
Como já se vem tornando habitual saímos com a auto-caravana para a “Romaria Centenária” do final das Festas da Torreira, à meia-noite do dia seis para sete de Setembro.
Noite do fogo de artifício no mar, era suposto que o trânsito estivesse compacto na saída, mas muito pelo contrário, chegamos por entre uma amálgama de carros e peões cerca das três da madrugada, com duas lindas horas passadas desde a chegada à ponte da Varela até ao estacionamento desfrutando o maravilhoso panorama daquela sociedade agitada onde as noites foram os dias para milhares de jovens que se espalhavam por ali e se apinhavam ao longo da praia entre o palmilhar nocturno das areias bem junto às ondas e as petiscadas nos bares bem despertos da zona, ao som das suas músicas favoritas atroando os ares a distâncias consideráveis até cerca das nove da manhã, hora em que tudo para eles adormecia.
Nada de desacatos... nada de confusões. Animação perfeita.
A “feira”, nas ruas principais, bem agradável à vista e à bolsa.
A noite seguinte trouxe o fogo de artifício na ria, espectáculo ímpar observado por centenas de milhar de pessoas de todas as idades, credos, cores e condições.
No final, tranquilamente, os veículos esperavam o brando movimento da multidão compacta desde bebés dormindo placidamente nos carrinhos aos mais idosos agarrados à pouca força da vida. Com o maior respeito mútuo que se possa imaginar, como corrente de água tranquila deslizando em terreno plano, encaminhavam-se para aplaudir a artista que os esperava e com quem foi estabelecida uma calorosa intercomunicação. A igreja, meigamente aberta, convidou alguns a entrar.
Espectáculo lindo de se ver... e melhor de se sentir!
No termo das festas foi chegada a hora de agraciar os patronos da localidade: a Natividade de Nossa Senhora ali invocada como Senhora do Bom Sucesso, e o jovem Mártir S. Paio. Foi junto à sua minúscula capela que D. António, Bispo de Aveiro, ladeado por nove Presbíteros e um Diácono, todos da região limítrofe da Torreira e conterrâneos do Pároco daquela comunidade, Padre Abílio Araújo, presidiu à Eucaristia. O Padre Abílio foi incansável na vigilância apertada de todos os momentos e intervenientes na celebração, deslocando-se rapidamente em todas as direcções tal como criança atenta e curiosa repleta de sorrisos amáveis e gestos encantadores.
Antes do início da procissão orientou as pessoas no cumprimento de promessas a se colocarem entre os onze andores que os restantes fiéis deviam ladear, pois atrás da música não deveria ir ninguém.
Um facto curioso é que duas senhoras de tronco bem descapado alternavam entre si a posse de um bebé vestido de anjo... que o Padre Abílio olhou inúmeras vezes... mas carinhosa e meigamente!...
D. António agradeceu o maravilhoso trabalho do Pároco e de todos os que com ele colaboravam; acarinhou o clero presente, as autoridades, o povo residente e os visitantes, lembrou os emigrantes, os falecidos, as comunidades vizinhas; chamou todos os padres presentes pelos seus nomes próprios; enumerou factos concretos da vida social da forma mais simples e elucidativa, sem restrições a nada nem a ninguém.
Na participação na Eucaristia aglomerou-se uma numerosa multidão... e uma multidão ainda maior fez cordão nas bermas das ruas na direcção da igreja.
Durante o trajecto da procissão, os comentários que inevitavelmente ouvi são de um povo que vagueia sedento de algo que não sabe como encontrar. Talvez... quando houver mais coerência nos que se dizem católicos e todos os nossos Bispos e Padres tiverem a linguagem e comportamento do D. António e do Padre Abílio, as pequenas “multidões” se possam tornar em grandes “MULTIDÕES”!...
Não podemos iludir-nos! As palavras só convencerão... quando provindas do coração da vida!...
Prof. Hermínia Nadais
A publicar no “Notícias de Cambra”