O Céu Caiu
O Céu Caiu
O Céu Caiu
pessoas apontando seus dedos para o alto e olhando para o mesmo. Obviamente, segui
a direção com meus olhos e não pude fazer nada além de contemplar o que estava
acontecendo.
Sem ter como contar de outra forma, vou ser literal: eu vi o céu caindo. As nuvens
e o próprio azul infinito estavam se aproximando.
A última vez que escutei sons meramente parecidos foi um dia traumatizante para
toda a nação: 11 de setembro. Mas nem mesmo esse trauma se equipara ao trauma
mundial que ocorreu no início deste dia, 1 de janeiro de 2012.
O céu parou de cair apenas a alguns metros dos prédios e, de repente, uma
gigantesca onda de choque percorreu tudo em volta, causando um estrondo que fez, no
mesmo instante, algumas pessoas perderem a audição. Sei que perderam porque dava
para ver o sangue escorrendo de suas orelhas, e dessa forma se iniciou um pânico
generalizado.
Acelerando como nunca, sentindo o sangue quente daquele homem que espirrara no meu
rosto, saí de lá o mais rápido possível em direção à minha casa. Estava
desesperado, mas, infelizmente, não o suficiente para não observar o terror ao meu
redor: pessoas sendo brutalmente atropeladas, todas gritando, tentando se salvar de
partes dos prédios que se soltavam após a onda de choque, e algumas não conseguiam
desviar.
Felizmente, consegui sair com vida, deixando para trás o que um dia fora um grande
centro comercial e agora é apenas um mar de tormento e agonia. Fui o mais rápido
possível ao encontro da minha família. Tenho uma esposa e uma filha, e descobrimos
que ela estava grávida alguns dias antes. Estávamos muito felizes, e naquele
momento eu só conseguia pensar neles. Porém, no instante em que vi minha esposa,
não acreditei no que estava diante de mim. Ela segurava o corpo da nossa filha, sem
nada da cintura para baixo e com um dos braços completamente desfigurado.
Nunca vi um vazio tão imensurável quanto o que habitava nos olhos da minha amada, e
nunca tive uma visão tão horrenda até aquele momento. Metade da minha filha, minha
amada Sapphira, estava coberta por uma camada de órgãos, sangue e fezes, enquanto a
outra metade era o que restava de seu corpo sem vida. Seu braço estava com ossos à
mostra e seu pescoço quebrado, e a forma como minha esposa a segurava fazia com que
sua cabeça se voltasse para minha direção, olhando diretamente para mim.
Sinceramente, não sei como aguentei tanto tempo, provavelmente pelo instinto
paterno de proteção e amor que nutria por ela e pelo nosso filho que estava em seu
ventre, ou talvez pelo ódio diabólico que se formou em minha alma após
acontecimentos futuros que ainda contarei.
A partir desse dia, o mundo entrou em caos total. Todos os meios de comunicação
eletrônicos pararam de funcionar, satélites caíram, aviões caíram. Mas enquanto o
mundo mergulhava no caos, eu tinha que permanecer focado em proteger minha esposa a
todo custo. Eu tinha que vigiá-la a cada passo, tinha que forçá-la a comer e beber.
Chegando ao ponto de necessitar amarrá-la e desmaiá-la diversas vezes, para assim
evitar seu suicídio e provocações contra abordagens de pessoas indelicadas e
violentas, evitando assim, conflitos que poderiam nos levar a morte.
Passamos meses nesse inferno. Aos poucos, Kali, minha esposa, foi recuperando sua
sanidade, e eu não era mais obrigado a fazê-la comer, beber ou amarrá-la. Porém,
ainda era necessário medicá-la para que não tivesse ataques ou surtos.
Sete semanas atrás, vi uma luz que há muito havia desaparecido; minhas esperanças
começavam a se realizar. Minha Kali, minha querida esposa, veio a mim, olhando-me
com aqueles olhos negros, mas cheios de uma nova vida. Lágrimas, que pareciam
escoar sua própria alma, deslizavam delicadamente por sua face tão bela e macia,
fazendo com que sua pele cor de chocolate reluzisse sob a luz do sol da manhã. Ela,
pondo uma de suas mãos em cima da barriga, disse: "Eu nunca pararia de contar, já
se passaram 35 semanas." Cada uma dessas semanas representava um marco da nossa
jornada na espera pelo nosso filho.
Desde que cheguei, me empenhei em obter suprimentos para todos no asilo. Passávamos
até cinco horas buscando tudo que podíamos para garantir que nada faltasse a
ninguém.
Cinco semanas atrás, saí para minha ronda diária com o policial Oliver. Sempre
partimos com medo, pois o mundo se tornou hostil; homens e mulheres faziam de tudo
para sobreviver, e tínhamos que ser cautelosos em cada passo.
A Kali e nossa criança não saíam da minha cabeça em nenhum momento. O medo que
sentia ao sair era muito mais por eles do que por mim. Sempre era muito bem
recompensado ao chegar, com minha mulher fazendo o que podia para deixar tudo o
mais confortável possível. Mesmo estando quase dando à luz, ela liderava a cozinha
para que todos se alimentassem da melhor forma possível.
Ao longo de nossas buscas, tanto o Oliver quanto o Jhon (o outro policial) não
cansavam de elogiar o quanto eu era sortudo por ter a mulher que tenho.
Preocupado, fui atrás dele. Primeiro, porque ele era uma boa pessoa e um bom amigo.
Ele ajudava muito a mim e a minha mulher, assim como o outro policial, Jhon, que
uma vez chegou a salvar minha vida quando um maluco quase me esfaqueou pelas
costas. Pelo jeito que Oliver era, sabia que ele faria o mesmo por mim. O segundo
motivo era que Oliver estava com o walkie-talkie que ele e Jhon usavam no trabalho.
Sempre levávamos um e deixávamos o outro no asilo.
Fui para o local de encontro que marcamos no outro dia, esperei até que se
completassem 4 horas que a gente saiu do asilo, passei mais duas o procurando,
passei do horário que costumava ficar na ronda pois tinha muito medo de que quando
eu chegasse, ele não estivesse lá.
Depois de esperar mais um tempo, voltei para o asilo. Antes mesmo de entrar, soube
que algo estava errado. Vi uma coluna de fumaça negra subindo aos céus, que agora
não estavam tão distantes quanto eram até o último dia do ano passado. Ao ver
aquilo, entrei em desespero.
Corri para descobrir o que estava acontecendo e, ao me deparar com a cena diante de
mim, paralisei por um breve momento. Vi uma pilha de cadáveres sendo queimada:
idosos, adultos, jovens, todos formando um grande amontoado de carne. Perto dali,
três homens e uma mulher vasculhavam os pertences dos mortos, ignorando a fogueira
macabra enquanto procuravam utensílios que pudessem ser úteis para eles.
Rapidamente, saí da frente e fui para os fundos, onde sabia outra forma de entrar
sem que ninguém percebesse. Atrás do asilo, havia casas com árvores muito grandes
nos quintais que permitiam escalar e acessar um dos quartos. Escolhi este caminho
para ser o mais cauteloso possível, mesmo estando com uma faca (que sempre
levávamos nas rondas). Não queria envolver-me em confrontos prolongados,
especialmente com mais de uma pessoa por vez.
Entrei no quarto, fui até a porta e olhei os corredores para garantir que estava
limpo. Quando percebi que podia passar pelo corredor sem ser visto, andei o mais
rápido possível em busca de alguém que ainda estivesse vivo e da minha amada.
Quando passei pelo quarto onde o Jhon geralmente ficava, me deparei com uma das
cenas mais perturbadoras da minha vida: ele estava morto, amarrado a uma cadeira,
com a pele brutalmente arrancada. Quem tirou sua vida deixou pedaços de pele
espalhados pelo quarto e até mesmo arrancaram todos os dentes de sua boca. Quase
vomitei ao ver aquilo, mas prossegui. Minha mulher podia não estar lá; eu queria
que não estivesse, esperava que ela tivesse fugido. Mas mesmo assim, queria matar
todos os culpados por aquelas atrocidades.
Andando pelos corredores, conseguia escutar alguns ecos que pareciam conversas, mas
um barulho em específico chamou minha atenção: o som de uma cama rangendo. Guiado
pelo som, deparei-me com outra visão horrenda: diante de mim, de costas, um dos
invasores estava estuprando alguém. Ao ver aquilo, não me contive; tirei minha
camisa e corri para cima daquele monstro (me nego a chamar aquilo de humano). Usei
a roupa que estava em minha mão para tampar sua boca ao mesmo tempo que cravava a
faca em sua barriga. Logo em seguida, amarrei com força a camisa para que ele não
conseguisse gritar. Sem perder tempo, corri para fechar a porta o mais
silenciosamente possível e voltei minha atenção àquele ser degradante.
"Por quê?" — perguntei, removendo a camisa e ameaçando-o para que não fizesse
barulho. Obviamente, eu queria saber o motivo de todo aquele massacre, mas aquela
abominação decidiu responder outra questão.
Ao escutar aquilo, não entendi ao que exatamente ele estava se referindo, mas ao
seguir seu dedo, compreendi na hora. Eu estava com o sangue tão quente, agi tão
rápido, que nem me dei conta. A mulher que ele estava estuprando estava morta, e
pior, decapitada.
Ao ver minha reação, ele riu, mas logo começou a tossir. Saindo do transe que sua
fala me causou, corri o mais rápido que pude para cima dele e o esfaqueei: uma,
duas, três vezes, até perder a conta. Seu sangue jorrava para todos os lados, e sua
cabeça já parecia uma vasilha cheia de carne moída quando finalmente parei.
Sem perder mais tempo, apenar limpei rápidamente meu rosto e segui minha busca para
achar Kali e matar todos os culpados. Continuei avançando despercebido até o
momento em que finalmente achei minha amada, e naquele momento uma tsunami de
emoções iria me carregar, mas criei uma represa no mesmo instante em que ela falou
a seguinte frase com extrema dificuldade:
"O Oliver nos traiu, ele levou nosso filho" - na mesma hora, eu olhei nos olhos
dela e disse:
"Eu vou voltar com ele e a cabeça do Oliver" - então, tranquei a porta do quarto e
continuei meu caminho.
Consegui matar mais dois dos 3 caras que vi, assim sobrando somente o Oliver e a
outra mulher, não vou mentir, tive sorte pois um deles estava cagando e o outro
estava dormindo. Após matar o ultimo, passei na dispensa para pegar um cabo de
vassoura para poder me defender de uma distância mais longa, se eu fosse entrar
numa briga com o Oliver sabia que estaria em desvantagem se usasse só a faca. No
instante em que a peguei, escutei o som inconfundíveldo choro de uma criança,
tinha que ser meu filho.
Quando cheguei à porta do quarto de onde vinha o barulho, deparei-me com Oliver
tentando fazer meu filho parar de chorar. Esperei pacientemente, até ele conseguir
fazer meu filho se acalmar. Assim que ele pôs um dos pés para fora, o acertei
usando o cabo de madeira que tinha pego. Eu atingi o rosto dele com tanta força que
a madeira se rompeu e sangue jorrou do nariz dele.
Ele não desmaiou na hora, mas ficou completamente desorientado. Me aproveitei para
enforcá-lo até que perdesse a consciência. Peguei suas algemas e a chave que ele
sempre deixava no chaveiro da recepção do asilo, e o prendi na despensa. Antes de
sair, deixei-o nu e cortei os calcanhares para que não pudesse andar, mesmo que
conseguisse se livrar das algemas; meus dias como cirurgião ajudaram muito nessa
hora. Tranquei a porta e, com o coração acelerado e a cabeça latejando, fui ao
encontro da minha amada.
E lá estava ela, minha linda esposa Kali, com seu cabelo ondulado formando um mar
de ondas negras pela cama, seu olhar dirigido a mim, sem vida. A mulher que eu
tinha visto mais cedo a matou. Aquele tsunami que eu tinha guardado se dissipou, e
agora meu subconsciente se tornou um terrível deserto onde todos que entram queimam
com chamas que nunca cessam. Minha respiração parou por um instante, e meu coração
parecia pesar toneladas, esmagando meus pulmões.
Naquele momento, também me tornei um monstro. Corri com todo ódio. A mulher se
levantou depressa como em um susto, e até tentou dar uma facada, mas consegui
desviar e lhe dar um belo soco na cara. Senti na hora pelo menos dois dentes
quebrando; minha mão esquerda estava ensopada de sangue, com fragmentos de dentes
cravados na pele. Logo em seguida, enlouquecido de raiva, comecei a pisoteá-la,
chutando suas costelas, e ainda a peguei e joguei seu corpo para fora do quarto.
Ela acabou desmaiando depois de bater a cabeça. Acabei falando: "É melhor ainda
estar viva." enquanto passava pelo seu corpo ensanguentado e quebrado.
Após isso, juntei Oliver e a mulher, que descobri se chamar Sabrina, num quarto só.
Presos, sem poderem andar nem usar os polegares, cortei-os fora. Minha mulher
sempre quis ser cremada. Não teria suas cinzas, mas alguma coisa podia fazer.
Então, na manhã seguinte, fiz toda uma cerimônia e depois a queimei. Já tinha
botado nosso filho para dormir quando comecei tudo isso.
Após acabar tudo, fui até os meus dois prisioneiros. Primeiro me dirigi a Sabrina:
"Como pôde fazer isso, como pôde deixar esses lunáticos fazerem todas essas
atrocidades, principalmente você sendo mulher?" - Meu ódio saía junto às palavras
como lava derretida.
"ME DESCULPA! EU NÃO SABIA QUE ISSO TUDO IRIA ACONTECER!" - Respondeu desesperada,
aos berros. Mas na mesma hora lhe dei um tapa que a fez cair da cadeira onde estava
amarrada.
"VOCÊ MATOU MINHA MULHER, COMO NÃO SABIA QUE TUDO ISSO IRIA ACONTECER?!" - Agora
minhas palavras eram como bombas, varrendo e destruindo tudo ao redor. Assim que
terminei a frase, dei um chute em seu rosto que quebrou seu nariz e a desmaiou
novamente.
"Ótimo, agora você." - Minhas palavras eram como lâminas, bisturis; sentia que
podia arrancar a cabeça dele com elas.
"Eu perdi minha filha também, que nem você. Mas você ainda tinha sua mulher e a
minha faleceu antes de tudo isso. Ela não passou por esse inferno, ainda bem, mas
sem ela eu já estava em um. Quando o inferno de verdade começou, minha filha
desistiu logo em poucos dias" - ele falou com a maior tranquilidade, como se tudo
isso justificasse o massacre que rolou... meu ódio aumentou.
"Você já tinha uma mulher incrível. Vocês pelo menos fazem mulheres lindas, servem
para alguma coisa. Não gosto de vocês no geral, mas suas mulheres são outra
história. Soube que..." - antes que ele terminasse a frase, lhe dei um chute na
cara que o derrubou, e saí do quarto.
"Oliver, lembra do Jhon? Aqui estão restos dele." Peguei um pedaço de pele e
mostrei para eles, que ficaram me encarando sem palavras, e continuei.
"Bom, sinto falta dele, e quero manter a lembrança dele bem vívida. Então, usarei
você para manter ele mais perto agora que ele se foi." Assim que digo isso, mostro
uma linha de costura, grampeador e agulha para os dois, que começam a gritar, se
debater e me xingar.
Depois de dias e dias de sessões de tortura, Oliver já tinha boa parte de seu corpo
coberta pela pele do Jhon. Frankenstein, era como o chamava agora. A Sabrina matei
depois de dois dias de tortura e o Oliver morreu depois de umas duas semanas por
conta de infecção, mas antes dele morrer fiz questão de torturá-lo das piores
maneiras possíveis.
Não sei como, mas consegui fazer com que meu filho sobrevivesse. Decidi chamá-lo de
Jhon, em homenagem a um homem bom que morreu defendendo todos nós. Agora, escrevo
minha história para manter minha sanidade, para continuar sabendo por que faço o
que faço hoje. Infelizmente, apenas o amor pelo meu filho não é o suficiente para
continuar, então me alimento do ódio. O deserto escaldante se transformou em um
deserto congelante com uma fortaleza no meio. Dentro dela é onde meu filho reside,
e ao redor, quem se aproxima deve ter muito cuidado para não morrer.