DUNCAN KENNEDY: UM REBELDE POR PRINCÍPIO
Rafael Lima Sakr*
Esta breve introdução à contribuição de Duncan Kennedy à filosofia do Direito tem
três objetivos. Primeiro, contextualizar a importância de sua vida e obra na história dos
Estados Unidos. Segundo, apresentar sucintamente as ideias centrais por ele
desenvolvidas, as quais foram fortemente influenciadas por duas correntes filosóficas:
estruturalismo e fenomenologia. Considerando a ampla contribuição do autor à
literatura jurídica, enfatizar-se-ão as inovações desenvolvidas na primeira fase
intelectual do autor, visto ser o período em que foram estabelecidos os fundamentos
teóricos de sua obra. Terceiro, prestar uma homenagem a Duncan Kennedy que, em
maio de 2014, aposentou-se de sua profícua carreira docente na Faculdade de Direito de
Harvard, após quarenta e três anos de intensa dedicação. A presente introdução visa,
portanto, oferecer um ponto de entrada na rica literatura do Direito crítico
estadunidense, em geral, e no pensamento de Duncan Kennedy, particularmente, os
quais se encontram atualmente marginalizados na academia jurídica brasileira.
A introdução é dividida em três partes. Na primeira, examinar-se-á as trajetórias
política, docente e intelectual de Duncan Kennedy, de modo a compreender sua
participação nas transformações histórico-sociais ocorridas nos Estados Unidos. A
segunda parte apresentará os fundamentos teóricos das ideias e críticas de Kennedy. A
terceira parte analisará a contribuição de Kennedy à teoria jurídica, em geral, e à
literatura crítica do Direito, em particular, bem como a reação de juristas e escolas de
pensamento a suas propostas. Por fim, concluirei especulando as razões pelas quais as
ideias de Duncan Kennedy não encontraram uma audiência receptiva na academia
jurídica brasileira.
I.
VIDA E OBRA
1. Da Rebeldia Política à Crítica Jurídica
Dourando em Direito na London School of Economics and Political Science. Bacharel em
Direito (2006) e Mestre em Direito Internacional (2010) pela Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo; Mestre em Direito (LL.M., 2012) pela Faculdade de Direito da
Columbia University, Pesquisador Visitante (2013) na Faculdade de Direito da Harvard
University.
*
1
Ativista estudantil, político radical de esquerda, fundador do Movimento
estadunidense de Direito Crítico, professor da Faculdade de Direito de Harvard, avantgardista... Duncan Kennedy possui muitos rótulos acadêmicos, profissionais e políticos,
mas qualquer categorização é transitória, pois a rebeldia crítica ou a crítica rebelde é o
impulso vocacional que tem orientado sua vida e obra.
O ativismo transformador de Duncan Kennedy é tanto produto como causador do
momento histórico. Por um lado, Kennedy pode ser visto como a expressão jurídica da
revolta geracional que implicou nos movimentos políticos, culturais e intelectuais que
varreram os Estados Unidos na década de 1960. Filho de pais politicamente
progressistas, Kennedy fez parte das rebeliões estudantis que protestavam contra o
autoritário sistema educacional, o patriarcalismo familiar e a Guerra do Vietnã. Por
outro lado, Kennedy pode ser encarado como líder simbólico da produção de estudos e
manifestações críticos que redefiniram as fronteiras do ensino e da consciência jurídica
nos Estados Unidos. Duncan Kennedy seria o precursor não de uma escola de
pensamento jurídico, mas de um movimento que transformou toda uma geração de
juristas (Fisher III, 2006). Assim, sua vida e obra estão intimamente entrelaçadas com
os rumos tomados pela academia jurídica estadunidense desde 1970.
Após graduar-se em economia em 1964 pela Universidade Harvard, Kennedy cursou
Direito na Universidade Yale. Desde o início, sua carreira docente foi marcada pela
rápida ascensão e pela intima ligação com a política. Após sua graduação em 1970, ele
serviu por um ano como assessor do Ministro Potter Stewart na Suprema Corte dos
Estados Unidos. Em 1971, Kennedy se juntou ao corpo docente da Faculdade de Direito
de Harvard, tendo apenas vinte e nove anos. Ao lado de uma geração de acadêmicos
rebeldes, Kennedy aliou sua carreira docente ao ativismo político ao participar da
fundação do Movimento de Direito Crítico (Critical Legal Studies ou “CLS”), o qual
exerceu grande impacto sobre a academia jurídica estadunidense nas décadas de 1970 e
1980. Além disso, sua influência foi amplificada por sua enorme vocação docente, na
medida em que serviu de mentor para diversos jovens professores e estudantes,
estadunidenses ou estrangeiros, dentre os quais se incluem James Boyle, William
Fisher, Jon Hanson, David Kennedy e Joseph William Singer.
Tão importante quanto sua carreira docente, a produção acadêmica de Duncan
Kennedy tem sido longa, diversificada, influente e continuamente desafiada e
desafiante. Seu primeiro artigo, How the Law School Fails: A Polemic (1970),
2
publicado ainda como estudante de Direito, chocou Yale ao criticar duramente a
estrutura hierárquica e autoritária do ensino jurídico. É interesse notar que esse trabalho
acadêmico já contém o tom cínico-crítico que viria ser a marca de sua obra. Ao longo de
sua vida acadêmica, Kennedy publicou cinco livros e mais de sessenta artigos, cobrindo
matérias tão variadas como teoria jurídica, ensino jurídico, história do Direito,
interdisciplinaridade jurídica (incluindo Direito e economia, feminismo jurídico e
Direito e desenvolvimento), bem como uma ampla gama de temas de direito privado
(tais como direito dos contratos, direitos reais, direito de família e responsabilidade
civil).
Diferente de grandes juristas que publicaram suas obras-primas após anos de
reflexão, os dois mais influentes trabalhos de Duncan Kennedy para a teoria jurídica
foram escritos em sua juventude. Form and Substance in Private Law Adjudication
(“Form and Substance”) foi publicado em 1974 na Harvard Law Review, enquanto o
The Rise and Fall of Classical Legal Thought (“Rise and Fall”) foi escrito e circulado
em 1975, mas apenas publicado trinta anos depois em 2006. Depois de um curto
período de rápida ascensão, suas ideias passaram a ser objeto de profundas contestações,
teóricas e políticas, resultando em sua marginalização no final da década de 1980.
Kennedy somente respondeu aos críticos em 1997 na forma do livro A Critique of
Adjudication [fin de siècle]. Foi, entretanto, em Three Globalizations of Law and Legal
Thought: 1850-2000 (“Three Globalizations”) publicado em 2006 que Kennedy
avançou com sua teoria jurídica, agora moderada pelas críticas sofridas anteriormente.
2. Duncan Kennedy e o Movimento Estadunidense de Direito Crítico
Não é possível compreender integralmente a contribuição da obra de Duncan
Kennedy ao Direito divorciada de seu envolvimento no Movimento estadunidense de
Direito Crítico. A perspectiva crítica estadunidense nasceu em um lugar e tempo
específicos. No final dos anos 1960, Yale era considerada a mais politicamente
progressista faculdade de Direito dos Estados Unidos, razão pela qual reunia estudantes
rebeldes que contestavam não o posicionamento dos conservadores de direita, mas o dos
liberais moderados de esquerda que dominavam a intelligentsia da elite política. Em
contraste com o esperado pelos estudantes, os intelectuais progressistas de Yale
revelaram-se complacentes frente às questões políticas da época, como o declínio dos
movimentos por direitos civis, a Guerra do Vietnã e os conflitos raciais; além de serem
3
excessivamente próximos ao posicionamento moderado dos liberais. O desapontamento
com a liderança intelectual levou ao aumento da rebeldia estudantil (Kalman, 2005).
Particularmente, a origem do movimento crítico está intrinsecamente enraizada na
faculdade de Direito devido à estrutura curricular e aos métodos pedagógicos
empregados pelo corpo docente, ambos considerados retrógrados. O método socrático
era visto como humilhante, razão pela qual os professores eram equiparados a
inquisidores, cuja função era dilacerar a espiritualidade dos alunos. As disciplinas e o
sistema de avaliação exemplificavam, na visão discente, os graves problemas de
hierarquização e alienação que prejudicavam o ensino jurídico. O ambiente opressivo de
Yale era visto como a expressão do autoritarismo do pensamento progressista
moderado,
o
qual
defendia
publicamente
ideias
de
centro-esquerda,
mas
institucionalmente reproduzia as estruturas acadêmicas convencionais. Daí o surgimento
da crítica antiautoritária que expôs as contradições da academia jurídica americana
(Kalman, 2005).
Nesse contexto, um grupo formado entre 1967 e 1972 por estudantes, incluindo
Kennedy, e dois professores assistentes de Yale, Richard Abel e David Trubek, viria a
ser responsável pela organização de um movimento político-jurídico que objetivava
contestar a visão liberal e conservadora do Direito. A construção do Movimento CLS
não foi fácil, começando pela demissão de Abel e Trubek de Yale. Ao grupo de radicais
exilado, juntaram-se acadêmicos vindos de outras universidades. Em 1977, Trubek,
Kennedy e Mark Trushnet organizaram a primeira Conferência de Direito Crítico, cujos
participantes refletiam a homogeneidade política e a heterogeneidade intelectual.
Reunidos por ideais políticos, três distintas vertentes intelectuais confluíram para formar
o Movimento CLS. Trubek liderava os adeptos à sociologia jurídica weberiana que
focava sua análise na cultura capitalista para explicar a construção das normas jurídicas.
Trushnet representava os juristas marxistas científicos que defendiam que as normas
jurídicas eram produtos do modo de produção dominante, numa relação determinística
entre base-econômica e superestrutura-jurídica. Em contraste, Kennedy e seus colegas
criticavam as duas teorias materialistas, filiando-se aos marxistas críticos que
defendiam serem as normas jurídicas construídas conforme uma dinâmica interna do
Direito e de teorias políticas sobre o Direito (Schlegel, 1984).
Refletindo as contradições internas da esquerda radical estadunidense, essas três
vertentes não conseguiram formar um consenso intelectual. Na verdade, os acadêmicos
críticos (conhecidos como crits) rejeitavam a própria noção de unidade, pois visavam a
4
um ecletismo antiautoritário. A falta de síntese não impediu, entretanto, o florescimento
e sucesso do Movimento de Direito Crítico ao longo de 15 anos. De seu início em 1975
até o seu fim em 1990, ele se tornou um extremamente bem-sucedido projeto políticointelectual, o qual produziu profundo impacto na academia jurídica dos Estados Unidos,
por meio da elaboração de múltiplas e alternativas teorias e métodos de análise do
Direito, bem como do auxílio a professores para politizar e transformar a educação e
cultura jurídicas.
II. TEORIA CRÍTICA: ESTRUTURALISMO FENOMENOLÓGICO DO DIREITO
Em seus primeiros anos de docência, Duncan Kennedy produziu o que são
consideradas suas maiores contribuições para a filosofia do Direito. Seu objetivo era
construir uma crítica à teoria do Direito baseado nas ideais fenomenológicas e
estruturalistas, sendo influenciado principalmente por Karl Marx (2007), Michel
Foucault (1969, 1977), Claude Lévi-Strauss (1958, 1962), Ferdinand de Saussure
(1983) e Jean Piaget (1964, 1972). O resultado foi a criação de um conjunto de métodos
de análise, hipóteses e estilos argumentativos que alicerçaram as teorias críticas do
Direito e ampliaram as possibilidades de interferência no estudo jurídico. Talvez por
aspiração antiautoritária ou por rebeldia interdisciplinar, ambas características típicas do
Movimento CLS, Duncan Kennedy não batizou o conjunto de sua obra. Por falta de
melhor definição e para facilitar a compreensão do leitor, denomino Teoria Crítica do
Estruturalismo Fenomenológico do Direito o conjunto de suas diversas contribuições
teóricas desenvolvidas entre 1971 e 1985.
O Estruturalismo Fenomenológico do Direito nasceu para contrapor-se às duas
escolas de pensamento jurídico dominantes nos Estados Unidos à época, o Legalismo
Liberal (Liberal Legalism) e a Teoria do Processo Legal (Legal Process Theory). Notese que, diferente da academia europeia, os juristas estadunidenses não se organizam
necessariamente em torno de correntes teóricas. Nos Estados Unidos, as escolas de
pensamento surgiram historicamente para reunir acadêmicos interessados em examinar
erros metodológicos ou para desenvolver novos modos de análise e interpretação do
Direito. Com isso, os movimentos intelectuais têm emergido não por um consenso
formado sobre uma teoria jurídica (e.g. juspositivismo ou jusnaturalismo), mas, sim, por
empregarem métodos comuns para analisar, criticar e argumentar sobre o Direito (D.
Kennedy & Fisher III, 2006).
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No contexto do pós-Segunda Guerra Mundial, o Legalismo Liberal despontou como
um projeto jurídico-político que utiliza estilos de argumentação jurídica, baseados em
regras e princípios, para reintroduzir questões morais e éticas no domínio do Direito
(Hart, 2012; Dworkin, 1967). Razão de rebeldia dos acadêmicos críticos, o Legalismo
Liberal teria falhado em fazer com que o Estado estadunidense respondesse
adequadamente aos problemas sociais da década de 1960, incluindo a Guerra do Vietnã,
o movimento pelos direitos civis, as questões raciais e feministas. Sua contrapartida
jurídico-política, a Teoria do Processo Legal tinha aumentado sua influência nos
últimos anos ao responder aos desafios suscitados pelo Realismo Jurídico estadunidense
ao pensamento jurídico clássico. Os juristas realistas haviam atacado as ideias clássicas,
visando demonstrar os abusos do método dedutivo nas decisões judiciais, bem como
criticar as análises formalistas e os pressupostos liberais e positivistas, enquanto
defendiam um estilo hermenêutico funcionalista (Holmes, 1897; Llewellyn, 1950). Para
responder ao assalto jus-realista, os defensores da Teoria do Processo Legal ofereceram
um método interpretativo cujo objetivo era garantir que os juízes, ainda que não fossem
eleitos e não passíveis de responsabilização por seus atos, pudessem decidir
legitimamente em uma sociedade democrática (Fuller, 1941; Wechsler, 1959; Hart &
Sacks, 1994).
Em Rise and Fall, Duncan Kennedy introduz a fenomenologia e o estruturalismo à
teoria jurídica ao propor o estudo da “consciência jurídica” (legal consciousness),
entendida como “the particular form of consciousness that caracterizes the legal
profession as a social group, at a particular moment”. A consciência jurídica é a
unidade de pensamento que contempla o aparato conceitual, métodos lógicoargumentativos, ideais e princípios do sistema jurídico, bem como imagens e
construções da elite jurídica, formada por renomados juízes, professores, promotores e
advogados, cujas opiniões conformavam o que o Direito é ou dever ser. Essa
consciência coletiva não é entendida como uma construção intencional do sujeito; pelo
contrário, Kennedy defende que juristas compartilham premissas sobre aspectos centrais
da ordem jurídica que estão arraigadas em seu inconsciente (Kennedy, 2006a). Se tais
premissas são dificilmente percebidas ou compreendidas, não há como assegurar a
neutralidade ou condicionar a discricionariedade do processo adjudicatório. Por
exemplo, aspectos do discurso jurídico revelam influencias ideológica nele subjacentes,
as quais são reveladas pelas sentenças judiciais, ainda que os juízes se abstenham de
demonstrar, conscientemente ou não, qualquer preferência (Kennedy, 1997). Assim,
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essas premissas comuns formam a estrutura do pensamento jurídico, cujo
funcionamento aspira à unidade, coerência e autonomia de suas regras internas
(Kennedy, 1991).
Em termos práticos, Kennedy argumenta que a consciência jurídica opera entre a
realidade material (esfera do ser) e a ideologia (esfera do dever ser), exercendo grande
influencia sobre o poder político, o interesse econômico e a decisão judicial (Kennedy,
2006b). Consequentemente, entender o Direito como um reflexo de interesses
econômicos e poder político é equivocado, na medida em que há uma linguagem
jurídica mediando entre o mundo social e a decisão judicial. Para compreender o
ordenamento jurídico, é necessário investigar a linguagem da consciência jurídica.
Segundo uma perspectiva externa, a linguagem é uma construção social, logo, é
possível elaborar definições mais precisas sobre a dinâmica interna do Direito e a
psicologia judicial (Kennedy, 1997). Portanto, ignorar a consciência jurídica impede a
compreensão da natureza do sistema jurídico, reduzindo qualquer esperança de reformálo (Kennedy, 1979).
Na visão de Kennedy, as estruturas jurídicas são subsistemas do grande sistema
social, por consequência, os problemas deste são análogos aos problemas do próprio
Direito. Essa problemática está vinculada a um conjunto de ideias submersas no
inconsciente dos juristas. A partir dessas ideias implícitas, surge um conjunto de
questionamentos, métodos e experiências que constitui a estrutura estilística do
pensamento liberal (Kennedy, 1997). A identificação daquelas ideias subjacentes à
estrutura do liberalismo é essencial para formular uma crítica ao sistema jurídico liberal.
Dessa forma, o conceito de consciência jurídica é uma explícita adaptação do método
estruturalista para uma visão fenomenológica do Direito. Por meio do Estruturalismo
Fenomenológico do Direito, Kennedy visa, por um lado, demonstrar que os discursos
jurídicos são governados por uma estrutura inconsciente mediada pela consciência
jurídica; e, por outro, resistir ao determinismo, típico do pensamento estruturalista de
Lévi-Strauss, de modo a permitir a análise dos aspectos intencionais das decisões
judiciais (Kennedy, 1997). Com isso, os juristas são profundamente condicionados tanto
por seu inconsciente como por sua vontade.
1. Pensamento Jurídico, Liberalismo Político e Contradição Fundamental
7
Em
Form
and
Substance,
Duncan
Kennedy
utiliza
seu
Estruturalismo
Fenomenológico do Direito para examinar as dimensões formais e materiais das normas
jurídicas (Kennedy, 1976). Diferente de outras correntes do CLS que focaram suas
análises em fatores exógenos (e.g. estrutura econômica, profissões jurídicas) ao Direito
(Horwitz, 1977, 1992; Gordon, 1983), Kennedy investigou os discursos jurídicos
concretos, mediante o exame de um gigantesco volume de obras e decisões judiciais.
Seu objetivo não é encontrar a causa ou origem, mas, sim, demonstrar que o Direito tem
uma estrutura argumentativa, a qual é moldada por ideias jurídicas subjacentes, como
numa relação estruturalista de língua/fala (langue/parole). Dessa estrutura profunda do
pensamento jurídico (langue) surgem estilos particulares de consciência jurídica, os
quais conformam as normas jurídicas (parole) (Kennedy, 1976, 1997, 2006a, 2006b).
Como será examinado a seguir, a forma particular de estrutura jurídica que ganha
predominância a partir do século XIX nos países de tradição liberal e capitalista é
denominada
Liberalismo
Jurídico
(legal
liberalism),
a
qual
é
construída
sincronicamente (isto é, no estado atual da estrutura) a partir de uma “contradição
fundamental” (fundamental contradiction) (Kennedy, 1976). Com isso, Kennedy
apresenta três teses centrais de seu Estruturalismo Fenomenológico do Direito.
Primeira, para compreender o Direito, é preciso examinar sua estrutura fenomenológica.
Segunda, a estrutura fenomenológica do Direito contemporâneo tem raízes no
liberalismo político. Terceira, há uma contradição fundamental na base do Liberalismo
Jurídico.
2. A Estrutura Fenomenológica do Liberalismo Jurídico
a) Dimensão Formal da Norma Jurídica
Ao examinar uma enorme quantidade de fontes jurídicas primárias e secundárias
sobre a dimensão formal da norma jurídica, Duncan Kennedy aponta que a questão não
encontra consenso nas diversas teorias gerais do Direito, sendo que seus principais
argumentos podem ser classificados ao longo de três eixos distintos (Kennedy, 1976).
O primeiro eixo é denominado “realizabilidade formal” (formal realizability), tendo
em suas polaridades dois tipos de normas jurídicas: “regras” (rules) e “princípios”
(standards). Regras são normas jurídicas diretivas que requerem à autoridade estatal
(e.g. juízes ou outros agentes governamentais) decidir sobre uma controvérsia, a partir
de aspectos fáticos legalmente listados, de uma forma previamente determinada.
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Princípios são normas jurídicas que informam os objetivos materiais da ordem legal,
concedendo à autoridade estatal espaço discricionário para decidir como uma
controvérsia deve ser resolvida visando alcançar aquela finalidade. Entretanto,
verdadeiras normas jurídicas são raramente descritas como puramente regras ou
princípios, sendo que cada uma delas possui qualidades que as levam a ser classificadas
entre esses dois tipos ideais.
O segundo eixo é denominado “generalidade” (generality), tendo por objetivo
determinar a precisão e extensão de seu conteúdo normativo. As polaridades variam
entre normas “gerais” (generality), as quais visam abranger ou excluir muitas situações,
e normas “particulares” (particularity), focadas em apenas algumas possibilidades
jurídicas.
O terceiro eixo é o menos óbvio, pois tem por objetivo classificar a finalidade da
norma jurídica. Em um polo, localizam-se as “normas de conduta” (deter wrong) que
visam impedir determinados comportamentos considerados moralmente ruins ou
indesejáveis. No outro polo, localizam-se as “normas de estrutura” (formalities),
positivadas para facilitar a organização da vida privada, por meio da indução das partes
a comunicar-se de certa forma a fim de permitir aos juízes decidir sobre as respectivas
intenções e ações.
Esses três eixos constituem, portanto, a estrutura formal da norma jurídica no
Liberalismo Jurídico, cuja característica essencial é de possuir polaridades definidas e
logicamente independentes. A estrutura formal pode ser representada pela seguinte
figura (D. Kennedy & Fisher III, 2006):
Diferentemente das teorias jurídicas clássicas fundadas numa filosofia analítica, a
estrutura formal da norma jurídica é revelada a partir de discursos jurídicos
efetivamente construídos pelos juristas para sustentar diferentes posições. Duncan
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Kennedy sugere que o ordenamento jurídico-normativo provê argumentos e contraargumentos, os quais são formalmente estruturados ao longo dos três eixos
independentes.
Por exemplo, o tradicional argumento do Legalismo Liberal consiste em defender
que as normas jurídicas estruturantes do sistema legal devem ser positivadas como
regras gerais e não como princípios (ou seja, localizadas no canto esquerdo frontal do
quadrado geométrico), pois tais normas devem ser teoricamente previsíveis, firmemente
sancionáveis e facilmente compreendidas e utilizáveis pelos indivíduos. Contudo, os
juristas afiliados ao Realismo Jurídico atacaram essa teoria em duas frentes. De um
lado, alguns grupos (e.g. consumidores e investidores de varejo) aprendem mais
lentamente como empregar normas jurídicas do que outros (e.g. industriais e
companhias abertas), logo, impor indiscriminadamente sanções exacerbaria as
desigualdades em relação ao poder de barganha. De outro lado, os juízes, levados a
contrabalancear essa desigualdade, converteriam tais regras em princípios, mediante a
criação de exceções particulares.
Nota-se, portanto, que Kennedy não está interessado em oferecer uma solução ao
debate estadunidense entre legalistas e realistas acerca da estrutura formal ideal para
normas jurídicas; mas, sim, em mapear argumentos antitéticos por eles elaborados
dentro da estrutura fenomenológica do Liberalismo Jurídico (Kennedy, 1976).
b) Dimensão Material da Norma Jurídica
Na dimensão material, o universo jurídico é examinado tendo por finalidade extrair a
estrutura subjacente dos discursos sobre a materialidade das normas jurídicas (Kennedy,
1976). Duncan Kennedy sugere que a maioria das posições formadas na jurisprudência
ou na doutrina pode ser classificada ao longo de um eixo de polaridades definidas, tendo
no “individualismo” e no “altruísmo” seus extremos. O conteúdo do discurso jurídico de
caráter individualista cria uma distinção entre interesses próprios e de terceiros, fundado
na ideia de que a preferência por interesses individuais é legítima, desde que limitada
pelas regras jurídicas, as quais tornam possível a coexistência entre indivíduos. Por sua
vez, o altruísmo consiste na crença de que um indivíduo não deve sempre favorecer suas
próprias preferências em detrimento dos interesses alheios, razão pela qual deve haver
espaço para sacrifícios, compartilhamento e piedade. Kennedy ressalta, entretanto, que
cada um desses tipos ideais não é encontrado em sua forma pura, na medida em que
normas jurídicas incorporam aspectos do outro tipo ideal. Com efeito, devido à
10
importância de respeitar o direito de terceiros, os individualistas reconhecem a
existência de limitações à concretização de seus interesses particulares, diferenciando-se
de um puro egoísmo; analogamente, ao impor limites a imperativos morais, o altruísmo
se diferencia da santidade.
3. As Consciências Jurídicas Estadunidenses
Compreendida a estrutura fenomenológica da norma jurídica, Duncan Kennedy
examina como as duas visões antagônicas, mas imbricadas, da materialidade da norma
jurídica (individualismo e altruísmo/coletivismo) vêm moldando o Direito nos Estados
Unidos. Analisando a história jurídica estadunidense, Kennedy propõe dividi-la em três
períodos sobrepostos segundo as particularidades de cada estrutura de consciência
jurídica. Radicalmente distinta de outras tentativas de periodização do pensamento
jurídico, a análise histórico-estruturalista tem por objetivo demonstrar como o “conflito”
entre as visões individualistas e altruístas/coletivistas determinou a construção do
discurso jurídico (Kennedy, 1976).
O período entre 1800 e 1870 é denominado “Pré-Clássico” por Duncan Kennedy.
Para os juristas pré-clássicos (Blackstone, 1796; Story, 1873; Kent, 1896), o propósito
do Direito e a fonte de sua legitimidade residiam na moralidade ética (morality), a qual
foi a primeira manifestação do princípio do altruísmo na common law. O individualismo
não era percebido como um princípio ético em conflito com o altruísmo, mas como um
agrupamento de argumentos pragmáticos, denominado “política” (policy), que
conflitava com a moralidade. As políticas eram utilizadas para restringir o alcance dos
princípios jurídico-morais (standards), na medida em que sua estrita aplicabilidade
resultaria
em
indenizações
excessivamente
onerosas
que
inviabilizariam
o
desenvolvimento econômico (Kennedy, 2006a).
O período “Clássico” (1850-1940) é caracterizado pela ascensão e predomínio do
individualismo, em contraposição com o declínio da argumentação moral (Langdell,
1870; Beale, 1935; Williston, 1936). O pensamento jurídico visou conciliar as diversas
políticas concorrentes, os julgamentos morais e a ideia de uma ordem jurídica coerente.
Nesse particular, ressalta-se que a concepção de individualismo deixa de ser um recurso
retórico para tornar-se um princípio ético, tendo por efeito excluir e substituir o
altruísmo como norma moral organizadora das decisões jurídicas. Ao rejeitar a ideia de
que normas jurídicas representavam uma conciliação entre políticas individuais e
11
altruísmo moral, o pensamento clássico entendia que regras representavam uma solução
coerente e consistente para os dilemas éticos e práticos da ordem legal. Assim, os
juristas clássicos concebiam, a partir da ideia da autonomia da vontade (free will) ser
possível deduzir do ordenamento jurídico uma única resposta para um determinado
conflito, a qual seria simultaneamente correta moralmente e economicamente eficaz
(Kennedy, 2006a).
No período “Moderno” (1900-presente), o individualismo clássico é rejeitado por
duas razões. Por um lado, foi incapaz de evidenciar que as instituições são fruto da
vontade individual; por outro, falhou em demonstrar ser possível deduzir normas
concretas de princípios abstratos (D. Kennedy & Fisher III, 2006). Com isso, há o
ressurgimento da tensão entre julgamentos morais e políticas concorrentes; todavia, esse
conflito aparece em diferentes termos, pois a moralidade não é inequivocamente
altruísta nem as políticas são puramente individualistas. Conceitos e argumentos
jurídicos podem incorporar aspectos individualistas e altruístas. Assim, dilemas morais
e políticas adversárias permeiam todas as questões importantes do ordenamento jurídico
(Kennedy, 1976).
4. Do Pensamento Político à Contradição Fundamental do Sistema Jurídico
Os efeitos do colapso do pensamento jurídico clássico, seguido pela síntese do
individualismo e coletivismo no pensamento jurídico moderno, revelam uma
contradição fundamental no cerne da estrutura fenomenológica do Liberalismo Jurídico.
As decisões jurisprudenciais expressam uma tensão existente entre valores individuais e
altruísticos. Duncan Kennedy argumenta que não há, contudo, nenhuma teoria jurídica
capaz de resolver tal dicotomia, na medida em que suas raízes alcançam os sistemas de
crenças e dogmas que vêm moldando a cultura e a política estadunidense como um todo
(Kennedy, 1976).
Nesse particular, o individualismo está associado ao liberalismo clássico, cuja
origem repousa nas ideias de filosofia política de Thomas Hobbes, John Locke, Jeremy
Bentham e John Stuart Mill. Contrariando a visão medieval escolástica de que o mundo
é pré-concebido em termos de bondade e maldade segundo uma ordem natural
(Aquinas, 1920), para os pais do liberalismo clássico, o indivíduo é capaz de determinar
o que é bom para si a partir de seu direito de autopreservação. Na doutrina medieval,
cada pessoa nascia com um propósito, o qual deveria ser concretizado pela prática
12
cotidiana, sendo que a falha em atingi-lo era um reflexo de um defeito moral. O
liberalismo clássico surge em negação a essa visão funcionalista da humanidade,
defendendo que os indivíduos não possuem essência, mas todos detêm o igual direito de
decidir sobre seu destino, a partir de seu direito de autopreservação (Hobbes, 2013;
Locke, 2013).
Todavia, o direito de autopreservação não possui uma definição objetiva nem se
sujeita a limites. Na visão de Hobbes, essa situação conduz à guerra de todos contra
todos, na medida em que não existe como determinar objetivamente quando o exercício
do direito de autopreservação por um indivíduo viola o de terceiros (Hobbes, 2013).
Para Locke, tal cenário levaria à criação da sociedade de mercado na qual as pessoas se
tornam proprietárias capazes de autorregular suas vidas mediante formas sofisticadas de
relações econômicas (Locke, 2013). Em ambas as visões, o mundo formado por
indivíduos vivendo em estado de natureza é insustentável em seus próprio termos. A
ordem liberal é construída a partir da renúncia do direito de autopreservação em troca da
formação da sociedade política, cabendo ao soberano protegê-la. Assim, o pensamento
liberal clássico é fundado numa relação de tensão entre o novo indivíduo e o Estado
secular (Kennedy, 1976).
A paradoxal relação constituinte da ordem liberal produz uma sociedade dividida em
duas esferas: sociedade civil e sociedade política. Para os indivíduos usufruírem de seus
direitos naturais na sociedade civil, criou-se o Estado como instituição político-jurídica
capaz de garantir ordem e segurança. O ordenamento jurídico nasce no contexto da
distinção entre a esfera privada de direitos naturais e a esfera pública de legalidade
liberal. O pensamento jurídico liberal surge justamente da ideia de soberania,
representada pelo Estado Leviatã ou pelo governo constitucional, a qual visa construir
uma sociedade na qual os indivíduos não possuem uma essência pré-determinada, mas
são sujeitos de direitos naturais de autogoverno. Com efeito, os valores morais são
entendidos como subjetivos e arbitrários, não cabendo ao Estado buscar a concretização
de um ideal particular de sociedade (Kennedy, 1976).
Em contraste com o individualismo, surge a ideia de altruísmo, cuja origem parece
oscilar no entendimento de Kennedy. Em Form and Substance, o altruísmo teria sua
raiz na teoria política de inspiração marxista que visa alcançar uma justiça utópicocoletivista (Marx, 2007; Avineri, 1968). A justiça altruísta consistiria na construção de
uma ordem organizada segundo objetivos comuns. O Estado, e com ele a magistratura,
estaria destinado a desaparecer, na medida em que é absorvido pelas pessoas
13
organizadas como comunidade. O pensamento coletivista entende que os objetivos
individuais e o interesse dos outros estão em evolução contínua na tentativa de atingir
um ideal universal de irmandade humana. As leis dessa transformação não são
redutíveis a mera causalidade, lógica ou empírica, ou a arbitrariedade. O progresso
moral não pode ser controlado mecanicamente ou juridicamente, mas mediante
participação constante das pessoas por meio da argumentação sobre valores morais.
Desse modo, é equivocada a noção de que o Estado é meio para atingir finalidades préexistentes dos cidadãos, na medida em que os objetivos são construídos
continuadamente pela coletividade (Kennedy, 1976).
Em The Structure of Blackstone’s Commentaries, Kennedy reposiciona a contradição
fundamental na própria condição humana, cujo caráter seria universal, porém sua
origem não fica clara. No século XIX, tal contradição ganharia expressão dentro do
próprio
liberalismo
político
clássico,
visto
que
a
liberdade
individual
é,
simultaneamente, dependente e incompatível com ações coercitivas comunitárias, as
quais são necessárias para sua realização. Seus efeitos são intensos e penetrantes,
estando presentes em todos os aspectos da vida social cotidiana, inclusive no Direito. Os
ideais liberais residiriam no âmago da estrutura da consciência jurídica, servindo como
mecanismos para ordenar o universo legal mediante progressivas abstrações e
generalizações. Com efeito, o liberalismo clássico construiu dois imaginários
antagônicos que objetivavam controlar ou negar a contradição fundamental. Enquanto a
sociedade civil é um domínio privado de interação livre entre indivíduos, o Estado é o
espaço público edificado para coagir os indivíduos a respeitar os direitos de terceiros
(Kennedy, 1979).
Ressalta-se, todavia, que a tese da contradição fundamental não visa revelar uma
incoerência lógica inerente ao Direito, mas uma incongruência psicológica advinda da
experiência prática do cotidiano. As raízes do individualismo e do altruísmo/coletivismo
são profundas, alcançando a ideologia e, talvez, a própria natureza humana. Kennedy
defende que o estudo da relação contraditória entre esses valores morais permite
identificar não apenas modos retóricos de argumentação jurídica, como também revelar
conflitos inerentes da vida social. Portanto, o objetivo da crítica é justamente alcançar a
estrutura fenomenológica subjacente ao pensamento jurídico, visando demonstrar a
existência de uma contradição fundamental imbricada no núcleo estruturante do
Liberalismo Jurídico (Kennedy, 1976).
14
5. Correspondência entre Dimensões Formais e Materiais da Norma Jurídica
Ao examinar os debates jurídicos travados tanto nos tribunais quanto na academia,
Duncan Kennedy defende que há uma conexão entre as dimensões formais (regras e
princípios) e materiais (individualismo e coletivismo), cuja origem remonta à
contradição fundamental. Os argumentos formalistas em favor de regras são geralmente
associados aos argumentos materiais de caráter individualista. Por outro lado, os
argumentos materiais em defesa de ideias altruístas tendem a preferir os princípios. Essa
associação de modos retóricos de argumentação jurídica, regras/individualismo e
princípios/coletivismo, opera em três níveis distintos: moralidade, economia e política
(Kennedy, 1976).
No domínio moral, a específica conexão entre aspectos formais e materiais aparece
claramente no discurso jurídico. Argumentos elaborados em favor da interpretação
estrita da lei têm por objetivo assegurar que um juiz decida sobre normas materialmente
individualistas. Nesse particular, defende-se a aplicação rigorosa da regra jurídica por
meio de mecanismos que garantem tanto a rígida observância dos requisitos formais,
bem como os direitos subjetivos privados, os quais são fundados no preceito da
autonomia da vontade. Em contraste, há uma analogia retórica entre os argumentos
jurídicos que relaxam ou flexibilizam a rigidez do regime de regras e os discursos em
defesa do altruísmo, cuja essência reside na misericórdia concretizada por meio de
partilha e sacrifício (Kennedy, 1976).
No domínio econômico, a correspondência entre argumentação formal e material é
mais sutil e difícil de perceber. Estruturalmente, individualismo e preferência por regras
dividem um compromisso implícito com o darwinismo social. Logo, as barganhas
econômicas, realizadas por indivíduos e governadas por regras, controlam a utilização e
produção de recursos, tendo por finalidade a maximização do crescimento econômico.
Em contraste, o altruísmo e a preferência por princípios contestam tais ideias,
alegando que os resultados da negociação econômica não são neutros. Isso porque os
resultados da atividade econômica são fortemente determinados pela ordem jurídica, a
qual guarda grande responsabilidade pela alocação de recursos e distribuição da renda.
A visão altruísta buscou demonstrar que regras, entendidas pelo individualismo como
passíveis de produzir apenas uma resposta objetiva, estão sujeitas a uma variedade de
interpretações e, logo, capazes de produzir consequências econômicas diferentes
daquelas antecipadas. Nesse sentido, para os altruístas, as normas jurídicas expressam
15
intervenções do Estado na economia, independentemente das respectivas dimensões
formais. Kennedy demonstra que esse paralelismo estrutural é confirmado
historicamente. Enquanto individualismo e preferência por regras eram parte da
ideologia econômica e teorias jurídicas do clássico laissez-faire, altruísmo e preferência
por princípios se aliaram na critica ao liberalismo jurídico-econômico do final do século
XIX (Kennedy, 1976).
Na dimensão política, a relação entre argumentação formal e material é a mais
intrincada. Seu objetivo era determinar que tipo de normas jurídicas conduz a um estilo
de adjudicação que é mais consistente com regimes democráticos. No entender de
Kennedy, os defensores do individualismo e os proponentes do sistema de regras
responderiam comumente que juízes devem buscar minimizar julgamentos fundados em
valores subjetivos, mediante (i) restrições a decisões orientadas por resultado em
matéria de direito privado, (ii) assunção de uma postura passiva no processo
adjudicativo constitucional, e (iii) elaboração de decisões de direito privado ou público
limitadas a subsunção de regras gerais a casos concretos. Diferentemente, os defensores
do sistema de princípios e os proponentes do altruísmo insistiriam ser inevitável o
julgamento de questões de direito privado ou público baseado em valores subjetivos. A
revisão judicial é inerente ao processo adjudicatório, logo, o foco da teoria jurídica não
deveria ter por objetivo restringir a interpretação dos magistrados, mas desenvolver
normas capazes de responsabilizá-los por suas decisões (Kennedy, 1976).
Todavia, as hipóteses desenvolvidas por Kennedy para explicar o paralelismo
estrutural da dimensão política sobre o direito público não se confirmaram
integralmente ao longo da história jurídica estadunidense. Entre o final do século XIX e
início
do
século
XX,
os
juristas
associados
ao
Legalismo
Liberal
(individualismo/regras) desenvolveram teorias jurídico-hermenêuticas que, ao invés de
defender a passividade da magistratura, justificaram a agressiva utilização da revisão
judicial, tendo por objetivo declarar ilegais aspectos da legislação de bem-estar social.
Em resposta, os juristas filiados ao Realismo Jurídico (altruísmo/princípios), por razões
“táticas” buscaram diferenciar direitos privados e públicos, argumentando que o direito
público tinha caráter político, enquanto o direito privado era científico. Por
consequência, para serem fieis à democracia, os juízes deveriam evitar substituir as
normas jurídicas positivadas pelo legislativo por decisões judiciais, porém tais restrições
não se aplicariam aos magistrados em processos adjudicatórios envolvendo matéria de
direito privado. Para justificar a divergência entre teoria e realidade, Kennedy abandona
16
o estruturalismo fenomenológico para criticar os dois grupos de juristas, na medida em
que seus posicionamentos falharam em seguir o paralelismo estrutural, incidindo,
portanto, em desonestidade intelectual (Kennedy, 2006ª; Fisher III, 2006).
Em contraste, o paralelismo estrutural revelou-se presente na adjudicação em matéria
de direito privado, visto que os juristas liberais, defensores do individualismo/sistema
de regras, reconheciam que a solução de conflitos privados somente seria consistente
com regimes democráticos se seguissem três etapas. Primeiro, as partes interagem e
uma adquire um ônus/obrigação. Segundo, o juiz aplica as regras individualistas do
sistema jurídico, de modo a acolher ou negar o pedido, concedendo determinado
remédio judicial. Terceiro, o legislativo tem a competência, mas não o judiciário, de
impor deveres altruístas não previstos no ordenamento jurídico (Kennedy, 1976).
Críticos à segunda etapa, os juristas jus-realistas não acreditavam que cada decisão
judicial seria determinada por uma resposta única à controvérsia, a qual seria extraída a
partir de um sistema jurídico completo e fechado. Ao demonstrarem que as normas
jurídicas incorporam, em variadas medidas, o valores do individualismo e do altruísmo,
os juízes, ao serem confrontados com lacunas legais, não teriam alternativa além de
decidir discricionariamente entre as possíveis escolhas políticas (Kennedy, 1976).
Diante da impossibilidade de evitar a discricionariedade em julgamentos de direito
privado, Kennedy indaga como reconciliar o processo adjudicatório com o princípio
democrático, na medida em que as leis não seriam escolhidas por representantes eleitos,
mas por juízes nomeados. Kennedy reposiciona a questão à luz do debate
contemporâneo entre escolas jurídicas rivais. No seu entender, tais escolas de
pensamento jurídico não teriam obtido êxito em propor uma solução satisfatória ao
problema anteriormente enfrentado pelo Legalismo Liberal e pelo Realismo Jurídico.
Para os juristas filiados à escola da Análise Econômica do Direito (Law and
Economics), o processo adjudicatório seria determinado e legítimo se os juízes
formulassem regras e julgassem casos visando alocar de forma mais eficiente os
recursos escassos da sociedade. A decisão expressaria o resultado que as partes teriam
alcançado caso tivessem barganhado livremente sem qualquer custo de transação.
Assim, atribuir-se-ia ao legislativo a decisão política de determinar os casos em que
recursos escassos deveriam ser redistribuídos (Posner, 2014; Calabresi, 1968, 1970). Na
visão de Kennedy, o erro fatal do projeto Law and Economics consiste em não
reconhecer que o resultado de barganhas, ainda que não sujeitas a custos de transação,
depende da distribuição inicial dos recursos entre as partes relevantes, a qual é
17
fortemente implicada pelas regras iniciais de direito privado. Isso porque, se não
houvesse custo de transação, o processo de negociação conduziria naturalmente a uma
alocação eficiente independente de qualquer julgamento. Como a eliminação dos efeitos
dos custos de transação é incapaz de prover um critério objetivo, decidir com
fundamento no critério de eficiência seria circular, na medida em que meramente
reproduziria as consequências das regras postas previamente. Para aplicar o teste de
custo de transação, o juiz deveria discricionariamente escolher quanto altruísta ou
individualista o regime jurídico deve ser. Portanto, a Análise Econômica do Direito
ofereceria um espaço retórico para produção de discurso jurídico, ao invés de um
método analítico capaz de solucionar o problema criado pela erosão da distinção entre
poder legiferante e adjudicante (Kennedy, 1976, 1998; Baker, 1975).
Na visão de Duncan Kennedy, a escola da Teoria do Processo Legal oferecia uma
solução alternativa que consiste na ideia de existir no ordenamento jurídico um conjunto
central de valores comuns e imanentes da sociedade. Ao serem confrontados por casos
surgidos dentro deste conjunto central, os juízes deveriam utilizar técnicas de
razoabilidade para (i) identificar o valor social, ou objetivo consensual, subjacente às
normas jurídicas, (ii) articular tais normas jurídicas, sendo estas regras ou princípios,
que incorporariam e promoveriam aqueles fins sociais, e (iii) utilizar essas normas
jurídicas para julgar os litígios. Entretanto, os casos sobre questões que não estão
compreendidas no conjunto central devem ser deixados para o legislativo decidir. Com
efeito, o judiciário teria competência sobre conflitos surgidos dentro do conjunto central
formado pelo consenso social, enquanto as questões periféricas seriam submetidas à
decisão política (Fuller, 1941, 1964; Wechsler, 1959; Hart & Sacks, 1994). Apesar de
não haver um problema lógico, Kennedy aponta que o defeito fatal da Teoria do
Processo Legal reside, contudo, na inexistência de um conjunto central de valores
sociais de caráter imanente ou consensual. O ordenamento jurídico seria, na verdade,
um grande campo de batalha entre os princípios do individualismo e do altruísmo.
Nesse contexto, não haveria aspectos normativos que não estivessem em disputa nem
posição de neutralidade da magistratura. Desse modo, os teoristas do processo legal
teriam falhado em oferecer uma descrição convincente da realidade (Kennedy, 1976).
Diante do exposto, Duncan Kennedy conclui que a contradição fundamental entre
individualismo e altruísmo/coletivismo é permanente e inescapável, sendo que as
dimensões formais e materiais da norma jurídica são expressões desta dicotomia. O
processo de tomada de decisão dos juristas clássicos entrou em colapso, sendo que
18
nenhuma das novas teorias contemporâneas teria sido capaz de preencher o vácuo.
Restando, entretanto, a questão: o que os juízes deveriam fazer?
Na conclusão de Form and Substance, Kennedy defende que os magistrados
deveriam, por um lado, desistir das tentativas de superar a contradição fundamental, e,
por outro lado, promover o altruísmo, não com o intuito de transformar a sociedade,
mas visando causar um efeito dramático sobre os adversários, contribuindo para “the
indispensable task of imagining an altruistic order” (Kennedy, 1976). Posteriormente,
Kennedy esclarece que, por ser a decibilidade sujeita a escolhas estratégicas, os juízes
devem ser integralmente responsáveis por seus julgamentos e respectivas consequências
(Kennedy, 2008).
6. Sistema e Sub-Sistemas Jurídicos
A partir das ideias de Duncan Kennedy, o Estruturalismo Fenomenológico do Direito
propõe uma nova visão da experiência jurídica, a qual seria governada por uma estrutura
jurídica, fundada numa contradição fundamental, responsável por produzir estilos de
pensamento jurídico que, por fim, resultam em argumentos jurídicos. O jusestruturalismo teria, portanto, identificado a estrutura profunda do Liberalismo Jurídico,
a qual seria caracterizada por um sistema lingüístico (langue) em cujo âmago encontrase uma contradição fundamental entre seus valores constituintes. Do conflito entre
individualismo e altruísmo, o projeto do Liberalismo Jurídico visou à produção de um
sistema jurídico formado por regras impessoais, objetivas e lógicas. Movendo-se em
direção à superfície ou periferia da estrutura, encontrar-se-iam os estilos de consciência
jurídica, Clássico e Moderno, responsáveis por produzir sub-sistemas legais.
Finalmente, na superfície da estrutura restariam os argumentos jurídicos (paroles)
elaborados no contexto da experiência jurídica, mediante a utilização de diversas fontes
primárias e secundárias do Direito (Kennedy, 1976, 1997, 2006a, 2006b).
7. Direito é Política (Law is Politics)
Duncan Kennedy buscou demonstrar acima que a contradição fundamental teria por
efeito impedir que o Liberalismo Jurídico fosse capaz de sustentar uma racionalidade
formal ou funcional necessária para que um juiz pudesse, tendo estabelecidos os fatos e
a norma jurídica, “determinar” a resposta correta. Embora a tese da indeterminação
19
legal tenha origem no Realismo Jurídico estadunidense (Llewellyn, 1950), seu
significado ganhou um sentido distinto para o Estruturalismo Fenomenológico, na
medida em que argumentos jurídicos seriam entendidos como paroles governados por
uma langue. Por ser uma parole fundada na relação arbitrária entre significante e
significado, os argumentos jurídicos ganhariam um caráter indeterminado (Kennedy,
1997).
Contudo, a noção do Legalismo Liberal de que a tese da indeterminação
representaria uma ruptura total da racionalidade jurídica é falsa. Isso porque, embora o
jurista tenha uma discricionariedade quase infinita para construir um argumento no
nível da parole, tal flexibilidade é rapidamente reduzida pelos limites impostos pela
langue. Ao conceber o Direito como um sistema coerente de signos linguísticos, o
Estruturalismo Fenomenológico do Direito entende que o potencial interpretativo do
magistrado no processo adjudicatório está limitado pela consciência jurídica subjacente
à experiência legal (Kennedy, 1997). Nota-se, assim, que Kennedy se diferencia de
outros membros do CLS que propunham a tese da indeterminação radical, a qual visava
reduzir o discurso jurídico à política ou ao debate ideológico (Kairys, 1998).
A partir da década de 1950, houve o surgimento nos Estados Unidos do
funcionalismo jurídico, fundado numa racionalidade pós-realista formulada em
oposição ao formalismo jurídico. O movimento funcionalista era edificado, todavia,
sobre os mesmos princípios epistemológicos que o formalismo, visto que visava
distinguir Direito da política e legislação de adjudicação (Peller, 1985). Os
funcionalistas defendiam que os juristas não deveriam fundamentar suas conclusões por
meio de uma única interpretação correta da norma jurídica, pois implicaria o criticado
abuso da lógica dedutiva. Para solucionar o problema de decidibilidade, eles
propuseram substituir o enfoque jurídico-normativo por um foco nos interesses e
necessidades sociais relevantes para a norma jurídica. Ao identificar os corretos
objetivos e normas jurídicas, a argumentação jurídica poderia alcançar novamente um
tipo de formalidade (Holmes, 1897). Desse modo, o Direito passou a ser concebido
como um instrumento político para o progresso social. No processo adjudicatório,
caberia aos magistrados realizar uma análise de política pública, respeitada uma
objetividade construída a partir de estudos empíricos. Enquanto a argumentação jusformalista era construída a partir de normas jurídicas, a argumentação funcionalista era
elaborada com fundamento no mundo social.
20
Contudo, na perspectiva do Estruturalismo Fenomenológico do Direito, os dois
modos de racionalidade são redutíveis à indeterminação, pois em nenhum dos casos é
possível encontrar a objetividade defendida por juristas formalistas e funcionalistas. A
argumentação jurídica elaborada sobre uma racionalidade funcionalista ou formalista
continua sendo uma parole, logo, construída a partir de uma consciência jurídica,
estruturada sobre uma langue. Nesse particular, ressurge a crítica jus-estruturalista que
conecta a indeterminação jurídica à contradição fundamental, para, em seguida, afirmar
que o Liberalismo Jurídico falhou em construir um processo adjudicatório fundado
numa racionalidade teorética de base lógico-formal ou empírica, cujas características
essenciais seriam objetividade, previsibilidade e neutralidade. A argumentação jurídica
é, portanto, entendida como uma linguagem estruturada, construída nos limites da
consciência jurídica, empregada para consecução de fins políticos. A técnica jurídica
consiste na utilização do Direito como discurso capaz de acomodar as normas
positivadas e as preferências do intérprete quanto ao resultado fático (Kennedy, 1997,
2008).
Diante disso, os pressupostos teóricos positivistas são rejeitados pelo Estruturalismo
Fenomenológico do Direito, tendo por efeito a negação do ideal liberal de que a
interpretação se resume ao processo cognitivo de mera subsunção de fato à norma
jurídica, limitado à produção de um único e determinável resultado. A argumentação
jurídica é um ato volitivo, cuja construção depende da sujeição de um conjunto formado
por conhecimento, tempo, ideologia e preferências dos intérpretes, à consciência
jurídica. Reconhecendo que o Direito tem um inevitável aspecto político (Law is
Politics), Duncan Kennedy entende que o jurista, em geral, e o magistrado, em especial,
devem ser integralmente responsabilizados por suas decisões (Kennedy, 1997, 2008).
III. IMPACTOS
DO
ESTRUTURALISMO FENOMENOLÓGICO
DO
DIREITO
NA
TEORIA
JURÍDICA
Diversos aspectos do Estruturalismo Fenomenológico do Direito repercutiram
profundamente na academia jurídica dos Estados Unidos. Por um lado, juristas de
escolas de pensamento concorrentes buscaram criticar tanto os pilares teóricos como
contestar
suas
aplicações
e
consequências.
Duncan
Kennedy
reconheceu,
posteriormente, que muitos de seus argumentos vieram a produzir impactos inesperados
em escolas rivais e aliadas. Suas críticas à Teoria do Processo Legal impactaram, por
21
exemplo, o Legalismo Liberal, como nas teorias de Ronald Dworkin e Robert Cover.
Para responder à tese da contradição fundamental, tais juristas buscaram reconciliar o
individualismo e o altruísmo no processo adjudicatório, por meio de técnicas de
decidibilidade capazes de mediar normas jurídicas impessoais, gerais e abstratas (Fisher
III, 2006).
No mesmo sentido, as contestações de Duncan Kennedy à Análise Econômica do
Direito visavam demonstrar duas grandes falhas. Primeira, magistrados, ao decidirem
seus casos empregando análises econômicas, teriam por objetivo maximizar no
agregado o bem-estar social. Todavia, essa maximização econômica é sujeita ao
“problema da oferta e demanda” (offer-asking problem) exposta por Ronaldo Coase
(1960), o qual consiste na ideia de que comprador e vendedor não estão em uma posição
neutra e equitativa na negociação, logo, uma pessoa irá valorar um determinado bem ou
direito dependendo da respectiva posição inicial na barganha. Segunda, a
indeterminação jurídica, decorrente da contradição fundamental, afetaria a capacidade
do juiz de encontrar a decisão mais eficiente, visto que, quando diversas questões
jurídicas são mutuamente dependentes, a decisão sobre uma delas poderá impactar os
pressupostos da análise econômica das demais. Entretanto, a Análise Econômica do
Direito não oferece uma resposta sobre a correta ordem para a decidibilidade dos
conflitos. Tais críticas à Law and Economics foram estendidas, todavia, a juristas
progressistas aliados pertencentes ao neo-Realismo Jurídico e ao Movimento Direito e
Sociedade (Law and Society) (Kennedy, 1981; Kennedy & Michelman, 1980).
Por outro lado, suas ideias serviram de inspiração para o Movimento CLS. O
principal ponto de confluência parece ter sido a desconstrução das teorias jurídicas que
defendiam ser o Direito um sistema neutro, abstrato e amoral, capaz de oferecer um
processo cognitivo e lógico para encontrar uma resposta certa e previamente
determinada. Na visão de Kennedy, a contradição fundamental revelou que o processo
adjudicatório confere aos magistrados um espaço para o engajamento em debates
políticos e morais, não devendo ser utilizado para discussões estéreis sobre teoria
jurídica e limites interpretativos. Portanto, seu ataque frontal às dominantes teorias
jurídicas, que visavam justificar a superioridade do liberalismo estadunidense fundado
no capitalismo econômico e democracia política, serviu simbolicamente como um
chamado às armas (Fisher III, 2006).
22
Desse modo, os métodos, estilos e teses de Duncan Kennedy foram apoiados e
contestados por diversos juristas ao longo dos anos, tendo por principal função servir
como marco fundante e catalizador do Movimento estadunidense de Direito Crítico.
1. Reações ao Estruturalismo Fenomenológico do Direito
A academia jurídica reagiu rapidamente às ideias de Duncan Kennedy. Embora as
críticas não sejam extensivamente examinadas neste trabalho, o Estruturalismo
Fenomenológico do Direito foi contestado em três frentes: por juristas pósestruturalistas do próprio Movimento de Direito Crítico, pelos sociólogos do Direito
filiados ao Movimento Direito e Sociedade, e pelos defensores do Legalismo Liberal.
a) Contestações do Movimento de Direito Crítico
O primeiro ataque às ideais de Duncan Kennedy foi desferido por juristas do próprio
Movimento CLS que se apoiaram na crítica pós-estruturalista cuja inspiração restava
nos trabalhos desconstrutivistas de Jacques Derrida (Derrida, 2007). Em síntese,
argumentava-se que o Estruturalismo Fenomenológico do Direito reconhecia a
existência de múltiplas e concorrentes estruturas que determinavam a existência de um
único objeto, porém não concluía qual seria a verdadeira causa. Além disso, o jusestruturalismo apresentava explicações superficiais acerca da relação entre a
consciência e as práticas jurídicas. Terceira objeção apontava a incapacidade da teoria
de Kennedy de explicar o papel do sujeito na estrutura, a qual era considerada
relativamente autônoma em relação à sociedade. Por fim, o jus-estruturalismo era
acusado de ignorar as razões que deram origem a uma particular estrutura.
Em suma, os pós-estruturalistas criticavam o Estruturalismo Fenomenológico do
Direito por ser obcecado por totalidades universalizáveis que, no âmbito da consciência
jurídica, seriam representadas pela contradição fundamental, a partir da qual se
desenvolveria uma hierarquia de significados, a fim de assegurar sua estabilização
(Heller, 1985; D. Kennedy, 1986). Essa formulação filosófica abstrata era exatamente a
forma de análise que os crits buscava evitar, pois resultaria na transformação da
contradição fundamental em um dogma legal (Minda, 1995).
b) Contestações do Movimento Direito e Sociedade
23
A segunda onda de contestações teve origem no Movimento Direito e Sociedade, o
qual defendia que o Estruturalismo Fenomenológico do Direito ignorava a
complexidade do mundo social. Em contraste com a ideia de Law is Politics de
inspiração jus-estruturalista, produziram-se diversos estudos sobre a política do Direito,
visando demonstrar que o papel constitutivo do Direito na sociedade somente poderia
ser entendido como resultado do jogo político. A ideia da consciência jurídica poderia
ser importante para entender o pensamento jurídico e seus pressupostos ocultos, mas
não ofereceria explicações para o funcionamento da dinâmica social. Por estar
comprometido com análises crítico-descritivas do fenômeno jurídico, o Estruturalismo
Fenomenológico do Direito não serviria como instrumento para engajamento em
debates político-normativos. Daí surgirem dúvidas sobre a utilidade da crítica à
indeterminação jurídica e da tese da contradição fundamental, bem como questões sobre
como empregar o método jus-estruturalista para elaborar propostas de reforma legal. A
análise da consciência jurídica seria, portanto, metade da história, sendo necessária uma
investigação empírica para compreender como as relações político-sociais afetam o
Direito (Trubek, 1972, 1984; Schlegel, 1997, 2001). Assumindo que o Direito está
imbricado na sociedade e vice-versa, o movimento de Direito e Sociedade forçava o
Estruturalismo Fenomenológico a ir além da ideia de Direito é Política em direção da
noção de Política é Direito (Politics is Law), o que demandaria ultrapassar seus próprios
limites teóricos e epistemológicos.
c) Contestações do Legalismo Liberal
Diversas foram as contestações dos juristas legalistas às críticas formuladas por
Duncan Kennedy. De um lado, os defensores do Legalismo Liberal argumentavam que
o próprio termo liberalismo era empregado imprecisamente, de modo a construir um
inimigo amórfico. Nesse particular, não haveria uma contradição fundamental, mas
apenas legítimas tensões entre necessidades conflitantes. Isso porque, caso Kennedy
estivesse certo, haveria uma negação do próprio liberalismo
(Fiss, 1986).
De outro lado, inexistindo uma contradição estrutural, a tese da indeterminação legal
já teria sido identificada pelo Legalismo Liberal, tendo sido objeto de discussão das
filosofias analíticas de H.L.A. Hart e de Ronald Dworkin. Nesse sentido, entende-se que
o Liberalismo Jurídico não requereria uma lógica formal, por meio da qual seria
possível determinar o relacionamento entre regras e resultados, mas exigiria, sim, que o
processo adjudicatório seja objetivo. Por meio de uma análise objetiva, seria possível
24
argumentar se determinada decisão foi correta. Todavia, para ser objetivo, é preciso que
sejam asseguradas ao juiz certas condições, como o acesso a toda informação relevante,
livre de preconceitos e estereótipos, bem como a uma variedade de soluções criativas
(Coleman & Leiter, 1993; MacCormick, 1990). Desse modo, o Legalismo Liberal
defende que a indeterminação legal é plenamente controlada por um processo
adjudicatório que emprega uma objetividade modesta, ou seja, haveria graus de
determinação do conteúdo da norma jurídica. Por exemplo, Hart propõe que o juiz
encontrará a decisão correta mediante o reconhecimento de que a textura normativa
pode ser distinguida entre núcleo de certeza e penumbra de dúvida (2012), enquanto
Dworkin entende que os magistrados deveriam julgar aspirando tornarem-se um juiz
Hércules (1986), ou, ainda, John Rawls sugere que a resposta correta é alcançável
mediante o exercício pelos juízes de retirada do véu de ignorância (1997).
Por fim, talvez a mais famosa crítica do Legalismo Liberal ao Estruturalismo
Fenomenológico é relacionada à falta de propostas normativas para transformar o
Direito. Contestando a utilidade do jus-estruturalismo, Michael Fischl formulou uma
pergunta jocosa que visava expressar a falta de propostas dos crits para substituir o
Liberalismo Jurídico: the question that killed critical legal studies
(Fischl, 1992). Nesse
sentido, os juristas do Movimento CLS teriam por objetivo apenas desmascarar a
política imbricada no Direito, mas não propor reformas para tornar o Direito um
instrumento efetivo para a sociedade. Adotando uma postura meramente antiliberal, o
Movimento do Direito Crítico se encerraria na própria crítica ao Direito (Fiss, 1986).
2. Revisando o Estruturalismo Fenomenológico do Direito
Do início do Movimento estadunidense de Direito Crítico até o amadurecimento das
contestações teóricas, o Estruturalismo Fenomenológico do Direito viveu um curto
período de ascensão em 1975 até a desestabilização em 1984. No começo da década de
1990, o jus-estruturalismo já havia sido marginalizado nas discussões da teoria jurídica,
inclusive no Movimento CLS. Diante das críticas recebidas, o próprio Duncan Kennedy
decidiu defender e, eventualmente, rever aspectos de sua obra.
Iniciando em 1984, Roll Over Beethoven é um marco importante, pois simboliza o
afastamento de Kennedy da análise da estrutura profunda da consciência jurídica,
implicando o aparente abandono das ideias sobre o liberalismo clássico como centro do
sistema jurídico e da tese da contradição fundamental. Curioso, entretanto, notar que
25
suas revisões teóricas foram objetivo de grande atenção da academia jurídica, visto
receberem apoio ou resistência de juristas que tiveram suas obras por elas impactadas
(e.g. Mensch, 1983; Alexander, 1985;
MacCormick, 1990; Posner, 2002;
Baron, 2001;
Goodrich, 2001; Klare, 2001; Olsen, 2001; Winter, 2001). O livro A Critique of
Adjudication [fin de siècle] de 1997, no qual responde às críticas anteriormente
formuladas, parece encerrar o processo de revisão. Ressalta-se, curiosamente, que
Kennedy aplica aos argumentos de seus detratores uma análise jus-estruturalista.
Foi, no entanto, em Three Globalizations of Law and Legal Thought: 1850-2000
publicado em 2006 que Duncan Kennedy retornou ao Estruturalismo Fenomenológico
do Direito, mas agora moderado pelo ataque pós-estruturalista. Three Globalizations
busca demonstrar, mediante uma análise estruturalista e fenomenológica, a existência de
consciências jurídicas que modelam e governam os padrões e formações jus-discursivas.
Em outras palavras, resgata-se a análise da parole e langue no Direito (Kennedy,
2006b).
A tese central de Three Globalizations é que, desde a Guerra Civil dos Estados
Unidos, os juristas têm participado em três fases de globalização da consciência
jurídica. Cada fase representa um movimento de globalização de ideias jurídicas a partir
de centros na Europa ou nos Estados Unidos. A primeira globalização (1850-1914)
envolveu a transmissão do pensamento jurídico “clássico” a partir da Europa, enquanto
a segunda globalização (1900-1968) envolveu a difusão do pensamento jurídico
“social”, cuja origem é europeia e estadunidense. Finalmente, a terceira globalização
(1945-2000) está relacionada à propagação do pensamento jurídico “contemporâneo” a
partir dos Estados Unidos.
Kennedy explica que o objeto da globalização não é uma particular ideologia
política, filosofia do Direito ou corpo doutrinário, mas a própria consciência jurídica, a
qual é formada por um vocabulário conceitual, modelos de organização, tipos de
racionalidade e argumentos característicos. O conceito de consciência jurídica é
reconstruído a partir da visão estruturalista de langue e parole e da ideia de bricolage de
Lévi-Strauss, sem, entretanto, ceder para uma lógica fático-causal proposta pelo
Movimento Direito e Sociedade. Cada consciência jurídica globalizada é utilizada como
um mapa para compreender a atividade dos juristas nos respectivos períodos, não
visando, porém, contar uma história universal ou total do pensamento jurídico. O
Estruturalismo Fenomenológico busca, portanto, construir uma genealogia da estrutura
jurídica a partir do Direito como experiência dos juristas.
26
Na primeira globalização, o pensamento jurídico clássico é descrito como um
sistema linguístico ancorado em três ideias: individualismo, separação estrita entre
direito privado e direito público, e formalismo legal. O modo de argumentação é
fundado na teoria da vontade, a qual defende que o direito privado dos países
desenvolvidos ocidentais é um conjunto de derivações racionais da ideia de que os
governos devem proteger o direito das pessoas, o que significa ajudá-las a concretizar
suas vontades nos limites da esfera individual do outro.
Na segunda globalização, o pensamento jurídico social é objeto de difusão. Enquanto
sistema linguístico, a consciência jurídica social está centrada na ideia de
altruísmo/interdependência. O modo de argumentação utiliza técnicas de ciências
sociais para solucionar problemas jurídico-sociais. Há uma preferência por
planejamento estatal em contraste ao livre mercado, bem como um grande apreço aos
direitos políticos e sociais. Surge um estilo de interpretação funcionalista do Direito que
visa responder às necessidades sociais. Com efeito, seu objetivo é proteger a
interdependência e a justiça social.
Na visão de Duncan Kennedy, a terceira globalização ainda não está totalmente
delineada. Diferente das duas precedentes que podem ser vistas como críticas às
respectivas predecessoras, tal relação dialética não ocorre na terceira globalização, visto
não haver um claro núcleo da estrutura subjacente, como a teoria da vontade ou o
princípio do altruísmo/interdependência. Nesse sentido, a consciência jurídica
globalizada
após
1945
seria
formada
por
elementos
não-sintetizados,
mas
transformados, dos pensamentos clássico e social. Do pensamento clássico, a ideia
transformada
foi
a
técnica
de
dedução
do
direito
positivo,
denominada
“neoformalismo”, a qual presume existir uma coerência interna ao ordenamento
jurídico, indiferente se a norma é pública ou privada. Quanto ao pensamento social, o
elemento transformado foi a “análise de políticas”, baseada na técnica de ponderação e
balanço de interesses conflitantes presentes no sistema jurídico, a qual visa encontrar
uma solução racional. Dessa forma, o objetivo do pensamento jurídico contemporâneo é
assegurar que os sujeitos de direito tenham suas identidades legalmente reconhecidas e
interesses ponderados, segundo o princípio da não-discriminação.
Em Three Globalizations, Duncan Kennedy visou evidenciar que o objeto da
globalização foi a consciência jurídica. A difusão das diferentes langues permitiu uma
infinita variedade de paroles. Ao questionar sobre o Direito enquanto projeto
normativo, cada langue revelava uma diferente preocupação. Para o pensamento
27
clássico, o Direito deveria ser distinto da moral. Na visão do pensamento social, o
enfoque era na diferença entre Direito e sociedade. Por fim, o pensamento
contemporâneo se preocupa em questionar a relação entre Direito e política. Em relação
aos discursos jurídicos, a langue influenciou a construção de múltiplas paroles, por
meio das quais o Direito foi expressado e discutido segundo as noções do
individualismo, coletivismo e identidades.
Ressalta-se
que,
em
contraste
com
a
primeira
fase
do
Estruturalismo
Fenomenológico, Duncan Kennedy não defende que a consciência jurídica tenha uma
essência universal. Na verdade, não haveria qualquer centro ideológico na estrutura do
pensamento jurídico, logo, livre de contradições fundamentais ou de alianças
predeterminadas com um posicionamento político, seja de esquerda ou direita. O
pensamento jurídico clássico seria estruturalmente liberal independentemente de suas
vertentes conservadora ou progressista, enquanto o pensamento jurídico social seria
estruturalmente comunitário, sendo empregado por socialistas ou sociais-democratas,
católicos ou protestantes ou fascistas, mas não por comunistas ou liberais clássicos.
Diferente de seus antecessores, o pensamento jurídico contemporâneo se desenvolveu
no sentido de transcender a dicotomia individualismo/altruísmo, visando restaurar o
primado da razão ao Direito. Por isso, a consciência jurídica contemporânea não
possuiria um projeto normativo e teoria jurídico-filosófica dominantes, mas abrigaria
diferentes projetos axiológicos, bem como distintos conceitos e técnicas jurídicas que
objetivam a interpretação do Direito em contraste com os tradicionais projetos de
reconstrução.
Portanto, a consciência jurídica em qualquer período serviria como uma estrutura
comum utilizada pela esquerda ou direita para múltiplos projetos políticos, econômicos
ou jurídicos. Para Duncan Kennedy, o conteúdo dos projetos políticos conservadores ou
progressistas não é mais axiologicamente determinável do que a validade jurídica. Ao
examinar o processo adjudicatório, verifica-se que a decisão judicial manifesta o
comprometimento do juiz tanto com seu posicionamento político como com sua
consciência jurídica. Isso revela como Direito e política estão numa relação dialética.
Daí Kennedy invocar a famosa formulação de Carl von Clausewitz de que a guerra é
política por outros meios, para, em seguida, recorrer ao entendimento de Carl Schmitt, o
qual inverte tal concepção para argumentar que política é guerra por outros meios, mas
não é redutível a esta. Com efeito, ele conclui que Direito é política por outros meios,
28
mas não é redutível a ela; como também política é Direito por outros meios (Kennedy,
2006b).
CONCLUSÃO
Não há dúvida de que Duncan Kennedy é um jurista controverso. Nos Estados
Unidos, a menção ao seu nome gera admiração ou rejeição. Tais posicionamentos
podem ser encontrados em qualquer domínio em que atue. No cenário político,
Kennedy advoga um papel ativo e transformador da esquerda em direta oposição à
esquerda moderada e aos conservadores. Na academia jurídica, sua liderança no
Movimento de Direito Crítico permitiu diversas contestações à educação jurídica, as
quais receberam tanto apoio como rejeição de professores tradicionalistas e
progressistas. Na teoria jurídica, o Estruturalismo Fenomenológico do Direito abriu um
caminho inexplorado para a investigação jurídica, bem como canalizou os esforços da
primeira geração de juristas críticos em direção ao Liberalismo Jurídico. Por outro lado,
seu jus-estruturalismo foi fortemente contestado pelos próprios crits da segunda geração
adeptos do pós-estruturalismo. Dessa forma, dos bancos de Yale até a aposentadoria de
sua cátedra em Harvard, Duncan Kennedy se tornou um ícone do Direito estadunidense.
Aos olhos da academia brasileira, Duncan Kennedy é, porém, um jurista marginal.
Suas ideias e teorias parecem não ter o apelo necessário para entusiasmar os juristas do
Brasil. A adoção de visões filosóficas tanto estruturalista como fenomenológica talvez
explicasse a resistência; contudo, há diversos aclamados doutrinadores brasileiros que
utilizaram teorias modernas ou pós-modernas similares, como Miguel Reale, Tercio
Sampaio Ferraz Júnior e Gofredo da Silva Teles Júnior. Outra explicação seria o
envolvimento de Kennedy com a política, o que comprometeria, aos olhos de
brasileiros, sua imparcialidade e objetividade como teórico; todavia, tal justificativa
parece não se sustentar, na medida em que muitos notáveis juristas brasileiros
envolveram-se com a militância política, como Celso Lafer, Eros Grau e Manoel
Gonçalves Ferreira Filho. Outra justificativa seria o fato de Kennedy ser estadunidense,
tendo seu objeto de pesquisa o common law, tradição jurídica distante da brasileira.
Novamente, essa hipótese não encontraria sustentação, em razão da popularidade de
outros juristas estadunindeses, como Ronald Dworkin, John Rawls e Richard Posner.
Diante disso, qual seria a explicação?
29
Para responder essa questão, seria necessário seguir os passos de Duncan Kennedy
realizando uma análise jus-estruturalista do pensamento jurídico brasileiro, o que fugiria
dos objetivos desta introdução. Não obstante, parece que tanto as ideias políticas, teorias
jurídicas e críticas ao ensino do Direito formuladas por Kennedy não encontraram uma
audiência no Brasil. Politicamente, os partidos de esquerda não se desenvolveram ao
longo da crítica ao Marxismo de inspiração crítico-democrática; pelo contrário, as ideias
de materialismo histórico, conflito de classes e forte dirigismo estatal parecem habitar o
imaginário da esquerda brasileira, como observável pelos discursos e programas
partidários. No domínio da teoria jurídica, a consciência jurídica brasileira parece não
ter sido transformada ou fustigada pela crítica ao Liberalismo Jurídico como em outros
lugares. Daí ter sido facilitada a recepção das ideias neopositivistas de Dworkin, Rawls
e Posner, enquanto as teorias críticas do Direito foram rejeitas. Por fim, as críticas ao
ensino jurídico estadunidense parecem ser ideias fora do lugar no Brasil. Isso porque os
debates contemporâneos da academia brasileira estão centrados em questões que foram
objetos de discussão e síntese na década de 1960 nos Estados Unidos.
Portanto, o presente trabalho tem por objetivo oferecer à comunidade jurídica
brasileira um ponto de entrada na extraordinária literatura tanto de Duncan Kennedy
como do Movimento estadunidense de Direito Crítico.
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