ANALISANDO O CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA

Gael Fostier de Moraes1

Resumo: Tendo em vista a relevncia do conflito entre Israel e Palestina, este artigo
prope estudar as origens deste e as relaes de fora ali presentes a partir de autores da
geografia assim como das relaes internacionais
Palavras-chave: anlise de territrio; fonte de conflitos; interveno internacional

MARLIA
2011

Graduando em Relaes Internacionais, 1 ano, na Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho

1. INTRODUO
Neste texto prope-se analisar de forma mais aprofundada o conflito existente entre
Israel e Palestina. Como se desenvolveu o territrio? Quais os agentes envolvidos? A
importncia da interveno internacional no contexto do conflito Israel Palestina. A
legitimidade do Estado de Israel fundado no territrio que se situa.
Comearemos aqui por introduzir a questo primeiramente definindo o territrio
inicial da Palestina e descrever seu desenvolvimento histrico e diviso desde a criao do
Estado de Israel at sua configurao atual, servindo de base para que possamos
contextualizar o conflito que posteriormente ser analisado.
A regio da Palestina localizada ao noroeste da sia, fazendo fronteira entre este
continente e a frica. Possui fronteiras: ao Norte com o Lbano e Sria, ao Leste com a
Jordnia e Oeste com Egito e sada para o Mar Mediterrneo. A regio era controlada pelo
Imprio Otomano at o final da 1 Guerra Mundial, quando vencido e a parte Sul de seu
territrio atribudo Frana (Lbia e Sria) e Gr-Bretanha (Jordnia e Palestina).
O conflito atual marcado por tenses entre judeus e rabes, no entanto suas origens
datam de mais de um sculo com o incio das imigraes de judeus para terras palestinas. No
incio a populao judia era mnima se comparada rabe (97% rabe e 3% judia de acordo
com o Middle East Research and Information Project www.merip.org), no entanto, aps a
propagao do movimento Sionista, que pregava que "a Palestina uma terra sem povo para
um povo sem terra", essa imigrao tendeu a se acelerar. Em 1917, aps a 1 Guerra Mundial,
o ento ministro britnico de relaes exteriores Arthur Balfur parece apoiar o slogan ao dizer,
no que ficou conhecido como a Declarao de Balfour: "O governo de Sua Majestade encara
favoravelmente o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o Povo Judeu".2
Aps esta declarao vieram outras que tambm apoiavam a criao do Estado
Israelense em terras palestinas, assim dando origem a conflitos violentos entre os dois povos.
Para amenizar estes, a Gr-Bretanha divide a zona em 1923 em dois distritos administrativos.
Ao Oeste do rio Jordo (cerca de 20% do territrio) ficariam os judeus e ao Leste ficariam os
rabes. No entanto a violncia entre os povos continua a crescer durante as dcadas de 30 e
40, at que em 1947, a recentemente formada Assemblia Geral das Naes unidas prope a
diviso do territrio em dois Estados, cerca de 55% da rea para os judeus e cerca de 45%
para os rabes (que constituam uma populao de cerca de 70% nesse ano 3). Neste mesma
2
3

Declarao de Balfour, 2

de novembro de 1917

GOMES, Aura Rejane. A Questo da Palestina e a Fundao de Israel. So Paulo, 2001. p. 3

poca houve forte emigrao de judeus de todas as partes da Europa devido ao termino da 2
Guerra Mundial sendo que a maioria deles se instalou em Israel. Em seguida Israel proclama
sua independncia, entrando assim em guerra com diversos pases rabes, no entanto, saindo
vitoriosa, tomando mais metade da terra palestina alocada aos rabes. Nos anos que se
seguiram, judeus abandonaram os pases rabes onde habitavam devido a expulses,
opresses legais ou por polticas de ocupao e expanso de Israel e l foram viver em
campos de refugiados. Ao mesmo tempo, os palestinos que vivam nas terras agora tomadas
por Israel foram expulsos ou as abandonaram, se refugiando em pases vizinhos.
Aps a 2 Guerra Mundial, com a crise Europia, a Inglaterra passa a responsabilidade
do territrio israelita aos Estados Unidos da Amrica, de quem Israel vem recebendo apoio
incondicional at hoje.
Frente ao crescimento do Estado israelita em 1967, Egito, Jordnia e Sria mobilizam
os seus exrcitos, mas foram vencidos novamente (forte apoio militar dos E.U.A.) e o
vencedor expandiu mais ainda seu territrio, e desde esse ano Israel adotou uma poltica
destinada a promover a instalao de colonatos civis israelitas, expropriando terras aos
palestinianos e construindo as casas para os seus cidados. Atitude essa segundo Jeff Halper4
ilegal de acordo com a 4 conveno de Genebra.
O que restava at ento do territrio palestino aos rabes era a Cisjordnia e a faixa de
Gaza. O perodo que se seguiu, at a dcada de 90, foi marcado por massacres e guerras,
como por exemplo a guerra do Yom Kippur (1973) e a 1 intifada (1987-93). Diante disso, em
1993 assinado o Acordo de Oslo entre Yitzhak Rabin (representando Israel) e Yasser Arafat
(representando a Palestina) mediado por Bill Clinton (ento presidente dos EUA). O acordo
tinha como inteno a criao de uma Autoridade Nacional Palestiniana (compreende a faixa
de Gaza e a Cisjordnia), reconhecer o direito do estado de Israel existir e uma forma de dar
fim ao terrorismo. No entanto nenhum dos dois lados pareceu cumprir com o acordo.
Desde ento o que se vive o que se chama de a segunda intifada caracterizada por
conflitos incessantes. Israel com forte aparato militar em ocupao a terras palestinas, e a
Palestina reagindo com ataques terroristas e homens bombas. Atualmente Israel est
construindo uma barreira fsica entre seu territrio e a Cisjordnia, porm este muro no s
delimita as fronteiras legais como separa a Cisjordnia de suas terras que foram ocupadas por
Israel. A barreira tem o dobro de altura e o qudruplo da extenso se comparado ao muro de
Berlim.
4

Professor de antropologia Ben-Gurion University of the Negev

2. DESENVOLVIMENTO
Agora que delimitamos o atual espao geogrfico da Palestina e como se deu seu
desenvolvimento ao longo da histria, podemos identificar as razes dos conflitos e analisar as
relaes de poder, estratgias e foras envolvidas neste conflito.
Primeiramente, para entendermos a repulsa de um povo em relao ao outro
utilizaremos aqui o conceito de iconografia desenvolvido por In de Castro 5. Ela descreve em
seu livro a iconografia como uma juno de trs categorias de smbolos, sendo eles a religio,
o passado poltico e a organizao social. Em seguida utiliza-se de uma citao de Jean
Gottmann para explicar como esta atua sobre um povo, assim como o farei aqui:
A iconografia tende a afastar da nao, de sua unidade e
originalidade, os estrangeiros e mesmo as influncias estrangeiras.
Ela exerce uma ao limitativa aos contatos, portanto, circulao.
(...) As iconografias de transmitem na famlia e na escola: elas se
imprimem fortemente nos espritos ainda maleveis das crianas e
dos adolescentes (...) assim que a iconografia se torna na geografia
um dique de resistncia ao movimento, um fator de estabilizao
poltica 6
Utilizando-nos deste conceito podemos explicar talvez o porqu de tamanha
incompatibilidade entre os povos rabes e os judeus. Cada um traz consigo uma enorme carga
de smbolos, religiosidade e costumes que se divergem enormemente, e bem se sabe que o
maior destes simbolismos a religio, principalmente neste caso.
Acontece que nesta disputa territorial, infelizmente h uma enorme diferena entre as
foras blicas envolvidas. Israel com o apoio dos EUA possui a segunda maior frota do
mundo de jatos F16 (362 aproximadamente) e uma vasta frota de tanques (3930
aproximadamente, enquanto que a Palestina possui nenhum, ou poucos.7 Explica-se desta
forma a ampla utilizao de homens bomba e de apedrejamento por parte dos rabes como
forma de resistncia.
Em relao aos homens bomba e ainda utilizando conceitos de iconografia, podemos
explicar de certa forma porque se sujeitam morte em defesa de seu territrio. Como disse
5

CASTRO, In Elias de. Geografia e Poltica. Territrios, escalas de ao e instituies. Rio de Janeiro,
Bertrand Brasil, 2005, p. 26
6
GOTTMANN, Jean. La polique ds tats et leurs gographie. Paris, Armand Colin, 1952
7

israeli-weapons.com e Globalsecurity.org

previamente, a carga religiosa que estes povos trazem consigo muito forte, assim como as
suas tradies e seu passado poltico. Dessa forma sua tendncia a proteg-los igualmente
muito forte. A ideologia islmica, amplamente difundida entre os povos rabes compreende a
justificao do suicdio em prol da religio como um ato herico e digno de recompensa em
um suposto alm vida. Alm disso, estudos concluram que a maioria dos homens bomba
foram traumatizados em experincias relacionadas aos israelenses, como por exemplo, morte
ou agresso a familiares8, o que tambm explica a prtica.
Desta vez tentando compreender as estratgias utilizadas por Israel para enfraquecer o
Estado Palestino, podemos utilizar outro conceito utilizado por In sua obra, onde pauta 5
pontos principais para o fim de um Estado:
a) pela perda da sua soberania; b) pela permeabilidade das suas
fronteiras; c) pela desnacionalizao do capital financeiro; d) pelo
fortalecimento dos novos atores supra-nacionais, como as grandes
corporaes e as organizaes internacionais de regulao; e) assim
como pela perda da sua centralidade poltica etc. 9
Relacionando os pontos acima com fatos ocorridos durante a histria do conflito em
pauta poderemos interpretar de que formas o Estado israelense vem atuando em relao ao
palestino. a) a soberania j no era um problema afinal a Palestina s teve sua soberania
reconhecida em 1994 (portanto, recentemente) e apenas por 109 pases, o que significa
fragilidade; b) Israel possui assentamentos e tropas ocupantes na Cisjordnia, o que significa
permeabilidade das fronteiras; c) atravs do acesso negado a palestinos ao territrio
israelense, cortou-se subitamente a renda de milhares deles. O Banco Mundial estima que
75% dos palestinos vivam hoje abaixo da linha da pobreza (U$2/dia); d) a rea teve desde o
incio do sculo XX seus destino traado por atores internacionais como potncias mundiais e
a ONU ; e) a antiga capital da Palestina foi tomada por Israel, hoje s resta uma central
administrativa localizada em Gaza.
Tivemos aqui uma parte da interpretao do conflito atravs da tica da Geografia
Poltica de In Elias de Castro, o prximo autor que utilizaremos ser Claude Raffestin.

Palestinian Suicide Bombers: A Statistical Analysis. Presente em: http://www.multaqa.org/access/inside.php?

id=852
9
Ibid., p. 32

Utilizaremos Raffestin a fim de definir poder e mostrar algumas formas de poder que
agem sobre o territrio em pauta. Comearei por utilizar uma citao utilizada em seu livro 10
para definir poder. Segundo Foucault 11 o Poder seria um conjunto de instituies e de
aparelhos que garantem a sujeio dos cidados a um Estado determinado. A definio vem
ao caso quando se trata de Israel, afinal seu poder constitudo pelo enorme aparato blico e
apoio poltico garantido pelos EUA e atravs disso se faz a sujeio do povo rabe a esse
determinado Estado.
Se aceitarmos o fato de que h Poder imposto nas relaes supracitadas a questo que
vem a mente : de que forma este poder age sobre os povos locais? Esta pergunta pode ser
respondida por meio de uma teoria12 desenvolvida por Raffestin onde prope que o poder
uma combinao varivel de energia e informao atravs de um grfico 13, onde cada
combinao entre estes 2 fatores levaria a um tipo de poder. Mais informao e menos energia
significaria por exemplo um poder como a religio, ou a diplomacia, que se do por meio de
discursos e argumentaes, j um poder com mais energia e menos informao seria um poder
coercitivo, de carter mais militar.
A partir do conceito acima podemos identificar algumas formas de poder que agem na
regio de Israel/Palestina. Interiormente a Israel, agem poderes com forte componente
informacional, a fim de justificar sua populao suas aes em relao aos palestinos. J
sobre a Palestina, o poder tem um forte componente energtico, pois a ocupao da
Cisjordnia se d com aparato militar bem estruturado.
Dando continuidade a esta forma de pensamento Raffestin pe o seguinte:
As organizaes, ao separarem a energia da informao, no nvel do
trabalho, realizaram a primeira fissura social. (...) As organizaes
podem, em seguida, controlar mais facilmente os fluxos de energia e
os fluxos de informao. (...) Em resumo, pode-se afirmar que, por
esse mecanismo, os homens perderam sua capacidade original de
transformao, que passou para as organizaes. 14

10

RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Traduo de Maria Ceclia Frana. So Paulo: tica,
1993.
11
FOUCAULT, Michel. Histoire de La sexualit, 1.La volonte de savoir. Paris, Galimard, 1976. p.121
12
Ibid,. p.55
13
Ver anexo 1
14
Ibid., p. 57

Utilizo do conceito acima juntamente com um mapa15 para mostrar como ocorre a
desmobilizao do territrio palestino por meio de assentamentos protegidos israelenses,
assim como a construo de estradas cujo acesso restrito aos palestinos dentro do prprio
territrio. Esse desmembramento da territorialidade representa uma fissura social, a medida
que priva alguns de trabalho e outros de educao (analogamente representa a manipulao
dos fluxos de energia e informao). Seguindo este raciocnio utilizarei outra citao de
Raffestin para desta vez ilustrar a luta palestina pela retomada desses fatores:
Contudo, os homens podem desejar a retomada do controle de seu
poder original. Podem procurar a unidade perdida do trabalho, o que
significa entrar num universo conflitual, cuja natureza puramente
poltica.16
Esta analogia pode parecer um tanto quanto complexa, no entanto ela se resume a uma
idia. Porque construir assentamentos e estradas em pontos estratgicos? Para separar a
populao. E porque separar a populao? Segundo Raffestin (1993:58) colocamos a
populao em primeiro lugar: simplesmente porque ela est na origem de todo o poder.
Portanto a nica funo estratgica disso seria o desmembramento do poder palestino.
3. CONCLUSO
Aps analisarmos as origens do conflito, as relaes de fora e as estratgias ali
presentes podemos perceber que o maior problema, se situarmos a questo no mbito
internacional, a falta de um rgo de relevncia, que tenha a capacidade de intervir a fim de
assegurar os direitos internacionais que teoricamente deveriam ser garantidos a todas as
naes. Atualmente a ONU desempenha tal papel, mas por sofrer forte influncia dos EUA
no se mostra forte o suficiente para garantir a segurana de um Estado como o da Palestina
por exemplo. De acordo com a Jewish Virtual Library 17, os EUA j intervieram mais de 40
vezes na ONU para defender Israel de acusaes de violao de direitos internacionais.
Dessa forma, o conflito existente na regio onde se encontra o estado da Palestina e de
Israel, apresenta-se de maneira muito instvel e a partir da premissa que a correlao de foras
15
16

17

Ver anexo 2
Ibid., p. 57
http://www.jewishvirtuallibrary.org/

 muito pendente ao Estado de Israel, a situao dos palestinos na regio se comprova muito
problemtica. A possibilidade da resoluo deste conflito est longe de ser orientada, dada a
grande polaridade cultural entre essas duas naes e a tendncia de acirramento verificada
como projeo num possvel cenrio futuro.
Assim ao se analisar este conflito de interesses de um mbito terico nas relaes
internacionais, observa-se que o argumento da criao de um sistema internacional mais
equilibrado, fixado na fortaleza de um rgo internacional legtimo e independente seria uma
possvel resoluo do problema, como verificamos no livro A Paz Perptua, de Immanuel
Kant:
a razo (...) condena absolutamente a guerra como procedimento de
direito e torna, ao contrrio, o estado de paz um dever imediato, que,
porm, no pode ser institudo ou assegurado sem um contrato dos
povos entre si 18
Entretanto em um mundo onde os interesses individuais aparentemente tm maior
relevncia se comparados aos interesses de uma sociedade internacional formalizada, esta
teoria se torna um tanto idealista e faz frente viso Hobbesiana de que o homem o lobo
do homem, viso esta que verificada no atual sistema internacional, onde a concorrncia
entre os estados e as diferenas entre estas instituies a relao que se verifica
predominante, como podemos observar no histrico conflito entre Israel e Palestina.

Bibliografia:
BALFOUR, Arthur James. Declarao de Balfour. [S.I.:s.n.], 1917
GOMES, Aura Rejane. A Questo da Palestina e a Fundao de Israel. So Paulo, 2001.
18

KANT, Immanuel. A Paz Perptua. Porto Alegre: L&PM, 1989 p. 40-41

CASTRO, In Elias de. Geografia e Poltica. Territrios, escalas de ao e instituies.

Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2005
GOTTMANN, Jean. La polique ds tats et leurs gographie. Paris, Armand Colin, 1952
RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Traduo de Maria Ceclia Frana. So
Paulo: tica, 1993.
FOUCAULT, Michel. Histoire de La sexualit, 1.La volonte de savoir. Paris, Galimard,
1976. p.121
KANT, Immanuel. A Paz Perptua. Porto Alegre: L&PM, 1989
Documentrio: Occupation 101 - a voz da maioria silenciada. Estados Unidos, 2006
Palestinian Suicide Bombers: A Statistical Analysis. Disponvel em:
http://www.multaqa.org/access/inside.php?id=852

ANEXO A

ANEXO B