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Alguns Desdobramentos da École de Paris

2017, Anais do Colóquio Internacional Greimas

Equivoca-se quem imagina que École de Paris, referindo-se à Semiótica, consiste em um conjunto único de conceitos, princípios e teorias sobre os quais todos os herdeiros intelectuais de A. J. Greimas estão de acordo. A dinastia intelectual greimasiana cresceu e multiplicou-se, sua edificação teórica ganhou outras configurações, o que pede revisões periódicas para que se tenha uma noção das relações complexas que vão se construindo entre essas ram École de Paris, como vêm repercutindo suas ideias, as que ele próprio animou, bem como as que concebeu em interação com seus discípulos? Este texto aponta alguns desses caminhos e tenta mostrar algumas ideias de cada um deles.

Anais Eletrônicos . 1 Anais Eletrônicos . 2 SESSÕES DE COMUNICAÇÃO ................................................................................................................................6 DIÁLOGOS: GREIMAS E OUTROS AUTORES ....................................................................................7 Lucila Lang Patriani de Carvalho, Greimas em Barthes.............................................................................7 Davi Junqueira Marin, A Galáxia de Gutenberg ...............................................................................15 SEMIÓTICA DA COMUNICAÇÃO: GAMES E TRANSMÍDIA ........................................................ 34 Liana Costa do Carmo, Os regimes de visibilidade no projeto transmídia de elle brasil: o .....................................................................................................34 Lúcia Márcia Carvalho Lemos, That dragon experiência do jogar...............................................................................................................................................55 SEMIÓTICA DA EDUCAÇÃO I ...........................................................................................................72 Angela Maria de Andrade Palhano et. al., Contributos da semiótica discursiva contemporânea para a educação[...]................................................................................................................................................72 Ana Paula Azarias da Fonseca e Marina Graziela Feldmann, Da Imperfeição fraturas, escapatórias e o lúdico [...]..................................................................................................................................87 Marion Rodrigues Dariz e Fabiane Villela Marroni, A construção da imagem do gaúcho Blau Nunes em curtas-metragens............................................................................................................................103 Roseméri Lorenz et. al, Semiótica discursiva e smartphones em sala [...]....................................118 Karime Vargas Cáceres, La semiótica greimasiana .......................................................................133 SEMIÓTICA DA LITERATURA I.................................................................................................... 150 Verônica Maria Biano Barbosa, Traço e prosa : intertextualidades em preto e branco [...]..................................................................................................................150 João Batista Toledo Prado, Do amor e outros vexames: a presença de pudor na elegia latina.........................................................................................................................................................................164 Ernani Terra e Jessyca Pacheco, Espacialização e sentido em intimidade, de edla van steen: uma análise semiótica........................................................................................................................................186 SEMIÓTICA DA LITERATURA II....................................................................................................208 Adda Sofía Barco Velásquez, J El terror de sexto B ................................................................................................................................................208 SEMIÓTICA DA MODA, CORPO E CONSUMO II.........................................................................221 Adriana Tulio Baggio, Gênero e vestuário: princípios para uma semiótica da moda na tese não semiótica de Greimas.................................................................................................................................221 Carolina Santos Garcia e Jaqueline Cavalcanti Zarpellon, O slow fashion na ruas de São Paulo [...].................................................................................................................................................................239 Marilia Jardim, Homenagem a Da Imperfeição: a estesia do véu.....................................................257 SEMIÓTICA DA PUBLICIDADE......................................................................................................275 Janderle Rabaiolli e Juliana Petermann, A perspectiva semiótica no ensino em publicidade e propaganda............................................................................................................................................................275 Taísa Vieira Sena, A boa culpa: o discurso de sedução de GUCCI [...]...............................................292 Tanier Botelho dos Santos, Análise semiótica da evolução das publicidades dos sabonetes LUX.............................................................................................................................................................................310 SEMIÓTICA DAS PRÁTICAS DE VIDA URBANA I.....................................................................321 .. . 321 Elder Cuevas-Calderón, Analgésicos para la (in)seguridad Anais Eletrônicos . 3 Lilian Kanashiro, Dispositivos de seguridad en los conjuntos residenciales de Lima [ ] SEMIÓTICA DAS PRÁTICAS DE VIDA URBANA II...................................................................348 Fabiane Villela Marroni, Semiótica das cidades: um olhar sobre o espaço urbano e práticas cotidianas...............................................................................................................................................................348 Manuella Vieira Reale, Experiência sensível no descanso habitual [...].........................................367 Flávia Mayer Dos Santos Souza e Maria Nazareth Bis Pirola, Um olhar sobre a universidade: entre enunciados, enunciações e práticas.................................................................................................377 Nilthon Fernandes de Oliveira Junior, Análise semiótica das peças de comunicação para prevenção de riscos de desastres [...]...........................................................................................................400 SEMIÓTICA DO AUDIOVISUAL III: CINEMA.............................................................................422 Ivan Capeller, O princípio do assincronismo revisitado: greimas e o componente gerativo audiovisual do cinema......................................................................................................................................423 Natália Cipolaro Guirado, A estesia nos objetos sincréticos..............................................................439 SEMIÓTICA DO DESIGN E DA ARTE...........................................................................................446 e José Mirna Xavier Gonçalves e Lauer Alves Nunes dos Santos, Leonilson [...].........................................................................................................................................................446 Denilson de Oliveira Moura, O semissimbolismo na pintura de Robert Oscar Lenkiewicz.............................................................................................................................................................455 SEMIÓTICA DO DISCURSO DA MARCA, DO MERCADO E DE GESTÃO.............................464 Fani Conceição Adorne, Aportes da semiótica greimasiana na determinação de classes conceituais no campo da gestão pública da cultura.............................................................................464 Valdenise Leziér Martyniuk e Evange Elias Assis, A inserção das marcas na vida social como estratégia de construção de valor [...]........................................................................................................481 Alessandra Cristina Bonilha Morau, Aporte da semiótica estrutural para uma análise do espaço da marca: as lojas................................................................................................................................500 Luís Alexandre Grubits de Paula Pessôa e Alessandra de Sá Mello da Costa, A nostalgia no discurso mercadológico....................................................................................................................................519 Lize Antunes de Oliveira, O Rock In Rio e os sujeitos da construção [...]......................................533 SEMIÓTICA DO POLÍTICO E DA POLÍTICA...............................................................................545 Maria Paula Piotto Guimarães, Lula, no corpo político, um ato de fé............................................545 Paolo Demuru, Impeachment, bandeiras e futebol [...]........................................................................564 SEMIÓTICA DOS MODOS DE PRESENÇA DA ALTERIDADE.................................................577 Jaqueline Crestani, Autorrepresentação e negociação da identidade cultural uma análise semiótica da produção audiovisual [...]......................................................................................................577 Eliane Aparecida Miqueletti, A demarcação de fronteiras na relação entre indígenas e não indígenas de dourados [...]...............................................................................................................................600 Emanuel Godoi Santos e Taísa Viera Sena, Artesanato aldeia indígena Araçá-I: discurso de resistência e mitológico fundado no sagrado.....................................................................617 Thiago Müller da Silva e Sonia Grubits, A mídia como mediadora das influências da sociedade de consumo em crianças indígenas [...]..................................................................................634 SEMIÓTICA E EPISTEMOLOGIA...................................................................................................653 Sandra Regina Ramalho e Oliveira et.al., Alguns desdobramentos da École de Paris..........................................................................................................................................................................653 Marcela Ulhôa Borges Magalhães, Por uma teoria do acontecimento..........................................670 Lucas Takeo Shimoda, Leitu greimasiano...........................................................................................................................................................681 Gustavo Cardoso Bonin, Semiocepção e sincretismo: modo de contato.......................................699 Anais Eletrônicos . 4 SEMIÓTICA SONORA.......................................................................................................................711 Geraldo Vicente Martins, Tensões poéticas na canção [...].................................................................711 SESSÕES DE COMUNICAÇÃO TEMÁTICAS ................................................................................................. 726 AS ESCAPATÓRIAS URBANAS ........................................................................................................ 727 Nathalia Guimarães Boanova, As escapatórias nas narrativas urbanas.......................................727 Luciana Chen et. al., As escapatórias nas narrativas urbanas: arcos do Bixiga como espaço de encenação de polêmicas.....................................................................................................................................751 EPISTEMOLOGIA E HISTÓRIA DA SEMIÓTICA ........................................................................ 768 Carolina Lindenberg Lemos, A história dos actes sémiotiques [...]..................................................768 ENUNCIAÇÃO E PLANO DE EXPRESSÃO....................................................................................787 Andréa Luisa Martins dos Santos, "Enunciação e plano da expressão: a manipulação do enunciatário".........................................................................................................................................................787 SEMIÓTICA DA EDUCAÇÃO II.......................................................................................................800 Moema Martins Rebouças et. al., Pesquisa Greimas 100 anos-CPS eixo-educação...................800 SEMIÓTICA DA MODA, CORPO E CONSUMO I..........................................................................820 Juliana Letenski Moreira e Taisa Viera Sena, As Sufragistas: moda e discurso político.....................................................................................................................................................................820 Sylvia Demetresco e Marcelo M. Martins, Manequins: histórias e contextos de projeção de pessoa, de espaço e de tempo..........................................................................................................................829 Jaqueline Cavalcanti Zarpellon, O projeto Ateliê Vivo [...]..................................................................841 Mariana Braga et. al., Os territórios do consumo de moda em São Paulo.....................................854 SEMIÓTICA DO AUDIOVISUAL I: ESTUDOS DE TELEVISÃO................................................877 Elizabeth Bastos Duarte, Tonalização: um dispositivo discursivo com dupla função.......................................................................................................................................................................877 Anielly Laena Azevedo Dias, A apropriação da semiótica greimasiana para o estudo dos objetos televisuais................................................................................................................................................888 Gabriel Souza e Fernanda Sagrilo Andres, A semiótica discursiva no estudo do televisual.................................................................................................................................................................900 SEMIÓTICA DO AUDIOVISUAL II.................................................................................................917 Jaqueline Esther Schiavoni, Telenovela: projeções discursivas em vinhetas de abertura..................................................................................................................................................................917 Conrado Moreira Mendes, Os sentidos da nova classe média na telenovela...............................936 Anais Eletrônicos . 5 Airton Jordani Jardim Filho (PPGAV/UDESC) Ana Paula Sabiá (PPGAV/UDESC) Janaí de Abreu Pereira (PPGAV/UDESC) Sandra Regina Ramalho e Oliveira (PPGAV/UDESC) Alguns Desdobramentos da École de Paris Some Developments of the École de Paris Resumo: Equivoca-se quem imagina que École de Paris, referindo-se à Semiótica, consiste em um conjunto único de conceitos, princípios e teorias sobre os quais todos os herdeiros intelectuais de A. J. Greimas estão de acordo. A dinastia intelectual greimasiana cresceu e multiplicou-se, sua edificação teórica ganhou outras configurações, o que pede revisões periódicas para que se tenha uma noção das relações complexas que vão se construindo entre essas ram École de Paris, como vêm repercutindo suas ideias, as que ele próprio animou, bem como as que concebeu em interação com seus discípulos? Este texto aponta alguns desses caminhos e tenta mostrar algumas ideias de cada um deles. Palavras-Chave: Semiótica Discursiva. Semiótica Greimasiana. Semiótica Pós-greimasiana. Abstract: It is wrong to imagine that the École de Paris, while referring to Semiotics, consists of one single set of concepts, principles and theories upon which all the intellectual heirs of A. J. Greimas agree. The Greimasian intellectual dynasty grew and multiplied, its theoretical construction gained other configurations, which demands periodic revisions so that one has a notion of the complex relations built between these ramifications. In the centenary of the "founding father" of the École de Paris, how are his ideas reverberating? Both the ideas he himself animated, as well as those he conceived while interacting with his disciples? This text points to some of those paths and attempts to show some ideas in each one of them. Keywords: Discursive semiotics. Greimasian semiotics. Post-Greimasian semiotics. Quando se fala em École de Paris, referindo-se ao âmbito dos estudos semióticos, ainda é comum o entendimento, entre os principiantes e leigos e sempre nos preocupamos em motiva-los e traze-los à discussão - , de que se trata de um conjunto único de conceitos, princípios e teorias sobre os quais todos os herdeiros Anais Eletrônicos . 653 intelectuais e demais seguidores de Algirdas Julien Greimas estão de acordo. Entretanto, hoje não apenas a dinastia intelectual greimasiana cresceu e multiplicou-se, como a própria edificação teórica ganhou outros traços e configurações, o que pede revisões periódicas para que se tenha uma noção mesmo que imprecisa da totalidade, das relações complexas que vão se construindo entre essas ramificações e as direções para as quais elas apontam. Em um sentido amplo, poder-se-ia dizer que temos duas direções mais profícuas operando atualmente, conforme J. Fontanille, quais sejam, a da semiótica do mundo sensível e a da semiótica das práticas. E estamos todos de acordo com este autor quando, mais adiante, afirma que se se examina com mais atenção cada uma das correntes que ocupam atualmente o domínio recoberto pela intitulada École de Paris, constata-se que que elas não se distribuem simplesmente de cada lado desta linha divisória. Ao contrário, elas combinam cada uma a sua maneira esses dois 1008 . Assim, há tendências dominantes, há produções que combinam pressupostos dessas tendências principais e há também outros deslocamentos respeitáveis. O manancial de estudos sobre fenômenos de significação e de sentido que tem como marco histórico o último quartel do século XX, como identificação inter paris o nome de École de Paris e como liderança intelectual a personalidade de Algirdas Julien Greimas, vem fluindo em tantas direções, e tão caudalosamente que tenham ousado faze-lo embora alguns hoje já não é mais possível dar conta de seus desenvolvimentos a partir de uma mesma fonte: as variadas vertentes têm seus credenciados especialistas. Enciclopédias encomendam aos mais respeitados conhecedores dos mais variados assuntos e atividades as explicações de fenômenos, teorias e conceitos; e dicionaristas o fazem, igualmente. Assim, os semioticistas franceses Driss Ablali e Dominique Ducard, organizaram e publicaram em 2009 na França um trabalho intitulado Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques, no qual apresentam uma proposta não apenas de um rol vocabular de conceitos, mas uma relação antecedida por compilações das principais ideias de cada corrente atual da semiótica em geral, e não apenas da greimasiana e pós-graimasiana, articulando-as à respectiva terminologia. E delegaram aos seus principais representantes essa compilação de ideias e conceitos. Certamente de Paris . In: ABLALI, D. e DUCARD, D. Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Paris: Honoré Champion Éditeur; Besançon: Presses Universitaires de Franche-Comté, 2009, p. 44. 1008 Anais Eletrônicos . 654 não esgotam as respectivas semióticas, mas apresentam um panorama fidedigno de cada uma, dadas as autorias. Menos ainda esta tentativa de sintetizar e de apenas delinear as principais correntes pós-greimasianas se ignora pretensiosa e confessamos previamente a frustração da incompletude, das lacunas, das dúvidas nas traduções, talvez de imprecisões. Tomemo-lo assim, este texto, como um mosaico constante de algumas peças-chave garimpadas com zelo, mas espalhadas sem hierarquia, deixando espaços não apenas para reflexão, que não deixa de ser presentificação do passado, mas possibilitando hiatos para respiração, para se inalar o presente. Em outras palavras, este texto, antes de ser um exaustiva listagem de nomes de diversas correntes semióticas e de seus respectivos propositores, visa ser um provocador de debates, bem como mais um entre os tantos argumentos que se tem para mostrar os aparatos teórico-metodológicos que a semiótica oferece ao pesquisador, além de esboçar um panorama genérico do que se faz em semiótica, hic et nunc. Igualmente, é necessário esclarecer que a opção semântica por intitular este a vez que ao serem caminhos diferentes os rumos tomados, não anula o fato de partirem de um mesmo ponto, ou seja, terem uma raiz comum. Assim, o quadro que hoje se apresenta na semiótica pósgreimasiana não é de um repertório comum a todos os estudiosos, mas não se trata de simples discordâncias teóricas, tampouco. Antes, consiste em repertórios de base comum que ora se aproximam, ora se afastam, dialogam ou não, às vezes sofrem críticas sutis ou sarcásticas, tão ao gosto dos franceses, mas sempre na busca de melhores perspectivas para observar e tentar compreender os fenômenos de significação e de sentido. 1 Mutações no tempo e no espaço e incompreensões A necessidade de cada vez mais se esclarecer a existência de incontáveis abordagens semióticas se evidencia na medida em que, por desconhecimento, estudiosos das diversas linguagens, com destaque para os iniciantes, distanciam-se ou simplesmente se fecham em críticas equivocadas. Ou seja, se alguém de dispõe a criticar, deve ao menos se ater a qual perspectiva semiótica se refere. O fato é que o senso comum e mesmo teóricos de outras áreas, a partir de conhecimentos superficiais Anais Eletrônicos . 655 ou ultrapassados, ignoram a existência de distintas vertentes, bem como as sucessivas atualizações pelas quais elas passam. Entre outras tantas características, as semióticas pós-greimasianas estão em constante mutação, no tempo e no espaço, tentando dar conta dos processos de sentido de um mundo igualmente em permanente mutação no tempo e nos espaços. Isto dificulta ainda mais a compreensão desse campo teórico por parte de iniciantes, além das diversas dificuldades já apontadas anteriormente. No transcorrer de anos, a semiótica, tida como proposta teórico-metodológica desconhecida e com fôlego para atuar nas mais diversas áreas, de um modo geral foi recebida com incompreensões no mundo científico, o que não é estranho a quem dele participa, fenômeno discutido extensamente por Th. Kuhn1009, acerca das estruturas das revoluções científicas. A. Hénault 1010 ilustra esse estranhamento diante do novo no campo científico relatando o fato de que quando da transformação de uma simples coluna sobre semiótica na revista científica Informations sur les sciences sociales, que tinha o apoio da UNESCO, em uma revista internacional de grande repercussão, em 1969, à matriz linguística da teoria semiótica pouco espaço foi concedido, embora ela -exclusão era um exemplo das consideráveis dificuldades de difusão pelas quais viria a passar (e pelas quais ainda hoje Ora, neste seu estudo, o objetivo de Hénault era o traçar um histórico dessa semiótica de origem linguística e então ela complementa, de um lado deixando explícito existência de outros motivos para um fato aparentemente banal e, de outro, justificando não aprofunda-los: não há dúvida de que seria útil tentar relatar esse estado de coisas. Mas, por essa via, entrar-se-ia em pormenores de uma história da semiótica que se confundiria parcialmente com a história social e ideológica do século XX, correndo provavelmente o risco de perder de vista um certo encadeamento de esforços conceituais e de descobertas maiores (...)1011. Ou seja, se tratamos de linguagens e dos sentidos infinitos que elas são capazes de construir e desconstruir - , estamos tratando do talvez mais importante elo de manutenção e funcionamento de qualquer sociedade e em qualquer dimensão. E essa amplitude, esse permear toda ação humana desempenhado pelas linguagens acaba por demandar um sem número de modos de estuda-las, até por conta das constantes KUHN, T. A Estrutura das Revoluções Científicas. São Paulo: Perspectiva, 1994. HÉNAULT, A. História Concisa da Semiótica. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. pp. 7-8. 1011 Idem, p. 8. 1009 1010 Anais Eletrônicos . 656 mutações linguísticas e da diversidade cultural. Portanto, caracteriza-se não só como importante, mas como necessário, esclarecer e difundir essas transformações e esses diversificados esforços intelectuais dispendidos no intuito de apreender os sentidos da vida e das coisas da vida, especialmente para quem atua não apenas na pesquisa, mais ainda na educação. Qual o panorama atual? semiótica da École de Paris, como vêm repercutindo suas ideias, as que ele próprio animou, bem como as que Greimas concebeu em interação com seus discípulos? Ou seja, como vem se desenvolvendo a profícua herança da École de Paris? A potência daquelas discussões foi de tal magnitude que são diversas as correntes hoje consideradas pós-greimasianas da Escola de Paris na 1012 . E é ele mesmo quem responde, 2 Desdobramentos Considerando a situação registrada há mais de um lustro, em coletânea organizada e publicada por Driss Ablali e Dominique Ducard, intitulada, no original em francês Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques, observa-se que os autores conseguiram reunir, como desdobramentos da semiótica discursiva greimasiana, ou da École de Paris, estudiosos que construíram pressupostos relacionados às seguintes correntes: Semiótica da Ação, Semiótica das Paixões, Semiótica Subjetal, palavra ainda sem tradução satisfatória em português ramo um tanto obliterado, pois a Semiótica Greimasiana tenha sido consierada objectale por Algirdas Julien Greimas - , Semiótica Tensiva, Sociossemiótica e Ethosemiótica. De que tratam essas novas ou, ao menos, renovadas vertentes? Em que direção têm sido conduzidos seus esforços? Cada uma delas é trazida pela autoria de um prócer de seu respectivo quadro teórico, o que faz desta coletânea uma fonte, além de confiável, um marco histórico. Segundo os organizadores do Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques, a intenção da publicação, que abrange não apenas as derivações greimasianas 1012 FONTANILLE, J. Op. cit, 2009, p. 43. Anais Eletrônicos . 657 obre inédita, nascida da articulação e do cruzamento de diferentes campos da semiótica 1013 e da , servindo de demarcação de um espaço fundamental para o ensino e a pesquisa nos domínios semióticos e semiológicos. Neste contexto, a coletânea considerada por seus autores como, ao mesmo tempo, enciclopédica e didática, inicia com um conjunto de textos referentes às semióticas anteriormente citadas, pertencentes ou decorrentes do programa teórico de teóricos da semiótica 1014 . O conjunto é introduzido por Jacques Fontanille, que se ocupa de mostrar tanto a coerência quanto as diferenças e os deslocamentos de foco, centrados nas práticas e no sensível. O presente texto tem como objetivo, por conseguinte, tanto apresentar a alguns debutantes os profícuos desdobramentos da escola greimasiana quanto, para outros já iniciados, trazer à discussão conceitos, teorias e métodos conforme propostos pelos pensadores que hoje dão continuidade à cruzada em busca de melhor conhecer e dar a conhecer os intricados às vezes parecendo inextricáveis - e inesgotáveis processos de construção de sentido. A apropriação de novos objetos de estudo se dá pela apresentação mesma de ensaios teóricos e análises tendo como foco objetos pertencentes a categorias anteriormente não consideradas, bem como em registros específicos de estudiosos a 1015 1016 . A estudiosa afirma que essa frase, embora ela pareça trivial se descontextualizada, apresenta uma proposta tanto de abertura para o estudo de novos práticas. Após fazer várias considerações acerca dessa espécie de atualização processada na semiótica em nossos dias, Teixeira apresenta suas principais fontes, além de Jean-Marie Floch, Eric Landowski, Jacques Fontanille e Caude Zilberberg, os quais, ABLALI, D. e DUCARD, D. Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Paris: Honoré Champion Éditeur; Besançon: Presses Universitaires de Franche-Comté, 2009, p. 9. 1014 Idem, p. 16. 1015 Semiótica Plástica. São Paulo: Hacker, 2004 a., pp. 111-112. 1016 TEIXEIRA, L In: OLIVEIRA, A. C. (Ed.). As Interações Sensíveis: ensaios de sociossemiótica a partir da obra de Eric Landowski. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2013, pp. 849-850. 1013 Anais Eletrônicos . 658 frutos da mesma árvore, hoje apresentam algumas diferenças nos modos de abordar os sentidos; apesar disso, pensamentos conciliáveis, pois é essa articulação que ela faz em seu artigo. Isto remete ao próprio Fontanille, quando se refere às combinações que os estudiosos processam. Entretanto, sabe-se que outros autores já consideram hoje inconciliáveis tais articulações, e essas posições também pretendemos mostrar, coletando, nos discursos dos sempre influentes semioticistas oriundos daquele grupo criado em Paris na década de sessenta, no número 10 da Rue Monsieur Le Prince, reverberações e desdobramentos daquela equipe de pesquisadores. 3 Semiótica da Ação Na obra citada, Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques 1017 , principal referência para a elaboração do presente texto, o responsável por apresentar a Semiótica da Ação foi o filósofo Jean-François Bordron, professor emérito de Semiótica na Universidade de Limoges. Segundo ele, esta Semiótica pode ser entendida de dois modos, a primeira, como a ação segundo expressa por enunciados em linguagens diversas, verbal, gestual, imagética. À esta possibilidade de atuação da Semiótica como possibilidade considerada pela Semiótica da Ação é aquela na qual a ação é o efeito de uma instância operatória que se situa obrigatoriamente na relação entre percepção e ação, chamada de cie de Bordron1018 sintaticamente a ação é o feito de um sujeito, embora um acontecimento possa ser o resultado de uma ação. Assim, a ação é tida como um processo com um autor, e o acontecimento pode ser a decorrência desse processo. Refere-se também às dimensões internas e externas que interferem no sujeito da ação, ou seja, as internas como sendo as do seu foro íntimo, seus desejos e paixões, e as ABLALI, D. e DUCARD, D. Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Paris: Honoré Champion Éditeur; Besançon: Presses Universitaires de Franche-Comté, 2009 1018 Idem. 1017 Anais Eletrônicos . 659 que muitas cenografias se articulam entre si, conforme a situação; é o que outros denominam contexto. 4 Semiótica das Paixões Anne Beyaert-Geslin, semioticista da Université Bordeaux-Montaigne, , vinculada ao ISIC responsabilizou-se por discorrer sobre o momento vivido pela Semiótica das Paixões, ramo cuja denominação é homônima ao título do livro escrito em coautoria por Greimas estudos se encontra exatamente nessa obra, embora registre que as primeiras ideias foram esboçadas por Greimas em 1983, em Du Sens II. Muito se tem escrito sobre a Semiótica das Paixões e muitos estudos têm sido produzidos fundamentados na Semiótica das Paixões, inclusive no Brasil, pois os estudos de Fontanille, depois dos de Landowski, são os mais divulgados no país, dentre os descendentes da École de Paris. Assim, vejamos o que diz o próprio J. Fontanille: (...) a semiótica das paixões nasceu da necessidade de resolver heterogeneidades próprias à semiótica narrativa, na qual ao lado dos enunciados de junção e de suas transformações, assim como das modalidades da competência quantitativo e, de forma geral, afetivos 1019. Ou seja, assim se dão os desenvolvimentos das ciências: os modelos vigentes vão se mostrando ineficazes ou insuficientes e novas buscas são impulsionadas. Nos escritos acerca da Semiótica das Paixões fica evidente a observação introdutória de J. Fontanille, de que hoje as demarcações de campo são imprecisas e flexíveis em se tratando dos herdeiros da École de Paris, tendo em vista uma já vasta bagagem em comum, malgrado os novos desenvolvimentos, levados a efeito por pensadores ou grupos distintos: com ideias da Semiótica das Paixões cruzam-se conceitos da Semiótica da Ação, da Semiótica Tensiva e mesmo da Sociossemiótica. 1019 FONTANILLE, J. Semiótica do Discurso. São Paulo: Contexto, 2007, p. 204. Anais Eletrônicos . 660 Beyaert-Geslin1020 das paixões, que possibilita convocar actantes coletivos, propõe uma dupla acepção de sujeito, o sujeito social e o sujeito individual. A autora encerra sua síntese acerca da Semiót inaugura duas pensamento contemporâneo de J. Fontanille e de E. Landowski. 5 Semiótica Subjetal Sob o título de Semiótica Subjetal é recuperado o pensamento de Claude Coquet, até então deixado à margem, em virtude de que a semiótica da École de Paris prio Greimas. Isto é o que nos traz Ivan DarraultHarris, professor emérito da Universidade de Limoges, membro do CeReS, Centre de Recherches Sémiotiques. Como seu nome sugere, a Semiótica Subjetal se ocupa do sujeito, antes de tudo. Darrault-Harris afirma que Coquet fez parte da École de Paris desde seus primórdios, por volta de 1965, mas manteve uma posição particular, o que pode ter motivado não ter sido levado em conta por seus pares, nos primeiros tempos. Discípulo de Émile Benveniste, manteve-se fiel à fenomenologia de Merleauum dos atores principais, no campo da semiode sua presença na ruptura epistemológica que permitiu rearticular linguagem e realidade 1021 . Dois fenômenos que ele recusou foram o formalismo e o imanentismo, o que constituiu uma ruptura epistemológica com o pensamento do grupo na época; e Darrault-Harris traz uma afirmação do próprio Jean-Claude Coquet, por considerar que ela resume sua posição teórica: Significar não é (...) um ato puramente intelectual. Não é exclusivamente BAYAERT: Sémiotique d e DUCARD, D. Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Paris: Honoré Champion Éditeur; Besançon: Presses Universitaires de Franche-Comté, 2009, pp. 55-59. 1021 DARRAULT D. e DUCARD, D. Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Paris: Honoré Champion Éditeur; Besançon: Presses Universitaires de Franche-Comté, 2009, p. 61. 1020 Anais Eletrônicos . 661 introduz nossa experiência de mundo, nosso contato com as coisas elas 1022 . Esta recuperação da dimensão integral do sujeito, de inspiração fenomenológica e em consonância com seu mestre Benveniste, gerou uma ruptura com o pensamento dominante da semiótica do seu tempo na Europa, principalmente a negação do princípio saussureano, de que a língua consiste em, apenas, forma. Ao contrário, Coquet propunha que a instância da enunciação é composta por duas dimensões, a instância pessoal, substancial e a instância linguística, formal. Ou seja, a realidade do discurso se dá em função dessa dupla presença, que é nada menos do que o diálogo. E é assim também que o elo entre linguagem e realidade. E ainda, segundo Darrault1023 . Entre outras proposições, Coquet, que se dedicou a analisar principalmente textos dos clássicos da literatura francesa, defendendo a presença dos dançarinos em cena e do sujeito tomando forma sobre o papel, criou uma metodologia que permitiu a análise psicossemiótica de comportamentos patológicos. Darrault-Harris 1024 encaminha seu texto sobre Claude Coquet e a Semiótica Subjetal, defendendo a ideia de que Greimas, atento aos pressupostos de Lacan, já preconizava certos princípios, que eram parte de uma epistemologia que foi renovada com o corpo sendo instituído como instância de base do processo de significação. E conclui com palavras do próprio Coquet, dizendo que a realidade não é uma conduzida convenientemente se a linguagem e a realidade são consideradas como duas 1025 gra . 6 Semiótica Tensiva A Semiótica Tensiva é muitas vezes confundida com a Semiótica das Paixões. Porém, seus participantes esclarecem que trata- 1022 - COQUET, J-C., 1997, pp. 1-2, apud DARRAULT - Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Paris: Honoré Champion Éditeur; Besançon: Presses Universitaires de Franche-Comté, 2009. 1023 DARRAULT - HARRIS, I. Op. cit, 2009, p. 62. 1024 Idem, p. 65. 1025 COQUET, J-C., 1997, apud DARRAULT - HARRIS, I. Op. cit, 2009, p. 66. Anais Eletrônicos . 662 sendo um prolongamento e uma atualização da Semiótica das Paixões. Daí o motivo de certas pessoas não perceberem a sutileza da linha que as separa. Na coletânea que apresenta o estado da arte da Semiótica não apenas das semióticas greimasianas e pós-greimasianas - , em 2009, e que é a base estrutural deste texto, Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques, a Semiótica Tensiva é apresentada por Nicolas Couégnas. Trata-se de um professor da Universidade de Limoges que coordena o programa ANR CEMES - Culturas Emergentes e Mediações Semióticas, entre outras atividades acadêmicas. Fica claro desde logo que, para o autor, a Semiótica Tensiva se subdivide em três perspectivas ou três abordagens, segundo Couégnas, linhas de pensamento diversas 1026 . A primeira das três abordagens da Semiótica Tensiva é considerada fenomenológica, traduzida pela mudança que significa a primazia da presença, em substituição a se considerar a semiótica como restrita ao campo das ciências da linguagem. Mesmo que se pretenda entendida como um aprofundamento da Semiótica de se referir, seus defensores, às suas bases, quais sejam, a linguística de Émile Benveniste, a fenomenologia de Maurice Merleau-Ponty e a Semiótica Subjetal de JeanClaude Coquet. Ainda de acordo com o mesmo autor, a segunda perspectiva da Semiótica Tensiva é representada pelo conjunto dos esforços teóricos de Claude Zilberberg, os quais podem ser classificados como estruturalistas e retóricos. Estão ancorados, por sua vez, em princípios saussureanos (pressupostos de Ferdinand de Saussure) e hjelmslevianos (postulados por Louis Hjelmslev). A terceira vertente da tensividade semiótica atual propõe-se a ser integradora, juntamente com as outras duas vertentes a Semiótica Tensiva, compondo um todo articulado e quase, mas nem sempre coerente, uma vez que constituído por produções pautadas por linhas distintas. Couégnas refaz sinteticamente o caminho percorrido por J. Fontanille, na construção da sua edificação teórica, desde a publicação, com A. J. Greimas, de Sémiotique des Passions, em 1991, não omitindo que seu germe vem de Du Sens II, de autoria de Greimas (1983). E conclui dizendo que nos seus últimos desenvolvimentos, 1026 DUCARD, D. Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Paris: Honoré Champion Éditeur; Besançon: Presses Universitaires de Franche-Comté, 2009, p. 68. Anais Eletrônicos . 663 articulando o enfoque fenomenológico ao percurso gerativo, implica levar em conta dimensões extra-discursivas, se opondo, neste aspecto, à Semiótica Tensiva de abordagem retórica, ou seja, intre-discursiva. 7 Sociossemiótica Mais conhecida entre os brasileiros do que qualquer outro ramo da semiótica - pós-greimasiana país, presença de fato e presença por meio de várias publicações, sempre vinculadas ao CPS, o Centro de Pesquisas Sociossemióticas que dirige juntamente com Ana Claudia de Oliveira na PUC/SP há cerca de vinte anos, temos a sóciossemiótica (em francês, socio-sémiotique). Ele é o autor do artigo que se refere a essa vertente teórica também originária na École de Paris na coletânea1027 que embasou a estrutura e muitas das ideias deste texto; mas não vamos nos restringir a ele. Nem vamos ignorá-lo, tampouco e assim, comecemos mesmo por esse artigo, de 2009. Nele Landowski inicia situando a sociossemiótica como vertente inspirada em Saussure e Hjelmslev, título a ser empregado para designar, segundo os contextos, tanto um dos ramos especializados da disciplina, aquele que toma especificamente por objeto o social (por oposição, por exemplo, ao literário) como uma das principais correntes teóricas oferecidas atualmente para fundamentar ou renovar a análise dos fatos significativos em geral, seja qual for o tipo de campo empírico considerado1028. Adiante, o autor faz a retrospectiva de sua trajetória intelectual e dos que comungam suas ideias, ilustrando com investigações levadas a efeito desde os anos setenta na França, na Itália e na América Latina, sempre tendo como objeto empírico problemas do cotidiano. Esclarece diversos conceitos, tanto os adotados por ele quando os desconsiderados, explicando os porquês, superações inerentes aos desenvolvimentos de uma disciplina. Assim, critica o que chama de modelo standard da semiótica greimasiana, o modelo clássico do quadrado semiótico, o percurso gerativo do sentido, propondo uma revisão, assim considerada por J. L. Fiorin: D. Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Paris: Honoré Champion Éditeur; Besançon: Presses Universitaires de Franche-Comté, 2009, pp. 73-80. 1028 Idem. 1027 Anais Eletrônicos . 664 Uma afirmação corrente entre os semioticistas era que o nível narrativo tinha sido o patamar mais bem desenvolvido do percurso gerativo do sentido. Essa asseveração levou à crença de que a notável redução operada por Greimas nas funções proppianas chegara a um modelo narratividade elegante, simples e universal 1029. Segue Fiorin, mais adiante, no mesmo texto, anunciando que a certeza dos semioticistas acerca da descrição do nível narrativo foi abalada pela publicação, em 2005, de Interações Arriscadas, de Eric Landowski. É essa obra que aparece agora em português. Nesse texto brilhante, Landowski mostra que não existe um modelo de narratividade, mas quatro 1030. Ora, isto consiste em uma grande mudança de paradigmas na semiótica pósgreimasiana, operado por Landowski, conforme deixa claro Fiorin. Em outro título do autor francês, publicado um ano antes considerando-se a versão francesa de Les interactions risquées (2005) e intitulado Passions sans nom (2004), ainda sem versão em português, Landowski reúne, revisados, boa parte da sua produção teóricometodológica, inclusive os princípios apresentados de modo mais conciso, em Interações Arriscadas (2014). Entre as conclusões apresentadas em Passions sans nom, Landowski mostra a necessidade de uma gramática do sensível, embora confesse não estar seguro de que esta seria a melhor denominação para tal; mas seria uma gramática destinada a dar conta desses modos de construção de sentido que contemplem a dimensão estésica1031. Ainda demonstrando insatisfação com a semântica, fala também de uma semiótica existencial, a ser desenvolvida no futuro, uma semiótica que saberá se mostrar atenta tanto às configurações dinâmicas que articulam para nós a matéria das coisas quanto aos regimes de contato que nos entretém com suas configurações, uma vez que são duas faces de um só e mesmo processo do qual depende a emergência e apreensão dos efeitos de sentido experimentados na presença do outro, pelos sujeitos em situação que somos nós1032. diversos problemas encontrados pela disciplina, permite ao estudioso o acesso às práticas sociais no sentido amplo. Segundo o autor, o edifício teórico que nós nos esforçamos para construir se torna, ao menos esperamos, que seja parte integrante da semiótica geral. Nós diríamos mesmo, se a modéstia não nos obriga a alguma reserva, que este trabalho é Interações Arriscadas. São Paulo: Estação das Letras e Cores; Centro de Pesquisas Sociossemióticas, 2014, p. 7. 1030 Idem. 1031 LANDOWSKI, E. Passions sans nom. Paris: PUF, 2004. 1032 Idem, p. 305. 1029 Anais Eletrônicos . 665 semiótica mesmo, sem prefixo nem adjetivo, tal como nos parece atualmente possível desenvolvê-la (...): uma semiótica sem nome1033. Mais recentemente, a ampliação dos modelos de narratividade, os regimes de interação e de sentido propostos por Landowski consistem em um campo fértil para o exame dos processos de efeitos de sentido nos mais diversos objetos empíricos de significação. O texto intitulado Socio-sémiotique que Landowski assina na coletânea Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques, citada anteriormente neste texto ad nauseam, conclui-se com o seguinte posicionamento - ou convite - do semioticista francês: fortemente integrador porque visa a dar conta não apenas das regularidades mas também dos acidentes de construção de sentido, este modelo implica uma moral da interação, ou uma ética do sentido. A este título, convida a uma nova reflexão sobre o papel, o estatuto e a vocação da nossa disciplina, a meio caminho entre as descrições antropológicas e a reflexão filosófica 1034. Trata-se do posicionamento reiterado em Interações Arriscadas, quando Landowski intitula o primeiro capít 1035 ologia e , ou seja, trata-se da explicitação de seu retorno às origens teóricas, bem como da identificação das inspirações de seus achados e suas elaborações mais atuais, além de um convite à reflexão. 8 Ethosemiótica Ivan Darrault-Harris, Professor e Pesquisador da Universidade de Limoges, que na coletânea de Driss ABLALI e Dominique DUCARD apresenta a Semiótica Subjetal, é quem também assina o texto sobre a Ethosemiótica, na mesma coletânea, Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Sabe-se que ethos é uma palavra de origem grega, que encerra os sentidos de valores, harmonia e hábitos, tendo dado origem à palavra ética; é usada para designar o modo de ser de uma sociedade, características sociais e culturais que distinguem um povo de outro. Campo de estudo da sociologia, pelo fato de igualmente se ocupar do comportamento, acaba sendo também objeto da psicologia e mesmo da psiquiatria. Ibidem, p. 11. LANDOWSKI, E. Op. cit, 2009, p. 79. 1035 LANDOWSKI, E. Interações Arriscadas. São Paulo: Estação das Letras e Cores; Centro de Pesquisas Sociossemióticas, 2014. 1033 1034 Anais Eletrônicos . 666 Ao contrário da sua abordagem acerca da Semiótica Subjetal, na apresentação da Ethosemiótica Darrault-Harris assume uma postura mais crítica. Inicia afirmando que quando subáreas da semiótica adotam prefixos de uma ciência humana, como pesquisas tradicionalmente ocupado por uma disciplina patenteada, conhecida e 1036 . Não obstante, reconhece que se trata de um desafio o confronto interdisciplinar no estudo de fenômenos comuns a mais de uma disciplina, mas adverte que a ethosemiótica e todas as demais semióticas com prefixos fazem concorrência com campos de conhecimento que se dedicam ao comportamento, como por exemplo, a antropologia, a sociologia, a psicologia. Não se trata de algo novo, porém; para ilustrar, lembra que Saussure, ao prever objetos de estudo futuros para a semiologia, chegou a citar ritos de boas maneiras; e que Greimas tomou por objeto de estudo, entre outros, a análise narrativa de comportamentos em sessões de psicodrama. Mas Darrault-Harris acaba dedicando boa parte de seu texto a diferenciar a ethosemiótica de outros campos aos quais ela se mescla e pode se confundir. Ao conceituar o projeto ethosemiótico, diz o autor: A ethosemiótica visa então a descrição, a análise e, finalmente, a modelização semiótica de comportamentos pertencentes tanto ao mundo animal (do ser unicelular ao primata) quanto ao mundo humano (mais o ser humano é composto por células dotadas cada uma de um (...)1037. Fica então esclarecido que o foco deste ramo da semiótica é o comportamento animal, tanto do mundo humano, quanto animal. Mas isto não é tudo; mais adiante, segue Darrault-Harris afirmando que no que se refere ao comportamento humano, ela se interessa especialmente pela gênese dos comportamentos, como dos bebês, das crianças e dos adolescentes, traços específicos, práticas e sequências características. Lembra que bizarros, perturbados, ou 1038 . Estes casos, mesmo sendo objeto da psico-patologia ou da psiquiatria também são incluídos nos estudos da ethosemiótica, dada a crença de que o estudo desses casos são frequentemente o caminho mais direto para a compreensão do normal. Por outro lado, há a ambição de mostrar que há problemas de natureza semiótica que são os responsáveis por patologias comportamentais. DARRAULTDUCARD, D. Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques. Paris: Honoré Champion Éditeur; Besançon: Presses Universitaires de Franche-Comté, 2009, p. 81. 1037 Idem, p. 82. 1038 Ibidem. 1036 Anais Eletrônicos . 667 Ainda de acordo com o mesmo autor1039 em termos de aplicação das teorias, a ethosemiótica se propõe a participar do diagnóstico quando da avaliação do comportamento quanto de um projeto terapêutico para que o sujeito volte a um comportamento dito normal ou ao menos, adaptado. Em síntese, a ethosemiótica atua em campos diversos, mas interdisciplinarmente, ou seja, em colaboração com pesquisadores dessas outras áreas, e sua hipótese geral é de que a dimensão narrativa pode ser reguladora do comportamento. Quanto às relações da Ethosemiótica com a Semiótica greimasiana, estudos mostraram que há recorrência , entre os adolescentes, de narrativas que podem ser identificadas como extensão do percurso gerativo canônico. Conclui Darrault-Harris1040 dizendo que a abordagem do objeto comportamento e espaço psíquico, equilibrando fenomenologia e psicanálise. Considerações Reputamos adequado, quando da celebração do centenário de A. J. Greimas, esboçar uma espécie de árvore genealógica dos descendentes da École de Paris, com breves anotações sobre cada um dos desdobramentos. Calcula-se que um grande número de semioticistas está de acordo com J. Fontanille 1041 quando ele afirma que temos dois ramos mais vigorosos operando, o da semiótica do mundo sensível e a da semiótica das práticas. Entretanto, existem referências esparsas acerca de outras ramificações mais recentes ou não, desdobramentos já em terceira geração, ou resultantes da retomada de princípios negligenciados ao longo da trajetória de buscas para a compreensão de fenômenos de significação e de sentido. A publicação organizada por Driss Ablali e Dominique Ducard, intitulada Vocabulaire des études sémiotiques et sémiologiques, sem tradução ainda para o português, nos trouxe reunidas essas muitas semióticas citadas em referências esparsas, derivadas da Ibidem. Ibidem, p. 87. 1041 FONTANILLE, J. Op. cit, 2009, p. 44. . Tanto que 1039 1040 Anais Eletrônicos . 668 é sempre o título de cada artigo e a semiótica específica é subtítulo. São textos que nos encorajaram a estruturar uma possibilidade de árvore genealógica, a partir de seus subtítulos, textos que foram citados, parafraseados e que suscitaram reflexões, além de possibilitar proceder a correlações com outros autores e títulos, além dos que fazem parte da citada coletânea. Se os textos apresentados naquela publicação já são sínteses, mais sintéticas ainda são as ideias aqui trazidas, que só aqui estão para provocar discussões e talvez trazer à luz algum desses ramos, eventualmente não conhecido por todos. Por outro lado, ainda a título de ressalva, o texto em francês mesmo passando por profissional da área da linguística e cidadão francês nato, como já ocorreu anteriormente, pode ter desviado alguma linha de pensamento do original. Propomos, caso entendido de modo discretamente diferente do que quereria dizer seu autor primeiro, que aqui está é o que foi entendido pelo leitor (não vivemos insistindo que, para a semiótica, o que se leva em conta não é tanto o que o autor quis diz, mas o que ele disse?). E consideremos, portanto, no caso de haver novas interpretações, como mais um desdobramento das ideias da École de Paris. É importante levar em conta, por outro lado, o ponto de vista ou mesmo a filiação teórica das fontes, ou da principal fonte, Ablali e Ducard e seus convidados, a maioria vinculado à Université de Limoges. Este texto consiste em um esforço de um grupo de debutantes, admiradores preocupação primeira será explicitar, na forma de uma construção conceitual, as condições da apreensão e da 1042 . E Hénault arremata afirmando, após esta citação: Vimos, como essas palavras, vagas e vazias na aparência, se preencheram de sentido pelo próprio desenvolvimento da pesquisa e pelos sucessivos deslocamentos dos conceitos: a real definição da teoria semiótica é a sua história1043. E afinal, acabamos fazendo um tipo modesto de história, história de cem anos com Greimas ou órfãos dele, para celebrar sua tão profícua existência. 1042 1043 A. J. Greimas, apud Anne Hénault, Op. cit., 2006, p. 153. Hénault, Op. cit., 2006, p. 153. Anais Eletrônicos . 669