A Arte Do Azulejo em Portugal Nos Seculo

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32 ART IS ON edição especial special issue n.

º 6 2018

A ARTE DO AZULEJO EM PORTUGAL


NOS SÉCULOS XVII-XVIII:
À (RE)DESCOBERTA DOS SEUS MESTRES
THE ART OF THE TILE IN PORTUGAL IN THE
SEVENTEENTH AND EIGHTEENTH CENTURIES:
(RE)DISCOVERYING ITS MASTERS
Miguel Portela
Investigador
[email protected]

RESUMO
Pretendemos, com este estudo, dar a conhecer elementos da maior relevância para o percurso da vida e
obra de alguns mestres ligados à arte da azulejaria em Portugal, em particular, dos ladrilhadores António de
Abreu, Domingos da Cruz, Manuel da Mata, Pedro de Almeida, Matias Batista Lisboa, Dionísio de Araújo,
e dos oleiros Manuel dos Santos e Miguel de Azevedo.
Procuraremos, ainda, elencar documentos que nos permitem traçar o seu percurso familiar, assim como
alguns acontecimentos do seu caminho profissional e artístico, entre o final do século XVII e as primeiras
décadas do século XVIII.
Por fim, propomo-nos, através de um conjunto de novos dados, alargar o conhecimento sobre estes mestres
ladrilhadores, oleiros e pintores de louça no contexto do Ciclo dos Mestres, firmando e dando consistência e
rigor aos elementos elencados que nos permitiram (re)descobrir a arte da azulejaria em Portugal nesse período.

PALAVRAS-CHAVE
Azulejo l Ladrilhador l Oleiro l Pintor de louça

ABSTRACT
In this study, we intend to present the most relevant elements concerning the life and work of some of the
masters associated with the art of tiling in Portugal, in particular the tilers António de Abreu, Domingos da
Cruz, Manuel da Mata, Pedro de Almeida, Matias Batista Lisboa, Dionísio de Araújo, and the potters Manuel
dos Santos and Miguel de Azevedo.
We will also seek to list documents that allow us to trace their family’s history as well as some events of
their professional and artistic path between the end of the seventeenth century and the first decades of the
eighteenth century.
Finally, through a set of new data, we propose to broaden the knowledge about these masters tilers, potters
and crockery painters in the context of the Masters’ Cycle, establishing and giving coherence and accuracy
to the elements that have allowed us to (re)discover the art of tiling in Portugal during this period.

KEYWORDS
Tile l Tiler l Potter l Crockery painter
n.º 6 2018 Quem Faz o Quê: Processos Criativos Em Azulejo WHO DOES WHAT: CREATIVE PROCESSES IN AZULEJO 33

INTRODUÇÃO

Entre o final do século XVII e as primeiras décadas do Santos (Portela, 2016c: 21), e dos ladrilhadores Fran-
século XVIII assistiu-se, em Portugal, a uma renovação cisco dos Santos2 (Portela, 2016a), Manuel Clemente
artística de um número significativo de edifícios religio- (Portela, 2016d: 124-125) e Manuel da Silva (Portela,
sos, públicos e civis. A arte portuguesa, nessa época, 2016b: 8-9), bem como documentar algumas obras
conheceu um significativo florescimento de diversos por eles executadas que, em alguns casos, estavam
ofícios, muito em particular dos vidreiros, pintores, atribuídas a outros artistas.
escultores, entalhadores, ladrilhadores, azulejadores,
pintores de louça, entre tantos outros.1 Procuraremos seguidamente, e através de um conjunto
de novos dados, revisitar a biografia de alguns artistas
Nesse período realça-se um gosto por um envolvi- ligados à arte da azulejaria portuguesa, alargando o
mento decorativo mais exuberante, interagindo de conhecimento e divulgando elementos do percurso da
forma única e sublime o azulejo com a pintura e com vida e obra desses artistas, em particular dos ladrilha-
a talha, culminando todo o processo criativo na desig- dores António de Abreu, Domingos da Cruz, Manuel
nada obra de arte total, tendo os pintores aduzido às da Mata, Pedro de Almeida, Matias Batista Lisboa,
suas obras uma original espontaneidade na aplica- Dionísio de Araújo, e dos oleiros Manuel dos Santos
ção mais desprendida e pictural das gravuras. e Miguel de Azevedo.

Investigar a azulejaria portuguesa nas mais diversas Este estudo apresenta novas linhas de investigação
formas e componentes implica, antes de mais, reco- no que à genealogia destes artistas diz respeito,
nhecer esta arte na sua relevância e especificidade tendo sido possível traçar o seu perfil familiar de uma
mais ampla e alargá-la, quer na História da Arte, forma precisa. A informação que aqui se publica
quer em outros ramos do saber, numa dimensão tem múltiplas implicações, principalmente ao nível
multidisciplinar. das parcerias de trabalho em diversas empreitadas
artísticas, não só entre elementos ligados à arte do
Tivemos a oportunidade de, numa ampla investiga- azulejo, mas também a um conjunto de indivíduos
ção sobre fontes documentais modernas, efetuada ao ligados a outras dinâmicas artísticas, nomeadamente,
longo dos últimos anos, sobre a região estremenha, a pintores, entalhadores, etc.
recolher um grande número de documentos históricos.
Neste contexto, foi realizada uma árdua pesquisa,
sobretudo no que respeita à vida económica, admi-
nistrativa, social e religiosa dos seus moradores, exis-
tente em vários arquivos.

Como resultado dessa investigação, foi-nos possível


dar a conhecer novos dados genealógicos e reconsti-
tuir as biografias do pintor de azulejos, Teotónio dos

1. Seja-nos permitido referenciar Vítor Serrão, que nos dá uma visão, ainda que sucinta, da importância da azulejaria no contexto da arte
portuguesa (Serrão, 2003: 209-225). Com a obra Revestimentos Cerâmicos Portugueses. Meados do século XIV à primeira metade
do século XVI, a problemática da cerâmica do azulejo em Portugal ganhou uma nova dinâmica, dimensão e alcance, abrindo novas
abordagens e caminhos no campo da investigação (Trindade, 2007). De idêntico modo, atente-se no alcance da linguagem brutesca
na azulejaria portuguesa e dos seus mais diversos interlocutores, nomeadamente, pintores-brutescadores e azulejadores (Serrão, 2012:
183-200), assim como das relações artísticas entre pintores a óleo e de azulejo (Flor, 2011: 291-307). Veja-se também o enquadra-
mento do estado da arte do azulejo em (Carvalho, 2012: 18-53) e, sobre o Ciclo dos Mestres, vejam-se as várias considerações com
a respetiva bibliografia analisada e documentada por (Carvalho, 2012: 334-361).
2. Tenhamos presente que Francisco dos Santos surge no contrato celebrado em 22 de abril de 1718 com os oficiais da Confraria de
Nossa Senhora da Conceição de Peniche designado como mestre pintor de azulejos (Portela, 2016a).
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O OLEIRO MANUEL DOS SANTOS


2

Manuel dos Santos3, filho do mestre oleiro João Fran- No matrimónio de Domingos Gonçalves11 com Fran-
cisco4 e de sua primeira mulher Cipriana Luís, foi bati- cisca dos Santos, celebrado em 29 de dezembro de
zado em 10 de novembro de 1658, na paróquia de 1697, Manuel dos Santos surge arrolado como oficial
Santa Catarina em Lisboa.5 Deste casamento nasceu de oleiro, juntamente com Lucas da Costa, também
Benta Maria,6 cujo batismo foi celebrado em 3 de oleiro.12
fevereiro de 1662. Cipriana Luís7 veio a falecer na
rua defronte de São Bento, poucos meses depois do Conhecemos ainda um segundo Manuel dos Santos,
nascimento desta filha, em 4 de dezembro de 1662. pintor de loiça, morador ao pé de Nossa Senhora
do Monte, na freguesia dos Anjos,13 que entrou na
No ano seguinte, em 8 de abril de 1663, o entretanto Irmandade de Nossa Senhora da Doutrina da Igreja
viúvo João Francisco8 contraiu matrimónio com Maria de S. Roque em 22 de abril de 1686 (Coutinho e
Gomes, filha de Pedro Mendes e Isabel Marques, natu- Ferreira, 2014: 217). Em 21 de março de 1703,
ral de Porto de Brandão. Constatamos, também, que Manuel dos Santos14 figura como oleiro, morador na
Maria Gomes9 faleceu em 26 de janeiro de 1683 e freguesia dos Anjos em Lisboa, tendo ficado registado
João Francisco,10 novamente viúvo, em 19 de agosto enquanto testemunha no casamento de Benedito Bino,
de 1686. natural de Génova, com Teresa de Jesus.

3. Os documentos que referiremos relativos à genealogia do oleiro Manuel dos Santos encontram-se publicados (Portela, 2017: 9). Não
devemos confundir Manuel dos Santos, oleiro, com um seu homónimo, D. Manuel dos Santos, pintor espanhol, o qual exerceu a sua
atividade em Portugal na primeira metade do século XVIII, tendo falecido em 26 de janeiro de 1757, enquanto morador na calçada de
Santa Ana na freguesia da Pena, em Lisboa. Arquivo Nacional da Torre do Tombo (A.N.T.T.), Arquivo Distrital de Lisboa (A.D.L.), Livro
de Óbitos da Paróquia da Pena [1743-1762], Livro O6, Caixa n.º 29, assento n.º 4, fl. 102. De igual modo, não deve ser confundido
o referido Manuel dos Santos, oleiro, com um seu outro homónimo Manuel dos Santos, pintor, casado com Luísa Francisca, que entrou
na Irmandade de S. Lucas em 22 de outubro de 1702 (Teixeira, 1931: 76) e que já era falecido em 1723, inviabilizando a possibili-
dade de ser este pintor aquele que pintou, por exemplo, os azulejos da Igreja da Misericórdia de Olivença. Sobre o pintor de azulejos
Manuel dos Santos destacamos o relevante estudo de José Meco (1980: 75-158), assim como a análise feita à sua obra por Rosário
Salema de Carvalho (2012: 302-314). Sobre a dificuldade de identificação entre os vários pintores com o nome de Manuel dos Santos,
veja-se ainda (Flor e Flor, 2016: 152-154).
4. Não devemos confundir este João Francisco com um seu homónimo casado com Catarina Lopes, o qual vivia em 1674 na Rua de
Marcos Marreiros, em Santa Catarina (Coutinho et al., 2011: 40-41), nem com outro seu homónimo casado com Faustina Maria,
que faleceu por volta de 1732 e que era pai de Agostinho dos Santos, Bartolomeu de Assunção e Antónia Maria, o qual viveu em
Santos-o-Velho (Mangucci, 1996: 163). Vergílio Correia, em 1918, referiu em relação ao oleiro que nos ocupa e à Olaria da Travessa
de Bento da Silva, em Santa Catarina (2.ª Travessa dos Poiaes) que “Em 1670 encontramos estabelecido na sua olaria «defronte da
Orta de S. Bento», a João Francisco, oleiro, em cuja casa vivem tres empregados. Em 1663, o Rol de Santa Catarina menciona-o como
morando, mais os seus cinco oficiaes, à frontaria de S. Bento, logo a seguir a Travessa do Oleiro. Em 1677 e 1680 o local onde habita
é designado pela Travessa de Bento da Silva, a segunda da rua dos Poiaes” (Correia, 1918: 177-178). Estes dados fornecidos por
Vergílio Correia, em 1918, são comprovados com os dados recolhidos no Rol dos Confessados da paróquia de Santa Catarina publi-
cados por (Coutinho et al., 2011: 3-62), permitindo asseverar a veracidade de que o oleiro João Francisco que tratamos é o mesmo a
que se refere Vergílio Correia.
5. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia de Santa Catarina [1648-1674], Livro B5, Caixa n.º 4, assento n.º 7, fl. 72v.
6. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia de Santa Catarina [1648-1674], Livro B5, Caixa n.º 4, assento n.º 4, fl. 105.
7. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia de Santa Catarina [1652-1674], Livro O5, Caixa n.º 54, assento n.º 3, fl. 58v.
8. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1659-1672], Livro C3, Caixa n.º 33, assento n.º 1, fl. 41.
9. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia de Santa Catarina [1652-1674], Livro O5, Caixa n.º 54, assento n.º 5, fl. 70.
10. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia de Santa Catarina [1652-1674], Livro O5, Caixa n.º 54, assento n.º 4, fl. 100.
11. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Anjos [1692-1719], Livro C3, Caixa n.º 24, assento n.º 1, fl. 99.
12. Importa referir a existência de um oleiro de loiça pintada de nome Manuel dos Santos, morador no Mocambo, em Santos-o-Velho, que
figurou como testemunha no testamento de Manuel Nunes Guizado, também este oleiro de loiça pintada (Simões, 2002: 80-82). Este
oleiro assinou o referido testamento de cruz pelo que não corresponde aos já aludidos seus homónimos, o pintor Manuel dos Santos,
ou mesmo ao oleiro Manuel dos Santos, que vimos referindo. É de salientar que no seu estudo sobre as Olarias de Louça e Azulejo
da Freguesia de Santos-o-Velho, Celso Mangucci não refira em momento algum a presença de Manuel dos Santos nessa freguesia no
período em estudo (Mangucci, 1996).
13. Em 3 de maio de 1704, Miguel de Azevedo, cunhado de Manuel dos Santos era morador ao Pé do Monte, na freguesia dos Anjos,
sendo então testemunha no casamento de Manuel Ferreira com Maria da Costa. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de
Santos-o-Velho [1696-1706], Livro C6, Caixa n.º 40, assento n.º 3, fls. 115-115v.
14. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1695-1707], Livro C6, Caixa n.º 34, assento n.º 1, fl. 208v.
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Fig. 01· Vista da cidade de Lisboa (Lisbone, ville capitale du Royaume de Portugal située a Iª embouchure du Tage / gravee par Aveline),
Pierre Aveline, 1656-1722 (fot. de Biblioteca Nacional de Portugal, e-1314-v.)

O testamento de Miguel de Azevedo, lavrado em 30 de Santos, que não só os teria realizado num espaço de
outubro de 1711, veio documentar o nome de “Vicente tempo muito curto como ensaiaria uma forma nova
Mendiz official delle Manoel dos Santos”, sendo este e mais pictural de expressão artística” (Meco, 1980:
referido nessa data como “Manoel dos Santos oleiro 144-145)16. Rosário Salema de Carvalho segue o
de louça vermelha”, o que nessa especialidade parece mesmo entendimento afirmando, ainda, e no que
distingui-lo do pintor de louça.15 concerne às molduras desses painéis, que as mesmas
estão associadas a revestimentos de António Pereira
Também devemos distinguir os oleiros de nome (Carvalho, 2012: 418). Na verdade, esses painéis de
Manuel dos Santos, do pintor de azulejos Manuel dos azulejos, assim como os da capela de Nossa Senhora
Santos. No que se refere aos painéis da capela-mor da Purificação, no mesmo templo, podem ter sido
da Igreja do Espírito Santo do Montijo, cuja data de executados por Manuel dos Santos, como tem sido
1708 se encontra assinalada numa das barras sobre proposto, pois sabemos que Manuel dos Santos,17
uma das portas laterais, José Meco afirma “com algu- morador nas olarias da cidade de Lisboa, se deslocou
mas reservas que estes painéis sejam de Manuel dos a esta igreja no dia 3 de junho de 1708, onde foi

15. Este testamento encontra-se citado por (Carvalho 2012: 97), e publicado por (Portela 2017d: 9).
16. Veja-se também, a sintetização dos elementos colhidos por Rosário Salema de Carvalho numa ficha resumo sobre a Igreja do Espírito
Santo no Montijo no anexo B da sua tese (Carvalho, 2012: 996-1000).
17. Arquivo Distrital de Setúbal, Livro de Batismos da Paróquia do Montijo [1688-1722], Cota 13/5913/6, assento n.º 4, fl. 148v,
“< Antonia > Aos trez de junho de setecentos e oito baptizei a pus os Santos oleos a Antonia filha de Joseph Pereira mareante e de
Ignes Cardoza sua molher. Padrinho Manoel dos Santos morador nas Olarias em Lisboa. (a) O Prior Antonio Catella”.
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padrinho de batismo de Antónia, filha de José Pereira ser aceite com algumas reservas dada a existência
e de Inês Cardosa. Contudo, a identificação desse de vários homónimos a trabalhar na mesma zona,
Manuel dos Santos, morador em 1708 nas olarias da conforme já referimos.
cidade de Lisboa, com o pintor de azulejos, deverá

O LADRILHADOR ANTÓNIO DE ABREU


18

António de Abreu, filho de António de Abreu e de sua filha de João Antunes e de Maria Francisca, tendo
mulher Maria de Almeida, foi batizado na Igreja de assistido nesse ato, como testemunhas, António Antu-
Nossa Senhora das Mercês, em 2 de julho de 1685.19 nes, ladrilhador, morador na rua do Pé de Ferro, em
António de Abreu era irmão de Pedro de Almeida, Santos-o-Velho, e António João, pedreiro, morador na
ladrilhador, e de José de Almeida, pintor, conforme rua das Partilhas.23 Deste matrimónio nasceu Marce-
documentamos neste estudo. lina, batizada em 13 de junho de 1703, e cujos
padrinhos foram Egídio Lestam e Maria Moreira.24
Em 5 de abril de 1701, António de Abreu surge
inscrito na Irmandade de Nossa Senhora da Doutrina Maria do Nascimento faleceria pouco tempo depois
da Igreja de São Roque em Lisboa, sendo arrolado do nascimento da filha Marcelina pelo que, em 29
como ladrilhador, morador na rua do Carvalho, nas de julho de 1705, António de Abreu contraiu novo
Mercês (Coutinho e Ferreira, 2014: 164). matrimónio com Maria do Ó, filha de João Rodrigues
Negrão e de Maria João.25 Deste casamento nasce-
A primeira referência a António de Abreu20 enquanto ram, entre outros filhos, António26, que foi batizado em
azulejador é-nos dada a conhecer num registo de 27 de abril de 1707, tendo assistido como padrinhos
batismo, datado de 16 de maio de 1697, de duas Manuel Antunes, pedreiro e Maria dos Santos mulher
irmãs gémeas, Maria e Teresa, filhas de dois escravos, de José Rodrigues Negrão; Pedro27, que foi batizado
as quais tiveram como padrinhos António de Abreu e em 11 de julho de 1709, tendo assistido como padri-
José de Almeida, pintor.21 De igual modo, em 9 de nho António Pereira, ladrilhador; Manuel,28 que foi
fevereiro de 1698, António de Abreu surge referen- batizado em 1 de maio de 1711, tendo assistido
ciado como ladrilhador no registo de casamento de como padrinho, Francisco dos Santos29, ladrilhador;
Manuel Ferreira com Margarida Salvador.22 Joana,30 que foi batizada em 8 de junho de 1713,
tendo assistido como padrinho Felipe de Souza, e
Constatamos que António de Abreu casou uma primeira ainda Roberto,31 que foi batizado em 3 de abril de
vez, em 14 de fevereiro de 1700, na igreja de Santa 1721, tendo assistido como padrinho, o já supra refe-
Catarina, em Lisboa, com Maria do Nascimento, rido Francisco dos Santos.

18. Tenhamos presente que António de Abreu surge nos anos de 1697 e 1711 designado como azulejador.
19. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia das Mercês [1622-1685], Livro B1, Caixa n.º 1, assento n.º 4, fl. 191v.
20. Os documentos que aqui apresentamos encontram-se publicados em (Portela, 2017b: 9).
21. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia das Mercês [1685-1746], Livro B2, Caixa n.º 2, assento n.º 3, fl. 68v.
22. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia das Mercês [1697-1761], Livro C2, Caixa n.º 20, assento n.º 1, fl. 6.
23. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1695-1700], Livro C6, Caixa n.º 34, assento n.º 1, fl. 122.
24. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia de Santa Catarina [1701-1721], Livro B8, Caixa n.º 4, assento n.º 4, fl. 29v.
25. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia das Mercês [1697-1761], Livro C2, Caixa n.º 20, assento n.º 2, fl. 44v.
26. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia das Mercês [1685-1746], Livro B2, Caixa n.º 2, assento n.º 7, fl. 124v.
27. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia das Mercês [1685-1746], Livro B2, Caixa n.º 2, assento n.º 4, fl. 137v.
28. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia de Santa Catarina [1701-1721], Livro B8, Caixa n.º 4, assento n.º 2, fl. 137v.
29. Relembramos que Pedro de Almeida, ladrilhador, irmão de António de Abreu, foi testamenteiro de Francisco dos Santos.
30. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia de Santa Catarina [1701-1721], Livro B8, Caixa n.º 4, assento n.º 5, fl. 165v.
31. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia de Santa Catarina [1721-1731], Livro B9, Caixa n.º 5, assento n.º 3, fl. 4. Roberto
veio a falecer em 24 de abril de 1725, A.N.T.T., A.D.L., Livro de óbitos da Paróquia de Santa Catarina [1721-1749], Livro O1, Caixa
n.º 54, assento n.º 3, fl. 24v.
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António de Abreu é referido em mais alguns atos Garcez e Serreat. / António de Abreu” (Carvalho,
paroquiais enquanto testemunha, surgindo arrolado 2012, 62). De igual modo, tenha-se em atenção o
como azulejador no registo casamento de Manuel da facto de António Abreu ter sido testemunha, em 24
Silva32 com Maria Josefa, celebrado em 14 de janeiro de novembro de 1712, de uma quitação de Catarina
de 1711, onde também figura como testemunha José Santos a José Ferreira de Araújo, este último repre-
Vicente, entalhador; e como ladrilhador no registo de sentado pelo cunhado António de Oliveira Bernardes,
casamento de José Caetano33 com Maria de Jesus, que se reporta a uma nota lavrada em 30 de abril de
celebrado em 26 de outubro de 1720. De idêntico 1698 (Carvalho, 2012: 62).
modo, António Abreu surge referido como testemunha
em alguns atos notariais, sobretudo num contrato de Em 1722, antes de falecer, António de Abreu recebeu
obrigação entre Nicolau Morum e o mestre pedreiro a encomenda do revestimento para a Igreja da Miseri-
Domingos António, celebrado em 5 de fevereiro de córdia de Salvador, no Brasil (Carvalho, 2012: 62).
1705, ou numa obrigação entre o carpinteiro António
João e Páscoa Francisca (Carvalho, 2012: 62). António de Abreu faleceu na rua do Almada, em 17
de julho de 1722, tendo sido sepultado no Convento
As relações estabelecidas entre diversos artistas de Nossa Senhora de Jesus, não tendo feito testa-
podem ser alargadas a pintores de outras modalida- mento.34 Maria do Ó, viúva, veio a falecer em 12 de
des, conforme se pode observar em documentação fevereiro de 1743, tendo sido sepultada no referido
lavrada em 13 de novembro de 1712, onde António Convento.35
de Abreu “surge envolvido numa complexa documen-
tação que se relaciona com António de Oliveira ladri- As relações familiares e profissionais dos irmãos
lhador e, eventualmente, com António de Oliveira ladrilhadores António de Abreu e Pedro de Almeida
Bernarde, e com a obra dos claustros do Convento são visíveis na presença de ambos, por exemplo,
de Jesus. Nessa data recebeu três mil réis: “Em dito num contrato de obrigação entre Nicolau Morum e
despendeu o dito síndico três mil reis / que tantos se o mestre pedreiro Domingos António, celebrado em
entregaram ao N. J. [I] António de Abreu / por conta 5 de fevereiro de 1705, onde António de Abreu e
do assento do azulejo que faz nos claustros e de como Pedro de Almeida surgem como testemunhas (Carva-
os recebeu assinou comigo / Padre Bento Francisco lho, 2012: 62).

O LADRILHADOR DOMINGOS DA CRUZ

Escassos são os elementos relativos a Domingos da da Igreja de São Roque em Lisboa, sendo arrolado
Cruz,36 o qual sabemos que residiu na Carreira dos como ladrilhador, morador à Carreira dos Cavalos,
Cavalos, freguesia dos Anjos, em Lisboa, onde veio nos Anjos (Coutinho e Ferreira, 2014: 164).
a falecer em 7 de julho de 1693, tendo sido casado
com Natália da Silva. Sabemos que Domingos da Cruz e Manuel Clemente,
ambos juízes do ofício de ladrilhador, e Domingos
Em 29 de abril de 1680, Domingos da Cruz surge Antunes, escrivão do mesmo ofício, figuram na carta
inscrito na Irmandade de Nossa Senhora da Doutrina de exame e aptidão passada por estes, em 10 de

32. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia das Mercês [1697-1761], Livro C2, Caixa n.º 20, assento n.º 2, fl. 70.
33. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1718-1724], Livro C8, Caixa n.º 35, assento n.º 1, fl. 72.
34. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia de Santa Catarina [1698-1724], Livro O7, Caixa n.º 55, assento n.º 2, fl. 166.
35. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia de Santa Catarina [1738-1753], Livro O9, Caixa n.º 55, assento n.º 5, fls. 71-71v.
36. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia dos Anjos [1687-1716], Livro O2, Caixa n.º 36, assento n.º 2, fl. 68. Após a sua morte,
Natália da Silva casa novamente, na paróquia dos Anjos, em 21 de agosto de 1694, com João Antunes, viúvo de Maria Josefa da
Encarnação, que havia falecido em 23 de dezembro de 1692 na freguesia de S. Sebastião da Pedreira. A.N.T.T., A.D.L., Livro de
Casamentos da Paróquia dos Anjos [1692-1719], Livro C3, Caixa n.º 24, assento n.º 1, fl. 40v.
38 ART IS ON edição especial special issue n.º 6 2018

dezembro de 1685, a João Neto da Costa, natu- esposa, Natália da Silva, como herdeira de seus bens.
ral de Viana do Conde, que pretendia exercer o Declara, também, que o Conde de São Lourenço lhe
ofício de ladrilhador na Comarca do Porto (Basto, devia dinheiro da obra que corria por ordem de João
1964: 197). Rebelo de Campos. De igual modo, lhe deviam Fran-
cisco de Barros, filho de Amaro de Barros, 65 000
Os dados mais relevantes surgem no seu testamento, réis, bem como o Secretário de Estado 160 000 réis,
lavrado em 4 de julho de 1693, e dado a conhecer dos quais lhe deveriam tirar 70 000 réis para pagar
por João Miguel Simões (2002: 71-73). Nele refe- a Manuel Ferreira, oleiro do azulejo (Simões, 2002:
re-se que não tinha filhos nem herdeiros, ficando sua 71-73).

O LADRILHADOR MANUEL DA MATA

Manuel da Mata,37 natural da freguesia de São Pedro Anos mais tarde, e em 25 de março de 1674, Manuel
da cidade de Coimbra, filho de António da Mata e de da Mata contraiu matrimónio novamente, tendo
Maria Simoa, morador na freguesia de São José, em desposado Mariana da Costa, filha de João Baltasar
Lisboa, foi casado com Maria Pinheira,38 a qual fale- e de Jerónima Gonçalves, e viúva de Pedro Garcia,
ceu em 7 de outubro de 1656, tendo sido sepultada que havia falecido na Índia. Assistiram a este ato
na Igreja de Santo André, em Lisboa. como testemunhas “João da Silva Leão morador nesta
freguezia na Rua da Esperança, cavaleiro do habitto
Em 8 de novembro de 1670, Manuel da Mata declara de S. Tiago e Francisco Rodriguez cobeiro morador no
que azulejou uma casa e um escritório sito na rua Campo de Santa Anna freguezia de Santa Ana”.40
Larga de São Roque, pertencente ao Padre Manuel
Soares.39 Manuel da Mata41 veio a falecer em 8 de abril de
1697, tendo sido sepultado na Igreja de Santa Cata-
rina, em Lisboa.

O LADRILHADOR Pedro de Almeida


42

Pedro de Almeida43 filho de António de Abreu e de sua Contraiu matrimónio, na Misericórdia de Lisboa, em 2
mulher Maria de Almeida, foi batizado na Igreja de de julho de 1700, com Antónia Maria44, filha de João
Nossa Senhora das Mercês, em 3 de maio de 1676. de Miranda e de Júlia Maria.

37. Sobre o ladrilhador Manuel da Mata veja-se a informação publicada, ainda que de modo mais reduzido em (Carvalho, 2012: 77-78).
38. A.N.T.T., A.D.L., Livro Misto de Batismos, Casamentos e Óbitos da Paróquia de Santo André [1645-1695], Livro M2, Caixa n.º 1,
assento n.º 1, fl. 151.
39. Documento transcrito por (Sequeira, 1939: 240).
40. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1672-1684], Livro C4, Caixa n.º 34, assento n.º 1, fl. 30,
documento publicado em (Flor, 2011: 301).
41. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia de Santa Catarina [1675-1698], Livro O6, Caixa n.º 55, assento n.º 3, fl. 175v, docu-
mento publicado em (Flor, 2011: 301).
42. Relevante referir que só após 1731 surge referido em diversa documentação como “Pedro de Almeida mestre azelegador”, conforme
se comprova nas referências documentais apresentadas neste estudo, sendo nas restantes referido como ladrilhador. Sobre este ladri-
lhador veja-se os documentos publicados em (Portela, 2017c: 21), assim como algumas notas em que é referido só e apenas como
ladrilhador (Carvalho, 2011: 99-100).
43. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia das Mercês [1622-1685], Livro B1, Caixa n.º 1, assento n.º 2, fl. 101v.
44. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia da Encarnação [1694-1708], Livro 4, Caixa n.º 15, assento n.º 2, fl. 134.
n.º 6 2018 Quem Faz o Quê: Processos Criativos Em Azulejo WHO DOES WHAT: CREATIVE PROCESSES IN AZULEJO 39

Em 1 de janeiro de 1701, Pedro de Almeida surge Sabemos que, em 1724, Pedro de Almeida desempe-
inscrito na Irmandade de Nossa Senhora da Doutrina nhou o cargo de escrivão na Casa dos Vinte e Quatro,
da Igreja de São Roque em Lisboa, sendo arrolado tendo exercido o mesmo cargo uma segunda vez, em
como ladrilhador, morador na rua das Partilhas, nas 1732 (Carvalho, 2011: 100).
Mercês (Coutinho e Ferreira, 2014: 164).
Reconhecemos Pedro de Almeida referenciado como
Pouco tempo depois, em 5 de março de 1702, o seu “Mestre azolejador” apenas na terceira década do
pai, António de Abreu,45 falecia na freguesia das século XVIII, nomeadamente enquanto testemunha no
Mercês, em Lisboa. A sua mãe, Maria de Almeida,46 casamento de Gaspar Gonçalves dos Reis53 com Ana
veio a falecer em 12 de novembro de 1706. Maria Coutinha, celebrado em 15 de junho de 1730,
na igreja da Encarnação, em Lisboa; no casamento
Do consórcio de Pedro de Almeida com Antónia de António da Cunha54 com Leonarda do Espirito
Maria nasceram, entre outros filhos, Francisca,47 que Santo, celebrado em 9 de junho de 1731, na referida
foi batizada em 10 de janeiro de 1706; Maria,48 igreja da Encarnação; e no casamento de José da
que foi batizada em 27 de junho de 1708, tendo Anunciação55 com Maria Teresa Caetana, celebrado
assistido a esse ato como padrinho, o entalhador José em 27 de agosto de 1733, na dita igreja.
Rodrigues Ramalho49 e pela madrinha, apresentou-se
José de Almeida, pintor, irmão de Pedro de Almeida; Constatamos a presença de Pedro de Almeida, em 2
Joana,50 batizada em 4 de julho de 1709; Maria,51 de setembro de 1736, na votação entre ladrilhadores,
batizada em 7 de setembro de 1710, tendo assistido enquanto juiz da bandeira, para que “se acrescentase
como padrinho o já referido José Rodrigues Ramalho este regimento com nouos capitullos que focem convi-
e António,52 batizado em 4 de abril de 1716. nientes ao bem comum”, sendo juízes do ofício José
da Costa e João Antunes (Carvalho, 2011: 88-89).
Pedro de Almeida é, na maior parte das vezes, refe-
rido como ladrilhador, sobretudo em 5 de fevereiro Em 1737, Pedro de Almeida, do ofício de ladrilhador,
de 1705, quando foi testemunha numa escritura de era juiz do povo de Lisboa, conforme se reconhece
obrigação quando Nicolau Morum assinou uma obri- nos elementos que incorporavam uma consulta da
gação com Domingos António, mestre pedreiro, e câmara de Lisboa ao rei, em 26 de outubro de 1735
outros, para as obras de sua casa (Carvalho, 2011: (Oliveira, 1903: 97-98).
99); em 25 de fevereiro desse ano, como testemunha
de uma escritura de Rafael Correia, mestre pedreiro Pedro de Almeida56 veio a falecer em 20 de janeiro
(Carvalho, 2011: 99) e em 22 de março do citado de 1738, afirmando-se no registo de seu óbito que
ano, como testemunha de uma obrigação entre o “Deixou quatro filhos, foy sepultado na Igreja de
ladrilhador João de Oliveira, sua mulher e a congre- Nossa Senhora de Jezus, e não fes testamento”. Sua
gação de Nossa Senhora dos Agonizantes da Igreja esposa, Antónia Maria57 veio a falecer muitos anos
de São Roque (Carvalho, 2011: 99). mais tarde, em 10 de setembro de 1751.

45. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia das Mercês [1622-1831], Livro O1, Caixa n.º 30, assento n.º 3, fl. 157v.
46. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia das Mercês [1622-1831], Livro O1, Caixa n.º 30, assento n.º 7, fl. 170v.
47. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia da Encarnação [1703-1720], Livro B10, Caixa n.º 3, assento n.º 5, fl. 44v.
48. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia da Encarnação [1703-1720], Livro B10, Caixa n.º 3, assento n.º 1, fl. 86v.
49. Salientamos o facto de que na “Folha das pessoas que trabalharam nos Paços da Ribeira e a quem se deu luto pelo falecimento da
rainha D. Catarina de Bragança. Lisboa, 12 de Janeiro de 1706”, surgir a seguinte referência: “Ao Aprendis de Architetura Jozeph
Rodrigues Ramalho doze Couados” (Coutinho, 2010: 184-186).
50. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia da Encarnação [1703-1720], Livro B10, Caixa n.º 3, assento n.º 2, fl. 104.
51. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia da Encarnação [1703-1720], Livro B10, Caixa n.º 3, assento n.º 2, fl. 126.
52. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia da Encarnação [1703-1720], Livro B10, Caixa n.º 3, assento n.º 3, fl. 240v.
53. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia da Encarnação [1729-1736], Livro 7, Caixa n.º 16, assento n.º 1, fl. 78v.
54. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia da Encarnação [1729-1736], Livro 7, Caixa n.º 16, assento n.º 1, fl. 109.
55. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia da Encarnação [1729-1736], Livro 7, Caixa n.º 16, assento n.º 1, fl. 197.
56. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia da Encarnação [1736-1754], Livro O11, Caixa n.º 27, assento n.º 5, fl. 52.
57. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia da Encarnação [1736-1754], Livro O11, Caixa n.º 27, assento n.º 4, fl. 278.
40 ART IS ON edição especial special issue n.º 6 2018

Sabemos que este mestre ladrilhador teve vários O mesmo surge como testamenteiro de Francisco dos
irmãos, entre os quais destacamos Francisco de Santos, ladrilhador da cidade de Lisboa, que faleceu
Almeida e José de Almeida. O primeiro,58 também na freguesia de Santa Catarina, em 10 de janeiro de
chamado de Francisco de Almeida Carvalho, foi bati- 1722.67
zado em 26 de fevereiro de 1679, tendo casado em
26 de junho de 1702 com Madalena da Paz,59 filha No que respeita às obras efetuadas por Pedro de
de Sebastião Dias e de Francisca de Abreu, moradora Almeida que se encontram documentadas, conhece-se
em casa de Cristóvão da Cunha, na rua da Trombeta. o registo de despesa da confraria de Nossa Senhora
Deste casamento nasceram, entre outros, Cristóvão,60 do Rosário da Igreja de Nossa Senhora do Rosário
que foi batizado em 1 de junho de 1705. Madalena das Caldas da Rainha, entre janeiro de 1731 e julho
da Paz61 veio a falecer em 1 de setembro de 1742. de 1732: “Pedro de Almeida mestre azelegador que
veyo de Lixboa a tomar a medida da igreija para o
O outro irmão, José de Almeida,62 pintor, contraiu azolejo tres mil e dozentos reis”.68
matrimónio, em 1 de junho de 1703, com Josefa
Maria, filha de Rafael Botado de Almeida e de Maria Tenhamos presente que a ligação de Pedro de Almeida,
da Silva natural da vila de Atouguia, tendo assistido ladrilhador, à família de Francisco dos Santos69 – o
como padrinho o pintor Manuel da Paz e Silva e o boti- mestre pintor de azulejo da cidade de Lisboa que
cário Francisco Gomes da Fonseca. José de Almeida63 contratualizou a execução dos azulejos da Igreja de
veio a falecer em 19 de janeiro de 1730 e sua S. Sebastião de Peniche, em 22 de abril de 1718,
esposa, Josefa Maria,64 em 25 de dezembro de 1738. com os oficiais da Confraria de Nossa Senhora da
Conceição de Peniche –, poderá ser reveladora de
Conhecem-se ainda mais dois irmãos de Pedro de uma parceria entre ambos, que no início da segunda
Almeida, um dos quais de nome João, que foi bati- década do século XVIII se encontravam a executar
zado em 8 de setembro de 1681,65 e o já referido trabalhos para diversas confrarias na região das
António de Abreu, ladrilhador. Caldas da Rainha e de Peniche (Portela, 2015: 17).

Respeitante a Pedro de Almeida, mestre ladrilhador, De igual modo, deveremos estar atentos e procurar
morador na cidade de Lisboa Ocidental, é ainda uma explorar, como possibilidades de investigação, as
procuração lavrada em 23 de janeiro de 1723 por ligações familiares e de amizade entre ladrilhado-
parte da viúva do capitão Sebastião Vaz Domingos, res, entalhadores e pintores, como sejam os casos
D. Antónia de Jesus, assistente em São Mamede, para de amizade entre o ladrilhador Pedro de Almeida e
que pudesse ser ajustada a aquisição de umas casas o entalhador José Rodrigues Ramalho, ou dos pinto-
a Maria da Luz, viúva de Francisco dos Santos, ladri- res José Almeida – irmão de Pedro de Almeida –, e
lhador, residente nessa cidade.66 Manuel da Paz e Silva, entre outros mais exemplos.

58. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia das Mercês [1622-1685], Livro B1, Caixa n.º 1, assento n.º 4, fl. 132.
59. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia da Encarnação [1694-1708], Livro 4, Caixa n.º 15, assento n.º 2, fl. 173v.
60. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia da Encarnação [1703-1720], Livro B10, Caixa n.º 3, assento n.º 3, fl. 35.
61. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia das Mercês [1622-1831], Livro O1, Caixa n.º 30, assento n.º 1, fl. 73.
62. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1695-1707], Livro C6, Caixa n.º 34, assento n.º 1, fl. 214.
63. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia do Socorro [1720-1738], Livro O4, Caixa n.º 28, assento n.º 2, fl. 92.
64. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia do Socorro [1720-1738], Livro O4, Caixa n.º 28, assento n.º 1, fl. 180.
65. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia das Mercês [1622-1685], Livro B1, Caixa n.º 1, assento n.º 3, fl. 164.
66. Arquivo Distrital de Leiria, Livro Notarial de Óbidos, Dep. V-90-E-34, fls. 1-1v.
67. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia de Santa Catarina [1698-1724], Livro O7, Caixa n.º 55, assento n.º 3, fl. 161, docu-
mento publicado em (Portela, 2015: 17).
68. Arquivo Distrital de Leiria, Confraria de Nossa Senhora do Rosário, Livro de Receita e Despesa da Irmandade do Rosário [1710-1739],
Dep. VI-2-B-5, fl. 111. Esta referência documental inédita foi publicada em (Portela, 2015: 17). Todavia, Rosário Salema transcreve,
em 2011, de um contrato celebrado em 16 de maio de 1733, um excerto desse documento onde Pedro de Almeida ajustou “azulejar a
igreja de Nª Sª do Rosario da Vila das Caldas da Rainha de azulejo de brutesco com passos da Vida da Senhora guarnecida com seus
ornatos, conforme planta que ele dito mestre apresentou”, pela quantia de 38 000 réis o milheiro assentado (Carvalho, 2011: 100).
Vítor Serrão (2012: 194) volta a publicar também um excerto desse documento e, nesse mesmo ano, Rosário Salema de Carvalho
(2012: 82) transcreve novamente, do mesmo contrato, um excerto mais amplo.
69. É de realçar que em 1707 e 1710 Francisco dos Santos, filho de Domingos Francisco, surge como dirigente da oficina (Olaria e forno)
da travessa do Benedito da freguesia de Santa Catarina em Lisboa (Correia, 1918: 178).
n.º 6 2018 Quem Faz o Quê: Processos Criativos Em Azulejo WHO DOES WHAT: CREATIVE PROCESSES IN AZULEJO 41

O LADRILHADOR MATIAS BATISTA LISBOA


70

São poucos os dados conhecidos sobre a vida de crito em vereação pela Câmara de Montemor-o-Novo
Matias Batista Lisboa,71 que reconhecemos enquanto e Matias Batista Lisboa, em que se refere que este,
testemunha, com a designação de ladrilhador, no “oficial de soleia/dor o qual se obrigou a soleiar a
registo de casamento de Manuel Ribeiro, filho de capella / do Senhor São Bartholomeu sita na Igre/ia
Pedro Francisco e de sua mulher Catarina Ribeira, matris de Nossa Senhor [sic] do Bispo, de que / he
com Jerónima Avenes, filha de Agostinho Avenes e de administrador a Camera desta villa / e se obrigou a
sua mulher Brites Falcata, celebrado em 1 de agosto fazer a dita obra de soleio / de obra de el Rej com o
de 1671, na Igreja de Santa Catarina em Lisboa. seu Banco de // De obra de Baiam e as fahcas como
Nesse mesmo registo surge também como testemunha lhe / a elle pareser; e o teto de azuzena de / aRozal
o oleiro Miguel de Azevedo, o que demostra a impor- com os seus perfis de brastas / e o preso de toda esta
tância quer das ligações familiares, quer das ligações obra faria per / preso de seis mil reis a brasa pondo
profissionais. / per sua comta a cal e area e todos / os carretos e
tudo que mais necessario / for e o arco azoleiado de
De igual modo, no registo de casamento de Dionísio azuleria de / Rozal d asusena fachas as que o mes
Correa,72 filho de José Correa e de Antónia Soares, / tre lhe pareser mais convenientes / e o frontespicio
com Ana José, filha de Francisco Ferreira e de Mada- [sic] da mesma forma; pello / mesmo presso; e o fron-
lena da Costa, celebrado em 10 de dezembro de tal de burtesco / com sua Ilargas e lastro em sima por
1687, Matias Batista Lisboa, ladrilhador, surge refe- / preso de oito mil e quinhentos reis / per barsa e não
renciado enquanto testemunha, morador aos Poiais de a tendo se abatera / aquillo que tiver de menos e os
São Bento, figurando também nesse ato, José Ferreira, a / lizares que levar o dito frontal / lhe pagarão per
pintor, irmão da contraente. oitenta reis cada hum / seno da marqua custumada o
qual / solleio hum e outro serão bons de Rece / ber
Em 1680, enquanto morador na rua Direita dos Poiais comforme o azul e amarello que / ouver na terra de
de São Bento, Matias Batista Lisboa surge referido bom e bem asentado” (Falcão, 1990: 156-158).
enquanto testamento de D. Maria Falcoa da Silva
(Simões, 2002: 217). Matias Batista Lisboa volta a ser referido, em 3 de
fevereiro de 1686, como testemunha na aprovação
Deve-se a José António Falcão a publicação do do testamento de Domingos Jorge, oleiro, tendo sido
contrato lavrado em 20 de setembro de 1681, subs- arrolado como ladrilhador (Simões, 2002: 31-32).

O LADRILHADOR DIONÍSIO DE ARAÚJO


73

Filho de Manuel de Araújo e de Antónia da Silva, e de Isabel da Costa, natural da freguesia de São
Dionísio de Araújo74 contraiu matrimónio em 14 Vicente de Fora em Lisboa, tendo casado em 29 de
de setembro de 1698 com Ângela Maria, filha de abril de 1638 com Antónia da Silva, filha de Baltasar
Manuel Duarte e de Maria Rodrigues. O seu pai, Dias e de Antónia Correa.
Manuel de Araújo,75 era filho de Baltasar de Araújo

70. Relevante referir que só em 1681 surge referido na documentação como “oficial de soleia/dor”.
71. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1659-1672], Livro C3, Caixa n.º 33, assento n.º 1, fl. 118.
72. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1684-1695], Livro C5, Caixa n.º 34, assento n.º 1, fl. 78.
73. Relevante referir que em 1707 surge referido como “Dionisio de Araujo oficial de azulejador” (Carvalho, 2012: 63-64).
74. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia dos Anjos [1692-1719], Livro C3, Caixa n.º 24, assento n.º 2, fls. 113-113v.
75. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia dos Anjos [1635-1666], Livro C1, Caixa n.º 24, assento n.º 1, fl. 137.
42 ART IS ON edição especial special issue n.º 6 2018

Sabemos também que Ângela Maria76 foi batizada em 2 de junho de 1709 e que se chamou João de
em 28 de fevereiro de 1677, tendo seus pais, Manuel Araújo,83 tendo falecido solteiro em 27 de novembro de
Duarte, filho de Manuel Duarte e de Maria Gomes, e 1727.
Maria Rodrigues, filha de Pedro Fernandes e de Maria
Rodrigues, contraído matrimónio em 4 de outubro de Em 1707, surge arrolado no Livro da Devassa da
1671.77 Visita à Cidade de Lisboa, da seguinte maneira:
“Angella Maria cazada com Dionisio de Araujo
Dionísio de Araújo surge como ladrilhador em 18 oficial de azulejador m.or na travessa dos Mayos de
de janeiro de 1696, aquando da sua inscrição na id. De trinta annos fei.da jurada aos Ssos Sacram.os
Irmandade de Santa Cruz e Passos da Graça (Sales, em que poz sua mão direita e prometeo dizer a verd.”
1925: 225). (Carvalho, 2012: 63-64).

Da união de Dionísio de Araújo com Ângela Maria Ângela Maria84 veio a falecer em 14 de novembro
nasceram os seguintes filhos, Maria,78 que foi bati- de 1721, tendo sido sepultada no Convento de São
zada em 28 de fevereiro de 1700; Francisco,79 que Francisco da cidade de Lisboa. Pouco tempo depois,
foi batizado em 26 de dezembro de 1701; Antónia,80 e em 16 de junho de 1723, Dionísio de Araújo,85
batizada em 29 de outubro de 1704; Rosa,81 bati- contraiu matrimónio com Bárbara da Conceição filha
zada em 7 de fevereiro de 1707 e João,82 batizado de Manuel Antunes, e de Joana Ferreira.

O OLEIRO MIGUEL DE AZEVEDO

Miguel de Azevedo,86 filho de Francisco Rodrigues e Miguel de Azevedo89 surge aludido como oleiro,
Maria Antunes, foi batizado na paróquia de Santo em 1 de agosto de 1677, enquanto testemunha do
Antão em Évora, em 15 de maio de 1653.87 Não matrimónio de Manuel Ribeiro com Jerónima Avenes,
sabemos quando veio para a cidade de Lisboa, mas surgindo nesse ato, também como testemunha, o ladri-
casou em 3 de fevereiro de 167688 na paróquia de lhador Matias Batista Lisboa. De igual modo, em 10
Santa Catarina, com Benta Maria, irmã de Manuel de janeiro de 1695, surge arrolado como oficial de
dos Santos (e portanto filha de João Francisco e de oleiro,90 juntamente com o pintor Manuel Francisco,
Cipriana Luís), que nessa data contava apenas com 14 enquanto testemunhas no casamento de António
anos. Em 1677 trabalhava como aprendiz na olaria Gonçalves e de Teresa Maria.
do seu sogro em Lisboa (Coutinho et al., 2011: 1-62).

76. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia dos Anjos [1656-1678], Livro B2, Caixa n.º 2, assento n.º 1, fl. 262v.
77. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia dos Anjos [1666-1692], Livro C2, Caixa n.º 24, assento n.º 1, fl. 73v.
78. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia dos Anjos [1690-1710], Livro B4, Caixa n.º 3, assento n.º 3, fl. 166v.
79. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia dos Anjos [1690-1710], Livro B4, Caixa n.º 3, assento n.º 3, fl. 201v.
80. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia dos Anjos [1690-1710], Livro B4, Caixa n.º 3, assento n.º 2, fl. 253.
81. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia dos Anjos [1690-1710], Livro B4, Caixa n.º 3, assento n.º 5, fl. 298v.
82. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Batismos da Paróquia dos Anjos [1690-1710], Livro B4, Caixa n.º 3, assento n.º 2, fl. 341.
83. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia dos Anjos [1716-1740], Livro O3, Caixa n.º 36, assento n.º 1, fl. 99v.
84. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia dos Anjos [1716-1740], Livro O3, Caixa n.º 36, assento n.º 2, fl. 40.
85. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia dos Anjos [1719-1733], Livro C4, Caixa n.º 25, assento n.º 1, fl. 61v.
86. Em (Carvalho, 2012: 97-98) há dúvidas sobre haver um ou mais artífices com este nome, dúvidas essas que são agora dissipadas, com
o conjunto de documentação apresentada. Os documentos que referiremos relativos à genealogia de Miguel de Azevedo encontram-se
publicados em (Portela, 2017: 9).
87. Arquivo Distrital de Évora, Livro de Batismos da Paróquia de Santo Antão [1648-1656], Livro 15, Caixa n.º 5, assento n.º 4, fl. 77.
88. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1672-1684], Livro C4, Caixa n.º 34, assento n.º 1, fl. 77v.
89. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santa Catarina [1672-1684], Livro C4, Caixa n.º 34, assento n.º 1, fl. 118.
90. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia dos Anjos [1692-1719], Livro C3, Caixa n.º 24, assento n.º 2, fls. 46v-47.
n.º 6 2018 Quem Faz o Quê: Processos Criativos Em Azulejo WHO DOES WHAT: CREATIVE PROCESSES IN AZULEJO 43

Anos mais tarde, em 3 de maio de 1704, voltamos a seus vários elementos. Nesse sentido, facilmente se
ter notícia de Miguel de Azevedo como morador ao compreende o trabalho desenvolvido por Manuel dos
Pé do Monte, na freguesia dos Anjos, sendo então Santos, pintor de azulejos, e Miguel de Azevedo,
testemunha no casamento de Manuel Ferreira com oleiro, que sendo provenientes de famílias distintas,
Maria da Costa.91 se cruzaram também no percurso profissional. Ambos
surgem, por exemplo, em 1709, concertados com
No contexto deste trabalho conseguimos localizar o António Correia da França95 para executar uma
registo de óbito de Miguel de Azevedo, o qual veio certa quantidade de azulejos para o revestimento
a falecer em Lisboa, na freguesia dos Anjos, em 10 das escadarias do Palácio Azevedo Coutinho, em
de novembro de 1711.92 De igual modo, reconhece- Lisboa.96
mos que sua esposa, Benta Maria, morreu em 31 de
agosto de 1741.93 As relações de amizade entre o ladrilhador Matias
Batista Lisboa, o pintor de azulejos Manuel dos Santos
A leitura do testamento de Miguel de Azevedo, e o oleiro Miguel de Azevedo, podem estar na origem
lavrado em 30 de outubro de 1711, veio documentar das diversas empreitadas artísticas levadas a efeito
vários nomes de oficiais – “Phelipe Neri e Antonio por estes mestres na região de Montemor-o-Novo,
dos Santos e Antonio Antunes e Luis Gomes e Anto- sobretudo na produção dos azulejos para a Capela de
nio de Araujo officiais delle Miguel de Azevedo” – os São Bartolomeu, na Igreja de Santa Maria do Bispo,
quais trabalharam na sua oficina; esclarecendo que efetuada por Matias Batista Lisboa (Falcão, 1990:
o mesmo passou a dispor de uma olaria própria em 137-174), na execução dos azulejos, em 1706,
determinado período da sua vida, a qual manteve até para o convento dos Congregados de Estremoz, por
ao seu falecimento.94 Manuel dos Santos (Espanca, 1968/69: 90), ou
mesmo na execução dos azulejos para a Igreja da
As relações pessoais e familiares entre alguns membros Misericórdia de Olivença, assinados por Manuel dos
destas famílias atestam a relevância profissional dos Santos.

EM SÍNTESE

Os elementos aqui apresentados contribuem para o não foram transcritos nem integralmente referencia-
conhecimento mais aprofundado, principalmente do dos) contribui, acima de tudo, para um maior conhe-
ponto de vista da genealogia, de ladrilhadores (6) e cimento das suas biografias e para o enriquecimento
oleiros (2) ativos na Lisboa seiscentista e setecentista. do conhecimento da história da azulejaria portuguesa
nos séculos XVII e XVIII.
A revelação destes dados alicerçados em documentos
inéditos ou já conhecidos da historiografia (mas que

91. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Casamentos da Paróquia de Santos-o-Velho [1696-1706], Livro C6, Caixa n.º 40, assento n.º 3, fls. 115-115v.
92. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia dos Anjos [1687-1716], Livro O2, Caixa n.º 36, assento n.º 2, fl. 223v.
93. A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia de Santa Catarina [1721-1749], Livro O1, Caixa n.º 54, assento n.º 3, fl. 47v.
94. Este testamento encontra-se citado por (Carvalho, 2012: 97), e publicado por (Portela, 2017d: 9).
95. António Correia da Franca foi casado com D. Ângela Francisca de Melo, morador no Arco do Chanceler, tendo falecido em 7 de maio
de 1729, A.N.T.T., A.D.L., Livro de Óbitos da Paróquia de Santo Estevão [1728-1749], Livro O5, sem Caixa, assento n.º 1, fl. 6.
96. Relembramos que o documento relativo à execução do revestimento dessa escadaria foi referido por Jorge Brito e Abreu num Encontro
sobre Preservação e Tratamento do Azulejo em março de 1988, tendo sido parcialmente transcrito, em 2012, por Rosário Salema de
Carvalho (2012: 303 e 370), e transcrito na sua totalidade, em 2014, por Fernando M. Peixoto Lopes e Margarida Almeida Bastos
(2014: 332-340). Tanto Rosário Salema de Carvalho, em 2012, como Fernando M. Peixoto Lopes e Margarida Almeida Bastos, em
2014, afirmam que Manuel dos Santos tinha um filho chamado Joaquim. Na realidade, Joaquim é filho de José da Costa, conforme se
pode facilmente comprovar pela leitura atenta e cuidada do documento de recebimento transcrito. Sobre a utilização do azulejo como
elemento decorativo integrado nos interiores das casas senhoriais, veja-se (Correia, 2014: 155-174).
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