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Dominando o Ciclo de Mercado
Copyright © 2019 da Starlin Alta Editora e Consultoria Eireli. ISBN: 978-85-5080884-0
Translated from original Mastering the Market Cicle. Copyright © 2018 by Howard
Marks. ISBN 978-1-3284-7925-9. This translation is published and sold by
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Com Todo o Meu Amor
a Nancy
Jane, Justin, Rosie e Sam
Andrew e Rachel
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
I. Por que estudar ciclos?
II. A natureza dos ciclos
III. A regularidade dos ciclos
IV. O ciclo econômico
V. Envolvimento do governo com o ciclo econômico
VI. O ciclo nos lucros
VII. O pêndulo da psicologia do investidor
VIII. O ciclo das atitudes em direção ao risco
IX. O ciclo de crédito
X. O ciclo dos títulos de empresas inadimplentes
XI. O ciclo do setor imobiliário
XII. Juntando tudo — o ciclo de mercado
XIII. Como lidar com os ciclos de mercado
XIV. Posicionamento no ciclo
XV. Limitações ao lidar com ciclos
XVI. O ciclo do sucesso
XVII. O futuro dos ciclos
XVIII. A essência dos ciclos
INTRODUÇÃO
S
ete anos atrás escrevi um livro chamado The Most Important
Thing: Uncommon Sense for the Thoughtful Investor (“A Coisa
Mais Importante: O Senso Fora do Comum para o Investidor
Previdente”, em tradução livre), que tratava dos pontos nos quais os
investidores deveriam concentrar sua maior atenção. Nele eu dizia
que “o mais importante é estar atento aos ciclos”. Na verdade,
porém, também rotulei 19 outras coisas como “a coisa mais
importante” — porque não há apenas uma coisa mais importante em
que investir. Cada um dos 20 elementos que discuti em The Most
Important Thing é absolutamente essencial para quem deseja ser
um investidor de sucesso.
Vince Lombardi, o lendário treinador dos Green Bay Packers, é
famoso por ter dito: “Vencer não é tudo, é a única coisa”. Nunca
consegui descobrir o que Lombardi queria dizer com isso, mas, sem
sombra de dúvida, ele considerava que vencer era a coisa mais
importante. No que me diz respeito, não posso dizer que uma
compreensão dos ciclos é tudo o que importa em investir, ou a única
coisa a ser considerada, mas certamente está bem próxima do topo
da lista.
A maioria dos grandes investidores que conheci ao longo dos
anos tinha uma excepcional compreensão da forma como os ciclos
funcionam em geral, bem como a percepção de em qual ponto
estamos no atual. Essa condição lhes permite posicionar
vantajosamente seus portfólios com relação ao que vem pela frente.
O alinhamento com a evolução do ciclo (combinado com uma
abordagem de investimento eficaz e o envolvimento de pessoas
excepcionais) explica grande parte do sucesso de minha empresa, a
Oaktree Capital Management.
Por essa razão decidi fazer uma sequência para The Most
Important Thing inteiramente dedicada a uma exploração dos ciclos,
movido por três fatores: as flutuações dos ciclos, algo que considero
particularmente intrigante; a pergunta mais frequente de meus
clientes — onde estamos no ciclo? —; e também porque pouco se
tem escrito sobre a natureza essencial dos ciclos. Espero que você
o aproveite.
Alguns padrões e eventos ocorrem de modo regular em nosso
ambiente, influenciando nosso comportamento e nossa vida. O
inverno é mais frio que o verão, e o dia é mais claro que a noite.
Assim, nos agasalhamos no inverno, e usamos roupas leves no
verão, e reservamos o dia para o trabalho ou lazer, e a noite para
dormir. Nós acendemos as luzes quando a noite cai e as desligamos
ao ir para a cama. Tiramos do armário nossas blusas mais quentes
conforme o inverno se aproxima e nossas roupas de banho para o
verão. Embora haja algumas pessoas que nadam no mar gelado no
inverno por diversão e outras que optam por trabalhar no turno da
noite para deixar seus dias livres, a grande maioria de nós segue os
padrões circadianos normais, facilitando o dia a dia.
Nós, humanos, nos valemos de nossa capacidade de reconhecer
e entender padrões para facilitar decisões, aumentar benefícios e
evitar dor. É importante ressaltar que dependemos de nosso
conhecimento sobre padrões recorrentes para prevenir que todas as
decisões partam do zero. Sabemos que os furacões são mais
prováveis em setembro, então evitamos o Caribe nessa época do
ano. Enquanto os nova-iorquinos agendam suas visitas a Miami e
Phoenix nos meses de inverno, quando o diferencial de temperatura
é positivo, não negativo, os turistas brasileiros acostumados ao calor
programam suas viagens para as localidades no sul do país a fim de
curtir o frio mais intenso. E não precisamos acordar todos os dias
em janeiro e decidir se devemos nos vestir para o calor ou para o
frio.
Economias, empresas e mercados também operam de acordo
com padrões. Alguns desses padrões são comumente chamados de
ciclos. Eles surgem de fenômenos que ocorrem naturalmente, mas,
em especial, também dos altos e baixos da psicologia humana e do
comportamento humano resultante. Em razão do papel relevante
dos fatores psicológicos e comportamentais em sua criação, esses
ciclos não são tão regulares quanto os ciclos de relógio e
calendário, porém dão margem para intensificar determinadas
ações, para o bem ou para o mal, podendo afetar profundamente os
investidores. Se prestarmos atenção aos ciclos, podemos sair na
frente. Se estudarmos os ciclos anteriores, entendermos suas
origens e significado e ficarmos alertas para o próximo, não teremos
de reinventar a roda para entender novamente cada ambiente de
investimento. E teremos menos chances de ser colocados em xeque
pelos acontecimentos. Podemos dominar esses padrões recorrentes
em nosso benefício.
Minha principal mensagem é a de que devemos prestar atenção aos
ciclos. Talvez eu devesse dizer “escute-os”. Há duas definições
estreitamente relacionadas, mas distintas, para a palavra “escutar”.
A primeira é “concentrar-se com o propósito de ouvir”. A segunda é
“prestar atenção”. Ambas são importantes para o que estou
escrevendo.
No intuito de posicionar adequadamente um portfólio diante do
que está acontecendo ao redor — e para a implicação disso em
relação ao futuro dos mercados —, o investidor tem de manter um
alto nível de atenção. Eventos acontecem igualmente para todos os
que estão operando em um determinado ambiente. Mas nem todo
mundo os “escuta” igualmente no sentido de prestar atenção, estar
ciente deles e, assim, potencialmente descobrir sua importância.
E certamente nem todos prestam a devida atenção. Por “devida
atenção” eu quero dizer “acate, tenha em mente, assuma como
modelo, incorpore”. Ou, em outras palavras, “absorver uma lição e
seguir seus ditames”. Talvez eu possa transmitir melhor esse
sentido de “atenção” para escutar listando seus antônimos: ignorar,
desconsiderar, repudiar, rejeitar, negligenciar, descuidar, desprezar,
desdenhar, escarnecer, não acatar, desconcentrar-se, deixar passar
batido ou ficar desatento. Invariavelmente, os investidores que não
levam em conta sua posição em ciclos tendem a sofrer sérios
revezes.
Para tirar o máximo proveito deste livro — e aprimorar-se na
maneira de lidar com ciclos —, um investidor tem de aprender a
reconhecer os ciclos, avaliá-los, identificar suas implicações e fazer
o que eles lhe dizem para fazer. (Veja adiante a nota do autor sobre
meu uso de pronomes masculinos.) Caso um investidor “escute”
nesse sentido, poderá converter ciclos, de uma força selvagem,
incontrolável e devastadora, em um fenômeno que pode ser
entendido e aproveitado: um filão que pode ser explorado para obter
um desempenho acima das expectativas mais otimistas.
Uma filosofia de investimento vencedora pode ser criada apenas
através da combinação de um certo número de elementos
essenciais:
Um ensino técnico em contabilidade, finanças e economia
providencia o fundamento: necessário, mas longe de ser
suficiente.
Uma visão de como os mercados funcionam é importante
— é preciso ter uma antes de começar a investir, mas ela
deve ser complementada, questionada, refinada e
reformulada à medida que você segue em frente.
Algumas de suas perspectivas iniciais são provenientes
daquilo que você leu, então a leitura é um elemento
essencial. Continuar a ler lhe permitirá aumentar a eficácia
de sua abordagem, seja por adotar as ideias que você
acha atraentes, seja por descartar as que não são.
Convém frisar que é importantíssimo realizar leituras para
além dos limites estritos da área relativa a investimentos.
O lendário investidor Charlie Munger frequentemente
aponta para os benefícios de ler de forma ampla; história e
processos em outros campos podem acrescentar muito a
eficazes abordagens e decisões de investimento.
Trocar ideias com outros investidores pode ser uma fonte
inestimável de crescimento. Dada a natureza não
científica do investimento, não há como terminar com seu
aprendizado, e nenhum indivíduo monopoliza os insights.
Investir pode ser solitário, mas penso que aqueles que o
praticam na solidão estão perdendo muito, tanto
intelectualmente quanto nas relações interpessoais.
Finalmente, na verdade não há substituto para a
experiência. Em cada novo ano ocorre-me investir de
forma diferente, e cada ciclo pelo qual passei me ensinou
algo sobre como lidar com o próximo. Aconselho ter uma
longa carreira, e não vejo razão alguma no horizonte
próximo para interrompê-la.
Escrever meus livros foi uma maneira maravilhosa de dar o devido
reconhecimento às pessoas que contribuíram para meus insights
sobre investimento e a construção de minha vida profissional.
Ganhei muito lendo o trabalho de Peter Bernstein, John
Kenneth Galbraith, Nassim Nicholas Taleb e Charlie Ellis.
Continuei a captar as dicas das pessoas que citei em The
Most Important Thing e outras, incluindo Seth Klarman,
Charlie Munger, Warren Buffett, Bruce Newberg, Michael
Milken, Jacob Rothschild, Todd Combs, Roger Altman,
Joel Greenblatt, Peter Kaufman e Doug Kass. E desde
que Nancy e eu nos mudamos para Nova York, em 2013,
para acompanhar nossos filhos, tive a sorte de incluir
Oscar Schafer, Jim Tisch e Ajit Jain nesse círculo. O modo
de ver as coisas de cada uma dessas pessoas foi
adicionado ao meu.
Por fim, quero retornar aos colaboradores mais
importantes, meus cofundadores da Oaktree: Bruce Karsh,
Sheldon Stone, Richard Masson e Larry Keele. Eles me
honraram adotando minha filosofia como base para a
abordagem de investimento da Oaktree, aplicaram-na
habilmente (obtendo reconhecimento por isso) e me
ajudaram a complementá-la ao longo dos mais de trinta
anos em que fomos associados. Como se vê a seguir,
Bruce e eu trocamos ideias e nos apoiamos quase que
diariamente durante esse período, e esse convívio
dinâmico e produtivo — especialmente nos momentos
mais difíceis — desempenhou um papel indispensável no
desenvolvimento da abordagem aos ciclos na qual este
livro se baseia.
Também sou grato a algumas pessoas cuja participação na
criação deste livro foi importante: meu talentoso editor na HMH, Rick
Wolff; meu engenhoso agente, Jim Levine, que me levou ao Rick;
minha grande amiga Karen Mack Goldsmith, que a todo momento
me forçava a tornar o livro mais atraente; e minha assistente de
longa data, Caroline Heald. Em particular, quero citar o professor
Randy Kroszner, da Universidade de Chicago, Booth School, que
ajudou analisando os capítulos sobre o ciclo econômico e a
intervenção governamental.
Como o conhecimento é cumulativo e nunca sabemos tudo, estou
ansioso para aprender mais nos próximos anos. Ao investir, não há
nada que sempre funcione, pois o ambiente é mutável por natureza,
e os esforços dos investidores para responder ao ambiente o fazem
mudar ainda mais. Assim, espero no futuro conhecer coisas que
desconheço agora, e fico na expectativa, aguardando por elas, para
compartilhá-las em memorandos e livros ainda por vir.
Notas do autor:
1. Como em The Most Important Thing, quero fazer desde já
um pedido de desculpas geral pelo uso consistente de
pronomes masculinos. Pode ser a força do hábito de
alguém que começou a escrever há mais de sessenta
anos. Acho muito mais fácil e mais atraente escrever “ele”
do que “ele/ela”. Alternar entre “ele” e “ela” parece
forçado. E eu não gosto do uso de “eles” quando o
assunto é uma única pessoa. As mulheres excepcionais
com quem tive o privilégio de trabalhar ao longo da minha
carreira sabem que eu realmente, ao pensar em
profissionais e investidores, tenho em mente tanto homens
quanto mulheres.
2. Tal como em The Most Important Thing, visando
esclarecer meus pontos aqui, de vez em quando me
basearei em memorandos de clientes que escrevi ao
longo dos anos, a partir de 1990*. Com essa mesma
finalidade, também pegarei emprestado meu primeiro livro.
Eu poderia me dar ao trabalho de reinventar a roda e
escrever sobre esses assuntos de novo, mas não vou. Em
vez disso, levantarei as principais passagens do meu livro
e memorandos que, em minha opinião, explicam as coisas
com clareza. Espero que isso não faça com que aqueles
que compraram este livro sintam que receberam menos
do que o valor de seu dinheiro.
Para atender aos propósitos deste livro, ocasionalmente
adiciono ou excluo algumas poucas palavras das
passagens que cito, ou apresento parágrafos em uma
ordem diferente daquela em que apareceram no original.
Como eles são trechos de minha autoria, acho que não há
problema em fazer isso sem notificar em todos os casos.
Mas faço isso apenas para aumentar sua utilidade, não
para alterar seu significado ou torná-lo mais correto com o
benefício da retrospectiva.
3. Ainda como em The Most Important Thing, tratarei aqui de
um tema que — tal como o investimento em geral — é
complexo e envolve elementos que se sobrepõem, não
podendo, por isso, ser nitidamente segregados em
capítulos distintos. À medida que alguns desses
elementos são abordados em vários lugares, haverá
casos em que ocorrerão repetições nas quais incluí
citações relevantes de outras pessoas ou de meu livro e
memorandos que não posso resistir a usar mais de uma
vez.
4. Observe que, quando falo em “investir”, parto do
pressuposto de que o investidor está comprando,
mantendo ou, como dizemos, “dando um tempo” na
expectativa de que certos ativos se valorizem. Isso é o
oposto de alguém vender valores mobiliários de curto
prazo que ainda não possui por considerar que sua
cotação cairá (operações denominadas de “mercado a
termo”). Os investidores nem sempre têm posições
“compradas”, em vez de “vendidas”, mas isso ocorre na
maioria das vezes. O número de pessoas que vendem
ações a descoberto ou que já têm “net short” — ou seja,
cujas posições vendidas têm um valor total superior ao
das ações que possuem — é pequeno em relação àquelas
que não possuem. Assim, neste livro falarei
exclusivamente sobre como investir em coisas porque elas
devem subir, não vendendo ativos com a expectativa de
que seus preços cairão.
5. Finalizando: inicialmente concebi este livro como sendo
apenas sobre ciclos, entretanto, à medida que o escrevia,
surgiram ideias sobre muitos outros tópicos, tais como
seleção de ativos e “queda brusca de preços valores ou
títulos” . Em vez de descartá-los, eu os incluí. Espero que
você fique feliz por eles estarem aqui como um bônus, em
vez de um desvio de rota.
*
Esses memorandos sobre diversos assuntos foram escritos pelo autor ao longo do tempo,
e ele os deixava à disposição dos clientes de sua empresa. Podem ser consultados em
https://www.oaktreecapital.com/insights/howard-marks-memos (conteúdo em inglês).
I
POR QUE ESTUDAR CICLOS?
I
As chances variam de acordo com nossa posição nos ciclos.
Se não alteramos nossa postura de investimento conforme as
coisas mudam, estamos sendo passivos em relação aos
ciclos; em outras palavras, estamos ignorando a chance de
inclinar as probabilidades a nosso favor. Porém, se
obtivermos algum insight sobre os ciclos, podemos aumentar
nossas apostas e colocá-las em investimentos mais
agressivos quando as probabilidades estão a nosso favor, e
podemos ficar mais cautelosos e aumentar nossa postura
defensiva quando as probabilidades estão contra nós.
nvestir é uma questão de se preparar para o futuro financeiro. A
tarefa é simples de definir: montamos hoje portfólios que
esperamos que se beneficiem dos eventos dos próximos anos.
Para investidores profissionais, o sucesso consiste em fazer isso
melhor do que o investidor médio, ou superar um benchmark (uma
referência, um parâmetro) de mercado atribuído, que é determinado
pelo comportamento de todos os outros investidores. No entanto,
alcançar esse tipo de êxito não é um desafio menor: embora seja
muito fácil gerar desempenho médio de investimento, é muito difícil
uma performance acima da média.
Um dos mais importantes fundamentos de minha filosofia de
investimento é a convicção de que não podemos saber o que o
“futuro macro” nos reserva em termos de economias, mercados ou
geopolítica. Ou, para ser mais preciso, contam-se nos dedos as
pessoas capazes de considerar todos os fatores envolvidos para
saber mais sobre o futuro macro. E nossas previsões levarão a um
desempenho superior apenas se soubermos mais do que os outros
(quer isso consista em ter dados melhores, fazer um trabalho
superior de interpretar os dados disponíveis, saber quais ações
tomar com base em nossa interpretação, ou ter a coragem
emocional necessária para colocar tais ações em prática).
Em resumo, se tivermos as mesmas informações que os outros,
analisá-las da mesma maneira, chegar às mesmas conclusões e
implementá-las de forma idêntica, não devemos esperar que o
processo resulte em desempenho superior. E é muito difícil ser
consistentemente superior com relação ao macro.
Então, em minha opinião, é improvável que tentar prever o futuro
macro ajude os investidores a obter um desempenho de
investimento superior. Muito poucos investidores são conhecidos por
terem superado a previsão macro.
Warren Buffett me contou sobre seus dois critérios para uma
informação desejável: ela tem que ser importante e compreensível.
Embora “todos saibam” que hoje os desenvolvimentos
macroeconômicos têm um papel dominante na determinação do
desempenho dos mercados, os “macroinvestidores” como um todo
mostraram resultados realmente inexpressivos. Não é que a
previsão macro não tenha importância, mas, sim, que muito poucas
pessoas podem dominá-la. Para a maioria, simplesmente não é
compreensível (ou não é suficientemente conhecida e
consistentemente suficiente para levar a um melhor desempenho).
Desse modo, dispenso a previsão macro como algo que trará
sucesso ao investimento da grande maioria dos investidores, e
certamente me incluo nesse grupo. Se é assim, o que resta?
Embora haja muitos detalhes e nuances, penso ser vantajoso gastar
nosso tempo em três áreas gerais:
Tentando saber mais do que os outros sobre o que chamo
de “o compreensível”: os fundamentos das indústrias, das
empresas e dos valores mobiliários.
Sendo disciplinado quanto ao preço apropriado a pagar
para participar nesses fundamentos.
Entendendo o ambiente de investimento em que estamos,
a fim de decidir como posicionar estrategicamente nossos
portfólios para isso.
Muito já foi escrito sobre os dois primeiros itens. Juntos, eles
constituem os ingredientes-chave em “análise dos valores
mobiliários” e “investimento em valor”: julgamentos sobre o que um
ativo pode produzir no futuro — geralmente em termos de lucro ou
fluxo de caixa — e o que tais análises dizem sobre valer a pena ou
não ter esses ativos hoje.
O que os investidores em valor fazem? Eles se esforçam para tirar
proveito das discrepâncias entre “preço” e “valor”. Para ter êxito
nessa empreitada, eles têm de (a) quantificar o valor intrínseco de
um ativo e como ele pode mudar com o tempo e (b) avaliar como o
preço de mercado corrente se compara relativamente ao valor
intrínseco do ativo, aos preços do ativo no passado, aos preços de
outros ativos e aos preços “teoricamente justos” para os ativos em
geral.
Em seguida, eles usam essas informações para montar portfólios.
Na maioria das vezes, o objetivo imediato é manter investimentos
que ofereçam as melhores proposições de valor disponíveis: os
ativos com maior potencial de valorização e/ou a melhor relação
entre o potencial de crescimento e o risco de declínio das cotações.
Pode-se argumentar que a formação de um portfólio deve consistir
em nada mais do que identificar os ativos com maior valor e aqueles
cujos preços mais o subestimam. Isso pode ser verdade em geral e
no longo prazo, mas penso que outro elemento pode entrar com
vantagem no processo: posicionar adequadamente um portfólio para
o que provavelmente acontecerá no mercado nos próximos anos.
Acredito que a melhor maneira de otimizar o posicionamento de
um portfólio em um dado ponto no tempo é decidir como equilibrar
agressividade e defensividade. Penso que a relação entre posições
mais agressivas e mais defensivas deve ser ajustada ao longo do
tempo, em resposta a mudanças no estado do ambiente de
investimento e onde houver uma série de elementos em seus ciclos.
A palavra-chave é “calibrar”. O valor investido, a alocação de
capital entre as várias possibilidades e o grau de risco das
coisas que se possui devem ser calibrados ao longo de um
continuum que vai de agressivo a defensivo… Quando for
barato, devemos ser agressivos; quando for caro, devemos
recuar. (“Yet Again?”, setembro de 2017)
Calibrar a posição de um portfólio é o assunto principal deste livro.
Uma das palavras-chave necessárias para entender as razões do
estudo dos ciclos são as “tendências”.
Se os fatores que influenciam o investimento fossem regulares e
previsíveis — por exemplo, se a previsão macro funcionasse —,
poderíamos falar sobre o que “acontecerá”. Porém, o fato de não ser
esse o caso não significa que somos incapazes de contemplar o
futuro. Ao contrário, podemos falar sobre as coisas que podem ou
não acontecer, bem como a probabilidade de acontecerem. Essas
coisas são o que eu chamo de “tendências”.
No mundo dos investimentos, falamos sobre risco o tempo todo,
mas não há um acordo universal sobre o que é risco ou as
implicações disso no comportamento dos investidores. Há os que
pensam que risco é a probabilidade de perder dinheiro, e outros
(incluindo muitos acadêmicos de finanças) acham que risco é a
volatilidade dos preços ou dos retornos dos ativos. E há muitos
outros tipos de risco que fogem ao escopo deste livro.
Eu me inclino fortemente para a primeira definição: em minha
opinião, o risco é principalmente a probabilidade de perda
permanente de capital. Mas também há o chamado risco de
oportunidade: a probabilidade de perder ganhos potenciais. Juntar
os dois é perceber que risco é a possibilidade de as coisas não
acontecerem do jeito que a gente quer.
Qual é a origem do risco? O falecido Peter Bernstein, um de meus
filósofos de investimento favoritos, disse o seguinte em uma edição
de seu boletim Economics and Portfolio Strategy intitulado “Can We
Measure Risk with a Number?” (“Podemos medir o risco com um
número?”, em tradução livre) (junho de 2007):
Em essência, risco quer dizer que não sabemos o que vai
acontecer… A cada momento rumamos para o desconhecido.
Há uma variedade de resultados, e não sabemos onde (o
resultado real) ficará nessa série. E com frequência
ignoramos a extensão dessa série.
Você encontrará a seguir algumas ideias — resumidas muito
brevemente a partir de meu memorando “Risk Revisited Again”
(“Revisitando o Risco Novamente”, em tradução livre), de junho de
2015 — que, a meu ver, surgem diretamente do ponto de partida
fornecido por Bernstein. Elas podem ajudá-lo a entender e lidar com
o risco.
Como disse Elroy Dimson, professor aposentado da London
Business School, “Risco significa que mais coisas podem acontecer
do que acontecerão”. Para cada evento em economia, negócios e
mercados (entre outras coisas), se apenas uma coisa pudesse
acontecer — ou seja, se pudesse haver apenas um resultado —, e
se fosse previsível, não haveria, obviamente, incerteza ou risco. E
sem incerteza em relação ao que acontecerá, teoricamente
poderíamos saber com exatidão como posicionar nossos portfólios
para evitar perdas e obter ganhos máximos. Mas na vida e no
investimento, uma vez que podem haver muitos resultados
diferentes, a incerteza e o risco são inescapáveis.
Em decorrência do exposto, o futuro deve ser visto não como um
único resultado fixo que está destinado a acontecer e capaz de ser
previsto, mas como uma série de possibilidades e, espera-se, com
base nos insights de suas respectivas chances de ocorrer, como
uma distribuição de probabilidades. Distribuições de probabilidade
refletem a percepção individual de tendências.
Investidores, ou qualquer um que queira lidar com sucesso com o
futuro, têm de elaborar distribuições de probabilidade, explícita ou
informalmente. Essas probabilidades, caso sejam bem feitas, serão
úteis para determinar o curso de ação mais apropriado. Contudo,
ainda é crucial ter em mente que, mesmo a par das probabilidades,
isso não significa que sabemos o que acontecerá.
Os resultados relativos a uma dada questão podem estar no
âmbito de uma distribuição de probabilidade de longo prazo, mas no
que diz respeito ao resultado de um único evento, pode haver
grande incerteza. Qualquer um dos resultados incluídos em uma
distribuição pode ocorrer, ainda que com chances variáveis, já que o
processo através do qual o resultado é escolhido será afetado não
apenas pelos méritos, mas também pela aleatoriedade. Para
inverter a declaração de Dimson, não obstante muitas coisas
possam ocorrer, apenas uma acontecerá. Podemos saber o que
esperar “em média”, mas isso pode não ter conexão alguma com o
que realmente acontecerá.
Quanto a isso, na minha maneira de pensar, o sucesso do
investimento é como escolher um ganhador da loteria. Ambos são
determinados por um bilhete (o resultado) sendo retirado de uma
urna (toda a gama de resultados possíveis). Em cada caso, um
resultado é escolhido dentre as muitas possibilidades.
Investidores superiores são pessoas que têm uma noção melhor
de quais bilhetes estão na urna e, portanto, se vale a pena participar
da loteria. Em outras palavras, ainda que os investidores superiores
— como qualquer um — não saibam exatamente o que o futuro
reserva, eles têm uma compreensão acima da média sobre as
tendências futuras.
Cabe aqui, de maneira oportuna, uma observação. A maioria das
pessoas acha que a maneira de lidar com o futuro é formulando
uma opinião a respeito do que acontecerá, talvez por meio de uma
distribuição de probabilidade. Penso que existem dois requisitos,
não um. Além de uma opinião sobre o que acontecerá, as pessoas
devem ter uma opinião sobre as chances de sua opinião ser correta.
Alguns eventos podem ser previstos com substancial confiança (por
exemplo, “Um título com determinado grau de investimento pagará
os juros prometidos?”), em outros há incerteza (“A Amazon ainda
será líder em varejo online em dez anos?”), enquanto alguns são
totalmente imprevisíveis (“O mercado de ações vai subir ou descer
no próximo mês?”). Meu ponto aqui é que nem todas as previsões
devem ser tratadas como igualmente prováveis de serem corretas e,
portanto, não devem ser usadas da mesma forma. Eu não acho que
a maioria das pessoas esteja tão ciente disso quanto deveriam.
Uma boa maneira de pensar sobre o investidor superior descrito é
como alguém cuja percepção das tendências permite inclinar as
chances a seu favor.
Digamos que existam 100 bolas em um pote, algumas pretas e
algumas brancas. Qual cor você deve apostar que aparecerá ao
retirar uma delas?
Se você nada sabe sobre o conteúdo do pote, apostar
seria apenas uma questão de adivinhação: especulação
desinformada. A situação é semelhante caso você saiba
que existem cinquenta bolas pretas e cinquenta brancas.
Você pode apostar tanto no preto quanto no branco, mas
não teria mais do que 50% de chance de acertar. Assim,
apostar será algo estúpido, a menos que você tenha uma
chance no mínimo igual — e a menos que você seja
capaz de evitar o pagamento de uma taxa de admissão
(no investimento, uma comissão ou spread) para jogar.
Apostar no preto ou no branco com chances iguais não
seria muito lucrativo a não ser que você tenha sorte, e a
sorte não é algo com que se pode contar. Quando não se
dispõe de uma vantagem de conhecimento em relação ao
conteúdo do jarro, apostar não seria lucrativo de forma
confiável.
Mas e se você tiver um insight especial sobre o conteúdo
do jarro? Digamos que você saiba que existem 70 bolas
pretas e 30 brancas. Isso pode lhe permitir ganhar mais
vezes do que perder. Se você pode apostar $10 no preto
contra alguém que lhe dá chances iguais, você ganhará
$10 em 70% do tempo e perderá $10 apenas em 30% do
tempo, para um lucro esperado de $40 a cada dez
escolhas. (Observação: esses serão os resultados, em
média, de um elevado número de tentativas, mas estão
sujeitos a variações significativas no curto prazo devido à
aleatoriedade.)
Claro, seu parceiro de apostas só lhe dará chances iguais
em uma aposta no preto (a) se ele não souber que as
bolas são 70% pretas e 30% brancas e (b) se ele não
souber que você sabe. Caso ele soubesse tanto quanto
você sobre o conteúdo do pote, ele lhe daria apenas 30:70
em uma aposta no preto, e apostar voltaria a não ser
lucrativo.
Em outras palavras, para vencer nesse jogo com mais
frequência do que se perde, você precisa ter uma
vantagem de conhecimento. É isso que o investidor
superior tem: ele sabe mais do que os outros sobre as
tendências futuras.
No entanto, é importante se lembrar do que eu disse
antes: ainda que você conheça as probabilidades — ou
seja, mesmo tendo uma percepção superior sobre as
tendências —, permanece, em essência, ignorando o que
acontecerá. Apesar de saber que a proporção de bolas no
pote seja de 70 pretas para 30 brancas, você ainda não
sabe qual será a cor da próxima bola retirada. Sim, é mais
provável que seja uma preta, mas ainda será uma branca
em 30% do tempo. Quando há bolas brancas e pretas no
pote, e especialmente quando forças aleatórias e
exógenas estão em ação quando a próxima bola é
escolhida, não há como ter certeza sobre o resultado.
Não obstante tudo o que foi dito, não é necessário haver
certeza para que o jogo valha a pena ser jogado. Uma
vantagem de conhecimento sobre as tendências é
suficiente para obter sucesso em longo prazo.
E isso nos leva a retornar à questão da compreensão dos ciclos.
Sobre o investidor médio, pode-se dizer que ele:
Não entende completamente a natureza e importância dos
ciclos.
Não está presente há tempo suficiente para ter passado
por muitos ciclos.
Não leu a história financeira e, assim, deixou de aprender
as lições dos ciclos passados.
Percebe o ambiente principalmente em termos de eventos
isolados, em vez de observar padrões recorrentes e as
razões por trás deles.
Não entende o mais importante: o significado dos ciclos e
o que eles podem lhe dizer sobre como agir.
O investidor superior está atento aos ciclos. Ele vai anotando
padrões passados que parecem estar se repetindo, adquire um
senso sobre onde estamos nos vários ciclos que importam, e sabe
que essas coisas têm implicações para suas ações. Isso o permite
fazer julgamentos úteis sobre ciclos e onde estamos neles.
Especificamente:
Estamos perto do começo de uma ascensão, ou nos
estágios finais?
Se um determinado ciclo cresce há algum tempo, já foi tão
longe que agora estamos em terreno perigoso?
O comportamento dos investidores sugere que eles estão
sendo motivados pela ganância ou pelo medo?
Quanto ao risco, os investidores parecem
apropriadamente avessos ou toltamente tolerantes?
O mercado está superaquecido (e superapreciado), ou
apático (e, portanto, barato) em função do que está
acontecendo ciclicamente?
Tudo isso somado, nossa posição atual no ciclo implica
que devemos enfatizar defensividade ou agressividade?
Estar atento a esses elementos dá ao investidor superior uma
vantagem que lhe permite ganhar com mais frequência do que
perder. Ele compreende tendências ou probabilidades; assim, sabe
de algo que os outros desconhecem sobre a cor das bolas no pote.
Ele tem uma percepção mais apurada sobre se as chances de
ganhar excedem as chances de perder, e então é capaz de investir
mais quando elas são favoráveis, e menos quando não são. É
importante ressaltar que todas essas coisas podem ser avaliadas
com base em observações a respeito das atuais circunstâncias.
Como veremos nos próximos capítulos, elas podem nos dizer como
se preparar para o futuro sem exigir que sejamos capazes de prevêlo.
Lembre-se, nossa posição nos vários ciclos influencia fortemente
as probabilidades. Por exemplo, como veremos em capítulos
posteriores, as oportunidades de ganho de investimento melhoram
quando:
A economia e os lucros das empresas são mais
propensos a subir do que a descer de patamar.
A psicologia dos investidores é moderada, e não instável.
Os investidores estão conscientes do risco ou — melhor
ainda — excessivamente preocupados com o risco.
Os preços de mercado não se elevaram demais da conta.
Há ciclos em todas essas coisas (e outras mais), e saber onde
estamos dentro deles pode ajudar a inclinar as probabilidades a
nosso favor. Resumindo, o movimento ao longo do ciclo reposiciona
a distribuição de probabilidade relativa a eventos futuros. No que diz
respeito aos retornos de investimento, talvez seja útil ilustrar:
Quando nossa posição nos vários ciclos é neutra, a perspectiva de
retornos é “normal”.
Quando os ciclos estão posicionados de forma propícia, a
distribuição de probabilidade move-se para a direita, de modo que a
perspectiva de retornos é, agora, inclinada a nosso favor. Nossa
posição favorável nos ciclos torna mais prováveis ganhos do que
perdas.
Mas quando os ciclos estão em extremos perigosos, as
probabilidades estão contra nós, significando que há menos chance
de ganho e mais chance de perda.
O mesmo acontece quando nossa posição muda em apenas um
único ciclo. Por exemplo, independentemente do que esteja
acontecendo com relação à economia e aos lucros das empresas
(isto é, como dizem os acadêmicos, ceteris paribus ou “todo o mais
é constante”), a perspectiva de retornos será melhor quando os
investidores estiverem deprimidos e temerosos (um fator que induz
os preços dos ativos a cair), e pior quando estiverem eufóricos e
gananciosos (situação que empurra os preços para cima).
As chances variam de acordo com nossa posição nos ciclos. Se
não alteramos nossa postura de investimento conforme as coisas
mudam, estamos sendo passivos em relação aos ciclos. Em outras
palavras, estamos ignorando a chance de inclinar as probabilidades
a nosso favor. Porém, se obtivermos algum insight sobre os ciclos,
podemos aumentar nossas apostas e colocá-las em investimentos
mais agressivos quando as probabilidades estão a nosso favor, e
podemos ficar mais cautelosos e aumentar nossa postura defensiva
quando as probabilidades estão contra nós.
Quem estuda ciclos não sabe de fato o que acontecerá a seguir —
não mais do que alguém com um insight sobre as bolas no pote
sabe qual cor da bola sairá em seguida. Mas ambos têm uma
vantagem de conhecimento sobre o que é provável. O
conhecimento que aquele estudante tem dos ciclos e a apreciação a
respeito de onde estamos em um momento no tempo podem dar
uma grande contribuição para demarcar os limites que devem estar
presentes para que um investidor alcance resultados superiores.
Saber que a proporção das bolas a serem retiradas do pote é de
70:30 para uma certa cor é uma vantagem. O mesmo se dá com o
investidor que sabe melhor do que os outros em que pé estamos no
ciclo. O objetivo deste livro é ajudá-lo a se tornar essa pessoa.
Para isso, descreverei vários processos cíclicos que observei em
tempo real. As oscilações podem parecer extremas, e de fato
podem ser, já que são escolhidas a partir da experiência de meio
século para provar um ponto. E elas podem dar a impressão de que
os eventos em discussão foram compactados no tempo, quando, na
verdade, levaram meses e anos para se desenvolver. Os exemplos,
no entanto, são reais, e espero que eles tornem minha mensagem
clara.
II
A NATUREZA DOS CICLOS
As pessoas, de um modo geral, pensam em ciclos como uma
série de eventos, e entendem que tais eventos seguem um ao
outro com regularidade e em uma sequência usual:
ascenções são seguidas por retrações/recessões e, por fim,
por novas ascenções. Mas isso não é o suficiente para se ter
uma compreensão completa dos ciclos. Os eventos na
vigência de um ciclo não devem ser vistos apenas como cada
um sendo seguido pelo próximo, mas — e muito mais
importante — como cada um causando o próximo.
Q
uando me encontro com clientes da Oaktree, eles quase
sempre me pedem para ajudá-los a entender o que está
acontecendo no mundo ou no mercado. Geralmente querem saber
sobre um ou outro ciclo específico e onde estamos nele.
Invariavelmente, puxo uma folha de papel e faço um desenho para
auxiliar a conversa.
Normalmente há uma linha que se estende da parte inferior
esquerda para a superior direita. Outra linha flutua para cima e para
baixo ao redor dela. Juntas, se parecem com isto:
Ao começar a me organizar para a tarefa de escrever este livro,
encontrei um grande número desses desenhos em uma sacola
Oaktree. Eu os havia desenhado quando descrevia vários
fenômenos diferentes, e eles foram anotados de maneira diferente.
Mas cada um deles se relacionava com um ciclo digno de
discussão, e, em geral, os capítulos deste livro serão dedicados a
esses fenômenos cíclicos.
Antes de prosseguir com minha discussão sobre ciclos, quero
voltar a algo que mencionei em The Most Important Thing. Confesso
que fico me revezando entre discutir os altos e baixos dos ciclos e
as oscilações dos pêndulos de um lado para o outro, aplicando o
rótulo do ciclo a alguns fenômenos e (como visto no Capítulo VII) o
rótulo do pêndulo a outros (normalmente aqueles ligados à
psicologia). Às vezes falo de um determinado fenômeno como um
ciclo, e às vezes, como um pêndulo. Mas, quando pressionado,
acho difícil distinguir entre os dois ou dizer por que um recebe um
rótulo, e não o outro.
Costumo pensar nas coisas visualmente, então talvez eu possa
usar uma imagem para descrever a conexão entre ciclos e
pêndulos. Como descreverei mais adiante, os ciclos oscilam em
torno de um ponto médio (ou uma tendência secular). De modo
semelhante, os pêndulos ficam pendurados em um ponto médio (ou
norma) e balançam para cá e para lá a partir daí. Mas pegue o
ponto de onde pende o pêndulo, vire-o de lado e movimente-o da
esquerda para a direita: à medida que ele oscila, o que você tem?
Um ciclo. Não há, na verdade, nenhuma diferença fundamental. Até
admito que um pêndulo é pouco mais que um caso especial de um
ciclo, ou talvez apenas uma maneira diferente de fazer referência a
ciclos específicos. Minhas razões para me referir a algumas coisas
como ciclos e a outras como pêndulos são claras para mim. Espero
que se tornem claras para você também. Ou, no mínimo, espero
que meu uso dos dois termos não prejudique o que você pode levar
deste livro.
O que de fato importa é que, no mundo em que os investidores
habitam, ciclos sobem e descem, e pêndulos balançam de lá para
cá. Ciclos e oscilações de pêndulos vêm em muitas formas e se
relacionam com uma ampla variedade de fenômenos, mas as
razões subjacentes a eles — e os padrões que produzem — têm
muito em comum, e eles tendem a ser relativamente consistentes ao
longo do tempo. Ou, como Mark Twain tem a fama de ter dito
(embora não haja provas da veracidade disso), “a história não se
repete, mas rima”.
Quer Twain a tenha cunhado, quer não, essa frase resume muito
do que este livro trata. Os ciclos variam em termos de motivos e
detalhes, e em tempo e extensão, mas os altos e baixos (e as
razões para eles) ocorrerão sempre, produzindo mudanças no
ambiente de investimento e, portanto, no comportamento exigido.
Em meus desenhos, a linha central representa um ponto médio
em torno do qual o ciclo oscila. Às vezes ela tem uma direção
subjacente ou uma tendência secular (“secular” no sentido de — ou
relacionado a — um longo período de duração indefinida), e isso
geralmente é ascendente. Assim, com o tempo e em longo prazo, as
economias tendem a crescer, os lucros das empresas tendem a
aumentar, e (em grande parte por causa disso) os mercados tendem
a crescer. E se esses desenvolvimentos forem científicos ou
totalmente naturais, processos físicos, economias, empresas e
mercados podem progredir em linha reta e a uma taxa constante
(pelo menos por um tempo). Mas claro, aqueles não são, então
estes também não se comportarão assim.
O fato é que o desempenho dessas coisas é fortemente
influenciado no curto prazo, entre outros fatores, pelo envolvimento
de pessoas, e pessoas estão longe de ser estáveis. Ao contrário,
elas de vez em quando alternam seu comportamento, em muitas
ocasiões em virtude do que podemos colocar sob o título amplo de
“psicologia”. Assim, o modo de ser das pessoas varia, certamente,
como o ambiente varia, mas às vezes também na ausência de
mudanças no ambiente.
Este livro aborda em grande parte a oscilação das coisas em torno
do ponto médio ou da tendência secular. A oscilação surpreende e
atormenta as pessoas que não a entendem ou, pior ainda, que
contribuem para que ela ocorra. Mas, como já informei, geralmente
apresenta oportunidades de lucro para aqueles que compreendem,
reconhecem e se aproveitam dos fenômenos cíclicos.
Ao olhar para meus desenhos por alguns segundos, fica claro que
os movimentos dos fenômenos cíclicos podem ser entendidos como
ocorrendo em várias fases identificáveis:
a. Recuperação a partir de um extremo inferior
excessivamente deprimido ou “baixo” em direção ao ponto
médio.
b. A oscilação continuada passando do ponto médio para um
extremo superior ou “alto”.
c. A obtenção de um ponto alto.
d. A correção descendente do ponto mais elevado de volta
para o ponto médio, ou média.
e. A continuação do movimento descendente após o ponto
médio, em direção a um novo ponto baixo.
f. O alcance de um ponto baixo.
g. Mais uma vez, a recuperação, do ponto baixo para o ponto
médio.
h. E depois novamente a continuação do movimento para
cima, passando do ponto médio para outro ponto alto.
Observando esse roteiro, é importante frisar que não se pode
dizer que haja um único “ponto de partida” ou “ponto final” para um
ciclo. Qualquer uma das etapas listadas pode ser descrita como
representando o início de um ciclo, ou o fim, ou qualquer estágio no
meio do caminho.
O narrador simplista pode achar fácil falar sobre o começo de um
ciclo, mas alguém um pouco mais sofisticado pode achar isso
extremamente difícil. Eis o que escrevi sobre esse assunto em “Now
It’s All Bad?” (“Tudo é ruim agora?”, em tradução livre, setembro de
2007):
Henry Kissinger era um membro da diretoria da TCW quando
eu trabalhava lá, e algumas vezes a cada ano tive o privilégio
de ouvi-lo falar sobre assuntos mundiais. Alguém poderia
perguntar: “Henry, como explicar os eventos de ontem na
Bósnia?”, e ele diria: “Bem, em 1722…” O que quero ressaltar
é que eventos do tipo reação em cadeia só podem ser
compreendidos no contexto do que aconteceu anteriormente.
Caso alguém pergunte “Como chegamos a esse ponto?” ou “O
que nos levou a chegar a um nível tão alto (ou baixo)?”,
invariavelmente a explicação tem que ser baseada nos eventos
anteriores. Mas, dito isto, pode não ser fácil retroceder até o ponto
inicial de sua narrativa.
As pessoas frequentemente me perguntam “O que causou o início
do ciclo?” ou “Estamos perto do fim do ciclo?”, questões que
considero impróprias, uma vez que os ciclos não começam nem
terminam. Perguntas melhores podem ser: “O que causou a atual
guinada para cima?”, ou “Quão longe estamos desde o início do
ciclo ascendente?”, ou ainda “Estamos perto do fundo do poço?”
Você até pode perguntar se estamos próximos do final de um ciclo,
desde que você o defina como se estivesse saltando de um pico
para o outro ou correndo de um vale para o seguinte. Contudo, na
ausência de tal definição, os ciclos não têm um começo definido, e
acredito que nunca terminarão.
Ciclos oscilam, como mencionei, ao redor do ponto médio. Este é
geralmente considerado como tendência secular, norma, meio,
média ou “meio termo” (a média depurada de ambos os extremos de
uma série) e, de certo modo, é tido como “correto e apropriado”. Os
extremos do ciclo, por outro lado, são considerados como
aberrações ou excessos a serem excluídos, e geralmente são.
Embora o conjunto de eventos responsável pela oscilação dos ciclos
tenha a tendência de ficar muito tempo acima ou abaixo do ponto
médio, a regra geral é a de que o movimento, por fim, toma o rumo
de volta em direção à média. O movimento de um extremo alto ou
baixo rumo ao meio é frequentemente descrito como “regressão ao
meio”, uma tendência poderosa e muito razoável na maioria das
esferas da vida. Porém, lembrando os estágios do ciclo listados
anteriormente, também pode ser dito que o padrão cíclico
usualmente consiste tanto de um movimento a partir do razoável
ponto médio até um extremo potencialmente imprudente (estágios b,
e, h no gráfico anterior) quanto no sentido oposto, partindo de um
extremo e indo de volta para o ponto médio (a, d, g).
O ponto médio racional geralmente exerce uma espécie de
atração magnética, fazendo com que as coisas responsáveis pela
oscilação promovam um movimento de retorno de um dos extremos
que segue na direção do “normal”. Mas geralmente a permanência
no normal não dura muito tempo, pois aquelas mesmas influências
continuam em vigor e, assim, fazem com que a oscilação a partir de
um extremo ultrapasse o ponto médio, indo em direção ao extremo
oposto.
É importante reconhecer e aceitar a confiabilidade desse padrão.
Os detalhes variam — tempo, duração, velocidade e força das
oscilações e, muito importante, as razões para eles —, e é provável
que estejam por trás do comentário de Twain sobre a história que
não se repete. Já a dinâmica subjacente é geralmente semelhante.
Em particular, isso significa que a oscilação de um ponto alto ou
baixo quase nunca permanece no ponto médio…
independentemente de quão “correto” ou “apropriado” ele pode ser.
A continuação do movimento além do ponto médio e em direção ao
extremo oposto é altamente confiável. Por exemplo, os mercados
raramente passam de “subprecificados” para “precificados
corretamente” e param por aí. Normalmente a melhoria nos
fundamentos e o otimismo crescente, que fazem com que os
mercados se recuperem dos níveis deprimidos, permanecem em
vigor, fazendo com que ultrapassem a condição de “precificados
corretamente” e passem a ser considerados “superfaturados”. Não é
obrigatório que isso aconteça, mas geralmente acontece.
Quanto mais se distanciam do ponto médio, mais os ciclos têm
potencial para causar estragos — ou seja, quanto maiores forem as
aberrações ou excessos. Se a oscilação em direção a um extremo
for mais longe, provavelmente será mais violenta, e mais danos
provavelmente ocorrerão, já que as ações encorajadas pelas
condições do ciclo em um extremo se mostram inadequadas para a
vida em outras partes do ciclo.
Em outras palavras, o potencial de destruição cresce à medida
que o movimento para longe do ponto médio aumenta: ou seja,
conforme as economias e as empresas “vão se dando muito bem”, e
os preços das ações “vão ficando muito altos”. Avanços são
seguidos por meras correções e altos e baixos dos mercados. Mas
booms e bolhas têm como consequência quebras, falências e
pânico.
O que é esse ponto intermediário ao redor do qual as coisas
funcionam? Como eu disse, muitas vezes é um ponto situado em
uma tendência secular. Por exemplo, o Produto Interno Bruto de
uma economia pode apresentar uma taxa de crescimento anual
secular de, digamos, 2% por algumas décadas. Mas o crescimento
será mais rápido em alguns anos e mais lento — até mesmo
negativo — em outros. O desempenho em anos individualmente
considerados é geralmente parte de um ciclo em torno da tendência
secular subjacente.
Ressalte-se que a taxa de crescimento secular também pode estar
sujeita a um ciclo, mas a um ciclo ainda mais longo e mais gradual.
É preciso retroceder ainda mais no tempo para constatá-lo. Por
exemplo, as sociedades tendem a seguir padrões de longo prazo de
ascensão e queda — pense no Império Romano, por exemplo —, e
o curto prazo de que falamos consiste em altos e baixos em volta da
tendência de longo prazo (ver páginas 49–52).
Assim também acontece com os setores de atividade industrial.
Entretanto, como os ciclos de longo prazo ocorrem ao longo de
décadas e séculos, em vez de trimestres e anos — e, portanto,
podem implicar períodos de tempo superiores à vida de qualquer
observador —, eles podem ser difíceis de detectar em tempo real e
dificultam o processo de decisão.
Veja o que escrevi sobre o assunto em meu memorando “The
Long View” (A Visão Longa, em tradução livre, janeiro de 2009):
Em uma antiga história, um grupo de homens cegos, andando
por uma estrada na Índia, se depara com um elefante. Cada
um deles toca uma parte diferente do elefante — o tronco, a
perna, a cauda ou a orelha —, e cada um explica de forma
diferente o que havia encontrado. Nós somos aqueles
homens cegos. Ainda que tenhamos uma boa compreensão
dos eventos que testemunhamos, não dispomos facilmente
de uma visão ampla o bastante para observá-los em conjunto.
Até o momento em que vemos o todo em ação, nosso
conhecimento é limitado às partes que tocamos…
…algumas das lições mais importantes dizem respeito à
necessidade de (a) estudar e lembrar os eventos do passado
e (b) estar consciente da natureza cíclica das coisas. De
perto, o cego pode confundir a perna do elefante com uma
árvore — e o investidor míope pode achar que uma tendência
de alta (ou de baixa) continuará para sempre. Mas, se
recuarmos e considerarmos o longo alcance da história,
devemos ter em mente que o ciclo de longo prazo também se
repete e envolve onde estamos nele.
Este é um bom momento para eu colocar um dos pontos mais
importantes sobre a natureza dos ciclos. A maioria das pessoas
pensa em ciclos em termos das etapas listadas anteriormente e os
reconhece como uma série de eventos. E entendem que tais
eventos seguem um ao outro com regularidade e em uma sequência
usual: movimentos ascendentes são seguidos por movimentos de
contração/recessão, e, por fim, por novos movimentos ascendentes.
Mas isso não é suficiente para que se tenha uma compreensão
completa dos ciclos. Os eventos na vida de um ciclo não devem ser
vistos apenas como cada um sendo seguido pelo próximo, porém —
muito mais importante — como cada um causando o próximo. Por
exemplo:
Quando os fenômenos envolvidos no ciclo se aproximam
de um extremo, esse movimento os energiza, energia
essa que é armazenada. Por fim, seu peso aumentado
torna mais difícil o impulso para se afastar ainda mais do
ponto médio, e atinge um máximo além do qual não há
mais como prosseguir.
O movimento naquela direção é então interrompido, e
quando isso acontece, a gravidade o força a dar marcha a
ré na direção da tendência central ou ponto médio, com a
energia que havia sido acumulada alimentando o empuxe
em sentido contrário.
E como o fenômeno em questão se move do extremo de
volta para o ponto médio, o impulso transmitido faz com
que ele ultrapasse o ponto médio e continue se dirigindo
ao extremo oposto.
Assim, um ciclo no mundo econômico ou de investimento consiste
em uma série de eventos que dão origem a seus sucessores. O
processo descrito nos três pontos citados soa como físico,
governado por forças como gravidade e impulso. Mas como
mencionei, e veremos mais adiante, os desvios mais importantes da
tendência geral — e a variação no timing, velocidade e extensão
desses desvios — são em grande parte produzidos por flutuações
no âmbito da psicologia.
Se você considerar que a psique humana — e não os atributos
físicos — é a fonte de grande parte da energia ou do impulso, esses
três pontos são eficientes ao também explicar as oscilações e
reviravoltas com que os investidores são desafiados a lidar. Nos
capítulos seguintes, alguns dos conteúdos mais importantes
consistem em descrições de maneiras pelas quais os eventos em
cada tipo de ciclo geram seus sucessores.
Diante dessa visão de ciclos como progressões de eventos
causadores, este livro contém diversos relatos detalhados das
progressões que ocorreram no passado. O objetivo de cada
progressão será ilustrar o que causou cada evento na progressão, o
que significou nela e como isso contribuiu para os eventos que se
seguiram. Voltar a relatar as progressões pode parecer algo
repetitivo, e algumas delas, na verdade, serão revisitadas mais de
uma vez (embora com referência a diferentes aspectos).
Esperamos, porém, que tais exemplos do mundo real ajudem os
leitores a alcançar o objetivo de entender os ciclos e a como se
posicionar com relação a eles.
É extremamente importante observar essa relação causal: os ciclos
dos quais estou falando consistem em uma série de eventos que
originam os que se seguem. Mas é igualmente significativo notar
que, não obstante os ciclos ocorram em diversas áreas graças a
esses eventos em série, os desenvolvimentos cíclicos em uma área
também influenciam os ciclos em outras. Desse modo, o ciclo
econômico tem influência sobre o ciclo do lucro. Anúncios
corporativos determinados pelo ciclo de lucro influenciam as atitudes
dos investidores. Estas influenciam os mercados, e a evolução dos
mercados exerce influência sobre o ciclo da disponibilidade de
crédito… que influencia economias, empresas e mercados.
Os eventos cíclicos são influenciados tanto pelos
desenvolvimentos endógenos (incluindo os eventos cíclicos que os
precedem) quanto pelos desenvolvimentos exógenos (eventos que
ocorrem em outras áreas). Muitos destes últimos — mas nem todos
(longe disso) — são parte de outros ciclos. Entender essas
interações causativas não é fácil, mas elas constituem, em grande
parte, a chave para entender e lidar com o ambiente de
investimento.
É preciso entender que, embora eu descreva os ciclos como
separados e discretos, isso não é inteiramente realista. Valendo-me
de uma narrativa simples, descreverei a operação de cada tipo de
ciclo isoladamente. Darei a impressão de que cada ciclo tem uma
vida independente, própria. Também posso dar a impressão de que
o avanço em uma determinada direção de um tipo de ciclo termina
antes do início de uma oscilação correspondente ou resultante em
um ciclo de outro tipo — isto é, que eles operam sequencial e
independentemente. Em outras palavras, tentarei discutir cada tipo
de ciclo isoladamente… embora, na verdade, eles não operem
isoladamente.
Minha descrição pode sugerir que os diferentes ciclos são
independentes uns dos outros e autocentrados. Pode parecer que
algo acontece no ciclo A que afeta o ciclo B, que afeta o ciclo C, que
pode alimentar todo o caminho de volta ao ciclo de influência A. Isso
pode dar a impressão de que o ciclo A fica em estado de espera
após ter influenciado o ciclo B, e enquanto a influência do ciclo B
sobre o ciclo C ocorre. Mas não é assim.
As inter-relações entre os vários ciclos estão longe de serem tão
perfeitas quanto minhas descrições serão. Os vários ciclos
funcionam por conta própria, mas também afetam continuamente
uns aos outros. Tento desemaranhar os vários tópicos em minha
mente e tratá-los separadamente, e é assim que este livro será
organizado. Mas os ciclos bem-comportados e isolados que
descreverei são apenas um conceito analítico. Na vida eles são
realmente um emaranhado de fenômenos inter-relacionados que
não podem ser separados de maneira completa. A afeta B (e C), e B
afeta A (e C), e todos influenciam D, que exerce influência sobre
todos eles. Todos estão envolvidos uns com os outros, mas
devemos pensar neles de uma maneira ordenada, se quisermos
entender os ciclos e seus efeitos.
Finalmente, talvez sob o título de “miscelânea”, quero salientar mais
algumas coisas sobre a natureza dos ciclos que são essenciais para
uma compreensão profunda (começando aqui com algumas
observações do meu memorando de novembro de 2001, “You Can’t
Predict. You Can Prepare.” (“Você não Pode Prever. Você Pode se
Preparar.”, em tradução livre):
Ciclos são inevitáveis. De vez em quando, uma inclinação
para cima ou para baixo se prolonga por muito tempo e/ou
para um longínquo extremo, e as pessoas começam a
dizer “desta vez é diferente”. Elas citam mudanças na
geopolítica, instituições, tecnologia ou no comportamento
e que tornaram obsoletas as “regras antigas”. Tomam
decisões de investimento que extrapolam a tendência
recente. Contudo, geralmente acontece que as regras
antigas ainda se aplicam, e o ciclo continua. No final, o
céu não é o limite, e algumas coisas vão para o chão. Em
vez disso, a maioria dos fenômenos acaba sendo cíclica.
A influência dos ciclos é potencializada pela incapacidade
dos investidores de lembrar o passado. Como diz John
Kenneth Galbraith, a “extrema brevidade da memória
financeira” impede que os participantes do mercado
reconheçam a natureza recorrente desses padrões e,
portanto, sua inevitabilidade:
Quando ocorrerem as mesmas (ou semelhantes)
circunstâncias, às vezes em apenas alguns anos, elas
são saudadas por uma nova geração, muitas vezes
jovem, e sempre supremamente autoconfiante, como
uma descoberta brilhantemente inovadora em um
mundo financeiro e econômico mais amplo. Pode haver
poucos campos do esforço humano em que a história
conta tão pouco quanto no mundo das finanças. A
experiência passada, na medida em que faz parte da
memória, é considerada como o refúgio primitivo
daqueles que não têm a visão necessária para apreciar
as incríveis maravilhas do presente (A Short History of
Financial Euphoria (“Uma Breve História da Euforia
Financeira”, em tradução livre, 1990).
Os ciclos corrigem-se a si mesmos, e sua reversão não
depende necessariamente de eventos exógenos. A razão
pela qual eles se invertem (em vez de durar para sempre)
é que as tendências criam as razões para sua própria
reversão. Assim, gosto de dizer que o sucesso carrega
dentro de si as sementes do fracasso, e este, as sementes
do sucesso.
Através das lentes da percepção humana, ciclos são
frequentemente vistos como menos simétricos do que são.
Flutuações negativas de preço são chamadas de
“volatilidade”, enquanto flutuações de preços positivas são
chamadas de “lucro”. Nos mercados em colapso ocorrem
as chamadas “vendas por pânico”, enquanto nos surtos as
descrições são mais benignas (mas eu acho que eles
podem ser vistos como “comprar por pânico”; veja as
ações de empresas de tecnologia em 1999, por exemplo).
Comentaristas falam sobre “capitulação dos investidores”
na parte inferior dos ciclos de mercado, enquanto eu vejo
a capitulação também no topo, quando investidores antes
prudentes jogam a toalha e compram.
Embora isso possa ser subestimado e negligenciado, de acordo
com minha experiência, os ciclos financeiros geralmente são
simétricos. Todo movimento de ciclo tem um “outro lado”, o que
significa que toda oscilação para cima é invariavelmente seguida de
— ou, dizendo com mais propriedade, leva a — uma oscilação para
baixo, e vice-versa.
Um fenômeno amplamente falado e normalmente compreendido é
o chamado “expansão e contração”, ou seja, um processo cíclico
recorrente de expansão e contração econômica. Trata-se de uma
boa ilustração da simetria do ciclo. A maioria das pessoas entende
que as retrações sucedem as expansões. E alguns poucos
assimilam o fato de que retrações são ocasionadas por expansões,
algo que dá sentido à afirmação de que (a) expansões geralmente
não sejam seguidas por ajustes modestos, graduais e indolores, e
(b), por outro lado, é improvável que haja uma contração se não
houver uma expansão.
Deve-se notar, todavia, que essa simetria só se aplica de maneira
confiável à direção, não necessariamente à extensão, tempo ou
ritmo do movimento. (Esta é a questão que Nick Train levanta —
você o encontrará no próximo capítulo.) Assim, um movimento
ascendente pode ser seguido por um movimento descendente de
maior ou menor magnitude. A inflexão descendente pode ter início
logo após o ápice ser alcançado, ou as coisas podem ficar ali no alto
por um bom tempo antes de a correção começar. E, talvez o mais
importante, pode levar anos para que uma expansão cresça até
alcançar seu ponto mais elevado. Em “compensação”, a contração
que se segue pode parecer um trem de carga em movimento muito
acelerado. Como meu parceiro de longa data Sheldon Stone diz: “O
ar sai da bexiga de gás muito mais rápido do que entrou”.
Vamos voltar ao que Mark Twain supostamente disse: “A história
não se repete, mas rima”. Interiorizar esse conceito é absolutamente
essencial para a compreensão dos ciclos. O que Twain deve ter
querido dizer é que, apesar de os detalhes variarem de um evento
para outro em uma determinada categoria da história (digamos, a
ascensão dos demagogos), os temas e mecanismos subjacentes
são consistentes.
Isso é verdadeiro para os ciclos financeiros e absolutamente
verdadeiro para as crises financeiras. Como se verá mais adiante, a
Crise Financeira Global de 2007/2008 decorreu em grande parte da
emissão de um grande número de hipotecas de alto risco (em
inglês, subprime), e isso se deu graças a um excesso de otimismo,
a uma carência de aversão ao risco e a um mercado de capitais
excessivamente pródigo, situação que levou a um comportamento
não seguro em torno das hipotecas de alto risco (assim chamadas
porque são concedidas a mutuários com baixa qualificação de
crédito). Assim, alguém literal e de mentalidade mais estreita diria:
“Definitivamente, ficarei mais cauteloso na próxima vez em que o
financiamento hipotecário for disponibilizado prontamente para
compradores de imóveis não qualificados”. Mas a esse aspecto da
Crise nunca é necessário recorrer para que as lições da Crise
Financeira Global sejam valiosas. Em vez disso, os temas que
fornecem sinais de alerta em cada expansão/contração são os
gerais: o otimismo excessivo é algo perigoso, a aversão ao risco é
um ingrediente essencial para o mercado ser seguro, e mercados de
capitais excessivamente generosos acabam levando a um
financiamento imprudente e, portanto, a colocar os participantes em
perigo.
Em suma, detalhes não são importantes e podem ser irrelevantes.
Temas, porém, são essenciais e tendem a se repetir. Entender essa
tendência — e ser capaz de identificar as recorrências — é um dos
elementos mais importantes para lidar com os ciclos.
Finalmente, quero trazer a definição de insanidade creditada a
Albert Einstein: “fazer várias e várias vezes a mesma coisa e
esperar resultados diferentes”. É uma insanidade quando as
pessoas investem em coisas muito valorizadas porque, como “todo
mundo sabe”, elas são perfeitas e subprecificadas — pensando que
elas oferecem altos retornos sem risco de perda. Tais crenças têm
perdido seu caráter sagrado depois de cada bolha. Mas muitas
pessoas, por não terem consciência de que bolhas tendem a
estourar, ou por não enxergarem esse risco pela ânsia de
enriquecer rapidamente, embarcam na próxima.
Valores mobiliários e mercados que se beneficiaram de
apreciação fabulosa são muito mais propensos a sucumbir a uma
correção cíclica do que a se valorizar indefinidamente. Experimente
dizer isso ao investidor ansioso que acredita que “desta vez é
diferente”.
A extensão deste capítulo e a grande variedade de tópicos
abordados são indicativos da natureza multifacetada e desafiadora
dos ciclos. Por essa razão, os ciclos devem ser entendidos analítica
e intuitivamente. Tal como se dá com muitos outros aspectos do ato
de investir, aqueles indivíduos que têm a habilidade mais recente,
além das anteriores, irão mais longe. Pode uma abordagem intuitiva
ser ensinada? Sim, até certo ponto, mas mais plenamente para
aqueles que começam com o dom da percepção. Resumindo,
algumas pessoas tendem a “captar” (seja lá o que “captar”
signifique), e outras não.
Cursos em contabilidade, finanças e análise de valores mobiliários
proporcionam ao investidor o conhecimento técnico necessário para
o sucesso, porém, em minha opinião, esses cursos estão longe de
ser suficientes. Neles, inexiste o principal elemento — uma
compreensão dos fenômenos cíclicos e como eles se desenvolvem
conforme estabelecido neste livro. Algumas pistas serão
encontradas em campos recém-estabelecidos de economia
comportamental e finanças comportamentais, aos quais recomendo
sua atenção. A psicologia é um componente essencial dos ciclos,
cuja compreensão é muito importante para os investidores.
As maiores lições sobre ciclos são aprendidas com a
experiência… como no ditado “experiência é o que você ganha
quando não obtém o que deseja”. Hoje sei muito mais sobre isso do
que quando comecei como jovem analista de valores mobiliários do
First National City Bank, 48 anos atrás.
No entanto, como normalmente vemos apenas um ciclo principal
por década, qualquer um que venha a depender apenas da
acumulação de experiência para seu progresso deve se revestir de
muita paciência. Espero que a leitura deste livro aumente sua
compreensão e acelere seu processo educativo.
O antigo historiador grego Tucídides declarou em History of the
Peloponnesian War (“História da Guerra do Peloponeso”, em
tradução livre) que ele ficaria satisfeito “se estas minhas palavras
forem julgadas úteis por aqueles que querem entender claramente
os eventos que aconteceram no passado e quais (sendo a natureza
humana o que é) vão, em um momento ou outro, e da mesma
maneira, ser repetidos no futuro”. Eis uma boa descrição de meu
objetivo aqui.
III
A REGULARIDADE DOS CICLOS
O esforço para explicar a vida por meio do reconhecimento de
padrões — e, assim, chegar a fórmulas vencedoras — é
complicado, em grande parte porque vivemos em um mundo
assediado pela aleatoriedade e em que as pessoas não se
comportam da mesma maneira mesmo quando pretendem. A
percepção de que os eventos passados foram em grande
parte afetados por essas coisas — e, portanto, que os
eventos futuros não são totalmente previsíveis — é
desagradável, pois torna a vida menos sujeita à antecipação,
à criação de regras e à segurança.
N
o outono de 2013, em resposta a algo que escrevi em The
Most Important Thing, recebi um e-mail de Nick Train, da
Lindsell Train, uma empresa financeira com sede em Londres. Nick
discordou do uso que faço da palavra “ciclo” para descrever
fenômenos como os que discuto aqui. Após uma conversa saudável
a respeito, marcamos um almoço, que foi agradável e animado.
Ao abordarmos o assunto, ficou claro que a motivação de Nick
para escrever foi sua convicção de que, para que algo seja descrito
como cíclico, seu tempo e extensão devem ser regulares e,
portanto, previsíveis. Um ciclo de rádio ou onda senoidal, por
exemplo, sobe e desce em um padrão regular e previsível, com a
mesma amplitude, frequência e ponto final de cada vez.
Ciclo, de acordo com o Dictionary.com, em física, pode ser
definido como “uma alteração completa em que um fenômeno atinge
um valor máximo e mínimo, retornando a um valor final igual ao
original”; já em matemática, ciclo é “uma permutação de um
conjunto de elementos que deixa a ordem cíclica original dos
elementos inalterada”. Em outras palavras, esses ciclos científicos e
matemáticos seguem padrões tão regulares que acabam voltando
para onde começaram, e isso acontece porque o tempo e o caminho
das flutuações são sempre os mesmos. Ponto para Nick.
Mas economias, empresas e mercados — e por certo a psicologia
e o comportamento dos investidores — não são regulares nesse
sentido. No almoço, e acho que concordamos, eu disse que as
coisas podem ser cíclicas sem exprimir esse grau de consistência. É
tudo uma questão de sua definição da palavra “ciclo”.
Aqui está parte do que escrevi depois ao Nick:
O que afirmo é que, geralmente, as coisas sobem e descem.
A maioria das coisas naturais tem um ciclo de
nascimento/morte, e a psicologia dos investidores tem um
ciclo muito pronunciado de otimismo crescente (e valorização
de preços) seguido de pessimismo crescente (e queda de
preços). Você pode pensar que isso é simplista e inútil. Mas
um dos principais pontos é que, quando algo sobe, os
investidores têm uma tendência a pensar que nunca cairá (e
vice-versa). Apostar contra essas tendências pode ser muito
lucrativo…
Pouco no mundo — e certamente não no mundo dos
investimentos — é regular o suficiente a tempo de lucrar com
a aplicação de um processo mecanicista. Isso não significa,
porém, que você não pode aproveitar os ciclos de altos e
baixos…
Não acho que as flutuações tenham que terminar voltando
para onde começaram a ser chamadas de ciclo. Muitos ciclos
acabam mais altos do que iniciaram — isto é, são ciclos em
torno de uma tendência de alta secular subjacente —, mas
isso não significa que não sejam cíclicos, ou que não seja
desejável subir o ciclo e evitar o ciclo descendente, ao
contrário de ir do começo ao fim.
Há uma definição de ciclo no Cambridge Dictionary — para uso de
modo geral, não técnico — segundo a qual ciclo é “um grupo de
eventos que acontecem em uma ordem particular, um seguindo o
outro, e que são frequentemente repetidos”. Fico feliz com isso, pois
reflete o sentido em que penso em ciclos e oscilações em meu
mundo.
Embora discordando da objeção de Nick Train de que a
irregularidade dos fenômenos que discuto os desqualifique para que
sejam descritos como cíclicos, há muito a ser entendido sobre sua
irregularidade e o que pode ser aprendido com isso.
Como eu disse no capítulo anterior, o aspecto mais importante a
ser notado aqui é que as coisas que chamo de ciclos não se
originam completamente — ou às vezes de forma alguma — da
ocorrência de processos mecânicos, científicos ou físicos. Eles
seriam muito mais confiáveis e previsíveis se o fizessem, mas muito
menos potencialmente lucrativos. (Isso ocorre porque os maiores
lucros vêm de ver as coisas melhor do que os outros, e se os ciclos
fossem totalmente confiáveis e previsíveis, não haveria
superioridade em percebê-los.) Às vezes há um princípio subjacente
(e às vezes não), mas muita variação é atribuível ao papel dos seres
humanos na criação de ciclos, pois suas tendências induzidas por
emoções e psicologias exercem influência sobre os fenômenos
cíclicos. Chance ou aleatoriedade também desempenham um papel
importante em alguns ciclos, e o comportamento humano contribui
para sua existência. Humanos são uma grande parte da razão pela
qual esses ciclos existem, mas também — junto da aleatoriedade —
por sua inconsistência e, portanto, sua falta de confiabilidade.
Nós humanos temos que viver no mundo real. Conforme descrito
anteriormente, procuramos padrões e regras que nos permitam viver
com mais facilidade e lucratividade. Isso talvez tenha começado
com a experiência inicial do homem com ciclos diários e anuais.
Pode ter sido aprendido da maneira mais difícil ao ver que não era
seguro matar a sede naquele lago bem na hora do dia em que as
leoas e seus filhotes estavam fazendo o mesmo ali. Ou por verificar
que certas culturas se saíam melhor quando plantadas na primavera
do que no outono. Quanto mais absolutas forem as regras, mais
fácil será a vida. Procurar padrões explicativos parece estar
enraizado no cérebro humano.
O esforço para explicar a vida por meio do reconhecimento de
padrões — e, assim, chegar a fórmulas vencedoras — é
complicado, em grande parte porque, como já mencionei, vivemos
em um mundo assediado pela aleatoriedade e em que as pessoas
não se comportam da mesma maneira mesmo quando pretendem.
A percepção de que os eventos passados foram em grande parte
afetados por essas coisas — e, portanto, que os eventos futuros não
são totalmente previsíveis — é desagradável, pois torna a vida
menos sujeita à antecipação, à criação de regras e à segurança.
Assim, as pessoas buscam explicações que tornem os eventos
compreensíveis… muitas vezes além do que é apropriado. Isso é
tão verdadeiro em investir como em outros aspectos da vida.
Encontrei algumas declarações interessantes sobre este assunto
em The Drunkard’s Walk (“O Caminhar do Bêbado”, em tradução
livre), um livro de 2008 no qual Leonard Mlodinow, seu autor e
membro do corpo docente da Caltech, discorre sobre aleatoriedade.
Aqui está a primeira, do prólogo de seu livro:
Nadar contra a corrente da intuição humana é uma tarefa
difícil… A mente humana é construída para identificar em
cada evento uma causa definida, e pode, portanto, ter
dificuldade em aceitar a influência de fatores não relacionados
ou aleatórios. Sendo assim, o primeiro passo é perceber que
sucesso ou fracasso às vezes não surgem nem de grande
habilidade nem de grande competência, mas, como escreveu
o economista Armen Alchian, de “circunstâncias fortuitas”.
Onipresentes em nossa vida cotidiana, os processos
aleatórios são fundamentais por natureza, mas a maioria das
pessoas não os entende ou sequer pensa muito sobre eles.
Mlodinow, em um capítulo em que trata da imprevisibilidade e do
capricho do sucesso na indústria cinematográfica, descreve a
opinião do produtor
William Goldman sobre o assunto:
Goldman não negou que há motivos para o desempenho de
bilheteria de um filme. Mas ele disse que essas razões são
tão complexas e que o caminho para o sucesso na semana
de lançamento é tão vulnerável a influências imprevisíveis e
incontroláveis, que suposições sobre o potencial de um filme
a ser produzido não são muito melhores do que acertar o lado
da moeda em um cara ou coroa.
O autor também discute como elementos aleatórios se aplicam a
um rebatedor de beisebol:
O resultado de qualquer rebatida em particular (isto é, uma
oportunidade de sucesso) depende, é claro, principalmente da
habilidade do jogador. Mas também depende da interação de
muitos outros fatores: sua saúde; o vento, o sol ou as luzes
do estádio; a qualidade dos campos em que joga; as
circunstâncias da partida; se ele adivinha corretamente como
o lançador arremessará; se a coordenação mão-olho funciona
perfeitamente quando ele vira o corpo; e se aquela morena
que ele conheceu no bar o manteve acordado até tarde ou o
cachorro-quente com batatas fritas com alho que ele comeu
no café da manhã azedou seu estômago. Não fossem todos
os fatores imprevisíveis, um jogador ou acertaria um home run
em todas as rebatidas ou não acertaria nenhum.
Sabemos que uma variedade de fatores influencia os resultados
em todos os campos, e que muitos deles são aleatórios ou
imprevisíveis. Isso certamente inclui muitos aspectos em economia
e investimentos. Mesmo que a renda seja estável, a propensão a
consumir de um indivíduo pode ser afetada pelo clima, por uma
guerra ou por qual país vence a Copa do Mundo (e isso, por sua
vez, por uma infeliz “canelada” do defensor). Uma empresa pode
emitir um relatório de lucros favorável, mas se suas ações subirão
ou cairão como resultado, é algo que será influenciado pelo
comportamento de seus concorrentes, se o banco central escolhe
justo aquela semana para um aumento da taxa de juros, e se o
anúncio dos resultados vem em uma semana boa ou ruim no
mercado. Dado esse grau de variabilidade, os ciclos com os quais
estou preocupado certamente não são regulares e não podem ser
reduzidos a regras confiáveis de tomada de decisão.
Posso dar um exemplo relacionado aos títulos de alto grau
especulativo (títulos de elevado retorno e alto risco): algo que me
deixou bastante aborrecido. Em certa ocasião, surgiu a opinião de
que os títulos tendem a se tornar inadimplentes em torno do
segundo aniversário de sua emissão. Se isso fosse verdade, seria
um conhecimento muito útil: para evitar o prejuízo, tudo o que se
teria de fazer seria vender todos os títulos à medida que eles se
aproximassem daquele aniversário e comprar de volta os que
sobreviveram. (Obviamente, essa regra ignora a questão sobre
quanto se receberia por títulos que estão se aproximando daquela
data fatal — já que todos saberiam que isso representa um risco —
e quanto teria que se pagar para recomprar os que sobraram.)
Talvez um padrão de segundo aniversário tenha ocorrido na época
em que a noção se tornou popular. Mas coincidência é muito
diferente de causalidade. Esse fenômeno é confiável? Quais foram
as razões para isso? Eles se repetiriam? Você deve apostar nisso?
Em particular, a história dos títulos de grau especulativo naquela
época provavelmente cobriu um período de apenas uns 20 anos,
fazendo-me pensar se a experiência e o tamanho da amostra eram
suficientes para justificar a confiança nessa observação. Em vez de
rigor intelectual, prefiro pensar que a regra de dois anos se baseava
mais na sede das pessoas por regras simples e úteis e, portanto,
em sua tendência excessiva de extrapolar sem qualquer base real.
Acho que seria melhor reconhecer que os títulos se tornam
inadimplentes em resposta a uma ampla variedade de influências —
como aquelas que contribuem para o sucesso ou o fracasso de um
rebatedor no beisebol — e que a maioria dos defaults não tem
absolutamente nada a ver com o número de anos que se passaram
desde que os títulos foram emitidos. Para inverter a pretensa
observação de Mark Twain, a história pode rimar, mas raramente se
repete exatamente.
Estou absolutamente convencido de que os mercados continuarão a
subir e a cair, e creio que sei (a) por que e (b) o que torna esses
movimentos mais ou menos prestes a acontecer. Contudo tenho
certeza de que nunca saberei quando eles subirão ou descerão, até
onde irão, a rapidez de sua movimentação, quando voltarão para o
ponto médio, ou quão longe vão continuar no lado oposto. Ou seja:
há muito a admitir sobre incerteza.
No entanto, descobri que o pouco que conheço sobre o tempo do
ciclo me dá uma grande vantagem em relação à maioria dos
investidores, que entendem menos ainda os ciclos e dão menor
atenção a eles e suas implicações para a ação apropriada. A
vantagem de que estou falando é provavelmente tudo que qualquer
um pode alcançar, mas é o bastante para mim. Ela tem sido a fonte
de uma vantagem significativa de que meus colegas da Oaktree e
eu desfrutamos nos últimos 22 anos. E é muito do que eu quero
passar neste livro.
IV
O CICLO ECONÔMICO
Em uma economia, o total produzido resulta do número de
horas trabalhadas e de quanto se produz em cada uma
dessas horas. Assim, o crescimento de longo prazo de uma
economia é determinado principalmente por fatores
fundamentais, como a taxa de natalidade e a taxa de ganho
de produtividade (mas também por outras mudanças na
sociedade e no meio ambiente). Tais fatores geralmente
mudam relativamente pouco de ano para ano, e só
gradualmente de década para década. Desse modo, a taxa
média de crescimento é bastante estável durante grandes
períodos de tempo.
Em razão da relativa estabilidade do crescimento secular
subjacente, há a tentação de esperar que o desempenho das
economias seja consistente de ano para ano. Contudo, vários
fatores estão sujeitos à variabilidade, fazendo com que o
crescimento econômico — mesmo seguindo, em média, a
linha de tendência subjacente— também apresente
variabilidade anual.
N
o mundo dos negócios e nos mercados, o ciclo econômico
(que principalmente no passado era também conhecido como
“ciclo de negócios”) constitui boa parte da base de ocorrência de
eventos cíclicos. Quanto mais a economia cresce, mais provável é
que as empresas aumentem seus lucros e os mercados de ações se
expandam. Tocarei brevemente aqui nos fatores que influenciam os
ciclos econômicos. Antes, porém, quero confessar que me
voluntario sempre que discuto economia (ou será isso uma
proclamação orgulhosa?): não sou economista.
Fiz cursos sobre economia como estudante de graduação e pósgraduação. Eu penso em economia. Lido com economia como um
investidor profissional. E me considero em grande parte um “homem
de economia”, que toma a maioria das decisões por razões lógicas
baseadas na relação entre custo e valor, risco e retorno potencial.
Mas meu pensamento sobre economia fundamenta-se amplamente
no senso comum e na experiência, e tenho certeza de que
escreverei aqui coisas das quais muitos economistas discordarão.
(Claro, eles também discordam uns dos outros. O funcionamento da
economia é bastante incerto e impreciso, e, por isso, não à toa ela é
chamada de “a ciência sombria”.)
A principal medida da produção de uma economia é o PIB, o
produto interno bruto, o valor total de todos os bens e serviços
produzidos para venda final em uma economia. Ele quase pode ser
visto como o resultado da multiplicação do número de horas que as
pessoas gastam trabalhando pelo valor da produção em cada hora.
(No início de minha carreira, isso era chamado produto nacional
bruto, mas esse termo saiu de moda. A distinção entre os dois está
em como tratar a produção de fabricantes estrangeiros que operam
em um determinado país: o PIB os inclui na produção daquele país,
enquanto o PNB, não.)
As principais questões em relação à economia com as quais a
maioria das pessoas (e certamente a maioria dos investidores) se
preocupa são se teremos crescimento ou recessão em um
determinado ano, e qual a dimensão de um ou da outra. Ambos são
componentes do que chamo de ciclo econômico de curto prazo.
(Apresentarei outras considerações em breve.)
Nos EUA, quando pensamos sobre o crescimento do PIB em um
determinado ano, é comum começar com uma suposição entre 2%
e 3% ou mais e, em seguida, adicionar ou subtrair conforme as
circunstâncias. Mas o ponto de partida para o crescimento do PIB
de cada ano é invariavelmente positivo. Em 2017, por exemplo,
houve muita discussão sobre a taxa de crescimento do PIB. Os
otimistas pensaram que seria de quase 3%, e os pessimistas
acharam que talvez não alcançasse 2%. Quase todos, porém,
pensaram que seria positivo. Uma recessão é definida oficialmente
quando há crescimento negativo em dois trimestres consecutivos, e
muito poucas pessoas pensavam que haveria decréscimo do PIB —
em 2017 ou logo depois disso.
Tendências Econômicas de Longo Prazo
Muitos investidores preocupam-se com o crescimento econômico
anual: alto ou baixo, positivo ou negativo. Suas preocupações
limitam-se a considerações de curto prazo. Estas são importantes,
mas não são tudo. Em longo prazo, sua importância se esvai, e
considerações a longo prazo tornam-se mais relevantes.
Como mencionei no início, a maioria dos ciclos que atraem a
atenção dos investidores consiste em oscilações em torno de uma
tendência secular ou central. Embora essas oscilações sejam muito
importantes para as empresas e os mercados no curto prazo, as
mudanças em relação à linha de tendência subjacente em si
provarão ter um significado geral muito maior. As oscilações ao
redor da tendência se anularão no longo prazo (reconheça-se:
depois de causar muita exaltação ou angústia em anos individuais),
mas mudanças na tendência subjacente farão a maior diferença em
nossa experiência de longo prazo.
Em janeiro de 2009, escrevi um memorando intitulado “The Long
View” entrado nesse assunto. Vou citá-lo extensivamente a partir
daqui.
Em primeiro lugar, descrevi uma série de “tendências seculares
salutares” que os mercados de valores mobiliários vinham
percorrendo nas décadas anteriores. Vou listá-los a seguir, mas
omitirei as descrições que os acompanharam no memorando:
Ambiente macro
Crescimento corporativo
A mentalidade do empréstimo
Popularização do investimento
Psicologia do investidor
Esses elementos constituíram um forte vento de cauda por
trás da economia e dos mercados nas últimas décadas e
produziram uma tendência de alta secular em longo prazo.
Note-se que, apesar da tendência de alta subjacente, não
houve uma linha reta. Economia e mercados foram pontuados
a cada poucos anos por surtos cíclicos de flutuações de curto
prazo. Ciclos em torno da linha de tendência decorrentes de
altos e baixos frequentes. A maioria era relativamente
pequena e breve, mas nos anos 1970 a estagnação
econômica se instalou, a inflação chegou a 16%, as ações
perderam em média quase metade de seu valor em dois
anos, e uma capa da revista Business Week trombeteava:
“The Death of Equities” (“A Morte do Mercado Acionário”, em
tradução livre, 13 de agosto de 1979). Não, meus quarenta
anos no mercado não foram todos um mar de rosas.
Na economia, desaceleração e prosperidade, recessão e
recuperação alternavam-se de tempos em tempos. Os
mercados também subiram e caíram. Tais flutuações foram
jogadas na conta de ciclos econômicos normais, mas também
de externalidades (como o embargo de petróleo em 1973 e a
crise do mercado emergente em 1998). O índice Standard &
Poor’s 500 teve alguns poucos anos de baixa entre 1975 e
1999, mas em nenhum perdeu mais de 7,5%. No lado
positivo, no entanto, 16 desses 25 anos apresentaram
retornos acima de 15%, e em 7 vezes o ganho anual
ultrapassou 30%.
Nos EUA, a despeito dos altos e baixos, os investidores
lucraram, o investimento passou a ser uma atividade nacional,
e Warren Buffett tornou-se um dos homens mais ricos do país
comprando ações ordinárias e companhias inteiras. Uma séria
tendência geral de alta estava em andamento, atingindo seu
apogeu em 2007…
Até meados de 2007, meus 39 anos de experiência como
gerente de recursos financeiros ficaram limitados à questão
do longo prazo. Talvez o que parecia ser uma tendência de
alta de longo prazo subjacente devesse ter sido visto como a
parte positiva de um ciclo de longo prazo que incorpora
quedas, assim como altas. Somente tomando certa distância
pode-se avaliar as proporções totais.
O principal ponto que quero discutir aqui é minha convicção
de que existem ciclos na tendência de longo prazo, não
apenas ciclos de curto prazo, e que vivemos a fase positiva
de um grande ciclo.
Antes de avançar para uma discussão sobre ciclos econômicos de
curto prazo, preocupação da maioria dos investidores, dedicarei
mais tempo ao longo prazo: os fatores que o modelam e as
perspectivas atuais para ele. Depois disso, discorrerei sobre o ciclo
econômico de curto prazo.
Já mencionei que um dos principais determinantes da produção
econômica de cada ano é o número de horas trabalhadas. Por sua
vez, o fator mais fundamental subjacente ao aumento das horas
trabalhadas é o crescimento populacional. O crescimento da
população significa que há mais pessoas trabalhando a cada ano
para fabricar e vender produtos (e também mais pessoas para
comprar e consumir, incentivando a produção). Mais produção
equivale a mais PIB. Se a população está crescendo, as horas
trabalhadas tendem a aumentar, e o PIB também. Assim,
nascimentos são uma das principais razões para a presunção usual
de que o crescimento econômico será positivo. Por outro lado, se a
população está encolhendo, o crescimento positivo do PIB enfrenta
um fator contrário.
A população não cresce muito de ano para ano. O número de
pessoas em idade fértil não muda muito no curto prazo, nem sua
tendência a ter filhos. Contudo, ao longo de décadas ou mais, elas
se alteram, provocando em longo prazo mudanças na população.
Que fatores ou eventos podem modificar a taxa de natalidade de
uma nação (o número médio de filhos que cada casal tem)?
Regras. Por exemplo, a longeva política de um filho da
China, que foi recentemente revisada.
Guerras, como a 2a Guerra Mundial, durante a qual caiu a
taxa de nascimentos, e que, ao ser encerrada, originou um
movimento oposto, chamado Baby Boom.
Condições econômicas, que, entre outras coisas,
influenciam os sentimentos das pessoas sobre poderem
ter filhos.
Costumes sociais, como a recente tendência de jovens
norte-americanos de retardar a formação de uma família.
As mudanças nas taxas de natalidade geralmente ocorrem ao
longo de grandes períodos de tempo, e quando o fazem, anos se
passam até se refletirem no crescimento do PIB. Vejamos, por
exemplo, a política de filho único da China, que estava em vigor há
muito tempo e, em certo dia de 2015, foi declarada extinta. Com
isso, embora as pessoas que já tinham um filho certamente tenham
ficado ocupadas produzindo outro naquele novo dia, seriam
necessários quase vinte anos para que o segundo filho se tornasse
um trabalhador e pudesse contribuir para a produção econômica da
China. Assim, o resultado final é que as mudanças ano a ano do PIB
provavelmente não serão atribuídas significativamente a mudanças
na taxa de natalidade.
O outro elemento principal na equação do PIB — o valor da
produção ocorrida em cada hora de trabalho — é determinado pela
“produtividade”. Alterações na produtividade são um fator
determinante nas mudanças no crescimento do PIB em termos de
longo prazo. Qualquer que seja a taxa de crescimento populacional,
o PIB crescerá mais rapidamente caso a produtividade aumente, ou
diminuirá se ela estiver em declínio. Matematicamente, olhando a
questão em termos de derivativos, a taxa de crescimento do PIB
acelerará se a taxa de ganho de produtividade aumentar, e
desacelerará se cair.
Tal como se dá com a taxa de natalidade, mudanças na
produtividade acontecem em graus modestos e de modo gradual, e
exigem longos períodos para viger. Elas se originam principalmente
de avanços no processo produtivo. Os primeiros grandes avanços
ocorreram durante a Revolução Industrial, aproximadamente entre
1760 e 1830, quando o trabalho humano foi substituído por
máquinas movidas a vapor e água, e quando grandes fábricas
substituíram o trabalho que era feito com menos eficiência em
pequenas lojas e em casa. O segundo grande ganho ocorreu no
final do século XIX e início do século XX, época na qual a
eletricidade e os automóveis tomaram o lugar de formas mais
antigas e menos eficientes de energia e transporte. A terceira
grande mudança ocorreu na segunda metade do século XX, quando
computadores e outras formas de controle automatizado
começaram a assumir a orientação de máquinas, tarefa que antes
cabia aos seres humanos. E, é claro, a quarta onda está em
andamento agora, na Era da Informação, já que os enormes
progressos na aquisição, armazenamento e aplicação de
informações — e atividades como metadados e inteligência artificial
— estão permitindo realizar tarefas jamais sonhadas no passado.
Convém lembrar que cada uma dessas mudanças ocorreu
gradualmente, ao longo de décadas. Cada uma representou uma
enorme diferença no PIB, mas mesmo assim não houve grandes
acelerações e desacelerações de ano para ano. A taxa de ganho de
produtividade tende a permanecer relativamente estável durante
anos, e certamente os ciclos de curto prazo de recessão e
recuperação econômica não são atribuídos a mudanças nela.
Sem dúvida, as tendências em horas trabalhadas e em produção
por hora se combinam para determinar tendências de longo prazo
na produção nacional. Quais fatores, porém, ocasionam mudanças
naquelas duas tendências? A seguir, uma lista indicativa parcial:
Movimentos demográficos — A migração de milhões de
chineses de fazendas para cidades é um exemplo do que
estou falando aqui. Ao aumentar a disponibilidade de
trabalhadores, essa migração representou um importante
papel no posicionamento da China como um local de
fabricação de baixo custo e está contribuindo para a
expansão da classe consumidora chinesa. Outro exemplo
é a imigração da América Latina para os Estados Unidos.
Neste país, como em outras nações desenvolvidas, a taxa
de natalidade está em declínio, e a imigração contínua
vinda do sul da fronteira — em parte, ilegal — toma o
lugar dos nascimentos na expansão do suprimento de
mão de obra produtiva e do nível de consumo dos EUA.
Elementos determinantes da produção — O número de
horas trabalhadas pode diferir do número de pessoas que
trabalham e, com certeza, do número de interessados em
trabalhar.
“Participação da força de trabalho” significa a
porcentagem de pessoas em idade ativa que
estão empregadas ou procurando trabalho.
O aumento ou diminuição da taxa de desemprego
(a porcentagem de pessoas que participam da
força de trabalho que não têm emprego) se dá em
resposta a mudanças nos gastos de
consumidores e empresas (e, portanto, a
mudanças na demanda por bens e na
necessidade de os trabalhadores produzirem
bens).
O número de horas trabalhadas por cada
indivíduo com um emprego varia conforme as
condições econômicas — as empresas diminuem
os turnos quando a demanda por bens é baixa e
autorizam horas extras quando a demanda é alta
(até que a demanda seja forte o suficiente para
exigir mais contratações ou outro turno).
Aspiração — A motivação do lucro e o desejo de viver
melhor estão entre as forças que levam os trabalhadores
(e, consequentemente, as sociedades) a trabalhar e
produzir mais. Pode ser tentador pensar nessas coisas
como universais, mas elas não são. Por exemplo, a
margem de lucro foi praticamente excluída do sistema
econômico no regime soviético, e a disposição de
trabalhar mais é limitada em outras economias (na
Europa, observei funcionários de bancos locais baterem o
ponto não para provar que haviam trabalhado até às 17h,
como nos EUA, mas, sim, que haviam saído, e portanto
não tinham excedido a jornada semanal de 35 horas).
Educação — A deterioração da educação pública nos
EUA provavelmente implicará negativamente, em algum
momento no futuro, a capacidade dos trabalhadores de
contribuir para a economia, bem como em sua condição
de obter rendas substanciais com as quais consumir.
Essas tendências negativas tendem a contrabalançar os
efeitos positivos da entrada de imigrantes.
Tecnologia — A inovação, que traz consigo novas
empresas, também provoca a extinção de outras mais
antigas. Nesse processo, empregos são criados, e outros,
eliminados. Em suma, isso se constitui em um
hiperexemplo da natureza darwiniana da evolução
econômica: gera vencedores e perdedores. Novas
tecnologias ultrapassam o esforço humano, assim como
as tecnologias antigas. Mas não são, de forma alguma,
“seguras”, pois também podem ser, como se diz hoje em
dia, descontinuadas. A tecnologia simboliza o padrão de
ascensão e queda, vida e morte — e renascimento.
Automação — A substituição do trabalho humano por
máquinas é um elemento que desperta particular
interesse. Por um lado, a automação pode ser vista como
fator positivo com relação ao ciclo econômico, uma vez
que aumenta a produtividade ou a quantidade de
produção por hora de trabalho. A mecanização da
agricultura, por exemplo, permitiu que muito menos
agricultores produzissem muito mais alimentos a um custo
muito menor. Mas, por outro lado, a automação diminui as
horas de trabalho destinadas à produção. Fábricas que há
30 anos poderiam ter 100 operários são hoje operadas por
poucos trabalhadores. Assim, o efeito líquido da
automação sobre o PIB pode ser neutro ou positivo.
Entretanto, diante de sua capacidade de eliminar
empregos, a automação pode ter o efeito de reduzir o
emprego e, portanto, a renda e, em decorrência, o
consumo.
Globalização — A integração das nações na economia
mundial pode aumentar a produção econômica do planeta,
em parte devido aos benefícios da especialização, ou
talvez não, deixando-a em um exercício de soma zero (ou
soma negativa). Mas percebe-se com nitidez que a
globalização pode ter efeitos de caráter diferencial nas
economias de cada nação (e gerar vencedores e
perdedores dentro de cada uma). O aumento maciço do
número de operários de fábrica descrito antes certamente
acelerou o crescimento econômico da China nos últimos
30 anos ao possibilitar a esse país se tornar um
importante exportador mundial. No entanto, essa mesma
tendência fez com que as nações desenvolvidas
adquirissem da China muitos bens que poderiam ter
produzido por conta própria, reduzindo assim seu próprio
PIB. Os alguns milhões de empregos da indústria
manufatureira norte-americana que se estima terem sido
perdidos para a China desde 2000 certamente fizeram
com que o crescimento econômico dos EUA fosse mais
baixo do que teria sido, embora, para estimar o impacto
total na economia dos EUA, se deva levar em conta o
benefício de importar produtos chineses baratos.
Os EUA foram abençoados com uma infraestrutura intacta vinda da
2a Guerra Mundial, e ela se beneficiou enormemente do Baby Boom
nos nascimentos do pós-guerra, gerando um aumento substancial
no crescimento econômico. Os produtos norte-americanos eram, em
geral, os melhores do mundo, e as corporações norte-americanas,
um grande sucesso. No mundo ainda a ser globalizado, os
trabalhadores norte-americanos podiam continuar sendo os mais
bem pagos, ao abrigo da concorrência de bens produzidos de forma
mais barata em outros lugares. O aprimoramento das técnicas de
gerenciamento e o rápido aumento da produtividade colaboraram
para isso. Assim, o crescimento econômico secular nos EUA foi
rápido, contribuindo para a demanda por consumo, criando desse
modo um círculo virtuoso do qual muitos se beneficiaram. A
continuidade disso, porém, não era algo com que se poderia contar.
Mais recentemente, o crescimento econômico parece ter
diminuído nos EUA (assim como em outros lugares). A pergunta é:
será esta uma mudança cíclica de curto prazo em relação à
tendência subjacente de longo prazo, ou uma mudança na própria
tendência de longo prazo? Muitos anos se passarão até que
saibamos a resposta. Mas surgiu uma escola de pensamento que
admite uma “estagnação secular” — isto é, um retardamento
fundamental da tendência de longo prazo.
Os avanços na população e na produtividade declinaram nos
EUA, tal como em outros países desenvolvidos. Combinados, esses
dois fatores sugerem que o PIB crescerá mais lentamente nos EUA
nos próximos anos do que nos anos posteriores à 2a Guerra
Mundial. Postula-se que os principais ganhos de produtividade do
passado recente não serão replicados no futuro. Além disso, a
disponibilidade de mão de obra muito mais barata em outros países
torna improvável que os EUA possam produzir a um custo
competitivo os bens manufaturados de que necessita. São evidentes
as implicações negativas disso em termos de possibilidades de
emprego entre norte-americanos menos qualificados e com menos
escolaridade, desigualdade de renda e padrões de vida em relação
às pessoas em outros países. Essas questões, evidentemente,
desempenharam um papel óbvio na eleição presidencial de 2016.
Mudanças no crescimento populacional e da produtividade podem
exigir décadas para se tornarem manifestas, mas claramente podem
afetar as taxas de crescimento econômico dos países. No século
XX, os EUA ultrapassaram a Europa como potência econômica. O
Japão parecia ter chegado aos anos 1970 e 1980 ameaçando
dominar o mundo, mas esse ímpeto refluiu no final dos anos 1980,
quando passou a ter níveis de crescimento insignificantes. Os
mercados emergentes — e especialmente a China — foram o local
de rápido crescimento nas últimas décadas, e embora seu
crescimento seja mais lento no momento, eles podem superar o
mundo desenvolvido nas próximas dezenas de anos. A Índia possui
recursos humanos que podem torná-la uma economia de
crescimento rápido, se puder aumentar sua eficiência e reduzir a
corrupção. E nações fronteiriças como Nigéria e Bangladesh estão
atrás das nações emergentes, esperando chegar sua vez como
países de crescimento rápido.
As sociedades se expandem e declinam, e aceleram e
desaceleram em termos de crescimento econômico umas em
relação às outras. Essa tendência subjacente no crescimento segue
claramente um ciclo de longo prazo, não obstante os altos e baixos
de curto prazo em torno dele sejam mais discerníveis, e portanto
mais facilmente discutidos.
Ciclos Econômicos de Curto Prazo
Como mencionei anteriormente, quem elabora previsões
econômicas e quem as utiliza estão geralmente preocupados com a
taxa de crescimento do PIB nos próximos um ou dois anos. Em
outras palavras, a preocupação deles é com a taxa de crescimento
relativa à oscilação ascendente do ciclo econômico de curto prazo e
sua duração, bem como se ela ficará negativa por dois trimestres
consecutivos, configurando, assim, uma recessão. Essas coisas
representam flutuações de curto prazo em torno da tendência de
crescimento de longo prazo, como ilustrado algumas páginas atrás.
Como os fatores que produzem a tendência de longo prazo pouco
se alteram de trimestre para trimestre e de ano para ano, por que as
mudanças de curto prazo são motivo de grande preocupação? Na
verdade, por que elas deveriam ocorrer? Por que não há apenas
crescimento na taxa média — digamos, 2% — a cada ano?
Tais questões oferecem uma boa oportunidade para apresentar
alguns dos protagonistas deste livro: processos de psicologia,
emoção e tomada de decisão. Nascimentos e produtividade
geralmente tendem a ser vistos como variáveis independentes e
quase mecânicas. Nascimentos resultam da procriação, cujas
razões e níveis em que ocorrem normalmente são bastante
constantes ao longo do tempo. Da mesma forma, a taxa de
mudança no índice de produtividade — na produção por unidade de
trabalho — é vista como sendo prescrita principalmente pelos
avanços tecnológicos e por sua disseminação. Dito de outra forma,
ainda que as economias sejam compostas de pessoas, o nível de
crescimento econômico não é considerado um reflexo relevante dos
altos e baixos dessas pessoas.
Mas, na verdade, é. Embora a tendência de longo prazo
estabeleça a taxa de crescimento econômico potencial, o nível real
do PIB de cada ano variará em relação àquilo que a tendência
determina… em grande parte em virtude do envolvimento das
pessoas.
A taxa de natalidade pode determinar as tendências de longo
prazo no número de horas trabalhadas, mas outros fatores podem
introduzir variações no curto prazo. A vontade de trabalhar não é
constante. Pode haver ocasiões em que as pessoas se sintam
desestimuladas pelas condições reinantes a buscar um lugar na
força de trabalho, como mencionado anteriormente, e também
quando eventos mundiais alteram o padrão de consumo.
O exemplo mais óbvio é a capacidade de provocar medo que
certos acontecimentos de ordem mundial têm, algo que desencoraja
a atividade econômica. A crise das hipotecas de alto risco
(subprime) e o colapso das instituições financeiras, cujo ápice se
deu com a falência do Lehman Brothers em setembro de 2008,
desencorajaram os consumidores a comprar, os investidores a
fornecer capital e as empresas a construir fábricas e expandir sua
força de trabalho. Tais desarranjos ocorreram até mesmo entre
pessoas que não perderam empregos, sofreram execuções
hipotecárias ou viram seus portfólios perderem valor. Esses eventos
afetaram rapidamente a economia global, e o resultado foi uma
grave recessão, que durou de dezembro de 2007 a junho de 2009.
Se o número de trabalhadores empregados e o montante de sua
remuneração forem relativamente constantes, podemos esperar a
mesma constância da quantia gasta em consumo. Mas não é isso
que ocorre. Os gastos flutuam mais do que o emprego e os ganhos
por causa da variação de algo chamado “propensão marginal a
consumir”: de cada unidade monetária adicional ganha, ela
determina a porcentagem que irá para o consumo. Como essa
propensão é variável no curto prazo, o consumo pode variar
independentemente da renda.
As pessoas podem optar por gastar em consumo uma
porcentagem maior do que ganham porque:
As manchetes diárias são favoráveis.
Elas acreditam que os resultados das eleições são
presságio de uma economia mais forte, renda mais alta ou
impostos mais baixos.
O acesso ao crédito para o consumidor ficou mais fácil.
A valorização de seu patrimônio faz com que se sintam
em melhor condição financeira.
O time delas venceu a final do campeonato.
O quarto desses fatores — o chamado “efeito riqueza” — é
particularmente digno de nota. É improvável que os proprietários de
ativos financeiros ou imobiliários (a) financiem o consumo vendendo
suas ações ou residências e (b) reconheçam que os ganhos nos
preços dos ativos podem ser efêmeros, e portanto não são um bom
motivo para alterar o padrão de gastos. No entanto, a valorização
dos ativos tende a levá-los a gastar mais. Esse fenômeno
demonstra a contribuição da psicologia no comportamento, e do
comportamento na variação econômica de curto prazo.
Nesse sentido, é particularmente importante observar até que
ponto as expectativas econômicas podem ser uma espécie de
profecias autorrealizáveis. Se as pessoas (e empresas) acreditarem
que o futuro será bom, gastarão mais e investirão mais… e o futuro
será bom. O oposto também é verdadeiro. Acredito que a maioria
das empresas tenha concluído que a Crise de 2008 não seria
seguida por uma recuperação em forma de V, como fora a regra nas
últimas recessões. Assim, elas se recusaram a expandir fábricas ou
forças de trabalho, e a recuperação resultante foi modesta e gradual
nos EUA (e ainda mais anêmica em outros lugares).
Outra razão para a variação de curto prazo diz respeito aos
estoques. As empresas podem superestimar a demanda por seus
produtos em um determinado período e, dessa maneira, aumentar a
produção acima daquilo que são capazes de vender. Ou podem
manter a produção constante, mas encontram lá na frente uma
demanda surpreendentemente fraca. Em ambos os casos, mais
bens serão produzidos do que vendidos. O excesso será adicionado
aos estoques. Isso, por sua vez, provavelmente fará com que a
produção em períodos subsequentes seja ajustada para baixo até
que os estoques atinjam os níveis desejados. Dessa forma, adições
e reduções nos estoques frequentemente levam a altos e baixos de
curto prazo na produção econômica.
Esses são apenas alguns exemplos dos fatores que podem levar
a produção de uma economia a variar em um dado trimestre ou ano
em relação ao crescimento do produto potencial que a taxa de
natalidade e os ganhos de produtividade podem sugerir. Tais fatores
não são “mecânicos” ou confiáveis por natureza. Muitos deles
derivam do comportamento humano, portanto são incertos e
imprevisíveis.
Isso me leva a dizer algo mais sobre previsões econômicas. Muitos
investidores baseiam suas ações em previsões que eles mesmos
fazem ou obtêm de economistas, bancos ou da mídia. E digo mais:
duvido que muitas dessas previsões contenham informações que
possam agregar valor e levar ao sucesso do investimento. (Para
uma discussão mais extensa sobre “o que não sabemos”, ver o
Capítulo 14 de The Most Important Thing.)
Eis como vejo essa questão:
Ao investir, é fácil obter um desempenho igual ao do
investidor médio ou uma referência de mercado.
Como é fácil estar na média, o sucesso real do
investimento deve consistir em superar os demais
investidores e as médias. Ter êxito ao investir é, em
grande parte, um conceito relativo, medido com base no
desempenho relativo.
Simplesmente estar certo sobre um evento vindouro não é
suficiente para garantir um desempenho relativo superior
se todos tiverem a mesma opinião e, como resultado,
todos estão igualmente certos. Assim, para obter sucesso
não basta estar certo, mas, sim, estar mais certo do que
os outros.
De modo similar, ninguém precisa estar certo para ter
sucesso: basta estar menos errado do que os outros.
O sucesso não vem de uma previsão correta, mas de uma
previsão superior. Essas previsões podem ser obtidas?
Em sua maioria, as previsões econômicas decorrem de
extrapolações da situação corrente e tendências de longo prazo. E
como a economia geralmente não se afasta muito desses níveis e
tendências, a maioria das previsões assim elaboradas está correta.
Porém essas previsões provavelmente serão compartilhadas, já
estando refletidas nos preços de mercado dos ativos, e, portanto,
não são geradoras de desempenho superior, ainda que sejam
confirmadas. Veja como se expressou Milton Frieldman, economista
ganhador do Prêmio Nobel:
Todas essas pessoas veem os mesmos dados, leem o
mesmo material e passam o tempo tentando adivinhar o que
o outro vai dizer. [As previsões deles] sempre estarão
razoavelmente certas — e quase nunca serão de muita
utilidade.
Previsões potencialmente valiosas são aquelas que indicam
corretamente o desvio das tendências de longo prazo e dos níveis
recentes. Caso alguém faça uma previsão em não conformidade
com uma extrapolação, e ela se revele correta, o resultado
provavelmente pegará de surpresa os outros participantes do
mercado. Em decorrência, todos se esforçam para ajustar seus
acervos, mas o ganho provavelmente será daqueles que previram
acertadamente. Há apenas um problema: uma vez que grandes
desvios da tendência (a) ocorrem com pouca frequência e (b) são
difíceis de prever certeiramente, a maioria das previsões de não
extrapolação não convencionais é incorreta, e qualquer pessoa que
invista com base nelas costuma ter uma performance abaixo da
média.
Então, eis as possibilidades que vejo em relação às previsões
econômicas:
A maioria das previsões econômicas é apenas
extrapolação. Extrapolações são geralmente corretas, mas
não valiosas.
Previsões não convencionais de desvio significativo da
tendência seriam muito valiosas se estivessem corretas,
mas geralmente não estão. Assim, a maioria das
previsões de desvio da tendência é incorreta, e também
não é valiosa.
Algumas previsões de desvios significativos revelam-se
corretas e valiosas — e seus autores são valorizados por
sua perspicácia —, mas é difícil saber com antecedência
quais serão as mais certeiras. Como a média geral de tiros
na mosca em relação a elas é baixa, as previsões não
convencionais, em última análise, não podem ser
consideradas valiosas. Há meteorologistas que ficaram
famosos por uma única chamada correta dramática, mas a
maioria de suas previsões não valeu a pena seguir.
Tomadas em conjunto, essas três conclusões sobre previsão
econômica não são muito animadoras. Desse modo, não
surpreende que John Kenneth Galbraith tenha dito que “Temos duas
classes de pessoas que fazem previsões: aquelas que não sabem,
e aquelas que não sabem que não sabem”.
É difícil prever mudanças seculares nos ciclos econômicos de
longo prazo, bem como avaliar com exatidão as previsões de tais
mudanças. Os altos e baixos dos ciclos econômicos de curto prazo
também não são nada fáceis para qualquer pessoa prever
consistentemente melhor que outros. Agir com base em previsões
econômicas é tentador, especialmente porque a recompensa por
aquelas que estejam corretas teoricamente poderia ser alta. Mas a
dificuldade de poder fazê-lo de forma correta e consistente não deve
ser subestimada.
A seguir, o que eu acredito ser o resultado final dos ciclos
econômicos:
Em uma economia, o total produzido resulta do número de
horas trabalhadas e de quanto se produz em cada uma
dessas horas. Assim, o crescimento de longo prazo de
uma economia é determinado principalmente por fatores
fundamentais, como a taxa de natalidade e a taxa de
ganho de produtividade (mas também por outras
mudanças na sociedade e no meio ambiente). Tais fatores
geralmente mudam relativamente pouco de ano para ano,
e só gradualmente de década para década. Desse modo,
a taxa média de crescimento é bastante estável durante
grandes períodos de tempo. Apenas nos períodos de
tempo ainda mais longos a taxa de crescimento secular de
uma economia acelera ou desacelera significativamente. E
isso acontece.
Em razão da relativa estabilidade do crescimento secular
subjacente, há a tentação de esperar que o desempenho
das economias seja consistente de ano para ano. Contudo
vários fatores estão sujeitos à variabilidade, fazendo com
que o crescimento econômico — mesmo seguindo, em
média, a linha de tendência subjacente — também
apresente variabilidade anual. Esses fatores talvez
possam ser vistos da seguinte forma:
Endógenos — O desempenho econômico anual
pode ser influenciado pela variação nas decisões
tomadas pelas unidades econômicas: para os
consumidores gastarem ou pouparem, por
exemplo, ou para as empresas expandirem ou
contratarem, para aumentar os estoques
(mediante aumento de produção) ou diminuir os
estoques (reduzindo a produção em relação à que
poderia ter sido sob outras circunstâncias). Não é
incomum que essas decisões sejam influenciadas
pelo estado de espírito dos atores econômicos,
como consumidores ou gerentes de empresas.
Exógenos — O desempenho anual também pode
ser influenciado por (a) eventos provocados pelo
homem e que não são estritamente econômicos,
como a eclosão de guerras; decisões do governo
que alteram as taxas de impostos ou para ajustar
as barreiras comerciais; ou mudanças causadas
por cartéis no preço de commodities; ou (b)
eventos naturais, que ocorrem sem o
envolvimento de pessoas, como secas, furacões e
terremotos.
O crescimento econômico de longo prazo é estável por
longos períodos de tempo, mas sujeito a mudanças de
acordo com ciclos de longo prazo.
O crescimento econômico de curto prazo segue, em
média, a tendência de longo prazo, mas oscila em torno
da tendência geral de ano para ano.
As pessoas se esforçam para prever a variação anual
como fonte de lucro potencial de investimento. E estão
perto da verdade na maior parte do tempo. Poucas entre
elas, entretanto, fazem isso corretamente e de forma
consistente, poucas fazem isso muito melhor do que todos
os demais, e poucos preveem corretamente os principais
desvios da tendência.
Eu sempre acho — e milagrosamente acontece — que quando
estou prestes a concluir algo que estou escrevendo, o exemplo
perfeito aparece na vida real ou em algo que leio. Assim, quando
estava completando o primeiro rascunho deste capítulo, em 23 de
junho de 2016, surgiu a notícia de que a maioria dos eleitores no
Reino Unido tinha escolhido deixar a União Europeia.
Essa decisão foi, de um modo geral, inesperada: a libra esterlina e
o mercado acionário de Londres haviam se apreciado nos dias que
antecederam a votação, e nas casas de apostas de Londres as
chances eram as de que o Brexit fosse rejeitado. Foi demais da
conta prever isso.
O Brexit pode ter ramificações significativas — econômicas,
sociais e políticas — para o Reino Unido e a Europa, mas também
para o resto do mundo. O impacto negativo na psique dos
consumidores, investidores ou empresários pode causar um
abrandamento do crescimento econômico em curto prazo. As
barreiras comerciais podem ser aumentadas, e a eficiência global,
reduzida.
Além disso, há uma chance de que esse evento (e outros, como a
possível saída da Escócia e da Irlanda do Norte do Reino Unido)
altere o crescimento de longo prazo para as nações diretamente
envolvidas e, possivelmente, para outras. Daqui a 50 anos, o Brexit
pode ser citado como responsável pela mudança da trajetória de
crescimento de grande parte da economia mundial e, portanto, de
toda ela, e como tendo contribuído para um redirecionamento do
ciclo de longo prazo.
Há, por certo, uma boa chance de que o ambiente econômico seja
diferente nos próximos anos em relação ao que teria sido se o Brexit
tivesse sido rejeitado — ou seja, que esse evento cause uma
reviravolta no ciclo econômico de longo prazo da Grã-Bretanha. Nós
simplesmente não podemos ter certeza de como, até que ponto, ou
quais serão os efeitos indiretos em outras economias.
V
ENVOLVIMENTO DO GOVERNO COM O CICLO ECONÔMICO
A ciclicidade econômica extrema é considerada indesejável.
Força em excesso pode desencadear movimentos
inflacionários e aquecer de tal forma a economia que uma
recessão se torna inevitável. Demasiada fraqueza, por outro
lado, pode fazer com que os lucros das empresas caiam, e
isso pode custar o emprego das pessoas. Assim, faz parte do
trabalho dos bancos centrais e funcionários do Tesouro
gerenciar os ciclos.
Uma vez que os altos e baixos dos ciclos podem ser
excessivos, as ferramentas para lidar com eles são
contracíclicas e implementadas com um ciclo próprio —
idealmente inverso ao próprio ciclo econômico. No entanto,
como tudo o mais que envolve ciclos, gerenciá-los está longe
de ser fácil. Não fosse assim, não veríamos os extremos que
realizamos.
N
a maior parte do mundo, capitalismo e livre mercado são
aceitos hoje como sendo o melhor sistema para alocar
recursos econômicos e estimular a economia. Nações tentaram
outros sistemas, como o socialismo e o comunismo, mas em muitos
casos mudaram ou adotaram aspectos do livre mercado.
Apesar da ampla aceitação do sistema de livre mercado, essa
liberdade não é absoluta. O envolvimento do governo assume
muitas formas, desde formular e aplicar leis e regulamentos até
participar diretamente na economia por meio de empresas e
agências regulatórias. Talvez a forma mais importante de
envolvimento do governo, todavia, venha das tentativas dos bancos
centrais e dos Tesouros Nacionais de controlar e afetar os altos e
baixos dos ciclos econômicos.
Bancos Centrais
Os bancos centrais, como o Federal Reserve Bank, dos EUA,
ganharam grande poder e responsabilidade ao longo do tempo. No
passado, seu papel primário era emitir moeda em troca de ouro ou
prata, mas hoje os bancos centrais se preocupam principalmente
com o gerenciamento dos ciclos econômicos.
No início, muitos bancos centrais emitiam divisas. Conforme foi
passando o tempo, eles assumiram a responsabilidade pelos ciclos,
e sua principal preocupação passou a ser a inflação. Em particular,
o mundo passou por períodos de hiperinflação, com os índices de
preços atingindo a casa de milhares e milhares por cento, como foi
visto na Alemanha durante a República de Weimar após a 1a Guerra
Mundial. Assim, os bancos centrais voltaram-se para a
administração da inflação. O objetivo não era eliminá-la — já que ela
é aceita como (a) tendo uma variedade de aspectos salutares e (b)
ser inevitável —, mas controlá-la.
As causas da inflação estão envoltas em certo mistério e, como
muitos outros processos descritos aqui, não são confiáveis, e são
esporádicas. Às vezes um dado conjunto de circunstâncias dará
origem à inflação e, em outras ocasiões, as mesmas circunstâncias
levarão a mais ou menos inflação, ou a nenhuma. Mas, em geral,
ela resulta de um forte movimento ascendente do ciclo econômico.
Quando a procura por bens cresce em relação à oferta, há
a chamada inflação “de demanda”.
Quando os insumos para a produção, como mão de obra
e matérias-primas, aumentam de preço, pode haver
inflação “de custo”.
E quando a moeda de um país importador cai em relação
à de um país exportador, o custo dos bens do exportador
pode aumentar no país importador.
O custo das mercadorias pode se elevar por qualquer um desses
motivos. Isso é inflação. Mas, como acabei de dizer, às vezes
aqueles eventos podem ocorrer sem serem acompanhados por uma
aceleração da inflação. E às vezes ela pode aumentar sem que
essas coisas estejam presentes. Nisso tudo há um grande
componente psicológico atuando.
Como a inflação resulta de quão forte está a economia, os
esforços dos bancos centrais para controlá-la significam tentar
diminuir um pouco a pressão sobre a economia. Eles podem reduzir
a oferta monetária, aumentar as taxas de juros e vender títulos da
dívida pública. Quando o setor privado adquire títulos do banco
central, dinheiro é retirado de circulação, e isso tende a reduzir a
demanda por bens, e portanto desestimula a inflação. Bancos
centrais que se dedicam fortemente a manter a inflação sob controle
são chamados de “falcões”. Eles tendem a implementar as medidas
listadas mais cedo e em maior extensão.
Os bancos centrais podem cumprir a meta de manter a inflação
sob controle, mas o efeito colateral dessas ações é, claro, o de
restringir o crescimento da economia, com efeitos que podem ser
inferiores do que benéficos.
A questão ganha contornos complicados pelo fato de que, nas
últimas décadas, muitos bancos centrais receberam uma segunda
responsabilidade. Além do controle da inflação, espera-se que eles
estimulem o nível de emprego, e, evidentemente, há mais emprego
quando a economia está crescendo. Com essa finalidade, os
bancos centrais adotam ações estimulantes como aumentar a oferta
monetária, diminuir as taxas de juros e injetar liquidez na economia
comprando títulos — como no recente programa de “flexibilização
quantitativa”. Os bancos centrais que se concentram fortemente na
criação de empregos e colocam essa política em prática são
chamadas de “pombas”.
O resultado é que muitos dos presidentes dos bancos centrais
acumulam dois empregos: um deles visa conter a inflação, o que
exige limitar o crescimento da economia; já o outro objetiva apoiar o
emprego, o que requer estimular o crescimento econômico. Em
outras palavras, suas responsabilidades duplas opõem-se umas às
outras, e, assim, seu trabalho exige um delicado ato de equilíbrio.
Nós discutimos o fato de que a economia é cíclica, crescendo
bastante em algumas vezes e pouco (ou se retraindo) em outras.
Um crescimento econômico tende a estimular o emprego, mas pode
fazer com que a inflação se acelere. Por outro lado, em tempos de
estagnação ou contração, a inflação é inibida, mas o nível de
emprego pode declinar. Assim, a função do banco central é atuar de
forma contracíclica: limitar a extensão dos ciclos, desacelerar a
economia em tempos de prosperidade a fim de manter a inflação
sob controle, e estimular a economia durante as desacelerações,
para apoiar o emprego.
Diga-se, porém, que assim como a percepção do investidor sobre
os ciclos é limitada e incerta, o mesmo ocorre com o banco central.
Suas duas tarefas — estimular a economia e restringi-la —
obviamente não podem ser realizadas de uma só vez. É hora de
estímulo ou restrição? E quanto disso, seja lá qual for a opção? Se
as taxas de juros estão baixas (como estiveram desde a Crise
Financeira Global, a fim de estimular a economia), mas o
crescimento econômico é tímido (também como tem sido), as taxas
podem ser aumentadas, para evitar uma elevação da inflação sem
asfixiar o crescimento morno da economia? Se os ciclos são
desafiadores para que os investidores os entendam e prevejam, não
são mais fáceis de serem administrados pelos bancos centrais.
Governos
Os governos têm um rol de responsabilidades maior do que os
banqueiros dos bancos centrais, das quais apenas uma pequena
parte está relacionada aos assuntos econômicos. Tal como os
bancos centrais, eles também são responsáveis por estimular a
economia quando apropriado, embora não diretamente com o
controle da inflação. Em sua função econômica, os Tesouros
Nacionais também estão preocupados em regular o ciclo: nem muito
rápido nem muito lento.
As principais ferramentas dos governos para administrar o ciclo
econômico são as fiscais, que se ocupam com a questão dos
impostos e gastos. Assim, quando os governos querem estimular as
economias de seus países, podem cortar impostos, aumentar os
gastos do governo e injetar dinheiro na economia por outros meios,
como a recente liberação dos lucros do FGTS, no Brasil. Por outro
lado, quando consideram que as economias estão crescendo tão
rapidamente a ponto de estarem sob risco de superaquecimento —
estabelecendo o cenário para uma desaceleração resultante —, os
governos podem aumentar impostos ou cortar gastos, reduzindo a
demanda em suas economias, com isso diminuindo o vigor da
atividade econômica.
O tópico final sob este título diz respeito aos deficits nacionais. No
passado distante, a maioria dos governos operava com orçamentos
equilibrados. Em suma, não podiam gastar mais do que
arrecadavam por intermédio da tributação (ou conquistas). Mas
então surgiu o conceito de dívida nacional, e a capacidade de
contrair dívida introduziu o potencial de ocorrerem deficits, isto é, os
governos gastarem mais do que arrecadam.
Em minha juventude, me parece, havia um debate ativo sobre a
pertinência de os países terem ou não dívidas nacionais, mas já não
se encontra muita resistência a respeito desse assunto. É
geralmente aceito que os países podem dever dinheiro, não
obstante de tempos em tempos surjam dúvidas sobre quanta dívida
é prudente. A resposta mais usual seria “não muito mais do que já
temos agora”.
A teoria econômica proposta por John Maynard Keynes na década
de 1930 enfatizava fortemente o papel dos governos na questão dos
ciclos. Na economia keynesiana, o ponto-chave está no papel da
demanda agregada na determinação do nível do PIB, em contraste
com abordagens anteriores cujo foco estava na oferta de bens. Para
Keynes, os governos devem gerenciar o ciclo econômico atuando
sobre a demanda. Isso, por sua vez, poderia ser alcançado pela
utilização de ferramentas fiscais, incluindo deficits.
Keynes propunha que os governos ajudassem uma economia
fraca estimulando a demanda por deficits. Quando as despesas de
um governo — seus gastos — excedem sua renda, principalmente a
decorrente de impostos, há injeção de recursos monetários na
economia. Isso incentiva o consumo e o investimento. Essa
característica dos deficits levou Keynes a considerá-los úteis para
lidar com uma economia fraca.
Por outro lado, quando as economias “iam bem, obrigado”,
Keynes afirmava que os governos devem ter superavits, gastando
menos do que recebem. Isso retira moeda da economia,
desestimulando gastos e investimentos. Excedentes de receita são
contracionários e, portanto, uma resposta apropriada aos booms. No
entanto, o uso de excedentes para esfriar uma economia próspera é
raro nos dias de hoje. Ninguém quer ir para casa quando a festa
está no auge, e gastar menos do que o orçamento atrai menos
votos do que programas de gastos generosos. Assim, superavits
tornaram-se tão raros quanto máquinas de escrever.
Como já mencionado, a ciclicidade econômica extrema é
considerada indesejável. Força em excesso pode desencadear
movimentos inflacionários e aquecer de tal forma a economia que
uma recessão se torna inevitável. Demasiada fraqueza, por outro
lado, pode fazer com que os lucros das empresas caiam, e isso
pode custar o emprego das pessoas.
Assim, faz parte do trabalho dos bancos centrais e funcionários do
Tesouro gerenciar os ciclos através das técnicas descritas antes.
Uma vez que os altos e baixos dos ciclos podem ser excessivos, as
ferramentas para lidar com eles são contracíclicas e implementadas
com um ciclo próprio — idealmente inverso ao próprio ciclo
econômico.
No entanto, como tudo o mais que envolve ciclos — como saber
onde estamos e o que fazer com eles —, gerenciá-los está longe de
ser fácil. Se não fosse, não veríamos os extremos que realizamos.
VI
O CICLO NOS LUCROS
Os elementos envolvidos na determinação dos lucros de uma
empresa são múltiplos e complexos. O ciclo econômico afeta
significativamente as vendas de algumas empresas, mas
menos em outras. Muito em decorrência das diferenças de
alavancagem financeira e operacional, uma dada variação
porcentual nas vendas tem um impacto muito maior nos
lucros de algumas empresas do que nos de outras.
A
tualmente, como já informei antes, a taxa de crescimento
normal do PIB dos EUA parece ser de algo entre 2% e 3% ao
ano. Em um ano lento, o crescimento pode chegar a 1% ou mais, ou
atingir 4% ou 5% em períodos de boom (ou durante a recuperação
de uma desaceleração). A taxa de crescimento anualizada pode até
se tornar negativa em alguns pontos porcentuais em tempos difíceis,
e caso fique negativa por dois trimestres consecutivos, isso
caracteriza uma recessão. Portanto há flutuações, mas moderadas:
o crescimento anual do PIB norte-americano quase sempre oscila
entre 5% e -2%, e mesmo esses extremos ocorrem apenas uma vez
a cada década, no máximo.
Pode-se concluir a partir daí que os lucros das empresas também
são estáveis de ano para ano? Nem de longe. Os lucros podem
chegar a muito mais que 5% nos bons tempos, e diminuir para
níveis menores que 2% nos maus. Eles também seguem um ciclo —
um que é influenciado pelo ciclo econômico, mas que flutua muito
mais do que a economia como um todo. Então os lucros são mais
voláteis do que o PIB. A questão é: por quê? Quais fatores fazem
com que o ciclo de lucro tenha um desempenho diferente do ciclo
econômico?
Primeiro, os altos e baixos da economia são absolutamente
importantes para determinar a ascensão e o declínio dos lucros
corporativos. Mais PIB significa — mais do que qualquer outra coisa
— um consumo maior, portanto maior demanda por bens. Isso, por
sua vez, significa maiores volumes vendidos e preços de venda
mais elevados, mais trabalho e salários mais altos e, então, mais
consumo. Todas essas coisas juntas significam aumento de receita
para as empresas.
Por definição, o conjunto das vendas de todas as empresas
corresponde ao PIB e reflete a mesma taxa de mudança. Mas isso
não significa que todas as empresas tenham o mesmo padrão de
comportamento.
Em certos setores de atividade, as vendas são sensíveis ao ciclo
econômico, mas em outros, não. E essa sensibilidade é alta em
alguns, e modesta em outros.
As vendas de matérias-primas e insumos industriais são
diretamente responsáveis pelo ciclo econômico. Quando
as empresas coletivamente aumentam sua produção —
ou seja, quando o PIB se expande — há a necessidade de
mais substâncias químicas, metais, plásticos, energia, fios
e semicondutores O inverso também é verdadeiro.
Já as necessidades diárias, como alimentos, bebidas e
medicamentos, são menos sensíveis ao ciclo econômico.
O consumo das pessoas, em geral, independe do que se
passa com a economia. (A demanda, porém, não é
absolutamente constante: nas recessões as pessoas
procuram alternativas — compram alimentos mais baratos
e comem em casa, em vez de em restaurantes —, e
compram itens mais caros em tempos de prosperidade. E,
infelizmente, quem passa por apuros financeiros pode
reduzir até mesmo seu consumo de “necessidades”
quando forçado a optar entre alimentos, medicamentos e
pagar o aluguel.)
A demanda por itens de consumo de baixo custo (como
roupas cotidianas, jornais e downloads digitais) não é
muito volátil, em comparação à demanda por bens de luxo
e viagens de férias.
Compras de “bens duráveis” — carros e casas para
indivíduos, e caminhões e maquinário para empresas —
são altamente sensíveis ao ciclo econômico. Primeiro,
pelo fato de tais bens serem duráveis, sua substituição
pode ser adiada em períodos de economia desaquecida.
Em segundo lugar, porque, devido ao custo elevado, sua
comercialização fica prejudicada em tempos de
dificuldades econômicas. E, em terceiro lugar, as
empresas geralmente precisam de mais deles quando os
negócios são bons, e menos quando não são. Esses
aspectos tornam a demanda por bens duráveis muito
suscetíveis ao ciclo econômico.
A demanda por serviços cotidianos geralmente não é
volátil. Se eles forem necessários (como transporte para o
trabalho) e de baixo custo (como manicures), a demanda
não será altamente sensível a mudanças na economia.
Ademais, serviços como esses têm vida útil limitada e não
podem ser armazenados, o que os faz ser requisitados
continuamente. Mas a demanda ainda pode variar com
base nas condições econômicas: por exemplo, as unhas
podem ser feitas de 15 em 15 dias, e não uma vez por
semana.
Além disso, as vendas de alguns produtos vinculam-se a outros
ciclos além do econômico. Como os duráveis são caros e podem ser
pagos ao longo de suas longas vidas, a demanda por eles pode
subir e descer (tudo o mais constante), já que as flutuações no ciclo
de crédito tornam o financiamento menos ou mais fácil de obter. E
algumas coisas são influenciadas por desenvolvimentos não
cíclicos: por exemplo, a demanda por novos telefones celulares e
notebooks responde a reduções de preço, introdução de novos
produtos e melhorias tecnológicas.
Na maior parte, porém, o crescimento econômico domina o
processo pelo qual as vendas são determinadas. Estas geralmente
aumentam bastante quando o crescimento do PIB é forte, e são
menores (ou diminuem) quando não é.
Mas não dá para vincular diretamente o crescimento do lucro ao
crescimento econômico. O motivo é que os movimentos do ciclo
econômico não são a única coisa que influencia as vendas (como
mostrado), e também porque uma mudança nas vendas não
necessariamente leva a uma alteração equivalente nos lucros. Uma
das principais razões para isso é que a maioria das empresas é
caracterizada por uma alavancagem de dois tipos, mecanismos que
ampliam a resposta dos lucros a uma mudança nas vendas. O
significado de “alavancagem” pode ser mais imediatamente óbvio a
partir da palavra britânica “gearing” (engrenagem).
Primeiro, as empresas estão sujeitas à alavancagem operacional.
Lucros equivalem a receitas menos custos (ou despesas). As
receitas são provenientes das vendas, e sabemos que estas variam
por um grande número de razões. Assim, os diferentes tipos de
custos variam de maneiras diferentes, particularmente em resposta
a mudanças nas vendas.
Na maioria das empresas há custos fixos, semifixos e variáveis.
Por exemplo, uma empresa de táxi:
Tem sua sede em um prédio comercial, mas quando o
número de viagens aumenta um pouco, não é necessário
ampliar o espaço do escritório. Este é um exemplo de
custo fixo.
Tem uma frota de táxis. Um aumento moderado no
número de viagens pode ser realizado com a frota atual,
mas se as viagens aumentarem muito, poderá haver a
necessidade de comprar mais veículos. Este é um
exemplo de custo semifixo.
Seus táxis são movidos a gasolina. Se um aumento nos
negócios fizer com que os carros percorram mais
quilômetros, é provável que o consumo de gasolina cresça
proporcionalmente. Para a companhia de táxi, então, o
custo da gasolina é variável.
Esses itens, considerados em conjunto, indicam que se o número
de passageiros da empresa (e, portanto, suas receitas) aumentar
em 20%, o custo com instalações não aumentará; os gastos com
táxis provavelmente não aumentarão inicialmente, mas podem fazêlo mais tarde; e os gastos com gasolina aumentarão imediata e
proporcionalmente. Assim, o custo total da empresa de táxi crescerá
com um aumento no número de passageiros, mas geralmente
menos que suas receitas. Isso fará com que a margem de lucro
aumente, o que significa que o crescimento nos lucros operacionais
será consideravelmente maior do que o aumento das vendas: essa
é a alavancagem operacional. Em geral, ela é maior para empresas
para as quais uma porcentagem maior de custos é fixa, e menor
para aquelas cujos custos são mais variáveis.
A alavancagem operacional é ótima para as empresas quando a
economia vai bem, e as vendas crescem. Mas nem tanto quando
acontece o contrário: os lucros podem cair mais do que as vendas, e
se as condições forem más o suficiente, pode não haver lucros, e,
sim, perdas. As empresas podem, no entanto, adotar algumas
medidas para limitar o efeito sobre os lucros de um declínio nas
vendas. Elas podem demitir funcionários e fechar lojas. Mas (a) as
medidas econômicas geralmente precisam de tempo para ter efeito;
(b) algumas vezes implicam aumento de despesas no curto prazo,
como no caso de indenizações; (c) geralmente podem limitar o
efeito negativo, mas não eliminá-lo; e (d) raramente funcionam tão
bem quanto se calcula.
A segunda forma de alavancagem que afeta a maioria das
empresas é a alavancagem financeira. Suponhamos que os lucros
operacionais de uma empresa diminuam em $1 mil (ou 33%), de $3
mil para $2 mil. Se o capital de giro de $30 mil da empresa proveio
inteiramente de recursos próprios, o que significa que ela não fez
empréstimos bancários e não precisa fazer nenhum pagamento de
juros, esse declínio se refletirá integralmente no resultado líquido da
empresa — o “lucro final ” —, que também cairia 33%.
Na realidade, porém, a maioria das empresas é financiada com
uma combinação de capital próprio e dívida bancária. Quando o
retorno sobre o capital próprio é superior ao custo dos empréstimos,
a alavancagem financeira é positiva; caso contrário, ela é negativa.
Na eventualidade de a empresa enfrentar sérias dificuldades em sua
atividade econômica, serão os acionistas que sofrerão todos os
declínios nos lucros e, em seguida, assumirão os prejuízos até que
o patrimônio líquido seja eliminado, quando então quaisquer perdas
adicionais recairão sobre os credores bancários. A remuneração
destes, se não houver inadimplência, restringe-se aos juros que
foram prometidos.
Suponhamos que a estrutura de capital da empresa em questão
seja composta de $15 mil em dívidas (exigindo pagamentos anuais
de juros de $1.500) e $15 mil de capital próprio. Isso significa que o
declínio de $1 mil nos lucros operacionais reduz o lucro líquido de
$1.500 ($3 mil de lucro operacional antes dos juros, menos $1.500
de juros) para $500 ($2 mil menos $1.500). Em outras palavras, um
declínio de 33% no lucro operacional (de $3 mil para $2 mil) faz com
que o lucro líquido da empresa diminua em 67% (de $1.500 para
$500). O impacto ampliado de um declínio no lucro operacional no
lucro líquido ilustra a alavancagem financeira em funcionamento.
Os elementos envolvidos na determinação dos lucros de uma
empresa são múltiplos e complexos. O ciclo econômico afeta
significativamente as vendas de algumas empresas, mas menos em
outras. Muito em decorrência das diferenças de alavancagem
financeira e operacional, uma dada variação porcentual nas vendas
tem um impacto muito maior nos lucros de algumas empresas do
que de outras.
E, claro, idiossincrasias podem ter reflexos importantes nos lucros.
Entre elas pode-se citar: decisões da administração sobre estoques,
níveis de produção e investimento de capital; avanços tecnológicos
(por parte de uma empresa, seus concorrentes no setor e até
empresas em setores concorrentes — veja adiante); mudanças na
regulação e tributação; e até mesmo desenvolvimentos exógenos ao
mundo dos negócios, como clima, guerra e modismos. O ciclo
econômico fornece o pano de fundo para mudanças nas vendas e
lucros das empresas, mas o potencial de desvio da expectativa
baseada no ciclo é grande. Desenvolvimentos idiossincráticos são a
principal razão.
Abro espaço aqui para lidar com o assunto da tecnologia (em vez
de dedicar um capítulo separado a ela). “Disrupção” é a palavra do
dia, e a capacidade de disrupção, pela tecnologia, de setores
econômicos tradicionais pode criar uma nova concorrência e liquidar
as margens de lucro dos participantes desses mercados. Veja, por
exemplo, a questão dos jornais. Recentemente, nos anos 1990:
O jornais eram considerados uma fonte de informação
indispensável.
Todos os dias, ao ir para o trabalho, a maioria das
pessoas comprava um jornal, e às vezes mais um ao
voltar para casa: o custo era baixo.
Quem comprava o jornal na segunda-feira voltaria a fazêlo na terça-feira: não havia “prazo de validade” ou uso
prolongado.
Os jornais eram uma das poucas maneiras pelas quais as
empresas locais podiam alcançar seus clientes, e um
jornal de uma cidade geralmente não conseguia competir
por publicidade com o de outra.
A concorrência veio principalmente de outros jornais,
televisão e rádio. Contudo, nos EUA, um jornal fortemente
estabelecido em uma cidade dificilmente perderia, em
virtude de sua vantagem competitiva, essa condição
vantajosa — assim, os jornais eram vistos como empresas
“encasteladas”.
Em face dessa combinação de fatores, que fazia com que a
posição dos jornais fosse vista como quase inexpugnável, as ações
das empresas jornalísticas eram consideradas “defensivas”,
beneficiando-se de receitas e lucros estáveis.
Quem poderia imaginar que a internet e outras formas de
comunicação
online afetariam significativamente a sorte dos jornais em menos de
20 anos? Atualmente, muitas empresas competem para levar
informações diretamente aos consumidores. Em luta para manter
sua fatia de mercado e lucratividade, pois a “gratuidade” passou a
caracterizar muitos aspectos do mundo digital, os jornais têm visto ir
por terra seus modelos de negócio. Os jornais fornecem um
excelente exemplo da capacidade de um fator idiossincrático
completamente alheio ao ciclo de lucro econômico e tradicional
influenciar as vendas e os lucros de uma empresa. Mas, cumpre
lembrar, a tecnologia não é, ela mesma, cíclica? As tecnologias
nascem, prosperam e são substituídas por outras ainda mais novas.
A inovação de alguns anos atrás pode ser suplantada mais
rapidamente do que nunca nos dias de hoje, e a lista de setores de
atividade que são percebidos como imunes à disrupção parece
encolher todos os dias.
Há 30 ou 40 anos parecia que o mundo era um lugar estável, um
cenário relativamente imutável para a vida, servindo como pano de
fundo para os desenvolvimentos econômicos, ciclos incluídos. Hoje,
em grande parte graças aos desenvolvimentos tecnológicos (mas
também sociais e culturais), nada parece imutável. Na verdade,
muito parece estar mudando rápido, tão rápido que a maioria de nós
não consegue acompanhar.
VII
O PÊNDULO DA PSICOLOGIA DO INVESTIDOR
Nos ciclos de negócios, financeiros e de mercado, a maioria
dos excessos no lado positivo — e as inevitáveis reações no
lado negativo, que também tendem a exceder — resulta de
oscilações exageradas do pêndulo da psicologia. Desse
modo, compreender e estar atento a oscilações excessivas é
requisito básico para evitar danos causados pelos extremos
cíclicos e, com sorte, para lucrar com eles.
A
té agora discutimos o ciclo econômico, a atuação
governamental para influenciar o ciclo econômico e o ciclo de
lucro. Em grande medida, essas coisas constituem o pano de fundo
ou ambiente para investir. Elas podem parecer exógenas ao
investimento: processos independentes que operam sós. Mas
qualquer um que pense que se tratam de coisas “mecânicas” em
sua operação e no controle total dos resultados de investimento
subestima o papel da psicologia ou, como costumo dizer,
intercambiavelmente, da emoção. (Psicologia e emoção são
certamente elementos diferentes, mas não vejo nenhuma maneira
significativa de distinguir entre os dois quanto a seu efeito no
ambiente de investimento.)
Primeiro, como já dito, as oscilações na emoção/psicologia
influenciam fortemente os ciclos econômicos e corporativos de lucro.
Em segundo lugar, eles desempenham importante papel ao causar
altos e baixos no mundo dos investimentos, especialmente no curto
prazo.
No Capítulo I, vimos que não há distinção fundamental entre ciclos
e movimentos pendulares. De fato, eu poderia ter facilitado a vida de
todos nós intitulando este capítulo de “O Ciclo em Psicologia”,
dando-lhe uma nomenclatura consistente. Porém, por alguma razão
não especificada, introduzi pela primeira vez a noção de “pêndulo”
em emoção/psicologia apenas em meu segundo memorando para
os clientes, “First Quarter Performance” (“Performance do Primeiro
Trimestre”, em tradução livre, abril de 1991). E como não encontrei
algo que o refutasse nos 26 anos seguintes, continuarei a me referir
a ele aqui.
Para apresentar o pêndulo, repriso o que escrevi em 1991:
As mudanças de humor dos mercados de valores mobiliários
lembram o movimento de um pêndulo, configurando um arco.
Embora haja um ponto médio representando a localização do
pêndulo “em média”, este realmente fica muito pouco ali: ele
está, sempre, ora se aproximando, ora se afastando dos
extremos do arco. E quando o pêndulo se aproxima de um
dos extremos, é inevitável que ele, cedo ou tarde, volte para o
ponto médio. De fato, o próprio movimento em direção a um
extremo fornece a energia para a volta.
Os mercados de investimento fazem o mesmo balanço
pendular:
entre a euforia e a depressão;
entre a comemoração de desenvolvimentos positivos e o
tormento gerado pelos negativos. E, por conseguinte;
entre estar sub ou superapreciado.
Essa oscilação é uma das características mais confiáveis do
mundo dos investimentos, e a psicologia dos investidores
parece gastar bem mais tempo nos extremos do que em um
“ponto médio feliz” [trocadilho com o termo técnico “meio
termo” — veja Capítulo II]”.
Voltei ao tema em “It’s All Good” (“Está Tudo Bem”, em tradução
livre, julho de 2007). Antes de fazer uma nova observação, listei
mais meia dúzia de elementos nos quais as oscilações do pêndulo
são vistas:
Entre a ganância e o medo.
Entre o otimismo e o pessimismo.
Entre tolerância ao risco e aversão a ele.
Entre a crença e o ceticismo.
Entre a fé no futuro e a insistência na concretude do
presente.
Entre a urgência de comprar e o pânico para vender.
Acho particularmente interessante o grau em que as
polaridades listadas estão inter-relacionadas. Quando, por
algum tempo, um mercado cresce bastante, nós
invariavelmente vemos todos os nove elementos listados. E
quando o mercado está em declínio, vemos todos os
elementos adicionais listados. Raramente vemos uma mistura
dos dois conjuntos, pois há uma relação causal entre os
componentes em cada um deles, com um dando origem ao
próximo.
Muito do que escrevi então sobre o pêndulo corresponde
diretamente ao que escrevi sobre ciclos no Capítulo 1. Há uma
oscilação de um extremo ao outro, chegando-se a um ponto que
não pode ser ultrapassado; e depois, um balanço de volta para o
ponto central, alimentado pelo ímpeto da reversão. Pode-se dizer
que o pêndulo também tende a regredir em direção à média ou ao
ponto médio, mas, como a maioria dos ciclos, ele geralmente não se
detém ali, continuando em direção ao extremo oposto de onde veio.
Por que o pêndulo é importante? Em essência, as acentuadas
oscilações ascendentes e descendentes dos ciclos que estou
cobrindo neste livro resultam em grande parte de (e representam)
excessos psicológicos em ação.
A taxa de crescimento linear da tendência na produção
econômica e nos lucros corporativos é moderada, e
quando as decisões pró-cíclicas dos participantes fazem
com que o crescimento seja anormalmente rápido (exceto
em tempos de recuperação de uma recessão), há
usualmente otimismo em demasia, do qual haverá um
recuo.
Da mesma forma, parece racional que, em longo prazo, as
ações em geral devam proporcionar retornos alinhados
com a soma de seus dividendos mais a tendência de
crescimento dos lucros corporativos, ou algo por volta de
um dígito da média para cima. Quando o retorno passa a
ser muito maior do que isso, é provável que ele venha a
se revelar excessivo (há um saque sobre o futuro) e,
assim, tornar as ações arriscadas, deixando uma correção
para baixo na ordem do dia.
Nos ciclos de negócios, financeiros e de mercado, a maioria dos
excessos no lado positivo — e as inevitáveis reações no lado
negativo, que também tendem a exceder — resultam de oscilações
exageradas do pêndulo da psicologia. Desse modo, compreender e
estar atento a oscilações excessivas é requisito básico para evitar
danos causados pelos extremos cíclicos e, com sorte, para lucrar
com eles.
As normas em termos de crescimento e apreciação são, em certo
sentido, “corretas” e “saudáveis”. E se todos se comportassem de
acordo com essas normas — em vez de ocasionalmente esperar
por mais e, assim, preparar o terreno para mudanças em direção a
menos —, o mundo seria um lugar mais estável, menos conturbado
e menos propenso a erros. Mas essa não é a natureza das coisas.
Eu falei sobre a inaplicabilidade das normas em “The Happy
Medium” (“O Meio Termo”, em tradução livre, julho de 2004), mas
agora com dados atualizados até 2016:
Juntando tudo, as flutuações nas atitudes e no
comportamento combinam-se para tornar o mercado de ações
o pêndulo final. Nos meus 47 anos no setor de investimentos,
a partir de 1970, os retornos anuais do S&P 500 passaram de
37% positivos para 37% negativos. Na média de anos bons e
anos ruins, o retorno de longo prazo é geralmente
estabelecido como 10% ou mais. Todos estão felizes com
esse desempenho típico e adorariam mais do mesmo.
Mas lembre-se, um pêndulo oscilante pode “geralmente”
estar no ponto médio, mas na verdade não se detém lá por
muito tempo. O mesmo acontece com o desempenho do
mercado financeiro. Aqui está uma pergunta interessante (e
uma boa ilustração): em quantos dos 47 anos de 1970 a 2016
o retorno anual do S&P 500 ficou dentro de 2% do “normal”,
isto é, entre 8% e 12%?
Eu esperava que a resposta fosse “não tão frequente”, mas
me surpreendi ao ver que isso acontecera apenas três vezes!
Também foi uma surpresa saber que o retorno girava em
torno de mais de 20 pontos percentuais do “normal” — acima
de 30% ou abaixo de 10% — durante mais de um 1/4 do
tempo: 13 dos últimos 47 anos. Então uma coisa que pode
ser dita com total convicção sobre o desempenho do mercado
de ações é que a média certamente não é a norma.
Flutuações de mercado dessa magnitude não são explicáveis
quase que totalmente pelas mudanças nas empresas, setores
ou economias. Elas são em grande parte atribuíveis às
mudanças de humor dos investidores.
Por fim, as ocasiões em que o retorno está nos extremos
não se distribuem aleatoriamente ao longo dos anos: eles
agrupam-se devido ao fato de que as oscilações psicológicas
dos investidores tendem a persistir por um tempo
(parafraseando Herb Stein, elas tendem a continuar até que
parem). A maioria desses 13 anos extremos para cima ou
para baixo estava dentro de um ano ou dois de outro ano de
desempenho similarmente extremo na mesma direção.
Que tal um exemplo do pêndulo em ação?
Um dos adágios de mercado mais consagrados pelo tempo diz
que “os mercados flutuam entre ganância e medo”. Há uma razão
fundamental para isso: é porque as pessoas oscilam entre a
ganância e medo. Em outras palavras, às vezes as pessoas se
sentem positivas e esperam coisas boas, e então se tornam
gananciosas e querem faturar alto. Sua ganância as leva a competir
para fazer investimentos, e isso faz com que os mercados subam, e
os ativos se apreciem.
Porém, em outras ocasiões, não se sentem tão bem, e suas
expectativas tornam-se negativas. Nesse caso, o medo assume o
controle. Em vez do entusiasmo em ganhar dinheiro, vem a
preocupação de perdê-lo. Com isso, retraem as compras,
eliminando o ímpeto ascendente dos preços dos ativos, e talvez
optem por vender, empurrando os preços para baixo. Quando estão
em “modo de medo”, as emoções das pessoas trazem forças
negativas para os mercados.
Eis aqui parte da discussão sobre o jogo entre ganância e medo,
retirado de “The Happy Medium” (julho de 2004):
Quando eu era um analista novato, ouvíamos o tempo todo
que “o mercado de ações é movido pela ganância e pelo
medo”. Quando o ambiente de mercado está em equilíbrio
saudável, ocorre um cabo de guerra entre otimistas, que
querem ganhar dinheiro, e pessimistas, que procuram evitar
perdas. Aqueles querem comprar ações, mesmo tendo que
pagar um preço um pouco acima do fechamento de ontem, e
estes querem vendê-las, mesmo que seja em uma queda.
Quando o mercado “anda de lado”, é porque o sentimento
por trás desse cabo de guerra é dividido de maneira uniforme,
e as pessoas — ou sentimentos — nas duas extremidades da
corda têm um peso aproximadamente igual. Os otimistas
podem prevalecer por algum tempo, mas conforme os títulos
se apreciam, os pessimistas ganham força e os vendem mais
barato…
Ainda que calouro, não demorou muito para eu perceber
que muitas vezes o mercado é movido pela ganância ou
medo. Nos momentos que realmente contam, numerosas
pessoas saltam de uma extremidade da corda para a outra.
Ora os gananciosos, ora os medrosos predominam e
influenciam dramaticamente o mercado. Quando há apenas
ganância e o medo está ausente, por exemplo, todos querem
comprar, ninguém quer vender, e poucos conseguem pensar
em razões pelas quais os preços não devem subir. E assim,
agem, por vezes aos trancos e barrancos, sem direção
aparente.
Nitidamente, foi o que aconteceu com as ações de
tecnologia em 1999. A ganância era a característica
dominante desse mercado. Quem estava de fora foi obrigado
a assistir todos os outros enriquecerem. “Investidores
prudentes” foram recompensados por um sentimento de
estupidez. Naquele mercado, os compradores não sentiam
medo. “Há um novo paradigma”, foi o grito de guerra. “Cavalo
encilhado não passa duas vezes. E, a propósito, o preço pelo
qual estou comprando não pode ser alto demais, porque o
mercado é sempre eficiente.” Todos perceberam um ciclo
virtuoso sem fim em favor das ações de tecnologia.
Mas uma hora algo muda. Aparece uma pedra no caminho,
ou uma empresa importante relata um problema, ou surge um
fator exógeno. Os preços também podem cair sob seu próprio
peso ou com base em uma queda na psicologia sem causa
óbvia. Com certeza ninguém que conheço pode dizer
exatamente o que fez a bolha das empresas de tecnologia
explodir em 2000. De alguma maneira a ganância evaporou, e
o medo tomou conta. “Compre antes que você perca” foi
trocado por “Venda antes de ficar com o mico na mão”.
E o medo, então, só fez crescer. As pessoas não se
preocupam com oportunidades perdidas; elas se preocupam
em perder dinheiro. A exuberância irracional foi substituída
por cautela excessiva. Se em 1999 as previsões para uma
década foram acatadas com fervor, em 2002 o que se ouvia
dos investidores, escaldados pelos escândalos corporativos,
era: “Nunca mais confiarei na administração” e “Como posso
ter certeza de que os demonstrativos financeiros refletem a
realidade?” Assim, por exemplo, quase ninguém queria
comprar os títulos das companhias envolvidas em
escândalos, e os preços foram lá para baixo. É a partir dos
extremos do ciclo de medo e ganância que surgem as
maiores oportunidades de lucros de investimento, como, nos
EUA, a compra com grandes deságios de títulos de empresas
inadimplentes, em 2003.
O binômio “ganância/medo” é o continuum psicológico ou
emocional mais óbvio ao longo dos quais os investidores oscilam, e,
em muitos aspectos, são os mais ilustrativos. Há outras mudanças
emocionais ou psicológicas importantes. A maioria opera de
maneira similar ao pêndulo de ganância/medo, e geralmente isso
não é uma coincidência. Vários parâmetros estão inter-relacionados.
Eis alguns exemplos.
Implícito no balanço entre ganância e medo está o duo euforia e
depressão. Por exemplo, como já dissemos, a ganância pode não
ser originada apenas por eventos positivos. Em vez disso, estes
estimulam a euforia, a qual favorece a ganância (de modo análogo,
eventos negativos podem levar à depressão e medo). Emoções
fundamentais, a euforia e depressão estão na origem das
oscilações.
Investidores eufóricos podem se entusiasmar com o desenrolar
dos acontecimentos atuais e aqueles que possam surgir no futuro, e
isso pode acentuar sua fixação com — e expectativa de — lucro.
Por outro lado, é improvável que investidores deprimidos se sintam
positivos o bastante para serem gananciosos. Se você pensar sobre
isso, a euforia é inconsistente com o medo, e a depressão é
inconsistente com a ganância.
Na mesma linha, os investidores também oscilam entre o otimismo
e o pessimismo. Eventos positivos em geral levam a expectativas de
mais eventos e resultados positivos — algo mais conhecido como
otimismo. Este está na base da ganância: não faz sentido pensar
que as pessoas podem ser gananciosas e impulsionadas a investir
quando suas expectativas são negativas. Com certeza, otimismo e
pessimismo encorajam outras emoções e influenciam o
comportamento.
O próximo fenômeno que quero abordar é a tendência dos
investidores a oscilar entre credulidade e ceticismo, e a flutuar entre
o fascínio de possíveis lucros no futuro e a insistência em um valor
palpável no aqui e agora.
Quando as coisas estão indo bem no mundo e os preços dos
ativos estão subindo, os investidores normalmente se dispõem a
crer em histórias favoráveis sobre desenvolvimentos futuros,
comprar ativos apreciados e arcar com riscos elevados. E quando
as coisas pioram, ficam mais propensos a rejeitar até projeções
razoáveis e a recusar a compra, em grande parte porque os preços
estão baixos (mesmo que isso aumente a probabilidade de que os
ativos estejam baratos).
Alguns investidores trabalham duro para quantificar os
ganhos deste ano e o crescimento a partir daí. Outros se
esforçam para valorar ativos reais, propriedade intelectual e
vantagens comerciais (e prever quanto os outros pagarão por
eles). E há os que tentam deduzir as implicações de valor nas
fusões e aquisições, reestruturações e transações que
transformam empresas de capital aberto em capital fechado.
É nisso tudo e em muito mais que as empresas do setor de
investimento trabalham para prever e precificar o futuro.
Aqui vai um exemplo. Em 2000–2001, nossos fundos para
dívidas em dificuldades investiu algumas centenas de milhões
de dólares em empresas de telecomunicações falidas. Em
cada caso, o preço de compra era uma pequena fração dos
valores investidos em ativos tangíveis, como equipamentos
de comutação ou cabos de fibra ótica. Se pudéssemos
revender esses materiais com alguma margem em relação ao
que pagamos, o investimento seria lucrativo.
A primeira venda, rápida, correu bem, e ganhamos cerca de
50%. Mas logo depois as pessoas deixaram de aparecer para
dar lances nesses ativos. Os primeiros a comprar
consideravam ter pago uma pechincha, mas nas negociações
posteriores os possíveis compradores esquivavam-se de
ativos que estavam se transformando em excesso de oferta.
E isso leva ao meu ponto. Em 1999, os investidores aceitaram
com sinceridade as previsões otimistas de suas empresas de
telecomunicações sobre o futuro, e estavam dispostos a
pagar com folga por esse potencial. Mas em 2001 já não viam
potencial algum e não se dispunham a pagar um centavo que
fosse, já que a capacidade do setor excedia largamente suas
necessidades atuais, e ninguém podia imaginar como
absorver esse excesso ao longo da vida. Esse ciclo na
disposição dos investidores de valorar o futuro é um dos
ciclos mais poderosos que existe.
Há uma metáfora simples, relacionada ao setor imobiliário,
que me ajudou a entender esse fenômeno: quanto vale um
prédio vazio? Esse ativo (a) tem um valor de reposição, é
claro, mas (b) não gera receitas e (c) custa dinheiro para
manter, na forma de impostos, seguro, manutenção mínima,
pagamento de juros e custos de oportunidade. Em outras
palavras, é um ralo de dinheiro. Quando o humor dos
investidores é pessimista e eles não conseguem enxergar
mais do que alguns anos, só conseguem pensar nos fluxos de
caixa negativos, e não conseguem visualizar o momento em
que o prédio será alugado e lucrativo. Mas quando o humor
melhora e o interesse no potencial futuro é alto, os
investidores o imaginam cheio de inquilinos pagando aluguéis
elevados e tornando o prédio vendável a um preço
exorbitante.
A flutuação na disposição dos investidores de atribuir valor
a possíveis desenvolvimentos futuros representa uma
variação do ciclo cheio ou vazio. Suas oscilações,
extremamente poderosas, não devem ser subestimadas.
(“The Happy Medium”, julho de 2004)
O investidor superior é maduro, racional, analítico, objetivo e não
emotivo. E, portanto, faz uma análise completa do ambiente e dos
fundamentos do investimento. Ele calcula o valor intrínseco de cada
potencial ativo de investimento. E compra quando qualquer
desconto do preço do valor intrínseco atual, mais qualquer aumento
potencial no valor intrínseco no futuro, juntos, sugerem que comprar
ao preço atual é uma boa ideia.
Para realizar todas essas coisas, o investidor superior estabelece
um equilíbrio apropriado entre medo (que é uma abreviatura de
aversão ao risco, antipatia por perder e respeito pela incerteza e
aleatoriedade) e ganância (também aspiração e agressividade).
Todos sentem emoções, mas o investidor superior mantém esses
elementos conflitantes em equilíbrio. A presença das duas forças
compensatórias leva a um comportamento responsável, sábio e
equilibrado.
Os pontos importantes, no entanto, são estes:
Poucas pessoas são estáveis ou não emotivas.
Em razão disso, poucos investidores são capazes de
estabelecer uma posição intermediária que equilibre
ganância e medo — e permanecer lá — conforme
desenvolvimentos mais e menos positivos surgem.
Muito ao contrário, a maioria dos investidores oscila entre
ser gananciosa quando está otimista e temerosa quando
está pessimista.
A maioria oscila para essas posições na hora errada —
tornar-se mais ganancioso após o surgimento de
desenvolvimentos positivos ter causado aumento dos
preços, e tornar-se mais temeroso após eventos negativos
deprimirem os preços.
A seguir um pouco do que escrevi sobre o balanço da psicologia
em “On the Couch” (“No Divã”, em tradução livre, janeiro de 2016):
Há muitas outras maneiras pelas quais as peculiaridades não
objetivas e não racionais comumente afetam o
comportamento. Como Carol Tavris apontou em sua resenha,
no The Wall Street Journal de 15 de maio de 2015, do livro do
prof. Richard Thaler, Misbehaving: The Making of Behavioral
Economics (2015):
Como psicólogo social, há muito tempo me divirto com os
economistas e sua curiosa noção fantasiosa do “homem
racional”. Racional? Onde essas pessoas vivem? Até 50
anos atrás, estudos experimentais demonstravam que as
pessoas não mudam suas decisões claramente erradas,
colocam dinheiro bom em dinheiro ruim, justificam
previsões fracassadas em vez de admitir que estavam
erradas, e resistem, distorcem ou rejeitam
sistematicamente informações que contestam suas
crenças.
A dificuldade de compreender os eventos, seu significado e
suas potenciais implicações decorre em boa parte das
distorções na psique dos investidores, e não só contribui
como realimenta, para exacerbar, as respostas destes. Assim,
em vez de adotar uma abordagem objetiva e equilibrada, os
investidores tendem a enfatizar com muito mais frequência
apenas os pontos positivos ou negativos. E tendem a se
tornar otimistas e ansiosos para comprar quando boas
notícias, interpretadas positivamente, forçaram os preços a
subir, e vice-versa. Tudo isso é óbvio (especialmente em
retrospecto). Desse modo, com igual obviedade, entender e
lidar com isso representa uma maneira potencial de melhorar
os resultados.
O ponto básico é que a psicologia oscila e o comportamento da
maioria das pessoas segue junto. A flutuação entre ganância e
medo é típica da oscilação do pêndulo psicológico. De fato, explica
não só o comportamento da maioria dos investidores, mas também,
pela ação coletiva, o comportamento de mercados inteiros. Quando
a psicologia dá o ar de sua graça, para o bem ou para o mal, os
mercados sobem se os eventos são positivos, e caem se estes são
negativos.
O pêndulo se detém por pouco tempo no ponto médio de seu
arco. Na verdade, seu comportamento normal é girar em direção a
um extremo ou outro, primeiro se recuperando de um extremo
psicológico — muito alto ou muito baixo —, e depois rumando em
sentido oposto.
Já o investidor superior resiste aos excessos psicológicos e,
assim, se recusa a embarcar nessas oscilações. A grande maioria
dos investidores altamente superiores que conheço são apáticos por
natureza. De fato, creio que essa peculiaridade é um fator que
colabora decisivamente para que obtenham sucesso.
Essa é uma das minhas observações mais persistentes, e, de
forma relacionada, uma das perguntas mais frequentes é se as
pessoas podem aprender a ser menos emotivas. Minha resposta é
“sim e não”. Acho que é possível que as pessoas estejam atentas a
possíveis influências emocionais e tentem restringir seu efeito. Mas
também acho que as pessoas inerentemente indiferentes têm um
grande trunfo nesse sentido. A falta de emotividade é um dom (no
investimento, mas talvez não em outras áreas, como o casamento).
Não digo que as pessoas emotivas não podem ser bons
investidores, mas isso exigirá uma grande dose de autoconsciência
e autocontrole.
Além da inter-relação das várias oscilações emocionais descritas
nas últimas páginas, também é importante notar a natureza causal
desses fenômenos. Assim como eventos positivos dão origem à
euforia, e esta ao otimismo, que incita o aumento da ganância, as
oscilações resultantes do somatório de todos esses elementos
definem a maneira como os investidores percebem que as coisas
flutuam: no céu de brigadeiro ou na escuridão da noite. A percepção
dos eventos pelos investidores é influenciada por seus movimentos
ao longo dos vários arcos emocionais ou psicológicos. E essa
percepção bifacetada se retroalimenta, criando mais euforia,
otimismo e ganância.
Eis como coloquei isso em “On the Couch” (janeiro de 2016):
Um dos fatores mais significativos que impedem os
investidores de chegar a conclusões apropriadas é a
tendência de avaliar o mundo com sentimentalismo, e não
com objetividade. Essa falha assume duas formas primárias:
percepção seletiva e interpretação distorcida. Em outras
palavras, às vezes eles registram apenas os eventos
positivos, e ignoram os negativos, e às vezes o oposto é
verdadeiro. Ocorre ainda de verem os eventos de uma forma
positiva e, às vezes, de modo negativo. Mas raramente suas
percepções e interpretações são equilibradas e neutras.
Desde os eventos de agosto de 2015 na China, recordo-me
sempre da frase de um dos cartuns mais antigos do meu
arquivo, e ainda um dos melhores: “Tudo que era bom para o
mercado ontem, não é bom para o mercado hoje”.
Em última análise, a psicologia do investidor raramente
sopesa igualmente desenvolvimentos favoráveis e
desfavoráveis. Da mesma forma, a interpretação dos eventos
pelos investidores é geralmente influenciada por sua reação
emocional a qualquer coisa que esteja acontecendo no
momento. A maioria dos desenvolvimentos tem aspectos úteis
e prejudiciais. Os investidores, porém, normalmente ficam
obcecados com um ou outro, em vez de considerar os dois.
Tudo parece muito óbvio: os investidores raramente
mantêm posições objetivas, racionais, neutras e estáveis.
Primeiro exibem um elevado grau de otimismo, ganância,
tolerância ao risco e credulidade, e seu consequente
comportamento faz com que os preços dos ativos subam, os
retornos potenciais caiam, e o risco aumente. Mas, então, por
alguma razão — talvez a chegada de um ponto crítico —, eles
mudam para pessimismo, medo, aversão ao risco e ceticismo,
e com isso os preços dos ativos caem, os retornos
prospectivos aumentam, e o risco diminui. E o que é notável:
cada grupo de fenômenos tende a acontecer em uníssono, e
a oscilação de um lado para o outro muitas vezes vai muito
além do que a razão pode exigir.
Trata-se de algo muito louco: no mundo real, as coisas
geralmente ficam entre o “mais ou menos bom” e o “nem
tanto”. Mas no planeta investimento, a percepção
frequentemente flutua de “tudo perfeito” para “sem
esperança”. O pêndulo viaja de um extremo ao outro, quase
sem parar no “ponto médio feliz” e muito pouco ao alcance da
racionalidade. Primeiro, a negação; depois, a capitulação.
A vida é repleta de eventos positivos e negativos, e na maioria dos
dias topamos com alguns deles. Alguns dos eventos são ambíguos,
contendo elementos bons e maus, tornando-os sujeitos a
interpretações positivas ou negativas.
É importante observar que as baixas taxas de juros são boas,
porque estimulam a atividade empresarial e aumentam o valor
presente descontado dos fluxos de caixa futuros. Mas têm seu lado
ruim, pois a atividade comercial mais forte que elas estimulam pode
ocasionar inflação e, assim, sinalizar aos bancos centrais que as
taxas devem ser elevadas, retirando o estímulo. Essa dualidade leva
a interpretações que flutuam de modo excessivo entre esses polos,
o que as leva muitas vezes a não valer um centavo.
Há alguns anos, meu amigo Jon Brooks ilustrou magnificamente a
questão da interpretação distorcida. Veja como os investidores
reagem aos eventos quando estão se sentindo de bem com a vida
(o que geralmente significa que o mercado está subindo):
Dados fortes: fortalecimento da economia — ações
recuperam-se.
Dados fracos: é provável que o BC intervenha — ações
recuperam-se.
Dados conforme esperado: baixa volatilidade — ações
recuperam-se.
Bancos lucram $4 bilhões: condições favoráveis para as
empresas — ações recuperam-se.
Bancos perdem $4 bilhões: as más notícias ficaram par
trás— ações recuperam-se.
Picos do petróleo: crescimento da economia global
contribuindo para a demanda — ações recuperam-se.
Petróleo cai: maior poder de compra do consumidor —
ações recuperam-se.
Taxa de câmbio derrete: ótimo para exportadores — ações
recuperam-se.
Taxa de câmbio nas alturas: ótimo para as empresas
importadoras — ações recuperam-se.
Picos de inflação: ativos valorizam-se — ações
recuperam-se.
Inflação cai: melhora a qualidade dos ganhos — ações
recuperam-se.
Naturalmente, o mesmo comportamento também acontece na
direção oposta. Quando as condições psicológicas são negativas e
os mercados caem há algum tempo, tudo é capaz de ser
interpretado de modo negativo. É provável que dados econômicos
robustos façam com que o BC retire o estímulo aumentando as
taxas de juros, e dados fracos são motivo para crer que as
empresas terão problemas em obter os lucros previstos. Em outras
palavras, não são os dados ou eventos; é a interpretação. E isso
flutua com oscilações na psicologia.
Quando o balanço do pêndulo o leva a qualquer um dos pontos
extremos, um processo pode ter a aparência de um círculo virtuoso
ou de um círculo vicioso. Se os eventos são predominantemente
positivos e a psicologia é cor-de-rosa, os desenvolvimentos
negativos tendem a ser negligenciados, tudo é interpretado
favoravelmente, e muitas vezes se pensa que as coisas são
incapazes de piorar. A lógica que sustenta a expectativa de
continuidade da bonança parece irresistível; restrições e normas
passadas são ignoradas ou racionalizadas, e quem enxerga
limitações no futuro positivo é descartado como um velho
ultrapassado e sem imaginação. O potencial para ganhos chega a
ser visto como infinito. E os preços dos ativos sobem, provocando
mais otimismo.
Mas há o outro lado da moeda: quando tudo vai mal por meses ou
anos e a psicologia é altamente negativa, o que pode ser esquecido
é o potencial de melhoria. Enfatizam-se os eventos desagradáveis,
e ignoram-se os positivos. O argumento para uma deterioração
adicional parece sólido, sem refutação, e agora é a desvantagem
que parece eterna. Os preços caem, resultando em mais
pessimismo.
Círculos virtuosos e viciosos são exageros não realistas. No
passado, ainda que muitas vezes imaginados, nunca foram
constatados. Mas esse fato não basta para que a maioria das
pessoas resista a eles quando tudo parece sem freios.
De novo: o investidor superior — que resiste a influências
externas, permanece emocionalmente equilibrado e age de modo
racional — percebe eventos positivos e negativos, pesa-os com
objetividade e os analisa desapaixonadamente. O fato, porém, é que
às vezes a euforia e o otimismo fazem com que a maioria dos
investidores veja as coisas de forma mais positiva do que seria
justificável, e às vezes a depressão e o pessimismo os fazem ver
apenas coisas ruins e interpretar eventos com um tom negativo.
Recusar-se a reagir assim é uma das chaves para um investimento
bem-sucedido.
Otimismo, exuberância, confiança, credulidade, ousadia, tolerância
ao risco e agressividade: se tais fatores caracterizam o ambiente,
estão dadas as condições para que uma fase de alta se mantenha
dominante. Mas esses elementos não governarão um mercado para
sempre. Por fim, cederão seu lugar ao medo, ao pessimismo, à
prudência, à incerteza, ao ceticismo, à cautela, à aversão ao risco e
à reticência. Falências são o produto de booms, e estou convencido
de que geralmente é mais correto atribuí-los aos excessos do boom
anterior do que ao evento específico que desencadeia a inversão de
rumo. (“Now What?” — “E Agora?”, em tradução livre —, janeiro de
2008).
Normalmente, a ascensão em direção a qualquer um dos
extremos é prontamente observável, e, portanto, as implicações
para os investidores devem ser óbvias para os observadores
objetivos. Mas, é claro, a oscilação do pêndulo do mercado para um
extremo ou outro ocorre pela simples razão de que a psique da
maioria dos participantes do mercado está se movendo na mesma
direção, em um estilo parecido com o de um rebanho.
Na verdade, poucos entre os envolvidos agem com objetividade.
Como já escrevi em meu memorando “Everyone Knows” (“Todo
Mundo Sabe”, em tradução livre, abril de 2007), esperar uma
observação fria generalizada durante uma mania de mercado faz
tanto sentido quanto dizer “todo mundo sabe que o mercado foi
longe demais”. Se muitas pessoas reconhecessem que foi longe
demais, ele não estaria lá (“It’s All Good”, julho de 2007).
VIII
O CICLO DAS ATITUDES EM DIREÇÃO AO RISCO
O investidor racional é sempre diligente, cético e
apropriadamente avesso ao risco, mas também está
constantemente à procura de oportunidades de retorno
potencial que mais que compensem o risco. Esse é o ideal.
Mas nos bons tempos ouvimos a maioria das pessoas dizer:
“Risco? Que risco? Não noto muita coisa que possa dar
errado. Veja como as coisas estão indo bem. E, ademais, o
risco é meu amigo — quanto mais riscos, mais dinheiro posso
ganhar”.
Então, em momentos ruins, elas mudam, simplificando tudo:
“Não quero ganhar nem mais um centavo no mercado; só não
quero mais perder. Tire-me daqui!”
A
gora que passamos de considerar ciclos no abstrato para
discuti-los ao operar no mundo dos investimentos, farei uma
breve observação sobre a natureza fundamental do investimento, a
fim de estabelecer uma base para a discussão que se seguirá. Algo
disso, admito, virá de capítulos anteriores.
O que é investir? Uma maneira de pensar isso é assumir riscos
em prol de obter lucro. Os investidores tentam posicionar seus
portfólios para lucrar com desenvolvimentos futuros, não para serem
penalizados por eles. O investidor superior é simplesmente alguém
que faz isso melhor do que outros.
Sabemos o que acontecerá no futuro? Alguns investidores
pensam que sim (ou pensam que precisam agir como se
soubessem, porque, caso contrário, perderão seus empregos e seus
clientes) ou sofreram uma lavagem cerebral, crendo ser possível
estar certo sobre o futuro por haver obtido lucro durante muito
tempo por meio de previsões (e ter se condicionado a ignorar suas
baixas taxas de sucesso no passado). Para outros investidores —
os mais inteligentes e autoconscientes, acho —, não há como ter
certeza sobre o futuro. Eles podem formar uma opinião sobre
eventos futuros, mas não têm certeza quanto à correção dela.
Uma vez que (a) investir consiste em lidar com o futuro, mas (b) o
futuro não é cognoscível, é daí que vem o risco de investir. Se os
eventos futuros fossem previsíveis, investir seria fácil e o lucro seria
certo. (Em tal situação, o nível geral de retorno pode ser baixo, pois
há muito pouco risco envolvido, mas esse é um tópico que fica para
outra vez.) No entanto, o fato de os eventos não serem previsíveis
apresenta riscos. Como os eventos reais podem ser diferentes
daqueles que foram previstos, ou a reação do mercado a eventos
pode ser diferente da esperada, um portfólio pode ser posicionado
incorretamente em face do futuro que se desdobra.
Considerando que o risco (ou seja, a incerteza quanto aos eventos
futuros e a possibilidade de maus resultados) é a fonte primária do
desafio para investir, a capacidade de entender, avaliar e lidar com o
risco é a marca do investidor superior e um fator essencial. Estou
tentado a dizer que se trata do requisito essencial para o sucesso do
investimento.
Finalmente, é importante reconhecer que, embora o ambiente de
investimento varie ao longo do tempo, em qualquer momento
específico isso é um dado. O que quero dizer é que podemos
aceitar o ambiente como ele é e investir, ou podemos rejeitá-lo e
ficar de fora, mas não há uma terceira opção que nos permita dizer
“Não gosto do ambiente como ele é hoje; exijo um diferente”. Ou
melhor, até podemos exigir outro, mas é claro que isso não vai se
materializar.
Minha opinião de que o risco é a principal peça móvel no
investimento me faz concluir que, em qualquer momento, o modo
como os investidores coletivamente enxergam os riscos e se
comportam em relação a eles é de vital importância na formação do
ambiente de investimento em que nos encontramos. E o estado do
ambiente é fundamental para determinar como nos comportar em
relação ao risco em tal momento. A avaliação de onde estão as
atitudes em relação ao risco em seu ciclo é o tema deste capítulo —
talvez o mais importante deste livro.
Um dos momentos da minha vida em que fui bafejado pela sorte foi
quando tive a oportunidade de cursar a Graduate School of
Business da Universidade de Chicago (renomeada como Booth
School) entre 1967 e 1969. Eu, como muitas pessoas naqueles dias,
fui direto da faculdade para a pós-graduação, talvez como a rota
mais eficiente para o sucesso, mas com o incentivo adicional
fornecido pela Guerra do Vietnã e pelo projeto de acompanhamento.
Nos quatro anos anteriores, eu tivera uma boa educação em
finanças na Wharton: prática, não teórica e qualitativa. Minha
escolha na pós-graduação foi muito fortuita, pois Chicago recém
começara a ensinar uma nova teoria de finanças e investimentos
que havia sido desenvolvida, em grande parte, no início dos anos
1960. Assim, meu treinamento na Wharton foi posto ao lado de um
estudo mais aprofundado em finanças que era quase inteiramente
acadêmico, teórico e quantitativo.
Mal acabara de chegar a Chicago, foi-me apresentado um gráfico
que forneceu grande parte da base para a nova teoria do
investimento e que serviu como ponto de partida para muito de meu
pensamento e escrita desde aquela época.
Esse gráfico tornou-se onipresente no mundo dos investimentos
desde que o conheci há 50 anos atrás. Sua essência está no fato de
a linha se inclinar para cima e para a direita, indicando uma relação
positiva entre risco e retorno. Isso geralmente é, a meu ver, mal
interpretado como significando que “ativos mais arriscados
produzem retornos maiores”, e, portanto, “se você quiser ganhar
mais dinheiro, a resposta é assumir mais riscos”. Essa formulação
carece de lógica, pois ativos os quais se pode contar que produzem
retornos mais elevados não são, por definição, os mais arriscados.
A linearidade com a qual a relação entre risco e retorno é
apresentada no gráfico ignora o fato de que em todos os níveis de
risco há uma série de resultados potenciais em relação ao retorno e
exagera, portanto, a confiabilidade do relacionamento. É isso que
faz as pessoas dizerem que investimentos mais arriscados
produzem retornos mais altos. Em lugar disso, penso que o gráfico
deve ser interpretado como: “Investimentos que parecem mais
arriscados têm que parecer prometer retornos mais altos, ou então
ninguém os fará”. Palavras como “parece” e equivalentes são as
corretas, pois indicam que o risco e o retorno potencial só podem
ser estimados e que o mundo dos investimentos não funciona como
uma máquina. Isso faz com que tais palavras sejam altamente
apropriadas — na verdade, atraentes — para usar ao discutir
investimento. (Para um estudo mais completo, veja o Capítulo V de
The Most Important Thing.)
As pessoas que imediatamente “captam” conceitos como risco e
risco/retorno geralmente têm um senso intuitivo que as prepara para
serem bons investidores. Espero que as razões por trás da minha
interpretação do gráfico se tornem imediatamente claras uma vez
que eu lhe tenha solicitado para pensar a respeito.
Suponhamos que um investidor lógico receba duas oportunidades
de investimentos, ambos com o mesmo retorno esperado, mas em
um caso ele sendo virtualmente garantido, e no outro, altamente
incerto. Esperamos que ele escolha o primeiro, pois a maioria das
pessoas prefere certeza à incerteza. Por exemplo, se um título do
Tesouro e uma startup de alta tecnologia parecessem propensos a
retornar 7%, a grande maioria das pessoas optaria pelo título. Por
que assumir o risco extra associado à startup se não houver
aumento potencial de retorno para compensar o risco incremental?
Bem, esse é o ponto: a maioria das pessoas prefere um 7%
garantido a um 7% possível. Em outras palavras, a maioria das
pessoas é avessa ao risco. Essa é a suposição essencial que
sustenta a visão de finanças da “Escola de Chicago”.
Para descrever a aversão ao risco, digo que a maioria das
pessoas prefere a segurança e desprefere o risco — mesmo que eu
nunca tenha visto a palavra “despreferir” em um dicionário. (Há,
entre o establishment linguístico e eu, uma absoluta diferença de
opinião em relação à propriedade desse termo, mas penso ser uma
ótima palavra. Se ela não existe, deveria.)
A antipatia generalizada pelo risco e a consequente insistência no
retorno incremental potencial, se houver risco incremental, são as
razões pelas quais os títulos da dívida pública de longo prazo têm
rendimentos mais elevados do que os de curto prazo, porque títulos
com grau de investimento rendem menos que os títulos sem essa
categorização, por que geralmente se espera que ações
proporcionem retornos maiores que títulos, e porque é esperado que
o investimento de capital de risco proporcione retornos mais
elevados do que as ações de empresas de capital aberto. Note que
estou falando apenas sobre “expectativas” e “promessas” — ou o
que “pode acontecer” ou “deveria acontecer” —, em vez de coisas
que “acontecerão” ou “com certeza acontecerão”. Mas, em geral,
essa expectativa de retorno incremental tem de estar presente para
que a maioria das pessoas assuma voluntariamente riscos
adicionais.
Devido à natural “despreferência” pelo risco, é perfeitamente
razoável esperar que, caso decidam assumi-lo, os investidores
sejam convencidos da possibilidade de uma recompensa
incremental. Os não audazes só se arriscarão se esperarem uma
recompensa generosa por fazê-lo. Nada faz mais sentido.
A aversão ao risco é um elemento essencial no investimento. O
medo de perder policia os mercados. Como a maioria das pessoas é
avessa ao risco, elas:
São cautelosas ao ponderar sobre investir.
Fazem uma análise cuidadosa ao considerar
investimentos, especialmente os arriscados.
Ao analisar, adotam suposições conservadoras e
ceticismo adequado.
Exigem maiores margens de segurança em investimentos
arriscados para se protegerem contra erros analíticos e
surpresas desagradáveis.
Insistem em prêmios de risco saudáveis — a expectativa
de retornos incrementais — se vão realizar investimentos
arriscados.
Recusam-se a investir em algo que não faz sentido.
Tudo isso é parte essencial do processo de investimento. Como
esse é o procedimento dos investidores avessos ao risco, investir é
uma ação racional para a qual proposições razoáveis são
oferecidas. Em suma, a aversão ao risco é o principal elemento que
mantém os mercados seguros e saudáveis.
Mas veja bem: isso é uma descrição normativa, ou uma descrição
de como as coisas deveriam ser. Essa é a maneira de agir do
investidor superior e que deveria ser a de todos os investidores.
Todavia, em termos globais, nem todos o fazem, e certamente nem
todos agem de forma igual em todos os momentos.
É um fato que as atitudes em relação ao risco mudam e, ao fazêlo, alteram o ambiente de investimento. O restante deste capítulo
tratará dessa questão.
Como o ambiente de investimento é formado? Eis a questão. Em
síntese, é o resultado das discussões que ocorrem no mercado
entre os investidores, faladas ou sinalizadas por suas ações, seja no
âmbito individual, seja em termos coletivos. Veja como descrevi a
criação do ambiente de investimento em “Risk and Return Today”
(“Risco e Retorno Hoje”, em tradução livre, outubro de 2004):
Usarei um mercado “típico” de alguns anos atrás para ilustrar
como isso funciona na vida real: digamos que a taxa de juros
dos títulos do Tesouro norte-americano de 30 dias seja de
4%. Então um investidor diz: “Para ficar com o papel durante
cinco anos, quero 5%. E para comprar um de dez anos, quero
obter 6%”. Ele exige uma taxa mais alta para prolongar o
tempo de permanência, pois se preocupa com o risco do
poder de compra, um risco que se assume aumentar com o
tempo até o vencimento. É por isso que a curva de
rendimento, que na realidade faz parte da “linha do mercado
de capitais1”, em geral se inclina para cima com o aumento da
vida útil dos ativos.
Consideremos agora o risco de crédito. “Se o título do
Tesouro de dez anos pagar 6%, não comprarei um título
corporativo de dez anos, a menos que eu consiga 7%.” Isso
introduz o conceito de spreads de crédito. Nosso investidor
hipotético quer 100 pontos base para passar de um título
governamental para um “corporativo”. Se o consenso dos
investidores for o mesmo, será esse o spread.
E se deixarmos de lado os títulos com grau de
investimento? “Não vou nem tocar em um título sem grau de
investimento a menos que eu ganhe seiscentos sobre um
título do Tesouro de vencimento comparável.” Então aqueles
títulos devem render 12% — um spread de 6% sobre o que
paga o Tesouro — se quiserem atrair compradores.
Agora vamos sair da renda fixa. Tudo fica mais difícil,
porque você simplesmente não tem como sair por aí à
procura do retorno esperado em investimentos como ações
(porque seus retornos são conjecturais, não “fixos”). Mas os
investidores têm um senso para essas coisas.
“Historicamente, as ações da S&P retornaram 10%, e eu só
vou comprá-las se achar que continuarão assim.” Então, em
teoria, o investidor comum determina o lucro por ação, a taxa
de crescimento dos lucros e o porcentual de dividendos, e os
insere em um modelo de avaliação para chegar ao preço pelo
qual as ações da S&P retornarão 10% (embora eu não tenha
certeza de que o processo seja tão metódico assim na
atualidade). “E as ações mais arriscadas devem dar um
retorno maior; não vou comprar no NASDAQ, a menos que eu
consiga 13%.”
A partir daí, é para a frente e para cima. “Se eu conseguir
10% nas ações, preciso de 15% para aceitar a iliquidez e a
incerteza associadas ao setor imobiliário. E 25% se eu investir
em aquisições de ações ordinárias… e 30% para que eu me
interesse em investir em capital de risco, com sua baixa taxa
de sucesso.”
É assim que parece funcionar, e, na verdade, acho que
geralmente funciona assim mesmo (apesar de os requisitos
não serem os mesmos em todos os momentos). O resultado é
uma linha de mercado de capitais do tipo que se tornou
familiar para muitos de nós, como mostrado a seguir.
O processo descrito resulta na formação de um continuum de
risco/retorno ou linha do mercado de capitais (LMC). Esse processo
estabelece o nível geral de retorno em relação ao risco, bem como o
quantum de retorno incremental prometido — ou o “prêmio de risco”
— que é esperado para o risco incremental. Em um mundo racional,
o resultado será o seguinte:
Investimentos que parecem mais arriscados serão
precificados para que pareçam oferecer maiores retornos.
O acréscimo do retorno por unidade de risco incremental
será razoável e apropriado.
O aumento no retorno esperado geralmente parecerá ser
consistentemente proporcional ao risco incremental (ou
seja, uma unidade de risco incremental em um ponto no
continuum provavelmente trará o mesmo retorno
incremental de uma unidade similar de risco incremental
em outro lugar no continuum).
Assim, não haverá pontos específicos no continuum em
que o risco é recompensado muito mais ou muito menos
do que em outros (ou seja, investimentos cujo retorno
ajustado ao risco prometido é obviamente superior ao
restante).
Em um mundo racional, quaisquer violações dessas cláusulas
poderiam fazer com que o capital se movesse de tal forma que os
preços dos ativos mal precificados fossem aumentados ou
empurrados para baixo. Em consequência:
As violações seriam corrigidas.
Todos os investimentos ofereceriam retornos ajustados ao
risco que seriam justos em relação uns aos outros.
Os investidores poderiam aumentar seus retornos apenas
aumentando a quantidade de risco que suportam.
No caso de os investidores sempre se comportarem dessa
maneira, isso implicaria um mundo constituído de “mercados
eficientes”, no qual nenhum investimento oferece um retorno mais
bem ajustado ao risco do que qualquer outro. É claro que os
mercados nem sempre funcionam como deveriam — as coisas nem
sempre têm o preço certo —, mas a sugestão geral de eficiência é
lógica demais para ser desconsiderada. (A eficiência do mercado é
outro tópico essencial, mas não irei mais fundo nisso — veja o
Capítulo 2 de The Most Important Thing, bem como a segunda
metade de “Getting Lucky” (“Tendo Sorte”, em tradução livre, janeiro
de 2014.)
Convém frisar que as flutuações nas atitudes em relação ao risco
podem causar exceções aos princípios descritos aqui. Há ocasiões
em que os investidores ficam muito avessos ao risco, e, em outras,
relaxam essa disposição e tornam-se tolerantes demais a ele.
Quando eventos positivos ocorrem como descrito no último
capítulo e euforia, otimismo e ganância aumentam, os investidores
tendem a se tornar menos avessos ao risco do que o usual e do que
deveriam ser. Quais são os efeitos (seguindo a lista de atitudes
tomadas pelos investidores na página 110)?
Ao se sentirem mais confortáveis com o meio ambiente e
mais otimistas quanto aos prováveis resultados, eles
baixam a guarda com relação ao processo de
investimento.
Uma vez que eles já não consideram o investimento como
algo arriscado, não veem a necessidade de uma análise
minuciosa.
Eles tendem a fazer suposições mais generosas e
substituem o ceticismo pela credulidade.
Eles tendem a se contentar com uma margem de
segurança menor.
Vendo o risco como menos preocupante, eles não mais
exigem prêmios de risco tão amplos quanto no passado.
Eles se comportam menos defensivamente, pois são mais
atraídos pelos retornos dos investimentos arriscados e
menos desconfiados do risco que envolvem.
É por essas razões que, como você verá no próximo capítulo, os
financiamentos mais duvidosos são concluídos nas economias e
mercados financeiros mais dinâmicos. Nos bons tempos, as
pessoas ficam mais otimistas, abandonam a cautela e aceitam
prêmios de risco baixos em investimentos arriscados. Além disso,
menos pessimistas e menos temerosos, tendem a perder o
interesse pelo trecho mais seguro do continuum risco/retorno. Essa
combinação de elementos leva os preços dos ativos de risco a
subirem em relação aos ativos mais seguros. Assim, não é de
admirar que investimentos mais imprudentes sejam feitos mais em
momentos bons do que em ruins. Isso acontece mesmo que os
preços mais altos em investimentos arriscados possam significar
que os prêmios de risco prospectivos, oferecidos para tornar esses
investimentos mais arriscados, são mais acanhados do que em
tempos de maior consciência sobre o risco.
A menor insistência em adequar os prêmios de risco faz com que
a inclinação da linha do mercado de capitais (LMC) se achate.
Voltando à geometria do ensino médio, lembramos que a inclinação
de uma linha em um gráfico é a distância percorrida no eixo vertical
por unidade de mudança ao longo do eixo horizontal. A inclinação
da LMC reflete a quantidade de retorno potencial incremental que é
oferecida por unidade de risco incremental suportado. Assim, é uma
indicação direta do grau de aversão ao risco presente no mercado.
Em períodos de esquecimento em relação ao risco — ou alta
tolerância a riscos —, a redução da demanda em termos de prêmios
de risco faz com que a inclinação da linha se achate e o nível de
compensação de risco seja menor.
O menor ângulo de inclinação da LMC significa, por definição, que
há menor incremento de retorno por unidade de aumento do risco.
Em termos mais simples, o retorno do risco é baixo.
Em minha opinião, todos esses itens acompanham logicamente a
observação direta. O processo é o seguinte:
Eventos positivos levam ao aumento do otimismo.
O aumento do otimismo deixa as pessoas mais tolerantes
ao risco.
O aumento na tolerância ao risco ocasiona menores
prêmios de risco.
Uma redução na exigência de prêmios de risco equivale a
menor exigência de retornos sobre ativos de risco.
Uma redução da exigência de retornos sobre ativos de
risco faz seus preços crescerem.
Preços mais altos tornam os ativos ainda mais arriscados
(mas também atraem a compra por parte dos “investidores
por impulso”, que vão em busca de ações em ascensão).
Daí se segue que o risco é alto quando os investidores sentem
que ele é baixo. E a compensação de risco é mínima se o risco está
no máximo (justo quando a compensação de risco é mais
necessária). É demais para o investidor racional!
Para mim, a conclusão de tudo isso é que a maior fonte de risco
de investimento é a crença de que não há risco. A tolerância
generalizada ao risco — ou um elevado grau de conforto do
investidor em relação ao risco — é o maior precursor dos
subsequentes declínios do mercado. Porém, como a maioria dos
investidores segue a progressão descrita antes, isso raramente é
percebido no momento em que percebê-la — e tornar-se cauteloso
— é mais importante.
Como o outro lado da moeda deve ser óbvio, não me deterei nele.
Mas usarei um minuto para falar sobre o que acontece quando o
declínio do ciclo de atitudes em relação ao risco torna os
investidores mais avessos ao risco.
Uma das características mais importantes dos ciclos psicológicos
é sua compulsão pelo extremismo. Os ciclos oscilam não apenas
em direções e graus que fazem sentido, mas também de maneiras
estapafúrdias e radicais. Por exemplo, os investidores, em grupo, de
vez em quando dizem: “Deixe o risco para lá. Ficaremos todos
ricos”. Sua paixão e entusiasmo fazem com que aceitem pagar
preços tão altos — e caiam em histórias tão irrealistas —, que,
depois do fato, seria algo risível se o dano causado não fosse tão
grande.
E depois de haverem se excedido em tais desatinos — e perdido
muito dinheiro na forçosa desaceleração rumo à prudência —,
punem-se pelos extremos de ganância e credulidade. Eles se
perguntam como puderam ter se comportado de maneira tão
insensata. Confessam que nunca entenderam realmente o
funcionamento dos investimentos exóticos e fascinantes em que se
envolveram, e prometem nunca mais entrar em uma dessas.
Assim como a inadequação de sua aversão ao risco lhes permitia
empurrar os preços para cima e comprar na alta — hipnotizados
pela visão de dinheiro fácil em um mundo no qual não podiam
visualizar qualquer risco —, agora eles jogam os preços para baixo
e vendem quando o mercado está no fundo do poço. A experiência
recente e desagradável deles os convence — ao contrário do que
pensavam quando tudo estava indo bem — de que o investimento é
um campo arriscado no qual não deveriam ter entrado. E, como
consequência, sua aversão ao risco vai de inadequada a excessiva.
A recente experiência dolorosa e a expectativa negativa
que adquiriram sobre o que vem pela frente aumentamlhes a cautela.
Agora, associando investimentos com perda, em vez de
lucro, eles passam a dar ênfase à precaução contra mais
perdas em relação à procura de oportunidades.
Eles se asseguram de que seus pressupostos são
conservadores o suficiente para descartar todo o potencial
de desapontamento, e incorporam o extremo ceticismo.
Eles acham impossível identificar — e mesmo imaginar —
investimentos cuja margem de segurança seja adequada.
Por verem risco em todos os lugares, consideram
insuficientes até mesmo os atuais e inchados prêmios de
risco.
Eles se tornam extremamente preocupados. Do mesmo
modo que a tolerância ao risco os posicionou como
compradores de ativos cujos preços estavam nas nuvens,
agora sua gritante aversão ao risco faz deles vendedores
— certamente não compradores — no chão do mercado.
É esse o ponto. Em tais circunstâncias, a percepção de risco é
exagerada, e a inclinação da LMC torna-se excessiva.
De forma totalmente contrária à minha descrição da LMC plana, a
maior inclinação aqui significa que o incremento de retorno
esperado por unidade de aumento de risco é extraordinariamente
generoso. Este é um mercado avesso ao risco, e oferece um retorno
exagerado para o risco. Assim, a recompensa por ter um risco
incremental é maior exatamente no momento em que — melhor
dizendo, simplesmente porque — as pessoas se recusam
absolutamente a suportá-lo.
Como as atitudes de risco oscilam de alto para baixo, o mesmo
acontece com as oportunidades de lucro ou perda. Na bonança, os
preços dos ativos estão subindo, os investidores veem o futuro com
óculos cor-de-rosa, arriscam-se como seus amigos e lucram com
facilidade. Todos sentem o mesmo, o que significa que pouca
aversão ao risco é incorporada nos preços e, portanto, eles são
precários. Os investidores tornam-se tolerantes ao risco justamente
quando deveriam aumentar sua aversão a ele.
Analogamente, mercados em baixa, investidores idem. Os
mercados são tidos como um lugar para perder dinheiro, o risco
como algo a ser evitado a todo custo, e as perdas são
desoladamente prováveis. Como descrevi no final do último capítulo,
na prevalência de um excesso de cautela, ninguém (a) aceitará
possibilidades cercadas de qualquer otimismo e (b) admitirá a
eventualidade de que uma suposição possa ser “ruim demais para
não ser verdade”.
Assim como a tolerância ao risco é ilimitada no topo, é inexistente
na parte inferior. Essa negatividade faz com que os preços caiam
para níveis em que as perdas são altamente improváveis, e os
ganhos possam ser enormes. Mas as cicatrizes das quedas
anteriores tendem a ampliar a aversão ao risco dos investidores,
imobilizando-os bem quando preços e risco estão em seu nível mais
baixo.
Eu gostaria de fornecer um exemplo real de mudança de atitudes,
com o benefício de alguma quantificação, tirada de “The Happy
Medium” (julho de 2004):
A prevalência da tolerância ao risco (ou inconsciência do
risco) no final da década de 1990 era insofismável. Eu
pessoalmente ouvi um importante estrategista de corretagem
dizer: “As ações estão superfaturadas, mas não o suficiente
para impedi-las de serem uma compra”. E todos nós ouvimos
o homem na rua dizer: “Meu fundo de pensão empresarial vai
tão bem que não me incomodaria se caísse em 1/3”. (Onde
estaria esse sujeito dois ou três anos depois?)
Não, essas atitudes tolerantes ao risco não persistirão para
sempre. Em algum momento algo irá se intrometer, expondo
as imperfeições dos títulos e os preços muito altos. Os preços
vão diminuir. Os investidores que possuíam $100 terão agora
$60. E o medo de perder os $60 restantes superará a vontade
de recuperar os $40 perdidos. A aversão ao risco voltará (e
em geral excessivamente).
Que tal alguma quantificação desse ciclo? Em meados de
1998, pouco antes da quebra do fundo norte-americano LTCM
(Long-Term Capital Management2) trazer os investidores, à
exceção dos “techies”, de volta ao bom senso, cerca de $12,5
bilhões em títulos adimplentes renderam mais de 20% — um
possível limite para o rótulo de “dívidas em dificuldades”
[distressing debt, tratam-se de títulos inadimplentes de
empresas sob ou prestes a ficar protegidas pela Lei de
Falências dos EUA. Veja mais no Capítulo X]. Como os
investidores não estavam muito preocupados com o risco,
exigiram retornos superelevados de relativamente poucos
títulos não inadimplentes. A expressão “sorriso de orelha a
orelha” pode descrever melhor a atitude deles.
Mas o falecimento da Long-Term despertou os investidores
para a existência do risco, e, um ano depois, o volume de
títulos cujo rendimento superou 20% mais que triplicou,
chegando a $38,7 bilhões. Em meados de 2002, quando os
escândalos corporativos aterrorizavam o mercado de dívidas,
os 20% de seus rendimentos haviam crescido para $105,6
bilhões, 8,5 vezes o nível de apenas quatro anos antes. A
aversão ao risco percorreu um longo caminho desde a
inadequação e, como os acontecimentos posteriores
mostraram, tornou-se excessiva. Em 31 de março de 2004,
aquele número caiu 85%, para apenas $16,2 bilhões; a
aversão ao risco havia retrocedido (e possivelmente se
tornado novamente inadequada). Tenho certeza de que os
fundamentos não flutuam em qualquer grau como o refletido
nos preços, nos rendimentos e, portanto, no registro das
“dívidas em dificuldades”. Como de costume, a realidade foi
muito exagerada pelas oscilações na psicologia.
Quando os investidores em geral são muito tolerantes ao
risco, os preços dos valores mobiliários podem incorporar
mais riscos do que podem dar de retorno. E quando os
investidores são muito avessos ao risco, os preços podem
proporcionar mais retorno que risco.
O título do memorando citado — “The Happy Medium” (O Meio
Termo, em tradução livre) — foi inspirado na sabedoria de minha
mãe e em seus constantes lembretes de que deveríamos evitar
comportamentos extremos. Em vez disso, devemos tender para o
meio, na maioria das coisas, em direção a um equilíbrio razoável
entre o muito e o pouco.
Porém, minha experiência como investidor me leva a concluir que
o meio termo raramente é visto. Se você refletir sobre o que informei
acerca do gráfico de um ciclo típico na página 26, você pode ficar
impressionado ao descobrir que nos estágios “a”, “d” e “g”,
fenômenos cíclicos tendem a retornar dos extremos e se mover na
direção de uma média mais razoável. Que coisa racional é isso!
Mas então, como já disse, normalmente ocorre que essas
“correções dos extremos” continuam além do ponto médio nos
estágios “b”, “e” e “h”, em direção ao extremo oposto.
Um estatístico que olhar para o gráfico anterior lhe dirá que, em
média, o fenômeno traçado é o valor central ou está vinculado à
tendência secular. Nós, porém, o vemos quase sempre em
movimento: ora se afastando, ora recuando em direção àqueles
pontos médios. Na verdade, permanece nos altos e baixos extremos
tanto quanto nos pontos médios. Em relação ao risco, a maioria dos
investidores age da mesma forma.
Qual é a maior fonte de risco do investimento? Os
desenvolvimentos econômicos negativos? Eventos corporativos que
ficam aquém das previsões? Empresas cujos produtos se tornam
não competitivos? Diminuição da massa salarial? Baixa
credibilidade? Não, decorre de uma situação na qual os preços dos
ativos atingem níveis excessivamente altos como resultado de um
novo e inebriante argumento de investimento que não pode ser
justificado com base nos fundamentos, e que faz com que
avaliações demasiadamente altas lhe sejam atribuídas. E quando
esses preços são atingidos? Quando a aversão ao risco e a cautela
evaporam, e a tolerância ao risco e o otimismo ocupam o espaço
vazio. Essa condição é o maior inimigo do investidor.
O que Acontece Quando a Aversão ao Risco É
Insuficiente?
A crise financeira global de 2007–2008 representou o maior tombo
financeiro que presenciei em minha vida, e, consequentemente,
apresenta a melhor oportunidade de observar, refletir e aprender.
Vários elementos contribuíram para que isso viesse a ocorrer. A
seguir, uma lista parcial, relativa ao mercado dos EUA:
As políticas governamentais dos EUA de apoio à
aquisição da casa própria levaram, por definição, à
inclusão de pessoas que historicamente não tinham
condições para tal — em um momento em que os preços
dos imóveis estavam subindo.
O Banco Central norte-americano (Fed) diminuiu as taxas
de juros, fazendo com que a demanda por instrumentos
financeiros de alta rentabilidade, como títulos hipotecários
estruturados/alavancados, aumentasse.
Havia uma tendência crescente entre os bancos de
conceder empréstimos hipotecários, empacotá-los e
vendê-los (em vez de retê-los).
As decisões de emprestar, estruturar, atribuir
classificações de crédito e investir foram feitas com base
na extrapolação de baixas taxas históricas de
inadimplência de hipotecas, algo que não foi questionado.
Esses quatro pontos anteriores resultaram em uma ânsia
crescente de conceder empréstimos hipotecários, com o
consequente declínio dos padrões de concessão de
crédito.
Novos e não testados títulos lastreados em hipotecas
foram desenvolvidos com a promessa de altos retornos
com baixo risco, algo de grande apelo em tempos não
céticos.
Leis e regulamentações de proteção foram flexibilizadas,
como a Lei Glass-Steagall (que proibia a criação de
conglomerados financeiros), a regra de “uptick” (que,
fixando limites de alta dos valores mobiliários, impedia que
os operadores que apostaram contra ações as obrigassem
a uma venda curta ininterrupta), e as regras que limitavam
a alavancagem dos bancos, permitindo que ela quase
triplicasse.
Finalmente, a publicação pela mídia dos EUA de artigos
afirmando que o risco havia sido eliminado mediante a
combinação dos seguintes fatores:
a agilidade do Fed em estimular a economia
quando se fazia necessário;
a confiança de que o excesso de liquidez que flui
para a China graças às suas exportações e para
os produtores de petróleo nunca deixaria de tomar
o caminho de volta, sustentando os preços dos
ativos; e
as inovações de Wall Street, que “fatiam e
dividem” com maestria o risco, o repartem
amplamente e o deixam em condições de ser
adequadamente assumido.
A ocorrência de todos esses elementos sinalizava a presença de
tolerância ao risco. Na verdade, eles não se materializariam se a
tolerância ao risco não tivesse dominado a psique dos investidores,
credores, devedores e reguladores. Um nível de tolerância ao risco
como a observada nos anos imediatamente anteriores à crise deve
ser muito preocupante, pois implica ausência de preocupação,
cautela e ceticismo.
Não havia como evitar que esses desenvolvimentos — e a
tolerância ao risco, ou negligência ao risco, que estava por trás
deles —, em última análise, levariam a comportamentos financeiros
inseguros, em particular por meio da criação de produtos financeiros
temerários e sujeitos ao fracasso. A capacidade de emprestar
vultosos capitais a baixas taxas de juros fez com que os
compradores de ativos se sentissem em uma “era de ouro”. Mas ela
não se caracterizava pela disponibilidade de investimentos sadios e
com preços moderados. Em vez disso, a pronta disponibilidade de
alavancagem facilitou o investimento pesado em ativos cujos preços
haviam subido muito e em instrumentos financeiros inovadores não
testados, sintéticos e alavancados, muitos dos quais continuariam a
dar errado.
Talvez o fator a ser apontado como chave para tal situação tenha
sido o comportamento de risco adotado por parcela das instituições
financeiras nesse período. Quando o mundo é caracterizado por
macroeventos benignos, atividade hiperfinanceira e inovação
financeira, os provedores de capital tendem a competir por
participação de mercado em um processo que eu chamo de “a
corrida para o fundo” (mais tarde farei referência a um memorando
com esse nome). O clima nos anos de 2005 a 2007 foi resumido
pelo CEO do Citigroup, Charles Prince, em junho de 2007,
virtualmente às vésperas da crise financeira global, em uma
declaração que se tornou emblemática da época: “Quando a música
para, em termos de liquidez, as coisas se complicam. Mas enquanto
a música estiver tocando, você tem que se levantar e dançar. Nós
ainda estamos dançando”.
Em outras palavras, os bancos tinham que fazer — e estavam
fazendo — coisas que dependiam, para o sucesso deles, da
continuação de condições anormalmente favoráveis, e haveria
problemas se essas condições se normalizassem. Nenhum
banqueiro, entretanto, pode se recusar a participar por medo de
perder participação de mercado. Os instrumentos não foram
testados e eram potencialmente defeituosos, mas ninguém estava
disposto a deixar o bonde passar. Esse é o tipo de comportamento
de manada que tipifica, cria e exacerba os ciclos.
Em teoria, um CEO do banco poderia ter se recusado a participar
daquela insensatez. Mas dadas as circunstâncias, qualquer um que
ficasse de fora do baile perderia participação no mercado e não
conseguiria pôr as mãos no “dinheiro fácil” que seus concorrentes
estavam recolhendo, e poderia ser forçado a deixar o mercado por
investidores ativistas. Assim, os bancos faziam ofertas agressivas
pela oportunidade de disponibilizar capital, como se a música nunca
fosse parar. Quem sabe que há ciclos, porém, deixa claro que um
dia a orquestra deixa de tocar. Esse tipo de tolerância/ausência de
risco desempenha um papel essencial na fase ascendente que
precede e define o cenário para cada ato dramático de reviravolta.
À medida que o período de 2005 a 2007 avançava, descortinavase uma grande oportunidade para observar eventos que tornavam
manifestas as atitudes dos participantes do mercado em relação ao
risco e para chegar a conclusões úteis. Acredito que o seguinte
trecho de “The Race to the Bottom” (“A Corrida para o Fundo”, em
tradução livre), um memorando que escrevi sobre o assunto em
fevereiro de 2007 — apenas alguns meses antes dos primeiros
sinais de que os maus momentos estavam chegando —, é um
excelente exemplo. Ele demonstra o valor potencial de inferências
extraídas de experiências isoladas e talvez anedóticas:
Embora os últimos anos tenham me dado muitas
oportunidades de maravilhar-me com os excessos no
mercado de capitais, neste caso o que provocou meu grito de
guerra — “isso pede um memorando” — chegou aos jornais
na Inglaterra durante minha última estada lá. O Financial
Times relatou em 1º de novembro de 2006:
O Abbey, segundo maior provedor de crédito imobiliário do
Reino Unido, elevou o limite de financiamento aos
compradores de casas para cinco vezes o salário individual
ou conjunto, superando os patamares tradicionais de cerca
de 3,5 vezes o salário. Ele acompanhou a decisão da
semana passada do Bank of Ireland Mortgages e da Bristol
and West de aumentar tais limites de quatro para 4,5 vezes.
Em outras palavras, havia uma regra tradicional informando
que os tomadores de empréstimos podiam assumir hipotecas
até um valor equivalente a mais de três vezes seus salários.
Mas agora eles podem tomar emprestado cinco vezes o que
ganham — cerca de 50% a mais. O que se pode deduzir daí?
Há ao menos quatro hipóteses:
Os antigos padrões eram conservadores, e agora os
novos estão corretos.
As condições mudaram, de tal forma que o novo padrão
é tão conservador para hoje como o antigo era em sua
época.
É razoável que os credores hipotecários aceitem
maiores níveis de inadimplência e, portanto, retornos
líquidos mais baixos, uma vez que o custo de capital
diminuiu.
A pressa em emprestar dinheiro fez com que a empresa
financeira afrouxasse seus padrões.
Não conheço a fundo o mercado hipotecário do Reino Unido,
e é minha intenção neste memorando comentar as tendências
gerais do mercado de capitais, e não um setor específico.
Além disso, é certamente verdadeiro que taxas de juros mais
baixas significam que um determinado salário pode dar conta
de uma hipoteca maior (e isso provavelmente permanecerá
assim desde que (1) os mutuários mantenham seus empregos
e (2) suas hipotecas tenham taxas fixas). Mas se você acha
que a razão da Abbey para dar esse passo pode ser lógica
como essa, a pergunta a ser feita é “por que agora?”
Razões lógicas e decisões sóbrias podem estar envolvidas
aqui. Mas também a concorrência para colocar o dinheiro e a
habitual crença de que “desta vez é diferente”. Quem
empresta recursos e que investe invariavelmente deixa de
lado as disciplinas consagradas pelo tempo quando os ciclos
chegam a extremos, acreditando que as condições atuais são
distintas daquelas que prevaleciam no passado, quando
essas disciplinas eram apropriadas. Estas também
invariavelmente mostram que os ciclos se repetem e nada
realmente muda. O que vimos no mercado hipotecário dos
EUA, à medida que os preços dos imóveis subiram e as taxas
de juros caíram? Primeiro, taxas promocionais, mais baixas.
Em seguida, uma maior porcentagem do valor financiado em
relação ao valor de avaliação do imóvel. Depois,
financiamento de 100%. Então, empréstimos de baixa
amortização. Daí, empréstimos sem amortização. A seguir,
empréstimos que não exigem documentação de emprego ou
histórico de crédito. Todas essas coisas tornaram possível
que mais compradores procurassem casas mais caras, mas
ao mesmo tempo tornaram as hipotecas mais arriscadas para
os credores. E esses desenvolvimentos ocorreram quando os
preços das residências estavam altos, e as taxas de juros
estavam em níveis baixos. No final, os compradores
assumiam a maior hipoteca possível em função de sua renda
e das taxas de juros vigentes. Tais hipotecas os deixariam nas
casas de seus sonhos… enquanto as condições não se
deteriorassem, o que invariavelmente ocorreria.
Na televisão dos EUA havia um programa chamado Name
That Tune (“Qual é a Música?”, em tradução livre). Nele, um
candidato “x” dizia: “Adivinho o nome da música em seis
notas”. O candidato “y” contrapunha: “Faço o mesmo com
cinco notas”. Então o candidato “x” replicava: “Eu posso dizer
qual é a música em quatro notas”. Por fim, tinha a chance de
acertar o nome da música aquele que se dispusesse a fazer a
aposta mais arriscada — tentar com base na menor
informação.
Assim, o Banco da Irlanda entrou na competição para
emprestar dinheiro para a compra de residências e declarou:
“Vou emprestar 4,5 vezes o salário do mutuário”. E o Abbey
disse: “Vou emprestar cinco vezes”. Quem “ganha” esse leilão
é aquele que vai colocar mais dinheiro com o mínimo de
segurança. Se isso é realmente ganhar ou perder, ficará claro
quando o ciclo girar, como aconteceu nos EUA no ano
passado. Mas certamente há uma corrida para o fundo
acontecendo… um concurso para se tornar a instituição que
fará empréstimos com a menor margem de erro.
Seja como for, nos últimos anos os padrões para
empréstimos hipotecários caíram, e o risco aumentou. Com
base na lógica? Possivelmente. Induzido (e exacerbado) por
um ciclo? Eu diria que sim. O FT citou John-Paul Crutchley,
analista do setor bancário do Merrill Lynch: “Quando o Abbey
empresta um múltiplo de cinco vezes o salário, isso pode ser
perfeitamente sensato — ou pode ser tremendamente
arriscado”. Certamente os empréstimos hipotecários se
tornaram mais arriscados. Em alguns anos, veremos se isso
foi uma assunção de risco inteligente ou um excesso de ardor
competitivo…
As condições atuais do mercado financeiro são facilmente
resumidas: excesso global de liquidez, interesse mínimo em
investimentos tradicionais, pouca preocupação aparente com
o risco e retornos prospectivos minúsculos em qualquer lugar
que se olhe. Assim, em face do preço de acesso a retornos
potencialmente adequados (mas menores do que os
prometidos no passado), os investidores aceitam de pronto
um risco significativo na forma de alavancagem elevada,
derivativos não testados e estruturas de negócios fracas. O
ciclo atual não é incomum na forma, apenas em sua
extensão. Minha opinião é a de que há pouco mistério sobre o
resultado final, mas neste ponto do ciclo são os otimistas que
parecem ver melhor as coisas.
Como é frequentemente o caso, eu poderia ter feito um
memorando mais curto simplesmente invocando minhas duas
citações favoritas, ambas se encaixando muito bem aqui.
A primeira é um comentário de John Kenneth Galbraith,
falecido em 2006. Tive a sorte de poder passar algumas horas
com o Sr. Galbraith um ano e meio antes e beneficiar-me em
primeira mão de sua sabedoria. Esta citação, mais uma vez, é
de seu inestimável livro A Short History of Financial Euphoria
[“Uma Breve História da Euforia Financeira”, em tradução
livre]. Parece particularmente apropriado nas circunstâncias
atuais:
Contribuindo para… a euforia, há dois outros fatores pouco
notados em nosso tempo ou em tempos passados. O
primeiro é a extrema brevidade da memória financeira. Em
consequência, desastres financeiros são rapidamente
esquecidos. E como corolário, quando ocorrerem as
mesmas (ou semelhantes) circunstâncias, às vezes em
apenas alguns anos, elas serão saudadas por uma nova
geração, muitas vezes jovem e sempre supremamente
autoconfiante, como uma descoberta brilhantemente
inovadora em um mundo financeiro e econômico mais
amplo. Pode haver poucos campos do esforço humano em
que a história conta tão pouco quanto no mundo das
finanças. A experiência passada, na medida em que faz
parte da memória, é descartada como o refúgio primitivo
daqueles que não têm a visão para apreciar as incríveis
maravilhas do presente.
A segunda é a advertência fundamental de Warren Buffett
sobre a necessidade de ajustar nossas ações financeiras com
base no comportamento do investidor ao nosso redor. Menos
palavras, mas provavelmente ainda mais úteis:
Quanto menor a prudência com que os outros conduzem
seus negócios, maior é a prudência com nossos próprios
assuntos.
Este memorando pode ser assim resumido: há uma corrida
para o fundo, refletindo uma redução generalizada no nível de
prudência por parte dos investidores e provedores de capital.
Ninguém pode provar neste momento que aqueles que
participam serão punidos, ou que seu desempenho de longo
prazo não excederá o de seus críticos. Esse, porém, é o
padrão usual.
Quem se recusar a entrar na fila de mercados
despreocupados como os de hoje, é provável, por um tempo,
(a) ficar atrasado em termos de retorno e (b) parecer um
sujeito ultrapassado. Mas nenhum dos dois é um preço caro a
pagar se isso significar manter a cabeça (e o capital) quando
outros acabam perdendo a deles. Em minha experiência,
tempos de frouxidão sempre foram seguidos por correções
nas quais são impostas penalidades. Pode não acontecer
desta vez, mas vou correr esse risco. Enquanto isso, a
Oaktree continuará a aplicar os padrões que nos serviram tão
bem nos últimos 20 anos.
Warren Buffett coloca isso muito bem na citação anterior; uso-a o
tempo todo. Ela resume apropriadamente tal fenômeno, assim como
a necessária reação contrária. Quando os demais se despreocupam
com o risco e deixam a cautela de lado, devemos tornar-nos mais
cautelosos. Mas também é preciso que se diga que quando outros
investidores estão em pânico, deprimidos, não conseguindo
imaginar condições nas quais o risco valeria a pena, devemos
tornar-nos agressivos.
O que Acontece Quando a Aversão ao Risco É
Excessiva?
A simetria dos ciclos financeiros, descrita detalhadamente no
Capítulo II, garantiu, em essência, que o ambiente tolerante ao risco
de 2005 a 2007 — e a explosão da emissão de instrumentos
financeiros que ajudou a ocorrer — seria seguido de uma séria
correção. E, claro, tal correção materializou-se.
Como informei anteriormente, a crise financeira global de 2007–
2008 forneceu o que espero que se torne uma oportunidade ímpar
para testemunhar um movimento pendular irracional transitando da
emoção à negatividade total, e um turno do ciclo nas atitudes em
relação ao risco rumo à excessiva aversão a ele. As ações que
haviam sido encorajadas pela excessiva tolerância ao risco entre
2005 e 2007 — como acabamos de descrever — revelaram-se
imprudentes e, como resultado, causaram grande dor e perda:
Nitidamente, a política de expansão do acesso à casa
própria fez com que muitas pessoas adquirissem um
imóvel que não tinham condições de pagar. Milhares
perderam o dinheiro que tinham investido em “home
equity3”, o valor gasto em quaisquer melhorias que
fizeram, além dos custos de mudança.
Hipotecas subprime que haviam sido emitidas sem
comprovação de renda ou emprego mostraram-se
insensatas.
Práticas frouxas de empréstimos hipotecários — ao lado
de incontáveis fraudes hipotecárias que essas práticas
não conseguiam prevenir — resultaram, não
surpreendentemente, na emissão de muitas hipotecas
cujos pagamentos os mutuários não podiam arcar.
A extrapolação das baixas taxas históricas de
inadimplência nas hipotecas deixou de lado a
possibilidade de que práticas frouxas dos financiamentos
resultassem em taxas de inadimplência nunca vistas.
As inadimplências reais excederam as taxas históricas nas
quais se basearam as decisões de estruturação de títulos,
ratings de dívidas e projeções de perdas. Assim, títulos
estruturados e alavancados, derivados de hipotecas
subprime, também inadimpliram números
impressionantes, provando o erro de suas altas
classificações.
Títulos lastreados em hipotecas alavancadas (e
derivativos financeiros, a maioria caracterizada por altos
níveis de alavancagem interna) geralmente deixam de se
constituir em ferramentas de melhoria de retorno para se
transformar em armas de destruição financeira em massa,
conforme fundos alavancados e valores mobiliários violam
acordos de empréstimo e os emissores são incapazes de
honrar suas dívidas.
É claro, os novos produtos financeiros demonstraram —
como de costume — que inovações financeiras que
prometem altos retornos com baixo risco raramente
cumprem essa promessa.
Quanto ao afrouxamento da regulamentação, os
conglomerados financeiros permitidos com a revogação
da Lei Glass-Steagall tinham enormes problemas, a
revogação da regra de uptick permitiu que as ações das
instituições financeiras sofressem implacável
desvalorização, e vários bancos se mostraram incapazes
de sobreviver sob os altos níveis de alavancagem que
haviam sido permitidos.
Em razão de tudo que havia acontecido antes, as consequências
incluíam inadimplência maciça de hipotecas e reinvestimentos em
casas, rebaixamentos de classificações de riscos e perdas com
títulos lastreados em hipotecas, colapso dos preços das casas e a
incapacidade de vendê-las, quebra dos mercados de ações e de
títulos corporativos e desaparecimento da liquidez, esgotamento
total da disponibilidade de crédito, e fracassos, resgates e falências
de vários bancos.
Claro, eventos improváveis provocaram a crise de crédito.
Muitas coisas ruins aconteceram e foram consideradas
improváveis (se não impossíveis), e aconteceram ao mesmo
tempo, para investidores significativamente alavancados.
(“The Limits to Negativism” — “Os limites do negativismo”, em
tradução livre —, outubro de 2008)
Qual foi o efeito psicológico cumulativo de todos os itens citados
em investidores e outros participantes do sistema financeiro?
Resumindo: assustou-os até a morte. Quando o medo absoluto
substitui um alto grau de confiança, a excessiva aversão ao risco
toma o lugar da tolerância a risco irrealista. Foi isso que aconteceu
no final de 2008 após a falência do Lehman Brothers. Os
vendedores correram em massa ao mercado para se desfazer
rapidamente de seus papéis. Os compradores ficaram de fora. Os
preços dos ativos entraram em colapso. E a liquidez do mercado
desapareceu.
Esses acontecimentos todos resultaram da substituição da
tolerância ao alto risco à aversão ao alto risco. E todos eles
contribuíram para alimentar ainda mais medo e aversão ao risco,
mais eventos negativos e medo generalizado. As mesmas pessoas
que haviam comprado produtos financeiros não testados com base
em suposições positivas e promessas boas demais para ser
verdade agora estavam convencidas de que todo o sistema
financeiro poderia derreter.
Para dar um exemplo da oscilação em direção à excessiva
aversão ao risco e seu impacto, compartilharei algo que aconteceu
algumas semanas após a falência do Lehman. Esse evento,
ocorrido em meio ao pior momento daquela situação, inspirou-me a
escrever o memorando “The Limits to Negativism”, citado
anteriormente.
A Oaktree, seguindo em menor grau as tendências gerais vigentes
nos EUA, criou seus primeiros fundos alavancados nos anos
imediatamente anteriores à crise. Usamos menos alavancagem do
que outros — por exemplo, quatro vezes o capital de nosso fundo
sênior de empréstimos europeu contra os sete ou oito mais
convencionais — e tentamos ser conservadores quanto aos ativos
que compramos, mas os acontecimentos nos levaram à beira de um
colapso. Antes da crise, os empréstimos “seniores4” ou
“alavancados” — mesmo aqueles com problemas de crédito —
raramente eram negociados a preços abaixo de 96 centavos por
dólar. Assim, sentimos que estávamos bem resguardados da
possibilidade de margens de cobertura ( demandas de credores por
capital acionário adicional) que, de acordo com nosso contrato de
empréstimo, só poderiam ocorrer se o preço médio de mercado dos
empréstimos na carteira caísse abaixo de 88. Mas após a falência
do Lehman, os preços dos empréstimos caíram para níveis sem
precedentes, pressionados, entre outras coisas, pelas vendas de
portfólios abandonados por detentores alavancados que receberam
chamadas de margem que não conseguiram satisfazer. Assim, 88
— e uma chamada de margem e um desastre — tornou-se uma
possibilidade concreta para nós. Conseguimos tempo para
responder ao nosso credor, e começamos a captar recursos
adicionais dos investidores do fundo para reduzir a alavancagem de
4:1 para 2:1. Os investidores, ao pedirmos para colocar mais capital,
entenderam ser isso uma oportunidade para: a) reter empréstimos a
preços descontados, em vez de desistir deles; b) aproveitar os altos
rendimentos implícitos dos empréstimos; e c) beneficiar-se da
alavancagem de baixo custo do fundo. Assim, a maioria deles
concordou com a solicitação que fizemos. No recém-reduzido nível
de alavancagem, o fundo foi protegido de uma chamada de
margem, a menos que o preço médio de nossos empréstimos
caísse para inimagináveis 65.
Mas com a total ausência de compradores e a continuação das
chamadas de margem e captação de fundos hedge, o mercado de
empréstimos continuou a cair, conforme a noção de “preço justo”
dava lugar a uma preocupação generalizada sobre qual seria o
preço “no fundo do poço”. Assim, o preço médio de nossa carteira
de empréstimos aproximou-se de 70. Senti que deveria reduzir a
alavancagem de 2:1 para 1:1, caso em que poderíamos eliminar
completamente a cláusula contratual que introduzira o risco de uma
chamada de margem.
Agora eu estava oferecendo aos investidores do fundo uma
chance de pagar para reter os empréstimos do fundo com
rendimentos até o vencimento da ordem de dois dígitos, e retornos
alavancados sobre o fundo total ao redor de 20% (como era antes
das perdas potenciais devido à inadimplência). É claro que, se um
investidor preexistente não conseguisse colocar sua participação
pro rata no patrimônio adicional e permitisse que outra pessoa o
fizesse, isso equivaleria a vender parte de sua participação no
portfólio do fundo com esses rendimentos.
Ainda assim, a combinação de ininterrupto declínio de preços,
liquidações de portfólios e ausência total de compradores tornou
difícil para alguns investidores do fundo realizar novos suplementos
de capital. Alguns estavam cansados de ter que lidar com tais
questões em seus portfólios. Outros não viam nisso uma chance de
resgatar seus investimentos, mas de possivelmente “jogar dinheiro
bom em dinheiro ruim”. Havia os que não tinham recursos líquidos à
mão. E alguns simplesmente não se sentiam confortáveis em
defender essa estratégia junto a seus superiores. Em fundos, pode
ser extremamente difícil realizar ações que exijam convicção e
firmeza. E isso levou ao evento que descreverei.
Para defender um investimento de capital adicional, fui a um fundo
de pensão, um dos investidores no fundo. Os rendimentos que
expus eram atraentes, eles admitiram, mas estavam preocupados
com a possibilidade de inadimplência dos empréstimos. A conversa
foi assim:
Fundo de pensão: Qual o potencial de inadimplência de
investimentos malsucedidos?
HM5: Bem, nossa taxa média de inadimplência nos últimos 26
anos em títulos de grau especulativo — de menor participação na
estrutura de capital para empréstimos como os do fundo — foi de
cerca de 1% ao ano (e tenha em mente que há recuperações no
caso de inadimplência, o que significa que nossas perdas de crédito
foram inferiores a 1% ao ano). Assim, a inadimplência em nossa
taxa histórica pouco faria para diminuir o retorno na faixa dos 20%
prometidos.
Fundo de pensão: Mas e se for pior que isso?
HM: No pior período de cinco anos que já tivemos, a inadimplência
foi em média de 3% ao ano. Obviamente, não é um problema com
relação aos rendimentos dos quais estamos falando.
Fundo de pensão: Mas e se for pior que isso?
HM: A taxa média de inadimplência no universo de títulos de grau
especulativo — sem assumir qualquer capacidade de evitar
inadimplência por meio de uma análise de crédito — foi de 4,2% ao
ano. Mesmo nesse nível, as perdas claramente não fariam muito
para prejudicar os resultados desse investimento.
Fundo de pensão: Mas e se for pior que isso?
HM: Os piores cinco anos na história, em termos universais,
tiveram uma média de 7,3% — ainda não é um problema.
Fundo de pensão: Mas e se for pior que isso?
HM: A pior taxa de inadimplência de um ano na história de títulos
de grau especulativo foi de 12,8%. Isso ainda deixa muito retorno
aqui.
Fundo de pensão: Mas e se for pior que isso?
HM: Uma vez e meia o pior ano da história seria de 19%, e ainda
teríamos um pouco de dinheiro, dado o rendimento do portfólio de
20. E para um retorno tão mínimo ser o resultado, padrões dessa
ordem de magnitude teriam que acontecer a cada ano — não
apenas uma vez.
Fundo de pensão: Mas e se for pior que isso?
A essa altura, perguntei: “Vocês têm algum patrimônio?”, e lhes
disse que se acreditassem — e acreditassem de verdade nos
cenários apocalípticos que estavam me apontando —, seria melhor
sair da sala imediatamente e vender tudo.
Quero com essa história colocar que, em um ambiente negativo, a
aversão excessiva ao risco pode fazer com que as pessoas
submetam os investimentos a escrutínio excruciante e suposições
negativas infinitas (assim como podem ter feito pouca ou nenhuma
avaliação e se apoiado em premissas cor-de-rosa quando
investiram em tempos inebriantes). Em pânico, as pessoas passam
100% do tempo garantindo que não haja perdas… quando deveriam
se preocupar em perder grandes oportunidades.
Em épocas de extremo negativismo, uma exagerada aversão ao
risco provavelmente fará com que os preços afundem e perdas
adicionais sejam altamente improváveis: o risco de perda, portanto,
é mínimo. Como já indiquei anteriormente, a coisa mais arriscada do
mundo é a crença de que não há risco. Da mesma forma, o
momento mais seguro (e mais recompensador) de comprar
geralmente é aquele em que todos estão convencidos de que a
esperança morreu.
Se fosse possível fazer apenas uma pergunta sobre cada
investimento que eu estava considerando, ela seria simples: quanto
de otimismo está embutido no preço? Se muito, provavelmente
significaria que os eventuais desenvolvimentos favoráveis foram
precificados, que o preço é alto em relação ao valor intrínseco e que
há pouca margem para erro em caso de decepção. Mas se o
otimismo é baixo ou ausente, é provável que o preço seja baixo, que
as expectativas são modestas, que surpresas negativas são
improváveis e que a mais leve mudança para melhor resultaria em
apreciação. A reunião do fundo de pensão descrita antes foi
importante pela simples razão de que indicava que todo otimismo
havia sido extirpado da mente dos investidores.
Terminada a reunião, praticamente corri para meu escritório para
escrever “The Limits to Negativism” mais ou menos no ponto
daquele ciclo, quando se poderia ter comprado a maior dívida com
os preços mais baixos. Nele compartilhei a seguinte realização:
Muitas coisas ruins consideradas improváveis (se não
impossíveis) aconteceram, e ao mesmo tempo, para
investidores com alavancagem significativa. Assim, a
explicação mais fácil é a de que as pessoas prejudicadas na
crise de crédito não eram céticas — ou pessimistas — o
suficiente.
Disso resultou uma epifania: ceticismo e pessimismo não
são sinônimos. Ceticismo clama por pessimismo quando o
otimismo extrapola. Mas também clama por otimismo quando
o pessimismo é demasiado. Vou escrever mais sobre o
assunto, mas, na verdade, não é tão simples assim.
Fazer o oposto do que os outros fazem, ou “nadar contra a
corrente”, é essencial para o sucesso do investimento. Mas
como a crise de crédito atingiu um pico na semana passada,
as pessoas se deixaram levar, em vez de resistir. Eram raros
os otimistas; a maioria era pessimista em algum grau. Alguns
se tornaram genuinamente deprimidos — até mesmo alguns
grandes investidores que conheço. Relatos cada vez mais
negativos do colapso próximo foram trocados via e-mail. Não
houve quem fosse cético ou dissesse “que o horror de uma
situação dessas era improvável”. O pessimismo alimentou-se
de si mesmo. A única preocupação das pessoas era proteger
seus portfólios para superar o colapso iminente ou levantar
dinheiro suficiente para atender aos resgates. A única coisa
inexistente na semana passada eram ofertas agressivas de
compra de títulos. Então os preços caíram, e caíram vários
pontos de cada vez — ou seja, “a casa caiu”.
Espero que este relato contemporâneo lhe dê uma ideia do que é
uma aversão excessiva e despropositada ao risco, e também uma
noção de como se posicionar em circunstâncias como essas.
Pós-escrito: alguns dos investidores do fundo (incluindo o que
visitei naquele dia) se recusaram a suplementar o capital aplicado.
Sentindo que eu deveria fazer tudo que pudesse para manter vivo o
fundo, tomei o lugar deles. A chance de investir em um portfólio
alavancado de empréstimos seniores depreciados em um momento
de aversão excessiva ao risco fez desse um dos melhores
investimentos que já fiz… pois a falta de vontade dos outros em
participar desse mercado tornou os empréstimos absurdamente
baratos.
Este capítulo sobre o ciclo das atitudes em relação ao risco cresceu
e é um dos mais longos deste livro. Há uma boa razão para isso:
acredito que cobre um dos ciclos mais importantes. Em The Most
Important Thing há um capítulo-chave que fala sobre a importância
de saber onde estamos nos vários ciclos. Ter ciência de como os
investidores estão pensando e lidando com o risco é talvez a coisa
mais importante para se propor a ter. Em suma, a excessiva
tolerância ao risco contribui para a criação de perigos, e a oscilação
para a excessiva aversão ao risco deprime os mercados, criando
algumas das maiores oportunidades de compra.
O investidor racional é sempre diligente, cético e apropriadamente
avesso ao risco, mas também está constantemente à procura de
oportunidades de retorno potencial que mais que compensem o
risco. Esse é o ideal. Mas nos bons tempos ouvimos a maioria das
pessoas dizer: “Risco? Que risco? Não noto muita coisa que possa
dar errado: veja como as coisas estão indo bem. E, ademais, o risco
é meu amigo — quanto mais riscos, mais dinheiro posso ganhar.
Então, em momentos ruins, eles mudam, simplificando tudo: “Não
quero ganhar nem mais 1 centavo no mercado; só não quero mais
perder. Tire-me daqui!”
Convém frisar que, uma vez que os investidores racionais e não
emotivos são muito minoritários, a totalidade dos investidores
raramente alcança o equilíbrio relativo às suas atitudes em relação
ao risco, ou a qualquer outro aspecto da psicologia ou emoção
presentes na oscilação do ciclo ou no movimento pendular. Eles
tendem a não manter um equilíbrio saudável entre a aversão ao
risco que os compele a ser cauteloso e a tolerância ao risco que os
impele: geralmente um ou outro está na fase de ascendência
pronunciada. Isso é igualmente muito verdadeiro no que diz respeito
à ganância e ao medo, ao ceticismo e à credulidade, à disposição
de, às vezes, ver apenas aspectos positivos e, às vezes, apenas
negativos, e muitas outras coisas. Os ciclos da psicologia
demonstram claramente que os investidores permanecem muito
pouco tempo no “ponto médio feliz”.
A flutuação — ou inconstância — nas atitudes em relação ao risco
é consequência tanto do resultado de alguns ciclos quanto da causa
ou exacerbação de outros. E isso sempre vai continuar, já que
parece ser difícil para a maioria das pessoas se tornarem mais
otimistas e tolerantes a riscos quando as coisas estão indo bem e,
depois, quando tudo passa a andar mal, mais preocupadas e
avessas ao risco. Isso significa que elas estão mais dispostas a
comprar quando deveriam ser mais cautelosas e mais relutantes em
comprar quando deveriam ser mais agressivas. Investidores
superiores sabem disso e esforçam-se para agir no sentido
contrário.
1
Nota do Tradutor: trata-se de portfólios de ações eficiente, que maximiza a relação de
risco/retorno.
2
Nota do Tradutor: trata-se de um fundo de hedge.
3
Nota do Tradutor: uma modalidade de empréstimo pessoal com a garantia do imóvel
residência.
4
Nota do Tradutor: produto do mercado financeiro norte-americano que tem prioridade de
ressarcimento em caso de falência do mutuário.
5
Abreviação para Howard Marks.
IX
O CICLO DE CRÉDITO
O investimento superior não é caracterizado pela compra de
ativos de alta qualidade, mas por comprar quando o negócio é
bom, o preço é baixo, o retorno potencial é substancial e o
risco é limitado. Tais condições são muito mais comuns
quando os mercados de crédito estão na parte menos
eufórica e mais rigorosa de seu ciclo. A fase de “portas
fechadas” do ciclo de crédito provavelmente faz surgirem mais
barganhas do que qualquer outro fator isolado.
A
gora nossos fundamentos estão completos. Cobrimos os ciclos
econômicos e de lucro que se constituem no pano de fundo
das atividades de investimento e também o vaivém psicológico e
comportamental que ocorre em resposta a mudanças nos
fundamentos (e que tende à exacerbação). Agora vamos nos ater a
alguns tipos específicos de ciclos financeiros. Você notará que as
flutuações neles afetam fortemente os ciclos abordados nos
capítulos seguintes.
Como já discutimos, algumas atividades, como a compra de uma
casa, respondem prontamente aos movimentos do ciclo econômico,
e outras, como a compra de alimentos, não. Alguns ciclos têm um
efeito profundo em outros aspectos da economia e em outros ciclos,
e outros não. O tema deste capítulo, o ciclo de crédito, é, em ambas
as situações, o primeiro: reage de pronto aos desenvolvimentos
econômicos e é altamente influente. Por fim, também é
extremamente volátil. Assim, seus movimentos são poderosos e
radicais, e afetam grandemente a atividade em muitas outras áreas.
E todas essas coisas são exacerbadas pelas oscilações
psicológicas descritas nos Capítulos VII e VIII.
Note que o assunto aqui é por vezes referido como o ciclo do
mercado de capitais, em vez do ciclo de crédito. Eu não acho a
distinção importante. A rigor, “capital” refere-se a todo o dinheiro
usado para financiar um negócio, enquanto “crédito” refere-se à
parte do capital de uma empresa que é composta de dívida, em vez
de capital próprio. Na prática, essas duas denominações de ciclo
parecem ser usadas de forma intercambiável, embora eu encontre
muito menos referências a “ciclo do mercado de capitais”. Vou me
ater ao “ciclo de crédito” quando falar apenas sobre os mercados de
dívida, e posso cair no “ciclo do mercado de capitais” quando falar
sobre a disponibilidade geral de financiamento. Mas de qualquer
forma, e mais importante, as considerações que se aplicam a uma
se aplicam igualmente à outra.
A seguinte passagem de “Open and Shut” (“Abrir e Fechar”, em
tradução livre, de dezembro de 2010), chama a atenção para
algumas das coisas que escrevi anteriormente e contextualiza o
ciclo de crédito na série de ciclos:
Considere isto: os altos e baixos das economias são
geralmente atribuídos às flutuações nos lucros corporativos, e
estas, à ascensão e queda dos mercados de valores
mobiliários. Mas nas recessões e recuperações, o
crescimento econômico geralmente se desvia de sua linha de
tendência em apenas alguns pontos porcentuais. Por que,
então, os lucros corporativos aumentam e diminuem muito
mais? A resposta envolve as alavancagens financeira e
operacional, que magnificam o impacto sobre lucros e
receitas, crescentes e decrescentes.
E se os lucros flutuam dessa maneira — mais do que o PIB,
mas ainda moderadamente —, por que os mercados de
valores mobiliários disparam e colapsam tão dramaticamente?
Atribuo tal fato a flutuações na psicologia e, em particular, à
profunda influência da psicologia sobre a disponibilidade de
capital.
Em suma, conforme as economias flutuam e lucram um
pouco, a janela de crédito abre-se e fecha-se… Eis a razão
do título deste memorando. Tenho em mim que o ciclo de
crédito é o mais volátil dos ciclos e o de maior impacto.
Merece, portanto, muita atenção.
Veja como coloco essa questão, mais sucintamente, em “You
Can’t Predict. You Can Prepare” (“Você Não Pode Prever. Você
Pode Se Preparar”, em tradução livre, novembro de 2001):
Quanto mais estou envolvido em investir, mais impressionado
fico com o poder do ciclo de crédito. É necessária apenas
uma pequena flutuação na economia para produzir uma
grande flutuação na disponibilidade de crédito, com forte
impacto nos preços dos ativos e, no repique, na própria
economia.
Alterações na disponibilidade de capital ou crédito são uma das
influências mais basilares nas economias, empresas e mercados.
Embora o ciclo de crédito seja menos conhecido do homem comum
do que a maioria dos outros ciclos discutidos neste livro, considero
ser ele de suma importância e profunda influência.
A metáfora da janela, na citação anterior, ajuda bem na
compreensão do que é o ciclo de crédito: às vezes está aberto, às
vezes está fechado. E, de fato, as pessoas no mundo financeiro
referem-se “à janela de crédito” como “o lugar onde você vai pedir
dinheiro emprestado”. Quando a janela está aberta, o financiamento
é abundante e fácil de obter; se está fechada, o financiamento é
escasso e difícil de conseguir. Por fim, é essencial ter sempre em
mente que a janela pode passar de aberta a fechada em apenas um
instante. Há muito mais para entender completamente esse ciclo —
incluindo as razões para esses movimentos cíclicos e seu impacto
—, mas esse é o objetivo.
Por que esse ciclo tem a importância que atribuo a ele? Primeiro,
porque capital ou crédito é um ingrediente essencial no processo
produtivo. Assim, a capacidade de crescimento das empresas (e
economias) geralmente depende da disponibilidade de capital
incremental. Se os mercados de capitais estiverem inoperantes,
pode ser difícil financiar o crescimento.
Segundo, o capital deve estar disponível na ocasião do
vencimento da dívida para que possa haver refinanciamento dela. É
comum que as empresas (assim como a maioria das outras
unidades econômicas, como governos e consumidores) não quitem
suas dívidas. Na maioria das vezes, eles simplesmente as rolam.
Mas se for incapaz de assumir uma nova dívida no momento em
que sua dívida existente vence, uma empresa pode ficar
inadimplente. Onde se está no ciclo de crédito — se o crédito está
prontamente disponível ou é difícil de obter — é o maior fator
determinante de refinanciamento ou não de uma dívida.
Muitos ativos corporativos são de longa duração (como edifícios,
maquinário, veículos e boa vontade). No entanto, muitas empresas
adquirem tais ativos com empréstimos de curto prazo em virtude de
seu menor custo relativamente a vencimentos de prazo mais longo.
Essa estratégia — “tomar emprestado a curto prazo para investir no
longo prazo” — funciona bem na maioria das vezes, quando o
mercado de crédito está aberto e funcionando plenamente, o que
significa que a dívida pode ser rolada com facilidade no vencimento.
Mas o descompasso entre ativos de longo prazo que não podem ser
facilmente liquidados e dívidas de curto prazo pode facilmente
causar uma crise se o ciclo de crédito se tornar negativo, impedindo
o refinanciamento da dívida no vencimento. Esse descompasso
clássico, quando combinado ao rigor dos mercados financeiros, é
frequentemente a causa dos mais espetaculares colapsos
financeiros.
Em 2007, com a crise financeira global deslanchando e o
congelamento dos mercados de crédito, o Departamento do Tesouro
dos EUA tomou uma providência sem precedentes: a de garantir
todos os títulos de dívida corporativa de curto prazo — que têm
vencimentos de 270 dias ou menos — cuja rolagem poderia não ter
sido possível no vencimento, o que tornaria inadimplentes até
mesmo empresas mais fortes. De fato, as inadimplências poderiam
ter se concentrado entre as empresas de primeira linha, as quais
emitem títulos da dívida em bilhões exatamente porque sua forte
credibilidade lhes dá acesso fácil ao mercado desses títulos. (A
importância de o mercado estar aberto — e da capacidade de rolar
papéis no vencimento — sublinha a diferença essencial entre
patrimônio líquido positivo e liquidez. Mesmo uma empresa rica
pode ter problemas se não tiver dinheiro em mãos e não puder obtêlo para honrar seus vencimentos de dívidas, contas e outras
necessidades de dinheiro em caixa.)
Terceiro, as instituições financeiras representam um caso especial
de exagerada confiança nos mercados de crédito. Sua matériaprima é dinheiro, e precisam de financiamento para se manterem
funcionando. Nelas também ocorrem, com frequência, os maiores
desajustes de curto/longo prazo e colapsos potenciais. Considere,
por exemplo, um banco cujos depósitos podem ser sacados em
qualquer dia e que os usa para fazer empréstimos hipotecários com
prazo de liquidação de trinta anos. O que acontece se todos os
depositantes exigirem seu dinheiro de volta no mesmo dia ruim
(uma corrida no banco)? Se não houver acesso ao mercado de
crédito (e nenhum resgate do governo), esse banco pode quebrar.
Por último, o mercado de crédito emite sinais que têm grande
impacto psicológico. Quando fechado, faz com que o medo se
espalhe, até mesmo desproporcionalmente em relação às
realidades negativas das empresas. Condições difíceis podem
causar o fechamento do mercado de capitais — e mercados de
capitais fechados podem ter um impacto negativo nas condições
dos negócios (bem como nas opiniões dos participantes do mercado
sobre as empresas). Esse tipo de “círculo vicioso” faz parte da
maioria das crises financeiras.
O Ciclo de Crédito em Funcionamento
A esta altura você deve ter uma compreensão da natureza e
importância do ciclo de crédito. O próximo tópico a ser abordado é o
motivo pelo qual os ciclos de crédito ocorrem: o que faz com que o
crédito fique mais disponível em alguns momentos e menos em
outros?
A janela de crédito não tem mente própria, abrindo e fechando
quando bem lhe aprouver. Ao contrário, isso ocorre sob
determinadas circunstâncias. Em “You Can’t Predict. You Can
Prepare”, de novembro de 2001, coloquei o processo de
expansão/contração em contexto e o expliquei com detalhe:
O processo é simples:
A economia está em um período de prosperidade.
Os fornecedores de capital prosperam e aumentam
seus recursos.
A escassez de más notícias faz parecer que os riscos
associados aos empréstimos e investimentos
encolheram.
A aversão ao risco sai de cena.
As instituições financeiras agem no sentido de expandir
seus negócios, isto é, fornecer mais capital.
Elas brigam por participação de mercado, diminuindo os
retornos exigidos (por exemplo, reduzindo as taxas de
juros), baixando os padrões de crédito, fornecendo mais
capital para uma determinada transação e facilitando as
obrigações contratuais.
Os fornecedores de capital chegam a financiar tomadores de
empréstimos e projetos não merecedores de crédito. Como
afirmou The Economist no início deste ano [2001], “os piores
empréstimos são feitos nas melhores épocas”. Isso leva à
destruição do capital, ou seja, ao investimento de capital em
projetos cujo custo do capital excede sua taxa de retorno e,
eventualmente, também em projetos em que nem mesmo se
recupera o capital aplicado.
Quando esse ponto é alcançado, a inflexão é total.
As perdas desencorajam e afastam os credores.
A aversão ao risco cresce, e junto, as taxas de juros, as
restrições de crédito e as obrigações contratuais.
Menos capital é disponibilizado, e, no vale do ciclo,
apenas para os mais qualificados dos mutuários.
As empresas ficam famintas por capital. Os mutuários
são incapazes de rolar suas dívidas, causando
inadimplência e quebra de bancos.
Esse processo contribui e retroalimenta a contração
econômica.
É claro que, no ponto extremo, o processo está pronto para
ser revertido novamente. Nessa ocasião, como a concorrência
para fazer empréstimos ou investimentos é baixa, altos
retornos podem ser exigidos, bem como elevada capacidade
creditícia. Quem, nesse momento, atua no sentido contrário e
empenha capital tem uma chance de obter altos retornos, e
aqueles com o olhar em retornos potenciais começam a atrair
capital. Dessa forma, uma recuperação começa a ser
alimentada.
Às vezes as pessoas estão ansiosas para colocar dinheiro para
trabalhar, e isso abre a janela de crédito. Mas quando as
circunstâncias as fazem mudar de ideia, o financiamento pode ficar
indisponível. Tal como acontece com tantas outras coisas neste
livro, é essencial que o leitor tenha uma compreensão clara do
funcionamento dos ciclos e, especialmente, da maneira como cada
elemento leva ao próximo. Assim, a explicação detalhada, passo a
passo, fornecida aqui é essencial e deve ser absorvida.
Contudo, em “You Can’t Predict. You Can Prepare”, reduzi o
processo a apenas algumas palavras. Elas realmente constituem o
cerne do ciclo de crédito e deixam claro a natureza interminável da
reação em cadeia do ciclo:
Prosperidade amplia a oferta de crédito, ocasionando
empréstimos imprudentes; estes produzem grandes perdas,
levando os credores a se retraírem, acabando com a
prosperidade; e por aí vai.
Um mercado é como um leilão: o item oferecido vai para quem der
o lance mais alto. Os mercados financeiros não são diferentes. A
oportunidade de fazer um investimento ou fornecer um empréstimo
vai para o participante do mercado que pagar mais por essa
oportunidade. Os lances elevam o nível de preço e a parâmetros de
valorização mais altos (tais como índices de preço/lucro mais
elevados). No mercado de crédito, isso traduz-se diretamente em
um baixo rendimento do instrumento de dívida em questão, e a
chance de fornecer capital vai para o credor que aceitar o menor
rendimento.
Meu memorando “The Race to the Bottom”, publicado em
fevereiro de 2007, destacava principalmente a ânsia dos
fornecedores de capital em expandir sua atuação nos bons tempos,
e o efeito disso:
Isso ajuda a pensar no dinheiro como uma mercadoria. O
dinheiro é praticamente um só. Porém, as instituições que
buscam aumentar o volume de empréstimos, os fundos de
private equity e os fundos de hedge desejam aumentar a
escala. Então, se você quer colocar mais dinheiro — isto é,
levar as pessoas a buscá-lo em detrimento de seus
concorrentes, para obter financiamento —, você tem que
tornar seu dinheiro mais barato. Tal como acontece com as
outras commodities, o preço baixo é o trunfo mais confiável
para aumentar a participação de mercado.
Você pode reduzir o preço de seu dinheiro diminuindo a
taxa de juros que cobra sobre os empréstimos. Um jeito um
pouco mais sutil é concordar com um preço mais alto por
aquilo que está comprando, por exemplo, aceitando um índice
de preço/lucro maior para uma ação ordinária ou um valor
mais elevado quando está comprando uma empresa. Seja
como for, você está se adaptando a um retorno prospectivo
menor. Mas há outras maneiras de baratear seu dinheiro, e
elas são o principal assunto deste memorando.
Com relação às dívidas, estrutura é algo importante. Assim,
termos mais fáceis para o mutuário podem trazer risco adicional
para o credor. Por exemplo, os credores gostariam de ter cláusulas
de proteção contra ações do tomador que aumentam o grau de risco
já presente. Eles podem restringir a dívida total que o mutuário pode
assumir, limitar o montante de dividendos a pagar ou exigir que ele
mantenha um determinado patrimônio líquido mínimo. Mas,
especialmente quando o mercado de crédito está aquecido, o
“melhor comprador” da dívida — o credor mais ansioso — pode
estar disposto a aceitar uma estrutura com menos cláusulas
protetoras e, portanto, mais riscos.
Então, em um leilão, a chance de fazer um empréstimo ou
comprar um título de dívida vai para quem se dispõe a aceitar uma
combinação de menor rendimento e estrutura mais arriscada.
Quando há aversão ao risco e a demanda por oportunidades de
empréstimo é razoável em relação à oferta delas, a licitação é, em
geral, prudente. Mas quando a tolerância ao risco assume e a
competição é grande, é provável que a licitação se torne
superaquecida. Quem obtiver a oportunidade de conceder um
empréstimo arcará com um ônus elevado: um ganho muito baixo
e/ou um risco excessivo. Assim, um leilão superaquecido no
mercado de crédito — como em outros lugares — provavelmente
produzirá um “vencedor” que na verdade é um perdedor. Esse é o
processo que chamo de corrida para o fundo.
Por outro lado, há ocasiões em que há um número menor de
compradores, e os poucos interessados querem comprar apenas a
preços promocionais. Os lances resultam em preços baixos,
rendimentos surpreendentes e estruturas de empréstimo que
oferecem excelente proteção. Ao contrário do clima superaquecido
que gera a corrida para o fundo, os mercados “gelados” nos quais
ninguém está ansioso para emprestar podem fazer com que haja
verdadeiros vencedores.
O quanto a janela de crédito se abre depende quase que
totalmente de provedores de capital ávidos ou reticentes, e tem um
impacto profundo nas economias, nas empresas, nos investidores e
no retorno e risco das oportunidades de investimento resultantes.
No curto prazo, o efeito das generosas condições do mercado
de capitais é disponibilizar mais dinheiro para mais empresas
por mais motivos, com taxas de juros mais baixas e menos
cláusulas de proteção. Isso leva a níveis mais altos de vendas
de empresas, aquisições de controle acionário e expansão
corporativa (sem mencionar as rápidas recapitalizações das
empresas adquiridas e, portanto, as altas taxas de retorno no
curto prazo). No curto prazo, isso contribui para um alto nível
de atividade financeira em geral.
Outro efeito é prevenir o rigor financeiro em empresas
enfraquecidas. Quando os credores são rigorosos e as
cláusulas de proteção são rígidas, as dificuldades
operacionais podem levar rapidamente a violações de
obrigações contratuais e inadimplência (não pagamento de
juros ou do principal). Mas condições mais frouxas podem
impedir o estado de insolvência: se as cláusulas de proteção
são frágeis ou ausentes; se os tomadores de empréstimos
têm a opção de pagar os títulos com outros títulos, e não em
dinheiro (por meio de uma inovação recente no mercado
norte-americano, os chamados “toggle bonds”); ou se eles
podem levantar dinheiro novo e, assim, adiar o dia da
reavaliação.
No fim das contas, muitas dessas inadimplências
prevenidas demonstrarão sua inevitabilidade, com as
empresas caindo de alturas mais altamente alavancadas. E
certamente a disposição dos mercados de capital de financiar
empresas menos que merecedoras levará, em última análise,
a um nível mais profundo de dificuldades corporativas. Assim,
tudo o mais constante, quanto maior o boom — e quanto
maiores os excessos do mercado de capitais no sentido
ascendente —, maior o colapso. Tempo e extensão nunca são
previsíveis, mas a ocorrência de ciclos é a coisa mais próxima
que conheço de ser inevitável. (“The Race to the Bottom”,
fevereiro de 2007)
O Impacto do Ciclo de Crédito
Um dos principais pontos deste livro é a extensão em que os
eventos dentro de um ciclo influenciam outros campos e outros tipos
de ciclos. Em lugar algum isso é mais claro do que no ciclo de
crédito.
Em “Genius Isn’t Enough” [“Gênio Não É o Bastante”, em
tradução livre], a respeito do Long-Term Capital Management,
(outubro de 1998), escrevi: “Olhe em volta da próxima vez
que houver uma crise; é provável que você encontre quem
empreste dinheiro”. Provedores de capital excessivamente
permissivos com frequência ajudam e estimulam bolhas
financeiras. Houve inúmeros exemplos recentes em que
mercados de capital generosos contribuíram para booms que
foram seguidos por colapsos muito conhecidos: imóveis em
1989–1992; mercados emergentes em 1994–1998; LongTerm Capital em 1998; indústria de exibição de filmes em
1999–2000; fundos de capital de risco e empresas de
telecomunicações em 2000–2001. Em cada um havia dinheiro
farto e barato para tomar emprestado e investir, e o resultado
foi uma expansão exagerada e perdas dramáticas. No filme
Campo dos Sonhos, uma das falas de Kevin Costner era: “Se
você construir, eles virão”. No mundo financeiro, se você
oferecer dinheiro barato, eles pedirão, comprarão e
construirão — muitas vezes deixando de lado a disciplina, e
com muitas consequências negativas.
Na formação da bolha tecnológica, a contribuição do ciclo
de capital foi tremenda. Muitas empresas foram criadas com o
dinheiro dos fundos de capital de risco, não raro sem que
houvesse justificativas de ordem comercial ou perspectivas de
lucro. A demanda selvagem por IPOs fez com que a cotação
de suas ações alcançasse níveis estratosféricos, permitindo
que os fundos de risco reportassem retornos de três dígitos e
atraíssem ainda mais capital, exigindo que essas empresas
se tornassem operacionais rapidamente. A generosidade do
mercado de capitais levou as empresas de telecomunicação,
seguras que estavam de poder contar com financiamentos
suplementares mais tarde, a assinar grandes projetos de
capital apenas parcialmente financiados, com índices de
preço/lucro e taxas de juros mais baixas à medida que os
projetos avançassem. Essa facilidade fez com que muito mais
capacidade de fibra óptica fosse construída do que era
necessário na época, grande parte ficando ociosa. Parcela
substancial do investimento que foi feito nunca pôde ser
recuperado. Mais uma vez, o dinheiro fácil levou à destruição
de capital.
Ao fazer investimentos, tornou-se meu hábito preocupar-me
menos com o futuro econômico — sobre o qual não há como
ter muita certeza — do que com a questão da oferta/demanda
relacionada ao capital. Estar posicionado para fazer
investimentos em uma arena despovoada confere grandes
vantagens. Participar de um campo em que todo mundo está
jogando dinheiro é uma receita para o desastre. (“You Can’t
Predict. You Can Prepare”)
A título de reafirmação, segue mais uma prova retirada de “The
Happy Medium” (julho de 2004) de que uma descrição longa e
importante como a citada, em relação ao processo cíclico, pode ser
resumida em menos palavras:
De tempos em tempos, provedores de capital simplesmente
abrem ou fecham a torneira — como em muitas outras coisas,
em excesso. Há ocasiões em que qualquer pessoa pode
obter qualquer quantia de capital para qualquer finalidade e
quando nem mesmo os mutuários mais merecedores
conseguem acessar valores razoáveis para projetos valiosos.
O comportamento dos mercados de capitais é um ótimo
indicador de onde estamos em termos psicológicos e um fator
de surgimento de barganhas em termos de investimento.
Nesse memorando, continuei a discutir a maneira como o ciclo de
crédito contribui para os excessos:
Procurar a causa de um mercado radicalizado normalmente
requer rebobinar a fita cassete do ciclo de crédito por alguns
meses ou anos. A maioria dos mercados em alta é
incentivada por um aumento na disposição de fornecer
capital, geralmente ignorando a prudência. Da mesma forma,
a maioria dos colapsos é precedida por uma recusa
indiscriminada em financiar certas empresas, setores de
atividade ou toda a variedade de potenciais tomadores de
empréstimos.
Tenho por meta, no que segue, descrever o efeito do ciclo de
crédito. Para isso, voltarei à Crise Financeira Global (CFG), fonte de
relevantes ensinamentos.
No final dos anos 1960, em meus primeiros anos como analista de
ações, eu compreendia muito bem o ciclo econômico e a forma
como os lucros corporativos aumentavam e diminuíam em função
deles. Embora houvesse muito mais a aprender, eu já sabia um
pouco sobre flutuações na psicologia e atitudes de risco (e sobre
sua importância). Mas quase não apreciei o papel ou o
funcionamento do ciclo de crédito. Em suma, é difícil entender
completamente a maioria dos fenômenos no mundo do investimento
a menos que os tenha vivenciado. Agora cheguei à conclusão de
que o ciclo de crédito é realmente algo importante. De fato, quando
perguntado sobre as causas da Crise Financeira Global de 2007–
2008, eu a coloquei no topo da lista.
A própria escolha do nome “Crise Financeira Global” para a
dolorosa experiência de 2007–2008 reflete o fato de ser um
fenômeno de caráter essencialmente financeiro, relacionado quase
inteiramente a eventos no âmbito dos mercados financeiros, e não
originado primariamente por situações de natureza econômica ou de
outra ordem. Aqui estão os fatores de comportamento e de atitudes
no mundo financeiro que levaram a uma crise de grande espectro:
A causa existencial foram as atitudes demasiado liberais
em relação ao risco financeiro descritas nas páginas 118–
119.
Essas atitudes pouco cuidadosas decorriam da forte
demanda por investimentos de alto rendimento que
resultaram da redução das taxas de juros gerais pelo Fed.
Esses dois fatores levaram, entre outras coisas, a uma
disposição excessiva dos investidores de aceitar produtos
financeiros inovadores e absorver toda a extrapolação
histórica favorável e as outras premissas otimistas nas
quais esses produtos foram baseados.
A predominância de títulos lastreados em hipotecas entre
essas inovações gerou uma necessidade crescente de
hipotecas a partir das quais se moldaram os novos papéis.
Essa demanda facilitou passar as hipotecas para a frente,
o que, por sua vez, permitiu que os credores hipotecários
fossem descuidados ao escolher os potenciais mutuários
compradores de imóveis. Como as hipotecas originais não
eram retidas, não havia preocupação com a solidez delas.
Em um exemplo extremo dessa tendência, a categoria de
hipotecas subprime foi criada para mutuários que não
conseguiam satisfazer os padrões tradicionais de
empréstimos em termos de emprego ou renda, ou que
optaram por pagar taxas de juros mais altas, em vez de
apresentar os documentos comprobatórios de emprego e
renda. O fato de que candidatos a mutuários frágeis como
esses poderiam tomar emprestado grandes somas era
indicativo das condições irracionais do mercado de
crédito.
A despreocupação quanto às condições para a concessão
de crédito dos credores hipotecários e a disponibilidade de
generosos financiamentos subprime tornaram possível a
posse de casas para mais norte-americanos do que
nunca, incluindo muitos que não teriam condições de arcar
com a hipoteca tradicional, de padrões mais rígidos.
Seduzidas pelo canto de sereia dos lucros potenciais
provenientes de numerosos títulos lastreados em
hipotecas subprime, cuja criação foi possibilitada por sua
própria ingenuidade, ou talvez ganância, as agências de
rating competiam por negócios realizando classificações
de risco de crédito demasiado favoráveis, em uma corrida
para o fundo de si mesmas.
O acesso à casa própria aumentou substancialmente,
turbinado pelas baixas taxas de juros em vencimentos
curtos, uma vez que nas hipotecas originais os
pagamentos mensais iniciais eram menores como forma
de maximizar o montante do financiamento hipotecário.
Isso contribuiu para o uso generalizado de hipotecas de
taxa flutuante, com baixos pagamentos mensais
vinculados a baixas taxas iniciais de juros. Obviamente,
essas taxas não fixas representavam um risco potencial
para os mutuários, que mal podiam arcar com as
mensalidades antes que aumentassem. Mas os
tomadores de empréstimos tinham a garantia de que,
graças às generosas condições do mercado de capitais,
eles sempre seriam capazes de refinanciar outra hipoteca,
novamente com uma taxa inicial baixa.
Os bancos de investimento estavam ansiosos para “fatiar”
as hipotecas originais de muitas hipotecas subprime,
transformando esses tranches em títulos com
classificação de crédito mais alta, a fim de maximizar sua
rentabilidade. O entusiasmo por essa atividade,
justamente no momento em que a “engenharia financeira”
entrou em vigor, deu origem a classificações para tranches
que se revelaram totalmente divorciadas de como
realmente se sairiam sob estresse.
Os bancos de investimento que criaram e venderam esses
títulos frequentemente se dispunham a reter o capital que
lastreava a estrutura que houvera sido fatiada, a fim de
facilitar um alto volume de emissão ou simplesmente pelo
desejo de manter ativos de alto risco (ou seja, eles
mesmos eram alheios à natureza tóxica de seu produto).
E outros bancos aproveitaram os altos níveis de
alavancagem permitida para criar ativos com spreads de
juros muito favoráveis, usando empréstimos de baixo
custo para comprar títulos de alto risco e de alto
rendimento, e tranches juniores1 de títulos hipotecários
estruturados.
Como você pode ver, praticamente todas as condições nas quais
a CFG foi gerada eram endógenas ao sistema financeiro e ao ciclo
de crédito. Os fatores que estavam na base constitutiva da crise não
se vinculavam a um boom econômico geral ou a um aumento
generalizado dos lucros corporativos. Os eventos-chaves não
ocorreram no ambiente geral de negócios ou além dele. Em vez
disso, a CFG era um fenômeno amplamente financeiro que resultou
por completo do comportamento dos agentes financeiros. As
principais forças que criaram este ciclo foram a fácil disponibilidade
de capital, uma falta de experiência e prudência suficiente para
temperar o entusiasmo sem sentido que permeou o processo, uma
imaginosa engenharia financeira, a separação entre decisões de
empréstimo e retenção de empréstimos, e irresponsabilidade e
ganância.
Frise-se, no entanto, que essa reação em cadeia foi encorajada
por autoridades norte-americanas eleitas que estavam ansiosas
para expandir o sonho da casa própria e ingenuamente pensaram
que seria ótimo se todos pudessem comprar uma. Discursando em
outubro de 2002, o presidente George W. Bush repetiu o que
dissera a um de seus amigos: “A primeira casa que alguém compra
não precisa ser muito pobre. Se você se dedicar a isso, o comprador
de baixa renda que nunca teve uma casa própria pode ter uma casa
tão boa quanto qualquer outra pessoa”. Eu me pergunto se as
pessoas que ouviram essa declaração na época acharam-na tão
ilógica quanto parece hoje.
Depois que a CFG bateu forte, o congressista Barney Frank, que
fora um dos mais fortes defensores da política de ampliar o acesso
à casa própria, declarou: “Ter uma casa é uma coisa boa. Mas,
como sociedade, cometemos um grande erro. Há nela pessoas que
não deveriam poder pedir dinheiro emprestado para comprar uma
casa. E nós temos incentivado pessoas que não têm condições para
isso”. (Como você pode ver, a retórica política também é cíclica.) Em
outras palavras, os eventos responsáveis pela CFG eram quase
todos sobre dinheiro. A busca de dinheiro teve um empurrão
poderoso. As realidades econômicas que refletem e limitam a
obtenção de dinheiro foram frequentemente ignoradas. E a cautela e
a aversão ao risco, que em geral se baseiam na disposição dos
participantes do mercado em fornecer dinheiro, estavam em grande
parte ausentes. Assim, o ciclo do capital chegou a um extremo
irracional, cujas consequências são normalmente previsíveis.
O ciclo, cedo ou tarde, chega a seu ponto máximo, mas
invariavelmente não pode ficar lá para sempre. Às vezes corrige-se
em função de seu próprio peso, e às vezes isso acontece graças a
eventos externos a ele. No caso, foi mais o primeiro. Assim como no
início da crise, a natureza da reversão dos mercados era
essencialmente financeira, embora o primeiro passo viesse do
“mundo real”.
Em 2006, os tomadores de hipotecas subprime
começaram a inadimplir em grande número. Alguns dos
mutuários que haviam obtido empréstimos sem comprovar
sua capacidade de assumi-los revelaram-se incapazes de
cumprir com os pagamentos. Alguns dos empréstimos
concedidos, obtidos por métodos fraudulentos, ficaram em
má situação quando os devedores fictícios
desapareceram. Outros empréstimos, de montante igual
ao preço total da casa — algo que permitia que os
compradores apostassem na valorização continuada do
imóvel sem arriscar qualquer dinheiro —, foram
abandonados quando o mercado parou de subir.
Independentemente do motivo, a base histórica norteamericana que permitiu que títulos lastreados em
hipotecas de alto risco fossem altamente alavancados e
obtivessem ótimos ratings — a tecla constantemente
batida de que não haveria uma onda nacional de
inadimplência de hipotecas — não se sustentou. Como se
viu, as decisões de empréstimo foram tomadas de forma
imprudente, com confiança indevida nessa história. É
importante ressaltar que os credores e investidores
haviam ignorado a chance de que tal confiança daria
origem a um comportamento de concessão de
financiamento tão descuidado que, por si só, tornaria a
história irrelevante.
Um grande número de inadimplências de hipotecas levou
a rebaixamentos dos ratings, infrações contratuais e
inadimplência nos títulos garantidos por hipotecas.
Rebaixamentos dos ratings, quebras e inadimplência
colapsaram os preços dos títulos lastreados em hipotecas,
e a resultante perda de confiança secou a liquidez do
mercado para esses instrumentos.
Com os compradores aterrorizados fora do mercado — e
titulares aterrorizados, cada vez mais ansiosos para
vender seus papéis (ou forçados a vender face às
chamadas de margem) —, o resultado foi uma espiral
descendente dramática nos preços dos títulos lastreados
em hipotecas.
Esses desdobramentos adversos bateram de frente nas
novas regulamentações, destinadas a aumentar a
transparência, como a “marcação a mercado”, que exigiu
que os ativos dos bancos fossem avaliados
realisticamente. Porém, com preços em queda livre e
inexistência de liquidez, era difícil ter fé em qualquer preço
escolhido. Quando os bancos se adequaram a essas
regras conservadoras, as perdas implícitas de seus ativos
chocaram os investidores: o pânico foi ainda maior, e os
preços caíram ainda mais.
Não foram raros os casos em que a própria viabilidade
dos bancos ficou a perigo. Muitos tiveram que ser
absorvidos por outros bancos (com o apoio do governo)
ou socorridos pelo governo.
O acúmulo de eventos indigestos — derrocadas de
instituições bancárias, aquisições a preços de banana ou
ajuda financeira governamental — trouxe perdas aos
investidores e minou ainda mais a confiança. Além disso,
as interligações entre os bancos causaram grande
preocupação mútua em relação à capacidade de solvência
dos demais. O “risco de contraparte” tornou-se a mais
nova fonte de preocupação.
Os bancos relataram perdas maciças. O aumento dos
preços cotados para swaps de inadimplência de crédito —
derivativos usados para apostar contra a qualidade de
crédito dos bancos — implicou maiores chances de
insolvência. Em resposta, os acionistas despejaram as
ações dos bancos nas bolsas, forçando seus preços para
baixo. Os investidores a descoberto vendiam
incessantemente, aumentando a pressão baixista,
tornando suas previsões pessimistas autorrealizáveis,
reforçando ainda mais o círculo vicioso.
Para culminar, o Lehman Brothers faliu após lhe ter sido
negada absorção ou socorro governamental. Somado a
muitos outros eventos perturbadores ocorrendo
simultaneamente, esse fato levou a nada além de pânico.
Visto que os mercados reagiram negativamente aos
problemas hipotecários em meados de 2007, mas
ignoraram o potencial de contaminação para outras áreas,
no final de 2008, todos jogaram a toalha. Os preços de
todos os ativos, com exceção do ouro e dos títulos do
Tesouro, colapsaram.
O valor dos ativos dos fundos que investiram valendo-se
de capital emprestado — “alavancagem” ou “margem” —
diminuiu de forma abrupta, e seus credores demandaram
chamadas adicionais de capital. Quando os fundos
solicitaram mais tempo aos bancos, estes em geral não
conseguiram ou não concederam. Como consequência,
ocorreram vendas de portfólio em massa, aumentando
ainda mais a pressão baixista sobre os preços.
Um ambiente em tal condição fez com que os mercados
fechassem as portas, ou seja, novos financiamentos
tornaram-se praticamente impossíveis em todos os
quadrantes dos mercados financeiros, mesmo aqueles
totalmente alheios a casas e hipotecas.
Em face da ação conjunta de todos esses fatores, as
unidades econômicas em peso recuaram, recusando-se a
comprar, investir ou expandir. O recuo econômico
resultante foi rotulado de “A Grande Recessão”.
Levada ao extremo nas últimas 15 semanas de 2008, a
desaceleração do ciclo de crédito pareceu universal e sem parada.
Poucas pessoas foram capazes de imaginar quaisquer forças
capazes de deter esse processo ou — como descrito no capítulo
anterior — qualquer cenário hipotético que fosse terrível demais
para se tornar realidade. Um colapso total do sistema financeiro foi
considerado uma possibilidade real.
O fato é que a disposição dos potenciais provedores de
capital para disponibilizá-lo varia violentamente, com um
impacto profundo na economia e nos mercados. Não há
dúvida de que a recente crise de crédito alcançou esse nível
de gravidade porque os mercados de crédito congelaram e o
capital tornou-se indisponível, exceto pelos governos. (“Open
and Shut”)
Estou convencido de que um colapso do sistema — com
ramificações como as vistas na Grande Depressão — poderia ter
ocorrido. O livro Stress Test (“Teste de Estresse”, em tradução livre),
do ex-secretário do Tesouro Timothy Geithner, confirma isso.
Felizmente, contudo, o governo dos EUA tomou medidas que
mudaram a situação. Elas incluíam a garantia dos títulos de dívida
emitidos pelas empresas privadas, como mencionado
anteriormente, e dos fundos de investimento. O socorro financeiro
governamental demonstrou que a ajuda estava disponível, e a
falência do Lehman Brothers em setembro de 2008 sugeriu que o
governo estava diferenciando entre os bancos que valiam a pena
salvar e os que não valiam. O mercado, em pânico, estava convicto
de que depois do Lehman o próximo a quebrar seria o Morgan
Stanley — e que o Goldman Sachs o seguiria —, quando a espiral
descendente foi detida com a confirmação do Mitsubishi UFJ do
Japão do prometido investimento de $9 bilhões no Morgan Stanley.
É importante ressaltar que os eventos nos mercados de crédito
acabaram demonstrando que os ciclos não podem seguir
eternamente em uma direção, mesmo com eventos cataclísmicos
generalizados. Os preços da dívida estavam em queda livre desde a
falência do Lehman até o final de 2008, ocasião em que os
ingredientes para uma sólida recuperação do mercado já estavam
presentes.
Os fundos superalavancados que fizeram chamadas de
margem receberam capital adicional, venderam ativos
para reduzir a alavancagem, conforme necessário, ou
foram liquidados.
Os fundos e gerentes de investimento que recebiam
avisos de investidores que desejavam se retirar no final do
ano impunham restrições aos saques ou vendiam os
ativos necessários para atendê-los.
Os preços dos títulos de dívida chegaram a um ponto no
qual os ganhos eram tão elevados, que as vendas eram
impraticáveis, e as compras tornaram-se atraentes.
E, em última análise, os participantes do mercado
demonstraram que quando a psicologia negativa é
universal e “as coisas não podem piorar”, elas não o farão.
Quando já não há otimismo algum e a absoluta aversão
ao risco está em toda parte, torna-se possível chegar a um
ponto em que os preços não têm como cair mais. E
quando os preços param de cair, as pessoas tendem a
sentir alívio, e com isso o potencial para uma recuperação
dos preços começa a surgir.
A cotação dos preços dos títulos continuou a declinar no primeiro
trimestre de 2009, uma vez que a compostura, a confiança e uma
“base” de poder de compra ainda não haviam retornado
completamente. Mas a capacidade dos investidores de comprar em
grande escala era nenhuma no início do ano, devido aos fatores
listados anteriormente. E quando a “compra de juros2” se
materializou no segundo trimestre — talvez porque os compradores
de dívidas inadimplentes chegaram à conclusão de que haviam se
retraído injustamente diante da assustadora possibilidade de
comprar antes de os preços chegarem ao fundo do poço —, a
escassez de oferta contribuiu para um poderoso movimento para
cima.
A Crise Financeira Global mostra o ciclo de crédito em seu maior
nível desde a Grande Depressão. Historicamente, os mercados de
dívida haviam sido marcados pelo conservadorismo geral, o que
significa que os excessos no lado positivo eram limitados e a
maioria das bolhas ocorria no mercado acionário. Certamente foi o
caso do Grande Crash de 1929.
Mas a criação do mercado de títulos de alto risco no final da
década de 1970 deu início a uma liberalização do investimento em
dívida, e o ambiente econômico geralmente positivo das três
décadas subsequentes proporcionou àqueles que se aventuraram
nisso uma experiência global favorável. Essa combinação levou a
uma forte tendência a aceitar instrumentos de dívida de ratings
baixos e não tradicionais.
Houve períodos de enfraquecimento dessas operações em 1990–
1991 (relacionados a falências generalizadas entre as aquisições
altamente alavancadas da década de 1980) e em 2002 (decorrentes
do exagerado endividamento para financiar o excesso de
construções na indústria de telecomunicações, o que levou a fortes
rebaixamentos que coincidiram com vários e famosos escândalos
contábeis corporativos). Os efeitos disso, porém, foram limitados
devido à natureza isolada de suas causas. Só em 2007–2008 os
mercados financeiros testemunharam o primeiro pânico difundido
pela dívida, com reflexos em toda a economia. Assim, a CFG se
constituiu no exemplo final do pleno efeito do ciclo de crédito.
Como descrevi em “Open and Shut”, o ciclo do mercado de capitais
é simples em sua operação, e sua mensagem é fácil de perceber.
Um mercado de crédito tenso e cauteloso geralmente decorre de,
leva ou conota coisas como estas:
Medo de perder dinheiro.
Maior aversão ao risco e ceticismo.
Falta de vontade de emprestar e investir não importando o
mérito.
Escassez generalizada de capital.
Contração econômica e dificuldade de refinaciamento das
dívidas.
Inadimplências, quebras e reestruturações.
Baixa nos preços dos ativos, elevado potencial de retorno,
risco baixo e excessivos prêmios de risco.
Tomados em conjunto, esses elementos indicam épocas
muito favoráveis para investir. É evidente, contudo, que
devido ao papel desempenhado pelo medo e pela aversão ao
risco em sua criação, a maioria das pessoas evita investir
nesse estado de coisas. Isso torna difícil para a maioria das
pessoas investir quando o ciclo de capital é negativo e
potencialmente lucrativo.
Por outro lado, um mercado de capitais generoso é
geralmente associado ao seguinte:
Receio de perder oportunidades lucrativas.
Reduzida aversão ao risco e do ceticismo (e,
consequentemente, diminuição das precauções).
Muito dinheiro atrás de poucos negócios.
Propensão a adquirir títulos em maior quantidade.
Disposição para comprar títulos de menor qualidade.
Altos preços de ativos, baixos retornos prospectivos, alto
risco e baixos prêmios de risco.
Fica claro, a partir dessa lista de fatores, que a excessiva
generosidade nos mercados de capitais decorre de uma falta
de prudência, e, portanto, isso deveria sinalizar aos
investidores uma das bandeiras vermelhas das mais nítidas.
Um mercado de capitais escancarado surge quando as
notícias são boas, os preços dos ativos estão subindo, o
otimismo está em alta e tudo parece possível. Mas,
invariavelmente, traz consigo a emissão de títulos insalubres
e superfaturados, e patamares de dívida que, por fim,
resultarão em ruína.
A questão a propósito da qualidade da emissão de novos
títulos em um mercado de capitais ostensivamente acessível
merece atenção especial. A diminuição da aversão ao risco e
o ceticismo — e o maior foco em garantir que as
oportunidades não sejam perdidas, em vez de evitar perdas
— levam os investidores franqueados a uma quantidade
maior de emissões. Os mesmos fatores tornam os
investidores dispostos a comprar títulos de menor qualidade.
Quando o ciclo de crédito está em expansão, as estatísticas
sobre novas emissões deixam claro que os investidores estão
comprando novas emissões em maior quantidade. Mas a
aceitação de títulos de menor qualidade é um pouco mais
sutil. Embora existam classificações de crédito e cláusulas
contratuais de proteção a serem observadas, pode ser
preciso esforço e tino para entender o significado dessas
coisas. No frenesi causado pela disponibilidade excessiva de
fundos, reconhecer e resistir a essa tendência parece estar
além da capacidade da maioria dos participantes do mercado.
Esta é uma das muitas razões pelas quais as consequências
de um mercado de capitais excessivamente generoso incluem
perdas, contração econômica e uma subsequente relutância
em emprestar dinheiro.
O resultado final da conjugação de todos os itens anteriores
é que mercados de crédito generosos geralmente estão
associados a preços elevados de ativos e prejuízos
subsequentes, enquanto a escassez de crédito proporciona
barganhar preços e grandes oportunidades de lucro. (“Open
and Shut”)
O objetivo precípuo deste livro não é ajudá-lo a entender os ciclos
depois que eles ocorreram, como a Crise Financeira Global,
conforme tão longamente descrito. Em vez disso, é permitir que
você sinta onde estamos nos vários ciclos em tempo real e possa,
assim, tomar as medidas apropriadas.
A chave para lidar com o ciclo de crédito está em reconhecer que
ele atinge seu ápice quando as coisas vão bem por um tempo, as
notícias estão boas, a aversão ao risco está baixa e os investidores
estão ansiosos. Isso torna mais fácil para os tomadores de
empréstimo levantar dinheiro e faz com que compradores e
investidores disputem entre si a oportunidade de fornecê-lo. Daí
resultam financiamentos baratos, baixos padrões de crédito,
negócios pouco sólidos e imprudente ampliação do crédito. São os
mutuários que dão as cartas quando a janela de crédito está aberta
— não quem concede o empréstimo ou investe. As implicações de
tudo isso devem ser óbvias: vá com cautela.
Exatamente o oposto torna-se verdadeiro no outro extremo do
ciclo de crédito. Seu ponto mais baixo é atingido quando os
acontecimentos são desagradáveis, a aversão ao risco aumenta e
os investidores ficam deprimidos. Sob tais circunstâncias, ninguém
quer fornecer capital, o mercado de crédito congela e propostas
implorarão para serem aceitas. Isso coloca as cartas nas mãos dos
provedores de capital, em vez dos tomadores de empréstimo.
Como o endividamento é difícil e o capital geralmente não está
disponível, aqueles que o possuem e estão dispostos a participar
podem exigir padrões mais rigorosos, insistir em fortes estruturas de
empréstimo e cláusulas de proteção e demandar retornos
prospectivos elevados. São coisas como essas que fornecem a
margem de segurança necessária para um investimento superior.
Quando esses fatores estão postos, os investidores devem entrar
em um modo agressivo.
O investimento superior não é caracterizado pela compra de ativos
de alta qualidade, mas por comprar quando o negócio é bom, o
preço é baixo, o retorno potencial é substancial e o risco é limitado.
Tais condições são muito mais comuns quando os mercados de
crédito estão na parte menos eufórica e mais rigorosa de seu ciclo.
A fase de “portas fechadas” do ciclo de crédito provavelmente faz
surgir mais barganhas do que qualquer outro fator isolado.
1
2
Nota do Tradutor: as que têm menor prioridade em caso de inadimplência.
Nota do Tradutor: do original em inglês “buying interest”, uma operação em que, nos
EUA, adianta-se um certo valor para conseguir uma redução na taxa de juros hipotecários.
X
O CICLO DOS TÍTULOS DE EMPRESAS INADIMPLENTES
Poucos entre aqueles que concedem crédito e os que
compram títulos são suficientemente imprudentes para
investir dinheiro que não será reembolsado se as condições
permanecerem como estão. E em tempos mais sóbrios, eles
insistem em uma margem de segurança suficiente para
garantir que os juros e o principal sejam pagos mesmo que as
condições para o devedor se deteriorem.
Mas quando o mercado de crédito se aquece — quando a
corrida ao fundo faz com que os credores ávidos financiem
mutuários que não merecem e aceitem estruturas de dívida
frágeis —, são emitidos títulos que não têm essa margem de
segurança e não poderão ser quitados se as coisas ficarem
um pouco pior. Essa é a extensão insensata do crédito. Tal
processo, como dizemos na Oaktree, “empilha a madeira”
para a próxima fogueira.
T
ive a sorte de ter Bruce Karsh como parceiro três décadas
atrás; em 1988 constituímos nosso primeiro fundo para
investimento em dívida em dificuldades1, que acreditamos ter sido
um dos primeiros de uma instituição financeira tradicional. Isso nos
levou a um nicho de investimento altamente especializado.
Em vez de empresas que estão bem ou têm um futuro brilhante,
os investimentos em dívidas em dificuldades (DD) geralmente estão
em empresas que estão indo tão mal, que não liquidaram suas
dívidas e têm saldos dela pendentes de pagamento ou que são
consideradas altamente prováveis de ficar em tal situação: estão ou
ficarão inadimplentes. Para ser claro, essa empresa típica não tem
dificuldades operacionais, apenas está sobrecarregada de dívidas.
Nosso mantra é, portanto, “companhia boa, balanço ruim”.
Normalmente, os investidores compram títulos de dívida ou fazem
empréstimos porque esperam receber juros periodicamente e
recuperar o principal no vencimento. Com DD, no entanto, o
consenso é o de que essas coisas não ocorrerão: não se espera
que juros e principal sejam pagos. Qual é, então, a motivação do
investidor?
A resposta: em resumo, e simplificando bastante, quando a
empresa quebra, os antigos proprietários são afastados e os antigos
credores tornam-se os novos proprietários. Cada credor recebe sua
parte do valor da empresa — dependendo do valor e prioridade de
recebimento da dívida que detém — em alguma combinação de
caixa, nova dívida e propriedade da empresa dali em diante.
Um investidor em DDs tenta descobrir (a) quanto a empresa falida
vale (ou valerá na ocorrência da falência), (b) o critério de divisão
desse valor entre os credores da empresa e eventuais outros, e (c)
quanto tempo isso levará. Com respostas corretas para essas
perguntas, ele pode determinar qual será o retorno anual de uma
parcela da dívida da empresa se comprada por um certo preço.
Entrarmos nesse tipo de investimento em 1988 foi extremamente
vantajoso, pois havia poucos concorrentes, e o campo era pouco
conhecido e pouco compreendido — duas condições que podem
ajudar a obter resultados superiores em qualquer área. Assim,
nossos fundos puderam obter um retorno médio alto nos 29 anos
seguintes. Mas, como acontece com muitas coisas, a média tem
limitada significação. Os fundos que formamos em épocas mais
normais em geral proporcionaram bons retornos, mas os resultados
dos fundos instituídos nos momentos certos foram superlativos.
Em outras palavras, as oportunidades para retornos altos em DD
vêm e vão. Em face da temática deste livro, analisarei aqui o que faz
com que as oportunidades aumentem e diminuam. Nenhuma
novidade a resposta estar nas flutuações do ciclo de títulos de
empresas inadimplentes (ciclo de DD). Mas o que causa essas
flutuações?
As oportunidades de lucrar com DDs são altamente cíclicas e
determinadas pelos desenvolvimentos em outros ciclos. Assim, eles
são ilustrativos do funcionamento dos ciclos e prontos para
discussão aqui.
No começo — em 1988, 1989 e início de 1990 —, nossos fundos
aproveitaram os benefícios muitas vezes ignorados do investimento
em DDs, e os retornos foram bons. Mas na segunda metade de
1990, o mercado de dívidas sem grau de investimento entrou em
colapso na primeira das três grandes crises em que Bruce e eu
trabalhamos juntos. Além de levar aos baixos preços de compra que
fizeram com que nossos fundos de 1990 ganhassem acima da
média, esse episódio foi muito educativo, pois nos deu o primeiro
vislumbre do processo pelo qual oportunidades superiores surgem
quando as dívidas estão em dificuldades.
O primeiro dos dois ingredientes essenciais em sua criação
consiste na “extensão insensata do crédito”. Dada a discussão do
capítulo anterior, você deve ter uma compreensão do que tenho em
mente e como isso se desenvolve. Explicarei através do exemplo de
títulos de alto risco:
No início, investidores adequadamente avessos ao risco
aplicam padrões de crédito rigorosos para a emissão de
títulos de alto risco.
O mesmo ambiente econômico saudável que facilita a
emissão de títulos facilita rolar as dívidas das empresas (o
que significa que inadimplências são raras).
Assim, os títulos de alto risco — com seus cupons de juros
generosos e baixa inadimplência — proporcionam
retornos sólidos.
Esses retornos convencem os investidores de que o
investimento em títulos de alto risco é seguro, atraindo
mais capital para o mercado.
Mais capital para investimento traduz-se em aumento da
demanda por títulos. Como Wall Street nunca permite que
a demanda não seja atendida, isso resulta no aumento da
emissão de títulos.
A mesma condição que permite que grandes quantidades
de títulos sejam emitidos — forte demanda de investidores
— também permite, sempre, que títulos com menor
credibilidade sejam emitidos.
Poucos entre aqueles que concedem crédito e os que compram
títulos são suficientemente imprudentes para investir dinheiro que
não será reembolsado se as condições permanecerem como estão.
E, em tempos mais sóbrios, eles insistem em uma margem de
segurança suficiente para garantir que os juros e o principal sejam
pagos mesmo que as condições para o devedor se deteriorem.
Mas quando o mercado de crédito se aquece — quando a corrida
ao fundo faz com que os credores ávidos financiem mutuários que
não merecem e aceitem estruturas de dívida frágeis —, são emitidos
títulos que não têm essa margem de segurança e não poderão ser
quitados se as coisas ficarem um pouco pior. Essa é a extensão
insensata do crédito. Tal processo, como já dissemos, “empilha a
madeira” para a próxima fogueira.
Essa é, porém, apenas a primeira metade do processo. Mesmo
depois que o combustível para uma fogueira estiver presente, nada
haverá até que o segundo ingrediente chegue: um acendedor. Ele
costuma vir na forma de recessão, o que faz com que os lucros
corporativos diminuam. Isso é muitas vezes acompanhado por uma
crise de crédito — o fechamento da janela de crédito —, de tal forma
que a dívida existente não pode ser refinanciada e entra em
situação falimentar. E muitas vezes as condições são exacerbadas
por eventos exógenos que minam a confiança e prejudicam a
economia e os mercados financeiros. Em 1990, eles foram:
A Guerra do Golfo, desencadeada pela invasão iraquiana
do Kuwait.
A quebra de muitas empresas proeminentes que haviam
passado por processos altamente alavancados de
transferência do controle acionário2 nos anos 1980.
A prisão de Michael Milken (o principal banqueiro de
investimentos por trás de títulos de alto risco) e o colapso
do Drexel Burnham (o empregador de Milken e o banco de
investimentos mais associado com títulos de alto risco).
Drexel e Milken saíram de cena, e com eles as operações
bancárias que ajudaram as empresas enfraquecidas a
evitar a inadimplência.
Quando o acendedor chega, títulos que não deveriam ter sido
emitidos — e talvez até alguns que deveriam ter sido — começam a
se complicar.
Uma economia mais lenta dificulta o pagamento de
dívidas.
Com o mercado de crédito fechado, não há
refinanciamento, o que significa aumento da
inadimplência.
Inadimplência crescente causa danos na psicologia dos
investidores.
Investidores que eram tolerantes ao risco quando as
coisas estavam indo bem agora se tornam avessos ao
risco.
Adiantar capital para empresas em dificuldades
financeiras, que parecia uma boa ideia pouco antes, agora
cai em desgraça.
Os potenciais compradores de dívidas recusam-se a fazêlo, dizendo que esperarão até que a incerteza acabe.
O capital desaparece do mercado. Os compradores
tornam-se escassos, e os vendedores predominam.
Cresce a venda de títulos, e seus preços desabam; os
fundos com solicitações de resgate tornam-se vendedores
forçados; e, por fim, os títulos estão disponíveis para
venda a qualquer preço.
Essas são as condições que dão origem à capacidade de efetuar
excelentes compras de DDs e obter, portanto, oportunidades de
retornos elevados.
Claro, o ciclo não vai em apenas uma direção. A economia, por
fim, se recupera, e o mercado de crédito reabre. Com isso há um
retrocesso da taxa de inadimplência em títulos de alto risco. A
combinação de uma economia melhorando e uma taxa de
inadimplência em declínio faz com que as vendas diminuam. Assim,
a pressão descendente sobre os preços dos títulos arrefece, e
algumas compras reaparecem. Os preços aumentam, em vez de
cair, e o melhor desempenho das empresas restaura sua
viabilidade, remove obstáculos e gera valor. Quando os ganhos nas
compras dos títulos começam a ser percebidos, capital adicional é
atraído para o mercado. Melhores resultados aliados a aumento de
capital elevam a demanda por títulos, e com isso completamos o
ciclo e voltamos ao começo.
Eis uma sinopse concisa da forma como o ciclo na emissão de
títulos subjaz na ascensão e queda do ciclo das DDs:
Investidores avessos ao risco limitam a quantidade e
exigem alta qualidade das emissões.
Alta qualidade das emissões leva a baixas taxas de
inadimplência.
Inadimplência baixa faz com que, com relação ao risco,
haja por parte dos investidores complacência e tolerância.
Tolerância ao risco aumenta a emissão e diminui a
qualidade.
A qualidade menor das emissões é enfim testada por
dificuldades econômicas, gerando um aumento da
inadimplência.
Um aumento da inadimplência inibe os investidores,
tornando-os de novo avessos ao risco.
Tudo reinicia.
Este é um ciclo que vi em ação repetidamente. Meus 29 anos de
experiência com títulos de dívidas inadimplentes me dizem que seus
temas definitivamente rimam. E a descrição anterior do ciclo dá-me
uma excelente oportunidade para mostrar que cada evento em um
ciclo leva ao ciclo subsequente. Na verdade, projetei essa descrição
especificamente para atingir esse objetivo. Dê uma olhada na
progressão que descrevi antes, e você verá que as palavras finais
de cada linha são as mesmas das primeiras palavras da linha a
seguir. Essa é uma verdadeira reação em cadeia, uma que espero
continue no futuro.
Como se pode ver, a ascensão e queda de oportunidades no
mercado de DDs decorre da interação de outros ciclos: na
economia, na psicologia dos investidores, nas atitudes de risco e no
mercado de crédito.
O ciclo econômico influencia a psicologia do investidor, a
lucratividade da empresa e a maior ou menor
inadimplência.
O ciclo da psicologia leva a flutuações nas condições do
mercado de crédito e no desejo dos investidores de
emprestar, comprar e vender.
O ciclo das atitudes em relação ao risco facilita a emissão
de títulos problemáticos no topo e nega capital para
refinanciamento na base.
O ciclo de crédito afeta profundamente a disponibilidade
de refinanciamento e o grau de rigidez dos padrões de
crédito ao qual os potenciais emissores de dívida estão
sujeitos.
Múltiplos ciclos subjacentes têm efeitos no mercado de DDs longe
de serem discretos e isolados. Já escrevi anteriormente: cada um
desses ciclos aumenta e diminui, cada um faz com que os outros
subam e caiam, e cada um é afetado pela ascensão e queda dos
outros. Mas o resultado disso tudo é um ciclo dramático de
oportunidades de investimento em DDs, um ciclo sujeito a uma
explicação.
1
Nota do Tradutor: trata-se de títulos inadimplentes de empresas sob ou prestes a ficar
protegidas pela Lei de Falências dos EUA.
2
Nota do Tradutor: do original em inglês “buyouts”.
XI
O CICLO DO SETOR IMOBILIÁRIO
Grande parte dos investimentos está sujeita a generalizações
grosseiras e declarações abrangentes — geralmente
enfatizando os pontos positivos, por causa da tendência dos
seres humanos à ganância e ao pensamento positivo — e,
por alguma razão, isso parece ser particularmente verdadeiro
no setor imobiliário. Ao longo da minha carreira, ouvi
racionalizações sobre investimentos em imóveis baseadas em
declarações facilmente digeridas como “eles não estão mais
fazendo” (a respeito de terras), “você pode sempre viver nela”
(a respeito de casas), e “é uma proteção contra a inflação” (a
respeito de propriedades de todos os tipos). O que as
pessoas acabam aprendendo é que, independentemente do
mérito por trás dessas declarações, elas não protegem um
investimento feito a preços muito altos.
O
ciclo imobiliário tem muito em comum com outros ciclos, como
o que controla a provisão de capital ou de crédito.
Eventos positivos e aumento de lucratividade levam a um
maior entusiasmo e otimismo.
Um estado psicológico favorável encoraja o aumento da
atividade. Isso inclui fazer mais de alguma coisa e com
base em suposições mais otimistas, pagar mais caro para
fazê-lo, e/ou baixar os padrões a serem atendidos, se for
necessário. Tudo isso leva a presumir um risco maior.
A combinação de psicologia positiva com o aumento da
atividade faz com que os preços dos ativos subam, o que
estimula ainda mais a atividade, gera mais aumentos de
preços e eleva o risco.
Daí ser inevitável que esse ciclo virtuoso assuma a
aparência de ser ininterrupto, e essa ilusão leva os preços
dos ativos e o nível de atividade longe demais para serem
sustentados.
Mas quando o noticiário vai se tornando menos positivo e o meio
ambiente menos hospitaleiro, os níveis de psicologia, atividade e
risco se mostram excessivos, o mesmo valendo para os preços dos
ativos. A correção de preços resultante faz com que a psicologia se
torne menos positiva, causando desinvestimento, o que pressiona
ainda mais os preços, e assim por diante.
Esses são todos os elementos que a maioria dos ciclos financeiros
têm em comum, e isso inclui o ciclo no setor imobiliário. Este,
porém, incorpora outro ingrediente que os demais de modo geral
não compartilham: os longos prazos de maturação inerentes a esse
setor de atividade.
No mercado de crédito, por exemplo, boas notícias e psicologia
otimista elevarão os empréstimos assim que os bancos de
investimento puderem alinhar os devedores em perspectiva e
imprimir os prospectos. Desse modo, o aumento do interesse dos
credores se traduz quase instantaneamente em aumento da
demanda por títulos, rendimentos menores, padrões mais baixos
para concessão de empréstimos e aumento do volume de
empréstimos e emissão de títulos.
Já no mercado físico de construção de imóveis — o mundo dos
“estabelecimentos tradicionais” — pode haver atrasos significativos.
Antes que um novo edifício possa estar pronto para ser
comercializado, aumentando a oferta de espaço (e, assim,
pressionando os preços do metro quadrado para baixo se a
demanda não aumentar rapidamente), é preciso: a) elaborar
estudos de viabilidade econômica; b) encontrar e comprar um
terreno; c) fazer o projeto do edifício; d) estudar o impacto
ambiental; e) obter a permissão da autoridade municipal para
construir, às vezes exigindo modificações nas leis de zoneamento; f)
obter o financiamento; e g), enfim, concluir a construção. Esse
processo pode durar vários anos e, no caso de um grande projeto,
exceder uma década. E as condições do mercado podem mudar
muito significativamente ao longo desse período.
Usarei uma descrição do ciclo de desenvolvimento imobiliário de
“Ditto” (“Idem”, em tradução livre), de janeiro de 2013, para ilustrar.
Como informei naquele memorando, “geralmente é claro, simples e
regularmente recorrente”:
Épocas desfavoráveis arrefecem o nível de atividade de
construção e limitam a disponibilidade de capital para esse
mercado.
Passado um tempo, o ambiente fica menos ruim, e, por
fim, até bom.
A melhora da economia eleva a demanda por imóveis.
A demanda adicional representada pelos poucos edifícios
cuja construção havia sido iniciada durante o período mais
fraco e que agora estão no mercado faz com que o quadro
de oferta/demanda aumente, e, assim, os preços dos
aluguéis e as vendas subam.
Isso melhora as condições do mercado imobiliário,
reavivando a vontade de construir dos empresários.
O ambiente e a economia vivendo tempos melhores
deixam os provedores de capital mais otimistas. Nesse
estado de espírito, o financiamento torna-se mais
prontamente disponível.
Financiamento mais barato e fácil aumenta os retornos pro
forma (método de cálculo baseado nas condições
vigentes) em projetos potenciais, elevando sua
atratividade e espicaçando o desejo dos empresários de
obtê-los.
Com maiores retornos projetados, empreendedores mais
otimistas e provedores de capital mais generosos, o ritmo
de construção deslancha.
Os primeiros projetos concluídos encontram forte
demanda reprimida. São prontamente alugados ou
vendidos, dando bons retornos.
Esses bons retornos — além das manchetes diárias cada
vez mais positivas — dão luz verde a mais projetos e
financiamento de imóveis.
Guindastes enchem o céu (e gruas adicionais são
encomendadas às fábricas, mas esse é um ciclo
diferente).
Leva anos para os prédios começarem a ser finalizados.
Nesse ínterim, os primeiros que ficam prontos saciam a
fome da demanda reprimida.
O período entre o início do planejamento e a “cobertura”
de um prédio é geralmente longo o suficiente para que a
economia passe de um boom a outro. Projetos iniciados
nos bons tempos muitas vezes são lançados em tempos
ruins, significando que os metros quadrados a mais
pressionam para baixo os preços de aluguéis e venda,
com imóveis total ou parcialmente desocupados.
Tempos ruins ocasionam baixos níveis de atividade
imobiliária e restrição na disponibilidade de capital para
construção.
Observe que, tal como ocorre em muitos dos outros ciclos
discutidos aqui, cada passo leva ao próximo. Em particular, o passo
na parte inferior da lista é, na verdade, o que inicia a próxima
iteração. Este é um bom exemplo da maneira pela qual os ciclos se
autoperpetuam.
No crédito, os prazos inerentes ao processo são breves, então,
quando o empréstimo é concedido, as condições econômicas e
comerciais vigentes no momento em que a vontade de emprestar
surge ainda estão em vigor. E se as condições mudarem
materialmente nesse ínterim processual, o credor pode ser capaz de
se descomprometer em face da existência no contrato de uma
cláusula de “mudança adversa significativa”. Assim, há
relativamente pouco risco nos empréstimos gerais resultantes da
lacuna entre ideia e ação.
Contudo, muitos anos podem passar entre a concepção de um
edifício e seu lançamento, e isso pode fazer com que as condições
mudem enormemente, como já informei. Tal possibilidade torna o
negócio imobiliário potencialmente arriscado. Os empreendedores
esperam que esse risco seja compensado pelo fato de terem à mão
extenso financiamento externo (e portanto arriscam relativamente
pouco de seu próprio dinheiro e são capazes de alavancar em alto
grau o retorno sobre ele).
Quando me mudei para Los Angeles, em 1980, esqueletos de aço
perfilavam-se ao longo do “corredor Wilshire”, em Westwood, onde
condomínios cintilantes haviam sido imaginados. Os
empreendedores que iniciaram esses projetos tomaram carona no
boom dos anos 1970, mas o panorama favorável sob o qual aqueles
projetos foram iniciados foi mudando de figura conforme as
condições econômicas refluíam e a demanda existente ia sendo
atendida por construtores mais rápidos.
Um desses esqueletos enferrujados permaneceu assim,
inacabado, durante anos. Seu construtor, que sonhara com um alto
retorno sobre o custo total de um projeto de $100 milhões, perdeu
seus $5 milhões ou $10 milhões de capital (e os bancos perderam
boa parte do financiamento desses projetos). Isso ilustra a
desvantagem do ciclo imobiliário e o efeito dos longos períodos de
tempo.
Já os investidores que compraram esses prédios inacabados
(muitas vezes de quem os financiou e os havia retomado) e os
concluíram, com frequência se beneficiaram:
Da capacidade de comprá-los por menos do que havia
sido investido em terreno, planejamento, licenciamento e
construção parcial.
Da redução do custo para finalizá-los graças a preços
mais baixos de mão de obra e materiais em um ambiente
sem boom.
Do período mais curto entre o reinício e a construção do
prédio.
Da possibilidade de que — assim como foram aprovados
nos bons tempos e passaram por maus momentos — os
projetos paralisados, adquiridos em tempos ruins,
entrassem no mercado nos bons tempos.
O longo tempo de espera no desenvolvimento imobiliário abria
essa possibilidade, e minha equipe entrou nessa. Isso ilustra o
impacto dos ciclos no potencial de lucro. Iniciar projetos em tempos
de boom pode ser uma fonte de risco. Comprá-los em tempos fracos
pode ser muito lucrativo. Tudo depende do que você faz e quando
faz. “Uma bela tacada”, como se diz no bilhar.
Há no campo imobiliário um outro aspecto dos ciclos que pode ser
visto claramente, embora ele também afete os ciclos em muitas
outras áreas: o fato de que as decisões das pessoas geralmente
não levam em conta o que os demais estão fazendo. Veja um
exemplo:
Quando há prosperidade, e riqueza e bons sentimentos afloram, é
normal crescer a demanda por moradias (resultando em aumento no
preço das casas) e aumentar a disponibilidade de financiamento
hipotecário. Muitas vezes isso agrava a carência de moradias na
medida em que a demanda por elas aumenta em relação à oferta,
algo cujo ajuste é lento. Altos preços das residências,
disponibilidade de financiamento e construtoras ansiosas por obtêlos unem-se para estimular a construção de novas casas para
atender à demanda.
Um construtor de residências pode concluir que há demanda não
atendida por 100 casas em sua cidade. Cauteloso — e premido
pelos limites de sua escala e acesso a fundos —, decide construir
apenas 20 novas casas. Até aqui, beleza.
Mas e se dez como ele tomarem a mesma decisão? Aí 200 casas
serão construídas. Ou seja, serão construídas mais casas do que a
demanda. E quando esses imóveis chegarem ao mercado, a
economia pode ter esfriado, as pessoas podem não se sentir tão
prósperas e, dessa forma, a demanda por casas pode ser bem
menor. Nesse caso, as 200 novas residências podem encontrar uma
escassez de demanda, o que significa que elas não serão vendidas
ou serão vendidas por preços muito inferiores àqueles que serviram
de base para a decisão de construir.
Agora as condições se inverteram. A economia patina. O acesso
ao financiamento diminui, dificultando a obtenção de hipotecas por
potenciais compradores. E há um estoque considerável de casas
não vendidas. Claramente, o mais inteligente é parar de construir.
Então todos os construtores fazem isso ao mesmo tempo… Ou seja,
na próxima vez que a economia melhorar, pode não haver casas
suficientes para atender ao aumento da demanda. E, assim, a roda
gira.
A seguir, uma descrição objetiva de um aspecto de um ciclo em
ação. E não é hipotética. Na conferência Oaktree de 2012, meu
parceiro Raj Shourie mostrou um dos gráficos mais interessantes
que já vi:
O gráfico registra, para o período de 1940 a 2010, o número anual
do início de construção de novas residências nos EUA. O que me
impressionou não foi o fato de que os empreendimentos
habitacionais de 2010 estavam no nível mais baixo desde 1945 (e
comparáveis aos níveis um pouco menos deprimidos de 1940), pois
essa observação conta apenas parte da história. Não leva em conta
o crescimento desde os anos 1940 na população dos EUA, a fonte
da qual surgem aumentos de longo prazo na demanda por
habitação.
Assim, enquanto os números em 2010 eram os mesmos de 1940,
a proporção em relação à população — sem dúvida um número
muito mais significativo — era apenas metade do nível altamente
deprimido de 1940. A explicação é que praticamente ninguém havia
retomado a construção de casas após a crise hipotecária do
subprime, o colapso imobiliário e a Crise Financeira Global de
2007–2008. A principal inferência a se extrair dessa observação foi
a de que a oferta de novas residências nos anos imediatamente
seguintes seria insuficiente para atender à demanda crescente por
imóveis residenciais.
Na época, generalizou-se a convicção de que nunca poderia
haver uma recuperação na demanda por residências. A maioria das
pessoas estava convencida de que o sonho norte-americano da
casa própria se desvanecera e a demanda por casas permaneceria
deprimida para sempre. Assim, o estoque de casas não vendidas
seria diluído muito lentamente. Citava-se a tendência entre os mais
jovens — em razão do colapso do sistema de financiamento
habitacional e das bolhas hipotecárias — em alugar, deixando de
comprar. Como sempre, essa ideia foi extrapolada, em vez de sua
durabilidade ser questionada. À semelhança de muitos dos
exemplos deste livro, para a maioria das pessoas, a extrapolação
conduzida pela psicologia tomou o lugar de uma compreensão e
crença na ciclicidade.
Com base naquele gráfico e no conhecimento que tínhamos dos
dados por detrás dele, ficou claro para mim e meus colegas da
Oaktre que, como a maior debacle econômica em quase 80 anos
havia interrompido o acréscimo na oferta de moradias, os preços
das casas poderiam se recuperar fortemente se houvesse algum
aumento concreto na demanda. E, rejeitando a ideia então
cristalizada, estávamos convencidos de que a demanda por
moradias se mostraria cíclica como de costume, e portanto decolaria
em algum momento no futuro, a médio prazo. Essa conclusão —
apoiada por outros dados e análises — contribuiu para nossa
decisão de investir pesadamente em hipotecas residenciais
inadimplentes e empréstimos bancários inadimplentes, garantidos
por terrenos para construção residencial, e também para adquirir a
maior empresa privada de construção de imóveis residenciais da
América do Norte. Isso deu muito certo. (É interessante nesse
contexto observar o que o The Wall Street Journal informou em um
artigo de 12 de maio de 2017 intitulado “Generation of Renters Now
Buying” (“Geração de Locatários Agora Compram”, em tradução
livre): “Dentre todos os compradores de casas, 42% o faziam pela
primeira vez este ano, contra 38% em 2015 e 31% no ponto mais
baixo do recente ciclo habitacional, em 2011”. Números que bastam
para desmistificar a ideia de abandono generalizado da casa
própria.)
Eis aí um exemplo prático de que a consciência da natureza dos
ciclos e da nossa posição no atual permitiram uma inferência
lucrativa. E é um caso em que um ciclo em um de seus extremos —
desta feita, no início da construção de residências em meio a uma
depressão profunda — enviou um nítido sinal pedindo uma ação
altamente lucrativa.
O rumo correto parece claro agora, quando olhamos para as
evidências. Em retrospectiva, as razões por trás das decisões de
sucesso são invariavelmente óbvias. Mas, neste caso, a análise
desapaixonada dos dados cíclicos permitiu que a conclusão correta
fosse obtida em tempo real… que é quando conta.
Gostaria agora de focar — pela primeira, mas não pela última vez —
o modo como as pessoas ocasionalmente concluem que algum
fenômeno financeiro deixou de ser cíclico, e para esse fim discutirei
um dos maiores casos. Quando as coisas vão bem, as pessoas
tendem a pensar que os bons tempos serão infindáveis. De fato,
não se passou muito tempo para que uma correção de rumos
mostrasse como a história cíclica foi negligenciada. Assim, é
apropriado citar novamente a observação de John Kenneth
Galbraith sobre as atitudes em relação à história:
Pode haver poucos campos do esforço humano em que a
história conta tão pouco quanto no mundo das finanças. A
experiência passada, na medida em que faz parte da
memória, é considerada como o refúgio primitivo daqueles
que não têm a visão necessária para apreciar as incríveis
maravilhas do presente.
Grande parte dos investimentos está sujeita a generalizações
grosseiras e declarações abrangentes — geralmente enfatizando os
pontos positivos, por causa da tendência dos seres humanos à
ganância e ao pensamento positivo — e, por alguma razão, isso
parece ser particularmente verdadeiro no setor imobiliário. Ao longo
da minha carreira, ouvi racionalizações sobre investimentos em
imóveis baseadas em declarações facilmente digeridas como “eles
não estão mais fazendo” (a respeito de terras), “você pode sempre
viver nela” (a respeito de casas), e “é uma proteção contra a
inflação” (a respeito de propriedades de todos os tipos). O que as
pessoas acabam aprendendo é que, independentemente do mérito
por trás dessas declarações, elas não protegem um investimento
feito a preços muito altos.
Já mencionei que nos EUA, no final dos anos 1990 e início dos
anos 2000, várias autoridades eleitas decidiram que se mais
pessoas tivessem acesso à casa própria, a sociedade se
beneficiaria. Isso passou aos credores hipotecários patrocinados
pelo governo a mensagem de que o financiamento residencial
deveria ser disponibilizado com mais facilidade, e eles concordaram.
Tal diretriz, combinada ao declínio acentuado das taxas de juros que
ocorria na época, teve um poderoso efeito estimulante sobre os
potenciais compradores de imóveis residenciais.
O fluxo de dinheiro para as hipotecas foi fortemente encorajado
por outra característica do setor imobiliário: “empréstimos
hipotecários são seguros”. Isso foi baseado na convicção de que
uma onda nacional de inadimplência de hipotecas não poderia
acontecer. A combinação de forte crescimento econômico,
flutuações econômicas geralmente moderadas e práticas prudentes
de empréstimo hipotecário impediram a ocorrência de tal onda no
período desde a Grande Depressão… tempo suficiente para o
último episódio ser esquecido, como diz Galbraith. Mas isso não
significa que os credores fossem incapazes de resvalar para
práticas de empréstimo tão generosas e imprudentes que uma
recessão poderosa poderia trazer uma onda de inadimplência.
Nos primeiros anos do século XXI, a combinação de forte
demanda por imóveis e financiamento hipotecário abundante —
instigada pela cobertura otimista da mídia — fez com que os preços
dos imóveis subissem fortemente. Assim, começamos a ouvir mais
uma ampla e generalizada ladainha sobre o setor imobiliário: “os
preços das moradias sempre sobem” (veja a seção a seguir).
Espero que agora você tenha entendido que os méritos do ativo
em questão importam muito, mas certamente não podem ser fortes
o suficiente para sempre ganhar o dia. A emoção humana
inevitavelmente faz com que os preços dos ativos — mesmo os que
valem a pena — sejam deslocados para níveis extremos e
insustentáveis: ou vertiginosamente altos ou excessivamente
baixos.
Resumindo, crer de modo consciencioso na inevitabilidade dos
ciclos, como estou pedindo, significa que há certas palavras e frases
que devem ser excluídas do vocabulário do investidor inteligente:
“nunca”, “sempre”, “para sempre”, “não pode, “não será”, “não
deverá” e “tem que” e correlatos.
Nos anos que antecederam a crise das hipotecas subprime de 2007
e a Crise Financeira Global de 2007–2008, uma grande dose de
comportamento altista (que mais tarde demonstrou ter sido
imprudente) sustentava-se na crença de que as residências
poderiam se apreciar de forma constante e não se provar cíclica.
Como parte — ou contribuindo para — a tendência de alta, alguns
pesquisadores declararam apoio a essa ideia e fizeram projeções
otimistas:
Segundo um artigo da The New York Times Magazine de
5 de março de 2006 intitulado “This Very, Very Old House”
(“Uma Casa Muito, Muito Velha”, em tradução livre), um
alto funcionário do Federal Reserve Bank de Nova York
concluiu que “o aumento acentuado dos preços dos
imóveis estar em linha com as condições econômicas […]
não é uma visão distorcida da realidade”. Atribui-se a ele o
seguinte comentário: “Às vezes nos perguntamos por que
os preços das casas não aumentaram muito mais, a julgar
pelo tremendo aumento no tamanho da hipoteca que uma
família média pode financiar”.
O artigo também mencionou que, na Universidade de
Colúmbia e da Wharton School, “especialistas da mesma
opinião concentram-se no que eles chamam de ‘cidadesestrelas’, lugares tão desejáveis que não apenas não
rumam para uma correção, mas também podem sustentar
preços sempre crescentes em comparação com cidades
menos procuradas”. (É claro que a disposição de
empregar termos como “sempre crescente” deveria servir
como sinal de advertência absoluta para o investidor
alerta.)
Havia, porém, muito a questionar sobre a razoabilidade dessas
conclusões:
Os dados relativos aos preços das casas referem-se a um
período de tempo curto.
O fato de que declarações sobre a tendência do preço da
casa média vendida em um determinado ano não
necessariamente dizem nada sobre o desempenho do
preço de uma determinada casa ou de todas as
residências (por exemplo, não há ajuste para mudanças
físicas na casa média ao longo do tempo, ou no mix de
casas vendidas naquele ano em relação a todas as
residências).
Da mesma forma, não há ajuste para o fato de que bairros
e cidades inteiras ganham ou perdem
importância/prestígio ao longo do tempo, afetando o valor
das casas. Por esse motivo, declarações sobre casas em
uma determinada cidade ou bairro não seriam
necessariamente aplicáveis a residências em geral.
Por isso achei muito interessante quando “This Very, Very Old
House” foi publicado, em 2006. O artigo mencionava um estudo que
solucionou muitos desses problemas metodológicos, seguindo o
preço de uma única casa em Amsterdã: uma que Pieter Fransz
construiu em 1625. Dali em diante, virtualmente inalterada, mudara
de mãos seis vezes, mas sua localização no bairro do canal
Herengracht continuava sendo a mais desejável de Amsterdã. Ou
seja, a questão não era sobre se o preço da casa média havia
subido, mas, sim, como o preço de uma determinada casa fora se
formando.
Contrastando com a opinião dos que acreditavam na perenidade
da situação favorável do mercado de habitação citada
anteriormente, Robert Shiller, da Yale, disse sobre a casa de Fransz
e seus vizinhos: “Olhar para os dados de Herengracht é muito
instrutivo, porque você pode observar intervalos de 50 anos de
crescimento, e isso muda as coisas de figura. Isso é mais realista do
que o argumento das cidades-estrelas”. O autor do estudo, Piet
Eichholtz, foi descrito como “cético em relação àqueles que afirmam
que os valores de propriedade podem continuar aumentando ao
infinito”. Ele considerou os argumentos econômicos “diferentes
desta vez”, mas disse: “Você pode ver avaliações igualmente
otimistas feitas recorrentemente, que são então invalidadas pelas
circunstâncias”.
Naquele artigo lia-se, ainda, que:
“Há um mito segundo o qual os valores imobiliários aumentam
significativamente ao longo do tempo…” Eichholtz disse: “…
mas os dados acabaram desafiando esse mito”.
Ou seja, lá onde todos, desde seu velho e sábio tio até o
corretor que lhe vendeu uma casa, consideram como escrito
na pedra que o setor imobiliário é um dos melhores
investimentos de longo prazo, o mais longo dos índices de
longo prazo sugere que, muito ao contrário, há algo que não
cheira bem. Entre 1628 e 1973 (o período do estudo original
de Eichholtz), os valores reais da propriedade em
Herengracht — ajustados pela inflação — subiram apenas
0,2% ao ano. Como Shiller escreveu em sua análise do índice
Herengracht, “os preços reais dos imóveis praticamente
dobraram, mas levaram quase 350 anos para fazê-lo”.
… É apenas nos últimos anos, diz Shiller, que os enormes
aumentos nos preços dos imóveis se tornaram a norma e o
que as pessoas esperam deles.
… se essa descrição dos últimos anos (em que “os preços
subiram surpreendentemente”) tipifica o admirável mundo
novo em que vivemos, colocando-o na perspectiva do tempo
— subir, cair, subir, cair — nos leva de volta ao que pode ser
a lição de história mais antiga de todas: ela tende a se repetir.
(algo que enfatizo com veemência)
Ainda que os dados de longo prazo sobre os preços das
residências sejam valiosos, a lição mais relevante é que, em tempos
de aumento dos preços dos ativos, as pessoas se tornam otimistas
e os analistas dão suporte a esse estado de coisas com a força de
sua autoridade. Isso é natural. De fato, racionalizações a propósito
de valorizações de preço ocorridas (e previsão de continuidade
desse processo) invariavelmente ocorrem em períodos de alta, e
não de baixa. Um conselho: para obter ajuda de verdade, eu
procuraria analistas que emitissem declarações sóbrias em tempos
de alta, ou que argumentassem contra a negatividade quando os
mercados estivessem em baixa.
O setor imobiliário, como todos os outros, está sujeito a ciclos de
alta e baixa. Mas os ciclos imobiliários podem ser amplificados por
fatores especiais:
O intervalo de tempo entre a concepção e o lançamento
de um empreendimento.
A típica alavancagem financeira extremamente alta.
O fato de a oferta ser geralmente inflexível demais para
ser ajustada à medida que a demanda sobe ou desce. (Ou
seja, um fabricante pode eliminar um turno de trabalho,
demitir funcionários ou reduzir a produção se a demanda
por seu produto cair muito. Mas é muito mais difícil para
um locador, hoteleiro ou incorporador imobiliário reduzir as
instalações que têm para oferecer se a demanda ficar
aquém da necessária.)
O ciclo no setor imobiliário ilustra e exemplifica as maneiras pelas
quais os fatores cíclicos sofrem e causam sofrimento uns aos
outros, bem como a tendência dos ciclos a ir a extremos. Não é por
acaso que se costuma dizer, com alta dose de cinismo, que — em
tempos mais difíceis, quando as generalizações otimistas já não
cabem — “somente o terceiro proprietário ganha dinheiro”. Não o
empreendedor que concebeu e iniciou o projeto. E não o banqueiro
que financiou a construção e, em seguida, recuperou a posse do
projeto do desenvolvedor no ciclo descendente. Mas, sim, o
investidor que comprou a propriedade do banco em meio a
dificuldades e, em seguida, surfou na onda do ciclo de alta.
Claro que, como todas as generalizações, trata-se de um exagero.
Mas serve como um lembrete da relevância da ciclicidade para o
mercado imobiliário, e em especial do modo como ela pode
funcionar em tempos menos favorecidos.
XII
JUNTANDO TUDO — O CICLO DE MERCADO
Quando um investidor inexperiente vive pela primeira vez um
ciclo de mercado ascendente, o início da progressão pode
parecer lógico, pois os aspectos positivos se formam em um
mercado altista, ou bolha. O fato de tantas boas notícias e
positividade poderem acabar em perdas pode ser uma
surpresa. É inevitável que pareça ser assim para os não
iniciados, porque se as progressões não pudessem chegar a
extremos com base em erros de julgamento, os mercados não
alcançariam o pico do mercado altista para então colapsar (ou
o fundo do poço para iniciar o processo de recuperação).
N
osso trabalho como investidores é simples: lidar com os preços
dos ativos, avaliar onde estão hoje e fazer julgamentos sobre
como mudarão no futuro. Os preços são afetados principalmente por
ocorrências em duas áreas: fundamentos e psicologia.
Os fundamentos, que venho chamando de “eventos”,
podem ser reduzidos em grande parte a ganhos, fluxo de
caixa e às perspectivas dos dois. Eles são afetados por
muitas coisas, incluindo tendências na economia,
lucratividade e disponibilidade de capital.
E a psicologia — ou seja, como os investidores se sentem
sobre os fundamentos e os valorizam — também é
afetada por muitas coisas, em particular pelo nível de
otimismo e pela atitude em relação ao risco.
Há ciclos nos elementos citados e vários aspectos em cada ciclo.
Os temas por trás do comportamento dos ciclos (as maneiras pelas
quais eles interagem e se combinam) têm um padrão repetitivo e
compreensível, como discutimos em detalhes. Todos eles se juntam,
combinando-se com influências idiossincráticas e aleatórias, para
causar o comportamento do mercado de valores mobiliários.
Pretendo neste capítulo dar uma noção dos ciclos de alta e baixa
do mercado. Não do fato em si ou como isso se deu no passado, ou
a que esses movimentos reagiram, mas, sim, das forças —
especificamente as não econômicas, não fundamentais — que
provocam o sobe e desce, muitas vezes de maneira descontrolada.
Se os fundamentos fossem o único parâmetro de cálculo do valor
de mercado, o preço de um título não flutuaria muito mais do que os
ganhos correntes de quem o emite e as perspectivas de ganhos no
futuro. Na verdade, o preço deveria, de modo geral, flutuar menos
que os ganhos, pois as variações trimestrais nos lucros geralmente
se igualam no longo prazo, e, além disso, não refletem
necessariamente as mudanças reais no potencial de longo prazo da
empresa.
E, no entanto, os preços dos títulos usualmente flutuam muito
mais do que os ganhos. As razões, claro, são em grande parte
psicológicas, emocionais, e não ligadas aos fundamentos. Assim, as
mudanças de preço exageram sobremaneira as mudanças nos
fundamentos. Esta é a versão curta do motivo:
Eventos na economia e nos lucros corporativos tornam-se
cada vez mais positivos.
A positividade alimenta a psicologia do investidor. As
emoções, o chamado “espírito animal” e a tolerância ao
risco dos investidores aumentam com os eventos positivos
(ou, às vezes, apesar dos negativos).
O aumento dos fatores psicológicos deixa os investidores
menos exigentes em termos de proteção contra riscos e
retorno prospectivo.
Eventos positivos, maior peso dos aspectos psicológicos e
redução das exigências de retorno dos investidores
elevam os preços dos ativos.
Mas, por fim, o processo se reverte. Os eventos já não
correspondem mais às expectativas, talvez em
decorrência do ambiente menos amigável ou, quem sabe,
porque as expectativas eram irrealistas.
Os investidores por fim se dão conta de que a psicologia
não pode permanecer positiva para sempre, ou porque
cabeças mais frias concluem que o nível dos preços é
injustificável, ou por um milhão de possíveis razões (ou
por nenhuma razão aparente).
Há declínio dos preços quando os eventos são menos
positivos ou passam a ser vistos menos positivamente. Às
vezes isso ocorre simplesmente porque os preços
atingiram níveis insustentáveis, ou em virtude de
desenvolvimentos negativos no meio ambiente.
Tendo começado a declinar, os preços dos ativos
continuam a cair até um ponto tão baixo, que o cenário
está pronto para sua recuperação.
É importante entender o modo como os fundamentos e a
psicologia interagem, conforme descrito antes. Mas é essencial
repetir algo sobre esse processo: a descrição anterior é ordenada e
sequencial, porém o processo não é tão simples assim. A sequência
em que essas coisas ocorrem está sujeita a mudanças, assim como
a própria direção da causalidade.
Às vezes são os eventos que fazem com que a psicologia
se fortaleça, e em outras, o contrário acontece (por
exemplo, fortalecendo a economia e os lucros das
empresas).
E embora seja óbvio que a melhoria da psicologia dos
investidores aumenta os preços dos ativos, é igualmente
óbvio que o aumento dos preços faz com que os
investidores se sintam mais ricos, mais inteligentes e mais
otimistas.
Então, em outras palavras, esses relacionamentos podem
funcionar em mão dupla… e até mesmo simultaneamente. E cada
um pode causar o outro. A velocidade desse processo varia muito
de ciclo para ciclo e ao longo de um determinado ciclo. E, ainda, os
ciclos não progridem necessariamente sem problemas; em vez
disso, ao longo do caminho podem ocorrer declínios e
recuperações.
Razões como essas não permitem que o investimento seja
descrito como científico, e assim, é fora de propósito trabalhar nele
sempre da mesma forma. Continuo voltando à observação de Mark
Twain de que “a história não se repete, mas rima”. Motivos e
resultados nunca são os mesmos do passado, mas de maneira
geral, remetem aos desenvolvimentos que vimos antes.
Independentemente da imprecisão do processo, fica claro que os
eventos, tanto os passados quanto os que se espera no futuro, se
combinam com a psicologia para determinar os preços dos ativos.
Eventos e psicologia também influenciam a disponibilidade de
crédito, e esta afeta muito os preços dos ativos, o qual realimenta a
influência dos eventos e da psicologia.
Em suma, tudo isso se reúne para criar o ciclo de mercado.
Ouvimos falar a respeito todo os dias, principalmente em relação
aos altos e baixos do mercado de ações, mas também no que tange
a mercados como o de títulos, ouro e moedas. Muitos ciclos se
cruzam aqui, e esse é o assunto deste capítulo.
A teoria financeira retrata os investidores como “homens
econômicos”: otimizadores, objetivos e racionais. Assim, o mercado
que eles coletivamente formam seria o que o autor e investidor (e
professor de Warren Buffett) Ben Graham chamou de “máquina de
pesar”: um avaliador disciplinado do valor dos ativos.
Mas, em forte contraste com essa ideia, fatos e números
financeiros são apenas um ponto de partida para o comportamento
do mercado; a racionalidade do investidor é a exceção, não a regra:
no mercado fica-se pouco tempo calmamente pesando dados
financeiros e definindo preços livres de emoções.
Os fundamentos do investimento são bastante objetivos. Eventos
passados foram registrados, e muitas pessoas têm as habilidades
quantitativas necessárias para analisá-los. O desempenho atual é
capturado nas demonstrações financeiras, às vezes com precisão,
às vezes exigindo ajustes. Quanto aos eventos futuros, seu
desconhecimento é democrático (embora alguns tenham mais
condições do que outros para prevê-los). Os fundamentos não são a
parte mais variável do investimento ou a que mais me intriga. Seja
como for, não posso escrever um livro dizendo como saber mais do
que os outros sobre eventos futuros. Um trabalho superior requer
elementos de previsão, intuição e “pensamento de segundo nível”
que duvido possam ser colocados no papel ou ensinados.
A parte que me fascina no investimento — em que penso na maior
parte do tempo e na qual meus colegas da Oaktree e eu fizemos
algumas de nossas maiores contribuições para o bem-estar de
nossos clientes — considera as maneiras como os investidores se
desviam dos pressupostos racionais e a contribuição desse
comportamento para a oscilação dos ciclos.
Um grande número de elementos está envolvido nesse aspecto da
tomada de decisões de investimento, interferindo no processo de
chegar a decisões puramente econômicas. Eles podem estar
rotulados como fatores psicológicos, emocionais ou inerentes à
natureza humana — a distinção não é relevante para nossos
propósitos aqui — e são absolutamente capazes de dominar o
comportamento do investidor e, portanto, os mercados. Alguns, mas
não todos, variam ciclicamente, e todos podem afetar ou exacerbar
os ciclos. Aqui estão as influências mais importantes:
O comportamento errático dos investidores, em vez de um
firme apego ao pensamento racional e às decisões
racionais resultantes.
A tendência dos investidores de ter visões distorcidas do
que se passa, envolvendo-se em percepções seletivas e
vieses de interpretação.
Peculiaridades como o viés de confirmação, que faz as
pessoas aceitarem evidências que confirmam suas teses
e rejeitarem as contrárias a elas, e a tendência a dar um
peso maior à perda monetária do que a um ganho
equivalente (efetivos ou em potencial).
A credulidade, que leva os investidores a engolir
promessas de lucros elevados nos bons tempos, e o
excesso de ceticismo que os faz rejeitar toda possibilidade
de ganhos em tempos ruins.
A natureza flutuante da tolerância ao risco e da aversão
ao risco dos investidores e, consequentemente, de suas
demandas por prêmios de risco compensatórios.
O comportamento de manada que resulta da pressão para
se alinhar àquilo que os outros estão fazendo e, como
resultado, a dificuldade de manter posições não
conformistas.
O extremo desconforto que vem de ver os outros
ganharem dinheiro fazendo algo que você rejeitou.
Assim, os investidores que resistiram a uma bolha de
ativos tendem, em última análise, a sucumbir à pressão e
comprar (embora — e não porque — o ativo objeto da
bolha tenha sido apreciado substancialmente).
A tendência correspondente a desistir de investimentos
pouco populares e malsucedidos, não importa quão
intelectualmente sólidos.
Finalmente, o fato de que investir diz respeito a dinheiro,
que introduz elementos poderosos como a cobiça por
mais, a inveja do dinheiro que os outros estão fazendo e o
medo da perda.
Otimistas e Pessimistas
Na gíria norte-americana, os investidores têm se caracterizado há
pelo menos 100 anos como “bulls” (touros) — otimistas que acham
que as ações subirão e que, consequentemente, se comportam
agressivamente) ou “bears” (ursos) — pessimistas que acham que
elas cairão e que, assim, se comportam defensivamente). Por causa
disso, as pessoas aplicam o rótulo de “bull market” a um mercado
que subiu, está subindo ou subirá (é bastante impreciso) e “bear
market” quando do contrário.
No início dos anos 1970, ganhei um grande presente: um
investidor mais velho e mais sábio apresentou-me “os três estágios
de um mercado em alta”:
Primeiro estágio: apenas algumas poucas pessoas
bastante perspicazes acreditam que as coisas melhorarão.
Segundo estágio: a maioria dos investidores percebe que
a melhoria está realmente ocorrendo.
Terceiro estágio: todos concluem que tudo será sempre
melhor.
Isso abriu meus olhos para os extremos psicológicos a que os
investidores podem chegar, bem como para o impacto desses
extremos nos ciclos de mercado. Como muitas das grandes citações
e adágios, poucas palavras encerram imensa sabedoria quanto às
atitudes: sua mutabilidade, seu padrão ao longo de um ciclo e sua
contribuição para o erro.
No primeiro estágio, porque a possibilidade de melhoria é invisível
para a maioria dos investidores e, portanto, pouco valorizada, os
preços dos títulos incorporam pouco ou nenhum otimismo. É comum
o primeiro estágio ocorrer após um declínio incidental dos preços, e
a mesma tendência de baixa que dizimou os preços afeta
negativamente a psicologia da multidão, que se coloca contra o
mercado e jura nunca mais investir.
No último estágio, por outro lado, como tudo vinha correndo bem
há muito tempo, os reflexos tão acentuados nos preços dos ativos
elevam ainda mais o bom humor do mercado. Com isso, os
investidores acabam extrapolando a melhoria para o infinito e
aumentam os preços para refletir seu otimismo. Os investidores
agem como se o céu fosse o limite… e pagam pelo potencial
ilimitado que percebem. Poucas coisas são tão caras quanto pagar
por um potencial superestimado.
Segue-se do exposto que alguém que investe no primeiro estágio
— quando quase ninguém consegue ver uma razão para otimismo
— compra ativos a preços baixos, a partir dos quais é possível uma
apreciação substancial. Mas alguém que compra no terceiro estágio
invariavelmente sofre pelo entusiasmo excessivo do mercado e
acaba perdendo dinheiro.
Há na descrição dos três estágios do mercado altista muita
sabedoria com grande economia. Mas não muito tempo depois de
conhecê-la, deparei-me com algo ainda melhor e mais sucinto —
essencialmente, a mesma mensagem em apenas 12 palavras: “O
que o sábio faz no começo, o idiota faz no final”.
Considero isso a pedra de toque do investimento e uma incrível
síntese da importância dos ciclos. Mais uma vez, o pioneiro — que,
por definição, é aquela pessoa rara que vê o futuro melhor do que
os outros e tem a força interior para comprar sem validação da
multidão — acumula potencial não descoberto a um preço irrisório.
Mas toda tendência de investimento acaba por ser exagerada e
aumenta demais, de modo que o comprador, no final, paga por um
potencial superestimado. Ele termina com seu capital sendo punido,
não valorizado.
“O que o homem sábio faz no começo, o idiota faz no final” diz
80% do que você precisa saber sobre os ciclos de mercado e seu
impacto. Warren Buffett disse a mesma coisa de maneira ainda mais
concisa: “Primeiro, o inovador, depois, o imitador, depois, o idiota”.
Claro, os ciclos funcionam nos dois sentidos, e a Crise Financeira
Global foi tão fundo, que tive a oportunidade de inverter o velho
ditado e descrever os três estágios de um “bear market” em “The
Tide Goes Out” (“A Maré Está Refluindo”, em tradução livre, março
de 2008).
Primeiro estágio: só alguns investidores conscientes
reconhecem que, apesar do otimismo predominante, as
coisas nem sempre serão assim,
Segundo estágio: a maioria dos investidores reconhece
que as coisas estão se deteriorando.
Terceiro estágio: todos pensam que as coisas só podem
piorar.
Já mencionei a capitulação. É um fenômeno fascinante, e há um
ciclo confiável para ela também. No primeiro estágio de um mercado
altista ou baixista, a maioria dos investidores abstém-se (por
definição) de acompanhar o que apenas uma pequena minoria faz.
Talvez porque lhes falte a percepção especial subjacente a essa
ação ou a capacidade de agir antes de o caso ter sido provado e
outros terem migrado para ele (após o que não já não há mais
desvalorização refletida nos preços de mercado). Ou, ainda, um
grupo precisou tomar um caminho diferente da manada e adotar
uma postura em contrário.
Ao deixar de lado a oportunidade de ser precoce, ousado e
correto, os investidores podem continuar resistindo à medida que o
movimento toma conta e ganha força. Uma vez que essa compulsão
vai ganhando mercado, eles ainda podem não participar. Eles se
recusam obstinadamente a comprar no mercado quaisquer classes
de ativos ou setores de atividade que tenham sido alavancados por
compradores otimistas, ou vender outros cujo preço esteja abaixo
do valor intrínseco. Juntar-se à tendência mais tarde não é opção
para eles.
Mas a maioria dos investidores por fim capitula. Simplesmente
deixam escapar a determinação necessária para resistir. Uma vez
que o ativo dobrou ou triplicou de preço — ou caiu à metade —,
muitas pessoas se sentem tão estúpidas e erradas, invejando
aqueles que lucram com a moda ou pularam fora antes do declínio,
que perdem a vontade de lutar. Minha citação favorável sobre esse
assunto é de Charles Kindleberger: “Não há nada tão perturbador
para o bem-estar e julgamento de alguém quanto ver um amigo ficar
rico” (Manias, Panics and Crashes: A History of Financial Crises,
1989). Os participantes do mercado estão sofrendo com o dinheiro
que outros fizeram e perderam, e temem que a tendência (e a dor)
continue. Eles concluem que se juntar à manada vai parar a dor,
então se rendem. E, finalmente, terminam por comprar o ativo bem
em sua ascensão ou vender depois de ter caído muito.
Em outras palavras, depois de deixar de fazer a coisa certa no
estágio um, erram mais ainda agindo no estágio três, quando agir é
um equívoco. Isso é capitulação. É um aspecto altamente destrutivo
do comportamento do investidor durante os ciclos e um ótimo
exemplo de erro induzido pela psicologia na pior fase.
Claro, quando o último que resistia jogou a toalha e comprou bem
na alta — ou vendeu bem na baixa —, já não havia ninguém para
entrar na fila. A ausência de compradores significa o fim do mercado
em alta, e vice-versa. O último a capitular define o ponto máximo ou
mínimo e delineia o cenário para um movimento cíclico na direção
oposta. Ele é quem “ficou com o mico na mão”.
O relato a seguir mostra que mesmo os mais brilhantes entre nós
podem ser vítimas da capitulação:
Sir Isaac Newton, que era Master of the Mint [um posto do alto
escalão do governo britânico] na época da “South Sea
Bubble1”, juntou-se a muitos outros ingleses ricos investindo
em ações da South Sea Company. A cotação subiu de £128
em janeiro de 1720 para £1.050 libras em junho. No início
dessa ascensão, Newton percebeu a natureza especulativa
do boom e vendeu suas ações por £7 mil. Ao lhe perguntarem
sobre as condições do mercado, sua resposta teria sido: “Eu
posso calcular os movimentos dos corpos celestes, mas não a
loucura do povo”.
Em setembro de 1720, a bolha estourou, e o preço das
ações caiu abaixo de £200, 80% a menos que a cotação de
três meses antes. Descobriu-se, no entanto, que a despeito
de sua antevisão, Sir Isaac, como tantos investidores ao
longo dos anos, não suportava a pressão de ver aqueles ao
redor obterem grandes lucros. Ele recomprou as ações em
alta e acabou perdendo £20 mil. Nem mesmo um dos homens
mais inteligentes do mundo estava imune a essa lição
tangível da gravidade! (“Bubble.com”, janeiro de 2000,
conteúdo em inglês)
Bolhas e Quebras
Sempre tivemos mercados em ascensão e queda, e sempre
teremos. Quando significativamente extensos, são chamados de
mercados em alta (em inglês, “bull markets”) e mercados em baixa
(em inglês, “bear markets”). Se a extensão for ainda maior, são
chamados de booms e de crises, respectivamente. Em inglês, e no
mundo, os termos mais populares hoje para descrever os mercados
extremos são “bubble” (“bolha”) e “crash” (“quebra” ou “estouro da
bolha”).
Estes últimos termos existem há muito tempo. A “South Sea
Bubble”, citada antes, caracterizada por maciços investimentos em
uma empresa que supostamente saldaria a dívida nacional
explorando o monopólio do comércio com a América do Sul, pegou
a Inglaterra de assalto em 1720. Nos EUA, o colapso do mercado
que deu início à Grande Depressão é chamado de “Great Crash of
1929” (no Brasil, “A Quebra da Bolsa de NY de 1929” ou “A Quintafeira Negra”). Mas foram a “tech bubble”, a “internet bubble” e a
“dotcom bubble” (no Brasil, respectivamente, “bolha tecnológica”,
“bolha da internet” e “bolha pontocom”), entre 1995 e 2000 — e as
bolhas imobiliárias e hipotecárias que terminaram em 2007 e
levaram à quebra de mercados em todo o mundo —, que juntaram a
palavra “bolha” ao léxico de uso frequente.
Uma consequência do mencionado é a atual tendência —
especialmente da mídia — a chamar de bolha qualquer crescimento
grande de mercado. No outono de 2017, quando eu escrevia este
texto, o índice S&P 500 de ações norte-americanas havia quase que
quadruplicado (incluindo dividendos) em relação a março de 2009,
então em plena baixa, e o rendimento dos títulos de alto risco dos
EUA caíra para 5,9%. Por isso, muitas vezes me perguntam se
estamos em uma nova bolha de um tipo ou outro, talvez sugerindo
que uma crise é iminente. É por isso que quero dedicar algum
espaço aqui à minha convicção de que nem todo grande aumento é
uma bolha. Para mim, o termo “bolha” tem conotações psicológicas
especiais que devem ser observadas e compreendidas.
Vivi bolhas muito mais antigas que aquelas em ações de
empresas de tecnologia ou financiamento hipotecário mencionadas
anteriormente. Um dos melhores exemplos ocorreu nos anos 1960
com as ações “Nifty Fifty” — as ações das empresas de mais alta
qualidade e crescimento mais rápido nos Estados Unidos. Até onde
sei, existe um fio comum nas bolhas, exemplificado pelo Nifty Fifty: a
convicção de que, quando o assunto é um ativo, “não existe um
preço alto demais”. Daí se segue, é claro, que não importa o preço
que você paga, você está certo de que ganhará dinheiro.
Há apenas uma forma de investimento inteligente: descobrir o
valor de algo e comprá-lo por esse preço ou menos. Não pode haver
investimento inteligente na ausência de quantificação de valor e
insistência em um preço de compra atraente. Qualquer ação de
investir construída em torno de um conceito diferente da relação
entre preço e valor é irracional.
A ideia de “growth stocks2” começou a ser popularizada no início
dos anos 1960, com base no objetivo de participar dos lucros em
rápido crescimento de empresas que se beneficiavam dos avanços
em tecnologia e técnicas de marketing e administração. Ela ganhou
corpo e, em 1968, quando eu tinha um emprego temporário no
departamento de pesquisa de investimentos do First National City
Bank (o precursor do Citibank), as ações da Nifty Fifty — as
melhores e que mais cresciam — haviam se valorizado tanto, que
os departamentos dos bancos que cuidavam das aplicações
financeiras de seus clientes, e que naquela época respondiam pela
maior parte do investimento, geralmente perderam o interesse em
todas as outras ações.
Todos queriam ter uma participação na Xerox, IBM, Kodak,
Polaroid, Merck, Lilly, Hewlett-Packard, Texas Instruments, Coca-
Cola e Avon. Essas empresas eram consideradas tão grandes, que
nada de ruim poderia lhes acontecer. E era aceito que
absolutamente não importava o preço que você pagava, não
importando se fosse um pouco alto demais: o rápido crescimento
das empresas logo faria valer a pena.
O resultado era previsível. Sempre que as pessoas estão
dispostas a investir independentemente do preço, elas obviamente o
fazem com base na emoção e na popularidade, e não em uma
análise fria. Assim, 50 ações que tinham sido vendidas entre 80 e 90
vezes os lucros em 1968, no ápice de um vigoroso mercado em alta,
foram ao chão quando o ardor esfriou. Muitos venderam a preços de
oito a nove vezes os lucros no mercado acionário muito mais fraco
de 1973, significando que os investidores nas “melhores empresas
dos Estados Unidos” haviam perdido de 80% a 90% de seu dinheiro.
E observe que várias das empresas “impecáveis” citadas vieram a
falir ou experimentar sérios problemas com o estresse.
Frustrante para “nenhum preço é muito alto”. Nenhum ativo ou
empresa é tão bom que não possa se tornar superfaturado.
Certamente aquela noção deveria ter sido banida para sempre.
Mas se você tem receio de que essa lição não tenha sido
realmente aprendida, avancemos para o final dos anos 1990. Agora
eram as ações de tecnologia que estavam sob os holofotes. Assim
como a inovação corporativa havia estimulado a moda das “growth
stocks”, naquela ocasião os ganhos em telecomunicações (telefones
celulares e transmissão via fibra ótica), mídia (incluindo a demanda
ilimitada por “conteúdo” para preencher os novos canais de
entretenimento) e tecnologia da informação (especialmente a
internet) tomavam conta da imaginação dos investidores.
“A internet mudará o mundo” era o grito de guerra, seguido do
usual “para uma ação de e-commerce não há preço alto demais”. As
ações da Nifty Fifty tinham sido vendidas em múltiplos inflados dos
lucros de suas empresas, mas isso nada tinha em comum com as
ações da internet: tais empresas não davam lucro. Não só o
investimento era puramente conceitual, como muitas empresas
também. Então, no lugar de índices de p/l, as ações eram vendidas
em múltiplos de receita (se houvesse) ou “eyeballs”: o número de
consumidores que visitavam seus sites.
Assim como a Nifty Fifty, havia um quê de verdade subjacente na
moda do investimento: um componente geralmente necessário para
inflar uma bolha. Os investidores, porém, deixaram de lado a razão
e a disciplina quando concluíram que o preço não importava. Havia
uma certeza: a internet de fato mudou o mundo, hoje irreconhecível
quando se olha para 20 anos atrás. Mas as empresas por trás da
grande maioria das ações de internet de 1999 e 2000 não existem
mais. Uma perda de 100% para quem investiu nelas, tornando
invejáveis as perdas de 80% a 90% da Nifty Fifty.
O resultado final é claro: penso que “o preço não importa” é um
componente necessário — e uma característica — de uma bolha.
Da mesma forma, em bolhas, os investidores muitas vezes
concluem que se pode ganhar dinheiro tomando dinheiro
emprestado para comprar. Não importa qual taxa de juros está no
empréstimo, o ativo com certeza se valorizará acima disso.
Nitidamente, eis outro exemplo de suspensão da descrença
analítica.
“Nenhum preço é alto demais” é o ingrediente supremo de uma
bolha e, portanto, um sinal infalível de um mercado que foi longe
demais. Não há maneira segura de participar de uma bolha, apenas
perigo. Convém notar, contudo, que “sobreapreciado” está longe de
ser sinônimo de “amanhã vai cair”. Muitas modas financeiras
passam da hora quando percorrem o território da bolha. Vários
investidores proeminentes jogaram a toalha no início de 2000
porque a resistência à bolha tecnológica provou ser demasiado
dolorosa. Alguns viram clientes retirarem uma grande parte de seu
capital, alguns desanimaram e abandonaram o negócio, e outros se
renderam e entraram de cabeça na bolha… bem a tempo de vê-la
estourar, agravando de vez o erro.
A progressão seguinte serve para sintetizar a evolução do ciclo de
mercado. Ela mostra como os ciclos da economia, dos lucros, da
psicologia, da aversão ao risco e do comportamento da mídia se
combinam para mover os preços de mercado muito além do valor
intrínseco, e como um desenvolvimento contribui para o próximo.
A economia está crescendo, e os relatórios econômicos
são positivos.
Os ganhos das empresas estão subindo e superando as
expectativas.
Na mídia só há boas notícias.
Os mercados de valores mobiliários fortalecem-se.
Os investidores estão a cada dia mais confiantes e
otimistas.
O risco é percebido como sendo baixo e benigno.
Para os investidores, assumir riscos é uma rota certa para
o lucro.
O comportamento é motivado pela ganância.
A demanda por oportunidades de investimento excede a
oferta.
Os preços dos ativos sobem além de seu valor intrínseco.
Os mercados de capitais estão abertos, facilitando a
obtenção de dinheiro ou a rolagem de dívidas.
A inadimplência é baixa.
O ceticismo é baixo, e a fé é alta, o que significa que
negócios arriscados podem ser feitos.
Não passa pela cabeça de ninguém que as coisas podem
dar errado. Nenhum desenvolvimento favorável parece
improvável.
Todos estão convictos de que tudo vai sempre melhorar.
Os investidores ignoram a possibilidade de perda e
preocupam-se apenas com a falta de oportunidades.
Ninguém pode pensar em uma razão para vender, e
ninguém é forçado a vender.
Os compradores são em maior número que os
vendedores.
Os investidores ficariam felizes em comprar se o mercado
caísse.
Os preços vão lá nas alturas.
A mídia celebra o emocionante acontecimento.
Os investidores ficam eufóricos e descuidados.
Quem detém capital investido em valores mobiliários
congratula-se por sua própria inteligência; talvez siga
comprando.
Aqueles que permaneceram à margem se arrependem;
assim, capitulam e compram.
Os retornos prospectivos são baixos (ou negativos).
O risco é alto.
Os investidores devem esquecer a oportunidade perdida e
preocupar-se apenas em não perder dinheiro.
Chega o momento da cautela!
A coisa mais importante a se notar é que o ponto máximo de
psicologia, a disponibilidade de crédito, o preço e risco e o retorno
potencial mínimo são alcançados ao mesmo tempo, e geralmente
esses extremos coincidem com o último paroxismo de compra.
Analogamente, a seguinte progressão descreve o que acontece
na situação de mercado oposta.
A economia está retraindo-se; os relatórios são negativos.
Os lucros corporativos são estáveis ou diminuem e ficam
aquém das projeções.
Na mídia, só más notícias.
Os mercados de valores mobiliários enfraquecem.
Os investidores ficam preocupados e deprimidos.
Enxerga-se risco em toda parte.
Os investidores veem o risco como nada mais do que uma
maneira de perder dinheiro.
O medo domina a psicologia dos investidores.
A demanda por títulos fica aquém da oferta.
Os preços dos ativos ficam abaixo do valor intrínseco.
Os mercados de capitais fecham-se, tornando difícil emitir
títulos ou refinanciar dívidas.
A inadimplência recrudesce.
Cresce o ceticismo, e diminui a fé, o que significa que
apenas negócios seguros podem ser feitos, ou talvez
nenhum.
Ninguém considera que melhorar seja possível. Nenhum
resultado parece negativo demais para não acontecer.
Todo mundo acha que as coisas sempre piorarão.
Os investidores ignoram a possibilidade de perder
oportunidades e preocupam-se somente em não perder
dinheiro.
Ninguém consegue pensar em um motivo para comprar.
O número de vendedores supera o de compradores.
A afoiteza (“Não espere chegar o fundo do poço”) substitui
o conselho para “comprar na baixa”.
Os preços atingem novos níveis mínimos.
A mídia fixa-se nessa tendência de queda.
Os investidores ficam deprimidos e entram em pânico.
Os detentores de valores mobiliários sentem-se tolos e
desiludidos. Percebem que não entenderam realmente as
razões por trás dos investimentos que fizeram.
Aqueles que se abstiveram de comprar (ou venderam)
sentem-se vitoriosos e são celebrados por seu
brilhantismo.
Quem detinha ativos desiste e vende a preços rebaixados,
dando força à espiral descendente.
Os retornos prospectivos implícitos são muito altos.
O risco é baixo.
Os investidores devem esquecer o risco de perder
dinheiro e preocupar-se apenas com a perda de
oportunidades.
É a hora de ser agressivo!
Quando o último otimista joga a toalha e se está lá embaixo, na
antítese do “topo”, há a virada do ciclo de mercado. Nesse ponto,
vemos agora se juntarem o nadir da psicologia, uma total
incapacidade de acesso ao crédito, preços mínimos, retorno
potencial máximo e risco mínimo.
As progressões descritas aqui são simplistas. Na verdade, elas
podem parecer representações caricaturizadas do caminho para o
fracasso. Mas não são imaginários ou exagerados. É absolutamente
lógico que cada evento traga o próximo em ambas as direções… até
que um extremo ilógico é alcançado, e o castelo de cartas
desmorona.
Os eventos nem sempre ocorrem na mesma ordem, e nem todos
estão necessariamente presentes em todos os ciclos do mercado.
Mas tais comportamentos são reais, e certamente são elementos
que ecoam nos mercados de década para década.
Quando um investidor inexperiente vive pela primeira vez um ciclo
de mercado ascendente, o início da progressão pode parecer lógico,
pois os aspectos positivos formam-se em um mercado altista ou
bolha. O fato de tantas boas notícias e positividade poderem acabar
em perdas pode ser uma surpresa. É inevitável que pareça ser
assim para os não iniciados, porque se as progressões não
pudessem chegar a extremos com base em erros de julgamento, os
mercados não alcançariam o pico do mercado altista para então
colapsar (ou o fundo do poço para iniciar o processo de
recuperação).
Nas páginas 19–21, discuti a relação entre onde estamos em ciclos
e a implicação disso quanto aos retornos prospectivos. Agora, para
fechar este capítulo, quero ilustrar ainda mais essa conexão.
Nas semanas que antecederam o envio do rascunho final deste
livro, descobri uma maneira de mostrar o relacionamento que tenho
em mente. Para tal, vamos supor primeiro que o ciclo de mercado
está no ponto médio. Isso geralmente significa que o crescimento
econômico segue a tendência, os lucros são normais, as métricas
de avaliação são razoáveis no contexto histórico, os preços dos
ativos estão alinhados com o valor intrínseco, e as emoções não
são extremadas. Dado todo o exposto, a perspectiva de retornos
também é “normal”, ou seja, a distribuição de probabilidade que
rege retornos futuros se parece com a da página 19.
Mas o que acontece se o mercado estiver em ciclo de alta?
Independentemente do que está acontecendo em termos de
fundamentos, isso significa que as avaliações são exageradas, os
preços excedem em muito o valor intrínseco, e um alto nível de
otimismo instala-se. Nesse ponto, a perspectiva de retornos é
insignificante e com viés negativo, como mostrado pela nova
distribuição a seguir.
E quanto a um ciclo de baixa? Agora os investidores estão
psicologicamente deprimidos, e as métricas de avaliação estão em
níveis historicamente baixos, o que sugere a presença de
barganhas, e, portanto, os preços dos ativos estão bem abaixo do
valor intrínseco. Assim, a distribuição em relação aos retornos
futuros é deslocada para a direita, o que implica um potencial
extraordinariamente alto de lucro.
Essa representação conceitual indica a relação entre o nível do
ciclo e o potencial de retorno. Isso está longe de ser científico, mas
tudo indica que está correto.
1
2
Nota do Tradutor: nome pelo qual ficou conhecida uma bolha econômica.
Nota do Tradutor: ações de uma empresa que teve lucros superiores à média no
passado, da qual se espera comportamento igual no futuro.
XIII
COMO LIDAR COM OS CICLOS DE MERCADO
Qual é o ponto-chave nisso tudo? Saber onde o pêndulo da
psicologia e o ciclo em avaliação estão em seus balanços.
Recusar-se a comprar — e talvez a vender — quando a
psicologia demasiadamente positiva e a vontade de atribuir
avaliações exageradas fazem com que os preços subam aos
níveis máximos. E comprar quando a psicologia se abate e o
abandono de padrões de avaliação, quando no lado negativo,
fazem com que os investidores em pânico ofereçam
pechinchas vendendo, apesar dos baixos preços.
A
meta do investidor é posicionar o capital de modo a se
beneficiar de desenvolvimentos futuros. Ele deseja ter mais
capital investido em um mercado em alta do que quando o mercado
cai, e possuir mais das coisas que sobem mais ou caem menos, e
menos das outras. O objetivo é claro. A questão é como conseguir
isso.
O primeiro passo é decidir como lidar com o futuro. Algumas
pessoas acreditam em previsões econômicas e de mercado e em
adotar as medidas que tais estudos recomendam. Assim, investem
de forma mais agressiva quando há previsão de eventos favoráveis,
e vice-versa.
Já deixei bem claro que não acredito em previsões. Muito poucas
pessoas podem saber o suficiente sobre o que o futuro reserva em
termos de retorno, e o desempenho da maioria dos analistas em
prever eventos melhor do que outros e ter melhores retornos em
decorrência disso é sofrível. Alguns se tornam famosos de tempos
em tempos em face de sucessos singulares e espetaculares, mas
em geral sua próxima previsão correta não acontece há muitos
anos.
Ausente a capacidade de ver o futuro, como podemos posicionar
nossos portfólios para o que vem pela frente? Penso que grande
parte da resposta está na compreensão de onde o mercado está em
seu ciclo e o que isso implica em seus movimentos vindouros. Como
escrevi em The Most Important Thing, “talvez nunca saibamos para
onde estamos indo, mas é melhor ter uma boa ideia de onde
estamos”.
Fazer isso requer uma compreensão da natureza básica dos
ciclos em geral: o que origina seus movimentos os leva a progredir
em direção aos altos e baixos e a se afastar desses extremos? Eis
os principais elementos que nos preocupam:
A tendência à repetição de temas básicos e da história.
A tendência das coisas a subir e descer, especialmente
aquelas determinadas pela natureza humana.
O modo como cada ocorrência em um ciclo tem
implicações no seguinte.
A maneira como os vários ciclos influenciam e interagem
entre si.
O papel da psicologia em levar os fenômenos cíclicos
além dos níveis racionais.
E, com isso, a tendência dos ciclos para ir a extremos.
A tendência deles de voltar dos extremos rumo a um
ponto médio.
A regularidade com que esse movimento continua,
ultrapassando o meio e se dirigindo ao extremo oposto.
A seguir, as generalidades que afetam todos os ciclos. Além disso,
é preciso ter em mente os elementos específicos que influenciam o
ciclo de mercado:
Os ciclos econômicos e de lucro que moldam o ambiente
de investimento.
A tendência da psicologia de reagir excessivamente ao
que ocorre no ambiente.
A forma como o risco é considerado inexistente e benigno
em alguns momentos, e depois, enorme, inescapável e
letal em outros.
A maneira pela qual os preços de mercado refletem
apenas as coisas positivas e caem no exagero em
determinado ponto, e então, em outro ponto, refletem
apenas o que é negativo e ignoram todos os positivos.
Esses são os fundamentos — o básico sobre ciclos em geral e as
formas específicas como funcionam nos mercados — que devemos
perceber, tratar e obedecer. Devemos usar os insights que fomos
coletando para avaliar onde o mercado está posicionado, o que isso
implica em seus movimentos futuros e as atitudes a tomar em
função disso.
De posse de um profundo entendimento do que foi dito antes, é hora
de descobrir onde estamos no ciclo.
Qual é o ponto-chave nisso tudo? Saber onde o pêndulo da
psicologia e o ciclo em avaliação estão em seus balanços. Recusarse a comprar — e talvez a vender — quando a psicologia
demasiadamente positiva e a vontade de atribuir avaliações
exageradas fazem com que os preços subam aos níveis máximos. E
comprar quando a psicologia se abate e o abandono de padrões de
avaliação, quando no lado negativo, fazem com que os investidores
em pânico ofereçam pechinchas vendendo, apesar dos baixos
preços. Como bem colocou Sir John Templeton: “Comprar quando
os outros estão vendendo e vender corajosamente quando os outros
estão gananciosamente comprando requer grande fortaleza e traz a
maior recompensa”.
O movimento ascendente de preços, do valor justo até o excesso,
geralmente está relacionado à presença de alguma combinação de
elementos importantes.
Boas notícias em geral.
Complacência em relação a eventos.
Tratamento uniformemente otimista pela mídia.
Aceitação inquestionável de relatos otimistas.
Ceticismo em declínio.
Alta de aversão ao risco.
Fácil acesso a um amplo mercado de crédito.
Humor geral positivo.
Já o colapso dos preços, do valor justo para pechinchas, é
geralmente marcado por alguns ou todos os itens a seguir:
Más notícias em geral.
Alerta crescente em relação a eventos.
Relatos altamente negativos na mídia.
Aceitação generalizada de histórias assustadoras.
Forte aumento do ceticismo.
Crescimento significativo da aversão ao risco.
Canais de acesso ao mercado de crédito fecham-se.
Mau humor e depressão por toda parte.
A questão é como podemos dizer onde o mercado está em seu
ciclo. É importante ressaltar que os elementos que contribuem para
a ascensão do mercado se manifestam por meio de avaliações —
índices p/l de ações, rendimentos de títulos, nível de capitalização
de imóveis e múltiplos de fluxo de caixa em aquisições de controle
societário — elevadas em relação aos parâmetros históricos. Todas
essas coisas são indicativos de baixos retornos prospectivos. O
inverso é verdadeiro quando um colapso do mercado se vale dos
preços dos ativos para barganhar as avaliações. Essas coisas
podem ser observadas e quantificadas.
Além disso, a consciência de como os investidores estão se
comportando vem em auxílio de nossa compreensão do
posicionamento do ciclo. Para responder aos ciclos de mercado e
entender sua mensagem, há um ponto mais importante do que
qualquer outro: o risco em investir não vem principalmente da
economia, das empresas, dos títulos, dos certificados de ações ou
da bolsa de imóveis. Vem do comportamento dos participantes do
mercado. Então, dele resulta a maioria das oportunidades para
retornos excepcionais.
Investidores prudentes são céticos, restringem suas emoções e
têm na devida conta a aversão ao risco. Refletindo isso, os preços
dos títulos tendem a ser razoáveis em relação ao valor intrínseco,
tornando o mercado um lugar seguro e saudável. Por outro lado,
quando os investidores ficam eufóricos, seu entusiasmo os leva a
comprar excessivamente, e, em consequência, os preços
aumentam, alcançando níveis perigosos. E quando chega o
desespero, entram em pânico, vendem o que podem, e os preços
transformam-se em verdadeiras pechinchas.
Segundo Warren Buffett, “Quanto menor a prudência com que os
outros conduzem seus negócios, maior é a prudência com a qual
devemos conduzir nossos próprios negócios”. Quando os demais
estão eufóricos, devemos ficar aterrorizados. E quando os outros
estão aterrorizados, devemos nos tornar agressivos.
O fator determinante de seus resultados não é o que você compra,
mas quanto paga pelo produto. E o que você paga — o preço do
ativo e sua relação com o valor intrínseco — é determinado pela
psicologia do investidor e pelo comportamento resultante. A chave
para ser capaz de se comportar de uma forma apropriada ao clima
de mercado está na avaliação da psicologia e do comportamento
dos outros. Você tem que saber se o mercado está fervendo e,
portanto, superestimado, ou gélido e, consequentemente, propício a
barganhas.
Em “It Is What It Is” (“As Coisas São Como São”, em tradução
livre, março de 2006) — e também em The Most Important Thing —,
incluí o que chamei de guia para avaliação de mercado. Não
consigo pensar em um motivo para não incluí-lo novamente aqui, ou
em um substituto melhor. Por favor, note que estes pontos não são
científicos, quantitativos e quantificáveis, e até mesmo um tanto
jocosos. Mas eles devem dar a você uma sensação de que as
coisas devem ser observadas:
Economia:
Vibrante
Lerda
Perspectiva:
Positiva
Negativa
Emprestadores:
Famintos
Reticentes
Mercado de
capitais:
Acesso fácil
Acesso difícil
Capital:
Abundante
Escasso
Condições
contratuais:
Fáceis
Restritivas
Taxas de juros:
Baixas
Altas
Ganhos:
Estreitos
Extensos
Investidores:
Otimistas
Pessimistas
Sanguíneos
Estressados
Ansiosos para comprar
Desinteressados em
comprar
Donos de ativos: Felizes por tê-los
Não veem a hora de
se desfazer deles
Vendedores
Poucos
Muitos
Mercados:
Saturados
Famintos por
atenção
Fundos:
Difíceis de entrar
Abertos a qualquer
um
Há novos todos os dias
Aplicações só nos
melhores
Participantes estipulam as Poucos ditam os
condições contratuais
termos contratuais
Desempenho
recente:
Forte
Fraco
Preço dos ativos: Alto
Baixo
Perspectiva de
retornos:
Baixa
Alta
Risco:
Alto
Baixo
Características
mais populares:
Agressividade
Cautela e disciplina
Baixa seletividade
Seletividade
Características
adequadas:
Erros comuns:
Cautela e disciplina
Agressividade
Seletividade
Baixa seletividade
Comprar demais
Comprar de menos
Pagar para ver
Cair fora
Assumir risco demasiado
Não assumir risco
algum
Conforme eu dizia na introdução do guia, “em cada par, marque
aquele que você acha mais descritivo do mercado atual. Se a
maioria de suas marcas estiver na coluna da esquerda, ponha um
escorpião no bolso”.
Esses tipos de marcadores podem nos dizer onde estamos no
ciclo e as prováveis implicações disso no futuro. Assim, eles ajudam
no que chamo de “medir a temperatura do mercado”. Veja como
descrevi o processo em The Most Important Thing:
Se estamos alertas e perceptivos, podemos avaliar o
comportamento daqueles que nos rodeiam e, a partir daí, o
que devemos fazer.
O ingrediente essencial aqui é a inferência, uma das minhas
palavras favoritas. Pela mídia, todos vemos o que acontece a
cada dia. Mas quantas pessoas se esforçam para entender o
que esses eventos cotidianos dizem sobre a psique dos
participantes do mercado, o clima de investimento e, portanto,
o que se deve fazer?
Simplificando, devemos nos esforçar para entender as
implicações do que está acontecendo ao nosso redor.
Quando os outros são imprudentemente confiantes e
compram agressivamente, é preciso ser muito cauteloso;
quando outros estão com medo de ficar inertes e, em pânico,
vendem de qualquer jeito, deve-se ser agressivo.
Então olhe ao redor e se pergunte: os investidores estão
otimistas ou pessimistas? Na mídia, os comentaristas
aconselham a ir ou evitar os mercados? Novidades em termos
de investimento são prontamente aceitas ou descartadas de
imediato? As ofertas de valores mobiliários e as chamadas
para abrir ou participar de fundos são tratadas como
oportunidades para ficar rico ou possíveis engodos? O ciclo
de crédito tornou o capital prontamente disponível ou
impossível de obter? Os índices de preço/lucro são altos ou
baixos no contexto histórico, e as margens de ganho são
estreitas ou generosas?
Todos esses fatores são importantes, contudo, nenhum
deles tem algo a ver com previsão. Podemos tomar
excelentes decisões de investimento com base nas
observações do que ocorre atualmente, sem necessidade de
adivinhar o futuro. A chave é tomar nota de coisas como
essas e deixar que elas mostrem como agir. Nem sempre é
preciso agir, mas quando os mercados estão nos extremos do
ciclo, é extremamente importante atentar para os recados que
dão.
A todo instante, muitas coisas estão acontecendo no mundo, na
economia e no ambiente de investimento. Está fora do alcance de
quem quer que seja estudar, analisar, entender e incorporar todas
elas em decisões de investimento. E é irrelevante tentar: eventos
diferentes ocorrem em cada ciclo, em uma sequência diferente e
com resultados diferentes.
O que quero destacar aqui é que nem todos os detalhes têm
relevância. Em vez disso, interessa (a) descobrir quais são os mais
importantes, (b) inferir o que está acontecendo a partir dos mais
importantes (e depois, talvez, considerar tantos quantos pudermos
dos menos importantes), e (c) concluir dessas inferências quais são
as duas coisas que mais caracterizam o ambiente de investimento e
qual ação elas exigem. Em outras palavras, estar sintonizado com
os desenvolvimentos cíclicos e seu significado.
Em particular, é necessário citar que os ciclos de mercado não
podem evoluir até chegar a extremos com as avaliações sendo
feitas com base nas métricas normais. As avaliações são o
resultado — e portanto sintomático ou indicativo — da psicologia do
investidor.
Os elementos psicológicos e emocionais que listei têm seu
principal impacto ao convencer os investidores de que os padrões
de avaliação do passado se tornaram irrelevantes. Quando os
investidores estão nas nuvens, ganhando dinheiro, acham fácil
encontrar razões convenientes pelas quais os ativos devem ser
desvinculados das restrições das normas de avaliação. A explicação
geralmente começa com “desta vez é diferente”. Fique atento a esse
sinal ameaçador da suspensão voluntária da descrença. Da mesma
forma, quando os preços dos ativos desabam, isso geralmente é
atribuído à suposição de que nada que se apoie em um valor do
passado pode ser confiável para funcionar no futuro.
Assim, a chave para entender onde estamos no ciclo depende de
duas formas de avaliação:
A primeira é totalmente quantitativa: aferir as avaliações.
Esse é um ponto de partida apropriado, pois se as
avaliações estiverem em linha com a história, é improvável
que o ciclo de mercado estenda-se sobremaneira em
qualquer direção.
E a segunda é essencialmente qualitativa: a consciência
do que se está passando ao redor e, em especial, do
comportamento do investidor. É importante ser
disciplinado, mesmo observando esses fenômenos não
quantitativos acontecendo amiúde.
As questões-chave podem ser reduzidas a duas: como as coisas
são precificadas e como os investidores ao redor se comportam?
Avaliar esses dois elementos — de forma consistente e disciplinada
— pode ser muito útil. As respostas nos darão uma ideia de onde
estamos no ciclo.
Para encerrar este assunto, quero repetir algo em que estive
insistindo: até o melhor estudo meteorológico não pode nos dizer
como estará o tempo… apenas dá a tendência dele.
No que se refere aos ciclos de mercado, não dá para se basear no
que ocorreu antes para ter certeza do que ocorrerá em seguida,
uma vez que eles não primam pela regularidade em termos de
amplitude, ritmo e duração de suas flutuações. Assim, a partir de um
determinado ponto no ciclo, o mercado é capaz de se mover em
qualquer direção: subir, planar ou descer.
Mas isso não significa que todos os três são igualmente prováveis.
Onde estamos influencia as tendências ou probabilidades, mesmo
que isso não determine com certeza a evolução futura. Tudo o mais
constante, quando um mercado está no alto do ciclo, uma correção
para baixo é mais provável do que ganhos contínuos, e vice-versa.
Não há obrigatoriedade nisso, claro, mas essa é a aposta mais
segura. A avaliação da nossa posição no ciclo não nos diz o que
acontecerá a seguir, apenas o que é mais e menos provável. O que
não é pouco.
A melhor maneira de ensinar como reconhecer excessos cíclicos é
através de exemplos nos extremos, em que isso pode ser feito e é
mais importante. Assim, nas próximas páginas irei rever a formação
de duas bolhas recentes e a queda que se seguiu à segunda delas.
Mesmo as duas bolhas sendo diferentes, cada um desses três
eventos de mercado ilustra a importância de avaliar a temperatura
do mercado.
Primeiro analisaremos a ascensão meteórica das ações no final
dos anos 1990 e início de 2000, e especialmente a formação da
bolha da internet. O que o investidor alerta deve ter notado durante
esse período?
Na década de 1990, a economia norte-americana
desfrutou da mais longa expansão em tempo de paz de
sua história.
Em dezembro de 1996, quando o índice de ações S&P
500 estava em 721 pontos, o presidente do Fed, Alan
Greenspan, perguntou: “Como saber quando a
exuberância irracional elevou demasiadamente os valores
dos ativos?” Mas jamais foi ouvido sobre esse assunto,
mesmo com o S&P mais do que duplicando, chegando a
um máximo de 1.527 em 2000.
Em 1994, o professor Jeremy Siegel, da Wharton School,
publicou seu livro Stocks for the Long Run, no qual
destacou que nunca houve um período longo de tempo
em que o desempenho das ações não tivesse superado
títulos, dinheiro vivo e inflação.
Não obstante pesquisadores da Universidade de Chicago
tenham concluído, anteriormente, que o retorno normal
das ações dos EUA estava na vizinhança de 9% ao ano,
na década de 1990 o retorno médio do S&P era de quase
20%.
Quanto melhor o desempenho das ações, mais
investidores aplicam nelas. Isso foi especialmente
verdadeiro para as ações de tecnologia, que claramente
eram o xodó do mercado.
A composição dos índices de ações começou a incluir
mais ações de tecnologia. Tais índices, como o S&P 500,
indexam parcial ou totalmente os investidores, fazendo-os
comprar mais deles, levando os preços a subir — e
atraindo ainda mais capital para eles. Esse era um
clássico “círculo virtuoso”, cujo término ninguém podia
imaginar.
A inexistência de lucros na maioria das empresas da
“nova economia” eliminou qualquer exigência de que suas
ações fossem vendidas com razoáveis índices de
preço/lucro.
Quando a bolha estava próxima de seus limites de
expansão, os preços de algumas ações pontocom
aumentaram várias centenas por cento no dia de seus
lançamentos em bolsa (ou IPO — Oferta Pública Inicial).
Para estarem dispostos a comprar as novas ações pósIPO em seus preços inflacionados, os compradores
precisariam ter concluído que ou (a) os fundadores das
empresas estavam dispostos a vender as ações por uma
fração de seu valor real ou (b) os fundadores sabiam
menos sobre o valor das ações do que os compradores.
Ambas as conclusões deixaram muito a desejar.
Para compartilhar esse milagre — e evitar o desconforto
de ficar só na observação enquanto outros lucravam —,
os investidores participavam de IPOs de empresas que
não lucravam (e, em alguns casos, nada faturavam) e de
cujos modelos de negócios sabiam pouco ou nada.
Em 1999 foi publicado o Dow 36,000, de James Glassman
e Kevin Hassett. Seus autores argumentavam que, como
o risco de aplicar em ações era muito baixo (veja Siegel
na página 224), não era preciso oferecer um prêmio de
risco tão grande como os observados historicamente. Isso
significava que seus preços deveriam subir imediatamente
para níveis a partir dos quais proporcionariam retornos
prospectivos adequadamente reduzidos. Assim, o Dow
Jones Industrial Average (um renomado índice de cotação
de ações da Bolsa de Nova York) merecia mais do que
triplicar dos 10 mil pontos que ostentava no momento.
A relação p/l do S&P 500, impulsionada pelo crescimento
descontrolado e pelas ações de tecnologia, chegou a 33
durante o boom das ações de tecnologia, o dobro do usual
do pós-guerra e a maior valorização da história desse
índice até aquele momento.
Então, quais elementos estavam presentes?
Boas notícias no fronte econômico.
Artigos e livros favoráveis.
Comportamento despreocupado, alheio ao risco, dos
investidores.
Retornos de investimento extraordinários.
Valorização extremamente elevada em relação aos
números históricos.
Disposição generalizada de pagar preços analiticamente
injustificados.
Crença na existência de um moto-contínuo: aquela
situação de mercado não sofreria interrupção.
Este último ponto é particularmente importante. Cada bolha
começa com um quê de verdade, como observei anteriormente.
Mas, nas bolhas, a importância e o potencial de lucro dessa verdade
são superestimados; a descrença é posta em suspensão, e é
amplamente aceito que os ganhos podem durar para sempre.
Certamente, um observador atento e objetivo poderia ter
detectado a presença de uma bolha substancial cujo peso a faria
esborrachar-se no chão. Eis alguns dos fenômenos que descrevi em
“Bubble.com” (janeiro de 2000):
O Webvan Group [um serviço de entrega de compras
online], fundado em 1999, teve um faturamento de US$3,8
milhões e um lucro de US$350 mil no trimestre encerrado
em setembro. Atualmente, o mercado de ações o avalia
em US$7,3 bilhões.
Em 9 de dezembro, as ações da VA Linux1 subiram 698%
naquele dia em relação a seu lançamento, sendo cotadas
a US$239, para um valor de mercado de US$9,5 bilhões,
metade do valor da Apple. A empresa faturou US$17,7
milhões em 1999, até aquela data, e obteve um prejuízo
de US$14,5 milhões (já a Apple lucrou US$600 milhões
nos últimos 12 meses).
Como os índices de preço/lucro das empresas de internet
são tão bizarros — geralmente negativos —, alguém pode
ficar tentado a considerar a relação preço/vendas2 para
falar sobre avaliação. Na Red Hat [empresa de softwares],
por exemplo, esse índice chegou a 1.000:1 em
determinado período de 1999.
O Yahoo! vale US$119 bilhões, mais do que General
Motors e Ford juntas, empresas de outros setores que não
o tecnológico. Ao preço atual de US$432, seu p/l em 1999
era estimado em pouco mais de 1.000.
Sob tais, e incomuns, circunstâncias, o The Wall Street
Journal escreveu em 10 de dezembro de 1999 que “as
avaliações de ações assumem uma importância
extraordinariamente grande na aferição do desempenho de
uma empresa”. Em outras palavras: na ausência de outros
sinais, as pessoas precisam considerar o preço da ação como
uma indicação de como a empresa está se saindo. Isso não é
dar um passo para trás? Antigamente os investidores
descobriam como o negócio estava indo, e depois, definiam o
preço da ação.
Nesse vácuo de parâmetros de avaliação, uma
“mentalidade de bilhete de loteria” parece governar a decisão
de compra. O modelo para investimentos nas empresas de
tecnologia e pontocom não é a probabilidade de um retorno
anual de 20% ou 30% com fundamento nos ganhos
projetados e índices p/l, mas um ganho de 1.000% com base
em um conceito. O “discurso de vendas” pode ser: “Estamos
procurando financiamento inicial para uma empresa avaliada
em US$30 milhões que acreditamos poderá oferecer um IPO
em dois anos no montante de US$2 bilhões”. Ou talvez seja
“O IPO será precificado em US$20. Pode terminar o dia em
US$100, e chegar a US$200 em seis meses”.
Você entraria nessa? Poderia suportar o risco de dizer não
e estar errado? A pressão para comprar pode ser imensa.
Sempre houve ideias, ações e IPOs que geraram grandes
lucros. No entanto, a pressão para participar não era tão
grande quanto hoje porque no passado os vencedores
ganhavam milhões, não bilhões, e isso levava anos, não
meses. O lado positivo das negociações que deram certo até
agora foi de 100:1 (em cada 100, uma negociação dá errado).
Com esse tipo de potencial, (a) o lado positivo torna-se
irresistível e (b) não é necessária uma probabilidade muito
alta de sucesso para justificar o investimento. Eu já disse no
passado que, embora o mercado geralmente seja movido
pelo medo e pela ganância, às vezes o maior motivador é o
medo de perder. Nunca tão verdadeiro como hoje, isso só
intensifica a pressão para se juntar ao rebanho e nadar de
braçada para longe dessa coisa de risco.
No fim das contas, em uma bolha extrema como essa, o investidor
racional não precisa fazer distinções sutis. Tudo o que tem a fazer é
ser capaz de identificar um comportamento insano quando o vir.
Para mim — como um observador imparcial do lado de fora, não
alguém com a pele em jogo —, os eventos presentes na bolha de
tecnologia/internet tiveram a aparência de um conto de Hans
Christian Andersen. Aqueles mergulhados nela queriam-na inflada
sem que ninguém se atrevesse a dizer que o imperador estava nu.
Situações como as que acabamos de descrever eram sinais da
histeria coletiva, que faz parte de cada bolha.
O desempenho das ações nos anos 1990 — em especial ações
de tecnologia e internet — enriqueceu muitas pessoas, levando-as a
prever que uma nova era de prosperidade e criação de riqueza
surgiria, e eles responderam aos retornos de que desfrutaram
ampliando suas expectativas de retornos futuros. (A respeito,
Charlie Munger cita o antigo estadista e orador grego Demóstenes:
“O que o homem deseja, também acredita ser verdade”.) Mas
cabeças mais arejadas concluíram que a compra impulsionada pela
euforia dos anos 1990 tinha passado da conta e sacado em excesso
sobre o futuro, com implicações altamente negativas. Demorou
apenas alguns anos para que esse diagnóstico se provasse certeiro.
O resultado foi que entre 2000 e 2002 houve (a) o primeiro
declínio de três anos do mercado de ações desde 1929/1931, com
uma queda de 49% no S&P 500 de alto a baixo (ignorando a renda),
(b) declínios acentuados das ações de tecnologia, e (c) perdas de
100% em muitas ações de internet e e-commerce.
Normalmente, seria de esperar da dolorosa deflação de tal bolha —
que tinha sido impulsionada por excessos de otimismo e credulidade
— um sério impacto educacional, adiando em uma década ou duas
o surgimento de outra bolha do tipo. Mas não foi o caso. Por ser tão
importante, repetirei mais uma vez o que John Kenneth Galbraith
disse sobre o aprendizado das lições financeiras:
Contribuindo para… a euforia há dois outros fatores pouco
notados em nosso tempo ou em tempos passados. O primeiro
é a extrema brevidade da memória financeira. Em
consequência, desastres financeiros são rapidamente
esquecidos. E como corolário, quando ocorrerem as mesmas
(ou semelhantes) circunstâncias, às vezes em apenas alguns
anos, elas serão saudadas por uma nova geração, muitas
vezes jovem e sempre supremamente autoconfiante, como
uma descoberta brilhantemente inovadora em um mundo
financeiro e econômico mais amplo.
Os eventos que apenas alguns anos depois levaram ao boom das
hipotecas subprime — algo apropriadamente descrito anteriormente
neste livro — forneceram um ótimo exemplo da forma como os
excessos cíclicos são construídos sobre o erro:
Como escrevi na página 123, alguns líderes dos EUA
decidiram que somente o bem poderia vir do aumento da
posse da casa própria.
As agências federais encarregadas de emitir hipotecas
captaram a mensagem e aumentaram a disponibilidade de
hipotecas.
O declínio das taxas de juros tornou as hipotecas, e por
conseguinte a casa própria, cada vez mais ao alcance das
pessoas.
Maior acessibilidade e disponibilidade de hipotecas
permitiram que a compra e a demanda de imóveis
residenciais se intensificassem.
Esse aumento da demanda fez com que os preços das
casas aumentassem substancialmente. O canto de sereia
de que “os preços das casas só sobem” tornou-se uma
verdade aceita, ocasionando ainda mais demanda por
residências.
O pseudoargumento adicional de que “nunca pode haver
uma onda nacional de inadimplência de hipotecas” passou
a ser lugar-comum, fazendo com que os títulos lastreados
em hipotecas fossem aceitos como principais candidatos a
investimento, particularmente por instituições financeiras.
Wall Street apresentou um modelo para a securitização de
hipotecas residenciais em prosaicas e confiáveis
“tranches” (veja mais no Capítulo IX) — o próximo item de
alto retorno e baixo risco.
A criação e venda de CDOs3 e outros títulos garantidos
por hipotecas aumentaram muito os lucros dos bancos.
Com regulamentações frouxas permitindo aos bancos
empregar uma alavancagem materialmente maior,
grandes quantidades de capital estavam disponíveis para
investimento na criação de títulos garantidos por
hipotecas.
O crescimento meteórico do “empacotamento” de títulos
garantidos por hipotecas criou uma crescente demanda
por uma matéria-prima essencial no processo: novas
hipotecas emitidas.
A fim de aumentar o volume de hipotecas que emitiam,
quem concedia crédito criava novas formas de atrair os
tomadores: hipotecas cujos juros apenas minimizavam os
pagamentos mensais, eliminando a exigência tradicional
de amortização do principal; hipotecas de taxa ajustável
que permitiam aos mutuários se beneficiar de taxas de
juros bem baixas no início da curva de juros; e, mais
importante, hipotecas “subprime” (às vezes chamadas de
“empréstimos mentirosos”), que dispensavam os
candidatos de documentar renda e emprego.
Com as hipotecas subprime sendo desmembradas em
títulos e passadas para a frente, ao contrário de serem
mantidas como no passado, a ênfase dos credores
transferiu-se da capacidade de pagar dos mutuários para
o volume dos empréstimos que concediam. Capazes de
repassar as hipotecas desmembradas imediatamente e,
portanto, não tendo nenhum risco de inadimplência, não
havia razão para eles se preocuparem com a credibilidade
de seus tomadores. Claramente isso se revelou um
incentivo perverso para eles. (Incentivos como esses —
que permitem que os participantes se engajem em
comportamentos de risco sem ter que se preocupar com
as consequências — foram descritos na Crise Financeira
Global como criando um “risco moral”, um termo em voga
na época. Ouvido com menos frequência hoje em dia, o
conceito sobrevive e continua perigoso.)
A chave para o suposto sucesso dos títulos garantidos por
hipotecas subprime reside na “engenharia financeira”
executada por analistas de dados quantitativos e doutores,
muitos deles em seus primeiros empregos. Eles
modelaram o risco com base no falso pressuposto de que
as inadimplências das hipotecas permaneceriam não
correlacionadas e benignas, como no passado.
A criação de grandes quantidades de títulos subprime
significava que havia muitos negócios para as agências de
rating cuja aprovação era essencial. Entretanto, essas
lucrativas atribuições iam para a agência que fornecia a
classificação mais alta. Isso levou à comercialização de
ratings criando mais incentivos perversos, dessa vez
apoiando a ampla inflação dos ratings.
Em consequência, as agências de classificação de risco
emitiram muitos milhares de ratings AAA para títulos
lastreados em hipotecas (em comparação com as quatro
empresas dos EUA que desfrutavam de ratings AAA na
época). O pessoal das agências claramente não estava
capacitado para entender completamente a complexidade
dos títulos hipotecários que estava avaliando.
Os bancos e outras instituições financeiras compraram
enormes quantidades de tais títulos, auxiliados por
técnicas de “gerenciamento de riscos”, como Value at
Risk, fortemente vinculados ao curto e benigno histórico
dos ratings excessivamente generosos, subestimando,
assim, o risco que os compradores estavam assumindo.
Todos os itens citados ocorreram e foram facilitados por
atitudes alheias ao risco caracterizadas pela retórica da
“morte do risco” (veja a página 123).
Então onde está a raiz da formação dessa bolha? De acordo com
meu memorando “Now It’s All Bad?” (“Agora Tudo Está Ruim?”, em
tradução livre, de setembro de 2007):
... uma combinação padrão que se provou perfeitamente
incendiária:
Ganância subjacente.
Bons retornos na fase alta do ciclo.
Euforia e complacência.
Mercado de crédito livre e fácil.
A inventividade e capacidade de persuasão de Wall
Street.
A credulidade dos investidores.
Os fatores resultantes que alimentaram a ascensão do ciclo são
claros:
Uma enorme diminuição da aversão ao risco e, portanto, o
desaparecimento do ceticismo.
A aceitação de amplas generalizações positivas em
relação a casas e hipotecas.
Fé excessiva em novas ferramentas, como engenharia
financeira e gestão de risco.
Cegueira generalizada quanto ao impacto dos incentivos
indevidos sobre os envolvidos no processo.
Além da falta de memória de longo prazo, excessos psicológicos e
lapsos lógicos, a bolha que surgiu em títulos lastreados em
hipotecas foi estimulada por dois fatores adicionais:
Como essa nova bolha surgiu no setor de hipotecas —
uma parte dos mercados financeiros completamente
separada daquela que havia sido visitada pela bolha da
tecnologia e da internet —, os investidores de renda fixa e
as instituições financeiras que compunham esse mercado
não foram afetados em primeira mão, e não aprenderam
com isso.
O péssimo desempenho recente das ações desencorajou de tal
modo os investidores em ações — e taxas de juros trazidas para
baixo por um Fed bastante comedido, diminuindo muito os
rendimentos dos investimentos de renda fixa —, que eles desistiram
de obter elevados retornos em ações e títulos. Esse estado de
espírito os tornava altamente suscetíveis à promessa de uma nova
fonte de retorno sem risco: títulos garantidos por hipotecas.
Este é um bom momento para um valioso aparte. Ir para a coisa
certa — o ativo que fornecerá retorno sem risco, ou o que eu chamo
de “bala de prata” (que remonta a The Lone Ranger, um faroeste
dos anos 1950 sobre um homem da lei cujos tiros nunca erravam o
alvo) — é um dos maiores e recorrentes erros cometidos por
investidores. Ele exemplifica “o que todo homem deseja”, como
disse Demóstenes, mas não faz sentido. Se houvesse uma bala de
prata:
Por que alguém a ofereceria a você em vez de comprá-la?
E todos os outros não comprariam e aumentariam o preço
até o ponto em que não seria mais uma certeza?
Já me deparei com dezenas de balas de prata no decorrer dos
meus 48 anos de carreira. Nenhuma delas cumpriu o que prometia.
Nenhuma estratégia ou tática de investimento jamais proporcionará
um alto retorno sem risco, especialmente para compradores que
não têm um alto nível de habilidade para investir. Excelentes
resultados de investimento só podem vir de uma habilidade
excepcional (ou talvez em momentos isolados de boa sorte).
Como informei anteriormente, as bolhas geralmente nascem de
um quê de verdade. Mas todas foram longe demais, e seu estouro
deixa o mundo dos investimentos em maus lençóis. A crença em
uma bala de prata está por trás de muitas bolhas. O fato de os
investidores estarem dispostos a aceitar sem constatações uma
promessa de retorno sem risco é um indicador infalível de que o
ceticismo é escasso, a psicologia está superaquecida, e o ativo em
questão é superestimado e, portanto, provavelmente seu preço está
sobrevalorizado. Cuidado com isso; resista se puder. Por definição,
são poucos os que conseguem não participar delas.
Eu resumiria a conclusão-chave da seguinte maneira: a bolha das
hipotecas subprime surgiu da ampla aceitação de que a ideia
funcionaria de um modo jamais visto. A análise de formas de
investimento deve implicar (a) postura cética e premissas
conservadoras e (b) exame ao longo período histórico que inclua
algumas épocas difíceis. Essas coisas estavam claramente
ausentes.
De fato, a maioria das bolhas, se não todas, é caracterizada pela
aceitação inquestionável de coisas que nunca foram verdadeiras no
passado, de avaliações que estão dramaticamente em desalinho
com as normas históricas, e/ou de técnicas e ferramentas de
investimento que não foram testadas.
A bolha das hipotecas subprime demonstrou um princípio
extremamente importante em ação que não abordei até agora. O
ambiente financeiro e de investimento — e o desempenho de
técnicas e instrumentos de investimento — não é imutável. Muito ao
contrário, como informei muitas vezes em relação aos ciclos, essas
coisas são afetadas pelo envolvimento das pessoas.
Não existe um mercado que seja separado — e imune à ação —
das pessoas que o formam. O comportamento das pessoas no
mercado muda o mercado. Quando suas atitudes e comportamento
mudam, o mercado muda.
No caso em questão:
As forças do mercado mudaram as motivações dos
participantes.
Essas motivações alteradas mudaram o comportamento
deles.
Esse comportamento alterado determinou claramente os
resultados.
Como se vê claramente, uma progressão essencial estava em
curso:
Recorreu-se à história como garantia de que não poderia
haver uma onda nacional de inadimplência de hipotecas.
A aceitação desse histórico benigno fez com que imensas
quantias fossem investidas em títulos garantidos por
hipotecas.
Isso deu aval para que os valores mobiliários fossem
estruturados de forma agressiva.
E também fez com que as agências de classificação de
risco extrapolassem a experiência benigna e
concedessem ratings elevados.
Mais importante ainda, a forte demanda por títulos
lastreados em hipotecas criou uma necessidade de
matéria-prima — empréstimos hipotecários — e levou a tal
ansiedade de emiti-las, que fez com que os padrões de
concessão de empréstimos se deteriorassem.
Esses fatores atuando em conjunto virtualmente
garantiram que haveria uma onda nacional de
inadimplência de hipotecas.
Como mencionei anteriormente, graças ao impacto de práticas de
empréstimo descuidadas — cuja adoção passou em grande parte
despercebida na época —, o padrão da experiência com hipotecas
emitidas do final dos anos 1990 até 2007 demonstrou ser muito pior
do que havia sido historicamente. Pior do que as estruturas de
valores mobiliários e as agências de classificação de risco
consideravam possíveis, e pior do que os modelos dos compradores
informaram que seria. Ignorar essa possibilidade contribuiu, e muito,
para a criação da bolha hipotecária subprime. E sua ocorrência
provocou a crise resultante.
A chave é entender que o comportamento dos investidores pode
alterar o mercado, mudando os resultados que os investidores
podem esperar que o mercado entregue. Isso reflete a teoria da
reflexividade de George Soros:
Em situações que têm participantes pensantes, aqueles…
com visões distorcidas podem influenciar a situação com a
qual se relacionam, porque visões falsas levam a ações
inapropriadas. (“Soros: General Theory of Reflexivity” —
“Soros: Teoria Geral da Reflexividade”, em tradução livre —,
Financial Times, 26 de outubro de 2009.)
As pessoas que tentam entender como as coisas funcionam nos
mundos econômico e financeiro devem levar essa lição muito a
sério.
Tudo o que é necessário para que o moto-contínuo pare de girar é
que uma ou duas hipóteses se mostrem falsas, além do
funcionamento de algumas regras gerais:
As taxas de juros podem subir ou descer.
Platitudes podem falhar.
Incentivos inapropriados podem levar a comportamentos
destrutivos.
As tentativas de quantificar o risco antecipadamente —
particularmente quanto a novos produtos financeiros para
os quais não há histórico — serão muitas vezes inúteis.
O “pior caso” pode, na verdade, ser ultrapassado no lado
negativo.
O equívoco em todos esses pontos é sempre claro em
retrospectiva. Mas as práticas arriscadas em relação às hipotecas e
títulos lastreados em hipotecas —que foram tomadas em tão alta
conta — estavam ocorrendo em um canto obscuro do mundo
financeiro. Eram, assim, invisíveis para as diretorias das áreas de
investimento, estrategistas de portfólio, investidores em ações,
gerentes de investimentos alternativos, compradores de títulos
tradicionais e aparentemente até mesmo para os investidores em
hipotecas.
Lá na Oaktree tivemos a sorte, nos anos em que a bolha
hipotecária surgiu — levando à Crise Financeira Global —, de
entender que o ciclo de crédito seguia um rumo ascendente e,
portanto, que os mercados estariam cada vez mais precários. Isso
nos levou a vender ativos, liquidar os grandes fundos em
dificuldades e substituí-los por outros de menor porte, aumentar
nosso nível de consciência de risco e conservadorismo, e a levantar
um fundo de reserva várias vezes o maior de todos os tempos para
aproveitar as oportunidades de dívidas inadimplentes ou prestes a
estar nessa situação que sentimos poderiam se materializar.
Em que nos baseamos para fazer isso? Em retrospecto, foi fácil —
embora nunca pareça tão fácil em tempo real. O que estava ao
alcance, no período de 2005 a 2007, era fazer as seguintes
observações gerais:
O Fed reduziu a taxa básica de juros para níveis muito
baixos, a fim de afastar os efeitos depressivos do estouro
da bolha tecnológica, bem como a preocupação com o
“bug do milênio”.
Devido à baixa remuneração dos títulos do Tesouro (dos
EUA) e títulos com grau de investimento, bem como do
desencanto com as ações decorrente do contínuo declínio
entre 2000 e 2002, os investidores estavam ansiosos para
investir em instrumentos alternativos.
Os investidores já tinham dado de ombros para as
consequências funestas do colapso da bolha tecnológica
em 2000 e da bolha das telecomunicações e escândalos
corporativos de 2001 a 2002.
Havia, assim, pouca aversão ao risco (especialmente em
outras áreas que não a de ações, ainda observadas com
cautela), tornando os investidores geralmente ansiosos
por investimentos em instrumentos exóticos, estruturados
e sintéticos.
Como resultado de todos os itens citados, os mercados
estavam abertos para a emissão de dívida de baixa
qualidade, instrumentos mal estruturados e alternativas
não testadas.
Essas foram nossas observações, e a última nos chamou mais a
atenção para as tendências negativas que estavam em andamento.
Parecia que não havia um dia em que Bruce Karsh ou eu não
visitássemos o escritório um do outro para reclamar sobre um novo
produto financeiro, dizendo: “Não deveria ser possível emitir um lixo
como esse. Há algo de errado com o mercado”. Esses negócios
arriscados nos diziam que medo, ceticismo e aversão ao risco eram
insuficientes, e ganância, credulidade e tolerância ao risco estavam
em alta. As implicações dessa combinação nunca são boas.
Todos os pontos aqui mencionados eram óbvios, e não sujeitos a
debate. Tudo o que importava era se você fez essas observações e
tirou as conclusões apropriadas. Não era preciso entender
completamente o que estava errado com as hipotecas subprime ou
desconsiderar os títulos garantidos por hipotecas e obrigações de
dívida colateralizadas altamente estruturadas. Nós, com certeza,
não entendíamos.
E, a propósito, naqueles anos em que a bolha hipotecária estava
crescendo, as ações não estavam indo bem ou sendo vendidas em
grandes lotes, e a economia não estava crescendo (e, por
conseguinte, necessariamente caminhando para uma recessão).
Mas quem fez as observações que acabamos de listar
provavelmente teria concluído, como fizemos, que era hora de
reduzir o quantum de risco em seu portfólio. Isso foi tudo o que era
preciso.
E aqui estão os resultados do estouro da bolha hipotecária e de
suas repercussões, como mostrado no desempenho de alguns dos
índices de investimento padrão em 2008, o ano em que tudo se
desfez. Claramente um ano em que foi extremamente importante ter
um risco reduzido.
Finalmente, ao discutir como detectar e reagir aos extremos do ciclo
de mercado, convém voltar mais uma vez ao pânico generalizado
que se seguiu à quebra do Lehman Brothers, em setembro de 2008.
Embora tenha se originado em um canto periférico do mundo
financeiro e de investimentos, a crise das hipotecas subprime logo
se espraiou, contagiando principalmente as instituições financeiras
que subestimaram o risco dos títulos lastreados em hipotecas e,
portanto, investiram pesadamente neles. Em seguida, como
consequência da ameaça a essas instituições essenciais, impactou
os mercados de ações e títulos em todos os países — e depois as
economias em todo o mundo — na forma da Crise Financeira
Global.
Com isso, como descrevi anteriormente, os fundos de
investimento constituídos de títulos do mercado de valores
mobiliários e papéis representativos da dívida corporativa tinham
que ser garantidos pelo governo dos EUA. Vários bancos e
instituições financeiras importantes se deram mal, precisando ser
socorridos, resgatados ou absorvidos. Desconhecia-se até onde iria
a hemorragia do sistema financeiro. Os mercados de ações e dívida
entraram em colapso. Agora a generalização havia saltado para o
lado negativo: “o sistema financeiro poderia derreter totalmente” em
um círculo vicioso sem fim.
Com o caráter negativo das generalizações, a máquina de gerar
erros emperrou. Já não havia ganância, apenas medo. Nenhum
otimismo, só pessimismo. Nada de tolerância ao risco, apenas
aversão a ele. Nenhuma capacidade de ver pontos positivos,
somente negativos. Vontade alguma de interpretar as coisas de
forma positiva, muito ao contrário. Bons resultados eram
inimagináveis. No horizonte, só os ruins. Assim, chegamos ao dia
em que tive a conversa mencionada nas páginas 136–137, em que
o diretor do fundo de pensão não podia ou não estava disposto a
aceitar que qualquer suposição sobre possíveis inadimplências
pudesse ser suficientemente conservadora.
Qual a observação essencial a ser feita? Eis o que escrevi em
“The Limits to Negativism” (“Os Limites do Negativismo”, em
tradução livre):
Fazer o oposto do que os outros fazem, ou “nadar contra a
corrente”, é essencial para o sucesso do investimento. Mas
como a crise de crédito atingiu um pico na semana passada,
as pessoas se deixaram levar em vez de resistir. Eram raros
os otimistas; a maioria era pessimista em algum grau. Alguns
se tornaram genuinamente deprimidos — até mesmo alguns
grandes investidores que conheço. Relatos cada vez mais
negativos do colapso próximo foram trocados via e-mail. Não
houve quem fosse cético ou dissesse “que o horror de uma
situação dessas era improvável”. O pessimismo alimentou-se
de si mesmo. A única preocupação das pessoas era proteger
seus portfólios para superar o colapso iminente ou levantar
dinheiro suficiente para atender aos resgates. A única coisa
inexistente na semana passada eram ofertas agressivas de
compra de títulos. Então, os preços caíram, e caíram vários
pontos de cada vez — ou seja, “a casa caiu”.
A chave, como de costume, era se tornar cético sobre o que
“todo mundo” estava dizendo e fazendo. Alguém poderia ter
dito: “Claro, os aspectos negativos podem ser verdadeiros,
mas certamente já estão precificados no mercado. Então há
pouco a ganhar apostando nisso. Por outro lado, se não
forem verdadeiros, os níveis de preços estão tão deprimidos,
que a valorização será enorme. Eu compro!” A história
negativa pode ter parecido atraente, mas é a história positiva
— na qual poucos acreditavam — que detinha e ainda detém
o maior potencial de lucro.
Nesse ciclo de mercado extremo, todas as notícias eram
realmente negativas… e certamente não imaginárias. As únicas
perguntas que me fizeram foram: “Até onde vai?” e “Quais serão os
efeitos?” Dado que os preços dos ativos refletiam apenas um
pessimismo abjeto em relação a essas coisas — eu diria um
pensamento quase suicida —, a chave para lucrar está em
reconhecer que, mesmo diante de notícias uniformemente ruins e de
uma péssima perspectiva, o pessimismo pode ser exagerado e,
assim, os ativos podem se tornar baratos demais.
Foi o excesso de pessimismo que me levou a escrever “Os Limites
do Negativismo” com relação ao mercado de crédito em outubro de
2008. Nele, apontei, como mencionado no capítulo sobre atitudes
em relação ao risco, que o ceticismo inato do investidor superior
“exige pessimismo quando o otimismo é excessivo. Mas também
exige otimismo quando o pessimismo é excessivo”. Essa dupla face
do ceticismo estava totalmente ausente nos dias mais sombrios do
mercado, é claro.
Pouco depois da quebra do Lehman, em 15 de setembro de 2008,
Bruce Karsh e eu chegamos à conclusão de que (a) ninguém
poderia saber até onde iria o colapso das instituições financeiras,
mas (b) a negatividade era certamente abrangente e possivelmente
excessiva, e os ativos pareciam terrivelmente baratos. Pensando
estrategicamente, concluímos que se o mundo financeiro acabasse
— algo que não se podia descartar —, não importaria se
comprássemos ou não. Porém, se o mundo não acabasse e não
tivéssemos comprado, teríamos deixado de fazer nosso trabalho.
Então partimos para as compras de dívida agressivamente. A
Oaktree investiu mais de meio bilhão de dólares por semana
durante as 15 semanas entre 15 de setembro e o final do ano. Em
alguns dias pensamos que estávamos indo rápido demais, e em
outros, devagar demais; isso provavelmente significava que
estávamos certos. Bem, o mundo não acabou, o ciclo vicioso da
implosão das instituições financeiras parou no Lehman Brothers, os
mercados de capital reabriram, as instituições financeiras voltaram à
vida, a dívida foi novamente capaz de ser refinanciada, as falências
acabaram sendo muito poucas em relação aos dados históricos, e
os ativos que compramos se valorizaram substancialmente. Em
resumo, fomos recompensados por prestar atenção ao ciclo.
Embora estejamos revisitando o clima no final de 2008, este é o
momento apropriado para uma discussão sobre o comportamento
do investidor quando o mercado se encaminha, ou está, lá no fundo
(do poço).
Para começo de conversa, o que é fundo do poço? É o ponto no
qual os preços mais baixos do ciclo são atingidos. Pode-se dizer
que ele é alcançado no dia em que o último investidor, em pânico,
vende o que tem, ou o último dia em que os vendedores
predominam em relação aos compradores. Seja por que motivo for,
é o último dia no qual os preços caem e, assim, o dia em que eles
atingem seu nadir. (Claro que essas definições são altamente
exageradas. A expressão “fundo do poço” — tal como “pico” —
descreve um período de tempo, não um dia. Assim, a frase “o último
dia” é principalmente uma figura de linguagem). A partir do fundo, os
preços sobem, já que não há detentores de capital para capitular e
vender, ou porque os compradores agora estão mais decididos a
comprar do que os vendedores a vender.
A questão que quero abordar aqui é: “Quando devemos começar
a comprar?” Já me referi anteriormente, neste livro, a “fundo do
poço”. Trata-se de um conceito muito importante. Quando um
mercado está desabando, os investidores podem ouvir dizer: “Não
dá para saber se chegamos ao fundo do poço”. Em outras palavras,
“A tendência é de queda, e não dá para adivinhar quando isso vai
deixar de acontecer. Então, por que deveríamos comprar sem ter
certeza de que o fundo foi alcançado?”
Mas o que eu acho que eles estão realmente dizendo é: “Estamos
com medo — em especial de comprar antes que o declínio cesse e,
portanto, de nos dar mal —, então vamos esperar até que o fundo
do poço seja alcançado, a poeira abaixe e a incerteza passe”. Mas
espero que a esta altura tenha deixado bem claro que quando a
poeira baixar e os nervos dos investidores se acalmarem, o bonde já
terá passado, levando com ele as oportunidades perdidas — as
pechinchas.
Na Oaktree, rejeitamos fortemente a ideia de esperar pelo fundo
do poço para começar a comprar.
Primeiro, não há como saber quando o fundo foi
alcançado. Não há um LED piscando lá embaixo.
Reconhecemos isso quando se constata estarmos no dia
anterior ao início da recuperação. Por definição, isso só
pode ser identificado após o fato.
Em segundo lugar, geralmente é durante os escorregões
do mercado que você pode comprar as maiores
quantidades daquilo que quer, de vendedores que estão
jogando a toalha e enquanto os que esperam o fundo do
poço chegar estão abraçando-se pelos cantos. Mas, uma
vez que o escorregão leva o mercado ao chão, por
definição há poucos vendedores para vender, e os
compradores predominam. Assim, as vendas entram em
fase minguante, e os potenciais compradores enfrentam
uma crescente competição.
Começamos a comprar dívidas inadimplentes4 imediatamente
depois que o Lehman entrou com pedido de falência, em meados de
setembro de 2008, e continuamos até o fim do ano, à medida que os
preços diminuíam. No primeiro trimestre de 2009, outros
investidores haviam captado os valores disponíveis e reunido algum
capital para investir. Mas, com os vendedores motivados pelas
vendas efetuadas e as compras tendo começado, era tarde demais
para comprar em grandes volumes sem aumentar os preços.
Como tantas outras coisas no mundo dos investimentos que
podem ser testadas com base na certeza e precisão, esperar pelo
fundo do poço para começar a comprar é um ótimo exemplo de
insensatez. Então, se mirar o fundo é errado, quando comprar? A
resposta é simples: quando o preço está abaixo do valor intrínseco.
E se o preço continuar caindo? Comprar mais, pois agora é
provavelmente um negócio ainda mais interessante. Tudo que se
precisa para ter êxito nisso é (a) uma estimativa do valor intrínseco,
(b) a atitude emocional de perseverar, e (c), por fim, ter provado que
sua estimativa de valor estava correta.
Eis como os principais índices de investimento se comportaram no
ano seguinte. Os retornos disponíveis em 2009 mostram a
importância de ter reconhecido um ciclo em um extremo negativo e
ter comprado (ou pelo menos mantido) no caos que o
acompanhava.
É hora de um aparte: se você olhar as duas últimas tabelas —
aquelas que mostram grandes perdas em 2008 e grandes ganhos
em 2009 —, será fácil concluir que os dois anos juntos constituem
uma espécie de “não evento”. Por exemplo, se você tivesse
colocado $100 no Credit Suisse Leveraged Loan Index no primeiro
dia de 2008, teria perdido 29% ao longo do ano e ficaria com
apenas $71 no final. Mas depois teria ganho 45% em 2009, e
terminado com $103 transcorridos dois anos, o que significa um
ganho líquido de $3. Os resultados de dois anos nas classes de
ativos listados anteriormente variaram de perdas líquidas
moderadas a ganhos líquidos moderados.
É importante, todavia, o que você fez no meio. Sim, segurar-se lhe
permitiria recuperar a maioria ou todas as perdas e acabar bem,
com os resultados descritos antes. Mas se você perdeu o controle
dos nervos e vendeu “no meio” — ou se, tendo comprado com
dinheiro emprestado, recebeu uma chamada de margem que não
podia atender e se viu em uma posição vendida —, você
experimentou o declínio, mas não a recuperação, e seu resultado
líquido nesse período de dois anos de “não evento” foi desastroso.
Por essa razão, é importante frisar que sair do mercado após um
declínio — e, por conseguinte, não participar de uma recuperação
cíclica — é realmente o pecado capital no investimento.
Experimentar uma perda de marcação a mercado na fase
descendente de um ciclo não é fatal em si, contanto que você se
mantenha também na parte de cima, benéfica. Converter essa
flutuação descendente em uma perda permanente ao vender no
fundo do poço é realmente terrível.
Assim, compreender os ciclos e ter os recursos emocionais e
financeiros necessários para vivenciá-los é um ingrediente crucial no
sucesso do investimento.
Antes de cantar vitória na Crise Financeira Global e seguir em
frente, quero declarar com firmeza que o sucesso que meus colegas
e eu tivemos em lucrar com esse ciclo não foi inevitável. Isso
porque, refletindo o tema de Elroy Dimson, o bom resultado que
tivemos não era o único resultado que poderia ter-se materializado.
Estou convencido de que, se Hank Paulson, Tim Geithner e Ben
Bernanke não tivessem agido como o fizeram, ou se tivessem agido
de forma diferente, ou se suas ações não tivessem sido tão bemsucedidas como foram, um colapso financeiro e a reprise da Grande
Depressão com certeza poderiam ter ocorrido. Nesse caso, nossas
ações não seriam motivo de comemoração.
Meu receio é o de que as pessoas possam olhar para o declínio
de 2008 e para a recuperação que se seguiu e concluir que
declínios sempre podem depender de serem recuperados
prontamente e com facilidade, e, portanto, não há nada com que se
preocupar com os ciclos de queda. Mas acho que essas são as
lições erradas da crise, já que o resultado que realmente ocorreu foi
muito melhor do que algumas das “histórias alternativas” (como
Nassim Nicholas Taleb as chama) que poderiam ter ocorrido em seu
lugar. E se essas lições incorretas são as que são aprendidas, como
acredito que possam ter sido, então elas provavelmente trarão um
comportamento que aumente a amplitude de outro ciclo dramático
de boom/colapso algum dia, talvez com um ciclo mais sério e
consequências de longa duração para os investidores e para toda a
sociedade.
Mas muito se perdeu para nós na recuperação da crise, e para
todos os investidores “longos”. Certamente posicionamos de modo
correto os portfólios de nossos clientes para o futuro que se
materializou, e muito disso foi devido ao nosso sentimento pela
maneira como os ciclos psicológicos e de mercado operam. Dada a
incapacidade de prever o futuro, é o melhor que qualquer um pode
fazer.
Bolhas e quebras têm um padrão próprio: uma lógica — ou falta de
lógica — cuja essência rima de uma instância para outra. Os três
episódios analisados aqui mostram a oscilação do ciclo em sua
forma mais extrema, e, assim esperamos, eles fornecem uma
indicação de como os ciclos podem ser reconhecidos e tratados.
Quero levantar alguns últimos pontos essenciais.
Primeiro, todos os elementos nas progressões que
descrevi eram claros o bastante para serem identificados
naquela ocasião, resguardando os investidores de
emoções e percepções distorcidas sobre o que se
passava.
Segundo, inferir o que era essencial e, portanto, tomar as
ações apropriadas não exigia qualquer previsão. As
descrições das progressões então correntes são
convincentes, sem adivinhações sobre o futuro. Os
eventos e excessos cíclicos resultantes apontavam para
um comportamento lucrativo.
Finalmente, embora eu diga que os eventos foram óbvios
e as implicações também, quero afirmar categoricamente
que nada era fácil na época. Mesmo os melhores e menos
emocionais entre nós estão sujeitos às mesmas entradas
e estímulos que todos os outros. Nós nunca tivemos
certeza, mas fizemos a coisa certa, no entanto. E
enquanto os erros que levaram à Crise Financeira Global
foram facilmente reconhecíveis, o tempo de sua correção
foi absolutamente além da previsão. O melhor que os
investidores podem fazer é agir à luz do que se passa no
meio ambiente. Mas eles devem ter em mente o que John
Maynard Keynes teria dito: “O mercado pode permanecer
irracional por mais tempo do que você pode permanecer
solvente”.
Para fechar o assunto de como lidar com eventos cíclicos, quero
fornecer mais um exemplo, de 1991. As aquisições alavancadas de
controle societário haviam crescido nos anos 1980, graças à
capacidade de contrair dívidas dos compradores de empresas,
muitas vezes chegando até 95% do preço total de compra. Isso
levou muitas empresas a se sujeitarem a dívidas que não poderiam
honrar na recessão que se seguiu. Quebras e inadimplências foram
inúmeras, e, assim, sobreveio a primeira crise dos títulos de alto
risco. Isso tudo veio à tona logo após formarmos nossos Fundos II e
IIb para dívidas em dificuldades. Veja como avaliei o ambiente em
uma carta aos investidores nesses fundos em 23 de janeiro de
1991:
Em geral, os preços de mercado das empresas inadimplentes
ou prestes a inadimplir diminuíram durante 1990. Parte disso
deveu-se aos fundamentos, pois o valor de mercado de todos
os ativos enfraqueceu junto com a economia, enquanto
alguns decorreram de “condições técnicas”, um eufemismo
para a significativa expansão da oferta desse tipo de títulos da
dívida, que desencorajou os compradores e os retirou do
mercado.
A piora do clima econômico e psicológico nos dá a
oportunidade de escolher entre um grande número de
investimentos prospectivos a preços que são verdadeira
pechincha. O ambiente é depressivo, pois muito do que se
compra é logo cotado mais abaixo e não há animação.
Essas são exatamente as condições sob as quais queremos
estar trabalhando. Quando os compradores estão ativos e
dando vivas porque tudo o que compram aumenta mais no
dia seguinte e os faz se sentirem espertos, o “índice de dor” é
muito baixo, e os compradores são encorajados.
As condições de hoje me dizem que estamos mais
propensos a ganhar mais do que se estivéssemos em um
clima como esse. Há poucos concorrentes para aumentar os
preços das coisas que queremos comprar. É mais provável
que cada preço de compra seja um “baixo” do que um “alto”.
Não podemos presumir que começaremos a investir no dia
em que a economia e o mercado batam no fundo do poço.
Nossa maior esperança é a de que isso aconteça em algum
momento durante o período em que estamos investindo
ativamente, e que compraremos no caminho, ao longo e
depois daquele momento.
Esse é um bom exemplo de sentir o pulso do mercado em tempo
real… não apenas porque fui eu quem o fez, e não apenas porque
acabou dando certo (os fundos de dívidas em dificuldades que
estávamos investindo naquela época tinham alguns dos maiores
retornos que já alcançamos). Foi bom porque detectamos e nos
precavemos contra as influências emocionais deprimentes que
impediam os outros de comprar. Isso mostra que sabíamos que as
condições “lúgubres” e as perdas decorrentes da marcação a
mercado que estavam afastando compradores eram mais
propensas a ter implicações favoráveis e não desfavoráveis aos
retornos subsequentes, e que os preços em queda são bons para os
compradores, não ruins.
Entender o que as coisas realmente significam — em vez de como
elas fazem os investidores se sentirem — é o primeiro passo para
fazer as coisas certas na ocasião.
Este capítulo estendeu-se bastante, mas já que é assim, terminarei
com uma discussão geral sobre como pensar em posicionar um
portfólio à medida que o mercado passa por seu ciclo.
Penso ser útil ter uma abordagem organizada para o que chamo
de “riscos gêmeos”. Estou referindo-me aqui ao fato de que os
investidores têm que lidar diariamente com duas possíveis fontes de
erro. A primeira é óbvia: o risco de perder dinheiro. A segunda é um
pouco mais sutil: o risco de perder a oportunidade. Os investidores
podem eliminar qualquer um deles, mas isso os exporá inteiramente
ao outro. Então a maioria das pessoas equilibra as duas.
Qual deve ser a postura normal de um investidor em relação aos
dois riscos: equilibrada ou favorecendo um ou outro? A resposta
depende principalmente dos objetivos, das circunstâncias, da
personalidade e da capacidade de resistir ao risco (e das mesmas
coisas em relação aos clientes, se houver).
À parte de sua postura normal, o investidor deve alterar o
equilíbrio de tempos em tempos? Em caso positivo, como? Minha
opinião é a de que os investidores devem tentar ajustar
apropriadamente sua postura se eles (a) acharem que têm a
percepção necessária e (b) estão dispostos a se empenhar nisso e
assumir o risco de estar errados. Eles devem fazer isso com base
em onde o mercado está em seu ciclo. Em suma, quando o
mercado está no alto de seu ciclo, eles devem enfatizar a limitação
do potencial de perda de dinheiro, e quando está em um ciclo baixo,
devem enfatizar a redução do risco de perda de oportunidade.
Como? Tente viajar para o futuro e olhe para trás. Em 2023, você
acha que é mais provável dizer: “Em 2018, gostaria de ter sido mais
agressivo” ou “Em 2018, gostaria de ter sido mais defensivo”? E há
algo de hoje sobre o qual você provavelmente diria: “Em 2018, perdi
a chance de uma vida inteira para comprar xyz”? O que você acha
que pode dizer daqui a alguns anos pode ajudá-lo a descobrir o que
deve fazer hoje.
As decisões citadas referem-se diretamente à escolha entre
agressividade e defensividade. Quando um investidor quer reduzir
sua chance de perder dinheiro, deve investir com uma postura mais
defensiva. Mais preocupado com a falta de oportunidades? Nesse
caso, é necessário aumentar a agressividade. A variação de sua
postura deve ser feita em resposta a onde o mercado está em seu
ciclo, e, novamente, isso pode ser abordado em termos de como o
mercado é valorizado e como outros investidores estão se
comportando — os dois elementos na avaliação do mercado
mencionados anteriormente.
Quando a maioria dos investidores está se comportando de forma
agressiva, isso é um bom sinal de que o mercado é um lugar
arriscado, pois há pouca aversão ao risco. E a agressividade dos
investidores provavelmente terá como resultado direto a elevação
nos preços dos ativos. Nos dois sentidos, como já mencionei antes,
a agressividade dos outros torna o mercado arriscado para nós.
Uma boa maneira de pensar sobre essa decisão é considerar
quais atributos são adequados para o ambiente de mercado atual.
No final de 2008, início de 2009, um investidor só precisava de duas
coisas para ganhar muito dinheiro: capital para investir e coragem
para investir. Possuindo ambas as coisas, ganharia muito dinheiro
nos anos vindouros. Em retrospecto, o que ele não precisava era de
cautela, conservadorismo, controle de risco, disciplina, seletividade
e paciência: quanto mais dessas coisas ele tinha, menos dinheiro
fazia.
Isso significa que “dinheiro e coragem” é sempre uma fórmula
infalível para o sucesso do investimento? Absolutamente não. Se
um investidor tivesse dinheiro e coragem no início de 2007, teria
sobre os ombros todo o peso da Crise Financeira Global. Foi
quando ele precisou de cautela, conservadorismo, controle de risco,
disciplina, seletividade e paciência. Além disso, mesmo no final de
2008, início de 2009, os investidores inteligentes não podiam
abandonar completamente a cautela e a disciplina, porque não
havia como saber que a recuperação da CFG seria tão rápida e
suas sequelas tão relativamente indolores para os investidores. Na
Oaktree, investimos muito, mas enfatizamos a dívida sênior de
empresas de alta qualidade, não a dívida júnior e os emissores mais
frágeis, nos quais, como se viu, teríamos ganhado ainda mais
dinheiro.
Entre os muitos fatores que tornam o investimento interessante
está o fato de que não há tática ou abordagem que sempre
funcione. A única maneira de tentar se posicionar corretamente
conforme o ciclo se move é fazer julgamentos bem fundamentados
e ajustar-se às circunstâncias. Mas, convenhamos, não é tarefa
fácil.
Uma das maneiras pelas quais as pessoas tendem a responder
aos desafios destes dias é perguntar: “Em que ponto estamos?”
Desde o colapso financeiro no final de 2008, ouvi essa pergunta
regularmente. O que as pessoas realmente querem dizer com isso
é: “Onde estamos no ciclo?” No quarto trimestre de 2008, elas se
perguntaram: “Quanto já sofremos e quanto mais está à frente?”
Mais recentemente têm me perguntado principalmente sobre o ciclo
de crédito: por quanto tempo ele continuará em alta — facilitando o
empréstimo — e quando a disponibilidade de crédito começará a
diminuir?
Considero essas questões à luz do meu senso de quão longe as
coisas estão, e respondo do jeito que quem me pergunta quer: 15
minutos de jogo (apenas começando), fim do primeiro tempo (no
meio do jogo), ou nos minutos finais. Mas recentemente me tornei
mais consciente da limitação dessa abordagem: ao contrário de um
jogo de futebol normal, não temos como saber por quanto tempo um
ciclo em particular irá se desenrolar. Não há uma regra que
determine o tempo de jogo. Um ciclo econômico ou de mercado não
tem um tempo definido, isso não é determinável.
Nenhuma dessas abordagens oferece uma técnica infalível para
decidir como posicionar portfólios. Há apenas modos de pensar
sistematicamente sobre algo que não está aberto a respostas fáceis.
Mas espero que eles sugiram uma rota que seja superior a decisões
tomadas com base na emoção, adivinhação ou apenas seguindo a
manada.
Como lidar com os ciclos é uma das coisas mais importantes no
investimento. Ciclos acontecerão. A questão-chave é a resposta que
se dá a eles.
1
Nota do Tradutor: uma empresa de hardware de sistemas.
2
Nota do Tradutor: total das ações em circulação dividido pelas vendas anuais ou
anualizadas.
3
Nota do Tradutor: sigla em inglês para “Obrigações de Dívida Colateralizada”.
4
Nota do Tradutor: também tratadas aqui pelas chamadas dívidas em dificuldades - DD.
XIV
POSICIONAMENTO NO CICLO
Posicionar com sucesso um portfólio para os movimentos de
mercado vindouros depende de como se age (agressiva ou
defensivamente) e quando se age (com base em uma
compreensão superior do que os ciclos implicam para futuros
movimentos do mercado).
C
erta vez conheci um homem que era otimista e agressivo por
natureza — talvez porque tivesse tido o bom senso de ter
nascido rico e de levar uma vida daquelas tão sonhadas. Ele nunca
duvidou de si mesmo e jamais pareceu questionar a exatidão de
suas previsões ou a probabilidade de que seus estratagemas
fossem bem-sucedidos. Era agressivo desde que eu o conhecia, o
que acabou sendo uma ótima ocasião para agressividade. Essa
experiência me inspirou a cunhar uma frase que descrevesse as
forças em ação:
São três os ingredientes para o sucesso: agressividade, agir
no momento certo e habilidade; e se você tem bastante
agressividade no momento certo, não precisa de muita
habilidade.
Em fevereiro de 2017, eu estava trabalhando nos capítulos finais
deste livro enquanto estava de férias na Índia. Ali, visitei uma das
maiores atrações do mundo, a Amer Fort de Jaipur, e tentei capturar
uma pequena fração de sua beleza fotografando-a. Ao revisar
minhas fotos depois, tive a sorte de dar com algumas que havia
tirado alguns meses antes em outro local exótico: China.
Quando lá estive, um cliente de Pequim me fez uma série de
perguntas provocativas, e ao respondê-las, fiz alguns rabiscos,
como sempre faço, em um quadro branco. As respostas que vieram
a mim naquele dia não haviam passado antes pela minha cabeça.
Reconhecendo isso, tirei fotos do quadro com meu iPhone antes de
sair. (Que inovação! Vinte anos antes, eu nunca levaria uma câmera
em uma apresentação.) Três meses depois, enquanto revisava meu
trabalho fotográfico no Amer Fort, me deparei com aquelas fotos da
China, e pela primeira vez me recordei de tais ideias. Muito do que
falo neste capítulo apoia-se nelas.
Na Índia, após uma noite de sono entrecortada pela diferença de
mais de dez horas de Nova York, por alguma razão amanheci com
uma conexão entre o que acabei de mencionar, o sucesso, as fotos
de Pequim e a questão de como lidar com ciclos. Em suma, pensei
em como analisar os principais componentes da habilidade de
investir.
(Note que eu digo “amanheci com uma conexão”, e não “fiz uma
conexão”. Eu conscientemente escolho a forma passiva aqui porque
com frequência ideias “vêm a mim”, em vez de sentir que as
desenvolvo por meio de um esforço, um processo intencional. É
assim que surgem muitos de meus insights, geralmente auxiliados
pela redução do pensamento a uma representação gráfica como as
que fiz na China. Minha mente funciona dessa maneira.)
Voltando a minha explicação inicial de sucesso, em que usei a
expressão “momento certo”, preciso acrescentar a ela mais duas
palavrinhas: “da sorte”. Afinal, o que poderia ser melhor do que ser
agressivo em um momento fortuito? Mas, deitado na cama na Índia,
notei que o bom momento não precisa ser exclusivamente resultado
da sorte. Em vez disso, um bom momento para investir pode vir da
avaliação diligente de onde estamos em um ciclo e, em função
disso, fazer a coisa certa. No estudo dos ciclos, o objetivo é como
posicionar seu portfólio em face do que está por vir. Em uma frase, é
disso que este livro trata.
Gostaria de voltar a essa frase simples e refletir um pouco mais
sobre a fórmula para o sucesso do investimento. Concluo que para
isso devem ser considerados seis elementos principais, ou melhor,
três pares deles:
Posicionamento do ciclo — O processo de decidir sobre
a postura quanto ao risco de seu portfólio em resposta aos
julgamentos que você fez em relação aos ciclos principais.
Seleção de ativos — O processo de decidir quais
mercados, nichos de mercado e títulos ou ativos
específicos estão sub ou sobreapreciados.
Posicionamento e seleção são as duas principais ferramentas no
gerenciamento de portfólio. Pode ser uma simplificação excessiva,
mas acho que tudo o que os investidores fazem se enquadra em um
ou outro desses itens.
Agressividade — A suposição de aumento do risco:
arriscar mais de seu capital, deter ativos de menor
qualidade, fazer investimentos que dependam mais de
macro desfechos favoráveis, e/ou empregar alavancagem
financeira ou ativos e estratégias de alta volatilidade
(sensíveis ao mercado).
Defensividade — A redução do risco: investir menos
capital e reter dinheiro, enfatizar ativos mais seguros,
comprar coisas que possam se dar relativamente bem
mesmo na ausência de prosperidade, e/ou evitar
alavancagem e volatilidade.
A escolha entre agressividade e defensividade é a principal
dimensão na qual os investidores posicionam os portfólios em
resposta a onde eles pensam que estão nos ciclos e o que isso
implica na evolução futura dos mercados.
Habilidade — A capacidade de tomar decisões corretas
(embora certamente não em todos os casos) por meio de
um processo intelectual repetível e com base em
suposições razoáveis em relação ao futuro. Hoje em dia
isso ficou conhecido por seu nome acadêmico: “alfa”.
Sorte — O que acontece nas muitas ocasiões em que
habilidade e suposições razoáveis se provam inúteis, isto
é, quando a aleatoriedade tem mais efeito sobre os
eventos do que os processos racionais, resultando em
“períodos de sorte” ou “azar”.
Habilidade e sorte são os elementos principais que determinam o
sucesso das decisões de gerenciamento de portfólios. Sem a
habilidade do investidor, não se deve esperar que as decisões
redundem em êxito. De fato, há algo chamado de habilidade
negativa, e para as pessoas que estão sobrecarregadas com isso,
jogar uma moeda ou abster-se de decisões levaria a melhores
resultados. E a sorte é o curinga. Ela pode fazer com que as boas
decisões falhem e as ruins sejam bem-sucedidas, mas
principalmente no curto prazo. No longo prazo, é razoável esperar
que a habilidade vença.
Parte de meu despertar indiano — decorrente de minhas reflexões
na China — dizia respeito à dicotomia entre seleção e
posicionamento, e a maneira como essa habilidade influência o
resultado dessas duas atividades.
Um mercado fará o que fará. Parte do resultado virá de eventos
econômicos e lucratividade corporativa, outra parte será
determinada pela psicologia do investidor e do comportamento
resultante, e parcela dele decorrerá da aleatoriedade ou sorte.
Podemos ter algumas ideias sobre o que o futuro trará em termos
de desempenho de mercado; elas podem ser baseadas em
raciocínio sólido ou prenhe de vieses, e podem estar certas ou
erradas. Mas vamos analisar o desempenho futuro do mercado —
seja ele qual for, seja ele reconhecível ou não — como o ponto de
partida para nossa discussão aqui. Vamos expressar a expectativa
usual para o comportamento de um mercado como uma distribuição
de probabilidade:
Esse é o ponto de partida — a tela, se você quiser — para as
ações de um investidor. A questão é se ele tem a habilidade
necessária para superar o desempenho do mercado mediante
decisões ativas, ou se deve desistir de fazê-lo e, ao contrário,
investir passivamente, conformando-se ao desempenho do
mercado.
Mencionei antes as duas principais maneiras pelas quais um
investidor pode ampliar retornos: o posicionamento do ciclo e a
seleção de ativos. Começarei pelo primeiro, e me aprofundarei
bastante nele.
Como já disse, acredito que o posicionamento do ciclo consiste
primordialmente em escolher entre uma postura agressiva ou uma
postura defensiva: aumentar ou diminuir a exposição aos
movimentos do mercado.
Digamos que você conclua que está em um ambiente propício:
O ciclo econômico e o de lucro estão em ascensão e/ou
tendem a atender ou exceder as expectativas das
pessoas.
A psicologia do investidor e as atitudes em relação ao
risco são sóbrias, não febris.
Portanto, os preços dos ativos são de moderados a baixos
em relação ao valor intrínseco.
Nesse caso, a agressividade é necessária. Assim, você aumenta
seu comprometimento e aumenta as condições de risco e
volatilidade de seu portfólio. A linha pontilhada no gráfico a seguir
mostra suas perspectivas de desempenho. Você aumentou seu
potencial para ganhos, se o mercado se sair bem, e de perdas, se
ele se der mal.
Caso seus julgamentos sejam validados por um aumento de
mercado, seu portfólio posicionado de forma agressiva, com maior
sensibilidade de mercado, aumentará ainda mais, fazendo com que
você tenha um desempenho superior, conforme mostrado no gráfico
a seguir:
A receita para o sucesso aqui consiste em (a) uma análise
cuidadosa de onde o mercado está em seu ciclo, (b) em
decorrência, um aumento de agressividade, e (c) ficar provado que
isso está correto. Essas coisas podem ser resumidas como
“habilidade” ou “alfa” no posicionamento do ciclo. É claro que “c” não
é uma questão de todo dentro do controle de ninguém, em particular
devido ao grau de aleatoriedade a que está sujeito. Então, “ficar
provado que está correto” não acontecerá o tempo todo, mesmo
para investidores hábeis bons de raciocínio.
Por outro lado, sua análise pode concluir que o posicionamento do
ciclo é ruim — a economia está em ritmo lento, a psicologia é
excessivamente otimista, e, consequentemente, os preços dos
ativos também —, o que significa tender para a defensividade.
Nesse caso, você deve reter algum capital e diminuir o nível de risco
com um portfólio descrito pelo gráfico a seguir.
Você diminuiu a volatilidade de seus ativos e preparou-se para
tempos ruins. Caso esteja certo sobre o ciclo, o desempenho do
mercado estará do lado esquerdo da distribuição de probabilidade, e
seu posicionamento defensivo lhe proporcionará um desempenho
superior nesse mercado, perdendo menos, como mostrado pela
linha pontilhada no gráfico. Sua carteira, sendo defensiva, está
menos exposta ao vaivém do mercado, adequando-se, assim, a um
mercado fraco:
Claro que nem todos têm uma compreensão superior dos ciclos;
assim, nem todos os esforços de posicionamento têm êxito.
Suponha que um investidor que não tenha a habilidade de
estabelecer o posicionamento decida tornar-se defensivo e cortar
sua exposição ao mercado como mostrado. Se o mercado
surpreende positivamente, ele errou, e seus investimentos estão
abaixo do esperado:
No primeiro capítulo, apresentei o assunto “tendências”. A
perspectiva de mercado deve ser considerada por meio de uma
distribuição de probabilidades, a qual, se construída com precisão,
dará uma ideia da tendência factível. O movimento do mercado ao
longo do ciclo reposiciona a distribuição e, portanto, influencia sua
provável tendência futura, como mostrei nas páginas 210–211.
Quando o ciclo de mercado está na fase de baixa, os ganhos são
mais prováveis do que o normal, e as perdas são menos prováveis.
Vale o inverso quando a fase é de alta. Os movimentos de
posicionamento, baseados em onde você acredita que o mercado
está em seu ciclo, significam tentar preparar melhor seu portfólio
para os eventos que estão por vir. Embora sempre se possa ter azar
sobre a relação entre o que logicamente deve acontecer e o que
realmente acontece, boas decisões de posicionamento podem
aumentar a chance de que a tendência do mercado — e, portanto, a
chance de desempenho superior — esteja de seu lado.
Em 1977, a cidade de Nova York experimentou uma onda de
assassinatos de casais namorando em locais isolados, cometidos
por um serial killer rotulado como “o Filho de Sam”. Em 2014, li o
obituário de Timothy Dowd, o detetive que o flagrou. Adorei a parte
em que o citei dizendo que era seu trabalho “preparar-se para ter
sorte”. Considerando minha visão do futuro como indeterminada e
sujeita a uma aleatoriedade considerável, acho que é uma ótima
maneira de pensar sobre isso. Não obstante possa parecer que
estou defendendo ser passivo e deixar as coisas ao acaso, a
verdade é que os investidores superiores têm-se favorecido da
distribuição assimétrica de resultados, mas não a ponto de
estabelecer recordes olímpicos: eles ainda precisam adivinhar os
números da loteria.
Uma das melhores maneiras de aproveitar a distribuição
assimétrica de resultados que caracteriza os investidores superiores
é trazer a tendência do mercado para seu lado. O resultado nunca
estará sob seu controle, mas se você investir quando a tendência do
mercado for favorável, estará com o vento a favor — e o inverso
será verdadeiro. A análise hábil dos ciclos pode fornecer uma
compreensão melhor do que a média da provável tendência do
mercado, permitindo-lhe ampliar as chances de posicionar bem seu
portfólio para o que está por vir.
O que vem a seguir foge por completo do assunto dos ciclos, então
se isso é tudo em que você está interessado, pode pular adiante.
Mas quero concluir a discussão das ações que os investidores
podem adotar para melhorar o desempenho cobrindo o outro
componente da gestão de portfólio: a seleção de ativos.
A seleção de ativos consiste em identificar mercados, setores de
mercado e ativos individuais melhores ou piores do que os demais,
dando-lhes um peso maior ou menor no portfólio. Quanto mais alto
for o preço de um ativo em relação a seu valor intrínseco, menores
serão as expectativas em relação a ele (tudo o mais constante), e
vice-versa. O requisito-chave para um desempenho superior nesse
aspecto é a percepção acima da média do valor intrínseco do ativo,
as mudanças futuras prováveis nesse valor e a proporção entre o
valor intrínseco do ativo e seu preço de mercado atual.
Todos os investidores que seguem determinado ativo têm (ou
deveriam ter) um opinião sobre seu valor intrínseco. O preço de
mercado do ativo reflete o consenso dessas opiniões, ou seja, os
investidores coletivamente definiram o preço. É aí que compradores
e vendedores concordam em fazer transações. Os compradores,
porque acham que é um investimento inteligente ao preço atual, e
os vendedores, porque acham que o preço é cheio ou
superapreciado. O que sabemos sobre a precisão desses pontos de
vista?
Teórica — A hipótese do mercado eficiente afirma que
todas as informações disponíveis são incorporadas aos
preços “eficientemente”, de modo que os preços dos
ativos sejam justos, e os investidores não consigam
“vencer o mercado” escolhendo entre eles.
Lógica — Estamos falando sobre a capacidade de fazer
julgamentos melhores do que o investidor médio e, assim,
alcançar um desempenho acima da média. No entanto, a
única coisa que sabemos com certeza é que, em média,
todos os investidores estão na média. Assim, a lógica nos
diz que eles não podem fazer julgamentos acima da
média.
Empírico — Estudos de desempenho mostram que
pouquíssimos investidores estão consistentemente mais
certos do que os demais sobre esses julgamentos. A
maioria dos investidores é pior do que os mercados,
especialmente após a subtração dos custos de transação,
taxas de administração e despesas. Essa é a razão que
explica a crescente popularidade do investimento em
índices passivos.
Isso não significa que ninguém supera o mercado. Muitas pessoas
fazem isso todos os anos, mas em geral não mais do que ocorreria
em função da aleatoriedade. Algumas o fazem de maneira mais
consistente do que a aleatoriedade sugere, e algumas delas ficam
famosas. O ingrediente essencial — maior compreensão do valor
intrínseco — é o que lhes dá essa capacidade. Chamo isso de
“pensamento de segundo nível”: a capacidade de pensar
diferentemente do consenso e melhor.
Não me ocuparei aqui com questões a propósito de valor
intrínseco, relação entre preço e valor ou pensamento de segundo
nível, uma vez que tratei disso em detalhe em The Most Important
Thing. O importante, porém, é que o investidor superior — que
consegue pensar em segundo nível — é capaz de escolher ativos
com melhor desempenho e, assim, investir mais neles do que
naqueles de menor desempenho. A receita para a seleção de ativos
superior é simples.
E como essa superioridade se manifesta? Resultados
assimétricos.
O investidor não hábil na seleção tem a mesma proporção entre
ativos vencedores e perdedores que o mercado. Assim, ele se sai
bem quando o mercado se sai bem, e mal quando o mercado se dá
mal:
Um investidor com habilidade negativa na seleção escolhe
proporcionalmente mais perdedores do que ganhadores e, assim, se
comporta pior do que o mercado, para o bem ou para o mal, como
mostrado a seguir. Em outras palavras, sua distribuição de
probabilidade é deslocada para a esquerda do mercado:
Mas quem é hábil seleciona de modo a ter uma proporção melhor
de vencedores em relação a perdedores do que o mercado, ele é
capaz de investir mais em ativos vencedores do que em perdedores,
e os ganhos são mais que proporcionais em relação às perdas.
Os investimentos de um aplicador habitualmente
agressivo, que é capaz de uma seleção superior, se
valorizarão mais do que o mercado quando este sobe, e
pode cair mais do que o mercado quando ele cai. Mas sua
margem de superioridade no lado superior excederá seu
grau de inferioridade em virtude de sua capacidade de
selecionar ativos que ofereçam potencial positivo mais que
proporcional em relação ao risco de perdas. Ou seja, ele
se dará melhor que o mercado quando este subir, mas
não tão mal quando o mercado cair, como sua
agressividade sugeriria. Eis aí um exemplo da assimetria
que caracteriza o investidor superior:
Da mesma forma, o investidor habitualmente defensivo
com habilidade de seleção superior se sairá melhor do
que o mercado quando este cair, mas sua habilidade na
seleção o impedirá de apresentar um desempenho inferior
nos mercados em ascensão, o que sua atitude defensiva,
por si só, sugeriria. Sua habilidade na seleção de ativos
lhe permite encontrar ativos defensivos cuja participação
positiva compense o risco de queda. Também aí há uma
distribuição assimétrica:
Ambos os investidores com habilidade de seleção superior — a
agressiva e a defensiva — apresentam assimetria em relação ao
mercado. Ou seja, ambos têm distribuições de desempenho com
viés favorável. Os dois têm um potencial positivo mais que
proporcional a seu risco de queda (embora de maneiras diferentes).
É assim que o alfa na seleção de ativos se manifesta.
Finalmente, o investidor que habitualmente não é agressivo nem
defensivo — mas que é hábil no posicionamento do ciclo e na
seleção de ativos — ajusta a exposição do mercado de modo
correto e no momento certo, e tem o desempenho assimétrico
originado por uma relação melhor do que a média, seja dos
vencedores, seja dos perdedores. Este é o melhor de todos os
mundos:
Quase todos podem ganhar quando o mercado sobe e perder
quando ele cai, e quase qualquer um pode ter a mesma proporção
de vencedores para perdedores do que o mercado em geral. É
preciso habilidade superior para melhorar naqueles aspectos e
produzir a assimetria que marca o investidor superior.
Por favor, note que nesta discussão separei as habilidades de
posicionamento do ciclo e de seleção de ativos. Essa bifurcação é
um tanto artificial. Faço isso para descrever os dois elementos que
influenciam o desempenho, mas muitos grandes investidores têm
ambos, e a maioria dos demais não tem nenhum dos dois. Os
investidores que são capazes de ambos têm uma melhor percepção
da provável tendência do mercado e podem formar portfólios mais
adequados ao ambiente de mercado e que, provavelmente, estão à
frente em termos da proporção de vencedores para perdedores.
Isso é o que os torna ótimos... e raros.
Minha epifania na Índia me ensinou que posicionar com sucesso um
portfólio para os movimentos de mercado vindouros depende de
como se age (agressiva ou defensivamente) e quando se age (com
base em uma compreensão superior do que os ciclos implicam para
futuros movimentos do mercado). O objetivo deste livro é ajudar no
“como” e no “quando” agir.
XV
LIMITAÇÕES AO LIDAR COM CICLOS
Acho muito razoável tentar melhorar os resultados de
investimento a longo prazo, alterando as posições com base
na compreensão do ciclo do mercado. Mas é essencial
entender também as limitações, as habilidades necessárias e
as dificuldades envolvidas nisso.
P
rocurei escrever este livro para ter a oportunidade de definir o
que sei sobre ciclos e porque gosto de escrever, mas,
principalmente, como já informei aqui, para ajudar o leitor a lidar
com os altos e baixos do mercado.
Nas páginas anteriores abordei muitas das considerações que
envolvem o processo de compreensão dos ciclos, bem como os
fatores que restringem a confiança que alguém deveria ter em
relação à sua capacidade de chegar a bom termo nisso. Meu
objetivo aqui é repetir essas considerações, resumindo-as.
Investir, como informei, consiste em posicionar o capital para se
beneficiar de eventos futuros. Informei também que nunca sabemos
o que o futuro nos reserva e, portanto, para onde estamos indo. Mas
devemos fazer todo o possível para saber onde estamos, pois a
posição atual do ciclo tem implicações poderosas sobre como
devemos lidar com seu possível futuro.
Onde estamos em ciclos tem uma profunda influência sobre as
tendências futuras: sobre o que é provável que aconteça e talvez
até quando. Como discuti no Capítulo I e ilustrei no capítulo anterior,
nosso posicionamento de ciclo desloca a distribuição de
probabilidade que governa o futuro.
Muitas coisas podem acontecer. Sabemos que enfrentamos
incerteza e risco. Na melhor das hipóteses, tudo o que podemos
saber sobre o futuro é quais são as probabilidades. Conhecê-las
pode nos ajudar a estar, em média, mais certos do que os outros.
Mas é essencial lembrar-se de que conhecer as probabilidades está
longe de ser o mesmo que saber exatamente o que acontecerá.
Em geral não há outra escolha a não ser se contentar em
conhecer as probabilidades. Mas a amostra para cada resultado
(por exemplo, o crescimento do PIB de cada ano ou o ganho de
cada ação no próximo ano) normalmente será limitada a uma
observação — uma experiência —, significando que muitas coisas
podem acontecer, mas apenas uma de fato acontecerá. Não haverá
observações suficientes que permitam supor que a realidade futura
será a indicada como a mais provável… nem que a coisa mais
provável acontecerá em breve.
Vamos pegar, por exemplo, a correção de uma bolha impulsionada
pela euforia. Teoricamente, isso nunca deveria acontecer. Mas a
verdade dos ciclos diz que (a) isso uma hora acontecerá e (b)
quanto mais tempo passar sem que isso aconteça — e quanto mais
tempo o ciclo continuar subindo —, mais provável (e geralmente
mais iminente) é a correção esperada.
Naturalmente, quanto mais tempo se passar antes que esse
evento lógico ocorra — e quanto mais o ciclo tomar o rumo
ascendente —, mais pessoas concluirão que as regras dos ciclos
foram de alguma forma suspensas e que a correção prevista por
elas nunca acontecerá. Isso pode levar ao tipo de compra que vimos
em 2000 e, por fim, a um resultado extremamente traumático.
Temos que proteger nossos portfólios (e nossos negócios de
administração de investimentos) contra o perigo decorrente do fato
de que a coisa mais provável de acontecer — que nossa
compreensão dos ciclos pode nos dizer — pode não acontecer até
muito depois de se tornar provável. E temos que nos precaver
emocionalmente para poder viver o atraso potencialmente longo
entre chegar a uma conclusão bem fundamentada e vê-la tornar-se
correta.
Que tal rever a história? Em meados da década de 1990, o mercado
exuberante e o setor de tecnologia em franca expansão levaram os
investidores conservadores a concluir que as ações estavam
altamente supervalorizadas. O raciocínio pode ter sido sólido —
baseado em uma interpretação eficaz dos dados relevantes —, e a
necessidade de cautela pode ter sido forte. Anos passariam-se,
porém, até o mercado provar que eles estavam certos, dando razão
a um dos mais importantes adágios de investimento: “Estar muito à
frente de seu tempo é indistinguível de estar errado”. Conclusões
tão bem fundamentadas levariam os investidores a se limitar apenas
ao que era bom, senão, com a correção de 2000–2002, eles
poderiam ter perdido muito do capital sob seus cuidados.
Contudo, o afiado intelecto que levou esses investidores a tais
conclusões, combinado com alguma convicção, deveria ter sido
razão suficiente para tê-los mantido na rota que lhes era habitual.
Era de se esperar que tivessem permanecido cautelosos, em vez de
capitular e comprar na alta. Fosse assim, teriam provado estar
certos alguns anos depois e recuperariam sua reputação e seus
ativos. Mas o intervalo que viveriam certamente teria sido doloroso.
Um avanço rápido para a década atual, e topamos com a chance
de mais do mesmo. Investidores conservadores tiveram outra
oportunidade de concluir que as ações norte-americanas estão
superaquecidas. Para as empresas cautelosas, reduzir a exposição,
e, portanto, deixar de ganhar mais, poderia significar a saída dos
clientes: com isso, seus ativos encolheriam (em um mercado
crescente).
A cautela é apropriada novamente? Será tida como adequada
pelos eventos futuros? Uma correção virá logo, o suficiente para que
os investidores cautelosos aproveitem os benefícios de estar
certos? Serão vistos como aqueles investidores que sempre acham
que as ações cairão, e cuja sorte os premia de vez em quando com
períodos de declínio? Ou como estrategistas brilhantes que estão
certos em princípio, mas até agora frustram-se com a falta de
confiança na lei de causa e efeito no mundo dos investimentos?
Essas perguntas são em grande parte impossíveis de responder.
Mas o mais importante é que o leitor tenha em mente esta lição
fundamental: posicionar-se para ciclos não é tarefa fácil.
Acho muito razoável tentar melhorar os resultados de investimento a
longo prazo, alterando as posições com base na compreensão do
ciclo do mercado. Mas é essencial entender também as limitações,
as habilidades necessárias e as dificuldade envolvidas nisso.
É importante ressaltar o fato óbvio de que, em vez dos altos e
baixos cotidianos do mercado, os exemplos claros que forneci no
Capítulo XII envolviam todos os extremos cíclicos que ocorrem “uma
vez na vida” (que hoje em dia parecem acontecer uma vez por
década). Primeiro, os extremos da bolha e do colapso — e, em
particular, o processo que os faz surgir — ilustram mais claramente
o ciclo em ação e como responder a ele. E segundo, é quando se
lida com extremos pronunciados que devemos esperar a maior
probabilidade de sucesso.
A seguir, o que penso sobre o impacto dos movimentos do
mercado no ambiente de investimento em que trabalhamos. É uma
visão simplista, e sugere um mundo discernível e muito mais regular
do que o real. Mas funcionou para mim por décadas como uma
estrutura geral, e bate de frente com a tentativa de entender o
mundo como uma série de zigue-zagues irregulares e aleatórios:
Por definição, o estado da relação entre preço e valor em nenhum
lugar é tão claro quanto nos extremos. Assim:
É difícil fazer distinções frequentes e é difícil fazê-lo
corretamente.
No meio termo — onde está a relação “justa” — as
distinções não são tão lucrativas quanto nos extremos, e
não se pode esperar que essas distinções funcionem
como se fossem confiáveis.
Detectar e explorar os extremos é de fato o melhor que podemos
esperar. Acredito que isso pode ser feito de forma confiável sendo
analítico, perspicaz, experiente (ou versado em história) e não
emotivo. Mas isso significa que não se deve esperar conclusões
lucrativas todos os dias, meses ou mesmo todo ano.
Não há como criar grandes oportunidades para monitorar o
mercado por meio de nosso entendimento dos ciclos. É ele quem
decidirá quando as teremos. Se não houver nada inteligente para
fazer, o erro está em tentar ser inteligente.
A razoabilidade do esforço para identificar o momento do ciclo
depende simplesmente do que se espera dele. O êxito é improvável
se você frequentemente tenta localizar onde estamos no ciclo no
sentido de “o que vai acontecer amanhã?” ou “o que está reservado
para nós no mês que vem?” Qualifico esse esforço como “tentando
ser fofo”. Ninguém pode fazer boas distinções frequente ou
consistentemente o bastante para incrementar os resultados do
investimento. E ninguém sabe quando se materializarão os
desenvolvimentos de mercado que aqueles esforços quanto ao
posicionamento de ciclo rotulam como “prováveis”.
Por outro lado, posicionar os portfólios para os principais ciclos
contribuiu muito para o sucesso da Oaktree. Tornamo-nos
agressivos em 1990–1993, 2002 e 2008, e nos tornamos cautelosos
e puxamos o freio de mão em 1994–1995 e 2005–2006, e até certo
ponto nos últimos anos. Tentamos usar o ciclo a nosso favor e
agregar valor para nossos clientes, e eu diria que conseguimos o
posicionamento mais adequado nessas ocasiões. Além disso, não
houve grandes oportunidades perdidas para fazer mais.
Então, até agora, nossas principais chamadas de ciclo se
mostraram todas corretas. A palavra “todas” faz parecer que esta é
uma batalha que se ganha de forma consistente. Mas meu “tudo”
pessoal consiste em quatro ou cinco vezes em 48 anos. Ao agir
daquela maneira apenas nos maiores extremos cíclicos, maximizei
minhas chances de estar certo. Ninguém — e certamente não eu —
pode ter sucesso regularmente, a não ser nos extremos.
Sempre tento alertar as pessoas de que isso não é fácil, e não
quero dar a impressão de que os leitores devem esperar encontrar
facilidades ou ficar desapontados quando não o fizerem. Como
informei em “On the Couch” (“No Sofá”, em tradução livre, janeiro de
2016):
Quero deixar bem claro que, quando pedi cautela em 2006–
2007, ou para comprar ativamente no final de 2008, ou
novamente cautela em 2012, ou uma postura um pouco mais
agressiva aqui no início de 2016, fiz isso com considerável
incerteza. Minhas conclusões resultam do meu raciocínio,
aplicado com o benefício da minha experiência (e
colaboração de meus colegas da Oaktree), mas nunca as
considero com 100% de chance de estarem corretas, ou
mesmo 80%. Acho que estão certas, é claro, mas sempre
faço minhas recomendações com tremor nas mãos.
Eu leio os mesmos jornais que todo mundo. Vejo os
mesmos dados econômicos. Sou alvo dos mesmos
movimentos do mercado. Meu estado emocional é fustigado
pelos mesmos fatores. Talvez eu esteja um pouco mais
confiante em meu raciocínio e, por certo, tenho mais
experiência do que a maioria. Mas a chave é que, por algum
motivo, sou capaz de resistir às minhas emoções e seguir
minhas conclusões. Nenhuma dessas conclusões tem uma
fórmula que possa ser posta no papel. Se ela existisse, a
maioria das pessoas inteligentes chegaria às mesmas
conclusões, com o mesmo grau de confiança. Digo isso só
para comunicar meu sentimento de que ninguém deve temer
não estar à altura da tarefa só porque não tem certeza de
suas conclusões. Há coisas em que a certeza está fora de
questão.
Concluirei este capítulo com a sábia contribuição de Peter
Bernstein a este assunto:
Depois de 28 anos neste posto, e 22 anos antes disso
gerenciando dinheiro, posso resumir assim qualquer
sabedoria que porventura acumulei: o truque não é ser o mais
competente selecionador de ações, o mais vitorioso nas
previsões ou o desenvolvedor do modelo mais elegante. Tais
triunfos são transitórios. O truque é sobreviver! Conseguir isso
requer um estômago forte quando se está errado, porque
todos nós estaremos errados com mais frequência do que
esperamos. O futuro não é nosso para conhecê-lo. Mas ajuda
saber que estar errado é inevitável e normal, não uma
tragédia horrível nem uma falha terrível de raciocínio nem
mesmo má sorte na maioria dos casos. Estar errado vem com
a franquia de uma atividade cujo resultado depende de um
futuro desconhecido… (Jeff Saut, “Being Wrong and Still
Making Money” — “Estar Errado e Ainda Ganhar Dinheiro” —,
Seeking Alpha, 13 de março de 2017)
XVI
O CICLO DO SUCESSO
A lição importante é que — especialmente em um mundo
interconectado e informado — tudo o que produz lucratividade
incomum atrai capital incremental até ficar saturado e
totalmente institucionalizado, ocasião em que seu retorno
prospectivo ajustado ao risco se moverá em direção à média
(ou pior).
E, correspondentemente, as coisas que funcionam mal por
algum tempo finalmente se tornarão tão baratas, devido à sua
relativa depreciação e à falta de interesse dos investidores,
que estarão preparadas para iniciar um desempenho superior.
Ciclos como esses detêm a chave para o sucesso no
investimento, e não a crença de todos em um crescimento em
que o céu é o limite.
A
gora você está preparado para a tarefa de reconhecer, avaliar e
responder aos ciclos. Isso pode contribuir substancialmente
para o sucesso de seu investimento. Mas, como disse Peter
Bernstein, mesmo os melhores investidores não terão êxito o tempo
todo. Compreender isso é uma parte importante de poder viver
esforçando-se. O sucesso, como as outras coisas mencionadas
neste livro, vem e vai.
Ao longo de minha carreira, detectei um ciclo de sucesso. Em
grande medida, o fluxo e refluxo do sucesso, como os outros ciclos
que descrevi, decorre do papel desempenhado pela natureza
humana. E, mais uma vez, cada desenvolvimento no ciclo leva ao
seguinte. Há muito mantenho a convicção que mencionei na página
35 — e tem sido fortemente reforçada em meus 29 anos de
envolvimento com dívidas em dificuldades — de que “o sucesso
carrega dentro de si as sementes do fracasso, e este, as sementes
do sucesso”.
Peter Kaufman, biógrafo de Charlie Munger e CEO da Glenair, um
excepcional fabricante de componentes aeroespaciais, descreve o
funcionamento do materialismo dialético da seguinte forma: “Como
qualquer sistema cresce em direção a seu máximo ou pico de
eficiência, ele desenvolverá as próprias contradições internas e
fraquezas que ocasionarão sua decadência e morte (em seu ensaio
nº 49: “The Perpetual See-Saw” — “ A Perpétua Gangorra”, em
tradução livre —, 2010). Isso captura o processo que garante que o
sucesso será cíclico.
O Papel da Natureza Humana
Outra maneira que coloco isso é que “o sucesso não é bom para a
maioria das pessoas”. Em suma, o sucesso pode mudar as
pessoas, e em geral não para melhor. O sucesso faz as pessoas
pensarem que são inteligentes. Nada contra, mas também podem
haver ramificações negativas. O sucesso também tende a tornar as
pessoas mais ricas, e isso pode levar a que se diminua o nível de
motivação.
No ato de investir há uma relação complexa entre humildade e
confiança. Como os melhores negócios costumam ser encontrados
em meio a coisas não percebidas ou desconsideradas, um
investidor, para ser bem-sucedido, precisa ter confiança suficiente
em seu julgamento para adotar o que David Swensen, o bemsucedido gestor do fundo de investimentos formado por doações de
Yale, descreve como “ portfólios desconfortavelmente
idiossincráticos, que frequentemente parecem francamente
imprudentes aos olhos da sabedoria convencional” (Pioneering
Portfolio Management — “Pioneirismo em Gestão de Portfólio”, em
tradução livre —, 2000). Por definição, é mais provável que os
elevados ganhos em pechinchas sejam encontrados entre coisas
que a sabedoria convencional descarta, que deixam desconfortáveis
a maioria dos investidores e cujos méritos são difíceis de
compreender. Investir neles requer considerável força interior.
Quando uma dessas posições inicialmente não aumenta como o
investidor espera, ou talvez vá na direção oposta, este tem que ter
confiança suficiente para manter sua posição ou até mesmo cacifála. Com certeza, ele não pode diminuir o preço como sinal de
“venda”. Em outras palavras, não pode assumir que o mercado sabe
mais do que ele.
Mas, por outro lado, o investidor também precisa conhecer suas
limitações e não se presumir infalível. Ele tem de entender que
ninguém sabe ao certo o que o futuro macro guarda. Embora
provavelmente tenha opiniões sobre o futuro das economias,
mercados e taxas de juros, ele deve saber que eles não estão
necessariamente corretos. E, em contrapartida, não deve sempre
assumir que está certo e o mercado está errado — e, portanto,
manter ou adicionar sem limitação e sem rever seus fatos e seu
raciocínio. Isso é arrogância.
Conforme os sucessos se acumulam, é comum as pessoas
concluírem que são espertas. E depois de ganhar muito dinheiro em
um mercado em forte ascensão, decidem que investiram
magistralmente. Sua fé magnifica suas próprias opiniões e instintos.
Seus investimentos refletem menos insegurança, significando que
eles pensam menos sobre a possibilidade de estarem errados e
preocupam-se menos com o risco de perda. Isso pode fazer com
que não mais insistam na margem total de segurança que deu
origem a seus sucessos anteriores. Esta é a razão de um dos mais
antigos e importantes adágios de investimento: “Não confunda
cérebros com um mercado em alta”.
A verdade é que há pouco valor a ser aprendido com o sucesso.
As pessoas que são bem-sucedidas correm o risco de ignorar o fato
de terem tido sorte ou recebido ajuda de outras pessoas. No
investimento, o sucesso ensina às pessoas que ganhar dinheiro é
fácil e que elas não precisam se preocupar com riscos —duas lições
particularmente perigosas.
Eles podem concluir que a pequena oportunidade que lhes deu
sua grande vitória é infinitamente reproduzível, o que a maioria não
é. E muitas pessoas, incluindo investidores que ganharam fama por
um único êxito, concluem que podem se ramificar em inúmeros
outros campos porque a inteligência que produziu aquele primeiro
sucesso épico é amplamente aplicável.
Fatores como esses dificultam replicar o sucesso do investimento,
o que significa que este pode ser cíclico, em vez de serial. De fato,
em vez de sugerir que outro está vindo, um sucesso pode tornar um
segundo menos provável. Citarei Henry Kaufman, ex-economistachefe do Salomon Brothers: “Há dois tipos de pessoas que perdem
muito dinheiro: aquelas que nada sabem e aquelas que sabem tudo”
(“Archimedes on Wall Street” — “Arquimedes em Wall Street”, em
tradução livre —, Forbes, 19 de outubro de 1998).
Algumas pessoas famosas que foram capa da Sports Illustrated
ou da revista Forbes podem levar à má sorte. Estar em uma capa
pode ser o resultado de uma realização singular que pode ter vindo
de um golpe de sorte, uma oportunidade única, não replicável, ou de
uma atitude de extremo risco. Ou os bons resultados deles —
incluindo os investidores de sucesso louvados pela Forbes —
podem fazer com que eles se tornem mais confiantes e
convencidos, e menos disciplinados e esforçados… algo não muito
condizente com uma fórmula para o sucesso.
O Papel da Popularidade
Uma das principais maneiras pelas quais o sucesso carrega as
sementes do fracasso do investimento é por meio do aumento da
popularidade. Escrevi há pouco que os melhores negócios são
encontrados com mais frequência entre aquelas coisas difíceis de
compreender, desconfortáveis e facilmente descartadas pela
multidão. A performance do investimento em curto prazo é, em
grande parte, um concurso de popularidade, e a maioria das
pechinchas existe pela simples razão de que ainda não foram
percebidas pela manada e não se tornaram populares. Ao contrário,
ativos com bom desempenho são, em geral, aqueles que ganharam
popularidade graças a seu óbvio mérito e, portanto, se tornaram
caros.
Vamos pensar em estratégias de investimento. É crucial entender
que nada funcionará para sempre: nenhuma abordagem, regra ou
processo pode ter alta performance o tempo todo. Primeiro, a
maioria dos valores mobiliários e abordagens são apropriados para
certos ambientes e partes do ciclo, e inapropriados para outros. E
em segundo lugar, o sucesso passado por si só tornará o sucesso
futuro menos provável.
Na década de 1960, quando a ideia de investir em ações estava
ganhando popularidade entre os norte-americanos, a ênfase estava
nos líderes da indústria e nas ações chamadas “blue-chip”. As
ações de baixa capitalização de mercado (em inglês, “small-caps”)
foram, de início, amplamente desconsideradas, mas por fim foram
percebidas e compradas. Isso fez com que se saíssem melhor do
que as de grande capitalização. Quando as pessoas notaram os
retornos superiores das ações de pequena capitalização nessa fase
de “virada de mesa”, comprá-las proporcionou ganhos adicionais
para elas… até que alcançaram o preço cheio das grandes
empresas. Nesse ponto, o interesse voltou-se para as ações
“grandes”, que então recuperaram a liderança.
Da mesma forma, as ações de tecnologia e as “growth stocks1”
saíram-se muito melhor do que as demais ações no final da década
de 1990. Essa divergência atingiu o máximo em 1999, com o
diferencial a favor das growth stocks chegando a quase 25 pontos
percentuais em relação às “value stocks2”. Mas o desempenho
extraordinário das growth stocks as subestimou, e quando o
mercado de ações foi corrigido, em 2000–2002, elas perderam
muito mais do que as value stocks, que antes haviam definhado.
Em outras palavras, “desempenho superior” é apenas outra
maneira para dizer que uma coisa está sendo avaliada em relação à
outra. E, claramente, isso não pode durar para sempre.
Independentemente de quão grandes sejam seus méritos, é
improvável que “a” seja infinitamente mais valioso do que “b”. Isso
significa que se “a” continuar se valorizando em relação a “b”, tem
que haver um ponto em que se torna supervalorizado em relação a
“b”. E quando a última pessoa desiste de “b” porque este está se
saindo mal e o troca por “a”, é hora de “b” (agora relativamente
barato em relação a “a”) passar a ter um desempenho superior.
Forças poderosas geram uma tendência para estratégias,
investidores ou gestores de investimentos, que conseguem, por
algum tempo, evitar segui-la. Já disse que a maioria das ideias não
é infinitamente escalável. Uma verdade essencial sobre o
investimento é que, em geral, bons resultados trarão mais dinheiro
para gestores e estratégias de “hot money3”, e se houver
crescimento sem controle, mais dinheiro trará má performance.
Em meados dos anos 2000, a arbitragem rapidamente ganhou
popularidade. Sem uma noção do comportamento futuro de uma
determinada ação, os investidores estavam dispostos a comprar
títulos conversíveis em ações, desde que fossem capazes de
vender as ações subjacentes com um “nível de hedge4” apropriado
(veja meu memorando “A Case in Point” — “Exemplo de Caso”, em
tradução livre —, de junho de 2005). Quem fez isso obteve
excelentes retornos ajustados ao risco em todos os ambientes de
mercado… até que dinheiro e concorrentes atraídos para a
estratégia eram tantos, que as posições atraentes eram coisa do
passado.
A lição importante é que — especialmente em um mundo
interconectado e informado —, tudo o que produz lucratividade
incomum atrairá capital incremental até ficar saturado e totalmente
institucionalizado, ocasião em que seu retorno prospectivo ajustado
ao risco se moverá em direção à média (ou pior).
E, correspondentemente, as coisas que funcionam mal por algum
tempo finalmente se tornarão tão baratas, devido à sua relativa
depreciação e à falta de interesse dos investidores, que estarão
preparadas para iniciar um desempenho superior. Ciclos como
esses detêm a chave para o sucesso no investimento, e não a
crença de todos em um crescimento em que o céu é o limite.
É tudo uma questão de fluxo e refluxo. Ao investir, as coisas
funcionam até que deixam de funcionar. Ou, como Ajit Jain, da
Berkshire Hathaway, me contou outro dia sobre investir, “é fácil até
não ser mais”.
As small-caps baratas têm desempenho superior até
chegarem ao ponto em que já não são mais baratas.
Seguir a tendência ou investimento por impulso — ficar
com os vencedores — funciona por um tempo. Mas, por
fim, a rotação e as compras efetuadas pelos retardatários
se apropriam da estratégia vencedora.
“Fazer garimpagem” permite aos investidores tirar proveito
da fraqueza momentânea, até o momento em que um
grande problema aparece (ou o mercado simplesmente
não se recupera mais), fazendo com que os declínios de
preços sejam seguidos por mais quedas de preços, e não
por recuperações rápidas.
Os ativos arriscados têm desempenho superior,
provenientes de avaliações em que foram excessivamente
penalizados por seu grau de risco, até que sejam
precificados como ativos mais seguros. Em seguida, eles
têm um desempenho inferior até que, mais uma vez,
ofereçam prêmios de risco adequados.
O resultado final é claro: nada funciona para sempre. Mas é
essencial reconhecer que, quando todos se convencerem de que
algo continuará funcionando para sempre, esse é o momento exato
em que se tornará certo que não. Costumo dizer que “Ao investir,
tudo que é importante é contraintuitivo, e tudo o que é óbvio para
todos está errado”.
Talvez o maior exemplo da influência da popularidade (em sentido
inverso) tenha ocorrido em 1979, e poucos investidores que
estavam por lá na época se esqueceram disso. Em 13 de agosto
daquele ano, após quase uma década de desempenho
dolorosamente ruim do mercado acionário, a revista Business Week
publicou uma reportagem de capa intitulada “The Death of Equities”
(“A Morte das Ações”, em tradução livre). Sua conclusão, já
antecipada no título, foi baseada no oposto de tudo que recomendo
neste livro.
O artigo citou uma série de razões pelas quais o fraco
desempenho das ações não se reverteria:
Sete milhões de pessoas desistiram de investir em ações.
Muitas outras formas de investimento se saíram melhor.
Os fundos de pensão estavam voltando-se para “ativos
duros”, como o ouro.
A inflação minara a capacidade das empresas de
aumentar os lucros.
E continuava:
Mesmo as instituições que até agora permaneceram nos
mercados financeiros estão aplicando em investimentos de
curto prazo e em investimentos em “patrimônio alternativo”,
como papéis lastreados em hipotecas, títulos estrangeiros,
capital de risco, arrendamentos, contratos de seguro
garantidos, títulos indexados, opções de ações e futuros.
E eis a conclusão deles:
Hoje, a tradicional atitude [nos EUA] de comprar ações
sólidas como pedra angular de uma vida dedicada à
poupança e aposentadoria simplesmente desapareceu.
Segundo um jovem executivo dos EUA: “Você já esteve em
uma reunião de acionistas norte-americanos recentemente?
Eles são todos velhos ultrapassados. O mercado de ações
não está ali”.
Em resumo, o que “The Death of Equities” informou foi que as
ações se tornaram tão impopulares, que nunca voltariam a se dar
bem. É preciso um pensador de primeiro nível altamente simplista
para concluir que o fraco desempenho passado levou à
impopularidade hoje, o que implica mau desempenho amanhã. Em
vez disso, o pensador de segundo nível diz que o fraco desempenho
passado levou à impopularidade hoje, o que implica preços baixos
hoje, o que, por sua vez, implica bom desempenho amanhã.
“The Death of Equities” foi publicado apenas alguns anos antes —
e em essência expôs o caso por inteiro — do pontapé inicial em
1982 da maior fase de mercado em alta da história. Na época em
que foi publicado, o S&P 500 estava em 107 pontos, e em março de
2000, chegou a 1.527. Um ganho de preço de mais de 14 vezes, ou
13,7% ao ano por quase 21 anos (e esses números ignoram os
dividendos, que elevaram o ganho total para mais de 28 vezes e o
retorno total anualizado para 17,6%). A lição é simples: os
investidores devem desconfiar dos ativos populares. Ao contrário, a
impopularidade é amiga do comprador.
O Papel das Empresas
Empresas também estão sujeitas a altos e baixos em termos de
sucesso, em função de uma série de eventos de causa e efeito. A
Xerox é um exemplo marcante.
A gigante fabricante de máquinas de copiar para escritório —
pioneira em evitar o processo “úmido” de fotostática, que exigia que
os documentos fossem enviados para um laboratório fotográfico
para serem reproduzidos — foi uma das primeiras empresas que
visitei quando era um analista novato de equipamentos de escritório
no final dos anos 1960. Naquela época, a Xerox tinha o monopólio
da cópia “seca” e parecia ser dona de seu destino. Meu analista
sênior e eu costumávamos nos reunir com um funcionário da Xerox
que servia de contato entre nossas empresas, e para cada modelo
de copiadora na linha de produtos, ele nos ajudava a triangular as
projeções da empresa quanto ao número de máquinas que teria no
mercado no próximo ano e a receita anual de locação por máquina.
Em virtude da posição dominante de mercado que desfrutava, a
Xerox tinha total capacidade de realizar essas projeções. Poderia
cobrar preços monopolísticos que lhe permitissem ajustar a
quantidade de máquinas alugadas que lhe desse margens de lucro
muito altas. Ela também insistia em um modelo de negócios voltado
apenas para aluguel, recusando-se a vender ou fazer “leasing” de
suas máquinas e perder o controle sobre elas. Um verdadeiro motocontínuo!
Mas a gerência da Xerox pode ter ignorado a possibilidade de que
essas altas margens se mostrassem insustentáveis. Em 1975, a
Xerox resolveu uma queixa antitruste sobre o controle do mercado
de copiadoras consentindo em disponibilizar sua ampla carteira de
patentes para licenciamento. Os concorrentes começaram a
produzir e vender suas próprias copiadoras. Eles conseguiram
reduzir os preços da Xerox e abocanhar parte do mercado de
locações dessas máquinas. Isso reduziu a participação no mercado
de copiadoras da Xerox nos EUA de quase 100% para menos de
20%, impactando significativamente o montante de lucros da
companhia. A Xerox teve dificuldade em responder à concorrência
de preços, pois isso canibalizaria seus negócios existentes. Os
concorrentes fizeram desse fato um primeiro exemplo do que agora
é chamado de disrupção.
Em 1968, graças à sua posição monopolista, forte crescimento e
alta lucratividade, a Xerox era líder do Nifty Fifty, que descrevi
anteriormente — empresas consideradas tão fortes e de
crescimento tão rápido que “nada de ruim poderia acontecer” e
“preço algum de suas ações era muito alto”. Mas o céu não é o
limite, e o sucesso raramente é interminável.
Como o comportamento da Xerox havia atraído a concorrência e
ela não estava preparada para responder — além de outros motivos
—, nos primeiros anos do século XXI ela estava passando por
sérias dificuldades.
Tal como as pessoas, as empresas têm o potencial de responder
ao sucesso com comportamentos que condenam esse mesmo
sucesso. Assim, elas podem:
Ficar complacentes e tornar-se “gordas e felizes”.
Tornar-se burocráticas e lentas.
Deixar de agir para defender suas posições.
Desistir da inovação e não conformidade e juntar-se à
multidão medíocre.
Concluir que podem fazer praticamente qualquer coisa e,
assim, se aventurar em áreas além de sua competência.
Dessa forma, o sucesso realmente carrega as sementes do
fracasso. Mas a boa notícia — já disse isso — é que o fracasso
também traz as sementes do sucesso.
Sob ataque, as empresas podem recuperar sua motivação
e seu senso de propósito.
Elas podem se livrar da gordura burocrática, levar a sério
a competição e ganhar dinheiro.
E quando o insucesso é grande, podem passar por
quebras, encolher, perder linhas de negócios, locações
não lucrativas e contratos onerosos e dívidas opressivas.
(No entanto, claro, os donos de empresas falidas
geralmente perdem seus cargos.)
Jahan Janjigian escreveu assim sobre a Xerox em 2002:
[Em 2000,] uma nova equipe de gestão implementou várias
iniciativas de reestruturação voltadas para a rentabilidade da
empresa. Elas incluíram cortes de custos agressivos e a
eliminação de 13.600 cargos. A Xerox também vendeu suas
operações na China e em Hong Kong, além de 50% da Fuji
Xerox para a Fuji Photo Film. Além disso, a Xerox permitiu
que a GE Capital assumisse o financiamento de recebíveis,
pelo qual já recebeu US$2,7 bilhões. E a Xerox saiu do
negócio de pequenos escritórios e home offices.
Em abril, a Xerox concordou em pagar US$10 milhões para
encerrar a investigação de dois anos da SEC. Mais tarde,
restabeleceu todos os seus resultados financeiros passados,
conforme exigido pelo acordo. Além disso, a empresa foi bemsucedida ao renegociar suas dívidas com os credores,
obtendo prazos mais administráveis. E, talvez o mais
importante, os produtos da empresa agora são mais
competitivos em termos de preço e qualidade.
Devido ao sucesso desses esforços, a Xerox voltou a ser
lucrativa mais cedo do que o esperado. Em face de melhorias
operacionais significativas, acreditamos que a Xerox é uma
compra atraente nos níveis atuais. (“Xerox Back from the
Brink” — “Xerox de Volta à Vida”, em tradução livre — Forbes
Growth Investor, outubro de 2002)
Como as empresas não duram tanto quanto as economias e os
mercados, o ciclo de longo prazo do sucesso da empresa também
pode não ser extenso. Mas ao longo da vida, os ganhos das
empresas podem levar a perdas, e as perdas podem estabelecer as
bases para ganhos. Há um ciclo no sucesso do negócio.
O Papel do Timing
Entre os fatores que podem contribuir muito para o sucesso de um
indivíduo ou de uma empresa está o timing, ou seja, o momento
certo. Entre outras coisas, ajuda a se envolver em coisas mais
rapidamente. Foi isso que colocou a Xerox no mapa nos anos 1960
e também me ajudou.
Em agosto de 1978, pouco depois de ser transferido do
departamento de pesquisa de ações do Citibank para o
gerenciamento de carteiras de títulos, recebi um telefonema que
mudou minha vida. “Um cara chamado Milken, na Califórnia”, disse
meu chefe, “está envolvido em algo chamado títulos de alto risco.
Um cliente quer um portfólio desses títulos. Você consegue
descobrir o que é isso?”
Foi apenas em 1977 ou 1978 que o investimento em títulos de alto
risco foi institucionalizado nos EUA. Foi quando Michael Milken
conseguiu seu primeiro sucesso em convencer os investidores de
que não há problema em empresas sem grau de investimento
emitirem títulos — e para as instituições comprá-los — se a taxa de
juros for alta o suficiente para compensar o risco. Esse universo
consistia em menos de US$3 bilhões em títulos na época em que
me envolvi pela primeira vez. A grande maioria das organizações
investidoras tinha uma regra contra a compra de títulos classificados
abaixo do grau de investimento, que eram comumente chamados de
“junk bonds”. E a Moody’s rejeitava categoricamente os títulos
classificados como B, dizendo que “não possuem as características
de um investimento desejável”.
Como esses títulos impopulares poderiam não ser negócios
subestimados? Como poderia a participação precoce não ter sido
uma dádiva?
E então, uma década depois, Bruce Karsh trouxe suas habilidades
jurídicas e seus insights estratégicos para minha equipe,
complementando a expertise de Sheldon Stone em crédito, e
organizamos um dos primeiros fundos de dívidas em dificuldades de
uma grande instituição financeira. O que poderia ser mais arriscado
e, portanto, mais inconveniente do que investir na dívida de
empresas em processo de falência ou prestes a isso? A que ideia as
pessoas poderiam ser mais avessas? Em outras palavras, onde se
poderia ganhar mais dinheiro com tanta segurança?
Em ambos os casos, e mais, tive a sorte de me deparar com
classes de ativos quase completamente desconhecidos, sem
aglomeração, e, portanto, com preços baixos. Há poucas situações
que podem tornar o investimento tão fácil como ter um mercado em
grande parte só para si. É muito difícil tentar arrancar retornos
decentes de um mercado que todos descobriram, invadiram,
conquistaram e lotaram. Este último está longe de ser uma fórmula
para o sucesso. O retardatário de um campo agora lotado não é “o
homem sábio no início”. Em vez disso, é mais provável que ele seja
“o tolo no final”. Aqueles de nós que tiveram a sorte de chegar cedo,
não tarde, sabem — ou certamente deveriam saber — que nosso
sucesso não foi todo ele obra nossa. É preciso que o tempo certo
coopere.
E isso me leva a uma grande observação de Henry Phipps, o
menos celebrado sócio de Andrew Carnegie e Henry Clay Frick,
dois dos maiores empresários do século XIX. Em 1899, Phipps
escreveu o seguinte:
Bons tempos, como os atuais, produzem maus momentos;
uma lei tão certa como o balanço de um pêndulo. Nós temos
experiência para conhecer essas verdades elementares.
Temos o bom senso de colocá-las em prática? (George
Harvey, Henry Clay Frick: The Man — “Henry Clay Frick: O
Homem”, em tradução livre, 2002).
Tal como acontece com as pessoas — cujos sucessos podem
constituir instâncias isoladas, em vez de indicadores de grandes
coisas pela frente, como elas poderiam estar habituadas a acreditar
—, o passar do tempo pode não corroborar o sucesso contínuo.
Bons tempos podem encorajar decisões de investimento que
dependem da perpetuação no tempo para ter sucesso. Mas esses
bons momentos podem levar a momentos ruins que testam as
decisões de maneiras que as pessoas não podem suportar.
Os bons tempos não apenas são seguidos mais cedo ou mais
tarde pelos maus tempos, mas — como se dá com tantos outros
exemplos de ciclos — eles muitas vezes produzem maus tempos.
Bons tempos podem levar a emissões imprudentes de títulos da
dívida (como vimos na discussão do ciclo de dívidas em
dificuldades) ou ao excesso de construções (como vimos na
discussão do ciclo imobiliário).
É como Ruchir Sharma, estrategista-chefe global da Morgan
Stanley Investment Management, escreveu em seu livro The Rise
and Fall of Nations (“A Ascensão e Queda das Nações”, em
tradução livre) sobre o efeito da atuação dos modernos reformistas:
“A reforma leva ao crescimento e aos bons tempos, e os bons
tempos encorajam uma arrogância e complacência que levam a
uma nova crise”.
Phipps mostrou que a história denota claramente essas
tendências. A questão-chave é se somos perspicazes e não
emotivos o suficiente para saber que os bons momentos não levam
necessariamente a mais bons momentos e, portanto, que o sucesso
realmente pode ser cíclico.
Voltemos à citação de Demóstenes de Charlie Munger: “O que o
homem deseja, também acredita ser verdade”. Em outras palavras,
o pensamento positivo muitas vezes é hegemônico. Isso pode fazer
com que os investidores acreditem que os bons tempos serão
seguidos por mais bons tempos. Mas isso ignora a natureza cíclica
das coisas e, especialmente, do sucesso.
1
Nota do Tradutor: ver o Capítulo XII.
2
Nota do Tradutor: ações de empresas com ótimos fundamentos cuja cotação é inferior a
seu valor intrínseco.
3
4
Nota do Tradutor: empréstimos de curtíssimo prazo.
Nota do Tradutor: simplificadamente, uma forma de reduzir a volatilidade do preço das
ações.
XVII
O FUTURO DOS CICLOS
A tendência das pessoas para o excesso nunca terminará. E
assim, uma vez que esses excessos acabarão sendo
corrigidos, tampouco cessará a ocorrência de ciclos. As
economias e os mercados nunca se moveram em linha reta
no passado nem o farão no futuro. Isso significa que os
investidores com capacidade de entender ciclos encontrarão
oportunidades de lucro.
A
té agora fui muito ao passado e fiquei um pouco no presente.
Agora, como concluo, quero voltar para o futuro.
Ao longo de minha carreira, presenciei várias ocasiões em que
especialistas disseram que a ocorrência de um tipo de ciclo ou outro
havia chegado ao fim. Seja por causa da vitalidade econômica,
inovação financeira, administração corporativa perspicaz ou a
suposta omnisciência de presidentes de bancos centrais e
secretários do Tesouro, eles observaram que as flutuações do ciclo
econômico ou do ciclo nos lucros não seriam mais vistas.
Debrucei-me algum tempo sobre esse assunto em “Will It Be
Different This Time?” (“Será Diferente Desta Vez?”, em tradução
livre, novembro de 1996). Primeiro reportei-me a um artigo de jornal
que apareceu alguns dias antes:
Nele havia o relato (referindo-se aos EUA) do conceito
vigente de expansão econômica contínua e livre da recessão.
Já na chamada se lia:
De diretorias a salas de estar, e de escritórios do governo a
pregões, está surgindo um novo consenso: o grande e mau
ciclo de negócios foi domado.
A atual expansão, aos 67 meses, já superou em muito a
média do pós-guerra. No entanto, 51 dos 53 mais
conceituados economistas entrevistados pela newsletter da
Blue Chip (meus especialistas favoritos e o tema de meu
memorando de julho de 1996, “The Value of Predictions II” —
“O Valor das Previsões II”, em tradução livre) preveem um
crescimento de 1,5% ou mais no próximo ano. E a pesquisa
da Universidade de Michigan revelou que a expectativa
predominante entre os consumidores é de que teremos pela
frente mais cinco bons anos.
O Presidente da Sears afirma que “não existe uma lei
natural que diga que temos que ter uma recessão”. De acordo
com o Presidente da Amoco, “não vejo qualquer razão para
acreditar [que a recuperação] não pode continuar até a virada
do século!” O CEO da Sara Lee diz: “Não sei o que poderia
acontecer para ocasionar uma recessão cíclica.” (“The
Business Cycle is Tamed, Many Say, Alarming Others”, The
Wall Street Journal, 15 de novembro de 1996).
Claramente, tais declarações, feitas em 1996, na verdade não
marcaram o fim dos ciclos. Em vez disso, houve uma recessão
modesta em 2001 e, em seguida, apenas alguns anos depois, a
Grande Recessão de 2008–2009, o evento cíclico mais poderoso já
experimentado pela maioria das pessoas atualmente vivas.
Em “Will It Be Different This Time?”, continuei a citar uma série de
afirmações semelhantes de outros líderes respeitados:
“Não haverá nenhuma interrupção na atual prosperidade.”
“Não posso deixar de levantar uma voz dissidente para as
declarações de que… a prosperidade neste país deve
necessariamente diminuir e retroceder no futuro.”
“Estamos apenas no começo de um período que vai entrar
para a história como a era de ouro.”
“Os negócios do país… estão assentados em uma base
sólida e próspera.”
Ao avaliar a razoabilidade dessas declarações, é importante
observar sua proveniência: respectivamente, pelo presidente da
Pierce-Arrow Motor Car Company, pelo presidente da Bolsa de
Valores de Nova York, pelo presidente da Bush Terminal Company e
pelo presidente dos Estados Unidos. Os cargos do primeiro e do
terceiro devem servir como uma indicação de que tais declarações
vieram de um passado distante, mesmo sem você saber que o
presidente em questão era Herbert Hoover. A época histórica
dessas declarações em 1928 e 1929 — à beira da Grande
Depressão que assolou o mundo por mais de uma década — foi
menos do que auspicioso. Tanto, pensei, para a prosperidade sem
desaceleração quanto para o fim da ciclicidade.
Mas então, na década de 2000, a expectativa de “prosperidade
permanente” voltou a surgir. Apesar de não argumentar
especificamente que não haveria mais ciclos, muitos investidores,
banqueiros e gente da mídia certamente abraçaram a crença de que
o risco desaparecera — o que, em essência, era a mesma coisa.
Em sua autobiografia, Stress Test (“Teste de Estresse”, em
tradução livre), o ex-secretário do Tesouro Tim Geithner descreve o
clima ao chegar ao Fed em 2003:
Os economistas estavam começando a debater se o longo
período de estabilidade dos Estados Unidos constituía um
novo normal, uma Grande Moderação, uma era quase
permanente de resiliência a choques. Havia uma crescente
confiança de que os derivativos e outras inovações
financeiras destinadas a proteger e distribuir riscos — ao lado
de uma melhor política monetária para responder a
desacelerações e melhor tecnologia para suavizar os ciclos
de estoque — tornaram as crises devastadoras uma coisa do
passado.
O fato de que essa prosperidade alegadamente permanente
recebeu um nome como “a Grande Moderação” sugere que ela
havia entrado na consciência popular. Com isso, foi atendido um de
meus requisitos para um ambiente mais arriscado possível: quando
grassa a crença de que não há risco. Nas páginas 123–125,
descrevi os relatos da mídia para esse efeito que enumeravam as
forças que haviam causado a eliminação do risco: omnisciência do
Fed, a ininterrupta demanda dos países ricos por títulos e as mais
recentes invenções de Wall Street.
Todas essas afirmações de que os “ciclos acabaram” não só
estavam erradas, como é muito importante notar que cada uma
delas coincidiu com — e certamente contribuiu para — a marcha
ascendente para uma alta cíclica. E que os eventos que se
seguiram a essas altas seriam excepcionalmente dolorosos: a
Grande Depressão de 1929–1939, um declínio de três anos no
mercado de ações em 2000–2002 (o primeiro declínio desde 1929)
e a Crise Financeira Global de 2007–2008.
Em “Will It Be Different This Time?”, continuei lembrando as
declarações de Poliana citadas apenas para ilustrar o que penso
serem as conclusões essenciais sobre este assunto:
É claro, o que essas observações assinalavam não era que
os ciclos não se repetiriam, mas, sim, que os espectadores
haviam ficado confiantes demais. Os ciclos nas economias,
nas empresas e nos mercados continuarão a ocorrer pelo
menos enquanto as pessoas estiverem envolvidas na tomada
de decisões-chave — o que, acredito, significa para sempre.
…Há um momento certo para argumentar que as coisas
serão melhores, e é aí que o mercado está em segundo plano
e todo mundo está vendendo coisas a preços de bazar de
caridade. É perigoso, quando o mercado opera em níveis
recordes, alcançar uma racionalização positiva que nunca foi
verdadeira no passado. Mas isso já foi feito antes e será feito
novamente.
“Desta vez é diferente” são quatro das palavras mais perigosas no
mundo dos negócios, em especial quando aplicadas, como é
comum, a algo que atingiu o que em tempos anteriores teria sido
chamado de extremo.
Quando as pessoas dizem “é diferente” neste caso, querem, na
verdade, dizer que as regras e os processos que produziram ciclos
no passado foram suspensos. Mas o comportamento cíclico do
passado financeiro não resultou da operação de regras físicas ou
científicas. Na ciência, causa e efeito desfrutam de um
relacionamento confiável e recorrente, de modo que é possível dizer
com confiança “se A, então B”. Mas, embora existam alguns
princípios que operam no mundo das finanças e dos negócios, a
verdade resultante difere muito da ciência.
A razão para isso — volto a bater na mesma tecla — é o
envolvimento das pessoas. As decisões que elas tomam têm grande
influência nos ciclos econômicos, comerciais e de mercado. Na
realidade, economias, negócios e mercados consistem em nada
além de transações entre pessoas. E as decisões das pessoas não
são tomadas cientificamente.
Algumas pessoas levam em conta a história, os fatos e os dados,
e outras abordam suas decisões como “homens econômicos”.
Porém, mesmo os mais estoicos e desprovidos de emoção entre
eles estão sujeitos às influências humanas e à perda da
objetividade.
Richard Feynman, o conhecido físico, escreveu: “Imagine quão
mais difícil seria a física se os elétrons tivessem sentimentos!” Isto
é, se os elétrons tivessem sentimentos, não se poderia dar como
certo que sempre fariam o que a ciência espera deles, e então as
regras da física funcionariam apenas em parte do tempo.
A questão é que as pessoas têm sentimentos e, como tal, não
estão sujeitas a leis invioláveis. Elas sempre trarão emoções e
fraquezas às suas decisões econômicas e de investimento.
Consequentemente, se tornarão eufóricas ou desanimadas na hora
errada — exagerando o potencial de crescimento quando as coisas
vão bem, e o risco de queda quando as coisas vão mal — e,
portanto, seguirão a tendência a extremos cíclicos.
Alguns parágrafos de The Most Important Thing fornecem uma
boa base para uma recapitulação dos principais pontos sobre a
persistência dos ciclos:
A razão básica para a ciclicidade em nosso mundo é o
envolvimento dos humanos. Artefatos mecânicos podem
seguir em linha reta. O tempo segue em frente
continuamente. Assim se dá com uma máquina quando
adequadamente posta em ação. Mas os processos em
campos como história e economia envolvem pessoas, e
quando pessoas estão envolvidas, os resultados são variáveis
e cíclicos. A principal razão para isso, penso eu, é que as
pessoas são emocionais e inconsistentes, não estáveis e
lógicas.
Os fatores objetivos, obviamente, desempenham um papel
nos ciclos — fatores tais como relações quantitativas, eventos
mundiais, mudanças ambientais, desenvolvimentos
tecnológicos e decisões corporativas. Contudo, é a ação da
psicologia nessas coisas que faz com que os investidores
reajam de forma exagerada ou insuficiente, determinando,
assim, a amplitude das flutuações cíclicas.
Quando as pessoas se sentem bem com o andar da
carruagem e otimistas sobre o caminho à frente, seu
comportamento é fortemente impactado. Elas gastam mais, e
economizam menos. Tomam emprestado para desfrutar mais
ou aumentar seu potencial de lucro, mesmo precarizando sua
condição financeira (é claro que conceitos como precariedade
são esquecidos em tempos otimistas). E se dispõem a pagar
mais pelo valor atual ou por um pedaço do futuro.
Os investidores tendem a olhar para os processos em andamento,
atribuir dependência mecânica a eles, confiar nisso e extrapolar os
processos. E negligenciam o papel das emoções: ganância na
recuperação e medo na recessão.
As emoções operam nos ciclos de duas maneiras: ampliam as
forças que levam a extremos que em algum momento requerem
correção, e fazem com que os participantes do mercado ignorem a
ciclicidade exatamente quando reconhecer os excessos é mais
essencial e mais potencialmente lucrativo: estágio três dos
mercados de alta e baixa descritos nas páginas 197 e 198–199.
A seguinte passagem de The Most Important Thing pode servir
para resumir as perspectivas de recorrência dos ciclos:
Ciclos nunca vão parar de ocorrer. Só deixariam de existir (ou
pelo menos seus extremos) se houvesse algo como um
mercado completamente eficiente, e se as pessoas realmente
tomassem decisões calculadas, isentas de emoção. Mas isso
jamais acontecerá.
Em uma economia, a alternância entre expansão e
contração depende do maior ou menor gasto dos
consumidores, que respondem emocionalmente a fatores
econômicos ou eventos exógenos, geopolíticos ou naturais.
As empresas projetarão um futuro promissor durante o ciclo
ascendente e, portanto, ampliarão demais as instalações e os
estoques; estes se tornarão onerosos quando a economia
cair. Os provedores de capital serão muito generosos quando
a economia estiver indo bem, favorecendo o crescimento
excessivo com dinheiro barato, e pisarão no freio quando as
coisas deixarem de parecer tão boas. Os investidores
supervalorizam as empresas nos tempos bons, e as
desvalorizam nos momentos difíceis…
Ignorar ciclos e extrapolar tendências é uma das coisas
mais perigosas que um investidor pode fazer. As pessoas
muitas vezes agem como se as empresas prósperas fossem
continuar sempre assim, e os investimentos com performance
superior manterão esse ritmo ad eternum, e vice-versa. Na
verdade, o mais provável é que ocorra o oposto.
Uma profunda compreensão das emoções e do excesso que elas
induzem é um dos principais tópicos deste livro. Desvios cíclicos da
linha de tendência derivam em grande parte do excesso e sua
respectiva correção. Tal fato é obviamente verdadeiro nos mercados
de valores mobiliários, que nada mais são do que uma coleção de
pessoas que tomam decisões (muitas vezes de maneira semelhante
a um rebanho) que, esperam, serão rentáveis. Mas não é menos
verdadeiro nas economias e empresas: elas podem parecer
máquinas autônomas e bem azeitadas, mas também nada mais são
mais que grupos de pessoas tomando decisões, com tudo o que
isso implica.
Na primeira vez que investidores iniciantes se deparam com
esse fenômeno, é compreensível que aceitem que algo que
nunca tenha acontecido antes — o fim da ciclicidade — possa
acontecer. Mas na segunda ou terceira vez, esses
investidores, agora experientes, devem perceber o equívoco e
transformar esse conhecimento em vantagem.
Da próxima vez que você topar com uma negociação
baseada em ciclos que deixaram de ocorrer, lembre-se de
que, invariavelmente, é uma aposta perdida. (The Most
Important Thing)
Em 1968, aos 22 anos, eu era um novato no que se referia a
investimento quando soube do Nifty Fifty. Pessoas muito mais
experientes que eu defendiam a grandeza das empresas, seu
potencial ilimitado de crescimento, o fato de que nada de ruim
poderia acontecer com elas e, portanto, a ausência de qualquer
limite nos preços de suas ações. Engoli essas histórias; de qualquer
modo, não me lembro de ter insistido na ilogicidade dessa defesa
tão intensa. Assim, tive a sorte de aprender minhas primeiras lições
sobre ciclicidade, valor e risco em tenra idade e com relativamente
pouca aposta em conceitos errôneos.
Já era um pouco menos ingênuo quando organizei a resposta do
Citibank ao embargo de petróleo árabe de 1973, ocasião em que o
preço do petróleo passou de US$20 o barril para US$60, e os
analistas do setor de energia perceberam poucos entraves à
continuidade dos aumentos. E também quando, em 1980, as
maravilhas dos computadores levaram à formação de muito mais
empresas de disquetes do que seria necessário.
Porém, mais tarde, com algumas décadas de experiência,
consegui reconhecer os excessos das bolhas tecnológicas, da
internet e do e-commerce do final da década de 1990, e do
inquestionável comportamento do mercado de capitais que acabou
se tornando a Crise Financeira Global de 2007–2008. Esse
processo de aprendizado sobre os excessos nos mercados — e sua
contribuição para os ciclos — é uma parte indispensável da
educação de todos os investidores.
A tendência das pessoas para o excesso nunca acabará. E assim,
porque esses excessos em algum momento serão corrigidos, e
cessará a ocorrência de ciclos. As economias e os mercados nunca
se moveram em linha reta no passado nem o farão no futuro. Isso
significa que os investidores com capacidade de entender ciclos
encontrarão oportunidades de lucro.
XVIII
A ESSÊNCIA DOS CICLOS
Concluirei juntando alguns dos parágrafos do livro que acho
que detêm as chaves para entender os ciclos, sua gênese e
como eles devem ser tratados. Eu os alterarei apenas quando
necessário para deixá-los ficar isolados aqui, fora de contexto.
Este não será um resumo do livro, mas, sim, uma
recapitulação de algumas de suas principais observações. (E
para aqueles que desejarem, ler apenas as frases destacadas
fornecerá uma boa sinopse da recapitulação.)
O
H.M.
sucesso do investimento é como escolher um ganhador da
loteria. Ambos são determinados por um bilhete (o resultado)
sendo retirado de uma urna (toda a gama de resultados possíveis).
Em cada caso, um resultado é escolhido dentre as muitas
possibilidades.
Investidores superiores são pessoas que têm uma noção melhor
de quais bilhetes estão na urna e, portanto, se vale a pena participar
da loteria. Em outras palavras, ainda que os investidores superiores
— como qualquer um — não saibam exatamente o que o futuro
reserva, eles têm uma compreensão acima da média sobre as
tendências futuras. (página 14)
As chances variam de acordo com nossa posição nos ciclos. Se não
alteramos nossa postura de investimento conforme as coisas
mudam, estamos sendo passivos em relação aos ciclos. Em outras
palavras, estamos ignorando a chance de inclinar as probabilidades
a nosso favor. Porém, se obtivermos algum insight sobre os ciclos,
podemos aumentar nossas apostas e colocá-las em investimentos
mais agressivos quando as probabilidades estão a nosso favor, e
podemos ficar mais cautelosos e aumentar nossa postura defensiva
quando as probabilidades estão contra nós. (página 21)
Acredito que a melhor maneira de otimizar o posicionamento de um
portfólio em um dado ponto no tempo é decidir como balancear
agressividade e defensividade. Penso que a relação entre posições
mais agressivas e mais defensivas deve ser ajustada ao longo do
tempo, em resposta a mudanças no estado do ambiente de
investimento e onde houver uma série de elementos em seus ciclos.
A palavra-chave é “calibrar”. O valor investido, a alocação de
capital entre as várias possibilidades e o grau de risco das
coisas que se possui devem ser calibrados ao longo de um
continuum que vai de agressivo a defensivo… Quando for
barato, devemos ser agressivos; quando for caro, devemos
recuar. (“Yet Again?”, setembro de 2017)
Calibrar a posição de um portfólio é o assunto principal deste livro.
(página 12)
O que de fato importa é que, no mundo em que os investidores
habitam, ciclos sobem e descem, e pêndulos balançam de lá para
cá. Ciclos e oscilações de pêndulos vêm em muitas formas e se
relacionam com uma ampla variedade de fenômenos, mas as
razões subjacentes a eles — e os padrões que produzem — têm
muito em comum, e eles tendem a ser relativamente consistentes ao
longo do tempo. Ou, como Mark Twain tem a fama de ter dito
(embora não haja provas da veracidade disso), “a história não se
repete, mas rima”.
Quer Twain a tenha cunhado, quer não, essa frase resume muito
do que este livro trata. Os ciclos variam em termos de motivos e
detalhes, e em tempo e extensão, mas os altos e baixos (e as
razões para eles) ocorrerão sempre, produzindo mudanças no
ambiente de investimento e, portanto, no comportamento exigido.
Em meus desenhos, a linha central representa um ponto médio
em torno do qual o ciclo oscila. Às vezes ela tem uma direção
subjacente ou uma tendência secular (“secular” no sentido de — ou
relacionado a — um longo período de duração indefinida), e isso
geralmente é ascendente. Assim, com o tempo e em longo prazo, as
economias tendem a crescer, os lucros das empresas tendem a
aumentar, e (em grande parte por causa disso) os mercados tendem
a crescer. E se esses desenvolvimentos forem científicos ou
totalmente naturais, processos físicos, economias, empresas e
mercados podem progredir em linha reta e a uma taxa constante
(pelo menos por um tempo). Mas claro, aqueles não são, então
estes também não se comportarão assim.
O fato é que o desempenho dessas coisas é fortemente
influenciado no curto prazo, entre outros fatores, pelo envolvimento
de pessoas, e pessoas estão longe de ser estáveis. Ao contrário,
elas de vez em quando alternam seu comportamento, em muitas
ocasiões em virtude do que podemos colocar sob o título amplo de
“psicologia”. Assim, o modo de ser das pessoas varia, certamente,
como o ambiente varia, mas às vezes também na ausência de
mudanças no ambiente. (páginas 25)
Ciclos oscilam, como mencionei, ao redor do ponto médio. Este é
geralmente considerado como tendência secular, norma, meio,
média ou meio termo e, de certo modo, é tido como “correto e
apropriado”. Os extremos do ciclo, por outro lado, são considerados
como aberrações ou excessos a serem excluídos, e geralmente são.
Embora o conjunto de eventos responsável pela oscilação dos ciclos
tenha a tendência de ficar muito tempo acima ou abaixo do ponto
médio, a regra geral é a de que o movimento, por fim, toma o rumo
de volta em direção à média. O movimento de um extremo alto ou
baixo rumo ao meio é frequentemente descrito como “regressão ao
meio”, uma tendência poderosa e muito razoável na maioria das
esferas da vida. Porém, lembrando os estágios do ciclo listados
anteriormente, também pode ser dito que o padrão cíclico
usualmente consiste tanto de um movimento a partir do razoável
ponto médio até um extremo potencialmente imprudente (estágios b,
e, h no gráfico anterior) quanto no sentido oposto, partindo de um
extremo e indo de volta para o ponto médio (a, d, g).
O ponto médio racional geralmente exerce uma espécie de
atração magnética, fazendo com que as coisas responsáveis pela
oscilação promovam um movimento de retorno de um dos extremos
que segue na direção do “normal”. Mas geralmente a permanência
no normal não dura muito tempo, pois aquelas mesmas influências
continuam em vigor e, assim, fazem com que a oscilação a partir de
um extremo ultrapasse o ponto médio, indo em direção ao extremo
oposto.
É importante reconhecer e aceitar a confiabilidade desse padrão.
Os detalhes variam — tempo, duração, velocidade e força das
oscilações e, muito importante, as razões para eles —, e é provável
que estejam por trás do comentário de Twain sobre a história que
não se repete. Já a dinâmica subjacente é geralmente semelhante.
(páginas 28–29)
Os temas que fornecem sinais de alerta em cada
expansão/contração são os gerais: o otimismo excessivo é algo
perigoso, a aversão ao risco é um ingrediente essencial para o
mercado ser seguro, e mercados de capitais excessivamente
generosos acabam levando a um financiamento imprudente e,
portanto, a colocar os participantes em perigo.
Em suma, detalhes não são importantes e podem ser irrelevantes.
Temas, porém, são essenciais e tendem a se repetir. Entender essa
tendência — e ser capaz de identificar as recorrências — é um dos
elementos mais importantes para lidar com os ciclos. (página 37)
Quanto mais se distanciam do ponto médio, mais os ciclos têm
potencial para causar estragos — ou seja, quanto maiores forem as
aberrações ou excessos. Se a oscilação em direção a um extremo
for mais longe, provavelmente será mais violenta, e mais danos
provavelmente ocorrerão, já que as ações encorajadas pelas
condições do ciclo em um extremo se mostram inadequadas para a
vida em outras partes do ciclo.
Em outras palavras, o potencial de destruição cresce à medida
que o movimento para longe do ponto médio aumenta: ou seja,
conforme as economias e as empresas “vão se dando muito bem”, e
os preços das ações “vão ficando muito altos”. Avanços são
seguidos por meras correções e altos e baixos dos mercados. Mas
booms e bolhas têm como consequência quebras, falências e
pânico. (página 29)
A maioria das pessoas pensa em ciclos em termos das etapas
listadas anteriormente e os reconhece como uma série de eventos.
E entendem que tais eventos seguem um ao outro com regularidade
e em uma sequência usual: movimentos ascendentes são seguidos
por movimentos de contração/recessão, e, por fim, por novos
movimentos ascendentes.
Mas isso não é suficiente para que se tenha uma compreensão
completa dos ciclos. Os eventos na vida de um ciclo não devem ser
vistos apenas como cada um causando pelo próximo. (página 31)
As coisas que chamo de ciclos não se originam completamente —
ou às vezes de forma alguma — da ocorrência de processos
mecânicos, científicos ou físicos. Eles seriam muito mais confiáveis
e previsíveis se o fizessem, mas muito menos potencialmente
lucrativos. (Isso ocorre porque os maiores lucros vêm de ver as
coisas melhor do que os outros, e se os ciclos fossem totalmente
confiáveis e previsíveis, não haveria superioridade em percebê-los.)
Às vezes há um princípio subjacente (e às vezes não), mas muita
variação é atribuível ao papel dos seres humanos na criação de
ciclos, pois suas tendências induzidas por emoções e psicologias
exercem influência sobre os fenômenos cíclicos. Chance ou
aleatoriedade também desempenham um papel importante em
alguns ciclos, e o comportamento humano contribui para sua
existência. Humanos são uma grande parte da razão pela qual
esses ciclos existem, mas também — junto da aleatoriedade — por
sua inconsistência e, portanto, sua falta de confiabilidade.
O esforço para explicar a vida por meio do reconhecimento de
padrões — e, assim, chegar a fórmulas vencedoras — é
complicado, em grande parte porque, como já mencionei, vivemos
em um mundo assediado pela aleatoriedade e em que as pessoas
não se comportam da mesma maneira mesmo quando pretendem.
A percepção de que os eventos passados foram em grande parte
afetados por essas coisas — e, portanto, que os eventos futuros não
são totalmente previsíveis — é desagradável, pois torna a vida
menos sujeita à antecipação, à criação de regras e à segurança.
Assim, as pessoas buscam explicações que tornem os eventos
compreensíveis… muitas vezes além do que é apropriado. Isso é
tão verdadeiro em investir como em outros aspectos da vida.
(páginas 41–42)
Por que o pêndulo é importante? Em essência, as acentuadas
oscilações ascendentes e descendentes dos ciclos que estou
cobrindo neste livro resultam em grande parte de (e representam)
excessos psicológicos em ação.
Nos ciclos de negócios, financeiros e de mercado, a maioria dos
excessos no lado positivo — e as inevitáveis reações no lado
negativo, que também tendem a exceder — resultam de oscilações
exageradas do pêndulo da psicologia. Desse modo, compreender e
estar atento a oscilações excessivas é requisito básico para evitar
danos causados pelos extremos cíclicos e, com sorte, para lucrar
com eles.
As normas em termos de crescimento e apreciação são, em certo
sentido, “corretas” e “saudáveis”. E se todos se comportassem de
acordo com essas normas — em vez de ocasionalmente esperar
por mais e, assim, preparar o terreno para mudanças em direção a
menos —, o mundo seria um lugar mais estável, menos conturbado
e menos propenso a erros. Mas essa não é a natureza das coisas.
(páginas 88–89)
Tudo parece muito óbvio: os investidores raramente mantêm
posições objetivas, racionais, neutras e estáveis. Primeiro
exibem um elevado grau de otimismo, ganância, tolerância ao
risco e credulidade, e seu consequente comportamento faz
com que os preços dos ativos subam, os retornos potenciais
caiam, e o risco aumente. Mas, então, por alguma razão —
talvez a chegada de um ponto crítico —, eles mudam para
pessimismo, medo, aversão ao risco e ceticismo, e com isso
os preços dos ativos caem, os retornos prospectivos
aumentam, e o risco diminui. E o que é notável: cada grupo
de fenômenos tende a acontecer em uníssono, e a oscilação
de um lado para o outro muitas vezes vai muito além do que a
razão pode exigir.
Trata-se de algo muito louco: no mundo real, as coisas
geralmente ficam entre o “mais ou menos bom” e o “nem
tanto”. Mas no planeta investimento, a percepção
frequentemente flutua de “tudo perfeito” para “sem
esperança”. O pêndulo viaja de um extremo ao outro, quase
sem parar no “ponto médio feliz” e muito pouco ao alcance da
racionalidade. Primeiro, a negação; depois, a capitulação.
(página 99)
Quando o balanço do pêndulo o leva a qualquer um dos pontos
extremos, um processo pode ter a aparência de um círculo virtuoso
ou de um círculo vicioso. Se os eventos são predominantemente
positivos e a psicologia é cor-de-rosa, os desenvolvimentos
negativos tendem a ser negligenciados, tudo é interpretado
favoravelmente, e muitas vezes se pensa que as coisas são
incapazes de piorar.
Mas há o outro lado da moeda: quando tudo vai mal por meses ou
anos e a psicologia é altamente negativa, o que pode ser esquecido
é o potencial de melhoria.
O investidor superior — que resiste a influências externas,
permanece emocionalmente equilibrado e age de modo racional —
percebe eventos positivos e negativos, pesa-os com objetividade e
os analisa desapaixonadamente. O fato, porém, é que às vezes a
euforia e o otimismo fazem com que a maioria dos investidores veja
as coisas de forma mais positiva do que seria justificável, e às vezes
a depressão e o pessimismo os fazem ver apenas coisas ruins e
interpretar eventos com um tom negativo. Recusar-se a reagir assim
é uma das chaves para um investimento bem-sucedido.
Normalmente, a ascensão em direção a qualquer um dos
extremos é prontamente observável, e, portanto, as implicações
para os investidores devem ser óbvias para os observadores
objetivos. Mas, é claro, a oscilação do pêndulo do mercado para um
extremo ou outro ocorre pela simples razão de que a psique da
maioria dos participantes do mercado está se movendo na mesma
direção, em um estilo parecido com o de um rebanho. (páginas 101–
102)
Minha opinião de que o risco é a principal peça móvel no
investimento me faz concluir que, em qualquer momento, o modo
como os investidores coletivamente enxergam os riscos e se
comportam em relação a eles é de vital importância na formação do
ambiente de investimento em que nos encontramos. E o estado do
ambiente é fundamental para determinar como nos comportar em
relação ao risco em tal momento. A avaliação de onde estão as
atitudes em relação ao risco em seu ciclo é o tema deste capítulo —
talvez o mais importante deste livro. (página 107)
Nos bons tempos, as pessoas ficam mais otimistas, abandonam a
cautela e aceitam prêmios de risco baixos em investimentos
arriscados. Além disso, menos pessimistas e menos temerosos,
tendem a perder o interesse pelo trecho mais seguro do continuum
risco/retorno. Essa combinação de elementos leva os preços dos
ativos de risco a subirem em relação aos ativos mais seguros.
Assim, não é de admirar que investimentos mais imprudentes sejam
feitos mais em momentos bons do que em ruins. Isso acontece
mesmo que os preços mais altos em investimentos arriscados
possam significar que os prêmios de risco prospectivos, oferecidos
para tornar esses investimentos mais arriscados, são mais
acanhados do que em tempos de maior consciência sobre o risco. E
quando ocorrem eventos negativos, a falta de prêmios de risco
adequados e a margem de erro mostram que não houve prudência
nos investimentos.
Daí se segue que o risco é alto quando os investidores sentem
que ele é baixo. E a compensação de risco é mínima se o risco está
no máximo (justo quando a compensação de risco é mais
necessária). É demais para o investidor racional!
Para mim, a conclusão de tudo isso é que a maior fonte de risco
de investimento é a crença de que não há risco. A tolerância
generalizada ao risco — ou um elevado grau de conforto do
investidor em relação ao risco — é o maior precursor dos
subsequentes declínios do mercado. Porém, como a maioria dos
investidores segue a progressão descrita antes, isso raramente é
percebido no momento em que percebê-la — e tornar-se cauteloso
— é mais importante. (página 117)
Assim como a inadequação de sua aversão ao risco lhes permitia
empurrar os preços para cima e comprar na alta — hipnotizados
pela visão de dinheiro fácil em um mundo no qual não podiam
visualizar qualquer risco —, agora eles jogam os preços para baixo
e vendem quando o mercado está no fundo do poço. A experiência
recente e desagradável deles os convence — ao contrário do que
pensavam quando tudo estava indo bem — de que o investimento é
um campo arriscado no qual não deveriam ter entrado. E, como
consequência, sua aversão ao risco vai de inadequada a excessiva.
Eles tornam-se extremamente preocupados. Do mesmo modo que
a tolerância ao risco os posicionou como compradores de ativos
cujos preços estavam nas nuvens, agora sua gritante aversão ao
risco faz deles vendedores — certamente não compradores — no
chão do mercado. (páginas 118–119)
Em pânico, as pessoas passam 100% do tempo garantindo que não
haja perdas… quando deveriam se preocupar em perder grandes
oportunidades.
Em épocas de extremo negativismo, uma exagerada aversão ao
risco provavelmente fará com que os preços afundem e perdas
adicionais sejam altamente improváveis: o risco de perda, portanto,
é mínimo. Como já indiquei anteriormente, a coisa mais arriscada do
mundo é a crença de que não há risco. Da mesma forma, o
momento mais seguro (e mais recompensador) de comprar
geralmente é aquele em que todos estão convencidos de que a
esperança morreu. (páginas 137–138)
Como as atitudes de risco oscilam de alto para baixo, o mesmo
acontece com as oportunidades de lucro ou perda. Na bonança, os
preços dos ativos estão subindo, os investidores veem o futuro com
óculos cor-de-rosa, arriscam-se como seus amigos e lucram com
facilidade. Todos sentem o mesmo, o que significa que pouca
aversão ao risco é incorporada nos preços e, portanto, eles são
precários. Os investidores tornam-se tolerantes ao risco justamente
quando deveriam aumentar sua aversão a ele.
Analogamente, mercados em baixa, investidores idem. Os
mercados são tidos como um lugar para perder dinheiro, o risco
como algo a ser evitado a todo custo, e as perdas são
desoladamente prováveis. Como descrevi no final do último capítulo,
na prevalência de um excesso de cautela, ninguém (a) aceitará
possibilidades cercadas de qualquer otimismo e (b) admitirá a
eventualidade de que uma suposição possa ser “ruim demais para
não ser verdade”.
Assim como a tolerância ao risco é ilimitada no topo, é inexistente
na parte inferior. Essa negatividade faz com que os preços caiam
para níveis em que as perdas são altamente improváveis, e os
ganhos possam ser enormes. Mas as cicatrizes das quedas
anteriores tendem a ampliar a aversão ao risco dos investidores,
imobilizando-os bem quando preços e risco estão em seu nível mais
baixo. (página 120)
Ter ciência de como os investidores estão pensando e lidando com
o risco é talvez a coisa mais importante para se propor a ter. Em
suma, a excessiva tolerância ao risco contribui para a criação de
perigos, e a oscilação para a excessiva aversão ao risco deprime os
mercados, criando algumas das maiores oportunidades de compra.
A flutuação — ou inconstância — nas atitudes em relação ao risco
é consequência tanto do resultado de alguns ciclos quanto da causa
ou exacerbação de outros. E isso sempre vai continuar, já que
parece ser difícil para a maioria das pessoas se tornarem mais
otimistas e tolerantes a riscos quando as coisas estão indo bem, e
depois, quando tudo passa a andar mal, mais preocupadas e
avessas ao risco. Isso significa que elas estão mais dispostas a
comprar quando deveriam ser mais cautelosas e mais relutantes em
comprar quando deveriam ser mais agressivas. Investidores
superiores sabem disso e esforçam-se para agir no sentido
contrário. (páginas 139–140)
Alterações na disponibilidade de capital ou crédito são uma das
influências mais basilares nas economias, empresas e mercados.
Embora o ciclo de crédito seja menos conhecido do homem comum
do que a maioria dos outros ciclos discutidos neste livro, considero
ser ele de suma importância e profunda influência.
Quando a janela está aberta, o financiamento é abundante e fácil
de obter; se está fechada, o financiamento é escasso e difícil de
conseguir. Por fim, é essencial ter sempre em mente que a janela
pode passar de aberta a fechada em apenas um instante. Há muito
mais para entender completamente esse ciclo — incluindo as razões
para esses movimentos cíclicos e seu impacto —, mas esse é o
objetivo. (página 143)
Prosperidade amplia a oferta de crédito, ocasionando empréstimos
imprudentes; estes produzem grandes perdas, levando os
emprestadores a se retraírem, acabando com a prosperidade; e por
aí vai. (página 148)
Procurar a causa de um mercado radicalizado normalmente requer
rebobinar a fita cassete do ciclo de crédito por alguns meses ou
anos. A maioria dos mercados em alta é incentivada por um
aumento na disposição de fornecer capital, geralmente ignorando a
prudência. Da mesma forma, a maioria dos colapsos é precedida
por uma recusa indiscriminada em financiar certas empresas,
setores de atividade ou toda a variedade de potenciais tomadores
de empréstimos. (página 153)
A chave para lidar com o ciclo de crédito está em reconhecer que
ele atinge seu ápice quando as coisas vão bem por um tempo, as
notícias estão boas, a aversão ao risco está baixa e os investidores
estão ansiosos. Isso torna mais fácil para os tomadores de
empréstimo levantar dinheiro e faz com que compradores e
investidores disputem entre si a oportunidade de fornecê-lo. Daí
resultam financiamentos baratos, baixos padrões de crédito,
negócios pouco sólidos e imprudente ampliação do crédito. São os
mutuários que dão as cartas quando a janela de crédito está aberta
— não quem concede o empréstimo ou investe. As implicações de
tudo isso devem ser óbvias: vá com cautela.
Exatamente o oposto torna-se verdadeiro no outro extremo do
ciclo de crédito. Seu ponto mais baixo é atingido quando os
acontecimentos são desagradáveis, a aversão ao risco aumenta e
os investidores ficam deprimidos. Sob tais circunstâncias, ninguém
quer fornecer capital, o mercado de crédito congela e propostas
implorarão para serem aceitas. Isso coloca as cartas nas mãos dos
provedores de capital, em vez dos tomadores de empréstimo.
Como o endividamento é difícil e o capital geralmente não está
disponível, aqueles que o possuem e estão dispostos a participar
podem exigir padrões mais rigorosos, insistir em fortes estruturas de
empréstimo e cláusulas de proteção e demandar retornos
prospectivos elevados. São coisas como essas que fornecem a
margem de segurança necessária para um investimento superior.
Quando esses fatores estão postos, os investidores devem entrar
em um modo agressivo.
O investimento superior não é caracterizado pela compra de ativos
de alta qualidade, mas por comprar quando o negócio é bom, o
preço é baixo, o retorno potencial é substancial e o risco é limitado.
Tais condições são muito mais comuns quando os mercados de
crédito estão na parte menos eufórica e mais rigorosa de seu ciclo.
A fase de “portas fechadas” do ciclo de crédito provavelmente faz
surgir mais barganhas do que qualquer outro fator isolado. (página
165)
Os méritos do ativo em questão importam muito, mas certamente
não podem ser fortes o suficiente para sempre ganhar o dia. A
emoção humana inevitavelmente faz com que os preços dos ativos
— mesmo os que valem a pena — sejam deslocados para níveis
extremos e insustentáveis: ou vertiginosamente altos ou
excessivamente baixos.
Resumindo, crer de modo consciencioso na inevitabilidade dos
ciclos, como estou pedindo, significa que há certas palavras e frases
que devem ser excluídas do vocabulário do investidor inteligente:
“nunca”, “sempre”, “para sempre”, “não pode, “não será”, “não
deverá” e “tem que” e correlatos. (página 185)
No início dos anos 1970, ganhei um grande presente: um investidor
mais velho e mais sábio apresentou-me “os três estágios de um
mercado em alta”:
Primeiro estágio: apenas algumas poucas pessoas
bastante perspicazes acreditam que as coisas melhorarão.
Segundo estágio: a maioria dos investidores percebe que
a melhoria está realmente ocorrendo.
Terceiro estágio: todos concluem que tudo será sempre
melhor.
Isso abriu meus olhos para os extremos psicológicos a que os
investidores podem chegar, bem como para o impacto desses
extremos nos ciclos de mercado. Como muitas das grandes citações
e adágios, poucas palavras encerram imensa sabedoria quanto às
atitudes: sua mutabilidade, seu padrão ao longo de um ciclo e sua
contribuição para o erro.
No primeiro estágio, porque a possibilidade de melhoria é invisível
para a maioria dos investidores e, portanto, pouco valorizada, os
preços dos títulos incorporam pouco ou nenhum otimismo. É comum
o primeiro estágio ocorrer após um declínio incidental dos preços, e
a mesma tendência de baixa que dizimou os preços afeta
negativamente a psicologia da multidão, que se coloca contra o
mercado e jura nunca mais investir.
No último estágio, por outro lado, como tudo vinha correndo bem
há muito tempo, os reflexos tão acentuados nos preços dos ativos
elevam ainda mais o bom humor do mercado. Com isso, os
investidores acabam extrapolando a melhoria para o infinito e
aumentam os preços para refletir seu otimismo. Os investidores
agem como se o céu fosse o limite… e pagam pelo potencial
ilimitado que percebem. Poucas coisas são tão caras quanto pagar
por um potencial superestimado.
Segue-se do exposto que alguém que investe no primeiro estágio
— quando quase ninguém consegue ver uma razão para otimismo
— compra ativos a preços baixos, a partir dos quais é possível uma
apreciação substancial. Mas alguém que compra no terceiro estágio
invariavelmente sofre pelo entusiasmo excessivo do mercado e
acaba perdendo dinheiro.. (páginas 197–198)
A coisa mais importante a se notar é que o ponto máximo de
psicologia, a disponibilidade de crédito, o preço e risco e o retorno
potencial mínimo são alcançados ao mesmo tempo, e geralmente
esses extremos coincidem com o último paroxismo de compra.
(página 206)
Quando o último otimista joga a toalha e se está lá embaixo, na
antítese do “topo”, há a virada do ciclo de mercado. Nesse ponto,
vemos agora se juntarem o nadir da psicologia, uma total
incapacidade de acesso ao crédito, preços mínimos, retorno
potencial máximo e risco mínimo. (página 208)
Na crise financeira de 2007, a essa altura, com as generalizações
no lado negativo, a máquina de errar engatou marcha a ré. Nenhum
otimismo, só pessimismo. Nada de tolerância ao risco, apenas
aversão a ele. Nenhuma capacidade de ver pontos positivos,
somente negativos. Vontade alguma de interpretar as coisas de
forma positiva, muito ao contrário. Bons resultados eram
inimagináveis. No horizonte, só os ruins. (página 240)
Para começo de conversa, o que é fundo do poço? É o ponto no
qual os preços mais baixos do ciclo são atingidos. Pode-se dizer
que ele é alcançado no dia em que o último investidor, em pânico,
vende o que tem, ou o último dia em que os vendedores
predominam em relação aos compradores. A partir do fundo, os
preços sobem, já que não há detentores de capital para capitular e
vender, ou porque os compradores agora estão mais decididos a
comprar do que os vendedores a vender.
Quando um mercado está desabando, os investidores podem
ouvir dizer: “Não dá para saber se chegamos ao fundo do poço”. Em
outras palavras, “A tendência é de queda, e não dá para adivinhar
quando isso vai deixar de acontecer. Então, por que deveríamos
comprar sem ter certeza de que o fundo foi alcançado?”
Mas o que eu acho que eles estão realmente dizendo é: “Estamos
com medo — em especial de comprar antes que o declínio cesse e,
portanto, de nos dar mal —, então vamos esperar até que o fundo
do poço seja alcançado, a poeira abaixe e a incerteza passe”. Mas
espero que a esta altura tenha deixado bem claro que quando a
poeira baixar e os nervos dos investidores se acalmarem, o bonde já
terá passado, levando com ele as oportunidades perdidas — as
pechinchas.
Geralmente é durante os escorregões do mercado que você pode
comprar as maiores quantidades daquilo que quer, de vendedores
que estão jogando a toalha e enquanto os que esperam o fundo do
poço chegar estão abraçando-se pelos cantos. Mas, uma vez que o
escorregão leva o mercado ao chão, por definição há poucos
vendedores para vender, e os compradores predominam. Assim, as
vendas entram em fase minguante, e os potenciais compradores
enfrentam uma crescente competição. (páginas 242–243)
Sair do mercado após um declínio — e, por conseguinte, não
participar de uma recuperação cíclica — é realmente o pecado
capital no investimento. Experimentar uma perda de marcação a
mercado na fase descendente de um ciclo não é fatal em si,
contanto que você se mantenha também na parte de cima, benéfica.
Converter essa flutuação descendente em uma perda permanente
ao vender no fundo do poço é realmente terrível.
Assim, compreender os ciclos e ter os recursos emocionais e
financeiros necessários para vivenciá-los é um ingrediente crucial no
sucesso do investimento. (página 245)
Se os fundamentos fossem o único parâmetro de cálculo do valor de
mercado, o preço de um título não flutuaria muito mais do que os
ganhos correntes de quem o emite e as perspectivas de ganhos no
futuro. Na verdade, o preço deveria, de modo geral, flutuar menos
que os ganhos, pois as variações trimestrais nos lucros geralmente
se igualam no longo prazo, e, além disso, não refletem
necessariamente as mudanças reais no potencial de longo prazo da
empresa.
E, no entanto, os preços dos títulos usualmente flutuam muito
mais do que os ganhos. As razões, claro, são em grande parte
psicológicas, emocionais, e não ligadas aos fundamentos. Assim, as
mudanças de preço exageram sobremaneira as mudanças nos
fundamentos. (página 192)
A verdade é que fatos e números financeiros são apenas um
ponto de partida para o comportamento do mercado; a racionalidade
do investidor é a exceção, não a regra: no mercado fica-se pouco
tempo calmamente pesando dados financeiros e definindo preços
livres de emoções. (páginas 194–195)
A meta do investidor é posicionar o capital de modo a se beneficiar
de desenvolvimentos futuros. Ele deseja ter mais capital investido
em um mercado em alta do que quando o mercado cai, e possuir
mais das coisas que sobem mais ou caem menos, e menos das
outras. O objetivo é claro. A questão é como conseguir isso.Ausente
a capacidade de ver o futuro, como podemos posicionar nossos
portfólios para o que vem pela frente? Penso que grande parte da
resposta está na compreensão de onde o mercado está em seu
ciclo e o que isso implica em seus movimentos vindouros. Como
escrevi em The Most Important Thing, “talvez nunca saibamos para
onde estamos indo, mas é melhor ter uma boa ideia de onde
estamos”. (páginas 213–214)
Qual é o ponto-chave nisso tudo? Saber onde o pêndulo da
psicologia e o ciclo em avaliação estão em seus balanços. Recusarse a comprar — e talvez a vender — quando a psicologia
demasiadamente positiva e a vontade de atribuir avaliações
exageradas fazem com que os preços subam aos níveis máximos. E
comprar quando a psicologia se abate e o abandono de padrões de
avaliação, quando no lado negativo, fazem com que os investidores
em pânico ofereçam pechinchas vendendo, apesar dos baixos
preços. Como bem colocou Sir John Templeton: “Comprar quando
os outros estão vendendo e vender corajosamente quando os outros
estão gananciosamente comprando requer grande fortaleza e traz a
maior recompensa”. (páginas 215–216)
O ingrediente essencial aqui é a inferência, uma das minhas
palavras favoritas. Pela mídia, todos vemos o que acontece a
cada dia. Mas quantas pessoas se esforçam para entender o
que esses eventos cotidianos dizem sobre a psique dos
participantes do mercado, o clima de investimento e, portanto,
o que se deve fazer?
Simplificando, devemos nos esforçar para entender as
implicações do que está acontecendo ao nosso redor.
Quando os outros são imprudentemente confiantes e
compram agressivamente, é preciso ser muito cauteloso;
quando outros estão com medo de ficar inertes e, em pânico,
vendem de qualquer jeito, deve-se ser agressivo.
Os elementos psicológicos e emocionais que listei têm seu
principal impacto ao convencer os investidores de que os padrões
de avaliação do passado se tornaram irrelevantes. Quando os
investidores estão nas nuvens, ganhando dinheiro, acham fácil
encontrar razões convenientes pelas quais os ativos devem ser
desvinculados das restrições das normas de avaliação. A explicação
geralmente começa com “desta vez é diferente”. Fique atento a esse
sinal ameaçador da suspensão voluntária da descrença. Da mesma
forma, quando os preços dos ativos desabam, isso geralmente é
atribuído à suposição de que nada que se apoie em um valor do
passado pode ser confiável para funcionar no futuro. (páginas 220 e
221–222)
Quando as pessoas dizem “é diferente” neste caso, querem, na
verdade, dizer que as regras e os processos que produziram ciclos
no passado foram suspensos. Mas o comportamento cíclico do
passado financeiro não resultou da operação de regras físicas ou
científicas. Na ciência, causa e efeito desfrutam de um
relacionamento confiável e recorrente, de modo que é possível dizer
com confiança “se A, então B”. Mas, embora existam alguns
princípios que operam no mundo das finanças e dos negócios, a
verdade resultante difere muito da ciência.
A razão para isso — volto a bater na mesma tecla — é o
envolvimento das pessoas. As decisões que elas tomam têm grande
influência nos ciclos econômicos, comerciais e de mercado. Na
realidade, economias, negócios e mercados consistem em nada
além de transações entre pessoas. E as decisões das pessoas não
são tomadas cientificamente.
As pessoas têm sentimentos e, como tal, não estão sujeitas a leis
invioláveis. Elas sempre trarão emoções e fraquezas às suas
decisões econômicas e de investimento. Consequentemente, se
tornarão eufóricas ou desanimadas na hora errada — exagerando o
potencial de crescimento quando as coisas vão bem, e o risco de
queda quando as coisas vão mal — e, portanto, seguirão a
tendência a extremos cíclicos. (páginas 295–296)
Posicionamento de ciclo é o processo de decidir sobre a postura
quanto ao risco de seu portfólio em resposta aos julgamentos que
você fez em relação aos ciclos principais, e a seleção de ativos é o
processo de decidir quais mercados, nichos de mercado e títulos ou
ativos específicos estão sub ou sobreapreciados. Essas são as duas
principais ferramentas no gerenciamento de portfólio. Pode ser uma
simplificação excessiva, mas acho que tudo o que os investidores
fazem se enquadra em um ou outro desses itens. (página 255)
Posicionamento do ciclo consiste primordialmente em escolher entre
uma postura agressiva ou uma postura defensiva: aumentar ou
diminuir a exposição aos movimentos do mercado.
A receita para o sucesso aqui consiste em (a) uma análise
cuidadosa de onde o mercado está em seu ciclo, (b) em
decorrência, um aumento de agressividade, e (c) ficar provado que
isso está correto. Essas coisas podem ser resumidas como
“habilidade” ou “alfa” no posicionamento do ciclo. É claro que “c” não
é uma questão de todo dentro do controle de ninguém, em particular
devido ao grau de aleatoriedade a que está sujeito. Então, “ficar
provado que está correto” não acontecerá o tempo todo, mesmo
para investidores hábeis bons de raciocínio. (páginas 257 e 259)
Quando o ciclo de mercado está na fase de baixa, os ganhos são
mais prováveis do que o normal, e as perdas são menos prováveis.
Vale o inverso quando a fase é de alta. Os movimentos de
posicionamento, baseados em onde você acredita que o mercado
está em seu ciclo, significam tentar preparar melhor seu portfólio
para os eventos que estão por vir. Embora sempre se possa ter azar
sobre a relação entre o que logicamente deve acontecer e o que
realmente acontece, boas decisões de posicionamento podem
aumentar a chance de que a tendência do mercado — e, portanto, a
chance de desempenho superior — esteja de seu lado. (página 261)
Acho muito razoável tentar melhorar os resultados de investimento a
longo prazo, alterando as posições com base na compreensão do
ciclo do mercado. Mas é essencial entender também as limitações,
as habilidades necessárias e as dificuldade envolvidas nisso.
É importante ressaltar o fato óbvio de que, em vez dos altos e
baixos cotidianos do mercado, os exemplos claros que forneci no
Capítulo XII envolviam todos os extremos cíclicos que ocorrem “uma
vez na vida” (que hoje em dia parecem acontecer uma vez por
década). Primeiro, os extremos da bolha e do colapso — e, em
particular, o processo que os faz surgir — ilustram mais claramente
o ciclo em ação e como responder a ele. E segundo, é quando se
lida com extremos pronunciados que devemos esperar a maior
probabilidade de sucesso.
Por definição, o estado da relação entre preço e valor em nenhum
lugar é tão claro quanto nos extremos. Assim:
É difícil fazer distinções frequentes e é difícil fazê-lo
corretamente.
No meio termo — onde está a relação “justa” — as
distinções não são tão lucrativas quanto nos extremos, e
não se pode esperar que essas distinções funcionem
como se fossem confiáveis.
Detectar e explorar os extremos é de fato o melhor que podemos
esperar. Acredito que isso pode ser feito de forma confiável sendo
analítico, perspicaz, experiente (ou versado em história) e não
emotivo. Mas isso significa que não se deve esperar conclusões
lucrativas todos os dias, meses ou mesmo todo ano.
A razoabilidade do esforço para identificar o momento do ciclo
depende simplesmente do que se espera dele. O êxito é improvável
se você frequentemente tenta localizar onde estamos no ciclo no
sentido de “o que vai acontecer amanhã?” ou “o que está reservado
para nós no mês que vem?” Qualifico esse esforço como “tentando
ser fofo”. Ninguém pode fazer boas distinções frequente ou
consistentemente o bastante para incrementar os resultados do
investimento. E ninguém sabe quando se materializarão os
desenvolvimentos de mercado que aqueles esforços quanto ao
posicionamento de ciclo rotulam como “prováveis”.
Como Peter Bernstein disse, “O futuro não é nosso para conhecêlo. Mas ajuda saber que estar errado é inevitável e normal, não uma
tragédia horrível nem uma falha terrível de raciocínio nem mesmo
má sorte na maioria dos casos. Estar errado vem com a franquia de
uma atividade cujo resultado depende de um futuro
desconhecido…” (página 269, 272–274 e 275)
A tendência das pessoas para o excesso nunca acabará. E assim,
porque esses excessos em algum momento serão corrigidos, e
cessará a ocorrência de ciclos. As economias e os mercados nunca
se moveram em linha reta no passado nem o farão no futuro. Isso
significa que os investidores com capacidade de entender ciclos
encontrarão oportunidades de lucro. (página 291)
Economia Para Leigos
Flynn, Sean
9788550805580
416 páginas
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Desconstrua o jargão e compreenda como você está envolvido na
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e compreender um assunto que nos afeta todo dia, então acabou de
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dos consumidores. Um olhar aprofundado sobre uma empresa
maximizadora de lucro no centro do capitalismo. Esclarecimentos
sobre direitos de propriedade e equívocos.
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Idiotices Que Pessoas Inteligentes
Fazem com o Próprio Dinheiro
Schlesinger, Jill
9788550811604
288 páginas
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Por que até mesmo os mais inteligentes cometem erros idiotas ao
lidar com dinheiro?
Jill Schlesinger, analista de negócios do CBS News e apresentadora
do programa de rádio Jill on Money, explora nossos maiores pontos
cegos financeiros e nos fornece as ferramentas que precisamos
para entender e assumir o controle de nossas finanças.
Você tem um "amigo" que é superinteligente, possui uma carreira
maravilhosa, é pós-graduado, até economizou um bom dinheiro
para a aposentadoria, mas continua cometendo os mesmos erros
idiotas quando se trata de dinheiro?
Esse "amigo" é você?
Após décadas trabalhando como negociante em Wall Street,
consultora de investimentos e especialista financeira da CBS, Jill
Schlesinger revela 13 erros graves que você provavelmente está
cometendo com seu dinheiro sem nem ao menos saber. Levada por
histórias pessoais comoventes (sim, especialistas financeiros
também fazem besteira), Schlesinger mostra que não é a falta de
inteligência que faz com que pessoas competentes cometam
burradas financeiras, e sim os pontos cegos emocionais.
Então, se cometeu erros agindo com boas intenções, como
economizar para a faculdade dos filhos antes de poupar para a
própria aposentadoria, ou assumiu um risco muito elevado quando
investiu, você veio ao lugar certo. Se evitou momentos
desconfortáveis, como sentar-se para escrever um testamento ou
planejar cuidados de longo prazo para um pai idoso, este livro é
para você.
Ao romper com hábitos ruins e seguir as regras pragmáticas e
acessíveis de Schlesinger para gerenciar as finanças, você pode
economizar dezenas, ou até centenas de milhares de dólares, além
de evitar incontáveis noites de insônia.
Prático, engraçado e frequentemente contraintuitivo, Idiotices que
Pessoas Inteligentes Fazem com o Próprio Dinheiro diz o que você
realmente precisa saber sobre aposentadoria, financiamento
universitário, seguro, mercado imobiliário e muito mais. E pode ser o
investimento mais inteligente que fará este ano.
ELOGIOS PARA IDIOTICES QUE PESSOAS INTELIGENTES
FAZEM COM O PRÓPRIO DINHEIRO:
"O senso comum nem sempre é comum, principalmente quando se
trata de gerenciar seu dinheiro. O livro de Jill Schlesinger é um guia
de tudo o que você deveria saber sobre dinheiro mas nunca
ninguém lhe ensinou. Depois de lê-lo, você ficará mais inteligente,
sábio, esperto e, quem sabe, mais rico."
―CHRIS GUILLEBEAU, autor de Side Hustle e A Startup de $100
"Um livro que deve ser lido, quer você esteja saindo de um abismo
financeiro ou economizando para o futuro, Idiotices que Pessoas
Inteligentes Fazem com o Próprio Dinheiro é uma mina de ouro das
finanças pessoais, com muitas dicas inteligentes, na linguagem
direta e sem julgamentos de Schlesinger. Este livro o ajuda a viver a
vida que quer, enquanto o faz gargalhar ― porque ela não é só
brilhante, mas hilária!"
―BETH KOBLINER, autora de Make Your Kid a Money Genius
(Even If You're Not) e Get a Financial Life
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Pai Rico, Pai Pobre - Edição de 20
anos atualizada e ampliada
T. Kiyosaki, Robert
9788550801483
336 páginas
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<p>Celebrando 20 anos como o livro n° 1 em finanças
pessoais, A escola prepara as crianças para o mundo real?
<br />Essa é a primeira pergunta com a qual o leitor se
depara neste livro.<br />O recado é ousado e direto: boa
formação e notas altas não bastam para
assegurar o sucesso de alguém.</p>
<p>O mundo mudou a maioria dos jovens tem cartão de
crédito, antes mesmo de concluir os estudos, e nunca teve
aula sobre dinheiro, investimentos, juros etc.</p>
<p>Ou seja, eles vão para a escola, mas continuam
financeiramente improficientes, despreparados para enfrentar um
mundo que valoriza mais as despesas do que a
poupança.Para o autor, o conselho mais perigoso que se
pode dar a um jovem nos dias de hoje é: 'Vá para a
escola, tire notas altas e depois procure um trabalho seguro.' O fato
é que agora as regras são outras, e não existe
mais emprego garantido para ninguém.</p>
<p>Pai Rico, Pai Pobre demonstra que a questão não
é ser empregado ou empregador, mas ter o controle do
próprio destino ou delegá-lo a alguém.<br
/>essa a tese de Robert Kiyosaki neste livro substancial e
visionário. Para ele, a formação proporcionada
pelo sistema educacional não prepara os jovens para o
mundo que encontrarão depois de formados. E como os pais
podem ensinar aos filhos o que a escola relega?<br />Essa
é outra das muitas perguntas que o leitor encontra em Pai
Rico, Pai Pobre.</p>
<p>Nesse sentido, a proposta do autor é facilitar a tarefa dos
pais. Quem entende de contabilidade deve esquecer seus
conhecimentos acadêmicos, pois muitas das teorias expostas
por Robert Kiyosaki contrariam os princípios
contábeis comumente aceitos, e apresentam uma valiosa e
moderna percepção do modo como se realizam os
investimentos.</p>
<p>A sociedade sofre mudanças radicais e, talvez, de
proporções maiores do que as ocorridas em
séculos passados.</p>
<p>Não existe bola de cristal, mas algo é certo: a
perspectiva global de transformações transcende
nossa realidade imediata. Aconteça o que
acontecer,só existem duas alternativas: segurança ou
independência financeira. E o objetivo de Pai Rico, Pai
Pobre é instruir o leitor e despertar sua inteligência
financeira e a de seus filhos.</p>
<p><br /><strong>Comentário do autor:</strong></p>
<p>'A principal razão pela qual as pessoas têm
problemas financeiros é que passaram anos na escola, mas
não aprenderam nada sobre dinheiro. O resultado é
que elas aprendem a trabalhar por dinheiro… mas nunca a
fazê-lo trabalhar para elas.'<br /><strong>― Robert
Kiyosaki</strong></p>
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Feitas Para Durar
Porras, Jerry I.
9788550808598
368 páginas
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"Este livro não aborda líderes carismáticos e visionários. Não trata
de conceitos de produtos, nem de insights de mercado visionários.
Não fala simplesmente sobre como ter visão corporativa. Este livro
se refere a algo imensamente mais importante, duradouro e
substancial. Este livro aborda as empresas visionárias." Assim
escrevem Jim Collins e Jerry I. Porras em seu livro inovador que
destrói mitos, traz novas perspectivas e orienta de forma prática
aqueles que desejam construir empresas que se tornarão referência
e sobrepujarão o tempo. Baseados em 6 anos de pesquisa na
School of Business de Stanford, Collins e Porras utilizaram 18
empresas excepcionais e duradouras — que têm idade média de
100 anos e superam o mercado de ações por um fator de 15 desde
1926 — e as compararam diretamente com suas melhores
concorrentes. Eles investigaram as empresas desde seus
primórdios até a época da pesquisa — por todos os seus estágios:
startups, empresas medianas e grandes corporações. No processo,
os autores perguntaram: O que diferencia as empresas
legitimamente expressivas das outras? O que separa General
Electric, 3M, Merck, Wal-Mart, Hewlett-Packard, Walt Disney e Philip
Morris de suas concorrentes? Como, por exemplo, a Procter &
Gamble, que começou sua jornada substancialmente atrás da
concorrente Colgate, acabou dominando o setor? Como a Motorola
conseguiu transcender sua atividade de reparos de baterias e
integrar o ramo de comunicações, enquanto a Zenith nunca
conseguiu a supremacia em nada além de televisores? Como a
Boeing destronou a McDonnell Douglas como melhor companhia de
aviões comerciais — qual foi seu algo a mais? Ao responder essas
questões, Collins e Porras ultrapassam o obstáculo de termos em
voga e outros modismos administrativos, e descobrem
características atemporais que distinguem fortemente as empresas
excepcionais. Eles também inspiram todos os executivos e
empresários a destruir a ideia amplamente aceita, e tão falaciosa,
de que apenas líderes carismáticos constroem empresas
visionárias. Repleto de exemplos específicos e organizado com
base em um quadro coerente de conceitos facilmente aplicáveis por
gestores e empresários de todos os níveis, Feitas para Durar é o
mapa para se chegar à formação de empresas que prosperarão ao
longo do próximo século, ao infinito e além. Elogios a Feitas Para
Durar: "Um dos estudos corporativos mais reveladores desde In
Search of Excellence." — Kevin Maney, USA Today "Se estiver
procurando um estudo histórico fascinante sobre os fatores que
possibilitaram o alto dinamismo de algumas empresas atuais, este
livro é para você!" — Brian Dumaine, Fortune "Feitas para Durar é
um livro atípico — uma pesquisa minuciosa com conclusões que
desafiam o senso comum… Vale a leitura principalmente pelos que
estão tentando revigorar as maiores empresas de nossa nação." —
Richard J. Tofel, Wall Street Journal "Em Feitas para Durar, Collins e
Porras apresentam uma análise racional e brilhante e, como se não
bastasse, o caminho das pedras para a excelência corporativa.
Leitura obrigatória." — Warren Bennis
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12 Regras para a Vida
Peterson, Jordan B.
9788550804002
448 páginas
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Aclamado psicólogo clínico, Jordan Peterson tem influenciado a
compreensão moderna sobre a personalidade e, agora, se
transformou em um dos pensadores públicos mais populares do
mundo, com suas palestras sobre tópicos que variam da bíblia, às
relações amorosas e à mitologia, atraindo dezenas de milhões de
espectadores. Em uma era de mudanças sem precedentes e
polarização da política, sua mensagem franca e revigorante sobre o
valor da responsabilidade individual e da sabedoria ancestral tem
ecoado em todos os cantos do mundo. Bem-humorado,
surpreendente e informativo, dr. Peterson nos conta por que
meninos e meninas andando de skate devem ser deixados em paz,
que terrível destino aguarda aqueles que criticam com muita
facilidade e por que você sempre deve acariciar gatos ao encontrar
um na rua. O que o sistema nervoso das humildes lagostas tem a
nos dizer sobre a relação entre manter as costas eretas (e os
ombros para trás) e o sucesso na vida? Por que os antigos egípcios
veneravam a capacidade de atenção como seu deus mais
supremo? Que terríveis caminhos as pessoas percorrem quando se
tornam ressentidas, arrogantes e vingativas? Neste livro, ele oferece
doze princípios profundos e práticos sobre como viver uma vida com
significado.
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