Crónica de onomástica paleo-hispânica (31)
António Marques de Faria* |
[email protected]
*Direção-Geral do Património Cultural
O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1945
Resumo
Esta nova crónica destina-se em grande medida a complementar bibliograficamente alguns dos recentes estudos que,
de um modo mais ou menos aprofundado, versam sobre a antroponímia ibérica. Também tentamos explorar caminhos já abertos
anteriormente, no sentido de sustentar a inclusão de determinados NNP, até agora considerados ibéricos ou turdetanos, na
antroponímia céltica continental ou genericamente indo-europeia.
Abstract
This paper intends mainly to add literature to some of the recent studies that deal with Iberian personal names in a more or
less profound way. We also tried to explore previous paths in order to include certain personal names, until now considered Iberian
or Turdetanian, in continental Celtic or generically Indo-European anthroponymy.
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António Marques de Faria
aPeśTarioŕ. Placa de chumbo. “Barranco del Rey” (Serra de Gádor, Almeria). MLH III 2 H.1.1;
Ferrer, 2021a, p. 81.
Na proposta de transliteração do NP aqui lematizado, cuja principal novidade consiste em ler o
primeiro grafema como <a> (Ferrer, 2018a, passim), partimos de dois pressupostos:
1. Ao invés do que sustentava De Hoz (1976, p. 266), assumindo uma postura que reverteu num
trabalho publicado postumamente (De Hoz, 2021, p. 55), o sistema de escrita meridional não era
“único y coherente”, circunstância que, além de confirmar as nossas suspeitas iniciais (Faria,
1990–1991, pp. 79–80), torna legítimo o reequacionamento dos valores fonéticos a atribuir a
determinados signos dentro de um mesmo documento.
2. O chumbo de Gádor está redigido em ibero, ou, não o estando, configura um documento
contabilístico turdetano — correspondente grosso modo ao autêntico âmbito geográfico tal como
foi identificado por Moret (2011, pp. 239–240; 2017, p. 123; 2018, pp. 19, 21) para esta etnia —
que, além de cifras e respectivas unidades de medida, veicula exclusivamente NNP ibéricos.
abeś, o primeiro formante deste NP, relaciona-se de algum modo com beś (Faria, 1995a, pp. 327,
328; 1998a, p. 234; 1999, p. 154; 2000a, p. 126; 2001a, p. 98; 2002a, p. 129; 2003a, p. 216; 2003b, p. 316;
2004a, p. 295; 2008a [2009a], p. 76), conforme o modelo baś/abaś (Faria, 1991a, p. 189; 1994a, p. 39, n.º 52;
1995b, pp. 80, 83; 1996, p. 153; 2004a, pp. 277–278, 301; 2010 [2011], p. 91; 2011 [2012], p. 149).
Vários são os NNP que testemunham o segmento tar (MLH III 1, p. 233; Faria, 2011 [2012], p. 175),
entre os quais se inclui Taraion (Ferrer, 2005 [2006], p. 964) (a segmentar em Tar∙aion), figurando ioŕ em
ESCERIOR (Simón, 2020, p. 130, n.º 64) — um NP que Ferrer (2021b, p. 83) julga estar documentado no
Bronze de Ascoli (CIL I2 709) — e, seguramente com outro signo de vibrante, em tarbelior (Faria, 1994b,
p. 67; 1997, p. 106; 2000a, p. 122; 2003a, p. 215; 2006, p. 116; 2008a [2009a], p. 64; 2010 [2011], p. 99;
2011 [2012], p. 175; 2016 [2017], p. 117).
Importa contemplar a possibilidade de o NP em questão se restringir a PeśTarioŕ, havendo que
classificar a como morfema (sufixo?: MLH V 2, p. 409) de significado e função desconhecidos (MLH III 1,
p. 157). Além de figurar nos exemplos fornecidos por Untermann (MLH III 1, p. 157), este morfema parece
ocorrer em selgitar # a # salgidei (B.7.34; MLH V 2, p. 409), lorsur # a # betiga (B.7.35), urCar # a # iluŕ
(F.21.1) e ]uTir # a # ilTir (Ferrer, 2021a, p. 81). Haverá eventualmente que adicionar a estes testemunhos
as sequências presentes no texto em apreço: oCoPilos # a # PeśTarioŕ (3x) e PaśTiPilos # a # PeśTarioŕ.
Independentemente de ᛊ ser o primeiro ou o segundo signo do NP em questão, nenhuma dúvida
pode subsistir quanto ao facto de nos caber a prioridade na sua transliteração como <be>/<Pe> (Faria,
1990–1991, pp. 76, 78; 1995a, p. 328; 1998a, pp. 234, 235; 2000a, p. 140; 2004a, p. 292; 2006, p. 121;
2008b [2009b], p. 153; 2020a, pp. 57–58).
Mal andou, por conseguinte, Ferrer (2021a, pp. 77, 79) ao ocultar o nome de quem o precedeu na
atribuição ao silabograma ᛊ do valor fonético <be>/<Pe>, contando esta atitude com a agravante de, há
alguns anos, este paleo-hispanista ter considerado a nossa proposta inaceitável (Ferrer (2010 [2011], p.
73).
aCinir. Placa de chumbo. La Punta de Orleyl (Vall de Uxó, Castellón). MLH III 2 F.9.7.
Gimeno & Velaza (2021, p. 207) não possuem qualquer legitimidade moral para se fazerem passar
por autores da identificação do NP ibérico aCinir, segmentável em aCin∙ir (Faria, 1991a, p. 189; 1994b,
pp. 66, 70; 1998a, p. 235; 2004a, p. 302).
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aiunoŕdin. Placa de chumbo. El Castellet de Banyoles (Tivissa, Tarragona). Benages, 1990, pp.
41–43.
Ferrer (2021b, p. 66) não possui qualquer legitimidade moral para reivindicar a autoria da
identificação do NP ibérico aiunoŕdin, segmentável em aiun∙oŕdin (Faria, 1992–1993, p. 277; 1994b, p.
68; 2008b [2009b], p. 146; 2010 [2011], p. 91).
PanTui. Estela funerária de arenito. *Baitolo/Baetulo (Badalona, Barcelona). Comas, Padrós &
Velaza, 2001, pp. 297–298.
Ferrer, Moncunill & Velaza (2020, p. 81, n. 16) acreditam que o NP em questão figura em escrita
dual, o que os leva a transliterá-lo como bantuin, seguido da posposição pronominal ḿi. Do nosso ponto
de vista, porém, é preferível admitir que o <n> corresponda a um sufixo (Comas, Padrós & Velaza, 2001, p.
297), constituindo PanTui a transliteração correcta do NP ibérico *Bandui, a segmentar em ban∙dui (Faria,
2003a, p. 226). Esta nossa interpretação diverge da que foi formulada na editio princeps (Comas, Padrós
& Velaza, 2001, p. 297), pelo facto de nesta se sustentar a ocorrência do NP *Bantui em detrimento de
*Bandui.
Não menos verosímil, a nosso ver, é a identificação de um NP celta, *Manduios (Faria, 2011–2012,
p. 153; 2015, p. 128). Em abono de uma tal exegese podemos aduzir MANDVI (gen.), um NP atestado em
EDCS-56000155.
banśoŕ. Placa de chumbo. Pech Maho (Sigean, Aude). Solier, 1979, p. 83.
Ferrer, Moncunill & Velaza (2020, p. 81, n. 16) não possuem qualquer legitimidade moral para
revindicarem a autoria da identificação do elemento onomástico ibérico ban (Faria, 1990–1991, pp. 77, 79;
1991a, p. 190; 1992, p. 195; 1994b, pp. 66, 70; 1995b, p. 326; 2000a, p. 130; 2004a, p. 278), uma autoria
que, curiosamente, nos foi em tempos atribuída por Velaza (Comas, Padrós & Velaza, 2001 [2002], p. 297):
“[e]l primero en sospechar la existencia de un elemento antroponímico ban fue Faria (...)”.
Do mesmo modo, Ferrer, Moncunill & Velaza (2020, p. 81, n. 16) não possuem qualquer legitimidade
moral para reivindicarem a autoria da interpretação de banśoŕ como NP ibérico (Faria, 1990–1991, p. 83;
1991a, p. 190; 1992, p. 195; 1994b, pp. 66, 70; 1995a, p. 326; 1997, p. 107; 2004a, p. 292; 2007b, p. 213).
PasiPeś. Placa de chumbo. La Serreta de Alcoy (Valência). MLH III 2 G.1.5.
Untermann (MLH III 1, p. 214) optou por segmentar o NP em apreço como Pas∙iPeś, no que
foi acriticamente seguido por Rodríguez (2002 [2003], pp. 257, 261; 2014, pp. 124, 125). Resulta desta
observação que nem Untermann nem Rodríguez jamais contemplaram a existência segmento antroponímico
ibérico basi. Qual não foi, por conseguinte, o nosso espanto ao constatarmos que Ferrer (2021c, p. 101)
decidiu outorgar precisamente a Untermann (MLH III 1, p. 231, n.º 102) e a Rodríguez (2014, p. 190, n.º 120)
a primazia na individualização do segmento antroponímico ibérico basi.
Apesar de se tratar sempre de uma tarefa ingrata, cumpre-nos desmontar sem hesitações esta
falácia tão tropegamente promovida por Ferrer (2021c, p. 101), devendo ser reconhecida a outros a
identificação de basi enquanto componente antroponímico ibérico (Correa, 1992, p. 266 e n. 49; 1994a,
pp. 273, n. 25, 275, n. 31; 2001, p. 315; Silgo, 1994, p. 69; Faria, 1998a, p. 234; 1999, p. 154; 2000b, p. 62;
2001a, pp. 97–98; 2003a, pp. 215–216; 2004a, p. 295; 2019, p. 57).
Sem colocar em causa o seu pioneirismo, não podemos, no entanto, deixar de assinalar que
Correa (1994a, p. 283), ao invés de Silgo, não hesitou em reconhecer a — do nosso ponto de vista,
muito duvidosa (Faria, 1998a, p. 234; 1999, p. 154; 2000b, p. 62; 2001a, pp. 97–98; 2003a, pp. 215–216;
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2004a, p. 295; 2019, p. 57) — existência do infixo -i- em NNP ibéricos. Contudo, tanto quanto sabemos,
Correa nunca chegou a fornecer um só exemplo demonstrativo de tal processo morfológico no idioma
em questão. Seja como for, além de o isolar em PasiPalCaŕ (F.14.1) (Correa, 1992, p. 266, n. 49), Correa
individualizou o segmento basi num NP que nunca deixou de ler de um modo desacertado: Βασιγγερος
(Correa, 1992, p. 266), ΒΑΣΙΓΓΕΡΡΟΣ (Correa, 1994a, p. 273, n. 25; 1994b, p. 341) e φασιγγερος (Correa,
2001, p. 315).
É curioso notar que Rodríguez (2014, p. 125) chegou a creditar-nos indevidamente a individualização
do elemento basi, mas fê-lo mencionando somente o nosso apelido (nenhum trabalho é citado), não fosse
dar-se o caso de, na eventualidade de providenciar uma citação completa — como, aliás, mandam as
regras mais básicas da ética científica —, ser acusado de respeitar as normas de redacção em vigor
na revista que lhe publicou o original: < https://webs.ucm.es/info/arqueoweb/Documentos/Indicaciones_
autores/Normas_autores_AW.pdf >.
PeCose. Dracmas. *Begose > *Egose > Egosa (localização desconhecida). CNH 52:102; ACIP 429;
CNH 52:103 = ACIP 430.
É nossa convicção que *Begose terá sido o NL antecessor de Egosa, cuja única atestação ocorre
em Ptolemeu (Geogr. 2.6.70). A confirmar-se esta nossa hipótese, que manifestamos com as devidas
ressalvas, estaríamos perante mais um exemplo de aférese da oclusiva labial sonora, um metaplasmo
há muito identificado no (paleo)basco e, em anos mais recentes, também no ibero (Uhlenbeck, 1910, p.
92; Gavel, 1921, pp. 329–330; Michelena, 19772, pp. 253 e n. 48, 531–532; 1972, p. 25; Mariner, 1972, p.
295; Gorrochategui, 1984, p. 187; Quintanilla, 1998, pp. 269–270; Belasko, 19992, p. 85; Faria, 2002a, pp.
124, 138; 2003a, pp. 218–219; 2017, pp. 84–85; Ferrer, 2006 [2008], p. 152 e n. 79; 2007 [2008], p. 69,
n. 44; 2018b, p. 247; Pérez Orozco, 2007, pp. 104, 114; Oribe, 2011 [2013], p. 338; Yarza, 2015, p. 351;
Rodríguez, 2018, pp. 193–198).
BETATVN. Cipo de calcário. Arredores de Fuerte del Rey (Jaén). Corzo & alii, 2007 [2008], passim.
Muito embora não seja a nossa análise favorita, a verdade é que nos cabe a prioridade na
segmentação do presente ND em *bete∙atun (Faria, 2008a [2009a], p. 67). Tal facto foi completamente
ignorado por Ferrer, nos últimos anos, em cinco ocasiões distintas (Ferrer, 2018c, p. 112; 2019, p. 44;
2021d, pp. 202, 204; Ferrer, Velaza & Olesti, 2018, p. 182; Ferrer & Sinner, 2019, p. 155).
bedule. Vaso de cerâmica. Ensérune (Nissan-lez-Ensérune, Hérault). MLH II B.1.33.
Tal como advertiu Correa (1993, p. 108 e n. 23), no que foi seguido por Luján (2003, p. 225), a
analogia entre este NP e Betullus, aventada por Untermann (MLH II, p. 112), deve ser descartada com
segurança, atendendo à natureza sonora da oclusiva dental presente no NP aqui tratado. Não obstante,
Simón (2021, p. 315) persistiu em adoptar a posição errónea assumida por Untermann.
É possível que estejamos perante uma forma iberizada de Pedullus (MLH II, p. 112; Correa, 1992,
p. 269; 1993, p. 108; Luján, 2003, p. 225), mas nada impede que tenha sido *Medul(l)us < *Medul(l)os o NP
céltico subjacente a bedule, uma hipótese que Simón (2021, p. 315) nem sequer chegou a contemplar.
BEỊSVNIS (uel BEḶSVNIS) (gen.). Estela de arenito vermelho. Alcaraz (Albacete). Abascal, 2013,
pp. 18–19.
Das duas vezes em que nos debruçámos sobre o presente NP (Faria, 2014, pp. 169–170; 2021,
p. 85), alicerçámos a defesa da lição BEḶSVNIS, em alternativa a BEỊSVNIS, na circunstância de o filho
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do portador deste nome se chamar NIGRINVS. Considerámos que este idiónimo poderia configurar a
tradução latina do NP Belsu / Belśu (Untermann, 1996, p. 131) < *bel∙(s)u / *bels∙(s)u / *bel∙śu / *bel(s)∙śu.
Em ambas as ocasiões, era nossa obrigação citar quem, antes de nós, havia contemplado a hipótese de
um outro testemunho do NL NIGRINVS consistir numa «traducción del euskérico “beltz, baltz”» (Martínez
& González, 1998, p. 492).
Toda a bibliografia pertinente foi obliterada por Aznar (2017, p. 127), ainda que, noutro passo da
mesma obra, este autor (Aznar, 2017, pp. 470, 544, n. 1285) tenha decidido repristinar parte de bibliografia
sobre o assunto (Martínez & González, 1998, p. 492), ao ter asseverado, algo temerariamente, que
NIGRINVS não pode recobrir senão um único NP: BELSCO.
PeleśaCin. Placa de chumbo. La Punta de Orleyl (Vall de Uxó, Castellón). MLH III 2 F.9.7.
Gimeno & Velaza (2021, p. 208) não possuem qualquer legitimidade moral para reivindicarem a
autoria da identificação do NP ibérico PeleśaCin, composto por beleś e por agin (Faria, 1994b, p. 67;
1998a, p. 235; 2004a, p. 296).
PerPai. Téssera de chumbo. Camp de les Lloses (Barcelona). Panosa, 2001, pp. 530–531.
Ferrer (2021 [2022], p. 88) não possui qualquer legitimidade moral para reivindicar a autoria da
identificação do NP ibérico PerPai (*Berbai), composto por ber e por bai (Faria, 2002a, p. 125; 2003b, p.
318; 2004a, p. 304; 2011 [2012], p. 150).
BINSNES. Bloco de calcário negro. *Sabe (La Rambla, Córdova). Lacort & alii, 1986, pp. 70, 73.
Os primeiros editores contemplaram a hipótese de o NP em questão pertencer ao ibero, encarando-o
como uma deformação de *Bennesnes (Lacort & alii, 1986, p. 73). Sem nunca colocarmos em causa a
inserção de BINSNES na onomástica ibérica (Faria, 1991a, pp. 190, 194, 1994b, p. 67, 2005b, p. 167; 2011
[2012], p. 160; 2017, p. 91), sempre defendemos para o mesmo uma segmentação em *bins∙nes/*binś∙nes.
No entanto, o cotejo com o NF PiniśCum (Untermann, 1996, p. 133; 1994–1995 [1997], p. 139) leva-nos a
encarar BINSNES como forma sincopada de *Binisnes/*Biniśnes. Importa referir que Untermann (1994–1995
[1997], p. 139), sem prescindir de outras hipóteses, sugeriu que o NF PiniśCum, apesar de surgir associado
a NP célticos no Terceiro Bronze de Botorrita, terá possuído uma origem ibérica. Num trabalho prévio,
porém, Untermann limitou-se a fazer derivar PiniśCum de um NP céltico, *Binos (Untermann, 1996, p.
133), que parece contar com diversos testemunhos adaptados à morfologia latina (Delamarre, 2019, p.
127); não obstante, todos eles foram omitidos pelo linguista alemão.
BVGANSONIS (gen.). Estela de calcário. Villartoso (Sória). Alfaro & Gómez-Pantoja, 2021, p. 168.
Tanto quanto sabemos, foi Prósper (2019, p. 161), que identificou BVGANSONIS (gen.) como
um só NP em detrimento de BVGAN SONI[S] F(ilius) (Alfaro, 2018, p. 66). Gómez-Pantoja (2019, p. 149)
preferiu individualizar um nom. (parissilábico) Bugansonis, mas não cremos que haja razão para semelhante
interpretação.
Cremos que bugan, o radical deste idiónimo que aqui surge sufixado por -so, deverá ser interpretado
como o étimo do basco muga < mugan ‘limite, fronteira, termo’ (Agud & Tovar, 1994, p. 938).
Talvez haja que fazer remontar bugan a *burgan, vocábulo que, a ser analisado como *bur∙gan,
poderia ter possuído no início o significado de ‘cabeço alto’, um elemento da paisagem que, num segundo
momento, seria alvo de uma reinterpretação semântica, vindo a expressar o conceito de ‘limite orográfico’.
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Neste sentido, importa ter presente que muga apresenta murga como variante (Lhande, 1926, p. 751;
Sarkisian, 1998, p. 413).
Esta nossa interpretação segue em grande parte a posição assumida por Sarkisian (1998, pp.
412–413) a propósito da mesma matéria. A única divergência que mantemos com este investigador reside
na circunstância de, atento o testemunho aqui comentado, preferirmos *burgan como protoforma, em
detrimento de *burugain (Sarkisian, 1998, p. 413).
Não conhecemos muitos paralelos para o significado de *Buganso noutros idiomas de uso
coetâneo. É possível que este NP, em ambientes latinos, fosse recoberto por Montanus (Kajanto, 1965,
p. 309) como Deckname, no caso vertente como nome de tradução, ficando por entender o que levou
Delamarre (2007, p. 136) a incluir este e outros NNP derivados de mons na antroponímia céltica.
Importa ainda recordar que Pérez Orozco (2009 [2010], p. 35) traduz a legenda monetária
seTeisCen, por “los fronterizos”, individualizando na mesma o lexema basco zede ‘limite fronteira’.
Independentemente da justeza de uma tal tradução, este investigador parece ter-se esquecido de que
seTeisCen configura, com grande probabilidade, um gen. pl.
Curiosamente, constituindo *Buganso o patrónimo de Udanus, valerá a pena assinalar que, entre
as várias acepções de muga, conta-se a de “tempo” e, especificamente, a de ‘estação do ano’ (Lhande,
1926, p. 745), não sendo provavelmente fruto do acaso a existência do composto udamuga ‘solstício de
Verão’ (Lhande, 1926, p. 997).
Uma interpretação diversa da nossa foi formulada por Prósper, que, além de ter atribuído a “Artoso”
o epitáfio onde se documenta BVGANSONIS (gen.), veio defender a inclusão do dito NP na antroponímia
celtibérica (Prósper, 2019, p. 161).
catuiśaŕ. Fragmento de asa de cratera campaniense. Ensérune (Nissan-lez-Ensérune, Hérault).
MLH II B.1.20.
Bénezet & Moncunill (2021, p. 56) fizeram-se implicitamente eco de uma determinada interpretação
acerca do presente NP, de provável matriz céltica. Assim, catuiśaŕ deveria segmentar-se em *catuiś(e)-aŕ
(Correa, 1993, p. 107), resultando de uma tal análise a individualização do NP *Catuisso(s) (Untermann,
1969, p. 109; MLH II, p. 101).
Acreditamos, no entanto, que, num trabalho omitido por Bénezet & Moncunill (2021, p. 56),
deixámos demonstrada a inverosimilhança de semelhante exegese (Faria, 2015, pp. 126–127).
Sempre no âmbito da onomástica céltica, julgamos ser mais plausível a identificação, em catuiśaŕ,
do NP *Catuissa (De Hoz, 2003, p. 89; 2011, p. 245; Faria, 2012, p. 104; 2013, p. 192; 2015, p. 127) ou
*Catu(u)ix (Faria, 2012, p. 104; 2013, p. 192; pp. 127, 128). Como paralelo para *Catu(u)ix poderemos
aduzir Καντυιξ < *Canto-ṷix (Delamarre, 2007, p. 56; 2019, p. 184), com assimilação da vogal final do
primeiro segmento à semivogal /ṷ/, com que principia ṷix.
Vimos igualmente noutras oportunidades — também ignoradas por Bénezet & Moncunill (2021, p.
56) — que não pode ser excluída a hipótese de catuiśaŕ consistir num NP completo, ibérico (Faria, 1995b,
pp. 82–83; 2003a, p. 223; 2004b, pp. 178–179; 2005a, p. 286; 2007b, p. 221), céltico (Faria, 2012, p. 104;
2013, p. 192) ou híbrido. Seja como for, mesmo que, muito improvavelmente, nos confrontemos com um
NP ibérico, a segmentação de catuiśaŕ em catu∙i∙śaŕ não passa de um capricho de Rodríguez (2002 [2003],
pp. 263, 268; 2002–2003 [2005], pp. 251–255; 2014, pp. 165, 197) (Faria, 2004b, p. 179; 2015, pp. 127, 128).
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Crónica de onomástica paleo-hispânica (31)
GAISCO. Inscrição rupestre. Osséja (Prades, Les Pyrénées catalanes, Pyrénées-Orientales). Ferrer,
Velaza & Olesti, 2018, p. 180.
Se a aproximação de gais ao segmento final de PilosPalCarCais (E.1.372) se afigura de grande
pertinência (Michelena, 1958, p. 43 e n. 23; Orduña, 2005, p. 337), não podem restar quaisquer dúvidas
de que o paralelo perfeito para Gaisco reside obviamente em Gaizco, cuja primeira atestação, neste caso
como sobrenome, figura, através da forma Gaizcho, em documento datado de 1068, pertencente ao
Becerro Antiguo de Leire (Michelena, 19975, p. 91; Ciérbide, 1996, p. 125; Orpustan, 1999, p. 319).
Se é bem certo que a identificação entre ambos os NNP, aqui mais uma vez posta em evidência,
não foi alvo de uma só linha por parte de Ferrer, Velaza & Olesti (2018, p. 180), convém referir que esta
postura foi corrigida mais tarde por um dos autores (Ferrer, 2021 [2022], p. 93).
Orduña (2021a, pp. 471, 486, 488), em contrapartida, estabeleceu uma tal ligação, mas, divergindo
de Ferrer (2021 [2022], p. 93), não conseguiu resistir à tentação de obliterar o nome de quem o precedeu
na descoberta desse vínculo em quase um ano (Faria, 2019, p. 59).
Importa assinalar que voltámos a abordar este tema no volume anterior desta mesma revista (Faria,
2021, pp. 86–87).
Caraniś/garaniś. Fragmento de base de cerâmica ática. El Vilar (Valls, Alt Camp, Tarragona).
Panosa, 2015, p. 32.
Tal como constatámos em mais do que uma ocasião (Faria, 2016, pp. 159–160;
2017, p. 85; 2020a, p. 55), estamos, muito provavelmente, na presença de um NP céltico —
*Caranis/*Caranissa/*Garanis/*Garanissa/*Granis/*Grannis/*Granissa/*Grannissa —, pelo que não podemos
de modo nenhum seguir quem tem vindo a sustentar a integração do NP em apreço na onomástica
ibérica, preceituando a segmentação do mesmo em gara∙niś ou em gara∙niśar (Panosa, 2015, p. 32;
Velaza, 2016, p. 352; MLH V 2, p. 276).
Esta mesma teoria, cujas fragilidades são por demais evidentes, foi acriticamente acolhida ad HEp
2014–2015 [2021], 636.
CaresTar. Placa de chumbo. La Punta d’Orleyl (Vall d’Uixó, Castellón). MLH III 2 F.9.7.
Importa deixar bem claro que Ferrer (2021b, pp. 66–67) não possui qualquer legitimidade para
envolver Rodríguez na identificação do elemento onomástico cares/gares em CaresTar, assim como em
vários outros NNP (Pérez Vilatela, 1992, p. 355; Faria, 1991a, p. 190; 1992, p. 195; 1994b, pp. 67, 70; 1997,
p. 107; 1998c, p. 271; 2004a, pp. 284–286; 2008b [2009b], pp. 148–149; 2012, pp. 87–88).
Trata-se de uma associação espúria, cuja explicação só pode residir no papel preponderante que
Ferrer vem reconhecendo à solidariedade nacional em prejuízo do rigor científico.
CASTLOSAIC. Placa de calcário. caśtilo/Castulo (Cazlona, Linares-Lupión-Torreblascopedro,
Jaén). MLH III 2 H.6.1.
Muitas foram as vezes em que nos debruçámos sobre este gentílico (Hübner (1862, p. 33), dando
devida nota das diferentes perspectivas sobre o mesmo (Faria, 1991, p. 189; 2009 [2010], pp. 160–161;
2011 [2012], p. 159; 2014, p. 171).
Cumpre-nos nesta ocasião, tão-somente, recuperar uma interpretação que talvez tenha sido por
nós rejeitada um tanto apressadamente. Admitindo o acerto da segmentação CASTLO-S-AIC aventada por
Pérez Orozco (1993a, pp. 225–226), fundados nos cada vez mais numerosos testemunhos onomásticos
da presença céltica em todo o curso do Baetis, julgamos agora bastante razoável interpretar -aic como
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António Marques de Faria
abreviação do sufixo indo-europeu (celta) -aikos/ -m (Tovar, 1989, pp. 27, 175; Pérez Orozco, 2009 [2010],
p. 36). Cremos que o melhor comparandum para este sufixo reside em Pac(c)iaecus, cognomen que foi
criado em território hoje andaluz, presumivelmente em Carteia (Caballos, 1989, p. 249; Hernández, 1998, p.
174; Stannard, Sinner & Ferrante, 2019, p. 158). Tal conexão decorre, segundo Caballos, 1989, p. 249), da
presença na numária carteiense de «diversos magistrados con el gentilicio “Vibius”». Esta é uma asserção
que não se confirma — a supracitada ceca só documenta um Vibius, sucessivamente edil e quadrúnviro
(Faria, 1994a, p. 56, n.º 397) —, ainda que tal circunstância não coloque em causa a provável ligação
entre Vibius Pac(c)iaecus e Carteia. Dificilmente se compreenderia que o sufixo -aikos/ -m não entrasse na
formação do cognomen em causa se o mesmo não fosse de uso comum naquela região. É possível que
o cognomen Pac(c)iaecus tenha sido criado a partir de um *praedium Pac(c)iaecum, propriedade de um
ramo dos Vibii (Hernández, 1998, pp. 173–174), conquanto não existam quaisquer provas de que assim
tenha acontecido.
girśdo. Pátera de prata. Castellet de Banyoles (Tivissa, Tarragona). MLH III 2 C.21.1.
Não podemos permitir que Orduña (2021a, p. 477) se faça passar por autor quer da identificação
do NP girśdo, quer da respectiva segmentação em girś∙do (Faria, 1994a, p. 67; 1997, p. 107; 1998a, p.
236; 2004a, p. 306; 2010 [2011], p. 95).
Γολο[-]βιυρ. Placa de chumbo. Pech Maho (Sigean, Aude). Lejeune, Pouilloux & Solier, 1988, p. 53.
É preocupante constatar que Velaza (2021, p. 55) continua a veicular a leitura Γολοβιυρ em vez
de Γολο[-]βιυρ, um NP ibérico que, com grande probabilidade, deverá ser restituído como Γολο[ν]βιυρ
(Faria, 1991a, p. 192; 1994a, p. 45, n.º 175; 1995b, p. 82; 1998a, p. 239; 2000a, pp. 131, 132; 2001a, pp.
99–100; 2001b, p. 209; 2007a, p. 174).
CoPeśiŕ. Inscrição rupestre. La Camareta (Agramón, Hellín, Albacete). Pérez Rojas, 1993, pp.
164–165.
Vemo-nos de novo na obrigação de assinalar que tanto a transliteração como a subsequente
interpretação de CoPeśiŕ como NP são da nossa autoria (Faria, 1997, p. 107; 2000a, pp. 122–123; 2003a,
p. 215; 2004a, p. 305; 2004b, pp. 180–181; 2006a, p. 116; 2007a, p. 167; 2011 [2012], p. 163; 2012, p.
95; 2019, pp. 57–58; 2016 [2017], p. 121), não podendo, pois, ser reivindicadas por Ferrer (2021d, pp.
199, 206). E o mesmo se diga, de resto, da transliteração de um outro NP constante da mesma inscrição,
designadamente Caresi[ŕ?] (Faria, 1997, p. 107; 2004a, p. 285; 2011 [2012], p. 163; 2016 [2017], p. 120).
Esta cada vez mais expectável tentativa de usurpação surge ao arrepio da postura outrora assumida
por Ferrer (2010 [2011], p. 100) acerca do mesmo assunto. Trata-se da confirmação de uma declinante
trajectória deontológica, denunciada por nós nos últimos anos (também noutras páginas deste mesmo
artigo), que não podemos deixar de lamentar.
TANNIBER. Marca em lingote de chumbo. Naufrágio Cabrera 5 (Cabrera, Baleares). Simón, 2015,
passim.
Escapa completamente à nossa compreensão que, na memória descritiva redigida em HEp 2014–2015
[2021] (p. 72) a propósito do presente NP, seja outorgada a Simón (2015) a autoria da segmentação do presente
NP em TANN-IBER, cabendo ao autor destas linhas a prioridade numa tal análise (Faria, 2016, p. 164),
que é também contemplada por Velaza (2016, p. 358), ainda que fazendo uso de um menor número de
argumentos. Em HEp 2014–2015 [2021] (p. 72), nada se diz sobre o assunto, mas o elemento iber já
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Crónica de onomástica paleo-hispânica (31)
tinha sido individualizado há várias décadas na onomástica ibérica, designadamente no NP iaŕiPer (Pérez
Rojas, 1983, p. 279; Faria, 1990–1991, p. 85; 2002a, p. 128; 2008a [2009a], p. 77; 2014, p. 174; 2018a, p.
103; 2021, p. 88; Pérez Vilatela, 1993, p. 40).
TarTiCeleś. Ânfora. Local indeterminado (proximidades de Lloret de Mar, Gerona). Vilà, 1996, p. 296.
Nada temos a acrescentar ao que consignámos noutras ocasiões sobre o presente NP (Faria,
1997, p. 110; 1999, p. 159; 2002a, pp. 123, 125; 2003b, p. 328; 2004a, p. 300; 2007b, pp. 179–180;
2007b, p. 227; 2008a [2009a], pp. 59, 63–64; 2008b [2009b], p. 152; 2010 [2011], p. 99; 2012, p. 103;
2013, p. 204). Pretendemos tão-somente corrigir a transliteração fornecida por Estarán (2021, p. 279, n.
39) — TarTiPeleś —, autora que, além do mais, omite os diversos paralelos por nós aduzidos em diversas
ocasiões para TarTiCeleś.
É descoroçoante constatar a facilidade com que se forjam transliterações que a primeira edição do
grafito está longe de legitimar; vejam-se, por exemplo, as duas invenções perpetradas por Ferrer (2012, p.
148): TauTiCeleś e TauTiPeleś.
A menos que se prove através da publicação de uma fotografia (o que ainda não foi feito) que a
leitura de Vilà está errada, não nos parece que haja alguma razão válida para duvidar da fidedignidade
do desenho do grafito post cocturam reproduzido por aquela autora (Vilà, 1996, p. 296, fig. 1). Em
contrapartida, vale a pena frisar que Vilà (1996, pp. 297–298) isolou rTiCeles (sic) como NP indígena, visto
acreditar que a distância entre o primeiro e o segundo grafemas, por ela considerada excessiva, impedia
que ambos pertencessem à mesma palavra.
Tão-pouco Moncunill & Velaza (MLH V 2, p. 212) conseguiram resistir à tentação de, ao privilegiarem
a transliteração TauTiCeleś em detrimento de TarTiCeleś, adoptarem aquela leitura com o único propósito
de identificarem no mesmo NP dois segmentos onomásticos ibéricos anteriormente conhecidos.
O NP ibérico de que aqui nos ocupamos deve ser naturalmente segmentado em TarTi∙Celeś
(Faria, 1997, p. 110; 1999, p. 159; 2002a, pp. 123, 125; 2004a, p. 300; 2007b, p. 227; 2008a [2009a], p.
59; 2010 [2011], p. 99).
TOLOCO. Placa de calcário. Noua Carthago (Cartagena, Múrcia). EDCS-05502833.
Além de figurar no epitáfio acima mencionado, TOLOCO ocorre em mais duas inscrições latinas
EDCS-08701409; EDCS-45100139), Não obstante caber-nos a prioridade na atribuição deste NP
(segmentável em tolo∙co) à onomástica ibérica (Faria, 1994a, p. 49; 1995a, p. 326; 1995b, p. 83; 1997, p.
111; 2000a, p. 133; 2002a, pp. 129, 135; 2003a, pp. 222–223; 2003b, pp. 313–314; 2004a, p. 310; 2008b
[2009b], p. 147; 2011 [2012], p. 175; 2013, p. 204; 2015, p. 138; 2016, p. 163), vários têm sido os autores
que não têm hesitado em reivindicar a autoria de uma tal descoberta, ocultando deliberadamente aquele
facto (Ferrer, 2005 [2006], p. 959, n. 6; 2021b, p. 81; Campmajo & Ferrer, 2010, p. 260; Rodríguez, 2014,
pp. 170–171; Velaza, 2015, p. 291; Moncunill, 2019, pp. 146, 147, 151, 154; 2020, pp. 177, 179, 186; 2021,
p. 448; Ferrer & Sinner, 2019, p. 153).
Convirá ter presente que Untermann só se apercebeu de que TOLOCO consistia num NP ibérico
na sequência do aparecimento de ToloCu no Terceiro Bronze de Botorrita (Untermann, 1996, p. 160;
1994–1995 [1997], p. 140).
Ao ter citado este último artigo como “Untermann, 1994–1995, p. 149 [sic]”, Simón (2020, p. 154,
n.º 111) omitiu o ano de impressão — 1997 — do número da revista (28–29) em que aquele foi publicado.
Sublinhe-se que o dito artigo insere na respectiva bibliografia o supracitado trabalho de Untermann saído
em 1996 (Untermann, 1996, pp. 109–166). Com esta conduta, Simón prestou informações inexactas,
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António Marques de Faria
enganando assim os seus leitores menos atentos, que foram levados a pensar ter sido Untermann o
primeiro investigador a atribuir uma origem ibérica a TOLOCO.
toraibeleś. Lâmina de chumbo. Pico de los Ajos (Yátova, Valência). Ferrer & alii, 2021, p. 105.
Não havendo nada a referir acerca de beleś, o membro final deste NP, colocam-se duas
hipóteses acerca da interpretação a dar a torai: como segmento antroponímico autónomo ou como
combinação de tor + ai. Seja qual for a exegese adequada, torai deve ser cotejado com os outros
componentes onomásticos que terminam com o mesmo ditongo: deśai, presente em deśailaur
(Faria, 2008a [2009a], p. 89; 2010 [2011], p. 95), e śalai, constante, e.g., de [ś]alaiTiPaś (Faria,
1995a, p. 328; 2002b, p. 239; 2004a, pp. 290–291; 2007a, p. 179; 2007b, p. 226; 2015, p. 138).
Efectivamente, enquanto deś deverá corresponder ao radical celta dexs-/dess-, śalai parece derivar
de śal, segmento que ocorre no presumível NP śalcidei (Faria, 1993, p. 154; 1994b, p. 68).
Ferrer & alii (2021, p. 105) admitiram isolar o mesmo morfema posposto aos NNP aTaPer
(Faria, 1991a, pp. 190, 191; 1994b, p. 66; 1998c, p. 270; 2004a, p. 278; 2007b, p. 211; 2016, p.
158) e anḿPer (Faria, 1991a, p. 191; 2004a, p. 277; 1998c, p. 270; 2007b, p. 211; 2016, p. 158).
Levando, no entanto, em linha de conta a localização do dito morfema, em aposição ao segmento
final ber, tal hipótese afigura-se-nos pouco provável.
Ελερυας. Placa de chumbo. Pech Maho (Sigean, Aude). Lejeune, Pouilloux & Solier, 1988, p. 53.
Temos vindo a sustentar há quase três décadas que a leitura Βλερυας deve dar lugar a Ελερυας,
um NP ibérico que já era conhecido em escrita levantina, sob a forma elerbaś, num grafito cerâmico de
Iliberris (Elne) (B.9.1) (Faria, 1994b, p. 69; 1998a, p. 234; 2000a, p. 131; 2000b, p. 63; 2001a, pp. 99–100;
2003b, p. 323; 2004a, p. 292; 2006, p. 118; 2007a, p. 170; 2011 [2012], p. 166; 2020a, p. 60; 2021, p.
88–89).
A precedência nesta descoberta foi-nos devidamente reconhecida por alguns autores, entre os
quais se conta Moncunill (2010, p. 75; 2017, p. 12, n. 15).
Lamentavelmente, em nítido contraste com esta postura, Velaza (2021, p. 55) veio mais uma vez
tentar apropriar-se da autoria tanto da leitura como da atribuição linguística do NP Ελερυας ao ibero.
Enquanto tal se justificar, não deixaremos de denunciar esta e outras vilezas perpetradas por Velaza.
É interessante notar que também Sabaté (2021, p. 239), numa lastimável tese precisamente
orientada por Velaza, quis emular este iberista, tentando, sem qualquer pudor, usurpar a nossa perspectiva
acerca do NP em causa. De resto, fomos confrontados com esta conduta predatória em numerosas
passagens da dita tese (respeitantes a quase todas as inscrições ibéricas), que, por falta de espaço, não
serão aqui devidamente expostas.
ENASAGIN. Tábua de bronze. Roma. CIL I2 709.
Gimeno & Velaza (2021, p. 207) não possuem qualquer legitimidade moral para reivindicarem a
autoria da segmentação do NP ibérico ENASAGIN em enas∙agin (Schuchardt, 1909, pp. 242, 244; Faria,
1994b, p. 67; 1998a, p. 235; 2004a, p. 297).
ibuścetin/ipuścetin. Cerâmica. Ensérune (Nissan-lez-Ensérune, Hérault). MLH II B.1.270, .271.
Nunca será demais assinalar que coube a Correa (1992, p. 262) corrigir as transliterações que
Untermann (MLH II, pp. 237–238) tinha aduzido para esta sequência, na qual identificámos um NP
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Crónica de onomástica paleo-hispânica (31)
ibérico bimembre: ibuś∙cetin (Faria, 1995a, p. 327; 2004a, p. 307; 2004b, p. 182; 2005a, p. 279; 2006,
pp. 119–120; 2007a, pp. 170–171; 2011 [2012], p. 148; 2020a, p. 61).
Assim sendo, Ferrer (2021b, p. 82) não possui qualquer legitimidade para associar Rodríguez
(2002–2003 [2004], p. 367) à identificação do dito NP.
Trata-se de uma tentativa de envolvimento espúria, cuja explicação só pode residir no papel
preponderante que Ferrer vem reconhecendo à solidariedade nacional em prejuízo do rigor científico.
ICSTNIS. Urna de calcário. Torreparedones/Cortijo de las Vírgenes (Castro del Río, Baena/Cañete
de las Torres, Córdova). EDCS-08700430.
Em contraste com a posição por nós adoptada ao longo de mais de uma década acerca de
ICSTNIS (Faria, 1991b, p. 17; 1994a, p. 45, n.º 174; 2000a, p. 126; 2002a, p. 130), — quase sempre
favorável à sua inclusão numa suposta língua comummente chamada turdetana (ou, de um modo mais
prudente, “turdetana”) —, não nos parece agora nada seguro que este intrigante NP possua uma origem
paleo-hispânica.
Estamos, contudo, perante um conceito — a língua turdetana — que se define apenas por
oposição (“negative evidence”: De Hoz, 2018 [2019], p. 156) a realidades onomásticas bem estabelecidas.
É justamente a operatividade de um tal conceito, acolhido acriticamente em diversos trabalhos (v., entre
outros, Correa, 2009, pp. 282–285, 287–291; De Hoz, 2016, pp. 212–217; 2018 [2019], pp. 137–157;
Herrera, 2019, p. 358; 2021, pp. 121, 127; 128; Vallejo, 2021, p. 173; Ferrer, 2021a, pp. 69–70, 75–77, 80,
88, 90; García Alonso, 2022, pp. 48, 49, 50, 54–61), que decidimos questionar há alguns anos (Faria, 2015,
p. 135).
Só por mera convenção é que poderemos chamar turdetano (ou mesmo “turdetano”) a um conjunto
de NNP documentados em território hoje andaluz, que, não sendo, decerto, de filiação ibérica, reúnem
certas características que permitem, a muitos deles, ser considerados indo-europeus (Villar, 2000, pp.
337–349; contra, De Hoz, 2018 [2019], p. 156) e, muito provavelmente, célticos (Faria, 2015, pp. 128–130,
Quadro 1).
Aliás, se, algum dia, o corónimo Turdetania, derivado do NE Turdetani, reflectiu uma realidade
étnico-cultural (e, a fortiori, linguística) concreta, convirá ter em consideração que o referente geográfico
primordial de uma tal entidade se situaria numa região delimitada pelo rio Júcar e pelo Alto Guadalquivir,
mais precisamente no saltus Castulonensis, entre Castulo e Saetabis (Moret, 2011, pp. 239–240; 2017, p.
123; 2018, pp. 19, 21; Cruz, 2011, p. 220, n. 25; Blanco, 2021, p. 423). Semelhante localização, estabelecida
com base em passagens de Tito Lívio (21.6; 24.42.11; 34.17) e em fragmentos das Origines, de Catão,
o Velho, pouco tem que ver com o constructo de Estrabão (ou das suas possíveis fontes, Possidónio e
Artemidoro), que, grosso modo, fazia coincidir a Turdetânia com o médio e baixo vale do Baetis (Moret,
2011, pp. 241–243; 2017, pp. 130–137; 2018, pp. 24–26).
Acresce ainda, que, contra a existência do turdetano como glotónimo — tenha sido, ou não, falado
na zona central e ocidental da Bética —, milita a possibilidade de o NL Turta/Turda, identificativo da capital
epónima dos Turdetanos, pertencer à onomástica ibérica (Moret, 2018, p. 21).
É, pois, por demais evidente que a classificação como turdetanos de determinados restos
onomásticos de explicação reconhecidamente complexa decorre tão-só da descoberta dos mesmos no
território que Estrabão decidiu, de um modo artificial, designar por Turdetânia (Cruz, 2011, pp. 214–222;
García Fernández & García Vargas, 2020–2021, pp. 76–77).
As considerações acima expendidas deixam igualmente entrever as fragilidades da individualização
ad hoc de uma “toponimia tartesoturdetana” (Correa, 2016, pp. 57–59; 2021, pp. 354, 361, 366, 367,
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António Marques de Faria
n. 25), um conceito cuja criação conta com a agravante de ser tributária da descrição geográfica de
Ptolemeu. Nada indicia, como vimos, que o idioma turdetano (a ter existido) corresponda ao que se falava
em Tartesso.
O quadro que aqui deixamos esboçado contrapõe-se naturalmente ao panorama optimista traçado
por De Hoz (2010, pp. 320–322) relativo à definição da Turdetânia como entidade étnico-geográfica
precisa. Com efeito, este autor tenta operar uma síntese impossível entre as diversas fontes que, ao longo
de dois séculos, foram transmitindo informações contrastantes sobre uma realidade histórica que, com os
dados actualmente disponíveis, não é passível de ser apreendida (García Fernández, 2012, pp. 714–715).
Incidindo de novo a nossa atenção sobre ICSTNIS, à luz da análise linguística, subscrita por
Obrador, De Nicolás & Múrcia (2020, pp. 63–64), do cognomen ICESTA (EDCS-05503073), documentado
em Pollentia (Maiorca), a interpretação daquele como NP paleo-amazigue deve, do nosso ponto de vista,
prevalecer sobre qualquer outra adscrição linguística, seja ao ibero (Faria, 1991b, p. 17; 1994a, p. 45,
n.º 174; 2002a, p. 130), seja ao turdetano (Faria, 2000a, p. 126; 2002a, p. 130; Beltrán Fortes, 2021,
p. 274), um idioma que, conforme vimos supra, além de ostentar uma denominação inadequada, é de
caracterização imprecisa, pelo que a sua qualificação como não-indo-europeu deve ser colocada cada
vez mais sub iudice. Tão-pouco a classificação de ICSTNIS como indígena (Padilla, 2006, p. 232) poderá
ser considerada satisfatória.
Em resumo, tudo leva a crer que ICESTA e ICSTNIS configurem diferentes latinizações de um
mesmo NP paleo-amazigue.
Não é ICSTNIS o único NP norte-africano documentado no “mausoléu dos Pompeios” descoberto
em Torreparedones. Além de contarmos com o patrónimo BAHANNONIS (gen.), considerado por Padilla
(2006, p. 232) como indígena, não será por casualidade que, no conjunto sepulcral em apreço, se regista o
cognomen AFER (EDCS-08700441), ficando deste modo comprovado “que la famille à laquelle appartenait
le tombeau comptait des Africains parmis ses membres” (Merimée, 1844, p. 180). Convirá, todavia, notar que
nem Lefebvre (2006, pp. 108–109) nem Álvarez (2018, p. 191), autores que nada dizem sobre ICSTNIS ou
BAHANNONIS (gen.), NNP documentados no mesmo âmbito espácio-temporal, secundam uma associação
do cognomen AFER, no caso vertente aposto a um Cn. Pompeius, com o território norte-africano.
À primeira vista, por comparação com ICESTA, é possível detectar no NP ICSTNIS < *Icestan
um alongamento em -n- com a consequente adaptação à 3.ª declinação latina, um facto que parece
verificar-se não só em IL‘DI’RO‘NI’S/ILD<I>RON<I>S < *Ildiro e VELAVNIS < *Uellau(n), mas também em
‘Pan’gioniś < *Mangionis (Faria, 2018a, p. 92). Se um tal fenómeno, que poderá igualmente ocorrer no
problemático TOLOCONIS (EDCS-08701409), não for fruto do acaso (Faria, 2018a, pp. 92–93), o mesmo
contribuirá para a delimitação de uma isoglossa própria de um idioma associável ao vale do Baetis,
independentemente da filiação linguística dos NNP em questão.
Tal como ‘Pan’gioniś < *Mangionis (Faria, 2018a, p. 92), também VELAVNIS poderá remontar ao
celta — *Uellau(n) < uellaunos (DLG, p. 311; Matasović, 2009, p. 411) —, ainda que não possa ser excluída
a hipótese de o mesmo ser inserido na antroponímia ibérica — *Belaun (a segmentar em bel∙aun).
ISELAVACE. Estela de calcário. Villartoso (Sória). Alfaro & Gómez-Pantoja, 2021, p. 170.
Num trabalho maculado por erros incompreensíveis (Alfaro & Gómez-Pantoja, 2021, p. 170), este
NP surge de(s)composto em três palavras (!): ISE L AVRCE.
Dada a ausência de uma segmentação fiável, não estamos em condições de fornecer uma
interpretação minimamente convincente para este NP.
De qualquer modo, convém assinalar que Ise guarda algumas semelhanças com HISSI (Faria,
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2008a [2009a], p. 75) e com os membros iniciais de isiPela (Ferrer, Olesti & Velaza, 2020, p. 34) e de *Isibra
(MLH VI, pp. 461–462), que podem corresponder a um só. Não será, tão-pouco, de excluir que o mesmo
formante se possa isolar no ND BEISIRISSE (dat.) (Gorrochategui, 1984, p. 315, n.º 473; Faria, 2007a,
p. 162; 2014, p. 169; 2019, p. 55; Silgo, 2009 [2010], p. 140). Quanto a ce, além de se testemunhar em
HAVRCE (Faria, 2019, p. 68), NP com que principia a presente inscrição, figura em idêntica posição em
lecarce (Solier, 1979, pp. 83, 84; Faria, 2002a, p. 133; 2015, p. 132; 2019, p. 68). Haverá igualmente que
contemplar a eventualidade de ser este mesmo segmento que se atesta em oToCeilTir (F.21.1) (Fletcher,
1984, pp. 409, 410; Faria, 2002b, p. 234) e, porventura, noutros NNP: orCeiCelauŕ (D.12.1) (Faria, 1994b,
p. 65; 2004a, p. 289) e aParCePioTar (Faria, 1994b, p. 67; 2000a, p. 121; 2004a, p. 301; 2005a, p. 285;
2010 [2011], p. 89).
Admitindo que ISEL∙AVA∙CE constitui a segmentação correcta, isel encontra os melhores
comparanda em ISELICI (gen.) (Holder, 1904, col. 78) e ISELLIA (Holder, 1904, col. 78; Delamarre, 2007,
p. 112).
Com base nas fotos disponibilizadas em < https://www.amaata.com/2021/06/indicaciones-parala-lectura-de-la.html#more >, parece possível ler-se na linha 6 da mesma inscrição o NP ORIINIARƧE (=
Oreniarse).
liCine. Grafito sobre campaniense B. Plaza de la Virgen (Valência). Bonet & Mata, 1989, p. 142.
É absolutamente assombroso que, passadas mais de duas décadas sobre a publicação do artigo
em que Pérez Vilatela e Silgo (Pérez Vilatela, 1992, pp. 352, 354, Fig. 2) corrigiram a transliteração do
supracitado grafito alvitrada por Bonet & Mata (1989, p. 142) — liCine por ligie —, tanto Beltrán Lloris
(2017, p. 335, n. 43) como Rodríguez (2018, p. 201) venham reivindicar a autoria de uma tal correcção.
Cremos que vale a pena reiterar a nossa convicção de que liCine é justamente o mesmo NP que se
encontra atestado nos textos ibéricos inscritos nos mosaicos de La Caridad (Caminreal, Teruel) e *Andelo
(Muruzábal de Andión, Navarra) (Pérez Vilatela, 1992, p. 352; Faria, 2000a, p. 124; 2011 [2012], p. 172;
2014, p. 176). Por outro lado, importa referir que quer o local de achamento do grafito em questão —
Valentia, uma cidade povoada sobretudo por imigrantes itálicos —, quer a natureza do suporte, um
objecto de carácter privado, quer ainda a pretensa adaptação do NP à morfo-fonologia ibérica tornam
altamente inverosímil que liCine designe um Celtibero (Faria, 2019, p. 62; contra, Pérez Vilatela, 1992,
p. 352). Semelhante facto não impediu que Moncunill (2021, p. 452, n. 36), munida de uma sobranceria
e de uma auto-suficiência só permitidas pela cumplicidade de quem lhe publica semelhantes palpites,
sentenciasse, sem discutir um só dos óbices acima invocados, que liCine conforma um NP celtibérico.
Acresce ainda que, tanto quanto sabemos, nenhum dos paladinos da interpretação do NP liCine,
referenciado no mosaico de Caminreal, como forma iberizada do celtibero Licinos conseguiu até hoje
fornecer uma resposta válida para a questão que formulámos há muitos anos (Faria, 1997, p. 109):
que explicação poderá ser encontrada para o facto de um fabricante de mosaicos celtibérico gravar uma
inscrição em língua ibérica numa casa e numa cidade (...) habitadas por Celtiberos?
Tudo se conjuga, pois, para que o NP em causa, nas três ocorrências até agora documentadas, seja
mesmo ibérico — *Ligine (Vicente & alii, 1991, p. 122; 1993, pp. 755–756; Faria, 1992, p. 193; 1992– 1993,
p. 278; 1993, pp. 153, 157; 1997, p. 109; 2011 [2012], p. 172; 2019, p. 62) — ou, em último caso, latino —
Licinus (García-Bellido, 1990, p. 72; Velaza, 1991, p. 292; De Hoz, 1992, p. 336, n. 33; 1995, p. 30; Pérez
Vilatela, 1992, p. 352; Faria, 1994b, p. 68; 1997, p. 109; 2000a, p. 123; 2011 [2012], p. 172; 2014, p. 176;
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2019, p. 62). Apesar de ambas as hipóteses de atribuição linguística — ibérica ou latina — terem sido
equacionadas por Beltrán Lloris (2017, pp. 335, 340, 341), este autor considerou adequada a omissão
de todos e cada um dos 17 títulos citados no parágrafo anterior, o mesmo sucedendo, de resto, com
Moncunill (2021, p. 452, n. 36).
minuli[. Placa de chumbo. La Mesa de Alcolea (Alcolea del Río, Sevilha). Luján & López, 2017, pp.
128–136; Ferrer, 2021a, p. 85.
Na proposta de transliteração do NP aqui lematizado, pretendemos dar corpo às nossas suspeitas
iniciais (Faria, 1990–1991, pp. 79–80) de que, ao invés do que sustentava De Hoz (1976, p. 266), assumindo
uma postura que reverteu num trabalho publicado postumamente (De Hoz, 2021, p. 55), o sistema de
escrita meridional não era “único y coherente”, uma perspectiva que torna legítimo o reequacionamento
dos valores fonéticos a atribuir a determinados signos dentro de um mesmo documento.
Caso os valores fonéticos agora assumidos para o primeiro e terceiro signos venham a ser
corroborados através do aparecimento de testemunhos incontestáveis, nada obsta a que possamos estar
perante o NP céltico Minulus (Delamarre, 2007, pp. 134, 227) < *Minulos ou, levando em consideração a
última vogal legível, *Minul(l)ius < *Minul(l)ios.
O radical deste NP, minu-, é o mesmo que ocorre em Μινουρος, o nome de um dos assassinos de
Viriato (Albertos, 1966, p. 157; contra, Faria, 2007b, p. 220).
Ναλβε[--]ν. Placa de chumbo. Pech Maho (Sigean, Aude). Lejeune, Pouilloux & Solier, 1988, p. 53.
É preocupante constatar que, não obstante as nossas insistentes chamadas de atenção para o
único modo correcto como o presente NP deve ser transcrito (Faria, 2004b, p. 185; 2010 [2011], p. 97;
2016 [2017], p. 125; 2019, pp. 62–63; 2021, p. 91), ainda vai sendo possível depararmo-nos com invenções
do calibre de Ναλβεαδεν (Velaza, 2021, p. 55).
53.
[Ν]αυαρυας. Placa de chumbo. Pech Maho (Sigean, Aude). Lejeune, Pouilloux & Solier, 1988, p.
Temos vindo a sustentar há mais de três décadas que [Ν]αυαρυας configura um NP ibérico
composto por nabar e por baś (Faria, 1991b, p. 18; 1994b, p. 69; 1998d, p. 229; 2000a, p. 131; 2001a, pp.
99–100; 2002a, p. 129; 2004a, p. 292; 2010 [2011], p. 100; 2011 [2012], p. 166; 2016 [2017], p. 126; 2019,
p. 63).
É triste verificar que Velaza (2021, p. 55), lendo Ναυαρυας onde figura [Ν]αυαρυας, veio mais
uma vez tentar apropriar-se da autoria de semelhante atribuição linguística. Enquanto tal se justificar, não
deixaremos de denunciar esta e outras vilezas perpetradas por Velaza.
oCoPilos. Placa de chumbo. “Barranco del Rey” (Serra de Gádor, Almeria). MLH III 2 H.1.1.
Lamentavelmente, Ferrer (2021a, p. 81) escondeu o nome de quem, pela primeira vez, individualizou
este NP ibérico (Faria, 1995a, p. 327; 2002b, p. 236; 2003a, p. 225; 2004a, p. 308; 2007a, p. 174; 2008b
[2009b], p. 152; 2012, p. 99), um comportamento em que este autor reincidiu (Ferrer, 2021a, p. 82) a
propósito do NP PaśTiPilos (Faria, 1990–1991, pp. 76, 78, 84; 1991a, p. 190; 1994b, p. 67; 1995a, p. 324;
1998a, p. 236; 2004a, p. 304; 2006, p. 118; 2007a, p. 174; 2008b [2009b], p. 148; 2012, p. 92).
Não mais afortunado esteve o mesmo investigador ao transliterar oCoPilos sucessivamente como
onpilos (Ferrer, 2021a, p. 81) e onbilos (Ferrer, 2021a, p. 81). Se, numa das duas vezes em que este nome
surge inscrito, nenhumas dúvidas se colocam à transliteração do segundo signo como <Co>, aumenta
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de maneira substancial a probabilidade de ser aquele o signo que ocorre em idêntica posição na outra
atestação do referido NP. Trata-se de um raciocínio cuja lógica nos parece irrebatível, pouco importando
para o caso que, nestoutro testemunho, <Co> se apresente incompleto — uma conjectura que Ferrer não
conseguiu provar — ou superficialmente gravado.
Em mais uma manifestação de uma triste conduta várias vezes reiterada na sua tese de
doutoramento, Sabaté (2021, p. 329) ocultou toda a bibliografia que produzimos acerca da inscrição
ibérica em apreço.
ordincali. Inscrição rupestre. Osséja 2 (Prades, Pirenéus Orientais, Occitânia). Campmajo &
Untermann, 1990, pp. 71, 73; 1993, pp. 508–509.
Ferrer (2021b, p. 64) não possui qualquer legitimidade moral para envolver Rodríguez na
identificação do NP ibérico ordincali, segmentável em ordin∙cali (Faria, 2007a, p. 168; 2007b, p. 212).
Trata-se de uma associação espúria, cuja explicação só pode residir no papel preponderante que
Ferrer vem reconhecendo à solidariedade nacional em prejuízo do rigor científico.
OR[-]ṾNETSI (dat.). Lápide funerária. Muez (Navarra). Gorrochategui, 1995 [1997], p. 225, Foto 3.
Cremos que pouco mais haverá que acrescentar às reflexões que este cognomen nos suscitou
noutros momentos (Faria, 2002b, p. 237; 2005, p. 283; 2009 [2010], p. 166).
Cumpre-nos, contudo, deixar em aberto a possibilidade de este cognomen corresponder a um
gentílico, a exemplo de muitos outros NNP ibéricos/paleobascos, por nós coligidos (Faria, 2013, pp. 195–196),
que derivam de NNL.
A sugestão que aqui formulamos é evidentemente tributária do juízo emitido sobre este assunto
por Castillo (1992, p. 122; 1998, p. 80). Esta autora, que, tal como muitos outros investigadores (v., muito
recentemente, Orduña, 2021b, p. 253), lê ORDVNETSI onde figura OR[-]ṾNETSI, interpreta este termo
como referência à naturalidade de L. Aemilius: *Ordunesis < *Ordunensis. Segundo Castillo (1992, p.
122; 1998, p. 80), o NL de que derivaria o gentílico teria sido *Ordonum ou *Ordunum, ainda que, por
razões óbvias (a tratar-se de um topónimo, seria naturalmente pré-romano), fosse preferível optar *Ordun,
*Ordune, *Orduna ou *Orduni.
Divergindo de Castillo, seja qual for a letra a restituir — em função do idioma a que o cognomen
possa pertencer, não é seguro que se trate de um <D> (Faria, 2009 [2010], p. 166) —, ORDVNETSI nunca
terá possuído uma segunda nasal a seguir a <E>, se, conforme reputamos plausível (mas não inteiramente
certo), o mesmo equivaler a um gentílico paleobasco/ibérico, *Or[-]unes, correspondendo o signo de
sibilante a um sufixo étnico (Schuchardt, 1907, pp. 32–37; Pérez Orozco, 1993, pp. 225–226; 2009 [2010],
p. 36; De Hoz, 2002, pp. 162–163; Faria, 2002b, p. 234; 2003b, p. 319; 2005b, pp. 164–165; 2006, p. 122).
A título de exemplo, recordemos o NP ENNEGES, que deverá filiar-se no NL *Ennege (Faria, 2003a, p.
218), *Ennega (Curchin, 2011, p. 313; Vidal, 2015, p. 97; MLH VI, p. 402) ou *Ennegi (Silgo, 2013, p. 138).
Vem a propósito assinalar que, no radical (ou no primeiro componente) do NP ENNEGES,
continuamos a preferir identificar a forma latina (com assimilação vocálica e consonântica) de inde (*indeges,
de preferência a *indegeś) (Faria, 2002a, p. 132) em detrimento de ende (Mariner, 1979, p. 76), porquanto
só aquele primeiro formante é conhecido em escrita indígena, nomeadamente no NP inTePele[ś] (F.11.7).
ENNE também poderia provir de indi, mas a existência deste segmento antroponímico, advogada por
diversos iberólogos (que preferem inti [sic]) (MLH III 1, p. 224; MLH V 2, p. 524; Rodríguez, 2014, p. 261),
baseia-se em dois testemunhos de fiabilidade bastante discutível.
À luz da comparação com ENDEGVS (EDCS-12100756) e com ENDEITEREIS (dat. pl.) (EDCS-22800065;
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EDCS-08200010), continuamos a admitir que inde < ende constitui um elemento antroponímico ibérico importado
do celta (Faria, 2008a [2009a], p.77), um conjunto que, estimamos, rondará a meia centena de componentes até
hoje identificados.
É evidente que, na eventualidade de OR[-]ṾNETSI corresponder a um cognomen/gentílico de
ascendência paleobasca/ibérica, afigura-se tentador completá-lo como OR[D]ṾNETSI, uma opção tomada
por todos os autores que se debruçaram sobre o mesmo (v., em último lugar, Salaberri, 2017, p. 242, n. 3;
Moncunill, 2019, pp. 143, 147; 2020, p. 179; Simón, 2020, pp. 138–139, n.º 83). Certo é, porém, que não
existe até hoje, em escrita epicórica, qualquer prova da existência de ordun como formante onomástico
ibérico, sendo que o único indício da sua documentação em escrita latina, durante a Época Romana, é
justamente o cognomen/gentílico fragmentário que aqui analisamos. Convirá, notar, por outro lado, que
muitos dos NNL atestados a partir da Idade Média (e.g., Orduña/Urduña), passíveis de explicar o nosso
cognomen/gentílico, parecem encontrar a sua origem na antroponímia latina (v., recentemente, Yarza,
2015, pp. 361–362, 369, 376–378, 379). Não obstante, cremos que são em número suficiente as provas da
existência de ordun na onomástica basca medieval, tanto na antroponímia como na toponímia (Michelena,
1987 [1969], p. 133; Irigoyen, 1994, pp. 242–243; Silgo, 1994, pp. 217–218; 2020, pp. 141–143; Salaberri,
2003, pp. 224–225; 2017, p. 242, n. 3; Ciérbide, 2017, p. 17), emergindo o apodo composto Ordun velça
(1366) (Irigaray, 1955, p. 498; Reguero, 2011, p. 218) como o testemunho mais evidente de tal facto.
Não obstante reconhecermos que OR[D]ṾNETSI configura a hipótese de transcrição mais plausível,
atrevemo-nos a formular uma outra sugestão de leitura do cognomen/gentílico em análise, que expomos
aqui com as necessárias reservas; consiste a mesma na restituição de um <S> como a letra em falta no
início da segunda linha do epitáfio.
Nesta conformidade, *Orsune poderia estar na génese de Urssua (1146) (Salaberri, 2006, p. 699),
através das formas intermédias *Urssue < *Orsuhe, um NL que hoje teria eventualmente correspondência
com Uxue/Ujué. De *Orsune também poderia ter derivado outro NL navarro atestado na documentação
medieval como Ursue (1359, 1459) (Salaberri, 2009, pp. 145, 146; 2011, p. 142).
Ainda a propósito de OR[-]ṾNETSI (dat.), chega a ser desarmante o à-vontade com que Moncunill
(2021, p. 448), atropelando todas as regras a observar na análise epigráfica e linguística, transforma este
cognomen/gentílico em Ordunnes.
SALAGINI (dat.). Placa de xisto. Mina Peña de Hierro (Riotinto, Huelva). Gimeno & Velaza, 2021, p.
204.
Trata-se decerto de um ND ibérico — *Salagin — latinizado em *Salaginis, a segmentar em *sal∙agin.
sal comparece em sal∙ageŕ (Faria, 1994b, p. 70; 1995a, p. 328; 1998a, p. 235; 2004a, p. 289;
2007a, p. 177; 2010 [2011], p. 98; 2015, p. 138), enquanto agin figura em aCinir (Faria, 1991a, p. 189;
1994b, pp. 66, 70; 1998a, p. 235; 2004a, p. 302), PeleśaCin (Faria, 1994b, p. 67; 1998a, p. 235; 2004a, p.
296) e em ENASAGIN (Faria, 1994b, p. 67; 1998a, p. 235; 2004a, p. 297).
É triste reconhecer que Gimeno & Velaza (2021, pp. 207–208) omitiram despudoradamente toda
a bibliografia por nós dedicada aos NNP ibéricos que testemunham os componentes do ND SALAGINI
(dat.).
[s]elgiberśaŕ/[s]elCiPerśaŕ. Vaso de cerâmica. Molí d’Espígol (Tornabous, Urgell, Lérida). Cura,
1993, p. 219.
Não podemos permitir que Orduña (2021a, p. 488) se faça passar por autor quer da identificação
do NP [s]elgiberśaŕ/[s]elCiPerśaŕ, quer da respectiva segmentação em [s]elgi∙ber∙śaŕ/[s]elCi∙Per∙śaŕ
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(Faria, 1999, p. 156; 2003a, p. 215; 2003b, p. 318; 2004a, p. 299; 2006, p. 117).
SVLAGESSIA. Estela de calcário. Villartoso (Sória). Alfaro & Gómez-Pantoja, 2021, p. 168.
Num trabalho maculado por erros incompreensíveis, pode ler-se que este NP contém um sufixo
final (sic) alheio ao âmbito indo-europeu (Alfaro & Gómez-Pantoja, 2021, p. 168).
No entanto, seja qual for a análise adequada, parece-nos preferível atribuir SVLAGESSIA ao celta.
Cremos que SVL∙AGESSI-A configurará a segmentação mais provável. São vários os NNP que contam
sul- como radical, designadamente Sul(l)a (Lambert, 20032, pp. 56, 58, 123, 124; Delamarre, 2007, p. 174).
agessia, com final latinizado em -ia ou -a, é um componente que deverá ser cotejado com o radical
de AGESILLVS (Delamarre, 2007, p. 14) e AGESSILI (gen.) (EDCS-49602309; EDCS-49602310).
VDANVS. Estela de calcário. Villartoso (Sória). Alfaro & Gómez-Pantoja, 2021, p. 168.
Segundo os primeiros editores, “Udanus puede ser una variante sorda [sic] de un poco corriente nomen
gentile Utanius, que usaron unos pocos individuos de Roma y sus alrededores” (Alfaro & Gómez-Pantoja, 2021,
p. 168).
No entanto, a nosso ver, estamos perante um NP derivado do (paleo)basco uda ‘Verão’ (van Eys,
1873, p. 352; Lhande, p. 996), correlato do latim Aestiuus/ -a. Importa assinalar que, segundo Caro (1945,
p. 103), o NL alavês Estibaliz terá derivado do NP Aestiuus, preferindo Michelena & Yrigaray (1958, p.
78) reportá-lo a *Aestiualis. Refira-se que *Aestiualis (também referido por Michelena, 19975, p. 109) é
correcção por Aestiualis (Michelena & Yrigaray, 1955, p. 113), porquanto tal NP não se encontrava atestado
na década de 50 do século passado, uma situação que, tanto quanto sabemos, se mantém até hoje.
De qualquer modo, estamos tentados a dar razão a Salaberri (2013 [2015], p. 208; 2015, p. 179)
ao preconizar a filiação do NL Estibaliz em *Estival (ou, melhor, *Aestiual), em conformidade com o modelo
derivacional Bazcoareiz (patrónimo) < Bazcoare < Pascoal (Michelena, 1987 [1969], p. 138; Salaberri, 2003,
p. 158).
Se, numa rápida pesquisa da EDCS, observamos que a área de distribuição do NP Aestiuus/ -a
indicia claramente que estamos ante um Deckname em substituição de um ou vários NNP célticos, tal
não obsta a que pelo menos alguns exemplos hispânicos do dito NP recubram NNP de ascendência
paleobasca ou ibérica.
Se a etimologia de Udanus ora sugerida estiver correcta, sai fragilizada a hipótese, aventada por
Michelena (19772, p. 100), de a variante eudea ser anterior a uda.
]iTe. Placa de calcário. Ampúrias (La Escala, Gerona). MLH III 2 C.1.1.
Continuamos a acreditar que poderemos estar perante a iberização do cognomen Auitus, mutilado
no início (Faria, 2004b, p. 184; 2014, p. 181; 2015, p. 139), pertencente a [ḿPa]rCe / [Pa]rCe Corneli <
Marcus Cornelius.
Esta nossa perspectiva, até agora por contestar, foi deliberadamente silenciada por Moncunill &
Velaza (MLH V 2, p. 519).
[cu]inTi. Placa de calcário. Ampúrias (La Escala, Gerona). MLH III 2 C.1.1.
Tal como sustentámos em diversas ocasiões, estamos perante a versão ibérica, truncada no início,
do nomen Quintius (Faria, 1997, p. 111; 2000a, pp. 136–137; 2004b, p. 184; 2010 [2011], p. 94; 2014, p.
181; 2015, p. 139) ou, com menor grau de probabilidade (em face do número de atestações, bem mais
escasso), de Quinctius.
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Tudo o que Moncunill & Velaza (MLH V 2, p. 524) escreveram acerca de ]inTi resulta de uma
postura de má-fé e não passa de areia atirada aos olhos dos seus leitores menos informados.
Tal como Moncunill & Velaza (MLH V 2, p. 524), também Rodríguez (2014, p. 156) admitiu
a possibilidade de o NP fragmentário que nos ocupa testemunhar a ocorrência do pretenso formante
antroponímico ibérico inti. Trata-se obviamente de uma suposição errada.
[Ci?]neruniŕ. Placa de chumbo. “Barranco del Rey” (Serra de Gádor, Almeria). MLH III 2 H.1.1.
Na proposta de transliteração do NP aqui lematizado, partimos de dois pressupostos:
1. Pretendemos dar corpo às nossas suspeitas iniciais (Faria, 1990–1991, pp. 79–80) de que, ao
invés do que sustentava De Hoz (1976, p. 266), o sistema de escrita meridional não era “único
y coherente”, uma perspectiva que torna legítimo o reequacionamento dos valores fonéticos a
atribuir a determinados signos dentro de um mesmo documento.
2. O chumbo de Gádor está redigido em ibero, ou, não o estando, configura um documento
contabilístico turdetano — correspondente grosso modo ao autêntico âmbito geográfico tal como
foi identificado por Moret (2011, pp. 239–240; 2017, p. 123; 2018, pp. 19, 21) para esta etnia —
que, além de cifras e respectivas unidades de medida, veicula exclusivamente NNP ibéricos.
A provável restituição do segmento inicial do NP radica na individualização do dito formante em
TerCeCiner (F. 20.1) (MLH III I, p. 226, n. 75; MLH III 2, p. 536; Faria, 1993, p. 150; 1994b, p. 69; MLH V 2,
p. 216; contra, Faria, 1992–1993, p. 278: TerCe∙Cine∙(e)rTin).
O segmento uniŕ ocorre com outro fonemograma de vibrante em isCeunir (G.17.1) (Faria, 1998a,
p. 238; 2000a, p. 135; 2007a, p. 172; 2014, pp. 174–175; 1990–1991, pp. 76, 86; 1991a, p. 190; 2004a, p.
303; 2007a, p. 172; 2008a [2009a], p. 77) e em ḿreśunir (B.7.36)/ḿur[eś]unir (B.7.36)/ureśunir (B.7.34)
(Faria, 1990–1991, p. 88; 1991a, p. 190; 1992, p. 195; 1994b, p. 68; 1995a, pp. 326, 329; 2004a, pp. 308,
311).
]rCe. Placa de calcário. Ampúrias (La Escala, Gerona). MLH III 2 C.1.1.
De entre as várias tentativas de atropelamento e fuga (metaforicamente falando) ensaiadas por
Moncunill & Velaza (MLH V 2), quiçá a mais despudorada é a que nos cumpre agora denunciar.
Por muitos apoios — desde Mayer (2012, p. 127) a Simón (2013, pp. 69, 157), passando por
Beltrán (2011, p. 36, n. 95; 2012, p. 18 e n. 78) — que Velaza tenha podido angariar na sua pretensão de se
fazer passar por autor da identificação do praenomen iberizado [ḿPa]rCe/[Pa]rCe < Marcus, pertencente
a um tal Corneli < Cornelius, não há aqui lugar para qualquer espécie de liberdades poéticas: é a nós que
nos cabe a precedência em tal descoberta (Faria, 1993, pp. 155–156; 1997, p. 111; 2000a, pp. 136–137;
2003a, p. 223; 2004b, p. 184; 2013, p. 205; 2014, pp. 181–182; 2015, p. 139).
Teremos, pois, de concluir que, ao resultar de uma evidente postura de má-fé, tudo o que Moncunill
& Velaza (MLH V 2, p. 465) escreveram acerca de ]rCe não passa de areia atirada aos olhos dos seus
leitores menos informados.
[-]ṾCENSES. Tábua de bronze. Roma. CIL I2 709.
Na esteira de Gómez-Moreno (1949, p. 247), persistimos em restituir como [A]ṾCENSES o gentílico
que figura truncado no Bronze de Ascoli (Faria, 2009 [2010], p. 163; 2011 [2012], p. 151).
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Nada justifica, por conseguinte, a tentativa empreendida por Amela (2021, p. 33) com vista a
remeter este gentílico para o NL Auso, porquanto, em nenhum caso, pode este ser considerado variante
de Auca.
Convirá referir que o gentílico Aucensis, respeitante a uma sede episcopal situada em território
hoje pertencente à província de Burgos, só surge inequivocamente mencionado pela primeira vez nas
Actas do III Concílio de Toledo (589) (Irigoyen, 1985, p. 1010; Tovar, 1989, p. 326; García Sánchez, 2003, p.
149). Como é evidente, tal circunstância não obsta a que Auca possua uma origem linguística pré-romana
(García Sánchez, 2003, p. 149).
Não é certo que seja esta a Auca indirectamente documentada no Bronze de Ascoli, dada a grande
distância entre o referido povoado, decerto situado nas imediações de Villafranca Montes de Oca (Burgos)
(Peterson, 2009, p. 56, n. 2), e Salduie (Saragoça), centro de recrutamento da turma Salluitana (Pina,
2003 [2004], pp. 200, 202). Em contrapartida, é bem verdade que os Libenses (textualmente Llbenses:
Faria, 2007a, p. 162) mencionados no mesmo documento ocupariam também uma posição excêntrica
relativamente a Salduie, caso aqueles correspondessem aos habitantes de Libia (Cerro del Piquillo,
Herramélluri-Grañón, La Rioja) (Peterson, 2009, pp. 62 e n. 26, 70, 71 e n. 57, 73 e n. 63), uma hipótese
que colide com o inequívoco cunho celtibérico dos testemunhos linguísticos pré-latinos conotados com
esta cidade (Tovar, 1989, p. 461; Beltrán Lloris, 2006, p. 75; Burillo, 20072, p. 225; MLH VI, p. 494; Amela,
2021, p. 36).
É, pois, nossa convicção que a Auca cuja existência se depreende do Bronze de Ascoli configure
uma cidade homónima da que se conhece em território hoje burgalês, mais próxima de Salduie. Indo um
pouco mais longe nas nossas elucubrações, talvez seja esta a cidade que, no Anónimo de Ravena (310,
6), se documenta como Auci. A ter sido assim, uma tal forma não passaria de uma corruptela de Auca
(contra, Tovar, 1989, pp. 326, 379; Curchin, 2008, p. 17; Silgo, 2013; Vidal, 2015, p. 196; MLH VI, p. 222).
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