Selvagem - Um Conto Escoces - Persephone Ex
Selvagem - Um Conto Escoces - Persephone Ex
Selvagem - Um Conto Escoces - Persephone Ex
A manhã estava chuvosa. A pequena Rooney olhava a água cair pelos muros de pedra
que cercavam o modesto castelo de sua família. Seu padrasto Edon Mackenzie administrava uma
porção de terra que pertencia ao suserano Kade Reed, um homem de avançada idade e saúde
complexa.
Isobel Mackenzie, outrora Ferguson era uma mulher surpreendentemente bonita. Os cabelos
loiros cascateavam em ondas largas pelas costas e os olhos verdes eram hipnóticos. Rooney em
nada lembrava a mãe, pelo contrário: Seu padrasto vivia a ralhar sobre o quanto o incomodava
que a enteada parecesse com o pai. Uma espécie de beleza bruta e incomum, olhos de formato
amendoado e de cor cinza como as nuvens carregadas que choviam lá fora, emoldurados por
sobrancelhas escuras. Cabelos castanhos claros muito lisos presos embaixo da touca branca e as
sardas sobre o pequeno nariz, tudo nela lembrava Derek Ferguson.
Isobel puxou a filha pelo braço de forma rude. Mal podia esperar para se ver livre do último
resquício de seu anterior casamento. Uma união com um homem que, apesar de bondoso teve
uma vida humilde e morreu devido à exaustão causada pelo excesso de trabalho.
- Entregue isto nas mãos de irmã Brianna assim que chegar ouviu?
Era a doação ao convento por aceitarem a menina ainda tão pequena. Assim que ela assentiu a
porta da diligência foi fechada na sua cara e o cocheiro deu início à longa viagem até o convento
de Santa Maria, seu novo lar.
E assim, sem nenhum beijo de despedida ou adeus, Rooney de apenas cinco anos fora
despachada para um lugar onde certamente não mais incomodaria ninguém.
Outono de 1612
O vento frio espalhou as folhas mais uma vez. Por mais que Rooney tentasse juntá-las as
benditas saíam voando ao menor sopro vindo das colinas. As meninas mais novas riam e
apontavam, divertidas.
- Oras, suas traquinas! Quando eu as pegar terão que me ajudar a varrer! - largou a vassoura
escorada em um muro e saiu em disparada atrás das duas mocinhas, que corriam sem parar de rir.
Rooney ainda conservava a mesma beleza diferenciada que tinha quando era pequena. As
mesmas sardas nas bochechas rosadas, os mesmos olhos cor de prata e as sobrancelhas
expressivas... Até mesmo usava um gorro branco tricotado há alguns anos atrás por uma das
irmãs que ficou com pena ao ver a garota chorar, pois o antigo não mais lhe servia.
As meninas se esconderam por trás das saias da Madre Superiora, Irmã Brianna. Rooney estacou
na frente dela, reta como um carvalho.
- Srta.Ferguson... - a mulher começou num tom de total reprovação. - Não deveria ficar
brincando assim, já é uma mulher de dezessete anos, quase dezoito! Não fica bem para você agir
assim!
- Acompanhe-me até minha sala. Tenho um assunto muito sério para discutir com a Srta.
- Imediatamente, Madre! - Rooney seguiu a velha senhora pelos corredores escuros e silenciosos
feitos de pedra.
A sala onde Madre Brienne passava grande parte do dia era austera e modestamente mobiliada.
Uma enorme e pesada mesa de carvalho com entalhos de arabescos estava no centro da sala. Um
gabinete grande que continha papéis referentes a assuntos do convento e uma mesa pequena com
duas cadeiras no lado oposto. A menina esperou que sua tutora tomasse seu lugar de frente à
escrivaninha, para só assim acomodar-se também.
- Rooney, minha querida, temo que as notícias não sejam boas. - a mulher uniu as mãos sobre o
móvel, séria. - Sua mãe, Lady Isobel Mackenzie faleceu...
Rooney levou as mãos aos lábios, chocada. Isobel nunca fora exemplo maternal, mas era sua
mãe, e ela a amava como tal. A notícia a pegou despercebida, pois a jovem sonhava com o dia
em que finalmente voltaria para casa e se reuniria com a família.
- Bem, ele enviou uma carta através de uma diligência, demanda que você volte para o castelo.
Imediatamente. O cocheiro a espera lá fora.
Uma fagulha de alegria surgiu bem no fundo de seu ser. Apesar do desfecho triste da mãe
provavelmente isto serviu para que o padrasto amolecesse diante a possibilidade de uma vida de
solidão e se compadeceu pela situação da enteada. Voltaria para casa e se esforçaria ao máximo
para não incomodar o parente e acreditava que em pouco tempo seria amada como uma filha.
Saiu apressada da presença da Madre e foi correndo saltitante organizar os poucos pertences que
tinha em uma pequena mala. Beijou respeitosamente a capa da Bíblia de viagem e a acomodou-a
lá dentro também. Despediu-se chorosamente de todas as que haviam sido sua família por todos
estes anos e saiu pelos muros do convento, entrando na carruagem e partindo de volta para sua
casa.
***
Já começava a escurecer quando a carruagem finalmente chegou aos portões do castelo de Edon
Mackenzie. Algo parecia estranho. O lugar estava um pouco decadente. Algumas pedras haviam
se soltado dos muros e os poucos empregados que eram vistos no pátio não pareciam muito
contentes. Rooney atribuiu isso ao clima de luto do lugar. O coche parou e ela saiu, dando de
cara com uma jovem muito ruiva, com a pele coberta por manchinhas cor de ferrugem e olhos
azuis como o céu limpo da primavera. Não podia crer, seria aquela Iana?
Iana era a filha da cozinheira. Na infância as duas costumavam estarem sempre juntas, como
irmãs. Durante a despedida de Rooney a amiga se confinara nos aposentos dos criados,
recusando-se a sair para dar um adeus.
- Rooney, pensei que nunca mais a veria! Senti tanto sua falta... Mas, venha logo para dentro!
Tem leite de cabra morno e bolo de frutas te esperando! - a amiga agarrou a mala da patroa e
seguiu para dentro com ela.
O castelo emanava um calor gostoso. Era aconchegante. Mas os adornos caros vindos de muitos
cantos do mundo tinham desaparecido. A sala antes ricamente decorada agora estava
praticamente vazia. De pé em frente à lareira seu padrasto a aguardava, com as mãos para trás do
corpo. Tinha uma expressão cansada e carregada.
- Há quanto tempo, Rooney. - o homem aparentava ter mais idade do que possuía. Sinalizou par
que ela sentasse. - Creio que já saiba da notícia. Uma gripe muito forte levou sua mãe no começo
do outono. Nada pudemos fazer...
Ela assentiu, cheia de pesar. O padrasto amava muito sua mãe, disso não tinha dúvidas. Estava
sempre mimando-a e enchendo-a de presentes.
- Não, creio já não ter mais fôlego para isso. Espero poder viver o tempo que me resta com
tranqüilidade... - o homem virou-se para a lareira. - Mas não foi para isso que a trouxe aqui,
enteada. Estou passando por um momento difícil é preciso muito de sua ajuda.
Rooney se prontificou. Sabia que a perda de alguém querido doía e faria o que fosse preciso para
aliviar a dor do homem que conhecia como pai.
- No que eu puder ajudar senhor meu padrasto! Conte comigo, somos uma família e devemos
ficar unidos! - Disse, cheia de convicção.
- Pois bem. Os tempos não têm estado muito bons aqui em nosso lar. Pragas nas plantações,
baixo valor de venda de madeira... coisas com as quais uma mulher não deve se preocupar. Com
isso nossos impostos foram se acumulando e as dívidas só aumentavam...
Rooney não entendia o que poderia fazer em relação àquilo. Será que o padrasto queria dizer que
ela teria que trabalhar na casa para suprir a falta de criados? Aprendera a cozinhar muito bem,
também a lavar e costurar. Distraía-se um pouco na hora da faxina, mas sempre que terminava
era um trabalho bem feito. Faria tudo o que fosse possível para não ver sua casa perecer!
-... enfim, - o homem continuou. - Nosso suserano lorde Reed acabou executando algumas
cobranças referentes a impostos que já contavam alguns anos e simplesmente não tenho como
pagar!
- Você partirá amanhã bem cedo para Craig Moss. Lá se casará com Lorde Reed e salvará nossas
terras!
Rooney não podia acreditar! Havia sido vendida! Num reflexo espontâneo subiu correndo
as escadas e entrou no quarto que costumava ser seu, desabando na cama, em prantos. Como o
padrasto podia ter feito aquilo com ela? Era desleal demais! As únicas lembranças que tinha
acerca de Lorde Reed eram de sua mãe falando o quanto era velho e desprezível. E se já era
velho naquela época, imagine agora?
A ruiva entrou e imediatamente largou de lado a bandeja que trazia. Aproximou-se da amiga que
estava deitada de barriga para baixo e acariciou suas costas.
- Oh, amiga! É uma tragédia! Estou prometida a um homem que nem ao menos conheço, e para
saldar dívidas! Lorde Reed. Eu não sei o que será de mim agora! Casar-me à força com um
homem que tem idade para ser meu avô!
Iana ficou surpresa. Realmente não sabia da notícia e se compadecia pela amiga.
- Rooney, isto pode ser muito pior do que imagina. Dói-me falar isto, mas não posso esconder de
ti a verdade. O velho lorde Kade Reed faleceu há muitos anos atrás, enfraquecido pela idade.
Apesar de tudo era um homem bom e todos choraram sua morte na época. Quem governa estas
terras em nome do rei agora é seu filho mais novo, Cailean Reed. Este sim é o demônio em
pessoa!
Rooney parou de soluçar e sentou-se na cama, ouvindo o que a amiga tinha a dizer.
- Ele assumiu as terras tão logo o pai morreu. Já era inclusive casado, com apenas dezoito anos.
Sempre foi obsessivo por batalhas e muito impiedoso também. Até que na idade de vinte anos
enviuvou. Uns dizem que assassinou a pobre mulher grávida, outros comentam que ela, ao
perceber o erro de ter se casado com ele, suicidou-se com uma punhalada certeira no coração.
Mas ninguém ousa a dizer uma palavra sobre isso em Craig Moss, sob pena de ser condenado
pela ira do suserano louco.
A perspectiva de contrair matrimônio com o monstro a apavorava. Precisava fugir dali, mas a
propriedade ficava em meio a uma planície, longe de tudo e de todos. Para onde iria? Sonhava
em um dia casar-se por amor, com um rapaz trabalhador e honesto e ter com ele muitos filhinhos
fortes e valentes. Agora todas as suas fantasias se quebravam bem diante de seus olhos, como
cristais de gelo.
- O que será de mim, Iana? O que farei? - Voltou a chorar, inconsolável. - Tirarei minha própria
vida, assim não terei que passar por essa situação horrenda!
- Não diga isso, nunca mais! Você é muitíssimo importante para mim, e vê-la morrer acabaria
comigo! Depois do jantar conversarei com lorde Mackenzie e implorarei para que me deixe
seguir viagem com você! Eu não a abandonarei olhando que parta pela janela, como a covarde
que fui há doze anos atrás! Estarei aqui com você e enfrentarmos isto juntas!
Rooney encarou a amiga com o rosto vermelho de tanto chorar. Em nenhum momento pensara
que Iana fosse uma covarde, pelo contrário. Sempre assumia sozinha a culpa pelas travessuras na
cozinha e livrava a amiga mais nova de ser punida pelos pais já muito negligentes e maus.
- Iana, não sei o que faria sem você. - abraçou-a. Obrigada, por tudo!
A criada deixou Rooney sozinha e foi dar continuidade a seus afazeres. Após comer o que lhe
fora servido foi deitar-se magoada, mas não conseguiu pregar os olhos por um minuto, temerosa
por seu destino.
***
Na manhã seguinte foi acordada, banhada e vestida bem cedo e logo já estava pronta para partir.
Iana apareceu também com suas roupas de viagem, dizendo que havia sido permitido a ela
acompanhar a patroa nesse novo estágio de sua vida. Disse também que o padrasto não viria se
despedir, alegando estar ocupado demais para isso. Ela já estava acostumada a ser ignorada pelo
mesmo e também estava irritada com ele, por isso não deu muita importância. Entraram as duas
na carruagem após despedirem-se dos demais moradores da casa e empreenderam a viagem junto
ao cocheiro e dois guardas a cavalo.
***
Três dias depois a diligência atravessava o portão pesado das muralhas externas de Craig Moss.
A vila fervilhava de pessoas curiosas para espiar a noiva de seu líder. O rosto de Rooney estava
contorcido em uma máscara de nervosismo extremo e ela apertava a mão da amiga tão forte que
está temia ter os dedos arrancados pela aflição da patroa.
Muitos dos homens usavam o tradicional kilt escocês e a manta com o conhecido padrão
quadriculado nas cores preto e azul cobalto, particularidade do clã de Reed. As mulheres também
traziam as mesmas cores em suas saias e xales. Todos pareciam orgulhosos de seu nome. Mais a
frente às moças puderam perceber uma cena totalmente destoante do clima de alegria: homens
presos a estacas gemiam, com o peito nu e marcas de chibata. Pelo estado deplorável de seus
corpos os coitados já deviam estar ali há algum tempo, mesmo sobre o frio gélido que a noite
trazia. Todo corpo de Rooney se sacudiu violentamente numa demonstração irracional de medo.
Seguiram adentrando os muros interiores, que cercavam o imponente castelo que se erguia
pretencioso sobre uma colina rochosa. Em seu entorno um enorme fosso tomado por grossas
estacas de madeira. "Pobre daquele que fosse atirado ali dentro.", Rooney pensou ao ver lá
embaixo esqueletos retorcidos entre as setas afiadas.
A carruagem parou no enorme pátio pavimentado com grandes pedras escuras. Alguns homens
saíam com seus cavalos, gritando excitados enquanto incitavam os animais a correr mais. Um
empregado abriu a porta do coche e ajudou as duas mulheres a saírem. Uma senhora baixinha e
rechonchuda se aproximou delas, apressada.
- Lady Ferguson! - Fez uma profunda reverência. - Estávamos em seu aguardo. Espero que
tenham feito uma boa viagem! Chamo-me Fiona Riley. Estou aqui para cuidar de qualquer coisa
de que precise.
- A mulher se aproximou da hóspede. - Querida, não se preocupe. Todos aqui farão o possível
para que sinta-se em casa... agora venha, vamos! Provavelmente precisam descansar!
As meninas seguiram a senhorinha efusiva pelo pequeno lance de escadas até o salão principal
do castelo. Era gigantesco! As paredes estavam decoradas com tapeçarias bordadas com
riquíssimos desenhos representando caça e ilustrando o falcão, animal que simbolizava o clã
Reed. O chão recém lavado estava coberto com palha seca e emanava um gostoso cheiro de
limpeza. No teto um pesado lustre de ferro já estava abastecido com velas novas. Os empregados
andavam apressados de um lado para o outro, provavelmente acertando os últimos detalhes da
festa de casamento. Na parede oposta à porta de saída erguia-se o imponente trono forrado com
veludo negro. Ninguém parava seus afazeres, mas lançavam olhares rápidos e curiosos para as
duas jovens. Rooney procurou, mas não viu ninguém que parecesse um lorde em nenhum lugar.
- Diga-me, Sra. Riley. Onde se encontra seu senhor? Por acaso não virá nos receber? - o coração
palpitava de nervoso e as mãos suavam frio enquanto ela entrelaçavam os dedos das mãos na
frente do corpo, freneticamente.
- Ora, isso! Bem... Lorde Reed saiu para caçar javalis de manhã bem cedo. Mas não se preocupe
Lady Ferguson! Antes do cair da noite milorde já estará de volta para recebê-la! Isto dará tempo
para que Milady se prepare em seus aposentos.
Rooney não tinha vontade de se preparar para nada! Queria aproveitar a chance para sair
correndo dali em direção às colinas, sem olhar pra trás. E que espécie de anfitrião era este afinal?
Via-se de longe a total falta de educação em não receber a própria noiva!
A Sra. Riley as levou até os aposentos que Rooney ocuparia até o dia da cerimônia. Tinha
um bonito tapete decorando o chão de frente à cama pesada coberta com diversas peles
quentinhas. O fogo da lareira estava quente e aconchegante. No centro do cômodo uma tina vazia
esperava para ser enchida com água quente. Em uma das paredes uma porta discreta levava ao
quarto que seria destinado a Iana.
- Espero que esteja tudo a seu gosto, Lady Ferguson! Em alguns minutos trarei sua refeição e
água para o banho. Sinta-se à vontade! - a mulher saiu, fechando a porta atrás de si.
- Iana, não posso crer que ele não está aqui! - Rooney finalmente relaxou. - Como pôde ser tão
deselegante?
A ruiva passou a desfazer a parca bagagem, acomodando os poucos pertences de sua Lady num
enorme baú aos pés da cama.
- Céus, Rooney! Você deveria estar aliviada de não ter que encontrar com o homem, ainda...
- Sim, é claro! Mas eu esperava pelo menos... um pouco de consideração... - a menina estava
cansada de tanta rejeição por parte de pessoas que deveriam amá-la ou apenas protegê-la e lhe
acolher.
Poucos minutos depois a Sra. Riley voltou seguida de criadas com água fumegante e pratos com
pão, batatas e pedaços de frango assado com cenouras e molho de mel. O estômago de Rooney
roncou alto, e todos na sala puderam perceber.
- Lady Ferguson, deixaremos a Srta a vontade agora para banhar-se e comer. - a mulher ia
saindo, mas estacou. Ah, mais uma coisa! Estamos cientes de seus votos de pobreza para o
convento, por isso deixei ali no armário um vestido para usar hoje à noite. Mais para frente
outros irão chegar. Afinal, Milady logo será a castelã daqui e não poderá ser vista enrolada em
trapos! Um guarda esperará aqui fora. Assim que terminar de se preparar ele a levará até a sala
onde poderá esperar com Lorde Reed. Até mais ver! - a mulher mais uma vez deixou o quarto.
Que petulante a mulher! Mas era tudo verdade. As poucas roupas que possuía estavam perto da
morte, e novos trajes não lhe fariam mal algum.
Após banhar-se com água perfumada de lavanda, Rooney vestiu-se com a sobre camisa e jantou.
Após isso Iana a ajudou com o bonito vestido azul como o estandarte da casa Reed, a barra e as
mangas largas eram decoradas com viés dourado da mesma cor da fivela do cinto, contrastando.
A amiga prendeu-lhe duas mechas dos sedosos cabelos castanhos para trás, deixando o resto cair
livremente em perfeito alinho até a curva da base das costas.
- Está linda, Rooney! Garanto que o frio coração de Lorde Reed não resistirá a tanta beleza!
A morena corou.
- Não fale isso! Tenho ciência de ser desengonçada e sem graça. Era assim que meu padrasto
sempre se referia a mim, como um ganso manco!
- Ele dizia isso por puro despeito! Tinha raiva por nunca ter conseguido um filho com Lady
Isobel, e isso o irritava! Agora vá! E esteja segura de que arrancará suspiros deste homem! - Iana
empurrou a amiga para fora do quarto, rindo.
O guarda pôs-se em prontidão, fazendo uma reverência. E seguiu pelo corredor, em direção as
escadas.
Ela o seguiu descendo as escadas e passando por um longo corredor, até uma sala com porta
onde uma lareira estava acesa e duas poltronas viradas para o fogo. Rooney agradeceu ao rapaz e
sentou-se na menor das poltronas, esperando.
Passou-se muito tempo. A menina já estava cansada de tanto esperar. As nádegas e costas doíam
de tanto ficar sentada ereta. O fogo já havia sido avivado diversas vezes e nada de Lorde Reed.
Os olhos pesaram tanto que ela finalmente sucumbiu ao sono. Acordou algumas horas mais tarde
ainda sozinha. Subiu para seu quarto furiosa por ter sido feita de boba mais uma vez.
***
Na manhã seguinte ela foi acordada pelo canto dos pássaros em sua janela. O sol parecia
já estar alto. Devido à rotina imposta no convento ela nunca acordava tarde. Mas na noite
anterior ficara acordada até tarde esperando seu noivo invisível e o cansaço acabara por pegá-la
de jeito. Iana entrou no quarto e sorriu ao ver a amiga acordada.
- Pensei que havia desfalecido, dorminhoca! - Puxou as cobertas da amiga. - O dia está lindo, não
quer conhecer seu novo lar?
Rooney revirou os olhos diante a efusividade da ruiva. Levantou-se a contragosto, vestiu-se com
sua costumeira humildade: uma saia cinza e pesada de lã, camisa branca por cima do espartilho e
grossas meias pretas até as coxas. As botas foram doadas por uma pessoa com pés maiores, o que
dava aos pés pequenos uma aparente silhueta desajeitada. Como de costume enfiou todo o longo
cabelo dentro do folgado gorro branco. Serviu-se do desjejum ali mesmo, uma boa tigela de
mingau quente e logo resolveu seguir o conselho da amiga, entediada.
O lugar parecia um labirinto de corredores e salas amplas. A cozinha fervilhava para o grande
dia de amanhã, quando finalmente se tornaria a castelã de Craig Moss, isto é, se seu noivo fizesse
o favor de comparecer ao casamento. Saiu em um grande pátio coberto de uma grama grossa e
muito alta e cheia de galhos secos. Poderia ser... um jardim? Mas por qual motivo estava tão feio
o seco? O outono apenas se iniciava. Pelo menos folhas verdes ainda deveriam estar penduradas
nos galhos. Depois perguntaria a Sra. Riley por que aquele era o único lugar do vivo castelo que
parecia abandonado. Afastou-se dali, observando mais do lugar. Havia uma biblioteca enorme e
cheia de livros. Alguns falavam sobre terras estrangeiras. Rooney adoraria passar algum tempo
ali, saciando sua curiosidade e sede de conhecimento. Ao retornar para o corredor foi
surpreendida por uma grande matilha de cachorros pretos e enormes, que se aglomeraram em
torno dela com suas línguas de fora e depois seguiram rapidamente em direção a sala de
banquete. Rooney sorriu, finalmente. Que animais fascinantes! Seguiu-os a fim de agarrar todos
pelas fartas bochechas, para distrair-se. Quando entrou no cômodo percebeu que vários homens
estavam sentados de frente as mesas que convergiam para o salão. Todos riam e bebiam
entusiasmados e atiravam porções de comida no chão, que os enormes cães prontamente
devoravam. Na cadeira do centro estava sentado um homem extremamente belo, mas de
aparência feroz. O torso musculoso estava à mostra, coberto apenas pelo manto posicionado na
transversal, sobre o ombro suado e forte. A peça estava presa ao kilt com o mesmo padrão
quadriculado em azul cobalto. Nos pés calçava botas até os joelhos. Apenas isso. Os cabelos
muito escuros estavam revoltos, provavelmente pelo vento na cavalgada. O homem a encarou
com os olhos azuis muito claros. Neste momento todo e qualquer barulho no recinto cessou.
Capítulo 4 – Cailean
Todos a olhavam como se ela houvesse roubado algo. A única reação de Rooney foi
baixar a cabeça respeitosamente e reverenciar aquele que acreditava ser Cailean Reed, Lorde de
Craig Moss.
O homem apenas ficou parado, observando-a por algum tempo, confuso. Quando finalmente se
pronunciou a voz saiu grave e baixa, num timbre extremamente encantador que faria qualquer
mulher se derreter instantaneamente, não fossem as palavras proferidas.
- Diga para sua senhora que desça imediatamente. - o homem exigiu, com um tom autoritário de
quem estava acostumado a ser obedecido, sem que precisasse se repetir.
Ele achava que ela era a serviçal de sua noiva? Que absurdo! Ela permaneceu parada no mesmo
lugar, encarando o homem com raiva.
- Vamos menina! Está surda ou esta touca horrível lhe impossibilita de ouvir? - ele completou.
Todos os homens riram em uníssono. Já bastava, aquilo era desrespeitoso demais! Não sendo
suficiente as duas situações do dia anterior, agora ele zombava dela! Aprumou o corpo co o
máximo de coragem e dignidade que possuía e se apresentou, orgulhosa.
- Sou Rooney Ferguson, enteada de seu servo Edon Mackenzie. Estou aqui para saldar a dívida
de meu tutor, casando-me com Milorde.
As risadas cessaram mais uma vez. Os belos olhos azuis a encaravam perplexos. Era como se
ninguém ali acreditasse no que ela havia dito. Com um sinal da mão enorme de Cailean todos os
homens levantaram-se sem nada dizer e passaram por ela em direção a saída, seguidos pelos
cachorros. Agora só restavam eles dois ali, numa atmosfera pesada.
***
Cailean não pôde acreditar no que via. A menina era pálida demais, desengonçada
demais, mal vestida demais e ele tinha quase certeza de que era careca! Por qual outro motivo
usaria esta capa de cogumelo na cabeça? Lembrava-se de ter visto Isobel Mackenzie quando
jovem. A mulher era a perfeição escultural em pessoa. A criaturinha esquisita que estava na sua
frente em nada lembrava a mãe.
A mocinha deu alguns passos vacilantes para frente, com certa dificuldade. As botas pareciam
grandes demais e atrapalhavam seus movimentos.
A mulher pareceu contrariada a princípio, mas logo afastou os lábios, expondo a dentição em
perfeito estado. Pelo menos não lhe faltava nada na boca. Ele sorriu.
Rooney deu um suspiro exasperado. Afastou os braços do corpo e fez uma volta completa.
- Milorde já está satisfeito, ou pretende continuar me avaliando como quem vai comprar uma
égua?
- Estou apenas examinando minha mercadoria, certificando-se de que fiz um bom negócio.
O rosto dela se contraiu em fúria. Como esse presunçoso ousava se dirigir a ela desta maneira?
- Serei sincero com a senhorita, já que me parece bem esperta, ao contrário do que pensei. Está
aqui por que tive piedade do covarde de seu padrasto. E também por que muitos de meus
importantes conselheiros dizem que preciso de um herdeiro. Sendo assim juntei a conveniência à
utilidade.
Ele levantou-se contornando a mesa e se aproximando dela. O homem era enorme! Apenas sua
presença seria o bastante para intimidar qualquer um. Rooney estremeceu com a proximidade
dele, fixando seus olhos no peito desnudo para só em seguida voltar sua atenção a boca bem feita
dele.
- Devo acrescentar que a Srta ficou aquém de minhas expectativas. Sinceramente não sei dizer
nem se conseguirá carregar uma criança dentro deste corpo magrelo!
- E eu só estou aqui obrigada! Nem em um milhão de anos desejaria me deitar com um porco
como você! Aliás, não consigo imaginar o motivo pelo qual alguém em sã consciência o queira!
Pois digo que me caso por obrigação, mas juro por todos os meus ancestrais que só me tomará na
intimidade se for à força! - Virou-se em seus calcanhares e saiu da sala, deixando para trás o
homem com os olhos arregalados.
***
- Oh, Iana! Tive o desprazer de conhecer Reed! O homem é um bruto, um monstro! Parece até...
até um SELVAGEM!
- Não! Ele nem me tocou, mas foi extremamente rude e grosseiro! Examinou-me como a uma
vaca e me chamou de magricela! - Rooney jogou-se de costas na cama e começou a espancar
furiosamente os travesseiros. - Como o odeio! O desgraçado achou que eu era uma serviçal e fez
pouco do meu gorro! - Sorriu diabolicamente. - Mas ele não perde por esperar...
***
Na manhã seguinte a Sra. Riley irrompeu o quarto com sua já costumeira indiscrição.
Suas empregadas a seguiam fielmente trazendo o todos os apetreixos para a preparação da noiva.
As mulheres arrancaram Rooney da cama, despindo-a sistematicamente e a metendo na tina
perfumada, esfregando sua pele com vigor. Secaram-na e a envolveram em deslumbrante vestido
branco lindamente bordado. Os cabelos foram presos num coque de onde pendiam cachos e uma
bela tiara presa a uma longa grinalda enfeitava sua cabeça. Ao final de todo o ritual a Sra. Riley
evadiu-se com as mulheres, prometendo enviar alguém para acompanhar Rooney até a capela do
castelo. A mesma dispensou educadamente a ajuda, dizendo que preferia ir sozinha pra conhecer
melhor o caminho e prometeu não se atrasar.
Assim que as mulheres saíram Rooney parou de frente para o espelho de corpo inteiro e se
admirou por alguns instantes, sorrindo. Seu pai que pouco conheceu provavelmente ficaria muito
orgulhoso de vê-la assim, mas provavelmente ela estaria se casando com alguém muito mais
digno da mão de sua filha. O sorriso morreu em seus lábios enquanto ela arrancava da cabeça a
tiara e soltava os grossos cabelos.
A morena virou os braços para trás, tentando desfazer sozinha os cordames do corpete.
Trajava camisa, colete e uma elegante casaca preta, na parte inferior seu tradicional kilt. Assim
estavam vestidos a maioria dos convidados do sexo masculino. As mulheres também ostentavam
orgulhosas as cores de seu governante, em forma de uma faixa de tecido xadrez transpassada
pelo ombro. O padre olhava atento para a entrada da capela, foi quando viu uma sombra se
aproximando da porta e sussurrou:
- A noiva chegou.
Todos tomaram suas posições e aguardaram ansiosos a noiva adentrar pela nave, deslumbrante.
O noivo bambeou e seus pares acharam que ele fosse desmaiar. As pessoas encaravam perplexas
enquanto ela se posicionava ao lado do futuro marido com a maior naturalidade possível,
olhando-o com um sorriso cínico e depois se dirigindo ao padre, em voz baixa.
- Perdoe-me reverendo. Sabe como as noivas demoram para se arrumar. Pode dar início a
cerimônia.
O homem santo que até então estava boquiaberto pigarreou, tentando recuperar a postura neutra
e deu início a celebração.
Certamente que a noiva foi o centro das atenções por sua escolha de traje incomum a ocasião.
Um pequeno saco de tecido contendo as alianças foi passado por todos os convidados e depois
entregue a Rooney que retirou as jóias de dentro, entregando a menor na mão do marido. Inseriu
a anel no dedo dele e ele fez o mesmo, proferindo os votos matrimoniais entre dentes. Trocaram
um rápido selinho desajeitado e depois uniram as faixas de seus respectivos clãs, envolvendo-as
em suas mãos. A dela púrpura pelos Ferguson e a dele cobalto, pelos Reed.
Ambos levantaram as mãos atadas para que todos vissem. A união havia sido selada. Uma onda
de gritos animados tomou conta da capela enquanto todos seguiam os noivos carrancudos para o
salão onde a festa seria dada.
A música iniciou-se tão logo as pessoas entravam no salão e se acomodavam em seus lugares. A
comida era servida de forma farta, enquanto todos celebravam uma felicidade que obviamente o
mais novo casal não compartilhava. Cailean entornava canecas de vinho uma atrás da outra,
bebendo avidamente, enquanto Rooney se ocupava em esquadrinhar as pessoas no salão. Em um
lugar não muito afastado um homem de meia idade, barbudo e com cara de poucos amigos a
encarava. Ela sentiu algo apertar dentro de si e desviou o olhar. Não tinha percebido aquele
homem antes. Por que ele não parava de fuzilá-la com o olhar?
A festa seguiu até altas horas da noite, quando Cailean levantou-se e o barulho foi silenciado.
- Bom! - ele sorriu encantadoramente. - Se nos derem licença, minha querida esposa e eu iremos
nos recolher. - ele tomou a mão dela entre as suas, fazendo-a se levantar. - Pois, como todos
sabem temos trabalho a fazer!
Todos riram divertidos e levantavam suas canecas enquanto Rooney não sabia onde enfiar a
cara. Cailean a ergueu nos braços com facilidade, enquanto ela agarrava forte no pescoço dele,
temendo cair.
Ele a carregou por todo o salão, enquanto os homens o parabenizavam avidamente, esfregando
seus cabelos e lhe dando tapinhas nas costas. Atravessou o corredor e subiu as escadas, seguindo
até a porta de seus aposentos. Quando parou na soleira Rooney começou a se espernear feito um
coelho assustado.
Cailean deu um suspiro profundo e largou a mulher no chão, fazendo-a perder o balanço e quase
se estatelar com as nádegas no assoalho de pedra. Ele abriu a porta no momento em que um
criado cruzava o corredor. Rooney deu um sorriso amarelo e entrou com ele no quarto,
afastando-se logo em seguida.
-Ah é? - Ele arqueou uma sobrancelha, aproximando-se lentamente. - O que planeja fazer?
- Ou corto o monstro que tem no meio das pernas! - Na noite anterior Iana havia explicado a ela
por alto o que acontecia entre um homem e uma mulher na noite de núpcias. A inocente morena
ficara horrorizada com a possibilidade de algum corpo estranho entrar nela e resolvera esconder
o pequeno punhal, para defender-se caso Cailean tentasse algo - Por todos os Santos, juro que
decapito isto como a uma galinha! - ela apontava para o kilt dele.
Cailean não pôde segurar o riso. A criatura aparentemente sem graça tornara-se uma fonte
inesgotável de charadas para ele. Algo muito instigante, que ele adoraria desvendar...
- Minha senhora, duvido muito que consiga me fazer algo com este palito de dentes, antes que eu
a alcance!
Em um movimento rápido ele avançou sobre ela, lhe segurando os pulsos, forçando-a a largar a
lâmina.
- Aliás, - ele estava bem próximo dela agora. - Uma coisa me incomoda desde a primeira vez que
a vi. - ele olhou em direção a cabeça dela. - Esta coisa pavorosa. Nunca mais use isto, eu a
proíbo! - Arrancou-lhe o gorro, atirando-o no fogo da lareira.
Cailean saltou para trás, soltando um urro de dor enquanto sangue escorria pelo seu queixo.
- Mulher louca! Por que fez isto? - Ele tocou o canto da boca, limpando o líquido escarlate.
- Não acredito que você saiu de um convento, criatura demoníaca! - ele avançou sobre a cama,
agarrando um travesseiro e cobertas, esticando-as sobre o tapete felpudo de pele de urso.
- Mas é claro que vou! Este é meu quarto, afinal! Só espero que não acorde na calada da noite e
tente me ESFAQUEAR! - ele começou a livrar-se de suas roupas, irritado.
- H-hey! O que está fazendo? Pare com isto já! - Ela virou-se, corada.
- Não espera que eu durma com um traje formal, não é? Aliás, vá se acostumando. Quando
durmo não gosto que NADA me incomode!
Ela subiu na cama de olhos fechados e desatou os nós que prendiam as cortinas do dossel,
formando um casulo a sua volta. Ali se pôs a despir-se, ficando apenas com a velha chemise
imaculadamente branca.
- Nem que fosse a última freira diabólica do mundo, milady! - ouviu-o proferir.
***
Ele estava doente? O que será que acontecia com o homem aparentemente saudável, no auge de
seus vinte e oito anos? Ela precisava descobrir o que se passava com o marido. Assim que o dia
clareasse ela perguntaria o que ele estava escondendo.
Rooney acordou se espreguiçando languidamente, mas logo recordou-se de onde estava. Abriu
lentamente o dossel e viu que Cailean não estava mais ali. Levantou-se e procurou por toda
câmara, sem encontrar sinal. Abriu a porta do quarto e chamou por Iana, que prontamente
atendeu, com um sorriso idiota na face.
- Como foi o que? Não aconteceu nada! Eu lhe disse que não me entregaria a ele, que lutaria até
o fim!
- Como pode ser tão assanhada, Iana?- perguntou, boquiaberta. - Ameacei cortar-lhe as
intimidades e o desgraçado me agarrou! - Corou violentamente.
- Nossa! E você fala como se seu marido houvesse cometido um crime! - Dá o nó final e joga a
camisa no rosto da amiga chocada.
- No fim foi dormir no chão... TOTALMENTE NU! - Rooney terminava de se vestir por si só. -
E por falar no sem vergonha, sabe onde ele está? Não o encontrei esta manhã ao acordar.
- Ele saiu bem cedo com alguns homens. Os empregados disseram que está havendo um
problema com bandidos nas fronteiras do leste e ele como suserano teve que ir resolver. - A ruiva
colocou as mãos nos quadris, admirando o trabalho. - Ele não lhe disse nada?
- Não... - Como ele pôde fazer isso? Como não a avisou que sairia em excursão? E o mais
importante: POR QUE ELA HAVIA SE MAGOADO?
- Não se preocupe Rooney. Eles disseram que a comitiva voltará em no máximo quatro dias.
Vocês logo logo estarão juntinhos mais uma vez... - Iana debochou.
- Não seja estúpida! Quero distância daquele troll! Só me irritei por mais uma falta de
consideração por parte dele! E também... Aconteceu uma coisa muito estranha durante a
madrugada... - Tornou-se taciturna.
- O que?
- Acordei ouvindo um som vicioso. Espiei através do dossel e o vi tossindo sangue... Não pense
bobagens! Estou apenas preocupada que possa ser contagioso!
Iana mordeu o lábio inferior e sorriu. Rooney era como um livro aberto e ela podia ver
perfeitamente sua alma.
- Por que você não vai ter com o herbalista? Se não me engano ele chama-se Daniel... Se Lorde
Reed tem alguma enfermidade seu curandeiro certamente saberá!
***
Demorou um pouco até que Rooney encontrasse o caminho para a câmara subterrânea do
herbalista. Bateu na porta maciça e logo foi atendida pelo velho curvado e caquético.
- Lady Reed! Que agradável surpresa! - o velho regojizou. - Por favor, entre! Já terminamos
aqui.
Rooney deu um passo para dentro e viu o mesmo homem barbudo que captara seu olhar durante
a cerimônia. Ele passou por ela e fez uma reverência apressada, deixando a câmara.
- Lord Graham é seu tio em união, milady. Parente de Lorde Reed por parte de sua mãe. - o
velho percebeu o interesse dela no homem que acabara de sair. - Ele não é de falar muito, mas é
corajoso e nosso senhor tem plena confiança nele, por isso o deixou aqui, para guardar a senhora
e o castelo... Mas, em que devo a honra de sua visita?
- Lorde Reed teve um comportamento estranho hoje pela madrugada. O vi tossindo muito e
expelindo sangue. Gostaria de saber se o senhor tem ciência do que o acomete?
O velho virou-se para a mesa onde estavam dispostas várias ervas a secar.
- O jovem lorde ainda não contou, pois tem muita vergonha de parecer fraco perante minha
senhora. - Começou. - Ele tem uma inflamação nos pulmões, algo que o incomoda muito e o faz
sentir dor. Mas Milady não precisa se preocupar estou tomando conta dele e receitando diversos
chás e infusões. Milorde Reed tem melhorado gradativamente e logo voltará a sua saúde plena!
Assentiu convencida.
- Tem certeza de que Milady não deseja mais nada? Uma poção para aumentar a fertilidade
talvez?
- Não, pois não haveria uso para tal coisa. Passar bem. - a mulher subiu. Seu coração havia se
tranqüilizado agora. Estava certa de que seus medos eram por temer enviuvar ainda recém
casada.
***
Foi em uma manhã triste e chuvosa, seis dias após a partida de Cailean que ela ouviu toda uma
comoção se formar na entrada. As vozes misturavam-se ao latido efusivo dos cães gigantescos.
Sem pensar duas vezes ela correu em disparada para a sala principal, repreendendo-se no
caminho e deixando os passos mais lentos. Ao entrar na sala e abrir caminho em meio à algazarra
foi surpreendida por seu marido segurando um grande saco de pano encharcado de sangue. Em
seu âmago a rezava para que fossem lebres ou codornas, mas já imaginava não ser nada disso.
- Ora isto? São cabeças! Para prender em estacas e exibir nos muros. Assim todo e qualquer
ladrão pensará duas vezes antes de aterrorizar minha família! - ele se exibia com naturalidade e
orgulho.
Rooney olhava nervosa do chão ensangüentado para o saco com formas redondas e então para a
cara de triunfa te do marido e novamente para a poça. Seu estômago revirava violentamente e sua
visão se tornava turva.
***
Cailean viu que a esposa bambeava e ficava vesga. Previu um desmaio. Largou o saco no
chão e correu para segurá-la, mas não foi rápido o suficiente. Rooney estabacou-se no chão,
inconsciente.
Rooney acordou na cama. A última coisa que lembrava era da demonstração desnecessária de
carnificina do marido. Sentou-se e o encontrou de costas, remexendo a brasa da lareira.
- Rooney, este sou eu. É assim que sou e não vou mudar! - respondeu virando-se para ela,
irritado.
- Estas coisas me incomodam! - ela tentou argumentar, mas já perdendo a razão. - Me incomoda
que traga pedaços de mortos para casa, me incomoda que saia na surdina, antes mesmo do sol
raiar!
- A mim incomoda que minha mulher me desafie em minha própria casa, e que me ameace!
Incomoda-me também que vá xeretar minha vida fofocando com os criados, ao invés de
perguntar diretamente a mim! - ele ia aumentando o tom da voz conforme se aproximava dela.
- Ora! Me desculpe não ser a esposa perfeita, recatada e silenciosa que você tanto desejaria que
eu fosse! Mas não posso e não vou baixar a cabeça para você, não escolhi estar aqui! Até por que
corro o risco de ser assassinada pelo meu marido violento ou cometer suicídio por desgosto,
como a outra antes de mim! - quando Rooney percebeu a besteira que havia proferido já era
tarde.
Cailean venceu a distância que havia entre os dois num pulo, agarrando-a pelo pescoço delgado.
- Nunca mais fale dela, entendeu? - ele sibilava furioso. - Você não sabe do que está falando,
então deveria calar a boca!
***
- Aliás, que velho língua solta! Se ele mesmo havia lhe dito que Lorde Reed não queria falar
deste assunto com você, por que diabos ele correu para contar a seu marido que você estava
perguntando sobre a doença dele?
- Não sei Iana. Talvez por medo de que Cailean se enfurecesse caso eu contasse primeiro! Ele
preferiu salvar sua própria pele e me jogar ao leão enfurecido.
Iana nada disse, mas não engolia a atitude covarde do velho, agindo duplamente.
- Não se preocupe Rooney. Ele está bravo agora, mas eventualmente irá te perdoar!
- Eu espero que sim. Pela graça de Deus, não fiz por mal baixou os olhos. - Não sei por que, mas
a possibilidade de que ele nunca mais me olhe apavora-me...
***
Numa noite fria em que alguns flocos de neve caíam lá fora ela deitou-se na cama como de
costume: coberta até os ombros. Estava sozinha no quarto e o sono lhe subiu rapidamente.
Há certa hora Rooney sentiu alguém tocar no seu pé por baixo das cobertas. Acariciando seu
tornozelo delicadamente. Ela sentou-se na cama, puxando a perna assustada. Cailean estava
sentado na beirada, apenas de calça. Olhava profundamente nos olhos dela, como se estivesse
examinando sua alma com aquelas íris gélidas.
- Rooney, eu não deveria ter agido daquele jeito. Eu pensei muito nestes dias, não sabia como
encará-la, mas sou homem o suficiente para assumir que errei.
- Eu é que peço perdão. Estava preocupada com o que eu vi na primeira noite em que
compartilhamos a cama e também irritada por você ter me escondido isso é fugido pela manhã.
Fui saber com Daniel se havia algo mais que pudéssemos fazer... acabei passando dos limites
também, falando daquela forma cruel sobre sua esposa...
- Rooney, você é minha esposa agora. Merece saber de tudo... Minha primeira esposa, Megan era
um amor de juventude. A conheci aos doze anos e daquela época eu já sabia que queria passar o
resto de meus dias com ela. Quando nos casamos meu clã estava em guerra com uma família
rival por uma porção de terra que hoje nos pertence. Eu era muito jovem e parecia dar mais valor
a glória das batalhas do que a ela, mas não era verdade. Aos vinte anos descobri de seria pai, e
aos vinte anos os perdi. Megan havia contraído a mesma doença que hoje me assombra e devido
à fragilidade de seu estado não resistiu. - a voz dele soava cada vez mais melancólica. - Eu não a
matei, Rooney! Eu a amava! E certamente não mataria você também! Eu... eu nunca faria mal a
minha própria família...
Ela tocou o rosto dele, com suavidade e estendeu os braços, convidando-o para um abraço.
- Você pode dormir na cama esta noite, se quiser. Desde que use uma calça e que não conte para
ninguém que ficamos juntos. Tenho uma reputação de megera a manter.
Ele sorriu e deitou-se ao lado dela. Não o costumeiro sorriso debochado, mas sim uma
demonstração de alegria. Ela virou-se de lado, oferecendo as costas para ele, numa posição de
"conchinha". O calor do corpo grande quase a fez vacilar e perder a razão de si.
- E Cailean...
- Diga, Milady.
- Nunca mais traga cabeças ensangüentadas para a sala de casa, tudo bem?
***
Uma noite após o jantar Rooney procurou a amiga Iana a fim de conversar e entender mais o
funcionamento de uma vida conjugal, já que o fato de ter sido criada num convento unido a
vergonha irracional de tirar suas dúvidas com o marido a tornavam praticamente uma criança
sem experiência alguma como mulher.
- Iana, você já me explicou mais ou menos como um homem e uma mulher se conhecem, na
cama... - para ela era difícil até mesmo falar. - Não que eu vá fazer isto algum dia! Parece-me
algo extremamente nojento e doloroso, é apenas a caráter de conhecimento! Como chegamos a
esta parte? Quero dizer, como se conduz até o ato... principal?
- Hm. bem, na verdade você não precisa fazer muita coisa. É só demonstrar que quer e pronto!
Mas sempre pode provocar e se divertir com isso!
- Provocar? - ela se interessou.
- Sim! Pode instigá-lo e quando ele estiver excitado, entregue a seus encantos você interrompe
qualquer contato. Isso faz com que ele esteja sempre interessado em você, mas você o tem na
mão, compreende?
- Sim, acho que compreendo. E como poderei fazer isso? Só mesmo pra ter em mente, acumular
experiência.
- Claro! "Acumular experiência". - Iana continuava a ler a amiga, como um livro aberto. Isso a
divertia. - Nesses casos, Rooney, seu corpo é a sua melhor arma. Você é uma mulher linda,
extraordinária e desejosa. Qualquer homem mataria para receber um pouco de sua atenção, você
só não se deu conta disso ainda, pois é muito inocente. - acariciou o rosto da amiga. - Creio que
com o tempo você vá aprender essas coisas! Vamos nos preparar para dormir. Recolherei-me
cedo por que amanhã teremos um mutirão para bater os tapetes antes do inverno chegar!
Ainda na mesma noite Rooney desejava colocar o que Iana lhe ensinara em prática. Cailean
havia tentado tocá-la apenas uma única vez, há meses e nunca mais. Queria saber se realmente
poderia instigar um homem, mesmo depois de tudo o que acontecera entre eles, se em algum
lugar lá no fundo ela poderia acender o fogo do marido, só para provar que... Quem ela pensava
que estava enganando? Ela queria mesmo era ser beijada! Com volúpia e intensidade. Desde a
noite de núpcias não parava de pensar no momento que os dois tiveram juntos, na língua intrusa
que escorregava para dentro de sua boca, acariciando-a, o que brotara do espaço entre seus rins e
rapidamente dominou-a por completo.
***
Cailean teve um dia cheio e sua cabeça palpitava. Corriam notícias de que a Inglaterra
pretendia uma invasão e uma guerra parecia inevitável. Caso o rei Jaime VI fizesse uma
convocação ele correria o risco de se afastar de casa por meses em direção ao litoral. Pela
primeira vez na vida aquilo o angustiava demais. Como poderia viver muito tempo longe de sua
irritante esposa? Acabara por pegar gosto de seu mau humor característico e suas críticas ácidas.
Poderiam não ter um relacionamento comum aos casais, mas com toda certeza aquela não era
uma união tediosa. Entrou no quarto pensando encontrar Rooney já adormecida e ressonando
tranquilamente, mas deu de cara com a casta esposa exibindo grande parte das pernas para ele.
Cailean aproximou-se sem acreditar no que via. Sua doce megera, que sempre procurava cobrir-
se ao máximo quando ele entrava agora o encarava com aqueles expressivos olhos cor de aço e
os lábios entreabertos, num convite silencioso para serem sugados até ficarem inchados e
tingidos de escarlate. A luz da vela contra o fino tecido da camisola deixava a mostra o contorno
das auréolas rosadas e os bicos protuberantes de seus seios. Ele engoliu um seco e se aproximou,
procurando examiná-la melhor. O membro já ereto pulsava dentro da calça, lutando para se
libertar.
Ter o sempre zangado marido olhando-a assim fazia com que ela sentisse poderosa e no
controle, mesmo sem fazer a menor idéia do que fazer depois. Pensou em repetir o que fizeram
naquele dia. Levantou-se, parando bem de frente a Cailean. Sentiu que algo duro roçava em sua
barriga e lembrou-se do que Iana havia falado. Que se ela sentisse algo rígido em meio às pernas
do marido isto significava que estava no caminho certo. Tocou timidamente o peito largo por
cima da camisa e recebeu um gemido grave e baixo em resposta. Todos os pêlos de seu corpo se
arrepiaram, como se o som fosse algum tipo de chamado, atraindo-a ao parceiro perfeito.
Ele tocou o a parte do tecido que cobria o ombro direito dela, empurrando em direção ao braço e
desnudando a carne alva de seu colo. Pousou ali beijos que queimavam como se fossem
marcados a ferro, enquanto ergueu sorrateiramente a mão, beliscando de leve o mamilo esquerdo
por cima da camisa, surpreendendo-a.
Rooney queria pará-lo. Não achava aquilo certo, tinha feito tudo aquilo atrás de apenas um
beijo, mas ele não havia beijado-a na boca. Estava tocando-a em lugares nos quais ela não
imaginava poder ser possível sentir coisas tão... gostosas! Mordeu o lábio quando sentiu que ele
a lambia desde o colo, passando pelo ombro e pescoço até abocanhar a orelha. A respiração
quente dele fez as pernas dela tremerem e um gemido longo e lânguido sair involuntariamente de
sua boca. Ele enfiou ali seu dedo indicador e ela sentiu que deveria chupá-lo, passando a língua
avidamente, desconcentrando-o de sua tarefa.
O homem retirou do outro ombro a alça da camisola, que despencou no chão como uma leve
pluma e afastou-se para admirar a esposa. Descobriu que os seios que estavam sempre muito
apertados pelo espartilho e cobertos por camadas de tecido eram fartos e pesados. Queria perder
sua boca ali e sugá-los até deixar a pele imaculada com marcas avermelhadas. Rooney usou as
mãos imediatamente, cobrindo-os e também a seu ponto erótico mais escondido, cheia de
vergonha.
- Se não me deixa admirar, não tenho outra escolha a não ser tocar...
Ele avançou sobre a esposa, fazendo-a deitar-se enquanto a beijava com pressa e desejo. Metia
mais uma vez sua língua na boca dela, brincando lá dentro enquanto afastava as mãos tímidas
que tentavam esconder o corpo. Tocou sem dificuldades o ninho de pêlos escuros, estimulando-o
enquanto lambia o mamilo intumescido pelo desejo. Rooney serpenteava sobre seus dedos,
indecisa entre fechar as pernas ou abri-las ainda mais.
- Permita meu amor... Permita que eu lhe dê prazer. - ele falou com a respiração entrecortada. O
rosto colado em seu peito. - Quero fazê-la ter orgasmos em minha mão e em minha língua, até
que implore para que eu entre em você...
"Em minha língua"? O que ele estava falando? Antes de poder se expressar teve sua pergunta
respondida. Ele ajoelhou-se no chão, afastando-lhe as pernas e beijou ardentemente a parte mais
sensível de seu corpo, como fazia com sua boca. Rooney teve certeza de que morreria ali,
naquele instante. Certamente iria para o inferno, mas não se importava com isso! Acariciou os
cabelos revoltos do marido e se entregou as sensações primais que acometiam suas entranhas,
sentindo que um calor beirando o insuportável crescia onde Cailean lambia. Seu corpo sacudiu
um espasmo de prazer, enquanto ela chamava alto pelo nome dele, clamando algo, não sabia
direito o que, mas associava ao enorme volume que ameaçava explodir as calças do marido
quando ele se levantou do chão, livrando-se das roupas rápida e habilidosamente. Ele lambeu o
dedo que usara para acariciá-la e tocou suavemente o enorme membro, preparando-o. Ajoelhou-
se sobre a cama desta vez, olhando-a nos olhos.
Penetrou-a com o máximo de cuidado que seu tamanho permitia. Inclinou-se beijando e
acariciando-a o tempo todo. Queria aliviar toda tensão daquele momento, desejava que ela só
sentisse coisas boas.
Ela tinha certeza de algo não estava certo e que as duas partes envolvidas claramente não se
encaixariam, pois a dor era grande. Quando estava quase pedindo pra que ele parasse sentiu o
alívio da pressão e foi preenchida por inteiro pelo marido que após uma pausa começou a mover
os quadris ritmicamente, sem parar de fita-la, atento. De súbito aquele calor inflamado voltou e
ela fechou os olhos, e abraçou aquela sensação prazerosa e simples. Cailean estocou lentamente
diversas vezes, rebolando de forma sensual dentro dela, segurando suas pernas unidas, por cima
do ombro esquerdo, até começar a pulsar violentamente, ejaculando bastante dentro dela e caindo
a seu lado, exausto. Os dois se abraçaram sem forças e dormiram profundamente, satisfeitos.
Menos de uma semana mais tarde Cailean recebeu a notificação de que ele e os guerreiros do
clã Reed haviam se juntado para combater a invasão inglesa no litoral, como previra. A história
se repetia mais uma vez. Deixaria a mulher amada e partiria numa expedição suicida em nome de
seu país. As sucessivas guerras entre os países irmãos marcava a história da Europa com
manchas de sangue de guerreiros de ambos os lados já há muito tempo e pelo visto ainda
demoraria muito para que esta rixa acabasse. Uma guerra havia levado seu irmão mais velho
anos atrás e ele previa que este também seria seu destino. Pelo menos ele esperava, pois seria
uma morte muito mais honrada do que sucumbir a essa maldita tosse compulsiva e as dores que a
acompanhavam. Após tudo acertado com seus companheiros viria agora a parte mais difícil.
***
- Uma CONVOCAÇÃO REAL? - Rooney falou em alto e bom som. - Pare de enfeitar palavras!
Você vai para GUERRA! Acha que eu não sei? Que sou burra por ser mulher? - estava furiosa.
- Eu não posso e nem quero recusar! Minha honra e meu país estão em risco! E se os ingleses
invadirem, vocês também correrão perigo! Tenho um compromisso com meu clã e minha
família! Meu dever como homem e como líder é o de proteger vocês! - ele gesticulava muito e
andava pela sala, nervoso.
- E por quanto tempo você ficará fora? - ela perguntou, angustiada.
- Não sei, é difícil dizer... Se eu for chamado ao fronte possa ser que eu fique por lá enquanto o
embate durar...
-... ou até morrer, não é verdade? - Rooney tinha os olhos cheios de lágrimas.
- Não diga isso, mulher! Estou vivo até hoje e assim pretendo me conservar. - ele aproximou-se
dela, com um olhar descarado. - Preciso voltar o quanto antes! Ainda tenho muito a te ensinar... -
riu divertido ao ver que ela corava. - Não se preocupe, deixarei meu tio Graham cuidando de
tudo por aqui. Ele é da família. Tomará bem conta de você e de toda Craig Moss. Se ele assim
não o fizer arrancarei seu coração com minhas próprias mãos!
- Não fale isso como se fosse normal! Além do mais, estou preocupada com sua saúde! Não vejo
melhora nenhuma, pelo contrário. Está sempre cansado e vacilante pelos cantos. Não seria
melhor pedir uma dispensa?
- Não diga loucuras, Rooney! Eu estou forte como sempre fui e dentro de pouco tempo você me
verá entrar pelos portões de Craig Moss com uma enorme coleção de cabeças de ingleses
asquerosos para decorar todo o entorno da fortaleza! - ele riu diante da expressão de nojo dela.
Ela sabia que não havia mais nada que pudesse ser feito. O homem era teimoso como uma mula
e nada mudaria isso. Seu amado bruto partiria na manhã seguinte por tempo indeterminado e ela
nem mesmo sabia se ele voltaria. E ainda exigiam dela que se resignasse e tentasse compreender
os planos do rei Jaime. Pro inferno com ele! Gostaria de poder dizer-lhe isto pessoalmente, mas
aí seria a cabeça DELA a enfeitar a entrada da residência real.
***
Na madrugada seguinte, antes mesmo do sol começar a aparecer a comitiva de Cailean e seus
duzentos homens já estava preparada para marchar sob a bandeira de seu país. O enorme pátio
estava abarrotado de mulheres e crianças chorosas, Rooney sentia-se só mais uma na multidão.
Mas não era! Ela agora carregava o título de senhora de Craig Moss e precisava ser forte para
inspirar coragem e sabedoria àqueles que ficavam. Recebeu um beijo terno por trás, no topo da
cabeça por parte do marido que se aproximara, a fim de partir.
- Meu amor, já lhe disse isto ontem, mas prometo voltar inteirinho e cheio de histórias para que
você mesma possa me despedaçar pessoalmente.
- Eu esperarei mesmo, Cailean Reed! E não perdoarei sua alma caso quebre esta promessa!
- Te devolverei isto quando voltar! - montou em seu garanhão lustroso e deu sinal para que os
homens o seguissem, ao som característico das gaitas de fole.
Rooney não deixou que ninguém percebesse, mas algumas lágrimas teimosas não paravam de
rolar.
***
A Sra. Riley atravessou a sala principal como um foguete em direção ao estábulo, onde
sua senhora cuidava de uma égua prestes a parir. Tinha um envelope nas mãos rechonchudinhas.
Pouco mais de um mês havia se passado desde a sua partida. Rooney aguardava aflita por
alguma correspondência acerca dele. Limpou as mãos no avental que usava e pegou o envelope,
quebrando o selo e abrindo a carta.
"Querida esposa, como tem passado? O frio aqui está insuportável! O vento corta como uma
lâmina afiada! E por falar em lâmina, encontramos seus parentes distantes Ferguson! Todos
homens ruivos, corpulentos e barbudos! Imagino que não seria tão linda se tivesse puxado seus
primos! Em breve nossa marcha chegará ao litoral e teremos uma visão geral da situação.
Quando eu estiver lá você poderá enviar-me respostas, que aguardarei ansioso. Espero que
ainda me ame quando eu voltar, pois minha devoção por você só cresce a cada dia que passa.
Com amor, C. Reed."
Ela fechou os olhos e apertou o papel contra o peito, emocionada. O animal que estava atrás de
si relinchou mais uma vez, incomodado. Rooney guardou a carta no bolso da saia e voltou-se
para ajudar a jovem égua no difícil trabalho de parto.
Em questão de alguns minutos o pequeno potrinho apontou os cascos e a cabeça para fora.
Rooney o segurou gentilmente, ajudando-o a sair. O bichinho lutou contra suas próprias patas
desajeitadas até conseguir ficar de pé e aproximar-se da mãe, que passou a lambe-lo,
instintivamente.
- Muito! - Rooney Levantou-se e foi até um balde, abaixando-se para lavar as mãos. - Tínhamos
alguns cavalos, porcos e galinhas no convento. Eu passava muito tempo lá com eles, me
consolavam enquanto eu pensava em como estaria o mundo aqui fora.
A velha sorriu.
- Moro aqui desde antes mesmo de Lorde Cailean nascer e posso garantir que Craig Moss nunca
viu uma senhora como Lady Rooney! - a mulher expressou, com orgulho.
A patroa Levantou-se, secando as mãos no avental. Ao virar na direção da velha senhora sentiu
uma forte tontura, apagando.
Capítulo 10 – Pelas Mãos do Destino
Abriu os olhos e viu que estava em seu quarto. A sua volta estava a Sra. Riley, com as
mãos juntas envoltas por um terço, sufocando-a. Um pouco afastados se encontravam Iana com
uma expressão aflita, o herbalista Douglas e Lorde Graham, de braços cruzados e a mesma cara
fechada de sempre.
- Milady. - a velha começou. - A senhora perdeu os sentidos, Lorde Graham a trouxe para
dentro!
- Oh, acho que passei tempo demais sem comer. Acabei ficando fraca!
A jovem corou violentamente. Por que a mulher abelhuda queria saber daquilo?
- Não sei qual a importância disso, Sra. Riley. - ela sussurrou de volta. - Mas vão completar dois
meses que ando em atraso. Isto pode ter ocasionado minha exaustão, por um acaso?
A mulher não respondeu. Ao invés disso pôs-se a rodopiar pelo quarto, batendo palmas
freneticamente. Estaria a velha louca? Ou será que se encontrava feliz, pois descobrira alguma
enfermidade em sua senhora.
-Teremos um bebê um Craig Moss! - a mulher não parava de gritar. - Lady Reed está grávida!
Todos esboçaram uma reação positiva, às suas maneiras. Iana correu até a amiga e lhe segurou
as mãos.
- Oh, isto é maravilhoso! Precisamos avisar a Lorde Reed o quanto antes! E também preparar o
enxoval para o bebê! Devemos também encomendar o berço! São tantas coisas...
- Meus parabéns, querida sobrinha! Em breve teremos um moleque forte e robusto correndo
pelos salões do castelo! Não há maior honra neste mundo para uma mulher do que agraciar seu
marido com muitos e muitos filhos!
Rooney olhava confusa para todos. Não sentia-se grávida. Sua barriga não deveria estar
dolorida, inchada?
O herbalista foi o último a se aproximar, com um olhar analítico.
- Foi como suspeitei. Milady, a senhora teve um pequeno sangramento. Deve guardar repouso e
tomar chá de folhas de framboesa cinco vezes ao dia, para segurar a gravidez. Se seguir meus
conselhos tudo correrá bem!
A Sra. Riley finalmente parou de rodopiar como uma louca e voltou a aproximar-se do leito.
- Minha senhora, esta notícia é esplêndida! Temos que anunciar a todos! Ou melhor, fazer um
enorme banquete em homenagem ao pequeno Highlander!
Estava grávida! Carregava dentro de si a semente de Cailean Reed. Um homem bruto e cruel.
Mas, era isto o que queria? A resposta era sim! Era o que mais queria nesta vida! Dar a seu
marido o presente que lhe fora roubado, anos atrás. Acariciou o ventre liso sussurrando.
- Cuidarei muito bem de você, meu bebê. Ficaremos unidos até o dia que seu pai possa conhecê-
lo.
Aquele dia foi marcado por uma felicidade geral em Craig Moss. Todos sabiam do terrível
passado de seu Lorde e a chegada desta criança poderia suprimir o vazio que ficara dentro do
homem adorado.
***
Iana Levantou-se e foi atender o menino, dando-lhe duas moedas de recompensa. A ruiva voltou
para dentro e entregou o envelope na mão da amiga.
Rooney abriu sem cuidado algum. Já haviam chegado notícias de que os escoceses conseguiram
afastar os cavaleiros da Inglaterra, e que apesar de muitas baixas a campanha havia sido boa. Ao
terminar de abrir a carta ela leu em voz alta.
"Olá, minha amada. Saudades? Pois eu estou morrendo por dentro. Perdemos muitos em
batalha, mas nossos esforços ajudaram a garantir um futuro para nosso lindo bebê. E por falar
nele,(ou nela!) é fato que chegarei a tempo para o parto. Provavelmente quando você receber
esta carta eu já estarei bem perto de casa, ansioso para enche-la de carinhos. Espero que
estejas sendo bem cuidada, caso contrário servirei a Sra. Riley como prato principal do
banquete! Morrendo de amores, seu eterno C. Reed."
- Pela pureza do sangue da Rainha Mary! Ele pode chegar a qualquer momento!
- Onde já se viu desconfiar de minha competência... - a Sra. Riley fez uma pausa. - Acalme-se,
menina! Toda essa agitação não faz bem para o bebê! Já está com sete meses, mas ainda existem
riscos!
- Não se preocupe Sra. Riley. - Iana manifestou-se. - Todas sabemos que cuida muito bem de sua
senhora, que, aliás, deveria estar descansando! - levantou-se, puxando a velha. - Vamos! Eu
ajudo a senhora com o jantar!
A mulher saiu, antes dizendo que mandaria que lhe trouxessem o chá de folhas de amora para o
bebê.
Algum tempo depois seu chá já havia sido trazido. Ao sorver a bebida reparou que um fio de
líquido avermelhado boiava na superfície da bebida quente, desfazendo-se. Passou um lenço
dentro dos lábios e constatou que era sangue. Estaria com a mesma enfermidade de seu marido?
Pereceria sem dar a luz, como sua esposa anterior? Ela desesperou-se. Já ia começar a gritar por
alguém quando algo lhe ocorreu: não tinha dores e nem tossia. Algo muito estranho estava
acontecendo... Lembrou-se de passagens dos livros sobre ervas que costumava ler e veio-lhe a
idéia. Uma certa erva que se administrada aos poucos em pequenas quantidades causava
hemorragia e morte a longo prazo. Está erva, mesmo em pequenas quantidades reagia com
cicuta-de-fogo, usada normalmente para perfumar os cabelos. Rooney Levantou-se e foi até a
gaveta de sua penteadeira, pegando um pequeno saquinho aveludado. Dele tirou uma pequena
pitada de cicuta-de-fogo seca e jogou dentro do chá. Na mesma hora o líquido âmbar adquiriu
uma suave coloração rósea. Era como ela havia pensado! Losna! Alguém envenenara a finada
Lady Megan e agora estava tentando fazer o mesmo com Cailean e a ela também!
Capítulo 11 – O Retorno
Rooney optou por não revelar suas descobertas a ninguém antes de fazê-la ao marido. Não
queria alertar a todos e isto poderia fazer com que o culpado recuasse. Assim, passou os dias
fingindo tomar o chá envenenado. A barriga protuberante a fazia marchar como um pato. O bebê
mexia muito, como se já estivesse louco para sair.
Numa tarde fresca de primavera a menina relaxava no jardim antes mal cuidado, mas agora
exibia rosas e hidrângeas de diferentes tons quando ouviu uma comoção enorme se formar lá
fora. Levantou-se de sua cadeira de balanço e saiu apressada, já prevendo o motivo da algazarra.
A comitiva de homens que haviam saído corajosamente de casa para amparar seu rei havia
retornado. Bem menor em número, mas ainda assim recebidos como heróis épicos.
Rooney tentava manter a calma, mas tudo no que pensava era em ver aquele homem novamente.
Tentava segurar o nervosismo, enquanto esticava o pescoço em meio à multidão, procurando
encontrar seu marido. Foi quando pôde vê-lo descendo do cavalo em meio a rios de gente. Mas
sua surpresa foi enorme.
Cailean tinha o braço esquerdo preso numa tipóia improvisada e o olho direito enfaixado. Um
corte descia pelas ataduras até sua bochecha. As entranhas dela se contorciam. Ele estava bem
ferido! Cumprimentava as pessoas, mas assim que elas se afastavam ele comprimia os lábios
formando uma linha dura e fina, segurando a dor. Ela prendeu a respiração, pois lágrimas
ameaçavam sair sem controle. Neste momento ele voltou sua atenção para a porta de entrada,
como se tivesse sido atraído pela aflição da esposa. Correu imediatamente a seu encontro,
sorrindo como um menino.
- Minha senhora... Rooney... - Beijou-a profundamente, como se apenas eles dois estivessem ali.
Ela pretendia não passar fraqueza, mas este contato desarmou todas as suas defesas. Abraçou-o
com força e só parou após ouvir um gemido de dor.
- Acalme-se minha rainha. Prometi que voltaria inteiro, mas parece que não consegui cumprir o
trato. - Brincou. - Preciso ver Daniel para que cuide corretamente de meus ferimentos.
Rooney sobressaltou-se. Não sabia direito quem estava tentando envenená-los, mas certamente
que o curandeiro era o maior suspeito.
- Deixe que eu cuide de você. Aprendi bastante com as freiras no convento e estive estudando
muito nestes meses...
Ele apenas sorriu em resposta e pôs-se a alisar o ventre firme e protuberante da esposa.
- Está vendo! Sua mãe parece finalmente estar acostumada com a idéia de que é minha e não vai
me escapar! - ele ajoelhou-se e beijou o abdômen coberto por um simples vestido cor de
mostarda. - Meu pequenino. Logo estarei recomposto e pronto para te mimar bastante. -
Levantou-se e seguiu com Rooney para o quarto.
***
Após os criados terem fornecido a Rooney tudo o que precisava para cuidar dos
ferimentos de Cailean ela pediu que fossem deixados a sós. Verificou que os ossos do braço do
guerreiro estavam bem posicionados e com um pouco de repouso ele curaria sem maiores
problemas. Retirou a atadura do olho e percebeu que o corte na bochecha havia transpassado por
cima da pálpebra e que muito provavelmente não mais voltaria a enxergar com ele. Seus olhos se
encheram de lágrimas mais uma vez.
- Ora! Shhh shhh...o que é isso agora? - ele falou, com ternura. - Não é tão ruim assim! Pense
que eu voltei para vocês! Parti para fornecer a nosso bebê um futuro seguro e retornei para vê-lo
nascer! Todo o resto não importa, são apenas meros detalhes. Troféus de guerra que fazem o
homem orgulhoso!
- Não seja estúpido! Pra você é tudo um jogo, uma brincadeira? Descobri que carregava um filho
de um homem que foi para uma guerra! Passei todo esse tempo sozinha, incerta se jamais o veria
novamente! - Pensou em contar sobre a descoberta do veneno, mas decidiu esperar uns dias, até
que ele estivesse melhor pois provavelmente decidiria fazer algo com as próprias mãos. - e você
ainda brinca com a situação de ter voltado em frangalhos!
- Por que você tem que ser sempre tão dramática, mulher? Coisas muito piores podem vir a
acontecer comigo! É bom que esteja preparada para tudo! Você foi criada num mundo onde
coisas ruins aparentemente não aconteciam, mas aqui fora a realidade é outra, e você tem que se
acostumar! - estalou a língua, impaciente. - E eu achando que o tempo havia curado esse seu
gênio terrivelmente infernal!
- Se não gosta de mim pode simplesmente me deixar ir! Eu já lhe disse que não pedi para estar
aqui! E certamente não pedi para ter um marido suicida! As batalhas são inevitáveis, mas não
custa nada ter um pouco de cautela! Não quero que termine entrevado em uma cama...
- Ah, então era com isso que estava preocupada...? - esticou a mão boa, puxando-a para perto. -
Posso garantir, mulher. Estou tão ativo quanto antes... - Beijou-lhe a barriga, enquanto subia a
mão direita pela coxa dela, por baixo do vestido. - Senti muito sua falta. De seus ataques
nervosos, dessa postura autoritária, de seu corpo maravilhoso...
- Pare Cailean! Estou redonda como uma romã! Não há nada de maravilhoso aqui!
- Como não? A beleza da mulher que carrega meu filho em si é perfeita, indescritível...
Num gesto rápido puxou para baixo um dos ombros do vestido, expondo o pesado e redondo seio
esquerdo, envolvendo-o com os dedos e massageando-o com delicadeza.
- Nem pense nisso, Cailean. - gemeu.- Você não está em condições de se esforçar e eu pareço um
leitão!
- Nenhum de nós precisa sofrer com isso, meu anjo... - ele a deitou na cama. Tirando-lhe as
sapatilhas e lhe erguendo a saia até expor a barriga intumescida que remexia suavemente. - Não
há do que ter vergonha. Você está ainda mais bela do que em nossa primeira noite...
Beijou-a do umbigo até os joelhos e voltou para entre suas coxas, dando uma atenção especial a
área. Realmente a esposa estava coberta de vergonha, mas preferia não demonstrar por temer que
ele parasse. Após alguns instantes nessa doce angústia ele se ajoelhou na cama.
Ela pensou em protestar, mas a forma como ele se dirigiu a ela, a súplica no olhar...
Rooney levantou-se e se livrou do vestido, deixando-o cair a seus pés. Cailean recostou-se nos
travesseiros, sem deixar de admirar a esposa. Ele desatou o nó que prendia a calça, expondo o
membro viril e ereto. Deu dois tapinhas no próprio colo. Rooney vacilou e ele repetiu a ação.
- Venha. Não vou te machucar. O tempo de sentir dor passou, lhe garanto...
Rooney posicionou-se sobre ele, se encaixando e unindo-se ao marido. Sentiu que ele deslizava
para dentro de si, preenchendo-a completamente. Em uma reação instintiva iniciou um
movimento lento e sensual, rebolando sobre ele, arqueando as costas para trás.
Rooney gostou da sensação de estar no controle. Sentiu que finalmente o tinha em suas mãos,
delirando de prazer, perdendo-se logo abaixo de seu ventre. Acelerou seus movimentos, soltando
gemidos descompassados.
- Calma, meu amor, devagar. Assim eu não vou agüentar muito tempo...
Para ela o tempo não importava, não fazia diferença. Teriam todo o tempo do mundo agora que
Cailean estava de volta. Sua única preocupação no momento era proporcionar prazer ao marido.
Manteve o ritmo por mais algum tempo, sentindo que ele lhe pressionava a coxa e trincava os
dentes.
- Mulher...ah... - ele não mais pôde segurar, ejaculando com abundância no interior dela.
Rooney observava com satisfação as reações que havia provocado em seu homem. Beijou-o
triunfante e deitou a seu lado. Os dois ficaram ainda se tocando e beijando, querendo lembrar da
sensação de como era estarem juntos por algum tempo, até adormecerem tranqüilos e
apaixonados.
Na manhã seguinte a criada veio trazer tanto o chá de Rooney quanto o de Cailean. A
jovem aceitou a bandeja contendo os dois, mas os jogou pela janela.
- Não precisaremos mais disso. - Respondeu. - Eu cuidarei de nós dois a partir de agora. Já
começo suspendendo estes chás. - colocou a bandeja com os copos de lado e se aproximou da
cama, acariciando o rosto dele. - Como se sente hoje, meu guerreiro valente?
Cailean tomou a mão dela, depositando um beijo na palma macia.
- Muito bem. Bem até demais, para falar a verdade! Acho que a brisa oceânica limpou meus
pulmões!
Rooney sabia que não era este o motivo da melhora, mas sim a abstinência da bebida batizada.
Sorriu, inocente.
***
Rooney sentia-se agradecida cada dia mais por ter seu marido de volta e rezava todos os dias na
capela do castelo por Deus ter devolvido seu marido são e salvo. Foi em um dia desses, depois de
uma sessão de agradecimento ao Divino que ouviu uma conversa no corredor. Duas pessoas de
sexos opostos falavam baixo.
- Você continua adicionando as ervas aos chás, como lhe instruí? - o homem indagou.
- Sim, claro! Três vezes ao dia para ela e uma vez para ele! - a mulher respondeu.
- Talvez seja necessário aumentar a dose. Os dois parecem estar muito bem.
- Meu Deus! Será que descobriram? - a mulher se apavorou. - estamos perdidos! Lorde Reed
abrirá nossas barrigas e nos prenderá no pátio para que os corvos se alimentem de nossas
entranhas. Eu já o vi fazer isso com homens que ele suspeitava serem traidores!
- Não seja tola! Tenho certeza de que eles não descobriram nada! Caso o contrário já teríamos
sido abordados e provavelmente nem estaríamos tendo esta conversa agora.
Rooney percebeu que a pequena reunião macabra de dissipava. Não conseguiu reconhecer as
vozes que sussurravam muito baixo, mas agora tinha certeza de que havia traidores morando ali.
Os motivos ainda lhe eram obscuros. Não podia mais esconder isto de Cailean. Foi atrás dele no
quarto e o encontrou discutindo com a Sra. Riley, que tentava massagear-lhe com ungüento o
braço magoado enquanto ele proferia mil palavrões e ameaças.
- Sossegue já, Milorde! Troquei suas fraldas, sabes que não me amedronta em nada!
- Não a amedronto pois é uma bruxa vinda das profundezas do inferno! É com essas mãos
malignas que pretende cuidar de meu filho?
- Espero ter saúde para que assim seja! Deus é testemunha de que é o que mais desejo nesta vida!
- a pequena senhora de mãos pesadas finalmente soltou seu amo e dirigiu-se a Rooney. - Ele está
se curando com velocidade, Milady. A senhora está fazendo um grande trabalho!
Rooney sorriu.
- Que bom! Assim logo logo não teremos que ouvir mais estas lamúrias toda vez que for trocar
alguma atadura! - brincou.
- Bem, preciso vigiar as criadas da cozinha! Deus sabe o quanto são desastradas e como fazem
tolices e fogem dos afazeres quando não são vigiadas! - a mulher fez uma rápida reverência ao
passar por Rooney e saiu.
***
Rooney chegou logo atrás. Ao se deparar com a cena, correu até o marido e segurou-lhe o braço.
- Solte-me mulher, solte-me agora para que eu possa acabar com a vida deste desgraçado com
minhas próprias mãos!
- Não, Cailean! Eu imploro por tudo o que é mais sagrado, por nós! Não faça isso, não tire
conclusões precipitadas! Vai matá-lo!
- Você não está entendendo! É isso mesmo o que quero! - soltou-se dos braços dela e voltou a
espancar o velho, que parecia alheio a tudo.
Rooney sabia que não teria força para deter o guerreiro, então usou sua arma mais poderosa: a
astúcia.
Segurou a barriga e fechou os olhos, fingindo que ia desmaiar. Cailean soltou o herbalista na
mesma hora e agarrou a esposa com destreza.
- Meu amor, você está bem? - ele perguntou. - Sente alguma dor?
Ela abriu um dos olhos, espiando para ver se tinha toda atenção dele, depois o fechou
novamente, assumindo uma postura dramática.
Cailean virou-se furioso, prestado para outra sessão de espancamento. Foi quando Rooney
agarrou-lhe o braço e ele estacou.
- Você...destruiu minha família uma vez e pretendia fazer o mesmo novamente! Mas terei minha
vingança. Cozinharei você agora mesmo em óleo fervendo!
- Piedade, Milorde! Misericórdia! Eu não fiz nada! Não faço idéia do que o senhor está dizendo!
- Velho diabólico! Como pôde fazer isto? Por mais que eu pense, não consigo encontrar um
motivo que possa te-lo levado a cometer tais atrocidades.
Rooney raciocinou neste exato momento. O velho herbalista realmente não tinha motivos para
envenená-los, mas ela sabia quem os tinha!
Capítulo 13 – Vingança
- Mulher, de que lado você está? Tem coragem de defender este monstro?
- Não foi Daniel pelo simples fato de que ele não tem motivos para isso. - ela respondeu.
O velho, acostumado a soltar qualquer coisa ao menor sinal de pressão pôs-se a falar como uma
gralha.
Cailean não escutou. Saiu da câmara a passos apertados e furioso, deixando o velho Daniel e sua
esposa, que se abaixara perante o velho.
***
Cailean se dirigiu até o campo que ficava nos fundos do castelo. Seu tio era responsável pelo
acolhimento de novos guerreiros, então de certo estaria lá. Deu uma esquadrinhada rápida no
local até que seus olhos encontraram Graham, como uma águia que segue sua presa. O homem
estava simulando combate com um jovem frangote que falhava miseravelmente. Cailean chegou
até o menino e tomou a espada de sua mão, assumindo posição de combate em frente ao tio.
- Lute comigo!
- Ah, meu sobrinho! Você se sente melhor? Há quanto tempo não travamos um embate. - o
homem assume também a posição de batalha, sem se dar conta ainda do real motivo da aparição
repentina do jovem Lorde.
Cailean foi o primeiro a atacar. O braço latejava enquanto empregava força real aos golpes.
Graham defendeu-se, surpreso.
- Vejo que deseja uma experiência mais emocionante, Cai. - o homem jogou-se contra o
sobrinho, atacando verticalmente.
A espada desceu sobre sua cabeça como um raio. Cailean levantou sua própria lâmina a tempo
de aparar o golpe. Saltou para trás com a agilidade de um gato.
- Diga-me. - Começou. - Como sentiu-se? Como se sentiu ao receber a notícia de que Megan
havia perecido após meses ingerindo veneno? - seus olhos eram como setas cortantes.
- Como todos em Craig Moss fiquei muito triste com o ocorrido. Mas, por que está trazendo à
tona este assunto bem agora? - o homem perguntou, fingindo inocência.
- Por que está tentando fazer novamente! - Cailean jogou toda sua fúria sobre seu parente,
golpeando paralelamente ao pescoço de Graham, que ergueu sua espada, para defletir o ataque,
finalmente entendendo do que se tratava.
- Minha mulher e meu filho...como pôde?! Confirmo em você! É meu tio! Irmão de minha mãe!
É mais do que óbvio o que deseja: Craig Moss! - cuspiu para o lado. - Se quer algo aja como
homem e venha me tomar à força!
Foi a vez de Graham avançar. Golpeando diversas vezes, dando preferência ao lado do braço
ainda ferido do sobrinho, fazendo-o perder o equilíbrio e vacilar.
- Se Megan não tivesse engravidado teria sido poupada! - o homem finalmente se manifestou. -
O mesmo vale para Rooney! Mas um herdeiro seu significava que eu subiria ao comando da
fortaleza apenas temporariamente, mesmo tomando sua viúva como esposa. Então tive que tratar
de eliminar todas as ameaças! - emitiu um golpe pesado contra o braço bom do sobrinho,
ferindo-o e em seguida estocando em direção ao estômago, pegando de raspão.
Cailean vacilou devido ao ódio e dor, queria matar o desgraçado, e o faria! Ou pelo menos
morreria tentando!
Rooney subiu, amparando nos ombros o velho Douglas. Ao se deparar com a cena tentou correr
e se meter na frente, mas foi impedida pelo herbalista.
- Não, minha senhora. Há certas coisas que um homem precisa fazer, e Lorde Reed deve honrar a
memória de Lady Megan e proteger a senhora é seu filho.
Rooney assentiu e ficou apenas a olhar, com o coração na mão, enquanto tio e sobrinho lutavam
ferrenhamente por suas respectivas vidas.
Graham levava claramente a vantagem. Avançou sobre Cailean, apertando com força a ferida
que acabara de provocar no braço dele. O sobrinho urrou de dor e ajoelhou-se.
- Está certo, meu sobrinho! Tenho que tomar o que quero, à força!
Graham ergueu sua espada com as duas mãos, preparando-se para desferir o golpe final sobre o
aparentemente dominado Lorde de Craig Moss.
Rooney não pôde mais se conter, e soltou um grito de desespero. Foi quando Cailean ergueu a
mão, atirando terra e grama nos olhos de deu atacante, que afastou-se confuso e sem poder se
defender.
Cailean se levantou e desferiu um golpe giratório perfeito, arrancando fora a cabeça do traidor,
que caiu rolando ao lado do corpo sem vida.
Daniel finalmente soltou Rooney, que correu ao encontro de seu marido, abraçando-o com força.
***
Logo após o ocorrido uma das criadas se entregou, implorando misericórdia. Disse que
Graham havia lhe oferecido uma grande quantia de dinheiro, da qual ela precisava pelo filho
doente. A pedido de Rooney, Cailean perdoou a mulher, apenas enviando-a para o exílio. O
jovem Lorde pediu perdão publicamente ao herbalista, que afinal nada tinha a ver com o
ocorrido. E assim dois meses se passaram tranquilamente.
***
Era madrugada. Cailean foi acordado por gemidos de sofrimento. Pôs-se de pé em um pulo. Na
cama Rooney se contorcia, numa demonstração de pura dor.
Capítulo 14 – Milagre
Cailean pôs-se a correr desesperado pelo quarto. Meu Deus! O que deveria fazer?
Abriu a porta do quarto e gritou por Iana e pela Sra. Riley, acordando todos. A ruiva foi a
primeira a atender seu chamado, assustada.
- O bebê...o bebê está chegando! Faça algo! - Não suportava ver Rooney sofrendo daquela
maneira. Isso o deixava muito nervoso.
Ela sorriu.
- Tudo bem, Milorde. Não se preocupe. Tudo dará certo! - se aproximou da amiga na cama e
atirou longe as cobertas.
A Sra. Riley chegou logo depois, radiante.
- Eu sabia que seria hoje, senti! Ontem estava apanhando ovos na granja e um deles saiu
pintadinho! Juntando isso com a lua nova e...
- Mas que diabos a Sra. está falando? Minha esposa está tendo um filho, sabia?
A mulher foi arrancada de seus pensamentos supersticiosos e se dirigiu a seu senhor, com
audácia.
- Sim, sim! Já sei! Já fiz isso centenas de vezes! Aliás, o senhor só está aqui me afrontando agora
graças a minhas mãos! - a mulher o empurrava na direção do corredor. - Vamos, vamos! Homens
não são permitidos durante a entrega do bebê, vocês só atrapalham! Por favor Milorde, desça e
Acorde as criadas. Ordene-as que subam água quente e tecidos limpos. E por favor, CALMA!
A mulher fechou-se no quarto junto com Iana e a pobre Rooney, que Gritava e proferia
impropérios como um taverneiro bêbado. Cailean correu a providenciar tudo o que a empregada
pedira e depois foi para a capela. Adentrou, fazendo o sinal da cruz e se ajoelhou, em busca de
conforto.
- Oh Deus, o Senhor sabe que não tenho sido um bom cristão e nunca lhe escondi isso. Mas estou
aqui hoje pedindo por minha família. Ajude-os, Altíssimo! Por favor traga meu filho a salvo e
proteja minha mulher!
- Jovem Lorde, há quanto tempo não o vejo prostrado aqui! - Daniel, o herbalista entrava na
capela a passos vagarosos.
- Com toda esta gritaria é impossível dormir, meu senhor. Não se preocupe. Fiona já trouxe
muitos em segurança, inclusive Milorde e seu irmão. Ela cuidará bem de Lady Reed.
***
Quatro horas já haviam se passado. O sol já havia nascido e Rooney não parava de gritar.
Cailean estava no corredor andando impaciente de um lado para o outro quando Iana saiu, com
uma bacia nas mãos.
- Iana! - ele agarrou a jovem pelo braço. - E então? Está tudo correndo bem?
- Eu não deveria falar isto com o senhor, mas...o bebê está sentado. A Sra. Riley está fazendo o
possível para movimentar o pequeno, mas ele se recusa! Se continuar assim teremos um parto
muito difícil e arriscado, tanto para Rooney quanto para o pequeno...
Cailean soltou a braço da jovem e cambaleou para trás. A perspectiva de que, apesar de toda sua
força e coragem nada adiantaria para ajudar sua mulher o deixava inconsolável.
- Só nos resta esperar, Milorde. Rezar para que Rooney seja forte e consiga superar esta prova...
O guerreiro assentiu silencioso e foi em direção ao salão. Agarrou uma garrafa de vinho,
sentando-se em um dos longos bancos e virou o conteúdo na boca, pensativo.
***
Dezoito horas já haviam se passado. A madrugada acabara por entrar. Cailean não desistira de
sua vigília silenciosa. Estava abaixado de cabeça baixa na frente da porta do quarto. Os gritos da
mulher a muito haviam diminuído, tornando-se um lamento doloroso, misturado a pedidos de
ajuda. O guerreiro enorme e corpulento havia chorado poucas vezes em toda sua vida, poderia
contar nos dedos de uma única mão. E este era um momento em que lágrimas rolavam por sua
face, pingando no chão. O que seria de sua vida sem sua luz, sua alma? Já há algum tempo estes
pensamentos negros cruzavam sua mente. Sua adorada esposa havia se tornado o ar que
respirava e sem ela apenas sufocaria até a morte...
Foi arrancado dos mórbidos pensamentos por um chorinho fraco e delicado. Apertou o olho,
procurando se concentrar mais. Era como um pequeno gatinho, que acabara de nascer... Era sua
criança!
Levantou-se e escancarou a porta do quarto, apressado. A Sra. Riley segurava em seus braços o
pequeno embrulhinho barulhento. Na cama Rooney estava suada e abatida. Muito de seu sangue
manchava os lençóis. Ela dirigiu ao marido um sorriso franco e exausto. Ele atravessou o
cômodo, chegando até ela é lhe beijando a testa molhada.
- Minha pequena valente! - ele lhe tirou os cabelos colados na testa, com gentileza. E voltou-se
para a Sra. Riley.
- É um menino, Milorde! Um menino forte e saudável! Ele está um pouco cansado da batalha
que acabara de travar, mas logo estará a plenos pulmões!
Cailean pouco tinha experiência com bebês. Nunca chegara a conhecer seu primeiro filho e o
contato com crianças tão pequenas se limitava a uma olhadela rápida no colo dos pais. Mas este
era seu filho, seu pequeno milagre. As lágrimas voltaram a rolar pesadas através do olho bom.
Mas desta vez não havia angústia e nem pesar, apenas felicidade pura e plena.
- Vai se chamar Élan, pois é um anjo que foi arrebatado dos céus, lutando bravamente por sua
vida. - beijou a pequena testinha cabeluda com ternura.
***
O pequeno Élan foi recebido com festa e durante muito tempo não se falava de outra coisa em
Craig Moss. Ele foi o primeiro de outros cinco, porém o único menino. Ele viria a se tornar um
rapaz forte e honrado, guerreiro valoroso que empunharia a espada em nome do lar de seus pais.
Cailean e Rooney. Viveram ainda muitos anos e o resto de seus dias foram marcados por
discussões calorosas e intensas demonstrações de paixão. Dizem que em toda Escócia nunca
houve um casal tão complexo assim. Mas uma certeza todos tinham: Amor entre eles nunca
faltaria.
FIM.
N/a: Este foi um dos primeiros contos que eu escrevi. Tenho muito carinho por ele, pois foi a
título que começou a me dar mais visualização no Wattpad, na época em que sua degustação foi
publicada. Depois disso ele foi terminado e ficou engavetado por pelo menos dois anos até que
finalmente tive vontade de compartilhá-lo com vocês. A correção foi feita com o corretor
automático. Por isso peço encarecidamente que, caso encontre alguma coisa errada, mande um
feedback antes de postar algum comentário negativo. Com o feedback eu saberei exatamente
onde está o erro para poder consertá-lo e melhorar, com o comentário eu nunca poderei fazer a
correção, ok? Beijos!