O Retrato Do Rei Dom Sebastiao Do Museu PDF

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O retrato do rei Dom Sebastião

do Museu Nacional de Arte Antiga

Por: Armando Seixas Ferreira

Pintura Portuguesa dos séculos XV e XVI

História da Arte

Professor Pedro Flor

Universidade Nova de Lisboa

Maio de 2013
ÍNDICE

Índice…...……………………………………………………………………………….2

Introdução………………………………………………………………………………3

Ambiente……………………………………………………………………………......4

Descrição e análise……………………………………………………………………...6

Investigação……………………………………………………………………………11

Cristóvão de Morais…………………………………………………………………..15

António Mouro, Jorge da Rua, Cristóvão Lopes e Afonso Sanches……………....17

Conclusão……………………………………………………………………………...20

Bibliografia………………………………………………………………………….....22

Galeria e Anexos………………………………………………………………………23

2
INTRODUÇÃO

É o retrato mais fascinante e enigmático da história de Portugal. O quadro do rei


Dom Sebastião (1554-1578) do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) transporta-
nos para o ambiente faustoso da corte de Lisboa no século XVI. Nenhuma outra pintura
retrata tão bem o espírito ambicioso do jovem rei que perdeu a vida na batalha de
Alcácer Quibir.

A peça em análise foi atribuída ao pintor português Cristóvão de Morais e é


considerada uma obra-prima do Maneirismo. Nesta época, a corte estava bem servida de
artistas. A chegada a Lisboa em finais de 1551, ou início de 1552 do grande retratista
flamengo Anthonis Mor marca um ponto de viragem. Mor dignificou a família real
portuguesa com a sua perfeição e majestade no desenho, inaugurando uma verdadeira
escola do retrato de corte no país da qual Cristóvão de Morais foi discípulo. Este retrato
de D. Sebastião parece mais sofisticado do que as obras que Mor pintou em Portugal.
São 20 anos de diferença. Como frisa Baptista Pereira, “enquanto o retrato de D. João
III pintado pelo mestre flamengo é tipicamente de corte, sem referências ao divino, o
quadro de D. Sebastião recupera a ideologia cavalheiresca e a sua tradução simbólica”
(1).

Nesta análise apresento fotografias inéditas do retrato do MNAA. Com base em


documentação tentarei reconstituir o histórico desta obra de arte e o ambiente em que se
insere. A atividade dos pintores que terão partilhado a mesma oficina com o mestre
português serão igualmente objeto de estudo. Durante a pesquisa encontrei alguns dados
curiosos que decidi incluir neste trabalho relativamente à vida e obra dos artistas que em
teoria também poderiam ter assinado este retrato de D. Sebastião. Designadamente
Alonso Sanchéz Coello. Espanhol para uns, português para outros. Não pretendo que
este trabalho académico seja um somatório dos livros que escolhi para a bibliografia. É
somente a minha interpretação dos factos. Decidi, por isso, contactar pessoalmente
especialistas e historiadores com vista a escolher o melhor ângulo de abordagem.
Agradeço especialmente a Anísio Franco do MNAA pela visita guiada ao museu e o
acesso a informação privilegiada sobre este retrato do Desejado.

(1) PEREIRA BAPTISTA, “Retrato de Dom Sebastião como cavaleiro do Graal”, Cavalaria
Espiritual e Conquista do mundo, INIC, Lisboa, 1986

3
AMBIENTE

Portugal vive o esplendor dos séculos XV e XVI. É a época dos


Descobrimentos, iniciada pela dinastia de Avis com a conquista de Ceuta e que culmina
com a chegada ao Japão. O país divide com a Espanha o domínio dos oceanos. O
português é usado como língua franca nas paragens mais longínquas do império.

No campo das Artes, o período que antecede o reinado de D. Sebastião (1554-


1578), é marcado por contactos e trocas comerciais com as feitorias de Antuérpia e
Brugges. Os artistas portugueses são influenciados pela técnica e pelas cores vivas da
pintura do Renascimento que se faz na Flandres e em Itália. A passagem por território
nacional de Jan Van Eyc que se deslocou à corte portuguesa para pintar um retrato da
princesa Isabel filha de D. João I e a visita de Roger Van der Weyden, autor de uma
pintura desaparecida do mosteiro do Batalha, demonstram que o país estava na rota dos
melhores artistas do seu tempo. Em Portugal estavam ativas as oficinas de Lisboa,
Coimbra, Évora e Aveiro. Os painéis de São Vicente (c. 1470) de Nuno Gonçalves
atestam bem a qualidade dos nossos executantes. No seu tratado sobre pintura antiga, de
1548, Francisco de Holanda elogiava o desempenho do mestre português de
quatrocentos e comparava-o aos mestres italianos. "E neste capítulo quero fazer menção
de um pintor português que sinto que merece memória, pois em tempo mui bárbaro quis
imitar nalguma maneira o cuidado e a discrição dos antigos e italianos pintores" (2).

Portugal não é um país isolado, pelo contrário, ocupa uma posição geográfica
estratégica. Nesta altura, a coroa mantem importantes ligações diplomáticas aos
principais centros de poder da Europa através de uma política de casamentos. A dinastia
de Avis usou a arte para se legitimar e ser reconhecida. Na arquitetura, os mosteiros da
Batalha e dos Jerónimos são exemplos desse investimento. Os principais mecenas são a
coroa e o clero. Os pintores são profissionais polivalentes e desdobram-se em várias
tarefas na corte. Além da pintura, também são iluminadores, escultores, gravadores e
pedreiros. É uma arte anónima, porque raramente assinam as obras.

No que toca ao retrato de corte, é inaceitável que entre 1470 e 1552, período que
abrange o estilo manuelino, não seja conhecido um único exemplar a óleo de época de
D. Manuel I (1495-1521) nem do seu antecessor D. João II (1481-1495).

(2) VASCONCELOS, JOAQUIM “Da pintura antiga”, edição Porto, 1930

4
Até aos nossos dias chegaram excelentes tábuas de arte sacra, mas poucos
retratos. Tudo leva a crer que muitas obras de qualidade terão embelezado os palácios e
as igrejas portuguesas até serem dispersadas, roubadas ou até destruídas durante o
domínio Filipino, no terramoto de 1755, ou nas invasões francesas.

No reinado de D. João III (1521-1557), a coroa apoia a formação de artistas no


estrangeiro, como foi o caso do próprio Cristóvão de Morais e de Francisco de Holanda.
Todavia uma série de revezes e de infelizes coincidências vão condicionar o futuro das
artes no reino. Nomeadamente o problema da sucessão. É também neste reinado que se
encerra a feitoria de Antuérpia e a Inquisição ganha mais poderes.

Dos nove filhos do casamento com D. Catarina de Áustria, apenas D. João e D.


Maria chegam à adolescência devido à consanguinidade dos pais. Em 1543, D. Maria
contrai matrimónio com Filipe, filho do imperador Carlos V e morre no parto. Em 1552,
o príncipe herdeiro de Portugal casa-se com D. Joana, também filha do rei de Castela.
Mas em 1554 morre inesperadamente aos 16 anos de tuberculose. Sem herdeiros, D.
João III deposita todas as esperanças no neto que nasce no dia 20 de janeiro, sem
conhecer o pai. O rei morre em 1557 e D. Sebastião sobe ao trono com apenas três anos.

No reinado de D. Sebastião, a corrente dominante Maneirismo. Para Vítor


Serrão é o “estilo oficial durante a segunda metade do século XVI” também “marcada
por caminhos de superação do figurino renascentista mesmo que nesse campo surja
menos veemente de anticlassicismo e mais temperado aqui com a austeridade
progressiva da Contra-Reforma reinante” (3). Até atingir a maioridade, a regência do
reino é entregue a D. Catarina e depois o Cardeal D. Henrique. Poucos meses após o
nascimento de D. Sebastião D. Joana muda-se para Espanha por razões políticas a
pedido do pai, Carlos V. A mãe do rei português fundou o convento das Descalzas em
Madrid e nunca mais volta a ver o filho que é criado pela avó em Lisboa. Para diminuir
a tristeza da nora e sobrinha, a rainha D. Catarina que tinha uma galeria de retratos
régios no paço, enviava todos os anos quadros a documentar o crescimento do neto.
Muitas dessas pinturas foram executadas por Cristóvão de Morais. É bem possível que o
quadro de D. Sebastião que hoje podemos admirar no MNAA seja uma dessas pinturas
que pertenceu à coleção particular de D. Joana no convento de Madrid.

(3) SERRÃO, VÍTOR, História da Arte em Portugal, o Renascimento e o Maneirismo, terceiro


volume, Editorial Presença, Lisboa, 2001

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DESCRIÇÃO E ANÁLISE

(Figura 1)

Nome: Retrato de Dom Sebastião

Autor: Cristóvão de Morais

Data: 1570-1574

Local onde está a obra: Museu Nacional de Arte Antiga

Número de inventário: 1165

Proveniência: Doação do Conde de Olivais e Penha Longa, 1909

Dimensões: 100 cm de altura por 85 cm de largura

Matéria: Óleo

Suporte: tela

6
Retrato de meio corpo. Dom Sebastião aparece numa pose “amaneirada” (figura
1). O rei de cabelo louro e curto, de olhos azuis fita o espetador com um ar sobranceiro
e distante em posição de três quartos (figuras 2 e 3). O rosto é pálido, bem como as
mãos.

(figuras 2 e 3)

A figura do rei surge recortada num fundo escuro e opaco. Segura a espada de
punho dourado com a mão esquerda, ao estilo dos cavaleiros cristãos (figura 5).
Enquanto a direita repousa na cintura com elegância. No indicador usa um anel com
uma joia e aliança no mindinho (figura 4). Os dedos são finos e bem desenhados. Está
armado com um punhal cujo punho é visível entre o fundo e a curva do braço direito.

(figura 4) (figura 5)

O monarca enverga uma armadura milanesa ricamente desenhada e decorada a


ouro na qual aparece refletido um raio de luz. Usa uma gola encanudada (figura 6) e
mangas brancas de folhos. Os lábios são carnudos e vermelhos. O inferior é
ligeiramente pronunciado, característica dos Habsburgos (figura 7).

(figura 6) (figura 7)

7
O rei traja calções com bordados a ouro. O retratado tem a companhia de um
galgo com uma cabeça enorme em comparação à do próprio rei. Eparece farejar o seu
dono e senhor (figura 8).

(figura 8)

O cão tem uma coleira de couro encarnada forrada a veludo na qual está
desenhado um escudo com as armas de Portugal. Este detalhe encontra-se tapado pela
moldura que não é de origem (figura 11). É possível observar este pormenor delicioso a
partir de uma fotografia inédita feita antes do restauro. A imagem foi solicitada e
amavelmente cedida pelo MNAA para ser publicada neste trabalho (figura 9).

(figura 9)

8
No canto superior esquerdo da tela existe uma inscrição: “Rex Portvgal’ et
Algarbiorvm’ XVI” indicando o estatuto e a idade de 16 anos do retratado (figura 10). O
quadro não está assinado. Contudo, a cabeça oval e os olhos azuis amendoados são
típicos de Cristóvão de Morais tal como no retrato de D. Sebastião no Convento de
Madrid, pelo que parece justificada a atribuição da obra ao mestre português.

(figura 10) (figura 11)

Na visita que realizei ao museu também pedi uma fotografia do lado inverso do
quadro na expetativa de encontrar informação relevante (figura 12). No outro lado da
tela apenas é visível o número de inventário “1165” e autocolantes indicando que o
quadro pertenceu à coleção do Conde da Penha Longa e participou nas exposições
“Royal Academy of Arts” de Londres, em 1955, “Portugal et Flandres” em Bruxelas,
1991 e no Kunst und Ausstellungshalle der Bundesrepublik Deutshland de Bona, em
1999.

(figura 12)

9
A atribuição deste quadro ao pintor português tem por base uma nota de
pagamento da rainha D. Catarina em 1571 e a comparação com a pintura de D.
Sebastião aos 11 anos que se encontra no Convento das Descalzas em Madrid (figura
13). Essa última obra está assinada “Cristobal de Morales Faciebat 1965” (4) (5). As
parecenças estilísticas com o quadro do MNAA levam os peritos a concluir que se trata
do mesmo autor.

Existe, no entanto, outro retrato no convento de Madrid que também se


aproxima bastante do estilo de Morais, tendo sido atribuído a Alonso Sanchéz Coello.
Trata-se do retrato do infante D. Carlos de Espanha (figura 14), primo direito de D.
Sebastião, atribuído a Alonso Sanchéz Coello.

Esse retrato também foi pintado em 1965 (figura 15), curiosamente na mesma
altura em que Cristóvão de Morais se deslocou a Madrid para oferecer o quadro de D.
Sebastião com 11 anos a D. Joana. É provável que tenha pintado D. Carlos nessa
passagem pela capital espanhola. Uns anos mais tarde inspirou-se certamente no retrato
de D. Carlos para “tirar ao vivo” D. Sebastião.

Em Espanha, Sanchéz Coello pintou vários quadros de D. Sebastião, sobretudo


cópias de Cristóvão de Morais, como o quadro que atualmente está no Hampton Court
Palace em Londres (figura 16).

Analisando as duas obras é bem possível que estejamos perante o mesmo artista.
Parece até haver mais afinidades entre estas duas obras do que entre os retratos de
Madrid e de Lisboa. O detalhe na armadura, a pose e o rosto são garantidamente da
mesma mão. Se não foi Alonso Sanchéz Coello que pintou os retratos de D. Carlos e D.
Sebastião. O autor só pode ter sido Cristóvão de Morais.

(4) PEREIRA BAPTISTA, “Retrato de Dom Sebastião como cavaleiro do Graal”, Cavalaria
Espiritual e Conquista do mundo, INIC, Lisboa, 1986
(5) JORDAN, Annemarie, Retrato de Corte em Portugal, o legado de António Moro, 1994

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INVESTIGAÇÃO

Quando escolhi este retrato para análise sabia que não ia ter uma tarefa fácil.
Decidi, por isso, entrar em contacto com Anísio Franco do MNAA que diariamente
convive com esta pintura. A sua reação à minha opção foi: “Ui!!!! É que já foi quase
tudo dito sobre esse quadro”. Expliquei-lhe que há sempre qualquer coisa a acrescentar
e que este trabalho seria sempre a minha interpretação dos factos, pelo que só por isso
valia a pena arriscar. Marcámos uma visita à galeria no segundo andar do museu onde
está exposto o retrato. Na nossa conversa apurei alguns dados que importa destacar no
tocante ao histórico e à origem desta pintura. A versão oficial é que esta peça “terá sido
comprada em Paris em 1885 pela rainha D. Maria Pia, tendo pertencido anteriormente à
colecção de D. Maria del Carmen Aragon Azloré Idiáquez, descendente da Casa de
Aragão. Contudo, o especialista do MNAA não é dessa opinião. Lembra que existe no
Palácio da Vila em Sintra um quadro que representa o infante D. Carlos, mas até há
poucos anos era tido como um retrato de D. Sebastião. É possível ver no raio X o
desenho subjacente e os repintes que foram feitos por altura da Restauração da
independência política de Portugal. A ordem de Cristo no colar e as armas de Portugal
no canto direito são posteriores. Tudo aponta para que seja este o quadro comprado no
leilão (figuras 18 e 19). Se o quadro do MNAA tivesse sido adquirido pela rainha D.
Maria Pia seria natural que permanecesse na posse do Estado. Não foi o caso, uma vez
que o retrato figurava na coleção particular do Conde de Olivais e Penha Longa e foi
oferecido ao MNAA em 1909 que por sua vez o adquiriu ao ministro da América (6).

Como já foi referido, a atribuição ao pintor português baseia-se em fontes


documentais e iconográficas. Em primeiro lugar uma ordem de pagamento de 1571 da
rainha D. Catarina que manda pagar 12 mil reais em adiantado a Cristóvão de Morais
por um retrato do neto, D. Sebastião (7). Em segundo lugar, o quadro de D. Sebastião de
1965 das Descalzas assinado por Morais tem semelhanças com o retrato de Lisboa.

(6) PEREIRA BAPTISTA, “Retrato de Dom Sebastião como cavaleiro do Graal”, Cavalaria
Espiritual e Conquista do mundo, INIC, Lisboa, 1986
(7) JORDAN, Annemarie, Retrato de Corte em Portugal, o legado de António Moro, 1994

11
Parece muito arriscado, o palpite Maria Kusche que prefere atribuir a obra ao
pintor flamengo Rolan Moys, por comparação com outras pinturas que integram cães.
Diz a autora que há dois indícios inconfundíveis: “o cão e a mão extremamente aberta e
plana” que se repetem nos seus quadros. E acrescenta “é provável que em 1570,
descontente com o quadro pouco atraente de Morais tenha pedido a Moys que fosse a
Lisboa retratar o rei” (8).

Prefiro seguir a pista dos documentos guardados na Torre de Tombo que


levantam a hipótese de este ser o quadro pago por D. Catarina a Cristóvão de Morais
para ser oferecido ao Papa. Trata-se de um recibo de pagamento 4 de Abril de 1571.
Nessa altura D. Sebastião já tinha feito 17 anos. É por isso estranho que na inscrição da
idade apareça XVI e não XVII. No entanto, D. Sebastião foi o 16º rei de Portugal. Será
que foi esse o motivo? Também não parece que seja assim.

Contactei directamente os museus do Vaticano em Roma para apurar se coleções


do Papa tinham algum retrato de D. Sebastião de Cristóvão de Morais. Se existisse um
retrato idêntico podíamos ter a certeza de que a peça que está no MNAA seria uma
cópia do retrato enviado para o papa da autoria de Cristóvão de Morais. Dois dias
depois, a Secretaria do Delegado Ciêntifico dos Museus do Vaticano respondiam assim
à minha questão: “Lamentamos informar, mas na coleção do Vaticano não existe um
retrato do rei D. Sebastião, nem nenhuma obra do pintor Cristóvão de Morais. Não
existe qualquer retrato de rainhas ou reis portugueses na nossa coleção”.

Esta incerteza levanta, porém, algumas questões. É que a pintura do MNAA


poderá não ser o quadro destinado ao Papa, mas sim um retrato pintado em Madrid para
integrar a galeria de retratos de D. Joana nas Descalzas, à semelhança do que sucedeu
com o quadro do infante D. Carlos, também executado por Cristóvão de Morais cerca de
dez anos antes, como também sublinha Sofia Leite (9). O quadro de Lisboa tem as
mesmas dimensões dos quadros dos cavaleiros nas Descalzas e é bem possível que
tenha sido D. Joana a encomendar essa obra, em que o filho aparece com um galgo,
imitando o quadro do pai da princesa espanhola, Carlos V pintado por Jakob Seisnegger
em 1530.

(8) KUSCHE MARIA, “Retratos y Retratadores”, 2003


(9) LEITE, SOFIA, O Retrato do rei D. Sebastião do Museu de Arte Antiga, Boletim Cultural da
Assembleia Distrital de Lisboa em 1999

12
O quadro do MNAA poderá então ter sido pintado em 1570 quando D. Sebastião
completou 16 anos, ou seja antes da encomenda para o Papa. A correspondência trocada
entre D. Catarina e o seu embaixador em Roma e tornada pública por Baptista Pereira
sustentam esta hipótese. Nas cartas enviadas pela rainha confirma-se que o envio do
quadro para o Papa está atrasado devido à impaciência do rei.

A 15 de dezembro de 1571, D. Catarina escrevia: “O retrato do senhor meu neto


que sua santidade deseja ver vos será dado esta pera lho apresentardes não tem S.A.
fregma pera querer aguardar a que estem retratando E por esta causa o não mandem tão
cedo como quisera (…) (10).

No inventário de D. Joana de Áustria de 1573 consta a descrição de uma pintura


de D. Sebastião que corresponde às características do quadro de Lisboa. “Un medio
retrato de pincel, en lienzo, del dicho Sereníssimo Rey de Portugal, armado, com lebrel
(cão) cabo del, de edad de diez y seis años, en un marco de madera, sin molduras,
tasado en 11,250 maravedis”.

Depois da morte da princesa, a peça deve ter seguido para o palácio Alcazar de
Madrid, para integrar a coleção de Filipe II porque também surge no inventário de 1600.
“Outro retrato de medio corpo, de pincel, en lienzo, del serenissimo Rey de Portugal
don Sebastián, armado, com un lebrel al lado” (11) (12).

Mas qual a simbologia do cão neste quadro? Além de copiar a pose do seu avô,
Carlos V no retrato de 1530, existe uma leitura avançada por Baptista Pereira, citando
Julius Evola que no seu mistério do Graal interpreta a dupla do dux e do galgo da
seguinte forma: “Dante prevê o advento daquele que porá termo à dupla usurpação. É
precisamente o galgo que segundo a referida convergência dos símbolos forma um todo
com o dux, Enviado de Deus que matará a barregã, com o gigante que com ela peca”
(10).

(10) PEREIRA BAPTISTA, “Retrato de Dom Sebastião como cavaleiro do Graal”, Cavalaria
Espiritual e Conquista do mundo, INIC, Lisboa, 1986
(11) LEITE, SOFIA, O Retrato do rei D. Sebastião do Museu de Arte Antiga, Boletim Cultural da
Assembleia Distrital de Lisboa em 1999
(12) JORDAN, Annemarie, Retrato de Corte em Portugal, o legado de António Moro, 1994

13
Este D. Sebastião simboliza o vingador e o restaurador, imagem do senhor
Universal de que fala Dante no De Monarchia. O monarca surge representado como
instrumento guerreiro da vingança a dois níveis. “O espiritual representado pelo rei e o
temporal representado pelo Galgo, visando a regeneração da Cristandade cuja realidade
o rei parece olhar com desdém”, explica Baptista Pereira (10).

Apesar desta simbologia encriptada, concordo inteiramente com Sofia Leite


quando diz que fazia todo o sentido enviar ao Papa um retrato numa pose e
enquadramento mais institucionais. “Seria natural que o retrato feito expressamente para
Roma fosse semelhante ao que representa o rei aos 18 anos, de corpo inteiro, junto à
coluna dos Habsburgos, bastão na mão, e armadura cinzelada com esse símbolo tão
legível que é a fénix”, acrescenta Sofia Leite (13).

Esse retrato faz parte de uma coleção particular em Espanha e o modelo tem
muitas parecenças com o quadro de Lisboa. A armadura é idêntica, a gola, as mangas de
camisa, o desenho da cabeça (figura 20). Na tela há uma inscrição indicando que D.
Sebastião tem 18 anos, uma idade que acaba por estar cronologicamente mais próxima
da encomenda para o Papa do que o retrato em que o rei aparece com 16 anos e que faz
supor que o quadro do MNAA afinal terá sido mesmo acabado dois anos antes, em
1570, cerca de dois anos antes da correspondência entre a rainha e o seu embaixador em
Roma quando ainda falavam de um quadro inacabado.

Existe uma cópia deste retrato de corpo inteiro que deverá ter sido executada em
Espanha na oficina de Alonso Sanchéz Coello, uma vez que apresenta muitas diferenças
relativamente ao retrato de Morais, sobretudo na cabeça, na expressão e no detalhe
(figura 21).

Em 1914, um inventário refere a existência de cinco retratos de D. Sebastião no


Convento das Descalzas em Madrid (13). No ano seguinte foram vendidos vários
quadros. Atualmente, conforme constatei in loco só restam dois do rei português. A
pintura de 1965 e um quadro de meio corpo feito certamente por um pintor menor,
representando D. Sebastião adulto e de bigode (figura 17).

(13) LEITE, SOFIA, O Retrato do rei D. Sebastião do Museu de Arte Antiga, Boletim Cultural da
Assembleia Distrital de Lisboa em 1999

14
CRISTÓVÃO DE MORAIS

Nascido cerca de 1530, Cristóvão de Morais foi criado na corte de Lisboa e era
de nacionalidade portuguesa, mas provavelmente de ascendência espanhola.

Trabalhou para a mulher de D. João III, D. Catarina de Áustria como moço de


câmara e pintor. Da sua produção pictórica pouco se conhece, além de alguns retratos de
aparato, um retábulo de importância e decorações para a rainha. A sua formação de base
é claramente nórdica, seguindo um estilo italianizante. Sabe-se que fez parte do círculo
de Mor. Foi através dele que assimilou Bronzino, Pontormo, Lotto, ou seja, toda a
influência florentina recebida pelo flamengo na sua viagem a Itália (14). Foi patrocinado
pela rainha D. Catarina e por D. João III e esteve a aprender pintura na Flandres. Morais
exerceu a sua atividade de pintor entre 1551 e 1571 ou até 1574. A primeira referência é
um recibo de 1539 referente ao pagamento de 1800 reais a um pajem de D. Catarina
chamado Cristóvão de Morais, sendo que a idade de pajem ia dos 8 aos 12 anos (14).

Pedro Flor faz referência ao livro da Guilda de Antuérpia em 1538 que menciona que
“Chrystoffele Moralys terá realizado a sua aprendizagem na Flandres junto a Cornelius
Buys II” (15).

Em 1554 é promovido a examinador dos pintores da Corte, sendo autor de vários


retratos aúlicos do Desejado. A obra de Morais foi bem recebida na corte joanina, tendo
sido enviado por D. Catarina para pintar D. Joana e uma negrita (figura 20), futura
mulher do príncipe D. João (14). O quadro está em Bruxelas e esteve atribuído a António
Mouro e a Alonso Sanchez Coello, mas trata-se afinal de uma obra de Morais como foi
bem fundamentado por Stephanie Breuer (14) e Annemarie Jordan (16).

A evolução do pintor, como bem destaca Sofia Leite (14), acompanha o


desenvolvimento da situação artística nacional. As primeiras obras são mais flamengas e
as últimas mais italianizantes.

(14) LEITE, SOFIA, O Retrato do rei D. Sebastião do Museu de Arte Antiga, Boletim Cultural da
Assembleia Distrital de Lisboa em 1999
(15) FLOR, PEDRO, “A Arte do retrato de corte em Portugal nos séculos XV e XVI”, 2005

(16) JORDAN, Annemarie, Retrato de Corte em Portugal, o legado de António Moro, 1994

15
Em 1560, João de Barros vendeu umas casas a Cristóvão de Morais (18). Em
1965 pinta o quadro das Descalzas. Após a saída de Jooris Van der Straten do reino,
Morais é promovido a pintor oficial do rei. Há ainda documentação que prova que foi
autor douramento e pintura do leito para D. Catarina. Dois anos depois pinta uma liteira
para a rainha. Nesse mesmo ano, executou um retábulo entretanto perdido que decorava
a capela-mor da igreja conventual da Conceição de Beja (17), o que demonstra que o
mestre português não pintava apenas retratos.

De acordo com Annemarie Jordan, existe a possibilidade de Cristóvão de Morais


ter executado um retrato de D. Sebastião quando tinha 7 anos, a partir da gravura de
Hieronymous Cock de 1561 (figura 28), já nessa altura Van der Straten já tinha saído de
Portugal (18). No seu estudo, Pedro Flor faz referência a um retrato de criança localizado
no Bowes Museum de Durham “com fisionomia e pose muito idênticas à iconografia
deste rei” que poderá ser uma réplica do retrato executado por Van der Straten (17).

A propósito do retrato em estudo, Baptista Pereira apresenta documentação já


mencionada anteriormente sobre os contornos da encomendada para o Papa. O
historiador publica os recibos de pagamento ao pintor Cristóvão de Morais e
correspondência entre a rainha D. Catarina e o seu embaixador em Roma sobre os
motivos do atraso na execução da pintura.

Estes documentos sustentam que o retratador oficial de D. Sebastião era de facto


Cristóvão de Morais (18). E também comprovam que o quadro destinado a Roma só terá
ficado pronto em 1572, como é possível ler na carta de Dezembro de 1571 em que a
rainha justifica a demora com a falta de paciência de D. Sebastião em ser retratado ao
natural (20). Nesta lógica, Cristóvão de Morais terá pintado o retrato de D. Sebastião que
está no museu das Janelas Verdes em 1570 quando o rei tinha 16 anos (19).

(17) FLOR, PEDRO, “A Arte do retrato de corte em Portugal nos séculos XV e XVI”, 2005
(18) JORDAN, Annemarie, Retrato de Corte em Portugal, o legado de António Moro, 1994
(19) LEITE, SOFIA, O Retrato do rei D. Sebastião do Museu de Arte Antiga, Boletim Cultural da
Assembleia Distrital de Lisboa em 1999
(20) PEREIRA BAPTISTA, “Retrato de Dom Sebastião como cavaleiro do Graal”, Cavalaria
Espiritual e Conquista do mundo, INIC, Lisboa, 1986

16
ANTÓNIO MOURO, JORGE DA RUA,

CRISTÓVÃO LOPES E AFONSO SANCHES

Reservei para este capítulo os nomes dos pintores que ajudaram a desenvolver a
arte do retrato de corte em Portugal na segunda metade do século XVI.

Começo por Anthonis Mor, considerado o maior retratista do seu tempo. O


mestre de Utrecht nasceu por volta de 1521 e estudou na oficina de Jan van Scorel.
Viajou para Itália para conhecer as obras de Rafael e Miguelangelo, sendo influenciado
por Ticiano. Antes de se tornar pintor da corte de Filipe II de Espanha, o mestre
flamengo foi enviado a Portugal em 1551 por Maria da Hungria irmã da rainha D.
Catarina para pintar ramo português da casa de Habsburgo. Esteve no país cerca de um
ano, o suficiente para lançar uma oficina que contou com vários seguidores entre eles,
os portugueses Cristóvão de Morais e Cristóvão Lopes, o flamengo Jooris Van der
Straten e Alonso Sanchéz Coello. O retratista flamengo pintou D. João III e D. Catarina,
o infante D. Luís, o príncipe D. João, pai de D. Sebastião e a infanta D. Maria. Sobre
este artista, Max J Friedlander escreve: “(…) Moro cinge-se tanto à aparência do que
tem de pintar, penetrando profundamente dentro da alma, que até não se deixa perturbar
pelos preconceitos do seu tempo acerca da beleza” (21).

Depois de trabalhar no país vizinho, Mor fugiu para a Holanda por causa da
Inquisição. Teve vários filhos, um dos quais acompanhou-o em Espanha, mas
desapareceu na batalha de Alcácer Quibir, onde lutou ao lado de D. Sebastião (22).

A obra em estudo pertence ao pincel de Cristóvão de Morais, mas em teoria


qualquer um destes pintores poderia ter sido o autor, uma vez que todos copiaram bem o
estilo característico de Anthonis Mor, retratando a figura a três quartos. A posição do
olho direito ao centro da face, a orelha muito bem desenhada, o olhar requintado e um
colorido quase irreal são características dos retratos do pintor.

(21) ALMEIDA, FUNDAÇÃO MEDEIROS E, “Realidade e Capricho”, 2008


(22) DUTCH ART, FLEMISH. “The book of Art”, Volume 3, Grolier, 1967

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Na época era habitual que os pintores estrangeiros adotassem nomes
portugueses. Por cá, Mor ficou conhecido por António Mouro ou Moro, Jooris Van der
Straten que chegou na comitiva de Mouro era conhecido por Jorge da Rua ou Jorge
Destrata, enquanto Alonso Sanchéz Coello, também colaborador de Mouro, era
apelidado de Afonso Sanches. Ainda hoje subsistem dúvidas quanto à naturalidade
exata deste importante pintor. Após a morte do príncipe D. João, em 1554 e do rei D.
João III três anos depois, Sánchez Coello mudou-se para Espanha e ficou ao serviço do
rei Filipe II e de D. Joana de Áustria. Várias fontes dizem que era espanhol, outras
garantem que seria português. O que não oferece contestação é que a formação artística
do pintor foi feita em Portugal. Segundo Francisco de B. de San Roman, Sanchéz
Coello nasceu em território espanhol e emigrou para Portugal quando era jovem. Para
provar a sua tese, o autor apresenta três documentos inéditos do Arquivo de la Capilla
de Reyes Nuevos de Toledo referentes a Juan Sanchéz Coello Reynalte, filho do pintor.
O primeiro é um juramento de limpeza de sangue antes de ser nomeado capelão em
1593. Os restantes dizem respeito a um testamento e a um inventário do filho do pintor
datado de 1631. Juan Sanchéz declarou que o pai havia nascido em Benifairó del les
Valls um “lugar junto a Valência del Cid” e por isso era espanhol (23). O estudo serviu
para rebater a tese apresentada em 1908 por José de Figueiredo (24), na qual era de
defendida a nacionalidade portuguesa do artista. Figueireido explica que após 1580, é
possível que fosse conveniente aos Sanchéz Coello negar a sua origem portuguesa,
porque emigraram para Espanha para trabalharem na corte espanhola. Francisco San
Roman contesta, afirmando que as declarações do filho de Sanchéz Coello foram feitas
sob juramento soleníssimo “juro a Dios y a esta cruz y por las ordenes que tengo que es
ansi verdade” (22).

Durante a pesquisa encontrei um documento que pode ser útil na discussão. Na


Torre do Tombo, existe uma carta do diplomata português Lourenço Pires de Távora
dirigida ao rei D. João III e à rainha D. Catarina de 15 de fevereiro de 1557 com a
seguinte descrição: “Carta (…) dando conta à rainha ficar a princesa de saúde e
contentíssima com o retrato do príncipe seu filho, que lhe trouxeram Afonso Sanches,
pintor português.” TT/Corpo Cronológico, Parte I, mç. 100, n.º 104 (figura 23).

(23) SAN ROMAN, FRANCISCO DE B., “Alonso Sánchez Coello”, Grupo dos Amigos do Museu de
Arte Antiga em 1938
(24) FIGUEIREDO, JOSÉ DE, “Algumas Palavras sobre a Arte em Portugal”, 1908

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Esta carta será um bom ponto de partida para uma futura investigação. O
documento prova que existia um pintor chamado Afonso Sanches na corte de Lisboa de
nacionalidade portuguesa. A não ser que houvesse outro artista com o mesmo nome, o
que não parece possível, já que Alonso Sanchéz Coello partiu para Madrid nesse mesmo
ano de 1557 e nunca mais regressou a Portugal, pelo que deverá ser a mesma pessoa.

Não é de todo possível saber se o quadro entregue a D. Joana é da autoria de


Afonso Sanches, ou de Jorge da Rua/Destrata que chegou a pintar D. Sebastião em aos
três anos como faz prova esta nota de pagamento guardada na Torre do Tombo (figura
24). “Alvará da rainha D. Catarina para Álvaro Lopes dar a Jorge Destrata, pintor, 80
cruzados por tirar, pelo natural, o retrato do príncipe, seu neto”, TT/ Corpo
Cronológico, Parte I, maço 100, nº27, de 14 de Dezembro de 1556. A diferença de
menos de dois meses entre os dois documentos leva a acreditar que a pintura enviada a
D. Joana será um retrato de D. Sebastião com três anos executado pelo pintor flamengo
que residiu em Portugal até 1960.

Quanto a Cristóvão Lopes, filho de Gregório Lopes, foi pintor régio em 1550.
Seguiu o estilo de Anthonis Mor como se pode ver nas réplicas magníficas de D. João
III e D. Catarina que estão no museu de São Roque em Lisboa (figuras 25 e 26).

A recente descoberta no castelo de Schonberg na Áustria, residência dos


Habsburgos, de um quadro desconhecido de D. Sebastião em criança fornece mais
alguns detalhes. Após um restauro pago pelo Museu de Riterberg, as armas de Portugal
ficaram visíveis na coleira do cão, o que levou a investigadora Annemarie Jordan a
alertar para o facto de estarmos perante um retrato de D. Sebastião perdido há mais de
400 anos, em vez do sacro imperador Romano-Germânico, Maximiliano II, como até há
pouco tempo era identificado (figura 27). O quadro foi atribuído à oficina de Alonso
Sanchéz Coello, mas esta nota de pagamento a Jorge Destrata com vista a retratar o rei
quando tinha apenas três vem adensar o mistério, uma vez que na imagem D. Sebastião
aparenta ter pouco mais do que essa idade.

Contudo, existe uma gravura de 1561 de Hieronymous Cock (figura 28), que
permite constatar que afinal o rei já tinha completado sete anos. É provável que tenha
sido esta imagem a servir de inspiração a Sanchéz Coello para pintar o retrato
descoberto em Viena, já que as figuras apresentam os mesmos traços.

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CONCLUSÃO

O quadro do rei D. Sebastião de Lisboa atribuído ao pintor Cristóvão de Morais


comprova que entre 1550 e 1580 existiu uma escola do retrato em Portugal. Nesta época
a dinastia reinante apercebeu-se do poder do retrato oficial e investiu significativamente
na formação de um núcleo duro de pintores que projetasse a imagem do reino e do seu
soberano. Após analisar detalhadamente o quadro do MNAA cheguei às seguintes
conclusões:

1-Com base em fotografias inéditas da obra foi possível identificar as armas de


Portugal na coleira do galgo que estão escondidas pela moldura. No lado inverso do
quadro existe o número de inventário do museu e um autocolante com informação sobre
a proveniência da peça, oferecida em 1909 pelo Conde da Penha Longa ao museu das
Janelas Verdes.

2-Ao comparar o retrato do MNAA com outros existentes no Convento das


Descalzas em Madrid encontrei semelhanças no estilo com a pintura assinada por
Cristóvão de Morais em 1965 e com o retrato de armadura do infante D. Carlos que não
será obra de Sanchéz Coello, mas sim de Morais,

3-Após contactar os museus do Vaticano, considero que o quadro encomendado


por D. Catarina a Cristóvão de Morais para oferecer ao Papa pode nunca ter chegado a
Roma.

4-Uma carta da rainha de Dezembro de 1571 indica que esse quadro só ficou
pronto em 1572. Nessa data o rei teria 18 e não 16 anos como no quadro do MNAA
que, por sua vez, estaria assim destinado à galeria de Cavaleiros de D. Joana no
convento das Descalzas e teria sido executado, dois anos antes em 1570.

O mais provável é que o quadro de Roma seja aquele em que D. Sebastião


aparece com bastão de comando, aos 18 anos, também da autoria de Morais e idêntico
estilisticamente ao do MNAA, mas executado dois anos depois.

5-Documentação apresentada reforça a hipótese do pintor Alonso Sanchéz


Coello ser português e não espanhol.

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Como sintetiza tão bem Baptista Pereira, o quadro de D. Sebastião de Lisboa “é
a imagem paradigmática de um projeto político que interveio no reequacionamento da
identidade coletiva do povo português no último terço do século XVI e se apresenta
hoje como o mais notável testemunho artístico e cultural da última grande utopia
cavaleiresca da Dinastia de Avis e também da Nação portuguesa” (25).

Concordo com Annemarie Jordan quando diz que a chave de todo o processo foi
o relacionamento e as afinidades existentes entre D. Catarina e D. Joana de Áustria. De
ambas partiu uma constante permuta de artistas e intercâmbio cultural entre Lisboa e
Madrid (26).

Partilho da opinião de Sofia Leite quando afirma: “ao contrário do que é habitual
dizer-se, foi em Portugal e não em Espanha que primeiro se criou um grupo de artistas
formados no retrato aúlico Maneirista”, do qual o pintor português fez parte (27).

De salientar que só depois de permanecer na corte de Lisboa, Anthonis Mor


partiu para Madrid onde também introduziu o ensino do retrato de corte na corte de
Filipe II.

Quanto a Cristóvão de Morais, estamos talvez perante um dos melhores


retratistas portugueses de todos os tempos, formados na tradição do mestre flamengo.
Muito da sua produção pictórica continua por descobrir. Assim como o nevoeiro que
subsiste em torno da vida deste importante pintor após a saída para Espanha de Jooris
Van der Straten e Alonso Sanchéz Coello.

O que não oferece grande contestação é que o D. Sebastião do MNAA atribuído


a Cristóvão de Morais continua a ser hoje o mais belo retrato de corte Maneirista em
Portugal.

(25) PEREIRA BAPTISTA, “Retrato de Dom Sebastião como cavaleiro do Graal”, Cavalaria
Espiritual e Conquista do mundo, INIC, Lisboa, 1986
(26) JORDAN, Annemarie, Retrato de Corte em Portugal, o legado de António Moro, 1994
(27) LEITE, SOFIA, O Retrato do rei D. Sebastião do Museu de Arte Antiga, Boletim Cultural da
Assembleia Distrital de Lisboa em 1999

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BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, FUNDAÇÃO MEDEIROS E, “Realidade e Capricho”, 2008


ALVES, JOSÉ DA FELICIDADE, “Introdução ao Estudo da Obra de Francisco
de Holanda”, Livros Horizonte, 1986
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XVI”, 2005
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una Jesuíta, Reales Sitios, 2002
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Cavalaria Espiritual e Conquista do mundo, INIC, Lisboa, 1986
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Amigos do Museu de Arte Antiga em 1938
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Maneirismo, terceiro volume, Editorial Presença, Lisboa, 2001
VASCONCELOS, JOAQUIM “Da pintura antiga”, edição Porto, 1930

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GALERIA E ANEXOS

(figura 13)

(figura 14) (figura 15)

23
(figuras 16 e 17)

(figuras 18 e 19)

(figuras 20 e 21)

24
(figura 22)

(figura 23)

(figura 24)

25
(figura 25 e 26)

(figuras 27 e 28)

26

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