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Brazilian Journal of Development 28352

ISSN: 2525-8761

Estudo dos recalques primários em um aterro executado sobre a argila


mole do Sarapuí

Study of primary settlements in a landfill built on Sarapuí soft clay


DOI:10.34117/bjdv9n10-059

Recebimento dos originais: 08/09/2023


Aceitação para publicação: 11/10/2023

Eliomar Gotardi Pessoa


Mestre em Engenharia Geotécnica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
Mestre em Engenharia e Desenvolvimento Sustentável
Instituição: Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
Endereço: Ronaldo Scampini, 440, Jardim da PenhaVitória – ES, CEP: 29060-760
E-mail: [email protected]

Luana Machado Feitosa


Tecnóloga em Administração e Finanças
Instituição: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI)
Endereço: 271 Citrus Dr, Kissimmee, Flórida - Estados Unidos
E-mail: [email protected]

Vitor Pereira e Padua


Graduado em Engenharia Química
Instituição: Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
Endereço: Rua Amarantina 18, Taquara, Rio de Janeiro – RJ, CEP: 22710-180
E-mail: [email protected]

Adonias Gomes Pereira


Tecnólogo em Engenharia de Petróleo
Instituição: Instituto de Educação Tecnológica Avançada da Amazônia (IETAAM)
Endereço: 10548 Demilo Place, Orlando, Flórida - Estados Unidos
E-mail: [email protected]

RESUMO
Os efeitos do adensamento sempre foram um desafio para a Engenharia Civil, uma vez
que os recalques gerados por esse fenômeno podem produzir inúmeros problemas para a
obra. Para o presente trabalho, foi escolhido o caso do Aterro Experimental II
implementado sobre uma camada de argila mole do Sarapuí, na Baixada Fluminense/RJ.
A partir dos ensaios oedométricos realizados, é possível calcular o recalque primário ao
final do processo. Além disso, pelo fato de a extensão do aterro ser muito maior do que a
camada compressível, o adensamento pode ser modelado através da equação do
adensamento unidimensional (Equação Diferencial Parcial linear), cuja solução é dada
por meio de Séries de Fourier. Através dela, é gerado um ábaco relacionando a
porcentagem de adensamento já ocorrido versus o tempo. Contendo os valores de
recalque primário final e porcentagem de adensamento, pode-se plotar gráficos de
recalque ao longo do tempo. Por fim, com base na coleta das leituras das placas de
recalque instaladas no local, é realizada uma comparação entre os valores teóricos e
experimentais, mostrando que os valores inicialmente estimados para o coeficiente de

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adensamento não estavam de acordo com a realidade do local e que a compressão


secundária deve ser levada em consideração nesse caso.

Palavras-chave: adensamento, equação diferencial parcial, recalque, série de fourier.

ABSTRACT
The effects of densification have always been a challenge for Civil Engineering, since the
settlements generated by this phenomenon can produce numerous problems for the work.
For the present work, the case of the Experimental Landfill II implemented on a layer of
soft clay from Sarapuí, in Baixada Fluminense/RJ, was chosen. From the oedometric tests
carried out, it is possible to calculate the primary settlement at the end of the process.
Furthermore, because the landfill extension is much greater than the compressible layer,
consolidation can be modeled using the one-dimensional consolidation equation (linear
Partial Differential Equation), whose solution is given through Fourier Series. Through
it, an abacus is generated relating the percentage of densification that has already occurred
versus time. Containing the values of final primary settlement and percentage of
consolidation, settlement graphs can be plotted over time. Finally, based on the collection
of readings from the pressure plates installed at the site, a comparison is made between
theoretical and experimental values, showing that the values initially estimated for the
densification coefficient were not in accordance with the reality of the site and that
secondary compression must be taken into consideration in this case.

Keywords: density, partial differential equation, repression, fourier series.

1 INTRODUÇÃO
1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
De acordo com ALMEIDA e MARQUES (2014), os solos moles são compostos
por sedimentos argilosos com valores de SPT ≤ 4, ou seja, argilas moles ou areias
argilosas fofas de deposição recente. Esses tipos de solo têm origem fluvial e estão
presentes em todo o mundo, com maior intensidade no Brasil e outros países com costas
litorâneas extensas.
Apesar de bastante comuns, os solos moles têm algumas características
desfavoráveis como alta compressibilidade e baixa resistência ao cisalhamento, tornando
necessário um maior cuidado ao se executar estruturas sobre esse tipo de solo. Esta alta
compressibilidade dos solos moles faz com que surjam recalques de grande magnitude,
gerando efeitos indesejáveis a longo prazo.
Esses recalques são, em geral, causados pelo adensamento do solo, que é o
incremento de deformação devido a saída de água do sistema, com a redução do índice
de vazios. No adensamento primário esse fenômeno ocorre devido à poropressão
provocada por um acréscimo de tensão no solo. Dessa forma, a velocidade com que

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acontece o adensamento depende da permeabilidade do solo, geralmente baixa em argila,


fazendo com que os recalques demorem mais para se estabilizar. (LEIROS, 2017)

1.2 OBJETIVO
O objetivo desse trabalho é efetuar uma análise dos recalques em um aterro
experimental real executado na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro. Todos os dados
sobre o aterro e a instrumentação utilizada está em TERRA (1988).

1.3 METODOLOGIA
Os recalques são calculados por meio de TERZAGHI (1943) apud TERRA (1988)
e, posteriormente, comparados com os valores da instrumentação através do gráfico
recalques vs tempo.

2 CASO ESTUDADO
O Instituto de Pesquisas Rodoviárias (IPR) patrocinou a construção de dois aterros
experimentais para fins de pesquisa no depósito de argila mole, situado no Rio de Janeiro,
Baixada Fluminense, km-16 da BR-040 (Rio-Petrópolis). O caso estudado no presente
trabalho refere-se ao aterro experimental II executado no local. A área também foi
conhecida como “Área Experimental do Sarapuí”.
Segundo TERRA (1988), as características a respeito do depósito de argila estão
descritas a seguir:
• Espessura de aproximadamente 10 m sobrejacente à uma camada arenosa;
• Nível d’água coincidente com o nível do terreno durante todo o processo
de adensamento;
• Consiste em um sedimento flúvio-marinho, com teor de matéria orgânica
variando de 4,0 a 6,5%;
• Considerado recente do ponto de vista geológico (6.000 a 10.000 anos);
• O principal argilomineral presente é a caulinita, possuindo, ainda, ilita e
montmorilonita;
• Tensão de sobreadensamento média (σ’vm) da argila igual a 10,5 + 3,9z,
sendo z a profundidade;
• Resistência não drenada (Su) variando de 8 kPa a 18 kPa;
• Para amostras retiradas a menos de 2,0 m de profundidade: c’ = 15 kPa e
ϕ' = 30°;

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• Para amostras retiradas a mais de 2,0 m de profundidade: c’ = 0 kPa e ϕ' =


25°;
• Entre 4,0 m e 10,0 m: CC = 1,53 e CR = 0,34;
• mv = 0,003 m²/kN;
O aterro experimental possui 330 m de comprimento e 400 m de largura e foi
dividido, ao longo do seu eixo longitudinal, em sete seções (A até G), conforme a Figura
1. Cada seção apresenta características individuais, como mostra a Tabela 1. No presente
trabalho, estudaremos as seções A e G, que são as que não apresentam reforço com drenos
verticais, nos quais há fluxo horizontal.

Figura 1: Planta e corte longitudinal projetados para o aterro experimental II (TORRES, 1988).

Fonte: Autor

Tabela 1: Características das seções do aterro experimental II (TORRES, 1988).


Seção Tipo de Espessura do Tipo de dreno Diâmetro Espaçamento Tipo de Quantidade
colchão colchão (m) (m) (m) malha de drenos
A Geotêxtil 0,0045 - - - - -
B Areia 0,41 Ponta fechada 0,40 2,50 Quadrada 216
C Areia 0,32 Ponta aberta 0,40 2,50 Quadrada 168
D Areia 0,31 Jato d’água 0,40 2,50 Quadrada 168
E Areia 0,43 Fibro-químico 0,05 1,70 Quadrada 320
F Areia 0,39 Geotêxtil 0,01 2,00 Quadrada 322
G Areia 0,34 - - - - -
Fonte: Autor

Além disso, o aterro foi executado em três etapas de carregamento, conforme


ilustra a Figura 2.

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• 1ª Etapa de carregamento: Construção de colchão drenante de areia, de


peso específico médio de 20,2 kN/m³, com altura aproximada de 0,50 m. Posterior
deposição de material de jazida (areia siltosa), com peso específico médio 19,7
kN/m³, até a altura aproximada de 1,0 m.
• 2ª Etapa de carregamento: Deposição de material de jazida (areia siltosa),
com peso específico médio 19,7 kN/m³, até a altura aproximada de 2,0 m.
• 3ª Etapa de carregamento: Deposição de material de jazida (areia siltosa),
com peso específico médio 15,8 kN/m³, até a altura aproximada de 3,5 m.
Essas etapas se dividiram em duas fases, com a primeira fase abrangendo as duas
primeiras etapas, e a segunda fase correspondendo à terceira etapa de construção.

Figura 2: Seção transversal projetada do aterro experimental II (TORRES, 1988).

Fonte: Autor

As medições de recalque nas diferentes seções do aterro experimental II foram


realizadas através de placas de recalques e placas magnéticas (aranhas). Para a medida de
poropressões, utilizaram-se piezômetros do tipo Casagrande. A Figura 3 ilustra a seção
transversal com o plano de instrumentação.

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Figura 3: Seção transversal com a instrumentação de campo (TORRES, 1988).

Fonte: Autor

3 METODOLOGIAS UTILIZADAS PARA O CÁLCULO DE RECALQUES


Existe uma parcela do recalque que ocorre imediatamente após a aplicação
carregamento: o recalque inicial ou imediato. Para a estimativa desse, os autores
utilizaram a teoria de GIROUD (1972).
Já as análises teóricas sobre o cálculo de recalques primários são, via de regra,
deduzidas através da solução clássica de adensamento unidimensional de TERZAGHI
(1943). Como é admitido que a extensão do aterro é muito maior do que a espessura da
camada mole, conclui-se que essa teoria poderá nortear o estudo das seções A e G (as
demais, por terem dreno, não são contempladas por essa metodologia e não serão
analisadas neste trabalho).

3.1 ESTIMATIVA DO RECALQUE INICIAL OU IMEDIATO POR GIROUD (1972)


O recalque inicial é aquele que ocorre imediatamente após a aplicação do
carregamento e são associados às deformações cisalhantes elásticas não drenadas. Assim,
os recalques iniciais são determinados com o auxílio da Teoria da Elasticidade.
Uma maneira conveniente para o cálculo dos recalques iniciais em aterros sobre
solos moles é através da Equação (1) e do gráfico proposto por GIROUD (1972) apud
TERRA (1988), conforme a Figura 4. A Tabela 1 mostra os resultados, tendo como
recalques iniciais totais de 4,2cm para a seção A e 7,9cm para a seção G.

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Onde:

r0 = recalque inicial ou imediato;


γ = peso específico total do aterro;
h = altura do aterro;
r1 = coeficiente das dimensões do aterro relativo à 2H/b1, sendo H a altura da camada compressível;
r2 = coeficiente das dimensões do aterro relativo à 2H/b2;
b1 e b2 = definidos na Figura 1;
Eu = Módulo de Elasticidade não drenado, calculado em função do módulo cisalhante G, o qual foi
encontrado através de ensaios.

Figura 4: Gráfico para auxílio do cálculo do recalque inicial (GIROUD, 1972 apud TERRA, 1988).

Fonte: Autor

Tabela 2: Recalques iniciais das seções do aterro experimental II.

Fonte: Autor

3.2 ESTIMATIVA DO RECALQUE PRIMÁRIO PELOS DADOS DO ENSAIO


OEDOMÉTRICO
Como o solo compressível está sobreadensado e sua espessura é muito menor do
que a extensão do aterro que será executado sobrejacente a ele, a magnitude do recalque

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final pode ser estimada através da Equação (2), cujos parâmetros provêm do ensaio
oedométrico. Para espessuras de solo compressível maiores do que 3 metros, recomenda-
se dividi-la em camadas de 1m ou 2m de espessura (MARTINS e ABREU, 2002).

Onde:

r = recalque primário;
hi = espessura da camada i de solo compressível;
e0i = índice de vazios inicial da camada i de solo compressível;
Cri = índice de recompressão da camada i de solo compressível;
Cci = índice de compressão da camada i de solo compressível;
σ′vmi = tensão de sobreadensamento da camada i de solo compressível;
σ′v0 = tensão vertical efetiva inicial, antes da construção do aterro, na metade da camada i de solo
compressível; σ′vfi = tensão vertical efetiva final, após a construção do aterro, na metade da camada i de
solo compressível.

Os parâmetros extraídos dos ensaios oedométricos estão nas Tabela 3 e 4,


conforme LEIRA (2017). Considerando a submersão do aterro e aplicando a Equação
(2), constata-se que o recalque primário para a seção A é de 0,70m. Considerando o
recalque imediato calculado no item 3.1, o recalque primário final é de 0,74m. Já para a
seção G, o recalque primário é de 1,18m. Somando com o recalque imediato, o recalque
primário final é de 1,26m.

Tabela 3: Parâmetros da argila de Sarapuí com base nos ensaios oedométricos – Seção A.
Camada esp (m) z méd (m) γsat (kN/m³) σ'v0 (kN/m²) σ'vm (kN/m²) Cr Cc e0 OCR
1 1,0 0,5 12,74 1,37 12,20 0,22 1,49 4,38 8,91
2 1,0 1,5 12,74 4,11 16,02 0,22 1,49 4,38 3,90
3 1,0 2,5 12,74 6,85 19,85 0,22 1,49 4,38 2,90
4 1,0 3,5 12,74 9,59 23,67 0,22 1,49 4,38 2,47
5 1,0 4,5 12,75 12,38 27,49 0,19 1,27 3,9 2,22
6 1,0 5,5 12,93 16,12 31,31 0,18 1,18 3,69 1,95
7 1,0 6,5 13,10 20,15 35,13 0,16 1,09 3,48 1,74
8 1,0 7,5 13,28 24,60 38,96 0,15 1,00 3,27 1,58
9 1,0 8,5 13,46 29,41 42,78 0,14 0,90 3,06 1,46
10 1,0 9,5 13,63 34,49 46,60 0,12 0,81 2,85 1,35
11 1,0 10,5 13,81 40,01 50,42 0,11 0,72 2,64 1,26
Fonte: Autor

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Tabela 4: Parâmetros da argila de Sarapuí com base nos ensaios oedométricos – Seção G.
Camada esp (m) z méd (m) γsat (kN/m³) σ'v0 (kN/m²) σ'vm (kN/m²) Cr Cc e0 OCR
1 1,0 0,5 12,74 1,37 12,20 0,22 1,49 4,38 8,91
2 1,0 1,5 12,74 4,11 16,02 0,22 1,49 4,38 3,90
3 1,0 2,5 12,74 6,85 19,85 0,22 1,49 4,38 2,90
4 1,0 3,5 12,74 9,59 23,67 0,22 1,49 4,38 2,47
5 1,0 4,5 12,75 12,38 27,49 0,19 1,27 3,90 2,22
6 1,0 5,5 12,93 16,12 31,31 0,18 1,18 3,69 1,95
7 1,0 6,5 13,10 20,15 35,13 0,16 1,09 3,48 1,74
8 1,0 7,5 13,28 24,60 38,96 0,15 1,00 3,27 1,58
9 1,0 8,5 13,46 29,41 42,78 0,14 0,90 3,06 1,46
10 1,0 9,5 13,63 34,49 46,60 0,17 0,76 2,85 1,35
Fonte: Autor

3.3 ESTIMATIVA DO RECALQUE A UM TEMPO QUALQUER PELA TEORIA DO


ADENSAMENTO UNIDIMENSIONAL DE TERZAGHI
O adensamento é o processo de compressão do solo saturado ao longo do tempo.
Esse fenômeno é ocasionado por um carregamento imposto ao solo que gera um excesso
de poro-pressão na água de seus vazios. Conforme essa água é expulsa da massa de solo,
com a redução do volume de vazios, há uma transferência gradual desse carregamento
para o esqueleto sólido.
Baseando-se na premissa de que para cada índice de vazios há uma tensão máxima
efetiva que pode ser suportada pelo esqueleto sólido, temos o seguinte diagrama de índice
de vazios (e) x tensão efetiva vertical (σ’v).

Figura 5: Tensão efetiva vertical (σ’v) vs índice de vazios (e).

Fonte: Autor

Os pontos A e C estão sobre a curva de compressão edométrica, com A


representando a condição inicial e C, a condição final. O excesso de poro-pressão gerado
pelo carregamento Δσ’v é representado pela letra “u”.

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No instante que um solo saturado com as condições do ponto A é carregado de


Δσ’v, a tensão em seu esqueleto sólido continua como σ’v0 e é gerado um excesso de
poro-pressão u0 na água. Com o passar do tempo, a água vai sendo expulsa, o índice de
vazios diminuindo e esse excesso de poro-pressão vai se dissipando, pois o esqueleto
granular vai sendo carregado. Esse é o processo de gradual compressão do solo, chamado
de adensamento, e a porcentagem de adensamento pode ser medida pelo grau de evolução
do fenômeno.

Ou seja:

U é igual a 0% no intante de aplicação do carregamento e gradualmente aumenta atpe 100% a medida que
o índice de vazios decai de e0 para ef.

Além disso, o coeficiente de compressibilidade é numericamente igual à


inclinação da reta no diagrama e vs σ’v, dessa forma ele pode ser expresso por:

São admitidas as seguintes hipóteses simplificadoras para a teoria do


adensamento unidimensional de Terzaghi:
1) Solo homogêneo;
2) Solo saturado;
3) Grãos e água são considerados incompressíveis quando comparados ao
esqueleto sólido;
4) Não há diferença de comportamento entre camadas de argila de pequenas
e grandes espessuras;
5) A compressão é unidimensional (vertical);
6) O fluxo de água é unidirecional (vertical);
7) É válida a Lei de Darcy (v=ki);

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8) Os parâmetros são considerados como constantes;


9) É válida a relação idealizada para e vs σ’v;
10) As deformações e deslocamentos são admitidos como infinitesimais.
A equação de adensamento unidimensional é uma equação diferencial parcial
linear e é expressa pela Equação (3):

Onde:

u = excesso de poropressão em um dado tempo t; t = tempo; z = distância medida da superfície da camada


de argila até o ponto considerado; cv = coeficiente de adensamento vertical, dado pela Equação (4).

Sendo,

kv = coeficiente de permeabilidade vertical; e = índice de vazios; γ_w = peso específico da água; av =


coeficiente de compressibilidade, através da Equação (2).

O valor de cv é admitido como constante tanto com a profundidade (z) e o tempo


(t) de acordo com as hipóteses (i) e (viii), respectivamente.
Para a resolução da equação diferencial do adensamento temos as seguintes
condições de contorno:
Para z = 0 ⟶ u(0,t) = 0
Para z = 2H ⟶ u(2H,t) = 0
Para t=0 ⟶ u(z,0) = Δσ(z) = u0(z)
Sendo u(z,t) a função do excesso de poro-pressão, admite-se que u(z,t) = f(z).g(t).
Dessa maneira, a equação do adensamento (3) pode ser escrita como:

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Ou

Nota-se que membro esquerdo da equação (6) é independente do tempo (t),


enquanto o membro da direita não depende da profundidade (z). Como a profundidade
e o tempo são quaisquer e independentes, conclui-se que ambos os membros podem ser
considerados como constantes. Essa constante será chamada de -A2, logo essa equação
é subdividida em duas.

f′′(z) = −A2f(z) (9)

Cuja solução é f(z) = C1cosAz + C2senAz (10)


A segunda equação diferencial fica:

g′(t) = −A2cvg(t) (11)

(12)
Cuja solução é g(t) = C3e−A2cvt
As constantes C1, C2 e C3 deverão ser determinadas com o auxílio das condições
de contorno do problema.
Como u(z,t) = f(z).g(t), então a solução da equação diferencial é:

u(z, t) = (C1cosAz + C2senAz) C3e−A2cvt (13)

Podendo ser reescrita como:

u(z, t) = (C4cosAz + C5senAz) e−A2cvt (14)

Satisfazendo a 1ª condição de contorno de que para z = 0, u(0,t) = 0, temos que:

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0 = (C4cos0 + C5sen0)e−A2cvt → C4 = 0 (15)

Reduzindo a expressão (12) para a equação (14) abaixo.

u(z, t) = C5senAz e−A2cvt (16)

Aplicamos agora a 2ª condição de contorno, a qual define que para z=2H,


u(2H,t)=0.

0 = C5sen2AH e−A2cvt → sen2AH = 0 (17)


Ou seja, 2AH = nπ, ou ainda A = para n = 1, 2, 3, ...
2H

A equação (14) se escreve então da seguinte maneira:

− 2 22cvt
nπz nπ , n = 1,2, 3 … (18) u(z, t) = C5sen
e 4H 2H

A solução típica dessa equação é: u(z, t) = F1sen e−4H2cvt + F2sen 2π z

Para a terceira condição de contorno: quando t=0, u(z,0) = u0(z) = u0.

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A equação acima é uma expansão da série de Fourier em senos da função u = u 0


que é constante no intervalo [0,2H]. Os coeficientes Fn da expansão em série de Fourier
em senos que representa a função u0 no intervalo [0,2H] podem ser determinados como:

Ou seja, todos os coeficientes de ordem par da série de Fourier são nulos, e os


demais, de ordem ímpar, são:

A função u(z, t) resulta em:

Definindo o fator tempo T como: T = cvt H²

E chamando: (2m + 1) =M
A função u(z, t) pode ser reescrita como:

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A partir do somatório acima, foi feito um gráfico (u⁄u0)x(z⁄H) para valores fixos de
T e variando z/H de zero até 2. Com os valores de T e z/H definidos foi feito o cálculo do
somatório dos n primeiros termos, seguido da soma dos n+1 primeiros termos, e assim
estimado o erro relativo entre eles da seguinte forma:

O critério de convergência utilizado para a parada foi o de erro relativo máximo


tolerável de 0,0001. Obtemos assim, um ponto no gráfico, repetindo esse processo para
diferentes valores de T e z/H encontra-se as isócronas apresentadas no gráfico abaixo e
tabelas auxiliares em anexo.

Figura 6: Gráfico de isócronas do fator tempo T.

Fonte: Autor

Através do gráfico acima, nota-se que os excessos de poro-pressão são


simétricos em relação ao meio da camada que está adensando. Ou seja, quanto mais
próximo às fronteiras drenantes, menor é o excesso de poro-pressão gerado no solo,
fazendo com que o processo de adensamento ocorra de maneira desuniforme ao longo
da camada mole.

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3.4 EVOLUÇÃO DE RECALQUES COM O TEMPO


O grau de evolução do adensamento em determinado ponto pode ser medido pelo
grau de adensamento U, definido pela Equação (1), e o recalque total r da camada com
espessura de 2H é dado por:

Dessa forma o requalque de toda a camada em um tempo t ou em um fator de


tempo T é:

A porcentagem média de adensamento pode ser definida pela razão:

A expressão (25) permite que sejam criados, a partir dos mesmos critérios de
parada já descritos, a tabela e gráfico a seguir:

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Tabela 5: Evolução da porcentagem de adensamento com o tempo.


T U (%) T U (%)
0,0079 10 0,3400 65
0,0177 15 0,4030 70
0,0314 20 0,4770 75
0,0491 25 0,5670 80
0,0707 30 0,6840 85
0,0962 35 0,8480 90
0,1257 40 1,1290 95
0,1590 45 1,2190 96
0,1970 50 1,3360 97
0,2390 55 1,5000 98
0,2860 60
Fonte: Autor

Figura 7: Evolução da porcentagem de adensamento.

Fonte: Autor

3.4.1 Consideração do Tempo de Construção


A aplicação de carga, pela construção de um aterro, acontece em um período
gradual, se estabilizando quando concluída. O incremento da consolidação durante esse
período pode ser estimado pelo processo de superposição.
Considera-se inicialmente uma construção sobre uma camada de argila de
espessura 2H entre duas superfícies de absorção, cuja construção se inicia no tempo t = 0
e termina no tempo t1. A curva C1 representa a curva tempo x recalque obtida para um
aterro construído instantaneamente sobre o solo no tempo t = 0. A curva C é curva real
dos recalques. Antes do término da construção a tensão é tomada igual a "p" (ver Figura
7). Sendo assim, o grau de adensamento da curva C pode ser calculado a partir da Equação
26.

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Onde:

U - grau de consolidação da curva C1;


U’ – grau de consolidação da curva C;
p – tensão durante o período
construtivo; p1-tensão aplicada ao
final do carregamento.

Figura 8: Curva de construção do aterro com a consideração do tempo de construção.

Fonte: Autor

4 RESULTADOS
4.1 SEÇÃO A
A seção A indicada no aterro de Sarapuí foi construída em duas etapas, como
indicado na Figura 9, essas etapas foram consideradas para a adequação da curva obtida
no gráfico de recalques no tempo, apresentada na Figura 10.

Figura 9: Etapas de construção da seção A.

Fonte: Autor

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Figura 10: Curva recalque x tempo (cv=20x10-4cm2/s).

Fonte: Autor

Os recalques calculados se aproximam do valor do recalque medido até


aproximadamente os 300 dias, quando são adicionadas novas cargas. A partir do tempo
de aproximadamente 1000 dias, os recalques obtidos pelo cálculo de adensamento são
inferiores aos registrados em campo devido à contribuição da compressão secundária.
Com o intuito de ajustar as curvas com a realidade, foi realizada uma retroanálise
dos valores de coeficiente de adensamento (cv), utilizando os valores de cv obtidos por
Ortigão (1980) para a faixa de tensão à qual o solo foi submetido, e estimado um valor
de 0,20 m de adensamento secundário para o tempo de estudo, obtendo as curvas da
Figura 11.

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Figura 11: Curva recalque x tempo - Seção A(ajustada).

Fonte: Autor

Nota-se que o coeficiente de adensamento de 12 x 10-4 cm2/s é o que resulta em


menores erros no trecho final da curva, porém erros mais altos no início. A curva com
coeficiente de adensamento de 9,5 x 10-4 cm2/s é a que tem a melhor aproximação da
instrumentação no trecho inicial.

4.2 SEÇÃO G
A seção G indicada no aterro de Sarapuí foi construída em três etapas, como
indicado na Figura 12, essas etapas foram consideradas para a adequação da curva obtida
no gráfico de recalques no tempo, apresentada na Figura 13.

Figura 12: Etapas de construção da seção G.

Fonte: Autor

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Figura 13: Curva recalque x tempo (cv=20x10-4cm2/s (fase 1) e cv=10x10-4cm2/s (fase 2)).

Fonte: Autor

Novamente, os recalques calculados se aproximam do valor do recalque medido


até aproximadamente os 300 dias, quando são adicionadas novas cargas. A partir do
tempo de aproximadamento 1000 dias, os recalques obtidos pelo cálculo de adensamento
são inferiores aos registrados em campo devido à contribuição da compressão secundária.
Com o intuito de ajustar as curvas com a realidade, foi realizada uma retroanálise
dos valores de coeficiente de adensamento (cv), utilizando os valores de cv obtidos por
Ortigão (1980) para as faixas de tensão as quais o solo foi submetido, e estimado um valor
de 0,40 m de adensamento secundário para o tempo de estudo, obtendo as curvas da
Figura 14.

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Figura 14: Curva recalque x tempo - Seção G (ajustada).

Fonte: Autor

Nota-se que o coeficiente de adensamento de 5,5 x 10-4 cm2/s é o que resulta em


menores erros no trecho inicial da curva, porém erros mais altos no meio. Já a curva com
coeficiente de adensamento de 9 x 10-4 cm2/s na fase 1 é a que tem a melhor aproximação
da instrumentação no trecho do intermediário.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na seção A, os recalques medidos e calculados têm valores próximos apenas até
aproximadamente os 300 dias, quando são adicionadas novas cargas. A partir da curva
resultante de recalques no tempo também foi possível notar que aproximadamente no dia
1000, os recalques calculados são inferiores aos registrados em campo, e a provável causa
é a contribuição da compressão secundária aos recalques.
Com o ajuste das curvas na seção A, nota-se que o cv= 20 x 10-4 cm2/s, estimado
em um primeiro momento, não é o que melhor corresponde ao comportamento do solo
local. O coeficiente de adensamento de 12 x 10-4 cm2/s é o que resulta em menores erros
no trecho final da curva, enquanto o de 9,5 x 10-4 cm2/s é o que tem a melhor aproximação
da instrumentação no trecho inicial.
Para a seção G, o ajuste das curvas mostrou que o coeficiente de adensamento de
5,5 x 10-4 cm2/s para as duas fases é o que resulta em menores erros no trecho inicial da
curva, enquento o de 9 x 10-4 cm2/s na fase 1 é o que apresenta a curva com melhor
aproximação da instrumentação no trecho do intermediário. De modo geral, para essa

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seção, o melhor ajuste de coeficientes de adensamento é o de cv= 9 x 10-4 cm2/s na fase 1


e cv= 6 x 10-4 cm2/s na fase 2.
Por fim, conclui-se que para o caso estudado é necessário considerar o efeito da
compressão secundária nos recalques e os valores de coeficiente de adensamento
estimados inicialmente não foram compatíveis com a realidade do local. Estimando-se os
recalques devido ao adensamento secundário e ajustando com valores de coeficiente de
adensamento, foi possível obter uma boa aproximação da curva instrumentada.

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REFERÊNCIAS

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desempenho. 2 ed. São Paulo, Oficina de Textos, 2014.

GIROUD, J. P. Tables pour le calcul de fondations. Paris, PUNOD, Vol. IV, 1972.

LEIROS, L. H. M. Estimativa de recalques em aterros sobre solos moles. Trabalho de


Conclusão de Curso, Centro de Tecnologia/UFRN, Natal, RN, Brasil, 2017.

MARTINS, I. S. M.; ABREU, F. R. S. Uma solução aproximada para o adensamento


unidimensional com grandes deformações e submersão de aterros. Solos e Rochas, v.
25, p. 3-14, 2002.

ORTIGÃO, José Alberto Ramalho. Aterro experimental levado à ruptura sobre argila
cinza do Rio de Janeiro. 1980. Tese (Doutorado em Engenharia Civil)-Faculdade de
Engenharia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1980.

TERRA, B. R. C. S. S. R. Análise de recalques do aterro experimental II sobre a


argila mole de Sarapuí com elementos drenantes. Dissertação de M.Sc, COPPE/UFRJ,
Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 1988.

TERZAGHI, K. Theorical Soil Mechanics. John Wiley & Sons. New York, Chichester,
Brisbane, Toronto, Singapure, 1943.

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