Levinas - Judaísmo, Alteridade e Educação 2021.2

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Ler a vida à luz do Livro:

Judaísmo, alteridade e educação em Emmanuel Levinas

Luciano Costa Santos1

Para Haroldo Lima, testemunho


vivo do espírito do Livro.

1. A civilização do Livro

O filósofo lituano judeu Emmanuel Levinas foi testemunho privilegiado do breve


século XX, cujos acontecimentos decisivos viveu de perto, quando não os sofreu na carne.

Sob impacto da Ia Guerra mundial, ainda criança migra com a família para a
Ucrânia, de onde pouco depois lhe chegam alvíssaras da Revolução Soviética, até que,
duas décadas mais tarde, com Stalin, visse sepultadas esperanças revolucionárias junto
aos corpos de prisioneiros políticos dos gulags. Em fins da década de 1930, já professor
de Filosofia estabelecido em Paris – e naturalizado francês “por amor à língua de Racine
e Pascal” –, é recrutado como oficial do exército quando estoura a II Guerra. A decisão
cívica-literária termina por salvar-lhe a vida, pois, capturado pelos nazistas, fica retido
por mais de quatro anos em campo de refugiados, sob proteção da jurisdição militar, ao
passo que – como saberá depois de finda a Guerra – quase todos os seus familiares são
mortos nos campos de concentração. Junto a milhões de outros judeus, eles conheceram
a “derrelição” extrema, “condição inferior à das coisas, experiência de passividade total,
experiência da Paixão.” (URA, 25) Liberto do cativeiro, retorna a Paris, onde reassume o
posto docente. Enquanto as potências nucleares medem forças à sombra fria do pós-
Guerra, nos países de Terceiro Mundo proliferam guerras civis de libertação contra o
capitalismo neocolonial. Em suma, nas palavras de Levinas:

As guerras mundiais – e locais –, o nacional-socialismo, o stalinismo – e mesmo


a desestalinização –, os campos, as câmaras de gás, os arsenais nucleares, o
terrorismo e o desemprego, é muito para uma só geração, ainda que ela fosse
apenas testemunha. (Noms Propres, apud Diffficile Liberté, p. 1)2

1
Doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com Pós-
Doutorado em Filosofia Moral e Política pela Universidad Metropolitana de México (UAM). Professor
Titular da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), credenciado no Programa de Pós-Graduação em
Educação e Contemporaneidade (PPGEDUC). Contato: [email protected]
2
Todas as traduções dos textos extraídos da obra Difficile Liberté são de autoria nossa.

1
O pensamento de Levinas madura nesse cenário de ruínas atravessado por dentro,
a cobrar-lhe excepcional gravidade e vigilância. A leitura desse feixe de acontecimentos
extremos converge em sua obra para o reconhecimento de uma crise de sentido que mina
os fundamentos da civilização ocidental, abrangendo as dimensões econômica, política,
jurídica, cultural, filosófica e pondo em cheque a sua expansão planetária sob o paradigma
da modernidade. O colapso histórico do entre (e pós) Guerras não seria, portanto, senão
o aflorar de uma crise civilizatória que estaria a exigir radical reposição do sentido do
humano.

Chama a atenção do filósofo judeu a insuficiência das matrizes humanistas


hegemônicas no Ocidente para se fazer face a essa erosão de sentido: “Apesar de toda a
sua generosidade, o humanismo ocidental jamais soube duvidar dos triunfos e
compreender os fracassos, nem pensar uma história em que vencidos e perseguidos
poderiam trazer algum sentido válido.” (A-HE, 392)

Em particular, parece-lhe patente a inoperância do modelo de cristianismo


subjacente à Cristandade, pois, sedimentado por séculos na cultura ocidental, mostrou-se
incapaz de impedir ou ao menos conter a institucionalização do absurdo nazista numa
sociedade massivamente “batizada”:

Que a monstruosidade do hitlerismo tenha conseguido produzir-se numa Europa


evangelizada, abalou no espírito judaico o que a metafísica cristã possa ter de
plausível para um judeu habituado a uma longa vizinhança com o cristianismo: o
primado da salvação sobrenatural em relação à justiça terrestre. Tal primado não
tornou, ao menos possível, tanta desordem sobre a terra e esse extremo limite da
derrelição humana? (PJH, 225-226)
Face a esse impasse civilizatório, a sobrevivência do povo de Israel às cinzas do
Holocausto constituiria, para Levinas, bem mais que demonstração de resiliência
histórica, a possibilidade mesma de recomeço da história. Após o Holocausto, nos
desertos do século XX, caberia mais uma vez a Israel guardar a memória da lei inviolável
sem a qual nenhuma civilização humana poderia constituir-se como tal. Ser-lhe-ia assim
restituída a primogenitura entre as nações no anúncio do sentido do humano, tal como
este se revela – e só pode revelar-se – a partir do Eterno em sua inexpugnável
transcendência:

Na aurora do novo tempo, o judaísmo tem consciência de ter, por sua


permanência, uma função na economia geral do ser na qual ninguém pode
substituí-lo. É preciso que, no mundo, exista alguém tão velho quanto o mundo.

2
Talvez o pensamento judaico, em seu conjunto, consista hoje em se ligar mais
fortemente que nunca a essa permanência e eternidade. (PJH, 232)
Não obstante o alcance de sua vocação civilizatória, há séculos, especialmente
desde o XIX, a presença de Israel sofre intenso refluxo no mundo ocidental, a partir do
processo de emancipação social que levou as comunidades judaicas a adotarem no espaço
público as formas culturais vigentes, diluindo a mensagem do Livro em um humanismo
mediano constituído de ideais “genéricos e generosos”, remanescentes do patrimônio
greco-romano-cristão acomodado ao espírito liberal moderno. Para inscrever-se na
sociedade civil em condições de igualdade, Israel suprimiu a sua voz ou passou a falar
apenas para dentro de sua circunscrição confessional, fazendo de sua herança espiritual
um mister reservado aos seus. Reduziu espiritualidade a instrução religiosa, ritualismo
tradicional e piedade. Reduziu ação social a beneficência. Privatizou a vida espiritual,
aprisionada na sinagoga, tornando-a assunto de especialistas, com seus “lugares especiais,
dias especiais e horas especiais, em presença de uma clientela de especialistas,
frequentemente pagos.” (CJP, 342) Com isso, Israel renunciou à primogenitura e ao
protagonismo histórico e deixou de contar como cultura, se por esta se entende não “um
conjunto de curiosidades arqueológicas às quais um sentimento de piedade conferiria, por
sua virtude própria, valor e atrativo”, mas “um conjunto de verdades e formas que
respondem às exigências da vida espiritual e da vida propriamente dita.” (REJ, 370-371)
Ao destituir-se como cultura e perder o compasso do tempo, Israel acabou perdendo a
audiência dos que esperariam ouvir a palavra que ele teria a dizer: “A Sinagoga sem
fundamento não saberia subsistir. É preciso buscar as condições de sua possibilidade. Pois
um fato é certo: reduzida a si mesma, sob as tempestades dos tempos modernos, a
Sinagoga esvaziou as sinagogas.” (CJP, 343)

Assim, nesses tempos revoltos e revoltosos, o discurso religioso judaico se torna


implausível não tanto pelo descrédito filosófico da teodiceia quanto por tais privatizações
do Divino, que inviabilizam o diálogo da tradição com as questões humanas emergentes
do contexto histórico-social:

É intolerável, no século XX, essas domesticações do Eterno. Não há mais,


propriamente falando, vida privada. Todas as questões que apelam nossas decisões
e nos põem em relação com os semelhantes, engajam nossa particularidade mais
íntima. A pureza moral, a dignidade moral não se jogam no face a face com Deus,
mas no meio dos homens. O Deus judaico jamais tolerou esse face a face. Ele
sempre foi o Deus das multidões. O judaísmo não nos deveria ser solicitado no
dia do Kipour, à hora da prece dos mortos, mas todos os dias e pelos viventes.
(CJP, 345)
3
Sintonizada com o espírito do tempo, a juventude é a primeira a desertar dessa
sinagoga reduzida ao estado de museu (CJP, 343), como se a cultura judaica “houvesse
perdido seu valor humano e não chegasse a igualar os alimentos espirituais da civilização
ambiente.” (REJ, 370) Para que venha a dar uma contribuição civilizatória à altura das
graves exigências do século XX, portanto, segundo Levinas, é preciso que Israel se
reaproprie de si mesmo como civilização e promova uma atualização hermenêutica pela
qual sua mensagem recobre fecundidade de sentido e responda aos desafios atuais.
Tratando-se de um povo formado ao redor da revelação contida em um livro – o Livro –,
com a inesgotável tecitura de interpretações sapienciais, princípios, valores, códigos
normativos e ritos que dele derivam, para Levinas a refundação histórica da civilização
judaica não é possível senão a partir de uma ampla mobilização educacional que assegure
a lúcida apropriação e aprofundamento desse legado formativo. Com efeito, não se é
judeu por mera herança genética ou adesão afetiva, mas a partir de cuidadosa iniciação
pedagógica à sabedoria revelada no Livro. Ser judeu é ler e viver a vida à luz do Livro.
De um lado, isto significa que a vida do judeu é um aprendizado incessante e inconcluso
da sabedoria do Livro a partir dos eventos da vida e, de outro, que a sabedoria do Livro
somente se consuma e se prova na vida, em atos, na relação com os outros seres humanos.

No entanto, para Levinas não basta assumir o Livro como centro da vida e da
civilização; é preciso retomá-lo em sua língua originária – o hebraico – e à luz dos
comentários sapienciais rabínicos do Talmud3 que, séculos a fio, fazem-no falar a partir
dos acontecimentos da história, reinaugurando a cada vez “um diálogo inacabado com
um mundo reposto em questão.” (REJ, 372) Longe de reivindicar uma suspeitosa
prerrogativa de endogenia confessional, ler o Livro no hebraico e à luz do Talmud – no
espírito que suscitou Israel – seria, para Levinas, garantir a perene atualização histórica
de sua mensagem, mas sobretudo salvar o crivo hermenêutico das “verdades correlativas
de virtudes”, sem o qual a sabedoria do Livro ficaria limitada, aí sim, ao mero
“pensamento de um povo isolado” (PHH, 383): “Segundo o judaísmo, o verdadeiro não
encontra simbolismo fiel que o preserve da imaginação senão nas atitudes práticas, numa
Lei. Os grandes textos do judaísmo rabínico, inseparáveis da Bíblia, expõem essa Lei na
qual consistem as grandes verdades.” (PHH, 382).

3
Livro sagrado dos judeus, contém as discussões rabínicas referentes à lei, costumes e história do judaísmo.
Compõe-se da Mishna (220 d.C), primeiro compêndio escrito da Lei Oral judaica; e da Guemara (500 d.C),
discussão da Mishna e de outros escritos sapienciais judaicos.

4
De qual lei se trata, afinal? Ei-la:

O monoteísmo que anima o Livro – a mais perigosa, a mais alta das abstrações –
não consiste em conduzir o ser humano, em suas imperfeições, ao encontro de um
Deus consolador, mas em reportar a presença divina à justiça e aos esforços
humanos, como se reporta a luz do dia aos olhos, único órgão capaz de ver. A
visão de Deus é ato moral. Essa ótica é uma ética. O Livro não nos conduz aos
mistérios de Deus, mas às tarefas humanas. O monoteísmo é um humanismo.
Somente os néscios fazem dele uma aritmética teológica. Os livros em que esse
humanismo se inscreve esperam seus humanistas. Para os que querem continuar
o judaísmo, a tarefa consiste em abrir esses livros. (PHH, 382-383)
Uma ressalva primordial, porém, seja feita. De tal modo a “mais perigosa e alta
das abstrações” que funda o humanismo hebraico separa-se, na tradição do Talmud, de
toda noção nacional, local, racial ou histórica associada a Israel, que, para o Rabi Meïr –
um dos principais doutores da Lei –, “um pagão que conheça a Torá4 é igual ao Grande
Patriarca de Israel”. (URA, 40) Israel detém a primogenitura, mas não a exclusividade da
mensagem que lhe foi confiada.

2. “Ateliê de ardente trabalho”

Criado no judaísmo ashkenazi5 do Leste europeu, com sua ênfase no estudo do


Talmud, Levinas frequentou desde tenra idade as escolas rabínicas, cujo ambiente de
devoção ao Livro e aos livros, cuja reverência à figura do mestre, franca circulação de
saberes e fomento de intenso debate de ideias, jogaram importante papel em sua formação
pedagógica e, em certa medida, transpiram em seu pensamento e obra. Entretanto, foi
preciso o contexto de derrocada do século XX, com as Grandes Guerras, os totalitarismos
nazista e soviético e a escalada mundial do capitalismo neocolonial para que a “nostalgia
das fontes hebraicas” (PJH, 226) viesse a se tornar um clamor coletivo, motivando a
instalação de escolas rabínicas em países da Europa Ocidental, em busca do reavivamento
daquele “humanismo monoteísta” acima referido. De volta a Paris após o fim da Guerra,
Levinas foi convidado pela Aliança Israelita da França para assumir a direção da École
Normale Israelite Oriental (ENIO), encarregada de formar professores de hebraico e
cultura judaica para atuarem em países do Oriente Médio e Norte da África, fato que lhe

4
Cinco primeiros livros da Bíblia judaica (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio), que
constituem o texto central do judaísmo.
5
Nome dado aos judeus provenientes da Europa Central e Europa Oriental.

5
deu valiosa expertise na compreensão do papel civilizatório das escolas rabínicas no pós-
Guerra.

A sabedoria judaica é tão inseparável dos textos bíblicos e rabínicos quanto estes
o são da língua hebraica em que foram originalmente escritos, cuja “vida profunda” só
pode ser decifrada com o método, disciplina e dedicação que o ambiente escolar oferece.
Ademais, a aproximação dos textos sagrados impõe o mesmo “espírito interrogador” que
permitiu aos comentaristas talmúdicos do passado desentranhar do Livro novos
ensinamentos a partir de seus respectivos tempos históricos e pontos de vista. Sendo
assim, é preciso transformar o judaísmo em ciência, e organizar a ciência do judaísmo em
instituição escolar, o que não significa meramente submeter suas fontes à perícia técnica
da filologia e outras especialidades, mas permitir que seus textos permaneçam tão
ensinantes hoje quanto o foram outrora. (REJ, 372) Aqui, o rigor sobre o texto deriva do
amor ao que ele revela.

Concebida para ser a principal incubadora do pensamento judaico contemporâneo,


a nova escola rabínica menos assemelha-se ao estilo do liceu público, com programa de
conteúdos curriculares ministrado a centenas de estudantes, que ao de um “ateliê de
intenso e ardente trabalho”. (CJP, 349) Em seu plano de base para uma política cultural
na França, Levinas orienta que a escola rabínica não tenha um perfil eclesiástico,
reservado à formação de quadros para a sinagoga, mas fomente uma intelligentsia judaica
destinada a ocupar os primeiros postos na comunidade e intervir com protagonismo na
vida pública. A simples reunião dessa intelligentsia, por si, já teria um alto valor
educativo. Não obstante sua autonomia intelectual, a escola deve imbricar-se numa
estrutura institucional de conjunto, atuando em cooperação com a sinagoga a serviço da
comunidade. Escola de Altos Estudos e de tempo integral, mantida por professores judeus
qualificados, na qual as humanidades judaicas sejam ensinadas “em consideração a sua
verdade intrínseca e não por mero conhecimento histórico ou exercício de piedade.”
(CJP, 349)

Mesmo resguardando sua unidade de projeto, a escola rabínica deve permanecer


aberta ao pluralismo de tendências e adaptar-se aos modos de uma juventude secularizada,
pouco afeita à educação judaica. (CJP, 350) É essa simbiose de tradição e jovialidade,
reverência e abertura, memória e pesquisa, devoção e questionamento, que confere às
novas casas de estudos rabínicos sua singular persona institucional, a rigor nem antiga,
nem moderna:
6
A novidade é o surgimento, na Europa ocidental, de casas de estudos talmúdicos
típicas da Europa oriental, e de movimentos de jovens e adultos, que buscam nos
textos tradicionais da literatura rabínica uma resposta a questões postas a um
Ocidental de formação moderna. A novidade do pensamento judaico está na
revalorização ocidental do Talmud, não mais tratado arqueológica nem
historicamente, mas como ensinamento. (PJA, 226-227)
Foi preciso que a civilização ocidental moderna chegasse a um estágio muito
avançado de exaustão para que o ideal de progresso deixasse de ser uma sedução
irresistível e se buscasse na lucidez da tradição a resposta a questões para as quais a
racionalidade científica ou crítica já não pareciam suficientes.

Simultaneamente ligado a uma venerável tradição sapiencial e bem aclimatado à


secularização moderna, o humanismo hebraico promove o conhecimento “das virtudes
mais altas”, mas não impõe adesão às fontes espirituais que as revelam. Permanece em
solo laico, “no cruzamento de fé e lógica” (PHH, 381), antes importando-lhe os princípios
do agir que promovem a aproximação entre os seres humanos do que as crenças que os
dividem. O judaísmo acredita piamente na inteligência humana. Para o judeu, a educação
quase se confunde com instrução, e o ignorante propriamente dito não saberia ser piedoso:
“A pertença ao judaísmo supõe rito e ciência. A justiça é impossível ao ignorante. O
judaísmo é uma extrema consciência.” (EE, 17) Para que os valores judaicos formem a
alma, é preciso que “nutram o cérebro”. (REJ, 371) Daí a importância, na espiritualidade
judaica, da aplicação da inteligência ao conteúdo do Livro, de modo que a noção de
revelação se alargue até compreender todo saber essencial. (URA, 29-30) Para o
judaísmo, segundo Levinas, não bastam a piedade, o entusiasmo e os sentimentos puros:

Só se impõe de verdade o que traz o selo do intelecto. A única honra dos tempos
modernos consiste em tomar consciência da razão, na qual o judaísmo se
reconhece. Só os altos estudos tornarão possível um ensino secundário ou primário
que não será desmentido ou esquecido ao primeiro contato com o mundo no qual
entendemos viver, trabalhar e criar. (REJ, 373)
Decorre da dimensão secularizante do humanismo judaico a firme recusa de toda
e qualquer forma de sacralidade numinosa. Esta não se dirige à inteligência de face,
privando-a do direito de compreensão e resposta, ao tempo em que aliena o ser humano
a uma potência sagrada triunfante, “com sua vida clandestina e misteriosa”, que o possui
no “entusiasmo extático” e – de tudo o mais grave – substitui o Eterno por um ser divino
à imagem das representações e à medida dos desejos humanos. O judaísmo é
imensamente cioso da transcendência de Deus, da liberdade do ser humano e da
autonomia da inteligência e, com o mesmo ardor com que os reverencia, trata de investir

7
impiedosamente contra os “mitos” religiosos que os ameaçam, “desenfeitiçando” assim
o mundo e denunciando como idolatria essa religiosidade do sagrado:

O numinoso ou sagrado envolve e transporta o ser humano para além de seus


poderes e quereres, mas uma verdadeira liberdade ofende-se com esses excessos
incontroláveis. O numinoso anula as relações entre as pessoas, fazendo-as
participar, pelo êxtase, de um drama que elas não desejaram, numa ordem na qual
se abismam. O sagrado que me transporta é violência. (URA, 28)
Por essa via crítica, o humanismo judaico reencontra a rota do pensamento
ocidental que, desde os Pré-Socráticos – vide Xenófanes –, previne contra concepções
antropomórficas do Divino, como se o risco de ateísmo, próprio ao exercício exigente do
pensamento filosófico, fosse o inevitável tributo a se pagar pelo resgate da maioridade.
(URA, 31) Nesse sentido, em face do divino mitologizado, o monoteísmo judaico também
é um ateísmo:

A afirmação rigorosa da independência humana e de sua presença inteligente ante


uma realidade inteligível, a destruição do conceito numinoso do sagrado –
comportam um risco de ateísmo que se deve correr, pois somente por ele o ser
humano eleva-se à noção espiritual do Transcendente. É uma grande glória para o
Criador ter posto sobre os pés um ser que o afirma após contestá-lo e negá-lo nos
prestígios do mito e do entusiasmo, ter criado um ser capaz de buscá-lo de longe,
a partir da separação ou do ateísmo. (URA, 30)
Assim entendido, o ateísmo é ainda mais que um tributo ou rito de passagem no
caminho de maturação espiritual e humana; é uma dimensão constitutiva da própria vida
espiritual judaica, como se fosse a reverência ao Eterno considerada em seu avesso.
Noutras palavras, e indo mais longe, dir-se-ia que, em certa medida, não há vida religiosa
judaica sem ateísmo: “O monoteísmo ultrapassa e engloba o ateísmo, mas é impossível a
quem não atingiu a idade da dúvida, da solidão e da revolta.” (URA, 31, grifo nosso)

Como observa Levinas, não deixa de ser sintomático que a pertença ao


humanismo judaico se revele, amiúde, mais vigorosa e tenaz nos que não lhe conferem
nenhum sentido religioso e vivem uma “espiritualidade estranha à herança religiosa.”
(CJP, 346-347) Ao passo que não são raros os frequentadores de sinagoga “acomodados
à inércia”, entre os que a deixaram “pelos ventos do mundo” há “grandes almas tomadas
pelo absoluto.” (EO, 378) Com efeito,

Nessa época a presença judaica se manifesta antes na participação dos israelitas


em movimentos libertadores e sociais – na luta pelos direitos humanos e por uma
justiça social atuante – que nos sermões das sinagogas emancipadas. Todos esses
negadores da tradição, todos esses ateus e insurgentes reúnem, à sua revelia, a

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divina tradição da justiça intransigente que, por antecipação, expia as blasfêmias.
(EE, 16-17)
Extremo paradoxo típico da condição judaica: ateus devotos da “divina justiça” a
expiar por seus atos a culpa dos que transgridem a Lei de Deus, por vezes, em nome de
Deus; rebeldes reverentes que se insurgem contra estéreis tradicionalismos litúrgicos por
fidelidade à tradição de justiça saída do Livro. Para quem se contente em ver nessa
expressiva estirpe judaica de “piedosos ateus” ou “reverentes rebeldes” apenas um
desconcertante acaso, caberia indagar se a recusa ateia – dura, madura – das máscaras do
divino justamente não favoreceria a devoção ao caráter divino da justiça que clama pelo
rosto do próximo, conforme uma vetusta linhagem de profetas hebreus que denunciavam
o culto a Baal6 em nome da sacralidade das vítimas humanas a ele imoladas. Caberia
questionar se o enterro do deus morto não liberaria afinal o ser humano para a dimensão
de “altura” a partir da qual o Eterno se pode revelar, considerando que “Deus eleva-se a
sua suprema presença como correlativo da justiça feita aos humanos.” (TI, 64) Para a
salvaguarda dessa cultura que “identifica espírito e justiça” foram plantadas as escolas
judaicas da Diáspora, cujos estudos não oferecem ao ser humano uma sabedoria exótica
a mais, mas visam “ressuscitar uma de suas almas”. (PHH, 384) Em suma, “Que a relação
com o divino atravesse a relação com os seres humanos e coincida com a justiça social –
eis todo o espírito da Bíblia judaica.” (UR, 36)

3. Crer em Deus é cumprir sua lei

Segundo o monoteísmo judaico lido pela tradição rabínica, o sentido primordial


da educação consiste em “instituir e manter a relação entre o ser humano e a santidade de
Deus” (URA, 28) – aqui tomada no sentido etimológico de “separação” ou distância –,
pois, ao reconhecimento da transcendência intransponível do Altíssimo, corresponde a
obediência à lei inviolável por Ele revelada, na qual se comunica todo sentido digno de
ser cultivado. Crer no Único é cumprir sua lei, reverenciá-Lo é agir segundo sua justiça.
Na sabedoria judaica, o ser humano ergue-se em resposta ao Eterno – e é chamado a
existir na relação com e para outrem. A sua medida está além de si. A imanência a si
mesmo – ao seu ser, saber e poder – seria a mais radical destituição de sua destinação
enquanto humano.

6
Deus principal dos fenícios e cartagineses.

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Em torno desse enlace seminal de transcendência divina e alteridade humana,
germinam as principais concepções do legado espiritual judaico, das quais Levinas
oferece um resumo exemplarmente didático – como convém a um texto desse teor – no
verbete “Judaísmo”, escrito para a Encyclopaedia Universalis, para cuja transcrição mais
extensa pedimos licença ao leitor:

O que diz a voz de Israel e como traduzi-la em algumas proposições? O


monoteísmo de Israel denota um conjunto de significações a partir das quais a
sombra do Divino se projeta, além de toda teologia e dogmatismo, sobre os
desertos da Barbárie: seguir o Altíssimo, não ser fiel senão ao Único; desconfiar
do mito pelo qual se impõem o fato dado, os condicionantes do costume e do
terror, e o Estado maquiavélico e suas razões de Estado; seguir o Altíssimo, de
modo que nada seja superior à aproximação do próximo, à preocupação pela sorte
‘da viúva, do órfão, do estrangeiro e do pobre’, não havendo verdadeira
aproximação de ‘mãos vazias’; é sobre a terra, em meio aos humanos, que se passa
a aventura do espírito; o trauma da escravidão no Egito constitui minha própria
humanidade – que me reaproxima, de início, de todos os proletários, miseráveis,
perseguidos da terra; na responsabilidade por outrem reside a minha unicidade:
não saberia me desobrigar de ninguém, assim como não saberia me fazer substituir
ante minha morte; donde a concepção de uma criatura que tem a chance de se
salvar sem cair no egoísmo da salvação; o ser humano é, assim, indispensável aos
desígnios de Deus ou, mais precisamente, ele é o próprio desígnio de Deus no
ser; daí a ideia de eleição, que pode se degradar em orgulho, mas que
originalmente exprime a consciência de uma assinação irrecusável da qual vive a
ética e pela qual a universalidade da finalidade buscada implica solidão, a
colocação à parte do ser responsável; o ser humano é interpelado no julgamento
de justiça que reconhece essa responsabilidade, e a misericórdia atenua os rigores
da Lei, sem jamais suspendê-la; o ser humano só pode o que ele deve; ele poderá
dominar as forças hostis da história realizando um reino messiânico, um reino de
justiça anunciado pelos profetas; a espera do Messias é a própria duração do
tempo. (J, 45-46)
Articulam-se no trecho acima posições que comunicam singular atualidade ao
pensamento judaico. O “Altíssimo” ou “Único” não é exaltado por sua onipotência, mas
como o dispensador da lei de justiça que justamente interdita a conversão do poder em
regime de vida. Separado de sua criação – Santo –, o Altíssimo não submete a história
como um deus ex machina, mas confia ao homem/mulher, pela livre adesão ao bem, a
instauração de seus desígnios no ser. A eleição do ser humano pelo Eterno não implica
privilégio ao eleito, mas o encargo de cumprir Sua lei, a qual consiste não propriamente
em atender ao arbítrio divino, mas em responsabilizar-se pelo próximo que ordena justiça,
chama ao acolhimento e interdita a violência. De tal modo outrem é visado na lei divina
que, segundo a sabedoria judaica, “O Criador que suporta todo o universo não pode
suportar, não pode perdoar o crime que o ser humano comete contra o ser humano”, de

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modo que “a falta cometida contra Deus aumenta o seu perdão, mas não a ofensa contra
o próximo.” (URA, 37) Assinalado pelo Eterno, o sujeito encontra a sua unicidade não
em si mesmo, mas na responsabilidade pelo outro que o interpela. E vai tanto mais ao
encontro de sua salvação, quanto menos esta importa para si mesmo. Nessa linha,
movendo-se na contracorrente de uma milenar obsessão que lateja no coração de fiéis das
mais diversas tradições (e de tantos infiéis), a sabedoria judaica reserva importância
secundária – ou franca desconsideração – ao afã de imortalidade, face à urgência de acudir
aos clamores dos “miseráveis e perseguidos da terra”, pois, mais importante que persistir
no ser em “outra vida”, é agir de acordo com o sentido que o justifique nesta. “Ser ou não
ser” já não é, portanto, a questão. A tal ponto chega a primazia judaica do bem sobre o
ser que o salmista, do fundo de sua fossa, com a alma “sedenta”, ainda clama pelos
mandamentos divinos, como se estes fossem o próprio respiro de sua alma e lhe valessem
antes que todo consolo ou conforto: “Minha alma parte-se por suspirar por teus
julgamentos a cada instante.” (Sl 119, 20, apud URA, 36)

Criador separado da criação, anterioridade da bondade divina sobre a onipotência,


ação de Deus pela justiça humana, eleição como responsabilização, constituição da
unicidade pela alteridade, salvação sem preocupação com a salvação, superação da
disjunção entre ser ou não ser, prevalência do bem sobre o ser e da retidão sobre o consolo
– eis um repertório de subversivas ortodoxias da tradição judaica que o espírito crítico
moderno, após tantas rupturas e emancipações, por si mesmo não teria como prover ante
os desafios do mundo contemporâneo.

4. Ótica ética

Subjaz as proposições acima a primazia hermenêutica da ética. Segundo a


sabedoria judaica revisitada por Levinas, a ética “é a própria visão de Deus. Tudo o que
sei de Deus e posso entender de Sua palavra, encontra expressão ética.” Nesse sentido, a
justiça feita ao outro permite uma proximidade “inultrapassável” de Deus, “tão íntima
quanto a prece e a liturgia que, sem justiça, nada seriam.” (URA, 33-34) A sabedoria
áspera do Livro desconfia de toda consolação espiritual que tende a fazer do divino objeto
de fruição privativa, como se toda religiosidade estivesse a um passo de transformar-se
em ópio. A “amizade espiritual” com Deus é impensável sem a realização de uma
“economia justa na qual cada um é plenamente responsável.” (URA, 36) A rigor, portanto,

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“o piedoso é o justo”. Mesmo o amor a outrem demanda justiça aos outros, uma vez que
a terna responsabilidade devida ao ser amado não perde de vista o outro ser humano – o
“terceiro”, próximo do próximo – que, em sua relação com o ser amado, fora do circuito
amoroso dialógico, me interpela à justiça e, nessa medida, também é meu próximo. Isto
significa que o amor ao próximo só o é propriamente quando me abre e permanece aberto
à aproximação dos demais. (URA, 34) Realizar a sociedade justa entre os humanos é “a
beatitude e o sentido da vida” e, ipso facto, elevação à sociedade com Deus. Nenhuma
relação com Deus é mais própria, ou mais imediata, que a relação ética, e o Divino não
se manifesta senão pelo próximo. (PJH, 223)

Dito em termos filosóficos, a mensagem fundamental do pensamento judaico


consiste em “conduzir o sentido de toda experiência à relação ética entre os humanos.”
(PJH, 223) À luz da ética – e somente à sua luz – mostra-se o sentido do real e a
sacralidade do universo em toda sua espessura concreta: em última instância, o pão é o
que se partilha, a casa é onde se acolhe, o corpo é o ouvido atento e as mãos estendidas
ao encontro e ao dom. Dizer que o senso do real se compreende à luz da ética, é dizer que
o universo é sagrado enquanto votado à hospitalidade, ao dom e à responsabilidade. Aqui,
a ética usurpa da ontologia o estatuto de filosofia primeira. Para Levinas, na ontologia
tratar-se-ia de desvelar o ente à luz neutra e englobante de um ser universal, retirando-lhe
a possibilidade de comparecer por si mesmo, isto é – no final das contas –, a partir de sua
fala. Nesse sentido, no horizonte luminoso da ontologia o ente conserva a sua silhueta,
mas “perde a sua face” e se oferece à livre apropriação do pensamento, redundando o “eu
penso” em “eu posso”. A teoria – “visão do todo” em sentido etimológico – renunciaria,
assim, “à maravilha da exterioridade” (TI, 30) e, nessa medida, considerada como prima
philosophia, a ontologia seria uma filosofia do poder e da injustiça. (TI, 33-34)

Se é assim, caberia reconhecer que a ética cumpre a vocação “ontológica” antes


que a própria ontologia, já que sua perspectiva estaria melhor ajustada a corresponder ao
ser do outro. Com efeito, já não se trata de interrogar sobre o ser do outro, mas de
interrogar o outro ou, melhor ainda, deixar-se interpelar por ele. Na ética, a ótica converte-
se em escuta: o real se mostra de frente e não à luz do horizonte, e a experiência absoluta
não é apropriação pelo desvelamento, mas revelação, pela linguagem, de “uma presença
que vem das alturas, imprevista, ensinando a sua novidade.” (TI, 53) Nesse sentido, a
relação ética supõe o gesto pedagógico primordial de se deixar ensinar pela palavra
“essencialmente magistral” de outrem: “O Outro não é para a razão um escândalo que a

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põe em movimento dialético, mas o primeiro ensino racional, a condição de todo ensino.”
(TI, 171) A inteligência humana desperta a partir da revelação da alteridade do outro e,
por isso, o estatuto de racional sequer caberia a um discurso constituído à margem do
encontro e do diálogo. (SANTOS, L., 170)

Na ótica da ética, outrem é compreendido como rosto (visage) – o que se apresenta


por si na linguagem. O olhar do rosto “não reluz – fala” (TI, 53) e abre “o discurso
original, cuja primeira palavra é obrigação que nenhuma ‘interioridade’ permite evitar.”
(TI, 179) Em sua apresentação na fala, outrem é invocado antes que nomeado, e saudado
antes que conhecido. A conversação – o face a face – suspende a violência, ao exigir
como condição prévia que os falantes renunciem à dominação e se exponham à resposta
do outro, sendo assim de ordem ética antes que teórica. (EE, 20) Falando por si, de frente,
para além da luz do horizonte, o rosto não se encerra em sua forma visível nem se oferece
à captura, mas “destrói a cada instante e ultrapassa a imagem plástica que me deixa, a
ideia à minha medida e à medida de seu ideatum – a ideia adequada.” (TI, 37-38) Além
de toda adequação cognitiva, o rosto rompe a totalidade autorreferente da consciência e
introduz nesta a ideia de infinito como “exterioridade total em relação àquele que a
pensa.” (TI, 36) O infinito revelado no rosto advém ao sujeito de fora do campo de
vigência de seu ser, saber e poder. Ele não significa – comunica-se; não se manifesta –
revela-se. Pensá-lo é “fazer mais ou melhor do que pensar” (TI, 36):

O olhar moral mede, no rosto, o infinito inalcançável no qual se aventura e


sucumbe a intenção mortífera. Por isso, ele nos conduz além de toda experiência
e olhar. O infinito só se dá ao olhar moral: ele não é conhecido, está em sociedade
conosco. A relação que começa com o ‘não matarás’, não é conforme o esquema
de nossas relações habituais com o mundo: o sujeito que conhece ou absorve seu
objeto como um alimento, e satisfaz sua necessidade. Tal relação não retorna ao
ponto de partida, transformando-se em satisfação, fruição ou conhecimento de si.
Ela inaugura a caminhada espiritual do ser humano. (EE, 23)
Na perspectiva aqui considerada, ética já não diz mera ação em conformidade com
normas socialmente legitimadas ou princípios e valores da consciência, mas relação de
responsabilidade para com outrem ou não-indiferença pela sua diferença. Acontecimento
relacional, a ética transborda o acordo com a norma ou a solitária coerência do sujeito
com a voz de sua consciência: é descentramento de si mesmo, exposição à exterioridade
de outrem, resposta a sua palavra e despertar para o sentido do humano, implicando o
“trauma” de uma dessubjetivação que leva o sujeito a reconstituir-se a partir do outro.
Ética é êxodo sem retorno.

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5. Libertar a liberdade

Na relação ética, a alteridade inviolável e vulnerável de outrem sobrevém do


“alto” – com autoridade –, pois seu rosto enuncia um comando que me interdita a
violência (“não matarás”) e me obriga à justiça e responsabilidade. Bem entendido, tal
assimetria da relação ética nada tem a ver com qualquer propriedade ou mérito de outrem
que lhe dariam uma condição de suposta “superioridade” sobre mim; concerne antes a
sua (de)posição de alteridade – estrangeira ao meu domínio, despojada de meus recursos
e exposta ao meu poder –, face à qual não tenho como permanecer indiferente e não
contrair débito, tanto mais agravado quanto maiores o despojamento e vulnerabilidade do
outro: “A nudez do rosto é penúria. Reconhecer outrem é reconhecer uma fome.” (TI, 62)
Nesse sentido, dar a outrem é restituir-lhe o que lhe devo. Em última instância, justiça e
responsabilidade não são iniciativa ou mérito meus, mas correspondência direta e reta à
exigência inscrita no rosto de outrem. Não sou eu quem lhe faz justiça; é ele quem me dá
a chance de deixar que a justiça se cumpra. Não faz sentido, portanto, cobrar de outrem a
contrapartida pela responsabilidade que lhe devo, nem esperar dividendos pelo bem
praticado. A exigência de retribuição pela responsabilidade empenhada comprometeria
inapelavelmente o sentido desta. E a responsabilidade de outrem por mim diz respeito a
ele, não a mim. A relação ética é sem reciprocidade e a fundo perdido e – suprema
subversão – torna-se tanto mais defasada quanto mais responsiva, como um desejo
insaciável que se alimenta de sua própria saciedade (TI, 22), como uma resposta que
jamais termina de cumprir-se, por ter diante de si o infinito da alteridade irredutível à
imanência do eu:

Intuição fundamental da moral: eu não sou igual a outrem, pois me vejo obrigado
a seu respeito e, pois, sou infinitamente mais exigente em relação a mim que a ele.
Não há consciência moral sem consciência da posição excepcional do eu derivada
dessa eleição. A reciprocidade é uma estrutura fundada sobre uma desigualdade
original.
Se houvesse apenas a alteridade de outrem diante de mim, a relação ética
permaneceria assimétrica. No entanto, há o próximo do próximo (o terceiro), e o outro
daquele, e assim por diante, a instaurar um espaço coletivo que reúne presenças laterais
sob a mesma perspectiva geral. O “ser-para” da socialidade ética dá lugar ao “ser-com”
da socialidade jurídica; os rostos se apagam e aparecem os perfis indiferenciados a
coexistir na ordem civil. Impõe-se, portanto, comparação e mensuração em vista do
estabelecimento de uma justiça objetiva que considere a todos – inclusive a mim – como

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iguais perante a lei impessoal, evitando que privilégios privados suprimam direitos
universais. Porém, para Levinas a justiça equitativa é tão somente uma extensão mitigada,
para os demais seres humanos, da responsabilidade ilimitada originalmente devida ao
próximo. Trata-se de uma necessária limitação da responsabilização interpessoal em
favor da garantia do direito de todos, que de modo algum retira da ética assimétrica a
primazia pedagógica na constituição do sentido do bem. Com efeito, a sociedade “não é
coexistência de multidões humanas ou participação nas leis coletivas, mas o milagre da
saída de si.” (EI, 22) Transferir para o plano normativo tal prerrogativa pedagógica seria
reduzir a prática da justiça a um cálculo ardiloso pelo qual o dever para com outrem seria
exercido como inevitável contrapartida ao usufruto do próprio direito, fazendo da ética,
no final das contas, uma organização racional dos deveres de todos a serviço do interesse
de cada um.

No entanto, o ser humano está longe de encontrar a sua medida em si mesmo: “A


verdadeira vida está ausente.” (TI, 21) Assim como a alteridade impõe justiça e
responsabilidade, não obstante eventuais deméritos de outrem, em face de outrem o eu
precisa justificar-se, apesar de todos os seus direitos.

Segundo Levinas, ser eu “é ter a identidade como conteúdo.” (TI, 24) Aqui, a
identidade não é lida à luz da categoria de substância da ontologia clássica, que estabelece
neutra equivalência tautológica do ser a si mesmo (“eu sou eu”); muito menos o eu se
inscreve no âmbito do Espírito absoluto, como no idealismo alemão. Em chave
fenomenológica, Levinas descreve a identidade do eu a partir do mundo, como processo
de identificação inseparável do “concreto do egoísmo”. O eu existe para si, como
dinâmica de autocentramento ou interioridade, separado da totalidade das coisas,
mantendo-se no mundo como sua morada pela apropriação do outro como objeto de saber,
fruição, trabalho, posse, em suma, como objeto de poder. No mundo, ser eu é permanecer
o Mesmo contra o outro:

A maneira do Eu contra o ‘outro’ do mundo consiste em permanecer, em


identificar-se, existindo aí em sua casa. O Eu, num mundo, à primeira vista, outro,
é, no entanto, autóctone. O ‘em sua casa’ é um lugar onde eu posso, onde,
dependente de uma realidade outra, sou, apesar dessa dependência, ou graças a
ela, livre. A possibilidade de possuir, isto é, de suspender a alteridade daquilo que
só é outro à primeira vista e outro em relação a mim – é a maneira do Mesmo.
(TI, 25)

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Se eu tivesse diante de mim apenas coisas à vista e à mão, a vida não passaria de
uma alegre dissipação de posses, e o mundo seria um reino ao dispor de minha solitária
soberania. Mas eis que, de fora e acima de meu mundo, sobrevém o rosto de outrem, tábua
viva da lei na qual se inscreve o “não matarás” e demais interdições ao meu poder, pondo
“em questão minha tendência natural a me apropriar de tudo o que toco.” (URA, 32) A
existência econômica é, então, chamada a converter-se em existência ecumênica,
derivada do mencionado “milagre da saída de si”. Assim, a condição de possibilidade da
sociedade reside no reconhecimento de que poder não equivale a dever, e que o eu não é
inocente: “A consciência é a impossibilidade de invadir a realidade como uma vegetação
selvagem que absorve, rompe ou expulsa o que a circunda.” (EE, 22) A consciência de si
é, portanto, inseparável da consciência da injustiça natural feita por si a outrem, em razão
da própria estrutura do Ego. Na consciência de si, a descoberta de seus poderes não se
separa da descoberta de sua ilegitimidade; por isso, a consciência moral é o modo
elementar da consciência de si. Ser para si, é já saber minha falta para com outrem.
“Inteiramente só”, o eu se encontraria em estado de “dilaceração”, como se já houvesse
usurpado um lugar que não lhe pertence. (URA, 32-33) Nesse sentido, ética é “a
impugnação de minha espontaneidade pela presença de outrem.” (TI, 30)

Deixada à sua deriva, a liberdade do sujeito “descobre-se mortífera em seu próprio


exercício.” (TI, 71). Ao contrário do que prevalece no pensamento moderno, cuja
“revolução copernicana” põe o sujeito no centro do real, para Levinas a principal tarefa
da filosofia não consiste em “demonstrar” a possibilidade da liberdade, mas em
“justificar” o seu sentido ou torná-la justa. Se a liberdade “não está nua” em face do rosto
que tende a ignorar ou violar, cumpre “descobrir a investidura que a liberte do arbitrário.”
(TI, 71) A liberdade precisa ser libertada. Chegamos assim a outro paradoxo da sabedoria
judaica, pelo qual a autonomia humana – como tal – não repousa no eu, mas numa
“suprema heteronomia” – “e a força que por si produz maravilhosos efeitos, a força que
institui a força, a força civilizadora, chama-se Deus.” (URA, 25) Ora, como Deus
comunica-se à liberdade humana por sua lei ou comando (mitzwah), conhecê-Lo é saber
como se deve agir. Sendo assim, o aprendizado supremo, na educação judaica, consiste
em reconhecer e obedecer a esta outra vontade que se encontra à base de toda realidade.
(URA, 33).

Nada disto significa destituir a autonomia humana, mas abri-la à precedência de


sentido da transcendência divina, tal como esta se revela na alteridade de outrem. Com

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efeito, na relação ética outrem se apresenta como absolutamente outro, mas sua alteridade
radical não destrói minha liberdade: “A relação ética é anterior à oposição das liberdades.
O rosto do próximo tem uma alteridade que não é alérgica, mas abre o além (au-delà).”
(URA, 34) Por isso, a mesma educação que ensina o ser humano a obedecer à lei divina
também permanece relação com um ser livre, posto que “A liberdade não é um fim em
si, mas a condição de todo valor que o ser humano possa atingir.” (URA, 29) Não se trata,
portanto, de encurtar o campo de ação da liberdade, mas de encontrar sentido ao seu poder
ou “a força que institui a força”. Dito em termos teológicos, “O Deus do céu é acessível
sem nada perder de sua transcendência e sem negar a liberdade do fiel.” (URA, 34) Ou
ainda:

O judaísmo integra sua exigência de uma liberdade quase vertiginosa ao desejo de


Deus, sentindo a Sua presença na relação com o ser humano. A relação ética
aparece como excepcional: nela, o contato com um ser exterior institui e investe a
soberania humana, ao invés de comprometê-la. (URA, 31)

6. Antiga atualidade

Na tradição judaica, a formação do sujeito para a relação ética – a libertação da


liberdade – passa pela pedagogia do rito. O rito é o espírito da lei traduzido em disciplina
gestual; é a educação pelo gesto. Supõe que o humano em nós não se comunica por
herança natural nem madura por simples concessão aos impulsos do desejo, mas – ao
contrário – é fruto de aprendizado laborioso que implica vigilante “recuo diante de si e da
natureza.” (A-HE, 400) Em sua estrutura objetiva, regular, regulatória, o rito começa por
descentrar o sujeito de si mesmo, mostrando-lhe, pela humilde subordinação a um
meticuloso receituário simbólico, que há outros princípios, sentidos, valores, em suma,
outra vontade além da que recebeu por natureza ou hábito. A autoridade prescritiva do
rito traduz em gesto a regência da lei sobre a liberdade: “É preciso manter e cortar o elã
da alma – e o rito talvez seja isto! A paixão tornando-se consciência!” (EE, 17) A
inscrição da lei na carne mediante o gesto ritual põe em curso a iniciação do sujeito na
dura ascensão para o Alto: “Sem o gesto ritual a alma não se elevaria a Deus. A via que
conduz a Deus conduz ao ser humano; e a via que conduz a este reconduz à disciplina
ritual, à educação de si, cuja grandeza reside em sua regularidade cotidiana.” (URA, 35)

Por suposto, não é sem esforço e luta que o fiel-educando é chamado a vencer,
pelo rito, a força gravitacional da própria vontade. No entanto, por mais que a fidelidade

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ritual demande uma “coragem, calma e nobreza maiores que a do guerreiro”, para o judeu
ela não chega a ser um “jugo”, considerando a singular alegria que brota da libertação da
liberdade pela prática do bem, da qual “se alimentam uma vida religiosa e toda a mística
judaica.” (URA, 35)

Na pedagogia do rito, o espírito da lei imprime-se em atos prescritivos


compartilhados pela comunidade e transmitidos de geração a geração, retirando-se do
sujeito a primazia na constituição do sentido. Não é o sujeito que fala pelo rito, é este
quem o inicia na linguagem do Eterno. Há uma similitude estrutural entre o caráter
práxico, prescritivo e interpessoal do rito e o da relação ética, cuja memória aquele deve
reatualizar. Em sua própria estrutura formal, a prática ritual já educa o sujeito para a
obediência e abertura ao outro em que deve empenhar-se na relação ética. Aqui, uma
firme desconfiança é reservada a toda tentativa sub-reptícia de sequestrar a linguagem do
rito nos arroubos “espirituais” do indivíduo, em meio aos quais apagar-se-iam as
fronteiras entre a “interioridade” e o divino, fazendo deste, ao cabo, um sublime objeto
de fruição anímica:

A educação judaica é a certeza de que um limite deve ser imposto à interiorização


dos princípios de conduta; e que as inspirações devem fazer-se ritos. As reservas
mentais da interioridade humana em vias de ‘espiritualização’ recuam aos abismos
do niilismo. (A-H E, 400)
Levinas mostra a relação de tal espiritualização individualizante, “niilista”, com
um movimento mais profundo de “liberação do desejo” a “chacoalhar obrigação e lei”, o
qual culmina sucessivos processos de liberação em curso no Ocidente desde o alvorecer
da era moderna. O tropel dos movimentos modernos de emancipação começa na luta pela
autonomia do cidadão burguês, diante da imposição de formas hereditárias de poder. Em
sequência, passa-se à luta contra a exploração econômica da classe operária, a exigir a
constituição de leis públicas que assegurem os seus direitos. Tempos depois, em nações
ditas desenvolvidas, cujas sociedades são organizadas sob rigoroso aparato institucional,
a lei já parece obstruir a liberdade que ela mesma havia tornado possível, e desconfia-se
de que, sob sua límpida face pública, ela esconderia tenebrosos desígnios repressivos. Eis
que, no século XX, o lugar privilegiado da liberação humana passa a ser visto não mais
na emancipação econômica ou política, mas na desopressão do desejo, em que o indivíduo
afinal poderia livrar-se inteiramente à realização – ou satisfação – de si mesmo, chegando-
se nos anos 1960 à “revolução sexual” e à vertigem psicodélica da “revolução
contracultural”. Presumido de sua inocência original, o eu vê-se no espelho do desejo

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como um pequeno deus e não mais teria por que nem para quem prestar contas – “é
proibido proibir”. Aqui, “não há necessidade de nenhuma relação inter-humana e as
responsabilidades se desatam.” (AH-E, 395-396) É nesse lisérgico jardim de delícias que
viceja a espiritualização “cósmica” na qual o eu (Eu) e Deus (deus) se tornariam um e o
rosto do outro, afinal, se apagaria:

A espiritualização ao extremo – é a solidão, o êxtase solitário da droga, o espírito


nos vapores do ópio! O ópio como religião do povo! Mas há um degrau a mais a
descer – neste ponto, tudo é permitido, nada é absolutamente proibido. Talvez
nada mais seja proibido com relação a outrem. (AH-E, 396)
Após tantas liberações, do coração de equívocos tempos “pós-modernos”, parece
inevitável indagar se o recalcitrante zelo judaico com a lei e o rito não se reduziria, no
final das contas, à velada preocupação com o controle social do desejo e a manutenção
da Ordem moral que “reprime a liberdade, vela a verdade e foge da realidade”: “Voltar-
se à educação judaica para nos salvar das consequências últimas da ideia de liberdade,
não é fortalecer instâncias retrógradas e moralistas da família e da pátria? Liberdade não
é, também, subversão?” (A-HE, 399)

Para o filósofo judeu, não se trata, porém, aqui, de preocupação de ordem policial,
mas “que os jovens não sejam educados sem reconhecer a distinção entre bem e mal e as
ilusões da felicidade.” Afinal, após toda margem possível de revolucionária
experimentação concedida ao campo sexual, por exemplo, com seus imprevistos efeitos
colaterais no âmbito das relações conjugais e familiares, não acontece que “o amor sem
lei” possa desembocar no “prazer sem amor?” (A-HE, 396-397) Não acontece que, na
voragem do desejo para além de bem e mal, a alteridade de outrem se veja reduzida a
objeto de fruição?

Assim, o fato de que, na sociedade contemporânea, a felicidade convertida em


ideal exija a supressão da lei e, enquanto tal, esta pareça repressiva; e que a liberdade seja
concebida “no sentido natural da vontade arbitrária” – marca, para Levinas, a ruptura do
Ocidente com sua herança bíblica, mas também o momento histórico propício para que
os valores judaicos reencontrem sua originalidade em meio à civilização hegemônica e,
à educação judaica, seja dada “a chance de tornar-se necessária, justamente por remar
contra a maré.” (AH-E, 397) O kairós dessa hora da história consiste justamente na
inusitada possibilidade de que a sabedoria do Talmud se torne uma verdade tanto mais

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oportuna e “vivente”, quanto mais se cava a distância entre a sua ótica ética e o espírito
lasso dos tempos:

Que textos desenvolvendo a lei da estrita justiça (essa entediante ética, tão
desacreditada por artistas e místicos) possam nos levar às contradições secretas e
à mais íntima respiração da alma humana; que a preocupação mais concreta,
moderna, pesada e plana de justiça social e econômica, nos transpasse como o
próprio verbo desse Deus tão familiar, amigo, cuidadoso e exigente – eis a incrível
aventura do estudante ocidental do Talmud. (PJH, 227)

Com a “espessura de uma experiência multimilenar mantida original na história”,


e a guarda da “memória da memória da sabedoria de seus ancestrais”, o judaísmo pode
oferecer não um “suplemento”, mas uma “base” à educação. (A-HE, 398) A sua
jovialidade alimenta-se de sua antiguidade, dos arcanos da memória vem a seiva de sua
atualidade, e a “particularidade” de seu monoteísmo, a revelar na ética a ótica do divino,
não “compromete, mas promete a universalidade.” (UR, 28). Eterno e hodierno, o
judaísmo pertence a uma linhagem espiritual da qual talvez se possa dizer que não seja
propriamente pré-moderna, por certo não é moderna e menos ainda pós-moderna,
entrando aqui em jogo uma outra profundidade temporal que destitui o paradigma
moderno, com sua perspectiva linear e progressiva, como referência axial de intelecção
histórica. Nesse sentido, a promissora novidade da fundação de escolas talmúdicas no
Ocidente pós-Guerras reside na chance de encontrar, em veneráveis textos da literatura
rabínica, respostas atuais para questões postas pelo ocidental de hoje. A novidade é o fato
paradoxal de que, em meio ao subjetivismo atual derivado da moderna “revolução
copernicana”, no qual cada sujeito erige-se em seu próprio centro e passa a errar como
astro sem órbita, retorna uma demanda radical de sentido que parece só poder ser atendida
de um ponto de vista que recua aos abismos da memória. Diante disso, não obstante a
missão da escola rabínica seja “despertar a razão dormente na sabedoria recitada” (EO,
377) – ou até por isso mesmo –, talvez seja pouco limitar-se a exigir que ela se revista da
semântica do cidadão ocidental que “calcula e analisa”, para assegurar atestado de
razoabilidade junto à sociedade contemporânea:

O pensamento autêntico não é, a um tempo, incessante renovação, atenção à


juventude do mundo e fidelidade a sua luz primeira? Renovação do pensamento
não é um pleonasmo e uma contradição? O que mais fortemente caracteriza o
pensamento judaico hoje talvez seja a consciência de sua permanência, atualidade
e do inesgotável de sua mensagem. (PJH, 232)

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Por retirar sua força inovadora da fidelidade às própria fontes, as escolas rabínicas
professam um judaísmo “intelectualmente ambicioso”, receptivo ao mundo moderno mas
arrostando-o a partir de seu lugar hermenêutico sapiencial. Formado no espírito
questionador do Talmud, longe de fazer da memória da paixão judaica um “masoquismo
de perseguidos”, o pensamento desenvolvido na escola rabínica da Diáspora assume a
tarefa radical de encontrar um sentido ao ser e de resguardar a essência humana à luz de
um “humanismo do outro ser humano”, de modo que, “em sua revolta ou em sua
paciência”, os perseguidos de todas as terras e línguas “não se convertam em
perseguidores e aprendam a desconfiar de todo ressentimento”. (A-HE, 392)

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

LEVINAS, Emmanuel. “Refflexions sur l’éducation juive”. In: Difficile Liberté. Paris:
Editions Albin Michel, 1976.

__________________. “Éthique et Esprit”. In: Difficile Liberté. Paris: Editions Albin


Michel, 1976.

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Editions Albin Michel, 1976.

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Albin Michel, 1976.

__________________. “Comment le judaïsme est-il possible?” In: Difficile Liberté.


Paris: Editions Albin Michel, 1976.

__________________. “La pensée juive aujourd’hui”. In: Difficile Liberté. Paris:


Editions Albin Michel, 1976.

__________________. “Antihumanisme et éducation”. In: Difficile Liberté. Paris:


Editions Albin Michel, 1976.

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Michel, 1976.

__________________. “Judaïsme”. In: Difficile Liberté. Paris: Editions Albin Michel,


1976.

__________________. Totalidade e Infinito. Lisboa: Edições 70, s/d. Tradução de José


Pinto Ribeiro.

SANTOS, Luciano. O Sujeito Encarnado: a Sensibilidade como Paradigma Ético em


Emmanuel Levinas. Ijuí-RS: Ed. Unijuí, 2009.

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