A solidão torna-nos heróis.
Somos capazes de aturar o pior dos males em nome de uma companhia que esteja lá para partilhar a vida connosco.
Aturamos casamentos falhados, homens que já não gostam de nós, amigos que nos maltratam, família que se agride mutuamente, tudo em nome de termos lá alguém que nos ajude a não nos sentirmos tão sós.
Somos capazes de abdicar do nosso programa de televisão favorito, de estarmos com outras pessoas que fazem parte das nossas vidas, do prazer de ir a um jogo de futebol, de fazermos aquilo que gostamos porque não queremos desagradar ou entristecer a pessoa que vive connosco na rotina estúpida do dia-a-dia.
Pela manutenção daquilo que convencionamos chamar de relação somos capazes de nos destruir a nós próprios um bocadinho, apenas porque temos medo de deixarmos de ser nós e passarmos a ser eu + tu.
O medo do assumir de um à mesa, na vida, no confronto dos problemas, das noites más leva-nos inevitavelmente à diluição da nossa própria personalidade.
Pelo facto de mantermos alguém ao nosso lado, abdicamos de nós.
A solidão torna-nos heróis quando somos capazes de fazer coisas impensáveis. Quando repetimos as atitudes que vistas nos outros nos parecem alvo de críticas. Quando deixamos de nos realizar como pessoas para nos realizarmos apenas como a parte integrante de um nós.
A solidão torna-nos heróis quando nos anulamos em nome de um bem comum, visto sempre como maior independentemente do tamanho que represente. Quando abdicamos daquilo que nos realiza pela realização do outro. Quando largamos os sonhos e crenças pessoais para abraçar sonhos e crenças que nunca vislumbramos como nossos ou pertença do nosso caminho individual.
A solidão torna-nos heróis quando nos tornamos exactamente naquilo que não queremos e nos superamos a nós mesmos.