Sarah Mercury - Nos Braços Do Mafioso

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NOS BRAÇOS

DO MAFIOSO

SARAH MERCURY
1ª EDIÇÃO
2020
Copyright © 2020 Sarah Mercury
Autora: Sarah Mercury
Revisão e diagramação digital: Luana Souza
Artes dos capítulos: Luana Souza
Leitura final: Larissa Freitas
Capa: Alicia Lorena

É PROIBIDA A REPRODUÇÃO TOTAL E PARCIAL DESTA OBRA, DE QUALQUER


FORMA OU POR QUALQUER MEIO ELETRÔNICO OU MECÂNICO, INCLUSIVE POR MEIO
DE PROCESSOS XEROGRÁFICOS, INCLUINDO AINDA O USO DA INTERNET, SEM A
PERMISSÃO EXPRESSA DA AUTORA (LEI 9.610 DE 19/02/1998).

ESTA É UMA OBRA DE FICÇÃO. NOMES, PERSONAGENS, LUGARES E


ACONTECIMENTOS DESCRITOS SÃO PRODUTOS DA IMAGINAÇÃO DA AUTORA.

QUALQUER SEMELHANÇA COM ACONTECIMENTOS REAIS É MERA COINCIDÊNCIA.


TODOS OS DIREITOS DESTA EDIÇÃO SÃO RESERVADOS PELA AUTORA.
Esse livro trata-se de um romance dark. A obra contém cenas
de sexo explícito, violência, tortura, palavras de baixo calão e
assassinato. Portanto, é indicado para maiores de 18 anos. Se você
é sensível a esse tipo de conteúdo, não leia, pois contém gatilhos.
A autora não concorda de forma alguma com tais atrocidades.
Trata-se de uma história fictícia.
Dedico a todas as pessoas que acreditam no amor, e que
mesmo em meio as dores e sofrimentos, conseguem enxergar o
lado positivo da vida e encontrar forças para continuar lutando
por um mundo melhor.
Agradeço a Deus por me capacitar, e à minha família e amigos pelo
apoio. Em especial, ao meu amigo Mikael, que me desafiou com o tema e foi
um grande incentivador na criação dessa obra, e que por várias vezes quando
pensei em desistir, me deu forças para continuar. Também agradeço a todos
os leitores que acompanham meus trabalhos na wattpad e à minha amiga
Luana por sempre ler, revisar e me ajudar com dicas essenciais para as
construções dos capítulos finais desse livro.
Muito obrigada!
Sinopse
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Epílogo 1
Epílogo 2
Sinopse - Entre o céu e o inferno
Prólogo
Capítulo 1
Nota da autora
Lorena Ávila é brasileira e aos quatorze anos foi raptada e vendida aos
Lourenço através do tráfico humano. Obrigada a trabalhar para uma família
de mafiosos que são sem escrúpulos, capazes de tudo por dinheiro e poder,
Lorena se vê em meio a uma guerra da qual não pediu para entrar. Seu maior
erro foi se apaixonar por quem deveria odiar. Ela é doce, de personalidade
forte e almeja a liberdade.
Vincent Lourenço é conhecido por ser uma máquina de matar. Desde
cedo aprendeu que na vida em que nasceu, era ele ou os outros. Ele sente
prazer no que faz. Vincent não tem compaixão e pela famiglia é capaz de
fazer qualquer coisa. Sujeito frio, calculista e almeja vingança.
É possível nascer amor em meio a tanto ódio, armações e guerra?
Salvador, Bahia - Brasil
Passado

Vou correndo para casa. Já passou do meu horário. E provavelmente


meu irmão já tenha chegado e irá me dedurar para a nossa mãe. Fugi da
escola e fui com a Karen, minha melhor amiga, ao elevador Lacerda, um dos
pontos turísticos mais conhecidos de onde eu moro. Quando se sobe nele tem
uma vista muito bonita para o mar da Baía de Todos os Santos (uma costa
litorânea que cruza a Bahia). O mercado modelo, que fica em frente, é outro
ponto que vale a pena conhecer. Ele é muito antigo, hoje abriga mais de
duzentas lojas que vendem artesanatos e lembrancinhas. De lá, fomos ao
Pelourinho, o qual possui uma enorme ladeira, várias construções coloridas e
diferentes. Também há muitas lojinhas que vendem coisas para turistas, como
camisas, acessórios e objetos decorativos sobre Salvador. Aqui as religiões
que reinam são as de matrizes africanas, principalmente o Candomblé.
Ainda nem citei o farol da barra, que é lindo e fica na praia mais famosa
daqui, além do Centro Histórico e os museus que mostram a história do nosso
povo. Salvador é uma cidade histórica.
Tiramos o dia para visitar esses lugares maravilhosos, confesso que
fiquei tão entretida que não vi a hora passar. Agora estou aqui quase
colocando a alma pela boca para chegar em casa. Não é que minha mãe não
nos deixe sair, ela só não gosta que eu fique andando sozinha até tarde da
noite. Às vezes é bem neurótica sobre segurança, o que, particularmente,
acho o maior exagero. Não é como se onde nós moramos seja perigoso.
Viro a esquina com o coração na mão, torcendo para que Vítor não
tenha chegado ainda e que dona Clarice não esteja no portão com uma cinta,
a minha espera. Acredite! Ela já fez isso, garanto que foi a maior vergonha
que passei em minha vida. A rua inteira me viu apanhar porque saí e me
esqueci de avisar. Esses adultos são tão chatos! Eu já tenho quatorze anos e
sei me cuidar.
Um carro anda bem devagar perto da calçada que estou. Olho no intuito
de conseguir ver quem dirige, mas os vidros escuros e fechados não me
permitem identificar pessoa de dentro dele. Acelero meus passos quando
percebo que está muito devagar, cada vez mais encostado. A porta então se
abre, um cara vestido de preto sai e vem em minha direção. Corro o mais
rápido que posso, deixando minha bolsa para trás no processo. Eu consigo
avistar o portão da minha casa e grito para chamar a atenção de quem estiver
por perto, mas é tarde demais. O homem me alcança, cobre minha boca com
um pano que cheira a algo muito forte, então tudo fica escuro e eu desmaio.

*****

Acordo amarrada, deitada no chão frio. O lugar fede a algo podre que
parece ter morrido há dias. Ao longe escuto vozes, mas infelizmente é um
idioma diferente do meu. Olho tentando achar um meio de escapar, só que
está muito escuro. Cada vez que acordei, estava em um lugar diferente. Não
sei dizer onde estou ou com quem, mas todas às vezes que consegui minha
consciência de volta, eu era dopada novamente. Não faço a mínima ideia de
quanto tempo se passou ou que dia é hoje, só sei que quero sair daqui. Quero
minha família de volta! Quero ser livre de novo! Sei que será quase
impossível, mas nada que me impeça de continuar tentando e lutando para
conseguir me libertar. Não vou desistir. Nunca!
Tento afrouxar as cordas, contudo elas estão muito bem amarradas.
Alguém abre uma porta, a claridade bate em meu rosto me cegando por um
tempo. Ponho-me em alerta e olho para o invasor. Ele fala algo que não
entendo, então não respondo. Coloca-me de pé e pega uma faca para cortar as
cordas dos meus pés. Por instinto tento me afastar, com medo, porém o
cretino me segura e me empurra para fora. Subimos uma escada que dá
acesso a uma sala muito bonita e bem decorada. Sou jogada aos pés de um
senhor que veste um terno escuro fumando charuto. Ele me avalia por um
tempo, então começo a ficar com medo.
— Por favor, não me machuque! — não me envergonho de implorar.
O homem que me trouxe para cá começa a rir do meu desespero. Já o
senhor, se mantém com seu olhar em mim, aparentando ser tão ou mais frio
do que o chão que estou. Ele faz sinal para que eu levante, e aos poucos, com
muita dificuldade, por me sentir fraca, me levanto e fico em pé a sua frente.
Ele traz suas mãos ao meu rosto e vai descendo aos meus seios. Começo a
tremer de pavor.
— Não me machuque! — peço dando um passo para trás.
Finamente o senhor sorri, entretanto não é um sorriso amigável. É
predatório, é maligno. Ele me pega pelos cabelos, me joga no sofá enorme
que estava sentado. Começo a chorar e a me debater, prevendo o pior
acontecer.
Tenho minha roupa rasgada, meu corpo violado de todas as piores
formas que possam imaginar. Depois do que eu imagino serem horas de
abusos e humilhações, sou levada ao mesmo quarto que estava, por fim,
trancada novamente. Pela primeira vez em minha vida entendo o que mamãe
tentava me dizer sobre os perigos que tinham do lado de fora. Acreditei que
tudo passado na televisão diariamente, nunca iria acontecer comigo, e agora
estou pagando caro. Eu queria poder voltar no tempo, ter ficado em casa! Eu
nunca mais serei a mesma depois disso. Eu só espero sobreviver a tudo isso,
ter minha liberdade um dia de volta.
12 anos de idade
Milão - Itália
Passado
Desço as escadas à procura do tio Luigi. Ele disse que iria me levar
para treinar. Segundo ele, tenho que aprender a controlar meus impulsos ou
serei expulso de mais uma escola. Não tenho culpa do moleque ter me
provocado. Eu apenas revidei. O que eles esperavam de mim? Que eu
apanhasse calado?
Mamãe disse que eu nasci com uma condição que me torna diferente das
outras crianças. Não entendo bem, eu só sei que tenho tendência a perder a
paciência e não sinto culpa quando bato em alguém, geralmente parto para a
agressão quando me sinto muito irritado, o que é quase sempre. O médico
disse que tenho que tomar alguns remédios, mas eu odeio.
Outro dia uma mulher me chamou de psicopata. Não sei direito o que é,
porém não ligo. Desde que o filho dela me deixe em paz, pode me chamar do
que quiser. Mas agora que ambos meus pais morreram em um trágico
acidente de avião, meu tio se tornou o novo capo, ele ficou com minha
guarda e muitas coisas mudaram desde então. Não preciso ir mais aos vários
médicos que eu ia antes, por exemplo. Tio Luigi disse que eu não preciso de
nenhum remédio, porque o que tenho é uma dádiva e não devo me
envergonhar por não ser igual aos outros. Ele disse que quando eu crescer,
vou entender melhor e agradecer por isso.
— Vincent? Vamos! — tio Luigi me chama caminhando para a porta.
Desço correndo ao seu encontro. Saímos de carro, andamos por um tempo
até chegar a um velho galpão, do qual entramos. Por fora parece ser velho,
enferrujado, porém, dentro é bem arrumado e cheio de equipamentos de luta.
No centro tem um ringue onde há vários homens treinando, chutando uns aos
outros. No canto da sala há alguns que estão atirando em um boneco. Olho
com curiosidade. Papai nunca me trouxe em nenhuma de suas saídas, por
mais que eu pedisse, sempre eram as mesmas respostas: “Você é muito novo”
e “Ainda não está pronto”. E até quando cogitava em me trazer, mamãe dava
um jeito de fazê-lo mudar de ideia.
— Vejo que gostou do lugar. Quer tentar? — diz Luigi apontado para um
boneco todo furado.
— Eu posso? — pergunto incerto.
— Sim. Você está em uma boa idade. É hora de aprender a ser homem.
Se passar no teste, logo se tornará um mad man. Tem que saber se defender.
Balanço a cabeça concordando, então coloco o fone que me entregam, um
óculos transparente, mas antes ganho uma aula sobre posição e postura
correta. Me ensinam como destravar a arma, mostram como cada uma delas
funciona. Sou levado para uma linha vermelha para começar e tio Luigi vem
para o meu lado.
— É normal se sentir nervoso em sua primeira vez. Esqueça o resto e
apenas relaxe! Tente se concentrar somente no seu alvo! A arma não esta
carregada, mas você terá seis chances.
Eu não estou nervoso, mas sim animado em poder fazer as coisas de
adulto. Pego a glock e me posiciono. Destravo a arma, miro no alvo e atiro.
Repito o processo mais cinco vezes, e por fim, quando a arma descarrega, é
que paro. Sinto-me de repente satisfeito comigo mesmo. Todo estresse que
tenho sentido nos últimos dias foram embora. Estou em êxtase pelo meu
feito.
Chegamos onde o boneco está, para verificar quantos tiros acertei, e sou
aplaudido quando percebem que dos seis tiros que dei, acertei quatro. Um na
cabeça, dois perto do coração e um no braço.
— Muito bom, Vincent! Claramente você tem um dom! Agora vamos à
outra sala para que possa fazer a sua iniciação? Você está mais do que pronto.
O olho confuso. Não precisa ser mais velho? Ao menos era o que
papai me falava todas as vezes em que eu pedia para ir junto em alguma de
suas missões.
— Sim, eu acho. — respondo e seus homens gargalham como se eu
tivesse falado algo muito engraçado.
— Ele não vai conseguir matar alguém. Isso não é para qualquer um. —
diz Henrique, seu consigliere.
— Você só esqueceu que meu sobrinho não é qualquer pessoa, Henrique.
Ele ainda vai comandar isso aqui e será nosso maior trunfo. Quero que você o
treine!
Escuto tudo sem entender nada, apenas observando as pessoas a minha
volta.
— Vamos? — tio Luigi diz saindo andando na minha frente.
O acompanho para uma sala onde tem um homem amarrado e sangrando
no chão.
— Vincent? Esse homem é culpado pelo acidente dos seus pais.
Estávamos à sua procura há algum tempo e só agora que o encontramos. Se
você quer ser tratado como um homem, ter o respeito da máfia, tem que atirar
nele. Está pronto para isso?
— Estou. — digo com segurança.
Olho o cara no chão tentando se soltar das amarras, com os olhos
arregalados. Um dos homens do meu tio me mostra uma mesa com variadas
armas, de vários tamanhos e modelos diferentes. Pego uma que me chamou
atenção, um punhal de cabo preto. Volto para onde meu tio está, vejo que
todos estão claramente surpresos com minha escolha. O que muitos deles não
sabem é que desde os oito anos caço e mato os animais que conseguia pegar
nas armadilhas em que eu criava na floresta. Como não podia acompanhar
papai, arrumei um jeito de me divertir preso em casa. As facas são minhas
fiéis companheiras. Eram as únicas armas fáceis de conseguir e que ficavam à
minha disposição.
— O bom e velho punhal? — tio Luigi pergunta, arqueando a
sobrancelha.
— Eu gosto deste. — digo olhando o brilho na lâmina da faca conforme
eu a viro.
— Nada contra sua escolha. Eu também gosto, mas o negócio é que isso
causa muita bagunça. Você foi bem com a arma lá dentro. Tem certeza que
não vai querer trocar?
— Não ligo! Quero essa! — falo com determinação.
Volto analisar o cara, procurando uma maneira de atingi-lo. Escolho o
pescoço. É um local certeiro e a morte é rápida.
— Saiba de uma coisa, filho, na máfia não existe lugar para pessoas
fracas. Ou é você ou é seu alvo. Um erro, uma hesitação... e nem a máfia ou
seus inimigos perdoarão.
Não digo nada, visto que gosto do silêncio nessas horas. É uma pena o
cara estar amarrado. Não será tão divertido quanto às vezes em que brinquei
com os coelhos. Chego perto dele, seguro seu cabelo para que seu pescoço
fique a mostra, então o cara começa a se debater. Eu me animo com o
desafio. Seguro firme o punhal, passando apenas uma vez. O corte foi
perfeito. O sangue jorra sujando para todos os lados. Ele se debate, faz uns
barulhos parecidos com os que os animais faziam quando eu os cortava. Aos
poucos vai parando, até que seus olhos ficam desfocados e sem vida.
Me viro para meu tio, que agora ostenta um grande sorriso. Ele vem até
mim, me abraça, diz o quanto fui bem e como está orgulhoso. Sou levado a
outra sala, onde um cara tatua em meu braço esquerdo o símbolo da famiglia:
um punhal com duas flores vermelhas. Uma vez eu perguntei ao meu tio o
porquê das rosas com o punhal, e ele me explicou que a faca é um lembrete
de que matamos sem piedade — olho por olho, dente por dente — e as flores
são para a nossa morte, porque lutaremos até o último suspiro por nossa
causa. Embaixo é escrito o juramento, que repito mais tarde na cerimônia de
iniciação feita especialmente para mim, perante a sala cheia de pessoas
importantes para a máfia.
— Pela máfia eu vivo, pela máfia eu morro!
Los Angeles, Califórnia
Presente

Todo dia a mesma merda! Tenho que levantar cedo para limpar a boate
inteira com as meninas depois de passar a noite toda acordada atendendo esse
bando de filhos da puta que fedem a bebida barata, e a charuto de péssima
qualidade. Não aguento mais essa vida! Qualquer dia desses, eu vou dar uma
de doida e meter o tiro na cara de um deles.
Eu odeio esse lugar e tudo o que ele representa. Eu queria ter minha vida
de volta! Sinto tanta falta da mamãe e do meu irmão Vítor. Será que eles
estão bem? Será que ainda se lembram de mim? Eu quero voltar para a minha
família e ter meu direito de escolha! Já tentei de tudo para sair daqui e nunca
consegui nada. Aliás, consegui sim: um braço e três costelas quebradas. Luigi
é um monstro! Com ele não tem esse negócio de meio termo. Ele manda e
você obedece. Eu demorei um tempo para aprender isso, e até alcançar esse
nível de entendimento, apanhei muito e fui deixada por dias passando fome
no calabouço. Um dia tive que ceder.
E não! Eu não desisti de sair desse inferno! Eu apenas não achei um
jeito ainda. Mas vou conseguir minha liberdade de volta, nem que seja a
última coisa que eu faça nessa minha vida miserável.
— Lorena! Luigi quer que você recepcione seus convidados hoje à
noite. Vista algo sexy e não o decepcione, ou sabe o que vai acontecer, não é?
— a vaca da Antonella diz.
— Sim, senhora! Estarei lá. — Forço um sorriso de boca fechada.
Minha vontade é de pular no pescoço dessa cafetina. Por culpa dela, tive
que ser castigada várias vezes. Eu não a suporto! Um dia ela terá o que
merece.
— Muito bem! E só para deixar claro, é melhor nem olhar para o
Vincent. Luigi sabe do seu interesse pelo sobrinho e não está nada feliz com
isso. — Sai me deixando de boca aberta.
Desgraçada! Já esteve fofocando de novo. Eu não tenho interesse
amoroso no subchefe, apenas o acho bonito. Contudo, o que tem de lindo,
tem de perigoso. O cara tem fama de degolar suas vítimas e se deleitar com
isso. Há até mesmo um boato de que ele fez isso com algumas prostitutas que
dormiram com ele. Eu que não quero chegar perto para descobrir se é verdade
essa história!
Volto aos meus afazeres. Depois de verificar se tudo está como
ordenado, subo para tomar um banho e escolher minha roupa da noite.
Arrumo meu cabelo, termino de passar maquiagem. Quando estou pronta,
desço para recepcionar os convidados. Luigi já está sentado no sofá, bebendo,
e quando me vê, faz sinal para que eu vá até ele.
— Estou ao seu agrado, senhor? — pergunto me sentindo insegura.
— Vejo que hoje está obediente. — diz me puxando para seu colo. — É
assim que eu gosto de você: mansinha feito uma ovelhinha.
Seguro a vontade de vomitar quando ele vira meu rosto para um beijo. O
homem é um escroto!
— Serão muitos convidados para hoje? — digo tentando tirar seu foco
do meu corpo.
— Sim. E é melhor preparar o quarto especial. Hoje eu e um amigo
queremos brincar com você. — fala com seu sorriso diabólico.
Fico rígida com suas palavras, o fazendo gargalhar. Oh, não! Todas as
vezes que ele me leva para lá e me divide com seus colegas, eu sempre me
dou mal. Dez anos sendo torturada, violentada praticamente todos os dias, e
ainda assim não me acostumei.
— Você é tão transparente, doce Lorena. Eu me deleito com sua
rebeldia. Você me excita quando pensa que pode se livrar de mim. Seu corpo
me pertence e faço com ele o que eu quiser, entendeu? — diz me fazendo
arfar com seu aperto em meus cabelos.
— Sim, mestre! — digo segurando o choro quando a dor vem forte
demais.
— Isso! Assim que eu quero você. Engula o choro e ajoelhe! Me dê
prazer com essa sua boquinha carnuda! Estou muito excitado agora.
Faço o que ele pede. Abro o zíper da sua calça, tiro seu pau para fora o
coloco na boca enquanto começo a masturbá-lo. Luigi segura minha cabeça e
começa a bombear em minha garganta com força. Sinto falta de ar, mas
quando tento sair para respirar, ele não deixa. Me faz continuar chupando até
tê-lo se derramando em minha boca. Levanto-me para poder sair, mas travo
quando ele me segura.
— Sobre esperar meu amigo, mudei de ideia. Quero comer você agora!
Tire a roupa e empine essa bunda para mim!
— Mas... — tento argumentar, mas antes de sequer formar a frase, levo
uma bofetada na cara.
— Eu disse para tirar a roupa e abrir as pernas para mim, vagabunda! Eu
falei que você é minha! Qual parte não entendeu ainda?
Balanço a cabeça e me viro fazendo o que pede. Nessas horas é
impossível segurar as lágrimas. Choro em silêncio quando ele entra em mim
com brutalidade, me machucando no processo. Gemo, mas meus gemidos
não são de prazer, e sim da dor que sinto com suas estocadas violentas.
Seguro na mesa, me firmando para não cair, apenas respirando fundo,
deixando minha mente vagar para quando eu era livre e saía com minha
amiga Karen, ou quando ia passar o dia na praia com minha família. Esse é
meu refúgio, é onde me escondo até tudo acabar. Ele se segura em minha
cintura e estoca uma última vez antes de se derramar em meu interior.
— Gostosa! Você nunca decepciona. — Bate em minha bunda, saindo
de dentro de mim. — Vá se limpar, porque à hora que meu convidado chegar,
quero que você dê o mesmo tratamento a ele, ou nós dois iremos ter bem
mais do que uma conversa.
Coloco meu vestido e saio o mais rápido possível de sua frente. Esbarro
em alguém no corredor, mas nem me importo em olhar para ver quem é a
pessoa. Me sinto tão humilhada, indefesa e usada, que nada interessa nesse
momento. Ele sente prazer em me ferir e tudo que sinto é nojo dele.
Entro no banheiro e me sento no chão, permitindo que toda dor,
humilhação, saiam em forma de grandes e grossas lágrimas salgadas. Ali eu
permito que minha máscara caia, me tornando novamente a menina que foi
tirada do seio de sua família, sem aviso prévio ou direito de escolha, e jogada
nesse mundo monstruoso. Posso ser a prostituta dos Lourenço e ferida o
quanto for, posso ter meu corpo usado, judiado e até mesmo sodomizado
pelos seus amigos sádicos, mas eles nunca terão a minha rendição, nem
minha alma, sempre terão que me ter à força. Não vou me render, nem deixar
que tirem o mais importante de mim: a minha dignidade.
Levanto do chão, limpo meu rosto para voltar. Ainda têm muitas horas
pela frente para enfrentar e eu faço de cabeça erguida, como uma verdadeira
brasileira de sangue quente nas veias, porque desistir não faz parte do meu
ser.
Los Angeles, Califórnia
Presente

Chego ao Dark Nigth e saio à procura de Luigi. O vejo comendo sua


prostituta pessoal e o aguardo terminar para falar com ele. Esse tipo de coisa
não é comum aqui na parte de baixo, pois tenho clientes que não fazem parte
da máfia. Para isso temos os quartos no segundo andar, todavia meu querido
tio não é seguidor de regras e estou sem vontade nenhuma de discutir sobre
isso. Olho a mulher sair chorando, arqueio uma sobrancelha para ele. Ela foi
enviada para cá com Antonella há cerca de seis meses e tenho um
pressentimento de que não veio a passeio. A garota cheira a problema, e tudo
que menos preciso no momento é ter alguma dor de cabeça.
Não sei o que meu tio andou fazendo na Itália para vir correndo à Los
Angeles, mas tenho a leve impressão de que não irei gostar da resposta.
Odeio que esteja bagunçando minha boate e trazendo seus amigos para o
meio dos meus negócios. Uma das coisas que pedi quando aceitei o cargo de
subchefe, foi para que ele não se metesse. O respeito muito, só que não tolero
desrespeito, nem dele e muito menos de ninguém.
Sob meu comando, nossa organização cresceu bastante e tem se
expandido rápido para outros estados. Consegui deixar tudo muito bem
organizado, sem a federal no nosso pé até o momento. Entretanto, imagino
que com meu tio aqui, não teremos essa paz por muito tempo. Ele tem
tendência a levar o caos por onde passa e isso me preocupa. Não estou a fim
de perder o controle e nem entrar na mira do FBI. Estou vendo que esses dias,
com sua presença, serão verdadeiros testes de paciência.
— Se divertindo? — digo me sentando ao seu lado.
— Um pouco de diversão nunca é demais. — diz rindo.
— Como andam os negócios em casa? Imagino que sua vinda até aqui
tenha um motivo.
— Direto como sempre, hein? Queria sentir novos ares, e nada melhor
do que onde meu querido sobrinho está.
— Os negócios estão indo muito bem por aqui, pelo que vejo.
— Sim! Tudo dentro dos conformes, como tem que ser. Convidei Lucca
Vitiello para uma reunião. Fiquei sabendo que ele está interessado em fazer
uma aliança conosco, até ofereceu a mão da filha Giovanna para selar o
compromisso.
Filho da puta! Sabia que tinha algo fedendo com sua chegada.
— Eu não tenho interesse em fazer nenhum tipo de negócio com ele, tio.
Estou indo muito bem sozinho. Essa semana mesmo, consegui expandir
nossas vendas de drogas para outros territórios, inclusive México e Nova
York.
— Eu sei, filho. Não estou dizendo que você não é capaz. Tem se
mostrado muito competente em tudo que faz. Só acho, que se tivéssemos o
controle de Las Vegas, seria bom também. E você está em uma boa idade
para se casar. A filha dele é jovem e muito bonita. Tê-la como esposa não
será nenhum sacrifício e trará vantagem para nós.
— Eu não quero! Se está tão interessado assim, case-se você com ela!
Ele fecha a cara, se levanta, ficando de frente para mim.
— Está se esquecendo de quem é que manda aqui, Vincent. Eu continuo
sendo o capo e você me deve respeito. O que eu digo é lei. Antes de dar suas
respostas finais, pelo menos escute sua proposta.
Meu sangue ferve, a mão chega a coçar para pegar meu punhal e enfiar
em sua garganta, mas me mantenho inexpressivo, frio. Não irei deixá-lo ver
que me atingiu em cheio. Se pensa que irá me controlar feito uma marionete,
está muito enganado. Quando eu era pequeno, talvez tenha me manipulado,
mas hoje não permito que tenha esse poder sobre mim.
— Como quiser, capo. — digo olhando em seus olhos. — Afinal, como
você mesmo acabou de pontuar, ainda é o chefe.
Ele franze a testa com minha resposta, por certo na dúvida se abaixei a
guarda ou o ofendi.
— Assim que eu gosto. — Dá uns tapinhas em minhas costas e sai para
receber seus convidados que chegaram.
Faço sinal para que Marco, que está a poucos passos de mim, se
aproxime. Preciso montar uma estratégia de emergência. Sempre estou dois
passos à frente e agora não será diferente.
— Quero saber tudo o que Luigi tem feito pelas minhas costas! Ache
todos os seus pontos fracos! Também quero estar por dentro do verdadeiro
interesse do Lucca em nosso território!
— Ouvi o que ele disse e isso não é bom. Trazer o inimigo para dentro
de casa é um tiro no pé.
— Eu sei. Luigi nunca foi inteligente. É muito ganancioso, vive
metendo os pés pelas mãos. Não foi por pouco que quase nos expôs e fez a
famiglia afundar várias vezes.
— Acha que ele ficará pouco tempo? — pergunta curioso.
— Bem que eu queria. Porém, se minhas desconfianças estiverem certas,
dessa vez veio para ficar. Melhor nos prepararmos para algumas possíveis
retaliações! Luigi não abandonaria tudo em Milão por pouca coisa. Isso está
me cheirando à encrenca, e das grandes.
— Irei mandar uma equipe investigar. Não se preocupe! Tente agir com
naturalidade e não deixe que ele jogue fora anos de trabalho duro que
tivemos!
— Não deixarei. Nem que para isso eu tenha que tomar medidas
drásticas. — digo me sentando no sofá e dando sinal para que me tragam uma
bebida.
Marco cresceu junto comigo. Fomos treinados na mesma época, por
Henrique. Por termos a mesma idade, acabamos nos tornando amigos, por
assim dizer. Quando fui promovido, o recrutei para ser meu executor. Com o
tempo, ele acabou se tornando meu braço direito. Em minha ausência, ele é
meus olhos aqui dentro. Por esse motivo o permito me aconselhar, valorizo
muito suas opiniões sobre meus negócios. É o único que deixo chegar mais
perto de mim e tem minha total confiança.
— Farei algumas ligações. Deixarei Thadeo como seu guarda até eu
voltar. — diz apontando para o moleque mais a frente de onde estamos.
— Tudo bem. Ele tem se destacado bastante nos treinamentos. Estou
pensando em colocá-lo na nossa equipe principal. O que acha?
— É um caso a se pensar. Farei mais alguns testes com ele.
Balanço a cabeça concordando e ele vai até o garoto para orientá-lo.
Lorena desce as escadas com uma roupa diferente dessa vez, vai ao pole
dance, começa a dançar com sensualidade no ritmo da música que toca.
Reparei que gosta de ir para o palco sempre que está triste ou chateada. Não
porque gosta de se exibir, e sim como um meio de extravasar o que sente,
assim como eu gosto da tortura. Tomo meu drink, observando-a, e meu pau
se anima com sua desenvoltura. Não posso deixar de sentir desejo por ela.
Tenho a evitado desde quando chegou aqui. É a queridinha do meu tio, então
fico longe para não causar nenhum tipo de confusão. Faço sinal para que
Ashley venha até mim.
— Precisa de mim? — pergunta se sentando ao meu lado.
— Sim! Suba e me espere no quarto! — ordeno sem olhá-la.
Apenas quando a apresentação da morena acaba é que me levanto e vou
atrás de Ashley. Acendo um cigarro, entro no quarto. Encontro-a ajoelhada e
nua no chão, com as mãos para trás, como ensinei.
Depois dos treinamentos pesados que tive com Cavallaro e seus homens,
fiquei com algumas manias. Uma delas é foder as mulheres amarradas para
que não me toquem, desse modo não corro o risco de ser morto na hora do
sexo. Me acostumei assim, chego a sentir prazer em vê-las a minha mercê.
— Levante, vá até a cama e estique os braços!
Ela faz como mando. Vou até a gaveta, pego uma algema para prender
seus pulsos. Ashley sabe como eu gosto, já está acostumada, mas por via das
dúvidas, não baixo a guarda. Não tenho o trabalho de tirar a roupa, posto que
não irei demorar. Será apenas uma transa rápida para me acalmar. Coloco o
preservativo, me arrumo entre suas pernas compridas, entrando dentro dela
com uma única estocada. Ela arfa com minha invasão, e meto em seu canal
escorregadio, com força, até alcançar o clímax. Saio dela, soltando seus
pulsos, liberando-a para sair. Descarto o preservativo usado e fecho o zíper
da calça. Simples assim! Um sexo duro, cru, sem conversa, beijo, toque ou
carinho. Ela está aqui para me servir e é bem paga para isso.
Saio do quarto, mais controlado, e desço para encarar essa reunião com
os malditos Vitiello.
Desço do palco, peço uma bebida para o barman. Ao longe observo os
convidados de Luigi. Do seu lado está Vincent, sério, com seu cigarro nos
dedos. Ashley senta comigo e também pede um drink. Desde que cheguei
aqui, ela foi a única que me tratou com respeito. Em nossas poucas conversas
a sós, me confidenciou que também foi sequestrada ainda pequena quando
muito mais nova do que eu. Não cheguei a conhecê-la na Itália porque ela já
havia sido despachada para cá.
Quando fui entregue as mãos de Luigi, fui enviada juntamente com
outras doze meninas de variadas idades para um casarão afastado da cidade,
onde éramos vigiadas vinte e quatro horas por dia. Fomos treinadas por
Antonella para sermos submissas perfeitas, ou melhor dizendo, escravas
sexuais. As meninas que não falavam a língua local, como eu, tiveram que
aprender o suficiente para poderem se comunicar com os clientes. Aprendi a
falar inglês com uma das minhas companheiras que era americana.
Nesse mesmo terreno tinha um galpão que era usado como uma boate
clandestina para pedofilia, com o nome bem propício para o local. Devil's
Games era como chamava o maldito lugar. Lá, três vezes na semana, éramos
vestidas a caráter e lavadas para servir os convidados especiais. Políticos,
juízes, policiais e empresários eram alguns da extensa lista de homens
importantes para a sociedade, que na mídia se passavam como defensores da
família, dos bons costumes, mas pelas costas iam para lá extravasarem seus
fetiches sádicos e doentios em meninas inocentes.
Só era permitido ficar morando nesse lugar até completarmos dezoito
anos. Depois disso, fomos todas separadas e jogadas em boates, como essa,
por sermos consideradas velhas. Até hoje não me esqueci da pequena Melissa
que morreu em meus braços por ter sido abusada em uma das salas de jogos.
Ela só tinha onze anos e não aguentou os ferimentos, vindo a falecer. Minha
única consolação é que onde estiver, ao menos ficou livre daqueles monstros.
— Noite difícil? — pergunta Ashley me tirando dos meus pensamentos
sombrios.
— E todas as noites não são? — respondo chateada.
— Sim. Me pergunto se um dia poderemos responder diferente. — diz
bebericando sua bebida.
— Podemos sonhar, não? Mas acho cada vez mais difícil. Já tentei
pensar em algo, mas sempre falho miseravelmente em todas as minhas
opções.
Ela se vira de frente para mim, me estudando.
— Talvez esteja investindo na pessoa errada. Já parou para pensar
nisso?
— Como assim? — digo com curiosidade.
— Eu acho que a sua porta de saída dessa vida é o chefe.
— Luigi? — Rio na sua cara. — Aquele ali me mataria antes que eu
cogitasse pronunciar a palavra liberdade. Ele se sente meu dono.
— Não disse que é o velho babão. Estou falando do Vincent. Eu vi
como ele te comeu com os olhos na hora que estava no palco, e não é de hoje
que reparo nisso.
Arqueio a sobrancelha, duvidando de suas palavras.
— Você é doida! O cara tem a fama de matar mais do que come. Sem
contar que está se preparando para ser o novo capo. Nunca se envolveria
mais intimamente com uma prostituta. Seria considerado um sinal de
fraqueza.
— Pode ser, mas não custaria você tentar. De todas as formas, já
estamos condenadas à morte mesmo. Ou acha que viveremos por muito
tempo sofrendo abusos e violências de todas as formas possíveis, todo santo
dia?
— Você está bem? Ele te machucou? Vi que foi atrás de você para o
quarto. — pergunto preocupada com ela.
Eu sei o quanto os homens podem ser ruins e sem coração conosco.
— Nada que eu já não esteja acostumada, minha amiga. De todos os
homens que passam pela minha cama, eu posso te dizer, com toda certeza,
que Vincent é quase um gentleman. Só estou muito cansada disso tudo.
Meu coração dói por ela. Por nós. Anos de sofrimento uma hora começa
a cobrar seu preço. Queria mesmo ter esse poder de ajudar. Não só a ela,
como todas as meninas que sofrem o mesmo que nós. Mas não sou capaz
nem de me ajudar, como eu poderia mudar isso para as outras?
— Pense no que te falei! Às vezes a solução está mais perto do que
imaginamos. Se existe alguém, de todas nós, que pode sair daqui, é você. E
talvez, de quebra, possa conseguir nos tirar também. — diz saindo e indo
atender um dos convidados.
Será? Não, não! Isso é loucura! O cara me evita desde quando cheguei,
como se eu tivesse uma doença contagiosa. Nem ao menos fala comigo.
Nunca me deixaria chegar perto dele. Mas... E se eu tentasse? Não custará
nada. Como Ashley disse, o pior seria eu morrer, e nessa vida que levo, não
vejo como isso poderia ser algo ruim.
Viro para olhar a mesa onde estão e Luigi aponta para cima. Eu me
levanto entendendo seu comando. Lá vamos nós de novo para esse inferno na
terra! Entro no quarto e apenas espero por mais uma seção de tortura. Se
existir purgatório, imagino que seja assim, e que eu já esteja em um. Preparo-
me para o que está por vir, contudo para minha surpresa, quem entra minutos
depois é Romeo, com seu sorriso idiota.
— Parece estar com sorte hoje, gracinha. O cara recusou o convite,
porém o chefe me deu o aval para vir me divertir um pouco com você, por tê-
lo ajudado a marcar essa reunião.
— Uau! Que sorte eu tenho, não? Saí dos braços do diabo para cair nas
mãos do satanás. Grande diferença mesmo! — rebato com sarcasmo.
Ele gargalha jogando a cabeça para trás.
— Eu gosto de você assim, Lorena, só que te aconselho a me tratar bem.
No dia que o chefe não te quiser mais, vou pedi-la para mim. Então seja mais
suave, querida! Posso ser seu passaporte para sair dessa vida que leva.
Quem ri agora sou eu.
— Pois eu prefiro que ele meta uma bala no meio da minha testa. Seria
um fim muito mais digno do que ter você como marido.
Mal termino de falar e levo uma bofetada na cara, caindo no chão com o
tamanho da força aplicada. A segunda do dia. Eu e essa minha boca!
— Levanta, sua puta, e venha fazer seu serviço! E fique feliz por eu não
te dar uma boa surra, por tamanho desrespeito.
Desgraçado! Também, sendo filho da cafetina, só poderia ser podre
como ela. Levanto do chão, ainda sentindo meu ouvido esquerdo zumbir, tiro
minha lingerie, permitindo que meu corpo seja abusado mais uma vez. Só
que meus pensamentos são diferentes agora. A todo instante repasso minha
conversa com a Ashley, e ali, tendo meu corpo violado contra a minha
vontade, tomo a decisão de colocar meus planos em ação. Talvez esse seja o
real motivo de eu ter sido mandada para esse lugar. Ou tento, e com muita
sorte obtenho sucesso, ou eu vou morrer tentando. E seja qual for o resultado,
será lucro para mim.
Estou correndo na esteira enquanto ouço Pompeii de Bastille, quando o
interfone do meu elevador privado toca avisando que tem alguém aguardando
eu liberar a entrada para o meu apartamento. Sete horas da manhã, e já vem
um idiota torrar minha paciência. Não tenho nem tempo de tomar um café
descente para suportar a carga de problemas, dos quais sei que irão se
derramar para cima de mim assim que aquelas portas se abrirem.
Meu apartamento fica na cobertura da boate, pegando todo o andar.
Comprei esse prédio exatamente pela comodidade de poder morar em cima
do local onde trabalho. Gastei uma fortuna para reformar tudo e deixá-lo ao
meu gosto, mas valeu a pena cada centavo. Gosto da minha privacidade, e
morar sozinho sempre foi uma prioridade para mim desde que completei
dezoito anos. No quarto andar estão meus homens de confiança e no terceiro
ficam as meninas que trabalham para mim. Logo abaixo estão os quartos que
alugamos para os clientes passarem a noite, e no primeiro está à boate, onde
mantenho meu cassino e o ringue de luta ilegal, que comando há algum
tempo.
Todo o dinheiro que juntei com meus trabalhos para a máfia, gastei aqui.
É um investimento pessoal e posso dizer que tudo isso aqui é meu, fruto de
muito suor. Quando alguém mexe no meu território, trazendo inimigos para
cá, automaticamente assina seu atestado de óbito. Foi exatamente isso que tio
Luigi fez ao me desafiar aceitaando o acordo com o capo de Las Vegas. Ele
passou por cima dos meus desejos, deixando claro que não me respeita como
seu subchefe, muito menos como seu sobrinho e único parente vivo. Então,
como não possuí nenhuma consideração por mim, por que eu deveria ter por
ele? Se há uma coisa que aquela reunião da semana passada deixou claro para
mim, é que mereço subir novamente de cargo, do qual me pertence por
direito. Estou levando o nome da família adiante, então quero ser reconhecido
como chefe.
Enxugo o rosto, desligo a música, vou até a porta digitar o código,
liberando a entrada da pessoa. Sento no sofá e a aguardo entrar. Deixo minha
arma debaixo da almofada, por precaução, e apenas espero. Logo Marco
aparece em meu campo de visão, então relaxo.
— Bom dia, chefe! Vim te trazer algumas informações valiosas. — diz
se sentando ao meu lado.
— Espero que sejam notícias boas!
— Oh, são sim! Veja você mesmo! — Me entrega uma pasta.
Abro com curiosidade, visualizando seu conteúdo. Tiro de lá várias
fotos e relatórios.
— Mas que porra é essa?! Luigi está com o FBI na cola dele
novamente?! — Levanto puto pelo que vejo.
— O pior nem é isso. Olha os motivos no outro envelope!
Sento novamente, começo a ler uma por uma das documentações, e a
cada uma que abro, com mais raiva fico.
— Esse imbecil está metido com tráfico humano? É isso mesmo que
estou lendo aqui?
— Sim. Estou indo mais a fundo, Vincent, mas há boatos espalhados por
aí de que ele está metido com tráfico infantil também. Ainda não sei dizer se
é verdade, mas vou conseguir descobrir.
— O desgraçado faz merda no território dele e foge para cá com o rabo
entre as pernas, achando que vou deixar respingar em mim?! Ele vai ver só o
dele! Não nadei feito louco para morrer na praia. Dessa vez ele vai se virar
sozinho!
— Eu sei que você está zangado, e não tiro a sua razão, mas precisamos
ir com calma. Se fizer qualquer coisa que coloque em risco a vida do capo,
você será morto por traição! Por mais que isso prejudique a organização,
nada disso é proibido em nosso mundo.
Isso é verdade. Nada disso tiraria ele do poder, ainda haveria quem
batesse palmas para essa palhaçada. Entendam bem! Sou um mafioso, porém
me considero um criminoso de colarinho branco. Estou dentro dos padrões
normais do crime. Nunca matei um inocente.
Mexo com tráfico de drogas, todavia não obrigo ninguém a comprar.
Todos que usam, compram por vontade própria. Não saio por aí viciando
ninguém. Isso vale para o cassino também. Cobro o que me devem. Se jogam
criando uma dívida grande, é tudo de forma consciente e é gente que vem
com as próprias pernas. No ringue, ofereço uma premiação para o ganhador e
todos os participantes são adultos capazes de fazerem as próprias escolhas.
Lá não entra nenhum santo. Tenho minhas próprias regras e não aceito
crianças nem pessoas que são, de alguma forma, forçadas a participar.
Têm as prostitutas que trabalham para mim, pagando suas dívidas, sejam
elas de jogos, de dinheiro que pegaram emprestado ou de vícios que querem
manter garantidos. Tudo bem que têm algumas que meu tio me manda e
tenho lá minhas dúvidas de onde vieram, contudo recebem um bom dinheiro
por seus trabalhos e ainda sou generoso em deixá-las morarem aqui, com as
despesas praticamente pagas.
O que mais eu poderia fazer? Sou um mafioso, não um bom samaritano.
Disse que não leso a vida de quem não me deve nada. Muitas dessas
mulheres não conseguiriam lá fora nem metade do que ganham aqui. Elas
têm que ser gratas por terem comida na mesa e onde dormir. Aqui, todos que
entram, sabem que não saem. É a regra! Um juramento feito no sangue, onde
se entra vivo e só sai morto. No entanto, Luigi tem passado dos limites. Anos
de papai no poder, e nunca vi tantos agentes nos perseguirem, como acontece
com o meu tio no comando. Ele traz direto suas merdas para nossa porta
colocando toda a organização em perigo.
— Temos que fazer alguma coisa, Marco. Tente juntar mais provas e
depois marcaremos uma reunião com todos os nossos subchefes para mostrar
os perigos que estamos correndo.
— Eu não sei se irão querer ficar contra seu tio, Vincent. A maioria foi
colocada lá por ele, se sentem em dívida com o capo. Todos estão nas mãos
do Luigi.
— Se acaso eles não quiserem tomar partido, vamos ao plano B.
— Qual seria? — pergunta não acompanhando minha linha de
raciocínio.
— Tirá-lo do nosso caminho é a nossa meta. Se não vai sair por bem,
faremos sair por mal.
— Pretende matá-lo? Isso seria suicídio. Todos se virariam contra você
e o julgariam por trair a famiglia.
— Eu não. Já seus inimigos, todos querem sua cabeça. Eu não seria
penalizado se meu tio caísse e morresse em mãos inimigas, certo?
— Um plano audacioso, arriscado, que pode dar certo ou nos ferrar de
vez.
— Não tenho medo da morte. Você tem? Trinta anos me parece uma
boa idade para morrer. — digo fazendo disso uma piada. Marco ri.
— Nós temos muito a viver ainda. Você tem uma cadeira para sentar e
governar por muitos anos. Podemos tentar primeiro dentro das leis da máfia,
do jeito certo, caso não tivermos resultado, vamos montar outras estratégias.
— O que me preocupa é Henrique. Dele sim eu tenho um certo receio,
visto que é um homem muito misterioso, reservado. Lembro quando chegou
lá em casa e entrou na máfia. Aos poucos foi subindo, até conseguir ser o
conselheiro. A meu ver, é um cargo muito importante para quem é comum e
não faz parte de nenhuma das famílias tradicionais.
— É um homem visionário, Luigi percebeu isso, mas até mesmo o
Henrique perdeu o controle sobre as ações de seu tio.
— Por pouco tempo, meu amigo. Luigi até o momento não tinha
encontrado um adversário à altura. Já está na hora de mostrarmos a ele que
seus pupilos cresceram e irão derrotar o mestre.
Marco me entrega uma dose de whisky para brindarmos. É cedo, mas a
ocasião pede uma exceção.
— À queda de Luigi! — diz levantando seu copo.
— À nossa vitória! — confirmo levantando o meu também, virando a
minha dose de uma só vez.
Que vença o melhor nessa guerra, e com certeza vencerei, porque não
estou disposto a perder, então irei até as últimas consequências para ter o que
desejo.
Limpo o cassino com a Ashley, para podermos nos arrumar para a
noite. Hoje é dia de luta. Uma vez na semana Vincent vai liberar lutas
clandestinas valendo muita grana. Como o espaço estava passando por
reforma e só foi liberado ontem, eu nunca tinha assistido a uma dessas lutas.
Dizem ser uma coisa de louco, onde vale de tudo, inclusive, que já teve gente
que morreu nessa disputa sanguinária. O lado bom é que todos que
participam são criminosos, então não sinto pena de nenhum desses imbecis.
Estou muito ansiosa, porquanto hoje vou tentar minha primeira
aproximação com o Vincent. Essa semana tentei chegar mais perto, no
entanto com a presença constante de Luigi em cima de mim, não deu.
Contudo, como no momento ele está viajando, essa será minha chance de
colocar meus planos em vigor.
— Está muito quieta hoje. Tudo bem? — Ashley pergunta me
analisando.
Puxo-a para o lado, olhando a nossa volta, a fim de verificar se não há
alguém por perto.
— Estive pensando sobre o que me falou semana passada. Quero tentar,
mas estou muito insegura. Não sei praticamente nada sobre ele. Me passe
algumas dicas, para que eu não coloque tudo a perder!
— Não se preocupe, eu sou uma boa observadora. Não sei de muita
coisa, porque ele é bem fechado, o único que chega muito perto dele é o
Marco.
— É impressão minha ou você só faltou derreter aí quando disse o nome
do executor? Está rolando algo entre vocês?
— Que nada! Ele nem olha para mim. — diz cabisbaixa. — Mas
voltando ao assunto “Lourenço”, tudo que precisa saber é que ele gosta de
foder mulheres amarradas, porque odeia ser tocado. Não tem conversa, beijos
ou qualquer coisa do tipo. É somente sexo. Não pergunte nada por enquanto,
ele é bem desconfiado, caso perceba que está tentando manipulá-lo, irá matar
você sem pensar duas vezes.
Bem animador, não?!
— Como vou chegar perto dele, se de todas as meninas daqui, você é a
única que ele chama?
— Na próxima vez vamos trocar! Em vez de mim, será você que irá
atendê-lo. Diz que eu passei mal e mandei você em meu lugar. Só se lembre
de não questionar nada de início. Conquiste a confiança dele!
— Okay! Deixa comigo!
— O que as mocinhas tanto fofocam aí no canto? Compartilhem
conosco! Também queremos saber. — Antonella pergunta nos fazendo pular
de susto quando entra acompanhada de seus filhos Romeo e Thadeo.
— Nada de importante! Estamos ansiosas pelo dia de hoje.
— Hum! Estou de olho em você, Lorena. Não pense que vai fazer o que
bem entender apenas porque o chefe não está aqui. Tenho ordem restrita para
puni-la caso necessário.
Vagabunda!
— Mas não precisará, porque tenho feito meus serviços direito. Não
sabia que estava proibido conversar!
— Muito cuidado com o jeito que fala comigo, menina, ou eu posso
acidentalmente deixar você ser espancada por um cliente até a morte! Luigi
não ligaria de substituir seu brinquedinho por uma versão mais nova. —
cospe suas palavras de ódio.
Tremo de raiva. Na minha cabeça se passa um tutorial das várias
maneiras que eu gostaria de matá-la agora. Mas não posso! Preciso manter o
foco e ao menos tentar livrar as meninas daqui. Essa será minha única
chance. Não vou desperdiçar por conta dessa cobra.
— Voltem aos seus afazeres! Não estão sendo pagas para ficarem
trocando figurinhas sobre como os clientes fodem vocês. — diz com um
sorriso de deboche virando-se para sair.
Ashley dá um passo à frente para atacá-la, então a seguro para não fazer
merda.
— Calma! Não faça nada que vá fazê-la se arrepender depois!
— Qualquer dia desses eu mato essa ajudante do inferno. Mulherzinha
nojenta!
— Ela tem prazer em me humilhar. Desde quando cheguei ao casarão,
nunca gostou de mim.
— Isso porque antes de você, ela era a preferida de Luigi, e jurava, na
minha época, que seria a nova senhora Lourenço. Reparei que o velho nem
olha mais na direção dela, a não ser que a queira fazendo algo para ele.
— Pois que faça bom aproveito daquele monstro! Só não digo que não
me importaria de ser trocada por outra, porque sabemos onde ele busca as
substitutas. — falo com desânimo.
Ashley também faz uma cara de tristeza e mudamos de assunto.
Terminamos nossa parte, subimos para nos aprontar. No quarto, ela me passa
mais algumas informações sobre Vincent, me diz para ficar preparada, porque
caso a oportunidade surja, me avisará.
Desço ao primeiro andar, vejo o quanto está lotado. Olho para os lados
tentando achar Vincent, no entanto não consigo vê-lo em lugar algum. As
pessoas começam a ir à área, lugar em que está o ringue. Acompanho a
multidão animada, que grita obscenidades de todos os tipos. Encosto na
parede tentando ver quais serão os lutadores, entretanto não enxergo em meio
a tanta gente. Alguém agarra meu braço, me assustando com o aperto
doloroso em meu pulso.
— Não era para você estar aqui! — a voz grossa diz atrás de mim me
fazendo tremer pelo contato.
Não preciso me virar para saber que é ele. Meu corpo, minha mente
sabem, e ambos no momento estão gritando com uma grande placa em letras
neon escrita PERIGO. A vontade de sair correndo é grande, mas me
mantenho presa no lugar, apenas respirando, a fim de me acalmar e conseguir
fazer as palavras saírem sem gaguejar.
— Só queria poder assistir a luta. — digo tentando manter a voz baixa e
calma, sem transmitir o que estou sentindo.
— Isso aqui irá ficar muito violento em pouco tempo.
Seguro a vontade de rir do seu comentário.
— Sério? Mais violência do que já vi?! Impossível! Nada mais me
assusta.
Ele ri muito perto agora, minha pele se arrepia todinha.
— Não se engane, doce coelhinha! Te garanto que tudo que já
presenciou em sua vida, não é nem metade do pior que existe em nosso
mundo.
Franzo a testa com sua escolha de apelido. Coelhinha? Por quê? Pareço
ser inofensiva? Se ele soubesse de tudo que já me aconteceu, não diria isso,
todavia não estou afim de dizer nada também.
— Talvez esteja certo. Porém, vivendo nesse meio, conviver com o
perigo é inevitável.
Viro-me de frente para vê-lo melhor. Seus olhos não desviam dos meus,
me analisando.
— Pode ser. Mas se quer realmente assistir, terá que sair daqui e ir ao
outro lado, onde é mais seguro. — diz me soltando, e imediatamente sinto
falta de seu toque.
Ele começa a andar e eu o acompanho.
— Quem irá lutar hoje? — pergunto para puxar assunto.
— Vou abrir a noite.
Somente isso. Curto e grosso! Me deixa junto as outras meninas e sai.
— Vejo que conseguiu algum progresso. — Ashley diz. — Me escuta!
Ele vai lutar, e quando sair, vai pedir para que eu entre, na intenção de
extravasar o restante da sua adrenalina. Além disso, ele vai precisar de ajuda
com os ferimentos. Será sua chance, entendeu?
— Quando diz “extravasar”, está falando sobre sexo, né? — pergunto
para tirar minhas dúvidas.
Ela gargalha achando engraçado meu embaraço.
— Sim! Lembre-se de tudo o que te falei e vai dar certo.
Ashley me passa mais algumas orientações e balanço a cabeça
concordando. Pouco tempo depois um participante grande, todo tatuado entra
na gaiola. Quando Vincent entra, do outro lado, as pessoas gritam eufóricas,
fazendo com me questione se ele ganhará daquele homem. O cara é muito
maior e aparentemente mais forte.
— Esse adversário irá acabar com o Vincent. Olha o tamanho dele! —
digo admirada.
— Relaxa! O chefe nunca perdeu uma luta, olha que já pegou
adversários muito piores que esse. — Marco, com sua enorme barba, diz ao
meu lado.
— Se você diz. — Viro para frente sem me desprender do que acontece
lá dentro.
A luta inicia com os dois dançando um em volta do outro, encarando-se.
Uma sucessão de chutes começa, o que parece durar uma eternidade. O cara
consegue acertar o maxilar de Vincent, fazendo-o tropeçar e quase perder o
equilíbrio, mas ele se recupera dando um sorriso provocativo. O adversário
revida a provocação com uma tentativa de acertar um chute na parte inferior
de sua barriga, entretanto, Vincent com a perna esquerda bloqueia e revida
com um soco na boca do estômago de seu oponente, seguido de outro que
acerta o nariz, tirando-lhe sangue. Antes de receber mais um golpe, o lutador
rival consegue se recuperar, e devolver o ataque recebido, levantando uma
perna, dando um chute alto na cabeça de Vincent, fazendo-o cambalear para
trás e cair no chão.
Dou um gritinho, arrancando algumas risadas a minha volta. Então ele
se recupera rapidamente, levantando o braço para se defender de alguns
golpes. Aproveita a guarda aberta do adversário, volta com tudo para cima do
cara, iniciando uma sequência de socos. Após várias pancadas na cabeça do
oponente, o mesmo cai no chão e não se levanta mais. Vincent se joga em
cima do homem, como se estivesse possuído por uma besta, continua a bater
no cara desacordado. Como esperado, é declarado o vencedor, levando a
galera à loucura com o resultado.
Ele sai da gaiola sendo recebido por algumas pessoas que lhe dão os
parabéns. Olha para onde estamos, prendendo seus olhos nos meus por um
curto período de tempo, depois desvia fazendo um sinal para Ashley, que vá
ao banheiro. É minha chance! Despeço-me da minha amiga, pedindo
mentalmente para que Iemanjá, a minha deusa de amor, me abençoe e ajude a
conquistá-lo. Com pensamentos positivos, parto para minha missão.
Entro no banheiro, tiro o short para tomar meu banho, sentindo o
sangue quente da adrenalina ainda correndo em minhas veias. O filho da puta
conseguiu acertar alguns golpes em mim. Não era nem para eu ter demorado
tanto, visto que geralmente no primeiro round, eu já derrubo meus
adversários. No entanto, aquele toque me desconcentrou, e eu ainda podia
sentir o quente de sua pele em minha mão. Pude até mesmo perceber seus
batimentos acelerando diante de meu toque. Ela é difícil de ler. Consigo
estudar, até adivinhar alguns dos seus comportamentos, por serem repetitivos,
mas no geral é quieta e calada. Notei que poucas pessoas se aproximaram
dela lá fora, então com certeza foram avisadas para manterem distância.
Fecho meus olhos, lembro do seu cheiro gostoso. Me segurei para não
pegar uma mecha de seu cabelo e trazer ao meu nariz, feito um tarado. Meu
pau fica ainda mais duro com a lembrança, levo minha mão para acariciar e
acalmá-lo um pouco. Gemo sentindo o gozo já na borda, então acelero os
movimentos, deixando-me esvair em êxtase, imaginando ser ela aqui me
tocando com suas delicadas mãos de unhas pintadas de vermelho sangue.
Gostei dessa cor nela. Abro os olhos, termino de me enxaguar, coloco a
toalha na cintura e saio do chuveiro.
Como se uma miragem saísse diretamente da minha cabeça e se
materializasse em minha frente, ali está ela com uma caixa de primeiros
socorros nas mãos. Reprimo os pensamentos pecaminosos, procurando tomar
o controle do meu corpo novamente.
— O que está fazendo aqui? — pergunto com raiva por ter baixado a
guarda.
— Eu... — Ela lambe os lábios ao olhar meu peitoral molhado. —
Ashley me mandou aqui.
— Por quê? Ela sabe que esse é o serviço dela. — a corto.
— Ela precisou subir, porque não estava se sentido bem.
— Não me interessa! Pode deixar isso aí e cair fora daqui antes que
alguma conversa chegue aos ouvidos do meu tio e você me traga problemas!
— Eu posso fazer isso no lugar dela. Ela me orientou sobre como você
gosta. Deixe-me ajudá-lo!
Parto para cima dela, prendendo-a na parede. Ela me olha com seus
olhos azuis arregalados, temendo meus próximos passos. Isso, coelhinha!
Tenha medo de mim, fique o mais longe possível, antes que eu estraçalhe
você com minha fome.
— Não! Você não pode! Eu não sou suave, garota! Gosto de duro e
forte, e a Ashley aguenta tudo sem reclamar. Então dê meia volta e vaze
daqui!
Como se eu tivesse ligado um interruptor dentro dela, seus olhos vão de
amedrontados para raiva em um piscar de olhos. Ela me empurra, joga a
caixa no chão e tira a roupa, ficando nua em minha frente.
— Eu não sou frágil, querido, nem vou quebrar. Acredite em mim
quando digo que já passei pelo fogo e sobrevivi. Não será uma foda dura que
irá me fazer sair correndo daqui. — fala rápido e sem tomar fôlego.
Analiso suas falas, me afasto quando a minha mente grita para que eu a
deixe sair sem aceitar o desafio. Mas logo depois abaixo meus olhos para o
seu corpo e meu membro pulsa de desejo. Ela é magra, porém com curvas
nos lugares certos. Seus seios são medianos, caberá perfeitamente em minhas
mãos. Sua feminilidade lisa me deixa com a boca salivando para prová-la.
Qual será seu gosto?
— O quê? Não vai ser homem para fazer o serviço? Acho que quem vai
sair correndo daqui será você. — me provoca.
Foda-se!
— Ah, coelhinha, você não sabe com quem está brincando! — digo
jogando ela na parede e segurando seus cabelos compridos. — Vire de costas
e coloque as mãos para trás!
Ela faz o que mando. Paraliso quando vejo suas costas marcadas. Não
ouso perguntar o que aconteceu e quebrar o clima, mas acho que agora
entendo o que ela quis dizer sobre estar no nosso mundo e já conhecer a
violência. Rasgo sua calcinha usando a mesma para amarrar seus pulsos.
Cheiro seu pescoço, ela se arrepia. Sorrio perverso vendo o quanto eu a afeto.
Nesse momento seu corpo diz tudo o que preciso saber sobre ela.
— Você cutucou o lobo com vara curta, Lorena. Muito curta! Por isso
pagará pelo seu atrevimento.
— Estou ansiosa por isso. — diz me olhando sobre os ombros.
Puta que pariu! Que mulher é essa?!
— Vamos às regras: você não fala, não tenta me tocar na hora do sexo e
nem me beija. Entendeu? — digo e ela balança a cabeça em concordância. —
Muito bem! Agora fique quietinha! Não saia daqui ou terei que te punir.
Vou até a minha bolsa com roupas, pego um preservativo. Jogo a toalha
no chão, rasgo o pacotinho e cubro meu pau. Chego por trás dela, segurando
sua cintura, mordo seu pescoço, belisco um dos seus mamilos e depois
pincelo meu membro em sua abertura. Coloco a glande e tiro, provocando
sua entrada, então ela começa a querer se mexer. Dou dois tapas em sua
bunda arrebitada, encaixo nela e a empalo de uma só vez. Ela arfa e eu a
deixo se acostumar com meu tamanho. Não sei porquê, mas quero que ela
sinta tanto prazer quanto eu. Quero marcá-la para que sinta que nunca terá
outro igual a mim. Começo a me mexer, aos poucos vou aumentando minhas
estocadas. Caralho! Ela é muito apertadinha. Tenho dificuldade para entrar
novamente depois que saio de dentro dela. Como pode uma prostituta ter uma
boceta apertada assim?! Ou os homens que ficaram com ela têm paus
pequenos ou só pode ser algum tipo de genética.
A fodo com força, deliro com o seu canal molhado me sugando. Levo
meu dedo ao seu botãozinho, ela geme baixinho. Aproveito seus sucos e
passo o dedo devagar em seu clitóris, apenas atiçando. Ela se contorce e eu a
seguro para não escapar de mim, nem cair no chão. Acelero meu dedo ao
mesmo tempo em que acelero minhas batidas. Lorena começa a choramingar
e eu me deleito com sua entrega.
— Por favor, pare! Eu acho que vou fazer xixi. — diz com a voz
preocupada.
Segurei o riso porque a situação não é para rir. Não sei se é alguma
atuação dela, mas deixo que continue seu teatro.
— Não vai, querida. Confia em mim! Deixe vim! — digo continuando.
— Oh, meu Deus! — ela grita alto quando o orgasmo vem forte.
Tenho certeza que lá fora todos ouviram e sabem exatamente o que
estamos fazendo.
Eu não consigo me controlar mais, então feito um animal no cio, deixo
me levar. Aproveito que sua boceta me esmaga em um aperto de morte e me
esvazio dentro dela com um gemido gutural. Respiro fundo, saio para tirar o
preservativo, desamarro suas mãos deixando-a se recuperar. Tomo outro
banho, me visto e sento no banco, aguardando ela terminar de se vestir.
Ficamos em um clima estranho pós-foda. Normalmente essa é a hora que saio
ou mando a prostituta sair.
— Passe a pomada em meu machucado! — digo querendo me livrar
logo dela.
— Okay! Só um momento. — fala indo pegar a caixa no chão.
Ela senta ao meu lado e começa a passar os remédios.
— Nunca tinha gozado antes? — pergunto fazendo suas bochechas
ficarem vermelhas.
Interessante!
— Se está se referindo àquilo que senti... Não.
Só pode ser mentira dela. Resolvo mudar de assunto.
— Quem fez essas marcas em suas costas? — a curiosidade me vence e
pergunto.
— Seu tio. Fazia parte do treinamento doentio dele. — diz dando de
ombros.
— Que treinamento? As mulheres não precisam ser treinadas para serem
prostitutas.
— Vocês nos tratam como se fôssemos objetos, só que somos pessoas
de carne e osso, com sentimentos. Sentimos dor, tristeza, alegria. — diz
colocando mais força do que o necessário no algodão que passa em minhas
feridas.
Então seguro seu pulso.
— Já chega! É o suficiente. — Levanto e me afasto dela. — Deixe a
caixa aí, pode sair! Seus serviços não são mais necessários.
Ela muda a postura e fecha a cara. Levanta para sair, mas não antes de
dizer algumas frases que ficariam rondando minha cabeça o restante da noite.
— Logo se vê que não entende nada sobre o nosso mundo. Nem todas
nós estamos nessa vida porque escolhemos, e mesmo aquelas que vieram por
vontade própria, merecem respeito. Somos pessoas, como vocês, não somos
máquinas. — Sai pisando duro, sem olhar para trás.
— Só essa que me faltava agora! Depois irei ter uma conversinha com a
Ashley. Quem essa atrevida pensa que é para me enfrentar desse jeito?! —
digo jogando a caixa dentro da bolsa e saindo do banheiro.
Vou à procura de Marco, já que quero saber das novidades sobre meu
querido tio. Lucca Vitiello já começou a me pressionar para marcar a festa de
noivado com sua filha, contudo estou adiando o quanto posso para sair fora
desse acordo. Não darei uma resposta até saber exatamente quais são seus
interesses nessa união. Tenho desconfiança de que estão tentando derrubar
nossa organização. Se tem uma coisa que aprendi em meus duros
treinamentos, é que não se deve confiar cem por cento em ninguém, nem
mesmo nos que estão sentados à nossa mesa, comendo conosco.
Encontro Marco encostado na parede do banheiro me aguardando sair.
Como de costume, sempre alerta, mantendo-se por perto para me proteger.
Faço sinal para que venha comigo ao escritório. Existem certos assuntos que
não dá para falar estando perto de tanta gente desconhecida. Sento em minha
cadeira fazendo sinal para ele prosseguir.
— A garota saiu cuspindo fogo. Tem certeza de que foi uma boa ideia
ficar com ela? Não que eu seja contra você ficar com quem desejar, mas isso
pode nos causar algum problema futuramente com o seu tio. Ele é obcecado
pela morena.
— Não se preocupe! Ela não é ninguém importante, garanto que não irá
acontecer novamente. Foi apenas um descuido que não se repetirá. — digo
sucinto e ele balança a cabeça em concordância.
— Já que esclarecemos essa parte, preciso te dizer algo nada agradável
sobre o sumiço de uma carga de drogas que estava sendo transportada para
Nova York.
Paraliso com a mão no ar, segurando o isqueiro que estava indo acender
meu cigarro na boca.
— Como assim sumiu? Estava tudo dentro do planejado, também
estamos com o pagamento dos policias em dia. Conseguiu descobrir quem foi
o desgraçado?
— É aí que fica interessante. Pegamos um dos homens do seu futuro
sogro com um dos produtos roubados. Segundo ele, comprou de alguém
daqui de dentro, já tenho quase certeza de que foi do Romeo, pois ele não
viajou com seu tio, o que é bastante estranho, visto que anda atrás dele feito
uma maldita sombra desde moleque. Mas, por via das dúvidas, prendemos no
galpão o indivíduo que efetuou a compra.
— Filho da puta! — digo batendo na mesa, com raiva.
— Literalmente, não? Não acho coincidência ele ter chegado com seu
tio, marcado a reunião com o chefe de Las Vegas, e na semana seguinte, um
dos nossos produtos estarem nas mãos deles.
— Faz sentido. Já tentou arrancar a confissão do imbecil?
— Não. Deixei esse presente para você, sei o quanto gosta desse tipo de
diversão.
Sorrio. Ele me conhece bem. É uma das coisas que não abro mão. Para
mim não é sacrifício nenhum fazer pessoalmente.
— Então vamos! Preciso arrancar a pele de alguns ratos. — falo
animado.
Saímos da boate, dirigimos por uma estrada de terra para ir ao local que
tenho afastado da cidade. O lugar é um antigo armazém de agricultores,
sendo de difícil acesso, bem escondido no meio da mata. Para entrar e saber
daqui, precisa ser um dos meus homens de confiança. Desço do carro,
ansioso pelo que está por vir. Já sinto a adrenalina me tomar novamente.
Entro indo em direção à sala separada especialmente para resolver esses tipos
de assuntos. O desgraçado está amarrado a uma cadeira. Fico em sua frente e
ele levanta a cabeça para me encarar. Jogo meu cigarro no chão, piso nele
para apagar.
— Quero ter uma conversa com você! Te aconselho a colaborar comigo.
Não sou conhecido por ser paciente, muito menos por dar clemência, ainda
mais quando se refere a quem ousa me passar a perna.
— Foda-se! — diz ele cuspindo em meus pés.
Sorrio de sua atitude. Gosto dos rebeldes, pelo simples fato de serem os
que mais me dão prazer em torturar.
— Palavras difíceis para um homem considerado morto. — digo com
uma calma que não estou sentido por dentro.
— Eu já disse tudo que sabia aos seus homens. Não vou dizer mais
nada!
Aproximo-me mais dele.
— Não, não disse. Mas não se preocupe, você não é o primeiro que me
diz essa frase e nem será o último. Todos falam a mesma coisa até eu
começar. — digo pegando meu punhal, movendo-o de um lado ao outro,
fazendo o reflexo bater em seu rosto.
Me abaixo estudando ele.
— Quando eu terminar com você, saberei até mesmo onde seus
antepassados viveram. — Acerto um soco em cima da costela do seu lado
direito.
— Quer que eu deixe preparada uma transfusão de sangue? — Marco
pergunta ao meu lado.
— Não. Ele irá falar logo. Vamos ver quanto tempo aguentará se manter
calado. Qual foi meu recorde da última vez?
— Vinte e cinco minutos, chefe. — responde rindo.
— Estou apostado quinze nesse. Pendure-o nas correntes! — peço,
arrancando algumas risadas a minha volta.
Arregaço as mangas da minha camisa e começo meu trabalho. Alguns
socos em lugares estratégicos, quatro facadas mais tarde, logo já tinham não
somente o nome do idiota que me traiu, como também o endereço do local
onde foi feita a entrega dos meus produtos.
— A sua sorte é que estou muito ansioso para fazer o babaca que ousou
me roubar, pagar. Caso contrário, não me importaria de passar a noite inteira
aqui, brincando com você. — Passo meu punhal em sua jugular, dando fim
na sua vida medíocre.
O cheiro de cobre do sangue toma conta do lugar. Um dos meus homens
me entrega uma toalha para que eu limpe-me. Olho ao meu Rolex
confirmando quanto tempo gastei, mas Marco responde primeiro.
— Levou vinte minutos. Bateu seu recorde da última vez.
— Cinco minutos depois do planejado. Na próxima eu consigo os
quinze. — Sorrio. — Vamos atrás do filho da puta! Só finalizarei minha noite
depois de colocar uma bala no meio de sua testa.
— Ainda acho que isso tem dedo do Romeo. — ele diz exasperado.
— Se ele tiver envolvido o recado de hoje já irá assustar o mandante e
deixá-lo com o rabo entre as pernas.
Saímos do galpão indo atrás do traidor. Somente depois que dei cabo da
sua vida é que voltamos à boate. É tarde da noite, só está no local algumas
pessoas e funcionários. Passo arrancando alguns suspiros e exclamações, mas
minha mente está ligada no foda-se para o que eles pensam de mim nesse
momento. Vou até o bar, coloco algumas doses de tequila no copo, jogando-
as para dentro em um único gole.
Entro no elevador privativo para subir e levanto meus olhos encontrando
os dela arregalados me observando de onde está. Sei que sou um filho da puta
assustador quando quero, só que com a camisa embebida de sangue, devo
parecer o monstro que tanto me chamam pelas costas, ou como a maioria me
define: o psicopata que ama matar. Imagino que ela esteja pensando o mesmo
agora e me comparando ao meu tio, que a torturou. Isso, coelhinha! Veja
como eu sou e entenda porque tem que ficar longe de mim. Enquanto a porta
se fecha, não desvio meus olhos dos seus, deixando que ela veja minha
verdadeira face. Quando o elevador sobe para o meu andar, e entro em minha
fortaleza, tudo que penso é de qual maneira vou tomar o controle da minha
vida de volta. Isso que aconteceu hoje foi só o início de tudo.
Tomo outro banho e acendo um charuto para relaxar. Quando permito
fechar meus olhos para dormir, não sonho com as mortes que tenho em
minhas mãos, nem com os rostos de meus pais, como de costume, mas sim
com um par de olhos azuis assustados como os de um cervo perante um farol
de um carro desgovernado.
A intensidade do seu olhar me tem toda arrepiada. Foi um claro sinal
de alerta para que eu fique na minha e não chegue mais perto. Vê-lo todo sujo
de sangue me mostra o quanto estou ferrada, percebo que estou metendo em
um beco sem saída. Se ele fez aquilo com o intuito de me causar medo, teve
efeito contrário. Meu corpo traidor reconheceu sua presença assim que
entrou, antes mesmo que eu virasse e o visse entrando na boate. Ah, minha
deusa mãe! Não deixe que o feitiço vire contra a feiticeira. Tenho que tê-lo
comendo em minhas mãos, não o contrário.
Termino de limpar as mesas, de organizar as bebidas em seu devido
lugar e subo para meu andar. Preciso urgentemente falar com Ashley e lhe
passar o resumo do fiasco da noite.
Bato na sua porta aguardando ela abrir.
— Oi! Algum problema? — diz abrindo a porta e me fazendo um sinal
para entrar.
— Não sei dizer. Acho que fiz tudo errado, também não sei como
consertar.
— Como foi com o Vincent? — pergunta se sentando em minha frente
cruzando as pernas.
— Foi do jeito que você falou. — digo fazendo um breve resumo sobre
o ocorrido. — Mas no final acabamos discutindo, ai ele me colocou para
correr de lá. Em minha defesa, ele mereceu ouvir cada palavra dita por mim.
Ashley engasga com a própria saliva, levanta-se tossindo.
— Você o quê?! Discutiu com o chefe?! Você está doida?! — fala
atropelando as palavras.
— Ele me ofendeu, acabei perdendo a cabeça. Não vai acontecer de
novo. Eu juro!
— Mas não vai mesmo! Estou sem acreditar em como você está inteira
aqui na minha frente. Combinamos que você iria conquistá-lo para nos ajudar
a sair daqui e não nos matar de vez. Ele deve estar muito puto comigo. —
Coloca as mãos na cabeça, andando de um lado para o outro.
— E acha isso ruim? Não foi você mesmo quem disse que iremos
morrer mais cedo ou mais tarde nessa vida?
— Só não precisa ser tão cedo, né, amiga? Eu não quero saber como ou
pelas mãos de quem eu vou morrer. — diz levando uma mão ao pescoço.
O arrependimento bate ao saber que posso ter prejudicado ela com
minha burrice. Não quero que ela sofra por minha causa.
— Eu vou dar um jeito, não se preocupe! Irei pedir desculpas a ele e
bancar a boa submissa que fui treinada para ser.
Ela gargalha segurando a barriga.
— Desculpa Lorena! “Você” e “submissa” na mesma frase é até
engraçado. Quantas vezes você se enfia em encrenca por ter esse gênio forte?
— Não tenho culpa se não nasci com uma veia submissa. Eu sou assim
mesmo, só que às vezes abaixo a cabeça para evitar punição.
— Acho que é por isso que você chama tanta atenção. Tem uma aura
diferente a sua volta, isso te torna valiosa. Todos eles te enxergam como um
desafio, e com Vincent não será diferente. Você tem que continuar tentando!
Eu ouvi falar que nossos documentos estão guardados no cofre do
apartamento dele. Então com você o conquistando, talvez consiga descobrir a
senha e ter acesso para pegar nossos passaportes.
— Como tem tanta certeza de que ele vai ceder a mim?
— Porque ele é um homem e tem um pau nos meio das pernas.
Inclino a cabeça pensando no que acabei de ouvir, então ela me devolve
o olhar por um tempo balançando a cabeça sorrindo.
— Você não vê mesmo, não é? Está com todas as cartas nas mãos,
Lorena. Basta saber jogar usando as certas.
— Nunca fui boa em nenhum tipo de jogo de cartas. Sempre gostei de
dominós. — falo arrancando outra risada dela.
— Meu Deus! Você é a melhor! Veja bem o que irá fazer! Amanhã cedo
leve o café da manhã dele lá em cima, vista sua roupa mais sexy e chegue lá
arrasando! Faça a sua melhor cara de arrependida ao desculpa a ele! Vincent
sempre acorda antes do dia amanhecer, para treinar, geralmente pede seu café
no mesmo horário. Esteja lá embaixo entre às cinco e seis da manhã para que
você atenda sua chamada. Será sua chance de arrumar essa bagunça que fez.
— Okay! É bem cedo, então não correrei o risco de Antonella me ver
subindo.
— Aquele demônio está com seus dias contados. Escreve o que estou te
dizendo. Pega aqui! Esse é o endereço da Starbucks que ele gosta e o que
geralmente pede de manhã.
Guardo o papel e me levanto para sair.
— Vou descansar, já que está tarde e terei que levantar bem cedo.
— Será por uma boa causa. — Dá uma piscadela e abre a porta.
Vou para o meu quarto, rolo na cama metade da noite, ansiosa pelo que
vou fazer, mas consigo cochilar um pouco.

*****

Quando o bip do celular dispara, levanto correndo para não ser vista,
nem perder o horário. Arrumo-me e desço, esperando sua chamada. Começo
a roer os esmaltes das unhas, de nervoso, enquanto olho sem piscar para o
telefone. É uma pena que essa porcaria seja rastreada, vigiada vinte e quatro
horas por dia por uma equipe de soldados escolhidos a dedo, ou eu iria ligar
para a minha família. Uma vez tentei avisar à polícia sobre mim e fui
descoberta. Apanhei tanto de Luigi e dos seus comparsas, que só de me
lembrar, estremeço de pavor. Por fim, isso também nem adiantaria, já que
eles têm o controle sobre as autoridades locais. Naquele dia eu estive tão
perto, mas ao mesmo tempo tão longe da saída.
Não demora muito para que o telefone toque, então eu atendo.
— Dark Nigth. Bom dia! — Meu coração parece que vai sair pela boca.
— Mande meu café aqui para cima! Quero o de sempre, porém com um
expresso duplo hoje!
Grosso! Nem sequer deseja um bom dia antes de passar seu comando.
— Sim, senhor! Já estou subindo.
Desliga na minha cara.
— Lorena? O que faz acordada há essa hora?
Congelo com a voz atrás de mim, mas suspiro de alívio ao ver que é
Thadeo. Apesar de ser o filho mais novo de Antonella, ele nunca me fez mal.
Diferente da mãe e do irmão.
— Hum! Vincent pediu seu café, então estou indo buscar. Eu ia pedir
para um dos soldados irem comigo. Você pode me acompanhar?
— Claro! Vamos lá, antes que o chefe ligue de novo.
Entramos no carro, vou com ele até a bendita lanchonete. Faço o pedido,
e volto com tudo para a viagem.
— Você está bem próxima dele, não é? — pergunta me estudando. Eu
seguro a respiração.
— Na verdade não. Só estou fazendo meu trabalho. Acho muito difícil
alguém ser próxima ao Vincent. O cara é assustador!
Ele ri concordando.
— Sua fama o define bem. É um exemplo para nós novatos. Todos
queremos ser como ele um dia.
— Uau! Parece que ele tem um fã, hein? — brinco com ele.
— Só sei reconhecer o seu trabalho. O cara levou nossa organização a
outro nível, além de estar fazendo seus próprios investimentos pessoais. Isso
é um feito e tanto para a sua idade.
Não sei muito dos seus negócios, então fico calada. Chegamos de volta à
boate e vou até o elevador para subir ao seu apartamento.
— Obrigada pela ajuda!
— De nada! — diz com um sorriso bonito.
Quem vê assim, nem imagina que é tão letal quanto os outros mafiosos.
Entro no elevador e aperto o botão. Meu estômago começa a revirar,
minhas pernas tremem de medo pelo que vou enfrentar. Respiro várias vezes
aguardando ele liberar minha entrada. As portas se abrem e ali está ele, todo
suado, com sua habitual carranca me aguardando.
— Você de novo? Parece que não tem amor à própria vida, não é? —
diz sério, me observando de cima a baixo.
Engulo em seco, sem saber o que falar. A sensação que tenho é que meu
cérebro acabou de ter um curto-circuito, porque tudo que havia ensaiado,
sumiu da minha cabeça, restando somente um branco.
Ela engole em seco e chama minha atenção para seu pescoço delgado.
Espero ela falar alguma coisa, mas somente me encara travada.
— Vamos, Lorena! Diga o que você quer de mim.
— Na... Nada. Quer dizer... Apenas vim trazer seu café e te pedir
desculpas por ontem. — diz com a voz trêmula.
— Se é só isso, pode deixar tudo ali no balcão e sair. — Me afasto da
porta para que ela passe.
Ela passa quase se esbarrando na parede e eu seguro a vontade de rir. A
garota é engraçada. Está com medo, mas mesmo assim veio aqui na toca do
lobo mau. Ela se inclina sobre o balcão para deixar as coisas, como pedi. Seu
vestido curto — se é que pode chamar esse pedaço de pano de roupa — sobe
mostrando a polpa da sua bunda empinada. Meu pau fica duro com a bela
visão, assim, em dois passos estou atrás dela, segurando-a no lugar.
— Sua mãe nunca te disse que você não deve entrar na casa de
estranhos, coelhinha?
Sinto-a ficar tensa com minhas palavras.
— Sim. Mas esse conselho não me ajudou muito. Nunca fui boa em
seguir regras.
— Eu vejo que não. — A seguro pelo pescoço para que se levante, sinto
sua pulsação acelerada em meus dedos, o que me deixa ainda mais excitado.
— Diga, Lorena, que veio aqui porque gostou do que fizemos ontem e
está em busca de mais! — digo baixo em seu ouvido.
— Sim, eu quero. — Responde com um gemido.
Seus seios estão pontudos e a roupa fina não ajuda a esconder esse fato.
Esfrego-me em sua bunda sentindo meu pau babar em meu short. Mordisco
sua nuca enquanto aperto seus seios empinados e então desço minha mão
para o meio de suas pernas. Ela se abre mais para mim, brinco de passar os
dedos por cima da sua calcinha, deixando um deles escorregar para dentro,
encontrando ela molhada. Tiro o dedo e trago ele aos meus lábios, provando-
a. Ela me olha com suas pupilas dilatadas, quase do tamanho de suas íris
azuis, de tão excitada.
— Isso tudo é para mim, coelhinha? Quer o meu pau aqui? — Volto o
meu dedo para dentro dela e rodeio sua entrada, apenas para provocá-la.
— Oh, Deus! Sim! — Joga a cabeça em meu ombro, totalmente
entregue aos meus avanços, sorrio do seu desespero.
— Coloque as duas mãos na mesa e se segure. Não vire para trás, nem
tente me tocar. Tudo bem? — eu digo e ela balança a cabeça afirmando. —
Boa menina!
Rasgo a sua calcinha e desço por trás dela sentido seu delicioso cheiro
de fêmea. Coloco minha língua em sua entrada e gemo quando seu gosto
explode em meu paladar. Direto da fonte é ainda melhor. Seguro-a firme no
lugar quando começa a se mexer com meu ataque em seu clitóris. Lorena
começa a tremer, dando sinais de que está perto de gozar.
— Já volto. — digo levantando e praguejando quando vejo que estou
longe do quarto, então me afasto e vou para lá.
Vou até a minha gaveta, pego uma gravata e alguns preservativos. Volto
para onde a deixei e coloco suas mãos juntas, amarrando-as para trás. Rasgo
um pacotinho e encapo meu membro com rapidez.
— Abre mais as pernas para mim, babe! — digo me encaixando em sua
boceta, entrando em seu canal.
Jogo a cabeça para trás sentido o puro êxtase em minhas veias. Começo
a estocar dentro dela, me segurando em sua cintura fina.
— Humm! — Geme ao ser empalada pelo meu pau até o talo.
Bato em sua bunda a fazendo gritar e me regozijo com as marcas de
minha mão em sua bunda morena. Direciono uma mão para o meio de suas
pernas na intenção de levá-la ao seu limite e fazê-la gritar de prazer.
— Goza para mim, coelhinha! — digo aumentando os movimentos do
meu quadril e dedo quando sinto ela me apertar.
— Deixa vir, Lorena! Não se prenda! Se entregue ao prazer!
Ela choraminga. E foda-se se esse som me deixa ainda mais duro e
pronto para explodir a qualquer momento dentro dela! Levanto uma de suas
pernas e a posição me faz ir mais fundo, nos fazendo arfar com a sensação.
Lorena começa a gemer mais, e como da primeira vez, solta um grito alto
gozando por todo o meu pau, e de quebra me leva junto, me derrubando de
um precipício de prazer e luxúria. Respiro fundo até a minha respiração
voltar ao normal, então saio de dentro dela. Viro-a de frente para mim
segurando em seus cabelos para que me olhe nos olhos.
— Vou perguntar apenas uma vez, espero que não minta para mim,
Lorena! É meu tio que está te mandando aqui? O que ele quer que você tire
de mim? Responda!
— Não. Ele não me mandou aqui. Eu juro!
— Para o seu bem, espero que esteja falando a verdade, porque se
estiver mentindo ou tentando me manipular, não serei nem um pouco
misericordioso com você. Estamos entendidos?
— Sim. Entendi.
Solto minha mão de seus cabelos, seguro seu queixo.
— Quero continuar a transar com você, mas nunca mais tente invadir
meu espaço sem que eu permita, Lorena, ou as consequências serão muito
desastrosas! Eu te chamo quando quiser sua presença, mas sempre será só
sexo. Repete para mim o que sempre será!
— Só sexo. — responde rápido.
Ela acha que me engana. Está em busca de algo que ainda não descobri.
Só que isso é questão de tempo.
— Bom! Muito bom! — A puxo para ficar encostada em meu peito. —
Porque será a única coisa que terá. Não tenho sentimentos e muito menos me
deixo ser manipulado por alguém. Então pense bem no que está tentando
fazer.
Ela balança a cabeça concordando e eu a pego com a guarda baixa para
beijar seus lábios carnudos e tentadores. Ela se derrete em meus braços.
Aproveito que já está com as mãos amarradas e a levo ao quarto ao lado do
meu, deitando-a na cama. Ela me olha curiosa, ofegante pelo que está por
vir.
— Vai ter que confiar em mim. — digo pegando outra gravata e usando
nela como uma venda.
Sua respiração acelera, desse modo me afasto para vê-la ali a minha
mercê. É bonito ver o contraste de sua pele com seus cabelos negros
espalhados nos lençóis de cetim vermelho. Vou testá-la, saber seus limites,
para explorá-los. Não todos hoje, porém já será um começo.
— Somente aqui você pode me chamar de Vincent, e nunca fora desse
quarto. Vou levá-la a outro nível de prazer. Se não gostar de algo, poderá me
dizer que irei parar, mas aqui, sou eu quem mando e seu corpo é meu para
fazer o que quiser. Quer desistir e sair?
— Não! Eu quero isso! — Morde os lábios, nervosa, eu sorrio de sua
entrega.
Vou até a maleta onde guardo alguns acessórios e brinquedos, pego uma
vela aromática, acendo e trago até ela.
— Se for demais para você, me diz. — falo virando o caldo da vela em
seus seios, a fazendo arfar.
Ela não pede para parar, então vou descendo devagar, derramando em
sua barriga plana até alcançar seu centro. Lorena se contorce, me coloco entre
suas pernas, a chupando com voracidade. Porra! Eu poderia me viciar nesse
gosto. Enfio minha língua em seu buraco apertado, tirando alguns gritos dela
no processo. Levanto-me para colocar outro preservativo, me posiciono em
sua entrada, vou entrando aos poucos, apenas curtindo e testando, para
somente depois de um tempo, agora com ela já no limite, posso acelerar. A
fodo como gosto, feito um animal faminto: com força e profundo, até tê-la
me apertando e implorando por alívio.
— Por favor, Vincent!
— Por favor o quê, mia bella?
— Humm! Por favor, me deixa gozar!
Sugo um de seus mamilos e belisco seu clitóris, o que é mais do que o
suficiente para tê-la gozando e gritando novamente meu nome. Eu me
permito vir tão forte enchendo o preservativo com minhas sementes, que por
um instante cheguei a pensar que o mesmo tinha estourado e eu estava nu
dentro dela.
Nos acalmamos e eu saio, tirando sua venda, desamarrando seus pulsos.
— Vá se limpar, que você precisa descer antes que todos acordem. Têm
toalhas no armário de cima. — digo ajudando ela a se levantar.
Saio e vou ao meu quarto tomar um banho rápido. Quando termino,
volto a minha cozinha para tomar meu café. Logo, ela vem ao meu encontro,
meio sem jeito. Não tem muito que falar. Ela precisa entender que não terá
tratamento especial apenas porque fodemos. Por fim, digito o código do
elevador para que entre.
— Ninguém deve saber nada sobre isso, Lorena, ou nós dois estaremos
com muitos problemas.
— Eu sei. Tomarei cuidado.
Fecho a porta permitindo que ela desça ao seu andar.
Faz muito tempo desde que estive com uma mulher a minha disposição
para realizar meus fetiches. Infelizmente, a última armou para mim há cinco
anos quando se juntou com o inimigo e tentou me matar na hora que
estávamos fazendo nossos jogos sexuais. Eu baixei a guarda e quase fui
morto pelo inimigo. Depois disso, nunca mais permiti que mulher nenhuma
me tocasse. Mas talvez com ela, eu possa brincar um pouco, ao menos até
descobrir o que realmente esconde de mim.
Milão - Itália

O telefone toca e desvio os olhos da janela para ver quem é. Vejo o


nome de Romeo na tela e atendo imediatamente, ansioso por notícias de Los
Angeles.
— Luigi! — digo soltando a fumaça no ar.
— Chefe, achei que iria gostar de saber que já passei a carga aos Vitiello
como parte do combinado.
— Ótimo! Não esperava menos de você.
— Devo dizer que a segunda parte do plano também está indo muito
bem. Ashley fez um excelente trabalho aconselhando sua pupila, pelo que
fiquei sabendo ela já anda se esgueirando pela cama do seu sobrinho.
— Maravilha! Continue de olho nele e deixe Lorena livre! Isso vai nos
calhar mais à frente.
— Acha mesmo que Vincent vai confiar nela ao ponto de contar seus
planos?
— Acredito que sim. Eu vi como ele andou a observando quando pensou
que não tinha ninguém olhando.
— Entendo. Falta somente Vincent confirmar o noivado com Giovanna.
Lucca está muito ansioso para fazer o anúncio oficial.
— Ele vai cumprir com o combinado. Nunca voltei atrás em minha
palavra e não será agora que começarei.
— Um dos nossos homens foi sacrificado. Marco desconfiou e tive que
montar uma estratégia de emergência. Ficou muito perto de eles descobrirem
que fomos nós, porque o soldado dos Vitiello deu com a língua nos dentes,
então tive que improvisar.
— Não se preocupe! Isso foi por um bem maior. Se mantenha neutro e
continue fazendo como o combinado. Quero todos esses negócios em minhas
mãos de volta, Romeo! Chegou a hora de meu sobrinho cumprir seus deveres
com a família e parar de brincar de ser chefe por aí. A única maneira de ele
voltar ao meu controle é se eu quebrar as suas asas. Isso já foi longe demais!
Eu não posso deixá-lo tomar posse da minha cadeira e se voltar contra mim.
— Entendido, chefe! Serei discreto.
— Me mantenha informado de tudo!
Desligo e sento em minha cadeira, bebendo meu vermute, ouvindo
Moonlight Sonata de Beethoven ao fundo, contemplando a visão da menina
sentada no banco lá fora. Ela é a minha mais nova aquisição. Já estava na
hora de começar a treinar uma substituta para Lorena, que está começando a
se rebelar contra mim. Gosto de cortar o mal pela raiz.
Henrique entra pela porta com as papeladas que detesto olhar.
— Nós precisamos conversar! — diz jogando as pastas em cima da
minha mesa, fazendo a maior bagunça.
— Ainda não é muito cedo para estar estressado e me trazer problemas?
— Não quando as pessoas estão começando a questionar sobre a nossa
contabilidade. Luigi, os gastos estão muito maiores do que as entradas, para
variar, tiveram várias perdas esse mês. O FBI está em cima, já prenderam
muitas das nossas mercadorias, e até mesmo alguns dos nossos homens. A
situação está ficando insustentável! Mesmo comprando muitos deles, ainda
não foi o suficiente. Os outros representantes do conselho estão ficando
preocupados e pedindo uma reunião. Andam cogitando a troca do capo.
Levanto-me fechando o terno, agora muito chateado.
— Mucchio di maledetti! Pois eles que ousem me desafiar e questionar
como administro os negócios da famiglia! Se muitos deles têm cargos
importantes, foi porque eu os coloquei lá, mas posso arrumar um jeito de tirar
também.
— Iria caçar guerra com todos os subchefes e aliados apenas para provar
seu ponto?
— Se for preciso? Sim! Minha família está no poder há anos e nunca
conseguiram nos derrubar. Comigo não será diferente. Eu sou o chefe, não
deveriam me questionar tanto, como estão fazendo. Minha palavra é lei!
— Olha! O caso é que as coisas aqui estão indo de mal a pior. Não seria
melhor pedir para o Vincent voltar? Os negócios de Los Angeles e Nova
York vão muito bem, tenho certeza de que com sua ajuda poderemos
rapidamente colocar os daqui em ordem também.
— Não! Já estou resolvendo isso. Tenho outros planos para o meu
sobrinho.
— E posso saber quais são? Eu sou seu consigliere, tenho que ficar por
dentro dos assuntos para poder acalmar os outros.
Abano a mão, desdenhando. O escolhi para ser meu conselheiro
exatamente pela sua inteligência e faro para os negócios, além de ter
pertencido, por muitos anos, ao grupo de elite do exército dos Estados
Unidos. Ele trouxe consigo o treinamento pesado que aprendeu, e passou aos
meus soldados, porém, ultimamente, tem me torrado muito a paciência, já
estou me questionando se fiz a coisa certa ao colocá-lo em um cargo tão alto.
Odeio questionamentos, e atualmente eles andam me cercando por todos os
lados.
— Vou fazer uma aliança com o capo de Las Vegas. Um casamento vai
selar a paz e nós iremos ganhar muito com essa união. Eles conseguiram
autorização de quem está no comando do território mexicano, para ter livre
acesso entre as cidades.
— Com o homem que suspeitamos ser o mandante das mortes do seu
irmão e cunhada? Vincent concordou com isso?
— Isso são detalhes. Já faz muito tempo e meu sobrinho não precisa
saber disso. Se conseguirmos essa aliança, o problema de entrada na fronteira
vai ser resolvido. Eles têm os melhores pontos para entrega de drogas, sem
serem rastreados, junto deles teremos permissão para entrar e entregar nossas
cargas sem tanta dor de cabeça. Logo tudo voltará a ser como antes.
— Se você diz, acredito em sua palavra. Vou marcar uma reunião com
os membros das outras cidades e passar as novidades para ver se consigo
acalmar os ânimos.
— Faça isso! Estou sem paciência para tantos dramas desnecessários.
Só essa que me faltava! Já não basta a maioria dos meus homens se
bandearem para o lado do meu sobrinho, o considerando mais chefe do que
eu, agora surgem esses malditos que querer me tirar do poder. Só se for por
cima do meu cadáver! Não cheguei ao meu extremo, fazendo tudo o que fiz,
para abrir mão agora. Esse casamento veio a calhar, posto que irá expandir
muito mais os negócios e tirar Vincent do meu calcanhar. Tenho que tirar o
foco dele daqui da Itália, consequentemente, a noiva e o sogro o manterão
muito ocupado para continuar se intrometendo nas minhas escolhas.
Ninguém nunca soube dos meus investimentos no tráfico humano e vai
continuar assim enquanto eu viver.
Chegando ao andar, vou direto ao meu apartamento e sento na cama,
repassando tudo que aconteceu lá em cima. Só agora me permito respirar de
alívio. O cara é gostoso e sabe o que está fazendo. Nunca tinha ficado com
alguém que se preocupasse com o meu prazer, e sinceramente, não me
importava com isso. Sempre tive somente relações sexuais contra minha
vontade, sendo assim tudo que eu sentia era dor. Nunca vi motivos para
gostar de ter meu corpo violado dessa forma. Toda vez que me olho no
espelho, me condeno por viver nessa vida, sinto nojo de mim, fico com
aquela sensação de que estou suja o tempo todo. Porém, com ele não, pois
pela primeira vez senti desejo. Não sei se será uma boa ideia continuar com
isso. Quando Vincent me virou de frente e perguntou o que eu queria dele,
não infartei por pouco, porque meu sangue gelou, achei que iria morrer. Juro
que até mesmo vi aquele filme da retrospectiva da minha vida passando na
minha frente. Tenho que tomar cuidado, calcular bem meus próximos passos,
dado que ele é muito esperto, desse modo será questão de tempo até que
saque meu jogo.
Coloco a cabeça em minhas mãos, me sentindo cansada de repente.
Onde é que fui me meter? Todos os questionamentos que eu fazia e mantive
trancado por anos, ameaçam sair. Faço um chá com a intenção de me ajudar a
acalmar, para assim conseguir pensar com mais clareza. Logo depois termino
de me arrumar e desço até a boate para começar meu dia infernal. Mal coloco
o pé para fora do elevador e já sou cercada por uma Ashley ansiosa.
— E aí? Deu tudo certo? — pergunta assim que me vê.
— Se “dar certo” para você significa que eu não tenha ganhado uma
bala na cabeça ou conhecido o famoso punhal dele, então sim, saiu como o
planejado.
— Você demorou, me deixou bem preocupada. Já estava quase subindo
para ver se estava tudo bem.
— E teria morrido. Uma hora achei que não sairia de lá com vida,
porque ele me pressionou achando que seu tio estava me mandando atrás
dele.
Ashley parece perder a cor do rosto.
— Que bobagem! Ele deve ter feito isso como uma armadilha,
acreditando que você iria cair. Continue firme, porque está no caminho certo.
— Tudo bem com você? Está pálida.
— Si... Sim! Me lembrei que esqueci algo lá em cima, então vou
buscar, já volto!
Observo minha amiga sair com pressa, há algo estranho em seu
comportamento. Seja o que for, parece ser importante. Organizo minha parte,
e subo ao palco para treinar minha dança de hoje. Duas vezes por semana me
apresento, dias dos quais considero os melhores, posto que prefiro ter os
homens me olhando, desejando de longe do que no meio das minhas pernas.
Esse é o momento em que deixo minha alma viajar, tornando-me livre com as
batidas da música. É uma rota de fuga para meu corpo tão ferido pelo destino
cruel em que me encontro.
Seguro na barra de ferro, me alongando. O maravilhoso poder do pole
dance! Além de ser uma arma poderosa na conquista, também ajuda a manter
a forma, porque trabalha todos os músculos do corpo, incluindo postura e
barriga. Começo fazendo alguns movimentos isométricos, cruzo as pernas em
uma posição de crucifixo invertido e volto, subindo aos poucos para cima e
sentando na barra para fazer o movimento seats tesoura. Depois passo para o
twisty split, intercalando com a diva cruzada. Desço devagar, giro meu corpo
fazendo um Scorpions, finalizando com o gemini. Fico de costa, levo minhas
mãos para trás na intenção de me firmar e rebolo sensualmente, deixando
meu corpo me levar nas batidas de The hill da banda The Weeknd.
Quando a música que eu dançava termina, se inicia Killing Strangers de
Marilyn Manson, quando abro os olhos, me deparo com o dono de um par de
olhos azuis me observando, perto do palco. Solto a barra, me preparando para
ir até ele, rebolando ao ritmo da música. Sento na cadeira, desço a mão pelo
decote da blusa, apalpando meus seios. Vincent acompanha todo o caminho
que faço com ela até alcançar o cós do short, onde passo o dedo, provocando,
ameaçando abrir. Ele está sentado na poltrona de couro preta, respirando
pesado, me estudando como um leão faminto quando se prepara para atacar
sua presa. Não desvio os olhos dos seus, sentindo meu corpo ferver diante do
seu desejo óbvio. Tomo coragem e começo a dar passos vacilantes em sua
direção, até ficar em sua frente.
— Gostou da dança? — pergunto atrevida.
— Deveria dançar assim para mim da próxima vez que eu te chamar.
— Não será nenhum sacrifício. — digo baixinho para que somente ele
escute.
— Você está brincando com o perigo, Lorena. Como te mostrei há
pouco, não sou um cara gentil e muito menos um bom moço. Suas táticas de
sedução não funcionarão comigo.
— Não é o que eu vejo. — digo olhando para a sua calça bem marcada
que forma o desenho do seu enorme pau muito animado. — Talvez eu goste
do que é perigoso.
Um leve tremor em seus lábios, sugerindo um sorriso, me diz que ele
não é tão imune quanto tenta aparentar. Chego mais perto e fico entre suas
pernas, descendo bem devagar e ficando diante do seu rosto.
— Só para que saiba, não estou usando calcinha, então não terá que
rasgar outra da minha coleção.
— Puta que pariu! — Puxa minha boca para a sua, grudando nossos
lábios. Sua língua duela com a minha em um beijo quente de tirar o fôlego.
— Eu só não te fodo aqui porque tenho que sair e estou muito atrasado. Caso
contrário, te amarraria naquela barra e esbofetearia sua bunda enquanto te
fodia por trás, na frente de todas essas pessoas, para que assim você aprenda
a não brincar com coisa séria.
Só agora que olho a minha volta vejo várias meninas de boca aberta nos
olhando. Até mesmo Marco está encostado na parede do outro lado com os
olhos semicerrados. Estou ferrada! Olho de volta para ele me lembrando do
que disse sobre manter nós dois em segredo para não causar nenhum tipo de
problema.
— Desculpe! — Engulo seco. — Eu... Eu não tive a intenção de te
prejudicar. Não pensei nas consequências.
Ele segue a direção do meu olhar.
— Ninguém falará nada. — diz com sua voz grossa e rouca
acompanhada do seu hálito quente que faz cócegas no meu ouvido.
— Como tem tanta certeza disso?
— Ninguém aqui é idiota de me trair ou causar algum mal-entendido,
porque sabem que não viverão o suficiente para cometer outro erro.
Sua certeza me traz arrepios na coluna, a adrenalina de pouco tempo
atrás volta com força. Esfrego a perna uma na outra, excitada, chamando sua
atenção. Qual é a porra do meu problema?!
— Você não sente medo de mim, coelhinha? — Se aproxima segurando
uma mecha do meu cabelo entre os dedos.
— Não. — respondo firme, mesmo que não seja totalmente verdade.
— Pois deveria. Eu sou um monstro, seria melhor se lembrar disso
quando for brincar comigo da próxima vez.
— Ou você prefere que todos pensem assim, para mantê-los afastados.
Acredito que até mesmo os monstros têm um coração que bate por alguém.
Ele solta meu cabelo e levanta rápido, se afastando.
— Não se engane, garota, nem mesmo fique achando que me conhece,
ou acabará virando comida de lobo mau. Quero você hoje à noite em meu
apartamento assim que terminar aqui!
Ele se vira, saindo acompanhado de seus homens. Levanto-me, passo
pelos burburinhos, fingindo que não estão falando de mim, procuro refúgio
em meu quarto, lugar do qual saio somente quando chega a noite e o horário
da minha apresentação.
Saio da boate, entro no carro seguido de um Marco que me analisa feito
um verme no microscópio. Não dou abertura para ele perguntar alguma coisa,
pois não terei uma resposta descente para seus questionamentos. Entretanto,
como eu já esperava, ele não pega a dica clara que lhe dou.
— Está perdendo o controle. Já te disse que essa menina irá atrapalhar
os nossos planos!
Não discordo, uma vez que sei que é verdade.
— É só uma prostituta, Marco, como todas as outras. Se meu tio não
quisesse que eu a tocasse, teria levado a garota com ele, não acha?
— Acha que Luigi está usando a morena para manipular você? —
pergunta chocado.
— Tenho minhas desconfianças. — Dou de ombros.
— Ainda assim continuará se envolvendo com ela, mesmo sabendo
disso?
— Dois podem jogar o mesmo jogo. Posso fazê-la se apaixonar por
mim, tirar dela tudo o que meu tio tem aprontado. Seria um triunfo em nossas
mãos. Lorena deve saber muita coisa de Luigi, já que está com ele há anos.
Ele me olha por um tempo, de cenho franzido, mas depois concorda com
o meu ponto de vista.
— Você deve saber o que está fazendo. Só tome cuidado para você
mesmo não cair na sua armadilha e entregar todas as munições para o inimigo
usar contra nós.
— Tranquilo, meu amigo. Agora me conte o que mais descobriu sobre
aquele filho da puta.
— Luigi tem uma encomenda para chegar daqui a alguns dias. É uma
carga grande de meninas para serem entregues aqui. Seu tio tem brincado
com fogo, sem o menor medo de ser queimado.
Fico na dúvida se ele está sendo ousado em fazer negócios aqui, debaixo
do nosso nariz, ou se apenas está sendo um idiota mesmo.
— Ligue para o FBI, passe o local e o horário da entrega! Vamos fechar
o círculo e apertar ainda mais. O que Henrique disse?
— Que por lá as coisas não andam bem, mas tem feito sua parte para
ajudar. Seu tio foi pego na mira deles e acho muito difícil sair. Nem todos os
seus contatos na política têm dado conta. Além disso, os membros estão
preocupados com essa exposição e seguem pressionando seu tio.
Sorrio ao saber disso. Ele mesmo vai se quebrar, pois mais cedo ou mais
tarde os membros do Conselho irão ceder e chegar à conclusão de que eu sou
a melhor opção para ocupar a chefia.
— Será questão de tempo até eu pegar o que me pertence.
— Sim. E é melhor se preparar. Te aconselho a arrumar um bom
advogado, para que quando a bomba estoure, você saia livre e com o mínimo
de respingos possível.
— Veja isso para mim! Eu quero o melhor ao nosso lado.
— Pode deixar. Já comecei a pesquisar.
Saímos do carro e fomos para o encontro marcado, onde será feita a
entrega das armas que encomendei. Quero verificar uma por uma antes de
enviá-las ao Afeganistão. O que para muitos são maldições, para mim são
negócios bem sucedidos. Estou levando a organização a um patamar de
sucesso nunca alcançado antes, nem mesmo na época do meu pai. Ele tinha
um certo receio em ousar, por conta da nossa família, tinha medo de nos
colocar em risco. Será mais uma carta que terei na manga contra Luigi. Em
pouco tempo nós estaremos no topo, do jeito que sempre sonhei. Não é por
menos que os Vitiello estejam buscando aliança, até porque o meu nome já
está rodando por todos os cantos do mundo, onde fazemos negócios.
— Trouxe tudo que pedi? — pergunto em um espanhol fluente ao
responsável da entrega.
Tive que aprender várias outras línguas para lidar não somente com os
aliados estrangeiros, como também com inimigos. Não tem graça torturar
alguém que você não possa entender o que fala.
— Tudo. E o chefe mandou mais algumas de brinde como forma de
agradecimento por fazer muitos negócios conosco. — diz me entregando uma
submetralhadora MP5.
— Agradeça a ele por mim, diga que me lembrarei disso quando estiver
no comando de tudo!
Dou sinal para que meus homens olhem todas as caixas conferindo meus
pedidos. Quando meus agentes confirmam que está tudo certo, libero o
pagamento.
— Pode entregar a mala, Marco! — dou a ordem sem tirar os olhos do
visitante.
— Foi um prazer, senhores! Estaremos sempre à disposição. — diz se
virando para ir acompanhado por alguns dos soldados até a saída.
— Você já sabe o que fazer. Essa encomenda tem prazo de entrega,
preciso que alguém da nossa confiança leve a mercadoria pessoalmente ao
Mohammed Shariq.
— Será feito, chefe! Tenho a pessoa certa para isso.
— Confio em suas escolhas, sei que não falhará comigo.
— Lucca tentou entrar em contato com você de novo? — questiona
curioso.
— Sim. Ele quer marcar a festa de noivado.
— Vi as fotos da sua futura noiva, a moça é muito bonita e bem criada,
como manda a tradição.
Torço o nariz com a menção da garota mimada e sem sal.
— Merda! Também vi a pasta que me trouxe. A garota parece uma
boneca de porcelana. Um toque meu é o suficiente para quebrara-la em mil
pedaços. Imagina se presenciar o meu pior.
Marco gargalha, visto que sabe que é verdade.
— Você não terá muito do que reclamar se revolver aceitar esse acordo
maluco. O lado bom é que ela já está acostumada com a vida que as mulheres
têm na máfia, então não ficará questionando nada.
— Você está parecendo meu tio. Eu só vejo muita hipocrisia nisso tudo.
Essa baboseira deveria ser enfiada no cu de quem criou, até porque, com tudo
que fazemos, nossas almas já estão condenadas ao inferno. Logo, não há
motivos para seguir regras de igreja e tradições descabidas.
— Nisso eu concordo contigo, no entanto faz parte da famiglia e serve
para manter as aparências diante da sociedade.
— Vamos! Eu preciso treinar um pouco, porque estou com muita
energia acumulada e esse assunto me deixa ainda mais estressado. — Coloco
meus óculos escuros e saímos rumo ao galpão de treino onde me sinto em
casa.
Treino até meu corpo não aguentar mais. É assim que aprendi a
controlar meus instintos assassinos, até acabei descobrindo que sou tão bom
no combate corpo a corpo quanto sou com a arma ou meu punhal nas mãos.
Horas mais tarde volto à boate. Sento no bar, peço uma dose de whisky
puro. Ao longe, observo Lorena dançando a coreografia que ensaiou mais
cedo. O desejo toma conta de mim e meu pau fica duro imediatamente. Meu
sangue pulsa em minhas veias quando imagino que mais tarde a terei sob
minha disposição para fazer o que eu quiser com seu delicioso corpo tão
viciante e perigoso quanto uma dose letal de heroína. Todos os homens
presentes têm seus olhos presos ao palco, como uma mariposa sendo pega
pela armadilha da aranha. Ela é como uma sereia: bonita e sedutora,
enfeitiçando todos a sua volta com sua beleza e desenvoltura, apenas
esperando os otários caírem em seu encantos para uma inevitável e prazerosa
morte. Para um homem como eu, acostumado com o pior do submundo, isso
tanto me deixa em alerta quanto me excita. Se o demônio Lilith tivesse um
rosto, com toda certeza Lorena a representaria bem. Foda-se! Eu me deixaria
ser levado para o fogo do inferno por ela e sua maldita boceta apertada. No
fundo, torço para que ela não esteja ao lado do meu tio, já que assim como foi
com a Jessie, não lamentarei por ter que tirar a sua vida.
São quatro da manhã, estou aqui há algum tempo parado na porta do
apartamento dela, pois a espertinha achou que seria uma boa ideia me
desafiar. A esperei subir, mas nada dela aparecer. Me provocou e depois não
veio apagar o fogo que ela mesma atiçou. Então agora vou mostrar quem
manda aqui.
Abro a porta com a chave mestre que uso para possíveis casos de
emergência, entro (esse é o lado bom de ser o dono do prédio), avanço,
olhando tudo a minha volta e vejo que a porta do seu quarto está entreaberta
com apenas a luz fraca do abajur acesa. Observo sua silhueta coberta por um
lençol branco e fino o suficiente para que eu consiga ver que por baixo dele
Lorena está dormindo sem nada no corpo. Tiro minha roupa e subo na cama
afastando seus cabelos do caminho para que eu possa ter livre acesso ao seu
pescoço. Passo meu dedo suavemente por suas costas, tomando o cuidado de
não tocar em suas marcas, cheiro seus cabelos de fios macios e tão escuros
como a noite sem lua.
— Você é muito teimosa, coelhinha. — falo baixo em seu ouvido.
Ela pula assustada, mas a mantenho firme no lugar.
— Vincent? O que está fazendo aqui?! — sua voz é apenas um
resmungo grogue de sono.
— Pegando o que me prometeu. — Mordo sua nunca.
— Achei que estava dormindo, e por isso não subi.
— Pois achou errado. Te esperei até agorinha, e como não foi, vim
buscar pessoalmente o que me pertence.
— Quanta gentileza sua. — diz sarcástica.
Rio baixinho do seu atrevimento. Está cada vez mais solta e eu prefiro
essa sua versão. É melhor do que a outra que conheci há pouco tempo:
cabisbaixa, submissa e pronta para correr a qualquer momento, amedrontada.
Ela é um desafio e tanto, do qual quero muito ganhar.
— Vamos ver se na hora que eu acabar, você ainda pensará que sou
gentil.
Puxo seus braços para trás, aproveitando que já está de bruços, e rasgo o
lençol para amarrar suas mãos.
— Que maravilha! Estamos evoluindo. Mudamos de rasgar calcinha
para rasgar lençol.
Bato em sua bunda e ela grita com a cara enfiada no travesseiro.
— Vai pagar pelo seu atrevimento, coelhinha!
Desço raspando minha barba por toda a sua coluna, sento ela estremecer.
Alcanço a polpa de sua bunda e dou pequenas mordidas.
— Ai! — reclama.
— Shi! Você está sem moral aqui. Fique quietinha e me deixe te comer
do jeito que eu queria mais cedo, quando saiu do palco.
Coloco a língua em sua entrada, sentindo seu néctar em minhas papilas.
Sou fascinado pelo seu gosto afrodisíaco natural que me deixa
instantaneamente duro por ela. Pincelo a glande em sua entrada e enfio
somente a cabeça, provocando-a. Entro nela de uma vez, nos fazendo arfar,
deito em cima de suas costas enquanto seguro seus cabelos.
— É isso que você queria de mim quando me provocou na frente de
todos?
Ela só geme, então bato mais forte dentro dela.
— Fala, Lorena! Queria meu pau enterrado dentro de você, te fodendo
duro assim e arregaçando essa boceta apertada do caralho?
— Oh, Deus! Sim! Eu queria exatamente assim.
— Então toma meu pau, sua safada! Sente ele todinho enfiado até o talo
nessa bocetinha gulosa.
Ela empina a bunda para receber minhas estocadas brutas, me fazendo ir
ainda mais fundo. |Prendo-a no lugar e bato mais rápido e forte em seu canal
que me recebe escorregadio, pingando seu prazer. Levo minha mão para o
meio de suas pernas, abrindo seus lábios vaginais para tocar seu clitóris que
pulsa em meu dedo. Ela grita alto agora e isso me deixa fora de controle. Fico
ensandecido com sua total entrega a mim, sem nenhum pudor. Seu gozo vem
forte, encharcando todo meu membro, e por pouco não gozei dentro dela. Eu
tiro do seu canal no último segundo e jorro meu esperma em sua bunda,
marcando-a com minha porra.
— Provocadora! Nunca mais me deixe esperando. — digo dando duas
palmadas em sua bunda e entrando nela novamente.
Mexo devagarzinho, construindo novamente seu prazer, viro sua cabeça
para beijá-la.
— Então, Vincent... Por que você me chama de coelhinha?
Paro de me movimentar, penso em uma resposta que não possa assustá-
la.
— Porque você me lembra as coelhinhas da playboy. — minto.
Não vou dizer que ela parece uma por ser bonita e arisca, contudo fácil
de cair em minhas armadilhas.
— Por que será que eu não acredito em você?
— Não sei. Talvez porque eu seja um homem selvagem que adora
comer um bichinho indefeso. — Mordo seu ombro.
— Essa versão eu acho mais parecida com a realidade.
Rio da sua sinceridade e começo a estocar dentro dela de novo. Seguro-a
em meus braços fazendo sua costa grudar em meu peito e aumento a força
das minhas batidas.
— Ficar me atiçando e depois correr, não vai te ajudar em nada, Lorena.
Agora que já tive um gosto seu, quero mais. Você pertence a mim para eu
fazer o que quiser e partir de hoje a única cama que esquentará é a minha. Te
proíbo de ficar com outros, entendeu?
— Okay! Obrigada!
Franzo o cenho com seu agradecimento, mas depois entendo o porquê.
— Você não tem motivos para me agradecer. Continuará com seus
serviços, mas a diferença é que terá apenas eu como seu cliente.
— Tudo bem. O que vai acontecer quando seu tio chegar e... — para de
falar, insegura.
— E... Ele terá que se revolver comigo. Se não quisesse que alguém te
reivindicasse, não teria mandado você para meu território.
Depois de mais uma rodada de sexo, tiro suas amarras e a solto.
Levanto-me para ir embora, porém ela pula da cama ficando em minha frente.
— Posso te tocar da próxima vez?
— Eu prefiro que não. Não sei fazer sexo de outra forma, nem quero
aprender. Estou sendo até mais maleável com você do que fui com as outras,
mas não pense que isso vai mudar algo entre nós, porque não vai. — digo
balançando o dedo entre mim e ela.
— Você não gosta de toques. Por quê?
— Porque há algum tempo uma vadia tentou me matar na hora em que
eu a fodia.
Ela arregala os olhos, surpresa com minha resposta.
— Não tenho nada aqui comigo que possa te machucar. — fala dando
uma voltinha e se virando. — Jamais faria isso!
— Vou fingir que acredito em você, porque se eu pensar o contrário,
teria que te eliminar. Nós dois não iríamos querer isso, certo?
— Está bem! Isso já é o suficiente para mim por enquanto. — Sorri
mordendo o lábio inferior. — Eu mudarei sua opinião mais para frente,
mostrando que você pode confiar em mim.
— Estou curioso para ver você tentar. — Semicerro os olhos para ela e
saio do seu apartamento.
No corredor dou de cara com uma Antonella bêbada.
— Meu doce Vincent! Veio à minha procura? Sinto falta de você em
minha cama. — diz esticando a mão para me tocar.
Dou alguns passos para trás, me afastando de seus toques nojentos.
— Pois eu não sinto nenhuma. Saia da minha frente!
Ela joga a cabeça para trás, rindo.
— Você não era assim antes. Se aproveitou bem desse corpinho aqui
quando era mais novo. Deveria ser grato a mim por ter te ensinado a foder tão
gostoso.
Sinto repulsa das lembranças. Luigi contratou Antonella no dia em que
fui iniciado, para que ela — nas palavras dele é claro — me fizesse virar um
homem completo. Olhando para trás percebo o quanto esses dois me usaram
para seus interesses. Ela é tão mesquinha e podre quanto aquele imbecil.
— Tudo que sinto por você é nojo. Eu era somente uma criança.
— Que dramático! Depois cresceu e continuou vindo me procurar para
se aliviar em meu corpo. Confesse, querido, que você gostou de tudo que
fizemos! Aposto que se eu te tocar agora, vou te encontrar duro.
Levo a mão para trás para pegar meu punhal e ela segue meus
movimentos, dando um passo para trás. Ainda assim, a encurralo na parede
com as duas mãos, uma de cada lado de sua cabeça.
— Como se sente ao saber que dormiu com todos os Lourenço, mas
nenhum quis assumir você? Todos te descartaram.
— Disgraziato! — diz tentando me empurrar.
Seguro seu pescoço com uma mão e coloco a lâmina afiada em sua
garganta.
— Você me subestima, Antonella. Não sou mais um pobre moleque
manipulável. Só não te mato agora porque você, por enquanto, me é útil, mas
seu momento ainda irá chegar.
— Stronzo! Você me paga por isso! Todos vocês!
— Ficarei ansioso esperando por esse dia.
Solto-a e ela entra correndo em seu apartamento, batendo a porta.
Inferno! Não vejo a hora disso tudo acabar e dar um fim nesses miseráveis.
Estou cansado de lidar com todos eles. Amanhã mesmo irei começar a
colocar meu plano B em ação e acabar com tudo isso de vez.
Acordo disposta de uma forma que não me sentia há muito tempo.
Estou muito feliz! Só de saber que não terei que me sujeitar a dormir com
vários estranhos, já considero uma batalha vencida. Tudo tem dado certo,
caso continue assim, logo, logo, vou conquistá-lo e tornar realidade os meus
planos de sair daqui.
Tomo meu café, começando meu dia ligando a minha playlist, ouvindo
as batidas de The Weeknd explodirem na caixa de som. Amo esse homem e
sou capaz de ter um orgasmo ouvindo apenas o timbre da sua voz sensual.
Rebolo no ritmo da música, separando as minhas roupas para lavar, depois
dou uma organização em meu apartamento. Além de morar sozinha, passo
praticamente o dia fora, sendo assim quase não tem bagunça. Apesar de ser
domingo, não temos descanso, para variar hoje é o dia que a boate mais
enche. Haja paciência para aturar os bêbados sem noção!
De repente alguém bate na porta, me tirando do meu momento reflexão.
Viro a maçaneta surpresa por encontrar Thadeo com sua postura de "eu sou
fodão, então não mexa comigo, senão eu te mato".
— Posso te ajudar, menino bonito?
Ele sorri, balançando a cabeça.
— O chefe pediu que eu te acompanhasse até uma loja para você
comprar um vestido e todas as coisas de mulher que precisar.
— Não é que eu não goste de fazer compras, mas... por que tudo isso?
— Ele irá a um evento hoje à noite e quer a sua companhia. Ah! Ele
pediu para que escolhesse uma roupa formal.
Bato palma de felicidade. Vou sair um pouco, e de quebra, ganhar
presentes. Quem diria?! Viro-me para ir trocar de roupa e volto rápido,
parando em sua frente, fazendo ele rir da minha animação.
— Vamos! Antes que ele mude de ideia. Sabe me dizer que tipo de
evento será?
— Não sei dizer. Sabe que ele é bem fechado, né? Apenas disse o que já
te passei e deu carta branca.
— Tudo bem. Deixa comigo, que sei o que comprar.
Chegamos a uma dessas lojas de roupas bem chiques que custam os
olhos da cara. No meu caso, pior, visto que nem se eu vendesse todos os
órgãos do meu corpo conseguiria comprar algo aqui. Entretanto, como
Vincent deu carta branca, vou aproveitar. Escolho um vestido na cor salmão
de frente única, com um decote nas costas que vai até a cintura e na frente
tem uma fenda na coxa. Experimento e fica perfeito em meu corpo. Compro
bolsa e sapatos para combinar, saio da loja satisfeita. Peço que Thadeo pare o
carro no salão, digo para pagar um serviço VIP para mim, com tudo que
tenho direito. Se é para acompanhar o chefe, vou chegar arrasando, para não
fazer vergonha.
Depois de algumas horas em mãos habilidosas, saio renovada: cabelos
brilhantes, unhas e sobrancelhas bem feitas, uma pele mais macia após o
banho de beleza que levei com óleos aromáticos.
— Uau! Todas essas horas de castigo aqui fora fizeram valer a pena.
Sorrio do seu elogio.
— Estou pronta para voltar. Não sei que milagre é esse que Vincent não
ligou.
— Ligou várias vezes, na verdade, para verificar se você não tinha
fugido. Você é a menina de ouro dos Lourenço.
Minha alegria cai junto com as suas palavras. Por algumas horas pude-
me sentir livre, mas agora vamos voltar para a prisão em que vivo.
— Desconfiei.
Fico calada o restante do caminho. Mamãe sempre falava que quando
você não tem nada de bom a dizer, o melhor a fazer é calar-se.

*****

Estou terminando de passar o batom quando Vincent entra. Ele está com
um terno preto de três peças e um sobretudo por cima. Um verdadeiro
mafioso! Só faltou o charuto pendurado no canto da boca. Poderia questionar
sua entrada de novo sem minha permissão, no entanto não vou criar confusão
logo agora que consegui um pouco da sua confiança. Ele me observa de cima
a baixo, me comendo com os olhos.
— Bellíssima! Mas estou vendo que terei muita dor de cabeça por conta
desse vestido.
— Por quê? Não gostou? — digo dando uma voltinha para mostrar o
decote na costa que quase revela o rego da bunda.
— Merda, Lorena! É para ser um evento formal com algumas pessoas
do alto escalão e eu não quero causar nenhum desconforto ou ter que matar
alguém que fizer alguma piadinha sobre seu corpo.
— Ciúmes? Achei que era apenas a sua prostituta particular. — digo
cruzando os braços.
Vincent se aproxima de mim com seu jeito predador, ofego com a
intensidade do seu olhar, dando passos para trás até encostar na parede. Ele
coloca as suas mãos em minha cintura, cheirando meu pescoço.
— Se comporte, coelhinha! Lá estarão alguns membros que fazem parte
da famiglia. Esse jantar é muito importante para mim e preciso causar uma
boa impressão.
— Prometo me comportar. E o vestido, que nem é tão escandaloso
assim, escolhi pensando em você. — Me aproximo mais, quase encostando
em seu peito. Arrisco pegar em seu braço, mas ele apenas observa meus
movimentos. Passo a palma de sua mão sobre minha coxa para que ele sinta a
minha pele macia e vou subindo até onde a fenda lateral permite. — Se você
ficar excitado e quiser me foder, tudo que precisará é puxar para o lado sem
precisar rasgá-lo para ter livre acesso.
Seus olhos incendeiam e suas pupilas dilatam de desejo. Ponto para
mim!
— Provocadora! Depois conversaremos sobre essa sua mania de me
desafiar.
— Promessas, promessas... — desdenho o fazendo gargalhar.
Saímos juntos do prédio e lá fora tem um de seus carros esportivos, um
jaguar na cor preta. Ele coloca as mãos em cima da minha costa, quase choro
agradecendo por inconscientemente ele me ajudar a ficar sobre meus enormes
saltos. Abre a porta para mim, como um verdadeiro cavalheiro, vai para seu
lado ligando o carro e acelerando. Logo atrás, uma comitiva de outros carros
se forma para nos seguir. Dois passam na nossa frente e os outros dois ficam
atrás, fazendo a nossa guarda.
— Não é muita segurança para apenas um jantar? — digo abismada.
— Não. Lá vão estar vários subchefes reunidos em um mesmo lugar,
então o risco de um atentando contra nós é muito alto. Temos todos que nos
preparar.
Andamos por volta de meia hora antes de parar perto de um grande hotel
de luxo, onde tem um enorme tapete vermelho esticado na frente. Quando
entramos, entendi o porquê de sua preocupação e toda a recomendação. O
lugar “grita” luxo do chão ao teto. Logo na entrada tem um enorme lustre de
cristal nos dando boas-vindas.
Somos levados até uma área reservada com uma grande mesa que tem
pelo menos umas vinte pessoas. Há soldados espalhados por todos os lados,
de vigia, acabo me sentindo sem jeito quando vejo a mesa lotada de mulheres
muito bem vestidas e cheias de joias. Acho que tem mais pedras preciosas
aqui do que na Tiffany. Elas esbanjam elegância e de repente me sinto sem
graça perto delas. De cara percebo que não irei fazer parte da panelinha, já
que os olhares em seus rostos ao me examinarem de cima a baixo são
impagáveis. A sensação é de que sou um dos bichos raros postos em
zoológicos para a exibição da elite. Algumas expressam curiosidade, todavia
outras já me olham com os narizes empinados, deixando claro que não sou
bem vinda ao grupo. Tudo bem! Não faço questão de suas hipocrisias
mesmo. Os homens, ao contrário de suas esposas, só faltam colocar a língua
para fora e babar feito cachorros no cio. Se essas olhadas não forem
desrespeitos, eu não sei o que é.
— Boa noite, senhoras e senhores! Desculpe o atraso. Estava
aguardando minha acompanhante terminar de se arrumar. Sabem como são as
mulheres, não é? — Vincent diz brincando, tirando algumas risadas dos
homens presentes.
— Eu diria que a espera valeu a pena, não? A moça está deslumbrante.
— um senhor de uns setenta anos, sentado na ponta da mesa, responde.
— Una bella ragazza! — confirma um jovem loiro que aparenta ter a
minha idade.
Esse daí eu diria que só falta tirar o pau pra fora de tanto que me despe
com o olhar. Vincent, então, dá um passo à frente.
— Cuidado, Filippo! Não queremos confusão aqui. — Vincent diz com
a voz arrastada e carregada de ameaças.
— Está certo, meu jovem. Vamos jantar para tratar de negócios.
Vincent puxa uma cadeira para que eu me sente ao seu lado e fico grata
por ter percebido o clima nada agradável com a nossa entrada. O jantar
transcorre bem, sem nenhuma faca ou arma puxadas. Quando finalizamos a
sobremesa, as mulheres se levantam para sair e me sinto novamente
deslocada, sem saber o que fazer.
— Você pode ir dar uma volta no jardim se não quiser acompanhar as
senhoras.
— Vou me esforçar para me enturmar. Caso eu não seja bem recebida,
irei dar um passeio pelo local.
Retiro-me da mesa e saio à procura da ninhada de cascavel. Antes de
alcançá-las, tenho meu braço puxado por uma delas.
— Querida! Você não é uma de nós e não tem que estar aqui. Não nos
misturamos com gente da sua laia!
Meu sangue ferve diante da afronta.
— E a qual laia pertenço? Posso saber?
A cobra faz cara de nojo, me avaliando.
— Claramente não é a nossa. Fazemos parte da alta sociedade, e você,
no máximo, é uma meretriz. Não sei como ele pôde fazer isso conosco. Nem
assumiu o compromisso com a Giovanna e já está envergonhando a família.
— Quem é Giovanna?
Ela sorri feliz como se tivesse acabado de ganhar o melhor presente no
dia de natal.
— Oh! Você não sabe? Vincent irá oficializar seu noivado com a bela
Giovanna Vitiello. Muita educada e refinada a menina.
Meus olhos se enchem de lágrimas. Mais pela humilhação do que a
menção de outra mulher em si. Então me viro para sair, mas não antes de
falar o que ela merece.
— Sabe por que vocês odeiam tanto a nossa classe e tentam nos
rebaixar? A verdade é que no fundo vocês sabem que são tão incompetentes e
frias, que seus maridos não acham o que precisam em casa, então vão atrás de
quem sabe fazer o serviço direito. Por isso esse desrespeito todo conosco.
— Sua desaforada!
— E pode avisar a essa Giovanna sei lá do quê, que ela terá uma
concorrente forte. Não entro em uma briga para perder. — Viro-me e saio de
lá, deixando-a de boca aberta. Não vou permitir que alguém entre no meu
caminho, tirando de mim a última chance de conseguir voltar a minha terra.
O jantar termina e as mulheres imediatamente se levantam para sair,
desocupando a mesa para que possamos tratar de negócios. Elas não fazem
parte das conversa, sempre foi assim. Mulher tende a falar demais uma com
as outras, o que pode nos prejudicar. Sem contar que em uma armadilha, não
precisaria de muito para abrirem a boca e contar tudo aos inimigos.
Felizmente, para elas, não é necessário fazer o juramento de sangue, como
nós, nem passar por duros treinamentos para aprenderem a aguentar as
torturas, no caso de serem pegas por organizações rivais. No entanto, isso não
as torna propriamente livres, já que uma vez nascidas aqui, não saem e nem
terão uma vida normal.
Observo Lorena de longe ser barrada por uma das antigas matriarcas.
Trazê-la comigo nesse maldito jantar, talvez não tenha sido uma boa ideia,
visto que essas mulheres irão comê-la viva. Depois de algumas trocas de
palavras, que imagino não terem sido nada amigáveis, a morena sai rumo ao
jardim com uma expressão de chateada. Dou sinal para que um dos meus
soldados a vigie e volto a minha atenção à mesa, sem a mínima vontade de
ficar ouvindo as baboseiras que esses velhos idiotas estão falando. Fui
avisado em cima da hora dessa reunião, entretanto tive que comparecer,
porque essa é a minha chance de tentar mostrar aos outros membros que sou
responsável, a fim de colocá-los ao meu lado, para futuramente não ter
nenhum impedimento quando alcançar o meu posto. Pior do que ter inimigos
fora da organização, é ter dentro dela.
O cargo de capo é desejado por muitos e nessa mesa não dá para contar
nos dedos quantos estão ansiando pela chefia. Apesar dos Lourenço estarem
no comando há anos, não somos necessariamente uma dinastia onde somente
membros da minha família possam ocupar esta cadeira. Existem outras
organizações por aí que levam como uma das regras passar o cargo de chefe
de pai para filho, sucessivamente. Porém, a nossa não é assim, desde que o
capo pertença a uma das sete famílias tradicionais e fundadoras, está valendo,
o que me torna um odiado concorrente nesse momento, posto que meu nome
é o mais cotado para assumir depois de Luigi.
— Ficamos sabendo que você está levando o nome da famiglia ainda
mais longe do que imaginamos um dia. Traficar armas para um país em
guerra é uma ideia muito inteligente. Somente o governo dos Estados Unidos
esteve no topo, lucrando há anos com essa estratégia.
Semicerro os olhos com a fala de Alessandro, um dos nossos antigos
subchefes. Acabei de fazer esse negócio com os árabes e poucas pessoas
sabiam disso.
— Vejo que estão muito bem informados sobre o que ando fazendo. —
digo com os dentes trincados.
— Podemos não estar mais ocupando a cadeira, Vincent, mas não somos
idiotas, portanto, não tiramos os olhos de cima de nenhum dos nossos novos
subchefes, e isso inclui você, meu caro. Estamos apenas tomando precauções
para que as coisas não saiam do controle. — retruca me analisando.
Merda!
— Essa vigilância também se estende aos mais velhos que ainda ocupam
algum cargo na máfia? — questiono sua audácia em achar que nós que
podemos prejudicar os negócios.
— Como é? Está querendo nos acusar de algo? — Carlo sobe a voz
achando que me fará ter medo de continuar.
— Quem tem sujado o nome da Camorra não são os novatos, mas sim
alguns dos mais velhos, que deveriam ter sabedoria adquirida com a idade.
Eu tenho feito o que posso, mas ainda assim não é o suficiente para apagar o
fogo que tem se alastrado na mídia sobre a organização, com essas histórias
de tráfico humano. Imagina quando chegar aos ouvidos das autoridades que
também temos alguns velhos sem escrúpulos nenhum sequestrando crianças
para suas taras sexuais.
Vejo pelo menos metade da mesa empalidecer. Figli di puttana!
— São somente especulações, das quais sempre tiveram e sempre terão.
Nada que comprove nosso nome no meio. — Anthony, um dos anciões mais
antigos, diz secando a testa com seu lenço.
Estúpido! Acabou de provar que tem culpa no cartório.
— Não dessa vez. O FBI está nos cercando cada vez mais, para variar,
meu tio não tem colaborado como deveria. Estamos cada dia mais perto de
sermos presos e ter nossa organização dada de mão beijada para eles fazerem
o que quiserem com ela. Na Itália, as coisas não andam nada bem, e por lá,
eles já estão nos dando grandes prejuízos financeiros.
— Estamos sabendo disso, porém o capo já está tomando as devidas
providências, então não temos razões para fazer um alarde e nos
desesperarmos. Ainda mais agora, que a sua união com a menina Vitiello
veio em boa hora. Trate de marcar logo a data do casamento, já que você é o
mais cotado para ser o próximo capo! — Mariano, amigo chegado do meu
tio, dá ênfase na última palavra, me provocando.
— Concordo com o Mariano. — Francesco, outro imbecil da época do
meu pai, confirma.
Desgraçados! Eles sabem dos podres do meu tio. Provavelmente são uns
dos beneficiados com essa sujeira, só que estão com medo de sobrar para
eles.
— Não vejo aonde essa união irá nos ajudar sobre esse assunto, já que o
nosso maior inimigo, no momento, que anseia por nossa queda, é a Polícia
Federal, e possivelmente, os governantes do país. Não duvido que até mesmo
os russos estejam enfiados nisso, já que peguei alguns rondando nosso
território há pouco tempo.
Um silêncio recai na mesa e o clima está pesado. Eles sabem que não é
de hoje que os Volkov tentam tomar nossos postos. Sem contar que o atual
senador não é exatamente nosso fã e seu nome está no topo da lista para ser o
próximo presidente. O cara usa a cartilha de tolerância zero para as drogas e o
uso de armas. Imagina se descobrem sobre os tráficos. Não duvido que tenha
dedo dele por trás dessa perseguição, o que vem a calhar com meu tio no
poder, contudo, não deixa de ser um grande risco e prejuízo para todos essa
caças às bruxas.
— É por isso que precisamos fazer um tratado de paz com os Vitiello,
logo, para nos beneficiarmos da aliança deles com os cartéis mexicanos.
Vamos poder mudar todas as nossas rotas de entrega, o que vai ajudar a
acalmar as coisas, dando tempo de nos recuperarmos de tudo o que
perdemos. — Alessandro responde com uma pitada de acusação.
Parece até que estou ouvindo a porra do meu tio falando nessa merda.
— E depois? Vamos ficar nos casando e misturando nossos sangues com
os dos inimigos até quando? Suponho que o próximo passo será nos unir aos
malditos Falcone ou até mesmo aos próprios Sanches, para sobreviver.
— Se for preciso, sim. O que você sugere como uma melhor opção?
Compartilhe conosco. — Carlo diz com deboche.
Jogo a pasta na mesa, contendo nela a cópia dos documentos que
comprovam o que alguns deles têm feito pelas costas.
— Cortar o tráfico humano seria uma ótima opção, assim como negociar
com o governo a entrega de alguns bodes expiatórios responsáveis. Então,
desse modo, resolveremos esses problemas. Eles querem apenas mostrar
serviço, e um “cala boca” desse tamanho irá tirá-los do nosso pé.
Anthony bate na mesa, indignado.
— Seu moleque insolente! Você está louco?! Entregar um dos nossos
aliados para esses abutres?! Nunca nos aconteceu isso antes e não vai ser
agora que iremos aceitar. Talvez devêssemos repensar sobre a sua indicação
ao cargo de subchefe.
Levanto-me puto com seu afronte, doido para enfiar meu punhal bem no
meio do seu coração. Vejo alguns dos soldados se preparando para o
combate, até mesmo Marco enfia a mão dentro do blazer, pegando sua arma.
— Tenho que lembrá-los de que não cheguei aqui apenas por indicação,
e sim por mostrar trabalho. Já consegui para essa organização muito mais do
que todos vocês juntos durante seus anos no comando. Não diminua o que fiz
para a Camorra.
— Nos mostre respeito, rapaz! — Pietro, que até o momento estava
calado, se intromete no meio. — Reconhecemos o que tem feito, mas não
concordaremos com essa ideia absurda. Tire isso da sua cabeça, pois não terá
o nosso apoio. Case-se com a Vitiello, assunto encerrado!
Não é surpresa para mim que não ficariam do meu lado, por esse motivo
que ontem mesmo pedi para que Marco desse início ao nosso segundo plano.
Sorrio com desprezo enquanto meu sangue ferve de ódio. Meu lado animal
quer vir à tona nesse momento, faminto por uma luta sangrenta onde o fim
seria a cabeça de todos esses traidores em uma bandeja de prata em cima
dessa mesa.
— Claro, senhores! Marcarei a festa de noivado para o mais breve
possível, como desejam. Irei me sacrificar pelo bem da máfia e deixar o
inimigo entrar pela porta da frente, para dentro do nosso território, com a
bênção de todos vocês.
Levanto-me da mesa dando por encerrada a reunião, cumprimento os
demais e saio. Troco um olhar com Marco, que aponta a porta dos fundos,
vou à procura de Lorena para sairmos logo daqui, antes que eu faça alguma
besteira e tudo acabe em um banho de sangue.
Saio à sua procura, olhando ao redor do prédio, no entanto não
encontro Lorena em lugar nenhum. Vejo meu soldado encostado na parede,
fumando, e vou para onde ele está mantendo a guarda.
— Cadê ela?
— Está ali, chefe, desde a hora que saiu.
Peço que nos dê privacidade, ando em meio aos arbustos, onde a vejo
sentada em um banco no jardim olhando para o céu, pensativa. Sento-me ao
seu lado aproveitando o silêncio para esfriar a minha cabeça, também, e não
voltar lá dentro.
— Você está bem? — questiono para puxar assunto.
— Fisicamente sim, mas emocionalmente é outra história.
— Uma noite ruim! — digo mais para mim do que para ela.
— Me diz você! — Vira de frente para mim, chateada. — Quando iria
me contar que está noivo?
Caralho! Essa noite só melhora.
— Não tem porque te falar sobre os negócios da famiglia, Lorena. Não
confunda o que temos com algo mais. Eu disse isso a você e nunca te enganei
ou menti.
— Sim, já entendi o meu lugar. Sou somente a sua amante, ou melhor
dizendo, a sua prostituta particular, enquanto a moça de família nobre não
chega para esquentar sua cama.
— Isso não é assunto seu. Nem deveria ter te trazido comigo, pois você
não pertence a esse lugar.
— E acha que eu não sei disso? Eu daria tudo para nunca ter vindo parar
aqui, nas mãos da sua família. — fala se levantando e me dando as costas.
Enrijeço meu corpo com sua atitude rebelde, agarro-a pelo braço e puxo-
a para mim.
— Não brinque comigo, Lorena! Eu não estou em um bom momento
para ser desafiado. Odeio que me deixe falando sozinho, porra! Fiz um
combinado com você, se não está bom, podemos colocar um fim nisso agora
e você volta a ser apenas a prostituta do clube. Por mim tudo bem! Não terá
problema nenhum se escolher a segunda opção.
— Esse não é um acordo justo, Vincent, levando em consideração o fato
de que eu não tenha outras opções melhores. — Tenta se soltar do meu
aperto, indignada.
— É o melhor que posso te oferecer.
— Não, não é! Você poderia escolher me deixar ir, já que tem esse
poder, mas age como o seu tio, me mantendo presa aqui contra a minha
vontade.
— E parecer um fraco diante de todos? Acha que Luigi a deixará viver
livre dele? Se está aqui é porque há um motivo. Pare de bancar a inocente e
tentar me manipular com os seus dramas. Nenhuma das prostitutas vieram
para essa vida sem ter quebrado alguma regra ou ter feito algo para a máfia.
— Seu idiota! Eu não escolhi! Acredite em mim quando digo que não
foi escolha minha. — fala socando meu peito, com raiva.
Não sei o que fazer diante da cena a minha frente, mas não quero
descontar nela toda a ira que estou sentindo daqueles imbecis lá dentro. Então
tomo a atitude que fui ensinado desde muito cedo quando o assunto é mulher.
Seguro seu pescoço, trazendo sua boca para a minha, a empurro para um dos
arbustos, a escondendo da vista de quem ousar passar por ali, e abro o zíper
tirando meu membro para fora, pronto para ela. Levo meu dedo ao seu
clitóris, o esfregando delicadamente, no entanto de início ela reluta e tenta me
empurrar, porém, eu a seguro em meus braços, acariciando seus cabelos e
beijando seu ombro. Aos poucos ela vai se acalmando e abre mais as pernas,
permitindo que eu coloque o meu dedo em seus lábios encharcados que
palpitam por mim.
— Quer que eu pare, coelhinha? — Cheiro seu pescoço, sentindo um
delicioso e delicado aroma de flores. — Me diz para parar! Fala para mim
que não me quer como eu a quero!
Ela geme encostando a cabeça na parede e eu seguro suas mãos, porém
ela puxa se soltando.
— Não quero ser amarrada! Se vai me foder aqui, vai ser comigo te
tocando.
Observo-a, pensando nos prós e contras da situação, e como esperado,
todo o meu bom senso se foi no momento em que meu sangue desceu e se
concentrou completamente na cabeça de baixo.
— Se tentar alguma coisa...
— Não vou! Confia em mim. — me corta antes que eu termine a
ameaça, trazendo suas mãos para o meu rosto e alisando minha barba.
Ela morde minha orelha, me fazendo arrepiar, leva suas mãos para
baixo. De início acaricia meu pau e o masturba devagarinho, então depois
fica de joelhos e o leva para dentro de sua boca.
— Ah, inferno! Essa boca é assassina, mulher! — Me seguro na parede
com uma mão enquanto levo a outra para a sua nuca e estoco meu membro
em sua garganta, sentido a maciez da sua língua rodando a glande. — Isso,
querida! Ordenha meu pau!
Ela faz alguns sons com a garganta, que vibra por todo o meu corpo.
Estou na borda e necessitado dela desde que a vi nesse vestido. Venho em
jatos fortes em sua boca e ela sobe limpando os respingos no canto, chupando
o dedo. É uma visão extremamente pornográfica que me deixa pronto
novamente em segundos. Ela se segura em mim e encaixa meu pau em sua
entrada molhada. Com um único empurrão, estou dentro do seu corpo. Gemo
com a conexão e beijo sua boca sentindo a mistura do seu gosto com o meu.
— Você me deixa louco! Essa boquinha é tão gostosa quanto a sua
boceta. — digo ao seu ouvido enquanto me movo dentro dela.
— Mais forte, Vincent! — pede me fazendo rir da sua gula.
— Assim, minha safada? Gosta de duro e forte?
— Oh, sim! Humm! — Encaixa uma de suas pernas em minha cintura.
Aumento a velocidade dos meus movimentos, fazendo exatamente o que
ela me pede. Sua boceta me aperta como um punho fechado e eu perco
totalmente o controle, querendo me fundir cada vez mais nela, de todas as
formas.
— Goza para mim, baby! Deixe todo o meu pau molhado com seu mel.
— Aperto sua bunda em minhas mãos, me permitindo segurá-la para não se
machucar com as batidas na parede.
Seus choramingos se iniciam e sei que está tão perto quanto eu. Suas
unhas grandes machucam meu pescoço, onde segura, quando ela goza com
um gemido abafado, mordendo meu ombro. Foda-se se fico mais louco ainda
com a pitada de dor e prazer! Então me permito gozar em seu canal, com um
grunhido alto, feito um animal selvagem acasalando com sua fêmea. Beijo
novamente sua boca, ainda palpitando dentro dela até a última gota.
— Vamos! Aqui não é um bom lugar para ficarmos por mais tempo.
Desço Lorena, tirando meu membro de dentro do seu calor, e o guardo.
Fecho o zíper, dou-lhe um tempo para se arrumar e saímos de lá para irmos
embora. Passo por Marco, que balança a cabeça em negativa. Com certeza
terei que ouvir depois uma enorme palestra sobre meu descuido. Mas por
agora, não quero ter que escutar nada que possa estressar ainda mais.
Entro no carro dando partida e volto para a boate, por todo o caminho
pensando sobre o maldito jantar de merda. Esse bando de filhos da puta
escolheram o lado errado e eu vou conseguir o que eu quero. É só uma
questão de tempo até que eu derrube um por um que ficou em meu caminho.
Em minha mente vem à imagem de minha mãe com seu sorriso doce me
dizendo para ser um bom menino e não deixar o ódio me consumir. Balanço a
cabeça para afastar os pensamentos. Desculpa, mãe! Já estou perdido há
muito tempo. Ainda irei achar os mandantes do atentando contra a vida dos
meus pais e acabar com ele. Isso é uma promessa!
Quatro semanas se passaram após o fracassado jantar. Vincent tem me
chamado quase todos os dias para o seu apartamento e aos poucos fui
conquistando sua confiança. Antes ele era mais fechado comigo, mas agora o
sinto mais aberto sobre alguns assuntos. Claro que ele não fala comigo sobre
a máfia e nem tocou mais no assunto da noiva, o que também não quero
saber. Ocasionalmente ouço uma coisa aqui, outra ali, entretanto não comento
nada e nem procuro me meter. Se tem uma coisa que aprendi em todos esses
anos sendo uma escrava, é que quanto mais você tentar entender alguma
coisa sobre eles, mais confusa irá ficar. Os homens daqui nos veem como
objetos e isso não vai mudar. Não espero que Vincent vá me assumir, até
porque ele já deixou claro que sou apenas uma substituta temporária, também
não sou burra de ficar esperando algo a mais dele. Como todos os outros, eu
somente sirvo para lhe dar prazer.
O meu foco é a missão que tenho para cumprir e tudo que me importa é
conseguir sair daqui, e de quebra, tirar a Ashley comigo. Eu sei que não tenho
o poder de mudar o mundo — bem que eu gostaria —, mas isso é sonhar alto
demais. O pouco que eu conseguir fazer, já valerá a pena todo o meu
sacrifício.
Entro no Elevador, aperto o botão da cobertura. Diferente de como era
no início, não sinto mais medo do Vincent, posto que aprendi a lidar com
suas constantes mudanças de humor. Marco libera minha entrada com uma
cara de poucos amigos. Ele não gosta de mim e não me importo com isso
também, porque meu foco é o seu chefe e o que ele guarda no cofre.
Deixo seu café na mesa, como de costume, e me viro para procurá-lo.
— Bom dia, Marco! — tento aparentar simpatia, mesmo não o
engolindo nem com um pacote inteiro de açúcar.
— Bom dia, menina! Vincent está tomando banho. Quero aproveitar que
estamos a sós para te perguntar uma coisa que tem ficado em minha mente
todos esses dias, espero que não minta para mim.
— O que seria? — Viro-me de frente para ele.
— O que você estaria disposta a fazer para ter a sua liberdade? — Me
olha de braços cruzados, esperando minha resposta.
— Não entendi. Aonde quer chegar? — digo desconfiada e ele se
aproxima, me encurralando entre a parede e o balcão da cozinha.
— Entendeu sim, Lorena. Você quer algo do chefe, eu imagino que seja
isso. Não pense que me engana. Tenho te observado e pesquisado sobre você,
então descobri sobre a sua vontade de sair daqui.
Oh, porra! Eu estou muito ferrada!
— Não sei do que você está falando. — encaro, tentando não
demonstrar meu medo de ser descoberta.
— Ah, não? Então me deixe refrescar a sua memória. — Joga um
envelope em cima do balcão ao meu lado.
Pego o envelope com os dedos trêmulos, abro, encontro um relatório
sobre mim com algumas fotos minhas de quando mais nova. Vejo duas ao
fundo, que me chamam atenção: uma da mamãe e a outra do meu irmão,
ambos mais velhos. Meus olhos se enchem de lágrimas e choro passando o
dedo no rosto dos dois. A saudade aperta em meu peito. Como queria estar
com eles, nem que fosse por pouquinho tempo.
— Vai me dizer que não foi sequestrada e que Luigi não tem te
mandado aqui para arrancar algo do Vincent? Vai negar que tem algum
interesse oculto nessa aproximação?
Tento falar, mais não sai nada. A emoção de vê-los me deixa de pernas
bambas.
— Aqui está o que você vai fazer! Não estou pedindo, portanto, não é
uma escolha. Você irá nos contar tudo o que sabe sobre os negócios do capo
ou eu vou acabar com você.
Desvio meus olhos e encontro os azuis gelados do Vincent, que está
encostado na parede, sem camisa, somente de calça de flanela nos
observando sério. Nesse momento ele me lembra muito o seu tio.
— Eu... Eu fui sequestrada e vendida ao Luigi quando tinha quatorze
anos. — Engulo a saliva, com dificuldade. — Não sei muito sobre o que ele
faz, mas posso dizer que trafica garotas menores de idade. Fiquei presa em
uma de suas casas de pedofilia até completar dezoito anos. Isso é tudo! Ele
não falava de seus negócios comigo.
Marco me estuda, buscando uma mentira. Não sei dizer se viu a verdade
em meus olhos, mas dá um passo para trás, me libertando.
— Agora é com você, chefe. Meu trabalho aqui acabou. Só queria que
visse com seus próprios olhos o quanto tem sido descuidado ao baixar à
guarda em meio a uma guerra. Essa garota com certeza está aqui somente
para prejudicá-lo. — diz se afastando e indo em direção ao elevador.
Agacho para pegar as fotos que caíram e volto a olhar cada uma. Queria
tanto saber como eles estavam, e mesmo não sendo do jeito que eu esperava,
tenho a minha resposta em mãos.
— Se levante, Lorena, e venha até aqui! — sua voz retumba feito um
trovão.
Levanto-me do chão, vou ao seu encontro, parando em sua frente.
— Há mais de um mês convivendo comigo e não achou que deveria me
dizer essa parte da sua vida, hum?
— E diria o quê? Que seu tio é um monstro? Que me tirou da minha
família, me estuprou, me colocou à venda e que provavelmente esteja
treinando a minha substituta, para me eliminar? Você se importaria, Vincent,
com as dores que uma prostituta carrega? Você mesmo me acusou de estar
nessa vida por escolha.
Ele me segura pelo pescoço e me empurra na parede.
— Não! Eu não me importo! Mas essa mancha vai sair do nome da
minha família. Eu nunca matei um inocente e posso ser um monstro, mas não
sou pedófilo, nem a favor de traficar crianças.
— Diz o cara que trafica armas para o Afeganistão. Armas que
provavelmente vão parar nas mãos de muitas crianças inocentes. E ainda tem
a sua boate, que está cheia de mulheres vindas do tráfico. Você tem tanto
sangue nas mãos quanto seu tio.
Com a rapidez de um piscar de olhos, seu punhal vem parar na minha
garganta.
— Anda me espionando, Lorena? O que eu faço para a minha
organização, não é da sua conta. Eu deveria matar você por ousar me desafiar
desse jeito.
Seguro sua mão e pressiono a faca ainda mais.
— Mata, Vincent! Se tiver um resquício de bondade em seu coração de
pedra, por favor, acabe com essa agonia!
Ele pressiona, me cortando, o que causa uma ardência desgraçada. Eu
fecho os olhos esperando o golpe final, que não vem, e apenas ouço o barulho
do metal bater no chão com um tilintar seco.
— Abra os olhos, coelhinha! — diz sussurrando perto do meu ouvido,
lembrando aquela vozinha maldosa que te incentiva a fazer algo errado. —
Olhe para mim!
Abro meus olhos, encarando seu rosto, suas feições são rígidas. Nada
me lembra o Vincent dos últimos dias. Nesse momento, eu tenho o mafioso,
o homem frio e cruel feito o próprio diabo.
— Matar você acabaria com toda a diversão que tenho planejada. Não
sou misericordioso, então viver aqui será seu castigo por esconder de mim a
verdade e tentar me enganar, como fez durante todas essas semanas. Não vou
te matar. Você trabalhará para mim e virá para a minha cama sempre que eu
quiser que venha. Será tratada com a puta que é!
As lágrimas voltam a derramar com mais intensidade.
— Não! Você não entende! Eu só queria ir para casa. Não pedi para ser
quem eu sou. Você nasceu na máfia, mas eu não sou desse mundo.
— Mas está nele e não sairá, a não ser que morra. Só que não será pelas
minhas mãos. Se quiser, pode tirar sua vida você mesma. — diz apontando
para o punhal caído no piso.
— Você é um desgraçado! — me jogo em cima dele com uma patética
tentativa de acertá-lo, porém, como era de se esperar, ele me segura.
— Nem tente, Lorena! Não adianta me provocar. Você não conseguirá
tirar de mim mais nada, por essa rebeldia será punida. Lembre-se que tentei
negociar com você, te dar uma chance, mas agora vai aprender a nunca mais
tentar me usar ou mentir para mim.
Ele me puxa pela mão até o quarto que temos dividido todos esses dias,
me joga na cama, tirando uma algema da gaveta e prendendo minhas mãos.
— Ashley arrumará suas coisas e a trará para cá. A partir de hoje, aqui
será seu lugar. Ou é isso ou vai voltar para a Itália.
Arregalo os olhos com a menção de ir para Luigi de novo. Não, não,
não!
— Estava certo o tempo todo. Não existe humanidade em você.
Realmente é um monstro, como todos dizem.
Sua respiração é pesada e seus olhos escurecem ao ponto de suas pupilas
ficarem tão grandes e escuras feito uma ônix, com as minhas palavras.
— Que bom que enfim percebeu quem eu sou. Bem vinda ao covil do
lobo, chapeuzinho! Se acha que sofreu nas mãos do meu tio, é porque não
sabe o quanto posso ser ruim para aqueles que me traem ou se tornam meus
inimigos.
Vincent sai, me deixando ali, e mais uma vez me sinto indefesa,
lamentando minha existência. Choro por ter nascido mulher, por ter vindo
parar aqui, pela minha família que nunca mais verei e pelo meu trabalho de
meses que foi jogado fora. Apenas deixo sair, para colocar para fora toda a
mágoa que sinto por ser uma fraca, que até mesmo quando tenta fazer o certo,
ainda assim, dá tudo errado.
Encosto a cabeça na porta tentando controlar a agonia que sinto. Escuto
Lorena chorar baixinho e minha vontade é de ir consolá-la. Eu queria voltar e
dizer que menti, que me importo sim com ela, no entanto não posso
demonstrar fraqueza, uma vez que querendo ou não, ela me enganou. Não
tenho ponto fraco e é por isso que cheguei tão longe. No meu mundo, não
temos tempo para sentimentos tolos. Esfrego meu peito tentando aplacar a
sensação de vazio que me consome me lembrando que a última vez em que
me senti assim, foi quando os meus pais morreram.
Lorena sorrateiramente tomou conta do ambiente, da minha vida, da
minha cama. Nunca mais toquei outra mulher depois que toquei nela, porra!
Sei o quanto a máfia pode ser ruim e capaz de te quebrar por dentro, mas
quem está de fora não entende um terço do que vivemos, do que temos que
fazer para manter o poder. Precisamos ser fortes e temos que abrir mão de
praticamente tudo, isso inclui até mesmo a família, se necessário. Apesar de
não sentir muito e não ter nenhum tipo de ligação sentimental com as
pessoas, tive meu lado cruel aflorado desde pequeno, fui forjado a ferro e
fogo para me tornar cada vez mais frio, calculista... Um verdadeiro monstro,
como ela afirmou. Não posso fraquejar agora, porque tenho uma guerra para
ganhar e vários inimigos para derrubar.
Meu celular toca e atendo, até mesmo sem olhar para a porcaria da tela,
o que me causa arrependimento logo quando ouço voz irritante de Luigi na
linha.
— Você ainda não foi visitar sua noiva?
— Não tenho motivo para fazer sala a ela, pois minha resposta já foi
confirmada. O que mais você quer?
— Que compareça na festa de noivado semana que vem. Não trate com
descaso essa aliança, Vincent. Lucca não está satisfeito com sua recusa em
atendê-lo e tudo que menos preciso é que volte atrás com sua palavra por
conta da sua falta de interesse.
— Foda-se! Tem certeza que esse cara não tem uma vagina no lugar do
pau? Está sendo muito dramático com um assunto que já está resolvido.
Ele gargalha ao telefone, me irritando ainda mais, fazendo a minha
cabeça latejar.
— Apareça na festa e entregue um anel de noivado para a Giovanna.
Isso irá acabar com quaisquer especulações.
— Okay! Farei isso. — Massageio a testa no intuito de diminuir a dor.
Uma porra! Antes de misturar meu sangue com o do inimigo, eu derrubo
esse merda da cadeira. Desligo a chamada, olho para a porta do quarto onde
Lorena está. Troco de roupa, entro no elevador para ir à reunião marcada na
empresa Willians & Associados, da qual solicitei que me indicassem o
melhor advogado. Para a minha surpresa, descobri que meu tio está sendo
representado per Oliver, filho do senhor Willians. Tenho que acelerar meus
planos, porque Luigi não está brincando no ponto. Sabia que sua visita há um
mês era para muito além do que a negociação com os Vitiello. Ele veio atrás
dos seus contatos aqui para livrar a sua cara, que prepararei sua queda usando
a mesma estratégia. Depois de passar minhas ordens à Ashley e ao Thadeo,
referentes à Lorena, saio da boate.
— Estamos atrasados. — Marco diz ao meu lado, entretanto não digo
nada. Ainda estou por um fio com tudo o que aconteceu lá em cima. — Sei
que está chateado com o que acabei de fazer, só que eu precisava te deixar em
alerta. Você estava perdendo o foco e se esquecendo da nossa causa, por
conta dela.
Viro-me ficando cara a cara com ele.
— Deixa que da Lorena cuido eu! Você não toca nela sem a minha
permissão! Entendeu, Marco?
— Entendi, chefe! — Levanta as mãos se rendendo. — Só lembre-se de
que não confraternizamos com os inimigos, e ela é uma inimiga enviada pelo
seu tio. Porra, Vincent! Não abaixe a guarda.
— Vamos logo para essa bendita reunião, pois quero dar início à
segunda fase do plano. — digo dando por encerrado o assunto.
Chegamos ao prédio da empresa, peço para que a secretária avise sobre
a minha chegada, e logo em seguida, já entro no escritório do senhor
Willians.
— Vincent! Quanto tempo! Foi uma enorme surpresa quando me ligou
querendo falar comigo. Não te vejo desde que você tinha o quê? Quatorze
anos?
— Faz bastante tempo. Acontece que ando muito ocupado. Você sabe,
né? As coisas da máfia e tudo mais.
Tenho uma certa abertura para falar sobre a organização com ele, já que
era o advogado de confiança do meu pai.
— Entendo, filho. Pode dizer o que te fez, depois de todos esses anos,
vir pedir minha ajuda?
— Desde a morte dos meus pais, as coisas desandaram na organização e
eu quero limpar a famiglia de algumas sujeiras. Luigi está metido até o
pescoço com o tráfico humano e isso tem nos trazidos muitos problemas. Os
prejuízos financeiros são incalculáveis.
Ele se senta na cadeira, nos servindo dois copos de bebidas.
— Eu sabia que quando seu tio pegasse o poder, as coisas não seriam
mais as mesmas. Sempre foi ganancioso, desde a época de comando do seu
avô. Como te disse por telefone, ele me procurou e pediu um representante,
mas não entramos em detalhes.
— Sei. Ele sabe que as coisas vão explodir a qualquer momento e quer
tirar o dele da reta.
— Suponho que você também, não?
— Pretendo tirar Luigi do poder, para pegar o comando, para isso
preciso do seu melhor advogado. Quero Eduardo Gonzalez me
representando! Marco fez uma pesquisa sobre ele e o cara é muito bem
requisitado, além de ter bons contatos. Preciso de alguém assim ao meu lado.
Ele sorri, coçando a cabeça.
— Vejo que fez a lição de casa. Porém, sinto dizer, que ele não irá
querer pegar esse caso. Já até dispensou o do seu tio. Eduardo é... digamos...
muito certinho. Ele não andaria do outro lado da lei nem se pusessem uma
arma na sua cabeça.
— Eu posso tentar fazê-lo mudar de ideia. A arma eu já tenho aqui. —
Arqueio a sobrancelha, tirando uma gargalhada dele.
— Você me lembra muito o seu pai. Ele gostava de sair por aí
ameaçando os outros, mas mudou muito quando conheceu sua mãe e mais
ainda depois que você nasceu.
A conhecida dor no peito volta ao ouvir sobre eles.
— Eu ainda vou achar os culpados. Não desisti de continuar procurando.
— E achará! Só que nem pense em tocar em meu pupilo! Eduardo é
como um filho para mim. Diga a sua proposta e o convença. Você também é
muito bom nisso.
— Tudo bem! Mande chamar o tubarão. — digo zombeteiro me
referindo ao ridículo apelido pelo qual ele é conhecido em sua área
profissional.
Logo que o cara entra, somos apresentados. É óbvio que não gosta da
minha família e percebo isso ao ver a feição que faz quando ouve o
sobrenome. Falo sobre meus planos, deixando uma boa parte do lado de fora,
no entanto ele reluta de início a possibilidade de aceitar. Por fim, com a ajuda
do Willians, ele finalmente parece ser convencido. Esperto! Sabe que se
ganhar a causa irá alavancar ainda mais a sua carreira e ficará conhecido por
ajudar a derrubar o chefe de uma das organizações mafiosas mais famosas
nos Estados Unidos. Todos querem ganhar um pedacinho de qualquer jeito
do que faturamos.
Saio chateado pela sua enrolação em confirmar se realmente aceita,
entretanto pelo menos fiquei com a garantia de que ele me dará a resposta em
breve. O que não contei a ele, nem ao antigo amigo da família, é que preciso
somente que alguns aliados caiam com o meu tio, e já tenho as pessoas certas
para incriminar, deixando a organização sair intacta dessa sujeira. O FBI
somente irá limpar meu nome de todas as acusações feitas até agora contra
nós. Meu tio já tem a cabeça encomendada e ninguém tocará nele antes que
eu possa ter meu tão esperado acerto de contas.
Pedi para voltar dirigindo sozinho, uma vez que precisava esfriar um
pouco a cabeça. Estou a dois quarteirões da boate quando recebo um forte
impacto do meu lado direito. Sou arremessado para frente, sem tempo de
sequer entender o que aconteceu. O zumbido alto da pancada na minha
cabeça me deixa tonto e confuso por alguns segundos. Meu peito dói e não
duvido que ao menos uma costela tenha sido quebrada com tamanha força
aplicada sobre ela pelo airbag. Pego minha arma, me preparando para sair e
acabar com o filho da puta que me atingiu. Se foi sem querer ou não, ele não
viverá para sequer pedir desculpa pelo seu erro estúpido. Tento sair do carro,
mas com certa dificuldade, lidando com uma falta de ar. Foi muita sorte, ou
eu teria sido jogado pela janela por ter esquecido de colocar o cinto de
segurança. Arrasto-me para o chão, sentindo todo o meu corpo dolorido, e
seguro na porta para me firmar.
— Fomos pegos em uma armadilha! — Marco diz chegando logo em
seguida para me ajudar a levantar.
Um dos responsáveis sai de trás de um dos carros parados mais a frente
e começa a atirar em nossa direção. Mesmo me sentindo desorientado, ainda
consigo acertar um tiro nele, que cai no chão. Meus homens o cercam
terminando o serviço.
— Filhos da puta! Estavam nos aguardando. Eu vou acabar com esses
desgraçados! Vá para o carro, Vincent, que nós daremos cobertura.
Começo a ir em direção ao outro veículo blindado, no entanto antes
mesmo de alcançar a porta, somos alvejados com mais uma chuva de tiros.
Sinto o momento em que uma das balas entra em meu ombro, com outra
atingindo meu quadril. Encosto na porta, fazendo alguns disparos, mas é tudo
em vão. Os atiradores não estão mais visíveis. Não conseguimos identificar
de cara por onde os tiros estão vindo, mas seja quem for o responsável pela
cilada, foi muito bem planejada e pode se considerar um homem morto.
— Merda! Coloque o chefe no carro! AGORA! Tem snipers no outro
prédio, à nossa esquerda. — diz Alec, um dos meus guardas pessoais.
— Entra nesse carro, Vincent, e não saia dessa porra, nem se todos nós
morrermos! Vou chamar reforço. — Marco grita ao meu lado.
— Sua sorte é que estou sentindo muita fraqueza, senão ia te ensinar a
não gritar de novo comigo.
Viro-me para entrar na Mercedes, me jogo no banco de trás, minutos se
passam até eles voltarem e já estou entre o mundo dos sonhos e da realidade.
— Aguenta firme aí, meu amigo, que já estamos saindo daqui.
Tento dizer algo, porém não consigo. Sei que não deve ser grave, mas a
quantidade de sangue que perdi, me derrubou. Olho para os prédios altos e
imponentes que passam, assim meu último pensando vai a Lorena, na forma
em que ela me olhava magoada, implorando para que eu tirasse sua vida. Não
podia fazer isso, não puno e nem tiro a vida de pessoas inocentes. Ela pode
ter mentido, me feito perder a cabeça ao tentar me manipular, mas eu a
entendo. O desespero te leva a fazer coisas horríveis, e algumas delas são sem
volta ou chances de redenção.
Tento manter os olhos abertos, contudo a escuridão vem ao meu
encontro, me levando a apagar logo em seguida, sendo transportado para
umas das minhas mais dolorosas lembranças.

*****

Flashback
13 anos de idade

Entro no galpão com meu tio e Henrique. Hoje será mais um dia de
treinamento. No começo, eu gostava de vir aqui todos os dias, só que agora
nem tanto. Gosto de machucar homens maus, no entanto não aqueles que
nunca me fizeram nada. Observo Marco amarrado sendo açoitado pelos
outros soldados. Ele geme, arrancando risadas dos outros que estão
assistindo. Quanto mais gritos liberados, mais ele apanha. É por isso que
aguento tudo calado. Chorar não irá fazer eles diminuírem ou terem pena, só
causará mais punições.
— Vai lá, Vincent, é a sua vez de bater nele! — Tio Luigi diz e eu o olho
com raiva.
Ele sabe que não gosto quando me dá ordens ou me obriga fazer o que
não quero.
— Não posso! Ele é meu único amigo.
— Não pense que se fosse Marco aqui em seu lugar, ele não faria o
mesmo com você. Aqui não temos amigos, apenas soldados, você tem que
aprender isso desde cedo.
Olho para Henrique, que mantém o maxilar trincado observando o
desenrolar da cena a nossa frente. Não entendo o Henrique, porque quando
está sozinho conosco, é diferente, não usa da violência para nos ensinar.
Porém, quando está com meu tio, se torna tão ruim quanto ele ou pior.
Dou alguns passos à frente e um dos homens me entrega o chicote.
Marco está desacordado e ganha um banho de água gelada para despertar.
As pedras de gelo caem no chão se misturando com o vermelho carmesim do
sangue. Ele geme, levanta a cabeça para me olhar com apenas um dos seus
olhos abertos, uma vez que o outro está roxo e inchado. Por fim, me dá um
sorriso triste, com sua boca ferida. Tento recuar, contudo ganho um chute na
costela, me fazendo cair de joelhos no meio do molhado.
— Já disse que não se deve mostrar fraqueza ou o seu inimigo irá te
estraçalhar. — Dominic, outro soldado que nos treina, retruca. — Agora
levante-se e faça o que lhe foi mandado!
Seguro a vontade de xingá-lo e fico de pé novamente.
— Tudo bem, Vincent, pode fazer! Não irei ficar com raiva de você. Não
deixe eles te punirem por minha causa! — Marco fala baixinho, com certa
dificuldade para formar as palavras.
Levanto o chicote, porém travo. Não quero machucá-lo. Não consigo!
Não sei explicar a nossa ligação, mas gosto dele da mesma forma que
gostava dos meus pais. É a única pessoa que me entende e não tenta me
obrigar a fazer alguma coisa contra a minha vontade. O único, que em meio
às minhas crises, me ajuda a voltar a não me perder na escuridão.
— Se não fizer o que foi pedido, deixarei meus homens te surrarem com
o dobro do que ele levou! Se fizer, terá sua recompensa mais tarde. Você
escolhe! — Luigi tenta me convencer.
Não quero ser recompensado por ele. A última vez que falou que eu
ganharia um presente, fiquei trancado três dias sendo obrigado a foder com
a prostituta asquerosa dele. Para ser um mad man, eu não podia ser virgem,
pois é uma das regras doentias da máfia.
Solto o chicote no chão, sabendo qual será o meu castigo.
— Peguem o garoto e o coloquem no lugar dele! Têm a minha
permissão para fazerem o que quiserem, menos matá-lo.
Imediatamente tomei o lugar de Marco e ganhei o dobro das chicotadas
que ele levou. Meu tio, com raiva de mim, fez questão de aplicar alguns dos
seus corretivos pessoalmente. Passei o dia amarrado pelas correntes,
recebendo chutes e socos. Por fim, tive muitos hematomas pelo corpo, um
braço e várias costelas quebradas. Depois disso, ainda fui levado ao porão,
lugar que fiquei por uma semana sem direito a nenhum remédio para dor ou
sequer podia sair para ver a luz do sol, enquanto ganhava um prato de
comida um dia sim, um dia não.

*****

Aquele dia foi somente um dos piores que passei durante o tempo em
que fui submetido aos sádicos ensinamentos das leis da máfia, todavia esse
foi o mais marcante, visto que ali eu aprendi que não deveria baixar à guarda
e nunca subestimar meus inimigos. Também passei a nutrir um ódio mortal
por Luigi. O gosto da vingança na boca passou a me acompanhar dia e noite,
naquele fatídico dia, ele selou a sua sentença de morte sem saber.
Depois do que parece terem se passado horas, Ashley entra pela porta
do quarto abrindo minhas algemas. Já me aconteceram coisas bem piores do
que isso. Se fosse com Luigi, estaria em um porão nojento e provavelmente
ficaria lá por vários dias. Isso se não fosse violentada por seus homens como
forma de castigo. Não saberia dizer qual das duas seria a pior escolha.
Confesso que ficar presa não me incomodou, e sim a maneira que ele
disse sem emoção alguma que não se importava com meus sentimentos. De
duas, uma: ou ele é um ótimo ator ou é muito fingido mesmo. O cara esteve
entre minhas pernas por semanas dizendo o quanto gostava de estar ali,
jurava que estava conquistando-o aos poucos. Ele até mesmo me deixava
tocá-lo. Ledo engano! Já contava com o ovo dentro da galinha, como diria a
mamãe. Achei que estava com metade da batalha ganha, quando na verdade,
quem estava caindo em uma armadilha era a tola aqui. Foquei em Vincent e
me esqueci dos seus aliados.
— Oh, ele te machucou? — Ashley pergunta olhando meu pescoço.
— Não! Estava somente testando se a lâmina era afiada. — respondo
mal humorada.
— O negócio foi feio. Está até mesmo soltando farpas.
— Não se faça de sonsa! O desgraçado do seu amado me entregou de
bandeja para ele. Só faltou ele mesmo me enfiar a faca.
— Eu sinto muito! Talvez não tenha sido uma boa ideia ter te
incentivado a continuar com isso.
— Você bateu com a cabeça, Ashley? Eu tive muito tempo para pensar
enquanto estava sozinha, já que não morri, cheguei à conclusão de que isso é
um presente dos deuses.
Ela me olha confusa e a minha vontade é de dá-lhe um chute na bunda.
Foi só começar a dormir com o executor, que seu cérebro virou mingau.
— Não entendo qual é a parte boa nisso. Perdeu o resto da liberdade que
tinha. Se antes você já era vigiada, agora tudo será dobrado. Ele não confia
mais em você. — Se joga na cama bufando e esticando os braços.
— Jesus, amiga! Se todas as pessoas apaixonadas ficarem como você,
estarei matando o meu cupido, porra!
Ela gargalha.
— Você já está caidinha pelo chefe. Só está magoada com ele por ter
escondido sobre o noivado com a princesinha Vitiello.
— Sou realista. Precisei ter a verdade esfregada na minha cara para
entender que não posso deixar a minha boceta me controlar.
— Não seria o coração? — ela diz e eu a olho com raiva. — Ah, deixa
para lá! Mas me diz onde você vê benefício nisso.
Belisco sua coxa a fazendo gritar. Haja paciência!
— O cofre, sua tonta! Estarei mais tempo perto dele. Poderei pensar em
um meio de abri-lo, pegar os nossos passaportes e dinheiro para fugirmos.
— Oh, meu Deus! — grita dando um pulo da cama, finalmente caindo
na real.
Thadeo chuta a porta com a arma em punho nos olhando desconfiado. A
vontade de rir é grande. Um homem desse tamanho com medo de duas
mulheres que não alcançam nem seu peito direito.
— Tudo bem por aqui?
— Hum... Sim. Eu me assustei com uma enorme barata voadora.
Ele balança a cabeça olhando agora para todos os lados em busca do
bicho imaginário.
— Tudo bem! Eu vou deixar vocês à procura dela. — Sai quase
correndo do quarto.
Tapamos a boca para os risos não saírem histéricos.
— Sério! Um cara que teve que fazer um juramento de sangue e passar
por um treinamento pesado, tem medo de uma barata? — Ashley se acaba de
rir.
— Já sabemos seu ponto fraco. — Sorrio olhando a porta.
— Voltando ao nosso assunto, Lorena. Eu procurei pelas nossas
documentações no apartamento de Antonella, mas não achei. Só pode estar
aqui mesmo.
— Vai dar certo! Só precisamos moldar nossos planos. Se antes
buscávamos uma maneira de subir mais vezes para cá, agora temos que achar
uma oportunidade de sair quando tivermos a chance.
— Se não acharmos uma maneira, nós criaremos. Esse cofre tem que ser
aberto.
— Por que às vezes eu tenho uma leve impressão de que está mais
interessada na abertura do cofre do que em sair daqui, Ashley? Tem algo que
você saiba e não me disse?
Arregala os olhos me deixando ainda mais desconfiada.
— Nãaao! Como pode pensar uma coisa dessa de mim? Eu quero sair
daqui tanto quanto você. Espero por esse momento há muito tempo.
— Está bem. Quando chegar a hora, eu te aviso.
Acredito em sua palavra, pois não tenho porque duvidar dela, que tem
me ajudado desde quando cheguei aqui.
— Vou ter que descer. As ordens eram para somente trazer suas coisas
pessoais e te soltar.
— Quanta gentileza, dele, não? — desdenho.
— Tente não atacá-lo quando ele voltar. Por mais chateado que esteja,
ainda assim não te castigou como teria feito com qualquer uma de nós.
Eu sei.
— O que nada impede de fazer quando voltar. Vou tentar controlar meu
gênio forte e não enfiar a porcaria do punhal em seu maldito peito.
Ela estremece me olhando com uma cara de espanto.
— Você está falando umas coisas muito estranhas ultimamente. A
convivência diária com o chefe tem te deixado tão fria quanto ele.
— Pode ser isso. — Dou de ombros.
Pouco tempo depois ela sai acompanhada por Thadeo e mais dois
soldados, então eu volto a ficar com minha solidão. Porém, a paz não dura
muito tempo. Logo chega Marco carregando um Vincent desacordado e todo
ensanguentado para dentro do apartamento. Seja o que for que tenha
acontecido, foi feio.
Encosto na parede olhando a multidão de gente ajudando a deitar ele na
cama. Pela primeira vez vejo uma fagulha de humanidade no temido Marco
Moretti, que late ordens para todos a sua volta, desesperado para que possam
ajudar.
— Já ligou para o médico? — pergunta ao Thadeo.
— Sim. Já está a caminho.
— Foi um atentado? — pergunto meio sem jeito.
Marco muda a sua expressão instantaneamente, se fechando quando
percebe a minha presença.
— Isso não é assunto seu, menina! Vá buscar algumas toalhas para que
possamos limpá-lo!
Entro no banheiro, pego todas as toalhas que encontro no armário,
molho algumas com água e o ajudo a tirar todo o sangue. O cheiro forte de
cobre toma conta do quarto. Em pouco tempo ele está limpo, parecendo um
ser humano novamente. Jogo as toalhas sujas no cesto e me afasto.
— Não é melhor levá-lo ao hospital? — pergunto observando que ele
ainda não acordou.
— Não! — diz seco.
— Teríamos que responder muitas perguntas, então é melhor ficar aqui.
— Thadeo complementa.
Um senhor idoso vestindo jaleco entra minutos depois com uma maleta
branca, começa a examinar Vincent e tratar das suas feridas. Conversa
baixinho com Marco, passa o que imagino ser a receita de remédios e vai
embora.
— Você cuidará dele até eu voltar. Tenha ciência de que se fizer
qualquer coisa com ele, acontecerá o dobro com você. — fala para mim com
os seus olhos semicerrados.
— Eu sei.
— Ótimo! Thadeo e mais dois guardas estarão de vigia na sala também.
— Ousado quase nada! Com mais alguns quilos e pelo menos uns cinco
centímetros maior, eu ia lhe dar umas porradas bem no meio da cara. —
resmungo para mim mesma quando ele some da minha vista.
— E estaria morta nos minutos seguintes. — diz a voz na cama me
fazendo saltar com um grito de susto.
Ele ri baixinho.
— Está precisando de algo?
Me observa por um tempo, como se estivesse analisando minha alma. Se
é que eu ainda a tenho depois de tudo.
— Sim. Quero um pouco de água. — diz se sentando devagar e
encostando na parede.
Vou até a cozinha buscar enquanto os seguranças se mantêm em cima de
mim olhando o que estou fazendo. Por certo com medo de que eu coloque
algo em sua bebida. Até parece! Não sou tão idiota ao ponto de pensar em
matar o chefe dentro da sua casa lotada de soldados treinados. Seria suicídio.
Entrego o copo, deixo a jarra na cabeceira da cama e me viro para sair.
— Fique! — sua voz rouca me para quando alcanço o batente da porta.
— Precisa de mais alguma coisa?
— De você!
A pancada deve ter sido forte.
— Hum! Você acabou de sair de um acidente, ou seja lá o que lhe
aconteceu, e já quer transar? — Abro a boca chocada.
— Eu não disse que quero sexo, Lorena. Quero que me conte sobre
você.
Arregalo os olhos sem saber o que ele quer realmente dizer com isso.
— Não tenho nada de interessante para falar. O que eu poderia dizer, já
foi revelado mais cedo pelo seu cão de guarda.
— Não tudo. Quero saber como era sua vida antes de ser jogada aqui!
Qual é a motivação que te faz, com tanto afinco, querer voltar?
— Bom... Quando se inclui a parte de viver em meio à violência, sendo
tratada como moeda de troca, não precisa de muito para querer sumir daqui.
— falo o fazendo tremular o canto direito do lábio. — Mas também tenho
minha família. É por eles que continuo lutando. Você não faria qualquer
coisa pela sua?
Uma fagulha de dor se passa pelos seus olhos, mas foi tão rápido que me
perguntei se realmente vi ou foi só coisa da minha cabeça.
— Me fale deles então!
— Vo... Você... — Sinto um aperto no peito ao imaginar que ele queira
saber de algo para matá-los, como uma punição.
— Não matarei eles, se é isso que está pensando. Apenas perguntei por
curiosidade. — ele me corta como se adivinhasse meus pensamentos e eu
suspiro de alívio com sua resposta.
Sento na poltrona, mantendo um pouco de distância, então começo a
narrar como é Salvador, como era minha vida antes de chegar aqui, como vim
parar nas mãos do seu tio. Conto como foi à experiência na casa do satanás
onde fiquei e sobre a pequena que morreu em meus braços.
Ele escuta tudo atentamente sem mostrar nenhuma reação ao meu relato,
apenas fica ouvindo. Raramente pergunta algo, até que se cala de novo.
Quando termino, vejo que ele ia falar algo, porém Marco entra com sua cara
de bunda e eu me retiro. Fico torcendo para que tenha um coração ali com
alguma outra função que não seja somente bombear sangue, que o faça cair
na real e acabar com pelo menos essa parte sombria da máfia. Talvez o
lobinho não seja tão imune assim a mim.
Vejo-a sair assim que Marco entra e eu o olho perguntando
silenciosamente o que ele fez. Como se entendendo a minha pergunta, dá de
ombros e se joga na poltrona onde Lorena sentava há pouco.
— O que disse a ela?
— Somente avisei que estou de olho nela.
Faço o meu melhor olhar de "não me foda". Sei que não foi só isso, pois
ele é como eu, e nós nunca somos suaves com as nossas palavras e avisos.
Nunca são somente avisos.
— Foda-se! Deixa que eu irei resolver as coisas com ela do meu jeito.
— digo o recriminando.
Ele me lança seu olhar raivoso sabendo que não irei ceder, então muda
de assunto.
— Você escapou por pouco. A bala da cintura passou somente de
raspão, já do ombro entrou e saiu. Alguns dias de repouso te deixará novinho
em folha.
— E eu lá tenho tempo de ficar descansando, Marco! Já passamos por
coisas muito piores do que essa e sobrevivemos. Não serão duas balas que
irão me parar.
— Isso é verdade. — diz pensativo, olhando para o chão.
— Descobriu mais alguma coisa sobre os atiradores?
— Pegamos um dos caras. Mas antes de interrogá-lo, o desgraçado
engoliu um comprimido de placebo e espumou até a morte, antes de sequer
ganhar o primeiro soco.
Veneno! Tática de suicídio que os malditos da máfia russa usavam
quando eram pegos em alguma armadilha, desde a época do meu bisavô no
comando. Ouvi muitas histórias sobre isso.
— Os desgraçados dos russos! — digo minhas suspeitas.
— Também pensei que eram, porém, o cara não tinha nenhuma
tatuagem ou algo que ligasse ele aos Volkov ou aos Ivanov. Esse serviço foi
encomendado por outra pessoa, que inclusive pode ser gente da família.
— Quem seria? — pergunto gemendo de dor. — Não acho que seja
Luigi, pois não faria sentido ele mandar me matar se está contando com o
meu casamento para calar a boca do Conselho. Alguém mais não quer que
cheguemos perto da verdade e no momento pode ser qualquer um dos nossos
inimigos.
— Não podemos descartar nada, porque você conseguiu irritar muita
gente naquela reunião. Não é coincidência sermos atingidos no exato dia em
que fomos à empresa do antigo advogado da sua família. Alguém daqui pode
estar jogando dos dois lados e eu vou descobrir quem é.
Encosto a cabeça na parede fechando os olhos, me sentindo cansado.
— Eu achei que íamos morrer. — me permito desabafar com ele.
— Eu já disse que antes que isso aconteça, eu teria que ir primeiro.
Minha vida pela sua, lembra? — repete o juramento que me fez há anos.
— Temos o mesmo direito, Marco. Não se diminua.
— Não temos. Eu sei disso, você sabe e todos sabemos como os
bastardos são tradados na máfia.
— Eu vou mudar isso. Você terá seu reconhecimento.
— Não me importo com essa merda! Ficarei satisfeito em te ver chegar
ao topo. E se... — Passa as mãos no cabelo, os bagunçando de nervoso. — E
se eu tiver que morrer no processo, morrerei feliz, desde que você esteja lá e
cumpra nosso combinado.
— Chega! Nenhum de nós dois irá morrer nessa porra! Se tem alguém
que não merece respirar, esse alguém é Luigi.
Ele concorda com um pequeno sorriso, mas ainda tem a testa franzida. O
conheço o suficiente para saber que por mais que tente negar, isso o
incomoda.
— Não seja teimoso! Tome seu remédio e descanse. Estarei a poucos
passos daqui e só sairei depois que você voltar totalmente à consciência. Não
confio nessa garota.
Arqueio minha sobrancelha, contudo decido não discutir por agora com
ele. Estou sem energia. Apenas fecho os olhos confiando em sua palavra e me
permito dormir.

*****

É tarde da noite quando acordo. Levanto meio trôpego para ir à procura


de algo para comer e encontro Lorena dormindo na sala com a televisão
ligada. Mais adiante dela está Marco, que se encontra concentrado mexendo
no seu notebook com uma garrafa de cerveja do lado.
— Assistindo pornô? — o provoco.
— Assistir na sala com uma inimiga a cinco metros do meu pau? —
devolve com sarcasmo.
— Não seria a primeira vez que faria isso.
— Em minha defesa, eu não sabia que a garota era filha do chefe do
cartel.
— Uhum! E descobriu isso na hora que estava dentro da empregada dela
ou depois?
— Como eu ia adivinhar que a garota ia aparecer tarde da noite na
cozinha, exatamente na hora que eu fodia a mulher?
— Cara! Era a casa dela. Sua sorte foi que a menina era muito tímida
para dizer algo a seu pai, ou Sebastian já teria batido aqui para matá-lo.
— Bem provável! Está melhor? — pergunta
— Muito melhor do que já me senti depois dos nossos treinamentos. O
que tanto procura aí?
— Estive fazendo algumas pesquisas e descobri no sistema do FBI que o
cara que se matou trabalhava para uma gangue de motociclistas daqui.
— Mc's? Achei que tínhamos fechado um acordo com eles e colocado
todos para correr, deixando claro quem manda nessa parte da cidade.
— Eu vou fazer uma visitinha para eles logo que amanhecer. Estou com
algumas suspeitas do que pode ter acontecido e quero tirar todas as minhas
dúvidas antes de acabar com eles.
— Eu vou com você.
— Não, não vai! A sua ida iria mais atrapalhar do que ajudar. Está
ferido e preciso de você aqui, seguro.
— Mas que porra, Marco!
— Se eu estiver certo em meu palpite, iremos fazer um belo churrasco
de ratos. Já que está melhor, vou descer lá para baixo e cuidar das coisas por
lá. Aproveite que tem uma meretriz a sua disposição e vá foder para pôr um
pouco dessa sua raiva para fora.
Semicerro meus olhos para ele, o fazendo rir.
— Às vezes eu acho que você gosta de me ter no meu limite.
— Esse é um dos meus trabalhos. — diz saindo.
Volto meus olhos para Lorena, que dorme tranquilamente em minha
frente. Meu pau dá sinal de vida, sento na beirada do sofá tirando alguns fios
de cabelos caídos sobre os seus olhos, a fazendo parecer quase um anjo. O
lençol a cobre contornando exatamente o seu corpo, me tentando a tirá-lo do
caminho. E é exatamente isso que faço. Suas belas pernas ficam nuas me
deixando ver sua calcinha cor de rosa. Quase rio quando vejo o quão pequena
é. Mal cobre sua boceta lisinha. Ah! Lorena, você não colabora! Feito um
tarado, desço para o meio de suas pernas para senti-la em minha boca. Ela
geme quando coloco minha língua por cima da calcinha, provocando-a.
Chupo seu brotinho e arranco um gritinho dela quando faço um pouco mais
de pressão. Escorrego um dedo para dentro, a abrindo para meu ataque. Enfio
minha língua em seu buraco, pegando seu gosto vicioso que tem me deixado
louco por todas essas malditas semanas. Merda! Eu estou muito ferrado! Não
sou um bom homem e minhas intenções com ela são ainda piores. Mas
fodido eu serei se não a ter para mim ou deixar outro tocá-la depois que
provei o que é o paraíso.
— Vincent? — sua voz doce e rouca me chama.
Levanto meus olhos encontrando os seus sonolentos.
— Oi, coelhinha.
Subo devagar por cima dela até alcançar as duas delícias que cabem
perfeitamente em minhas mãos. Dou um pouco de atenção a cada uma e beijo
seu pescoço.
— Seus ferimentos! — diz se lembrando que estou machucado.
— Não me importo! Eu quero você, e agora! — falo beijando sua
perfeita boca pecaminosa.
Abaixo minha calça o suficiente para tirar meu pau pulsando desejoso
por ela e me encaixo em sua entrada encharcada, empalando-a. Gememos
quando alcanço o fundo do seu canal. Começo a fodê-la lento e suave, apenas
a sentido um pouco mais.
— Diga para mim de quem você é, Lorena!
— Minha! — geme me puxando mais para si.
Ela gosta de me provocar e mostrar que eu sempre a terei, mas porque
permite isso. Eu adoro tê-la me desafiando, somente para provar que tenho o
controle, no final de tudo, sobre seu corpo.
— Vamos tentar de novo, querida! A quem essa boceta pertence? —
Estoco mais forte dentro dela.
— A mim! Seu desgraçado!
— Não, coelhinha! Você é todinha minha!
— Continue dizendo isso para convencer a si mesmo.
— Provocadora!
Meu ombro dói e meu quadril está me matando, no entanto só sairei de
dentro dela depois de ter aplacado ao menos um pouco da minha fome por
ela. Como a safada que é, move seu quadril de encontro ao meu e eu me
perco mais uma vez. Insano de desejo, a viro de barriga para baixo, volto para
dentro do seu corpo apertado, seguro em sua cintura e a fodo, extravasando
tudo que tenho sentido nesses últimos dias, como tensão, raiva, luxúria, tudo
aquilo que quero e ainda está fora do meu alcance. Mas de repente a
escuridão aparece querendo me tomar e me dominar.
— Vincent? — sua voz me puxa para fora do buraco negro em que eu
estava e volto a me concentrar nela. Tento me controlar e pensar somente no
agora.
— Não se controle! Eu quero mais forte!
Porra! Ela é perfeita para mim.
— Vem, Lorena, e me dê o que é meu! Goza para mim! — digo saindo e
voltando com tudo.
— Aah, sim! — Empina sua bunda em busca de mais.
Faço de novo, levo meu dedo molhado com seus fluídos para seu
clitóris, passando devagar, apenas deixando-a saber que estou ali e que com
um pequeno toque terei seu prazer se derramando em mim. Sinto-a me
apertando, então acelero para acompanhá-la para o mundo desconhecido do
prazer. Jogo-me sem medo com ela e fico a sua mercê, vulnerável, dominado
e sem chances de escapatória, mesmo não sabendo disso, ela me tem. Como
estou fodido por isso! Pela primeira vez em minha miserável vida, me
questiono o que é certo ou errado por culpa de uma mulher que não posso ter
e que eu nem deveria estar tocando.
O dia mal amanheceu e eu já estava de pé. Para falar a verdade, nem
fechei os olhos para dormir direito. Fiquei até tarde pesquisando todos os
possíveis locais que aqueles Mc’s se instalaram, até que achei. Não
sossegarei até ter acabado com aqueles imbecis. Não vou deixar ninguém
atrapalhar nossos planos. E quando digo ao Vincent que estou disposto a
morrer por nossa causa, não estou brincando, pois faria qualquer coisa por
ele, sem pensar duas vezes. Ele teve seus pais arrancados drasticamente pelos
inimigos, foi iniciado na máfia e abusado tantas vezes que teve uma época da
nossa vida a qual achei que não iríamos sobreviver. Ao contrário de mim, que
não tenho nada, ele tinha tudo. Sua causa virou a minha, seus sonhos se
tornaram os meus e sua vida se tornou a minha prioridade.
Não sei o que é amar ou ser amado por alguém, não tive quem me
cobrisse a noite ou aos menos me contasse uma história na hora de dormir.
Aprendi cedo o quão duro à vida pode ser. Ele é a pessoa mais próxima de
mim, lutou ao meu lado, apanhou em meu lugar e esteve lá no meu pior. A
nossa ligação instantânea sempre foi inexplicável e ninguém nos entendia.
Fomos várias vezes punidos por esse elo, por esse motivo valorizo o que
temos e sentimos um pelo outro. Seja lá o que for que nos une assim, vai
além do sangue, dos nossos juramentos ou grau de parentesco. Sim, porque
em tese somos da mesma família. Luigi engravidou minha mamma e
simplesmente a abandonou como uma qualquer. Ela foi rechaçada de sua
família, jogada em um bordel, onde morreu anos depois por um erro que nem
foi dela. Ela foi enganada por aquele miserável e a única punida por isso.
Cresci sendo jogado de um canto para o outro feito um animal
indesejado até ter idade para entrar na máfia. Com a minha habilidade de
rastrear qualquer coisa, como um hacker, acabei chamando a atenção do
stronzo do meu pai. A partir daí conheci meu primo quando fomos treinados
e passei a nutrir por ele um carinho de irmão. Eu vou ajudá-lo a chegar onde
ele deseja e vingar todos aqueles que se colocarem em seu caminho. É minha
missão de vida até meu último suspiro e vou acabar com qualquer um que
tentar impedir que aconteça ou tentar feri-lo, como fizeram ontem.
— Todos prontos? — pergunto à equipe que escolhi a dedo para me
acompanhar e sair à caça.
— Sim! Thadeo e Alec já estão lá em cima protegendo o chefe e Nino
está com a outra equipe protegendo a entrada.
— Ótimo! Avise a eles que se houver qualquer coisa, pode nos chamar
de volta.
— Sim, senhor!
Entro no carro dando a ordem de seguir para o local. O sangue bombeia
forte em minhas veias e me coloca pronto para mandar mais algumas almas
ao inferno, sem arrependimento nenhum. A adrenalina de saber que estou
indo para o combate me deixa animado. Se os inimigos querem assustar
alguém, eu estou fora das suas listas. Gosto do desafio de me sentir vivo, de
saber que tenho o poder de decidir na hora quem vive e quem morre. Todos
me temem! Não por ser o executor de Los Angeles, mas por saber que sou
uma verdadeira besta sozinho ou acompanhado. Por onde passo, todos sabem
quem sou, pois deixo a minha marca.
— Parem aqui! — aviso assim que vejo um antigo casarão cercado de
arames farpados, onde os Mc's ousaram, pelas nossas costas, fazer a nova
moradia deles.
— Quero somente o presidente deles, todo o resto vocês podem matar!
— Até as mulheres, senhor?
Viro-me de frente para o jovem soldado recém-iniciado.
— Eu falei grego? Qual a parte de “todos mortos” você não entendeu?
— Desculpe! — Abaixa a cabeça envergonhado.
— Caso alguém ainda tenha alguma dúvida na hora que for disparar no
inimigo, lembrem-se que ontem eles atacaram o nosso chefe, sem hesitar,
então se algum deles pegarem um de vocês, não terão clemência por suas
vidas. Entenderam?
Ouço um coro de “sim”, então me viro para invadir o lugar. Fomos pelo
fundo, perto da mata, e encontramos um pedaço sem vigia.
— Sávio e Miguel? Vocês ficarão responsáveis por espalharem as
bombas. Assim que saímos, mandem tudo pelos ares! Não deixaremos
rastros, nem provas contra nós. Não falhem, ou acabarei com vocês quando
sair de lá e os jogarei em uma vala, como fazemos com os traidores.
Capiche?
— Entendido, senhor!
Cercamos todo o local pegando os inimigos desprevenidos. Derrubamos
um por um até chegar ao alvo. Atiro em suas pernas e o amarro.
— Gostaria de dizer que é um prazer reencontrá-lo, Dragon, mas nós
dois sabemos que não será. Ao menos não para você.
— Por favor, Marco, eu sou um associado. Um de vocês.
— Um de nós? — Rio sem humor e os homens acompanham meu riso
forçado. — Nossos associados são do alto escalão. Você é no máximo um
inseto irritante, uma sanguessuga tentando nos tirar tudo que conseguimos
com nosso sangue e suor.
Ele começa a implorar e isso me irrita. Acerto um soco em sua
mandíbula, o fazendo parar.
— Então mandou um dos seus homens nos cercar e tentar contra as
nossas vidas? A pergunta é: por quê? O combinado não foi esse e você estava
sendo bem recompensado trabalhando ao nosso lado da outra parte da cidade.
— Não sei do que você está falando. Eu não tenho a mínima ideia do
que está acontecendo.
— Não sabe? Então quer dizer que um dos seus subordinados estava no
meio de um atentado ontem e você nem fazia ideia? Que tipo de pres é você?
— Ele fez por conta própria. Não tínhamos mais nenhuma ligação com
ele. Eu juro!
— É lamentável que você não queira colaborar comigo. Estou muito
estressado, com sono e sem paciência para relevar suas mentiras. Se não me
serve nem para uma informação, vou acabar com o seu sofrimento. — digo
tirando minha arma do coldre e apontando para a sua cabeça.
— NÃO! Por favor, não! Tudo bem... Eu falo o nome da cidade de onde
foi enviado o pacote com o comando. É tudo que sei!
— De onde? — pergunto tremendo de raiva.
— Miami. Foi de lá que veio. Não estava assinado e havia somente o
dinheiro com as instruções do que tínhamos que fazer.
Mariano! Figlio de una cagna.
— Uma pena que você nos traiu. O preço da traição na nossa
organização é a morte, Dragon.
— Mas eu te contei tudo. Eu colaborei para você me deixar vivo.
— E em nenhum momento eu disse que o deixaria viver. Diga ao diabo
que eu mandei lembranças. — Destravo a arma e meto um tiro no meio da
sua testa.
Observo com satisfação quando uma linha fina de sangue escorre do
buraco da bala, entretanto, tenho minha atenção puxada quando vejo um
pequeno vulto na parte de cima.
— Verifiquem tudo e destruam qualquer coisa que acharem referente à
máfia! Não quero que sobre nada!
Corro escada à cima empurrando as portas pelo corredor estreito,
verificando uma a uma até chegar em frente a última. Olho a minha direita
onde estão as cortinas balançando com o vento que entra pela janela e os
arrepios em meu corpo dizem que não estou sozinho. Eu acredito em meus
instintos.
— Vou contar até três! Se não sair antes, vou atirar em você! Um, dois...
Antes de terminar, uma jovem loira sai de dentro do guarda roupa
surrado e caído aos pedaços, muito pálida e tão magra que até mesmo dá para
ver seus ossos sobressaindo na pele. Ela deve ter no máximo quinze anos.
— O que faz aqui, menina? É filha dele?
— Na... Não! Sou uma das prostitutas do clube.
Observo atentamente, analisando suas palavras. Caralho! Quem em sã
consciência conseguiria sentir tesão por uma menina anêmica, com olheiras
profundas e aparência de morta viva? Eu com toda certeza não!
Levanto a arma para atirar e ela se encolhe mais na parede, me olhando
sem esperança e ao mesmo tempo com um certo alívio, como se torcesse por
isso. Vejo perfeitamente as nuances de emoções em seus olhos azuis feito
água cristalina.
— Qual é o seu nome?
— Angel. — diz baixinho.
É claro que para me atentar e me foder de vez, ela se chamaria assim.
— Some, Angel! Vá embora daqui! Espero nunca mais te ver em minha
frente, ou eu mesmo me certificarei de que nunca mais irá respirar de novo.
Entendeu?
Balança a cabeça rapidamente e sai correndo. Como ela ainda consegue
andar, eu não sei. Vejo a menina pular a janela no final do corredor sumindo
em meio a densa floresta. O que acontecer com ela a partir daí, não será
minha culpa. Não vou ter nas minhas costas a morte de uma criança com
nome de anjo. Já tenho muitos pecados a pagar. Desço as escadas para
conferir o trabalho e assim que verifico que está tudo ao meu gosto, vou ao
encontro dos meus homens. Quando estamos a uma distância segura, Sávio
explode todo o local e ficamos observando tudo ir para o alto. Agora é só ir
atrás do outro traidor e ter a certeza de que nunca mais levantará um dedo
contra nós ou outro membro da família.
Ando entre as folhas secas, indo em direção a nossa casa de campo. É
estranho ter meu eu de agora refletido nas águas do nosso pequeno lago.
Sempre encontro mamãe perto da ponte, e toda vez que eu a via, eu era mais
jovem. Aperto o passo mais um pouco e sorrio quando vejo que lá está ela,
sentada em um tronco, me esperando como das outras vezes.
— Oi mamma! Sou eu, Vincent. — digo quando me observa sem falar
nada por um longo tempo, como se não me reconhecesse.
— Está diferente. Esse não foi o filho que eu deixei. — diz alisando meu
rosto com carinho.
Está linda com seus cabelos loiros encaracolados, do jeito que eu
lembrava.
— Isso porque não sou o mesmo. Muitas coisas aconteceram depois que
você se foi.
— Eu sei, mio amore, mas a vingança tem te consumido. Ela tem um
preço alto a se pagar e não trará nenhum benefício. Veja o quanto isso mudou
você.
— Não me importo. Estou disposto a pagar o valor que for.
Ela balança a cabeça, decepcionada.
— O poder pode cegar as pessoas. Você já tem tudo e não precisa causar
uma guerra por mais. Você é muito melhor do que isso, querido.
— Mamma, você não entende. Tudo de mais importante me foi tirado:
você e papà. E tio Luigi me usou, me manipulou e tem sujado o nome de
nossa família, portanto, não merece continuar vivendo depois de tanto mal
que fez em benefício próprio.
— E se acha melhor do que ele, tomando todas essas decisões? Deixa
isso para lá! Você irá sofrer muito com suas escolhas. Veja qual foi nosso fim
em meio a tanta ganância.
— Não! Eu não vou desistir! Não mudarei de ideia. É o que eu quero e é
o que irei ter.
Seus olhos ficam tristes com minhas palavras, todavia não insiste mais.
— Che Dio ti protegga.
— Ele não olha mais por mim, mamma. Eu sou uma ovelha perdida.
— Não, não é! Você só quer que todos pensem assim. Mas aqui... — diz
colocando sua pequena mão no meu coração. — Ainda tem bondade. Eu sei
disso!
— Eu sinto sua falta! Por que só você aparece para mim?
— Não sei te dizer, mio angelo. Preciso ir. Lembre-se que ti amo.
— Não! Não vá!
Ela se levanta, me joga um beijo como sempre fazia quando eu era
pequeno e some na nuvem de fumaça branca. A dor no peito é forte, como
das outras vezes. Odeio esse momento! Fazia muito tempo que não via minha
mãe e em todas as vezes que ela aparece, eu aproveito cada segundo ao seu
lado, só que nunca é fácil a nossa despedida.

*****

Acordo suado, sentido a angústia de quando sonho com ela. Parecia tão
real! Linda como sempre foi e com uma voz tão doce que seria impossível
não compará-la com um ser divino. Olho Lorena dormindo ao meu lado e
saio de fininho para não acordá-la. No relógio marca que já são oito da
manhã. Meu celular escolhe esse momento para tocar insistentemente e me
xingo por não ter o deixado somente vibrando. Preparo-me para as más
notícias, suspirando quando vejo o nome de Marco na tela. Atendo
rapidamente assim que me lembro da nossa conversa na madrugada.
— Tudo certo?
— Por aqui sim. Preciso ir à Miami resolver um assunto urgente.
Amanhã estarei de volta.
Franzo a testa com sua fala. Ele está me escondendo algo.
— O que descobriu? — eu pergunto e ele fica em silêncio por um
tempo. — Marco? Desembucha! — uso minha voz de chefe para que entenda
que não estou pedindo e sim ordenando.
— Um pacote foi enviado de lá e estou indo investigar quem foi o
mandante. Só volto quando tiver uma resposta e acabar com o culpado.
— Esse é o território sobre o poder de Mariano. Acha que ele está
envolvido nisso? Seria muita burrice e óbvio demais.
— Como eu já disse, não podemos descartar ninguém. Tudo é possível
quando estamos em meio a uma guerra que tanto temos inimigos de fora
como de dentro da organização, lutando por poder. Tudo é válido para
ganhar.
— Tudo bem. Me deixe informado de cada detalhe e faça o que for
preciso. E... Marco?
— Sim?
— Tome cuidado! Não deixe rastro e leve o Nino com você.
— Tranquilo! Se cuide você também!
Desligo o telefone e fico um tempo pensando no que vou fazer a partir
daqui. Eduardo já me disse que vai ajudar e marcou uma reunião com seus
contatos, porém, é muita burocracia. É por isso que gostamos de resolver as
coisas por nossa conta e risco. Não tenho paciência de ficar esperando a
lentidão que esse povo leva para ler um pedaço de papel. Mas é preciso
aguardar o desenrolar das coisas. Ainda tem a investigação que Marco está
fazendo sobre os possíveis locais onde Luigi esconde as garotas.
Esfrego a cara me sentindo ansioso de repente. Odeio me sentir de mãos
atadas. Logo sinto braços quentes me abraçar por trás e me viro para ver a
minha perdição em pé atrás de mim. Puxo Lorena para a minha frente e a
beijo.
— Ainda está muito bravo comigo? — pergunta sem jeito.
— Não, Lorena. Bravo não, mas chateado pelo que me escondeu, sim.
Eu preferia ter ficado sabendo da sua boca sobre o seu passado do que pela de
Marco.
Ela abaixa os olhos e eu levanto seu queixo para que me olhe
novamente.
— Entenda uma coisa! Eu tolero tudo, menos que me traiam. Não julgo
seus motivos, mas sou egoísta demais para te libertar.
— O que quer dizer com isso?
— Que você é minha! Que eu não sou um bom homem para deixar você
ir para longe de mim, mesmo sabendo que é a coisa certa a se fazer. Que eu
nunca deixei alguém chegar tão perto como você e agora não quero outra
pessoa.
— Eu... Eu não entendo. Até ontem você disse que não se importava
comigo. O que mudou?
— Eu quase morri em meio a um tiroteio e percebi o quanto você é
importante para mim. Eu no seu lugar teria feito o mesmo. Lutaria e faria
qualquer coisa para ter meus pais de volta.
— Então me deixe ir, Vincent! Me deixe ter meu direito de escolha.
— Porra, mulher! — Me afasto dela com raiva de mim, dela e de tudo.
— Eu acabo de abrir o meu coração para você e tudo que tem a dizer é que
deseja ir embora?
— Você vai se casar e eu mereço muito mais do que ser “a outra” na sua
vida. Nós dois sabemos que a família não me aceitaria. No meu país não tem
essas regras descabidas e lá eu posso ser eu, a Lorena Ávila, a menina que
sonhava em ser enfermeira para ajudar os outros, não a prostituta que só tem
serventia para que homens tenham seus paus molhados quando necessitam.
— Eles não aceitam muita coisa e eu não me importo de ir contra todos
eles.
— E morrer? Você estaria disposto a morrer por mim, Vincent? Largaria
tudo isso aqui e me acompanharia?
— Essa é a minha vida. É tudo que sei e tenho, Lorena. É meu legado e
está no meu sangue comandar isso aqui. Fui preparado para isso desde
pequeno.
— Eu não. Eu não fui preparada para viver aqui. Depois de tudo que
passei, estar aqui é uma tortura.
Encosto minha testa no vidro da janela que vai do chão ao teto, olhando
a rua lá embaixo com todas as pessoas passeando felizes com suas famílias e
seus cachorros, como se o mundo fosse um lugar seguro, sem guerra, sem
nenhum conflito ou violência. Tudo em perfeita ordem. Uma tremenda
hipocrisia!
— Vincent? — diz tentando se aproximar de mim.
— Me deixe sozinho, Lorena, e volte ao seu apartamento.
— Não se feche de novo e não me empurre para fora! Por favor!
— Eu acho melhor a gente separar as coisas. Eu estou confuso e isso não
é bom para o momento que eu estou passando. Não posso perder o foco e
você me distrai.
Ela se joga em meus braços e se segura forte em mim. Gemo com o
impacto do meu ombro na parede.
— Não vou deixar que me expulse daqui. Se não posso ter minha vida
de volta, ao menos me deixe ficar aqui com você. Não quero que outro me
toque ou me machuque. Faça o que quiser comigo, mas não me deixe voltar
para o controle do seu tio.
Ela se ajoelha puxando minha calça para baixo e massageia meu pau.
Em outro momento eu estaria excitado e agradecido, mas não agora, não com
suas lágrimas escorrendo por todo o seu rosto, mostrando seu desespero e
tristeza. Foda-se! Desde quando as lágrimas de uma mulher me incomodam?
Eu saí de dominador para ser o dominado.
— Pare! — A puxo pelas mãos, para que se levante.
— Me deixe te dar prazer com a minha boca.
— Não! Por mais que eu ame sua boca em mim, eu não quero assim.
Venha aqui! — A seguro em meus braços e ela soluça forte. — Não chore,
mia bella. Eu jamais te mandaria de volta para o meu tio. Eu disse aquilo na
hora da raiva.
Aos poucos ela vai se acalmando. Limpo seu rosto com a minha mão e
beijo a ponta do seu nariz arrebitado.
Eu estou muito, muito ferrado! Se meus inimigos ficarem sabendo que
uma mulher consegue me controlar com suas lágrimas, eu vou morrer fácil,
caralho! Isso é um enorme ponto fraco. Um que tentei ao máximo ficar longe,
e mesmo assim não consegui. Uma fraqueza que me fará criar uma guerra
para tê-la ao meu lado. Marco vai arrancar meu pescoço fora quando eu
contar que não quero seguir adiante com o casamento com a Giovanna. Nós
vamos ter que acelerar as coisas, porque depois de acabar com essa, vou ter
outra batalha para enfrentar.
Quando o dia amanheceu, percebi que tinha acordado nos braços do
Vincent. Estava tão drenada dos acontecimentos dos últimos dias, que
simplesmente apaguei. Marco ainda não voltou da sua viagem, seja lá para o
que ele foi fazer, e isso tem deixado Vincent muito estressado. É notório que
algo não esteja saindo como deveria, pois o clima ficou mais tenso por aqui.
Como vim parar na cama, eu não sei. Desci ontem para ajudar as meninas na
limpeza da boate, ensaiei um pouco e depois bebi com a Ashley, para me
distrair. Só me lembro de deitar no sofá para tirar um cochilo e acabei foi
apagando. Eu sou muito fraca paras bebida, alguns goles são o suficiente para
me derrubar. Bebo de teimosa e porque gosto da sensação de dormência que
o álcool me traz, sempre me ajudando a aplacar um pouco das minhas dores
e solidão.
Viro de frente para o homem bonito ao meu lado, analiso seu rosto de
semblante fechado até mesmo dormindo e fico o admirando por um tempo.
Se não fossem as circunstâncias em que me encontro, eu iria arriscar deixar
meu coração em suas mãos, mas não posso. Por todos os motivos errados,
não posso ficar aqui e simplesmente fingir que nada aconteceu, tendo em
vista que poderei esbarrar em Luigi ou qualquer outro cliente que tive, a
qualquer momento. Só de imaginar essa cena, já me dá um nó no estômago.
Isso porque não estou contando com o fato de que ele está noivo, ou seja, não
tenho nenhuma razão para querer ficar. Meu lugar é longe daqui e tudo
conspira para me provar isso.
Sua declaração me pegou desprevenida há alguns dias. Depois do
episódio no qual eu surtei, ele não tocou mais no assunto, mas percebo em
seu olhar que espera algo de mim, até mesmo pela maneira que me toca e me
beija quase que em aflição, como se tentasse me provar com seu corpo, que
estava falando sério. Eu ainda tenho lá minhas dúvidas sobre isso. Passei
muitos anos nas mãos de sua família para aprender que eles são capazes de
tudo quando querem chegar aos seus objetivos, inclusive fingir sentimentos.
Eu vi muitos dos soldados manipulando e brincando com as meninas no
clube, por fim as jogando fora quando conseguiam o que queriam delas. Eu
até gostaria que fosse diferente, entretanto como ignorar todas as coisas
erradas se elas estão gritando em alto e bom som a minha volta?
— Seus pensamentos estão muito altos. — diz com a voz rouca de
sono.
— Sério? Então me diz no que estou pensando agora.
Ele me observa com olhos de falcão.
— Que sou um homem maravilhoso e que me quer dentro de você para
o resto da sua vida.
Gargalho alto.
— Seu sonho, não é?
Ele suspira resignado.
— Não nego. O que tenho que fazer para que possa acreditar em mim,
hein? — Ele pergunta e eu não respondo nada. O que eu quero, ele já disse
que não me dará. — Eu sei exatamente o que quer, Lorena. Eu só queria que
me desse uma chance de provar o que sinto por você.
— Como me provaria isso? — pergunto curiosa.
— Fique comigo! Três meses é tudo que te peço e preciso para te
provar que não tenho nada a ver com o que aconteceu com você. Pretendo te
recompensar por tudo o que passou.
Seu rosto está inexpressivo no momento, me avaliando. Às vezes ele é
tão transparente, e em outras se fecha tanto que não consigo ver
absolutamente nada.
— Eu não sei o que dizer. Não tenho nada a oferecer, Vincent.
Ele deita em cima de mim, beijando suavemente meus lábios.
— Lorena, você é tudo que eu preciso para continuar lutando pelas
coisas certas.
O olho surpresa. Choque é a descrição mais correta. Ele está falando
sério ou é mais algum dos seus joguinhos?
— É algum tipo de teste?
— Eu tenho honra, coelhinha. Quero você, já deixei isso claro, mas
tenho planos de mudar algumas coisas e preciso desse tempo. Nada pode sair
errado ou poderei me prejudicar diante da famiglia.
Não caia nessa, Lorena! Mafiosos são sem escrúpulos. Continue com
seu plano, que é mais seguro.
— Eu não sei de mais nada, então não sei como eu poderia ajudar.
— Nem se for para acabar com tráfico humano dentro da máfia?
Arregalo os olhos. Agora ele tem minha total atenção. Isso só pode ser
brincadeira! Teria um novo objetivo para lutar, algo muito maior do que eu.
— Está falando sério?
— Muito sério! Mas não posso falar todos os detalhes para você.
— Eu sei. Negócios da máfia e tudo mais. — Bufo revoltada.
— É isso ai! Mas ao contrário do que me acusou, eu não sou a favor e
quero acabar com isso. O negócio é que ainda não tenho todo o poder que
necessito. Só preciso de você ao meu lado, mia bella. Me dê pelo menos esse
tempo. Se depois que tudo isso acabar, você ainda querer ir embora, vou
fazer tudo o que tiver ao meu alcance para que saia daqui com segurança.
— Me dê a sua palavra! Jura pelo seu sangue? — Eu sei o quanto esse
juramento é importante para ele.
Ele levanta a sobrancelha.
— Se isso for fazer você reconsiderar a minha proposta, então juro pelo
meu sangue.
Não tenho nada a perder, certo? Não vou mudar de opinião. Três meses
é pouco tempo e vai passar rápido. Se for verdade dele, não estarei me
colocando em risco tentando fugir. O beijo com todas as forças, feliz por ele
ao menos me oferecer essa chance. Por favor, minha deusa! Prometo te
entregar várias oferendas. Não deixe ser mentira.
— Tudo bem. Eu vou ajudar no que for preciso.
— Bom... Merece até uma recompensa por ter feito a escolha certa. —
sussurra em minha boca, parecendo satisfeito com minha resposta.
Depois de uma rodada deliciosa de sexo na banheira, ele se troca e sai.
Quem diria que sexo seria bom? Eu achava nojento antes e agora até anseio
por seus toques.
Ando de um lado para o outro com a cabeça a mil, visto rápido minha
roupa e saio correndo para falar com a Ashley. Bato em sua porta aguardando
ela vir me atender. Só que como a vida é uma cadela vira-lata, quem abre a
porta é Romeo, somente de toalha e com seu imbecil sorriso de crocodilo.
— Ora, ora! Sentiu saudade de mim, meu bem? — diz me medindo de
cima a baixo, mordendo o lábio inferior.
— Nenhum pouco! Depois falo com minha amiga. — Me viro para
sair, no entanto ele é mais rápido e puxa meu braço, me encurralando.
Tento acertar um chute em suas bolas, porém ele já esperava por isso e
prende minha perna entre as suas.
— O que foi? Agora que esquenta a cama do chefe, não sou bom o
suficiente para você? — Segura em meu pescoço e empurra minha cara na
parede.
— Me solta, seu desgraçado! Ou eu irei acabar com você!
Ele gargalha.
— Você sabe o quanto eu amo quando você luta, querida. O sexo fica
muito mais interessante e sua boceta bem mais apertada em volta do meu
pau. — Esfrega seu membro em meu traseiro fazendo a bile subir em minha
garganta, por nojo.
— Eu odeio você! — falo já esperando pelo pior.
— Não! Você ama! Já disse a ele o quanto você gosta de duro e forte?
Que gritava com meu pau enterrado até o fundo?
— Seu doente! Eu gritava de dor, não de prazer.
Ele aperta forte a mão em minha garganta, cortando meu ar.
— Solte ela, Romeo, ou você estará cavando sua própria cova! —
Thadeo grita ao nosso lado.
— Qual é, irmãozinho? Vai dizer que nunca quis molhar seu pau na
bocetinha mais disputadas pelos chefes? Eu não me importo em dividi-la com
você. Ela até gosta de ser preenchida por dois. — cita às vezes em que Luigi
me obrigou a ficar com ele e vários de seus amigos asquerosos ao mesmo
tempo.
— Isso não é da nossa conta. Solte ela agora!
Ele me puxa pelo pescoço e encosta seu lábio próximo ao meu ouvido,
deixando com a ponta da sua língua um rastro molhado.
— Você ainda vai ser minha, doce Lorena, e é só questão de tempo até
ele enjoar de você também. Então eu vou fazer você pagar por todas as vezes
que me rejeitou!
Ranço é o que sinto só de imaginar que isso pode acontecer um dia. É
disso que eu falava! De como eu não teria paz a cada vez que tivesse que
encarar algum dos homens que abusou do meu corpo.
Ele se afasta, só depois de vê-lo sumir respiro aliviada.
— Você está bem? — Thadeo pergunta me examinando.
— Sim. Eu vou subir. Se ver a Ashley, diga que preciso falar com ela!
— Tudo bem.
Saio de lá com o coração nas mãos. Que diabos! Logo ele tinha que
estar com a Ashley hoje! Essa foi por pouco. Vou ter que tomar um banho
com desinfetante para tirar toda a sujeira que seus toques repugnantes me
trouxeram. Não sei se depois do Vincent, eu conseguiria voltar a ser quem
era antes. Uma vez que se conhece o outro lado da vida miserável que
levamos, não queremos mais voltar para ela. Ele disse três meses. Respiro
fundo para me acalmar. Só mais noventa dias e terei minha vida de volta. Eu
posso aguentar mais um pouquinho.
Desço ao escritório para resolver as papeladas da boate. Tenho que
deixar tudo organizado para ir à Las Vegas conversar pessoalmente com o
Lucca. Irei pedir um pouco mais de tempo para o anúncio do noivado. Ele vai
ter que entender meu lado, visto que afinal de contas, serei eu com a corda no
pescoço. Mas estou vendo que do jeito que as coisas estão, vai ser impossível
sair daqui hoje. Marco está surtando com as informações que passei. No
geral, ele é o mais racional de nós dois, entretanto vejo que as coisas em
Miami tem o deixado em seu limite, o fazendo perder fácil a paciência nesses
dias que precisou se afastar. O que nos traz ao momento de agora.
— VOCÊ SÓ PODE ESTAR BRINCANDO COMIGO, CARALHO! —
grita pela chamada de vídeo. Estamos a mais de vinte minutos nesse impasse.
— EU SAIO POR MENOS DE CINCO DIAS E VOCÊ JÁ ESTÁ
CAÇANDO SARNA PARA SE COÇAR?!
Se ele não estivesse tão revoltado, eu iria rir das suas expressões.
— Eu a quero, Marco. O plano de início segue como planejamos.
Apenas estou acrescentando mais uma cláusula.
— Você fez o quê? — pergunta incrédulo.
— Falei a ela que darei sua liberdade se por acaso tudo passar e ela
ainda queira ir embora.
— Só pode ser feitiçaria! E olha que nem acredito nessas coisas.
— Dei minha palavra, jurei pelo meu sangue e não voltarei atrás.
— E espera o quê? Que em três meses ela esteja caidinha aos seus pés?
Vocês estão juntos há semanas e ela ainda continua com o mesmo
pensamento. Acha mesmo que vai mudar de opinião em um passe de mágica?
— Tenho esperança que sim. Ela odeia o tráfico, e se nós derrubarmos,
acabaremos com essa escória de dentro da máfia, além de fazê-la feliz. Será
minha última tentativa. Se não der certo, eu caso com a Giovanna, como
combinado.
— E até você se lembrar do seu compromisso com a famíglia, vai
enganar o seu tio e o Lucca Vitiello até quando? A gente não precisa de mais
um inimigo na nossa cola.
— Vai levar o tempo que precisar. Eu estou aguardando o desenrolar da
reunião com o Eduardo.
— Você só pode estar querendo me foder, cacete!
— Com lubrificante ou sem?
Ele me mostra o dedo e eu gargalho.
— Oh! Foda-se, Vincent! Não banque o espertinho comigo. Eu só não
quebro a sua cara porque estou muito longe. A boceta dessa mulher deve ser
muito boa para você se colocar em uma enrascada atrás de outra por conta
dela.
Esse stronzo tem muita sorte por eu considerá-lo muito, se não já teria
mandado ele à merda. O que não quer dizer que de vez em quando eu não
tenha que me impor e lembrá-lo quem sou, mesmo dando minha vida por ele.
— Vou desconsiderar o que acabou de falar porque sei que está muito
nervoso, mas se voltar a desrespeitá-la de novo, iremos resolver na gaiola as
nossas desavenças. Capiche? — Respiro várias vezes tentando manter a
calma.
O teimoso continua me encarando de cara feia e me olhando como se
tivesse nascido mais duas cabeças em meu pescoço.
— Porraaa! Nem acredito que estou ouvindo isso. Ligue para o Lucca e
combine com ele para adiar a festa de noivado. Arrume qualquer desculpa!
Se vire! Você se colocou nessa merda, então a resolva. Eu estou muito
ocupado aqui ainda.
— Vai dar tudo certo, Marco. Fique calmo e confie em mim quando
digo que vamos resolver isso.
— Tenho lá minhas dúvidas. Do jeito que você está se deixando levar
por seu pau, não irei me surpreender se você me disser que desistiu de tudo
no dia que eu chegar aí.
— Isso nunca! Eu honro com a minha palavra e isso é muito mais do
que uma briga pelo poder. É vingança por tudo que aquele desgraçado nos
fez.
Ele respira fundo e ficamos nesse jogo de quem cede primeiro ao outro
por um bom tempo. E como sempre, mesmo a contragosto, não me
decepciona.
— Tudo bem! Estou do seu lado. Mesmo não concordando com isso e
achando que a união com a Vitiello seria o caminho mais seguro no
momento, eu respeito sua decisão e não vou voltar atrás no que te prometi.
— Eu agradeço pelo seu apoio, mio amico.
— Não me agradeça. Se ela nos trair ou dizer algo que nos prejudique, é
melhor me matar, Vincent, porque nem você e nem o próprio diabo em
pessoa me impedirá de colocar uma bala no meio da testa dela.
O frio me toma só de pensar na possibilidade de ter que escolher um dia
entre os dois. Espero que nunca chegue a esse ponto.
— Juntos até a morte!
— Sempre! — diz ainda chateado.
Desligo o notebook mais tranquilo porque sei que ele estará comigo.
Torço para que um dia possa se apaixonar e sentir o que sinto por ela. Só
assim ele me entenderá. Por um tempo eu achei que nem coração eu tinha, e
que tudo o que importava era cumprir com minhas obrigações e minha sede
por justiça, só que agora eu tenho mais um motivo para continuar lutando.

*****

O apartamento está silencioso, olho tudo a procura dela. Me distraí lá


embaixo e esqueci de parar até para comer. Só me toquei que fiquei muito
tempo lá quando olhei pela janela e vi que já era noite. Ela está de costa
vestindo sua roupa da noite para se apresentar no palco. Odeio que ela vá se
expor para aquele bando de babacas, porém, ela gosta, e foi a primeira coisa
que descobri sobre ela. Chego silencioso por trás e beijo seu pescoço.
— Ai! Que susto! — diz colocando a mão no coração. — Um “olá”
quando se está entrando, evitaria um infarto.
— É uma das minhas habilidades... — paro de falar quando vejo a
marca roxa em seu pescoço. — Quem fez isso?
Instintivamente ela leva a mão ao local e dá um passo para trás, se
afastando de mim.
— Não foi nada!
— Anda, Lorena! Me diz quem foi o filho da puta que ousou tocar no
que é meu!
— Romeo. — fala incerta.
— Eu vou matá-lo!
Vejo tudo vermelho em minha frente e me viro para ir atrás do
desgraçado.
— Vincent, não precisa! Thadeo me ajudou e ele nem chegou a fazer
nada.
Coloco minhas mãos em suas bochechas e a faço me encarar.
— Esse é o meu território e ele tocou em alguém que está sob a minha
proteção. E não bastando isso, me desrespeitou debaixo do meu teto. Não há
perdão para isso.
Ela tenta me segurar quando me viro, no entanto puxo meu braço de
suas mãos. Entro no elevador e vou direto para onde ele está, sentado no bar
com duas mulheres, uma de cada lado, se sentindo o rei do pedaço. Não falo
nada, apenas acerto meu punho em sua mandíbula o fazendo cair por cima da
mesa lotada de bebidas.
— Você a quer, não é? — digo o óbvio e ele sorri zombeteiro cuspindo
no chão o sangue da boca.
— Qual é, Vincent? Eu estive dentro daquela boceta primeiro que vo...
— não o deixo terminar, acertando outro soco.
— Se quer tanto tê-la, vai ter que ser direito. Te desafio a entrar comigo
no tatame e lutar como um verdadeiro homem de honra faria.
Tiro a parte de cima do meu terno, jogando-a para trás. Ele sabe que não
ganhará de mim, pois sou o melhor na minha modalidade, e o único que
chegaria perto de me derrubar, seria o Marco. Isso porque fomos treinados
pela mesma pessoa. Mas Romeo é orgulhoso demais para pular fora, ainda
mais depois que o desafiei em meio a uma multidão.
— Você não vai machucar o meu bebê! — Antonella grita ao meu lado.
— Se o seu bebê não honra as calças que veste, se escondendo atrás da
barra da saia da mamãe, não tem porque ele está na famiglia. É mais um
motivo para eu acabar com ele. Não temos tempo para homens fracos aqui.
— E de fraqueza você entende bem, não é, chefe? Vamos lá! Não vou
deixar você se sentir envergonhado por se prestar ao ridículo de brigar por
uma mulher que já passou nas mãos de metade dos homens da Itália.
— “Metade” que vou descobrir o nome e matar um por um por ter
violentado ela quando era somente uma criança. A começar por você.
Seus olhos piscam conhecimento. Ele sabe que eu sei de tudo, só que
não me arrependo de dizer o que vou fazer, posto que acabei de contar um
dos meus segredos a um homem morto. Mortos não falam, e ele será um em
breve.

*****
Subo na gaiola em meio aos gritos e aplausos do público, gostando do
showzinho extra.
— O vencedor fica com a bella donna. Já sabemos quem será, não é? —
o provoco com a certeza de qual será o resultado final.
— Se eu fosse você, não teria tanta certeza assim.
Ele tenta acertar um soco em meu abdome, entretanto é muito lento, o
que me faz pegá-lo desprevenido e chutar sua costela quando chega muito
perto. O mundo parece parar a nossa volta. Minutos se passam e eu me
desligo de tudo. É só eu e ele aqui e as nossas vidas em jogo. Meu sangue
bombeia tão forte que o sinto pulsar por todo meu corpo. Ele vem para cima
de mim, conseguindo atingir alguns golpes, mas não o suficiente para me
derrubar. Tenta novamente acertar mais um soco, porém me defendo
acertando o cotovelo em seu braço, o deixando pendurado, mostrando que
desloquei do lugar. Ele recua fazendo uma careta de dor, mas se mantém
firme.
— Pensando em desistir?
— Nunca! — fala respirando pesado.
— Eu bem que gostaria de ficar brincando mais um pouco com você,
mas tenho uma mulher para cuidar.
Com satisfação ataco cada um dos pontos mais sensíveis que sei que irá
enfraquecê-lo. Agora é para valer! Os golpes são muito mais violentos,
fazendo o chão ficar vermelho com os respingos dos nossos sangues. Mais
dele, do que meu. Tenho que admitir que ele é corajoso. Mesmo eu sendo
muito melhor que ele no kickboxing, estou realmente impressionado. Poderia
ter o matado sem sequer sujar as minhas mãos, com uma única bala em seu
maldito crânio, contudo eu teria acabado com isso antes mesmo dele perceber
o porquê de estar sendo morto, o que seria rápido demais. Todos os homens
que a tocaram contra a sua vontade, merecem ter uma morte lenta e dolorosa.
Escolhi lhe dar uma chance justa, mas não porque sou bom, e sim pelo prazer
de vê-lo quebrar, se debater e ter uma pequena esperança, até no último
minuto, por fim, arrancar todas as suas chances, mostrando o quanto foram
inúteis seus esforços.
Acerto um chute em sua canela e outro em sua cabeça, fazendo a mesma
virar e ele cair no chão. Pulo em cima dele o estrangulando e vendo aos
poucos a vida deixar seus olhos. Somente solto ele quando dá seu último
suspiro. As pessoas gritam eufóricas com a minha vitória. Peço uma arma ao
meu soldado e atiro para ter certeza de que não pegará o caminho de volta do
inferno.
Olho em meio à multidão tentando encontrá-la e a vejo no canto com a
mão na boca, assustada, me observando de olhos arregalados. Não desvio
meus olhos dela enquanto eu desço do tatame e vou ao seu encontro. Coloco
meus braços a sua volta puxando-a para mim. Beijo a marca em seu pescoço
com suavidade para que entenda que fiz tudo por ela e que enquanto estiver
comigo, eu a protegerei de tudo e de todos. Essa foi a minha primeira prova
do quão sério eu falo sobre recompensá-la pelo que passou, inclusive da
minha parte que a ignorou de início e não acreditou nela.
Perplexa! Essa é a palavra que me define agora. Estou tão em choque,
que não consegui sair do lugar. Acho que nem pisquei os olhos. Já tinha
ouvido falar sobre como ele é mortal, impiedoso, frio, só que saber e ver são
coisas completamente diferentes. O que ele fez por mim me deixou sem
palavras. Alguém me defendeu depois de anos gritando em silêncio, sem
ninguém para me ouvir ou ajudar. Estou tão emocionada quanto petrificada.
Eu passeio entre duas possíveis reações: correr para beijá-lo em
agradecimento ou fugir. Sim! Fugir para o mais longe possível quando vejo
seus olhos famintos. Se no dia em que chegou à boate, sujo de sangue, ele
parecia intenso e assustador, hoje está dez vezes mais.
Ele me segura pela cintura, beija meu pescoço, involuntariamente meu
corpo responde ao seu toque. Sem dizer uma única palavra, ele traz seus
lábios ao meu em um beijo exigente. Sua língua não pede licença e
simplesmente toma o que seu dono quer e deseja. Gemo em seus braços e o
sinto me carregar. A próxima coisa que vejo é que estou deitada nos lençóis
da nossa cama, com ele pairado sobre mim. Sinto o gosto do sangue em
minha boca, e ao contrário de uma pessoa normal, em vez de nojo, fico
excitada, porque é o sangue que ele derramou por mim.
Ele tira minha roupa e delicadamente me beija dos pés à cabeça. Fecho
os olhos sentindo uma avalanche de sentimentos me atropelarem feito um
caminhão desgovernado. Não quero sentir, mas não tenho controle. É como
se eu tivesse me perdido e de repente me achado. O quão louca eu sou por
pensar assim?
— Olhe para mim, coelhinha! — ele pede e eu abro os olhos, vendo os
seus belos azuis me observando. — Está com medo de mim?
Eu deveria, não é? Mas não... Não estou com medo. O que estou
sentindo, não consigo colocar em palavras.
— Não. Estou apenas sem saber como agir depois do que houve lá.
— Foi por você, mia bella! Ele nunca mais encostará um dedo em você.
Eu irei te proteger de todos eles.
Meus olhos se enchem de lágrimas não derramadas. Tudo me bate,
porra! Qual é o meu problema? Será que anos de abusos fizeram eu me tornar
um deles? Eu o vi matar um homem na minha frente, e em vez de me
lamentar, porque alguém morreu por minha causa, estou feliz. Muito aliviada,
na verdade. Na minha cabeça se passa um filme de todas as vezes que Romeo
me machucou ou ajudou Luigi a escolher meus clientes. Eram sempre os
piores, os mais sádicos para poder me punir por rejeitá-lo. Sei que não
deveria dizer isso, no entanto quero que ele queime no fogo do inferno se
realmente existir um. Que sofra o triplo do que me fez passar!
— Obrigada! — Aliso seu rosto trazendo sua boca novamente para a
minha.
— Você está em choque. — Encosta sua testa na minha. — Deixa eu
pegar um pouco de água para você.
Como explicar que estou mais sem reação pela sua atitude do que pela
morte do Romeo em si?
— NÃO! — O seguro. — Por favor! Só fique aqui comigo!
— Tudo bem, coelhinha. Não sairei daqui.
Puxo sua calça para baixo afim de ter mais contato com seu corpo. O
desejo pulsa em cada fibra minha.
— Me foda! Me puna do jeito que você gosta! Tire toda a marca que ele
deixou em mim.
— Eu não vou fodê-la, Lorena. Não hoje. Não agora, pelo menos. Você
merece mais do que isso.
— Por quê? Não faz isso, Vincent. Eu preciso de você nesse momento.
— Porque, mio amore, quando eu entrar em seu corpo, eu estarei indo
devagar, lento e muito suave. Irei fazer amor com você.
Oh! Foda-se! Meu coração traidor falha uma batida.
— Então me mostre como é. — peço baixinho, duvidando que haja uma
diferença entre um e o outro.
Ele volta a deitar em cima de mim, desce rumo a minha boceta que
pinga de necessidade e a chupa devagar, me torturando, explorando cada
parte minha como nunca ninguém fez antes dele. Já percebi que como um
ritual, ele me dá prazer primeiro, só depois que vem em busca do seu.
— Você me quer em você? — diz pincelando seu pau em minha entrada
encharcada.
— Sim, Vincent! — Eu o quero tão ruim que não sei se choro ou me
condeno.
Arqueio minha coluna querendo que entre logo em mim.
— Minha menina gulosa!
Ele se encaixa e entra bem devagar, no mesmo instante em que sua
língua toma minha boca. Move o quadril em estocadas rasas e lentas em
combinação com a maneira que me beija. Cada toque seu é registrado pelo
meu corpo, minha mente e meu coração. Estou caindo duro por ele. Com
cada movimento eu sinto um fogo líquido e quente me consumir, como se
fosse feita uma marca em minha pele, da qual nunca conseguirei me livrar.
Sei qual é a diferença dessa vez em relação às outras: tem sentimento, muita
emoção, veneração. É diferente de tudo que já senti em toda a minha vida.
Sinto-me única e totalmente completa. Ele se move em mim de um jeito
sensível, sensual, tão puro, tão cru, tão certo, e ao mesmo tempo com um leve
gosto de proibido, doentio e insaciável.
Quando ele sussurra ao meu ouvido que me ama, que eu sou sua e ele é
somente meu, sou dominada por um orgasmo que me bate, tirando todo o
meu fôlego. Venho forte com um grito alto, sendo arrebatada para um outro
mundo completamente diferente. Nesse, eu e ele somos apenas um. Não têm
monstros, nem prisão ou dor. É onde sou livre como sempre sonhei. Não
porque saí dessa vida, mas porque tudo fez sentido e eu encontrei de uma
maneira estranha a libertação que procurava por todo esse tempo, nos braços
de um mafioso.

*****

Olho seu lado da cama e vejo que estou sozinha. Levanto e saio à sua
procura. Tudo parece tão irreal que estou em dúvida se dormi e sonhei ou se
realmente aconteceu. O encontro na sala com vários papéis sobre a mesa,
como se nada tivesse acontecido. Ele levanta seus olhos, fixando aos meus.
— Você está bem? — Inclina a cabeça me analisando.
— Sim. Eu acho. — Tudo é tão estranho.
— Venha aqui. — Me estica uma de suas mãos.
Dou alguns passos e coloco a minha mão na sua. Mãos fortes e macias.
Nem parece que estrangulou um homem até a morte.
— Está com fome, mia bella?
Sorrio com meu novo apelido carinhoso. Ele tem me chamado muito
assim ultimamente, e sinceramente gosto mais desse.
Vejo uma pequena mala no chão e a curiosidade me toma.
— Vai viajar?
— Preciso ir a Las Vegas revolver um problema. Quer vir comigo?
— Me levaria? — Fico animada com o convite.
— Sim! De lá preciso dar uma passada rápida em Miami. Creio que
você não conhece lá também, não é?
— Tá brincando? Nem a Itália onde tive morada por dez anos, eu
conheço direito.
— Então me deixe te mostrar ao menos um pouco, coelhinha. — Beija
minha mão. — Deixa eu te ajudar a descobrir o mundo.
— Você não vai pegar leve, não é? Está decidido a me fazer cair por
você.
— Se estiver funcionando, não medirei esforços.
Ai meu coração! Te controla, porra!
— Quando vamos sair? — mudo de assunto porque ainda não estou
preparada para assumir meus sentimentos.
— Estava só esperando você acordar.
— Tudo bem! Eu irei me arrumar para podermos ir.
— E o seu café? Coma alguma coisa! Está muito tempo sem se
alimentar.
Como mamãe diria: saco vazio não para em pé. Olho para a bela mesa
na minha frente, chamativa e repleta de guloseimas. A minha ansiedade é tão
grande que não conseguiria comer nem uma rosquinha sequer, porém, para
não fazer desfeita, nem criar caso, como um pouco, então corro até o quarto
para me arrumar e escolher as roupas que irei levar.
Vinte minutos depois estamos no aeroporto e pego minhas coisas para
irmos ao balcão de embarque, mas sua mão me para.
— Não iremos em voo comercial, pois chamaria muita atenção. — diz
apontando para a fila de homens vestidos de preto logo atrás de nós.
Realmente! É de assustar as pessoas que não sabem quem eles são, e
pior ainda as que sabem.
Fomos para o terminal executivo, onde tinha um jatinho nos esperando.
Entramos, e logo que alçamos voo, observo pela janela as nuvens passando
admirando cada detalhe. Permito-me imaginar que estou indo ver mamãe e
Vítor, que tudo não passou de um terrível pesadelo e que logo irei acordar
com dona Clarice gritando que irei perder a hora de ir à escola. Estou tão
confusa. Por que as coisas não poderiam ser mais fáceis? Com esse
pensamento encosto minha cabeça na poltrona e acabo tirando uma soneca.

*****

— Lorena! Chegamos.
Levanto atordoada e saímos rumo aos carros que já nos espera. Olho
tudo a minha volta com um sorriso bobo no rosto feito uma criança no parque
de diversões. Tudo é novo e fascinante aos meus olhos. Quem passa por mim,
logo percebe que sou uma turista. Para que ficasse mais óbvio, só faltou um
chapéu de palha e uma máquina fotográfica pendurada no pescoço.
— É tudo tão lindo! Estou apaixonada pelo lugar.
— Assim que eu cumprir com meus compromissos, irei levá-la para
conhecer os pontos turísticos daqui.
— Jura?! — pergunto e ele me olha como se me achasse louca, até que
me toco sobre o que falei. — Não no sentido figurado! É só uma expressão.
Rio da cara que ele faz. Sinto um pequeno apertar da sua mão em minha
coxa, como se dissesse que me entende. Percebo que no exato momento que
saímos da boate, ele mudou seu comportamento. Está sério, observador e
muito calado. Imagino que assumiu essa postura perante os seus soldados,
para não mostrar fraqueza diante deles. Até mesmo o senti um pouco mais
distante de mim. Entendo, posto que no mundo dele quem abaixa a cabeça, é
morto em um piscar de olhos. Os fracos são submetidos a serem como
escravos ou mortos. Não sei de tudo o que eles fazem ou como vivem dentro
das suas próprias leis, mas com base em mim, posso dizer que é horrível não
poder colocar limite ou mostrar uma opinião contrária. Se não for pedir
muito, gostaria de mudar ao menos o que está errado diante dos meus olhos.
Se ele realmente estiver disposto há ceder um pouco, eu ficaria imensamente
feliz. Vamos ver como será daqui em diante. Meu coração pode ter
amolecido, meu corpo estar em total sincronia com o seu, porém, minha
mente não. Sempre me orgulhei de ser racional e pensar com todo o cuidado
sobre o que iria fazer. Aprendi a usar essa habilidade ao meu favor, essa será
a última parte de mim a ceder. É graças a ela que me mantive viva até hoje e
não será diferente porque ele disse palavras bonitas quando fizemos amor.
Vou lhe dar a chance de realmente me provar o que disse, mas não em
palavras, mas sim em atitudes.
Faço check-in no hotel Bellagio, subimos e peço nosso almoço. Depois
que terminamos, levo Lorena para dar uma volta pela cidade. Muito mais
tarde digo ao motorista para me deixar em frente ao cassino da família
Vitiello, onde tenho marcado uma reunião com Lucca. Deixo ordem aos
meus homens para não tirarem os olhos dela enquanto compra sua roupa para
o nosso passeio de hoje à noite e saio do carro. Respiro várias vezes para me
controlar, já me preparando para o estresse que essa conversa me trará. Logo
na entrada encontro o Enzo e o nosso consigliere Henrique Cavallaro que
veio representar meu querido tio que está hospitalizado. O desgraçado
também sofreu um atentado e nem para morrer logo e tirar um grande
problema do meu ombro, serviu.
— Cavallaro! — o cumprimento. — Como está Luigi?
— Melhor. Não foi tão grave quanto achávamos. E você?
— Ótimo! Para a minha sorte e azar dos meus inimigos, estou pronto
para outra.
Ele treme o canto do lábio e me dá um olhar de conhecimento.
— Vittello! Como vai?
— Olha se não é o nosso subchefe preferido! Achei que vocês iriam
novamente arrumar uma desculpa. Se não os conhecesse, eu poderia dizer
que estão dando para trás em nosso combinado. — critica.
Não digo que o que ele acha saber sobre nós, não chega nem perto do
que realmente somos.
— É por isso que estamos aqui. Houve alguns contratempos que me
impediram de vir antes.
— Estou sabendo dos atentados que sofreram. Imagino que já tenham
achado e punido os culpados, não?
— Claro! Mas vamos aos negócios. Não estamos aqui para trocar dicas
de como matamos e torturamos nossos inimigos.
Ele semicerra os olhos e eu me mantenho sério. Não somos amigos
deles, tão pouco estou feliz com esse arranjo. Quero deixar claro que mesmo
que eu me case com sua irmã, não será motivo o suficiente para dividir
segredos sobre a nossa organização.
— Está certo! Vamos subir! O capo já nos aguarda.
Observo a minha volta, procurando uma possível rota de fuga caso seja
necessário. Estamos em desvantagem em terreno inimigo e qualquer passo
em falso pode causar um derramamento de sangue. Dou sinal para que Alec e
Miguel se mantenham em alerta. Liberei Thadeo dessa viagem, contudo não
para plantear a perda do imbecil do seu irmão, mas sim porque não confio
nele perto de mim e nem da Lorena por agora. As pessoas tendem a ser
irracionais e voláteis quando estão de luto. Entramos no escritório e Lucca,
junto com vários de seus homens, se levanta para nos receber.
— É um prazer tê-los
conosco. Minha filha ficou decepcionada por ter cancelado a festa de
amanhã.
— Tudo que posso oferecer no momento é um anel. Ela vai ter que
esperar mais um pouco para ter o nome da minha família. Acredito eu que
você não esteja ansioso por isso. — Sorrio com escárnio.
— Não mesmo! Mas essa união será muito vantajosa para a Outfilt,
então, certos detalhes insignificantes temos que deixar passar. — devolve na
ponta da língua.
— Por minha conta, nem teria aceitado esse acordo, pois estamos
levando muito bem sem vocês. — revido.
— Não é o que fiquei sabendo. O FBI está em cima, com todos esses
ataques que estão sofrendo. Suponho que ficar na boca da mídia e perder
muito dinheiro, tem dado bastante prejuízo.
— Cuidado! — Dou um passo à frente — Quem te escutar, pode achar
que você realmente se preocupa com os nossos negócios, ou pior, que esteja
nos atacando para tentar nos enfraquecer e se beneficiar com isso.
Ele solta uma risada forçada.
— Não me tenha por tolo, rapaz. Nós podemos ajudá-los e você deve
conhecer o ditado: uma mão lava a outra. Logo, nossas famílias estarão
ligadas e não quero que sobre nenhuma confusão para mim.
— Vamos com calma, cavalheiros! Estamos aqui para negociar, não
criar uma guerra. — Henrique tenta apaziguar a situação.
— Para quando pretende marcar a data de oficialização? — Riccardo,
seu consigliere, questiona.
— Quando eu resolver alguns problemas que tenho pendentes. Como
podem ver, o momento não é propício a festas.
— Espero que resolva logo! Quanto às fronteiras, permitiremos que
passem por elas assim que os papéis forem assinados. Até lá, nenhuma outra
proposta nos interessa. — Enzo responde de mal humor.
— Entendemos seu ponto de vista. Não estamos aqui para cobrar nada,
apenas pedimos um pouco mais de paciência até tudo se resolver. Três meses
nem é tanto tempo assim. — digo sucinto.
— Tudo bem! Desde que apareça hoje à noite na minha casa e coloque o
anel no dedo da minha filha, não irei me importar de esperar um pouco mais.
Espero que isso não seja um problema para você. — Lucca diz me
“fuzilando”.
— Estaremos lá! — Henrique se levanta, sendo seguido por mim.
Caralho! Lá se vão meus planos com a Lorena.
Saímos do prédio e me despeço de Henrique, mas não sem antes ouvir
um dos seus sermões.
— Está sendo muito relapso, Vincent. Trazer a menina para cá e matar
Romeo, não está ajudando a limpar sua barra com seu tio.
Nem pergunto como ficou sabendo. Imagino que Antonella deve ter ido
choramingar com Luigi a morte do seu precioso filho.
— E você acha que eu quero limpar algo com ele?
— Sei que não quer, porém precisa. Não se esqueça de que ele é seu
capo e você lhe deve todo o respeito.
— Uau! Por um instante eu jurei que era ele aqui na minha frente em
carne e osso. O babaca estava no meu território e me provocou. Não esperava
que eu relevasse e ensinasse os outros a fazerem o mesmo, não é?
— Vai me dizer que não tem nada a ver com a bela morena que está te
esperando naquele carro?
Merda!
— Você tem uma ideia muito errada sobre mim, Cavallaro. Sempre
gostei de ter meu pau molhado por uma boa boceta. A idade está afetando a
sua visão e o fazendo enxergar coisas onde não existem.
Me dói dizer isso dela, no entanto não posso deixá-lo achar que tenho
um ponto fraco e futuramente usá-lo contra mim. Retribuo seu olhar sério,
que desde mais jovem parecia ter o poder de ver além de mim e saber
exatamente o que eu escondia ou fazia por suas costas. Com o passar dos
anos, tanto Marco quanto eu aprendemos a respeitá-lo, o que não quer dizer
que não temos os dois pés atrás com ele. Henrique só parece ser calmo, mas é
muito observador, tão ou mais letal que eu, afinal, foi ele que nos treinou,
ensinou tudo que sabemos. Vamos dizer que não iremos querer ele como
inimigo. Até hoje tento entendê-lo, descobrir de qual lado ele está exatamente
e o que realmente quer.
— Só digo que se cuide! Da mesma forma que eu percebi, eles também
podem. Nos vemos à noite no jantar. — Olha para o carro mais uma vez e sai.
Inferno!
Vou ao encontro da minha coelhinha, levá-la para conhecer os pontos
turísticos da cidade, como prometi.

*****

Aguardo Lorena descer para irmos jantar. Não quero chateá-la, então
somente depois que nós jantarmos, é que irei encarar a mansão do monstro.
De repente ela vem ao meu encontro, linda em um vestido longo e vermelho.
Tudo que ela veste, fica perfeito em seu corpo tentador. Faço uma anotação
mental de pedi-la para vestir essa cor mais vezes. Pergunto-me quando foi
que passei a reparar nesses pequenos detalhes. Logo eu que sempre fui
desligado assim? Ou só comecei a reparar agora por ser ela? Seguro em sua
cintura, admirando o brilho em seus olhos, que antes não estava lá. Decido
ali, fazer tudo para que ela não o perca. A beijo suavemente apreciando o
gosto de cereja do seu batom. Tão minha!
— Você vai sujar sua blusa. — diz rindo.
— Eu não me importo. Precisamos ir logo! Infelizmente, depois terei
que comparecer a um jantar de negócios.
— Você veio para ver ela, não é?
— Não se preocupe com isso, mia bella. Tudo que importa para mim, é
você. Eu irei resolver isso da melhor forma que eu puder. — eu digo e ela me
olha duvidosa. Não posso deixar de me culpar por isso. — Vamos? — Pego
em sua mão, colocando-a em meu braço.
Apesar do hotel que hospedamos ter dois restaurantes cinco estrelas
muito requisitados, a levo para o restaurante Aureole no hotel Mandalay Bay,
por ser uns dos meus preferidos devido as opções de pratos das mais
diferentes origens e culinárias, e claro, também por ser o único daqui que
possui a maior carta de vinho da América do Norte.
Somos levados à nossa mesa e Lorena absorve tudo a sua volta. Depois
que pedimos nossos pratos e escolhemos o vinho, é que ela fala algo.
— Eu sempre gostei de vinho e estou encantada com essas enormes
torres de vidro cheias deles.
— São quatro andares para ser mais exato. O melhor daqui é que se
pode escolher o vinho por estilo, região ou tamanho.
Sorrio de sua cara de espanto e percebo que ultimamente tenho rido
mais ao seu lado. Ela é diferente de tudo que conheci. Uma menina presa no
corpo de uma bela mulher. Ingênua e ao mesmo tempo sensual, sem precisar
de muitos esforços ou acessórios caros para se destacar. Entendo o porquê
meu tio e Romeo se encantaram ao ponto de morrer por ela. Pensar nele e
imaginar que ele que a tocou primeiro, me tem fervendo, e a minha vontade é
de trazê-lo de volta somente para matá-lo de novo. Espanto os péssimos
pensamentos e me concentro de novo nela.
— Eu gostaria de saber como eles fazem para pegá-los quando o cliente
pede um que não têm na parte mais baixa.
— Espera e verá! Eu escolhi um vinho que fica exposto na parte mais
alta.
— Você não fez isso... — ela para de falar quando ver uma das
garçonetes sendo presa e subindo pelas torres para pegar o vinho desejado. —
Uau! Isso foi demais!
Desfrutamos do nosso delicioso jantar e aproveito para saber um pouco
mais sobre ela. Lorena é falante e muito expressiva. Se nota suas emoções
por todo o seu rosto quando fala de sua família e novamente me bate uma
pitada de arrependimento por não ter prestado atenção detalhadamente sobre
ela.
A deixo em nosso hotel e saio para mais esse infortúnio encontro. Sinto
que essa noite vai ser para lá de longa e tudo pode acontecer.
Saio de fininho do meu quarto, desço em direção a cozinha dos
empregados, onde sei que todas as noites ele vai fazer um breve lanche
quando acontece a troca de soldados e chega o fim das suas rondas noturnas.
Ele é muito mais velho do que eu e não me importo. Odeio saber que logo
serei sacrificada como um cordeiro, dada como uma promessa de paz que
todos sabemos que não durará muito tempo. Só de pensar que não estarei
mais em seus braços, já sinto uma dor imensa no peito. Não me importaria de
fugir e viver longe daqui. Nada disso aqui me importa. Mas nós dois sabemos
como seria nosso fim. Papai não me perdoaria. Além de ser expulsa de casa,
deserdada, eu seria jogada em um bordel qualquer, e de quebra, o matariam
por tocar em uma das mulheres da família. Seríamos sentenciados e
condenados pelo resto das nossas vidas.
Chego por trás de suas costas e o abraço.
— Você demorou. Achei que não viria hoje. — diz acariciando minha
bochecha.
— Samantha custou a dormir e fiquei com medo de que me visse sair.
Nos olhamos por um tempo, com todas as palavras engasgadas, ao
mesmo tempo sem ter o que falar. Sabemos que nada pode ser feito.
— Eu estou com medo. — assumo sentindo a angústia me tomar.
— Seja corajosa, principessa! Nossos destinos foram traçados desde o
nosso nascimento. Não há nada a se fazer.
— Eu sei. — Tremulo os lábios segurando o choro. — Promete não se
esquecer de mim?
Ele segura em meu pescoço e junta nossas testas.
— É tudo que posso te prometer, pequena.
— Quero que saiba que posso até ser dada a ele em casamento, mas
nunca terá meu coração, porque eu te amo.
Nessa hora meus olhos já estão alagados, e mesmo que eu tente segurar,
as lágrimas escorrem pela minha bochecha. Isso é muito injusto!
— Faz amor comigo! Por uma última vez. — peço com jeitinho.
E ele faz. Me beija e me toma em seus braços, amando todo o meu corpo
de uma maneira marcante e carinhosa. Mal sabia eu que quando eu disse
aquelas palavras, inconscientemente selava ali o fim de uma história de amor
tão trágica quanto às de Shakespeare que eu lia desde menina.

*****

Arrumo-me em frente ao espelho, passando mais um pouco de corretivo


nos olhos a fim esconder as olheiras. Mamãe entra, seguida por Samantha,
que apenas me aguardam para me levarem ao meu velório. Escolhi um
vestido preto que usei no funeral da vovó, exatamente para mostrar o quanto
estou me sentindo infeliz com tudo isso.
— Eu sei que você não está feliz com esse noivado, mas precisava vestir
preto? Quer que o seu pai te bata na frente de todos eles e me humilhe perante
nossos convidados?
— É só um vestido, mamãe, de alta costura, muito caro e bonito demais
para ser usado somente uma vez na vida.
— Você que sabe! Depois não diga eu que não avisei.
Descemos as escadas e a conversa para instantaneamente. Todos me
observam como se eu fosse à atração da noite. O que não deixa de ser, já que
estão montado todo esse circo na sala para no fim me servirem como prato
principal. Papai aperta os lábios em uma linha fina ao ver a roupa que eu
escolhi.
— Giovanna, minha filha, venha conhecer seu noivo! — Seu aperto é
firme em meu braço, deixando claro o quanto odiou a minha rebeldia.
— Olho para frente batendo meus olhos no jovem homem de expressão
indiferente, como se eu fosse um mero incomodo a ser suportado. Pior do que
ele é o outro mais velho ao seu lado com olhar mortal e mais frio que uma
geleira. Engulo em seco quando não desvia seus olhos dos meus. Se antes eu
já sentia medo, agora estou apavorada.
— Esse é o Vincent, o subchefe de Los Angeles. — Papai aponta para o
mais novo. — Vincent, essa é a minha doce Giovanna.
Ele apenas dá um leve balançar de cabeça em cumprimento, me
estudando, puxa do bolso uma caixinha azul com um anel solitário de várias
pedrinhas pequenas o enfeitando e me entrega. Não faz questão de colocar
em meu dedo, deixando claro o quanto está chateado com isso também.
Maravilhoso! Além de ser um assassino cruel, terei um marido que nem me
conhece e já me odeia. Mil vezes ótimo!
— Já que todos estamos devidamente apresentados, vamos comemorar.
— Papai bate palmas, feliz, me fazendo lembrar da apresentação de uma foca
que vi na televisão. Ele parece ser o único aqui radiante com isso.
O Jantar transcorre como o desejado e somos dispensadas da mesa assim
que terminamos. Todos os homens são levados até a sala para conversarem.
— Teremos três meses para preparar tudo. — Mamãe diz ao meu lado.
— Ele pediu esse tempo ao seu pai.
— Parece tão pouco. — Ao menos sei agora quanto tempo terei perto do
Damien.
— Para! Você deveria estar feliz com a escolha. Seu pai poderia ter dado
sua mão a um velhote qualquer. Ao menos seu marido é um homem jovem e
bonito.
A olho chocada. Ela acha que isso é bom?
— Uau, mamãe! Estou ansiosa para conhecer o peso da sua bela e jovem
mão. — digo sarcástica.
— Sua insolente! — Me olha de cara feia e se afasta.
Espero ela subir para seu quarto e saio disfarçada pela porta dos fundos
a fim de ver se encontro meu amado. O vejo fumando no jardim e corro até
ele.
— Temos somente três meses juntos. — digo sem fôlego, me jogando
em seus braços.
— Giovanna! Não deveria estar aqui. É muito perigoso. — Me
recrimina.
— Eu sei! É que não aguentei ficar mais tempo lá dentro... longe de
você.
Ele me empurra para o tronco de uma árvore, me beija delicadamente.
Um contraste interessante: ele grande e eu pequena. Porém, me trata com
muita delicadeza.
— Você me deixa louco! Eu já disse que não podemos fazer mais isso.
— diz esfregando sua ereção em mim me fazendo gemer com o seu toque.
Minha respiração é pesada e eu pulso o desejando. Tenta se afastar, mas
eu o puxo de volta, colando seu corpo ao meu. Um barulho de palmas a nossa
direita nos chama a atenção, nos fazendo virar para ver quem é, e congelamos
logo em seguida.
— É interessante o romantismo de vocês e tudo mais, mas não posso
deixar de me perguntar se o seu pai sabe que a princesinha dele anda se
enroscando com um de seus guardas. — o homem de olhos frios que meu pai
chamou de Henrique, fala encostado no muro.
Eu não consigo falar.
— Não é isso que o senhor está pensando. — Damien tenta se explicar,
ficando na minha frente e tentando me proteger.
— Não tenho nada a falar com você. Sabe qual é o preço a se pagar pela
traição. — Um estopim seco da arma é tudo que escuto em seguida.
Um grito alto sai da minha boca quando Damien cai em cima de mim.
Eu não preciso verificar para saber que ele está morto. E antes de poder tocá-
lo, Henrique me puxa pelo braço, me levando para longe do meu amado.
— Você vem comigo, garota!
— Mas o que está acontecendo aqui?! — Papai e todos os convidados
vêm aos gritos. — Espero que você tenha uma boa explicação para isso,
Cavallaro!
— Eu acho que isso te pertence. Peguei a garota agarrada a um dos seus
soldados. Eu não sabia que vocês eram tão generosos e tinham a mania de
dividir suas mulheres com eles.
— Sua vagabunda! — Papai acerta um tapa em meu rosto, me fazendo
cair no chão.
Eu não ligo! Mereço isso e muito mais. Por minha culpa, Damien
morreu. Eu o condenei por ser tão impulsiva.
— Acho que não temos mais nada a tratar aqui, não é? Nosso acordo
está desfeito. — meu agora ex-noivo fala.
— Negativo! Tem a mão da minha outra filha. Daqui a seis meses ela
completará seus dezessete anos e estará pronta para desposar.
— Não! — grito quando percebo que estraguei mais uma vida. — Por
favor, papai! Ela é só uma menina.
— Calada, sua inconsequente! Você não tem direito de dizer mais nada!
— Por favor, Enzo! — Olho para meu irmão, implorando por ajuda, mas
ele vira o rosto assim que começo a falar.
Papai continua com seu discurso, enfiando a última faca em meu
coração.
— A partir de hoje será jogada em um bordel. Já que gosta tanto dos
meus soldados, fique satisfeita em servir todos eles. Você não faz mais parte
dessa família. Podem levá-la daqui!
Choro mais forte.
— Um momento! Nós não nos casamos com criança, Vitiello. Deveria
saber disso. — a voz do desgraçado do Henrique que acabou com a minha
vida, soa de novo. — Nós viemos aqui para entrarmos em um acordo e selar a
paz. Já que Vincent, com todo o direito, é claro, não a quer, eu assumo o
compromisso.
— Você aceita se casar com ela? Mesmo estando danificada? — meu
pai pergunta admirado.
Eu queria gritar e dizer para todos irem se foder, contudo meu egoísmo
me colocou aqui, se eu fizer mais alguma coisa, será a minha irmãzinha quem
irá pagar por isso.
— Sim! Pode chamar o padre, oficializaremos agora. Há de concordar
comigo que não necessitará de uma festa, já que não terá a tradição do sangue
no lençol.
Stronzo!
— Você quem sabe. A escolha é sua. — Papai ri alto com seus homens.
— Ótimo! Então vamos agilizar essa palhaçada, porque eu quero
terminar logo com isso e voltar para casa.
— Enzo! Leve-a para se trocar e mande chamar o padre, imediatamente.
Deixo-me ser levada sem falar nada, uma vez que estou anestesiada
demais para lutar contra algo que eu mesma causei. Aceito qualquer coisa
para salvar ao menos a honra de Samantha. Não tive tempo de chorar pelo
meu amor, nem guardar meu luto, porque uma hora mais tarde eu estava em
frente ao padre e de toda a família, sem direito sequer a uma aliança,
assinando com dor no coração a minha sentença infernal para o resto da vida.
Deixo definitivamente de ser uma Vitiello e passo a ser a senhora Cavallaro.
Aguardo ela entrar no carro e acelero para o aeroporto. Não quero ficar
mais um segundo aqui. Eu sou um cara prático. Se tem como resolver na
hora, não tem porque ficar arrumando desculpas e empurrando para a frente.
Ela pode não entender agora, no entanto foi a melhor forma que achei de
ajudá-la. Se fosse qualquer outra pessoa que os tivessem pegos, correria o
risco de até mesmo pedirem a sua morte, por desrespeito. Esses jovens de
hoje não sabem seguir as malditas regras e evitarem problemas. Não ia me
meter, mas como Vincent pulou fora, eu tinha que fazer algo. O porquê eu me
importei, não sei dizer, mas talvez seja para salvar a mais nova de uma vida
miserável ao nosso lado. Uma vez inimiga, sempre será tratada como inimiga
pelo nosso povo. Não queria me casar, contudo, mais cedo ou mais tarde isso
iria acabar acontecendo. Pelo menos saímos com tudo resolvido e ela é muito
bonita, de família nobre, me dará os herdeiros que preciso.
Desligo o carro e a olho por um tempo tentando entender o que faz uma
pessoa arriscar tanto sua vida em prol de alguém que nem mesmo lutou por
ela, que a mantinha escondida como um segredinho sujo. Uma porra de uma
piada! Tirou sua honra sem se preocupar se o atual marido poderia matá-la na
noite de núpcias ao descobrir a verdade. Eu deveria era ter descarregado
minha arma nele.
— Pegue as suas coisas! Temos que ir!
— Eu não tenho nada. Não viu que só saí com a roupa do corpo?
— Quando chegarmos em Milão, você compra tudo novo. Estará no
centro da moda.
— Que maravilha! Eu deveria me ajoelhar e te agradecer por isso?
Petulante!
— Se quiser! De preferência com a sua boca em meu pau, o chupando.
Ela arregala os olhos.
— Stronzo! Nunca me tocará! Somente se for à força.
Tão inocente. Nunca fui desse tipo, não vai ser agora que serei. Chego
bem perto dela para que veja a verdade em meus olhos.
— Eu não vou precisar, boneca. Não tocarei um dedo em você até que
queira isso. Pode demorar um pouco, mas eu te garanto que logo terei você
implorando por meus toques, meus beijos e meu grande e grosso pau.
Ela arfa com minhas palavras, ficando com suas bochechas coradas.
— Você é muito convencido, não é?
— Não. Sou seguro de quem eu sou e de onde eu irei chegar.
— Eu odeio você! Eu o amava, e por sua culpa, ele vai ser enterrado
como um traidor.
— Mas ele não te amava, menina, e era sim um traidor. Fique feliz por
ele ainda ser enterrado, pois eu o teria jogado no lago para os jacarés
comerem e não deixar sobrar nada, por ter ousado tocar no que não lhe
pertencia.
— Não fale dele! Não diga o que não sabe! — diz com a voz
embargada.
— Não precisei de muito, pois o que vi foi o suficiente para saber sobre
a índole dele. — Tento suavizar minha voz para não deixar ela mais
assustada. — Escuta! Eu poderia dizer todos os motivos do porquê ele não te
respeitava e não tinha um pingo de consideração por você, mas vou deixar
que descubra isso sozinha. Você poderia estar nesse momento sendo
violentada por uma horda de homens que não teriam um pingo de piedade,
então eu salvei você. Não seja uma ingrata! Preciso chegar logo em casa,
então deixe de dramas e entre logo no jato, que eu tenho meus compromissos
a cumprir.
Ela sai marchando em minha frente e eu entro logo depois dela.
Somente, quase doze horas depois, chegamos ao nosso destino. Camillo
arqueia uma de suas sobrancelhas quando a vê descer comigo.
— Senhor? Como foi a viagem?
— Foi bem, Camillo. Quero te apresentar a Giovanna, minha esposa! —
Ele me olha sério, apenas movimentando a cabeça. — Você será o
responsável por sua segurança a partir de hoje!
— Como quiser!
— Oh! Eu não vou ter uma coleira ou algo do tipo? Fiquei sabendo que
vocês gostam de escravizar mulheres. — ela responde sarcástica.
— Não é do nosso feitio, espertinha, mas se faz tanta questão, eu posso
providenciar uma para você.
— Nunca!
— E só para que saiba, meus homens terão uma mão cortada antes de
tocá-la. Nem tente achar que vai ter um caso com algum deles ou eu mato os
dois dessa vez. Entendeu?
— Claro como água, boss! — Vai andando na nossa frente.
— Ela dará trabalho, chefe. — Camillo comenta rindo.
— Bom... Nós quase não estamos tendo problemas. Estávamos
precisando de mais ação por aqui. — Saio o deixando gargalhando atrás de
mim.
Sou paciente e posso esperá-la cair na real. Ela vai entender que o
babaca não deveria ter a prejudicado. Seu serviço era protegê-la, pelo jeito
nem para isso serviu, já que o seu maior perigo foi ele mesmo. Deixou seu
pau o governar não cumprindo seu juramento. No momento em que coloquei
meus olhos nela, sabia que seria minha. Teria ficado de fora se Vincent
tivesse ido em frente com seu compromisso, entretanto as coisas aconteceram
de outra maneira e não poderia ter sido diferente. Não espero amor, me
respeitando e sendo uma boa esposa para mim, já estará de bom tamanho.

*****

Duas semanas depois

De novo ela está sentada na maldita sacada, me ignorando. Já tentei de


todas as formas me aproximar, contudo a garota sempre me repele feito um
inseto, isso tem me deixado muito chateado. Pensei que com o passar desses
dias, ela iria se adaptar e esquecê-lo, contudo acho que devo ter calculado
errado. Sirvo-me de uma generosa dose de vodca bebendo em grandes goles.
O álcool sempre foi um grande companheiro e agora não poderia ser
diferente. Sento-me na poltrona, a admirando de longe. Pior do que ter desejo
por uma mulher que não é sua, é ficar louco por uma que corre de você e mal
te suporta. Eu poderia sair e procurar uma boa boceta para me aliviar que
ninguém ousaria me julgar por isso, mas cá estou eu, sendo fiel aos meus
votos e ansiando por ela embaixo de mim, comigo estocando profundamente
dentro dela.
Esses dias têm sido muito estressantes, posto que Luigi está aprontando
alguma coisa e estou feito um maluco trabalhando dobrado. Está cada vez
mais difícil segurar as pontas e fiquei extremamente decepcionado com suas
atitudes. Esperava mais dele como capo, só que o homem parece um
gafanhoto, destruindo tudo por onde passa, deixando só os estragos para que
eu arrume. Ele anda me escondendo as coisas, meu faro me diz que isso não
vai prestar.
O celular toca na minha mesa, olho pensando se devo continuar aqui e
deixar a chamada cair na caixa postal ou se atendo essa porcaria que só me
traz problemas. Analiso atentamente a tela e vejo o nome do meu antigo
colega de profissão. A curiosidade me vence e eu atendo.
— Estou surpreso! Faz algum tempo que não tenho notícias suas.
— Isso porque andei muito ocupado. Foi um mês muito puxado.
— Eu imagino! Do que precisa?
— Está chegando o momento. Ele está muito perto da verdade e
devemos nos preparar para o combate.
— Entendo! Não queria tirar férias dos problemas mesmo. — eu ironizo
e ouço sua risada.
— Quero que saiba que seremos eternamente gratos pelos seus serviços.
Esse será o último. Eu prometo!
— Tudo bem! Desde que cumpra com o nosso combinado, por mim será
fechado com chave de ouro.
— Será feito! Até lá, mio amico!
— Até!
Desligo feliz por saber que finalmente estamos chegando ao fim dessa
merda, visto que já não aguentava mais fingir ser uma pessoa que não sou.
Fiz uma promessa ao meu amigo de infância há muito tempo, e mesmo
depois de sua morte, continuei sua luta. Mais por motivos pessoais do que
pela promessa em si. Depois de anos de tortura, finalmente a hora do Luigi
está chegando, e ele pagará por todo o mal que causou para a minha amada
irmã.
Acordei passando mal e fui correndo ao banheiro, sentido um gosto
amargo na boca. Nossa viagem, por mais rápida que tenha sido, foi
maravilhosa. Amei conhecer Las Vegas e Miami, apesar de não ter explorado
muito a segunda tanto quanto a primeira, por conta de algo que estava
acontecendo por lá. Também não teria tanta graça, já que não venho me
sentindo tão bem nesses últimos dias. Não comentei nada com Vincent, para
não preocupá-lo, nem atrapalhar suas reuniões de negócios. Porém, desde a
nossa volta, tudo piorou, e eu imagino o que esteja acontecendo. Só era essa
que me faltava! Em meio a uma guerra fodida, eu ter engravidado.
Antonella sempre manteve os métodos contraceptivos de todas as
meninas em dia, para acaso algum cliente não respeitasse as normas, não
pudesse nos deixar grávidas. Mas desde que me desliguei dela e passei a ficar
somente com o Vincent, não me cuidei mais, nem tinha coragem de ir até
aquela cafetina para pedir algo. Seus favores sempre foram caros demais.
Também não me lembrei, porque estava tão focada em sair daqui, que não me
importei com esse detalhe, do qual agora veio me morder na bunda, me
mostrando o quão estúpida eu fui. Como será que Vincent reagiria? Me
mandaria tirar, como vi acontecer com várias das meninas, ou ficaria feliz por
me manter presa a ele. Quero nem imaginar o resultado disso. Uma criança
nesse mundo iria sofrer muito. Se a máfia não é piedosa com as mulheres e
com os homens de berço, imagina com os bastardos. Porque é isso que meu
bebê seria, não é?
Bebo um chá de camomila para poder acalmar o estômago que tem me
dado trabalho de segurar algo nele. Ainda bem que Vincent anda tão ocupado
que não percebeu nada. Eu também sempre fui muito magra, o que me
deixará passar despercebida por um tempo. É, eu sei! Estou sendo uma
cretina por me manter calada, no entanto em minha defesa, estou protegendo
a mim e a esse pequenino que tenho quase certeza que já existe. Não quero
que ele seja usado como algum tipo de moeda de troca, da maneira que eu
fui.
As crianças que nascem na máfia, nascem juradas no sangue, e
provavelmente meu bebê seria tirado de mim assim que nascesse. Não vou
pensar nisso. Só de imaginar, começo a suar frio e meu estômago embrulha
de novo.
— Há algo de errado? — Ashley pergunta.
— Não. Por quê?
— Está a um bom tempo sentada aqui, sem falar nada, apenas olhando
para a parede.
— Eu só estou pensando. Depois que Antonella foi dispensada daqui, as
coisas melhoraram muito para todas nós, não é?
— Sim! E graças a você! As meninas estão muito felizes com isso. Você
acredita que o chefe, de manhã, disse que aquelas que tinham vindo do tráfico
humano, iriam ser liberadas?
— Ele disse isso? — Meu coração a acelera.
— Sim! Pelo que parece, ele vai apenas ficar com as mulheres que estão
dispostas a trabalhar para ele por vontade própria e pagar muito bem a elas.
Isso é mérito seu, Lorena! Ninguém antes se preocupava com o nosso bem
estar e Antonella só nos explorava. E você sabe... vivíamos sob ameaças de
morte o tempo inteiro para mantermos nossas bocas fechadas.
Sorrio ao saber que elas estão felizes.
— O mérito é nosso! Fico imensamente feliz que ele, por vontade
própria, tenha chegado a essa conclusão de tomar essa decisão. Ninguém
acreditava na gente até pouco tempo atrás e o tráfico estava sendo mantido a
sete chaves. Era como se fosse um mito ou uma especulação da mídia.
— Vale lembrar que os interessados nesse tipo de serviço, eram homens
poderosos que nunca iriam querer ser expostos se tudo chegasse a vir à tona.
É claro que iriam esconder bem, para não manchar as suas belas reputações
hipócritas.
— Pois é! Gostaria que ele fizesse essa mudança em todas as boates,
mas sabemos que isso não será possível, a não ser que ele fosse o capo e
desse essa ordem.
— E de Luigi a gente sabe que nunca partirá esse comando. Gera muito
dinheiro para ele por debaixo dos panos.
— Não mesmo!
— Mas me diga uma coisa. Se ele fosse o capo e mudasse tudo isso,
você não reconsideraria ficar?
— Não sei. Estou muito confusa, Ashley. Passei anos da minha vida
com apenas um foco, e agora todas as paredes que eu construí, ele está
conseguindo derrubar uma por uma.
— Eu sei como é. Eu bem que gostaria que Marco me olhasse da mesma
forma que ele olha para você.
— Como está o relacionamento de vocês dois?
— Que relacionamento? Ele só me procura, como todos os outros, e
depois some. Ontem mesmo ele ficou com a Deborah. Foi doloroso vê-la
relatar o que fizeram e eu ter que ouvir sem poder dizer nada. Eu não sou tão
importante para ele como você é para o chefe. — Seus olhos estão lacrimosos
e eu sinto muito por ela. Sei como é ser tratada como apenas um pedaço de
carne. — Sabe o que é o pior de tudo? É que passei anos tentando sair daqui,
e agora que está chegando o momento, eu não sei para onde ir ou como
seguir frente. Nem sei se minha família ainda é viva ou se irão me querer por
perto. Eu não tenho mais nada, Lorena. Tudo que tinha, eu perdi e não sei
como recuperar.
— Me peguei pensando o mesmo sobre a minha família. Somos
mulheres quebradas, mas podemos procurar ajuda e voltar a ter uma vida
normal, Ashley.
— Será? Eu duvido muito que um dia sejamos completamente normais.
Nós teríamos que nos manter caladas. Pode imaginar a cara das pessoas
quando dissermos que fomos prostitutas durante vários anos?
— As mulheres iriam nos ver como rivais, e os homens lá fora, com
toda certeza imaginariam cenas sexuais conosco. O tempo inteiro isso seria,
de alguma forma, jogado em na nossa cara.
— É bem isso, minha amiga. O mundo é cruel. Podem tirar as
prostitutas dos bordéis, mas nunca da mulher.
— A não ser que comecemos a vida com novas identidades. — eu digo e
ela arregala os olhos.
— Claro! Como foi que não pensei nisso antes? Você bem que poderia
me ajudar a conseguir documentações diferentes, né?
Rio porque eu não consegui essa proeza para mim, imagina para outras
pessoas. Olho para ela, com a sobrancelha arqueada, e meu riso morre
quando percebo sobre o que está falando. O maldito cofre!
— Ah, não! Não vou queimar meu filme com ele logo agora que as
coisas começaram a entrar no eixo.
— Você não se importava com isso antes e estava bem empenhada em
abri-lo. Eu não acredito que você vai dar para trás logo agora que tem ele nas
suas mãos.
— Sim! Porque estávamos sem opção nenhuma. Os motivos que nos fez
montar aquele plano, não existem mais, já que não só eu, mas todas vocês,
irão sair daqui também.
— De que plano estão falando? — a voz grossa do Marco nos faz saltar
e eu semicerro meus olhos para uma Ashley pálida na minha frente.
— Plano de acabar com a cafetina. — respondo a primeira coisa que
vem em minha mente. — Todas nos odiávamos como ela nos tratava quando
estava aqui.
— Sei! — Ele prende seus olhos em mim por um tempo me deixando
com o cu que não passa nem uma agulha. — Sabe que se você aprontar, não
serei como o chefe, não é, Lorena?
Reviro os olhos para mais um dos seus avisos, tentando mascarar minha
tensão.
— Sim, Boss. Você não me deixa esquecer a cada oportunidade que tem.
Porque não pega essa merda de arma e descarrega logo em mim?
— Vontade não me falta! Mas não teria graça nenhuma fazer isso sem
uma boa dose de adrenalina antes.
— Ou você sabe que se fizesse isso, daria uma boa dose de adrenalina
ao seu chefe mais tarde. — repito sua frase, a jogando contra ele.
O canto de sua boca sobe com a sombra do que seria um sorriso.
Pequeno, mas ainda assim perceptível.
— Está confiante demais, sua atrevida.
— Bom, querido, sinto lhe dizer que eu tenho todos os motivos para me
sentir segura, já que meu homem matou um dos seus por mim e todas as
noites diz que me ama quando está entre as minhas pernas. — Sorrio dando-
lhe uma piscada, me dando por vencida.
Ele faz uma careta de nojo me fazendo rir mais forte da cara dele. Não
nos tornamos exatamente amigos ainda, todavia, ele está mais maleável
comigo depois que voltamos da viagem. Creio que seja por conta do Vincent,
porque se fosse por mim, já teria me colocado para correr, com toda a
certeza. Mas vou conseguir quebrar um pouco dessa parede que Marco criou
e logo ele gostará de mim também.
Nos viramos para a Ashley, que está feito uma pedra, movendo seus
olhos entre mim e Marco, quase que sem respirar. Coitada!
— Jesus! Vão se foder os dois! Eu achei que teria um derramamento de
sangue na minha frente. Vocês me assustaram. Não caguei aqui porque não
tinha bosta pronta.
Marco franze o nariz, sobe uma de suas grossas sobrancelhas agora e eu
gargalho alto. Ele dá um pequeno sorriso sutil mostrando dentes tão brancos
que nos deixa paralisadas por alguns segundos.
— Caramba! Por um tempo eu achei que o motivo de você não sorrir,
era por ser banguela. — digo provocando.
Se o homem já se destaca quando está o tempo inteiro com sua cara de
mal, sorrindo ele é ainda mais letal. Que Vincent não me escute!
— A piada deve ter sido boa. — ouço sua voz perto do meu ouvido e
logo em seguida sinto um delicado e rápido beijo deixado no meu pescoço.
Falando do diabo! Em público vejo que ele continua cauteloso, me
tratando com certa distância e frieza, no entanto quando está somente nós
dois, ou como agora, apenas Marco e Ashley por perto, ele se permite relaxar
e até arrisca fazer algumas piadinhas. O que me deixa muitas das vezes em
choque ainda por conhecer esse outro lado dele, mais descontraído e
brincalhão.
— Foi só mais uma das tentativas do Marco de me assustar que falhou.
— Está ameaçando ela de novo? — ele o encara.
— Fazendo perfeitamente meu serviço de sempre. — Marco responde
como se estivesse falando sobre o clima.
— Preciso falar com você em particular. E meninas, preciso que
organizem uma despedida de solteiro. Teremos convidados especiais hoje. —
diz indo para o seu escritório.
— Tudo bem! — respondemos juntas.
Os dois saem e eu me viro para minha bocuda amiga, fuzilando ela com
os olhos.
— Se quer me foder, é só me beijar, porra! Essa foi por pouco! Se
controle, ou nós duas não precisaremos de nenhuma documentação se os
nossos destinos for o lugar para onde eles costumam mandar os cadáveres.
Ela se treme toda, esfregando os braços, e demos nossa conversa por
encerrada sobre esse assunto. Minha mente já está montando todo o cenário
perfeito para agradecê-lo por mais essa prova de amor.
Sentado em meu escritório penso na maneira em que vou convencer o
advogado a acelerar o bendito processo. Não queria entregar as pastas com
minhas pesquisas pessoais, mas estou vendo que vai ser o jeito. Marco em
sua viagem para Miami conseguiu descobrir vários casarões por lá, como o
que a Lorena nos descreveu. Creio que meu tio em um momento de
desespero mudou todos os locais para tirar os policias do seu pé e confundi-
los. A pior das hipóteses é ter alguém dentro do próprio FBI passando
informação, prejudicando o nosso trabalho. A sensação que tenho é de que
estou patinando sem sair do lugar.
Lá fora a música alta e os gritos das pessoas me deixam ciente de que a
festa já está a todo vapor e eu nem saí daqui para ver como ficou a
organização da despedida. Para começar, estou evitando meu tio, que chegou
de surpresa para me trazer mais problemas sobre seus deslizes, além de que
não estou com cabeça para lidar com seus olhares gulosos direcionados à
Lorena. Coloquei homens de vigia para que me avisassem caso ele chegasse
perto dela na tentativa de fazer algo, só que ele é esperto, sabe que estou por
um fio, ou seja, não quer criar inimizade agora, ainda mais estando lotado de
problemas e precisando de apoio dos novos subchefes. Gostaria de subir e
mandar todos, inclusive ele, para o inferno, entretanto esse compromisso é
muito importante e não posso adiar.
— O advogado chegou. — Marco avisa da porta.
— Ótimo! Vamos acabar logo com isso, estou precisando resolver o
quanto antes esse problema.
Saio para ir ao seu encontro. Mal vejo o idiota e já quero matá-lo por
ousar despir e comer a minha mulher com os olhos. Lorena, para me foder,
dança no pole dance vestida somente de lingerie vermelha. Ele está
praticamente babando no seu copo de bebida, observando hipnotizado sua
desenvoltura na barra de ferro.
O ciúme fala mais alto e em poucos passos estou ao seu lado.
— Tira o olho, que essa me pertence! — falo trincando os dentes.
Como se para me provocar, ele me olha, vira-se novamente ao palco
para analisá-la e lentamente volta seus olhos para mim, levantando uma
sobrancelha em provocação.
Pezzo di merda!
— Se não quer que ninguém a admire, não deveria deixa-la dançar
praticamente nua aos olhos de todos, não acha?
O cara é corajoso! No meu território, desacompanhado, e me
provocando. Dou um sinal discreto aos meus homens para segurá-lo e coloco
meu punhal em seu pescoço.
— Às vezes penso que você não tem medo de morrer. — digo
analisando sua reação.
— Para estar na profissão que escolhi, lidando com mafiosos filhos da
puta e bandidos da pior espécie, é preciso ter coragem.
— Vejo isso! — dou sinal para os caras o soltarem.
Vamos ver o quão corajoso ele é no mano a mano.
— Não vou pedir desculpa por isso.
— Pelo quê? — pergunta confuso.
Acerto meu punho em seu rosto, fazendo seu nariz entortar sangrando
instantaneamente. Ele fica atordoado, não reage como eu esperava. Lento,
muito lento! Logo mando mais outros golpes seguidos de um chute na
costela, o fazendo cair no chão, desacordado. Fraco!
— Leve ele para meu escritório, deixe a donzela acordar!
Marco me olha com um olhar recriminador e eu faço cara de paisagem.
— Sempre impulsivo! Agora que terminou o show e chamou a atenção
das pessoas a nossa volta, que tal mandar a Lorena ir se vestir antes que você
resolva botar fogo em tudo?
— Vá se foder! — resmungo para ele e saio à procura dela.
A encontro no camarim já vestida com um roupão.
— Não poderia ter escolhido uma roupa menos provocativa, mia bella?
Ela cruza os braços fazendo seus seios quase pularem de dentro do
minúsculo sutiã.
— E faria diferença? Você está agindo feito um homem das cavernas.
Daqui a pouco ninguém vai querer mais vir aqui por conta dos seus chiliques.
— Foda-se! Eu odeio que você fique mostrando demais. Não percebe o
quanto aqueles caras estavam quase pulando em cima do palco, salivando por
um pedaço seu?
— E daí? Sempre foi assim. Inclusive, você se sentava a distância para
me ver rebolar.
Chego mais perto dela e a puxo para meu peito, encostando seu corpo
gostoso no meu.
— É por saber exatamente o que eles estão imaginando fazer com você,
que eu fico louco.
— E o que eles estão pensando? Pode me mostrar? — Segura em minha
gravata, levando minha boca para a sua.
Ela se esfrega em mim deixando meu pau tão duro que não duvidaria
que o filho da puta pudesse criar vida própria, rasgar a calça e pular para fora.
Sua pequena mão desce e massageia minhas bolas, arrancando um gemido
meu. Morde meu pescoço e a ponta da minha orelha.
— Eu amo dançar e você estragou meu show, por isso vai ficar de
castigo para aprender a não roubar meu momento. — Sai correndo me
deixando atordoado e com um grave caso de bolas azuis.
— Lorena! Venha terminar o que começou! — Ela já sumiu porta a fora.
— Provocadora! Mais tarde você me paga por esse atrevimento!
Depois de me recompor, volto ao meu escritório e fico esperando a bela
adormecida abrir os olhos. Não demora muito e ele levanta a cabeça
analisando o ambiente.
— Que porra aconteceu aqui?! — pergunta confuso.
— Ah! Finalmente acordou?
— Que tipo de reunião é essa?
— Eu tinha que disfarçar e te tirar de lá para conversamos a sós.
— E precisava me amarrar e bater?
— Solte ele, Marco! — ele passa a mão no rosto e encara Marco com
raiva, o fazendo rir.
— Acho que ele não gostou das boas vindas, chefe.
O idiota, “inteligente” como é, parte para cima do meu amigo,
conseguindo acertar alguns golpes de sorte. Coitado! Se soubesse que em um
estalar de dedo, Marco poderia acabar com essa estúpida luta, não estaria o
provocando.
— Chega! — grito para os dois. — Eduardo? Meu tio estava lá embaixo.
Se eu não tivesse feito isso, teria desconfiado. — Em uma parte é verdade,
mas em outra, é porque mereceu mesmo.
— Já deixo claro que meus honorários serão dobrados, por esse
desaforo.
Seguro o riso. O cara é um bebezão.
— Por mim tudo bem. Já disse que dinheiro não é problema para mim.
Agora vamos ao que realmente te trouxe aqui.
— Você tem sorte de que eu sou um homem de palavra. Depois de uma
recepção tão calorosa, estou pensando seriamente em te deixar se foder sem
minha ajuda. — Se senta na cadeira, ainda puto pelo ataque, enquanto eu e
Marco não aguentamos e gargalhamos da sua cara feia.
— E aí? O que tem de bom para mim?
— Descobri que meu tio vai ter uma grande entrega no mês que vem. É
a nossa chance de tentar incriminá-lo.
— Calma aí, apressadinho. As coisas têm que ser bem planejadas. Já
conversei com meus contatos sobre uma negociação e eles estão dentro,
desde que seja bem planejada, para não ter pontas soltas. Caso contrário, você
também terá que se entregar, entendeu?
Nem morto!
— Como faremos, então?
— Me passa a data e o horário certo que essa entrega chegará e vou
deixá-los informados. Aí será com eles. Não vai ser muito, mas irá ser um
ponto positivo para você. Quando tudo estiver pronto, o FBI entrará em
contato para armarmos uma emboscada.
— Porra! Eu tenho pressa. Quero esse desgraçado fora do meu caminho.
— Estou fazendo o que posso. Eles estão montando um bom processo
com o que você já entregou. As chances de sair praticamente sem nenhuma
acusação é alta. Só peço que não faça nada que te prejudique nesse tempo.
— Tudo bem. Tomarei os devidos cuidados. Marco? Pega a pasta e
entrega para ele.
— Isso ainda existe? — pergunta chocado.
É lamentável o que tem ali. O local parece um clube, como o meu,
porém, em vez de ter mulheres vestidas com roupas sensuais, são várias
crianças.
— Infelizmente sim. Descobri por acaso que existe, em uma das minhas
pesquisas. Eu tenho pouco tempo. O circo está se fechando e meu tempo não
é tão grande quanto eu pensava.
— Vou levar isso aqui. Talvez assim agilize as documentações.
— Ficarei aguardando. — Se levanta para ir embora.
— Já vou indo. Qualquer coisa eu ligo.
— Como uma recompensa, tudo que gastar será por conta da casa,
inclusive as mulheres.
— Devo agradecer tamanha generosidade? — Ele diz sarcástico.
— Não precisa. Vai curtir sua noite.
— A porra que vou! A próxima reunião pode deixar que eu vou marcar
o lugar. — Rimos da sua revolta. O cara é um comediante!
— Não duraria um dia dentro da máfia. Algumas porradas e ele já pediu
arrego. — Marco gargalha.
— É, mio amico! Esse mundo é para poucos.
— Acha que ele vai cumprir com a palavra?
— Eu espero que sim. Cuide de tudo aqui, que eu tenho uma outra conta
a acertar lá em cima.
— Vai lá! Mais um pouco e o advogado chorão iria te processar por
assédio se tivesse visto como chegou aqui.
— Admirando meu pau, Marco? — Rio da sua expressão de indignado.
— Vai se lascar, idiota! Eu não sei porque eu ainda arrisco minha vida
por você. — Sai resmungando, me fazendo rir ainda mais forte.
Vou atrás da minha coelhinha para fazê-la pagar por ter me deixado
necessitado por ela. Faz um tempo que não abro minha maleta de tortura
sexual e hoje eu irei puni-la devidamente como merece.
Sinto sua presença no instante em que entra pela porta do quarto. Pedi
que colocassem uma das barras aqui em cima para eu dançar para ele. Fiz
Nino ir semana passada comigo ao sex shop comprar um conjunto de fantasia
de coelhinha. A cara que ele fez dentro da loja foi hilária, me fez ter uma
crise de risos com a sua reação a cada vez que eu jogava algo em cima do
balcão. O homem arregalava os olhos e ficava mais vermelho do que uma
cereja de tanta vergonha. Para combinar com a calcinha que é apenas um fio
dental, eu comprei um plug anal com pompom na cor branca, que depois que
coloca, dá a sensação de realmente ser o rabo do pequeno animalzinho. Ficou
perfeito em meu corpo para atiçar meu homem faminto e agradecê-lo por
suas boas atitudes.
Olho por cima dos ombros encontrando-o sorrindo. Seus olhos são puro
fogo e ele nem precisa me tocar para que eu esteja queimando e derretendo
por ele.
— Ah, coelhinha! É hoje que eu te como inteirinha! — diz andando
devagar, tirando sua roupa pelo caminho e sentando nu na cama, em toda a
sua glória.
— Gostou do meu rabinho? — Balaço a bunda para o seu lado, o
fazendo jogar a cabeça para trás, rindo.
— Vou comer ele com gosto, sua safada!
— Oh! Eu não duvido. Mal posso esperar por isso, senhor lobo mau. —
Pisco inocentemente o fazendo rir todo cafajeste.
Lindo! Todo pecaminoso com seu pacote de seis gominhos nessa barriga
trincada dos seus exercícios matinais. Ligo a música Earnerd it de The
Weeknd e começo a balançar lentamente meu corpo ao ritmo da batida.
Seguro no poste, me esfrego nele como se estivéssemos fodendo, tiro o sutiã
e depois a calcinha, e desço devagar arrebitando minha bunda para sua
privilegiada visão. Subo na barra e faço meus movimentos sensuais,
arreganhando ao máximo as minhas pernas e fazendo um giro completo. Ele
tem seus olhos em mim enquanto move sua mão em seu pênis com tanta
rapidez que me pergunto se ele não está o machucando. Minha boca saliva
para senti-lo em minha língua, ansiando em tê-lo.
Quando minha apresentação termina, eu estou ofegante e pingando de
necessidade, mas novamente esse tirano roubou meu show e jogou o feitiço
contra mim. Parece ser outra de suas habilidades.
— De joelhos, querida! Quero que venha engatinhando para mim.
Subo na cama e fico de quatro, indo em sua direção. Ele morde o lábio
inferior e eu beijo sua coxa, chegando perto do seu pau que brilha saindo pré-
sêmen. Coloco a língua para fora, e quando seu gosto agridoce toca minhas
papilas degustativas, eu gemo querendo mais dele. Chupo todo o seu
membro, sentido o pulsar em minha boca e sugo seu prazer, arrancando
gemidos do fundo da sua garganta. Subo beijos por sua barriga, peito, queixo
e finalmente chego em sua boca deliciosa. Nos beijamos de forma urgente e
esfomeada, como se estivéssemos há dias sem provar um ao outro. Ele vira
meu pescoço para o lado, raspando sua barba, e logo em seguida mordendo
suavemente.
— Eu vim para te punir e quem saiu punido fui eu. — Sorrio com sua
fala.
— Eu tinha que te compensar por tê-lo deixado sofrendo de tão duro.
— Bela recompensa! Para ficar ainda melhor, eu vou ter que comer esse
seu rabinho lindo, que há muito tempo eu desejo. — fala apertando minha
bunda com um pouco de força.
— Todinho seu! Sua coelhinha está muito faminta por uma cenoura
enorme que só você tem. — Massageio seu pau e esfrego em minha entrada
encharcada.
Sem tirar meus olhos dos seus, encaixo seu membro e desço em cima
dele, rebolando.
— Oh, mulher safada! Assim você vai me matar!
O cavalgo gostoso com muito desejo e controlo seu prazer. Hoje eu
estarei no comando, deixando ele saber o quanto posso deixá-lo louco
também. Não demora muito para que meu orgasmo venha e eu mordo seu
ombro, gritando, o fazendo perder o controle e derramar sua essência no
fundo do meu canal que ainda pulsa o ordenhado, tirando cada gota dele.
— Isso foi forte! — falo sem fôlego.
— Forte vai ser agora!
Ele me joga de barriga para baixo, bate várias vezes em minha bunda e
depois a alisa como se fosse para acalmar a ardência. A picada de dor
combinada com seu carinho me tem pronta de novo. Somente ele consegue
me fazer sentir prazer dessa forma. Entra em minha vagina e começa a fazer
os movimentos de vai e vem junto com o plug. É como ser fodida por dois ao
mesmo tempo. Eu odiava quando era submetida a esse tipo de sexo, mas esse
homem impossível me faz desejar tudo com ele.
Tira delicadamente o objeto de mim e começa a estimular meu clitóris.
A vantagem é que o plug anal me preparou para que a sua invasão não fosse
tão dolorida. Eu empino mais para ele, o sentindo derramar mais um pouco
do lubrificante e pincelar a cabeça do seu pau em minha entrada de trás.
Lentamente ele entra em mim e nós dois gememos quando sua pélvis fica
colada nas minhas nádegas até o punho.
— Humm! Que delícia, amor! Tão apertadinho! É isso que você queria?
Me deixar insano e ser devorada por mim?
— Sim! Me come mais forte, Vincent!
— Seu desejo é uma ordem, linda. Tome pau nesse cuzinho gostoso!
Ele mexe lentamente seu quadril e a ardência do início vai sendo
substituída pelo prazer. Aos poucos vai acelerando gradativamente até
estarmos os dois se chocando um contra o outro. Seu dedo volta ao meu
clitóris, que pisca ansioso querendo sua atenção, e o massageia na pressão
certa, construindo meu segundo orgasmo. Ele mete mais forte percebendo
que já estou em meu limite e pronta para vir de novo.
— Vem para mim, Lorena! Goza gritando por seu macho, vai!
E como se meu corpo traidor só estivesse esperando o comando dele, eu
venho forte me balançando toda com a força do meu gozo, sentindo todo o
meu corpo se arrepiar no processo. Em algum lugar longe do nosso mundo
real, eu escuto seu gemido gutural quase primal, mostrando que ele me
acompanhou. Vincent beija minha costa enquanto eu me recupero. Minhas
pernas estão bambas e meu corpo ainda não entendeu que acabou. Estou
lânguida e saciada, sem força para sequer sair do lugar. Não posso deixar de
sorrir quando a música Side to side de Ariana Grande me vem à cabeça. Acho
que acabei de entender o que sua música depravada queria dizer. Sortuda!
Descobriu antes de mim o quanto é bom ser bem fodida.
— Tudo bem? — Ele pergunta se retirando.
— Mais do que bom! Gostou da surpresa?
— Se gostei?! Meu pau invadindo todos os seus buracos e os enchendo
com meu esperma, deixou alguma dúvida?
— Uau! Que romântico! — o provoco.
Ele franze o nariz me fazendo ri.
— Quer romantismo? Me deixe tentar de novo. Meu membro avantajado
entrando em seus doces canais corporais, fazendo amor com você e expelindo
toda a minha essência masculina, não te respondeu?
Rio mais forte dessa vez.
— Credo! Parece que você acabou de me vender um produto erótico
com uma descrição muito, muito ruim.
Ele dá um tapa na minha coxa.
— Sua provocadora! Vou te mostrar já, já, o quão ruim o produto pode
ser, estocando novamente dentro de você. — diz chupando um dos meus
mamilos e me fazendo soltar um gritinho por ele estar muito sensível.
— Adoro! Vem, cretino! Me come todinha e não deixe sobrar nada!
Ele gargalha alto.
— Se você soubesse o que essas palavras fazem comigo, não ficaria me
provocando.
— E está esperando o que para me mostrar?
— Meu pau se recuperar. Uma coisa é a minha mente querer te foder até
você esquecer seu nome, outra é ele cooperar para isso.
Agora quem gargalha sou eu. Ele me analisa sério por um tempo e se
joga em cima de mim.
— Vai me pagar por rir da minha cara. — diz prendendo meus braços
em cima da cabeça e me fazendo cócegas na barriga até eu pedir arrego.
— Eu achei que os lobos eram insaciáveis. — falo assim que me solta.
— Insaciável é uma coisa, ninfomaníaco é outra. Nós também temos
nossos limites.
— Para mim dá no mesmo. — Eu prendo os lábios com os dentes
tentando reprimir mais uma crise de riso.
— Shiu! Que você não entende nada de lobo, coelhinha. Você só
entende de reprodução.
E meu riso morre na menção de filhotes.
— É. Você talvez tenha razão. Vamos tomar um banho então, que a
segunda parte da surpresa está lá.
Tento disfarçar e não deixá-lo perceber o quanto isso mexeu comigo.
Saio correndo para o banheiro e ele me acompanha.
— Perece que esteve muito ocupada depois que subiu, hum?
— Claro! Com tudo que temos direito.
Falo observando ele mexer na água da banheira com flores e óleos
aromatizantes que coloquei. Na bancada da pia, vários outros brinquedinhos
sexuais comestíveis nos esperam para a nossa noite de prazer. É hoje que eu
amanso esse lobinho de uma vez por todas!
Aguardo ansioso Marco chegar. Faz uma semana que Luigi está aqui e
tenho certeza que tem algo a ver com o nosso caso. Ele está calado e
observador, mas isso em vez de me relaxar, só tem me deixado ainda mais
nervoso. Droga de justiça lenta! O elevador apita e eu libero a passagem
sabendo que é meu amigo. Marco entra com uma expressão pior do que
quando saiu e me tenho em alerta. Parece até um déjà vu quando se senta no
sofá e me encara como se procurasse uma maneira de falar e não me fazer
surtar.
— O que aconteceu? — pergunto impaciente.
— Cara! Eu sinto muito, mas delataram o lugar da entrega. Acabei de
saber que passou despercebido por nós uma enorme carga de garotas.
Alguém passou panos quentes na entrada delas, e mesmo com todos os meus
contatos de olho, seu tio foi avisado sobre a emboscada e desviou o caminho.
— Que caralho! — Bato na mesa, com raiva. — Isso não podia ter
acontecido! Não conseguiram descobrir nada? Ao menos um local? Elas
podem estar escondidas aqui ainda em algum lugar que não pensamos.
— Todos os nossos homens e pessoas de autoridades confiáveis estão no
caso, mas é como se tivessem sido evaporadas do mapa.
— E as casas de Miami?
— Vazias! Todas as provas que tinham lá, foram... — ele faz uma
pequena pausa e eu arqueio a sobrancelha — apagadas.
Não! Luigi não fez isso!
— Como assim apagadas? — Eu sei o que isso significa, porra! Mas me
recuso a acreditar nisso.
— Mortas, Vincent! Todas as meninas que estavam lá, foram
sacrificadas.
Coloco a mão na cabeça, me sentindo culpado. Mortas! Todas pagaram
com suas vidas por causa do meu estúpido erro. Tudo porque eu não fui
rápido o bastante.
— Não foi sua culpa! Você fez o que podia. Infelizmente não podíamos
ir lá e atacarmos por conta própria o território de Fellipo logo após da morte
do Mariano. Iria levantar muita suspeita para nós.
— Eu sei. Nós também não temos tanto poder nas mãos para um ataque
desse nível.
— É por isso que estamos tentando o FBI, Vincent. Sem seu tio no
poder, você poderá dar a ordem para todos se desfazerem dessas casas e punir
os que se rebelarem contra você.
— Ele é seu pai. Você parece se esquecer disso às vezes.
— Foda-se! Não quis me reconhecer como seu filho, também não o
reconheço. Vamos continuar nossa luta!
— Ligue para o Eduardo e peça o nome do seu contato. Quero falar
pessoalmente com ele.
— Tudo bem! Só tente manter a calma. Vai dar tudo certo!
Dou um breve balançar de cabeça, sem vontade de continuar
conversando. Eu nunca tinha sentido culpa pelos meus atos antes, mas isso
porque todas as pessoas que matei, eram criminosos da pior espécie e não
mereciam continuar respirando. Só que nesse momento, eu me sinto perdido
e decepcionado comigo mesmo. Eram apenas crianças com a vida inteira pela
frente, que nunca mais poderão ter a chance de ver suas famílias de novo.
Lorena me vem à mente nesse momento, fazendo minha consciência
pesar ainda mais. De certa forma e de um jeito bem egoísta, estou tirando
essa chance dela também. Depois que isso tudo passar, se ela quiser ficar, irei
levá-la para ver sua família e passar um tempo com eles. E se não me quiser,
darei a liberdade que tanto almeja, mesmo que arranque no processo um
pedaço do meu coração, ou o que seja que tenho no peito.
— Ele aceitou te encontrar, Vincent. — volto meus pensamentos para o
presente com a voz de Marco. — Então... Vamos?!
Ele fica ao meu lado e dá uma pequena batida em meu ombro me
deixando saber que está comigo. Chegamos vinte minutos depois no local
marcado e lá está o cara, já nos esperando, encostado na sua motocicleta
Harley Davidson.
— Obrigado por ter aceitado meu convite. Sou Vincent Lourenço.
— Gabriel Miller. Confesso que estou curioso com sua insistência em
me ver.
— Eu queria falar pessoalmente contigo sobre meu caso. Eduardo disse
que você tem ajudado ele a encontrar as pessoas certas para nos auxiliar, e eu
preciso de agilidade para isso.
— Eu só aceitei ajudar porque tenho um grande interesse nesse assunto
específico. Há algum tempo venho fazendo minha pesquisa sobre isso e dois
nomes sempre aparecem em destaque, todas as vezes: Luigi Lourenço e
Alejandro Montez.
— Montez? Do quartel mexicano?
— Sim. O filho mais novo do cara se mudou para Los Angeles anos
atrás e virou pastor.
— Deixa eu adivinhar. A igreja é de fachada?
— Tudo indica que sim. Sabem o que dizem: filho de peixe, peixinho é.
Assim que seu tio cair, eu vou atrás dele para descobrir até onde ele está
enfiado nessa sujeira.
— Por essa eu não esperava. Então é por isso que meu tio tem vindo
muito para cá.
— Imagino eu que ele esteja tentando fazer uma aliança com o tal pastor
Jorge ou sua família, procurando aliados para que possa possivelmente fugir
e receber asilo.
Não! Isso não!
— O que podemos fazer para acelerar as coisas?
— Vou conversar com meu chefe e verificar a possibilidade de
conseguirmos o juiz Schmitz para o caso. Se tivermos um pouco de sorte e
ele pegar o seu processo, as coisas serão mais rápidas. Aquele homem tem
um gênio do cão, porém, é implacável em todos os seus anos de profissão.
— Ótimo! É disso que preciso. Pessoas que não irão abandonar o caso
no meio do caminho ou pular fora acaso receba alguma ameaça. O que você
vai querer em troca, para me ajudar nisso?
Ele coloca os óculos escuros e puxa a jaqueta de motoqueiro. O cara
parece mais um chefe de quadrilha, com todas as suas tatuagens, do que um
agente. Deve passar batido quando precisa se infiltrar no meio do crime.
— Fica me devendo um favor. No dia que eu precisar, vou te cobrar.
— Combinado!
Ele monta na sua moto e sai levantando poeira.
— Os Montez são pessoas muito influentes fora do México e dentro
dele. Se eles se aliarem ao Luigi, acabou para nós.
— Não vamos deixar que isso aconteça. Vamos segui-lo mais de perto.
E... Marco? Quero o dossiê desse pastor de araque na minha mesa.
— Como desejar, oh, meu senhor! O que você não me ordena que eu
não derramo meu sangue para conseguir?
Rio.
— Palhaço! Vou voltar, porque eu não confio no Luigi sozinho com a
Lorena.
— Eu vou atrás das informações. Qualquer coisa me liga.
Entro no carro para voltar ao Dark Nigth. Tenho tentado achar uma
solução para provar de vez à Lorena que estou sendo fiel a minha promessa.
Além de derrubar o tráfico, quero fazer mais. Então me veio na mente as
investigações sobre o advogado, onde descobri que sua irmã e a atual
namorada trabalham na fundação Amélia Goulart. Irei fazer uma proposta
generosa aos responsáveis para ampliarem a instituição e criar uma nova ala
psicológica para tratar as mulheres que sofreram algum tipo de abuso. Já sei
que trabalham com crianças vítimas de violência sexual e me interessei muito
pelo trabalho deles. Vamos juntar o útil ao agradável.
Peço que o motorista mude nossa rota e pare em frente da instituição,
para que eu desça.
— Bom dia! Em que posso ajudar? — a secretaria pequena sorri.
— Bom dia! Preciso falar com a coordenadora Rebeca Evans. Ela está?
— O senhor tem hora marcada?
— Não. Mas tenho certeza que irá me receber. O que eu tenho para falar
com ela, será de seu total interesse. — Dou meu melhor sorriso sedutor para
convencê-la.
— Claro! A quem devo anunciar?
— Vincent Lourenço.
Ela sai por alguns instantes e volta logo em seguida avisando que a
mulher já me aguarda.
— Obrigada, querida! — Beijo sua mão em agradecimento, a deixando
vermelha.
— Olá! Quando minha secretária me avisou sobre você, tentei puxar na
memória se já nos conhecíamos e não me lembrei. Você não é nenhum dos
meus ex-peguetes não, né?
Levanto uma sobrancelha para a pergunta.
— Não. Nunca nos vimos antes.
— Claro que não! Eu me lembraria de um espécime feito você. — Pisca
sorrindo.
Impossível não sorrir. Uma mulher simpática e muito bonita com seus
cabelos vermelhos e olhos verdes. Se encontrasse ela em qualquer outro
lugar, eu iria jurar que era alguma das modelos da Victória Secret.
— Então, Rebeca, confesso que meu aparecimento não é apenas
curiosidade de conhecê-la, mas sim vontade de firmamos uma parceria pelo
bem da instituição.
— Estou gostando. Pode me dizer que tipo de parceria seria essa?
— Eu tenho interesse em ajudar aqui, e se você aceitar, doaria uma boa
quantia para a construção de mais salas de atendimentos, desde que abrisse
espaço para atender também as mulheres vítimas de violência.
— Meu Deus! Você é algum tipo de anjo que caiu do céu?
Sorrio do seu entusiasmo.
— Eu sou mais do tipo caído, Rebeca. Eduardo que o diga.
— É amigo daquele traste?
— Amigo é uma palavra muito forte. Ele é meu advogado.
— Ele te conhece e não me apresentou? Que cara de pau! Me
escondendo o pote ouro.
Gargalho da sua revolta. O cara conheceu a sua versão mulher.
Interessante! Quase que sinto dó dele.
— E aí? Aceita minha proposta ou não?
— Meu querido! Por mais que eu esteja eufórica com isso, não sou
inocente e muito menos tonta. Você é um cara charmoso e tudo mais, porém,
nada vem de graça nessa vida, e com toda certeza uma proposta desse naipe
tem algum objetivo por trás. A questão é: qual seria?
Esperta! Gostei dela.
— Gosto de pessoas como você, Rebeca, que saca as coisas no ar e vai
direto ao ponto. Como eu disse, quero ajudar e estou sendo muito sincero
nessa proposta. A minha única exigência é que uma pessoa muito especial
para mim fique como uma das responsáveis e que o projeto criado para
atender essas vítimas, leve seu nome.
— Uau! Isso que é romantismo! Deveria ensinar àquele cavalo. Por mim
tudo bem. Irei fazer uma reunião com os filhos da fundadora e passar sua
proposta para eles. Hoje ainda eu entro em contato com você e te dou a
resposta.
— Ficarei muito grato por isso. Pense com carinho!
— Eles irão gostar e com toda certeza a resposta será um grande e
sonoro sim. Era o desejo de sua mãe Amélia, que Deus a tenha. Mesmo
depois de sua morte, eles continuaram levando adiante seus sonhos.
— Ótimo! Será muito bom contribuir. Ficarei aguardando sua resposta.
Foi um prazer conhecê-la.
— O prazer foi meu, Vincent.
Me despeço e saio feliz em poder não só ajudar essas pessoas a se
recuperarem, como de quebra me redimir ao menos um pouco e provar
novamente à Lorena minha promessa de que nunca compactuei com esses
tipos de atrocidades.
Sento na cadeira e escuto atentamente cada palavra que o advogado de
meia tigela me passa. Aparentemente estou calmo por fora, mas por dentro
estou com uma imensa vontade de acabar com todos a minha volta. Merda de
sangue ruim que minha família tem! Estão sempre passando a perna uns nos
outros e tentando me derrubar da minha cadeira.
Vincent não precisava armar contra mim, pois é meu sucessor por
direito e eu o preparei para pegar meu lugar. Era só ter um pouco mais de
paciência. — Suspiro. — Mas a quem eu estou querendo enganar? Ele puxou
totalmente ao pai. Se fosse igual a sua mãe, não teria ambição, seria bondoso
e se contentaria com muito pouco. Pensar em minha doce Ariella me traz
boas lembranças. Eu deveria tê-la reivindicado quando pude e não ter
deixado meu irmão tomá-la de mim. Eu fui seu primeiro e ela era minha por
direito, mas aquele imbecil tinha que passar na frente e me tomar mais uma
coisa que me pertencia. Uma pena ter morrido tão rápido, porque eu teria
gostado de ficar dias o torturando, como planejei várias vezes. Ao menos
duas das minhas coisas, eu consegui de volta: minha cadeira e meu filho.
Meu ponto fraco!
Mantive o segredo por sua segurança, mas acho que está na hora dele
entender que tudo que viveu e esteve a sua volta, foi uma mentira criada. Eu
vou trazê-lo para o meu lado, mas antes eu vou ensiná-lo quem manda e ele
irá me agradecer depois que entender que cada uma das coisas que eu fiz, foi
para seu bem, para deixá-lo mais forte e não ser um fraco como eu já fui um
dia.
— Senhor Luigi? Está me escutando? — Volto minha atenção para
Oliver.
— Estou. Descubra quando será essa reunião, me fale o que foi
combinado e quem participou dela. Quero nomes, endereços e quais seus
pontos fracos. Preciso dessas informações para ontem, Oliver.
— Isso é fácil de conseguir. Mas irá realmente me dar o cargo de
consigliere?
— Sim. Você é de família italiana e meu atual não me serve mais,
porque ele se bandeou para o outro lado e eu não confio mais nele.
Ele sorri feliz achando que acabou de ganhar um enorme prêmio no
poker. Coitado! A máfia não é para qualquer um. Muitos quiseram entrar por
conta própria, mas nenhum conseguiu sair.
— Eu serei eternamente grato, meu senhor. Cresci ouvindo sobre você e
não entendo o porquê meu pai os abandonou.
— Seu pai era amigo do meu irmão. Era de se esperar se afastar. Mas
devo te dizer que esse não será qualquer cargo, meu rapaz. Terá que fazer o
juramento, e com uma falha sua, não precisará se explicar para mim, e sim
diretamente ao diabo.
Ele engole em seco.
— Farei o meu melhor. Posso lhe garantir isso.
— Assim espero! Mais alguma coisa que devo saber? — pergunto já
impaciente, querendo sair.
— Não. Isso era tudo o que precisava saber.
— Ótimo!
Saio do restaurante com a cabeça fervilhando planos para dar uma bela
lição ao meu querido e amado Vincent. Logo chego na boate e encontro
Antonella na porta sendo barrada por soldados.
— O que está acontecendo aqui?
— Eles não querem me deixar entrar, e preciso falar com você.
— Vamos dar uma volta. — digo entrando novamente no carro, logo
atrás dela.
— Eu quero meu posto de volta, Luigi. Você prometeu que se eu
mantivesse seu segredo guardado, me deixaria ter controle sobre as boates.
Eu perdi tudo, não vê? Seu sobrinho me tirou meu serviço, e ainda por cima,
matou nosso filho.
— Seu filho! Eu não tenho filhos com prostitutas. Para mim, ele era só
um soldado. E se dê por satisfeita que eu não tenha matado ele anos atrás
quando me enganou.
— Como pode ser tão frio assim? Ele deu duro, provando ser merecedor
de estar ao seu lado, e pagou por isso.
— Morreu por culpa dele mesmo. Eu mandei que vigiasse os passos do
meu sobrinho e não que fosse procurar encrenca com as próprias mãos.
— A fruta podre não cai longe do pé! Ele era todo você. Uma pena que
não o valorizou quando pôde. Eu quero vingança, ou irei pessoalmente ao
Andrei Volkov contar como foi que a querida irmã dele, sequestrada anos
atrás, morreu. Ele vai adorar saber que tem um sobrinho bastardo perdido por
aqui.
Agarro seu pescoço tendo o prazer de sufocá-la.
— Ousa me ameaçar depois de tudo que fiz por você?
— Lu... Luigi! Por favor! — Tenta falar engasgada.
— Você tem que entender seu lugar, sua cafetina! Eu tirei você de uma
vida miserável, deixei que ficasse com as suas crianças, te dei casa e um
cargo de destaque, como outro não faria, e é assim que me paga?
— Desculpe! Eu falei sem pensar.
A solto, me recompondo.
— Ninguém tocará no Vincent! Ou eu pessoalmente acabarei com você
e com todos que tiver alguma ligação.
— Seu precioso está te traindo e tudo que você ainda faz é defendê-lo?
Parece que gosta de ser torturado pelas lembranças dela.
— Cale a boca! Não fale de Ariella com essa sua boca imunda!
— Por quê? Eu amei você, fiquei ao seu lado, te dei um filho homem e
tudo que você queria era correr atrás do que não podia ter. Foi por sua culpa...
Rodo a mão na cara dela.
— Nunca mais lembre aquele dia, ou também será a última vez que me
lembrará como foi que eu a perdi.
Ela me fuzila com raiva e eu bato na divisória para pedir que o motorista
volte.
— Peça para que o Thadeo se prepare. Eu entrarei em contato com ele
em breve para um serviço.
— Ele vai acabar morrendo também.
— Ótimo! Assim me livro de mais um problema.
Saio deixando ela no carro e subo para meu apartamento provisório.
Inferno! Odeio quando ficam me lembrando dos meus erros. Eu não sabia
que ela iria estar com ele. Não foi intencional. Era para ter terminado de uma
forma diferente. Eu a amava, porra! Ela foi a única mulher que eu me permiti
baixar a guarda e demostrar sentimentos. Eu fiz de tudo por nós! E para quê?
Para me trair, me enganar e fazer como todos os outros sempre fizeram?
Escolher Matteo em meu lugar. Maldito! Que onde estiver, esteja pagando
dolorosamente por ser um traidor covarde.
Hoje será a bendita reunião com os interessados no meu caso e espero
que dê tudo certo com eles. Luigi está aprontando algo e eu preciso estar a
sua frente dessa vez. Marco está feito um doido trabalhando dobrado à
procura de quem é o traidor entre nós, porém, até o momento, a pessoa se
manteve na sombra. A única coisa boa é que Gabriel já me avisou que o Juiz
Schimitz se interessou e pegou o processo. Agora é só torcer para que
aceitem a proposta e deem seguimento, sem mais demora.
Encontro Eduardo já me aguardando e vou ao seu encontro.
— Tudo pronto? — pergunto.
— Sim. Preciso dar uma palavra com você antes de entrarmos.
— Pode falar.
— Preciso que você me deixe levar o caso. Naquela sala estarão pessoas
influentes que podem aceitar a proposta ou não. Eu conheço esse juiz e sei
que qualquer palavra errada e tudo irá por água abaixo. Fale somente quando
for solicitado.
— Tranquilo. Mas tenho que te dizer que estamos sendo vigiados. Meu
tio anda me cercando e desconfio que alguém tenha passado algumas
informações para ele.
— E só agora me diz isso, porra?! Tem chance de ele aparecer aqui e pôr
tudo a perder? É sua única chance, Vincent. Um passo em falso e você estará
tão encrencado quanto seu tio.
— Luigi não será burro de atacar em um tribunal em plena luz do dia
cercado de câmeras e policias. Ele não é tão idiota assim. E tenho homens de
confiança lá fora para barrarem qualquer imprevisto.
— Desconfia de alguém? Eu tomei todos os cuidados necessários para
não deixar escapar informações. — diz chateado.
— Não sei ainda, mas já coloquei gente para averiguar e descobrir quem
é o traíra.
— Vamos entrar. Está na hora.
Entramos na sala e todas as pessoas necessárias já estão presentes,
inclusive Gabriel e o futuro senador que tem interesse político e pessoal em
derrubar nossa organização. Todos nos cumprimentamos e sentamos nos
nossos devidos lugares.
O primeiro a iniciar é o juiz Schmitz. Ele fala que estavam conversando
antes de nós chegarmos, sobre a proposta, e que tudo o que entreguei é o
suficiente para levar Luigi ao julgamento. O chefe do FBI começa com a sua
baboseira dizendo que eu pedi um preço muito alto e que as provas entregues
por mim incriminam diretamente ao meu tio, mas nada prova que ele faça
parte da máfia. Sério? Eles achavam que eu era algum idiota e estavam
esperando que eu fosse entregar a nossa organização? Bando de
sanguessugas! Anos tirando vantagens de nós e ainda querem pagar de
santos.
— Com todo o respeito, senhor, meu cliente está disposto a colaborar
com o que for preciso, e até mesmo dar seu depoimento. Não acho que seja
um preço tão alto assim. Vocês estão no caso há anos e nunca conseguiram
pegá-lo. Tudo que meu cliente entregou até agora, não só vai ajudar a prender
o chefe, como também várias pessoas envolvidas diretamente. Vocês irão
derrubar uma grande rede de tráfico com vários outros criminosos que
possivelmente nem na lista de vocês estão.
Boa, Eduardo! Agora entendi o porquê ele é considerado o melhor.
— O que você não entendeu é que podemos conseguir e ter todo o caso
arquivado meses depois. Luigi tem bons contatos e não é a primeira vez que
estamos tentando essa jogada. Anos atrás tivemos provas nas mãos e
testemunhas para montar o processo, mas na semana do julgamento o caso
dele foi arquivado a pedido do desembargador da justiça na época.
Não aguento mais me segurar e tomo a frente.
— Como assim? Estão querendo dizer que podem ter as provas e ainda
assim não valerem de nada?
Se não conseguem nos prender e nem provar nada, por que caralho nos
perseguem?
— Sim, é isso que estou dizendo. Tudo depende de quem for comandar
esse caso. Por isso solicitamos o juiz Schmitz para essa reunião informal.
Estamos escolhendo a dedos quem irá entrar nesse processo, para tentar
diminuir as chances de ele escapar de novo.
— Porra! — Respiro fundo para não chamá-los de incompetentes.
O babaca do senador começa a dizer o quanto é honroso o que estou
tentando fazer, apesar de não acreditar que eu esteja colaborando apenas por
ser uma boa pessoa, e sim por interesse próprio. É claro que tenho interesses.
Eles acharam que eu estaria aqui, me sujeitando a participar dessa palhaçada,
se eu tivesse outras opções?
— Tenho interesse pessoal sim. Meus pais foram mortos a mando dessas
pessoas e minha mulher foi uma das milhares de crianças que são tiradas do
seu lar e jogadas nesse mundo. Posso ter nascido na máfia, mas não concordo
com muitas coisas que existem por lá.
Todos ficaram surpresos com essa informação, inclusive Eduardo, que
não sabia disso. Tenho que ser convincente o suficiente e vale de tudo se for
para acabar de vez com isso.
— O que nos garante que não irá remontar tudo depois que tirarmos o
seu tio do caminho? — pergunta Gabriel.
— Não vou. Pretendo mudar muita coisa depois que Luigi sair do
comando.
— Vocês não têm suas próprias regras dentro desse mundo? O que te faz
tentar pelo lado certo da lei e não resolver com as próprias mãos?
Piada! Se eu pudesse, já teria matado aquele filho da puta. O problema é
que ele é muito esperto.
— Eu seria morto por eles após ser considerado um traidor. Não quero
meu nome envolvido exatamente por isso. Acreditem em mim quando digo
que quero tentar pelo lado certo para não me sujar com a família, ou todo o
meu trabalho será jogado fora.
— Entendo. Então estamos todos de acordo em dar imunidade a ele se
der tudo certo? — diz o juiz Schmitz.
— Sim. Se ele cumprir com a promessa e fizer sua parte, estamos
dispostos a limpar seu nome. — diz o chefe do FBI.
— Mas que fique bem claro que depois disso, estaremos de olho em
você. E qualquer deslize seu, não terá mais clemência. — finaliza o juiz.
— Entraremos em contato em breve para que você nos entregue ele.
Espero não me arrepender. — Gabriel diz me encarando.
Me despeço e saio de lá confiante de que agora vai ser do jeito que eu
quero. Meu celular apita assim que entro no carro e vejo a mensagem de Nino
avisando que Luigi está em meu escritório me aguardando. O que me deixa
puto não é ele invadir meu local e sim a parte que diz que a Lorena está com
ele.
— Marco, acelera esse carro! Luigi está com Lorena!
— Foda-se! Mantenha a calma. Seja o que for, somente revide se for
extremamente necessário.
Não respondo, pois meus nervos estão a flor da pele e sou capaz de
matá-lo se estiver tocado em um fio de cabelo dela.
— Vincent! — Marco me chama de volta.
Estou me perdendo com o monstro em meu interior querendo se
assumir.
— Olha para mim! Se controle! Não podemos colocar tudo a perder.
Seja o que for que você veja lá, lembre-se da nossa promessa. Entendeu?
— Okay! — Aos poucos enxergo seu rosto de novo.
— Eu estarei a poucos passos de você. Estarei lá dentro em poucos
segundos.
— Tudo bem!
Controlo minha respiração e estou fora do carro antes mesmo dele parar
direito. A primeira coisa que vejo é Antonella na porta com um sorriso
sarcástico no rosto. Só essa que me faltava!
— A reunião vai ser para lá de interessante. — diz indo na minha frente.
A ignoro e entro no escritório. O que eu vejo me deixa pronto para fazer
uma carnificina com todos aqui. Luigi tem Lorena ajoelhada o chupando e
todas as armas dos seus homens estão apontadas para ela. Respiro e tento
manter a calma, mas tudo que enxergo é vermelho... O vermelho do sangue
desse filho da puta que eu irei derramar quando chegar a hora. Vou esfolá-lo
vivo, sem nenhuma piedade. Não olho para Lorena, pois não tenho coragem.
Meu coração está saindo pela boca, por minha mulher ter que passar por isso.
Meus olhos estão nele, gravando cada expressão do seu rosto, para quando
for a minha vez de tê-lo nas mãos, devolver o favor.
Luigi geme alto quando chega ao seu ápice, deixando claro seu recado.
Seu pau vai ser a primeira coisa a ser tirada do seu corpo. Nunca mais irá
sonhar em tocar qualquer mulher quando eu acabar com ele.
Lorena se levanta e sai de cabeça baixa. Eu quero correr atrás dela, pedir
que me perdoe e dizer que isso é minha culpa, mas não posso mostrar meus
sentimentos por ela. Estou por um fio de fazer uma besteira e não posso
mostrar fraqueza em sua presença.
— Mandou me chamar? — cada palavra sai raspando da minha garganta
como se fossem cacos de vidro.
Ele fecha a calça, senta na minha cadeira e calmamente acende um dos
meus charutos, me desafiando a fazer algo. Não hoje, querido tio! Seu
momento irá chegar e vai ser bem mais demorado do que seus míseros
cinquenta segundos de ereção.
— Mandei, mas já está dispensado.
Saio de lá antes que eu perca o meu controle. Encontro Marco na porta e
ele me diz que descobriu ser Thadeo o traidor. Coincidência, não? Eu deveria
saber. Uma mãe gananciosa e pedófila e um irmão no mesmo caminho, não
deveria ser surpresa o outro ser um traidor. Mas hoje eles sairão da minha
lista de preocupação. Chegou a vez de Antonella pagar por tudo o que me fez
e ir encontrar seus amados filhos do outro lado de suas vidas medíocres para
uma reunião em família.
Somente muito mais tarde é que volto para os braços da minha amada,
para mimá-la como merece. Se antes eu tinha alguma dúvida do porquê lutar
por ela, hoje todas foram tiradas. Eu vou lutar com qualquer um que ousar
tentar tirá-la de mim e isso incluirá Luigi, que está no topo da minha lista de
inimigos, e não é de hoje.
Ele está ansioso. Eu o conheço tempo o suficiente para saber que nada
de bom virá disso. Sinto medo por mim e pelo pequeno aqui dentro. Fiz o
teste de farmácia assim que Vincent saiu, e como suspeitava, deu positivo.
Agora estou aqui no chão amarrada feito um animal pronto para ser abatido.
A incerteza de que sairei com vida me tem tremendo.
— Doce Lorena! Achou mesmo que ia conquistar meu sobrinho, o jogar
contra mim, e eu não iria fazer nada? Você é bem mais ardilosa do que
pensei.
— Não fiz nada, senhor.
Ele gargalha alto.
— É claro que não. Ashley e Antonella fizeram um ótimo trabalho.
Levanto a cabeça sem entender.
— Ashley?
— Sim! Eu mandei que colocasse nessa sua cabecinha a ideia de
conquistar o Vincent.
— Mas... Ela sempre me disse sobre abrir o cofre, pois nossos
passaportes estavam lá.
— Qual? Esses? — Ele joga um monte de passaportes dentro da lata de
lixo, despeja um pouco de bebida e taca fogo.
— Vocês não têm documentações nenhuma, lembra? Esses aqui foram
feitos para emergência e no intuito de tirar os polícias da minha cola acaso
dessem batida nas minhas boates. Vocês não existem! São indigentes!
Lágrimas descem pelo meu rosto.
Ashley entra com Antonella e fica encostada na parede, de cabeça baixa.
Eu nunca senti tanta vontade de matar alguém como estou sentido nesse
momento.
— Eu achei que você era minha amiga, mas o tempo todo estava me
usando. Ele já ia te liberar. Não precisava disso.
— Sim! Mas eu iria para onde? Sem dinheiro, sem casa, sem nada. Eu
teria que sair com uma mão na frente e outra atrás. Isso não é justo, Lorena!
— Eu teria te ajudado! — Lágrimas escorrem pelo meu rosto. Raiva e
decepção são as maiores causadores delas.
— Não me julgue por algo que você mesmo faria se estivesse no meu
lugar.
— Seus serviços não são mais necessários aqui! Como eu sou um
homem de palavra e prometi que te daria a liberdade, vou cumprir.
Ele dá sinal para Antonella, que entrega para Ashley uma bolsa pequena.
Ela pega e me olha uma última vez, sussurrando um “desculpe”. Eu a fuzilo
com ódio e ela sai. Nesse instante o telefone do Luigi toca e ele o atende
rapidamente.
— Alô? Pode falar. Interessante. Dê seguimento à segunda fase então.
Segunda fase do quê?
— Não tem problema. Deixe acharem que não sabemos de nada. Sim,
sim! Tenha paciência, que logo nos vingaremos de todos eles.
Ele desliga e fica me observando. As lembranças da primeira vez em
que vim parar em suas mãos me vêm a mente.
— Fique de joelhos! — ordena.
— Sim, senhor. — digo trêmula.
Abre o zíper da calça e tira seu pau para fora. Assim que a cafetina avisa
que Vincent chegou, ele pede com seu sorriso sádico para que o deixe entrar.
— Abra a boca, querida, e faça o seu melhor trabalho, ou eu irei atirar
na cabeça dele assim que passar pela porta. Você escolhe!
— Não! Por favor! Eu faço qualquer coisa. — Encho meus olhos de
lágrimas.
E como da primeira vez, seu pau incha perante a visão de meu
desespero. Leva seu membro até meus lábios e o desliza para dentro. Vincent
entra e seus homens destravam as armas. Não preciso olhar para saber que
elas estão apontadas para mim e prontas para serem disparadas caso seja
necessário.
Luigi mete seu pau na minha boca até explodir em jatos fortes na minha
garganta. A ânsia sobe e eu me seguro para não desmoronar na frente dele e
tornar a situação ainda mais humilhante.
— Muito bem, querida, pode ir.
Saio sem coragem de olhar para ninguém, me sentido suja e sem valor
nenhum.
*****

Jogo fora tudo que estava em meu estômago, por nojo, e choro ao menos
uma hora seguida. Depois de ter pena de mim mesma, levanto e escovo meus
dentes até quase vê-los sangrar. Deito no sofá com os olhos fixos na janela de
vidro, sem vontade nenhuma de sair do lugar ou sequer levantar para ir fazer
algo para comer. Não sei o que aconteceu para fazer Luigi agir daquele jeito,
mas com toda certeza foi algo que Vincent fez e que o deixou muito irritado.
“Abra a boca, querida, e faça o seu melhor trabalho, ou eu irei atirar na
cabeça dele assim que passar pela porta. Você escolhe!”
Isso teve um peso enorme sobre mim, pois me lembrou exatamente o
que sou aqui e me trouxe na mente a conversa que tive com a Ashley.
“Podem tirar as prostitutas dos bordéis, mas nunca das mulheres.”
Lembrar de sua traição ainda me dói, mas ela está certa, pois no lugar
dela, eu também teria feito qualquer coisa para sair daqui. Quem eu queria
enganar? Até pouco tempo atrás, era eu procurado uma fuga. Eu sabia que
Vincent estava presente e eu senti o exato momento que ele entrou naquela
sala. Meu corpo queimou diante da sua presença, mas não ousei virar para vê-
lo, com vergonha. Humilhação me definia ao ser submetida a passar por tudo
aquilo de novo.
— Senhora! Eu fiz um chá para você tomar. — Nino diz me entregando
uma xícara com o líquido fumegante.
— Obrigada! Pare de me chamar de senhora. Não sou senhora de nada.
Nem da minha vida eu sou dona.
— Eu sinto muito! Eu não pude fazer nada, ou ele teria te matado. Eu sei
que não deveria me meter nesse assunto, mas não é culpa do chefe. Ele está
tentando fazer a coisa certa e isso causa muitos inimigos.
— Eu sei, Nino. O pior de tudo é que eu sei. Todas essas guerras e todos
esses atentados é por ele estar se rebelando contra o tráfico.
Ele fica calado. Mesmo que saiba os reais motivos em detalhes, não
pode compartilhar comigo. Minha cabeça parece que tem uma escola de
samba dentro dela e todo o meu corpo dói de exaustão. Termino o chá, volto
a me deitar, fecho meus olhos e cochilo.
Braços fortes me carregam e me sinto ser colocada em um lugar muito
mais macio. Não preciso abrir meus olhos para saber quem é. Não quero
ouvir nada agora, só esquecer as cenas deploráveis que passei mais cedo.
*****

Levanto devagar da cama, ainda muito abalada pelo acontecido. O


cheiro de algo na cozinha faz meu estômago roncar me lembrando o quanto
estou sendo relapsa comigo e com a criança inocente dentro de mim. Vincent
está mexendo algo no fogão, apenas de cueca box. Em outro dia eu estaria
babando em seu belo corpo musculoso, mas agora estou sem saber como me
aproximar. Como se sentido minha presença, ele se vira e tranca seus olhos
aos meus, e nesses poucos segundos nos olhando, tudo foi dito sem precisar
que nenhum de nós falássemos qualquer palavra. Ele desliga o fogo, vem em
minha direção, me puxa para seus braços e me beija, colocando minha cabeça
em cima do seu peito. Eu escuto as batidas fortes e descompassadas do seu
coração tão acelerado quanto o meu.
— Eu sinto muito, mia bela! Sinto muito! Eu não sei nem o que dizer
para me desculpar por você ter ficado no meio do fogo cruzado. — Me aperta
ainda mais forte.
— Não tem que falar nada, Vincent. As coisas são o que são. Eu só fui
mais uma vez lembrada de qual é o meu lugar aqui. Uma vez prostituta,
sempre uma prostituta.
— Não fale assim! Não se diminua desse jeito.
— É a realidade. Você diz que vai me provar que não é como ele e eu
sei que você pode ser diferente, Vincent. Mas e eles lá fora? E toda a família?
Quantas lutas você terá que enfrentar para ficarmos juntos?
— Eu vou dar o meu jeito! Acredite em mim quando digo que ninguém
ficará entre nós.
Rio. Mas meu riso é doloroso e sem vida.
— Para, Vincent! Você está se enganando. Vamos dizer que você
derrube o Luigi. O novo capo e uma prostituta? Sério que você acha que irão
aceitar isso? Com tantas perfeitas bonecas de plástico, nascidas em berços de
ouro, para se casar? Não acha que vai ter uma retaliação das outras famílias
por se sentirem ofendidas?
— EU NÃO LIGO PARA O QUE ELES PENSAM! EU JÁ DISSE
QUE SOMENTE VOCÊ ME IMPORTA! — grita socando a parede, com
raiva.
— MAS EU SIM! EU ME IMPORTO! — Respiro tentando me
acalmar. — Porque você e eu morreríamos tentando. Eu me importo porque
eu te amo e você foi um desgraçado em me fazer me apaixonar por você
sabendo que não nascemos para ficar juntos.
— Lorena! — Em dois passos me deixa encostada na parede e me beija
com urgência. — Você é minha, meu amor! Eu não vou desistir de continuar
lutando pela minha causa e nem por você. Eu não me importo se eu tiver que
pagar com a vida, porque nada fará sentido se eu não tiver você comigo.
Choro mais forte.
— Ah, Vincent! Você é tão teimoso! O que eu faço com você, hein?
— Minha mãe falava a mesma coisa. Persistência é meu segundo nome.
— Eu vejo! — sorrio em meio as lágrimas.
— Agora diz de novo!
— Dizer o quê?
— Diz que me ama!
Inclino a cabeça reparando que nesse momento eu o vejo diferente de
todas as outras vezes. Nesse momento ele parece um menino perdido,
esperando por qualquer farelo de carinho. Apenas o Vincent homem, sem
máscaras, sem armadura e sem cargos pesando nas costas.
— Eu te amo! Eu não deveria entregar meu coração a você, mas acho
que fui sua desde a primeira vez que o vi.
Seus olhos brilham com a minha confissão.
— Também te amo, coelhinha!
Ele volta a me beijar mais forte dessa vez e tudo vira uma confusão de
roupas pelo chão e toques desesperados. Quando ele entra em mim e nossos
corpos de fundem, eu sei que não serei de mais ninguém e que se por acaso
nos separarmos em um futuro próximo, eu nunca mais serei a mesma mulher,
porque com todo o meu corpo, alma e coração, eu pertenço somente a ele.
Algumas semanas depois

Depois de participar na semana passada da última reunião para


trocarmos informações com o chefe do FBI e saber que poderíamos a
qualquer momento finalizar esse pesadelo, um peso saiu dos meus ombros.
Parece que finalmente a sorte voltou a sorrir para mim. Após semanas
exaustivas à procura de qualquer deslize de Luigi, encontramos onde ele
estava escondendo as garotas e conseguimos dessa vez invadir o local a
tempo. Não vai trazer as outras que morreram de volta, mas ao menos essas
tiveram um final feliz. Além disso, minha proposta foi aceita pela fundação
— não que eu tivesse dúvidas de que isso iria acontecer — e desde então
começaram as construções da nova ala. Tenho certeza de que minha
coelhinha vai gostar muito. Eu vou aproveitar o dia da entrega para pedi-la
em casamento e será a minha última prova para convencê-la a ficar. Até
mesmo já andei olhando algumas casas para comprar.
— Devemos nos preparar para o pior, Vincent. Seu tio vai vir com força
total.
— Eu sei. Minha maior preocupação é a Lorena. Não quero que nada
aconteça com ela novamente.
— Vamos dobrar toda a segurança do lugar e tomar mais cuidado a
partir de hoje.
— Confio em você! — digo pensativo.
— Eu sei que eu disse que não iria me meter mais, porém, não seria
melhor liberar ela?
Viro meu rosto instantaneamente para ele.
— Você está louco?! Eu não vou abrir mão dela, porra!
— Todos os nossos inimigos sabem dela e virão direto para ela com o
intuito de te ferir.
— Você acha que eu não sei? Que minha cabeça não está explodindo
com todos os cenários possíveis dos quais irei receber uma ligação dizendo
que a levaram de mim?
— Somente dei uma sugestão. — Dá de ombros como se não tivesse
acabado de me deixar mais chateado.
No fundo eu sei que ele tem razão. Todos que quiserem me atingir,
saberão exatamente onde e quem pegar.

*****

Estou há horas sentado aqui no meu escritório pensando sobre o que


Marco falou e não consigo chegar a um consenso comigo mesmo sobre o
assunto. Nino bate na porta me avisando que Henrique está aqui e me levanto
curioso por sua visita inesperada.
— Cavallaro? Não estava te esperando.
— Gostaria de dizer que a minha visita é de rotina, mas o que tenho a
dizer é muito sério, Vincent. Precisamos conversar.
— Claro! Posso te oferecer uma bebida?
— Vodca! Se tiver.
Sirvo duas doses para cada um e entrego a dele.
— Imagino que seja muito sério, para te tirar de Milão. O casamento vai
bem?
— Sim! — Suspira. — Mas não é sobre isso que quero falar.
— Tudo bem! — Me arrumo na cadeira e espero ele continuar.
— Anos atrás, seu pai me procurou pedindo ajuda porque desconfiava
que Luigi estava envolvido com as mortes e o desaparecimento de algumas
meninas na Itália. Daí surgiu a desconfiança de que ele estivesse mexendo
com o tráfico humano. Eu tinha saído há pouco tempo do exército e com a
ajuda do seu pai, fui iniciado na época para ter acesso a família e o ajudar.
Nos conhecíamos desde a adolescência e não foi difícil ele me convencer.
Mas as coisas saíram do nosso controle muito rápido. Seu pai passou a
receber várias ameaças, tanto de fora como de dentro da máfia, e não
conseguíamos encontrar o autor. Foram vários traidores. E quanto mais
acabávamos com eles, mais apareciam.
Me vem na mente o que estou passando agora. Ataques e traidores de
dentro e de fora da família.
— Meus pais foram mortos por isso? Por tentar acabar com o tráfico,
como eu?
— Sim, Vincent. Quando estávamos chegando perto da verdade, eles
sofreram o atentado. E bom... Você sabe o resto da história. Mas o que ficou
muito bem escondido, foi o nome do mandante, e eu levei todos esses anos
arrumando aliados para me ajudarem a provar a verdade, e enfim, agora eu
sei quem foi.
Me levanto nervoso querendo que ele acabe com esse suspense. Anos
procurando o verdadeiro culpado e agora finalmente saberei quem é.
— Fale! Quem foi o desgraçado?
— Seu tio! Luigi orquestrou tudo, detalhe por detalhe. Ele é o
responsável por trás das mortes dos seus pais e de vários outros membros da
família que ajudavam seu pai na época.
— Sério mesmo? — Não acredito nisso! Como deixei isso passar?!
— Eu já desconfiava dele há anos. Achei um vídeo no escritório, da
época do seu pai. Nele há uma discussão entre eles e logo depois que Matteo
sai, Luigi recebe a visita de nada mais, nada menos, que Alejandro Montez.
De novo esse desgraçado?! Me lembro de Gabriel dizendo que o nome
dos dois estavam sempre ligados. Claro! Eles fizeram um acordo. Filho da
puta! Eu vou esquartejar Luigi quando o tiver em minhas mãos. São poucas
as coisas que me deixaram sem palavras nesses meus trinta anos, mas essa
está no topo da minha lista. Me lembro do sonho onde mamãe falava sobre
preço alto e ganância, e que tudo iria me fazer mal quando a verdade viesse à
tona. Tudo se encaixa agora. Estava o tempo inteiro na minha frente e eu não
vi.
— Por quê? Papai era seu sangue, seu único irmão. — Como se isso
valesse algo nessa família. Minha consciência ri de mim.
— Isso só ele poderá nos dizer.
Como se sentido minha ansiedade e frustação, o agente Gabriel me liga
no exato momento.
— Diga que você tem boas notícias para mim. — falo nervoso.
— Será hoje! Luigi está novamente na cidade e estamos com tudo
pronto para pegá-lo dessa vez. Vou te passar as coordenadas. — Assim ele
faz logo após encerrar a chamada.
Reconheço o local imediatamente quando me passa, pois é um dos meus
armazéns. Eles não sabem disso, porque como a boate, esse é um dos meus
outros investimentos pessoais e não está ligado à organização. Eu conheço
esse lugar como a palma da minha mão.
— Marco?
— Ele saiu, senhor. — É Nino que responde.
— Para onde ele foi?
— Não sei dizer. Saiu com a senhora Lorena há uns quarenta minutos.
— Prepare os homens para a nossa saída! — Adrenalina em alta. — Nós
vamos à caça!
— Sim, senhor!
Tento falar com Marco e só dá fora de área. Meu celular torna a tocar e
eu olho a tela, vendo que recebi uma mensagem. Abro na esperança de ser ele
retornando, mas tudo que vejo é o meu pior pesadelo se concretizando. Um
vídeo de Lorena desacordada, amarrada e jogada ao chão aparece na tela.
Luigi surge sorridente logo que o foco é tirado de cima dela.
“Querido sobrinho, não achou que as coisas se tornariam tão fáceis
assim, não é? Eu sempre estou dois passos a sua frente. Vou ser bonzinho
com você. Peça para todos recuarem! Você vai ligar para o advogado e dizer
que voltou atrás na negociação, ou sua querida amada aqui e a esposa grávida
dele, não verão mais a luz do dia. Você sabe onde me achar.”
O vídeo acaba.
Meu coração acelera e a dor me dilacera, como se vários canivetes me
cortassem de dentro para fora. O que tanto temi, aconteceu. Lorena está de
novo em suas mãos e novamente falhei com ela e meu amigo Marco, que a
essa hora pode até mesmo estar morto.
Quebro tudo que vejo pela frente. Garrafas de bebidas se espatifam na
parede, fazendo os cacos de vidro voarem para todos os lados. Henrique me
segura pedindo calma, mas eu estou longe. A raiva guardada por todos esses
anos vem à tona e me deixa cego, com sede de vingança.
— Me solta, porra! Eu quero matar esse desgraçado e ninguém vai me
impedir disso!
— Não vai adiantar pirar agora! Se controle, seu merda! Guarde essa
raiva para quando estivermos com ele nas mãos. Você vai ter a sua vingança,
como eu vou ter a minha.
— Eu vou matá-lo! Eu vou acabar com ele! — repito como se eu
estivesse em transe.
— Eu concordo com você e estou totalmente do seu lado nisso. —
Henrique diz atrás de mim.
Saímos rumo ao local e meu pensamento se divide entre Lorena e
Marco. Nem vi como chegamos ou o que falei com Eduardo por telefone.
Minha mente tem um único objetivo nesse momento e tudo isso só terminará
quando aquele imbecil não estiver mais respirando.
Mando uma mensagem avisando a Gabriel sobre nossa chegada. Viemos
por trás do galpão e estamos aguardamos o momento certo de entrar. Poucos
minutos depois escutamos dois disparos. Nos preparamos para invadir,
quando vejo Eduardo seguido de alguns homens correndo na mesma direção.
— Droga! Eu disse para ele ficar fora disso. Isso nos complicará ainda
mais.
— Isso não vai ser bom. — Henrique diz a minha frente. — Vamos nos
separar e entrar. Teremos mais chances de encontrá-los.
— A prioridade é tirar o Marco e a Lorena de lá. Alguns de vocês
cubram as costas daqueles idiotas que entraram.
Não espero pela confirmação. Apenas nos separamos e entramos cada
um por um lado. Encontro Eduardo com sua equipe bancando os espiões e eu
teria rido se não fosse trágico, pois o cara nem consegue segurar direito a
arma nas suas mãos e quer ser o herói. Trocamos poucas palavras e
invadimos a sala onde Luigi está. O tiroteio começa e no meio do fogo
cruzado vejo que o advogado consegue sair com sua mulher. Menos mal!
Não queria que se ferissem e me complicasse. Continuo atirando e consigo
derrubar três dos homens do Luigi, mas em compensação perco quatro dos
meus. Ele coloca a arma na cabeça de Lorena, que parece dopada. Seus olhos
estão desfocados e ela mal se aguenta em pé com Luigi a segurando.
— Se não parar agora, eu irei atirar nela.
Dou um passo para trás e olho ao redor tentado achar Marco. No chão há
vários corpos espelhados, onde dois deles eu nunca vi. Um estrondo no fundo
deixa claro que os federais estão entrando.
— Acabou, Luigi! Desista!
— Nunca! Eu não irei ser preso e já até arrumei um jeito de sair daqui.
Acha mesmo que me entregaria tão fácil assim? Seu moleque ingrato!
— Você matou meus pais! Você deve saber o que acontecerá vindo de
mim, deles lá fora ou até mesmo dos membros da família. De todo jeito, você
será um homem morto.
Seu sorriso vacila.
— Então já ficou sabendo disso? Era para ter sido somente o Matteo.
Como eu ia saber que a Ariella estaria junto?
— Matou seu irmão a troco de quê? Inveja? Ou para cobrir suas
perversões doentias?
— Não! O matei porque ele tomou a minha família de mim. Não bastou
usurpar a minha cadeira e se meter em meus negócios, mas também pegou a
minha mulher grávida do meu filho e me escondeu.
— Do que você está falando?
— Você é meu filho, Vincent! Ele sabia disso e me escondeu esse fato
por anos.
Vacilo com o impacto de suas palavras.
— Mentira! Minha mãe amava meu pai. Ela jamais se prestaria a esse
papel.
— Sua mãe tinha muitas qualidades, mas contar a verdade não era uma
delas. Ela era a minha prometida e me trocou por ele, escondendo a gravidez
de mim. Já que ser capo era um requisito tão importante para ela, eu iria virar
um e tê-la de volta.
— Você é um idiota se pensa dessa forma! Como pode dizer uma coisa
dessa depois de matá-los?
— Somos um monstro! Tal pai, tal filho. Você não é diferente de mim.
Romeo era seu irmão bastardo e você acabou com ele sem pensar duas vezes.
Você é a minha versão mais nova, Vincent. — Novamente um balde de água
gelada em mim. — Agora vamos deixar de conversas desnecessárias, que eu
estou sem tempo. Vou te dar uma chance de provar o quanto você é diferente.
— Não vou provar nada a você. Solte ela!
Dois dos seus homens entram trazendo Marco, que é colocado de
joelhos ao lado de Lorena, todo machucado. E eu vejo todo o cenário sendo
montado a minha frente, me destruindo pedaço por pedaço.
— Escolha, Vincent! Seu único irmão vivo ou sua amada? — Ele dá o
último golpe impiedoso.
Estou sem chão. Entre a cruz e a espada. Eu não posso escolher e todos
vamos acabar morrendo.
— Se não escolher, a dor será dobrada, pois irei matar os dois. Escolha
um e viverá como eu, sentido o peso da culpa, e só assim poderá me
entender. — repete quase a mesma frase de anos atrás, do nosso treinamento.
— Não posso!
— Fraco! Eu não te treinei para ser fraco desse jeito. Talvez precise de
um incentivo. — Atira na perna direita da Lorena, a fazendo gritar. Sua
primeira reação desde que cheguei. Quero ir até ela e tirá-la de suas mãos. Ele
percebe, pois sorri. — O próximo será na cabeça. ESCOLHE! — grita.
Levanto a arma e miro em Marco, como se fosse um déjà vu do dia em
que ele estava amarrado apanhando com o chicote.
— Pode fazer, Vincent. Eu não vou ficar com raiva de você. Não deixe
que ele te puna por minha causa. — Marco diz levantado a cabeça e sorrindo
em meio ao sangue seco dos ferimentos em seu rosto, fazendo uma lágrima
solitária descer dos meus olhos.
Meu irmão! Sempre me protegendo e pronto para levar uma bala por
mim. A mesma frase de anos atrás me bate, e se era possível morrer mais
nesse momento, eu acabo de descobrir. A arma dança entre ele e Lorena. Eu
não posso! Qualquer um dos dois que for morto nesse momento, vai levar um
pedaço de mim.
— Atire, Vincent! — Luigi fala quase cantarolando, sentido prazer em
me ter em suas mãos. — É sua última chance.
Ele coloca a sua arma na cabeça de Lorena enquanto seus homens
miram em Marco. Anestesiado pela dor, eu também levanto a minha arma,
respirando várias vezes para limpar a minha mente. Então eu engatilho, miro
e atiro.
O erro de Luigi foi achar que ainda somos aqueles garotos de quatorze
anos, sem experiência e manipuláveis, e que não crescemos e não nos
tornamos mais ardilosos, sempre com um plano reserva nas mãos. Olho para
Marco, que pisca o olho bom me dando o sinal que preciso. Engatilho, miro e
no último instante viro a arma para Luigi e atiro, acertando o meio do seu
peito ao mesmo tempo que Marco toma a arma de um dos homens ao seu
lado e atira em ambos. Tão rápido que nem mesmo eles esperavam por isso,
mas não rápido o suficiente para ajudar Lorena que recebe outro tiro de uma
das armas dos desgraçados.
A sala de repente se enche com os agentes e o restante dos meus
homens. Henrique corre até Marco, o ajuda a se levantar e eu pego Lorena
nos braços, gritando por ajuda. Paramédicos entram e começam os
procedimentos para socorrê-la. De onde eles saíram, não faço a mínima ideia,
mas nesse momento os detalhes pouco me importam. O tiro pegou em seu
abdômen e eles tentam conter o sangramento para que ela não entre em
choque pela perca de sangue.
Eu estou sem rumo, sem saber o que fazer. Minha mulher está morrendo
e o desgraçado que procurei por anos está há poucos passos de mim, ainda
respirando. Henrique pede que eu o deixe com ele e vá acompanhar Lorena, e
é exatamente isso que faço. Eu a escolho acima da minha vingança. Sempre
será ela em primeiro lugar.
Entro na ambulância e em tempo recorde chegamos ao hospital. Logo na
entrada ela teve uma parada cardíaca da qual me deixou louco e tive que ser
contido pelos seguranças. A médica fala algo e eu não entendo nada, pois
minha mente está vazia, longe dali. O caso dela não poderia ser tratado por
nosso médico em casa, ou ela iria morrer. Como irei explicar sua falta de
documentos eu não sei e nem me importa, desde que ela se salve.
— Senhor? Está em choque e precisa ser avaliado. — a enfermeira diz
levando uma luz aos meus olhos.
— Eu estou bem! Como ela está? Me deixe vê-la! — digo em desespero.
— O senhor precisa se acalmar ou iremos ter que pedir que se retire.
Está assustando os outros pacientes.
Olho para o lado me dando conta das várias pessoas no corredor me
olhando espantadas. Só aí percebo o quanto devo estar parecendo assustador
com a roupa suja de sangue.
— Desculpe! Eu só quero saber notícia dela.
— Eu entendo! Tudo que sei é que ela está na mesa de cirurgia. Quando
terminarem, a médica que a atendeu virá para poder lhe dizer mais notícias.
Esfrego o rosto, com impaciência, e me sinto impotente. Alec chega
acompanhado de Nino e me entrega uma bolsa com meus produtos de higiene
e uma muda de roupa. Não quero sair e perder o momento que alguém vier
com o boletim médico, mas saio à procura de um banheiro com a promessa
de que Nino me chamará acaso alguém resolva aparecer. Tomo meu banho,
me troco em tempo recorde e volto para meu lugar à espera de qualquer
migalha que possa vir.
Duas horas se passaram e ninguém me diz nada. Nunca fui um homem
de igreja e nem entendia a maioria das palavras que o padre falava quando ia
com mamãe, mas nesse exato momento imploro para qualquer ser divino que
existir acima de nós, que não a leve de mim. Prometo até mesmo libertá-la se
tudo ocorrer bem e ela sair dessa.
— Parente da senhora Lorena Lourenço?
Tive que mentir seu sobrenome, ou eles não iriam atendê-la.
— Sou eu! — Me levanto ansioso. — Como ela está?
— Está estável no momento. A cirurgia foi um sucesso e com poucos
dias em observação poderá ir para casa. Porém, eu sinto muito, pois não
conseguimos salvar o bebê.
— Bebê? — pergunto atordoado com a pequena informação.
— Sim! Acredito eu que sabiam, não? Ela estava de oito semanas. Não
se preocupe! Nada causou danos permanentes ao ponto de atrapalhar a
paciente de ter outros filhos futuramente. Logo ela será transferida para o
quarto e o senhor poderá vê-la.
— Obrigado! — É tudo que consigo pronunciar.
Minha mente parou na palavra bebê. Meu filho! Por minha culpa, ele
morreu. Sento de cabeça baixa e ali eu fico inerte. A culpa espezinha meu
peito e me quebra novamente, o que achei que não fosse possível. Agora eu
te entendo, mamma! O preço foi alto demais! Esse eu não estava disposto a
pagar. Meus olhos ardem e eu me seguro para não chorar e mostrar fraqueza
aos meus homens. Eu tenho que ser forte e não me deixar abater. Essa guerra
ainda não terminou.
Sinto alguém se sentar ao meu lado e levanto a cabeça para ver Marco,
como sempre me mostrando seu apoio, e mais a frente está Henrique
encostado na parede, conversando com Nino.
— Como você está? — pergunto tentando tirar o foco da angústia que
me sufoca.
— Bem! Nada que eu já não tenha passado antes. E ela?
— Acabou de sair da sala de cirurgia. Ela... — travo a mandíbula
tentando em vão prender a dor que sinto ao pensar no bebê. — Ela estava
grávida. Eu deixei que ele me tirasse mais uma coisa.
— Sinto muito! — Ele aperta meu ombro em conforto.
— Você estava certo o tempo todo.
— Sobre o quê? — Me observa abatido.
— Eu deveria ter libertado ela e evitado que passasse por isso. Mesmo
que me perdoe, eu nunca vou esquecer disso. Prepare tudo que ela precisar e
peça a Nino que arrume suas coisas. Quando ela sair daqui, quero que a leve
em segurança para o seu país.
— E vai desistir dela depois de tudo que fez para tê-la?
— Não estou desistindo, Marco, eu estou libertando ela. Porque eu a
amo demais para ter sua morte em minhas mãos, e Lorena merece alguém
melhor do que eu.
— Você que sabe! Se é o que quer, irei providenciar tudo.
Encosto a cabeça na parede, sentido um cansaço me abater. Eu perdi
uma parte de mim agora, mas eu tenho que ser, ao menos uma vez na vida,
altruísta. Ela merece uma vida melhor que essa e o melhor que posso fazer
para provar meu amor é deixá-la ir.
A enfermeira avisa que ela foi para o quarto, mas ainda está sob efeito
anestésico. Entro no pequeno cômodo que cheira a desinfetante e álcool e
paraliso ao vê-la pálida e frágil deitada na cama, ligada por vários aparelhos e
com uma intravenosa em sua mão direita. Chego mais perto e toco as pontas
dos seus dedos gelados. Levanto sua mão com cuidado e trago aos meus
lábios. Aqui, entre só eu e ela, com as paredes brancas de testemunha, me
permito chorar feito uma criança. Passei anos me sentindo sozinho e vivendo
uma vida com apenas um objetivo em mente, mas quando encontro uma
chance de recomeçar depois que a tempestade passasse, eu estrago tudo. Não
tinha tudo sob as minhas mãos como achei que tinha e fiz a pessoa que mais
amo pagar caro por isso.
— Oi, mia bella! Eu não sei se você pode me escutar, mas quero te dizer
que... — Respiro fundo. — Você foi a coisa mais preciosa que eu tive. Eu
não sei como será a sua reação quando acordar e souber de tudo e sou muito
covarde para ficar e ver em seus lindos olhos, ódio por mim. Prefiro ficar
com as boas lembranças de você sorrindo e dizendo que me ama. Só peço que
se for possível, um dia possa me perdoar. Ficarei feliz em saber que teve a
chance de superar, mesmo que seja longe de mim. Eu... Eu te liberto! Quero
que saiba que sempre vou te amar. Seja feliz, minha coelhinha! — Beijo seus
lábios com carinho.
Fico um tempo absorvendo cada detalhe de suas delicadas feições pela
última vez e saio deixando com ela a minha melhor versão, parte do meu
coração e todo o amor que um dia me permiti sentir. Peço que Alec me leve
embora, pois não estou em condições de dirigir. Quando chego na boate,
pego a última garrafa de whisky que sobrou intacta, como se estivesse me
esperando, e subo para meu apartamento vazio e tão sem vida — exatamente
como eu estou me sentindo.
Olho para a porta na esperança de vê-lo entrar, mas quem estou
querendo enganar? Ele cumpriu com a sua palavra e eu o admiro por isso. A
única parte dolorosa disso tudo é que no processo acabei me apaixonando por
ele e isso não tem cura. Suas palavras ainda queimam em minha cabeça.
“Eu... Eu te liberto! Quero que saiba que sempre vou te amar. Seja feliz,
minha coelhinha!”
Eu queria gritar com ele, dizer que não o culpava e que não aceitava,
depois de tudo, ele me deixar, mas eu não conseguia. Eu sentia sua dor, sua
raiva e seus medos dentro de mim porque compartilhávamos os mesmos
sentimentos. Mas como ajudar alguém a se curar se nem mesmo você
consegue estancar as suas feridas? Talvez ele esteja certo em acabar com
tudo. Nós dois estávamos fadados ao fracasso desde o início e não iríamos
dar certo. Eu queria liberdade e ele me deu. Ponto final! Enfim eu poderei ver
a minha família depois de anos separados. Espero que eles me aceitem do
jeito que sou hoje e me entendam, sem julgamentos. A minha maior decepção
seria enxergar nojo ou pena nos olhos deles.
Quando a médica me explicou o que aconteceu, eu chorei e me revoltei
pela vida que perdi antes mesmo de ter nascido. Mas nada me preparou
quando Marco entrou pela porta e disse que assim que eu ganhasse alta, iria
para a casa. Senti um misto de ansiedade, felicidade e decepção por Vincent
não ter vindo ao menos se despedir pessoalmente. Eu entendo, pois deve ser
doloroso para ele me ver partir, e o conhecendo bem, deve estar se culpando
por tudo que o aconteceu.
— Tudo pronto para a sua partida. — Marco avisa da porta. — A
vontade de perguntar por ele é imensa, mas me calo.
— Estou indo. — Pego minhas coisas e o acompanho para a saída.
Depois de quase duas semanas de molho, finalmente fui liberada do
hospital. Fomos direto para o aeroporto. Marco e Nino me acompanharam,
ambos na maioria do tempo calados e apenas fazendo seus trabalhos. Quando
questionei sobre a ida dos dois, Marco respondeu que era uma exigência do
chefe, para me deixar segura e entregue à minha família. Depois disso não
questionei mais nada e apenas entrei no avião, me permitindo curtir cada
momento de uma nova etapa na minha vida.

*****

Saio do carro e olho para Marco, que ainda se mantem quieto. Somente
vi ele esboçar uma reação quando ligou para alguém, o que não duvido ter
sido Vincent.
— Diga a ele que sou muito grata por tudo o que fez por mim e pelas
meninas.
Apenas movimenta a cabeça, sério.
— Ele pediu para que eu te entregasse isso. — Me passa um envelope.
— O que tem dentro? — pergunto com medo de abrir.
— Dinheiro para recomeçar e fazer a sua faculdade. — Se é possível, eu
o amei ainda mais nesse momento.
— Diga que eu o agradeço. — Seguro a vontade de chorar. E ele ainda
se achava um monstro.
— Será dito, Lorena. — Nino, sempre mais educado, que me responde.
— Obrigada!
— Se cuide! — Liga o carro dando partida.
— Você também!
Foram nossas palavras finais. Não mandei dizer que o amava, pois ele já
sabia disso e não faria sentido dizer para outra pessoa passar esse tipo de
recado. Agora estou aqui em frente a minha antiga casa, sem saber como e a
quem chamar. No portão vejo Vítor se preparando para sair e eu o grito
eufórica. Ele se vira me analisando por um tempo.
— Vítor? Sou eu! A Lorena! Lembra?
— Olha, moça! Eu não sei quem é você e como me conhece, mas pare
de brincar com coisa séria. Respeite nossa dor e a memória da minha irmã.
— Sou eu, mano! A sua bonequinha. — falo chegando mais perto para
que ele me veja melhor.
— Isso não é possível! Por favor, pare de mentira.
— Me deixe provar que sou eu. Me pergunte qualquer coisa.
Ele cruza os braços me analisando.
— Me diz uma coisa que somente eu e Lorena saberíamos então.
Sorrio porque isso é bem típico do meu irmão.
— Hum! Você me pagava para comprar camisinhas para você porque
tinha vergonha de entrar na farmácia e escondia sua revistas pornôs em cima
da caixa de descarga do banheiro. Você dizia que eu e mamãe éramos
pequenas para alcançar, então lá era o melhor esconderijo.
Ele me olha de queixo caído e se aproxima mais, ainda desconfiado.
— É você mesmo? — pergunta me olhando pálido, como se estivesse
vendo um fantasma.
Imagino que eu seja exatamente isso para eles, depois de tanto tempo
sem dar nenhuma notícia.
— Sim! Você mudou muito. — Sorrio em meio as lágrimas.
Finalmente se dá conta de quem sou, então vem correndo em minha
direção e me puxa para seus braços.
— E você também! Só tenho certeza de que é mesmo você pela cor dos
seus olhos, que são inconfundíveis e que ainda te fazem parecer uma boneca.
Rio do seu jeito molecão, exatamente como eu me lembrava.
— E a mamãe? — A insegurança bate forte por medo da rejeição.
— Ela está lá dentro. Vamos entrar, que você tem muito a nos contar,
mocinha. Nós iremos querer saber de tudo, cada detalhe. Não sabe o quanto
sofremos sem você. — diz atropelando as palavras, me fazendo rir de novo.
— Eu prometo contar tudo que vocês queiram saber, mas me deixe ver a
mamãe primeiro. Estou com muitas saudades!
O carro que até o momento estava parado a uma distância segura com
Marco e Nino dentro, acelera passando por nós e vai embora. O olho com
pesar e com uma certa saudade, mas sei que vou ficar bem. Entramos em
nossa pequena casa e mamãe está de costas na pia com sua longa saia florida
e um turbante da mesma estampa na cabeça.
— Mainha? — pergunto chegando mais perto.
Como em câmera lenta, ela se vira e arregala os olhos deixando os
pratos que enxugava caírem no chão.
— Lorena?! — Arregala os olhos e coloca as mãos na boca, já chorando.
— Oh, minha mãe abençoada! Você a trouxe de volta!
Me abraça apertado, e como Vítor fez, me analisa para ver se sou eu de
verdade. Viramos uma bagunça de lágrimas salgadas.
— Oh, Mainha! Como sonhei com esse abraço. — Beijo seu rosto e
alguns fios brancos dos seus cabelos se desprendem do turbante, marcando
sua idade.
— Eu achei que nunca mais fosse vê-la, minha filha. Eu quase morri a
sua procura e não te achamos em canto nenhum. Me conte o que aconteceu
com você! Temos que ir na delegacia e avisar que te encontramos. Vítor, vá
chamar suas tias! Elas precisam saber!
— Eu sei que tenho muito o que explicar, mas me deixe sentar um
pouco e curtir vocês dois. Mais tarde nós iremos fazer todos os
procedimentos necessários, okay?
Depois de perguntar por todo mundo e saber como foram todos esses
anos que estive fora, contei uma versão resumida do que aconteceu comigo,
deixando de fora a parte sobre o Vincent e os mafiosos. Apenas falei sobre o
meu sequestro e sobre a casa da qual fui submetida a ficar, sendo escravizada,
e como foi meu resgate. De uma forma meio tosca, não quero que ela tenha
raiva dele e o culpe por tudo o que aconteceu comigo. Ficou no passado e eu
só quero seguir em frente a partir de agora, ou ao menos tentar.
A casa vira uma bagunça de gente a minha volta entrando e saindo,
querendo me ver com os próprios. Até Karen veio com seus filhos me visitar
e colocar um pouco do nosso papo em dia, ou melhor dizendo, ela me contou
sobre a sua vida, porque eu fiquei insegura de falar sobre mim.
Não pude deixar de pensar nele em várias das ocasiões em que alguém
falava ou fazia algo que me lembrava ele, mas tentei jogar no fundo da mente
e me convencer de que esse foi o nosso fim e um novo começo para mim.

*****

Cinco meses depois

Estar de volta em casa é muito estranho. Nos primeiros dias eu não saí e
também não quis falar com mais ninguém os detalhes sobre o que aconteceu.
Mamãe e Vítor já sabiam e isso era o mais importante. Depois passei a falar
apenas o necessário e sem entrar em mais detalhes, para os curiosos. Porém,
esse era o foco das conversas dentro da nossa família. Todos perguntavam a
mesma coisa e eu já não tinha mais paciência para responder tantas
especulações. Eu percebia que eles me tratavam diferente, como se eu fosse
quebrar, e alguns com certa desconfiança, como se tudo que eu falava fosse
mentira. Não me passava despercebido suas expressões e olhares de
incredulidade. Isso porque eu nem contei a parte da prostituição.
Não conseguia ser a mesma de antes e eles ficavam esperando por isso.
No nosso primeiro almoço em família eu tentei me enturmar e sair com os
primos para as festas, mas não tinha jeito. Me sentia deslocada. Fomos em
uma boate, e lá, como era de se esperar, me senti a vontade, consegui me
soltar e até me arrisquei a dançar. Foi a primeira vez em dias que me senti
feliz, só que foi uma felicidade momentânea, pois assim que o efeito do
álcool passou, eu voltei a me sentir vazia e solitária. O quão estranho isso
era? Eu queria voltar a ser a Lorena de antes: alegre, risonha e que fugia de
casa para ir às festas às escondidas. Porém, essa parte de mim não existia
mais, e eu achei que iria recuperá-la quando chegasse aqui, e que tudo seria
diferente, mas me enganei. Criei expectativas demais e fiquei decepcionada
comigo mesma quando não foi do jeito que eu imaginei.
Eu não queria ser julgada ou mal compreendida, então na maioria das
vezes ficava sozinha e me isolava para evitar que alguém tocasse nesse
assunto novamente. Uma hora ou outra eu me pegava pensando em Vincent e
espantava com dor no coração as lembranças. A primeira vez que saí sozinha,
achei muito estranho estar em meio a tanta gente. Ficava olhando por cima
dos ombros com a sensação de que tinha alguém me vigiando e temia ser
sequestrada de novo. Eu não conseguia ser totalmente normal e parecia
paranoica.
Tanto que lutei para ser livre e tudo parecia sem sentido agora, já que
ainda assim uma parte minha estava presa em Los Angeles com ele. A
maldade maior que ele me fez foi fazer eu me apaixonar, somente para me
empurrar depois que eu já tinha caído de amores. Sua atitude por mais
altruísta que fosse, ainda assim, foi insensível em ter simplesmente se
afastado. Sinto sua falta, do seu corpo, de suas palavras de carinhos e dos
seus toques. Ainda doem todas as vezes em que me pego lembrando dos
nossos momentos juntos e penso que eu não os terei mais.
Eu fui dando passos pequenos a cada dia e tentava a todo custo
reaprender a viver em meio a esse novo mundo que me foi apresentado.
Mainha me incentivou a procurar ajuda psicológica, mas fui em três seções e
não consegui ir mais. Não tive coragem de me abrir. Eu sentia que a
psicóloga não iria me entender e ia acabar me julgando. Eu não conseguia
explicar o porquê desse buraco dentro de mim. Quer dizer... Eu sabia que
uma parte era por conta dele, mas quando chegava a essa conclusão, eu me
recriminava e guardava na caixinha que criei mentalmente de assuntos
proibidos. E assim eu vivia a minha atual vida, tentando passar por um dia de
cada vez e fingido que estava tudo bem.
— Lorena?
— Sim, Mainha!
— Filha? Há algo que não me contou e que tem lhe incomodado? Eu
vejo que você está sempre suspirando pelos cantos e parece que não está aqui
completamente.
— Estou tendo dificuldade em sair e fazer amizades. Me inscrevi na
faculdade e nem consegui assistir as aulas sem me sentir fora do lugar.
— Oh, querida! Levará um tempo até se acostumar com a vida aqui fora.
Você deveria continuar com as suas consultas e sair mais com suas primas.
— Eu nem consigo falar com as pessoas que eu conheço. Como vou
falar com os estranhos?
— Olha o filho da Cidinha! Ele faltou comer você inteira quando te viu.
Saia com ele, vá ver gente e curtir a vida! Está jovem para ficar trancada em
casa.
— É tão estranho ver a senhora me mandando sair e me incentivando a
namorar. A minha cabeça dá um nó. — Rio me lembrando de como era antes.
— O tempo passou e hoje você é uma mulher jovem e bonita. Não tem
porque se prender e não aproveitar o que a vida tem de melhor.
— Eu sei! Eu juro que estou tentando! — E é verdade.
— Vamos cortar o tempero e fazer aquela moqueca que eu sei que você
gosta. Vou te lembrar de todas as suas travessuras e já, já, estará se sentido
você novamente.
Apenas sorrio concordando, não querendo deixar que se chateie comigo
ou me venha com mais perguntas.
A cada história que mamãe contava, eu sentia que era sobre outra pessoa
e isso me matava aos poucos. Talvez ela tenha razão e eu precise ao menos
tentar seguir em frente e esquecê-lo de vez. E quem melhor seria do que outra
pessoa totalmente diferente dele? Não custa tentar e ver o que vai dar.
Um ano depois

Meses sem ela. Meses de agonia sabendo apenas o básico pela boca
dos outros, sobre como ela estava. Eu me afundei no trabalho, me arrisquei
mais do que acostumava, me testei e coloquei em segundo plano qualquer
sentimento que sentia, apenas para continuar sobrevivendo. Marco voltou
alguns dias depois e Nino ficou para trás. Eu queria ter a certeza de que ela se
adaptaria e que nada aconteceria para atrapalhar isso. E enquanto ela estava
reaprendendo a viver, eu me contentava com os vídeos que Nino me enviava
constantemente dela. Eu a via indo para a faculdade, saindo com a família e
dançando na boate. Me embebia de suas imagens para aplacar a dor que eu
sentia com sua partida.
Eu estou me sentindo tão perdido, sem um objetivo. Tudo parece sem
graça e sem cor, e para diminuir minha solidão, eu saia para caçar os
traidores. Fiz da sua ausência um combustível para a minha vingança. Eu
destrocei, manipulei e burlei todas as leis que foram criadas, apenas para me
sentir vivo de novo. Deixei que a sede que eu sentia dela, fosse como heroína
em minhas veias, me impulsionando a continuar minha luta. A cada tiro que
dei, a cada pessoa que torturei e matei, era para descontar as frustações de
não tê-la comigo. Mas quando a adrenalina passava e eu me afundava em
meu escritório com uma garrafa de bebida nas mãos, era quando eu me sentia
drenado, sozinho e carente dos seus sorrisos, dos seus beijos e do seu corpo
acolhedor, quente, apertado e gostoso recebendo o meu e me causando
sensações indescritíveis, que só ela me proporcionava. É um inferno! Até
tentei buscar em outros corpos o alívio que procurava, somente para me
chatear ainda mais, pois não era o dela.
Dias depois de sua partida, Luigi conseguiu fugir do hospital em que
estava recebendo atendimento, e daí foram semanas o procurando. Minha
parte eu tinha feito ao FBI e eles o deixaram escapar debaixo dos seus
narizes. Nem fizeram questão de procurá-lo, já que tinham outros cabeças da
investigação em suas mãos, que eu mesmo entreguei: políticos, juízes,
empresários e homens do mais alto escalão admirados pela mídia e pelo
público em geral. Um prato cheio para o FBI, que ganhou todo o crédito pela
queda do tráfico.
Foi difícil encontrá-lo e quebramos a cara várias vezes com pistas falsas
implantadas de propósito, mas a sua escapada não durou muito tempo. Graças
a aliança que ele tanto quis firmar com os Vitiello, entramos no México e o
achamos escondido em um dos pontos sob o poder do quartel dos Montez,
que nada besta preferiu entregá-lo do que ter problemas com duas
organização diferentes. E assim meu adorado tio veio parar em minhas mãos
para meu tão esperado e merecido acerto de contas.
Entro no galpão e o vejo amarrado na cadeira, com arame farpado. —
Cortesia de Marco, que adora deixar nossos convidados à vontade.
— Sentiu saudades, Luigi? — pergunto com deboche. — Espero que a
festa de boas-vindas esteja do seu agrado.
Ele me olha com raiva.
— Eu deveria ter acabado com você quando tive a chance.
— Deveria! Só que agora a chance é minha e pode ter certeza de que
não irei ser sentimental e fraquejar com você de novo.
— Nossos convidados especiais chegaram. — Marco diz entrando
acompanhado de Lucca, Enzo e Henrique.
— Isso vai ficar interessante e muito divertido. Já que sou o anfitrião,
nada mais justo do que eu começar.
Vou até a mesa de metal, onde todas as minhas ferramentas de diversão
estão espalhadas. A primeira que pego é o maçarico profissional, comprado
especialmente para ele.
— Você traiu a nossa família, e como punição, merece a morte. Porém,
antes que possamos começar, vou apagar o símbolo da Camorra. Você não
merece tê-lo no seu corpo.
Ligo a ferramenta e levo ao seu braço, onde está esculpida a tatuagem.
Ele grita quando a chama de temperatura de mil e quatrocentos graus entra
em contato com a sua pele, fazendo derreter a carne instantaneamente.
— Por favor! Para! — grita em desespero e eu me congratulo com isso.
— Quantas meninas devem ter dito essa mesma frase e você não ouviu,
hein?
— Chega! Eu sou seu pai e você deveria me agradecer por ter sido o
único a te contar toda a verdade. — Ignoro a parte sanguínea que não me
comove nem um pouco.
— Desculpe! Se eu não fizesse isso, outro iria fazer em meu lugar. Você
me ensinou isso, lembra? Aguente firme! Estou te ajudando a purificar seu
corpo e a se acostumar com o calor que encontrará no lugar para onde vai.
— Seu desgraçado! É melhor me matar, porque se me deixar vivo, eu
vou acabar com todos vocês!
— Não se preocupe! Nenhum de nós tem a intenção de ter misericórdia.
— Henrique completa.
Continuo a tortura por mais um tempo, e quando me dou por satisfeito,
eu desligo e passo para a próxima etapa. Pego uma tesoura de jardineiro e
volto para onde ele está. O suor e o sangue se mesclam com o cheiro de carne
queimada.
— Essa parte vai ser em homenagem a cada uma das meninas que você
sequestrou e estuprou sem nenhuma piedade, e isso inclui a minha Lorena. —
Levo a tesoura para o meio das suas pernas enquanto. Enquanto ele dá seus
gritos de protesto, eu corto seu pau fora, o levantando na sua frente e enfiado
em sua boca. — Já que gosta tanto de abusar de crianças, espero que em seus
anos de experiência, você saiba se dar prazer.
Os homens a nossa volta riem da cena e eu passo a vez para Marco, que
estava ansioso por esse momento tanto quanto eu. Quando ele termina sua
parte, precisamos fazer uma transfusão de sangue no imbecil, que teve uma
parada cardíaca. Deixamos ele descansar por um tempo, apenas para
começarmos tudo de novo.
A maior surpresa foi quando Henrique confessou que a sua vingança foi
por Eva Moretti, nos deixando chocados com a revelação de que ele era tio de
Marco, por ser irmão da mulher que foi enganada por Luigi e jogada em um
bordel. Também confirmou depois, apenas para mim, que meu pai havia lhe
confessado que eu não era mesmo o seu filho, porém, ao contrário do que
Luigi tinha me contado, minha mãe nunca foi prometida ao desgraçado, mas
sim ao meu pai Matteo, só que Luigi no intuído de burlar as regras, a dopou e
a violentou. Meu pai, como a amava, assumiu mesmo assim o compromisso e
me registrou como dele quando a gravidez foi confirmada.
A minha raiva foi a nível máximo com mais essa descoberta, ao saber
que desde o início ele vinha prejudicando a minha família. Só não entendi o
porquê papai não o matou na época, se ele era o capo e ninguém iria contra o
que ele fizesse. Mas depois de pensar bem, cheguei à conclusão de que
mamma deve tê-lo impedido, já que odiava vingança e tudo que vinha com
ela. Ao menos agora, tudo acabou e vou ter paz de espírito para continuar
com a minha mudança na organização.

*****

O dia da minha posse como novo chefe chegou. Ao me sentar na mesa e


olhar a festa que os hipócritas fizeram para comemorar, me dá ânsia. Metade
dos que estão aqui, sabiam de tudo o que Luigi tinha feito, mas nenhum se
deu ao trabalho de levantar o tapete e limpar a sujeira. Agora, os mesmos que
se sentavam na mesa com ele e se diziam seus amigos, me congratulam por
tê-lo matado. Bando de idiotas! Duas caras!
— Agora que é o novo chefe, tem que se casar. Não pega bem um
homem com seu cargo, não ter uma boa mulher do lado. — Carlo diz
querendo me pressionar.
— Luigi ficou viúvo e não vi nenhum de vocês o pressionando para
casar de novo.
— Ele já era macaco velho, mas você ainda é muito jovem e precisará
de herdeiros em breve.
Meu peito aperta com a lembrança do que perdi.
— Na hora certa eu tomo essa decisão. — eu respondo, e logo após, ele
se levanta e sai.
Até mesmo porque a única pessoa que desejo e quero ao meu lado, está
há quilômetros de distância.
— Você não parece muito feliz. — Henrique diz se sentando ao meu
lado.
— Estou radiante!
Ele ri baixinho.
— Estou vendo. Porque não vai buscá-la?
— E causar outra guerra? Não, obrigado! — A verdade é que eu queria
fazer exatamente isso.
— Você nunca foi de fugir de uma batalha. O que aconteceu com o cara
que praticamente sozinho conseguiu o que nem eu e seu pai juntos
conseguimos?
— Estou cansado. Só quero um pouco de sossego.
— Eu sei que como seu conselheiro, deveria te dizer o contrário do que
vou falar agora, mas um amor como o de vocês não se encontra muitos por aí.
O encaro tentando ver se é realmente ele me falando isso.
— Você falando de amor? Cuidado! As pessoas podem achar que está
ficando mole. — o provoco.
— Fraco é o homem que se limita a não amar em meio a vida miserável
que levamos. Seu pai amava sua mãe e nem por isso deixou de ser o melhor
capo que tivemos. Eu estou feliz com as minhas decisões. E você? — Olha
para onde Giovanna está sentada, um pouco distante de nós, conversando
com as outras mulheres.
— O casamento parece ter te feito bem. — aponto o óbvio.
— Vamos dizer que eu passei a ver a vida de outra forma depois que
uma bela italiana de sangue quente entrou nela. — Sorrio de sua fala. —
Realmente! As coisas são muitos estranhas e eu só posso agradecer por ter
sido dessa forma.
— Entendo! — Sei bem como ele se sente.
— Eu vou chamar minha bella donna para dançar. Se quer um conselho
de amigo... Lute por sua mulher! Eu nunca tinha te visto tão feliz como você
era quando estava com ela. Hoje você parece a casca do homem que foi
quando a tinha.
— Eu prometi não ir atrás dela quando eu dei sua liberdade.
— Nós somos mafiosos, Vincent. Não desistimos do que queremos e
vamos até as últimas consequências para conseguir.
Sai me deixando com suas palavras fervilhando em minha cabeça e em
meu coração teimoso, que pulsa somente por ouvir seu nome.
Ando pela festa somente para marcar presença e depois saio para ir me
esconder em meu refúgio. Fico vendo suas fotos, seus vídeos e sentindo seu
cheiro nas roupas que ficaram para trás. Me martirizo pelas coisas não terem
sido diferentes. A vozinha incidente no fundo da minha mente bate na mesma
tecla e faz as palavras do Henrique ficarem me torturando a todo o momento.

*****

Sento na mesa com os outros membros do conselho e analiso com


cuidado cada palavra que irei falar.
— Estou curioso por essa reunião. — Francesco diz recebendo um coro
de afirmações.
— Convoquei cada um de vocês para deixar claro que a partir de hoje
está estritamente proibido o tráfico humano e a pedofilia dentro da
organização. E qualquer um que ousar me desobedecer e fazer pelas minhas
costas, irei considerar como uma traição e puni-los com a morte.
— Você deixou isso bem claro na última reunião e todos aqui estamos
de acordo que esse assunto nos trouxe muita dor de cabeça. — Alessandro
toma a frente dos demais.
— Ótimo! Também quero informar que minha noiva será de
nacionalidade brasileira e estaremos nos casando assim que eu a buscar.
— Mas isso é uma afronta! Uma estrangeira dentro da máfia? Não dará
certo! Ela não conhece nossos costumes e não saberá se portar em público. —
é a vez de Anthony abrir a boca.
— Eu lhe garanto que ela conhece mais da máfia do que qualquer uma
de suas esposas e filhas juntas.
— Ela nunca será aceita por nossa família e pelas outras mulheres. Com
tantas opções, você quer logo uma de fora? Vai criar especulações e logo
todos acharão que você não será um bom capo. — Felippo retruca.
Rio sem vontade alguma.
— Engraçado que vocês não se importavam de enfiar seus paus nas
bocetas estrangeiras que eram traficadas, não é? Pois eu desafio qualquer um
a vir dizer na minha cara que eu não serei um bom chefe depois de tudo que
eu fiz para a famiglia.
— A questão não é o que você fez, mas sim o que fará a partir de agora.
Um homem na sua posição não deve se deixar levar pela boceta de uma
vagabunda qualquer. — Giany, filho mais novo de Anthony, fala do fundo da
sala, estufando o peito.
— Ele está falando por você, Anthony?
— Não! — Arregala os olhos.
— Qual dos seus filhos será o seu sucessor?
— Lorenzo! — responde rápido.
— Bom! Então não precisará desse, certo? — Puxo a arma e acerto o
tiro no meio da testa do atrevido que me desrespeitou em frente a sala cheia
de homens governados por mim. — Mais alguém nessa mesa acha que serei
conduzido por meu pau e não farei o meu trabalho direito?
Um silêncio absoluto reina na sala e todos me olham receosos.
— Quero lembrá-los de que muitos estão como subchefes pelo bem da
família e porque não irei prejudicar a organização por desavenças pessoais.
Eu espero que saibam valorizar esse voto de confiança e me respeitem como
capo. Passem esse recado para as suas esposas e filhos também. Se eu souber
que alguém andou cercando e maltratando minha mulher, a conta a se pagar
será bem alta.
Todos concordam com minhas falas e saem com o rabo entre as pernas.
— Quero que saiba que ao contrário do meu pai, fico feliz que esteja no
comando. — Lorenzo diz puxando meu saco, achando que não enxergo além
dele e de suas palavras vazias.
— Ótimo! Eu também fico feliz por saber que não tenho mais um
inimigo para me preocupar. Retire seu irmão daqui e faça os procedimentos
necessários.
— Quando vamos para o Brasil? — Marco pergunta assim que todos
desocupam a sala.
— Agora!
Ele ri.
— Eu sabia que não ficaria longe dela por muito tempo. Você até que
demorou para tomar essa decisão. Foi mesmo amarrado pelas bolas! —
Zomba.
— Até parece que você não anda vigiando cada passo de uma certa
garçonete por aí. Está sem moral para me zoar, amigo.
Passo por ele, rindo da sua cara de espanto. Ele acha que não sei dos
seus passos. Estou só esperando o momento que irá se render pelo seu
pequeno anjo loiro.
Hoje vim até a praia para entregar a minha oferenda à Iemanjá em
agradecimento pela sua proteção e por tudo o que fez por mim. Mesmo sendo
uma filha relapsa e que só agora teve coragem de pagar a promessa, como a
mãe bondosa e amorosa que ela é, eu sei que me entende e sabe que não fiz
por mal.
— Minha protetora Iemanjá. Enfermeira dos que sofrem, consoladora
dos aflitos e conselheira dos angustiados. Mãe de todos. Te agradeço por
todas as graças que me concedeu. Indigno-me de tua áurea luminosa e rendo-
te minha homenagem, rainha das águas, que contribui caridade e amor entre
todos os seus filhos. Eu te agradeço, minha mãe, por me atender nas horas
que recorro a teus poderes. Divinas graças te dou pelas tuas radiações
milagrosas. Eu agradeço dizendo obrigado por tua proteção constante e tudo
que tens me proporcionado. — Agradeço baixinho enquanto o barquinho com
as velas e as flores vai embora sendo levado pelas ondas do mar.
Eu ouso pedir que ela tire do meu coração essa sensação de solidão por
não pertencer a lugar algum. Eu não quero ser fraca, eu quero ser forte.
Voltei a fazer a terapia e em meio a uma de nossas conversas saiu o
assunto síndrome de estocolmo, onde a psicóloga apontou que minha ligação
com Vincent é devido ao relacionamento forçado que tivemos e que eu
enxerguei nele um herói que não existe. Segundo ela, isso não é um
sentimento saudável. Fiquei calada. Como eu poderia explicar a ela, que do
jeito torto dele, ele me protegeu, me amou e eu o amei de volta? Que dentro
dele existe um menino quebrado e forçado pela máfia a ser o que era? Eu via
dentro dele um homem bondoso, com medos e inseguranças, como qualquer
ser humano. Eu estava ao seu lado quando ele acordava suado e gritando
porque as lembranças do seu treinamento o perseguiam até mesmo quando
dormia. Ela não entenderia. Quem não nasce na máfia, não consegue
enxergar nada além dos seus crimes e do que a mídia fala.
Eu vi nele, desde a primeira vez em que fui atrás dele no banheiro, o que
ele tentava esconder. Porra! Ele se achava um monstro, um ser sem alma.
Quantas vezes o vi se afastar dizendo não ser bom para mim, que não valia
nada e que eu merecia coisa melhor? Eu estava lá quando se culpou pelas
mortes das garotas que Luigi matou. Eu vi sua luta dia após dia para me
provar que não era igual ao tio. E conseguiu! Apesar do que faz, ele tem um
coração bom e tem amor para dar. Ele só não conseguia se expressar e muitas
das vezes tinha que esconder e usar uma máscara de homem frio, para não
sofrer.
Eu o amo mesmo vivendo na vida em que nasceu e fazendo tudo o que
fez. Eu o compreendo porque comigo ele era apenas meu Vincent. As
pessoas julgam o que não conhecem, pois é mais fácil assim do que tentar
olhar por um outro ângulo desconhecido. Eu fui assim no início também, e
continuo não concordando com muita coisa que existe lá dentro, mas ele
estava fazendo as coisas certas e seguindo outro caminho. Isso deve contar
alguns pontos.
Olho o balançar do mar e não deixo de me comparar a ele nesse
momento: bonito e ao mesmo tempo turbulento, com uma imensidão de
possibilidades e ainda assim, dentre elas, existe a escolha errada que pode
levá-lo a morte.
Me levanto da areia e começo a andar na calçada a beira da praia para
voltar. Estou tão despercebida que não notei na minha frente um carro parado
e o homem que tem povoado todos os meus sonhos, encostado nele,
parecendo uma miragem em meio ao deserto seco. Paro de andar e o olho
com calma, verificando se realmente estou o vendo ali ou se estou
começando a ficar louca.
— Vincent?! — sussurro.
— Mia bella! — fala começando a dar alguns passos em minha direção.
Ele para a uma distância segura, meio indeciso e com as mãos no bolso
da calça. Nesse momento volta a ser o meu menino inseguro e machucado.
— O que faz aqui? — pergunto ainda não acreditando que ele está na
minha frente.
— Sabe? Eu estava esperando outro tipo de recepção. — ele diz me
avaliando.
— E esperava o quê? Que eu soltasse fogos?
Ele arqueia a sobrancelha e dá um sorriso safado.
— Vim buscar o que é meu! Eu não consigo ficar longe de você,
coelhinha, e pelo que vejo, você também não.
— E como sabe disso? Eu poderia ter me adaptado e estar em um outro
relacionamento, inclusive.
Ele trinca o maxilar e vejo em seus olhos o fogo queimando.
— Se isso fosse verdade, eu jamais viria aqui. Mas nós dois sabemos
que não é assim que tem vivido. Você mal sai de casa e nem para a
faculdade, que tanto queria fazer, não foi mais. — Inclina a cabeça me
olhando.
— Está me espionando?
— Vamos dizer que mantive um olho em você.
Meu queixo cai.
— Então era por isso que eu me sentia sendo vigiada? — falo mais para
mim do que para ele. — Quem?
— Nino. Ele me manteve atualizado com informações diárias suas.
Corro até ele, mas como uma pessoa nada normal que sou e mesmo
morrendo de saudades por estar sem vê-lo há muito tempo, em vez de beija-
lo, eu dou primeiro uns tapas nele por ter me jogado para longe sem sequer
me dar a chance de dizer algo. Ele apenas fica lá recebendo as pancadas até
eu ter minhas mãos doendo e parar.
— Isso foi por você ter me empurrado para longe! — Ele balança a
cabeça apenas concordando com o que falo. — E isso é por mesmo de longe,
ter se preocupado comigo! — O puxo pela camisa e bato minha boca na dele,
saboreando seu gosto único: uma mistura de cigarro com bala de menta.
Suas mãos me firmam no lugar e eu agradeço por ele fazer isso, pois
estou de pernas bambas. Seus toques me têm gemendo em seus braços de
músculos firmes que tanto senti saudade.
— Senti tanto a sua falta! — diz encostando sua testa na minha.
— Eu também! Achei que você não queria mais me ver.
— Só eu sei o quanto foi difícil me manter longe de você todo esse
tempo. Eu não queria quebrar a minha promessa.
Alisa meu rosto com carinho.
— Mas quebrou. E a pergunta é: por que demorou tanto?
Ele joga a cabeça para trás, soltando uma gargalhada gostosa. Amo seus
sorrisos e amo ainda mais saber que sou a causa deles.
— Por você, eu quebro todas, mia bella! Eu estava colocando a casa em
ordem antes de vir atrás de você.
— O quanto está disposto a me convencer a voltar? — provoco.
— Eu sou um mafioso inescrupuloso e capaz de tudo pela sua amada.
Rio da sua cara pau.
— É bom que esteja preparado para muitas provas e disposto a ceder um
pouco mais, seu cretino.
— Vai ser difícil, mas vou deixar que faça a sua escolha, e irei respeitar,
seja ela qual for.
Ele me estende uma de suas mãos.
— Vai me deixar vir visitar a minha família sempre que eu quiser?
— Estamos negociando? — Franze a testa, me avaliando.
— Sim! Prefiro que me fale agora, antes que eu caia em sua lábia de
novo. Sem usar chantagem e sem promessas quebradas dessa vez.
— Tudo bem, senhorita! Manda bala!
Faço careta com a menção da palavra bala, o fazendo rir. É tão bom vê-
lo mais relaxado, sem a pressão em seus ombros, que o deixava sério e
fechado.
— Chega de bala por um tempo. Não sou uma prisioneira e quero poder
sair para fazer as minhas coisas e vir ver a minha família quando tiver
saudade.
— Tudo bem! Desde que aceite e entenda que precisará de seguranças o
tempo todo ao seu lado. E isso é inegociável. Eu apoio que você seja
independente.
Bom! Estamos quase chegando lá.
— Não vou ser “a outra” se a famiglia não me aceitar.
— Eles obedecem a seu chefe e eu sou o capo deles agora. — Pisca para
mim. — E um chefe precisa de uma bela esposa ao seu lado.
Olho para ele buscando sinceridade em suas palavras.
— Está me pedindo em casamento?
— Sim! Só que quando eu for fazer o pedido oficial, não será de
qualquer jeito e sem um anel descente para colocar em seu dedo. — Beija
meus dedos suavemente.
— Ounty! Você sendo romântico é tão fofo!
— Vou te mostrar o quanto mais romântico e fofo eu posso ser depois.
— Me sinto pulsando com a promessa velada de tê-lo em mim de novo. —
Então, senhorita Lorena Ávila, aceita ser minha? Irreversivelmente dessa vez!
Coloco a mão no queixo, pensando por um tempo, o que faz ele
semicerrar os olhos. Sorrio para a sua impaciência e coloco minha mão na
dele.
— Claro, meu lobinho favorito!
Ele rosna me puxando para beijar meus lábios mais uma vez.
— Vamos sair logo daqui, antes que eu te foda bem ali, com você
jogada no capô daquele carro.
— Que selvagem! Bem seu estilo fazer isso mesmo.
Ele sorri me puxando apressado para o carro e dá partida para sairmos
daqui.
Olho para trás e não vejo mais a minha oferenda, mas sorrio para o mar
na esperança de que minha deusa mãe me veja feliz e sinta toda a minha
gratidão pelo seu imenso amor por mim e por me fazer ser amada, de um
jeito torto e nada convencional, por um homem que passa longe de ser
perfeito, mas que é incrível para mim com todos os seus defeitos.
Chegamos tão rápido ao hotel onde me hospedei, que nem vi.
Estávamos tão sedentos um pelo outro que mal abrimos a porta e já
estávamos nos devorando. Era como se todo esse tempo estivéssemos
perdidos em um deserto e de repente encontrássemos um oásis. E não está tão
longe da verdade, pois é exatamente assim que me sinto.
Viramos uma confusão de toques, beijos e roupas espalhadas por todos
os lados, loucos para termos mais um do outro e aplacar esse fogo ardente.
Somente nós dois entendíamos a causa da nossa necessidade, dessa ânsia e de
querer mais. Boca na boca, língua com língua, corpo no corpo, e enfim,
coração com coração.
Deito ela na cama e espalho beijos por todo o seu delicado corpo. Ela
está mais magra. Eu vinha acompanhando de perto seu progresso e vibrava a
cada conquista que minha menina dava, mas também me preocupei quando a
vi se perder de si mesma. Não suportei saber que estava se isolando e se
afastando de todos. Me doía sua expressão de tristeza, e a cada passo que ela
dava para trás, eu me sentia mais culpado ainda. Quando Nino me disse que
até mesmo em suas consultas, ela não ia mais, eu sabia que era grave e tinha
que me meter. Não suportaria vê-la se diminuindo e achando que tudo que
passou a tornaria incapacitada e diferente das outras pessoas. Eu achei que a
enviando de volta para sua família, iria ficar feliz e se sentir completa de
novo. Eu queria que ela se curasse, e que se algum dia viesse atrás de mim,
fosse por sua decisão. Eu esperaria o tempo que precisasse, porque ela vale a
pena.
Toco a pequena cicatriz em sua barriga, da qual me lembrará de nunca
mais errar ou hesitar em minha vida. Um descuido meu a fez perder o fruto
do nosso amor, e de quebra, quase a perdi também. Essa marca a faz ainda
mais bela para mim e me mostra o quanto ela foi forte e corajosa até o último
minuto.
— Mia bella! Senti tanta saudade de você e do seu corpo. — Subo meus
lábios de encontro aos seus. — Eu temi que você se apaixonasse por outra
pessoa e me esquecesse.
— Eu tentei! Mas não consegui seguir em frente. Eu sou sua e sempre
serei.
Eu sabia que ela saia com o vizinho da sua família. Foi a parte mais
dolorosa de assistir.
— Eu sei, mio amore! E não posso deixar de me culpar por isso. Você
merece alguém melhor do que eu.
— Eu não quero que você se culpe, Vincent, e nem que ache que não é
bom para mim. Eu quero esquecer isso! Só me ame, como sempre fez.
— Tudo que você quiser, coelhinha!
Ela sorri me puxando para ela. Feito uma sincronia perfeita, nossos
corpos se unem em um só, e nesse momento eu me sinto completo, como se
somente agora voltasse o ar para meus pulmões e eu pudesse respirar de
novo. Pode parecer piegas para muitos, mas eu sou completamente louco por
ela. Existem apenas duas versões de mim, e uma delas, somente Lorena
conhece e trouxe à tona.
Balanço meu quadril entrando e saindo da sua doce boceta, da qual
sonhei noite dia e me dei prazer com minha mão imaginando estar assim com
ela. Enquanto eu estava empenhado em ensiná-la a fazer amor, ela me
ensinou a amá-la irremediavelmente, e foi muito difícil ficar todo esse tempo
sem tê-la em meus braços.
— Vincent! — balança seu corpo junto com o meu quando bato no
ponto dentro dela, que sei que a deixa louca.
— Vem para mim, amor! Me dê todo o seu prazer!
E ela vem forte, gritando, pulsando e me apertando feito um punho de
aço, me levando junto quando se entrega a mim como sempre fez, de corpo e
alma. Coloco meu rosto na curva do seu pescoço, sentido seu cheiro único e
inconfundível, para recuperar o fôlego. Ela acaricia meus cabelos da nuca me
fazendo arrepiar. Levanto para vê-la sorrindo e é impossível não retribuir.
— Tudo bem? — pergunto admirando suas bochechas coradas.
— Sim! — Toca em minha barba, com o maior com carinho, me
fazendo fechar os olhos e apreciar seu toque. — Eu te amo!
Muitas vezes ansiei ouvir essas palavras de novo, quando estava no
fundo do poço, sozinho, e pensando nela.
— Eu também te amo! E muito! — Beijo sua mão.
Deito de lado, colando seu corpo ao meu, e coloco sua cabeça em meu
peito. Acaricio seus cabelos que estão cortados em um estilo mais curto,
porém não menos bonito. A deixou com um aspecto mais mulherão. Ela
poderia ter os cortado em estilo “Joãozinho”, que provavelmente eu ainda a
acharia a coisa mais linda do mundo. Droga! Eu virei mesmo um desses caras
amarrados pelas bolas. Fico um tempo olhando-a, com medo de dormir e
quando acordar perceber que foi um sonho, mas o cansaço da viagem e o
nosso encontro me deixaram esgotado. Fecho meus olhos e me permito,
depois de mais de um ano sem ela, dormir tranquilo.

*****

— Então quer dizer que você é o novo capo? Isso significa que Luigi
morreu? — pergunta curiosa enquanto comemos o lanche que pediu para nós.
Eu a atualizo dentro do que posso falar sobre como foi em Los Angeles
sem ela por lá.
— Sim. Acabou, mio amore! Não se preocupe com isso.
— Bom! Não vou ser hipócrita e dizer que sinto muito. Me preocupo, na
verdade, é sobre o que os outros membros irão falar quando me ver com
você.
— Não irão falar nada. Já deixei claro minha decisão e eles tiveram que
aceitar.
— Sem uma luta? — questiona duvidosa.
— A maioria deles está com medo de perder seus cargos, agora que não
têm mais Luigi para passar a mão em suas cabeças. Então, mesmo não
gostando, eles não irão mais se meter.
Não quero dizer para ela que tive uma grande dor de cabeça quando
reuni o conselho e contei minha decisão. Não quero preocupá-la.
— Eu comecei a fazer a faculdade de enfermagem e não consegui
continuar, pois não me sentia parte daquelas pessoas. Tanto tempo presa, que
me senti estranha.
Eu já sabia disso, só que prefiro ouvir dela como se sente e o que se
passa por sua mente, para poder ajudá-la.
— Você tentou cedo, Lorena. Não deveria ter parado com suas
consultas. Eu sei que é difícil se abrir com estranhos, mas vai te ajudar a se
encontrar de novo e trabalhar seus medos e inseguranças.
— E como sabe disso?
— Eu andei pesquisando sobre o assunto e tenho me envolvido em
projetos sociais para crianças e mulheres vítimas de abusos. Fiz uma parceria
com uma instituição. Até doei um dinheiro para aumentar mais o espaço e
atender mais pessoas.
Vou deixar para mostrar o projeto com seu nome quando chegarmos lá.
Demorou um tempo para ficar pronto e pedi que deixasse para inaugurar
assim que voltasse. De preferência com ela, para lhe fazer uma surpresa.
— Oh, Vincent! Estou tão orgulhosa de você! — diz com os olhos
cheios de lágrimas.
Sorrio.
— Não faço mais do que a minha obrigação, Lorena. De certa forma,
quero me redimir por ter demorado tanto tempo para destruir essa parte suja
da nossa organização.
— Foi um grande passo. Eu sei que não falaremos sobre os negócios da
máfia e respeito isso, mas quero que me prometa que não deixará esse crime
voltar para dentro da Camorra.
— Enquanto tiver sob o meu comando, isso nunca mais passará impune.
Eu te prometo isso.
— Eu tenho que aprender muita coisa sobre vocês, porque eu só sei o
básico.
— Não muito, querida. Como deve saber, as mulheres não fazem parte
das reuniões e tomada de decisões. E eu prefiro que continue assim.
— Se for como imagino, eu prefiro ficar mesmo de fora. Nossos filhos
terão que passar pelo mesmo treinamento que você?
Penso com calma sobre o que responder. Com toda certeza eles terão
que ser treinados para serem fortes e se prepararem para quando for o
momento de governar em meu lugar.
— Eu preciso os ensinar a se defender e treiná-los para serem bons
chefes depois de mim. Tudo que posso te prometer é que não passarão pelo
que eu passei. Aquilo que Luigi fazia com seus homens e comigo, beirava ao
sádico.
Ela parece respirar de alívio.
— Sendo assim, eu concordo. É horrível se sentir indefesa e a mercê do
inimigo.
— Quando voltarmos, vou treinar você. Também precisa aprender a se
defender e manusear uma arma caso precise.
— Sério? Não vai contra as leis da máfia ou algo do tipo?
— Não. As mulheres não têm a necessidade de treinar, por não
ocuparem cargos perigosos, porém, não é proibido ensiná-las a se proteger.
— Deixa eu adivinhar! Os maridos preferem deixá-las ignorantes e
totalmente dependentes deles, porque são muito desprezíveis para abrir mão
dos seus domínios sobre elas.
— Eu diria que eles têm medo de treinar um inimigo que dorme na
mesma cama que eles. — falo sério.
— E você não tem?
Levanto meus olhos, analisando suas feições.
— Você usaria uma arma contra mim, Lorena?
— Se tivesse me feito essa pergunta há uns quase dois anos atrás...
Provavelmente!
Rosno para ela, a fazendo rir.
— Você não está se ajudando, mulher. Acho que vou repensar sobre o
uso da arma. Vou somente te ensinar a lutar.
— Ah, não! — Gargalha. — Você sabe que estou brincando. Se
prometeu, tem que cumprir!
— Posso descumprir!
— Nem ouse, seu cara de pau!
Me levanto e dou a volta na mesa para pegá-la. Ela percebe minha
intenção e sai correndo para o quarto.
— Primeira lição, coelhinha: nunca fuja para dentro e sim para fora.
Corro atrás dela a alcançando antes que feche a porta. Agarro ela e a
jogo no ombro, batendo em sua bunda. Chego perto da cama e a coloco
deitada, segurando seus braços com uma mão.
— O que vai acontecer agora? — Seus olhos brilham em expectativa.
— Vou comer um ensopado de coelhinha!
Ela ri mais forte dessa vez.
— Então venha! — Abre as pernas me fazendo encaixar em sua entrada.
— Provocadora! Vou com todo o prazer.
Entro em seu canal molhado e a fodo com força, a fazendo gritar. Dessa
vez não será carinhoso, mas sim depravado, sujo e muito selvagem, do jeito
que eu gosto e sei que minha mulher ama. Quando venho em jatos fortes
dentro dela, eu sei que dessa vez tudo ficará bem e não haverá mais uma
despedida e sim um reencontro definitivo. Ela terá que se contentar e se
adaptar com a minha vida e com tudo que sou e significo. Deixá-la ir de novo
seria meu fim, pois por ela eu fui capaz de tudo, e agora que a tenho
novamente, não conseguiria mais libertá-la.
Passamos uma semana em Salvador antes de voltarmos para Los
Angeles. Claro que levei Vincent para a minha família conhecer, e charmoso
como é, conquistou a todos rapidinho. Bonitinho foi vê-lo tentando falar em
português. Segundo ele, andou treinando algumas frases para não passar
vergonha. Dizer à mamãe e a Vítor que eu iria voltar com ele, não foi fácil.
Ambos ficaram tristes, mas mainha me chamou para conversar e disse que
mesmo doendo nela reconhecer, eu não estava feliz aqui com eles. Me fez
prometer vir sempre visitá-la e disse que a casa sempre estaria aberta para
mim caso eu precisasse e quisesse voltar. Eu não irei precisar, pois minha
casa é ele. Vincent é a pessoa com quem me sinto completa.
Quando chegamos em Los Angeles, fui recebida com carinho pelas
meninas que escolheram ficar e fiz novas amizades assim que cheguei.
Graças ao projeto na instituição, conheci Rebeca, Lara e Camilla. Todas
muito queridas e de personalidades distintas. Rebeca é a que não tem papas
na língua, então é impossível ficar perto dela sem rir; Camilla é a brincalhona
e Lara é muito amorosa e conselheira, sempre pronta para ajudar e acolher
todos a sua volta. Me identifiquei de cara com ela por sua história de vida ser
muito parecida com a minha, e através da sua superação, eu quis voltar meu
acompanhamento para conseguir melhorar cada vez mais, e assim, ajudar
outras pessoas que passaram pelo mesmo que eu.
Chorei na inauguração quando Vincent explicou a origem do projeto e
que eu seria uma das responsáveis por ele. Fiquei muito feliz. O lugar ficou
lindo e acolhedor. O que nos surpreendeu foi a rapidez em que cresceu nesses
últimos seis meses. É incrível a quantidade de mulheres que se inscreveram
para participar logo nas primeiras semanas. Cada uma com suas
particularidades, pedindo socorro e sofrendo silenciosamente. Muitas
histórias fortes que marcaram de alguma forma suas vidas e não tinham com
quem compartilhar, e que assim como eu, se escondiam por se sentirem
diferentes e com medo de serem julgadas. Aqui, na terapia em grupo,
conseguiram se encontrar e fazer amizades com outras pessoas que iriam
compreendê-las, por saber exatamente como se sentem. Os casos iam desde
abusos sexuais a violência doméstica.
Através do projeto, consegui descobrir minha verdadeira vocação e
iniciei a faculdade de Psicologia para poder me entender melhor e orientá-las
da maneira correta. Nunca estive tão feliz em toda a minha vida. Me sinto útil
e necessária para outras pessoas iguais a mim. Pude entender com o tempo,
que eu não podia mudar o meu passado, mas poderia superar e me tornar uma
pessoa melhor e mais forte.
Olho para a porta, onde uma jovem mulher entra sem jeito, meio
acanhada. Se conhece as vítimas pelos seus comportamentos atípicos. Elas
chegam se sentindo fora do lugar, e na maioria das vezes, ficam caladas nas
reuniões, pois se acham um peixe fora d’água. Me aproximo dela com
delicadeza para me apresentar e conversar com ela.
— Oi. Seja bem vinda! Eu sou Lorena. Posso te ajudar?
— Oi. Eu sou Catharina. — diz com vergonha e muito baixinho.
— Veio participar da reunião?
— Ah, não! Eu só... queria conhecer a instituição. O agente Gabriel me
falou daqui.
— Fique conosco! A reunião já vai começar e você não precisa dizer
nada se não se sentir à vontade.
Ela analisa o ambiente como se procurasse uma desculpa para fugir. Não
vou pressioná-la, então apenas deixo o convite em aberto. O primeiro passo
ela já deu, que foi vir atrás de conhecer. Agora é só aceitar que precisa de
ajuda e fazer o acampamento.
— Tudo bem! Eu vou ficar um pouco.
Sorrio com sua resposta e a chamo para entrar na sala onde as
profissionais estão fazendo uma atividade dinâmica com o grupo, para que as
mulheres fiquem mais relaxadas e aprendam a se enturmar, antes de
começarmos a falar dos assuntos sérios. O tema de hoje é autoestima e
consiste em ir passando uma pequena caixa com um espelho dentro entre o
grupo. No início da brincadeira, é falado que tem uma foto na caixa e a
pessoa tem que dizer três qualidades e três defeitos da pessoa que vê, sem
revelar quem é ao restante do grupo. Porém, não tem foto nenhuma, e sim um
pequeno espelho onde a pessoa irá ver apenas sua imagem refletida e se auto
avaliar. A caixa irá passar nas mãos de todas as integrantes da roda, e cada
uma, quando chegar a sua vez, fará o mesmo. É uma atividade de
autoconhecimento que ajuda elas a trabalharem a confiança em si mesmas e
se aceitarem do jeito que são.
Catharina olha tudo com curiosidade, sentada no canto, e depois que as
brincadeiras terminam e se inicia a terapia, conforme as meninas vão falando
sobre seus progressos, vejo seu interesse aumentar. Em alguns momentos ela
até mesmo abaixa a cabeça e chora. Lara com seu jeitinho delicado e voz
angelical, senta perto dela dando seu apoio e conversando com ela até
acalmá-la. Logo a vejo sorrindo de algo que Rebeca fala e fico feliz em ver
mais uma mulher se sentir acolhida por nós.

*****

Saio da instituição, cansada, mas muito satisfeita com os resultados de


hoje. Nino não me perde de vista com os outros soldados e Vincent me espera
sentado dentro do carro e mais a frente dois carros nos aguarda.
— Irá assustar todas as mulheres que saírem e verem esse tanto de
homens vestidos de preto aqui fora. — digo entrando no carro e o
cumprimentando com um beijo.
— Estou sendo é muito bonzinho melhorando o dia delas com nossa
ilustre presença.
Gargalho dando um tapa em seu braço.
— Mas é um convencido!
— Tenho uma surpresa para você, mia bella. — dá partida no carro,
pegando o caminho da praia.
— Não está um pouco tarde para irmos tomar banho de mar?
Ele ri achando engraçado meu embaraço.
— Tenha calma, que logo você verá.
Relaxo e curto a visão que vai passando pela janela, até que ele vira em
um caminho de cascalhos e para diante de uma casa de dois andares feita de
pedras, com janelas de vidro transparente e um enorme gramado na frente
com variadas flores espalhadas a sua volta. Porém, o que me chama a atenção
e deixa o lugar ainda mais magnífico, é a piscina natural logo na entrada da
casa, que não sei dizer como o arquiteto conseguiu essa proeza, pois a água
da piscina é ligada diretamente a água do mar. A casa é cercada, e para onde
se olha, vê areia e mar a perder de vista. Olho admirada a beleza do lugar.
— Vamos? — ele pergunta me esticando sua mão.
— Quem mora aqui? — pergunto curiosa.
— Logo você verá!
Subimos a escada e paramos em uma grande porta dupla de vidro.
Vincent tira um chaveiro do bolso e abre a porta. Seja quem for que more aí,
deve ser alguém com quem ele tenha muita intimidade. Continuamos
andando pela casa pintada de cor creme e com alguns detalhes em dourado no
teto abobadado. No meio da sala um lustre de cristal dá charme e elegância
ao lugar. Nós continuamos nossa caminhada até chegarmos em uma varanda
na parte superior com uma mesa arrumada e bem decorada para duas pessoas
jantarem. Sorrio ao perceber aonde ele quer chegar. Viro para trás olhando
meu belo homem encostado na parede, me observando.
— Me diz que você não fez isso! — digo já pulando por dentro de
felicidade.
— Você falou que sentia falta de duas coisas no Brasil: morar em um
lugar próximo da praia e ter sua família por perto. Então comprei essa casa
para você matar a saudade. Assim você vai poder jogar seus barquinhos
quando fizer uma promessa para a sua deusa.
— Se chama oferenda.
— É! Isso aí mesmo.
Rio tentando não chorar para não estragar toda a minha maquiagem e
ficar parecendo um guaxinim. Me jogo em seus braços o beijando.
— Eu amei! Isso é maravilhoso!
— E não acabou, mio amore.
— Não?
Não dá tempo de ele responder, pois mainha já entra sorridente junto
com Vítor.
Aí não tem jeito! Eu me derramo em lágrimas, os abraçando.
— Não acredito que vocês estão aqui!
— Seu homem pode ser muito convincente quando quer. — ela fala
rindo.
Vincent se ajoelha e abre uma caixinha, deixando a mostra um lindo
anel de brilhante.
— Bom! Eu não levo jeito com as palavras, mas quero aproveitar esse
momento especial para pedir sua mão em casamento. Aceita se casar comigo?
— Homem, meu coração não aguenta tantas emoções. É claro que
aceito!
Ele se levanta sorrindo e coloca o anel em meu dedo.
— Que bom! Porque sua mãe veio especialmente passar uma temporada
conosco para te ajudar a organizar a festa que acontecerá semana que vem.
— Jura?! — Me viro olhando para mainha, que chora emocionada.
— Viemos ajudar, minha menina. Eu vou ter um trabalhão organizado
um casamento baiano com um toque italiano, mas superar desafios é o meu
sobrenome do meio.
Rio do seu jeito alegre e entusiasmado. Seu inglês não é um dos
melhores, pois ainda está aprendendo, mas dá para entender. Para mim, é o
melhor sotaque.
— E eu vou aproveitar para curtir minha estadia e treinar meu inglês. Se
eu gostar daqui, vocês terão que me expulsar para ir embora. Mamãe volta
sozinha. — fala meu irmão.
Mainha lhe dá uns tapas, brigando com ele e nos fazendo rir de novo das
suas reclamações.
— Vamos! Temos que deixar os pombinhos à vontade. Aproveitem o
jantar! Eu fiz com muito carinho.
— Obrigada, mainha!
— Por nada! — Pisca saindo e puxando Vítor.
Viro para o homem ao meu lado, sorrindo.
— Eu já disse que te amo hoje, meu lobinho?
— Não que eu me lembre, coelhinha. Também não fez mais aquelas
dancinhas no pole dance, que eu tanto gosto.
— Um bom dia para recompensá-lo, não?
— Eu adoraria! — Faz cara de pidão me fazendo rir mais forte.
Sentamos para desfrutar da deliciosa comida que só minha mãe sabe
fazer: aquele vatapá de camarão com azeite de dendê. — Tempero único da
minha terra. — Olho para o mar, admirando a vista, e não posso deixar de me
sentir grata pelos bons frutos que venho colhendo. Eu sofri muito, e se eu
pudesse ter chegado aqui sem passar pelo vale sombrio e tortuoso, eu teria
com toda a certeza cortado o caminho, mas não mandamos no nosso destino.
O que está escrito para cada um de nós, irá acontecer independente de
querermos ou não. O importante para mim é que quando veio a minha
recompensa, fez valer a pena, pois consegui mudar não só a minha história de
vida, como de várias pessoas ao meu redor, e isso por si só, é muito mais do
que eu desejei e pedi um dia.
Como nossa história de amor, o nosso casamento não poderia ter sido
mais diferenciado. Para não ter confusão e nenhum dos lados ficarem
chateados, decidimos fazer duas cerimônias. A primeira foi um casamento
civil, no estilo do casamento tradicional, para agradar a famiglia. Foi
realizada por um juiz de paz. Não poderia me casar na igreja católica, pois eu
precisaria me converter ao catolicismo, fazer o catecismo e me batizar de
acordo com a doutrina. Então não seria possível. É claro que deu muito o que
falar e temi até mesmo que pudesse sair uma nova guerra por conta de
divergências religiosas, mas as coisas se acalmaram depois que cedi a uma
festa grandiosa e luxuosa para o povo de lá se mostrar aos outros membros.
Tudo aconteceu em um salão alugado e muito bem decorado, com direito a
bolo, tapete vermelho e vestido de noiva de alta costura, como manda o
figurino e protocolo da máfia. Diante de quase duzentas pessoas das quais
nunca vi em minha vida, dizemos o tão esperado “sim” finalizando com a
famosa valsa dos noivos, jogada de buquê e tudo que tínhamos direito.
Hoje acontecerá a segunda cerimônia: um casamento mais parecido com
o estilo do candomblé. Não será o tradicional que aconteceria no terreiro com
o sacerdote responsável e nem teremos o obi, o fruto sagrado formado por
quatro gomos, que na cerimônia original é comido pelos noivos em
agradecimento à bênção após uma consulta com os orixás se é da vontade
deles o casamento.
Foram os sacrifícios que tivemos que fazer para ficarmos juntos. Apesar
de sofrermos muito preconceito, minha religião não discrimina as outras.
Muito pelo contrário. Nós respeitamos e achamos que toda fé é importante e
deve unir as pessoas, independentemente de suas crenças. Porém, como
Vincent não é um filho de santo, chamamos somente os amigos dele que são
mais próximos e os meus mais íntimos, como todos os colegas da instituição
e seus familiares.
A cerimônia será na praia e em estilo festa havaiana, com direito a
pratos típicos da Bahia, muito axé e outras músicas brasileiras para animar
nossos convidados.
Sento na penteadeira para retocar a maquiagem. Escolhi um vestido
branco, porém não é tradicional como o do civil. Esse é mais estilo “festa ao
ar livre”: justo no busto, de estampas florais e muito longo. Rebeca deu a dica
de usar a coroa de flores na cabeça e eu amei a ideia, pois lembra muito a
coroa de obará, que representa as alianças nos casamentos da minha religião.
Mainha entra no quarto e fica toda boba me olhando, com os olhos
marejados.
— Está tão linda, filha! Oxalá deve estar muito orgulhoso de você.
— Será que os orixás não irão se irritar por não pedirmos suas bênçãos?
— Eles são justos e não teriam colocado vocês juntos se não fosse da
vontade deles. Eu desejo que todos os orixás os abençoem nessa nova
caminhada.
— Eu sou agradecida a eles por todas as bênçãos alcançadas.
— Isso é o mais importante! Não esquecer de quem você é e ser sempre
grata por tudo aquilo que lhe for concedido.
Vítor entra no quarto e sorri ao me ver.
— Quem diria que um dia eu ia ter a chance de levá-la ao altar? Estou
muito feliz por você, bonequinha.
— Para! Irá me fazer chorar. E você não vai querer irritar a Rebeca.
— Aquela mulher é fogo! Em outra encarnação, ela foi um homem, com
toda a certeza.
Rimos da sua analogia.
— Pronta? — Lara pergunta da porta.
— Sim!
— Queremos entregar os presentes das tradições. No outro casamento,
mal chegamos perto de você, e por ser de estilo italiano, preferimos não nos
meter. — Rebeca explica.
— Quais tradições se refere? — pergunto curiosa.
— É uma tradição muito antiga da qual te presenteamos. Diz trazer boa
sorte aos noivos.
— Toda sorte será bem vinda! — Sorrio permitindo e Camilla bate
palmas, feliz.
— Então vamos começar! Esse é seu “algo azul”. — Camilla entrega um
colar com várias pedras na cor azul.
— Lindo! Eu amei! Parecem conchas. — falo admirando as pedrinhas.
— Esse é o meu. É o seu “algo emprestado”. — Lara me entrega um par
de brincos de pérolas. — Eu ganhei de vovó e adoraria que você os usasse.
Ela me emprestou no meu casamento e me trouxe muita sorte.
— Muita obrigada, Lara!
— E esse é o seu “algo novo”. — Rebeca me entrega uma lingerie
branca de cinta liga, toda bordada.
— Perfeito, Beca! Acho que vou ter que tirar o vestido para colocá-la.
Rebeca se joga de joelho no chão.
— Levanta esse vestido, mulher, que eu te ajudo a colocar rapidinho.
— Mas... O quê? Ai! — dou um gritinho quando ela arrebenta minha
calcinha fio dental.
A meninas riem da minha desgraça.
Vítor sai voando do quarto, resmungando e fazendo todos rirem da
presepada.
— Rebeca, o que você está fazendo aí? — Eduardo pergunta da porta.
— Ajudando Lorena a trocar de calcinha.
— Pode falar! A boca dela é mágica, não é? — ele fala rindo, com cara
se safado.
— Não é isso que você está pensando. — eu tento explicar.
— Não era para você estar lá embaixo? — Camilla pergunta.
Minha nossa! Minha cara está no chão de vergonha. O momento é para
lá de constrangedor e Rebeca não colabora enfiada debaixo da saia do meu
vestido.
— Gatinha, por mais que eu goste de imaginar você com outra mulher,
Charlotte encheu a frauda e eu não estou afim de tentar trocar sozinho essa
porra e causar o mesmo acidente da outra vez.
— Te vira, Eduardo! Eu estou ocupada, e se eu sair daqui, não vai ser só
a bebê que precisará trocar alguma coisa.
A sala cai na gargalhada.
— Que porra é essa, Rebeca?!
— A sua porra! Não gostou de virar os olhos? Agora aguente as
consequências!
— Oh, mulher dos infernos! — resmunga esticando os braços com
Charlotte para a frente e faz cara de nojo.
— Sai daqui seu, cavalo! Antes que Vincent resolva aparecer e causar a
terceira guerra mundial.
Rapidinho ele some da porta e Rebeca olha sem entender nada.
— Se eu soubesse que a palavra mágica era “Vincent”, eu teria dito
antes.
Seguro o riso. Acho que ela não sabe da surra que ele levou na boate,
por me encarar, e eu que não vou contar.
— Eu amei! — Olho a Lingerie já imaginando o Vincent arrancando ela
mais tarde.
— Vocês são todas doidas! — Catharina diz tapando a boca e rindo.
Convidamos o escroto do seu marido somente para servir de ajuda ao
Gabriel em sua investigação. Ele terá muito trabalho para convencê-la de que
o casamento que tem é abusivo. Estamos fazendo o que podemos para ajudá-
la nas terapias, mas a sua mente é muito fechada ainda, pela religião que
segue.
— Vai se acostumando, Cat, que é daqui para pior.
— Olha! Eu não sei muito sobre essas tradições, porque não tive no meu
casamento, mas Rebeca me deu umas dicas e eu trouxe seu “algo antigo”. —
Ela me entrega uma presilha de cabelo em formato de uma grande rosa
vermelha. — É a única coisa mais antiga que eu tinha e ela foi um presente
da minha bisavó no meu aniversário de quinze anos.
Meus olhos marejam com tamanha delicadeza. É simples, bonito e de
um significado tão grande que nenhum dinheiro compra.
— É perfeita! Vai combinar com o buquê. — A abraço em
agradecimento.
— Chega de chorar! Se não vamos ficar parecendo a Lara quando
acorda. — Rebeca zoa.
— E que jeito eu pareço, Rebeca?! — Lara coloca a mão na cintura,
encarando amiga e nos fazendo rir, porque ela parece uma smurf de tão
pequena que é.
— A encarnação da noiva cadáver.
— Eu mereço! Vamos descer antes que eu te jogue pela janela. E olha
que nem sou violenta.
Elas saem do quarto e Vítor entra soltando um assobio.
— Caramba! Todas essas mulheres juntas deixam qualquer um doido.
Descemos os degraus ouvindo o delicioso batuque dos tambores. Ligo
meu braço ao do meu irmão e caminhamos pelo tapete de flores. A leve brisa
bate em meu rosto, trazendo o cheiro da água salgada do mar. Sorrio quando
vejo Vincent vestido totalmente fora dos padrões que está acostumado. Ele
usa short, camisa colorida e um colar de flores no pescoço. Os membros do
conselho infartariam se o vissem assim. É incrível como tudo cai bem nesse
homem. Seus olhos não desviam dos meus enquanto dou passos em sua
direção. E quando paramos em frente um do outro, ele pega minha mão, a
beijando.
— Está linda, mio amore!
— Você também, lobinho.
Nos viramos de frente para o mestre de cerimônia e demos início ao
casamento. Quando chega as nossas vezes de falar, estou uma bagunça de
lágrimas. Como já trocamos as alianças na primeira cerimônia, apenas iremos
reforçar nossos votos, sem a pressão de escolher as palavras ou o medo de
expressar nossos sentimentos.
— Vincent, eu jamais imaginei estar aqui um dia. Tudo isso é muito
louco e eu ainda acho que estou sonhando. Eu só tenho a agradecer aos orixás
por terem te colocado em minha vida e me tirado da prisão em que eu vivia.
— Seus olhos amolecem com minha fala. — Você vive me dizendo que não é
bom e que eu mereço muito mais, e eu vou continuar dizendo que não
concordo. Eu hoje afirmo que você é perfeito para mim e eu te amo
exatamente do jeito que é. Que possamos passar por todas as turbulências que
vier e sair juntos muito mais fortes do outro lado. Prometo ser sua casa, como
você é a minha, e estar do seu lado em todos os momentos, para resto das
nossas vidas.
Ele sorri e me dá um selinho.
— Mia bella! Eu prometo ser e fazer o melhor para você e te proteger
com a minha vida se preciso for. Estarei ao seu lado em todos os momentos, e
até mesmo naqueles em que eu não puder demostrar todo o meu sentimento
por ti, quero que saiba que em meu silêncio, eu continuarei te amando. — Ele
me beija e somente para que eu ouça, fala junto aos meus lábios a sua
promessa. — Jurado no sangue e nascido no sangue, por você eu vivo e por
você eu morro.
— Te amo! — digo retribuindo seus beijos.
Foi o mais próximo que pudemos fazer para lembrar as minhas origens e
ficou maravilhoso. Mais importante do que nossas crenças diferenciadas, é o
jeito que nosso relacionamento começou e como foi a construção do nosso
amor e respeito um pelo outro ao longo do caminho. Para mim, isso é mais do
que o suficiente para que eu possa esquecer o passado, porque eu sei, no
fundo do meu coração, que assim como ele luta e morre pela famiglia,
cumprirá sua promessa feita para mim, e eu o amarei mesmo no seu pior,
incondicionalmente.
Temos que nos mudar para a Itália? — Lorena questiona.
Estamos fazendo nossa viagem de lua de mel e estou mostrando a ela
um pouco mais sobre a minha cultura, já que nunca lhe foi permitido sair do
casarão no tempo em que morou aqui.
— O certo seria isso, mia bella. Foi aqui que iniciou a organização,
então é como se fosse a matriz. Mas não pretendo sair de Los Angeles, pois
foi onde trabalhei para ganhar reconhecimento e conheci você. Por mais que
eu ame a minha terra, aqui não me traz boas lembranças.
— E como ficará então? — pergunta curiosa.
— Coloquei Riccardo, o filho do Carmo, como subchefe daqui. Eu e
Henrique estaremos sempre de olho nele e em sua administração.
Ela parece aliviada. Imagino eu que não seja fácil para ela se lembrar do
que passou aqui nas mãos do Luigi.
Entro na casa onde cresci e tenho uma leve nostalgia quando olho para
as escadas. Parece que vejo papai descendo impecável, vestido em seu terno,
e mamãe logo atrás tirando pelos invisíveis, apenas para passar as suas
recomendações das quais ele fingia que ouviu, sendo que iria fazer tudo ao
contrário e irritá-la profundamente. Sorrio ao imaginar a cena dele chegando
com a cara mais lavada do mundo, sem um pingo de arrependimento, e
pedindo desculpa por ter feito algo que ela disse para não fazer, apenas para
que não fique dias sem falar com ele.
Chego mais perto da parede onde tem um grande retrato dos dois
comigo mais jovem e observo suas fisionomias.
— Você é a mistura de ambos. — Lorena fala parando ao meu lado e
olhando o retrato também. — Tem a aparência do seu pai, mas os seus olhos
e o seu sorriso puxaram os da sua mãe.
Apesar de Matteo não ser o meu pai biológico, eu puxei mais a ele na
aparência do que a Luigi. E para respeitar sua memória e tudo o que ele fez
por mim e pela minha mãe, o segredo morreu com Luigi. Para todos os
efeitos, eu sou filho de Matteo e Ariella Lourenço.
— Ela se vangloriava sobre isso.
— Ela era linda. Fico pensando... Se um dia tivermos uma filha, será
que ela terá chances de nascer com esses cabelos de cachos loiros?
Tento pensar como ela e não me vem na cabeça uma menina assim, e
sim morena, de cabelos escorridos e de profundos olhos azuis, como os dela.
Isso traz outro sorriso aos meus lábios. Provavelmente eu teria que dobrar a
segurança para cuidar da minha princesinha.
— Todas as vezes que falamos de filhos, você apenas cita meninas. Por
quê?
Ela desvia os olhos.
— É porque eu não consigo imaginar meus filhos chegando todos
ensanguentados como você quando chega de alguns dos seus trabalhos. Eu
infartaria cedo!
A puxo para mim e beijo sua cabeça.
— Você falava isso dos treinamentos e agora implora para participar.
— Porque quero ser capaz de ajudar se por acaso formos atacados. E
você chama aquilo de treinamento? Na maioria das vezes termina com nós
dois fodendo feito coelhos.
Abro um sorriso predador para ela e passo meu nariz na extensão do seu
pescoço, fazendo-a arfar.
— Eu não vejo problema nenhum nisso. É a melhor parte do início do
meu dia.
— Sei! Deixa eu aproveitar o momento bem oportuno e te dar um
presente. — Tira da bolsa uma caixa e me entrega.
— É alguma data especial?
— Vai se tornar! — diz sorridente.
Abro a caixa e encontro duas pequenas luvas de boxe dentro (uma rosa e
a outra azul). Olho para ela, tentando entender a dica, mas nada me vem na
cabeça, até que meus olhos batem onde está sua pequena mão. Sinto o
coração acelerado diante da possibilidade.
— Lorena?! — questiono, já me sentindo emocionado. — Você está
grávida, mia bella?
Ela balança a cabeça confirmando e eu a puxo para mim, sem saber o
que falar. Na garganta um nó se forma de emoção.
— Eu queria que fosse especial e tivesse significado. — fala com a voz
embargada.
— Você é especial, amor, e eu amo tudo o que vier e fazer parte de
você.
— De nós dois! Porque terá um pedacinho de você também.
E eu concordo com ela. Um filho! Meu e dela! Uma mistura de
características interessantes que estou louco para conhecer e ter em meus
braços. Dessa vez eu vou ser mais cuidadoso e os proteger melhor. Sorrio a
beijando e alisando sua barriga, onde descansa a minha preciosidade.

*****

Sento no sofá olhando Vincent chegar de mais uma de suas noites


sangrentas. As luzes estão apagadas, o que não permite que ele me veja, mas
a claridade da lua lá fora me deixa vê-lo perfeitamente de onde estou. Senta
na poltrona e coloca a mão na cabeça, pensativo. Todas as vezes são assim e
nunca fica mais fácil. É sempre horrível e pesado, e não tem um jeito melhor
de lidar com isso. Odeio vê-lo tão perdido dentro de si e se condenando por
algo que precisou fazer. Me levanto devagar, vou até onde está e me ajoelho
em sua frente, tomando cuidado para não assustá-lo.
— Você está bem? — pergunto suavemente.
— Não toque em mim, amor. Estou muito sujo e não quero contaminar
você.
A sua voz está distante, como se sua mente não estivesse aqui.
— Não sinto nojo, Vincent. Me deixe cuidar de você!
Ele levanta a cabeça e me olha sério.
— Me perdoe! Como protegerei vocês, se o perigo vive batendo na
nossa porta? Se eu não consigo ser um bom marido, como serei um bom pai?
— suas palavras são dolorosas e rasgam meu coração por ele.
— Não fale assim! Vamos tomar um banho e se sentirá melhor.
Pego sua mão e o levo para o chuveiro. Sua respiração está forte e seus
olhos estão sem foco. Ele está se perdendo e é minha obrigação trazê-lo de
volta e mantê-lo controlado. O lavo com cuidado, passando suavemente a
bucha por todo o seu corpo. O chão branco do banheiro agora está vermelho
do sangue que escorre junto com a água pelo ralo. Tento não prestar atenção
nesse detalhe, para não pirar. Nesse momento é tudo por ele e para ele.
Quando está limpo o suficiente, eu levanto meus olhos e encontro os
seus luxuriosos. Eu o prefiro cheio de tesão do que em arrependimento.
— Eu preciso de você! — diz me puxando pela nuca e beijando
suavemente meus lábios.
— Então pegue! Me use como quiser para extravasar essa angústia que
sente.
— Não quero machucá-la. — Me abraça apertado.
Eu sei que ele se controla e tenta ser mais cuidadoso agora que estou
grávida, mas eu gosto de todas as suas versões e amo quando me fode ou me
ama. Eu quero tudo dele e estou sempre disposta por mais. Levanto minha
perna e me encaixo em sua cintura sem tirar meus lábios dos seus. Levo seu
membro para dentro de mim e começo eu mesma a fodê-lo como sei que
deseja. Ele logo me joga na parede e arremete com mais força, me fazendo
gritar com a sua invasão bruta e certeira. Passo minhas unhas por suas costas,
o arranhando de leve e tirando dele um rosnado animalesco.
— Eu não quero que se segure, Vincent!
Mordo seu pescoço o fazendo gemer mais alto e meter mais forte em
minha vagina que pinga e se contrai querendo explodir em um orgasmo que
só ele é capaz de me dar.
— Vem amor! Me deixe te sentir gozar em meu pau! — Gira seu quadril
e atinge o local que me faz, alguns segundos depois, estar gritando seu nome.
Meu corpo ondula e eu me deixo vir, o fazendo grunhir e me
acompanhar logo em seguida. A água morna escorre entre nós, o deixando
ainda mais lindo com uma áurea quase selvagem.
— Te machuquei? — pergunta preocupado, me fazendo rir.
— Nem se você quisesse, me machucaria, Vincent. Nós estamos bem. E
você? Está melhor?
Ele abre um sorriso lindo me deixando saber que o tenho de volta.
— Estou ótimo! Obrigado! — Me beija de novo.
Saímos do banho e fomos em seguida até a cozinha para prepararmos
um lanche.
— Marco anda sumido. Está acontecendo alguma coisa? — pergunto
estranhando seu sumiço daqui.
— Ele está perseguindo sua presa.
— Presa?
— Sim! Ele libertou uma mulher tempos atrás em um dos seus trabalhos
e disse que se a visse de novo, iria matá-la. Agora que ele a reencontrou, ela
foge dele como o diabo foge da cruz por medo dele cumprir a promessa, e ele
está a perseguindo.
— Eu também fugiria. Marco me assusta até hoje.
Ele gargalha.
— Só quero ver a queda dele. Riu tanto de mim, que agora vai chegar a
minha vez de zoar com ele.
— Bom! Quem sabe assim ele amolece um pouco aquele coração de
pedra. Ashley até que tentou, mas não teve nenhum êxito.
— Nem me fale dessa garota. Só não fui atrás dela porque você pediu.
Espero nunca mais vê-la em minha frente ou não serei capaz de cumprir
minha promessa.
Também espero nunca mais vê-la. Não desejo o seu mal, mas torço para
que o caminho que ela escolheu, tenha realmente válido a pena ter jogado a
nossa amizade fora. Acho que todos nós depois de tudo que sofremos,
merecemos uma segunda chance.
Treze anos depois

— Papá! Papá! Gianna está treinando escondida com o Enzo. —


Matteo grita atrás de mim.
Agacho ficando a sua altura para entender melhor sua fala.
— Como assim treinando?
— Eu li no computador dela que ela está marcando de ir agora a tarde
encontrá-lo.
— Seu pirralho mentiroso! Você não tem lição de casa para fazer, em
vez de ficar me espionando?
— Eu sou um homenzinho e logo serei um mad man. Eu tenho que
proteger a família.
Sorrio com sua convicção. Ele só tem dez anos, mas é muito
disciplinado e aplicado nos seus treinamentos, ao contrário de mim na sua
idade. É claro que por enquanto só treina luta comigo ou Marco, porém, em
mais alguns anos, terá que avançar.
Olho para a minha filha, que o fuzila com os olhos.
— Gianna? Quantas vezes vou ter que dizer que não quero saber de você
fugindo e muito menos treinando sem supervisão?
— Ah! Pelo amor de Deus, papá! Você e tio Marco pegam leve comigo
só porque sou mulher. Eu quero treino pesado e com armas.
Para a minha perdição, ela é a cópia fiel da Lorena, tanto em beleza
quanto em rebeldia.
— Enzo é maior que você e já foi iniciado. Não quero que ele te
machuque, principessa, ou terei que puni-lo por isso e tenho certeza de que
Seu tio Marco não gostará de ver seu filho sendo castigado por sua causa.
— Isso é muito injusto! Na minha idade, Matteo estará se preparando
para ser iniciado, e só eu que tenho que ficar me humilhando para poder
aprender a me defender. Eu quero ser tratada como ele e receber o mesmo
treinamento.
Suspiro tentando buscar paciência do fundo do oceano. Ela ama armas
tanto quanto eu. Se eu for sincero comigo mesmo, ela é até mesmo melhor do
que seu irmão.
— Gianna, filha! Temos soldados para te proteger, então não precisa se
preocupar com isso. Continue somente treinado luta com sua mãe.
O fogo da teimosia se incendeia em seus olhos azuis.
— Um dia eu vou sentar naquela cadeira e irei mudar as leis onde
proíbem as mulheres de estarem no comando e ocuparem algum cargo.
Somos tão capacitadas quanto vocês!
Prendo a vontade de rir.
— E como vai fazer isso? — cruzo os braços, curioso por sua resposta.
— Tirando todos vocês do poder. Irei montar a minha própria equipe e
matarei todos aqueles que não aceitarem minhas ordens e ficarem em meu
caminho.
Bom! Por essa eu não esperava. Uso um dos meus golpes mais leves e a
derrubo no chão, a fazendo soltar um grito de surpresa. Levo meu punhal
para a sua garganta e pressiono levemente.
— Papai! — Grita assustada.
— Vincent? — Lorena me chama.
Olho para cima e digo com meus olhos para que confie em mim e não se
meta. Ela se afasta ao ver que estou apenas dando uma lição na nossa
pequena e provavelmente futura executora.
— O primeiro passo para mudar algo é ser cautelosa sobre o que fala e
com quem fala. Se você fosse qualquer outra pessoa, sendo mulher ou não,
meu punhal teria afundado em sua garganta agora. — Ela arregala os olhos
vendo a seriedade das minhas palavras.
— E teria coragem de me matar?
Amoleço um pouco meu tom, mas sem deixar de ser o capo nesse
momento.
— Eu teria que proteger a famiglia, filha. E se você for considerada uma
ameaça para todos, meu cargo não a protegerá de sua punição. Não se deve
ameaçar uma autoridade. Isso além de ser uma falta de respeito, é crime de
traição e motivo o suficiente para você ser condenada à morte. Pense bem
antes de fazer qualquer besteira e seja prudente nas suas escolhas. Entendeu?
— Sim, papá! Me desculpe!
— Eu te amo, principessa, mas não escapará das minhas punições se
tentar prejudicar a organização e me desrespeitar. — Beijo sua cabeça, a
liberando.
Seus olhos se enchem de lágrimas. Foda-se! Isso me dói! Mas tenho que
ser duro com ela. Se quer ser tratada como um dos homens, tem que aprender
primeiro a baixar a cabeça e receber ordens, mesmo não gostando. Ninguém
irá passar a mão na sua cabeça por ser minha filha. Se ela errasse, eu teria que
estar morto antes de deixar alguém tocar nela ou alguém da minha família. A
puxo para meus braços e digo olhando em seus olhos para que veja a verdade.
— Vista uma roupa apropriada, pois a partir de hoje aprenderá como se
manuseia uma arma.
— Sério?! Vai mesmo me ensinar?!
— Sim, bambina! Mas passo a passo. Nada de treinar sozinha, para não
se ferir.
— Você é o melhor pai do mundo! — diz me abraçando. — Eu prometo
que vou provar para você e para todos o quanto eu sou melhor do que
qualquer um dos homens da nova geração. — Se vira saindo saltitante do
cômodo com Matteo logo atrás a provocando.
Sei que no fundo daqueles olhos azuis gelados, ela falou sério. Vejo a
mesma determinação que eu tinha na idade dela. Se tiver um terço da minha
força de vontade, ela causará uma guerra até ter o que quer, e que Deus nos
proteja quando esse dia chegar.
— Eu estou ansioso para saber como ela irá burlar as leis da máfia.
— Não acha que foi muito duro com ela? – Lorena questiona me
olhando de longe.
— Ela precisa aprender a se controlar ou se colocará em grandes
problemas.
— Quer que eu fale a quem ela puxou?
Estico a mão para que venha até mim e sorrio a admirando. Vem
andando devagar em minha direção por conta da protuberância de sua barriga
de quase nove meses de gestação.
— Trate de colocar nosso bambino para fora, mia bella, que eu vou
precisar de um exército bem treinado para me ajudar a cuidar da nossa filha
quando ela ficar maior.
— E acha que seu exército parará a nossa Gianna?
Respiro fundo, imaginando o furacão.
— Acho que não. E isso me preocupa.
— Nada vai acontecer com nossa menina. Ela tem o melhor treinador.
A beijo sentido seu gosto viciante e gostoso que me deixa duro
instantaneamente.
— É melhor pararmos ou vou ter que te jogar na mesa do escritório e te
castigar por ser uma esposa tão provocadora.
— Eu adoro esses castigos, marido, mas vou dispensar dessa vez porque
estou sentido leves fisgadas desde a hora que acordei da minha soneca.
— Quer ir para o hospital?
Quando chegou o dia de Gianna nascer, eu estava uma pilha por ser pai
de primeira viagem e quase coloquei o hospital abaixo para que nos
atendessem. Na vez do Matteo, fiquei mais controlado. Nesse, estou ansioso,
porém tranquilo também.
— Ainda é cedo, e acredito que são contrações de treinamento.
— Então venha comigo e Gianna. Se caso as dores aumentarem, eu
estarei por perto.
Saímos para o treinamento e cinco horas mais tarde demos entrada no
hospital para o nascimento do nosso filho Dominic Lourenço. Minha esposa,
como sempre, foi maravilhosa e trouxe nosso pequeno ao mundo feito uma
verdadeira guerreira. E ali vendo nosso bambino ser amamentado pela mãe,
eu só podia agradecer por tantas maravilhas em minha vida. Consegui minha
vingança contra todos aqueles que prejudicaram minha família, me tornei o
capo e mudei muita coisa errada dentro da nossa organização, que ao longo
desses anos só prosperou ainda mais em meu comando, e de quebra formei
uma família linda e saudável com a minha amada. Eu sou um filho da puta
muito sortudo!
Fim!
Catharina Alencar é uma típica e honrada moça de igreja que foi criada
dentro de doutrinas e ensinada desde cedo que mulher servia ao marido e não
opinava em casa, muito menos fora dela. O que ele falasse era lei e ela
deveria seguir à risca ou estaria pecando contra os mandamentos divinos. Só
que ela não era feliz. Por trás da bela moça de olhos castanhos e cabelos
cacheados, tinha sofrimento, tristeza, mentiras e muita violência. Ela
aguentava tudo calada e perdoava por se achar merecedora de todo o castigo
que lhe era aplicado. Até que um dia ela conhece Gabriel Miller, seu novo
vizinho charmoso e com nome de anjo, mas que de santo não tinha nada. Ele
é um típico solteirão depravado e totalmente descompromissado, que
segundo ela, foi enviado pelo próprio Lúcifer para atentá-la e implantar
dúvidas em seu coração, das quais irão fazer a doce dona de casa se
questionar sobre tudo o que lhe foi ensinado e se despertar das mentiras e
manipulações que sofrera, desejando ser livre da prisão que se encontra.
Ela terá que escolher entre viver a vida fantasiosa que criaram para ela
ou seguir novos caminhos onde descobrirá os prazeres pecaminosos do corpo
e encontrará a libertação de sua mente.
O que fazer quando o que dizem ser pecado, se torna aquilo que te
salva?
A primeira vez que vi mamãe apanhar, eu tinha oito anos. No dia me
lembro de ter pensado que se eu e meu irmão apanhávamos porque tínhamos
feito algo errado, então ela também tinha, e era por isso que papai a
castigava. Aos doze anos, quando no meio de um importante jantar e com a
mesa lotada de parentes, ela derramou sem querer o caldo da sopa no colo
dele, ele jogou o seu prato em cima dela causando uma queimadura grave no
seu braço. Naquele dia eu percebi, pela primeira vez, que não precisava de
um motivo para sermos castigados, pois era a sua maneira de descontar suas
frustações diárias em nós, com motivos ou sem.
Eu torcia para que nunca entrasse em um relacionamento daquele e até
mesmo culpava a mamãe por aguentar aquilo calada e não fazer nada. Eu
dizia para a minha amiga que ela gostava de ser maltratada, porque se fosse
eu, teria revidado ou sumido no mundo. Ledo engano! A gente tem mania de
querer opinar sobre os assuntos dos quais somente conhecemos pela boca do
povo e não nos colocamos no lugar do outro, ou pior, queremos mandar no
coração e na mente de outras pessoas, como se tivessem um botão de liga e
desliga.
Com o passar dos anos, eu vi minha mãe sumindo e se tornando a casca
da mulher bonita e cheia de vida que foi um dia. Uma vez eu perguntei
porque ela não se separava dele ou denunciava o que ele fazia, mas ela
respondeu que não saberia para onde ir e que foi condicionada àquilo há tanto
tempo que passou a ver como normal. Eu fiquei horrorizada, é claro. Como
alguém se acostuma a ser tratada assim? Mas pouco tempo depois eu entendi.
Quando chegou a minha vez de sentir na pele o que ela falava, eu também
deixei, me calei e fui perdoando por amor e devoção, até perceber que aquilo
não era recíproco. Então me fechei, me diminuí e passei a simplesmente
ignorar tudo o que um dia condenei e julguei. O maior erro de quem passa
por algum tipo de agressão, é perdoar a primeira vez. Entendam! As outras
não são menos piores, mas tudo começa com a primeira. Os agressores
sempre irão entender que se você perdoou uma, vai perdoar as seguintes.
No início do meu relacionamento, tudo era lindo. Jorge era carinhoso,
me trazia presentes, chocolates e flores, além de me dizer palavras bonitas.
Mas isso foi até colocar a aliança em meu dedo. Lembro até hoje como foi a
primeira vez que me agrediu. Ele chegou estressado do trabalho por alguma
coisa que tinha acontecido e me deu um empurrão quando eu quis
erroneamente ajudá-lo perguntando o que tinha acontecido. Ele me pediu
perdão e eu deixei passar com a desculpa de que ele estava estressado e foi
minha culpa ir fazer questionamentos. Na segunda vez ele me chutou quando
sem querer queimei uma de suas blusas preferidas, e novamente achei que era
minha culpa por ser tão desastrada. A terceira foi porque eu me esqueci de
fazer a comida no horário e ele precisou esperar um pouco mais. Ali eu vi
que ele nem pedia mais desculpas, pois já tinha se acostumado a usar seus
punhos em mim. Fui falar com mamãe e pedir conselho, mas quando eu disse
o que vinha acontecendo, ela me chamou para orar e falou que Deus iria nos
ajudar. Só que essa ajuda nunca veio.
Com o passar do tempo, a situação foi ficando pior. Eu era humilhada
dia após dia. Elogios já não existiam mais, porque no lugar ficaram os
xingamentos e as ofensas. Cheguei a um estado de depressão tão profundo
que nem forças para me arrumar eu tinha mais. Foi aí que eu vi que tudo
poderia ficar ainda pior. Ele não só passou a me trair, como também começou
a destilar seu veneno sobre a minha aparência, deixando minha autoestima lá
embaixo. Quando me aconselharam a procurar ajuda psicológica, a resposta
que eu ganhei das pessoas da igreja e da minha família, era para que eu fosse
orar, pois a depressão era coisa do diabo, e se eu a tinha, foi porque eu dei
liberdade para a entrada dele. Será que eles não percebiam pelas minhas
olheiras e magreza que eu já morava com o próprio em casa? No fim das
contas, eu cheguei à conclusão de que eles poderiam ter razão e era realmente
uma doença causada por um ser maligno mesmo.
— Vós maridos, amai vossas mulheres como também Cristo amou a
igreja e a si mesmo se entregou por ela.
Sentada no último banco suspiro resignada ouvindo a explanação da
palavra de hoje. A palavra tão bonita se torna vazia e sem nexo quando sai da
boca do meu marido. Me pergunto se mais alguém aqui se sente assim ou se é
somente eu que estou fria ultimamente. Se devem nos amar como Cristo
amou a igreja, algo está errado, porque aqui os homens dão a vida, zelam por
seus cargos e amam a igreja até mais do que suas próprias famílias, enquanto
suas esposas são tratadas como seres inferiores e indesejados.
Tento pegar nem que seja um pedaço daquela palavra e guardar na
mente, mas a cabeça está longe daqui. Eu tenho que me lembrar pelo menos
um pouco do que ele disser, pois mais tarde, quando chegarmos em casa, as
perguntas irão se iniciar e eu tenho que estar com a resposta na ponta da
língua, ou só Deus sabe o que ele irá inventar dessa vez para me punir.
Observo as mocinhas sentadas na frente, quase babando por meu amado
marido, e em vez de ciúmes, sinto pena. Um dia foi eu ali, sonhado com o
belo príncipe encantado montado em seu cavalo branco, mas hoje eu sei que
eles não existem e que a maioria são sapos. Grandes, feios e nojentos. Se
todos soubessem o quanto o pastor de ovelhas lá na frente mais parece o lobo
em pele de cordeiro, as mulheres não iriam achar que tirei a sorte grande, e os
homens não iriam tê-lo como exemplo a ser seguido. Fala de amor, perdão e
arrependimento para os fiéis enquanto usa da força de seus punhos e de
palavras venenosas para resolver seus problemas matrimoniais.
A igreja está lotada e eu só quero sair correndo daqui para não falar com
ninguém, não ver as pessoas e nem ser obrigada a ouvir das mulheres o quão
maravilho ele é, enquanto eu sei o monstro que tenho dentro de quatro
paredes. Como é possível estar rodeada de pessoas e ainda assim se sentir
sozinha?
Um bebê chora ao meu lado e imediatamente minha atenção vai para a
mãe que o amamenta. Tenho certeza que meus olhos brilham de admiração,
pois a maternidade era um dos meus sonhos, mas até isso ele me tirou e eu
vivo na monotonia de uma vida sem graça, cheia hematomas, humilhações e
dor.
Volto minha atenção para o púlpito e tento me concentrar no que é
falado, pedindo a Deus que se eu for merecedora de alguma misericórdia sua,
que me ajude a aguentar essa vida ou ao menos mude ela um pouco. Não é
pedir muito, não é? Deus não pode ser a favor dessas coisas. Eu sei o que a
bíblia diz sobre nós mulheres, que devemos ser servas e esposas submissas, e
tudo mais, e não questionar as atitudes do marido, por ele ser o cabeça da
casa. Mas se somos castigadas pelo que a Eva fez, não seria mais fácil
extinguir logo nossa raça do que culpar somente um lado? Se parar para
pensar, a Eva deu a maçã, mas Adão quem escolheu comer. Por que os
homens foram perdoados e nós não? Não faz sentido sermos tão rechaçadas e
não termos os mesmos direitos se ambos pecaram da mesma forma.
Uma vez questionei a papai sobre o porquê de não podermos ter cargos
altos na igreja e a resposta que ganhei foi um tapa na cara, porque segundo
ele, eu estava pecando contra Deus e indo contra os mandamentos divinos.
Eu só queria entender, então não foi nada demais. Ou foi? Sei lá! Já desisti de
entender essa lógica. Só posso me lamentar pela vida miserável em que nasci
e sou obrigada a aguentar calada, sem reclamar, rogando proteção aos céus
para dormir e levantar com forças para enfrentar dia após dia esse casamento
tóxico, sem que me perca pelo caminho.
— Esse culto foi uma benção, não é? Jorge estava muito inspirado! —
Mamãe fala ao meu lado.
Esse é meu medo. A inspiração dele ir além da explanação e terminar
em meu corpo.
— É sim! Ele tem estudado bastante a bíblia. — Para aprender a enganar
mais o povo com suas mentiras.
— Você não parece muito feliz, querida. Há algo te incomodando?
Fora tudo?
— Não! É só cansaço. Hoje foi um dia de faxina em casa. Sabe como é!
— Forço um sorriso.
— Nem me fale! Amanhã é a minha vez.
— Pronta para irmos embora? — Jorge pergunta assim que se aproxima
de onde estamos.
— Claro! Já vou indo, mamãe.
Ela me puxa para seus braços.
— Não se esqueça de elogiá-lo sobre a palavra. Assim o manterá feliz e
ele não ficará aborrecido contigo. — ela fala baixo em meu ouvido.
— Sim. Pode deixar! — Dou um beijo em seu rosto e o acompanho.
A viagem de carro até nossa casa é no mais absoluto silêncio. Quando
chegamos, ele vai fazer sua troca de roupa, mas não antes de deixar suas
ordens.
— Esquente a comida, que eu estou com fome! — sua primeira palavra
dirigida a mim depois de horas conversando com as pessoas da igreja.
— Sim.
Lá se vai eu esquentar a comida, que por birra, ele não quis comer na
hora de irmos para o culto.
Ele volta e come calado, fingindo que nem estou ali.
— Essa carne parece borracha.
— Ela parecia macia quando fiz mais cedo.
Se levanta e joga a comida no lixo, tacando o prato dentro da pia.
— Seu discurso foi muito bonito. — tento seguir o conselho de mamãe e
distraí-lo.
— Não seja hipócrita! Pensa que não vi você dispersa durante o culto?
Seus olhos estavam em todos os lugares, menos em mim.
— É... Eu só estava olhando as pessoas. Mas escutei tudo!
— Não importa! Eu deveria ter me casado com Rosália quando tive a
oportunidade. Ela sim é uma mulher de fibra, elegante e digna de um pastor.
Está sempre sendo elogiada pelos irmãos e seu marido por ajudar na obra.
Você nem para isso serve!
— Como não? Eu ensino as crianças e ajudo as irmãs a ensaiarem suas
apresentações. — digo com a voz embargada.
— Foi bom você falar sobre isso. A irmã Raphaella ficará responsável
por esse posto, porque ela é melhor do que você com as crianças e tem sido
muito prestativa.
É claro que tem! Prestativa em ajudar nas coisas até mesmo fora da
igreja. Mordo a ponta da língua para não dizer exatamente isso. Estar em
meio as crianças era meu único momento de alegria, mas agora nem isso
terei.
— Tudo bem!
Não. Não está tudo bem. Ele está fazendo isso para me castigar. Tirando
o que eu mais gosto e dando mais uma coisa para a sua amante viúva.
— Ótimo! Pode usar melhor seu tempo aprendendo a fazer una comida
que preste.
— Vou tomar um banho. — eu aviso e ele dá um balançar de mão, como
se estivesse dizendo para que um cachorro saia.
Assim que chego ao banheiro me permito chorar por tamanha frieza.
Quando volto ao quarto, ainda que abalada e magoada, como todas as
noites, ele se deita ao meu lado e me procura para se satisfazer. Tenho que
suportá-lo entrando em mim e deixar que me tenha, como uma boa esposa
disposta, mesmo que eu ache errado. Porém, sou sua mulher. E se me
entregando a ele, já sou taxada como culpada por ele ir buscar fora de casa o
que diz que eu não dou, imagina se eu nego meu corpo para seu prazer.
Quando ele termina seus movimentos com um gemido animalesco, sai
de mim como se eu fosse uma mera prostituta. Sem beijo, sem toque, sem
palavras de carinho ou sequer a decência de perguntar se eu gostei.
Simplesmente acabou aí nosso contato carnal, que não é nada parecido com
os livros de romance que eu lia, do qual as mulheres pareciam gostar de ter
seus corpos usados e explorados pelos seus companheiros, e ainda sentiam
prazer com isso. Será que é tudo só ficção? Ou eu que tenho algum
problema?
Talvez ele tenha razão quando diz que nasci quebrada, e que por isso
sou fria demais. Como as pessoas podem gostar de ficar com vários parceiros
se é tão ruim assim? Viro para meu lado e caio no mundo dos sonhos onde o
homem da minha imaginação é um ótimo marido e é romântico, mas também
é depravado, me ama e me mantém segura, como todos os mocinhos das
minhas histórias românticas, que protegem as mocinhas.
Meu nome é Sarah Mercury, tenho 27 anos, sou formada em
administração, casada há 10 anos e mãe de três filhos que são
minhas razões de viver. Leitora compulsiva, descobri a leitura aos
sete anos de idade, e desde então, nunca mais parei.
Sempre sonhei em escrever, mas nunca tive a coragem de tirar
do papel. “Marcas do passado” foi a minha primeira obra, da qual
abriu caminho para o casal de “Razão e emoção” e ao casal do livro
“Nos braços do mafioso”. Espero que tenham gostado, pois fiz com
muito carinho. Me acompanhem no Instagram (@sarah.mercury)
para ficarem por dentro das minhas próximas obras.
Até logo!

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