II Teorico
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no Processo de
Alfabetização
A relação entre Alfabetização e Letramento e os Gêneros Textuais
Revisão Textual:
Profa. Ms. Selma Aparecida Cesarin
Unidade A relação entre Alfabetização e Letramento e os
Gêneros Textuais
Thinkstock/Getty Images
• Introdução
• Letramento e Alfabetização
• Os Gêneros Textuais
Esta Unidade tem por objetivo principal favorecer o entendimento dos conceitos
de alfabetização e de letramento e a relação que existe entre eles.
Pretende, ainda, contribuir para a compreensão do conceito de gêneros textuais e
sua importância na apropriação da cultura escrita pelas crianças.
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Unidade: A relação entre Alfabetização e Letramento e os Gêneros Textuais
Contextualização
Foi a partir da década de 1980 que surgiram no Brasil as primeiras discussões sobre o conceito
de letramento em relação ao de alfabetização.
Embora recentes, as primeiras ideias sobre esse conceito vêm sendo reformuladas, em função
da necessidade de considerarmos a multiplicidade de práticas de leitura e de escrita requeridas
no mundo contemporâneo.
Nesta Unidade, portanto, você terá a oportunidade de entender o estado atual das discussões
sobre alfabetização e letramento.
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Introdução
Letramento e Alfabetização
O termo letramento foi utilizado no Brasil pela primeira vez na década de 1980, no livro No
mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística, da linguísta Mary Kato.
Já a distinção entre alfabetização e letramento foi feita pela primeira vez por Leda Tfouni, em
1988, no livro Adultos não alfabetizados: o avesso do avesso, de sua autoria.
Mary Kato
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Unidade: A relação entre Alfabetização e Letramento e os Gêneros Textuais
Leda Tfouni
Possui graduação em Letras Anglo Germânicas pela Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho (1964), é Master Of Arts In Language Acquisition –
University of California (1979), doutora em Linguística pela Universidade Estadual
de Campinas (1984) e livre-docente e associada pela Universidade de São Paulo.
Atualmente, é professora titular sênior da Universidade de São Paulo em Ribeirão
Preto. Realizou estágio de pós-doutorado em duas ocasiões na Université de
la Sorbonne Nouvelle, com Jacqueline Authier, e também na Universidade de
Bologna, com Carlo Ginsburg. Atua na pós-graduação nas áreas de letramento,
análise do discurso, autoria, psicanálise lacaniana, genéricos discursivos. Tem
formação em psicanálise. É pesquisadora do CNPq.
Disponível em: <https://uspdigital.usp.br/tycho/CurriculoLattesMostrar?codpub=37A0B65C4923>.
De acordo com Piccoli e Camini (2012), Paulo Freire não utilizou o termo letramento e, ao
utilizar o conceito de alfabetização, fez isso de um modo tão amplo que suas ideias englobavam
e superavam o que hoje se denomina letramento.
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A discussão que fez tinha a ver com a consciência crítica das pessoas em relação à realidade,
tendo em vista a transformação. Além disso, ele questionou a alfabetização como técnica
mecânica, voltada à decodificação.
Emília Ferreiro, também conforme Piccoli e Camini (2012), não usou o termo letramento.
Preferiu utilizar o termo “cultura escrita” para a tradução de literacy, utilizando o argumento que
o contato com essa cultura desencadeia a alfabetização, “já que a participação da criança em
contextos sociais nos quais a língua escrita é produzida e interpretada ocorreria muito antes do
ensino formal e sistemático realizado na escola” (PICCOLI; CAMINI, 2012, p.17-8).
Emilia Ferreiro
Nenhum nome teve mais influência sobre a educação brasileira nos últimos 30
anos do que o da psicolinguista argentina Emilia Ferreiro. A divulgação de seus
livros no Brasil, a partir de meados dos anos 1980, causou grande impacto sobre
a concepção que se tinha do processo de alfabetização, influenciando as próprias
normas do governo para a área, expressas nos Parâmetros Curriculares Nacionais.
As obras de Emilia – Psicogênese da Língua Escrita é a mais importante
– não apresentam nenhum método pedagógico, mas revelam os processos de
aprendizado das crianças, levando a conclusões que puseram em questão os
métodos tradicionais de ensino da leitura e da escrita. “A história da alfabetização
pode ser dividida em antes e depois de Emilia Ferreiro”, diz a educadora Telma
Weisz, que foi aluna da psicolinguista.
Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/alfabetizacao-inicial/estudiosa-revolucionou-
alfabetizacao-423543.shtml>.
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Unidade: A relação entre Alfabetização e Letramento e os Gêneros Textuais
De acordo com essa autora, a alfabetização vai além dos anos iniciais da escolarização, pois
implica continuidade.
Ou, segundo Piccoli e Camini:
Foi nesse contexto que Freire e Ferreiro contribuíram para que houvesse uma conceitualização
ampla de alfabetização. No entanto, acabaram por provocar certo apagamento da alfabetização
(PICCOLI; CAMINI, 2012, p.19).
Magda Soares (2004) chamou esse movimento de desinvenção da alfabetização, que foi
provocado pelas abordagens psicogenéticas e pelo surgimento do conceito de letramento.
Sem minimizar os legados desse estudo, Soares (2004, p. 11) aponta como a perspectiva
psicogenética contribui para a “desinvenção” da alfabetização: ao privilegiar “a faceta psicológica
da alfabetização, obscureceu-se sua faceta linguística: fonética e fonológica”.
Essa última assertiva poderia também ser posicionada como um dos efeitos produzidos pelo
letramento, como se as crianças pudessem aprender a ler e a escrever apenas por estarem
imersas na cultura escrita, não sendo necessário o ensino sistemático, planejado e executado
pelos professores.
Longe de querermos encontrar os culpados ou dizer que houve uma distorção das teorias, esta
breve exposição quer entender as implicações pedagógicas desses movimentos, uma das quais
é sinalizar que as facetas linguísticas da alfabetização não podem sucumbir face à hegemonia do
letramento (PICCOLI; CAMINI, 2012, p.19-20).
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A alfabetização na perspectiva construtivista é concebida como um processo de
construção conceitual, contínuo, iniciado muito antes de a criança ir para a escola,
desenvolvendo-se simultaneamente dentro e fora da sala de aula. Alfabetizar é
construir conhecimento. Portanto, para ensinar a ler e escrever, faz-se necessário
compreender que os/as alfabetizando/as terão de lidar com dois processos paralelos,
nos quais a criança procura ativamente compreender a natureza da linguagem
que se fala à sua volta, e tratando de compreendê-la, formula hipóteses, busca
regularidades, coloca à prova suas antecipações e cria sua própria gramática e, ao
tomar contato com os sistemas de escrita, a criança, mediante processos mentais,
praticamente reinventa esses sistemas, realizando um trabalho concomitante de
compreensão da construção e de suas regras de produção/decodificação.
Segundo Emilia Ferreiro e Ana Teberosky, as crianças elaboram conhecimentos
sobre a leitura e escrita, passando por diferentes hipóteses – espontâneas e
provisórias – até se apropriar de toda a complexidade da língua escrita. Tais
hipóteses, baseadas em conhecimentos prévios, assimilações e generalizações,
dependem das interações delas com seus pares e com os materiais escritos que
circulam socialmente.
Estas hipóteses estão descritas em seu livro A Psicogênese da Língua Escrita.
Para a Teoria da Psicogênese, toda criança passa por níveis estruturais da linguagem
escrita até que se aproprie da complexidade do sistema alfabético. São eles: o pré-
silábico, o silábico, que se divide em silábico-alfabético, e o alfabético. Tais níveis
são caracterizados por esquemas conceituais que não são simples reproduções
das informações recebidas do meio; ao contrário, são processos construtivos nos
quais a criança leva em conta parte da informação recebida e introduz sempre
algo subjetivo. É importante salientar que a passagem de um nível para o outro é
gradual e depende muito das intervenções feitas pelo/a professor/a.
Fonte: GIUBERTTI, Adriana Maria. A Formação de Professores em Psicogênese da Linguagem Escrita.
Disponível em: <http://portal.mte.gov.br/data/files/FF8080812D5CA2D3012D60ABEEBD1540/formacao_professores_
psicogenes_linguagem_escrita.pdf>.
É nesse cenário que Magda Soares defende a “reinvenção” do processo de alfabetização para
que este tenha um novo lugar. Ela diz ser necessário diferenciar alfabetização de letramento,
pois esses fazem referência a processos de aprendizagem distintos, sem haver independência e
precedência de um processo em relação ao outro (PICCOLI; CAMINI, 2012, p.20).
Na perspectiva dessa estudiosa, seria preferível conservar ambos os termos – alfabetização
e letramento – por meio do reconhecimento das várias facetas de cada um: para o letramento,
a imersão das crianças na cultura escrita, a participação em experiências variadas com a leitura
e a escrita, o conhecimento e a interação com diferentes tipos de gêneros e material escrito; para
a alfabetização, a consciência fonológica, a identificação das relações fonema-grafema, as
habilidades de codificação e decodificação da língua escrita, o conhecimento e o reconhecimento
dos processos de tradução da forma sonora da fala para a forma gráfica da escrita.
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Unidade: A relação entre Alfabetização e Letramento e os Gêneros Textuais
Das relações entre essas facetas, com origens em processos diferentes, emerge então a ideia
de alfabetizar em um contexto de letramento, ou de “alfabetizar letrando”, como vem circulando
amplamente (PICCOLI; CAMINI, 2012, p.20)
Magda Soares
Professora emérita da Faculdade de Educação (FAE) da Universidade Federal
de Minas Gerais (UFMG), pesquisadora do Centro de Alfabetização, Leitura e
Escrita (Ceale), é um dos maiores nomes na área de alfabetização e letramento,
com ênfase em ensino-aprendizagem. Além de sua inquestionável importância
no cenário acadêmico, há 7 anos, a especialista atua como consultora da rede
municipal de educação da cidade mineira de Lagoa Santa, onde desenvolve
um intenso trabalho ligado à formação de professores da rede pública. Entre
seus livros, destacam-se os teóricos Alfabetização e letramento (São Paulo:
Contexto, 2004); Português: uma proposta para o letramento (São Paulo:
Moderna, 2002); Letramento: um tema em três gêneros (Belo Horizonte:
Autêntica, 1998) e o autobiográfico Metamemória, memórias: travessia de
uma educadora (São Paulo: Cortez, 1991).
Disponível em: <http://www.plataformadoletramento.org.br/em-revista-entrevista-detalhe/393/magda-soares-discute-
como-mediar-o-processo-de-aprendizagem-da-lingua-escrita.html>.
Para nós, o uso do termo letramento vai além das propostas meramente escolares, como
ler um texto e, em seguida, responder questões sobre ele. Tem a ver com os usos sociais
que fazemos da leitura e da escrita nas diversas esferas sociais, como, por exemplo: na esfera
doméstica, fazer uma lista dos produtos a serem comprados para casa, antes mesmo de ir a um
supermercado; na esfera do trabalho, apresentar oralmente um projeto novo; na esfera religiosa,
participar da discussão de um texto bíblico etc.
Apresentado esse contexto, importa agora destacar que as abordagens mais recentes sobre
esse tema, as quais têm reconhecido a existência de letramentos (no plural) e a necessidade,
portanto, de a escola trabalhar a leitura e a escrita, tendo em vista as exigências do mundo
contemporâneo em relação às capacidades de ler e de escrever.
Conforme Rojo: “um dos objetivos principais da escola é justamente possibilitar que seus
alunos possam participar das várias práticas sociais que se utilizam da leitura e da escrita
(letramentos) na vida da cidade, de maneira ética, crítica e democrática” (ROJO, 2009,
p.107-8).
Para fazê-lo, é preciso que a educação linguística leve em conta, hoje, de maneira ética e
democrática:
a) os multiletramentos ou letramentos múltiplos, deixando de ignorar ou apagar os
letramentos das culturas locais de seus agentes (professores, alunos, comunidade escolar)
e os colocando em contato com os letramentos valorizados e institucionais; como diria
Souza Santos (2005), assumindo seu papel cosmopolita;
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b) os letramentos multissemióticos exigidos pelos textos contemporâneos, ampliando a
noção de letramento para o campo da imagem, da música, das outras semioses e sistemas
de signos que não somente a escrita alfabética. O conhecimento e as capacidades relativas
a outros meios semióticos estão ficando cada vez mais necessários no uso da linguagem,
tendo em vista os avanços tecnológicos: as cores, as imagens, os sons, o design etc. que estão
disponíveis na tela do computador e em muitos materiais impressos que têm transformado
o letramento tradicional (da letra/livro) em um tipo de letramento insuficiente para dar
conta dos letramentos necessários para agir na vida contemporânea (MOITA-LOPES &
ROJO, 2004);
c) os letramentos críticos e protagonistas requeridos para o trato ético dos discursos em
uma sociedade saturada de textos e que não pode lidar com eles de maneira instantânea,
amorfa e alienada; como afirmam Moita-Lopes & Rojo (2004, p. 37-8), é preciso levar em
conta o fato de que a linguagem não ocorre em um vácuo social e que, portanto, textos
orais e escritos não têm sentido em si mesmos, mas interlocutores (escritores e leitores, por
exemplo) situados no mundo social com seus valores, projetos políticos, histórias e desejos
constroem seus significados para agir na vida social. Os significados são contextualizados.
Essa compreensão é extremamente importante no mundo altamente semiotizado da
globalização, vez que possibilita situar os discursos a que somos expostos e recuperar
sua situacionalidade social ou seu contexto de produção e interpretação: quem escreveu,
com que propósito, onde foi publicado, quando, quem era o interlocutor projetado etc.
Tal teorização tem uma implicação prática, porque possibilita trabalhar em sala de aula
com uma visão de linguagem que fornece artifícios para os alunos aprenderem, na prática
escolar, a fazer escolhas éticas entre os discursos em que circulam. Isso possibilita aprender
a problematizar o discurso hegemônico da globalização e os significados antiéticos que
desrespeitem a diferença (ROJO, 2009, p.107-8).
Essa nova forma de entender o conceito de letramento tenta, portanto, abarcar as mudanças
atuais nas práticas de leitura e escrita em relação aos diversos contextos e às esferas nas quais
elas ocorrem.
Os textos, por exemplo, com os quais lidamos são constituídos não apenas por linguagem
verbal, mas por imagem, recursos gráficos diversos, sons etc., o que faz com que eles sejam
considerados multimodais.
Nesse contexto, convocamos o conceito de gêneros textuais, pois a nosso ver contribui para
repensar o modo como as práticas sociais devem ser incorporadas às propostas desenvolvidas na
escola, favorecendo o contato da criança com a diversidade de textos que circulam socialmente.
É isso que veremos no item a seguir.
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Unidade: A relação entre Alfabetização e Letramento e os Gêneros Textuais
Os Gêneros Textuais
Conforme Pannuti (2012, p.43), a escrita é socialmente contextualizada, ou seja, seus
sentidos não residem nas palavras escritas, mas no contexto em que se inserem. Assim, como
usamos diferentes tipos de roupas em diferentes ocasiões, os textos também apresentam sentidos
diversos, variando de acordo com os contextos.
Nesse sentido, assim como em muitas situações, não basta estar vestido, é preciso estar
vestido adequadamente; com a escrita, acontece a mesma coisa: não basta escrever, é preciso
aprender a escrever (e ler) diferentes textos que se adéquam a diferentes situações.
Partindo dessa citação, é possível depreender o conceito dos gêneros textuais que está
intimamente relacionado ao contexto em que é utilizado e indica os diferentes textos com os
quais lidamos de acordo com os propósitos comunicativos a cada situação.
De acordo com Rita Jover-Faleiros, da Revista Nova Escola, as reflexões feitas por Bakhtin
ajudam a entender que os gêneros textuais se definem em virtude de sua função social.
Nas palavras dessa autora, os gêneros são textos que se realizam por uma (ou mais de uma)
razão determinada em uma situação comunicativa (um contexto) para promover uma interação
específica.
Trata-se de unidades definidas por seus conteúdos, suas propriedades funcionais, estilo e
composição organizados em razão do objetivo que cumprem na situação comunicativa.
Explicando melhor: isso significa que, a cada vez que produzo um texto, seleciono um gênero...
Isso vale das trocas mais prosaicas do cotidiano, nos bilhetes registrados em post-its colados
nas geladeiras, passando pelas mensagens eletrônicas, entrevistas (orais e escritas), bulas de
remédio, orações, cordéis, dissertações, romances, piadas etc.
Uma das principais características dos gêneros é o fato de serem enunciados que apresentam
relativa estabilidade. É esse aspecto que permite, justamente, que sejam compreendidos.
Um exemplo extremo disso está no gênero “bula de remédio”. Nos idos anos 1980, a linguista
francesa Sophie Moirand mostrou como a estabilidade desse tipo de enunciado permitiria que
qualquer falante do francês sem conhecimento nenhum de grego pudesse localizar informações
(nome comercial, princípio ativo e posologia, por exemplo).
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Mikhail Bakhtin, o filósofo do diálogo
Ao analisar o discurso na arte e na vida, o russo revolucionou a teoria linguística
no século 20. Mikhail Bakhtin dedicou a vida à definição de noções, conceitos e
categorias de análise da linguagem com base em discursos cotidianos, artísticos,
filosóficos, científicos e institucionais. Em sua trajetória, notável pelo volume de
textos, ensaios e livros redigidos, esse filósofo russo não esteve sozinho. Foi um
dos mais destacados pensadores de uma rede de profissionais preocupados com
as formas de estudar linguagem, literatura e arte, que incluía o linguista Valentin
Voloshinov (1895-1936) e o teórico literário Pavel Medvedev (1891-1938).
Um dos aspectos mais inovadores da produção do Círculo de Bakhtin, como
ficou conhecido o grupo, foi enxergar a linguagem como um constante processo
de interação mediado pelo diálogo – e não apenas como um sistema autônomo.
“A língua materna, seu vocabulário e sua estrutura gramatical, não conhecemos
por meio de dicionários ou manuais de gramática, mas graças aos enunciados
concretos que ouvimos e reproduzimos na comunicação efetiva com as pessoas
que nos rodeiam”, escreveu o filósofo.
Segundo essa concepção, a língua só existe em função do uso que locutores (quem
fala ou escreve) e interlocutores (quem lê ou escuta) fazem dela em situações
(prosaicas ou formais) de comunicação. O ensinar, o aprender e o empregar a
linguagem passam necessariamente pelo sujeito, o agente das relações sociais e
o responsável pela composição e pelo estilo dos discursos. Esse sujeito se vale
do conhecimento de enunciados anteriores para formular suas falas e redigir
seus textos. Além disso, um enunciado sempre é modulado pelo falante para
o contexto social, histórico, cultural e ideológico. “Caso contrário, ele não será
compreendido”, explica a linguista Beth Brait, estudiosa de Bakhtin e professora
associada da Universidade de São Paulo (USP) e da Pontifícia Universidade
Católica (PUC), ambas na capital paulista.
Nessa relação dialógica entre locutor e interlocutor no meio social, em que o verbal
e o não-verbal influenciam de maneira determinante a construção dos enunciados,
outro dado ganhou contornos de tese: a interação por meio da linguagem se
dá num contexto em que todos participam em condição de igualdade. Aquele
que enuncia seleciona palavras apropriadas para formular uma mensagem
compreensível para seus destinatários. Por outro lado, o interlocutor interpreta e
responde com postura ativa àquele enunciado, internamente (por meio de seus
pensamentos) ou externamente (por meio de um novo enunciado oral ou escrito).
Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/filosofo-dialogo-487608.shtml>.
Defendemos o uso dos gêneros no trabalho a ser desenvolvido com a linguagem desde as séries
iniciais, porque essa é uma forma de alfabetizar-letrando, como comentamos no item anterior
e contribuir para que as crianças tenham acesso, desde cedo, às práticas contemporâncias da
leitura e da escrita.
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Unidade: A relação entre Alfabetização e Letramento e os Gêneros Textuais
Segundo Pannuti (2012, p.45), ao desenvolverem habilidades para participar dessas práticas,
por meio da aprendizagem dos gêneros, as crianças ganham condições de se experimentarem
usuárias da língua e participantes ativas da cultura.
Outro ganho que o trabalho com os gêneros nos traz é levar para a escola o contexto ao qual
fazem parte. Mas para que isso aconteça, devem ser tomados não apenas como objeto de ensino
e de aprendizagem, mas também como objetos a comunicar. Em outras palavras: os gêneros
devem ser utilizados na escola em conformidade com os usos que fazemos deles socialmente,
favorecendo, assim, o desenvolvimento de comportamentos leitores e escritores diversos.
Destacamos, por fim, de acordo com Pannuti, que:
Vivemos numa Sociedade que vai se tornando cada vez mais centrada na
escrita e que exige de seus falantes saber praticá-la. Com isso, defrontamo-nos,
constantemente, com uma reflexão sobre o uso da língua escrita na vida e na
sociedade e sobre a questão da inclusão ou exclusão que os indivíduos sofrem em
virtude desse uso.
Sendo a linguagem o “caminho de invenção da cidadania” (FREIRE, 1993, p.41),
é comum a preocupação sobre como isso acontece no Brasil, tendo em vista que
participamos de uma sociedade que tem a linguagem como “arame farpado mais
poderoso para bloquear o acesso ao poder” (GNERRE, 1985) e, por extensão,
à vida social. Afinal, é na linguagem, pela linguagem e com a linguagem que o
homem produz mundos e nele se produz, havendo um destaque para o uso social
da palavra nesse contexto.
Ao se falar em linguagem, logo a escrita emerge para o estudo e o tema da
alfabetização entra em campo. Sabemos que apenas decodificar palavras é
insuficiente para a participação em práticas sociais que envolvem a língua escrita, é
necessário algo mais: saber utilizar a leitura e a escrita de acordo com as contínuas
exigências sociais. Esse algo mais é o que se vem designando letramento.
O letramento é um tema que se torna relevante como passaporte para o pleno
exercício da cidadania, e, consequentemente, da inclusão social. Destacaremos aqui
uma forma que acreditamos ser a mais fértil para alcançar esse letramento: uso dos
gêneros em sala de aula. Segundo Silva (2008b), conhecer os gêneros do discurso é
um imperativo se queremos efetivar práticas de letramento em nossa vida, vez que
todo texto que lemos ou produzimos pertence a um determinado gênero.
Fonte: SILVA, Vanessa Souza da. Letramento e ensino de gêneros.
Disponível em: <http://www.ufjf.br/revistaedufoco/files/2012/08/Texto-011.pdf>.
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Material Complementar
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Unidade: A relação entre Alfabetização e Letramento e os Gêneros Textuais
Referências
JOVER-FALEIROS, Rita. O conceito de gênero textual e seu uso em aula. Revista Nova
Escola. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-2/conceito-genero-
textual-seu-uso-aula-735561.shtml?page=2>. Acesso em: 5 nov. 2014.
PANNUTI, Daniela. Interações: encontros de leitura e escrita. Maria Cristina Carapeto Lavrador
Alves (org.). São Paulo: Blucher, 2012. (Coleção InterAções).
ROJO, Roxane. Letramentos Multiplus, Escola e Inclusão Social. São Paulo: Parábola
Editorial, 2009.
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Anotações
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