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IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO

2019, IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO

Estudo que mensura os impactos potenciais de um maior uso da bicicleta na cidade do Rio de Janeiro.

IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO MENSAGEM DO PATROCINADOR O Itaú Unibanco está comprometido com o desenvolvimento das comunidades em que atua para gerar valor compartilhado. Por sermos um banco essencialmente urbano e reconhecermos a importância da valorização do transporte ativo para o desenvolvimento sustentável das cidades, definimos mobilidade urbana como um pilar de investimento dentro de nossa plataforma de sustentabilidade e fomentamos o amadurecimento da cultura de integração das bicicletas ao modelo de transporte das cidades de forma conjunta com o poder público e com a sociedade, buscando influenciar políticas públicas que promovam o uso da bicicleta no dia a dia das pessoas. Itaú Unibanco. CEBRAP Presidência Angela Alonso Diretoria Científica Carlos Torres Freire Diretoria Administrativa Graziela Castello Equipe da pesquisa “Impacto social do uso da bicicleta no Rio de Janeiro” Carlos Torres Freire (coordenação), Graziela Castello, Monise F. Picanço, Paula Santana Santos, Victor Callil Agradecimentos Equipe Itaú: Cícero Araújo, Luciana Nicola, Simone Gallo Azevedo, Helen Faquinetti Costa, Natália Cerri Oliveira, Guilherme Monacelli Cipullo Revisão Otacílio Nunes Projeto Gráfico Eduardo Asta Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Torres-Freire, Carlos Impacto social do uso da bicicleta no Rio de Janeiro [livro eletrônico] / Carlos Torres Freire, Victor Callil, Monise Fernandes Picanço ; [coordenação Carlos Torres Freire]. -- São Paulo : CEBRAP, 2019. 1,5 MB ; eBook "Apoio Itaú, realização e edição CEBRAP". Bibliografia ISBN 978-85-62676-29-1 1. Bicicletas 2. Bicicletas - Aspectos sociais 3. Ciclovias - Rio de Janeiro (RJ) 4. Ciências sociais 5. Mobilidade urbana 6. Transporte urbano Política - Rio de Janeiro (RJ) 7. Projeto Desafio Mobilidade Itaú-Cebrap 2018 I. Callil, Victor. II. Picanço, Monise Fernandes. III. Freire, Carlos Torres. IV. Título. 19-27877 CDD-388.453 Índices para catálogo sistemático: 1. Transporte por bicicleta em cidade do Rio de Janeiro : Mobilidade urbana 388.453 Maria Alice Ferreira - Bibliotecária - CRB-8/7964 ÍNDICE 1. Introdução p.7 2. Desenho e metodologia da pesquisa p.8 2.1. Impacto do uso da bicicleta no meio ambiente p.9 2.2. Impacto do uso da bicicleta na saúde p.10 2.3. Impacto do uso da bicicleta na economia p.11 3. Perfil: população e viagens p.12 3.1. Perfil da população e dos ciclistas p.13 3.2. Perfil de viagens p.14 3.2.1. Tipos de viagens p.16 4. Projeções de impacto do uso da bicicleta: meio ambiente, saúde e economia p.18 4.1. Meio ambiente p.18 4.1.1. Bem-estar: experiências de conforto e desconforto nos deslocamentos pela cidade p.19 4.1.2. Bem-estar: interação com espaço público, percepção de segurança no cotidiano e percepções de problemas da cidade p.22 4.1.3. Emissão de CO2 por modo de transporte p.24 4.2. Saúde p.27 4.2.1. Perfil de atividade física de ciclistas e da população do Rio de Janeiro p.28 4.2.2. Economia no SUS com doenças cardíacas e diabetes p.29 4.3. Economia p.31 4.3.1. Impacto individual do uso da bicicleta como meio de transporte e aumento da renda disponível p.31 4.3.2. Impacto social do uso da bicicleta como meio de transporte e aumento do PIB p.32 5. Percepções sobre o uso da bicicleta p.36 5.1 Disposição e motivação para adoção da bicicleta entre a população do Rio de Janeiro que não usa bicicleta p.36 5.2. Motivos para o uso da bicicleta entre ciclistas e satisfação em relação a ciclovias p.38 6. Considerações finais p.40 7. Referências bibliográficas p.41 APRESENTAÇÃO Este trabalho apresenta a Pesquisa de Impacto do Uso da Bicicleta na Cidade do Rio de Janeiro, conduzida em 2018 pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), com patrocínio do Banco Itaú Unibanco. São Paulo foi a primeira cidade em que o estudo foi realizado, em 2017. Agora foi a vez do Rio de Janeiro. A pesquisa foi elaborada a partir de entrevistas domiciliares, com indivíduos de 16 anos ou mais, e amostragem com dois grupos distintos: população do município do RJ e ciclistas. Ela permite verificar as condições de deslocamento dos cariocas e medir os impactos individuais e sociais do uso da bicicleta no meio ambiente, na saúde e na economia. A pesquisa mostra que a bicicleta está presente em 3% das viagens realizadas cotidianamente no Rio de Janeiro e que, ao longo da semana, 3,4% da população utiliza a bicicleta como meio de transporte. APRESENTAÇÃO Os ciclistas cariocas têm ainda uma relação mais positiva com a cidade: fazem mais atividades ao ar livre e apresentam sensações de estresse e desconforto em menor frequência que a população carioca. O uso da bicicleta não impacta apenas a sensação de bem-estar nos deslocamentos, mas também traz ganhos ao meio ambiente. Se a parcela da população carioca que mais utiliza veículos motorizados individuais (automóvel como passageiro ou motorista, táxi/app ou moto) e ônibus utilizasse a bicicleta em todos os trajetos de até 8 km, a cidade teria uma redução de 18% na emissão de CO2. 6 Já no tema economia, calculamos os ganhos no orçamento pessoal dos indivíduos caso passassem a realizar as viagens pedaláveis de seu cotidiano por meio da bicicleta. Nesse caso, a troca favoreceria principalmente os cariocas das classes C/D (Critério Brasil), que reduziriam seus gastos com transporte de 18% para 4% da renda pessoal, uma economia em média de R$ 151 mensais. Além disso, caso a população que utiliza veículos motorizados passasse a realizar suas viagens pedaláveis de bicicleta, o tempo economizado nos trajetos tem potencial produtivo de R$ 525 milhões, o que poderia promover um aumento de 0,16% do PIB da cidade do Rio de Janeiro. As projeções realizadas na pesquisa não esgotam as possibilidades de estudo de impacto do uso da bicicleta no Rio de Janeiro. Novas pesquisas podem ajudar a mensurá-lo e outros modelos de cálculo permitiriam compreender o impacto da bicicleta em gastos com outras doenças que não envolvam o aparelho circulatório e diabetes, ou mesmo o impacto da bicicleta por setor de atividade econômica (indústria, comércio e serviços). Há, assim, uma ampla agenda de pesquisa para dimensionar os impactos do uso da bicicleta na cidade e na vida de seus cidadãos. No que diz respeito à saúde, verificamos que os ciclistas são mais ativos fisicamente do que a população carioca. Caso toda a população passasse a ter o mesmo padrão de atividade física que o dos ciclistas, haveria uma economia de até 19% dos custos do SUS municipal com internações ocasionadas por doenças do aparelho circulatório e diabetes. Isso equivale a uma economia de R$ 7,7 milhões por ano. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Em 2017, o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) desenvolveu, com o patrocínio do Itaú, uma metodologia para aferir os possíveis impactos do uso da bicicleta como meio de transporte na vida das cidades. Partindo de uma série de estudos, verificamos as maneiras pelas quais o aumento da prática do ciclismo como meio de transporte contribuiria positivamente em três áreas de interesse: meio ambiente, saúde e economia. Em cada uma dessas áreas, analisamos os impactos individuais do uso da bicicleta, ou seja, aqueles que dizem respeito à vida das pessoas, e os impactos sociais, isto é, os ganhos obtidos pela sociedade como um todo caso a bicicleta fosse utilizada de maneira mais frequente como meio de transporte pela população. São Paulo foi a primeira cidade em que foi aplicado esse estudo, publicado em 2018 (Torres-Freire et al., 2018). Na capital paulista, aferimos que a bicicleta poderia reduzir em até 18% o volume de CO2 oriundo dos transportes de passageiros na cidade. Além disso, poderia reduzir em mais de R$ 34 milhões os gastos municipais com doenças do aparelho circulatório e diabetes. Um uso mais intenso da bicicleta para mobilidade urbana poderia impactar positivamente o PIB paulistano em aproximadamente R$ 870 milhões. Agora foi a vez do Rio de Janeiro de ser a base do estudo sobre o impacto da bicicleta. Utilizando a mesma metodologia, com alguns aperfeiçoamentos, a equipe do Cebrap aplicou a pesquisa na cidade do Rio de Janeiro em 2018. Averiguamos que a bicicleta aparece em 3% das viagens realizadas cotidianamente na cidade e que 3,4% da população utiliza a bicicleta como meio de transporte ao longo da semana. Embora a cidade possua mais de 400 km de infraestrutura cicloviária e sistemas de bicicleta compartilhada, ainda carece de políticas voltadas para o incentivo ao ciclismo urbano. Um dos principais objetivos deste trabalho é justamente mensurar quanto a bicicleta impactaria a cidade caso seu uso como meio de transporte fosse maior. Ao abordarmos a temática meio ambiente, consideramos como impactos individuais as sensações que os indivíduos têm ao transitar pela cidade. Ou seja, verificamos com que frequência os indivíduos têm sensações positivas ou negativas em seus deslocamentos. Já no campo dos impactos sociais, medimos a redução potencial da emissão de CO2 caso a bicicleta fosse adotada como meio de transporte em viagens pedaláveis, critério definido por Amigo (2018) a partir de adaptação de estudos da Transport for London (2016). No tema saúde, verificamos o impacto individual da bicicleta a partir da comparação do nível de atividade física entre os ciclistas com aquele da população carioca como um todo. Vale lembrar que nosso conceito de ciclista contempla o indivíduo que fez pelo menos uma viagem de bicicleta para qualquer propósito no dia anterior à aplicação da pesquisa de campo. Logo, os ciclistas que responderam a essa pesquisa não necessariamente são pessoas que andam de bicicleta todos os dias. Em relação aos impactos sociais na saúde, verificamos a economia que seria obtida pelo SUS municipal se a população utilizasse mais a bicicleta como meio de transporte. Essa economia seria possível porque o aumento do nível de atividade física reduz as probabilidades de doenças do aparelho circulatório e diabetes, diminuindo assim os gastos públicos com tais doenças. Já na economia, ao tratar da dimensão individual, calculamos os ganhos no orçamento pessoal dos indivíduos caso passassem a realizar as viagens pedaláveis de seu cotidiano usando a bicicleta. Na dimensão social, por meio da metodologia da “produção sacrificada”, de Vianna e Carusi (2017) e Firjan (2014), estimamos a contribuição da bicicleta para o aumento do PIB municipal caso fosse adotada pela população que viaja com outros meios de transporte, mas que teria uma viagem mais rápida caso o fizesse pedalando. 1. INTRODUÇÃO 1. INTRODUÇÃO 7 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Ressaltamos que as projeções apresentadas na pesquisa não esgotam as possibilidades de análise de impacto do uso da bicicleta na cidade do Rio de Janeiro. Outras medidas poderiam ser calculadas. Um exemplo disso é o estudo da ONG Transporte Ativo sobre ciclologística e entrega por bicicletas no bairro de Copacabana em 2011. Na ocasião, descobriu-se que mais de 11 mil entregas são realizadas por bicicleta na região, o que mostra a importância que o uso da bicicleta como instrumento de trabalho tem para economia local. 2. DESENHO E METODOLOGIA DA PESQUISA Vale destacar, mais uma vez, que este é o segundo estudo de impacto do uso da bicicleta em uma cidade brasileira. Realizar estudos com o mesmo instrumento de pesquisa, em diferentes cidades, permite a comparação do impacto do uso da bicicleta a partir de contextos de mobilidade distintos. Esse empreendimento é raro entre estudos de mobilidade e traz ganhos analíticos para a compreensão do impacto do uso da bicicleta não só para a população carioca como para a de outras cidades. 8 Além desta introdução, o presente documento se divide em mais seis partes. Na segunda, tratamos do desenho e da metodologia da pesquisa. Na terceira, abordamos o perfil da população investigada e das viagens observadas. Já na quarta parte, apresentamos as projeções de impacto do uso da bicicleta nas três áreas: meio ambiente, saúde e economia, com suas respectivas metodologias de cálculo. Em seguida, desenvolvemos uma análise a respeito da percepção da população sobre o uso da bicicleta, além da disposição e da motivação para sua adoção entre não ciclistas, assim como das motivações para o uso da bicicleta entre ciclistas. Por fim, encerramos o trabalho com um balanço dos principais achados nas considerações finais. 2. DESENHO E METODOLOGIA DA PESQUISA Para a coleta de dados, realizamos uma pesquisa amostral domiciliar com 1.1001 entrevistas de indivíduos com 16 anos ou mais entre os dias 2 de setembro e 11 de outubro de 2018. Destas, uma parte foi direcionada à população geral da cidade do Rio de Janeiro (amostra regular) e outra ao grupo de usuários de bicicleta (amostra ciclistas), que serviu como grupo de comparação para nossas análises. A pesquisa considerou como usuários de bicicleta (os ciclistas) aquelas pessoas que realizaram viagem com bicicleta para deslocamento no dia útil anterior ao da entrevista. A amostra representativa da população da cidade do Rio de Janeiro (amostra regular) foi desenhada com 1.000 entrevistados. Para isso, realizou-se o sorteio de 100 setores censitários na cidade e foram aplicados 10 questionários em cada um deles. Para o grupo de 100 ciclistas (amostra ciclistas), as entrevistas foram realizadas no setor censitário vizinho ao sorteado. Essa estratégia permitiu, por um lado, captar a incidência do número de ciclistas na cidade por meio da amostra regular e, por outro, compreender as características desse grupo de modo a considerar ciclistas de todas as regiões da cidade (amostra ciclistas). 1) A margem de erro é de 3 p.p, com 95% de confiança. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 1. Geral: perguntas sobre o perfil demográfico da população da amostra; 2. Problemas da cidade: perguntas sobre a percepção dos entrevistados em relação aos principais problemas existentes na cidade do Rio de Janeiro e aos problemas que mais os afetam pessoalmente; 3. Economia: perguntas sobre orçamento pessoal e familiar do entrevistado; 4. Mobilidade: perguntas sobre: a) os trajetos e modais utilizados pelos entrevistados em todos os deslocamentos realizados por eles no último dia útil anterior ao da aplicação do questionário; b) sensações no deslocamento; c) custos com transporte; d) frequência semanal de uso dos modais; 5. Saúde: perguntas do Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ) reduzido, desenvolvido para identificar o nível de atividade física da população; 6. Bem-estar: perguntas sobre o tempo de exposição dos entrevistados em espaços públicos; 7. Violência: perguntas sobre a sensação de segurança dos entrevistados na cidade; 8. Ciclistas: perguntas direcionadas, especificamente, àqueles que utilizaram bicicleta como meio de transporte no dia útil anterior ao da aplicação do questioIMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP nário. Os entrevistados foram indagados sobre: a) tempo que utilizam bicicleta como meio de transporte; b) motivações que os fazem usar a bicicleta; c) frequência com que pedalam; d) percepções sobre a infraestrutura para o pedal na cidade. A partir da pesquisa com os dois grupos (população do município do Rio de Janeiro x ciclistas), foi possível comparar diferentes indicadores de condições e qualidade de vida para aferir os impactos individuais do uso de bicicleta e, simultaneamente, projetar o impacto nas dinâmicas sociais mais gerais, combinando estimativas populacionais, econômicas e gastos públicos. 2.1 Impacto do uso da bicicleta no Meio Ambiente Os possíveis impactos do uso da bicicleta no meio ambiente foram calculados a partir de duas frentes: 1. A percepção da experiência de vida e bem-estar na cidade, considerando a dimensão individual de análise; 2. A redução da emissão de CO2 oriundo dos meios de transporte na cidade para a dimensão social de análise. Os indicadores definidos para a comparação entre ciclistas e população carioca sobre suas experiências com a cidade e sensação de bem-estar foram: tempo de exposição ao ar livre (outdoor) declarado pelos entrevistados de cada um dos grupos e sensação de bem-estar apresentada em seus deslocamentos. 2. DESENHO E METODOLOGIA DA PESQUISA Para garantir a representatividade da população e a comparabilidade entre os grupos, definimos as amostras probabilísticas com cotas no setor censitário (sexo, idade e escolaridade). As amostras da população geral do Rio de Janeiro e do grupo de ciclistas foram ponderadas a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2015. A coleta de dados foi efetuada por meio da aplicação de questionário estruturado organizado em oito blocos: 9 Figura 1 – Dimensões e indicadores em Meio Ambiente Dimensões Individual Social Indicadores Análise de Impacto Bem-estar no deslocamento Percepções de conforto e desconforto nos deslocamentos cotidianos pela cidade Bem-estar pelo tempo de exposição ao ar livre (outdoor) Interação com espaço público aberto Percepção de segurança no cotidiano Percepção de problemas da cidade Total de CO2 emitido por modal Redução na emissão de CO2 a partir da troca para bicicleta nos deslocamentos A análise foi encaminhada nessa direção de modo a trabalhar com a hipótese de que há diferenças entre as populações estudadas no que se refere a: fruição em espaços públicos abertos, sensação de segurança, percepção sobre problemas da cidade e percepção sobre conforto nos deslocamentos cotidianos (Barros, 2014; St. Louis et al., 2014). 2. DESENHO E METODOLOGIA DA PESQUISA Em relação à dimensão social, buscamos identificar qual seria a redução na emissão de CO2 caso se consolidasse a substituição do uso de automóveis e ônibus por bicicletas em viagens para deslocamento pela cidade com características de potencial ciclável. 10 2.2 Impacto do uso da bicicleta na Saúde Os possíveis impactos do uso da bicicleta na saúde foram calculados adotando-se como dimensão de análise o contraponto entre sedentarismo e vida ativa. Estudos na área da saúde apontam melhores indicadores para pessoas com maiores níveis de atividade física (Arem et al., 2015; Ekelund et al., 2015). Buscamos trabalhos acadêmicos que identificavam possíveis impactos da atividade física para aqueles que realizam deslocamentos por bicicleta. A partir disso, utilizamos o indicador de distribuição da população entre inativos, irregularmente ativos e ativos para medir o impacto do uso da bicicleta na saúde em sua dimensão individual. A análise dos impactos da atividade física pelo uso da bicicleta foi, então, realizada por meio da comparação entre o perfil de atividade dos ciclistas e o da população geral. Para medir os impactos na saúde em sua dimensão social, levantamos os gastos do Sistema Único de Saúde (SUS) do município do Rio de Janeiro com Autorização de Internação Hospitalar (AIH) referentes às “doenças do aparelho circulatório” (capítulo IX, códigos 100 a 199 no Datasus) e às “doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas e lista de morbidades referente a todos os tipos de diabetes” (capítulo IV no Datasus). A partir desses dados e do nível de atividade física da população geral e do grupo de ciclistas, estimamos as probabilidades de ocorrência dessas doenças nos grupos. Em seguida, calculamos o potencial de economia no sistema público de saúde caso a população geral tivesse o perfil de atividade física dos ciclistas. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Figura 2 – Dimensões e indicadores em Saúde Dimensões Indicadores Análise de Impacto Individual Distribuição da população em: sedentário, moderadamente ativo, ativo Comparação entre a população do RJ e grupo de ciclistas Social Inatividade física como fator de risco associado a doenças Projeção da potencial economia de recursos no sistema de saúde 2.3 Impacto do uso da bicicleta na Economia Na dimensão individual, verificamos como o uso da bicicleta poderia impactar a renda disponível2 do indivíduo. Considerando que deslocamentos por bicicleta podem ser realizados a custo zero, já que não há gastos com combustíveis ou tarifas – a despeito de um baixo custo de manutenção esporádico –, verificamos que há um potencial de economia da renda pessoal tanto de usuários de transporte público como daqueles de transporte motorizado privado. Isso significa um aumento da renda disponível do indivíduo para consumo com outros bens que não transporte. então, em nossa amostra, indivíduos que teriam um tempo de deslocamento menor caso tivessem realizado a sua viagem por bicicleta e verificamos quanto esse decréscimo de tempo de deslocamento representaria em termos de possibilidade de aumento do PIB municipal do Rio de Janeiro.3 Na próxima seção, apresentamos os perfis dos grupos analisados e de suas respectivas viagens. Figura 3 – Dimensões e indicadores em Economia Dimensões Indicadores Análise de Impacto Individual Gasto individual com transporte Aumento da renda disponível Social “Produção sacrificada” associada ao desperdício no tempo de deslocamento individual Projeção de potencial aumento do PIB 2) Renda disponível é a renda pessoal do indivíduo menos os impostos. 3) Até o momento da elaboração dos cálculos para esta pesquisa, o dado mais recente disponível publicado do PIB municipal do município do Rio de Janeiro era o de 2016. Os dados foram deflacionados pelo IPCA. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 2. DESENHO E METODOLOGIA DA PESQUISA No que se refere à dimensão social, utilizamos o modelo de “produção sacrificada”, assumindo que o tempo parado no trânsito poderia ser gasto trabalhando caso o indivíduo não estivesse ali. Essa “produção sacrificada” pode ser monetizada a partir do salário-hora dos trabalhadores (Vianna e Carusi, 2017; Firjan, 2014). Dessa forma, indivíduos que se deslocassem mais rápido para o trabalho poderiam contribuir para o aumento do nível de produtividade da economia (PIB). Identificamos, 11 3. PERFIL: POPULAÇÃO E VIAGENS Figura 4 – Conceito de viagem e trecho (exemplo) Casa Nesta seção, descrevemos o perfil socioeconômico e o perfil de viagens da população do Rio de Janeiro e do grupo de ciclistas. A coleta dos dados teve como base o questionário da pesquisa Origem-Destino, realizada pelo Metrô a cada 10 anos na região metropolitana de São Paulo. Esse instrumento captura todos os deslocamentos do indivíduo no dia útil anterior à pesquisa, fornecendo assim uma fotografia dos deslocamentos no cotidiano da cidade. Trecho 1 Ônibus Consideramos como viagens os trajetos realizados entre um ponto A e um ponto B com uma motivação específica. Dessa maneira, se o indivíduo saiu de casa e foi direto para o trabalho, conformou-se uma viagem. Caso o indivíduo tenha, por exemplo, deixado filho na escola e de lá seguido para o trabalho, duas viagens são contabilizadas. 3. PERFIL: POPULAÇÃO E VIAGENS Outro conceito importante para as análises realizadas neste trabalho (em especial na seção de meio ambiente) é o de trecho. Ele se refere a frações do caminho entre o ponto A e o ponto B onde houve troca de modal. Por exemplo: para ir ao trabalho, uma pessoa pega um ônibus na origem, troca para um metrô e anda mais de 500 metros até o destino. Essa viagem possui três trechos. O primeiro, de ônibus, o segundo, de metrô, e o terceiro, a pé. Para compormos o grupo de comparação (amostra ciclista), consideramos ciclistas aqueles indivíduos que necessariamente realizaram ao menos um deslocamento com a bicicleta no dia anterior à pesquisa. Além disso, captamos a existência de ciclistas no município do Rio de Janeiro para além da amostra de ciclistas, ou seja, também coletamos informações sobre viagens de bicicleta no dia anterior à pesquisa de pessoas que não faziam parte do grupo previamente selecionado de ciclistas. Trecho 2 Viagem Metrô Trecho 3 A pé Trabalho 12 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP A população do Rio de Janeiro e o grupo de ciclistas apresentam grandes semelhanças no que diz respeito a composição por classe (Critério Brasil) e escolaridade. Essa semelhança permite comparações entre os dois grupos, uma vez que os aspectos socioeconômicos não trarão vieses às análises realizadas. Gráfico 1 – População do Rio de Janeiro e ciclistas por classe e escolaridade Classe AB População 13% MRJ C Ciclistas 9% 56% Gráfico 2 – Uso dos transportes na semana anterior à pesquisa População MRJ Ciclistas 31% 35% VLT Fundamental Fundamental Médio incompleto completo completo Superior completo 22% 6% 9% BRT Trem Escolaridade 41% Ônibus público Metrô DE 56% transporte em relação ao total de viagens da cidade, esse dado é importante porque permite vislumbrar a incidência do uso de cada modal pela população. 9% 2% 5% 7% 0% 1% Ônibus 1% fretado 0% Automóvel (motorista) 13% 11% 6% Automóvel (passageiro) 11% 11% A distribuição dos grupos em relação à classe é bastante similar, havendo apenas uma leve distinção na proporção das classes AB e DE. Já as diferenças observadas nos estratos de escolaridade são mais nítidas, sendo maior a proporção de ciclistas com ensino médio completo e pequena a proporção de ciclistas com ensino superior completo, quando comparados os dados do grupo de controle e os da população geral. Taxi, app (uber, 99, etc.) 10% 6% População 20% MRJ Ciclistas 15% 21% 26% 43% 53% 15% A leitura do Gráfico 1 leva a crer que a população carioca apresenta uma proporção maior de pessoas mais escolarizadas em relação aos ciclistas. Além disso, os ciclistas apresentam uma proporção ligeiramente menor de pessoas no estrato socioeconômico mais rico (AB). Sobre o perfil de mobilidade do público pesquisado, coletamos primeiramente informações sobre os meios de transporte utilizados pelos respondentes na semana anterior à pesquisa. Ainda que essa informação não permita mensurar a proporção de uso de cada meio de IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Moto 3% 3% 35% A pé (mais de 500 metros) Bicicleta própria 23% 3% 94% Bike Rio 1,4% 6% Outros (barca, balsa, etc.) 4% 5% Nenhum 13% 0% 3. PERFIL: POPULAÇÃO E VIAGENS 3.1 Perfil da população e dos ciclistas 13 A primeira informação que chama atenção é a proporção expressiva de indivíduos que usam transportes coletivos para seus deslocamentos: 68% da população se deslocou por meio de ônibus público, BRT, metrô, trem, VLT ou barcas.4 Entre os tipos de transporte coletivo mais utilizados está o ônibus público, modal usado por 41% da população na semana anterior. Uma explicação possível para a relevância do ônibus público entre os transportes coletivos é a densidade demográfica da região metropolitana do Rio de Janeiro. São 58 km de sistema de metrô (MetrôRio, 2018) e aproximadamente 270 km de trens metropolitanos (SuperVia, 2018), uma densidade de 1,8 mil habitantes por km². A título de comparação, a região metropolitana de São Paulo abriga 273 km de trilhos metropolitanos (CPTM, 2018), 96 km de metrô (Metrô, 2018; Via Quatro, 2019; Via Mobilidade, 2019) e apresenta uma densidade de 2,7 mil habitantes por km². 3. PERFIL: POPULAÇÃO E VIAGENS Quando observamos aqueles que recorreram ao transporte motorizado individual, verificamos que 33% da população usou automóvel (como passageiro ou motorista), táxi/Uber ou moto. Já aqueles que se locomoveram por meios de transporte ativo (a pé e de bicicleta) são cerca de 40% da população carioca, sendo a maioria formada por aqueles que realizaram viagens a pé (35%). 14 A incidência de uso de bicicleta na semana anterior, por sua vez, foi de 3,4% – 0,4 ponto percentual a mais do que a observada entre os paulistanos em 2017. Assim, embora as avaliações sobre infraestrutura cicloviária sejam piores e a sensação de insegurança seja maior do que em São Paulo (dados discutidos adiante neste relatório), existe uma proporção maior de ciclistas no Rio de Janeiro. A comparação do perfil de mobilidade do grupo de ciclistas com o da população carioca apresenta diferenças importantes. Além do esperado maior uso de bicicleta entre os ciclistas (94% a usaram na semana anterior), eles utilizaram transportes coletivos em uma proporção menor que a da população: considerando todos os modais coletivos, 46% dos ciclistas utilizaram transporte coletivo, em contraposição a 68% de uso da população carioca. Ainda que a proporção de viagens a pé entre os ciclistas seja menor que a da população, esse tipo de viagem constitui parte importante da mobilidade do grupo: quase um quarto dele realizou deslocamento desse modo na semana anterior à pesquisa. Por fim, vale dizer que o uso de transporte motorizado individual dos ciclistas (29%) é bastante semelhante ao da população (33%). Os dados apresentados são bastante coerentes com a realidade de uma grande cidade, onde a população tende a usar mais os transportes coletivos, com prevalência do sistema composto de ônibus, micro-ônibus e vans públicos em função de sua capilaridade. 3.2 Perfil de viagens Os cariocas realizam, em média, 2,2 viagens por dia, percorrendo uma distância média de 7 km em viagens que duram em torno de 36 minutos – em São Paulo, a distância média das viagens é de 7,4 km, com duração de 41 minutos. O tempo médio em São Paulo provavelmente é maior pelo fato de as viagens de ônibus na capital paulista terem duração muito maior (62 minutos, contra 45 minutos no Rio) com incidência semelhante de viagens (38% contra 37% no Rio). A coleta de informações sobre todas as viagens realizadas pelos respondentes no último dia útil anterior à aplicação do questionário, assim como dos deslocamentos e do uso dos diferentes modais de transporte na cidade, permite uma análise detalhada do cotidiano da mobilidade no Rio de Janeiro. Podemos destacar três evidências principais sobre a mobilidade na capital carioca. 4) Vale lembrar que esta resposta é múltipla, ou seja, o respondente pode escolher mais de um tipo de transporte. Logo, a somatória das percentagens no Gráfico 2 ultrapassa 68%. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Tabela 1 – Incidência dos modais utilizados e perfil da mobilidade na cidade* Modais MRJ (incidência na população) Duração da viagem em minutos Distância média em metros 19% MRJ (% de viagens em que os modais aparecem) 32% A pé 24 1.294 Bicicleta 1,5% 3% 25 2.319 Ônibus 23% 37% 45 8.718 Metrô/Trem/VLT 7% 11% 45 12.243 BRT 2,6% 4% 42 9.849 17% 33 6.918 Automóvel (motorista ou passageiro, próprio ou app) 11% Moto 2% 4% 28 8.426 Ciclistas (controle) - - 22 2.737 População MRJ - - 36 7.053 *Os dados das duas primeiras colunas não somam 100% porque uma pessoa pode usar mais de um modal de transporte por dia. O segundo achado se refere à alta proporção no uso do ônibus: é o modal mais utilizado em viagens pela população carioca, aquele com maior número de viagens e com a maior duração média das viagens, junto com metrô/trem/ VLT (Tabela 1). Essa informação permite uma comparação interessante: ônibus e metrô/trem/ VLT apresentam as maiores médias de duração de viagem: 45 minutos. Mas salta aos olhos o fato de as viagens nos trilhos apresentarem distância média 40% maior que a percorrida por ônibus. Ou seja, o ônibus leva o mesmo tempo que o sistema de trilhos para percorrer uma distância menor, o que acarreta uma jornada mais cansativa para seus passageiros. A terceira evidência que chama atenção é a baixa proporção do uso cotidiano do automóvel na população carioca, com uma incidência de 11% (Tabela 1), metade da proporção encontrada em São Paulo (22%). Além disso, as viagens de automóvel têm distância média pequena (7 km), menor inclusive que a das motos e maior apenas do que aquelas que envolvem mobilidade ativa (a pé e de bicicleta). Essa comparação entre uso de modos ativos (bicicleta e a pé), transporte público (ônibus, metrô/trem/VLT, BRT) e motorizado individual (automóvel como passageiro ou motorista, táxi/app, moto) merece uma atenção especial. Para tanto, fizemos uma análise específica organizando as preferências em grupos para entender a intensidade de uso dos diferentes tipos de transporte pela população carioca.5 5) Nos casos em que havia a mesma frequência de uso em dois ou três grupos da análise, demos prioridade para o transporte ativo, seguido pelo uso de transporte público e, por último, o uso de transporte motorizado individual. Isso significa que, se o indivíduo usou modos ativos em cinco dias da semana anterior e transporte motorizado individual também por cinco dias, entrou no grupo que usa mais mobilidade ativa. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 3. PERFIL: POPULAÇÃO E VIAGENS Primeiramente, os deslocamentos por modos ativos (a pé e de bicicleta) estão bastante presentes no cotidiano do carioca – em 35% das viagens. A bicicleta aparece em 3% das viagens e foi utilizada no dia anterior à pesquisa por 1,5% da população do Rio. Na capital paulista, em 2017, a incidência de uso da bicicleta era de 2% nas viagens e 1,2% na população. Uma tradição de uso interno em bairros, a proximidade com a orla do mar e a existência de uma rede cicloviária que favorece a mobilidade em alguns pontos importantes da cidade podem ser fatores que ajudem a explicar esse uso mais intenso da bicicleta no Rio (Tabela 1). 15 Tabela 2 – Perfil de deslocamento por média de viagens realizadas e renda Perfil de mobilidade % da população MRJ Média de viagens Usa mais modos ativos 33% 2,12 Renda Familiar per capita mensal 1.079 Usa mais transporte público 45% 2,29 1.271 Usa mais motorizado individual 22% 2,26 1.741 População MRJ - 2,19 1.242 A informação sobre renda é a que mais se destaca quando analisamos a população carioca a partir de seu perfil de mobilidade. A renda de quem usa mais modos ativos é 38% menor do que a renda daqueles que usam mais motorizados individuais e 15% menor do que aquela dos que usam mais transporte público. A Tabela 2 ilustra a ideia de que, de modo geral, os mais pobres utilizam mais modos ativos por falta de recursos para a tarifa dos transportes coletivos, os intermediários andam mais de transporte público por falta de recursos para adquirir um veículo próprio e os de maior renda adquirem o próprio veículo. 3. PERFIL: POPULAÇÃO E VIAGENS Vale dizer que, embora sejam utilizados com mais frequência por somente 22% da população, os motorizados individuais ocupam a maior parte do espaço das vias. Não há dados sobre isso na capital carioca, mas em São Paulo, por exemplo, apenas 24% da população usa mais motorizados individuais, enquanto 88% do espaço das vias é ocupado por automóveis (IEMA, 2017). 3.2.1. Tipos de viagem Assim como foi feito no estudo sobre a capital paulista, aplicamos o conceito de viagens pedaláveis aos deslocamentos coletados na cidade do Rio de Janeiro. Usando como referência a tipologia criada por Amigo (2018) a partir de estudos da Transport for London (2016), adaptamos uma classificação dividida em três grupos: facilmente pedaláveis, pedaláveis e não pedaláveis: 1. Viagens facilmente pedaláveis: de até 5 km, realizados entre 6 h e 20 h, por pessoas com até 50 anos; 2. Viagens pedaláveis: de até 8 km, realizados entre 6 h e 20 h, por pessoas com até 50 anos; 3. Viagens não pedaláveis: trechos que não se adéquam a nenhuma das classificações anteriores. Tomando-se por base essa tipologia, metade das viagens realizadas na cidade poderia ser feita por bicicleta, sendo que 41% das viagens são facilmente pedaláveis. O Rio de Janeiro tem um potencial pedalável expressivo, superior ao da capital paulista, que apresenta 42% de viagens passíveis de ser realizadas de bicicleta, das quais 35% são viagens facilmente pedaláveis. 16 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Gráfico 3 – Potencial pedalável das viagens realizadas na cidade do Rio de Janeiro Facilmente pedalável Pedalável Não pedalável 41,3% 8,2% 50,4% Como vimos anteriormente, o Rio de Janeiro é uma cidade onde as pessoas utilizam frequentemente o ônibus para se locomover. Dessas viagens, 27% têm até 5 km e 9% têm entre 5 km e 8 km. Isso significa que 36% dos deslocamentos feitos com ônibus têm potencial pedalável.6 Considerando apenas os modos motorizados individuais, verificamos um potencial pedalável ainda maior. Entre as viagens realizadas com automóvel7 ou moto, 40% seriam facilmente pedaláveis e 11% seriam pedaláveis. Esses dados evidenciam um contexto muito importante para as estimativas de impacto que faremos mais adiante em relação ao meio ambiente. 3. PERFIL: POPULAÇÃO E VIAGENS A cidade do Rio de Janeiro apresenta, portanto, um potencial pedalável significativo, inclusive nos trajetos realizados em transportes motorizados, importantes na matriz de deslocamentos do município. Conhecer o potencial da bicicleta como meio de transporte na capital fluminense dá a dimensão da ampla oportunidade de investir e promover o ciclismo urbano na cidade. 6) Esse percentual considera idade e horário das viagens. 7) Como motorista, passageiro, ou através de serviços de transporte como táxi e Uber. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 17 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA Esta parte do trabalho avalia o potencial impacto da bicicleta na cidade do Rio de Janeiro no meio ambiente, na saúde e na economia. As análises descritivas aqui apresentadas identificam o contexto atual do uso da bicicleta para cada uma das temáticas. Já as projeções têm, a cada tópico, as seguintes perguntas como norte para seu cálculo: se a população utilizasse mais a bicicleta, qual seria o ganho para os indivíduos? E o impacto social desse uso? 18 Em cada parte, detalharemos o processo de coleta de dados e sua organização para gerar os resultados aqui apresentados. As análises e projeções de impacto individual e social do uso de bicicleta no meio ambiente, na saúde e na economia para o Rio de Janeiro partiram de uma série de dados coletados ao longo do questionário que subsidia esta pesquisa. Os deslocamentos realizados no dia anterior à pesquisa estão na base das estimativas de potencial redução de CO2 e foram fundamentais para os cálculos do impacto na economia. Os dados referentes à saúde foram captados por meio de uma seção específica do questionário, em que foi reproduzida a versão reduzida do IPAQ (International Physical Activity Questionnaire), reconhecido internacionalmente. Os elementos que possibilitaram as comparações sobre vivência da cidade e experiência nos espaços públicos foram captados com perguntas fechadas, elaboradas estrategicamente para essa análise. É importante salientar que os caminhos metodológicos adotados nesta pesquisa foram fruto de um longo processo de estudo por parte dos pesquisadores e de busca por referências nacionais e internacionais consistentes e passíveis de adaptação para o caso da bicicleta no Rio de Janeiro. Esses estudos tornaram possível a primeira pesquisa de impacto do uso da bicicleta, realizada em São Paulo, e agora as escolhas foram aperfeiçoadas para a análise sobre o Rio de Janeiro. 4.1 Meio ambiente Em relação ao impacto individual no tema meio ambiente, analisamos as percepções de ciclistas e da população carioca em relação ao seu dia a dia na cidade e, de maneira mais específica, sobre as sensações de bem-estar durante deslocamentos cotidianos dos dois grupos. Já no que diz respeito ao impacto social, buscamos estimar a redução na emissão de gás carbônico já obtida pela presença dos ciclistas e qual seria o nível de redução desse poluente caso a população carioca adotasse um perfil de mobilidade por bicicleta em viagens pedaláveis. A dimensão individual do impacto do uso da bicicleta foi avaliada a partir dos aspectos positivos e negativos relacionados a experiências dos respondentes durante as viagens realizadas na cidade e de como a população geral carioca e os ciclistas se sentem ao trafegar pelo espaço público. Para construir essa análise, partimos de duas hipóteses centrais. A primeira trata da experiência do indivíduo no seu ambiente urbano como elemento constitutivo da sua qualidade de vida (Adams, 2013; Pacione, 2003). A segunda aponta a tendência de ciclistas estarem mais presentes em espaços públicos externos devido ao seu perfil de mobilidade, o que teria implicações em sua relação com o espaço urbano, que seria qualitativamente diferente daquela da população como um todo. Os resultados da pesquisa apontam essa diferença na relação com a cidade entre ciclistas e população em geral. Na comparação com a população do Rio de Janeiro, o grupo de ciclistas apresenta sensações negativas em menor frequência ao transitar pela cidade. As proporções dos ciclistas que sentem insegurança, desconforto, estresse ou irritação sempre ou quase sempre em seus deslocamentos são cerca de 10 pontos porcentuais menores que aquelas da população geral. Isso corrobora a segunda hipótese, ao mostrar que a maior exposição aos espaços públicos no deslocamento implica mais bem-estar para os ciclistas cariocas em relação à população em geral, que tem sensações negativas mais frequentes em seu trânsito na cidade (Gráfico 4a). Uma exceção é o medo de acidente, que está um pouco mais presente entre os ciclistas. Esse dado pode estar associado a um problema de insegurança pertinente à gestão do trânsito na cidade, que esteve na quarta posição em número de acidentes no país em 2017 (DPVAT, 2018). Gráfico 4a – Sensações negativas no deslocamento entre a população do MRJ e os ciclistas Raramente ou nunca Às vezes Sempre ou quase sempre Estresse ou irritação 28% 39% 28% 50% 32% População MRJ 22% Ciclistas Medo de atrasar 42% 30% 42% 36% 29% População MRJ 22% Ciclistas Desconforto 31% 42% 27% População MRJ 36% 47% 16% Ciclistas Insegurança (assalto, roubo, violência) 14% 24% 62% População MRJ 13% 34% 53% Ciclistas Medo de acidente 25% 39% 36% População MRJ 21% 43% 36% 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA 4.1.1. Bem-estar: experiências de conforto e desconforto nos deslocamentos pela cidade Ciclistas 19 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA Quando observamos as experiências no deslocamento da população carioca agrupando os indivíduos por perfil de mobilidade (usa mais modos ativos, usa mais transporte coletivo, usa mais transporte motorizado individual), verificamos as menores proporções de sensações negativas no grupo que usa mais modos ativos em seu deslocamento (Gráfico 4b). Por exemplo, 23% sempre ou quase sempre sentem estresse ou irritação, contra 39% de quem usa transporte coletivo e 38% de quem usa motorizado individual. Outra diferença que chama atenção é o medo de atrasar: entre usuários de modos ativos, 16% têm essa sensação sempre ou quase sempre, bem abaixo dos 42% no transporte coletivo ou dos 28% no motorizado individual. Proporções similares podem ser vistas na sensação de desconforto. 20 A menor proporção de indivíduos com sensação de insegurança e de medo de acidente é, no entanto, contraintuitiva, na medida em que o usuário de transporte ativo fica mais exposto à cidade que os demais (Gráfico 4b). A baixa insegurança vai também de encontro ao que se verifica nos dados de roubo na cidade do Rio de Janeiro (Instituto de Segurança Pública, 2018)8, onde, proporcionalmente, as pessoas que andam a pé são vítimas de roubo com uma frequência 82% maior do que a daqueles que estão dentro de veículos. Isso evidencia que a sensação de vulnerabilidade não está necessariamente associada à exposição a eventos de roubo no espaço público em si. Gráfico 4b – Sensações negativas no deslocamento por perfil de mobilidade da população Raramente ou nunca Às vezes Sempre ou quase sempre Estresse ou irritação Modos 33% ativos 45% Transporte 22% coletivo 23% 40% Motorizado 26% individual 39% 39% 38% Medo de atrasar Modos 49% ativos 35% Transporte 29% coletivo 29% Motorizado 44% individual 16% 42% 27% 28% Desconforto Modos 33% ativos 51% Transporte 24% coletivo 17% 39% Motorizado 33% individual 38% 42% 25% Insegurança (assalto, roubo, violência) Modos 17% ativos 31% Transporte 11% 21% coletivo Motorizado 11% 18% individual 53% 68% 71% Medo de acidente Modos 25% ativos 8) INSTITUTO DE SEGURANÇA PÚBLICA. ISP Dados Abertos: Estatísticas de Segurança. Disponível em: <http://www.ispdados.rj.gov.br/estatistica.html> Acesso em: 15 fev. 2019. 44% 31% Transporte 23% coletivo 39% 38% Motorizado 22% individual 39% 39% IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP A pesquisa também comparou a população do Rio de Janeiro e os ciclistas cariocas quanto às sensações positivas no deslocamento urbano. Aqui os resultados mostram semelhanças: em geral, os dois grupos apresentam baixos níveis de sensações positivas, ou seja, os deslocamentos no Rio parecem ser agradáveis para poucos. As diferenças entre os dois grupos aparecem apenas em sensações positivas ocasionais. Os ciclistas apresentam uma proporção de 10 pontos percentuais maior dos que, às vezes, têm sensações positivas em seus deslocamentos. Além disso, a proporção de ciclistas que raramente ou nunca sentem prazer, relaxamento ou satisfação ao se deslocar pela cidade é de, em geral, 15 pontos percentuais a menos que a da população carioca. Isso mostra que, mesmo que a sensação positiva no deslocamento seja pouco frequente, ela é mais presente entre os ciclistas do que na população em geral. Gráfico 5 – Sensações positivas no deslocamento Raramente ou nunca Às vezes Sempre ou quase sempre Prazer em transitar pela cidade 40% 46% 14% População MRJ 26% 57% 17% Ciclistas Relaxamento 44% 45% 11% População MRJ 31% 54% 15% Ciclistas Satisfação 39% 49% 12% 25% Ciclistas 62% 13% 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA População MRJ 21 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 4.1.2. Bem-estar: interação com espaço público, percepção de segurança no cotidiano e percepções de problemas da cidade Como vimos anteriormente, a presença frequente de sensações positivas no deslocamento da população carioca, mesmo entre os ciclistas, é rara. Isso, no entanto, não parece impedir o grupo de ciclistas de estar mais presente nos espaços públicos. Nas três situações analisadas, o grupo de ciclistas tem maior frequência em espaços públicos: parques, praças, feiras, praia, calçadão; ruas; bares ou restaurantes com cadeiras na calçada (Gráfico 6). A proporção de ciclistas que frequentam espaços públicos pelo menos uma vez por semana é, no mínimo, 1,4 vez a proporção da população carioca. Existe, portanto, maior disposição dos ciclistas para ocupar os espaços públicos da cidade, de modo que o incentivo ao uso da bicicleta pode, indiretamente, resultar em um incentivo ao uso do espaço público de modo mais amplo. 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA Gráfico 6 – Frequência com que realizam atividades ao ar livre (passear, praticar atividades físicas) 22 Pelo menos uma vez por semana Pelo menos uma vez por mês Menos de uma vez por mês Quase nunca/ nunca Parques, praças, feiras, praia, calçadão etc. População 29% MRJ 25% Ciclistas 48% 19% 21% 28% 15% 15% Bairros ou ruas População 22% MRJ 32% 19% Ciclistas 45% 29% 26% 10% 16% Bares ou restaurantes com cadeiras na calçada População 24% MRJ Ciclistas 34% 24% 18% 31% 34% 16% 19% Por outro lado, embora os ciclistas apresentem um perfil mais propenso ao uso de espaços abertos da cidade em relação ao da população geral, o mesmo não pode ser dito sobre a percepção de segurança na cidade. Ao serem questionados sobre quão seguro é o local onde moram e quão seguro é transitar pela cidade, os ciclistas apresentam as mesmas tendências da população carioca (Gráfico 7). Gráfico 7 – Sensação de segurança na cidade Bastante seguro Seguro o suficiente Não é muito seguro Não é nada seguro Pensando no seu dia a dia, no seu bairro ou comunidade, você acha que o local em que mora é: População 8% 16% MRJ 35% 41% Ciclistas 9% 16% 34% 41% Pensando no seu dia a dia, na vida na cidade do Rio de Janeiro, quão seguro você se sente ao transitar pela cidade: 2% 6% População 27% MRJ Ciclistas 24% 66% 67% 5% 4% Os dois grupos também são muito parecidos em sua percepção dos problemas da cidade como um todo. A segurança pública foi apontada como um problema para mais de 80% da população geral e dos ciclistas – uma proporção 10 pontos percentuais maior que a encontrada entre os paulistanos, em 2017. Mais da metade de ambos os grupos citou ainda a questão da saúde pública como um problema relevante. Essa percepção pode estar relacionada aos problemas de segurança pública da capital carioca, que acumula territórios em conflito, dominados por milícias, e mesmo por organizações de tráfico de drogas; além da delicada situação financeira na qual se encontra o estado fluminense, que reverberou na capital carioca em falta de investimento e manutenção de serviços públicos, forçando a população a conviver com um sistema de saúde precário e ineficiente. A crise no estado, bem como no município, pode IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Gráfico 8 – Percepções sobre principais problemas da cidade Gráfico 9 – Percepções sobre principais problemas da cidade que o afetam pessoalmente População MRJ Ciclistas Segurança/ violência/ criminalidade 79% 79% 57% 59% Serviços de saúde deficientes População MRJ Ciclistas 34% 33% Falta de emprego Segurança/ violência/ criminalidade 82% 82% 57% 54% Serviços de saúde deficientes 41% 42% Falta de emprego 25% 32% Corrupção Serviços de educação deficientes 18% 17% 22% 22% Corrupção Sistema de transporte público deficiente Má administração pública Serviços de educação deficientes Venda/ consumo de drogas 18% 20% 14% 8% 13% 20% 13% 13% Venda/ consumo de drogas 15% 10% A pobreza 9% 6% Má administração pública 15% 14% 8% 6% Sistema de transporte público deficiente Preço alto da energia / Aumenta todo mês 13% 13% A pobreza Preço alto da energia / Aumenta todo mês 11% 7% 4% 5% Os ciclistas e a população carioca também estão de acordo sobre os problemas que mais os afetam pessoalmente (Gráfico 9). Os dados obtidos aqui apresentam proporções semelhantes às dos problemas que mais afetam a cidade, com exceção dos transportes públicos, que aparecem em 5º lugar entre aqueles que mais afetam pessoalmente a população e os ciclistas cariocas – identificados como problema por cerca de um quinto da população carioca. Essa percepção de precariedade no sistema de transporte público, somada à proporção significativa de viagens pedaláveis na cidade carioca, permite apontar o uso da bicicleta como uma oportunidade para políticas públicas do Rio de Janeiro. Como vimos, a população do Rio de Janeiro e o grupo de ciclistas se assemelham no modo de compreender os problemas da cidade. Os ciclistas, no entanto, passam mais tempo expostos ao ar livre, têm menor frequência de sensações negativas nos seus deslocamentos e mais sensações positivas ao transitar pela cidade. A mobilidade por bicicleta, portanto, tem um impacto positivo no bem-estar individual no trânsito na cidade. 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA também estar relacionada à identificação da falta de empregos como um dos principais problemas na cidade – apontada por mais de 40% tanto da população como dos ciclistas (Gráfico 8). 23 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 4.1.3. Emissão de CO2 por modo de transporte pelo menos um dos trechos do trajeto para o modal bicicleta. O impacto social do uso da bicicleta no meio ambiente foi estudado a partir do potencial de redução da emissão de CO2. Duas medidas de impacto foram calculadas: uma considerando um cenário em que mais pessoas utilizassem bicicleta em seus deslocamentos cotidianos; e outra a partir da utilização atual da bicicleta para deslocamentos na cidade. Atualmente, serviços como bicicletários públicos e bicicletas compartilhadas permitem inserir a bicicleta como um modal de transporte de maneira flexível no cotidiano. Com esses equipamentos, as pessoas podem cumprir o chamado “first/last mile”10 de sua viagem pedalando. Ou seja, a viagem pode ser feita combinando modais, e não necessariamente precisa ser feita toda de bicicleta para gerar impactos sociais positivos. a) Potencial de redução na emissão de CO2 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA Os deslocamentos realizados por motorizados individuais e ônibus/BRT, passíveis de ser trocados por bicicleta, representam 18% de todo o dióxido de carbono emitido pelo transporte de passageiros da cidade do Rio de Janeiro. 24 Para realizar essa projeção, utilizamos os dados relativos aos deslocamentos dos entrevistados, os quais captamos de forma semelhante à do instrumento de pesquisa utilizado pelo Metrô de São Paulo em sua pesquisa de Origem-Destino. Trata-se de um questionário completo e validado, que vem sendo usado nas pesquisas do Metrô de São Paulo desde 1967, ou seja, conta com mais de 50 anos de testes e adequações. Utilizamos aqui a versão do questionário da Pesquisa de Origem-Destino de 2007 (Metrô, 2008). A estimativa foi calculada a partir dos trechos de viagem. Como explicado no início deste trabalho, trecho de viagem é o nome que se dá a cada etapa da viagem. Por exemplo, uma pessoa que sai de casa, pega um ônibus até o metrô e, depois, caminha 1 km até o trabalho faz uma viagem com 3 trechos: 1º) ônibus, 2º) metrô e 3º) a pé. Observar o potencial de redução de emissão de CO2 a partir de trechos pedaláveis de viagem permite identificar de forma mais precisa9 o impacto possível da mudança de No Rio de Janeiro, cerca de 30% dos trechos de viagens são realizados de modo ativo. Já aqueles realizados por veículos motorizados individuais (automóvel ou moto) representam um quinto de todos os trechos, e quase 40% de todos os trechos de viagens são realizados de ônibus ou BRT. Dessa forma, 59% dos trechos percorridos pelos cariocas são feitos por meio de veículos motorizados, o que gera emissões de gases poluentes. As distâncias percorridas nos trechos foram calculadas a partir do georreferenciamento de cada um dos pontos de origem e destino de cada trecho percorrido pelos respondentes. Trata-se de um trabalho bastante detalhado e muito importante, pois permite chegar o mais próximo possível da distância exata percorrida pelos indivíduos da amostra, o que, por sua vez, dá segurança para nossas estimativas de impacto. Já o cálculo da emissão de CO2 foi efetuado levando em consideração a média mundial de emissão de CO2 para automóveis e a emissão de ônibus municipais de São Paulo de 2012 a 2014, pois não existem dados de emissão de CO2 para a frota carioca. Os valores de emissão de CO2 para motos foram apurados por meio da calculadora da Eccaplan11 e os dados de emissão dos VLTs e BRTs foram calculados a partir do estudo da Anptrilhos (2017). Os valores de emissão 9) O estudo de impacto realizado na cidade de São Paulo (Torres-Freire et. al., 2018) considerava apenas as viagens completas passíveis de ser realizadas de bicicleta. 10) Trajeto pequeno (em geral realizado de ônibus ou mesmo a pé), entre a casa ou o trabalho da pessoa e o transporte estrutural (BRT, metrô, trem). 11) Disponível em <https://calculadora.eccaplan.com.br/>. Acesso em: 10 dez. 2018. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Gráfico 10 – Referência de emissões por modal por quilômetro por passageiro 130 Moto 88 Ônibus BRT 22% Motorizados individuais Metrô/Trem/VLT 37% 19% 2% 110 Automóvel VLT Participação na distância total percorrida pela população Paticipação nas emissões de CO2 Ônibus/BRT Emissão em cCO2e/pkm Metrô/Trem Gráfico 11 – Participação dos modais na distância percorrida pela população e nas emissões de CO2 6 4,5 15 A pé 0 Bicicleta 0 Fonte: Custos de energia, fontes renováveis e emissões de CO2 (apud Metrô, 2011; Metrô, 2018); ANPTrilhos (2017); calculadora Eccaplan (2018). Para entendermos o contexto de emissão de CO2 da capital fluminense, analisamos a distância percorrida pela população e o volume de emissão em cada modal. Essa análise é muito importante e permitiu identificar que os motorizados individuais são os mais ineficientes. Eles cobrem uma proporção pequena de distância (22%), ao mesmo tempo em que são responsáveis por uma parcela elevada da emissão de dióxido de carbono (37%). Já os ônibus são responsáveis por mais da metade da distância percorrida pela população (53%) e por 61% das emissões de CO2. O sistema de trilhos carioca é o mais eficiente entre os motorizados no quesito ambiental, com uma proporção de distâncias alta (19%) em relação a uma emissão de CO2 bastante baixa (2%). Por fim, os modos ativos representam 7% da distância percorrida e 0% das emissões (Gráfico 11). 53% 61% Bicicleta 1% 0% A pé (mais de 6% 500 metros) 0% Para calcular o impacto social do uso da bicicleta no meio ambiente, levamos em consideração a emissão de CO2 liberada por motorizados individuais, ônibus e BRTs somente em percursos que poderiam ser substituídos por bicicletas, cuja emissão do poluente é zero.12 Utilizamos como referência a classificação de viagens apresentada anteriormente (Transport for London, 2016; Amigo, 2018), adaptada para nosso estudo: 1. Trechos facilmente pedaláveis: de até 5 km, realizados entre 6 h e 20 h, por pessoas com até 50 anos; 2. Trechos pedaláveis: de até 8 km, realizados entre 6 h e 20 h, por pessoas com até 50 anos; 3. Trechos não pedaláveis: trechos que não se adéquam a nenhuma das classificações anteriores. 12) Optamos por não incluir o transporte sobre trilhos na análise dada a sua evidente eficiência em permitir o transporte da população em grandes distâncias respondendo por uma fração bastante pequena da emissão de CO2. Dado o volume trafegado, qualquer redução do número de passageiros nas linhas seria marginal na redução da emissão de CO2. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA média de CO2 aqui utilizados são de conhecimento público na literatura sobre o tema (Neun e Haubold, 2016; Vasconcellos, 2008) e foram calculados pela metodologia do GHG Protocol Brasil. Esse cálculo permitiu verificar a média de emissão por modal por passageiro por quilômetro rodado. 25 Verificamos que os modos motorizados individuais são responsáveis por 20% e os ônibus/BRT por 35% de todos os trechos de viagem. O restante dos trechos de viagem (45%) é realizado por outros modais. Ao separarmos os dados por modo de transporte, observamos que 51% dos trechos dos motorizados individuais e 37% dos trechos de ônibus/BRT poderiam ser trocados por bicicleta (Gráfico 12). Gráfico 12 – Proporção de trechos de viagens por modo de transporte da população do Rio de Janeiro e possibilidade de serem pedaláveis/facilmente pedaláveis 35% Ônibus/ BRT Ônibus/BRT 27% Facilmente pedalável 10% Pedalável Assim, constatamos que os 51% de trechos de viagens pedaláveis cumpridos por motorizados individuais levariam à redução de 9% de toda a emissão dos transportes de passageiros da cidade do Rio de Janeiro (Gráfico 13). Somamos então a este valor os 9% de emissão de CO2 oriundos dos ônibus/ BRT – que se referem aos 37% de trechos de viagens desse modal que poderiam ser realizadas por bicicleta. Logo, caso o potencial pedalável fosse atingido, haveria uma redução da emissão de CO2 de 18%. Gráfico 13 – Percentual de CO2 emitido por tipo de viagem e de modal (ônibus/BRT e automóvel) na cidade do Rio de Janeiro Facilmente Pedalável Pedalável Não Pedalável Motorizados individuais Ônibus/ BRT 5% 4% 28% 5% 4% 52% 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA 63% Não pedalável 20% Motorizados individuais 45% Outros modais Motorizados individuais 40% Facilmente pedalável 11% Pedalável O potencial de redução de emissão de CO2 por meio do uso mais intenso da bicicleta, como vimos, é notável (18%) na capital fluminense. Ainda assim, vale lembrar que, por se basearem na categorização de trechos pedaláveis, os cálculos possuem cortes de idade (50 anos) e horário de início das viagens (entre 6 h e 20 h). Isso significa que, se levássemos em consideração pessoas com mais de 50 anos e viagens 24 horas por dia, esse potencial poderia ser ainda maior. 49% Não pedalável 26 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Os dados coletados permitem também estimar quanto os ciclistas da capital carioca já economizam de CO2. Para fazer esse exercício, seguimos o seguinte procedimento: 1. Calculamos a distância D1 pedalada pelos ciclistas na população geral; 2. Aferimos como a população da cidade fez suas viagens; 3. Assumimos que a distância D1 seria realizada com o mesmo padrão de deslocamento da população da cidade; 4. Calculamos a emissão economizada tendo em vista o multiplicador do GHG Protocol Brasil. A bicicleta está presente em 3% das viagens realizadas na cidade do Rio de Janeiro e é utilizada no deslocamento de 1,5% da população da cidade. Seguindo a lógica de análise apresentada, estimamos que os ciclistas cariocas são responsáveis pela redução de 1% de todo o CO2 emitido pelo transporte de passageiros na cidade. Os exercícios aqui apresentados mostraram que a bicicleta pode ser uma importante ferramenta de política pública para o meio ambiente. A redução na emissão de gases do efeito estufa é uma agenda global. Como mostramos, o uso mais intenso da bicicleta para os trajetos cotidianos poderia proporcionar uma redução de até 18% do CO2 emitido pelo transporte de passageiros da cidade. Além disso, a bicicleta pode ajudar a promover uma relação mais positiva com o deslocamento na cidade. 4.2 Saúde A bicicleta pode ser um modal de transporte bastante eficiente quando está inserida em um arcabouço de políticas públicas que promovam seu uso. Do ponto de vista da qualidade de vida, a bicicleta propicia ao ciclista a possibilidade de se exercitar ao longo de deslocamentos que teriam de ser realizados de qualquer modo, sem a necessidade de incluir uma atividade física específica no seu cotidiano, como ir a uma academia, por exemplo. Para analisar o impacto do uso da bicicleta na saúde, estruturamos a pesquisa a partir da oposição entre sedentarismo e atividade física. Na perspectiva de impacto individual, comparamos os perfis de atividade física da população do Rio de Janeiro em geral e de ciclistas, com a hipótese de que o segundo grupo seria mais ativo. Já no que diz respeito à dimensão social, partimos da ideia de inatividade física como fator de risco associado a doenças e projetamos a potencial economia de recursos no sistema de saúde caso a população do Rio de Janeiro adotasse um perfil de atividade física semelhante ao dos ciclistas da cidade. Para medir o nível de atividade física, esta pesquisa utilizou um instrumento já validado pelos estudos em saúde: o Questionário Internacional de Atividade Física, em inglês International Physical Activity Questionnaire – IPAQ. Assim, por meio do IPAQ, pudemos mensurar o nível de atividade física dos ciclistas e também o da população carioca de modo geral. O questionário do IPAQ capta a quantidade de tempo que a pessoa gasta em dois tipos de atividade (Celafiscs, 200-?): 1. Moderadas: são aquelas que exigem algum esforço físico e fazem a pessoa respirar um pouco mais fortemente que o normal. Exemplos: pedalar leve na bicicleta, dançar, nadar, jogar vôlei recreativo, executar serviços domésticos em IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA b) Redução de emissão de CO2 atual 27 casa ou no quintal que façam aumentar um pouco o ritmo da respiração ou os batimentos cardíacos; 2. Vigorosas: são aquelas que precisam de um grande esforço físico e que fazem respirar muito mais fortemente do que o normal. Exemplos: correr, fazer ginástica aeróbica, jogar futebol, pedalar rápido na bicicleta, jogar basquete, executar serviços domésticos pesados em casa, no quintal ou cavoucar no jardim, carregar pesos ou qualquer atividade que faça aumentar muito o ritmo da respiração ou os batimentos do coração. A partir dos dados coletados, o IPAQ permite classificar os entrevistados em função do volume (tempo) e da intensidade (força exercida) das atividades físicas realizadas. Para as análises aqui apresentadas, utilizamos uma classificação que segmenta o grupo pesquisado da seguinte maneira (Bielemann et al., 2010; Garret et al., 2004): 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA 1. Regularmente ativos são aqueles que se encaixam em uma das condições a seguir: a. realizaram atividades vigorosas em pelo menos 3 dias na semana por pelo menos 20 minutos por dia; b. ou atividades moderadas em pelo menos 5 dias na semana por pelo menos 30 minutos por dia; c. ou realizaram qualquer nível de atividade em pelo menos 5 dias na semana por pelo menos 30 minutos por dia; 2. Irregularmente ativos: apresentam atividade física, mas menos do que o mínimo suficiente para serem considerados regularmente ativos; 4.2.1. Perfil de atividade física de ciclistas e da população do Rio de Janeiro Os ciclistas apresentam uma proporção muito maior de pessoas regularmente ativas em relação à da população carioca. Esse grupo é o que corre menos risco de contrair doenças relacionadas ao sedentarismo. É importante lembrar que consideramos ciclista qualquer pessoa que tenha feito qualquer viagem de bicicleta, ainda que curta, no dia anterior ao da pesquisa. Ou seja, não era necessário que a pessoa realizasse todos os seus deslocamentos por bicicleta, nem mesmo que usasse a bicicleta como meio de transporte todos os dias da semana. Ainda assim, entre os ciclistas, não há pessoas inativas e a proporção regularmente ativa é o dobro da observada na população do Rio (82% contra 41%) (Gráfico 14). Além disso, 61% do tempo de atividades físicas dos ciclistas provêm de seus deslocamentos de bicicleta. Ou seja, mais da metade do tempo que faz com que esses ciclistas sejam considerados regularmente ativos está associada diretamente ao fato de eles usarem a bicicleta como meio de transporte. Gráfico 14 – Perfil de atividade física da população Inativos Irregularmente ativos Regularmente ativos 16% 43% 41% Rio de Janeiro Ciclistas do Rio de Janeiro 18% 25% 82% 27% 48% São Paulo 3. Inativos: nenhuma atividade física na semana. 28 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Quando comparamos o perfil de atividade da população geral com o do grupo de ciclistas a partir do corte de renda, os achados são bastante interessantes. A comparação entre as proporções de regularmente ativos na população geral e no grupo de ciclistas mostra que, caso a população do Rio de Janeiro tivesse o mesmo nível de atividade dos ciclistas, os estratos de classes A/B e C/D teriam um aumento de cerca de 40 pontos percentuais na proporção de regularmente ativos (Gráfico 15). Ou seja, a bicicleta pode contribuir para o aumento da atividade física em geral, tanto entre os mais ricos como entre os mais pobres. Gráfico 15 – Proporção de regularmente ativos por classe social População Ciclistas C/D A partir de informações sobre o nível de atividade física da população coletadas na pesquisa, identificamos a proporção de inativos e de irregularmente ativos na população. Em seguida, aplicamos os fatores de risco para as doenças cardíacas e diabetes (Tabela 3). Para o cálculo de inatividade física, também consideramos as variáveis de gravidez e impossibilidade de prática de atividade. Por fim, elaboramos a projeção de gastos do SUS para o tratamento das doenças (a partir de gastos com Autorização de Internação Hospitalar – AIH), considerando a redução da população inativa e irregularmente ativa pelo aumento do uso de bicicleta para deslocamentos. 43% 86% 39% Tabela 3 – Fator de risco associado ao perfil de atividade física Perfil de atividade física 80% A bicicleta parece, portanto, influir fortemente no nível de atividade física dos indivíduos. Outra forma de avaliar o impacto da bicicleta na cidade do Rio de Janeiro é analisar quanto poderia ser economizado no Sistema Único de Saúde (SUS) no município se a população carioca reproduzisse o mesmo padrão de atividade física dos ciclistas, o que apresentamos a seguir. 4.2.2. Economia no SUS com doenças cardíacas e diabetes Grupos Doenças cardíacas 2,0 1,4 1,0 Hipertensão 1,5 1,2 1,0 Infarto 2,0 1,4 1,0 Depressão e Ansiedade 1,3 1,1 1,0 Diabetes 1,5 1,2 1,0 Câncer de Mama 1,5 1,2 1,0 Osteoporose 2,0 1,4 1,0 Câncer de Cólon 2,0 1,4 1,0 Fonte: Garrett et al. (2004) Estudos na área da saúde já constataram que uma pessoa regularmente ativa tem menos probabilidade de apresentar determinadas doenças (Bueno et al., 2016; Carlson et al., 2015; Codogno et al., 2015; Bielemann et al., 2010; Garrett et al., 2004). Entre essas doenças, estão as cardíacas e diabetes, focos de nossa estimativa de economia dos gastos no SUS. A estimativa do impacto de economia no sistema de saúde foi feita por meio da aplicação do fator de risco (relative risk), apresentado nos IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Inativo Irregularmente Regularmente ativo ativo 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA A/B estudos de Bielemann et al. (2010) e Garrett et al. (2004), que calcula o risco de uma série de doenças crônicas para os diferentes níveis de atividade física captados a partir do IPAQ. 29 Tabela 4 – Projeção de economia no SUS com doenças do aparelho circulatório e diabetes Doenças cardíacas Gastos SUS - Município do Rio de Janeiro (2016) Economia com redução de inativos Economia com redução de irregularmente ativos R$ 38.829.069 Cálculo (%Econ.) (Inativos SP% - Inativos Ciclistas%)*0,5 %Econ. 8% Valor Economia R$ 3.125.740 Cálculo (%Econ.) (Irr Ativos SP% - Irr Ativos Ciclistas%)*0,28 %Econ. 7% Valor Economia R$ 2.641.929 Total economizado R$ 5.767.669 Diabetes Gastos SUS - Município de São Paulo (2016) Economia com redução de inativos 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA Economia com redução de irregularmente ativos 30 R$ 1.848.967 Cálculo (%Econ.) (Inativos SP% - Inativos Ciclistas%)*0,33 %Econ. 5% Valor Economia R$ 98.235 Cálculo (%Econ.) (Irr Ativos SP% - Irr Ativos Ciclistas%)*0,16 %Econ. 4% Valor Economia R$ 71.887 Total economizado R$ 1.920.855 Os cálculos permitem estimar que, caso a população carioca tivesse o mesmo padrão de atividade física dos ciclistas, poderia haver uma economia de até 19% dos custos do SUS municipal com internações ocasionadas por doenças do aparelho circulatório e diabetes. Isso equivale a uma economia de R$ 7,7 milhões13 (Tabela 4). Essa estimativa não leva em consideração custos com medicamentos nem os gastos com outras doenças. Isso quer dizer que o impacto na saúde com o aumento do uso da bicicleta pela população poderia ser ainda maior. Gastos no SUS com Doenças do aparelho circulatório e Diabetes no Município do Rio de Janeiro (2018) Total economizado R$ 40.678.036,70 R$ 7.688.525,43 18,9% de economia Portanto, o uso da bicicleta para os deslocamentos oferece aos indivíduos a oportunidade de incluir a atividade física no seu dia a dia, promovendo uma vida ativa com mais qualidade e menores riscos de adquirir doenças crônicas. 13) Houve uma mudança na metodologia de cálculo em relação ao estudo sobre São Paulo (Torres-Freire et al., 2018). Aplicando-se a mesma metodologia de cálculo, a economia observada na capital paulista seria similar, de 18%. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP No caso da economia, o impacto individual do uso da bicicleta foi estimado a partir do aumento da renda disponível se os cariocas usassem a bicicleta em seus deslocamentos cotidianos. Para isso, utilizamos os dados obtidos das perguntas sobre orçamento familiar da pesquisa. Como veremos, os cariocas teriam um potencial aumento da renda disponível se adotassem a bicicleta como meio de transporte nas viagens passíveis de ser pedaladas. Para analisar o impacto social do uso da bicicleta na economia, utilizamos como referencial os trabalhos de Vianna e Carusi (2017) e Firjan (2014). Esses autores trabalham com o método denominado “produção sacrificada”14, que calcula o prejuízo resultante dos engarrafamentos, considerando que o tempo gasto no trânsito poderia ter sido utilizado para a produção. Esse tempo ocioso é monetizado atribuindo-se a ele um valor com base no valor da hora de trabalho da população estudada. Dessa maneira, a partir do tempo perdido nos deslocamentos, é possível estimar quanto deixou de ser produzido em relação ao PIB da região analisada. 4.3.1. Impacto individual do uso da bicicleta como meio de transporte e aumento da renda disponível A população teria um potencial de economia significativo caso deixasse seus meios de transporte habituais e passasse a se deslocar de bicicleta nos trechos pedaláveis. As pessoas que utilizam mais transporte público economizariam mais que os usuários de modos motorizados individuais, pois realizam mais viagens pedaláveis. A população que usa mais transporte público reduziria em 10 pontos percentuais a proporção de seus gastos mensais com transporte ao passar a usar a bicicleta nos trajetos cicláveis. Isso significa uma economia média mensal de R$ 150. Já para os usuários frequentes de veículos motorizados individuais, essa queda é de 5 pontos percentuais, com uma economia média de R$ 124 (Gráfico 16). Gráfico 16 – Potencial redução da renda pessoal gasta com transporte por perfil de deslocamento % médio da renda pessoal gasta com transporte % médio da renda pessoal gasta com transporte se as viagens pedaláveis fossem realizadas de bicicleta Usa mais motorizado Individual 15% R$ 124 Economia média mensal Usa mais transporte público R$ 150 Economia média mensal 17% 10% 7% Para analisar o impacto da bicicleta no orçamento do carioca, estimamos quanto a população do Rio de Janeiro poderia economizar se realizasse de bicicleta as viagens consideradas pedaláveis. Para tanto, calculamos o gasto diário da população com transporte e o substituímos por uma viagem (ou trecho de viagem) com bicicleta. A coleta dos dados sobre orçamento dos entrevistados foi fundamental para elaborarmos essa projeção. Nesse cálculo, consideramos gastos com transporte público, combustível e estacionamento. 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA 4.3 Economia 31 14) Houve uma mudança na metodologia de cálculo do impacto social na economia em relação ao estudo sobre São Paulo (Torres-Freire et al., 2018). IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Gráfico 17 – Potencial redução da renda pessoal gasta com transporte por classe do Critério Brasil % médio da renda pessoal gasta com transporte % médio da renda pessoal gasta com transporte se as viagens pedaláveis fossem realizadas de bicicleta Classe C/D Classe A/B R$ 147 Economia média mensal 14% R$ 151 Economia média mensal 18% 9% 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA 4% 32 E se as pessoas utilizassem a bicicleta dois dias por semana para realizar seus trajetos pedaláveis, qual seria a economia? Entre as classes C/D, haveria uma redução de cerca de 6 pontos percentuais em seus gastos mensais, com uma economia média de R$ 61 na renda mensal. Assim, verificamos que a bicicleta pode ser um instrumento importante para o incremento de renda, em especial, para pessoas de classes mais baixas. Esse grupo, mesmo pedalando apenas duas vezes por semana, teria um impacto considerável em sua renda pessoal. Vale dizer que mais de 20% das pessoas da classe C/D declararam que, caso gastassem menos com transporte, usariam o dinheiro para poupar. Existe, portanto, um anseio por parte dessa população de guardar e investir seu dinheiro. A diminuição dos custos com transporte permitiria concretizar essa ambição, beneficiando, assim, a saúde financeira da população. 4.3.2. Impacto social do uso da bicicleta como meio de transporte e aumento do PIB Uma forma de analisar o impacto da bicicleta na sociedade do Rio de Janeiro é verificar a influência no PIB do maior uso desse modal por sua população. Para isso, utilizamos a metodologia da “produção sacrificada”, que mede o prejuízo resultante dos congestionamentos nas cidades, considerando que o tempo desperdiçado no trânsito poderia ser utilizado para a produção econômica. Esse tempo ocioso é monetizado atribuindo-se a ele um valor com base no valor da hora de trabalho da população estudada. Dessa maneira, a partir do tempo perdido nos deslocamentos, é possível estimar quanto deixou de ser produzido em proporção do PIB da região analisada. Nesse sentido, existe um potencial econômico importante para o maior uso da bicicleta como meio de transporte. O Gráfico 18 mostra a proporção de viagens que seriam mais rápidas caso esses deslocamentos fossem realizados de bicicleta. Verificamos que 71% das viagens pedaláveis (com até 8 km) seriam mais rápidas se realizadas de bicicleta, com uma redução média de 13 minutos por viagem.15 Gráfico 18 – Duração das viagens de até 8 km em minutos caso elas fossem realizadas de bicicleta 6 Saldo tempo em minutios ao trocar por bicicleta O impacto de economia é ainda mais relevante quando observamos os resultados por classe social da população (Critério Brasil). Caso a classe C/D utilizasse a bicicleta em suas viagens pedaláveis, seu gasto mensal com transporte passaria de 18% para até 4%, uma diferença de 14 pontos percentuais em suas rendas pessoais, resultando, em média, em uma economia de R$ 151 – diferença maior que aquela observada entre indivíduos das classes A/B (Gráfico 17). 4 2 Este é o grupo que economizaria tempo 0 -2 -4 -6 -8 -10 15) Nesse cálculo estão incluídas todas as viagens de até 8 km, inclusive aquelas realizadas a pé. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 1. 19% das viagens de automóvel de até 8 km de ida ou volta para o trabalho seriam mais rápidas caso fossem realizadas por bicicleta. O tempo de produção renunciado com esse deslocamento significa um potencial produtivo de R$ 117 milhões, ou um aumento de 0,04% no PIB da cidade; 2. 26% das viagens de ônibus pedaláveis têm como motivação o trabalho e seriam mais rápidas de bicicleta. O tempo de produção renunciado com esse deslocamento tem um potencial produtivo de R$ 325 milhões, o que significaria um aumento de 0,10% no PIB municipal do Rio de Janeiro; 3. Considerando todos os meios de transporte motorizados (automóvel, moto, ônibus, BRT, metrô, trem e VLT), 23% das viagens motivadas por trabalho são pedaláveis e ficariam mais breves se fossem realizadas de bicicleta. Esse tempo de produção renunciado tem potencial produtivo de R$ 525 milhões, e promoveria um aumento de 0,16% do PIB da cidade. Figura 5 – Processo de cálculo para projeção econômica na troca dos motorizados individuais para bicicleta Modal a se trocar por bicicleta Motorizado individual VIAGENS % do total dos trechos de viagens com até 8 km que são de ida ou volta ao trabalho e seriam mais rápidas se realizadas de bicicleta 19% % do total de trecho de viagens do modal na cidade 13% % do total de trechos de viagens da cidade 2% PIB SACRIFICADO 118milhões R$ % do PIB municipal 0,04% 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA Para o cálculo do “PIB desperdiçado” por meio da “produção sacrificada”, consideramos apenas as viagens de ida ou volta para o trabalho. Chegamos aos seguintes resultados: 33 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Figura 6 – Processo de cálculo para projeção econômica na troca de ônibus para bicicleta Modal a se trocar por bicicleta Ônibus Modal a se trocar por bicicleta Todos os motorizados (públicos e individuais) VIAGENS VIAGENS % do total dos trechos de viagens com até 8 km que são de ida ou volta ao trabalho e seriam mais rápidas se realizadas de bicicleta % do total dos trechos de viagens com até 8 km que são de ida ou volta ao trabalho e seriam mais rápidas se realizadas de bicicleta % do total de trecho de viagens do modal na cidade % do total de trecho de viagens do modal na cidade 26% 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA Figura 7 – Processo de cálculo para projeção econômica na troca de todos os motorizados para bicicleta 15% 23% 13% % do total de trechos de viagens da cidade % do total de trechos de viagens da cidade PIB SACRIFICADO PIB SACRIFICADO R$ R$ % do PIB municipal % do PIB municipal 0,10% 0,16% 5% 325milhões 7,7% 525milhões 34 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Essas comparações dão dimensão do potencial do uso da bicicleta como meio de transporte, tanto como fator de economia de recursos quanto como fator de geração de riqueza. O Rio de Janeiro tem um grande potencial cicloviário. Embora a cidade tenha avançado bastante nos últimos 6 anos em implantação de infraestrutura cicloviária (Torres, 2019), ainda é bastante carente de conexões que permitam que as pessoas consolidem o uso da bicicleta no seu cotidiano. 16) Estimativa obtida a partir do valor gasto em construção de infraestrutura cicloviária da cidade de São Paulo dividido pela quilometragem implantada no período de expansão da malha (2014-2016). 17) A base de cálculo é o valor atualizado para 2016 (via IPCA) pela WTorre JK: <http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/08/ciclopassarela-que-liga-parque-ciclovia-e-inaugurada-em-sp.html>. Acesso em: 15 jan. 2019. 18) Considerando o preço médio de uma bicicleta elétrica de R$ 4.500. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 4. PROJEÇÕES DE IMPACTO DO USO DA BICICLETA: MEIO AMBIENTE, SAÚDE E ECONOMIA A bicicleta como meio de transporte tem, portanto, um potencial econômico expressivo para a cidade do Rio de Janeiro. Se 2% das viagens realizadas com automóveis fossem feitas por bicicleta, o PIB municipal teria um ganho potencial de até R$ 118 milhões. Esse recurso equivale, por exemplo, à construção de cerca de 470 km de ciclofaixas e ciclovias.16 O tempo produtivo ganho com aqueles que poderiam trocar o ônibus pela bicicleta geraria R$ 325 milhões ao PIB municipal, o suficiente para construir, aproximadamente, 47 ciclopassarelas.17 Outro exemplo seria considerar a troca de todas as viagens motorizadas que seriam mais rápidas se feitas pedalando. Nesse caso, o ganho no PIB seria de R$ 525 milhões, montante suficiente para comprar uma frota de mais de 116 mil bicicletas elétricas.18 35 5. PERCEPÇÕES SOBRE O USO DA BICICLETA Mostramos até agora como o uso mais frequente da bicicleta como transporte teria impactos relevantes na melhoria de diversos aspectos da vida dos cariocas e na cidade do Rio de Janeiro. Existem outras questões, entretanto, que tendem a dificultar a ampliação do uso da bicicleta. Esta seção, dividida em duas partes, dedica-se a analisar as percepções que levam ao uso do modal e também o que dificulta a maior utilização da bicicleta. A primeira parte trata da disposição e da motivação para a adoção de bicicleta como meio de transporte entre aqueles que não pedalam atualmente. A segunda parte busca entender o que levou os ciclistas a adotar a bicicleta como meio de transporte e o que os faz persistir no uso desse modal. 5. PERCEPÇÕES SOBRE O USO DA BICICLETA 5.1 Disposição e motivação para adoção da bicicleta entre a população do Rio de Janeiro que não usa bicicleta A despeito do potencial impacto da utilização da bicicleta, o processo de promoção do uso desse modal pela população será um grande desafio para o poder público e para movimentos sociais na cidade. Ainda que mais de 30% da população tenha se mostrado disposta ou muito disposta a abrir mão de outros modais e adotar a bicicleta em seus deslocamentos cotidianos, metade da população carioca não está disposta a fazer essa troca. Gráfico 19 – Disponibilidade para utilizar a bicicleta como meio de transporte entre não ciclistas Muito disposto Disposto Nem disposto, nem indisposto Com pouca disposição Sem nenhuma disposição Total 11% 21% Masc 14% 24% Fem 8% 16% De 16 a 34 15% 28% De 35 ou + 8% 17% Classe A/B 10% 22% Classe C/D 11% 19% 9% 11% 49% 10% 12% 41% 9% 10% 58% 10% 14% 33% 7% 10% 57% 7% 10% 51% 11% 15% 44% Há uma maior disposição para a adoção da bicicleta por homens de até 34 anos19, e os maiores níveis de rejeição estão entre as mulheres mais velhas. Esses dados vão ao encontro do que se sabe por meio das contagens realizadas no Rio de Janeiro ao longo dos últimos 10 anos (TA, 2009, 2011, 2012, 2013, 2016, 2017): a bicicleta é utilizada sobretudo por homens. Isso significa que as políticas cicloinclusivas precisam ser pensadas não apenas para promover o uso da bicicleta na população de forma geral, mas também considerando políticas específicas que promovam a diversidade de gênero e idade entre os ciclistas. Examinamos também quais fatores levariam as pessoas a utilizar a bicicleta como meio de transporte (Gráfico 20). Para os cariocas, a infraestrutura cicloviária apareceu como um ponto-chave para essa decisão, mesmo entre aqueles que mostraram pouca ou nenhuma disposição para pedalar. Em segundo lugar, aparecem a praticidade na locomoção e a exposição a menor violência na cidade. Isso sugere que a percepção sobre a violência na cidade afeta as escolhas de determinados modais na cidade. 36 19) Esse também foi o resultado em São Paulo. IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Gráfico 20 – O que levaria a utilizar a bicicleta como meio de transporte Muito dispostos e dispostos Infraestrutura viária p/ bikes (mais ciclovias, ciclovias melhores) 37% Menos violência na cidade (roubos) 21% Praticidade, conforto e rapidez 21% Se não tivesse restrições de acesso (financeiro, posse) 18% Comportamento no trânsito 18% Para economizar (gastar menos com transporte, combustivel) 9% Trajeto favorável geograf. (relevo, distan. curtas) 8% Motivação Pessoal (aprender a andar, coragem) 2% Lazer 2% Utilizaria apenas se não tivesse outra alternativa 1% Não sabe 1% Pouco ou nada dispostos Nada, não gosta, tem medo 61% Infraestrutura viária p/ bikes (mais ciclovias, ciclovias melhores) 13% Menos violência na cidade (roubos) 9% Comportamento no trânsito 9% 4% Utilizaria apenas se não tivesse outra alterantiva 3% Se não tivesse restrições físicas (saúde, idade) 3% Motivação Pessoal (aprender a andar, coragem) 2% Praticidade, conforto e rapidez 2% Se não tivesse restrições de acesso (financeiro, posse) 2% Não sabe 3% Quase um quinto dos cariocas apontou também o comportamento no trânsito e as limitações financeiras como razões para não utilizarem a bicicleta como transporte. Lembramos, mais uma vez, que o Rio de Janeiro figura entre as cidades com maior número de acidentes do Brasil, e os dados parecem refletir a percepção da população sobre a violência no trânsito carioca. A promoção da bicicleta como meio de transporte na cidade do Rio de Janeiro deve ocorrer, portanto, pela ampliação e pela melhoria da malha cicloviária existente, mas também precisa incluir outras ações que enfrentem problemas que inquietam a população, como a segurança pública e a violência no trânsito. 5. PERCEPÇÕES SOBRE O USO DA BICICLETA Trajeto favorável geograf. (relevo, distan. curtas) 37 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 5.2 Motivos para o uso da bicicleta entre ciclistas e satisfação em relação a ciclovias Mais de 80% dos ciclistas utilizam a bicicleta ao menos 5 vezes por semana (Gráfico 23). Isso indica que, a partir do momento em que as pessoas começam a usar a bicicleta, elas tendem a adotá-la cotidianamente. Existe, portanto, um real potencial de atração da bicicleta como modal alternativo. A maioria dos ciclistas (64%) utiliza a bicicleta como meio de transporte há mais de 4 anos (Gráfico 21). Como já apontavam nossas projeções, a bicicleta é percebida pelos ciclistas como um modal alternativo que permite a economia de tempo nos deslocamentos e de recursos financeiros, diminuindo os gastos com tarifas, combustíveis ou estacionamento (Gráfico 22). A preferência pela bicicleta em função da economia de tempo vai ao encontro do que já havíamos demonstrado sobre as sensações durante o deslocamento dos ciclistas na capital fluminense, que declararam ter medo de atrasar e desconforto com menos frequência que a população carioca como um todo. Gráfico 23 – Dias de uso da bicicleta (lazer ou transporte) Quantos dias por semana você utiliza bicicleta (lazer ou transporte)? 2 Dias 1% 3 Dias 42% Menos de 4 anos De 4 a 10 anos 10% 21% 5 Dias 6 Dias 12% 7 Dias 50% Você costuma usar a bicicleta: Gráfico 21 – Tempo de uso da bicicleta 36% 7% 4 Dias 2% Mais aos finais de semana 73% Tanto em finais de semana quanto em dias úteis 22% 25% Mais em dias úteis Mais de 10 anos Gráfico 22 – Motivação para uso da bicicleta como meio de transporte Motivo principal 48% Por economia: é mais barato, não gasto ou economizo 29% Por tempo: é mais rápido, não fico no trânsito 12% Por saúde: é mais saudável, faço exercício 6% Por falta de opção: não tenho outras alternativas de transporte 5. PERCEPÇÕES SOBRE O USO DA BICICLETA Por prazer: gosto de andar de bicicleta Por conforto: evito ônibus e metrô cheios 4% 1% Total de motivos Por economia: é mais barato, não gasto ou economizo 80% Por tempo: é mais rápido, não fico no trânsito 74% Por saúde: é mais saudável, faço exercício 67% Por prazer: gosto de andar de bicicleta 36% Por conforto: evito ônibus e metrô cheios Por falta de opção: não tenho outras alternativas de transporte Pelo meio ambiente: é menos poluente, é bom pra cidade 17% 10% 8% 38 IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP Pouco mais da metade dos ciclistas utiliza as ciclovias da cidade. No entanto, são justamente os ciclistas mais pobres (da classe C/D) que menos usam as ciclovias (Gráfico 24). Esse cenário parece estar relacionado com a falta de acesso, uma vez que existe uma concentração geográfica das ciclovias em regiões mais ricas da cidade e 100% dos ciclistas indicaram que as ciclovias são importantes ou indispensáveis para o uso da bicicleta para transporte no Rio de Janeiro (Gráfico 25). conservação da infraestrutura existente. Ainda assim, apenas um terço dos ciclistas consideram esse item satisfatório. Gráfico 24 – Uso das ciclovias, para o grupo de ciclistas e por classe Conservação (manutenção, limpeza, iluminação, pavimentação) Você utiliza as ciclovias da cidade do Rio de Janeiro? 53% Sim % de ciclistas de cada classe que utilizam as ciclovias do Rio 47% Não Gráfico 26 – Avaliação das ciclovias Insatisfeito Indiferente Satisfeito Integração ao sistema de transporte público (ônibus, etc.) 56% 61% 22% 22% 8% 31% Conexão entre as ciclovias 65% 15% 20% 63% 48% Qualidade da ciclovia (largura, obstáculos, desvios) 64% Classe A/B 8% 28% Classe C/D Informação e sinalização sobre os caminhos das ciclovias Gráfico 25 – Importância da ciclovia para o uso da bicicleta como meio de transporte 68% 8% 24% Respeito dos motoristas e pedestres às ciclovias Indispensável Importante 59% 41% Pouco ou nada importante: 0% Ainda que em seus deslocamentos cotidianos sintam desconforto ou estresse menos frequentemente que a população em geral, os ciclistas avaliam a experiência de pedalar nas ciclovias do Rio como negativa (Gráfico 26). Há insatisfação em relação à distribuição das ciclovias pela cidade (68%), o que pode estar associado ao fato de quase metade dos ciclistas não utilizar a infraestrutura disponível. Além disso, 69% dos ciclistas estão insatisfeitos com o respeito de motoristas e pedestres às ciclovias. Se antes verificamos que a população carioca teme a adoção da bicicleta em função da violência no trânsito, os ciclistas parecem sentir na pele essa situação. O aspecto mais bem avaliado foi a IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP 69% 13% 18% Existência e distribuição das ciclovias nos caminhos que eu faço 68% 10% 22% Os ciclistas usam a bicicleta de modo intenso com o intuito de economizar tempo e dinheiro. Entretanto, como mostra sua avaliação negativa da infraestrutura cicloviária, eles encontram uma estrutura bastante deficiente para pedalar. A menor proporção de ciclistas que utilizam ciclovias entre as classes C/D denota ainda uma concentração da infraestrutura em locais da cidade de maior renda. Pensar a malha cicloviária tomando como referência os terminais de alta e média capacidade pode ser um instrumento de promoção do uso da bicicleta entre aqueles que moram longe das áreas que con- 5. PERCEPÇÕES SOBRE O USO DA BICICLETA Quão importante você diria que é a ciclovia para você usar a bicicleta como meio de transporte? 39 centram o maior volume de empregos (Centro e Zona Sul). 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS A mobilidade é um dos temas mais importantes na agenda de pesquisa sobre as metrópoles e na pauta de políticas públicas das grandes cidades brasileiras. A centralidade do automóvel no território urbano produziu cidades que, muitas vezes, são inóspitas para seus próprios habitantes. A promoção da mobilidade ativa é essencial para a retomada do espaço urbano pela população, permitindo a apropriação da cidade pelos seus habitantes. Este trabalho foi elaborado com o objetivo de demonstrar como o uso da bicicleta pode ser benéfico para a cidade do Rio de Janeiro. Verificamos que as sensações nos deslocamentos pela cidade são melhores entre os ciclistas. Além disso, os ciclistas estão mais presentes no espaço público e têm uma sensação de segurança maior. Pedalar cotidianamente parece, portanto, influenciar positivamente a relação do cidadão com a cidade. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Além disso, observamos que a adoção da bicicleta nos trechos pedaláveis que hoje são realizados pela população em veículos motorizados (ônibus, BRT e motorizados individuais) poderia reduzir em até 18% a emissão CO2 pelo transporte de passageiros da cidade do Rio de Janeiro. 40 Estimamos também o impacto da bicicleta na saúde das pessoas, mostrando que a adoção pela população do padrão de atividade física dos ciclistas implicaria uma economia de até 19% nos custos do SUS municipal com internações por doenças do aparelho circulatório e diabetes. Isso equivale a uma economia de R$ 7,7 milhões. Na economia, as evidências mostram que a adoção da bicicleta nos deslocamentos promove uma economia importante para o orçamento pessoal da população, favorecendo principalmente os cariocas das classes C/D, que reduziriam seus gastos com transporte de 18% para 4% da renda pessoal, uma economia média de R$ 151 mensais. Além disso, caso a população que utiliza veículos motorizados passasse a realizar suas viagens pedaláveis de bicicleta, o tempo economizado nos trajetos teria potencial produtivo correspondente a um acréscimo de R$ 525 milhões no PIB da cidade do Rio de Janeiro. A análise do impacto do uso da bicicleta leva à conclusão de que vale a pena investir em políticas e projetos de ampliação do uso da bicicleta na cidade do Rio de Janeiro. Mais do que isso, esse investimento é necessário, especialmente se levarmos em consideração a insegurança e o medo de violência que acometem a cidade. A bicicleta, embora não possa combater a crise na segurança pública, pode ser um instrumento estratégico para trazer as pessoas novamente ao espaço público e aumentar a sensação de segurança nas ruas. Este estudo não esgota as possibilidades de mensuração do impacto da bicicleta na cidade do Rio de Janeiro. Há outros campos possíveis a se explorar, como, por exemplo, o impacto econômico na cadeia produtiva da bicicleta na cidade. Ou: quantas pessoas são empregadas pela indústria e venda de bicicleta no território carioca? Qual o tamanho do mercado, formal e informal, de vendas de bicicleta? Qual a economia de recursos a ser alcança no sistema de saúde com a prevenção de outras doenças (que não as do aparelho circulatório e diabetes)? Ou, ainda: qual a dimensão da atividade de bike courier na economia e na logística das entregas na cidade? Portanto, há uma ampla agenda de pesquisa para dimensionar os impactos do uso da bicicleta nas cidades e na vida de seus cidadãos. Este trabalho buscou trazer dados e insumos relevantes para os gestores locais em suas tomadas de decisão e para os interessados no uso da bicicleta como um meio de transporte. Esperamos ter contribuído para o avanço da discussão sobre mobilidade ativa na cidade, evidenciando IMPACTO SOCIAL DO USO DA BICICLETA NO RIO DE JANEIRO - CEBRAP o potencial da bicicleta na vida urbana carioca e também na de outros centros urbanos. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADAMS, Mags (2013). “Quality of urban spaces and wellbeing”. Wellbeing, [s.l.], 17 dez., pp. 1-21. AMIGO, Ignacio (2018). “Um carro a menos? Trocando o carro pela bicicleta”. In: CALLIL, Victor & COSTANZO, Daniela. Estudos de mobilidade por bicicleta. São Paulo: Cebrap. No prelo. AREM, Hannah et al. (2015). “Leisure time physical activity and mortality”. Jama Internal Medicine, [s.l.], v. 175, n. 6, 1º junho, pp. 1-18. American Medical Association (AMA). ANPTrilhos (2017). Veículo Leve sobre Trilhos – Mobilidade sustentável. Disponível em: <https://bit.ly/2WSdjEf>. Acesso em: 10 dez. 2018. BABBIE, Earl (2003). Métodos de pesquisas de survey. 2. ed. Belo Horizonte: UFMG. BARROS, Ana Paula Borba Gonçalves (2014). 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