Trabalho Tópico 2 Métodos

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UAb/MCCA – Metodologia de Investigação

Trabalho Tema 2 – Pesquisa em Bases de Dados


Aluno Luis Felipe Lago Nogueira, N° 2102079

1. Publicações:

Gastronomica: The Journal for Food Studies

Publicação internacional interdisciplinar dedicada a estudos críticos e translacionais.


Expõe análises de tendências históricas e transformações do alimento e do seu consumo
dos pontos de vista político, econômico e social. Publicado pela University of California
Press.

Seu impact factor em 2023 é 0.6 segundo o site Exaly.

Appetite

A Appetite se especializa na influência dos fatores culturais, sociais, psicológicos,


sensoriais e fisiológicos no consumo alimentar. Trata, no fundo, da natureza e
multidimensionalidade do apetite.

Seu impact factor em 2023 é 5.016.

International Journal of Gastronomy and Food Science

Revista focada na interface entre gastronomia e ciência dos alimentos. Expõe artigos
científicos, reviews, comentários e trabalhos culinários, tanto de acadêmicos quando de
chefs. Mantida pelo Basque Culinary Center e AZTI.

Seu impact factor em 2023 é 3.194.

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Food, Culture and Society

Explora as relações complexas entre alimento, cultura e sociedade a partir de várias


disciplinas das ciências humanas, sociais e da natureza, contemplando também discussão
não acadêmica sobre a alimentação.

Seu impact factor em 2023 é 0.220.

Anthropology of food

É uma publicação multilíngue dedicada às ciências humanas e sociais aplicadas à


alimentação. É mantida pelo Instituto Francês para as Ciências Humanas e Sociais.

Seu impact factor em 2023 é 0.4 segundo o Exaly.

Journal of ethnic foods

A publicação provê uma cobertura abrangente do consumo alimentar dos povos,


buscando elucidar os benefícios do conhecimento tradicional e ancestral dos alimentos.
Privilegiam-se os trabalhos que exploram alimento, gastronomia e comportamento
alimentar em relação a etnias e contextos geográficos particulares.

Seu CiteScore em 2023 é 3.3

2. Artigos

Selecionei dois artigos de interesse:

i) Lorena Peña Jiménez. Pastrami's gourmetisation in Jewish cuisine in


Buenos Aires, Argentina. International Journal of Gastronomy and Food
Science, Volume 32, 2023. URL: Pastrami's gourmetisation in Jewish cuisine in
Buenos Aires, Argentina - ScienceDirect

O artigo mescla alguns métodos qualitativos, mas mantém uma abordagem


marcadamente etnográfica para compreender as dinâmicas da mudança do status do

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pastrame em Buenos Aires e na sua difusão para além da sua comunidade de origem – a
sua gourmetização.

A sua relevância consiste na identificação da gênese de fenômenos da alimentação – a


revalorização do pastrame, no caso – em meio a movimentos culturais e sociais. Além
disso, esses fenômenos aparentemente marginais podem se tornar tendências de consumo
de maior escala, por qual razão torna-se relevante a reflexão sobre os seus princípios. Do
ponto de vista metodológico, não parece haver grandes inovações, ainda que seja
interessante a aplicação da abordagem etnográfica para análise de fenômenos do consumo
alimentar. É interessante também como registro de um processo de gourmetização,
fenômeno recorrente sobre o qual seria oportuno ter mais informações, tanto da sua
gênese quanto do seu impacto.

Do ponto de vista do meu projeto acadêmico, o artigo toca os dois pontos que imagino
fundamentais na elaboração da minha tese, que são: i) os métodos da antropologia e outros
métodos qualitativos, e ii) a análise de fenômenos no nível do consumo, no âmbito do
gastronômico, ou seja, da cultura alimentar, para colocá-lo resumidamente.

Deste farei um resumo mais detalhado adiante.

ii) Rebecca Irons. Ceviche Revolution: Coastal Cholera, Marine


Microplastics, and (Re)Fashioning Identities in Postcolonial Peruvian
Gastropolitics. Gastronomica: The Journal Food Studies, Vol. 22, No. 4, pp.
10-19. URL: Ceviche Revolution | Gastronomica | University of California Press
(ucpress.edu)

O artigo trata da reproposição do ceviche na cultura peruana contemporânea como


símbolo da gastronomia da nação, fazendo uma análise do histórico do prato e da
construção dos novos discursos sobre ele e das suas novas versões, tendo em conta as
dinâmicas sociais específicas dessa nação, a condição de ex-colônia e as iniciativas nos
âmbitos político e privado que moldaram a história recente do ceviche. O artigo aborda
sobretudo a incorporação e omissão das contribuições de diferentes classes para a
formação do prato e dos seus modos de consumo no novo discurso sobre o ceviche,
enxergando a atual reproposição do prato como uma iniciativa “branca” com viés
colonialista, e caráter excludente, uma vez que condena os modos de fazer tradicionais

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dos vendedores de ceviche em prol de um novo ceviche compatível com o projeto de um


“Peru moderno”. No fundo, sendo um trabalho de gastropolítica, trata das relações de
poder que se manifestam em fenômenos da gastronomia.

O método principal são as entrevistas com diversos agentes (chefs, representantes de


ONGs, servidores públicos, ativistas, pescadores, artistas, entre outros), selecionados pelo
grau de envolvimento no processo; também foi conduzido um trabalho de campo
etnográfico no circuito de gastronomia peruana de Londres, buscando entender a imagem
de Peru veiculada e consumida no estrangeiro.

O interesse do artigo consiste na exploração do tema da gastropolítica, de como se


manifestam as relações de poder na esfera da gastronomia (de novo, da cultura alimentar).
O contexto peruano – uma nação multiétnica, ex-colônia, com dinâmicas sociais
complexas – torna a análise ainda mais interessante. É, além de tudo, bom demonstrativo
da multidisciplinaridade do estudo do consumo alimentar, lidando ao mesmo tempo com
questões sociais, culturais, econômicas, ambientais e até técnicas ou culinárias.

Já tratando do meu projeto acadêmico, considero interessantíssima a condução de um


trabalho de campo etnográfico em restaurantes, além do uso de entrevistas abertas com
participantes selecionados não-aleatoriamente. Se assemelha muito a um trabalho de
jornalismo investigativo e, apesar do interesse, me questiono sobre a aceitação desse tipo
de trabalho na comunidade científica.

3. Resumo

Lorena Peña Jiménez,

Pastrami's gourmetisation in Jewish cuisine in Buenos Aires, Argentina,

International Journal of Gastronomy and Food Science, Volume 32, 2023

O artigo explora como o pastrame ganhou status de comida “gourmet” em Buenos Aires
através da observação do seu consumo nas comedorias judaicas contemporâneas e da

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análise do histórico do seu consumo entre a diáspora judaica nas Américas. No fundo, o
artigo trata dos processos de gourmetização, sendo estes um objeto de crescente interesse
no estudo dos fenômenos da gastronomia. Entenderemos a gourmetização como a
sofisticação e mudança de status de um alimento num contexto social, frequentemente
caracterizado por reformulações no seu feitio, por mudanças no modelo de consumo e
uma mudança do público consumidor, coisas que averiguaremos adiante.

A autora descreve o método como um estudo de caso sobre os métodos qualitativos, do


ponto de vista antropológico, com natureza “hermenêutica e interpretativa”. Num plano
prático, a autora selecionou seis restaurantes judaicos de Buenos Aires, conjunto que
considera “suficiente para examinar como se produz a gourmetização do pastrame nesse
contexto”.

Cada um dos estabelecimentos foi visitado uma vez, e durante um período que variava de
uma a três horas a autora tomou notas de campo (field notes) e tirou fotos; as notas de
campo foram tomadas segundo o método antropológico – a observação direta, sistemática
e controlada de cada estabelecimento, seus menus e a apresentação do objeto de estudo,
o pastrame, uma abordagem etnográfica; a informação foi organizada num diário de
campo em diferentes categorias de análise relevantes para o objeto (localização, preço,
apresentação, etc), prestando especial atenção ao discurso que envolvia o objeto de
análise.

Como medida complementar, foram conduzidas entrevistas abertas e informais com


pessoas com e sem ascendência judia com o objetivo de entender melhor a inserção do
pastrame no cenário alimentar portenho. Por fim, toda a informação recolhida em campo
foi sistematizada e analisada sob a ótica do marco teórico de referência.

O pastrame é uma elaboração tradicional do leste europeu, que consistia na


condimentação com especiarias, secagem e cura da carne, seguidas da sua defumação
(quente). Era comumente aplicada ao ganso, animal mais comum na região de origem.
Foi com formação de comunidades de judeus Ashkenazi na América que se passou a
aplicar a técnica a cortes bovinos, mais baratos e abundantes no Novo Mundo.

Esboça-se, através dos testemunhos de integrantes da comunidade judaica e outros


cidadãos de Buenos Aires, um panorama histórico do consumo de pastrame na cidade,

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buscando compreender a sua origem – seria a presença do pastrame de carne bovina uma
influência da comunidade judaica novaiorquina ou haveria outras vias de inserção do
produto no cenário portenho? Após a análise histórica, sugere-se que se conjugaram
várias vias de inserção do pastrame na alimentação dos portenhos, judeus ou não, para
moldar o modelo de consumo desse produto ao longo do século XX e na
contemporaneidade.

Por outro lado, em contraste com essas conclusões, a autora atesta que a recente
gourmetização do produto está mais intimamente associada à influência norte-americana.
A via de acesso dessas tendências teria sido criada pela abertura da comunidade judaica
portenha e por novas tendências internacionais da gastronomia; estas são a queda da
hegemonia da cozinha francesa e a resultante oportunidade da valorização (cultural e
econômica) de outras cozinhas, e processos de “gentrificação alimentar”. Essas dinâmicas
fizeram com que o pastrame, que há muito tempo estava incorporado aos hábitos
alimentares da comunidade judaica de Buenos Aires, servido por alguns locais
tradicionais, se tornasse um produto característico de um novo e vibrante fenômeno
gastronômico, cujo alcance vai além da comunidade em que se originou.

É relevante o contexto social em que isso ocorre – a consolidação de uma nova classe
média com novos padrões de consumo e de interação com a cidade. A autora associa a
mudança do status cultural do pastrame e dos seus locais de serviço a fenômenos do lado
ofertante e da demanda: a disposição da comunidade judaica a afirmar-se no espaço e na
contemporaneidade pela revalorização do patrimônio cultural, que torna interessante, por
sua vez, a sua exploração econômica, a sua comoditização (dá-se a entender, inclusive,
que a valorização cultural não apenas precede a atribuição de valor econômico, mas sim
se retroalimentam – a valorização econômica impulsiona a valorização da cultura da
comunidade ofertante nesse espaço também); e a disposição do consumidor a buscar
experiências convergentes com valores que orientam suas escolhas de consumo – no caso,
a preocupação com o impacto negativo da industrialização e massificação na cultura,
sociedade e ambiente, que resulta na apreciação de alimentos artesanais, tradicionais e
com aparente significado cultural, como o pastrame. A autora de certa forma relaciona
essa tendência dos consumidores da nova classe média portenha à influência do estilo de
vida da classe média norte americana, que tem como característica o hábito de socializar
em restaurantes e bares, também orientado pela preocupação com as mazelas da
industrialização.
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Assim, iniciou-se um processo de abertura dos bairros judaicos aos consumidores de fora
da comunidade, tornando-os “zonas temáticas”, com uma nova oferta de experiências
culturais, sendo a gastronomia a principal. Esses locais ganham uma nova vocação
turística, atraindo recursos de outras partes da cidade e de outras comunidades, coisa
característica dos processos de gentrificação. O pastrame e a nova cozinha judaica foram
peças chave da mudança de vocação desses bairros, sendo os principais focos de atração
de pessoas de fora.

A autora conclui que esse novo pastrame gourmet, síntese das histórias paralelas do
pastrame das antigas comunidades judaicas portenhas, do pastrame novaiorquino e dos
seus contatos, é produto da nova classe média, da lógica em que opera e das dinâmicas
que dela emergem, tanto na oferta como na demanda, como foi descrito acima. Expõe
com o alimento pode ser usado como um instrumento de (re)posicionamento social de
uma comunidade, e como mecanismo de distinção e ferramenta de construção ou
afirmação identitária para o público consumidor.

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