Retomo como tema o discurso do Presidente da República nas comemorações do 5 de Outubro para fazer notar que, quer as oposições, quer os jornalistas, se esforçam por encontrar no discurso presidencial qualquer palavra que possa ser considerada como crítica velada ou directa à actuação do Governo, num afã digno de galinhas à cata de milho. Foi assim o que se passou desta vez e não é obviamente caso virgem.
Talvez não seja despropositado lembrar, nesta altura, umas tantas evidências:
1- O que menos falta nos faz, numa época como a actual (a braços com uma crise mundial que já vi qualificar como a mais grave depois da Grande Depressão) é uma situação de conflito institucional entre o Presidente da República e o Governo, sendo necessária, mais que nunca, a existência de uma concertação entre os dois órgãos de soberania, até porque, se não sairmos do atoleiro, ficam os dois e nós todos a perder.
2. O Governo, embora dependa da Assembleia da República, depende também do Presidente da República. Este, não só pode vetar os diplomas do governo, como pode, dentro dos limites constitucionais, pôr termo a qualquer experiência governativa e já tivemos exemplo disso no nosso país, como é sabido. Ora, se assim é, qualquer crítica pública que o Presidente faça a este governo ou a qualquer outro, virar-se-á sempre contra ele, pois é responsável pela sua manutenção no poder.
3. Não é, pois, ao Presidente da República que caberá criticar publicamente o Governo, nem tal lhe deve ser pedido. Essa tarefa pertence por inteiro aos partidos da oposição. É a estes, que cabe fazer a crítica do governo e dos seus actos, dentro e fora do Parlamento.
4. O afã com que os partidos e os jornalistas esgaravatam as palavras do Presidente da República para aí encontrar uma crítica ao Governo, só prova a incapacidade dos partidos da oposição para cumprirem, por forma cabal, o seu papel.
5. Isto é tão claro como água. O que espanta é que nem uns nem outros se dêem conta disso!
(Mensagem reeditada)