"Apesar de conhecer a simbologia
que o termo "sexo frágil" carrega ao longo da história, nunca pensei
que ele poderia portar outra conotação para além daquela que inferiorizou as
mulheres por tanto tempo. Essa é uma das novidades dos tempos nefastos de
agora, a capacidade inventiva de atribuir conceitos piores ao que já era ruim.
Isto porque, em plena comemoração do dia Internacional da Mulher, o sexo
continua sendo frágil, não apenas o delas, mas o de todos. Nunca se fragilizou
tanto este assunto quanto no modelo inquisitorial que governa o Brasil de hoje.
Saímos da seara do tabu e estamos rapidamente
adentrando às cercanias da proibição. A presidência censura qualquer tentativa
salutar de discutir questões ligadas a sexo, sexualidade, gênero e identidade,
demonizando estes temas nos lares brasileiros onde pouco se problematiza tais
pautas. Setores ultraconservadores religiosos aproveitam a deixa presidencial
para coagir a sociedade leiga a tratar com mais recato àqueles pontos,
ignorando eixos transversais de cunho científico comprovadamente estudados. Na
fogueira de vaidades em torno disso, quem está sendo levado às chamas são os
jovens.
Já nas escolas, temáticas ligadas a
feminismo e machismo são vistas como ideologias, não como problemáticas
emergenciais para minar as inúmeras violências sexistas que assolam o país. O
"Kit gay" é inventado para causar mais polêmica entre os ignorantes,
alavancando a escalada do conservadorismo na política. Além disso, tratar de
DSTs e gravidezes indesejadas também é um risco, já que os jovens não podem ter
acesso a conteúdos didáticos que mostrem como por uma camisinha e quais são as
partes que compõem uma vagina; na recente remoção da Caderneta Saúde do
Adolescente.
Enquanto de um lado o governo tenta
inutilmente enfraquecer o debate sexual, na outra margem do rio a cultura
mainstream segue sexualizando a juventude por meio da mídia, da moda e da
música. Meninas são retalhadas em bundas e peitos para atender aos anseios
machistas da sociedade que corporifica seus corpos, mas não as ensina
devidamente sobre prevenção e a autonomia do prazer sexual. Assim como elas, os
meninos também são incitados a iniciar precocemente na vida do sexo sem
quaisquer responsabilidades com o próprio corpo e o do outrem. Ou seja, impedir
que a juventude tenha contato com o sexo é praticamente impossível.
Nossa sociedade cheira a sexo. O
erotismo é a mercadoria mais barata do mercado. Logo, não seria mais lógico
atribuir valor a esse produto para que os mais jovens entendessem a importância
que há por trás do ato sexual? Ao contrário da censura, que é inútil na era da
internet, por que não tratar com mais naturalidade a questão, esvaindo do
discurso a visão pecaminosa que resiste em torno do sexo? Será mesmo que evitar
mostrar pênis e vaginas na adolescência, bem como suas funcionalidades, é o
caminho mais acertado para construir uma vida sexual plena? Quais são os reais
temores governamentais por trás dessa perseguição ao orgasmo?
Antes, é preciso lembrar que sexo é
conhecimento de si mesmo e do outro. Decerto, as pessoas que têm uma vida
sexual bem resolvida tratam com mais naturalidade as variações em torno deste
campo. Porém, quando fragilizado sexualmente, o indivíduo entra na paranóia
hipócrita que resume o coito a dois à procriação, numa visão medieval sobre o
prazer humano. Aí vem preconceito, céu, inferno, pode, não pode, etc, etc, etc.
É raso, é tosco, é ineficaz. Logo, neste dia Internacional da Mulher, para além
das merecidas homenagens, vamos fortalecer nosso sexo, exaltar todas as
sexualidades, legitimar as identidades sexuais, extirpando mais essa visão
pejorativa sobre o "sexo frágil." Se for para fragilizar, que façamos
isso com a política. Lá está a parte denotativamente mal resolvida do país. O
sexo frágil está na presidência."