrao que inibe completamente o crescimento), que corresponde cubeta lmpida.
Tabela de percentuais de positividade, para diferenciao bioqumica, simplificada das principais Enterobacteriaceae estudadas na clnica
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Obs1: Shigella grupo A, B, C diferenciao: Grupo A: manitol (-), Grupo B e C: manitol (+). A diferenciao final sorolgica. Obs2: Para identificao completa de Salmonella e Escheria coli, dever ser realizada sorologia complementar. (Tabela de Farmer et al., 1985, atualizada com informaes contidas em Koneman, 2001 e Jawetz et al., 2009.)
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