Nicolau Tolentino de Almeida
(1740 – 1811)
“ Do nosso sec. XVIII a melhor produção em verso é a obra satírica de Nicolau Tolentino de Almeida, no género a mais notável da literatura portuguesa.
Uma parte importante da obra de Tolentino é constituída por memoriais e requerimentos em verso, assim como por poesias de humilde homenagem aos grandes de quem dependia. Mais que uma sátira,a obra de Tolentino é uma ironia impassível,envolvendo o próprio autor que se vê também ironicamente a si mesmo.
O mais profundo efeito estético que resulta dos seus versos provém de um superior manejo da ironia”.
Recordemo-lo com os sonetos, quartetos e quintilhas que se seguem.
Obs. Respeitei a estrutura ritmíca das composições do Poeta
Sonetos
A – Solução para a crise
Sou pastor e soletro devagar.
Já faço contas a diminuir.
A escrita ainda me faz sorrir.
Mas em breve tudo isto vai mudar:
meus conhecimentos vou apurar.
Farei manada e rebanho a mim vir
e direi que, p’ra termos bons porvir,
comer e beber, mas não esbanjar.
Todos os excrementos deverão ser
aproveitados para no futuro
no país nunca recessão haver.
Enquanto estudo, vós ireis no duro
trabalhar, p’ra comida merecer.
O contrário, estareis em apuro.
B – continuação
Senhor Primeiro Ministro, queria
ser a rendoso cargo pretendente,
porque me considero competente
p’ra ocupar lugar de muita valia.
Possuo cultura e sabedoria.
Prometo em tudo ser-lhe obediente.
Minhas entrevistas, passadas a pente
fino, deixam o povo em agonia.
Bons conselhos e avisos a todos dei.
Farei recuperar as esperanças
nas contas públicas dentro da lei.
Pretendo ser Ministro das Finanças,
seguindo o que até aos brutos ensinei:
poupar, trabalhar e muitas cobranças!
Quartetos
A uma quarentona pretensiosa
És esquelética e de ti beleza
fugiu. O toucado parece ninho
de cegonha. Aí pões adornos teus,
p’ra agradar ao velho e gordo amiguinho.
Lá guardas cabeleira com madeixas,
encobrindo a careca encarquilhada;
p’ro namorado ter onde apalpar,
p’ras ancas escondes postiça camada.
Quintetos
A um peralta corcunda e perneta
Por que queres alterar a obra de Deus?
Por que passar desejas por casquilho?
Jamais na mulhar verás peitos seus,
porque corcova tua é impecilho.
A essa “guloseima” diz adeus.
Cuidado! Não tens “onde cair morto”.
Atrás de ti anda um tropel de gente.
Vives em pardieiro e sem conforto,
Mas não sai dessa cabeça demente
que p’ras damas não és pobre, nem torto.
Agostinho Alves Fardilha (o meu pai)
Coimbra
Fotos:internet