“Um espírito original sabe subordinar a leitura à actividade pessoal. Ela é para ele apenas a mais nobre das distracções, sobretudo a mais enobrecedora, pois só a leitura e o saber conferem ‘as boas maneiras’ do espírito”.
Marcel Proust, in O Prazer da Leitura, 1997, p. 56
É sempre com ansiedade, curiosidade e expectativa que inicio a leitura aturada da Revista Ler. Já há muito o não fazia, mas desta vez aconteceu. Tenho de agradecer à Drª. Cristina por me ter proporcionado a sua leitura e, perante tal publicação, o desafio começou logo pela capa (Revista Ler, Março 2009, nº 78). António Barreto iria abordar a problemática da leitura na actualidade. Logo toda a minha enciclopédia de autores, investigadores e experiências foi “activada”.
Como sociólogo e, sobretudo, pensador das questões que mais assolam a sociedade portuguesa, não me desiludiu. Ora vejamos. António Barreto, um intelectual com origens e vivências no Douro, sempre viveu rodeado de livros, de literatura. Contudo, é a mãe quem lhe oferece o livro que o marca para sempre, aos 15 anos. Chamava-se “A Noite Sem Lua” de John Steinbeck – um romance que revela a vitória inevitável da liberdade humana sobre a violência (os movimentos da Resistência da Europa ocupada pelos nazis). Mas mais tarde, exilado na Suíça, outra obra o marca na esteira da anterior: “Le Silence de la Mer” – uma novela de sabor patriótico, também passada na Europa da II Guerra Mundial. O silêncio do mar é uma metáfora bem expressiva daquilo que o fundo do mar é capaz de guardar (os segredos, neste caso de duas pessoas que nunca se deixaram subjugar pelos ideais nazis e sempre enfatizaram a cultura francesa e os ideais da liberdade).
Façamos aqui eco de um pequenino, mas sentido, poema de Sophia de Mello Breyner que ilustra o papel do mar na literatura (o seu sonho de liberdade, tal como aconteceu com António Barreto):
Marcel Proust, in O Prazer da Leitura, 1997, p. 56
É sempre com ansiedade, curiosidade e expectativa que inicio a leitura aturada da Revista Ler. Já há muito o não fazia, mas desta vez aconteceu. Tenho de agradecer à Drª. Cristina por me ter proporcionado a sua leitura e, perante tal publicação, o desafio começou logo pela capa (Revista Ler, Março 2009, nº 78). António Barreto iria abordar a problemática da leitura na actualidade. Logo toda a minha enciclopédia de autores, investigadores e experiências foi “activada”.
Como sociólogo e, sobretudo, pensador das questões que mais assolam a sociedade portuguesa, não me desiludiu. Ora vejamos. António Barreto, um intelectual com origens e vivências no Douro, sempre viveu rodeado de livros, de literatura. Contudo, é a mãe quem lhe oferece o livro que o marca para sempre, aos 15 anos. Chamava-se “A Noite Sem Lua” de John Steinbeck – um romance que revela a vitória inevitável da liberdade humana sobre a violência (os movimentos da Resistência da Europa ocupada pelos nazis). Mas mais tarde, exilado na Suíça, outra obra o marca na esteira da anterior: “Le Silence de la Mer” – uma novela de sabor patriótico, também passada na Europa da II Guerra Mundial. O silêncio do mar é uma metáfora bem expressiva daquilo que o fundo do mar é capaz de guardar (os segredos, neste caso de duas pessoas que nunca se deixaram subjugar pelos ideais nazis e sempre enfatizaram a cultura francesa e os ideais da liberdade).
Façamos aqui eco de um pequenino, mas sentido, poema de Sophia de Mello Breyner que ilustra o papel do mar na literatura (o seu sonho de liberdade, tal como aconteceu com António Barreto):
Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade.
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade.
Hoje, Barreto lê toda a ficção, mas com uma finalidade: compreender a nossa sociedade e perceber o momento, tal como o fez Eça de Queirós.
A literatura tem, para António Barreto, a dupla função: apreciar a escrita e trabalhar a sociedade, partindo daquilo que o autor lhe dá (a visão da evolução da sociedade). E quem não concorda com isto? A função do texto literário é imensa. Para além da dimensão estética e valorativa, a dimensão social é fulcral. Só estudando e percebendo o pensamento dos nossos vultos da Literatura, poderemos construir a nossa identidade, compreender as nossas raízes, poderemos ser interventores na sociedade. A Literatura tem de ser compreendida, reflectida, ponderada e articulada com todo o cosmos. Reparem o que nos diz António Barreto: “… a leitura é meditação, é tempo de saborear, tempo de ponderar o que se está a ler, de parar, voltar, recomeçar (p.38)”. Mais à frente, num outro artigo desta Revista Ler é Filomena Mónica que é assertiva no que respeita à Literatura e análise do texto literário: “A análise de um texto não deve ser feita como se de uma bíblia se tratasse”, porque “a obra é escrita por um ser de carne e osso, com um trajecto, com emoções e com manias (p.57)”.
A literatura tem, para António Barreto, a dupla função: apreciar a escrita e trabalhar a sociedade, partindo daquilo que o autor lhe dá (a visão da evolução da sociedade). E quem não concorda com isto? A função do texto literário é imensa. Para além da dimensão estética e valorativa, a dimensão social é fulcral. Só estudando e percebendo o pensamento dos nossos vultos da Literatura, poderemos construir a nossa identidade, compreender as nossas raízes, poderemos ser interventores na sociedade. A Literatura tem de ser compreendida, reflectida, ponderada e articulada com todo o cosmos. Reparem o que nos diz António Barreto: “… a leitura é meditação, é tempo de saborear, tempo de ponderar o que se está a ler, de parar, voltar, recomeçar (p.38)”. Mais à frente, num outro artigo desta Revista Ler é Filomena Mónica que é assertiva no que respeita à Literatura e análise do texto literário: “A análise de um texto não deve ser feita como se de uma bíblia se tratasse”, porque “a obra é escrita por um ser de carne e osso, com um trajecto, com emoções e com manias (p.57)”.
Tudo isto nos faz reflectir, mas para chegar à problemática da leitura e o papel da escola. Concordo que até certo momento da nossa História, a leitura sentida, prazenteira e significativa não era praticada. Mas hoje a situação mudou; não tanto como desejaríamos, apesar de ser uma das preocupações que está bem no cerne de qualquer instituição de educação e o PNL é o testemunho do que digo. Não chega. É necessário que a família também se envolva para que toda a sensibilização e motivação que se tenta transmitir não se desvaneça. Todos estamos empenhados na melhoria dos níveis de literacia dos nossos alunos. Já se dá conta de muitas actividades e projectos que se vão realizando e que têm dado os seus frutos. Concordo, no entanto, que a aposta não seja apenas na informática, nem que alguém critique a “cultura livresca”. António Barreto tem toda a razão quando diz que “o livro é a melhor maneira de transmitir cultura”. Não esqueçamos que a Internet produz informação, mas não produz conhecimento. Reparem na delícia com que este sociólogo nos presenteia (p.39):
“Adequar o tipo de livro à pessoa em causa. Depois, pôr de parte, até muito tarde, tudo o que é instrumento, estrutura, forma. No essencial, chamar a atenção do jovem para o sentido, para a narrativa, para a história. É como no amor: o que conta é o sentimento, o ver, o beijar. É isso o que se deve ir buscar à literatura…”.
É, na verdade, uma entrevista desafiadora, mas realista. Há que procurar o bom senso entre a literacia computacional e a literacia em leitura para que não surjam barbaridades como as que se revelaram no Magalhães. Antes de tudo, uma sólida preparação ao nível da leitura e da escrita, servindo-nos de todos os suportes, incluindo os informáticos, para que melhor se utilize a informação online.
Ora, a propósito da importância da leitura e do livro que António Barreto tão bem abordou e criticou, eu não podia deixar de fazer referência a Fernando Pessoa e à polémica do seu espólio (as chamadas arcas sem sossego de que a família fala na mesma Revista). Estão ali publicadas algumas cartas originais, entre elas uma de Almada Negreiros, traduzida por Fernando Pessoa, mas que ilustra o quão importante era o livro (p.44):
“Entrei numa livraria. Pus-me a contar os livros que há para ler e os anos que terei de vida. Não chegam, não duro nem para metade da livraria.
Deve certamente haver outras maneiras de se salvar uma pessoa, senão estou perdido.
No entanto, as pessoas que entravam na livraria estavam todas muito bem vestidas de quem precisa salvar-se (…)”.
Reparemos nesta última frase. Que crítica mordaz vos sugere? Será que hoje estas palavras se aplicam? Deixem que vos diga: estão actualíssimas. O mundo, ou seja, as pessoas necessitam da leitura para que, em certas situações, se libertem do que as preocupa, do que as oprime, do que as angustia. Uma boa leitura liberta-nos. Deixo-vos como desafio essa frase realçada. É para isso que serve a nossa comunidade de leitores: desafiar, reflectir, gerar ideias, pôr em comum.