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Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz da 2ª Vara Cível da

comarca de Blumenau - SC.

VILMA PRA FRANCA, devidamente qualificada nos autos


da Ação nº 5007071-03.2020.8.24.0008, movida em face de
BANCO BRADESCO S/A., vem, por sua advogada infrafirmada, à
presença de Vossa Excelência, manifestar-se acerca da contestação
apresentada.

I – Resumo do Processo

1. Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE


DE DÉBITO, COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, “inaldita altera
pars”, proposta pela Requerente em face do Requerido, pleiteando a
declaração de inexigibilidade das compras feitas no cartão de crédito e
indenização por danos morais, em decorrência de ter sido inscrita no
SERASA.

2. A Requerente foi vítima do conhecido “GOLPE DO


MOTOBOY”, onde falsários se passaram por funcionários do Banco
Bradesco, informando que estavam sendo realizadas compras em seu cartão
de crédito com sucesso, apesar de seu cartão está em sua posse.

3. Acreditando que se tratava de ligação do Banco Bradesco,


a Requerente, pessoa simples e de pouca instrução, entregou a um motoboy

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o cartão de crédito quebrado, após ser sabatinada pelos farsantes, que
possuíam todos os seus dados pessoais.

4. Citada, a Requerida apresentou contestação alegando: a)


há falta de interesse de agir, b) ausência de pretensão resistida, c) culpa
exclusiva da Requerente, d) débitos são existentes, e) não há má-fé nas
cobranças, f) em caso de condenação deve ser respeitado o princípio da
razoabilidade, g) não pode ser invertido o ônus da prova.

5. Contudo, em que pese a boa lavra da defesa, os


argumentos nela levantados não podem prevalecer como será demonstrado:

Do interesse de agir

6. De início esclarece que o interesse de agir é uma das


condições da ação e é definido como a necessidade do postulante invocar o
judiciário para alcançar a tutela pretendida

7. Sobre o interesse de agir já lecionava Moacyr Amaral


Santos no seguinte sentido:

"[...] há o interesse de agir, de reclamar a atividade jurisdicional do


Estado, para que este tutele o interesse primário, que de outra forma não
seria protegido. Por isso mesmo o interesse de agir se confunde, de
ordinário, com a necessidade de se obter o interesse primário ou direito
material pelos órgãos jurisdicionais

8. A Requerida sustenta antes de adentrar ao mérito que o


Requerente carece de ação, pois lhe faltaria o interesse de agir,
considerando que não buscou administrativamente resolver o conflito.

9. No entanto, a alegação não pode prosperar posto que o


próprio banco reconhece em contestação que a Requerente buscou resolver
a situação administrativamente, vejamos, o teor do que consta no 6º
parágrafo da fls. 06.

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10. Por esse motivo, cai em contradição o banco Requerido,
ora alega que não foi feito requerimento administrativo, ora alega que
identificou o pedido, não merecendo crédito as alegações, devendo ser
analisado o mérito da demanda.

11. No mais, a Requerida em contestação afirma também que


não acolheu os pedidos administrativos da Requerente, ora a única via para
solucionar o conflito seria a judicial, existindo dessa forma a pretensão
resistida.

12. Nunca é demais lembrar que conforme dispõe o artigo 19


do CPC o interesse de agir da parte pode ser limitado a simples declaração
de existência, ou inexistência, ou ainda do modo de ser de uma relação
jurídica, no caso em decorrência de falha desta relação compete buscar no
judiciário reparação em razão de um dano sofrido.

13. Desta forma, a Requerente não é carecedora de ação,


devendo o pleito prosseguir regularmente, até mesmo porque o acesso a
justiça é uma garantia constitucional estando prevista no rol dos direitos e
garantias fundamentais, em especial no artigo 5º XXXV.

Do mérito

14. De início, conforme se percebe nas faturas acostadas


pela Requerida com a defesa, percebe-se que o valor médio despendido
pela Requerente é de R$ 800,00, sempre com compras realizadas na cidade
de Blumenau – SC.

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15. No entanto, nos meses de outubro e novembro de 2019
foi surpreendida com lançamentos de valores muito acima da suas faturas
habituais.

Data Estabelecimento Valor


30.09.2019 • PAG* Henrique Fernandes R$ 999,99
30.09.2019 • PAG* Henrique Fernandes R$ 997,99
30.09.2019 • PAG* Henrique Fernandes R$ 1.166,68
30.09.2019 • PAG* JefersondaSilvaSo R$ 1.166,67
30.09.2019 • PAG* LeandroPaivaBrito R$ 1.166,67
01.10.2019 GUSTAVO ALEIXO DE R$ 10,00
AN
01.10.2019 PAG* Rayanne Kelly R$ 999,99
01.10.2019 PAG* Rayanne Kelly R$ 500,00
01.10.2019 PAG* Rayanne Kelly R$ 300,00
TOTAL R$ 7.307,99

16. Embora tenha buscado a solução amigável do litígio, a


Requerida se recusou a realizar composição, cujo resultado seja diferente do
pagamento da dívida que a Requerente não reconhece como sua.

17. O Golpe do Motoboy é uma das práticas usuais dos


falsários que buscam dinheiro fácil, que agem a margem da lei e se
beneficiam da falta de segurança da operadora de cartão de crédito, que
não mantém a segurança das informações dos seus usuários, que ficam
disponíveis a qualquer pessoa.

18. Além disso, as lojas têm por costume não pedir a


identificação de quem está fazendo a compra, o que torna possível este tipo
de golpe.

19. Frise-se, não foi a autora que realizou as compras, tanto


que a ré sequer conseguiu comprovar tal fato, ademais consta na fatura que

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as compras teriam sido realizadas em São Paulo, lugar esse que a
requerente sequer esteve.

20. As compras no valor de R$ 7.307,99 (sete mil trezentos e


sete reais e noventa e nove centavos) realizadas em dois dias destoam em
muito ao padrão de compras da Requerente, que variam de cerca de R$
500,00 (quinhentos) a R$ 1.400,00 (mil e quatrocentos reais), em 30 dias.

22. Assim, as compras realizadas em 30.09 e 01.10


representam mais de 1000% da média de compras da fatura do mês de
referência de setembro de 2019, onde gastou a quantia de R$ 428,68.

23. Isto é, a Requerente não fez as compras e as compras


superam em mais de 15x o padrão médio de suas compras normais.

24. Desse modo, mostra-se flagrante o defeito na prestação


de serviços da Ré, que autorizou a realização de compras em cartão clonado
da Requerente, devendo a demandada responsabilizar-se pelos danos
decorrentes desta ação lesiva, na exegese do artigo 14 do Código de Defesa
do Consumidor, in verbis:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da


existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos
consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como
por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos:
§ 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o
consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as
circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu
fornecimento;II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se
esperam;III - a época em que foi fornecido.”

25. No mesmo sentido são os artigos 186 e 927 do Código


Civil, que assim dispõe:

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou


imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo”.

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26. Em razão da inquestionável legislação supracitada, tem-
se reconhecido a inexigibilidade de débito de compras não realizadas pelo
titular do cartão de crédito, especialmente quando se trata do conhecido
“golpe do motoboy”, senão vejamos:

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO CUMULADA


COM PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE VALORES E REPARAÇÃO POR
DANOS MORAIS – Sentença de parcial procedência – Irresignação de
ambas as partes – Preliminar de ilegitimidade acolhida -
Responsabilidade solidária da cadeia de fornecedores –
Gastos indevidos realizados por terceiro, por meio de cartão de crédito
– Golpe do "motoboy" – Aplicação do Código de Defesa do Consumidor
(súmula nº 297 do STJ) – Autores que deixaram de zelar pela segurança
de seus cartões e senhas – Por outro lado, diversas operações bancarias
realizadas por terceiro foram dissonantes do padrão de consumo dos
autores – Ausência de bloqueio preventivo – Falha na
prestação do serviço caracterizada – Responsabilidade objetiva das
instituições financeiras – Súmula nº 479 do STJ - Reconhecimento,
contudo, de fato concorrente dos autores, cuja conduta contribuiu para o
evento danoso – Aplicação do artigo 945 do Código Civil – Cada parte
deverá arcar com metade do valor total efetivamente utilizado pelo
fraudador – Danos morais configurados – Autores que tiveram seus
nomes inseridos em cadastro de órgãos de proteção ao crédito em razão
dos débitos efetuados por terceiro fraudador – Valor indenizatório
fixado pelo juízo a quo (R$10.000,00), que se mostra razoável frente às
circunstâncias do caso, notadamente tendo em vista que a conduta dos
autores colaborou para a efetivação da fraude – Sentença mantida –
Recurso dos autores parcialmente provido - Recurso dos requeridos não
provido, sem fixação de verba honorária recursal, tendo em vista
fixação na origem no patamar máximo de 20%
(TJ-SP 1067826-93.2018.8.26.0002, Relator: Marco Fábio Morsello, Data
de Julgamento: 15/10/2020, 11ª Câmara de Direito Privado, Data de
Publicação: 16/10/2020)
_________________________________________________________________

INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO - Dano moral – Restituição em dobro -


Fraude denominada "Golpe do Motoboy" - Hipótese em que foram
efetuadas operações que não foram realizadas pelo autor e foram frutos
de fraude – Procedência da ação - Inconformismo – Relação de Consumo
– Aplicação das regras do Código de Defesa do Consumidor – Inversão
do ônus da prova - Falha na prestação de serviço que se mostra
indiscutível - Polo requerido possui responsabilidade pela situação
descrita, pois é dever das instituições financeiras mobilizarem-se para
impedir fraudes como a descrita e monitorar as operações que fogem da
normalidade do cliente - Inexigibilidade dos débitos – Dano moral
configurado – Indenização fixada em R$ 20.000,00 que deve ser
minorada para R$ 10.000,00 - Valor que se mostra suficiente para
reparar o dano - Sentença reformada nesse aspecto - Recurso
parcialmente provido. (TJ-SP 1010280-25.2019.8.26.0009, Relator:
Heraldo de Oliveira, Data de Julgamento: 08/10/2020, 13ª Câmara de
Direito Privado, Data de Publicação: 08/10/2020)

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27. A Requerida alega ainda que as compras estavam dentro
do padrão da Requerente, o que demonstra a total falta de zelo, sendo
incapaz de prever fraudes.

28. A Requerente nunca gastou mais de R$ 2.000,00, em uma


fatura, sempre comprou no comércio de Blumenau – SC, o que deveria ter
sido observado pela Requerida, na primeira tentativa de aquisição de
produto na cidade de São Paulo.

29 Aliás, o valor de uma única compra foi maior que todas as


suas compras habituais, ressaltando que foram realizadas várias operações
fraudulentas, que fogem totalmente do perfil da Requerente, vejamos, o que
consta no lançamento das faturas:

30. Em vários anos possuindo o cartão a Requerente nunca


adquiriu produtos com parcelamento tão expressivos e nem poderia arcar
com esse valor, uma vez que sequer recebe remuneração suficiente para
tanto.

31. Conforme se verifica da última ementa relacionada


acima, o tema em debate nestes autos já está sumulado pelo Colendo
Superior Tribunal de Justiça. Vejamos, pois o conteúdo da Súmula 479 do
STJ:
“As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos
gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por
terceiros no âmbito de operações bancárias”.

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32. Dessa forma, perfeitamente cabível a condenação da
Requerida, nos moldes requeridos em sede de exordial.

Do dano moral e quantum

33. Confirmada a responsabilidade da Requerida cabe ela


compensar os prejuízos sofridos pelo Requerente, decorrente da
manutenção indevida do nome do Requerente nos órgãos de proteção ao
crédito.

34. A alegação da parte Requerida no sentido de que o


Requerente não comprovou os danos morais sofridos, não prospera, uma vez
que se tratando de inscrição indevida, segundo a jurisprudência pacífica, o
dano é presumido, nao havendo necessidade da comprovação, vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE RESTRIÇÃO DE


CRÉDITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO DA
INSCRIÇÃO DO NOME DA AUTORA NOS CADASTROS DE INADIMPLENTES
MESMO APÓS A QUITAÇÃO DA DÍVIDA QUE ORIGINOU SUA ANOTAÇÃO.
PROVA DO ALEGADO ABALO SUPORTADO. DESNECESSIDADE. DANO
PRESUMIDO. É assente na jurisprudência que, a inscrição ou a manutenção
indevida nos cadastros de inadimplentes, por aproximadamente quatro
meses, com baixa somente após o ingresso da ação, torna pertinente a
indenização por danos morais, por decorrer do próprio fato que os torna
presumidos e, assim, sem a necessidade de demonstração dos prejuízos
sofridos.” (TJSC, Apelação Cível n. 2012.092400-6, de Camboriú, rel. Des.
João Batista Góes Ulysséa, j. 26-09-2013)

35. Por esse motivo, uma vez demonstrada existência do


abalo moral sofrido pela Requerente, deve-se fixar uma indenização.

36. Ademais, o Requerente sentiu-se profundamente lesado


pela atitude negligente da Requerida, já que pagou toda a sua dívida, mas
essa manteve a negativa ao crédito registrada, devendo responder de forma
objetiva pela sua negligência de acordo com o art. 14 do CDC.

37. Para se apurar o quantum deve-se considerar o grau de


culpa do ofensor, a extensão dos danos, a capacidade financeira do ofensor,

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devendo ainda ter a condenação um caráter pedagógico, com a finalidade
de inibir a repetição do fato danoso por parte de quem o cometeu.

38. Para Silvo de Salvo Venosa:

“A indenização pecuniária na tem apenas o cunho de reparação do


prejuízo, mas também caráter punitivo ou sancionatório, pedagógico, preventivo
e repressor: a indenização não apenas repara o dano, repondo o patrimônio
abalado, mas também atua como forma educativa ou pedagógica para o ofensor e
a sociedade e intimidativa para evitar perdas e danos futuros.” (Venosa. Silvo de
Salvo. Direto civil – responsabilidade civil, 9ª Ed, Atlas, 2009, pg. 24)

39. No presente caso, como já exposto, a responsabilidade


pelo evento danoso foi exclusiva da Requerida, e por absoluta desídia,
demonstrando a ausência de segurança de seus serviços.

40. Os danos decorrem da própria inscrição indevida, sendo


conhecidos seus nefastos efeitos de abalo de crédito, impedindo o acesso a
bens de consumo, financiamentos, empréstimos ou qualquer tipo de
parcelamento.

41. Quanto à capacidade econômica, que também deve ser


considerada para determinar o quantum indenizatório, levando em
consideração que a Requerida é prestadora de serviços no ramo de
comunicação

42. Justamente por isso, a condenação deve ser arbitrada em


valor que oprima este tipo de conduta ilegal cometida, devendo ter o caráter
pedagógico desejado, onde seja mais vantajoso atuar com mais prudência
do que pagar as indenizações arbitradas judicialmente.

43. Diante desta realidade deve a indenização ser arbitrada


no valor mínimo de R$ 10.000,00, com juros desde a data da inscrição.

III – Do Pedido

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44. Portanto, impugna a contestação apresentada e requer o
prosseguimento regular do feito, com a total procedência dos pedidos
formulado pela Requerente na exordial.

Blumenau, 21 de outubro de 2020.

Tânia Marta Gripa


OAB/SC 44.402

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