Trabalho Faculdade

Fazer download em docx, pdf ou txt
Fazer download em docx, pdf ou txt
Você está na página 1de 18

CENTRO UNIVERSITÁRIO

PARAÍSO
CURSO DE DIREITO
PROJETO DE PESQUISA
PROF. DRA. PRISCILA RIBEIRO JERONIMO DINIZ

LUANA LEITE FERREIRA

ANÁLISE JURISDICIONAL DA LEGÍTIMA DEFESA CONSOANTE O


ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL

JUAZEIRO DO NORTE, CEARÁ.


ABRIL 2024

Luana Leite Ferreira


ANÁLISE JURISDICIONAL DA LEGÍTIMA DEFESA CONSOANTE O ESTRITO
CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL

TCC 1 como requisito parcial para a conclusão do


Curso de Direito do Centro Universitário Paraíso
do Ceará para obtenção de grau em bacharel em
direito.
Orientador: Prof. Me. Pedro Jorge Monteiro Brito

JUAZEIRO DO NORTE, CEARÁ.


ABRIL 2024
Sumári
o
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................3
2 JUSTIFICATIVA................................................................................................................4
3 OBJETIVOS......................................................................................................................5
3.1 Objetivo Geral...............................................................................................................5
3.2 Objetivos Específicos....................................................................................................5
4 METODOLOGIA...............................................................................................................6
5 CRONOGRAMA................................................................................................................7
1 LEGÍTIMA DEFESA E SUAS APLICAÇÕES LEGAIS .....................................................8
1.1 Teorias da Legítima Defesa e suas tipologias..............................................................8
1.2 Estrito cumprimento do dever legal no contexto fático...............................................11
1.3 Excesso punível nas causas de excludente de ilicitude.............................................13
REFERÊNCIAS......................................................................................................................15
3

1 INTRODUÇÃO

O instituto da legítima defesa diz respeito a uma excludente de ilicitude que é


aplicada quando o indivíduo, usando de meios necessários e moderados, combate
injusta agressão praticada contra ele ou contra terceiros. Desta forma, por mais que
a conduta praticada seja tipicamente punível pelo direito brasileiro, a ilicitude do fato
é afastada, ou seja, o indivíduo nem mesmo pratica crime se estiver amparado por
este princípio.
Já o estrito cumprimento do dever legal, muito embora também seja uma
causa excludente de ilicitude, ocorre somente nos casos em que agentes da
segurança, sendo estes funcionários públicos ou particulares, tem a obrigação de
agir, na maioria das vezes violando alguns bens jurídicos, como por exemplo, a vida,
com o objetivo de resguardar o bem-estar geral da sociedade.
Desta forma, pode-se perceber que tanto a legítima defesa quanto o estrito
cumprimento do dever legal são situações em que uma pessoa pode repelir
agressões utilizando-se de meios considerados típicos, sem ser considerada
culpada. Contudo, enquanto a legítima defesa ocorre quando alguém age para se
proteger de uma ameaça iminente de outra pessoa, o estrito cumprimento do dever
legal acontece quando alguém age de acordo com o que a lei determina, mesmo
que isso envolva a possibilidade de causar danos a outra pessoa. Ambas as
situações têm suas bases na proteção de interesses legítimos, sejam eles
individuais ou sociais, e são reconhecidas como exceções à responsabilidade legal.
Assim, diante de todo o exposto, é possível apontar que o presente projeto
busca esclarecer a distinção entre o devido cumprimento do dever legal e a legítima
defesa, bem como de seu uso em excesso no ato profissional. Com isso, surge a
seguinte questão: como identificar a distinção entre o devido cumprimento do dever
legal e a legítima defesa, frente ao cenário do exercício profissional?
Posto isto, com propósito de solucionar a pergunta problema e compreender a
distinção entre a legítima defesa e o estrito cumprimento do dever legal no contexto
do exercício profissional, é necessário que haja uma análise da proporcionalidade
das ações tomadas em relação às ameaças iminentes percebidas, levando em
consideração a legislação aplicável à profissão em questão.
4

2 JUSTIFICATIVA

No âmbito social: A presente pesquisa pode contribuir significativamente para


o aprimoramento do sistema de justiça, permitindo identificar possíveis lacunas ou
inconsistências na interpretação da legislação vigente. Isso pode resultar em
melhorias nos processos judiciais, na proteção dos direitos dos cidadãos e na
promoção de uma sociedade mais justa e segura.
No âmbito acadêmico/científico: O projeto de pesquisa possui
inequivocadamente importância no âmbito acadêmico e científico, pois, ao investigar
a aplicação da legítima defesa em conformidade com o estrito cumprimento do dever
legal, as considerações coletadas podem servir de base para futuros estudos e
debates acadêmicos, enriquecendo os diversos ramos do direito, em especial do
direito penal e processual penal, e possibilitando a elaboração de interpretações
mais fidedignas no que diz respeito a aplicação da lei no caso concreto.
No âmbito pessoal: Ao longo de toda jornada acadêmica, a autora em
questão sempre foi fascinada por tudo que envolvesse tanto o direito penal como a
sua aplicação prática, principalmente no âmbito da segurança pública. Desta forma,
escrever a presente pesquisa tornou-se essencial para que ela conhecesse a fundo
um tema extremamente importante, pois a área da segurança pública sempre esteve
presente em sua vida desde o seu nascimento, com seu pai sendo servidor público
militar e conhecendo de perto a aplicação da lei brasileira no que diz respeito aos
dois institutos abordados.
5

3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo Geral


Analisar a aplicação dos institutos da legítima defesa e do estrito cumprimento
do dever legal, bem como os quesitos que levam ao uso de tais princípios, e as
diferenças práticas de sua aplicabilidade.

3.2 Objetivos Específicos


1. Identificar quais elementos são essenciais para a aplicação das teorias
da legítima defesa e do estrito cumprimento do dever legal.
2. Compreender a influência de tratados internacionais e convenções
sobre a aplicação da legítima defesa no estrito cumprimento do dever
legal, no ordenamento jurídico nacional.
3. Interpretar a responsabilidade civil e penal decorrente do uso da
legítima defesa no estrito cumprimento do dever legal, considerando
casos jurisprudenciais relevantes.
6

4 METODOLOGIA

A metodologia dentro do cerne de um trabalho científico, expressa-se como


um instrumento essencial para a sua elaboração e desenvolvimento, uma vez que,
através de seus diferentes métodos, possibilita a compreensão lógica de como se
realizar as etapas do trabalho que está sendo produzido. Sendo assim, seria
impossível a criação de um trabalho científico sem um planejamento adequado, a
fim de facilitar toda execução da estrutura.
Desta forma, a fim de se alcançar os objetivos abordados no presente
trabalho, fora utilizada uma abordagem qualitativa, visando compreender as
diferenças práticas da aplicação dos institutos abordados no presente estudo.
Contudo, a investigação a ser realizada não se dará por meios quantitativos, mas
sim qualitativos, analisando-se os materiais disponíveis sobre o assunto estudado.
Quanto ao método, a pesquisa utilizará o dedutivo, pois parte de premissas
gerais ou universais para chegar a conclusões específicas. Desta maneira, este
método permite que o pesquisador analise informações gerais para, através da
dedução, chegar ao resultado de sua pesquisa.
Em relação ao tipo de pesquisa, foi escolhido o bibliográfico, posto que,
consiste na coleta de informações a partir de textos, livros, artigos e demais
materiais, que são usados no estudo sob forma de citações e referências, e servem
de embasamento para o desenvolvimento do assunto pesquisado.
Por fim, a técnica de pesquisa empregada foi a documental indireta, na
medida em que essa técnica permite uma análise aprofundada e sistemática de
dados pré-existentes, fornecendo uma base sólida para a elaboração de argumentos
e conclusões embasadas em evidências concretas.
7

5 CRONOGRAMA

ATIVIDADES FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
Escolha do tema X
Elaboração do X X X X X X X X X X X
Projeto
Encontros com o X X X X X X X X X X X
Orientador
Levantamento X X X X
Bibliográfico
Produção do X X X
Projeto
Entrega do Projeto X
Primeira Parte

Entrega do Projeto X
Segunda Parte

Apresentação X
do Projeto
Entrega do 1° X
Capítulo da
Monografia
Entrega do 2° X
Capítulo da
Monografia
Entrega do 3° X
Capítulo da
Monografia
Revisão e X
Redação Final
Apresentação X

.
8

1 LEGÍTIMA DEFESA E SUAS APLICAÇÕES LEGAIS

Inicialmente, a história da legítima defesa no Brasil remonta aos tempos


coloniais, onde as Ordenações Filipinas estabeleciam que, se a morte de um
indivíduo fosse necessária para que outro se defendesse, não haveria nenhuma
pena, sob a condição de não haver excessos. No entanto, na época era possível o
assassinato de mulheres e de seus amantes em casos de adultério, desde que o
seu amante não tivesse renome dentro da sociedade, pois, o ato era considerado
legítimo em razão da tese da legítima defesa da honra.
Contudo, com o Código Criminal de 1830, a previsão de morte por adultério
foi desautorizada e a aplicação do instituto foi mantida nos casos em que o ato
praticado fosse realizado em defesa própria ou de terceiros. Para mais,
posteriormente, o Código Penal de 1890 consolidou a legítima defesa como uma
excludente de ilicitude, estabelecendo os requisitos e limites para sua aplicação no
ordenamento jurídico brasileira.
Isto posto, vislumbra-se que a legítima defesa da honra era uma tese jurídica
utilizada na época em que a honra masculina era considerada um bem tutelado
juridicamente. À vista disso, essa tese foi utilizada para ocorrência de morte de
mulheres em casos de adultério ou suposta traição por parte da parceira, se
baseando na ideia de que a honra do homem havia sido ferida e que, portanto, era
legítimo defender essa honra com a morte da mulher.
No entanto, com a redemocratização do Brasil e a luta feminina pela
igualdade, a tese começou a ser questionada, fazendo com que a Constituição de
1988 trouxesse garantias às mulheres, incluindo o princípio da igualdade e o direito
fundamental à vida, o que tornou a tese em questão incompatível com os preceitos
da sociedade atual.
Por fim, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a tese de defesa legítima
da honra inconstitucional em crimes de feminicídio, considerando que ela era um
recurso argumentativo odioso, desumano e cruel que contrariava os princípios
constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e à igualdade
de gênero. Essa decisão foi vista como uma vitória para a luta feminina e um passo
importante para a eliminação da cultura de violência e discriminação contra as
mulheres no Brasil.
9

Além disto, ao longo do século XX, a legítima defesa continuou a ser um


instituto relevante no direito penal brasileiro, com algumas modificações em seus
critérios e interpretações. O Código Penal vigente, de 1940, reafirma a legítima
defesa nos artigos 23 e 25, exigindo que a ação seja moderada e proporcional à
agressão sofrida, além de não ultrapassar os limites necessários para cessar a
injusta agressão.
Por conseguinte, recentemente os debates sobre a legítima defesa têm se
intensificado, especialmente em relação a questões como o excesso na sua
aplicação e a defesa de terceiros. A jurisprudência brasileira tem se debruçado
sobre casos que envolvem a interpretação dos requisitos da legítima defesa,
buscando garantir que sua aplicação seja justa e proporcional.
Em suma, a evolução da legítima defesa no Brasil reflete não apenas
mudanças legais, mas também transformações sociais e culturais. A compreensão e
aplicação desse instituto têm sido moldadas pela busca por uma justiça mais
equitativa e pela proteção dos direitos individuais e coletivos. A análise histórica da
legítima defesa no país revela não apenas a evolução das leis e da jurisprudência,
mas também a necessidade contínua de adaptar esses conceitos à realidade social
e aos princípios fundamentais de dignidade e respeito aos direitos humanos.

1.1 Teorias da Legítima Defesa e suas tipologias


A legítima defesa é um instituto fundamental do direito penal brasileiro, que
permite um indivíduo utilizar os meios necessários e proporcionais para repelir uma
agressão injusta, atual ou iminente, a seu direito próprio ou alheio. Essa excludente
de ilicitude, como citado anteriormente, está prevista nos artigos 23, II, e 25 do
Código Penal, e é considerada uma forma legítima de proteção para aqueles que se
encontram em situações de perigo. À vista disso, Augusta Diniz e Ruth Araújo Viana
discorre o seguinte:
No entanto, essa defesa não se confunde com a vingança privada, devendo
se ater aos limites necessários para a repulsa da ofensa, e só será legítima
diante da total impossibilidade de o indivíduo recorrer ao Estado. Por isso, o
art. 25 do Código Penal prevê expressamente os requisitos necessários
para o reconhecimento da presente causa de exclusão da ilicitude (...)
(Viana, et al. 2024, p.269)

Contudo, a sua aplicação depende de determinadas condições, com o fim de


não ser utilizado de maneira errada e servir de meio para, em linguagem popular,
“fazer justiça com as próprias mãos”. Sendo assim, Rogério Greco, em sua obra
10

Direito Penal Estruturado do ano de 2023, separa os elementos constitutivos da


legítima defesa em cinco, os quais são: Injusta agressão, meios necessários,
moderação, atualidade e iminência da agressão e defesa própria ou de terceiros.
A priori, destaca-se que a agressão citada no âmbito da legítima defesa é
compreendida como um ato humano, uma vez que não é possível, a luz do
ordenamento jurídico, a aplicação da legítima defesa em face de ataques advindos
de animais, pois, neste caso, a excludente de ilicitude aplicada será o estado de
necessidade. No entanto, como no ramo do direito há sempre uma exceção à regra,
nos casos em que o ataque é provocado pelo dono do animal com o intuito de ferir o
outro indivíduo, o princípio da legítima defesa pode e deve ser aplicado, já que a
agressão ocorreu somente devido a ação humana de instigar o animal a ferir a
integridade de outrem. Além disso, a agressão não se restringe apenas ao âmbito
físico, já que o verbal e psicológico também está incluso no montante.
Por conseguinte, os meios necessários são todos os recursos utilizados pelo
agente para repelir a injusta agressão. No entanto, para se configurar como
necessário, é imprescindível que haja proporcionalidade entre a repulsa a agressão
e o bem jurídico que se quer preservar. Desta forma, Rogério Greco, a fim de se
fazer compreender a necessidade da proporcionalidade da ação, utilizou como
exemplo o assassinato injustificável de um indivíduo que estava furtando frutas de
uma árvore localizada em uma propriedade particular, ou seja, o ato de ferir o bem
jurídico da vida de outrem por este motivo esdrúxulo, não se configura como meio
necessário no cerne da legítima defesa. Sendo assim, é possível perceber um outro
requisito essencial, qual seja a moderação, pois os meios utilizados devem ser
apenas suficientes para fazer cessar a agressão, não podendo em nenhuma
hipótese, se tornar excessivo ou desproporcional.
Outro ponto importante, se trata da atualidade e iminência da agressão, pois
ela deve estar acontecendo ou prestes a acontecer para que seja devidamente
repelida.
Por conseguinte, a legítima defesa pode ser exercida tanto em defesa própria
quanto em defesa de terceiros. A própria ocorre quando o agente protege um direito
ou interesse próprio, enquanto a defesa de terceiros ocorre quando o agente protege
um direito ou interesse alheio. Ainda, a legítima defesa de terceiros é amparada pelo
princípio da solidariedade humana, o qual diz respeito ao vínculo de sentimento
racional que impõe o oferecimento de ajuda entre os cidadãos, e pode ser exercida
11

por qualquer pessoa, independente da relação ou proximidade entre o ameaçado e


o reagente.
Ainda, o jurista Cezar Roberto Bitencourt (2024), expõe mais um componente,
que, diferentemente dos citados acima, se trata de um elemento subjetivo do
instituto debatido e sobre o qual o doutrinador discorre o seguinte:

A reação legítima autorizada pelo Direito somente se distingue da ação


criminosa pelo seu elemento subjetivo: o propósito de defender-se. Com
efeito, o animus defendendi atribui um significado positivo a uma conduta
objetivamente desvaliosa (negativa). Contrapõe-se assim o valor da ação na
legítima defesa ao desvalor da ação na conduta criminosa. Aliás, o valor ou
desvalor de qualquer ação será avaliado segundo a orientação de ânimo
que comandar a sua execução (p.209).

Posto isto, esses elementos são fundamentais para entender a legítima


defesa e sua aplicação no direito penal brasileiro, permitindo que os cidadãos sejam
protegidos em situações de perigo, garantindo a segurança e a integridade física e
moral dos indivíduos.
No entanto, apesar de possuir um conceito geral, a legítima defesa não se
restringe apenas a ele, uma vez que existem diversas classificações em contextos
fáticos diferentes, por isto, é importante destacar alguns conceitos a fim de se
vislumbrar a dimensão deste instituto. A primeira delas, é a defesa autêntica ou real,
na qual a agressão injusta ocorre e é repelida pela vítima dentro dos limites legais
estabelecidos, ou seja, trata-se do conceito geral de legítima defesa. Ademais, tem-
se a putativa ou imaginária, a qual ocorre quando o indivíduo, por erro, imagina que
está sendo ou virá a ser agredido. Sendo assim, por se tratar da modalidade de erro
prevista no Código Penal em seu artigo 20, parágrafo 1º ou artigo 21, o agente
também fica isento da pena.
Outra classificação interessante de ser salientada, é a sucessiva, a qual é
decorrente de uma situação em que houve excesso na legítima defesa. Ou seja, o
cidadão age amparado pela legítima defesa, mas se excede, fazendo com que
aquele que inicialmente se enquadrava no papel de agressor, passe agora a ser a
vítima, devido ao excesso empregado. Posto isto, a vítima, ora agressor, pode e
deve agir para repelir a agressão injusta que está sofrendo.
Por fim, existe a polêmica legítima defesa preordenada ou antecipada, que,
embora existam debates sobre a sua possibilidade ou não, refere-se a repressão de
agressão futura, ou seja, aqui não se vislumbra os elementos de atualidade ou
12

iminência, contudo, há a possibilidade de o instituto em questão ser empregado no


caso concreto. Assim sendo, o exemplo mais comentado no meio doutrinário a
respeito dela, trata-se dos ofendículos, os obstáculos colocados em casas com o
objetivo de proteger o patrimônio de qualquer ataque que venha a sofrer. Ademais, a
possibilidade de ofendículos para proteção da posse está devidamente assegurado
no Código Civil em seu artigo 1297, o qual fala que o proprietário tem o direito de
cercar e murar o seu imóvel de qualquer maneira.

1.2 Estrito cumprimento do dever legal no contexto fático

Inicialmente, é imprescindível destacar que no Brasil, a inclusão do estrito


cumprimento do dever legal como causa excludente de ilicitude foi uma resposta à
necessidade de proteger os funcionários públicos que, em virtude de suas funções,
precisam violar bem os jurídicos de indivíduos para cumprir as leis e
regulamentações
Posto isto, estrito cumprimento do dever legal se refere à justificativa de uma
conduta que, embora possa causar danos a terceiros, é considerada legítima por ter
sido realizada em cumprimento de uma obrigação ou ordem legal. Desse modo,
como exposto acima, essa justificativa é baseada na ideia de que o agente, ao
realizar a conduta, estava exercendo seu papel ou função de acordo com as normas
que regem sua atuação
Portanto, em conformidade com a doutrina atual, temos o entendimento
confirmado dos doutrinadores Cláudia Barros Portocarrero e Filipe Ávila acerca do
supracitado instituto de defesa do profissional em exercício, cita-se:

Aquele que pratica uma ação por determinação legal, ou seja, que cumpre
um dever que a lei impõe, consoante art. 23, III, do Código Penal, não
pratica crime. Aqui não se tem faculdade, mas dever. Como exemplos de
prática de conduta típica por imposição de dever legal podemos dar os
seguintes: a do carrasco, em países onde a pena de morte é admitida; a do
policial que prende o criminoso em flagrante delito ou em cumprimento à
ordem emanada de autoridade judiciária competente; a do oficial de justiça
que viola o domicílio para cumprimento de mandado judicial, bem como, na
hipótese de resistência, a utilização dos meios necessários para se
defender ou para vencer a resistência, conforme art. 292 do CPP (Ávila et
al., 2023, p.415).

Logo, entende-se que as ações da força de segurança pública de realizar


abordagens, busca e apreensão, dentre outras, baseia-se na imposição do dever
13

legal, não devendo haver recusa ao seu cumprimento. No entanto, para que uma
conduta esteja inserida dentro deste princípio, é necessário que atenda a uma série
de elementos.
O primeiro deles, como citado acima, é a existência de um dever legal, que é
uma obrigação direta ou indiretamente derivada de lei. Assim, sobre tal classificação
as juristas Augusta Diniz e Ruth Araujo Viana explanam:

O dever pode estar previsto em qualquer ato emanado do Poder Público de


caráter geral (portaria, regulamento, decreto) e não apenas em lei em
sentido estrito. Também pode advir de decisão judicial (que aplica, no caso
concreto, a lei formal). Se estiver previsto em ato administrativo despido de
caráter geral ou em resolução administrativa particular, não haverá exclusão
da ilicitude, podendo a culpabilidade ser afastada em razão da obediência
hierárquica (art. 22 do Código Penal) (Viana, et al., 2024, p.283)

Destarte, quando se fala que o dever legal deriva da lei, não está restringindo
apenas a lei em sentido estrito, mas também em sentido amplo, a qual condiz com
toda norma apta de provocar direitos e obrigações, como bem ilustrado acima.
Todavia, esta norma não poderá ter caráter particular, pois segundo Bitencourt:
“Se a norma tiver caráter particular, de cunho administrativo, poderá,
eventualmente, configurar a obediência hierárquica (art. 22, 2ª parte, do CP), mas
não o dever legal” (Bittencourt, 2024, p.211).
Não obstante, a norma autorizadora não poderá, sob nenhuma hipótese,
permitir que os agentes estatais possam ferir ou até mesmo matar os indivíduos que
não obedecem às leis brasileiras. Porquanto, sendo necessária a utilização de força
violenta, em razão de grave ameaça ou agressão injusta, configura o princípio da
legítima defesa própria ou de terceiros. Deste modo, se caracteriza como caso de
uma excludente de ilicitude inclusa dentro da aplicação de outra.
Além disso, é necessário que a conduta seja realizada dentro dos limites
legais e que não cause danos injustificados a terceiros e deve ser realizada com a
intenção de cumprir o dever legal e não com motivações pessoais ou arbitrárias.
Logo, motivações sociais, morais ou religiosas não funcionam como justificativa
plausível para a aplicação deste instituto no caso concreto.
Outrossim, embora o princípio em questão seja comumente invocado pelos
agentes de segurança pública, não existe nenhum impedimento legal para que ele
não possa ser aplicado ao cidadão comum. Não obstante, para que isso ocorra, é
preciso que o indivíduo atue sob a imposição de um dever e a ação praticada não
14

precisa necessariamente estar amparada pelo ramo do direito penal. Ou seja, para
deixar mais claro, Bittencourt (2024) levanta a hipótese de os pais responsáveis pela
criança, que possuem os deveres de vigilância e educação dos seus filhos,
constrangê-los de alguma forma, dentro dos limites legais, estarem amparados pela
excludente de ilicitude.

1.3 Excesso punível nas causas de excludente de ilicitude

Como visto ao longo desta discussão, uns dos pontos de convergência das
excludentes de ilicitude tratadas aqui, é a proporcionalidade, a qual traduz-se em um
princípio fundamental com o objetivo de garantir que a conduta do agente, mesmo
quando amparada por uma excludente, seja realizada de forma equilibrada e
proporcional à situação enfrentada. Sobre o tema, Alexis Couto de Brito em sua obra
“Direito Penal Brasileiro, disserta o seguinte:

A proporcionalidade relaciona-se com a necessidade de defesa e com o


reconhecimento de que existe uma colisão de interesses entre o agressor e
o agredido. Por tudo isso, se houver opções para se defender, deve-se
optar pela menos lesiva para o agressor, ou seja, com o emprego daqueles
meios que sejam mais racionais ou moderados para a defesa. Isto não deve
ser interpretado como um dever de evitar ao agressor. Como entende a
doutrina dominante na Alemanha, uma vez que exista uma agressão injusta
e também a necessidade de defesa, o Direito permite optar por enfrentar o
agressor ou evitar o confronto (sem que seja obrigatório recorrer à
intervenção da polícia ou outros órgãos do Estado, ainda que isso seja
possível no caso concreto). Quem tem a possibilidade de fugir e ainda
assim se defende está dentro do marco do Direito, isto é, atua
justificadamente, salvo quando existir uma desproporção intolerável entre os
bens jurídicos em conflito (Brito, 2017, p.401).

Destarte, a proporcionalidade nas causas de exclusão de ilicitude atua como


um limite essencial para garantir que a conduta do agente, mesmo quando
respaldada por uma justificativa legal, não ultrapasse os limites do razoável e não se
torne excessiva. Consequentemente, é um elemento chave para a aplicação correta
das excludentes de ilicitude, garantindo que a defesa ou a ação do agente seja
adequada e justa diante das situações enfrentadas.
Ainda, quando os limites da razoabilidade são ultrapassados, surge o
chamado excesso punível, o qual refere-se à situação em que um agente, ao agir
amparado por uma causa de exclusão da ilicitude, ultrapassa os limites permitidos
pela lei e passa a responder pelos atos praticados. Isso significa que, mesmo diante
15

de uma situação juridicamente justificável, se o agente tiver reagido


desproporcionalmente, seja de forma intencional ou negligente, ele poderá ser
responsabilizado pelo excesso de infração. Logo, essa abordagem visa equilibrar a
proteção dos direitos individuais com a necessidade de responsabilização nos casos
em que a conduta ultrapassa as restrições das excludentes de ilicitude, garantindo a
segurança jurídica e a proporcionalidade na aplicação da lei penal.
Todavia, apesar da necessidade de aplicação da proporcionalidade em todas
as excludentes, a redação original do Código Penal de 1940 trazia em seu bojo a
possibilidade de punição apenas para aqueles que, amparados pela legítima defesa,
cometessem excessos. Contudo, com a reforma penal de 1984, o excesso punível
foi devidamente incluso em todas as excludentes, cita-se o artigo 23 do Código
Penal:

Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:


I - em estado de necessidade;
II - em legítima defesa
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo,
responderá pelo excesso doloso ou culposo (grifo nosso).

Diante disso, ao analisar o parágrafo único do artigo supracitado, percebe-se


que o excesso pode ser dividido em duas espécies, em virtude de as classificações
abordarem diferentes aspectos do comportamento do agente nas situações do caso
concreto. Como resultado, o excesso doloroso ocorre quando o agente, de forma
consciente e voluntária, ultrapassa os limites permitidos pela lei na proteção de seu
direito, movido por motivações e desejos pessoais, como a violenta emoção
causada pela agressão injusta.
Já o excesso culposo é caracterizado pelo exagero decorrente da falta do
dever de cuidado objetivo de repelir a agressão. Em outros termos, ele é
consequência de uma avaliação errônea do agente, que, em situações específicas,
não foi capaz de avaliar a situação, levando a uma ocorrência mais violenta do que
necessária para a defesa. Para mais, esta modalidade só poderá ser punível nos
casos em que haja a previsão legal da modalidade culposa da conduta típica
realizada, ou seja, quando o tipo penal não abranger a culpa, o agente não pode ser
punido.
Sobre as espécies supramencionadas, Bittencourt comenta o seguinte:
16

Enfim, o excesso punível, seja a título de dolo, seja a título de culpa, que
acontece no momento em que se exercita uma ação de salvaguarda ou uma
conduta consentida, decorre, normalmente, da escolha de meio inadequado,
ou do uso imoderado ou desnecessário de determinado meio, em princípio
ajustado, que causa resultado mais grave do que o razoavelmente
suportável nas circunstâncias. Nos casos em que o sujeito se excede
porque crê estar amparado por uma causa de justificação, incidindo num
erro de permissão, sua conduta é completamente ilegítima, e deverá
receber o mesmo tratamento do erro de proibição indireto (...) (2024, p.
200).

Não obstante, embora não sejam abordadas pela lei, existem mais duas
classificações doutrinárias segundo alguns doutrinadores como Cezar Roberto
Bittencourt e Alex Couto de brito, as quais são o excesso extensivo e intensivo. À
vista disso, a primeira classificação ocorre quando o agente continua a agir mesmo
após cessadas as situações que justificavam a defesa, ultrapassando os limites da
exclusão de ilicitude. Ou seja, o indivíduo age movido pela sensação de vingança,
pois a agressão não se configura mais como atual ou iminente, mas sim como
passada.
Para mais, a segunda categoria pode ser conceituada como aquela em que o
sujeito realiza uma ação que não preenche os requisitos de nenhuma excludente de
ilicitude, consequentemente, há presença de um delito que pode ser enquadrado
tanto na modalidade dolosa como culposa. Portanto, torna-se passível de punição
perante o direito penal, atentando-se às atenuantes previstas nos art. 65, III, alínea c
ou as atenuantes genéricas do artigo 66 do Código Penal, a luz do caso concreto.
17

REFERÊNCIAS
DINIZ, Augusta; VIANA, Ruth A. DIREITO PENAL: PARTE GERAL. [DIGITE O
LOCAL DA EDITORA]: GRUPO GEN, 2024. E-BOOK. ISBN 9786559649341.
DISPONÍVEL EM:
HTTPS://INTEGRADA.MINHABIBLIOTECA.COM.BR/#/BOOKS/9786559649341/.
ACESSO EM: 14 DE MAIO. 2024.

BITENCOURT, Cezar r. TRATADO DE DIREITO PENAL: PARTE GERAL. V.1.


[DIGITE O LOCAL DA EDITORA]: SRV EDITORA LTDA, 2024. E-BOOK. ISBN
9786553629325. DISPONÍVEL EM:
HTTPS://INTEGRADA.MINHABIBLIOTECA.COM.BR/#/BOOKS/9786553629325/.
ACESSO EM: 15 DE MAIO. 2024.

HTTPS://WWW.PLANALTO.GOV.BR/CCIVIL_03/DECRETO-LEI/DEL2848.HTM

JUNQUEIRA, Gustavo; VANZOLINI, Patrícia. MANUAL DE DIREITO PENAL:


PARTE GERAL. [DIGITE O LOCAL DA EDITORA]: SRV EDITORA LTDA, 2023. E-
BOOK. ISBN 9786553625860. DISPONÍVEL EM:
HTTPS://INTEGRADA.MINHABIBLIOTECA.COM.BR/#/BOOKS/9786553625860/.
ACESSO EM: 21 MAI. 2024.

OLIVÉ, Juan Carlos F.; BRITO, Alexis Couto de. DIREITO PENAL BRASILEIRO, 2ª
EDIÇÃO. [DIGITE O LOCAL DA EDITORA]: SRV EDITORA LTDA, 2017. E-BOOK.
ISBN 9788547215231. DISPONÍVEL EM:
HTTPS://INTEGRADA.MINHABIBLIOTECA.COM.BR/#/BOOKS/9788547215231/.
ACESSO EM: 21 MAI. 2024.

Você também pode gostar