Entre Caminhos:: O Ensino Do Desenho - Que Tipologias de Aula?

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Joana Bárbara Ferreira Macedo

Entre Caminhos: O Ensino Do Desenho – Que Tipologias


De Aula?

Relatório apresentado na Faculdade de Psicologia e de Ciências da


Educação da Universidade do Porto e Faculdade de Belas Artes da
Universidade do Porto, para obtenção do grau de Mestre em Ensino de
Artes Visuais no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário.

2018
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Joana Bárbara Ferreira Macedo

Entre Caminhos: O Ensino Do Desenho – Que Tipologias


De Aula?

Relatório apresentado na Faculdade de P sicologia e de Ciências da


Educação da Universidade do Porto e Faculdade de Belas Artes da
Universidade do Porto, para obtenção do grau de Mestre em Ensino de
Artes Visuais no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário.

Orientador: Professor Doutor Paulo Nogueira

Professora Cooperante: Professora Augusta Medeiros

Escola onde decorreu o Estágio: Escola EB 2/3 e Secundária de Ermesinde.

Relatório de Mestrado

Ensino de Artes Visuais no 3º Ciclo

do Ensino Básico e no Ensino Secundário

2018

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Resumo

Bem-vindos a bordo. O presente relatório revela um acontecimento e uma


reflexão em volta da experiência de estágio numa escola pública. O ponto de
partida é a Escola Secundária de Ermesinde, onde foi desenvolvido o estágio em
questão, entre outubro de 2017 e junho de 2018, na turma de 12º J,
especificamente no âmbito da disciplina de Desenho A.

Ao longo do documento são desenvolvidos vários percursos em torno do


desenho, sendo este o tema em estudo. Salienta-se a reflexão sobre o desenho e
as marcas que este deixa ao longo do tempo, assim como as influências que
trilha. Ao nível da experiência, foram desenvolvidas práticas que atuam como
um complemento ao que se prevê em lecionação para a unidade curricular de
Desenho A, partindo do programa inscrito pelo Ministério da Educação, que
prevê para o presente ano letivo a realização de um exame nacional.

Com bagagens de experiências e vivências, explora-se a tipologia da aula


de campo como uma das possibilidades a desenvolver no ensino e aprendizagem
do Desenho. Exploram-se diferentes metodologias pedagógicas na prática da
atividade lecionada, que, por sua vez, têm como base princípios do projeto
Learning by Design. Espera-se encontrar a partir destas distintas tipologias de
ensinar o desenho, uma forma de chegar a todos os alunos.

Sendo assim, apresentam-se os vários caminhos percorridos, não na


tentativa de apresentar uma fórmula de solução, mas antes questionar e refletir
sobre a disciplina do Desenho e práticas associadas.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Abstract

Welcome aboard. The present study reveals an event and a reflection


concerning the internship experience in a public school. The starting point is
the Ermesinde Secondary School, where the mentioned traineeship was
developed, between October 2017 and June 2018. The studied object was a 12th
grade class, specifically in relation to the course of Drawing A.

Throughout this document several paths around drawing are developed,


this being the main topic of study. A reflection on Drawing is highlighted, as
well as the footprints that it leaves over time and the influences that follow.
Concerning experience, practices that complement what is expected to be
taught in the Drawing A course have been developed, based on the program
registered by the Ministry of Education, which foresees for the current school
year the execution of a national examination.

With the experience acquired in the past, the typology of the field class is
explored as one of the possibilities to develop while teaching and learning
Drawing. Different pedagogical methodologies, which are based in the
principles of the project Learning by Design, are explored. It is expected to find,
based on these different lecturing typologies, a way to reach all the students.

Thus, various paths that were followed are presented, not in the attempt
to create a general solution, but rather to question and reflect on the course of
Drawing and associated practices.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Résumé

Bienvenue à bord, Ce rapport révèle un événement et une réflexion à


propos de l'expérience d'apprentissage dans une école publique. Le point de
départ est le Lycée d'Ermesinde, où le stage a été développé entre octobre 2017
et juin 2018, dans le groupe de Seconde spécialisé en Dessin. Tout au long du
document sont développés plusieurs cours autour du dessin, celui ci étant le
sujet du stage. Il souligne la réflexion sur le dessin et les marques qu’il laisse au
fil du temps. En termes d’expérience, les pratiques ont été développés pour agir
en complémentarité de ce qui est attendu du programme inscrit par le ministère
de l’éducation. Aussi, un examen final est prévu pour l’année en cours. Grâce à
certaines expériences, nous avons constatés que certaines sorties en dehors du
lycée seraient une des possibilités de développement dans l'enseignement et
l'apprentissage du dessin. Différentes méthodologies pédagogiques sont
explorées dans la pratique de l'activité enseignée, qui, à son tour, sont basées sur
les principes du projet Learning by Design. On espère trouver de ces différents
types d’enseignement, un moyen d'atteindre tous les étudiants. Ainsi, les
différentes voies sont présentées, non pas dans le but de présenter une formule
de solution, mais plutôt de questionner et de réfléchir sur la discipline du
Design et des pratiques associées.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Agradecimentos

À Escola EB2/3 e Secundária de Ermesinde, especialmente à Professora


Augusta Medeiros pelo acompanhamento sempre atento, pela recetividade em
todos os assuntos, pela simpatia e boa disposição, e por me permitir uma
frequência ativa nas suas aulas; não deixo de agraciar à Professora Eugénia
Sebastião pela sua afabilidade e disponibilidade, assim como às funcionárias do
bloco de mecânica que sempre foram prestáveis, amáveis e atenciosas.

Aos alunos com quem interagi, que permitiram entrar nas suas rotinas,
partilhar as suas vivências e conhecer um pouco mais dos seus mundos (ao 12º J
e 8º PD);

Ao Professor Paulo Nogueira, pela disponibilidade, acompanhamento e


orientação, pelas palavras ditas (e escritas) que tornaram o meu processo de
escrita menos angustiante; pela inquietação deixada através do questionamento
contínuo para encontrar alguma tranquilidade;

Aos Professores do curso de Mestrado de Ensino em Artes Visuais, pela


partilha de experiências e demais ensinamentos

Aos colegas de mestrado, com quem partilhei momentos de reflexão e,


também, de descontração;

Aos meus pais, pelo apoio constante e estarem sempre presentes.

Ao Zé e a Eva pela imensa paciência e tolerância, a quem peço desculpa


pelas minhas ausências, especialmente nestes últimos meses.

À Vera, que permitiu manter-me focada e foi/é minha âncora nas


inseguranças e dificuldades.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Índice

Abstract ......................................................................................................................................... 6
Résumé .......................................................................................................................................... 7
Ponto de Partida.......................................................................................................................... 13
Parte I .......................................................................................................................................... 19

Desenho na Escola ................................................................................................ 19

Parte II ......................................................................................................................................... 35

1. Desenho: o que pode ser dito ..................................................................... 35

2. Desenho: os vários papéis ........................................................................... 39

3. Dos exercícios às aprendizagens do desenho ............................................. 46

4. Learning by Design e o planeamento da proposta ..................................... 49

Parte III ........................................................................................................................................ 59


As minhas propostas – da teoria à prática .............................................................................. 59

1. As aulas que dei ........................................................................................... 59

Considerações finais .................................................................................................................... 73


Bibliografia .................................................................................................................................. 75
ANEXOS ....................................................................................................................................... 81

Anexo I .................................................................................................................. 81

Anexo II ................................................................................................................. 85

Anexo III ................................................................................................................ 89

Anexo IV ...................................................................................................................................... 91

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Ponto de Partida

O presente relatório prende-se com o narrar de um tempo. Parto de


observações e de anseios por descobertas na observação da turma. Descobertas
que se prendem com questionamentos, em alguns casos para se encontrar um ou
vários caminhos, em outros casos assume-se o questionamento. Para me situar
tenho de olhar para dentro, fazer uma introspeção do que faço aqui e que lugar
ocupo. Todos os caminhos têm uma estação de partida, que, por apeadeiros e
estações, nos levam a um destino que não tem de ser o final. A analogia ao
comboio e aos seus percursos vem da minha descoberta nas viagens que fiz para
o estágio que realizei no presente ano letivo. É nestes momentos que olho para
dentro, que reflito e divago, quase como uma suspensão no tempo, para refletir
nas práticas sociais em torno da escola, do desenho e do estágio em si.

Numa apresentação/conversa “olhar a folha com olhos de fala”, inserida


na programação do Zine Fest.pt de 2017, com a participação de Regina
Guimarães, Saguenail e PAM1 falavam, entre várias coisas e evocando diferentes
autores, sobre o erro. Saguenail, com sombras de Descartes2, compara o erro a
estar perdido numa floresta. Como é que se sai de uma floresta? Não podemos
andar à volta aleatoriamente, temos de escolher um caminho e ir sempre em
frente, podemos vir a descobrir ser o caminho errado, mas em qualquer escolha
tomada “em frente” temos, na verdade, menos hipótese de errar. Haverá o
contrário do erro? Como sabemos o que está certo? Mais vale um erro
sustentável. Na ciência justifica-se o certo após vários erros (tentativa-erro),
ainda que tal movimento apenas traduza uma certeza temporária.

Assim, neste documento retrata-se uma narrativa de descoberta, tanto a


partir de uma escrita desenhada à medida dos erros de percurso, como da

1
PAM – nome artístico de Paulo Ansiães Monteiro
2
Saguenail nesta conversa evoca inúmeras vezes o filósofo Descartes para justificar o erro.
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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

performance de estagiária, social e institucionalmente expectável. Ao longo da


minha experiência de estágio no ensino do Desenho, fui convocando diferentes
entradas e saídas “de carruagem”, segundo um processo que pode assemelhar-se
à leitura de diferentes perspetivas sobre uma mesma realidade social, neste caso,
a realidade particular de uma escola pública e as práticas de ensino e
aprendizagem do desenho, conhecidas e desenvolvidas no contexto de uma
turma do 12º ano. Ao convocar diferentes leituras sobre a relação com o
Desenho relaciono-me igualmente com as minhas próprias memórias. Lembro-
me não de uma situação escolar em particular, mas de brincar num atelier, e de
como a experiência do contacto com os materiais artísticos, entre eles de
Desenho, marcou os meus modos pessoais de encarar esta forma de linguagem e
os seus significantes. As minhas brincadeiras são no chão, com folhas e
riscadores, e muita música à mistura. Clareia-se um percurso em que as artes se
tornam cada vez mais presentes. Tive a sorte de não ser bloqueada por quem me
rodeava na liberdade da minha linguagem visual, antes até estimulada. Penso
retroativamente que se houve algum bloqueio naquilo que dizemos ser a nossa
“capacidade de expressão”, tal sucedeu mais tarde, com a entrada na escola As
limitações e regras impostas pela instituição escolar podem levar a um
distanciamento e a um sentimento de frustração, ambos complexos do ponto de
vista da condição social de aluno à qual a escola frequentemente nos reduz. No
entanto, encontrei nestes bloqueios escapes e formas de tentar encontrar-me e
de procurar caminhos alternativos para construir um modo de desenhar. Seja
como for, isto leva-me a pensar que, frequentemente, as normas curriculares
culturalmente instituídas e reproduzidas pelas escolas (como por exemplo, a
noção “de bom e mau aluno”, o discurso salvacionista da criatividade presente
nos programas e nas práticas escolares, as regras e as lógicas da classificação, o
predomínio do discurso da excelência dos resultados, entre outros aspetos)
podem constituir-se numa parte significativa, se não mesmo determinante, das
razões que levam um determinado aluno a romper a sua ligação pessoal, única e
singular com o desenho.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

No que a mim me toca, não sei ao certo quando se deu o momento de


abandonar o desenho enquanto prática de comunicar e ação artística, mas foi já
em idade adulta. Talvez reflexões e inibições por me sentir incapaz de progredir
tenham sido responsáveis por deixá-lo em standby. Em paralelo, existe algo que
não desapareceu, o fascínio e a paixão pela arte.

Cheguei ao apeadeiro do ensino por acidente e tem vindo a tornar-se num


trilho cada vez mais afincado e crescente. Para me situar, evoco memórias,
imagens de professores e educadores que, de alguma forma, deixaram marcas
positivas em mim. Foram aprendizagens e marcos que irei ter como referência
enquanto futura docente. É nessas imagens que me projeto e projetei ao longo
desta experiência de estágio. O maior marco de referência que guardo da minha
relação com os professores é a relação interpessoal. O que é isto de nos
relacionarmos uns com os outros, de criar empatia? Quem são esses “outros” que
marcaram o nosso percurso pessoal e académico e que através do tempo parecem
inscrever-se em nós e nas nossas práticas enquanto docentes num campo tão
singular como o do ensino do Desenho? Felizmente, posso afirmar que é
sobretudo essa dimensão muito positiva da relação interpessoal que mais se
projeta na imagem que agora construo de mim enquanto professora.

Como instrumento de memória e estudo, observo no diário de bordo que


os momentos que inicialmente foram objeto de registo relacionam-se com os
modos particulares de a professora cooperante dialogar com cada um dos alunos,
dentro e fora da sala de aula. Crio empatia com ela e, em certos pontos, revejo-
me nela, assim como me vêm à memória alguns professores que me marcaram.
No entanto, protejo-me neste papel de estagiária e encontrei-me com algum
receio e bloqueios. Acredito que o tempo ajuda, o tempo vai dar confiança, este
tempo de observação, de conhecer os alunos, de parar para com eles conviver,
acompanhar algumas das suas experiências. Aos poucos ganho confiança, circulo
na sala, observo, paro, escuto. Há alunos que se fecham, outros enfrentam-me,
outros são indiferentes. Abordo-os por meio de discurso de circunstância,
procuro provocar desbloqueios para chegar aos alunos. A aluna x já está
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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

confortável, e eu também, e assim falamos sobre o desenho e os exercícios que


estão a desenvolver. Com o andar da carruagem vou circulando e pouco a pouco
vou chegando a todos alunos. Pergunto-me como sou como aluna, como era na
idade deles e, mais uma vez, lembro-me de que a boa e descontraída relação
ajuda a desbloquear. Os professores por quem tinha mais admiração, para os
quais tinha maior abertura e maior prazer em realizar tarefas, eram os que
tinham uma boa empatia, aqueles que olhavam para mim como alguém, como
pessoa, com interesses, pensamentos e objetivos, e não como uma mera aluna.
Projeto-me nesta imagem como estagiária/futura professora.

Com a naturalidade do desenrolar do estágio aproxima-se a inquietação


da prática da aula. Que tipo de aula iria desenvolver e que temáticas iria
abordar? Mais uma vez parti da minha experiência pessoal. Ao longo do meu
percurso enquanto aluna, apre(e)ndi muito com as visitas de estudo, portanto
teria como objetivo preparar uma aula de campo3. A temática sujeita a
planeamento e intervenção nas aulas que desenvolvi, e sobre a qual mais à frente
irei falar, surge inerente ao facto de o estágio se desenvolver no âmbito da
disciplina de Desenho A. Ainda assim, é reforçada com a minha observação dos
alunos e das dificuldades que me apercebo que têm ao realizar exercícios de
observação e de traço rápido. Assim, a temática geral partiu da realidade do
desenho na sala de aula e dos diferentes modos de os alunos se relacionarem com
este discurso e prática, não só do ponto de vista do que desenhavam em função
dos exercícios exigidos (especialmente no contexto de fim de ensino secundário),
mas sobretudo em termos das possibilidades e/ou modalidades de desenho que
poderiam ensaiar no contexto das suas aprendizagens.

3
Lembro-me, e relato aqui, um pequeno episódio de uma aula de campo. Aconteceu no meu 10º ano
(2001), em contexto da então, unidade curricular de História das Artes. Durante dois dias fizemos um
roteiro sobre as pinturas rupestres em Foz Côa. Além das aprendizagens inerentes à disciplina, ver o
registo milenar das pinturas rupestres, o professor em questão, alertou sempre para o despertar do
olhar, o olhar em volta, questionar permanentemente. Ainda hoje me lembro do cheiro daquelas serras,
a cor das rochas e, sempre que vejo uma capela ou igreja, lembro-me das aprendizagens que este
professor transmitiu, de onde vêm os elementos de tal capela, ser curiosa em relação ao porquê da
existência de tal presença.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Pretendo refletir/descobrir/explorar o que é para os alunos o desenho e


como estes veem o desenho. Como é ensinar/aprender desenho? Que tipo de
desenhos conhecem e nos quais se revêm? Que dizem da experiência da aula de
campo e da prática de exercícios nas aulas de desenho?

Assim, começo este relatório com uma reflexão sobre a Escola, para logo
de seguida apresentar a escola particular em que realizei a experiência de
estágio, assim como a caraterização da turma em questão. Posteriormente,
abordo, ainda, o questionamento dos vários papéis do desenho e a pertinência do
exercício do desenho. Ao falar do desenho enquanto linguagem e gramática,
questiono ainda o que é, e o que pode ser o desenho. Além de procurar qual o
lugar que o desenho ocupa na formação e na aprendizagem do aluno, quer pelo
lado social e cultural, como pelo lado técnico, pretende-se também, explorar o
exercício do desenho e o que se encontra inerente às práticas do desenhar, como
o nomear e o treinar dos possíveis traços e linhas desenhadoras. No final do
relatório, reflito sobre a minha experiência da lecionação, a qual subtendeu
diferentes tempos e contextos letivos, bem como um dispositivo de planeamento
– Learning by Design – cujos procedimentos apoiaram a minha proposta de
intervenção didática. Nessa secção, apresentam-se assim os objetivos e o relato
das aulas, assim como as reflexões críticas aí implicadas. Por fim, com este
relatório, e à medida que reflito na minha experiencia de estágio, procuro
aprofundar, principalmente, duas questões: poderemos todos aprender a desenhar?
Como aprender a desenhar? Não deixo de frisar que por detrás destas questões, se
encontra camuflada a interrogação, como ensinar a desenhar?

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Parte I

Desenho na Escola

a. A Escola

Antes de particularizar a Escola Secundária de Ermesinde, contexto no


qual realizei o meu estágio, procuro caminhos para tentar compreender e
explorar o sentido da Escola. Farei aqui uma breve aproximação.

“A humanidade não se enganou quando constatou que era preciso,


necessariamente, dar lugar às exigências da aprendizagem. Isto
significava consagrar tempo à aprendizagem e também um período da
infância centrado sobre ela, adultos destinados a ajudar os indivíduos
durante a aprendizagem, edifícios construídos para acolher estes
indivíduos, quantias monetárias destinadas a financiar estes
empreendimentos, etc.”

Lobrot (1992: p.9)

A Escola, tal como foi sendo configurada, sofreu um longo processo de


secularização, passando por várias fases e doutrinas diferentes. Assume-se que a
Escola que hoje se conhece vem dos tempos da Revolução Francesa, do séc.
XVIII. A propósito do surgimento dessa Escola Moderna, e ainda nas palavras
de Lobrot,

“Na verdade, a Revolução não se encaminha totalmente neste sentido, reclama,


sobretudo, a generalização da instrução pensando ingenuamente (por vezes sem

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

ingenuidade) que esta constitui por si só (excluindo a cultura) o motor do progresso


social e humano. Será necessário esperar por Napoleão, pela lei Falloux…. Esta nova
ideia é a de que a Escola se destina a disseminar a sabedoria e não a doutrina religiosa
e os bons costumes (…) A causa mais profunda é o triunfo das conceções estatais após
o desenvolvimento do absolutismo na época clássica. Agora a sociedade é concebida
com uma grande máquina que os dirigentes políticos conduzem à prosperidade. Nesta
máquina, é importante que cada um ocupe o seu lugar e trabalhe, o que implica
aptidões e capacidades. Estas adquirem-se na escola, e entre elas, a aprendizagem da
leitura – a alfabetização – constitui a base. Assim, a escola assume um papel
principal.”

Lobrot (1992, p.31)

Neste contexto, a Escola passou a assumir uma função social específica,


estando vinculada com a “difusão da sabedoria”, considerada essencial para que
uma sociedade, em nome do progresso e da técnica, funcione enquanto tal. À luz
deste pressuposto, o “saber” é encardo como um bem social, cultural e técnico,
esperando-se, por via de profissionais especializados na prática de ensinar,
“reduzir a ignorância” e assegurar o contínuo ajustamento profissional e útil às
necessidades de progresso e de mercado. Na constituição da Escola enquanto
instituição histórica e cultural, assume-se que o saber é de tipo disciplinar,
segundo uma estrutura formal que define hierarquias e classes na figura de
cursos, programas, turmas e exames homogéneos, os quais têm em vista seriar e
classificar “aptidões” consideradas funcionais à organização das sociedades e às
necessidades, também elas socialmente divididas e determinadas, de trabalho.
Ferdinand Buisson declarava, no seu Dictionnaire de Pédagogie, que “o principal
objetivo dos exames é pôr os alunos a trabalhar, a vencer a sua preguiça natural. A
avaliação é secundária e, aliás, nestes casos, a sua realidade é discutível.” (Lobrot, 1992,
p.82). Aqui se anula a subjetividade, tornando-se o aluno num automatismo,
colocando-o numa lógica de funcionamento, dada a ameaça de fracassar perante
as necessidades consideradas úteis à sua sobrevivência no mercado de trabalho.
Esta lógica de encarar o sentido da Escola funcionou tão bem no início do século
XX que ainda hoje, na verdade, perdura.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

A Escola é uma máquina bem montada e muito organizada, e as


disciplinas são dispositivos que sujeitam os alunos à obrigação de que esta
“fábrica” funcione. O treino repetitivo do desenho com que a maioria dos alunos
se vê confrontada na Escola, já que uma mão treinada responde melhor e mais
depressa a um exame nacional de duas horas, leva-me a questionar sobre o
sentido do que virá depois. A engrenagem neste apeto funciona, porque a atual
obsessão das Escolas pelos “bons resultados” e pela eficácia do desenho dos
alunos é o reflexo de uma racionalidade meritocrática imposta pelos rankings,
cuja prevalência nos últimos anos, ao ser encarada enquanto fator de “medida”
das aprendizagens” tem conduzido a graves desigualdades no espaço geoescolar
(pensando nos diferenças sociais e culturais que atravessam o território
português), além de produzir falsas representações sociais sobre a qualidade do
trabalho escolar. Assim, onde está, então, o cidadão excecional? O que é isto de
ser um cidadão excecional? É preciso fazer uma paragem urgente e refletir,
olhar para todos os pormenores e para toda a diversidade de fatores de que se
constitui uma escola em particular, muito além da conceção dominante de Escola
que temos vindo a referir.

A Escola, dentro desta conceção dominante, tem assim em vista formar


alunos que se tornem aptos para procurarem, por si próprios, as soluções para os
problemas que ao longo das suas vidas vierem a colocar-se frente à necessidade
de sucesso, considerada além disso vital em todas as suas áreas de atuação
pessoal, social e profissional. Neste sentido, o desenho encontrou, em parte, a
sua identidade disciplinar na Escola colando-se à psicologia da forma. O desenho
na escola “elegeu a cognição como centro irradiador do conhecimento, no interior de
condições invariantes, estádios universais de desenvolvimento, ao serviço de resolução de
problemas. O pensamento era entendido como meio invariante, através do qual o sujeito
apreendia o objeto e se dava a conhecer” (Penim, 2003, p.162). Questiono-me se não
foi a partir desta aliança do Desenho à Psicologia Cognitivista,
fundamentalmente de base piagetiana, que o ensino do desenho na Escola tem

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

vindo a ser instrumentalizado na base de preocupações educativas consideradas


úteis ao bom desenvolvimento das aprendizagens dos alunos.

Com base nesta aliança, que de resto surge refletida nos programas da
disciplina de Desenho nos ensinos básico e secundário, a conceção de um
currículo considerado artístico aliou ainda um ideal de estética a uma
psicologização do desenvolvimento das aprendizagens do desenho, sujeitando o
sentido da formação escolar a categorias historicamente definidas pelo campo do
Belo e do Sensível. Nesta ordem de ideias, caberá então à Escola o papel de
afinar progressiva e esteticamente esta natureza considera intrinsecamente bela
do Desenho, e no âmbito da qual os mecanismos da manipulação, da seleção,
bem como da organização de materiais, cores e formas vieram estabelecer-se ao
serviço de uma autoconstrução do eu através da atividade produtiva do aluno.

Todavia, sendo a sala de aula o lugar social que, na escola, determina


significativamente o sentido das múltiplas relações com o saber, é fundamental
compreender as diferentes narrativas dos jovens sobre as experiências que aí
vivenciam, no sentido de conhecer alguns dos fatores que contribuem para essa
construção do saber. A propósito de uma conceção dominante de Escola e das
questões da relação com o saber, Correia, (2001: p.15) deixa-nos o desafio de
desenhar outras narrativas profissionais, as quais “permitam aos professores
inscrever-se, escrever e desenhar as suas subjetividades e as suas vivências para lhes
darem uma expressão pública… possam contribuir para a construção de uma profissão
solidária e crítica alternativa à profissão solitária e deficitária…”.

Muito do que é preciso, senão o mais necessário no exercício da docência,


é a permanente reflexão. Elvira Leite (2001) empresta-nos um facto, “os
professores em formação consideram restrito o tempo de reflexão sobre conteúdos
programáticos e práticas letivas” (AA, 2001:20). É urgente criar tempo ou, pelo
menos, criar momentos para intercomunicar, pois “teremos todos porventura algo
em comum – o questionamento, a procura de referências, o desejo de perspetivar com
qualidade o trabalho no terreno, partilhar estímulos e informações. É premente que

22
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

deixe de haver ilhas, que se perceba que o ensino não se constrói com pessoas isoladas.”
(idem).

Por outro lado, Alberto Carneiro (2001:34) enfatiza que “a didática do


ensino do desenho tem que passar pelo aluno”. Ele próprio, aquando docente, teve de
“redimensionar a orientação pedagógica, no sentido de fazer o levantamento do que
seria fundamental para cada aluno. (Carneiro, 2001: 34). Nas suas palavras:

“O desenho é uma escrita do corpo que revela o mais íntimo dele. A consciência do que
se aprende com o desenho passa pelo ato do próprio desenho, a relação
ensino/aprendizagem tem que ser centrada na individualidade de quem desenha e
aprende o desenho…embora tenhamos de colocar e ensinar as questões universais do
desenho, aquelas que possam definir a correspondente gramática e os conhecimentos
específicos, a utilização dos instrumentos e a construção das ideias é, de facto, pessoal e
passa necessariamente pela reflexão sobre a sua própria experiência de desenho.”
(Carneiro, 2001:34,35)

Um erro muito comum quando se fala do desenho é vê-lo como uma obra
acabada, assim como achar que este se pode realizar de uma forma imediata. O
desenho final identifica-se com o estilo4, com o conceito que define a tendência
do autor. Logo, é um erro considerar que para criar uma obra «concetual» só se
possam fazer «desenhos concetuais», e que para criar um desenho segundo um
estilo «barroco» só se desenhe barroco (Molina, 2005: 98). Enquanto docentes,
teremos que proporcionar qualidades muito diversas antes da planificação do
projeto através do qual o aluno (desenhador) vai desenrolando o seu
pensamento, saltando de um sistema para outro, segundo as necessidades de
visualização ou previsão que veja como necessárias. De facto, e como mais
adiante procurarei problematizar, a maior parte do que se nomeia no desenho
realiza-se por meio de projeções de outros conhecimentos analógicos, estruturas,
linhas de força, direções e modelos fictícios de luzes inexistentes, a partir e no
interior das quais «vemos o invisível» (Molina, 2005:121).

4
Estilo refere-se à assinatura do artista, podemos falar de um estilo de artista quando este tem uma
linguagem visual própria, que o identifica enquanto único e referenciador.
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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Em suma através do que aqui quis notar, considero que o eventual


interesse dos alunos pelas aulas de Desenho nem sempre é proporcional às
relações pedagógicas que no seu seio se desenrolam, isto é, as aprendizagens do
desenho realizam-se e adquirem um sentido próprio no contexto de diferentes
relações pedagógicas com o saber. Considero ainda que para grande parte dos
jovens a relação com o desenho, uma relação variável ao longo da vida e
intimamente conectada com as aprendizagens que vai realizando, provém da
descoberta de si mesmo, da sua identidade e da sua experiência de relação com o
outro, na descoberta de um mundo de possibilidades. Assim, para um professor,
a necessidade de relacionar a sua prática educativa com os interesses dos alunos
passa por conhecer o mundo do aluno, o seu meio de ação. (Penim, 2003 :130)

“É-lhes dada a palavra. Para que esta nos ajude a passar do nosso mundo para o deles”.
Charlot (2009:9)

b. Esta escola em particular

A escola onde me insiro enquanto estagiária, e a partir qual surge a


maioria das minhas questões e problemáticas relacionadas com as aprendizagens
do desenho, é a Escola Secundária de Ermesinde (ESE), do Agrupamento de
Escolas de Ermesinde, pertencente ao concelho de Valongo. É uma escola onde
estão inseridos alunos desde o 2º e 3º ciclos de Ensino Básico até ao Ensino
Secundário, com cursos científico-humanísticos, como Ciências e Tecnologias,
Ciências Socioeconómicas, Línguas e Humanidades e Artes Visuais, englobando,
ainda, cursos Profissionais, como Técnico de Design Gráfico, Técnico de Gestão
de Equipamentos Informáticos, Animador/a Sócio Cultural e Técnico de
Eletrónica, Automação e Comando. Esta escola integra, ainda, cursos CEF
(Cursos de Educação e Formação) de tipo 3 (de equivalência ao 9º ano de
escolaridade), englobando, assim, um grande número de alunos, e colocando em
confronto e/ou em harmonia, uma grande diversidade etária, económica e
cultural.
24
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Uma das particularidades da Escola Secundária de Ermesinde, tal como


afirma o Diretor do Agrupamento, Dr. Álvaro Pereira, numa entrevista pública
sobre esta escola, parece inscrever-se no atual discurso da excelência académica
ao qual atrás fizemos referência. Nessa entrevista, e referindo-se aos alunos,
considera que “queremos que sejam alunos excelentes, mas, acima de tudo, que sejam
cidadãos excelentes”5. Percebe-se assim que esta escola procura formar alunos para
uma sociedade fortemente marcada pela ideologia neoliberal da excelência, o que
faz com que o paradigma que preside ao projeto educativo da escola pareça
subordinar-se a uma lógica também ela marcada pela aposta nos resultados e
pela forte competitividade que caracteriza as “exigências do mercado de
trabalho”, e para as quais parece já não ser suficiente ser-se um bom cidadão,
tem de se ser excelente. Questiono-me acerca do que é isto da excelência, do
cidadão excelente. Bastará só estar preparado para o mercado de trabalho? E,
numa escola que se rege por rankings e resultados, qual é a coerência de um
discurso de excelência, onde tudo é controlado por normativos e requisitos
impostos? E os que fogem à norma, não poderão ser excelentes cidadãos? É
certo que esta é a realidade que nos é imposta, contudo não posso deixar de me
questionar.

A Escola Secundária de Ermesinde detém um Projeto Educativo que


nasce da vontade de um programa legal e político de reforço da autonomia das
escolas (Decreto-Lei Número 43/89 de 3 de fevereiro), no âmbito de políticas de
desconcentração e de descentralização da educação. No seu Projeto Educativo
do Agrupamento (PE) é referida a missão de serviço público que atravessa a
política pedagógica da escola:

“(…) move-nos a vontade de tornar o Agrupamento um espaço de aprendizagem e de


interação, onde os alunos/formandos encontrem as condições propícias a um ensino de
qualidade e onde possam “crescer” enquanto cidadãos ativos, responsáveis, autónomos,
participativos, com espírito crítico e respeitadores dos princípios democráticos e da diferença.

5
Citação retirada de um vídeo promocional da Escola Secundária de Ermesinde, realizado pelos alunos
de Artes do 12º ano, em 2017. https://www.youtube.com/watch?v=q2LZ7qGg1jE&t=24s
25
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Nesta linha de vontades, adotámos o lema Conhecimento e Humanismo. Norteiam-nos


valores éticos, de solidariedade, igualdade e respeito pela diferença. Queremos um
Agrupamento ajustado às necessidades da sociedade, alicerçado não só em princípios de rigor,
justiça, eficiência e responsabilidade, mas também de cooperação, criatividade e autonomia.”

Projeto Educativo Do Agrupamento De Escolas De Ermesinde 2013/2017 p.3

Assumem como prioridades para o seu PE a promoção do sucesso


educativo, assumindo-se o Agrupamento como um polo de cultura, socialização
e formação, tendo como objetivos melhorar a comunicação, desenvolver o
sentido de pertença ao agrupamento e gerar condições de realização profissional.

As instalações da escola sede, a ESE, foram selecionadas para a 3.ª fase de


requalificação das escolas secundárias, pois necessitavam de uma intervenção
urgente de reparação/modernização, dados os sinais evidentes de desgaste e
degradação. Constatei que era uma necessidade muito desejada por toda a
comunidade escolar, embora tenha verificado a existência de alguns incómodos,
como a reorganização da escola para albergar os estudantes, apeto que tem
vindo a criar uma gerar uma forte ansiedade para que a reparação termine em
breve. Perguntando aos alunos como veem estas obras, praticamente todos me
responderam que estas são necessárias, mas que se perdeu uma identidade
artística que a escola, segundo eles, possuía, ao referirem os painéis e as pinturas
realizados pelos alunos de Artes e que agora o que existe é uma escola “cinzenta
e sem vida6”. Na minha perspetiva, a requalificação será uma possibilidade para
os novos alunos recomeçarem a trabalhar na “identidade artística da escola” e
verem as paredes da “nova escola” como “telas brancas”. No entanto, é preciso
termos consciência de que atividades como estas nos espaços da escola são
frequentemente objeto de instrumentalização pela própria instituição escolar.
Quero com isto dizer que muito embora estas atividades possam ser colocadas
ao serviço de “valores sociais e humanos” vistos como essenciais à formação dos
alunos, na verdade os alunos de Artes são frequentemente chamados a

6
Relato a partir de conversa com alunos do 12º ano, a 14 de junho de 2018.
26
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

realizarem estas intervenções como um recurso decorativo da escola. Sabemos


que as “artes adentram a escola, em parte, com contornos românticos e instintos
domesticados, disfarçadas de personagens tais como coelho da páscoa, cartões
festivos, objetos artesanais utilitários”, é aqui que a escola muitas vezes “usa” a
arte como didática “muitas vezes na tentativa de controlar e “didatizar” obras
nem um pouco controláveis; ou, ainda, como uma concessão quase supérflua dos
projetos curatoriais interessados em garantir seu público (e, por conseguinte,
patrocínios e financiamentos).” (Loponte, 2012:3). Partindo deste
questionamento, da pertinência do “uso” das artes enquanto recurso decorativo
e/ou de proveito económico para a Escola, não deixo de tentar encontrar um
lugar e pertinência desta ação, tão frequente na Escola, e em particular na ESE,
e assim, segundo o autor Eisner, (2008, cit. in Loponte, 2012:4), uma das lições
ou tarefas da arte para a educação encontra-se “o pensamento de professores e
os estudantes” no contato com que “os processos criativos com um novo
material (e todas as dificuldades envolvidas),” e assim “desenvolvem a maneira
sobre o qual nós pensamos sobre ele.” (Loponte, 2012:4). Quero com isto dizer,
ou colocar em questão, poderemos nós enquanto futuros docentes em artes,
aproveitar estas atividades paralelas enquanto recurso didático?

Relativamente às salas de Artes, é visível um grande desgaste, os móveis


estão degradados e mal-organizados, considerando a necessidade imposta pela
atual requalificação de se guardarem num mesmo local todos os materiais e
recursos artísticos. Os estiradores estão, em grande parte, inutilizáveis, estando,
portanto, a ser usados como mesas que, ainda assim, estão em más condições, da
mesma forma que as cadeiras e bancos – alguns estão partidos e não se adaptam
à ergonomia dos alunos. Denota-se, ainda, a fraca e desadequada iluminação,
sendo esta essencial para a produção do desenho. As salas de Artes Gráficas,
embora estejam bem equipadas a nível de recursos, como computadores e
impressoras, são pequenas para criar espaços de experiências de montagem de
maquetes e para exposições resultantes das atividades propostas nestas áreas.

27
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

b. Os alunos

Particulariza-se a turma do 12º ano H, na disciplina de Desenho A. Esta


turma de 22 alunos, 12 raparigas e 10 rapazes, com idades entre os 17 e os 19
anos. Quase todos os alunos pretendem seguir o Ensino Superior na área do
Design, da Pintura, Ilustração e Arquitetura. Referência ainda a um aluno que
seguirá o curso de Hair and Make up for Fashion no London College of Fashion e
uma aluna pretende seguir a área das tatuagens.

Na particularidade da relação com o desenho, deparo-me com um certo


automatismo na resposta aos exercícios propostos na sala de aula e no âmbito do
programa que enquadra e orienta os objetivos de aprendizagem. Na verdade,
sinto através da observação quotidiana na sala de aula que os alunos estão bem
treinados por e para um sistema de ensino que espera deles a excelência de
resultados, bem como a excelência de saber dar uma resposta que o sistema quer
que seja dada.

Tendo em conta o que fui observado na sala de aula, e recorrente na


prática de desenhar destes alunos o recurso ao telemóvel para pesquisa de
imagens, bem como o uso destas enquanto base para os diferentes exercícios de
desenho, muitas vezes copiando-as diretamente dos sítios de pesquisa para o
papel. Recordo-me, porém, de um aluno que nunca antes o tinha visto a
desenhar. Aproximei-me dele e o bloco de desenho estava fechado, mas
surpreendeu-me vê-lo com um diário gráfico cheio de desenhos, desenhos dele,
de memória, de imagens. Esta situação inquieta-me, fazendo-me questionar
sobre a pertinência dos exercícios do desenho inerentes ao programa de
Desenho A do 12º ano e que, à luz do programa em vigor, são prescritos na sala
de aula.

28
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

c. O programa de Desenho

«o currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação de poder. O currículo


é trajetória, viajem, percurso. O currículo é autobiografia, nossa vida, curriculum
vitae: no currículo se forja a nossa identidade. O currículo é texto, discurso,
documento. O currículo é documento de identidade.»

Tomaz Tadeu da Silva, in Penim (2003, p. 13)

O programa de Desenho A evoca um alinhamento de como se deve


proceder e orientar perante a disciplina, quer a nível de estratégias, quer a nível
de relações pedagógicas. O programa prevê uma estratégia que engloba o 10º,
11º e 12º anos, sendo que este último é de consolidação dos conhecimentos
adquiridos nos dois primeiros anos. Nessa medida, reúne um conjunto de
orientações as quais referem como objetivos globais a resposta a uma “eficácia
pelo desenho a um nível pré-profissional e intermédio. Dominar, perceber e comunicar,
de modo eficiente, através de meios expressivos do desenho” (Ramos et al., 2001:3).
Espera-se que o aluno revele o desenho enquanto forma universal de conhecer e
comunicar. Neste contexto, e enquanto disciplina, o Desenho “atua na aquisição e
na produção de conhecimentos”, “por ser essencial à criação, conceção, projetação ou
comunicação” (idem). Isto significa que, enquanto disciplina, o professor terá que
tomar o Desenho como fonte de conhecimento, conhecer a linguagem e técnica
do desenho e transmiti-las ao aluno, passando ainda a mensagem de que o
desenho é mais do que isso, sendo também forma de os alunos se expressarem e
comunicarem. Relativamente a esta última dimensão, recupero a citação
transcrita acima de Tomaz Tadeu da Silva, de acordo com a qual o professor
deverá olhar para o programa, ou currículo, como um guião orientador.

“O desenho é também forma de reagir, é atitude perante o mundo que se pretende


atenta, exigente, construtiva e liderante. Marca o estudante no sentido em que concorre
para que este venha a ser um profissional…enriquece a dinâmica social, se torne mais
capaz de ver criticamente e de intervir” (Ramos et al., 2001:3). O Programa parte do
princípio que o desenho é uma disciplina motivadora por si só, no entanto

29
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

questiono esta verdade. Acredito que as Artes no geral potenciem um interesse


por parte dos jovens, mas não quer dizer, contudo, que seja regra e fórmula.
Este acolhe “a maturação bio-psico-social” sem oprimir ou ultrapassar as
complexidades crescentes e em conflito que caraterizam a sociedade, assim como
“é uma disciplina que permite ou auxilia com sucesso o processo contínuo de integração
dos adolescentes… pela atração que a área pode exercer” (idem). O Programa assume,
ainda, o desenho como “piloto na área emergente da «educação para a
cidadania»”, sendo a “sua pedagogia geradora de posturas, de debates, de críticas, de
exposições de confrontos” (idem). Em síntese, a construção discursiva que preside ao
programa encara ainda o desenho como uma forma de estimular o
desenvolvimento estético e de apurar o sentido da qualidade na apreciação ou
recriação da forma.

Através destas afirmações transcritas do programa nacional de Desenho


A, é-nos possível observar a aura de salvação com que a disciplina se reveste e se
refere às qualidades do desenho, não só do ponto de vista da formação escolar
dos alunos, como, e sobretudo, do ponto de vista do exercício da sua boa conduta
em sociedade, cujos valores (estéticos, sociais, morais, de cidadania, entre outros)
o desenho na escola parece tornar-se capaz de promover.

Contudo, no meu ponto de vista, considero que as traduções destas


qualidades evocadas no programa de desenho passam mais pela prática
pedagógica do professor na relação com os alunos, e não tanto pelo programa
em si. O programa não deixa de referir isso mesmo quando propõe ao professor
que crie “modos de olhar o mundo capazes de perscrutar as suas aparências e
estereótipos” (Ramos et al, 2001:4), chamando ainda o professor para a
responsabilidade de criar um espaço de formação com os alunos através do (…)
contágio do pensamento e do agir comunicativo” (idem), tendo obviamente em conta
as orientações curriculares, mas mais do ponto de vista de uma “ação como
criador/autor”, “gerando um ambiente oficinal que se pode caracterizar dentro do
chamado «currículo oculto» e ainda evitando inibir potencialidades «currículo omisso
ou nulo»” (idem).
30
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Sendo o desenho uma “área disciplinar dinâmica esquiva a sistematizações


rígidas ou permanentes” (idem), o programa foca-se, porém, em três áreas, como a
perceção visual, a expressão gráfica e a comunicação visual. No seu conjunto,
estas desenvolverão conteúdos como a) a visão, a partir do tema da perceção
visual e do mundo envolvente, b) os materiais, englobando os suportes, os meios
atuantes e a infografia, c) os procedimentos, atendendo-se às questões das
técnicas e ensaios e d) a sintaxe, focando-se esta última dimensão em questões
relacionadas com a forma, a cor, o espaço e o volume, bem como com o
movimento, o dinamismo e o sentido, e ainda com as questões da interpretação e
do uso do desenho. Estas áreas debruçam-se sobre “condicionantes
biopsicológicas”, convenções sociais ou culturais e estudo do desenho, quer
sincrónico (contemporâneo) ou diacrónico (passado) (Ramos et al., 2001:5).

O programa revela, ainda, a dificuldade que é para o professor, ao nível de


tempo, ter a possibilidade de passar para o aluno todas as questões de conteúdo e
garantir as horas de prática de atelier exigidas nesta área de formação, apelando
para que os “exercícios complementares de verbalização de experiências visuais”, se
desenvolvam fora do horário letivo, “respondendo assim à necessidade de aperfeiçoar
competências no discurso a propósito da imagem”, sugerindo, também, “o confronto
quotidiano com exemplos do que o desenho pode assumir, como fator que motive o
trabalho do aluno ou que auxilie o enquadramento do que é proposto” (idem).

Do ponto de vista metodológico, o programa sugere competências a


desenvolver numa disciplina de Desenho A, apelando a um ideal de professor
que deve saber “combinar” e “confrontar”, e a um aluno que deve saber auscultar e
concretizar os exercícios prescritos, sendo que este deve ainda desenvolver em
si, de uma forma global, a tricotomia «ver-criar-comunicar». Assim, e olhando
para o sentido como estas “competências” são descritas pelo programa, até que
ponto a disciplina de desenho é capaz de criar resistências a uma lógica de
automatismo e eficácia? Onde se encontra nestas afirmações o sentido da relação
pedagógica? Porque, se por um lado, é esperado que professor seja detentor de
um conhecimento formal sobre a disciplina do desenho, por outro, na minha
31
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

perspetiva, o mais importante é que o professor construa também ele uma


relação com o saber desenhar, um saber que na verdade estará sempre em causa
e em confronto com os saberes e interesses dos alunos. Neste sentido, aquilo que
o programa refere relativamente aos conteúdos do desenho será, portanto, muito
menos complexo do que as exigências que se colocam à relação com os saberes
que no âmbito de uma determinada relação pedagógica podem vir a constituir-se
em aprendizagens significativas, muito para além do programa.

Segundo Lee Shulman, “o teste definitivo para a compreensão de um assunto é


a capacidade para o ensinar, transformando o conhecimento em ensino” (Shulman,
1986, cit in Penim, 2003, p.13). Ora, se é do ensino que aqui se trata, então
teremos de repensar o sentido da ação dos professores nas escolas, sobretudo
olhando para a complexidade de fatores que se inscreve nas aprendizagens do
desenho na escola, e no contexto de uma determinada relação pedagógica.

A verdade é que o programa sugere uma “constante interação professor


aluno” (Ramos et al., 2001: 11) e objetiva a aquisição de conceitos, de
aprofundamento, de domínio de vocábulos específicos da disciplina. Refere-se
ainda à concretização de práticas, com grande diversidade de suportes, escalas,
materiais e potencialidades e compreensão das suas diferentes utilidades e
adequações, bem como ao desenvolvimento de valores e atitudes relativos ao
aluno, como espirito de observação e atenção visual, invenção criativa,
capacidade de leitura e interpretação crítica e estética de desenhos. Face à
diversidade de caminhos traçados pelo programa, muito embora não possamos
ignorar em que medida a construção discursiva da qual resulta se constitui numa
condicionante à ação dos professores com os alunos na sala de aula, olho para o
programa como um guia orientador cujas linhas podem apoiar os meus
processos de planeamento e de ação na sala de aula. De facto, sendo as
aprendizagens do desenho o foco da minha experiência de estágio, olhei
sobretudo para o programa de Desenho A como uma sugestão metodológica,
entre muitas outras, procurando construir experiências com os alunos, com o

32
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

recurso a diferentes meios, processos e materiais, como de resto o programa


igualmente prevê.

A partir da reflexão e dos questionamentos que surgiram da leitura do


Programa, e ao mesmo tempo que ia observado e compreendendo a realidade da
turma do 12º H, fui-me questionando sobre o sentido das aulas que não só, numa
primeira fase, acompanhei como, posteriormente, planei e realizei. Nos capítulos
seguintes especificarei esses diferentes momentos da minha experiência.

33
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

34
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Parte II

1. Desenho: o que pode ser dito

O desenho pode ter vários trilhos, vários destinos e diversas funções.


Olhamos para ele desde que nascemos e vemo-lo por toda a parte. A partir daqui
se vê a multiplicidade do que pode ser esta linguagem. A problemática que fui
construindo ao longo do meu estágio, e que se relaciona com as aprendizagens
do desenho na escola, parte da inquietação do que é o desenho, o que pode ser o
desenho e de que tipo de desenhos se pode falar, dentro e fora do espaço da sala
de aula. Segundo Elvira Leite, “o desenho é uma linguagem enraizada na nossa
cultura, faz parte de um imaginário coletivo, é expressão da atividade criadora,
analítica e construtiva.” (Leite, 2001:21). Desde a nossa infância, todos nos
lembramos do desenho. Tal como continua Elvira Leite, “aquele desenho
anónimo que é de todos e que fala da nossa infância; desenho espontâneo,
expressivo, que contém uma poética reconhecida pelos artistas…o desenho é
intuitivo, configura o modelo interior da criança”. Poderemos dizer, a partir
destas palavras de Elvira Leite, que o desenho nasce também quando nasce a
criança, assim como se desenvolve ao ritmo do desenvolvimento da criança.
Como uma criança precisa de espaço e autonomia para se descobrir a si própria,
também o faz com o desenho, um desenho que pode ser libertador ou castrador
conforme a ligação que tem com o seu mundo. Se a criança desde cedo é
comparada a um modelo do que deve ser e vai sendo moldada aos olhos de
alguém, o seu desenho também deixará de ser exploratório, mas antes
condicionado e formatado. A propósito, refere ainda Leite “com o crescimento

35
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

revela-se um apurado sentido crítico…começam os bloqueios e a rejeição das suas


próprias produções artísticas…Há crianças que desejariam saber desenhar, mas dizem
que não sabem. Para essas crianças, desenhar ‘bem’ é desenhar dentro do realismo visual
numa aproximação do que consideram um ‘desenho de adulto’” (Leite, 2001:22).

Assim, poderei eu dizer que o desenho é inerente ao nosso modo de viver?


É uma linguagem e, como tal, ela é socialmente construída, desenvolvida e
marcada ao longo dos tempos. Dada a sua natureza cultural, histórica e social,
interessou-me observar os diferentes modos de relação dos alunos com o
desenho na escola, procurando compreender os sentidos que atribuem às suas
aprendizagens, sobretudo numa altura que coincide com o final de um ciclo de
estudos no ensino secundário. Ao observar que o desenho na escola continua
profundamente marcado por uma gramática que tende ou a enaltecer os seus
efeitos pragmáticos (segundo uma retórica de inspiração cognitivista) ou a
reduzir o seu gesto de potência (segundo uma racionalidade estetizante e
historicamente marcada pelas belas artes, ou seja, o desenho “puro”, “agradável”,
“expressivo”, etc.) fui avançando por diferentes apeadeiros e formas de me
interrogar sobre os lugares do desenho na formação e nas aprendizagens dos
alunos.

a. Apeadeiros

O desenho causa-me algumas inquietações. Encontro-me numa estação


central onde tenho que recorrer ao mapa para ver os cruzamentos e as diversas
linhas que divergem. Vamos ver onde me levam. Uma das estações é o desenho
enquanto mero exercício: O que é isto de exercitar o desenho, treinar a mão ou
treinar o olhar? Esta interrogação torna-se o meu ponto de partida para a
experiência do estágio. Com a recorrência a estas dúvidas, afunilo o meu tema ao
desenho, e às práticas que posso desenvolver para ensinar e aprender acerca do
desenho. Partindo da observação dos alunos nas aulas, pensava sempre em
alternativas possíveis para o ensino do desenho a partir dos exercícios
36
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

propostos. Não querendo ir contra a prática da professora cooperante, tentava


do mesmo modo encontrar outras soluções possíveis que complementassem
exercícios em cena na sala de aula, também por sentir, por vezes, que alguns
alunos não se identificavam ou tinham dificuldade com certas propostas. Na
verdade, estas minhas intervenções seriam uma forma de chegar a todos os
alunos e faziam parte do meu processo de integração pessoal na turma e,
também, enquanto professora estagiária.

Desde o Renascimento que assistimos a uma tradição segundo a qual aos


aprendizes do ofício de desenhar, futuros discípulos de um artista, compete
saberem treinar os desenhos dos seus mestres. Por analogia, os alunos que eu
conheci fazem igualmente exercícios pela cópia, o que me fez questionar sobre
qual a pertinência deste recurso à cópia, à repetição, ao treino da mão. Também
os grandes mestres fizeram cópias dos seus mestres, grandes artistas começaram
por ir para museus copiar as grandes obras de antigos mestres. A história
ensina-nos que a cópia pode ser um dos muitos exercícios de aprendizagem. No
entanto, inquieta-me que a cópia possa levar a que não se pense sobre o desenho,
quando na verdade o exercício de copiar parece limitar-se à produção de
réplicas, não questionando o exercício do desenhar. Contundo, a cópia pode
eventualmente ser um “bom exercício” quando, apesar de tudo, não fica só pela
mera cópia, um argumento sobre o qual mais à frente irei refletir.

“Eu: ‘De onde tiraste essa imagem?’ / Aluno: ‘Da net.’ /Eu: ‘E viste o autor?’ / Aluno:
‘Não’ /Eu: ‘Não tiraste nenhuma referência da imagem?’ De que época? Ano? Tipo de site?’
/Aluno: ‘Não, simplesmente gostei da imagem e das cores.’”

(diário de bordo, aula #9, 19 outubro de 2017)

Este pequeno relato, retirado dos meus apontamentos no diário de bordo,


faz-me levantar muitas questões, incluindo a relação com a cópia enquanto uma
das múltiplas relações que os alunos podem manifestar com o desenho. De facto,
o tipo de imagem que estão a ver, como estão a ver a imagem, tudo é relevante
para pensarmos o desenho. Por isso, pergunto-me: como vamos fazer uma cópia

37
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

que se espera que seja a mais aproximada da realidade a partir de uma imagem
que não é real? Que técnicas estão suprimidas? Acredito que a cópia pode ser
pertinente, contudo devendo existir um acompanhamento por parte do professor
ao longo do exercício de pesquisa e cópia de imagens, e que esse
acompanhamento se constitua num processo de mediação de saberes e formas de
explorar a realidade do desenho.

A tecnologia traz-nos imagens nunca antes vistas, mas não passa de algo
fugaz. Se, por um lado, temos acesso a milhões de imagens, por outro lado não
vemos a imagem com “olhos de ver”. Se, por um lado, questionar o aluno acerca
da imagem – quem é o autor, referências, movimentos, etc. –, é um acrescentar
de exercícios e matérias próximas aos exercícios da técnica, por outro, tal
questionamento pode não acrescentar em muito o pensar do desenho, embora,
dependendo dos casos, possa até levantar algumas questões, ou ser um ponto de
partida para a projeção e projetação de novos conceitos. Nesse processo, os
alunos poderão questionar-se por que desenham de determinada maneira ou por
que gostaram de determinado desenho, questionarem a origem das suas
inquietações, por deslumbrância e/ou relutância. Poderão até confrontar-se com
outros autores e movimentos, pode ser um começo de inquietações.

Na minha observação, deparei-me com um aluno a desenhar e a olhar


para o lado, a copiar sem ver a imagem. Lembro-me, na altura, de pensar que
aquele gesto já não seria um exercício de cópia, mas antes uma ânsia de chegar a
um resultado final o mais rapidamente possível. Nalgumas situações, observei
assim que os alunos desistem de desenhar quando se apercebem que não estão a
ser suficientemente rápidos, ágeis, num jogo que mais se assemelhava a uma
competição. Nesta questão da cópia, em particular a partir de imagens da
Internet, é importante referir a relação com a informação, frequentemente
pesquisada e consumida com estatuto “verdade”. Falo aqui da palavra
informação, sobretudo veiculada através de poderosos fluxos de comunicação,
pois de facto é o que qualquer um de nós obtém ao pesquisar rapidamente em
aparelhos tecnológicos e tende a interpretar ou como conhecimento, ou como
38
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

verdade. Se a minha preocupação enquanto professora se relaciona com o


sentido das aprendizagens do desenho, julgo que estas só serão possíveis através
de exercícios de provocação, de pesquisa crítica, e de reflexão em torno do
estatuto da informação com a qual os alunos se relacionam através de todos os
dispositivos de comunicação hoje disponíveis na sala de aula, em particular, os
telemóveis.

Partindo da observação das aulas no âmbito do estágio, e do que tenho


vindo a refletir sobre os lugares do desenho na escola, deparei-me, também, com
a problemática do automatismo presente nos modos como os alunos respondem
ao exercício de desenhar na sala de aula. Nessa medida, fui configurando o
sentido da minha ação com a turma do 12º H, questionando-me sobre o eventual
contributo das aulas que concretizei e sobre a pertinência do “exercício” nas
aprendizagens do desenho.

2. Desenho: os vários papéis

O desenho corresponde a uma linguagem, cuja área de ação possui as suas


próprias funções, significados e processos simbólicos de representação, isto é,
quando falamos do ato de desenhar referirmo-nos a um gesto que é
simultaneamente atravessado por e sujeito a um conjunto de “leis gramaticais
próprias, formas de expressividade, tecnologias e estratégias de ensino”. (Sousa,
2010)

Segundo Molina (2005:17), o desenho pode iniciar-se como um autêntico


big bang criador, apelando ao desejo de um esboço, ansiando por uma operação
de tornar visível o invisível, formalizar a ideia indecisa na folha branca, que não
é mais do que fundo de imagem. Embora desvalorizado, o primeiro traço do
desenho “feito à mão” traduz um gesto que está muito para além do exercício da
mão sobre o papel, ou sobre qualquer outro suporte do que nos servimos para
desenhar. O autor refere, ainda, que desenho, ou o ato de desenhar,
39
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

“É a carga cinésia que estabelece um nó gordo entre o nosso corpo e o corpo do


desenho, uma experiência vital que estabelece uma relação temporal que converte o
traço num itinerário de memória, um sistema mnemotécnico que mobiliza a imagem e a
converte numa analogia visível dos processos cognitivos que darão lugar à origem da
ação, ao pensamento que originou a palavra que é buscada desde as trevas brancas de
papel”.

(Molina, 2005:17)

Rosário Forjaz (2001:27), a propósito do desenho do escultor Rui Sanches,


refere-se às diferentes “identidades” que, na sua perspetiva, podemos ver no
desenho: um gesto espontâneo e marca ocasional; uma construção herdada da
história da arte clássica; um apoio ao projeto; ou um processo de representação e
apropriação dos exercícios sequenciais inerentes à conceção, neste caso, da forma
escultórica. Rui Sanches (2001:30), num título para uma exposição sua em 1984,
cita três metáforas usadas para falar do desenho,

“a janela, a que toda a gente associa a ideia da janela renascentista, do espaço para além
do plano do desenho; o espelho, na aceção de uma autorrepresentação, uma reflexão do
artista sobre si próprio e sobre o seu processo de trabalhar; e o mapa, como um modelo
de realidade, uma construção de sinais que restituem o espaço e que permitem edificar
um caminho nesse complexo espaço até certo ponto sobreponível à própria realidade”.
(idem)

O autor fala-nos, ainda, do próprio processo de desenhar “que vai dar


fisicamente a momentos diferentes do desenho. A relação entre o espaço e o tempo, que é,
obviamente, central para a escultura é também explorada no desenho.” (idem).
Enquanto escultor, Sanches refere que

“o desenho tem uma presença muito importante como forma de pensar os elementos da
escultura, ou seja, o desenho de apoio, que é utilizado por todas as pessoas que
constroem qualquer coisa…esse pensar a forma tridimensional através do desenho, do
esboço, da pequena garatuja, tem um papel importante” (idem:33)

40
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Com efeito, o gesto é um conceito aliado ao desenho e também Sanches o


comprova num desenho de 87, “são desenhos onde há um tratamento do gesto,
simultaneamente com linhas mais geométricas que estruturam o espaço, no interior do
qual gesto se liberta.” (idem:32)

#1. Rui Sanches, “X + Y III”, 1987. Tinta da china, barra de óleo e colagem sobre papel. 50 x 70 cm.

Para o escultor Alberto Carneiro (2000: 34-38), “o desenho é


provavelmente a forma de expressão que sintetiza melhor a nossa relação com o
mundo. Ele permite-nos, com a elaboração mental, o desenvolvimento de ideias
e a descoberta do que ainda desconhecemos de nós mesmos”, para o artista,
desenhar é encontrar afinidades, e com um meio riscador, um lápis por exemplo,
“expressar, criar e comunicar”, assim, entende-se que “o essencial do processo de
criação não está nos instrumentos, está na conceção”. Encontra-se através do
desenho, um “desenvolvimento de ideias, conjunto de figuras que interagem
para que a pessoa autora e ou fruidora de desenhos possa vir a compreender os
sentidos dos seus movimentos de criação entre o seu fora e o seu dentro, entre a
interioridade do seu sentir e pensar e a exterioridade das referências que busca,
encontra e reflete como escalas necessárias para a própria mundividência”.
41
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Percebemos pelo artista que o desenho nos auxilia para compreendermos “a


realidade exterior e redimensionarmos o mundo interior em compreensões
múltiplas dos sentires e sentidos do corpo artístico e estético.” Encontramos no
desenho um conjunto de sinais, que visualizamos em todas as superfícies, onde
podemos conceber a nossa “realização artística e identidade estética.”

“Vemos e pensamos pelo desenho.” (idem:36)

“O desenho é assim um instrumento que nos permite analisar, conceber e comunicar


sobre a nossa realidade.

O desenho estrutura em si mesmo um percurso de aprendizagem que nos propicia a


realização livre e criativa da nossa vontade sobre o mundo… Quem desenha constrói
imagens, busca uma síntese que seja o seu constructo e o seu relato. Constructo como
eixo referencial próprio onde se desenha e projeta para encontrar sentidos
comunicativos.” (idem: 37)

“O desenho é a expressão humana mais consentânea com a unidade física, mental e


subtil do corpo… unifica pessoas e universo, cria imagens que figuram para a vida. O
desenho é na pessoa o projeto do desenho do ser.” (idem: 38)

#2. Alberto Carneiro, os caminhos da agua do corpo sobre a terra, 2003 grafite sobre papel 15 x 100 cm

Podemos refletir na importância do desenho também pela capacidade de,


pelo seu meio, gerarmos palavras, as quais, diretamente ou indiretamente
provêm da linguagem comum ou passam por uma linguagem específica. Neste
42
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

sentido, o desenho tem uma linguagem específica que muitas vezes se aproxima
da linguagem comum, sendo, portanto, necessário entender a linguagem
específica do desenho para nos aproximarmos da sua especificidade. Nomear é a
primeira ação na cadeia que irá desenrolar o desenho e é, por sua vez, uma forma
“radical de acalmar a ansiedade perante o desconhecido.” (Molina, 2005:21)

1. Nomes que definem a Dibujar (desenhar), disenar (projetar), trazar (traçar, riscar,
identidade e o sentido do planear), gráfico (esquema)
desenho:

Ideia, conceito, pensamento, imaginação, invenção, improvisação,


sensação, sentimento, emoção, impressão

2. Nomes vinculados às Desenho analítico, descritivo, naturalista, realista, conceptual,


formas de conhecimento e abstrato, esquemático, poético, científico, técnico, linear, artístico,
suas aplicações: artesanal, ornamental, decoração, desenho animado

3. Nomes das formas que Forma, desenho externo, ponto, linha, mancha, contorno, fundo,
estruturam os desenhos e silhueta, perfil, textura
as suas relações:

Composição, disposição, configuração, ordenação, estrutura,


simetria, articulação, harmonia, ritmo, equilíbrio, tensão, unidade,
fragmento, enquadramento, proporção

4. Nomes referidos que Representação, imagem, figura, anatomia, esfumado, manequim,


representam o desenho: retrato, fisionomia, símbolo

Tema, motivo, assunto, história, narração, guião, ilustração,


storyboard, reportório, iconografia, iconologia, tipologia, alegoria

5. Nomes referidos que Expressão, caráter, afeto, animação, gesto, movimento


expressam o desenho:

6. Nomes das estruturas do ilusão, figurado, aparência, ilusão de ótica (trompe-loeil)


simulacro:

Perspetiva, fuga, ponto de vista, horizonte, gradação, degradação,


primeiro plano, profundidade, relevo, panorama

Sombreado, claro-escuro, valorização, volume, esfumado,


sombreado

7. Nomes relativos a Projeto, esboço simples – resumo (esbozo), esboço (boceto),


modelos e projetos que delineamento apontamento, croquis, esquiço, garatuja, gatafunho,
orientam as suas ações: rabisco (garabato = garrapato), nota, esquema, estudo, sínteses.

Copia, contrafeito, deformado, torto (contrahacer), imitação,


réplica, reprodução, imitação, modelo

8. Nomes de operações Delineação, quadricula, pauta, encaixe, decalque (calco), perfis,


43
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

técnicas que se realizam: contornar, picado, molde, moldar, contramolde, esfregar,


digitalizar.

9. Nomes relacionados com Grafia, traço – linha ou risco que se escreve ou desenha, linear
os traços realizados e com (lineamento), marca, traço – linha, risco de divisão, incisão
as estruturas de onde se
desenrolam:

10. Nomes relacionados com Geometria, geometria descritiva, sistema de representação,


o conceito de medida e o axonometria, escala, cotação, normalização, módulo, trama,
seu controlo gráfico: diagrama, projeção, vistas, planta

11. Nomes que descrevem a Execução, feitio, acabamento, mão livre, preciosismo, rigor,
fenomenologia da sua desembaraço, tocar, alterar, modificar, matizar, combinar cores,
ação: aplicar peso, compósito – cores que não combinam bem, relevo
(realce), apagar, contraste, suavizar, estilizado, rebuscado,
estereotipado, pormenorizado, idealização, precisão

12. Nomes relacionados com Inspiração, introspeção, subjetivismo, automatismo, sonho, de


a atitude e o estado com repente, de pensamento, de retenção, de memória
que se realizam:

13. Nomes vinculados aos Estilo, maneira, classicista, barroco, maneirista, expressionista,
estilos, épocas e géneros: neoclassista, desenho politécnico, cubista, hiper-realista, Género,
de figura, academia, pose, postura, atitude, contraposto, três
quartos, de retrato, de paisagem

14. Nomes de seus materiais, Técnica, procedimento, lápis, porta minas, carvão, tinta, pigmento,
técnicas e procedimentos: sanguínea, aguada, ponta metálica (aparo), fotografia, fotocopia,
desenho por computador - desenho digital

15. Nomes de instrumentos: Compasso, esquadro, esquadro, molde, régua, réguas, prancheta

16. Nomes de suportes: Papel, tela, caderno, quadro preto, ecrã, formato

# Inventário pessoal a partir de inventário extraído de José Molina, em "Los Nombres del Dibujo" (2005).7

A realidade é sempre um imaginário construído com as representações


exemplares (simbólicas) que a nossa cultura coletiva nos legou; a tarefa do
desenho é combater este espaço fantasmagórico através do qual vamos
nomeando, um a um, pacientemente, os lugares desde os que sonhamos pela
primeira vez (Molina, 2005: 52). Assim, a linguagem pode converter-se num
dispositivo fundamental para que possamos passar do mundo das meras

7
Ver em anexo
44
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

sensações ao mundo da intuição e da representação. A linguagem, ao passar pelo


intelecto, manifesta-se ulteriormente na formação do conceito como conceito
científico, como unidade formal logicamente determinada. “Aqui se encontra o
princípio daquela função universal da separação e vínculo que encontra as suas
mais altas expressões conscientes em análise e síntese do pensamento científico.”
(Molina, 2005: 15)

No ensino do desenho, o processo nominal é duplo, por um lado é impossível


representar algo sem determinar aquilo que se aloja no conceito, por outro, para
compreender e analisar esses traços é necessário que se reconheçam, e finalmente é
necessário concetualizar as operações a que se chegam e as categorias que tornam
possível a sua perceção.” Molina, 2005: 78

Nos processos de ensino-aprendizagem a presença da palavra é crucial,


porque a palavra, seja ela na sua forma verbal ou não, corresponde a um
fenómeno de mediação dialética, ou seja, a um jogo subjetivo de posições e
oposições em relação à linguagem, e sem a qual, na verdade, a transmissão dos
conhecimentos e o sentido das experiências acumuladas, neste caso pela via da
educação, resultaria num processo desprovido de significação crítica (Molina,
2005: 77). Interessa-me assim pensar o desenho também na sua relação com a
palavra e com os diferentes modos de nomearmos o ato de desenhar como uma
experiência de linguagem, inclusivamente nos casos em que tal ato parece
aproximar-se mais do mero exercício da cópia, ou do treino, ou ainda da
imitação. Nesta medida, a relação com o ato de desenhar inscreve-se na relação
com os inúmeros modos de dizermos a realidade e de a pensarmos enquanto
possibilidade. Esta relação com o desenho não se constitui, porém, numa
natureza dada, independente da relação pedagógica em cena numa determinada
sala de aula e da linguagem aí usada para nomear o desenho e os atos de
desenhar. Ao assumir então esta relação com o desenho no contexto da relação
pedagógica, o meu olhar e a minha palavra em torno do desenho recaem,
sobretudo, no sentido das aprendizagens que os alunos experienciam pelo ato de
desenhar.

45
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

3. Dos exercícios às aprendizagens do desenho

No contexto pedagógico que tenho vindo a refletir, tornou-se essencial


para mim compreender a eventual pertinência dos “exercícios do desenho”. No
caminho do ensinar e aprender a desenhar, até que ponto o “exercício” pode
tornar-se um ponto de partida para a base do aprender a desenhar? Betty
Edwards (1994) diz-nos que para desenhar é preciso ver e depois treinar as
habilidades. No seu ponto de vista, profundamente marcado por uma tradição de
inspiração psicológica, será assim necessário ter em consideração a perceção dos
limites, dos espaços, das relações, das luzes e sombras, bem como a perceção da
totalidade (leis de Gestalt). Segundo a autora, é preciso insistir naquilo que ela
considera ser as “habilidades totais e globais”. No treino destas “habilidades”,
diz-nos a autora, partimos do exercício do rabiscar para um processo que,
gradualmente, permite encontrar as linhas, as formas, os espaços e as
representações. Nesta ordem de ideias, o exercício do desenho, tal como
qualquer outro treino psicológico (perceção, memória, atenção, etc.), requer
repetição, disciplina e eficácia, e a sua justificação, agora do ponto de vista
pedagógico, advém da ligação que o corpo possui com o cérebro e que o desenho
ajudará a “exercitar”.

Essencialmente, para aprender a desenhar, neste quadro marcado pelas


teorias da perceção e do cognitivismo, será apenas necessário aprender a ver e
ter coordenação de mãos, o que, à partida, a grande maioria das pessoas aparenta
possuir, e por essa razão poderíamos até afirmar que qualquer pessoa pode
instruir-se a desenhar. No entanto, é difícil explicar como se aprende a ver. A
propósito, Nicolaides (1941) refere que “aprender a desenhar, é na realidade uma
questão de aprender a ver, a ver corretamente, e isso não significa que se limite a

46
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

ver com os olhos.” (Nicolaides, 1941, cit in Edwards, 1994:19) 8. A forma de ver
de um artista é um “modo especial de ver”; muitos artistas declaram que, no ato
de desenhar ou criar, adotam um estado de “consciência alterado”. Neste sentido,
talvez seja necessário compreender que aprender a desenhar pressupõe, antes,
uma experiência subjetiva de si na relação com a linguagem e os seus múltiplos
significantes – esse estado alterado que nos permita “ver bem”; aí seremos
capazes de desenhar as nossas perceções.

Num contexto formal de sala de aula, tal como foi referido anteriormente,
embora os exercícios sejam, à partida, iguais para todos, os resultados serão
sempre diferentes. Assim como a nossa assinatura, que é própria e única de cada
um, o seu traço também o será. A linha expressa a individualidade e a
criatividade de cada sujeito, ao mesmo tempo que desenha o que o cada sujeito
interpreta da sua visão e das experiências pessoais e sociais que o constituem e a
sua história pessoal. Todavia, a ideia de "método de trabalho" subentendida no
ato do exercício parece levar os alunos a uma certa confiança técnica no “traço” e
na “linha”, generalizando não só diferentes possibilidades de resultado, bem
como diferentes interpretações sobre os processos de desenhar. Nos exercícios,
portanto, é importante que haja um reconhecimento crítico por parte do
professor e/ou dos colegas que compõem a turma, pensando que esta pode
constituir-se numa comunidade interpretativa. Para isso, acredito que comentar
os desenhos dos alunos ajuda à valorização dos diferentes processos de trabalho,
não necessariamente no interior de um método ou de uma abordagem que deva
servir a todos. Escutar, apoiar, comentar e explorar com os alunos os exercícios
do desenho, tais atos correspondem a processos pedagógicos através dos quais
se improvisam outros modos de ver a relação com o desenho, atendendo-se aos
modos pessoais de os alunos pensarem e falarem sobre os seus próprios
desenhos, não só no contexto das suas experiências de aprendizagem, como à luz

8
“Aprender a dibujar e sen realidade cuestión de aprender a ver, a ver correctamente, y eso significa
bastante más que limitarse a mirar com los ojos.” Kimon Nicolaides, in The natural way to Draw, cit in
“Aprender a dibujar con el lado derecho del cerebro”, Betty Edwards, 1994: 19)
47
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

das suas memórias e curiosidades. De facto, tal como refere Molina (1999),
“Cualquier cosa que dibuje se grabará en su memoria”.

Grande parte da aprendizagem social e cultural dos alunos ocorre fora da


sala de aula. Fora do espaço tradicional da sala, e através das novas tecnologias,
redes sociais, jogos ou viagens, por exemplo, os alunos também aprendem a
construir significados culturais acerca da realidade que os rodeia. Por outro
lado, as ferramentas tecnológicas admitem e estimulam a partilha de
experiências culturais, num contexto em que os jovens frequentemente
constroem linguagens próprias para se referirem aos significados do desenho e à
cultura visual que possuem. O que me interessa neste contexto tem que ver,
então, com uma conceção cultural das aprendizagens dos jovens, dentro e/ou
fora do espaço da sala de aula, e foi na base desta preocupação que fui refletindo
na minha proposta didática. Recuperei, assim, as principais ideias defendidas por
Vygotsky no momento em que se refere ao “desenvolvimento cultural do
sujeito”, tendo em conta a relação entre três dimensões interdependentes: a) as
inter-relações entre o psicológico e o social que atuam na unicidade e no sentido
cultural das experiências do sujeito; b) as relações interpessoais que, de um
modo dinâmico e colaborativo, se atravessam na aprendizagem e no
desenvolvimento do sujeito; c) o fator cultural e histórico da aprendizagem, cujo
dinamismo se liga diretamente com a linguagem e com o contexto sociocultural
em que o sujeito participa e se desenvolve (Kalantzis, Cope (2005). Nesta ordem
de ideias, os processos de ensino e de aprendizagem ajudarão a ressignificar e a
expandir as experiências dos alunos, à luz da relação com a linguagem e com o
sentido dos conceitos que usam num determinado contexto social de
aprendizagem para falarem e praticarem o desenho. Segundo Lindqvist (2003)
“cabe a Vygotsky o mérito de ter descoberto a diferença basilar entre os significados
múltiplos das palavras…”. Com efeito, para Vygotsky, os alunos surgem como
figuras centrais na produção de conhecimento, uma vez que participam
socialmente na construção das suas aprendizagens, cujos significados atuam
diretamente nos diferentes modos de relação com o saber Lindqvist (2003:146).

48
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

A propósito, Bernard Charlot (2005), fala-nos do Homem que nasce incompleto,


inacabado. Nas suas palavras, “(...) nascer significa ver-se submetido à obrigação de
aprender” (Charlot, 2000:53), aprender a ser-se e a ser com alguém. Deste modo,
“aprender é entrar num conjunto de relações e processos que constituem um sistema de
sentido, onde se diz quem eu sou, quem é o mundo, quem são os outros” (idem).

4. Learning by Design e o planeamento da proposta

O Learning by Design (LbD) é um dispositivo pedagógico que, na minha


perspetiva, se adequa à disciplina de Desenho A, numa turma de 12º ano. É uma
base de orientação e um suporte, não só para quem inicia a carreira docente, mas
para todos aqueles professores que pretendam ser reflexivos com os seus alunos,
do ponto de vista da construção das suas capacidades críticas de análise e
autonomia. A aprendizagem colaborativa, na base da qual radica o LbD, tem um
papel fundamental na reflexão e na estruturação das microdinâmicas do ensinar
e do aprender, em que, essencialmente, a pedagogia se relaciona com a criação de
novos ambientes de aprendizagem, visando o compromisso dos estudantes de
forma mais ativa do que aquela que tradicionalmente se assiste numa sala de
aula tradicional, dominada pela figura do professor. O LbD apela sobretudo a
didáticas informais, com base nas experiências de vida dos alunos e à luz dos
seus contextos socioculturais de aprendizagem. É desta forma que se torna
possível identificar e compreender, num registo de maior cumplicidade, a
multiplicidade destas experiências e trabalhar sobre elas, tendo em vista criar
melhores ambientes de aprendizagem para os alunos, na tentativa de que as
experiências de aprendizagem os transformem positivamente. Com efeito,
através de uma aprendizagem colaborativa espera-se construir novas formas de
aprendizagem implicadas nos interesses e nas expectativas dos jovens, face à
realidade que conhecem hoje e imaginam para o futuro.

49
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Com base no Learning by Design espera-se compreender as aspirações dos


alunos, as suas dinâmicas de relação face ao trabalho que realizam na escola,
encarando-se o saber de uma forma ativa e em construção. Isto implicará,
naturalmente, um maior compromisso para com o saber, quer do ponto de vista
do professor, quer do dos alunos, assumindo-se toda a sua complexidade e
ambiguidade. Relativamente às metodologias de trabalho em LbD, estas
compreendem o desenvolvimento do sentido de grupo, a estruturação do
trabalho a partir da pesquisa no terreno e a dinamização da relação teoria-
prática, visando, num processo aberto, gerar conhecimento sobre os temas em
estudo e/ou intervir sobre problemas identificados. O desenvolvimento da
metodologia tem por base uma planificação flexível, suscetível de ser alterada
segundo as necessidades do projeto em questão, devendo-se ter em consideração
a pertinência dos problemas vividos pelo grupo. Por este motivo, não fará
qualquer sentido a separação entre o saber e o saber-fazer. Não só a prática
humaniza e socializa os diferentes saberes dos alunos, como a teoria, ao ser
objeto de questionamento prático, ajuda a ultrapassar o empirismo e estrutura o
sentido dos saberes, valorizando-se assim tanto ou mais o processo de trabalho
quanto a criação final.

Como metodologia, e inspirando-se na lógica do trabalho de projeto, o


LbD apela à rentabilização da experiência pessoal e ou profissional, bem como à
implicação pessoal de todos os intervenientes em cena numa sala de aula, ou
num contexto pedagógico com finalidades de aprendizagem. Diferentes valores,
como criatividade, sentido de responsabilidade, trabalho em grupo, espírito de
aventura e propensão para assumir riscos, entre outros, traduzem a
racionalidade metodológica em que este dispositivo de planificação e intervenção
assenta. Faz parte, aliás, de alguns dos seus princípios teóricos a abertura a
novas ideias, a flexibilidade, a interdisciplinaridade, a interpretação
pluridimensional dos problemas, a dinâmica teoria-prática, a capacidade de
pesquisa, a experimentação de métodos e técnicas de investigação variadas
(preferencialmente qualitativas), como a observação, a entrevista, ou ainda

50
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

inquéritos com questões abertas, histórias de vida, análise de conteúdo, entre


outros (Vaz, 2011, slide 11).

Todavia, no que diz respeito à minha experiência de estágio, não tendo


sido possível abarcar todos os preceitos defendidos pelo LbD, comecei por
desenhar um processo flexível de trabalho no âmbito do qual diferentes
caminhos e propostas de relação com o desenho se cruzaram. Assim, este projeto
desenvolveu-se com base num plano de atividades (anexo II), começando por
desenhar um esboço em torno das questões que poderiam ser trabalhadas de
diferentes modos e que se implicaram na minha observação das dinâmicas das
aulas.

# Primeiro brainstorm do planeamento da aula a lecionar Fonte: Elaboração própria

51
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

A primeira fase constituiu-se numa ideação - a identificação de uma ideia


central – não só orientadora da unidade de trabalho a realizar com o grupo de
alunos, mas também geradora de outras ideias, atividades e propostas
encadeadas. Nesta fase recorri a post-its ou pequenos papéis para a notação de
atividades que dessem resposta à ideia, ou ao tópico central, e contribuíssem
para o envolvimento dos alunos.

Num segundo momento passei ao mapeamento (ver anexo III). Nesta


etapa, defende-se que os professores devam mapear as ideias e as atividades
concebidas de acordo com os processos de conhecimento que no contexto do
grupo fazem sentido explorar e construir.

O mapa é um guia dos processos de conhecimento, em que os professores


podem dispor as atividades geradas na fase de ideação, devendo ter, nesta fase, a
preocupação de identificá-las com os processos de conhecimento em questão. É
uma fase de troca de pontos de vista, reorganização, reelaboração e eventual
acréscimo de atividades, com o objetivo de assegurar um equilíbrio ao nível das
pedagogias que interessam mobilizar. A fase do mapeamento estimula, assim
sendo, a troca de ideias e o sentido da reflexão. O mapa dos processos de
conhecimento em questão pode sempre ter diferentes aplicações: despertar ou
fomentar o pensamento e a reflexão, mapear novos esboços, mapear e analisar os
esboços de colegas ou apresentar os processos de conhecimento a outras pessoas
(Vaz, 2011e Kalantzis, Cope, 2005).

A terceira fase prendeu-se com o processo de sequencialização. Deste


modo, a aprendizagem foi sendo propositadamente esboçada de modo a garantir
uma heterogeneidade de processos pedagógicos, bem como uma conexão e uma
articulação entre as diferentes atividades (anexo IV). No meu caso, a proposta
didática em curso procurava explorar, dentro e fora da sala de aula, a relação dos
alunos com o ato de desenhar e de que modo as atividades aí em cena poderiam
fazer-nos refletir sobre a lógica dos exercícios e o sentido das aprendizagens do
desenho realizadas e discutidas pelos próprios alunos.

52
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

De seguida recorri ao alinhamento. Nesta fase, os professores confrontam


as suas atividades com os seus objetivos de aprendizagem, questionando “o que é
que queremos que os nossos alunos alcancem? E como? É esta a atividade
adequada para atingir aquele objetivo? Como é que as nossas atividades se
conectam entre si? As atividades propostas estabelecem uma relação sequencial,
isto é, constroem-se a partir daquelas que as precedem e daquelas que as
sucedem?” Esta fase corresponde ao momento crítico de o professor justificar as
suas escolhas e as suas ações, podendo sempre haver a hipótese de redesenhar o
seu plano segundo diferentes olhares e interpretações. A possível cooperação
entre colegas de trabalho, alunos e encarregados de educação, e a oportuna
partilha, são essenciais neste processo de reflexão crítica. No caso da minha
prática, devido a não ter realizado este passo, não redesenhei o mapa,
assumindo-o como estava na primeira fase. No entanto, não deixo aqui de
recordar a importância da cooperação entre pares, alunos e encarregados de
educação, para uma melhor concretização da atividade, sempre com
fundamentação crítica.

Assim, fui chegando à última fase deste processo em LbD, a de formalizar


e publicar a própria lecionação que foi sendo objeto de planeamento. Neste
momento trata-se de confrontar o plano construído com a sua realização,
confronto esse que permitirá introduzir correções e/ou ajustamentos. A
formalização e a publicação permitem que os diferentes materiais e recursos
mobilizados possam ser disponibilizados a outros professores que trabalhem
temáticas e/ou problemas aproximados, permitindo ainda o acesso público (dos
alunos, mas igualmente dos encarregados de educação) às aprendizagens
efetuadas num contexto disciplinar específico. Na minha posição, o planeamento
da atividade e a sua reflexão foram pessoais, embora tenha conversado com a
professora cooperante e o orientador, a fim de obter algum feedback, para que
assim pudesse coadjuvar na introspeção da atividade em questão. Embora não a
tenha publicado, é importante ter como referência, enquanto futura docente, pois
irá fortalecer, tanto a reflexão crítica da atividade desenhada, como a partilha

53
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

com outros docentes, alunos e encarregados de educação/pais, assim como, a


conexão com futuras atividades similares.

4.1. Diferentes objetivos, experiências e percursos de aprendizagem do


desenho

A metodologia LbD permite construir objetivos de aprendizagem de


natureza fundamentalmente experiencial – o sendo e o estando – a partir dos
quais se experiencia o conhecido e o novo, olhando à experiência pessoal dos
alunos, o seu envolvimento concreto e a sua exposição à realidade. A experiência
corresponde a uma dimensão da atividade humana que ocorre ao longo da vida e
as aprendizagens daí resultantes são também inconscientes, fruto do acaso,
tácitas, acidentais, nem sempre racionais ou intelectualmente ponderadas. A
partir de conhecimentos prévios, contextos comunitários e interesses pessoais, a
conceção de aprendizagem que norteou a minha proposta didática surge
intrinsecamente relacionada com este sentido da experiência, a experiência na
sua unidade contínua, e a partir dos espaços vividos pelos alunos. Daí eu ter
planeado um processo de trabalho que passou por diferentes contextos do
desenho, contextos que fossem assumidos na sua dimensão viva, social e
experiencial (estação de caminhos de ferro, ruas, espaços edificados, paredes
públicas, etc.), numa lógica que, globalmente, pretendia associar a experiência do
desenho a alguns aspetos do movimento urbano.

Todavia, existirão igualmente objetivos de tipo conceptual, no âmbito dos


quais os processos de aprendizagem são objeto de uma “conexão por nomeação”
(Cope, Kalantzis, 2015:5), conceptualizando-se a experiência vivida à luz da
abstração teórica. Um conceito pode permite a generalização e o agrupamento
“das coisas conhecidas” por categorias, bem como a construção e aplicação de
termos e sua definição. No domínio conceptual pode então surgir uma ação a
partir da qual os professores buscam referências e, nesse processo, definem e/ou
excluem certas práticas e discursos. Quem se toma como referência? A ação do
54
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

professor neste domínio pode efetivamente definir o sentido da relação do aluno


com o desenho, na medida em que os nomeia, alude ou nega um conjunto de
outras referências e problemas que se estabelecem nas relações subjetivas com o
desenho. Aqui é necessária a reflexão do professor sobre que autores referenciar
e o modo através do qual os apresenta aos alunos, expõe e fala sobre o seu
trabalho, bem como as histórias pessoais que a propósito de alguns artistas
possam interessar no contexto das aprendizagens do desenho. Na verdade,
relativamente a esta questão, o processo de interação em e com o grupo revela-
se fundamental, sobretudo para que se possa tomar consciência que existirá
sempre um confronto entre as grandes figuras/narrativas previstas pelo
curriculum (autores consagrados, artistas validados pelos cânones, desenhos de
grandes “obras”) e os conhecimentos em ação numa sala de aula. Mas julgo ser
necessário assumir esse confronto, discuti-lo com os alunos, entrando em
conflito com discursos instituídos à volta do desenho. No caso da prática na
minha lecionação, e tal como no ponto seguinte irei referir, o recurso a artistas
nacionais, na sua maioria jovens e com trabalho em diferentes campos do
desenho, foi uma opção premeditada, no sentido de discutir com os alunos, de
uma forma mais próxima, como se pode trabalhar o desenho em diferentes áreas
das artes visuais, além de igualmente expor-lhes diferentes registos de desenho
para que não se “colassem” a um determinado tipo de traço, muitas vezes
definido pelo ideal da genialidade, mas questionando-se antes sobre a
diversidade de percursos no campo do desenho e com que traços (caminhos)
poder-se-iam pessoalmente identificar.

Por sua vez, mas agora no âmbito daquilo que em LbD se designa por
objetivos analíticos da aprendizagem (Kalantzis, Cope, 2005), a ação do
professor e dos alunos passa por analisarem criticamente aquilo que se desenha,
segundo uma lógica em que analisar corresponde principalmente a um processo
de conhecimento que envolve o exame dos diferentes elementos constitutivos de
uma determinada experiência de aprendizagem. Trata-se de um processo de
análise integrada, inscrita nos diferentes objetivos de aprendizagem dos alunos,
através da qual o exercício de analisar criticamente um determinado desenho é,
55
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

sobretudo, um processo de interrogação acerca das suas intenções e interesses.


De facto, uma imagem que frequente me surge e inquieta quando se fala em
ensinar e aprender a desenhar, é o desenho definido enquanto "obra", uma além
disso identificada como "assinatura" e possuidora do «estilo do artista». Esta
imagem é ainda, na verdade, um reflexo dos diferentes processos de reprodução
cultural e visual que continua a dominar o discurso à volta do desenho escolar.
Por outro lado, mas precisamente à custa destes processos de reprodução, a
história da cultura e da arte, dentro da esfera escolar, continua igualmente a
instituir, num panorama além disso fragmentado e enviesado, as narrativas dos
grandes pintores («os desenhos de ...»), bem como a personalidade dos grandes
artistas e escultores. Daqui surge a minha interrogação, terei eu que continuar a
seguir este reflexo, estas pisadas? No meu ponto de vista, tento contrariar o
regresso desta imagem, principalmente porque projetar esta imagem do “artista
com assinatura” pode levar os alunos a interpretações parciais e pouco críticas,
não só acerca das “origens” do desenho, como da diversidade de percursos
percorridos pelo desenho ao longo da história da arte, tal como formalmente foi
sendo instituída pelas academias clássicas das belas artes.

Finalmente, em relação aos objetivos de aplicação, e sustentando-me na


metodologia LbD, considerei que a aplicação, neste caso, das aprendizagens
realizadas no e pelo desenho, corresponderia a um processo de conhecimento, o
qual envolveria a intervenção no mundo natural e humano. Por um lado, quando
falamos de aplicar criticamente as aprendizagens estamos a falar de um processo
de ação através do qual os alunos usam o conhecimento de um modo específico e
com sentido à luz da (sua) realidade. Em contrapartida, aplicar criativamente as
aprendizagens significará, neste caso, um processo de adaptação crítica a
contextos diferentes do original e/ou de forma não familiar. Esta dupla face dos
processos de aplicação das aprendizagens do desenho pode resultar em/de
processos imaginativos, divergência criativa e justaposições que geram novos
significados e situações. A introdução do acaso e da imprevisibilidade implicará
os alunos em processos desconhecidos, segundo uma temporalidade que só o
envolvimento pode permitir conhecer. Não estamos com isto a querer dizer que
56
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

para aprender a desenhar é preciso primeiro desconhecer e, depois, conhecer.


Mas este modo de perspetivar a “aplicação das aprendizagens” parece-me
cruzar-se com o ponto de vista de Lígia Penim (2003), quando esta considera
que o que se passa no espaço pedagógico do desenho é tão ou mais importante
do que aquilo que lá se transmite. Neste sentido, a “bagagem” que o aluno traz
para o espaço de aula, seja este no exterior ou interior da escola, é tão ou mais
importante do que os conteúdos curriculares formalmente instituídos. Segundo
Penim:

“Os dilemas educativos não se resolvem no espaço das disciplinas, nem no espaço da
pedagogia, mas antes nesse «imenso meio» - as vezes, uma ponte, outras vezes um
abismo- que une/separa estas duas realidades.” (Penim, 2003, p. 11)

Pensando a lógica do Learning by Design à luz das tensões e dos desafios


que se atravessam nas sociedades contemporâneas, seria talvez de esperar que os
seus impactos na construção de um espaço pedagógico mais centrado no sentido
das aprendizagens dos alunos fossem, na verdade, mais visíveis e instauradores
de mudanças no modo de encaramos a singularidade de cada aluno desenhador.
Podem-se apontar inúmeros fatores que, de uma maneira recorrente, explicam a
invisibilidade de metodologias realmente centradas na aprendizagem dos alunos.
Mas a conceção dominante de Escola que ainda vigora ao nível das práticas
didáticas, tal como na I Parte deste relatório procurei refletir, parece-me
constituir ainda o principal entrave à introdução deste dispositivo de trabalho
nas escolas. Segundo António Nóvoa (1999), a realidade discursiva, retórica e
política presente na maioria dos textos sobre educação produzidos nas últimas
décadas expressa o conflito latente entre um “excesso de discursos e uma
pobreza de práticas” (Nóvoa, 1999: 11). Talvez a dificuldade de aceitar a
mudança, o medo de falhar, as falhas de investimento político, o desgaste do
pessoal docente e não docente, a descrença no ensino, entre outras questões,
sejam razões suficientes para, pelo contrário, continuarmos a resistir à corrente
dos discursos. Contudo, e apesar dos mais variados entraves a outras lógicas de
perspetivarmos hoje em dia o sentido da Escola e das aprendizagens dos alunos,

57
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

especialmente no que toca a relação com o desenho, considero que o dispositivo


do LbD seja aquele através do qual, e no espaço pedagógico (dentro ou fora da
sala de aula), os professores se afirmam enquanto reais agentes e autores de
mudança.

58
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Parte III

As minhas propostas – da teoria à prática

A experiência que anda de boca em boca é a fonte onde todos os narradores vão
beber. «Quem faz uma viagem traz sempre alguma coisa para contar».

Walter Benjamim

1. As aulas que dei

A proposta preparada para lecionar as aulas de Desenho A com a turma


do 12º ano, resulta de uma simbiose que provem da aprendizagem pessoal do
que são as possibilidades de desenho, reveladas nos pontos anteriores, olhando
ainda à possibilidade de construir novas experiências com aos alunos, fruto dos
questionamentos levantados nos capítulos anteriores. A proposta didática
estruturou-se em três partes, cujos tempos e espaços corresponderam,
respetivamente, a uma aula de campo, uma aula centrada em exercícios de
desenho rápido em sala de aula e, em seguida, uma outra, essencialmente de
exposição dialogada, abrangendo a temática do desenho e os seus diferentes
percursos no campo das artes visuais, atendendo-se a histórias, trabalhos e
registos de diferentes desenhadores e artistas visuais.

Parti para o trabalho com os alunos com o intuito de explorar as várias


linguagens do desenho enquanto identidade, memória e escrita visual, mas não
ignorando que o ato do desenhar (fora ou dentro da sala de aula) é igualmente
um trabalho do olhar, cuja experimentação e ensaio implicou não só diferentes

59
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

sensibilidades (riscar, ver, usar a mão, pensar, repetir, treinar, entre outras), bem
como o confronto pessoal com situações consideradas pouco habituais (desenhar
com o corpo em posições invulgares, desenhar alguém que não sabe que está a
ser desenhado, ou ainda, desenhar a ser-se observado,). Este trabalho assentou
na preocupação de enquadrar o ato de desenhar em noções relacionadas com o
tempo, o espaço e a destreza/rapidez da ideia para conceber e pensar o desenho,
tendo-se em conta que pelo ato os alunos concetualizariam igualmente uma ideia
e um pensamento próprios em tornos dos exercícios e das possibilidades de
aprendizagem daí resultantes.

Todas estas conceções surgiram-me a partir da observação que fui


fazendo com alunos em torno dos exercícios de desenho que iam praticando ao
longo da realização do meu estágio. Tais conceções surgiram, assim, a partir de
sensações e comentários sobre os quais os alunos foram revelando os seus
interesses, inseguranças, expectativas e bloqueios.

A questão do porquê da aula de campo, tal como de seguida irei explicitar,


surgiu tanto pelo meu fascínio que a realidade do desenho exerce sobre mim,
como pelo impacto que as “saídas de campo” (visitas de estudo, passeios, aulas ao
ar livre, etc.) tiveram ao longo do meu percurso escolar enquanto aluna.
Acredito que o contacto com a realidade pode permitir-nos viver uma escola
diferente, abrindo outras possibilidades de sentido para as aprendizagens dos
alunos, bem como outras formas de relação com o conhecimento (do desenho) e
com a lógica formal e disciplinar na qual assenta. Assim, e ainda no contexto da
aula de campo, considerei que esta proporcionaria viver o desenho no contexto
das suas manifestações culturais e sociais (neste caso, da cidade), ao mesmo
tempo que, possivelmente, ajudaria a olharmos, professora e alunos, para outro
tipo de questões que parecem ausentes das gramáticas disciplinares do desenho.
Falo a partir de preocupações agora no campo da minha ação como professora, e
que me interessam explorar no futuro em termos do meu trabalho na escola com
os alunos, nomeadamente a relação entre a educação e a cidade, as geografias e
os territórios da cidadania possíveis de serem pensados segundo uma lógica de
60
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

descoberta, participação e questionamento, o movimento enquanto contexto do


desenho, a rua enquanto património do olhar, etc. Ressalvo, porém, que não é a
aula de campo per si que proporciona tais pedagogias. Mas o fato de se estar fora
das quatro paredes às quais chamamos sala de aula, pode abrir-nos a um enredo
de possibilidades, às quais (aqui enquanto docente) eu poderei dar uma especial
atenção no contexto das aprendizagens do desenho.

Aula #1 – de dentro para fora

Partindo do pressuposto de que no interior da sala de aula grande parte


do que acontece é reprodução de algo (uma narrativa já construída e a partir da
qual o professor disserta), espera-se neste contacto com a “realidade real” uma
aproximação à natureza cultural, social e física do espaço da cidade, de modo a
que as experiências de aprendizagem se tornem enriquecedoras e engrandeçam
nalguma medida os alunos.

Desenhei como principais objetivos da aula de campo a possibilidade de


um alargamento de horizontes, uma nova, ou diferente, captação do olhar, no
sentido de os alunos conhecerem uma cidade segundo uma outra perspetiva.
Com feito, a “perspetiva” da cidade do Porto, vista e revista inúmeras vezes e
além disso reproduzida por múltiplos suportes visuais, constituiu-se, porém, e
no caso dos alunos com que trabalhei ao longo do meu estágio, numa estação de
partida. O facto de os alunos pertencerem a uma escola situada na cidade de
Ermesinde, e ainda que esta se situe a poucos quilómetros do Porto, a verdade é
que a grande maioria dos alunos revelou não “conhecerem o Porto”, não estando
“habituados a irem ao Porto”. Assim, o facto de se colocarem fora de um
contexto ao qual estariam mais habituados, fez-me pensar no sentido desta aula
de campo no contexto global das suas aprendizagens. Por outro lado, a aula de
campo poderia também constituir-se numa oportunidade para os alunos se

61
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

relacionarem com a cultura visual da cidade, os estados de conservação de


diferentes edifícios, a crescente gentrificação9 e turistificação10 que nos últimos
anos tem vindo a alterar a paisagem urbana do Porto, etc., num processo através
do qual fui gerindo a sua autonomia, liberdade e ritmo.

De um modo prático, o objetivo passou por observar a cidade através de


um roteiro previamente orientado por mim. A proposta consistiu em captarem
através do desenho descobertas que a cidade lhes dá. O facto de estarem em
andamento e com curto tempo levava a que tivessem que desenvolver um traço
rápido e conciso, atentos ainda ao sentido e às escolhas das suas observações.
Durante o percurso, e enquanto orientadora, fui apelando para alguns
enquadramentos, letterings, naturezas, arquiteturas, contrastes. Estas diferentes
imagens levaram-nos a diferentes linguagens e gramáticas de desenho. Neste
contexto, os alunos tiveram a liberdade na escolha das imagens, do material, do
registo e do enquadramento. O ponto de encontro que marcou o início deste
percurso foi a Estação de S. Bento, pois além de ser a estação onde os alunos
sairiam vindos da estação de Ermesinde, ali seria também o espaço para
vivermos diferentes imagens. Reuni então o grupo de alunos num espaço mais
reservado no interior da Estação para que pudessem apresentar a proposta de
forma clara. Comecei assim por dizer o que iríamos fazer, “um percurso pelas
ruas do Porto onde podemos observar várias imagens e diversas situações”.
Revelei, na altura, que tinha como objetivo que os alunos, através de um
riscador e de um suporte, desenhassem as imagens que mais curiosidade lhes

9
Gentrificação é um conceito que consiste num sistema de valorização imobiliária de uma determinada
zona urbana ou bairro típico. Com este processo, observa-se a deslocação dos residentes com menor
poder económico para um local periférico e a entrada de habitantes com maior poder económico para a
zona valorizada.

10
Turistificação consiste num fenómeno proveniente de uma transformação “socioeconómica, em
determinadas localidades ou zonas, geralmente urbanas, consideradas turísticas ou com potencialidades
para o turismo, em resposta à procura crescente de certos destinos turísticos, envolvendo a criação de
alojamentos temporários, a implementação de novas estruturas de apoio, a requalificação de
património imobiliário e, consequentemente, a alteração do perfil populacional residente.”, consultado
em https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/turistifica%C3%A7%C3%A3o , a
29/06/2018.
62
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

# Alunas a desenhar no percurso – Rua das Flores

despertasse, imagens com que mais se identificassem e/ou que de alguma forma
suscitassem algum interesse para eles. Como objetivos técnicos, pretendi que
registassem um desenho rápido, captando as ideias base do que estivessem a
observar, olhando ao espaço, às distâncias, às proporções, às texturas e às luzes.
A minha principal finalidade prendeu-se com o desenho de rascunhos/estudos
para futuros desenhos. Pude observar que à medida que realizavam os estudos,
os alunos foram convocando o meu apoio, por iniciativa própria, e noutros casos
comunicando entre si. Deste modo, chamei a atenção para a possibilidade de
desenharem o movimento, a entrada e a saída de passageiros do comboio, o
contraste da tecnologia com a natureza de fundo, bem como a arquitetura do
edifício da Estação de S. Bento. Sabendo que grande parte dos alunos não teve
História da Cultura e das Artes nos três anos letivos do Ensino Secundário,
achei ainda pertinente referir o contexto de surgimento da Estação, as diferentes
imagens que podemos encontrar nos seus interiores e o papel desta estação de
caminhos-de-ferro na história social e cultural da cidade. Em anexo (anexo III)
pode ver-se o planeamento que tracei a nível deste domínio.

63
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Deixando os alunos entregues à sua autonomia, ritmo e liberdade fui


marcando os pontos de encontro seguintes. Na passagem da Estação de S. Bento
para o início da Rua das Flores, salientei o movimento das diferentes pessoas
que ali poderia ser traçado, o tipo de arquitetura que atravessa esta Rua, as
atividades sociais e comerciais que ali poderíamos encontrar, os letterings
presentes nas lojas, as pinturas de rua e de parede, entre outros aspetos.

A terceira paragem foi em frente à Casa da Misericórdia do Porto, lugar a


partir do qual, e para além da contextualização que procurei fazer em torno da
peça “O Meu Sangue é o Vosso Sangue”11, de Rui Chafes, fui conversando sobre
alguns elementos da história dos edifícios que caracterizam esta rua.

# “O meu sangue é o vosso sangue”, Rui Chafes

Atravessámos de seguida a Rua de Mouzinho Silveira e subimos em


direção à Sé pelas ruas estreitas caraterísticas da cidade. Parámos depois em
frente a um edifício na Rua de Santana, uma fachada de uma ilha. Apercebendo-
me que os alunos desconheciam o que seria uma “ilha”, esta paragem tornou-se

11
Esta obra foi uma encomenda da Santa Casa da Misericórdia do Porto para oferecer à cidade do
Porto, integrante do Programa de Arte Pública criado pela Câmara Municipal do Porto em 2015.
Esta peça estabelece um arco com a obra Fons Vitae, que se encontra no interior do edifício, religando
tempos e espaços diferenciados, como se nos quisesse transmitir que se a pintura flamenga Fons Vitae
continuasse a sangrar e ganhasse vida fora do edifício.
64
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

significativa para conversarmos sobre as diferenças culturais, arquitetónicas e


sociais existentes entre esta rua e a Rua das Flores.

Subindo, parámos depois em frente à Igreja dos Grilos e, por último,


chegámos ao largo da Sé do Porto.

# alunos a desenhar no percurso. Largo da Igreja dos Grilos

No meu ponto de vista, as principais dificuldades desta aula de campo


deram-se devido à gestão de tempo. À medida que os alunos foram fazendo os
seus rascunhos/estudos/desenhos eu procurei de algum modo um tempo que
lhes permitisse viver esse ato, não propriamente de um modo pronto e acabado.
Mas uma vez que o tempo desta aula se traduziu num percurso a pé, os alunos
mostraram-se cansados e com fome, pedindo para fazer um intervalo e depois
continuavam, mesmo já tendo acabado o tempo previsto. Ao refletir, tive que me
preparar para um plano B, isto é, reduzi o planeamento previsto. Conversei com
o grupo e, mesmo sendo uma aula que pediria “mais tempo, não haveria na
realidade condições para repeti-la enquanto horário de aula, embora tivesse
mostrado toda a minha disponibilidade para, futuramente, os acompanhar numa
outra aula de campo. Antes de terminarmos, referi os pontos que faltavam e a
razão pela qual haveria interesse em realizarmos este percurso, não só com

65
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

“mais tempo”, mas sobretudo num “outro tempo”. A intenção era passarmos pela
zona das Fontainhas, um lugar que do ponto de vista da relação entre desenho e
identidade cultural me interessava explorar com os alunos, dado que nesta zona
da cidade poderíamos refletir sobre o desenho da arquitetura, dos jardins e da
paisagem. Na sequência desta paragem, a minha proposta passava então por
terminar o percurso na Faculdade de Belas Artes do Porto, explorando pelo
caminho diferentes intervenções artísticas no espaço público e o sentido do
desenho nos lugares percorridos.

Aula #2 – da execução à possibilidade de relação

A segunda parte da proposta consistiu em partilhar com os alunos outros


registos e possibilidades do desenho. Centrada no espaço da sala de aula, a
minha ação passou por fazer diferentes propostas de exercícios a partir das quais
pudéssemos refletir nas relações entre traçar, riscar, compor e desenhar numa
folha de papel. Neste contexto, parti de uma conceção de desenho enquanto
exercício, tal como aludi atrás no capítulo 3 (“Dos exercícios às aprendizagens
do desenho”), e no âmbito da qual o me importou sobretudo trabalhar foram as
possibilidades e as limitações que os alunos identificassem em exercícios rápidos
de desenho. Importou-me assim explorar de que modo o olhar, o gesto (neste
caso, físico) e a ideia pudessem interconectar-se e/ou desviar-se, à luz de um
processo de relação singular com o desenho.

Executadas em sala de aula, estas propostas de desenho corresponderam a


exercícios através dos quais se pretendia que os alunos assumissem o controlo
dum determinado resultado. Deste modo, a aula partiu de um conjunto de
exercícios, através dos quais os alunos riscaram a folha A1 em várias direções,
ocupando a sua totalidade. Do meu ponto de vista, esta aula surgiu com a
preocupação de aproximar/sensibilizar os alunos com o espaço pedagógico da
sala de aula e os recursos de trabalho, bem como com as suas possibilidades de
desenho face a propostas que assentavam, essencialmente, numa lógica de
66
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

execução. Assim, pretendi que os alunos observassem a composição de um clipe


e um pionés, num processo fundamentalmente orientado por mim, e através do
qual procurei que explorassem o olhar na relação com os espaços, proporções e
comparações. Este processo diretivo de orientar os alunos no exercício de
desenhar levou-me, porém, a refletir nalgumas limitações que se atravessam
numa lógica tecnicista de ensinar e aprender, uma lógica na verdade ainda muito
enraizada na tradição do uso do manual de desenho nas salas de aula, bem como
no discurso das manualidades predominantes nos programas e nos modos de
pensarmos a eficácia do desenho na escola (Acaso, 2009). Todavia, por vezes a
presença dos manuais de desenho nas salas de aula, mostram-nos possíveis
formas de expressar o domínio das técnicas na execução do desenho,
identificando-as e relacionando-as. Por essa razão, em muitas salas de aula de
desenho encontram-se desenhos “bem executados” de pintores e outros artistas,
e, nesse sentido, esses desenhos acabam por ser considerados academicamente
válidos, o que na minha perspetiva empobrece as possibilidades de pensarmos a
realidade do desenho no espaço da sala de aula. Tecnicamente estes registos são
feitos de acordo com algumas fórmulas, e nessa medida os manuais acabam por
se tornar muito pouco originais, porque repetem modelos de execução e técnicas
de expressão, havendo, portanto, a necessidade de o professor e os alunos
procurarem outros recursos. Estes recursos são vastos e podem ir desde a
leitura de vários livros, técnicos e/ou biográficos, à visualização de vídeos, ou
ainda à visita permanente de exposições e galerias, mantendo assim o contacto
com diferentes produções no campo das artes visuais, muito para além do que é
prescrito pelos manuais de desenho (Ramos, et al., 2001).

As propostas de exercícios que surgiram nesta aula integram 3 séries: na


primeira série os alunos representaram a composição atrás referida com a
indicação de diferentes tempos, (1 minuto, 40 segundos, 20 segundos e 10
segundos); na segunda série, não havendo aqui um tempo predefinido, os alunos
representaram a composição em negativo e em espelho; por fim, na terceira
série, cada aluno observou durante um minuto a sua composição e, em seguida,
reproduziu-a de olhos fechados; ainda nesta fase, e a partir de um acetato,
67
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

procurei que os alunos marcassem os pontos orientadores da composição que


haviam realizado, passando-os posteriormente para a folha A1. No final de cada
uma destas séries de exercícios os alunos escreveram um pequeno comentário a
propósito das dificuldades que sentiram nas propostas, olhando aos processos e
aos modos de cada um se relacionar com a execução dos desenhos. Ao refletir na
eventual pertinência desta aula para as aprendizagens dos alunos, considero que
as propostas puderam subjetivar o ideal de execução e de “obra” que na maioria
dos casos ainda se inscreve na maneira pela qual julgamos a perfeição destes
processos técnicos de desenhar. Nessa medida, a minha intenção passou por
trabalhar dimensões do desenho definidas precisamente pelo seu inacabamento,
isto é, pela rasura que subjaz ao ato de executar, riscar e compor.

# 1 Exemplo de um exercício realizado por um aluno. Fonte: pessoal

Quis que o ato de errar


fosse assumido enquanto ato de
desenhar e que esta possibilidade de relação com o desenho pudesse,
eventualmente, apoiar as possíveis inseguranças e os medos de os alunos se
sentirem ridicularizados no seu desenho.

68
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

De um modo geral, os comentários dos alunos acerca dos exercícios que


realizaram nesta aula aludiram à possibilidade que os próprios identificaram em
pensarem sobre as suas dificuldades, técnicas e modos pessoais de encararem o
desenho sob motivos muito variados. Mas, uma vez mais, e à semelhança da aula
de campo, li nos seus comentários a dificuldade sentida relativamente à gestão
do tempo. No entanto, não fazia parte das minhas intenções enquanto professora
resolver, no sentido curativo da palavra, qualquer tipo de problema manifestado
pelos alunos em relação ao desenho e às diferentes formas de responderem às
minhas propostas. Correspondendo a exercícios de execução rápida, uma aula
apenas não pode ser assumida como a resposta capaz de solucionar os eventuais
problemas ou de falta de rapidez ou de organização pessoal do tempo dos alunos
ao desenharem. Não se tratou, portanto, de assumir a pertinência desta aula pelo
lado do que ainda faltava aos alunos saberem dominar no desenho (rapidez,
capacidade de resposta e de síntese, organização pessoal do tempo, etc.) e que
esta aula iria assim “retificar”. Quis, pelo contrário, construir um espaço para
que os alunos experimentassem uma linguagem do desenho que também é
técnica e, por isso, imperfeita, sujeita a uma rotina que pode ser significativa do
ponto de vista das aprendizagens do desenho realizadas no espaço pedagógico
da sala de aula.

Aula #3 – Da teoria à reflexão

Durante a semana que compreendeu a realização da minha proposta


didática, planeei a realização de um debate, cuja dinâmica ocupou uma primeira
parte da aula. Obedecendo à preocupação de garantir um encadeamento de
sentido entre as aulas que tinha até então realizado com os alunos, a finalidade
passava por discutirmos as experiências vividas quer na aula/percurso, quer na
aula focada nos exercícios de execução. Porém, dei-me conta de que o grupo
necessitava de voltar aos desenhos praticados nas aulas anteriores e, nessa
medida, reorientei o que havia alinhado. Após este momento, passei a apresentar

69
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

um conjunto de diapositivos previamente elaborados por mim, em Powerpoint, a


partir dos quais procurava expor o trabalho de alguns artistas no campo do
desenho e das artes visuais (ver anexo V).

O meu objetivo seria problematizar e refletir sobre algum material


teórico produzido nesta área, e com exemplos de percursos pessoais de
desenhadores/as e artistas visuais. Nesse sentido, mesmo com o recurso a
desenhos de Pablo Picasso, figura consagrada pelos manuais e ensaios de
pintura, pretendi expor desenhos considerados menos óbvios, contrastando
autores e artistas menos valorizados pelo campo formal da história da arte.

# 2 “Bull”, 1945, Pablo Picasso. Imagem usada no Powerpoint.

Fonte: http://arteref.com/arte/as-etapas-do-touro-de-picasso-do-academico-ao-abstrato/

Recorri assim, na sua maioria, a trabalhos de artistas jovens e


portugueses, com o intuito de que os alunos se identificassem com percursos
pessoais e artísticos fora de um discurso curricular e académico que
frequentemente recai no elogio do “esplendor” e da “obra do artista”
mundialmente reconhecida.

70
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

# 3 Diapositivos apresentados na aula #3, exemplos de autores portugueses.

Ao longo da minha exposição, procurei contrariar a ideia de que a


definição de personalidade de um determinado artista se define sempre através
da descoberta de uma imagem ou de uma pulsão interior, cuja busca o artista
submete a uma viagem sem quaisquer referências e coordenadas históricas. De
Leonardo Da Vinci e Marcel Duchamp, julgo que esta ideia da “personalidade do
artista” corresponde, na verdade, a um dos maiores mitos, no campo do desenho,
produzidos pelas academias das Belas Artes. Com efeito, as personalidades de
todos os artistas, mais ou menos reconhecidos e validados pelas instituições
académicas, constroem-se a partir do encontro “com outros”, são fruto de um
exercício de imaginação pessoal em profunda tensão com o imaginário social e
coletivo a que somos sujeitos.

O estudo, a observação e a discussão em torno dos percursos dos artistas


que foram objeto desta aula permitiram dar a conhecer aos alunos, exemplos de
artistas que trabalham o desenho de diferentes formas e, que é possível que uma
pessoa se consiga realizar enquanto artista desenhador. Os alunos ao
conhecerem o percurso destes artistas e como estes iniciaram o seu percurso
profissional, pode ser uma possibilidade para se sentirem motivados para
prosseguir com a aprendizagem do desenho. Em forma de debate com os alunos,
ao falarmos, por exemplo do artista Joel Faria, o contexto de como foi
“descoberto” enquanto desenhador, a partir do seu trabalho enquanto barman no

71
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

estádio do Futebol Clube do Porto, este foi convidado pelo diretor de marketing
do clube a conceber o livro de apresentação da equipa, o que lhe deu coragem e
visualidade para envergar pelo percurso do desenho.

Como futura docente de Desenho (ou em vertentes artísticas) julgo ser


necessário debater com os alunos que as obras de alguns artistas consideradas
“míticas” não surgem do vazio, antes pelo contrário. A imagem de um mundo
virgem e primitivo, a partir do qual o artista, solitariamente, extrai o valor e a
arte do seu trabalho é, na minha perspetiva, uma imagem que precisa de ser
questionada nas aulas de Desenho. Não havendo lugar a visões mitificadas, pelo
menos à luz de uma contemporaneidade crítica, tal não significa que os «mitos»,
enquanto formas válidas de conhecimento, artístico e não só, deixem ser objeto
de exploração e trabalho com os alunos. Como seres sociais, singulares, sujeitos
à aprendizagem, cada um de nós é constituído por sonhos, paixões, desejos,
dimensões às quais, tal como atrás referi ao recorrer a Bernard Charlot (2009),
devemos a nossa relação com o saber. Neste contexto, considero que a relação
com o desenho, uma relação de aprendizagem com diferentes saberes, é, acima
de tudo, um campo permanente de tensões entre a singularidade que define cada
aluno desenhador e o domínio público dos discursos que se produzem sobre o
“saber desenhar na escola”. Foi sobretudo por estas razões que decidi realizar
esta última aula de exposição e debate com os alunos, acentuando a realidade do
exercício e da prática contínua do desenhar enquanto possíveis percursos de
aprendizagem no desenho.

72
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Considerações finais

“Eu, Leonardo... Mente inquieta, incontrolável, indomável, dominada pelo


fascínio do mundo – seus olhos e seu pensamento não conseguiam descansar
ante os infinitos objetos do mundo, existentes e por existir.”

(Rubem Alves, 1994:31)

Chegamos agora à estação final, com a certeza de que voltarei atrás e


seguirei, outra vez este e outros percursos.

Não se pretende com este relatório chegar a uma fórmula sobre como
ensinar o desenho ou descobrir quais são os melhores métodos pedagógicos.
Pretende-se antes refletir sobre o ato de ensinar, e neste caso, questionar o
ensino do desenho e que lugar este ocupa no ensino artístico, e, por sua vez, qual
o lugar das Artes na Escola. Sabendo que, sem certezas, o desenho, e, por sua
vez, as Artes, podem revelar e formar o sujeito.

Ao longo da procura de um sentido da pertinência das artes no ensino,


encontro o autor Eisner (2008:15), a quem recorro às palavras, “O sentido de
vitalidade e a explosão de emoções que sentimos quanto comovidos por uma das artes
pode, também, ser assegurada nas ideias que exploramos com os estudantes, nos desafios
que encontramos em fazer investigações críticas e no apetite de aprender que
estimulamos.” Concordo, e acredito, que, as artes podem dar ferramentas para
garantir aos estudantes, que, o que os docentes de ensino artístico ensinam “aos
estudantes vai continuar a persegui-los voluntariamente, depois de todos os incentivos
artificiais das nossas escolas serem esquecidos. É especialmente neste sentido que as artes
servem de modelo para a educação.” (idem)

73
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Enquanto metodologia pedagógica, recorro ao projeto Learning by


Design, com a justificação de que este engloba diversas metodologias de ensino,
para que assim se possa alcançar os diferentes alunos. Evoca ainda a reflexão
crítica como prática permanente na ação enquanto docente. Este projeto procura
um tipo de professor, (que eu procuro ser enquanto futura docente), que se
“esforça por ir ao encontro do aluno e entender o seu próprio processo de
conhecimento, ajudando-o a articular o seu conhecimento-na-ação com o saber
escolar” (Schon, 1992:82).

Tenho premente, e foi usado como ponto de partida para a planificação da


aula a lecionar, as aulas de campo. Partindo de experiências pessoais e,
posteriormente, fundamentadas com autores que justificam a saída da aula do
espaço físico condicionado a quatro paredes, para que assim, os alunos tenham
uma visão do real e um contato com a realidade. Com a prática desta atividade,
pretendo concretizar um método de aprendizagem que possa permitir aos alunos
“construir o seu conhecimento de uma forma mais apelativa e motivadora.”
(Aguiar, 2016: vi), não que por si só, o caso de ser uma aula de campo, se torne
nestas condições, mas pode potenciá-las.

Assim, com suporte na reflexão do ensino do desenho e do ensino


artístico, e das atividades praticadas no estágio, encontro um lugar, o de
procurar definir em mim, um perfil de docente reflexiva, crítica, abrangente e
tolerante.

74
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Bibliografia

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Visuais no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário, Faculdade
Psicologia Ciências da Educação da Universidade do Porto e Faculdade de Belas
Artes da Universidade do Porto, Orientada por José Paiva e Natércia Pacheco,
link partilhável em
http://catalogo.up.pt:80/F/?func=direct&doc_number=000140647&local_base
=PCEUP

75
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

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da Universidade do Porto e Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto,
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Ensino Básico e no Ensino Secundário. Link Partilhável em
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Mestre em Ensino de Artes Visuais no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino
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Universidade do Porto e Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto,
orientada por Henrique Vaz. Porto. Link Partilhável
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Ensino Básico e no Ensino Secundário, pela Faculdade de Psicologia e Ciências
da Educação da Universidade do Porto e Faculdade de Belas Artes da
Universidade do Porto, no ano letivo 2016/2017.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

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79
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

80
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

ANEXOS

Anexo I

Apresenta-se de seguida o inventário com a taxonomia que nos pode


ajudar a compreender a complexidade das palavras geradas, direta ou
indiretamente, pelo desenho, produzido por Juan José Molina (2005:12)12.

1. Nombres que definem la identidade y el sentido del dibujo:

1. a. Dibujar, disenar, trazar, gráfico

1.b. Ideia, concepto, diseno interno, pensamiento, imaginación, invención,


capricho, disparate, fantasía, ocurrencia, improvisación, hurtado, fusilado, sensación,
sentimiento, emoción, impreción.

2. Nombres vinculados a las formas de conocimiento y sus aplicaciones:

Dibujo analítico, descriptivo, naturalista, realista, conceptual, abstracto,


esquemático, poético, científico, técnico, lineal, artístico, artesanal, ornamental,
decoração, dibujo animado.

3. Nombres de las formas que estructuram los dibujos y de sus relaciones:

3.a. Forma, diseno externo, punto, línea, mancha, contorno, dintorno, fondo,
silueta, perfil, textura, píxel.

3.b. Composición, disposición, configuración, ordenación, estructura, simetría,


articulación, armonía, euritmia, ritmo, equilibrio, tensión, unidad, fragmento, encuadre,

12
O inventário encontra-se escrito segundo o texto original.
81
Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

vineta, trazado regulador, proporción, seccion áurea, divina proporción, numero de oro,
canon.

4. Nombres referidos a lo que representam los dibujos:

4.a. Representación, imagen, figura, icono, mimético, antropomorfo,


antropometría, anatomía, desollado, maniquí, retrato, fisionomía, efigie, caricatura,
monigote, signo, símbolo, senal, diagrama, pictografia

4.b Tema, motivo, asunto, historia, narración, guión, ilustración, storyboard,


repertorio, iconografia, iconologia, tipologia, alegoría, emblema, empresa, arquetipo.

5. Nombres referidos a lo que expresan lo dibujo:

Expresión, carácter, afecto, animación, gesto, movimiento, bizarría, morbidez,


esbeltez, decoro.

6. Nombres de las estructuras de simulacro:

6.a. Simulacro, ilusión, fingido, figurado, apariencia, verosimilitud, virtual,


trampatojo (trompe-loeil), anamorfosis, anaglifo, holograma.

6.b. Perspectiva, perspectiva militar, perspectiva cabaleira, fugar, punto de


vista, horizonte, scenographia, gradiente, degradación, escorzo, término, primer plano,
profundidad, relieve, panorama, diorama.

6.c. Sombreado, claroscuro, valorización, adumbración, volumen, sciographia,


esfuminado, lavado, plumeado

7. Nombres relativos a los modelos y proyectos que orientan sus acciones:

7.a. Proyeto, esbozo, boceto, bosquejo, apunte, croquis, esquicio, borrón,


borrador, rasguno, tanteo, garabato, garrapato, nota, esquema, estudio, síntesis.

7.b. Copia, lcontrahacer, imitación, réplica, reproducción, facsímil, plagio,


pastiche, modelo, ejemplar, muestra, prototipo, maqueta.

8. Nombres de las operaciones técnicas que se realizan:


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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

8.a. Delineación, cuadrícula, pauta, encaje, calco, tomar perfiles, contornear,


cartón, picado, estarcido, plantilla, molde, contramolde, colagge, frottage, grattage,
fumage, replanteo, levantamiento, restituición, reprografia, escanear, digitalizar.

9. Nombres relacionados com los trazos realizados y con las estructuras en onde se
desarrollan:

9.a. Grafía, trazo, lineamento, marca, raya, incisión, esgrafiado, huella, vestigio,
rasgo.

9.b. Ornamento, adorno, orla, historiado, grutesco, rocalla, filigrana, arabesco,


lacería, tracería, caligrafia, rúbrica, caligrama.

10. Nombres relacionados com el concepto de medida y su control gráfico:

Geometría, geometría descritiva, sistemas de representación, axonometría,


estereotomía, escala, pitipié, acotación, normalización, módulo, modulador, trama,
diagrama, estereometría, planimetría, fotogrametría, proyección, vistas, planta,
ichnographia, alzado, ortographia, montea, sección, corte, despiece.

11. Nombres que describen la fenomenología da su acción:

Ejecución, factura, hechura, acabado, mano alzado, virtuosismo, preciosismo,


efectismo, soltura, arrepentimiento, tocar, matizar, entonar, acordar, modelar, lamido,
recargado, abigarrado, rompimiento, realce, apagar, contraste, suavizar, estilizado,
amanerado, estereotipado, detallado, idealización, precisión.

12. Nombres relacionados con la actitude y el estado con que se realizan:

Inspiración, introspeción, subjetivismo, automatismo, azar, sueno, de repente,


de pensado, de retentiva, de memoria, cadáver exquisito.

13. Nombres vinculados a los estilos, épocas y géneros:

13.a. Estilo, manera, clasicista, barroco, manieirista, expresionista, neoclasicista,


dibujo politécnico, cubista, naif, pintoresco, hiperrealista, cinético.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

13.b. Género, de figura, academia, pose, postura, actitud, contrapuesto, tres


cuartos, serpentiforme, de retrato, de paisagem, vedutismo, aleluya, figurín, escena,
bambalina, tramoya

14. Nombres de sus materiales, técnicas y procedimientos:

Técnica, procedimiento, lápiz, portaminas, pluma, carboncillo, clarión, bistre,


piedra negra, sanguina, aguada, punta metálica, sinopia, fotografia, fotocopia, cad,
dibujo digital, infografia.

15. Nombres de instrumentos:

Compás, transportador de ángulos, escuadra, cartabón, plantilla de curvas,


regla, regla T, paralex, escala gráfica, escala volante, escalímetro, pantógrafo,
tiralíneas, estilógrafo, plancheta, velo, porticón, cámara oscura, cámara clara, cámara
lúcida, perspectógrafo, fisonotrazo, hialógrafo, diágrafo, plotter.

1. Nombres de soportes:

Plano, papel, papiro, pergamino, vitela, carta, lienzo, álbum, cuaderno, pizarra,
encerado, pantalla, lámina, formato, apaisado, recuadro, estampa, fotograma, paspartú
(passe-partout).

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Anexo II

Apresento de seguida o mapeamento, desenhado para aplicar na prática da


atividade a lecionar, segundo as práticas criadas por Learning by Design.

Transmissão de conhecimentos do professor para o aluno, privilegiando


e invocando a diferenciação social e cultural.

Apelar ao diálogo e à colaboração, envolvendo todos no processo


ensino-aprendizagem.

Adaptar os exercícios tendo por base o conhecimento prévio de todos os


alunos.
Recurso do
professor Dar lugar à diversidade a diferentes métodos e estratégias, sendo
reflexivo, para que chegue a todos os alunos.

Fomentar sentido crítico e interventivo por parte dos alunos.

A avaliação deverá ser contínua, acompanhada e individualizada, com


vista a alargamento de capacidades técnicas, compreensão,
desenvolvimento e aprendizagem pessoal.
Apelar a relação pessoa e comunidade, respeitar o património e
incentivar a cooperação e boa vontade social.

Capacidade de estar recetivo para que alcance melhores resultados nas


Recurso do aluno escolhas dos objetos a desenhar.

Os exercícios são individuais, aos que eles são responsáveis pelo seu
ritmo de aprendizagem. Embora individuais, apela-se à troca de
observação de resultados, reforçando o sentido de crítica e bom senso.

Os alunos irão usar além do recurso físico, o recurso imaginário,


intelectual e pessoal. Embora sejam exercícios de observação, não deixa
de haver um exercício de treino mental e apelo a uma destreza, para a
qual é necessária alguma imaginação. No debate, apela-se como recurso,

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

a capacidade de argumentação, sentido crítico e respeito para com o


próximo.
O domínio de aprendizagem é a unidade curricular de Desenho A.

Desenvolver conteúdos de relação pessoa – comunidade.

O nível de aprendizagem é o 12º ano, do curso geral de Artes.

Seguindo os objetivos desenhados pelo programa de Desenho A, do 12º,


salvando que este é permeável e adaptado por mim de modo reflexivo,
os alunos terão de ter como conhecimentos prévios:

Foco da
Registo de traço, mancha e traço e mancha
aprendizagem
Estudo de formas (esboço, escala, artesanal e industrial, interior e
exterior, anatomia e cânones

Transformação gráfica, infográfica e inventiva

Efeitos de cor (contrastes cromáticos, pós-imagens e contrastes


sucessivos)

Movimento e tempo (organização dinâmica – localização e orientação;


organização temporal – ritmo e tempo)
Dominar, perceber e comunicar através do desenho

Exploração da perceção visual, expressão gráfica e comunicação

Observar e analisar

Manipular e sintetizar
O que estamos a
Interpretar e comunicar
aprender
Representar e expressar

Colaborar e conviver

Espírito crítico e autonomia, superar preconceitos e estereótipos

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Sensibilidade estética

Consciência histórica, social e cultural e preservação do património


Sendo o final de um ciclo de estudos,
pretende-se proporcionar experiências
que reúnam as várias competências que
foram adquirindo. Mais que consolidar
as aprendizagens já adquiridas, é
Finalidade do Principais objetivos da necessário dar ferramentas para que
plano proposta consigam gerir os seus conhecimentos
de forma autónoma, crítica,
responsável, cooperativa e tolerante.
Acima de tudo pretende-se que se
forme um cidadão para uma sociedade e
que o desenho seja uma ferramenta
para se apoiar, orientar e quem sabe,
encontrar soluções.
O que vamos aprender Observar, decisão de escolha,
capacidade de síntese, despertar a
curiosidade
Ideias chave Edifícios, pessoas, natureza, contrastes
Objetivos
Questões de orientação Localização no espaço, enquadrar a
arquitetura no tempo
Questões que vão orientar a O que veem? Como veem?
nossa aprendizagem
Objetivos experienciais Contato com a realidade. Relações
espaço temporais, relações proporção
Objetivos de
Objetivos conceptuais Situação política e social da cidade
conhecimento
Sendo, estando O que é desenhar no meio das pessoas?
Como se sentem?
Descobrir
Conectando Como se posiciona o aluno perante o
que observa e o que desenha?
Objetivos de Objetivos analíticos Questões de luz, proporções e

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

conhecimento contrastes
Objetivos de aplicação Traços rápidos, mancha, trama, claro-
escuro, volumetria
Pensando sobre Porquê desenhar isto e não aquilo –
opção de escolha
Descobrir
Fazendo coisas O aluno vai desenhar a ideia ou o
pormenor?
Conceptualizando por Dar nome às coisas
nomeação
Conceptualizando com a O que o aluno conhece
teoria
Analisando funcionalmente A escolha do que desenho
Processos de Analisando criticamente O porquê da escolha do que o aluno vai
conhecimento desenhar e como desenhar
Experienciando o conhecido Usando técnicas, suportes, materiais e
conceitos conhecidos
Experienciando o novo Observação do real na realidade
Conceptualizando com a Proporções, claro-escuro, volumetria,
teoria trama, linha, forma, mancha, contorno,
perfil, composição, harmonia, ritmo,
equilíbrio, tensão
Aplicar apropriadamente Observar e fazer
Analisando funcionalmente Observar, fazer, criticar, aprender
Conectando o mesmo tipo de Tentar o mesmo registo em
coisas observações diferentes e diferentes
registos na mesma observação
Conectando diferentes tipos O desenhar e o saber o que se está a
Sabendo coisas
de coisas desenhar
Pensando sobre algo que faz Tirar a ideia chave, base do desenho
Pensando sobre para que Pode aplicar-se a ideia em diferentes
serve algo contextos – ver no powerpoint

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Anexo III

Apresentam-se imagens com a planificação, enquanto mapeamento,


segundo o projeto Learning By Design, realizadas no contexto de estágio.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

# Mapeamento, segundo LbD, realização própria

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Anexo IV

Apresenta-se de seguida, as planificações das atividades realizadas em


contexto de estágio.

Aula #1: De Dentro para Fora

Data: 20/02/2018 Hora: 14:45 – 17:15 Tempo de duração: 2h30m

Início: 14h45m

1. 10 min – Ponto de Partida: Estação de S. Bento

Conteúdos:

 Diferentes Perspetivas
 Desenhos em movimentos
 Contrastes arquitetura – natureza – Humanos

2. 15h15 – 5 min. – Chamada de atenção para o que podem


observar

30 min – Rua das Flores/Largo de S. Domingos

Conteúdos/ objetivos:

 chamada de atenção para a turistificação/ gentrificação


 Observação de publicidade/letterings/design/arte urbana
 Diferentes arquiteturas/pessoas

5 min: paragem em frente à Santa Casa Misericórdia do Porto para


explicação da obra de Rui Chafes e a história da Rua das Flores

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

3. 15h55 – Largo S. Domingos/Sé

Objetivos:

 desenhos em movimento
 Diferenças culturais e sociais com a Rua das Flores
 Captação de interesses pessoais dos alunos

4. 10 min: Igreja dos Grilos – explanação histórica cultural da


Igreja
5. 16h25 – 30 min – Sé – Guindais – Fontainhas – Praça da
Alegria
6. 16h55 – 15 min – Faculdade das Belas Artes
7. 17h10 – Fbaup – Estação de S. Bento - Reflexão da Visita

Aula #2. Da execução à possibilidade de relação

Local: Sala de Aula

Tempo: 11h15 – 13h10 – 90 min Data: 22/02/2018

Tema:

 Esquiços rápidos
 Treino cérebro/mão

Objetivos:

 Elaboração de exercícios rápidos


 Traço, proporção, trama, volumetria
 Expressão visual
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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Estratégia:

 Série 1
 Exercício 1

Desenho de 1 min – captar segundo os seus conhecimentos,


o máximo de pormenores, tendo atenção à proporção, luz,
material

 Exercício 2

O mesmo exercício anterior, mas com tempo de 40 seg.

 Exercício 3

O mesmo exercício, mas com tempo de 20 seg.

 Série 2
 Exercício 4

Desenho em negativo – 2min

 Exercício 5

Desenho de memória, com os olhos fechados – 1 min

 Exercício 6

Desenhar com mão alternativa à que usa – 2 min

 Exercício 7

Desenhar a composição invertidamente – 3 min

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

 Série 3
 Exercício 8

Desenho só com linha contínua, sem levantar o riscador – 1


min

 Exercício 9

Desenho só com mancha – 2 min

 Série 4
 Repetir exercício 1 – 1min
 Repetir exercício 2 – 40 seg
 Repetir exercício 3 – 20 seg
 Série 5
 Desenhar o mais realista possível – possível de usar grelha –
5 min

Um clipe e um piónes serão os objetos a serem desenhados.

Podem mudar de composição dos objetos entre as séries.

Ter atenção ao enquadramento e equilíbrio do desenho na folha, embora


possam ter os desenhos de várias séries na mesma folha.

Apontar a ordem e o tempo dos exercícios.

Entre cada série, apontar as dificuldades que tiveram.

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Entre Caminhos: O Ensino do Desenho

Aula #3: Da Teoria à Reflexão

Data: 23/02/2018 Hora: 9:20 – 11:10 Tempo de duração: 100 m

50 min:

Aula expositiva – apresentação dos vários tipos de desenho/diferentes


artistas.

Micrometas/micropedagogias: história de vida dos artistas, artistas


nacionais e jovens e diferentes percursos.

Diferentes linguagens do desenho.

50 min:

Acabar os desenhos da aula de campo, em torno de debate/ discussão


crítica.

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Anexo V

Apresenta-se de seguida os diapositivos do Powerpoint, apresentados na


aula #3: da teoria à reflexão.

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