Sebenta DC II - Luis

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Direito Constitucional II

Estruturas normativas na CRP

Atos Legislativos

Art. 112º

1. São atos legislativos as leis, os decretos-leis e os decretos legislativos regionais.


2. As leis e os decretos-leis têm igual valor
3. Nenhuma lei pode criar outras categorias de atos legislativos

• Sentidos do termo lei:

1- Lei como norma jurídica, ordenamento positivo ou Direito.

2- Lei como fonte intencional unilateral de Direito (criação de normas jurídicas por ato de
autoridade).

3- Lei como fonte intencional unilateral centralizada ou estatal de Direito (criação do Direito do
Estado por obra de autoridade estatal).

4- Lei como ato da função legislativa latissimo sensu (ato normativo da função política
subordinado à Constituição, com eficácia externa e interna).

5- Lei como ato da função legislativa stricto sensu (ato normativo da função política
subordinado à Constituição, com eficácia externa, ou seja, dirigido à comunidade política).

6- Lei como ato legislativo da assembleia política representativa ou Parlamento, como lei em
sentido nominal.

7- Lei como ato sob a forma de lei.

• A problemática jurídico-política da lei:

A lei como ato da função legislativa ou como Direito decretado pelo Estado, apresenta diversos
entendimentos:

- Lei como ordenação da razão.

- Lei como vontade do soberano.

- Lei como garantia da liberdade civil e da propriedade.

- Lei ligada à separação dos poderes e ao equilíbrio das instituições.

- Lei como expressão da vontade geral ou como vontade racional.

Com o conteúdo da lei contendem a organização da sociedade e do poder de a governar.

• A lei na evolução do Estado:

A cada tipo histórico de Estado corresponde uma certa configuração da lei. A lei a partir do
século XVI passou a ser o “corolário essencial da soberania” e a cada espécie de poder político
corresponde um tipo particular de legislação.

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Antes do Iluminismo e da Revolução Francesa, o peso da lei era relativamente pequeno. Lei e
Direito objetivo não se confundiam devido ao papel do costume e à aceitação de certos
princípios ético-jurídicos.

A partir do constitucionalismo, a lei tende a dominar todo o ordenamento jurídico estatal,


estando na disponibilidade do poder.

Também há diferenças entre a lei na época do Estado Liberal e a lei nos sécs. XX E XXI. No séc.
XIX, em que dominava uma sociedade homogénea, a lei era uma prescrição normativa que se
definia pela generalidade e pela abstração e que via na codificação o seu maior triunfo. A
racionalidade era o seu limite único e necessário e a Constituição não interferia na maioria das
matérias legais; Já no séc.XX e XXI, em que predomina uma sociedade heterogénea, a lei é
utilizada em intervenções contingentes nos vários setores e assiste-se a uma “inflação
legislativa”, com deficiências de formulação ou de legística formal que não reforçam a
autoridade da lei. Acrescenta-se a retração da lei perante o Direito Internacional.

No séc. XIX, a Constituição ocupa-se da organização política, mas deixa à lei o tratamento dos
direitos que declara. Já no séc. XX, a Constituição deixa de se mostrar neutra perante a
sociedade para se carregar também ela de intencionalidades conformadoras e
transformadoras, alargando as matérias sobre que versa e assumindo conteúdos diversos.

Lei em sentido material:

Ato normativo subordinado à Constituição e dotado de eficácia predominantemente externa


(dirigido à comunidade política e às relações entre os órgãos de poder, não se esgotando na
regulação de aspetos organizatórios.)

Ex: O Regimento da Assembleia da República não é uma lei – é um ato normativo dotado de
eficácia interna, não cumprindo os requisitos da lei em sentido material.

Lei em sentido orgânico-material:

Ato legislativo da Assembleia da República, que é diferente dos:

- Atos legislativos do Governo, que são os decretos-lei.

- Atos legislativos das Assembleias Legislativas Regionais, que são os decretos-legislativos


regionais.

- Atos não normativos do Parlamento, como é o caso das resoluções.

Ex: A Resolução da AR nº1/2017 não é uma lei, porque não é um ato com conteúdo normativo.

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Lei em sentido orgânico-formal:

• Ato normativo do Parlamento, aprovado no seguimento do procedimento legislativo


e com a “forma de lei” (“força de lei”).
• Nem todos os atos da AR são leis:

Art.166º (Forma dos atos):

1. Revestem a forma de lei constitucional os atos previstos no art.161º/a).


2. Revestem a forma de lei orgânica aos atos previstos no art.164º/a) a f) e h) j) l) q) t) e
art.225º
3. Reveste a forma de lei os atos previstos no art.161º/b) a h).
4. Revestem a forma de moção os atos previstos no art.163º/ d) e e).
5. Revestem a forma de resolução os demais atos da AR.

Para além destes, a AR também aprova:


- O Regimento (art.175º/a)
- Deliberações (art.156º/b)

• Nem todos os atos são publicados no Diário da República: Art.119º

• Podem existir atos com forma de lei que não devam qualificar-se como leis por não
terem um “conteúdo legislativo”?

- O problema das leis-medida, que são leis concretas dirigidas à resolução imediata de certos
problemas considerados prementes, mas conservam a caraterística de opções de 1ª linha, por
oposição a medidas administrativas em forma de lei. São leis que não visam criar uma
disciplina jurídica nova, mas sim realizar uma finalidade concreta.

- O problema das leis-individuais, que segundo o Dr. Jorge Miranda, devem continuar a
considerar-se leis sempre que sob a medida individual seja possível recortar um princípio geral
e se reconheça uma intenção geral.

Estas leis não são admitidas em matéria de restrição de direitos. Iguais problemas geram as
leis de amnistia, as leis que declaram o estado de sítio ou de emergência e as leis
orçamentais.

• Podem existir atos sem forma de lei que devam qualificar-se como leis por terem um
“conteúdo legislativo”?

A Constituição determina a forma de lei e os atos que devem ter força de lei (princípio de
tipicidade) não sendo admissível a delegação do poder legislativo fora dos casos previstos na
CRP.
Problemas:
- Os regulamentos (por não terem conteúdo legislativo) não podem ter caráter inovador nem
ser elevados à categoria de lei – proibição de regulamentos delegados (problema dos

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regulamentos autónomos e independentes dos regulamentos das entidades administrativas
independentes);
- Há uma limitação à liberdade de deslegalização, ou seja, os órgãos constitucionais no
exercício da função legislativa têm o dever de disciplinar as matérias, não sendo permitido
degradar o poder legislativo em poder regulamentar em matérias que a CRP inclua na reserva
de lei.
- Indeterminação da densidade da lei, o que pode suscitar problemas no uso de conceitos
indeterminados em áreas onde seja exigível o princípio da tipicidade (ex: lei penal, lei fiscal).
- As decisões judiciais não têm (nem podem ter) conteúdo legislativo (problema das sentenças
intermédias).

Categorias de Lei:

1. Lei Constitucional

• Revestem a forma de lei constitucional os atos previstos no art.161º/1/a).


• Compete à AR aprovar alterações à Constituição, nos termos dos arts. 284º a 289º.
• Leis que aprovam as revisões à CRP. Ex: lei constitucional nº1/2005.

2. Lei orgânica

• Categoria de lei introduzida a 1989 para matérias políticas, impondo nestes casos um
procedimento legislativo agravado.
• Revestem esta forma os atos que constam no art.166º/2, obedecendo ao princípio da
tipicidade: eleições dos titulares dos órgãos de soberania; regimes dos referendos;
organização, funcionamento e processo do TC; organização da defesa nacional, definição
dos deveres delas decorrentes e bases gerais da organização, do funcionamento, do
reequipamento e da disciplina das Forças Armadas; regimes do estado de sítio e do
estado de emergência; aquisição, perda e reaquisição da cidadania portuguesa;
associações e partidos políticos; eleições dos deputados às Assembleias Legislativas das
regiões autónomas; eleições dos titulares dos órgãos do poder local; regime do sistema
de informações da República e do segredo de Estado; regime de finanças das RA; lei de
criação das regiões administrativas.
• As leis orgânicas são um tipo específico de leis, com qualificação, numeração e forma
autónomas, diferentes das restantes leis da AR e que quando alteradas têm de ser
republicadas.
• Carecem de aprovação, na votação final global, por maioria absoluta dos Deputados
em efetividade de funções, devendo as disposições relativas à delimitação territorial

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das regiões, previstas no art.255º, ser aprovadas, em Plenário, por idêntica maioria
(art.168º/5).
• Todas as leis orgânicas são leis de valor reforçado (art.112º/3).
• A confirmação dos decretos que revistam a forma de lei orgânica, para superação de
um veto político, carece de maioria de 2/3 dos Deputados presentes, desde que
superior à maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções (art.136º/3).
• Para além do PR, podem pedir a fiscalização abstrata preventiva da
constitucionalidade de norma constante de decreto que tenha sido enviado ao PR
para promulgação como lei orgânica, o Primeiro-Ministro ou 1/5 dos Deputados à AR
em efetividade de funções (art.278º/4).
• O Presidente da AR, na data em que enviar ao PR o decreto que deva ser promulgado
como lei orgânica, dará dele conhecimento ao Primeiro-Ministro e aos grupos
parlamentares da AR (art.278º/5).

3. Lei Estatutária

• Leis que aprovam os estatutos político-administrativos das Regiões Autónomas.


• São leis da Assembleia da República (art.161º/b).
• Quer a aprovação, quer as alterações subordinam-se a procedimento legislativo
especial:
- Os projetos de estatutos político-administrativos são elaborados pelas Assembleias
Legislativas das RA e enviados para discussão e aprovação à AR (art.226º/1).
- Se a AR rejeitar o projeto ou lhe introduzir alterações, remetê-lo-à à respetiva
Assembleia Legislativa para apreciação e emissão de parecer (art.226º/2).
- Elaborado o parecer, a AR procede à discussão e deliberação final (art.226º/3).
• Carecem de aprovação por maioria de 2/3 dos Deputados presentes, desde que
superior à maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções as disposições dos
estatutos político-administrativos das RA que enunciem as matérias que integram o
respetivo poder legislativo (art.168º/6/f).
• São leis de valor reforçado por serem leis que servem de parâmetro material a outras
leis (art.112º/3).
• O desrespeito pelos estatutos por parte de outros atos legislativos dá origem a uma
ilegalidade qualificada, controlada através do processo de fiscalização asbtrata ou
concreta sucessiva (art.280º/2 e 281º/1).
• Definem o âmbito da competência legislativa regional (art.112º/4 e 227º/1).

4. Lei de Autorização Legislativa (Governo)

• Leis que autorizam o Governo a legislar em matéria reservada à competência


legislativa da AR – todas as matérias do art.165º.
• Esta lei não transfere a competência legislativa para o Governo, apenas a autoriza.
Através de um decreto-lei autorizado (art.198º/1) o Governo recebe um poder, mas não
um dever.

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• São leis de valor reforçado por serem leis que servem de parâmetro material aos
decretos-lei autorizados (art.112º/2).
• Têm um conteúdo mínimo tipificado na Constituição, que é requisito de validade da
autorização legislativa, ou seja, devem definir o objeto, o sentido, a extensão e a
duração da autorização, a qual pode ser prorrogada (art.165º/2).
- Limites materiais das autorizações:
✓ Só podem incidir sobre as matérias ao art.165º e têm de especificar qual, sob
pena de subversão da distribuição de competências legislativas pela
constituição.
✓ Têm de prescrever o sentido da autorização (indicar a orientação a seguir
pelo decreto-lei).
- Limites procedimentais e formais:
✓ Têm de seguir algumas normas procedimentais e específicas na sua
elaboração.
✓ Tem de indicar expressamente que se destina a essa finalidade.
- Limites subjetivos:
✓ É concedida pela AR em plenas funções a um Governo em funções e não é
transmissível.
✓ Caducam com a demissão do Governo a que tiverem sido concedidas, com o
termo da legislatura ou com a dissolução da AR (art.165º/4).
- Limites temporais:
✓ Têm um prazo de duração.
✓ Não podem ser utilizadas mais de uma vez, sem prejuízo da sua execução
parcelada (art.165º/3)
✓ As autorizações concedidas ao Governo na lei do Orçamento observam o
disposto no presente artigo e, quando incidam sobre matéria fiscal, só
caducam no termo do ano económico a que respeitam (art.165º/5)
• As leis de autorização legislativa não produzem efeitos externos, mas uma vez utilizadas
perduram como parâmetros dos decretos-lei autorizados.
• Vícios em caso de desconformidades:
- Se o Governo emanar um decreto-lei cujo objeto não se encontra abrangido pela
lei de autorização, o decreto-lei padece de inconstitucionalidade orgânica (o
Governo neste caso está a legislar em matéria reservada à AR e sem autorização
legislativa válida).
- Se o Governo emanar o decreto-lei depois de a lei de autorização ter caducado o
decreto-lei padece de inconstitucionalidade orgânica (o Governo neste caso está a
legislar em matéria reservada À AR e sem autorização).
- Se o Governo emanar o decreto-lei ao abrigo de uma autorização legislativa
concedida a um Governo anterior o decreto-lei padece uma de
inconstitucionalidade orgânica (o Governo neste caso está a legislar em matéria
reservada à AR e sem autorização).
- Se o decreto-lei autorizado não indica a lei de autorização legislativa padece de
inconstitucionalidade formal.
- Se a lei de autorização legislativa não define o sentido da autorização ou se não
respeita os limites materiais impostos pela constituição, a lei padece de

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inconstitucionalidade material e o decreto-lei autorizado de inconstitucionalidade
derivada (invalidade consequencial), mas é necessária uma declaração expressa
de inconstitucionalidade do decreto-lei.
- Se o decreto-lei autorizado não respeita o sentido da autorização legislativa
teremos uma ilegalidade material.
• Exceções: As autorizações que são especificamente de matéria financeira e
orçamental beneficiam de um regime menos exigente em matéria de sentido da
autorização, na medida em que o mesmo pode ser extraído das restantes normas. As
que dizem respeito a matéria tributária podem ser utilizadas mais do que uma vez e só
caducam com o termo do ano. Não podem ser alteradas pela AR a não ser em sede de
lei de alteração do orçamento (cuja iniciativa pertence ao Governo). Para além disso,
vigoram para além da demissão do Governo, pois destinam-se à execução do
orçamento, independentemente do Governo, e não podem ter uma duração superior
ou inferior a um ano.
• As autorizações legislativas sobre matérias não financeiras e sobre as financeiras que
tenham caráter permanente ou uma vigência superior ao ano orçamental são em regra
designados como “cavaleiros orçamentais” e não beneficiam do regime das
autorizações que são especificamente de matéria financeira e orçamental.

5. Leis de Bases (Governo)

• Leis que consagram os princípios gerais de um regime jurídico, deixando para o


Governo o respetivo desenvolvimento normativo.
• Esta lei serve de critério para o decreto-lei de desenvolvimento e constitui um limite
de atuação para o Governo.
• O decreto-lei de desenvolvimento – art.198º/1/c) – disciplina a matéria segundo o
disposto nas bases.
• As leis de bases só são leis com valor paramétrico superior aos decretos-lei nas
matérias em que a CRP reserva à AR a disciplina das bases ou do regime geral:
- Bases gerais de organização, funcionamento, reequipamento e da disciplina das Forças
Armadas. Art. 164º
- Bases do sistema de ensino.
- Bases do sistema de segurança social e do serviço nacional de saúde.
- Bases do sistema de proteção da natureza, do equilíbrio ecológico e do património
cultural.
- Bases da política agrícola, incluindo a fixação dos limites máximos e mínimos das
unidades de exploração agrícola.
- Bases do regime e âmbito da função pública.
- Bases gerais do estatuto das empresas públicas e das fundações públicas. Art. 165º
- Bases do ordenamento do território e do urbanismo.
- Regime geral de punição das infrações disciplinares, bem como dos atos ilícitos de
mera ordenação social e do respetivo processo.
- Regime geral da requisição e da expropriação por utilidade pública.
- Regime geral do arrendamento rural e urbano.

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- Regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades
públicas.
• Se a AR elaborar uma lei de bases em outras matérias (ex: em matéria concorrente),
esse regime jurídico pode ser modificado por um decreto-lei simples, mas não,
obviamente, por um decreto-lei de desenvolvimento.
• Nos casos do art.164º (reserva de competência legislativa absoluta da AR) as bases
ou o regime geral têm de constar de lei da AR.
• Nos casos do art.165º (reserva de competência legislativa relativa da AR) as bases ou
o regime geral podem constar de decreto-lei autorizado, se a AR autorizar o Governo a
legislar nessa matéria.
• Nos casos em que a reserva absoluta se limita às bases (como sucede com as bases
gerais de organização, funcionamento, reequipamento e da disciplina das Forças
Armadas) mas as matérias a desenvolver fazem parte da reserva relativa (como sucede
com a matéria penal e disciplinar do art.165º/c/d), concluímos que o desenvolvimento
só se pode fazer mediante decreto-lei autorizado.

6. Lei de autorização legislativa (Assembleias Legislativas Regionais)

• Leis que autorizam as Assembleias Legislativas Regionais a legislarem em matéria


reservada à competência legislativa da Assembleia da República, nos casos em que a
Constituição o permite.
• Esta lei serve de critério para o Decreto legislativo autorizado – art.227º/1b).
• As propostas de lei de autorização devem ser acompanhadas do anteprojeto do
decreto legislativo regional a autorizar, aplicando-se às correspondentes leis de
autorização o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 165º - valem as regras gerais da
autorização legislativa ao Governo, mas neste caso o anteprojecto do decreto
legislativo a autorizar tem de acompanhar a proposta de lei de autorização
(art.227º/2).
• As autorizações caducam com o termo da legislatura ou a dissolução, quer da
Assembleia da República, quer da Assembleia Legislativa a que tiverem sido concedidas
– valem também as regras de caráter subjetivo da autorização (art.227º/3).
• Os decretos legislativos regionais previstos nas alíneas b) e c) do nº1 devem invocar
expressamente as respetivas leis de autorização ou leis de bases, sendo aplicável aos
primeiros o disposto no art.169º, com as necessárias adaptações (art.227º/4) – também
aqui pode haver apreciação parlamentar dos decretos legislativos regionais.

7. Lei de bases (Assembleias Legislativas Regionais)

• Consagram os princípios gerais de um regime jurídico e a Assembleia Legislativa


Regional pode proceder ao respetivo desenvolvimento, mediante decreto legislativo
de desenvolvimento, adaptado às especificidades da Região e com âmbito de
aplicação circunscrito à respetiva área territorial.
• A lei de bases serve de critério para o decreto legislativo de desenvolvimento – art.
227º/1/c) – que desenvolve a matéria segundo o disposto nas bases para a adaptar às
Regiões.

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• Nem em todas as matérias onde existem leis de bases é admissível o desenvolvimento
legislativo regional, pois há-de tratar-se de matérias que não se considerem reservadas
aos órgãos de soberania e que tenham relevância diferenciada no contexto regional.
• A ALR apenas pode desenvolver em decreto legislativo regional as seguintes
matérias:
- Bases do sistema de proteção da natureza, do equilíbrio ecológico e do património
cultural (art.165º/1/g).
- Bases da política agrícola, incluindo a fixação dos limites máximos e mínimos das
unidades de exploração agrícola (art.165º/1/n)
- Bases gerais do estatuto das empresas públicas e das fundações públicas (art.165º/1/u)
- Bases do ordenamento do território e do urbanismo (art.165º/1/z)
• Não há uma reserva de competência legislativa regional, nem o Estatuto a pode
estabelecer.
• A competência legislativa regional está estipulada no art.37º da CRP.

8. Lei de Enquadramento

• Leis que pretendem estabelecer parâmetros jurídico-materiais estruturantes de um


determinado sector.
• É através destas que se fazem leis concretizadoras sem forma específica.
• Distinguem-se das leis de bases porque não se limitam a fixar as bases, mas sim as
regras e os princípios que devem ser respeitados naquele sector.
• Exs:
- Lei de enquadramento orçamental – É elaborada, organizada, votada e executada,
anualmente, de acordo com a respetiva lei de enquadramento, que incluirá o regime
atinente à elaboração e execução dos orçamentos dos fundos e serviços autónomos
(art.106º/1), esta lei integra a reserva de competência legislativa absoluta da AR (regime
geral de elaboração e organização dos orçamentos do Estado, das RA e das autarquias
locais – art.164º/r).
- Lei-quadro de criação, modificação e extinção das autarquias locais – integra também
a reserva de competência legislativa absoluta da AR (art.164º/n; 249º).
- Lei-quadro das privatizações (art.293º).

9. Leis de valor reforçado

• Introduzidas na revisão constitucional de 1997.


• A CRP identifica, no art.112º/3, as leis de valor reforçado (Princípio da Tipicidade):
- Leis orgânicas (art.166º/2)
- Leis que carecem de aprovação por maioria de 2/3 (art.168º/6):
. A lei respeitante à entidade de regulação da comunicação social.
. As normas que disiciplinam o disposto no art.118º/2 (a lei que estabelece limites
à renovação sucessiva dos mandatos dos titulares de cargos políticos e
executivos).
. A lei que regula o exercício do direito previsto no art.121º/2 (exercício do direito
de voto dos cidadãos portugueses no estrangeiro).

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. As disposições das leis que regulam as matérias referidas nos arts. 148º
(composição da AR) e 149º (círculos eleitorais), e as relativas ao sistema e ao
método de eleição dos órgãos previstos no art.239º/3 (órgãos deliberativos e
executivos municipais de natureza colegial).
. As disposições que regulam a matéria do art.164º/a (restrições ao exercício de
direitos por militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em
serviço efetivo, bem como por agentes dos serviços e forças de segurança).
. As disposições dos estatutos político-administrativos das RA que enunciem as
matérias que integram o respetivo poder legislativo.
- Aquelas que, força da Constituição, sejam pressuposto normativo necessário de
outras leis (parametricidade específica): as leis de autorização legislativa e as leis de
bases.
- Aquelas que por outras razões devam ser respeitadas (parametricidade geral): leis
estatuárias e leis de enquadramento.
• Caraterísticas das leis de valor reforçado:
- Constituem parâmetro de validade de outros atos legislativos no âmbito do processo
judicial de fiscalização de legalidade (arts. 280/2/a e 281º/1/b), seja quando são
pressuposto material e/ou formal destas (ex: leis de bases), seja apenas pelo seu valor
absoluto (ex: leis orgânicas).
- Exigem maiorias reforçadas para a sua aprovação.

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Principais Fases do Procedimento Legislativo Parlamentar:

Procedimento Legislativo Comum:

1. Iniciativa (art.167º e Título IX)


• Condição para o exercício da competência legislativa. Impulso procedimental que
pode ter motivações jurídicas ou políticas.
• Compete os Deputados, grupos parlamentares, ao Governo, às ALR e a grupos de
cidadãos eleitores.
• A iniciativa dos Deputados e grupos parlamentares é iniciativa interna e traduz-se
em projetos de lei. A do Governo e das ALR, como iniciativa externa, toma a forma
de proposta de lei.
• A iniciativa dos Deputados pode ser individual ou coletiva. Se o poder é em si
individual ele pode ser exercido coletivamente. O limite de 20 Deputados
subscritores de um projeto lei obedece a uma preocupação de garantia da
liberdade de deliberação. Mas nada impede a iniciativa conjunta de 2 ou + grupos
parlamentares.
• As propostas de lei são subscritas pelo 1ºMinistro e ministros competentes em
razão da matéria de vem conter a menção de que foram aprovadas em Conselho
Ministros.
• Projeto e proposta de lei significam iniciativa originária ou de abertura do processo
legislativo com vista a uma modificação de ordem legislativa. Também há iniciativa
superveniente, que se traduz em propostas de alteração (propostas de emenda,
substituição, aditamento ou eliminação) e textos de substituição (textos
apresentados pelas comissões parlamentares, sem prejuízo dos projetos e das
propostas de lei a que se referem)
• A iniciativa dos Deputados, grupos parlamentares, Governo e cidadãos é uma
iniciativa genérica. Pode versar sobre quaisquer matérias, salvo as reservas e os
limites que a CRP impõe.
• A iniciativa das ALR é específica. Somente pode versar sobre matérias concernentes
às respetivas regiões autónomas, nunca sobre lei de âmbito nacional.

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2. Apreciação

• Importa, sobretudo, conhecer os casos de consulta externa obrigatória nos termos da


CRP (que se realiza noutros órgãos constitucionais ou mesmo em organizações da
sociedade civil):
- Comissões de trabalhadores (art.54º)
- Direitos das associações sindicais e contratação coletiva (art.56º)
- Princípios Fundamentais (art.80º)
- Conselho Económico e Social (art.92º)
- Poderes das regiões autónomas (art.227º)
- Cooperação dos órgãos de soberania e dos órgãos regionais (art.229º)
• Consulta interna (a que se desenvolve no Parlamento, através do exame de comissão)
é genérica: dá-se em todos os casos, quanto a todos os projetos e propostas de lei.

3. Deliberação e Votação (art.168º)

• Discussão e votação na generalidade – versa sobre os princípios e o sistema de cada


projeto ou proposta de lei, podendo a AR deliberar que ela incida sobre divisão cuja
autonomia se justifica; Os textos aprovados serão votados na especialidade pelas
comissões, sem prejuízo na especialidade do poder de avocação pela Assembleia e do voto
final desta para votação global.

• Discussão e votação na especialidade – versa sobre cada artigo, número, alínea, pela
seguinte ordem: propostas de eliminação, substituição, emenda, texto discutido com as
alterações eventualmente já aprovadas e propostas de aditamento; A discussão e votação
na especialidade cabem à comissão parlamentar competente em razão da matéria; A AR
pode deliberar que se faça sobre mais de um artigo simultaneamente ou, com fundamento
na complexidade da matéria ou das propostas de alteração apresentadas, que se faça por
números. São obrigatoriamente votadas na especialidade pelo Plenário as leis sobre as
matérias previstas no art.164º/a) a f), h), n) e o o) e no art.165º/1/q.

• Discussão e votação final global – Finda a discussão e votação na especialidade,


procede-se à votação final global; Se aprovado em comissão parlamentar, o texto é enviado
ao Plenário para votação final global; Não é precedida de discussão, podendo cada grupo
parlamentar produzir uma declaração de voto oral por tempo não superior a dois minutos,
sem prejuízo da faculdade de apresentação por qualquer Deputado ou grupo parlamentar
de uma declaração de voto escrita; As leis orgânicas carecem de aprovação, na votação
final global, por maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções; Os projetos e
propostas de lei aprovados denominam-se “decretos da AR” e são enviados ao PR para
promulgação.

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4. A promulgação (art.136º, 137º, Título IV)

• No prazo de 20 dias contados da receção de qualquer decreto da AR para ser promulgado


como lei, deve o PR promulgá-lo ou exercer o direito de veto.
• Se a AR confirmar o voto por maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções,
o PR deverá promulgar o diploma no prazo de 8 dias a contar da sua receção.
• Será porém exigida a maioria de 2/3 dos Deputados presentes, desde que superior à
maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções, para a confirmação dos
decretos que revistam a forma de lei orgânica, bem as matérias do art.136º/3.
• A falta de promulgação ou assinatura pelo PR dos atos do art.136º/b implica a sua
inexistência jurídica.
• Se a AR expurgar as normas inconstitucionais ou se confirmar o decreto por maioria de
2/3 dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em
efetividade de funções, o decreto é enviado para o PR para promulgação.
• Se a AR introduzir alterações, o novo decreto é enviado ao PR para promulgação.

5. Referenda

• Carecem de referenda do Governo os atos do PR praticados ao abrigo do


art.133º/h/j/l/m/n/p e art.134º/b/d/f) e art.135º/a/b/c/.
• A falta de referenda determina a inexistência jurídica do ato.

Procedimentos Legislativos especiais e regras especiais em relação a algumas categorias


de leis:

• Aprovação dos estatutos das RA (leis estatuárias).


• São obrigatoriamente votadas na especialidade pelo Plenário as leis sobre as matérias
previstas no art.164º/a) a f)/h)/n)/0) e art.165º/1/q).
• As leis orgânicas carecem de aprovação, na votação final global, por maioria absoluta
dos Deputados em efetividade de funções, devendo as disposições relativas à
delimitação territorial das regiões, previstas no art.255º, ser aprovadas, na especialidade,
em Plenário, por idêntica maioria. (art.165º/5)
• Carecem de aprovação por maioria por maioria de 2/3 dos Deputados presentes desde
que superior à maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções:
a) A lei respeitante à entidade de regulação da comunicação social;
b) As normas que disciplinam o disposto no art.118º/2.
c) A lei que regula o exercício do direito previsto do art.121º/2.
d) As disposições das leis que regulam as matérias referidas nos arts. 148º e 149º, e as
relativas ao sistema e método de eleição dos órgãos previstos no art.239º/3.
e) As disposições que regulam a matéria do art.164º/o.
f) As disposições dos estatutos político-administrativos das RA que enunciam as matérias
que integram o respetivo poder legislativo (art.168º/6)

13
Os Decretos-Lei

Competência legislativa (art.198º):


• Compete ao Governo fazer decretos-lei em matérias não reservadas à AR. Goza
de uma competência legislativa concorrente, que lhe permite legislar em todas as
mateiras não reservadas ao Parlamento.
• Em matérias de reserva relativa de competência da AR, o decreto-lei autorizado
subordina-se à lei de autorização legislativa.
• Em matérias de reserva de competência legislativa do parlamento quanto às
bases do regime jurídico, o Governo pode legislar através de um decreto-lei de
desenvolvimento que se subordina à lei de bases.
• Os decretos-leis devem invocar a lei de autorização ou a lei de bases ao abrigo da
qual são aprovados.

Principais fases do Procedimento Legislativo Governamental

Apreciação parlamentar de atos legislativos (art.169º)

Os decretos-leis, exceto os aprovados no exercício da competência legislativa exclusiva do


Governo, podem ser submetidos a apreciação da AR, para efeitos de cessação de vigência ou
de alteração, a requerimento de 10 Deputados, nos 30 dias subsequentes à publicação.

Requerida a apreciação, a AR pode suspender a vigência do decreto-lei até à publicação da lei


que o vier a alterar ou até à rejeição de todas aquelas propostas.

A suspensão caduca decorridas 10 reuniões plenárias sem que a AR tenha decidido. Se for
aprovada a cessação da sua vigência, o diploma deixará de vigorar desde o dia em que a
resolução for publicada e a cessação de vigência toma a forma de resolução; Se, requerida a
apreciação, a AR não se tiver pronunciado ou não tiver votado a respetiva lei até ao termo da
sessão legislativa em curso, considera-se caduco o processo; Se não for aprovada a cessão de

14
vigência e tiverem sido apresentadas propostas de alteração, o decreto-lei e as propostas
baixam à comissão parlamentar competente para proceder à discussão e votação na
especialidade.

Os Decretos Legislativos Regionais

Poderes das regiões autónomas (art.227º):


- Legislar no âmbito regional em matérias enunciadas no respetivo estatuto político-
administrativo e que não estejam reservadas aos órgãos de soberania.
- Legislar em matérias de reserva relativa da AR, mediante autorização desta (exceto as
matérias do art.165º/1/a/b/c/d/f/i/m/o/p/q/s/t/v/x)
- Desenvolver para o âmbito regional os princípios ou as bases gerais dos regimes jurídicos
contidos em lei que a eles se circunscrevam.
- Regulamentar a legislação regional e as leis emanadas dos órgãos de soberania que não
reservem para estes o respetivo desenvolvimento.
- Exercer a iniciativa estatuária e a iniciativa legislativa.

Competência da ALR (Art.232º): É da exclusiva competência da ALR o exercício das atribuições


do art.227º/1/a) b) c) d) f) i) l) n) q) bem como a aprovação do orçamento regional, do plano
de desenvolvimento económico e social e das contas da região e ainda a adaptação do sistema
fiscal nacional às especialidades da região.

Principais fases do Procedimento Legislativo Regional

Outros atos normativos sem valor legislativo:

1. As Resoluções do Parlamento
• Categoria residual que abrange atos muito diversos.
• Não precisam de promulgação pelo PR.
• São publicadas no DR (art.119º/1/e).
• Proposta de classificação tricotómica:
- Resoluções que são pressuposto de outros atos jurídico-constitucionais
(ex: aprovação de convenções internacionais).

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- Resoluções relativas a órgãos e titulares de órgãos. (ex: consentimento
para o PR sair do país.)
- Resoluções conexas com a fiscalização política (ex: cessação da vigência
dos decretos-lei).
• Atualmente utiliza-se regularmente a Resolução para exercer atividade
política.

2. As Resoluções do Conselho de Ministros:


• São atos também de conteúdo diverso, mas aprovam maioritamente linhas e
programas de ação para a efectivação de políticas públicas.
• Não carecem de promulgação pelo PR.
• São objeto de publicação na 1ª Série do DR (art.3º/2/p) da lei sobre
Publicação, Identificação e Formulação dos Diplomas.
• Ex: Resolução do CM nº56/2015 que aprovou o Quadro Estratégico para a
Política Climática.

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O Regulamento Administrativo

• Enquadramento jurídico-constitucional dos regulamentos:

Tendo em conta o art.112º da CRP, é possível uma lei disciplinar certa matéria e remeter para
regulamentos outros aspetos, desde que não abranja matérias da reserva. O que se proíbe é
que um regulamento com eficácia externa interprete, integre, modifique, suspenda ou
revogue uma lei.
Os regulamentos do Governo revestem a forma de decreto-regulamentar bem como no caso
de regulamentos independentes.
Os regulamentos devem indicar expressamente as leis que visam regulamentar ou, no caso, de
regulamentos independentes, as leis que definem a competência subjetiva e objetiva para a
sua emissão. (Princípio da precedência de lei)
Os regulamentos independentes não procuram regulamentar uma lei, mas apenas dinamizar a
ordem jurídica em geral (por isso têm um caráter inovador), fora das áreas da reserva.
As autarquias locais dispõem de poder regulamentar próprio nos limites da Constituição, das
leis e dos regulamentos emanados das autarquias de grau superior ou das autoridades com
poder tutelar (art.241º)

• Noção e Fundamento:

Conceito – Normas jurídicas emanadas por órgãos administrativos, no desempenho da função


administrativa. Distinguem-se dos atos administrativos gerais, que não têm um conteúdo
inovador, limitando-se a dispor sobre um caso concreto, de acordo com o disposto numa
norma, dirigindo-se a um “círculo aberto de pessoas”.

• Tipos de Regulamentos:

- Regulamentos externos = disciplinam relações jurídicas inter-subjetivas e inter-


administrativas.

- Regulamentos internos = limitam-se a disciplinar a organização ou funcionamento de uma


pessoa coletiva ou de um órgão administrativo (incluindo os regulamentos organizativos).

- Regulamentos de execução de lei = organizam procedimentos, pormenorizam, interpretam


ou integram lacunas de leis específicas.

- Regulamentos de integração = admitidos nos estritos limites do art.112º/5, quando sejam


expressão de um poder de autonomia regulamentar ou estatutária (ex: regulamentos das
ordens profissionais e/ou das Universidades).

- Regulamentos independentes = têm conteúdo inovador e baseiam-se apenas numa lei


habilitante. (No caso de regulamentos independentes do Governo, alguns autores entendem
que tem que existir uma lei habilitante, para outros a habilitação resulta do art.199º/g).

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- Regulamentos das entidades reguladoras independentes (art.267º/3) = são regulamentos
técnicos que complementam os regimes legais (regulamentos complementares de natureza
técnica).

• Formas regulamentares mais importantes:

• Regulamentos do Governo:

Vantagens do Governo em utilizar os regulamentos independentes em vez do decreto-lei:

1- Não estão subordinadas a apreciação parlamentar (art.169º)


2- Os decretos regulamentares estão sujeitos a promulgação e veto pelo PR (art.134º/b e
136º/4)
3- Não estão subordinados a fiscalização preventiva de constitucionalidade (art.278º)

Contudo existe recurso obrigatório por parte do Ministério Público em caso de


desaplicação de uma norma de um decreto regulamentar (art.280º/3)

• Regulamentos da Administração Pública:

- Regulamentos dos Ministros;


- Regulamentos dos Secretários de Estado;
- Regulamentos da Administração Indireta;
- Regulamentos das entidades administrativas independentes.

• Regulamentos autónomos do poder local:

Regulamentos do órgão deliberativo (assembleia municipal), que tomam a designação de


posturas municipais.
Estes regulamentos fundamentam-se no poder constitucionalmente reconhecido às autarquias
locais e legalmente conformado para regulação dos seus assuntos próprios e para a prossecução

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de atribuições legais (princípios da subsidiariedade, da autonomia local e da descentralização
democrática).
Distinguem-se regulamentos autónomos (iniciativa regulamentar do muncípio) de
regulamentos em que é o legislador que impõe ao município a adoção, por regulamento, de
normas densificadores e concretizadoras da lei.

• Normas do novo CPA:

De acordo com o art.138:


- Os regulamentos governamentais prevalecem sobre os regulamentos regionais e autárquicos e
das demais entidades dotadas de autonomia regulamentar, salvo se estes configurarem normas
especiais;
- Os regulamentos municipais prevalecem sobre os regulamentos das freguesias, salvo se estes
configurarem normas especiais;
- Estabelece-se a seguinte ordem de prevalência: decretos regulamentares; resoluções de CM
com conteúdo normativo; portarias e despachos.

De acordo com o art.139º:


- A produção de efeitos do regulamento dependa da sua publicação no DR, sem prejuízo de
também poder ser feita na entidade pública e na Internet.

De acordo com art.140º:


- Os regulamentos entram em vigor na data neles estabelecida ou no 5º dia após publicação.

De acordo com art.141:


- Os regulamentos desfavoráveis não têm eficácia retroativa; não podem reportar-se a data
anterior àquela a que se reporta a lei habilitante.

De acordo com art.142º:


- Os regulamentos podem ser interpretados, modificados e suspensos pelos órgãos competentes
para a sua emissão;
- Não podem ser derrogados por atos administrativos individuais e concretos.

De acordo com art.143º:


- São inválidos os regulamentos que sejam desconformes com a Constituição, a lei e os
princípios gerais de direito administrativo ou que infrinjam normas de DI ou de direito da EU;
- São também inválidos: os regulamentos que desrespeitem os regulamentos emanados dos
órgãos hierarquicamente superiores, emanados pelo delegante ou que desrespeitem os
estatutos emanados ao abrigo de autonomia normativa nas quais se funde a competência para a
respetiva emissão.

19
Os atos normativos transnacionais:

As normas emanadas dos órgãos competentes das OI de que Portugal seja parte vigoram
diretamente na ordem interna e as normas emanadas das instituições da EU são aplicáveis na
ordem interna, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático.
(art.8º).
Para exercerem as competências da EU, as instituições adoptam regulamentos e diretivas. O
regulamento é obrigatório e aplica-se diretamente em todos os Estados-Membros; a diretiva
vincula o Estado-Membro destinatário quanto ao resultado a alcançar (art.288º TFUE).
A transposição de atos jurídicos da EU para a ordem jurídica interna assume a forma de lei,
decreto-lei ou decreto legislativo regional.
Compete à AR aprovar os tratados e acordos internacionais que versem matérias da sua
competência ou que o Governo entenda submeter à apreciação. (art.161º).
A inconstitucionalidade orgânica ou formal de tratados internacionais regularmente ratificados
não impede a sua aplicação da ordem interna, salvo se tal inconstitucionalidade violar uma
disposição fundamental (art.277º).
Cabe ao Governo aprovar os acordos internacionais não submetidos à AR (art.200º)

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Direitos Fundamentais

• Conceito de direitos fundamentais:

Art.16º /1. – “ Os DF consagrados na CRP não excluem quaisquer outros constantes das leis e
das regras aplicáveis e de DI.”
Não existe um princípio de tipicidade dos direitos fundamentais, o que significa que o seu
conceito é material e aberto:
- Radical subjetivo = normas que contemplam posições jurídicas subjetivas individuais ou de
categorias abertas de indivíduos.
- Função de proteção de bens jurídicos das pessoas ou do conteúdo das suas posições ou relações
na sociedade = bens ou conteúdos que sejam essenciais ou primários.
- Função de explicitação da ideia de Homem e da dignidade da pessoa humana.

• Evolução da conceção dos DF:

Verifica-se a passagem da ideia de separação entre Estado (poder) e a Sociedade à ideia de


integração Estado-Comunidade-Sociedade.
Assim, os DF passaram a ser considerados como uma área do direito constitucional dotada de
uma autonomia relativa.

• Dupla dimensão do conceito:

- Dimensão subjetiva = posição jurídica do indivíduo perante o Estado.


- Dimensão objetiva = conjunto de valores prosseguidos pela comunidade.

• Tipos de DF – sentido material e formal:

1. DF materialmente e formalmente constitucionais – direitos que correspondem


materialmente ao conceitos de direito fundamental independentemente da sua forma.
2. DF só materialmente constitucionais – direitos com conteúdo fundamental mas que se
encontram fora do catálogo (ex: DF consagrados em lei ordinária; DF consagrados em
normas de DI; normas da Constituição fora do catálogo).
3. DF só formalmente constitucionais – direitos que embora cansagrados na Parte I da CRP
não respondem positivamente a todas as notas materiais que caraterizam um DF.

• Dimensões dos DF materialmente e formalmente constitucionais:

1. Direitos, Liberdades e garantias = categoria tipificada, que abrange todos os DF do Título II


da Parte I (arts. 24º a 57º, exceto 40º) e que embora tenha um sentido unitário pode ser
desagregado em:
- Direitos-garantia: assumem uma dimensão instrumental para a proteção do direito
(ex: garantia do dr.penal).
- Direitos-direitos: têm como objeto bens específicos da pessoa (ex: vida, honra).

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- Direitos-liberdades: protegem espaços de decisão livres da interferência do Estado
(ex: escolha da profissão).

2. Direitos económicos, sociais e culturais = direitos consagrados no Título II da Parte I (arts.


58º a 79º) que se traduzem maioritamente em direitos a prestações estaduais positivas, que
carecem de mediação do legislador para se transformarem em direitos subjetivos certos.

3. Direitos análogos a direitos, liberdades e garantias = direitos que embora não integrem o
título II se devem considerar materialmente equivalentes aos DLG e que podem estar em
outras normas Constitucionais ou de DI.

• Diferenças entre os DLG e os DESC:

. Direitos, Liberdades e Garantias:


- Têm uma função primária de defesa da autonomia pessoal.
- Com conteúdo principal determinado ou determinável a partir dos preceitos constitucionais.
- A escassez de recursos não deve condicionar a efetividade destes direitos e a medida da sua
efetivação não depende de escolhas políticas.

. Direitos económicos, sociais e culturais:


- Têm uma função prestacional por parte do Estado.
- Apenas o conteúdo mínimo tem determinação a nível constitucional, cabendo ao legislador
ordinário a determinação do conteúdo principal.
- A escassez de recursos condiciona a efetividade destes direitos e, além disso, a medida da sua
efetivação depende de escolhas políticas em matérias económicas e sociais.

• Dimensões dos direitos subjetivos individuais (exceções à individualidade):

- DF de pessoas coletivas = Não existe uma posição unânime em relação aos DF exclusivos de
organizações privadas ou públicas. Embora a CRP consagre direitos das associações sindicais, das
Comissões de trabalhadores e o direito de antena como um direito dos partidos políticos, uma
parte da doutrina entende que devem ser equiparados a garantias institucionais e não a direitos
subjetivos fundamentais.

- DF de exercício coletivo = Aqueles que não podem ser exercidos pelos indivíduos de forma
isolada por pressuporem atuações concertadas (ex: direito à greve) embora esse exercício
coletivo não ponha em causa a titularidade individual do direito (o direito à greve é exercido
individualmente por cada trabalhador).

- DF fundamentais de grupos ou minorias = situação complexa que surge com o


multiculturalismo e que pode justificar o reconhecimento de direitos grupais de minorias (ex:
etnia cigana), cujo reconhecimento, porém, não pode pôr em causa os direitos subjetivos
fundamentais dos membros desses grupos.

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• Dimensões objetivas dos DF:

Garantias institucionais = “deveres sem direitos”, ou seja, o legislador investe as entidades


públicas e privadas num conjunto de deveres de promoção, realização e garantia de um domínio
típico de um DF tendo em vista a sua realização, mas não atribui os correspetivos direitos aos
seus titulares, o que significa que só podem ser acionadas por via do desrespeito destes deveres
(ex: autonomia estatuária das Universidades, art.76º/2 CRP).

• Titularidade dos direitos subjetivos individuais:

. Os direitos subjetivos fundamentais são posições jurídicas universais e permanentes dos


respetivos titulares (sujeitos individuais).
. São direitos de igualdade no sentido de serem atribuídos a todas as pessoas pela sua condição
humana (art.13º CRP).
. Atualmente existe um discurso de gerações de direitos (que não subscrevemos!), segundo a
qual os DF vão perdendo o seu radical subjetivo e podem transformar-se em direitos da
titularidade não só de pessoas jurídicas coletivas, mas também de representantes de interesses
difusos (ex: direito ao ambiente) ou até dos próprios recursos naturais.
. Excluem-se da titularidade das pessoas coletivas os direitos que pressupõem uma referência
humana (ex: direito à vida).
. A titularidade dos restantes DF depende do princípio da especialidade, ou seja, de o gozo dos
DF ser necessário ou conveniente à prossecução dos seus fins (ex: uma sociedade comercial só
pode invocar o direito de criação artística se entre os seus fins estiver a produção de bens com
inovação, o que não tem sentido se o seu fim é apenas o transporte pesado de mercadorias).
. As pessoas coletivas públicas só podem invocar a titularidade e o gozo de DF quando
estiverem perante o Estado numa relação de subordinação, embora correspondam, na
estrutura organizativa do Estado, a entidades com autonomia de substrato territorial (ex:
autarquias), associativo (ex: ordens profissionais) ou estatutário (ex: Universidades) – mas
questiona-se aqui se também não estamos perante meras garantias institucionais.
. Relativamente aos DF dos estrangeiros (art.15º), a universalidade humana de titularidade dos
DF impõe a regra geral de equiparação do estrangeiro ao nacional. Contudo, a CRP exclui:
direitos políticos (salvo os casos de reciprocidade), exercício de funções públicas não técnicas
e outros direitos reservados pela CRP e pela lei exclusivamente aos cidadãos portugueses.
. São estipulados direitos próprios dos estrangeiros: direito de asilo e de refugiado político e
garantias processuais em matéria de expulsão e de extradição.

• Regime jurídico dos direitos, liberdades e garantias (art.18º):

Traços do regime jurídico dos DLB:


1 - Aplicabilidade direta;
2 - Vinculação de entidades públicas e privadas;
3 - Regime especial de restrições;
4 - Limites ao poder de revisão constitucional;

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Âmbito de aplicação do regime jurídico dos DLB:
- Direitos, liberdades e garantias (Título II).
- Direitos análogos a direitos, liberdades e garantias (art.17º) – sendo que uma parte da doutrina
entende que nem todos os direitos análogos podem beneficiar deste regime jurídico.

1. Aplicabilidade direta: os preceitos fundamentais relativos a direitos, liberdades e


garantias aplicam-se contra a lei e em vez da lei:

- Princípio da constitucionalidade (art.3º/3) = Uma norma legal será desaplicada se ofender


o conteúdo de um preceito constitucional relativo a DLG – efeito derrogatório ou
anulatório; Os poderes públicos, ao aplicarem a lei, devem interpretá-la em conformidade
com os DF – efeito interpretativo.

- Princípio da eficácia imediata dos DF = As normas que consagram DLG’s são dotadas de
um conteúdo determinável e de auto-suficiência aplicativa, pelo que o juiz pode mobilizá-las
para solucionar um caso concreto, mesmo sem lei – exequibilidade imediata dos DLG; As
normas que consagram DLG, mesmo quando não se possam considerar imediatamente
exequíveis, são comandos vinculados para o Estado, o que significa que o juiz pode declarar
a existência do direito, mesmo na ausência de lei ou, quando tal não seja possível, condenar
o Estado à prática do ato omitido e ainda à reparação dos danos causados pela omissão –
deverosidade estrita dos DLG; Os órgãos administrativos não podem suprir as omissões
legislativas, nem desaplicar as normas legais com fundamento em violação de DLG, pois
estão vinculados pelo princípio da legalidade – conflito entre o princípio da separação dos
poderes e o princípio da constitucionalidade.

- Direito de resistência (art.21º) – só em casos de evidência.

2. Vinculação de entidades públicas:

- Vinculação do legislador = Uma explicitação do princípio da constitucionalidade, que


reforça a vinculação mais intensa do legislador a DLG. Ainda assim há graus diferentes de
vinculação consoante o tipo de intervenção legislativa (remissão para as diferentes
categorias de leis – de intervenções do legislador – em matéria de DLG).

- Vinculação da Administração Pública = O conceito de entidade pública para efeitos de


sujeição a DLG não tem de respeitar as orientações classificatórias legais, devendo
reconhecer-se que todas as entidades que gozam de prerrogativas de poder público estão
especialmente vinculadas a DF. Quanto ao modo de vinculação coloca-se novamente o
problema da interposição do princípio da legalidade da Administração (art.271º)

- Vinculação de outras entidades públicas = Vinculação especial dos tribunais a quem se


pede, contudo, uma aplicação dos DLG com respeito pelas esferas da autonomia privada.

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Vinculação de entidades privadas:

. Teoria Drittwirkung (“efeitos em relação a terceiros”) – os DF não vinculam apenas o


Estado e as entidades públicas, mas também terceiros e entidades privadas. (Teorias
monistas – eficácia imediata; teorias dualistas – eficácia mediata, através da intervenção do
legislador).

. Diferença entre Drittwirkung (eficácia em relação a terceiros) e Schutzplicht (dever de


proteção) – Superação da ideia de eficácia direta dos DF nas relações entre privados e
substituição da construção teórica pela imposição de um dever de proteção destes direitos
por parte do Estado.

. State action – teoria norte-americana que amplia a proteção dos DF, “equiparando” a
atuações do Estado (e, assim, ao dever de respeitar e promover os DLG) a atuações de certas
entidades privadas.

Sentido da vinculação de entidades privadas: Vincula diretamente as pessoas privadas que


disponham de poder especial; existe liberdade e igualdade como regras nas relações
privadas; verifica-se a resolução judicial dos litígios, mas com respeito pelas esferas de
autonomia pessoal, negocial e contratual.

3. Limites e limitações dos DLG:

. Os DF são direitos subjetivos, mas não são pretensões individualistas da responsabilidade


social e do conjunto dos valores comunitários – não são direitos absolutos.
. Os DLG são direitos tendencialmente conflituantes com outros direitos ou valores sociais,
cuja efetividade, quase sempre, carece de um juízo de harmonização que delimita o seu
âmbito de ação concreto.
. Existem limites internos dos DLG (conflitos entre as diversas facetas da dignidade da
pessoa humana que obrigam à delimitação do direito a partir de uma atividade
interpretativa).
. Existem limites externos dos DLG (imposições da vida em sociedade: ordem pública, ética,
moral, social, etc).

. Tipos de limitações:

1. Limites imanentes = o conteúdo do DF protegido carece de uma densificação jurídica,


que resulta da atividade de interpretação normativa dos preceitos constitucionais, pois
só assim conseguimos identificar o âmbito de proteção do direito. (ex: o direito a
contrair casamento não abrange a poligamia).
2. Restrições constitucionais diretas – o conteúdo do DF é restringido diretamente pelo
texto constitucional que consagra o direito (ex: os cidadãos têm o direito de se reunir,
sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer
autorização.)

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3. Restrições legais constitucionalmente autorizadas – o legislador constituinte autorizou
expressamente o legislador ordinário a restringir o conteúdo de certos DLG ou habilitou-
o a regular a matéria, o que também pode ser interpretado como uma restrição.
4. Restrições legais tacitamente autorizadas – construção teórica do TC para admitir a
conformidade constitucional de restrições legais de DLG em que não existe um comando
constitucional expresso para a restrição (“ restrições necessárias para salvaguardar
outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”).
5. Reserva geral imanente de ponderação – existência de uma restrição justificada em
função das exigências da vida prática.

. Categorias de leis relativas à intervenção do legislador em matéria de DLG:

1. Leis restritas – leis que visam intencionalmente diminuir o conteúdo de um DF por o


considerarem “agressivo” ou para acautelar um valor comunitário.
2. Leis harmonizadoras – leis que visam resolver um conflito de direitos.
3. Leis ordenadoras – limitam-se a acomodar os direitos na vida jurídica, ou seja, a
tornar efetivos os direitos definindo o seu modo de realização no contexto de
pretensões individualistas que se exercem num contexto comunitário. Muitas vezes,
ao regulamentar o direito, o legislador estabelece leis condicionadoras, que não
sendo verdadeiras restrições, na medida em que não visam o respetivo conteúdo,
acabam por limitar o seu exercício numa perspetiva puramente individualista.
4. Leis interpretativas – explicitam os preceitos constitucionais (leis concretizadoras)
ou que delimitam os conceitos normativos fundamentais (leis delimitadoras).
5. Leis constitutivas ou conformadoras – leis que, por remissão expressa da
constituição, definem o conteúdo do direito (limitando-se a CRP a determinar o seu
conteúdo mínimo ou conteúdo essencial).
6. Leis protetoras, promotoras e ampliativas – leis que ampliam a proteção dos DLG.

. Os limites dos limites - exigências das leis restritivas:

* Reserva relativa de lei parlamentar (forma de lei ou decreto-lei autorizado, exigindo-se


neste caso uma densidade mínima da lei de autorização) – art.165º/1/b).

* Delimitação de vinculações especiais.

* Têm de revestir um caráter geral e abstrato - não se admitem leis individuais restritivas de
DLG nem leis-medida restritivas de DLG.

* Não podem ter efeito retroativo - não se admitem leis restritivas de DLG com efeitos
retroativos, mas podem ser retrospetivas sempre que a proteção da confiança legítima o
permita.

* Não podem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos


constitucionais - o núcleo do direito, que é objeto de proteção pode ser definido como o
conteúdo intocável do direito, ou seja, aquele que se for atingido descarateriza a existência do
direito. (teorias absolutas - núcleo determinável em abstrato que é intocável. Ex: projeção da
dignidade ou de valores sociais; teorias relativas – núcleo é que aquilo que não pode ser

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restringido a não ser que tal seja necessário para salvaguardar outro direito ou valor
considerado prevalecente, valendo aqui a aplicação do principio da proporcionalidade).

. Colisões de direitos fundamentais:

Apesar do esforço harmonizador do legislador constituinte e do legislador ordinário existem


diariamente situações de colisão ou conflito de DLG que têm de ser solucionadas pelos tribunais.
Há colisão de DF sempre que as normas constitucionais protegem dois direitos ou valores
fundamentais que, no litigio concreto, se apresentam com sentidos contrários – o conflito é
sempre uma contradição normativa relativa um caso concreto.

Para solucionar estes conflitos recorre-se ao princípio da concordância prática, ou seja, busca-
se otimizar cada um dos direitos em conflito, o que significa que vale assim o princípio da
proporcionalidade na “distribuição de benefícios e custos” e em certos casos, a solução
consiste na prevalência de um direito sobre o outro, valendo o critério da “prevalência do
interesse preponderante”.

• Traços gerais do regime jurídico dos direitos económicos, sociais e culturais

- Direitos a prestações estaduais (embora também seja possível reconhecer em alguns casos
dimensões negativas ou de defesa entre os direitos sociais).
- Direito cujo conteúdo não está totalmente determinado na Constituição e que por isso
carecem de conformação político-legislativa, de acordo com opções político-ideológicas e
condições de facto para a sua efetividade.
- Direitos cujo conteúdo nuclear tem uma especial força jurídica, o que significa que estamos
perante verdadeiros direitos e não meras normas programáticas.
- Núcleo dos direitos sociais encontra o seu fundamento jurídico na ideia de dignidade da pessoa
humana.

• Os direitos sociais como posições jurídicas subjetivas

Os direitos sociais podem ser reconduzidos a:


- Princípios políticos.
- Normas programáticas
- Fins do Estado
- Normas organizatórias
- Garantias institucionais
- Direitos subjetivos públicos.

Na CRP os direitos sociais são:


- Normas impositivas de legislação (deveres de legislação) – o legislador é um mediador
necessário para a formação do direito subjetivo certo.
- Normas que estabelecem um conteúdo mínimo individualizável do qual se pode densificar um
direito subjetivo, mas que não pode ser determinado judicialmente quanto aos pressupostos e à
extensão do conteúdo, sob pena de violação do princípio da separação dos poderes.

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• Força jurídica dos direitos sociais:

- Imposição legislativa concreta das medidas necessárias para tornar exequíveis as normas
constitucionais (ex: art.63º/2 – não é uma opção, o Estado tem de instituiu um sistema de
segurança social).
- Padrão jurídico de controlo judicial de normas e de interpretação normativa (ex:
art.64º/3/a) – se a lei passar a exigir um pagamento prévio obrigatório para acesso a
tratamentos ou não reconhecer isenções para os mais carenciados será inconstitucional).
- Fundamento constitucional de restrição ou de limitação de DF, incluindo DLG. (ex: art.64º/3
– a lei pode sancionar atividades como a plantação de cannabis.)
- Força irradiante, que se traduz na tendencial resistência dos direitos derivados (direitos
legalmente positivados) a modificações legislativas que impliquem uma diminuição do grau
de realização dos direitos não fundamentada em interesse público superior. (ex: modificação
do regime jurídico que estabelece a idade de reforma).
Alguns autores sustentam a existência de um princípio do retrocesso social, mas o consenso
atual, no quadro do modelo social europeu é no sentido de aplicar a metódica do princípio da
proteção da confiança legítima para assegurar a liberdade constitutiva do legislador, com
respeito pela intangibilidade, também aqui, do núcleo concretizador do direito social.

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Justiça e Processo Constitucional

• Modelos teóricos do controlo de constitucionalidade:

1. Modelos de controlo Jurisdicional:

- Modelo Unitário: O controlo de constitucionalidade não tem autonomia organizativo-


institucional. Todos os tribunais têm o direito e o dever de controlar a constitucionalidade dos
atos normativos que aplicam nas suas decisões. Os tribunais superiores são os que têm a
última palavra em matéria de interpretação constitucional e controlo normativo de
constitucionalidade. Ex: EUA

- Modelo de separação: O controlo de constitucionalidade é atribuído a um Tribunal


exclusivamente competente para questões de constitucionalidade, que é um órgão separado
dos restantes tribunais. Ex: Alemanha e Portugal.

2. Modelos intermédios de controlo: O controlo de constitucionalidade é confiado a órgãos


judiciais – um Supremo Tribunal ou um Tribunal Constitucional, mas as sentenças não têm
efeito de invalidade das leis ou esse efeito pode ser superado pelo Parlamento. Ex: Canadá e
Nova Zelândia.

3. Modelos de controlo político: O controlo de constitucionalidade é confiado a órgãos


políticos, como assembleias eleitas ou o Parlamento, sendo impensável que um tribunal possa
invalidar uma lei por considera-la desconforme à Constituição. Ex: França e Holanda

• Conceitos operatórios:

- Sistema difuso: qualquer juiz, em qualquer tribunal, pode controlar a constitucionalidade das
normas que vai aplicar. Ex: modelo norte-americano

- Sistema concentrado: a competência para fiscalizar a constitucionalidade das leis é reservada


a um único tribunal, seja um Tribunal Supremo, seja um Tribunal especialmente criado para o
efeito (TC). Ex: modelo austríaco

- Controlo incidental ou por via incidental: a questão de inconstitucionalidade só pode


colocar-se no contexto de um processo judicial, ou seja, a questão de constitucionalidade é um
incidente do processo principal e não o objeto da ação. Ex: um funcionário público que fez
greve e, por essa razão, foi sancionado no âmbito de um processo disciplinar, intenta uma
ação no tribunal administrativo, alegando a ilegalidade do ato final do processo disciplinar (o
objeto da ação) e, incidentalmente, a inconstitucionalidade da norma legal da lei do processo
disciplinar que admite sanções em caso de greve, por a mesma consubstanciar uma violação
do art. 57º da CRP.

- Controlo por via direta: a questão de inconstitucionalidade é suscitada diretamente,


mediante um processo autónomo e junto do tribunal competente. Ex: o PR recebe para
promulgação como lei um decreto da AR que regula a maternidade de substituição e, tendo

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dúvidas quanto à conformidade de algumas normas com o art. 67º da CRP solicita a
fiscalização preventiva daquelas normas ao TC.

- Controlo abstrato: a questão de inconstitucionalidade não depende de qualquer litígio


judicial, a ação é movida contra a própria norma legal ou regulamentar e visa a defesa da
constituição. Não se baseia, por isso, no contraditório entre as partes, apesar de o autor da
norma ser ouvido no processo. Ex: um grupo de deputados da AR pode ao TC que fiscalize a
legalidade de uma norma independentemente de existir qualquer contraditório sobre a
mesma.

- Controlo concreto: a questão de inconstitucionalidade surge associada a um caso e na estrita


medida em que a norma é objeto de fiscalização constitui um parâmetro de decisão do litígio.
Ex: um pensionista litiga com a Segurança Social o valor da sua reforma e considera que a sua
situação é tratada, pela lei, de forma desigual a outras comparáveis, neste caso pode suscitar a
questão de constitucionalidade e pedir ao tribunal que verifique se aquela norma que lhe é
aplicada pela Administração viola ou não o princípio da igualdade.

- Controlo preventivo: a questão de inconstitucionalidade é analisada e decidida antes de uma


norma entrar em vigor, sendo sempre um controlo abstrato. Ex: quando o PR solicita a
fiscalização preventiva da constitucionalidade de uma norma.

- Controlo sucessivo: a questão de inconstitucionalidade surge depois de a norma já estar em


vigor no ordenamento jurídico. Ex: o Provedor de Justiça solicita ao TC que aprecie a
constitucionalidade de uma lei do Orçamento de Estado.

- Legitimidade processual: pessoa ou entidade a quem a lei reconhece o poder para estar em
juízo a realizar aquele pedido, naquele processo (distingue-se da capacidade ativa, que é
apenas a capacidade de poder estar em juízo) e no processo constitucional a legitimidade pode
ser: universal (reconhecida a qualquer pessoa que tenha um interesse direto na demanda) ou
restrita (limitada a certas entidades ou a pessoas que tenham uma determinada relação com o
processo).

- Fiscalização Ex officio: no caso de a lei prever que os órgãos de controlo poderiam realizar o
controlo de constitucionalidade por iniciativa própria.

- Fiscalização dependente da iniciativa das partes: o controlo de constitucionalidade assenta


no princípio do pedido, ou seja, os órgãos de controlo só atuam se as entidades com
legitimidade processual os accionarem de forma correta.

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• Caraterização do modelo português de controlo de constitucionalidade

• Composição e natureza do Tribunal Constitucional:

- O TC é um verdadeiro tribunal, por força do art. 209º da CRP.


- O TC é um tribunal constitucional ao qual compete administrar a justiça em matérias
de natureza jurídico-constitucional, sendo que vigora em Portugal um modelo de
separação, por força do art. 221º da CRP.
- O TC embora tenha outras competências é o responsável pelo controlo de
constitucionalidade, por força do art. 223º da CRP.
- É composto por 13 juízes, sendo 10 designados pela AR e 3 cooptados por estes.
- O seu mandato tem a duração de 9 anos e não é renovável.
- O presidente do TC é eleito pelos respetivos juízes.
- Podem ser eleitos juízes do TC os cidadãos portugueses no pleno gozo dos seus
direitos civis e políticos que sejam doutores, mestres ou licenciados em Direito (por
escola portuguesa ou oficialmente reconhecidos em Portugal) ou juízes dos restantes
tribunais.

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• Organização e funcionamento do TC:
- A lei estabelece as regras relativas ao seu funcionamento, podendo determina-lo por
secções, salvo para efeito da fiscalização abstrata da constitucionalidade. Também
regula o recurso para o pleno do TC das decisões contraditórias das secções no
domínio de aplicação da mesma norma (art.224º).
- As decisões do TC são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e
prevalecem sobre as dos restantes tribunais. (art.2º LOFPTC).
- São publicadas na 1ª Série – A do Diário da República as decisões do TC que tenham
por objeto a declaração de inconstitucionalidade de uma norma, a existência de
inconstitucionalidade por omissão e a constitucionalidade das propostas de referendo.
As demais decisões são publicadas na 2ª Série do Diário da República. (art. 3º LFPTC)
- O TC funciona em sessões plenárias e por secções, havendo 3 não especializadas. Só
pode funcionar estando presente a maiorias dos respetivos membros em efetividade
de funções e as deliberações são tomadas à pluralidade de votos dos membros
presentes. Cada juiz dispõe de um voto e todos têm o direito de fazer lavrar voto de
vencido. (art.40º, 41º e 42 LFPTC).

Os processos de controlo normativo:

1. Controlo normativo abstrato preventivo (art. 278º CRP)

❖ Legitimidade processual ativa limitada ao:


- Presidente da República (só para normas constantes de tratados internacionais, leis,
decretos-lei e acordos internacionais).
- Representante da República (só para normas constantes de decretos legislaticos
regionais).
- Primeiro-ministro e 1/5 dos Deputados à AR (só para normas constantes de leis
orgânicas).

❖ Momento temporal do controlo:


Antes de a norma entrar em vigor, pelo que este é um tipo de controlo de
constitucionalidade que acaba por se incluir no âmbito do procedimento legislativo.

❖ Objeto do controlo/ Tipo processual:


A norma em si (controlo abstrato) mediante um processo autónomo e dirigido ao
respetivo controlo, ou seja, não associado a qualquer letígio.
Apenas certo tipo de normas: as que constem de decreto para promulgar como lei ou
decreto-lei ou para assinar como decreto legislativo regional ou ainda norma de
tratado internacional para ratificação ou de acordo internacional para assinatura.
O pedido de controlo é dirigido ao Presidente do TC e tem de indicar, para além da
norma ou normas cuja apreciação se requer, as normas ou os princípios violados (art.
51º/1º da LOFPTC).
O Tribunal só pode declarar a inconstitucionalidade de normas cuja apreciação tenha
sido requerida na petição inicial (limita o objeto da ação) mas pode fazê-lo com

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fundamento na violação de normas ou princípios constitucionais diversos daqueles
cuja violação foi invocada (princípio do pedido – art.51º/5 da LOFPTC). Ou seja, o
Tribunal está limitado ao objeto mas não aos fundamentos.
Admitido o pedido, o presidente notifica o órgão de que tiver emanado a norma
impugnada para, querendo, se pronunciar sobre ela no prazo de 3 dias.
Na tramitação é apresentado o memorando pelo relator, discutido e votado no
plenário e elaborado o acórdão.

2. Controlo normativo abstrato sucessivo (art.281º):

❖ Legitimidade processual ativa limitada:


- Presidente da República.
- Presidente da Assembleia da República.
- Primeiro-Ministro.
- Provedor de Justiça.
- Procurador-Geral da República.
- 1/10 dos Deputados à Assembleia da República.
- Representes da República, as Assembleias Legislativas regionais, os
presidentes das Assembleias Legislativas regionais, os presidentes dos
Governos regionais ou um 1/10 dos deputados à respetiva Assembleia, quando
o pedido de declaração de inconstitucionalidade se fundar em violação dos
direitos das regiões autónomas ou na violação do respetivo estatuto.

❖ Momento temporal do controlo: Depois de a norma entrar em vigor.

❖ Objeto do controlo/ Tipo processual:


- São analisadas quaisquer normas em si (controlo abstrato) mediante um
processo autónomo e dirigido ao respetivo controlo, ou seja, não associado a
qualquer litígio (controlo por via directa).
- Na jurisprudência do TC uma norma é “Toda e qualquer proposição precetiva
(que carece de aplicação) ou o ato que a contém, produzido no exercício de
um poder ou de uma competência estatal de conformação, ou condicionante
da conformação daquele ordenamento ou sob a correspondente forma.”
Excluem-se normas privadas e atos aplicativos de normas (decisões judiciais,
atos administrativos a políticos) e normas de regimentos ou de regulamentos
internos. Incluem-se normas individuais e concretas e regulamentos das
federações desportivas.
- O conceito de norma para efeitos de controlo de constitucionalidade é um
conceito funcional que tem de preencher as seguintes caraterísticas:
1. Normatividade (regra jurídica que define posições jurídicas dos cidadãos;
norma de atuação para a administração; padrões de controlo da
constitucionalidade e legalidade; Há uma conceção dualista de norma para
efeitos de controlo: por um lado entende-se que são prescrições contidas em
diplomas com a forma de lei, por outro, considera-se ser atos desprovidos de

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forma legal mas que transportam regras gerais e abstratas reconduzíveis a um
das situações indiciadora de normatividade.)
2. Imediação constitucional (Estamos perante uma norma para efeitos de
controlo quando ela emergir imediatamente da Constituição, não existindo
qualquer outro ato hierarquicamente superior a regular a matéria disciplinada
nessa norma senão a Constituição).
3. Heteronomia normativa (Se uma norma se impuser aos destinatários sem
que esses sejam parte no seu processo formativo, então ela é passível de ser
controlada pelo TC, exceto regras aprovadas por condomínios.)
4. Reconhecimento jurídico-político (Caso o Estado reconheça a uma norma
força vinculativa para se impor a terceiros ao seu processo formativo, como
acontece com as convenções coletivas de trabalho, através de portarias de
extensão, essa é uma norma que deve ser controlada pelo TC, mas não é uma
posição unânime.)
- O pedido de controlo pode ser apresentado a todo o tempo e é igualmente
dirigido ao Presidente do Tribunal.
- Segue-se a tramitação em que o pedido e a resposta do autor da norma são
distribuídos pelos juízes, juntamente com um memorando onde o Presidente
formula as questões de fundo a que o Tribunal deve responder. Decorridos 15
dias, o memorando é debatido e fixada a orientação do Tribunal, sendo o
processo distribuído a um relator. Finalmente, após 40 dias é apresentado o
projeto de acórdão.

3. Controlo normativo concreto (art.280º)

❖ A questão de inconstitucionalidade surge de forma incidental em relação a um


litígio que está a ser julgado. Surge no TC por via de recurso.

❖ A desaplicação da norma pode resultar (ex officio) do poder-dever de os juízes


de qualquer tribunal não aplicarem normas que infrinjam o disposto na
Constituição (art. 204º).

❖ Legitimidade processual para o recurso de inconstitucionalidade:


- As partes no processo em que surge um problema de inconstitucionalidade
relacionado com a norma que é parâmetro de decisão do letígio – o juízo do
tribunal aquo sobre a questão de inconstitucionalidade tem de ser ratio
decidendi e não mero obter dictum da decisão.
- O Ministério Público nos casos em que o recurso de inconstitucionalidade é
obrigatório: quando a norma cuja aplicação haja sido recusada, por
inconstitucionalidade, conste de convenção internacional, ato legislativo ou
decreto regulamentar. Pode abster-se de interpor recurso de decisões
conformes com a orientação que se encontre já estabelecida em
jurisprudência constante do TC.

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❖ Objeto do controlo/ Tipo processual:
Cabe recurso para o TC as decisões dos tribuanis que recusem a aplicação de
qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade ou que apliquem
norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
É fiscalizada a norma que é parâmetro de decisão do letígio (controlo concreto)
mediante um recurso de inconstitucionalidade (controlo por via incidental).
Os recursos só podem ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão da
inconstitucionalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal
que proferiu a decisão recorrida, em termos de estar obrigada a dela reconhecer:
- A decisão recorrida já não admite recurso ordinário;
- A questão de constitucionalidade foi suscitada no processo antes da decisão
do tribunal a quo, ou seja, a inconstitucionalidade tem de ser suscitada e
decidida na decisão da qual se recorre;
- Não se recorre da decisão e sim da norma utilizada na decisão.
O recurso para o TC interpõe-se por meio de requerimento, no qual se indica
alínea do nº1 do art. 70º ao abrigo da qual o recurso é interposto e a norma cuja
inconstitucionalidade se pretende que o tribunal aprecie. Do requerimento deve
também constar a indicação da norma ou o princípio constitucional que se
considera violado, bem como da peça processual em que o recorrente suscitou a
questão de inconstitucionalidade. Nos casos das alíneas g) e h) do art. 70º
também deve ser identificada a decisão do TC que, com anterioridade, julgou
inconstitucional a norma aplicada pela decisão recorrida.
O Tribunal só pode julgar inconstitucional a norma da decisão recorrida, conforme
os casos, tenha aplicado ou a que haja recusado aplicação, mas pode fazê-lo com
fundamento na violação de normas ou princípios constitucionais diversos
daqueles cuja violação foi invocada.
Os recursos de inconstitucionalidade são sempre julgados pelas secções, podendo
haver apenas uma decisão sumária, nomeadamente quando a norma em questão
já tiver sido objeto de decisão anterior do Tribunal ou quando é manifestamente
infundada.
Por fim, a tramitação segue as regras do recurso do processo civil mas com as
devidas adaptações. Em caso de divergência entre as secções pode ainda haver
recurso para o plenário.

ESQUEMA PARA OS CASOS PRÁTICOS (suma)

1º O tribunal a quo recusa a aplicação de uma norma com fundamento em


inconstitucionalidade (art. 204º e 280º/1/a).

A norma consta de convenção internacional, ato legislativo ou decreto


regulamentar?
- Se sim – há recurso obrigatório para o Ministério Público (art. 280º/3 e 72º/3
LTC), exceto se for uma decisão conforme com a orientação já estabelecida em
jurisprudência constante do TC (art. 72º/4 LTC).

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- Se não – não há recurso obrigatório para o MP (é facultativo) e a questão só
chegará ao TC quando já não admitir recurso ordinário e se o MP ou a parte na
decisão quiserem interpor recurso (art. 70º/5 e 72º/1 LTC).

2º - A parte suscita a inconstitucionalidade, mas o tribunal a quo aplica a norma.

A norma já foi julgada anteriormente inconstitucional pelo TC?


- Se sim – há recurso para o MP, exceto se for uma decisão conforme com a
orientação já estabelecida em jurisprudência constante do TC.
- Se não – o recurso para o TC só é admitido se preencher as seguintes condições:
- Se a decisão do processo principal já não admitir recurso ordinário, não se
contando para este efeitos os recursos para uniformização de jurisprudência.
- Se a parte que corre tiver suscitado a questão de inconstitucionalidade de
modo processualmente adequado, ou seja, se o tiver feito na decisão do
tribunal a quo da qual recorre e em termos de este estar obrigado a conhecer
dela.
- Se a decisão se limitar à questão de inconstitucionalidade da norma aplicada
na decisão, ou seja, a parte da norma que é ratio decidendi do caso.
- Se o recurso indicar a norma ou o princípio violado e a peça processual onde
suscitou a questão de inconstitucionalidade.

No caso do recurso pode:


- O presidente do TC, com a concordância do tribunal, determinar a intervenção
do plenário, contrariando a regra de que a questão é julgada por uma das
secções.
- A parte recorre da decisão do TC adoptada numa das secções, para o plenário, se
houver divergência de julgados.
- O MP ou qualquer ou juízes, quando a norma tiver sido julgada inconstitucional
em 3 casos concretos, promover a organização de um processo de fiscalização
abstrata sucessiva.

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As decisões e efeitos do TC:

✓ Fiscalização abstrata preventiva:

• Efeitos das decisões que se pronunciam pela inconstitucionalidade das normas


(art.279º): O diploma é vetado pelo PR ou pelo Representante da República e é
devolvido ao órgão que o tiver aprovado. O decreto constante no diploma não pode
ser promulgado ou assinado novamente sem que o órgão que o tiver emanado
expurge a norma julgada inconstitucional ou a confirme por maioria absoluta de 2/3
dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em
efetividade de funções. Caso o diploma vier a ser reformulado, o PR ou o RP pode
requerer a sua apreciação preventiva de constitucionalidade.

• Efeitos das decisões que não se pronunciem pela inconstitucionalidade das normas
(art. 136º): o PR deve promulgar o diploma ou exercer o poder de veto político.

✓ Fiscalização abstrata sucessiva:

• Efeitos das decisões que declaram a inconstitucionalidade das normas (art.282º):

1 - Eficácia retroativa = anula os efeitos jurídicos produzidos pela norma desde que a
mesma tenha entrado em vigor (efeito constitutivo). Nos casos em que a norma seja
anterior à CRP os efeitos retroagem apenas até à data da entrada em vigor da CRP.
2 - Efeito repristinatório = reentrada em vigor das normas revogadas pela norma
agora declarada inconstitucional.
3 - Salvaguarda dos casos julgados = salvo em matéria penal, disciplinar ou de ilícito
de mera ordenação social, se o regime jurídico que resulta da declaração de
inconstitucionalidade (a norma que é repristinada) for de conteúdo favorável ao
arguido, caso em que o TC pode decidir reabrir os casos julgados, sendo que para tal
tem de haver decisão expressa do TC nesse sentido.
4 - Possibilidade de o TC limitar os efeitos das decisões = pode fazê-lo seja o efeito
retroativo ou repristinatório com fundamento em segurança jurídica, razões de
equidade ou interesse público de excecional relevo e a decisão tem de ser
expressamente fundamentada.

• Efeitos decisões que não declaram a inconstitucionalidade das normas: A norma


continua a vigorar no ordenamento jurídico. A decisão negativa não faz caso julgado, o
que significa que a questão pode voltar a ser colocada perante o TC e pode o Tribunal
nesse caso declarar a inconstitucionalidade da norma.

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✓ Efeitos das decisões na fiscalização concreta (art. 80º LOFPTC)

• Recurso de decisão que desaplicou a norma com fundamento em


inconstitucionalidade e que o TC manteve o mesmo juízo (não deu provimento ao
recurso):
- A questão que é objeto de litígio foi decidida pelo tribunal a quo sem a aplicação
daquela norma e assim se deve manter.
- Neste caso não pode voltar a questionar-se pela inconstitucionalidade da norma
naquele processo, mas a norma continua em vigor no ordenamento jurídico.

• Recurso de decisão que desaplicou a norma com fundamento em


inconstitucionalidade e que o TC não julgou inconstitucional (deu provimento ao
recurso):
- A questão que é objeto de litígio foi decidida pelo tribunal a quo sem a aplicação
daquela norma.
- Os autos, já com a decisão do TC, baixam ao tribunal a quo e este tem de reformular
a sua decisão, aplicando a norma que havia desaplicado.
- Não pode também voltar a questionar-se a inconstitucionalidade da norma naquele
processo e a norma continua em vigor no ordenamento jurídico.

• Recurso de decisão que aplicou a norma cuja constitucionalidade as partes


questionaram no processo e que o TC não julga inconstitucional (não deu provimento ao
recurso):
- A questão que é objeto de litígio foi decidida pelo tribunal a quo com a aplicação
daquela norma e assim se deve manter.
- Não pode voltar a questionar-se a inconstitucionalidade da norma naquele processo.

• Recurso de decisão que aplicou a norma cuja constitucionalidade as partes


questionaram no processo e que o TC julgou inconstitucional (deu provimento ao
recurso):
- A questão que é objeto de litígio foi decidida pelo tribunal a quo com a aplicação
daquela norma.
- Os autos, já com a decisão do TC, baixam ao tribunal a quo e este tem de reformular
a sua decisão, desaplicando a norma que havia desaplicado.
- A norma mantém-se em vigor e continuará a ser aplicada em outros casos concretos.

O TC não decide o caso concreto, apenas a conformidade constitucional da norma.


Conclusão: As decisões nesta fiscalização produzem efeitos inter partes e não erga
omnes, o que significa que os respetivos efeitos ficam circunscritos aos processos em
que as mesmas constituem questões incidentais.
O TC pode fundar o seu juízo sobre a conformidade constitucional da norma numa
determinada interpretação da mesma (interpretação conforme à CRP) e nesse caso a
interpretação fixada pelo TC é a que o tribunal a quo tem de aplicar.
Uma norma pode julgada diversas vezes inconstitucional e em sede de fiscalização
asbtrata não ser declarada inconstitucional.

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