210 Robyn Donald - Inferno em Teus Braços (Bianca 210)
210 Robyn Donald - Inferno em Teus Braços (Bianca 210)
210 Robyn Donald - Inferno em Teus Braços (Bianca 210)
Alannah sabia que não podia escapar de Nicholas Challoner. Durante um ano, ele
havia planejado cuidadosamente uma vingança terrível e agora a faria pagar por ter
causado a morte de sua esposa grávida. Ele a humilharia até que a dor fosse sua
companheira inseparável; usaria seu corpo jovem até que ela lhe desse os filhos que
queria. O fato de se casar com Nicholas não diminuía sua degradação. Ao contrário: o
lindo anel de safiras que ele lhe havia dado no dia do casamento era um símbolo de
escravidão. Significava que pertenceria a Nicholas enquanto ele assim o desejasse. A
única coisa que podia fazer era rezar para que o marido se fartasse logo de seu corpo e
arranjasse uma amante
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Bianca 210 — Inferno em teus Braços — Robyn Donald
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Bianca 210 — Inferno em teus Braços — Robyn Donald
Capítulo 1
O enorme jato passou pelos Alpes do Sul. Alannah Finderne virou-se, animada,
para a simpática mulher a seu lado:
— Um desses picos é provavelmente o Monte Cook, o mais alto da Nova Zelândia,
mas daqui não sei distingui-lo. Toda a minha vida eu os vi no horizonte, mas ficam
completamente diferentes vistos daqui de cima!
— Mas são mesmo lindos. — Comentou a sra. Hamel. — Então, está quase em
casa, meu bem. Será que sua mãe e sua irmã estão a sua espera?
— Espero que sim. Naturalmente, Tina está na escola. Não, não! Ela terminou no
fim do ano. Este ano já está fazendo pré-mediciana; no ano que vem ela começará o
curso de Medicina.
A sra. Hamel sorriu, olhando com admiração o rosto atraente da moça.
— Nos Estados Unidos esse curso é muito difícil.
— Mas Tina é brilhante. — Comentou Alannah, sem a menor sombra de inveja. —
Brilhante, mesmo! Não terá problemas, e também é sua vocação. Lá em casa sempre
soubemos que ela seria médica.
— E você?
Alannah ficou levemente corada, antes de responder:
— Também quero ir para a universidade. Tenho muito interesse por computação.
— Seus pais devem estar orgulhosos de filhas tão inteligentes. Você tem mais
irmãos?
Os límpidos olhos azuis de Alannah ficaram sombrios, e ela levou alguns instantes
para responder:
— Não. Somos só Tina, eu... e minha mãe. Meu pai morreu há seis meses.
— Sinto muito. Parece que a ouvi dizer que ficou fora um ano inteiro?
— É verdade. Fui para uma escola de etiqueta na Suíça. Minha mãe estava tão
decidida a me fazer aprender boas maneiras, como receber e coisas assim, que tive que
ceder. Meu pai morreu enquanto eu estava lá.
— Coitadinha! Tão longe de casa...
— Sim. Naturalmente, eu quis voltar para casa, mas minha mãe achou que era
bobagem. E a irmã de papai, que mora em Londres, foi passar duas semanas comigo.
Todos foram muito bons, em St. Antoine.
— Passou esses últimos dias em casa de sua tia?
Alannah olhou para as belas planícies de Canterbury, lá em baixo, a maior parte já
envolvida pela sombras, e seu coração bateu mais depressa.
— Sim, com tia Ray. Ela é maravilhosa e me hospedou durante dois meses ótimos.
Mas bem que estou contente de voltar para casa! Estava com tanta saudade!
A voz suave não escondia a emoção tanto tempo reprimida. Consciente disso.
Alannah virou a cabeça, e agora somente seu perfil era visível, o rosto corado escondido
sob a massa de cabelos castanhos. Cabelos macios como seda, disse David um dia
enquanto segurava entre os dedos uma mecha que caíra nos olhos.
Talvez David estivesse lá para recebê-la. Tina havia escrito que ele estava muito
ocupado na universidade, com aulas mas talvez ela tivesse sorte a aquele fosse para ele.
Fazia um ano que os dois não se viam: um longo ano sem cartas, embora a querida Tina
sempre mandasse notícias dele.
Mas isso não era suficiente para o coração faminto de Alannah.
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Talvez agora, dentro de poucos minutos, ela o veria, e sua vida ficaria novamente
completa.
Até mesmo a profunda tristeza pela morte do pai não diminuía a intensa
expectativa de voltar a seu país e rever sua família.
A sra. Hamel a observava atentamente, percebendo que algo a preocupava.
— Espero sinceramente que tudo dê certo para você.
As duas se despediram na sala da Alfândega, e logo Alannah estava nos braços da
mãe e da irmã. Abraçadas, as três choraram um pouco, emocionadas, lembrando em
silêncio o quarto membro da família, agora morto.
Entretanto, seis meses é tempo suficiente para acalmar as dores mais cruéis, e o
coração de Alannah deu um salto de alegria ao ver um rapaz alto e louro se aproximar.
Mas era só alguém parecido com David. Ele não tinha vindo. Intimamente se consolando,
sabendo que o veria muito em breve, demonstrou uma alegria descuidada que na
verdade não sentia.
As três foram para casa em dois táxis: um para as malas e outro para elas.
— A culpa de tantas malas é de tia Ray. — Defendeu-se ela. quando Tina
comentou a enorme bagagem. — Ela não resiste a vestidos bonitos e foi absurdamente
generosa comigo. Eu pedia para ela não exagerar assim, mas ela ria e continuava
comprando coisas sem parar!
— Menina de sorte! Só quero ver se vai fazer a mesma coisa para mim, quando
eu,for um dia a Londres.
— Mas é claro que sim, Tina. Ela vai ficar radiante quando puder escolher roupas
para uma moça tão elegante como você. Com essa altura e esse corpo de modelo. Tia
Ray lamentava o tempo todo o meu um metro e sessenta de altura.
A mãe imediatamente reagiu:
— Não venha outra vez com essas queixas, minha querida! Você saiu a minha
família, é isso. Muitos homens até preferem mulheres mais baixas, eles se sentem
protetores. — Olhou para as duas filhas, que riam, e acabou rindo também. — Espere um
pouco, e logo verá que tenho razão. E você perdeu um pouco de peso, Alannah; está com
o corpo muito bem proporcionado para a sua altura. Parecendo um pouco... mais velha,
um pouco mais sofisticada.
— Espero que sim. — Respondeu Alannah, sentindo o olhar implacável da mãe,
mas o treino em St. Antoine funcionou, e ela se manteve aparentemente controlada. —
Teria sido tempo e muito dinheiro perdidos, se eu não voltasse tão... tão polida como uma
mesa de sala de jantar!
— Bem, tem que reconhecer que você era uma garota das mais sem vaidade e
sem modos que já existiram. — Comentou Rose, olhando para a filha, agora uma moça
refinada e pronta para assumir o lugar para o qual a mãe a havia preparado. — Eu fico
contente em ver que aquele seu ar obstinado e infeliz, também sumiu. Era tão
desagradável! Parecia que eu tinha uma enjeitada dentro de casa!
Alannah afastou uma mecha de cabelo que lhe caía no rosto.
— Em compensação, você tinha uma verdadeira fada, que era Tina.
— Pare com isso, Alannah! — Reclamou a irmã.
— Precisa se livrar dessa ideia, querida. Não há razão para ter sempre ciúme de
Tina e...
— Mas não tenho ciúme de Tina! Nunca tive, verdade! E como poderia? Ela é um
encanto. É mesmo. Tina, não faça essa cara! Sei perfeitamente que sou muito teimosa e
tenho um gênio difícil, e sou rancorosa. Como poderia culpar você por ser mais dócil do
que eu? Afinal de contas, ela tem o seu gênio. Nunca indiferente a um elogio, ainda mais
um elogio sincero.
Rose Finderne riu.
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— Você! Com todos esses vestidos novos, deve ter um bem bonito para a festa de
seu aniversário.
— Festa?
— Querida, festa de seus dezenove anos. Ou será que já esqueceu?
— Claro que não. Mas, será que podemos? — Parou de falar, lembrando-se de
que o motorista do táxi escutava a conversa.
Quando chegaram à espaçosa casa, no elegante bairro de Cashmere Hills,
Alannah perguntou, preocupada:
— Temos dinheiro para dar uma festa? Pensei que... que com a morte de papai, as
coisas tinham ficado mais difíceis.
Rose serviu-se de uma xícara de chá, fazendo uma careta como sempre faria
quando tinha que conversar sobre dinheiro. Mas respondeu despreocupada:
— Queridinha, não se preocupe, tudo está sob controle; eu garanto.
— Tem certeza?
— Mas claro! Não há nada que a impeça de ter uma linda festa. Todos os nossos
amigos sabem que você voltou e já a convidaram para mais programas do que vai poder
ir.
— Sem falar em David. — Disse Tina, a voz controlada, olhando para a bela casa
do outro lado da rua, onde o rapaz morava.
Alannah teve a impressão de que a mãe estava preocupada, mas Rose
imediatamente afastou aquela sensação desagradável e sorriu, pois não queria ter rugas
no rosto ainda moço e conservado.
— Não fique pondo ideias bobas na cabeça de Alannah. Aquilo foi um romance de
criança, David é um ótimo rapaz, mas Alannah logo descobrirá que tem muito pouco em
comum com ele.
Entretanto, quando os dois se encontraram naquela mesma noite, Alannah sentiu
que tudo voltava a ser como antes de sua partida. Atirou-se nos braços dele, e trocaram
um beijo longo e apaixonado, pelo qual ambos esperaram um longo ano.
— Meu amor. Ah, Alannah, como senti sua falta!
— Estou tão contente por voltar! Foi um ano que parecia não acabar nunca!
— É verdade.
Era só o que precisava ser dito.
Os dois tinham crescido juntos, David era três anos mais velho do que ela. Sempre
houve uma grande afinidade entre eles, mas só aos dezesseis anos Alannah descobriu
que a amizade e o companheirismo tinham se transformado em amor. Nessa ocasião,
David a beijou pela primeira vez. Timidamente, a princípio, mas a resposta imediata dela
o assustou. Agindo como um adulto responsável, ele lhe disse que não deviam permitir
que as liberdades entre eles aumentassem muito, pois ainda teriam que esperar um bom
tempo antes de poderem casar.
Ambos levavam uma vida muito ocupada, ele na universidade, ela ainda no
colegial, e assim o namoro seguia vagarosamente seu curso. Até que Rose começou a
insistir em mandá-la para a Suíça, o que atirou novamente um nos braços do outro. Foi só
o bom senso de David que evitou que acontecesse exatamente o que Rose mais temia.
Assim, foram obrigados a testar seu amor durante um ano. E agora, até mesmo
Rose tinha que reconhecer que haviam nascido um para o outro.
Embora a mãe não fizesse mais uma oposição aberta ao namoro, algo em sua
atitude deixava Alannah intrigada. Sempre que tentava perguntar por que era contra seu
amor por David, Rose desconversava. Finalmente, Alannah chegou à conclusão de que
ela simplesmente não aprovava casamentos de duas pessoas muito jovens.
Como não tinha intenção de casar logo, pois Davíd ainda precisava fazer pelo
menos um ano de especialização na faculdade, resolveu desistir de pressionar a mãe e
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mais baixa do que a bela irmã, o corpo esguio e bem feito, cabelos acobreados, pele
clara, olhos de um azul intenso. Tina, alta e loura, tinha olhos castanho-claros e herdara
os traços clássicos e perfeitos da mãe. Naquela noite, usava um vestido dourado e estava
mais linda do que nunca.
Olhando para a sala cheia de flores, Alannah sentiu o coração leve. O ano passado
no exterior tinha sido fascinante, mas sentira imensa saudade de casa. Agora, depois do
exílio forçado, recebia sua recompensa. Estava finalmente de volta, à espera dos amigos.
E de David?!
Logo a casa estava cheia de música, de risos e de conversa. E David, a seu lado.
Feliz, ela se movimentava entre os convidados, encantadora, vivaz, sorridente.
Depois de cumprir seu papel de anfitriã, dançou com David.
— Tive tanta saudade — ele sussurrou em seu ouvido.
— Humm...
— É só o que tem a dizer? — Reclamou David, fingindo zanga
— O quer que eu diga? — Perguntou, provocante. — Se eu dissesse tudo que
quero, acho que assustaria você. Deus do céu ! Esse ano parecia não acabar mais!
— O pedido de sua mãe para não escrever um ao outro podia ser sensato, mas,
querida, foi um inferno para mim!
Alannah ficou impressionada com a intensidade do amor dele; mesmo assim, quis
ter certeza.
— Pelo que Tina me escreveu, você estudou tanto que nem teve tempo para
pensar em mim.
— Nunca tirei você do pensamento. E tudo que fiz foi por você... por nós.
Era o mais perto que ele tinha chegado de um pedido de casamento. Feliz, ela
levantou os belos olhos azuis para ele, e os dois continuaram dançando, esquecidos de
tudo a sua volta. Então David desviou o olhar e sua expressão mudou.
— O que foi? — perguntou ela.
— Entrou um homem, e ele estava olhando muito firme para nós. Agora, está
conversando com sua mãe.
— Mas quem é?
— Não sei, mas o rosto me é familiar. — Girou, para que ela pudesse ver o
desconhecido. — E aquele ali. Conhece?
Alannah o reconheceu imediatamente. Nem que vivesse mil anos, se esqueceria
daquele rosto que vira pela primeira vez aos dezesseis anos. Aquele rosto frio,
controlado, bonito e implacável. Os olhos verde-claros contrastavam com a pele morena,
e a gelaram imediatamente, fazendo com que perdesse o ritmo da dança e tropeçasse.
— Querida, o que foi? Alannah? — perguntou David, olhando para o rosto lívido da
namorada.
— Aquele é Nicholas Challoner.
— Nicholas Challoner? O mesmo...?
— Sim, o mesmo Nicholas, cuja mulher eu matei quando tinha dezesseis anos.
Ele ficou calado, acompanhando mecanicamente o ritmo da música, enquanto
Alannah sentia o corpo se transformar em um pedaço de gelo. A única realidade naquele
instante eram os olhos frios e acusadores de Nicholas Challoner.
— Mas que diabo ele está fazendo aqui? — Perguntou David, irritado. — Sua mãe
o convidou, ou ele veio se intrometer?
— Ela não me disse nada.
— Mas não parece estar surpresa de vê-lo. Vamos tomar alguma coisa. Você
precisa de uma bebida forte, para se recuperar do susto.
Deu a ela um pouco de conhaque e levou-a até o terraço. Ficaram apreciando a
bela vista da cidade de Christchurch que se via lá em baixo, uma cidade luminosa,
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influenciada pela mãe, Alannah se acalmou. Logo Tina e David se juntaram aos três, e ela
percebeu, assustada, que também eles sucumbiam ao feitiço de Nicholas. Parecia que só
ela notava que ele a olhava como se fosse seu dono!
— Como você viu. — Disse David logo depois, quando dançavam. — Ele esqueceu
e perdoou. Pelo que Rose falou, tinha até negócios com seu pai. Devem ter se tornado
amigos e decidiram não contar nada a você para não aborrecê-la.
Aquilo parecia lógico. Ainda assim, Alannah achava que as coisas não eram tão
simples.
— Estou com medo. — Murmurou. David reagiu com impaciência.
— Está sendo tola, querida. Ele é um sujeito muito agradável. Na verdade, se você
não fosse tão bobinha eu teria ciúmes. Homens como Nicholas costumam conquistar
todas as mulheres. Mas concordo que Rose devia ter avisado você de que ele vinha. Foi
um choque terrível, não? Mas agora tudo passou. E pode viver sem essa sombra
ameaçando você.
Como David podia ser tão obtuso? Alannah tinha vontade de gritar, para que ele
percebesse o que estava acontecendo bem debaixo de seu nariz. Nicholas Challoner não
era uma sombra, era muito real, muito homem, e a ameaçava como se quisesse separá-la
do resto do mundo!
Quando ergueu o rosto para o namorado, inconscientemente implorando sua ajuda,
percebeu que David estava fascinado pela forte personalidade de Nicholas e não percebia
o homem cruel que havia sob aquela máscara. Sentiu-se sozinha como nunca. Nem
mesmo quando imaginara que era responsável pela morte de Claire Challoner sentira-se
desse modo. Naquela época, os pais a entenderam e encorajaram, ajudando-a a vencer a
angústia. Mas agora o pai não estava mais ali para protegê-la. Teria que enfrentar aquela
ameaça assustadora sozinha, e desarmada!
— Meu benzinho, você parece exausta. — Disse David, com ternura. — Desconfio
que deve estar sentindo a mudança de fusos horários. Precisa dormir até tarde amanhã.
— Sim, vou fazer isso. — Respondeu, subitamente sem energia. Eram três da
madrugada, quando a festa finalmente acabou.
Alannah foi procurar a mãe, mas Tina avisou que ela acabara de se deitar, com
uma forte dor de cabeça.
Teria que esperar pelo dia seguinte para pedir explicações sobre a presença de
Nicholas Challoner.
Depois de dar boa-noite à irmã, foi para o quarto e caiu na cama, sem forças.
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— Ora, compreensivo. Sei que ele dá a impressão de ser duro, mas, na verdade,
tem um coração de ouro.
— É mesmo? — Alannah lembrou-se das três músicas que tinha sido obrigada a
dançar com ele e do seu olhar de desprezo. — Acha mesmo que ele é bom?
— Sim. — Insistiu Rose, com firmeza. Depois de tomar o resto do café, ela se
levantou. — Agora, vamos arrumar tudo, está bem? A casa está com cheiro de bar!
Não estava, naturalmente. A firma contratada para preparar e servir a ceia deixara
o lugar imaculadamente limpo, mas, exigente como sempre, Rose trabalhou até a hora do
almoço para que tudo estivesse exatamente no lugar. Depois, Tina saiu para passar a
tarde com uma amiga e Rose foi descansar, deixando Alannah sozinha. Quando foi dar
uma volta no jardim, a moça desejou ardentemente que David não tivesse que ir receber
um professor visitante, naquele dia.
A tarde estava clara e ensolarada e logo seus temores da véspera lhe pareceram
fantasias. Lógico que Nicholas Challoner não a ameaçava de maneira alguma! Era
impossível que um dia se tornassem amigos, mas devia estar mesmo muito agitada para
imaginar que ele era seu inimigo.
Havia chegado a essa reconfortante conclusão, quando parou, atônita. Sem sentir,
tinha ido até o exato lugar onde surgira de repente na frente de Claire Challoner, três anos
atrás. O enorme rododendro que a escondera da vista da mulher ainda estava no mesmo
lugar. Perturbada, começou a andar pela rua, e deu um grito de susto, quando um carro
freou a centímetros dela.
Um homem saltou e agarrou-a pelos ombros. Era Nicholas.
— Tentando outra vez? — Gritou, fora de si. — Pois ia se dar mal, Alannah. Não
sou maluco para me matar e salvar uma adolescente idiota!
— E pare de gritar!
Alannah pensou por um momento que ia desmaiar. O mundo parecia estar
escurecendo à sua volta, e em seus ouvidos havia um assustador zumbido.
Repentinamente, ele a levantou nos braços e a jogou dentro do carro. Com os olhos
fechados, tentando dominar o tremor do corpo, e calar o terror que a dominava, ela não
conseguia pensar em mais nada, a não ser no terror que aquele homem lhe provocava.
Ficou imóvel, até o carro estacionar na porta de sua casa.
— Saia!
Ela obedeceu sem hesitar, sua natural rebeldia esmagada pelo choque de vê-lo tão
inesperadamente.
Mas Nicholas não a deixou entrar em casa. Segurando-a pelo braço, levou-a até a
pequena estufa.
Aos poucos, Alannah recuperou o autocontrole. Tentou se livrar dele, mas foi
forçada a sentar-se num banco.
Absurdamente emoldurado por uma cascata de rosas, ele a olhava de cima
observando o esforço que ela fazia para se recuperar do susto, os olhos azuis revelando
toda a confusão que sentia.
— Está assim tão decidida a se suicidar naquele exato lugar? — Perguntou,
insensível.
Alannah piscou.
— Oh, meu Deus, você me deu um susto tão grande!
— Estou vendo. Onde está sua mãe?
— Descansando.
— Pela sua aparência você também devia estar. Seu namorado ficou até muito
tarde?
— Não é da sua conta!
— Não? Bem, talvez tenha razão. Agora me diga, Alannah Finderne, gosta muito
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de sua mãe?
Olhou-o completamente atônita.
— O quê?
— Você escutou. A primeira vez que nos vimos, e tenho certeza de que também se
lembra, você me deu a impressão de ser a queridinha do papai. Mas vendo-a novamente
ontem imaginei se minha conclusão não foi excessivamente simplista. Gosta muito de sua
mãe, não?
O medo que Alannah sentira na véspera voltou, com toda a força ameaçadora.
— Lógico que gosto!
— E Tina, também gosta muito dela? Provavelmente, existe alguma rivalidade
entre vocês. Afinal, ela é bem mais bonita que você, mesmo hoje; e, quando ficar mais
velha, será uma beleza. Tem inveja dela? Ciúme?
— Você é um louco! — Exclamou Alannah, com tanta convicção que ele começou
a rir, achando graça na reação dela.
— Não. — Estendendo a mão para impedir que ela fosse embora, irritada com
seus comentários, os dedos dele se fecharam em volta do pulso delicado, sem perceber
que a estavam machucando, até ela gemer de dor.
Subitamente, Nicholas ficou sério. Obrigou-a a levantar o rosto, segurando seu
queixo voluntarioso. Quando seus olhares se encontraram, ela percebeu, incrédula, que
havia uma luz diferente naqueles olhos verdes, agora brilhando ardentes.
— Me diga uma coisa, Alannah: o que faria por sua mãe e sua irmã?
— O que quer que eu faça?
Ele a soltou e deslizou as mãos pelo braço dela. A pele sensível de Alannah se
arrepiou com aquele contato sensual, e sentiu as pernas bambas. Mas conseguiu se
libertar e sentou-se outra vez; evitando olhar para ele.
— Sua mãe me contou que você estava surpresa por ela poder gastar tanto com
uma festa.
O comentário, que provava a intimidade que existia entre Nicholas e Rose, foi tão
inesperado, que ela levantou os olhos atormentados para ele.
— Por que isso interessa a você? O que quer, sr. Challoner? Por que está me
torturando assim?
— Torturando?
Um silêncio pesado caiu entre eles, e se podia ouvir perfeitamente o zumbido do
voo de uma abelha. Na rua, um carro tocou uma buzina estridente. Mais longe, alguém
aproveitava o domingo para cortar a grama. O sol aquecia a estufa e o ar estava úmido e
perfumado, mas Alannah tremia, sentindo que algo a ameaçava.
Mas não falou; esperou que ele começasse. Depois do alguns segundos, Nicholas
disse, tranquilo como se comentasse o tempo:
— Estou curioso sobre você. Vim até aqui para ver se aquela adolescente atrevida
que conheci tinha mudado muito.
— É...
— Não muito. Os anos e a escola suíça mudaram a menina bonita numa mulher
desejável, mas parece que continua descuidada, à espera de motoristas imprevidentes.
Alannah novamente se levantou, irritada com o comentário cruel. Nesse instante.
Rose chamou da casa e ela fugiu correndo.
A mãe pediu que preparasse o chá e logo depois David apareceu.
Não se beijaram na presença de Rose, mas ele segurou a mão de Alannah com
tanta força que ela reclamou.
— Desculpe, querida. É que estou excitado: recebi uma notícia maravilhosa.
— O que foi? — Perguntou a moça, esquecendo os pressentimentos sombrios
daquela última hora.
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— Bem, aquele professor visitante, que fui receber junto com o professor-
assistente da faculdade, é um VIP mesmo! Imagine que tem prestígio para recomendar
alguém para fazer uma especialização nos Estados Unidos e, depois que o dr. James
falou com ele, fui o escolhido.
— Mas que maravilha! Para onde você vai?
— Para Los Angeles. Vou fazer uma especialização lá, num dos mais modernos
laboratórios do mundo.
Alannah estava radiante, mas, de repente, foi invadida por um terrível
pressentimento.
— Quanto tempo vai ficar lá?
— Dois anos. — Por um instante, a animação dele pareceu diminuir, ao ver o rosto
sério da namorada. — Alannah...
— Dois anos passam depressa. — Interrompeu Rose. — Querido David, você
merece essa oportunidade: tem estudado muito.
Embora Alannah sentisse a rebelião crescendo dentro dela, reconhecia que a mãe
tinha razão. Não devia dizer ou fazer nada que estragasse a alegria de David, diante
dessa oportunidade inesperada. Não, aquilo não era inesperado; ele merecia, por seu
esforço e sua inteligência! E ele a esperara durante um ano, sem se queixar, fiel; agora,
era a vez dela. Seu olhar brilhava de orgulho, quando pousou no rosto de David. Ele
agora contava animadamente as vantagens que teria com sua estada nos Estados
Unidos.
Uma onda de amor a invadiu. Sem se importar com a presença da mãe, deu um
beijo no rosto dele. David puxou-a para mais perto e continuou a falar.
Tina chegou então. Mas, ao saber da novidade, explodiu em lágrimas,
surpreendendo a todos. David sorriu e a consolou.
— Sou mesmo uma boba... — Ela dizia, soluçando. — E só que... que as coisas
parecem estar acabando. Primeiro, foi Alannah. Quando ela voltou, pensei que tudo seria
como antes. E, agora, David vai embora e nunca mais será a mesma coisa... —
Inconsolável, foi abraçada por cada um deles. Enquanto Rose e David foram em busca de
uma garrafa de champanhe que sobrara da véspera e de taças, Alannah tentou confortá-
la.
— Não ligue para mim. — Tina disse, fungando.— Se começar a me agradar muito,
vou chorar outra vez, Mas como pode ficar tão calma, sabendo que não vai vê-lo durante
dois anos?
— Ainda não pensei direito. — Confessou Alannah, contrafeita. — Não se
surpreenda se, qualquer noite dessas, me escutar em prantos.
— Oh, Ally, gosto tanto de você! — E abraçou a irmã. Logo Rose e David voltaram
com as taças e a garrafa.
David partiu uma semana depois, prometendo escrever, mas sem voltar a falar em
algum compromisso entre ele e Alannah. Ela se despediu muito pálida, os olhos sem
lágrimas, e depois se deixou levar para almoçar num restaurante com os pais dele, Rose
e Tina.
Ninguém pareceu reparar que seu sorriso era forçado. A mãe de David também
tinha os olhos brilhantes demais e a voz, estava ligeiramente alterada.
No restaurante, Alannah percebeu que alguém a observava de longe. Quando ele
levantou o copo, numa saudação irônica, ela sentiu o sangue fugir do rosto. O que
Nicholas estava fazendo ali? Ele morava na ilha do Norte, em Auckland. O que fazia ali no
sul há tantos dias?
Foi distraída pelos outros; mesmo assim não pôde ignorá-lo, no outro extremo da
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sala, e sentiu a pele se arrepiar quando percebeu que Nicholas se levantava e caminhava
na direção deles.
Rose cumprimentou-o, calorosamente:
— Nick, meu querido! Já conhece o sr. e a sra. Opie? São os pais de David.
Acabamos de voltar do aeroporto, ele partiu para os Estados Unidos.
Nicholas foi educado e amável, conquistando imediatamente os Opie. Em silêncio,
Alannah brincava com sua xícara de café, como se tentasse não chamar atenção sobre
si. Mas os implacáveis olhos verdes procuraram seu rosto pálido.
— Parece deprimida, Alannah. Não gostaria de dar um passeio comigo? Tenho que
visitar alguns amigos.
— Excelente ideia! — Exclamou Rose. — Queridinha, vá com Nick. Se não for, vai
chorar o resto do dia.
Alannah levantou o olhar. Estava sendo vagarosa e inexoravelmente manipulada. E
o instinto lhe dizia que não adiantava procurar a mãe em busca de ajuda.
— Está bem. — Concordou, sem interesse.
Os amigos de Nicholas eram agradáveis e tinham uma fazenda de carneiros na
terra acidentada da península de Bank.
Em outras circunstâncias, Alannah teria apreciado sua companhia. Eles
evidentemente gostavam de Nicholas Challoner, embora, por alguma razão, o temessem.
Quando ele a apresentou, ambos reconheceram seu nome, mas não fizeram qualquer
comentário.
Ficaram lá cerca de duas horas. Depois, Nicholas levou-a diretamente para casa e
entrou com ela.
— Rose não está. — Informou Alannah, seca.
— Eu sei. Ela disse que ia a um desfile de moda. Não se interessa por moda,
Alannah?
— Não hoje.
— Prefere chorar por causa do namoradinho?
Ela mordeu o lábio e seguiu na frente, até a sala de estar.
— Não quer se sentar? Posso lhe dar alguma coisa para beber?
— É muito cedo, depois daquele incrível chá que acabamos de tomar. — Esperou
que ela se sentasse, pegou uma cadeira e sentou-se bem na frente dela.
— O que você quer? — Perguntou, intrigada.
— Você.
Por incrível que parecesse, aquela resposta não a surpreendeu. Enfiou as unhas
nas palmas das mãos.
— Exatamente, como?
— Como minha esposa.
Dessa vez, ela arregalou os olhos e estremeceu.
— Para ficar no lugar da que eu matei?
— Isso mesmo. E também para me dar o filho que você me tirou.
Aquilo não podia estar acontecendo! Talvez, se fingisse que Nicholas não estava
ali ele fosse embora, pensou, e assim se esqueceria do terror que sentia naquele instante.
No aparador sobre a lareira, o relógio marcava os minutos, um som que a fazia
recordar a infância. Era estupidez sentir tanto medo. Ele não podia obrigá-la a casar.
E foi o que lhe disse.
Nicholas demorou algum tempo para responder.
— Mas claro que posso, Alannah. Acha mesmo que eu esperava que
concordasse? Mesmo que eu esperasse, ao ver seu olhar fascinado para David Opie
perceberia a realidade. Mas não acredito em fracassos.
— Foi você que o mandou embora!
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para comprar outra casa, por mais modesta e pequena que seja. Duvido que Rose se
conformasse com a pobreza. Ela sempre foi uma mulher de hábitos caros.
— Muito bem, você tem todas as cartas.
— É claro que sim. — Sorriu, e puxou-a pelos ombros. — Vamos então selar nosso
compromisso?
Quando Rose entrou na sala viu os dois abraçados, a boca de Nicholas cobrindo a
da filha, os braços dele envolvendo-a, completamente submissa. Se percebeu que
Alannah não correspondia ao beijo, fingiu não perceber.
Naquela tarde, algo morreu no íntimo de Alannah, deixando apenas uma pessoa
fria e sem alma.
Depois que Nicholas foi embora, ela seguiu a mãe até a cozinha, para guardar as
compras do supermercado. Com uma calma desesperada, perguntou:
— De quanto é sua dívida com Nicholas?
A reação de Rose foi de indignação:
— Foi um empréstimo perfeitamente legal! Ele foi tão amável quando seu pai
morreu! Não sei o que seria de nós sem ele. Alannah, seu pai tinha perdido quase toda a
fortuna. As coisas para nós tinham ido de mal a pior. Se Nick não me ajudasse, acho que
não teria condições de continuar. Mas foi só um empréstimo. Nick me disse que tudo vai
dar certo e que não preciso me preocupar.
— Quando foi que os negócios de papai começaram a ir mal?
Rose abaixou-se para guardar as batatas.
— Há alguns anos. Isso não interessa agora. Confio inteiramente em Nick. É um
homem muito rico, você sabe. Num artigo que saiu há algumas semanas no jornal, diziam
que tem a cabeça de um gênio financeiro.
E o coração de pedra. Mas Alannah não disse isso. Rose estava determinada a
não ver o estado real de suas finanças, e a moça sentiu que não tinha forças para obrigar
a mãe a enfrentar os fatos. Isso traria uma tensão intolerável entre ambas. Linda e tola
Rose como Nicholas Challoner dissera. Talvez ele tivesse razão quanto a isso, mas não
queria prejudicar a mãe.
— Ele é um homem incrivelmente bonito, não acha? — Comentou Rose. — E que
magnetismo!
— Ele quer casar comigo.
— Eu sei. Tão romântico! Ele me contou que nunca se esqueceu de você, embora
só a tivesse visto por dez ou quinze minutos.
Então, era assim que ela estava decidida a encarar tudo? Bem, Rose sempre havia
sido uma romântica. Uma visão tão cor-de-rosa da situação combinava com seu
temperamento.
A mãe esperou por uma resposta e quando não veio nenhuma, perguntou, com
ansiedade na voz:
— O que vai fazer?
A nova Alannah, que agora se sentia tão velha,enquanto a mãe parecia tão infantil,
respondeu, com calma:
— Vou casar com ele, acho.
— Sei que não se arrependerá. — Alannah percebeu, por seu tom, que estivera
preocupada. — Ele é um perfeito cavalheiro, e esse é o tipo de casamento que sempre
sonhei para você. Nick tomará conta de você por toda a vida e nunca precisará se
preocupar com dinheiro. Foi ele quem pagou sua escola na Suíça, sabe?
Alannah não se surpreendeu. Pelo que ficara sabendo naquele dia, Nicholas
Challoner havia tecido uma teia em volta da família Finderne durante anos, desde a morte
da esposa.
— E imagino que ele também vai se responsabilizar pelas despesas de Tina na
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faculdade de Medicina.
— Bem... sim. Ele ofereceu, e Tina ficaria tremendamente infeliz, se perdesse essa
chance.
Alannah mordeu o lábio. Por um perigoso instante, sentiu que estava perdendo a
calma, revelando a Alannah secreta, que existia sob a máscara de serenidade. Suas
mãos tremiam. Lutou contra a vontade de gritar sua revolta e seu medo, de pedir à mãe
que a protegesse contra um futuro tão vazio. Mas não havia nada que pudesse fazer, que
alguém pudesse fazer. Nicholas Challoner a encurralara, e a única maneira de manter a
dignidade era erguer a cabeça e não permitir que ela visse como sua derrota era
vergonhosa.
Mas foi Tina quem pôs o dedo na ferida. Quando contou as novidades, a irmã
permaneceu calada, a perplexidade controlada, mas à noite seguiu Alannah até o quarto
e perguntou, sem rodeios:
— E David?
— David, o quê?
— Não se faça de boba! David está pensando que você vai casar com ele.
Sentada diante da penteadeira, Alannah fingiu se olhar no espelho.
— Ele não me disse nem uma palavra. Não há nenhum compromisso entre nós.
— Não havia necessidade de dizer nada. — Insistiu Tina, com impaciência. —
Você está apaixonada por ele... e ele por você. E não tente me enganar, vi os dois juntos
na festa, É por causa do dinheiro, Alannah?
— Não.
Mas Tina não acreditou.
— Tem que ser. Você mal conhece o sr. Challoner. Ally, não preciso ir para a
faculdade de Medicina, você sabe.
Doía ter que mentir para a irmã, ver o olhar claro e límpido se tornar sombrio, até
mesmo desdenhoso, ao tentar convencê-la de que Nicholas Challoner era tudo que ela
queria.
— Se não é por causa do dinheiro para nós, é dinheiro para você. Ele é
tremendamente rico, não é?
— Acho que sim.
— E David? O que vai dizer a ele?
— Escreverei amanhã, contando.
— Vai ficar arrasado.
— Não. Ele está tão feliz com sua chance de trabalho e pesquisa, que vai superar
o choque bem depressa.
Talvez Tina tivesse sido enganada por seu sorriso forçado. Franziu a testa e ficou
em silêncio durante alguns minutos, pensando. Mas logo protestou nervosa.
— Ally, ele a ama. Sempre amou! No ano passado, não saiu com ninguém e
costumava... bem, eu sabia que vocês não podiam escrever um ao outro, e assim eu lia
as suas cartas para ele, e David uma vez me disse que vivia para aqueles momentos.
Ally...
— Está tão preocupada com ele, que parece até que está apaixonada! — Disse,
Alannah, exasperada.
Corando, Tina enfrentou o olhar da irmã e respondeu com simplicidade:
— Eu o amo desde menina. Mas isso não importa. Não case com Nicholas
Challoner, só porque ele é rico! Ele me assusta. É tão frio! Mesmo quando sorri, os olhos
continuam duros e amargos.
— Não se preocupe comigo, Tina. Por que não se preocupa com David? Eu o
deixo para você, com meus melhores votos. Nada melhor do que conservar essas coisas
em família, não é? — Virou-se de costas para que a irmã não percebesse seu desespero.
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Capítulo 3
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sabe.
— É o que quer que eu vista? Parece que minha mãe comprou um ou dois. Se
precisa disso para se excitar, tudo bem.
Se pretendia irritá-lo, não conseguiu. Ao contrário, ele sorriu.
— Não, minha doce esposa, não preciso disso para me excitar. Olhar para você já
me basta. Mas me agradaria, se usasse uma roupa que combinasse com a ocasião.
Lutando contra a náusea que lhe virava o estômago, Alannah voltou à mala e, com
dedos trêmulos, guardou outra vez o vestido verde de lã que escolhera. Depois de uma
rápida procura, encontrou o provocante conjunto de camisola e penhoar que a mãe lhe
comprara, todo em rendas, de um branco virginal. Nicholas não tinha se movido, mas ela
sentia seu olhar duro como aço.
“Oh, David!” Seu coração chamava. Mas foi com a cabeça erguida que foi até a
porta e entrou no banheiro. Para sua surpresa. Nicholas deixou-a tomar o banho em paz.
Receava que ele a seguisse e aumentasse sua humilhação, obrigando-a a se despir e
tomar o banho na frente dele.
O calor da água afastou um pouco o cansaço da viagem, mas nada, nem mesmo o
perfume suave do sabonete caro, ou a enorme toalha felpuda, ou o luxo oriental daquele
banheiro, podia diminuir a dor em seu coração e o medo que tomava seu rosto branco
como mármore. Depois de ter escovado os dentes, passou um brilho nos lábios
ressecados e, envolta em seda e rendas, voltou ao quarto.
Nicholas estava de pé, ao lado da janela, olhando a noite lá fora. Quando
pressentiu sua chegada, virou-se e olhou-a com insolência.
— Agora vou eu tomar uma ducha. Seu quarto de vestir fica naquela porta ao lado.
Alannah pendurou os vestidos e guardou as sofisticadas e luxuosas roupas de
baixo que Rose havia comprado. Não se espantaria se ainda encontrasse as roupas de
Claire por ali, mas não havia nenhum sinal da outra.
Enquanto arrumava suas coisas, seu olhar foi atraído pela imagem que o espelho
refletia, no outro lado do quarto. “Não tão bonita como Tina." Ele dissera, e tinha razão.
Seus olhos eram grandes demais e os traços, nada regulares. Realmente, o que mais
impressionava nela eram os cabelos e o contraste com os olhos intensamente azuis e a
pele muito branca.
"Preciso cortar os cabelos." Pensou, desgostosa. David gostava deles assim
compridos e soltos, adorava passar os dedos pelos fios sedosos, mas agora isso não
tinha mais importância, não havia mais razão para satisfazer os gostos de David. Agora
pertencia a Nicholas Challoner, como uma mercadoria. Seria melhor pensar em David
como se ele tivesse morrido.
A mão, onde uma aliança grossa de ouro brilhava como uma algema, refletiu no
espelho, e o rosto que a olhava mostrava uma dor intolerável. Pouco a pouco, usando
toda a força de vontade, ela transformou a angústia numa máscara inexpressiva e
controlada.
Voltou ao quarto, onde seu marido já estava, todo vestido de preto. Será que ele
escolhera de propósito a cor do luto e do terror? Era muito provável, da mesma maneira
como a estava humilhando, obrigando-a a usar roupas que revelavam sutilmente os
contornos do corpo jovem e desejável.
Quando entrou no quarto, ele a olhou outra vez com intensidade, submetendo-a a
um insultante exame.
— É eficiente também. — Comentou, pegando a mala vazia e jogando aos pés da
cama. Depois, com suavidade: — Vem cá.
A náusea voltou, mas ela obedeceu, ficando imóvel, quando ele segurou seu rosto.
— As coisas não precisam ser assim. — Disse Nicholas, inesperadamente.
Alannah sentiu a revolta substituir a náusea. Como ele ousava pensar que... que
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havia algum jeito de ela esquecer que estava casada com um bárbaro?
— Precisam, sim! — Respondeu, com altivez. — Oh, não tenha medo, não vou
reagir, não vou gritar, não vou fazer nenhuma bobagem. Você está pagando por mim, e
sei como o preço é alto. Serei sua esposa submissa. Mas é tudo que serei.
Ergueu os olhos para ele, revelando seu ódio, mas Nick deu um sorriso diabólico e
disse, rouco:
— Então, que seja assim, minha beleza. Vamos descobrir se seu preço foi alto
demais! — E puxou-a para si.
Um raio de luar entrava no quarto, chegando até a mesinha ao lado da cama,
clareando o vaso com belas rosas que alguém havia colocado ali, ao lado do relógio de
esmalte rosa e branco, uma verdadeira obra de arte. O olhar desesperado de Alannah
pousou no mostrador, e viu que já eram duas da manhã.
Ela não conseguiu dormir, atormentada por pensamentos dolorosos. Ouvia uma
coruja piando ao longe, contou cada segundo daquela noite, enquanto Nicholas
ressonava a seu lado, calmamente. Alannah sentia o estômago virado.
Finalmente, impelida pela náusea, esgueirou-se cuidadosamente da cama. Só deu
tempo para chegar ao banheiro.
Depois de voltar, ela se apoiou na parede, muito fraca, até a respiração voltar ao
normal. Depois, escovou os dentes e lavou o rosto. Estava completamente nua e teve a
impressão de sentir o cheiro dele, grudado na pele. Agitada, fechou a porta e entrou no
chuveiro.
Enquanto ensaboava o corpo violado, pensou: "Bem, o pior já passou. Nunca mais
será tão ruim como foi. Quem sabe, eu já estou grávida e não vai haver necessidade
disso novamente".
O que aconteceu com ela não podia ser chamado de "'fazer amor". Estremeceu,
quando lhe voltaram à memória os longos minutos passados nos braços dele. Mas o
orgulho a fez endireitar os ombros e erguer, a cabeça. Nicholas a possuíra interessado
apenas no desejo que sentia, usando com habilidade a arte da sedução, na qual era
mestre. Ela havia esperado violência e ficou surpresa quando isso não aconteceu. Era
como se ele não tivesse tido coragem de violentá-la, como se sentisse necessidade de
usar toda a experiência para arrancar uma resposta de seu corpo indiferente.
Como tinha prometido, Alannah não resistiu, mas sua passividade desdenhosa o
enfureceu, a ponto de ele murmurar em seu ouvido:
— Até agora, você foi cara demais. Vamos ver se afinal valeu à pena.
Permitiu que ele fizesse o que queria, não reagindo quando tocou suas partes mais
íntimas. Ficou deitada, imóvel, os olhos fechadas para não vê-lo, tentando dissociar sua
alma do que estava acontecendo com ela. Reprimiu complelamente a lembrança de
David. Mas, enojada com a própria traição, aos poucos foi percebendo que as suaves e
apaixonadas carícias do marido estavam produzindo nela uma resposta insidiosa. Mas só
uma resposta física.
Mesmo quando a rigidez do corpo diminuiu, ela ainda pensava no quanto o odiava.
Que o calor dos lábios dele sobre seus era muito desagradável, mas sabia que estava
mentindo. Enquanto sentia aquela reação diabólica dentro dela, sua mente continuava
lúcida. Desesperada, foi forçada a reconhecer além do ódio, instintos mais profundos e
mais fortes a assaltavam sem defesa, e, embora recusasse a ele o seu coração e sua
mente Nicholas já tinha o domínio de seu corpo traidor.
Ele também sabia. Era fácil para ele perceber a reação física que suas mãos e
seus beijos provocavam.
Alannah esperava um gesto de triunfo, mas Nicholas continuou
surpreendentemente delicado.
A novidade inesperada de todas aquelas carícias a assustou. Ficou tensa, quando
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ele procurou seus lábios. Tentou afastar-se mas ele não a deixou fugir, obrigando-a a
suportar, enquanto explorava a maciez morna de sua boca jovem e perfumada.
Ela devia sentir-se enojada pela intimidade daquelas carícias, mas seus seios
começaram a enrijecer-se, quando as mãos dele desceram até as coxas, uma louca
excitação dominou-a. Finalmente, estava pronta: o corpo traiçoeiro tinha respondido à sua
vibrante virilidade. Tudo que pôde fazer foi não gemer de desejo, tornando mais
humilhante sua rendição.
Procurou ficar imóvel, não revelando o que seu corpo implorava, um desejo que
não tinha forças para sufocar.
— Relaxe. — Pediu ele, baixinho, mas ela cada vez ficava mais tensa.
O ardor do corpo transformou-se em gelo, quando ele a tomou com ferocidade,
aumentando nela o sentimento de traição e causando uma dor insuportável.
Nicholas finalmente teve o orgasmo e caiu sobre ela respirando convulsivamente.
Depois de um instante, ele se recuperou e rolou para o lado, dizendo, sem notar seu rosto
molhado de lágrimas:
— Não vai doer da próxima vez.
— Eu sei.
Nicholas pôs a mão em seu ombro e ela estremeceu. Irritado, ele disse um
palavrão baixinho e falou com frio desdém:
— Pode dormir agora. Não quero mais você esta noite.
Mas foi ele quem dormiu, e ela permaneceu acordada durante horas, odiando-se
pela traição involuntária de seu corpo. Estava tão segura de si! Como podia adivinhar que
não seria capaz de ficar indiferente quando ele a tocasse? Será que era do tipo de mulher
que podia dormir com qualquer um? Ou Nicholas teria percebido que existia uma atração
latente entre ambos, e por isso resolvera possuí-la?
Não, impossível! Na primeira vez em que se encontraram, ele ainda estava
chorando a morte da pobre Claire. E, se suas suspeitas fossem corretas, fora
imediatamente após aquele desastrado encontro que Nicholas resolvera arruinar seu pai
e destruir a vida dela. Portanto, era evidente que não se importava com seus sentimentos.
Revigorada pelo banho, afastou aqueles pensamentos. Precisava dormir um
pouco; senão, ficaria inútil no dia seguinte. E não gostava de pensar que Nicholas sorriria
ao ver suas olheiras.
Movendo-se com dificuldade, pois sentia o corpo inteiro dolorido, vestiu novamente
a camisola e apagou a luz.
"Oh, meu Deus, faça com que eu fique grávida!"
De volta à cama, gelou quando ele se virou, murmurou alguma coisa, e passou um
braço por cima dela, puxando-a para si. Ficou apavorada, esperando que o marido
acordasse e começasse tudo de novo. Mas a respiração dele se regularizou, e ela se
acalmou.
Era evidente que estava acostumado a dormir sempre com uma mulher ao lado.
Por maior que fosse seu sofrimento pela perda da esposa, não havia se privado de sexo.
Como seria bom se já tivesse alguma amante, e assim a deixasse em paz!
Quando acordou, Alannah estava sozinha na imensa cama. Ficou olhando a
fazenda branca e rosa, até se lembrar do que acontecera.
Sentiu o sangue lhe subir ao rosto. Felizmente, Nicholas não estava ali. Passava
das nove horas, e alguém tinha aberto as pesadas cortinas, revelando uma enorme porta
de vidro, aberta para o campo.
Sentou-se e procurou sinais da noite passada no corpo. Encontrou algumas
marcas, que com certeza se transformariam em manchas roxas. Marcas que lhe
trouxeram lembranças penosas. Para afastá-las, Atannah pulou da cama, lavou-se e
vestiu jeans velhos e uma camiseta.
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Atraída pelo brilho do sol lá fora, foi até a porta de vidro, que dava para um
terracinho com chão de cerâmica. Embora fosse encantador, com suas trepadeiras
floridas, foi a vista que arrancou dela uma exclamação maravilhada.
Nicholas tinha construído Puhinui perto do mar. Olhando melhor, percebeu que, na
realidade, a água que brilhava ao sol era de um enorme estuário. Localizada no alto, em
uma das extremidades da baía, de um dos lados a casa dominava uma faixa de areia
rosada e, do outro lado, montes verdes e íngremes, onde carneiros pastavam.
Naquele braço de mar havia outras praias e algumas casas. Uma lancha estava
atracada no cais.
— Parece que acordou de bom humor. — Comentou Nicholas, destruindo o
encantamento que ela sentia. Alannah sentiu o sangue gelar e, virando-se, viu que ele
trazia a bandeja de café.
— É muito bonito. — Respondeu, imediatamente pálida e reservada.
— É. — Colocou a bandeja numa mesinha no terraço, sob um enorme guarda-sol.
Depois, puxou uma cadeirinha de ferro batido, com uma almofada estampada de azul e
branco. — Venha tomar seu café.
O apetite de Alannah tinha desaparecido com a chegada dele.
— Não estou com fome.
— Alannah!
Submissa, ela obedeceu.
Foi difícil engolir o copo de suco, mas afinal conseguiu.
— Café? — Quando ela sacudiu a cabeça, ele pediu: — Quer, por favor, me servir
uma xícara?
Ao lhe entregar o café, Nicholas segurou sua mão. Uma revolta feroz dominou
Alannah. Foi preciso todo seu autocontrole para não puxar a mão e enfiar as unhas
naquele rosto moreno e orgulhoso e marcá-lo com seu ódio.
Nicholas sentiu sua tensão e disse, sombrio:
— Muito bem. Então, me odeia. Não esperava que fosse diferente. Mas você
poderia ter uma vida até bem agradável, se quisesse.
— Com você aqui?
Os dedos longos apertaram os dela, dolorosamente, mas logo os soltaram.
— Sim, comigo aqui. — Respondeu, recostando-se na cadeira, um sorriso irônico
nos lábios sensuais. — Está acostumada a gastar muito dinheiro, e comigo, nunca terá
este problema. É evidente que gosta do lugar. Se der uma chance a si mesma, dentro de
algum tempo perceberá que gosta de mim. Não imediatamente, mas estou disposto a
esperar algumas semanas. Mas a noite passada provou duas coisas: a primeira, que
ainda era virgem; a outra, que não é indiferente a mim.
— Já me disseram muitas vezes que atração física não tem nada a ver com amor
ou respeito. Agora sei que é verdade. Ontem, você teve tudo que conseguirá de mim:
nada que qualquer outro homem experiente não conseguiria.
— Como o seu namoradinho?
Ela encolheu os ombros, embora seu coração tivesse sentido o golpe.
— Como sabe, eu ainda era virgem. David e eu estávamos preparados para
esperar.
— Felizmente para você. Então, está resolvida a continuar resistindo?
— Ontem à noite eu lhe disse o que pretendo fazer. Não vejo por que tornar as
coisas mais fáceis para você.
Ele a olhou com aqueles olhos verdes e frios, observando os traços delicados.
— Engana-se, se pensa que isso me abala. Sua indiferença é um desafio. Terei
imenso prazer ao tocar seu corpo, sabendo que me odeia e que, no entanto, adora que eu
a toque.
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Capítulo 4
Quando tudo terminou, Alannah ficou ofegante, os olhos fechados, sentindo ódio.
Tinha lido em algum lugar que a maior parte do prazer do sexo estava na cabeça;
portanto, enquanto o odiasse, ele não arrancaria dela a entrega definitiva. Nichotas
destruíra seu sonho de amor, roubara sua virgindade, possuíra totalmente seu corpo,
mas, enquanto o odiasse, isso seria tudo o que conseguiria. Nunca a ouviria gemendo de
prazer, nunca gozaria o triunfo de levá-la ao êxtase em seus braços, todas as defesas
vencidas, sua rendição total. E se o preço que ela precisava pagar era a frustração, como
a que sentia naquele instante... bem, ela o pagaria, contente.
— Olhe para mim. — Ordenou o marido. Quando ela abriu os olhos, ele estava
sorrindo. — Mas que mulherzinha teimosa. — Murmurou, beijando os seios redondos e
palpitantes.
Exausta, Alannah ficou calada, observando a cabeça morena com irritação. Não,
outra vez! Ele não ia conseguir, pensou.
Mas aparentemente ele só pretendia atormentá-la, pois logo se afastou um pouco.
— Estou cansado.
Pouco depois dormia profundamente, a cabeça apoiada no peito da esposa, o
corpo nu colado ao dela num total abandono.
Alannah não sabia quanto tempo ficou ali, olhando interessada o contraste de sua
pele muito branca com a dele, bronzeada. Devia ter cochilado, pois de repente acordou
com frio. Nicholas tinha levantado e se vestia.
Os olhos verdes percorriam demoradamente seus seios, os quadris, as coxas.
Irritada com aquela atitude de posse, ela se cobriu com o lençol.
— Levante. — Quando ela resistiu, sacudindo teimosamente a cabeça, ele chegou
perto. — Já é mais de meio-dia e um bom passeio a pé só vai lhe fazer bem.
— Não quero sair.
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Ele então beijou-a na boca, forçando-a a entreabrir os lábios. Depois, segurou seu
rosto, os olhos nos dela, numa luta de vontades.
Alannah baixou o olhar primeiro.
— Sim. — Disse ele, como se lesse seus pensamentos. — Faça como eu quero, e
vamos nos dar bem.
— Duvido! — Estava louca de raiva e não conseguiu fingir calma.
O rosto dele revelava uma ironia enlouquecedora, enquanto um sorriso de
zombaria o iluminava.
— Quer apostar? Dentro de cinco anos você vai lamentar tanto desperdício de
emoção.
— Acredita mesmo nisso? Se acredita, é porque não me conhece. Ou, além de
outros defeitos lamentáveis, é também convencido?
Preparada para aguentar uma reação violenta, Alannah se surpreendeu quando
Nick deu uma gargalhada.
— Vai se divertir tentando descobrir. Ande, vista-se logo. Ou prefere que eu me
deite outra vez?
A pressa com que ela saltou da cama foi quase insultante, mas ele riu irônico.
Pelo menos, deixou-a sozinha enquanto ela se arrumava, bem devagar. Ele que
esperasse!
Alannah parou na soleira da porta, observando o marido. Era na verdade um belo
homem, pensou, sem emoção. Com o sol batendo nos cabelos negros, a cabeça um
pouco inclinada, parecia completamente absorto na leitura de um livro.
"Esse homem sabe tudo o que é possível saber sobre mim... sobre meu corpo."
Era uma estranha sensação. Aqueles dedos longos que viravam as páginas
haviam tocado sua pele, como se ela o fascinasse, como se a amasse, experimentando o
êxtase da posse, usando-a para gerar os filhos que desejava.
Lembrou-se então da mulher que um dia havia compartilhado a cama dele, a
mulher que ela descuidadamente matara. Será que ele fingia estar com Claire, quando a
possuía?
Aquele pensamento a revoltou. Já era bastante assustador ter que se sujeitar à
luxúria daquele homem, mas ser usada como uma substituta, saber que enquanto ele a
possuía era o rosto de Claire que via, deixava-a enojada.
Entretanto, por que se importar com isso? Desprezaria Nicholas até morrer, nada
que ele fizesse apagaria a humilhação que a obrigara a passar. Entretanto, foi com algo
semelhante a alívio que se lembrou de que, enquanto a possuía, seus dedos haviam
mergulhado nos cabelos dela como se o agradassem, murmurava seu nome e elogiava
seu corpo e seu rosto. E, fisicamente, ela e sua falecida mulher não se pareciam em
nada. Claire fora alta e loura, os traços miúdos e regulares. Depois do acidente, tinha
visto várias fotos dela nos jornais e revistas, e aqueles traços clássicos tinham ficado
gravados para sempre em sua mente atormentada.
— Pronta? — Perguntou Nicholas, erguendo o olhar. Uma escada descia do
terraço, ladeada por enormes samambaias, e dava num extenso gramado. Foram na
direção da praia por um caminho estreito, e Alannah gostou que Nicholas não tentasse
segurá-la, seguindo na frente.
A praia era uma pequena extensão de areia rosada cercada de enormes árvores,
e, além delas, um meio círculo de terras planas se elevava abruptamente em montes
verdejantes. A água cintilava ao sol e havia um silêncio tão grande, que escutavam o
ruído de uma serra, a quilômetros dali. Acostumada a altura dos Alpes do Sul, aqueles
montes não impressionavam Alannah, mas eram igualmente belos.
Aos poucos, foi ficando mais alegre. Em Christchurch, o verão tinha acabado e já
estava frio, mas ali ainda fazia bastante calor para nadar. No entanto, logo desistiu da
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ideia, encantada com a linda paisagem. Pelo estuário, via o mar ao longe, coalhado de
velas brancas.
— Está olhando para o golfo de Hauraki. — Explicou o marido. — Durante os
feriados parece que cada habitante de Auckland sai de barco.
— Você tem um?
— Não. Gosto muito de velejar, mas tenho tão pouco tempo que não vale a pena
comprar um. Mas pretendo trabalhar cada vez menos. E, quando tiver uma família,
pretendo dar mais atenção a ela e ficar mais tempo em casa.
Pegou a mão dela e beijou os dedos, com um sorriso malicioso.
Passearam em silêncio pela praia, ele acertando seus passos aos dela, enquanto
olhava sua propriedade com evidente prazer.
Está muito consciente deste homem, pensou Alannah, rebelde. Ignore-o. Ele
também a está ignorando. Aproveite essa praia, esse cenário maravilhoso, o ar com um
pouco de maresia, o grito longínquo das gaivotas...
Abaixou-se, tirou as sandálias, e saiu correndo para a água, o instinto fazendo com
que se afastasse dele. A água estava agradável, mas um ruído repentino a fez
estremecer.
— Um peixe. — Disse ele lacônico. — Muitos costumam saltar assim.
— Ah... — E mudando de assunto: — Quem toma conta da casa?
— Ellen Thurkettle. Ela cuida de tudo. Mora numa casa atrás da nossa. O
administrador da fazenda mora num chalé perto da estrada. Fica naquela direção. —
Apontou para um ponto onde o caminho se elevava em direção ao topo. — Ellen não é
difícil de se lidar, mas tem dignidade.
— Uma coisa que seu patrão não tem.
Ele sorriu, mas a voz era fria.
— Você fez uma escolha. Do que se queixa?
— Uma escolha impossível! Sabia perfeitamente que eu tinha que concordar com a
sua proposta.
— Se bem me lembro, foi uma proposta, não uma imposição.
— Eu teria preferido uma imposição. Você usou seu poder para controlar meu pai.
E, quando ele morreu, convenceu minha mãe a confiar em você e fez com que ela ficasse
ainda mais cheia de dívidas. Você roubou... e pretende continuar roubando. Roubou a
minha virgindade e pretende roubar o meu corpo, obrigando-me a gerar seu filho. Você
roubou a minha vida! Mas não vai conseguir roubar meu coração, ou minha mente. Esses,
guardarei bem guardados! E não há nada que possa fazer!
— Não me importo. Pensa mesmo que me interesso por seu coração... ou sua
mente? Esses só me interessam na medida em que não a impeçam de ser uma boa mãe.
E quanto ao seu coração... — Pousou de leve a mão no seio dela. — A única coisa que
me interessa quanto ao seu coração é que ele dispara cada vez que encosto a mão em
você.
— É medo.
— Bobagem. Seu orgulho não a deixa confessar que tem atração por mim. Ah,
finge muito bem, resignada e impassível, mas não preciso me esforçar muito para excitar
você. Seu corpo mostra o que sente. Acha mesmo que seria tão pouco dolorido ontem à
noite, ou hoje de manhã, se não estivesse pronta para mim? Você...
Agarrou o pulso dela bem a tempo e segurou-a com força durante longos e
desesperantes minutos, a poucos centímetros de seu rosto. Depois, inclinou a cabeça e
deu uma leve mordida um pouco abaixo da palma. Alannah estremeceu e ele deu um
sorriso de vitória.
— Está vendo? Não pode negar, benzinho.
— Odeio você!
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uma quadra de tênis, escondida atrás de uma trepadeira de maracujá. Colheu uma das
frutas já bem madura e comeu.
Visitou então o pomar com suas laranjeiras, limoeiros e macieiras; a seguir, a horta,
onde encontrou um homem no meio dos brócolos. Era alto e magro, e olhou espantado
para ela.
— Sou Alannah Challoner. — Disse, estendendo a mão.
— Hugh Thurkettle. Espero que seja feliz.
— Obrigada. Mas que linda horta! É o senhor quem cuida de tudo aqui?
— Sim.
— É um lindo lugar. — Comentou, tentando puxar conversa. Mas tudo que
arrancou dele foram monossílabos. Depois de algum tempo, desanimada, ela voltou para
a casa.
Sentou-se numa espreguiçadeira perto da piscina. Aparentemente, os dois
Thurkettle eram pouco comunicativos, mas conseguira descobrir que a casa tinha sido
decorada por um profissional, e apenas o quarto do casal, por Claire.
Mergulhou a mão na água e se surpreendeu ao descobrir que ela estava aquecida.
Por que não? A mãe lhe havia dito que Nick era muito rico.
— Aquecimento solar. — Explicou uma voz atrás dela, a zombaria deixando-a
imediatamente tensa. — Já esteve na garagem dos barcos?
— Não. — Não aceitando a mão que ele lhe estendia, ficou de pé, mas Nicholas
passou o braço por sua cintura, puxando-a para ele.
— Vamos até lá.
A garagem ficava no sopé do rochedo. Havia duas canoas, um barco a motor e um
escaler, além de material de pescaria e redes.
— É enorme. — Comentou Allanah, sua voz ecoando.
— Foi construída quando os barcos eram guardados em galpões. Podemos dar
uma volta de barco hoje.
— Você não precisa trabalhar?
— Preocupada com minha renda? — Caçoou, e ela ficou tensa. — Não se
preocupe, senhora minha mulher, farei com que nunca lhe falte dinheiro. Mas não vou
perder tudo só porque estou em lua de mel. Tenho gente de confiança, e esta semana
estarei à sua disposição.
— Se estivesse mesmo, eu o afogaria.
Ele riu e chegou perto daquela figurinha altiva e desafiadora, os belos olhos azuis
brilhando friamente, o queixo erguido.
— Você seria a própria viúva alegre, não é? Sinto muito, meu bem, mas não
pretendo morrer tão convenientemente, terá que me aturar ainda por muitos anos.
Para se certificar de que ela havia entendido, ele a beijou, segurando-a com força,
deixando claro quem mandava.
Nos dias seguintes, exploraram a propriedade e fizeram longos passeios na lancha
a motor, por toda a baía, parando em praias; a princípio, a conversa era forçada entre
eles, mas aos poucos tornou-se mais natural.
Os dias não eram tão ruins. Eram as noites que Alannah temia, pois cada vez
ficava mais difícil mentir nos braços dele. Não que sua passividade o aborrecesse. Ele
parecia ter um perverso prazer com sua teimosa resistência, provocando-a com as
pequenas traições de seu corpo, até que chegava ao clímax e por alguns momentos se
entregava à paixão, ficando depois relaxado e saciado.
Nícholas divertia-se com o poder que tinha sobre o corpo dela, mas pelo menos
não a violentava. Apreciava sua pele acetinada, a forma perfeita de seu corpo, seu
perfume, o gosto de sua boca. Enquanto a amava, dizia tudo isso, usando também a voz
grave para aumentar o domínio físico que tinha sobre ela, até que seu corpo começava a
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Bianca 210 — Inferno em teus Braços — Robyn Donald
Capítulo 5
Certa noite, depois do jantar, Alannah sentiu-se estranha. O cheiro forte do café lhe
causou náuseas, e ficou imóvel, olhando para a xícara.
Nicholas estava sentado diante dela, na sala de música, enquanto escutavam
discos. Silenciosamente, ela levou o café até a cozinha e derramou-o na pia. Não queria
que ele descobrisse o que estava acontecendo; não queria lhe dar essa alegria.
Uma semana depois, Alannah saiu do consultório do médico, pequena e pálida,
mas ainda indomável. Hugh a levara até um vilarejo próximo, depois de ter explicado a
ela, muito sem jeito, que não tinha ordens para lhe entregar o carro.
— Não quero que meu marido saiba sobre esse nosso passeio, Hugh. É... uma
espécie de surpresa.
A princípio, ele pareceu em dúvida, mas acabou concordando. Já escurecia
quando voltaram para casa.
Agora, Alannah sabia que dentro dela vivia um ser, que roubaria o alimento de seu
corpo, era essa a causa dos enjoos que vinha sentindo. Aquela criança não era bem-
vinda. Entretanto, ela estava satisfeita. Agora, Nick a deixaria em paz.
O carro dele estava na garagem, mas ele não estava em casa. Não que Alannah o
tivesse procurado. Mal tivera tempo de chegar até o banheiro, nauseada, e ainda estava
sentada na borda da banheira, quando ele chegou.
— Alannah? O que foi?
— Estou grávida. — Respondeu, repentinamente furiosa com ele. Seus sonhos de
gravidez sempre estiveram ligados a David. Queria ferir Nicholas como ele a havia ferido,
pisar em seus sonhos como ele pisara nos dela.
— Estou vendo. — Disse, frio e impassível.
Bem e o que ela esperara? Mesmo assim, ficou ainda mais furiosa.
— E não estou me sentindo bem. Quer me deixar sozinha, por favor?
Ele sorriu e se aproximou.
— Venha, mulherzinha briguenta. Acho que precisa se deitar. Está muito pálida.
A recusa dele em reagir às suas provocações a deixaram em ponto de explodir.
Quando tentou abraçá-la pela cintura, ela o repeliu com violência.
Nicholas ficou lívido; sua raiva era tão evidente que por um instante a própria fúria
de Alannah diminuiu.
— Estou grávida, não escutou? Conseguiu o que queria: portanto, não tenho mais
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Bianca 210 — Inferno em teus Braços — Robyn Donald
que aturar você. Pelo menos, até que você resolva ter outra criança. Minha pele se
arrepia cada vez que encosta em mim. Me deixe em paz! Eu te odeio!
Por um instante terrível, teve medo de ter ido longe demais. Nicholas a olhava com
tal ferocidade que seus dedos, agarrados à, borda da banheira, ficaram lívidos. Mas
conseguiu se controlar e quando falou, havia desprezo em sua voz.
— Gosta de sentir minhas mãos em você, sua hipócrita, e não tente negar. Quando
eu a possuo, seu corpo está pronto para me receber. Espero que o médico não tenha
feito restrições a relações sexuais.
Por um momento, ela teve vontade de mentir, mas não ousou.
— Não.
— Então, possuirei você sempre que tiver vontade. Parece que precisa ser mais
realista Alannah. Por exemplo, começar a reconhecer que gosta de ter relações comigo.
— Seu pretensioso! Pois saiba que só suporto suas mãos em cima de mim porque
fecho os olhos e finjo que é David que está a meu lado. É por isso que...
Ela não viu a mão dele chegando. Na verdade, só alguns instantes depois do
golpe, tomou conhecimento da bofetada que jogou a sua cabeça para trás, violentamente.
Escutou vagamente os xingamentos de Nicholas. Mas logo ele a tomou nos braços,
e a levou para a cama.
— Entre debaixo das cobertas, a não ser que queira sentir minhas mãos em você
enquanto eu a despir.
Alannah ficou de olhos fechados, até escutar a porta bater atrás dele. Então, trocou
de roupa, deitou-se e puxou as cobertas, até o queixo. Evitou deitar sobre a face dolorida
e suspirou de dor e agonia. Um entendimento completo só era possível entre duas
pessoas que se amavam, mas uma inimizade como a que eles partilhavam levava a uma
estranha união. Já ouvira falar de prisioneiros que se apegavam a seus carcereiros. De
certo modo, ela e Níck eram assim.
A reação dele ao seu insulto não a surpreendeu. Sabia da violência que estava
provocando, antes mesmo de acabar de dizer aquelas palavras. Queria magoá-lo e tinha
escolhido a parte mais vulnerável de seu ego.
Suas palavras seriam um veneno para qualquer homem, mesmo um tão viril e
autoconfiante como Nicholas. Poderia até não acreditar nelas; na verdade, ele percebia a
reação dela às suas caricias, mas nunca se esqueceria do que havia dito.
Aos poucos, mergulhou num sono profundo, acordando apenas quando Ellen
entrou empurrando um carrinho de chá.
— Trouxe o jantar. E sua mãe não lhe avisou que, se procurar encrenca, acaba
encontrando?
— Avisou, sim. Será que ninguém disse o mesmo a Nick?
— Não tenho dúvida de que ele está aprendendo. — Comentou Ellen, revelando
piedade no olhar. — Você é uma criaturinha teimosa.
— Acho que sou determinada.
— Sem dúvida. Mas tenha juízo, acabe com esta vingança. O que está feito não
tem remédio. Daqui por diante, evite discussões e aborrecimentos. Dizem que a criança
sente os estados de alma da mãe. Não lhe fará bem se continuar a se comportar como
uma boba.
— Mas é exatamente o que sou. Se Nicholas queria uma esposa que o amasse,
devia ter escolhido outra. — Seus lábios tremiam, quando continuou: — E como ele ousou
contar a você?
Ellen se empertigou, antes de responder:
— Acha que não tenho miolos? Que não entendo as coisas que acontecem diante
do meu nariz? Nick não me contou nada, não foi preciso. Agora coma e se sentirá melhor.
— Não consigo.
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— Consegue, sim. Sei como se sente, acredite. É horrível enquanto dura, mas
passará. Vamos, coma, ou me sentirei ofendida.
— Pensei que não gostava de mim.
— Pensou? — Perguntou a mulher, levantando a tampa da terrina e mostrando
uma canja cheirosa. — Sou muito pouco paciente com as pessoas que têm pena de si
mesmas. Tem que reconhecer que esteve se lamentando desde que chegou aqui.
Era incrível que ela estivesse discutindo seu casamento tão abertamente com
aquela mulher, mas a revolta com o comentário foi mais forte.
— Pena de mim mesma? E daí? Tenho muito boas razões para isso.
— Pode ser. Mas, se tem caráter, vai esquecer tudo agora. O que importa daqui
para a frente é o bebê.
— Odeio esse bebê!
— Se continuar assim, ele é que vai acabar odiando você. Tenho certeza de que
não escolheria uma mãe tão imatura. Se você jogasse bem suas cartas, teria Nick a seus
pés; mas, não! Com essa indignação cega, procura fazer sua vida o mais insuportável
que consegue.
— Nick me detesta tanto quanto eu o detesto.
— Bobagem! Como foi que o bebê entrou aí?
O rosto de Alannah ficou vermelho.
— Sabe muito bem que gostar... ou amar... não tem nada a ver com... com isso.
A mulher deu uma risadinha, ao perceber o embaraço que sua frase causara.
— Pensei que os jovens de hoje conversassem abertamente sobre sexo. Olhe só
para você, corando feito uma colegial! É claro que conheço a vida, mas sei mais do que
simples fatos, e também conheço Nick. E qualquer que seja a razão que ele deu para
seus atos, posso garantir que, se não a desejasse na cama, nunca haveria casamento.
— Devo então me sentir honrada por sua luxúria? — Perguntou Alannah, furiosa
porque Ellen estava ganhando a discussão.
— Muitas mulheres ficam. Afinal, é um cumprimento que um homem a deseje. E
pode ser a base de tudo. — Olhou com simpatia para a moça frágil e pálida. — Nick não
comenta comigo ou com qualquer outra pessoa sobre sua vida, e não sou tão teimosa
que não possa mudar minha opinião sobre as pessoas.
Alannah levantou o olhar atormentado para ela.
— Quanto tempo a gente leva para se recuperar de uma morte?
— Um ano.
— Bem, então, ainda tenho que esperar dez meses. Nick matou todos os meus
sonhos, todas as minhas esperanças, quando me forçou a casar com ele. Mas não tenho
nada contra você.
— Bondade sua. Mas não é comigo que vai viver.
— Ele provocou tudo isso.
— E vai fazer com que pague? — Perguntou Ellen, sem acreditar. — Pensa
realmente que pode vencer? Pois, minha cara, já vi Nick quebrar muita gente antes. Ele é
ainda mais duro do que parece. É melhor ser sensata.
— E permitir que ele me domine?
— Parece que ele já conseguiu isso.
— Sim. — Reconheceu, levantando o olhar para a mulher.
— Não espere que, por causa do seu estado, ele vá fazer concessões. — Notando
as marcas de dedos no rosto, acrescentou: — Parece que você já descobriu, não é?
— Já.
Ellen ficou parada ao lado dela durante alguns instantes e depois foi embora, sem
dizer nada. Alannah tomou um pouco da sopa e deitou-se, muito quieta. Logo adormeceu.
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Capítulo 6
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decoração, e não cedeu quando o decorador que Nicholas escolheu tentou modernizar
demais o quarto.
— Qualquer outra coisa vai destoar da casa. — Comentou ele, olhando com
desdém para a decoração de Claire.
Alannah suspirou. Agora fazia uma ideia de como a outra se sentira. O decorador
era um homem de meia-idade e falava com evidente autoridade, mas a esposa de
Nicholas Challoner tinha bastante personalidade para enfrentar qualquer um. A custa de
muita conversa, os dois chegaram a um resultado espetacular.
Enquanto o quarto estava sendo redecorado, Nicholas dormia separado de
Alannah, quando vinha para casa. E se ela se sentia sozinha, não confessava nem a si
mesma.
Quando tudo ficou pronto, ele voltou, mas fez um comentário casual, depois de
olhar rapidamente em torno. Alannah sentiu como se a tivessem mergulhado em água
gelada. Mas reagiu, pensando que pelo menos ela estava satisfeita com as paredes
pintadas de verde-jade, os jarrões chineses, a colcha pesada de cetim estampado, com o
mesmo fundo verde e desenho oriental, mais o fofo tapete branco.
Num canto, uma escrivaninha laqueada em vermelho brilhava como uma joia rara
naquele conjunto luxuoso. Quando escolheu aquela peça, assustou-se com o preço, mas
o decorador insistiu:
— O sr. Challoner me deu instruções para comprar tudo que a senhora escolhesse,
não importando o preço.
E assim tinha sido feito. Agora, admirando os belos móveis, ela franziu a testa. O
marido era um verdadeiro enigma para ela, generoso, apesar de não lhe dar dinheiro para
seus gastos pessoais; respeitoso, embora a desprezasse; distante e frio, embora a
tivesse escolhido como esposa, para ser a mãe de seus filhos.
Enquanto Nicholas tomava uma ducha, ela foi até a porta que dava para o terraço.
Já era inverno, mas algumas flores desabrochavam entre as pedras que
pavimentavam os caminhos do jardim. Verônicas escarlates, margaridinhas silvestres,
tomilhos com seus cones vermelhos esperando pelas abelhas. Mais além, os hibiscos
floresciam, as flores menores do que no verão, mas as cores mais vívidas.
Alannah tinha também substituído a mobília de ferro batido do terraço por uma
mais confortável, de madeira natural, com almofadões estampados de verde e bege, e,
em vez do guarda-sol, mandara construir uma pérgula. Mas ainda não havia decidido que
trepadeira plantaria para proteger do sol de verão.
Apalpou a cintura. No verão, o bebê já teria nascido, para ser carregado em seus
braços, perto do coração. Quando disse a Ellen que odiava a criança, era sincera: mas,
na véspera, quando o bebê se mexeu pela primeira vez, ela começou a senti-lo não como
o filho que Nick tão brutalmente havia gerado dentro dela, mas como uma criatura
indefesa.
Imediatamente, uma onda de ternura a invadiu, mesclada por um sentimento de
proteção. Agora, as mãos no ventre, pensou aflita: "Meu Deus, mas que confusão é tudo
isso!"
— Não está se sentindo bem? — A pergunta fez o sonho sumir, e ela se voltou
para Nicholas.
— Nunca me sinto bem. — Respondeu altiva.
— É, estou vendo. Quanto tempo mais isso vai durar?
— O Dr. Stewart é muito evasivo. Tudo que ele diz é que não é provável que dure
todos os nove meses.
— Deus! Espero que não!
Olhou para ele cheia de ressentimento.
— Por quê Nick? Sei que não é dor de consciência.
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Mas isso seria a rendição final, a sujeição vergonhosa a seu machismo feroz. Se
Nicholas descobrisse que tinha o poder de seduzi-la, poderia fazê-la perder todas as
inibições e acabaria esmagando toda a sua dignidade, transformando-a numa criatura
submissa, e tornando assim sua vitória total e completa.
— Não posso! — Murmurou, quando ele colocou a mão sob a renda da calcinha.
— Está querendo dizer que não quer.
Alannah estava cada vez mais fraca. Tinha esquecido como ele podia ser
irresistível, era tão mais fácil lutar quando a tratava com brutalidade e desprezo! Mas,
dessa vez, estava surpreendentemente terno, despindo-a com carinho, envolvendo-a
numa teia de fascínio, beijando cada pedacinho de pele que ia ficando exposto,
murmurando como a achava linda, como vivia atormentado de desejo por ela. a voz grave
e modulada envolvendo-a, dominando-a.
"Por favor, me maltrate." ela implorava em silêncio. "Só consigo resistir quando
você me fere! Sei que quer acabar comigo, me afogar em sua ternura, me matar de
desejo! Me fazer sua escrava!”
Enquanto Nicholas a acariciava, era incapaz de pensar muito claramente, todo o
seu ser estava dominado pelo desejo de ser possuída. Com os olhos fechados, porque se
os abrisse ele veria o quanto estava enfeitiçada, ela se conteve, não colando o corpo ao
dele, para tentar apagar aquele fogo que a queimava por dentro.
Nicholas deu um grito abafado, chamando por ela, a boca úmida e quente sobre o
seio. Sem pensar no que fazia, Alannah começou a se mover sob ele, guiada pelo
instinto, sabendo como excitá-lo até a loucura.
Ele pôs as mãos por baixo dos quadris dela. Alannah abriu os olhos, assustada, e
viu refletidos no rosto dele a mesma agonia e o mesmo desejo que sentia. E, pela
primeira vez, foi dominada por uma sensação de prazer tão intensa, que poderia morrer
naquele instante.
Foram as batidas fortes de seu coração que a trouxeram novamente à realidade.
Devagar, muito devagar, o prazer começou a se transformar em melancolia, profunda e
sombria. Agora sabia! Milhões de palavras tinham sido escritas, numa tentativa de
descrever aquela sensação, mas era uma coisa indescritível, a experiência mais
perturbadora de toda a sua vida. Mas a tristeza que vinha depois, isso ela não sabia que
existia.
Sempre intuíra que Nicholas tinha o poder de vencê-la. Talvez por isso tinha
sentido tanta aversão por ele. Pois, se amasse David, que espécie de mulher seria para
reagir com tanta paixão à posse de outro homem? E era o que tinha feito! Aos dezesseis
anos, quando viu Nicholas pela primeira vez instintivamente soube que ele seria capaz de
despertá-la; por isso o odiou tanto!
Aflita, virou a cabeça e escondeu o rosto molhado de lágrimas. Sentindo que ela se
mexia, Nicholas levantou a cabeça.
— Olhe para mim. — Pegou seu queixo e obrigou-a a se virar. — Então, agora nós
sabemos.
O cinismo na voz dele era como uma punhalada.
Era evidente que a desprezava, e sua resposta apaixonada só havia aumentado
esse desprezo. Mas, se ousasse caçoar dela, seria capaz de matá-lo!
Nicholas devia ter percebido a confusão que a dominava, pois imediatamente se
afastou.
— É melhor tomar um chuveiro. Vou dizer a Ellen para lhe trazer o jantar.
Alannah fechou os olhos, sem se importar com mais nada curtindo a sua
humilhação.
Depois daquele dia, ele não a procurou mais e ela se perguntava por que a
obrigara a conhecer o segredo do prazer. Será que queria provar a ela que não era
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melhor do que as outras mulheres que também tinham conhecido o êxtase em seus
braços?
Então a resolução de Alannah de não tornar a sucumbir à fascinação dele tornou-
se obsessiva. Agora que sabia que qualquer atração, por pequena que fosse, a colocaria
em perigo, evitava o mínimo contato. Ele não a escravizaria!
Passava noites acordada, olhando-o adormecido, seu ressonar tranquilo a seu lado
provocando nela uma série de sentimentos contraditórios.
— Não consigo acreditar! — Exclamou Alannah, quando Hugh lhe trouxe um belo
ramo de camélias.
Ele costumava trazer dos jardins as mais belas flores,às vezes junquilhos
perfumados,outras vezes frutas exóticas como a kiwi,e também íris em vários tons de
azul, dafnes cheirando a limão, florzinhas rasteiras em buquê cor de rosa.
— Aqui vocês não têm inverno. — Comentou surpresa, para Ellen.
— Espere até o ano que vem, minha querida. Já estará acostumada com o calor, e,
à menor queda da temperatura,vai se agasalhar toda e se queixará do frio.
— Vocês nem têm geadas!
— Aqui perto do mar não temos: só lá nas montanhas, mais no interior.
— E também não têm neve!
— Nevou em Auckland, há alguns anos, durante cinco minutos, e foi uma loucura
geral. — Olhou Alannah com atenção. — Está com uma cara melhor.
Nicholas tinha viajado para San Francisco e já estava fora há uma semana.
Durante esse tempo, o enjoo acabara.
— Estou me sentindo bem melhor.
Com o passar do tempo, a atitude de Ellen havia abrandado muito mas Alannah
ainda achava que ela a vigiava como se fosse uma professora, a língua ferina nunca
fazendo concessões. Assim, tratava-a com polida reserva, mais à vontade na companhia
do velho Hugh. Mas Hugh tinha saído para buscar Nicholas, que chegava naquela tarde,e
ela sentia novamente a tensão a envolvendo.
Por alguma razão que não entendia, não tinha mais vontade de resistir a ele.
Talvez a gravidez a tivesse tornado menos geniosa. Já as razões de Nick para não
discutir mais eram bastante claras. Sem dúvida, queria que o filho tivesse um começo de
vida tranquilo, e uma mulher agitada dificilmente lhe proporcionaria uma gestação sem
problemas.
A insistente campainha do telefone interrompeu seus pensamentos. Ellen atendeu
e,depois de um momento,veio até o pátio, onde Alannah tomava sol entre vasos de
begônias floridas.
— Era Nick.
— Ah... — Talvez ele não viesse para casa. Uma emoção estranha mudou sua voz,
quando perguntou: — O que ele queria?
— Está trazendo hóspedes. Os Sterling, Caroline e Ralph. Pai e filha.
Alannah olhou para a mulher com surpresa. Depois levantou-se e foi com ela até
os quartos de hóspedes.
— Como todos os homens. — Resmungou Ellen. — Ele espera que tudo esteja em
ordem! Mas ainda bem que avisou.
— Os Sterling já estiveram aqui alguma vez?
— Ah, sim muitas.
— Como são?
Ellen encolheu os ombros.
— Simpáticos. O sr. Sterling tem negócios com Nick. E ela teria gostado de ser a
segunda sra. Challoner.
— Ah... — Por um instante, Alannah sentiu-se confusa, e foi desenvolvido um
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sentimento de posse em relação a ele. — Imagino que ela seja muito bonita. — Disse,
tentando manter a dignidade.
— É, sim. — Concordou Ellen, com um sorriso irônico.
— Sei...
— O que quer para o café de amanhã? — Perguntou a outra, encerrando as
confidências nesse ponto.
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Depois, ele se virou para Caroline e respondeu, com uma ponta de malícia:
— E me arriscar a morrer de tédio com uma mulherzinha sem opinião e sem
vontade própria? Pensei que me conhecia melhor Caroline.
Havia uma leve insinuação naquelas palavras, e a outra deu um risinho de
cumplicidade.
— Realmente, você não é assim. — Disse, subitamente mais confiante. — Que
sensata você foi, Alannah, não mudando a decoração da casa. A casa inteira é tão
refinada, tão... tão harmoniosa. — Sorriu um pouco embaraçada. — Como o dono,
austero e formal, mas com um incrível magnetismo. Pode rir. Nick, mas tem que
reconhecer que você combina com sua casa.
Então, ela nunca tinha estado no quarto de Claire. Por alguma razão obscura,
aquilo deu satisfação a Alannah, e continuou bem-humorada enquanto tomava os
aperitivos.
O jantar eslava perfeito. Se os convidados fossem outros, Alannah teria se divertido
mais. Não havia percebido como eslava afastada do convívio social. Nicholas não lhe
dava dinheiro e a mantinha praticamente prisioneira naquela bela casa. Caroline tinha dito
que ele era austero e formal... Não sabia de sua sensualidade animal.
Caroline falara em harmonia. Seria por isso que Nicholas procurava compensação,
uma vida por outra vida, uma criança por outra criança? A princípio: fazer com que ela
sofresse como ele havia sofrido. Mas era uma razão muito simplista.
Sem se dar conta de sua expressão absorta, ela observava cada movimento do
marido. Parecia incrível... era incrível que aquelas mãos a acariciassem com tanta
sensualidade, como se soubessem exatamente o que ela precisava. Como duas pessoas
podiam estar tão próximas e ao mesmo tempo tão distantes? Esse homem a quem
pertencia, esse homem complexo e sutil, era um desconhecido, um perfeito estranho!
Sentiu medo, de repente. Ouviu então a voz de Ralph Sterling, muito distante.
Fechou os olhos e depois sorriu, contrafeita, enquanto se voltava para ele.
— Sinto muito, eu estava sonhando acordada.
— E sei com o quê. Ainda não me esqueci de meus primeiros tempos de casado.
— Está pálida. — Disse Caroline, levemente irritada. — Papai, você a aborreceu?
— Alannah? — Perguntou Nick. — Você está bem?
— Estou, só não quero mais vinho.
Ele aceitou a resposta, mas, daí em diante, percebeu que a olhava, pensativo.
Quando ia se retirar com o sr. Sterling para conversarem sobre negócios, ele se
aproximou dela.
— Quer ir se deitar agora? Tenho certeza de que Caroline não ficará ofendida.
— É claro. — Disse a outra, com um ar de piedade. — Sinceramente, Alannah,
ficarei muito bem assistindo televisão perto da lareira.
Era tentador, mas o treino de Rose falou mais alto.
— Estou bem. — Sorriu para Nick. — Não deve me tratar como se eu fosse uma
inválida. O sr. Stewart disse que isso é péssimo.
Logo que os homens saíram da sala, Caroline deixou cair a máscara.
— Não tem obrigação de me fazer companhia. Sei cuidar de mim. E também
conheço muito bem a casa; portanto, não há necessidade de ficar acordada, se estiver
cansada. Nick e eu somos velhos amigos, e tenho certeza de que ele não me considera
uma estranha aqui.
— Também tenho certeza. — A resposta educada causou-lhe um grande esforço.
Caroline olhava com interesse o magnífico tapete persa, as prateleiras cheias de
livros raros, um queimador de incenso de bronze, uma antiga peça chinesa.
— É da dinastia Sug. — Disse, abruptamente.
— Eu sei.
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— Nick tem um gosto refinadíssimo. Queria que Claire decorasse a casa, mas o
gosto dela era extremamente vulgar. Então, ele arranjou um decorador. Claire fazia tudo
que Nick queria. Pensava que o sol brilhava por causa dele...
Não havia resposta para aquilo e, assim, Alannah só balançou a cabeça, sorrindo
vagamente, sugeriu que ligassem a televisão. Não queria confidências sobre a mulher
cuja morte tinha causado. Pelo menos, parecia que os Sterling não sabiam disso.
— Sabia que Claire era minha prima? — Insistiu a outra.
— Sim? — Alannah corou. — Não fazia ideia.
— Percebi. Eu e papai estamos sempre com Nick. Eu e ele temos muito em
comum. Naturalmente, ele era dedicado a Claire, mas sempre desconfiei de que era
porque ela realmente o idolatrava. Os homens tendem a amar as mulheres que os
adoram. Claire era uma loura espetacular, mas completamente sem personalidade.
Olhou atentamente para Alannah, que procurava se manter calma, apesar das
provocações. Vendo que não obtinha resposta, Caroline continuou:
— Por isso, você é uma grande surpresa. Não parece indefesa e tem jeito de ser
bastante inteligente.
— Tem razão. — Respondeu Alannah, sorrindo intimamente ao pensar como a
outra se enganara no julgamento. Era totalmente indefesa contra a desumana frieza de
Nick. E, naquele instante, gostaria de ser uma mulher espetacular.
— Como o conheceu?
— Meu pai e ele tinham negócios. — Disse, pouco à vontade.
— Entendo. — Havia sarcasmo em sua voz. — E quem é seu pai?
Um brilho frio iluminou os olhos azuis de Alannah.
— Holman Finderne, Mas muita gente o conhecia como Holt.
— Conheço o nome, claro. Nick não está agora na direção da firma, em
Christchurch?
— Sim. Meu pai morreu no ano passado.
— Então foi uma união, em vários sentidos. Deve sentir falta de sua família.
— Muita. — Respondeu, só agora se dando conta da saudade que sentia da bela e
compenetrada Tina, da tola e também bela Rose. E David... oh, David!
— Saudade de casa é um inferno, não? — Perguntou Caroline, mas não parecia
nem um pouco solidária. — Mas ser esposa de Nick deve ter suas compensações. Além
do fato de ele ser um homem absolutamente fascinante, ainda há esta casa maravilhosa,
Uma pena você não se sentir bastante bem para convidar e ser convidada, mas imagino
que isso pode esperar até depois de nascimento do bebê. Claire estava vendendo saúde,
quando engravidou. Coitadinha...
Ótimo para Claire, pensou Alannah, com azedume. Mas respondeu com calma.
— As pessoas reagem de maneira diferente. Ellen diz que uma gravidez difícil
muitas vezes significa um parto fácil e um bebê bonzinho. Espero que tenha razão.
— Sim. — Concordou Caroline, mas não estava interessada na opinião de Ellen. —
Quanto tempo acha que esse enjoo ainda vai durar?
— Não sei.
— Bem, acho que você não teria interesse em ir a um baile, mesmo se estivesse
passando bem. Não poderia dançar, e seria terrivelmente aborrecido ficar o tempo todo
apreciando...
— Provavelmente. Mas de que baile está falando?
— Ah, é uma testa de caridade, e Nick nunca falta. Sempre organizamos um grupo
para ir, e como ele é o presidente, deve comparecer. Será dentro de três semanas, em
Auckland. É um acontecimento social! Primeiro, há um jantar e, em seguida, o baile, que
dura às vezes até o dia seguinte e termina com o café da manhã. Maravilhoso!
— Parece, mesmo. — Comentou Alannah, concluindo que Caroline era artificial
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— Por quem mais? Embora Stewart tenha me garantido que apesar da palidez,
você está perfeitamente bem.
— E, naturalmente, o bebê estará bem. Como um parasita que cresce e floresce...
— É o que pensa dele? — Perguntou Nick, abrindo a porta do quarto.
A vontade de mentir foi muito grande, mas ela prometeu a si mesma nunca mentir.
— Não. Não desde que ele começou a se mexer.
— O instinto vence tudo.
Por um momento, ela observou o rosto do marido, mas só encontrou um olhar
indiferente e frio.
— É verdade. — Reconheceu, dando um suspiro. — Boa noite.
Capítulo 7
Caroline tinha razão. Nicholas só foi se deitar às duas da manhã, e não adormeceu
logo, ficando deitado de costas, as mãos em baixo da cabeça, pensando.
Mantida acordada por causa da atividade do bebê. Alannah tentou ficar imóvel,
mas depois de algum tempo se levantou e correu para o banheiro.
Receou deitar-se novamente ao lado do marido. Apesar de todas as intimidades
que tinham compartilhado, ainda se sentia tímida em relação a ele. Durante o dia,
disfarçava esta timidez com uma atitude, mas no grande leito sua autoconfiança
desaparecia, agudamente consciente de cada movimento dele, do calor de seu corpo.
Nicholas sabia disso, ela via em seus olhos. Todas as vezes que, tendo que mudar de
posição, evitava encostar nele. E sua timidez parecia causar prazer ao marido! Mas ele
não se embaraçava, e agia muitas vezes como se ela não estivesse presente, andando
pelo quarto, às vezes completamente nu.
Já devia estar acostumada, mas não conseguia. Foi até a janela se arrepiando de
frio, enquanto olhava as nuvens. Havia luar e a água ao longe estava prateada. Mais
distante, no mar aberto, um farol era a única luz.
— Vai se resfriar.
A voz de Nick a fez estremecer e virar para ele. Depois, voltou obedientemente
para a cama.
— Está frio demais para andar sem um roupão. — Disse ele, tocando em seu
ombro.
Ela estremeceu de frio. Ela ouviu uma praga abafada, e logo os braços fortes do
marido a puxavam para junto de seu corpo quente e musculoso.
— Se continuar com essas infantilidades só para fugir de mim, vai ter que aguentar
as consequências. — Disse, sem se importar com a tensão dela. — Fique quieta.
Devia estar mais cansada do que pensava, pois quando ia começar a protestar, um
bocejo interrompeu a frase. Além disso, sentia-se muito confortável ali juntinho dele.
Nicholas abraçava-a por trás, com uma das mãos sobre o ventre crescido.
— Boa noite. — Ele murmurou.
Alannah bocejou outra vez, vencida pelo cansaço.
Caroline Sterling e o pai ficaram mais um dia e uma noite, e foram embora depois
do almoço. Alannah ficou aliviada quando os viu partir. Caroline passava o tempo todo
jogando indiretas, até deixar claro que seu relacionamento com Nicholas tinha sido íntimo.
E ainda era, pelo que Alannah via. Atormentada pela sensação de ciúme, que
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nascera de uma hora para outra em seu coração, ela descobriu que a ideia de Nick na
cama de Caroline a enfurecia. Fervia de raiva quando a outra pousava os olhos
possessivamente em seu marido, embora tivesse que reconhecer que Nick não
correspondia à aberta provocação. Continuava a tratar Caroline, com distante cortesia,
mas isso não provava nada.
A vida pareceu ficar mais tranquila, depois daquele fim de semana. Só podendo dar
pequenos passeios dentro da fazenda.
Alannah sentia-se cada vez mais limitada pelo tamanho e peso da criança.
Começou a fazer roupinhas para o enxoval, e se comovia com elas. Mas não tinha
coragem de mostrá-las para Nick.
Usando um maiô feito por Ellen, tomava banhos de piscina, embora tivesse
vontade de ficar ali durante horas.
A náusea acabou, mas ainda precisava tomar cuidado com o que comia, e cada
vez se sentia mais deselegante e feia. Nick passava agora muito mais tempo em casa,
apesar de estar ainda distante e indiferente.
Quando ele falou que ficaria naquele fim de semana em Auckland, ela ergueu a
cabeça, subitamente zangada.
— Por causa do baile?
— Para dizer a verdade... sim. Quem...? Caroline, claro.
— Claro. — Respondeu, furiosa. Agora ele ia pensar que ela estava com ciúme.
Mas não estava! É que fazia muito tempo que não se divertia!
— Tenho que ir, sinto muito. — Disse ele, suavemente,
— Claro. — Repetiu, com tanto sarcasmo, que esperou uma resposta malcriada.
Mas, em vez de impaciência, havia um imenso cansaço no rosto moreno e bonito.
— Você está com problemas? — Perguntou, subitamente preocupada. — Parece
cansado.
— Pareço? Então, você olha às vezes para mim!
— Não posso evitar.
Ele sorriu à resposta espirituosa e veio para perto dela, abraçando-a por trás.
— Essa resposta parece mais com você. — Disse, acariciando o rosto dela.
Alannah fechou os olhos, sentindo a carícia sensual, que desceu pelo pescoço
lentamente, até as mãos pousarem nos seios.
Fazia tanto tempo que não a tocava assim, que Alannah se assustou com a
imediata resposta de seu corpo.
— Não!
Nicholas se inclinou e começou a sussurrar em seu ouvido.
— Não é verdade que não quer. Gostaria que eu ficasse aqui este fim de semana?
Mas estava tão assustada, que respondeu exatamente o contrário do que gostaria.
— Não! Prefiro que fique em Auckland.
Ele apertou seus seios e depois largou-a.
— Acho que, se não fosse, causaria muitos comentários. Meus amigos andam
dizendo que tenho um ciúme tão doentio de você que nem a deixo sair.
— Ficarão desapontados quando me conhecerem. Mas não tenho a menor dúvida
de que Caroline está se esforçando bastante para convencer a todos de que o boato é um
absurdo.
— Talvez. — Disse ele, parecendo aborrecido. — Apesar de incrivelmente bonita,
Caroline não é inteligente. Acha estranho que todos escutem a descrição que faz de
minha nova esposa e ainda assim acreditem que venero o chão que você pisa. Afinal, por
que eu casaria com você?
— Certamente, não pela minha aparência. Ou pela minha personalidade. Mas,
mais cedo ou mais tarde, vão descobrir por quê. E o que você fará, então? Aposto que
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não será nada bom para a sua imagem. A maioria das pessoas, mesmo as mais duras,
acharia seu plano cruel demais para aceitar. Gente normal não casa por vingança. Não
receia que seus amigos fiquem desgostosos?
— De jeito nenhum. Se... e quando todos souberem que você causou a morte de
Claire, direi que, depois que a vi, fiquei tão impressionado que não quis perder o contato.
— Sorriu, irônico. — E, quando nos encontramos depois de três anos, nos apaixonamos
imediatamente. Uma história romântica, não concorda? Com a vantagem de ser quase
verdadeira.
— Pois estou certa de que ninguém que conheça você vai acreditar nessa
conversa mole.
— Tem, mesmo? Mas é surpreendente como as pessoas se deixam enganar! Olhe
só sua mãe. Está crente que nos amamos loucamente.
Alannah desviou o olhar, odiando-o, odiando a si mesma por ter provocado aquela
conversa. Não tinha mais ânimo para aguentar. Parecia incrível que no começo do
casamento estivesse determinada a lutar contra Nicholas o tempo todo. Agora, só queria
sossego, e, se isso era uma capitulação... bem, a culpa era de seu estado.
Mas ele não deixou assim, e insistiu:
— Acho você difícil de entender. Pelas cartas que coloco semanalmente no correio,
tenho a impressão de que já perdoou Rose pela responsabilidade parcial por nosso
casamento; no entanto, seu ressentimento por mim continua o mesmo.
— Você não entende, minha mãe, ela é...
— Rose é uma mulher tola. Uma mulher tola e mercenária, que estava preparada
para vender a própria filha, para que ela e a filha favorita continuassem a viver
luxuosamente, no que considera um direito dela.
Alannah estremeceu, porque ele havia dito parte da verdade.
— Você não compreende... — Insistiu, sem convicção.
— Compreendo muito bem. — Nicholas falou com tal desprezo, que ela corou. — É
você que não compreende. Rose sabia exatamente o que estava acontecendo. Não fiz
nenhuma tentativa de esconder minhas razões.
— Eu sei... — Sentou-se, profundamente magoada. — Mamãe foi protegida a vida
inteira. Papai... papai costumava caçoar dela por causa de sua falta de interesse pelos
negócios, mas nunca tentou mudá-la. Ela sempre acreditou que se uma pessoa tinha
pensamento positivo, tudo no fim dava certo.
Levantou o olhar e viu o brilho de desdém nos olhos verdes, mas continuou a falar,
pausadamente.
— Você não sabe o que é ser sempre julgada pela sua beleza, sua atração, suas
qualidades de anfitriã! Nunca ninguém encorajou minha mãe a usar o cérebro. Casou com
meu pai porque ele era bom e seus pais lhe disseram que daria um ótimo marido. E
aprendeu a amá-lo. Naturalmente, esperou que... acreditou que comigo aconteceria a
mesma coisa
— Mesmo sabendo que você estava profundamente apaixonada pelo rapaz da
casa ao lado.
— Ela pensou que era uma coisa de criança.
— E era?
A pergunta atingiu-a como uma flecha, a ponta envenenada pegando bem no
coração. Alannah sentiu a boca seca.
— Já sabe a resposta.
— Oh, Deus, eu sei! — Nicholas deu uma risada. — Amor eterno. — Caçoou,
segurando o queixo dela e obrigando-a a encará-lo. — Tem um prazer masoquista em
bancar a mártir, Alannah? Quando chora em segredo, consola-se pensando que elas
devem a felicidade a você? Pois bem, não a privarei dos pequenos prazeres que tem...
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mas lembre-se de que, quando geme em meus braços, não está pensando em Rose.
Nem em Tina, nem no seu verdadeiro amor. Aquela sensação é por minha causa!
Beijou-a explorando sensualmente a boca morna com cruel prazer, até deixá-la
trêmula de raiva e... sim... de desejo!
Quando a largou, ela limpou a boca com as costas da mão, num gesto de repúdio,
e ele riu.
— Farei com você o que eu quiser. E possuirei você sempre que desejar.
— Tenho desprezo por você!
— Eu sei. E me divirto quando me despreza.
Ficou olhando para ela, que sentiu o sangue subir ao rosto, sabendo que ele se
lembrava de sua ardente resposta na última vez em que fizeram amor.
Na manhã de sábado, Alannah acordou com dor nas costas, uma dor que
provavelmente desapareceria depois de um passeio ou uma hora passada na piscina.
— Não está piorando, está? — Perguntou Ellen, preocupada.
— Não. — Respondeu, surpresa com o interesse da mulher.
— Não sei não. — Disse Ellen, enquanto arrumava os travesseiros. — Não fique
preocupada, não deve ser nada, mas acho melhor levantar os pés.
Agitada e abalada, Alannah obedeceu. A governanta trouxe uma pilha de livros
para ela ler, mas não teve vontade de pegar nenhum deles. Apenas tomou uma xícara de
chá e tentou descansar um pouco. Quando o telefone tocou, ela atendeu, contente de ter
uma coisa para fazer.
— Alô, Caroline. — Respondeu, menos animada.
— Alannah, querida! Nick me disse que você está cada vez mais gorda!
— É verdade.
— Que bom para você. Posso falar com Nick, por favor? Sinto muito incomodar,
mas algumas coisas saíram erradas para o baile desta noite, e, como ele vai me levar,
precisa saber.
Alannah mordeu os lábios, esforçando-se para que sua voz saísse fria e serena.
— Sinto muito, mas ele não está. Foi à cidade.
— Ah... Ele parece estar passando muito tempo no apartamento, ultimamente.
Preocupações com os negócios, imagino. Nick sempre gostou de passar os fins de
semana em casa... Bem, irei até lá falar com ele, Tchau.
Alannah sentiu uma onda de revolta. Qualquer que fosse o lugar de Caroline na
vida de Nicholas, parecia cada vez mais evidente que era sua amante e não tinha o direito
de ser tão provocadora. Irritada porque não havia nada que pudesse fazer a respeito,
curvou-se para a frente, pois a tensão fazia suas costas doerem ainda mais.
— Agora, eu vou decidir sozinha! — Disse Ellen, da porta — Vou ligar para o dr.
Stewart.
Por mais que Alannah lhe dissesse para não ligar, ela não a escutou. O médico,
uma hora depois, fez, um cuidadoso exame c acalmou-a.
— Não acredito que seja nada sério, mas fique na cama durante uns dois ou três
dias. Onde está seu marido?
— Em Auckland.
— Está vindo para cá. — Notando o espanto de Alannah, acrescentou: — Ele seria
capaz de me despedir, se eu não o avisasse.
Quando Nick chegou, Alannah estava deitada, só ela sabia que sua palidez não era
por causa de seu estado.
— Tudo bem? — Perguntou ele, entrando apressado no quarto.
— Não sei por que toda essa confusão. Afinal, foi só uma dor nas costas.
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Aparentemente, ele tinha conversado com o médico, porque puxou uma cadeira ao
lado da cama e começou a falar com Alannah, com calma:
— Uma dor nas costas pode significar um aborto. Stewart não acredita que seja,
mas acha melhor tomar todos os cuidados.
— Não havia necessidade de você voltar. — Disse, sem se incomodar que ele a
achasse ingrata. Não era isso o que esperava ouvir dela?
— E deixar Ellen chocada? — Perguntou segurando sua mão.
— Acha que ela ficaria chocada?
— Ah, sim. Está começando a ter esperança de que a convivência possa fazer o
que o sexo não conseguiu até agora: salvar este casamento, e você sabe muito bem o
que o bebê representa para mim.
— O quê?
— A razão de sempre. O velho desejo do homem de se perpetuar.
A curiosidade que sentia por ele era recente e, portanto, mais forte.
— Li em algum lugar que tudo o que somos, corpo e mente, é só um meio que a
natureza usa para que nossos genes sejam transmitidos para outros seres. O instinto
cego de reprodução.
— E acredita nisso?
— Às vezes. É uma brincadeira irônica, não acha?
— Que fizeram com você?
Olhou para ele, curiosa.
— Está arrependido, Nick?
— Não. — Levantou-se devagar. — Não acredito em remorsos do passado. Eles
afetam o presente e o futuro, e não levam a nada. — Sorriu, contrafeito. — Digamos que
eu agiria de maneira diferente, agora.
— Ainda casaria comigo?
Ele sorriu novamente, porque sabia exatamente o que ela estava pensando.
— Oh, sim, minha pequena insegura. Minha vida seria insuportavelmente sem
graça sem você explodindo perto de mim. Adoro ter meu vulcãozinho particular.
Por um momento, um momento horrível, Alannah receou que ele visse as lágrimas
que aquela resposta tinha provocado. Mas conseguiu esconder o brilho suspeito, virando
a cabeça no travesseiro e fingindo um bocejo.
— Vou sair agora. Se precisar de alguma coisa, toque a campainha.
Esperou que ele chegasse na porta, para perguntar, inocentemente:
— A propósito, Caroline conseguiu falar com você?
Nicholas parou imediatamente e olhou para ela, o rosto inexpressivo.
— Conseguiu. Ela estava lá, quando Ellen ligou. Por que?
— Nada. Só que ela ligou para cá perguntando por você, e eu disse onde estava.
— Disse? Obrigado. Ela deve ter se esquecido de que eu linha planejado passar o
fim de semana na cidade.
"Mentira! Ela queria que eu soubesse que ia ser seu par, e você sabe disso, seu
canalha!"
Ele saiu, deixando-a tensa.
Maldito Nick! O que importava se dormia com Caroline Sterling? A princípio,
gostara de pensar que ele tinha uma amante. Mas, não alguém que ela conhecesse. E
não tão linda! Nick não tinha o direito de trazer a amante ali!
Entretanto, Caroline não ia ao baile com ele, naquela noite. Embora tivesse dito
que tinha vindo por causa de Ellen. ela sentia um estranho prazer em poder controlar as
ações dele, mesmo que fosse com um truque. E todo o remorso desapareceu, quando ele
lhe contou que Caroline estava a seu lado, quando Ellen ligou.
Não, a dor nas costas definitivamente não ia melhorar até o dia seguinte!
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Ficou mais aliviada e adormeceu. Quando acordou, já era noite e Nick estava ao
lado da cama, sorrindo. Alannah espreguiçou-se e depois, lembrando-se da "dor", pôs a
mão nos quadris.
— Ainda dói?
— Um pouco. — Disse, envergonhada por mentir. Logo Ellen chegou com uma
bandeja.
— Ela ainda sente um pouco de dor. — Disse Nick, alegre. — Mas está passando.
Alannah olhou-o com súbita desconfiança, mas ele estava impassível. Mais calma,
comeu o jantar que Ellen tinha trazido. Certamente, ele nem suspeitava de sua pequena
farsa... e como poderia? Quando se mexia, realmente sentia uma dorzinha enjoada nas
costas; portanto, não estava mentindo. Não completamente.
Capítulo 8
Depois do jantar, Nicholas trouxe-lhe um toca-fitas e alguns livros mais a seu gosto.
Surpreendentemente, ajeitou-se numa poltrona perto dela e tirou da pasta alguns papéis,
que começou a estudar.
Alannah leu por algum tempo, mas seu olhar era sempre atraído para o marido.
Uma vez, ele ergueu os olhos e surpreendeu-a. Por um instante ficaram se
encarando e ela então pediu um copo de água, a primeira coisa que lhe veio à cabeça.
Ele tinha olhado para ela assim, quando vieram de avião de Christechurch. Apesar do
ódio que sentia naquele dia ela notara que lia muito depressa, que tinha mãos fortes e
bem cuidadas, que era um belo homem.
Se fechasse os olhos, podia se lembrar de cada detalhe, como se visse um filme.
Tentou lembrar-se do rosto de David, mas o rosto de Nicholas anulava o do outro.
— Está se sentindo mal?
— Não. — Respondeu, hesitante. Abriu os olhos e pegou o copo de água que ele
havia trazido.
— Tem certeza?
— Tenho. Não se preocupe: também quero esse bebê.
— Quer, mesmo?
A dúvida na voz dele a fez reagir:
— Quero, sim! Eu o carreguei por tanto tempo, que detestaria perdê-lo agora. Além
disso, ele não tem culpa do que o pai fez.
— Não, realmente.
E aquilo foi tudo. Nenhuma resposta para sua provocação. Alannah virou de costas
para ele e adormeceu.
Muito tempo depois, acordou. Uma chuva forte caía lá fora trazida pelo vento leste.
A única luz, no quarto vinha do abajur sobre a escrivaninha. Nicholas estava sentado lá.
Algo nele a fez ficar imóvel e calada. Sentia-se como se espreitasse algo que devia
ficar em segredo.
Então, ele levantou a cabeça e ela prendeu a respiração, porque em seu rosto
havia uma tal expressão de sofrimento que a fez sentir uma onda de piedade. Estaria se
lembrando de Claire?
De repente, o terrível ressentimento que envenenava sua vida pareceu evaporar,
deixando-a vazia e perdida. Vendo-o naquele estado, Alannah podia entender como um
homem, que amara tão profundamente, podia ter roubado, mentido e se atirado num
plano surgido de seu desespero, perdendo pelo caminho toda a misericórdia. Só um
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Alannah sentiu-se agitada naquela tarde e resolveu dar uma volta pelo jardim, em
vez de se aconchegar numa espreguiçadeira no terraço, aproveitando os últimos raios de
sol.
Escutou vozes quando foi olhar um pêssego. Hugh muitas vezes trabalhava no
pomar até tarde, e naquele dia Ellen estava com ele.
A princípio, Alannah não prestou atenção na conversa. O que a fez parar atrás de
um arbusto foi a voz irritada de Ellen:
— Não sei o que ele está pensando! Francamente! Levar aquela ordinária da
Caroline Sterling com ele!
— O pai também. — Lembrou Hugh.
— E desde quando a presença daquele velho impediu alguma coisa? Ele vinha
para cá com ela, antes, e você sabe muito bem o que acontecia. Pois acho que o velho
faz vista grossa porque, para ele, é bom ter negócio com Nick.
Hugh resmungou qualquer coisa, mas o coração de Alannah batia com tanta força
que ela mal podia se manter de pé. Ellen continuou a falar, sua voz estridente mais fácil
de ser ouvida.
— Não sei mais o que pensar! Tudo parecia estar indo tão bem agora! Ela está
mais calma, nada mais daquelas respostas agressivas, e ele, tão bom. E agora... isso!
Tem certeza de que aquela mulher viajou com ele? Não foi só se despedir?
Alannah tentou desesperadamente escutar a resposta de Hugh, mas em vão. No
entanto Ellen confirmou tudo:
— Está bastante evidente. Por que Nick foi fazer uma coisa dessas?
Continuou a falar, mas Alannah se afastou silenciosamente, como um ladrão, e às
cegas, pois seus olhos só viam Nick nos braços de Caroline. Correu a se esconder num
lugar que sabia que não a procurariam: o caminho que descia até a praia.
Ofegante e angustiada, sentou-se num tronco, uma das mãos sobre o ventre, e
chorou feito uma criança.
Quando as lágrimas secaram, apertou as têmporas latejantes, tão abalada com a
própria reação como Ellen estava com o comportamento de Nicholas.
Por quê? Por que se importava por ele levar a amante? Nunca havia ligado para o
que o marido fazia; tinha sempre se defendido dele, acreditando que essa atitude a
protegeria.
Agora, diante de seu súbito colapso, enfrentava a verdade sobre si mesma. Era
uma mulher ferida, vulnerável e assustada, que se escondia atrás de discussões
tempestuosas e da fria arrogância porque só assim poderia permanecer sã, naquele
pesadelo que Nicholas tinha inventado para ela.
Sentia-se novamente criança e indefesa. Precisava desesperadamente da mãe,
mesmo sabendo que nem Rose nem ninguém poderia lhe dar o que realmente desejava;
segurança e amor.
O bebê se mexeu, e o movimento a fez se levantar. Foi com apreensão que voltou
para casa e para o quarto. Não queria que Ellen visse seu rosto pálido e inchado.
Tomou um demorado banho de chuveiro, desejando poder levar também toda a
desolação que tinha no coração. A cama nunca lhe pareceu tão convidativa, mas levou
algum tempo para dormir.
E a dor que a acordou era continuação das dores que já tinham começado,
espaçadas, há algum tempo. O filho de Nicholas escolhera aquele instante para nascer.
Uma hora depois, foi levada para a sala de parto no Cottage Hospital, enquanto
uma enfermeira sorria para ela, encorajadora.
— Está indo muito bem. Lembrou-se de todos os exercícios pré-natais. Esse aí
está com pressa.
Estava, realmente! O sol começava a nascer quando Alannah olhava para o rosto
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vermelho do filho, tentando ver se ele se parecia com Nicholas: encontrou, maravilhada,
as sobrancelhas cerradas, o queixo firme, o nariz que seria mais tarde reto e perfeito
como o do pai.
A exaltação que a tinha invadido foi desaparecendo, para deixá-la exausta e
gelada. Então, o bebê abriu os olhos, e seu, rosto se contraiu como se sorrisse.
Num impulso, ela o apertou mais junto ao peito e beijou-o na testa enrugada.
Imediatamente, ele pareceu procurar alguma coisa.
— Está com fome. — Disse a enfermeira. — Por que não o alimenta?
Ela adormeceu logo depois de dar de mamar, acordando só no fim da tarde,
quando lhe trouxeram a refeição. O hospital era pequeno, mas havia sido levada para um
anexo, e assim, estava sozinha com o filho quando Nicholas entrou.
— Como está? — Perguntou preocupado.
— Bem. O quê... o que faz aqui?
— Vim conhecer meu filho, o que mais?
— Você nem olhou para ele.
Ele se aproximou e, levantando o rosto dela, examinou atentamente suas feições,
até Alannah corar e baixar as pálpebras.
— Foi muito ruim?
A sua ternura deixou-a desarmada. Mais do que tudo, queria sentir os braços dele
à sua volta, queria descansar a cabeça em seu peito, apoiar-se em sua força.
— Não, não foi nada difícil. O dr. Stewart disse que... que vamos ter que tomar
cuidado com o próximo, pois este chegou depressa demais. Parece que os segundos
nascem ainda mais depressa.
— Se houver um próximo.
Soltou-a e se virou, inclinando-se sobre o berço, deixando-a surpresa.
Mas aquela farsa de casamento não tinha uma única finalidade: a de dar a ele
herdeiros? A menos que não a quisesse mais, que Caroline bastasse. Por alguma razão,
Alannah sentiu uma fúria que há meses não sentia. Ódio, angústia, desespero, tudo ao
mesmo tempo. Recostada nos travesseiros, fechou os olhos, para que ele não lesse seus
pensamentos.
— Você está bem?
— Ótima. — Respondeu, abrindo os olhos e olhando-o, agressiva. — Bem, o que
achou dele? Preenche as exigências dos Challoner?
— Oh sim. Me conte uma coisa: ele sempre faz esse barulho?
O instinto protetor foi mais forte, e Alannah se inclinou para o berço.
— Oh, meu amorzinho... Droga!
Ele a olhou sorrindo.
— O que aconteceu?
— Ele está chupando o dedo. E isso, sinto dizer, herdou de mim.
— Bem acho que consigo perdoar você. De que cor são os olhos dele? — Riu,
quando viu que ela se surpreendia. — Ellen quer saber.
— Não sei. Até agora, são azulados.
— Cor de olho de recém-nascido. — Respondeu a enfermeira, que acabava de
entrar no quarto. — Mas serão azuis, como os da sra. Challoner.
Sorriu para Alannah, enquanto ajeitava a bandeja no colo dela, e depois saiu.
— Quando vai voltar para a Austrália? — Perguntou Alannah, não se interessando
pela comida. — O sr. Sterling está provisoriamente em seu lugar?
Nicholas olhou-a, subitamente alerta.
— Não, ele não está. Terei que voltar no voo desta noite. Quem lhe disse que ele
foi comigo?
— Ouvi Hugh e Ellen conversando. E Caroline? Também está se divertindo?
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— Pois saiba que é maior do que a média dos bebês. — Corrigiu Alannah, com
falsa indignação. E brincou: — E tão adiantado para a idade dele!
O bebe parou de mamar um instante e levantou os olhos azulados para ela.
Nesse momento, Nicholas entrou.
— Vejam, ele vai ter olhos azuis! — Exclamou Rose, — Iguais aos seus, minha
queridinha. Que bom!
Era a primeira vez que Nicholas via o filho mamando; Alannah o encarou,
embaraçada, quando os olhos dele pousaram nos seios cheios de leite. Foi preciso um
grande esforço para que não se cobrisse com os lençóis. Ele adivinhou o dilema dela e
riu, com ironia. Depois, inclinou-se e beijou-a rapidamente nos lábios, e tocou o rosto do
filho.
— Ele é um encanto. — Disse Rose, animada, enquanto Tina observava
atentamente Nicholas e Alannah. — E se parece com você, Nick! Mas, me conte, que
nome vai dar a ele? Alannah, essa bobinha, não faz a mínima ideia.
— Andrew Holman. O nome dos dois avôs.
Os olhos de Rose ficaram cheios de lágrimas.
— Obrigada. — Disse, dramática. — Meu querido Holt teria muito orgulho do
primeiro neto. Mas não ousem chamar sua filha de Rose! Sempre odiei meu nome e não
suportaria se minha neta tivesse que aguentar a mesma carga.
Alannah sentiu o sangue subir pelo rosto. Ficou de olhos baixos, enquanto Nick
fazia um comentário qualquer e Rose insistia.
— O ideal é a diferença de idade ser pequena, para que os dois possam ser
amigos e companheiros, como Alannah e Tina foram.
Foi Nicholas quem respondeu.
— Alannah teve uma gravidez difícil. Por isso, acho que vamos esperar algum
tempo, antes de submetê-la a tudo aquilo outra vez.
— Ah, mas a segunda vez é sempre bem mais fácil. — Disse Rose, mas calou-se
ao perceber algo no olhar de Nicholas.
Tina falou alguma coisa irrelevante durante o silêncio que se seguiu, até chegar a
hora de fazer o pequeno Andrew arrotar.
Então, Rose reclamou esse privilégio e um pouco da tensão desapareceu. Quando
mais tarde Alannah ficou sozinha no quarto pensou se Nicholas, com aquela declaração,
estaria pensando em fazer amor com ela só quando achasse que seria conveniente ter
outra criança. Lágrimas quentes correram por seu rosto.
Dois dias depois, teve alta. Nicholas foi buscá-la e fez tudo que um pai encantado
deveria fazer. Agradeceu com enorme charme, entregando à enfermeira-chefe um
envelope com uma quantia em dinheiro para a compra de uma nova tevê para a sala das
enfermeiras.
Durante toda a viagem de volta, Alannah olhou para o bebê adormecido no banco
de trás reparando nos traços do rosto que herdara do pai.
— Cansada?
— Não.
— Não se preocupe. Stewart me disse que você provavelmente iria se sentir
deprimida e que precisaria de cuidados especiais.
— E você vai... tratar de mim com cuidado?
Ele ficou calado e ela se perguntou por que tinha que provocá-lo o tempo todo.
— Não pretendo aborrecer você, se é o que está perguntando. Deixou muito claro
o que sente sobre isso tudo.
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Nesse instante, Andrew choramingou e Alannah se virou ansiosa para ver o que
era. Quando se endireitou, percebeu que Nicholas estava tenso.
— Deve pensar que sou um monstro. — Disse ele, zangado. — Acabou de passar
nove meses miseráveis. Espera mesmo que eu a faça passar por tudo isso novamente,
sem lhe dar descanso?
— Você não parece ter a preocupação de... de ser bonzinho.
— Não. — Riu, com amargura. — Era a última coisa que eu pretendia. Queria
intimidar você, quebrar você! Mas você não se deixou quebrar, não é? Cada vez que eu
tentava, você reagia, os olhos soltando chispas, a língua cheia de veneno. Por que não
tem medo de mim, Alannah?
Ela olhou pela janela, sem ver a paisagem.
— Não sei. Algumas vezes eu tive. Mas sabia que, o que quer que você fizesse a
mim, se eu não cedesse, não poderia me atingir. — Encolheu os ombros. — Você
cometeu um erro de julgamento. Se realmente queria me ferir, devia ter me conquistado
para depois me fazer viver num inferno.
— Essa era a minha ideia original.
Alannah olhou-o atônita. O belo perfil do marido estava impassível, mas a ironia do
sorriso era visível.
— Mas, então, descobri que você tinha um namorado e tive que usar a força.
Alannah olhou para as mãos, crispadas no colo, e teve um terrível pressentimento.
Por que ele estava sendo tão franco agora?
Mas Nicholas não disse mais nada. Além disso estavam quase chegando em casa,
e o momento tinha passado. Alannah logo descobriu que o berço tinha sido colocado na
nursery, dois quartos adiante do dela. Apertando o filho nos braços, sacudiu a cabeça,
teimosa.
— Não. Se ele for dormir aqui, eu também dormirei.
— Muito bem. — Cedeu Nick, sorrindo, para espanto dela. — A noite, ele dormirá
em nosso quarto, até que passe sua ansiedade.
Tinha sido simples demais. Ao se deitar naquela noite, ainda se sentia surpresa
com sua fácil vitória. Nicholas parecia estar seguindo à risca as determinações do dr.
Stewart, tratando-a com tanta doçura!
Ellen insistira para que ela fosse cedo para a cama, e realmente estava extenuada.
Agora, com a luz fraca da mesinha de cabeceira iluminando o quarto, não conseguia
parar de olhar para o bercinho. Rose providenciara cortinados cheios de fitas, os mesmos
que ela e Tina tinham usado e que, amorosamente, a avó reformara colocando fitas azuis,
em vez de rosa.
Apagou a luz e se aconchegou nos travesseiros. A vida de repente lhe parecia
insuportavelmente descolorida, e não adiantava dizer a si mesma que aquilo ia passar.
Uma parte de sua tristeza podia ser creditada a depressão pós-parto, mas havia ainda a
ferida aberta em seu coração.
Tremendo, pensou que nunca mais se aqueceria. Sentia um enorme vazio, que
nem sua total devoção ao filho conseguia preencher.
Naquela noite sonhou que ela e David caminhavam pelos montes Cashmere. Era
um dia claro e os Alpes do Sul brilhavam como se fossem encantados, em contraste com
as planícies de Canterbury. David segurava sua mão e andavam sem falar por um
caminho bastante estreito para somente os dois passarem. De repente o caminho se
bifurcava, uma parte seguindo na direção das montanhas e a outra seguindo para um
lugar que ela sabia, no sonho, levava a um imenso perigo.
Tenho que deixar você agora, disse a David, e afastou-se seguindo pelo caminho
perigoso, ele a chamou duas vezes, mas sabia que o caminho deste era o mais fácil e
melhor, onde as cotovias cantavam e o vento soprava livremente.
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— Quanta consideração! Ou será porque prefere que eu não a veja assim? Não,
pode se esconder de mim o tempo todo; portanto, vai ter que se acostumar à minha
presença quando estiver amamentando.
— Não, não é isso. Eu nem pensei...
— Ora, esqueça. Vou fazer o possível para não incomodar você, mas não espere
que eu desvie o olhar feito adolescente envergonhado, toda vez que estiver por perto e
meu filho quiser mamar.
Ela sentiu lágrimas nos olhos, e aconchegou o bebê ao peito.
Parecia que tudo que fazia estava errado. Ficou calada, enquanto, lá fora, os
passarinhos saudavam barulhentamente o novo dia.
Capítulo 9
Andrew era um bebê muito bonito. Rose achava, e até Ellen. Dormia quando devia
dormir e acordava regularmente a cada quatro horas durante o dia.
O verão passava tranquilo. Multidões de veranistas apareceram para acampar nas
praias, morando em barracas ou ainda nos poucos hotéis de luxo das redondezas. Em
cada fazenda, barracas brotavam como cogumelos, e os barcos à vela e a motor
cortavam as águas tranquilas do estuário.
Era um outro mundo, embora Puhinui não tivesse sido invadido pelos turistas, a
presença deles se impunha, e Tina juntou-se a um grupo cujo iate havia ancorado na
baía, a convite de Nick. Às vezes ficava com eles desde a manhã até a noite.
O grupo era animado e descontraído, formado por velhos amigos de Nick e aceitou
Alannah e o bebê com incrível facilidade.
Rose estava feliz, inteiramente dedicada ao neto e a ajudar Ellen. Para surpresa de
Alannah, Ellen aceitou a ajuda, e o relacionamento entre as duas era muito amigável.
Alannah sentia-se vegetando. O desespero que se abatera sobre ela ao chegar em
casa tinha se transformado numa profunda melancolia. Enquanto os dias quentes
passavam, ela foi se acostumando à tristeza como parte de sua vida.
Nicholas estava mais distante do que nunca, como se não se importasse com o
que ela estava sentindo, sem querer nem mesmo feri-la.
Aproveitando as competições e as regatas, apresentou-a aos vizinhos. Os convites
começaram a chegar; ele os aceitava, garantindo a Alannah que Andrew seria tão bem
recebido como os pais. E tinha razão.
Um dia, ele lhe disse casualmente que tinha aberto uma conta no banco em seu
nome. Mas ainda se recusava a deixá-la dirigir.
Depois de protestar muito ela não teve outro jeito, a não ser ceder.
Era uma boa motorista, mas o bom senso lhe dizia que a maioria dos carros com
que cruzavam na estrada era dirigida por gente que tinha pouca ou nenhuma prática
naquelas estradas íngremes e cheias de curvas. Aparentemente, as razões dele para
mantê-la prisioneira naquela casa não existiam mais. Alannah olhava intrigada para o
marido, prestando atenção em seus menores gestos: a maneira de rir, as brincadeiras
bem humoradas com Tina, o respeito que provocava nos vizinhos, até mesmo o brilho nos
olhos das mulheres quando o olhavam.
Então, um dia, ele partiu para Auckland, voltando algumas horas depois com uma
pessoa.
— Você sabia? — Perguntou Alannah a Ellen, enquanto vestia uma saída de praia
em cima do biquíni.
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— Sim eu sabia.
— Quanto tempo esse hóspede vai ficar?
— Nick não falou.
Alannah prendeu os cabelos, o sangue fervendo.
— Droga! Ele podia... — A voz parou na garganta, quando ela viu quem era o
homem alto e elegante ao lado de Nick. David, Só a mão firme de Ellen em seu braço
evitou que corresse para o rapaz e se atirasse em seus braços.
Felizmente, estavam um pouco distantes e ela teve tempo de recuperar um pouco
a compostura. Mas o olhar que deu ao marido foi frio e cheio de ressentimento.
David estava o mesmo, bonito, amável e, ao lado de Nick, muito jovem. Alannah
estendeu a mão, com calma dignidade.
— Querido David, que bom ver você novamente.
Ele pegou sua mão, mas antes hesitou um pouco, o que a deixou com raiva. David
não queria aborrecer Nicholas!
— Você está... ótima. Seu... seu marido me contou que já é mãe.
Ela nem olhou para Nick, não confiando em si mesma, embora pudesse sentir sua
presença poderosa e ameaçadora.
— Não precisa se espantar tanto. — Disse, com falsa naturalidade. — Andrew já
tem quase um mês.
— Parabéns. — David olhou em torno, tentando esconder o mal-estar. — Sua casa
é muito bonita.
— Obrigada. — Só então olhou para Nicholas, que parecia totalmente indiferente.
Isso foi como se tivessem lhe dado uma bofetada. — Deve estar cansado e com calor.
Chegou hoje de avião? Quer beber alguma coisa antes de ir conhecer seu quarto?
— Gostaria de tomar um banho. Catorze horas num jato deixam a gente suado e
moído.
— Posso imaginar.
— Eu lhe mostro seu quarto. — Disse Nicholas. — Depois do banho, volte para o
terraço, e tomaremos alguma coisa.
Depois que eles saíram, Alannah caiu sentada numa cadeira, o rosto branco como
cera, tentando recuperar o controle. A emoção maior era uma revolta fria e impotente.
Como ele ousava? Como se já não tivesse feito o bastante! Esperar até que ela
alcançasse uma precária estabilidade e então, cruelmente, trazer David! Oh, como ele
teve coragem?
— É fácil. — Disse Ellen, como se ela estivesse falando em voz alta. — Devia
conhecer melhor o homem com quem casou, para saber que não há nada que ele não
ouse.
— Mas por quê? — Murmurou Alannah. — Deve estar louco!
— Eu não acredito nisso. Nick é frio e calculista, e não conhece o remorso. Ele dirá
por que agiu assim na hora certa.
— Meu Deus, tenho vontade de matá-lo!
— Não é a primeira vez, e você superou todas as outras. — Lembrou Ellen, com
uma ponta de ironia. — Ah, sim, você conseguiu, e não fique sacudindo a cabeça para
mim. Tenho a impressão de que Nick está pagando para ver. Ele é um homem muito
impaciente: não consegue esperar muito, quando quer uma coisa. Acho que, dessa vez,
está farto de esperar.
— Mas o que ele quer? Tem tudo o que deseja.
— Tem mesmo? Não acha que precisa dar um jeito nesse cabelo?
Alannah resmungou uma crítica aos próprios cabelos e ao mundo em geral, sem
entender o motivo de tal mudança de assunto mas aceitou o conselho e voltou
desanimada para o quarto. Tina e Rose estavam passando o dia no iate, mas voltariam
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logo, e eles se sentariam todos juntos sob a imensa pérgula onde pequenos jasmins
espalhavam um aroma delicioso..
E Nicholas, como sempre, estaria seguro, e sofisticado. Por que? Oh, ele era cruel!
Era um diabo, e ela o odiava!
Em homenagem a David, Alannah vestiu-se cuidadosamente, escolhendo um
vestido azul que combinava com seus olhos. Quando se perfumou com Magie Noir, ficou
séria. Era seu perfume favorito, e parecia ter passado uma vida desde que o usara pela
última vez. Ficou alguns momentos sentada diante da penteadeira, o rostinho delicado
revelando preocupação e sofrimento. Mas aos poucos recuperou a coragem.
Não sabia o que Nicholas pretendia com mais essa tortura. Só sabia que não lhe
daria o prazer de ver o quanto estava abalada. Apesar de tudo, era bom ver David
novamente.
Naquela noite Nicholas estava encantador. Intrigada e cheio de desconfiança, o
olhar de Alannah não o deixava, ele era alguns centímetros mais baixo do que David, mas
tão bem proporcionado e tão elegante, que o outro parecia desajeitado e alto demais. Não
que David estivesse em muita desvantagem. Depois dos primeiros minutos tensos,
quando reencontrou Rose e Tina foi se descontraindo, ficando logo a vontade naquele
ambiente acolhedor e refinado.
Mas Alannah não conseguia se acalmar. Cada nervo de seu corpo estava tenso,
enquanto ouvia os dois homens conversando sobre trabalho. Não ficava nem um pouco
surpresa ao notar o tom de respeito com que David se dirigia a Nick. Naturalmente, seu
marido tinha condições de conversar sobre computadores da mesma maneira que se
sentia completamente à vontade discutindo sobre a vida das fazendas com os vizinhos.
Aquele cérebro frio e claro não se deixava perturbar pelas emoções que atrapalhavam os
pensamentos das pessoas comuns.
Na aparência, a noite foi muito agradável e civilizada. O jantar estava soberbo,
todos conversaram e riram. Tina levou David para dar um mergulho na piscina e depois
os dois se sentaram num canto e conversaram por um bom tempo, em voz baixa.
Nicholas sentou-se no sofá ao lado de Alannah, mas não tentou encostar nela.
Quando ficaram sozinhos no quarto, ela se virou para ele, os olhos brilhantes. Mas,
antes que pudesse falar, ele levantou a mão.
— Vai acordar o bebê.
— Sabe muito bem que ele tem um sono pesado. O que passou pela sua cabeça
para trazer David aqui? Que inferno!
— Não gosto de ouvir você praguejar. — Segurou o queixo dela e a fez olhar para
ele. — Não faça mais isso. E, quanto ao seu namoradinho... bem, ultimamente você tem
estado muito dócil. Pensei que devia recompensá-la.
— Tenho vontade de matar você.
Ele sorriu.
— Gosto quando reage assim. É mudança de atitude, em vez de querer bancar a
menininha dócil. É melhor que me odeie, Alannah. Pelo menos, é uma emoção mais
vigorosa do que a afeição aguada que tem por esse garotão.
— Eu amo David!
— É mesmo? — Soltou o queixo dela. — Pois eu duvido, querida.
— Gostaria que eu me apaixonasse por você, não é? Assim, ficaria realmente
vingado pela morte de Claire!
— Mas não culpo você pela morte dela.
— Eu... O que você disse?
Ele começou a tirar os documentos e a carteira do bolso da calça e colocou na
mesinha.
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— Jamais culpei você. A não ser nas primeiras semanas, até o inquérito terminar.
Então ficou tudo bastante claro: houve culpa, de ambos os lados.
Apertando as têmporas, como se com isso pudesse evitar o turbilhão que fazia sua
cabeça rodar, Alannah falou, debilmente:
— Mas... mas você disse, disse que por isso eu tinha que casar com você. Disse
que eu era culpada.
— Eu sei. E por isso David Opie está aqui. Nada mais fazia sentido.
— Não compreendo. — Falou, esgotada.
— Sei que não. Talvez, se parasse de olhar para dentro de si mesma e olhasse um
pouco em volta, você compreendesse. — Aquilo, dito num tom de aborrecimento, irritou-a
outra vez.
— Está dizendo que eu não...
— Quer calar a boca? Vá para a cama. Tenho trabalho para fazer.
Só Deus sabia a hora em que ele viria para a cama. Alannah continuou acordada
durante horas, mas nem sinal de Nicholas. O dia amanheceu, e ela não conseguia dormir.
Vestiu um maiô, pegou um roupão do quarto. Quem sabe, nadar lhe faria bem. Foi até a
praia. A água estava bastante fria, mas revigorante, e o estuário, mais bonito do que
nunca. Nos morros, os carneiros baliam, seguindo pelos caminhos estreitos. Uma garça
voava serenamente no céu. Alannah voltou para a areia, sacudindo os cabelos molhados,
a figura pequena e delicada banhada pela luz dourada do sol da manhã.
— Oi! — Chamou David, chegando pelo caminho estreito que descia pelo
penhasco.
— Oi! — Respondeu, corando. Era ridículo ficar embaraçada. David a vira de
biquíni centenas de vezes. No entanto, vestiu depressa o roupão.
— Desculpe, não queria assustar você. — Disse ele, as mãos nos bolsos, sorrindo
para ela.
— Pois levei um susto enorme. Pensei que não ia encontrar ninguém.
— O sr. seu marido não acorda cedo?
— Geralmente acorda, mas ele ontem trabalhou até tarde.
David baixou os olhos. Parecia inquieto e desnorteado. Era incrível que, depois dos
longos anos de companheirismo e amor, estivessem ali, dizendo coisas banais, em vez
de conversarem sinceramente.
— Ele é um homem brilhante. — Alannah concordou, com um gesto de cabeça. —
Quando recebi sua carta, eu... bem, eu sofri e me desesperei. Esperava casar com você,
depois que terminasse a bolsa. — Ergueu os olhos para ela. — Não era tanto tempo para
esperar, só dois anos. E você era tão jovem!
— Sim, é verdade. — Seria ela mesmo quem estava falando tão calmamente,
enquanto seu coração se despedaçava?
— Aos poucos, consegui ver as coisas do seu ponto de vista. E quando conheci
Nicholas... Bem, agora compreendo por que a impressionou tanto. Ele sempre consegue
tudo o que quer, não é mesmo?
Sim, havia uma real admiração no rosto de David, como se Nicholas fosse um
super-homem.
— É, consegue. — Disse Alannah, sem entusiasmo.
— Então, foi melhor para você, não? Deve admirá-lo muito, para me dar o fora
daquele jeito. Ele me disse, enquanto vínhamos para cá, que vai transformar minha bolsa
numa pesquisa permanente. É dono de uma firma que está pesquisando alguns
componentes muito interessantes.
Sentindo o coração estourando, Alannah começou a andar. Então, Nick tinha
acenado com uma posição brilhante para David e ele mordera a isca? Começou a se
lembrar de pequenos fatos.
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dando a impressão de que era uma superfície de espelho, o ar estava parado e abafado.
Alannah estava deitada na cama, o bebê em seus braços. Ela vestia um biquíni e
Andrew só uma camisinha mesmo assim, a cabecinha morena estava úmida de suor, mas
era tão gostoso ficar com ele, que Alannah cedeu à tentação e conservou-o em sua cama.
Era tão pequenino, mas crescia tão depressa! Um dia, ele seria tão grande como o pai,
alto, forte, poderoso; só esperava que não tivesse um coração tão insensível.
Encostou o rosto no dele, sorrindo quando o bebê fez uma careta. Uma sombra fez
com que virasse a cabeça. E, quando Nicholas se aproximou, o sorriso sumiu de seus
lábios.
— Acalme-se. — Disse ele, com tranquilidade. — Acabei de colocar David no avião
para Christchurch. Ele pediu que eu lhe transmitisse suas despedidas.
Ela não esperava nada disso.
— Tina foi também. — Continuou Nick. — Vai ficar com os pais dele até Rose
voltar.
Alannah olhou o rosto sério do marido, procurando em vão por alguma coisa,
alguma expressão. Houve um longo silêncio antes que ele falasse novamente:
— Se você quiser, pode voltar com Rose.
Ela não podia acreditar no que ouvia. Seu coração começou a bater dolorosamente
no peito.
— Por... por quanto tempo? — Perguntou, confusa.
— Pelo tempo que quiser. Para sempre, se é o que deseja.
Para ela, soava como um dobre de finados.
— Sabe muito bem que não posso deixar Andrew. — Murmurou apertando o filho
nos braços.
Ele respondeu, ainda sem nenhuma expressão:
— Pode levá-lo com você.
Alannah tinha a impressão de que o mundo inteiro havia parado. Arregalou os
olhos, mas ainda não conseguia ler nada no rosto impassível do marido.
— Tudo que eu peço... — Continuou ele — é que me deixe visitar o menino... e que
o traga aqui algumas vezes por ano, para que eu... para que ele cresça me conhecendo.
— Por quê?
Nick encolheu os ombros, num gesto de indiferença.
— Provavelmente, ele será meu único filho. E não quero que cresça sem me
conhecer.
— Por quê? Por que está me deixando partir?
Ele enfiou as mãos nos bolsos.
— Por que não pretendia que você fosse assim tão infeliz. Várias vezes, disse que
eu era pretensioso. Talvez seja mesmo. Nunca tive dificuldades para conseguir as
mulheres que queria. Concluí que, depois da primeira reação de revolta, aconteceria o
mesmo com você. Não pensei encontrar um caráter tão forte como o seu. Portanto, você
venceu. Pode partir.
E acrescentou, com alguma malícia:
— Mas, se fosse você, não voltaria para David Opie. Ele é um bom sujeito, mas
muito mole para uma mulher como você. E vai acabar se apaixonando por Tina. É só uma
questão de tempo.
— Você é um verdadeiro demônio!
Os olhos verdes brilharam mais uma vez.
— Não, definitivamente, ele não é páreo para você! Aqui está um presente. Isso é
para compensar pelo ano miserável que você passou.
Alannah olhou para ele com raiva; depois, para o colar que Nick colocou em cima
da sua perna, e depois para o filho adormecido. O colar estava pesado e frio em sua
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— Não quero apenas sexo, embora seu corpo me dê um prazer infinito. Agora,
sexo não é o bastante para mim.
— É um bom começo. — Murmurou ela, pegando a mão dele e pousando sobre o
seio.
Antes que tivesse tempo para pensar, Nick já a havia puxado para a cama, a boca
faminta sobre a dela.
— Sua feiticeira! Eu devia ter fugido de você na primeira vez que a vi, em vez de
resolver casar com você.
Ela levantou os grandes olhos para ele.
— Mas você me ama. — Disse, sem esconder a alegria da voz.
— E como! Pensei que podia obrigá-la a casar comigo e transformá-la numa
esposa razoavelmente feliz. Na primeira vez em que nos vimos senti uma enorme
atração, e tinha certeza de que você corresponderia. Por isso, não estava preocupado.
— Mas isso foi... quando você ainda estava chorando por Claire. — disse Alannah,
uma ruga vincando a testa. — Não podia ter prestado tanta atenção em mim.
— Não? — Perguntou ele, sorrindo e tocando-lhe o ombro com os lábios quentes.
— Confesso que eu estava em choque. Amava Claire. Não como amo você, é claro. Mas
ela era doce e meiga e dependia inteiramente de mim. Chorei muito por ela. E, um mês
depois de sua morte, conheci a garota de cabelos avermelhados e grandes olhos azuis,
que olhava para mim como se eu fosse um diabo, e que me deixou louco de raiva quando
começou a rir logo que pensou que eu não a escutava mais. Quando estive diante dessa
garota de dezesseis anos, o ar entre nós ficou carregado por uma intensa atração sexual.
— Mais uma vez, ele a beijou. — Só o que eu queria era levá-la para meu quarto, despi-la
e me tornar dono daquele belo corpo. Por que mais acha que planejei tudo para deixá-la
inteiramente em meu poder?
Ela o olhava, incrédula.
— Não acredito em você!
— Não? Então, por que acha que envolvi seu pai, fazendo com que arriscasse sua
fortuna?
A reação dela foi imediata. Seu corpo ficou tenso e Nick teve que segurá-la para
que não se afastasse. Parecia novamente com o homem que a forçara a casar.
— Foi exatamente isso que eu fiz. — Disse, com aspereza, obrigando-a mais uma
vez a enfrentar o lado sombrio de seu caráter. — De propósito e só com uma coisa em
mente: deixar você numa tal posição que não poderia se negar a casar comigo. Só que, e
por favor, querida, pense nisso, embora eu não pretendesse deixá-la escapar, não queria
que você fosse infeliz. — Deu um risinho cínico. — Sou tudo o que você xingou, mas não
sou um monstro. Eu realmente acreditava que você poderia ser imensamente feliz a meu
lado.
— Presunçoso! — Brincou, beijando-o no rosto. Dentro dela, o desejo estava
crescendo, levando a um certo torpor nas pernas e no ventre. Percebia que ele também a
desejava.
— Acho que sou, mesmo. Muitos homens ricos certamente dirão a você que não é
difícil comprar qualquer mulher que se deseja. E eu seria um idiota se não soubesse que
tenho uma coisa que quase todas as mulheres querem.
— Chama-se magnetismo sexual. — Murmurou no ouvido dele. — E você não é
idiota.
A cabeça morena inclinou-se e veio se apoiar entre seus seios,
— Há um ano, eu diria exatamente isso. — Colocou a mão entre o sutiã do biquíni
e a pele dela. — Só não imaginava que uma mocinha pequena e frágil, mas com uma
vontade de ferro e com um orgulho invencível, me faria mudar tanto.
Aqueles dedos acariciando sua pele a estavam pondo maluca. Fazia tanto tempo
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desde a última vez em que tinham se amado! Alannah sentia o desejo crescer, mas dessa
vez não ia resistir. Dessa vez, se entregaria em total abandono.
— Se eu não pensasse que ainda estava apaixonada por David, teria cedido antes.
— Confessou.
— Maldito David! — Disse ele, brincando. — Eu estava com um ciúme doido e seu
desprezo frio era um desafio. Tinha esperado ensinar uma virgem tímida; em vez disso,
só encontrava na cama um corpo inerte. Era a mesma coisa que fazer amor com uma
boneca, e me deixava um gosto amargo na boca. Você se recusava a se submeter, e
para mim não era o bastante. Além disso, estava evidentemente infeliz e ressentida.
— Então, você ficou terrivelmente cruel.
Ele concordou, e por alguns instantes abraçou-a, o rosto contra os cabelos em
desordem.
Alannah começou a desabotoar a camisa dele, percebendo que o corpo do marido
se enrijecia. Gostava de ficar olhando-o, sentindo-o; o futuro se mostrava muito promissor
e traria para ambos felicidade completa. Mas, naquele momento, queria sentir uma porção
de pequenos prazeres.
— Você está procurando encrenca. — Murmurou Nicholas, enquanto ela acariciava
os ombros dele.
Ela sorriu. Era excitante flertar assim.
— Bem, não é encrenca que eu quero agora...
— Podemos...?— Perguntou, tenso.
— O dr. Stewart disse hoje que já podemos ter relações conjugais.
— É isso que nós temos? — Caçoou ele, e abraçou-a, apaixonado, deixando-a
sentir o quanto a desejava.
— Está querendo me seduzir?
— Acho que devo estar. Embora seja um absurdo um homem ter que seduzir a
mulher que está casada com ele há quase um ano.
Agora, os olhos verdes soltavam chispas ardentes, tão devastadoras como as
carícias que ele fazia com a boca em seu pescoço.
Alannah escutava os próprios gemidos, sentia a onda de desejo avançando mais,
cada vez mais. Suas mãos sobre o corpo dele foram ficando mais ousadas. As carícias de
Nicholas agora a atormentavam, pois ansiava pela posse viril e total, dominando-a, afinal.
— Diga que me ama. — Pediu ele, olhando-a febrilmente, os lábios quase colados
aos dela.
— Eu te amo, amo com todas as minhas forças. Nick... por favor...
— E que me quer. — Insistia ele, o olhar cheio de dúvida, tão tenso que ela teve
medo.
— Você sabe...
— Diga!
— Quero você! — Falou completamente dominada pelo incrível magnetismo dele.
Abraçou-o e puxou-o para ela. — Eu te amo tanto, que poderia morrer por você.
Então, a respiração dele tornou-se mais pesada, enquanto, murmurava loucas
palavras de amor e paixão, coisas que ela nunca, sonhara ouvir, até que afinal seus
corpos famintos chegaram a explosão do êxtase tão intensamente que ficaram exaustos,
nos braços um do outro.
Foi Alannah quem falou primeiro.
— Se eu fizesse alguma ideia de que podia ser assim, não acredito que teria forças
para resistir tanto.
— Por que acha que eu ficava tão alucinado, sua bobinha? Eu sabia que havia
fogo em você.
— Foi por isso que decidiu não... não me procurar mais depois daquela última vez.
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