Boola!
Duncan Kennedy
Trad. de Ana Caroline Pereira Lima
Thiago Santos Aguiar de Pádua
SUMÁRIO
“Como eu esCrevo” ..................................................................................................................... 11
Richard Posner
Tradução de Ana Caroline Pereira Lima
Thiago Santos Aguiar de Pádua
Boola! ..........................................................................................................................................16
Duncan Kennedy
Tradução de Ana Caroline Pereira Lima
Thiago Santos Aguiar de Pádua
a Comida fiCa na Cozinha: tudo que eu preCisava saBer soBre a interpretação de um estatuto eu aprendi quando tinha 9 anos .......................................................................................... 22
Hillel Y. Levin
Tradução de Jefferson Carús Guedes
Ana Caroline Pereira Lima
Thiago Santos Aguiar de Pádua
polítiCas púBliCas: uma ContriBuição suCinta à edifiCação de um modelo para sua análise .... 28
Victor Manuel Barbosa Vicente
1 Introdução ...........................................................................................................................................................29
2 Politicas públicas: alguns modelos para sua análise ..........................................................................................29
2.1 A análise institucional .............................................................................................................................................29
2.2 Redes de políticas públicas ....................................................................................................................................37
2.3 O modelo de luxos múltiplos ..............................................................................................................................39
2.4 Advocacy coalition framework .............................................................................................................................40
3 Considerações inais ............................................................................................................................................43
Refêrencias .............................................................................................................................................................43
direito à saúde, polítiCas púBliCas do sistema úniCo de saúde e aCesso ao serviço púBliCo
hospital e amBulatorial .............................................................................................................
49
Emerson Affonso da Costa Moura
Fabrizia da Fonseca Passos Bittencourt Ordacgy
1 Introdução ...........................................................................................................................................................50
2 O direito social à saúde ....................................................................................................................................... 51
3 A constituição de 1988 e as políticas de saúde ....................................................................................................54
4 A saúde pública e os serviços públicos ...............................................................................................................56
5 Conclusão ............................................................................................................................................................57
Referências .............................................................................................................................................................58
autismo: o ideal e o real na efetivação da deCisão jurisdiCional que implementa polítiCas
púBliCas ....................................................................................................................................... 60
Grasielly de Oliveira Spínola
1 Introdução ...........................................................................................................................................................60
2 Sobre o autismo: diagnóstico, sintomas e tratamentos ..................................................................................... 61
3 O controle jurisdicional de políticas públicas relacionadas ao autismo no Estado de São Paulo .....................62
3.1 Da ineiciência do julgado em razão da execução pela via individual ............................................................65
3.2 Dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos ...............................................................................65
3.3 Da Importância de se reconhecer os direitos e interesses difusos, no caso do autismo, para eiciência do
julgado........................................................................................................................................................................................ 66
4 O controle jurisdicional de políticas públicas relacionadas ao autismo no Estado do Rio Grande do Norte ..67
5 Conclusões...........................................................................................................................................................68
direito à saúde, polítiCas púBliCas e portadores de transtorno mental: a internação Compulsória do dependente químiCo no muniCípio do rio de janeiro ........................................... 72
Emerson Affonso da Costa Moura
Laila Rainho de Oliveira
1 Introdução ...........................................................................................................................................................72
2 O direito à saúde e as políticas públicas .............................................................................................................73
3 O dependente químico e a política pública de internação .................................................................................78
4 Estudo de caso: a internação compulsória no Rio de Janeiro ............................................................................ 81
5 Conclusão ............................................................................................................................................................84
Referências .............................................................................................................................................................85
produção de alimentos: agriCultura familiar x Cultura de exportação no Brasil, soB a
perspeCtiva da sustentaBilidade ................................................................................................. 89
Luá Cristine Siqueira Reis
João da Cruz Gonçalves Neto
1 Introdução ...........................................................................................................................................................90
2 Agricultura familiar no contexto contemporâneo ...............................................................................................90
3 Agronegócio no Brasil .........................................................................................................................................93
4 Reforma agrária, produção de alimentos e sustentabilidade .............................................................................94
5 Conclusão ............................................................................................................................................................96
Referências .............................................................................................................................................................97
direito agroalimentar e território: reflexões soBre o uso da água na atividade agríCola .100
Rodolfo Franco
1 Introdução ......................................................................................................................................................... 100
2 Quadro normativo sobre a água ........................................................................................................................ 102
3 Uso da água na atividade agrícola .................................................................................................................... 105
3.1 O aquífero guarani ................................................................................................................................................105
3.2 Água e território ....................................................................................................................................................106
3.3 Água e liberdade ....................................................................................................................................................107
4 Conclusão ...........................................................................................................................................................110
a Construção de novas polítiCas soCiais: o Caso de mato grosso do sul ............................... 114
Ricardo Luz Chagas Amorim
1 Introdução ..........................................................................................................................................................114
2 Exclusão social ..................................................................................................................................................115
3 As diiculdades dos anos 1990 e a nova política social sul-mato-grossenses.....................................................118
4 COGEPS e a gestão matricial das políticas sociais .......................................................................................... 122
5 FIS como garantia de recursos.......................................................................................................................... 125
6 Alguns números e observações sobre os impactos ........................................................................................... 129
7 Comentários inais............................................................................................................................................. 134
Referência............................................................................................................................................................. 135
programas soCiais Brasileiros e sua relação Com a poBreza, a desigualdade e o desenvolvimento .........................................................................................................................................138
Mirian Aparecida Rocha
Rosa Maria Olivera Fontes
Leonardo Bornacki de Mattos
Jader Fernandes Cirino
1 Introdução ......................................................................................................................................................... 139
2 Estudo sobre as inter-relações entre programas sociais, pobreza e desigualdade ......................................... 140
3 Metodologia.......................................................................................................................................................141
3.1 Modelos analíticos ...............................................................................................................................................141
3.2 Fonte de dados .....................................................................................................................................................142
4 Resultados ........................................................................................................................................................ 143
4.1 Indicadores multidimensionais ...........................................................................................................................143
4.2 Comportamento dos indicadores multidimensionais nas regiões brasileiras .............................................145
4.3 Ranking dos estados brasileiros ..........................................................................................................................147
4.4 Impacto dos programas sociais sobre os indicadores multidimensionais ....................................................148
5 Conclusão ..........................................................................................................................................................151
Referências ........................................................................................................................................................... 152
a jurisdição ConstituCional e a Contextualização do texto da Constituição federal de
1988: mutação ConstituCional ..................................................................................................155
Eduardo Sadalla Bucci
Introdução ............................................................................................................................................................ 156
Direito é alográico............................................................................................................................................... 156
A jurisdição constitucional como fator de estabilização institucional ................................................................ 160
Mutação constitucional: poder reformador ou interpretação constitucional? .................................................... 164
1. Mutação constitucional: delineação pela doutrina majoritária........................................................................ 166
2. Mutação constitucional à luz de o direito ser alográico: mudança das normas e não do texto constitucional ..... 167
Conclusão ............................................................................................................................................................. 170
polítiCas púBliCas na fronteira trinaCional:
o desafio ao pleno exerCíCio da Cidadania
....173
Priscila Lini
representação interventiva, jurisdição ConstituCional e Conflito federativo ...................186
Marcelo Rodrigues Mazzei
Sebastião Sérgio Silveira
Henrique Parisi Pazeto
Introdução ............................................................................................................................................................ 186
Aspectos gerais da intervenção federal ................................................................................................................ 187
Histórico da representação interventiva no Brasil............................................................................................... 190
A representação interventiva na Constituição Federal de 1988 ............................................................................191
Legitimação ativa ................................................................................................................................................. 193
Procedimento ....................................................................................................................................................... 194
Decisão ................................................................................................................................................................. 195
Conclusão ............................................................................................................................................................. 198
Referências .......................................................................................................................................................... 199
a liCitação púBliCa Como instrumento de desenvolvimento na perspeCtiva do paternalismo
liBertário...................................................................................................................................201
Felipe Furtado Ferreira
Eduardo Carlos Pottumati
1 Introdução ......................................................................................................................................................... 202
2 A licitação pública e sua função social ............................................................................................................. 202
3 Direito ao desenvolvimento sustentável ........................................................................................................... 206
4 A atividade de fomento..................................................................................................................................... 209
5 O paternalismo libertário como terceira via – simulitude com a atividade de fomento .................................. 210
6 Considerações inais .......................................................................................................................................... 212
Referências ........................................................................................................................................................... 213
triButação & regulação: um diagnóstiCo soBre inter-relações possíveis..............................215
Veyzon Campos Muniz
1 Introdução ......................................................................................................................................................... 215
1.1 Um necessário acordo semântico ao tratar de regulação ................................................................................216
2 Regulação da tributação.................................................................................................................................... 216
2.1 Apatia endêmica e a produção legislativa tributária .........................................................................................217
3 Tributação como regulação............................................................................................................................... 218
3.1 Medidas extraiscais: um instrumento regulatório ...........................................................................................218
3.2 Automatismo moral e a análise de impacto regulatório ..................................................................................220
4 Conclusões articuladas ...................................................................................................................................... 221
análise eConômiCa do direito: a efiCiênCia da norma jurídiCa na prevenção e reparação de
danos sofridos pelo Consumidor ...............................................................................................224
Héctor Valverde Santana
1 Introdução ......................................................................................................................................................... 225
2 Conceito de análise econômica do direito (AED) ............................................................................................ 225
3 Eiciência das normas jurídicas protetivas do consumidor ............................................................................. 227
4 Análise econômica da prevenção e reparação de danos sofridos pelo consumidor ......................................... 228
5 Conclusão .......................................................................................................................................................... 234
Referências ........................................................................................................................................................... 235
inovação para quem? o Caso da polítiCa de inovação da universidade federal de juiz de
fora ...........................................................................................................................................238
Marcos Vinício Chein Feres
Marcelo Castro Cunha Filho
1 Introdução ......................................................................................................................................................... 239
2 Integridade e ação comunicativa aplicada ao direito ....................................................................................... 240
3 A busca pelo desenvolvimento tecnológico e sua repercussão na ICT federal de juiz de fora ...................... 244
4 Por que o direito não concorda com uma política inovação utilitária? A deiciência da política da UFJF ..... 249
5 Conclusão .......................................................................................................................................................... 252
a ponderação Como meCanismo de solução de Conflitos entre prinCípios norteadores
do direito penal amBiental ....................................................................................................256
Maria Isabel Esteves de Alcântara
Michelle Lucas Cardoso Balbino
1 Considerações Iniciais ....................................................................................................................................... 257
2 Introito ao Estudo dos Princípios ..................................................................................................................... 257
3 Princípio do In Dubio pro Reo ......................................................................................................................... 260
4 Princípio do In Dubio pro Ambiente ou In Dubio Pro Nature ........................................................................ 261
5 A Ponderação como Mecanismo de Solução de Conlitos: Princípio “In Dubio pro Reo” Versus Princípio
“In Dubio pro Nature”...................................................................................................................................... 263
6 Considerações Finais ........................................................................................................................................ 268
Referências ........................................................................................................................................................... 269
a neCessidade de polítiCas púBliCas amBientais muniCipais e partiCipação popular para CoiBir
as Brigas de galo ........................................................................................................................273
Marco Lunardi Escobar
Lucia Santana de Freitas
Gesinaldo Ataíde Candido
1 Introdução ........................................................................................................................................................ 274
2 A proteção à fauna ............................................................................................................................................. 274
3 As normas ambientais e a defesa animal ......................................................................................................... 276
3.1 Maus tratos a animais: as rinhas de galo ...........................................................................................................277
3.2 A competência do município em matéria ambiental e a necessidade de políticas públicas para coibir as
rinhas de galos. ......................................................................................................................................................277
3.3 A falta de políticas públicas: seria falta de interesse?.......................................................................................279
3.4 A participação da sociedade civil como auxiliar na gestão ambiental ...........................................................279
4 Aspectos metodológicos.................................................................................................................................... 280
5 O Combate às brigas de galo no Rio Grande do Norte ................................................................................. 281
5.1 As operações de 2010 a 2012 ..............................................................................................................................281
5.2 Poder de polícia ambiental...................................................................................................................................283
6 Considerações inais ......................................................................................................................................... 284
DOI: 10.5102/rbpp.v4i1.2868
Boola!1
Duncan Kennedy*
Tradução de Ana Caroline Pereira Lima**
Thiago Santos Aguiar de Pádua***
Eu não me sinto um forasteiro ao escrever sobre Yale porque eu
frequentei a Faculdade de Direito de Yale, e pensando na minha época isso
me traz toda sorte de imagens do inal dos anos 1960 e início dos anos 1970.
Uma poderosa imagem que icou comigo todos estes anos é uma imagem
que poderia vir do livro de fotos de 1970 da revista Life: um homem e uma
mulher jovens, estudantes de graduação de Yale, em uma ala entregando
rosas para homens jovens, integrantes da Guarda Nacional chamados para
proteger as lojas na rua contra saques ou apenas atos de desobediência civil
no período do julgamento dos Panteras Negras em New Haven.
Os caras da Guarda Nacional inicialmente estavam aterrorizando em
seus uniformes, com seus riles, mas uma olhada mais de perto revelou
dentro deles alguns garotos de colégio tipo classe média alta, não se
esforçando para parecer insensíveis, apenas embaraçados, desviando os
olhos enquanto os portadores das lores se aproximavam deles ao longo da
calçada. Uma garota perguntou: “Ei, Joe, o que você está fazendo aqui?”
Mas também havia faces de trabalhadores e algumas faces raivosas do tipo
“seu babaca”. Havia faces brancas e negras na linha. As rosas não eram
inocentes.
Recebido em 01/06/2014
Aprovado em 01/06/2014
Artigo convidado
*
Duncan Kennedy é professor de Direito
em Harvard, bacharel em economia
pelo Harvard College (1964), bacharel
em Direito por Yale (1970). Foi um dos
fundadores do Critical Legal Studies. Foi
estagiário de Potter Stewart, Juiz da
Suprema Corte Americana, e detém o
título professoral de “Carter Professor of
General Jurisprudence”.
**
Mestranda em Direito (UniCEUB),
Pesquisadora-Discente
do
CBEC
– Centro Brasileiro de Estudos
Constitucionais.
***
Mestrando em Direito (UniCEUB),
Pesquisador-Discente do CBEC – Centro
Brasileiro de Estudos Constitucionais.
Bolsista da CAPES.
Em certo sentido elas eram equivalentes a armas, uma agressão contra
os garotos em seus uniformes, e também contra homens crescidos numa
peça escolar surreal na qual eles eram as “forças de ordem”, e nós os
insanos subversivos. Não era apenas uma peça, entretanto, não apenas
porque as armas pareciam estar carregadas, mas porque todos os tipos
de relacionamento (ignorados, temidos e sufocados) entre nós -, atores
itinerantes, meninos, meninas e guardas, - pareceram voar brevemente
como pássaros.
1
Publicado originalmente em 1996: Duncan Kennedy, “Boola!”, in Social Text, Volume 12, nº
4, pp. 31-36. Copyright, 1996, Duke University Press. Todos os Direitos Reservados. Republicado
com a autorização de Duke University Press, proprietário dos Direitos Autorais (Copyright holder).
www.dukepress.edu. Republicação por autorização. Pedido de autorização para tradução enviado em
20.05.2014, com a resposta autorizativa recebida em 21.05.2014.
NT: Optou-se por não traduzir o título (Boola!), em razão de ser uma expressão idiomática que
na prática se revela intraduzível. O artigo foi publicado em uma edição especial da revista “Social
Text” apelidada de “The Yale Strike Dossier”, originalmente composto por 14 escritos que abordam a
crise do trabalho acadêmico. A palavra “Boola” é a um só tempo parte do título (Boola Boola) e faz
parte do refrão do que nós chamaríamos no Brasil de uma espécie de “grito de guerra” comum em
atividades esportivas, sendo verdadeiro hino esportivo de Yale. A origem da palavra é controversa
mesmo para antigos alunos, especulando-se que eventualmente poderia signiicar “bom” em alguma
língua Polinésia. Cfr. HIRSH, Philip. The secret source of that silly tune: ‘Boola Boola’ has now been
part of Yale’s repertory of football ight songs for exactly a century. Yale Alumni Magazine, 2000.
Disponível em: <http://archives.yalealumnimagazine.com/issues/00_10/boola.html> Acesso em:
22 maio 2014.
Mesmo se o professor que lhe diz isso estiver usando uma gravata e um terno bonitos, e mesmo se
vocês tiverem lido seus livros e apostem a vida em sua habilidade em distinguir entre dois manuscritos
de Beowulf, ou mesmo que vocês se sintam honrados em serem escolhidos para fazer pesquisa para
ele, seu discurso estará equivocado. Vocês têm o direito de formar uma associação. Não é ilegal vocês
formarem uma associação, para forçar ou para barganhar coletivamente com Yale. Todo mundo nos
Estados Unidos (prisioneiros e soldados, talvez, excepcionados) tem o direito de formar uma associação,
isso não é ilegal, e não tem importância vocês serem estudantes.
O único ponto jurídico válido é que a Lei Federal de Trabalho2 , o estatuto da organização do trabalho
neste país, pode não se aplicar a vocês - e eu digo “pode não se aplicar” deliberadamente - se vocês são
estudantes de graduação. Se - uma grande ênfase no se - isso não se aplica a vocês, então o seu empregador
pode usar um monte de táticas contra a associação que seriam ilegais se vocês fossem protegidos pelo
estatuto. Pelas regras do estatuto, seriam práticas de trabalho injustas para disciplinar trabalhadores para
atividades associativas; se vocês não estão protegidos, e se também não há norma estadual que se aplique
a vocês, então o empregador não está violando a Lei se ele despedir você por barganhar ou se associar.
Não é uma desgraça estar em uma das categorias de trabalhadores que não estejam abarcadas pelo
ato normativo federal. As categorias não abarcadas incluem, por exemplo, trabalhadores rurais, que não
estão incluídos porque eles foram excluídos com vistas a obter ação através do Congresso (as forças que
vivem do trabalho rural são fortes o suiciente para deixá-los excluídos). O ato não inclui trabalhadores
domésticos pelas mesmas razões. Não estar coberto não signiica que o “Grande Papai Direito” decidiu
que vocês não deveriam se unir em associação. Não mesmo. Isso signiica que vocês devem ter sua
associação sem a sua ajuda, não signiica que - como no ditado popular, “você está desprotegido”.
Repetida algumas vezes a frase, “você está desprotegido” atrai alguma moderna conotação sexual. Isso
signiica: “Nós podemos fazer qualquer coisa que quisermos com vocês, e nós faremos, e as consequências
podem ser terríveis. Não esqueça nem por um minuto: VOCÊ ESTÁ DESPROTEGIDO”. Mas quando
um membro da faculdade diz que você está desprotegido porque é um estudante, ele ou ela estão
acariciando uma especulação jurídica. Como eu disse antes, é uma questão em aberto o fato de qualquer
estudante de graduação estar coberto ou não. O Ato Nacional das Relações Laborais (ANRL) não diz
que os estudantes não estão protegidos. Ele diz que funcionários são protegidos. Nenhuma Corte ou
agência administrativa decidiu ainda um caso sobre os estudantes a partir do “ANRL”, especialmente
sobre o tipo de relacionamento referente à universidade de Yale cujos estudantes graduandos ensinam
uma seção, e que tenha por empregador a sua universidade.
Minha própria opinião, falando como um professor de Direito, é: se Clinton for reeleito e o Conselho
Nacional das Relações Laborais permanecer um conselho liberal, é provável que estudantes da graduação
empregados como vocês vão ser reconhecidos. Estudantes empregados do seu tipo estarão cobertos. E
todas as pessoas que estão dizendo que vocês não estão protegidos porque não são empregados estarão
equivocados. Se Bob Dole for eleito, as coisas podem ser diferentes. Então, quando seus professores
estenderem o direito contra vocês, vocês devem rir: eles não sabem do que estão falando.
2
NT: A referência do texto é ao denominado “the New Deal National Labor Relations Act”, que doravante será referido no texto como
“Ato Nacional das Relações Laborais” (ANRL).
KENNEDY, Duncan; LIMA, Ana Caroline Pereira; PÁDUA, Thiago Santos Aguiar de. Boola. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 4, n. 1, 2014 p. 16-20.
Isso foi há muito tempo atrás, e a linha que amarra os oposicionistas ao longo das gerações foi
fortemente esticada e ainada. O que signiica hoje em dia juntar-se ao movimento trabalhista, se você
é um estudante de graduação em uma universidade de elite, pensando em si mesmo como parte da
tradição humanística ou da cultura cientíica e social? Uma coisa que isso signiica é que conversas
com seus professores, talvez não muitas, talvez não longas, são altamente carregadas como as conversas
daqueles dias. Uma imagem do direito aqui: professores dizem que vocês não tem o “direito” de formar
uma associação porque vocês são estudantes, ou que é inapropriado porque vocês são aprendizes, e não
trabalhadores.
17
Não é verdade que a alternativa ao “status quo” seja a organização sindical burocrática confrontar a
universidade no topo, destruindo o corpo-a-corpo, descentralizado, com relacionamentos emocionalmente
carregados que os estudantes de graduação possuem com a faculdade. Essa ideia vem em parte do que eu
somente posso chamar de propaganda do empregador sobre as associações, e em parte da realidade das
organizações dos trabalhadores da produção em grandes fábricas; mas isso é uma concepção equivocada
sobre o que é a sindicalização, como quando pessoas gerenciam para fazer auto-organização e criar,
especialmente neste tipo de contexto, algo como um movimento de trabalho vivo para nosso próprio
momento, para grandes e pequenos locais de trabalho, empregos de colarinho azul e de colarinho branco,
locais de trabalho com atmosferas bastante diferentes.
O direito laboral americano é facilitador; ele encoraja a auto-organização dos trabalhadores em
qualquer forma que eles queiram adotar. O movimento laboral americano, como uma instituição
organizada, não pode (na verdade não deve), impor a novas organizações trabalhistas nenhuma forma
ridícula de advertência dos empregadores. Não há nenhuma razão jurídica e nenhuma razão social (ou
institucional) para que as associações dos estudantes da graduação não devam nutrir e alimentar boas
relações entre estudantes e membros da faculdade, relações estas baseadas no contato corpo-a-corpo,
com relações completamente lexíveis entre membros da faculdade e estudantes individualmente. Se
houver um problema, não será sobre o que a sindicalização signiica em abstrato, mas sobre que formas
de auto-organização vocês mesmos deveriam escolher e como deveriam sentir - nem tudo sempre bom,
certamente - sobre ter que lutar e pechinchar e se comprometer consigo mesmos sobre este tipo de coisa,
mais do que deixar isto para a resolução das autoridades.
Não esqueça que não importa quantas vezes você diz a palavra aprendizagem; a universidade age como
uma única organização unitária com relação a muitas questões que afetam seus próprios interesses, e não
fazem isso de uma maneira descentralizada. Isso ixa as taxas, isso decide quantos de vocês empregarem,
isso molda as condições básicas de suas vidas como trabalhadores do centro, usando todo o poder que
vem de sua organização centralizada e unitária. E isso explora a fraqueza que advém do fato que vocês
negociam com o centro como indivíduos, com cerca de zero poder de barganha.
Tem um pouquinho de loucura nesta parte da retórica antisindicalização. Professores tendem a estar felizes
e orgulhosos se eles como puros pensadores tenham deixado o trabalho sujo de estabelecer os termos para a
administração. Eles dizem que não é sua culpa que vocês sejam explorados, porque eles não têm o controle;
então eles se viram e dizem que vocês não deveriam se organizar para negociar com o centro porque isso
vai paralisar ou matar suas relações calorosas com eles como indivíduos. Mas porque vocês devem negociar
com a administração como indivíduos quando eles negociam com você como um grupo unido? E porque
organizações deste nível deveriam interferir nas suas relações de amor cultivado, individual e idiossincrático
com eles como professores e supervisores, dia a dia?
Os reais problemas para professores são difíceis de imaginar, mas talvez eles saibam que eles competem
com vocês por recursos e compensação vis-à-vis com a administração, e, fazendo isso muito bem, um
pouco melhor do que fariam se vocês estivessem organizados. E então há a ideia do aprendizado. Esta
é uma ideia que eu penso tenha uma verdadeira atração, com signiicado emotivo e real para muitos
KENNEDY, Duncan; LIMA, Ana Caroline Pereira; PÁDUA, Thiago Santos Aguiar de. Boola. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 4, n. 1, 2014 p. 16-20.
Pensar sobre isso como um grupo bizarro de questões jurídicas é algumas vezes tranquilizador, eu
acho, como uma maneira de manter certa ambivalência. Pessoas, professores e estudantes que são contra
a associação, ou inseguros quanto a ela, estão algumas vezes respondendo a uma imagem do grande
trabalho, do sindicalismo industrial, que pode ser reforçada se se descobrir que estudantes de graduação
poderiam ser empregados para os propósitos da “ANRL”. Estudantes de graduação deveriam colocar os
capacetes, carregar marmitas metálicas e bater o relógio; quando pegar por si mesmo um copo de café
for uma questão de regras de associação trabalhista, inlexivelmente deinidas por gestão em negociação
com burocratas trabalhistas do topo. Existe um certo medo em perder o status de classe, que precisamos
apenas superar, mas também um medo de que as coisas boas sejam perdidas.
18
Nós não temos mais aprendizado. Legalmente, aprendizado costumava ser o seguinte: era contratual
e vocês eram delimitados por isso, mas se vocês fossem menores de idade, o contrato poderia ser feito
em seu favor por seu pai ou pelos supervisores locais dos pobres. Isso também era um status porque uma
vez que você anuiu você estava obrigado por suas regras.
Quando você era um aprendiz, seu mestre era legalmente obrigado a lhe prover hospedagem em
sua casa, e treinamento em sua arte ou ofício (arte ou ofício que você não poderia exercer a não ser
através dele e de outros membros de sua guilda). Em troca você teria concordado em trabalhar para ele
e sujeitar a si mesmo a disciplina de dois diferentes tipos. Se você desistir, poderia ser trazido de volta à
força - a justiça local de paz traria você de volta para a criadagem de seu mestre. Dentro da casa, você
tinha o dever de obedecer aos seus mandamentos; ele poderia enviar vocês para as autoridades locais
para punição se você desobedecesse ou se comportasse mal. Nos anos 1950, milhões de criancinhas em
idade escolar leram um romance bombástico chamado “Johnny Tremain”, sobre um aprendiz no tempo
de Paul Revere. Eu me lembro de uma cena horripilante na qual prata líquida escorreu pelas mãos de
Johnny...coisas poderiam ir muito mal.
Claro, isso não é tão simples. O aprendizado possui conotações positivas também. Isso evoca a verdade
da iliação, o nexo emocional que algumas vezes existe entre estudantes nos programas de pós-graduação
e seus professores, o elemento de vulnerabilidade, a autoentrega do estudante, o elemento da boa emoção
e responsabilidade patriarcal e matriarcal em seus professores.
Uma das coisas que foram mais poderosas para mim como um estudante de Direito de Yale foi a
experiência do desapontamento, da decepção das minhas expectativas como um aprendiz. Eu era um
forte anticomunista da esquerda liberal que queria se juntar a parte progressiva da classe dominante para
fazer boa política. Eu me identiiquei, fácil e rapidamente, com os principais professores ativistas, que
eram liberais e pareciam ter exatamente essa agenda, como um acesso ao poder capaz de realiza-la.
Eu não gostei de radicais no começo. Eu não era um radical. Eu fui radicalizado pela faculdade
de direito, por minhas interações com os meus professores ao invés da experiência no Movimento.
Um evento em particular cristalizou minha desilusão. Alexander Bickel, um brilhante professor da
complicada esquerda liberal e líder intelectual, brevemente um redator de discursos para Bobby Kennedy,
estava alito com a insolência dos estudantes ativistas, particularmente por parte da primeira geração de
estudantes negros na faculdade de direito que lá estavam em razão de um transcendental e admirável
programa progressista. Ele era a quintessência liberal-contra-juramentos-de-lealdade, mas na primavera
de 1970, de maneira absurda, embora de boa-fé, conforme me pareceu, ele sentiu que havia um paralelo
entre ativistas radicais (negros e brancos) e os ativistas “Camisas Marrons” no im da república de
Weimar. Ele propôs que, na admissão, todos os alunos deveriam assinar um juramento de lealdade ao
“empreendimento acadêmico”, embora sem mecanismos de coação, e mais como um ato simbólico.
Não foi a proposta que nos aligiu, mas nossa discussão civilizada com ele. Ele parecia assustadoramente
diferente de como eu o imaginava. Ele parecia pensar que nós, seus alunos, em certo sentido seus
seguidores, éramos assustadoramente diferentes, também. No início, houve uma troca legal, e em seguida,
um momento em que ele, em que nós, uma geração inteira, realmente, apenas capotamos. Você podia ver
em sua linguagem corporal, em seus olhos, que era repulsa, era medo, que era vergonha pelo fato de que
nós estávamos os empurrando da esquerda.
Era também mais raiva do que poderíamos explicar: as nossas exigências pareciam apenas a extensão
do que eles nos ensinaram, demandas em torno da guerra do Vietnã, raça, sexo, as demandas por mais
poder aos estudantes a administração da escola. No momento de encararmos nós mesmos – nosso
KENNEDY, Duncan; LIMA, Ana Caroline Pereira; PÁDUA, Thiago Santos Aguiar de. Boola. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 4, n. 1, 2014 p. 16-20.
professores e para muitos estudantes. Mas como a maioria das imagens ou “iguras” com este tipo de
poder, isto tem o seu lado sombrio, seu lado hierárquico “neoGotico”, condizente com a arquitetura de
escolas como Yale.
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O resultado foi que eles se retiraram de nós e nós deles, uma retirada que foi dolorosa, mas nunca
concluída, porque estávamos ligados uns ao outros, querendo ou não, mesmo quando estávamos mais
irritados com eles. Eu penso que tínhamos razão em estar com raiva, bem como estávamos com dor.
Como icou mais intensa, os que eram malvados se tornaram cada vez mais malvados, e os que era tímidos
se tornaram cada vez mais tímidos. Aqueles que eram da faculdade júnior que eram tímidos, mas bravos,
apesar de si mesmos, ou simplesmente corajosos, se machucaram, às vezes seriamente, talvez eles tenham
tido suas posses negadas, porque eles tentaram proteger-nos de uma forma ou de outra, e isso ainda não
é esquecido. Às vezes parecia que os malvados – ou talvez apenas aqueles cuja maldade prejudicasse mais
– eram aqueles que tinham a coniança inconsciente de que eram iluminados. Progressismo americano.
Eles foram os únicos que disseram: “Quem vocês pensam que são? Camponeses bolivianos? Você são
estudantes de direito de Yale”. Foi complicado, a sensação de ser humilhado por um privilégio, por uma
pessoa que era incrivelmente mais privilegiada, uma pessoa dizendo-lhe: “Porque vocês são privilegiados
que vocês tem que fazer tudo o que eu digo.”
Nós não izemos o que eles disseram, ao invés disso, apesar de nós pensarmos que aprendemos com
nossas tensões e conversas decepcionantes com eles, agora nós, minha geração, somos eles. Nós somos o
corpo docente que no passado eram outras cerdas, envergonhados, encurralados, hipócritas, e com uma
mente muitas vezes confusa na argumentação quando os estudantes da graduação nos dizem coisas deste
tipo para “eles”, nos nossos dias.
Uma de suas funções mais básicas como estudantes de graduação é o de reviver o senso moral de seus
interlocutores do corpo docente, mantendo-os e pressionando-os e nem mesmo por um minuto deixarse ser levado de volta para a sensação de que talvez vocês estejam sendo uma criança má e talvez vocês
estivessem errados desde o início.
Nisto, os ativistas de hoje do sindicato de estudantes de graduação são mais parecidos com os militantes
do movimento trabalhista americano do que quando apareceram pela primeira vez. Uma boa parte da
luta, o tempo todo, tem sido contra a parte de nós que responde com medo e passividade não apenas
às ameaças materiais, mas às ameaças à legitimidade do patrão, o mestre dos aprendizes. Superar isso,
através do tipo de ações que os corajosos membros do GESO tem tomado, é para mim o que é redentor
no momento da junção do trabalho organizado, não menos hoje que a cem anos atrás.
KENNEDY, Duncan; LIMA, Ana Caroline Pereira; PÁDUA, Thiago Santos Aguiar de. Boola. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 4, n. 1, 2014 p. 16-20.
terrível eu – em seus olhos, nós pensamos (e você poderia pensar hoje) “talvez eu seja um criminoso,
talvez estejamos destruindo a comunidade acadêmica. “Então, você pensa... “Nahh”.
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