Trabalho de Conclusão de Curso 2019 PDF
Trabalho de Conclusão de Curso 2019 PDF
Trabalho de Conclusão de Curso 2019 PDF
João Pessoa
2019
LORENA FERNANDES DA SILVA
João Pessoa
2019
S586s Silva, Lorena Fernandes da.
42p.
CDU 616.89-008.441.44
SUICÍDIO SOB UMA ÓTICA HUMANISTA: RESSIGNIFICAR A DOR E PRESERVAR
A VIDA
Data: ________________
( ) Aprovada
( ) Reprovada
BANCA AVALIADORA
________________________________________________________________
Prof. Dr. Aluízio Lopes de Brito
(Orientador - UNIPÊ)
________________________________________________________________
Prof. Esp. Guilherme Jorge Stanford Dantas
(Membro – UNIPÊ)
________________________________________________________________
Profa. Ms. Ana Sandra Fernandes
(Membro – UNIPÊ)
―Eu quero ser tudo que sou capaz de me tornar‖
(Katherine Mansfield).
RESUMO
É fato que a morte chega para todos, no entanto, variam-se as maneiras de chegar-se até ela.
Muitas pessoas morrem porque consideram que a vida não merece ser vivida, desfazem a
própria existência na tentativa deliberada de livrar-se de alguma desesperada dor, de situações
de vida insuportáveis. Morrem pelo cansaço, pela culpa e por acreditarem que não existem
mais sentidos para viver e, no desespero que surge desse contexto psicossocial, a morte
induzida e realizada por si próprio aparece como saída do sofrimento, assim é o suicídio. De
acordo com o boletim epidemiológico, realizado pelo Ministério da Saúde (2017), estima-se
que, anualmente, mais de 800 mil pessoas morrem dessa maneira. Emblemático, esse tema
promove as mais variadas reações, quer conversado ou estudado. Uma tentativa de suicídio
pode colocar uma pessoa diante de um problema existencial significativo. Nesse momento,
seu sofrimento se torna propiciador para seu autoconhecimento. Ela precisará responder a si
mesma qual o valor que a vida tem para a ela e isso só será possível, conhecendo-se. Não
saber quem se é gera desespero, desamor e incongruência, causa sofrimento e insegurança, o
que contribui para a tomada de atitudes rígidas e negativas referidas a si próprio e aos outros
(BRITO; MOREIRA, 2011). Pensando nisso, interessou ao presente trabalho, compreender o
suicídio a partir da perspectiva humanista com ênfase na abordagem centrada na pessoa
relacionando seu entendimento com a ressignificação da dor para a preservação da vida. Além
de, buscar demonstrar a importância do autoconhecimento, como forma de promover a
relevância do amor que cada indivíduo precisa obter por si, para que, dessa maneira, venha a
saber se cuidar, prevenindo possíveis pensamentos desastrosos para sua vida, como é o
suicídio. No patamar das ideias expostas, fica a projeção de que, este trabalho venha a ser
relevante para acadêmicos de psicologia, profissionais da área e pessoas interessadas no
assunto.
It is a fact that death comes to all, however, the ways of reaching it vary. Many people die
because they feel that life does not deserve to be lived, they undo their existence in the
deliberate attempt to get rid of some desperate pain, unbearable life situations. They die of
fatigue, of guilt and of believing that there are no more senses to live and, in the desperation
that arises from this psychosocial context, self-induced death appears as the way out of
suffering, so is suicide. According to the epidemiological bulletin, carried out by the Ministry
of Health (2017), it is estimated that, annually, more than 800 thousand people die this way.
Emblematic, this theme promotes the most varied reactions, whether spoken or studied. An
attempted suicide can put a person in the face of a significant existential problem. At that
moment, his suffering becomes conducive to his self-knowledge. She will have to answer to
herself what value life has for her and this will only be possible, knowing herself. Not
knowing who one is generates despair, lack of love and incongruity, causes suffering and
insecurity, which contributes to the taking of rigid and negative attitudes about oneself and
others (BRITO; MOREIRA, 2011). Thinking about this, it was interesting to the present work
to understand suicide from the humanist perspective with emphasis on the person-centered
approach relating his understanding with the resignification of pain for the preservation of
life. In addition, seek to demonstrate the importance of self-knowledge as a way to promote
the relevance of the love that each individual needs to obtain for themselves, so that, in this
way, they will know if they care, preventing possible disastrous thoughts for their life, such as
suicide. At the forefront of the ideas exposed, it is projected that this work will be relevant for
psychology scholars, professionals in the field and people interested in the subject.
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 8
2 OBJETIVOS ........................................................................................................................ 10
2.1 OBJETIVO GERAL ........................................................................................................... 10
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ............................................................................................. 10
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 41
8
1 INTRODUÇÃO
É fato que a morte chega para todos, no entanto, variam-se as maneiras de chegar-se
até ela. Muitas pessoas morrem porque consideram que a vida não merece ser vivida,
desfazem a própria existência na tentativa deliberada de livrar-se de alguma desesperada dor,
de situações de vida insuportáveis. Morrem pelo cansaço, pela culpa e por acreditarem que
não existem mais sentidos para viver e, no desespero que surge desse contexto psicossocial, a
morte induzida e realizada por si próprio aparece como saída do sofrimento, assim é o
suicídio.
Mais de 10 mil pessoas morrem dessa forma todos os anos no Brasil. De acordo com o
primeiro boletim epidemiológico sobre suicídio, divulgado pelo Ministério da Saúde (2017),
entre 2011 e 2016, 62.804 pessoas tiraram suas próprias vidas no país, sendo 79% delas
homens e 21%, mulheres.
Emblemático, esse tema promove as mais variadas reações, quer dito, escrito ou
estudado. Fontes (2000, p.11) entende, baseado na obra de Durkheim (1930), essa experiência
como ―todo caso de morte que resulta mediata ou imediatamente de um ato positivo ou
negativo praticado pela própria vítima‖, sendo considerado então, ―tentativa de suicídio‖
todos os atos que antes da consumação tenham sido interrompidos ou incapazes de serem
realizados.
Uma tentativa de suicídio pode colocar a pessoa diante de um problema existencial
significativo. Ela precisará responder a si mesma qual o valor que a vida tem para ela, por
mais difícil que seja estar vivenciando todo esse sofrimento psíquico e emocional que a cerca.
Nesse momento, o sofrimento se torna proporcionador para o autoconhecimento, pois,
segundo Dutra (2000, p.58), o ser se enxergará diante a duas importantes alternativas: ―ou o
homem poderá retornar da angústia para o cotidiano que continua a afastá-lo de si mesmo, ou
poderá ser conduzido a uma superação desse vazio, para um caminho em direção ao seu
próprio SER‖, ou seja, um caminho para o despertar, para o descobrimento de sua verdadeira
essência, para sua transcendência.
A psicologia enquanto ciência que procura compreender os comportamentos advindos
da mente humana e suas respectivas emoções, mostra-se efetiva com suas práticas e diretrizes
no atual estudo em questão. Este trabalho, se discorre sob a perspectiva da Psicologia
Humanista com ênfase na Abordagem Centrada na Pessoa (ACP), sempre buscando estar de
acordo com a linha de pensamento de Carl Rogers, que foi quem iniciou e destrinchou a ACP.
9
2 OBJETIVOS
- Realizar uma revisão bibliográfica sobre questões acerca do suicídio, de acordo com a
Abordagem Fenomenológica Existencial com ênfase na abordagem Centrada na Pessoa;
- Destacar a importância da aceitação como forma de ressignificação da dor;
- Apresentar a aceitação e a ressignificação da dor como estratégia de prevenção do
comportamento suicida;
- Demonstrar a relevância do autoconhecimento como forma de valorização da vida;
11
A morte faz parte do desenvolvimento humano desde que a vida se inicia, sempre
presente, acompanha o ciclo vital de todos os indivíduos e deixa grandes marcas quando
acontece, porém, por mais que seja um fenômeno comum, ainda é pouco compreendida e
aceita na sociedade. Considerando o que se objetivou tratar este estudo, foi realizado uma
revisão a respeito da morte por suicídio, vista aqui, sob uma ótica humanista.
Tal assunto carece de estudos e informações, o que o faz ser menos preventivo e pouco
elucidado diante a sociedade. Carvalho (2011) apud Ceccon (2017, p.888) diz que ―em nossa
cultura o homem tende a afastar-se de temas que lhe causem angústia. Dentre esses, a morte é
um deles‖. Por se tratar de algo imutável, que leve a finitude do ser humano, o receio em lidar
com atributos que estejam diretamente ligados ao fim da vida é altamente instalado. Como
consequência, este ainda é um tema misterioso entre as pessoas.
Em uma sociedade que não quer saber da morte, que busca escondê-la ou
afastá-la a todo custo para impedir que ela aconteça, alguém que tente ou
que consiga tirar voluntariamente a própria vida, só poderia ser considerado,
no jargão mais ―senso comum‖ possível, um louco (CFP, 2013, p.17).
mesmo, qualquer que seja o grau de intenção letal e de conhecimento do verdadeiro motivo
desse ato‖. Silva (2006), preocupada com a limitação que essa definição possa causar, opta
por caracterizar tal comportamento de forma mais abrangente, quando pretensiosamente
afirma que todo o comportamento se parte de uma ideação, logo, para ela, pensamentos auto
lesivos também devem ser considerados como parte do processo nesta definição, até mesmo,
porque, a pessoa que o pensa, na grande maioria da vezes (salve exceções de condições
específicas), está conscientemente se colocando na possibilidade de cometer o ato.
À vista disso, a referida autora, com base em seu entendimento sobre o
comportamento suicida, tendo sido fundamentado a partir de outras literaturas, complementa
que tal conduta deve ser percebida como um ―continuum‖ que parte de ―pensamentos de
autodestruição, passando por ameaças, gestos, tentativas de suicídio até o desfecho letal,
qualquer que seja o grau de intenção letal e de conhecimento do verdadeiro motivo desse ato‖
(p.42).
Cassorla (1991) apud Gaspari (2002, p.17), considera o suicídio como um evento que
ocorre como culminância de uma série de fatores que vão se acumulando na biografia do
indivíduo, em que entram em jogo desde ―fatores constitucionais até ambientais, culturais,
biológicos, psicológicos, etc. O que se chama ‗causa‘ é, geralmente o elo final dessa cadeia‖.
Uma vida é vivida por experiências, construída com histórias e sentidas pela alma.
Pessoas não são robôs. Pessoas tem sentimentos. Se um suicídio surge como saída para fugir
de alguma determinada dor, é porque, de fato, quem a sente, sente muito. Essa realidade dói
para quem a sente, quem convive diariamente com a dor, dói para quem ver quem se ama se
deteriorando, se matando. Por vezes o indivíduo pode sentir-se estático, sem saída, vendo sua
vida acontecer e a vivendo no automático, estando na maioria do tempo deprimido, chateado
ou extasiado, sem forças para reescrever partes de sua história.
De acordo com o boletim epidemiológico, realizado pelo Ministério da Saúde (2017,
p. 1-7), ―O suicídio é um fenômeno que ocorre em todas as regiões do mundo. Estima-se que,
anualmente, mais de 800 mil pessoas morrem por suicídio. [...] No período de 2011 a 2015,
foram registrados 55.649 óbitos por suicídio no Brasil‖. Supõe-se que os dados aumentam
consideravelmente se contado com as tentativas interrompidas ou inalcançadas e até mesmo
as que jamais chegaram ao conhecimento dos estudos estatísticos.
As pessoas que chegam a tentar o suicídio devem ser o principal foco das
ações de vigilância e de ações preventivas dos profissionais e serviços de
saúde. A tentativa de suicídio é a expressão de um processo de crise, que se
desenvolve de forma gradual. Portanto, intervir precoce e adequadamente na
13
da realidade (meio em que está inserido) e surta, podendo permanecer no surto por tempo
indeterminado, resultando muitas vezes em sintomas de transtornos conhecidos como
depressão, esquizofrenia, entre outros. Todas essas representações, para algumas teorias
humanistas, não passam de meios protetivos, não-conscientes, dos próprios seres em seus
estados mais alarmantes de dor.
Nunca se deve ouvir analises críticas de outros, se não de nós mesmos, pois isso indica
uma diretividade imprecisa, uma ofensa, e quando o ser humano se sente ofendido sua
tendência inata de autodefesa se faz presente, fazendo-o contra-atacar, o que resulta em uma
comunicação não construtiva e violenta entre os envolvidos, não contribuindo, dessa forma,
para o objetivo da questão que é a de ajudar o bom desenvolvimento dos seres. Por tanto,
devemos considerar as dores que sentimos, não as análises destas (ROSENBERG, 2003).
O suicídio sempre foi objeto de estudo de distintas áreas do saber e não há uma
explicação única que permita sua total compreensão. No entanto, alguns autores tecem sobre a
multicausalidade deste ato. Fukumitsu e Scavacini (2013), nos apresenta um pouco dessa
noção, segundo eles, tal fenômeno não deve ser sabido por apenas um determinante, pois, na
pluralidade dos casos, há sempre uma interação entre vários fatores, como: ―[...] psicológicos,
psiquiátricos, econômicos, culturais, religiosos [...]‖, que devem ser melhores observados e
levados mais em conta. ―É necessário apresentar a distinção entre as causas e o
desencadeante. As causas são sempre múltiplas, no entanto, há, geralmente, algo que
desencadeia o ato‖ (p.198).
De acordo com o pensamento de Kierkegaard apud Tenório (2003, p.40-41): ―nenhum
princípio, sistema ou idéia geral pode dar conta de explicar ou descrever a realidade humana,
a vivência particular de cada pessoa‖. Desse modo, rotular uma única causa para a efetivação
desse ato não estaria alcançando a dimensão que realmente este problema traz, como afirma
Advíncula (1992, p.93): ―a objetivação não é possível para um ser tão complexo‖.
Poucos temas provocam tanta singularidade como esse. É necessário compreender os
motivos, os porquês, os sentimentos, os pensamentos, as incertezas, inseguranças, medos e
outros mais, é preciso alcançar o humano. Só assim se é capaz de chegar ao que o suicídio
implica verdadeiramente para uma pessoa. Vale repetidamente salientar, os fatores podem ser
considerados singulares e cabíveis para as causas classificatórias, mas, os desencadeantes,
não.
Ao se pensar em Psicologia, logo vem à mente seu conceito chave de que é a ciência
que estuda os processos mentais do comportamento do ser humano e de suas interações
sociais com o mundo. Não estaria errado afirmar tal colocação, entretanto, pretende-se aqui
15
complementa-la, de maneira que destrinche o seu interesse em seu princípio básico, mais
complexo, que é o ser humano.
Por óbvio, a Psicologia como ciência humana trata da pessoa humana, porém, alguns
conceitos atualmente estão se distanciando dos princípios fundamentais dessa noção. Ao ser
tentado resolver, elucidar e cientificar cada passo que dá o ser humano, têm-se direcionado a
atenção apenas para a compreensão de seus comportamentos, de forma metódica experimental
objetiva, esquivando-se, desse modo, da subjetividade inerente que apresenta o ser existente
no mundo. Essa humanização é, pois, entendida como um processo que deve ser enxergada a
partir do homem e não, inicialmente, de suas ações, só assim, se encontrará os conceitos a ele
pertinentes (ADVÍNCULA, 1992).
Não é que a objetivação seja totalmente inadequada às questões humanísticas, mas ela
não deve ser tida como principal fonte de descobertas de suas questões existenciais.
Sintetizando esse pensamento, parece oportuno referenciar o filosofo Martin Buber (1982)
que nos deixa, com suas próprias palavras, uma importante alusão podendo ser relacionada a
respeito:
Por tanto, eu sou o que sou e preciso do tu para que eu possa realmente ser, e tu
precisas do eu para que possas seres tu. O eu e o tu, precisam do meio (mundo) para que
possam se relacionar e se perceberem um diante ao outro, pois as diferenças é o que nos
tornam indivíduos (BUBER, 1982).
Muitos pensam que, por se tratar de abordagens mais voltadas ao subjetivo do ser
humano, a Psicologia Humanista não compactua com os conhecimentos científicos que
também buscam explicar as questões humanas, porém, grandes conhecedores da área intentam
desmistificar essa ideia. Rogers, por exemplo, enxergava a ciência como um dos polos da
experiência humana, que, afinal, sua conduta (ação do sujeito para a utilização do saber
cientifico) parte-se de sua própria vivência subjetiva, ou seja:
A ciência apenas existe nas pessoas. Qualquer projeto científico tem o seu
impulso criativo, o seu processo, a sua conclusão provisória, numa pessoa ou
em várias pessoas. O conhecimento – mesmo o conhecimento científico - é
aquele que é subjetivamente aceitável. O conhecimento científico só pode
16
isso a importância em pensar sobre a maneira de como portar-se nos diferentes tipos de
convívios sociais. Um comentário, uma ação, uma desatenção, podem ser fatores que, se
acumulados, geram fontes para sofrimentos existenciais. É válido salientar que, nossos
sentimentos são nossa responsabilidade, isto é, o meio pode apenas desencadear sentimentos
já pertencentes a mim, mas nunca é capaz de tomar posse da minha própria liberdade de
escolhas.
Rogers e Rosenberg (1977/2002), elaboraram algumas críticas para a sociedade em
que estavam inseridos, segundo eles, o caminho que a maioria das pessoas estavam tomando
serviriam de bases para uma possível crise existencial coletiva, dizia ele:
Mesmo com tantas coisas ainda para se melhorar, Rogers não desistiu da humanidade
em sua época, nem tampouco de suas expectativas para a mudança dos seres no futuro, ou
melhor, para o bom desenvolvimento de suas potencialidades e subjetividades. É perceptível
aí a significância da Psicologia Humanista, com ênfase na abordagem rogeriana, para o
constante progresso das personalidades dos seres humanos.
O enfoque existencial humanístico com a metodologia fenomenológica ocupa um
espaço amplo dentro da psicologia com seus conceitos e suas características. Há na história
das filosofias, um termo conhecido como ―Epoché‖, significa dizer que, tudo deve se dar de
acordo com a sua transcendência, isto quer dizer que não devemos fazer juízo algum sobre o
mundo e tudo aquilo que nele se inclui, pois nada, além de nós mesmos, possui o poder de
explicar ou determinar o que algo implica e impõe para uma outra realidade que não seja essa,
verdadeiramente, a nossa.
A fenomenologia é uma corrente filosófica fundada por Edmund Hussel e marcada
posteriormente por grandes outros filósofos, como Merleau-Ponty. No geral, compreende-se
por fenomenologia tudo aquilo que busca compreender os fenômenos e como esses se
manifestam, buscando entender a essência das coisas e como essas são percebidas no mundo.
Seu foco está nas experiências vivenciadas pelas pessoas, de modo que, o entendimento
sentido de tal experiência possa anteceder a qualquer explicação lógica, cientifica ou
psicológica que essas lhes possam oferecer, ou seja, ―a fenomenologia consiste em voltar à
experiência humana direta, pondo de lado quaisquer ideias preconcebidas derivadas de nossas
teorias cientificas ou de filósofos‖ (MATTHEWS, 2010 apud MOREIRA; TORRES, 2013,
p.183).
A abordagem centrada na pessoa dá ênfase ao mundo fenomenológico do cliente. O
próprio Rogers (1985), em uma entrevista concedida a Evans (1979, p.79), apud Moreira e
Torres (2013, p.183), diz que:
perceptivo) que alude ao caráter global daquilo que é experimentado e simbolizado, via
consciência. ―O campo fenomenológico funciona como uma lente que constitui um modo
particular da pessoa se perceber e se relacionar com o mundo, formando uma perspectiva de
realidade‖ (BRANCO; CIRINO, 2016, p.245).
No processo psicoterápico rogeriano, a pessoa pode tomar consciência daquilo que
está realmente vivenciando, não simplesmente daquilo que se permite experimentar depois de
ter passado por um filtro conceitual (ROGERS; ROSENBERG, 1997). Desse modo, o
indivíduo está oportunizando-se a estar congruente consigo mesmo, com seus sentimentos e
ações, com sua realidade. A partir do momento que ocorre a real compreensão do que lhe está
acontecendo, o ser passa a se inteirar de seus valores positivos, fortunando-se ao próprio
conhecimento pessoal.
A seguinte série de preposições, ditadas por Kinget e Rogers (1975, p.66), formulam
uma representação deste processo:
O corpo adoece para não morrer. Essa afirmação clareia a ideia da relação corpo e
alma existente na filosofia clássica, onde, alma (psyque) representa o ser e, o corpo, a matéria
que dá luz as ações da alma. Desse modo, quando o ser apresenta alguma insatisfação
persistente perante a vida que está sendo vivida, refletirá com adoecimentos, seja de maneira
somática no corpo, seja de modo emocional, sentida puramente na alma.
Vale salientar, não se entende aqui doença como ausência de saúde e sim, como a
constatação de que a vida se trata de mudanças que exigem dos seres a capacidade de
encontrar novos sentidos mesmo que diante as transformações ocorridas. A saúde também não
implica dizer que se trata de falta de doença, mas o inverso, a capacidade de lidar com ela e
20
saber acolhe-la como algo inevitável e necessária. ―A Saúde é uma forma de estar na vida,
disponível, para o que ela pode apresentar‖ (DELIBERADOR; VILLELA, 2010, p. 235).
Cada vez que o sujeito se distancia dele mesmo e passa a insatisfazer constantemente
os interesses de sua alma, suas ações começam a se tornar contrárias à essência positiva de
seu ser, de modo que, seus sentimentos se tornem incongruentes em relação às suas ações
diárias (KINGET; ROGERS, 1975).
Isso contribui para o afastamento de segurança interna, maior sensibilidade aos
acontecimentos diários, ascensão aos medos, irritabilidade, tomadas de comportamentos
agressivos e/ou auto lesivos, tristeza profunda, entre outras comorbidades. Tudo isso, facilita
a elaboração de pontes para situações que o façam querer desistir de si mesmo, aproximando
o ser ao vazio existencial, a perca dos sentidos de estar-se vivo. O encerramento da própria
vida aparece como forma de escape para a dor de existir, ou seja, ―aquilo de que o sujeito
possa dispor quando a vida lhe parecer insuportável‖ (CFP, 2013, p.33).
Dutra (2000, p.99-100) atesta essa explicação da seguinte forma:
Vale, nesse momento, recordar de uma passagem escrita por um grande filosofo
existencialista francês, Maurice Merleau Ponty (1908-1961) apud Advíncula (1992, p.95), que
diz: ―o homem se define, em oposição à pedra, que é o que é, como o lugar de uma
inquietação, como o esforço constante por se recuperar e consequentemente, pela recusa em
se limitar a qualquer uma de suas determinações‖. Desse modo, estaria errado enxergar as
experiências de alguém como algo que pudesse vir a ser imutável ou intransmissível.
Cabe, por tanto, ao terapeuta, agir como um facilitador para incitar o melhor
desenvolvimento de seu cliente, criando as condições necessárias para emergir nessa pessoa a
manifestação de suas forças pessoais, como consequente, o indivíduo estará imerso em um
processo de crescimento continuo, de vir-a-ser o seu próprio eu no mundo, com
comportamentos próprios e pessoais, livres de tantas atribuições externas (ADVÍNCULA,
1992).
Carl Rogers (1902-1987), autor de grandes obras como ―Psicoterapia e consulta
psicológica (1942), a Pessoa como centro (1951) e Tornar-se pessoa (1961), é considerado
como principal pivô da psicologia humanista, sendo ele, fundador da abordagem ―terapia
centrada no cliente‖ que, com o tempo mudou de nominação para ―terapia centrada na
pessoa‖. Sua obra é amplamente conhecida pelo leitor de língua portuguesa. Há uma
variedade de material (livros, artigos, vídeos legendados) disponível a respeito da Abordagem
Centrada na Pessoa. Sua terapia inovadora, centrada na pessoa e não diretiva, contribuiu com
grandes marcos para a história da ciência da Psicologia (COLLIM et. al. 2016, p. 136-137).
A teoria humanista obtém uma visão holística e positiva do ser humano. Segundo
Collim et. al. (2016, p. 132), ―O psicólogo americano Carl Rogers adotou uma abordagem
muito mais esotérica da questão da saúde mental e, com isso, provocou uma ampliação
definitiva dos métodos da psicoterapia‖. Em meados dos anos 50, sua Terapia Centrada no
Cliente já havia se tornado uma referência, ele tinha sido eleito presidente da maior entidade
de psicologia de seu país – a APA – American Psychological Association – e gozava de
prestígio internacional (MESSIAS; CURY, 2006).
Ele se inteirou na noção de vida verdadeiramente humana, para ele, nenhum indivíduo
poderia ser rotulado às generalizações das classificações, partindo do pressuposto de que cada
indivíduo possui as suas próprias características, vivenciam as suas próprias experiências e
contém as suas especificas particularidades.
Rogers ainda complementa que não pretende parecer ter uma visão ―ingenuamente
otimista da natureza humana‖, mas que a entende como perfeitamente capaz de se comportar
de maneira agressiva ou autodestrutiva quando emerge nela a necessidade de se defender dos
seus medos mais íntimos.
23
No patamar das ideias expostas, fica a projeção de que, o sentido da existência humana
se dá na constante atualização de seu modo de existir. Para tanto, o ser humano deve ser
respeitado e compreendido por inteiro e não apenas a luz de classificações ou do atual estado
de seus seres.
Pode-se perceber que ao buscar compreender o fenômeno do suicídio pela vertente da
Psicologia Humanista, emana uma gama de conhecimentos em como ser-no-mundo, onde, se
apresentado a estímulos que promovam o autoconhecimento juntamente a liberdade
experiencial provida de segurança e sentidos, o ser passa cada vez mais a ser autônomo,
autentico e potencialmente livre de vivenciar desesperos existenciais.
Ao relacionar essa teoria com os constructos buberianos, percebe-se a compatibilidade
entre as noções, pois, para Buber, o homem é um ser que se caracteriza ao existir, logo, a
existência implica uma correlação vincular com o mundo. Se obtém a noção de que a relação
do ser com o outro é essencial para se alcançar o bom fluído da vida humana, ―visto que é no
encontro com o outro que o ser se atualiza‖ (ADVÍNCULA, 1992, p.99).
Havendo um bom fluido nos processos relacionais existentes entre os seres, o que
existe de mais saudável no peculiar de um ser humano será posto em ordem, caso contrário,
inicia-se um longo processo de desordens frequentes, que podem abrir caminhos para o
adoecimento deste ser. Ordem e desordem são etapas constantes e necessárias no desenvolver
do homem e do mundo, porém, o que as tornam saudáveis ou não é, por tanto, a maneira que
o indivíduo enxerga e acolhe os fenômenos que lhes acontece.
O suicídio é um fenômeno complexo que engloba diversas esferas da vida. Para nos
aproximarmos da multiplicidade de facetas que envolvem esse tema, precisaremos, por tanto,
compreender o mundo vivido das pessoas e como essas o veem (MOREIRA; SOUZA, 2018).
´Não é fácil, por isso se faz necessário a contribuição dos saberes da Psicologia Humanista,
para que, o entendimento dessa questão possa ser explanado da maneira mais pessoal
possível. A Abordagem Fenomenológica Existencial com ênfase na abordagem Centrada na
Pessoa, traz atitudes quem promovem a prevenção do suicídio, além de demonstrar modos
mais humanos de ajudar a conseguir retirar pessoas em situações de crise emergenciais.
Rogers (1997) destacou em sua obra que, estar atento, saber ouvir, para além das
palavras faladas, se fazer presente na relação, fará com que proporcione uma atmosfera
facilitadora que pode ser útil no sentido de possibilitar uma escuta compreensiva. O
profissional psicólogo humanista precisará estar preparado para o encontro existencial, onde o
outro poderá manifestar sobre a possibilidade de querer dar fim a sua vida
24
Vale salientar que, mesmo dentro dessa abordagem, ou melhor, principalmente nesta,
depois das tomadas de todas as atitudes facilitadoras, se o ser, ainda assim, desejar continuar
com a opção de retirada da própria vida, o terapeuta ou facilitador desse sentido deverá
respeitá-lo, ainda buscando compreende-lo empaticamente, pois não poderá ter outra opção
senão a de aceitar a liberdade de escolha expressada pelo seu cliente.
Isto não significa dizer que, se deve desistir de ajudá-lo a encontrar sentidos para a
continuação de sua vida, mas, que mesmo querendo-o vivo, fará de tudo para aceita-lo por
completo, independentemente se este decida suicidar-se. Isso nos remete a ideia de que a
liberdade rogeriana deve ser realmente expressa e sentida em todo seu teor psicoterapêutico.
Evidentemente, a clínica psicológica compreende a importância da atenção preventiva
nos cuidados com os pacientes suicidas, porém entende que a vontade de morrer é uma
experiência legítima e que merece ser acompanhada como qualquer outra experiência
humana. Contudo, tal posição não abre espaço para a concordância com o ato letal.
Experimentar-se é uma forma de poder significar essa vontade de uma nova maneira,
descobrindo novos sentidos que justifiquem viver.
25
É chamada rede de apoio aqueles com que o indivíduo em crise poderá contar se
houver a necessidade (GASPARI, 2002). Esta, pode ser composta pelos familiares, grupos de
apoio sociais (amigos, colegas de trabalho, vizinhos, etc.) e até mesmo pets, geralmente, são
seus próprios animais de estimação. Além desses, também pode ser incluído na rede de apoio,
objetos que conotem valor sentimental para o tentador, um simples objeto poderá ser
desencadeador de sentidos e emoções na vida de um ser, logo, possuem também importância
significativa na prevenção do suicídio.
A ajuda emocional de toda a rede de apoio do indivíduo é imprescindível para que o
suicídio não venha a ser efetivado. O profissional de saúde que trabalhe em casos como esse
deve compreender o tamanho da responsabilidade e importância que representa na vida deste
ser, por tanto, precisa considerar que quando seu cliente estiver em momentos de crise, seu
apoio emergencial será fundamental, principalmente para se conseguir mais tempo para a
busca de sentidos, valores e novas saídas que façam o indivíduo pensar em desistir da ideia de
tentar realizar o ato suicida.
A dor que toma forma, que toma corpo, é uma dor que realmente corrói. Essa é a dor
do momento, a maior dor, talvez. Aceitar e reconhecer que essa dor verdadeiramente dói
ajuda na compreensão do porquê da existência e permanência desta. É necessário saber
quando é preciso pedir ajuda, vezes o ser humano consegue lidar sozinho com seu próprio
sofrimento, vezes não, conseguir interpretar isso demonstra alta responsabilidade para
consigo.
Recompor-se de uma tentativa de suicídio muitas vezes é mais difícil do que a própria
coragem em se suicidar, o indivíduo precisará estar, novamente, enfrentando as suas dores e
lamentos, reencontrando os motivos que lhes fizeram desejar ir contra a sua própria
existência, mas, dessa vez, com o atributo de ainda precisar lidar com as opiniões e
julgamento das pessoas em sua volta. Neste momento, a rede de apoio deve também ser
acionada, devendo essa, contribuir de modo substancial na vida deste alguém, pelo menos até
que o sujeito consiga libertar-se do período de crise, onde tudo parece estar propicio para que
venha a tentar contra ele mesmo novamente.
Culpa, vergonha, busca incessante do motivo, sentimentos intensos de
responsabilidade, rejeição e abandono, maior dificuldade em dar sentido para a morte,
autoacusações, isolamento, mudanças na dinâmica familiar são alguns dos sentimentos e
comportamentos usualmente experienciados pelo sobrevivente (JORDAN, 2001).
Estar em sofrimento é doloroso, por isso essa dor que tem gerado outras dores com
constância, precisa ligeiramente ser compreendida pelo sujeito que a sente. Mas, até que este
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consiga alcançar tamanha compreensão, antes, precisará passar pelo processo de aceitação, ou
seja, seus sentimentos precisarão serem verdadeiramente sentidos, expostos para si,
percebidos, para que, só assim, sua dor possa ser aliviada e então chegar a ser ressignificada.
Esse é o real processo de cura, cuja qual, vai muito além da bioquímica habitual, trata-se de
curar a alma, de ratifica-la, de fazê-la refletir sobre a valorização do próprio self e de
conseguir compreender a importância da própria existência, conhecendo e valorizando a
própria essência.
Na visão esotérica humanista, o que de primeiro importa quando se está frente a uma
tentativa de suicídio é a pessoa, com todas as suas dores e lamentos, medos e temores, com
tudo que lhe estiver convindo no momento. O acolhimento de sua dor é a primeira grande
atitude que deve ser tomada pelo outro, para que, em seguida, seja alcançado o objetivo
primordial do processo: a transcendência deste ser.
É por meio da compreensão empática que o psicoterapeuta compreende os
significados do sofrimento do cliente, e isso somente é possível quando o cliente recebe o
psicoterapeuta em seu mundo vivido. Esse sofrimento pode ser compartilhado com o
psicoterapeuta que o compreende como um facilitador empático. Dessa forma, ocorre uma
possibilidade de ressignificação do sofrimento pelo cliente, que facilitará a mudança na
psicoterapia (FONTGALLAND; MOREIRA; MELO, 2018).
O meio social geralmente é apontado como desencadeador de sentimentos como os de
frustração, carência e desgosto nos indivíduos. Esse, por sua vez, não é culpado pelos
sentimentos emergentes, é apenas propiciador, essa diferença precisa ser bem compreendida.
Por exemplo, digamos que existe um relacionamento amoroso entre duas pessoas, quando
uma destas decide acabar, a outra a culpa pelo sofrimento que sente pelo término da relação.
Percebam que a frustração emergida é de conta e responsabilidade própria de quem a sente,
não dá outra pessoa que apenas seguiu o que lhe conveio no momento. A carência emergiu em
quem irá sentir a falta do outro, não em quem decidiu partir. Por tanto, a pessoa que se foi
apenas foi algo que fez desencadear sentimentos pertencentes apenas a si. Admitir os próprios
sentimentos eleva o ser a possibilidade de auto compreender-se enquanto indivíduo no
mundo, o que é maravilhoso para o desenvolvimento positivo de si.
Uma vez que se aceita o fato de cada pessoa é quem escreve e conta a sua própria
história, estas passam a prestar mais atenção aos detalhes que tornam essa história mais
instigante para ser lida.
Eventos de vida como perdas ou conflitos interpessoais, problemas acadêmicos, no
trabalho, com a polícia, desemprego, falência financeira e acesso fácil a meios letais, têm sido
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Augras (1986) apud Tenório (2003) acredita que se o ser permanece em um estado
contrário ao seu eu construtivo, reagindo de maneira abrupta, reclusa e deliberada contra si
mesmo, este, estaria se caracterizando como um ser (em termos de desordem) adoecido. Já a
saúde, vista sob o mesmo olhar, era entendida como forma de ―habilidade para recuperar o
equilíbrio e superar a crise na relação com o ambiente, utilizando então sua capacidade
criadora para transformar esse meio inadequado em mundo satisfatório‖ (p.38). Por tanto,
limitar-se a uma condição existencial é o que torna o ser adoecido. Não se trata das doenças,
dos sintomas ou das condições, se trata em como a pessoa os concebe. Sabendo lidar com os
problemas que possam-lhes ocorrer, a pessoa estaria então, saudavelmente, bem.
―A pessoa doente é antes de tudo uma pessoa que sofre, que precisa em primeiro lugar
ser compreendida a partir de seus sentimentos, sensações, emoções, enfim, de tudo que por
ela é vivenciado‖ (ANGERAMI, 1984 apud TENÓRIO, 2003). Quando o indivíduo não
encontra possibilidades de cura e se enxerga imerso em uma realidade que custa aceitar, pode
facilmente querer manifestar sua insatisfação com a vida por meio do suicídio. Por isso, em
casos como esse, o apoio deve ser dado de forma mais intensa, principalmente em situações
de crise.
Pessoas que possuem determinadas condições precisam ser estimuladas
constantemente há descobrirem-se, pois se percebendo, verão que há em si inúmeras
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características perfeitamente saudáveis prontas para serem usufruídas e postas em prática. Por
tanto, é necessário estimular o que há de saudável nestas pessoas, pois ela não pode ser
reduzida a uma doença e ela precisa se dar conta disso.
A clínica humanista fenomenológica, existencialista e centrada-na-pessoa possui um
jeito próprio de enxergar a psicopatologia e seu diagnóstico, Tenório (2003, p.41) referencia,
com suas próprias palavras, o que representa este processo nessa visão mais humana de
compreender as questões existenciais do próprio ser humano. Diz ele:
Além dessas, outras fontes têm ganhado força e destaque na luta pela causa, como por
exemplo, o CVV – Centro de Valorização da Vida. Este, realiza apoio emocional a todos que
querem e precisam, atendem sob total sigilo, por telefone, e-mail ou chat por 24 horas todos
os dias, de maneira voluntária e gratuita. Além dos atendimentos, o CVV desenvolve, em todo
o país, outras atividades relacionadas a apoio emocional, com ações abertas à comunidade que
estimulam o autoconhecimento e a melhor convivência em grupo e consigo mesmo.
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) atuam de maneira direta e estratégica, é
um serviço de saúde de caráter aberto e comunitário, constituído por uma equipe de
multiprofissionais que atuam sobre a ótica interdisciplinar. Realizam prioritariamente
atendimento às pessoas com sofrimento ou transtorno mental, incluindo aquelas com
necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas, em sua área territorial, seja em
situações de crise ou nos processos de reabilitação psicossocial, além de também serem
substitutivos ao modelo asilar. As Unidades Básicas de Saúde (Saúde da família, Postos e
Centros de Saúde), a UPA 24H, o SAMU (192), o Pronto Socorro e os hospitais, também
podem contribuir de modo relevante na luta pela causa, preparando seus profissionais a
saberem lidar com os indivíduos em crise, pois são estes que as famílias geralmente buscam
quando percebem uma situação de emergência.
Em toda a vida, o ser humano participa de diferentes meios sociais, o que, querendo ou
não, acaba trazendo para si características que podem não ser propriamente suas. Por não se
tratar de um ser isolado e que precisa estar constantemente agindo em sociedade, passa a ser
mutualmente influenciado aos acontecimentos de seu meio externo. Este, quando não se sente
pertencente aos seus grupos, tende a moldar suas atitudes, vontades e modos, na tentativa de
ser aceito e reconhecido pelos seus semelhantes, sem perceber que, dessa maneira, está se
afastando de quem se é de maneira gradual e preocupante.
As relações interpessoais existentes na humanidade são essenciais para a evolução dos
indivíduos. As pessoas assumem um importante papel na constituição de seus semelhantes, o
que preocupa, de fato, é o modo que esses possam estar lidando uns com os outros. Todas as
atitudes tomadas por um ser, são ações que geram resultados imediatos no meio em que este
se encontra inserido, sendo assim, suas atitudes influenciam a tomada de outras atitudes de
um outro ser que também se encontra inserido neste mesmo meio. Neste viés, as pessoas
podem contribuir de dois modos nos modos de ser de um outro alguém, são eles: modo
positivo ou modo negativo.
É no encontro com o outro que o ser se atualiza, cresce e evolui. Se esse encontro for
positivo, repleto de emoções transcendentes, empáticas e construtivas, resultará em seres
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positivamente satisfeitos uns com os outros e, mais importante, satisfeitos consigo mesmos.
Ao contrário, caso aconteça uma má construção do aspecto relacional na vida de alguém, se
ignorado ou não cuidado, o indivíduo poderá tender-se a se manifestar de maneira negativa,
caminhando de modo contrário ao encontro do seu próprio eu, que no fundo é ser positivo, se
afastando, assim, de sua essência e de seus valores (ROGERS, 1997; BUBER, 1982).
Quando isso acontece, é necessário encontrar rapidamente um meio de ajuda que o
faça tentar voltar ao caminho de volta para o encontro de si mesmo. O retorno a si pode ser
doloroso e difícil, porém, ainda assim, necessita que seja alcançado. Conhecer quem se é da
chance para que o indivíduo haja de maneira autentica e positiva na sociedade, contribuindo
com um melhor desenvolvimento do meio onde está inserido, diminuindo, assim, o risco de
crises existenciais ou depreciativas que possam ser influenciadas em outros seres. Sendo
assim, a pessoa estará transcendendo a si mesma e influenciando seus próximos a também
tomarem posse de atitudes como essa.
Rogers ainda complementa que, mesmo que essa tendência esteja de certa forma
enrustida por detrás de camadas de autoproteção psicológicas, ela existe e é contida em cada
um dos seres humanos, ―aguarda somente pelas condições apropriadas para ser liberada e
expressa‖ (p.41). Quando percebida, inicia-se daí o verdadeiro processo de autoconhecimento
e de mudança de atitudes.
A partir daqui, então, o que o indivíduo vier-a-ser perdurará em sua personalidade, de
modo que, continue naturalmente imerso em seu processo de fluidez, sentindo-se mais
fielmente inteiro em toda a sua integridade, podendo ele sempre fazer uso de sua tendência
atualizante e de suas novas maneiras em como saber lidar consigo mesmo e com a sua
escuridão, com as experiências de sua vida.
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Vale a pena refletir sobre um aspecto que será muito repetido nesta obra, que é o estar
inteiro consigo mesmo, ser um ser que se sente inteiro significa dizer que este é um alguém
que alcança a plenitude e congruência com todos os diferentes estados de ser de seu interior,
ou seja, estando ele feliz ou triste, cansado ou energizado, chateado ou em paz, entre outros,
este consegue se auto perceber e aceitar plenamente os sentimentos a ele pertencentes.
Rosenberg (2006, p.187) diz: ―Temos compaixão para conosco quando conseguimos
acomodar todas as partes de nós mesmos e reconhecer as necessidades e valores expressos por
cada uma dessas partes‖. Se perceber é um grande passo em direção ao próprio entendimento
e ao ato de auto respeitar-se. Quando nos conhecemos, se torna mais fácil saber como
poderemos nos portar nos diferentes tipos de situação que nos ocorre nos dias-após-dias,
tendo compaixão com nossos sentimentos e emoções.
O mesmo autor explica, em seu livro ―Comunicação Não-Violenta‖, como fazer para
obter diálogos mais saudáveis consigo e com os outros, de maneira que nenhuma das partes
sintam-se violentadas ou ofendidas pelos envolvidos. Segundo ele, se nós, seres humanos,
pudermos identificar, com eficácia, o que observamos, sentimos, necessitamos e precisamos
para enriquecer nossa própria vida, alcançaríamos, portanto, meios de comunicação menos
agressivos e, por tanto, mais humanizados, sabendo nos entregarmos com mais verdade uns
aos outros. Tal entendimento nos serviria de base para o florescimento autêntico de novas
tomadas de atitudes positivas em relação a nossa própria vida (ROSENBERG, 2006).
Nesse desenvolvimento humanístico, já se compreende que cada ser-no-mundo é
absolutamente capaz de resolver suas questões existenciais, basta saber-se-á a devida
compreensão de si e de suas questões. Para tanto, se faz necessário a compreensão dos
fenômenos que nos acontece diariamente e suas respectivas essências.
Aceitando as próprias vivências, se torna mais fácil de admitir que estas são partes
imprescindíveis de si. O processo de aceitação não é fácil, pelo contrário, pode ser muito
doloroso aceitar as coisas que não queremos nem ao menos perceber, mas, ainda assim, é
necessário. Como bem afirma Rogers (1997):
Todo esse árduo caminho de autoconhecimento tem sua graça no fim, talvez se fosse
tão fácil de ser aceito não seria tão majestoso quanto demonstra ser. O despertar para a
verdade de ser quem se é revigora o ser, cura suas dores mais profundas e torna-o rico de
sentidos e valores positivos para sua vida.
É importante esclarecer que a palavra ―fim‖ mencionada no parágrafo anterior não
exprime um sentido intransitivo ou imutável, na verdade, seu sentido aqui se dá como parte
resultante de um processo, cujo qual, possibilita que outras partes possam ser iniciadas com
base nesta.
A vida, com todos os seus momentos de altos e baixos, se exprime em mudanças,
movimentos, por tanto, ignora o fato de ser entendida como fixidez. Chegar a se conhecer,
não implicará dizer que todos os problemas a partir disso estarão resolvidos ou acabados, ao
contrário, saber quem se é possibilitará o ser de resolver cada vez mais seus problemas de
forma pessoal e positiva, o que não quer dizer que não possa haver novamente um
afastamento dessa autenticidade conquistada.
A contribuição do pensamento de Carl Rogers para a psicologia humanista foi
fundamental, tanto para sua época como para os dias de hoje, quando o seu legado continua a
ser divulgado e praticado, desenvolvendo-se através de novos paradigmas epistemológicos e
filosóficos.
Como parte destas contribuições, as condições facilitadoras, propostas por ele,
mantêm-se como fundamentais dentro da Abordagem Centrada na Pessoa e das vertentes
contemporâneas humanistas dos percussores de Rogers (Moreira, 2010). Em seu artigo sobre
"As condições necessárias e suficientes para a mudança terapêutica na personalidade", Rogers
(1957/2008) apud FontgallandI, Moreira e Melo (2018, p. 7), fala com clareza sobre algumas
das condições que podem facilitar o processo terapêutico, são elas:
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
permite que se saiba, de forma gradual, o que realmente se deseja para si, sabendo assim,
enriquecer-se de sentidos, valorizando mais a própria vida.
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REFERÊNCIAS
BERGAMO, K. Suicídio: a vida não pode parar. Revista Saúde. São Paulo: Editora Abril, 20
jul 2017. Disponível em:< https://saude.abril.com.br/mente-saudavel/suicidio-a-vida-nao-
pode-parar/> Acesso em: 20/05/2019.
COLLIN, A. et. al. O livro da Psicologia. Tradução: Clara M. Hermeto e Ana Luisa Martins.
2. Ed. São Paulo: Globo Livros, 2016, 352 p. Título original: The psychology book. ISBN:
978-85-250-6249-9.
SANCHES, L. M.; BOEMER, M.R. O Convívio com a dor: um enfoque existencial. Rev.
Esc Enferm USP, 2002, p. 386-387.
SILVA, K. F. A.; ALVES, M. A.; COUTO, D. P. Suicídio: uma escolha existencial frente ao
desespero humano. Minas Gerais, Revista da Graduação em Psicologia da PUC Minas, v.
1, n. 2, jul./dez. 2016. ISSN 2448-0738.