Condicao Jovem - Texto
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Condicao Jovem - Texto
médio no Brasil
Marta Wolak Grosbaum*
Ana Maria Falsarella**
*(Ideias Educação e Cultura, São Resumo: O artigo trata do tema “condição jovem”, um dos
Paulo, SP) aspectos abordados na pesquisa “Políticas para o ensino
médio: o caso de quatro estados”, desenvolvida pelo
**(Universidade de Araraquara,
Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e
Araraquara, SP)
Ação Comunitária (Cenpec) e a Fundação Tide Setubal entre
2015 e 2016 em escolas estaduais de ensino médio nos
estados do Ceará, Goiás, Pernambuco e São Paulo. O texto
parte da exploração teórica e legal sobre juventude e sobre
ensino médio para analisar o discurso e representações dos
estudantes sobre escola, juventude e futuro, levantadas
por meio de entrevistas coletivas. Concluiu-se que o jovem
recebe influências culturais e sociais não passivamente,
mas interpretando-as à luz dos valores dos grupos aos
quais pertence. Isso possibilita diferentes modos de
construção identitária, o que confirma ser mais adequado
falar em “juventudes”, já que inexiste um só perfil do jovem
brasileiro que frequenta o ensino médio.
Apresentação
No entanto, parece mais fácil traçar metas do que alcançá-las, o que implica
a superação de um quadro especialmente desafiador: a oferta educacional a
jovens pobres, moradores de territórios vulneráveis econômica e socialmente,
localizados principalmente nas periferias das grandes cidades, e também,
segundo observamos, em localidades menores e com maior índice de
ruralidade.
A noção de vulnerabilidade social tem sido amplamente utilizada para pensar as condições
de vida das famílias urbanas. Essa noção, diferentemente da ideia de pobreza, restrita à
insuficiência de renda, implica uma análise multidimensional do problema que envolve
a estrutura de oportunidades disponíveis para as famílias em um determinado território,
os riscos a que estão expostas, os recursos que dispõem para aproveitar essas ofertas e a
capacidade de construir estratégias para defender-se desses riscos (GARRAFA, 2016, p. 28).
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A segunda parte apresenta uma síntese dos dados coletados em campo por
meio de entrevistas coletivas com grupos de alunos do 2o ano do ensino
médio sobre o que pensam os adolescentes e jovens que frequentam escolas
públicas de ensino médio.
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Abordar o tema, portanto, é andar sobre uma tênue linha divisória. Considerar
a juventude como uma só categoria impede a visão das diferenças. Enfatizar
demais as diferenças gera rotulações e discriminações.
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Resumidamente, podemos definir construção social como aquilo que é produto da
interação social humana, o que é considerado como verdade no mundo social e na
existência de cada sujeito pertencente a esse mundo. “Cada indivíduo, durante o
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Coletivos juvenis agregam jovens em diferentes campos (religião, esportes, movimentos
sociais e culturais, torcidas de futebol, dentre outros). Inclusive, formam-se grupos
voltados ao enfrentamento violento de outros grupos ou pessoas, com base em
preconceitos, para demarcar territórios ou simplesmente para demonstrar poder. Nos
anos 80, o filósofo francês Michel Maffesoli cunhou a expressão “tribos urbanas”
(turmas, galeras, gangues), referindo-se a esses grupos juvenis cujo objetivo é formar
redes com base em visões comuns da vida, interesses, hábitos, maneiras de vestir e de
se comportar.
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Uma análise simplista nos levaria a pensar que o problema do ensino médio
estaria centrado unicamente no fato de os jovens não terem interesse em
estudar e não se responsabilizarem pelas atividades escolares. Ultrapassar
essa visão de senso comum demanda repensar a escola, no sentido de
desenvolver uma escuta mais aguçada das multiplicidades juvenis para
saber quais expectativas e interesses estão exigindo inovações de práticas,
de currículos e de modos de ensinar e de aprender. Como já fora apontado na
Coleção Jovens e Escola Pública (HUBNER et al., 2002):
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Como a representação social pode ser entendida como uma forma de discurso,
também ponderamos a análise do discurso em nossas considerações,
entendida como “campo de conhecimento que relaciona a linguagem com o
sujeito e consequentemente com as formas do saber” (ORLANDI, 1994, p. 54).
Assim, as constantes e as contradições presentes nas falas dos estudantes
entrevistados ajudaram-nos a identificar os sentidos que eles atribuem às
questões que lhes foram propostas, considerando o contexto e o momento por
eles vivido. Por vincular linguagem, sociedade e história, o discurso explicita
sempre uma ideologia, entendida “como o imaginário que medeia a relação
do sujeito com suas condições de existência” (ORLANDI, 1994, p. 56).
Ser jovem
“Ser jovem é ter interesse, curiosidade em buscar as coisas”.
“Significa sonhar, imaginar coisas. Um dia vou ser tal coisa, vou ter tal coisa. Essa
imaginação te leva a alcançar seus objetivos e aqui (na escola) nós temos esse apoio”.
“Ser jovem é quando o mundo ainda não está nas suas costas, quando você ainda não sente
o peso dele. Ser responsável e se divertir ao mesmo tempo.”
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“Ser jovem é difícil, porque o jovem tem opiniões diferentes dos pais e a sociedade só sabe
criticar os jovens.”
“Existe um julgamento da sociedade, porque alguns jovens são violentos, acham que todos
são, as pessoas generalizam.”
há regalias que no tempo de seus pais não existiam. É uma oportunidade que
muitos jovens não têm ou não valorizam. Eles acreditam que a sociedade os
vê como números. Então, depende deles próprios ter um olhar crítico para
mudar suas vidas, precisam “correr atrás”. “Tudo está em nossas próprias
mãos”, diz um aluno. Creem que, sem estudo, não há chance de a pessoa
ter uma boa carreira. Estudam para adquirir conhecimentos, fazer faculdade,
ter uma profissão, ter uma vida melhor que a dos pais e construir um futuro
promissor.
Por fim, os jovens veem o ensino médio como uma oportunidade de não
replicarem as dificuldades enfrentadas pelos pais: “Temos motivação e
possibilidades de futuro melhores do que nossos pais”.
A maior parte dos estudantes acredita que o ensino médio atende aos anseios
dos jovens quanto ao futuro, no que diz respeito a fazer o Exame Nacional do
Ensino Médio (Enem), cursar faculdade, conseguir uma bolsa de estudos e ter
um bom futuro profissional.
Todas as disciplinas são importantes, mas o que o Enem e a sociedade vão cobrar da gente é
português e matemática.
Por exemplo, diz um aluno: “Sociologia é importante, mas não tão importante
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O que faz com que gostem (ou não) das disciplinas e das aulas [título tipo 2]
Os alunos preferem aulas práticas (com a ressalva de que “aula prática não
significa que é livre”), pois “aprendem outras linguagens”, e gostam de
aulas com propostas diferenciadas, que estabelecem a relação entre teoria
e prática, o que “facilita a aprendizagem”. Exemplificam: um professor de
ciências que relaciona os conteúdos vistos na sala de aula com as práticas
no laboratório; um professor de história que liga a história com a vida atual
dos alunos. Valorizam os professores “que se importam muito com os alunos,
pegam no pé, mas fazem os alunos aprenderem”.
Professores e gestores
“Os professores ensinam, eles não estão preocupados em vir aqui e só ganhar o salário deles,
estão preocupados com a gente. Eles mostram as experiências de vida deles.”
“A escola tem bons resultados porque as aulas são boas, não tem muita bagunça, o grupo é
pequeno, todos se conhecem. A escola é um centro que acolhe a todos.”
“Os professores se dedicam. Quando o aluno erra, eles dão conselhos, não ficam brigando,
dão atenção aos alunos, discutem diferentes temas e pontos de vista sem choques. Há
respeito.”
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Comentários finais
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Referências
______. Juventude e ensino médio: quem é este aluno que chega à escola. In:
DAYRELL, J.; CARRANO, P.; MAIA, C.L. (Org.). Juventude e ensino médio. Belo
Horizonte: Ed. UFMG, 2014. p. 101-133.
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TORRES, H. G.; FRANÇA, D.; TEIXEIRA, J.; CAMELO, R.; FUSARO, E. Relatório
final: O que pensam os jovens de baixa renda sobre a escola. Projeto de
pesquisa desenvolvido pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento/
Cebrap, com apoio da Fundação Victor Civita. São Paulo: Cebrap/Fundação
Victor Civita, 2013.
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