PRINCÍPIOS E MÉTRICAS PARA AVALIAÇÃO
DO DOT 1
Fernando Tadeu de Araujo Lima2
Nuno Montenegro3
Rodrigo Cury Paraizo4
José Ripper Kós5
DOI: 10.5752/P.2316-1752.2020v27n40p243
Resumo
O Desenvolvimento Orientado pelo Transporte (DOT) é um
modelo de desenvolvimento urbano que preconiza cidades mais
sustentáveis. Este artigo tem por objetivo identificar e apresentar
métricas para avaliação de desempenho que se relacionam com
seus princípios básicos, de natureza objetivamente mensurável.
Pretende-se, portanto, contribuir para abordagens de análise e
proposição que possam ser suportadas pela implementação
1. Artigo elaborado a partir da tese de LIMA, F.T.A., intitulada “MÉTRICAS URBANAS: Sistema
(para)métrico para análise e otimização de configurações urbanas de acordo com métricas de
avaliação de desempenho”. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2017.
2. Arquiteto pela UFJF, doutor em urbanismo pela UFRJ. Professor do Departamento de Projeto,
Representação e Tecnologia da FAU-UFJF. E-mail:
[email protected]
3. Arquiteto pela ULisboa, doutor em Urbanismo pela ULisboa. Professor da Faculdade de Arquitetura da ULisboa. E-mail:
[email protected]
4. Arquiteto pela UFRJ, doutor em urbanismo pela UFRJ. Professor do Departamento de Análise
e Representação da Forma da FAU-UFRJ. E-mail:
[email protected].
5. Arquiteto pela UFRJ, PhD em Tecnologia da Informação e Arquitetura, pela University of Strathclyde. Professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC. E-mail: jose.kos@
ufsc.br
instrumental dos princípios e das métricas aqui caracterizadas.
Palavras-chave: Desenvolvimento Orientado Pelo Transporte.
Métricas urbanas. Caminhabilidade. Diversidade de usos. Compacidade.
244
PRINCIPLES AND METRICS FOR TOD ASSESSMENT
PRINCIPIOS Y MÉTRICAS PARA LA EVALUACIÓN DOT
Abstract
Resumen
Transit-Oriented Development is an urban
development model aimed at more sustainable
cities. This article aims to identify and present
metrics for performance evaluation of this model's
fundamental principles of an objectively measurable
nature. Therefore, it is intended to contribute to the
discussion on the subject and promote analysis
and urban propositions that can be supported by
an instrumental implementation of the principles
and metrics described here.
El Desarrollo Orientado al Transporte (DOT) es un
modelo de desarrollo urbano que aboga por ciudades
más sostenibles. Este artículo tiene como objetivo
identificar y presentar métricas para la evaluación
del desempeño que estén relacionadas con sus
principios básicos, de naturaleza objetivamente
medible. Se pretende, por tanto, contribuir a
245
enfoques de análisis y proposición que puedan
apoyarse en la implementación instrumental de los
principios y métricas aquí caracterizados.
Keywords:
Transit-Oriented
Development.
Urban metrics. Walkability. Land-use diversity.
Compactness.
Palabras-claves:
Desarrollo
Orientado
al
Transporte. Métricas urbanas. Transitabilidad.
Diversidad de usos. Compacidade.
1 Introdução
246
A queima de combustíveis fósseis em veículos motorizados tem sido responsabilizada por até 75 por cento
da poluição do ar nos centros urbanos e foi associada a
3,7 milhões de mortes prematuras em 2012 (Global Fuel
Economy, 2016). Além de contribuir para as emissões de
carbono, o paradigma de organização e de expansão das
cidades tem causado grandes impactos inconvenientes
nos centros urbanos contemporâneos (e. g. dependência do automóvel, padrões espaciais fragmentados, menor interação social). Nesse cenário, o Desenvolvimento
Orientado pelo Transporte (DOT) se tornou um dos principais modelos de planejamento destinados à criação de
bairros compactos, caminháveis e de uso misto, organizados em torno de estações de transporte. Essa lógica de
organização de configurações urbanas incentiva a criação
de comunidades que não dependem exclusivamente do
automóvel para os deslocamentos diários e está sendo
crescentemente promovida em várias cidades do mundo
como exemplo de uma prática mais sustentável para a
organização de bairros e centros urbanos (FARR, 2013;
LEITE, 2012; SUZUKI; CERVERO; IUCHI, 2013).
Além disso, é possível identificar princípios básicos do
DOT que podem ser aferidos por meio de diversas métricas, de natureza geométrica, algébrica e mensurável
(LIMA, 2017; LIMA; KÓS; PARAÍZO, 2016a; LIMA; PA-
Cadernos de Arquitetura e Urbanismo v.27, n.40, 1º sem. 2020
RAÍZO; KÓS, 2016b). No entanto, há forte demanda por
métodos ou sistemas que auxiliem os atores envolvidos
na discussão, proposição e/ou avaliação de projetos baseados na lógica do DOT a serem implementados de maneira mais bem-sucedida (PATEL; SHAH, 2019; SUZUKI;
CERVERO; IUCHI, 2013; LEITE, 2012).
Portanto, este artigo visa identificar e apresentar métricas para avaliação do DOT, que se relacionam com seus
princípios básicos de natureza objetivamente mensurável. Portanto, a seção 2 deste paper traz uma revisão de
literatura do DOT, delineando seu conceito, suas definições, vantagens, limitações e a sua relevância. A seção
3 apresenta uma identificação dos princípios básicos do
DOT e suas características objetivamente mensuráveis,
enquanto a seção 4, estabelece métricas que podem ser
utilizadas para mensurar o atendimento de uma área urbana (ou de eventuais propostas) a cada um destes princípios. Na seção final, se discute sobre o potencial da utilização dessas métricas em processos de planejamento
orientado pelo DOT.
2 DOT – Conceitos e definições, vantagens, limitações e relevância.
2.1 Conceito e definições
Peter Calthorpe (1993), em seu livro intitulado “The next
american metropolis” ”, iniciou a articulação de algumas
247
248
premissas de planejamento urbano sustentável, que posteriormente vieram a constituir as bases do conceito do
Transit Oriented Development, no original em inglês, ou
Desenvolvimento Orientado pelo Transporte, como é comumente traduzido para o português. São elas: i) a organização do crescimento a um nível regional, de maneira
policêntrica e compacta, que ofereça suporte à mobilidade urbana; ii) o posicionamento de residências, pontos
de comércio e emprego, parques e demais usos dentro
de uma distância acessível a pé das paradas de trânsito;
iii) a criação de redes de vias que conectem destinos locais e que incentivem a caminhada e o ciclismo; iv) a promoção de um mix de densidades, tipologias e usos; v) a
preservação do habitat local, zonas ribeirinhas e espaços
abertos e de alta qualidade; vi) a instituição dos espaços
públicos como foco para a orientação dos edifícios e das
atividades da vizinhança e; vii) o incentivo à ocupação e
ao desenvolvimento ao longo de corredores de trânsito e
comunidades existentes.
Atualmente, entretanto, embora não exista uma definição
consensual para o DOT, ele é frequentemente descrito de
uma maneira física: uma área compacta com edifícios de
uso misto, que conecta serviços e residências por meio
de distâncias caminháveis e servida por uma rede de mobilidade multimodal (CALTHORPE; FULTON, 2001; CERVERO; KOCKELMAN, 1997; SUZUKI; CERVERO; IUCHI,
2013). Nesse modelo, necessidades urbanas básicas são
Cadernos de Arquitetura e Urbanismo v.27, n.40, 1º sem. 2020
facilmente acessíveis sem exigir automóveis ou despender grandes quantidades de tempo em deslocamentos,
suportando bairros mais autônomos e sustentáveis.
Adotar esse modelo de desenvolvimento urbano significa
considerar um novo paradigma para o funcionamento e
para o próprio metabolismo das cidades. Uma implementação adequada do DOT requer que a estruturação urbana, a lógica de transporte e a configuração das vias, dos
passeios e das quadras se deem de maneira diferente
do que preconiza o modelo de desenvolvimento urbano
comumente adotado. Stuchi e Leite (2015) apontam também que para se conseguir cidades articuladas e agradáveis é necessário desprestigiar o modelo de desenvolvimento ligado ao automóvel particular e estimular os usos
de transportes alternativos, conjuntamente à intensificação do uso e qualificação do transporte coletivo.
Para Gehl (2013), o DOT é um modelo de desenvolvimento urbano de crescente aceitação em todo o mundo, que
compreende a concentração nas “interrelações entre as
estruturas para pedestres e ciclistas e a rede coletiva de
tráfego” (Gehl, 2013, p.107). Além disso, Gehl (2013) considera uma vantagem o fato de que cidades compactas
baseadas no DOT são capazes de oferecer um número
suficiente de moradias e locais de trabalho a uma distância caminhável das estações. Essas cidades, com
bons espaços públicos e curtas distâncias entre trabalho,
249
serviços e moradias “garantem inúmeras vantagens ambientais como linhas de abastecimento curtas e reduzido
consumo de áreas.”(GEHL 2013) p. 107).
Farr (2013), por sua vez, apresenta o DOT como um modelo de organização urbana que proporciona mais opções
de habitação e transporte, além de serviços variados que
podem ser acessados a pé (priorização dos pedestres e
vida urbana). Em paralelo, Dittmar e Ohland (2004) entendem que o DOT visa maximizar o acesso ao transporte
coletivo e não motorizado, por meio da implantação de
estações (de trem ou ônibus) centralmente localizadas e
rodeadas por densidade relativamente alta.
250
Ainda segundo Farr (2013), o DOT transcende a ideia de
simplesmente se orientar uma unidade de vizinhança próxima a uma estação de transporte público. Trata-se, no
entanto, do conceito de um bairro estruturado em torno
de uma estação ou ao longo de um corredor de transporte, permeado por empreendimentos múltiplos, usos
mistos, e “uma rede viária em que se possa caminhar e
um desenho que permita vida urbana e opções de transporte.” (FARR. 2013, p. 109).
Suzuki, Cervero e Iuchi (2013) consideram o DOT uma
abordagem prática para reduzir congestionamento, emissão de gases responsáveis pelo efeito estufa e outros
causadores de problemas ambientais, além de proporcio-
Cadernos de Arquitetura e Urbanismo v.27, n.40, 1º sem. 2020
nar possibilidades de arranjo e organização espacial urbana que visam a promover maior interação social, melhor
uso do solo e conexões entre trabalho, serviços e residências. Ainda segundo Suzuki, Cervero e Iuchi (2013),
experiências mostram que a implementação bem-sucedida do DOT não apenas aumenta o uso do transporte
coletivo (estimulando usuários a abandonarem os carros
e utilizarem ônibus ou trens), mas também serve como
instrumento para o desenvolvimento das comunidades e
revitalização de bairros deteriorados.
Há certo consenso, segundo os autores apresentados
de que determinados atributos ou princípios do DOT, são
especialmente benéficos para a estruturação e o funcionamento dos centro urbanos contemporâneos. Embora
nem todos mencionem especificamente o DOT (pois o
termo específico e o conceito surgiram a posteriori mediante uma certa “concatenação” de ideias) os autores
estudados defendem a implementação dessa “lógica”
de organização e desenvolvimento urbano como um importante passo na direção de cidades mais autônomas,
integradas, caminháveis e sustentáveis. Nesse cenário, é
possível apontar algumas vantagens e limitações desse
modelo de desenvolvimento urbano, conforme em sequência.
251
2.2 Vantagens e limitações
252
Dentre as vantagens apontadas à adoção do DOT como
modelo para estruturação e organização espacial dos centros urbanos, encontram-se: a) a redução da emissão de
gases poluentes do ar e de gases relacionados ao efeito
estufa; b) a promoção de comunidades caminháveis, que
incentivam modos de vida mais saudáveis e menos sedentários; c) a otimização de infraestrutura urbana, uma
vez que a expansão da urbanização demanda maiores
custos públicos com a provisão e manutenção da infraestrutura e serviços urbanos e; d) a redução da dependência
do automóvel (FARR, 2008; STUCHI; LEITE, 2015; SUZUKI; CERVERO; IUCHI, 2013).
Apesar de todos esses benefícios relacionados, o DOT
ainda apresenta algumas limitações que dificultam sua
implementação com maior frequência e eficiência. Diversos autores permitem encontrar, basicamente, limitações
de quatro ordens a esse respeito. São elas: a) de ordem
financeira – apesar de reduzir custos com infraestrutura
a longo prazo, o DOT demanda grandes investimentos públicos e privados para ser implantado; b) de ordem participativa – resistências da comunidade local representam
um desafio para a implementação do DOT, uma vez que
moradores muitas vezes temem que o DOT possa descaracterizar seu bairro, criar congestionamento de tráfego
localizado ou depreciar suas propriedades; c) de ordem
Cadernos de Arquitetura e Urbanismo v.27, n.40, 1º sem. 2020
legal – a legislação da maioria dos municípios não é favorável à implantação do DOT, pois leis de zoneamento e
códigos de uso do solo são geralmente concebidos para a
lógica de bairros e edifícios monofuncionais, com desenvolvimento orientado aos automóveis. Em alguns casos,
parâmetros de zoneamento frequentemente proíbem a
densidade necessária, e disposições como valores máximos em relação a taxa de ocupação, limitações de altura
e afastamentos dos edifícios, entre outros, praticamente
inviabilizam o DOT, apesar de serem comumente distorcidos por interesses relativos à especulação imobiliária e;
d) de ordem instrumental – ainda não foram suficientemente desenvolvidos instrumentos ou sistemas que
auxiliem os atores envolvidos na discussão, proposição
e/ou avaliação de projetos, a implementarem de maneira
eficiente soluções baseadas na lógica do DOT (DITTMAR;
OHLAND, 2004; STUCHI; LEITE, 2015; SUZUKI; CERVERO; IUCHI, 2013). Portanto, torna-se de grande importância a elaboração de instrumentos e/ou ferramentas de
suporte a tarefas de suporte à tomada de decisão, bem
como a identificação de métricas para avaliação de implementação do DOT. Há que se ressaltar, ainda, que esses
obstáculos para a implementação do DOT são acentuados no contexto brasileiro, principalmente em áreas urbanas periféricas, que são as mais impactadas pelas dificuldades de transporte e baixa acessibilidade aos serviços.
253
2.3 Relevância
254
Para Leite (2012), há uma forte demanda atual em promover cidades providas de um metabolismo que gere maior
urbanidade, o que Gehl (2013) define como “cidades para
as pessoas”. Ogra e Ndebele (2014) afirmam que o DOT
assumiu, nos últimos anos, um papel central no contexto
das políticas de mobilidade urbana mundial, tornando-se
um dos principais paradigmas de planejamento que visa
a reverter o desenvolvimento urbano baseado nos deslocamentos por automóvel individual. Em consonância,
Dittmar e Ohland (2004) afirmam que o DOT vem sendo
crescentemente promovido em várias cidades do mundo
como uma política sustentável para centros urbanos contemporâneos.
Segundo a Transit Cooperative Research Program (2004),
uma entidade norte-americana voltada para a pesquisa
sobre mobilidade urbana, uma grande variedade de DOTs
pode ser encontrada no Estados Unidos e todos os indicadores demonstram que os números e tipos de DOT
tendem a aumentar naquele país. Atualmente, existe
mais de uma centena de DOTs implementados nos Estados Unidos, em diversas escalas e tipologias. Altoon
e Auld (2011) demonstram que a relevância do DOT não
se restringe aos Estados Unidos e apresentam inciativas
de implementação do DOT em diversos países como:
Alemanha, Austrália, Bélgica, Canadá, China, França, Ho-
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landa, Nova Zelândia, Polônia, Reino Unido, Rússia, entre
outros.
No Brasil, cujo tempo médio de deslocamento nas regiões metropolitanas aumentou de 38,1 para 43,3 minutos nos últimos 10 anos (RODRIGUES, 2016), há uma
flagrante saturação dos meios de transporte existentes
e uma crescente demanda por soluções para esse desafio em cidades de grande e médio porte, principalmente.
Pode-se observar, nos últimos anos, a implementação de
BRTs (Bus Rapid Transit) em diversos centros urbanos
brasileiros (sendo a cidade de Curitiba uma das pioneiras).
A cidade de Nova Friburgo, por sua vez, ao elaborar seu
Plano de Desenvolvimento Urbano Estratégico – 2050,
estabeleceu princípios do DOT como parte da estratégia
central para aproximar as atividades da cidade, qualificar a
vida urbana nos bairros, equilibrar as dinâmicas urbanas e
alinhar desenvolvimento urbano e mobilidade, ao incentivar a criação de territórios compactos e de redes de centralidades multifuncionais, em “uma rede equilibrada de
núcleos densos conectados por adequados sistemas de
mobilidade” (STUCHI; LEITE, 2015, p. 24).
O município de São Paulo, por outro lado, apesar de não
citar nominalmente o conceito do DOT, incorpora muitas
de suas premissas (e. g. priorizar o uso do transporte público, valorizar o pedestre e seus percursos, implementar
múltiplos modais, incentivar o uso misto e a multicentra-
255
lidade, distribuir equilibradamente serviços urbanos ao
longo dos bairros e orientar o crescimento da cidade nas
proximidades do transporte público) na elaboração de seu
Plano Diretor Estratégico (SÃO PAULO, 2014).
3 Princípios mensuráveis do DOT
256
Em trabalhos anteriores afirmamos que o DOT é um modelo de desenvolvimento urbano que considera princípios
mensuráveis (e, portanto, programáveis) para melhorar o
desempenho sustentável de bairros e centros urbanos sob a perspectiva da mobilidade urbana e do uso do solo
solo (LIMA. 2017; LIMA et al. 2016a; LIMA et al. 2016b).
Baseado nisso e considerando o universo de interesse e
o escopo desta pesquisa, é possível estabelecer parâmetros-chave que permitam avaliar configurações urbanas 6
sob a perspectiva dos princípios do DOT. As premissas
fundamentais que estruturam o conceito do DOT variam
de acordo com algumas definições, mas em essência,
podem ser mensuradas por meio de características ou
6. Para efeito desta pesquisa, são considerados como configurações urbanas os seguintes arranjos formais (geométricos e algébricos) do espaço urbano, relacionados à organização de
bairros e cidades sob a perspectiva da mobilidade urbana e do uso do solo: o desenho de ruas,
quadras, lotes e edifícios; a distribuição, a variedade e a localização de serviços urbanos e suas
respectivas distâncias para as demais localidades de um bairro; a articulação e a proporção entre
áreas residenciais e não residenciais desse mesmo bairro; atributos diretamente relacionados à
densidade, como indicadores de aproveitamento construtivo e de ocupação do solo.
Cadernos de Arquitetura e Urbanismo v.27, n.40, 1º sem. 2020
propriedades objetivas como: distância física7 ; distância
topológica8; densidade física; densidade populacional;
contagem/posicionamento de equipamentos urbanos,
entre outros. Nesta pesquisa, as premissas apresentadas
anteriormente, são articuladas por meio de quatro princípios básicos, que visam a permitir a quantificação e a
análise de características fundamentais do DOT, são eles:
a) a acessibilidade ao transporte; b) a caminhabilidade;
c) a diversidade e; d) a compacidade.
3.1 Acessibilidade ao transporte
Promover curtas distâncias até o acesso ao transporte público significa conectar melhor a cidade, incentivar a caminhada, o ciclismo e a utilização do sistema de transporte
público. A distância possui implicações substanciais para
a viabilidade e a eficácia de um sistema de transporte
público: em essência, a distância permite mensurar a proximidade ou a acessibilidade9 de uma estação de trânsito
7. O termo “distância física”, no contexto desta pesquisa, refere-se àquela dada (em metros, por
exemplo) pelo menor caminho disponível para conectar duas localidades e não necessariamente
pela linha reta entre dois pontos, isto é, a distância física é dada pela distância percorrida para se
alcançar um ponto B, partindo de um ponto A, dada uma rede “R” de ruas para deslocamento.
8. O termo “distância topológica” é aqui utilizado no mesmo sentido daquele proposto na teoria
da sintaxe espacial, proposta por Hillier e Hanson (1984), ou seja: o número de ruas (ou de mudanças de direção) necessárias para se alcançar um determinado destino.
9. O termo “acessibilidade” é aqui adotado, de maneira mais restrita, como aquele que se refere
à proximidade (física ou topológica) entre dois ou mais pontos e não necessariamente como
forma de designar a disciplina que busca promover o acesso de pessoas portadoras de algum
tipo de deficiência ou mobilidade reduzida.
257
(OGRA; NDBELE, 2014).
Entretanto, frequentemente, os esforços em tornar as
cidades mais conectadas têm tido como premissa a opção por proporcionar a movimentação de pessoas ao redor da cidade mais rapidamente, com a abertura de uma
quantidade cada vez maior de vias para deslocamento de
automóveis, e não por trazer os serviços urbanos mais
próximos das pessoas. A este respeito, Calthorpe (1993)
pontua que os sistemas de transporte precisam ser estruturados de maneira a facilitar o acesso a uma grande
variedade de destinos, como trabalho, serviços, recreação, entre outros.
258
Nesse contexto, a acessibilidade ao transporte é um
princípio fundamental dentro da equação do DOT e uma
questão importante para esta pesquisa, uma vez que
preconiza a proximidade (física e/ou topológica) entre a
estação e/ou paradas de transporte e os locais de moradia, trabalho e demais destinos de uma área urbana.
É importante considerar também, que conferir uma boa
acessibilidade ao transporte significa potencializar o acesso de todas as classes sociais às oportunidades ofertadas
pelas cidades.
3.2 Caminhabilidade
Gehl (2013) defende que a cidade tende a se tornar mais
viva, na medida em que mais pessoas se sintam convi-
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dadas a caminhar, pedalar ou permanecer nos espaços
públicos, interagindo e trocando informações e oportunidades sociais e culturais. Caminhar por um bairro que
possua parques, serviços e comércios que estejam diretamente conectados a uma pequena distância é, sem
dúvida, uma atividade muito mais agradável que andar por
regiões onde esses se encontram dispersos, o que tende
a trazer mais pessoas para o convívio no espaço urbano.
Para Farr (2013), a caminhabilidade consiste na capacidade que um determinado bairro possui de conectar habitações, pontos de comércio e demais serviços por meio de
distâncias que podem ser percorridas a pé, conferindo,
assim, maior autonomia, menor dependência do automóvel e “uma rede viária em que se possa caminhar e um
desenho que permita vida urbana e opções de transporte” (Farr, 2013, p.109). Nesse sentido, o princípio da caminhabilidade, no contexto desta investigação, é aquele que
preconiza a organização do espaço urbano em função de
promover as menores distâncias possíveis10 aos inúmeros serviços que um bairro estruturado na lógica do DOT
deve possuir.
10. Evidentemente, quanto menor for a distância entre as localidades de um bairro e seus
serviços, maiores serão os índices de caminhabilidade. No entanto, há certo consenso de que
distâncias de até 400m são consideradas como ideais. Há que se considerar também, que no
contexto atual, de desenvolvimento rápido das tecnologias de transporte, a distância muitas
vezes pode ser substituída pelo tempo, como métrica de avaliação da acessibilidade, sobretudo
em espaços menos densos.
259
260
No caso específico da caminhabilidade, as análises ganham contornos mais complexos quando comparadas ao
cálculo da acessibilidade ao transporte. Isso porque aqui
interessa avaliar não apenas a distância para um equipamento único (no caso da acessibilidade ao transporte a
estação), mas sim verificar qual o nível de acesso a diferentes serviços essenciais à vida nas cidades, o que
significa abordar: a) quais categorias de serviços estão
disponíveis em uma determinada vizinhança (e. g. educação, comércio, alimentação, recreação, entre outros);
b) qual a proximidade dos serviços em cada uma dessas categorias (considerando distâncias físicas e topológicas); c) qual a diversidade dessas categorias, uma vez
que cada uma delas engloba diferentes atividades (no
caso da educação, por exemplo, creches, escolas e faculdades desempenham papeis diferentes, mas igualmente
importantes para a dinâmica de um bairro), e; d) qual a
quantidade desstes serviços em cada categoria, o qual
possui correspondência direta com as opções disponíveis
em uma determinada área urbana.
3.3 Diversidade
Calthorpe (1993) entende que o uso diversificado na escala do bairro é um fator primordial para a sustentabilidade das cidades e por isso reforça a importância de vizinhanças multifuncionais. Rogers (1997) defende o uso
misto e a diversidade para um melhor aproveitamento de
Cadernos de Arquitetura e Urbanismo v.27, n.40, 1º sem. 2020
espaços, a partir de uma lógica em que tudo acontece
simultaneamente: morar, trabalhar, consumir e recrear
em uma mesma área, visando atender o princípio de
posicionar serviços e comércios sem a necessidade de
grandes deslocamentos. Sendo assim, bairros configurados com diversos tipos de serviços que se complementem, incentivam as pessoas a deslocarem-se a pé, por
meio da proximidade de diferentes serviços necessários
no cotidiano, permitindo o contato e a integração de pessoas de diferentes culturas e classes, e potencializando
a qualidade de interação e de vida social. Panerai, Castex e Depaule (2013) defendem que a questão do tecido
urbano não pode ser dissociada da experiência cotidiana
da cidade.Nessa ótica, ressaltam ainda, a importância de
ações sustentáveis no projeto urbano como um espaço
público acessível a todos, com vizinhanças mistas, atividades que se misturem e edifícios que se adaptem e se
transformem.
O princípio da diversidade, no contexto desta investigação, é aquele que preconiza a distribuição equilibrada entre as áreas residenciais e as não residenciais em uma
mesma vizinhança. Quanto mais equilibrada for esta relação, menor a quantidade de grandes deslocamentos
tende a ser, o que significa bairros mais autônomos e
sustentáveis. Esse princípio, também fundamental para
o conceito do DOT, atende à premissa da cidade polinucleada com centralidades multifuncionais, isto é, defende
261
que todos os serviços essenciais à vida urbana estejam
acessíveis dentro de um bairro por meio de distâncias caminháveis, ou ainda, bem como por meio de transportes
coletivos e integrados que permitam acesso a outros bairros, igualmente diversos e caminháveis.
3.4 Compacidade
262
A compacidade em áreas urbanas é uma ideia defendida por diversos autores, como Dantzig e Saaty, (1973);
Rogers, (1997); Gaeser, (2011); Leite,( 2012); Chakrabarti,
(2013) ; Farr, (2008); Gehl, (2013); Suzuki, Cervero e Iuchi,
(2013). Rogers (1997), por sua vez, afirma que cidades
sustentáveis são compactas, pois a cidade compacta propicia otimizar o desempenho de energia, reduzir o nível de
poluição e o consumo de recursos, além de oferecer as
vantagens de se morar próximo ao local de trabalho e do
outro, em uma busca pela redescoberta da proximidade.
Segundo Stuchi e Leite (2015), a noção de cidade compacta se sustenta em três pilares: a otimização de recursos, a inovação e a sustentabilidade. A otimização de
recursos se dá à medida em que “maiores densidades
urbanas potencializam as infraestruturas urbanas, as ruas
e os sistemas de transporte, redes de cabos ou fibras
e equipamentos públicos” (STUCHI; LEITE, 2015, p. 30).
Além de aproximar pessoas e suas necessidades urbanas, cidades mais compactas desperdiçam menos inves-
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timentos públicos. A inovação acontece, porque cidades
compactas “propiciam concentração de diversidade que
gera inovação e oportunidades únicas (seja em termos de
conhecimento, cultura ou desenvolvimento econômico).”
(STUCHI; LEITE, 2015, p. 30).
Maiores densidades promovem o encontro, a diversidade
e otimizam o uso de infraestruturas urbanas e recursos
públicos, além de determinarem menores consumos
(principalmente de recursos energéticos) per capita e menor produção de resíduos e de gases de efeito estufa, ou
seja, “cidades compactas são mais sustentáveis.” (STUCHI; LEITE, 2015, p. 31). Para Rogers (1997), a cidade
compacta, mais que ser sustentável, promove maior autonomia às áreas urbanas, abrigando atividades diversas
que, ao mesmo tempo, se complementam e sobrepõem.
Para Leite (2012), “a opção pelos parâmetros advindos da
cidade compacta tem sido consenso internacional.” (LEITE, 2012, p. 135).
Conforme mencionado anteriormente, um desafio crítico
voltado para aqueles que pensam e planejam a cidade é o
alto nível de dependência do automóvel. Desenvolvimentos de baixa densidade têm influência direta nesta questão. Assim, Ogra e Ndebele (2014) apontam que as áreas
urbanas devem ser concebidas de maneira a suportar desenvolvimentos de alta densidade, complementados por
uso do solo misto e investimentos em sistemas de trans-
263
portes públicos. A esse respeito, altas densidades estão
normalmente relacionadas a menores distâncias médias
de viagem para todos os modais. A principal premissa do
desenvolvimento de alta densidade assume que a colocação de edifícios residenciais perto de grandes nós de
transporte, instalações e locais de trabalho irá aumentar a
conveniência e, portanto, a aceitação de modos de transporte sustentáveis.
264
Neste contexto, a compacidade é um princípio fundamental na lógica do DOT, uma vez que preconiza o adensamento de áreas urbanas por meio da verticalização e da
concentração de atividades e equipamentos. Instrumentos para mensurar diferentes aspectos da densidade de
uma área urbana são indispensáveis para articular relações entre os serviços disponíveis, os modais de transportes e a quantidade potencial de pessoas que podem
residir e trabalhar em uma determinada localidade.
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Figura 1 | Diagrama conceitual dos princípios básicos mensuráveis do DOT.
Fonte: Os autores, adaptado de Lima, 2017, p. 62.
4 Métricas para avaliação de princípios básicos
do DOT
4.1 Métricas para a acessibilidade ao transporte
A acessibilidade ao transporte de uma determinada área
pode ser aferida por meio do cálculo da distância dos menores percursos entre uma determinada estação e sua
área de influência (ou bairro). Importa, sob essa noção,
mensurar a distância física para a estação, considerando
as inclinações no percurso, mas também a distância topológica, ou seja: o número de ruas (ou de mudanças de
265
direção) necessárias para se alcançar um destino. Assim,
quanto menores as distâncias físicas e topológicas entre
todos os destinos de uma determinada localidade e sua
respectiva estação, maior a acessibilidade ao transporte
deste bairro.
266
Gehl (2013, p. 121) afirma que “a distância aceitável de
caminhada é um conceito relativamente fluido” e que fatores como a qualidade do percurso, a superfície, a quantidade de pessoas e os obstáculos no trajeto influenciam
este dado. Entretanto, o próprio Gehl (2013, p. 121) reconhece a necessidade de estabelecer uma meta para deslocamentos a pé ao afirmar que “o tamanho dos centros
das cidades confirma a distância de 500 metros como um
objetivo aproximado de uma caminhada aceitável”.
Em concordância com o valor aceitável para Gehl, um
valor de referência comumente aceito para estabelecer
a distância ideal para uma estação de transporte é o de
cinco minutos (ou menos) de deslocamento. Para distâncias percorridas a pé, estipula-se 400m, e para distâncias
percorridas de bicicleta, 1600m (FARR, 2008; SUZUKI;
CERVERO; IUCHI, 2013). Entretanto, essas medidas não
podem ser obtidas por meio da relação simples entre a
posição da estação e o desenho de um círculo (buffer) que
delimite sua área de influência, uma vez que os percursos
nas cidades nem sempre se dão em linhas que conectam
diretamente dois pontos, mas em função do desenho das
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vias. Assim, é fundamental considerar a rede de ruas em
que se dão os deslocamentos para que as distâncias dos
percursos sejam precisamente calculadas, o que significa
abordar regras de cálculo mais elaboradas.
Figura 2 | Diferença entre cálculo das distâncias via buffer (em vermelho), ou considerando a rede de ruas (em preto).
Fonte: Lima, 2017, p. 62.
Há de se considerar ainda que, embora a meta de até
400m de distância para o transporte seja comumente
aceita, não se pode compreendê-la como um limite rígido. É ilógico supor que alguém que resida a 395m da estação tenha plena acessibilidade ao transporte, enquanto
seu vizinho, que vive a 405m do mesmo ponto, esteja
completamente isolado. Obviamente, a relação entre a
distância física e a acessibilidade ao transporte é uma
curva contínua, sem interrupções bruscas. Portanto, instrumentos que visem a mensurar o atendimento a esse
princípio devem considerar estas nuances.
267
Hillier e Hanson (1984) propõem a teoria da Sintaxe Espacial para descrever as relações espaciais de uma determinada localidade através de medidas quantitativas
(ou sintáticas), que possibilitam compreender aspectos
importantes do sistema urbano, como a acessibilidade e
a distribuição de usos do solo.
268
Dentre as medidas sintáticas, a principal é chamada integração. Essa medida é utilizada para a previsão de fluxos
de pedestres e veículos em um determinado espaço, o
que lhe confere utilidade para o entendimento da dinâmica dos encontros sociais e do posicionamento de diferentes atividades urbanas. A integração mede o quão
“profundo”, ou distante, um determinado espaço está de
todos os outros espaços do sistema. No entanto, o conceito de profundidade considera a distância topológica,
e não a distância física. Dessa forma, todos os espaços
diretamente conectados estão a um passo topológico entre si. Espaços que se conectem por intermédio de um
outro espaço estão a dois passos topológicos de distância, e assim sucessivamente. A profundidade média de
um determinado espaço é, por conseguinte, obtida pela
somatória das profundidades de todos os demais espaços em relação a ele, dividida pelo número total de espaços menos um.
Uma outra medida sintática a ser considerada no contexto desta pesquisa é a conectividade. Essa medida calcula
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a quantidade de espaços (ou vias, no contexto urbano)
que se interceptam. Isso significa que a conectividade
pode ser usada para computar quantas conexões diretas
com outros espaços (ou ruas) uma determinada via possui, possibilitando compreender sua importância em uma
rede. Espaços com alta conectividade tendem a ter um
papel estruturador, uma vez que promovem, potencialmente, acesso a um grande número de outros espaços.
4.2 Métricas para a caminhabilidade
Diversas estratégias e instrumentos têm sido desenvolvidos no intuito de mensurar a caminhabilidade de um
determinado local. Um desses instrumentos é o Walkscore, um algoritmo que, segundo Carr, Dunsigen e Marcus,
(2011), gera uma pontuação que se baseia na distância
entre uma determinada localidade e os pontos de comércio e serviço mais próximos a ela. Esses pontos classificados em cinco categorias (educacional, alimentação,
comércio, entretenimento e recreação), são ponderados
com mesmo peso e somados, resultando em um único
índice que classifica a caminhabilidade de um determinado local. Por exemplo, se em relação a uma determinada
localidade o serviço mais próximo em uma categoria está
a 400m (cinco minutos de caminhada ou menos), então
o número máximo de pontos é atribuído para esta localidade nessa categoria. O número de pontos diminui à medida que a distância se aproxima de 1,6 km (30 minutos
269
de caminhada) e não são atribuídos pontos para serviços
com mais de 1,6 km de distância. Cada categoria possui
o mesmo peso e os pontos são somados e normalizados
para produzir uma pontuação entre 0-100, o que permite
classificar a caminhabilidade de uma determinada área
(ver Tabela 1). O número de serviços disponíveis e a suas
distâncias para as residências nas proximidades são os
principais parâmetros para promover a caminhabilidade.
270
Tabela1 | Classificação de valores de Walkscore.
Fonte: (LIMA, 2017, p. 67). Elaborado a partir de Walkscore (2014).
Dobesova e Krivka (2012) utilizam o Walkability Index, um
outro instrumento que visa a mensurar a caminhabilidade
de uma determinada área. Para isso, esse indicador considera quatro subíndices que avaliam diferentes aspectos
relacionados à caminhabilidade, são eles: (a) Conectivity
Index – também denominado Intersection Index, esse
subíndice, que adapta medidas da teoria da sintaxe espacial, calcula o número de interseções entre ruas por metro
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quadrado de uma determinada área, de maneira a procurar indicar quão conectada uma determinada vizinhança
é; (b) Entropy Index – visa mensurar o quão diverso é o
uso de uma determinada área, ao quantificar diferentes
funções em uma área urbana, de acordo com as seguintes categorias: residencial, comercial, serviços, industrial,
institucional, e outros; (c) Floor Area Ratio Index – considera a proporção entre as áreas de cada serviço e a área
total de sua respectiva categoria; (d) Household density
index – informa a densidade populacional de uma determinada localidade com base no número de domicílios.
Existem ainda inúmeros índices e instrumentos que visam mensurar características relacionadas à caminhabilidade de uma determinada localidade. Alguns abordam,
inclusive, questões subjetivas, relacionadas à percepção
do pedestre (ZACHARIAS, 2001; ZAMPIERI, 2006, entre
outros). Entretanto, considerando o espectro de interesse e os objetivos de aplicação desta investigação, os dois
índices apresentados (Walkscore e Walkability Index) são
alvo de especial atenção por tratarem aspectos objetivos
e essencialmente mensuráveis, que podem servir de
referência para o desenvolvimento de métricas e instrumentos que permitam medir e otimizar o desempenho de
configurações urbanas com base em aspectos objetivos.
271
4.3 Métricas para a diversidade
Hoek (2008) propõe um indicador que visa a mensurar
quão diversificada uma determinada área urbana é. Trata-se do Mixed-Use Index (MXI), que calcula a proporção entre a soma de todas as áreas residenciais e não
residenciais de um bairro, realizando uma comparação
dessas proporções, conforme demonstrado na Tabela 2.
Quanto mais próxima a relação entre as áreas é de 50/50,
maior a diversidade que uma área urbana possui.
272
Tabela 2 | Valores de referência para o MXI.
Fonte: (LIMA, 2017, p. 71). Elaborado a partir de Hoek (2008).
Figura 3 | Exemplo de uma área urbana com pleno equilíbrio entre áreas residenciais e
não-residenciais.
Fonte: Lima, 2017, p. 142.
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4.4 Métricas para a compacidade
Pont e Haupt (2010) propõem uma abordagem de múltiplas variáveis para medição de diferentes indicadores
de densidade, o Spacematrix. Esse conjunto de índices
objetiva oferecer um método específico o suficiente para
permitir a análise de tipos urbanos e o gerenciamento de
quantidades excessivas de dados sem, no entanto, estabelecer definições excessivamente detalhadas.
O Spacematrix consiste em três indicadores fundamentais: Intensidade (Floor Space Index - FSI), Cobertura
(Ground Space Index - GSI) e Densidade da rede (Network
density - N). O FSI reflete a intensidade de construção e
é dado pela divisão entre a área total construída e a área
do local que se analisa. O GSI demonstra a relação entre
espaços construídos e não construídos e é calculado por
meio da razão entre a área ocupada no solo e a área do
local que se analisa. N se refere à concentração de redes
em um dado tecido, e é obtido por meio da divisão entre
o somatório da extensão das ruas internas com a metade
do perímetro das ruas que delimitam uma área, adicionada a área total do local que se analisa (PONT; HAUPT,
2010). Os indicadores de Spacematrix são instrumentos
dinâmicos que fornecem avaliações objetivas das questões de densidade e podem ser adaptados à diversas
escalas urbanas (edifício, lote, quadra, tecido e bairro), o
que os credenciam como um importante instrumento no
273
escopo desta investigação.
5 Considerações finais
274
Planejar as cidades para uma organização eficiente é a
maneira mais eficaz e sustentável para reduzir os impactos da lógica atual de mobilidade nas cidades e promover uma vida mais interativa nos centros urbanos. Nesse
quadro, o DOT é um modelo em franco desenvolvimento
ao redor do mundo, que se baseia em alguns princípios
mensuráveis para melhorar a organização (sob a perspectiva da mobilidade urbana e do uso do solo sustentáveis)
de bairros e cidades, por meio de uma ordenação urbana
que preconiza a proximidade ao transporte e a demais
serviços essenciais, a distribuição equilibrada de atividades e a compactação e o adensamento dos centros urbanos. Nesse contexto, esse trabalho apresenta além de
uma revisão de literatura sobre o tema uma articulação de
princípios básicos mensuráveis do DOT e de suas respectivas métricas para análise. Pretende-se, portanto, contribuir para o desenvolvimento de abordagens de projeto e
planejamento urbano que se beneficiem da utilização de
princípios e métricas objetivamente quantificáveis para
avaliação e proposição de configurações urbanas mais
autônomas e sustentáveis.
No que diz respeito a esse cenário, é importante reforçar que o DOT se apoia em princípios essencialmente
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mensuráveis como estratégia para qualificar a vida urbana, auxiliando na proposição de cidades mais dinâmicas,
caminháveis, compactas e diversas. Em outras palavras,
o DOT constitui uma base teórica e prática com inúmeras possibilidades para exploração e para implementação, que pode ser suportada, por exemplo, por recursos
e ferramentas computacionais. Por essa razão, as bases
do DOT podem ser adotadas como referência para o desenvolvimento de novas ferramentas e abordagens, que
visem a suportar tarefas de análise urbana e de tomada
de decisão. Além disso, é importante ressaltar que ainda não foram suficientemente desenvolvidas abordagens
que considerem a grande quantidade de parâmetros (e
de dados) que podem estar envolvidos no contexto do
DOT para suportar maneiras de implementação mais
dinâmicas e eficientes. Trata-se, portanto, de um modelo que pode ser em grande parte programável, o que o
credencia como um caso potencial para implementação
de recursos computacionais. Apesar de grande parte da
base teórica desta pesquisa, bem como muito dos referenciais dos princípios e métricas apresentadas serem
mais constantemente implementadas em uma realidade
urbana diferente da brasileira, acreditamos que o uso da
parametrização possui potencial para as adequações que
se façam necessárias sejam dinamicamente abordadas
para soluções dos principais problemas de nossas cidades, dentre eles habitação, saúde e mobilidade urbana.
275
276
Por fim, acreditamos que este artigo possa contribuir
para o desenvolvimento de novas abordagens e/ou instrumentos de planejamento orientados pelo DOT e por seus
princípios, de maneira a identificar métricas que possam
ser sistematizadas e implementadas como base para avaliação e implementação de projetos orientados em um
contexto paramétrico. Espera-se, em trabalhos futuros,
a elaboração e o aprimoramento de ferramentas nesse
sentido, assim como a identificação de mais métricas
que possam se relacionar com os princípios apontados
neste trabalho e até mesmo com novos princípios que extrapolem o conceito de DOT, mas que possam contribuir
para a consolidação de cidades mais compactas, autônomas, sustentáveis e dinâmicas.
Agradecimentos
Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ao Centro de Investigação em Arquitectura, Urbanismo e Design (CIAUD) da
Universidade de Lisboa e ao Programa de Pós-Graduação
em Urbanismo (PROURB) da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ), pelo suporte concedido para o desenvolvimento desta pesquisa.
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