Filipo Figueira - M. PECHEUX E AAD69

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DOI: 10.20396/cel.v64i00.

8664079

AS FORMAS DA LÍNGUA NA ANÁLISE AUTOMÁTICA DO DISCURSO (1969-


1983): A HERANÇA LINGUÍSTICA DE MICHEL PÊCHEUX1

(LES FORMES DE LA LANGUE DANS L’ANALYSE AUTOMATIQUE DU


DISCOURS (1969-1983) : L’HÉRITAGE LINGUISTIQUE DE MICHEL
PÊCHEUX)

Filipo Figueira2

RESUMO: A Análise de Discurso proposta por Michel Pêcheux se exerce sobre a dupla materialidade da
língua (base) e do discurso (processo). No entanto, há uma insatisfação, tanto dos linguistas quanto dos
analistas do discurso, relativa ao suposto esquecimento do aspecto linguístico na AD. Assim, pretendo
estabelecer um percurso de leitura sobre o conceito de “língua” no projeto teórico da Análise Automática
do Discurso (1969-1983) de Michel Pêcheux como uma maneira de expor e defender sua importância nas
análises e no arcabouço teórico da Análise do Discurso contemporânea. O percurso deste trabalho, portanto,
inicia-se pela apropriação discursiva dos primados da metáfora sobre o sentido e do valor sobre a
significação, estendendo-se até suas reelaborações finais, em que se formula a assunção de que a língua é
capaz de revolta.
Palavras-chave: língua; discurso; análise automática do discurso; Michel Pêcheux.

RÉSUMÉ: L’Analyse du Discours proposé par Michel Pêcheux s’exerce sur la doble matérialité de la
langue (base) et du discours (procès). Pourtant, dans le champ des études du langage, il y a quelques
insatisfactions, soyez des linguistes, soyez des analystes du discours eux-mêmes, à propose de l’oubli du
rôle de la langue dans l’AD. Ainsi, on prétend établir un parcours de lecture autour de la notion de « langue
» chez Michel Pêcheux dans son projet théorique de l’Analyse Automatique du Discours (1969-1983) pour
mieux montre et mieux défendre l’importance de ce concept aux études discursives aujourd’hui. Donc, on
début sur l’appropriation des concepts linguistique dans l’établissement des primés de la métaphore sur le
sens et de la valeur sur la signification et on suit jusqu’aux réélaborations théoriques finales où la langue
devient l’espace-même de la révolte.
Mots-clés: langue ; discours ; analyse automatique du discours ; Michel Pêcheux.

INTRODUÇÃO

A Análise de Discurso francesa se exerce sobre a dupla materialidade da língua e


do discurso. Nos termos de Michel Pêcheux, tido como seu fundador, “é mais conveniente
conceber a língua (objeto da linguística) como a base sobre a qual processos se
constroem”, e, portanto, “reservar a expressão processo discursivo […] ao funcionamento
da base linguística em relação a representações […] postas em jogo nas relações sociais”

1
Agradeço às leituras críticas e atentas, das diferentes versões do manuscrito deste texto, por Sírio Possenti,
Fábio Ramos Barbosa Filho e Ana Cláudia Ferreira. Quaisquer impropriedades, é claro, são de minha
responsabilidade.
2
Doutorando em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, SP, Brasil.
[email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-8916-0822

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(LLD3, p. 128). Efetivamente, então, assumir a postura interpretativa da Análise de
Discurso materialista (AD, daqui em diante) é interrogar porque, sobre a mesma base
linguística, ocorrem processos discursivos diferentes. Dilema de Babel revisitado: um
desentendimento interno à língua.
No entanto, em um aparente paradoxo, há um mal-estar na relação entre a AD e a
Linguística, que se reflete em uma crítica feita tanto por linguistas de jure quanto por
analistas de discurso: ao longo do tempo, a disciplina teria deixado a língua de lado em
favor do aspecto histórico-social da enunciação. Ao que parece, esse mal-estar pode ter
uma história: a disciplina se institucionalizou na Linguística e, de certa maneira, contra
ela. Sabe-se que a AD estabeleceu seu campo de atuação através de uma “mudança de
terreno”, rompendo – e aqui sigo a tese de Sírio Possenti (2011) – com os preceitos
linguísticos da semântica gerativa, da pragmática e da semiologia estruturalista. No
entanto, faço o esforço de lembrar que não se deve confundir a postura contralinguística4
da AD com um sentimento antilinguístico: “não há AD sem linguística” (POSSENTI,
2011, p. 361) – muito menos sem língua.
Estas impressões gerais pavimentam o objetivo deste texto: traçar um percurso de
leitura sobre o conceito de língua no projeto da Análise Automática do Discurso (1969-
1983) de Michel Pêcheux5. Para isso, divido-o em três partes: parto da apropriação das
teorias estruturalistas e distribucionalistas, sigo pela crítica da independência dos
domínios linguísticos até chegar, enfim, à elaboração de uma concepção discursiva do
que é o próprio da língua.

1. LEVANDO A LINGUÍSTICA A SÉRIO

Ancorada na ruptura estruturalista (Jacques Lacan, Louis Althusser, Michel


Foucault etc.)6 e no “clima marxista” do pós-68 francês7, a teorização de uma “semântica
discursiva” (CS, p. 28) responde às urgências de construir uma espécie de “escuta social”
(RCS, p. 53), um dispositivo de leitura capaz de investir contra as teorias humanistas e
idealistas da interpretação. Em virtude dessas urgências, sua elaboração se estabeleceu,
entre os anos 1969 e 1975, numa disputa político-teórica travada em dois fronts no campo
da linguagem: de um lado, pela crítica às leituras humanistas e espontâneas do texto,
fundadas em um Autor mestre e originário do sentido (LI, p. 56-57); de outro, pela
oposição às “ideologias do consenso” ou ao “problema da comunicação” – isto é, à

3
Visto que irei me referir a diversas obras de Michel Pêcheux, preferi estabelecer uma relação de siglas,
exposta em um glossário ao final do texto (item 5 deste texto).
4
Eventualmente, se poderia enquadrar a AD no campo das contraciências, como fez Foucault (1966/1995,
p. 391) com a psicanálise e com a etnologia, disciplinas que se distinguem por um “um perpétuo princípio
de inquietude, de questionamento, de crítica e de contestação daquilo que, por outro lado, pôde parecer
adquirido”.
5
Propondo esse recorte nominal, pretendo tanto sublinhar que não falo do contexto “mundial” (ou “não-
francês”) da AD quanto distinguir, dentro da “Escola Francesa da Análise do Discurso”, o projeto de Michel
Pêcheux. Para os fins exclusivos deste texto, “AD” é empregado como metonímia desse projeto. A escolha
de orbitar em volta dos textos de Michel Pêcheux, enfim, apoia-se na centralidade do projeto da Análise
Automática do Discurso (1969-1983) para o desenvolvimento dos anos iniciais da AD na França e,
posteriormente, no Brasil.
6
Cf. ADI, p. 277; AAD, p. 251; DTL, p. 12; DEA, p. 46-47; MI, p. 156; EDI, p. 103; CE, p. 283.
7
Cf. Guilhaumou e Mazière (2010).

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posição idealista de que seria preciso apaziguar os desentendimentos entre os homens por
meio de uma espécie de higiene lógico-formalista8 da língua (DTL, p. 15)9.
Assim, o primeiro projeto da Análise Automática do Discurso, publicado em 1969
(donde AAD69), supunha a elaboração de um dispositivo informacional de leitura dos
discursos políticos e uma teoria materialista do sentido que o embasasse (ADI, p. 277;
AAD, p. 251). Desse modo, a ruptura com as teorias semânticas então estabelecidas
incidiu principalmente sobre o par “liberdade/determinação”, considerado como um par
ideológico na medida em que seus termos se supõem reciprocamente. Nessa perspectiva,
a fala, como realização individual e criativa da língua, figuraria como “um caminho para
a liberdade humana; avançar no caminho estranho que conduz dos fonemas ao discurso é
passar gradatim da necessidade do sistema à contingência da liberdade” (A69, p. 70). Isto
é, nestas teorias, “a criatividade supõe com efeito a existência de um sistema que lhe
permita [ao sujeito] fazer irromper, e todo sistema nada mais é do que o efeito resultante
de uma criatividade anterior” (CS, p. 21).
É contra essa perspectiva que Pêcheux inscreve o sentido entre a realização da
língua e as relações históricas das lutas de classe. Em sua mudança de terreno, portanto,
o que se vê é que “a AD especifica-se por sua relação com a língua” (EDI, p. 100). Assim
sendo, essas urgências estabeleceram e povoaram o horizonte sob o qual Pêcheux e seus
colegas trabalharam: opondo-se à mera “aplicação metafórica” (LLD, p. 126), o diálogo
com os estudos da linguagem estava marcado pelo esforço em “levar a ‘linguística
moderna’ a sério” (ADI, p. 277), concretizado nos primados da metáfora sobre o sentido
e do valor sobre a significação.

1.1 A metáfora e o sentido

Em seu projeto teórico, a AAD69 contava com um método de análise focado na


variação e identidade lexical entre Sequências Discursivas Autônomas (SDAs) – os
recortes do arquivo que constituem o corpus de interesse do analista. Este dispositivo se
baseava em um resgate da língua em Ferdinand de Saussure e no paradigma distribucional
de Zellig Harris. Do primeiro, retomou-se a descoberta do simbólico na língua: isto é, a
máxima de que “a língua é uma forma, e não uma substância” (SAUSSURE, 1916/2012,
p. 170). Uma vez que a língua é um sistema – e não a expressão do sentido em si mesma
–, caberia à linguística descrever seu funcionamento, isto é, “quais são as regras que
tornam possível qualquer parte, quer se realize ou não” (A69, p. 60). De Harris (1952),
por sua vez, retomou-se o paradigma distribucional, um método de análise de “fronteiras
morfológicas” que consiste em apenas atestar a ocorrência de elementos morfológicos em
um texto a partir de um paradigma de correspondência.
No entanto, na conjugação entre essas duas teorias, a AD encontrava-se frente a
um dilema e a uma contradição. Um dilema porque, como Harris (1952, p. 5) alerta, o
método distribucional limita-se a localizar a ocorrência das sentenças, e nada pode dizer
de seu sentido. Uma contradição porque, como também afirma Harris (1952, p. 5), o
método distribucional aplica-se a um texto, ao passo que a teoria saussuriana atesta que o
que funciona é, em contrapartida, a língua. É frente a essas limitações e impropriedades
teóricas – a essa contradição na teoria – que Pêcheux faz intervir a ordem do discurso na
ordem da língua, introduzindo o primado da metáfora sobre o sentido. Se a língua pode
ser abordada pela distribuição lexical de seus elementos, o sentido torna-se apreensível
nas “comutações contextuais” que “uma mesma família parafrástica” permite – o que

8
Há uma passagem de D. Laporte (1977), historiador francês citado por Michel Pêcheux e Françoise Gadet
(LI, p. 90, nota 3), que ilustra com ironia finíssima esse sentimento: “Se a língua é bela, é porque um mestre
a lava. Um mestre que lava os lugares de merda, retira as imundices, saneia cidade e língua para conferir-
lhes ordem e beleza”.
9
Esquematicamente, diria que se opunham tanto às diversas correntes do movimento estruturalista quanto
às das escolas semânticas lógicas ou formais.

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Pêcheux chamou de efeito metafórico, uma maneira de “lembrar que esse ‘deslizamento
de sentido’ entre x e y é constitutivo do ‘sentido’ designado por esse x e y” (A69, p. 96).
Assim, o fundamento principal do primado da metáfora sobre o sentido consiste “[n]esta
repetição do idêntico através das formas necessariamente diversas que caracteriza, a
nossos olhos, o mecanismo de um processo de produção” (A69, p. 98, meus destaques).
É sobre este efeito que a AAD69 deveria intervir.
Para ilustrar este princípio teórico, retomo duas sequências discursivas (SD, daqui
em diante) do que chamaria de “fascio-bolsonarismo” (se verá o porquê), ambas
enunciadas em 2020, no contexto da pandemia global provocada pela doença COVID-19
e na conjuntura mundial de ascensão neofacista. São elas: SD1 máscara é coisa de viado10
e SD2 viado tem que morrer de coronavírus11. A primeira foi atribuída ao presidente Jair
Bolsonaro e a segunda foi enunciada por um de seus apoiadores. Sigo aqui algumas
propriedades gerais do fascismo propostas por Umberto Eco (2019): a exacerbação do
moralismo conservador, da belicosidade e do machismo. Por último, destaco ainda que,
figurando no epicentro dos afetos fascistas, “o homem é indubitavelmente um absoluto:
fonte de todo o valor moral, ele encarna a essência do fenômeno fascista”
(CHAPOUTOT, 2013, p. 336). Frente a essas considerações, tomo partido pela
imbecilidade12: quais sentidos estão em jogo no deslizamento entre SD1-SD2?
O virilismo bolsonarista, à luz das características acima, inscreve-se num
antagonismo entre ser viado e ser macho: viado designa uma categoria inferior de homem,
que, por sua vez, vê no macho a realização ideal de seu gênero (AMBRA, 2015;
GAZALÉ, 2017). Essa dicotomia é facilmente verificável pelas sequências acima: se, na
SD1, viado pode ser apreendido como qualidade indesejada, na SD2 ele é um termo
violentamente recusado, identificando um perigo ou um inimigo – por exemplo, poderia
reescrevê-la como SD2’ o coronavírus tem que matar os viados. Ademais, é preciso
lembrar que, no contexto pandêmico, máscara funciona como metonímia para os
cuidados contra o vírus, fortemente menosprezados pelo presidente da república, muito
por conta do virilismo que identifica o cuidado pessoal com fraqueza. Nesse sentido,
proponho a seguinte reconstituição – as aspas inglesas (') e tradicionais (") indicam
sequências que reconstituo a partir das outras, numeradas – para os sentidos desse efeito
𝑓𝑟𝑎𝑐𝑜
metafórico (SD1-2): se SD1-2’ aquele que usa máscara é 𝑣𝑖𝑎𝑑𝑜 , logo, SD1-2’’ aquele que
é𝑣𝑖𝑎𝑑𝑜⁄é𝑓𝑟𝑎𝑐𝑜 𝑢𝑚𝑝𝑒𝑟𝑖𝑔𝑜
𝑢𝑠𝑎𝑚á𝑠𝑐𝑎𝑟𝑎
é 𝑢𝑚𝑖𝑛𝑖𝑚𝑖𝑔𝑜 e precisa morrer13. Assim, viado e máscara se combinam numa
rede na qual a identidade de cada vocábulo escapa sempre para outros termos solidários
entre a doença e a fraqueza física e moral14.

10
Disponível em: https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/mascara-e-coisa-de-viado-dizia-
bolsonaro-antes-de-pegar-covid-19/. Acesso em 09/07/2020, às 12:08.
11
Disponível em: https://www.pnoticias.com.br/noticia/policia/236889-apoiador-de-bolsonaro-e-preso-
apos-dizer-que-viado-tem-que-morrer-de-coronavirus. Acesso em 09/07/2020, às 12:08.
12
Como esclarece Pêcheux (AC, p. 25), “[f]azer o imbecil: isto é, decidir não saber nada do que se lê,
permanecer estranho a sua própria leitura, acrescentá-la sistematicamente à fragmentação espontânea das
sequências, para acabar de liberar a matéria verbal dos restos de sentido que ainda aderem aí”.
13
A forma de notação das famílias parafrásticas utilizada não corresponde à maneira usual da AAD (questão
que não é meu foco aqui). Para maiores detalhes sobre o modelo original da AAD, cf. (A69; MOI; PAD).
14
Essa é uma contradição típica do fascismo – esse “alveário de contradições” (ECO, 2019, p. 32) –, na
qual “os inimigos são, ao mesmo tempo, fortes demais e fracos demais” (ECO, 2019, p. 52): os viados são
fracos, por isso usam máscara para se proteger da doença; os viados são perigosos, por isso devem ser
eliminados pela doença.

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1.2 O valor e a significação

Se o sentido de cada palavra está na sua substituição/comutação em uma família


parafrástica, decorre que a língua seja tanto um “tesouro lexical” quanto uma lista de
regras combinatórias desses elementos (a “gramática”). No entanto, ainda se enfrenta o
problema da identidade do sentido. Retomo como exemplo o emprego de máscara na SD1
comparando-o à SD3 a máscara em que você vive [the mask you live in] – título do
documentário de Jennifer Newson (2015) sobre a “condição masculina”. Como visto,
máscara, no discurso bolsonarista, está associada, como um objeto “físico”, à prevenção
da doença COVID-19, mas também à (suposta) fraqueza homossexual, e vesti-la seria
índice de “fraquejar”15 em sua condição masculina viril. Por outro lado, a SD3 participa
de outras relações solidárias de sentido, e máscara designa não (necessariamente) um
objeto, mas um esconderijo: o homem se esconderia na máscara da masculinidade viril.
Entre as duas sequências (SD1- SD3), marca-se na língua uma contradição16: SD4 máscara
𝑣𝑖𝑎𝑑𝑜
é coisa de 𝑚𝑎𝑐ℎ𝑜. Resta saber o que permite que dois termos se tornem equivalentes em
uma família parafrástica, mas não em outra; ou ainda, como se dá a economia metafórica
da identidade do sentido.
O grupo encabeçado por Pêcheux encontra na publicação de Arqueologia do
Saber (1969/2002), de Michel Foucault, a abertura para “uma concepção materialista da
discursividade” (MI, p. 157): através do conceito de formação discursiva e da noção de
arquivo como “campo de documentos pertinentes e disponíveis sobre uma questão”
(LAH, p. 51), foi possível (re)introduzir a problemática da língua no domínio das
discursividade (EDI, p. 101). Assim, em um artigo escrito a seis mãos, Pêcheux e seus
colegas propuseram que, sob uma mesma formação ideológica, organizam-se uma ou
mais formações discursivas, “que determinam o que pode e deve ser dito [...] a partir de
uma posição dada numa conjuntura dada” (CS, p. 27). Desse modo, o método da AAD69
se efetuaria pela comparação regrada entre as SDAs que constituem o corpus “tido como
representativo de um certo estado de condições de produção características de uma
formação discursiva dada” (CS, p. 30, meus destaques). O interessante, no entanto, é que
para conseguir elaborar uma compreensão topológica do sentido – isto é, feita de posições
(sociais e linguísticas) e não de substâncias – foi preciso retomar outra vez Saussure,
dessa vez, através do conceito de valor.
Segundo Pêcheux e seus colegas, as teorias linguísticas (especialmente as
semânticas) haviam permanecido “surdas” ao que teria sido a verdadeira ruptura
saussuriana – um corte que implicaria, segundo eles, na separação entre o sistema da
língua e a significação. Segundo Saussure (1916/2012, p. 163), o valor de um signo está
determinado “por aquilo que o rodeia”, isto é, pelas relações de semelhança e
dessemelhança que ele estabelece dentro de um sistema. O genebrino é categórico: “na
língua, só existem diferenças” (SAUSSURE, 1916/2012, p. 167). O valor, portanto,
consiste no embrião do que seria a “filosofia nova” estruturalista, uma espécie de
metafísica em que “os lugares prevalecem sobre aquilo que os preenche” (DELEUZE,
1972/2006, p. 226). É essa prevalência que Pêcheux e seus colegas exploram para romper
com as teorias semânticas de então.
O primado do valor sobre a significação assenta-se no fato de que “do ponto de
vista linguístico, o valor domina a significação” (CS, p. 17), isto é, “do ponto de vista da

15
É famosa a declaração de Bolsonaro sobre sua família: “Eu tenho cinco filhos. Foram quatro homens, aí
no quinto eu dei uma fraquejada e veio uma mulher”. Disponível em: https://exame.com/brasil/piada-de-
bolsonaro-sobre-sua-filha-gera-revolta-nas-redes-sociais/. Acesso em 16/03/2021.
16
Courtine (1981/2009, p. 184) explorará esse fenômeno na forma do enunciado dividido: “uma
configuração particular de paráfrase discursiva, na qual duas formulações, de forma sintática determinada
[...], atribuem valores semelhantes [...] a certos lugares dessa estrutura e dois valores antagônicos a pelo
menos um lugar”.

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língua, só conta o valor e não a significação” (CS, p. 19). Supor, portanto, que a
significação esteja prevista no sistema linguístico iria na contramão do que propõe
Saussure, pois seria considerar que os diferentes sentidos possíveis – os diferentes atos
fônicos e psicológicos – estariam alojados de antemão em “subsistemas” da língua,
articulados, por sua vez, na fala criativa de um sujeito. Nesse sentido, distinções como
“sentido real ou abstrato”, “próprio ou impróprio”, “denotativo ou conotativo”, “literal
ou figurado” não são produtivas (SD, p. 147, nota 10), uma vez que todo sentido é
metafórico:
Isto suporia que não há, de início, uma estrutura sêmica do objeto, e em seguida aplicações variadas
dessa estrutura nessa ou naquela situação, mas que a referência discursiva do objeto já é
construída em formações discursivas (técnicas, morais, políticas...) que combinam seus efeitos em
efeitos de interdiscurso (MI, p. 158, meus destaques).

Enfim, recusar a “criatividade linguística” da fala e separar valor e significação,


apoiando-se em contrapartida na noção de formação discursiva, é levar a cabo
radicalmente a concepção de que “o laço que une as ‘significações’ de um texto às suas
condições sócio-históricas não é meramente secundário, mas constitutivo das próprias
significações” (CS, p. 20). Assim, a identidade de uma palavra não está em seu
(re)emprego, mas nos efeitos metafóricos de equivalência parafrástica a partir de uma
formação discursiva dada.

2. QUESTIONAR OS FUNDAMENTOS

Até 1975, tudo ia bem. As apropriações das teorias linguísticas de Saussure e


Harris, organizadas sob os primados da metáfora e do valor, permitiam à AD abordar a
língua como um “tecido de elementos solidários” (A69, p. 98), um tesouro lexical que
forneceria o “material” das famílias parafrásticas dentro de uma formação discursiva
dada. Contudo, o tratamento discursivo das SDAs nunca seria capaz de esgotar a
combinatória desse tesouro: inevitavelmente, “todo discurso comportaria uma parcela de
‘ruído semântico’” a ser contornado, uma vez que “cada unidade, na qualidade de
agrupamento, é suscetível de introduzir elementos de significação desnecessários ou
redundantes em relação à manifestação global da significação dos discursos em questão”
(CS, p. 22, meus destaques). Tudo ia bem demais; porém, os ruídos foram se tornando
ensurdecedores. Seja o exemplo:

Figura 1: SD5 ENVIADE-SE.

Fonte: página do artista na plataforma Instagram17.

Algo que salta aos olhos mesmo em uma leitura superficial é que figuram em SD5
ENVIADE-SE os mesmos elementos que em SD1 máscara é coisa de viado. Há fortes
indícios, porém, de que não se trata dos mesmos sentidos. Como visto (SD1-SD2), no

17
Disponível em: https://www.instagram.com/p/CCY1SzIjMQ_. Acesso em 11/07/2020, às 15:11.

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discurso bolsonarista viado e doença são ambos metonimicamente representados por
𝑛ã𝑜𝑢𝑠𝑒𝑚á𝑠𝑐𝑎𝑟𝑎
máscara, de onde se poderia supor SD1’ 𝑛ã𝑜𝑠𝑒𝑒𝑛𝑣𝑖𝑎𝑑𝑒 . Ora, agora o sentido se inverte: em
𝑡𝑜𝑟𝑛𝑒−𝑠𝑒𝑣𝑖𝑎𝑑𝑜
vez de afastar a palavra viado, aconselha-se seu acolhimento18: SD5’ 𝑢𝑠𝑒𝑚á𝑠𝑐𝑎𝑟𝑎 . Uma
maneira de abordar o problema seria considerar que essa diferença se dá apenas por uma
mudança entre formações discursivas. No entanto, assim se correria o risco de admitir
que a enunciação e escolha lexical da SD5 seriam contingentes às da SD1, além de perder
de vista o caráter transgressor em SD5, que as inverte. Ora, viado e máscara mantém sua
relação metonímica em SD5 em boa medida como resposta à SD1, e ainda assim elas não
reaparecem “idênticas” – máscara é iconograficamente aludida ou representada.
Ao propor uma “invariante proposicional subjacente a uma família parafrástica”
(PAD, p. 234) para atingir “nexos semânticos” constituintes comuns a essa família, o
projeto inicial da AAD69 acabou por apoiar-se em um sentido “já constituído” ou pré-
concebido. O exercício rigoroso da AD, entretanto, pressupõe que não há garantias de
que o sentido permaneça o mesmo sob as transformações e substituições entre sequências
discursivas distintas (PAD, p. 236). Assim, o método tanto lexical quanto “aerolítico”19
da AAD69 mostra-se ainda acanhado para uma análise discursiva do sentido. Era
necessário que a AD passasse a escutar os ruídos semânticos. Em 1975, enfim, o
interdiscurso aparece definido como o “‘todo complexo com dominante’ das formações
discursivas, esclarecendo que também ele é submetido à lei da desigualdade-contradição-
subordinação” (SD, p. 149).
Numa disposição topográfica – com dominante –, elementos de outras formações
discursivas, com as quais se estabelecem diferentes relações, não cessariam de se
inscrever no fio do discurso “meta-forizados” (MI, p. 158) na forma daquilo que se pode
dizer e daquilo que se pode retomar: “o interdiscurso aparece como o puro ‘já-dito’ do
intra-discurso, no qual ele se articula por ‘co-referência’” (SD, p. 154). Não por acaso, a
introdução do interdiscurso resvala no questionamento da independência dos domínios
linguísticos: é através da autonomia relativa das formas sintáticas de encaixe (discurso
transverso) e articulação (pré-construído) que se pode observar o discurso sob o
discurso20. A implicação entre a SD1 e SD1’ é um exemplo da primeira. A segunda,
podemos observá-la na SD5, marcada pelos “fantasmas” da SD1. Na SD5, viado – pré-
construído morfológico21 – constitui o neologismo “en-viad-ar”. Esta transformação
passa pela retenção de um signo anterior (viado) e pela inclusão de afixos (em- e -ar) e
do clítico reflexivo (-se), mudanças que incidem diretamente na produção de outros
efeitos semânticos: somente sofrendo uma reorganização morfossintática foi possível
passar de uma recusa moral (SD1 máscara é coisa de viado) a uma convocação ética (SD5
ENVIADE-SE).
Assim, a reconstituição do algoritmo da AAD69 abala também as fronteiras, antes
fortemente estabelecidas, entre os domínios morfológico, sintático e o semântico: a tese
do valor é “a base da distinção entre intradiscurso e interdiscurso e a origem da tese
segundo a qual o intradiscurso só se constitui pelo interdiscurso que o atravessa”

18
Sobre a negociação entre palavras acolhidas e mantidas à distância, cf. Authier-Revuz (1984/1990).
19
Em 1983, Pêcheux comenta o que segue sobre o aspecto acontecimental do discurso: “não se trata de
pretender aqui que todo discurso seria como um aerólito miraculoso, independente das redes de memória
e dos trajetos sociais nos quais ele irrompe, mas de sublinhar que, só por sua existência, todo discurso
marca a possibilidade de uma desestruturação-reestruturação dessas redes e trajetos” (DEA, p. 56, meus
destaques).
20
Para uma explicação mais detalhada desses dois procedimentos, cf. (SD, p. 151-157). Para a proposição
inicial do “pré-construído” como revisão da “pressuposição linguística”, cf. (HENRY, 1975/1990).
21
Me apoio aqui na expansão do conceito em Jean-Marie Marandin (1993/2010, p. 130): de modo geral, é
um pré-construído quando “a expressão ou as expressões que introduzem o objeto da referência restringem
sua interpretação”. A limitação à sintaxe seria, segundo ele, “um efeito da ‘conjuntura teórica’ na qual se
desenvolvia a AD” (p. 131).

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(MARANDIN, 1993/2010, p. 122). O encontro morfossintático (a língua), portanto, antes
de formar um cálculo combinatório regrado de unidades lexicais independentes,
produziria modos diferenciados de enunciação (a sintaxe) sob os quais um conjunto
estruturado de elementos (o léxico) se articula. O reconhecimento do ponto cego quanto
ao funcionamento material da língua em relação a si mesma no projeto da AAD69 – agora
abalado pela introdução do interdiscurso – pavimentou também o caminho para a crítica
dirigida à Linguística sobre estes mesmos aspectos.
Entre os anos de 1975 e 1980, a AD se fez passar por uma sublevação teórica. Ao
tentar construir sua “teoria do discurso” através da figura conciliatória da “Tríplice
Aliança” (IPF, p. 279), cidadela teórica sob a qual se reuniam conjugadas a ciência
linguística, o materialismo althusseriano e o moterialismo lacaniano22, a AD havia
assumido seus objetos (a língua, a história, o inconsciente) como sobreponíveis, e que,
portanto, todas poderiam estar falando da “mesma coisa” (AC, p. 23). No entanto,
defrontando-se com uma postura radicalmente materialista – “Há um real da língua. Há
um real da história. Há um real do inconsciente” (QI, p. 17) –, era preciso tomar “partido
pelo fogo” (IPF, p. 270) de um trabalho crítico a essa sobreposição redutora. Assim,
voltou-se o olhar para onde a ordem do discurso falhava e para onde o ritual da
interpelação se estilhaçava.
Por um lado, foi necessário precisar que toda formação discursiva trabalha sobre
uma contradição fundante – “trata-se, então, de pensar [...] a contradição de dois mundos
em um só” (RSF, p. 196) – e que, portanto, as formações discursivas dominadas estão
umbilicalmente ligadas às dominantes – isto é, “não há dominação sem resistência” (IPF,
p. 281). Paralelamente, viu-se a necessidade de repensar os fundamentos da interpelação
ideológica: não seria mais o sucesso da interpelação que interessaria à AD, mas
justamente a possibilidade do seu fracasso – afinal, como atestaria a psicanálise lacaniana,
“só há causa daquilo que falha” (IPF, p. 277). Curiosamente, para além das reformulações
e crises provocadas em sua própria teoria, Pêcheux preparou também o terreno para uma
crítica feroz à Linguística. Como alerta em 1977, no início da parceria teórica com a
linguista Françoise Gadet, seu diagnóstico lançaria luz sob “a ocasião de um problema
em que o destino da ciência linguística se engaja e põe em jogo até seus fundamentos”
(FLS, p. 295). Assim deu-se início à crítica da recusa linguística em reconhecer o próprio
da língua.

3. EM ALIANÇA COM O FOGO

A nova postura epistemológica da AD23 se encontra pautada pela paráfrase que


Pêcheux faz da fórmula psicanalítica: “não há ritual sem falhas” (IPF, p. 277). Através
dela, retoma-se a tese lacaniana segundo a qual toda foraclusão24 deixa restos de real que
não tardam a retornar, e que portanto, nem a dominação nem a interpelação podem ocorrer
incólumes25; mas também reaviva a tese materialista de que a história, um processo sem

22
Neologismo chistoso de Lacan (1975) para expressar sua posição como um “materialismo da palavra
[mot]”.
23
A AD também elabora para si uma nova ética, materializada no conceito dos gestos de leitura e na relação
de batimento constante entre descrição e interpretação das materialidades discursivas (LAH).
24
Segundo o dicionário de psicanálise de Roudinesco e Plon (1998, p. 246), a foraclusão “consiste na
rejeição primordial de um significante fundamental para fora do universo simbólico do sujeito”.
25
Nas palavras de Pêcheux, “a causa que determina o sujeito [...] se ‘manifesta’ incessantemente e sob mil
formas (o lapso, o ato falho etc.) no próprio sujeito, pois os traços inconscientes do significante não são
jamais ‘apagados’ ou ‘esquecidos’, mas trabalham, sem se deslocar, na pulsação sentido/non-sens do sujeito
dividido” (IPF, p. 277)

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sujeitos nem fins, é calcada no absurdo26, e que, portanto, todo sentido encontra no sem-
sentido (non-sens) fundador a instabilidade incontornável de sua identidade. O momento
era de aliar-se ao fogo da cidadela teórica em defesa da metáfora: “‘uma palavra por outra’
é a definição da metáfora, mas é também o ponto em que o ritual se estilhaça no lapso”
(IPF, p. 277). É, portanto, sob a metáfora do incêndio – um que acabou por fazê-la
abandonar a postura conciliatória da teoria do discurso (QI, p. 17) – que entendo a crítica
da AD ao ofício e à língua dos linguistas.

3.1 Só há causa daquilo que falha

Há línguas. Sob esse conjunto de realidades que se nos apresenta, articulam-se tanto as
musas quanto as quimeras da Linguística. Supõe-se a partir dele que as diferentes línguas
compõem identidade entre si (é possível falar em uma língua) e que logo podem ser reunidas em
um conjunto homogêneo ou sem contradição (é possível falar em as línguas). Em um nível ainda
mais basilar, supõe-se que é possível discernir entre o que é e o que não é (uma) língua. Nesse
espaço aí circunscrito se funda a prática do linguista. Ao mesmo tempo, no entanto, há duas
realidades que a ameaçam: primeiro, que uma língua sempre pode ser língua-mãe, tornando-se
incomensurável a todas as outras e, logo, não pode formar conjunto; segundo, uma mesma língua
não se expressa sempre da mesma forma, pois há uma heterogeneidade constitutiva que atravessa
todo seu sistema, não sendo, portanto, Uma. Essa é a tese de Jean-Claude Milner (1978/2012).
Segundo o linguista e psicanalista, enfim, a Linguística é a atualização moderna de uma postura
longeva de narcisismo sobre a língua:

Ora, é evidente que essas condições irredutíveis só são satisfeitas caso se descartem determinadas
proposições: - as línguas, por serem incomensuráveis, não formam uma classe contingente; - uma
língua não é idêntica a si mesma; - uma língua é uma substância; - uma língua pode cessar de ser
estratificada; - uma língua não é isótopa. Mas como vimos, não há nada na experiência que faça
com que alguma dessas proposições seja impossível de ser sustentada. É por uma decisão de
princípio que elas são descartadas, e esse princípio se reduz à pura e simples demanda de que um
determinado tipo de proposição universalizável possa ser proferido sobre toda língua (MILNER,
1978/2012, p. 20, meus destaques).

De um só golpe, a Linguística constrói seu objeto e funda a ignorância (o campo


de não-saber) que lhe permite existir. Inscrevendo a psicanálise no território da linguagem
– “[o] campo freudiano é coextensivo ao campo da palavra” (MILNER, 1978/2012, p. 7)
–, Milner defende que é preciso abordá-la naquilo que escapa à sua representação
imaginária e à sua organização simbólica – sua dimensão real, o impossível da língua que
não cessa de não se escrever27. Sistêmico e assistêmico, gramatical e agramatical, a regra
e o desvio, a língua e seu real são duas faces de uma mesma realidade – a lalíngua
(lalangue). Assim, contra o desejo da escrita científica, Milner (1978/2012, p. 22) define
o objeto da Linguística através de sua relação de não-todo: “[u]m modo singular de se
fazer equívoco: eis, então, o que é uma língua entre outras”.
Dessa maneira, também subjaz à gramática das línguas uma razão absurda. Como
alertam Pêcheux e Gadet, “o real da língua não é costurado nas suas margens como uma
língua lógica: ele é cortado por falhas, atestadas pela existência do lapso, do Witz [chiste]
e das séries associativas que o desestratificam sem apagá-lo” (LI, p. 55). No entanto, o
filósofo e a linguista fazem questão de ressaltar que o acompanham em seu argumento
somente até certa altura: faltava a Milner – como ainda faltaria à Linguística – reconhecer
o real da história; caso contrário, seria impossível dar conta da existência material da

26
Como questiona Louis Althusser (1980/2019, p. 49): “Mas por que não reconhecer francamente que a
condição mais segura para poder agir no mundo, para poder mudar o seu curso, e, portanto, dar-lhe sentido
– pelo trabalho, pelo conhecimento e pela luta – é admitir que o mundo não tem sentido (preestabelecido,
fixado por um ser todo-poderosos que é pura ficção)?”.
27
Nas palavras de J. Lacan (1972-1973/1985, p. 127): “O não para de não se escrever, em contraposição,
é o impossível tal como o defino, pelo que ele não pode, em nenhum caso, escrever-se”.

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língua (LI, p. 52). Assim, defendem – e retomo aqui somente parte de sua argumentação,
o suficiente para os objetivos deste artigo – que, sob as tendências do logicismo e do
sociologismo, correria sob a história da Linguística uma “loucura subterrânea”, uma
logofilia (amor da língua) fundada na dupla estratégia de dominação capitalista das
figuras do Direito e da Vida: de um lado, “a ditadura logicista instituindo a circulação
oficial das significações garantidas por uma autoridade central”; de outro, “as múltiplas
práticas fragmentárias, indefinidamente reelaboradas e aperfeiçoadas pelas quais a
divisão estratégica burguesa encontra o caminho do seu exercício” (LI, p. 38).
A Linguística, portanto, estaria ainda radiculada sob uma oposição ideológica
fundamental: seja em termos de “sistema e criatividade” ou de “competência e
performance”, a recusa do real da língua (e do equívoco como constituinte do sistêmico)
garantiria, simultânea e paradoxalmente, a existência de uma língua padrão e de suas
variantes, todas compostas por signos idênticos a si mesmos (e arbitrários aos objetos),
consequentemente passíveis de descrição/dominação. No centro dessa posição,
possibilitando a estratégia burguesa, argumentam Pêcheux e Gadet, está um mal-
entendido em reconhecer no arbitrário do signo o núcleo do empreendimento saussuriano.
Sub-repticiamente, a substância teria voltado à língua:

O objeto da Lingüística (o próprio da língua) aparece assim atravessado por uma divisão discursiva
entre dois espaços: o da manipulação de significações estabilizadas, normatizadas por uma higiene
pedagógica do pensamento [o logicismo], e o das transformações do sentido, escapando à toda
norma a priori, de um trabalho do sentido sobre o sentido, tomado no lance indefinido das
interpretações [o sociologismo] (DTL, p. 25).

O valor linguístico, assim, foi submetido às imagens do equilíbrio e da circulação:


“a língua é um ‘tesouro de signos’ que, do mesmo modo que os signos monetários, só
têm valor com a condição de circularem na comunicação, de trocarem (por coisas ou por
outros signos)” (LI, p. 56-57). Não há espaço para a falta, e o equívoco, “dissimulado no
patológico da margem, do distanciamento, da regra violada e da obscuridade inefável”
(LI, p. 115), ficou restrito à figura da linguagem poética e em sua manipulação “libertina”
por alguns poucos sujeitos privilegiados. A Linguística teria cedido a uma “concepção
aristocrática” da língua, presa à “certeza elitista que pretende que as classes dominadas
nunca inventem nada [...]; [elas] teriam uma tal necessidade vital de universos
logicamente estabilizados que os jogos da ordem simbólica não lhes dizem respeito”
(DTL, p. 25). Assim, denúncias tais como a de que a língua seria “simplesmente: fascista”
(BARTHES, 1977/2013, p. 14), apesar de soarem espetaculosas e subversivas28, apenas
ratificam a ignorância do fato de que “o humor e o traço poético não são o domingo do
pensamento, mas pertencem às competências fundamentais da inteligência política e
teórica” (DTL, p. 26).
Outra vez foi preciso advertir que submeter a significação ao valor incorre em
submeter o sentido ao non-sens; que sempre há algo que não cessa de não se escrever: “o
valor sustenta e, ao mesmo tempo, limita o arbitrário” (LI, p. 58)29. Levar a cabo a

28
Como continua, “o fascismo não é impedir de dizer, é obrigar a dizer” (BARTHES, 1977/201, p. 14).
Ora, esta denúncia se mantém ainda presa à posição ideológica sistema/criatividade, pois somente
ignorando que há lalíngua – isto é, que “a linguagem humana é sem exterior: é um lugar fechado”
(BARTHES, 1977/201, p. 14) – que se faz possível identificar um imperialismo na língua, isto é, que ela
nos conforme às suas “regras”. Inclusive, satirizam Pêcheux e Gadet, se há “uma ‘língua fascista’, é
precisamente essa língua lógica, língua metálica, sem aspecto exterior” (LI, p. 23).
29
Em 2013, durantes as manifestações consagradas como “Jornadas de Junho”, escutava-se uma palavra
de ordem que expõe também a equivocidade do “valor monetário”: “não é só [por] 20 centavos”. Por um
lado, evoca-se a ampliação das pautas das manifestações frente ao discurso hegemônico da imprensa que
as “reduzia” à questão do preço da passagem. Por outro, indica-se que há algo a mais em seu valor, que
ultrapassa a simples troca por uma mercadoria: o aumento de 20 centavos no valor da passagem em São

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proposição de que um signo vale por aquilo que ele não é – uma fórmula composta apenas
pela afirmação de sua negatividade (não-x) – seria dar consequência ao fato de que “em
toda língua, um segmento possa ser ao mesmo tempo ele mesmo e um outro” (LI, p. 55).
Dito de outra maneira: “não há fronteira ou ponto assinalável de mudança linguística entre
o gramatical e o não-gramatical. Há somente trabalho na língua” (LI[e], p. 103). Manter-
se cego à capacidade de derrapagem constituinte da lalíngua, para além de seguir na
contramão do projeto saussuriano – que “faz do poético um deslizamento inerente a toda
linguagem” (LI, p. 58)30 –, é negar também a razão pela qual as línguas são capazes de
política. “Não há linguagem poética” (LI, p. 58): era preciso restituir à língua sua
predisposição à revolta.

3.2 A revolta é contemporânea à linguagem

Situar o valor e sua negatividade como eixo de organização da língua conduz a


compreendê-la como “um corpo atravessado por falhas, ou seja, submisso à irrupção
interna da falta” (DTL, p. 28). Atear fogo nas certezas da Linguística e, em decorrência,
nas da cidadela teórica da AD impôs, de imediato, dificuldades incontornáveis: se, por
um lado, a existência da língua é de “um sistêmico capaz de subversão” (LI, p. 59), e se,
por outro, o “sentido surge do interior da sintaxe” (LAH, p. 57), como propor uma
descrição alternativa da regra linguística?
Outra metáfora, bastante familiar aos linguistas, se apresenta em resposta: aquela
do jogo. Já em Saussure ela aparece (1916/2012, p. 130), para quem, “de todas as
comparações que se poderiam imaginar, a mais demonstrativa é a que se estabeleceria
entre o jogo da língua e uma partida de xadrez”. No entanto, tomar a língua pela metáfora
do xadrez implica, ainda, em marginalizar o equívoco: só seria da ordem do jogo o que
joga em suas regras31. Para abordar um sistema capaz de subversão, “as regras da língua
não podem ser consideradas como regras categóricas – no sentido de que uma regra deve
ou não deve ser aplicada”; ao contrário, elas “devem ser vistas como intrinsecamente
possibilitadoras dos jogos ideológicos e das latitudes discursivas” (LI[e], p. 102). Sua
ordem, portanto, não é nem de uma máquina lógica, nem uma construção social fictícia
de natureza metalinguística: “[f]azer a língua funcionar é somente jogar nas suas coerções
e nas suas lacunas – jogar nas latitudes que ela oferece” (LI[e], p. 105). Assim, antes de
uma analogia distante, ela abriga como princípio uma dimensão do espaço de jogo: “o
paradoxo da língua toca duas vezes na ordem da regra: pelo jogo nas regras, e pelo jogo
sobre as regras” (DTL, p. 27).
A regra linguística, antes de uma limitação – algo que se entreporia entre o sujeito
e sua liberdade –, impele a uma forma de jogar, e, consequentemente, de resistir.
“Trapacear a língua/mudar a vida”, diria Françoise Gadet (1980/2016, p. 193). Talvez a

Paulo significa também a desigualdade e o impedimento de acesso à cidade, submetidos, por sua vez, à
obstrução financeira da mobilidade urbana e pública.
30
Um bom exemplo são os comentários de Saussure (1916/2012, p. 121-122) sobre o jogo das diferentes
segmentações silábicas possíveis entre si je l’a prends e si je l’apprends.
31
Talvez – e aqui assumo o risco da prepotência – uma analogia que melhor representaria o jogo da língua
(desde que lembrado que toda analogia implica em deslizamento) seja pelo tabuleiro de Go, precursor do
xadrez, originário da China e popularizado no Japão. Um diálogo em Pi (1998), filme de Damien
Aronofsky, me parece exemplar. A interpretação que a personagem Sol Robeson elabora do jogo segue da
seguinte maneira: “Os antigos japoneses consideravam que o tabuleiro de Go era um microcosmo do
universo. De qualquer forma, quando está vazio, parece simples e ordenado, mas as possibilidades em jogo
são intermináveis. Duas partidas de Go nunca são idênticas, assim como os flocos de neve. Então, o que o
tabuleiro de Go realmente representa é um universo extremamente complexo e caótico. E essa é a verdade
de nosso mundo, Max. Não pode ser facilmente resumido com a matemática. Não há um padrão simples”
[minha tradução]. A língua, à luz do tabuleiro de Go, não pode ser matematizada facilmente, não sem
excluir dela sua potência; e cada jogada – ou cada regra – pode ser vista como um manejo fugidio em
intensidade das possibilidades de movimento de suas peças.

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melhor maneira de exemplificar essa tese seja seguir Pêcheux em sua afeição
contemporânea ao “ordinário do sentido” (DEA, p. 36). Neste estado da teoria, “a
metáfora aparece fundamentalmente como uma perturbação que pode tomar a forma do
lapso, do ato falho, do efeito poético, do Witz [chiste] ou do enigma” (MI, p. 160). Sigo
pela via do chiste, com o seguinte tuíte32: SD6 se home office fosse bom se chamaria mulhe
office. Suas condições de produção não diferem muito daquelas das sequências anteriores:
enunciada durante a pandemia da COVID-19, faz menção à condição de trabalho remoto
(home office) a que grande parte da população foi submetida quando foi decretado o
isolamento social. Para deslinearizar os sentidos que nela se estratificam, sugiro trabalhar
pela implicação semântica do encaixe sintático de oração condicional e pelos efeitos de
sentido provocados pelo jogo fonético e gráfico.
Segmentando-a da seguinte maneira SD6AB [A se home office fosse bom] [B se
chamaria mulhe office], pode-se enquadrar a SD6 como uma sentença subordinada
adverbial condicional (CASTILHO, 2019, p. 375), em que SD6A é a prótase
condicionante e SD6B é a apódose condicionada; conforme sua disposição – isto é, [se +
subjuntivo + verbo terminado em –ira] –, configura-se no “tipo semântico” contrafactual
ou irreal, o que significaria que “a prótase [SD6A, neste caso] encerra uma afirmação falsa,
contrária à realidade” (CASTILHO, 2019, p. 376). Tomo partido por uma definição de
sentido menos categórica do que de Ataliba Castilho (2019), mas há nela um ponto de
partida: a SD6 constrói, por meio da oposição e da negação, uma relação de hierarquia.
Primeiro, a SD6A introduz um pré-construído, um fragmento interdiscursivo que diria algo
como SD6’ home office é bom; mas o faz tão somente para negá-lo em seguida por meio
da forma verbal fosse; enfim, oferece-se uma alternativa (SD6B), introduzida pelo
condicional se e pelo futuro do pretérito seria, implicando uma contradição entre dois
𝑚𝑢𝑙ℎ𝑒
termos: ℎ𝑜𝑚𝑒 .
Portanto, diferentemente de Castilho (2009), não podemos dizer que a prótase
SD6A seja falsa ou irreal, porque ela precisa existir (mesmo que como efeito imaginário)
para que SD6 se sustente. Ademais, o importante é que, além de hierarquizá-los, a SD6
também supõe possível uma correlação de oposição entre estes termos, efeito que, em
alguma medida, os equipara. Ocorre que não consta na língua brasileira – menos ainda na
inglesa – o vocábulo mulhe office. Ele é, como se verá, um neologismo fugaz, efeito do
trabalho sobre a língua.
A palavra home (“casa”), em home office, em sua “ascendência anglófona” – trata-
se de um neologismo brasileiro –, estaria oposta à workplace (“local de trabalho”). No
entanto, se constata outra oposição no enunciado. Está transposição de oposições só é
possível por uma subversão através do jogo com a grafia e com o som. Em sua
incorporação à língua brasileira, home office encontrou-se na ocasião de uma possível
homografia e, por consequência, homofonia: “home”, em português, é usada para grafar
a forma coloquial ou caipira de se dizer “homem”, abrindo, também, a palavra de origem
inglesa à fonologia brasileira: /ˈhəʊm/ [“home”] torna-se /ˈomɨ/ [“home”], por intermédio
de /ˈomeɲ/ [“homem”]33. O jogo com a língua fica ainda mais evidente na introdução da
antinomia binária das palavras homem e mulher. Aqui não é possível discernir com
certeza, mas pelo menos duas hipóteses me parecem plausíveis: primeiro que a
semelhança possa ser de ocasião fonética, pois é possível pensar na forma coloquial ou
caipira de /muʎˈɛ/ [“mulhé”]; por outro lado, é possível que se tenha apenas retirado o
“r” final (mulhe), assim como home não carregaria o “m” padrão, criando-se a

32
Disponível em: https://twitter.com/colourdodge/status/1244794745655832579. Acesso em 09/11/2020,
às 13:00. As notações em colchete [ A B] são de minha autoria.
33
Por um lado, esse exemplo permite ver a língua funcionando pela lógica de sua falha. Por outro, ele
reafirma que, ainda que seja uma estrutura tensionada pelo acontecimento, a língua não deixa de ter
materialidade: é porque há um diagrama fonológico específico que “home” e “home” puderam ser
relacionadas. Apesar de tudo, há língua, como bem me lembrou Sírio Possenti recentemente.

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equiparação por paralelismo linguístico. Como se queria, home passou a opor-se a mulhe,
e não (só) à workplace.
No entrecruzamento da articulação sintática com a “trapaça” fonética, é possível
ℎ𝑜𝑚𝑒𝑜𝑓𝑓𝑖𝑐𝑒
propor o seguinte jogo de paráfrases: SD6” se ℎ𝑜𝑚𝑒𝑚 fosse bom se chamaria
𝑚𝑢𝑙ℎ𝑒𝑜𝑓𝑓𝑖𝑐𝑒
𝑚𝑢𝑙ℎ𝑒𝑟
. Essas paráfrases estendem-se para além da própria antinomia simples entre
homem e mulher, tendo em vista que não é o neologismo que encerra a graça do chiste,
mas sim sua criação para opor-se à imposição do home office – e, no limite, ao discurso
neoliberal que o sustenta. Seu mecanismo de resistência, portanto, está em “deslocar as
regras na sintaxe e desestruturar o léxico jogando com as palavras” (DID, p. 17). É
evidente que essa criação fugaz de um neologismo, que só faz sentido no âmbito mais
restrito da piada, não se propõe a ruir o neoliberalismo ou o virilismo, mas ainda assim
são “formas de aparição fugidias de alguma coisa ‘de uma outra ordem’, vitórias ínfimas
que, no tempo de um relâmpago, colocam em xeque a ideologia dominante tirando partido
de seu desequilíbrio” (IPF, p. 278) – “o instante de uma vitória do pensamento no estado
nascente” (IPF, p. 280). É nesse sentido que a “sintaxe é a base da criatividade histórica”
(LI[e], p. 102), e por essa razão – por ser um espaço de trabalho, em que a regra serve para
abrir a possibilidade de jogo (na história, no sujeito, no discurso...) – que “a revolta é
contemporânea à linguagem” (IPF, p. 279).

4. CONCLUSÃO

À guisa de conclusão e muito esquematicamente, acredito que foi possível


delinear, ao longo da leitura e interpretação dos textos, três configurações da “língua” no
projeto teórico de Michel Pêcheux. Numa primeira abordagem, a língua fora concebida
como (i) um “cálculo combinatório regrado” das unidades de um tesouro lexical,
entendendo-se léxico e gramática como domínios distintos. Em um segundo momento,
após a introdução do interdiscurso e do choque entre os domínios linguísticos, a língua
fora concebida como (ii) modos diferenciados de enunciação sobre os quais um conjunto
estruturado de elementos se articula. Enfim, após a revisão crítica da Linguística,
concebeu-se a língua como um (iii) corpo cingido de um sistema capaz de subversão,
destacando-lhe sua dimensão de jogo e de revolta. Assim, durante todo o percurso, o que
se viu foi um esforço constante para cada vez mais abordar a língua em sua especificidade.
Um trajeto que se inicia e termina em diálogo com a Linguística: primeiro pelo
empréstimo de alguns conceitos; posteriormente, pela crítica à prática e à epistemologia
linguística. “[P]ara ser analista de discurso é preciso ser linguista e deixar de sê-lo”,
lembra Jean-Jacques Courtine (2009/1981, p. 19).
Para reconhecer o próprio da língua foi preciso fazer frente à língua de madeira
do logicismo (LI, p. 24) – que nega a política e normatiza o sentido –, às línguas de vento
do sociologismo (LI, p. 24) – que capturam a política da língua e as práticas indefinidas
de interpretação –, e ainda às línguas de ferro imperialistas (LI, p. 24) – que impõem os
seus sentidos e a censura de outros. Ao cabo deste percurso, me parece que o esforço feito
por Pêcheux foi de restituir, cada vez mais através de sua dimensão ordinária e marginal,
a capacidade de rebeldia à língua. Talvez essa seja uma das principais lições que nós
linguistas devamos guardar de sua obra: “A língua de ferro, de madeira ou de vento...
façamos ouvido de surdo. Como se, desde há muito tempo, estivéssemos impedidos de
usar a língua” (LI, p. 117). Há um outro registro da língua para se escutar, um que não
seja de substância, cuja matéria seja a de uma estrutura atravessada pelo seu
acontecimento: uma língua de estalo, que faz ranger as bases de seu próprio
funcionamento.

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GLOSSÁRIO DAS OBRAS CONSULTADAS DE MICHEL PÊCHEUX34

Sigla Título Ano de publicação


RCS Reflexões sobre a situação teórica das Ciências Sociais e,
especialmente, da Psicologia Social [sob o pseudônimo “Thomas 1966
Herbert”]
A69 Análise Automática do Discurso (AAD-69) 1969
CS A semântica e o corte saussuriano 1971
LLD Língua, "Linguagens", Discurso 1971
SD Semântica e Discurso 1975
PAD A propósito da Análise Automática do Discurso 1975
FLS Há uma via para a Linguística fora do logicismo e do sociologismo? 1977
RFS Remontemos de Foucault a Spinoza 1977
MOI As massas populares são um objeto inanimado? 1978
IPF Só há causa daquilo que falha ou o inverno político francês 1978/1982
QI Questões iniciais [chamada para o colóquio Matérialités Discursives] 1979
HEM La linguistique hors d'elle-même [A linguística fora de si mesma] 1980
AC Abertura do Colóquio [Matérialités Discursives] 1980
OE O enunciado: encaixe, articulação e (des)ligação 1980
LI A língua inatingível 1981
ADI Análise de Discurso e Informática 1981
EE O estranho espelho da Análise do discurso 1981
DID Delimitações, inversões, deslocamentos 1982
LAH Ler o arquivo hoje 1982
LI[e] A língua inatingível [entrevista] 1982
AAD Apresentação da Análise Automática do Discurso 1982
DTL Sobre a (des-)construção das Teorias Linguísticas 1982
DEA O Discurso: Estrutura ou Acontecimento 1983
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As datas dizem respeito à publicação original. O ano das edições consultadas consta nas referências
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que foram publicadas postumamente.

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Recebido: 25/1/2021
Aceito: 10/4/2021
Publicado: 7/3/2022

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