402 - Resumo

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Módulo 402 1

MÓDULO 402
DISTÚRBIOS SENSORIAIS, MOTORES E DA CONSCIÊNCIA

Sophia Molina Turma XIX


2 Módulo 402

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 3

SUMÁRIO
PROBLEMA 1 7

Miastenia gravis 7
Fisiopatologia 7
Características clínicas 9
Diagnóstico 9
Tratamento 13
Repercussões 18

Referências bibliográficas 18

PROBLEMA 2 19

Polineuropatias 19
Diagnóstico diferencial 19
Neuropatia diabética 21

Polirradiculopatias 23
Síndrome de Guillain-Barré 24

Casos clínicos do P2 29

Referências bibliográficas 29

PROBLEMA 3 30

Anatomia das vias sensitivas e motoras 30

Anatomia funcional dos neurônios motores 32

Déficit de força muscular 32


Avaliação clínica 32
Síndrome do neurônio motor superior 33
Síndrome do neurônio motor inferior 35

Referências bibliográficas 36

PROBLEMA 4 37

Anatomia funcional da medula espinhal 37

Síndromes medulares 38
Secção medular 38
Mielite transversa 38
Hemissecção medular – síndrome de Brown Séquard 40
Síndrome da substância cinzenta 40

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4 Módulo 402

Isquemia da artéria espinhal anterior 40


Lesões do funículo posterior 41
Síndrome do cone medular 41
Compressão da medula por tumor 41

Referências bibliográficas 41

PROBLEMA 5 42

Anatomia funcional do tronco encefálico 43


Bulbo 44
Ponte 44
Mesencéfalo 46

Síndromes do tronco encefálico 46


Síndromes bulbares 47
Síndromes pontinas 48
Síndromes mesencefálicas 49

Referências bibliográficas 49

PROBLEMA 6 50

Anatomia funcional do cerebelo 50


Conexões intrínsecas do cerebelo 52
Núcleos centrais e corpo medular do cerebelo 52
Divisão funcional do cerebelo 52
Conexões extrínsecas 53
Aspectos funcionais 53

Sistema vestibular 54

Ataxias 56
Ataxia sensitiva 56
Ataxia cerebelar 56
Ataxia vestibular 57
Semiologia e diagnóstico diferencial 59

Referências bibliográficas 61

PROBLEMA 7 62

Anatomia funcional dos núcleos da base 62


Conexões e circuitos 62

Distúrbios do movimento 63
Fisiopatologia e semiologia 64
Doença de Parkinson 65
Coreia de Sydenham 69

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 5

Referências bibliográficas 70

PROBLEMA 8 71

Epilepsia 71
Conceitos em epilepsia 71
Epidemiologia 72
Etiologia 72
Fisiopatologia 74
Crises epilépticas focais 75
Crises epilépticas generalizadas 76
Síndromes de epilepsia 77
Exames complementares 78
Tratamento 78
Prognóstico 82

Referências bibliográficas 83

PROBLEMA 9 84

Estado de mal epiléptico 84


Etiologias 84
Fases do EME 84
Objetivos do tratamento 84
Tratamento do estado de mal refratário 86
Estado de mal epiléptico não convulsivo 87
Tratamento do estado de mal super-refratário 87

Referência bibliográfica 87

PROBLEMA 10 88

Anatomia funcional do córtex cerebral 88


Áreas de projeção 88
Áreas de associação 89

Conceitos importantes 91
Funcionamento do córtex cerebral 91
Apraxias 91
Agnosias 91
Afasias 92
Memória 93
Miniexame do estado mental 93

Síndromes demenciais 96
Quadro clínico 96
Diagnóstico diferencial 96
Diagnóstico de acordo com a DSM-IV 96
Etiologias 97

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6 Módulo 402

Doença de Alzheimer 97
Epidemiologia 98
Fisiopatologia 98
Manifestações clínicas 98
Diagnóstico 99
Tratamento 99
Prognóstico 100

Referências bibliográficas 100

PALESTRA 2 101

Fisiologia do sono 101

Transtornos do sono 101


Classificação de acordo com a ICSD – 2013 101
Manifestações clínicas 101
Diagnóstico 102
Apneia obstrutiva do sono 102
Insônia 103

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 7

Módulo 402 – Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 1
1. Discutir as principais alterações que acometem a junção neuromuscular.
2. Discutir a miastenia gravis.
3. Discutir os diagnósticos diferenciais da miastenia gravis.
4. Discutir os aspectos biopsicossociais da doença (relação entre prognóstico e repercussões).
Antonio, 59 anos, aposentado, há 2 meses iniciou dificuldade na deglutição e mastigação de alimentos sólidos, que
se agravava ao longo das refeições e no decorrer do dia, engasgando-se com frequência. Após 1 mês do início do
quadro, passou a apresentar diplopia durante as leituras, com queda das pálpebras associada. Em relação a
antecedentes, tem HAS em tratamento com associação de valsartana /anlodipino (160 mg/5 mg), na dose de 1
comp. por dia. Ao exame físico: EG bom; hidratado; normocorado; PA: 130 x 80 mmHg; ausculta cardíaca normal;
vigil, orientado T/E; atento; linguagem: fluência e compreensão normais, porém com evolução para disartria e fala
nasalada ao longo do discurso; acuidade visual normal; ptose palpebral parcial bilateral e paresia de toda a
musculatura ocular extrínseca de ambos os olhos após olhar fixamente para cima durante 40 segundos; pupilas
isocóricas e fotorreagentes; sensibilidade facial normal; paresia bilateral de masseteres; reflexo de convergência e
acomodação normais; mímica facial normal; acuidade auditiva normal; véu palatino com elevação normal
bilateralmente; reflexo nauseoso presente à E e D; esternocleidomastoideos e trapézios com trofismo e tônus
normais; língua com força e trofismo normais; tônus e trofismo muscular normais nos 4 membros; manobra dos
braços estendidos: queda de ambos os MMSS após 10s; manobra de Mingazzini: queda de ambos os MMII após
30s; reflexos miotáticos grau 2 em MMSS e MMII; reflexo plantar com resposta em flexão bilateral; coordenação
normal nos MMSS e MMII; equilíbrio normal; sensibilidade superficial e profunda normais nos 4 membros. O
residente de clínica médica que o atendeu discutiu o caso com um neurologista e os dois estabeleceram suas
principais hipóteses diagnósticas. Ficaram em dúvida se internaria ou não o paciente devido à pandemia pelo
SARS-CoV2. Pediram exames complementares para estabelecimento de diagnóstico diferencial. Antonio e seus
familiares estavam preocupados com a repercussão do quadro sobre sua alimentação e no cotidiano.
• Diagnóstico sindrômico: síndrome miastênica
• Diagnóstico topográfico: junção neuromuscular
• Diagnóstico etiológico: autoimune
• Diagnóstico nosológico: miastenia gravis
• Conduta:

Miastenia gravis
A miastenia gravis (MG) é um distúrbio neuromuscular caracterizado por fraqueza e fatigabilidade dos
músculos esqueléticos. Está associada à redução no número de receptores de acetilcolina (AChR) nas junções
neuromusculares (JNM) devido reação autoimune mediada por anticorpos.

Fisiopatologia
Revisão de fisiologia
Na JNM, a ACh é sintetizada na terminação nervosa motora e armazenada em vesículas. Quando um potencial
de ação alcança a terminação, são liberadas de 150-200 vesículas de ACh, as quais se combinam com os
receptores distribuídos nas pregas pós-sinápticas. O canal do receptor se abre, permitindo a entrada rápida de
cátions – principalmente sódio → produz uma despolarização na placa motora da fibra muscular. Se a
despolarização for suficientemente intensa, inicia-se um potencial de ação que se propaga na fibra e
desencadeia a contração do músculo. O processo é logo interrompido por dois mecanismos: (1) hidrólise da ACh
pela acetilcolinesterase no interior das pregas sinápticas; e (2) difusão da ACh dos receptores.

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Na MG, o principal defeito consiste na redução do número de receptores de ACh da membrana pós-
sináptica, ao mesmo tempo que as pregas pós-sinápticas se tornam mais achatadas (menor superfície de contato).
Ambas as alterações culminam em menor eficiência da transmissão neuromuscular. Isto quer dizer que mesmo com
liberação normal de ACh, os potenciais produzidos são incapazes de desencadear potenciais de ação musculares.
Quando ocorre em várias JNMs, manifesta-se como fraqueza da contração muscular.
O mecanismo de exaustão pré-sináptica é normal e consiste na diminuição da quantidade de ACh liberada
a cada impulso em atividades repetitivas. No paciente miastênico, a associação entre deficiência da transmissão
neuromuscular com a exaustão normal resulta na ativação de um número progressivamente menor de fibras
musculares por impulsos nervosos sucessivos, aumentando a fadiga miastênica. Este evento pode ser observado
em exames eletrodiagnósticos que utilizam estimulação nervosa repetitiva.
As anormalidades neuromusculares na MG são resultantes de uma resposta autoimune mediada por
anticorpos anti-AChR específicos, que reduzem o número de receptores nas JNMs por meio de três mecanismos:
1) Renovação acelerada dos AChRs: está associada ao entrecruzamento e à rápida endocitose dos receptores
2) Lesão da membrana muscular pós-sináptica: deve-se a anticorpos e complementos
3) Bloqueio do sítio ativo do AChR: impede a ligação da ACh
Além destes mecanismos, uma resposta imune à quinase específica do músculo (MuSK) também pode
resultar em MG, uma vez que esta proteína contribui para o agrupamento dos receptores de ACh nas JNMs → o
ataque às proteínas MuSK resulta em menor quantidade de receptores de ACh. Anticorpos anti-MuSK ocorrem em
40% dos pacientes miastênicos sem anticorpos anti-AChR.
Por fim, uma pequena parte dos pacientes é soronegativo para ambos os anticorpos (anti-AChR e anti-
MuSK). Estes indivíduos apresentam anticorpos para outra proteína da JNM: a proteína 4 relacionada ao receptor
de LDL – o Irp4. Esta proteína também é importante para o agrupamento de AChRs. Os anticorpos patogênicos são
do tipo IgG dependentes de células T, sendo necessária imunoterapia dirigida contra as células B produtoras de
anticorpos ou contra as células T auxiliares.

Etiologia
Não se sabe ao certo como a resposta autoimune se inicia e se mantém nos pacientes miastênicos, mas
acredita-se que o timo tenha participação no processo. Os dados que contribuem para tal hipótese são:

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 9

• O timo é anormal em cerca de 75% dos pacientes com MG positiva para anticorpo anti-AChR
• Em 65%, é hiperplásico e apresenta centros germinativos ativos detectados histologicamente
• Cerca de 10% dos pacientes apresentam tumores do timo – os timomas
• Células mioides (semelhantes às musculares) no interior do timo expressam AChR, podendo servir como
fonte de autoantígeno → desencadeia a reação autoimune no interior do órgão

Características clínicas
As principais manifestações clínicas são fraqueza e Epidemiologia
fatigabilidade dos músculos. A fraqueza aumenta durante uso
repetitivo ou ao final do dia, podendo melhorar após repouso ou sono. Prevalência de 8-10 casos em 1 milhão
Durante a evolução da MG, exacerbações ou remissões podem ocorrer, Acomete todas as faixas etárias
sendo comum nos primeiros anos da doença. Remissões não costumam Mulheres → 21-40 anos
ser completas ou permanentes. Sabe-se que crises miastênicas podem Homens → 51-70 anos
ser desencadeadas por infecções ou distúrbios sistêmicos não Proporção M:H → 3:2
relacionados com a MG.
A distribuição da fraqueza muscular segue o padrão típico:
• Músculos da pálpebra e extraoculares são acometidos no início: originam queixas de diplopia e ptose
• Fraqueza facial: produz expressão de “rosnar” quando paciente tenta sorrir
• Mastigação: há um esforço prolongado ao mastigar carne, por exemplo, resultante da fraqueza do palato,
da língua e/ou da faringe → resulta em regurgitação nasal ou aspiração de líquidos/alimentos
• Fraqueza do palato: fala com timbre anasalado
• Fraqueza da língua: disartria em que a fala parece “mole”
• Cerca de 85% dos pacientes evolui para fraqueza generalizada: nos membros, o acometimento costuma
ser proximal e pode ser assimétrico
• Quando não se torna generalizada (limitada aos músculos extraoculares) por 3 anos é chamada MG ocular;
• Crise miastênica: fraqueza respiratória grave a ponto de exigir assistência médica respiratória

Diagnóstico
Diplopia, ptose, disartria, disfagia, dispneia Flutuação da fraqueza: piora com atividade
Anamnese

repetitiva, melhora com repouso


Fraqueza com distribuição característica:
segmento proximal dos membros, músculos Resultados de tratamentos anteriores
extensores do pescoço, generalizada, assimétrica
Ptose e diplopia Tempo de abdução dos braços para a frente
Exame
físico

Pesquisa da força motora: exame quantitativo da Medição da capacidade vital


força muscular
Ausência de outros sinais neurológicos
Radioimunoensaio para anti-AChR: 85% positivo Eletromiografia de fibra única: bloqueio e abalo,
Exames complementares

na MG generalizada, 50% na MG ocular. O com densidade normal de fibras → é confirmatório,


diagnóstico é definitivo se positivo, mas o mas inespecífico
resultado negativo não exclui MG → 40% dos
Cloreto de edrofônio: 2 mg + 8 mg IV → fornece
pacientes com MG generalizada e anticorpos anti-
diagnóstico altamente provável se for
AChR negativos têm anticorpos anti-MuSK
inequivocamente positivo
Estimulação nervosa repetitiva: decréscimo de
Para MG ocular ou craniana: excluir lesões
10%-15% da amplitude dos potenciais em
intracranianas por meio de TC ou RM
frequência de 2-3 choques por segundo →
diagnóstico altamente provável

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Teste de anticolinesterase
Medicamentos que inibem a enzima acetilcolinesterase (AChE) permitem que a ACh interaja
repetidamente com o número limitado de receptores nos pacientes com MG, produzindo melhora na força
muscular. O cloreto de edrofônio é o mais utilizado para fins de diagnóstico em razão do rápido início de ação (30
segundos) e curta duração do efeito (5 minutos). Seu uso está limitado a pacientes com achados clínicos sugestivos
de MG, mas com resultados negativos nos títulos de anticorpos e testes eletrodiagnósticos.
Para avaliar o efeito do edrofônio observa-se os sintomas do paciente (p. ex. fraqueza dos músculos
extraoculares, comprometimento da fala ou período em que o paciente consegue manter os braços em abdução
para frente). Inicia-se o teste com dose intravenosa de 2 mg de edrofônio. Se houver melhora evidente, o teste é
considerado positivo e encerrado. Caso não haja alteração, administra-se mais 8 mg IV. Algumas considerações
sobre o teste de anticolinesterase:
• O edrofônio é administrado em duas partes porque diminui a chance de efeitos colaterais
• São efeitos colaterais: náusea, diarreia, salivação, fasciculações e, raramente, síncope ou bradicardia
• Deve-se dispor de atropina 0,6 mg em seringa para administração IV caso surjam estes sintomas
• Falso-positivo: pode ocorrer em pacientes com outros distúrbios neurológicos
• Em alguns casos, utiliza-se um fármaco de ação mais prolongada → permite mais tempo para avaliação

Diagnóstico diferencial
1) Síndromes miastênicas congênitas não autoimunes
2) Síndrome miastênica de Lambert-Eaton
3) Miastenia induzida por fármacos
4) Botulismo
5) Neurastenia
6) Hipertireoidismo (doença de Graves)
7) Lesões expansivas intracranianas
8) Distrofia oculofaríngea
9) Miopatia mitocondrial (síndrome de Kearns-Sayre, oftalmoplegia externa progressiva)

Síndromes miastênicas congênitas não imunes


As SMC compreendem diversos distúrbios da JNM que não são autoimunes, mas decorrem de mutações
genéticas que podem afetar qualquer componente da junção. Síndromes que resultam da alteração na terminação
nervosa pré-sináptica ou nas subunidades do AChR ou da AChE compartilham muitas das manifestações clínicas da
MG autoimune – por exemplo, a fraqueza e a fatigabilidade dos músculos, podendo até mesmo acometer músculos
extraoculares, pálpebras e músculos proximais.
A suspeita de SMC surge quando os sintomas da miastenia iniciam na lactância ou na segunda infância
associados a pesquisa de anticorpos anti-AChR negativa.

Síndromes miastênicas congênitas


Tipo Características clínicas Eletrofisiologia Efeitos na placa terminal
Iniciada entre a segunda e a Resposta muscular repetitiva à Miopatia excitotóxica da placa
terceira décadas de vida estimulação nervosa motora
Canal lento

Gravidade variável Abertura prolongada do canal e Diminuição dos AChRs


maior duração dos potenciais
Fraqueza dos extensores do Lesão pós-sináptica
de placa motora
antebraço

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 11

Início precoce Aberturas rápidas e Estrutura normal da placa


Canal rápido de
baixa afinidade
infrequentes do canal motora
Gravidade moderada
Oposto à síndrome do canal
Ptose + envolvimento dos
lento
músculos extraoculares + fadiga +
fraqueza
Início precoce Resposta decrescente à Aumento da extensão das
grave de AChR
Deficiência

estimulação nervosa repetitiva placas motoras


Gravidade variável
Diminuição da amplitude dos Pregas sinápticas variáveis
Fadiga + manifestações de MG
potenciais de placa

Início precoce Resposta decrescente à Terminações nervosas


Deficiência de AChE

estimulação nervosa repetitiva pequenas → diminuição do


Gravidade variável
tamanho para compensar o
Presença de escoliose aumento da ACh na JNM
Pode ter músculos extraoculares Pregas juncionais
normais e ausência de respostas degenerativas
pupilares

Síndrome miastênica de Lambert-Eaton


A SMLE é um distúrbio pré-sináptico da JNM causado por autoanticorpos dirigidos contra os canais de
cálcio tipo P/Q nas terminações nervosas motoras. Os anticorpos são detectados por radioimunoensaio em cerca
de 85% dos pacientes com SMLE e afetam a liberação de ACh nas terminações nervosas.
• Atinge mais os músculos proximais dos membros inferiores
• Até 70% dos pacientes apresentam ptose palpebral e diplopia → acometimento de nervos cranianos
• Reflexos diminuídos ou abolidos → principal diferencial
• Alterações autonômicas (p. ex. boca seca e impotência): não estão presentes na MG → diferencial
É comum haver associação entre SMLE e um tumor, especialmente o câncer de pulmão de pequenas
células, que parece desencadear a resposta autoimune. A identificação da SMLE muitas vezes indica precocemente
a presença do tumor, permitindo sua remoção precoce e, assim, auxiliando no prognóstico do paciente.

Miastenia induzida por fármacos


Pacientes com esclerodermia ou artrite reumatoide tratados com penicilamina podem apresentar MG
autoimune verdadeira. A fraqueza geralmente é leve e a recuperação ocorre pouco tempo após a suspensão do
medicamento. Antibióticos aminoglicosídeos e procainamida: exacerbam a fraqueza em pacientes miastênicos e
causam fraqueza neuromuscular em indivíduos normais.

Botulismo
• As toxinas bacterianas são produzidas por qualquer uma das cepas de Clostridium botulinum
• As toxinas clivam proteínas específicas essenciais para a liberação de ACh na terminação nervosa
• Fraqueza bulbar semelhante a miastenia: diplopia, disartria, disfagia
• Ausência de sinais e sintomas sensoriais
• Fraqueza pode generalizar e culminar em insuficiência respiratória → semelhante à crise miastênica
• Reflexos presentes no início, mas podem diminuir com a progressão
• Consciência normal
• Achados autonômicos: íleo paralítico, constipação, retenção urinária, pupilas dilatas e boca seca

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12 Módulo 402

O diagnóstico reside na demonstração da toxina no soro por bioensaio, mas os resultados podem ser
demorados e/ou negativos. Outra forma de realizar este diagnóstico diferencial é por meio da estimulação nervosa:
mostra evidências de bloqueio neuromuscular pré-sináptico com redução dos potenciais de ação musculares
compostos, que aumentam de amplitude após estimulação repetitiva de alta frequência – diferente da MG.

Outros diagnósticos diferenciais


Neurastenia designa uma síndrome de fadiga semelhante a miastenia sem origem orgânica. Pacientes
apresentam sintomas subjetivos de fraqueza e fadiga, mas o teste muscular mostra liberação brusca ou fraqueza
voluntária – típicas dos distúrbios não orgânicos. A queixa de fadiga nesses pacientes na verdade traduz cansaço
ou apatia mais do que uma redução da força muscular sob esforço repetitivo. Já distúrbios da função tireoidiana
(hiper ou hipotireoidismo) são facilmente diagnosticados ou excluídos pelas provas de função tireoidiana – exames
de rotina em pacientes com suspeita de MG.
Uma diplopia que simule os sintomas da MG ocasionalmente pode ocorrer em razão de lesão expansiva
intracraniana que comprima os nervos para os músculos extraoculares, mas a RNM de crânio e órbitas costuma
revelar a lesão e fechar o diagnóstico. A oftalmoplegia externa progressiva é um distúrbio raro que resulta em
fraqueza dos músculos extraoculares e pode estar associada à perda de força dos músculos proximais dos membros
e outras manifestações sistêmicas.

Pesquisa de distúrbios associados


Doenças associadas Exames laboratoriais/procedimentos recomendados
Distúrbios do timo: timoma, hiperplasia TC ou RM do tórax para buscar timoma
Outros distúrbios autoimunes: tireoidite de Exames para lúpus eritematoso, fator antinuclear,
Hashimoto, doença de Graves, artrite reumatoide, fator reumatoide e anticorpos anti-tireoidianos
lúpus eritematoso, distúrbios cutâneos e história
Provas de função tireoidiana
familiar de doença autoimune
Teste PPD (prova tuberculínica)
Podem exacerbar a miastenia gravis: hipertireoidismo
ou hipotireoidismo, infecção oculta e tratamento Medição da glicemia em jejum e hemoglobina A1c
farmacológico de outros distúrbios Provas de função pulmonar
Podem interferir no tratamento: tuberculose, diabetes Densitometria óssea
melito, úlcera péptica, hemorragia digestiva, doença
renal, hipertensão arterial, asma, osteoporose e
obesidade

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 13

Tratamento

Medicamentos anticolinesterásicos
Produzem melhora parcial na maioria dos pacientes miastênicos, sendo que pacientes positivos para
anticorpos anti-AChR são os mais beneficiados. O principal agente utilizado é a piridostigmina oral, um
anticolinesterásico de duração intermediária – ação inicia em 15-30 minutos e permanece por 3-4 horas.
• Iniciar com dose moderada: 30-60 mg, 3 ou 4 vezes ao dia
• Dose máxima benéfica: 120 mg a cada 4 ou 6 horas
• A overdose pode aumentar a fraqueza
• Efeitos colaterais muscarínicos: diarreia, cólica abdominal, salivação, náuseas

Timectomia
Duas cirurgias envolvendo o timo devem ser consideradas:
1) Remoção cirúrgica do timoma: necessária para evitar uma possível disseminação local do tumor
2) Timectomia como tratamento da MG: na ausência de tumor, até 85% dos pacientes submetidos à
timectomia obtém melhora da miastenia, sendo que 35% deixam de utilizar a medicação

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A resposta à timectomia pode demorar meses ou anos, mas a grande vantagem é que o procedimento
pode oferecer benefício a longo prazo: reduz ou até elimina a necessidade do tratamento clínico contínuo. A
timectomia deve ser realizada em todos os pacientes com miastenia generalizada que estejam entre a puberdade
e os 55 anos de idade. Pacientes com MG positivos para anti-MuSK não respondem tão bem à timectomia em
comparação àqueles com anticorpos anti-AChR.

Imunossupressão
Este tratamento é efetivo em praticamente todos os pacientes com MG. Os riscos e benefícios relativos a
cada paciente e a urgência do tratamento devem ser considerados na escolha do fármaco.
• Curto prazo: administração de Ig IV ou realização de plasmaférese → paciente muito grave ou que necessita
retomar suas atividades o mais cedo possível ou que fará cirurgia
• Médio prazo: glicocorticoides, ciclosporina ou tacrolimo → melhora clínica entre 1-3 meses
• Longo prazo: azatioprina e micofenolato de mofetil → melhora após alguns meses até um ano

Glicocorticoides
Efeitos adversos
Promovem melhora na força muscular para a
maioria dos pacientes. Para evitar efeitos adversos, deve-se Supressão da resposta a infecções ou lesões → risco
administrar a prednisona em dose única ao dia. de infecções oportunistas que podem evoluir com
gravidade
1) Dose inicial baixa: 15-25 mg/dia → pacientes
Síndrome de Cushing → euforia, corcova de búfalo,
tratados inicialmente com esquema de altas doses
adelgaçamento da pele, braços e pernas mais finos
têm mais chance de sofrer enfraquecimento
devido atrofia muscular, face em lua cheia com
precoce bochechas vermelhas, aumento da gordura
2) Aumentar a dose em 5 mg/dia a cada 2 ou 3 dias abdominal, equimoses frequentes, cicatrização
até obter melhora clínica substancial ou até atingir deficiente de feridas e outros
a dose máxima de 50-60 mg/dia
Osteoporose → aumenta risco de fraturas
3) Manter a dose anterior por 1-3 meses e após este
período modificar para um esquema em dias Hiperglicemia → pode evoluir para diabetes
alternados por mais 1-3 meses → objetivo: reduzir Desgaste muscular e fraqueza muscular (quando
a dose a zero ou a um nível mínimo. em dose inicial alta)
Os pacientes costumam iniciar melhora algumas Inibição do crescimento em crianças em
semanas após atingir-se a dose máxima, e a melhora tratamento por mais de 6 meses
continua aumentando por meses ou anos. Deve-se realizar
Efeitos sobre o SNC → euforia, depressão e psicose
uma monitoração cuidadosa a fim de: (1) determinar a dose
mínima efetiva de prednisona; e (2) prevenir ou tratar os Outros efeitos → glaucoma, aumento da pressão
efeitos adversos. Poucos pacientes são capazes de intracraniana e aumento da incidência de catarata
permanecer sem agentes imunossupressores. Retirada abrupta do fármaco após terapia
prolongada → risco de insuficiência aguda da
Os erros mais comuns no tratamento dos pacientes
suprarrenal, que teve sua capacidade de síntese de
miastênicos com glicocorticoides são:
corticoesteroides suprimida durante o tratamento
• Persistência insuficiente: a melhora pode ser tardia
e gradual
• Redução da dose muito precoce, muito rápida ou excessiva
• Falta de atenção para prevenir e tratar efeitos colaterais

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 15

Outros fármacos imunossupressores


Micofenolato de mofetil
Tem boa efetividade e poucos efeitos colaterais. Todas as células possuem duas vias de produção de
purinas: a via de novo e a via de resgate alternativa – com exceção dos linfócitos, que só têm a primeira. O
mecanismo de ação do micofenolato de mofetil é a inibição da via de novo → interfere na formação de linfócitos,
mas não de outras células.
Apesar disso, o medicamento não destrói nem elimina linfócitos autorreativos preexistentes, de forma que
a melhora clínica pode ser retardada por meses a 1 ano, até que estes linfócitos morram espontaneamente. A
grande vantagem é a menor quantidade de efeitos colaterais quando comparado a outros fármacos. São os efeitos:
• Sintomas gastrointestinais
• Desenvolvimento raro de leucopenia
• Risco de neoplasia maligna
• Risco de leucoencefalopatia multifocal progressiva
Azatioprina
Este medicamento interfere na síntese de purinas: quando Importante: não se pode associar
metabolizado, gera mercaptopurina, um análogo da purina que inibe a azatioprina com alopurinol para
síntese de DNA, impedindo a proliferação clonal durante a fase de indução tratar hiperuricemia (níveis altos
da resposta imunológica. Assim, reações imunológicas do tipo celular e de ácido úrico no sangue). Os dois
mediadas por anticorpos são deprimidas pela azatioprina. fármacos compartilham a via de
degradação, de forma que o uso
Seu efeito terapêutico pode ser adicional ao dos glicocorticoides
combinado pode resultar em
e/ou permitir a redução da dose dos glicocorticoides. Porém alguns supressão grave da medula óssea
pacientes são incapazes de tolerar a azatioprina em razão da ocorrência de em função do aumento dos
reações idiossincrásicas (sintomas gripais de febre e mal-estar, supressão daefeitos da azatioprina.
medula óssea ou anormalidades da função hepática). O efeito é de longo
prazo, levando 3-6 meses para começar e até mais tempo para atingir seu pico.
Inibidores da calcineurina, ciclosporina e tacrolimo
• Seu efeito benéfico surge mais rápido do que o da azatioprina
• Pode ser usado isoladamente, mas em geral é empregado como adjuvante dos glicocorticoides para
permitir a redução da dose do esteroide
• Efeitos colaterais: hipertensão arterial e nefrotoxicidade → importante monitorar
Rituximabe
• Anticorpo monoclonal que se liga à molécula CD20 sobre os linfócitos B
• Usado no tratamento de linfomas de células B e diversas doenças autoimunes (p. ex. AR)
• Mais efetivo em pacientes com teste positivo para anticorpos anti-MuSK do que com anticorpos anti-AChR
Ciclofosfamida
Para o paciente ocasional com MG que seja genuinamente refratário ao tratamento ideal com agentes
imunossupressores convencionais, a ciclofosfamida em altas doses pode induzir um benefício prolongado por
“reiniciação” do sistema imune. Isto acontece pela eliminação dos linfócitos maduros associada à preservação dos
precursores hematopoiéticos, uma vez que estes apresentam uma enzima que hidrolisa a ciclofosfamida – a aldeído
desidrogenase. Após a reiniciação, utiliza-se imunoterapia de manutenção para manter o efeito benéfico.

Plasmaférese e imunoglobulina intravenosa


Plasmaférese Imunoglobulina intravenosa

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16 Módulo 402

Indicada aos pacientes em estado grave ou para Mesma indicação da plasmaférese e não costuma ser
melhorar seu estado antes da cirurgia útil para tratamento a longo prazo

O plasma contendo anticorpos patogênicos é Não exige equipamento especial nem acesso venoso
mecanicamente separado das células sanguíneas, as de grosso calibre → vantagens
quais são devolvidas ao paciente Tem mecanismo de ação desconhecido
Ciclo de 5 trocas (3-4 litros por troca) é administrado Dose habitual → 2 g/kg por 5 dias, mas, se tolerada,
durante um período de 10-14 dias pode ser administrada ao longo de 3-4 dias
Promove redução a curto prazo nos anticorpos anti- Efeitos colaterais → cefaleia, sobrecarga hídrica e,
AChR → melhora clínica de muitos pacientes raramente, meningite asséptica ou insuficiência renal
Tratamento da crise miastênica
A crise miastênica corresponde ao agravamento da fraqueza de maneira a colocar em risco a vida do
paciente. Geralmente cursa com insuficiência respiratória consequente à fraqueza do diafragma e dos músculos
intercostais. Tais crises não costumam ocorrer em pacientes acompanhados adequadamente. O seu tratamento é
feito em UTI com profissionais capacitados e experientes em MG, insuficiência respiratória, doenças infecciosas e
terapias hidroeletrolíticas.
• O uso de dose excessiva de anticolinesterásicos pode desencadear uma deterioração parecida: a “crise
colinérgica” que se apresenta com miose → retira-se a medicação para excluir esta hipótese
A causa mais comum das crises miastênicas propriamente ditas é a infecção intercorrente. Esta deve ser
tratada imediatamente, visto que as defesas imunológicas do paciente devem estar comprometidas. O paciente
miastênico com febre e no início de infecção deve ser tratado como os outros pacientes imunocomprometidos:
1) Antibioticoterapia precoce e efetiva 3) Fisioterapia respiratória
2) Assistência respiratória (de preferência não 4) A plasmaférese ou a Ig IV são úteis para
invasiva, utilizando pressão positiva bifásica acelerar a recuperação
nas vias respiratórias)

Interações medicamentosas
Alguns medicamentos devem ser evitados sempre que possível, e os pacientes miastênicos devem ser
cuidadosamente monitorados sempre que qualquer medicamento novo for introduzido.

Medicamentos que podem agravar a MG

Antibióticos: aminoglicosídeos (estreptomicina, tobramicina), quinolonas (ciprofloxacino, levofloxacino),


clindamicina, vancomicina, macrolídeos (azitromicina)
Miorrelaxantes não despolarizantes para cirurgia: D-tubocurarina, pancurônio, vecurônio, atracúrio
Betabloqueadores (propanolol, atenolol, metoprolol), procainamida
Anestésicos locais e agentes relacionados (bloqueadores neuromusculares): procaína, xilocaína em grandes
quantidades, procainamida
Toxina botulínica (exacerba a fraqueza), magnésio (reduz a liberação de acetilcolina), penicilamina (pode causar
MG), cloroquina e hidroxicloroquina, anticorpos monoclonais

Medicamentos com interações importantes na MG


Ciclosporina: possui ampla gama de interações medicamentosas que podem elevar ou reduzir os níveis e a
atuação da ciclosporina
Azatioprina: não associar a alopurinol → combinados podem desencadear mielossupressão

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 17

Avaliação do paciente
A avaliação periódica é importante para mensurar a eficácia do tratamento e acompanhar os efeitos
colaterais induzidos por fármacos. Os testes clínicos mais úteis são:
• Tempo de sustentação dos braços abduzidos para a frente (até 5 minutos completos)
• Capacidade vital forçada
• Amplitude dos movimentos oculares
• Tempo até o aparecimento da ptose durante o olhar para cima
• Exame muscular manual
• Dinamometria quantitativa dos músculos dos membros (em especial proximais)
É interessante utilizar um formulário com perguntas sobre a evolução recente e achados do exame físico.

Caso clínico do problema


Ficha da miastenia gravis
Anamnese
Estado geral Normal Bom Regular Ruim
Diplopia Nenhuma Rara Ocasional Constante
Ptose Nenhuma Rara Ocasional Constante
Algum comprometimento das Definitivamente
Braços Normais Ligeiramente limitados
atividades cotidianas limitados
Fadiga ao Capaz de andar distâncias Caminha
Pernas Normais
caminhar/correr curtas minimamente
Fala Normal Disartria Disartria intensa Ininteligível
Voz Normal Desvanece Reduzida Muito prejudicada
Fadiga com alimentos Fadiga com alimentos
Mastigação Normal Sonda alimentar
normais pastosos
Deglutição Normal Alimentos normais Apenas alimentos pastosos Sonda alimentar
Dispneia a esforços
Respiração Normal Dispneia a qualquer esforço Dispneia em repouso
incomuns
Exame físico
Pressão arterial → 130 x 80 mmHg Esternocleidomastoideos e trapézios com trofismo e
Frequência de pulso tônus normais
Língua com força e trofismo normais
Peso Tônus e trofismo muscular normais nos 4 membros
Edema Manobra dos braços estendidos: queda de ambos os
Capacidade vital MMSS após 10s
Manobra de Mingazzini: queda de MMII após 30s
Cataratas? D ou E Reflexos miotáticos grau 2 em MMSS e MMII
MEO → ptose parcial bilateral Reflexo plantar com resposta em flexão bilateral
Tempo até ptose → 40 segundos Coordenação normal nos MMSS e MMII
Equilíbrio normal
Face → sensibilidade e mímica OK Sensibilidade superficial e profunda normais nos 4
Tempo de abdução dos braços → 10 s membros

• Diagnóstico topográfico: junção neuromuscular;


• Diagnóstico sindrômico: síndrome miastênica;
• Diagnóstico etiológico: autoimune;
• Diagnóstico nosológico: miastenia gravis.

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Módulo 402 18

Repercussões
É uma doença crônica com repercussões durante toda a vida do paciente. Além da doença em si, que
raramente apresenta remissão total, o próprio tratamento gera efeitos colaterais importantes, exigindo
acompanhamento contínuo a fim de adaptá-lo sempre que necessário. Muitos pacientes podem sofrer redução ou
perda da autonomia, mesmo nas atividades mais cotidianas. Da mesma forma, pode haver incapacidade para
participação de eventos sociais e familiares, trabalho ou estudo → atenção aos pacientes jovens.

Referências bibliográficas
Harrison – Medicina Interna – 19ª Edição – 2017
Rang & Dale – Farmacologia – 7ª Edição – 2012

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 19

Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 2
1. Revisar a anatomia funcional das vias sensitivas e motoras.
2. Citar as polineuropatias e as polirradiculopatias.
3. Explicar o diagnóstico diferencial das polineuropatias e polirradiculopatias.
4. Descrever a síndrome de Guillain-Barré.
5. Descrever a polineuropatia diabética.
Marta, 65 anos, há 10 dias começou com dor em região lombar esquerda, com irradiação para face anterior da coxa
homolateral. A dor é contínua, mas vem com sensação de “choques” intermitentes, havendo acentuação no
período noturno. Também vem cursando com dificuldade para levantar da cama ou subir escadas em função da
fraqueza do MI esquerdo. Tem diabetes mellitus tipo 2, com diagnóstico há 10 anos e atual descontrole glicêmico
em função do uso irregular de medicações. Ao exame neurológico, apresenta força muscular – MMSS: grau 5 à E e
D; MMII: no MID, grau 5 em todos os segmentos, no MIE, grau 4 na flexão da coxa e extensão da perna, e grau 5
nos outros segmentos; reflexos miotáticos: grau 2 nos MMSS, MID: grau 2, MIE: grau 0 no reflexo patelar e grau 2
nos outros; reflexo plantar com resposta em flexão bilateral; sensibilidade: hipoestesia tátil-dolorosa na face
anteromedial da coxa E, sendo normal nos outros segmentos; restante do exame neurológico normal. O clínico que
a atendeu fez as hipóteses diagnósticas sindrômica, topográfica e etiológica, solicitou exames complementares e
prescreveu medicação para sua dor.
• Diagnóstico sindrômico: neuropatia periférica
• Diagnóstico topográfico: gânglios das raízes dorsais
• Diagnóstico etiológico: diabetes mellitus
• Diagnóstico nosológico: neuropatia radiculoplexal diabética
• Conduta:

Polineuropatias
A polineuropatia é uma doença difusa dos nervos periféricos que não se restringe à distribuição de um
único nervo ou membro e, tipicamente, é bilateral e simétrica. Sempre devem ser realizados exames
eletrodiagnósticos para identificar as estruturas nervosas envolvidas, distribuição e gravidade da doença e para
direcionar a busca da causa subjacente. O tratamento é voltado à atenuação ou à remoção da causa subjacente.
Existem vários tipos de polineuropatia inclusive com repercussões clínicas diferentes. Alguns cursam com
perda seletiva de sensibilidade à dor, ao passo que outras são dolorosas. A perda de fibras nervosas pode ser
predominantemente nas de grande calibre ou nas de pequeno. Uma importante polineuropatia dolorosa com
perda prevalente de fibra fina é a polineuropatia diabética.

Diagnóstico diferencial
1) Os sistemas afetados → motor, sensorial, autonômico ou misto
2) Distribuição da fraqueza → apenas distal ou proximal e distal; focal/assimétrico ou simétrico
3) Natureza do déficit sensorial: perda de sensibilidade à temperatura, dor em ardência e/ou pontadas →
perda de fibras finas; perda de sensibilidade vibratória ou proprioceptiva → perda de fibras calibrosas
4) Acometimento do neurônio motor superior → pode cursar com ou sem déficit sensorial
5) Evolução temporal → aguda (até 4 semanas), subaguda (4-8 semanas) ou crônica (> 8 semanas);
monofásica, progressiva ou recorrente-remitente
6) Origem hereditária → história familiar de neuropatia; sem sintomas sensoriais, mas com sinais sensoriais
7) Distúrbios clínicos associados → câncer, diabetes, doenças do tecido conectivo ou outros distúrbios
autoimunes, infecção (HIV e hanseníase), fármacos, toxinas

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20 Módulo 402

Doenças infecciosas
As neuropatias periféricas são as complicações mais frequentes na infecção pelo HIV, principalmente a
polineuropatia distal simétrica (PDS) → desordem neurológica mais frequente no HIV. A ação linfotrópica do vírus
HIV diminui o número de linfócitos CD4 Th2, acarretando depleção das interleucinas 4 e 10 → aumenta número de
macrófagos ativados e de linfócitos CD8 no gânglio da raiz dorsal e nervo periférico. Esta proliferação celular seria
a via final comum para o dano axonal observado na PDS.

Causas metabólicas
A deficiência de vitamina B12 compromete o sistema piramidal e as colunas brancas dorsais da medula
espinal. Neste caso, o comprometimento do sistema nervoso periférico é pouco importante. A lesão na coluna
branca posterior gera parestesias e arreflexias geralmente limitadas aos pés. Sintomas de anestesia, hipoestesia
dolorosa e/ou redução na velocidade de condução nervosa ajudam a diferenciar a polineuropatia da mielopatia
cordonal posterior.
A neuropatia por carência de cobre pode ser explicada pelo fato de este elemento estar envolvido na
síntese de mielina. Sua carência pode levar à perda da atividade da citocromo-oxidase, o que resulta na redução da
síntese de fosfolipídios pelas mitocôndrias e consequente falha na mielinização dos neurônios.
A incidência de polineuropatia em indivíduos com hipotireoidismo é de cerca de 25% a 42%. Isso pode se
explicar pela síndrome poliglandular autoimune tipo 2 (SPA-2), caracterizada pela doença de Addison com diabetes
e/ou doença autoimune da tireoide. Essa síndrome apresenta um quadro clínico com manifestações neurológicas
periféricas e, sendo o hipotireoidismo um de seus fatores, pode incluir a polineuropatia. As anormalidades nervosas
apresentadas são mononeuropatia e polineuropatia sensitivomotora, causadas possivelmente pela
desmielinização por anormalidades metabólicas das células de Schwann com degeneração axonal secundária.

Neuropatias tóxicas
Muitos trabalhadores estão sujeitos à intoxicação por chumbo → operários de fábricas de bateria, de
sapato, de cachimbo, de balas para arma de fogo, de fundições de minério, pintores. Derivados orgânicos do
chumbo estão presentes em grande quantidade na atmosfera próxima a bombas de gasolina e na margem de
estradas muito movimentadas → o Pb pode ser absorvido pelas vias respiratória, dérmica e digestiva.
As características da neuropatia plúmbica são:
• Comprometimento motor de neurônios de determinado segmento periférico
• Dores articulares
• Hipoestesia
• Anestesia distal
• Queda do punho por paralisia do nervo radial, geralmente assimétrica
• Alterações mais nítidas nos membros superiores
• Pode acometer os membros inferiores, resultando em pé caído
• Eletroneuromiografia: detecta diminuição da velocidade de condução máxima motora e sinais de
desenervação

A intoxicação por mercúrio pode ser epidêmica/endêmica em locais de garimpo de ouro ou indústrias que
empregam o metal. Em trabalhos experimentais, evidenciou-se que o mercúrio ativa o sistema nervoso simpático
→ elevação sérica de adrenalina resulta em efeitos taquicardizante, hipercinético e hipertensivo. O vapor de
mercúrio pode intoxicar o SNC, sobretudo o cérebro, e provocar:
• Letargia • Ataxia
• Excitação • Coreotetose
• Hiperreflexia • Distúrbios proprioceptivos
• Tremores de extremidades • Tendência convulsiva

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 21

Neuropatia diabética
Fisiopatologia
O marco estrutural da neuropatia diabética consiste em: atrofia e perda de fibras mielinizadas e não-
mielinizadas + degeneração walleriana + desmielinização paranodal e segmentar + fraca resposta degenerativa.
Anormalidades identificadas no tecido conectivo são: (1) proliferação do tecido conectivo endoneural; e (2)
espessamento e duplicação da membrana basal → gera tumefação e proliferação de células endoteliais da
vasculatura endo e perineural.
A alteração mais precocemente detectável é a tumefação do axônio nas regiões nodal e paranodal. A isso,
associa-se a lentificação da condução nervosa e o aumento em até 5 vezes na concentração de sódio, com
persistente diminuição no potencial de repouso, causado pelo mau funcionamento da bomba de Na+ e K+.
Anormalidades encontradas no esqueleto axonal incluem neurofilamentos mal orientados, que são
posteriormente sequestrados pelas células de Schwann: reduz o volume axoplasmático e contribui para a atrofia
axonal. Mecanismos que levam a essas lesões não estão totalmente identificados, mas há evidência da participação
de quatro vias: metabólica, vascular, neurodegenerativa e inflamatória.

Via metabólica
Na via metabólica a glicose penetra em níveis anormalmente altos dentro dos nervos periféricos. No
axoplasma, a enzima aldose redutase converte a glicose em sorbitol: acúmulo de sorbitol diminui o transporte ativo
de vários metabólitos, entre eles, o mio-inositol → sua ausência reduz a atividade da enzima sódio-potássio-ATPase
→ prejuízo à atividade da bomba de sódio e potássio. Tudo isso gera acúmulo de sódio intracelular, o que altera o
potencial de repouso da membrana e diminui a velocidade de condução neural. Além disso, o acúmulo de sorbitol
e o consequente edema podem alterar a produção de prostaciclina e comprometer a difusão de gás oxigênio →
estresse oxidativo.
Produtos da glicosilação avançada (PFGA) atuam modificando a laminina e a fibronectina (essenciais para
a regeneração axonal) e formando ligações irreversíveis em receptores de macrófagos e em células endoteliais.
Essas alterações resultam em estresse oxidativo + secreção de citocinas + degeneração da matriz extracelular →
gera apoptose celular. Por fim, níveis elevados de glicose levam à ativação excessiva da proteína quinase C (PKC),
determinando produção de óxido nítrico → lesão isquêmica do nervo periférico.
Em suma, o estresse oxidativo leva ao aumento de radicais livres, gerando disfunção mitocondrial, que
pode ativar a cascata de apoptose celular. Nesta fase, ainda é tratável com insulina periférica.

Via vascular/isquêmica
Caracterizada pelo aumento da resistência vascular e pela redução do fluxo sanguíneo e da tensão de
oxigênio, que geram anormalidades microvasculares. São elas:
• Espessamento e duplicação da membrana basal
• Edema
• Proliferação endotelial e muscular lisa intimal
• Presença do trombo plaquetário oclusivo

Via neurodegenerativa
A via neurodegenerativa é explicada pelo declínio quantitativo e qualitativo da insulina, que causa
redução parcial da atividade do fator de crescimento insulina-like 1 e do fator de crescimento neuronal. Com isso,
ocorre diminuição na produção de proteínas essenciais para dois processos:
1) Formação dos neurofilamentos 2) Manutenção do transporte axonal
Ambos são imprescindíveis para o crescimento e regeneração do axônio. O resultado é a degeneração
axonal e apoptose do corpo neuronal.

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22 Módulo 402

Via inflamatória
Na via inflamatória a presença de agentes pró-inflamatórios em pacientes diabéticos promove:
recrutamento de células inflamatórias + produção de citocinas + redução do fluxo sanguíneo → hipóxia e isquemia
do nervo periférico.

Polineuropatia diabética sensorial e sensitivomotora simétrica distal (PNSD)


Caracteriza-se por déficits sensoriais que começam nos dedos dos pés e avançam gradativamente em
direção proximal para as pernas, os braços e os dedos das mãos. Casos graves podem cursar com déficit sensorial
no tronco, que se inicia na linha média e avança lateralmente. Outros sintomas são formigamento, ardência e dores
profundas e incômodas. Os exames complementares mostram:
• Estudo de condução nervosa (ECN): amplitudes reduzidas e lentidão leve a moderada das velocidades de
condução
• Biópsia de nervo: degeneração axonal, hiperplasia endotelial e, ocasionalmente, inflamação perivascular
Quanto ao tratamento, sabe-se que o controle da glicose pode reduzir o risco de desenvolver neuropatia
ou melhorar os sintomas neuropáticos existentes. O tratamento dos sintomas dolorosos pode ser feito com as
mais diversas classes de medicamentos.

Medicamento Mecanismo de ação Efeitos colaterais


Lidocaína adesivo a 5% Bloqueia canais de sódio Irritação cutânea
Antidepressivos Compete pelo sítio ativo dos
Distúrbios cognitivos, sedação,
tricíclicos → transportadores de serotonina
ressecamento dos olhos e da boca,
amitriptilina e para impedir a sua captura pelas
retenção urinária, constipação
nortriptilina terminações nervosas
1ª linha

Antiepilépticos →
Inibe a subunidade α2δ do canal de Distúrbios cognitivos, sedação, edema
gabapentina e
cálcio periférico
pregabalina
Distúrbios cognitivos, sedação,
Antidepressivo → Inibe captação de norepinefrina e
ressecamento dos olhos, sudorese,
duloxetina serotonina
náuseas, diarreia, constipação
Antiepiléptico → Distúrbios cognitivos, tontura, leucopenia,
Bloqueio dos canais NaV1.8
carbamazepina disfunção hepática
Inibe canais de Na, K e Ca,
Antiepiléptico → Distúrbios cognitivos, tontura, disfunção
aumenta concentração local de
fenitoína hepática
GABA
Astenia, sudorese, náuseas, constipação,
2ª linha

anorexia, vômitos, sonolência, boca seca,


Antidepressivo → Inibe captação de norepinefrina e
tontura, agitação, ansiedade, tremor e
venlafaxina serotonina
turvação visual, além de
ejaculação/orgasmo anormal e impotência
Liga-se aos receptores μ opioides
do cérebro → diminui as
Opioide → tramadol Distúrbios cognitivos, desconforto GI
mensagens de dor que chegam ao
SNC

Mexiletina Bloqueia canais de sódio Arritmias

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 23

Neuropatia autonômica diabética


Costuma estar associada à PNSD. Caracteriza-se por transpiração anormal, distúrbio da termorregulação,
ressecamento dos olhos e da boca, anormalidades pupilares, arritmias cardíacas, hipotensão postural,
anormalidades GI (gastroparesia, distensão pós-prandial, diarreia ou constipação crônica) e disfunção
geniturinária (impotência, ejaculação retrógrada, incontinência). Testes da função autonômica anormais, inclusive
as respostas cutâneas simpáticas e o teste quantitativo do reflexo axonal sudomotor. ECN demonstra mesmo
resultado da PNSD.

Neuropatia radiculoplexal diabética


Também conhecida como amiotrofia diabética ou síndrome de Bruns-Garland. Em 1/3 dos pacientes, é a
primeira manifestação de diabetes. O quadro clínico inclui:
• Dor intensa na região lombar baixa, no quadril e na coxa de um dos membros → padrão de neuropatia
radiculoplexal lombossacral (mais típica)
• Casos raros: polirradiculoneuropatia diabética começa nas duas pernas ao mesmo tempo
• Atrofia e fraqueza dos músculos proximais e distais do membro inferior afetado tornam-se evidentes após
alguns dias ou semanas
• Geralmente se acompanha ou é prenunciada por emagrecimento grave
• Fraqueza progride ao longo de semanas ou meses → pode continuar sua progressão por 18 meses ou mais
• Em seguida, há recuperação lenta, embora muitos pacientes fiquem com fraqueza, déficit sensorial e dor
residuais
Ao contrário da neuropatia radiculoplexal
Diagnóstico complementar

Concentração de proteínas do LCR: em geral está


lombossacral mais típica, alguns pacientes elevada, embora a contagem de células esteja normal
desenvolvem radiculopatia torácica ou, ainda mais
raramente, polirradiculoneuropatia cervical. VHS aumentada
Avaliação eletrodiagnóstica: detecta indícios de
Alguns pacientes com dores graves são
desenervação ativa dos músculos proximais e distais
tratados na fase aguda com glicocorticoides →
dos membros afetados e dos músculos paraespinais
ainda não há um estudo randomizado controlado
que comprove a eficácia. História natural desta Biópsias de nervo: podem demonstrar degeneração
neuropatia é de melhora gradativa. axonal e inflamação perivascular

Mononeuropatias diabéticas ou mononeuropatias múltiplas


Incluem a neuropatia mediana do punho e a neuropatia ulnar do cotovelo (mais comuns), além da
neuropatia fibular da cabeça da fíbula e as neuropatias ciática, femoral lateral, cutânea ou craniana. Nas
mononeuropatias cranianas, as paralisias do sétimo nervo (nervo facial) são relativamente comuns, mas podem ter
outras etiologias que não o diabetes. Nos diabéticos, uma paralisia de terceiro nervo (oculomotor) é mais comum,
sendo seguida pelo sexto nervo (abducente) e, com menor frequência, por paralisias de quarto nervo (troclear). As
paralisias diabéticas do terceiro nervo craniano costumam preservar as pupilas.

Polirradiculopatias
As radiculopatias cursam com dor nos dermátomos correspondentes e são associadas a distúrbios
sensitivos e/ou motores. A característica da dor é a piora com esforço ou em certas posturas. A polirradiculopatia é
a patologia na qual mais de uma raiz do nervo espinhal é afetada. Diversas são as causas de radiculopatia, com
destaque para processos inflamatórios (p. ex. na síndrome de Guillain-Barré): afecções degenerativas vertebrais,
iatrogenia, aracnoidite, metástases e carcinomatose meníngea.

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24 Módulo 402

Síndrome de Guillain-Barré
A SGB é uma polirradiculoneuropatia aguda, de natureza autoimune pós-
infecciosa, caracterizada por paralisia flácida com dissociação albuminocitológica (níveis
altos de proteínas no LCR com contagem normal de células). A SGB engloba um grupo de
doenças dos nervos periféricos, cuja distinção é feita pela distruibuição da fraqueza nos
membros ou nos músculos inervados pelos NC.

Eventos antecedentes
Cerca de 70% dos casos de SGB ocorrem de 1-3 semanas após processo infeccioso
agudo → respiratório ou gastrointestinal:
• Campylobacter jejuni (mais frequente)
• CMV ou vírus Epstein-Barr
• Mycoplasma pneumoniae, HIV e Hepatite E
• Algumas imunizações, como vacina de Influenza

Imunopatogênese
Pesquisas apontam a existência de uma
base autoimune para a polineuropatia
desmielinizante inflamatória aguda (PDIA).
Trata-se de mecanismos imunes celulares e
humorais → aplicam-se a todos os subtipos de
SGB.
A SGB surge diante de respostas
imunológicas a antígenos alheios (agentes
infecciosos, vacinas) que se dirigem
erroneamente ao tecido nervoso do
hospedeiro por meio do mecanismo de
semelhança de epítopos (mimetismo
molecular). Os alvos neurais são representados
pelos glicoconjugados, presentes em grande
quantidade no sistema nervoso, inclusive nos
nodos de Ranvier e placas motoras → destaque
para gangliosídeos GM1, que possuem resíduos
de ácido siálico. Estes compostos estão
expostos na membrana plasmática e, portanto,
estão suscetíveis ao ataque mediado por
anticorpos.
Anticorpos antigangliosídeos,
principalmente contra GM1 (ganglioside-
monosialic acid), aparecem em 20-50% dos
casos, sobretudo na NAMA (neuropatia axonal
motora aguda) e NAMSA (neuropatia axonal
motossensorial aguda) e nos casos precedidos
de infecção por Campylobacter jejuni. O ácido
siálico dos gangliosídeos também pode ser encontrado na bactéria C. jejuni. Assim, durante uma infecção por
determinadas cepas de C. jejuni, os resíduos de ácido siálico do patógeno podem desencadear a ativação das
células dendríticas por meio de sinalização via TLR4 (Toll-like receptor), promovendo a diferenciação das células B
e a amplificação da autoimunidade humoral.

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 25

Os anticorpos anti-GM1 são capazes de desencadear lesão mediada pelo complemento nas junções
paranodais axônio-glia, desorganizando a aglomeração dos canais de sódio e provavelmente contribuindo para o
bloqueio de condução.

Fisiopatologia
Nas formas desmielinizantes da SGB, a origem da paralisia flácida e do distúrbio sensorial é o bloqueio da
condução → indica que as conexões axonais permanecem intactas. Portanto, a recuperação pode acontecer
rapidamente à medida que a remielinização ocorra. Em casos graves de SGB desmielinizante, ocorre degeneração
axonal secundária → se for muito extensa, observa-se recuperação mais lenta e maior grau de incapacidade
residual.
Quando um padrão axonal primário é detectado em testes eletrofisiológicos, infere-se que os axônios
sofreram degeneração, foram desconectados de seus alvos (JNM) e, portanto, devem regenerar-se para que ocorra
recuperação. Alguns casos axonais motores têm rápida recuperação → lesão parece estar nos ramos motores
préterminais, possibilitando regeneração e reinervação mais rápidas. Nos casos leves, o brotamento colateral e a
reinervação dos axônios motores sobreviventes próximos à JNM começam a restabelecer a continuidade fisiológica
com as células musculares → processo que ocorre ao longo de vários meses.

Manifestações clínicas
Os primeiros sintomas de SGB são paresia, paresteria, fraqueza e dor nos membros. A fraqueza progride
simetricamente por um período de 12 horas a 28 dias, após o qual se atinge o platô. Por ser uma doença dos nervos
periféricos e raizes nervosas, a SGB atinge fibras motoras, sensitivas e autonômicas, podendo gerar distúrbios
inclusive respiratórios e em nervos cranianos.
• Paralisia motora: arrefléxica, de evolução rápida, acompanhada ou não de alterações sensoriais, de caráter
ascendente → percebida como sensação de peso nas pernas
• Fraqueza: se instala em algumas horas ou dias e é
acompanhada de disestesias com formigamento nos
membros
• Dor incômoda e profunda nos músculos enfraquecidos
• Membros inferiores são mais afetados
• Diparesia facial → 50% dos pacientes
• Fraqueza bulbar + dificuldade no manejo de secreções e
manutenção das vias aéreas → acometimento de nervos
cranianos inferiores → pode ser confundido com isquemia do
tronco encefálico
• Dor no pescoço, nos ombros, no dorso ou difusamente na
coluna vertebral → 50% dos pacientes
• Febre e sintomas constitucionais ausentes → se presentes,
geram dúvida diagnóstica
• Reflexos tendíneos profundos reduzidos ou abolidos nos
primeiros dias de instalação
• Déficits sensoriais cutâneos: perda das sensibilidades álgica
e térmica → relativamente leves
• Funções servidas por fibras sensoriais grossas: reflexos tendíneos profundos e propriocepção → são mais
afetadas
• Casos graves: disfunção vesical (transitória)
• Manifestações autonômicas: perda do controle vasomotor (flutuação ampla da pressão arterial),
hipotensão postural e arritmias cardíacas → monitorar cuidadosamente e tratar – grande risco de morte

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26 Módulo 402

Subtipos de Guillain-Barré
Subtipo Características e diagnóstico Patologia e diagnóstico
Adultos são mais acometidos Primeiro ataque na superfície da
Polirradiculoneuropatia 90% dos casos no mundo ocidental célula de Schwann → lesão difusa da
desmielinizante Recuperação rápida mielina, ativação de macrófagos e
inflamatória aguda Anticorpos anti-GM1 (< 50%) infiltração linfocitária
(PDIA)
Eletrodiagnóstico: desmielinizante Lesão axonal secundária variável
Crianças e adultos jovens Primeiro ataque aos nodos de Ranvier
Prevalente na China e no México motores → ativação de macrófagos,
Neuropatia Pode ser sazonal poucos linfócitos, macrófagos
axonal motora aguda Recuperação rápida periaxonais frequentes
(NAMA) Anticorpos anti-GD1a
Extensão da lesão axonal altamente
Eletrodiagnóstico: axonal variável
Principalmente adultos
Incomum
Neuropatia Igual à NAMA, mas também afeta
Recuperação lenta, com frequência
axonal motossensorial nervos e raízes sensoriais
incompleta
aguda (NAMSA) Estreitamente relacionada com a NAMA Lesão axonal geralmente intensa
Eletrodiagnóstico: axonal
Adultos e crianças
Oftalmoplegia, ataxia e arreflexia
Síndrome de Poucos casos examinados
Anticorpos antiGQ1b (90%)
Miller Fisher (SMF) Assemelha-se à PDIA
Eletrodiagnóstico: axonal ou
desmielinizante

Características laboratoriais e eletrodiagnósticas


Exame do líquido cefalorraquidiano Achados eletrodiagnósticos
Normal quando sintomas começaram há menos de 48h Leves ou ausentes nos estágios iniciais da SGB →
pioram conforme a evolução clínica
Ao fim da primeira semana → proteína elevada
Polineuropatia desmielinizante inflamatória aguda:
Proteína de 100-1.000 mg/dL → sem pleocitose
• Manifestações iniciais → latências prolongadas da
concomitante (dissociação proteinocitológica)
onda F, latências distais prolongadas e amplitudes
Pode ocorrer aumento transitório na contagem de reduzidas do potencial de ação muscular
leucócitos → 10-100/μL composto (PAMC)
• Manifestações tardias → redução da velocidade e
Pleocitose persistente LCR → necessário pensar em
bloqueio de condução, dispersão temporal
diagnósticos diferenciais:
• Diagnóstico alternativo → mielite viral Potenciais de ação de nervos sensoriais podem estar
normais
• Diagnóstico concomitante → infecção pelo HIV não
identificada, leucemia/linfoma com infiltração de Patologia axonal primária → redução da amplitude dos
nervos ou neurossarcoidose potenciais de ação musculares compostos e redução
dos potenciais de ação de nervos sensoriais na NAMSA

Diagnóstico
Em geral, todos os pacientes com suspeita de SGB farão hemogramas completos e dosagem de glicose,
eletrólitos, função renal e enzimas hepáticas, cujos resultados podem excluir outras causas dos sintomas (p. ex.,
infecções, disfunções metabólicas, distúrbios eletrolíticos). Outro exame utilizado para excluir outras causas é o do
LCR, que na SGB é caracterizado pela dissociação albuminocitológica (tabela acima).

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 27

Os estudos eletrodiagnósticos não são obrigatórios no diagnóstico da SGB, mas podem ser úteis. O exame
característico do paciente com SGB revela velocidades de condução reduzidas, amplitudes reduzidas do potencial
somassensitivo e motor, dispersão temporal anormal e/ou bloqueios parciais da condução motora → são os sinais
eletrodiagnósticos de polineuropatia ou radiculoneuropatia.

Critérios diagnósticos SGB – National Institute of Neurological Disorders and Stroke


Características necessárias para o diagnóstico Características que lançam dúvida sobre o diagnóstico
Fraqueza bilateral progressiva dos braços e pernas Números elevados de células mononucleares ou
(inicialmente, pode haver o envolvimento somente das polimorfonucleares no LCR (>50×106 /l)
pernas)
Assimetria acentuada e persistente da fraqueza
Reflexos tendinosos ausentes ou reduzidos nos
membros afetados (em algum momento no curso Disfunção vesical ou intestinal no surgimento ou
clínico) persistente durante o curso da doença
Características que embasam fortemente o diagnóstico Disfunção respiratória grave com fraqueza limitada nos
A fase progressiva dura de dias a 4 semanas membros no surgimento
(geralmente < 2 semanas) Sinais sensitivos com fraqueza limitada no surgimento
Sintomas e sinais sensitivos relativamente leves Febre no surgimento
(ausentes na variante motora pura)
Nadir < 24 h
Comprometimento do nervo craniano, principalmente
Nível sensitivo bem demarcado, indicando lesão na
paralisia facial bilateral
medula espinhal
Dor muscular ou radicular nas costas ou nos membros
Hiperreflexia ou clônus
Nível proteico elevado no LCR (níveis proteicos normais
Resposta extensora do reflexo cutâneo plantar
não excluem o diagnóstico)
Dor abdominal
Características eletrodiagnósticas da neuropatia
sensitivomotora ou motora (eletrofisiologia normal Progressão lenta com fraqueza limitada e sem
nos estágios iniciais não excluem o diagnóstico) comprometimento respiratório
Características que excluem o diagnóstico Progressão continuada por > 4 semanas após
começarem os sintomas
Diagnóstico de outras causas de fraqueza muscular
aguda (miastenia gravis, botulismo, poliomielite) Alteração de consciência (exceto na encefalite do
tronco encefálico de Bickerstaff)
Citologia anormal do LCR sugerindo invasão
carcinomatosa das raízes nervosas

O diagnóstico de PDIA é definido pelo reconhecimento do padrão de paralisia rapidamente progressiva


com arreflexia, ausência de febre ou outros sintomas sistêmicos e eventos antecedentes característicos. Os
exames laboratoriais são úteis principalmente para excluir afecções que simulam a SGB. Ter em mente os seguintes
aspectos do diagnóstico:
• Os sinais eletrodiagnósticos podem ser mínimos nas primeiras 48 horas
• O nível de proteína do LCR pode não se elevar até o fim da primeira semana
• Se a suspeita diagnóstica for forte → iniciar tratamento sem aguardar o aparecimento dos achados
eletrodiagnósticos e do LCR
• Pacientes com SGB + fatores de risco para HIV ou pleocitose no LCR → realizar teste sorológico anti-HIV

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28 Módulo 402

Diagnóstico diferencial
O diagnóstico diferencial é vasto, exigindo uma boa investigação neurológica topográfica que localize a
doença nos nervos periféricos e exclua causas cerebrais, espinais, de JNM e musculares. Na ausência de distúrbio
sensorial, deve-se considerar poliomielite, miastenia gravis, distúrbio eletrolítico (p. ex., hipocalemia), botulismo
ou miopatia aguda. As mielopatias podem ser facilmente confundidas com a SBG, mas se diferenciam por alguns
aspectos, como o nível sensitivo medular (na SBG costuma ser em bota e luva), e o acometimento piramidal (na
SGB atinge apenas 2º NM). Diante de uma paralisia abrupta com retenção urinária, deve-se realizar uma RM da
medula espinal a fim de descartar lesão compressiva.
• Mielopatias agudas (em especial com • Vírus do Oeste do Nilo
doralgia prolongada e alterações • Polirradiculite por CMV (em pacientes
esfinctéricas) imunocomprometidos)
• Difteria (alterações orofaríngeas precoces) • Neuropatia ou miopatia de doença crítica
• Polirradiculite de Lyme e outras paralisias • Distúrbios da junção neuromuscular, como
transmitidas via carrapatos miastenia gravis e botulismo (perda precoce
• Porfiria (dor abdominal, crises convulsivas, da reatividade pupilar)
psicose) • Intoxicações por organofosforados, tálio ou
• Neuropatia vasculítica (medir velocidade de arsênico
hemossedimentação) • Intoxicação por moluscos paralíticos
• Poliomielite (febre e meningismo comuns) • Hipofosfatemia grave (rara)

Tratamento
Iniciar o tratamento o mais breve possível nos pacientes que forem incapazes de caminhar 10 m sem auxílio
→ duas semanas após os primeiros sintomas não se sabe se a imunoterapia ainda será efetiva. Se o paciente estiver
no estágio de platô, é provável que o tratamento não esteja mais indicado (a não ser que o paciente tenha fraqueza
motora intensa e não se possa excluir a possibilidade de ocorrência de ataque imunológico ainda em curso).
• IgIV → terapia inicial escolhida em razão da facilidade de O tratamento com plasmaférese reduz em
administração e bom histórico de segurança 50% a necessidade de ventilação
• Acredita-se que a IgIV é preferível à plasmaférese (PF) para mecânica (de 27% para 14%) e aumenta a
as variantes de NAMA e SMF da SGB probabilidade de recuperação plena após
1 ano (de 55% para 68%). A ausência de
• A IgIV é administrada em infusão contínua durante 5 dias
melhora perceptível após um ciclo de IgIV
para uma dose total de 2 g/kg de peso corporal
ou PF é indicação para tratamento
• Anticorpos anti-idiotípicos presentes nas preparações de alternativo → alguns pacientes tratados no
IgIV parecem neutralizar os autoanticorpos da SGB → pode início da evolução da SGB melhoram, mas,
explicar seu efeito terapêutico em seguida, sofrem recidiva no prazo de 1
• Um ciclo de plasmaférese em geral consiste em troca de 40 mês. Nesses casos, a repetição breve do
a 50 ml/kg de plasma 4-5 vezes por semana tratamento original costuma ser efetiva.
Em pacientes com formas muito leves de SGB, pode-se optar pelo tratamento conservador sem IgIV ou PF.
Já na fase de piora da SGB, a maioria dos pacientes necessita de monitoração em unidade de terapia intensiva,
observando:
• Capacidade vital • Função cardiovascular
• Ritmo cardíaco • Consideração precoce de traqueostomia
• Pressão arterial (após duas semanas de intubação)
• Nutrição • Fisioterapia torácica
• Profilaxia de trombose venosa profunda

Mudanças frequentes de decúbito e cuidados com a pele são importantes, bem como exercícios diários
cobrindo todo o arco de movimentos para evitar contraturas articulares e tranquilização diária acerca das
perspectivas geralmente boas de recuperação.

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 29

Prognóstico e recuperação
Cerca de 85% dos pacientes obtém recuperação funcional completa ao longo de vários meses a 1 ano,
embora alguns achados possam persistir (arreflexia, fadiga) → em 15% dos casos há alguma sequela persistente. Os
pacientes podem piorar continuamente por períodos que variam de duas a quatro semanas e até que o quadro se
torne estável (platô). A SGB tem mortalidade abaixo de 5% e ocorre geralmente por complicações pulmonares
secundárias. Alguns pacientes estão sujeitos a menor eficácia do tratamento, como aqueles com lesão axonal
primária ou secundária, de idade avançada, que apresentaram episódio fulminante grave ou que tiveram o início
do tratamento retardado por algum motivo. Entre 5 e 10% dos pacientes com SGB típica apresentam uma ou mais
recidivas tardias, caracterizando uma polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica.
É importante realizar uma avaliação periódica para monitorar a pregressão da doença e a ocorrência de
complicações, visto que os pacientes podem levar meses para se recuperar completamente. A frequência de
monitoramento deve ser decidida diante da avaliação de cada caso individualmente. As recomendações incluem:
1) Medição rotineira da função respiratória, já que nem todos os pacientes com IRpA apresentarão sinais
clínicos de dispneia
2) Teste da força muscular no pescoço, braços e pernas → utilizar escala de classificação do Medical Research
Council
3) Avaliação da incapacidade funcional → escala de incapacidade da SGB
4) Monitoramento da dificuldade de deglutir e tossir
5) Avaliação da disfunção autonômica → ECG e monitoramento de FC, PA e funções vesical e intestinal

Casos clínicos do P2
Caso 1 Caso 2
Diagnóstico topográfico: raízes nervosas Diagnóstico topográfico: 2º NM cervicais e lombares
D. sindrômico: paralisia flácida aguda D. sindrômico: neuropatia periférica
D. etiológico: reação autoimune, mimetismo molecular D. etiológico: diabetes mellitus
D. nosológico: síndrome de Guillain-Barré D. nosológico: neuropatia radiculoplexal diabética

Referências bibliográficas
Bear, Connors & Paradiso – Neurociências – 4ª Edição – 2017
Machado – Neuroanatomia Funcional – 3ª Edição – 2013
Harrison – Medicina Interna – 19ª Edição – 2017
Onofre – Dor: Princípios e Práticas – 1ª Edição – 2008
Revista Neurociências – Diretrizes Baseadas em Evidências Diagnóstico e manejo da Síndrome de Guillain-
Barré em dez etapas – 2021
The New England Journal of Medicine – Review Article: Guillain–Barré Syndrome – 2012

Sophia Molina Turma XIX


30 Módulo 402

Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 3
1. Revisar a anatomia funcional dos neurônios motores (1º e 2º).
2. Explicar os diagnósticos topográficos e sindrômicos da síndrome do neurônio motor superior.
3. Explicar os diagnósticos topográficos e sindrômicos da síndrome do neurônio motor inferior.
4. Discutir os diagnósticos diferenciais e etiologias das síndromes de 1º e 2º neurônio.
Rodolfo, 40 anos, que estava internado na enfermaria do HRAN há 2 dias. Dez dias antes da internação, apresentou
febre alta (39º C) e mialgia difusa, evoluindo para anosmia após 48 horas. No 3º dia de quadro, realizou swab
nasofaríngeo para exame de Rt-PCR para SARS-CoV2, sendo positivo. Evoluiu com tosse seca, porém sem hipoxemia
ou dispneia. No 10º dia de quadro, começou a apresentar parestesias em ambos os pés e fraqueza nos 4 membros,
ascendente, de instalação aguda e progressão em 12 horas, evoluindo para dificuldade de deambulação. Nega
retenção urinária ou intestinal. Diante desse quadro foi levado por familiar ao HRAN. Nega outros antecedentes
patológicos. Ao exame físico: EG regular; PA: 180 x 120 mmHg; FC: 120 bpm; ausculta cardíaca com algumas
extrassístoles, mas sem sopros; eupneico, com ausculta respiratória normal e Sat O2 98% em ar ambiente, ao exame
neurológico: vigil, orientado no tempo e no espaço; pares cranianos: anosmia bilateral, ageusia, restante normal;
tetraparesia com grau 0 em segmentos proximais e grau 2 em segmentos distais; reflexos profundos abolidos em
MMSS e MMII; reflexo plantar sem resposta bilateral; sensibilidade superficial e profunda normais. O neurologista
estabeleceu as hipóteses diagnósticas sindrômica e topográfica, solicitou exames complementares e orientou uma
conduta terapêutica.
• Diagnóstico sindrômico: paralisia flácida aguda
• Diagnóstico topográfico: raízes nervosas
• Diagnóstico etiológico: reação autoimune, mimetismo molecular
• Diagnóstico nosológico: síndrome de Guillain-Barré
• Conduta:

Anatomia das vias sensitivas e motoras

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 31

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32 Módulo 402

Anatomia funcional dos neurônios motores


O controle da motricidade é feito em três níveis do sistema nervoso:
1) Áreas de associação do neocórtex e núcleos da base do prosencéfalo: responsáveis pela estratégia de
movimento → estabelecer a finalidade do movimento e a estratégia que melhor atinge a finalidade
2) Córtex motor e cerebelo: associados à tática do movimento → sequência de contrações musculares,
orientadas no espaço e no tempo, para atingir a meta estratégica com acurácia
3) Tronco encefálico e medula espinhal: realiza a execução do movimento → ativação do neurônio motor e
de interneurônios que geram o movimento direcionado à meta, além de correção da postura se necessário
O 1º neurônio motor – também chamado neurônio motor superior – fica localizado centralmente e emite
axônio que descende em direção ao 2º neurônio motor, localizado no corno ventral da medula espinhal. Os
neurônios motores inferiores inervam a musculatura somática → comandam diretamente a contração muscular.
Os axônios dos NM inferiores formam as raízes ventrais: cada raiz ventral se junta com uma raiz dorsal para formar
um nervo espinhal misto, que deixa a medula através dos espaços intervertebrais. Os NM inferiores podem ser de
dois tipos: alfa ou gama. Os motores alfas estão diretamente relacionados à geração de força pelo músculo. Um
neurônio motor alfa e as fibras musculares que ele inerva compõem a unidade motora. Contrações musculares
resultam da atividade individual e combinada das unidades motoras envolvidas. Existem três vias que se
comunicam com o neurônio motor alfa:
• Células ganglionares da raiz dorsal provenientes do fuso muscular → informam o comprimento muscular
ao NM, criando um sinal de retroalimentação
• Neurônios motores superiores do córtex cerebral motor e do tronco encefálico → iniciam o controle do
movimento voluntário
• Interneurônios da medula espinhal → podem inibir ou excitar o NM
Tendo em mente os componentes do sistema motor, é interessante separá-los em dois sistemas distintos:
o sistema piramidal e o sistema extrapiramidal. O sistema piramidal é responsável pela motricidade voluntária e
tem ação facilitadora sobre os reflexos cutâneos superficiais. É composto pelos tratos: (1) corticoespinhal, que
une o córtex motor cerebral aos neurônios motores da medula espinhal; e (2) corticonuclear, que une os núcleos
dos nervos cranianos aos NM. Já o sistema extrapiramidal está associado à movimentação automática,
involuntária e de ajustes ou correções de movimentos voluntários. É composta por quatro tratos: rubrosepinhal,
tectoespinhal, vestibuloespinhal e reticuloespinhal.

Déficit de força muscular


Termos utilizados: Topografia:
Fraqueza: diminuição da potência Monoplegia/paresia: apenas um membro
muscular em relação ao padrão normal
Hemiplegia: um hemicorpo
da pessoa → focal ou generalizada
Paraplegia: membros simétricos acometidos → braquial ou crural
Paresia: déficit parcial de função
Tetraplegia: quatro membros acometidos por uma lesão
Plegia: déficit total de função
Diplegia: dois hemicorpos acometidos em virtude de duas lesões

Avaliação clínica
A fim de diferenciar as síndromes de neurônio motor e superior, deve-se avaliar reflexos, tropismo
muscular e a presença de fasciculações. Todas as formas de motricidade passam pela unidade motora, de forma
que uma lesão no 2ª NM acarretaria perda de várias formas de motricidade → fraqueza, diminuição do tônus
muscular, diminuição dos reflexos miotáticos fásicos e atrofia muscular.

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 33

Já a síndrome piramidal (1º NM) cursa com fraqueza, sinais de déficit piramidal, ausência do reflexo
cutaneoabdominal e sinal de Babinski e liberação do tônus e reflexos que, até então, eram inibidos pelo trato
reticuloespinhal → gera hipertonia e hiperreflexia.

Diagnóstico diferencial das síndromes motoras


Sintoma/síndrome NM superior NM inferior
Em comum Fraqueza Fraqueza
Tônus Aumentado Diminuído ou normal
Reflexos Hiperreflexia Hiporreflexia ou arreflexia
Trofismo muscular Pouca atrofia, atrofia tardia Atrofia leve a grave
Fasciculação Ausente Presente (lesões do corno anterior)
Distribuição da fraqueza Em grupo muscular, distal Focal ou generalizada
Presente, mas pode estar ausente
Reflexo cutaneoabdominal Ausente
nas lesões de nervos abdominais
Em flexão, mas pode estar abolido
Reflexo cutaneoplantar Em extensão → sinal de Babinski
nas lesões de nervos dos pés

Síndrome do neurônio motor superior


Decorre de lesão cortical ou das vias centrais relacionadas com a motricidade (tratos corticoespinhal e
reticuloespinhal inibidor). Uma lesão piramidal costuma acometer agrupamentos musculares extensos, pois um
feixe nervoso central influência viários grupos de neurônios periféricos.
A fase aguda é marcada por paralisia flácida, fraqueza proximal e distal, seguida de melhora nas regiões
axial e proximal → isto ocorre porque há maior representação cortical motora dos segmentos distais e há outros
tratos que são responsáveis pela inervação proximal, como o reticuloespinhal e vestibuloespinhal, além desta ser
bilateral. Os sinais piramidais podem ser de liberação (fase subaguda) ou deficitários (fase aguda).
Os sinais de liberação incluem:
• Hiperreflexia profunda: o trato reticuloespinhal bulbar exerce efeito inibitório sobre o arco reflexo → sua
lesão provoca hiperatividade dos motoneurônios → reflexos mais amplos e bruscos
• Reflexos policinéticos: associados à hiperexcitabilidade dos motoneurônios → ao exame, uma percussão
desencadeia contrações repetidas do mesmo grupo muscular
• Aumento da área reflexógena: um mesmo reflexo pode ser conseguido percutindo uma área maior
• Clônus: causado pelo estiramento passivo muscular → os fusos musculares estirados enviam estímulo
excitatório à medula → há integração do reflexo + envio da mensagem de volta à musculatura por NM alfa
para que esta se contraia → diminui o estiramento do fuso e o estímulo excitatório (se o examinador seguir
estirando, terão estímulos contínuos e contrações repetidas)
• Hipertonia espástica: aumento da excitabilidade dos neurônios alfa e gama → fusos musculares ficam mais
sensíveis ao estiramento do músculo → contração reflexa mais intensa que o normal → mais percebida com
movimentos mais rápidos (velocidade dependente) e no início do movimento (sinal do canivete). O
acometimento é desigual nos membros superiores e inferiores → superior mais flexores (postura de
Wernick-Mann, braço fletido e polegar dentro dos outros dedos) e inferiores mais extensores (marcha
ceifante, com o músculo esticado)
• Sincinesias
• Sinal de Babinski: extensão do hálux ao fazer o cutaneoplantar → o trato corticoespinhal inibe o reflexo
primário cutaneoplantar em extensão (sua lesão cursa com este sinal) → ocorre diante de lesões que
estejam acima dos níveis medulares que inervam os membros inferiores (L1)
• Reflexo cutaneoabdominal (na medula de T6 a T12) também ausente ou diminuído
• Pode haver discreta e tardia hipotrofia muscular

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34 Módulo 402

Na SNM superior a hemiparesia pode se apresentar de duas formas: proporcionada (braquial e crural com
mesma intensidade) ou desproporcionada (intensidades diferentes). A lesão é dita incompleta quando acomete
face e membros. Diante de acometimento do nervo craniano contralateral → hemiparesia alterna.

Topografia da lesão
Diagnóstico diferencial das lesões do neurônio motor superior
Fraqueza desproporcionada Lesão do hemisfério direito cursa com
Córtex cerebral

anosognosia (falta de percepção da doença) e


Alteração sensitiva vaga → grafoestesia alterada
distúrbios de atenção à esquerda
(perda da capacidade de reconhecer símbolo
desenhado na mão) Pode haver depressão psíquica
Lesão do hemisfério esquerdo cursa com afasia
→ geralmente dominante para linguagem

Fraqueza completa e proporcional A cápsula interna é irrigada pelas artérias estriadas


Cápsula
interna

(provenientes da cerebral média) → sofrem muitas


Raramente poupa a face
rupturas de microaneurismas em hipertensos
Hemi-hipoestesia contralateral ao tálamo lesado
Hemiparesia alterna → acometimento de Comum distúrbio autonômico → síndrome de
membros contralaterais e nervos cranianos Horner: acometimento das fibras que conectam o
homolaterais hipotálamo à coluna intermediolateral da medula
cerebral

entre C8 e T1 – neurônios pré-ganglionares


Tronco

Sensibilidade pode estar preservada


simpáticos
Oftalmoplegia internuclear → quando presente,
Semiptose palpebral, miose, pseudo enoftalmo,
indica lesão no tronco cerebral (principalmente na
vermelhidão no olho por vasodilatação e ausência
ponte)
de sudorese (anidrose)
Paraparesia crural ou tetraparesia, *Tumor intramedular: acometimento motor do
hemiparesia/plegia braquicrural incompleta (sem membro superior na lesão cervical que com o
acometimento de nervos cranianos) crescimento atinge o membro inferior
espinhal
Medula

Perda de sensibilidade dolorosa contralateral ao *Tumor extramedular: dor é um sintoma precoce


déficit motor e depois aparecem sintomas motores nos
membros inferiores e vão subindo pelos
dermátomos do corpo com a evolução (atinge 1º
nível abaixo e depois seu próprio nível)

*Na coluna, o trato corticoespinhal tem somatotopia bem definida: as fibras mais laterais vão aos motoneurônios
lombossacrais e as mais mediais aos motoneurônios cervicais.
O nível de lesão medular é avaliado da seguinte maneira:
• C5: deltoide e bíceps • T6: acima deste não tem • L3: quadríceps femoral
• C6: extensores punho cutaneoabdominal • L4: tibial anterior
• C7: tríceps • L1: acima deste tem • L5: extensor do hálux
• C8: flexor dos dedos Babinski • S1: gastrocnêmio e
• T1: adutor dedo mínimo • L2: iliopsoas sóleo

Paralisias faciais
O nervo facial inerva a musculatura da face responsável pela mímica: origina-se na ponte → penetra o osso
temporal pelo meato acústico interno junto ao nervo VIII → emerge posteriormente pelo forame estimastóideo →
passa pela parótida → chega aos músculos. As fibras motoras que chegam ao núcleo facial são provenientes do
trato corticonuclear e da formação reticulopontina. O núcleo facial tem duas partes:

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 35

1) Rostral: inerva a metade superior da face → recebe eferências predominantemente da substância reticular
a sua volta (poucas vem do córtex)
2) Caudal: inerva a metade inferior da face → recebe eferências do córtex motor contralateral

Lesões do nervo facial em qualquer parte do seu percurso desde sua saída do núcleo facial na ponte
até a musculatura
Lesão facial periférica

Paralisia da musculatura mímica da face da metade lesada, andares inferior e superior


Perda de tônus da musculatura – desvio para o lado normal (tônus preservado)
Músculo orbicular do olho (que fecha) é acometido → olho mantem-se aberto (inervado pelo III)
Déficit de sensibilidade gustativa nos 2/3 anteriores da língua e diminuição de secreções lacrimais e
salivares
Lesões no tronco podem lesar o nervo ou o núcleo: hemiparesia alterna
Lesões supranucleares (trato corticonuclear)
Lesão facial
central

Motricidade contralateral do andar inferior da face é acometida


Outras funções periféricas do facial estão preservadas
Desvio da rima bucal para o lado normal

Síndrome do neurônio motor inferior


Distúrbios da unidade motora originam a síndrome do 2º neurônio, cujo principal sintoma é a fraqueza,
que pode estar acompanhada de fadiga e mialgia. O quadro é caracterizado por: (1) diminuição ou abolição dos
reflexos miotáticos: o acometimento dos motoneurônios impede o funcionamento normal da alça eferente do arco
reflexo → não se observa resposta motora perceptível; (2) reflexos superficiais cutaneoabdominais a
cutaneoplantar em flexão: geralmente preservados, pois dependem principalmente da integridade do trato
corticoespinhal → podem estar diminuídos ou abolidos, mas não patológicos; (3) tônus muscular: diminuído
(hipotonia) → menor reflexo de estiramento do músculo → paralisia flácida.
A atrofia muscular precoce acontece porque a lesão neuronal interrompe o fluxo axoplasmático
anterógrado de substâncias tróficas, a partir do corpo celular do neurônio, que era responsável pela manutenção
da massa muscular → diferente da atrofia por subutilização do músculo, em lesões centrais, que é tardia e menor.
• Miastenia gravis: fluxo de substâncias tróficas é mantido → menor atrofia
• Poliomielite: destruição do corno anterior da medula implica na destruição dos corpos celulares onde todo
o metabolismo neuronal se processa → maior atrofia
• Pseudo-hipertrofia: tecido muscular é substituído por fibrose e tecido adiposo, mas é um crescimento
associado a diminuição de força muscular → presente em alguns tipos de distrofias musculares
Fasciculações são contrações involuntárias de uma unidade motora devido lesão do corno anterior da
medula. Estão associadas aos mecanismos: (1) menor liberação de ACh pelo neurônio → sensibilização da placa
motora + aumento do número e responsividade dos receptores colinérgicos da JNM → ACh circulante na corrente
sanguínea poderia desencadear pequenas contrações; e (2) uma modificação nos canais iônicos, levaria o músculo
a se despolarizar espontaneamente e a originar potenciais de ação → sugere-se que após a lesão nervosa os canais
de cálcio do músculo se tornem autônomos e permitam a entrada desse íon na célula, essencial para a contração
muscular.

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36 Módulo 402

Topografia da lesão
Diagnóstico diferencial das lesões na unidade motora
Topografia Fraqueza Tônus Atrofia Fasciculação Reflexo Sensibilidade
Presente,
Corno Focal, em geral Diminuído
Flácido acentuada e Presente Preservada
anterior assimétrica ou ausente
precoce
Diminuído
Raiz Focal Flácido Presente Ausente Dor irradiada
ou ausente
Deficitária:
Focal, em geral Presente, Ausente ou hipoestesia,
Plexo/nervo Flácido Ausente
distal moderada diminuído anestesia e/ou
parestesia
JNM Difusa Normal Ausente Ausente Preservado Preservada
Tardia, se
Difusa, proximal Diminuído
Músculo Flácido acentua com Ausente Preservada
nos membros ou normal
tempo

Referências bibliográficas
Bear, Connors & Paradiso – Neurociências – 4ª Edição – 2017
Machado – Neuroanatomia Funcional – 3ª Edição – 2013
Mutarelli – Propedêutica Neurológica – 2ª Edição – 2014

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 37

Módulo 202 – Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 4
1. Revisar a anatomia funcional da medula espinhal.
2. Descrever as principais síndromes medulares e suas topografias.
3. Discutir as medidas iniciais para tratamento de lesões medulares (mielite transversa).
Carla, 30 anos, há 2 dias começou a cursar com dorsalgia. Após 2 dias de dor, apresentou quadro agudo de
dormência e déficit de força nas pernas, associado dificuldade para urinar, sendo levada ao pronto-socorro. O
quadro progrediu em 12 horas, levando à dificuldade de deambulação. Nega doenças prévias ou atuais. Há 1 ano,
apresentou quadro de “borramento” visual em olho D, que remitiu após 24 horas, não tendo procurado um médico.
Ao exame físico: EG bom, afebril, PA: 120 x 80 mmHg; FC: 82 bpm; ausculta cardíaca normal; abdome com bexiga
palpável em hipogástrio; vigil, orientada T/E, atenta; força: grau 5 em MMSS e grau 3 em MMII; reflexos miotáticos:
normais em MMSS e abolidos em MMII; trofismo: normal; tônus: normal em MMSS e diminuídos em MMII; reflexo
plantar com resposta em extensão em ambos os pés; reflexos abdominais abolidos; sensibilidade: anestesia
dolorosa de cicatriz umbilical para baixo, incluindo o períneo; apalestesia e perda de sensibilidade cinéticopostural
do rebordo costal até os pés, estando preservada em MMSS; restante do exame neurológico normal. O clínico que
atendeu Carla tinha certeza de que a lesão estava no sistema nervoso central, com base em alguns sinais clínicos
apresentados. Embora tivesse segurança sobre o diagnóstico topográfico, tinha dúvidas sobre qual síndrome
neurológica ela apresentava, pois lesões desta mesma área podem se manifestar sob mais de um tipo de síndrome.
Discutiu o caso com o neurologista que, com base na principal hipótese do diagnóstico nosológico, pediu que Carla
fosse internada, programou alguns exames complementares e orientou uma conduta medicamentosa que poderia
interferir no prognóstico dela.
• Diagnóstico sindrômico: síndrome de transecção medular completa
• Diagnóstico topográfico: medula espinhal (T8)
• Diagnóstico etiológico: reação autoimune, mimetismo molecular
• Diagnóstico nosológico: Mielite Transversa Aguda
• Conduta: RM, corticoterapia, plasmaférese

Anatomia funcional da medula espinhal


A medula espinhal é envolta
pela coluna vertebral óssea e está
ligada ao tronco encefálico. Ela é o
maior condutor de informação de pele,
articulações e músculos ao cérebro, e
vice-versa. Transecção da medula
espinhal → anestesia da pele e paralisia
dos músculos das partes do corpo
caudais à secção. A paralisia, neste
caso, não significa que os músculos não
possam funcionar, mas sim que eles
não podem ser controlados pelo
encéfalo.
Os nervos espinhais emergem
da medula espinhal através de espaços
existentes entre cada vértebra da
coluna vertebral. Cada nervo espinhal
associa-se à medula espinhal através da
raiz dorsal ou da raiz ventral.

Sophia Molina Turma XIX


38 Módulo 402

Síndromes medulares

Conceitos de uso comum:


• Anestesia: desaparecimento de uma modalidade sensorial → perda de sensibilidade tátil e dolorosa
• Hiperestesia: aumento da intensidade ou duração sensorial produzida por um estímulo
• Hipoestesia: diminuição da intensidade ou duração sensorial produzida por um estímulo
• Analgesia: perda da sensação dolorosa
• Hiper ou hipoalgesia: aumento/diminuição do limiar cutâneo para estímulos dolorosos
• Parestesias: sensações espontâneas de dor, formigamento, “alfinetadas” ou queimação → não há estímulo
• Disestesia: sensações distorcidas e desagradáveis de estímulos normalmente inócuos
• Alodínea: percepção de estímulo não doloroso como estímulo doloroso de alta intensidade
• Hiperpatia: alto limiar para estímulos dolorosos, mas se houver estímulos sucessivos de baixa intensidade
→ dor violenta
• Grafoestesia: capacidade de reconhecer símbolos pelo tato → por exemplo, letras
• Estereognosia: capacidade de reconhecer objetos por sua forma, tamanho e textura pela palpação

Secção medular
Todas as formas de sensibilidade são perdidas abaixo do nível da lesão + déficits motores e autonômicos.
Imediatamente após traumatismo com seção completa da medula → paciente entra em choque medular, que dura
de 2-4 semanas e consiste em (1) perda de todos os tipos de sensibilidade, movimentos, reflexos e tônus nos
músculos dependentes dos segmentos medulares abaixo da lesão; e (2) retenção de urina e fezes. Com o tempo →
reaparecimento dos reflexos profundos + hiperreflexia + sinal de Babinski (síndrome piramidal) → não há
recuperação da motricidade voluntária ou da sensibilidade. O nível de anestesia pode servir para identificar o
segmento medular acometido → examinar os dermátomos.

Mielite transversa
A mielite transversa aguda é a inflamação das substâncias cinzenta e branca, em um ou mais segmentos
adjacentes da medula espinal, geralmente torácicos. As causas incluem esclerose múltipla, neuromielite óptica,
inflamação autoimune, pós-infecciosa ou pós-vacinação, vasculite e certos fármacos – mas 15-30% dos casos são
idiopáticos. Tem dois picos de incidência por idade, entre 10-19 anos e 30-39.

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 39

Fisiopatologicamente, o que marca a mielite transversa é a presença de coleções localizadas de linfócitos


e monócitos, com graus variados de desmielinização, dano axonal, e ativação de células gliais na medula espinal.
Casos pós-infecciosos e pós-vacinação corroboram a hipótese de que há envolvimento de mecanismos
fisiopatológicos como mimetismo molecular e desenvolvimento de autoanticorpos. A desmielinização se manifesta
clinicamente com: (1) o sinal de Lhermitte, que corresponde a uma parestesia que irradia pela espinha ou membros
à flexão do pescoço; e (2) espasmos tônicos (contrações involuntárias e distônicas de músculos dos membros ou do
tronco). As manifestações autonômicas (urinárias, intestinais e sexuais), como incontinência ou retenção urinária,
incontinência ou constipação intestinal e disfunção sexual, variam em gravidade.
Os sintomas se desenvolvem ao longo de alguns dias, sendo que quanto mais aguda for a evolução, pior
será o prognóstico do paciente:
• Dor cervical, no dorso e na cabeça → sugere • Formigamento
inflamação intensa • Dormência nos pés e nas pernas
• Aperto em faixa no tórax ou no abdome • Dificuldade na micção
• Fraqueza

Os déficits podem evoluir durante vários dias até a mielopatia sensitivomotora transversa completa,
marcada por paraplegia, perda de sensação abaixo da lesão, retenção urinária e incontinência fecal.

Diagnóstico
Estabelecido o diagnóstico sindrômico (síndrome medular), é preciso partir para o diagnóstico etiológico,
que pode ser compressão medular, vasculite, alterações metabólicas, neoplasias etc. O primeiro passo para
investigação é a realização de uma RM da medula completa – exclui síndrome compressiva e lesão estrutural. O
achado típico de mielite transversa na RM é o realce da lesão na medula quando é infundido o gadolíneo.
Suspeita clínica de
mielopatia aguda
Radiografias de coluna
AP e perfil + RM
medular com
contraste

Mielopatia compressiva:
Mielopatia não
avaliação neurocirúrgica de
compressiva: punção
emergência, considerar
lombar de LCR
corticosteroides

Considerar mielopatia
Considerar mielopatia não
inflamatória: doenças
inflamatória: AVM, pós-
desmielinizantes (EM), doenças
radiação tardia, mielite
sistêmicas, parainfecciosas,
incipiente, outras causas mais
mielite transversa idiopática,
raras
gliomas

Iniciar metilprednisolona EV, considerar


plasmaférese em doenças
desmielinizantes/mielite idiopática
refratária, considerar anticoagulação e
ciclofosfamida em doenças sitêmicas,
considerar ATB específicos se infecção,
avaliar RM de crânio, potenciais
evocados visuais e/ou outros exames
específicos

Sophia Molina Turma XIX


40 Módulo 402

Tratamento
O tratamento da mielite transversa aguda é direcionado para a causa ou a doença associada, mas em
outros aspectos é apenas de suporte. Em casos idiopáticos, pela possibilidade de causa autoimune, administram-
se altas doses de corticoides, às vezes seguidas de plasmaférese. A eficácia deste tratamento é incerta.
• Corticoides intravenosos, em doses elevadas por três a cinco dias + corticoide via oral → reduzir a
inflamação da medula espinhal e estimular a reação do sistema imune
• Plasmaférese: quando a resposta aos corticoides intravenosos e orais não foi satisfatória → troca do plasma
sanguíneo, ou seja, remoção do fluido em que as células inflamatórias estão suspensas, para substituí-lo
por outro com medicação adequada
• Medicamentos analgésicos contra a dor, sintoma comum na mielite transversa
Prognóstico é variável: pode haver completa recuperação clínica, ou déficits residuais. A recuperação em
geral ocorre entre 3-12 meses. Pacientes que tiveram progressão muito rápida da doença tendem a ter prognósticos
mais reservados, principalmente aqueles que sofrerem choque medular.

Hemissecção medular – síndrome de Brown Séquard


Manifestações homolaterais Manifestações contralaterais

Anestesia térmica e dolorosa 1 ou 2 dermátomos


abaixo da lesão (acontece porque as fibras que
Síndrome piramidal: paralisia espástica + sinal de penetram o corno posterior podem ascender pelo
Babinski trato de Lissauer – ficam preservadas) → lesão do trato
espinotalâmico lateral
Perda de propriocepção consciente e tato epicrítico:
lesão dos tratos grácil e cuneiforme → só decussam no Pouca diminuição do tato protopático e pressão: lesão
tronco encefálico do trato espinotalâmico anterior → comprometimento
relativamente pequeno devido vias colaterais homo e
contralaterais

Síndrome da substância cinzenta


Pode ser causada por seringomielia, hematomielia ou tumores. A siringomielia corresponde à formação
de uma cavidade contendo líquido no canal central da medula → destruição da parte central da substância cinzenta
e da comissura branca. São lesadas as fibras que cruzam o plano mediano para formar os dois tratos
espinotalâmicos laterais: anestesia térmica e dolorosa bilateral na área inervada pelos segmentos medulares
acometidos → gera distribuição suspensa da hipoestesia. Propriocepção e tato preservados: não acomete funículo
posterior.
• Dissociação siringomiélica: anestesia térmica e dolorosa + preservação de tato e propriocepção
• Siringomielia é mais comum na medula cervical e torácica alta → déficit sensitivo no alto do tórax e nos
membros superiores (plexo braquial: C5-T1) → pode ser chamada sensibilidade em xale

Isquemia da artéria espinhal anterior


Trombose da artéria espinhal anterior (irriga os 2/3 anteriores da medula) → lesão das colunas neuronais
anteriores: acomete tratos espinotalâmicos e corticoespinhal. Há concomitância de síndrome motora periférica e
síndrome piramidal. O quadro é marcado por diferentes manifestações a partir da localização:
• Ao nível da lesão: paralisia flácida, arreflexia, atrofia muscular e fasciculações → síndrome do neurônio
motor inferior devido destruição do corno anterior da medula

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 41

• Abaixo da lesão: paralisia espástica, hiperreflexia e sinal de Babinski bilaterais (lesão dos tratos
corticoespinhais) + perda da sensibilidade térmica, dolorosa e tátil protopática (lesão dos tratos
espinotalâmicos laterais e anteriores) + preservação de sensibilidade tátil epicrítica e proprioceptiva
(tratos posteriores) + manifestações autonômicas, com queixas urinárias (lesão das inervações autônomas
anteriores)

Lesões do funículo posterior


Lesão típica de tabes dorsalis (neurossífilis) e deficiência de cobre e/ou vitamina B12. Resulta em perda da
sensibilidade profunda em ambos os hemicorpos abaixo da lesão → lesão dos tratos grácil e cuneiforme
bilateralmente: perda de propriocepção consciente, palestesia e tato epicrítico. Comprometimento da
propriocepção consciente cursa com ataxia sensitiva (incoordenação) → déficit de coordenação motora que piora
com o fechamento dos olhos (sinal de Romberg).
• Tabes dorsalis: decorrente da neurossífilis → perda de sensibilidade profunda + não há perda motora +
reflexos presentes → extensão da lesão pode evoluir com arreflexia
• Não há hiporreflexia → fibras aferentes do arco reflexo estão íntegras

Síndrome do cone medular


Decorrente de tumores, metástases ou distúrbios da irrigação medular abaixo de L2.
• Paralisia flácida da bexiga • Abolição dos reflexos anais
• Incontinência anal • Ausência de paralisia dos membros
• Impotência inferiores
• Anestesia “em sela” • Preservação do reflexo do tendão calcâneo

Compressão da medula por tumor


Tumor intramedular
• Inicia com déficits sensitivos e motores (pelos tratos mais mediais)
• Cursa com dor pelo acometimento de raízes nervosas
• Fibras dos segmentos medulares mais altos são mais mediais → inicia com sintomas nos segmentos mais
altos e descende: afeta por último regiões inervadas pelos segmentos sacrais da medula
• Déficit de sensibilidade inicial determina nível verdadeiro da lesão

Tumor extramedular
• Também chamado tumor do canal vertebral
• Inicia com dor pela compressão das raízes nervosas
• Cursa com sintomas de comprometimento dos tratos medulares: déficits sensoriais e motores afetam
primeiramente os segmentos sacrais → onde as fibras são mais laterais
• Progride por compressão das fibras adjacentes para segmentos cada vez mais altos
• Nível da lesão é determinado pela dor radicular inicial
• Déficits sensitivos determinam falso nível medular → o déficit sensitivo lombossacral pode estar sendo
causado por tumor na região cervical

Referências bibliográficas
Bear, Connors & Paradiso – Neurociências – 4ª Edição – 2017
Machado – Neuroanatomia Funcional – 3ª Edição – 2013
Mutarelli – Propedêutica Neurológica – 2ª Edição – 2014

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42 Módulo 402

Módulo 202 – Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 5
1. Revisar a anatomia funcional e aspectos semiológicos do tronco encefálico e dos pares cranianos.
2. Discutir as síndromes do tronco encefálico (bulbo, ponte e mesencéfalo) relacionando com a topografia.
3. Discutir a investigação complementar das síndromes do tronco encefálico.
4. Citar as possíveis etiologias do caso da paciente.
Romilda, 58 anos, há 6 horas teve quadro de déficit de força em membros esquerdos associada a alteração da fala,
de instalação aguda, apresentando queda ao solo. Foi trazida ao pronto-socorro. É tabagista de longa data e tem
HAS, negando outras comorbidades. Estava em uso irregular de antihipertensivos. Ao exame físico: EG regular;
hidratada; normocorada; PA: 180 x 110 mmHg; ausculta cardíaca normal; eupneica, ausculta respi-ratória normal;
vigil, orientada T/E; atenta; linguagem: fluência, nomeação e compreensão normais, porém com fala disártrica;
pupilas isocóricas e fotorreagentes, reflexo pupilar direto e consensual normais à E e D; motilidade ocular extrínseca
normal; mímica facial normal; sensibilidade facial normal, com força de mastiga-ção preservada; reflexo
corneopalpebral normal à E e D; língua: à protrusão, desvio da língua para a D, com déficit de força em hemilíngua
D; acuidade auditiva normal à E e D; acuidade visual normal à E e D, com cam-pos visuais normais; reflexo nauseoso
presente à E e D; esternocleidomastoideos e trapézios com força nor-mal; força - MMSS: grau 5 à D, grau 3 à E,
MMII: grau 5 à D, grau 3 à E; tônus: normal nos 4 membros; sinal de Babinski à E; reflexos miotáticos: MMSS: grau
0 à E e grau 2 à D; MMII: grau 0 à E e grau 2 à D; sensibilidades: superficial - normal; profunda - apalestesia e
ausência de sensibilidade cinético-postural em hemicorpo E, sen-do normal em hemicorpo D; marcha: avaliação
não realizada em função da impossibilidade de deambulação.
• Diagnóstico sindrômico:
• Diagnóstico topográfico:
• Diagnóstico etiológico:
• Diagnóstico nosológico:
• Conduta:

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 43

Anatomia funcional do tronco encefálico

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44 Módulo 402

Bulbo
• Limite superior: sulco bulbo-pontino
• Limite inferior: forame magno cervical
• Superfície longitudinalmente
percorrida por sulcos que determinam
as áreas ventral, lateral e posterior
• Superfície dorsal: porção aberta –
início do assoalho do IV ventrículo
• Pares cranianos: IX, X, XI e XII

Ponte
• Situa-se ventralmente ao cerebelo,
interposta entre o bulbo e o
mesencéfalo
• Sulco bulbo-pontino: VI, VII e VIII
• Pedúnculo cerebelar médio: V
• Constitui o assoalho do 4º ventrículo

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 45

Sophia Molina Turma XIX


46 Módulo 402

Mesencéfalo
• Interpõe-se entre a ponte e o diencéfalo
• É atravessado pelo aqueduto cerebral, que divide o mesencéfalo em teto e pedúnculos
• Teto: colículos superiores e inferiores
• Pedúnculos cerebrais: cada um é dividido em tegmento e base – separados pela substância negra

Síndromes do tronco encefálico


No tronco encefálico, vários tratos estão próximos uns aos outros:
• Tratos motores descendentes que ainda não decussaram (decussam na região mais inferior do bulbo)
• Tratos sensoriais ascendentes que já decussaram
• Nervos cranianos → geralmente não decussam
Graças a esta organização anatômica, lesões focais do tronco encefálico são caracterizadas por síndromes
“cruzadas” → disfunção do NC ipsilateral + disfunção do trato motor e/ou sensorial longo contralateral. Por
exemplo, paciente com lesão no lado direito da ponte → núcleos dos NC VI e VII estão próximos ao trato
corticoespinhal direito, que inerva o lado esquerdo do corpo → paralisia de NC à direita + hemiparesia à esquerda.
Em virtude das conexões vestibulares e cerebelares, os pacientes com doença do tronco encefálico
costumam apresentar tontura ou vertigem, instabilidade, desequilíbrio, incoordenação, dificuldade para
caminhar, náuseas e vômito. Músculos da faringe e da laringe são inervados por neurônios no tronco encefálico →
comum a ocorrência de disartria ou disfagia.
Do ponto de vista anatômico, as síndromes do tronco encefálico podem ser localizadas tomando-se como
referência os níveis rostral a caudal e medial a lateral:

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 47

Nervos e tratos Localização da lesão


NC III ou IV → anormalidade do olhar vertical Mesencéfalo
NC VI ou VII → paralisia do olhar horizontal Ponte
NC VIII Junção pontobulbar
NC IX, X, XI ou XII Bulbo
NC V → vasta extensão longitudinal Ponte até medula espinhal cervical
Tratos motores longos e núcleos motores somáticos + medial
Tratos sensoriais longos e núcleos braquiomotores + lateral

Síndromes bulbares
Lesões da base do bulbo
Também chamada síndrome bulbar medial. Compromete-se a pirâmide e o nervo hipoglosso.
• Lesão piramidal compromete trato corticoespinhal → cruza abaixo do nível da lesão → hemiparesia do
lado oposto à lesão
• Quando a lesão se estende dorsalmente → atinge os demais tratos motores descendentes → hemiplegia
contralateral
• Lesão do hipoglosso (NC XII) → paralisia dos músculos de metade da língua no lado lesado + sinais de
síndrome do 2º NM (atrofia dos músculos linguais, fasciculações)
• Paciente faz a protrusão da língua → musculatura do lado normal desvia a língua para o lado lesado

Síndrome de Wallemberg
Também conhecida como síndrome da artéria cerebelar inferior posterior ou síndrome bulbar lateral.
Artéria vertebral → artéria cerebelar inferior posterior → região dorsolateral do bulbo. Tromboses desta artéria
implicam no comprometimento das estruturas localizadas na região dorsoteral do bulbo:
• Lesão do pedúnculo cerebelar inferior: acomete os tratos espino-cerebelar posterior e anterior, cursando
com incoordenação de movimentos em hemicorpo → ipsilateral à lesão
• Lesão do trato espinhal do trigêmeo e seu núcleo: perda de sensibilidade térmica e dolorosa em hemiface
→ ipsilateral à lesão
• Lesão do trato espinotalâmico lateral: perda de sensibilidade térmica e dolorosa (contralateral)

SÍNDROME LATERAL X SÍNDROME MEDIAL KKK

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48 Módulo 402

Síndromes pontinas
Lesões do nervo facial
O nervo facial se origina no núcleo facial situado na
ponte e emerge lateralmente no sulco bulbo-pontino, de
onde se dirige aos músculos mímicos. Lesões periféricas do
nervo VII resultam em paralisia total dos músculos da
expressão facial na metade lesada → perdem tônus, ficam
flácidos → paralisia do músculo bucinador cursa com
vazamento de saliva pelo ângulo da boca do lado lesado.
Musculatura do lado oposto permanece normal, por isso se
observa desvio da rima labial para o lado sadio. Paralisia do
músculo orbicularis oculi → paciente não consegue abaixar a
pálpebra, predispondo o olho a lesões e infecções (reflexo
corneopalpebral abolido). O doente não consegue soprar,
assoviar, pestanejar nem enrugar o lado correspondente da
testa. Quando há acometimento da porção central do nervo
(trato corticonuclear – vai do córtex ao núcleo do nervo
facial) o quadro clínico é completamente diferente e a
paralisia é chamada central.

Síndrome de Millard-Gubler
Lesão na base da ponte compromete o trato corticoespinhal e fibras do nervo abducente → hemiplegia
cruzada. Paciente apresenta hemiparesia contralateral + paralisia do músculo reto lateral ipsilateralmente à lesão.
O olho não afetado se move normalmente → olhar deixa de ser conjugado → raios luminosos provenientes de um
determinado objeto incidem em partes não simétricas das retinas dos dois olhos, por exemplo, na mácula do olho
normal e em um ponto situado ao lado da mácula, no olho afetado → diplopia. Lesão do NC VI também cursa com
estrabismo convergente: desvio do bulbo ocular na direção medial → ação do músculo reto medial não é
contrabalanceada pelo reto lateral (afetado). Lesão da base pode se estender lateralmente → atinge nervo facial.

Lesão da ponte ao nível da emergência do nervo trigêmeo


Lesão na base da ponte compromete o trato corticoespinhal e fibras do nervo trigêmeo → hemiplegia
contralateral (síndrome do neurônio motor superior) + perturbações motoras e sensitivas ipsilaterais à lesão do NC
V:
• Alterações motoras: paralisia da musculatura mastigadora + desvio da mandíbula para o lado paralisado
(ação dos pterigoides do lado normal)

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 49

• Alterações sensitivas: anestesia de hemiface + perda do reflexo corneopalpebral


Lesão se estende ao lemnisco medial → afeta propriocepção consciente e tato epicrítico contralaterais.

Síndromes mesencefálicas
Síndrome de Weber
Lesão na base do pedúnculo cerebral → trato corticoespinhal + fibras do NC III. Resulta em hemiparesia
contralateral acompanhada dos sintomas ipsilaterais resultantes da lesão do nervo oculomotor: (1)
impossibilidade de mover o bulbo ocular para cima, para baixo ou medialmente; (2) diplopia; (3) estrabismo
divergente; (4) ptose palpebral → queda da pálpebra devido paralisia do músculo levantador; e (5) midríase por
ação do músculo dilatador da pupila → perde ação do músculo constritor que é inervado pelo NC III.

Síndrome de Benedikt
Lesão do tegmento do mesencéfalo compromete nervo oculomotor, núcleo rubro e lemniscos medial,
espinhal e trigeminal:
SÍNDROME DE BENEDIKT X SÍNDROME DE WEBER
• Lesão do NC III: mesma
sintomatologia
ipsilateral que na
síndrome de Weber
• Lesão dos lemniscos
medial, espinhal e
trigeminal: anestesia de
hemicorpo
contralateral, incluindo
cabeça
• Lesão do núcleo rubro:
tremores e movimentos
anormais em hemicorpo contralateral

Síndrome de Parinaud
Tumor da pineal comprime o colículo superior → paralisia do olhar conjugado para cima. Evolução do
tumor pode causar oclusão do aqueduto cerebral → hidrocefalia + paralisia ocular (devido compressão dos núcleos
dos NC III e IV).

Referências bibliográficas
Blumenfeld – Neuroanatomy Through Clinical Cases – 3rd Edition – 2010

Sophia Molina Turma XIX


50 Módulo 402

DeJong – O Exame Neurológico – 7ª Edição – 2014


Machado – Neuroanatomia Funcional – 3ª Edição – 2013

Módulo 402 – Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 6
1. Descrever a anatomia funcional vestibular e cerebelar.
2. Diferenciar os tipos de ataxia (diagnósticos sindrômico e topográfico).
3. Discutir epidemiologia, quadro clínico, diagnóstico, diagnóstico diferencial e tratamento da vertigem
posicional paroxística benigna (VPPB), neurite vestibular e síndrome de Ménière.
4. Discutir a semiologia da coordenação, equilíbrio e marcha.

Anatomia funcional do cerebelo

O cerebelo, assim como o cérebro, é um órgão do sistema nervoso suprassegmentar. Os núcleos centrais
do cerebelo (córtex – substância cinzenta), envolvem o corpo medular do cerebelo (centro – substância branca).
Possui três camadas da superfície para o interior:
1) Camada molecular: suas fibras são paralelas e possui dois tipos de neurônios → células estreladas e
células em cesto (formam sinapses axossomáticas em torno do corpo das células de Purkinje)

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 51

2) Camadas de células de Purkinje: células piriformes e grandes, com dendritos que se ramificam na camada
molecular e um axônio na direção oposta até os núcleos centrais do cerebelo, onde tem ação inibitória
→ são as únicas fibras eferentes do córtex cerebelar
3) Camada granular:
• Células granulares do cerebelo: são muito
pequenas – citoplasma pequeno – e possuem
vários dendritos e um axônio → atravessa a
camada de Purkinje e, ao chegar na
molecular, se bifurca em T → constitui as
fibras paralelas ao eixo da folha cerebelar
• Células de Golgi: são menos numerosas e
possuem ramificações muito amplas

Fibras trepadeiras

Axônios de neurônios situados


no complexo olivar inferior
Enrolam-se nos dendritos das
células de Purkinje, exercendo
ação excitatória

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52 Módulo 402

Correspondem à terminação
dos demais feixes de fibras
que penetram no cerebelo

Fibras musgosas
Ao entrar no cerebelo enviam
ramos colaterais que fazem
sinapses excitatórias
axodendríticas com várias
granulares que, através das
fibras paralelas, se ligam as de
Purkinje

Conexões intrínsecas do cerebelo


As fibras que penetram o cerebelo são de dois tipos (tabela ao lado) e se dirigem ao córtex. Ambas são
glutamatérgicas.
O circuito cerebelar básico funciona da seguinte forma: impulsos nervosos penetram o cerebelo pelas
fibras musgosas → ativam granulares e neurônios dos núcleos centrais. Portanto, as informações aferentes ao
cerebelo agem inicialmente sobre os neurônios de núcleo central → emitem as respostas eferentes. As células
granulares (ativadas pelas fibras musgosas) ativam as células de Purkinje que, por sua vez, inibem os neurônios
dos núcleos centrais. A atividade das células granulares é modulada pela ação inibitória das células de Purkinje
(principal) + células de golgi, células em cesto e células estreladas → liberam GABA. Assim, a célula granular é a
única de efeito excitatório, precisamente por meio da liberação de glutamato. As células de Purkinje se dirigem
para os núcleos centrais do cerebelo ou para o núcleo vestibular → são as vias de saída do cerebelo.

Núcleos centrais e corpo medular do cerebelo


Os núcleos centrais emitem as fibras eferentes do cerebelo e recebem aferências das células de Purkinje
e colaterais das fibras musgosas. São eles: (1) núcleo denteado: mais lateral, é o maior dos núcleos centrais do
cerebelo; (2) núcleo emboliforme + núcleo globoso: situados entre o denteado e o fastigial, são parecidos e por
isso agrupados sob o nome de núcleo interpósito; e (3) núcleo fastigial: próximo ao plano mediano.
Já o corpo medular do cerebelo é constituído de substância branca → fibras mielínicas: fibras aferentes ao
cerebelo: penetram pelos pedúnculos cerebelares e se dirigem ao córtex, onde perdem a bainha de mielina; e fibras
formadas pelos axônios de Purkinje: dirigem-se aos núcleos centrais e, ao deixar o córtex, tornam-se mielínicas.

Divisão funcional do cerebelo


Divisões Divisões
Conexões – células de Purkinje → núcleo → eferência cerebelar
anatômicas funcionais

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 53

Zona lateral → núcleo denteado → córtex cerebral Cerebrocerebelo


Corpo do cerebelo Zona medial → núcleos fastigial e vestibular lateral → medula espinhal
Espinocerebelo
Zona intermédia → núcleo interpósito → medula espinhal
Lobo floculonodular Núcleo fastigial e núcleos vestibulares Vestibulocerebelo

Conexões extrínsecas
Conexões aferentes Conexões eferentes (homolaterais ou duplo cruzamento)
Vestibulocerebelo

Núcleos vestibulares →
Vestibulocerebelo → núcleo vestibular lateral → modulam tratos
fascículo vestibulocerebelar →
vestibuloespinhais lateral e medial: controlam musculatura axial e
lobo floculonodular
extensora dos membros → equilíbrio e postura na marcha
Trazem informações da parte
Vestibulocerebelo → núcleo vestibular medial → movimentos oculares
vestibular do ouvido interno
+ movimentos da cabeça
sobre posição da cabeça

Trato espinocerebelar Via interpósito-rubroespinhal: zona intermédia → núcleo interpósito


→ núcleo rubro → trato rubroespinhal → neurônios motores (NM)
anterior → pedúnculo
cerebelar superior: sinais Via interpósito-tálamo-cortical: zona intermédia → núcleo interpósito
motores que chegam à medula → tálamo do lado oposto → córtex cerebral – onde se origina o trato
pelo trato corticoespinhal corticoespinhal → este decussa, portanto o cerebelo influencia os NM
Espinocerebelo

Trato espinocerebelar ipsilaterais


posterior → pedúnculo Ação do núcleo interpósito → NM do grupo lateral da coluna anterior:
cerebelar inferior: sinais músculos distais dos membros → movimentos finos
originados em receptores Zona medial → núcleo fastigial → trato fastígio-vestibular → núcleo
proprioceptivos → avalia grau vestibular → trato vestibuloespinhal → neurônios motores
de contração dos músculos, Zona medial → núcleo fastigial → trato fastígio-reticular → formação
tensão nas cápsulas articulares reticular → trato reticuloespinhal → neurônios motores
e tendões, posições e Ação do núcleo fastigial → NM do grupo medial da coluna anterior:
velocidades dos movimentos músculos axiais e proximais dos membros → equilíbrio e postura
Via córtico-ponto-cerebelar:
Cerebrocerebelo

núcleos pontinos → pedúnculo Via dento-tálamo-cortical: zona lateral → núcleo denteado → tálamo
cerebelar médio → córtex da do lado oposto → áreas motoras do córtex cerebral → trato
zona lateral corticoespinhal
Fornece informações oriundas Núcleo denteado participa da atividade motora da musculatura distal
de áreas motoras e não dos membros → movimentos delicados
motoras do córtex cerebral
Aspectos funcionais
Manutenção de equilíbrio e postura
Através do arquicerebelo (lóbulo floculonodular) e do vérmis, exerce controle sobre o tônus dos músculos
axiais e sobre os proximais dos membros, mantendo o indivíduo equilibrado quando está de pé e quando caminha.

Controle de movimentos voluntários


O planejamento do movimento é elaborado no cerebrocerebelo, a partir de informações trazidas pela via
córtico-ponto-cerebelar de áreas do córtex cerebral ligadas a funções psíquicas superiores (áreas de associação) →
expressam a intenção do movimento. O plano motor é enviado às áreas motoras de associação do córtex cerebral
pela via dento-tálamo-cortical. Neurônios das áreas pré-motora e motora suplementar associam → plano motor do
cerebelo + dados corticais → plano motor comum é colocado em execução por meio da ativação de neurônios da
área motora primária. O trato corticoespinhal ativa NM medulares e inicia o movimento.

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54 Módulo 402

Uma vez iniciado o movimento, este passa a ser controlado pelo Em movimentos balísticos
espinocerebelo. Os tratos espinocerebelares informam sobre o movimento em (movimentos muito rápidos),
execução → a via interpósito-tálamo-cortical promove correções necessárias ao apenas o cerebrocerebelo é
agir sobre áreas motoras e trato corticoespinhal. Ao que parece, o ativado → não há tempo do
espinocerebelo compara as características do movimento em execução com o espinocerebelo receber
plano motor, promovendo as correções e ajustamentos necessários para que o informações sensoriais que
lhe permitam corrigir o
movimento se faça de maneira adequada.
movimento
Aprendizagem motora
Ao realizarmos um movimento várias vezes, este se torna cada vez mais rápido e necessita de menos
correções. Fibras olivocerebelares enviam os sinais de erro ao córtex cerebelar através das fibras trepadeiras, que
fazem sinapse diretamente com as células de Purkinje → permite a correção do movimento.

Sistema vestibular
Células pilosas vestibulares são receptores não neurais que respondem a mudanças na aceleração
rotacional, vertical e horizontal, e no posicionamento. As células pilosas vestibulares possuem um único cílio longo,
denominado cinocílio, localizado em um lado do feixe ciliar → estabelece um ponto de referência para a direção da
curvatura. A gravidade e a aceleração fornecem a força que move os estereocílios. Quando os cílios se curvam, os
filamentos de ligação entre eles abrem e fecham canais iônicos. O movimento em uma direção provoca
despolarização das células pilosas, enquanto na direção oposta acarreta despolarização.
O aparelho vestibular ou labirinto membranoso é uma série intricada de câmaras interconectadas cheias
de líquido. Ele é composto de:
• Órgãos otolíticos: sáculo e utrículo → informam a aceleração linear e a posição da cabeça
• Canais semicirculares → detectam a aceleração rotacional em várias direções
O aparelho vestibular é preenchido com endolinfa com alta concentração de K+ e baixa de Na+ → secretada
pelas células epiteliais. De forma semelhante ao líquido cerebrospinal, a endolinfa é secretada continuamente e
drenada da orelha interna para o seio venoso da dura-máter do encéfalo.
Os três canais semicirculares que detectam a aceleração rotacional estão orientados em ângulos retos um
ao outro, como três planos que se juntam para formar o canto de uma caixa. O canal horizontal (ou lateral) detecta
rotações que associamos com o giro (dizer não); o canal posterior detecta a rotação esquerda-direita (inclinar a
cabeça em direção ao ombro); e o canal anterior detecta a rotação para a frente e para trás.
Em uma das extremidades de cada canal há uma câmara chamada ampola, que contém uma estrutura
sensorial chamada crista. Esta é constituída de células pilosas e uma massa gelatinosa, a cúpula, que se estende da
base ao teto da ampola, fechando-a. Além disso, os cílios das células pilosas são embebidos pela cúpula.
• A cabeça gira → o crânio ósseo e as paredes membranosas do labirinto se movem → o líquido dentro do
labirinto não consegue acompanhar (inércia) → nas ampolas, a endolinfa inclina a cúpula e suas células
pilosas na direção oposta àquela para a qual a cabeça está girando
• Rotação continua → movimento da endolinfa passa a ser o mesmo da cabeça
• Rotação para abruptamente → líquido não para imediatamente (inércia) → pessoa tem a sensação de estar
girando. Se for suficientemente forte, a pessoa pode projetar seu corpo na direção oposta à da rotação,
em tentativa reflexa de compensar a perda de equilíbrio

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 55

Já os dois órgãos otolíticos


(utrículo e sáculo) são organizados para
detectar forças lineares, de forma que
suas estruturas sensoriais, chamadas
máculas, compreendem as células
pilosas, a membrana otolítica (massa
gelatinosa) e os otólitos (partículas de
proteínas e carbonato de cálcio. Os cílios
das células pilosas são inseridos na
membrana otolítica, e os otólitos ligam-
se à matriz de proteína na superfície da
membrana.
• Gravidade ou aceleração →
otólitos deslizam para frente ou
para trás → membrana otolítica gelatinosa desliza → curva cílios das células pilosas → sinal
Mácula do utrículo: detecta aceleração para a frente ou desaceleração, bem como quando a cabeça se
inclina. Já a mácula do sáculo está orientada verticalmente quando a cabeça está ereta, sendo sensível às forças
verticais, como num elevador.
A porção periférica do sistema vestibular é composta pelo labirinto e o ramo vestibular do VIII nervo
craniano. Este penetra no tronco encefálico através da ponte, estabelecendo conexões com os núcleos vestibulares,
localizados no assoalho pontino. Destes núcleos, partem fibras às seguintes regiões:
1) Cerebelo: chegam ao lobo floculonodular, que compõe
o arquicerebelo (detalhado acima)
2) Fascículo longitudinal medial: conjunto de fibras
localizado na região pontomesencefálica, que conecta os núcleos
dos nervos responsáveis pela motricidade ocular (III, IV e VI
nervos cranianos), permitindo os movimentos oculares
conjugados → graças a esta conexão, os olhos movimentam-se de
forma harmoniosa com os movimentos cefálicos (reflexo
oculovestibular), fixando os objetos de forma adequada, mesmo
quando estes ou o paciente estão se movimentando → esta
interação é a responsável pela geração do nistagmo (movimento
oscilatório e rítmico dos olhos) tanto fisiológico quanto o
patológico
3) Medula espinhal: através do trato vestibuloespinhal, há
ajustes reflexos da musculatura axial do corpo de acordo com a
movimentação cefálica, evitando quedas
4) Córtex cerebral: as fibras chegam ao córtex cerebral,
permitindo a conscientização do indivíduo com relação à posição
da cabeça e à direção do movimento cefálico → a porção do
córtex que recebe informações vestibulares está localizada no
lobo temporal, lobo parietal inferior e lobo da ínsula posterior
Núcleos vestibulares também recebem informações de outros sistemas: vias sensitivas e cerebelo → todas
as informações são integradas para que ocorram ajustes na postura, equilíbrio e na movimentação ocular, diante
das modificações da posição do corpo em relação ao espaço. Lesões vestibulares podem ser periféricas ou centrais:
• Periféricas: mais homogêneas e estereotipadas, pois todas as informações estão reunidas no VIII nervo

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56 Módulo 402

• Centrais: as informações centrais estão espalhadas entre vários núcleos vestibulares que recebem
influência de outras informações não vestibulares e com independência em relação às informações
auditivas, causando síndromes clínicas heterogêneas e parcelares

Ataxias
As alterações envolvendo o equilíbrio e/ou a coordenação motora de um indivíduo são denominadas
ataxias. Os pacientes com ataxia podem se apresentar com uma ou mais das seguintes queixas:
• Tonturas: sensação de perturbação do equilíbrio corporal → causa mais frequente são as vestibulopatias,
mas também podem ser relacionadas a hipoperfusão encefálica (pré-síncopes ou arritmias) ou a causas
psicogênicas (ataques de pânico)
• Vertigem: alucinação de movimento, podendo ser objetiva (percepção de movimento de objetos e/ou
ambiente ao redor) ou subjetiva (percepção de movimento do próprio corpo)
• Dificuldade de marcha e desequilíbrio: variável ou não com o uso da visão
• Dificuldade de pegar objetos de forma adequada: reflete incoordenação dos movimentos finos → falta de
destreza dos movimentos

Ataxia sensitiva
Resulta de anormalidades em qualquer ponto da via sensitiva proprioceptiva: nervo periférico, raiz dorsal,
tratos espinocerebelares ou, menos frequentemente, tálamo e córtex. O SNC, especialmente o cerebelo, não
recebe informações proprioceptivas dos fusos neuromusculares e órgãos neurotendinosos → perda do controle
cineticopostural sobre cada segmento corporal em relação aos outros (força muscular preservada).
O déficit é parcialmente suprido pela aferência visual, por isso o paciente apresenta o sinal de Romberg
verdadeiro → perda de equilíbrio se acentua quando pedimos ao paciente que feche os olhos: paciente em posição
ereta e pés juntos → queda imediata após fechamento dos olhos, sem sentido preferencial (aleatória). Pacientes
terão dificuldade de executar movimentos em ambientes escuros → perde compensação visual. Outros sinais são:
• Provas de index-nariz: paciente executa as manobras normalmente quando está de olhos abertos → ao
fechar os olhos apresenta dismetria e decomposição dos movimentos
• Marcha talonante: base alargada, olhar direcionado ao solo → perda da noção da proximidade pés-chão →
paciente arremessa os pés e os bate com força no chão
• Perda da propriocepção: além da perda de noção cineticopostural nos segmentos afetados → diminuição
ou ausência da sensibilidade vibratória
• Hipo/arreflexia: ausência/perda da aferência dos reflexos miotáticos nos segmentos afetados
• Ausência de nistagmo

Ataxia cerebelar
Pacientes apresentam alterações na marcha, equilíbrio e coordenação motora mesmo com os olhos
abertos. Sintomas e sinais decorrem de lesão ou disfunção cerebelar e suas conexões. Alterações nos hemisférios
cerebelares acarretam sinais apendiculares homolaterais à lesão, enquanto alterações na porção central (vérmis)
cursam com sinais axiais. São sinais apendiculares:
• Dismetria: paciente erra o objeto-alvo • Disdiadococinesia: incapacidade de realizar
• Decomposição dos movimentos: nos movimentos alternados
membros e nos olhos • Tremor intencional: acentua quando se
• Hipotonia aproxima do objeto alvo
Já os sinais axiais (lesão do vérmis) incluem:
• Disbasia: base de sustentação alargada, mesmo de olhos abertos
• Marcha cerebelar: passos cambaleantes e irregulares (ora pequenos, ora grandes)

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 57

• Ataxia de tronco: mesmo de olhos abertos, paciente apresenta balanço para os lados ou de frente para
trás → acarreta contração dos tendões dos pés (dança dos tendões)
• Dissinergia tronco-membros: quando o paciente está em decúbito dorsal e tenta elevar a cabeça →
elevação das coxas impede que ele complete o movimento
• Fala escandida: tipo de disartria → fala lenta, hesitante, com pausas inadequadas e sílabas prolongadas

Ataxia vestibular
Quando a cabeça se mexe, o líquido existente nas estruturas da orelha interna (sáculo, utrículo e canais
semicirculares) se desloca em direção oposta ao sentido do movimento (pela inércia) e leva os cílios → ao se
movimentarem produzem impulsos elétricos que trafegam através do nervo vestibular em direção aos núcleos
vestibulares e cerebelo → controle/manutenção da cabeça e ajustes visuais.

Síndromes vestibulares
Características Periféricas Centrais
Núcleos vestibulares do tronco encefálico
Locais de lesão ou Labirinto e/ou ramo vestibular do VIII
e/ou conexões com o cerebelo, córtex
disfunção nervo craniano
cerebral ou fascículo longitudinal medial
Persistentemente para um lado →
modifica a direção da queda conforme Tendência de queda para frente ou para
mudamos a posição da cabeça trás
Desvio postural
Teste dos braços estendidos: desvio Teste dos braços estendidos: queda de um
conjugado dos braços ou ambos os braços → desvios não
conjugados
Marcha em estrela de Babinski-Weil
Vertigem Mais intensa Menos intensa
Náuseas
Sintomas autonômicos Vômitos Ausentes
Sudorese
Diplopia
Dismetria
Sintomas de disfunção Decomposição dos movimentos
do tronco encefálico Ausentes Disfagia
ou do cerebelo Paralisia facial periférica
Dormência em hemiface
Incoordenação de movimentos
Sintomas auditivos Zumbido, hipo/anacusia Ausentes
Latente → demora de 2-30 s para surgir Não há latência
Fatigável → cessa após período de até 40s Não há fatigabilidade
Padrão de nistagmo
Movimento rotatório e horizontal Movimento apenas horizontal ou vertical
Esgota com a fixação visual Não esgota com a fixação visual

Segundo um estudo que avaliou 652 portadores de tontura que buscaram o clínico geral em dois anos, as
vestibulopatias mais encontradas foram a vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) em 38,7% dos casos,
neurite vestibular (31,9%), síndrome de Ménière (17,4%) e outras vestibulopatias (12,1%). As síndromes mais
comuns serão discutidas abaixo:

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58 Módulo 402

Vertigem posicional paroxística benigna (VPPB)


É a causa mais comum de síndrome vestibular periférica. Ocorre devido deslocamento de otólitos do
sáculo ou utrículo para os canais semicirculares (90% das vezes para o canal semicircular posterior). Os otólitos se
deslocam em descompasso ao movimento da cabeça → ativam a cúpula, que sinaliza aos núcleos vestibulares →
sinal decorrente do movimento de otólitos e não da cabeça como deveria ser.
• Sensação vertiginosa, rotatória, de curta duração (< 1 minuto), em determinada posição da cabeça que
desencadeie o movimento dos otólitos
• Após a crise → mal-estar e náuseas com instabilidade que pode durar horas
• Mais comumente a tontura ocorre ao olhar para cima, ao deitar-se ou virar na cama
• Nistagmo de posicionamento
• Pesquisa do diagnóstico é realizada pela manobra de Dix-Hallpike → nistagmos posicionais
A maioria dos casos de VPPB regridem espontaneamente, assim que cessado o período de adaptação
natural do SNC. Não são indicados medicamentos sedantes vestibulares, uma vez que a vertigem tem causa
mecânica e apresenta bons resultados com as manobras de reposicionamento → o uso de depressores vestibulares
interfere na recuperação funcional do sistema.
• Manobra de Epley (reposicionamento das partículas em suspensão): paciente é colocado na posição de
diagnóstico de Dix-Hallpike por 1-2 minutos até o desaparecimento do nistagmo e da tontura → a cabeça
é lentamente girada 90° para o lado oposto (1-2 minutos) → o corpo é rodado para a posição de decúbito
lateral, seguido pela movimentação de 90° da cabeça até que o nariz aponte para o chão em um ângulo
de 45° do plano do solo (30-60 segundos) → paciente é orientado a encostar o queixo no peito e sentar-
se lentamente

Neurite vestibular
Conhecida popularmente como labirintite (termo inadequado, pois serve para infecção do labirinto
secundária à otite média). Neurites vestibulares são doenças de origem periférica que podem se manifestar por:
• Episódio único, prolongado e violento de vertigem → seguido por período de instabilidade → resolução
em uma a duas semanas
• Alguns podem não apresentar compensação adequada da lesão vestibular → sintomas mais brandos
persistentes por várias semanas
• Sintomas neurovegetativos intensos → náuseas e vômitos incoercíveis
• Fator desencadeante parece ser infecção de vias aéreas dias antes do episódio
• Não há hipoacusia associada
Diagnóstico diferencial da neurite vestibular é feito com infarto cerebelar (pode se manifestar
exclusivamente por vertigem). Nistagmo que não cessa com a fixação ocular + reflexo vestíbulo-ocular íntegro →
fecham diagnóstico de síndrome vertiginosa de origem central.
Tratamento é feito com depressores labirínticos potentes (prometazina) → deve ser descontinuado assim
que possível para não interferir na compensação fisiológica. Exercícios de reabilitação vestibular devem ser
iniciados o mais precocemente possível, assim que o doente for capaz de suportá-los.

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 59

Síndrome de Ménière
Vestibulopatia de origem periférica caracterizada por crises vertiginosas + diminuição da audição,
zumbidos e plenitude auricular (sensação de ouvido cheio). A SM também pode ser incompleta, apresentando
apenas um ou dois destes sintomas. Períodos intercrises → ausência de sintomas, persistência das queixas auditivas
ou desequilíbrio ao movimento. Com a evolução da doença, a flutuação dos sintomas deixa de ocorrer e a lesão
labiríntica é instalada → perda grave da audição + hiporreflexia labiríntica. Apesar de sua evolução lenta e benigna
na maioria das vezes, alguns casos podem evoluir rapidamente e levar à surdez → daí a importância do
acompanhamento médico e identificação da causa.

Possíveis etiologias estão relacionadas ao desenvolvimento da hidropsia (distensão do espaço endolinfático) →


substrato anatomopatológico da SM. Esta relação é incerta, pois a hidropsia também está presente em outras
patologias → seria apenas um sintoma da SM e não sua causa. Infecções da orelha média, distúrbios metabólicos,
traumatismos, migrânea e otosclerose podem desencadear hidropsia.
A real etiologia parece ser a concentração plasmática da vasopressina (hormônio antidiurético ou ADH) e atuação
das aquaporinas na orelha média. Outros autores consideram a SM como manifestação isquêmica regional.
Quando não identificado um fator causal, a SM é denominada doença de Ménière.
Conclusão: ainda não se sabe com certeza a etiologia da SM, mas clinicamente, é importante buscar possíveis
causas tratáveis para impedir a evolução da doença.

Semiologia e diagnóstico diferencial


Equilíbrio
Equilíbrio estático
Teste de Romberg: o paciente é mantido em posição ortostática, com calcanhares unidos e pontas dos
pés juntas ou afastadas a 30°, com os braços ao longo do corpo em posição anatômica. Depois, pede-se para que
ele feche os olhos por um minuto. Se houver dúvidas no achado, pode-se sensibilizar o teste pedindo-se ao paciente
que coloque um pé à frente do outro em linha reta (Manobra de Romberg-Barré). Possíveis achados incluem:
• Paciente sem alterações: não há queda nem de olhos abertos, nem fechados
• Ataxia vestibular periférica: queda com lateralização para esquerda ou direita → muda a direção da queda
conforme o posicionamento da cabeça à direita ou à esquerda, pois muda a posição dos canais
semicirculares do labirinto
• Ataxia vestibular central: queda para frente ou para trás
• Ataxia cerebelar: disbasia e queda com lateralização para esquerda ou para direita já de olhos abertos,
sem mudar a direção da queda com a rotação da cabeça
• Ataxia sensitiva: sem quedas de olhos abertos, porém ao fechar os olhos → disbasia, oscilação e queda do
tronco, sem direção preferencial = Romberg verdadeiro
Braços estendidos: paciente em posição ortostática, com os braços estendidos à sua frente, paralelos
entre si, com seus indicadores apontando para os indicadores do examinador, que fica diante dele. Pede-se ao
paciente que feche os olhos. Possíveis achados incluem:
• Paciente sem alterações: sem queda dos braços após um minuto
• Ataxia vestibular periférica: desvio conjugado dos braços para o lado lesado → modifica a direção
conforme a rotação cefálica
• Ataxia vestibular central: desvio não conjugado ou queda de um ou ambos os braços
• Ataxia cerebelar: desvio não conjugado dos braços e disbasia já de olhos abertos
• Ataxia sensitiva: sem alterações de olhos abertos, mas ao fechar os olhos → disbasia e queda sem direção
preferencial

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60 Módulo 402

Equilíbrio dinâmico
Os testes são úteis para pacientes com suspeita de ataxia vestibular periférica ou central. Os achados
anormais referentes aos outros tipos de ataxia já podem ser encontrados nos testes do equilíbrio estático.
Teste de Babinski-Weil: pede-se ao paciente que caminhe em linha reta, de olhos fechados, para frente e
para trás, um percurso de 1,5 metros. Achados incluem:
• Paciente sem alteração: não há desvio
• Ataxia vestibular periférica: desvio da marcha para o lado lesado → mantem a mesma lateralização
preferencial quando caminha para frente e quando caminha para trás
• Se mudarmos a direção da caminhada, desviará para o mesmo lado: marcha em estrela de Babinski-Weil
Teste de Fukuda: pede-se ao paciente que marche com os braços estendidos e olhos fechados, elevando
os joelhos a 45° sem deslocar-se para frente → um minuto. Achados:
• Paciente sem alteração: não há desvio
• Ataxia vestibular periférica: desvio conjugado dos braços em angulação acima de 30°
• Ataxia vestibular central: desvio não conjugado dos braços

Coordenação
Coordenação apendicular
Prova índex-nariz: pede-se ao paciente que mantenha seus braços abduzidos e toque a ponta de seu nariz
com o indicador sucessivas vezes → inicia de olhos abertos e, depois, continua o movimento de olhos fechados.
Prova calcâneo-joelho: com paciente deitado, pede-se que ele eleve uma das pernas, toque o joelho da
perna contralateral e, em seguida, escorregue seu calcanhar pela crista tibial → repetir sucessivas vezes,
inicialmente de olhos abertos e, depois, de olhos fechados.
Possíveis achados de ambos os testes:
• Ataxia cerebelar: olhos abertos → dismetria, decomposição dos movimentos e tremor intencional
• Ataxia sensitiva: execução normal de olhos abertos, mas dismetria ao fechar os olhos
Diadococinesia: capacidade de realizar movimentos sucessivos e alternados. Há várias formas, mas no
teste mais usado, pede-se ao paciente que realize movimento de pronação-supinação das mãos sobre as coxas
(marionete).
• Ataxia cerebelar: disdiadococinesia, homolateralmente à lesão

Coordenação axial
Pesquisa da dissinergia tronco-membros: paciente em decúbito dorsal, pede-se que ele levante da cama
sem o auxílio das mãos. Possíveis achados:
• Paciente sem alteração: músculos posteriores da coxa e do glúteo agem como sinergistas fixando os
membros inferiores na cama
• Ataxia cerebelar: fixação não ocorre e o movimento da cabeça é acompanhado pela elevação da coxa,
dificultando seu se levantar
Prova do rechaço ou Sinal de Stewart-Holmes: paciente sentado e com apoio sobre as costas → pede-se a
ele, de olhos fechados, para fletir o braço contra a resistência do examinador. Sem que ele espere, o examinador
interrompe a força → proteger o rosto do paciente com a mão que não estiver usando para testar a flexão do
braço. Possíveis achados:
• Paciente sem alteração: após interromper a resistência haverá a contração imediata do músculo
antagonista (tríceps) → impede que o paciente seja atingido pelo seu próprio braço
• Ataxia cerebelar: paciente é atingido pelo próprio braço

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 61

Provas vestibulares
Manobra de Dix-Hallpike
Para testar o canal posterior direito, deita-se o paciente na maca em decúbito dorsal, com a cabeça
inclinada a 45° abaixo do plano da maca e rodada a 45° para a direita. Depois, testa-se o canal posterior esquerdo
rodando a cabeça 45° para a esquerda. Achados:
• Paciente sem alteração: não desencadeia sintomas
• Ataxia vestibular periférica: manobra positiva → paciente apresenta vertigem e nistagmo iniciados
segundos após o término da manobra

Manobra de Halmagyi
Também chamada de reflexo oculovestibular, consister em rodar velozmente a cabeça do paciente em 20-
30° pedindo-lhe para manter o olhar fixo em um ponto (p. ex., nariz do examinador). Achados:
• Paciente sem alteração: consegue manter o olhar fixo
• Ataxia vestibular periférica: o olho acompanha o movimento da cabeça e em seguida volta a olhar para o
ponto fixo → paciente não tem o reflexo, tendo que fazer o movimento voluntariamente, o que explica o
atraso

Diagnóstico diferencial
Diagnóstico diferencial das ataxias
Sinais Ataxia sensitiva Ataxia vestibular Ataxia cerebelar
Pseudo-Romberg ou Romberg
Sinal de Romberg Presente Dança dos tendões
vestibular
Sensibilidade profunda Comprometida Normal Normal
Coordenação com os Paciente já tem alterações
Piora significativa Piora significativa
olhos fechados com os olhos abertos
Marcha em estrela e marcha
Marcha Talonante Ebriosa
de Fukuda
Tendência para
Ausente Presente Ausente
lateralização da queda
Outros Hiporreflexia Vertigem, déficits auditivos Hipotonia, reflexos pendulares

Referências bibliográficas
HCUSP – Clínica Médica – Volume 6 – 2ª Edição – 2016
Machado – Neuroanatomia Funcional – 3ª Edição
Mutarelli – Propedêutica Neurológica – 2ª Edição – 2014
Silverthorn – Fisiologia Humana – 7ª Edição – 2017

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62 Módulo 402

Módulo 402 – Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 7
1. Revisar a anatomia funcional dos núcleos da base.
2. Diferenciar os distúrbios do movimento hipercinéticos e hipocinético.
3. Discutir a doença de Parkinson e a coreia de Syndenhan.
4. Discutir os fatores biopsicossociais relacionados ao prognóstico aos distúrbios do movimento.

Anatomia funcional dos núcleos da base


Os núcleos da base, também chamados gânglios da base, são massas de substância cinzenta situadas na
base do telencéfalo, de onde modulam a ação do trato corticoespinhal e participam de funções não motoras,
relacionadas a processos cognitivos, emocionais e motivacionais. Existem diversas divisões que levam em conta
anatomia e filogenética desses núcleos:
• Corpo estriado dorsal: núcleo caudado + putâmen + globo pálido
• Núcleo lentiforme: putâmen + globo pálido
• Neoestriado ou striatum: putâmen + núcleo caudado
• Paleoestriado ou pallidum: globo pálido
• Globo pálido se divide em pálido medial (interno) e pálido lateral (externo) → fazem conexões diferentes
• Corpo estriado ventral: núcleo accumbens → situado entre o putâmen e a cabeça do núcleo caudado →
pertence ao sistema límbico → comportamento emocional

Conexões e circuitos
O corpo estriado não tem conexões aferentes ou aferentes diretas com a medula → circuitos consistem em
projeções corticais ao corpo estriado + eferências ao tálamo → tálamo se conecta às áreas corticais de origem. São
cinco circuitos em alça corticoestriado-talamocorticais:
1) Circuito motor: áreas motora e somestésica do córtex → participa da regulação da motricidade voluntária
2) Circuito oculomotor: começa e termina no campo ocular motor → movimentos oculares
3) Circuito pré-frontal dorsolateral: começa na parte dorsolateral da área pré-frontal → projeta-se para o
núcleo caudado → daí para o globo pálido → núcleo dorsomedial do tálamo → volta ao córtex pré-frontal
4) Circuito pré-frontal orbitofrontal: começa e termina na parte orbitofrontal da área pré-frontal e tem o
mesmo trajeto do circuito anterior → manutenção da atenção e supressão de comportamentos
socialmente indesejáveis
5) Circuito límbico: começa nas áreas neocorticais do sistema límbico (giro do cíngulo), projeta-se ao estriado
ventral (núcleo accumbens) e daí para o núcleo anterior do tálamo → processamento das emoções

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 63

O circuito motor se origina nas áreas motoras do


córtex e na área somestésica, de onde se projeta ao putâmen
somatotopicamente: para cada região do córtex há uma região
correspondente no putâmen. A partir do putâmen, o circuito
pode seguir pelas vias direta e indireta.
O funcionamento dos circuitos tem como base a ação
inibitória tônica do pálido medial (GPi) sobre os núcleos
talâmicos → resulta em inibição das áreas motoras do córtex.
• Via direta: putâmen inibe o GPi → cessa inibição sobre
o tálamo → ativação cortical facilita a movimentação
• Via indireta: putâmen inibe o GPe → cessa inibição do
GPe sobre o subtálamo → subtálamo fica livre para
excitar o GPi → aumenta sua inibição sobre os núcleos
talâmicos → inibição do córtex e dos movimentos
Ligado ao circuito motor há um circuito subsidiário, no
qual o putâmen mantém conexões recíprocas com a
substância negra. As fibras nigroestriatais são dopaminérgicas
e exercem ação modulatória sobre o circuito motor. Esta ação
é excitatória na via direta e inibitória na via indireta → o
mesmo neurotransmissor, dopamina, tem ações diferentes
devido ao fato de que no putâmen existem dois tipos de
receptores de dopamina: D1 excitatório e D2 inibitório. Função dos núcleos da base – resumo
A atividade tônica inibitória das eferências do
A ação das fibras dopaminérgicas nigroestriatais sobre pálido medial é um freio permanente para
os receptores D1 no putâmen → maior excitação do putâmen movimentos indesejados. A necessidade de
→ maior inibição do GPi → a favor da via direta e do realizar um movimento interrompe este freio
movimento. Já a estimulação dopaminérgica da substância tônico → permite liberação do comando motor
negra sobre os receptores D2 no putâmen modula a via ordenado pelo córtex cerebral. Dessa forma, os
indireta: diminui a ação inibitória do putâmen sobre o GPe → núcleos da base têm um papel na preparação
este fica livre para inibir o núcleo subtalâmico → menor de programas motores e na execução
excitação do GPi → menor inibição talâmica → a favor do automática de programas motores já
movimento. aprendidos

O comportamento motor normal depende do equilíbrio entre as vias direta e indireta: os sinais para um
movimento específico são direcionados para os mesmos neurônios do globo pálido interno, simultaneamente →
aferências da via indireta têm função de suavizar/frear movimentos, enquanto aferências da via direta facilitam os
movimentos.

Distúrbios do movimento
São decorrentes de disfunções dos núcleos da base → prejuízo ao equilíbrio das vias direta e indireta gera
movimentos hipocinéticos (inibição talâmica) ou hipercinéticos (liberação talâmica). Os distúrbios do movimento
se caracterizam pela presença de um ou mais tipos de movimentos involuntários, que podem ser:
• Tremores: movimentos involuntários rítmicos, oscilantes, causados por contrações alternadas de grupos
musculares e seus antagonistas → as oscilações ocorrem em torno de um plano, e podem ser regulares ou
irregulares quanto à frequência e à amplitude
o Tremor de repouso ou estático: movimento presente em repouso
o Tremor cinético ou de ação: aparente apenas na movimentação voluntária
o Tremor postural: depende da postura específica do paciente

Sophia Molina Turma XIX


64 Módulo 402

• Distonia: tônus anormal → contrações musculares sustentadas, causando abalos lentos, tremores,
movimentos de torção e posturas anormais → contração simultânea de músculos agonistas e antagonistas
• Coreia: movimentos involuntários de início abrupto, explosivo, curta duração → repetem-se com
intensidade e topografia variáveis (caráter migratório e errático)
• Atetose: movimentos lentos, sinuosos, contínuos, que lembram uma contorção → predominam nas
extremidades distais, com um componente rotatório entorno do eixo longo do membro afetado →
acompanhados de hiperextensão e flexão dos dedos
• Balismo: movimentos involuntários amplos, de início e fim abruptos → segmentos proximais dos membros,
tronco e segmento cefálico → deslocamentos bruscos, violentos, semelhantes a chutes/arremessos.
Frequentemente associado a coreia na extremidade distal de um lado do corpo → hemicoreia/hemibalismo
• Mioclonias: contrações involuntárias e súbitas, breves, com abalos lembrando pequenos
solavancos/choques/sustos → envolve face, tronco ou extremidades
o Mioclonia positiva: contrações musculares abruptas
o Mioclonia negativa ou asterixe: cessação súbita de descargas musculares
• Tiques: movimentos estereotipados breves, repetitivos, usualmente rápidos e sem propósito → envolvem
múltiplos grupos musculares → são suprimíveis pela vontade e precedidos por urgência premonitória →
podem ser motores ou vocais, simples ou complexos

Fisiopatologia e semiologia
A disfunção dos núcleos da base anormalidades motoras que podem ser agrupadas em quatro categorias:
1) Movimentos voluntários prejudicados
2) Tônus muscular anormal
3) Movimentos involuntários espontâneos anormais
4) Posturas e reflexos posturais anormais
De acordo com o conjunto de alterações observadas clinicamente, classifica-se o distúrbio do movimento
como sendo hipocinético ou hipercinético.

Distúrbios hipocinéticos
Maior exemplo é o parkinsonismo ou síndrome parkinsoniana. Observa-se quatro elementos básicos:
• Tremor de repouso: tremor de baixa frequência e pequena amplitude, presente durante o repouso, pode
desaparecer durante o sono, ser brevemente suprimido durante o movimento e acentuado por estímulos
emocionais. Começa envolvendo mãos (ação semelhante a “contar dinheiro”) → predomina movimentos
de pronação-supinação. Quando decorre da doença de Parkinson (etiologia degenerativa) costuma iniciar
de forma unilateral → mesmo quando evolui para a outra mão, ainda se mantém assimétrica.
• Rigidez postural e apendicular: aumento uniforme e constante da resistência ao movimento passivo, no
deslocamento de uma articulação com o paciente relaxado (hipertonia plástica ou cérea). Sinal da roda
denteada → resistência é quebrada periodicamente no deslocamento passivo do segmento examinado.
• Acinesia: ocorrem pobreza e lentidão da iniciação e execução de movimentos voluntários + dificuldade na
mudança de um padrão de movimento para o outro, sem que haja paralisia → incapacidade em executar
atos motores simultâneos. Também observamos perda de movimentos automáticos associados na marcha
(ausência do balanço passivo de MMSS durante a caminhada). Paciente apresenta fala hipofônica e
monótona. Durante a escrita, ocorre micrografia. Podemos evidenciar hipomimia facial, com diminuição
do piscamento palpebral bilateral. Ao exame neurológico, podemos solicitar ao paciente que faça o finger
taps → toques sucessivos do indicador sobre o polegar. Se houver acinesia, haverá diminuição progressiva
da velocidade e amplitude dos movimentos, com interrupções bruscas da ação solicitada.

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 65

• Instabilidade postural: postura fletida e dificuldade de readaptação postural nos testes de equilíbrio. Para
avaliar esta alteração, o paciente deve ser colocado em pé, de olhos fechados, com o examinador atrás
dele → médico puxa o paciente para trás na altura dos ombros e abruptamente. Em condições normais, o
paciente conseguirá manter o tronco equilibrado, no máximo trocando o passo uma vez. Se houver
instabilidade postural, ele terá que dar 2 ou 3 passos para trás para evitar a queda ou cairá.

Distúrbios hipercinéticos
Englobam doenças que cursam com movimentos involuntários espontâneos – coreia, balismo, distonia,
atetose, mioclonias, tiques – ou combinações deles, como coreia de Sydenham e hemibalismo, caracterizado por:
• Movimentos involuntários, de grande amplitude e forte intensidade, dos membros do lado da lesão → se
assemelham ao movimento de um indivíduo arremessando um objeto
• Casos mais graves: movimentos ocorrem mesmo durante o sono → exaustão
• Causa mais comum é lesão do núcleo subtalâmico → possui função potencializadora da via indireta
• Sem o estímulo do núcleo subtalâmico, o GPi perde, em parte, seu efeito inibitório sobre o córtex → áreas
motoras respondem exageradamente aos comandos → neurônios disparam espontaneamente → origem
dos movimentos involuntários

Doença de Parkinson
Trata-se de uma doença neurodegenerativa que acomete cerca de 5 milhões de pessoas em todo o mundo.
Costuma iniciar por volta dos 60 anos, mas também pode ser encontrada em pacientes de 20 anos ou menos.
Envelhecimento da população → estimativa de aumento drástico da prevalência.

Fisiopatologia
A doença de Parkinson está relacionada aos seguintes mecanismos:
1) Degeneração dos neurônios dopaminérgicos na parte compacta da substância negra (SNc)
2) Redução da dopamina estriatal → aumenta descarga do NST e GPi → inibição excessiva do tálamo
3) Inclusões proteináceas intracitoplasmáticas – os corpos de Lewy, que contêm proteína alfa sinucleína
Estudos sugerem que a maioria dos casos de DP se deve ao “duplo golpe” → mutação gênica que induz
suscetibilidade à exposição + fator ambiental tóxico que pode induzir alterações epigenéticas ou somáticas no DNA.
A morte celular na DP por apoptose decorre de estresse oxidativo, inflamação, disfunção mitocondrial e estresse
proteolítico. Envelhecimento: neurônios dopaminérgicos substituem Na por Ca → neurotoxicidade mediada por Ca.
Além do sistema dopaminérgico, afeta: neurônios colinérgicos do núcleo basal de Meynert, neurônios
noradrenérgicos do locus ceruleus, neurônios serotoninérgicos dos núcleos da rafe e neurônios do sistema
olfatório, hemisférios cerebrais, medula espinhal e SNA periférico. Acredita-se que a patologia “não dopaminérgica”
explica as características clínicas não dopaminérgicas (sinais não motores). A degeneração se inicia primariamente
no sistema nervoso autônomo periférico + sistema olfatório + núcleo motor dorsal do nervo vago (parte inferior
do tronco encefálico). Em seguida afeta parte superior do tronco encefálico + hemisférios cerebrais →
estadiamento de Braak: disseminação previsível e sequencial.

Manifestações clínicas
Sintomas que refletem degeneração não dopaminérgica costumam preceder o início das manifestações
motoras clássicas → degeneração de neurônios dopaminérgicos ocorre em estágio intermediário da doença.

Características clínicas da doença de Parkinson


Bradicinesia Anosmia
essenciais

motores
motores
Sinais

Sinais

Tremor de repouso Distúrbios sensoriais (p. ex. dor)


não

Rigidez Transtornos do humor (p. ex. depressão)


Distúrbio da marcha/instabilidade postural Distúrbios do sono (p. ex. DCR)

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66 Módulo 402

Micrografia Distúrbios autonômicos


Fácies em máscara (hipomimia) Hipotensão ortostática
motores
Outros

Distúrbios gastrintestinais
sinais

Diminuição do piscar de olhos


Voz baixa (hipofonia) Distúrbios geniturinários
Disfagia Disfunção sexual
Congelamento (freezing) Déficit cognitivo (CCL/demência)
Diagnóstico diferencial Diagnóstico diferencial do parkinsonismo
Parkinsonismo: termo genérico que define Genética

DP
síndromes manifestadas por bradicinesia com Esporádica
Demência de corpos de Lewy
rigidez e/ou tremor. O diagnóstico diferencial
reflete a lesão de diferentes componentes dos Atrofia de múltiplos sistemas (AMS)

Parkinsonismo
núcleos da base. Entre as formas de parkinsonismo, Tipo cerebelar (AMS-c)

atípico
Tipo Parkinson (AMS-p)
a DP é a mais comum → 75% dos casos.
Paralisia supranuclear progressiva
• Exame de imagem do sistema Degeneração ganglionar corticobasal
dopaminérgico: útil se diagnóstico incerto Demência frontotemporal
Parkinsonismo secundário
(p. ex. tremor distônico, tremor essencial) Induzido por fármacos
→ pouco utilizado na prática de rotina, Tumor
visto que o diagnóstico é eminentemente Infecção
clínico Vascular
• Teste genético: útil para identificar Hidrocefalia de pressão normal
Traumatismos
mutações específicas que os indivíduos
Insuficiência hepática
com maior risco → apenas para pesquisas
Toxinas (p. ex. CO, manganês, MPTP, cianeto,
Parkinsonismo atípico: grupo de hexano, metanol, dissulfeto de carbono)
condições em que há neurodegeneração mais Doença de Wilson
neurodegenerativos
Outros distúrbios

disseminada que na DP → quadro clínico um pouco Doença de Huntington


diferente da DP: rigidez e bradicinesia, Neurodegeneração com acúmulo de Fe no cérebro
comprometimento precoce de fala e marcha, SCA 3 (ataxia espinocerebelar)
ausência de tremor de repouso e ausência de Ataxia associada ao X frágil-tremor-parkinsonismo
assimetria motora → não responde Doença priônica
adequadamente à levodopa. Exame de imagem Distonia-parkinsonismo (DYT3)
Doença de Alzheimer com parkinsonismo
metabólica das conexões entre núcleos da base e
tálamo → atividade diminuída no GPi e aumentada no tálamo (inverso da DP).
• Atrofia de múltiplos sistemas: parkinsonismo atípico + sinais cerebelares e/ou autonômicos (hipotensão
ortostática) → degeneração de SNc, estriado, cerebelo e núcleos olivares inferiores
• Paralisia supranuclear progressiva: movimentos sacádicos lentos, apraxia das pálpebras e movimentos
oculares restritos → pode haver hiperextensão do pescoço, distúrbio precoce de marcha e quedas +
dificuldade da fala e deglutição + déficit cognitivo evidente → atrofia do mesencéfalo com preservação da
ponte + degeneração de SNc, estriado, núcleo subtalâmico, núcleos talâmicos da linha média e globo pálido
• Degeneração ganglionar corticobasal: contrações distônicas assimétricas e falta de habilidade de uma mão
+ distúrbios sensoriais corticais → apraxia, agnosia, mioclonia focal de membros ou fenômeno do membro
“fantasma” → RM mostra atrofia cortical assimétrica

Critérios do banco de cérebros de Londres (1992)


Estabelece critérios diagnósticos para doença Critérios de exclusão
de Parkinson ou que descartam este diagnóstico.
• Antecedente de múltiplos TCEs ou AVEs
Critérios de inclusão: presença de síndrome • Uso de neurolépticos desde o início do quadro
parkinsoniana associada a três ou mais quesitos abaixo • Remissão prolongada dos sintomas
• Início unilateral e curso assimétrico

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 67

• Presença de tremor de repouso • Persistência de acometimento unilateral por


• Progressão dos sintomas mais de 3 anos → sugere lesão estrutural
• Resposta excelente à levodopa • Presença de sintomas e sinais não
• Resposta à levodopa por, pelo menos, 5 anos parkinsonianos no início do quadro: disfagia,
• Discinesia induzida pela doença → comprova acometimento do SNA, demência, paralisia de
neurodegeneração movimentos oculares, síndrome piramidal →
• Evolução clínica ≥ 10 anos sugere presença de outra doença degenerativa
• Pouca resposta a doses elevadas de levodopa

Tratamento medicamentoso
Levodopa
A levodopa é um precursor de dopamina, absorvida no intestino delgado por meio de transporte ativo e é
capaz de atravessar a barreira hematoencefálica – diferente da dopamina. Entende-se, portanto, que a conversão
periférica de levodopa em dopamina não seria interessante, uma vez que esta não atravessaria a BHE para agir nos
locais apropriados e, ainda, causaria uma série de efeitos colaterais → náuseas, vômitos e hipotensão ortostática.
Para impedir que isso ocorra, utiliza-se um outro medicamento associado, que também não é capaz de atravessar
a BHE, mas funciona na periferia como inibidor da dopadescarboxilase (benserazida ou carbidopa) → evita
conversão periférica de levodopa em dopamina. Ao atingir o SNC, a levodopa fica livre para ser convertida em
dopamina.
Quase todos os pacientes com DP têm melhora, e a ausência de resposta a uma tentativa adequada de
terapia com levodopa deve levar ao questionamento do diagnóstico. Nenhum tratamento clínico ou cirúrgico atual
proporciona benefícios antiparkinsonianos superiores aos que podem ser obtidos com a levodopa:
1) Beneficia as manifestações motoras clássicas da DP
2) Prolonga a independência e a capacidade de trabalho
3) Melhora a qualidade de vida
4) Aumenta o tempo de sobrevida
Deve-se administrar o medicamento até 30 minutos antes das refeições, especialmente as ricas em
proteína, em função da sua competição com aminoácidos à absorção intestinal. Tem meia vida plasmática de até
duas horas → considerada curta.
Os efeitos adversos agudos são experimentados pela maioria dos pacientes no início do tratamento, mas
tendem a desaparecer depois de algumas semanas. São eles:
• Náusea e anorexia: pode-se utilizar a domperidona → agonista da dopamina que atua na zona de gatilho
do quimorreceptor, onde a BHE é permeável à dopamina → medicamento não possui acesso aos núcleos
da base, então não interfere no efeito terapêutico da levodopa
• Hipotensão postural: como já foi explicado, pode ser evitada com uso de inibidor de dopadescarboxilase
• Efeitos psicológicos: levodopa, ao aumentar a atividade dopaminérgica no cérebro, pode produzir uma
síndrome esquizofrenia-símile (delírios e alucinações), ou, mais comumente, confusão, desorientação,
insônia e pesadelos
A maioria dos pacientes com tratamento de longo prazo com levodopa desenvolve lentamente os efeitos
colaterais motores, que podem ser de dois tipos principais:
1) Discinesia: movimentos involuntários de contorção que aparecem após 2 anos de tratamento com
levodopa → afeta face e membros. Ocorre no momento do pico do efeito terapêutico, de forma que a
margem entre o benefício e o efeito discinético torna-se cada vez mais estreita. O efeito da levodopa é de
curta duração → flutuação da concentração plasmática do fármaco favorece desenvolvimento de
discinesias.

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68 Módulo 402

2) Efeito on-off: consiste em várias flutuações no estado clínico em que a hipocinesia e a rigidez pioram
subitamente por minutos a horas e, em seguida, melhoram novamente. O efeito off pode ser tão súbito
que o paciente para durante a deambulação e se sente preso naquele lugar, ou fica incapaz de levantar de
uma cadeira onde se sentou normalmente minutos antes. Este efeito também parece ser decorrente das
flutuações da concentração plasmática de levodopa → conforme a doença avança, os neurônios perdem a
capacidade de armazenar dopamina → exige formação contínua de dopamina extraneuronal a partir da
levodopa, ou seja, um suprimento contínuo do medicamento.
Além disso, a doença continua progredindo → quedas, congelamento da marcha, disfunção autonômica,
distúrbios do sono e demência. Manifestações de origem não dopaminérgica (sobretudo quedas e demência) não
são beneficiadas pela levodopa → constituem a principal fonte de incapacidade e principal motivo de internação
dos pacientes com DP avançada em clínicas de repouso.

Agonistas da dopamina
Apesar de não possuírem efeito comparável ao da levodopa, os agonistas da dopamina podem funcionar
como adjuvantes da levodopa → aumentam função motora e reduzem o tempo off em pacientes com flutuações
motoras. Além disso, sua ação prolongada tem menor tendência a induzir discinesia quando comparada com a
levodopa. Em função disso, é comum iniciar o tratamento com um agonista da dopamina, apesar de que, com a
evolução do quadro, a levodopa será necessária em quase todos os pacientes.
• Ropinirol e pramipexol: disponíveis em formulações orais de liberação imediata (3x ao dia) e liberação
prolongada (1x ao dia)
• Rotigotina: disco transdérmico (1x ao dia)
• Apomorfina: possui eficácia comparada à da levodopa, mas deve ser administrada por via parenteral e tem
efeito muito curto (45 minutos) → pode ser administrada por via injetável como agente de resgate para o
tratamento de episódios off muito graves
Os efeitos colaterais agudos dos agonistas de dopamina são primariamente dopaminérgicos: náuseas,
vômitos e hipotensão ortostática. O uso crônico produz efeitos como alucinações, déficit cognitivo e sedação →
episódios súbitos de adormecimento à direção de veículo motorizado → alertar os pacientes. Também podem
estar associados a transtornos do controle dos impulsos: jogo patológico, hipersexualidade, compulsão alimentar
e compras compulsivas → parecem estar relacionados aos sistemas de recompensa associados à dopamina, bem
como a alterações no estriado ventral e orbitofrontais.

Inibidores enzimáticos
Inibidores da monoaminoxidase tipo B (MAO-B) bloqueiam o metabolismo central da dopamina,
aumentando as concentrações sinápticas deste neurotransmissor. Clinicamente, proporcionam benefício
antiparkinsoniano modesto em monoterapia no início da doença e produzem redução do tempo off quando
utilizados como adjuvante da levodopa em pacientes com flutuação motora. São exemplos deste medicamento:
selegilina e rasagilina.
Inibidores da catecol-ortometiltransferase (COMT) bloqueiam a metabolização periférica da levodopa,
aumentando a meia vida e sua disponibilidade no cérebro. São exemplos deste medicamento: tolcapona e
entacapona. Levodopa + inibidor da COMT → reduz o tempo off e prolonga o tempo on nos pacientes com flutuação
motora. Efeitos colaterais são dopaminérgicos, mas podem ser controlados com redução da dose de levodopa.
Alguns efeitos adversos são mais associados à tolcapona: diarreia (exige interrupção da medicação em 5-10% dos
pacientes) e hepatotoxicidade fatal (necessário monitorar a função hepática).

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 69

A amantadina é
antagonista do receptor
de glutamato (NMDA),
utilizada tanto em fases
iniciais como em fases
avançadas para tratar
discinesia. Já os
medicamentos
anticolinérgicos, como
biperideno ou triexifenidil,
são indicados para
pacientes mais jovens,
com sintomas leves e
predomínio de tremores.

Tratamento cirúrgico
Indicado nos casos de refratariedade ao tratamento medicamentoso ou intolerabilidade às doses efetivas
destes. As modalidades mais usadas são: estimulação subtalâmica e estimulação do núcleo ventral intermédio do
tálamo (tratamento dos tremores).

Abordagem dos sintomas não motores


• Depressão: ocorre em até 50% dos pacientes → amitriptilina, sertralina ou escitalopram
• Demência: comum após 10 anos do quadro, já na fase avançada → rivastigmina
• Alucinações ou delírios: retirar amantadina ou anticolinérgico e investigar distúrbios eletrolíticos ou
infecções → se não for uma dessas causas, iniciar clozapina (antipsicótico atípico – não acarreta
parkinsonismo)
• Transtorno comportamental do sono-REM → clonazepam

Prognóstico
A doença de Parkinson não é fatal, mas é inevitavelmente progressiva e atinge a gravidade em 10-25 anos
→ grande comprometimento motor e cognitivo. Pacientes que iniciam a doença ainda jovens sofrem com
deterioração mais rapidamente. A disfagia decorrente da doença predispõe os pacientes a pneumonias de
repetição → principal causa de morte. Em geral, as medicações funcionam bem nos primeiros 10 anos de quadro →
paciente tem boa capacidade funcional, mas mesmo assim irá progredir e piorar eventualmente.
Para além das repercussões biológicas, sabe-se que a doença de Parkinson afeta a qualidade de vida do
indivíduo nos aspectos físico, mental/emocional, social e econômico. Acarreta custos diretos como gastos com
hospitalizações, medicações e reabilitação, além de custos indiretos devido perda da produtividade, diminuição da
renda familiar e aposentadoria precoce.

Coreia de Sydenham
A coreia de Sydenham acomete mais o sexo feminino e é mais comum na infância, dos 5-15 anos. Surge
em associação a uma exposição prévia à infecção por estreptococo do grupo A → resposta autoimune. Após
período de 1-5 semanas da faringite, paciente apresenta sintomas de febre reumática. A coreia ocorre entre 1-6
meses após a infecção → aparece isoladamente ou associada a outros sinais de doença reumática. O quadro clínico
é marcado pelo início agudo de movimentos coreiformes e distúrbios do comportamento. Cerca de 60% a 80%
dos pacientes apresentam cardite concomitante e 30% têm artrite associada. Pode haver sintomas psiquiátricos,
como TOC.

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70 Módulo 402

Esta coreia é autolimitada, apresentando remissão completa entre 9 meses e 2 anos do seu início. No
entanto, o tratamento pode ser instituído nos casos mais intensos → bloqueadores da dopamina (haloperidol),
ácido valproico e carbamazepina. Pode haver recidiva posteriormente, sobretudo em associação com a gravidez
(coreia gravídica) ou tratamento com hormônios sexuais. A profilaxia com penicilina benzatina evita ataques
recorrentes.

Prognóstico
Diferentemente da etiologia degenerativa vista na coreia da doença de Huntington, o prognóstico biológico
da coreia de Sydenham é excelente, com remissão espontânea do quadro entre 9 meses e 2 anos. No entanto,
apresenta impacto significativo nas relações sociais, uma vez que acomete principalmente crianças e adolescentes.
A ignorância em relação à natureza desta hipercinesia pode levar o paciente ao isolamento social e ao sofrimento
de bullying → criança é vista como desajeitada pelos colegas. É importante a informação sobre a doença através da
educação e, se preciso for, realizar acompanhamento psicológico do paciente.

Referências bibliográficas
Machado – Neuroanatomia Funcional – 3ª Edição
Harrison – Medicina Interna – 19ª Edição – 2017
Rang & Dale – Farmacologia – 7ª Edição – 2012

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 71

Módulo 402 – Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 8
1. Definir epilepsia, convulsão e crise epiléptica, abordando suas características semiológicas.
2. Discutir a classificação das crises epilépticas de acordo com a International League Against Epilepsy.
3. Descrever a epidemiologia, etiologia, fisiopatologia, diagnóstico e diagnóstico diferencial da epilepsia.
4. Descrever o tratamento farmacológico da epilepsia.

Epilepsia
Conceitos em epilepsia
Crise epiléptica
Ocorrência transitória de sinais e/ou sintomas
devido atividade neuronal cerebral anormal excessiva ou
síncrona, classificadas de acordo com a tabela ao lado
(ILAE).
• Crise não provocada ou espontânea: ocorre na
ausência de uma condição clínica desencadeadora
• Crises sintomáticas agudas: eventos que ocorrem
logo após agressão aguda ao SNC que pode ser
metabólica, tóxica, tumoral, infecciosa ou
inflamatória (podem ser de origem neurológica ou
sistêmica) → tais crises cessam assim que o insulto
desencadeante é controlado e em geral não
cronificam
• Aura: termo leigo sinônimo de crise focal
perceptiva → pode ocorrer de forma isolada ou
preceder uma crise epiléptica observável
• Crise reflexa: crise epiléptica desencadeada por estímulos sensoriais ou cognitivos → estimulação fótica,
estímulos sonoros e outros
• Convulsão: termo leigo utilizado para descrever crises epilépticas com manifestações motoras tônicas,
clônicas ou tônico-clônicas, que podem ser uni ou bilaterais

Epilepsia
Doença neurológica definida por qualquer uma • Epilepsia resolvida: é assim considerada em
das seguintes condições: indivíduos que tinham síndrome epiléptica
idade-dependente, mas que agora estão além
1) Pelo menos duas crises epilépticas
da idade aplicável ou que permaneceram livres
espontâneas (ou duas crises reflexas)
de crises nos últimos 10 anos, sem fármacos
ocorrendo em um intervalo maior do que 24
anticrise nos últimos 5
horas
• Epilepsia refratária ou farmacorresistente:
2) Uma crise epiléptica espontânea (ou reflexa)
paciente não fica livre das crises de modo
com risco de recorrência estimado em pelo
sustentado mesmo após duas tentativas de
menos 60% em 10 anos, como por exemplo
tratamento com FACs apropriadamente
EEG com atividade epileptiforme, evidência
escolhidos, usados de modo adequado e
clínica ou por neuroimagem de lesão cerebral
tolerados, seja em monoterapia ou em
3) Diagnóstico de uma síndrome epiléptica
combinação

Sophia Molina Turma XIX


72 Módulo 402

• Encefalopatia epiléptica: a atividade epiléptica


e/ou as crises contribuem para
comprometimentos cognitivo e
comportamental, além daqueles esperados
pela patologia isolada

Epidemiologia
Condição neurológica crônica mais comum, depois de cefaleia, e afeta indivíduos de todas as idades, tendo
um pico na infância e outro em idosos: incidência de 35 a 52 por 100.000, variando conforme a faixa etária.

Etiologia
• Causa indeterminada em mais de 50% dos pacientes
• Mais comum na infância é idiopática, e em adultos, secundárias a outras causas
• Principais: AVE, traumatismo craniano, doenças do desenvolvimento/congênitas, infecção, neoplasias,
doenças degenerativas (p. ex. Alzheimer)
• Pacientes com epilepsia podem ter: retardo mental (alterações das alterações cognitivas e dificuldade de
aprendizado), transtornos psiquiátricos e déficits motores
• Entre as muitas causas de epilepsia figuram várias síndromes epilépticas, cujas características clínicas e
patológicas são distintivas e sugerem uma etiologia subjacente específica

Causas de crises epilépticas relacionadas à idade


Adolescentes 12-18

Traumatismos
Hipóxia e isquemia perinatais
Distúrbios genéticos
Hemorragia e traumatismos intracranianos
Infecção
Recém-nascidos < 1 mês

Infecção do SNC
Uso de drogas ilícitas
Distúrbios metabólicos:
Tumor cerebral
• Hipoglicemia
• Hipocalcemia
Adultos jovens 18-35

• Hipomagnesemia Traumatismos
• Deficiência de piridoxina – B6 Abstinência de álcool
Abstinência de drogas Uso de drogas ilícitas
Distúrbios do desenvolvimento Tumor cerebral
Distúrbios genéticos Autoanticorpos

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 73

Lactentes e crianças < 12 anos


Crises febris (3 meses a 5 anos) Doença vascular cerebral
Distúrbios do desenvolvimento Tumor cerebral

Adultos > 35 anos


Infecção do SNC Abstinência de álcool
Distúrbios genéticos Distúrbios metabólicos (uremia, insuficiência
hepática, anormalidades eletrolíticas,
• Síndromes metabólicas
hiper/hipoglicemia)
• Síndromes degenerativas
• Síndromes de epilepsia primária Alzheimer e outras doenças degenerativas
Traumatismos Autoanticorpos

A crise febril ocorre entre 3 meses e 5 anos de idade, geralmente em crianças com história familiar de
epilepsia. O quadro típico consiste em: crise tonicoclônica generalizada durante enfermidade febril decorrente de
infecção comum na infância (p. ex. otite média, infecção respiratória ou gastroenterite) → ocorre quase sempre
durante a fase de elevação da temperatura (1º dia). Considerações:
• Crise febril simples: evento único, breve e de apresentação simétrica → não aumenta risco de epilepsia
• Crise febril complexa: atividade epiléptica repetida, duração > 15 minutos e características focais →
aumentam o risco de epilepsia em 2-5%
• Cerca de 33% sofrem recorrência, porém menos de 10% chegam a 3 ou mais episódios
Autoanticorpos dirigidos ao SNC (p. ex. aos receptores de glutamato ou canais de potássio) são uma causa
recentemente reconhecida de epilepsia: suspeitar desta etiologia quando → pessoa previamente hígida apresenta
padrão de crises epilépticas particularmente agressivo ao longo de semanas a meses, caracterizado por crises
cada vez mais frequentes e prolongadas + declínio cognitivo.
A doença vascular cerebral parece ser causa de 50% dos casos novos de epilepsia após os 65 anos, podendo
ser de dois tipos: (1) crises epilépticas agudas, que ocorrem no momento do AVE, principalmente o embólico; ou
(2) crises epilépticas crônicas, que surgem meses ou anos após o evento vascular e estão associadas a todos os
tipos de AVE → embólico, trombótico ou hemorrágico.

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74 Módulo 402

Fisiopatologia
Início e propagação da crise epiléptica
A atividade epiléptica focal pode começar em uma região bem definida do córtex e, depois, lentamente
invadir as regiões vizinhas. Existem muitos fatores que controlam a excitabilidade neuronal e, portanto,
mecanismos fisiopatológicos que envolvam alteração desses fatores são capazes de causar atividade paroxística
(tabela ao lado).
A característica fundamental da crise epiléptica é uma ‘’ponta’’ eletrográfica devido disparos intensos
quase simultâneos de um grande número de neurônios excitatórios locais → resulta em hipersincronização
aparente dos disparos excitatórios em uma região cortical relativamente grande. A atividade paroxística em
neurônios individuais é causada por: influxo de Ca2+ extracelular → induz abertura dos canais de Na+ dependentes
da voltagem + influxo de Na+ + potenciais de ação
Mecanismos de controle da excitabilidade neuronal
repetitivos → despolarização de longa duração. Isso é
seguido de hiperpolarização mediada por receptores de Alterações na condutância dos canais iônicos
+
GABA ou canais de K , de acordo com o tipo celular. As Alterações nas características de resposta dos
salvas sincronizadas de um número suficiente de receptores da membrana
neurônios resultam na chamada descarga em ponta no Intrínsecos
EEG. Alterações nos sistemas de segundo mensageiro
Alterações no tamponamento citoplasmático
A onda de disseminação de crise é alentecida e,
por fim, interrompida pela hiperpolarização intacta e Alterações na expressão de proteínas
inibição ‘’circundante’’ → graças à ativação progressiva determinada pela transcrição, tradução e
de neurônios inibitórios. Com ativação suficiente, há modificação pós-graduação dos genes
recrutamento dos neurônios circundantes por diversos Modificações na quantidade ou no tipo de
mecanismos sinápticos e não sinápticos: neurotransmissores presentes na sinapse
1) Aumento do K+ extracelular: amortece a Modulação de receptores por íons
Extrínsecos

hiperpolarização e despolariza neurônios extracelulares e outras moléculas


vizinhos
Propriedades temporais espaciais dos impulsos
2) Acúmulo de Ca2+ nas terminações pré-
aferentes sinápticos e não sinápticos
sinápticas: maior liberação de
neurotransmissores Astrócitos e oligodendrócitos são células não
3) Ativação induzida pela despolarização do neuronais que exercem importante papel em
NMDA do receptor de aminoácidos diversos desses mecanismos
excitatórios: causa influxo adicional de Ca2+ e ativação neuronal
4) Interações efáticas relacionadas a alterações de osmolaridade tecidual e edema celular
O recrutamento de uma quantidade suficiente de neurônios leva à propagação de correntes excitatórias
para áreas contíguas por meio de conexões corticais locais, e para áreas mais distantes por meio de vias
comissurais longas como o corpo caloso. Algumas causas de hiperexcitabilidade incluem:
• Ingestão ácido domoico (análogo do glutamato) → ativação direta de receptores de AAs excitatórios em
todo o SNC
• Penicilina diminui o limiar para crises ao reduzir a inibição → antagoniza efeitos do GABA no seu receptor

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 75

Mecanismos da epileptogênese
Epileptogênese consiste na transformação da rede neuronal normal em uma rede cronicamente
hiperexcitável → pode levar meses a anos entre a lesão inicial do SNC (traumatismo, AVE ou infecção) e a primeira
crise epiléptica: a lesão parece desencadear um processo gradual de diminuição do limiar para crise epiléptica na
região afetada, até que ocorre uma crise espontânea.
Algumas formas de epileptogênese teriam relação com Epilepsia do lobo temporal mesial: perda
alterações estruturais nas redes neuronais: uma lesão inicial (p. seletiva de neurônios → inibição dos
ex. traumatismo craniano) pode gerar uma região focal de principais neurônios excitatórios do giro
modificação estrutural que causa hiperexcitabilidade local → a denteado. Em resposta à perda neuronal,
hiperexcitabilidade local origina novas alterações estruturais que ocorre reorganização ou “brotamento” dos
evoluem ao longo do tempo, até que a lesão focal produz crises neurônios sobreviventes de uma forma que
epilépticas clinicamente evidentes. Outros mecanismos de parece afetar a excitabilidade desta rede
epileptogênese:
• Alterações a longo prazo nas propriedades bioquímicas intrínsecas das células da rede → alterações
crônicas na função do receptor de glutamato ou GABA
• Indução de cascatas inflamatórias

Causas genéticas de epilepsia


• Mutações que afetam a função dos canais iônicos → formas relativamente “puras” de epilepsia nas quais
as crises são uma anormalidade fenotípica e a estrutura e função cerebrais são de resto normais
• Mutações associadas a vias que incluem o desenvolvimento do SNC ou a homeostase neuronal (como da
via de novo): epilepsias sintomáticas → distúrbios nos quais outras anormalidades neurológicas, como
deficiência cognitiva, coexistem com as crises epilépticas

Crises epilépticas focais


Surgem a partir de uma rede neuronal localizada distintamente dentro de um hemisfério cerebral ou
distribuída mais amplamente, porém ainda situada dentro do hemisfério. Podem ser perceptivas ou
disperceptivas e podem evoluir para crises epilépticas tônico-clônicas bilaterais. O eletroencefalograma (EEG)
interictal (entre crises epilépticas) em pacientes com crises epilépticas focais está frequentemente normal ou pode
demonstrar descargas breves, denominadas pontas epileptiformes ou ondas agudas.

Crises epilépticas focais


Crises motoras focais são caracterizadas por:
• Movimentos motores anormais, que podem começar em uma região muito restrita, como os dedos, e
avançar de modo gradual (segundos ou minutos) para incluir uma parcela maior do membro → “marcha
jacksoniana” → extensão da atividade epiléptica para uma região progressivamente maior do córtex motor
• Pacientes podem apresentar paresia localizada (paralisia de Todd) durante alguns minutos a muitas horas
na região acometida após a crise epiléptica
• Casos raros: crise epiléptica persiste durante horas ou dias → denominada epilepsia parcial contínua
As crises focais também podem manifestar-se como alterações na sensibilidade somática (p. ex.
parestesias), na visão (luzes piscando ou alucinações constituídas), no equilíbrio (sensação de queda ou vertigem),
ou na função autonômica (rubor, sudorese, piloereção):
• Crises focais oriundas do córtex frontal ou do temporal → alterações auditivas, olfatórias, corticais
superiores (sintomas psíquicos)
• Incluem sensação de odores incomuns e intensos (p. ex. borracha queimando ou querosene) ou sons
(grosseiros ou altamente complexos), ou sensação epigástrica que ascende do estômago ou tórax para a
cabeça

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76 Módulo 402

• Alguns pacientes descrevem sentimentos de medo, sensação de mudança iminente, dissociação,


despersonalização, déjà vu, ilusões de que objetos estão se tornando menores (micropsia) ou maiores
(macropsia)

Crises epilépticas focais disperceptivas


Manifestações focais acompanhadas de comprometimento transitório da capacidade do paciente de
manter contato normal com o ambiente: paciente é incapaz de responder adequadamente a comandos visuais ou
verbais durante a crise e tem memória ou percepção comprometidas da fase ictal.
O início da fase ictal muitas vezes corresponde a uma parada comportamental brusca ou olhar vago e
imóvel, que assinala o começo do período de comprometimento da percepção consciente. Esta parada em geral
acompanha-se de automatismos: movimentos repetitivos, complexos e direcionados a um fim.
Após a crise epiléptica → paciente confuso, sendo que a recuperação plena da consciência pode demorar
de segundos até 1 hora → exame físico imediatamente após a crise pode evidenciar amnésia anterógrada ou, caso
envolva o hemisfério dominante, afasia pós-ictal.

Evolução das crises focais para tônico-clônicas bilaterais


As crises focais podem se disseminar e comprometer ambos os hemisférios cerebrais → crise do tipo
tonicoclônica bilateral. Essa evolução é observada com frequência após crises focais originadas em um foco no lobo
frontal (em outras áreas também).

Crises epilépticas generalizadas


Acredita-se que as crises generalizadas tenham a sua origem em algum ponto do cérebro, porém passam
a ocupar imediata e rapidamente redes neuronais em ambos os hemisférios. Diversos tipos de crises generalizadas
apresentam características que as incluem em categorias distintas e que facilitam o diagnóstico clínico. Geralmente
decorrem de anormalidades genéticas.

Crises de ausência típicas


Caracterizam-se por lapsos breves e súbitos da consciência, sem perda do controle postural. Crise dura
apenas alguns segundos e a consciência retorna tão subitamente quanto foi perdida → não há confusão pós-ictal.
Embora a breve perda da consciência possa não ser evidente clinicamente ou ser a única manifestação da descarga
epiléptica, as crises de ausência em geral acompanham-se de: sinais motores bilaterais sutis, como rápido piscar
de olhos, movimentos mastigatórios, ou movimentos clônicos de pequena amplitude das mãos.
As crises de ausência típicas estão associadas a um grupo de epilepsias geneticamente determinadas que
começam na infância (entre 4 e 8 anos) ou no início da adolescência → são o principal tipo de crise em 15 a 20%
das crianças com epilepsia. As crises podem ocorrer centenas de vezes durante o dia, mas a criança pode não ter
consciência ou ser incapaz de expressar sua ocorrência. Eletrofisiologicamente, há uma descarga em pontaonda
generalizada simétrica de 3 Hz, que começa e cessa bruscamente, sobre um EEG de base normal.

Crises de ausência atípicas


A perda de consciência tem duração maior, com início e fim menos abruptos → acompanha-se de sinais
motores mais evidentes: podem incluir características focais ou de lateralização. As crises de ausência atípicas
costumam associar-se a anormalidades estruturais difusas ou multifocais do cérebro e, portanto, podem
acompanhar outros sinais de disfunção neurológica, como deficiência intelectual. EEG: padrão lento e generalizado
de pontaonda, frequência ≤ 2,5 Hz, e outros tipos de atividade anormal.

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 77

Crises tonicoclônicas
Principal tipo de crise em cerca de 10% de todas as pessoas com epilepsia e a mais comum nos distúrbios
metabólicos. A fase inicial da crise costuma ser de contração tônica dos músculos de todo o corpo: músculos da
expiração e da laringe no início da crise → produz lamento alto, ou “grito ictal” + prejuízo à respiração + acúmulo
de secreções na orofaringe + surgimento de cianose. Contração dos músculos da mandíbula pode levar o paciente
a morder a língua. Aumento acentuado do tônus simpático gera aumentos da FC, da PA e do tamanho das pupilas.
Após 10 a 20 segundos, a fase tônica da crise epiléptica evolui para a fase clônica, produzida pela
superposição de períodos de relaxamento muscular sobre a contração muscular tônica. Os períodos de
relaxamento progressivamente aumentam até o final da fase ictal, a qual costuma durar não mais que 1 minuto.
A fase pós-ictal se caracteriza por ausência de responsividade, flacidez muscular e salivação excessiva que
pode causar respiração ruidosa e obstrução parcial das vias respiratórias. Nesse momento, pode ocorrer
incontinência urinária ou fecal. A consciência é recuperada em alguns minutos ou horas e, durante essa transição,
há um período de confusão pós-ictal.
Existem diversas variantes da crise tonicoclônica generalizada, incluindo crises tônicas puras e clônicas
puras. Crises tônicas podem ser breves (apenas alguns segundos de duração), pois costumam associar-se a
síndromes epilépticas específicas que apresentam fenótipos epilépticos mistos, como a síndrome de Lennox-
Gastaut.

Crises generalizadas atônicas


Perda súbita de tônus muscular postural com duração de 1 a 2 segundos → pode levar a queda do
paciente. A consciência é brevemente prejudicada, mas não costuma haver confusão pós-ictal.

Crises generalizadas mioclônicas


Mioclonia: contração muscular súbita e breve que pode comprometer uma parte ou todo o corpo. Uma
forma fisiológica comum e normal de mioclonia é o movimento de abalo súbito observado ao adormecer. A
mioclonia patológica é vista com mais frequência associada a distúrbios metabólicos, doenças degenerativas do
SNC ou lesão cerebral anóxica. Crises mioclônicas costumam coexistir com outras formas de crises epilépticas
generalizadas, mas são predominantes na epilepsia mioclônica juvenil.

Síndromes de epilepsia
As síndromes epilépticas são distúrbios nos quais a epilepsia é uma característica predominante, e existem
evidências suficientes em favor de um mecanismo subjacente comum.

Epilepsia mioclônica juvenil


A epilepsia mioclônica juvenil (EMJ) é um distúrbio epiléptico generalizado de causa desconhecida que
surge no início da adolescência → caracteriza-se por abalos mioclônicos bilaterais que podem ser únicos ou
repetitivos. Sobre as crises:
• Mais frequentes pela manhã, ao acordar
• Podem ser provocadas por privação do sono
• A consciência é preservada, a menos que a mioclonia seja especialmente intensa
• Muitos pacientes também apresentam crises tonicoclônicas generalizadas, e 33% têm crises de ausência
Embora a remissão completa seja relativamente incomum, as crises costumam responder bem à
medicação anticonvulsivante apropriada. Muitas vezes há história familiar de epilepsia: estudos sugerem causa
poligênica.

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78 Módulo 402

Síndrome de Lennox-Gastaut
A síndrome de Lennox-Gastaut ocorre em crianças e é definida pela seguinte tríade:
1) Múltiplos tipos de crises epilépticas → tônico-clônicas generalizadas, atônicas e ausência atípica
2) EEG com descargas em ponta-onda lentas (< 3 Hz) e várias outras anormalidades
3) Disfunção cognitiva na maioria dos casos, mas não em todos
A síndrome de Lennox-Gastaut associa-se a doença ou disfunção do SNC de várias etiologias, incluindo
mutações de novo, anormalidades do desenvolvimento, hipoxia/isquemia perinatal, traumatismo, infecção e outras
lesões adquiridas. A natureza multifatorial dessa síndrome sugere que se trate de uma resposta inespecífica do
cérebro à lesão neural difusa. Muitos pacientes têm prognóstico reservado em razão da doença subjacente do SNC
e das consequências físicas e psicossociais da epilepsia grave mal controlada.

Síndrome de epilepsia do lobo temporal mesial


Síndrome mais associada a crises focais disperceptivas. A ressonância magnética (RM) de alta resolução
pode detectar a esclerose hipocampal típica que parece ser essencial à fisiopatologia da ELTM em muitos
pacientes. Tende a ser refratária ao tratamento com anticonvulsivantes, mas responde bem à intervenção cirúrgica.

Síndrome de epilepsia do lobo temporal mesial


Anamnese Observações clínicas Exames complementares

História de crises febris Parada do comportamento Pontas temporais anteriores


unilaterais ou bilaterais no EEG
História familiar positiva para Olhar fixo
epilepsia Ressonância magnética: hipocampo
Desorientação pós-ictal
pequeno com sinal hiperintenso
Raras crises epilépticas com Perda de memória nas sequencias ponderadas em T2 +
evolução p/ tonicoclônica bilateral lobo temporal pequeno +
Automatismos complexos
Crises podem remitir e reaparecer cornotemporal aumentado
Postura anormal unilateral
Início precoce Biópsia: perda altamente seletiva
Disfasia (quando foco no de populações celulares especificas
Crises frequentemente intratáveis hemisfério dominante) do hipocampo na maioria dos casos

Exames complementares
• TC de crânio: na investigação inicial de todos os pacientes → elucida a causa da epilepsia
• Ressonância magnética de encéfalo: mais sensível na investigação etiológica das epilepsias → detecta
lesões sutis não vistas pela TC de crânio
• Eletroencefalograma (EEG): ajuda na confirmação diagnóstica e classificação do tipo de síndrome
epiléptica → importante que o paciente também faça durante o sono porque este aumenta a chance do
aparecimento de descargas epileptiformes
• Vídeo-EEG (usado em situações especiais): consiste na monitorização prolongada dos pacientes para
registro simultâneo das crises e do EEG → importante para identificação foco de origem das crises naqueles
pacientes candidatos à cirurgia (não responderam aos medicamentos) e no diagnóstico diferencial entre
crises epilépticas e não epilépticas.

Tratamento
Princípios gerais
1) Usar a medicação de primeira linha conforme o tipo de crise epiléptica (vide algoritmo)
2) Iniciar com monoterapia titulando até dose mínima efetiva
3) Conforme resposta clínica, aumentar até dose máxima tolerada pelo paciente

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 79

4) Se esgotadas 2 monoterapias, associar outra medicação com efeito sinérgico


5) Devido possíveis efeitos adversos, solicitar exames anualmente: hemograma, creatinina, ureia, sódio,
potássio, cálcio, glicemia de jejum, amilase (se uso do ácido valproico), gama-GT, fosfatase alcalina, TGO,
TGP
Em relação ao tratamento:
• Cerca de 70% a 80% dos pacientes obtêm remissão completa das crises com o tratamento medicamentoso
• 20% a 30% evoluem com refratariedade ao tratamento medicamentoso, necessitando de avaliação para
busca de tratamentos alternativos (centros de atenção terciária), que podem ser:
o Cirurgia
o Dieta cetogênica
o Estimulação vagal

Principais fármacos utilizados


Fenobarbital
• Mecanismo de ação: aumenta inibição gabaérgica
• Efeitos adversos:
o Sonolência excessiva, ataxia e contratura de Dupuytren
o Induz sistema enzimático hepático p450 → diminui nível sérico de outras medicações

Fenitoína
• Mecanismo de ação: interfere no transporte de sódio
• Efeitos adversos:
o Nistagmo, ataxia e confusão mental → dose-dependente
o Hipertrofia gengival → orientar higiene dental para prevenção
o Hiperglicemia em diabéticos e distúrbio de condução cardíaca → na administração intravenosa
o Induz sistema enzimático hepático p450 → diminui nível sérico de outras medicações
o Farmacocinética não linear: ao dobrar a dose, o nível sérico quadruplica → faixa terapêutica está
próxima da tóxica → cuidado ao ajustar a dose

Carbamazepina
• Mecanismos de ação: diminui a condutância de canais de sódio e bloqueia receptores de NMDA
• Efeitos adversos:
o Sonolência excessiva, tontura e diplopia
o Hiponatremia devido aumento da secreção de ADH
o Leucopenia
o Induz sistema enzimático hepático p450 → diminui nível sérico de outras medicações

Oxcarbazepina
• Derivada da molécula de carbamazepina
• Mecanismos de ação: diminui a condutância de canais de sódio e bloqueia receptores de NMDA
• Efeitos adversos:
o Mesmos da carbamazepina → porém menos frequentes
• Mais bem tolerado pelos pacientes

Ácido valproico
• Mecanismo de ação: aumenta a ação gabaérgica
• Efeitos adversos:
o Náuseas, pirose e aumento do peso
o Alopecia: pode ser corrigida em 11% dos casos → repor zinco e biotina

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80 Módulo 402

o Síndrome metabólica e plaquetopenia


o Pancreatite → raramente
o Hepatotoxicidade: mais frequente < 2 anos → medicamento contraindicado nesta idade
o Inibe o sistema enzimático hepático p450 → aumenta nível sérico de outras medicações
• Divalproato de sódio: mesmo mecanismo de ação, com menos efeitos adversos graças à absorção → ocorre
no duodeno e é mais lenta

Etossuximida
• Mecanismo de ação: inibição de canais de cálcio tipo T talâmicos → específicos para crises de ausência
• Efeitos adversos:
o Náuseas
o Sonolência excessiva

Topiramato
• Mecanismos de ação: aumenta atividade dos receptores GABAA, bloqueia receptores AMPA e inibe a
anidrase carbônica
• Efeitos adversos:
o Alterações cognitivas → dose-dependente
o Perda de peso
o Litíase renal em 2% dos casos
o Glaucoma

Lamotrigina
• Mecanismo de ação: bloqueia canais de sódio voltagem-dependentes
• Efeitos adversos:
o Rash cutâneo em 10% dos casos → tenta-se prevenir com introdução lenta da dose
o Cefaleia, náuseas, vômitos, diplopia, tontura e ataxia
• É a medicação com menor incidência de efeitos teratogênicos: ótima escolha em gestantes → a gestação
reduz o nível sérico em 75% do basal → aumentar a dose e monitorar mensalmente o seu nível sérico

Benzodiazepínicos
• Clonazepam, clobazam e nitrazepam
• Mecanismo de ação: aumenta a ação gabaérgica
• Efeitos adversos:
o Sonolência excessiva
o Aumento de secreção traqueobrônquica

Levetiracetam
• Mecanismo de ação: reduz a neurotransmissão excitatória
• Efeitos adversos:
o Sonolência, astenia, tontura, cefaleia, anorexia
o Depressão e psicose em crianças mais frequentemente que em adultos

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 81

Algoritmos de tratamento
Crises focais e crises focais com evolução para tonicoclônica bilateral

Crises generalizadas

Crises 1º fármaco antiepiléptico Associar


Ácido valproico ou divalproato de sódio Lamotrigina ou levetiracetam ou topiramato
Tonicoclônicas
bilaterais

Ácido valproico ou divalproato de sódio ou lamotrigina ou


Levetiraceram
fenobarbital
Ácido valproico ou divalproato de sódio ou levetiracetam ou
Lamotrigina
topiramato ou fenobarbital
Ausência

Ácido valproico ou divalproato de sódio Etossuximida

Etossuximida Ácido valproico ou divalproato de sódio ou lamotrigina


Mioclonia

Ácido valproico ou divalproato de sódio Levetiracetam

Levetiracetam Ácido valproico ou divalproato de sódio ou clonazepam

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82 Módulo 402

Situações especiais
Mulheres em idade fértil
Mulheres em idade fértil em tratamento com fármaco antiepiléptico que não desejam engravidar têm
indicação para implante de DIU como método anticoncepcional. Isso porque os ACOs têm seus níveis séricos
diminuídos pelas medicações antiepilépticas. Já aquelas que desejam engravidar devem fazer uso adicional de
ácido fólico → diminui o risco de malformações fetais relacionadas às medicações epilépticas, especialmente se
usado até 3 meses antes da gestação.
Toda gestante epiléptica deve ser acompanhada em ambulatório de gestação de alto risco. No caso de
gestação planejada, é pertinente trocar o fármaco em uso por algum com menor teratogenicidade, como
lamotrigina ou levetiracetam → evitar ácido valproico. Gestantes que não planejaram a gravidez podem acabar por
interromper a medicação por conta própria, devido ignorância das alternativas mais seguras de tratamento. No
entanto, o médico deve esclarecer suas dúvidas e informá-la de que o risco oferecido ao feto por crise epiléptica é
muito maior do que de qualquer medicamento. Se for necessário utilizar ácido valproico → manter dose < 750 mg
ao dia.

Câncer em uso de quimioterapia e AIDS


Evitar FACs indutores enzimáticos, como: fenobarbital, fenitoína, carbamazepina e oxcarbazepina.

Idosos
Evitar os de mecanismo gabaérgico, que possuem impacto cognitivo, ou indutores enzimáticos. Prefere-se
usar lamotrigina ou levetiracetam.

Prognóstico
O prognóstico em relação ao controle de crises é determinado principalmente pela etiologia, sendo pior
nos casos secundários à lesão encefálica. Nos pacientes com alto risco de recorrência de crises (certos tipos de
síndromes epilépticas, presença de lesão encefálica e exame neurológico alterado), as medicações devem ser
usadas continuamente. Contudo, em algumas epilepsias benignas da infância, nas quais o exame neurológico e a
neuroimagem são normais, as medicações podem ser retiradas gradualmente após 2 a 4 anos livres de crises.
A mortalidade está relacionada aos acidentes que acontecem em decorrência das crises (acidentes de
trânsito, TCE, afogamento, queimaduras), sendo maior nas crises TCG. Mas existem casos de morte súbita,
denominados “morte súbita inexplicada em epilepsia”, que ocorrem com maior incidência que na população geral
(1:300). Os pacientes mais propensos a esta complicação são aqueles com epilepsia refratária aos medicamentos e
que estão em politerapia → minoria dos pacientes. Seus mecanismos ainda não estão elucidados.
Transtornos psiquiátricos (depressão e transtorno psicótico) associados são mais frequentes nos pacientes
com epilepsia do lobo temporal e requerem intervenção medicamentosa. Em relação aos impactos sociais, cabe
destacar os preconceitos que estes pacientes ainda sofrem, o que acarreta isolamento social e dificuldade de
emprego. Há custos elevados, especialmente naqueles com epilepsia refratária, sendo relacionados ao pagamento
de auxílio-doença, aposentadoria e pensões do INSS.

Direção de veículos por pacientes epilépticos


O Código de Trânsito Brasileiro determinou a obrigatoriedade do Exame de Aptidão Física e Mental para os
candidatos à direção, sendo este renovável. No momento de responder ao questionário, caso o candidato tenha
diagnóstico de epilepsia, é obrigado a informar. Se o diagnóstico tiver ocorrido depois, deverá parar de dirigir e
informar o mesmo ao DETRAN. Se quiser adquirir ou renovar a habilitação, deverá trazer um relatório dos seus
dados clínicos e de exames, preenchido por um médico assistente que o acompanhe por, pelo menos, um ano
Critérios de aprovação da carteira de habilitação ao paciente epiléptico

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 83

Aqueles que manterão uso contínuo de antiepilépticos: Aqueles que estão em retirada da medicação:
1) Estar há 1 ano sem crise epiléptica 1) Estar há, no mínimo, há 2 anos sem crises
2) Ter parecer favorável do médico, desde que 2) Se a retirada tiver duração mínima de 6 meses
este o acompanhe há, pelo menos, 1 ano 3) Estar sem crises há, no mínimo, 6 meses após
3) Boa adesão ao tratamento a retirada completa da medicação

Referências bibliográficas
Harrison – Medicina Interna – 19ª Edição – 2017
Rang & Dale – Farmacologia – 7ª Edição – 2012
Purple Book – Guia Prático para Tratamento das Epilepsias – 2ª Edição – 2020
Dr. Pedro Oliveira – Algoritmo de Tratamento Ambulatorial das Epilepsias

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84 Módulo 402

Módulo 402 – Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 9
1. Discutir o estado de mal epiléptico.
2. Descrever a abordagem terapêutica do mal epiléptico, incluindo a posologia das drogas.
3. Discutir o prognóstico do mal epiléptico.

Estado de mal epiléptico


De acordo com a ILAE, é definido como:
• Condição resultante da falência dos mecanismos responsáveis pelo término da crise ou dos mecanismos
de iniciação, que ocasiona uma crise anormalmente prolongada (tempo 1)
• Condição que pode ter consequências a longo prazo, se ocorre de forma prolongada (tempo 2), incluindo
dano ou morte neuronal e alterações das redes neurais, conforme o tipo e a duração das crises
Quando as crises não cessam após cinco minutos ou se repetem, sem melhora evidente do nível de
consciência, também se caracteriza um EME.

Tipo de estado de mal epiléptico Tempo 1 Tempo 2


Tônico-clônico bilateral 5 minutos 30 minutos
Focal com alteração da consciência 10 minutos > 60 minutos
Ausência 10-15 minutos Desconhecido

Etiologias
• Suspenção de FAE • Lesão congênita
• Abstinência de álcool • Epilepsia prévia
• Cerebrovascular: AVE, anóxia e hemorragia • Idiopática
• Metabólica: encefalopatia aguda
• Traumatismos
• Toxicidade por drogas
• Infecção do SNC
• Tumor

Fases do EME
I. Preliminar ou iminente → duração de 5-30 minutos
II. Estabelecido → duração > 30 minutos
III. Refratário: persiste apesar do tratamento nas fases I e II – estado de mal sutil, comatoso ou não convulsivo
→ duração > 60 minutos ou falha na fase I e II
IV. Super-refratário: persiste apesar do tratamento com anestésico por > 24 horas

Objetivos do tratamento
Estabilizar os parâmetros clínicos do paciente
1) Checar e corrigir → vias aéreas, oxigenação, pressão arterial, frequência cardíaca e glicemia
2) Glicemia capilar: em caso de hipoglicemia → 50 ml de glicose a 50%
3) Desnutridos, alcoólatras e hipoglicêmicos → administrar 500 mg de tiamina IV
4) Acesso venoso periférico: ideal 2 acessos
5) Colher exames → hemograma, creatinina, ureia, sódio, potássio, cálcio, magnésio, fósforo, TGO, TGP, CPK
e gasometria

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 85

Interromper as crises epilépticas


Escolher um dos tratamentos com benzodiazepínicos (midazolam ou diazepam), e repeti-los se necessário:
MDL: ampolas de 5 mg/5 ml, 15 mg/3 ml ou 50 mg/10 ml DZP: ampolas de 10 mg/2 ml
Criança (0,2 mg/kg) IM ou nasal: Adolescente e adulto IV, IM ou nasal: Criança → intravenoso ou retal: 0,5
• < 1 ano → 2,5 mg • 13-40 kg ou idosos → 5 mg mg/kg
• 1 a 5 anos → 5 mg • > 40 kg → 10 mg Adolescente e adulto → intravenoso
• 5 a 10 anos → 10 mg ou retal: 10 mg
Continuação do tratamento – dose de ataque
Para continuidade do controle das crises epilépticas é necessário iniciar um FAE (em dose de ataque IV)
para obtenção rápida de nível sérico efetivo.

– Fenitoína Divalproato Fenobarbital Lacosamida Levetiracetam Brivaracetam

Apresentação 250 mg/5 ml 500 mg/5 ml 200 mg/5 ml 200 mg/20 ml 500 mg/5 ml 50 mg/5 ml

200 a 400 mg 25 a 50 mg/kg


Dose inicial 20 mg/kg 30 mg/kg 20 mg/kg 50 a 400 mg
(8 mg/kg) (2,5-4 g EV)
100 ml
Diluição – – 100 ml salina 100 ml salina –
salina
Velocidade 3-6 100 5-15 min
50 mg/min 5 a 15 min 2 a 15 min
máxima mg/kg/min mg/kg/min 60 mg/min
2 ml/kg/h
Manutenção 6 horas 12 horas 12 horas 12 horas 12 horas
por 6 horas
Idosos, Crianças, DZP prévio, Hipertensão
Bloqueio
Cautela bloqueio alteração depressão em crianças, –
cardíaco
cardíaco hepática respiratória psicose

Se 15 minutos após o término da infusão o paciente continuar com crises epilépticas ou EME não
convulsivo, considerar como EME refratário e encaminhar à UTI para tratamento com anestésico. Se isso não for
possível, aplicar um outro antiepiléptico IV.
Realizar dose de manutenção nas doses diárias usuais, em intervalos de 6 a 24 horas após o término da
infusão, conforme a vida média do antiepiléptico. Idealmente esta manutenção deverá ser feita por via IV, pois a
absorção por via oral é errática nesta condição clínica.
Atenção: não utilizar PHT, PB e DZP IM.

Prevenir recorrência de crises


1) Avaliação pela neurologia
2) Investigação e tratamento da doença de base
3) Iniciar dose de manutenção do FAE
4) Identificar estado de mal não convulsivo

Determinar e tratar a etiologia


Exceto nos EME causados pela supressão abrupta do antiepiléptico, o EME é um sintoma de uma outra
condição cerebral que deve ser investigada e tratada. São essenciais hemograma, creatinina, ureia, glicemia, sódio,
potássio, cálcio, magnésio, fósforo, TGO, TGP, CPK e gasometria, realizados logo no início do atendimento. A
dosagem de níveis séricos de antiepilépticos é útil para confirmar suspeita de má adesão ao tratamento.
1) História + exame físico
2) Investigação (após estabilização do quadro e controle das crises):

Sophia Molina Turma XIX


86 Módulo 402

• TC cerebral e RM, além de exames laboratoriais → hemograma, eletrólitos, função renal e


hepática, gasometria, amônia e níveis séricos de anticonvulsivantes
• LCR → na suspeita de infecção do SNC
• EEG → na suspeita de EME não convulsivo: flutuação do nível de consciência, movimentos
repetitivos, em especial oculares, nistagmo

Tratamento do estado de mal refratário


Fármacos anestésicos via IV contínua p/ supressão de crises/atividade epileptiforme → atingir padrão surto-
supressão no EEG: supressão em > 50% do registro ou 1-2 surtos de atividade separados por 3-5s de supressão. É
recomendada a realização de EEG (idealmente EEG contínuo) se após o uso de BZD + antiepiléptico não ocorrer
significativa melhora da consciência e para identificar estado de mal não convulsivo, eficácia do tratamento e o
ajuste da dose do anestésico.

Quetamina (infusão contínua)


• Apresentação: ampolas 10 ml (50 mg/ml)
• Crianças: bolo inicial 2 a 3 mg/kg (até 2 x) → infusão IV 2,4 mg/kg/h (0,6-3,6 mg/kg/h)
• Adultos: bolo inicial 1 a 5 mg/kg → Infusão IV 0,6 a 15 mg/kg/h
• Preferencial para EME com ≥ 1 h de duração associado a diazepínico
• Menor risco de hipotensão, eventual hipertensão

MDL (infusão contínua)


• Menor risco de hipotensão, eventual hipertensão
• Apresentação: ampolas de 5 mg/5 ml, 15 mg/3 ml ou 50 mg/10 ml (diluição salina ou glicose 5%)
• Bolo IV 0,2 mg/kg (< 4 mg/min) → manutenção 0,05 a 0,4 mg/kg/hora

Propofol (infusão contínua)


• Apresentação: frascos 1% (10 mg/ml) ou 2% (20 mg/ml) para diluição salina ou glicose 5%)
• Bolo IV 2-3 mg/kg → bolos de 1-2 mg/kg cada 3-5 min até parada crise → manutenção 4 a 10 mg/kg/hora
• Atenção: evitar uso prolongado devido risco da Síndrome da Infusão do Propofol (PRIS), sobretudo em
crianças → 48h de uso, uso concomitante de catecolaminas e esteroides e doses maiores de 4-5 mg/kg/hora

Tiopental (infusão contínua)


• Apresentação: frasco com 500 ou 1.000 mg (diluição salina, água ou glicose 5%)
• Bolo IV 3-5 mg/kg → bolos de 1-2 mg/kg cada 3-5 min até parada crise → manutenção 3-7 mg/kg/hora
• Dose de ataque + doses fracionadas (1/2 dose inicial) até controle da crise e/ou padrão surto-supressão no
EEG contínuo
o Ajuste da dose de manutenção até obter 2-3 intervalos de supressão a cada 10s no padrão surto-
supressão no EEG. Não aumentar a dose se houver hipotensão não controlada com vasoativos
o Manter o tratamento por 24 h após o controle do EME
o Usar FAE de manutenção em dose adequada, sugerindo a associação de ao menos dois FAEs
o Retirada gradual do fármaco anestésico em 12-24 horas (redução de 20% dose inicial a cada 2-3h)
o Se recidiva das crises repetidas ou EME não convulsivo → trocar para outro anestésico

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 87

Estado de mal epiléptico não convulsivo


Caracterizado por alteração da consciência e crises epilépticas sutis (flutuações do quadro, como da
responsividade, presença de desvio ocular, mioclonias, contraturas de face e mãos, entre outros), acompanhada
por ausência de melhora significativa da consciência após o controle das crises epilépticas ou persistência de
padrão periódico epileptogênico no EEG. Nesta situação é essencial um EEG para identificar crises
eletrográficas/padrões rítmicos periódicos, a eficácia do tratamento e o ajuste da dose do anestésico (idealmente
um EEG contínuo).
Engloba vários tipos, como o EME focal com alteração da consciência (também conhecido como EME focal
disperceptivo), EME de ausência, EME em pacientes comatosos.
É mais frequente que o EME convulsivo, contudo menos uniforme, pois engloba diferentes etiologias e
dessa forma diferentes níveis de gravidade e prognósticos, além de serem frequentes as comorbidades.
A abordagem terapêutica inicial é semelhante, com estabilização dos parâmetros clínicos do paciente, uso
de medicações para interrupção das crises (BZD) e continuidade do tratamento e investigação. Contudo, não deve
ser feito na mesma intensidade e agressividade, existindo inclusive evidências de que o tratamento agressivo não
melhora o prognóstico, apresentando riscos e aumento nos custos. Dessa forma, deve ser evitado uso de doses
elevadas de BZD, pelo risco de depressão respiratória e instabilidade hemodinâmica, assim como uso das
medicações anestésicas (uso em casos selecionados e por curto período). A sugestão é uso de medicações IV de
forma sequencial ou em associação em paralelo com definição da etiologia e seu tratamento.

Tratamento do estado de mal super-refratário


É caracterizado por um EME refratário que dura mais de 24 horas. Nestas situações, além do tratamento
citado anteriormente, é necessário utilizar outras opções terapêuticas, como as descritas a seguir.

Quando associado a VPA, pode precipitar


Suspeitar em EME super-refratário quando:
Topiramato

encefalopatia hiperamônica
1) LCR, TC e RM com pouca ou nenhuma
Apresentação: comprimidos de 25, 50 e 100 mg
alteração significativa
Crianças: 10 a 30 mg/kg/dia
2) Antecedentes de alteração do humor,
Adultos: 400 a 1.000 mg/dia (2 tomadas)
comportamento ou personalidade
Encefalite autoimune

Apresentação: comprimidos de 10 e 20 mg recente


Clobazam

Crianças: 0,5 a 1 mg/kg/dia 3) Presença de discinesias e


Adultos: Inicial 10 mg, podendo chegar até 60 disautonomias
mg/dia (1 a 2 tomadas) 4) Presença de extreme delta brush no
EEG
cetogêni

Relação lípides/não lípides → 4:1


Dieta

Tratamento: pulsoterapia e imunoglobulina ou


ca

Corrigir ingestão de glicose extradieta plasmaférese → rituximabe OU Ciclofosfamida


+ pesquisa de neoplasia oculta + se disponível,
Pulsote

Pode ser considerada em pacientes com EME dosar anticorpos (NMDA, GAD, CASPR2,
rapia

sem etiologia ou imunomediada AMPAR, mGLUR5, LG1 etc.)

Referência bibliográfica
Purple Book – Guia Prático para Tratamento das Epilepsias – 2ª Edição – 2020

Sophia Molina Turma XIX


88 Módulo 402

Módulo 202 – Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Problema 10
1. Correlacionar as áreas anatômicas primárias, secundárias e terciárias às suas funções e aos sintomas
resultantes de suas lesões.
2. Citar as principais síndromes demenciais correlacionando com a topografia e etiologia, bem como os
conceitos de apraxia, afasia e agnosia. (citar a maioria das síndromes e focar no Alzheimer)
3. Discutir a doença de Alzheimer.
4. Discutir o MEEM.

Anatomia funcional do córtex cerebral


Anatomicamente, o córtex cerebral é dividido nos lobos: frontal, temporal, parietal e occipital. Há ainda
um outro lobo, o da ínsula, que fica “escondido” ao fundo do sulco lateral durante o desenvolvimento fetal.

Há ainda uma divisão funcional em áreas de projeção e áreas de associação. As áreas de projeção
englobam as áreas sensitivas e motoras primárias, enquanto as áreas de associação são as secundárias e terciárias.

Áreas de projeção
Recebem ou dão origem às fibras
diretamente relacionadas à sensibilidade e
à motricidade. Podem ser chamadas de
áreas primárias. Determinam com que
fiquemos conscientes das qualidades
sensoriais, porém sem ainda interpretá-las.

Áreas sensitivas primárias


Área somestésica
Localizada no giro pós-central,
relaciona-se com temperatura, dor,
pressão, tato e propriocepção consciente
contralaterais. Lesões desta área
acarretam alterações no tato
discriminativo. Tato grosseiro, dor e temperatura não se alteram porque se tornam conscientes em nível talâmico.

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 89

Área visual primária


Localizada nos lábios do sulco calcarino. Recebe fibras do corpo geniculado lateral (núcleo talâmico).
Áreas da retina têm uma relação direta com áreas do sulco calcarino. A lesão bilateral desta área causa cegueira
completa na espécie humana.

Área auditiva primária


Localizada no giro temporal transverso anterior. Nela chegam fibras do corpo geniculado medial (núcleo
talâmico). As vias auditivas não são totalmente cruzadas, têm representação de ambos os lados. Por conseguinte,
lesões nesta região usualmente não causam surdez.

Área vestibular primária


Está no lobo parietal, área
somestésica próximo à área de representação
da face.

Área olfatória primária


Pequena região na parte anterior do
uncus e giro para-hipocampal (lobo
temporal). As crises epilépticas uncinadas são
manifestadas por alucinações olfatórias
caracterizadas por cheiros desagradáveis.

Área gustativa primária


Localiza-se na região inferior do giro
pós central, próximo da insula e da área
correspondente à língua.

Área motora primária


É uma área efetuadora do
movimento, recebendo projeções das áreas
que o planejam e programam. Fica no giro
pré-central e tem uma representação
somatotópica, assim como a área somestésica
primária (figura ao lado). Nesta região estão
os neurônios motores superiores ou 1°
neurônio motor.

Áreas de associação
Estão envolvidas com a interpretação das informações sensoriais, sua correlação com experiências
prévias, com a adição do significado afetivo delas e o consequente processamento da resposta motora. Podem ser:
secundárias (sensitivas e motoras), sendo estas unimodais, e terciárias, sendo estas polimodais.

Áreas secundárias
Recebem ou enviam fibras às áreas primárias, estando envolvidas em uma análise mais refinada da
informação sensorial que chegam por estas áreas e comparando esta informação com experiências prévias.

Áreas motoras secundárias


• Área motora suplementar: programação de sequências complexas de movimentos já aprendidos
• Área pré-motora: programação de sequências complexas de movimentos durante sua execução

Sophia Molina Turma XIX


90 Módulo 402

• Área de Broca (no giro frontal inferior): planejamento da atividade motora da expressão da linguagem →
sua lesão causa afasia de expressão ou de Broca

Áreas sensitivas secundárias


• Área somestésica secundária: fica logo atrás da área somestésica primária → é uma área de interpretação
e comparação com experiências prévias somáticas – gnosia
• Área visual secundária: fica nas regiões occipital e têmporo-occipital → é uma área de interpretação das
informações visuais e comparação com experiências prévias visuais (gnosia)
• Área auditiva secundária: circunda a área auditiva primária → é uma área de interpretação das
informações auditivas e comparação com experiências prévias auditivas (gnosia)

Áreas terciárias
São regiões do córtex
muito especializadas que
processam informações de
múltiplas modalidades
somatossensoriais e elaboram
estratégias comportamentais
de memória e emocionais.

Área pré-frontal
É a parte anterior e
não motora do lobo frontal.
No homem, muito
desenvolvida, ocupa 25% do
tamanho do córtex. Recebe
fibras de todas as outras áreas
de associação do córtex e se
liga ao sistema límbico. Na
lesão desta área, o paciente
mantém as funções básicas
normais, porém pode ter as
seguintes alterações: perde o
senso de responsabilidade,
fala grosserias, esquece
informações faladas minutos
antes (memória de trabalho),
tem distrações e não
apresentam frustração ou
arrependimento.

Área temporoparietal
Corresponde ao
entroncamento das áreas
secundárias auditivas, visual e
somestésica. Tem importância
na percepção espacial e a relação do indivíduo com o meio que o cerca, sendo também área do esquema corporal.

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 91

Área límbica
Formada principalmente pelo giro do cíngulo, giro para-hipocampal, hipocampo e núcleo amigdaloide.
Está envolvida com a formação e consolidação na memória das informações sensoriais que chegam ao córtex
cerebral, além interpretar emoções a partir de padrões de reações autonômicas e físicas e programar
comportamentos motivados.

Conceitos importantes
Funcionamento do córtex cerebral
O arranjo cortical das funções cognitivas segue uma Por exemplo: uma imagem que chega
organização topográfica → funções primárias unimodais chegam aos ao córtex visual é decodificada e, então,
córtices primários e de lá vão para áreas corticais secundárias onde a transferida para áreas secundárias onde
informação será processada e encaminhada para as áreas terciárias. será interpretada → as informações
serão encaminhadas para as áreas
Entende-se, portanto, que há um fluxo das áreas unimodais terciárias em que, juntamente com
para as supramodais de maneira hierarquizada e que determinada outras informações modais, serão
função intelectual ocorre pela ação de diversas áreas cerebrais ao comparadas e analisadas de maneira
mesmo tempo. mais complexa

Apraxias Tipos de apraxias


Incapacidade de executar atos motores complexos Incapacidade de executar uma ordem
Ideomotora

previamente aprendidos, sem que haja déficit motor. motora, mais evidente quando o
paciente tenta imitar o uso do objeto
As áreas motoras e sensitivas secundárias são
por mímica, do que quando ele obedece
responsáveis pela elaboração e planejamento do ato motor, ao comando de realizar o teste
enquanto a área motora primária é aquela que realiza o ato ao
Indivíduo não tem a ideia nem o
Ideatória

estimular motoneurônios e desencadear contração muscular.


conceito do movimento → perde a
A apraxia cinética dos membros é a mais comum e capacidade de realizar a sequência
consiste em dificuldade na manipulação de pequenos objetos correta do movimento
com os dedos. As demais estão classificadas na tabela ao lado. Desempenho do paciente piora quando
De condução

lhe é pedido que imite os movimentos


Agnosias do examinador e melhora quando se
pede que produza movimentos sob
Três áreas de associação secundárias (visual, a auditiva e comando → análoga à afasia de
somestésica) participam do processo intelectual relacionado condução
com a sensibilidade. A identificação de objetos possui 2 etapas: Incapacidade de seguir ordens verbais
Dissociativa

1) Etapa de sensação: depende das áreas primárias → ou imitar gestos → desconexão entre as
consiste na chegada de informações sensoriais do áreas posteriores, de visualização do
gesto ou de compreensão da ordem,
objeto, como forma, tamanho, volume cor e textura
com as áreas anteriores do lobo frontal
2) Etapa gnósica: informações sensoriais do objeto são
que produzem movimento
comparadas ao conceito do objeto que já existe na
Incapacidade de movimentar
memória e, assim, o objeto é reconhecido
Bucolinguofacial

mandíbula, língua e lábios sob


As agnosias são causadas por lesões das áreas comando voluntário, mas fazem isso em
secundárias → perda da capacidade de reconhecer objetos, atos automáticos como na mastigação
apesar de áreas primárias estarem normais. Podem ser: → lesões próximas à área de Broca, no
hemisfério dominante (geralmente o
• Visuais: incapacidade de reconhecer aquilo que se vê, esquerdo)
mas ainda é possível fazer o reconhecimento por outras
vias sensitivas como tátil ou auditiva → prosopagnosia: indivíduo não reconhece rostos familiares

Sophia Molina Turma XIX


92 Módulo 402

• Auditivas: incapacidade de reconhecer pelos sons → indivíduo pode perder a capacidade de reconhecer
vozes familiares (fonagnosia), sons ambientes e sons musicais (amusia)
• Somestésicas: incapacidade de reconhecer pelo tato, indicando lesão parietal
Se um indivíduo perde uma modalidade, mantém intacta a capacidade de reconhecimento e interpretação
a partir de outras modalidades. Por exemplo: um indivíduo com agnosia visual, ao ver um objeto, não sabe o que
é, mas o reconhece após tocá-lo. Já quando o indivíduo não reconhece o objeto por mais de uma via sensorial, o
déficit não é considerado gnósico, mas sim de memória ou mnéstico.

Afasias
São alterações na função de linguagem que
ocorrem em indivíduos nos quais esta função foi
estabelecida. Desta forma, se uma criança apresenta
atraso na aquisição da linguagem, não se pode afirmar
que ela tem afasia, e sim, atraso de linguagem.
Algumas considerações anatômicas são
necessárias. A área perissylviana concentra as
principais estruturas relacionadas à linguagem, sendo
que o hemisfério dominante para a linguagem é o
esquerdo em 70% das pessoas. Duas áreas corticais
principais relacionadas com a linguagem verbal – área
de Broca, localizada no giro frontal inferior
(programação da atividade motora relacionada à
linguagem) e de Wernicke, localizada no giro temporal
superior (percepção e compreensão da linguagem
verbal). O fascículo arqueado liga as áreas de Broca e
Wernicke.

Afasia de Broca
• Também chamada afasia motora ou de expressão
• Paciente compreende a palavra falada ou escrita, porém tem dificuldade em expressar adequadamente
através da escrita ou da fala
• Decorre de lesão na área de Broca, localizada no hemisfério cerebral dominante para a linguagem

Afasia de Wernicke
• Também chamada afasia sensitiva ou de compreensão
• Paciente mantém a fluência normal, embora fale algumas palavras não existentes no vocabulário
(neologismos), porém apresenta déficit na compreensão da palavra escrita ou falada
• Decorre de lesão da área de Wernicke no hemisfério cerebral dominante para a linguagem

Outras afasias
• Afasia nominativa: dificuldade de nomear objetos → lesões perissylvianas anteriores do hemisfério
dominante para a linguagem
• Afasia condutiva: há déficit de repetição de fonemas ou palavras, porém a fala e a compreensão estão
preservadas → lesão no fascículo arqueado (conjunto de fibras que conectam a área de Broca à área de
Wernicke)
• Afasias transcorticais: há dificuldade na expressão e/ou compreensão da palavra falada e escrita, porém o
paciente consegue repetir o que foi falado ou imitar gestos do examinador → lesões perissylvianas difusas
do hemisfério dominante para a linguagem

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 93

Diagnóstico diferencial das afasias

Memória
Aprendizado é uma mudança no comportamento que resulta da aquisição de conhecimento acerca do
mundo, sendo a memória o processo pelo qual este conhecimento é codificado, armazenado e posteriormente
evocado. A memória pode ser classificada conforme duas dimensões: (1) o curso temporal do armazenamento e
(2) a natureza da informação armazenada.
• Memória imediata: capacidade de guardar informações por alguns segundos ou minutos → depende do
nível de atenção do indivíduo no momento
• Memória recente: por conveniência do indivíduo é retida por mais tempo (horas a dias) → depende
principalmente do sistema límbico
• Memória remota: muito estável e geralmente carregada de significado emocional para o indivíduo → pode
manter-se por vários anos
• Memória operacional: retenção de informações que serão utilizadas durante a execução de uma tarefa →
lobo frontal
• Memória implícita: forma inconsciente de memória observada durante o desempenho de uma tarefa,
como andar de bicicleta e passar marchas, que se manifesta geralmente de forma automática (requer
pouco processamento consciente por parte do indivíduo) → nos dá a capacidade de fazer tarefas repetitivas
com habilidade progressivamente melhor
• Memória explícita: também chamada consciente ou declarativa, é mais sensível a lesões cerebrais
o Episódica: memória individual, autobiográfica para eventos vividos pelo individuo
o Semântica: o conhecimento semântico é o conhecimento geral acerca do mundo, englobando
fatos, conceitos e informação acerca de objetos, assim como as palavras e seus significados → é
mais resistente às lesões que a episódica
• Memória verbal: memória para nomes e palavras → relacionada à linguagem
• Memória não verbal: rostos, objetos, música
Alterações da memória podem ser classificados quanto ao tempo da doença:
1) Déficit de memória retrógrada: paciente não se recorda de fatos ocorridos em período anterior ao
processo patológico desencadeante → pode haver, no entanto, preservação da memória mais antiga, como
a da infância
2) Déficit de memória anterógrada: dificuldade de lembrar ou armazenar informações a partir de um
determinado momento, ou seja, o paciente se lembra de fatos ocorridos antes do evento → geralmente
decorre de lesão do hipocampo e amígdalas (sistema límbico), responsáveis pelo armazenamento e
transferência de novas informações ao neocórtex, onde seriam transformadas em memória remota

Miniexame do estado mental


Tem a função de graduar a escala de demência ou então triar outros déficits não demenciais. Ao aplicar o
teste, o paciente deve estar à vontade e se sentir livre de julgamento → não cabe ao médico corrigir os erros, a não
ser que o paciente peça. O exame (descrito na próxima página) é aplicado da seguinte forma:
• Pergunte a data e, a seguir, pergunte os itens da data omitidos pelo paciente – faça o mesmo com o local

Sophia Molina Turma XIX


94 Módulo 402

• Pergunte “posso testar sua memória?” e, então,


Miniexame do estado mental
pedir a ele que repita três as palavras (1 ponto
para cada palavra) – caso não consiga repetir Orientação (10 pontos)
alguma palavra, repetir por até 6 vezes → se o 1) Dia da semana
paciente for incapaz de repeti-las, a prova da 2) Dia do mês
memória não terá significado 3) Mês
• Nos cálculos, considere os resultados corretos, 4) Ano
mesmo que o paciente erre uma conta 5) Hora aproximada
intermediária, ou seja, se acertar a próxima 6) Local onde se encontra
7) Endereço (como chegou ao local de exame)
subtração a partir do resultado errado, considerar
8) Andar/setor
um erro e os demais acertos → se o paciente não
9) Cidade
for bem, considerar o escore obtido ao soletrar a 10) Estado
palavra “mundo” de trás para frente
• Só dê um ponto se o paciente fechar os olhos na Retenção ou registro de dados (3 pontos)
ordem escrita Vaso, carro, tijolo (anotar número de tentativas)
• A frase escrita deve ser espontânea → não pode Atenção de cálculo (5 pontos)
ser ditada, e não valem palavras soltas, apenas
100 – 7 sucessivos ou soletrar “mundo” invertido
uma frase
• Na cópia do desenho só é importante a presença Memória (3 pontos)
de 10 lados (10 ângulos) e que as figuras se Recordar os objetos do item Retenção ou registo de
intersectem dados
Linguagem (9 pontos)
Itens avaliados pelo exame Nomear uma caneta e um relógio (2 pontos)
Orientação Repetir: “nem aqui, nem ali, nem lá” (1 ponto)
Obedecer à ordem: “pegue o papel com sua mão
Ao perguntar informações referentes à data e o direita, dobre-o ao meio e coloque-o sobre a mesa”
local, avalia-se a memória recente, a atenção e a (3 pontos)
orientação temporoespacial. A orientação está Ler e obedecer: “feche os olhos” (1 ponto)
relacionada à integridade e à interconexão de áreas Escrever uma frase (1 ponto)
corticais → córtices parietal, frontal, occipital e giro do Copiar o desenho (1 ponto)
cíngulo, além da circuitaria subcortical.
Distúrbios de orientação espacial se relacionam com lesões em estruturas dos córtices somatossensoriais
e de associação visual superior e inferior → agnosia: desordens da memória visuoespacial. Assim, entende-se que a
orientação não é localizada em determinada região do cérebro, mas é efeito da integração entre as diversas áreas.

Retenção de dados
A repetição das três palavras testa o grau de atenção e a memória imediata (curto prazo ou primária) →
dura cerca de 10 segundos a 2 minutos, com capacidade limitada a 10 itens.
Anatomicamente, a memória imediata depende da integridade do hipocampo e do córtex para-
hipocampal. Também depende da atenção e, consequentemente, de suas relações anatômicas → complexo
parietofrontal.

Atenção e cálculo
Avalia-se a capacidade de cálculo, a atenção e a memória imediata e operacional. Atenção e orientação
visuoespacial são funções ligadas ao hemisfério direito e conexões subcorticais frontais → se lesão nesta região, às
vezes, consegue utilizar a máquina de calcular. Já a acalculia → lesões do giro angular no lóbulo parietal inferior E.

Sophia Molina Turma XIX


Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 95

Memória
Ao pedir que o paciente recorde as palavras faladas anteriormente, avalia-se a memória recente
(secundária), que dura minutos a semanas ou meses → depende do hipocampo, trato mamilotalâmico e tálamo
dorsomedial.

Linguagem
As propriedades avaliadas são: fala o Agnosia visual: incapacidade de
espontânea, compreensão oral, repetição, reconhecer objetos apenas pela
nomeação, leitura e escrita, que refletem a visão → lesão occipitotemporal
integridade das áreas perissylvianas do hemisfério esquerda ou lesões bilaterais
cerebral esquerdo. • Repetição: depende da integridade das áreas
de Wernicke, de Broca e fascículo arqueado
• Nomeação: mostra-se um relógio e uma
o Lesões destas áreas → incapaz de
caneta ao paciente, perguntando a ele o que
repetir por déficit no entendimento
são → avalia capacidade de nomeação,
o Lesões de outras áreas relacionadas
compreensão e entendimento. A falha neste
à linguagem não cursam com
teste pode indicar duas patologias, e é
alteração de repetição → não é
importante diferenciá-las:
preciso entender para repetir
o Afasia nominativa: paciente sabe o
palavras
significado e função dos objetos
• Obedecer à ordem oral: falar pausadamente o que o paciente deve fazer e atribuir um ponto para cada
ação executada corretamente → avalia compreensão oral, desde que se exclua hipoacusia, além da
memória imediata, orientação direita-esquerda e praxia, coordenação e motricidade do paciente
o Importante: certificar-se de que o paciente entende o que se pede, do contrário a prova não tem
validade
• Leitura, ordem escrita: avalia-se a capacidade de leitura e de compreensão/memória → resultado depende
da integridade da área de Wernicke e das áreas pré-motoras e motoras
o Não realizar a prova se o paciente não souber ler
• Escrita: a frase deve conter sujeito e predicado, além de fazer sentido → se não cumprir um dos requisitos,
não se atribui ponto ao teste
o Não é necessário que a frase esteja gramaticalmente correta
o A capacidade de escrita depende da área motora relacionada com a linguagem – a área de Broca
• Cópia de desenho: avalia orientação visuoespacial, bem como a programação motora e a praxia construtiva
o Estas funções dependem do hemisfério cerebral direito (lobo parietal direito)
o Alguns casos de lesão parietal direita se manifestam somente com a incapacidade de desenhar

Notas de corte do MEEM Notas do MEEM conforme o nível escolar


Idade, nível socioeconômico e escolaridade Escolaridade formal Nota de corte
são aspectos que interferem no resultado do teste.
Analfabetos 20
Portanto, são utilizados diferentes níveis de corte
que levam em conta as questões anteriores. De 1 a 4 anos 25
Entende-se que o MEEM é um teste inicial, de fácil De 5 a 8 anos 26
execução e que deve ser de domínio de todos os De 9 a 11 anos 28
médicos. Em caso de dúvida diagnóstica, é
Pelo menos 12 anos 29
necessário aprofundar o exame com outras provas,
ou recorrer a testes específicos com especialistas.

Sophia Molina Turma XIX


96 Módulo 402

Síndromes demenciais
Quadro clínico
Demência corresponde ao transtorno de cognição que interfere com o funcionamento diário e resulta em
perda da independência. A maioria progride lentamente em pessoas com cognição normal prévia, mas algumas
podem começar abruptamente a depender da etiologia (AVE, encefalite ou TCE) e permanecer estáveis durante
longos períodos. Quase sempre os pacientes são incapazes de reconhecer a extensão das suas próprias perdas
cognitivas e funcionais – fenômeno que é chamado de anosognosia. É comum haver sintomas neuropsiquiátricos
como apatia e perda de iniciativa (mais frequentes), além de depressão, ansiedade, irritabilidade, paranoia,
pensamento delirante e alucinações.
O início do quadro demencial é marcado por dificuldade de lidar com finanças, medicações, viagem
independente, preparação de refeições e cumprimento de compromissos. Já a doença mais avançada é
caracterizada pela dificuldade de realizar atividades básicas de vida diária → tomar banho, vestir-se, fazer higiene
e alimentar-se.

Diagnóstico diferencial
A avaliação de uma possível demência querer história clínica e exame cognitivo e neurológico do paciente.
O histórico é a ferramenta diagnóstica mais importante e deve ser obtido com o próprio paciente e algum parente
ou amigo próximo. Queixas podem incluir desde esquecimento ou perda de memória autobiográfica, até
anosognosia (paciente não tem consciência da própria doença).
Por meio da HC, deve-se caracterizar três aspectos da doença: (1) natureza, que se refere a quais domínios
cognitivos foram afetados; (2) magnitude, que se refere à interferência das queixas nas atividades de vida diária; e
(3) progressão, que diz respeito à evolução dos sintomas no tempo.
É importante investigar se o paciente tem fatores de risco para DCV (p. ex., hipertensão e diabetes),
doenças neurológicas em curso ou passadas (p. ex., AVE, DP, trauma encefálico), e uso de medicações que podem
afetar a cognição (p. ex., benzodiazepínicos, analgésicos com codeína e antimuscarínicos para incontinência
urinária). Histórico familiar de demência pode estar relacionado com o aparecimento da doença em pessoas < 65
anos, devido a herança genética (raro).
O exame cognitivo identifica a presença, gravidade e natureza do acometimento cognitivo, desde que
sejam observadas as diferenças culturais, linguísticas, educacionais e as comorbidades, como ansiedade e insônia.
O exame utilizado pelo clínico para avaliar esses aspectos é o MEEM (existem outros mais sensíveis, mas são
utilizados pelo neurologista). Já o exame neurológico avalia a presença de sintomas neurocognitivos, como afasia,
apraxia e agnosia. Também podem ser evidenciados sinais de parkinsonismo, tipicamente presente em estágios
iniciais da demência dos corpúsculos de Lewy.
De rotina, são feitos exames laboratoriais como dosagem sérica de B12 e tireotrofina (TSH) para descartar
outras etiologias. Alguns exames podem ser indicados a depender da suspeita diagnóstica, a fim de identificar
causas metabólicas, infecciosas (p. ex., HIV e sífilis) ou autoimunes. Neuroimagem pode ser obtida por RM ou TC
a fim de identificar atrofia cortical e hipocampal (sinais de DA) ou outros sinais de demência tratáveis (p. ex., tumor,
hidrocefalia).
O exame do LCR pode corroborar o diagnóstico de demência por DA, ao mostrar níveis baixos de amiloides
e níveis altos da proteína tau).

Diagnóstico de acordo com a DSM-IV


1) Comprometimento da memória
2) Pelo menos um dos seguintes: dificuldade de abstração; dificuldade para fazer julgamentos e controlar
impulsos; outros distúrbios como afasia, apraxia e agnosia; modificações da personalidade

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 97

3) Déficits cognitivos causam significativo comprometimento social e ocupacional → declínio importante do


nível de funcionamento anterior do paciente
4) Déficits cognitivos não ocorrem exclusivamente durante episódio de delirium
O quadro pode estar relacionado a uma condição médica geral, aos efeitos persistentes de alguma
substância (como toxinas) ou a uma combinação destes dois fatores.
À história clínica, deve-se obter dados com paciente e familiares, buscando alteração de um ou mais
domínios da cognição, alterações de humor e comportamento, tempo de início do quadro e interferência com a
vida ocupacional, social e familiar. Ao exame físico, além da avaliação neurológica, deve-se aplicar o MEEM. A
investigação de causas secundárias é feita por meio de:
• Exames laboratoriais: hemograma completo, glicemia, ureia, creatinina, nível de vitamina B12, TSH e T4
livre, enzimas hepáticas, cálcio sérico, VDRL, Fta-abs (neurossífilis) sorologia para HIV
• LCR: se houver suspeita de hidrocefalia de pressão normal
• Neuroimagem:
o Tomografia computadorizada de crânio: afastar causas estruturais
o Ressonância nuclear magnética de encéfalo: afastar causas estruturais
o Tomografia por emissão de pósitrons (PET) cerebral: avaliação funcional com base no metabolismo
cerebral → indicada quando houver dúvida sobre o tipo de demência degenerativa
• EEG: quando há demência de evolução rápida associada a mioclonias, pode-se suspeitar de doença de
Creutzfeldt-Jakob (forma rara), em que o EEG mostra padrão específico

Etiologias
Demências com evidência de lesão estrutural
Primárias
São as formas degenerativas, nas quais a demência é a síndrome principal (doença de Alzheimer,
degeneração frontotemporal, demência por corpúsculos de Lewy) ou está associada a outras doenças
degenerativas (doença de Parkinson, doença de Huntington).

Secundárias
Demências vasculares, hidrocefalia de pressão normal (tríade de demência + incontinência urinária +
apraxia de marcha), hematoma subdural crônico, doenças priônicas (doença de Creuzfeldt-Jakob).

Demências sem evidência de lesão estrutural


Causas metabólicas/infecciosas: distúrbios eletrolíticos, carência de B12, hipotireoidismo, demência por HIV.

Doença de Alzheimer
A doença de Alzheimer é a patologia neurodegenerativa mais frequente associada à idade, cujas
manifestações cognitivas e neuropsiquiátricas resultam em deficiência progressiva e eventual incapacitação.
Em geral, o primeiro aspecto clínico é a deficiência da memória recente → as lembranças remotas são
preservadas até certo estágio da doença. Além das dificuldades de atenção e fluência verbal, outras funções
cognitivas deterioram à medida que a patologia evolui → capacidade de fazer cálculos, habilidades visuoespaciais
e a capacidade de usar objetos comuns e ferramentas.
Estágios tardios são marcados por declínio do grau de vigília e lucidez, bem como contraturas musculares.
Outros sintomas: distúrbios comportamentais (agressividade, alucinações, hiperatividade, irritabilidade e
depressão), apatia, lentificação (de marcha e/ou discurso), dificuldade de concentração, perda de peso, insônia e
agitação.

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98 Módulo 402

Epidemiologia
A doença de Alzheimer é a causa mais frequente de síndrome demencial (60-80% dos casos). Em indivíduos
com mais de 65 anos, a prevalência é estimada em 5%. Após os 65 anos, a prevalência duplica a cada 5 anos → 30%
nos indivíduos com 85. Os fatores de risco estabelecidos até o momento são idade avançada e história familiar.

Fisiopatologia
O diagnóstico histopatológico da DA é baseado na presença conjunta de uma quantidade substancial de
placas neuríticas (núcleo de peptídeo beta-amiloide agregado circundado por neuritos em degeneração –
fragmentos de axônios e dendritos) + emaranhados neurofibrilares (agregados intracelulares da proteína tau
associada a microtúbulos) → pelo menos 6 placas neuríticas nos córtices frontal, temporal ou parietal +
emaranhados neurofibrilares no neocórtex do lobo temporal e em outras áreas de associação estabelecem o
diagnóstico definitivo.
O peptídeo beta-amiloide é formado a partir da clivagem da proteína precursora do amiloide (APP). Um
predomínio da via de clivagem amiloidogênica e superprodução do peptídeo beta-amiloide, geralmente de início
esporádico, cursaria com as seguintes consequências:
• Acúmulo de beta-amiloide → processo inflamatório + excitoxicidade pelo glu + oxidação → morte celular
• Hiperfosforilação da proteína tau → forma emaranhados neurofibrilares → déficit de neurotransmissão
o A proteína tau tem função de estabilizar os microtúbulos, ou seja, sua autoagregação compromete
a organização tubular → prejuízo ao transporte dos nutrientes pelas células neuronais
Placas neuríticas e emaranhados acumulam-se em pequenos números durante o envelhecimento normal
do cérebro, mas são excessivos na DA → extensão regional de emaranhados segue um padrão previsível:
• Acúmulo inicial no córtex entorrinal e hipocampo → comprometimento cognitivo leve: disfunção da
memória episódica declarativa
• Se estende para neocórtex de associação dos lobos frontal, parietal e temporal → início dos sintomas de
linguagem, visuoespaciais e cognitivos executivos
• Lobos occipitais e córtices motor e sensitivo primários → estágios avançados e mais graves
O principal sistema de neurotransmissão afetado é o colinérgico, uma vez que os emaranhados
neurofibrilares se acumulam nos neurônios das projeções colinérgicas hipocampais e neocorticais (septo, banda
diagonal e nucleus basalis).
A maioria dos casos é esporádica, sem história familiar. Entretanto, há menos casos de origem genética e
com herança autossômica dominante: 3 genes identificados acarretam, como alteração comum final, a produção
excessiva de proteína beta-amiloide → entre eles o gene da proteína precursora amiloide. Nestes pacientes, a
doença tende a começar de forma mais precoce (entre 20 e 60 anos). Pacientes com síndrome de Down (trissomia
do 21), que compartilham a alteração de um destes genes, têm risco aumentado de desenvolver a DA.

Manifestações clínicas
O quadro se inicia de forma lenta e insidiosa pela manifestação de amnésia anterógrada. Os déficits de
memória inicialmente são ocasionais, mas evoluem para falhas mais constantes, traduzidas por: esquecimento de
eventos e conversas recentes, colocação errada de objetos, problemas com o acompanhamento da data, perder-
se em vizinhanças familiares, esquecer de completar tarefas. No início, as atividades de vida diária rotineiras ainda
ficam preservadas, mas pode haver dificuldades de lidar com dinheiro ou contabilidade. Evolui com:
• Mudanças na personalidade → apatia, perda da iniciativa e perda de interesse por hobbies e passatempos
prévios
• Déficits de linguagem: inicialmente anomia → incapacidade de nomear objetos, mesmo sendo capaz de
reconhecê-lo
• A capacidade de realizar atividades diárias fica cada vez mais difícil → necessita de um cuidador

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 99

• Paciente começa a ser auxiliado até mesmo para tomar banho, vestir-se, fazer higiene e comer
• Na fase avançada da doença, há perda total da comunicação e imobilidade motora
• Paciente geralmente morre de doenças que atingem outros indivíduos idosos debilitados, como sepse,
pneumonia e ICC
• Duração da evolução clínica é longa, mas variável: de demência leve até a morte pode passar de 2-3 anos
ou mais de uma década

Diagnóstico
Na história clínica e exame físico buscam-se os critérios de demência da DSM-IV (Diagnostic and Statistical
Manual of Mental Disorders, 4th Edition) → evidência de perda de memória e de, pelo menos, outra função
cognitiva. O início é gradual e a progressão insidiosa. O MEEM deve demonstrar comprometimento da memória de
curto prazo, bem como outros déficits cognitivos. Testes laboratoriais não confirmam o diagnóstico, mas são feitos
para descartar outras causas possíveis do quadro. RM de encéfalo (com cortes em plano de hipocampos) pode ser
normal ou mostrar atrofia hipocampal.
O diagnóstico diferencial é feito com outras formas de demência de início insidioso e evolução progressiva:
• Demência com corpúsculos de Lewy: sugerida pela presença de parkinsonismo, alucinações visuais
proeminentes e um distúrbio específico do sono
• Degeneração lobar frontotemporal: alterações proeminentes do comportamento e personalidade ou
dificuldades da linguagem marcam o início do quadro e não o déficit de memória
• Esclerose hipocampal: impossível distinguir por características clínicas
• Outras doenças têm manifestações motoras proeminentes precocemente em sua evolução:
o Doença de Huntington
o Paralisia supranuclear progressiva
o Degeneração corticobasal
o Esclerose lateral amiotrófica
o Doença de Wilson

Tratamento
A abordagem destes pacientes deve incluir orientações aos familiares sobre cuidados específicos no
ambiente da residência, manuseio de medicações e, na fase avançada, no auxílio à higiene pessoal. É importante a
participação de profissionais cuidadores.
• Atividades que estimulem o cognitivo
• Exercício físico
• Tratar fatores de risco: hipertensão, diabetes, hiperlipidemia
• Interações sociais
• Sono adequado; reabilitação do sono
• Medidas de segurança dentro da casa
Além das medidas não farmacológicas, as classes de medicações aprovadas até o momento para DA são:
• Fármacos anticolinesterásicos: donepezila, galantamina ou rivastigmina
o São inibidores da acetilcolinesterase (AChE)
o Devem ser instituídos de forma gradativa, alcançando a dose plena após 4 semanas, a fim de
reduzir a incidência de efeitos adversos
o Retardam a progressão dos sintomas a 6 a 12 meses em pacientes com DA leve ou moderada
o Efeitos adversos: TGI (náuseas, diarreia, cólicas), alteração do sono com sonhos desagradáveis ou
vívidos, bradicardia (geralmente benigna) e cãibras musculares
• Memantina: antagonista dos receptores NMDA de glutamato usado na fase avançada da doença →
também demonstrou retardar a progressão dos sintomas

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100 Módulo 402

• IMAO (inibidor da monoamina oxidase): selegilina; trabalhos mostram a redução da institucionalização e


aumento da sobrevida

Prognóstico
A DA é uma doença inevitavelmente progressiva, que cursa com comprometimento cognitivo grave e
dependência total. A DA contribui para a morte prematura:
• Taxa de mortalidade de 10% ao ano
• Em pacientes com demência avançada, a mortalidade de 6 meses é cerca de 55%
• Pneumonia, febre e problemas alimentares são associados ao prognóstico ruim
• Os pacientes comumente morrem de: pneumonia, sepse ou insuficiência cardíaca congestiva

Referências bibliográficas
Blumenfeld – Neuroanatomy Through Clinical Cases – 3rd Edition – 2010
Mutarelli – Propedêutica Neurológica – 2ª Edição – 2014
Artigo de revisão da Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul – A doença de Alzheimer: aspectos
fisiopatológicos e farmacológicos – 2008

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 101

Módulo 402 – Distúrbios sensoriais, motores e da consciência


Palestra 2
1. Explorar as principais queixas clínicas relacionadas ao sono e identificar os possíveis transtornos do sono
relacionados a elas.
2. Conhecer a última versão da Classificação Internacional dos Transtornos do Sono (ICSD - 2013).
3. Descrever a epidemiologia, quadro clínico, diagnóstico, tratamento e impactos social, cognitivo e
ocupacional da insônia.
4. Descrever a epidemiologia, quadro clínico, diagnóstico, tratamento, prognóstico, e impactos médico, social
e ocupacional da síndrome de apneia-hipopneia obstrutiva do sono.

Fisiologia do sono
Características do sono: necessidade, qualidade e quantidade, hir

Transtornos do sono
O estado de vigília está sob controle do • Sonolência excessiva diurna: paciente dorme
sistema reticular ativador ascendente → se projeta da muito, a ponto de o sono se tornar um
parte rostral do tronco encefálico em direção ao problema
tálamo e ao córtex. A inibição desses sistemas de • Vigília excessiva = insônia: paciente dorme
projeção é modulada por neurônios pontinos e pouco e o sono é aliviador
mesencefálicos e resulta no sono. • Alterações no comportamento do sono:
sono é agitado
Existem três principais tipos de transtornos
do sono → o médico deve sempre pesquisar a partir
das causas de fragmentação do sono ou de perda do
tempo de sono:

Classificação de acordo com a ICSD – 2013


A) Transtorno de insônia: crônica, de curto prazo E) Parassônias: do sono NREM, do sono REM, outras
B) Transtornos respiratórios relacionados ao sono: F) Transtornos do movimento relacionado ao sono:
apneia obstrutiva do sono, apneia central do sono, síndrome das pernas inquietas, síndrome dos
transtorno de hipoventilação movimentos periódicos dos membros, câimbras
C) Transtornos de hipersonolência central: nas pernas relacionadas ao sono, bruxismo
narcolepsia tipos 1 e 2, hipersônia idiopática G) Outros transtornos do sono
D) Transtorno do ritmo circadiano de sono-vigília: Apêndice A – Condições médicas e neurológicas
atraso de fase do sono, avanço de fase do sono, relacionadas ao sono: insônia familiar fatal, epilepsia
transtorno dos trabalhadores em turnos relacionada ao sono, cefaleia relacionada ao sono

Manifestações clínicas
As queixas geralmente se encaixam em 4 o A causa mais comum é a privação
categorias: voluntária do sono por razões
sociais ou econômicas
• Hipersônias: sonolência excessiva diurna
o Privação involuntária quase sempre
o Paciente tende a adormecer em
é decorrente de um transtorno
contextos inadequados ou
subjacente de sono → os dois mais
indesejáveis, como no trabalho,
comuns são apneia obstrutiva ou
durante uma conversa ou dirigindo
narcolepsia
um veículo

Sophia Molina Turma XIX


102 Módulo 402

• Insônias: dificuldade em adormecer e/ou • Parassônias: comportamentos complexos


permanecer dormindo que ocorrem durante o período de sono
• Transtornos do ritmo circadiano: alteração
no relógio biológico

Diagnóstico o Adultos em estado normal de


descanso geralmente não
Na anamnese é importante a presença de um adormecem em menos de 10
familiar que possa informar sobre questões que o minutos e é incomum exibirem sono
paciente não tem consciência. Perguntar sobre 5 REM
aspectos: que horas se deita, dorme, acorda, levanta o Doentes com narcolepsia
e quantas horas de sono contínuo o paciente tem. tipicamente adormecem em 5
Questionar sobre os hábitos de sono quanto aos minutos ou menos e
finais de semana, bem como presença de frequentemente exibem sono REM
roncos/apneias e comportamentos anormais (hora e durante pelo menos dois cochilos
tipo). Perguntar se o paciente está em uso de • Actigrafia: sensor preso ao punho registra
indutores do sono/psicotrópicos e se existem atividade motora ao longo do tempo →
situações anormais causadas por excesso de sonhos: geralmente 1-3 semanas
presença e tipo de sonhos, questões sobre síndrome
das pernas inquietas. Apneia obstrutiva do sono
Avaliação subjetiva do sono Condição crônica com obstrução clínica das
vias aéreas superiores durante o sono, combinada
• Diários de sono: com sinais e sintomas de distúrbios do sono.
o Preenchidos por 2-3 semanas
o Fornecem informações sobre a Epidemiologia
percepção subjetiva do paciente
• A maioria dos adultos com AOS moderada a
sobre o próprio sono
grave não foi diagnosticada
• Escalas de sonolência: usadas como
• Acomete principalmente indivíduos obesos
ferramenta de triagem
que são grandes roncadores, mas também
o Identifica sonolência excessiva
pode ocorrer em crianças e indivíduos
diurna, mas com baixa sensibilidade
magros por anormalidades anatômicas e
Avaliação objetiva do sono ventilatórias que podem predispor ao
desenvolvimento da síndrome
• Polissonografia: registro de movimentos • Prevalência maior em homens
oculares, atividade de EMG e EEG
o Indicações absolutas → transtornos Fisiopatologia
respiratórios do sono, movimentos
A maioria dos genes relacionados a AOS
periódicos do sono e hipersônias
compartilham ligações com o IMC, ou seja, o
sem causa aparente
componente genético aparece ligado aos fatores
o Indicações relativas → insônia, SPI,
predisponentes à AOS → obesidade, transporte de
narcolepsia e transtorno do humor
serotonina e estrutura craniofacial. O distúrbio
• Teste das latências múltiplas do sono: avalia
envolve fechamento completo ou parcial de
a tendência para adormecer durante as
segmentos colapsáveis da farine, incluindo
horas normais de vigília e consiste em 5
velofaringe, orofaringe e hipofaringe → ausência de
oportunidades de cochilos durante 20
fluxo aéreo por pelo menos 10 segundos associada a
minutos obtidas a um intervalo de cada 2
esforço ventilatório contínuo, com resistência
horas
aumentada de vias aéreas superiores. O excesso de
peso diz respeito aos seguintes aspectos:

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Distúrbios sensoriais, motores e da consciência 103

• Restrição do movimento da parede torácica • Alterações de humor: depressão e


→ estreitamento da via aérea superior irritabilidade
• Instabilidade ventilatória • Alterações na memória visual e de trabalho
• Capacidade comprometida de compensar a → relacionadas à intensidade da
resistência elevada da via aérea no início do fragmentação do sono e à hipoxemia
sono • Obstrução da respiração: interrupção da
respiração manifestada por engasgos ou
Cada evento obstrutivo culmina na pressão
dispneia
crítica de fechamento da faringe → faringe se torna
• Boca seca e cefaleia pela manhã
mais difícil de expandir durante o próximo esforço
• Insônia
respiratório → leva à geração de mais esforços
• Congestão nasal, rinite, sinusite crônica e
voluntários contra a via aérea superior obstruída. O
alterações anatômicas da nasofaringe
despertar abrupto subsequente é associado à
• Anomalias craniofaciais: micrognatia e
reabertura da via aérea com descarga simpática
retrognatia
(vasoconstrição periférica + súbito aumento de FC,
PAS e PAD → PA flutuante – relativamente baixa O diagnóstico definitivo é feito por meio de
durante a apneia e agudamente elevada no final do estudo polissonográfico. O tratamento de escolha é o
evento obstrutivo). CPAP: aparelho de pressão positiva que joga o ar
dentro da via aérea, provocando uma pressão de
Durante o sono REM há inibição neural
abertura a via.
descendente sobre os músculos respiratórios
acessórios, o que pode acarretar hipoventilação Insônia
alveolar intensa: hipoxemia intensa está associada a
eventos obstrutivos e desequilíbrio ventilação- Definida pela dificuldade de iniciação e
perfusão → colapso da via aérea superior durante o manutenção do sono, marcada por sono de má
sono. Pode estar associado a queda no nível qualidade e de duração insuficiente → acarreta
sanguíneo de oxigênio, resultando em despertares comprometimento das funções diurnas. Pode ser
repetidos para restabelecer o fluxo de ar → esses primária ou secundária e possui três etiologias
despertares não são percebidos pelo individuo, mas possíveis de serem tratadas:
resultam em sonolência excessiva diurna. 1) Psíquica: tratamento de doença psiquiátrica
A cada evento obstrutivo, a combinação de 2) Psicofisiológica: terapia cognitiva
asfixia progressiva, pressão intratorácica negativa comportamental + mudança de hábitos
crescente e súbito despertar autonômico resulta em 3) Aguda: indutores de sono
alterações cerebrovasculares e cardíacas agudas: Alguns insones se encontram em um estado
aumento da pós-carga no VD e VE, redução da de hiperalerta fisiológico constante – geralmente
complacência do VE, aumento da PA pulmonar, estão menos sonolentos durante o dia do que
redução do fluxo sanguíneo arterial coronariano e indivíduos normais e alguns apresentam aumento da
aumento da demanda miocárdica de oxigênio. atividade metabólica nas 24 horas do dia. A relação
Diagnóstico clínico e tratamento entre insônia e afecções psiquiátricas é bidirecional →
a depressão pode causar insônia e a insônia pode
As manifestações clínicas incluem: causar depressão.
• Ronco alto e crônico: oclusão parcial do Manifestações clínicas:
tecido mole da faringe com vibrações
• Pacientes são incapazes de dormir por
sonoras desses tecidos → normalmente é um
tempo ou com qualidade suficiente para
padrão crescente, com um ruído mais alto no
acordarem se sentindo descansados ou
final do evento
recuperados
• Excessiva sonolência durante o dia:
• Sono não restaurador
pacientes podem adormecer
• Sensação de cansaço ou fadiga
inesperadamente
• Dificuldades de concentração

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104 Módulo 402

O diagnóstico é clínico, mas diários do sono e


actigrafia podem ser úteis nos casos difíceis. Estudos
formais do sono são indicados apenas sob suspeita de
transtorno de sono coexistente. Tratamento pode ser
feito com TCC, que apesar da eficiência pode demorar
muito tempo para surtir efeito. Pacientes hiper-
despertos podem se beneficiar de sedativos-
hipnóticos → benzodiazepínicos, novos não
benzodiazepínicos e agonistas de melatonina.

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