Processo Legislativo em Geral

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PROCESSO LEGISLATIVO EM GERAL: princípios e competência legislativa

1.PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS SOBRE PRODUÇÃO LEGISLATIVA

Para compreender, em absoluto, a produção normativa de determinado Estado deve


atender-se a determinados princípios e normas jurídicas.

Assim, têm-se como especialmente relevantes os seguintes princípios:

a) Princípio da competência;

b) Princípio da tipicidade;

c) Princípio da separação de poderes.

PRINCÍPIO DA COMPETÊNCIA

A actividade legislativa integra-se no exercício de funções de carácter público,


disciplinadas por regras de Direito Público, que se manifestam no seguinte:

- a competência depende de regra constitucional ou legal atributiva, ou seja, não se


presume;
- só podem verificar-se transferências de competência nos termos em que o permita a
Constituição ou as leis;

- no domínio legislativo, são as Constituição que goza de uma reserva de determinação


dos órgãos competentes.

EXEMPLIFICAÇÃO:

“Nenhum órgão de soberania ou de poder local pode delegar os seus poderes noutros
órgãos, a não ser nos casos e nos termos expressamente previstos na Constituição”.

“Nenhum órgão de soberania, de poder regional ou local pode delegar os seus poderes
noutros órgãos, a não ser nos casos e nos termos expressamente previstos na
Constituição”.

Destes exemplos decorre que:

- No plano legislativo, as competências que sejam integradas em reservas de


competência de um órgão só podem transitar para a competência de outro se a
Constituição o admitir;

- A autorização ou transferência de competência deve verificar-se nos termos


constitucional ou legalmente previstos;
- O princípio da competência tem carácter geral, incluindo todos os órgãos responsáveis
pela produção legislativa.

PRINCÍPIO DA TIPICIDADE

Quer na actividade jurídico-pública, quer na actividade jurídico-privada, dão-se


fenómenos de informalidade ou de criação de novos actos capazes de desenvolver as
competências constitucional ou legalmente previstas.

Dada a natureza soberana da função legislativa, e a natureza dos actos legislativos, a


Constituição define os actos considerados legislativos.

EXEMPLIFICAÇÃO:

-“São actos legislativos as leis de revisão constitucional, leis orgânicas, leis de bases,
leis, leis de autorização legislativas e resoluções (Artigo 166.º)”.

- “São actos do Presidente da República os decretos legislativos presidenciais, decretos


legislativos presidenciais provisórios, decretos presidenciais e despachos presidenciais
(Artigo 125.º)”.

Estas normas definem o seguinte regime e efeitos:

- A Constituição delimita o conjunto de actos legislativos previstos no ordenamento;


- Não se afigura possível que actos infra-constitucionais atribuam carácter legislativo a
outra espécie de actos.

PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES

Trata-se de um princípio geral previsto nas Constituições e que tem por objecto não só a
organização do poder político, mas também o exercício de outras funções do Estado,
como a legislativa. Assim, como intervêm diversos órgãos na produção legislativa e
como existe concorrência de competências no plano legislativo, afigura-se pertinente
invocar o princípio da separação de poderes relativamente ao exercício do poder
legislativo.

EXEMPLIFICAÇÃO:

-“Os órgãos do Estado devem respeitar a separação e interdependência de funções


estabelecidas na Constituição” (Artigo 105.º n.º 3).
Do exposto, decorre que:

- O princípio da separação de poderes se manifesta na produção legislativa motivando a


intervenção de mais do que um órgão de soberania;

- Para além da participação do órgão competente para aprovar o acto, a Constituição


pode prever regras especiais sobre iniciativa, reservando-a a órgãos distintos dos
competentes para a aprovação;

- A separação de poderes nesta área pode envolver a intervenção de tribunais,


nomeadamente de tribunais constitucionais ou de outros tribunais superiores;

- Em sistemas com Chefe de Estado eleito é frequente a atribuição da competência para


a promulgação de leis.

Relativamente à promulgação, vejam-se os seguintes exemplos:

“Artigo 119.º

1 - Compete ao Presidente da República, enquanto Chefe de Estado:


(…)
“r)promulgar e mandar publicar a Constituição, as leis de revisão constitucional e as leis
da Assembleia Nacional”.

“Artigo 124.º

1 - O Presidente da República promulga as leis da Assembleia Nacional nos 30 dias


posteriores à sua recepção.

2 - Antes do decurso deste prazo, o Presidente da República pode solicitar, de forma


fundamentada, à Assembleia Nacional, uma nova apreciação do diploma ou de algumas
das suas normas.

3 - Se depois desta reapreciação, a maioria de 2/3 dos Deputados se pronunciar no


sentido da aprovação do diploma, o Presidente da República deve promulgar o diploma
no prazo de 15 dias a contar da sua recepção”.

“Artigo 200.º (RAN)

1. No caso de exercício do direito de veto pelo Presidente da República, nos termos do


n.º 2 do artigo 124.º da CRA, a nova apreciação do diploma efectua-se a partir do
décimo quinto dia posterior ao da recepção da mensagem fundamentada, em reunião
marcada pelo Presidente da Assembleia Nacional, por sua iniciativa ou de um décimo
dos Deputados”.
Nestes exemplos verifica-se o seguinte:

- A competência para promulgar é atribuída ao Presidente da República;


- O Presidente da República pode suscitar dúvidas que conduzam a um reexame,
reapreciação ou veto da medida legislativa adoptada;
- Para a confirmação parlamentar é exigida uma maioria qualificada;
- Após a confirmação parlamentar o Presidente da República deve promulgar os actos
vindos do Parlamento.

Ora, o elemento de separação de poderes exprime-se, neste caso, através da relação


entre os órgãos que aprovam os actos e o órgão competente para promulgar.

O Presidente da República, no que respeita ao Direito interno, não tem competência


para, por via de um acto unilateral – veto –, impedir a publicação de determinada
legislação. Pode, contudo, obrigar o Parlamento a uma segunda apreciação. Se esta for
favorável, e expressa pela maioria constitucionalmente requerida, o Presidente da
República não pode opor-se à decisão parlamentar.

No que respeita a actos parlamentares o veto será, assim, suspensivo.

2.COMPETÊNCIA LEGISLATIVA EM ANGOLA

A competência legislativa integra-se na função política do Estado e pode ser repartida


ou concentrada num único órgão.

Os sistemas dos Estados de língua portuguesa apontam para modelos em que existe uma
pluralidade de órgãos com competência legislativa. A legislação é fonte de conteúdos
normativos que usualmente apresentam as características da generalidade e da
abstracção.

Apesar desta tendência tradicional admitem-se normas integradas em leis-medida, ou


seja, leis com destinatário perfeitamente identificável: surge, então, o conceito de norma
funcionalmente adequado às tarefas da fiscalização.

No domínio da competência para a prática de actos normativos, a competência


legislativa corresponde às decisões primárias e fundamentais da actividade normativa e
da vida de uma comunidade. Assim, a actividade regulamentar encontra necessário
amparo em elementos legislativos e deve neles habilitar-se.

Relativamente aos órgãos com competência para prosseguir a função legislativa, vejam-
se os seguintes exemplos:

“Artigo 161.º

Compete à Assembleia Nacional:


(...)

a) aprovar alterações à Constituição (…);

b) aprovar leis sobre todas as matérias (…); e,

“Artigo 120.º

1.Compete ao Presidente da República, enquanto titular do Poder Executivo:

e) Definir a orgânica e estabelecer a composição do Poder Executivo.”


j) Exercer a iniciativa legislativa, mediante proposta de lei apresentada à Assembleia
Nacional;

Nos exemplos citados verifica-se a existência de competência legislativa parlamentar e


“governamental” = Executivo. O Parlamento dispõe de uma competência legislativa
mais alargada, encurtada apenas por reservas legislativas do Executivo sobre a sua
organização e funcionamento.

De resto o constitucionalismo de língua portuguesa admite, com alguma latitude, uma


zona concorrencial de competência legislativa entre Parlamentos e Governos.

A iniciativa constitui a primeira fase do processo legislativo. As Constituições


estabelecem os órgãos com competência para apresentar propostas ou projectos
legislativos no Parlamento.

Vejam-se os seguintes exemplos:

“A iniciativa de lei pertence:

a) Ao Presidente da República;

b) Aos deputados;

c) Grupos parlamentares.

1- A iniciativa legislativa pode ser exercida pelos Deputados, pelos grupos


parlamentares e pelo presidente da República;.

5- Os cidadãos organizados em grupos e organizações representativas podem apresentar


à Assembleia Nacional propostas de projectos de iniciativa legislativa, nos termos a
definir por lei.
“Artigo 168.º CRA

1. A iniciativa de referendo nacional pode ser exercida pelo Presidente da República,


por 1/5 dos Deputados em efectividade de funções e pelos grupos parlamentares”.

Relativamente à maioria necessária para aprovar propostas e projectos de lei, a CRA


apresenta regras distintas. Com efeito, existem matérias em relação às quais a
necessidade de consenso é maior, o que gera a necessidade de maiorias mais exigentes.
Determinadas formas de lei podem, também, exigir uma maioria reforçada.

Veja-se como exemplo:

“Artigo 169.º

(Aprovação)

1. Os projectos de leis de revisão constitucional e as propostas de referendo são


aprovados por maioria qualificada de 2/3 dos Deputados em efectividade de funções.

2. Os projectos de leis orgânicas são aprovados por maioria absoluta dos Deputados em
efectividade de funções.

3. Os projectos de leis de bases, de leis e de resoluções são aprovados por maioria


absoluta dos Deputados presentes, desde que superior a mais de metade dos Deputados
em efectividade de funções”.

3.1. FASES DO PROCEDIMENTO OU PROCESSO LEGISLATIVO – ARTIGO


175.º E ss DO RAN

Em Angola, nos termos do RAN, as fases do procedimento ou processo legislativo


(artigo 175.º e ss) são cinco:

1.ª Fase da iniciativa;

2.ª Fase da discussão;

3.ª Fase da votação;

4.ª Fase da promulgação; e,

5.ª Fase da publicação.


3.1.1. FASE DA INICIATIVA LEGISLATIVA

A iniciativa legislativa é acto através do qual se dá início ao procedimento legislativo e,


por isso, corresponde ao poder/direito de propor ou apresentar projecto ou proposta de
actos normativos. A iniciativa legislativa não se confunde com a competência
legislativa, uma vez que os titulares do poder/direito de iniciativa e da competência de
aprovar não precisam de coincidir.

Via de regra, quem tem iniciativa legislativa, não tem de ser o órgão competente para
aprovar e vice-versa.

Outrossim, a iniciativa legislativa não é assimilável, não redutível aos impulsos


legiferantes uma vez que ela situa-se no interior do procedimento legislativo, representa
o seu primeiro passo; ao passo que os impulsos legiferantes (legislativos) são factores
de natureza jurídica, política, social ou de outra ordem, que determinam, estimulam ou
condicionam a decisão de legislar.

No caso angolano, os titulares do poder/direito de iniciativa (artigos 167.º da CRA +


168.º da RAN) são:

a) Deputados (= projecto de lei);

b) Grupos Parlamentares (= projecto de lei);

c) Presidente da República (= proposta de lei);

d) Grupo de cidadãos organizados e organizações representativas (n.º 5 do artigo 167.º


da CRA) = INICIATIVA POPULAR, cujos termos e condições de exercício desse
direito, bem como da participação popular no procedimento legislativo a que derem
origem, estão ainda por definir em lei (= inconstitucionalidade por omissão/impulso
legiferante).

A iniciativa legislativa pode ser: reservada e concorrente (consoante o impulso para


desencadear a marcha do procedimento compete exclusivamente a certa entidade ou,
pelo contrário, é aberta a possibilidade de vários órgãos exercerem iniciativa legislativa
sobre a mesma matéria); geral e específica (quando pode ser exercida sobre todas as
matérias ou apenas em relação a determinadas matérias específicas) ou originária e
superveniente (quando o poder/direito de iniciativa é exercido num momento inicial, ou
quando consiste em apresentar projectos ou propostas de alteração, sugerindo emenda,
substituição, aditamento ou eliminação de iniciativas já exercidas).

LIMITES DA INICIATIVA LEGISLATIVA (artigo 167.º n.º 6 da CRA + artigos


170.º e 171.º do RAN)
Nos termos constitucionais e regimentares, a iniciativa legislativa conhece limites:
gerais e especiais. Por isso, não podem ser admitidos propostas de lei, projectos de lei e
propostas de alteração, que:

a) Contrariem a CRA ou lei de hierarquia superior;

b) Não definam concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem


legislativa;

c) Impliquem no ano fiscal em curso aumento das despesas ou diminuição das receitas
fixadas no OGE, salvo as leis de revisão do OGE.

REQUISITOS DA INICIATIVA LEGISLATIVA (artigo 174.º do RAN)

Os projectos e propostas de lei ou de resolução devem:

a) Ser apresentados por escrito, em papel e em suporte informático;

b) Ser redigidos e estruturados sob a forma de artigos;

c) Ter uma designação que traduza, sinteticamente, o seu objecto principal;

d) Ser precedido de um breve relatório de justificação ou exposição de motivos;

e) Cumprir outras formalidades previstas na CRA e na lei (por ex.: apresentação da


memória descritiva das situações económicas, sociais, financeiras e políticas a que se
aplica; informação sobre os benefícios e as consequências da sua aplicação; resenha da
legislação vigente referente ao assunto e a que tenha de ser revogada).

3.1.2. FASE DA DISCUSSÃO E VOTAÇÃO

CONCEITO

Esta fase consiste no exame do conteúdo do projecto ou da proposta de lei e na


deliberação sobre a sua aprovação ou rejeição.

MODALIDADES

A discussão e votação do projecto ou da proposta de lei reparte-se por três (3) actos ou
momentos distintos:

a) Discussão na generalidade;
b) Discussão na especialidade;

c) Votação final global.

A discussão e votação na generalidade (artigo 191.º do RAN) ocorrem no Plenário da


AN e versam sobre os princípios, objectivos e linhas de força de cada projecto ou
proposta de lei.

O debate na generalidade inclui:

a) A apresentação da iniciativa pelo proponente;

b) A apresentação do relatório/parecer pela Comissão pertinente; e,

c) As intervenções dos Deputados.

A discussão e votação na especialidade (artigo 192.º do RAN), por seu turno, ocorre na
Comissão de Trabalho Especializada, em razão da matéria, e incide sobre a análise de
cada um dos artigos, número ou alínea do projecto ou da proposta de lei, podendo a
Comissão ou Comissões de Trabalho Especializadas deliberarem que incida sobre mais
de um artigo simultaneamente, ou por números, com fundamento na complexidade da
matéria ou das propostas de alteração apresentadas.

O debate na especialidade inclui: a apresentação do Relatório/parecer na especialidade,


seguida de debate, com a participação do proponente.

A votação na especialidade obedece a seguinte ordem:

a) Proposta de eliminação;

b) Proposta de substituição;

c) Proposta de emenda;

d) Texto discutido com as alterações já aprovadas;

e) Proposta de aditamento ao texto votado.

Todavia, mesmo que a votação tenha sido realizada na Comissão de Trabalho


Especializada, em razão da matéria, o Plenário pode deliberar, a todo tempo, chamá-la a
si, a requerimento de pelo menos dez (10) Deputados.
3.1.3. FASE DA VOTAÇÃO

Finda a discussão e votação na especialidade realiza-se a votação final global em


reunião plenária. Esta votação não é precedida de discussão, podendo cada Grupo
Parlamentar produzir uma declaração de voto oral por tempo não superior a três
minutos, ou declaração de voto escrita por qualquer Deputado ou Grupo Parlamentar até
ao 3.º dia útil após a votação que lhe deu origem.

A votação (artigo 144.º da CRA + artigo 146.º do RAN), seja na generalidade, na


especialidade ou votação final global, é um direito e um dever para o Deputado. Por
isso, o Deputado presente não deve deixar de votar (FAVOR, CONTRA,
ABSTENÇÃO), nem deve retirar-se da sala sem autorização, quando anunciada a
votação, sob pena de responsabilidade disciplinar.

3.1.4. FASE DA PROMULGAÇÃO (artigos 197.º, 198.º e 199.º do RAN)

Terminada a votação final global, feita a redação final do projecto ou da proposta de lei
e sem que sobre o mesmo haja reclamações do Presidente da República ou dos
Deputados, ou depois da solução das referidas reclamações, o texto é considerado
definitivo, assinado pelo Presidente da Assembleia Nacional, e enviado á Imprensa
Nacional para publicação, se se tratar de RESOLUÇÃO ou enviado ao Presidente da
República para PROMULGAÇÃO, se se tratar de lei.

3.1.5. FASE DA PUBLICAÇÃO

A publicação, obviamente, é feita no Diário da República (Imprensa Nacional). O envio


do documento é feito pelo Presidente da República, se se tratar de Lei; e pelo Presidente
da Assembleia Nacional, se se tratar de Resolução. Existe uma lei própria, nos termos
da qual a publicação é feita – Lei n.º 2/10, de 25 de Março (Da Publicação e do
Formulário dos Diplomas Legais).

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