Publicar Um Estado
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CAPÍTULO I. INTRODUÇÃO
1.1. Conceito de Direito Internacional Privado (DIP)
1.2. Objecto e Função do DIP
1.3. Âmbito do DIP
1.4. Fundamento e Natureza DIP
1.5. Fontes do DIP
1.6. DIP e Domínios Afins
PREÂMBULO
A divisão da humanidade em Estados independentes com leis próprias e as causas que
determinaram e, progressivamente, multiplicaram as relações internacionais,
produziram, naturalmente, o aparecimento de regras de direito disciplinadoras dessas
relações, quer a vida internacional fosse provocada pelos interesses gerais dos povos,
quer a fosse pelos interesses particulares dos indivíduos que os constituem.
E assim se formou o Direito Internacional nas suas duas manifestações de – Direito
Internacional Público, ou o regime jurídico das relações dos Estados no que respeita aos
seus interesses gerais de colectividades nacionais, e de – Direito Internacional Privado,
ou o regime jurídico das relações internacionais que respeitam aos interesses dos
indivíduos considerados como simples particulares, o qual vai constituir objecto do
nosso estudo durante o presente semestre.
Assim sendo, sempre que ocorrer que determinadas relações jurídicas estejam
vinculadas a mais de um sistema de direito, seja por envolverem partes naturais ou
domiciliadas em diferentes Estados, seja porque as obrigações são cumpridas em
lugares diferentes dos da celebração dos negócios, ou do domicílio das partes, caímos
no âmbito do Direito Internacional Privado. Este é o caso, por exemplo:
(a) do download de uma música de um site localizado na Índia para um computador em
Portugal;
(b) a compra de gás natural na Bolívia para entrega no Brasil;
(c) a venda de crude e sua exportação por produtor angolano para compradores
chineses;
(d) os investimentos realizados por angolanos no exterior e a possibilidade de bloqueio
e repatriação deles pelas autoridades angolanas; e
(e) o casamento entre um(a) angolano(a) e um(a) português(a) realizado na França.
1.1. CONCEITO DE DIP
• O Direito Internacional Privado (DIP) é a disciplina jurídica que regula as
situações da vida privada internacional;
• O Direito Internacional Privado (DIP) é o ramo da ciência jurídica onde se
definem os princípios, se formulam os critérios, se estabelecem as normas a que
deve obedecer a busca de soluções adequadas para os conflitos emergentes de
relações jurídico-privadas internacionais.
• Nas palavras de FERRER CORREIA, o DIP é o ramo da ciência jurídica onde se
procuram formular os princípios e regras conducentes à determinação da lei ou
das leis aplicáveis às questões emergentes das relações jurídico-privadas de
carácter internacional e, bem assim, assegurar o reconhecimento no Estado do
fórum das situações jurídicas puramente internas de questões situadas na órbita
de um único sistema de Direito estrangeiro (situações internacionais de conexão
única, situações relativamente internacionais).
Segundo o mesmo autor, incluímos no âmbito do DIP três ordens de questões:
• conflitos de leis;
O Direito Internacional Privado não estabelece a norma de direito material
aplicável ao caso concreto (se A tem direito de cobrar de B indemnização pelos prejuízos
decorrentes de um acidente de carro). Limita-se a definir em que ordenamento jurídico
o aplicador da lei deverá buscar as normas materiais incidentes no caso concreto (ex. a
disputa entre A e B deve ser resolvida de acordo com as leis da Suíça), quando a relação
jurídica abranger mais de um ordenamento. É o que se chama de conflito de leis.
• duas questões de direito processual civil internacional, nomeadamente,
competência internacional;
Também cabe ao Direito Internacional Privado definir que tribunal – de que
sistema jurídico – deverá decidir as questões relativas a determinada relação jurídica
multi-conectada, aplicando a lei material incidente no caso. É o que se chama de conflito
de jurisdição.
e,
reconhecimento de sentenças estrangeiras.
O DIP não se confina ao estudo do Direito aplicável a uma dada questão material
controvertida, preocupando-se também com os problemas relativos à eficácia e aos
efeitos das decisões emanadas, quer dos tribunais judiciais, quer dos tribunais arbitrais.
E na Lusofonia?!
O DIP como ramo das Ciências Jurídicas é constituído pelo Direito de Conflitos e pelo
Direito do Reconhecimento. Numa visão alargada ele abrangerá questões ligadas ao
Comércio Internacional, designadamente à arbitragem do Comércio Internacional,
maxime a lei aplicável ao mérito da causa, ao reconhecimento das sentenças arbitrais,
versará sobre questões relativas à competência internacional dos tribunais locais
(Direito da Competência Internacional), a nacionalidade; a condição dos estrangeiros,
e ainda outras questões consideradas acessórias destes problemas.
Quando nos referimos ao DIP como disciplina jurídica temos, prioritariamente, que
indagar quais as matérias a que este se reporta e se circunscreve.
O DIP sendo, essencialmente, um Direito de Conflitos, elegendo o sistema “legislativo”
onde devemos procurar a solução para a questão jurídica privada internacional ou,
dito de outro modo, designando a lei potencialmente aplicável à situação, com todas as
vicissitudes que esta técnica implica, assenta, sobretudo, nas chamadas regras de
conflitos.
A metodologia relativa à resolução das situações plurilocalizadas não se reduz apenas
ao método conflitual, mas elas ocupam um lugar de destaque em razão da
operacionalidade deste método quando confrontado com outras técnicas, que se
mostram muito mais fragmentadas.
FONTES TRANSNACIONAIS
Estas fontes constituem processos específicos de criação de proposições
jurídicas independentes das ordens jurídicas estaduais por um lado, e da
ordem jurídica internacional, por outro.
São fontes transnacionais o Costume Comercial Internacional e a produção
normativa de “centros autónomos”.
Os órgãos de produção dessas normas transnacionais podem ser privados, como
a Câmara de Comércio Internacional, ou internacionais, como a UNIDROIT
(Unificação do Direito Privado).
Decisiva é a natureza da norma transnacional produzida, que não é doméstica
(por exemplo, uma lei) ou internacional (um tratado), objectivando a regulação
de factos transfronteiriços. A fonte transnacional nos coloca diante da existência
de um verdadeiro pluralismo jurídico global, com normas oriundas dos Estados
e, também, de agentes privados.
FONTES INTERNAS
No âmbito das fontes internas teremos a lei, merecendo destaque a
Constituição, que não sendo fonte de normas de conflitos, não deixa de ser fonte
de DIP. Na lei ordinária a principal fonte de Direito de Conflitos é o Código Civil.
Encontramos também normas de conflitos, designadamente, no Código
Comercial, no Código de Sociedades Comerciais, no Código do Direito de Autor
e dos Direitos Conexos.
O Costume é considerado fonte importante nos países em que o DIP não está
codificado, como acontece na França, Bélgica e Holanda. Em alguns países ele foi
importante até a produção do Código Civil, passando nesses a ter um significado,
apesar de limitado, no desenvolvimento e aperfeiçoamento do sistema. Trata-se
acima de tudo de Costume Jurisprudencial.
A Jurisprudência é uma das fontes mais importantes, considerada até a principal
fonte interna de DIP. Na falta de norma legal ou consuetudinária os tribunais
formularão normas de conflitos, apelando a ideias orientadoras ou princípios
gerais, consolidando soluções numa jurisprudência constante.
A Ciência Jurídica, que consiste no labor doutrinal, que permite a aproximação
dos sistemas baseados em fontes não escritas, contribuindo para a codificação.
A ciência do DIP tem carácter internacional e universalista, aproximando os
vários sistemas de DIP e contribuindo para o intercâmbio que estimula a
evolução deste ramo de Direito.
3.ª R: Aludindo sobre o último dos problemas suscitados pela relação entre o DIP e o
Direito Constitucional – Lei Estrangeira designada pela Regra de Conflitos e a sua
Conformidade com Preceitos Constitucionais do Ordenamento ad quem.
Verdadeiramente a questão é a de saber se, no momento de aplicar a lei estrangeira
competente, não deverá o juiz do foro tomar em consideração o facto de dado preceito
ou grupo de preceitos não ser válido – e por tal razão não ser aplicado – no âmbito da
lex causae, em função da relação de incompatibilidade existente entre ele e a respectiva
Constituição.
Postas as coisas nestes termos, a resposta deve situar-se no plano próprio: o dos
critérios gerais que hão-de orientar o juiz na aplicação do direito estrangeiro. Ora
estabelece o artigo 23.º do Código Civil que, na aplicação da lei estrangeira, o julgador
deve mover-se no quadro dessa lei e orientar-se pelos princípios nela fixados.
Assim, se em dado sistema estrangeiro determinado preceito não é aplicado pelos
tribunais ordinários por colidir com normas da respectiva Constituição, cabe ao juiz
angolano dar a essa circunstância o devido valor, e abstar-se identicamente de o
observar.
A resposta à questão que enunciámos será então a seguinte: não cabendo seguramente
ao julgador do foro sindicar a compatibilidade constitucional de preceitos da lei
estrangeira, incumbe-lhe aplicar a mesma lei tal como ela seria aplicada pelo juiz do
respectivo sistema jurídico.
Nestes termos, assume relevância, posto que indirecta, o facto de certa norma de lex
causae considerada inconstitucional não ter aplicação nesse sistema. Do ponto de vista
do foro, a referida relevência tem lugar, não por a norma em causa ser inconstitucional,
mas por lea não ser aplicável no sistema a que pertence.
DIREITOS PRIVADOS
São os seguintes os sistemas geralmente usados para determinar a condição jurídico-
privada dos estrangeiros:
1.º - sistema da equiparação dos estrangeiros aos nacionais;
2.º - sistema de reciprocidade (diplomática ou convencional e legislativa ou de facto).
A fórmula do art. 14.º, n.º 1 do Código Civil inclina-se para o primeiro sistema. Ela limita-
se a estabelecer o princípio de que aos estrangeiros é reconhecida a capacidade de gozo
de direitos privados, tal como aos nacionais e independentemente de reciprocidade.
Sob este aspecto não há diferença entre nacionais e estrangeiros.
Mas é só este o alcance da regra da equiparação. Ela não pode deixar de ser entendida
de acordo com as normas de conflitos do nosso sistema.
A lei competente para decidir se ao interessado, cidadão estrangeiro, é reconhecido o
direito que ele pretende exercer (o direito de divórcio, o direito de ser proprietário de
bens imóveis, o direito de adoptar e de ser adoptado, etc.) não pode ser senão a lei
definida como reguladora da respectiva relação jurídica (a lei reguladora do divórcio e
da reparação judicial de pessoas, a lex rei sitae, a lei nacional das partes no caso da
adopção, etc.)
Se interpretássemos o art. 14.º, n.º 1, no sentido de que aos estrangeiros são
reconhecidos todos os direitos civis dos cidadãos angolanos e mais nenhuns , não
poderíamos, por exemplo, deixar de reconhecer a um cônjuge português o direito de se
divorciar, a despeito de a lei da nacionalidade comum das partes não o admitir no caso
concreto, se esse direito fosse atribuído aos angolanos pelo direito material angolano.
Simplesmente, uma tal solução colocaria a norma do art. 14.º em conflito aberto com a
do 55.º, segundo a qual a lei aplicável ao divórcio é exactamente a da nacionalidade
comum dos cônjuges, na sua falta a da residência habitual comum e, na falta desta, a lei
com a qual a vida familiar se ache mais estreitamente conexa.
É para evitar tão aguda e incompreensível discrepância que importa interpretar a regra
do art. 14.º, n.º 1, nos termos fixados acima; e, assim, o cônjuge estrangeiro não será
admitido a exercer em Angola em relação ao outro cônjuge, igualmente estrangeiro,
todos os direitos decorrentes do sistema jurídico angolano, mas apenas aqueles – e
todos eles – que lhe forem concedidos pela respectiva lei nacional (cfr. o art. 52.º do
Código Civil); do mesmo modo, os pais estrangeiros poderão exercer em Angola em
relação aos filhos, estrangeiros como eles, não decerto todos os direitos dos pais
angolanos, mas todos aqueles que lhes forem reconhecidos pela lei designada pelo
artigo 57.º, n.º 1, do nosso Código Civil.
Mas nem por assim entendido o artigo 14.º, n.º 1, deixa de consagrar a regra da
equiparação. Efectivamente, se a lei designada pelo nosso direito para regular o caso for
estrangeira, o estrangeiro poderá prevalecer-se entre nós de todos os direitos por essa
lei reconhecidos, precisamente como se fosse um cidadão português, salvo tão só os
limites que apresentaremos adiante.
Se, pelo contrário, for a lei angolana e competente, então o estrangeiro poderá exercer
todos os direitos dela decorrentes, como se fosse angolano. Ao fim ao cabo, quer a lei
competente seja a angolana ou uma lei estrangeira, o estrangeiro é sempre equiparado
ao nacional.
c) Critério da Sede. Sendo a nacionalidade o vínculo jurídico mais forte que pode ligar o
sujeito de direitos – indivíduo ou pessoa colectiva – ao Estado, a sua atribuição
pressupõe a existência entre ambos de uma conexão viva e real. Ora a conexão
representada pelo elemento “sede” satisfaz plenamente a este requisito.
Sede é o lugar onde os órgãos de direcção superior e de controlo da pessoa colectiva
existem e funcionam. Aí está o governo da associação, fundação ou sociedade, aí são
tomadas as decisões mais importantes para a vida do ente colectivo, daí partem os
impulsos indispensáveis à prossecução das actividades estatutárias. Evidente se torna
que a sede de que falamos é a sede real: se não houver coincidência entre a sede real e
a estatutária, há-de prevalecer a primeira.