TCC-Gabriela Machado Reais
TCC-Gabriela Machado Reais
TCC-Gabriela Machado Reais
Departamento de Matemática
À minha família (minha mãe Maria José, meu pai Geraldo, meus irmãos, Cristina, Ricardo
À XDani, por toda dedicação, companheirismo, paciência e estímulo que tornaram possível
esta realização.
lente forma de ndar meu curso e à Professora Liane, que muito contribuiu e ajudou durante
todo o trabalho.
Conteúdo
1 Considerações Iniciais 6
1.1 Relações de Equivalência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
2 Números Naturais 15
2.1 Axiomas de Peano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
3 Números Inteiros 30
3.1 Relação de Equivalência em N×N . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
4 Números Racionais 50
4.1 Construção dos números racionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
4.2 Operações em Q . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51
5 Números Reais 64
5.1 Cortes de Dedekind . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
5.3 Operações em C . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
6 Números Complexos 89
6.1 Construção dos complexos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
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Resumo
Apresentamos a construção dos conjuntos numéricos, com o enfoque voltado para o ensino
construções dos números inteiros, dos racionais, dos reais e dos complexos a partir do conjunto
dade. E a própria vida está impregnada de matemática. Grande parte das comparações que
o homem formula, assim como gestos e atitudes cotidianas, aludem conscientemente ou não
Em todas as épocas da evolução humana, mesmo nas mais atrasadas, encontra-se no homem
o sentido do número. Esta faculdade lhe permite reconhecer que algo muda em uma pequena
coleção (por exemplo, seus lhos, ou suas ovelhas) quando, sem seu conhecimento direto, um
O primeiro estudo esquemático dos números como abstração é comumente atribuído aos
Os números naturais e as frações têm sua origem das atividades de contagem e medida, o
que talvez tenha levado os membros da escola pitagórica a postularem que na natureza tudo
é número devido acreditarem que tudo podia ser contado, logo atribuído um número, e que a
qualquer medida também se poderia atribuir um número ou uma razão entre números.
que foi bastante usado no decorrer dos estudos. Para isto, introduzimos os conceitos de partes
Fizemos a formalização no conjunto dos naturais através dos Axiomas de Peano, conside-
rando o zero como um número natural. Assumimos que existe um conjunto satisfazendo tais
isto, denotamos este conjunto por N e chamamos de Naturais. O que zemos, foi formalizar e
construção consistente que foi desenvolvida no século XIX por Giuseppe Peano.
Richard Dedekind (1831-1916) estabeleceu uma relação de equivalência entre pares ordena-
das classes de equivalência é o conjunto dos números inteiros. Na construção dos inteiros que
zemos neste trabalho, utilizamos esta construção, de forma que, denimos um inteiro como
uma classe de equivalência e o conjunto dos números inteiros como o conjunto dessas classes de
equivalência.
A construção dos racionais é feita a partir do mesmo raciocínio que os inteiros, utilizando o
3
conceito de relação de equivalência, mas esta construção se da de forma mais rápida do que a
A construção dos números reais feita neste trabalho foi baseada na construção feita por
Dedekind, através dos chamados Corte de Dedekind, que considera o conjunto de todos os
cortes, denindo a adição e a multiplicação nele e, em seguida, mostrando que ele possui as
propriedades aritméticas de Q e mais uma propriedade que Q não possui, a chamada completude
dos reais.
Por m, mas não menos importante, a construção dos números complexos, que foram de-
nidos como pares ordenados de números reais e, a partir disto, foram provadas todas as propri-
edades aritméticas, mostrando que o conjunto dos números comeplexos possui uma estrutura
de corpo, assim como os reais e racionais, mas possuindo uma grande diferença dos anteriores,
que foram em busca dos fundamentos da matemática acumulados até a época, principalmente
4
Capítulo 1
Considerações Iniciais
No decorrer deste trabalho lidaremos diretamente com o conceito de relação de equivalência,
por isso faremos uma abordagem tratando desta questão. Trabalharemos com conceitos prévios
e com a noção intuitiva de conjuntos durante todo o trabalho e, em particular neste capítulo,
operações, lembrando que estudaremos o conceito rigoroso desses conjuntos numéricos nos
capítulos seguintes.
potência de A, denotado por P(A), é o conjunto cujos elementos são todos os subconjuntos de
A.
Exemplo 1.1.2.
1. Se A = {a, b}, então P(A) = {∅, {a}, {b}, A};
2. Se A = {1, 2, 3}, então P(A) = {∅, {1}, {2}, {3}, {1, 2}, {1, 3}, {2, 3}, A};
4. Se A = P({1}), então A = {∅, {1}}, logo, P(A) = {∅, {∅}, {{1}}, A}.
Desde o Ensino Fundamental consideramos um par ordenado como um par de objetos onde a
ordem tem importância. A denição acima formaliza matematicamente esta ideia intuitiva. O
teorema seguinte mostra que um par ordenado é exatamente o que idealizamos intuitivamente.
6
(a, b) = (c, d) ⇔ a = c e b=d
Demonstração.
• a = b.
Nesta situação(a, b) = (a, a) = {{a}, {a, a}} = {{a}, {a}} = {{a}}. Dessa forma,
{{a}} = {{c}, {c, d}}, ou seja, {c} = {a} e {c, d} = {a}. Assim, c = a e d = a.
Como a = b, obtemos a = c = b = d.
• a 6= b.
Por hipótese {{a}, {a, b}} = {{c}, {c, d}}. Se {a, b} = {c}, então, a = b = c, contradi-
zendo a hipótese a 6= b. Logo, {a, b} = {c, d}, o que acarreta c 6= d. Disso, concluímos
que {a} não pode ser igual a {c, d}, logo, {a} = {c}, ou seja, a = c. Já concluímos que
Exemplo 1.1.6.
1. Se A = {a, b} então A × A = {(a, a), (b, b), (a, b), (b, a)}
2. Se A = ∅, então A×A=∅
y ∈ B}.
Observação: (x, y) = {{x}, {x, y}} ⊂ P(A ∪ B), pois, como x, y ∈ A ∪ B , obviamente,
Exemplo 1.1.8.
1. Seja A = {x} e B = {y}. Temos que A × B = {(x, y)} = {{x}, {x, y}} e B × A =
{(y, x)} = {{y}, {y, x}}. Para que A × B = B × A, precisaríamos que {x} = {y}
ou {x} = {x, y}, ou seja, x = y . Como x e y são quaisquer, não podemos dizer que
A × B = B × A.
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2. Sejam A=∅ e B um conjunto qualquer. Suponhamos que exista (x, y) ∈ A × B . Por
Denição 1.1.9. Dado um conjunto A não vazio, uma operação em A é uma função ∗ :
A × A −→ A. A imagem ∗((x, y)) de um par ordenado (x, y) pela função ∗ é usualmente
denotada por x ∗ y .
aritméticas, podemos ver que, das quatro operações, apenas a soma e o produto são de fato
Denição 1.1.10. Uma relação binária R num conjunto A é qualquer subconjunto do produto
cartesiano A × A, isto é, R ⊂ A × A.
Exemplo 1.1.11. Se A = {a, b, c}, então R = {(a, a), (b, a), (c, b), (c, a)} é uma relação binária,
dado que é um subconjunto de
A × A = {(a, a), (a, b), (a, c), (b, a), (b, b), (b, c), (c, a), (c, b), (c, c)}.
No contexto deste trabalho, diremos que a está relacionado com b (escreve-se aRb) se R é
uma relação binária em A e se (a, b) ∈ R, isto é, (a, b) ∈ R ⇔ aRb. Uma relação binária será
chamada apenas de relação. No exemplo 1.1.11, temos bRa, mas não aRb.
Denição 1.1.12. Seja dado um conjunto A e uma relação R sobre ele. Diz-se que R é uma
que bRa, mas não aRb. Entretanto, ela é transitiva (basta ver que cRb, bRa e cRa). Como não
Exemplo 1.1.13. Seja A = {1, 2, 3} R = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (1, 2), (2, 1)} é uma relação de
equivalêcia, pois:
No exemplo seguinte será usada uma noção intuitiva de conjuntos numéricos e suas pro-
Exemplo 1.1.14. Seja a, b ∈ Z coma 6= 0. Diremos que a divide b se existir c ∈ Z, tal que
b = ac. Escrevemos a|b para simbolizar que a divide b. Esta relação de divisibilidade em Z não
é uma relação de equivalência, pois, apesar de ser reexiva e transitiva, ela não é simétrica:
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1. Vale a reexiva: para todo a ∈ Z, a = ac com c = 1 ∈ Z, portanto aRa.
a, b ∈ Z onde a divide b.
de equivalência em A. De fato,
3. Vale a transitiva: sejam x, y, z ∈ A, xRy e yRz , ou seja, (x, y), (y, z) ∈ A × A, como
chama igualdade em A (ou identidade de A), e se denota por “ = ”. Logo (x, x) ∈ R para todo
x ∈ A, que escrevemos usalmente como x = x, ∀ x ∈ A. Mostremos que esta relação, de fato,
é de equivalência em A.
2. Simétrica: se a, b ∈ A e (a, b) ∈ R, temos que existe x ∈ A tal que (a, b) = (x, x), de onde
qualquer. Claramente, (x, x) ∈ R (pela propriedade reexiva, que nos garante que, para todo x
Exemplo 1.1.19. As classes de equivalência dadas pela relação R do exemplo 1.1.13 são 1=
{1, 2}, 2 = {2, 1} e 3 = {3}
Observe, neste exemplo, que 1 = 2, isso se deve ao fato de que 1R2. O seguinte teorema
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Teorema 1.1.20. Seja R uma relação de equivalência em um conjunto A e a, b elementos
quaisquer de A, então:
1. a ∈ a;
2. a = b ⇔ aRb;
3. a 6= b ⇔ a ∩ b = ∅
Demonstração.
reexiva), logo a ∈ a;
onde segue que, a ∈ b (pois por hipótese a = b). Logo, pela denição de b, aRb;
(⇐) Seja a ∩ b = ∅. Suponhamos a = b, que signica, pelo item 2 deste teorema, que
aRb, ou seja, a ∈ b. Claramente a ∈ a, sendo assim, a está em a e em b, o que contradiz
a hipótese de que a ∩ b = ∅. Portanto, a 6= b.
O teorema anterior nos fornece propriedades muito importantes. Ele nos fornece a ideia de
que todo elemento de uma classe de equivalência a tem a mesma classe de equivalência que a,
ou seja, a pode ser representado por x, para todo x ∈ a. Ele nos garante também que duas
Da mesma forma que já zemos anteriormente nesta sessão, o seguinte exemplo faz referência
aos números inteiros, mas ele serve apenas para clarear a ideia de classe de equivalência e não
e b por 2 forem iguais. Por exemplo, (5, 21) ∈ R, (6, 14) ∈ R, mas (5, 8) 6= R. Vamos vericar
se esta relação é de equivalência em Z:
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3. Transitiva: sejam x, y, z ∈ Z, xRy e yRz . Dessa forma, x e y divididos por 2 possuem
o mesmo resto t, assim como y e z divididos por 2 possuem o mesmo resto s. Como y
1 = {. . . , −3, −1, 1, 3, . . .} = 3 = 7 = −5
2 = {. . . , −4, −2, 0, 2, 4, . . .} = 0 = 4 = −2
Sabemos ainda que todo número inteiro é classicado como ímpar ou par, onde o par pode ser
número par por 2, obetemos a = 2n+0, ou seja, o resto da divisão é 0. Já quando dividimos um
número ímpar por 2, obtemos a = 2n + 1, ou seja, resto 1. Dessa forma, a divisão de qualquer
inteiro por 2 nos fornece restos 1 ou 0. Portanto, só existem duas classes de equivalência
distintas para esta relação de equivalência. Mais precisamente, tem-se a = 0 para a par e a = 1
para a ímpar.
Denição 1.1.22. Seja R uma relação de equivalência num conjunto A. O conjunto constituído
das classes de equivalência em A pela relação R é denotado por A/R e denominado conjunto
Exemplo 1.1.23.
1. Se R é a relação do exemplo anterior, então A/R = {0, 1}
A × A = {(1, 1), (1, 2), (1, 3), (2, 1), (2, 2), (2, 3), (3, 1), (3, 2), (3, 3)}.
Se A = {1, 2, 3}, então R = {(1, 1), (2, 2), (3, 3)} e, portanto, 1 = {x ∈ A | xR1} = {1},
Exemplo 1.1.24. Seja ∼ uma relação em Z, denida como segue: x∼y quando os restos das
divisões de x e y por 3 forem iguais. Esta é uma relação de equivalência. Com efeito,
logo, y ∼ x;
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3. Transitiva: Se x, y, z ∈ Z, x ∼ y e y ∼ z , temos que, o resto das divisões de x e y por 3 é
o mesmo, digamos t, e o resto das divisões de y e z por 3 é o mesmo, digamos s. Sendo
assim, o resto da divisão de y por 3 é dado por s e por t, logo s = t. Portanto, o resto
{. . . , −8, −5, −2, 2, 5, 8, . . .}. Sendo assim, temos que o conjunto quociente Z/ ∼ = {0, 1, 2}.
Exemplo 1.1.25. Seja A o conjunto de todas as pessoas e R a relação em A dada por: xRy
quando x for mãe de y. Esta relação não é de equivalência. De fato,
1. Não vale a reexiva: seja x∈A qualquer, x não pode ser mãe de x;
2. Não vale a simétrica: sejam x, y ∈ A e xRy , ou seja, x é mãe de y. Dessa forma, y não
é mãe de x;
Exemplo 1.1.26. Seja A o conjunto de todas as pessoas e R a relação em A dada por: xRy
quando x for irmão de y, ou quando x e y forem a mesma pessoa (diremos aqui que x e y
são irmãos quando são lhos biológicos dos mesmos pais). Esta é uma relação de equivalência,
pois:
x, logo, yRx;
xRz .
Observe que, se a relação fosse denida apenas como “xRy quando x for irmão de y”, não
dois a dois disjuntos e não vazios. Para x e y ∈ A, denimos a seguinte relação: xRy quando
x e y pertencem ao mesmo elemento da partição, isto é, xRy ⇔ existe i ∈ {1, . . . , n} tal que
x, y ∈ Ai . Esta é uma relação de equivalência. De fato,
xRz .
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Observe que se os conjuntos não fossem disjuntos dois a dois, ou seja, Ai ∩ Aj 6= ∅, poderíamos
ter y na intersecção de Ai e Aj e assim não nos valeria a transitiva e, portanto, esta relação
Exemplo 1.1.28. Seja A = {1, 2, 3}. Já vimos que A × A, assim como “=” são relações de
equivalêcia em A. Vimos também que quaisquer outras relações de equivalência neste conjunto
R1 = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (1, 2), (2, 1)};
R2 = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (1, 3), (3, 1)};
R3 = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (2, 3), (3, 2)}.
xRz .
Exemplo 1.1.30. SejaA como no exemplo anterior e S uma relação denida por: xSy ⇔
existe k∈N tal que x = y2 + k.
2
Veriquemos agora a relação S:
Sendo assim, temos que a simétrica só vale quando x2 = y 2 . Como a propriedade deve
valer pra quaisquer x, y ∈ A, temos que a simétrica não é válida. O par ordenado (−5, −4)
é um exemplo que mostra que essa relação não é simétrica, pois (−5, −4) satisfaz a con-
2 2
dição da relação, ou seja, existe k∈N tal que (−5) = (−4) + k , porém, (−4, −5) não a
satisfaz.
Com isso concluímos que apenas a simétrica não é válida, o que é suciente para que a relação
Observemos que se a relação do exemplo anterior nos desse a condição com k ∈ Z no lugar
de k ∈ N, teríamos que a relação seria de equivalência. Com efeito, seja x, y ∈ A e xSy , ou seja,
2 2 2 2 2 2
existe k1 ∈ Z tal que x = y + k1 , e assim, y = x − k1 ⇒ y = x + k2 com k2 = −k1 ∈ Z.
13
Exemplo 1.1.31. SejaA ainda como no exemplo 1.1.29 e T denida como segue: xT y ⇔
existe k∈Z tal que x − y − 3k = 0. Vamos vericar se T é uma relação de equivalência.
14
Capítulo 2
Números Naturais
Desde os primórdios existe a necessidade de contagem e são exatamente os números naturais
que estão envolvidos com esta ideia de quantidade, que é considerada básica nos dias atuais.
Os números naturais tiveram suas origens nas palavras utilizadas para a contagem de objetos,
O primeiro grande avanço na abstração foi o uso de numerais para representar os números.
avanço muito posterior na abstração foi o desenvolvimento da ideia do zero com um número com
seu próprio numeral. Um dígito zero tem sido utilizado como notação de posição desde cerca de
700 a.C. pelos babilônicos, porém ele nunca foi utilizado como elemento nal. Os Olmecas e a
civilização maia utilizaram o zero com um número separado desde o século I AC, aparentemente
da forma que ele é utilizado atualmente se originou com o matemático indiano Brahmagupta
em 628. Hoje temos este conceito de zero formalizado, poratanto, nossa construção foi feita
incluindo o zero como um número natural, porém, outros matemáticos, preferem seguir a
Formalizaremos este conceito utilizando uma axiomática, método que, apesar de ser con-
siderado uma construção, na verdade, apenas assume a existência do conjunto dos naturais,
Esta axiomatização foi dada por Giuseppe Peano, no nal do século XIX, e se apresenta
Finita, que é, na verdade, um conceito menos intuitivo e imediato do que a ideia de que o
assim segue. Logo A contém {3, 4, 5, 6, . . .}. Se esse nesse conjunto tivesse como hipótese inicial
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Os Axiomas de Peano apresentam a formalização rigorosa destas ideias intuitivas, utilizando
1. s é injetora;
2. Existe um elemento em A, que denotaremos por 0, e chamaremos de zero, que não está
na imagem de s, isto é, 0∈
/ Im(s).
(a) 0 ∈ X;
(b) Se k ∈ X, então s(k) ∈ X .
Temos garantido que tal A é diferente de vazio, pelo segundo axioma de Peano. Como
0 ∈
/ Im(s) s(0) ∈ Im(s), concluímos que 0 6= s(0), e, portanto, A possui pelo menos dois
e
elementos: 0 e s(0). Da mesma forma, podemos observar que s(s(0)) é diferente de 0, pois
0 ∈/ Im(s), e diferente s(0), pois s é injetora, ou seja, s(0) 6= 0 ⇒ s(s(0)) 6= s(0). Assim,
A possui pelo menos três elementos: 0, s(0) e s(s(0)). Prosseguindo desta forma, concluímos
que s(s(s(0))) também está em A e é diferente de 0 (pois 0 ∈ / Im(s)), diferente de s(0) (0 6=
s(s(0)) ⇒ s(0) 6= s(s(s(0))), pois s é injetora) e diferente de s(s(0)) (s(0) 6= s(s(0)) ⇒ s(s(0)) 6=
s(s(s(0))), pois s é injetora). Agora temos que A possui pelo menos quatro elementos: 0, s(0),
s(s(0)) e s(s(s(0))).
Tomando estes sucessores de forma repetida, vemos que cada elemento novo é diferente dos
anteriores mencionados. Isto será provado rigorosamente neste capítulo. Prosseguindo assim,
Denição 2.1.2. Dado um conjunto X , dizemos que ele é innito se existir uma função injetora
f : A −→ X . Um conjunto é dito nito quando não é innito.
bijeção com A, ou ainda, dizendo que este Y é equipotente a A. Uma outra denição de conjunto
innito, equivalente a esta, que existe devido a Georg Ferdinand Ludwig Philipp Cantor (1845-
1918)(ele rompeu com o paradigma grego de que o todo é sempre maior do que qualquer uma
das suas partes próprias), é a seguinte: um conjunto diz-se innito quando existir uma bijeção
O terceiro axioma de Peano é conhecido como Princípio de Indução Finita e ele é utilizado
na demonstração de propriedades que dizem respeito aos números naturais. Veremos muitos
Im(s).
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Teorema 2.1.3. Se s : A −→ A é a função sucessor, então, tem-se:
2. Im(s) = A \ {0}, isto é, 0 é o único elemento de A que não é sucessor de nenhum outro
elemento de A.
Demonstração.
0 ∈ B;
(b) Seja k ∈ A, ou seja, k 6= s(k). Como, pelo axioma 1, s é injetora, obtemos que
2. Novamente usaremos indução nita. Seja B⊂A dado por B = {0} ∪ Im(s):
(a) Claramente, 0 ∈ B;
(b) Seja k ∈ B. Com isso s(k) ∈ Im(s) ⊂ B , daí, s(k) ∈ B .
Logo, B = A. Como 0∈
/ Im(s), concluímos que Im(s) = A \ {0}.
Todo elemento de A\{0} é sucessor de um único elemento de A, que se chama seu antecessor.
Vamos, agora, formalizar a operação que chamaremos de adição e representaremos por (+),
que é, na verdade, a operação que já conhecemos do ensino básico.
ou ainda,
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e assim por diante. Esta é a idéia intuitiva que iremos formalizar a seguir utilizando o Princípio
2. Seja k ∈ Sm , isto é, m+k está denido. Temos que m + s(k) = s(m + k) está denido,
logo s(k) ∈ Sm .
operação em A.
Introduziremos agora a notação para os números naturais que é conhecida desde o ensino
básico.
Denição 2.2.3. Indica-se por 1 e lê-se um o elemento de A que é sucessor de 0, ou seja,
1 = s(0).
m + 1 = 1 + m.
que B = A:
Sendo assim, B = A.
18
O teorema seguinte mostra que os axiomas de Peano formalizam a ideia intuitiva do conjunto
N = A:
1. Por construção 0 ∈ N;
Logo, N = A.
1. 1 + 1 = s(1) = 2;
2. 2 + 1 = s(2) = 3;
3. 3 + 1 = s(3) = 4;
1. s0 (m) = m = m + 0, portando 0 ∈ Sm ;
2. Seja k ∈ Sm , ou seja, m + k = sk (m). Temos ainda que m + s(k) = s(m + k), daí, pela
k k k k+1
hipótese, m + s(k) = s(s (m)) = s ◦ s (m). Por denição, s ◦ s (m) = s (m) = ss(k) (m),
s(k)
e assim, m + s(k) = s (m), logo, s(k) ∈ Sm .
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Vamos enunciar e demonstrar agora uma proposição que será fundamental para a prova do
próximo teorema.
Proposição 2.2.10. Para todo m ∈ N, temos que m+0 = m = 0+m, isto é, m é um elemento
neutro da adição em N.
Demonstração. Por denição m+0 = m. Provemos agora que 0+m = m. De fato, consideremos
o conjunto A0 = {m ∈ N | 0 + m = m}.
1. Por denição 0 + 0 = 0, portanto 0 ∈ A0 ;
desde a escola.
Teorema 2.2.11. Se m, n e p são números naturais arbitrários, temos que as seguintes ar-
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Concluímos assim, por indução, que An = N.
que A(m,n) = N.
⇒ (m + 1) + k = (n + 1) + k
⇒ s(m) + k = s(n) + k
⇒ s(m) = s(n) por hipótese
⇒ m+1=n+1⇒m=n
O teorema anterior deixa bem claro a importância da Indução Finita nas demonstrações. A
Proposição 2.2.12. Suponhamos que exista u∈N tal que m+u=m (ou u + m = m), para
Assim como foi denida a adição, deniremos agora a operação que chamaremos de multi-
plicação:
m · p = m · (n + 1) = m · n + m.
seguir, um teorema com as propriedades da multiplicação, mas antes disso, enunciaremos duas
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Demonstração. Consideremos o conjunto S = {m ∈ N | 0 · m = 0} e utilizemos indução para
mostrar que S = N:
como queríamos.
5. mn = 0 ⇒ m = 0 ou n = 0;
6. Comutatividade: mn = nm
Demonstração.
riamente.
Sendo assim, por indução Sm = N . Como m foi xado arbitrariamente, a igualdade vale
para qualquer m ∈ N.
2. Temos que n·1 = n(0+1), e por denição n(0+1) = n·0+n = n, logo, n·1 = n. Agora, para
mostrar que 1 · n = n para todo n ∈ N, consideremos o conjunto S = {n ∈ N | 1 · n = n},
e mostremos que N = S .
22
(a) Temos que 1 · 0 = 0, por denição, logo, 0 ∈ S;
(b) Suponhamos que k ∈ S, ou seja, 1 · k = k . Sabemos que 1 · (k + 1) = 1 · k + 1, daí,
(a) De fato, 0 ∈ Am,n pois m(n+0) = mn e mn+m·0 = mn, ou seja, m(n+0) = mn+m·0;
(b) Mostremos agora que, se k ∈ Am,n , isto é, m(n+k) = mn+mk , então (k +1) ∈ Am,n .
Com efeito, m(n + (k + 1)) = m((n + k) + 1) = m(n + k) + m = (mn + mk) + m =
Logo, Sm,n = N.
Mostremos que Sm = N:
0 ∈ Sm ;
(b) Suponhamos k ∈ Sm , mk = km. Temos que m(k + 1) = mk + m = km + m,
ou seja,
Completaremos agora esta parte, mostrando que o elemento neutro, visto no segundo item do
Proposição 2.3.5. Se p∈N é tal que np = n (ou pn = n), para todo n ∈ N, então p = 1.
Demonstração. Para um tal p, 1 = 1p = p, como queríamos.
23
2.4 Relação de ordem em N
A ideia intuitiva que trazemos desde a escola, de que 0 é menor que 1, que é menor que
2 e assim sucessivamente, vem da relação de ordem que existe nos naturais, que nos permite
Denição 2.4.1. Seja R uma relação binária em um conjunto não vazio A e x, y, z elementos
condições:
1. Reexividade: xRx;
Vamos denir agora uma relação de ordem em N através da operação adição, o que o torna
um conjunto ordenado.
Denição 2.4.2. Dados m, n ∈ N, dizemos que mRn se existir p∈N tal que n=m+p
Exemplo 2.4.3.
1. Temos que 2R7, pois 7 = 2 + 5;
tiva:
signicará mRn.
24
Seja(A, +) um grupo abeliano e ≤ uma relação de ordem em A que satisfaz a ≤ b ⇔
b = a + c para algum c ∈ A. Denotamos por A∗ = A \ {0}, B+ = {x ∈ B | x ≥ 0} e
B− = {x ∈ B | x ≤ 0}.
Seguem algumas variações desta notação:
Demonstração. Novamente, devemos mostrar que s(n) = n + p, com p 6= 0. De fato, temos que
Proposição 2.4.8 (Lei da Tricotomia dos Naturais). Para quaisquer m, n ∈ N temos que uma,
e somente uma, das relações seguintes ocorre:
1. m < n;
2. m = n;
3. m > n.
Demonstração. Vamos mostrar primeiro que duas delas não podem ocorrer simultanemante e
não podem ocorrer juntas. Suponhamos agora que 1 e 3 ocorram ao mesmo tempo, isto
25
2. Suponhamos agora que k ∈ M, isto é, k=m ou k>m ou k < m. Analisemos os
três casos:
(a) k = m ⇒ k + 1 = m + 1 ⇒ k + 1 > m ⇒ k + 1 ∈ M;
(b) k > m ⇒ k = m + p para p ∈ N∗ ⇒ k + 1 = (m + p) + 1 ⇒ k + 1 = m + (p + 1) ⇒
k + 1 > m ⇒ k + 1 ∈ M;
(c) k < m ⇒ m = k + p para p ∈ N∗ . Como p 6= 0, temos que p = p1 + 1 com p1 ∈ N.
Logo, m = k + p ⇒ m = k + (p1 + 1) ⇒ m = (k + 1) + p1 . Se p1 = 0 teremos
A Proposição 2.4.8 anterior nos fornece o fato de que dois naturais são sempre compará-
veis pela relação de ordem acima denida. Chamamos uma relação de ordem que obedece a
tricotomia de relação de ordem total. Veja a seguir uma relação de ordem que não obedece a
De fato, seja X um conjunto qualquer. Vamos vericar primeiramente que esta é uma
relação de ordem:
Y = Z;
Concluímos, assim, que esta é uma relação de ordem. Precisamos agora vericar se é de ordem
total.
Consideremos primeiro X diferente de vazio e não unitário, por exemplo, X = {a, b}. Com
isso, P(X) = {∅, {a}, {b}, {a, b}}. Vemos facilmente que {a} * {b} e {b} * {a}, portanto,
não obedece a tricotomia. Concluímos então que esta é uma relação de ordem parcial em X
Suponhamos agora X = ∅ e assim, P(X) = {∅}. Esta é uma relação de ordem total, pois
o único subconjunto de P(X) é o conjunto vazio, e, obviamente, ∅ = ∅, além de ∅ não está
propropriamente contido em ∅.
Seja agora X um conjunto unitário qualquer, digamos X = {a}. Sabemos que P(X) =
{∅, {a}}. O vazio é subconjunto de qualquer conjunto, sendo assim, ∅ ⊂ {a} e ainda, {a} * ∅,
ou seja, satisfaz a tricotomia. Vericamos, assim, que a relação de inclusão é de ordem em
todo caso, mas é relação de ordem total apenas quando X é vazio ou unitário.
1. a ≤ b ⇔ a + c ≤ b + c;
26
2. a ≤ b ⇔ ac ≤ bc com c 6= 0;
Demonstração.
b + c ≥ a + c.
Note que o teorema anterior é válido com < no lugar de ≤ e a demostração segue da mesma
forma.
Demonstração. Suponhamos que a 6= b. Pela tricotomia devemos ter a < b ou b < a. Se a < b,
pelo teorema anterior, temos, ac < bc, contradizendo a hipótese de que ac = bc, da mesma
Demonstração.
Dessa forma 0 < 1 < 2 < 3 < . . .. Notemos, ainda, que não existem naturais entre a e s(a),
para todo a ∈ N, pois a < r < a + 1 implicaria, pelo teorema anterior, que a + 1 ≤ r < a + 1,
27
O próximo teorema aborda um conceito intuitivamente claro desde o Ensino Fundamental:
todo subconjunto não vazio de números naturais possui um menor elemento. Mas antes dele
Denição 2.4.13. Dado um conjunto ordenado A, dizemos que a∈A é um menor elemento
Proposição 2.4.14. Se A é um conjunto ordenado que admite um menor elemento, então este
como queríamos.
De modo análogo ao que foi feito no teorema anterior, maxA é o maior elemento ou elemento
máximo de um conjunto ordenado.
Teorema 2.4.15 (Princípio da Boa Ordem). Todo subconjunto não vazio de números naturais
k + 1 ∈ M , contradizendo a escolha de k .
Logo k ∈ S , como queríamos.
Vimos que o Princípio de Indução implica no Princípio da Boa Ordem. Estes dois princípios
são equivalentes. Neste caso assumimos o Princípio de Indução e provamos o da Boa Ordem, mas
poderíamos ter assumido o da Boa Ordem e demonstrado o outro como teorema, conseguindo
os mesmo resultados.
1. a ∈ X;
2. n ∈ X ⇒ n + 1 ∈ X.
ele:
28
1. 0∈Y pois a+0=a∈X por denição de X;
Logo N=Y.
2. Seja n ∈ X, isto é,sn (0) 6= sk (0), para todo k < n. Apliquemos s a ambos os lados
n+1
dessa desigualdade, isto é, s (0) 6= sk+1 (0), para todo k < n. Podemos dizer que
sn+1 (0) 6= sl (0) para todo l de 1 até n. Temos ainda que, sn+1 (0) 6= 0 = s0 (0), daí
sn+1 (0) 6= s1 (0), para todo l < n + 1, o que diz que n + 1 ∈ X , como queríamos.
29
Capítulo 3
Números Inteiros
Por conta do rigor matemático, não é adequado seguir a ideia de número inteiro que é
introduzida na escola. Faremos aqui uma construção rigorosa com todas as demonstrações
precisas deste conjunto numérico, através das noções básicas de Teoria dos Conjuntos e de
relações de equivalência.
Deniremos aqui, um número inteiro como uma classe de equivalência dada por uma relação
destas classes de equivalência. Em seguida, iremos denir duas operações em Z e mostrar que
sua construção.
Demonstração.
2. Simétrica: Se (a, b), (c, d) ∈ N×N e (a, b) ∼ (c, d), então, a+d = b+c, e disso, c+b = d+a,
que signica, (c, d) ∼ (a, b).
3. Transitiva: (a, b), (c, d), (e, f ) ∈ N × N, (a, b) ∼ (c, d) e (c, d) ∼ (e, f ), temos que,
Se
a + d = b + c e c + f = d + e. Assim temos a + d + e = b + c + e e a + c + f = a + d + e,
daí,
b + c + e = a + c + f ⇒ b + e = a + f ⇒ a + f = b + e.
30
Pensando de forma intuitiva, por um momento, considerando a subtração de inteiros, no-
tamos que a+d = b+c é equivalente a a − b = c − d, isto é, dois pares ordenados são
equivalentes, segundo a denição acima, quando a diferença entre suas coordenadas, na mesma
ordem, coincidem.
Esta foi a forma encontrada pelos matemáticos do século XIX para iniciar a construção
do conjunto Z sem mencionar a subtração, mas trazendo a sua essência, tendo como ponto de
Denotaremos por (a, b) a classe de equivalência do par ordenado (a, b) pela relação ∼, isto
é,
Exemplo 3.1.3.
1. (3, 2) = {(2, 1), (3, 2), (4, 3), (5, 4), . . .};
2. (1, 7) = {(0, 6), (1, 7), (2, 8), (3, 9), . . .};
3. (5, 4) = {(2, 1), (3, 2), (4, 3), (5, 4), . . .}.
(a, b) será denota por Z e chamado de conjunto dos números inteiros. Assim, Z = N × N/ ∼=
{(a, b) | (a, b) ∈ N × N}.
Deniremos agora a operação (+) em Z que denominaremos por adição. Voltando à nossa
em (a + c, b + d). Esta é a motivação para a denição formal de (a, b) + (c, d), que daremos a
seguir.
Denição 3.2.1. Sejam (a, b), (c, d) ∈ Z. A soma (a, b) + (c, d) é dada por (a + c, b + d).
Vamos mostrar a seguir que esta operação de adição está bem denida.
Teorema 3.2.2. Se (a, b) = (a0 , b0 ) e (c, d) = (c0 , d0 ), então, (a, b) + (c, d) = (a0 , b0 ) + (c0 , d0 ),
isto é, a adição de números inteiros está bem denida.
a + b 0 = b + a0 (3.1)
Da mesma forma,
c + d 0 = d + c0 (3.2)
31
Temos, por denição, que (a, b) + (c, d) = (a + c, b + d) e (a0 , b0 ) + (c0 , d0 ) = (a0 + c0 , b0 + d0 ).
Devemos mostrar que (a + c, b + d) = (a0 + c0 , b0 + d0 ). De fato, somando os primeiros e segun-
dos membros de (3.1) e (3.2), na ordem dada, obtemos,
(a + b0 ) + (c + d0 ) = (b + a0 ) + (d + c0 ) ⇒ (a + c) + (b0 + d0 ) = (b + d) + (a0 + c0 ).
Teorema 3.2.3. A adição em Z é comutativa, associativa e tem (0, 0) como elemento neutro.
Demonstração.
1. Comutativa: Devemos mostrar que, dados (a, b) e (c, d) em Z, temos (a, b) + (c, d) =
(c, d) + (a, b). De fato, (a + b) + (c + d) = (a + c, b + d) = (c + a, d + b) = (c, d) + (a, b).
2. Associativa: Queremos mostrar que, dados (a, b), (c, d) e (e, f ) em Z, temos (a, b)+((c, d)+
(e, f )) = ((a, b) + (c, d)) + (e, f )
(a, b) + (0, 0) = (a + 0, b + 0) = (0 + a, 0 + b)
= (0, 0) + (a, b) = (a, b)
Teorema 3.2.5. Vale a propriedade do elemento oposto: dado (a, b) ∈ Z, existe um único
(c, d) ∈ Z tal que (a, b) + (c, d) = (0, 0). Este (c, d) é o elemento (b, a).
32
Demonstração. Provaremos inicialmente a existência deste elemento oposto e, em seguida, a
sua unicidade.
Sendo assim, existe um elemento (c, d) = (b, a) ∈ Z, tal que,(a, b) + (c, d) = (0, 0).
Suponhamos que existam dois elementos distintos desta forma, (c, d), (c0 , d0 ) ∈ Z, isto é,
Somando o primeiro membro de (3.4) ao segundo de (3.5) e o primeiro de (3.5) com o segundo
de (3.4) obtemos:
a + c + b + d 0 = b + d + a + c0 ⇒ c + d 0 = d + c0 ,
Dessa forma, α + (−α) = (0, 0) e, como visto, −α = (b, a). A existência e unicidade de
oposto de um número inteiro permite que denamos uma terceira operação em Z, denominada
subtração.
33
1. −(−α) = α;
2. −α + β = β − α;
3. α − (−β) = α + β ;
4. −α − β = −(α + β);
5. α − (β + γ) = α − β − γ ;
Demonstração.
−α + β = (b, a) + (c, d) = (b + c, a + d)
= (c + b, d + a) = (c, d) + (b, a)
= β − α.
assim:
34
(a − b) · (c − d) = a · c + b · d − (a · d + b · c), temos a motivação para a seguinte denição.
Denição 3.3.1. Dados (a, b) e (c, d) em Z, denimos o produto (a, b) · (c, d) como sendo
(a · c + b · d, a · d + b · c).
Teorema 3.3.2. A multiplicação em Z está bem denida, isto é, se (a, b) = (a0 , b0 ) e (c, d) =
(c0 , d0 ), então, (a, b) · (c, d) = (a , b ) · (c0 , d0 ).
0 0
da + b0 d = bd + a0 d. (3.7)
ac + bd + a0 d + b0 c = ad + bc + a0 c + b0 d
(ac + bd, ad + bc) = (a0 c + b0 d, a0 d + b0 c)
(a, b) · (c, d) = (a0 , b0 ) · (c, d). (3.8)
a0 c + a0 d 0 = a0 d + a0 c 0 (3.9)
b0 c + b0 d 0 = b0 d + b0 c 0 . (3.10)
a0 c + b0 d + a0 d0 + b0 c0 = a0 d + b0 c + a0 c0 + b0 d0
(a0 c + b0 d, a0 d + b0 c) = (a0 c0 + b0 d0 , a0 d0 + b0 c0 )
(a0 , b0 ) · (c, d) = (a0 , b0 ) · (c0 , d0 ). (3.11)
como queríamos.
Teorema 3.3.3. A multiplicação em Z é comutativa, associativa, tem (1, 0) como neutro mul-
Demonstração.
35
1. Comutativa: Sejam α = (a, b) e β = (c, d) em Z. Temos,
Podemos ver que (3.12) é igual a (3.13), isto é, (ac + bd, ad + bc) = (ca + db, cb + da), que
signica αβ = βα.
α · β = (a, b) · (1, 0)
= (a · 1 + b · 0, a · 0 + b · 1)
= (a, b) = α. (3.16)
5. Cancelamento Multiplicativo: sejam α = (a, b), β = (c, d), γ = (e, f ) ∈ Z, com (e, f ) 6=
(0, 0) tais que αγ = βγ , isto é,
que equivale a
ae + bf + cf + de = af + be + ce + df
36
e disso,
(f + p)(a + d) + f (b + c) = (f + p)(b + c) + f (a + d)
⇒ f a + f d + pa + pd + f b + f c = f b + f c + pb + pc + f a + f d
⇒ pa + pd = pb + pc ⇒ p(a + d) = p(b + c)
⇒ a + d = b + c ⇒ (a, b) = (c, d) ⇒ α = β.
Suponhamos (a, b) 6= (0, 0), isto é a 6= b. Dessa forma a>b (ou b > a), e assim, a = b + p, com
∗
p∈N . Substituindo esta igualdade em (3.17) obtemos:
(b + p)c + bd = (b + p)d + bc ⇒ bc + pc + bd = bd + pd + bc
⇒ pc = pd.
Como p ∈ N∗ , podemos usar a lei do cancelamento, e concluir que c = d, o que signica que
(c, d) = (0, 0). Analogamente, se supormos que (c, d) 6= (0, 0), concluiremos que (a, b) = (0, 0).
2. (−α)(−β) = αβ .
Demonstração.
37
−αβ = −(a, b) · (c, d)
= −(bd + ac, bc + ad)
= (bc + ad, bd + ac) (3.19)
Claramente, (3.18), (3.19) e (3.20) são iguais, isto é, (−α)β = −αβ = α(−β).
Demonstração.
Façamos, como em N, uma comparação dos elementos de Z através de uma relação de ordem.
Denição 3.4.1. Dados os inteiros (a, b) e (c, d), escrevemos (a, b) ≤ (c, d), quando a+d ≤
b + c.
Proposição 3.4.2. A relação denida anteriormente está bem denida, isto é, se (a, b) =
(a0 , b0 ), (c, d) = (c0 , d0 ) e (a, b) ≤ (c, d), então, (a0 , b0 ) ≤ (c0 , d0 ).
Demonstração.
38
(a, b) ≤ (c, d) ⇒ a + d ≤ b + c
⇒ a + b0 + d ≤ b + b0 + c
⇒ a + b0 + d + d0 ≤ b + b0 + c + d0 . (3.23)
b + a0 + d + d0 ≤ b + b0 + d + c0 ⇒ a0 + d0 ≤ b0 + c0
⇒ (a0 , b0 ) ≤ (c0 , d0 ).
Teorema 3.4.3. A relação ≤ denida acima é uma relação de ordem em Z, ou seja, é reexiva,
antissimétrica e transitiva.
Demonstração.
1. Reexiva: Seja α = (a, b) ∈ Z. Claramente, (a, b) ≤ (a, b), pois, (a, b) = (a, b).
assim,
α ≤ β
(a, b) ≤ (c, d)
a+d ≤ b+c
β ≤ α
(c, d) ≤ (a, b)
c + b ≤ d + a.
Pela tricotomia dos naturais, obtemos que, a + d = b + c, isto é, (a, b) = (c, d).
a+d+p=b+c
e
c + f + q = d + e.
Somando os primeiros e segundos membros das duas igualdades, na ordem dada, obtemos
a+d+p+c+f +q = b+c+d+e
a+f +p+q = b+e
39
1. α ≤ β ⇒ α + γ ≤ β + γ;
2. α≤β e γ ≥ (0, 0) ⇒ αγ ≤ βγ ;
3. Apenas uma das situações seguintes ocorre: α = (0, 0) ou α < (0, 0) ou α > (0, 0).
Demonstração.
(a, b) ≤ (c, d) ⇒ a + d ≤ b + c
⇒ a+e+d+f ≤b+f +c+e
⇒ (a + e, b + f ) ≤ (c + e, d + f )
⇒ (a, b) + (e, f ) ≤ (c, d) + (e, f )
⇒ α + γ ≤ β + γ.
Como queríamos.
b + c = a + d + p ⇒ be + ce = ae + de + pe, (3.24)
b + c = a + d + p ⇒ bf + cf = af + df + pf (3.25)
e = f + q ⇒ pe = pf + pq. (3.26)
ae + de + pe + bf + cf = be + ce + af + df + pf.
ae + de + pf + pq + bf + cf = be + ce + af + df + pf
ae + de + bf + cf + pq = be + ce + af + df
ae + de + bf + cf ≤ be + ce + af + df
(ae + bf, af + be) ≤ (ce + df, cf + de)
(a, b) · (e, f ) ≤ (c, d) · (e, f )
αγ ≤ βγ.
40
3. Suponhamos α > (0, 0) e α < (0, 0) simultaneamente, com α = (a, b).
o que é um absurdo pela tricotomia dos naturais. Suponhamos agora α = (0, 0) e α < (0, 0)
(ou α > (0, 0)) simultaneamente.
(a, b) = (0, 0) ⇒ a = b,
O seguinte teorema mostra que Z é não só ordenado, como também, totalmente ordenado,
Teorema 3.4.5 (Tricotomia dos Inteiros) . Para α, β, γ ∈ Z, uma e apenas uma das situações
α=β simultaneamente:
a + d < b + c, b + c < a + d, a + d = b + c.
(a, b) < (c, d), (c, d) < (a, b), (a, b) = (c, d).
41
Daí, como α ≤ β, pelo item 2 do Teorema 3.4.4
Observemos que se (a, b) > (0, 0) então a > b, e assim, existe m ∈ N∗ tal que b + m = a, que
∗
equivale (a, b) = (m, 0). Analogamente, se (a, b) < (0, 0), existe m ∈ N , tal que a + m = b e
∗
dessa forma, (a, b) = (0, m). Dessa forma, temos que Z = {(0, m) | m ∈ N }∪{(0, 0)}∪{(m, 0) |
Observemos que Z+ está em bijeção com N, o que mostra que Z+ é uma cópia algébrica de N
em Z, como o seguinte teorema traduz.
Teorema 3.4.8. Seja f : N −→ Z dada por f (m) = (m, 0). Então f é injetora e valem as
seguintes propriedades:
1. f (m + n) = f (m) + f (n);
42
Dessa forma, o conjunto f (N) = Z+ , tem a mesma estrutura algébrica que N. Por exemplo,
2 + 3 = 5, corresponde, via f , a (2, 0) + (3, 0) = (5, 0). Do mesmo modo, 2.3 = 6, corresponde,
via f , a (2, 0) · (3, 0) = (6, 0). A relação 2 ≤ 3 se preserva, via f , como (2, 0) ≤ (3, 0),
um subconjunto de Z.
A função f descrita acima, chama-se imersão de N em Z, o que mostra, pela Denição 2.1.2,
Notemos que, se m ∈ N, o simétrico de (m, 0) é (0, m), logo, se identicarmos (m, 0) com
m através de f , obtemos −m = −(m, 0) = (0, m). Dessa forma, identicando N com Z+ , via
f , obtemos o que será denido a seguir.
Denição 3.4.9. Denimos o conjunto dos inteiros como
1. Como x e y são elementos positivos de Z, podemos identica-los por x = (x, 0) e y = (y, 0).
Dessa forma, xy = (x, 0) · (y, 0) = (xy, 0). Sabemos que (xy, 0) > (0, 0), portanto, xy > 0.
Temos:
43
3. Pelo Teorema 3.4.6, x < 0 ⇒ −x > 0, sendo assim,
Temos:
Denição 3.4.11. Seja X um subconjunto não vazio de Z. Dizemos que X é limitado inferi-
ormente se existe α∈Z tal que α ≤ x, para todo x ∈ X. Tal α chama-se cota inferior de X.
Dizemos que X é limitado superiormente se existir β ∈ Z tal que x≤β para todo x ∈ X. Tal
β ∈ Z:
• Se β > 0, então, β ∈ N, portanto, s(β) ∈ N. Sabemos que β < s(β), isto é, β < β + 1.
Sendo assim, para todo β > 0 em Z, existe x = β + 1 ∈ N, tal que β < x.
Teorema 3.4.14 (Princípio da Boa Ordem). Seja X⊂Z não vazio e limitado inferiormente.
0 0 0 0 0
Ordem em N, o conjunto X possui elemento mínimo , digamos, m . Assim, m ∈ X e m ≤ y
0 0 0 0 0
para todo y ∈ X . Como m ∈ X , m = m−α, para algum m ∈ X . Armamos que m = m +α
é elemento mínimo de X . Só falta vericar que m ≤ x para todo x ∈ X , mas isso equivale a
44
Demonstração. Seja A = {y ∈ Z | 0 < y ≤ 1}. Temos que A 6= ∅, dado que 1 ∈ A, e A
é limitado inferiormente por 0. Pelo Princípio da Boa Ordem, A possui elemento mínimo,
2
digamos, m. Suponhamos m < 1. Sendo assim, 0 < m < 1, logo, 0 < m < m < 1, o que
2
signica que m ∈ A e é menor do que m, contradizendo a minimalidade de m. Portanto,
digamos, m. Como m ∈ A, temos que n < m ≤ n + 1, de onde segue que 0 < m − n ≤ 1. Como
Denição 3.4.17. Seja x ∈ Z. Denimos o valor absoluto de x (ou módulo de x), denotado
Exemplo 3.4.18.
1. | − 3| = |3| = 3;
2. |0| = 0.
1. |x| ≥ 0;
2. |x| = 0 ⇔ x = 0.
Demonstração.
|x| > 0;
• Se x = 0, temos que |x| = x = 0.
45
Portanto, x = 0, como queríamos.
• Se x > 0 e y > 0, temos, pelo Teorema 3.4.10, xy > 0, e assim, por denição de módulo,
|xy| = xy . Pela mesma denição, |x| = x e |y| = y , logo, |x||y| = xy . Portanto,
|x||y| = |xy|.
• Se x < 0 e y < 0, pelo Teorema 3.4.10, xy > 0, e assim, |xy| = xy . Temos que,
x < 0 ⇒ |x| = −x e y < 0 ⇒ |y| = −y , sendo assim, pelo item 2 da Proposição 3.3.5,
|x||y| = (−x)(−y) = xy . Logo, |xy| = |x||y|.
• Se x<0 y > 0 (ou x > 0 e y < 0), pelo Teorema 3.4.10, xy < 0, isto é, |xy| = −xy .
e
Temos que, x < 0 ⇒ |x| = −x e y > 0 ⇒ |y| = y , sendo assim, |x||y| = (−x)(y) =
−xy . Logo, |xy| = |x||y|.
|x| = n ⇔ x = n ou x = −n.
|x| = n.
• Se x = −n, então |x| = | − n|. Como n > 0, pelo Teorema 3.4.6, −n < 0, sendo assim,
Denição 3.4.22. Um elemento x∈Z diz-se inversível se existe y∈Z tal que xy = 1.
46
Demonstração. Seja x ∈ Z inversível e y ∈ Z, tal que, xy = 1. Sendo assim, |xy| = |x||y| = 1.
Como |x| ≥ 0, |y| ≥ 0 e |x||y| = 1, segue que |x| > 0 e |y| > 0, que signica, |x| ≥ 1 e |y| ≥ 1.
Multiplicando esta última desigualdade por |x|, em ambos os membros, obtemos, |x||y| ≥ |x|.
Sendo assim, 1 = |x||y| ≥ |x| ≥ 1, o que nos garante |x| = 1. Daí, pela Proposição 3.4.21, x = 1
Vimos que a função f : N −→ Z, dada por f (m) = (m, 0), é injetora. Outro exemplo
de função injetora que vai de N em Z, pode ser dada por, f (m) = (0, m), ou ainda, f (m) =
(m + 1, 0). Vejamos a seguir, uma função que exibe uma bijeção entre N e Z, apresentando
Denição 3.5.2. Seja A um conjunto qualquer. Se existe uma bijeção entre A e N, dizemos
A).
Dessa forma, o Exemplo 3.5.1 nos diz que Z é enumerável e a inversa da bijeção σ é uma
enumeração para Z.
por:
n+1
, se n for ímpar,
−1
σ (n) = 2
−n
, se n for par.
2
Dessa forma temos:
−8
1. σ −1 (8) = = −4, isto é, o oitavo elemento de Z é −4.
2
4
2. σ −1 (3) = = 2, ou seja, o terceiro elemento de Z é 2.
2
Podemos ver que σ −1 ◦ σ : Z −→ Z, e ainda,
(2n − 1) + 1 2n
σ −1 (σ(n)) = σ −1 (2n − 1) = = =n
2 2
ou
−(−2n) 2n
σ −1 (σ(n)) = σ −1 (−2n) = = = n.
2 2
47
Do mesmo modo, σ ◦ σ −1 : N −→ N, e ainda,
−1 n+1 n+1
σ(σ (n)) = σ =2· −1=n+1−1=n
2 2
ou
−1 −n −n
σ(σ (n)) = σ = −2 · = n.
2 2
Como σ −1 ◦ σ = Id e σ ◦ σ −1 = Id, ca claro que σ é inversível, e portanto, bijetora.
Os estudos de Cantor, além de terem rompido com o paradigma grego de que o todo
é sempre maior do que qualquer uma das suas partes próprias , ainda generalizaram para
conjuntos innitos o fato conhecido para conjuntos nitos de que o número de elementos de
um conjunto é sempre menor do que o número de elementos das partes desse conjunto. Vamos
1. 0 ∈ A, pois, se η(X) = 0, temos que X = ∅, sendo assim, P(X) = {∅}, isto é, η(P(X)) =
20 = 1.
Desta forma, por indução, A = N. Portanto, se η(X) = n, então η(P(X)) = 2n , para todo
n ∈ N.
Cantor generalizou para conjuntos innitos a ideia contida na proposição anterior, como
de Cantor. Ele tornou estas questões rigorosas matematicamente através da sua aritmética
Esta cadeia começa com a cardinalidade de N. A Denição 2.1.2, nos diz que um conjunto X
é innito quando existe uma função injetora que vai de N em X . Claramente, o conjunto X,
com menor cardinalidade, que permite esta injeção é o próprio N, sendo assim, a cardinalidade
de N pode ser considerada a menor innita.
Mostraremos adiante que η(R) > η(N), além disso, veremos que η(R) = η(P(N)), ou seja,
R e P(N) são equipotentes. Esta desigualdade é um caso particular do que vimos no parágrafo
48
Chama-se Hipótese Generalizada do Contínuo a suposição de que não há cardinalidades
americano Kurt Godel (1906-1978) provou que a Hipótese Generalizada do Contínuo não é
contraditória com outros axiomas da Teoria dos Conjuntos, ou seja, não obtemos contradições
Dessa forma, assumindo a Hipótese do Contínuo, concluímos que entre R e N não são obtidas
cardinalidades distintas das desses dois conjuntos, ou seja, qualquer subconjunto de R, ou é
equipotente a N, ou é equipotente a R.
Demonstraremos agora a generalização feita por Cantor.
Teorema 3.5.5. Seja X um conjunto não vazio qualquer. Nenhuma função f : X −→ P(X)
pode ser sobrejetora.
49
Capítulo 4
Números Racionais
No contexto do Ensino Básico, um número racional é apresentado como a razão entre dois
inteiros, onde razão signica divisão. Aqui deniremos razão e divisão a partir do conjunto dos
a partir dos inteiros, do mesmo modo que o utilizamos para denir um número inteiro a partir
dos naturais.
Denição 4.1.1. Sejam a∈Z e b ∈ Z∗ . A relação ∼ é dada por (a, b) ∼ (c, d) quando ad = bc
Demonstração.
ad = bc ⇒ adf = bcf
cf = de ⇒ bcf = bde
Dessa forma, adf = bde, como d 6= 0, af = be, que signica, (a, b) ∼ (e, f ).
Consideremos, por um momento, nossas noções intuitivas de números racionais. Temos que,
a c
ad = bc ⇔ = , ou seja, se as divisões de a por b e c por d coincidem, podemos dizer que
b d
(a, b) ∼ (c, d),
Exemplo 4.1.3.
1. (3, 6) ∼ (1, 2) ∼ (−6, −12);
50
2. (−35, 5) ∼ (−7, 1) ∼ (14, −2).
a
Denição 4.1.4. Dado (a, b) ∈ Z × Z∗ , denotamos por (a sobre b) a classe de equivalência
b
do par (a, b) pela relação ∼ acima. Assim,
a
= {(x, y) ∈ Z × Z∗ | (x, y) ∼ (a, b)}
b
3
Exemplo 4.1.5. = {(x, y) ∈ Z × Z∗ | (x, y) ∼ (3, 6)} = {(x, y) ∈ Z × Z∗ | 6x = 3y}.
6
3 3 3
Com isso, (1, 2) ∈ , (−6, −12) ∈ e (1, 3) ∈
/ .
6 6 6
Teorema 4.1.6 (Propriedade Fundamental das Frações). Se (a, b) e (c, d) são elementos de
a c
Z × Z∗ , então = se, e somente se, ad = bc.
b d
Demonstração. Pelo item 2 do Teorema 1.1.20, temos:
a c
= ⇔ (a, b) ∼ (c, d) ⇔ ad = bc,
b d
como queríamos.
Denição 4.1.7. Denotamos por Q, e denominamos por conjunto dos números racionais, o
4.2 Operações em Q
a c
Denição 4.2.1. Sejam e números racionais, isto é, elementos de Q. Denimos operações
b d
chamadas de adição e de multiplicação, respectivamente, por:
a c ad + bc a c ac
+ = e · = .
b d bd b d bd
a c ac
Denotaremos · por .
b d bd
Exemplo 4.2.2.
2 4 2·6+3·4 24 4
1. + = = = ;
3 6 3·6 18 3
2 4 2·4 8 4
2. · = = = .
3 6 3·6 18 9
a a0 c c0
Teorema 4.2.3. As operações em Q estão bem denidas, isto é, se = 0 e = 0, então,
0 0 0 0
b b d d
a c a c a c a c
+ = 0 + 0 e · = 0 · 0.
b d b d b d b d
0 0 0 0
Demonstração. Por hipótese, ab = ba e cd = dc . Temos:
0
a c ad + bc a c0 a0 d 0 + b 0 c 0
+ = + = e .
b d bd b0 d0 b0 d0
0 0 0 0 0 0
Queremos provar que as duas somas são iguais, ou seja, que (ad + bc)b d = (a d + b c )bd, isto
0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
é, adb d + bcb d = a d bd + b c bd, ou ainda, (ab )(dd ) + (cd )(bb ) = (a b)(dd ) + (bb )(c d), o que
0 0 0 0
é fato, pois, ab = ba e cd = dc . Temos também:
51
a c ac a0 c 0 a0 c 0
· = e · = .
b d bd b0 d 0 b0 d 0
ac a0 c 0
Da mesma forma, queremos provar que = 0 0, isto é, acb0 d0 = bda0 c0 , ou, (ab0 )(cd0 ) =
bd bd
(dc0 )(a0 b), que é verdadeiro, pela hipótese acima.
Teorema 4.2.4. O conjunto Q, munido das operações acima, adição e multiplicação, tem as
0 1
propriedades algébricas de Z onde o elemento neutro aditivo é e o neutro multiplicativo é .
1 1
a 0 c a c 1
Além disso, dado um racional 6= , existe em Q tal que · = , isto é, todo elemento
b 1 d b d 1
não nulo de Q possui inverso multiplicativo.
a c e
Demonstração. Sejam r, s, t ∈ Q com r= , s = e t= :
b d f
1. Comutativa da Adição:
a c ad + bc
r+s = + =
b d bd
bc + da c a
= = +
db d b
= s + r.
2. Associativa da Adição:
a c e ad + bc e
(r + s) + t = + + = +
b d f bd f
(adf + bcf ) + bde adf + (bcf + bde)
= =
bdf bdf
a cf + de a c e
= + = + +
b df b d f
= r + (s + t).
0 a 0 a·1+0·b a
r+ = + = = = r.
1 b 1 b·1 b
0 −a
Existe r0 tal que r + r0 = . Seja r0 = ,
1 b
a −a ab + (−ab) 0 0
r + r0 = + = = = .
b b bb bb 1
5. Comutativa da Multiplicação:
ac ac ca ca
rs = = = = = sr.
bd bd db db
52
6. Associativa da Multiplicação:
a c e ac e ace
(rs)t = = =
bd f bd f bdf
a ce a ce
= = = r(st).
b df b df
1 a1 a·1 a
r· = = = = r.
1 b1 b·1 b
8. Elemento Inverso:
0 1 b
Se r 6= , existe r00 tal que rr00 = . Seja r00 = :
1 1 a
ab ab ab ab
rr00 = = = =
ba ba ab ab
11
= pelo item anterior
11
1
= .
1
a c e a cf + de a(cf + de)
r(s + t) = + = =
b d f b df b(df )
acf + ade f ac + dae b f ac + dae b(f ac + dae)
= = = =
bdf dbf b dbf b(dbf )
bf ac + bdae ac ae ac ae
= = + = + = rs + rt.
bdbf bd bf bd bf
os itens abaixo:
1. s + r = t + r ⇔ s = t;
0
2. Para r 6= , sr = tr ⇔ s = t.
1
Demonstração.
a c e
1. Sejam s= , t = e r= :
b d f
a e c e af + be cf + de
s+r =t+r ⇔ + = + ⇔ =
b f d f bf df
⇔ (af + be)(df ) = (cf + de)(bf ) ⇔ af df + bedf = cf bf + debf
⇔ f (af d + bed) = f (cf b + deb) ⇔ af d + bed = cf b + deb
a c
⇔ af d = cf b ⇔ ad = cb ⇔ = ⇔ s = t.
b d
53
a c e 0
2. Sejam s= , t = e r= 6= :
b d f 1
ae ce ae ce
sr = tr ⇔ = ⇔ = ⇔ (ae)(df ) = (ce)(bf )
bf df bf df
a c
⇔ ad = cb ⇔ = ⇔ s = t.
b d
Proposição 4.2.6. Os elementos r0 e r00 são únicos e denotam-se por −r e r−1 , chamados de
0
Demonstração. Suponhamos que u0 seja também um simétrico de r. Assim, u0 + r = e
1
0
r0 + r = , dessa forma, u0 + r = r0 + r, daí, pelo item 1 da Proposição 4.2.5, u0 = r 0 .
1
1 1
Suponhamos agora que u00 seja também um inverso de r. u00 r = e r00 r = , dessa
Assim,
1 1
0
forma, u00 r = r00 r, daí, pelo item 2 da Proposição 4.2.5,
00 00
u = r (r 6= para possuir inverso).
1
forma: se r, s ∈ Q, então:
s − r = s + (−r).
2. (−r)(−s) = rs.
Demonstração.
1.
a c ac
(−r)s = − = − = −rs
b d bd
ca c a
−rs = − = − = (−s)r = r(−s).
db d b
2.
a c
(−r)(−s) = − −
b d
a c a c
= − − =− − pelo item anterior
b d b d
ac ac ac
= − − =− − = pelo item 2 da Proposição 3.3.5
bd bd bd
ac
= = rs.
bd
54
Proposição 4.2.9. Vale a distributiva da multiplicação em relação à subtração: r(s − t) =
rs − rt.
a c e
Demonstração. Sejam r= , s = e t= :
b d f
a c e a c e
r(s − t) = − = + −
b d f b d f
ac a e ac ae
= + − = + −
bd b f bd bf
ac ae
= − = rs − rt.
bd bf
−a a a −a
Proposição 4.2.10. Para (a, b) ∈ Z × Z∗ , temos que: = =− =− .
b −b b −b
Demonstração. Para (a, b) ∈ Z × Z∗ , herdando as propriedades dos inteiros temos:
−a a a −a
= =− =− .
b −b b −b
a
Segundo esta Proposição 4.2.10, se ∈ Q, então b pode ser tomado positivo. Este fato será
b
utilizado para denir a relação de ordem em Q a seguir.
ordem em N.
Teorema 4.3.2. A relação ≤ está bem denida e é uma relação de ordem em Q.
Demonstração. Vamos mostrar inicialmente que a relação está bem denida.
a a0 a c
Seja = 0 , isto é, ab0 = a0 b. Temos que ≤ ⇒ ad ≤ bc, e, como b0 > 0, obtemos
b b b d
ab0 d ≤ bcb0 , daí, pela igualdade acima, a0 bd ≤ bcb0 , de onde concluímos que a0 d 0
≤ cb , ou seja,
0
a c
≤ .
b0 d
c c0
Do mesmo modo, como = 0 ⇒ cd0 = dc0 ,
d d
a0 c 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 a0 c0
≤ ⇒ a d ≤ cb ⇒ a dd ≤ cb d ⇒ a dd ≤ c db ⇒ a d ≤ c b ⇒ ≤ .
b0 d b0 d0
a c a0 c a0 c a0 c0 a c a0 c0
Logo, como ≤ ⇒ 0 ≤ e ≤ ⇒ 0 ≤ 0, concluímos que ≤ ⇒ 0 ≤ 0.
b d b d b0 d b d b d b d
Provemos, agora, que esta é uma relação de ordem:
55
a a a a a
1. Reexiva: se ∈ Q, claramente, = , isto é, ≤ ;
b b b b b
a c a c c a
2. Simétrica: se , ∈ Q, ≤ e ≤ , temos que ad ≤ bc e cb ≤ ad, daí, pela tricotomia
b d b d d b
a c
dos inteiros, obtemos, ad = bc, isto é = ;
b d
a c e a c c e
3. Transitiva: se , , ∈ Q, ≤ e ≤ , temos ad ≤ bc e cf ≤ ed. Multiplicando
b d f b d d f
f na primeira e b na segunda desigualdade (podemos fazer isto, pois, b, d > 0), obtemos
adf ≤ bcf e bcf ≤ bed, daí, pela transitividade dos inteiros, obtemos, adf ≤ bed, ou ainda,
a e
af ≤ be (d > 0), que signica, ≤ .
b f
1. r ≤ s ⇔ r + t ≤ s + t;
0
2. Se r≤s e t≥ , então rt ≤ st;
1
0
3. Se r≤s e t≤ , então rt ≥ st.
1
a c e
Demonstração. Sejam r= e s= e t= :
b d f
1.
a c
≤ ⇔ da ≤ bc ⇔ daf ≤ bcf pois f >0
b d
⇔ daf + dbe ≤ bcf + dbe por propriedade dos inteiros
e 0 e 0
2. Como t= e t≥ , temos ≥ ⇒ e ≥ 0. Assim:
f 1 f 1
a c
≤ ⇒ ad ≤ cb
b d
⇒ aedf ≤ cebf pois e ≥ 0 e f >0
ae ce ae ce
⇒ ≤ ⇒ ≤ .
bf df bf df
e 0 e 0
3. Como t= e t≤ , temos ≤ ⇒ e ≤ 0. Assim:
f 1 f 1
a c
≤ ⇒ ad ≤ cb ⇒ adf ≤ cbf pois f > 0
b d
⇒ aedf ≥ cebf pois e ≤ 0
ae ce ae ce
⇒ ≥ ⇒ ≥ .
bf df bf df
56
Como em Z, temos aqui:
na o na o
Q∗ = | (a, b) ∈ Z∗ × Z∗+ , Q∗+ = | (a, b) ∈ Z∗+ × Z∗+ ,
b b
na na
o o 0
Q∗− = | (a, b) ∈ Z∗− × Z∗+ , Q− = | (a, b) ∈ Z∗− × Z∗+ ∪ ,
b b 1
na
o 0 0
Q+ = | (a, b) ∈ Z∗+ × Z∗+ ∪ e Q= Q∗− ∪ ∪ Q∗+ .
b 1 1
Teorema 4.3.4 (Tricotomia em Q). Dados r, s ∈ Q, uma, e apenas uma, das situações seguin-
tes ocorre: ou r = s,
r < s, ou s < r.
ou
a c
Demonstração. Seja r = e s = com b, d > 0. Pela tricotomia em Z, ou ad = bc, caso em
b d
que ocorre r = s, ou ad < bc, caso em que ocorre r < s, ou bc < ad, caso em que ocorre s < r .
2. i(mn) = i(m)i(n);
m+n 1·m+m·1 m n
1. i(m + n) = = = + = i(m) + i(n);
1 1·1 1 1
mn m·n mn
2. i(mn) = = = = i(m)i(n);
1 1·1 1 1
m n
3. m≤n⇒m·1≤n·1⇒ ≤ ⇒ i(m) ≤ i(n).
1 1
nn o
Novamente temos um homomorsmo injetor, de modo que, o conjunto i(Z) = |n∈Z
1
é uma cópia algébrica de Z em Q. Como existe uma cópia algébrica de N em Z, essa imersão
Faremos agora uma série de demonstrações para conseguirmos chegar ao teorema que garante
57
Estes resultados estão demonstrados em [9].
não vazio. Obtidos x0 , x1 , x2 , . . . , xn (n ∈ N) dessa forma acima, obtemos xn+1 como sendo o
novamente ao Princípio da Boa Ordem, dado que Yn é não vazio para todo natural n (pois X
é innito).
ser maior do que x0 , por estar em Y0 , deveria ser maior do que x1 por estar em Y1 e, assim
sucessivamente, x deveria ser maior do que xn para todo n ∈ N. Dessa forma, o conjunto
Enunciaremos um resultado bastante interessante que pode ser demonstrado com as propri-
edades de Z, prova esta que pode ser encontrada em [7], ele é chamado Teorema Fundamental
da Aritmética: todo número natural maior que 1 pode ser expresso como produto de números
primos. Além disso, essa fatoração é única, a menos da ordem dos fatores.
a
Lema 4.3.7. Todo número racional positivo (a, b > 0), pode ser escrito, de modo único,
b
m
como uma fração irredutível, isto é, na forma , onde m e n são primos entre si, ou seja, não
n
possuem fatores primos em comum.
58
Demonstração. Consideremos os números racionais escritos na forma irredutível,
0 como no lema
m m m
∗
anterior. Seja f : Q+ −→ N dada por f = 2m · 3n . Se f =f 0
m n
, então, 2 · 3 =
n n n
0 0
2m · 3n , daí, pelo Teorema Fundamental da Aritmética e pela a unicidade da representação
m 0 0
de frações na forma irredutível, dada pela proposição acima, 2 = 2m e 3n = 3n , ou seja,
0
m m
m = m0 e n = n0 , que nos garante que, = 0 . Logo, f é injetora e tem como imagem
n n
um subconjunto innito de N, que é, pelo Lema 4.3.6, enumerável. Daí segue o que queríamos
provar.
Proposição 4.3.9. A união de dois conjuntos enumeráveis é enumerável. Além disso, a união
A ∩ B 6= ∅.
Suponhamos primeiro que A ∩ B = ∅:
ComoA é enumerável, existe f1 : A −→ Nbijetora. Temos que existe também uma função
g1 : N −→ Np (onde Np são os números naturais pares), dada por g1 (n) = 2n para todo n ∈ N.
Como para todo 2n existe n, tal que g(n) = 2n e 2n = 2m ⇔ n = m, esta função é bijetora,
sendo assim, podemos ter h1 = g1 ◦ f1 : A −→ Np , dada por h1 (x) = 2f (x), bijetora. Do mesmo
são os números naturais ímpares), dada por g2 (n) = 2n + 1 para todo n ∈ N, que é claramente
bijetora. Desta forma, obtemos h2 = g2 ◦ f2 : B −→ Ni , dada por h2 (x) = 2f2 (x) + 1, bijetora.
ou X ∩ Y 6= ∅.
59
(
yk se 1 ≤ k ≤ n,
f (k) =
g(k − n) se (n + 1) ≤ k.
Esta função está bem denida, pois X ∩Y = ∅ e, claramente, é bijetora, portanto, X ∪Y é
enumerável.
Seja agora, X ∩ Y 6= ∅:
Seja C = X \ Y , um conjunto tal que X ∪ Y = C ∪ Y . Temos Y ∩ C = ∅ por construção,
portanto, pelo que já foi demonstrado acima, C ∪ Y é enumerável, logo, X ∪ Y tmabém é.
O conjunto dos números racionais está munido das duas operações, adição e multiplicação,
estudadas no decorrer deste capítulo, além da subtração e divisão, que são denidas a partir
das duas primeira e simbolizadas por (−) e :, respectivamente. A subtração já foi denida
anteriormente como: se r, s ∈ Q, r − s = r + (−s). Já a divisão, é dada da seguinte forma:
Denição 4.3.12. Sejam r, s ∈ Q com s 6= 0. Dizemos que r dividido por s é dado por
r : s = r · s−1 .
Olhando a denição exatada de operação, podemos ver que, a divisão não é uma operação
Dessa forma, identicando Z com sua cópia algébrica i(Z) em Q, a igualdade da proposição
a
acima se escreve a:b= .
b
a c c 0 a c ad
Proposição 4.3.14. Se , ∈ Q, com 6= , então : = .
b d d 1 b d bc
a c a d ad
Demonstração. : = · = .
b d b c bc
a
b a c
É usual, nos textos elementares de matemática, adotar-se a notação c para : , exten-
d
b d
dendo a notação da proposição anterior.
valem:
1. Se rs = 0, então s=0 ou r = 0;
60
2. Se r>0 e s > 0, então rs > 0;
a c ac
2. >0⇒a>0 e > 0 ⇒ c > 0, sendo assim, ac > 0, logo > 0;
b d bd
a c ac
3. >0⇒a>0 e < 0 ⇒ c < 0, sendo assim, ac < 0, logo < 0;
b d bd
a c ac
4. <0⇒a<0 e < 0 ⇒ c < 0, sendo assim, ac > 0, logo > 0;
b d bd
a b
5. > 0 ⇒ a > 0. Temos que b > 0, por convenção, sendo assim, > 0, isto é, r−1 > 0;
b a
6. Se r < s, temos que, 2r < r + s e r + s < 2s,
2r < r + s < 2s daí, e assim,
a a c c a −1 a
c c
2· < + <2· ⇒ <2 + < ,
b b d d b b d d
61
Acabamos de ver que Q não é um conjunto bem ordenado como Z, porém, ele possui, além
de todas as propriedades aritméticas de Z, a propriedade de que todo elemento não nulo possui
inverso.
Denição 4.3.17. Sejam (K, +, ·) um conjunto munido de duas operações. Dizemos que K é
um corpo, se:
1. + e · são associativas;
3. + possui elemento simétrico e · elemento inverso, para todo elemento distinto do neutro
da adição;
4. + e · são comutativas;
5. · é distributiva em relação a +.
E ainda, se este corpo tiver uma relação de ordem compatível com suas operações, ele é
ordenados em geral.
62
Escrevemos b = sup X para indicar que b é o supremo do conjunto X. O ínmo de um
conjunto é dado analogamente, sendo a maior das cotas inferiores (cota inferior máxima de X)
e, escreve-se a = inf X , quando a é o ínmo do conjunto X.
Temos que, se existe o supremo b de X, então este supremo é único. De fato, suponhamos
que existam dois supremos b2 . Dessa forma, x ≤ b1 para todo x ∈ X e, se c ∈ Q tal que
b1 e
b1 = b2 .
Denição 4.3.21. Seja K um corpo ordenado. Dizemos que K é arquimediano se, dados
Teorema 4.3.22.
1. O conjunto N⊂Q não é limitado superiormente;
1
2. O ínmo do conjunto X= | n ∈ N∗ é igual a 0;
n
3. Q é um corpo arquimediano.
Demonstração.
a a
1. Suponhamos que exista ∈Q ≥ n para todo n ∈ N. Como, por convenção,
tal que
b b
a
b > 0, temos que a, b ∈ Z∗+ , isto ∗
é, a, b ∈ N . Dessa forma, b ≥ 1 e, assim, a ≥ .
b
a ∗ a
Se a > , como a ∈ N , encontramos uma contradição com o fato de que é um limitante
b b
superior de N em Q.
a a ∗
Se a = , então a + 1 > a = e, como a ∈ N ⇒ a + 1 ∈ N, encontramos uma
b b
a
contradição com o fato de que é um limitante superior de N em Q. Logo, N não é
b
limitado superiormente em Q;
2. Claramente, 0 é uma cota inferior de X. Basta então provar que nenhum c > 0 é cota
1 1
inferior de X. Dado c > 0, existe, pelo item 1, um número natural n > , daí, < c,
c n
como queríamos;
b
3. Dados a, b ∈ Q, usamos 1 para obter n∈N tal que n> . Então, n · a > b.
a
As três propriedade acima são equivalentes. Vale ressaltar que estas propriedades são válidas
desta mesma forma, não só para Q, mas também para todo corpo ordenado.
63
Capítulo 5
Números Reais
Os números reais foram construídos de duas formas diferentes, a partir dos racionais. Uma
delas foi por Classes de Equivalência de Sequência de Cauchy e foi dada por Cantor. A outra
foi através dos Cortes de Dedekind. Faremos aqui, esta última, que foi apresentada por Julius
Quando se fala deste conjunto no contexto escolar, diz-se que nem todos os pontos da reta
correspodem a números racionais, sendo que a esses pontos correspondem a números chamados
sempre periódica e toda representação decimal periódica representa um número racional. Sendo
assim, deni-se número irracional como sendo aqueles que possuem representação decimal não
periódica. Dessa forma, chama-se conjunto dos números reais aquele constituído pelos racionais
e irracionais.
Estas são formas nas quais os números reais são abordados na matemática escolar, entre-
tanto, faremos aqui uma construção rigorosa deste conjunto a partir dos números racionais com
cortes, denir a adição e multiplicação nele e, em seguida, mostrar que ele possui as propriedades
aritméticas de Q e mais uma propriedade que Q não possui. Chamaremos este conjunto de
1. α 6= ∅ e α 6= Q;
64
3 3
2. Seja r∈A e s < r, assim, s<r< , logo s< , isto é, s ∈ A;
5 5
3. Suponhamos que exista uma máximo em A, digamos m. Sendo assim,
r ≤ m para todo
3 3 −1 3
r ∈ A. Sabemos que m< , portanto, pela Proposição 4.3.15, m< m+ 2 < ,o
5 5 5
que contradiz a maximalidade de m. Logo, A não possui máximo.
Portanto, A é um corte.
3
Exemplo 5.1.3. O conjunto B= x∈Q|x> não é um corte:
5
1. B 6= ∅, pois 1∈B e B 6= Q, pois 0∈Q e 0∈
/ B;
65
Proposição 5.1.8. Sejam α um corte e r ∈ Q. Então, r é cota superior de α se, e somente
se, r ∈ Q \ α.
r ∈ Q \ α.
isto é,
item 2 da denição de corte, r ∈ α, o que é uma contradição com a hipótese, logo, r ≥ s, isto
superior de α.
Demonstração.
Seja s∈Q uma cota superior de s < r, o que implica que s ∈ α, assim s
α. Suponhamos que
é um elemento máximo de α, contradizendo o fato de α ser corte. Logo, r ≤ s para toda cota
Denição 5.1.10. Os cortes do tipo da proposição anterior são chamados cortes racionais e
se representam por r∗ .
Proposição 5.1.11. Todo corte que possui cota superior mínima é racional.
Temos que r ∈ / α pois, caso contrário, r seria máximo de α, o que não pode acontecer, por
denição de corte, sendo assim x < r para todo x ∈ α. Como r é a mínima das cotas superiores
de α, temos que, qualquer s ∈ Q, tal que s < r , não é cota superior de α, isto é, pertence a α.
que o número x o qual é solução desta equação não é um número racional. Suponhamos por
66
implica que a2 é par, daí, podemos armar que a também é par (quadrado de um número par
por a = 2m.
2 2 2 2 2 2 2
Agora, a = 2b ⇒ (2m) = 2b ⇒ 2m = b . Isto signca que b é par, novamente,
podemos armar que b também é par. Concluímos que a é par e b é par, logo, o m.d.c(a, b) = 2,
é racional.
Demonstração.
• Se s≤0 então s ∈ α;
• Se s>0 e s < r, então s2 < r2 < 2, isto é, s ∈ α;
3. Para cada r ∈ α é possível encontrar um racional s ∈ α tal que r < s. De fato, suponhamos
Veriquemos agora queα não possui cota superior mínima. Os racionais que não pertencem
a α são os positivos que têm quadrado maior ou igual a 2, e sabemos que não existe racional
cujo quadrado é igual a 2, pelo Exemplo 5.1.12. Sendo assim, q é uma cota superior de α se
q > 0 e q ∈ Q tal que q 2 > 2. Mostraremos que, para cada cota superior p, encontraremos
2
outra cota superior q tal que q < p. De fato, seja p uma cota superior, isto é p ∈ Q e p > 2.
2
p −2
Seja q = p − . Dessa forma, 0 < q < p e
2p
2 2
p2 − 2 p2 − 2 p2 − 2
2 2
q = p − 2p + =2+ > 2.
2p 2p 2p
67
Demonstração. Uma vez que p e q são números racionais e a relação de ordem usual em Q é
da denição de corte que q ∈ α, mas isto contradiz, novamente, nossa hipótese. Portanto, nos
Desta forma, os elementos de um corte α serão, daqui por diante, chamados números infe-
riores de α, enquanto que os racionais que não estão em α serão chamados números superiores
de α.
Denotaremos, a partir daqui, por C o conjunto de todos os cortes.
Exemplo 5.2.2.
∗ ∗
4 4
1. 5∗ > , pois 1 ∈ 5∗ \ ;
5 5
1
2. 1∗ > 0∗ pois ∈ 1∗ \ 0∗ ;
2
1
3. (−1)∗ < 0∗ , ∗ ∗
pois − ∈ 0 \ (−1) ;
2
18
4. Se α = {x ∈ Q+ | x2 < 2} ∪ Q∗− , então α < 2∗ , pois ∈ 2∗ \ α.
10
Denição 5.2.3. Seα ∈ C e α > 0∗ , α chama-se corte positivo. Se α < 0∗ , é chamado de
1. α<β⇔α⊂β e α 6= β ;
2. α ≤ β ⇔ α ⊂ β.
Demonstração.
68
Teorema 5.2.5 (Tricotomia) . Sejam α, β ∈ C , então uma e somente uma das possibilidades
a seguir ocorre:
item 2 da Proposição 5.2.4,α ≤ β . Se α < β , obteríamos uma contradição, pois, pelo item 1
desta mesma proposição teríamos, α 6= β . Portanto, a igualdade α = β , exclui as outras duas
possibilidades. Temos ainda que, α < β ou β < α excluem α = β , pelo item 1 da Proposição
5.2.4. Veriquemos agora que as posibilidades α < β e β < α se excluem mutuamente. Para
(
α < β ⇒ α ⊂ β e α 6= β,
β < α ⇒ β ⊂ α e β 6= α.
conjunto.
Devemos mostrar ainda que uma das três deve ocorrer. Temos que α=β ou α 6= β . Se
α=β não há o que provar. Se α 6= β , então α \ β 6= ∅ ou β \ α 6= ∅. No primeiro caso, β < α
Demonstração.
3. Transitiva: Sejam α, β, γ ∈ C , α ≤ β e β ≤ γ.
(
α ≤ β ⇒ α ⊂ β,
β ≤ γ ⇒ β ⊂ γ.
α ⊂ γ, daí α ≤ γ.
5.3 Operações em C
Demonstração. Devemos mostrar que γ ∈ C , isto é, provar que satisfaz as três considições para
ser um corte:
69
1. Como α 6= ∅ e β 6= ∅, claramente γ 6= ∅. Sejam t ∈ Q \ α e u ∈ Q \ β . Sendo assim, t > r
para todo r ∈ α e u > s para todo s ∈ β , daí, t + u > r + s, para todo r ∈ α e para todo
3. Devemos mostrar que γ não possui elemento máximo, isto é, para todo r ∈ γ , existe s ∈ γ
tal que r < s. De fato, temos que r = p + q com p ∈ α e q ∈ β . Como existe p0 ∈ α tal
que p < p0 , o racional s = p0 + q ∈ γ e é maior do que r.
anterior, isto é,
α + β = {r + s | r ∈ α e s ∈ β}.
Demonstração.
Lema 5.3.4. Sejam α∈C e r ∈ Q∗+ . Então existem números racionais p e q tais que p ∈ α,
q∈
/ α, q não é cota superior mínima de α e q − p = r.
• A ⊂ N, por denição de A;
• A 6= ∅, pois 0 ∈ A;
70
• A é nito, por consequência das condições 2 e 3 para α ser corte.
Portanto podemos armar que o conjunto A assume um máximo m. Isto acarreta que sm ∈ α
e sm+1 ∈
/ α.
Se s + (m + 1)r não for cota superior mínima de α, devemos tomar p = s + mr e q =
s + (m + 1)r, daí, q − p = r. Se s + (m + 1)r for cota superior mínima de α, devemos tomar
r r
p = s + mr + e q = s + (m + 1)r + , daí, q − p = r.
2 2
Teorema 5.3.5. Dado α um corte, existe um único corte β tal que α + β = 0∗ . Como nos
casos dos inteiros e racionais, tal β denota-se por −α e se chama simétrico (ou oposto) de α.
0
Demonstração. Provemos inicialmente a unicidade. Suponhamos que α + β = α + β = 0∗ :
0 0 0 0
β = β + 0∗ = β + (α + β) = (β + α) + β = 0∗ + β = β.
β = {p ∈ Q | −p ∈
/α e −p não é cota superior mínima de α}.
2. seja p ∈ β e q ∈ Q tal que q < p. Queremos mostrar que q ∈ β . Como p ∈ β , temos que
−p ∈
/ α e −p não é cota superior mínima de α. Como q < p, então
−p < −q (5.1)
daí, −q ∈
/α (visto que −p ∈
/ α). Temos também que −q não é cota superior mínima de
71
−q ≤ −p, contradizendo (5.1)). Como q ∈ Q, −q ∈
/α e −q não é cota superior mínima
de α, concluímos que q ∈ β .
3. Seja p ∈ β, queremos mostrar que existe q∈β tal que p < q. Dividiremos em dois casos.
Como −p ∈
/α eα não possui cota superior mínima, então existe uma cota superior
q de α (isto é, q∈
/ α), tal que q < −p. Assim, −q ∈ β e p < −q , logo β não possui
máximo.
• α m:
possui cota superior mínima
−m + p
Seja r = ∈ Q. Como p ∈ β , temos que −p ∈/ α, ou seja, é uma cota superior
2
de α, mas não é cota superior mínima de α, portanto, m < −p, daí, p < −m. Sendo
assim,
−m + p −m p p p
r= = + > + = p.
2 2 2 2 2
Por outro lado,
m−p m p m m
−r =
= − > + = m,
2 2 2 2 2
portanto, −r 6= m. Como −r > m, então −r ∈ / α. Finalmente, como r ∈ Q, −r ∈ /α
e −r não é cota superior mínima de α, temos que r ∈ β e p < r , logo, β não possui
máximo.
• p ∈ 0∗ ⇒ p ∈ Q e p < 0 (−p > 0). Sejam r ∈ α e r0 ∈ / α (r0 não sendo cota superior
0 0
mínima de α), tais que r − r = −p (Lema 5.3.4). Segue que p = r + (−r ), com r ∈ α e
−r0 ∈ β , ou seja, p ∈ α + β .
α + (−α) = α − α = −α + α = 0∗ .
72
Teorema 5.3.8 (Compatibilidade da relação de ordem com a adição) . Sejam α, β, γ ∈ C tais
que α ≤ β. Então α + γ ≤ β + γ.
Demonstração. α ≤ β ⇔ α ⊂ β . Seja t ∈ α + γ , isto é, t = r + s com r ∈ α e s ∈ γ . Como
α ⊂ β, então r ∈ β , e t = r + s ∈ β + γ , ou seja, α + γ ⊂ β + γ . Portanto, α + γ ≤ β + γ .
e q ≥ 0.
s
Como r > 0, segue que p>0 e q > 0. (s ≥ 0, p > 0 ⇒ t ≥ 0). Se q ≤ t,
Seja t=
p
teríamos pq ≤ pt, isto é, r ≤ s, o que é um absurdo, pois, s < r . Logo, devemos ter t < q
3. Seja r ∈ γ e mostremos que existe s ∈ γ tal que r < s. De fato, se r < 0, basta tomar
r
s = < 0, daí s > r. Suponhamos r ≥ 0. Neste caso, r ∈ γ signica que r = pq , com
2
p ∈ α, q ∈ β , p ≥ 0 e q ≥ 0. Existem t ∈ α e u ∈ β tais que p < t e q < u (pois α e β não
possuem máximo). Logo, r = pq < tu. Tomando s = tu, temos s ∈ γ (pois s = tu com
anterior, isto é,
Para denir produto de cortes que contêm fatores negativos, começamos com noção de valor
absoluto de um corte.
Denição 5.3.11. A cada corte α associamos um corte |α| que chamamos valor absoluto de
α, denido por (
α se α ≥ 0∗ ,
|α| =
−α se α < 0∗ .
73
Proposição 5.3.12. Se α < 0∗ , então −α > 0∗ .
q < 0. Tomemos r = −q , que nos fornece r > 0. Nesta condições, vemos que r ∈ −α (por
denição de corte oposto, pois −r = q , q ∈
/ α e q não é cota superior mínima de α) e r > 0,
/ 0 , o que nos garante que −α > 0∗ .
isto é, r ∈
∗
1. |α| ≥ 0∗ ;
2. |α| = 0∗ ⇔ α = 0∗ .
Demonstração.
contradição.
1. Comutativa: αβ = βα;
3. Elemento Neutro 1∗ : α · 1∗ = α.
74
1. Seja r ∈ αβ . Se r < 0, então r ∈ βα, por denição de produto. Suponhamos r ≥ 0.
Então r = pq , p ∈ α, q ∈ β , p ≥ 0 e q ≥ 0. Portanto r = pq = qp, q ∈ β , p ∈ α, q ≥ 0 e
Por outro lado, seja r ∈ α. Se r < 0 então r ∈ α, por denição de produto. Suponhamos
r
r ≥ 0. Tomemos p ∈ α tal que 0 ≤ r ≤ p (pois α não tem máximo). Se q = então
p
0 ≤ q < 1 e portanto q ∈ 1∗ . Concluímos que, como r = pq , p ∈ α, q ∈ 1∗ , p > 0, q ≥ 0,
∗ ∗ ∗
então r ∈ α · 1 . Portanto α ⊂ α · 1 . Logo α = α · 1
−(|β||α|) = βα, por denição de módulo, pelo que foi demonstrado anteriormente (|α| ≥ 0 e
|β| ≥ 0) e por denição de produto.
Demonstração.
1. 0 ∈ β , portanto β 6= ∅. Seja p ∈ α tal que p > 0 (este p existe pois, como α > 0∗ existe
q ∈ Q, q ∈ α e q ∈ / 0∗ , isto é, q ≥ 0. Devemos provar agora que p−1 ∈ / β . De fato, se
−1 −1 −1
p ∈ β , então teríamos que (p ) = p ∈ / α, isto é, p ∈
/ α, o que é contradição, pois
−1
p ∈ α. Logo, p ∈ / β , ou seja, β 6= Q;
3. Seja p ∈ β.
Mostraremos que existe q∈β tal que p < q.
Sem perda de generalidade, vamos supor p > 0. Como p ∈ β e p > 0, então p−1 ∈/ αe
r + p−1
existe r∈
/α tal que r < p−1 . Tomemos s =
−1
. Assim temos r < s < p . Tomando
2
75
q = s−1 temos q = s−1 > p > 0, portanto, q > 0. De fato, q −1 = s ∈ / α (pois s>r e
Denição 5.3.17. Seja α um corte tal que α 6= 0∗ . Se α > 0∗ , então o corte β do teorema
anterior é denotado por α−1 e chamado de inverso de α. Se α < 0∗ , então denimos o inverso
de α como α−1 = −|α|−1 .
Teorema 5.3.18. Seja α um corte tal que α 6= 0∗ . Então αα−1 = 1∗ . Além disso, o inverso
de α é único.
• α > 0∗ :
Seja r ∈ αα−1 . Se r ≤ 0, então r ∈ 1∗ . Suponhamos r > 0. Como r ∈ αα−1 existem
s ∈ α, p ∈ α−1 tal que r = sp, s ≥ 0, p ≥ 0. Como r > 0, devemos ter s > 0 e p > 0.
−1
Como p ∈ α e p > 0, existe q ∈ / α tal que q < p−1 . Como s ∈ α e q ∈ / α, então s < q .
−1 −1 −1 −1
De q < p , temos p < q , daí, sp < sq . Portanto, como s < q , temos que sq < 1, e
−1 ∗
assim, r = sp < sq < 1, daí r ∈ 1 .
Reciprocamente, seja r ∈ 1∗ , isto é, r < 1. Se r < 0, então r ∈ αα−1 , por denição de
−1 −1
produto. Se r = 0, temos r = p · 0, ponde p ∈ α, 0 ∈ α e p > 0, logo r ∈ αα .
Suponhamos agora, 0 < r < 1. Seja s ∈ α com s > 0. Seja n o maior natural que
−1 n n
satisfaz s (r ) ∈ / α (este n existe, pois, r−1 > 1 e se s (r−1 ) ∈ α para todo n ∈ N,
−1 n−1
teríamos α = Q, o que é uma contradição, pois α é corte). Tomemos p1 = s (r ) ∈α
−1 n
e t = s (r ) ∈/ α. Seja p ∈ α tal que p1 < p (α não possui máximo). Tomemos
q = t−1 p−1 p1 , isto é, q −1 = tpp−1
1 . Assim, podemos ter
p1 < p ⇒ p1 p−1 −1 −1 −1 −1
1 < pp1 ⇒ 1 < pp1 ⇒ t < tpp1 ⇒ t < q .
Assim, como / α, q −1 ∈
t∈ /α e q −1 não é a menor cota superior de α. Temos ainda,
• α < 0∗ :
Se α < 0∗ , por denição,α−1 = −|α|−1 . Sabemos que |α|−1 > 0∗ (pelo item 1 da
−1
Proposição 5.3.13), e disso, −|α| < 0∗ (pela Proposição 5.3.12), isto é, α−1 < 0∗ . Daí,
−1
por denição de produto, αα = |α||α−1 | = |α|| − |α|−1 | = | = |α||α|−1 = 1∗ .
76
Provemos agora a unicidade de α−1 . Suponhamos que existam α1−1 e α2−1 , tais que αα1−1 = 1∗
e αα2−1 = 1∗ . Assim,
α(β + γ) ⊂ αβ + αγ .
Mostremos agora que αβ + αγ ⊂ α(β + γ). Com efeito,
com p ≥ 0 e s + q ≥ 0;
Provamos, então, que existe a dupla inclusão entre αβ + αγ e α(β + γ), isto é, αβ + αγ =
α(β + γ).
77
Demonstração. De fato, temos,
Isso signica que (−α)β = −(αβ), pois, como já foi provado, o oposto de um corte é único.
Temos também,
Demonstração. Temos, α·0∗ = α(0∗ +0∗ ) = α·0∗ +α·0∗ , daí, α·0∗ −α·0∗ = α·0∗ +α·0∗ −α·0∗ ,
portanto, 0∗ = α · 0∗ , como queríamos.
forma,
β = β · 1∗ = β(αγ) = (αβ)γ = 0∗ γ = 0∗ .
Temos, então, C munido de duas operações e uma relação de ordem, de forma que C é
78
Teorema 5.3.24. A aplicação j : Q −→ C , dada por j(r) = r∗ é injetora e preserva adição,
3. j(p) < j(q) se e somente se p < q, ou ainda, p∗ < q ∗ se, e somente se p < q;
Demonstração.
h h
Seja, agora, u ∈ (p + q)∗ , isto é, u < p + q . Sejam h = p + q − u, s = p − e t = q − .
∗ ∗ ∗
2∗ 2
Dessa forma, s < p e t < q , ou seja, s ∈ p e t ∈ q . Logo u = s + t ∈ p + q .
2. Provaremos apenas para o caso p > 0 e q > 0, os outros casos podem ser provados de
forma análoga.
Seja r ∈ (pq)∗ , então podemos armar que ou r < 0 ou 0 ≤ r < pq . Se r < 0, claramente
r ∈ p∗ q ∗ , pela denição de corte positivos. Se 0 ≤ r < pq então existem p1 ∈ Q e q1 ∈ Q
∗ ∗
tais que 0 < p1 < p, 0 < q1 < q e, ainda, r < p1 q1 < pq . É evidente que p1 ∈ p , q1 ∈ q ,
p1 q1 ∈ p∗ q ∗ e assim, r ∈ p∗ q ∗ .
4. Se p = q, obviamente p∗ = q ∗ .
Suponhamos p∗ = q ∗ . Como p ∈/ p∗ , segue que p ∈
/ q ∗ , logo p ≥ q . Por outro lado, como
/ q∗,
q∈ segue / p∗ , então p ≤ q . Com isso, pela tricotomia, p = q .
que q ∈
Mais uma vez obtivemos uma cópia algébrica de um conjunto em outro, isto é, um homo-
morsmo injetor. Desta vez, j(Q) é uma cópia de Q em C , sendo j(Q) precisamente o conjunto
dos cortes racionais. O Teorema 5.1.13 mostra que existem cortes não racionais em C . Assim,
C \ j(Q) 6= ∅.
Notemos ainda que o corpo ordenado dos números racionais é isomorfo (bijetor, preserva
∗
a soma, o produto e a ordem) ao corpo ordenado de todos os cortes racionais (C ) o que nos
modo algum, o mesmo número racional, mas as propriedades que interessam (aritméticas e
79
Demonstração. Se r ∈ α, como r∈/ r∗ , então r∗ < α. Reciprocamente, se r ∗ < α, existe s ∈ α,
tal que / r∗ .
s∈ Temos então, s ≥ r e s ∈ α, logo, r ∈ α.
Teorema 5.3.26. Se α, β ∈ C e α < β, então existe um corte racional r∗ tal que α < r∗ < β .
Demonstração. Do fato que α < β , podemos armar que existe um número racional s ∈ β , tal
que s ∈/ α. Uma vez que s ∈ β , segue da defnição de corte que existe um racional r tal que
s < r e ainda r ∈ β , o que implica r∗ < β , pelo resultado anterior.
∗ ∗ ∗ ∗
Segue do item 3 do Teorema 5.3.24 que, s < r , portanto, α ≤ s < r (como s ∈ / α, pela
∗ ∗
Proposição anterior, s ≥ α) e assim, chegamos a conclusão que, α < r < β .
Denição 5.3.27. O conjunto C dos cortes será, a partir de agora, denominado de conjunto
dos números reais e denotado por R. Os cortes racionais serão identicados, via injeção j, com
os números racionais. Todo corte que não for racional será denominado número irracional.
A seguir vamos enunciar e demonstrar a principal propriedade que difere o conjunto dos
números racionais do conjunto dos números reais. Essa propriedade é conhecida como Teorema
de Dedekind.
1. R = A ∪ B;
2. A ∩ B = ∅;
3. A 6= ∅ e B 6= ∅;
Nestas condições, existe um, e apenas um, número real γ tal que α ≤ γ ≤ β, para todo α∈A
e para todo β ∈ B.
perda de generalidade) nas condições do enunciado. Consideremos γ3 tal que γ1 < γ3 < γ2 ,
que existe, como foi provado no Teorema 5.3.26. Temos que γ2 ≤ β , para todo β ∈ B , dessa
forma, se γ3 ∈ B , teríamos γ2 ≤ γ3 , o que não pode acontecer, pois γ1 < γ3 < γ2 , portanto,
então γ3 ∈ A ∩ B , uma contradição. Portanto não podemos ter γ1 e γ2 distintos nas condições
do enunciado.
80
2. Seja r∈γ e s < r. Temos que r∈α para algum α∈A e, como s < r, então s ∈ α, de
3. Temos que r∈α para algum α∈A e, como α é um corte, existe s>r em α, logo s ∈ γ;
Dessa forma, γ é um número real e temos que α≤γ para todo α ∈ A, pois, pela denição
que, este exemplo nos diz, informalmente, que em R não há lacunas, mas em Q, há. Por esta
Corolário 5.3.30. Nas condições do Teorema 5.3.28, ou existe em A um número máximo, ou,
em B, um número mínimo.
Demonstração. Seja γ como no teorema anterior. Então, pela primeira hipótese, γ está em A
ou γ está em B e, em apenas um desses conjuntos, pela segunda hipótese. Se γ ∈ A, então ele
é elemento máximo de A. Se γ ∈ B, então, ele é elemento mínimo de B.
Observemos que, se o conjunto A do Teorema 5.3.28 não contiver γ, então ele é um corte
é que em Q não se tem necessariamente, como no Teorema 5.3.28 para os números reais, um
elemento como γ. Essas lacunas é que geram os cortes irracionais. Como tais lacunas não
nições de supremo e ínmo, dadas para o conjunto dos racionais, são equivalentes no conjunto
analogamente.
Teorema 5.3.31. Se X⊂R é um conjunto não vazio e limitado superiormente, então existe
sup X .
81
As duas primerias condições são obviamente válidas.
Dessa forma, vericamos que A e B satisfazem as codições do Teorema 5.3.28, logo, pelo
Corolário 5.3.30, ou A possui máximo, ou B possui mínimo. Devemos mostrar que A não possui
0
máximo. De fato, tomemos α arbitrário em A. Existe x ∈ X tal que α < x. Consideremos α
0 0 0
tal que α < α < x. Como α < x, então α ∈ A e é maior do que α, ou seja, nenhum elemento
de A é maior do que os demais, ou seja, A não possui máximo. Sendo assim, obrigatoriamente
Essa propriedade válida paraR não se verica em Q, isto é, não é verdade que todo subcon-
junto de números racionais não vazio e limitado superiormente em Q sempre admita supremo
2
em Q. Por exemplo, o conjunto A = {x ∈ Q+ | x < 2} não possui supremo racional, mas tem
sendo:
(
1, se n = 0,
an = n−1
a·a , se n > 1.
Finalmente, se a 6= 0, denimos:
n
a−n = a−1 .
1. (ab)n = an · bn ;
2. an am = an+m ;
3. (an )m = amn .
82
Demonstração. Faremos a prova apenas do primeiro item, dado que as outras se dão do mesmo
para n = k + 1.
Hipótese de Indução: (ab)k = ak · bk .
Por denição, (ab)k+1 = (ab)(ab)k+1−1 = (ab)(ab)k , daí, por hipótese de indução,
Assim, por (5.4) e (5.5), concluímos que (ab)k+1 = ak+1 bk+1 . Logo, por indução a igualdade é
válida.
Estas propriedades são válidas, ainda, para m, n ∈ Z, e a prova é simples, basta notarmos
n
que, se m < 0, então m = −n para algum n em N, daí, am = a−n = (a−1 ) e, assim, voltamos
aos itens do teorema anterior. Vale ressaltar que, para expontes negativos, a base deve ser não
nula.
Teorema 5.3.35. Seja a um real positivo e n > 0 natural. Existe um único número real positivo
n
que é solução da equação x = a.
está feita com bastante rigor em [3] e não será feita aqui.
Denição 5.3.36. Dado um número real positivo a, o único número real positivo que é solução
da equação xn = a, estabelecido pelo teorema anterior, chama-se raiz n-ésima de a e é denotado
√ 1
por n
a, ou por a n . A raiz n-ésima de a permite
1 que se dena expoente racional do seguinte
m m
−m
modo: se m e n são inteiros positivos, a n = a n e, como para expoentes inteiros, a n =
m
(a−1 ) n .
temos que:
1 1 1
1. (ab) n = a n b n ;
2. ar as = ar+s ;
3. (ar )s = ars ;
4. (ab)r = ar br .
83
Demonstração. Novamente provaremos o primeiro item, os seguintes decorrem do mesmo modo,
ab = αn β n = (αβ)n ,
1 1 1 1
assim, por denição, αβ = (ab) n , daí, a n b n = αβ = (ab) n , como queríamos.
Teorema 5.3.38. Todo subconjunto não vazio de números reais, limitado inferiormente, possui
ínmo.
é limitado superiomente, logo, −X possui supremo, digamos c = sup (−X). Vamos mostrar
Dessa forma −c é uma cota inferior de X . Suponhamos que exista d tal que −c < d ≤ x para
é cota superior de −X , porém, temos que −c < d ⇒ c > −d, o que é uma contradição, pois
Sendo conhecida a representação dos inteiros na base dez, faremos o estudo da representação
decimal dos números reais. Para isto, demonstraremos um resultado a respeito da representação
decimal dos números reais não negativos menores do que 1, a partir do qual a representação
decimal dos demais números reais será automática, com auxílio de um resultado anterior.
Proposição 5.4.1. Dado um número real não negativo α, existe um número natural máximo
mostrar que A possui um elemento máximo. De fato, seja B = {p ∈ N | p > α}. Claramente
84
Tendo que n0 é o máximo de A, claramente n0 ≤ α < n0 + 1, donde 0 ≤ α − n0 < 1.
nindo Sk como em 1c, corresponde um único número real α, não negativo e menor do que
Denição 5.4.3.
1. Dado um número real α, com 0 ≤ α < 1, seja (nk )k∈N∗ a sequência de dígitos corres-
3. Se α < 0, denimos sua representação decimal como sendo −r, onde r é a representação
decimal de −α.
Já sabemos que as representações decimais não consideram, então, expressões com innitos
noves consecutivos, entretanto, podemos atribuir a elas um signicado similar ao das expressões
sem innitos noves consecutivos. Consideremos a expressão 0, 9999 . . .. Estendendo o que vimos
para representações sem innitos noves sucessivos, o número real α a ela associado deve ser o
∗ 9 9 9
supremo do conjunto S = {Sk | k ∈ N }, onde Sk = + 2 + . . . + k , . . ., que converge
10 10 10
para 1 (fato que está bem demonstrado em [4]).
Por outro lado, a representação decimal de 1 é, pela denição acima, 1, 00000 . . ., que con-
vencionamos representar pelo próprio 1. Dessa forma, considerando expressões com innitos
noves consecutivos como representações decimais, tem-se como resultado que elas representam
também números reais com representação decimal nita e, reciprocamente, qualquer represen-
tação decimal nita, diferente do 0, tem uma representação decimal innita com innitos noves
consecutivos nos termos acima.
85
Exemplo 5.4.4. 2, 79999 . . . também representa o número 2, 8. De
A representação decimal
fato, neste caso, n0 = 2 e o número real α − n0 deve ser o supremo do conjunto S = {Sk | k ∈
7 9 9 9 9
N∗ }, onde Sk = + 2 +. . .+ k , . . .. Analogamente ao que foi visto acima, 2 +. . .+ k , . . .
10 10 10 10 10
converge para 0, 1, daí, Sk converge para 0, 8, ou seja, a representação deste α, segundo a
a1 a2 . . . an
10n α = a1 a2 . . . an ⇒ α = ,
10n
o que nos garante que α é um número racional.
a1 a2 . . . an
10n α − α = a1 a2 . . . an ⇒ (10n − 1)α = a1 a2 . . . an ⇒ α = ,
10n − 1
o que nos garante que α é um racional.
Reciprocamete, pode-se provar que todo número racional possui representação decimal nita
ou periódica ([3] é uma referência para uma demonstração rigorosa deste fato).
A representação decimal dos números reais feita acima, permite que mostremos que R não
Demonstração. Devemos mostrar que, qualquer que seja a enumeração estabelecida para ele-
qualquer subconjunto enumerável de I é diferente de I, de onde obteremos que I não pode ser
enumerável.
86
por um certa bijeção de N em I 0 . Vamos representar cada elemento de I0 pela sua representção
Cantor e se chama método diagonal de Cantor, por conta da disposição de matriz innita em
Demonstração. Pelo Lema 5.5.2, o subconjunto I de R é não enumerável, logo, pela Proposição
5.5.1, R não pode ser numerável.
brejetoras. Este resultado é bastante importante e será usado na prova da proposição que
segue.
são equipotentes e, assim, os conjuntos P(Q) e P(N) também são, isto é, existe uma bijeção
que ϕ é injetora, sejam a e b reais distintos, digamos a < b, sem perda de generalidade. Pelo
5.3.26, existe a < r < b com r racional. Como r < b, então r ∈ ϕ(b) e, ainda, como a < r ,
temos que r ∈ / ϕ(a), logo ϕ(a) 6= ϕ(b). Concluímos assim que ϕ é injetora.
Para denirmos f : P(N) −→ R, seja A ∈ P(N) e consideremos a função XA : N −→ {0, 1},
dada por
87
(
1, se n ∈ A,
XA (n) =
0, se n ∈ N \ A.
Com o auxílio dessa função, denimos f (A) como sendo o número real cuja representação
decimal será 0, XA (0)XA (1)XA (2)XA (3) . . .. Para mostrar que f é injetora, seja A 6= B , isto
é, existe n0 ∈ A tal que n0 ∈ / B (ou n0 ∈ B tal que n0 ∈ / A). Dessa forma XA (n0 ) = 1 e
XB (n0 ) = 0, daí, podemos ver que
88
Capítulo 6
Números Complexos
Os números complexos são ensinados no Ensino Médio como expressões do tipo a + bi, onde
2
a, b ∈ R e i é a unidade imaginária, com a propriedade de que i = −1. Dessa forma, pode-se
manipular tais expressões como expressões algébricas reais, sob a condição de que i2 = −1. O
que faremos agora é justicar a origem desta unidade imaginária com rigor matemático.
Relembremos, por um momento, como lidávamos com números complexos no ensino básico:
Dois números, a + bi e c + di, são iguais apenas quando a=c e b = d, o que nos lembra a
igualdade entre os pares coordenados (a, b) e (c, d). Temos também, que,
e que,
O conjunto R2 , munido dessas operações, será chamado conjunto dos números complexos e
ção são comutativas, associativas e têm elemento neutro: (0, 0) para a adição e (1, 0) para a
multiplicação. Além disso, dado (a, b) ∈ C, seu simétrico existe,
−(a, b),
que é (−a, −b) e, se
a −b
(a, b) 6= (0, 0), seu inverso existe, (a, b)−1 , que é , 2 . Finalmente, a multiplica-
a + b a + b2
2 2
ção é distributiva em relação à adição.
89
1. Comutatividade da adição:
2. Associatividade da adição:
4. Comutatividade da multiplicação:
(a, b) · (c, d) = (ac − bd, ad + bc) = (ca − db, cb + da) = (c, d) · (a, b);
5. Associatividade da multiplicação:
a2 b2
a −b −ab ab
(a, b) · , 2 = + , 2 + 2 = (1, 0).
a + b a + b2
2 2 2
a +b 2 2 2
a +b a +b 2 a + b2
90
9. Distributividade da multiplicação em relação a adição:
uma função injetora que preserva as operações de adição de multiplicação, mostrando que existe
(a, b) pode ser escrito como (a, b) = (a, 0) + (b, 0)(0, 1).
Teorema 6.1.3. Seja k : R → C, dada por k(x) = (x, 0). Temos que, k é injetora e preserva
as operações de adição e multiplicação, isto é, k(x + y) = k(x) + k(y) e k(xy) = k(x)k(y).
Demonstração. Provemos que k é injetora. De fato, se k(x) = k(y), então, (x, 0) = (y, 0), que
Desta forma, k(R) é uma cópia algébrica de R em C, o que nos permite identicar R com
k(R) e considerar R ⊂ C. Admitindo esta identicação e adotando o símbolo i para o número
complexo (0, 1), a expressão mensionada acima, (a, b) = (a, 0) + (b, 0)(0, 1), pode ser escrita
Notemos que i2 = (0, 1)2 = (−1, 0), que pode ser identicado por −1. Temos que, os
números complexos escritos da forma a + bi, com b 6= 0, chamam-se números imaginários, e,
se além disso, a = 0, obtemos os imaginários puros. Tal denominação provém do fato que
os complexos demoraram a ser aceitos como números, dessa forma, o termo imaginários tem
91
6.2 C não é ordenável
que as de R e Q, sendo assim, podemos dizer que C é um corpo. Entretanto, vimos que os
elementos, tanto de R quanto de Q mantêm uma relação de ordem, o que não ocorre em C,
isto é, intuitivamente falando, não temos como dizer se 3 é maior ou menor do que 3i, por
exemplo. Dessa forma, como R e Q são dotados de uma relação de ordem compatível com as
Vamos provar a seguir que C é um corpo não ordenável, isto é, mostraremos que é impossível
dotar C de uma relação de ordem compatível com as suas operações aritméticas. No entanto,
C possui uma propriedade algébrica que R e Q não têm, o Teorema Fundamental da Álgebra,
cuja demonstração foi a tese de doutorado de Johann Carl Friedrich Gauss (1777 -1855). Tal
teorema arma que todo polinômio não constante com coecientes complexos admite uma raiz
Podemos notar que Z não é um corpo, pois seus únicos elementos inversíveis são 1 e −1.
No entanto, Z possui todas as outras propriedades de corpo, além de uma relação que satisfaz
o Princípio da Boa Ordem, sendo assim, Z diz-se um domínio de integridade bem ordenado,
enquanto N não possui nem a propriedade do elemento simétrico. Diante de todas estas cons-
de R em C.
•2
•(2,0) •(0,2)
Após todas estas contruções, podemos nos perguntar se os conjuntos numéricos param por
aí, isto é, se existem conjuntos nos quais C pode ser imerso propriamente. Na verdade, fazendo
2 2
R ×R como foi feito na contrução dos complexos, podemos obter o anel dos quatérnios de
92
Hamilton, que perde a estrutura de corpo, pois a comutativa da multiplicação deixa de ser
válida. Esta estrutura foi desenvolvida no século XIX pelo irlandês William Rowan Hamilton.
Os quatérnios, podem ainda ser imersos nos octônios (O), estes contruídos sobre R4 × R4 ,
no qual a multiplicação não é mais associativa. Esse processo de imersão em conjuntos maiores
Frobenius, provado por Ferdinand Georg Frobenius (1848-1917), em 1877, caracteriza a álgebra
de divisão associativa de dimensão nita sobre os números reais. De acordo com o teorema,
cada tal álgebra é isomorfa a um dos seguintes: R (números reais), C (números complexos), H
(Quatérnios).
relacionado com o teorema de Hurwitz (Adolf Hurwitz (1859-1919)) , que arma que as únicas
93
Bibliograa
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[11] RUSSELL, B.; A série dos números naturais - Introdução à losoa matemática. Tradução
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de Augusto J. Franco de Oliveira. 1 edição (provisória), Janeiro, 2006.
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