O Bebê Renegado - Sem Perdão - Thatyanne Tenório

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C o p y r i g h t © 2 0 2 4 T h a t y a n n e Te n ó r i o

FICHA TÉCNICA:
R E V I S Ã O : T. T. E d i t o r i a l
D E S I G N C A PA : D e s i g n e r T. Te n ó r i o
@autorathatyanne
[email protected]
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens,
lugares e acontecimentos descritos são produtos da
imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes,
datas e acontecimentos reais, é mera coincidência.
Esta obra segue as regras da Nova Ortografia da
Língua Portuguesa.
To d o s o s d i r e i t o s r e s e r v a d o s .
É proibido o armazenamento e/ou a reprodução de
qualquer parte dessa obra, através de quaisquer meios —
tangível ou intangível — sem o consentimento escrito da
autora.
N o t a d a a u t o r a

Este romance é uma história sobre segundas


chances e um amor que floresce onde menos se espera.
Embora siga os elementos clássicos do gênero, há uma
promessa importante: não há traições.
A trama contém cenas explícitas de violência, temas
sensíveis, conteúdo sexual e linguagem forte,
sendo imprópria para menores de 18 anos.
Ao final da leitura, deixe sua avaliação. Sua
opinião é essencial para que mais leitores descubram e se
inspirem a mergulhar nessa história.
D e d i c a t ó r i a

A todos que acreditam em segundas chances, no


amor que aparece quando menos se espera e na força de
seguir em frente, mesmo quando o caminho é cheio de
desafios.
Este livro é para vocês, que encontram beleza até
nas histórias mais difíceis e que, acima de tudo, nunca
deixam de acreditar no poder do recomeço.
C o m c a r i n h o , T h a t y a n n e Te n ó r i o !
Nota da autora
Dedicatória
Sinopse
Capítulo 1 – Marina
Capítulo 2 – Diogo
Capítulo 3 – Diogo
Capítulo 4 – Marina
Capítulo 5 – Diogo
Capítulo 6 – Marina
Capítulo 7 – Diogo
Capítulo 8 – Marina
Capítulo 9 – Diogo
Capítulo 10 – Diogo
Capítulo 11 – Marina
Capítulo 12 - Diogo
Capítulo 13 – Marina
Capítulo 14 – Diogo
Capítulo 15 – Marina
Capítulo 16 – Marina
Capítulo 17 – Marina
Capítulo 18 – Diogo
Capítulo 19 – Diogo
Capítulo 20 – Diogo
Capítulo 21 – Marina
Capítulo 22 – Marina
Capítulo 23 – Diogo
Capítulo 24 – Diogo
Capítulo 25 – Marina
Capítulo 26 – Diogo
Capítulo 27 – Diogo
Capítulo 28 – Igor
Capítulo 29 – Diogo
Capítulo 30 – Marina
Capítulo 31 – Marina
Epílogo – Diogo
Agradecimentos
Sobre a autora
S i n o p s e

Marina Ribeiro, 25 anos, sempre acreditou em


contos de fadas – até que sua vida se torna um pesadelo.
Ao deixar tudo para trás por um grande amor em
Te r e s ó p o l i s , R J , e l a s e v ê g r á v i d a e a b a n d o n a d a p e l o
homem que prometeu estar ao seu lado. Rejeitada pela
própria família, Marina está sozinha e sem esperanças...
até que a ajuda surge de onde ela menos espera.
Diogo Arslan Macêdo, um agente federal de 36
anos, sempre priorizou o trabalho e evitou compromissos.
Solteiro por convicção e avesso a laços familiares, ele
jamais pensou em se envolver com a ex-namorada do
irmão. Mas, ao ver Marina lutar uma batalha injusta, ele
decide agir – sem imaginar que sua decisão o levará a um
caminho sem volta.
Entre segredos perigosos e escolhas inesperadas,
Diogo descobre que, às vezes, estar ao lado "errado"
pode ser o início de algo que jamais planejou... e que
desafia todas as suas regras.
Uma história intensa de redenção, segundas chances
e um amor que surge onde menos se espera.
C a p í t u l o 1 – M a r i n a

E N V O LTA N A S C O B E RTA S , t e n t o e n c o n t r a r u m a
p o s i ç ã o c o n f o r t á v e l p a r a d o r m i r. A c h u v a l á f o r a b a t e
contra a janela, criando um som ritmado que geralmente
me acalma. Mas esta noite, meu sono é inquieto, cheio de
sonhos perturbadores e imagens confusas.
Ta l v e z s e j a a a n s i e d a d e q u e s i n t o s o b r e o f u t u r o
incerto ou a constante preocupação com Felipe e suas
atitudes.
Minha mão repousa suavemente sobre minha barriga
de oito meses, sentindo os movimentos sutis do bebê. A
e s c u r i d ã o d o q u a r t o é s u a v e m e n t e i l u m i n a d a p e l o a b a j u r,
cuja luz deixo acesa para me sentir mais segura.
De repente, ouço a porta da frente se fechar com
um estrondo. Me sento com dificuldades e fico olhando
para a porta do quarto. Não demora muito, a vejo abrir
lentamente, e Felipe entrar cambaleando. O observo
começar a tirar a roupa, enquanto seu olhar me tem.

— Vo c ê m e a s s u s t o u — a v i s o p a r a e l e q u e r e t i r a o s
sapatos e se joga ao meu lado na cama. O cheiro forte de
á l c o o l i m p r e g n a n d o o a r. — B e b e n d o d e n o v o ?
Ele murmura algo ininteligível, virando-se para o
lado. — Só tive um dia difícil, Marina. Preciso de um
pouco de paz, ok?

E s t i c o o b r a ç o e p e g o m e u c e l u l a r. S ã o e x a t a s 2 h 3 0
da madrugada.

— Eu te esperei para jantar e você nem ao menos


me mandou uma mensagem. — murmuro, sentindo meu
peito apertar com a visão da sua expressão endurecida na
minha frente.

— Age como se eu morasse aqui. — ele responde


adotando um tom seco. — Eu esqueci, ok?

— Esqueceu de mim? Onde você esteve? —


pergunto, sentindo um gosto amargo ao perceber que me
ignora. — É a terceira vez que você chega desse jeito,
F e l i p e . F i c o p r e o c u p a d a e t e n t o t e l i g a r, m a s v o c ê f a z
que não existo. Eu fiz o seu prato favorito e...

— E u q u e r o d o r m i r, c a r a l h o ! — e l e g r i t a , m e
assustando com sua agressividade de sempre. — Parece a
porra do meu pai! — suas narinas inflam e seus olhos
escurecem de puro ódio.

Engulo em seco e me deito tensa. Da última vez que


ele gritou desse jeito, me derrubou grávida no chão e me
culpou por sua explosão. Respiro fundo e me deito de
lado. O fedor de álcool começa a me deixar enjoada, mas
se eu sair da cama, ele pode não gostar e ficar mais
agressivo. Esfrego o nariz no travesseiro e me forço a
fechar os olhos. Meu sono aos poucos retorna e, estou
quase me entregando, quando sinto uma mão passear por
minha bunda.
— Felipe... — respiro fundo, tensa com a sua
aproximação repentina.

— Shh! Não quero dormir brigado com você —


murmura enquanto seus lábios procuram meu pescoço. —
Vo l t e i p a r a c á p o r q u e s e n t i f a l t a d o s e u c o r p o . D a s u a
boceta. Da sua boca me chupando.

Te n t o n ã o r e s p i r a r o f e d o r d e b e b i d a f o r t e q u e s a i
de seus lábios e rapidamente posiciono minha mão por
cima da sua o parando.

— Eu estou cansada, Felipe. — deixo claro, mas ele


logo solta sua mão da minha e tenta infiltrar os dedos sob
minha calcinha, mas eu o paro. — E você sabe que por
enquanto não podemos...

Ele pragueja mais alto e me puxa os cabelos.

— Eu não perguntei se você está cansada! — soa


a m e a ç a d o r. — E s e e u q u i s e r v o c ê v a i s e r m i n h a s e m
reclamar! Paciência tem limites, sua idiota.

Assim que ele solta o meu cabelo, me encolho


protegendo com os braços minha barriga. Ele pragueja
mais uma vez e se levanta da cama. Não me atrevo a
o l h a r, m a s s e i q u e e l e s a i d o q u a r t o , p o i s e m s u a f a l t a d e
educação faz questão de bater a porta com força. Fecho
novamente os olhos e tento acalmar minha respiração.
Por que sempre é desse jeito? Por que minha vida tem
que ser dessa forma?

Penso em ligar para os meus pais, sei que minha


m ã e v a i m e a j u d a r, j á o m e u p a i n ã o q u e r s a b e r d e m i m .
Afinal de contas, eu fugi de casa, da minha cidadezinha
no Santiago do Sul, abandonei meu emprego, meus
e s t u d o s p e l a m e t a d e . Tu d o p o r q u e F e l i p e h a v i a m e
prometido casamento e uma vida juntos como sempre
s o n h e i . M e d e i x e i l e v a r, a c a b e i m e d e s c u i d a n d o e q u a n d o
engravidei o pesadelo começou.

Após saber que seria pai, Felipe foi embora e ficou


a l g u m a s s e m a n a s s e m m e r e s p o n d e r. Vo l t o u c o m o s e n a d a
tivesse acontecido e, como não falou nada da gravidez,
achei que ele tinha aceitado. Os meses seguintes fui
procurada apenas para satisfazê-lo, mas quando a barriga
começou a crescer e veio as restrições, tudo mudou. As
vezes ele só aparecia à noite, ficava algumas horas e ia
embora. Mesmo namorando há dois anos, ele nunca me
apresentou aos pais ou a algum conhecido.

Sempre presa nesse apartamento, que é dele, e sem


manter contato com mais ninguém.

Com a cabeça cheia, me viro com cuidado para o


outro lado e resmungo com o fedor impregnado no lençol.
C o m d i f i c u l d a d e s a i o d a c a m a e r e t i r o o f o r r o p a r a t r o c a r.
E u s e i q u e p r e c i s o a g i r, q u e p r e c i s o f a z e r a l g u m a c o i s a ,
m a s e u n ã o s e i o q u e f a z e r. E m b r e v e m e u b e b ê n a s c e r á e ,
isso me deixa com mais medo.

Já de forro limpo, me deito novamente e fecho os


olhos. Espero que pela manhã, Felipe esteja mais calmo,
ele desse jeito me deixa com medo. Após mais um
suspiro, me entrego ao cansaço.
Saio do banheiro pronta para começar o dia. Com o
celular em mãos, verifico o horário. São 8h10. Me
encaminho para a cozinha e assim que passo pela sala,
vejo algumas almofadas jogada no chão. Há uma garrafa
de cerveja em cima da mesinha de centro e, nem sinal de
Felipe. Na cozinha, abro a geladeira e pego a jarra de
suco.

E n c h o u m c o p o e p r e s t e s a b e b e r, a p o r t a d o
apartamento se abre.

Felipe me vê e entra empurrando uma mala. Fico


s e m e n t e n d e r, c o m o c o r a ç ã o a o s p u l o s . E l e v a i m o r a r
comigo?
— P r e c i s a m o s c o n v e r s a r, M a r i n a . — o s e u
semblante fechado e o seu maxilar tensionado me causam
uma sensação ruim.

Apoio as mãos no balcão, meu olhar vai direto na


mala.
— De quem é essa mala? — pergunto, baixinho,
com medo da resposta.

— É sua. — avisa me deixando assustada. — Eu


cometi o erro de deixar você aqui e fingir que nada está
acontecendo. Só que acabou, eu não posso mais.
— O quê? — desacreditada, arregalo os olhos, os
mesmos que se enchem de lágrimas.

— A n t e s d e v o c ê , h a v i a u m a o u t r a m u l h e r, M a r i n a .
— fala de braços cruzados. Seu rosto não muda quando
e l e v o l t a a f a l a r. — E l a é f i l h a d o a m i g o d o m e u p a i . E u
devia ter te contado, mas o sexo com você era alucinante.
A minha ideia era ficar com você mesmo depois de
c a s a d o c o m a Tr i z , a f i n a l , e u g o s t o d e c o m e r s u a b o c e t a .

To n t a c o m a s i n f o r m a ç õ e s , p a s s o p o r e l e e v o u a t é a
sala. Me sento com dificuldades, enquanto minha cabeça
está fervilhando com as suas palavras. Eu sou a outra da
relação? Casamento com outra? Só percebo que estou
chorando quando levo a mão para limpar as lágrimas.

— Eu não vou ser a sua amante, Felipe. Eu sou a


mãe do seu filho! — Esbravejo sentindo meus olhos
cheios de lágrimas.

— S e u f i l h o ! Vo c ê e n g r a v i d o u p o r q u e v o c ê q u i s !
Essa coisa não estava nos meus planos, Marina.

— Não fala assim dele! — Exijo vendo-o passar a


m ã o n a b a r b a . — Vo c ê é i n a c r e d i t á v e l . E s s e s a n o s t o d o s
mentindo? Então, quando você sumia e não me atendia...
Vo c ê e s t a v a c o m e l a ?

— Marina...

— Ela sabe que você vai ser pai? — indago ficando


de pé. Seu olhar se torna atravessado. — Não, ela não
d e v e s a b e r. P o r i s s o n ã o m e a p r e s e n t o u a o s s e u s p a i s , n ã o
é? Seu pai não concordaria com isso.
Rapidamente ele me puxa com agressividade pelo
braço, seu rosto agora torcido em uma expressão que eu
nunca tinha visto antes.

— Por acaso você está me ameaçando? — ele


pergunta com uma voz fria e controlada. — É isso,
Marina? — eu o encaro, incrédula, enquanto ele continua
a f a l a r. — Vo c ê s a b i a q u e n ã o e r a n a d a s é r i o , c e r t o ? —
e l e r i , u m s o m a m a r g o e c r u e l . — Vo c ê f o i u m a d i v e r s ã o ,
uma trepada fácil para passar o tempo. Achou mesmo que
eu largaria tudo por você?

— Eu larguei para ficar com você, Felipe. — me


desespero, sem chão, vendo-o rir divertido com meu
sofrimento.

— L a r g o u a p o b r e z a ! Vo c ê a c h a r e a l m e n t e q u e
alguém como eu, que sempre tive tudo do bom e do
m e l h o r, m e a p a i x o n a r i a p o r u m a m u l h e r c o m o v o c ê ? —
ele me humilha friamente, rindo como se fosse um
p s i c o p a t a a p ó s t e r c o m e t i d o u m c r i m e e g o s t a d o . — Vo c ê
foi tão fácil, abriu as pernas para mim feito uma cadela
no cio. Quem me garante que você já não tenha feito isso
com outros?

Com fúria eu o acerto com um tapa me soltando do


seu agarre.

Suas palavras cortam mais fundo do que eu poderia


i m a g i n a r. C o m o e l e f a l a i s s o ? E l e s a b e q u e f o i o m e u
primeiro. Sinto como se estivesse sendo despedaçada,
cada palavra dele me esmagando um pouco mais.

— E u o d e i o v o c ê ! — e u f i n a l m e n t e c o n s i g o d i z e r,
m i n h a v o z t r e m e n d o d e r a i v a e d o r. — C o m o p o d e s e r t ã o
cruel? Posso ter o nosso bebê a qualquer momento e você
não se importa?

Ele dá de ombros, indiferente. Ajeita o cabelo preto


sem tirar os olhos de mim.

— A verdade te ofende, não é? — desdenha,


risonho. — Se você não pode lidar com isso, o problema
é s e u , i d i o t a ! To d o h o m e m q u e q u e r b o c e t a f á c i l i r i a a g i r
como eu! Não se faça de boba, porque você não é.

— Agora eu entendo tudo... — murmuro baixinho


f a z e n d o - o f r a n z i r o c e n h o . — Vo c ê s e m p r e r e c l a m o u q u e
seu pai valorizava mais o seu irmão, e eu entendo o
m o t i v o . Vo c ê é r u i m , F e l i p e . Ta l v e z s e u p a i s a i b a d i s s o ,
por isso...

A mão pesada me acerta um tapa, em seguida meu


cabelo é agarrado com violência.

— Nunca mais, repita isso. — grita, aproximando o


seu rosto do meu. — Eu já te aturei demais e, não ache
que não corrijo você por estar grávida, sua vagabunda!

Com essas palavras, ele me solta bruscamente e se


afasta, pegando seu telefone como se nada tivesse
acontecido. A sensação de vazio, dor e traição é
avassaladora. Me sento trêmula, com o rosto doendo e
com o medo percorrendo meu corpo. O vejo pegar a
carteira, retirar um cartão de crédito e o jogar no sofá.

— Arrume as suas coisas e vá para algum hotel. Eu


não pedi para ser pai, essa foi uma escolha somente sua!
— joga a responsabilidade em minhas costas como se eu
fosse a única culpada. — Deveria ter abortado o feto
assim que soube dessa gravidez, então acho bom não me
procurar ou posso fazer da sua vida um inferno. Espero
n ã o a e n c o n t r a r a q u i q u a n d o e u v o l t a r.

A n t e s d e s a i r, e l e m e o l h a u m a ú l t i m a v e z e e m
seguida me dá as costas.

S o z i n h a e u m e p e r m i t o c h o r a r, e u n ã o f a ç o a
m í n i m a i d e i a d o q u e f a z e r. O u p a r a o n d e i r. O l h o p a r a o
lado e vejo o cartão, o pego e quando leio Diogo Macêdo,
percebo que é o cartão do irmão de Felipe. Fico sem
c o m p r e e n d e r, m a s p o r f i m o d e p o s i t o n o s o f á . A p o i o u m a
mão no encosto do sofá e me levanto, minhas costas estão
doendo, mas não ligo, não quero ter que encontrar Felipe
mais uma vez por ali.

Vo u p a r a o q u a r t o , p e g o o s m e u s p o u c o s v e s t i d o s ,
roupas íntimas e roupinhas que comprei para o bebê.
Ainda não sei o sexo dele, mas não me impediu de
comprar alguns macaquinhos em cores neutras. Abro uma
gaveta e pego um envelope.

R$700.

Meu único dinheiro. O coloco dentro da minha


bolsa, junto com os meus documentos. O restante arrumo
tudo na mala e quando me encontro pronta, calço os pés
c o m s a p a t i l h a e s a i o d o q u a r t o . Vo u n a c o z i n h a e b u s c o
meu celular no balcão. Olho uma última vez para a sala e
vejo o cartão no sofá. Eu não tenho muito dinheiro, então
seria burrice minha não usar o cartão? Ainda com aquilo
em mente, vou até ele e o pego.

Enquanto caminho para fora, pesquiso no celular


u m l u g a r b o m e b a r a t o p a r a f i c a r. A d e n t r o o e l e v a d o r e
espero até que finalmente chego no hall do prédio. O
porteiro me olha um tanto confuso, mas então parece se
r e c o r d a r.

— B o m d i a ! Vo c ê é a a m i g a d o S r. M a c ê d o ? — p a r o
um tanto confusa, mas aceno incerta. — Ele disse que
poderia deixar a chave do apartamento comigo.

— A h ! — b a l b u c i o e m e a p r o x i m o p a r a e n t r e g a r. —
Obrigada.
— Só estou fazendo meu trabalho, senhorita —
murmura e olha minha mala. — Precisa que eu chame um
táxi?

— S i m , p o r f a v o r. — r e s p o n d o e e l e m e s o r r i
educado enquanto guarda a chave. — O senhor sabe de
algum hotel ou pousada baratos?

— Te m n o c e n t r o , e p r ó x i m o d a r o d o v i á r i a t e m u m
hotel.

— Obrigada — agradeço e o observo pegar minha


mala.
Paramos nas escadinhas de frente ao prédio. Sinto o
sol em minha pele, o vento balançar os meus cabelos e a
sensação me traz um conforto diante todo o caos que
estou passando.

O porteiro assobia com os dedos e um taxi se


aproxima. Assim que para ao meu lado, educadamente,
e l e a b r e a p o r t a e m e a j u d a a e n t r a r. A m a l a é c o l o c a d a
atrás e, com tudo pronto o taxista dá a partida.

— Onde vai ficar?


— N o h o t e l p r ó x i m o d a r o d o v i á r i a , p o r f a v o r.

— Te m d o i s h o t é i s .

Olho-o confusa, o porteiro disse apenas um.

— Eu não sei, pode ser qualquer um.

Ele acena e volta a focar na estrada.

O trajeto todo não demora muito, então após


algumas horas no trânsito, ele para em frente a uma
fachada bem arrumada. À primeira vista, dá a impressão
de ser um hospital, mas leio hotel no letreiro. Pergunto
quanto devo, e faço o pagamento. Em seguida, desço
com um pouco de custo e agradeço quando o motorista
coloca minha mala ao lado.

Assim que entro vou até a recepcionista que sorri


para mim. Apoio minhas mãos no balcão de mármore.

— B o m d i a , g o s t a r i a d e u m q u a r t o , p o r f a v o r.

— Só um momento — pede e eu aceno. Os segundos


p a s s a m e e l a v o l t a a m e o l h a r s o r r i d e n t e . — Te m o s
apenas as suítes presidenciais disponíveis, os outros
estão ocupados ou agendados.

— E quanto é a presidencial?

— R$1.990 por dia.


— Nossa! — exclamo e fico parada olhando para a
tela que exibe o preço. — Não teria desconto?

— Infelizmente, não senhora. — me sorri de um


jeito automático. — Deseja um dos quartos?

Respiro fundo e logo lembro do cartão na minha


bolsa. Então, sem peso na consciência eu aceno. Na hora
de passar o cartão, decido que será no crédito de uma vez
só. Felipe que se entenda com o irmão depois. O
pagamento é feito e fico surpresa por aceitar tão rápido,
mas ao mesmo tempo aliviada. Assim que pego a chave,
sou acompanhada por um funcionário. Subimos de
e l e v a d o r e p a r a m o s n o ú l t i m o a n d a r. P a r a m o s e m f r e n t e a
uma porta branca com dourado, o rapaz a abre e entra
colocando minha mala ao lado.

Tu d o n o q u a r t o é r e a l m e n t e l i n d o e b e m - o r g a n i z a d o .
Vo u a t é a c a m a e m e d e i t o n e l a . É t ã o m a c i o e p e r f u m a d o ,
olho para a porta e percebo que o funcionário já foi. Me
liberto das sapatilhas e me aconchego melhor no meio da
cama.

— Meu Deus, o que eu vou fazer? Eu não posso


ficar aqui, e quando o bebê nascer?

Frustrada, esfrego o rosto com as mãos e logo sinto


u m l e v e c h u t e n a b a r r i g a . M e d e i x o s o r r i r, e e m s e g u i d a
levo a mão até onde senti e a acaricio. Meu celular toca
dentro da bolsa, a pego e procuro o aparelho. Ao ver
quem me liga, reviro os olhos e encerro a chamada.
Q u a n d o p e n s o e m g u a r d a r o c e l u l a r, e l e t o c a n o v a m e n t e e
eu vejo a foto de Felipe aparecer na tela.

Qual era a dele afinal? Me humilhar mais?


Ignoro a chamada e aproveitando, procuro o número
da minha mãe. Clico, e levo a orelha. Espero alguns
segundos e quando penso que não seria atendida, ouço a
voz tão conhecida.

— Filha?

Não consigo segurar o choro.

— Mãe... a senhora pode falar?

— Espera! — pede, ao fundo escuto ela falar


a l g u m a c o i s a p a r a o m e u p a i e e l e r e s m u n g a r. A v o z d e l e
é i n c o n f u n d í v e l . — P ro n t o ! M e f a l a f i l h a , c o m o e s t á ?
Nunca mais deu notícias.

— É que eu andei bem ocupada — minto, pois não


tinha coragem para dizer que Felipe tinha me proibido de
ligar e reclamar para os meus pais. — Com o bebê.

— Ele já nasceu?

— Ainda não — nego, em seguida solto um suspiro.


— Mãe, eu preciso de dinheiro. Eu... — paro, mas logo
t o m o c o r a g e m . — E u n ã o q u e r i a p e d i r, m a s e u n ã o s e i
m a i s o q u e f a z e r.

— O que aconteceu? Onde está?

— Eu não estou mais com o Felipe — respondo me


sentindo patética. Eu tinha ido com Felipe, mesmo meus
pais me dizendo que não e agora eu peço dinheiro? —
Olha, desculpa. Eu vou dar um jeito, não...
— Calma filha, eu vou tentar depositar na sua
c o n t a . E u t e n h o u m d i n h e i ro g u a rd a d o , d a s c o s t u r a s , v o u
no banco e coloco na sua conta. Só não sei se consigo
h o j e , o s e u p a i e s t á o d i a t o d o e m c a s a . S e e l e s o u b e r. . .

Fecho os olhos sentindo as lágrimas escorrerem por


meu rosto.

— Eu quero voltar para casa, mãe. O papai ainda


está aborrecido?

A o f u n d o e u e s c u t o n i t i d a m e n t e m i n h a m ã e c h o r a r.

— Eu vou conversar com o seu pai — promete se


r e c o m p o n d o . — Vo c ê c o n s e g u e v i r ?

Seco minhas lágrimas e penso um pouco. Sim, eu


c o n s i g o v o l t a r. P o s s o c o m p r a r a p a s s a g e m n o c a r t ã o ,
estando perto da minha mãe me sentiria mais segura. No
entanto, e o meu pai? Possivelmente ele não reagiria
bem, mas lá não estaria desamparada.

— Vo u c o m p r a r a p a s s a g e m d e i d a — aviso
decidida. — Quando eu estiver aí, aviso a senhora.

— Tu d o b e m , f i l h a . Ve n h a m e s m o ! S e u p a i p re c i s a
t e p e rd o a r, e l e t a m b é m s e n t e s u a f a l t a .

— Até breve, mãe.

Quando ela me responde, eu encerro a ligação.


Sinto saudades dos dois todos os dias da minha vida,
sempre quando ficava sozinha naquele apartamento, me
sentia solitária e desejei por vezes voltar para casa. Meu
c e l u l a r r e c o m e ç a a t o c a r, e m a i s u m a v e z , v e j o a f o t o d e
Felipe na tela. Ignoro a chamada e clico na opção de
bloquear o contato.

Me sento com dificuldade e fico uns segundos


parada. Em seguida pego minha bolsa e procuro o cartão.
Diogo Macêdo, o irmão adotivo de Felipe. Pelo pouco
que soube dele, não se dava bem com o irmão e
trabalhava como policial, assim como o pai deles. Acesso
à internet do meu celular e digito o site aéreo. Procuro
passagem para amanhã, mas só encontro para depois de
a m a n h ã . F i c a r m a i s u m d i a n a q u e l e h o t e l ? Ta l v e z e u
pudesse encontrar uma pousada mais barata, com mais
calma. Solto um suspiro e tento fazer a compra da
passagem, mas para minha surpresa, aparece as palavras
cartão inválido. Franzo o cenho, e confiro os números,
vencimento e os três códigos, mas tudo está correto.

— Não acredito!

Ta l v e z s e j a p r o b l e m a c o m o s i t e ? D e c i d o t e n t a r
mais tarde, minha cabeça está um turbilhão e também
estou com fome. Então me lembro que não tomei café.
Pensando nisso, pego o telefone do hotel e peço a
refeição. Em seguida vou até a janela e fico observando a
vista. Caso eu não consiga fazer a compra da passagem
pelo cartão, posso comprar com dinheiro que restou, se
for o mesmo que está no site daria certo.
Os minutos passam e quando batem à porta, sei que
é o serviço de quarto. Permito a entrada e sorrio para
uma mulher que empurra um carrinho.

— Obrigada — sorrio sendo retribuída.


Vo u a t é a b a n d e j a e a p u x o , h á t a n t a c o m i d a . Te m
até pudim de chocolate!

O p e g o e m e s m o s a b e n d o q u e d e v o e v i t a r, c o m o e l e
aos poucos. Finalizado ele, bebo um pouco do café e
pego uma fatia de bolo. Em cima da cama, meu celular
c o m e ç a a t o c a r. M e a p r o x i m o d e l e e v e j o u m n ú m e r o
desconhecido, o pego e no quarto toque o atendo.

— Onde você está?

Enrijeço ao ouvir a voz de Felipe.

— O que isso importa para você? Para de me ligar!

— Eu confundi e deixei o cartão do Diogo com


você. — Seu tom é de desprezo ao mencionar o irmão.

— Isso não é problema meu! — aviso e me sento no


s o f á . O o u ç o p r a g u e j a r. — E u n ã o r o u b e i , v o c ê d e i x o u
comigo.

— Marina...

— Não me ligue mais!

Encerro a ligação e para evitar surpresas, desligo o


c e l u l a r.
Já é noite e o tempo frio volta com força. Enquanto
me enrolo para me manter aquecida, assisto um filme
q u a l q u e r. P a s s e i a t a r d e t o d a s e m f a z e r n a d a , e p o r m a i s
que eu pensasse que tudo daria certo comigo e com o meu
bebê, eu tinha medo. Eu já tinha jantado e vomitado, era
algo corriqueiro desde que engravidei. Solto um suspiro,
e e s t i c o a t é p e g a r m e u c e l u l a r.

O ligo e recebo algumas notificações de ligações


perdidas. Reviro os olhos e com o cartão em mãos, junto
c o m m e u c e l u l a r, v o l t o p a r a o s i t e d e p a s s a g e n s . M a i s
uma vez dá erro e eu desisto.

O jeito seria comprar pessoalmente. Esfrego os pés


sob o lençol grosso e fico de lado na grande cama, e
m e s m o c o m a t v l i g a d a , f e c h o o s o l h o s p a r a d o r m i r.
C a p í t u l o 2 – D i o g o

O som abafado dos meus socos no saco de pancada


ecoa pelo quarto de musculação. Esse lugar é meu
santuário, isolado do resto do mundo, onde a única coisa
que importa é o próximo golpe, a próxima gota de suor
q u e e s c o r r e p e l a m i n h a t e s t a . A c o r d o a n t e s d o s o l n a s c e r,
visto meu uniforme de batalha – camiseta velha, calção
de treino, luvas gastas – e começo a rotina.

Cada soco é um desabafo, uma tentativa de


exorcizar os demônios que me perseguem desde que me
entendo por gente. As más lembranças que me rondam a
cabeça.

Ajeito a postura e soco mais rápido e com mais


força.
Meu punho direito encontra o saco de pancada com
um estalo abafado, seguido rapidamente pelo esquerdo. É
um ritmo que conheço bem, uma dança violenta que
acalma minha mente e prepara meu corpo para o que quer
que o dia traga.
Sinto os músculos ardendo, uma dor que me lembra
que estou vivo, que ainda estou lutando. O isolamento
acústico do espaço para musculação é uma bênção –
ninguém pode me ouvir aqui, ninguém pode julgar o que
estou enfrentando internamente.
Dou um chute, o saco balança, e eu volto com uma
série de socos rápidos. A respiração é controlada,
ritmada, sincronizada com cada golpe.
Olho para o relógio na parede – falta pouco para o
horário em que preciso ir para o trabalho. Ainda assim,
não diminuo o ritmo. Cada segundo aqui é precioso, cada
momento é uma oportunidade de me preparar para o meu
dia a dia.
Quando finalmente, sinto que atinjo o limite. Paro,
encostando a testa suada no saco de areia, respirando
fundo.
— Fico curiosa — ao ouvir a voz me volto para a
porta do quarto. Dona Herbertina me sorri. — Em quem
imagina sendo esse saco de pancada? É cada soco que
fico com pena.
— Ninguém em especial — murmuro sério enquanto
retiro as luvas. — Eu vou tomar banho.
— Vo u p r e p a r a r o s e u c a f é d a m a n h ã — f a l a m e
dando espaço para passar na porta. — Passei mais cedo
na feira e trouxe novas frutas, trouxe do morango que
você gosta.
Engulo em seco e me sinto um pouco culpado por
nem ao menos ter dado um bom dia ou perguntado como
ela está. Dona Herbertina cuida de mim desde que sou
criança, aceitou vir trabalhar na minha casa depois que
minha mãe a demitiu, sempre está de bom humor e cuida
tão bem de mim. Mesmo eu sendo adulto e muitas vezes
rabugento.
— Obrigado — agradeço e ela me sorri tocando em
meu rosto. — Eu como alguma fruta, ou faço qualquer
coisa, não precisa se esforçar de mais em frente ao
fogão.
— Oh, meu filho, nem pense nisso. A primeira
refeição do dia é essencial para o bom funcionamento da
mente e do corpo. Como vai prender os bandidos fraco de
f o m e ? — i n d a g a e q u a n d o p e n s o e m r e s p o n d e r, e l a
gesticula com a mão. — Agora vá tomar banho e fique
cheiroso, você está fedendo.
Ela se afasta e eu a observo caminhar para a
cozinha. Desvio o olhar e vou até meu quarto que fica no
final do corredor a esquerda. Ando até a suíte e já dentro
dela retiro minha roupa. De baixo do chuveiro permito
que a água fria caia sobre minha cabeça e fico alguns
minutos parado. Esfrego o rosto e em seguida pego o
s a b o n e t e . Te n t o n ã o d e m o r a r a l i , e q u a n d o p o r f i m
termino meu banho, vou para o closet. Pego uma cueca
preta, meu terno e a gravata. Após já vestido, calço os
sapatos sociais e coloco meu distintivo.
Antes de sair passo o perfume, coloco o relógio,
pego meu celular e em seguida ajeito meu coldre com a
arma no cinto.
Saio do quarto indo para a cozinha e no corredor
mesmo já posso sentir o cheiro do café bem passado.
Adentro o recinto e observo Herbertina colocar uma
xícara para mim. Agradeço e tomo um gole.
— Bernardinho vai jogar próxima semana em outra
escola — fala me fazendo encará-la. — Ele quer que você
v á l á . Vo c ê p r e c i s a v e r c o m o e l e e s t á j o g a n d o b e m .
Obrigada, por isso.
— Eu não fiz nada de mais — retruco e me sento.
— Vo c ê e s t á p a g a n d o a e s c o l i n h a p a r a e l e —
c o n t i n u a . — U m a d a s m e l h o r e s , e u n ã o p o d e r i a p a g a r.
Balanço a cabeça e pego uma torrada com ovos.
Dou uma grande mordida e evito encará-la, pois sei que
seu olhar está em mim. Antes de ser adotado com onze
anos, eu vivi com os meus pais biológicos, são momentos
q u e q u e r o e s q u e c e r. N o e n t a n t o , B e r n a r d i n h o m e f e z
lembrar quando tinha a sua idade. Com os pais parecidos,
mas diferente dele, não tive uma avó Herbertina em
minha vida para me ajudar quando precisava.
Pensar assim era injusto com minha mãe adotiva?
Às vezes me pego pensando isso.
— Só quero que ele tenha um futuro — murmuro e
noto que ela para me olhando. — Ele é um bom menino,
se continuar estudando e se esforçando, ele vai ser uma
grande pessoa.
— É isso mesmo, filho. — Ela sorri emocionada. —
Então, é amanhã que vai ter aquele jantar com a noiva do
seu irmão?
— É , n ã o e s t o u a f i m d e i r.
— Mas você precisa ir — retruca ocupada. — Se
n ã o f o r, s u a m ã e p o d e a c h a r q u e é c u l p a m i n h a .
Meu celular apita avisando uma nova notificação. O
pego no bolso da calça e solto um suspiro. Ontem, Felipe
perdeu o meu cartão e aparentemente quem achou está
usando para comprar coisas. A primeira notificação foi
u m p a g a m e n t o d e R $ 1 . 9 9 0 , 0 0 H o t e l I n t e rc i t y, a s s i m q u e
vi bloqueei o cartão e informei a perda dele. A segunda
notificação foi uma tentativa de compra em um site
aéreo.
— O que foi?
Olho para Herbertina e nego com a cabeça.
— F e l i p e p e r d e u m e u c a r t ã o e a l g u é m o a c h o u . Vo u
dar um jeito nisso.
— Esse seu irmão é um irresponsável — ela retruca
servindo-se de uma xícara de café. — Sempre foi assim,
desde pequeno.
C o n c o r d o c o m u m a c e n a r e v o l t o a c o m e r. S e e u
c o n s e g u i r, h o j e m e s m o v o u a t é o h o t e l a t r á s d o
responsável por aquela compra. Como tudo, e em seguida
volto até a suíte, escovo os dentes e antes de ir me
despeço de Herbertina.

Chego no departamento e estaciono na vaga de


sempre. Aceno para alguns colegas que estão na porta e
s i g o p a r a a m i n h a s a l a . N o c o r r e d o r, v e j o I g o r — m e u
amigo — correr em minha direção segurando um papel.
— Finalmente saiu o mandado para prender El
Fantasma.
P e g o o p a p e l e o l e i o , t e n h o v o n t a d e d e s o r r i r, m a s
me contenho.
— Atenção todos! — falo em voz alta fazendo os
olhares caírem em mim. — Àqueles que estão na operação
Encruzilhada, reunião em cinco minutos na sala sete. —
termino de comunicar e encaro meu amigo. — Confirme
para mim se os outros das cidades incluídas já receberam
os mandados.
— Certo.
Entro na minha sala e deixo meu paletó na minha
cadeira. Pego a pasta que está na gaveta com chave e
logo vou para a sala de reunião. Após meses de
investigações, incluindo interceptações telefônicas,
vigilância eletrônica e infiltração de agentes.
Identificamos vários membros da organização e seus
métodos de operação, que incluíam a utilização de
empresas de fachada para lavar o dinheiro proveniente do
tráfico de drogas.
A organização criminosa, liderada por um notório
traficante conhecido como "El Fantasma", estava
operando em diversas capitais brasileiras e tinha
ramificações internacionais, especialmente na Colômbia e
no México.
Parado no topo da mesa, espero pacientemente que
t o d o s e n t r e m e s e a c o m o d e m . Ve j o o s r o s t o s c o n h e c i d o s e
q u a n d o p e r c e b o q u e n ã o f a l t a n i n g u é m c o m e ç o a f a l a r.
Pego da pasta algumas imagens do nosso alvo e entrego
para eles, revisando mais uma vez o que temos sobre o
suspeito.
— Essa operação é bastante arriscada, e espero que
todos aqui estejam preparados. Nossa fonte avisou que
nosso procurado estará no armazém no porto.
— Quando?
— Daqui a dois dias — respondo a contragosto, por
mim agiríamos hoje mesmo. — Organizei uma série de
ações coordenadas em várias cidades simultaneamente.
Iremos em uma incursão no armazém no porto, com sorte
o pegamos lá. Perguntas?
— E depois uma rodada de cerveja por sua conta?
— I g o r, m e u a m i g o q u e s t i o n a f a z e n d o a l g u n s s o r r i r e m .
O ignoro ajeitando minha postura.
— Mais alguma pergunta referente ao plano? —
todos ficam em silêncio, então continuo. — Ao todo serão
cinquenta agentes somente nessa operação. Sairemos
a n t e s d o a m a n h e c e r.
A s s i m q u e t e r m i n o d e f a l a r, s i n t o m e u c e l u l a r
v i b r a r n o b o l s o d a c a l ç a . P e n s o e m i g n o r a r, m a s e l e v i b r a
mais uma vez. O pego rapidamente e vejo a notificação
do aplicativo do cartão avisando sobre outra tentativa de
compra. Solto um suspiro. Parece que preciso mesmo ir
até lá.
— Chefe?
Vo l t o a olhar meus companheiros e guardo o
c e l u l a r.
— O primeiro comboio será o nosso — falo de
braços cruzados. — Sem barulho e com muita atenção.
Para contenção, a área será isolada, então os carros dos
civis serão desviados para um outro caminho. — vejo
meu celular novamente e leio o nome do hotel. Fica há
algumas horas do departamento. — Por enquanto é só,
estão dispensados.
Abro o aplicativo do mapa e verifico a localidade
com mais precisão. Igor se aproxima e para ao meu lado,
s e u o l h a r e s t á n a t e l a d o m e u c e l u l a r.
— Eles receberam o mandado e estão esperando
apenas as ordens.
— Certo, eu vou para a minha sala e...
— O Marcelo está na sala dele — Igor me
i n t e r r o m p e . — E l e q u e r t e v e r.
Olho para a direção da sala do chefe e vejo a porta
aberta. Há uma agente conversando com ele. Igor sai da
sala e eu o acompanho, no corredor nos separamos e sigo
até meu destino. Paro na entrada e educadamente bato na
porta aberta.
— Entre, Diogo — manda e eu obedeço. — Irina,
p o d e i r. Q u a n d o D i o g o s a i r, v o c ê p o d e v o l t a r.
Meu olhar vai até a plaquinha em cima da mesa
onde está escrito Delegado Marcelo Alcantara. Espero
q u e e m b r e v e m e u n o m e e s t e j a n o l u g a r.
— O senhor queria falar comigo?
— Sim, sente-se. — indica a cadeira a minha frente.
M e s e n t o a e s p e r a d o q u e e l e t e m a d i z e r. — Q u e r o s a b e r
como anda o operação encruzilhada. Alguma novidade?
— Nenhuma.
— Soube do mandado que receberam — murmura e
solta um suspiro. — Precisa tomar cuidado nessa
o p e r a ç ã o — a c e n o s e m c o m p r e e n d e r, m a s c o n t i n u o o
e n c a r a n d o . — M a s c a s o o s u s p e i t o v e n h a a m o r r e r, i s s o
não será um problema.
Fico uns segundos o analisando, querendo entender
se entendi.
— Sabemos que o Juanito é chefe pequeno, apesar
dessa bagunça — respondo com seriedade. — Ele é só
uma peça para eu chegar em quem manda de verdade. Ele
n ã o p o d e m o r r e r, s e n h o r.
Marcelo me encara enquanto mexe em uma caneta,
então por fim acena.
— Eu sei disso, não queremos que nada disso seja
em vão.
— Exatamente — aceno e fico de pé. — Há mais
alguma coisa?
— Não, bom trabalho.
Dou as costas com aquela conversa em mente. Ao
chegar na minha sala, me sento na cadeira e ligo o
c o m p u t a d o r. A b r o n o r e l a t ó r i o d e o n t e m q u e n ã o c o n s e g u i
t e r m i n a r e a p ó s u m s u s p i r o , c o m e ç o a d i g i t a r.
— Algum problema, Diogo?
Olho para frente tirando os olhos de algumas
f o t o g r a f i a s d o s u s p e i t o . Tu d o o q u e t í n h a m o s c o n s e g u i d o
reunir contra ele, está em cima da minha mesa. Igor se
aproxima com um copinho de café.
— Só verificando se não deixei passar nada. —
Av i s o e m e e n c o s t o a t r á s . — N ã o d e v e r i a e s t a r
trabalhando?
— No momento, não. Agora são 18h45, seu turno
acaba às 19h. Consequentemente, acabando com o meu
t a m b é m . — A s s i m q u e t e r m i n a d e f a l a r, b e b e u m g o l e d o
café. — E sobre o roubo do cartão? Como ficou?
— Vo u a t é o h o t e l , t a l v e z a p e s s o a n ã o e s t e j a m a i s
l á , m a s é u m r i s c o . Vo u p e d i r p a r a v e r a s c â m e r a s .
— E o s e u i r m ã o n ã o d i s s e n a d a ? Va i f a z e r e l e
p a g a r, n ã o é ?
— Não quero me estressar com ele — respondo
c o m e ç a n d o a j u n t a r a s p a p e l a d a s . — Vo u d a r u m j e i t o
nisso.
Ficamos em silêncio, aproveito e guardo tudo
dentro da pasta. Abro a gaveta e coloco lá dentro,
passando a chave em seguida. Fico de pé, pego meu
paletó e a chave do carro. Saímos do departamento e Igor
me acompanha até minha caminhonete cabine dupla.
Rapidamente eu tomo o lugar do motorista e para a minha
surpresa, Igor se senta no passageiro.
— Não vou deixar que vá sozinho — comenta
c o l o c a n d o o c i n t o d e s e g u r a n ç a . — Va m o s i n d o . D e p o i s
você me deixa em casa.
— Vi r e i s e u m o t o r i s t a ?
Espero uma resposta que não vem, ao invés disso,
ele liga o rádio e coloca na estação de música. Reviro os
olhos e dou a partida.

S a i o d o b a n h e i r o e a j e i t o m e u v e s t i d o l o n g o . Vo u
até a mala e a verifico, xingo baixinho quando não
encontro uma blusa de frio. O finalzinho de tarde trouxe
o frio junto, e eu estava contando com uma peça de roupa
mais quente que deveria estar aqui. Mas, claro, está
f a l t a n d o . A j e i t o a m a l a n o v a m e n t e , t e n t a n d o m e a c a l m a r.
Meu jantar deve chegar em breve, e o hotel tem um
aquecimento decente.
De repente, ouço uma batida na porta.
— Já deve ser o jantar — murmuro, me dirigindo
até a porta com um sorriso leve. Porém, assim que abro,
meu coração quase para. — Felipe?!
Meu sorriso desaparece instantaneamente.
Ele está ali, parado, com uma expressão de raiva
que eu não entendo. Afinal, quais os motivos da raiva
dele? A única que tem o direito de estar com raiva sou
eu. No entanto, vê-lo daquela forma em minha frente,
traz o medo que eu sempre tive quando o via assim.
— O que você está fazendo aqui? Como me
encontrou? — Pergunto com o coração acelerado de
medo.
— Vo c ê a c h a q u e p o d e m e e v i t a r, M a r i n a ? B l o q u e a r
meu número? — Felipe empurra a porta com força,
entrando no quarto.
Dou um passo para trás, surpresa e assustada com
sua agressividade.
— F e l i p e , e u n ã o q u e r o b r i g a r, p o r f a v o r. E u e s t o u
grávida, você sabe disso. — tento manter a calma, mas
minha voz treme. — Eu fui embora como você mandou!
Vo c ê m e n e g o u e n e g o u o n o s s o b e b ê .
— Vê se aprende de uma vez! — ele avança, e eu
dou mais um passo para trás, encostando na cama. — Eu
s o u o ú n i c o q u e p o d e e x i g i r a l g o d e v o c ê ! Vo c ê m e
bloqueia, me faz ir atrás de um taxista do caralho e ainda
acha que pode me responder desse jeito?
— F e l i p e , n ã o é a s s i m . . . Vo c ê s a b e . . . — t e n t o
e x p l i c a r, m a s e l e n ã o q u e r o u v i r. S e u s o l h o s e s t ã o c h e i o s
de fúria.
A n t e s q u e e u p o s s a r e a g i r, e l e m e d á u m t a p a . M e
desequilibro e sinto meu corpo pender para o lado e caio
no chão, batendo forte. Uma dor aguda atravessa meu
abdômen, e quando olho para baixo, sinto algo descer por
minhas pernas. Levo a mão trêmula até ela, e fico
horrorizada olhando meus dedos sujos de sangue.
— Meu Deus! O que você fez? — grito, com a voz
desesperada. Coloco a mão sobre a barriga, sentindo uma
dor crescente. As lágrimas começam a escorrer pelo meu
r o s t o e n q u a n t o t e n t o m e l e v a n t a r, m a s m e u c o r p o não
responde.
Felipe recua, parecendo chocado com o que acaba
d e f a z e r.
— A c u l p a é s u a ! Vo c ê m e p r o v o c o u a f a z e r i s s o !
— Me ajuda! — peço com os olhos cheios de
lágrimas.
S i n t o m a i s d o r, e d e s s a v e z s o l t o u m g r i t o .
Ele hesita, mas ao ver o sangue e a minha expressão
d e d o r, p e r c e b o s e u s o r r i s o e c a l m a m e n t e e l e m e d á a s
costas.
Luto para alcançar meu celular na mesa de
cabeceira e não consigo.
— Não...
Do chão, após alguns segundos, ouço passos rápidos
e mesmo com os olhos cheios de lágrimas, vejo um
homem loiro de terno se aproximar apressadamente. Ele
parece ser muito bonito e elegante, mas a dor que sinto
me incapacita a olhá-lo com mais atenção.
— Precisamos levá-la ao hospital! — ele fala com
sua voz grossa.
Seu olhar me analisa meticulosamente.
— O m-meu bebê! — murmuro trêmula enquanto o
vejo retirar o paletó e em seguida me pegar nos braços.
— Ah!
— Desculpe! — Pede e ao mesmo tempo sai do
quarto comigo. Em meio a minha dor vejo a recepcionista
d o p r é d i o c o r r e r a o n o s s o l a d o . — I g o r ! Va i l i g a n d o o
carro!
— Eu acho que foi o seu irmão que saiu correndo.
Ouço outra voz ao fundo falar e fico confusa.
Irmão? Me agarro mais nele e quando sinto a dor fina
novamente, eu grito fincando as unhas no pescoço dele.
Para a minha surpresa, ele desce as escadas comigo e
f e c h o o s o l h o s c o m m e d o d e c a i r. S ó v o l t o a a b r i - l o s
quando sinto o vento frio bater em minha pele. Sou
colocada no carro e o desconhecido se junta ao meu lado.
Rapidamente saímos dali, enquanto minhas lágrimas
banham meu rosto.
— Q-Qual o seu nome? — Soluço, sentindo meu
corpo tremer por tanta dor que sinto.
— Diogo e o seu? — Se apresenta, com o semblante
aparentemente preocupado.
Franzo o cenho e na penumbra do carro, levo meus
dedos a camisa branca manchando-a de sangue.
— D-Diogo Macêdo? — Ele parece surpreso, mas
concorda. — Eu u-usei o seu cartão.
Ve j o q u e e l e c o n c o r d a , e n t ã o p a s s e i a s u a m ã o p o r
minha barriga. Assim que faz isso, sinto meu bebê chutar
e eu sorrio em meio ao choro.
— Vo c ê m e d e v e R $ 1 . 9 9 0 , 0 0 .
Penso que ele vai sorrir e dizer que está brincado,
mas ele se mantém sério. Eu não tenho esse dinheiro
t o d o . F i c o g e m e n d o d e d o r, q u a n d o f i n a l m e n t e p a r a m o s e
Diogo desce, percebo que chegamos.
Com cuidado, ele me pega novamente nos braços e
anda até a entrada. Fecho os olhos e logo sou colocada
d e i t a d a e m u m a m a c a . Te n t o m e m a n t e r a c o r d a d a , m a s
n ã o s o u f o r t e o s u f i c i e n t e e a c a b o d e s m a i a n d o d e d o r.
Quando acordo mais uma vez, me vejo deitada na
maca com uma bata azul e em meu braço direito tem um
a c e s s o c o m s o r o . Te n t o m e m o v e r, m a s s i n t o u m a d o r n o
corpo do lado esquerdo. Me recordo da queda que levei e
fico alarmada.
— Alguém? — o desespero me toma ao olhar de um
l a d o a o u t r o e m e e n c o n t r a r s o z i n h a . — P o r f a v o r ! Te m
alguém aí?
— Acordou! — uma enfermeira entra e sorri para
m i m . — Tu d o b e m ? — m e a v a l i a , p r e o c u p a d a .
— O meu bebê? — acaricio minha barriga e deixo
as lágrimas rolarem por meu rosto. — Eu caí e eu
sangrei, mas eu senti meu bebê chutando. Ele está bem?
Eu...
— Calma, mamãe — ela pede com um sorriso. —
Foi só um susto. Eu vou chamar o seu marido e avisar ao
médico que você acordou.
— O meu marido está aqui? — pergunto confusa e
quando noto que fiz a pergunta em voz alta, dando a
e n t e n d e r q u e D i o g o é m e u m a r i d o , p e n s o e m m e c o r r i g i r.
— Está sim, acho que ele foi resolver as pendências
do hospital. Faz horas que você dorme por conta da
medicação.
Olho para o relógio de parede, 22h30.
Vo l t o m i n h a a t e n ç ã o p a r a a e n f e r m e i r a , s ó p a r a
descobrir que ela me deixou sozinha no quarto.
— Obrigada, Deus! Obrigada! — passeio minha mão
por minha barriga, sinto uma leve ondulação e sorrio.
— Vo c ê é o f i l h o d e l e ? — e s c u t o a p e r g u n t a e v e j o
o médico entrar no quarto sendo seguido por Diogo. —
Seu pai é um grande homem. Ele deve estar radiante com
o neto a caminho.
— Ele não sabe e prefiro assim.
O médico dá um sorriso sem graça e se aproxima de
mim. Meu olhar intercala dele para Diogo. Fico sem
entender sua presença ali, até agora, mas agradecida
eternamente.
— Sra. Macêdo...
— Marina — o corrijo e olho rápido para Diogo que
cruza os braços. Então ali, pela primeira vez, notei o
distintivo em seu pescoço juntamente com a arma na
cintura. — M-Meu nome é Marina.
— Certo, Marina. Que susto não é mesmo? — o
médico me avalia.
— Sim — respondo e esfrego os dedos dos pés sob
o lençol fino. — O meu bebê está bem mesmo?
— Sim. Com a queda sua placenta descolocou, mas
com repouso absoluto vocês vão ficar bem. Infelizmente
é c o m u m i s s o a c o n t e c e r, p o r i s s o s e m p r e r e c o m e n d a m o s
que a mamãe fique de repouso, não pegue peso, sem
estresse e em alguns casos como o seu, sem sexo.
Tímida, eu encaro as minhas mãos.
— Então o meu bebê não corre risco?
— Não se obedecer e ficar de repouso. — engulo
em seco e o observo anotar algo na prancheta. — Eu vou
passar vitaminas para você. O seu exame de sangue não
f o i o q u e e u e s p e r a v a , M a r i n a . Te m q u e s e a l i m e n t a r b e m ,
você não está fazendo isso.
A p ó s c a r i m b a r, e l e e n t r e g a o p a p e l a D i o g o q u e o l ê
atentamente.
— Amanhã eu libero vocês — fala e estende a mão
para Diogo. — Amanhã de manhã eu volto, qualquer coisa
pode chamar a enfermeira.
Ele nos deixa sozinho e ali, me sinto intimidada
com a presença imponente ao meu lado. O papel é
dobrado e guardado em seu bolso, então ele se aproxima
da cama.
— Marina, não é?
— Sim.
— O que aconteceu naquele quarto?
Analiso o que respondo. Eu sei que Felipe e ele não
se dão bem, porque Felipe sempre reclama do irmão, mas
ele acreditaria em mim?
— Eu caí — minto e não consigo sustentar seu
o l h a r. — C o m o s a b i a q u e e u e s t a v a l á ?
De braços cruzados, ele da a volta no leito e se
senta perto.
— A recepcionista disse que tinha um homem com
você no quarto. — comunica ignorando minha pergunta.
— Era o Felipe? Foi ele que deu o meu cartão para você?
Foi ele que te machucou?
Seus olhos azuis me encaram de um jeito intenso,
desvio o olhar dele, mas logo seus dedos tocam meu
rosto. Forçando nossos olhares.
— Não acreditaria em mim — respondo sem forças.
— O b r i g a d a p o r m e a j u d a r, D i o g o . S e r e i e t e r n a m e n t e
grata por ter salvo meu bebê.
Ele afasta a mão e fita minha barriga.
— O bebê é dele?
— Sim, mas ele não quer saber da gente. Eu não era
amante dele, se pensa assim. A gente já namorava, mas
ele aparentemente não estava satisfeito comigo. — falo e
ele me escuta em silêncio. — Estávamos juntos há dois
anos, eu morava no apartamento dele, mas aí ontem ele
m e m a n d o u e m b o r a . E u n ã o t e n h o p a r a o n d e i r, a m i n h a
família é de Santa Catarina e o meu pai não me aceita
grávida.
— Entendo. — cruza os braços desviando os olhos
com a expressão de revolta.
— Desculpa pelos R$1.990,00 — peço e ele volta a
m e o b s e r v a r. — E u n ã o t e n h o c o m o t e p a g a r a g o r a , s ó
tenho R$675.
— Não quero o seu dinheiro — retruca e vai até a
p o l t r o n a . — F a l e i a p e n a s p a r a d e s c o n t r a i r.
— Ah! É que você estava tão sério. — engulo em
seco.
Ele se senta e sem me responder afrouxa a gravata.
O observo arregaçar as mangas da camiseta branca suja
de sangue, o paletó está no braço da poltrona. Diogo é
um homem bonito, os braços fortes, corpulento e bem
alto. Olhos azuis escuros, barba um pouco grande loira, a
m e s m a c o r d e s e u c a b e l o . Te m u m a p r e s e n ç a m a r c a n t e ,
assim como o perfume que está usando. Desço meu olhar
por seu corpo e foco nas coxas grossas. Subo o olhar para
seu rosto e fico tímida quando percebo que me encara.
Ele esfrega a mão na barba sem desviar nossos olhares.
— Amanhã quando estiver de alta, vamos abrir um
boletim de ocorrência contra ele. — decide por mim, com
a expressão dura e revoltada.
— O quê? — estou assustada. — Não! Ele vai ficar
furioso, não! É melhor deixar para lá.
— S e v o c ê n ã o f i z e r, e u v o u f a z e r. — a v i s a e e u o
encaro incrédula. — Não vou passar a mão na cabeça dele
porque é o meu irmão.
— Não, por favor! Quando ele está furioso... —
paro quando o percebo atento. Engulo em seco e me
deito. Não vou falar para ele do que já sofri com o irmão
dele. — Eu não quero fazer nenhum tipo de denúncia e
v o c ê t e m q u e a c e i t a r.
— Eu sou um agente federal, Marina. Eu vi a
situação, sabemos que foi ele, se eu não fizer quem será
preso sou eu. — penso em dizer algo, mas ele é mais
rápido. — Durma tranquila, vou estar aqui quando
a c o r d a r.
F i c o c o n f u s a , e q u e r o s a b e r p o r q u e e l e v a i f i c a r,
mas me mantenho em silêncio. Fechos os olhos e tento
d o r m i r, m a s e n t ã o s i n t o u m a p r e s s ã o c r e s c e n t e n a b e x i g a ,
u m a s e n s a ç ã o c o n s t a n t e q u e n ã o c o n s i g o i g n o r a r. O l h o
para Diogo e ele mantém os olhos fechados.
— Está dormindo? — indago e ele me encara. —
Poderia chamar a enfermeira?
— Está sentindo dor? — questiona ficando de pé.
— Não — balanço a cabeça e retiro o lençol das
minhas pernas. — Só preciso da ajuda dela para ir ao
banheiro.
Para minha surpresa, ele se aproxima e estende os
braços. Fico uns segundos olhando seus braços com as
v e i a s s a l t a d a s , e p e n s o e m n e g a r, m a s q u a n d o s i n t o q u e
não vou aguentar esperar apenas aceito. Com delicadeza
ele me pega nos braços e percebo que ele não faz esforço.
Diogo me leva até o banheiro dali e me coloca em pé
perto do vaso.
Ele rapidamente sai, mas deixa a porta encostada.
Não ligo para aquilo e a cada movimento, por menor que
f o s s e , p a r e c e i n t e n s i f i c a r a n e c e s s i d a d e d e u r i n a r.
Quando finalmente me sento no vaso sanitário, o alívio é
imediato. Uma parte minha sente vergonha por ele,
possivelmente, estar ouvindo. Então, mesmo quando
termino fico uns minutinhos ali em silêncio.
— Está tudo bem?
— Sim, obrigada. — me seco e em seguida lavo as
mãos. — Diogo? — após dar a descarga eu o chamo e ele
me verifica. Em seguida caminha em minha direção e me
p e g a n o s b r a ç o s . — Te m c e r t e z a d e q u e v o c ê p o d e f i c a r
a q u i c o m i g o ? N ã o q u e r o o a t r a p a l h a r.
— Não vou te deixar sozinha até resolvermos isso.
De volta ao quarto, sou colocada em cima do leito.
— A sua namorada não vai brigar?
Ele sorri e fico surpresa. Diogo também é bonito
quando sorri.
— Precisa de mais alguma coisa? — nego,
percebendo que ele não me afirma ter alguém. O observo
ir até a poltrona e se sentar com as pernas abertas e
braços cruzados. — Então durma.
Me aconchego mais onde estou deitada e aliso
minha barriga. Era um alívio saber que meu bebê está
bem e que Diogo, apesar de desconhecido para mim, está
ali protegendo meu sono. Não acredito que Felipe possa
a p a r e c e r, m a s s e i s s o a c o n t e c e r p e l o m e n o s n ã o e s t a r e i
sozinha. Fecho os olhos, e no mesmo instante me lembro
da feição raivosa dele, do tapa, do sorriso ao me ver
caída e sangrando.
Como eu pude ser tão cega em relação a ele?
Me culpo sem conseguir evitar e rapidamente seco
minhas lágrimas. Não quero que Diogo me veja assim, ele
já fez tanto por mim e nem ao menos me conhece. Solto
um suspiro e decido dormir de vez.
C a p í t u l o 3 – D i o g o

De braços cruzados, observo Marina dormir de um


jeito sereno. Meu olhar desce para a sua barriga e logo
penso em Felipe. Era óbvio que ele a tinha empurrado ou
feito algo para que ela perdesse o bebê, e se tem algo que
abomino é uma mulher sofrer violência. Minha mente
fervilha com pensamentos nada amigáveis que desejo
fazer contra Felipe. O desejo de fazer justiça, de protegê-
l a , é q u a s e e s m a g a d o r.
Caminho até a janela, contemplando a vista da
cidade à noite. As luzes piscam ao longe, indiferentes ao
d r a m a q u e s e d e s e n r o l a a q u i . Vo l t o m e u o l h a r p a r a
Marina, que se remexe levemente na cama. Como que
Felipe tem a coragem de ferir alguém tão delicado e que
no momento precisa de todo cuidado? Respiro fundo,
prometendo a mim mesmo que tentaria não me envolver
nisso. Mas de uma coisa eu tenho certeza, Felipe não
sairia impune disso.
Me sento novamente na poltrona e espero
p a c i e n t e m e n t e a t é o a m a n h e c e r.
No outro dia quando acordo, meu olhar vai até
M a r i n a q u e a i n d a d o r m e . Ve j o q u e o s o r o a c a b o u , e n t ã o o
f e c h o e v o u a t é a p o r t a d o q u a r t o . Av i s o a e n f e r m e i r a q u e
passa no corredor sobre o soro e volto para a poltrona.
Apesar do móvel ser um pouco confortável, não é uma
cama. Não demora muito e a enfermeira entra, sorri de
um jeito educado e vai até o soro. Ela o retira, mas deixa
o acesso no braço de Marina.
— Quando o médico der a alta, volto para retirar o
acesso. Se precisar de algo é só apertar nesse botão
vermelho.
Olho para onde ela aponta e noto o tal botão.
— Obrigado.
Sinto meu celular vibrar no meu bolso e o pego.
Olho para Marina que dorme e saio do quarto ficando no
c o r r e d o r. A t e n d o a l i g a ç ã o d e I g o r n o t e r c e i r o t o q u e .
— Ainda está no hospital? Não chegou no trabalho.
— Sim, ainda estou aqui — respondo parado sem
me afastar da porta fechada. — Não sei que horas saio.
— A grávida ficou bem? O bebê também?
— Sim, os dois estão bem, mas ela precisa de
repouso.
A o f u n d o o e s c u t o p r a g u e j a r.
— Adivinha quem acabou de chegar e está na sala
d o M a rc e l o ?
Fecho os olhos reprimindo um xingamento.
— Meu pai?
— O p r ó p r i o ! A c h o q u e v a i p e rg u n t a r p o r v o c ê . O
q u e e u re s p o n d o ?
— Nada. Se ele quiser falar comigo tem o meu
número.
— Vo c ê s a b e q u e e u n ã o t r a b a l h o s o b p re s s ã o , n ã o
é?
Respiro fundo e quando olho para o lado vejo o
m é d i c o d e o n t e m c h e g a r n o c o r r e d o r.
— Eu preciso ir! — aviso e encerro a chamada. —
Doutor!
Ele me sorri e se aproxima. Me aperta a minha mão
e olha pelo vidro pequeno da porta.
— Como passaram a noite? Ela reclamou de dor ou
algo do tipo?
— Não, a ajudei a ir ao banheiro e só. Não
reclamou de dor ou qualquer desconforto.
Olhamos para dentro do quarto no momento em que
Marina acorda. A observo olhar para a poltrona e
carinhosamente acariciar a barriga. Percebo que ela
sussurra algo com um pequeno sorriso e, aquilo mexe
comigo. O doutor abre a porta e eu o acompanho.
— Bom dia, Marina. Como passou a noite?
— Bom dia! Bem, obrigada. — responde, sua voz
sai baixo e tão suave. — Eu estou de alta?
Ao finalizar a pergunta, ela franze o cenho e
p e r c e b o q u e t e n t a s e c o n t r o l a r p a r a n ã o c h o r a r. C o m o
sei? Os olhos estão levemente cheios de lágrimas,
transmitem angústia. Me sinto mal ao constatar aquilo,
tanto que respiro fundo e repito em minha mente “ela não
é problema meu e sim do Felipe”.
— Sim, vai poder voltar para casa, mas com as
recomendações dobradas. Nada de pegar peso, se
e s t r e s s a r, s e a b a i x a r, c a m i n h a r m u i t o , n a d a d e s e x o . —
avisa e nos olha. Percebo que Marina fica envergonhada.
— Se alimentar bem, tomar as vitaminas e aguardar o
nascimento que é em breve. Eu diria que no começo desse
m ê s q u e v a i e n t r a r.
— Isso — ela confirma cabisbaixa. — Obrigada,
d o u t o r.
— Vo u p e d i r p a r a r e t i r a r e m e s s e a c e s s o .
Marina agradece mais uma vez e para pensativa. O
doutor nos deixa a sós, meu olhar foca em Marina, seu
rosto delicado.
— E então? — indago fazendo-a engolir em seco. —
Te m a l g u m l u g a r p a r a f i c a r ?
— Acho que sim — responde e fico surpreso. —
Ontem pela tarde eu pesquisei pousadas mais baratas.
Acho que vou ficar em uma delas.
Aceno de braços cruzados, meu olhar desce para os
dedos sobre a barriga. Ela está nervosa, é fato. Lembro
d o v a l o r q u e m e a f i r m o u t e r, e s o l t o u m s u s p i r o . C o m o
ela pagaria os dias nessa pousada?
— Certo, eu posso conseguir que o escrivão venha
até você para que registre o boletim.
— Diogo — meu nome sai como uma súplica de
seus lábios. — Eu não quero registrar nada. Eu não quero
que ele fique com mais raiva de mim. Eu sou sozinha, e...
— ela respira fundo, mas continua. — Quando ele está
com raiva, ele fica muito violento. — respiro fundo, e
talvez ela tenha interpretado minha reação de um jeito
errado. Pois logo volta a falar de um jeito nervoso. —
Não estou falando isso para criar um atrito na família, ou
não sei o que você pode pensar de mim, eu só não quero
c o n t a t o c o m e l e . E n t ã o , p o r f a v o r, n ã o q u e r o f a z e r n a d a .
Eu vou dar um jeito e criar meu filho sozinha.
A enfermeira chega e eu aproveito aquilo para ficar
em silêncio. Não consigo tirar da mente Felipe sendo
violento, daquele jeito que bem conheço, com alguém tão
indefeso como Marina. É inevitável, e assim que ficamos
sozinhos, eu me aproximo dela, seu olhar é atento.
— Então você vai ficar na minha casa até que tenha
condições de se cuidar e cuidar do seu bebê.
Assim que falo, tenho certeza do que estou fazendo.
— O quê? — seu olhar fica assustado. — Não, eu
n ã o p o s s o a c e i t a r.
— Por que não?
Ve j o q u e p o n d e r a a n t e s d e r e s p o n d e r, m a s l o g o
continua.
— Se o seu irmão descobrir — balança a cabeça. —
E u n ã o q u e r o n e m p e n s a r.
— Se ele descobrir espero que venha até mim para
q u e s t i o n a r. — a v i s o c o m a v o z s é r i a . — A c h o d i f í c i l , e l e
n u n c a t e v e c o r a g e m d e m e c o n f r o n t a r.
A vejo balançar a cabeça, seu olhar entre confusa e
amedrontada mexe comigo. Bem lá no fundo quero
verbalizar que ela estará segura comigo e que nada de
ruim acontecerá com ela.
— Por que está fazendo isso?
Aquilo me pega de surpresa, fico uns segundos
calado, mas logo a respondo.
— Não posso fingir que nada está acontecendo,
Marina. Eu não sou o Felipe.
Ela chora me deixando desconfortável.
— Te m c e r t e z a ? E - E u v o u t e r o b e b ê e m b r e v e , e
ele vai chorar e vamos atrapalhar a sua privacidade. Sem
falar que...
— Marina — a interrompo e ela se cala. — Não vou
deixar que vá para algum lugar desprotegido e meu irmão
t e e n c o n t r e . Va i f i c a r n a m i n h a c a s a , s o b o s m e u s
cuidados. Depender de mim, você vai ter o seu filho sem
complicações.
S u a r e a ç ã o d e m o r a u n s s e g u n d o s p a r a m u d a r, m a s
assim que acontece, ela me sorri e a acho mais linda
assim: sorrindo. Então tão rápido como esse pensamento
chegou, expulso da minha mente. Estou sendo apenas
gentil, nada mais que isso.
— Te m c e r t e z a d e q u e n ã o v o u a t r a p a l h a r ?
— Se eu estou dizendo que não é porque não vai
a t r a p a l h a r. — r e s p o n d o e e l a m e o l h a s e m j e i t o . — Va i
ter que ir no meu colo, tudo bem?
— Vo u s a i r c o m e s s a r o u p a ? — q u e s t i o n a , e n t ã o
percebo que seu vestido não está ali. A bata azul não
mostra muito do corpo, mas evidência bastante a barriga
grande e os seios. Rapidamente pego meu paletó e a
a j u d o a v e s t i r. A o b s e r v o c o l o c a r o s c a b e l o s c a s t a n h o s
p a r a f o r a e m e o l h a r. — E u n ã o s o u m u i t o p e s a d a ?
— Bobagem — murmuro e a pego com cuidado. Os
braços frágeis rodeiam meu pescoço e é impossível não
sentir o cheiro doce vir dela. — Eu não moro longe daqui
— falo começando a andar para fora —, mas antes vamos
passar na farmácia e no hotel para pegar as suas coisas.
— Obrigada, Diogo.
— N ã o p r e c i s a a g r a d e c e r. — c o n t i n u o c a m i n h a n d o
para fora e ignoro alguns olhares em nossa direção. Ao
chegar na saída, vejo minha caminhonete estacionada
logo a frente. — Moro sozinho, mas tem a Dona
Herbertina que toma conta da minha casa.
— Entendo — ela fala com a expressão confusa.
Assim que paro ao lado do passageiro, consigo
a b r i r a p o r t a e a j u d o M a r i n a a s e s e n t a r. E l a a c a r i c i a a
barriga e me sorri. Mais uma vez aquele mesmo sorriso.
Puxo o cinto e encaixo na outra extremidade.
— Está doendo?
— Não. — nega com a cabeça. Rapidamente dou a
v o l t a e m e s e n t o n o l u g a r d o m o t o r i s t a . — Vo c ê é a g e n t e
federal?
Dou a partida saindo dali.
— Sim, trabalho na Superintendência Regional da
Polícia Federal do RJ que fica depois do centro.
— Vo c ê d e v e r i a e s t a r n o t r a b a l h o a g o r a , n ã o é ? —
ela indaga, percebo que está sem jeito. — Me sinto
culpada só de pensar que estou te atrapalhando.
— Não sinta — peço focado no caminho.
Ficamos em silêncio e eu agradeço mentalmente por
isso. A primeira parada é na farmácia onde compro todas
as vitaminas que o médico prescreveu, a segunda foi no
hotel; Marina tem apenas uma mala e uma bolsa, isso me
d e i x a s u r p r e s o . N ã o t e m n a d a d o b e b ê ? E v i t o p e r g u n t a r,
pois sei que no momento ela precisa de descanso. Nossa
última parada é em minha casa.
Moro em um bairro mais nobre, com muros
enormes, câmeras estrategicamente colocadas pela casa
toda e cercas elétricas. Aciono o portão da frente e logo
adentro estacionando no pátio. Enquanto saio do carro,
observo os portões fecharem por completo.
Da porta vejo dona Herbertina de braços cruzados,
parece zangada e sei bem o motivo: não avisei que não
voltaria para casa. Pego Marina nos braços e assim que
m e v o l t o p a r a e n t r a r, p e r c e b o q u e o olhar de Herbertina
muda.
— Sinto muito por não ter ligado — vou logo
falando e ela apenas gesticula, seu olhar está em Marina.
— Estávamos no hospital.
— Mas o que aconteceu? E quem é sua amiga?
— É a Marina — respondo parado em sua frente. —
Marina, essa é a dona Herbertina.
— É um prazer conhecer a senhora.
— O prazer é todo meu — Herbertina sorri, seu
o l h a r l o g o p a r a n a b a r r i g a . — Vo c ê e s t á g r á v i d a d e
quantos meses?
— Oito, quase chegando nos nove.
Herbertina me encara em silêncio, mas sem perder o
sorriso. Franzo o cenho e nego com a cabeça.
— Ela vai ficar um tempo por aqui.
— Eu acabei de trocar os lençóis do quarto de
hóspede. — avisa e começa a andar na frente, guiando o
caminho que conheço bem. — Está com fome, Marina?
— Um pouco — responde baixinho.
— Vo u p r e p a r a r u m a c o m i d a b e m g o s t o s a e l e v o
para você no quarto.
Paramos em frente a porta que fica em frente ao
m e u q u a r t o . H e r b e r t i n a a b r e e d á e s p a ç o . Vo u a t é a c a m a
de solteirão e a deposito com cuidado, ela me sorri
agradecida. Seu olhar vai até Herbertina que se senta
perto.
— Vo c ê t e m a l g u m a c o m i d a q u e n ã o p o d e c o m e r ?
— Não, mas a senhora não precisa se preocupar em
fazer nada caprichado. Posso comer qualquer coisa.
— Nada de qualquer coisa — retruco de braços
cruzados. — Ela precisa se alimentar bem, o médico
p a s s o u v i t a m i n a s p a r a e l a t o m a r. Vo u b u s c a r n o c a r r o .
Não espero uma resposta e já saio do quarto. Ando
rapidamente para o lado de fora e busco as coisas de
Marina. Quando volto, as duas estão conversando e
mesmo sabendo que é errado fico ali ouvindo.
— Graças a Deus que o seu bebê está bem e você
também — é a voz de Herbertina. — E qual o nome dele?
Ou dela?
— Eu ainda não dei um nome, não sei o sexo.
— Como você aguenta não saber?
As duas riem, mas logo a voz suave de Marina
preenche o cômodo.
— E u a c h o q u e é u m m e n i n o , m a s c o m p re i a l g u n s
m a c a q u i n h o s e m c o re s n e u t r a s .
— D e p o i s e u q u e ro v e r t o d o s .
— Tu d o b e m , s ã o u n s t r ê s o u q u a t ro . E u n ã o t i v e
como comprar mais coisinhas para ele.
Franzo o cenho, como assim ela não teve como
comprar? O bebê nasceria e ela não tem nada? Respiro
fundo e balanço a cabeça, teria uma conversa com Felipe.
Decido fingir que cheguei naquele momento, entro no
quarto e coloco a mala e a bolsa ao lado da cama.
— Aqui as vitaminas — mostro para Herbertina que
acena com a cabeça. — Esses dois ela deve tomar duas
v e z e s p o r d i a , c a f é d a m a n h ã e n o j a n t a r. E l a n ã o p o d e
carregar peso ou fazer qualquer tipo de esforço.
— Tu d o b e m , D i o g o . Vo c ê v a i p a r a o t r a b a l h o ?
— Vo u — a f i r m o c o m u m a c e n o — , m a s e u v o l t o
logo.
— Diogo! — me volto para Marina. Alguns fios
castanhos emolduram seu rosto delicado, os lábios
vermelhos me chamam rápido a atenção, mas me obrigo a
focar em seus olhos. Há gratidão estampados neles. —
Muito obrigada, mesmo. Nem sei como agradecer o que
está fazendo por nós.
Sua mão toca lentamente a barriga.
— Já disse que não precisa agradecer — respondo e
d e s v i o n o s s o s o l h a r e s . — Vo u t o m a r b a n h o .
S a i o d o q u a r t o r a p i d a m e n t e e v o u p a r a o m e u . Vo u
direto para a suíte e retiro minha roupa, tomo um banho
sem demora de cabeça em seguida escovo os dentes. Já
seco, pego uma cueca e um novo terno. Antes de sair vou
até a cozinha onde Herbertina está, pego uma maçã e
assim que sou notado, recebo um sorriso.
— E l a é u m a m o r, D i o g o . D e o n d e c o n h e c e e l a ?
Nunca me falou nada, e grávida? O bebê é...
— Do Felipe — respondo rápido e ela me olha
surpresa. — Não deixe que ele entre ou qualquer outra
pessoa, em minha ausência.
— O seu irmão? Não compreendo, por que ela está
aqui?
Solto um suspiro e esfrego os olhos.
— Eu tenho que sair agora — falo e ela concorda.
— Ela precisa de repouso, dona Herbertina. Quando
voltar conversamos.
— Tu d o b e m — m u r m u r a c o m p r e e n s í v e l . — E u v o u
cuidar bem dela. Ela parece ser uma moça tão boa e... —
então ela para assustada. — Foi por culpa dele que ela
foi parar no hospital? — Indaga e eu aceno. — Meu
D e u s ! O q u e e l e f e z ? — q u e s t i o n a m a i s p a r a s i . — Tu d o
b e m , v á t r a b a l h a r. Vo u c u i d a r d e l a , n ã o s e p r e o c u p e .
Agradeço com um acenar e vou em direção a saída.
Rumo para o trabalho, pois amanhã acontece a
operação e nada pode sair errado. Preciso checar se tudo
está encaminhado e, na madrugada, executaremos.
Enquanto dirijo, meus pensamentos me levam até Marina
e sua conversa com Herbertina. Ela terá o bebê em breve
e não tem praticamente nada? Lembro que, quando
Rogério, do departamento de TI, teve seu primeiro filho,
ele não perdia a oportunidade de falar sobre o quarto do
bebê e tudo que havia comprado. Me ajeito no banco do
motorista e nego com a cabeça. Não vou me preocupar
com coisas assim; ela já está na minha casa e é apenas
i s s o q u e p o s s o o f e r e c e r.
Respiro fundo e, assim que faço isso, sinto o
perfume doce dentro do carro. O perfume de Marina. É
como se sua presença estivesse impregnada no ambiente,
m e s m o q u a n d o e l a n ã o e s t á a q u i . Te n t o a f a s t a r e s s e s
pensamentos e me concentrar na estrada à minha frente,
mas é difícil. A imagem dela, sozinha e grávida, não sai
da minha mente.
Chego ao departamento e sou informado que todos
estão na sala doze, então subo rapidamente para a sala de
reuniões. A equipe já está revisando os últimos detalhes.
Me junto a eles e começamos a discutir os pontos críticos
da operação. Enquanto os minutos passam, a tensão no ar
a u m e n t a . To d o s s a b e m q u e n ã o p o d e m o s f a l h a r.
Depois da reunião, vou até minha sala e fecho a
porta. Pego o celular e ligo para casa, Herbertina me
atende no terceiro toque e antes mesmo da minha
pergunta, ela responde: "Ela está bem, descansando."
Encerro a ligação e fico por alguns minutos olhando para
a t e l a d o c e l u l a r. S i n t o u m a l í v i o t e m p o r á r i o , m a s s e i q u e
isso não é suficiente. Marina precisa de mais do que
a p e n a s u m l u g a r p a r a f i c a r. E l a p r e c i s a d e s e g u r a n ç a ,
apoio.
Encosto na cadeira e fecho os olhos por um
momento. A imagem de Marina volta à minha mente, e eu
sei que preciso fazer mais por ela. Não sei por que me
importo tanto, mas sei que não posso ignorar essa
sensação.
— Achei que não vinha — olho para a porta e vejo
I g o r. — E a í ? P a r a o n d e e l a f o i ? — q u e s t i o n a e i n v a d e
minha sala. — Ficou naquele hotel? Ou em outro?
— A levei para a minha casa.
Igor me olha incrédulo.
— Por quê?
— Porque ela está grávida e sozinha. Não pode
fazer esforço, nem nada do tipo.
— Só por isso?
Respiro fundo com impaciência. Odeio quando faço
algo e ficam procurando problema nisso. Ele queria que
eu fizesse o quê? Que eu a abandonasse como meu irmão
fez? Igor não é uma pessoa ruim, mas as vezes pensa de
um jeito egoísta.
— Ela quase perdeu o bebê por algo que meu irmão
fez. Queria que eu a deixasse para lá como se fosse nada?
— Wo w, c a l m a a í . — I g o r s o r r i r á p i d o , m a s l o g o
fica sério quando não o retribuo. — Só fiquei confuso,
mas sim, você tem razão. Seu irmão é um cretino. Aposto
que ele a empurrou ou a agrediu de outro jeito.
— Sim. — respondo por fim, não gosto nem de
imaginar tal cena. É inaceitável, tanto que tenho vontade
de sair agora mesmo e ir até Felipe. — Mas é isso, por
enquanto ela vai ficar comigo.
— Com você? — Igor indaga com um sorriso de
lado. Reviro os olhos e fico de pé, pego meu paletó e
saio da sala. — Eu tô brincando, você é muito chato!
Para onde vai?
— A l m o ç a r. E s t o u c o m f o m e .
— Eu vou com você — avisa e corre para ficar do
meu lado. — Aliás, seu pai perguntou por você. Como
n ã o d i s s e o q u e e r a p a r a f a l a r, d i s s e q u e v o c ê t e v e u m a
consulta porque estava com disenteria, por isso, talvez
não vá para o jantar de hoje.
— Merda!
— Isso.
Olho para Igor que me sorri despreocupado. Havia
me esquecido do jantar e, uma parte minha mandava
aceitar aquela desculpa — mesmo que fosse tão ridícula
— e não ir no tal compromisso. Não sei o que posso fazer
caso Felipe apareça na minha frente e, duvido que nossa
mãe aceite o que penso em fazer com ele. Adriana
Macêdo fala que nos ama igual, mas eu sei que no fundo
ela prefere o filho biológico.
Enquanto adentro o carro com Igor tagarelando ao
meu lado, me lembro de quando fui adotado. Não me
recordo como Humberto — meu pai adotivo — soube de
mim, só sei que voltei sozinho da escola, vi uma
ambulância e dois carros de polícia em frente a minha
casa. Perguntei por minha mãe grávida, mas uma senhora
e n g r a v a t a d a a o i n v é s d e m e r e s p o n d e r, m e l e v o u a t é o
abrigo. Fiquei por três longos dias lá, sem uma resposta e
c o m m e d o . S e m c o n s e g u i r d o r m i r, c o m e r o u m e e n t u r m a r,
eu só queria a minha mãe.
No quarto dia, Humberto apareceu por lá e me falou
o que tinha acontecido. Meu pai estava preso, mas minha
mãe e meu irmão não estavam mais aqui.
— Diogo?
— O quê?
— Me leva para comer naquele restaurante de
comida nordestina?
Olho para ele, que me sorri, e apenas solto um
suspiro. Não entendo como Igor está sempre sorrindo. Em
nossos cinco anos de amizade, nunca o vi emburrado ou
d e m a u h u m o r. O o l h a n d o a s s i m , p a r e c e s e r f á c i l s o r r i r.
— Ah, e eu não trouxe minha carteira.
— Vo c ê n u n c a t r a z .
Ele me responde com uma risada, balançando a
cabeça.
Igor é o tipo de pessoa que consegue encontrar
humor em qualquer situação, o que é algo que sempre
admirei nele. Ele é o oposto de mim, e talvez seja por
isso que nossa amizade funciona tão bem. Onde eu vejo
problemas e complicações, ele vê oportunidades e
soluções.
— Como a grávida se chama?
Franzo o cenho com a pergunta repentina, mas
apenas dou de ombros.
— Marina.
— Um nome bonito — fala e eu fico em silêncio
dirigindo. — Ela também é bem bonita, mas está grávida.
Com confusão genuína, eu o encaro.
— E o que isso tem a ver?
— Sei lá, nunca prestei muito atenção em grávidas.
Acho estranho, não sei, desrespeitoso pensar malícia com
elas.
— Eu prefiro quando você está calado e guardando
seus pensamentos únicos e exclusivamente para você. —
retruco impaciente com tal fala dele.
— Vo c ê é m u i t o d o c h a t o , D i o g o .
— E você, não é? — devolvo e dou seta para entrar
em outra rua. — Parece que testa minha paciência.
— Isso se chama amizade. — afirma e eu o ignoro.
— Então, como vai ser com você e a Marina?
F r a n z o o c e n h o s e m c o m p r e e n d e r.
— Como assim?
— Eu já fui na sua casa — começa enquanto mexe
n a s a í d a d e a r. — D e v i a c o m p r a r a l g u m a s c o i s a s p a r a o
bebê, já que ele vai ficar lá. Principalmente um berço. O
que mais tem por aí são casos onde a mãe exausta de
cansada, dorme por cima do bebê e ele morre. Isso
quando os dois dividem a mesma cama.
Surpreso, olho para Igor que agora tem o celular em
mãos. Fica sério, mas logo rir de algo.
O k . Ta l v e z c o m p r a r o b e r ç o s e j a a l g o a s e p e n s a r.
— Vo u v e r o q u e p o s s o f a z e r. Ta l v e z a m a n h ã ,
depois da operação, eu dê uma passada em uma loja de
bebês.
Igor sorri novamente.
— Se precisar de ajuda é só falar — fala e olha ao
redor —, mas se não precisar vai ser melhor ainda. Não
me leve a mal, mas meu trabalho toma minhas forças e
meu chefe é carrancudo de mais, não me liberaria para
bater perna.
Um pouco surpreso, o olho rapidamente.
— É assim que você fala de mim para os outros?
— Não, jamais.
B a l a n ç o a c a b e ç a e n o f u n d o q u e r o s o r r i r. S i n t o
uma onda de gratidão por ter Igor ao meu lado. Ele é um
amigo de verdade, apesar de eu nunca ter dito, mas
acredito que saiba.
Com o fim da tarde chegando e de volta ao
t r a b a l h o . Te r m i n o a l g u n s r e l a t ó r i o s e o s d e i x o n a s a l a
vazia de Marcelo. Querendo saber se Marina está bem,
pego o celular e abro no aplicativo das câmeras de casa.
Ve r i f i c o c ô m o d o p o r c ô m o d o e q u a n d o a e n c o n t r o d e i t a d a
no quarto, aumento a tela e fico alguns segundos a
encarando.
Marina usa um vestido diferente, os cabelos
castanhos estão presos no alto da cabeça. Percebo que
seu olhar está focado em algo a sua frente, mas não há
nada. Então deduzo que ela esteja pensando. Posso
imaginar os questionamentos que rondam sua mente,
talvez perguntas iguais as minhas, essas que não tenho
respostas. Bloqueio a tela do celular e volto para a minha
sala. Após encerrar com tudo, saio e tranco minha sala.
Já chegando no lado de fora, fico surpreso ao ver minha
mãe parada ao lado da minha caminhonete.
Me aproximo dela que está sorrindo.
— Vi m v e r s e e s t a v a b e m m e s m o o u s e e r a u m a
desculpa para não se juntar a sua família. Liguei para a
sua casa e a empregada disse que estava aqui.
— Mãe...
— Vo c ê n ã o v a i m e d e i x a r n a m ã o , D i o g o — a v i s a e
s e a f a s t a d a p o r t a . — Va m o s i n d o . E s t á l i n d o d e s s e j e i t o ,
então não precisa passar em casa. — reprimo um suspiro
e abro a porta do passageiro para ela, em seguida vou
p a r a o m e u l u g a r. — O s e u p a i v e i o a q u i m a i s c e d o , o n d e
esteve?
— Estava ocupado, mãe.
— Ocupado onde? — indaga e eu a encaro rápido.
— Vo c ê e e s s a s u a m a n i a d e n ã o m e d i z e r a b s o l u t a m e n t e
nada sobre você. Espero que seja gentil hoje.
F i c o s e m c o m p r e e n d e r, m a s n ã o q u e s t i o n o . O
caminho todo fizemos em silêncio e quando finalmente
chegamos no condomínio, noto dois carros estacionados
e m f r e n t e a c a s a . M i n h a m ã e é a p r i m e i r a a s a i r, v o u l o g o
atrás, mas antes de entrar ligo para dona Herbertina e
a v i s o q u e i r i a d e m o r a r u m p o u c o p a r a v o l t a r. E l a m e f a l a
brevemente que não preciso me preocupar que quando eu
voltar para casa, ela ainda estará lá.
Sigo para dentro, meu pai conversa com um senhor
bem arrumado e no outro sofá, há três mulheres. Me
aproximo para cumprimentá-los, então vejo Felipe descer
as escadas.
— Ve j a ! E s s e é D i o g o , m e u f i l h o m a i s v e l h o — m e u
pai me apresenta ao homem. — Filho, esse é o Juiz
Emílio Cavalcanti, não sei se recorda dele. Nos
reuníamos na fazenda dele, quando eram pequenos. — ele
fala me fazendo recordar brevemente dessa época. —
E s s a é a e s p o s a Ve r ô n i c a , e a s f i l h a s : B e a t r i z e A m a n d a .
Aperto a mão de cada um educadamente. Felipe
logo se junta abraçando Beatriz, já Amanda me observa
com um sorriso.
— Diogo Macêdo — Emílio murmura. — Como você
cresceu! Está maior do que seu pai e eu. — Ele ri
acompanhado de meu pai. — Que bom que veio, estava
c u r i o s o p a r a r e v ê - l o . Vo c ê a g o r a é a g e n t e f e d e r a l ?
— S i m , s e n h o r.
— Pensa em se inscrever no concurso de Delegado
de Polícia Federal? Soube que será em breve.
— Sim, estou me preparando para isso.
— U m h o m e m b e m p r o m i s s o r. M u i t o b o m ! A m i n h a
filha Amanda é advogada, mas sempre teve o desejo de se
tornar uma agente federal. Não é filha?
— Sim, papai — olho para ela que se aproxima. —
Estou estudando bastante.
— Esse é o caminho.
Me volto para Emílio que sorri para o meu pai.
— Filho — minha mãe para ao nosso lado. — Por
q u e n ã o v a i m o s t r a r o j a r d i m p a r a A m a n d a ? Vo c ê
aproveita e conversa com ela, dá algumas dicas sobre
esse meio. Vão! Quando o jantar estiver pronto, aviso.
— A h ! E u v o u a d o r a r, D i o g o . — A m a n d a m e t o c a o
b r a ç o . — Te m a l g u m a s c o i s a s q u e e s t o u e m d ú v i d a s .
Encaro minha mãe, sem conseguir disfarçar que não
gostei do que ela está fazendo. No entanto, apenas aceno
e indico o caminho. Olho para Felipe que tem uma
expressão azeda no rosto, controlo minha vontade de ir
até ele e socá-lo.
— Então Diogo, trabalha nessa área há muito
tempo?
— Uns cinco anos por aí.
Paramos na varanda, a noite está fria, poucas
estrelas no céu.
— Nossa, muitos anos. O que mais gosta de fazer
quando não está trabalhando?
— Amanda, não é? — indago e ela concorda. — Eu
não estou procurando ninguém, não sei bem o que minha
mãe lhe falou, mas acho melhor não se encorajar a nada.
E n t ã o e l a r i e d e s v i a o o l h a r.
— Sua mãe comentou que você é bem recluso —
responde parando em minha frente. — Conversar vai tirar
um pedaço seu? Porque é só isso que quero agora. Uma
conversa.
Olho o relógio de pulso, são 19h30. Solto um
suspiro e enfio as mãos nos bolsos.
— Seja breve.
— Interessante — murmura cruzando os braços. —
Qualquer outro homem faria de tudo para ter minha
atenção, sabia?
Amanda tem a sobrancelha arqueada, um tanto
presunçosa. A analiso enquanto coloco minhas mãos nos
bolsos da calça social.
— Então por que perder tempo comigo? —
questiono cansado. Eu devia ter desconfiado que aquele
jantar não era apenas o pedido de noivado.
Não.
Sempre tem algo a mais quando minha mãe está
envolvida.
— Porque no momento você tem a minha atenção,
D i o g o . M e u p a i h á d i a s q u e f a l a s o b r e v o c ê e e s s e j a n t a r.
Paro um instante e a observo por um segundo.
Amanda tem os cabelos castanhos curtos, é bonita, mas
não me chama a atenção. Em seu nariz, no lado esquerdo
há um piercing bem sutil. Sua altura é quase do meu
tamanho, uns 10cm mais baixa. Usa calça jeans, botas e
uma blusa com caimento.
— Para ser sincero não queria ter vindo a esse
j a n t a r.
— N e m e u , m a s f i q u e i c u r i o s a p a r a t e v e r. —
comenta enquanto me analisa lentamente. — Faz anos,
não é? Se lembra que tentou me beijar perto do lago
quando éramos pequenos?
Estou prestes a falar quando minha mãe aparece na
entrada. Nos sorri enquanto se aproxima de Amanda.
— Eu nem tive a chance de te cumprimentar — ao
f a l a r i s s o a a b r a ç a . — Vo c ê é t ã o l i n d a , q u e r i d a . N ã o é
mesmo, Diogo?
— Sim. — minha mãe sorri e fica me encarando.
Ela espera que eu fale mais alguma coisa? — O jantar
está pronto?
Ve j o s e u o l h a r m e f u z i l a r r a p i d a m e n t e , m a s e l a l o g o
volta a atenção para Amanda.
— Espero que ele tenha sido educado.
— Foi sim, Sra. Macêdo — Amanda responde e
v o l t a a m e o l h a r. — A t é m e c o n v i d o u p a r a j a n t a r n e s s e
fim de semana.
— M a r a v i l h a ! Te n h o b o a s i n d i c a ç õ e s c a s o q u e i r a .
— E u v o u a d o r a r, s e n h o r a .
Incrédulo, a observo sair com a minha mãe. Fecho
os olhos pedindo paciência, mas por fim acompanho as
duas. Ao passarmos pela sala, noto Felipe cochichando
algo para a Beatriz. Ele realmente não parece ter remorso
a l g u m c o m o q u e f e z c o m M a r i n a . Va m o s t o d o s p a r a a
sala de jantar e nos sentamos.
— Então Diogo — Emílio me chama mais uma vez.
— Me fale mais sobre você.
— N ã o t e n h o o q u e d i z e r, s e n h o r. — r e s p o n d o e e l e
acena ainda me olhando. Desvio para meu pai, que
c l a r a m e n t e m e i n c e n t i v a c o m o o l h a r a c o n t i n u a r. —
Gosto do meu trabalho e apenas isso.
— Entendo — ele murmura sem tirar os olhos de
m i m . — E u e r a a s s i m a n t e s d e c o n h e c e r Ve r ô n i c a , v i v i a
para o trabalho. Mas quando conheci o amor da minha
vida, tudo mudou. Não há alguém assim na sua vida?
— Meu irmão não tem tempo para namoro — Felipe
fala sentando-se a minha frente. — Acho que não gosta
muito.
— Já você tem de sobra, não é?
F e l i p e m e e n c a r a s e m e n t e n d e r, m a s l o g o d á u m a
risada.
— Culpado! — ele ri levantando as duas mãos. —
Tr i z t e m t o d a a m i n h a a t e n ç ã o , i s s o é f a t o .
— E eu amo ser mimada por você, amor! E estou
ansiosa para morarmos juntos!
Pego a taça de vinho e dou um gole.
— Eu recuperei, Felipe — falo e ele me olha
confuso. — O meu cartão que você perdeu. Estava sendo
usado por uma pessoa — assim que falo, percebo
n i t i d a m e n t e q u e e l e f i c a p á l i d o . — Vo c ê a c r e d i t a q u e e l a
pagou uma estadia no hotel com ele? Suíte presidencial.
— Como assim, Diogo? — meu pai questiona.
— Eu vou pagá-lo, irmão — Felipe fala rápido. —
Não vamos falar desse assunto. Hoje o dia é para ser
comemorado.
Aceno sem tirar os olhos dele e após todos serem
s e r v i d o s , c o m e ç a m o s a c o m e r. M e u p a i e E m í l i o m a n t é m
uma agradável conversa, e enquanto como, sinto um olhar
em minha direção. Felipe me encara e eu mantenho o
o l h a r.
— Irmão — Felipe me chama, seu rosto tenta um
incômodo. — Lembrei de algo, pode me acompanhar um
minuto?
— Para onde vai, Fê?
— Vo l t o j á , m e u a m o r. — a s s i m q u e e l e s e l e v a n t a ,
limpo meus lábios com o guardanapo e o acompanho.
Va m o s a t é a b i b l i o t e c a , n o i n s t a n t e e m q u e f e c h o a p o r t a
atrás da gente, ele vem em minha direção. — O que deu
em você? O que aquela vadia falou de mim? — indaga, e
eu respiro fundo. — Eu não tive culpa por ela ter caído e
perdido o bebê. Ela vem me ameaçando, dizendo que vai
falar para todo mundo que eu era o pai do bebê. Só que
e u n ã o s o u , e l a é s ó u m s e x o q u e t i v e e a p e n a s i s s o . Vo c ê
s a b e o q u e a c o n t e c e r i a c a s o a Tr i z s o u b e s s e d i s s o ? E l a é
descompensada!
— O q u e a c o n t e c e u n a q u e l e q u a r t o d e h o t e l ? Vo c ê
bateu nela?
Felipe me olha surpreso.
— Não! — mente descaradamente. As vezes acho
q u e e l e e s q u e c e q u e o v i c r e s c e r. — E l a s e d e s e q u i l i b r o u
e caiu. Ela queria dinheiro, mas não deixei ser ameaçado.
Acabou, não tem mais bebê e eu espero que ela volte para
os pais dela.
— Vo c ê q u e r m u i t o a c r e d i t a r n i s s o , n ã o é m e s m o ?
— O quê?
Em um movimento rápido, o puxo pela gola da
camisa ficando cara a cara com ele.
— Vo c ê s e a c h a e s p e r t o ! B a t e n d o e m u m a m u l h e r
indefesa e grávida! — praticamente rujo o segurando com
f i r m e z a . — Vo c ê v a i t e r m u i t a s o r t e s e e l a n ã o t e
d e n u n c i a r, p o r q u e e u f a r i a q u e s t ã o d e p r e n d e r v o c ê . —
F e l i p e m e o l h a r a i v o s o . — Vo u f a l a r u m a ú n i c a v e z : N ã o
se aproxime dela, não ligue mais para ela, ou eu vou
esquecer que é meu irmão e quebrar a sua cara. Como é o
meu desejo agora mesmo! Seu merda! — ele tenta se
s o l t a r, m a s n ã o p e r m i t o . — S e t e m u m a c o i s a q u e e u
a b o m i n o , é u m a m u l h e r s e r a g r e d i d a c o v a r d e m e n t e ! Vo c ê
está avisado!
O solto com agressividade e saio da biblioteca.
M i n h a m ã e a p a r e c e n a e n t r a d a d a s a l a d e j a n t a r, m a s a
i g n o r o e c a m i n h o e m d i r e ç ã o a s a í d a . Vo u a t é m i n h a
caminhonete que está no meio fio e, em questões de
segundos saio dali.
Chego em casa e a primeira coisa que vejo é Marina
sentada na sala ao lado de Herbertina. As duas têm
álbuns que reconheço muito bem espalhados pelo sofá.
Em ambas as mãos, noto os álbuns de quando eu tinha 12
anos.
— Já chegou? Pelo visto o jantar acabou rápido.
— Eu que saí antes — respondo a Herbertina que
me olha curiosa. — Olhando minha infância?
— Vo c ê u s a v a o s c a b e l o s g r a n d e s — M a r i n a s o r r i
me deixando estranho. — E você era tão fofo.
Fico a encarando passar a outra página ainda
sorrindo e me pergunto como meu irmão teve coragem de
machucá-la?
— Sempre que ele queria bolo de chocolate com
cobertura de morango, chegava perto de mim com aqueles
olhinhos grandes e lindos — Herbertina comenta me
deixando envergonhado. Marina apenas sorri de um jeito
d o c e . — E r a i m p o s s í v e l n e g a r, s e m p r e t ã o e d u c a d o , m a s
não gostava de tomar chá. A mãe dele brigava comigo por
causa disso.
— Mesmo?
R e t i r o o p a l e t ó e o j o g o n o o u t r o s o f á . Vo u p a r a a
cozinha e sobre o balcão observo as duas falarem de mim,
como se eu não estivesse ali.
— A Sra. Macêdo não tinha muita paciência com os
meninos, mas você deve saber disso.
O l h o p a r a M a r i n a q u e d e s v i a o o l h a r.
— Eu gosto de chá — ela fala —, mas ultimamente
enjoo bastante só de imaginar o cheiro. A minha mãe tem
uma caixa cheia deles — assim que ela fala, percebo que
engole em seco. — Os primeiros meses da gravidez foram
terríveis.
— Eu imagino, filha. Com os meus dois filhos foi
assim, passava sempre mal. Não conseguia deixar no
estômago o que comia.
— Eu pensei que em algum certo mês de gravidez
isso passava.
— Quem dera — responde e olha em minha direção.
— Te m j a n t a r n a g e l a d e i r a .
— Não estou com fome — pego um copo d’água e o
b e b o . — Vo u t o m a r b a n h o — c o m e n t o , m a s a n t e s d e s a i r
me volto para Herbertina. — Eu vou para uma operação
na madrugada, a senhora pode dormir aqui hoje?
— Operação? É muito arriscado? — ela questiona
com um olha apreensível.
Automaticamente meu olhar procura o de Marina, e
ela me encara parecendo ansiosa, talvez preocupada.
Balanço a cabeça, só pode ser coisa da minha cabeça.
— É confidencial, a senhora sabe.
Herbertina balança a cabeça.
— Mas tome cuidado. Fico com o meu coração na
mão toda vez que sai assim.
Quero falar que tudo vai ficar bem, que ela não
p r e c i s a s e p r e o c u p a r, m a s a p e n a s a c e n o e c a m i n h o p a r a o
quarto.
C a p í t u l o 4 – M a r i n a

Assim que Diogo nos deixa a sós, volto meu olhar


para o álbum em minhas mãos. Passo para a próxima
imagem e vejo os irmãos abraçados quando crianças. Em
quase todas as fotos Diogo não dá um mínimo sorriso,
mas eu sei que ele tem um sorriso bonito.
— Ele sempre foi tão sério assim?
Mostro a imagem e Herbertina me dá um sorriso
singelo.
— Sim, sempre foi muito fechado — responde e
mostra uma outra imagem. É ele abraçado a Herbertina,
ela mais jovem. — Eu sei que no fundo ele tem questões
não resolvidas, mas é um bom homem.
— Ele realmente é bom — concordo fechando o
álbum. — Ele decidiu me ajudar sem pedir nada em troca.
E u d i s s e q u e i r i a a t r a p a l h a r, p o r q u e e m b r e v e v o u t e r o
meu bebê, mesmo assim ele reforçou dizendo que se eu
fosse incomodar ele não faria o pedido.
Herbertina ri e me toca a mão.
— Ele é um pouco grosseiro, mas não leve isso para
o pessoal. As vezes ele me dá umas patadas, mas vejo que
se arrepende na hora. Queria muito poder curar essa
ferida que ele tem por dentro.
Solto um suspiro e ajeito as almofadas atrás de
mim.
— A senhora disse que ele foi adotado com onze
anos? — Indago e ela acena. — O que aconteceu com os
pais dele?
— É um pouco delicado — Herbertina me responde,
e eu prontamente aceno.
— É claro! Imagina, eu só fiquei curiosa. Das vezes
que Felipe falava do irmão, era para reclamar que o pai
dava muita atenção para ele. Felipe nunca reclamou que a
mãe desse mais atenção ao Diogo, que ele.
— Infelizmente, essa família é um tanto
complicada. — Herbertina junta os álbuns que têm em
mãos assim que fala. — O Felipe parou os estudos,
s e m p r e g o s t o u d e f e s t a s e e s s a s c o i s a s . O S r. M a c ê d o
sempre repudiou esse estilo que o filho mantinha. Já o
Diogo sempre foi o mais centrado, quis seguir a carreira
do pai e isso foi os céus para o senhor Humberto.
E n q u a n t o u m e r a n a m o r a d o r, o o u t r o e r a m a i s d e d i c a d o
aos estudos.
— O Diogo não namora?
— Não, mas as vezes ele sai com o melhor amigo,
I g o r. Tr a b a l h a c o m o D i o g o .
— Então por isso ele riu quando perguntei — aviso
e e l a m e o l h a s e m e n t e n d e r. — N o h o s p i t a l , e u p e r g u n t e i
se a namorada dele não iria se importar por ele ficar lá
comigo.
— E l e r i u ? Te m c e r t e z a ?
Franzo o cenho e por uns segundos penso à
respeito. Eu não tinha sonhado, estava bem acordada.
— Sim, eu até o achei bonito sorrindo.
Herbertina tem o ar confuso, mas logo sorri
balançando a cabeça.
Passei o dia conversando com ela, depois do almoço
cochilei e quando acordei comi um sanduíche natural de
peito de peru com pão integral, tomate, alface e suco de
laranja. Conversarmos mais um pouco, e falei da minha
vida, praticamente toda dela. Era tão bom conversar com
outra pessoa, alguém que realmente se interessava por me
o u v i r. Te r m i n o d e v e r a s f o t o g r a f i a s e a j u d o c o l o c a n d o - a s
n a s c a i x a s . Te n t o p e g a r u m a p a r a a j u d a r a l e v a r, m a s
r e c e b o u m n e g a r.
F i c o a l i s o z i n h a e s p e r a n d o m i n h a c o m p a n h i a v o l t a r,
então vejo o controle da grande tv e o pego. Clico no
botão vermelho e ele logo liga no canal de notícias.
Entretida na notícia, sinto um chute na parte de cima da
barriga. Sorrio e levo a mão em uma carícia no local. Em
b r e v e e u o t e r i a e m m e u s b r a ç o s e m a l p o d i a e s p e r a r.
— Ele está chutando?
— Sim — respondo para Herbertina que se senta ao
meu lado. — Acho que ele também está ansioso para
n a s c e r.
— Faz tantos anos que não vejo um bebê —
murmura com um sorriso de leve. — Posso tocar?
— É claro! — Autorizo e coloco a mão dela no
lugar da minha. Demora um pouco, mas o chute logo vem.
— Eu assisti uns vídeos sobre cuidados com o bebê, mas
acho que vou precisar da ajuda da senhora, se não for
pedir muito.
— N ã o , i m a g i n a . Va i s e r u m p r a z e r a j u d a r n o q u e
for preciso.
— Obrigada!
Pela visão periférica, percebo Diogo aparecer e fico
sem palavras ao olhá-lo por completo. Ele está com um
c a l ç ã o p r e t o e a b l u s a s e m m a n g a s d a m e s m a c o r. O s
braços enormes me chamam mais a atenção, e assim que
ele se aproxima mais um pouco, sinto o perfume másculo
vir dele um misto de madeira e especiarias que faz meu
c o r a ç ã o a c e l e r a r. E l e p a r a a o m e u l a d o e c r u z a o s b r a ç o s ,
fazendo os músculos saltarem ainda mais. Engulo em
s e c o e v o l t o o o l h a r p a r a a t v.
— E u v o u d o r m i r, p r e c i s o a c o r d a r c e d o .
— Eu também vou para o quarto — falo e quase na
mesma hora fico envergonhada. Eu dei a entender que iria
para o quarto com ele? — Ele é bem aconchegante,
obrigada.
— Certo, mas pode ficar a vontade por aqui.
— Obrigada.
Ele fica me olhando calado e eu faço o mesmo. É
t ã o i n e v i t á v e l n ã o o o l h a r, o s c a b e l o s l o i r o s e m s e u c o r t e
baixo, a barba adornando seu rosto másculo, o deixa tão
bonito. Seus olhos azuis, intensos, parecem atravessar
minha alma, tentando desvendar cada segredo que
escondo. Não consigo escutar nada, meu coração bate
acelerado no peito, e cada segundo que passa parece uma
e t e r n i d a d e . Te n t o d e s v i a r o o l h a r, m a s é i m p o s s í v e l . E l e
me atrai como um ímã, e eu me perco nos pensamentos,
lembrando de como chegamos até aqui.
— Bom, então eu também vou deitar — Herbertina
a v i s a f a z e n d o n o s s o s o l h a r e s d e s v i a r e m . Vo l t o m i n h a
a t e n ç ã o p a r a e l a e s o r r i o . — Va m o s i n d o ?
— S-Sim — concordo e tento ficar de pé.
Então rapidamente Diogo se aproxima.
— D e i x a e u t e a j u d a r.
— N - N ã o , n ã o p r e c i s a . Vo c ê j á m e p e g o u t a n t o n o s
braços deve estar cansado. Estou pesada.
— Bobagem — ele fala e se posiciona ao meu lado.
Por fim eu aceno e ele me pega com cuidado. Olho
para Herbertina que me sorri enquanto nos acompanha até
o quarto. Já dentro dele, Diogo fica comigo parado
enquanto os lençóis são tirados. Encaro seu rosto de
p e r t o , m a s q u a n d o e l e m e i m i t a , e u d e s v i o o o l h a r. S o u
colocada delicadamente no meio do colchão e me deito de
lado. Até parece que sou uma criança, mas não reclamo
quando Herbertina me cobre. Isso seria algo que minha
mãe faria, me lembro dela naquela hora, mas decido ligar
somente amanhã.
— D u r m a , s e p r e c i s a r d e a l g o é s ó m e c h a m a r, v o u
ficar no quarto aqui ao lado.
— Obrigada dona Herbertina, a senhora é muito
gentil.
Recebo um amável sorriso e retribuo.
— Boa noite.
Sorrio e a observo agarrar o braço de Diogo e o
levá-lo para fora. Solto um suspiro, e observo a pequena
resta da janela que invade o quarto não deixando que
fique totalmente escuro. É estranho, mas ali me sinto em
c a s a , t u d o p a r e c e e s t r a n h a m e n t e f a m i l i a r. S i n t o u m a
sensação estranha no estômago, algo que já se tornara
familiar nos últimos meses. Levo a mão a barriga e a
acaricio por completo, até que adormeço.
Quando acordo novamente, olho ao redor e tento
lembrar onde estou. Encaro o quarto, a porta do banheiro
fechada, a estante encostada à parede e me recordo. Sinto
uma pressão na bexiga e isso me faz sair da cama. Com
c a l m a , m e l e v a n t o d e v a g a r, v o u a t é o b a n h e i r o q u e t e m
ali e após usá-lo lavo as mãos.
O som vindo de fora do quarto me tira do meu
objetivo que é voltar para a cama. O corredor está mal
iluminado, mas posso ver uma luz vindo da sala.
Caminho em silêncio, apoiando minhas mãos pelas
paredes, meus pés descalços não fazem ruído no chão
frio. Quando chego perto da sala, o vejo. Diogo está de
costas para mim, fico parada, observando-o em silêncio.
Ele está vestido com a farda de policial federal, e a
imagem é impressionante. O uniforme azul-escuro
contrasta com sua pele branca, destacando seus ombros
largos e braços musculosos. O colete à prova de balas
ajustado ao corpo realça ainda mais sua presença
imponente.
Cada detalhe do uniforme parece feito sob medida
para ele. A pistola presa ao cinto, tudo se encaixa
perfeitamente, dando-lhe um ar de autoridade
inquestionável. Seus cabelos, estão penteados
perfeitamente, e a barba acrescenta um toque de dureza
ao seu rosto, tornando-o ainda mais atraente.
Ele se movimenta com eficiência, verificando os
equipamentos com uma concentração absoluta. Assim que
ele fica de lado, vejo a tensão em seus olhos, a seriedade
com que ele encara cada missão. Esse olhar determinado
me faz pensar em o quanto ele é dedicado ao seu
trabalho, o quanto ele se arrisca para proteger os outros.
Sinto um misto de admiração e preocupação. Ele é
forte, competente, mas também humano. Sei que cada
operação traz riscos, e a ideia de que ele possa não voltar
me assusta. Mesmo assim, não posso deixar de admirar a
figura poderosa a minha frente. Cada linha do seu corpo
transmite confiança, e isso me dá um pouco de conforto,
apesar do medo.
Diogo percebe meu olhar e se vira para mim. Por
um instante, nossos olhares se encontram, e vejo uma
sombra de suavidade em seus olhos antes de ele retomar a
p o s t u r a f i r m e e d e t e r m i n a d a . Te n t o s o r r i r, m a s s i n t o u m
aperto no peito.
— Diogo? — Chamo, minha voz saindo mais baixa
do que pretendia.
— Marina — ele maneia a cabeça. — O que você
está fazendo acordada a essa hora? — Ele pergunta, a voz
grave, mas com um toque de preocupação.
— Ouvi um barulho e vim ver o que era —
r e s p o n d o , d a n d o u m p a s s o à f r e n t e . — Vo c ê j á v a i s a i r ?
Ele assente, ajustando mais uma vez o colete à
prova de balas.
— S i m , e v o c ê d e v e r i a d e s c a n s a r. A i n d a e s t á m u i t o
cedo para você estar de pé.
Nesse momento, Herbertina aparece na sala
segurando uma bandeja com uma xícara de café
fumegante. Eu nem tinha percebido sua presença na
cozinha. Seus olhos se alternam entre Diogo e eu,
enquanto mantém um sorriso gentil no rosto.
— F i z u m c a f é p a r a v o c ê , D i o g o . Va i p r e c i s a r d e
energia — diz ela, colocando a bandeja sobre a mesa.
— O b r i g a d o , m a s n ã o p r e c i s a v a s e i n c o m o d a r, d o n a
Herbertina — ele responde, mesmo assim pega a xícara e
toma um gole rápido. — Não sei que horas eu volto.
Ela se aproxima de mim, colocando uma mão
carinhosa no meu ombro.
— O que faz acordada?
— Escutei um som e vim ver o que era.
Eu queria dizer mais, pedir para ele ter cuidado,
mas as palavras não saem. Apenas fico ali, olhando para
ele, tentando memorizar cada detalhe, como se fosse a
última vez que o veria assim.
— Eu vou indo — avisa e pega o celular que está
em cima da mesinha, junto a uma mochila de ombro. —
Dona Herbertina, sabe as recomendações, não é?
— S i m , s e n h o r. N ã o s e p r e o c u p e , m a s q u a n d o
e s t i v e r t u d o b e m m e a v i s e . Vo u o r a r p a r a q u e t u d o o c o r r a
bem.
— O b r i g a d o . — A g r a d e c e , e e l e m e o l h a . — Vo l t e
para a cama, ainda está cedo.
Após falar isso, ele sai sem olhar para trás. Com a
sua ausência, sinto um braço envolver o meu. Herbertina
me sorri enquanto me leva de volta para o quarto.
— Foi enjoo ou bexiga cheia?
— A segunda opção — respondo aceitando a
companhia. Então passo a mão nos cabelos e fico um
pouco alarmada. — Estou muito descabelada? Apareci
assim na frente dele.
— Imagina — murmura enquanto sorri —, nem está
tanto assim. Nem se preocupe, você é linda.
Sorrio com o elogio e vou até a cama. Me sento
l e n t a m e n t e e s o l t o u m s u s p i r o a o m e d e i t a r.
— Ele vai tomar cuidado, né?
— Va i s i m — a f i r m a H e r b e r t i n a , m e c o b r i n d o c o m o
lençol. — Acredite, fico preocupada todos os dias que ele
sai, mas ele é cuidadoso. Agora descanse, vou para o meu
quarto também.
Aceito o que ela diz e assim que ela sai, fecho os
olhos. Demoro a pegar no sono, mas assim que adormeço,
o s p e n s a m e n t o s s o b r e D i o g o c o n t i n u a m a m e a s s o m b r a r.
Sonho com ele em meio a uma operação, a tensão
evidente no seu rosto.
Acordo várias vezes durante a madrugada, o
silêncio do quarto sendo perturbado apenas pelos meus
suspiros inquietos. Em um desses momentos de vigília,
percebo o quanto me preocupo com ele, o quanto sua
segurança significa para mim. É estranho, mas ao mesmo
tempo não.
Finalmente, a exaustão toma conta de mim e
consigo cair em um sono mais profundo, ainda com a
imagem de Diogo em sua farda gravada na minha mente.
A esperança de vê-lo retornar em segurança é a única
coisa que me conforta enquanto a madrugada avança
lentamente.

J á é m a n h ã q u a n d o d e c i d o l e v a n t a r, m e u c e l u l a r
marca 8h20 e meu primeiro pensamento é em Diogo. Ele
já tinha ligado? Já tinha voltado da operação? Sento-me
na cama, ainda sentindo a sonolência da noite mal
dormida. Pego o celular ao meu lado e verifico as
n o t i f i c a ç õ e s , e l e e s t á p r e s t e s a d e s c a r r e g a r, m a s n ã o h á
nenhuma mensagem. Levanto-me lentamente, tentando
afastar o nervosismo. Decido tomar um banho para tentar
m e d i s t r a i r, m a s c a d a m o v i m e n t o é a u t o m á t i c o , m e u s
pensamentos sempre voltando para ele. A água quente
ajuda a relaxar meus músculos, mas não consegue
acalmar meu coração inquieto.
M e u b a n h o é b e m p r á t i c o e r á p i d o . Vi s t o u m d o s
meus vestidos enormes, e minha calcinha de vovó. Felipe
nunca gostou delas, mas ele não entendia que elas são
confortáveis, diferente das outras.
Lembro-me que ele me falou algo sobre eu me
esforçar para parecer feia para ele. O que jamais fiz, eu
só não usaria as calcinhas desconfortáveis só porque ele
gosta. Após já vestida e perfumada, saio do quarto e vou
até a cozinha, onde Herbertina já está preparando o café
d a m a n h ã . O a r o m a d e c a f é f r e s c o e n c h e o a r, e e l a m e
oferece um sorriso caloroso.
— Bom dia, Marina. Dormiu bem? — Me pergunta,
colocando uma xícara de café na minha frente.
— Mais ou menos — respondo, tentando sorrir de
volta. — Alguma notícia do Diogo?
Herbertina balança a cabeça, mas seu olhar é
tranquilo.
— Ainda não, querida. Mas ele sempre avisa quando
c h e g a . Te n h a p a c i ê n c i a .
Eu aceno, tentando me agarrar às suas palavras de
c o n f o r t o . To m o u m g o l e d e c a f é , m a s m i n h a m e n t e
c o n t i n u a a v a g a r, p r e o c u p a d a c o m e l e . D i o g o é f o r t e ,
preparado, mas o perigo é sempre real. Me sento na
cadeira e deposito a xícara na mesa.
— Ele saiu tão cedo, né? Quanto tempo demora para
ele voltar?
— Depende muito — Herbertina me sorri. — As
vezes ele volta para o departamento, tem que trabalhar
por lá. Ou as vezes ele dá entrevistas.
— Mesmo? — Questiono surpresa, meu olhar vai
para a tv da sala. — A gente pode ligar a tv?
— Será que é uma boa ideia?
— Por favor!
Ela me olha por um momento, desce o olhar para a
minha barriga, mas por fim acena e vai até a sala. Encaro
a t v, m a s e s t á n o c o m e r c i a l . E l a v o l t a a s e a p r o x i m a r,
m a s m i n h a a t e n ç ã o e s t á n a g r a n d e t e l a d e t v.
— Eu fiz omelete de espinafre com queijo.
Ao dizer isso me oferece um prato bem recheado.
— Eu não quero que a senhora se esforce muito —
falo e ela me sorri. — É sério, no apartamento do Felipe
eu comia qualquer coisa.
— Por isso está sem vitaminas — retruca e vai até o
balcão onde estão os meus remédios. — Eu não entendo
como o Felipe ficou esses anos todos sem falar nada.
— No primeiro ano que fui morar no apartamento
d e l e — c o m e ç o f a z e n d o - a m e o l h a r. — E l e m e p r o m e t e u
que me apresentaria para os pais, mas quando me mandou
embora, disse que ele nunca se interessaria por alguém
como eu. Que eu era apenas uma diversão para ele.
— Eu sinto muito, filha. O Felipe sempre pendeu
para o lado canalha.
Desvio meu olhar para o prato.
— Eu acho que se eu soubesse que ele era assim,
teria voltado para casa. Só que meu pai não vai me
aceitar lá, não grávida e solteira. Ele é das antigas.
— Eu entendo e sinto muito — responde se
sentando a minha frente.
To m o o s c o m p r i m i d o s e e m s e g u i d a c o m e ç o a c o m e r
t e n d o H e r b e r t i n a c o m o c o m p a n h i a . Tu d o e s t á t ã o
delicioso, que me contenho para não pedir por mais.
Estou grávida, mas não posso abusar muito com a
comida.
— Quantos anos o Diogo tem?
— Se não me falha a memória, 35. — Ela me
analisa sutilmente. — E você?
— 26.
— Tão jovem, os dois.
Continuo comendo e olho rapidamente para a tv
quando escuto a musiquinha do noticiário. Então eu vejo
“Operação Encruzilhada” escrito em letras garrafais e
algumas imagens de carros de polícias já em frente ao
departamento.
"Bom dia. Em uma operação de grande escala
re a l i z a d a n a m a n h ã d e h o j e , a P o l í c i a F e d e r a l
d e s m a n t e l o u u m a d a s m a i o re s o rg a n i z a ç õ e s c r i m i n o s a s
d o p a í s , e n v o l v i d a e m t r á f i c o i n t e r n a c i o n a l d e d ro g a s e
l a v a g e m d e d i n h e i ro . A a ç ã o , d e n o m i n a d a O p e r a ç ã o
Encruzilhada, teve como palco principal o Rio de
J a n e i ro . N o s s o re p ó r t e r, J o ã o S i l v a , t e m m a i s d e t a l h e s . "
To c o m i n h a b a r r i g a e n q u a n t o m i n h a a t e n ç ã o
c o n t i n u a n a t v. A c e n a m u d a p a r a u m r e p ó r t e r q u e e s t á n o
local.
" B o m d i a . E s t o u a q u i n o P o r t o d o R i o d e J a n e i ro ,
o n d e a P o l í c i a F e d e r a l re a l i z o u u m a o p e r a ç ã o a u d a c i o s a
q u e re s u l t o u n a p r i s ã o d e 2 5 p e s s o a s , i n c l u i n d o o n o t ó r i o
traficante conhecido como 'El Fantasma'. A operação foi
liderada pelo Agente Federal Faruk, que está no
Comando das Operações Táticas, conhecido por sua
a b o rd a g e m d i re t a e i m p l a c á v e l . "
Engulo em seco ao ouvir o nome, por um momento
pensei que seria o Diogo. A imagem na tela mais uma vez
muda para mostrar agentes da Polícia Federal, vestidos
de terno e gravata, com distintivos visíveis, conduzindo
prisões e apreendendo drogas e dinheiro.
" A O p e r a ç ã o E n c r u z i l h a d a f o i re s u l t a d o d e m e s e s
d e i n v e s t i g a ç õ e s i n t e n s a s . F o r a m a p re e n d i d o s m a i s d e
500 kg de cocaína, armas de fogo, veículos de luxo e
c e rc a d e 1 0 m i l h õ e s d e re a i s e m d i n h e i ro . A l é m d i s s o ,
d o c u m e n t o s e c o m p u t a d o re s c o m i n f o r m a ç õ e s v a l i o s a s
s o b re a re d e d e t r á f i c o f o r a m c o n f i s c a d o s . "
A câmera foca no rosto mascarado de um homem, e
f r a n z o o c e n h o q u a n d o e l e f a l a c o m o r e p ó r t e r.
"Estou agora com o agente mais conhecido como
F a r u k q u e l i d e ro u a o p e r a ç ã o . S e n h o r, c o m o f o i
c o o rd e n a r u m a o p e r a ç ã o d e s s a m a g n i t u d e ? "
“ F o i u m t r a b a l h o á rd u o e m e t i c u l o s o . N o s s a e q u i p e
t r a b a l h o u i n c a n s a v e l m e n t e p a r a re u n i r p ro v a s e g a r a n t i r
q u e c a d a e t a p a f o s s e e x e c u t a d a c o m p re c i s ã o . A
segurança da equipe e a eficácia da operação foram
nossas prioridades. Hoje, conseguimos desmantelar uma
o rg a n i z a ç ã o c r i m i n o s a q u e c a u s a v a m u i t o d a n o a o n o s s o
país.”
— É o Diogo — me avisa e fico surpresa —, ele é
todo bonitão falando desse jeito — Herbertina comenta
comigo.
Apenas aceno, admirada pela tenacidade de Diogo.
M e p e r g u n t o o q u e m a i s a q u e l e h o m e m é c a p a z d e f a z e r.
" A o p e r a ç ã o e n v o l v e u c e rc a d e 5 0 a g e n t e s f e d e r a i s
e f o i c o o rd e n a d a s i m u l t a n e a m e n t e e m v á r i a s c i d a d e s d o
p a í s . A p r i s ã o d e ' E l F a n t a s m a ' re p re s e n t a u m g o l p e
s i g n i f i c a t i v o c o n t r a o t r á f i c o i n t e r n a c i o n a l d e d ro g a s . "

Solto um suspiro e me encosto na cadeira.


— Vi u ? — M e v o l t o para Herbertina. — Sem
preocupação, já já ele liga.
— Por que Faruk?
— É um nome de guerra que ele usa, para manter a
privacidade.
— Apesar de não saber o que significa — falo com
um sorriso pequeno. — Combina com ele.
— Combina mesmo — Herbertina concorda comigo.
— Então, o que vai querer para o almoço?
Dou de ombros e toco minha barriga.
— Eu não sei, o que a senhora quiser para mim está
tudo bem.
— Vo c ê p a r e c e o D i o g o m e r e s p o n d e n d o a s s i m —
ela comenta e me sorri. — Ele eu sei o que gosta, já você
não. Então me diga, filha, o que quer comer no almoço?
Tímida, eu dou um sorriso e pondero antes de
r e s p o n d e r.
— Faz tanto tempo que eu não como lasanha —
Herbertina me olha rapidamente. — Eu sei que não é uma
comida saudável, mas estou com desejo.
Recebo um olhar risonho.
— E s t á b e m — f a l a i n d o a t é o a r m á r i o . — Vo u f a z e r
porque é desejo de grávida, mas só dessa vez.
— Obrigada.
Vo l t o a c o m e r m e u c a f é d a m a n h ã , o l h o p a r a a t v
que agora passa mais comercial.

*** ***

O começo da noite chega e com ele o tempo frio. Lá


perto da hora do almoço, recebemos uma ligação do
Diogo. Fiquei em paz quando ele afirmou que estava bem,
mas que não conseguiria voltar mais cedo por conta da
operação. Após aquilo consegui ficar mais calma, e fazer
a q u e l e t u r b i l h ã o d e s e n t i m e n t o s s e d i s s i p a r. À s 1 8 h 3 0
Herbertina ligou novamente para Diogo e avisou que
p r e c i s a r i a i r e m c a s a , j á q u e e l a n ã o f o i n a n o i t e a n t e r i o r.
Ti v e q u e p r o m e t e r q u e f i c a r i a b e m s o z i n h a , q u e e l a n ã o
p r e c i s a v a s e p r e o c u p a r, m e s m o a s s i m p e r c e b i o r e c e i o
v i n d o d e l a . R e f o r c e i q u e f i c a r i a t u d o b e m e a n t e s d e s a i r,
ela deixou o número dela anotado perto do telefone fixo.
Tr o c o o c a n a l e e l e c a i e m u m f i l m e . M e u o l h a r
percorre ao redor e dou um sorriso, tudo ali parece muito
com Diogo e sua personalidade. Logo acima da tv
percebo, pela primeira vez, uma fotografia que me chama
a atenção. Me levanto com custo e vou até ela. Estico um
p o u c o p a r a p o d e r p e g a r, m a s a s s i m q u e c o n s i g o , a n a l i s o a
imagem.
Diogo segura um troféu e está vestido de quimono
azul.
Ele não sorri e se mantém sério. Os cabelos estão
maiores e bagunçados, me fazendo achá-lo muito bonito
na mesma hora. Acaricio a imagem e dou um sorriso,
Diogo é realmente muito bonito. Embora tenha seu jeito
mais fechado, é inegável que ele tem um coração bom.
Por um momento tenho curiosidade para saber mais sobre
ele, sua infância com os pais adotivos. Herbertina não me
disse nada sobre isso, só alguns momentos dele já em
meio a família Macêdo.
Devolvo a fotografia para o lugar e finalmente,
o u ç o o s o m d a c a m i n h o n e t e c h e g a r. M e u c o r a ç ã o d i s p a r a
s e m q u e e u p o s s a c o n t r o l a r, e a p ó s u m s u s p i r o , o l h o p a r a
a entrada. Não demora muito e o vejo com a mesma roupa
de manhã. Diogo mantém expressão cansada, mas ileso.
Um suspiro de alívio escapa dos meus lábios.
— Vo c ê c h e g o u — m u r m u r o e e l e a c e n a j o g a n d o a
m o c h i l a n o c h ã o . — E u v i a s u a e n t r e v i s t a . Vo c ê e s t á
bem?
— Estou. Foi uma operação difícil, mas estamos
todos bem — responde ele, sem tirar os olhos de mim. —
E você? Se sente bem?
— S i m — a f i r m o e l e v o a m ã o a b a r r i g a . — Vo c ê
d e v e e s t a r c o m f o m e e c a n s a d o , n é ? Vo u e s q u e n t a r a s u a
comida.
— Ei, não — ele gesticula com a mão e se
a p r o x i m a . — Vo c ê t e m q u e d e s c a n s a r, e u p o s s o c o l o c a r
minha comida. — Mesmo sabendo que ele está sendo
c u i d a d o s o , f i c o s e m j e i t o . Ta l v e z n o t a n d o i s s o e l e
continua: — O que fez o dia todo? Sentiu alguma dor?
— Não, só fiquei por aqui conversando com a
Herbertina. Ela não me deixou ajudar no almoço, e nem
quando estava arrumando a casa. Então não fiz nada.
— Se desobedecê-la é capaz dela te colocar de
castigo.
Eu sorrio sem segurar e coloco uma mecha do meu
cabelo atrás da orelha. Meu olhar nunca abandona Diogo,
q u e r a p i d a m e n t e d e s v i a o o l h a r. S i n t o q u e e s t o u o
i n c o m o d a n d o , e n t ã o t a m b é m d e s v i o o o l h a r.
— Eu vou para o quarto — falo e ele faz menção de
m e p e g a r n o s b r a ç o s . — N ã o , p o r f a v o r, n ã o p r e c i s a .
Ele apenas aceita e, mesmo após dar as costas a ele,
sinto seu olhar em mim. Chego no quarto e vou até a
cama que é extremamente macia. Me deito com cuidado e
fico ali olhando para o teto. O que estou fazendo? Eu não
p o s s o f i c a r, n ã o p o s s o s i m p l e s m e n t e o c u p a r a v i d a d e
Diogo desse jeito. Ele é um homem solteiro, talvez tenha
o costume de trazer mulheres para cá e eu estando aqui
só iria atrapalhá-lo.
Solto um suspiro.
Meu celular está carregando em cima da mesinha ao
lado da cama, o pego e assim que o ligo vejo algumas
mensagens. Abro a primeira e engulo em seco ao ver que
é Felipe. Ele pergunta onde estou e exige que eu entre em
c o n t a t o . Vo u p a r a a p r ó x i m a e f i c o t r ê m u l a a s s i m q u e
t e r m i n o d e l e r.

“ É m e l h o r v o c ê t e r p e rd i d o e s s e b a s t a rd o , p o rq u e
se eu a encontrar grávida, não queira saber o que vai
acontecer com você.”
“O que você disse para o idiota do meu irmão?
Acho bom você pensar bem no que está fazendo, Marina!
Mande agora sua localização!”
O que seria de mim quando eu for embora? Felipe
irá atrás de mim na minha cidade natal? E quando eu
tiver o meu bebê? O que eu vou fazer? Saio da cama
lentamente e no instante que fico em pé, sinto minha
visão ficar turva e meu corpo ficar mole. Para evitar a
queda, deixo meu celular cair no chão e apoio minhas
mãos no móvel.
— Marina? — Ouço a voz de Diogo ao longe, e em
questão de segundos ele está no quarto. Sinto suas mãos
me segurarem com cuidado, então eu o encaro. — O que
aconteceu? Está com dor?
— O que vai acontecer comigo quando o Felipe
souber que estou aqui?
Diogo me ajuda a sentar e olha para o chão, meu
celular está ligado, mas a tela está quebrada. Ele se
abaixa e o pega.
— O que ele fez?
— E - E u n ã o s e i o q u e f a z e r, D i o g o — m u r m u r o
enquanto choro. — Eu não tenho nada. Eu não tenho
emprego, dinheiro, nada... O que vai ser do meu bebê?
Meu pai está com raiva de mim, não me aceita em casa e
o Felipe quis que eu perdesse o bebê naquele noite.
— Marina...
— Eu não posso ficar aqui — o interrompo e ele
a c e n a . — E u s ó v o u t e a t r a p a l h a r ! Vo c ê é j o v e m e . . .
— Marina — ele me toca o rosto em uma carícia
t í m i d a . — Vo c ê n ã o v a i m e a t r a p a l h a r, n e m o s e u b e b ê .
Enquanto estiver aqui, nada vai faltar para vocês. Não
precisa se preocupar com isso, nem com o meu irmão. Ele
não vai chegar perto de vocês, e não vai fazer nada
c o n t r a v o c ê s . E u n ã o v o u d e i x a r.
Balanço a cabeça em negação, Diogo não entende
meu medo.
— E l e v a i m e b a t e r. . .
— Ele não vai encostar um dedo em você — sua voz
s a i m a i s d e t e r m i n a d a . — Vo c ê c o n f i a e m m i m ?
Com os olhos cheios de lágrimas, o encaro
sentindo um misto de medo e esperança. Nunca imaginei
que encontraria alguém disposto a me proteger assim,
ainda mais sendo um desconhecido até pouco tempo.
Diogo parece firme, sua expressão é de determinação,
mas também vejo uma gentileza que não havia notado
antes.
— Confio — respondo, minha voz saindo baixinho.
Ele dá um aceno e faz mais um carinho em minha
bochecha.
— Ótimo, agora você vai descansar e...
— Eu não quero ficar sozinha — o interrompo
sentindo um aperto no peito. — Eu não gosto de ficar
sozinha. Eu ficava muitas horas sozinha naquele
apartamento.
Diogo engole em seco e maneia a cabeça.
— Tu d o bem, mas eu preciso tomar banho — avisa e
eu desço meu olhar para a blusa preta de mangas curtas
que ele usa e short. — Quer ficar na sala por enquanto?
Só preciso de um banho.
To m a d a p e l a c o r a g e m do momento eu aceno e
decido fazer uma pergunta.
— Por que você é tão sério? Nas suas fotos que eu
vi com a Herbertina, em todas você está sério. Até
naquela foto que tem na sala, você ganhou um prêmio e
nem sorriu.
Ele para confuso e fica me encarando.
— Eu não sou “tão sério” — retruca e me pega nos
b r a ç o s . — Vo c ê v a i f i c a r s e n t a d a , n ã o v o u d e m o r a r.
Concordo e olho seu rosto tão próximo do meu. Ele
a n d a a t é a s a l a e n e m p a r e c e c a n s a d o p o r m e c a r r e g a r.
Assim que sou colocada no sofá, ele fica agachado a
minha frente.
— N ã o s a i a d a q u i — m a n d a e e u c o n c o r d o . — Vo c ê
quer que eu pegue alguma coisa?
To r ç o o s d e d o s e o l h o p a r a a c o z i n h a , p e n s o e m
c o n f i r m a r, m a s n ã o q u e r o o i n c o m o d a r c o m a l g o t ã o
bobo.
— Não.
Ele segue o olhar para a cozinha, mas logo me
encara.
— Mesmo?
— É que hoje pela tarde — murmuro sem jeito,
sinto meu rosto queimar só com ele me encarando tão
perto. — A dona Herbertina me deu alguns morangos.
Eles estavam tão gostosos.
Ele me analisa por alguns segundos, mas logo fica
de pé e vai até a cozinha. O observo ir até a geladeira e
pegar o pote dos morangos. Antes de vir até mim, ele os
lava e eu fico ali sentada esperando.
— Só tem esses — comenta e me entrega. —
Amanhã eu compro mais.
Dou uma mordida e sinto o gosto adocicado se
espalhar em minha língua.
— Não, não se incomode. — Franzo o cenho e dou
mais uma mordida. — Esse é realmente delicioso, eu
comeria um balde cheio.
Olho para Diogo ao mesmo tempo que ele sorri
enquanto me observa, mas logo volta a ficar sério. Mais
uma vez ele sorriu para mim, e ele é tão lindo sorrindo. A
água do morango escorre por meu lábio, mas rapidamente
recolho com a língua.
— Vo l t o l o g o .
Ele praticamente corre para longe e eu fico sentada
s e m c o m p r e e n d e r o p o r q u ê d e e l e f u g i r.
C a p í t u l o 5 – D i o g o

Ando rapidamente até o meu banheiro e, em tempo


r e c o r d e , r e t i r o m i n h a r o u p a . Vo u p a r a d e b a i x o d o
chuveiro e ligo na água fria. Fecho os olhos e tento tirar
a imagem de Marina comendo o morango e de sua língua
l a m b e n d o o l á b i o i n f e r i o r. M a s é i n ú t i l . A s l e m b r a n ç a s s e
r e c u s a m a d e s a p a r e c e r, f a z e n d o m e u c o r p o r e a g i r d e u m a
maneira que não deveria. Respiro fundo, tentando
recuperar o controle.
Não posso me permitir esses pensamentos. Marina
está vulnerável, e minha prioridade deve ser protegê-la,
n ã o m e p e r d e r e m f a n t a s i a s . Te n t o m e c o n c e n t r a r n a á g u a
gelada que escorre pelo meu corpo, esperando que isso
me traga de volta ao presente. Mas é difícil.
Te r m i n o o b a n h o e m e s e c o r a p i d a m e n t e . Vi s t o u m a
bermuda de moletom e uma camiseta limpa, tentando me
livrar dos resquícios de desejo que ainda persistem.
Quando saio do quarto, vou direto para sala. Marina está
sentada no sofá em posição de índio — sentada sobre as
pernas — e ainda come os morangos. Respiro fundo e em
seguida pigarreio. Ela me olha enquanto mordisca mais
um pedaço da pequena fruta.
Aqueles lindos olhos me encarando, como se
soubessem exatamente o fez comigo.
— Por que Faruk, Diogo? — Pergunta, visivelmente
curiosa.
Franzo o cenho com o questionamento, então
deduzo que ela me viu dando entrevista mais cedo.
— Foi o Igor que me deu esse apelido — respondo e
dou as costas indo até a geladeira. — Assim que ele
descobriu que tenho descendência turca.
— Mesmo? — Olho para ela que mantém a atenção
e m m i m . — Vo c ê s a b e f a l a r t u r c o ?
— Um pouco — falo e pego um deposito. —
Lasanha?
— Eu estava com desejo — ela fala com um mínimo
sorriso.
Pego um prato e coloco um pouco da lasanha nele.
Em seguida levo ao micro-ondas e, após alguns minutos,
meu jantar está quente e eu o pego.
— Herbertina não costuma fazer lasanha — comento
e me sento ao seu lado, mantendo uma distância
r e s p e i t o s a . — Ta l v e z p o r e u n ã o s e r m u i t o f ã .
— Como não? — Ela indaga incrédula fazendo os
lindos olhos se arregalarem.
Os lábios vermelhos do morango, que há pouco ela
e s t a v a s a b o r e a n d o , m e c h a m a m a a t e n ç ã o . Te n t o m e
concentrar na conversa, e não em saber o sabor dos
lábios carnudos. Por que diabos pensei nisso?!
— Não sei — balanço a cabeça. — Nunca fui muito
fã de massas. — Dou de ombros, dando uma mordida na
lasanha.
— Vo c ê n ã o s a b e o q u e e s t á p e r d e n d o — e l a
responde, voltando a comer o morango. Seus olhos
brilham enquanto mastiga, e por um momento, parece se
esquecer dos problemas.
— Pode ser — admito —, mas se você gosta,
podemos pedir mais vezes. Herbertina é uma ótima
c o z i n h e i r a , e l a p o d e f a z e r o q u e q u i s e r.
Marina sorri e percebo que, apesar de toda a tensão,
conseguimos criar um momento de leveza. Então, seu
olhar encontra o meu, mas ela logo desvia. Antes de
imitá-la, eu observo seu rosto delicado, as bochechas
rosadas, os cabelos castanhos soltos ao redor lhe
deixando ainda mais bonita.
— Diogo — ela começa, hesitante. — Sobre o
Felipe... e tudo o que aconteceu... você realmente acha
que tudo bem mesmo? Eu sei que conversamos, mas eu
tenho medo.
Olho para ela, vendo a vulnerabilidade em seus
olhos.
— Eu entendo e garanto que comigo estarão
seguros.
Ela assente, seus ombros relaxam.
— Confio em você, Diogo. Não sei como agradecer
por tudo isso.
— N ã o p r e c i s a a g r a d e c e r. A p e n a s s e c u i d e e c u i d e
da gravidez. O resto deixe comigo.
Ela sorri novamente, e vejo uma nova determinação
s u r g i r e m s e u r o s t o . Vo l t o a c o m e r e m s i l ê n c i o , m a s u m
silêncio confortável. Marina termina os morangos, e fica
o l h a n d o p a r a o d e p o s i t o . F i c a m o s a l i e n t r e t i d o s n a t v, e
q u a n d o t e r m i n o d e c o m e r, l e v o o s p r a t o s p a r a a c o z i n h a e
começo a lavar o que está sujo.
A p ó s t e r m i n a r, r e t o r n o p a r a a s a l a e m e s e n t o n o
s o f á . M a r i n a a l i s a a b a r r i g a e a s s i s t e t v. A l i m e l e m b r o
que em breve o bebê nasceria e aparentemente ela não
tem nada. Quero perguntar se ela quer ir comigo até o
shopping, mas me recordo que ela precisa de repouso.
— Por que decidiu ser agente federal?
Fico uns segundos calado, mas logo respondo.
— Sempre quis ser policial, prender bandidos e
proteger quem precisa.
Falo no automático, então percebo que talvez possa
ter sido grosso. Já que sutilmente ela se abraça, e desvia
o o l h a r.
— Ah, entendo.
Cruzo os braços aceitando o fim de assunto, mas
algo me faz olhá-la.
— Na verdade, eu só queria ter condições de
proteger quem precisa — falo novamente e ela me encara.
— Ta l v e z e u t e n h a s i d o i n f l u e n c i a d o p e l o m e u p a i a
cursar direito, e seguir os passos dele.
— Mas é o que gosta.
— Sim — confirmo. Automaticamente me lembro do
passado, da casa pequena, de um quarto pequeno e mal
iluminado, gritos de uma discussão são tão nítidos em
minha mente. Solto um suspiro e esfrego os olhos. — E
você? O que fazia da vida antes de conhecer meu irmão?
— Bom, eu estava terminando meu curso de
biologia — fala, fico surpreso, mas não demonstro.
Marina bióloga? — E eu trabalhava em uma loja de
construção meio período. Morava com os meus pais lá em
Santiago do Sul, eu estava analisando a possibilidade de
m e m u d a r, m a s a i e u c o n h e c i o F e l i p e p o r l á . E l e e s t a v a
visitando a cidade, trocamos números e ficamos
conversando. Eu fui bem burra. — Ri, mas sei que não
está achando realmente graça. — É lógico que eu não sou
tão interessante assim, nem sei por que acreditei que era
real.
Minha primeira reação é dizer que ela é sim
interessante, que o problema foi o meu irmão, mas me
mantenho calado. Apenas escutando e tentando manter a
calma, ver Marina naquele estado me deixa extremamente
desconfortável.
— E u m e d e s c u i d e i e a c o n t e c e u — v o l t a a f a l a r. —
Quer dizer — para confusa. — Eu sempre fui bem
cuidadosa em relação a isso. — Então ela balança a
cabeça. — Eu avisei que estava grávida e ele não reagiu
bem, foi embora e ficou sem falar comigo. Então, depois
de um tempo ele voltou como se nada estivesse
acontecendo. — Murmura com o olhar vago, como se
recordando. — Só me procurava a noite, as vezes eu nem
queria, mas se eu dissesse não ele ficava muito violento
e... — Marina para e me encarava. Eu a observo sem
p i s c a r, a s p a l a v r a s e n t r a n d o e m m i n h a c a b e ç a , m e
atingindo como se fossem socos. — Desculpa, eu...
— Não precisa se desculpar — falo e ela seca as
lágrimas rapidamente. Por dentro estou completamente
nervoso, minha vontade nesse exato momento é ir atrás
de Felipe. — Marina, ele empurrou você no dia que
encontrei? — Indago e ela respira fundo. — Eu sei que
n ã o q u e r f a l a r d i s s o , q u e n ã o q u e r l e m b r a r, m a s v o c ê n ã o
precisa protegê-lo.
— Não é que eu quero proteger o Felipe — retruca.
— Eu só não quero que ele venha atrás de mim. Eu não
sei como ele é com você, mas comigo as coisas são
diferentes. Ele me mandou embora da vida dele, mas
ainda assim insiste em me ligar ou querer mandar em
mim. O que acha que ele vai fazer comigo caso eu faça
um boletim contra ele?
Ela morde o lábio, claramente desconfortável com a
conversa.
— Se há algo que abomino com todas as minhas
forças, Marina — começo e ela me olha assustada. — É
uma mulher ser agredida.
— Diogo...
— Se você o denunciar — volto a falar a
interrompendo. — Eu prometo que ele não vai fazer nada
contra você.
— E os seus pais? Como vão receber essa notícia?
O seu pai também é policial, isso não vai envergonhá-lo?
— Vo c ê é a v í t i m a , M a r i n a . C o m o e l e s v ã o r e c e b e r
a notícia é problema deles.
Ela demora um pouco, mas assente. Posso ver o
receio em seus olhos e entendo o medo, mas estou
determinado a fazer o que for preciso para protegê-la e
ao bebê.
M a r i n a e n c a r a a s m ã o s , e q u a n d o v o l t a a m e o l h a r,
solta um suspiro.
— Eu posso pensar? — Indaga e eu respiro fundo.
— É que eu estou confusa e com desejo de comer algo
salgado. Uma coxinha com suco de laranja, é muito para
a minha mente.
A vejo alisar a barriga, a carinha triste e confusa
quase me arranca um sorriso. Sinto vontade de abraçá-la
e tirar qualquer pensamento ruim de sua mente.
— Vo c ê q u e r q u e e u p e ç a ?
— Não! — Ela nega sem jeito. — Só pensei alto.
Hoje comi bastante, a dona Herbertina realmente cozinha
bem.
M a r i n a a j e i t a o s c a b e l o s e v o l t a a a t e n ç ã o p a r a a t v.
— Isso tenho que concordar — afirmo e ela me
o l h a . E n g u l o e m s e c o e d e s v i o o o l h a r. Te r a q u e l e s
hipnotizantes olhos verdes em minha direção é diferente.
— Não está cansada?
Indago preocupado, mas acho estranho quando ela
me olha sem jeito.
— Vo c ê q u e r f i c a r s o z i n h o , n é ? — P e r g u n t a e f a z
m e n ç ã o d e l e v a n t a r.
— Não, pode ficar se quiser — respondo e a vejo
tocar a barriga e fazer uma leve careta. — O que foi?
— Nada — balança a cabeça. — Ele está se
mexendo — Marina ainda mantém o cenho franzido. —
Ele me dá cada chute — brinca, meu olhar vai direto para
a sua barriga. — Quer sentir?
Fico surpreso com a pergunta, e meu primeiro
instinto é negar com a cabeça.
— O quê? Não, eu não posso.
— Te m m e d o ? — S e u o l h a r é c o n f u s o , m a s a o
mesmo tempo há um leve toque de diversão. Posso ver
que se controla para ficar séria. — Me dá a sua mão —
p e d e e e u n e g o . To c a r s u a b a r r i g a m e p a r e c e t ã o í n t i m o ,
n ã o s e i e x p l i c a r. N o e n t a n t o , e l a p a r e c e n ã o l i g a r e p e g a
minha mão colocando no exato momento que o bebê
chuta. — Sentiu?
Fico um tanto sem jeito, mas permito aquele
contato.
— Esses chutes doem?
Ela nega e desliza minha mão por sua barriga, sinto
mais uma vez o chute. E dessa vez não consigo segurar o
sorriso. Minha mão fica sozinha, e eu permito alisar por
mais alguns segundos. Estou prestes a falar quando
escuto uma buzina do lado de fora da casa. Recolho
minha mão e me levanto indo até o painel que fica ao
lado da porta. Pela pequena tela vejo que é o carro de
minha mãe, e segundos depois ela e Felipe descem,
ficando parados em frente ao portão.
Me volto para Marina que me olha curiosa.
— Ta l v e z s e j a m e l h o r i r p a r a o q u a r t o .
— É o Felipe? — Ela pergunta ficando em pé.
Ve j o s u a c a r e t a e n q u a n t o t o c a o p é d a b a r r i g a , m a s
não dura muito.
— Sim, mas não se preocupe — peço quando ela me
o l h a a l a r m a d a . — Ve m , v o u t e l e v a r.
A pego nos braços e quase ao mesmo tempo o
t e l e f o n e d a s a l a c o m e ç a a t o c a r. D e i x o M a r i n a n a c a m a e
saio rapidamente indo até a sala. Após respirar fundo,
permito a entrada de ambos. Não demora muito e minha
mãe aparece pela porta da casa. Ela passa por mim e olha
a o r e d o r, e m s e g u i d a m e u i r m ã o a i m i t a .
— Quero que me explique agora mesmo o que está
acontecendo, Diogo.
Cruzo os braços encarando meu irmão, que de um
jeito covarde “se esconde” atrás da nossa mãe.
— Explicar o quê?
— Olhe aqui você não me tire do sério! — Profere e
e m s e g u i d a c r u z a o s b r a ç o s . — Vo c ê a m e a ç o u o s e u i r m ã o
por conta de uma mulher? O que está acontecendo com
essa família? Desde quando você ameaça seu irmão por
conta de uma vagabunda?
Respiro fundo na intenção de mantar a calma, ela
ainda é minha mãe e eu devo respeito.
— Não foi uma ameaça — murmuro baixinho, meu
irmão me encara mais sério por cima do ombro de nossa
m ã e . — F o i u m c o n s e l h o , e p o r f a v o r, n ã o a x i n g u e d e s s e
jeito. A senhora é a minha mãe e vou respeitá-la, mas não
vou admitir esses insultos em minha casa.
Ela me olha com descrença, como se eu tivesse
apontado uma arma para ela. Mas eu não posso deixar ela
continuar pensando que tem o direito de insultar alguém
que nem conhece, especialmente alguém que é tão
delicada e não merece passar por isso.
— Então no fundo você quer me xingar também? —
Franzo o cenho enquanto a vejo me dar as costas e ir até
o m e i o d a s a l a . — É i s s o m e s m o ? Ta n t o s a n o s c u i d a n d o
de você e te tratando como meu filho, para você me dizer
isso? Me desrespeitar assim?
Respiro fundo.
— Eu não a desrespeitei.
— Vo c ê f e z i s s o ! — M e a c u s a c o m o d e d o e m r i s t e .
— Fez isso quando deixou o jantar e nossos convidados
plantados. A Amanda está interessada em você, o Emílio
tem grande influência, conhece muitas pessoas e você
simplesmente me envergonha daquele jeito? Não pensa no
seu pai ou em mim? Por que Diogo? Por que me odeia
dessa forma?
Esfrego a mão no rosto e tento buscar uma calma
p a r a n ã o e x p l o d i r. O o l h a r d e j u l g a m e n t o d e m i n h a m ã e
ainda está em mim, já meu irmão mantém um sorriso de
lado. Isso me deixa enfurecido.
— Vo c ê a i n d a n ã o m e f a l o u q u e m é e s s a v a g a b u n d a .
— Eu já disse para não a insultar! — Retruco
perdendo a calma.
E l a a b r e a b o c a p a r a r e c l a m a r, m a s l o g o p a r a
q u a n d o e s c u t a u m g e m i d o a l t o d e d o r v i r d o c o r r e d o r.
Preocupado, passo por ela e vou até o quarto. Assim que
entro no recinto, vejo Marina escorada com a mão na
parede, a outra no pé da barriga e no chão uma poça de
u m l í q u i d o i n c o l o r.
— Marina?!
Ouço a voz de Felipe assustado, mas não ligo para
isso e corro até ela.
— Eu acho que ele vai nascer — sua voz é urgente.
Rapidamente a pego nos braços e me volto para a
porta. Minha mãe está visivelmente surpresa, os olhos
focam em Marina e apenas nela. Sinto os braços me
arrodearem o pescoço e saio do quarto. Na sala pego meu
c e l u l a r e a c h a v e d o c a r r o . M a r i n a g e m e d e d o r.
— Calma, vai dar tudo certo!
— O F-Felipe...
— Não pense nele — murmuro e carinhosamente a
coloco no banco.
Corro para o banco do motorista e assim que a
garagem abre, vejo parte da saída obstruída. Bufo e com
j e i t o c o n s i g o s a i r s e m b a t e r n o c a r r o . To m o o c a m i n h o d o
hospital, Marina ao meu lado solta alguns gemidos e
caretas. Pego meu celular e ligo para dona Herbertina,
quando me atende, aviso que estou indo para o hospital
com Marina. Peço para que assim possível, ela vá para a
minha casa que deixei sozinha.
O caminho até o hospital é breve. Quando por fim
chego, paro no estacionamento e pego Marina com
cuidado. Assim que entramos na recepção, eu peço ajuda
avisando o que está acontecendo. Duas enfermeiras se
aproximam e me pedem para colocar Marina em uma
cadeira de rodas que tem perto. Acompanho-as com a
adrenalina correndo por minhas veias, mas quando uma
d e l a s p a s s a p e l a s p o r t a s d e c o r r e r, a o u t r a m e i m p e d e d e
e n t r a r.
— O senhor não está vestido adequadamente.
Então eu me olho, e percebo que estou descalço, de
bermuda de moletom e camiseta. Abro os braços para
r e c l a m a r, m a s é t a r d e . P e l o v i d r o d a p o r t a v e j o M a r i n a
s u m i r n o c o r r e d o r. P e g o m e u c e l u l a r m a i s u m a v e z e
d e s s a v e z l i g o p a r a I g o r. Q u a n d o m e a t e n d e , p e ç o p a r a
q u e v á e m m i n h a c a s a e m e t r a g a r o u p a s . Av i s o q u e
Marina está em trabalho de parto no mesmo hospital que
antes, e que eu saí de roupa de dormir as pressas. Depois
d e l e r i r, m e a f i r m a q u e v a i p a s s a r n a m i n h a c a s a .
Fico ali parado na porta, olhando pelo vidro, em
busca de algum sinal de Marina. Levo as mãos a cintura e
impaciente, ando de um lado para o outro.

Após algumas horas, olho para a recepção e vejo


Igor andar calmamente em minha direção. Corro até ele e
pego a bolsa que traz em mãos.
— Obrigado Igor por ter vindo correndo me ajudar
— e l e f a l a c o m d e b o c h e . — Vo c ê é u m a m i g o , a m i g o .
A n t e s d e e n t r a r n o b a n h e i r o d o c o r r e d o r, e u o
encaro. Igor me manda um beijo e sorri. Como ele pode
e s t a r t ã o c a l m o ? Tr a n c o a p o r t a e c o m e ç o a t i r a r a r o u p a ,
vejo que dentro da bolsa há um vestido e embrulhado com
um tecido, há uma peça de cor neutra. Me visto
rapidamente com uma calça jeans, tênis e camiseta preta.
Saio do banheiro ainda segurando a bolsa e passo pelas
p o r t a s d e c o r r e r.
A s s i m q u e d o b r o n a e s q u i n a d o c o r r e d o r, t r o m b o
com a enfermeira. Ela me olha surpresa dos pés a cabeça.
— Eu ia chamar o senhor — avisa e indica o
caminho. — Ela está aguardando na sala de observação
pré-parto e está chamando por você.
— Ela estava com a placenta deslocada, vim com
e l a h á a l g u m a s n o i t e s . O d o u t o r. . .
— Sim, está no prontuário dela — paramos em
f r e n t e a u m a p o r t a . — O s e n h o r p o d e e n t r a r, t a l v e z a s s i m
c o n s i g a a a c a l m a r.
A acompanho e assim que entramos no quarto,
M a r i n a é a p r i m e i r a q u e v e j o . Te m a m ã o n a b a r r i g a
e n q u a n t o c h o r a e g e m e d e d o r.
— D-Diogo... — Sua voz sai dolorosa, me aproximo
ficando ao seu lado. — Está doendo tanto!
— Calma — peço começando a ficar nervoso. Não
estou acostumado a me sentir impotente, mas aqui, agora,
não posso fazer nada além de segurar a mão trêmula e
tentar transmitir força através do aperto dos meus dedos.
— Eu estou aqui com você.
A porta do quarto se abre e uma outra enfermeira
entra.
— Oi mamãe, vamos ver como está a dilatação?
Marina aperta a minha mão e fecha os olhos, o
r o s t o d e m o n s t r a n d o d o r.
— E então? — Pergunto e recebo um sorriso.
— Ansioso para ver o bebê, papai? — Indaga, e eu
fico em silêncio. Me volto para Marina que respira pela
b o c a . — Va m o s l e v á - l a p a r a o c e n t r o c i r ú r g i c o .
— Fica comigo! — Marina segura minha mão.
Rapidamente concordo, não sei explicar o que está
acontecendo. De repente, me sinto como se fizesse parte
daquilo, mesmo sabendo que não. Acompanho a
enfermeira empurrar a maca até uma outra sala, e antes
q u e e u p o s s a e n t r a r, d o i s e n f e r m e i r o s m e a j u d a m a
colocar a roupa especial. Ao mesmo tempo vejo Marina
ser preparada para a chegada do bebê. Quando por fim me
aproximo dela, seguro sua mão e seus olhos chorosos
encontram os meus.
O m u n d o a o r e d o r p a r e c e d e s a p a r e c e r, e e u s ó
consigo olhar para o seu rosto corado e suado.
— Mamãe, temos dilatação para um parto normal —
o médico informa chamando minha atenção. Me lembro de
s u a p l a c e n t a d e s l o c a d a e q u e r o q u e s t i o n a r, m a s n ã o q u e r o
trazer insegurança para Marina. Olho alarmado para o
d o u t o r q u e p a r e c e m e e n t e n d e r. — Va i d a r t u d o c e r t o .
Respiro fundo e me abaixo até ficar perto de
Marina.
— O u v i u ? Va i d a r t u d o c e r t o — m u r m u r o e
institivamente seco a lágrima que escorre por seu rosto.
— Não vou sair do seu lado.
E l a a c e n a f r e n e t i c a m e n t e e g r i t a d e d o r. E n t ã o o
médico começa a conversar calmamente com Marina, que
r e s p o n d e e m m e i o a s d o r e s . Ve j o s e u e s f o r ç o , e n ã o p o s s o
negar que fico admirado com sua força. Seu olhar
determinado encontra o meu, e eu toco em seu rosto
d e l i c a d o . M a r i n a s e c o n t o r c e d e d o r, a p e r t a n d o c o m
extrema força minha mão.
Ela me olha com os olhos arregalados.
— Dói tanto!
— Vo c ê é f o r t e , M a r i n a ! Vo c ê v a i c o n s e g u i r e
vamos finalmente conhecer a sua bebê.
Os olhos se fecham e ela grita fazendo força.
— E-Eu acho... que é um m-menino — ela fala, em
seguida faz mais força.
O suor escorre pela testa dela, o rosto contorcido
em esforço. Desvio nossos olhares e foco no médico que
tem o cenho franzido. Ele se inclina e não consigo ver
exatamente o que faz, mas logo se afasta e nos olha.
— Mamãe? É o momento de você respirar fundo e
fazer mais força. Já consigo ver o bebê coroando.
Marina me olha e balança a cabeça em negação, mas
eu aceno passando confiança. Então me inclino, a minha
mão direita é segurada com força, já a segunda, continuo
fazendo carinho em seu rosto suado.
— E s t á q u a s e , M a r i n a . Vo c ê c o n s e g u e — d i g o ,
minha voz grave tentando soar mais suave do que sinto.
O médico faz um sinal, e eu sei que estamos na reta
final. O quarto está um caos controlado, enfermeiras se
movendo rapidamente, máquinas bipando. Mas, para mim,
só existe Marina.
— Empurra, Marina. Só mais uma vez — encorajo,
minha voz quase rouca de emoção. Ela grita, um som
primal que reverbera pelo quarto, e então, de repente, o
c h o r o d e u m b e b ê p r e e n c h e o a r.
— Vo c ê c o n s e g u i u — m u r m u r o , c o m u m a m i s t u r a d e
a l í v i o e a d m i r a ç ã o . N ã o c o n s i g o e v i t a r, e s o r r i o s e n d o
a c o m p a n h a d o p o r e l a . — Vo c ê c o n s e g u i u !
— É um menino! — O médico avisa segurando o
bebê em pé, nos mostrando o pequeno que chora em
plenos pulmões.
Sorrio para o bebê, mas no momento que ele abre a
b o c a e p a r a d e c h o r a r. O m é d i c o f i c a d e p é e n o s d á a s
costas levando-o até uma mesa.
— O que foi? — Marina indaga abatida. — O meu
bebê...
Meu olhar está nas costas do médico que tem mais
d u a s e n f e r m e i r a s a o l a d o . Te n t o i r a t é e l e , m a s M a r i n a
ainda tem a mão segurando a minha. Os segundos passam
e eu só consigo respirar em alívio, quando o bebê volta a
chorar alto e claro. O médico vem até a gente e nos sorri.
— É um meninão!
— O que aconteceu...?
— Ele está bem, papai — afirma e olha para
Marina. — Como ele vai se chamar?
— Ainda não escolhi — Marina responde e quando a
enfermeira traz o bebê que ainda chora, noto suas
lágrimas. — Meu bebê!
O bebê é colocado nos braços de Marina, que o
embala de um jeito carinhoso. Engulo em seco e sinto
uma sensação se espalhar por meu peito, algo que não
c o n s i g o d e s c r e v e r. É c o m o s e t o d o o p e s o d o m u n d o
tivesse sido retirado dos meus ombros, substituído por
u m s e n t i m e n t o n o v o . Av a s s a l a d o r e p u r o .
Marina me olha com os olhos cheios de lágrimas,
um sorriso cansado, mas cheio de felicidade.
— Ele é lindo!
Olho para o rostinho enrugado e perfeito, aos
p o u c o s e l a c o n s e g u e f a z e r c o m q u e e l e p a r e d e c h o r a r.
Aproveitando o momento, toco na mãozinha minúscula e
sinto os dedinhos se fecharem em volta do meu. Sorrio
mais uma vez, e encaro Marina.
E foi ali naquele momento que eu percebi que os
protegeria com a minha vida.
— Ele é muito lindo, parabéns.
— Oi mamãe — a enfermeira se aproxima. — Agora
vamos te limpar e limpar o bebê. Quer passar a noite com
ele ou vai deixá-lo essa noite no berçário?
— C o m i g o , p o r f a v o r. E u q u e r o o m e u b e b ê c o m i g o .
Após isso, uma outra enfermeira me pede para sair
da sala e que em breve poderia encontrar Marina no
quarto. Saio ainda com o peito cheio de sentimento novo,
e a s s i m q u e v o u p a r a o c o r r e d o r, e n c o n t r o I g o r d e b r a ç o s
cruzados. Ele me olha um tanto surpreso e fico sem
e n t e n d e r. L e n t a m e n t e e l e s e a p r o x i m a e p a r a n a m i n h a
frente.
— Então? — Questiona enquanto enfia a mão no
bolso.
— É um menino. — Tão rápido, ele tira uma foto
minha e fico confuso. — Qual o seu problema?
Assim que termino, ele me mostra a foto: estou
sorrindo. O observo digitar alguma coisa e em seguida
m e o l h a r.
— É um acontecimento que precisa ser registrado —
m u r m u r a g u a r d a n d o o c e l u l a r. — D e v i a s o r r i r m a i s , m a s
e u a c h o q u e i s s o v a i a c o n t e c e r. — O i g n o r o e v o u a t é a
cadeira, me sento e tiro o avental azul. Meu amigo se
senta ao meu lado e me dá um tapa no ombro. — E agora?
Solto um suspiro e dou de ombros.
— Preciso comprar um berço e essas coisas de
bebê.
— Uau!
Olho para Igor que tem a atenção fixa na parede à
nossa frente.
— O que foi?
— Se eu te dissesse no começo dessa semana, que
na metade dela... você seria papai? Acreditaria em mim?
Fico uns segundos em silêncio, enquanto penso. Eu
diria, com certeza, que ele ficou louco e o ignoraria sem
pensar duas vezes. Só que agora é diferente, tudo tinha
mudado.
— Não sei se me entende, Igor — murmuro por fim,
ele me encara. — Eu não posso ficar indiferente e dar as
costas a ela. Não sei explicar de um jeito que não me
faça parecer um louco. Só estou fazendo o que acho
certo.
— Eu sei — ele fala e sorri. — Conheço você há
anos, sou o seu melhor amigo. Não precisa tentar se
e x p l i c a r, v o u t e a p o i a r n i s s o .
— Obrigado.
Olho para o corredor e penso em ir até o quarto que
deixei a bolsa. Então ao meu lado, Igor atende uma
ligação em seguida me olha assustado. Sem falar nada,
ele verifica o celular e faz uma expressão de “nossa, que
merda”.
— Me diga, meu melhor amigo, como está o seu
humor? — Ao final da pergunta, ele me sorri mais ou
menos tenso.
— Como assim?
— Vo c ê s e r p a i e r a u m s e g r e d o ?
Confuso, eu viro o corpo em direção a ele.
— Eu não sou pai.
— Mas era segredo? — Continua e por ver minha
expressão de confuso, solta um suspiro. — Eu acho que
esse celular tem algum problema. Acredita que ele postou
no status que você estava todo sorridente por que o bebê
é um menino? E o engraçado é que os nossos colegas
associaram que você teve um bebê.
Tr a v o a m a n d í b u l a e o e n c a r o .
— Eu vou matar você.
— Que hostil — Igor comenta e fica de pé. — Eu
vou comprar uma comida, você quer também? Que
p e r g u n t a , d e v e q u e r e r. Vo l t o d a q u i a p o u c o !
O observo correr para longe e solto um suspiro.
Ó t i m o ! Tu d o o q u e m e n o s q u e r i a e r a q u e s o u b e s s e m d a
minha vida. Fico de pé e ando em direção ao quarto. Lá a
enfermeira me pede as coisas do bebê, e eu retiro a
roupinha que estava embalada. Sinto o olhar de
julgamento e até entendo. Preciso logo comprar as
coisinhas dele.
C a p í t u l o 6 – M a r i n a

Vo l t a r p a r a o q u a r t o d o h o s p i t a l p a r e c e u m a
eternidade. Deitada na maca, sinto cada sacolejo
enquanto a enfermeira me empurra pelos corredores. Meu
corpo ainda se recupera do milagre que acabou de
a c o n t e c e r, e m e u s b r a ç o s m a l p o d e m e s p e r a r p a r a s e g u r a r
meu bebê de novo.
A porta do quarto se abre, e a luz fria das lâmpadas
fluorescentes ilumina o ambiente. Cada detalhe parece
novo, como se eu estivesse vendo tudo pela primeira vez:
a cama com os lençóis brancos, a poltrona ao lado, a
m e s a c o m o s e q u i p a m e n t o s m é d i c o s . Te n t o m e a j u s t a r n a
maca, mas minha atenção está totalmente voltada para o
pequeno berço ao lado da cama.
A enfermeira me ajuda a me transferir da maca para
a cama. O movimento é dolorido, mas nada se compara à
ansiedade que sinto para estar perto do meu bebê
novamente. Assim que estou acomodada, ela me sorri e
pede um momento. Ajeito o meu cabelo e tento subir mais
na cama. Antes de chegar ali, fui limpa por duas
enfermeiras e vesti outra bata do hospital.
Escuto a porta abrir e assim que viro o rosto na
direção, percebo Diogo com uma roupa diferente. Após
fechar a porta se aproxima de mim.
— Oi, como se sente?
Sorrio. Por dentro me sinto cheia de felicidade e
um pouco cansada também. No entanto, a expectativa de
ver meu bebê é maior que tudo.
— Feliz! — respondo e ele para do meu lado. — Eu
fiquei com medo, mas no fim deu certo. — ele desvia o
o l h a r, m a s l o g o v o l t a a m e e n c a r a r. P e l a j a n e l a p e r c e b o
que ainda está de noite e é inevitável não me sentir
c u l p a d a . — S e v o c ê q u i s e r i r p a r a c a s a e d e s c a n s a r, t u d o
bem. Hoje o dia foi tão corrido para você.
— Só volto para casa com vocês, Marina. — Diogo
murmura decisivo.
Não a lamentação em sua voz, ou qualquer coisa do
tipo.
Meu peito aquece e minha vontade de sorrir
aparece, mas me mantenho normal. Guardo para mim a
vontade de dizer que foi especial ele estar comigo
quando mais precisei, como se aquilo fosse um segredo
que eu tenho que guardar a sete chaves. Ele se senta na
poltrona e pega o celular do bolso.
— Eles estão demorando para trazer meu bebê. —
comento um tanto ansiosa, quero meu bebê nos meus
braços.
D i o g o p a r e c e m e c o m p r e e n d e r, p o i s m e o l h a e f i c a
de pé rapidamente.
— Vo u v e r c o m a e n f e r m e i r a — a v i s a e a n t e s d e
sair pergunta: — Sente alguma dor?
— Não, só um pouco cansada.
Ele fica parado na porta, mas logo se afasta. Fecho
os meus olhos, e apoio minha mão na barriga. Me lembro
de Felipe e sua mãe na casa do Diogo. Da pequena
discussão, do momento em que Felipe me descobriu ali.
Tu d o v e i o c o m o u m s o c o , m e d e i x a n d o a m e d r o n t a d a .
Afinal, Felipe já sabe onde estou e que vim para o
hospital.
Ao fundo escuto a voz grave de Diogo e de uma
m u l h e r, a s s i m q u e a b r o m e u s o l h o s , p e r c e b o a e n f e r m e i r a
com um embrulho nos braços.
— Oi mamãe — ela fala e eu sorrio. — Demoramos
porque fizemos os exames de praxe, em breve o médico
vem informar os resultados. O seu bebê.
Esfrego as mãos no lençol e delicadamente meu
filho é colocado em meus braços. O calor do seu corpo
contra o meu é reconfortante, e o mundo parece se
i l u m i n a r.
Olho para o rostinho dele, os traços delicados, a
respiração tranquila. É um momento de pura paz, como se
o tempo tivesse parado só para nós. Beijo os seus
cabelinhos ralos em sua cabeça, e em seguida o toco na
bochecha gorducha. Respiro fundo, sentindo o cheiro
suave do meu bebê.
— Qual o nome dele?
Olho para a enfermeira que ainda está ali.
— Ainda não escolhi.
— Precisamos atualizar o nome dele caso fiquem
mais dias — avisa. Então olho na pulseira que está no
bracinho dele. — Quando tiverem o nome, me chamem.
Na identificação dele, está o número do quarto e o
m e u . O b s e r v o a e n f e r m e i r a i r, n o s d a n d o p r i v a c i d a d e .
— Quer ajudar a mamãe a escolher o seu nome? —
p e r g u n t o c o m a v o z c a r i n h o s a . To c o e m s u a b o c h e c h a , e l e
é muito lindo. — Me sinto uma boba por não ter um nome
ainda.
— Não sinta — Diogo responde, ele se mantém na
poltrona com os braços cruzados. — Qual vai ser?
Olho para o meu bebê.
— O q u e a c h a d e Ti a g o ? — i n d a g o , q u a n d o n ã o
recebo uma resposta encaro Diogo. Ele arregala os olhos
e pigarreia. — Feio?
— Q u e r a m i n h a a j u d a ? Te m c e r t e z a ? — c o n c o r d o e
ele franze o cenho como se não compreendesse. Então ele
n ã o i r i a m e a j u d a r ? Ta l v e z f o s s e p e d i r d e m a i s . — Q u a l
outro nome pensou?
Olho para Diogo, e surpresa lhe endereço um
sorriso. Me volto para o meu bebê, que dorme
serenamente.
— Rômulo.
— Não. — Diogo tem uma careta. — Outro?
Penso mais um pouco, então sorrio.
— O q u e a c h a d e H e i t o r o u Vi n í c i u s ? — q u e s t i o n o
para Diogo que fica uns segundos analisando, mas logo
acena.
— Heitor é um bom nome.
Concordo e acaricio os cabelos ralos do meu bebê.
— Heitor Ribeiro — falo em voz alta.
— Ribeiro?
— É o meu sobrenome — aviso, e quando o vejo
acenar com seriedade continuo: — Eu ouvi a sua mãe me
chamando de vagabunda, tudo o que não quero agora é
que ela ache que eu tive o meu bebê para dar o golpe.
Solto um suspiro e desvio nossos olhares.
— Tu d o b e m — f a l a e f i c o a l i s o r r i n d o p a r a o m e u
b e b ê , a g o r a H e i t o r.
— A dona Herbertina? — pergunto. — Ela sabe que
já tive o Heitor?
— Sim, eu avisei assim que você deu entrada aqui,
liguei para ela e pedi para que fosse para casa. O Igor foi
buscar uma roupa para mim, a dona Herbertina já estava
lá. Ela mandou uma roupinha para o Heitor e para você.
Assenti e só agora percebi que o macacão que ele
usa, foi o que comprei. Me sinto envergonhada por não
ter comprado mais nada.
— Não se preocupe — Diogo volta a falar como se
lê-se meus pensamentos. — Amanhã vamos resolver sobre
as coisas dele e as suas. Nada vai faltar para você ou o
seu bebê.
Te n t o m e s e g u r a r, m a s n ã o c o n s i g o p r e n d e r a s
lágrimas. Fecho os olhos por um instante, deixando os
s e n t i m e n t o s m e i n v a d i r e m . O m e d o , a d o r, a i n c e r t e z a , a
felicidade... todos me deixando extremamente sensível.
Sinto dedos tocarem em meu rosto, abro os olhos só para
ver Diogo ao meu lado.
— Obrigada, Diogo. — Minha voz sai baixinho, mas
sei que ele escutou. Pois noto que a expressão de seu
rosto suaviza, seu olhar percorre por meu rosto: me
lendo, me decifrando.
— N ã o p r e c i s a a g r a d e c e r.
Ele olha para Heitor e dá um sorriso de lado. Então
tenho a ideia.
— Quer segurá-lo?
Assim que faço a pergunta, ele me olha assustado.
Te n h o q u e s e g u r a r a v o n t a d e d e r i r, e d o u a p e n a s u m
s o r r i s o e n c o r a j a d o r.
— Eu não levo jeito para segurar bebês.
F r a n z o o c e n h o , m a s l o g o v o l t o a s o r r i r.
— Quantos bebês você já segurou?
— Nenhum. — Nega cruzando os braços e continua:
— Por isso não levo jeito.
Aceito o que diz, pois não quero forçá-lo a nada.
Seus olhos me encaram me deixando levemente
r u b o r i z a d a , n ã o s e i e x p l i c a r p o r q u e f i c o a s s i m . Ta l v e z
por Diogo ter uma presença marcante e me deixar sem
jeito com tão pouco, ou pela forma que estou invadindo
sua vida. Inevitavelmente, meu olhar desce por seu rosto
e me perco por alguns segundos o analisando. Eu já tinha
visto que Diogo era forte e dono de um corpo musculoso,
mas ali com aquela camisa preta, tudo realça. Engulo em
seco e percorro com os olhos os caminhos dos grandes
braços. Aparentemente, ele percebe, pois assim que volto
a olhá-lo no rosto, noto seu sorriso de lado. O que só faz
meu coração bater mais rápido.
— Estou atrapalhando?
Olho de supetão para a porta e vejo um homem
a s i á t i c o e n t r a r. E l e u s a u m a c a m i s e t a p r e t a , j a q u e t a
aberta, calça jeans e coturnos. Me volto para Diogo que
tem os braços cruzados.
— Achei que já tinha ido.
— E não conhecer meu sobrinho? — indaga e eu
fico confusa. Não me lembro de Felipe ou Herbertina
falarem sobre um outro irmão. — Como vai, Marina?
Seu rosto não me é estranho, mas no momento não
consigo associar de onde o conheço.
— Desculpe, mas eu conheço você?
— S o u o I g o r, a m i g o d o s i m p a t i a a q u i — f a l a
enquanto se aproxima ficando do lado de Diogo. — Fui
com ele até o hotel naquele dia. Eu que dirigi para esse
hospital.
Arregalo levemente os olhos e então aceno. Não me
lembrava realmente, só sentia medo e desespero no dia.
— Ah, certo! E obrigada.
— Imagina — dá de ombros e se inclina em minha
direção. — Qual o nome dele?
— Heitor — Diogo e eu falamos em uníssono. —
Por que ainda está aqui?
Fico sem entender por que Diogo está praticamente
expulsando o amigo dali.
— Já disse, vim ver meu sobrinho. — retruca para
Diogo. — Ele tem cara de joelho, né? Mas é bonitinho.
— Meu filho não tem cara de joelho. — franzo o
cenho um pouco ofendida, meu bebê é lindo.
Igor me dá um sorriso brincalhão.
— Eu falei que ele é bonitinho — murmura. —
Posso segurá-lo?
D i o g o l o g o o i m p e d e d e s e a p r o x i m a r, a i n t e r a ç ã o
dos dois é bem confusa, mas me tira um sorriso.
— Vo c ê n ã o s a b e s e g u r a r u m b e b ê .
— S ó s e n d o i d i o t a p a r a n ã o s a b e r, n é ? ! — I g o r r i e
eu não consigo segurar a minha risada. Diogo me encara,
e eu tento ficar séria, falhando miseravelmente. — E aí,
posso?
Sinto o olhar de Diogo em mim, então dou de
ombros. Igor pega Heitor com delicadeza, e o traz para o
peito. Ele continua sorrindo e sutilmente balança os
braços.
— Cuidado com ele — Diogo manda, seu olhar
a t e n t o n o m e u b e b ê . — É m e l h o r v o c ê s e s e n t a r.
— Está vendo só, Marina? — Igor me olha, em
seguida o amigo. — É isso que tenho que aturar todos os
d i a s . E l e s ó s a b e m a n d a r, n u n c a c a r i n h o s o . N e m p a r e c e
que sou o único melhor amigo dele.
Percebo que Diogo revira os olhos, mas em seguida
continua cuidando do meu bebê com os olhos. Lembro de
Herbertina falar sobre as questões não resolvidas dele,
talvez seja isso mesmo que o impeça de se abrir mais.
Apesar de ele ter usado um tom mais sério, percebo que
ele gosta do amigo e Igor deve saber disso. Em meio ao
meu devaneio, Diogo enfia a mão no bolso e pega o
c e l u l a r. E l e v ê a t e l a , m a s l o g o o d e s l i g a .
— Está bom, Igor — ele fala e aponta em minha
direção. — Agora entregue o Heitor para a Marina.
— Eu não vou deixar ele cair — avisa e quando o
vejo segurar Heitor com apenas um braço, quase tenho
um infarto. Igor pega rapidamente o celular do bolso e
m e e n t r e g a . — Ti r a u m a f o t o d e n ó s t r ê s . Vo u r e v e l a r e
c o l o c a r n a m i n h a s a l a . Vo c ê e s t á u m p o u c o d e s c a b e l a d a ,
se não saía na foto também.
Um tanto sem jeito, passo a mão no meu cabelo.
— Não ligue para ele.
Aceno tímida e tiro a tal foto. Devolvo o celular e
a c e i t o q u a n d o e l e m e e n t r e g a H e i t o r. E l e s e r e m e x e
fazendo uma careta, abre a boca e vira o rostinho em meu
seio coberto. Quando não encontra o que procura, solta
um choro agudo e angustiado.
— O p a , a c h o q u e c h e g o u a h o r a d e i r.
Te n t o a j e i t a r H e i t o r e m m e u s b r a ç o s , e l e c o n t i n u a
chorando.
— Eu vou chamar a enfermeira.
A g r a d e ç o a D i o g o q u e s a i a o l a d o d e I g o r. M i n u t o s
depois, a enfermeira entra e se aproxima ficando ao meu
lado. Com um sorriso acolhedor e gestos tranquilos,
oferece orientação com paciência e cuidado.
— Segure a cabeça dele assim, bem próxima ao
peito, para que ele possa encontrar o mamilo com mais
facilidade. — a enfermeira orienta, ajustando
delicadamente a posição dos meus braços. — Isso,
exatamente assim. Agora, deixe-o sentir o seu cheiro e o
s e u c a l o r.
Sigo as instruções, tentando relaxar e me
c o n c e n t r a r n o p e q u e n o r o s t o d e H e i t o r. E l e s e r e m e x e ,
suas mãozinhas — cobertas pelas luvinhas do macacão —
se movendo de forma descoordenada enquanto procura
instintivamente pelo seio. Seus pequenos olhos estão
fechados, e ele emite pequenos grunhidos de frustração.
— C a l m a , m e u a m o r. — m u r m u r o , m i n h a v o z s u a v e
e reconfortante. — A mamãe está aqui.
Com a ajuda da enfermeira, consigo posicionar o
m a m i l o n a b o c a d e H e i t o r. E l e r a p i d a m e n t e s e a c a l m a ,
começando a mamar com uma intensidade surpreendente
para alguém tão pequeno. Sinto uma onda de alívio e
e m o ç ã o a o v ê - l o f i n a l m e n t e s e a l i m e n t a r, e u m s o r r i s o
suave aparecer em meu rosto.
— Isso, ele está pegando bem. — diz a enfermeira,
c o m u m t o m d e s a t i s f a ç ã o . — Vo c ê e s t á f a z e n d o u m ó t i m o
trabalho, mamãe. Lembre-se de manter essa posição e
observe os sinais que ele dá quando estiver satisfeito.
Assinto, mantendo o olhar fixo em seu rostinho.
Sinto uma conexão profunda com ele, como se o mundo
ao redor tivesse desaparecido, deixando apenas nós dois
nesse momento íntimo e sagrado. Cada pequena sucção de
Heitor parece fortalecer esse laço, e sinto o amor
maternal crescendo cada vez mais dentro de mim.
— Ele é tão perfeito. — sussurro, meus olhos
brilhando com lágrimas de felicidade.
— E você é uma mãe maravilhosa. — a enfermeira
responde, dando um tapinha carinhoso no meu ombro. —
Continue assim, e ele vai crescer forte e saudável.
Respiro fundo, sentindo-me mais confiante e
s e g u r a . Te n h o a c o m p a n h i a d a e n f e r m e i r a , a t é q u e H e i t o r
a f a s t a o r o s t i n h o e s o u i n s t r u í d a a f a z ê - l o a r r o t a r. A p ó s
isso, ela o pega dos meus braços e o deposita no bercinho
ao lado.
— Descanse — pede e eu fico olhando Heitor
ressonar tranquilamente. — Daqui a pouco volto com o
seu café.
S o r r i o e n q u a n t o a o b s e r v o i r.
Não demora muito e Diogo entra, fecha a porta e se
encaminha até parar ao meu lado. Me sinto mais segura
com ele ali, então encosto minha cabeça no travesseiro
fino.
— Cadê o seu amigo?
— Foi para casa — responde sem desviar os olhos
de mim. — O Igor fala muita baboseira, então, não ligue
para ele.
— Tu d o b e m — a s s i n t o e o l h o u m a ú l t i m a v e z p a r a
H e i t o r. M e u s o r r i s o é i n e v i t á v e l . — E l e e s t a v a t ã o
lindinho mamando. — relanceio para Diogo que está
sentado na poltrona. Mantém os braços cruzados,
expressão séria. Nem parecia o sorridente de antes. — O
Igor não achou estranho você me ajudar? Eu fiquei
surpresa por ele ter me tratado bem.
— Não devo nada a ninguém, Marina — retruca e eu
c o n c o r d o . — S e e u d e c i d i t e a j u d a r, f o i p o r q u e a c h e i
certo.
— Eu sei, mas as outras pessoas podem te criticar
ou não sei, não quero que se prejudique. A maioria aqui
a c h a q u e v o c ê é o p a i d o H e i t o r. . .
— Se sente incomodada?
— Não — nego rápido e fico torcendo os dedos sem
s a b e r e x a t a m e n t e o n d e q u e r o c h e g a r. — D e s c u l p a , e u n ã o
sei o que estou falando. Me sinto cansada.
— Então descanse — fala com a voz macia. —
E s t a r e i a q u i q u a n d o a c o r d a r.
Aceno e fecho os olhos. Estou extremamente
cansada, e sabendo que Diogo está ali, me sinto mil vezes
mais segura.

Olho uma última vez para o celular e o desligo.


Desde a madrugada estou recebendo mensagens e ligações
d e p a r a b é n s . G r a ç a s a o I g o r, a t é m e u c h e f e , M a r c e l o ,
acha que escondi que seria pai. Esfrego a mão no rosto e,
em seguida, observo Marina dormir de forma serena. Ela
p a r e c e t ã o e m p a z , e i s s o m e a c a l m a u m p o u c o . To m o u m
momento para respirar fundo e reunir minhas forças. As
próximas semanas serão desafiadoras, e preciso estar
preparado.
O relógio de parede marca 07h30. Espero ansioso o
h o r á r i o d e i r, a i n d a p r e c i s o p r o v i d e n c i a r o b e r ç o e a s
outras coisas.
Ouço um resmungo baixo vir do bercinho e me
levanto indo até ele. Assim que meus olhos fixam em
H e i t o r, m e u s o r r i s o s e a b r e l e n t a m e n t e . P a r a u m r e c é m -
nascido, ele tem bastante fios pretos e bochechas
gorduchas rosadas. Ou talvez era normal?
Ele estica os bracinhos, movendo as mãozinhas,
como se procurasse algo. Ainda não vi seus olhos, mas
tenho quase certeza que tem os mesmos de Marina.
Lentamente toco na mãozinha coberta e o sinto me
a g a r r a r. U m a s e n s a ç ã o d e o r g u l h o e a l g o m a i s s e a p o s s a
do meu peito, me fazendo demorar uns segundos antes de
m e a f a s t a r.
Olho para Marina e permito que um rápido suspiro
escape dos meus lábios. Como meu irmão teve coragem
de mandá-la embora grávida ou perder um momento tão
precioso como esse? Um acontecimento tão íntimo e
mágico... O nascimento do primeiro filho.
Saio do meu devaneio assim que a vejo franzir o
c e n h o a i n d a d o r m i n d o , m a s l o g o p a s s a r. E s t o u p r e s t e s a
acordá-la, quando escuto baterem à porta. Engulo em
seco ao ver meu pai me encarando. Me aproximo dele, ao
mesmo tempo que seu olhar vai para Marina e o berço.
— Eu preciso de uma explicação, Diogo. O Marcelo
me ligou, até o juiz Emílio me ligou para saber sobre o
meu neto?
— Pai...
— Diogo? — Marina me chama. Seu olhar está
confuso, mas assim que percebe meu pai, noto que fica
assustada. — Meu bebê! — exclama e inclina o corpo em
direção ao berço. Corro até ela e toco em suas mãos:
estão trêmulas. — Diogo...!
— Ei, calma! O Heitor está dormindo — murmuro.
Marina olha diretamente para o meu pai que se aproxima.
— Pai, vamos conversar lá fora.
Ele para ao lado do berço e sorri quase como
h i p n o t i z a d o p o r H e i t o r.
— Me dá o meu bebê, Diogo! — Marina me pede,
então eu o faço. E como bem suspeitei, ele tem o
corpinho molenga. — Meu bebê!
A observo o abraçar protetoramente, como se a
qualquer momento meu pai fosse avançar e retirar Heitor
de seus braços.
— E u v o u e s t a r n o c o r r e d o r, t u d o b e m ? — C o m o
resposta, ela concorda, mas sem desviar o olhar do meu
p a i . — Va m o s c o n v e r s a r, p a i .
C a m i n h a m o s a t é p a r a r n o c o r r e d o r.
— Como o senhor soube que estávamos aqui?
— O Igor me falou — responde. Por dentro eu solto
um xingamento para Igor e sua língua solta. — Estou sem
e n t e n d e r, D i o g o . E s t a v a d e p l a n t ã o q u a n d o s u a m ã e m e
ligou totalmente histérica, o seu irmão não fala nada, ai
de repente eu recebo ligações de parabéns vovô?! — o
tom alterado chama atenção desnecessária em nossa
d i r e ç ã o . — Vo c ê e n g r a v i d o u e s s a j o v e m ? — e l e c r u z a o s
braços. Conhecendo meu pai como conheço, se ele
descobrir o que Felipe fez, é capaz de forçar um
c a s a m e n t o e n t r e M a r i n a e e l e . Ta l p o s s i b i l i d a d e m e
embrulha o estômago, já que eu sei exatamente como
Felipe é, e posso imaginar o que ele faria com Marina.
Fico em silêncio analisando o que falo, e isso de certa
forma é como uma confirmação para meu pai. — Como eu
não soube dessa gravidez antes? Estava querendo omitir
meu neto?
— Fui pego de surpresa.
— Imagine eu! — esbraveja, então ele respira
fundo. — Quem é ela? Onde a conheceu? Como pôde
ocultar isso de mim? — Ele balança a cabeça e esfrega a
barba. — Eu esperava algo assim do Felipe! Ele é
inconsequente, mimado...! Já você sempre foi o mais
centrado, pés no chão, nunca me deu trabalho... Então
agora com 35 anos resolveu dar uma de moleque?
Era a primeira vez que eu via aquele olhar em meu
pai, a primeira vez que ele fala daquele jeito comigo e
isso me quebra por dentro. No entanto, engulo em seco e
me mantenho firme.
— Eu entendo que o senhor esteja chateado, mas eu
só peço que não desconte na Marina. Ela precisa de
repouso, está assustada com tudo isso.
— Eu jamais descontaria nela — profere e leva as
mãos a cintura. — É inacreditável! — balança a cabeça,
e n t ã o v o l t a a m e e n c a r a r. — P o s s o c o n h e c e r o s dois? Não
vou fazer perguntas, quero apenas conhecê-la e ao meu
neto.
Pondero, e logo atrás dele, vejo o doutor junto a
uma enfermeira se aproximarem.
— Pode ser na minha casa, eu ligo — aviso e ele
acena. — Ela precisa de descanso. — Olho por cima do
ombro dele e dou um passo a frente. — Doutor?
— B o m d i a ! E b o m d i a H u m b e r t o , m e u a m i g o ! Ve i o
conhecer o netinho?
Meu pai me encara, mas logo volta a atenção para o
d o u t o r.
— Bom dia, Fábio! Pois é. Conhecer meu neto e
minha futura nora.
O tom usado é bem conhecido por mim, olho para
meu pai que se mantém sério.
— I s s o é b o m — o d o u t o r s o r r i . — Vi m d a r o s
resultados dos exames.
Observo os dois se cumprimentarem e em seguida
meu pai me dar as costas. Entro em silêncio no quarto,
minha mente revivendo momentos atrás como forma de
p u n i ç ã o , t a l v e z . M a r i n a e s t á a m a m e n t a n d o H e i t o r, a b a t a
azul cobre um pouco do seio, mas me sinto sem jeito. Ela
rapidamente se cobre e me olha tensa.
— B o m d i a , M a r i n a ! Te n h o b o a s n o t í c i a s !
Me coloco ao lado dela e um tanto surpreso, sinto
sua mão segurar a minha.
— Que bom! Eu já vou poder ir?
— Calma — pede em seguida sorri. — Nós fizemos
todos os exames no seu bebê e ele está muito bem,
saudável e forte.
— Graças a Deus!
— Esse momento de recuperação é bastante
importante para você e o bebê. Então tente descansar o
m á x i m o q u e p u d e r, b e b a b a s t a n t e á g u a p a r a t e m a n t e r
h i d r a t a d a e t e n h a u m a d i e t a e q u i l i b r a d a e n u t r i t i v a . Tu d o
isso vai impactar na sua produção de leite.
— Tu d o b e m , d o u t o r. P o d e m o s i r h o j e m e s m o ?
Ele ri e anota alguma coisa.
— Sobre as vitaminas que passei, têm tomado? —
indaga, e eu tomo a frente acenando. — Ótimo, continue
com elas, mas assim que acabarem pode suspender o uso.
Como o seu parto foi normal e não precisou de nenhuma
incisão. Sua recuperação deve ser mais rápida e
tranquila. Claro, você vai sentir algum desconforto nos
próximos dias, mas isso é completamente normal. E sim,
você está de alta e pode ir para casa hoje.
Nos cumprimentamos uma última vez e eu espero
que saia. No instante em que ficamos sozinhos, Marina
aperta minha mão.
— O que o seu pai queria? Ele parecia tão furioso!
Eu fiquei com tanto medo, o Felipe já me falou que ele...
— Fique tranquila — peço. Ela respira fundo, seus
olhos transbordam os sentimentos conflitantes que está
sentindo. — Ouviu as recomendações do médico.
— Eu sei, é que...
— Marina — a interrompo tocando-a na bochecha.
O t o q u e é m a c i o e m e i n s t i g a a c o n t i n u a r, m a s s e i q u e
n ã o p o s s o . — Vo c ê s ó v a i s e p r e o c u p a r e m s e c u i d a r e
c u i d a r d o H e i t o r. M e u p a i , m i n h a m ã e e F e l i p e s ã o
p r o b l e m a s m e u s . Tu d o b e m ?
Seus olhos brilham e percebo que ela desvia para
H e i t o r. N o t o q u e a i n d a a t o c o n o r o s t o , e n t ã o m e a f a s t o e
enfio as mãos nos bolsos. Ela fica uns minutos calada,
m a s l o g o v o l t a a f a l a r.
— Va m o s p a r a a s u a c a s a ?
Engulo em seco. Sua voz sai baixo, o que me dá
vontade de sentar bem próximo e fazer com que seus
o l h o s v e j a m a v e r d a d e e m m e u o l h a r. N o e n t a n t o , a p e n a s
aceno e penso no que eu preciso fazer para que ela
entenda que desde o dia em que usou meu cartão, eu não
posso simplesmente lhe dar as costas e seguir com a
minha vida.
C a p í t u l o 7 – D i o g o

Mal estaciono o carro na garagem e rapidamente


vejo dona Herbertina abrir a porta da frente. Desço e com
agilidade vou para a porta do passageiro. Assim que a
a b r o , M a r i n a a c e i t a a m i n h a a j u d a p a r a d e s c e r. C o m
cuidado e com intenção de ampará-la, passo um braço por
sua cintura. Ela me olha assustada, mas logo me sorri
aceitando.
— Se eu soubesse que esse neném estava querendo
n a s c e r l o g o , t e r i a e v i t a d o i r.
Herbertina nos dá passagem.
— Dona Herbertina, esse aqui é o Heitor — Marina
apresenta mostrando o bebê a ela, que logo sorri
emocionada. — Eu já dei de mamar duas vezes.
Andamos até o sofá, onde as duas se sentam.
Marina com um sorriso, entrega Heitor para Herbertina.
Ela o segura com habilidade de dar inveja. Heitor
resmunga esfregando a mãozinha protegida no rosto, fico
ali parado olhando e segurando meu sorriso. Quando ele
f a z m e n ç ã o d e c h o r a r, H e r b e r t i n a o b a l a n ç a .
— Vo c ê é t ã o l i n d o , H e i t o r ! N ã o v a i c h o r a r, m e u
amorzinho... — A voz sai em um tom maternal. Isso me
faz lembrar de antigamente, ela sempre usava esse tom
comigo e muitas vezes eu a ignorava. — E ele lembra
m u i t o v o c ê , M a r i n a . O s c a b e l i n h o s d a m e s m a c o r, o
formato do nariz.
— Ele ainda não abriu os olhos — Marina murmura
sem tirar a atenção dele. — Eu acho que ele vai me fazer
i m p l o r a r.
Ela brinca fazendo Herbertina sorrir e aquela cena à
minha frente é uma das melhores que já presenciei. A
i n t e r a ç ã o d e l a s , t ã o n a t u r a l e c h e i a d e a m o r, t r a z u m
calor inesperado ao meu peito. Herbertina continua
balançando Heitor suavemente, e a paz que emana desse
momento parece contagiar a todos na sala.
— Eu lavei as outras roupinhas dele — avisa, então
me recordo que preciso sair para comprar o berço. —
P a s s e i f e r r o e m t o d a s e n a s s u a s t a m b é m . Vo c ê d e v e e s t a r
cansada.
— Um pouco, mas estou com mais fome.
M a r i n a s o r r i a c a r i c i a n d o o r o s t o d e H e i t o r. A l g u m a s
mechas caem em seu rosto, o que a deixa mais bonita.
Sinto um olhar em mim, então percebo que Herbertina me
observa com a sobrancelha arqueada. Engulo em seco e
passo a mão na barba.
— Eu vou precisar sair — aviso fazendo Marina me
o l h a r. — D e v o v o l t a r a n t e s d o a l m o ç o .
— Va i t r a b a l h a r ? — i n d a g a , e n t ã o m e l e m b r o q u e
também preciso passar no departamento. — Não quero
prejudicá-lo, Diogo.
— Não se preocupe — peço e olho para Herbertina.
— Ninguém está autorizado a entrar em minha ausência.
Q u a l q u e r c o i s a a s e n h o r a m e l i g a n o c e l u l a r.
— Tu d o b e m , f i l h o . P o d e i r t r a n q u i l o q u e v o u
cuidar muito bem dos dois.
Aceno e antes de dar as costas, meu olhar procura
Marina. Ela me sorri de um jeito doce, em troca balanço
a cabeça minimamente. Saio da casa e enquanto caminho
para a caminhonete, pego meu celular e o ligo. Me
acomodo no lugar do motorista, e após uns segundos meu
celular liga. Aciono o portão e manobro para fora. O
celular apita várias vezes anunciando mensagens que
recebi enquanto ele esteve desligado.
Passo o olho brevemente na tela e vejo mensagens
de minha mãe, Felipe, meu pai, e até mesmo de Marcelo.
Solto um suspiro e os ignoro por agora. Falar com Felipe
o u m i n h a m ã e n e s s e m o m e n t o , é a l g o q u e p r e c i s o e v i t a r.
Ta n t o p a r a m a n t e r M a r i n a e H e i t o r r e s g u a r d a d o s , t a n t o
p a r a o m e u h u m o r. P e g o a a v e n i d a e d u r a n t e o t r a j e t o ,
penso em meu pai em suas palavras duras.
Minha mentira foi apenas e exclusivamente para
p r o t e g e r M a r i n a e H e i t o r. Te n t o m e c o n v e n c e r d i s s o . A
primeira parada será o trabalho, preciso pedir pelo menos
um dia de folga para poder organizar tudo para Marina.
Após alguns minutos, estaciono na minha vaga de sempre
e saio. Assim que entro no departamento, todos me olham
e a p l a u d e m . F i c o s e m c o m p r e e n d e r, e n t ã o p e r c e b o
Marcelo aparecer na porta da própria sala com o cenho
franzido. No entanto, assim que me vê parado, se
aproxima.
— Diogo! Finalmente o mais novo papai apareceu!
— Marcelo gesticula com um sorriso.
Os outros me felicitam e eu apenas aceno.
— E u p r e c i s o f a l a r c o m o s e n h o r. — R e s p o n d o
ficando ao lado dele.
— Va m o s p a r a a m i n h a s a l a — m u r m u r a m e
guiando, a todo momento estou sendo felicitado por meus
colegas. — Era segredo sua mulher e seu filho?
Entramos na sala dele e o observo se sentar em sua
cadeira. Ele me encara a espera de uma resposta, e
mesmo a contragosto o respondo.
— É s o b r e i s s o q u e q u e r o f a l a r. — M a r c e l o m e o l h a
curioso. — Preciso de um dia de folga e...
— Tu d o c e r t o ! — M e c o r t a a f a l a . — D a r e i d u a s
semanas.
O olho alarmado e nego com a mão.
— Apenas um dia de folga me basta — afirmo tendo
a atenção para mim. — Não posso me ausentar por conta
da operação encruzilhada.
— Ele já está preso — Marcelo retruca. — E com as
p r o v a s q u e t e m o s d e l e , a c h o d i f í c i l q u e s e j a s o l t o . Vo c ê
sabe como o processo é lento a partir de agora.
— Eu sei, mas...
— Duas semanas em casa — profere em um tom
s é r i o . — Vo c ê m e r e c e o d e s c a n s o , p e l o m e n o s d a q u i .
Afinal o bebê vai tomar muito do seu tempo.
Solto um suspiro e por fim concordo. Me despeço
d e l e e s a i o e m d i r e ç ã o a o c o r r e d o r. M u i t o s a i n d a m e
parabenizam e fico um pouco surpreso. Não sou de
conversar amenidades com meus colegas, apenas o básico
e sempre sobre o trabalho. Ser recebido com tamanha
alegria é um tanto novo para mim.
Vo u a t é a s a l a d e I g o r, b a t o n a p o r t a e a o o u v i r u m
“entre”, o faço.
— Saudades de mim, amigo? — Igor indaga sem
tirar os olhos do papel que tem em mãos.
— Preciso de um favor — falo, ele rapidamente me
olha. — Marcelo me deu duas semanas de folgas, mas não
posso ficar tanto tempo longe do trabalho. A operação
encruzilhada...
— Não — ele me interrompe e anda até parar em
minha frente. — Se é sua folga, você vai tirar essas
semanas de férias. Confie em mim, eu dou conta e depois
posso até pedir um aumento.
— I g o r. . .
— D i o g o ! — E l e m e e m p u r r a p a r a f o r a . — Vo c ê
acabou de ter um bebê, por que não desfruta desse
momento?
B u f o e m e d e i x o l e v a r p a r a o c o r r e d o r.
— Mas se precisar de mim...
— Claro! Claro! Agora vai papai. Depois eu vou
levar um presente para o meu sobrinho carinha de joelho.
— Ele não tem cara de joelho — retruco e me solto
dele. — Estarei a espera caso precise.
Igor gesticula me mandando embora, então apenas
acato. Saio rapidamente e entro na caminhonete.

O caminho até shopping center demora um pouco,


mas quando finalmente chego, estaciono perto do meio
fio. Desço e busco o celular no bolso da calça. Nenhuma
ligação de Herbertina, solto um suspiro. Essa hora
Marina já deve ter comido algo, e descansado um pouco
c o m H e i t o r.
A entrada do shopping é movimentada, e me misturo
fácil na multidão enquanto sigo para o andar de cima.
Ando por alguns minutos e então vejo a loja de bebês. Há
algumas atendentes paradas em pontos estratégicos, assim
que entro uma se aproxima.
— Bom dia! Posso ajudá-lo?
— S i m — a c e n o c o m o l h a r a o r e d o r. H á m u i t a s
coisas de bebê que por um instante não sei o que devo
c o m p r a r. — P r e c i s o d e c o i s a s d e b e b ê s .
— Não entendi — ela fala com o olhar confuso.
— O bebê nasceu ontem — aviso e ela me sorri. —
Ele não tem nada de bebês. Então, preciso de berço,
roupas... essas coisas.
— Ah! Claro! É um menino?
— Isso — concordo e a acompanho quando ela
c o m e ç a a a n d a r. — E l e é b e m b o n i t i n h o , e n ã o t e m c a r a
de joelho.
A s s i m q u e t e r m i n o d e f a l a r, m e s i n t o u m i d i o t a . P o r
que estou falando isso para uma desconhecida? Como
resposta ela me olha e sorri.
— Claro, bebês são lindos desde o nascimento. —
Murmura e então vejo seu olhar descer por meu corpo,
c o m o s e m e a v a l i a s s e . — Vo c ê é o p a i ? — I n d a g a e n o
a u t o m á t i c o , a p e n a s a c e n o . — Vo u a j u d á - l o a e s c o l h e r
tudo o que o seu bebê precisa.
— Obrigado.
Andamos até os fundos da loja onde consigo ver os
b e r ç o s , t o d o s d a m e s m a c o r, m a s e m m o d e l o s d i f e r e n t e s .
Não demoro muito e escolho o berço, em seguida a
o b s e r v o s e p a r a r a l g u m a s r o u p i n h a s p a r a o H e i t o r. E m
uma prateleira, vejo macacões personalizados de time.
Me aproximo e pego um do Flamengo.
— Só não temos roupas para a mamãe — a
atendente volta a falar —, mas o senhor consegue
encontrar na terceira loja aqui do lado.
— Tu d o b e m — a c e n o c o m a p e q u e n a p e ç a d e r o u p a
em mãos. — Ele só vai precisar disso? — Pergunto
quando vejo algumas roupas, produtos como mamadeira,
fraldas, chupeta e perfumes.
— Vo u buscar alguns sapatinhos, luvinhas,
toalhinhas e uns brinquedos.
— Certo.
— Não foi comprado nada para ele?
— Não tivemos tempo — minto sob o olhar dela,
que por fim acena.
— Caso queira se sentar enquanto espera — aponta
p a r a u m a c a d e i r a l o g o a t r á s d e m i m . — Vo u c o n f e r i r s e
precisamos de mais alguma coisa.
Concordo e me sento, a atendente me sorri e vai até
outra prateleira.

O quarto está envolto em um silêncio suave e


reconfortante, apenas quebrado pelo som leve de
r e s p i r a ç ã o d o H e i t o r. E n q u a n t o o a m a m e n t o , m e u s
pensamentos vagam para Diogo. Ele tem sido um apoio
imenso, mais do que eu poderia ter imaginado. Sempre
que sinto o peso da responsabilidade, o simples fato de
ele estar presente me dá uma sensação de segurança.
Heitor se agita um pouco, mudando de posição, e eu
o ajusto delicadamente em meus braços. Através da janela
entreaberta, uma brisa leve entra, trazendo um frescor
sutil que faz com que eu me sinta ainda mais tranquila.
Herbertina está na cozinha preparando a sobremesa, um
mousse de maracujá. Especialmente para mim. Sorrio e
acaricio a bochecha gorducha.
Assim que ele afasta o rostinho, eu guardo o seio e
fico de pé com meu bebê em meus braços. Dou leves
batidinhas em suas costas, como a enfermeira me falou.
Após alguns minutos, ouço o arroto e solto um sorriso.
— Que arrotão, meu bebê.
O ajeito em meus braços e começo a niná-lo. Então
c o m o s e q u i s e s s e m e p r e s e n t e a r, e l e a b r e o s o l h i n h o s e e u
não consigo segurar meu grande sorriso. Heitor tem
realmente os meus olhos, no entanto, mais puxados para o
verde escuro. Ansiosa para mostrar a Herbertina, saio do
quarto.
No instante em que chego na sala, vejo algumas
sacolas com a logo de bebê. Então, da entrada vejo Diogo
passar segurando uma grande caixa e colocá-la ao lado de
outras.
— Diogo, o que é tudo isso? — estou assustada com
t a n t a s s a c o l a s e s p a l h a d a s a o r e d o r.
Ele para na minha frente e solta um suspiro,
acompanha meu olhar para as outras sacolas.
— É para o Heitor — avisa me fazendo encará-lo.
Estou totalmente surpresa. — Comprei o berço, o
carrinho, fraldas, roupinhas, brinquedos, mamadeira,
chupeta, produtos para o banho e a banheira.
S e m s a b e r o q u e f a l a r, e u e n c a r o a s c o m p r a s .
Herbertina vem logo atrás, segura mais duas sacolas.
— Quero ver todas as roupinhas — ela fala
e u f ó r i c a . — Vo c ê c o m p r o u a l o j a t o d a , m e u f i l h o ?
Pergunta enquanto passa por mim indo,
provavelmente, para o quarto.
— Só o essencial — Diogo responde e pega uma das
caixas. — Eu vou colocar essas caixas no seu quarto, vou
tomar um banho e depois monto o berço.
— E s p e r a ! — o i m p e ç o d e p a s s a r, e e l e p a r a , m e
olhando com uma expressão curiosa. — Não precisava
gastar tanto assim, eu não tenho como te pagar por tudo
isso. — Minha voz sai baixinho, um misto de vergonha e
preocupação.
Diogo levanta uma sobrancelha, seu olhar intenso
me deixa sem jeito.
— Marina, você não precisa se preocupar com isso
— ele diz com um tom suave. — Eu quis fazer isso
p o r q u e q u e r i a a j u d a r. N ã o e s t o u e s p e r a n d o n a d a e m t r o c a .
— E u s e i , m a s é q u e . . . — c o m e ç o a e x p l i c a r,
tentando encontrar as palavras certas. — É muito. Eu me
sinto mal por você ter gastado tanto.
Ele dá um passo em minha direção, olha por cima
do meu ombro, mas rapidamente me encara. Sua
expressão mostrando uma combinação de compreensão e
ternura.
— Não se sinta mal. Eu tenho o suficiente para
fazer isso e ainda mais. E, sinceramente, eu quero que
v o c ê e o H e i t o r t e n h a m o m e l h o r.
Sinto um nó na garganta ao ouvir suas palavras. A
generosidade dele é algo que eu não esperava, e me toca
profundamente. Ele logo passa por mim e eu o observo
caminhar mais um pouco e entrar no quarto que estou
dormindo. Herbertina em seguida sai do quarto e vem até
mim.
— Vo u l a v a r a s r o u p i n h a s n o v a s — a v i s a e m e
s o r r i r. — E o q u e v o c ê f a z d e p é ? D e v e r i a d e s c a n s a r.
— Ele abriu os olhinhos — murmuro extasiada com
tudo. — Ele tem os meus olhos.
— Oh meu Deus! — sorri ficando em minha frente.
Ela o toca na bochecha com carinho. — Eu também quero
ver os seus olhinhos, Heitorzinho. — Diogo volta e pega
mais duas caixas ao mesmo tempo. — Olhe esse, Marina
— olho para Herbertina, ela tira de uma caixa uma
cadeira de balanço para bebê. — Esse é muito lindo.
E l a o c o l o c a n o s o f á e e u m e a p r o x i m o . To c o o
tecido fofo na cor azul escuro com alguns animaizinhos
espalhados. Ajeitamos a cadeira e delicadamente coloco
Heitor deitado. Prendo o cinto no corpinho dele,
deixando-o mais seguro e sorrio. Pego uma sacola e de
dentro tiro um macacãozinho do Flamengo.
— Acho que o Diogo quer transformar o Heitor em
um torcedor nato.
R i m o s , m a s l o g o o l h o p a r a o c o r r e d o r. P r e c i s o f a l a r
com Diogo.
— A senhora olha ele rapidinho?
— C l a r o ! P o d e i r.
Me levanto e vou até o quarto, o encontrando vazio.
Ando até a minha bolsa e busco o restante do dinheiro
que eu tenho. Não é justo que Diogo gaste tanto assim
comigo. Dou meia volta e caminho até o quarto dele.
Paro em frente a porta e bato uma vez nela, ao fundo
escuto Diogo falar algo que não entendo, mas entro
mesmo assim. O quarto é espaçoso, no meio dele tem a
grande cama de casal, muito bem arrumada e atrás dela
tem duas janelas. Há uma estante ao lado da janela com
alguns livros e mais troféus.
Curiosa me aproximo e pego um livro grosso
intitulado A dança dos dragões. Leio brevemente a
sinopse, e em seguida abro na última página. Atrás de
mim escuto o chuveiro ser desligado, então guardo o
livro e me viro para a porta do banheiro.
Diogo emerge, apenas com uma toalha em volta da
cintura. Seus cabelos estão molhados e desgrenhados.
Gotas de água escorrem por seu peito largo, deslisando
por seu abdômen definido com seis gominhos e sumindo
entre a fileira de pelos loiros para dentro da toalha. Ele
para abruptamente ao me ver ali, seus olhos arregalados
de surpresa.
— O que você está fazendo aqui? — ele pergunta, a
voz baixa e carregada de confusão.
Ele fica parado me olhando, e embora me sinta
envergonhada, tento forçar um sorriso.
— Eu só... eu trouxe isso para você. — digo,
levantando o envelope e o colocando na estante. — Eu sei
que você gastou muito com a gente, e queria... ajudar um
pouco. É o dinheiro que eu tenho.
Ele encara o envelope como se fosse uma espécie de
enigma. Seus olhos voltam para mim, ainda confusos.
— Marina, não precisa disso.
Sua voz é suave, mas firme. Engulo em seco com
medo de ofendê-lo de alguma forma. O ambiente entre
nós é carregado de uma tensão suave, uma mistura de
e m o ç õ e s q u e n ã o s e i e x a t a m e n t e c o m o d e f i n i r.
— É só um gesto pequeno — eu digo, tentando
suavizar o momento. — Só queria que você soubesse que
valorizo tudo o que está fazendo por nós.
Ele suspira, seu olhar se suaviza um pouco, e ele se
a p r o x i m a f i c a n d o e m m i n h a f r e n t e . Te n t o a t o d o m o m e n t o
não desviar os olhos do rosto dele, mas acabo descendo
p o r s e u p e s c o ç o . Ve j o q u e e l e e s t i c a a m ã o m e f a z e n d o
sentir o cheiro bom vir dele, assim que ele volta com a
mão, vejo o envelope.
— Eu entendo o seu gesto — fala tão próximo de
mim, que sinto um formigamento no ventre. Meu olhar
desce por seu corpo, mas logo volto a olhar em seus
olhos. — Aprecio e não quero ser rude, mas não posso
a c e i t a r. — a s s i m q u e e l e f a l a , b a i x o o o l h a r
envergonhada. Ele rapidamente toca em meu queixo,
f o r ç a n d o n o s s o s o l h a r e s . — Ta m b é m n ã o q u e r o q u e s e
sinta ofendida e fique chateada comigo.
— Não estou chateada com você — respondo sem
jeito aceitando novamente o envelope. — Um pouco
envergonhada, eu cheguei na sua vida e só fiz você
g a s t a r.
Sinto seu toque no meu queixo lentamente ir para a
minha bochecha. Enquanto eu o observo, não pude deixar
de me perder na profundidade dos olhos azuis de Diogo.
Eles são como um lago sereno, refletindo uma
complexidade que parecia ir além das palavras. Cada vez
que ele me olha, sinto como se estivesse mergulhando em
um mar de emoções não ditas, uma mistura de calma e
força que era ao mesmo tempo reconfortante e
desafiadora.
— Va m o s f a z e r a s s i m — p e d e e e u a c e n o
hipnotizada, para minha surpresa, ele me sorri. —
Conversarmos sobre dinheiro depois e enquanto isso me
deixa cuidar de vocês. Não quero que se preocupe com
nada.
Engulo em seco, mas aceno. Quando percebo que
e l e v a i s e a f a s t a r, e u o a b r a ç o . F i c o n a s p o n t a s d o s p é s ,
mas consigo envolver meus braços em seu pescoço. Fecho
os olhos e inspiro o perfume dele, uma mistura de
sabonete fresco e uma sutil nota amadeirada que é
exclusivamente dele.
— Obrigada, Diogo — digo, com um sorriso
emocionado. — Isso significa muito para mim.
E l e d e m o r a u m p o u c o p a r a r e a g i r, e e u s i n t o u m
leve tremor em seus braços. Então, finalmente, os braços
fortes dele se fecham ao redor da minha cintura, e um
calor reconfortante invade meu corpo. Eu mordisco o
lábio, tentando conter o tremor que sobe como uma onda.
Diogo me abraça com força, e por uns segundos, sinto a
barba dele roçar suavemente contra o meu pescoço, entre
os cabelos.
O toque dele é suave, quase reverente, e o cheiro
dele parece se intensificar nesse espaço íntimo. A
sensação de sua respiração quente contra minha pele é
quase etérea, como se ele estivesse absorvendo e
compartilhando um momento que vai além das palavras.
Seus lábios, quase imperceptivelmente, tocam a pele do
meu pescoço, e eu sinto um formigamento leve que se
espalha por todo o meu corpo.
Sinto a força e a proteção nos braços dele, mas
também a ternura que ele transmite através desse gesto. A
presença dele é tão poderosa quanto tranquilizante, e eu
me deixo envolver por esse abraço, como se o mundo
pudesse esperar enquanto nós dois permanecemos nesse
instante. O momento é interrompido, quando escuto
Heitor chorar da sala.
Me separo do abraço lentamente e nossos rostos
ficam bem próximos, deixo minhas mãos descerem pelo
peitoral quente e definido de Diogo. Ao perceber isso,
recolho as mãos e me afasto. Me sinto tonta, quase
hipnotizada com o momento.
— E-Eu vou para a sala — aviso trêmula, meu
coração parece que vai sair pela boca a qualquer
momento. — Obrigada mais uma vez.
— Tu d o b e m .
Praticamente corro para fora do quarto, parecendo
u m a b o b o n a . Vo u p a r a o m e u e g u a r d o o e n v e l o p e , e m
seguida caminho para sala onde meu bebê chora em
plenos pulmões.
C a p í t u l o 8 – M a r i n a

A p ó s a l g u n s m i n u t o s c o n s i g o a c a l m a r H e i t o r, q u e
adormece em meus braços. Herbertina está na lavanderia
c o l o c a n d o a l g u m a s r o u p i n h a s p a r a l a v a r, e e u e s t o u n a
sala enquanto Diogo está no quarto montando o berço. É
quase inevitável segurar meu sorriso de felicidade, tenho
m e u b e b ê c o m i g o , p e s s o a s b o a s a o m e u r e d o r, f i c a r i a
mais feliz ainda com os meus pais por perto. Solto um
suspiro e fico de pé, passo pelo quarto que tem a porta
aberta. Diogo está sentado no chão enquanto já tem 50%
do berço montado.
Ve j o q u e e s t á c o n c e n t r a d o , s e u s o l h o s n ã o s a e m d o
manual em suas mãos.
Continuo caminhando e passo pela lavanderia, a
porta do quintal está encostada. A empurro e vejo
Herbertina colocando outras roupas no varal. Fico na
á r e a p r o t e g i d a p e l a s o m b r a , e b a l a n ç o l e v e m e n t e H e i t o r.
A parte detrás é enorme, tem uma piscina e um grande
espaço em verde.
— Ele já montou o berço? — pergunta olhando em
minha direção.
— Ainda falta — respondo e me sento em uma
cadeirinha que tem ali. — Aqui atrás é tão grande.
— É — afirma e se aproxima. — Diogo uma vez me
falou sobre adotar um cachorro, mas nunca mais falou
sobre.
— Eu gosto de cachorro — aviso e sinto Heitor se
r e m e x e r e m m e u s b r a ç o s . — Vo u c o l o c a r e l e n o c a r r i n h o ,
só quer ficar no dengo nos braços.
Herbertina sorri para mim.
— Ele é todo esperto.
Vo l t o p a r a d e n t r o e a s s i m q u e p a s s o p e l a p o r t a d o
quarto, Diogo não está mais lá. Antes de chegar na sala,
o vejo em pé perto do filtro na cozinha. Ele bebe água e
a o m e v e r p a r a d a , p e r c o r r e m e u c o r p o c o m o o l h a r. N ã o
me sinto invadida, é quase como uma carícia.
— Vo c ê n e m a l m o ç o u a i n d a — f a l o p a r a e l e q u e
deposita o copo dentro da pia. — Eu vou colocar o Heitor
deitado no carrinho, ai coloco sua comida.
— Não precisa, Marina — murmura enquanto anda
até parar em minha frente. — Falta pouco para terminar
de montar o berço.
Diogo usa uma camiseta preta sem mangas, short da
mesma cor e tão próximo assim, só evidencia o quão alto
e f o r t e e l e é . E n g u l o e m s e c o e b a l a n ç o H e i t o r.
— Eu não vi você comendo hoje — falo e ele
arqueia uma sobrancelha. — Então, eu vou colocar
mesmo assim.
Ele franze levemente o cenho e sem esperar uma
r e s p o s t a , l h e d o u a s c o s t a s . Vo u a t é a s a l a e c o l o c o
Heitor no carrinho. Segura de que ele está bem, vou até a
cozinha e lavo as mãos na pia. Diogo não está mais lá.
Em seguida começo a montar o prato de comida para
Diogo. Esquento por alguns minutos e em sequência volto
o prato à mesa. Coloco um pouco de suco e deixo em
frente o almoço.
Com tudo pronto vou até o quarto, paro na entrada
e pigarreio para chamar a atenção.
— A comida está na mesa.
Diogo me olha por uns segundos, mas logo se dá
por vencido e anda em minha direção. Dou espaço para
ele passar e o acompanho até a cozinha. Sorrio e olho
para a sala, verificando se Heitor está bem. Ao ver que
sim, me permito observar Diogo que se senta de frente
para mim.
— Vo c ê j á c o m e u ?
— Sim — confirmo e me aproximo para apoiar as
m ã o s n o e n c o s t o d a c a d e i r a . — To m e i b a n h o e c o m i —
r e s p o n d o , D i o g o a c e n a c o m e ç a n d o a c o m e r. — E o s e u
trabalho?
— Meu chefe me deu duas semanas de folga —
avisa e eu fico surpresa. — Aproveitando que está aqui,
pode se sentar?
E n g u l o e m s e c o , e o l h o u m a ú l t i m a v e z p a r a H e i t o r.
— É sobre o seu pai? — indago, pois me lembro
muito bem do pai dele ter ido até o hospital. Meu medo
do que ele poderia fazer naquele momento quase me
sufocou. — O Felipe deve ter falado com ele, eu...
— O Felipe não falou com ele — Diogo me
t r a n q u i l i z a e e u m e s e n t o p a r a e n t e n d e r. — O I g o r p o d e
t e r d a d o a e n t e n d e r, q u e o H e i t o r é o m e u f i l h o — a s s i m
que ele fala, eu fico assustada. — E eu confirmei quando
meu pai foi até o hospital.
— O quê? Mas por quê? — questiono sem
c o m p r e e n d e r.
Diogo se encosta para trás e fixa os olhos em mim.
— Eu conheço o meu pai, Marina. Ele com toda
certeza forçaria um casamento entre vocês e não
sossegaria até que isso acontecesse.
Engulo em seco sentindo um frio na espinha ao
ouvir a declaração de Diogo. Felipe havia dito que estava
comprometido com outra, e só a menção que fiz sobre o
pai ou a outra que ele mantém relacionamento saberem
s o b r e a g r a v i d e z , f o i m o t i v o p a r a e l e m e b a t e r. . . S e o p a i
forçasse um casamento, seria a minha sentença nas mãos
de Felipe.
Meu coração acelera, mas me forço a manter a
compostura.
— Mas e se ele descobrir que mentiu? — questiono
um tanto tensa. — Acha mesmo que ele faria Felipe se
casar comigo?
O vejo franzir o cenho.
— Vo c ê g o s t a r i a d e c a s a r c o m e l e ?
— Não! Não quero! — balanço a cabeça atordoada.
— É que, se o seu pai descobrir? Ou se sua mãe pedir o
exame de DNA? Vão achar que eu tentei dar o golpe.
— Se ela pedir você não vai fazer — Diogo volta a
f a l a r. — E u c o n f i r m e i , p o r q u e p e n s e i n o s e u b e m - e s t a r e
n o d o H e i t o r. E u s e i c o m o o m e u i r m ã o p o d e s e r c r u e l .
A sinceridade em sua voz me faz engolir em seco e
d e s v i a r o o l h a r. É e s t r a n h o r e c e b e r c o n f o r t o d e a l g u é m
que normalmente é tão reservado e direto. Mas, neste
momento, suas palavras e a forma como ele cuida de mim
e do Heitor me oferecem uma pequena fagulha de alívio
em meio ao medo que sinto. Esfrego o lado da minha
têmpora e respiro fundo.
— Te m c e r t e z a , D i o g o ? — m i n h a v o z s a i m a i s
hesitante do que eu gostaria, e meus olhos buscam os
dele, tentando ler suas intenções.
— Va m o s f i n g i r q u e s o u o p a i d e l e e q u e v a m o s
tentar ficar juntos. Até que você consiga se estabilizar —
ele responde, e eu aceno, um pouco aliviada, mas ainda
com a sensação de estar entrando em algo desconhecido.
— Depois disso, podemos dizer que não demos certo
juntos.
Seus olhos, sempre tão firmes e determinados, me
analisam com uma intensidade que me faz sentir um frio
na barriga. Por um breve momento, me sinto tímida, como
se estivesse desnuda diante dele, vulnerável e exposta.
No entanto, a realidade é que eu não tenho muitas
opções.

— Ok — digo, tentando soar mais confiante do que


realmente me sinto. — Concordo com isso se tudo bem
para você.
Ele parece relaxar um pouco, como se um peso
tivesse sido tirado de seus ombros. O que me deixa
confusa, afinal, quem deveria se sentir aliviada sou eu.
Ele está mentindo por minha causa. Por outro lado, não
posso deixar de pensar nas implicações disso tudo. O que
começará como um acordo pode se transformar em algo
muito mais complicado, principalmente porque há o
Heitor no meio da história.
Diogo volta a comer e eu me levanto em busca do
meu bebê. Ao chegar na sala, me sento no sofá e puxo o
carrinho para mais perto. A sensação de que tudo está
prestes a mudar é esmagadora, mas, ao mesmo tempo,
uma parte de mim está aliviada por ter alguém ao meu
lado, mesmo que seja apenas por um tempo.
E u s ó e s p e r o q u e , q u a n d o e s s e t e m p o a c a b a r, e u
esteja pronta para seguir em frente de verdade.

*** ***
Com a chegada da noite, tomei um banho quente
que relaxou todos os meus músculos. Assim que termino,
tiro o excesso de água dos cabelos e pego a toalha do
gancho. Me seco ainda dentro do box, e após isso, paro
em cima do pano de chão. Meu olhar vai até o espelho
q u e t e m a l i . Ti r o a t o a l h a d o c o r p o e o b s e r v o m e u s s e i o s
e barriga. Fico de lado e solto um suspiro. Será que
demora muito meu corpo voltar ao normal?
Me enrolo novamente e vou para o quarto. Sorrio
quando vejo o berço montado, e paro ao lado, observando
H e i t o r d o r m i r n e l e . S e m m e c o n t e r, a c a r i c i o a b o c h e c h a
gordinha e fico alguns minutos parada apenas o olhando.
Diogo está sendo realmente minha salvação nesse
momento, mas eu sei que estou abusando muito dele e
mesmo que ele já tenha dito que não preciso me
p r e o c u p a r, é i n e v i t á v e l . O l h o a o r e d o r e v e j o t u d o o q u e
f o i c o m p r a d o p a r a H e i t o r, t e m a t é b r i n q u e d o . S o r r i o m a i s
u m a v e z . P r e c i s o f a z e r a l g u m a c o i s a p a r a r e t r i b u i r, m a s o
quê?
Pensando nisso, vou até a cômoda, pego um vestido
e peças íntimas. Meu sutiã nem cabe meus seios, mas por
enquanto é o único que tenho. Após me vestir e pentear
os cabelos, saio do quarto.
Herbertina e Diogo estão na cozinha, parecem
conversar baixinho. Penso em voltar para o quarto, mas
Diogo me percebe e pigarreia. Com isso, Herbertina olha
para trás e me sorri.
— Não queria interromper — aviso sem jeito.
— Não, imagina! — se aproxima de mim. — E o
Heitor?
Olho dela para Diogo, que mais uma vez me olha
dos pés a cabeça. O que será que ele está pensando? Me
achando feia? Deve ser o vestido, que agora que não
estou com barrigão, está bem grande na parte da frente.
— Dormindo, acho que vai dormir a noite toda. —
a s s i m q u e t e r m i n o d e f a l a r, e l a c o m e ç a a r i r e m e t o c a o
rosto. — O que foi? Ele não vai?
Projeto os braços para frente do corpo, tentando
inutilmente esconder a roupa que estou usando.
— Não quero colocar medo — murmura e eu engulo
em seco. — Mas acho difícil.
F i c o s e m c o m p r e e n d e r. P o r q u e d i f í c i l ? P r o c u r o o
olhar de Diogo, e o vejo sorrindo. Ele ainda está com a
mesma roupa, e sob o meu olhar se senta na cadeira.
— Eu acho que ele vai dormir — afirmo e ela
acena. — No hospital, ele mal chorou.
— Isso porque você ficou o tempo todo com ele nos
braços — Diogo me dedura.
Olho para Herbertina que me sorri como se tivesse
me pego na mentira.
— Não fiquei o tempo todo — retruco e me sento
em frente a ele. — Só um pouquinho.
O vejo cruzar os braços e arquear a sobrancelha.
Sem que eu peça, Herbertina me traz um pouco do
mousse. Agradeço com um sorriso. Provo e assim que o
gosto doce se espalha em minha língua, fecho os olhos
s e m r e s i s t i r. P e g o m a i s u m a c o l h e r a d a e a p r e c i o
l e n t a m e n t e o s a b o r. A b r o o s o l h o s e e n c a r o D i o g o q u e
também está me observando, ele tem a mandíbula travada
e isso me chama a atenção.
Enquanto como, Herbertina começa a falar sobre
a l g u m a c o i s a q u e n ã o c o n s i g o f o c a r. M e u o l h a r n ã o s a i d e
Diogo, que está claramente se esforçando para manter a
compostura. Sinto uma mistura de curiosidade e
inquietação diante da sua expressão fechada. Por um
instante, imagino o que pode estar passando pela cabeça
dele. Ele parece tão distante, perdido em seus próprios
pensamentos, e isso me faz sentir um frio na barriga.
Desço meu olhar por seu rosto, no momento exato que ele
passa a língua pelos lábios.
Aquele gesto me faz pensar em como será um beijo
d e l e ? Ta l p e n s a m e n t o m e f a z e n g o l i r e m s e c o , e s e m q u e
eu tenha controle do meu corpo, sinto um calor subir por
minhas veias. A maior concentração sendo em meu
v e n t r e . S i n t o t a m b é m m e u r o s t o e s q u e n t a r, e n t ã o l e v o o s
dedos sutilmente até a bochecha. Eu só posso estar louca,
mas não consigo parar de pensar em estar com Diogo.
Herbertina, com sua presença calorosa e seu jeito
g e n t i l , c o n t i n u a a f a l a r, m a s s u a s p a l a v r a s s e t o r n a m u m
s o m d i s t a n t e p a r a m i m . Tu d o o q u e c o n s i g o p e n s a r é e m
Diogo. Ele tem um olhar intenso, quase como se estivesse
t e n t a n d o r e s o l v e r u m e n i g m a q u e n ã o c o n s e g u e d e c i f r a r.
As sobrancelhas dele se aproximam cada vez mais, e eu
posso ver a tensão em seus músculos. Será que ele
percebeu?
Algo no seu olhar me faz sentir que ele está me
a v a l i a n d o . Te n t o n ã o m e d e i x a r l e v a r p e l a n e r v o s i s m o
que sinto e foco em terminar meu mousse. As colheradas
se tornam um pequeno ritual de conforto para mim,
enquanto a sensação doce e cremosa me acalma um
pouco.
— Vo c ê s e s t ã o m e o u v i n d o ? — o l h o p a r a H e r b e r t i n a
ao mesmo tempo que Diogo. — No que estão pensando?
— N-Nada! — gaguejo e assim que olho para
Diogo, ele tem o olhar divertido para mim. — Só
apreciando o mousse.
— Está uma delícia mesmo — ela comenta, e em
seguida olha para Diogo. — E você? Sei que não gosta de
doce, mas poderia experimentar um pouco.
— Vo u f a z e r i s s o , o b r i g a d o d o n a H e r b e r t i n a .
A o f u n d o e s c u t o u m c h o r o b a i x o s e i n i c i a r.
D e p o s i t o a t a ç a n a m e s a e a n t e s d e s a i r, e n c a r o
Herbertina que tem o olhar de “eu avisei”. Sorrio e me
levanto indo para o quarto. O choro fica mais audível
quando abro mais da porta, o berço fica bem ao lado da
c a m a . Vo u a t é e l e e o p e g o c o m c u i d a d o .
— O que foi meu bebê? — indago como se ele fosse
m e r e s p o n d e r. — E s t á c o m f o m e ?
Me sento na cama e o coloco deitado em meus
b r a ç o s . Ta l m o v i m e n t o o f a z c h o r a r m a i s . O b a l a n ç o m a i s
um pouco e ofereço um seio. Ele pega, mas logo o solta
c h o r a n d o . Vo l t o a f i c a r d e p é e t e n t o d a r o s e i o m a i s u m a
v e z . E l e c o n t i n u a a c h o r a r. S e m p e r d e r a c a l m a , o d e i t o
no colchão e tento ver se está de xixi. Ao ver que sim,
começo a trocá-lo.
Os minutos se passam e nada do que faço ameniza o
c h o r o . E n t ã o d a p o r t a o u ç o H e r b e r t i n a m e c h a m a r, m e
viro para ela aliviada.
— O que foi? Ele não quer mamar?
— Ele não quis, ai troquei a fraldinha dele — aviso
para ela que já está ao meu lado. — Nada do que eu faço
o acalma.
— D e i x a e u v e r.
Dou espaço para ela e a observo dar uns tapinhas na
barriguinha dele.
— Vê que está inchada? — Pergunta, e eu concordo.
— Va m o s f a z e r a s s i m .
Então a observo pegar as perninhas dele e
movimentá-las, como se ele estivesse pedalando. Não sei
quantos minutos ficamos ali, mas quando ele parou de
c h o r a r, e u s o u b e q u e n a d a m a i s d o í a . H e r b e r t i n a s a i
a v i s a n d o q u e i r i a s e p r e p a r a r p a r a d o r m i r, e m e d e i x a
com o meu bebê. Ainda fico com ele nos braços, mesmo
depois que ele dorme, e é inevitável não lembrar de
D i o g o e i s s o m e f a z s o r r i r. E l e n ã o p o d e m e c u l p a r p o r
querer ficar com Heitor nos braços. Foram tantos meses a
espera dele, e quando por um momento pensei que o
perderia, meu mundo desabou.
Solto um suspiro e por fim o coloco deitado.
Me sento na cama e meu olhar crava no celular
quebrado no móvel. O pego e analiso se o estrago foi
muito grande; a tela está trincada e não liga quando
aperto no botão de lado. Solto um suspiro e penso no que
p o s s o f a z e r. P r e c i s o f a l a r c o m a m i n h a m ã e , q u e r o c o n t a r
sobre Heitor e perguntar como meu pai está. Ainda tenho
esperanças de que ele vá me aceitar de volta.
Saio do quarto sem fazer barulho, e dou logo de
cara com Diogo. Ele está prestes a entrar no próprio
q u a r t o , m a s a o m e v e r, f i c a p a r a d o . M e u s o l h o s m e t r a e m ,
e descaradamente observo seus braços enormes.
— Algum problema? — questiona e eu balanço a
cabeça alarmada.
Sem jeito levo meus dedos a uma mecha do meu
cabelo, colocando atrás da orelha.
— Eu queria poder ligar para minha mãe —
respondo e quando meu olhar vai para dentro do quarto
dele, me recordo da nossa cena mais cedo. Sentir o
peitoral desnudo contra o meu, e o rosto tão perto foi
uma sensação nova e totalmente quente. Fico
envergonhada na mesma hora. — Posso usar o telefone?
— É claro — ele afirma com aquele olhar intenso,
subitamente me deixando com uma sensação de calor no
corpo. — Pode se sentir à vontade aqui.
Ve j o s e u o l h a r p e r c o r r e r m e u r o s t o com uma
intensidade que me faz sentir um arrepio.
— Obrigada — agradeço tentando esconder a
inquietação na minha voz, e em um ato desesperado
gesticulo em direção ao quarto. — Agora pode entrar no
seu quarto.
Engulo em seco, totalmente tensa, enquanto o
encaro. Ele cruza os braços e, para minha surpresa, seu
olhar se torna divertido. É como se ele gostasse de como
me deixa sem jeito.
— Obrigado por permitir — ele diz, com um meio
sorriso. — Mais alguma coisa?
Assim que percebo o tom divertido em sua voz,
t e n t o r e l a x a r e d e s v i o o o l h a r p a r a o c o r r e d o r.
— Não, obrigada.
Ele acena com a cabeça, ainda com aquele sorriso
enigmático, e entra no quarto. O vejo fechar a porta atrás
de si e, por um momento, fico sozinha. Meu coração
acelera, e sem que eu entenda o motivo, deixo um sorriso
e s c a p a r. A n d o r a p i d a m e n t e a t é o t e l e f o n e e a s s i m q u e m e
sento, solto um suspiro. O pego e digito os números,
q u a n d o c o m e ç a a c h a m a r, l e v o a t é a o r e l h a . R e p a s s o
m e n t a l m e n t e o q u e v o u f a l a r, a t é q u e a c h a m a d a c a i .
Franzo o cenho, mas tento novamente.
— Alô, mãe? — falo assim que sou atendida. —
Mãe?
— Oi, Marina — ela fala baixinho. Ouvir minha
mãe me deixa emocionada. — Eu estava na cozinha, mas
v i m a q u i n o q u i n t a l t e a t e n d e r.
— O pai está aí? — indago entre ansiosa e curiosa.
— Já foi deitar — avisa, sua voz parece embargada.
— E l e e s t á c o m u m a g r i p e . Vo c ê s a b e c o m o e l e f i c a
d o e n t e , m a s n ã o s e p re o c u p e q u e j á j á e l e f i c a b o m . Vo c ê
sumiu, o que aconteceu?
Faz tanto tempo que vi meu pai doente, mas me
lembro que ele fica feito um bebezão carente.
— O meu bebê nasceu, mãe — comunico e posso
o u v i r q u e f i c a s u r p r e s a . — É u m m e n i n o , H e i t o r.
— Um menino?! Meu Deus!
— Sim, mãe — confirmo sentindo meus olhos se
encherem de lágrimas. — Ele se parece comigo quando
bebê... — olho para o corredor e o encontro vazio. —
Mãe, não precisa se preocupar comigo, estou na casa de
um amigo e...
— Amigo? — A voz soa confusa. — Não sabia que
tinha amigo. — Ela murmura baixinho. — Marina, eu
tentei te ligar antes e não consegui...
— Meu celular quebrou — falo rápido a
interrompendo.
— P o r f a v o r, m e o u ç a — p e d e , e e u a c e n o c o m o s e
e l a f o s s e v e r. — E u s e i q u e n ã o é i s s o q u e q u e r o u v i r d e
m i m , m a s e u n ã o c o n s e g u i m a n d a r o d i n h e i ro q u e f a l e i . O
seu pai descobriu e não permitiu.
As palavras rondam minha cabeça e eu apenas
concordo.
— Tu d o b e m , m ã e , e u . . .
— E talvez acho melhor você não voltar — profere,
d e s s a v e z m e i n t e r r o m p e n d o . — E u s e i q u e é d u ro d e
o u v i r, e d e f a l a r t a m b é m a c re d i t e . S ó n ã o é u m b o m
momento. — Fico uns bons minutos calada, digerindo
aquela fala. — Marina?
— E-Estou aqui — respondo e seco minhas
l á g r i m a s . — Tu d o b e m , m ã e . E u e n t e n d o .
— Ótimo! Não p re c i s a l i g a r, e s p e re a minha
ligação.
Q u a n d o p e n s o e m r e s p o n d e r, e l a e n c e r r a a c h a m a d a .
F i c o s e m c o m p r e e n d e r, c o m o o l h a r v i d r a d o n o t e l e f o n e .
Não sei se é impressão minha, mas notei um certo
distanciamento em toda sua fala. Coloco o telefone em
seu lugar e fico estática.
— Conseguiu ligar?
De supetão, olho para o lado. Diogo está parado me
observando, seus olhos sérios e inquietantes. Fico de pé e
dou um leve sinal de que consegui falar com a minha
mãe, mas sinto que ele percebe algo a mais na minha
e x p r e s s ã o . Te n t o p a s s a r p o r e l e , m a s s u a m ã o f i r m e
segura meu braço, um gesto de proteção que parece mais
uma âncora.
Meu olhar choroso se fixa no dele. Ele tem o poder
de me fazer sentir um misto de segurança e
v u l n e r a b i l i d a d e , e , s e m c o n s e g u i r m e c o n t e r, o a b r a ç o
novamente. Seu cheiro é tão marcante, algo que me dá
uma sensação de aconchego inesperada.
— O que aconteceu? — sua voz é baixa, mas eu
percebo a preocupação subentendida.
Fecho os olhos por um instante, na intenção de
ordenar meus pensamentos e sentimentos. A conversa com
minha mãe foi um turbilhão de palavras não ditas e uma
sensação de abandono disfarçada de conselhos. Sinto uma
pontada de dor ao lembrar da última coisa que ela disse,
aquelas palavras que, apesar de suaves, carregavam um
peso de indiferença.
— Eu falei com a minha mãe — digo, minha voz um
pouco abafada pelo abraço —, mas não foi como eu
esperava.
Sinto Diogo acariciar meu cabelo, um toque
c a r i n h o s o , c o m o s e q u e r e n d o m e r e c o n f o r t a r. E n q u a n t o o
abraço se prolonga, meu rosto está pressionado contra o
peito largo. Sinto o calor e a firmeza de seu corpo, e, de
repente, percebo algo que antes não havia notado. Seu
coração está batendo rapidamente, um ritmo acelerado
que parece contrastar com a calma que ele tenta
t r a n s m i t i r.
— Eu sinto muito — a voz é carregada de
sinceridade, é palpável.
Fecho os olhos e coloco minha mão sobre seu peito,
sentindo cada batida forte e vibrante. O som do seu
coração é como um tambor que acelera com a tensão do
momento, um testemunho silencioso de que, mesmo por
trás de sua fachada de segurança, ele também está
afetado.
— Diogo, você está bem? — pergunto, levantando a
cabeça para encarar seu rosto.
Ele me olha com um misto de surpresa e
preocupação, mas não diz nada. Em vez disso, a
expressão dele suaviza e ele dá um leve sorriso, tentando
tranquilizar-me, mas o som do seu coração continua a
bater em um ritmo acelerado. É como se o pulsar dele
estivesse sincronizado com o meu próprio estado
emocional, criando uma conexão que eu não posso
i g n o r a r.
Diogo parece hesitar por um momento, seus olhos
fixos nos meus como se procurassem palavras que não
encontram. O calor do abraço ainda nos envolve, e a
proximidade faz o mundo parecer um pouco mais simples,
como se todas as preocupações fossem deixadas de lado
por um instante.
Com um gesto suave, ele afasta uma mecha de
cabelo que caiu sobre o meu rosto. Seus dedos tocam
minha pele com uma ternura inesperada, e a sensação é
tão íntima que sinto um frio na barriga. Seus olhos, fixos
nos meus, parecem buscar a permissão para algo mais. A
tensão no ar é palpável, e o ambiente ao nosso redor
p a r e c e d e s a p a r e c e r, r e d u z i d o a u m p e q u e n o e s p a ç o o n d e
só existimos nós dois.
Sinto meu coração acelerar também, não apenas
pelo calor do abraço, mas pela intensidade do momento.
Diogo inclina a cabeça lentamente, e eu o acompanho,
nossos rostos se aproximando cada vez mais. O espaço
entre nós diminui até que posso sentir a respiração dele
misturada com a minha.
Quando nossos lábios finalmente se encontram, é
um toque suave e hesitante. O beijo começa de forma
delicada, como se ambos estivéssemos explorando esse
novo território com cuidado. É um beijo carregado de
emoção, uma fusão de conforto e desejo, onde a
intensidade das batidas dos nossos corações parece
encontrar um ritmo harmonioso. O tempo parece se
e s t e n d e r, e a p r e o c u p a ç ã o e a d o r q u e s e n t í a m o s a n t e s s ã o
momentaneamente substituídas por uma sensação de
conexão profunda. Assim que nos afastamos, o vejo
e n g o l i r e m s e c o e m e s o l t a r.
— Me desculpe! — murmura, a voz baixa e cheia de
vergonha. Ele leva a mão à barba, tentando esconder o
constrangimento. — Me desculpe, Marina. Eu não sei o
que deu em mim.
O movimento dos seus dedos, esfregando seus
lábios como se tentasse apagar o beijo, é quase um golpe
no meu coração.
Sinto um nó na garganta e uma onda de tristeza
misturada com confusão. Não deveria me sentir assim,
mas o ato de ver Diogo se afastar de mim, como se o
beijo fosse algo do qual ele se arrependesse, faz meu
c o r a ç ã o s e a p e r t a r. A s e n s a ç ã o d e r e j e i ç ã o é s u t i l , m a s
persistente.
— Tu d o b e m . N ã o p r e c i s a s e d e s c u l p a r — d i g o ,
tentando esconder a ferida na minha voz. — Eu vou para
o quarto.
D i o g o l e v a n t a o o l h a r, h á m i s t u r a s d e s e n t i m e n t o s
em seus olhos, mas o que mais se sobressai é o brilho de
arrependimento. Há um silêncio tenso entre nós, e o
ambiente ao nosso redor parece ter retornado ao seu
estado normal, com todas as preocupações e medos de
volta.
— Eu só... — ele começa, mas não consegue
encontrar as palavras certas.
Dou um passo para trás, tentando dar espaço para
a m b o s p r o c e s s a r m o s o q u e a c a b o u d e a c o n t e c e r.
— Boa noite, Diogo — murmuro, tentando manter a
calma na voz.
Diogo assente lentamente, e a expressão dele se
suaviza um pouco. Mesmo trêmula dou as costas a ele e
caminho até o quarto. Assim que fecho a porta atrás de
mim, levo os dedos aos lábios e sorrio. Diogo me beijou
e foi o melhor beijo que já recebi, apesar de ter sido
a p e n a s u m e n c o s t a r d e l á b i o s . Vo u a t é a c a m a e m e d e i t o
nela. Sentir os lábios nos meus, a barba roçando em meu
r o s t o e o s b r a ç o s a o m e u r e d o r, f o i c o m o s e e u f l u t u a s s e
em um sonho vívido.
No entanto, quando ele me afastou e claramente o
arrependimento ficou visível... me senti mal. Então veio
a dúvida: Ele se arrependeu por ter me beijado? Ou o
desconforto era pelo fato dele ter beijado a ex do irmão?
Por um momento me questiono se é assim como Diogo me
vê. Me viro na cama, totalmente desconfortável com
aquilo. Quero questioná-lo e saber a resposta. Se ele agiu
por impulso e me beijou no calor do momento, beijo esse
que eu aceitei, eu o entendo. Afinal eu também queria
beijá-lo, por culpa talvez, dos meus hormônios. No
entanto, me ofende pensar que Diogo de certa forma,
sente nojo de mim.
Heitor começa a resmungar no berço, seu pequeno
corpo se movendo inquieto. Levanto-me da cama com
cuidado e vou até ele, balançando-o delicadamente com a
mão em seu peito. A sensação do seu calor contra minha
pele me dá um conforto momentâneo, e eu tento acalmá-
lo com suaves movimentos de balanço.
Meu pensamento deveria estar inteiramente focado
em como cuidar do meu bebê e em encontrar uma maneira
de colocar minha vida nos trilhos. Mas, paradoxalmente,
enquanto balanço Heitor e tento fazer com que ele volte a
d o r m i r, m i n h a m e n t e n ã o p a r a d e s e v o l t a r p a r a D i o g o .
No beijo, e em como ele me deixa sem jeito,
nervosa, mas ao mesmo tempo tão viva. Como pode em
tão pouco tempo, ele me deixar assim? Me fazer sentir
protegida e desorientada ao mesmo tempo?
Meu bebê volta a dormir e eu me afasto voltando
para a cama.
A noite seria longa.
C a p í t u l o 9 – D i o g o

Observo Marina se afastar apressada para o quarto,


seus passos rápidos mostrando a inquietação que eu
sinto. Quando ela desaparece de vista, a sala parece se
encher de um silêncio pesado. Sento-me no sofá e me
jogo contra o estofado, a mente um turbilhão de
pensamentos caóticos.
O que caralho estou fazendo? Me aproveitando de
Marina? Essas palavras se repetem em minha mente como
u m m a n t r a a n g u s t i a n t e . Te n t o n e g a r c o m a c a b e ç a , c o m o
se pudesse espantar os pensamentos perturbadores. A
sensação de culpa e dúvida é esmagadora.
P a s s o a m ã o n o r o s t o , t e n t a n d o m e r e c o m p o r, m a s a
cada vez que fecho os olhos, os lábios macios de Marina
ainda estão lá, uma lembrança palpável do beijo que
compartilhamos. A sensação é ao mesmo tempo
reconfortante e aterrorizante, e não consigo me livrar da
preocupação de que ela possa pensar que eu estava
apenas buscando algo egoísta.
Enquanto me afundo mais no sofá, os pensamentos
giram descontrolados, mas, lentamente, começo a
perceber algo mais profundo. O beijo com Marina não foi
um ato egoísta. A intensidade da emoção que senti foi
algo que nunca havia experimentado antes e recíproco.
É muito cedo para afirmar que Marina mexe
comigo? Porque é assim como me sinto em relação a ela.
Fecho os olhos novamente, mas desta vez a
lembrança é de horas atrás quando estávamos no meu
q u a r t o . O j e i t o d o s e u o l h a r, a f o r m a c o m o m e a b r a ç o u ,
ou até mesmo no corredor quando ela se mostrou nervosa
com a minha presença. Definitivamente, Marina mexe
comigo. É algo que vai além do físico, uma conexão que
me atinge de forma visceral e intensa.
Me recordo de quando estávamos na cozinha, seu
olhar em mim foi quase como uma carícia e por um
momento me senti curioso quando a vi ficar de bochechas
vermelhas. Sorrio. O que será que estava pensando?
Fico de pé e vou para a sala de musculação. Preciso
limpar minha mente, extravasar um pouco e voltar ao
foco inicial. Assim que entro na sala, fecho a porta e
retiro minha camisa, o frio do ambiente me faz sentir um
leve arrepio. Evito colocar as luvas, pois quero sentir o
contato direto do saco de pancada.
Me posiciono em frente ao saco suspenso e começo
com a série de golpes. Cada golpe ressoa pelo ambiente,
e o som do impacto é um alívio para a frustração e a
confusão que estou carregando. Com cada soco, minha
mente retorna ao beijo com Marina. O contato dos nossos
lábios ainda está fresco em minha memória, um toque que
me deixou sem jeito e tão vivo. Enquanto continuo a
bater no saco, revivo cada momento daquele beijo – o
calor dos seus lábios, a suavidade de sua pele, e a
sensação de estar completamente envolvido.
Tê-la em meus braços foi algo único e isso não
p o s s o n e g a r.
Lembro da maneira como ela me abraçou,
encaixando-se perfeitamente com meu corpo, a
vulnerabilidade e a intensidade do momento. A forma
c o m o e l a s e e n t r e g o u a o b e i j o f e z m e u c o r a ç ã o a c e l e r a r,
e, inevitavelmente, também trouxe um medo profundo. O
que ela deve estar pensando agora? Será que ela sentiu o
mesmo? Ou está achando que a trouxe para cá, para de
uma forma cretina me aproveitar dela?
A questão de que ela está pensando que eu me
aproveitei dela, me deixa revoltado, não com ela, mas
comigo.
Passo alguns minutos socando, e quando a minha
r e s p i r a ç ã o f i c a m a i s p e s a d a e o s u o r c o m e ç a a e s c o r r e r,
sinto uma vontade abrasadora de ir até o quarto dela e
esclarecer a situação. Então, para evitar isso, aumento
mais os socos na intenção de focar na dor nos nódulos.
— Diogo?
Olho rapidamente para trás e vejo Marina parada na
entrada. Seguro o saco de pancada, enquanto a observo
entrar e fechar a porta.
— Marina.
Ela parece sem jeito, mesmo assim se aproxima
lentamente.
— Eu fui até o seu quarto — avisa de um jeito
tímido e eu fico surpreso. — Não te achei lá, então vim
parar aqui. — seu olhar percorre a sala por completo,
m a s l o g o v o l t a a m e e n c a r a r. — E u não te ouvi aqui.
— A sala tem isolamento acústico — respondo com
a voz grave. Meu olhar percorre seu corpo,
principalmente os seios no decote do vestido. — Precisa
de algo?
A v e j o m o r d i s c a r o l á b i o e a f i r m a r, o s d e d o s s ã o
torcidos nervosamente.
— Sobre o beijo na sala...
— Eu já me desculpei — a interrompo fazendo-a me
o l h a r. — F o i e r r a d o d a m i n h a p a r t e , n ã o v a i a c o n t e c e r d e
novo.
Marina engole em seco, seus olhos ficam mais
brilhantes e isso me incomoda. Não quero deixá-la
desconfortável.
— Foi errado porque sou eu? — indaga e eu fico
s e m e n t e n d e r. — O u p o r q u e s o u a e x d o s e u i r m ã o ?
Eu a observo por um momento, buscando as
p a l a v r a s c e r t a s . O s i l ê n c i o e n t r e n ó s p a r e c e p e s a r.
— Não é por causa de quem você é — respondo
finalmente, com a voz mais calma possível. — Nem por
você ser a ex do meu irmão. É porque, no final das
contas, eu não deveria ter agido de forma impulsiva,
especialmente considerando a situação em que você está
agora. Não quero que pense que me aproveitei de você.
Marina parece ponderar minhas palavras. Seus
olhos, antes brilhantes de tensão, agora mostram um
misto de cansaço e um pouco de alívio.
— Eu não penso assim… — ela começa, mas não
consegue encontrar as palavras. — Eu só não queria
acreditar que você estava com nojo de mim
— Nojo? — indago confuso, aos poucos me
aproximo dela. — Por que eu teria nojo de você?
Eu me inclino um pouco mais perto, tentando
m o s t r a r q u e e s t o u a q u i p a r a o u v i r e a p o i a r.
Ela balança a cabeça deixando algumas lágrimas
caírem. Sua mão está trêmula quando leva até o rosto.
— Não sei — nega. Então, carinhosamente toco em
seu rosto. A pele macia me faz suspirar sutilmente. — Eu
permiti o beijo e no fim você pediu desculpas... Até se
limpou.
Sua fragilidade naquele momento é palpável, sinto
vontade de me socar por ter dado entender aquilo.
A p r o x i m o m e u r o s t o d o d e l a , q u e m e e s p e r a s e m d e s v i a r.
— Eu só não quero que você se sinta usada ou
desrespeitada de qualquer forma — continuo, minha voz
suave. — Não era isso que eu pretendia.
Ela fecha os olhos por um momento, como se
tentando absorver e processar o que estou dizendo.
Depois, abre-os novamente e me encara com um olhar
mais tranquilo.
— Obrigada por me dizer isso — ela responde com
uma voz mais firme, embora ainda um pouco trêmula. —
E u s ó . . . p r e c i s a v a o u v i r. N ã o c o n s e g u i d o r m i r p e n s a n d o .
— então me endereça aquele sorriso, sinto meu coração
a c e l e r a r. — E u v o u t e d e i x a r e m p a z , n ã o q u e r o t e
atrapalhar mais.
Eu seguro sua mão com cuidado, impedindo que se
afaste.
— Não quero que você se sinta desconfortável aqui
o u e m q u a l q u e r o u t r o l u g a r.
Ela dá um leve sorriso, e mesmo que ainda seja
pequeno e um pouco triste, é um sinal de que a conversa
ajudou a suavizar a situação.
— Obrigada, Diogo. — agradece com um sorriso. —
Ta m b é m n ã o q u e r o q u e v o c ê s e s i n t a d e s c o n f o r t á v e l
comigo. Eu vejo que se esforça bastante quando estou por
p e r t o , e a g o r a t e n h o o H e i t o r. D e i x a m o s s u a v i d a d e
cabeça para baixo, não é mesmo?
A p ó s d i z e r i s s o f a z m e n ç ã o d e s e a f a s t a r, m a s n ã o
permito e a abraço com um puxão. Noto seu olhar
surpreso, suas mãos sobem por meu peito suado.
— Vo c ê n ã o m e d e i x a d e s c o n f o r t á v e l — a v i s o a
a b r a ç a n d o m a i s f o r t e . — Vo c ê m e d e i x a c u r i o s o , t a l v e z
s e m s a b e r o q u e f a l a r, m a s n ã o d e s c o n f o r t á v e l .
Os dedos sobem por meu pescoço suado, e só aquele
toque me arrepia por inteiro.
— Vo c ê t a m b é m m e d e i x a a s s i m . — c o n f i d e n c i a
com um pequeno sorriso. — Principalmente quando me
olha com cara de bravo.
P e g o d e s u r p r e s a , e u m e d e i x o s o r r i r.
— Não olho para você assim.
— Olha sim — afirma. Os dedos me tocam a minha
barba em uma carícia tímida. — Sempre parece
aborrecido comigo.
A olho nos olhos e me perco no tom de verde. Como
p o s s o f i c a r a b o r r e c i d o c o m e l a ? Ta l v e z e l a t e n h a
confundido. Meu olhar não é de alguém bravo, é de
curiosidade. De querer conhecê-la e entender o que a faz
sorrir ou quais os medos que têm. No entanto, sendo bem
sincero, meu olhar agora é de desejo. Levo minha mão
até seu rosto e o acaricio, Marina inclina em direção ao
carinho.
Dessa vez é ela quem se aproxima do meu rosto,
nossos lábios se encontram com um toque suave, um beijo
inicial que é quase terno demais. Mas, logo, o calor entre
nós se intensifica e nossos lábios se encontram com mais
pressão. A sensação é elétrica e deliciosa.
Eu a puxo para cima, meus dedos explorando
suavemente a curva de seu corpo. Nossas bocas se abrem,
e então o beijo se transforma em algo mais profundo,
mais urgente. Meu coração bate forte no peito, e eu sinto
u m a o n d a d e d e s e j o e c o n e x ã o q u e n ã o c o n s i g o i g n o r a r.
Quando nossas línguas se encontram, é como se
uma corrente elétrica passasse entre nós. O beijo é
ardente e cheio de um desejo que não conseguimos mais
e s c o n d e r. C a d a m o v i m e n t o é s i n c r o n i z a d o , u m a d a n ç a q u e
se torna mais intensa a cada segundo.
Eu posso sentir o gosto dela, algo doce e
inebriante, e isso só faz com que eu queira mais. Nossos
corpos estão colados agora, e a proximidade é perfeita,
como se fôssemos feitos um para o outro. O beijo
continua, mais profundo e mais envolvente, e eu perco a
noção de tempo, completamente absorto no momento.
Sinto sua língua esfregar na minha de maneira
provocativa e mal posso segurar meu rugido. Aperto sua
cintura e com fome devoro seus lábios, sempre exigindo
mais do beijo.
Quando finalmente nos afastamos, nossos lábios
estão um pouco úmidos, e eu posso ver a expressão de
surpresa e alegria no rosto de Marina. O calor de seu
corpo contra o meu e o brilho em seus olhos são sinais
claros de que, mesmo que as palavras ainda sejam
necessárias, algo significativo aconteceu entre nós.
— Não peça desculpas — ela sussurra, com os
lábios a milímetros dos meus.
Suas unhas me arranham do pescoço aos ombros.
— Não — nego e com um movimento a puxo para
cima, segurando-a pela cintura, fazendo com que as
pernas sem envolvam em meu quadril. — Eu quero mais.
Vo l t o a b e i j á - l a , a o m e s m o t e m p o q u e c a m i n h o a s
cegas até o banco onde costumo levantar peso. Me sento
e sinto Marina se aconchegar melhor em cima de mim,
mais precisamente no meu pau semiereto. Sinto suas
delicadas mãos segurarem a minha barba, e a puxo para
mais perto quando ela me chupa a língua. Minhas mãos
descem pelo corpo curvilíneo e para em cima do traseiro
arrebitado. Como quero sentir o corpo nu de Marina em
meus braços. Na tentativa de aplacar o calor entre nós.
Sutilmente, levo as mãos até o decote do vestido e em
meio ao beijo, meu dedo acaricia em movimentos
circulares o bico intumescido.
Marina separa nossos lábios e observa o que faço.
Continuo tocando o bico por cima do vestido e para
minha surpresa, noto que ele molha o tecido. Subo meu
o l h a r p a r a M a r i n a q u e f i c a s e m g r a ç a e t e n t a s e c o b r i r,
mas não permito. Sob o olhar desejoso dela, eu inclino
até que meus lábios ficam a centímetro do bico. Paro um
m o m e n t o , p a r a q u e s e M a r i n a q u i s e r m e a f a s t a r, e l a o
faça. Porém, ela apenas me encara.
Então eu continuo.
Primeiro, deixo que minha língua acaricie por cima
do tecido. Marina geme, mas não me repele. Em seguida,
eu tomo na boca o mamilo coberto e faço questão de
chupá-lo com carinho e desejo.
— Diogo... — Marina sussurra meu nome, a voz um
misto de prazer e incerteza. Seus olhos estão fechados, e
seu corpo se arqueia em resposta ao que estou fazendo. A
t e n s ã o e n t r e n ó s é p a l p á v e l , e a s a l a p a r e c e d e s a p a r e c e r,
reduzida ao simples toque e ao som de nossos suspiros.
Meus dedos deslizam pela cintura dela, mantendo-a
perto, enquanto continuo a explorar com cuidado e
intensidade. O calor de seu corpo é um convite
irresistível, e a maneira como ela reage a cada
movimento meu me faz querer aprofundar ainda mais esse
momento entre nós. Sem que eu peça, ela começa a
rebolar lentamente no meu colo. A essa altura, meu pau
está em riste dentro da cueca.
— Vo c ê e s t á b e m ? — p e r g u n t o , a v o z b a i x a e r o u c a ,
sem afastar meus lábios do seu seio. Minha preocupação
não é apenas com o prazer dela, mas também com o
i m p a c t o e m o c i o n a l q u e i s s o p o d e t e r. Q u e r o g a r a n t i r q u e
ela se sinta confortável e desejada, não apenas como um
desejo físico, mas como algo mais profundo.
Franzo o cenho com o pensamento.
Marina abre os olhos e me olha com uma expressão
que mistura desejo e vulnerabilidade. Ela balança a
cabeça levemente, como se dissesse que está tudo bem,
mas eu posso ver que a experiência é intensa para ela.
Com um suspiro, me afasto um pouco, mas continuo
a segurar seu corpo. Meu olhar a percorre, procurando
por qualquer sinal de hesitação.
— Se precisar de uma pausa, só me avise — digo
suavemente, tentando equilibrar o desejo com o respeito
pela sua vontade.
Marina sorri timidamente, seu rosto está vermelho e
o s l á b i o s i n c h a d o s d a m e s m a c o r. E l a s e a p r o x i m a m a i s ,
c o m o s e m e p e d i s s e p a r a c o n t i n u a r, m a s d e s s a v e z s i n t o
sua mão descer e parar no cós do meu short. Arqueio a
sobrancelha em sua direção.
— E-Eu me sinto pegar fogo — avisa e eu aperto o
seio. Ela geme e se encolhe. — Eles estão sensíveis.
Sinto seus dedos puxarem o cós da minha bermuda
lentamente para baixo.
— Marina... — minha voz sai extremamente rouca.
— Eu não quero parar — ela me interrompe e eu
não escondo meu sorriso de satisfação —, mas e-eu ainda
não posso...
Balanço a cabeça em confirmação. Eu entendo
perfeitamente, e mesmo que minha vontade nesse
momento seja deitá-la no chão emborrachado e fazê-la
minha a noite toda. Compreendo que por agora preciso
me contentar apenas com beijos.
— Tu d o b e m — m u r m u r o b a i x i n h o , e l a m e s o r r i
t í m i d a . — Vo c ê e s t á n o c o n t r o l e .
Ela se remexe em meu colo me fazendo encarar os
seios no decote a mostra, e olha para baixo. Meu pau está
totalmente duro, e visível sob o short de tecido fino.
Marina mordisca o lábio e, em seguida, me encara. Seu
olhar é curioso, suas bochechas vermelhas como se
estivesse envergonhada — e até mesmo pelo calor do
momento —, mas também interessada. Ela parece estar
lutando com seus próprios sentimentos, tentando
encontrar a coragem para tomar uma decisão.
— S e v o c ê q u i s e r. . . — c o m e ç a e e u a e n c a r o
ansioso. — Podemos tentar de outro jeito.
Meus dedos vão até seu rosto, tentando transmitir
calma. Já que por dentro estou em combustão, só de
i m a g i n a r o q u e e l a e s t á q u e r e n d o p r o p o r.
— Não há pressa — digo, tentando ser o mais gentil
possível. — Podemos ir com calma.
Ela assente lentamente e com as mãos apoiadas em
meus ombros fica de pé. Sinto sua mão agarrar a minha e
e l a m e p u x a r. E n t ã o a p e n a s a c e i t o e a s s i m q u e f i c o
totalmente de pé, seu olhar vai direto para a minha
ereção. Marina fica com a expressão de surpresa e isso
c e r t a m e n t e m e f a z s o r r i r. A n d a m o s p a r a f o r a d a s a l a e
antes que cheguemos em meu quarto, ouvimos um choro
s e i n i c i a r.
Marina para no corredor e a vejo soltar um suspiro.
O choro fica mais alto, então ela se vira para mim e me
dá um sorriso envergonhado.
— Desculpa... — sua voz sai baixinho, e ali no
corredor bem iluminado, posso ver melhor o estado real
que ela se encontra.
Os cabelos castanhos estão bagunçados, e nos dois
seios há rastros molhados nos bicos, o maior é onde
mamei minutos atrás. A toco na bochecha e me inclino
p a r a b e i j á - l a c a r i n h o s a m e n t e . A p ó s m e a f a s t a r, a o b s e r v o
ir para o próprio quarto a passos rápidos. Assim que a
porta se fecha, vou para o meu e sigo até o banheiro. Lá
dentro eu apoio as mãos na pia e me olho no grande
espelho.
Meu pescoço e ombros estão arranhados, minha
pupila está maior e ao descer o olhar para baixo, vejo a
ereção bem-marcada. A puxo para fora e a aperto,
arrancando um gemido mais alto. Solto o meu pau e vou
para de baixo do chuveiro, ligo na temperatura fria e
rapidamente me envio embaixo dela. A água cai no meu
pau e gemo com o contato.
Os minutos passam e derrotado, agarro minha
ereção.
— Não acredito que vou fazer isso.
Resmungo e começo a me masturbar em movimentos
rápidos. Fecho os olhos e quase que instantaneamente,
lembro do sabor do beijo e do corpo quente bem colado
ao meu. Me imagino deitado na cama e Marina me
cavalgando com força, ora gemendo, ora me pedindo para
ir com mais força. Gemo mais rouco e aperto a glande.
Sentir os lábios de Marina naquele beijo quente e
molhado, só fez com que meu imaginário trabalhe na
visão dela me chupando.
Acelero os movimentos e apoio o outro braço no
azulejo.
Demora alguns minutos, mas quando finalmente
gozo, meu pensamento está em Marina. A água continua
caindo em minhas costas, e mesmo que eu tenha acabado
d e m e a l i v i a r, m e u d e s e j o p o r M a r i n a c o r r e p o r m i n h a s
veias.
Permito que a água caia em meu rosto, e fico
parado por mais alguns minutos. Essa noite com toda
c e r t e z a s e r i a u m a d a s m a i s d i f í c e i s d e d o r m i r.
C a p í t u l o 1 0 – D i o g o

Antes das 5h já estou de pé. Faço meus exercícios


como sempre e após o banho, vou até a cozinha. Dona
Herbertina está terminando de preparar o café, ela me vê
e me dá bom dia. No entanto, a percebo pensativa. Em
silêncio vou até o armário e pego uma caneca. Me
aproximo dela, mas paro assim que sou encarado.
— Ontem a noite passei no quarto da Marina — ela
fala, então eu engulo em seco. — Queria saber se ela
estava bem, se o Heitor estava dormindo, mas ela não
estava lá. Ela estava com você?
Herbertina não desvia o olhar do meu.
— Estava — afirmo, e ela cruza os braços a espera
de mais. — Conversamos na sala de musculação. — falo
uma meia verdade. Afinal, conversarmos sim, antes de
praticamente transarmos lá.
— Sobre o quê? — indaga e eu me sirvo do café
para ganhar tempo. — Eu fico muito preocupada com ela,
Diogo. Ela é tão doce e no momento o único apoio que
ela tem, somos nós.
Me volto para ela e concordo.
— Eu sei disso.
— Então não fique chateado com o que eu vou pedir
— fala e eu espero. — Seja mais gentil com ela — pede e
e u f i c o s e m e n t e n d e r, n u n c a a t r a t e i m a l . Ta l v e z n o t a n d o
isso, ela continua: — Não estou dizendo que você não é,
mas você já percebeu que ela é bem sensível e você de
cara feia dá entender algo que eu sei que você não está
sentindo. Sorria mais, pelo menos tente não soar tão
grosso quando responde algo.
— Eu não sou grosso. — assim que falo, ela arqueia
u m a s o b r a n c e l h a . — Tu d o b e m , v o u t e n t a r s e g u i r o s e u
conselho.
— M u i t o b e m — m u r m u r a e v o l t a a s e o c u p a r. — E u
preciso ir na feira, quero comprar algumas frutas.
— S e q u i s e r, e u p o s s o i r.
— N ã o — n e g a c o m u m s o r r i s o . — Va i f i c a r e
colocar em prática o que pedi. — deixa claro com o dedo
apontando em minha direção. — E também você não
escolhe boas frutas.
Sorrio com aquela acusação e me sento. Ao fundo
e s c u t o H e i t o r c h o r a r e m e v i r o e m d i r e ç ã o a o c o r r e d o r.
Herbertina passa por mim e segue na direção do quarto.
Beberico o café e tento pensar no que posso fazer pelo
dia. Em meio ao meu devaneio, Herbertina volta com um
s o r r i s o a c o l h e d o r.
— Está tudo bem? — pergunto quando ela não fala
nada.
— Sim — afirma e vai até a geladeira. — Ele está
mamando, sempre que acorda é assim. Acho que a Marina
já entendeu quando ele chora com fome.
Bebo mais do café, pego uma torradinha do pote e
c o m e ç o a c o m e r. H e r b e r t i n a g u a r d a a l g u n s u t e n s í l i o s e
em seguida coloca o chapéu de feira e busca a bolsa que
sempre leva. Antes de ir me pede para lembrar sobre o
seu pedido e sai. Fico uns segundos ali na cozinha, me
segurando para não ir até o quarto. Não quero atrapalhar
o momento mãe e filho.
Assim que termino meu café, lavo o que sujei e vou
até a sala. Ligo a tv e quando vejo que é o noticiário
falando sobre a operação que comandei, aumento o
volume. Eles não falam nada de novo, apenas o que
p a s s e i p a r a a r e p ó r t e r. M e e n c o s t o n o s o f á e c r u z o o s
braços, mesmo tendo prendido a quadrilha que ajudava na
distribuição das drogas e armas, havia algo que não se
encaixava.
No dia do cerco, faltou pouco para prendermos. Foi
como se de última hora, Juanito soubesse o que
aconteceria.
— Hijo de puta!
X i n g o a o v e r n a t e l a d a t v, a f o t o g r a f i a d o c h e f e
que prendi.
— Dona Herbertina? — ouço Marina chamar do
quarto e rapidamente vou até ela. É com o coração
frenético que paro em frente a porta fechada, estou
completamente ansioso feito um adolescente. Dou uma
batida e escuto a voz suave permitir minha entrada. —
Ah, Diogo! — ela exclama assim que me vê, seu sorriso
chega até mim e a observo passar a mão nos cabelos.
Marina está em pé ao lado da cama, enquanto Heitor está
resmungando no colchão. — A dona Herbertina...?
— Ela saiu — falo e me aproximo. Seu olhar
percorre meu corpo, mas não se demora muito. Estou de
camisa branca e short preto, como a maioria das minhas
roupas. Já ela, usa um vestido diferente da noite passada,
uma mais rosinha. Esse chega até as coxas dela. — Foi na
feira, hoje é o dia que ela vai. Precisa de algo?
— Não — balança a cabeça e me sorri de um jeito
tímido. Como alguém pode ser tão linda logo pela manhã?
— É q u e e u v o u d a r b a n h o n o H e i t o r, d a s o u t r a s v e z e s f o i
ela quem deu. Só queria ela por perto para me sentir mais
segura.
— Ah, certo — balbucio e olho o pequeno
r e s m u n g a r c o m o s e f o s s e c h o r a r. — Q u e r q u e e u f i q u e ? —
pergunto e quase me arrependo. O que estou fazendo?
Então, ela me sorri ainda mais e acena.
— Se não for atrapalhar você... — dou de ombros.
— Então está bem.
Ando até parar ao lado dela, Marina tem as mãos
em frente ao corpo.
— Vo c ê d á b a n h o n e l e a q u i ?
— Não na cama — ela nega com um lindo sorriso.
A b a n h e i r a e s t á a r m a d a a o l a d o . Te m o s a b o n e t e , e
uma toalha no suporte. Com cuidado, ela começa a tirar o
macaquinho que ele dormiu. Ao ver o umbigo estranho,
eu franzo o cenho.
— Isso é normal? — questiono apontando para o
pegador no umbigo.
Marina olha para onde aponto e balança a cabeça.
— É sim — afirma e eu cruzo os braços ainda
olhando. — Depois do banho preciso fazer a limpeza e
secar bem.
Após dizer isso, ela o pega nos braços e caminha
até a banheira. Fico apenas em silêncio, observando o
cuidado que ela testa a água com a mão, para em seguida
depositar Heitor dentro. Ele começa a chorar em plenos
pulmões, como se não quisesse tomar banho. Fascinado,
admiro Marina banhá-lo enquanto conversa de um jeito
c a r i n h o s o c o m e l e . H e i t o r c o n t i n u a a c h o r a r, e s ó p a r a
quando o banho acaba.
Presto bastante atenção em cada passo e quando é a
vez do umbigo ser higienizado, redobro a atenção.
Marina o deixa no meio da cama e vai até a cômoda,
i n s t i n t i v a m e n t e m e a p r o x i m o d e H e i t o r, c o m m e d o q u e
ele embole e caia. Ele tem as mãozinhas fechadas,
resmunga ao mesmo tempo que mexe os pezinhos.
Eu nunca fui um homem dado a grandes emoções.
Pelo menos, não aquelas que envolvem ternura, carinho.
Minha vida sempre foi marcada por ação, por resolver
problemas de forma prática e eficiente. Mas, ao ver
Heitor ali e a forma como Marina o trata com cuidado,
percebo que algo dentro de mim está mudando.
Por um instante, me imagino vivendo aquela vida
para sempre.
Marina volta, e em suas mãos noto a peça de roupa
dobrada. Não consigo evitar o sorriso ao perceber qual é.
Ela ao ver minha reação, também sorri.
— Então quer dizer que esse é o seu time? — ela
q u e s t i o n a v o l t a n d o a a r r u m a r H e i t o r.
— Culpado — falo em um tom descontraído. —
Vo c ê s e i m p o r t a p o r e u t e r c o m p r a d o p a r a e l e ?
— Não — Marina me olha por um instante, mas
logo desvia. — Eu só não sou muito apegada a time.
Assim que ela termina de vesti-lo, sinto uma
s e n s a ç ã o a b r a ç a r m e u p e i t o q u e m e f a z s o r r i r. A o b s e r v o
pegar Heitor e colocá-lo no berço. Ele resmunga, mas não
c h e g a a c h o r a r.
— Eu vou estar na sala — aviso a ela, que coloca
uma mecha atrás da orelha.
Os olhos verdes de Marina me vasculham ansiosos.
A pele branca, que eu sei ser sedosa, parece um convite
para acariciá-la.
— Está bem — murmura. Meu olhar segue para os
seus lábios, seguro a vontade de beijá-la. — Eu vou
tomar banho, devo estar toda horrorosa.
— Vo c ê é a m u l h e r m a i s l i n d a q u e e u j á c o n h e c i . —
digo e ficamos os dois nos olhando, ela sem jeito fica
ainda mais bonita. — Eu vou indo — comunico e ela
acena com um pequeno sorriso, antes que eu vá, me volto
para Heitor deitado. — Ele vai ficar aí sozinho?
Marina o olha, mas logo volta a atenção para mim.
— N ã o v o u d e m o r a r.
C o n f i r m o , e f a ç o m e n ç ã o d e v i r a r, m a s a l g o m e
impede.
— Se quiser posso ficar com ele — falo e ela me
olha surpresa —, mas se não se sentir segura, tudo bem.
Eu não sei cuidar de bebês. O Igor tem aquela boca
grande, ele fala que só um idiota não sabe segurar um
bebê, mas parece não entender que um bebê é delicado e
se...
— Tu d o b e m — e l a m e i n t e r r o m p e e v a i a t é o b e r ç o ,
p e g a H e i t o r q u e r e s m u n g a e s e a p r o x i m a d e m i m . — Vo c ê
só precisa segurar ele com cuidado, e não deixar que ele
penda a cabeça para trás.
Ela se aproxima, e eu sinto meu corpo ficar tenso,
mas disfarço. Nunca fui de mostrar fraqueza, e segurar
um bebê nunca foi parte da minha rotina. Marina para na
minha frente, os olhos dela me encontram, buscando algo,
talvez um sinal de que posso lidar com isso. E, por mais
que eu seja bom em esconder o que sinto, algo nela me
faz querer mostrar que estou aqui, que posso ser
confiável.
Estendo os braços, um pouco rígido no começo, mas
quando ela coloca Heitor nos meus braços, o mundo ao
m e u r e d o r p a r e c e d e s a c e l e r a r. E l e é l e v e , m o l e n g a , e o
calor que emana do pequeno corpo contra o meu é
surpreendentemente reconfortante. Heitor se mexe um
pouco, fazendo um som suave, quase como um suspiro, e
eu prendo a respiração por um segundo, temendo que
qualquer movimento brusco o acorde ou o perturbe.
Marina me observa, seus olhos fixos em mim. Eu
nunca me senti assim antes, tão... responsável por algo
t ã o p e q u e n o . Te n t o n ã o p e n s a r d e m a i s , a p e n a s o s e g u r o
firme, mas com cuidado, como se estivesse segurando o
meu próprio coração.
Heitor se mexe nos meus braços, e eu abaixo o
o l h a r, f o c a n d o n o p e q u e n o r o s t o d e l e . É a í q u e p e r c e b o o s
olhos dele abertos, me encarando. Dois enormes olhos
verdes, exatamente como os de Marina. É como se eu
estivesse olhando para ela em uma versão tão pura e
inocente que me desarma por completo.
Esses olhos... Eles me prendem, me puxam para um
lugar que eu nem sabia que existia dentro de mim. Um
lugar onde não há caos, onde não há violência, onde não
há a vida que eu conheci até agora.
Apenas paz.
Apenas eles.
Eu deveria estar assustado com o peso desse
pensamento, mas, ao invés disso, sinto algo diferente.
Algo profundo e inegável. Uma vontade que cresce no
meu peito, uma certeza que se forma com cada batida do
meu coração. Ali, segurando Heitor e vendo esses olhos
verdes que espelham os de Marina, eu percebo que quero
essa vida. Não apenas hoje, ou amanhã, mas para sempre.
Quero estar aqui, ao lado deles, protegendo, cuidando,
construindo algo que eu nunca soube que desejava até
esse momento.
— Tu d o b e m , D i o g o ?
Me volto para Marina e aceno. Ela toca nos
cabelinhos ralos de Heitor e em seguida o beija.
— Vo u e s t a r n a s a l a .
Dou as costas a ela e caminho lentamente para fora.
Assim que chego na sala, baixo o volume da tv e me
sento no sofá.
— Heitor — murmuro e para minha surpresa, ele
abre os olhos novamente. — Seu nome é bem bonito,
rapazinho. — me sinto um bobo por falar com um bebê
que não me entende, mas não ligo para isso. — Não se
preocupe, você não tem cara de joelho. — ele resmunga
como se concordasse comigo, eu rio. — Não, não tem. A
sua mãe ama muito você, sabia disso? — toco na
mãozinha dele e o sinto agarrar meu dedo com força. —
Vo c ê é b e m f o r t i n h o . S ó n ã o q u e b r e m e u d e d o .
Balanço a cabeça e sorrio. Devo estar parecendo um
grande idiota, mas não vou negar: estou me sentindo bem
demais. Como se por anos eu estivesse esperando um
momento assim, para me sentir completo e realizado.
Afinal, eu sempre segui corretamente com tudo: estudos,
trabalho, família. No entanto, sempre senti que me
faltava, uma sensação de vazio. Mas agora ali? Não me
sinto dessa forma. Sorrio, mas por um breve instante,
vem na minha mente que aquele bebê não é meu filho,
Marina não é minha mulher e tudo isso que estamos
passando é algo passageiro.
Solto um suspiro triste. Por que tudo tem que ser
assim?
Ajeito Heitor melhor em meus braços e volto a
sorrio. Marina poderia ter pegado qualquer macacão, mas
ela escolheu especialmente aquele. Já fui em alguns
j o g o s c o m I g o r, s e m p r e t e m a l g u m p a i c o m o f i l h o
compartilhando aquele momento emocionante. Nunca
passou em minha cabeça tal possibilidade, mas agora fico
i m a g i n a n d o i n d o c o m H e i t o r.
A campainha toca e com o cenho franzido me
l e v a n t o . Vo u a t é o p a i n e l e p a r a m i n h a s u r p r e s a , v e j o
Marcelo parado na calçada, o carro está estacionado no
m e i o f i o . Te m u m a s a c o l a e m m ã o s , e . . . f l o r e s ?
Fico uns segundos observando a tela, mas logo abro
o portão para que ele entre. Pela porta da frente o vejo
andar pelo caminho de pedra, e abro a porta.
— Bom dia, Diogo!
— Bom dia, senhor — o cumprimento e permito que
entre. — Que surpresa.
— Espero não está incomodando — fala olhando ao
r e d o r, e n t ã o e l e s e v i r a p a r a m i m . O l h a d e u m j e i t o
surpreso para Heitor em meus braços. — Quem diria, o
seu primeiro filho. — O avalio tentando entender o que o
trouxe aqui, talvez notando isso ele continua: — Eu
estava indo para o departamento, e percebi que não dei
um presente.
— Não precisava se incomodar — murmuro indo me
sentar no sofá. — O senhor aceita alguma coisa?
— Não, só vim deixar esses dois presentes — avisa
colocando-os na mesinha de centro. — E quem sabe,
conhecer sua mulher e seu filho. Essa novidade me pegou
realmente de surpresa, Diogo.
— É, parece que todo mundo ficou surpreso.
Ele acena e antes que possa falar algo, olha para o
c o r r e d o r a o m e u l a d o . Ve j o q u e e l e f i c a s u r p r e s o e
rapidamente ajeita a compostura. Me viro para ver
Marina, ela usa um vestido de alças grossas da cor
amarelo. Assim que ela percebe que não estou sozinho,
e s t a c a n o l u g a r.
— Desculpa, eu pensei que era a tv ligada.
— Não — a impeço de ir e estendo a mão em sua
direção. Demora uns segundos, mas ela logo a segura. —
Esse é o meu chefe Marcelo Servat — apresento e
percebo quando após os dois apertam as mãos, Marina me
olha com uma expressão que não sei identificar no
momento. — Essa é Marina.
— Marina — Marcelo repete e sorri. — Se me
p e r m i t e d i z e r, v o c ê é m u i t o l i n d a , M a r i n a .
— Obrigada. — ela responde e me olha. — Eu vou
l e v a r o H e i t o r, a s s i m c o n v e r s a m a s ó s .
— Não precisa — meu chefe fala e aponta os
presentes. — Só vim para trazer isso, quis ser cortês, o
Diogo é um dos melhores no nosso departamento. Essas
f l o r e s s ã o p a r a v o c ê , o d a s a c o l a é d o p e q u e n o H e i t o r. É
um conjuntinho, foi a vendedora que escolheu. Não levo
jeito para isso.
— Obrigada.
O l h o p a r a M a r i n a q u e t e n t a m e s o r r i r, m a s p e r c e b o
q u e e s t á d e s c o n f o r t á v e l . Vo l t o p a r a M a r c e l o , q u a n d o e l e
desvia o olhar de Marina, para mim.
— Bom! — Marcelo olha o relógio de pulso, em
seguida para mim. — Eu vou indo, ainda tenho uma
reunião.
Fico de pé.
— Vo u a c o m p a n h á - l o a t é s a í d a .
Marcelo olha para Marina e acena com a mão.
— Até Marina, foi um prazer conhecê-la.
Marina retribui o aceno.
Saímos até a área coberta e eu fico na sombra
p r o t e g e n d o H e i t o r d o s o l . A n t e s d e i r, M a r c e l o m e
encara.
— Está tudo bem com ela? Ela pareceu
desconfortável.
Nego com a cabeça.
— Ela é tímida e tudo isso é muito novo para ela.
— Ah, entendo. — Marcelo estende sua mão e me
s o r r i . — Ve j o v o c ê d e p o i s , o s e u f i l h o e s u a m u l h e r s ã o
lindos.
O observo ir e logo entro fechando as portas.
Marina está na cozinha bebe um copo de água, mas ao me
ver deposita o copo na pia.
— Tu d o b e m ? — p e r g u n t o m e a p r o x i m a n d o d e l a . —
Vo c ê p a r e c e u d e s c o n f o r t á v e l c o m o M a r c e l o a q u i ?
— N ã o — n e g a , m a s p e r c e b o q u e m e n t e . Ta l v e z p o r
n o t a r, e l a c o n t i n u a . — N ã o é n a d a .
— M a r i n a , p o r f a v o r. P o d e m e d i z e r.
Aceno e fico a espera que fale. Ela solta um suspiro
e se aproxima com os braços cruzados.
— Eu não gostei dele — fala e eu fico surpreso,
mas também curioso. — O jeito que ele fala, não parece
ser de verdade e aqueles olhares estranhos como se me
medisse da cabeça aos pés. Eu não gosto quando me
encaram daquele jeito.
— Tu d o b e m , e u e n t e n d o . — r e s p o n d o e e l a s o r r i a o
ficar em minha frente. Ela toca a bochecha rosada do
H e i t o r. E l e e s t á d o r m i n d o e m m e u s b r a ç o s . — F o i a
primeira vez que ele veio aqui e a última, não se
preocupe.
Ela acena, mas seu olhar demonstra o quão confusa
está.
— Ele está tão quietinho — comenta, sem tirar os
o l h o s d e H e i t o r. — D e v e r i a c o l o c a r e l e n o b e r ç o , v a i
deixá-lo mal-acostumado.
M a r i n a s o r r i e e u n ã o c o n s i g o e v i t a r, e a t o c o n a
bochecha. Meu dedo percorre por sua mandíbula delicada,
e me permito tocar em seus lábios. Ela fecha os olhos,
mas logo os abre e aproxima o rosto do meu.
— Eu quero muito te beijar agora, Marina.
Como resposta, ela mordisca o lábio e acena
parecendo ansiosa.
— Eu também quero o seu beijo, Diogo. — sua voz
soa baixinho, como se estivesse com vergonha de falar
alto. — Mas talvez devesse colocar o Heitor no berço.
Concordo e dou meia volta indo para o quarto. Me
aproximo do berço e com extremo cuidado me inclino
colocando o pequeno deitado. Ele resmunga, mas no fim
não acorda. Me viro para a porta e vejo Marina parada na
entrada. Então a passos largos e com urgência a abraço.
Os lábios tomam os meus com fome e a sensação é
avassaladora. Marina responde com a mesma intensidade,
como se estivesse guardando esse momento há muito
tempo. A puxo para cima, e envolvo meus braços em sua
cintura. Ando para fora do quarto as cegas, e quando
minha mão sente a parede a minha frente, pressiono
nossos corpos contra ela.
Marina para o beijo e geme manhosamente.
Rapidamente tomo novamente os lábios deliciosos para
mim. Chupo sua língua com o desejo e praticamente a
devoro.
Sinto as mãos dela subirem pelo meu pescoço,
puxando-me para mais perto, como se não quisesse me
d e i x a r i r, c o m o s e p r e c i s a s s e d e m i m t a n t o q u a n t o e u
preciso dela. Meu coração bate forte, e por um momento,
nada mais existe — nem o mundo lá fora, nem as dúvidas,
nem as barreiras que construí ao longo dos anos.
Só Marina e eu.
Quando finalmente nos afastamos, nossos olhares se
encontram, e vejo nos olhos dela o mesmo brilho, a
mesma certeza que sinto agora.
— O que está fazendo comigo?
— E-Eu?! — ela parece genuinamente confusa,
então deixa escapar um pequeno sorriso. — Eu não estou
fazendo nada.
— Marina... — minha voz trava.
— Sim...?
Eu quero explicar como ela está me deixando, desde
que entendi que sua presença mexe comigo e não de uma
forma ruim. No entanto me sinto inseguro, como se o fato
de me abrir possa afastá-la e estragar o que estamos
começando.
Que sentimento confuso.
Sem querer falar nada, volto a beijá-la. Ela por sua
vez, sobe as mãos para o meu cabelo e os puxa com
f o r ç a ; n ã o u m a f o r m a d e m e p a r a r, m a s s i m i n s t i g a r.
A seguro firme em meus braços e afasto nossos
lábios, apenas para chegar até a sala. Assim que me sento
mantendo-a por cima, Marina geme mais e apoia as mãos
em meu peito.
— Estou machucando você?
— Não — responde passeando as mãos por meus
braços. — É que… meu corpo está pegando fogo.
Sorrio com a sinceridade e deixo que meus beijos
desçam por seu pescoço de pele macia.
— Me sinto do mesmo jeito.
— E-Eu sei… — dessa vez ela me afasta e sai do
meu colo. Seu olhar por um breve momento se torna
tenso. — E eu entendo que você precise se aliviar —
continua, seu rosto tem um tom avermelhado nas
bochechas. A frase me deixa levemente confuso —, mas
se você puder esperar eu me recuperar primeiro…
— O quê? — questiono quando finalmente entendi.
— Algumas semanas! — fala rápido com a
respiração alterada. — Desculpa! É que…
— Vo c ê e s t á m e c o m p a r a n d o c o m o m e u i r m ã o ? —
indago desacreditado e em um rompante fico de pé.
Eu era um idiota! É claro que ela está se entregando
para mim por algum tipo de obrigação, e eu feito um
imbecil imaginando uma maldita história bonitinha.
— Não! De onde tirou isso? Eu não o comparei. —
a voz doce sai trêmula.
— Não! Só está insinuando que sou um desgraçado
abusador — assim que profiro, ela me olha assustada. —
Acha que eu forçaria você como meu irmão já fez?
No instante que termino, percebo que fui longe
demais. Marina está petrificada, seu olhar em minha
direção me faz sentir como se várias facas atravessassem
meu peito. Solto um suspiro e envergonhado fico a
observando.
A o f u n d o e s c u t o o p o r t ã o a b r i r, e s e i q u e é
Herbertina. Ela é a única que tem as cópias das chaves.
Passo a mão no rosto frustrado, meu tesão se esvai
rapidamente. A possibilidade de Marina pensar tão baixo
de mim, me deixa extremamente decepcionado.
Escuto mais uma voz junto de Herbertina, e então
assim que vejo o recém-chegado, respiro fundo.
C a p í t u l o 1 1 – M a r i n a

Diogo desvia o olhar quando Herbertina entra


acompanhada. Olho para baixo e passo sutilmente a mão
nas bochechas, limpando os rastros das lágrimas. O pai
do Diogo fala, mas minha mente insiste em ignorar
aquela cena a minha frente, e me relembrar da minha
briga segundos atrás com Diogo.
Eu não o comparei com Felipe, eu só achei
necessário falar que eu não poderia me entregar a ele
a g o r a , m e s m o q u e r e n d o m u i t o . Ta l v e z e u d e v e s s e f i c a r
calada, era óbvio que Diogo não me forçaria a nada e
entende o meu resguardo.
Me sinto envergonhada.
— Marina? — encaro Herbertina que me sorri, mas
muda o semblante quando me vê. — Está tudo bem?
D i o g o e v i t a m e o l h a r, j á o p a i d e l e t e m t o t a l
atenção em mim.
— Sim! — afirmo e ajeito a mecha que caiu no meu
rosto. — Só estou pensando.
— Eu comprei mais morangos — murmura enquanto
vai até a cozinha com o pai do Diogo. — Aquela feira
estava pegando fogo.
Automaticamente olho para Diogo. Ele tem os
braços cruzados, mantém a atenção no recém-chegado.
— Marina, não é? — o pai do Diogo se aproxima me
deixando tensa. Ele usa um terno bem chique, o
distintivo está em seu pescoço. — Não precisa ficar com
medo de mim. Não sei o que Diogo disse sobre mim, mas
não sou uma pessoa ruim.
Ele me sorri simpático, não parece o monstro que
Felipe o pintou. Eu respiro fundo e aos poucos vou me
acalmando.
— Ele não disse nada sobre o senhor — falo por
fim. — Eu só fiquei assustada, o senhor perecia bem
bravo naquele dia no hospital.
— Ah, eu estava sim, mas não com você. — afirma
e e u o l h o p a r a D i o g o . — P o r f a v o r, v a m o s n o s a p r e s e n t a r
formalmente. — pede, e eu aceno. — Me chamo Humberto
Macêdo — estende a mão para mim e mesmo trêmula, eu
o cumprimento. — E você é?
— Marina Ribeiro.
— É u m p r a z e r t e c o n h e c e r, M a r i n a . E m e p e r d o e
por ter a deixado naquele estado caótico no hospital, juro
que não foi minha intenção.
— Tu d o b e m .
Balanço a cabeça, e quando ele olha para o filho, eu
o imito.
— Não vai trabalhar hoje?
— Recebi duas semanas de folgas — Diogo
responde com o tom de voz sério, mais do que o normal.
— E o senhor? O que faz aqui?
Humberto fica de pé e se aproxima do filho. Pelo
canto de olho, vejo Herbertina ficar parada ao lado do
sofá.
— Vi m c o n v i d a r o s d o i s p a r a u m j a n t a r a m a n h ã n a
nossa casa — ele responde quase no mesmo tom que
Diogo. — Às 20h. Já passou da hora da sua família
conhecer a mãe do seu filho, Diogo. — nesse exato
m o m e n t o , v e j o H e r b e r t i n a f r a n z i r o c e n h o e m e e n c a r a r.
— Tu d o b e m p a r a v o c ê , M a r i n a ? — o l h o p a r a H u m b e r t o
que foca a atenção em meu rosto. — Eu acho que não
precisamos adiar mais isso. — seu olhar volta para
Diogo, e ele continua: — Amanhã, às 20h.
— Vo u conversar com a Marina e ligo para
c o n f i r m a r.
— A sua mãe já começou com os preparativos —
informa e eu engulo em seco. — Se não for lá, pode ter
certeza de que ela traz o jantar para cá. — Humberto me
o l h a e d e s s a v e z , d i r e c i o n a u m s o r r i s o a c o l h e d o r. — Eu
posso conhecer meu neto?
— Ele está dormindo — respondo, e tento um
sorriso. — Mas o senhor pode vê-lo. — me levanto e
i n d i c o o c a m i n h o d o c o r r e d o r.
Ele concorda e me acompanha.
Vo u i n d i c a n d o o c a m i n h o e a s s i m q u e p a r o e m
f r e n t e a p o r t a , a a b r o d e v a g a r. E n t r a m o s e b e m c o m o
disse, Heitor está dormindo. Olho para Humberto e sorrio
quando percebo sua felicidade.
— Adorei a roupinha — avisa e eu aceno. Escolhi
vesti-lo assim só para ver a reação de Diogo, e lembrar
d a q u e l e s o r r i s o m e d e i x a s e m c h ã o . — Vo u c o m p r a r u m a
especial para ele. Na família, agora somos três torcedores
d o f l a m e n g o , o m e u c a ç u l a , F e l i p e , t o r c e p a r a o Va s c o .
— Eu sei.
Humberto me olha surpreso, mas logo sorri e volta
a a t e n ç ã o p a r a H e i t o r.
— Qual o nome do meu neto?
— Heitor Ribeiro.
— Ribeiro? — ele indaga e meu bebê no berço
resmunga, talvez por conta do barulho. Andamos para
f o r a e n o c o r r e d o r, H u m b e r t o m e e n c a r a . — Vo c ê n ã o
pensa em registrá-lo com o sobrenome da nossa família?
O Diogo falou com você sobre registrar o meu neto, ou
não?
Fico alarmada, sei que mentimos sobre o filho ser
dele, mas isso seria demais.
— Eu ainda não sei — respondo quando chegamos
na sala. Herbertina está na cozinha, Diogo sentado no
sofá. — Heitor Ribeiro soa bom para mim.
— Mas ele é um Macêdo — ele retruca, mas sem
alterar o tom de voz. — Não pode privar isso dele.
— P a i — D i o g o v e m a o m e u s o c o r r o . — Va m o s
resolver isso depois. O Heitor ainda é um bebê e eu estou
aqui, não vou a lugar algum.
Ve j o o s e m b l a n t e d e l e m u d a r, c o m o s e n ã o e s t i v e s s e
d e a c o r d o c o m o q u e o f i l h o a c a b o u d e f a l a r.
— Olha, eu não sei como foi o envolvimento de
vocês e o que aconteceu — Humberto fala com o cenho
franzido. — Eu só sei que aquele bebê sendo meu neto,
ele vai ser registrado com o sobrenome da família.
— Pai...
— Eu vou indo — volta a falar interrompendo
D i o g o . — E s p e r o o s d o i s a m a n h ã à s 2 0 h . Tc h a u M a r i n a ,
Herbertina!
— Tc h a u s r. H u m b e r t o — e l a o a c o m p a n h a a t é a
porta e fica parada. Então, segundos após a saída, ela se
volta para a gente. — Querem me explicar o que está
acontecendo? O caminho todo ele veio falando sobre o
neto, mas eu pensava que ele sabia quem é o verdadeiro
pai dele.
— O Igor deu a entender que eu sou o pai do Heitor
— Diogo fala olhando somente para ela. — Sustentei a
mentira para proteger a Marina e o bebê.
— Mas meu filho, seu gesto é lindo — ela murmura
levando a mão ao rosto. — Só que se descobrirem que
mentiu pode até se prejudicar no seu trabalho.
Assim que ela fala aquilo, eu penso à respeito. Eu
tinha pensado sobre os pais dele descobrirem, nunca me
passou na cabeça que poderia prejudicá-lo no trabalho.
S e i s s o a c o n t e c e r, v o u m e s e n t i r m a i s c u l p a d a .
— Diogo...
— Vo c ê q u e r i r a o j a n t a r ? — e l e m e i n t e r r o m p e c o m
os braços cruzados e a feição séria. — Os jantares da
minha mãe são extravagantes — avisa. — Se quiser ir
precisa comprar uma roupa para ocasião, caso não tenha.
Eu quero muito conversar com ele, mas não quero
fazer na frente de Herbertina.
— Eu acho que não tenho.
— D o n a H e r b e r t i n a — D i o g o a c h a m a . — Tu d o b e m
a senhora nos acompanhar depois do almoço?
— Claro — afirma, e então o vejo acenar com a
cabeça e sair da sala. Ele segue em direção ao corredor e
suspeito que vai para a sala de musculação. — O que
aconteceu com vocês?
— Nada — apenas digo, não quero falar com
Herbertina sobre o que aconteceu entre mim e Diego. —
Estou com um pouco de dor de cabeça — minto, só quero
ficar no quarto sozinha. — Eu vou deitar um pouco, tudo
bem?
— Tu d o b e m — a s s i m q u e p a r o e m s u a f r e n t e , e l a
m e t o c a a b o c h e c h a . — Va i d a r t u d o c e r t o . V á d e s c a n s a r,
quando o almoço estiver pronto eu aviso.
Me afasto dela e assim que passo pela porta ao lado
do meu quarto, penso em Diogo. Me abraço e entro no
meu, vou até o berço só para confirmar que Heitor ainda
dorme. Ele bem poderia ficar acordado pelo dia e dormir
só a noite. Sorrio com esse pensamento.
Deito no meio do colchão e fico alguns minutos
olhando para o teto. Na noite passada, quando fui beijada
por Diogo, senti algo que até então estava adormecido.
Hoje quando ele me beijou mais uma vez, e foi
totalmente recíproco, eu me imaginei propondo uma
alternativa para suprir nossos desejos. Afinal, meu corpo
entra em ebulição só de imaginar estar nos braços de
Diogo.
Por isso falei sobre entender que ele precisa se
a l i v i a r, p o r q u e e u t a m b é m p r e c i s o . M a s p e l o j e i t o , e l e
e n t e n d e u t u d o e r r a d o e n e m s e q u e r m e d e i x o u e x p l i c a r.
Ele jogar na minha cara o que Felipe já fez comigo e
dizer que eu o comparei à ele, me magoou bastante.
Esfrego o rosto com as duas mãos e em seguida
f e c h o m e u s o l h o s . Vo u a r r u m a r u m t e m p o e c o n v e r s a r
com Diogo, não quero que ele pense que em momento
algum me senti forçada a beijá-lo ou qualquer coisa do
tipo.
Se me entreguei a ele, foi porque eu quis.
M e v i r o n a c a m a e d e c i d o c o c h i l a r.
Estou sentada atrás do carro, observando Diogo
p e l o r e t r o v i s o r. E l e m a n t é m o s o l h o s f i x o s n a e s t r a d a , a s
mãos firmes no volante, enquanto Herbertina tenta, sem
sucesso, tenta arrancar alguma conversa dele. Suas
respostas são curtas, quase automáticas, e ele parece
mais concentrado em dirigir do que em qualquer outra
coisa.
E u s u s p i r o , s e n t i n d o a t e n s ã o n o a r. D e s d e a n o s s a
discussão, Diogo mal olha na minha direção, e cada
s e g u n d o d e s s e s i l ê n c i o e n t r e n ó s é u m a t o r t u r a . H e i t o r,
alheio a tudo isso, dorme tranquilamente na cadeirinha,
seu rostinho sereno, aliviando um pouco o peso no meu
peito. Mas não o suficiente para afastar meus
p e n s a m e n t o s d o q u e e s t á p o r v i r.
O jantar na casa dos pais do Diogo já seria tenso o
bastante por si só, mas a presença de Felipe transforma
tudo em um campo minado. O que ele vai pensar quando
me ver? Ele terá coragem de fazer uma cena e afirmar
para todos que é o pai do meu filho? Sua mãe já tem uma
opinião formada sobre mim, e ela não me conhece.
Eu tento imaginar como será, mas cada cenário
parece pior que o outro. E o silêncio de Diogo só faz
m i n h a m e n t e c o r r e r a i n d a m a i s r á p i d o . Te n t o m e
concentrar em algo, qualquer coisa, para afastar essa
angústia crescente. Observo as ruas passarem pela janela,
as lojas e pessoas, e tento imaginar que essa é apenas
uma tarde comum, uma mãe, um pai, e uma avó indo fazer
compras para um evento de família.
Mas não consigo. Porque nada nisso é comum.
As horas se arrastam lentamente, e quando Diogo
finalmente estaciona o carro, sinto uma mistura de alívio
e ansiedade. A fachada do prédio à nossa frente parece
comum, nada de extraordinário, mas meu coração está
acelerado, como se eu estivesse prestes a entrar em um
lugar completamente desconhecido.
Diogo sai do carro sem dizer uma palavra, e eu
observo enquanto ele coloca um óculos escuros e ajeita o
boné na cabeça, puxando-o um pouco para baixo, como se
quisesse se esconder do mundo. A camisa de mangas preta
contrasta com a bermuda e o chinelo de dedo, um visual
despreocupado que não combina com a tensão que paira
n o a r.
Herbertina, sempre atenciosa, desce rapidamente e
abre a porta para mim, sorrindo de leve, talvez tentando
aliviar um pouco o clima. Eu agradeço com um aceno,
forçando um sorriso, mas sinto o peso do momento me
p u x a n d o p a r a b a i x o . Te n t o m a n t e r a c a l m a , l e m b r a r q u e
estou aqui para uma tarefa simples — comprar uma roupa
para o jantar de amanhã. Mas é impossível ignorar que
esse jantar será tudo, menos simples.
Saio do carro e dou um passo para o lado. Antes
q u e e u p o s s a m e i n c l i n a r p a r a b u s c a r H e i t o r, D i o g o o f a z .
Cuidadosamente, ele solta os fechos da cadeirinha, e o
pega com uma delicadeza que contrasta com o jeito duro
que ele tem me tratado há algumas horas. Heitor
resmunga, ainda meio sonolento, mas Diogo parece saber
e x a t a m e n t e o q u e p r e c i s a f a z e r.
Fico um momento parada, observando aquela cena.
É estranho como, mesmo com a distância entre nós, ver
Diogo com Heitor me provoca uma mistura de
sentimentos — admiração, carinho, e uma pontada de
tristeza. Ele é tão protetor com o meu bebê, tão presente,
que às vezes me pergunto como seria se as circunstâncias
fossem diferentes.
E inevitavelmente, e imagino um cenário de família
feliz. Com Diogo participando de tudo, sendo um pai
p r e s e n t e e a m o r o s o p a r a H e i t o r, e u m m a r i d o c a r i n h o s o e
generoso comigo. Estou sonhando muito?
Herbertina, que já está na calçada, olha para trás e
sorri para mim, esperando que eu a siga. Eu balanço a
cabeça, como se quisesse afastar os pensamentos, e
caminho em direção a eles. Heitor está acordado agora, e
s e u s o l h o s c u r i o s o s o b s e r v a m t u d o a o r e d o r, e n q u a n t o
Diogo pega a bolsa e fecha a porta do carro com uma das
m ã o s , s e m s o l t a r o H e i t o r.
— Va m o s ? — H e r b e r t i n a p e r g u n t a , c o m o m e s m o
sorriso caloroso de antes. Eu apenas assinto, e seguimos
em direção à entrada do prédio. — Já pensou o que vai
querer?
— Sinceramente, não. — murmuro e olho para
D i o g o q u e c a m i n h a a o n o s s o l a d o . — Ta l v e z u m v e s t i d o ?
— Mas precisa ser um vestido bonito — retruca e
me puxa para a primeira loja. — Qual a sua cor
preferida?
— Não tenho cor preferida — respondo e olho para
trás, Diogo está parado nos olhando. — Quer me dar ele?
— Va i c o n s e g u i r p r o v a r r o u p a s e g u r a n d o e l e ? — e l e
indaga sem o mínimo de paciência.
Respiro fundo e me aproximo dele. Diogo é bem
mais alto que eu, o que é uma tarefa olhar para cima e
encará-lo, mesmo assim o faço.
— Va i m e t r a t a r c o m g r o s s e r i a a g o r a ? — p e r g u n t o ,
ficando em sua frente. — Está sendo bem infantil e mal-
educado.
Diogo me observa por alguns segundos, e quando
penso que vai me dar as costas ou ser mais grosseiro, ele
acena.
— Te m r a z ã o , m e d e s c u l p e .
A c e i t o e d e s v i o m e u o l h a r. Q u e r o p o d e r u s a r e s s e
momento para falar com ele, mas é um assunto tão
delicado para ser abordado dentro da loja.
— Diogo...
— Marina! — Herbertina me chama, me viro para
ela. — Olhe esse vestido.
Ela aponta para um que está no manequim. O tom é
um verde mais escuro, acho bonito, mas talvez no meu
corpo não vá ficar bonito. Meu corpo não voltou ao
normal, ainda tenho uma barriguinha arrebitada e não sei
q u a n t o t e m p o d e m o r a p a r a d e s i n c h a r. M e a p r o x i m o d o
vestido e o toco, o tecido é uma delícia.
— Posso ajudá-las?
Sorrio para a atendente que se prosta ao nosso lado.
— Pode sim, meu anjo. — Herbertina sorri educada.
— Queremos um vestido para um jantar na casa dos
sogros.
Herbertina pisca para mim e acompanhamos a
atendente que nos leva até uma outra parte com mais
vestidos. Olho para trás a procura de Diogo, só para vê-
lo conversando com uma atendente que sorri para ele.
Franzo o cenho para a cena, que me deixa com uma
sensação ruim. Espero o momento que ele vá encerrar
com a conversa, mas ele parece empenhado em manter um
diálogo.
— Qual o seu número? — olho para a atendente.
— 38, mas eu acabei de ter um bebê.
— Mesmo? — ela me olha por inteiro. — Nem
parece, você está ótima! — sorrio educada, era óbvio que
e l a e s t á s e n d o g e n t i l . — Vo u p e g a r d u a s n u m e r a ç õ e s e
você veste e me diz o que achou.
— Tu d o b e m .
Vo l t o n o v a m e n t e o o l h a r p a r a D i o g o e o e n c o n t r o
s o z i n h o . Va s c u l h o o l u g a r e m b u s c a d a m u l h e r q u e e s t a v a
conversando com ele, e a encontro em frente a uma
prateleira de sandálias. Ela separa três pares e em
seguida vem em minha direção. Assim que para na minha
frente, ela sorri para mim.
— O seu marido me pediu para trazer opções para
você.
Quase sorrio só pelo fato dela saber que ele é meu
marido, mas logo me sinto envergonhada com meus
pensamentos e reação. Inconscientemente meu olhar
procura o de Diogo, e dessa vez, ele está sem o óculos.
Um maldito sorriso de lado está sendo direcionado a
mim, mas o ignoro.
Com a volta da primeira atendente, finalmente
presto atenção no vestido que ela traz. Um verde escuro
estilo midi, pego os dois e dentro da cabine, visto
primeiro o meu tamanho normal. Assim que ajeito meus
seios nele, dou um passo para trás e me analiso. Não está
tão apertado como achei que ficaria, mas evidencia minha
barriga. Fico de lado e mesmo sem estar no meu corpo
normal, me achei bonita.
Saio da cabine e me mostro para Herbertina que me
sorri.
— Vo c ê e s t á l i n d a ! E o d e c o t e n ã o f i c o u m u i t o
grande.
— Até que estou mesmo — murmuro e viro de
costa. Assim que volto para Herbertina, vou até o assento
ao seu lado e me sento. — E ele não está me matando
quando me sento.
— Esse está muito lindo, Marina — Herbertina
reforça e aponta uma das sandálias. — Qual dessas?
Pego a que tem a tira fina, mas o salto grosso. O
calço e fico de pé. Herbertina solta os meus cabelos e os
joga para frente.
— Muito linda! — a atendente afirma. — Que tal
uma bolsa pequena?
— Não, obrigada. — nego rapidamente. Entramos
na loja, mas nem se quer o preço perguntei. Pelo
ambiente gritar elegância, tenho noção de que pode ser
bem caro. — Serão apenas esses. Pode me dizer quanto
ficou?
— Vo u v e r i f i c a r, s ó u m m o m e n t o .
Ti r o o s s a l t o s e e n t r o n a c a b i n e p a r a t i r a r a r o u p a , e
colocar a minha. Não demoro muito, mas quando saio
vejo Herbertina com Heitor nos braços.
— Cadê o Diogo?
— Está pagando — avisa e eu apenas aceito. Me
sento ao lado dela, e beijo a cabeça do meu bebê. —
Quando chegar em casa quero saber o que aconteceu com
vocês dois.
A olho alarmada e nego com a cabeça.
— Não aconteceu nada, dona Herbertina.
— Marina — ela para e solta um suspiro. — Eu
conheço o Diogo desde que ele era pequeno. Sei das
coisas que ele gosta, e o que não gosta. Sei quando ele
está chateado com algo, ou quando está apenas normal do
dia a dia e eu posso dizer com toda certeza de que ele
está chateado. — Sua afirmação me deixa sem jeito. —
Vo c ê s b r i g a r a m ?
— É complicado — murmuro e quando ela pensa em
tentar mais uma vez.
Ve j o D i o g o s e a p r o x i m a r c o m o s e m b l a n t e s é r i o , e a
bolsa do Heitor no ombro. Aquilo me tira um sorriso. Ele
franze o cenho, e assim que para em minha frente, me
entrega as sacolas.
— Em qual loja agora? — indaga e volta a segurar
H e i t o r. A q u e l a c e n a é a m i n h a f a v o r i t a s e m d ú v i d a s
alguma.
Percebo que ele espera uma resposta, e então eu
presto mais atenção no que ele perguntou.
— Podemos voltar para a sua casa — falo enquanto
vamos para fora da loja. — Era só isso que eu precisava.
— Mas você tem maquiagens e essas coisas para
ajeitar os cabelos? — dessa vez é Herbertina que
questiona.
— Na realidade, eu tenho — respondo sentindo o
braço dele abraçar o meu. — Mas ficou na dos meus pais,
e m S a n t i a g o d o S u l . E u n e m p e n s e i e m p e g a r, s ó a l g u m a s
roupas.
— Então acho melhor comprar — ela retruca. — A
dona Adriana, vai reparar em você dos pés a cabeça.
Um pouco assustada, procuro Diogo, ele está muito
o c u p a d o o l h a n d o a o r e d o r.
— O que foi? — pergunto a ele que me olha, e
balança a cabeça. — De qualquer forma, dona
Herbertina... acho que ela não gosta de mim.
— Ela é um pouco difícil — avisa e aponta para
uma outra loja mais a frente. — Então não deixe que ela
te intimide.
Entramos na segunda loja e vamos para a parte dos
cosméticos. Herbertina pega uma cestinha e escolhemos o
q u e l e v a r. E l a m e f a l a q u e D i o g o c o m H e i t o r, e s t á
chamando a atenção de algumas mulheres. Assim que me
viro, o vejo sorrir educado para uma mulher loira bem-
v e s t i d a . N ã o s e i e x p l i c a r, m a s q u a n d o d o u p o r m i m , e s t o u
me aproximando deles. Paro ao lado de Diogo e me
inclino beijando-o perto dos lábios, sua barba fazendo
cócegas em mim. Ele apenas me olha e segundos depois,
arqueia o canto da boca.
Me volto para a mulher que me sorri, claramente
falsa.
— Não estou atrapalhando, não é? — dou um
sorriso forçando, mas tentando ser o mais educada
possível.
A mulher me encara dos pés a cabeça.
— Vo c ê d e v e s e r a m ã e d e s s e l i n d o b e b ê .
Noto seu desdém, e me seguro para não ser
grosseira.
— A própria — afirmo e passo o braço, agarrando o
de Diogo. — Precisa de ajuda com algo?
— Não, linda. Só estava falando com o... — ela
para e olha para Diogo, em uma tentativa falha para dizer
seu nome.
— M e u m a r i d o ? — c o m p l e t o , e e l a v o l t a a m e o l h a r.
Ok. Sei muito bem que estou parecendo uma louca,
tendo ciúmes de alguém que não é realmente meu marido
ou namorado. Porém, como fazer esse sentimento ruim
passar?
— Isso. Só estava falando para o seu marido, que o
bebê de vocês é lindo.
S o r r i o e a o b s e r v o i r. Q u a n d o e l a s e a f a s t a o
bastante, me viro para Diogo.
— P o d e , p o r f a v o r, n ã o d e i x a r e s s a s a s s a n h a d a s
perto do meu bebê?
Para a minha surpresa, Diogo ri e ajeita Heitor nos
braços. Ainda me olhando ele o levanta, e aponta o dedo
para mim.
— Ve j a a s u a m ã e m o r r e n d o d e c i ú m e s e u s a n d o
você como laranja.
A b r o a b o c a p a r a r e t r u c a r, m a s f i c o s e m r e a ç ã o
q u a n d o D i o g o s o r r i e b e i j a a b o c h e c h a d e H e i t o r. M e u
coração bobo falha uma batida com ele sendo tão
c a r i n h o s o c o m o m e u b e b ê . M e p e r m i t o s o r r i r, m a s l o g o
sinto o rosto esquentar quando percebo o que estou
f a z e n d o . D e s v i o o o l h a r, t e n t a n d o e s c o n d e r o s o r r i s o
b o b o q u e i n s i s t e e m a p a r e c e r.
— N ã o é c i ú m e s . . . — c o m e ç o a d i z e r, m a s m i n h a
voz sai mais fraca do que eu gostaria.
— Claro que não — Diogo responde, com um tom
de voz divertido, claramente não acreditando. Ele
balança Heitor levemente, como se estivesse brincando
com ele, mas seus olhos permanecem fixos em mim,
avaliando cada reação minha.
Sinto uma mistura de irritação e constrangimento.
Por que ele tem que ser tão... encantador quando quer? E
p o r q u e i s s o m e a f e t a t a n t o ? Te n t o m e c o n c e n t r a r e m
qualquer outra coisa, mas é difícil ignorar a forma como
ele segura Heitor com tanta naturalidade, como se sempre
tivesse feito parte de nossas vidas.
— Eu só não gosto que estranhos fiquem muito
próximos dele — insisto, tentando soar mais firme. — É
uma questão de segurança.
Diogo arqueia uma sobrancelha, claramente se
divertindo com a situação.
— Ah, entendi. Então você está preocupada com a
segurança dele, não com... — ele faz uma pausa, como se
estivesse escolhendo as palavras — ... as assanhadas
perto de mim? Palavras suas, não minha.
Eu reviro os olhos, mas não consigo evitar o sorriso
que aparece em meus lábios.
— Estou pedindo demais? Não quero gente estranha
perto dele.
Ele ri novamente, um som profundo e genuíno que
faz meu coração acelerar mais uma vez. Nem parece que
estava chateado comigo.
— Tu d o b e m — e l e a d m i t e , a i n d a s o r r i n d o . — N ã o
v o u p e r m i t i r.
— Obrigada. — agradeço e dou as costas a ele.
Assim que paro em frente a dona Herbertina, noto seu
olhar confuso e braços cruzados. — Acho que só vou
levar isso.
Ela olha para Diogo e em seguida para mim. Engulo
em seco e balanço a cestinha.
— Estranho — murmura e segue em direção ao
caixa.
A p ó s D i o g o p a g a r, a n d a m o s m a i s u m p o u c o e e u
f i c o e n c a n t a d a c o m a q u e l e s h o p p i n g . Tu d o é p e q u e n o ,
mas tão aconchegante e bem-organizado. Heitor começa a
se agitar nos braços de Diogo, chamando a minha
atenção. Diogo imediatamente tenta o acalmá-lo falando
com ele em um tom suave, quase sussurrado. Meu coração
já está completamente rendido para a cena. Sinto um
calor estranho no peito e tento afastar o pensamento, mas
é difícil não imaginar como seria se essa cena fosse real,
s e D i o g o r e a l m e n t e f o s s e o p a i d e H e i t o r.
— Melhor verificar se ele está com muito xixi —
dona Herbertina fala e eu aceno.
Pego o meu bebê e ando com ela ao meu lado até o
banheiro. A placa do fraldário está mais a frente, assim
que paramos na porta, Diogo me entrega a bolsa e espera
do lado de fora.
Estou encostado em uma coluna de mármore no
s h o p p i n g , o b s e r v a n d o o m o v i m e n t o a o m e u r e d o r, m a s
minha atenção está dividida. Marina e dona Herbertina
e s t ã o n o f r a l d á r i o t r o c a n d o o H e i t o r, e e n q u a n t o e s p e r o ,
sinto aquele incômodo familiar de estar sendo observado.
Te n t o p a r e c e r r e l a x a d o , m a s m e u s s e n t i d o s e s t ã o e m
alerta.
Entre o vai e vem de pessoas, percebo algo
estranho. Um sujeito, de casaco preto e boné, está a
poucos metros de distância. Ele parece desinteressado,
mas seus olhos varrem o lugar com mais atenção do que o
necessário. Quando nossos olhares se cruzam por um
segundo, ele desvia rapidamente. Aquele instinto que
desenvolvi ao longo dos anos me diz que tem algo errado.
Finjo que não percebi nada, mas o peso do olhar
d e l e c o n t i n u a s o b r e m i m . E l e c o m e ç a a s e a f a s t a r,
m i s t u r a n d o - s e n a m u l t i d ã o . N ã o p o s s o d e i x a r p a s s a r.
Mantenho minha postura descontraída enquanto me afasto
da coluna e sigo na direção que ele foi.
Alguém esbarra em mim, e eu lanço um olhar
r á p i d o , a v a l i a n d o s e é a l g o p a r a m e p r e o c u p a r, m a s é s ó
um garoto correndo, seguido pela mãe, que pede
desculpas.
O shopping está lotado, o que complica minha
visão. Ele não está correndo, mas acelera o passo,
t e n t a n d o s e m i s t u r a r. F a ç o o m e s m o , p a s s a n d o p o r e n t r e
as pessoas com cuidado para não chamar atenção. Ele
vira uma esquina, e eu acelero, mas quando chego lá, ele
desapareceu.
Merda. Paro por um momento, tentando captar
qualquer sinal dele, mas é inútil. O cara simplesmente
s u m i u . F i c o p a r a d o , o l h a n d o a o r e d o r, a v a l i a n d o a s s a í d a s
m a i s p r ó x i m a s . Te n t o a n a l i s a r a s i t u a ç ã o , m a s e l e f o i
esperto, conhecia o lugar melhor do que eu.
Solto um suspiro pesado e volto, ainda de olho em
qualquer movimento suspeito. Quando chego perto do
fraldário, a porta se abre e Marina sai com Heitor nos
braços, seguida por dona Herbertina. Elas não percebem
nada do que aconteceu. Marina me vê e sorri, aquele
sorriso tranquilo que sempre consegue desarmar qualquer
tensão que eu esteja sentindo.
Pego a bolsa que dona Herbertina me entrega, os
olhos ainda escaneando o ambiente, procurando qualquer
sinal de perigo. Mas, por enquanto, parece que o risco
passou. Não gosto de não ter controle sobre essas
situações, e o fato de ter perdido o cara me deixa
inquieto.
— Podemos ir? — indago, tentando esconder o que
a c a b o u d e a c o n t e c e r.
Marina desfaz o sorriso e concorda. Mesmo
q u e r e n d o m u i t o , n ã o p e g o H e i t o r, p o i s q u e r o p o d e r e s t a r
c o m o s b r a ç o s l i v r e s c a s o p r e c i s e a g i r. E m a l e r t a , m a s
transparecendo naturalidade, ando um pouco afastado das
duas. Abro as portas da caminhonete e ajudo as duas a
subirem. Assim que estão acomodadas nos assentos, eu
f e c h o a s p o r t a s e o l h o m a i s u m a v e z a o r e d o r.
Antes de ir para o lugar do motorista, começo a
circular ao redor da caminhonete. Meus olhos percorrem
c a d a c e n t í m e t r o , p r o c u r a n d o a l g o f o r a d o l u g a r.
Agacho perto do para-choque dianteiro, como se
estivesse apenas verificando o pneu. Passo a mão por
baixo do chassi, sentindo a textura metálica e fria. Nada
a q u i . L e v a n t o d e v a g a r, a j e i t a n d o a r o u p a , e m e m o v o p a r a
o lado do passageiro, ainda mantendo a calma.
E n c o s t o n a p o r t a , d a n d o u m a o l h a d a n o i n t e r i o r.
Tu d o p a r e c e n o r m a l . M a s j á v i r a s t r e a d o r e s p e q u e n o s o
bastante para passarem despercebidos por um bom tempo.
Pior ainda, já soube de casos onde estavam dentro do
carro. Essa paranoia constante faz parte do trabalho, e
agora, mais do que nunca, preciso seguir meus instintos.
— O que está procurando? — dona Herbertina
indaga e eu nego com a cabeça.
— Nada.
Chego na traseira da caminhonete e faço o mesmo
movimento. Desta vez, minhas mãos encontram algo
diferente. Uma pequena saliência debaixo do veículo,
algo que não deveria estar ali. Passo os dedos ao redor e
sinto um objeto preso magneticamente ao chassi. Bingo.
Disfarço o alívio com um suspiro, mas minha mente
já está a mil. Alguém colocou isso aqui, e não é
coincidência que eu tenha notado aquele cara me
seguindo. Puxo o dispositivo, sentindo o peso dele na
mão. É pequeno, discreto, mas perigoso. Olho ao redor
para me certificar de que ninguém está prestando atenção
em mim.
Levanto-me e finjo mexer no porta-malas, ainda
com o rastreador na mão. Minha mente está processando
r a p i d a m e n t e o q u e f a z e r a s e g u i r. Vo l t a r p a r a d e n t r o c o m
isso ou dar uma volta e ver quem aparece? Então me
lembro de que não estou sozinho. Praguejo e opto por não
m e p r e c i p i t a r. J o g o o r a s t r e a d o r n o c h ã o e p i s o e m c i m a .
E m s e g u i d a e n t r o n a c a m i n h o n e t e , l i g a n d o o m o t o r.
Estou em território conhecido, mas agora, mais do
que nunca, sei que não estou sozinho. A partir daqui cada
movimento tem que ser calculado. E seja lá quem estiver
t e n t a n d o m e r a s t r e a r, e s t á p r e s t e s a d e s c o b r i r q u e m e x e u
com o cara errado.
C a p í t u l o 1 2 - D i o g o

Depois de algumas horas a mais no trânsito, e


perceber que não estava sendo seguido, finalmente pude
pegar o caminho de casa. O trânsito, embora ainda lento,
e s t a v a c o m e ç a n d o a s e a l i v i a r. Q u a n d o c h e g o e m c a s a ,
ainda sinto a tensão pulsando em minhas veias. O
rastreador que encontrei na caminhonete agora é apenas
pedaços de plástico e metal, quebrá-lo foi instintivo, mas
a sensação de estar sendo observado persiste, como uma
sombra invisível. Minha mente continua girando em torno
do que aconteceu.
A operação Encruzilhada é um caso complicado,
com muitos envolvidos e interesses diversos. Meu
envolvimento é sempre mantido sob sigilo absoluto:
nomes falsos, identidades encobertas, e uma constante
vigilância para garantir que ninguém descubra quem eu
realmente sou.
Enquanto vou para o meu próprio quarto, não posso
evitar fazer a conexão. A presença do rastreador e a
perseguição inesperada têm todas as marcas de alguém
que sabe mais do que deveria sobre a operação. A
maneira como o sujeito no shopping parecia me seguir
com uma precisão quase meticulosa sugere que a minha
identidade, mesmo oculta, pode ter sido comprometida de
alguma forma.
Repasso mais uma vez o dia em que invadimos e
conseguimos pegar Juanito. Não tem como ter sido ele. O
trajeto até o departamento, ele esteve com um capuz. As
ú n i c a s p e s s o a s q u e e l e t e v e c o n t a t o f o i c o m i g o e I g o r,
que também toma cuidado com a própria privacidade.
E s f r e g o a m ã o n o r o s t o e b u s c o o c e l u l a r. D i g i t o o s
números do meu amigo e espero alguns segundos.
— Há a possibilidade de o Juanito descobrir nossas
identidades?
Ouço um resmungo e um bocejo.
— Quem é que está falando?
— I g o r ! — e x c l a m o s é r i o e o e s c u t o r i r. — E u f u i
ao shopping com a Marina, Heitor e a dona Herbertina.
Lá tinha alguém me seguindo, colocou um rastreador na
minha caminhonete. Não pode ter sido apenas
coincidência! E só consigo associar a operação
encruzilhada.
— O J u a n i t o a i n d a e s t á p re s o — I g o r f a l a c o m o
t o m m a i s s é r i o . — To m a m o s c u i d a d o q u a n t o a s n o s s a s
i d e n t i d a d e s . Ta l v e z t e n h a s i d o . . . s e i l á , t e n t a t i v a d e
assalto?
Respiro fundo e ando de um lado para o outro.
Balanço a cabeça em negação, não é isso.
— Preciso que você dê um jeito e consiga as
imagens do estacionamento do shopping da avenida. O
sujeito que me seguia usava um casaco preto e boné.
Deveria ter uns 1,70 de altura, por aí, magro. Deve ter
sido ele que colocou.
— Vo u v e r o q u e c o n s i g o e t e i n f o r m o .
Olho no horário do celular e marcam 18h10.
— Vo c ê j á e s t á e m c a s a ?
— É c l a ro ! E s t a v a d o r m i n d o , então sinta-se
privilegiado por eu ter atendido.
Solto um suspiro e me sento na cama.
— Ve j a i s s o , I g o r, e p o r f a v o r, t o m e c u i d a d o a
partir de agora.
— N ã o s e p re o c u p e — p e d e , m a s é e m v ã o . A g o r a
me sinto preocupado com a segurança de todos ao meu
r e d o r. — D i g a a M a r i n a q u e m a n d e i u m o i , a i n d a v o u
l e v a r m e u p re s e n t e p a r a o m e u s o b r i n h o c a r a d e j o e l h o .
— Tc h a u , I g o r.
Encerro a chamada e me deito com os braços
abertos. Preciso resolver isso o quanto antes, pois agora
t e n h o M a r i n a e H e i t o r. E n t ã o c o m o s e p a r a c o n f i r m a r, e l e
c o m e ç a a c h o r a r, f i c o a l i p a r a d o a p e n a s o u v i n d o . N o
entanto, quando o choro persiste, eu vou ao seu socorro.
Tê-lo em meus braços, foi e é o sentimento mais puro que
já experimentei na vida.
Saio a passos rápidos do meu quarto e vou para o
de Marina. A porta está encostada, então eu a empurro.
Para a minha surpresa, Marina está sentada na cama,
enquanto Heitor mama com avidez.
— Desculpa — peço e logo quero sair dali. — Eu
o u v i e l e c h o r a r, p e n s e i q u e e s t a v a n o b a n h o .
— Espera! — ela pede, tentando manter a voz
calma, mas noto a inquietação na sua expressão. — Entra,
por favor!
Ela me observa por um instante, como se pudesse
v e r a t r a v é s d a f a c h a d a q u e e s t o u t e n t a n d o m a n t e r. S o l t o
um suspiro, mas acabo cedendo. Fecho a porta e me
aproximo, sabendo que não posso mais evitar essa
conversa.
— Se for pelo que aconteceu mais cedo... —
começo, mas ela me interrompe antes que eu possa
t e r m i n a r.
— Vo c ê i n t e r p r e t o u e r r a d o — e l a d i z , c o m u m a
firmeza que me pega de surpresa. Fico sem entender no
momento. — Eu não o comparei com o Felipe. Jamais
faria isso! — afirma, e por dentro, eu respiro fundo,
aliviado por ouvir isso, mas ao mesmo tempo ansioso
p e l o q u e v e m a s e g u i r. — E u s ó f a l e i a q u i l o p o r q u e
queria propor uma alternativa, mas você interrompeu
minha linha de raciocínio e me ignorou.
Marina termina de falar e mantém seus lindos olhos
em mim, esperando uma resposta. Ela está sendo direta, e
a s i n c e r i d a d e e m s u a v o z m e a t i n g e e m c h e i o . Te n t o
processar suas palavras, revendo mentalmente nossa
última conversa, onde claramente deixei minhas emoções
falarem mais alto.
A ideia de ser comparado a Felipe, mesmo que por
um segundo, realmente mexeu comigo de um jeito que
n ã o c o n s i g o e x p l i c a r. M a s a g o r a , v e n d o M a r i n a t ã o
determinada em esclarecer as coisas, percebo que talvez
eu tenha sido rápido demais em tirar conclusões.
Envergonhado, me lembro do que falei para ela.
— Eu... — começo, hesitando por um momento
enquanto encontro as palavras certas. — Me perdoe pelo
que falei na sala — peço, sentindo a tensão diminuir ao
finalmente reconhecer meu erro. — Não queria ter
magoado você como magoei.
— Va m o s e s q u e c e r i s s o — m u r m u r a e m e o b s e r v a .
— Não queria acreditar que você estava se
entregando para mim por obrigação.
Ela balança a cabeça, o olhar arregalado, quase
como se estivesse surpresa.
— Eu quis e quero me entregar a você — afirma e
eu sorrio. Carinhosamente a toco na bochecha, como quis
f a z e r h o j e m a i s c e d o . — Ta l v e z e u d e m o r e a l g u n s m e s e s
para voltar ao meu corpo normal — avisa e percebo que
está sem jeito. — Por isso também que mencionei o
tempo da minha recuperação.
— Não se preocupe, Marina. — minha voz soa
calma, transparecendo como me sinto agora depois de
tudo esclarecido. — Eu nunca forçaria você a nada.
Entendo perfeitamente que precisa do seu tempo, e eu
vou respeitar isso.
— Obrigada.
Marina me sorri, e eu a toco no queixo.
— E não precisa ficar com vergonha — digo para
ela que prende o sorriso. — Para mim você é a mulher
mais linda que já conheci.
Heitor resmunga chamando a nossa atenção, e solta
o peito. Marina o cobre e ajeita Heitor em pé.
— Para quem estava se esperneando de tanto chorar
— ela comenta e me olha. — Ele não mamou muito.
— Que pena — falo sem tirar meus olhos dela. —
Eu não desperdiçaria.
— Diogo! — Marina tem as bochechas vermelhas,
isso me arranca mais um sorriso.
Ela continua dando uns tapinhas nas costas do
H e i t o r, a t é q u e e s c u t o o a r r o t o .
— Isso foi ele? — questiono, surpreso, ao ouvir um
som audível q u e p a r e c i a t e r v i n d o d e H e i t o r. M a r i n a
acena com um sorriso, e eu não posso deixar de
comentar: — Um grande arroto.
No entanto, enquanto olho para ele tranquilamente
aninhado nos braços dela, uma memória me vem à mente.
— A l i á s , q u a i s a l t e r n a t i v a s ? Vo c ê n ã o d i s s e , s ó m e
deixou curioso.
Seu olhar desvia do meu, mas eu rapidamente a
direciono de volta para mim. O desejo de entender a
solução que ela mencionou é forte, e eu não consigo
d e i x a r p a s s a r.
— Eu não vou dizer aqui — nega com a cabeça,
tentando evitar o olhar que eu fixei nela. — Não com o
meu bebê ouvindo tudo.
Sorrio com a desculpa dela, achando-a adorável, e
a r q u e i o u m a s o b r a n c e l h a , d e s a f i a d o r.
— Te n h o c e r t e z a d e q u e e l e n ã o v a i s e l e m b r a r —
comento, rindo um pouco. — E então?
Ela sorri, mas há uma ligeira nota de diversão em
seus olhos, misturada com um toque de mistério.
— Ele não vai, mas eu vou. Depois eu te falo. — a
p r o m e s s a n o t o m d e l a m e f a z s o r r i r. — A g o r a v a i —
m a n d a e s e l e v a n t a d a c a m a . — Vo u a p r o v e i t a r q u e e l e
está cochilando e vou tomar banho.
A o t e r m i n a r d e f a l a r, a o b s e r v o d e p o s i t a r H e i t o r
dentro do berço.
— Não vai mesmo me falar?
E l a m e o l h a , c o m o s e e s t i v e s s e t e n t a n d o s e d e c i d i r.
P a r a o m e u a z a r, e l a n e g a c o m a c a b e ç a , e g e s t i c u l a p a r a
e u s a i r d o q u a r t o . A c e n o e a n t e s d e s a i r, a b e i j o n o s
lábios, apenas um encostar carinhoso. Quando penso em
m e a f a s t a r, e l a m e s e g u r a p e l a b a r r a d a c a m i s e t a . A f a s t o
nossos lábios, e toco meu nariz com o dela. Marina tem
um lindo sorriso, que me atinge direto no peito deixando-
o aquecido.
A beijo uma última vez e me afasto. Lanço um olhar
para o berço, só para confirmar que Heitor dorme sereno.
Saio do quarto e assim que fecho a porta atrás de
mim, dona Herbertina aparece de braços cruzados na
entrada da cozinha.
— Ve n h a a q u i . — m a n d a e e u a u t o m a t i c a m e n t e p a r o
d e s o r r i r. Vo u a t é s e u e n c o n t r o , m e s i n t o n e r v o s o , c o m o
se estivesse prestes a levar uma bronca. — Agora
explique-se.
Cruzo os braços com o semblante sério. Ela se senta
na cadeira e eu a acompanho.
— N ã o t e n h o o q u e e x p l i c a r.
— C o m o n ã o ? — r e p e t e i n c r é d u l a . — Vo c ê m e n t e
para o seu pai e fala que o Heitor é seu filho, hoje pela
manhã foi aquele clima estranho entre você e Marina,
agora você sai do quarto dela com um sorriso enorme?
A n a l i s o o q u e e l a a c a b a d e f a l a r, e p o r f i m s o l t o u m
suspiro. Me sinto confuso, como nunca me senti antes.
F i c o u n s s e g u n d o s c a l a d o , p e n s a n d o n o q u e d i z e r.
— E u n ã o s e i o q u e d i z e r, d o n a H e r b e r t i n a —
murmuro com honestidade. — Quando o Igor postou sobre
eu ser o pai do bebê, eu não gostei, porque seria uma
atenção em mim que particularmente não gosto.
— Então, meu filho? — ela franze o cenho em
minha direção. — Por que seguiu com a mentira?
— Para evitar a falação — respondo e ela assente
confusa. — O que iriam pensar dela? O que diriam de
mim? — dou de ombros balançando a cabeça. — Com
certeza haveria cochichos maldosos sobre Marina em
minha casa. — levo os dedos a têmpora. — E
principalmente para evitar que meu pai force um
casamento entre Marina e o Felipe. A senhora sabe como
meu pai é.
— Eu sei sim e sei como a sua mãe é — afirma com
a t e n s ã o n o o l h a r. — O q u e a c h a q u e e l a v a i f a z e r q u a n d o
conhecer a Marina?
— Ela não vai fazer nada — respondo convicto. —
E u n ã o v o u d e i x a r.
Ela fica uns segundos calada, apenas me
observando. Então me sorri.
— Eu não quero me intrometer na sua vida, Diogo.
Eu o conheço desde que era uma criança — sorri e
estende a mão até tocar na minha. — Eu acho lindo tudo
o que está fazendo, me sinto extremamente orgulhosa por
ser um homem de um coração tão bom. Eu só fico
preocupada com você e com a Marina.
— Como assim?
Dessa vez ela faz um barulho com a boca, e cruza
os braços.
— Vo c ê m e v ê v e l h a e a c h a q u e e s t o u b o c ó ?
— Não, jamais pensei isso da senhora. — respondo
rápido, ela sorri me fazendo entender que era uma
brincadeira a pergunta. — O que a senhora está falando?
— Nada, filho. — ela balança a cabeça. — Só tome
cuidado, a Marina é uma menina maravilhosa, doce,
educada, bonita..., mas você sabe que ela já sofreu
bastante nas mãos do seu irmão. Ela não precisa de mais
problemas e nem você.
Concordo lentamente, as palavras me atingem me
deixando triste. Entendo o que dona Herbertina está
falando, mas sinto que é um pouco tarde para tal
conselho. É como se eu tivesse mergulhado de cabeça em
um novo sentimento. Um que eu nunca senti. Afinal, já
tive sim com outras mulheres, mas quando o assunto é
M a r i n a . Tu d o é d i f e r e n t e .
— Eu só quero o bem dos dois — aviso após um
s u s p i r o . — E u s ó n ã o p o s s o i g n o r a r i s s o . — p a r o d e f a l a r,
mas logo continuo: — Parece que finalmente estou
acordado, vivo...
Herbertina está visivelmente surpresa, seu olhar
completamente emocionado.
— Ve m c á — m e c h a m a e f i c a d e p é c o m o s b r a ç o s
abertos. — Me dá um abraço.
Demoro uns segundos para ficar de pé, mas assim
que o faço, ela vem até mim. Os braços franzinos, mas
tão calorosos rodeiam minha cintura. Sinto as mãos
passearem carinhosamente por minhas costas, um gesto
a c o l h e d o r. S i n t o v o n t a d e d e m e a b r i r m a i s , f a l a r c o m o m e
sinto em relação a ela, depois de tantos anos ainda
cuidando de mim.
— Saber isso me deixa com o coração mais calmo
— fala e assim que se afasta, me toca o rosto. — Rezo
t a n t o p a r a q u e v o c ê s e j a f e l i z . E u t e a m o t a n t o , f i l h o . Ve r
sua felicidade é o meu maior presente.
— Por que está falando assim? — franzo o cenho
sentindo um medo repentino. — Não está doente, ou está?
Ela ri e se afasta.
— A minha saúde é de ferro — murmura
brincalhona. — Sei que não sou sua mãe de verdade, mas
amo você como se fosse. Não posso falar isso?
Sem jeito, eu desvio nossos olhares e aceno.
— Eu vou tomar banho.
— Antes de ir — me toca o braço. — Pode chamar
um carro para minha casa? Preciso ver se está tudo bem
por lá, se o Bernardinho precisa de algo.
— Eu levo a senhora — falo e me lembro de hoje a
t a r d e . — Vo u s ó b u s c a r u m a c o i s a n o q u a r t o .
— N ã o p r e c i s a — n e g a m e f a z e n d o p a r a r. — Vo c ê
passou o dia dirigindo.
— Nada disso — retruco e gesticulo com a mão. —
Me espere.
Saio da cozinha e a passos rápidos vou para o
quarto. Me encaminho até a cômoda de madeira, e na
t e r c e i r a g a v e t a b u s c o m i n h a p i s t o l a p e s s o a l . Ve r i f i c o o
carregador municiado, e a travo, em seguida escondo por
dentro do cós da bermuda sob a camisa.
A s s i m q u e s a i o n o c o r r e d o r, v e j o d o n a H e r b e r t i n a
se despedindo de Marina e afirmando que amanhã volta.
Me perco no vestido que Marina usa, marcando com
perfeição suas curvas.
— Eu volto logo — aviso para ela que acena. —
Não permita a entrada de ninguém na minha ausência. Ao
lado do painel, na parede da sala, tem um botão
vermelho. Aperte-o se acontecer alguma coisa.
— Está tudo bem, Diogo — ela sorri me fazendo
engolir em seco. — Não vou abrir a porta e nada vai
a c o n t e c e r. — a o b s e r v o j u n t a r a s m ã o s e m f r e n t e a o
corpo. — Até amanhã, dona Herbertina.
— Até minha filha — as duas se abraçam. — Não
posso ficar sem ir em casa.
— Eu entendo — Marina murmura com um pequeno
s o r r i s o . — E s t a r e m o s a q u i e s p e r a n d o a s e n h o r a v o l t a r.
Ve j o H e r b e r t i n a a c e n a r e a n d a r e m d i r e ç ã o a s a í d a .
A acompanho, mas logo paro e me volto para Marina.
— Eu vou deixar anotado o número do meu celular
perto do telefone.
Marina me sorri abertamente e concorda. Reprimo a
vontade de beijá-la, afinal, Herbertina ainda está na
p o r t a n o s o l h a n d o . Vo u a t é o t e l e f o n e e a n o t o n o b l o c o d e
recados. Após isso me dirijo até a saída.
C a p í t u l o 1 3 – M a r i n a

Sozinha e na intenção de esperar Diogo, me sento


n o s o f á e l i g o a T V. I n e v i t a v e l m e n t e , s o r r i o a o l e m b r a r
da nossa conversa no quarto. Saber que tudo está
esclarecido traz um alívio gostoso no peito. Não sei
e x p l i c a r, m a s p r e c i s o a d m i t i r q u e D i o g o t e m d e s p e r t a d o
algo em mim. Há anos não me sinto assim, tão viva e
cuidada.
É como se, de repente, eu tivesse voltado a ser uma
versão de mim mesma que havia esquecido. Uma parte
que acredita que merece ser ouvida, protegida, que pode
c o n f i a r e s e a b r i r. E s s e s e n t i m e n t o é a o m e s m o t e m p o
estranho e reconfortante, como uma chama acesa dentro
d e m i m , m e l e m b r a n d o q u e a i n d a s o u c a p a z d e s e n t i r, d e
m e c o n e c t a r, d e a c r e d i t a r e m a l g u é m .
Levo os dedos aos lábios em uma carícia suave. Ser
beijada por Diogo é algo que me deixa de pernas bambas,
uma sensação como se eu estivesse pulando de um prédio
e mergulhando em um abismo sem fim. A intensidade
desse sentimento é avassaladora, mas logo sou puxada de
volta à realidade. Acabei de ter um bebê. Minha vida
mudou completamente, e não posso me dar ao luxo de
a r r i s c a r t u d o s e m p e n s a r.
Mas, quando me lembro de como Diogo é cuidadoso
c o m H e i t o r, e s s e m e d o c o m e ç a a s e d i s s i p a r. A f o r m a
como ele segura o pequeno, como se fosse a coisa mais
preciosa do mundo, me faz ver que Diogo não está apenas
passando por nossas vidas. Ele está se tornando parte
delas. Cada gesto, cada olhar carinhoso que ele lança a
H e i t o r, f a z m e u c o r a ç ã o d e r r e t e r.
Sorrio sentindo meu peito aquecido.
Diogo não faz nada pela metade. Ele embala Heitor
com tanta paciência e dedicação, como se o bebê fosse
dele. É quase como se ele já estivesse assumindo o papel
de pai, sem precisar de palavras para isso. Essa
constatação me atinge com força. Não é apenas o jeito
c o m o e l e m e b e i j a q u e m e f a z q u e r e r a r r i s c a r, m a s a
maneira como ele está se conectando com meu filho,
m o s t r a n d o u m l a d o d e s i m e s m o q u e é t e r n o , p r o t e t o r.
Ve r D i o g o c o m H e i t o r, t ã o n a t u r a l e p r e s e n t e , m e
faz acreditar que talvez, só talvez, esse salto no escuro
n ã o s e j a t ã o a r r i s c a d o q u a n t o p a r e c e . Ta l v e z e u p o s s a
confiar nele para estar ao nosso lado, não apenas como
alguém com quem compartilho sentimentos intensos, mas
c o m o a l g u é m q u e e s t á d i s p o s t o a s e r u m p a i p a r a H e i t o r,
a cuidar de nós dois.
Essa ideia traz um misto de alívio e esperança.
Diogo já está se tornando algo mais do que eu poderia ter
imaginado, e pensar nisso faz com que o medo de arriscar
c o m e c e a p a r e c e r m e n o r, q u a s e i n s i g n i f i c a n t e .
Fecho os olhos e esfrego o rosto me sentindo
confusa com esses pensamentos. Sinto que estou me
precipitando, mas são sentimentos tão reais e intensos. O
carinho que Diogo demonstra quando está comigo, com o
meu bebê, nossos beijos, tudo parece tão verdadeiro.
Devo conversar com ele sobre isso ou apenas deixar
acontecer?
Ouço o resmungo do Heitor e me levanto indo em
direção ao quarto. Sutilmente me aproximo e o toco no
peito. O balanço por alguns minutos, e ele logo volta a
d o r m i r.
— E u a i n d a n ã o s e i o q u e f a z e r, m e u b e b ê —
murmuro baixinho. — Mas prometo que vou proteger
você para sempre.
Ajeito o mosquiteiro do berço e saio do quarto.
Olho para a sala e vejo um comercial qualquer passando
n a T V. C a m i n h o a t é l á , m a s e n t ã o m e l e m b r o q u e a i n d a h á
um pouco do mousse na geladeira. Rapidamente volto
p e l o c o r r e d o r, c o m a i n t e n ç ã o d e m e s e r v i r a n t e s q u e
Diogo volte.
A cozinha está silenciosa, e o leve som da geladeira
abrindo ecoa pelo recinto. Pego a tigela com o mousse e
sorrio. Dona Herbertina fez ele todinho para mim, aquele
cuidado e atenção, quase como uma mãe com um filho.
Me faz sentir saudades da minha mãe, ela também era
assim. Quando percebo que estou começando a ficar
triste, balanço a cabeça e vou em busca de um recipiente
para colocar da massa gelada.
Me sirvo de uma porção bem generosa, e depois de
t u d o g u a r d a d o e m s e u d e v i d o l u g a r, v o u p a r a a s a l a .
Tr o c o o c a n a l e d e i x o e m u m f i l m e d e a ç ã o . O d o c e s a b o r
s e e s p a l h a e m m i n h a l í n g u a , e m e p e r m i t o r e l a x a r.
As horas se passam, o filme termina e começa um
outro. Olho para o relógio de parede e constato que faz
mais ou menos duas horas desde que Diogo saiu. Me
levanto e vou até a pia lavar o que sujei. Enquanto faço
isso, escuto ao fundo o barulho de um automóvel e a
g a r a g e m a b r i r. S a b e n d o q u e é D i o g o , s o r r i o e t e r m i n o d e
tirar o sabão dos utensílios para em seguida enxugar e
g u a r d a r.
Estou secando as mãos quando o vejo aparecer na
porta da frente.
Continuo sorrindo para ele e sinto um comichão no
baixo ventre enquanto ele se aproxima todo sério. Com
possessividade, ele me puxa pela cintura e ataca os meus
lábios.
O m u n d o a o m e u r e d o r s e d e s f a z . Tu d o o q u e
consigo sentir é a pressão dos lábios dele contra os meus,
e o calor que começa a se espalhar pelo meu corpo como
f o g o . O t e m p o p a r e c e p a r a r, e t o d o s o s p e n s a m e n t o s
racionais desaparecem, deixando apenas o desejo
pulsante de estar mais perto.
Um braço me puxa ainda mais, e sinto o calor do
corpo dele se misturar ao meu. Meu coração bate
descontrolado, cada batida ecoando a intensidade do
momento. Ele inclina a cabeça, aprofundando o beijo, e
eu me perco completamente na sensação.
Os lábios de Diogo são firmes, mas gentis,
explorando os meus com uma urgência que faz meu corpo
i n t e i r o v i b r a r. A b a r b a r o ç a e m m e u r o s t o , m e i n s t i g a n d o
a exigir mais do beijo. Mais daquela sensação gostosa.
Meus dedos se entrelaçam em seu cabelo, puxando-o
ainda mais para mim, e um suspiro escapa de meus
lábios, intensificando ainda mais o desejo que nos
consome. O mundo poderia desmoronar agora, e eu não
n o t a r i a . Tu d o o q u e i m p o r t a é e s s e b e i j o , e s s a c o n e x ã o
avassaladora que parece capaz de destruir e reconstruir
tudo ao mesmo tempo.
A língua entrelaça com a minha em uma dança
erótica, e com mais um puxão para cima, sinto meus pés
saírem do chão. Sorrio entre o beijo, e separo nossos
lábios. Estou sendo praticamente segurada feito uma
boneca nos braços dele.
Os olhos azuis demonstram o desejo nu e cru que
ele está sentindo nesse exato momento.
— Oi — murmuro tímida, Diogo por sua vez me
s o r r i . — Vo c ê d e m o r o u .
— O trânsito esse horário é horrível. — responde, e
logo olha por cima do meu ombro. — O que está fazendo?
— Lavando o que sujei — falo, meus olhos fixos
nos lábios dele. Como era bom ser beijada por Diogo. —
Quer um pouco de mousse?
— Não — nega com a cabeça e me coloca no chão.
— E u v o u t o m a r b a n h o . Tu d o b e m p o r a q u i ?
Olho ao redor e concordo. Me sinto extasiada, louca
por mais beijos.
— Do mesmo jeito que deixou.
Sinto seus dedos me tocarem o rosto, uma carícia
suave. O jeito carinhoso como me olha agora, me deixa
completamente rendida. É cedo afirmar que quero isso?
Cedo para dizer que quero Diogo para mim, sendo meu e
um bom pai para Heitor?
— Eu volto logo.
— Podemos assistir um filme quando voltar? —
i n d a g o f a z e n d o - o p a r a r e m e e n c a r a r. — M a s s e n ã o
quiser tudo bem, eu só...
— Eu quero — me interrompe passando a mão no
cabelo. — Eu vou tomar banho.
Confirmo com um sorriso contido, mas quando ele
s e a f a s t a , d e i x o q u e m e u s o r r i s o f i q u e m a i o r. A n t e s d e
voltar para a sala, passo no quarto e verifico se Heitor
ainda dorme. Na sala, me sento no sofá e ajeito o meu
cabelo. Respiro fundo e me olho. Estou com um vestido
que usei no início da gravidez. Um que eu já tinha desde
a faculdade e que felizmente me serviu até hoje. O decote
é comportado, e como tem a regulagem na frente, consigo
sem problemas ajeitar o sutiã e meus seios.
Passo a mão mais uma vez no cabelo e então cheiro
as minhas axilas. Não sei por que estou tão nervosa, mas
é exatamente como me sinto.
Após alguns minutos, ele volta. Os cabelos estão
úmidos, ainda brilhando das gotículas de água, e ele
v e s t e u m s h o r t p r e t o e u m a r e g a t a d a m e s m a c o r. N ã o
consigo evitar que meus olhos percorram o corpo dele,
observando o contorno dos músculos sob o tecido fino.
Ele está relaxado, mas o porte atlético é inegável, e a
forma como o short e a regata moldam seu corpo só
reforça a presença marcante que ele tem.
D i o g o d á u m a o l h a d a r á p i d a n a T V, e q u a n d o s e u s
o l h o s e n c o n t r a m o s m e u s , s i n t o m e u c o r a ç ã o a c e l e r a r. A
combinação de sua aparência despreocupada com aquele
corpo musculoso e a aura de seriedade me deixa sem
palavras, atraída e um pouco intimidada ao mesmo tempo.
— O que vamos assistir? — Diogo questiona
enquanto se senta ao meu lado.
Te n t o e m v ã o c o n t r o l a r a s b a t i d a s d o m e u c o r a ç ã o .
Parece que a qualquer momento vai sair pela boca.
— Na verdade, eu não sei bem — respondo sincera.
— Não prestei atenção no começo. — ele estica o braço
deixando-o no encosto do sofá. Seu perfume é tão
delicioso, combinando perfeitamente com ele. — Diogo,
posso perguntar uma coisa?
— Claro — murmura e me olha. — O que foi?
Meu olhar percorre seu rosto, absorvendo cada
detalhe, e lentamente desce pelo pescoço, pelo peitoral
forte, até os braços enormes que ele cruza à frente do
corpo. Diogo é um homem muito bonito, não há como
n e g a r, m a s a d ú v i d a m e c o r r ó i p o r d e n t r o : e s t a r i a e l e
solteiro? Afinal, ele evitou responder quando perguntei
no hospital.
— Vo c ê s a b e q u e e u s o u s o l t e i r a — d i g o , e e l e
a c e n a c o m a c a b e ç a . — Q u e r d i z e r, e s t o u c o m p r o m e t i d a
com o meu bebê. — brinco, tentando aliviar a tensão, e o
olhar dele, antes sério, suaviza um pouco. — Mas, e
você?
— Acha que eu beijaria você caso fosse
comprometido? — ele arqueia uma sobrancelha, e de
braços cruzados, me observa com uma expressão
inquisitiva.
— Seria bom ouvir de você — respondo, imitando
seu gesto de cruzar os braços. — Ou talvez, você
estivesse conhecendo alguém?
— Sem namorada e sem conhecer ninguém — ele
a f i r m a , e e u r e p r i m o u m s o r r i s o d e a l í v i o . — Q u e r d i z e r,
tem uma pessoa que estou conhecendo.
Minha vontade de sorrir desaparece no mesmo
i n s t a n t e . D e s v i o o o l h a r, s e n t i n d o u m n ó s e f o r m a r n a
garganta. Eu deveria saber que sim. Diogo é um homem
b o n i t o , p r e t e n d e n t e s n ã o d e v e m f a l t a r. N o e n t a n t o , m e
chateia profundamente ele não ter mencionado isso antes
de nos beijarmos, antes de toda essa mentira que
c o m e ç a m o s a v i v e r.
— Na verdade, nos conhecemos de um jeito
diferente. — ele continua, fixando o olhar na TV como se
estivesse tentando esconder algo. — Quer saber como?
— Não. — respondo de imediato, minha mente
mergulhada nos nossos beijos. — Sabia que mesmo que
estejam se conhecendo, beijar outra é um tipo de traição?
— p e r g u n t o , p e r c e b e n d o a c o n f u s ã o e m s e u o l h a r, m a s e l e
logo acena em concordância.
— Concordo com você. — diz, e eu reviro os olhos,
sem conseguir esconder minha frustração.
— Se concordasse, não me beijaria. — murmuro,
tentando controlar o tom chateado na minha voz. —
Olha...
— Agora é você que está tirando conclusões
precipitadas — Diogo me interrompe, e eu fecho a boca,
surpresa. — Eu conheci essa mulher porque ela gastou
R$1.990 no meu cartão. Quando recebi a notificação,
estava no departamento e fiquei surpreso.
Ele ainda mantém os braços cruzados, mas agora há
um sorriso de lado em seus lábios. Sinto meu rosto
e s q u e n t a r d e v e r g o n h a e n q u a n t o d e s v i o o o l h a r, m e
s e n t i n d o i n c r i v e l m e n t e b o b a . Te n t o m a n t e r a s e r i e d a d e ,
mas não consigo segurar por muito tempo. Um sorriso
involuntário surge em meu rosto, e finalmente, volto a
encará-lo.
— Acho que nos conhecemos de um jeito bem
inusitado, então — digo, deixando escapar uma risada
l e v e , s e n t i n d o o p e s o d a t e n s ã o c o m e ç a r a d e s a p a r e c e r. —
I n v a d i s u a v i d a s e m p e d i r l i c e n ç a , e a g o r a t e n h o o H e i t o r.
— Vo c ê e o H e i t o r s ã o u m a i n v a s ã o q u e e u n ã o
esperava, mas que já faz parte da minha vida — ele diz,
descruzando os braços e se aproximando de mim, a voz
baixa e sincera. — E não me arrependo de nada disso,
Marina.
Surpresa o encaro, e quando ele inclina em minha
direção, eu o imito. Nossos lábios se tocam fazendo a
onda de calor subir por meu corpo. Diogo me puxa para o
seu colo e eu o monto com cuidado, mas cheia de desejo.
Meus braços rodeiam seu pescoço, sempre o puxando para
mim. O sinto descer mais no sofá, me fazendo arfar em
meio ao beijo, assim que sinto seu pau começando a ficar
ereto.
Nossas línguas se entrelaçam e na intenção de
aplacar meu desejo, me movo lentamente por cima dele.
Me esfregando descaradamente em sua ereção. Diogo
desce as mãos até a minha bunda e a aperta, seguido de
um tapa forte. Pulo em seu colo, surpresa, mas excitada.
— Vo c ê v e m m e d e i x a n d o l o u c o , M a r i n a —
confidencia bem perto dos meus lábios. — Louco para
s e n t i r s e u s a b o r, s e u c o r p o . . . , m a s v o u s a b e r e s p e r a r.
Os beijos descem por meu pescoço, me arrancando
gemidos baixos.
— Q-Quer saber a minha a-alternativa? — indago
trêmula de desejo. — Acho que posso falar agora, mas
primeiro... tira a camisa?
Ele me olha por alguns segundos, mas logo obedece
e fica sem camisa.
Hipnotizada, eu passo as mãos pelo peitoral dele e
d e s ç o l e n t a m e n t e p e l o s g o m i n h o s e m s u a b a r r i g a . To c o
nos pelos loiros que têm ali, e sorrio.
— Gostando do que vê? — ele pergunta com um
toque divertido em seu tom. — Eu bem que percebi seu
o l h a r m e d e v o r a n d o . N o c o r r e d o r, n a c o z i n h a , a t é l á n o
hospital.
Surpresa e envergonhada, eu nego o fazendo sorrir
mais.
— Eu nunca fiz isso — minto, porque foi
exatamente isso que fiz. — Eu não sou capaz de ficar
devorando ninguém com os olhos.
Diogo da uma curta risada, mas que me deixa
encantada. Ele está sorrindo e até rindo para mim, meu
coração está aponto de explodir de felicidade.
— Vo u f i n g i r q u e a c r e d i t o .
Mordisco o lábio e enquanto ele ainda sorri, eu
desço as mãos até pararem no cós do short.
— Podemos tentar algumas coisas — volto a falar
chamando a atenção dele. — Ta l v e z , algumas
preliminares?
— Estou ouvindo. — arqueio uma sobrancelha. Ele
não pode deduzir o que estou falando? Ou ele quer que eu
fale em voz alta? — Quero ouvir em voz alta o que está
me propondo — afirma como se lesse meus pensamentos.
— Não queremos tirar conclusões precipitadas.
— Mas você me entendeu.
— Entendi sim — confirma com um sorriso de lado
— , m a s q u e r o o u v i r.
Meu rosto queima de vergonha, e posso sentir
perfeitamente o calor subindo até as minhas bochechas.
Te n t o m e r e c o m p o r, m a s o o l h a r i n t e n s o d e D i o g o
c o n t i n u a f i x o e m m i m , d e s a f i a d o r, c o m o s e e s t i v e s s e
esperando para ver até onde eu vou.
— Eu posso fazer umas coisinhas — murmuro e ele
continua me olhando. — Eu não consigo falar — dou um
sorriso envergonhada. — Não seja tão mal.
Ainda com os olhos presos nos dele, tomo uma
decisão ousada. Estendo a mão e puxo o cós do short e da
cueca que ele está usando, meus dedos tremendo
l e v e m e n t e , m a s m i n h a d e t e r m i n a ç ã o é m a i o r. E l e n ã o
r e c u a , n e m d e s v i a o o l h a r. P e l o c o n t r á r i o , o d e s a f i o e m
s e u s o l h o s p a r e c e s e i n t e n s i f i c a r, c o m o s e e s t i v e s s e
testando meus limites e a minha coragem.
P o r u m m o m e n t o , o t e m p o p a r e c e p a r a r. A t e n s ã o
entre nós é palpável, e a mistura de vergonha e desejo me
f a z s e n t i r c o m o s e e s t i v e s s e p r e s t e s a e x p l o d i r. A n s i o s a
para vê-lo, sou a primeira a desviar o olhar e assim que
foco em sua ereção, engulo em seco. Ele é grande e
grosso, tem pelos curtos na base como se estivessem
crescendo. Com a mão trêmula, o agarro e movimento
minha mão em um vai e vem, bem lento. Da ponta robusta
e r o s a d a , s a i u m l í q u i d o i n c o l o r. D e s ç o a t é s e u s
testículos e os acaricio.
— Vo c ê é m u i t o b o n i t o — e l o g i o , D i o g o a p e n a s
sorri de lado.
— Está com medo?
— Não! — nego continuando a masturbá-lo. — Só
surpresa. — dou de ombros e dessa vez uso as duas mãos.
— Ele é pesado!
Diogo não perde tempo. Ele encaixa os dedos entre
meus fios de cabelo, segurando minha nuca com firmeza,
e me puxa para um beijo intenso. Sinto sua respiração
quente contra meus lábios por um breve instante antes de
ele me tomar por completo. O calor do beijo se espalha
pelo meu corpo, fazendo meu coração bater mais rápido.
P e r c o o f ô l e g o , m a s n ã o q u e r o p a r a r. E l e m e s e g u r a
c o m t a n t a f i r m e z a q u e p a r e c e q u e n u n c a v a i m e s o l t a r, e
eu me entrego completamente a esse momento,
esquecendo qualquer dúvida ou hesitação que ainda
p u d e s s e e x i s t i r. Tu d o o q u e i m p o r t a a g o r a é a s e n s a ç ã o d e
estar nos braços dele, conectada de uma maneira que
parece mais profunda a cada segundo que passa.
O beijo se aprofunda, e meu corpo responde ao dele
de forma instintiva. Minhas mãos se movem com mais
firmeza em seu pau, tê-lo sob meu agarre aumenta ainda
mais meu desejo por ele. Ele me puxa ainda mais para
perto, como se quisesse eliminar qualquer distância entre
nós, e eu me perco na sensação, no calor que irradia
entre nossos corpos.
Minha mente se dissolve no momento, e tudo o que
consigo pensar é em como Diogo me faz sentir viva,
desejada. O jeito como ele me segura, como seus lábios
se movem sobre os meus, transmite uma urgência que eu
nunca experimentei antes. É como se tudo o que
aconteceu até agora nos tivesse levado a esse exato
momento, onde palavras não são mais necessárias.
Sem quebrar o beijo, sinto as mãos de Diogo
deslizarem pela minha cintura até encontrarem a barra do
meu vestido. Com um movimento lento e firme, ele
começa a levantá-lo, mas então, algo dentro de mim faz
com que eu pare o beijo. Seguro o rosto de Diogo,
mantendo-o a apenas alguns centímetros do meu. Nossos
olhares se encontram, e há uma mistura de desejo e
i n c e r t e z a n o a r. M i n h a r e s p i r a ç ã o e s t á p e s a d a , e o
silêncio entre nós é carregado de tensão.
— Diogo, espera... — murmuro, minha voz quase
um sussurro. — Eu... eu estou amamentando... talvez saia
um pouco de leite.
Ele respira fundo, ainda segurando o tecido do meu
vestido entre os dedos, mas o olhar desafiador em seus
olhos suaviza. Por um momento, ele apenas me observa,
como se estivesse tentando ler meus pensamentos,
tentando entender o que estou sentindo.
— Eu não me importo, Marina. — ele nega me
fazendo mordiscar o lábio indecisa. — Só quero sentir
seu corpo com o meu. Se você não estiver pronta,
podemos parar — ele diz, a voz mais suave agora, mas
ainda carregada de intensidade. — Eu não quero te
a p r e s s a r, n e m t e m a c h u c a r.
Sorrio levemente e acaricio seu rosto, sentindo a
barba áspera sob meus dedos.
— Eu só... eu fico sem jeito... — respondo, minha
v o z e n v e r g o n h a d a . — Ta l v e z v o c ê n ã o g o s t e , o u . . .
— Eu quero você, Marina. — afirma com a voz
decidida. — E a propósito — ele sorri. — Estava
segundos atrás segurando o meu pau, e está tímida por
ficar sem vestido na minha frente?
Sorrio e me inclino para beijá-lo.
Assim que me afasto dele, sem dizer uma palavra,
seguro a barra do meu vestido com determinação e o puxo
para cima, deixando-o escorregar pelo meu corpo. Em
seguida meu sutiã. Sinto o ar fresco da sala tocar minha
pele exposta, e meus seios, ainda sensíveis, reagem
instantaneamente. O contato com o tecido do vestido ao
passar por eles me faz prender a respiração por um
momento.
Diogo observa cada movimento, seus olhos
escurecendo com uma mistura de desejo e admiração.
Quando finalmente o sutiã e o vestido fazem companhia a
camisa dele no sofá, sinto uma onda de vulnerabilidade
misturada com uma força recém-descoberta. Estou
completamente exposta a ele, tanto física quanto
e m o c i o n a l m e n t e , m a s n ã o h á h e s i t a ç ã o n o m e u o l h a r,
apenas uma decisão tomada.
Meus seios, ainda doloridos de desejos, estão à
mercê do olhar dele, e por um instante, sinto o calor do
rubor subir pelas minhas bochechas. Mas ao mesmo
tempo, há algo incrivelmente libertador em estar ali,
diante dele, sem barreiras.
Diogo estende a mão, seus dedos roçando
suavemente meu braço enquanto me puxa de volta para
perto dele. O toque é gentil, mas carrega uma
e l e t r i c i d a d e q u e f a z m e u c o r p o i n t e i r o r e a g i r. S e u s o l h o s
encontram os meus, e a conexão entre nós é tão intensa
que quase sinto como se pudéssemos nos comunicar sem
palavras.
Ele não apressa o momento. Em vez disso, suas
mãos começam a explorar minha pele com delicadeza,
traçando caminhos invisíveis ao longo das minhas curvas,
deixando claro o quanto me deseja.
Sem quebrar o olhar que trocamos, deixo que meus
dedos deslizem suavemente pelo abdômen definido de
Diogo, e voltem a agarrar a ereção com firmeza, sentindo
o calor que emana dele. A reação imediata de Diogo, um
s u s p i r o b a i x o e r o u c o , m e e n c o r a j a a c o n t i n u a r. M e s i n t o
extremamente poderosa, sabendo que estou causando esse
efeito nele, e minha própria excitação aumenta a cada
segundo.
Diogo coloca o meu cabelo para trás, o olhar
desafiador agora mesclado com um desejo incontido. Ele
não diz nada, mas o modo como seus músculos se
contraem sob minhas mãos e o calor que sentimos juntos
dizem tudo. Lentamente, ele inclina o corpo em minha
direção, até que os lábios estão a centímetros do meu
seio.
— Vo c ê p o d e m e p a r a r s e q u i s e r.
Aceno levemente, encorajando-o, e no momento em
que ele abocanha meu seio, um gemido alto escapa dos
meus lábios. A sensação é tão intensa que por um
segundo penso em afastá-lo, mas a onda de prazer que
começa a se espalhar pelo meu corpo me faz desistir
dessa ideia.
Fecho os olhos e me concentro na sensação,
deixando que o prazer me consuma. Diogo chupa e lambe
meu seio com uma mistura de fome e desejo, seus
movimentos firmes e ao mesmo tempo cuidadosos. Cada
toque, cada puxada suave dos lábios dele faz minha pele
arder e meu corpo responder com uma urgência que eu
n ã o s a b i a q u e p o d e r i a s e n t i r.
Quando ele se move para o outro seio, a barba
roçando contra minha pele sensível, um novo arrepio
percorre minha espinha. Olho para baixo e vejo Diogo
completamente entregue ao momento, o olhar fixo
enquanto ele me devora com a boca, sem qualquer pressa
d e p a r a r. A v i s ã o d e l e , t ã o c o n c e n t r a d o e m m e d a r p r a z e r,
só aumenta a intensidade do que sinto.
Minha respiração está descompassada, e cada
l a m b e r, c a d a c h u p a d a q u e e l e d á p a r e c e r e v e r b e r a r p o r
t o d o o m e u c o r p o . O c a l o r, o t o q u e , o s o m d o s n o s s o s
suspiros entrelaçados — tudo se mistura em uma
experiência que me faz esquecer o mundo lá fora, me
deixando completamente imersa no aqui e agora, nos
braços dele. Estou completamente ensopada entre as
pernas e totalmente sensível.
Ele se afasta por um momento, os olhos fixos nos
meus seios, e com um movimento lento, limpa o canto
dos lábios, um sorriso satisfeito se formando em seu
rosto.
— Deliciosa — ele murmura, a voz rouca e
carregada de desejo.
Meu rosto queima de vergonha ao ouvir suas
palavras, e quando ele tenta colocar meu seio de volta na
boca, eu o paro, com as minhas mãos em seu peito.
— Minha vez — aviso, minha voz baixa, mas cheia
de determinação.
Com a ajuda dele, saio de seu colo, e lentamente me
posiciono no chão, entre suas pernas abertas. Sinto o
peso do olhar dele me acompanhando enquanto me
ajoelho, o coração batendo rápido no peito. Minhas mãos
deslizam pelo interior de suas coxas, e sinto a tensão nos
músculos dele aumentar em resposta ao meu toque.
Olho para cima, encontrando o olhar de Diogo, e
vejo o fogo de antecipação em seus olhos.
S e m d e s v i a r o o l h a r, m e a p r o x i m o m a i s , s e n t i n d o a
ereção dele sob meus dedos enquanto começo a explorar
cada centímetro com delicadeza e intenção. O controle do
momento é meu agora, e estou determinada a dar a ele o
mesmo prazer intenso que ele me proporcionou.
Lentamente, abro a boca e deixo que minha língua
percorra todo o comprimento da ereção dele, sentindo a
textura e o calor enquanto deslizo de baixo para cima.
Cada movimento é deliberado, uma exploração cuidadosa
que faz Diogo soltar um suspiro pesado, seus dedos se
apertando contra o estofado do sofá.
Quando finalmente chego à cabeça robusta, paro
por um momento, deixando que a expectativa se acumule.
Então, sem pressa, envolvo-a com meus lábios, chupando
suavemente enquanto exploro cada contorno com minha
língua. A reação de Diogo é imediata, seu corpo tenso de
p r a z e r, e o s o m g r a v e q u e e s c a p a d e s u a g a r g a n t a m e
e n c o r a j a a c o n t i n u a r.
Sinto o gosto dele se misturar com a sensação da
pele macia sob minha língua, e aumento a pressão,
chupando com mais firmeza enquanto começo a mover
minha boca lentamente, criando um ritmo que parece
i n c e n d i a r o a r a o n o s s o r e d o r. D i o g o a r q u e i a l i g e i r a m e n t e
o quadril, os olhos fechados, completamente entregue ao
que estou fazendo.
Minha mão acompanha os movimentos da minha
boca, acariciando o restante de seu comprimento,
enquanto continuo a chupá-lo, saboreando cada reação
que consigo arrancar dele. O poder que sinto, sabendo
q u e p o s s o l e v á - l o a e s s e e s t a d o d e p r a z e r, m e f a z q u e r e r
ir além, explorar ainda mais, enquanto o som de seus
gemidos se mistura com o meu próprio desejo crescente.
Com o ritmo que estabeleci, sinto Diogo perder
ainda mais o controle, seus gemidos se tornando mais
i n t e n s o s , a r e s p i r a ç ã o p e s a d a e i r r e g u l a r. A s e n s a ç ã o d e
poder me impulsiona a continuar aumentando a
intensidade de cada chupada, enquanto minha língua
explora a sensibilidade da cabeça, provocando-o ainda
mais.
Minha mão desliza pelo seu comprimento,
complementando o movimento da minha boca, e cada vez
que minha língua percorre aquele ponto sensível, o corpo
d e l e r e a g e c o m u m t r e m o r d e p r a z e r. E u m e p e r c o n o
momento, na intimidade do que estamos compartilhando,
no som de nossos gemidos e na forma como ele se entrega
a mim.
Olho para cima, vendo o impacto do meu toque em
D i o g o , s e u r o s t o c o n t o r c i d o d e p r a z e r, o s m ú s c u l o s d e
seu abdômen se contraindo com cada movimento. É como
se o tempo tivesse parado, e tudo o que existe é esse
momento entre nós. A intensidade cresce a cada segundo,
e posso sentir que ele está se aproximando do limite, o
corpo dele se enrijecendo enquanto luto para manter o
controle da situação.
Mas antes que ele possa chegar ao clímax, sinto sua
mão em meu cabelo, puxando-me suavemente para cima,
o b r i g a n d o - m e a p a r a r. O l h o p a r a e l e , m e u s l á b i o s a i n d a
úmidos e o gosto dele na minha boca, o desejo claro no
m e u o l h a r. D i o g o r e s p i r a f u n d o , o p e i t o s u b i n d o e
descendo rapidamente, enquanto me puxa de volta para
cima, até nossos rostos estarem novamente alinhados.
— Marina... — ele murmura meu nome com um tom
d e u r g ê n c i a , e , a n t e s q u e e u p o s s a r e a g i r, e l e m e b e i j a
com uma fome renovada, como se quisesse absorver cada
p e d a ç o d o q u e a c a b a m o s d e c o m p a r t i l h a r, e n q u a n t o o
desejo entre nós se transforma em uma necessidade
avassaladora de nos perdermos um no outro.
S e p a r o o b e i j o c o m m u i t o c u s t o , e s e m h e s i t a r, e u
desço novamente, minha boca envolvendo seu
comprimento com determinação. Sinto o corpo dele reagir
instantaneamente, cada músculo se tensionando sob meu
toque, enquanto continuo a chupá-lo com um ritmo mais
intenso e urgente.
Diogo impulsiona o quadril, os gemidos agora
incontroláveis, cada som reverberando dentro de mim e
alimentando minha própria excitação. Eu o sinto se
aproximando do clímax, e isso só me faz redobrar meus
esforços, minha língua explorando cada centímetro,
enquanto minha mão acaricia a base de sua ereção.
E então, com um último gemido profundo, ele chega
ao limite. Os músculos de seu abdômen se contraem, e
ele explode na minha boca, o calor e a intensidade do
momento me surpreendendo. Eu aceito tudo, sem
hesitação, enquanto Diogo segura minha cabeça, seus
dedos ainda entrelaçados no meu cabelo, o prazer
evidente em cada suspiro que ele solta.
Eu mantenho meus movimentos suaves, prolongando
o prazer dele até que cada tremor passe pelo seu corpo,
absorvendo cada parte da experiência. Quando ele
finalmente relaxa, solto seu membro com cuidado,
limpando o canto dos meus lábios, enquanto olho para
cima e vejo a satisfação estampada no rosto de Diogo.
Ele me puxa para cima novamente, os olhos ainda
escurecidos pelo desejo, mas agora também suavizados
pela satisfação. Sem dizer uma palavra, ele me envolve
em um abraço apertado, seus lábios encontrando os meus
em um beijo lento e agradecido. Estamos conectados, não
apenas pelo ato, mas pelo entendimento silencioso que
compartilhamos, um sentimento que vai além do físico e
nos une de uma maneira profunda e inquebrável.
C a p í t u l o 1 4 – D i o g o

De braços cruzados e sentado no sofá, meus olhos


seguem cada movimento de Marina enquanto ela conversa
com dona Herbertina. Heitor está nos braços dela, tão
pequeno e tranquilo, como se aquele fosse o lugar mais
seguro do mundo. A cena deveria me trazer paz, mas tudo
o que sinto é um turbilhão de emoções que mal consigo
n o m e a r.
Marina sorri, e o som de sua voz é suave, mas eu
quase não escuto o que elas dizem. Estou mais
concentrado nos detalhes: a forma como ela segura Heitor
com tanto cuidado, como se ele fosse a coisa mais
preciosa que já teve. A expressão de dona Herbertina,
sempre acolhedora, me faz lembrar do quanto minha vida
mudou em tão pouco tempo.
E então, há a noite passada.
O pensamento retorna sem que eu queira, trazendo
uma onda de calor e lembranças que me deixam inquieto.
Olho para Marina, tentando desvendar o que se passa na
cabeça dela, se ela está pensando na mesma coisa que eu.
Mas ela parece tão tranquila, tão em paz... enquanto eu
estou aqui, tentando processar tudo o que está
acontecendo entre nós.
A sala de casa, que antes era só mais um cômodo,
agora parece carregada de uma energia nova, como se o
que aconteceu ali tivesse deixado marcas invisíveis em
cada canto.
Marina.
Só de pensar nela, meu corpo reage. A maneira
como ela me provocou e ao mesmo tempo se entregou de
uma forma que nunca imaginei... Não consigo evitar o
sorriso que se forma nos meus lábios. Ela é uma mulher
que me surpreende a cada dia, e ontem à noite não foi
diferente.
O jeito como ela me olhou, aquele brilho nos olhos,
como se soubesse exatamente o que estava fazendo
comigo... Ainda sinto o gosto de seus beijos, o calor de
sua pele contra a minha, o som dos gemidos. E o que
mais me impressiona é que, apesar de toda a intensidade,
houve também uma ternura que eu não esperava, um
carinho nos gestos que fez tudo ser ainda mais
significativo.
Eu não planejei que as coisas entre nós chegassem a
esse ponto tão rápido, mas agora que aconteceu, é
impossível negar o que sinto. Algo mudou dentro de mim,
e pela primeira vez em muito tempo, não sinto medo
d i s s o . N a v e r d a d e , e s t o u a n s i o s o p e l o q u e v e m a s e g u i r.
— E você, Diogo? — Dona Herbertina me chama,
me tirando dos pensamentos e me fazendo encará-la. — O
que tanto pensa aí sozinho que até sorrindo está?
A pergunta me pega de surpresa, e noto o leve
sorriso que ela também carrega. Desvio o olhar para
Marina, que está me observando com um sorriso contido,
como se soubesse exatamente o que está se passando na
m i n h a c a b e ç a . E l a é b o a n i s s o , e m m e l e r, e à s v e z e s i s s o
me desarma.
— Nada demais, Dona Herbertina — respondo,
tentando disfarçar o que realmente ocupa minha mente.
Me aproximo das duas, me esforçando a afastar as
m e m ó r i a s d a n o i t e p a s s a d a q u e i n s i s t e m e m v o l t a r. — A
senhora perguntou alguma coisa antes?
Dona Herbertina me lança um olhar curioso, como
se estivesse procurando decifrar o que se passa na minha
cabeça, mas então volta sua atenção para Marina, que
agora desvia o olhar de mim para Heitor em seus braços,
acariciando a cabeça e o beijando nela com carinho.
— Não, Diogo — responde dona Herbertina, mas há
uma ponta de diversão em sua voz, como se ela não
acreditasse completamente na minha resposta. Ela sabe
que tem algo mais, desde a nossa última conversa, ficou
claro que ela percebeu que algo acontece entre Marina e
eu.
Eu suspiro internamente, sabendo que minha mente
vai continuar revisitando aquela noite, querendo mais do
que nunca entender o que exatamente isso significa para
mim. Mas por agora, tento me focar no presente, no que
está diante de mim, sem deixar que as lembranças me
distraiam demais.
— Eu estava pensando — volto a falar chamando a
a t e n ç ã o d a s d u a s . — Vo u p e r g u n t a r a o I g o r s e e l e p o d e
v i r h o j e e f a z e r c o m p a n h i a a s e n h o r a e o H e i t o r.
— Por quê? — dessa vez é Marina que pergunta.
Ela tem o olhar curioso e confuso ao mesmo tempo.
— Porque não sabemos exatamente que horas vamos
voltar — respondo calmo. — Porque não quero que a
dona Herbertina e o Heitor fiquem sozinhos por aqui.
Marina franze o cenho e ajeita Heitor em seus
braços.
— Mas a sua casa é segura — ela retruca e me
sorri. — É segura, né?
— É claro — afirmo o mais educado possível e vou
a t é a g e l a d e i r a p a r a g a n h a r t e m p o . — Vo c ê n ã o g o s t a
dele?
— Não é isso — sua voz é suave. — Eu só fiquei
c o n f u s a , n ã o t e n h o n a d a c o n t r a o I g o r. S ó n ã o g o s t o
quando ele diz que o Heitor tem cara de joelho. Meu bebê
é todo lindinho.
Observo Marina tocar na bochecha de Heitor com o
dedo e o presentear com aquele lindo sorriso em seus
lábios.
— Aquele rapaz não tem jeito — dona Herbertina
fala com um pequeno sorriso. — Ele implica comigo
t a m b é m m e c h a m a n d o d e t i a H B T. O m e u n o m e f o i
homenagem, a avó da minha mãe se chamava assim.
— É um nome lindo — Marina responde. —
Combina com a senhora.
— O seu também é bem lindo — dona Herbertina
devolve e vai até a pia. — Quem pensou nele?
Cruzo os braços, quero ouvir e conhecer mais sobre
Marina. Ela por sua vez dá um sorriso triste, mas acena
com a cabeça.
— O meu pai — fala e percebo que ela se segura
para se manter neutra. — Ele sempre me disse que queria
uma filha. A maioria dos pais preferem meninos, mas ele
me disse que rezou muito para eu vir menina.
Marina sorri e seca rapidamente as lágrimas.
Meu primeiro instinto é me aproximar dela, mas
dona Herbertina rapidamente o faz e eu paro. Ela a
abraça sendo retribuída, assim que se afastam, Marina
sorri agradecida.
— Não fique triste — dona Herbertina fala. — O
seu pai vai perceber o erro de se afastar e vai entrar em
contato.
— Acho difícil — Marina responde, ajeitando
Heitor nos braços, enquanto a tristeza toma conta do seu
o l h a r. — A c h o q u e a t é a m i n h a m ã e e s t á q u e r e n d o s e
a f a s t a r. Q u a n d o l i g u e i , e l a p e d i u p a r a e u n ã o e n t r a r e m
contato, disse que me ligava.
Dona Herbertina, com sua calma habitual, toca
suavemente o rosto de Marina, em um gesto cheio de
carinho e compreensão.
— Confie no que eu digo — ela pede, e Marina
apenas acena, mesmo que o brilho nos olhos dela ainda
s e j a i n c e r t o . — Tu d o v a i s e a c e r t a r. A g o r a , v o u t e r m i n a r
o preparo do nosso almoço e você deveria começar a se
a r r u m a r.
— Tão cedo assim? — indago em voz alta,
chamando a atenção das duas para mim. — Só vamos sair
às 20h.
Dona Herbertina sorri para mim, como se
entendesse algo que eu ainda não percebi.
— Nunca é cedo demais para uma mulher começar a
s e a r r u m a r, D i o g o — e l a r e s p o n d e , o t o m l e v e m e n t e
brincalhão, mas com aquela sabedoria que só ela tem. —
Especialmente para um jantar importante.
Marina me lança um olhar de canto, um meio
sorriso nos lábios, mas há uma leveza ali que não estava
antes. Mesmo com todas as incertezas, parece que o
cuidado de Dona Herbertina e a presença de Heitor nos
braços dela têm um efeito calmante. E, de repente, fico
m a i s c o n s c i e n t e d a i m p o r t â n c i a d o q u e e s t á p o r v i r.
Ta l v e z , d e f a t o , n ã o s e j a c e d o d e m a i s p a r a n o s
p r e p a r a r m o s — n ã o s ó p a r a o j a n t a r, m a s p a r a o q u e q u e r
que esteja se desenrolando entre nós.
A observo ficar de pé e avisar que vai colocá-lo no
berço. Meu olhar percorre seu corpo, mas logo desvio.
Olho dona Herbertina que me sorri, e aviso que vou
resolver um assunto no quarto. Assim que chego nele,
fecho a porta e busco meu celular no bolso da bermuda.
Rapidamente digito o número do Igor e aguardo.
— A c re d i t a q u e i a t e l i g a r n e s s e e x a t o m o m e n t o ? —
ele questiona assim que atende. — Nossa conexão é
re a l m e n t e f o r t e .
Me sento em minha cadeira e ligo o notebook.
— Algum problema? Era sobre o meu pedido?
— A h ! S o b re i s s o e u i a t e l i g a r t a m b é m — c o m e n t a
e eu o aguardo continuar: — Eu tive acesso as gravações
e o c a r a q u e a p a re c e n e l a , b a t e u c o m a s c a r a c t e r í s t i c a s
q u e m e f a l o u . Vo u t e e n v i a r.
Respiro fundo e acesso meu e-mail. Demora alguns
segundos, e quando a mensagem chega eu a abro.
— Alguém mais comentou algo sobre isso? —
indago sentindo a tensão subir meu corpo. — Se estão
sendo seguidos?
— Até o momento ninguém falou nada — Igor
responde e em seguida dá um bocejo. Franzo o cenho. —
E u j á c o m p re i o p re s e n t e d o c a r i n h a d e j o e l h o . D e p o i s
q u e e u s a i r d a q u i v o u p a s s a r a í , e s p e ro q u e t e n h a j a n t a r
para mim.
A despreocupação na voz de Igor me deixa de uma
certa forma inquieto. Enquanto ele fala, olho para a tela
do notebook, onde as imagens que ele enviou começam a
s e c a r r e g a r. A t e n s ã o n o m e u c o r p o a u m e n t a a c a d a
segundo, e a ideia de que algo possa estar acontecendo
sem que ninguém tenha notado me incomoda
profundamente.
— Hoje vou com Marina em um jantar na casa dos
meus pais — respondo, mantendo minha voz firme,
mesmo que a preocupação esteja crescendo por dentro. —
Liguei para você, porque quero que venha para cá e fique
c o m H e r b e r t i n a e H e i t o r. E l e s n ã o s a b e m d a m i n h a
desconfiança sobre alguém nos seguindo.
— Eu sendo babá?
Solto um suspiro.
— E u s ó c o n f i o e m v o c ê , I g o r.
Do outro lado da linha, Igor fica em silêncio.
— Nossa, agora me deixou sem palavras. — ele diz,
com a sua costumeira voz brincalhona. — Se me chamar
para ser padrinho do carinha de joelho, eu acho que não
aguento de emoção. — dessa vez eu sorrio, mesmo não
g o s t a n d o d o a p e l i d o . — A s s i m q u e l a rg a r v o u d i re t o p a r a
a sua casa. Hoje saio mais cedo.
Franzo o cenho com aquela novidade.
— Por quê?
— P o rq u e o m e u c h e f e n ã o e s t á a q u i e o M a rc e l o
não veio para o trabalho.
Enquanto ele fala, abro o e-mail e vejo as imagens
das gravações. O cara que aparece nelas realmente bate
com as características que eu tinha mencionado. Meu
estômago dá um nó enquanto o observo se aproximar da
m i n h a c a m i n h o n e t e e s e a b a i x a r. B e m n o l u g a r q u e
e n c o n t r e i o r a s t r e a d o r.
— To m e c u i d a d o a o v i r p a r a c á — e x i j o , d e s v i a n d o
o olhar da tela para fechar os olhos por um momento e
m e c o n c e n t r a r. — D ê a v o l t a p e l a p r i n c i p a l e s ó v e n h a
quando notar que não está sendo seguido.
— Pode deixar — Igor responde, a voz mais séria
a g o r a . — E n ã o s e p re o c u p e , D i o g o , v a m o s d e s c o b r i r
q u e m é e s s e d o v í d e o e o q u e e l e q u e r. A g o r a e u t e n h o
q u e i r, q u e r i a e u e s t a r e m c a s a d e f o l g a .
Sem esperar uma resposta minha, ele encerra a
chamada. Fico olhando para a tela do notebook, as
imagens ainda abertas. Algo me diz que há mais nisso do
que parece, pois caso me quisessem morto eu já estaria
na primeira oportunidade. Então, o que ele queria?
Descobrir onde moro? Me sequestrar? Me chantagear?
Escuto alguém bater a porta, mas logo a voz de
M a r i n a m e c h a m a r. P e r m i t o s u a e n t r a d a , s e n t i n d o s e u
p e r f u m e m e a t i n g i r.
— Desculpa te atrapalhar — pede e me sorri de um
jeito tímido. — O almoço já está pronto.
Fecho o notebook e, sem tirar os olhos de Marina,
estendo minha mão em sua direção. Ela hesita por um
segundo, olhando para trás como se confirmasse que
estamos a sós, mas logo aceita meu gesto e caminha até
mim. Quando a puxo para o meu colo, ela se acomoda
com um riso baixo, aquele sorriso que me deixa
completamente desnorteado. Aposto que, neste exato
momento, estou com cara de adolescente bobo, mas como
ser indiferente a ela?
Meus dedos percorrem suavemente seu rosto,
traçando a linha de sua mandíbula até o queixo. O toque
é íntimo, quase instintivo, mas ao mesmo tempo, algo
sombrio começa a pesar em meu peito. Um medo que não
c o n s i g o a f a s t a r.
Eles sabem sobre Marina?
A pergunta surge do nada, invadindo meus
p e n s a m e n t o s c o m u m a f o r ç a q u e n ã o e s p e r a v a . Tu d o q u e
eu vi nas gravações, o cara que apareceu nelas, cada
d e t a l h e p a r e c e a g o r a m u i t o m a i s a m e a ç a d o r. S e e l e s
s o u b e r e m s o b r e e l a , s o b r e H e i t o r. . .
Marina percebe a mudança em minha expressão, o
sorriso diminuindo levemente enquanto me observa,
tentando ler o que está se passando na minha cabeça.
Te n t o d i s f a r ç a r, a f a s t a r o m e d o q u e c r e s c e , m a s s e i q u e
não sou bom em esconder minhas preocupações.
Especialmente não dela.
— Diogo, o que foi? — ela pergunta suavemente,
seus olhos procurando os meus, como se pudesse
encontrar as respostas ali.
Não posso permitir que nada aconteça com ela, nem
c o m H e i t o r. A i d e i a d e q u e a l g u é m p o s s a u s á - l o s c o n t r a
mim, que possam estar em perigo por minha causa, é
insuportável. Preciso garantir que eles estejam seguros,
acima de tudo.
— Nada, só pensando... — respondo, tentando soar
despreocupado, mas ela continua me olhando,
desconfiada.
— Está bem — murmura e me beija rapidamente os
l á b i o s . — Ve m c o m e r a n t e s q u e a d o n a H e r b e r t i n a n o s
procure.
Ela desce do meu colo e com um sorriso travesso
sai do quarto. Passo a mão na barba e demoro uns
segundos, mas a acompanho.
Assim que chego na cozinha, paro na entrada,
observando Dona Herbertina e Marina arrumando a mesa.
A cena é simples, mas carrega uma sensação de conforto
que me acalma, mesmo que apenas por um momento. As
duas estão envolvidas em uma harmonia silenciosa,
Marina sorrindo enquanto coloca os pratos e Dona
Herbertina ajustando os talheres com o cuidado de
sempre.
Essa visão me deixa com um nó na garganta, algo
entre gratidão e uma sensação de vulnerabilidade que
r a r a m e n t e p e r m i t o s e n t i r. P o r m a i s q u e e u t e n t e a f a s t a r o s
p e n s a m e n t o s s o m b r i o s , e l e s i n s i s t e m e m v o l t a r. A
segurança deles é minha prioridade, e saber que o mundo
lá fora pode ser tão implacável me deixa ainda mais
determinado a protegê-los.
Mas aqui, neste momento, há um vislumbre de
normalidade que quase me faz acreditar que tudo vai
ficar bem. Marina se vira e me vê parado na porta, seu
sorriso travesso de antes se transformando em algo mais
suave, mais íntimo.
— Va i f i c a r s ó o l h a n d o o u v a i n o s a j u d a r ? — e l a
pergunta, com um brilho brincalhão nos olhos.
Entro na cozinha, aproximando-me das duas, e
começo a ajudar a colocar os últimos itens na mesa.
D e i x o u m s o r r i s o e s c a p a r, e a s s i m q u e o l h o p a r a
dona Herbertina, vejo seu olhar de aprovação.
Enquanto me junto a elas, sinto a determinação
crescer dentro de mim. Nada vai atrapalhar essa paz. Eu
n ã o v o u d e i x a r. P r e c i s o r e s o l v e r e s s a s i t u a ç ã o a n t e s q u e
chegue até elas, principalmente Marina. Enquanto a
mantenho próxima, sinto a responsabilidade pesar ainda
mais. Preciso estar um passo à frente, proteger o que é
m a i s i m p o r t a n t e p a r a m i m , c u s t e o q u e c u s t a r.
A s s i m q u e t e r m i n o d e m e v e s t i r, m e o l h o n o e s p e l h o
e ajeito o decote reto. O vestido preto no estilo midi,
com alças finas e justo ao corpo, destaca minha silhueta
de uma forma que me faz sentir confiante. A saia
levemente ondulada na barra adiciona um toque de
elegância discreta. É simples, mas perfeito para a
ocasião.
Dou um passo para trás, verificando o caimento e
os detalhes. Ajeito os tampões que coloquei por dentro do
vestido, garantindo que tudo esteja no lugar e que não
corra o risco de vazar leite. Isso me traz um certo alívio,
pois a última coisa que quero é passar por uma situação
e m b a r a ç o s a d u r a n t e o j a n t a r.
Respiro fundo, observando meu reflexo por mais um
i n s t a n t e , t e n t a n d o m e a c a l m a r. E m a l g u m a s h o r a s e u
estaria na presença dos pais do Diogo e de Felipe, saber
que ele estará com certeza me deixa mais nervosa. Levo
as mãos a cintura e fico observando meu reflexo. Se ele
falar a verdade? Se Diogo sair prejudicado disso? Os pais
f i c a r i a m c o n t r a o f i l h o ? S r. H u m b e r t o , r e a l m e n t e f o r ç a r i a
um casamento entre mim e Felipe?
A porta do quarto se abre lentamente, e vejo dona
H e r b e r t i n a m e s o r r i r.
— Vo c ê e s t á l i n d a , M a r i n a — e l a m e e l o g i a e s e
a p r o x i m a . C o m d e l i c a d e z a a r r u m a m e u s c a b e l o s . — Vo c ê
não tem nenhuma joia? — Dona Herbertina pergunta, seus
olhos atentos examinando meu visual.
— Não — respondo, tentando esconder a tensão que
sinto. — Eu nem pensei nisso.
Ela me observa por um segundo, e então, com um
gesto decidido, leva as mãos ao próprio pescoço e retira
a correntinha que carrega. A simplicidade do gesto me
c o m o v e , e a n t e s q u e e u p o s s a p r o t e s t a r, e l a a e s t e n d e
para mim.
— Use essa.
— Não precisa, Dona Herbertina — digo, sentindo
um calor no peito por seu carinho, mas ela apenas
gesticula para que eu vire de costas. Obediente, faço o
que ela pede.
Sinto seus dedos ágeis fecharem o fecho atrás do
meu pescoço. O pingente repousa suavemente contra
minha pele, e eu toco nele com gratidão. Assim que me
volto para ela, estou sorrindo, o nervosismo
momentaneamente esquecido.
— Va i d a r t u d o c e r t o — e l a r e p e t e , s e u t o m f i r m e
como se quisesse garantir que eu realmente acreditasse
nisso. Concordo com um aceno, embora a dúvida ainda
permaneça em meu coração. — O Igor está lá na sala com
o H e i t o r. O D i o g o n ã o t i r a o s o l h o s d e l e , p a r e c e q u e a
qualquer momento vai arrancar o Heitor dos braços dele
— ela acrescenta, um sorriso divertido nos lábios.
Não consigo evitar sorrir também. Imaginar Diogo
v i g i l a n t e , s e m p r e t ã o p r o t e t o r c o m H e i t o r, a q u e c e m e u
coração de um jeito especial.
Saímos do quarto juntas, meus passos lentos e
cuidadosos. Estou ansiosa, meu coração acelerado
enquanto me aproximo da sala. Quero saber o que Diogo
vai dizer ao me ver assim, mas ao mesmo tempo, há um
medo sutil de não corresponder às expectativas. Cada
passo me leva mais perto do momento em que nossos
o l h o s v ã o s e e n c o n t r a r, e a e x p e c t a t i v a s ó c r e s c e .
Quando chegamos à sala, meu coração bate mais
r á p i d o , u m a m i s t u r a d e n e r v o s i s m o e e x p e c t a t i v a . Ve j o
Igor sentado no sofá com Heitor nos braços, balançando-
o suavemente. Meu bebê está vestido com um macacão
escrito “eu tenho o melhor titio”. Isso me tirou um
s o r r i s o s i n c e r o q u a n d o v i m a i s c e d o . Vo l t o m i n h a a t e n ç ã o
p a r a I g o r.
Ele tem cabelos pretos estão cortados mais baixos
que da última vez que o vi. Está com uma camiseta
branca, calça jeans e coturnos. Já Diogo está em pé ao
lado, os olhos fixos no bebê, como se estivesse pronto
para intervir a qualquer momento. A expressão dele é de
pura vigilância, o que me faz sorrir internamente. Igor
p e r c e b e m i n h a p r e s e n ç a p r i m e i r o e l e v a n t a o o l h a r, u m
sorriso brincalhão surgindo em seus lábios.
— Olha só quem está pronta para arrasar corações
— ele comenta, e Diogo finalmente se vira na minha
direção.
O olhar dele percorre meu corpo de cima a baixo,
seus olhos escurecendo um pouco enquanto me observa. É
um olhar intenso, que faz meu estômago dar um nó de
expectativa. O silêncio que se segue parece se estender
por uma eternidade, até que ele finalmente fala.
— Vo c ê e s t á l i n d a — a v o z d e l e é b a i x a , q u a s e
rouca, e sinto minhas bochechas aquecerem com o elogio.
— Obrigada — murmuro, tentando controlar o rubor
que certamente já tomou conta do meu rosto.
Quero dizer que ele também está muito bonito, mas
parece que minha voz não me obedece. A camisa branca
social abraça seus músculos de forma impecável,
destacando a definição de seus ombros e peito. O tecido
branco reflete a luz da sala, acentuando o contorno de
cada músculo e dando a impressão de que a camisa foi
feita sob medida para ele. Desço o olhar e vejo como a
calça social preta complementa perfeitamente o conjunto,
acentuando a forma das suas pernas. Seus sapatos de
couro polido brilham com um brilho sutil, e o cinto preto
é o toque final que une o visual.
Igor se levanta, ainda segurando Heitor com
cuidado, e olha para o amigo. Diogo continua me
o b s e r v a n d o , e p o s s o s e n t i r a t e n s ã o n o a r, c o m o s e a l g o
mais estivesse sendo dito sem palavras.
— É... estranho. — murmura, mas logo sorri. —
B o a s o r t e c o m o j a n t a r, M a r i n a — I g o r b r i n c a , d a n d o u m
l e v e t a p a n o o m b r o d e D i o g o a n t e s d e s e a f a s t a r. — N ã o
e s q u e n t e m c o m o h o r á r i o d e v o l t a r, v o u c u i d a r d o s d o i s .
Ti a H B T e o c a r i n h a d e j o e l h o e s t ã o s e g u r o s c o m i g o .
— Não chama meu bebê assim — peço e me
a p r o x i m o d e l e . To c o n a b o c h e c h a g o r d u c h a e s o l t o u m
pequeno suspiro. — Ele é bem lindo, puxou a mim.
— I s s o n ã o p o s s o n e g a r. — I g o r d e v o l v e e e u
desvio o olhar dele para Diogo que está com o semblante
sério. — Eu só confirmei o que ela disse — ele retruca ao
perceber o olhar de poucos amigos de Diogo.
Me afasto e sigo para o lado de Diogo. Ele ainda
me olha com aquela intensidade que faz meu coração
a c e l e r a r. A s s i m q u e f i c o p e r t o , s i n t o o d e l i c i o s o c h e i r o
do perfume amadeirado que ele usa. Uma essência que
combina perfeitamente com ele.
— Va m o s i n d o — D i o g o f a l a p a r a m i m . E n t ã o o l h a
para dona Herbertina. — Sinta-se à vontade para colocar
Igor de castigo caso ele mereça.
Igor ri, se aproxima dela e entrega meu bebê que
resmunga.
— Ti a H B T n ã o v a i f a z e r i s s o c o m i g o — a f i r m a , e m
seguida a beija na bochecha. — Posso olhar o que tem na
geladeira?
— Acho que tem o mousse que você gosta — ela
responde para ele de um jeito doce, Igor rapidamente vai
para a cozinha.
Sinto a mão de Diogo tocar na base da minha
coluna, um gesto suave, mas firme, que me guia em
direção à porta. Ele indica o caminho com um leve
p r e s s i o n a r, e e u s i g o , a i n d a u m p o u c o n e r v o s a , m a s
determinada.
A n t e s d e s a i r, o l h o u m a ú l t i m a v e z p a r a m e u b e b ê
nos braços de dona Herbertina. O pequeno Heitor está
tranquilo, e a confiança nos olhos dela me traz algum
conforto. Respiro fundo, sabendo que ele está em boas
mãos, e finalmente me viro para acompanhar Diogo.
Saímos de casa em silêncio, e a mão de Diogo
permanece firme na base da minha coluna, guiando-me
até a garagem. O ar fresco da noite envolve-nos quando
chegamos ao carro, onde ele abre a porta do passageiro
para mim, um gesto que me faz sorrir internamente,
apreciando o cuidado que ele tem comigo.
— Pronta? — Diogo pergunta, enquanto me observa
com atenção, seus olhos cheios de uma tranquilidade que
me acalma.
— Pronta — respondo, tentando transmitir
confiança.
Ele fecha a porta com suavidade e contorna o carro
para o lado do motorista. Assim que ele se acomoda no
b a n c o e l i g a o m o t o r, s i n t o a v i b r a ç ã o l e v e d o c a r r o
percorrer meu corpo. Coloco o cinto de segurança, e
Diogo faz o mesmo antes de manobrar para sair da
garagem.
A viagem começa tranquila. O trânsito flui bem
pelas ruas iluminadas da cidade, e o silêncio entre nós é
confortável, um espaço que ambos precisamos para
p r o c e s s a r o q u e e s t á p o r v i r. O b s e r v o a p a i s a g e m n o t u r n a ,
tentando controlar a ansiedade que cresce no meu peito.
Diogo dirige com uma calma habitual, as mãos firmes no
volante, enquanto seus olhos permanecem focados na
estrada.
— Tr â n s i t o e s t á m e l h o r d o q u e e u e s p e r a v a p a r a
essa hora — comenta ele, quebrando o silêncio, e eu
apenas aceno, ainda mergulhada em meus pensamentos.
Conforme nos aproximamos do destino, percebo que
estamos entrando em uma área mais tranquila da cidade.
As ruas ficam mais arborizadas, e noto que as casas
c o m e ç a m a a p a r e c e r, c a d a u m a m a i o r e m a i s i m p o n e n t e
d o q u e a a n t e r i o r. S i n t o u m a c u r i o s i d a d e m i s t u r a d a c o m
um pouco de nervosismo ao perceber que estamos
entrando em um condomínio de luxo. Nunca estive aqui
antes, e a imponência do lugar me faz sentir um frio na
barriga.
— Seus pais moram aqui? — pergunto, minha voz
traindo minha surpresa.
— Sim, há muitos anos. — ele responde com
naturalidade, sem tirar os olhos da estrada.
Diogo manobra o carro pelas ruas do condomínio
com a familiaridade de quem já percorreu esse caminho
inúmeras vezes. Finalmente, ele para em frente a uma
casa imponente, com luzes suaves iluminando o jardim e
a f a c h a d a . E l e d e s l i g a o m o t o r, e p o r u m m o m e n t o ,
ficamos sentados em silêncio, ambos cientes da
importância dessa noite.
— Não precisa ficar preocupada com nada — ele
fala, virando-se para mim. — Estarei sempre do seu lado.
— Obrigada! Estou bem ansiosa. — admito,
t e n t a n d o s o r r i r, m a s n ã o c o n s i g o e s c o n d e r o n e r v o s i s m o
na minha voz.
— Va i d a r t u d o c e r t o — e l e d i z , e s t e n d e n d o a m ã o
para segurar a minha por um breve momento, antes de
abrir a porta do carro.
Saímos juntos, e enquanto caminhamos até a
entrada da casa, observo dois carros estacionados na
calçada. Ao meu lado, Diogo pragueja baixinho, e eu fico
sem entender o motivo. Aperto a mão dele, buscando
força e confiança. Seu olhar encontra o meu rapidamente,
mas antes que ele possa dizer algo, a porta da casa se
abre.
Uma mulher elegante, com postura impecável,
aparece na entrada. Seu olhar crítico me examina dos pés
à cabeça, e eu sinto o julgamento em seus olhos verdes, o
que me faz engolir em seco.
— Finalmente chegou, Diogo — ela diz, com uma
voz fria e controlada.
— Boa noite, mãe.
C a p í t u l o 1 5 – M a r i n a

Diogo dá um passo à frente, soltando minha mão


para cumprimentá-la. Fico surpresa com essa
formalidade, mas não demonstro. Eu me sinto um pouco
deslocada, incerta de como me portar diante dessa mulher
q u e p a r e c e m e a v a l i a r c o m t a n t o r i g o r. Te n t o m a n t e r u m
sorriso educado no rosto, mas a tensão no ar é palpável.
— Esta é Marina — Diogo apresenta, virando-se
para mim e pousando uma mão leve em minhas costas.
— Prazer em conhecê-la, dona... — começo, mas
minha voz falha um pouco.
— Adriana Macêdo — ela interrompe, ligeiramente
forçando um sorriso. — Seja bem-vinda, Marina.
A forma como ela pronuncia "bem-vinda" soa mais
como uma formalidade do que um convite genuíno, e isso
só aumenta minha insegurança.
— Obrigada — respondo, tentando manter a
compostura.
Entramos na casa, e imediatamente sou envolvida
por uma sensação de opulência e elegância. O ambiente é
decorado com móveis de bom gosto, obras de arte nas
paredes e uma iluminação suave que realça o requinte do
l u g a r. É o t i p o d e c a s a q u e i m p r e s s i o n a à p r i m e i r a v i s t a ,
e isso só aumenta minha apreensão.
Diogo caminha ao meu lado, mantendo sua mão
firme nas minhas costas, como se estivesse tentando me
passar segurança. Sigo seus passos, tentando não me
sentir deslocada naquele cenário.
— S e u p a i e s t á n a s a l a . Vo c ê s d e m o r a r a m , s a b e q u e
odeio atrasos, Diogo. — a mãe dele diz, com um aceno
b r e v e e m d i r e ç ã o a o c o r r e d o r q u e l e v a à s a l a d e e s t a r.
— Va m o s — D i o g o m u r m u r a p a r a m i m , g u i a n d o - m e
com suavidade.
S e g u i m o s p e l o c o r r e d o r, e p o s s o o u v i r a s v o z e s
a b a f a d a s q u e v ê m d e u m a s a l a p r ó x i m a . A o e n t r a r, v e j o o
pai de Diogo sentado em uma poltrona de couro, com um
copo com bebida em mãos. Sentados em outro sofá, vejo
duas mulheres e Felipe. Ele assim que me vê trava a
mandíbula, seu olhar raivoso que eu já presenciei tantas
v e z e s e s t á a l i , m a s e l e t e n t a d i s f a r ç a r.
— Chegaram! — Humberto fala encarando-nos por
u m m o m e n t o a n t e s d e s e l e v a n t a r. — A c h e i q u e n ã o
viriam.
Olho para as duas mulheres que se levantam. Uma
tem os cabelos curtos, um piercing no nariz, é bem bonita
e não tira os olhos de Diogo. Já a outra tem os cabelos
longos e castanhos, sorri em minha direção.
— O trânsito estava complicado — Diogo dá de
ombros, e noto que ele evita entrar em detalhes. — Boa
noite.
O pai de Diogo se vira para mim, e seus olhos
analisam minha figura com um sorriso.
— Prazer em revê-la, Marina — ele diz, estendendo
a m ã o d e f o r m a c o r t ê s . — Vo c ê e s t á m u i t o l i n d a .
— O b r i g a d a , S r. M a c ê d o — r e s p o n d o , a p e r t a n d o s u a
mão com um sorriso educado. — A sua casa é linda.
— P o r f a v o r, m e c h a m e d e H u m b e r t o — p e d e e o l h a
rapidamente para Diogo. — Bom, deixe-me apresentá-la
as mulheres da família — ele murmura e aponta para as
outras. — Essa é a Amanda e Beatriz. São irmãs, filha de
um amigo meu.
— Oi — aceno para as duas. — Prazer em conhecê-
las.
— Oi, Marina. Igualmente! — A de cabelos longos
m e s o r r i e d u c a d a . — Vo c ê j á d e v e c o n h e c e r o F e l i p e , e l e
é o meu noivo.
Olho para ele que tem seu olhar sério em minha
direção.
— Oi Marina.
Meu coração acelera ao vê-lo ali, sinto uma onda de
nervosismo e me medo me atingirem. Aceno e
automaticamente me aproximo mais de Diogo. Ele
entrelaça os dedos nos meus me dando força.
— Acho que podemos ir jantar — Humberto fala e
n o s g u i a a t é a s a l a d e j a n t a r.
S e g u i m o s p e l o c o r r e d o r, e o s o m d e c o n v e r s a s e
risadas que vinha da sala de estar se transforma em uma
conversa mais contida.
Q u a n d o c h e g a m o s à s a l a d e j a n t a r, D i o g o p u x a u m a
cadeira para mim com um gesto cortês, o que me faz
sentir um calor no peito. Eu o olho agradecida, e ele me
responde com um sorriso que transmite confiança e
carinho.
— Obrigada — murmuro, sentando-me com cuidado
enquanto ele se acomoda ao meu lado.
A sala de jantar é sofisticada, com uma mesa de
madeira escura impecavelmente posta. As irmãs já estão
sentadas, e Felipe se aproxima em silêncio, não
respondendo quando Beatriz o pergunta algo. Diogo e eu
t r o c a m o s u m b r e v e o l h a r, e e l e s e g u r a m i n h a m ã o p o r
baixo da mesa, transmitindo uma tranquilidade que me
ajuda a relaxar um pouco mais.
O lugar de destaque na cabeceira da mesa é ocupado
por Humberto e Adriana, que logo se juntam a nós, em
seguida dois empregados se aproximam empurrando dois
carrinhos com as bandejas de INOX.
— Espero que gostem — Adriana diz, com um
sorriso que parece um pouco mais genuíno agora. —
Mandei preparar alguns dos pratos favoritos da família.
— educadamente um dos empregados começam a me
servir e ao Diogo. — Então, Marina, conte-nos um pouco
sobre você — ela murmura, sem tirar os olhos de mim. —
Como só agora soubemos de você e da sua gravidez?
— Mãe.
Diogo a olha, ela desvia o olhar dele de volta para
mim.
— Eu posso perguntar não é, Marina? Só sou uma
m ã e q u e d e s c o b r i u q u e p o r a c a s o t e m u m n e t o . Vo c ê n ã o
vai me levar a mal.
Assim que a comida é servida, eu olho para Diogo,
mas não me demoro nele.
— Sim, eu entendo a senhora. — respondo e
percebo que todos estão me olhando. Principalmente
Felipe que está entre tenso e raivoso. — Bom, eu estou
terminando o curso de biologia. Não sou do daqui, mas
acho a cidade adorável.
Sei que não foi exatamente isso que me foi
p e r g u n t a n d o , m a s n ã o c o n s e g u i p e n s a r e m a l g o m e l h o r.
— E como conheceu o meu filho?
— Ela trabalhava em uma loja de construção —
dessa vez é Diogo que responde. — Podemos começar a
comer?
Adriana mantém o olhar severo no filho, mas por
fim dá de ombros.
— Vo c ê a c a b o u d e t e r u m b e b ê , M a r i n a ? — B e a t r i z
pergunta e eu aceno. — Deve ser maravilhoso! Felipe e
eu estamos pensando em ter um, quero muito uma
m e n i n a . Vo c ê t e m u m m e n i n o ?
— Heitor Macêdo — Humberto fala antes que eu o
faça, então eu o encaro. — Meu primeiro neto. Ele é
muito bonito, da próxima vez quero segurá-lo.
Sorrio e volto meu olhar para o prato, com a cabeça
a mil.
— Vo c ê s p e n s a m e m c a s a r ? — a i r m ã d a B e a t r i z ,
Amanda, pergunta. — Afinal, acho que não precisam se
casar só porque tem um filho.
— Eu espero que sim — Humberto avisa e nos olha.
— Não me sinto confortável em saber que meu neto esteja
sendo criado longe da família, e podem me chamar de
antiquado, mas sou do tempo em que se engravidou a
filha de outro homem, então você deve honrar as suas
c a l ç a s e s e c a s a r.
— P a i — D i o g o m u r m u r a o o l h a n d o . — Va m o s
apenas jantar hoje. Eu sei dos meus compromissos.
— Compromissos — Adriana repete enquanto bebe
do vinho. — Engraçado você falar isso, porque no nosso
ú l t i m o j a n t a r, s e b e m m e l e m b r o — e l a f a l a e a p o n t a p a r a
D i o g o e A m a n d a . — Vo c ê s d o i s e s t a v a m s e c o n h e c e n d o .
E l e l h e c h a m o u p a r a j a n t a r, n ã o f o i A m a n d a ?
— Sim, Sra. Macêdo — Amanda afirma e me olha.
— Ele disse que era solteiro. Achei até que rolou um
clima.
O silêncio que se instala na sala de jantar é
e n s u r d e c e d o r. A s p a l a v r a s d e A m a n d a e c o a m n a m i n h a
mente, cada sílaba cravando uma dúvida mais profunda
no meu coração. Meu estômago se aperta, e a comida
parece pesar uma tonelada em minha boca. Mal consigo
e n g o l i r.
Com dificuldade, levanto os olhos para Diogo. Ele
está me olhando, seus olhos carregados de uma mistura
de surpresa e algo mais — talvez arrependimento?
C o n f u s ã o ? N ã o c o n s i g o d e c i f r a r. M a s o q u e s i n t o d e n t r o
de mim é claro: eu me sinto enganada.
L e m b r o - m e d a n o s s a c o n v e r s a a n t e r i o r, q u a n d o
perguntei diretamente a ele se estava conhecendo alguém.
Sua resposta foi um firme "não". E agora, sentada aqui,
rodeada por sua família, escutando Amanda contar que
e l e a c o n v i d o u p a r a j a n t a r, q u e h o u v e u m c l i m a e n t r e
eles... Isso parece uma traição.
— Eu disse que não estava à procura de ninguém,
Amanda — Diogo fala, sua voz firme e segura, me
forçando a levantar o olhar para ele. — E educadamente,
pedi para que não se encorajasse a nada.
Meu olhar se volta para Amanda, que mantém um
sorriso nos lábios, como se estivesse saboreando a tensão
n o a r. O d e s c o n f o r t o d e n t r o d e m i m s ó a u m e n t a , m a s
agora misturado com uma ponta de alívio. Diogo está
tentando esclarecer as coisas, mas a presença daquele
sorriso nos lábios de Amanda me deixa em alerta. Ela
parece estar testando as águas, provocando.
— Diogo, eu vi o seu olhar em mim — afirma e
pega a taça de água. — Mas vamos fingir que nada
aconteceu.
Diogo respira fundo, e meu olhar vai até Adriana
q u e m a n t é m u m s o r r i s o p e q u e n o . A o p e r c e b e r m e u o l h a r,
ela me sorri de um jeito forçadamente doce.
— Vo c ê c h e g o u d o n a d a , M a r i n a . N ã o p o d e c u l p a r o
meu filho por ele tentar procurar alguém que seja
r e a l m e n t e p r o m i s s o r. — e l a d á d e o m b r o s , s a b e n d o
exatamente como está me deixando desconfortável. — Me
fale sobre os seus pais. O que fazem?
A n t e s q u e e u p o s s a r e s p o n d e r, s i n t o a m ã o d e D i o g o
em minha coxa em um carinho suave. O toque é
reconfortante, mas a tensão na mesa é palpável. Amanda
c o n t i n u a c o m a q u e l e s o r r i s o p r o v o c a d o r, e n q u a n t o
Adriana, com seu tom incisivo, claramente tenta me
c o l o c a r n o m e u l u g a r. O a r e s t á c a r r e g a d o d e h o s t i l i d a d e
velada, e sinto que cada palavra é uma faca disfarçada de
cortesia.
— M e u s p a i s . . . — c o m e ç o a r e s p o n d e r, s e n t i n d o a
p r e s s ã o a u m e n t a r. — M i n h a m ã e c o s t u r a e m e u p a i e s t á
aposentado. Ele sofreu um acidente no trabalho, e por
i s s o n ã o p o d e m a i s t r a b a l h a r.
— Ah, ele é inválido?
— Ele trabalhou duro a vida inteira, até que o
acidente aconteceu — continuo, minha voz saindo mais
firme do que eu esperava. — Ele não é inválido, apenas
foi forçado a parar por conta de um acidente que o
deixou com limitações físicas.
Adriana levanta as sobrancelhas, como se minha
resposta a tivesse surpreendido. O tom de desprezo dela
me atinge como uma faca, mas me mantenho firme,
r e c u s a n d o - m e a d e i x a r q u e e l a m e v e j a r e c u a r.
— Entendo — ela responde com um sorriso, mas o
olhar que me lança mostra que, na verdade, ela não
e n t e n d e . O u t a l v e z n ã o q u e i r a e n t e n d e r.
— Te n h o c e r t e z a d e q u e e l e f e z o m e l h o r q u e p ô d e
por sua família — diz Humberto, sua voz firme, tentando
dissipar a tensão. — No final das contas, é isso que
importa.
Agradeço silenciosamente pelo apoio, mas o
desconforto permanece. Diogo, ainda ao meu lado,
desliza a mão pela minha coxa, me dando forças. O olhar
dele se cruza com o meu, e percebo a determinação em
seus olhos. Ele sabe que essa noite está sendo um teste, e
está comigo nessa batalha silenciosa.
— Va m o s m u d a r d e a s s u n t o — D i o g o d i z
finalmente, sua voz carregada de autoridade. — Estamos
aqui para jantar em família, e isso deveria ser agradável,
não uma sessão de interrogatório.
O d e s c o n f o r t o é a v a s s a l a d o r, m a s a m ã o d e D i o g o
em minha coxa, me acalma. Ele a aperta levemente, como
s e e s t i v e s s e m e d i z e n d o p a r a n ã o c e d e r, p a r a m a n t e r
minha posição.
— Deve saber que Diogo chegou nas nossas vidas
com onze anos, Marina — Adriana murmura, seu tom não
revelando muito. — Eu sempre o tratei como se tivesse
saído de mim. Dei brinquedos caros, viagens caras, ele
nem pedia, mas como a boa mãe que sou, proporcionava.
Criei meu Felipe do mesmo jeito. Ele me conta tudo da
vida dele, já o Diogo tem esse sentimento triste comigo.
— Mãe...
— Eu realmente não entendo — ela volta a falar
interrompendo Diogo. — E agora, só o fato de perguntar
sobre a mulher que engravidou e deu a luz ao meu neto, é
motivo para ele me tratar assim.
— Adriana — Humberto a chama. — O que está
f a z e n d o ? Va m o s a p e n a s c o m e r, v o c ê q u e q u e r i a e s s e
j a n t a r.
— Para conhecer a Marina — ela enfatiza com o
olhar nele. — E nem isso posso.
— Não como se estivesse a interrogando — Diogo
fala novamente.
Observo todos comerem desconfortáveis.
— Eu posso usar o banheiro? — pergunto para
Humberto que acena.
— Ve m , e u t e l e v o — D i o g o m u r m u r a f i c a n d o d e p é .
Peço licença e saio sem olhar para trás.
Diogo me guia pelo corredor em direção ao
banheiro, mas em vez de me soltar na porta, ele continua
me levando até um canto mais reservado da casa, longe
d o s o l h a r e s e o u v i d o s d a s a l a d e j a n t a r.
— P o r f a v o r, m e d e s c u l p e p o r t o d a e s s a p a l h a ç a d a
— ele pede e me toca o rosto. — Se eu soubesse que a
Amanda estaria aqui, pode ter certeza de que não
viríamos.
— Tu d o b e m — m u r m u r o c o m m i n h a v o z t r e m e n d o
u m p o u c o . — A s u a m ã e é r e a l m e n t e b e m d i f í c i l d e l i d a r.
— Eu sei, e sinto muito.
Mordisco o lábio e arrisco encará-lo nos olhos.
Diogo tem o olhar preocupado, levo minha mão a sua
barba e faço um carinho. Então me lembro de algo e
recolho minha mão lentamente.
— Vo c ê e s t a v a c o n h e c e n d o a A m a n d a ?
— Não estava procurando ninguém, Marina —
responde sério sem desviar nossos olhares. Ele abre a
boca para falar algo, mas por fim desiste. Fica uns
segundos me olhando, para em seguida tocar sutilmente
e m m e u q u e i x o . — Vo c ê q u e r i r p a r a c a s a ?
A p e r g u n t a m e d e i x a c o m u m a v o n t a d e d e s o r r i r,
com os meus sentimentos confusos em meu peito, só com
a menção “ir para casa”.
— Não quero ser mal-educada com os seus pais —
falo, mesmo que no fundo minha vontade seja de ir logo.
— Eles foram mal-educados com você. Eu não
quero que se sinta desrespeitada — afirma acarinhando
minha bochecha. — Se quiser podemos sair e ir até uma
lanchonete que fica 24h aberta. Caso ainda esteja com
f o m e . Va i e s t a r s e g u r a c o m i g o .
Analiso o convite, e meus olhos se perdem no azul
escuro de Diogo. O cabelo dele está impecavelmente
penteado para trás, e a barba loira emoldura seu rosto,
dando-lhe uma aparência que é ao mesmo tempo elegante
e protetora.
— Até que não seria má ideia.
Diogo sorri e se inclina até beijar os meus lábios.
Quando o puxo pela gola da camisa, escuto uma risada de
puro escárnio. Nos separamos, e então posso ver Felipe
s e a p r o x i m a r.
— E não é que você achou um otário para assumir
esse bastardo?! — Felipe diz com sua voz carregada de
desprezo.
— Se você não quiser um olho roxo — Diogo
murmura dando um passo a frente, mas logo o paro. — Eu
sugiro que vá embora.
— Vo c ê é i n a c r e d i t á v e l , D i o g o ! S e m p r e q u e r e n d o o
que é meu! Meus pais, minha vida, agora essa
vagabunda? — seu olhar direcionado a mim é de puro
n o j o . — M a s n ã o v o u t e c u l p a r, e l a t e m u m a b o c e t a
deliciosa e a boca então?
Diogo se afasta de mim em um movimento abrupto
e, num piscar de olhos, está segurando Felipe pela gola
da camisa. Seus olhos estão incendiados de raiva, e o ar
ao redor parece vibrar com a tensão.
— Eu vou dizer mais uma vez, Felipe — Diogo
sussurra com uma frieza cortante, o rosto quase colado ao
de Felipe. — Não chegue perto dela! Não ouse falar ou
pensar nela... para o seu próprio bem! E se você chamar o
Heitor de bastardo mais uma vez, pode ter certeza de que
eu vou quebrar a sua cara.
O tom de voz de Diogo é ameaçador e implacável, e
a força em suas palavras faz com que até mesmo o chão
p a r e ç a t r e m e r. F e l i p e e n g o l e e m s e c o , o m e d o f i n a l m e n t e
substituindo a arrogância em seu rosto.
— D i o g o . . . ? — t e n t o o c h a m a r, m a s e l e n ã o m e
olha.
— Entendeu? — Diogo continua apertando ainda
mais a camisa de Felipe. — Agora se afaste antes que eu
perca a paciência de vez.
Felipe, pálido e visivelmente abalado, balança a
cabeça em um gesto nervoso e se afasta lentamente, sem
se atrever a dizer mais uma palavra. Quando ele
finalmente se afasta, Diogo está respirando pesadamente
enquanto encara o irmão com um olhar que promete mais
d o q u e p a l a v r a s p o d e m e x p r e s s a r.
Diogo se vira para mim, o rosto ainda tenso.
— Vo c ê p r e c i s a i r a o b a n h e i r o ? — i n d a g a e e u
nego, eu só queria sair um pouco daquele jantar
s u f o c a n t e . — Va m o s e m b o r a .
E l e m e g u i a g e n t i l m e n t e d e v o l t a à s a l a d e j a n t a r,
onde se despede apenas de seus pais. O ambiente é um
pouco tenso, mas sua atitude firme e calma me faz sentir
um pouco mais segura, mesmo que há alguns minutos,
meu coração quase tenha saído pela boca. Seus pais
trocam olhares, mas não insistem. Nos dirigimos para a
saída, e Diogo segura minha mão com firmeza. Sinto um
alívio ao sair da casa e ver a caminhonete à nossa frente.
Entramos, e, enquanto Diogo da a partida ele me
olha.
— Descanse um pouco — Diogo sugere, sua voz
suave. — Nunca mais vou fazer você passar por isso —
profere convicto. — E não se preocupe com Felipe, ele já
está avisado.
Eu aceno, sentindo-me mais tranquila à medida que
o carro avança para a saída. Ajeito uma mecha atrás da
orelha e tento sorrir para Diogo. Ele continua sério, de
um jeito bem charmoso.
— Não te disse antes — começo fazendo-o me olhar
—, mas você está muito lindo.
Ele demora uns segundos, mas então me sorri.
— Vo c ê t a m b é m e s t á m u i t o l i n d a .
Vo l t o a o l h a r p a r a f r e n t e , s e n t i n d o m e u c o r a ç ã o a o s
pulos com o elogio e um calor se espalhar por meu peito.
Olho para meus seios e sinto-me aliviada ao perceber que
os tampões estão funcionando, evitando qualquer
constrangimento adicional. Solto um suspiro discreto,
contente por esse pequeno detalhe estar sob controle,
pelo menos.
Diogo continua dirigindo, seus olhos atentos à
estrada.
Ele mantém uma mão firme no volante, enquanto a
outra descansa sobre o câmbio, ocasionalmente se
movendo de forma ritmada. Inevitavelmente me lembro
da noite passada e sinto minha pele ficar arrepiada,
somente com a lembrança. Foi uma surpresa ver Diogo
pelado, seu tamanho me deixou realmente sem palavras
por uns segundos e com água na boca.
Minha respiração acelera um pouco, enquanto tudo
parece um filme em minha cabeça. A forma como ele me
tocou, suas palavras carinhosas e o cuidado comigo...
lembro-me de como seus dedos pressionaram minha pele,
seu toque firme e exigente, e o calor da sua boca em
meus seios, sugando e mordiscando com um prazer que
quase me fez perder o controle.
Ele expressava prazer em todos os toques, e mesmo
ali, me senti extremamente sexy e desejada.
Desvio o olhar para a janela, tentando disfarçar o
rubor que sinto subir pelas minhas bochechas. Sinto o
calor subir pelo meu pescoço, um formigamento suave na
minha pele. Aperto levemente os lábios, tentando não
pensar demais no efeito que Diogo tem sobre mim. Mas é
impossível. Cada vez que ele me toca, parece que estou
em chamas, e mesmo agora, só a lembrança é suficiente
para me deixar inquieta.
— No que está pensando? — a voz dele me tira dos
devaneios, profunda e levemente provocadora.
Engulo em seco, hesitando por um segundo, mas
acabo sorrindo de lado.
— Sobre ontem a noite — respondo, tentando soar
casual, mas minha voz sai um pouco mais rouca do que
pretendia. — Dormi maravilhosamente bem.
Ele sorri, um sorriso de canto que deixa claro que
sabe exatamente no que eu estava pensando.
— Bom saber que também dormiu maravilhosamente
bem — d i z , s u a v o z b a i x a , q u a s e u m r o n r o n a r. — M a s
preciso a d m i t i r q u e d e m o r e i u m p o u c o p a r a d o r m i r,
precisei tomar dois banhos frios. Se é que me entende.
Eu rio entre nervosa e sem jeito.
Estou praticamente contando os dias para que eu
possa me entregar completamente a Diogo. Sei que em
algum momento pensei em ir com calma, mas como
acalmar aquele fogo que me consome lentamente por
dentro? Segurar o pau de Diogo e sentir seu gosto de uma
forma tão íntima, só fez com que meu desejo aumentasse.
Meu corpo inteiro reage à lembrança, uma mistura
d e a n s i e d a d e e d e s e j o q u e f a z m e u e s t ô m a g o r e v i r a r. O
sorriso travesso de Diogo se amplia, seus olhos se voltam
rapidamente para mim e depois de volta para a estrada,
mas eu vejo o brilho de provocação ali. Ele sabe o que
está fazendo comigo, e parece gostar de me deixar nessa
expectativa.
— Não está facilitando para mim — digo, minha
voz falhando um pouco enquanto tento manter o tom
brincalhão.
— Nem quero — ele responde de imediato, a
e x p r e s s ã o m a i s s é r i a , m a s c o m u m t o q u e d e h u m o r. —
Quero que pense em mim. Que deseje o mesmo que eu.
Meu coração acelera, o som da sua voz profunda me
d e i x a n d o a i n d a m a i s a l e r t a . S i n t o a p e l e f o r m i g a r, u m
arrepio descendo pela espinha. Diogo sabe que estamos
no limite, que estamos nos testando, vendo até onde
conseguimos ir antes de nos perdermos um no outro
completamente.
— E o que você deseja, Diogo? — pergunto, minha
voz quase um sussurro, a respiração curta enquanto busco
seu olhar de novo.
Ele me olha de canto de olho, os lábios curvando-se
em um sorriso lento.
— Tu d o , M a r i n a . A b s o l u t a m e n t e t u d o d e v o c ê .
C a p í t u l o 1 6 – M a r i n a

Minha mente dispara, processando cada palavra,


cada nuance de seu tom. "Absolutamente tudo" pode ter
tantas interpretações, e não consigo evitar que a dúvida
se infiltre. Será que ele quer apenas o prazer do meu
corpo? Ou ele está disposto a aceitar tudo o que vem
comigo, incluindo Heitor?
Diogo percebe a mudança em minha expressão e,
por um instante, seus olhos se suavizam. Ele leva sua
mão do câmbio até a minha, pousando-a com firmeza,
seus dedos entrelaçando os meus.
— Marina... — ele fala e eu o observo atentamente.
Meu coração aos pulos, querendo muito saber o que ele
t e m p a r a m e d i z e r. — E u . . . — a n t e s q u e p o s s a c o n t i n u a r,
o celular dele apita duas vezes. Rapidamente ele o pega,
e sua expressão antes zangada pela interferência, se torna
m a i s s u a v e . — Ve j a q u e m e s t á a c o r d a d o .
Ele me mostra a tela do aparelho e meu sorriso
aparece. Dona Herbertina está com Heitor nos braços, ele
e s t á m a m a n d o o l e i t e q u e s e p a r e i a n t e s d e m e a r r u m a r. O s
lindos olhos verdes estão abertos e parecem atentos a
dona Herbertina.
— Meu bebê... — murmuro ainda olhando para a
tela. — Daqui a um mês, preciso voltar com ele ao
médico. Eu li que tem algumas vacinas para ele.
— Tu d o b e m , p o d e m o s i r. — S o r r i o e e n t r e g o o
celular para ele. — Isso se me quiser junto — ele fala
com o cenho franzido e poderia ser coisa da minha
cabeça, mas aquilo era uma timidez em seu rosto? —
Posso pedir para o Igor te levar e te esperar na porta.
— Não, tudo bem! Quero que vá comigo! — afirmo
r á p i d o e e l e m e o l h a . — S e n ã o f o r t e a t r a p a l h a r, n é ?
Vo c ê é b e m o c u p a d o .
— Não vai me atrapalhar — ele responde e dobra
em uma rua. — Eu não esperava esses dias de folga, mas
Marcelo foi bem insistente. Pedi para o Igor me informar
caso acontecesse algo, mas ele é outro que não me fala
nada.
— Vo c ê g o s t a r e a l m e n t e d o s e u t r a b a l h o .
— Sim — Diogo responde e me olha. — Chegamos.
Olho para fora e sorrio ao avistar a fachada da
lanchonete. Descemos do carro, e ao lado de Diogo, nos
dirigimos a entrada. Ele me guia até uma mesa perto da
janela, e se senta em minha frente. O local tem poucos
clientes, talvez por conta do horário. Pego o cardápio e
m e p e r m i t o a n a l i s a r o q u e p o s s o p e d i r.
— Faz tanto tempo que não como um hamburguer
completo — falo e procuro o olhar de Diogo. — Acho que
vou pedir um... o que vai pedir?
— Não sei — ele responde e se senta
despreocupado. Meu olhar vai até os grandes braços dele
e percebo os músculos bem definidos sob a camisa, o
tecido se esticando ligeiramente em cada movimento.
D e s v i o o o l h a r, s e n t i n d o u m l e v e c a l o r s u b i r p e l o m e u
rosto, e tento me concentrar no cardápio novamente. —
Um hambúrguer completo parece uma boa ideia — ele
diz, finalmente, com um pequeno sorriso no rosto. —
Acho que vou te acompanhar nessa.
Sorrio de volta, feliz com a escolha simples.
— Eu sempre gostei desse tipo de comida —
comento, passando os dedos pela borda do cardápio. —
Me lembra dos meus tempos de faculdade, noites
estudando até tarde e, às vezes, parando em lugares como
e s t e p a r a c o m e r.
Diogo ri suavemente, relaxando na cadeira.
— Imagino que tenha sido uma época interessante.
— ele observa, inclinando a cabeça de lado. — Na minha
época não gostava de sair para lugares assim, ficava em
casa no quarto. Eu não fazia outra coisa a não ser
e s t u d a r. F o r m e i n a f a c u l d a d e e f u i d i r e t o e s t u d a r p a r a
fazer a prova da OAB, passei, depois estudei para o
c o n c u r s o d a P F. S ó d e p o i s q u e p u d e a p r o v e i t a r u m p o u c o .
— Bem estudioso — comento. Ele acena e faz um
gesto chamando a garçonete. Ele rapidamente faz o
p e d i d o , n ã o e s q u e c e n d o d o s u c o p a r a a c o m p a n h a r. — S e u
pai deve ter ficado tão orgulhoso de você.
Ele sorri, um sorriso um pouco triste.
Automaticamente lembro da nossa farsa, sei que o que ele
está fazendo por mim é enorme. No dia que Humberto foi
até o hospital, vi que estava furioso e talvez tudo tenha
recaído sobre Diogo. De uma certa forma, ele se
prejudicou com o pai.
— Marina...
— Diogo... — falamos ao mesmo tempo, então
p a r a m o s e e u o e s p e r o f a l a r. — P o d e f a l a r.
— N ã o — n e g a e m e o b s e r v a . — P o r f a v o r, p o d e
falar primeiro.
Concordo e inspiro profundamente, tentando
encontrar as palavras certas. Sinto um nó se formando em
minha garganta, porque sei que o que preciso dizer é
importante.
— Eu sei que você propôs que fingíssemos para os
outros e eu aceitei — começo notando que ele me
observa. — E o seu pai falou sobre casamento... eu só
q u e r o d i z e r, q u e e u n ã o q u e r o q u e v o c ê s d o i s d i s c u t a m
sobre isso. Não quero que entre vocês tenha um
empecilho, que no caso, sou eu.
— Vo c ê n ã o é u m e m p e c i l h o , M a r i n a .
— E também não quero que você se sinta obrigado a
registrar o Heitor — continuo fazendo-o respirar fundo.
— Eu comentei com o seu pai que o Heitor teria o meu
sobrenome e hoje ele falou que Heitor é um Macêdo.
— Ele é um Macêdo. — Diogo afirma e eu aceno,
tentando controlar as batidas do meu coração para o que
p r e c i s o f a l a r a s e g u i r.
— É que casamento e registrar um bebê é algo tão
sério. É um passo delicado e importante. Não sei se você
p r e t e n d e t e r f i l h o s u m d i a , o u s e c a s a r, m a s e u n ã o q u e r o
q u e s e s i n t a p r e s o a a l g o q u e n ã o q u e r. P o r q u e i s s o f i c a r á
marcado na sua vida.
Te r m i n o d e f a l a r e f i c o t e n s a , D i o g o m e o b s e r v a
com aqueles lindos olhos azuis, que nesse momento estão
nublados como se seu pensamento estivesse bem longe.
Antes que ele possa falar algo, a garçonete volta com os
p e d i d o s . A g r a d e ç o c o m u m s o r r i s o e e s p e r o D i o g o f a l a r,
mas ele apenas fixa o olhar no hamburguer e segundos
d e p o i s c o m e ç a a c o m e r.
Me xingo mentalmente por ter tocado naquele
assunto, mas me sinto um pouco leve por dividir aquilo
com ele. Não sei o que estou sentindo por Diogo, mas sei
que ele me faz bem, trata o meu bebê com carinho... Só
que eu não posso me iludir que no fim ele vai ficar
c o m i g o , q u e a q u i l o é u m a h i s t ó r i a d e a m o r. A r r e g a l o o s
olhos com tal pensamento, estou ficando louca? Como é
possível me sentir assim em tão pouco tempo?
To m o u m g o l e d o s u c o d e l a r a n j a e d e c i d o c o m e r.
Ta l v e z c o m e n d o , a q u e l e s p e n s a m e n t o s c o n f u s o s s a i a m d a
minha cabeça.
Comemos em silêncio, Diogo ainda não falou nada e
aquilo acaba me deixando inquieta. Eu devia ter ficado
calada, guardado para mim e só dito caso ele puxasse o
a s s u n t o . M a s n ã o ! E u t e n h o q u e e s t r a g a r a n o i t e . Ta l v e z
fosse por aquele motivo que Felipe me falou aquelas
coisas quando me mandou embora. Olho para Diogo e
s i n t o v o n t a d e d e c h o r a r.
— Marina — Diogo me chama e eu o encaro, seco
rapidamente algumas lágrimas teimosas. — Por que está
chorando?
— Nada — falo e olho para fora. — Podemos ir?
Ele olha ao redor e concorda. Escuto ele chamar a
garçonete, mas meu olhar está lá na rua. Me sinto
confusa, quero construir algo com Diogo, mas eu sei
p e r f e i t a m e n t e q u e e l e m e r e c e a l g u é m m e l h o r. Ta l v e z a
Amanda, ela é bem bonita, deve ter algum diploma e
trabalho. Sem falar que a dona Adriana parece gostar dela
e me desaprovar como nora. Por um momento entendi
Felipe quando falou que não sou mulher para ele, e
talvez, não seja para o Diogo.
Com aquele sentimento ruim no peito, me levanto e
ando com Diogo para fora.
Nos acomodamos na caminhonete e por alguns
segundos, ele fica parado. O olho ao mesmo tempo que
seus olhos azuis me encara.
— Algumas coisas que precisa entender sobre mim
— sua voz é séria. — Eu nunca me envolvi com ninguém
desse jeito, não sou de me abrir com facilidade — dá de
ombros sem desviar nossos olhares. — Não sou de agir
s e m p e n s a r, m a s o q u e e u f a l e i o n t e m p a r a v o c ê , é a m a i s
pura verdade, Marina. — afirma e eu engulo em seco. —
Não me arrependo de ter vocês invadindo minha vida, e
não fui leviano ao dizer que você mexe comigo.
— A Amanda...
— Eu não quero a Amanda — ele me interrompe. —
Eu quero você, Marina. É em você que eu me pego
pensando — confidencia, estou sem palavras. — Quero
c o n h e c ê - l a d e v e r d a d e , s a b e r o q u e t e f a z s o r r i r, o q u e t e
f a z c h o r a r, q u a i s s ã o s e u s s o n h o s , s e u s m e d o s . . . Q u e r o
estar ao seu lado, não por obrigação, mas porque é isso
que eu desejo — ele conclui, sua voz firme, porém suave.
Sinto meu coração bater descompassado, uma
mistura de surpresa e emoção me atingindo com força. As
p a l a v r a s d e D i o g o p a r e c e m c o r t a r o a r, d i r e t a s e s i n c e r a s ,
e a intensidade em seus olhos me deixa vulnerável. O
f a t o d e e l e m e q u e r e r, d e m e e s c o l h e r, é a o m e s m o t e m p o
a s s u s t a d o r e e n c a n t a d o r.
— Eu... — começo, tentando encontrar a voz. — Eu
também quero isso, Diogo. Mas se for muito para você?
Eu tenho o Heitor e...
— Eu entendo os seus receios — Diogo me
interrompe com firmeza, e sua mão procura a minha. —
Eu sei que parece loucura, mas é como me sinto. — sua
voz é decidida, quase teimosa, e um calor se espalha pelo
meu peito.
— É s ó q u e . . . — t e n t o a r g u m e n t a r, m a s e l e b a l a n ç a
a cabeça, os olhos azuis fixos nos meus. — Eu olho para
você, e sei que você merece mais. — ele solta um suspiro
e então eu continuo: — Eu não quero que você perca
muito da sua vida...
Diogo sorri, um sorriso mais leve desta vez.
— Sinceramente? — indaga e eu aceno a espera. —
Eu nunca me senti tão vivo com você e o Heitor na minha
vida.
Minhas mãos tremem levemente enquanto acaricio
seu rosto, sentindo a aspereza de sua barba sob meus
dedos. Quando ele inclina a cabeça em direção à minha,
nossos lábios se encontram em um beijo lento, cheio de
promessas e sentimentos não ditos. É um beijo que sela
algo entre nós, algo que não precisa ser colocado em
palavras.
Quando nos afastamos, apoio minha cabeça na
janela, observando o céu estrelado lá fora. A
tranquilidade da noite parece espelhar o que sinto por
d e n t r o , u m a p a z q u e c o m e ç a a s e i n s t a l a r, d e r r u b a n d o
cada uma das barreiras que construí em torno do meu
coração.

Assim que chegamos em casa, Igor está no sofá


enquanto come e assiste. Observo Marina cumprimentá-lo
e ir direto para o quarto, me aproximo dele e me sento ao
seu lado. Ele tira os olhos da tela e me encara por alguns
segundos.
— Aparentemente de bom humor — comenta e cruza
os braços. — Não foram jantar com os seus pais? — ele
debocha sorrindo de lado.
Solto um rápido sorriso.
— Sim — respondo e começo a ficar descalço —,
mas não ficamos até o final. Estávamos na lanchonete.
Cadê a dona Herbertina?
— Foi deitar — avisa e volta a pegar a bacia de
pipoca. — O carinha de joelho chorou bastante,
p r i n c i p a l m e n t e n a h o r a d e c o m e r. E l e n ã o g o s t o u m u i t o
da mamadeira, mas não o julgo, eu também não aceitaria
um falso. — dessa vez eu cruzo os braços e o encaro
chamando a atenção. — O quê?
— N a d a — b u f o e m e a j e i t o n o s o f á . — Tu d o b e m
por aqui?
— Sim — afirma e fica de pé. — Acho que eu já
p o s s o i r.
O o b s e r v o s e e s p r e g u i ç a r e m e o l h a r. O a c o m p a n h o
e estendo a mão para agradecê-lo, mas ao invés disso, ele
me abraça. As mãos descem por minhas costas me
apertando intensamente. Solto um suspiro.
— Igor?
— Hoje foi um dia cheio de informações — comenta
ainda me segurando no abraço. Franzo o cenho, e quando
ele finalmente se afasta, percebo seu sorriso. — Por isso
q u e a m o a t i a H B T.
— Como assim?
Ele me dá um tchauzinho e se encaminha para a
saída, mas antes que vá, Marina o chama. Ela se
aproxima com um sorriso contido, descalça e ainda com o
vestido que me deixou completamente sem palavras.
— Obrigada por ter vindo — agradece de um jeito
doce.
— Não precisa agradecer — Igor fala com um tom
mais charmoso, que incrivelmente me deixa irritado. —
S e m p r e q u e p r e c i s a r e m p o d e m e c h a m a r.
Me aproximo dos dois e paro ao lado de Marina.
— Boa noite, Igor — falo com a expressão fechada.
Marina me olha confusa, já Igor sustenta o sorriso como
se só ele soubesse de algo. — Dirija com cuidado.
— Com toda certeza — me responde e olha para
Marina. — Rola um abração?
Assim que ele dá um passo a frente, eu o abraço
a n t e s q u e M a r i n a o f a ç a . E s c u t o a r i s a d a d e I g o r, q u e
aparentemente está se divertindo as minhas custas. Ainda
abraçado a ele, o encaminho para a saída. No instante que
ele se vai, me volto para Marina que está parada me
encarando com um pequeno sorriso.
— O que foi isso?
Nego com a cabeça e quando paro em sua frente,
toco com delicadeza sua bochecha.
— Nada — murmuro, é tão impossível não querer
sentir sua pele macia. — E o Heitor?
— Está dormindo — Marina me sorri. — Não sei
p o r q u a n t o t e m p o . — b r i n c a m e f a z e n d o s o r r i r.
Sinto as mãos dela descerem por meu peito e
pararem no cós da minha calça. Seus lindos olhos verdes
brilham em minha direção, tenho a impressão de que ela
vai falar alguma coisa, mas apenas fica ali me encarando.
Ta l v e z e s p e r a n d o u m a a t i t u d e m i n h a ? S ã o t a n t o s
sentimentos dentro de mim, como nunca senti antes.
Me inclino e lentamente toco nossos lábios. Eu
entendo o receio que Marina possa estar sentindo em
relação a nós, mas sinto que estou certo no que estou
fazendo.
Ela mexe comigo de todas as formas. O toque dos
lábios de Marina é suave, mas cheio de urgência, e meu
coração dispara em resposta. Ela traz uma mão para o
meu pescoço, puxando-me para mais perto, e eu
correspondo ao gesto, aprofundando o beijo. Sinto suas
unhas arranharem levemente a minha nuca, um gesto que
manda um arrepio quente pelo meu corpo.
— Diogo... — ela murmura contra minha boca, uma
mistura de urgência e desejo em sua voz.
N ã o s e i o q u e e l a e s t á p r e s t e s a d i z e r, m a s s o m o s
i n t e r r o m p i d o s q u a n d o d o n a H e r b e r t i n a c h a m a p o r I g o r.
M a r i n a s e a f a s t a e o l h a p a r a o c o r r e d o r, m e u c o r a ç ã o e s t á
acelerado.
— Ah — ela exclama assim que nos percebe. — Já
chegaram? — ao parar na sala, olha para o sofá e na
bagunça que Igor deixou. — E cadê o Igor?
— Ele já foi dona Herbertina — Marina responde
com sua voz suave. — Achei que a senhora estava
dormindo.
— Cochilando — corrige com um pequeno sorriso.
— Então? Como foi o jantar?
Marina me olha.
— Bem como a senhora imaginou — respondo
quando Marina não o faz.
— O Felipe, a noiva e a irmã dela estavam também
— Marina conta e leva as mãos até a corrente do pescoço.
— E u f i q u e i c o m m e d o d o q u e e l e p o d e r i a d i z e r.
— Marina, eu vi o Felipe começar a andar e falar —
ela murmura de braços cruzados. — Se ele não assumiu
v o c ê g r á v i d a , n ã o v a i a s s u m i r o H e i t o r.
— E eu não quero, dona Herbertina — Marina
afirma e entrega a correntinha. — Eu acho que só estava
apaixonada por ele, e depois de tudo o que passei tenho a
certeza de que não era um sentimento forte.
Sinto o peso das palavras de Marina me atingindo.
Ela não amava Felipe. Meu peito aperta com a ideia de
que, talvez, ela esteja finalmente pronta para seguir em
frente — e, quem sabe, seguir comigo.
— Vo c ê a i n d a v a i s e r m u i t o f e l i z — d o n a
H e r b e r t i n a f a l a , e m s e g u i d a m e o l h a . — E u v o u d e i t a r,
vocês já chegaram e estou mais aliviada. Boa noite. —
e l a s e v i r a p a r a i r, m a s r a p i d a m e n t e n o s o l h a . — H e i t o r
sentiu sua falta, não sei como ainda não acordou.
E n t ã o c o m o s e a d i v i n h a s s e , e l e c o m e ç a a c h o r a r.
Dona Herbertina nos sorri e vai embora. Marina se vira
para mim com um lindo sorriso. Algum dia meu coração
vai se acostumar com aquele sorriso?
— Eu vou indo — avisa e eu aceno. — Eu gostei da
nossa ida a lanchonete. — ao falar aquilo, ela leva a
mecha do cabelo para atrás da orelha. — Obrigada,
Diogo. Por tudo.
Rapidamente ela vai ao socorro de Heitor e me
deixa parado ali no meio da sala. Respiro fundo e vou até
a mesinha de centro limpar o que Igor sujou. Enquanto
pego a bacia de pipoca e copo de suco, penso em Marina.
Tê-la por perto e presenciar seus sorrisos ou ouvir sua
voz, é o meu momento de paz. A mesma coisa é com
H e i t o r, p o d e r s e g u r á - l o e s a b e r q u e e l e e s t á s e g u r o . . . E u
realmente quero isso.
U m a v i d a s e m e l a e H e i t o r, é a l g o q u e n ã o c o n s i g o
mais pensar ser possível. Meu peito se aperta com a
intensidade do que estou sentindo, com a certeza de que,
alguma forma, eles são as peças que faltavam. Naquele
momento decido que vou conquistá-la e mostrar que
posso ser um bom pai, que estou disposto a enfrentar
qualquer coisa para que fiquem ao meu lado.
Saio do banheiro, nu e enxugando os cabelos com a
toalha. Aquele é o meu segundo banho da noite. O ar
fresco do quarto toca minha pele fria do banho,
p r o v o c a n d o u m a r r e p i o i n s t a n t â n e o . Vo u a t é a c ô m o d a e
pego um short de tecido fino. O visto, em seguida
devolvo a toalha para o gancho do banheiro. Caminho até
a cama, mas minha vontade nesse momento é ir atrás de
Marina. Enquanto tomei banho, senti que não fui capaz
de falar tudo de maneira clara como estou me sentindo
em relação a nós, parece que tudo o que já disse não foi
suficiente para fazê-la entender como está me deixando.
Isso de uma certa forma tem um resultado inquietante em
mim, afinal, nunca precisei passar por isso.
Por fim, me deito na cama e fico olhando para a
porta. Faz algumas horas desde que chegamos e cada um
foi para seu quarto. Busco meu celular no móvel ao lado,
são 2h30. Solto um suspiro e coloco o celular no colchão.
A essa hora Marina deve estar dormindo e eu também
d e v e r i a e s t a r.
Esfrego a mão no rosto e fecho os olhos.
Chega a ser louco como consigo sentir o perfume
dela, mesmo tão longe. “Diogo?” Abro os olhos um tanto
confuso, estou até ouvindo sua voz.
— Diogo? — dessa vez escuto mais alto, olho para
a porta e me sento no colchão. Ela a abre, e então a vejo.
Marina tem os cabelos ondulados soltos, emoldurando seu
lindo rosto. — Posso entrar?
— Claro! — falo rápido e preciso segurar um
suspiro de desejo. Ela usa uma camisola curta de seda e
quando vejo que está sem sutiã. Sinto meu pau começar a
e n d u r e c e r. E n g u l o e m s e c o c o m u m d e s e j o d e p r o v a r
novamente aqueles seios deliciosos. — Algum problema?
— questiono com minha voz rouca.
E l a e n t r a d e v a g a r, f e c h a n d o a p o r t a a t r á s d e s i , e s e
aproxima da cama com passos silenciosos. A penumbra do
quarto realça suas curvas, e a luz fraca da lua ilumina
seu rosto de forma suave. Marina me olha e mordisca
s u t i l m e n t e o l á b i o i n f e r i o r.
— Não te acordei, né? — indaga e eu nego com a
c a b e ç a . — Te m u m a c o i s a m a r t e l a n d o m i n h a c a b e ç a —
c o n f i d e n c i a e n q u a n t o s e a p r o x i m a . — Vo c ê d i s s e q u e
nunca se sentiu tão vivo com a gente aqui e...
— É como me sinto — afirmo a interrompendo. —
Eu nunca me envolvi com ninguém assim, Marina. — fico
de pé e paro em sua frente. — Nunca ninguém me fez
sentir as coisas que sinto por você.
— É tão pouco tempo — comenta e eu aceno —,
mas me sinto da mesma forma. Eu não queria me envolver
com ninguém, mas você reascendeu algo em mim.
Paro por um momento e ela me olha a espera de
uma resposta. Rapidamente olho ao redor fazendo Marina
m e i m i t a r.
— Eu estou sonhando?
Ela ri e me acaricia a barba.
— Anda sonhando comigo?
Marina se deita sobre mim, o calor do seu corpo
irradiando o meu. Ela me olha com um sorriso que
mistura insegurança e desejo. Seus dedos continuam a
acariciar minha barba, e o contato suave me faz
e s t r e m e c e r.
— Vo c ê n ã o s a i d a m i n h a c a b e ç a , M a r i n a .
A vejo engolir em seco e então subo mais os nossos
corpos no colchão.
— Vo c ê t a m b é m n ã o s a i d a m i n h a . — s e u s o r r i s o é
o mais lindo do mundo. — O Heitor está dormindo —
avisa de um jeito tímido, enquanto se senta em meu colo,
suas bochechas estão vermelhas. Arqueio a sobrancelha.
— E se eu estiver certa, ele só vai acordar lá pelas 5h.
— Interessante.
Minha mão passeia por sua cintura e sobe em
direção aos seios perfeitos. Pego um deles e sinto seu
peso, lentamente desço a alça da camisola. A pele branca
é macia ao meu toque, o mamilo rosado endurece sob o
meu toque. Então eu olho em seus olhos, Marina me olha
em expectativa com a respiração acelerada.
— Vo c ê g o s t o u d a n o s s a ú l t i m a v e z ? — p e r g u n t o e
me sento abraçando sua cintura. — Porque eu adorei
provar você.
Jogo os cabelos dela para trás, revelando o pescoço
delicado. Aproximo meus lábios e começo a beijar
suavemente a pele quente. Sinto o aroma dela misturado
com a suavidade de seus toques, e a resposta dela é
instantânea, ela se entrega ao beijo, gemendo baixinho.
Marina apoia suas mãos nos meus braços,
apertando-os gentilmente como se estivesse se segurando
em mim para encontrar mais apoio.
— Achei um pouco... estranho — geme, em seguida
segura meu rosto. — Mas eu gostei, de tudo...
Marina me empurra suavemente até que eu fico
deitado na cama. Com um olhar intenso, ela puxa
lentamente meu short, e a visão da minha ereção faz com
q u e e l a m o r d a o l á b i o i n f e r i o r, c l a r a m e n t e e x c i t a d a . L e v o
as mãos ao seu rosto, sentindo a suavidade de sua pele
sob meus dedos. Me inclino lentamente, meus lábios
quase tocando os seus. O beijo é fervente e impetuoso,
um calor que me consume e me deixa em um estado de
ebulição. Marina corresponde com uma intensidade que
me faz perder o fôlego, seus lábios se movendo contra os
meus com um desejo ardente.
— Mal posso esperar para te fazer minha
completamente — sussurro, minha voz carregada de
urgência e desejo. Puxo seus cabelos na nuca, trazendo-a
ainda mais para perto de mim. — Estou indo dormir de
p a u d u ro , s a b i a ? P o rq u e m i n h a m e n t e f o r m a c e n a s
n o s s a s . . . Vo c ê i m p l o r a n d o p a r a e u m e t e r c o m f o r ç a , o s
seus gemidos me instigando a continuar bem fundo...
O desejo toma conta de mim a cada palavra, e
minha ereção se torna quase dolorosa só de imaginar o
que queremos fazer um com o outro. Sinto meu corpo
inteiro vibrar com a antecipação, e a intensidade desse
momento parece quase insuportável.
— E u p ro m e t o q u e v a m o s f a z e r — a f i r m a
começando a movimentar a mão em um sobe e desce
agonizantemente lento. — Não é só você que vai dormir
cheio de desejo.
Ela me sorri e me rouba um beijo.
— Vo c ê . . .
— Shhh! — me interrompe e de um jeito totalmente
sensual, desce o corpo até ficar entre as minhas pernas
abertas.
As mãos dela deslizam pelas minhas coxas com uma
lentidão calculada, provocando arrepios a cada toque. Os
dedos de Marina exploram cada centímetro da minha
pele, como se estivessem traçando um mapa de desejo.
Seus olhos me encaram, intensos e cheios de malícia,
enquanto um sorriso sutil curva seus lábios.
Ela se inclina mais, trazendo o rosto para perto do
meu pau, e a visão de seus lábios tão próximos da minha
ereção faz meu corpo inteiro pulsar de expectativa.
Então, Marina estira a língua, provocante, e passa pela
minha extensão com uma lambida lenta, que começa na
base e segue até a ponta, como se quisesse prolongar a
sensação e me deixar à beira da loucura.
Quando sua língua atinge a glande, ela para por um
segundo, seus olhos ainda fixos nos meus, antes de
fechar os lábios ao redor da ponta em um beijo molhado e
quente. O prazer explode em minha mente, e tudo em mim
parece gritar por mais. Cada gesto dela é uma mistura de
prazer e provocação, deixando-me completamente perdido
no momento. Ao sentir uma sucção mais intensa, jogo
minha cabeça para trás e permito que um gemido escape
e n t r e o s m e u s l á b i o s . Vo l t o a e n c a r á - l a , h i p n o t i z a d o p e l a s
deliciosas sensações que Marina me proporciona.
Os lábios se afastam por um segundo, e sua mão me
envolve em um ritmo rápido enquanto ela observa meu
pau completamente babado. Seu olhar demonstra todo o
desejo contido que ela está sentindo, quase competindo
com o meu.
— Diogo... — ela geme, minha pele formigando ao
som rouco da sua voz. Seus olhos se apertam levemente,
o c e n h o f r a n z i d o e m u m a e x p r e s s ã o d e p u r o p r a z e r.
A q u e l a é a v i s ã o m a i s l i n d a q u e e u p o d e r i a v e r. O s
cabelos de Marina caem sobre seu rosto enquanto ela me
envolve com os lábios outra vez, umedecidos, quentes,
deslizando com firmeza ao longo da minha ereção. Seus
olhos encontram os meus por um breve momento, e o
brilho de prazer em seu olhar me deixa ainda mais
insano.
Sua mão, ágil e decidida, acompanha o ritmo da
b o c a , a c a r i c i a n d o o q u e e l a n ã o c o n s e g u e e n g o l i r. S e u s
dedos apertam suavemente, seguindo cada movimento de
seus lábios, enquanto ela aumenta a pressão e a
i n t e n s i d a d e , n u m a d a n ç a d e p r a z e r q u e m e f a z e s t r e m e c e r.
Seus movimentos são ao mesmo tempo lentos e intensos,
como se ela quisesse prolongar o momento ao máximo,
me deixando à beira de um prazer insuportável.
Cada segundo se torna uma eternidade deliciosa.
Meus músculos se contraem, e minha respiração acelera
enquanto ela continua, sem nunca quebrar o contato
visual. O calor aumenta, e sinto que estou prestes a
e x p l o d i r, c o m p l e t a m e n t e d o m i n a d o p o r e l a .
— Marina... — gemo, tentando manter o
autocontrole, mas cada centímetro de mim está ardendo
de desejo. Ela sorri levemente ao ouvir meu gemido, seus
olhos cintilando de satisfação. Ela gosta de me ter assim,
vulnerável sob seu toque, à mercê de seu desejo e de suas
vontades.
Minha mão se move quase por instinto, agarrando
seus cabelos macios, puxando-os com um pouco de força
enquanto ela aumenta o ritmo. Sinto seus lábios me
envolverem com mais intensidade, e meu corpo responde
involuntariamente, empurrando-se para frente, buscando
mais dessa sensação que me deixa à beira do abismo.
Cada vez que sua boca desce, um gemido rouco escapa da
minha garganta, e percebo que estou cada vez mais
próximo de perder o controle.
Meus dedos enlaçados em seus cabelos puxam com
mais firmeza, guiando seus movimentos, e ela parece
entender exatamente o que quero, aumentando a
intensidade de cada lambida, cada sucção.
Meu corpo se tenciona por completo, os músculos
se contraem, e o prazer se torna insuportavelmente
próximo. Um gemido profundo escapa da minha garganta,
rouco e urgente, enquanto o calor se acumula em meu
v e n t r e , u m a o n d a q u e c r e s c e e a m e a ç a m e c o n s u m i r.
Ela continua, sem me dar trégua, seus olhos fixos
nos meus, desafiando-me a segurar por mais tempo, a
resistir ao impulso de me entregar completamente. Mas é
impossível. Sinto o prazer se espalhar por todo o meu
corpo, uma explosão de sensações que me faz arquear as
costas e empurrar os quadris para frente.
— Marina... — murmuro entre os dentes cerrados,
quase como uma súplica.
E então, o momento chega. O prazer me atinge em
cheio, uma onda devastadora de êxtase que me faz tremer
de cima a baixo. Meus gemidos se intensificam, ecoando
pelo quarto, enquanto meus dedos apertam seus cabelos,
mantendo-a no lugar enquanto me desfaço em suas mãos e
em sua boca, completamente perdido no êxtase que ela
me proporciona.
Ela continua até o fim, até que meu corpo relaxa,
saciado, e minhas mãos afrouxam o aperto em seus
cabelos. Seu olhar se suaviza, um sorriso satisfeito
brinca em seus lábios, enquanto ela engole os resquícios
d o m e u p r a z e r. S e m f o r ç a s , e u m e d e i x o c a i r d e v o l t a ,
respirando fundo, o coração disparado no peito. Ainda
sinto sua mão tocar meu membro semi-ereto, acariciando-
o suavemente, como se quisesse prolongar a conexão
entre nós.
— Vo c ê é i n a c r e d i t á v e l — m u r m u r o , s e m f ô l e g o , e
estendo uma mão para ela. Marina aceita, seus dedos
entrelaçando-se nos meus, e eu a puxo para cima, até que
nossos rostos fiquem na mesma altura. Seu corpo se
encaixa perfeitamente ao meu, e, por um momento, tudo
ao redor desaparece.
Eu a beijo profundamente, sentindo o gosto de nós
dois em seus lábios, grato e faminto por ela, mesmo após
t a n t o p r a z e r. M i n h a s m ã o s p e r c o r r e m s u a s c o s t a s ,
trazendo-a ainda mais para perto, como se pudesse torná-
la parte de mim. Ela suspira contra a minha boca, um som
suave que envia uma nova onda de calor pelo meu corpo.
— Diogo... — ela murmura contra meus lábios, e o
som do meu nome em sua voz é tudo o que preciso para
saber que, por agora, não há lugar algum onde eu
p r e f e r i s s e e s t a r.
— Fica aqui comigo? — peço fazendo-a me
o b s e r v a r, s e u r o s t o v e r m e l h o p o r c a u s a d e m i n u t o s a t r á s .
— Não quero me afastar de você agora.
— Tu d o b e m — M a r i n a m e s o r r i e e u r e t r i b u o . —
Vo c ê g o s t o u ?
— Vo c ê é m a r a v i l h o s a , M a r i n a — r e s p o n d o , s e u
sorriso aumenta. — Minha vontade nesse exato momento
é retribuir — aviso, e ela mordisca o lábio. — Chupar
você e te deixar mole na minha cama.
Ela arqueia a sobrancelha, me olha de um jeito
desafiador que eu aprovo.
— Eu vou cobrar de você — ela murmura, seus
olhos fixos nos meus, um sorriso travesso nos lábios. Ela
se aconchega mais perto, sua mão pousando levemente em
meu peito, como se estivesse marcando território.
Envolvo-a pela cintura, puxando-a para mais perto.
Sinto seu corpo moldar-se ao meu, a respiração dela
contra minha pele, enquanto um suspiro escapa de meus
lábios. O calor do seu toque e a proximidade me fazem
perceber o quanto eu quero protegê-la, estar ao lado dela.
— Pode cobrar o quanto quiser — murmuro em
resposta, beijando sua testa.
Sinto meu coração acelerar ao perceber que, neste
momento, não há mais nada além dela.
C a p í t u l o 1 7 – M a r i n a

Sinto uma leve sensação de sonolência e algo me


cutucando suavemente na bunda. Espreguiço-me
preguiçosamente, tentando afastar a sensação incômoda,
e coloco uma mão no local. Assim que meus dedos tocam
em algo duro, um gemido baixinho escapa dos lábios
atrás de mim. A sensação de uma barba áspera roçando
meu pescoço faz meu corpo se arrepiar de surpresa e
p r a z e r.
Rapidamente, meus olhos se abrem e tento me virar
para encarar a origem do toque. No entanto, o braço forte
e protetor que me envolve na cintura não me deixa fazer
mais do que me mexer um pouco. Sorrio, reconhecendo o
toque de Diogo e o calor que emana dele. Minha camisola
está toda embolada em torno da minha cintura, revelando
mais do que eu pretendia.
Com um esforço suave, tento ajustar a camisola
para cobrir um pouco mais, mas não consigo deixar de me
sentir confortável e segura com o Diogo ao meu lado. O
barulho suave de sua respiração e o calor de seu enorme
c o r p o f a z e m o m u n d o p a r e c e r p e q u e n o e a c o l h e d o r.
Sem conseguir conter um sorriso, deixo-me relaxar
novamente, encostando minha cabeça no travesseiro.
Sinto a mão dele se movimentar lentamente, traçando um
caminho carinhoso pelas minhas coxas. O silêncio da
manhã é preenchido apenas pelos sons suaves e a
sensação de estar tão perto, tão completa. Lentamente
empino na direção de Diogo e me movo em busca de mais
contato.
Sinto um beijo em meu pescoço, seguido de um
gemido baixo.
— Judiando de mim logo cedo? — Diogo indaga e
eu sorrio. — Isso não se faz...
Abro mais as pernas e coloco a ereção entre elas. É
tão gostoso de sentir o calor do corpo dele contra o meu,
a rigidez da sua ereção pressionando minha calcinha.
Diogo desliza a mão pela minha cintura descoberta, e
sinto cada toque como uma carícia ardente, uma promessa
s i l e n c i o s a d e p r a z e r.
— Desde quando você é malvada assim? — ele
sussurra, sua voz rouca e cheia de desejo. Não posso
evitar o sorriso que escapa dos meus lábios.
Me movo lentamente, provocando-o, sentindo o
atrito aumentar o calor entre nós. Diogo responde com
um movimento dos quadris, seus dedos apertando minha
cintura com mais firmeza.

— Eu não sou — confesso, mordiscando meu lábio


i n f e r i o r. — P r e c i s o i r.
A n t e s q u e e l e p o s s a r e t r u c a r, e s c u t a m o s a o f u n d o ,
H e i t o r c o m e ç a r a c h o r a r. S o r r i o e a s s i m q u e m e v i r o , v e j o
seus olhos azuis. Eles parecem duas piscinas profundas,
cheias de sentimentos que agora eu sei quais são. Me
aproximo dele e o beijo na bochecha.
— Não volte a dormir — peço e me levanto. — Ah!
E não faça nada que eu não faria.
Diogo sorri e aponta para o seu pau em riste. Nego
com a cabeça e corro para fora do quarto. Assim que saio
e fecho a porta, dona Herbertina sai do quarto ao lado.
Tr a v o n a m e s m a h o r a s o b o s e u o l h a r c u r i o s o , a j e i t o o s
cabelos e forço um sorriso.
— Bom dia, dona Herbertina.
— Bom dia — ela sorri e cruza os braços. —
Acordada tão cedo?
E n g u l o e m s e c o s e m s a b e r o q u e r e s p o n d e r. C r u z o
o s b r a ç o s s u t i l m e n t e e q u a n d o H e i t o r v o l t a a c h o r a r, e u
aponto para o quarto.
— Eu fui na cozinha beber água — falo e ela acena.
— Ai ele acordou.
Passo para o meu quarto com um pequeno sorriso.
Essa foi a desculpa mais terrível que já dei, mas
aparentemente ela acreditou... Eu sou uma pessoa
horrível? Aceno com a mão e entro no quarto, vou até
Heitor que chora em plenos pulmões.
— Oi, meu amor — murmuro e o pego com carinho.
— Não chora não, meu bebê.
Pego a chupeta que está dentro do berço e o
ofereço. Ele assim que a pega e começa a sugar com
força, os olhinhos ainda fechados. Sorrio sentindo uma
onda de amor e proteção tomando conta de mim.
— Prontinho, meu anjo — digo, balançando-o
levemente nos braços. — É só até a mamãe tomar um
b a n h o . Vo c ê m e e n t e n d e , n é ?
Heitor solta um suspiro suave, relaxando aos
poucos, seus olhinhos se abrem e ficam olhando para o
teto. Continuo balançando-o, sentindo seu corpinho se
acalmar contra o meu. Quando ele finalmente se acalma,
e u o c o l o c o n o b e r ç o e s i g o p a r a o b a n h e i r o . Ti r o m i n h a
roupa em tempo recorde e quando avisto minha calcinha,
solto um suspiro. Mais uma vez dormi cheia de desejo e
acordei do mesmo jeito.
Entro no chuveiro, e a água morna cai sobre meu
corpo, aliviando um pouco da tensão acumulada. Fecho os
olhos e encosto a testa na parede fria do azulejo,
tentando afastar os pensamentos sobre Diogo, mas é
impossível. A lembrança de suas mãos em mim, sua boca
em meu pescoço traçando beijos que me deixam de pernas
b a m b a s s ó d e p e n s a r, f a z m e u c o r p o i n t e i r o r e a g i r.
Aperto os olhos com força, tentando me concentrar
na água escorrendo, mas o desejo volta com tudo. Mordo
o lábio, sentindo uma mistura de frustração e desejo,
sabendo que talvez essa vontade não desapareça tão cedo.
Meus pensamentos se perdem em cada toque, cada beijo
que trocamos.
Abro a água fria para dispersar meus pensamentos e
p e r m i t o q u e c a i a s o b r e o s m e u s o m b r o s t e n s o s . To m o m e u
banho e quando por fim termino. Saio do chuveiro com o
corpo arrepiado pelo contraste da água fria. Enrolo a
toalha ao redor do corpo e sigo para a pia, olhando meu
reflexo no espelho embaçado. Passo a mão pelo vidro,
l i m p a n d o a s u p e r f í c i e p a r a e n x e r g a r m e l h o r. M e u r o s t o
t e m u m l e v e r u b o r, e m e u s o l h o s a i n d a c a r r e g a m o b r i l h o
de uma noite mal dormida.
Pego a escova de dentes e passo a pasta, iniciando a
minha rotina de higiene matinal. A sensação fresca da
menta traz um pouco de clareza para minha mente
confusa. Lavo o rosto com água fria, na esperança de
d e s p e r t a r p o r c o m p l e t o , e a o t e r m i n a r, s e c o o r o s t o c o m
uma toalha, enquanto meus pensamentos ainda vagueiam
sobre tudo o que está acontecendo.
No quarto, visto uma roupa confortável, que se
consiste em uma calcinha de vovó, sutiã de amamentação
e um vestido. Dou uma última olhada no espelho, arrumo
os cabelos de um jeito simples e solto um suspiro.
Vo u a t é o m e u b e b ê e o p e g o c o m c u i d a d o . M e s e n t o
no colchão e ofereço o seio. Acaricio a cabecinha de
Heitor enquanto ele mama, sentindo a suavidade dos fios
finos e macios. Sua boquinha se move com determinação,
sugando o leite enquanto seus olhos se fecham em um
semblante tranquilo.
Meus pensamentos voltam para Diogo. É inevitável
comparar as situações, mas também é tão óbvio o quanto
são diferentes. Com Felipe, eu estava em busca de algo
que ele nunca pôde me dar: segurança, a m o r,
reciprocidade. Com Diogo, é tudo tão… real. Sinto uma
conexão que nunca senti antes, algo que vai além da
atração física. Além do que, a forma como ele trata meu
bebê, também me deixa mexida.
Suspiro baixinho, cuidando para não perturbar
H e i t o r, e d e i x o m i n h a m e n t e v a g a r s o b r e o q u e o f u t u r o
p o d e t r a z e r. S e r á q u e e s s a i n t e n s i d a d e v a i s e t r a n s f o r m a r
em algo ainda maior? Não quero apressar as coisas, mas
ao mesmo tempo, é tão difícil ignorar o que estou
sentindo.
Me permito um sorriso leve ao pensar em como
D i o g o é d i f e r e n t e . E l e é p r o t e t o r, s i m , m a s d e u m j e i t o
que não me faz sentir presa. Pelo contrário, me sinto
mais livre, mais segura para ser quem sou. Ele não tenta
m e m u d a r, a p e n a s m e a c e i t a c o m o s o u , e i s s o é a l g o q u e
nunca tive antes.
D o u u m b e i j o s u a v e n a c a b e ç a d e H e i t o r, g r a t a p o r
esse momento de paz e por tudo o que estou vivendo
agora.

*** ***
Minutos depois saio do quarto com Heitor de
barriga cheia e de banho tomado. Assim que chego na
cozinha, sorrio para Diogo que vem em minha direção.
Dona Herbertina está sentada à mesa, mas nos observa em
silêncio. Para a minha surpresa, Diogo acolhe Heitor com
cuidado nos braços.
— Ve n h a c o m e r, M a r i n a — d o n a H e r b e r t i n a m e
chama e eu me aproximo da mesa. — A primeira refeição
do dia é importante, eu sempre falo isso para o Diogo.
Me sento enquanto Diogo vai até a outra cadeira.
Observo Diogo inclinar-se levemente, sua expressão
s u a v i z a n d o e n q u a n t o t o c a a m ã o z i n h a d e H e i t o r, q u e s e
agarra imediatamente ao seu dedo. O sorriso dele é
discreto, mas verdadeiro, e faz meu coração se aquecer
ainda mais.
Me sirvo de um copo de suco, e ao fundo escutamos
uma buzina ser acionada no portão. Curiosa, vejo Diogo
ir até o painel e apertar o botão para ativar a câmera de
s e g u r a n ç a . E l e s e i n c l i n a l e v e m e n t e p a r a o l h a r m e l h o r, o s
ombros tensos. O vejo soltar um suspiro e me pergunto
quem é.
— É a minha mãe.
Dona Herbertina me encara e respira fundo. Já
D i o g o s e a p r o x i m a d e m i m e m e e n t r e g a o H e i t o r. E s c u t o
a porta do carro bater com força e em questão de
segundos, ela já está na sala. Diogo está parado na
entrada para recepcioná-la, mas ao invés de falar com
ele. Adriana o ignora. Seus olhos estão a procura de
alguém e assim que ela me vê na cozinha, vem em minha
d i r e ç ã o a p a s s o s d e c i d i d o s . Te n s a , d o u u m a p e r t o m a i s
f i r m e e m H e i t o r, s e n t i n d o s e u c o r p i n h o q u e n t e c o n t r a o
meu peito.
Assim que para a minha frente, ela solta um suspiro
e em seguida pega meu copo de suco, jogando o líquido
em mim. No susto eu me levanto bruscamente, fazendo
H e i t o r c o m e ç a r a c h o r a r. D i o g o c o r r e a t é m i m e s e g u r a a
mãe pelo braço. Seu olhar está irado.
— O que pensa que está fazendo, mãe? — ele
indaga de um jeito nervoso.
Herbertina ao mesmo tempo vem ao meu socorro e
p e g a H e i t o r, o l e v a n d o p a r a o q u a r t o . S e m r e a ç ã o , a p e n a s
observo Adriana se soltar do agarre do filho.
— O que eu estou fazendo?! — sua voz soa
incrédula. — O que você está fazendo?! Eu já sei de
tudo, Diogo! O seu irmão me contou! Essa é a vagabunda
que foi o motivo de você brigar com ele! — Adriana
p r o f e r e d e s c o n t r o l a d a , e n t ã o m e e n c a r a . — Vo c ê n ã o t e m
v e r g o n h a n e s s a c a r a , n ã o ? Te n t a r d a r o g o l p e n o F e l i p e e
agora no Diogo?
— Eu não quero dar o golpe em ninguém!
Diogo fica praticamente na minha frente, me
protegendo da histeria da mãe.
— Nem se você quisesse conseguiria! Eu vou contar
para o seu pai, Diogo! Eu não acredito que você está
fazendo isso com a sua família! — ela franze o cenho
transtornada. — O seu pai vai ficar sabendo dessa
palhaçada!
— Mãe, chega! — Diogo fala mais alto fazendo-a
p a r a r. E l a t e m o o l h a r o f e n d i d o . — N ã o v a i d i z e r n a d a a o
pai, não vai se intrometer nisso!
— Eu não vou deixar que uma vagabunda —
murmura enquanto o encara. — Se aproveite da nossa
família! O Felipe me falou quem ela é — assim que fala
a p o n t a e m m i n h a d i r e ç ã o . — Vo c ê e s t á a r r u i n a d a ! N ã o ,
melhor! — Adriana sorri. — Eu vou tirar esse
bastardinho de você, e você vai para a cadeia. O meu
marido, pai do meu filho Felipe é um delegado. Família
errada para dar o seu golpe!
— Eu disse chega! — dessa vez, a voz de Diogo sai
mais alta e firme. Assustando nós duas. — Quer levar
e s s e a s s u n t o a o p a i ? Va m o s e n t ã o ! — e u o o l h o a s s u s t a d a
e com a mão trêmula o toco no braço. — Mas vamos
também colocar toda história a limpa! E pode ter certeza,
mãe. Nem o melhor advogado será capaz de tirar o Felipe
da cadeia depois de tudo o que for contado.
Ve j o o s o l h o s d e l a s e arregalarem, como se
estivesse realmente ofendida.
— Eu não posso acreditar nisso! — Adriana leva
uma mão a boca. — Como pode se virar contra a sua
f a m í l i a a s s i m ? ! Te m n o ç ã o d o q u e v o c ê e s t á f a z e n d o ?
Ficando do lado dessa vagabunda e fingindo que esse
b a s t a r d o é o s e u f i l h o ? Va i t e r c o r a g e m d e c r i a r u m
bastardo que nem é seu? Estragar a sua vida desse jeito?
Os ombros de Diogo caem e seu rosto muda o
semblante.
— Então fui um bastardo que a senhora não queria e
estragou a sua vida?
— Eu não disse, Diogo! Não coloque palavras na
minha boca! — ela vocifera, seu olhar duro focado nele.
— Eu aceitei você! Criei como se fosse meu filho e não
d e i x e i q u e t e f a l t a s s e n a d a ! To d o s o s b r i n q u e d o s q u e o
Felipe tinha, você tinha igual. Não vou admitir isso! Não
sei qual o seu problema comigo, porque você nunca me
falou, mas não vou aceitar isso que está querendo fazer!
Diogo solta um riso forçado, seu olhar está no
chão.
— A senhora não sabe por que nunca fez questão de
me ouvir! — Diogo volta sua atenção para a mãe. — Eu
tinha acabado de perder a minha mãe e irmão — ele fala
fazendo Adriana ficar calada. — Eu estava sofrendo, eu
s ó q u e r i a f i c a r s o z i n h o . . . E o q u e m e d i s s e ? Vo c ê j á é u m
rapaz, por que está chorando? Um Macêdo não chora.
Adriana engole em seco, mas não desfaz a pose
altiva.
— E u n ã o m e n t i ! Vo c ê j á e r a b e m g r a n d i n h o p a r a
ficar chorando pelos cantos. Era só sorrir mais, conversar
com as pessoas... eu te levei para tantos lugares.
— Me tratava como se eu fosse um bichinho de
exposição! — Diogo retruca visivelmente nervoso. —
Nunca teve paciência comigo.
— Diogo! — Adriana respira fundo. — Não estou
aqui para tratar dos seus ressentimentos comigo! Estou
aqui para evitar que uma golpistazinha safada, suje o
nosso nome.
Notando como Diogo está visivelmente abalado, eu
tomo à frente.
— Eu nunca! Nunca precisei dar golpe em ninguém!
— falo, Adriana cruza os braços. — E presenciando essa
insensibilidade toda, é uma confirmação para mim. Não
quero nada que venha do Felipe, nem da senhora ou do
seu marido! Não quero o meu bebê perto de pessoas como
a senhora.
— Vo c ê n ã o i r i a t e r m e s m o ! Vo c ê v a i e m b o r a e v a i
levar esse bastardinho. — profere e eu me mantenho
firme. — Pouco me importa para onde! Queria atrapalhar
o noivado do meu filho e não conseguiu. Agora quer
atrapalhar a chance do Diogo? O que você tem a
oferecer? Um rostinho bonito, mas não tem onde cair
morta.
— Mãe...
— A Amanda é uma advogada de respeito —
Adriana ignora o filho, não tirando os olhos de mim. —
Ela tem futuro, teve educação. Não é nenhuma
interesseira. Então se você realmente tiver um pingo de
vergonha na cara, vai pegar as suas coisas e deixar os
meus filhos viverem como merecem. — seu olhar varre
meu corpo, em seguida olha por cima do meu ombro. —
Pense no bastardinho, não vai querer ficar sem ele. Por
que pode ter certeza de que eu consigo...
— Chega, mãe. — Diogo toma a minha frente. — É
m e l h o r a s e n h o r a i r. O q u e d e c i d i r f a z e r, p o u c o m e
importa. Minha posição é essa, e tenha em mente de que
não vou deixar que Felipe saia disso empune. Sabe o
caminho da saída.
Adriana nega com a cabeça e ajeita os cabelos bem
arrumados.
— É realmente decepcionante, Diogo.
Após ela sair rapidamente, o silêncio que se segue
me permite respirar com dificuldade. Meus olhos se
enchem de lágrimas, e por um momento, estou perdida em
pensamentos confusos. Então, sinto um toque suave no
meu rosto e me concentro nos olhos de Diogo. O azul,
que normalmente parece calmo como duas piscinas
serenas, agora está agitado, como um oceano em fúria.
Mas ainda assim, seu toque é carinhoso, delicado.
— Ela não pode tirar o Heitor de mim — murmuro
trêmula, ele logo nega com a cabeça. — Eu não quero
meu bebê longe de mim, Diogo.
— N ã o ! Vo c ê n ã o v a i f i c a r l o n g e d e l e e e l a n ã o v a i
fazer nada.
— Ela vai contar para o seu pai? Meu Deus...
— Marina — meu rosto é acolhido,
automaticamente toco em sua mão. — Fique calma! Estou
do seu lado, nem meu pai ou ninguém vai te machucar ou
tirar o Heitor de você. Eu não vou permitir!
Concordo com a cabeça e aceito o seu beijo suave.
Em seguida os braços enormes estão em minha volta.
— E u t ro q u e i a ro u p i n h a d o H e i t o r — m e v i r o e m
direção ao quarto, ainda nos braços de Diogo. Herbertina
se aproxima com o olhar apreensível. — Eu sinto muito
por tudo isso que você teve que ouvir Marina. A dona
Adriana sempre foi assim, não leve em consideração nada
que ela tenha dito.
Saio do conforto dos braços musculosos de Diogo e
sou acolhida por Herbertina. Eu sei disso, mas sei que em
algumas coisas ela disse a verdade. Entrei na vida de
Diogo de repente, bagunçando tudo, tirando qualquer
possibilidade de ele conhecer outra pessoa.
— Va m o s a t é o c a r t ó r i o , M a r i n a — e l e d i z .
Me volto para Diogo com o cenho franzido, mas
logo nego com a cabeça.
— Eu não quero que meu bebê tenha o sobrenome
da sua família — respondo decidida. — Não quero que
isso se torne um peso para ele no futuro. O seu pai foi
muito educado comigo, mas eu não quero.
Diogo me observa em silêncio por um momento e
então fala:
— Não, ele não terá o sobrenome Macêdo. — Ele
f a z u m a p a u s a a n t e s d e c o n t i n u a r. — E l e t e r á o m e u
sobrenome, Arslan.
Franzo o cenho e quando penso em falar algo, dona
Herbertina me toca o rosto.
— Vá trocar essa roupa melada de suco — manda e
me endereça um pequeno sorriso. — Nesse momento
p r e c i s a m o s p e n s a r n o b e m d o H e i t o r, e r e g i s t r a n d o e l e é
uma segurança para os dois.
Concordo um pouco atordoada, e quando meu olhar
vai até Diogo, eu corro para abraçá-lo. A barba raspa por
meu pescoço e quando me afasto lentamente, meus olhos
fixam em seus lábios.
— Va i f i c a r t u d o b e m — a f i r m a t o c a n d o e m m i n h a
bochecha. — Eu vou ligar para um colega que trabalha no
cartório, vou pedir esse favor a ele.
Me viro e Herbertina está lá nos encarando.
Vo u e m d i r e ç ã o a o q u a r t o e , a s s i m q u e e n t r o ,
caminho até o berço. Heitor está acordado, chupando a
chupeta, com os olhos atentos, explorando cada detalhe
a o r e d o r. S o r r i o a o v ê - l o a s s i m d e s p e r t o e c u r i o s o .
— Oi, meu amor — murmuro, acariciando seus
cabelos finos. — A mamãe precisava tanto de um abraço
seu...
Meu olhar desce para meu corpo e em sequência
vou até a minha mala. Do fundo dela pego uma calça
jeans, e uma blusa mais arrumada. Jogo as peças em cima
da cama, e vou para o banheiro. Molho apenas o meu
corpo para tirar o suco que secou na minha pele.
De volta para o quarto me visto e percebo que a
calça ficou bem apertada, mas entrou.
Te n t o n ã o d e m o r a r, e a p ó s c a l ç a r o s p é s c o m o
s a l t o . P e g o H e i t o r, a m i n h a b o l s a c o m o s m e u s
documentos e a bolsa de bebê. Chego na sala e vejo
Diogo já vestido apropriadamente: com uma calça jeans,
camiseta preta e coturnos. Ele vem até mim e segura as
bolsas. Nos despedimos de Herbertina e saímos de casa.
*** ***
Após algumas horas, chegamos no cartório e fomos
logo atendidos. Entramos em uma sala particular e
rapidamente tudo foi feito. Diogo realmente registrou o
meu bebê como dele, e isso de certa forma me deixou
emocionada. Enquanto o assistente organizava os papéis,
olho para Diogo. Ele está tranquilo, decidido, sem
nenhuma hesitação. Era como se, para ele, aquilo fosse o
mais natural do mundo.
Então, ansiosa o observo inclinar e assinar o último
documento. Engulo em seco, tentando conter as lágrimas
q u e a m e a ç a m c a i r. Tu d o a q u i l o a i n d a p a r e c i a s u r r e a l , m a s
ao mesmo tempo certo. Diogo se vira para mim, ficando
bem perto e me toca a bochecha.
— Tu d o b e m ? — e l e p e r g u n t a , o s o l h o s a z u i s c h e i o s
de uma gentileza que me desarmava.
— Sim — respondo. Heitor ressona em meus braços.
— Ta l v e z u m p o u c o n e r v o s a .
Diogo sorri e após pegar os documentos que lhe são
entregues, me indica a saída. Respiro fundo e caminho
com Diogo ao meu lado. No lado de fora, sinto os raios
do sol e cobrindo Heitor com a fraldinha, sigo para a
caminhonete. Em um gesto cavalheiro, Diogo abre a porta
de trás e me espera deitar Heitor na cadeirinha. Enquanto
f a ç o i s s o , e s c u t o o c e l u l a r t o c a r. O l h o p a r a t r á s , s ó p a r a
ver Diogo com a cabeça inclinada me analisando com um
pequeno sorriso.
— O seu celular está tocando, sabia? — aviso com
um pequeno sorriso, como se ele não soubesse.
Ele sorri e atende a chamada.
— Sim? — termino de prender Heitor ainda
sorrindo. Ele está tão lindo, os cabelinhos então, estão
mais crescidos. — O quê?! — assustada me volto para
Diogo. A expressão dele é raivosa, sinto meu coração
a c e l e r a d o . — I g o r, e u e s t o u i n d o . N ã o é p a r a e n t r e g a r
relatório nenhum!
— O que foi?
— Querem deportar o narcotraficante que eu prendi,
estão querendo nossos relatórios sobre o caso —
r e s p o n d e e n q u a n t o g u a r d a o c e l u l a r n o b o l s o . — Va m o s
até lá, não tem como eu te deixar em casa antes.
— Eu posso pegar um táxi.
— De jeito nenhum — ele retruca e fecha a porta
traseira, em seguida abre a do passageiro para mim. —
Vo c ê v a i c o m i g o e d e p o i s v a m o s p a r a c a s a .
Me acomodo no assento e o observo correr até o
motorista. Ao mesmo tempo que ele dá a partida, ele
coloca o cinto de segurança. Diogo está realmente
transtornado, então evito fazer qualquer pergunta. Coloco
o cinto e deixo meu olhar fixado no caminho que
seguimos. O trânsito está fluído e mal paramos em
semáforos fechados.
Em questão de minutos chegamos, e curiosa encaro
o grande departamento. Há alguns carros estacionados
mais distantes, e policiais por perto.
— Eu volto logo — avisa enquanto tira o cinto e me
o l h a . — P o r f a v o r, n ã o s a i a d o c a r r o .
Aceno e ele logo sai a passos rápidos. Solto um
suspiro e regulo a saída do ar-condicionado. Olho para
trás, só para ver Heitor com sua chupeta. Sorrio e estico
a mão até tocar em seu rostinho. Meu bebê é tão
inocente, tão alheio a tudo o que está acontecendo ao
n o s s o r e d o r. C a d a v e z m a i s s i n t o a n e c e s s i d a d e d e
p r o t e g ê - l o d e q u a l q u e r c o i s a q u e p o s s a n o s a m e a ç a r.
No painel, vejo o envelope com as papeladas do
registro. O seguro mais firme e sinto um nó na garganta.
Esse nome, "Heitor Arslan Silva", parece tão definitivo,
tão carregado de significado. A assinatura de Diogo ao
lado da minha é uma marca de algo que, embora pareça
temporário, pode deixar consequências duradouras.
Não posso deixar de imaginar como será o futuro.
Se Diogo encontrar alguém e decidir construir uma vida,
como ele explicaria essa escolha? Como ele justificaria
ter dado seu sobrenome para um filho que não é
b i o l o g i c a m e n t e d e l e ? Ta l v e z s u a f u t u r a e s p o s a n ã o a c e i t e .
E s e i s s o a c o n t e c e r, e l e i r á à j u s t i ç a p a r a r e m o v e r o
s o b r e n o m e ? O p e n s a m e n t o m e f a z e s t r e m e c e r, e s i n t o u m
arrepio de incerteza.
Esfrego minha têmpora, tentando afastar a dor de
c a b e ç a q u e c o m e ç a a s e f o r m a r. É t a n t a c o i s a p a r a
p r o c e s s a r, t a n t a i n c e r t e z a s o b r e o q u e e s t á p o r v i r. M a s ,
ao mesmo tempo, o simples fato de Diogo ter feito isso
por nós, de ter assumido esse compromisso, me faz sentir
a l g o q u e n ã o c o n s i g o e x p l i c a r.
Fecho os olhos e respiro fundo, tentando encontrar
clareza no meio desse turbilhão de pensamentos.
— Ei! — me assusto e olho para a janela ao meu
lado. É o chefe de Diogo, está parado com um sorriso.
Fico uns segundos o olhando, rapidamente ele faz um
gesto para eu baixar o vidro. Olho para a entrada onde
Diogo sumiu, mas por fim baixo o vidro. — Acho que te
assustei — ele ri e apoia o braço na janela. — Cadê o
Diogo?
— Ele entrou — respondo e junto os papéis. —
Como vai o senhor?
— Senhor? — ele repete e ri. Observo seu rosto
pálido, ele mantém a barba preta um pouco grande. Mas
seu cabelo é cortado baixo. — Eu não sou tão velho
assim.
Engulo em seco e olho para a entrada; nada do
D i o g o a p a r e c e r.
— É questão de respeito — falo e ele acena. — Eu
posso ajudar em alguma coisa? — pergunto quando ele
f i c a a l i p a r a d o , s e m f a l a r o q u e r e a l m e n t e q u e r.
— Não — balança a cabeça e olha para trás, mas
r a p i d a m e n t e m e e n c a r a . — E u a c a b e i d e c h e g a r,
estacionei ali atrás. Passei e vi você sozinha — murmura
e olha para o banco de trás. — Na verdade, não está
s o z i n h a . Vi e r a m c o n h e c e r o n d e D i o g o t r a b a l h a ?
— Não — nego e quando ele fica me olhando,
percebo que quer saber mais. — Fomos até o cartório,
para registrá-lo.
— Isso é bom! — ele afirma e eu sorrio educada. —
Bom, eu vou indo, não quer esperar o Diogo lá dentro?
— Não, eu espero aqui mesmo. — respondo para ele
que acena.
Não lembro o nome dele, mas agradeço quando me
dá as costas. No entanto, ele me olha novamente.
— Não é comum — ele fala e me olha —, mas eu
acho que você não foi muito com a minha cara.
Pega desprevenida, eu o encaro com o cenho
franzido, mas logo me recupero.
— Não, imagina.
— Marina, eu sou policial — seu sorriso me deixa
d e s c o n f o r t á v e l . Tu d o n e l e e x a l a u m a á u r e a c a f a j e s t e . —
Eu percebo.
Solto um suspiro.
— É que eu não gosto quando me encaram como se
me medisse dos pés a cabeça — aviso e recebo uma
expressão surpresa. — Eu fico desconfortável em ser o
centro das atenções. Não gosto muito.
— Ah, e naquele dia eu realmente fiquei te olhando
— fala e sorri em seguida. — Mas não me leve a mal! Eu
sou casado! — mostra a aliança. — Era só surpresa,
porque ninguém sabia sobre você. Até o fofoqueiro do
Igor nunca falou nada. — aceno deixando meu sorriso
e s c a p a r. O I g o r p a r e c i a s e r u m f o f o q u e i r o m e s m o ,
d i f e r e n t e d o D i o g o . — E n t ã o , p o r f a v o r, m e d e s c u l p e s e
te deixei desconfortável.
— Tu d o b e m .
— Te m c e r t e z a d e q u e n ã o q u e r e n t r a r ?
— Te n h o , m u i t o o b r i g a d a .
Finalmente ele acena e caminha em direção a
entrada.
Suspiro aliviada quando finalmente ele entra no
p r é d i o , e e u f i c o s o z i n h a n o c a r r o . Te n t o r e s p i r a r f u n d o e
m e a c a l m a r. P e l o m e n o s , e l e f o i s i m p á t i c o e p e d i u
desculpas por me deixar desconfortável. Fico observando
a entrada por alguns segundos antes de voltar minha
a t e n ç ã o p a r a H e i t o r, q u e d o r m e t r a n q u i l a m e n t e n a
cadeirinha.
C a p í t u l o 1 8 – D i o g o

N e g o c o m a c a b e ç a e n q u a n t o l e i o a O rd e m d e
Deportação que o advogado de Juanito trouxe. Com ele
tem mais alguns agentes da imigração. Igor está de
braços cruzados e dessa vez não tem o sorriso no rosto.
Ele está sério, seu olhar não abandonando o advogado
que fala de um jeito enfadonho.
— Se puder agilizar — o engravatado fala para
mim. — Queremos que ele saia do país até o final da
tarde.
— Isso é uma palhaçada. — exclamo, jogando a
ordem em cima da mesa. — Há um processo legal que
deveria ocorrer no Brasil, e não no México.
O advogado tenta manter a compostura, mas a
tensão é visível.
— A decisão já foi tomada e não há muito o que
d i s c u t i r. A o r d e m p r e c i s a s e r c u m p r i d a .
— Não aceito isso! — digo, a voz firme e carregada
de frustração. — Como podem decidir algo tão sério sem
considerar que o devido processo legal deveria estar
ocorrendo no país correto?
Igor se aproxima, pondo a mão em meu ombro como
um gesto de apoio, embora sua expressão também reflita
a preocupação.
— Se isso não for resolvido rapidamente, vou ter
que intervir de outra forma — o advogado diz, mantendo
o tom sério.
A conversa se torna um emaranhado de argumentos
e tentativas de negociação, e o ambiente fica carregado
de tensão. O destino de Juanito agora parece depender de
um fio de esperança, e o tempo está se esgotando
rapidamente.
— Não dá para acreditar — resmungo e observo um
dos agentes pegar uma pasta de relatórios. — Essas
garantias de que ele será julgado adequadamente... —
bufo e pego novamente o papel. — Prisão domiciliar?
Isso é sério?
O advogado olha rapidamente o relógio e em
seguida para os agentes.
— Meu cliente tem problemas sérios de saúde — ele
a f i r m a e q u a n d o o s a g e n t e s c o m e ç a m a s a i r, e l e e s t e n d e a
mão para mim em um cumprimento. O ignoro. — Bom,
c a s o q u e i r a r e c l a m a r, p o d e f i c a r à v o n t a d e , m a s f o i o j u i z
Cavalcanti que assinou a autorização.
E s f r e g o a m ã o n o r o s t o e m e v o l t o p a r a I g o r. E l e
tem os braços cruzados.
— De volta a estaca zero.
Solto um suspiro e saio da sala, passo por algumas
pessoas que me cumprimentam, mas não retribuo. Antes
de chegar na saída, vejo Marcelo e o advogado
conversarem baixinho. Paro onde estou e fico olhando a
cena, rapidamente sou percebido e me aproximo.
O advogado sai, enquanto Marcelo me sorri.
— Eu acabei de falar com a Marina e...
— Sabia sobre essa decisão? — aponto em direção
ao advogado, a frustração evidente em minha voz.
Marcelo franze o cenho, a surpresa evidente em seu
rosto.
— Como soube? — pergunta, mas logo balança a
c a b e ç a c o m u m s u s p i r o c a n s a d o . — I g o r. — e l e a f i r m a , o
cansaço claro em sua voz. — Diogo, não cabia a mim
d e c i d i r i s s o . Te m o s u m t r a t a d o i n t e r n a c i o n a l , e v o c ê s a b e
que, se estiver dentro dos requisitos, esses tratados têm o
mesmo status que emendas à Constituição.
A menção ao tratado internacional me dá um pouco
de perspectiva, mas a raiva não diminui. Eu ainda estou
pensando em como Juanito pode escapar da justiça.
— Não é só sobre os requisitos do tratado, Marcelo.
É sobre garantir que ele enfrente as consequências dos
crimes que cometeu. Ele não pode simplesmente ser
colocado em prisão domiciliar e ficar livre para se mover
c o m o q u i s e r. C o m o o j u i z p e r m i t i u a l g o a s s i m ?
Marcelo suspira, o olhar é exausto.
— Eu entendo sua frustração, Diogo. — afirma e em
seguida me toca o ombro. — Mas a decisão foi tomada
com base no cumprimento das garantias legais. O tratado
exige que ele tenha o direito a um julgamento justo, e
isso inclui a consideração das condições que ele
enfrentará em seu país de origem. Se não cumprirmos
com essas exigências, estaríamos violando a lei.
Eu passo a mão pelo rosto, tentando controlar a
raiva e a frustração.
Cruzo os braços.
— O que falava com o advogado? — questiono sem
tirar os olhos dele.
— Nada de mais — ele dá de ombros e olha para
t r á s . — F a l e i c o m a M a r i n a , é m e l h o r i r, n ã o d e v e d e i x á -
la esperando por tanto tempo sozinha.
Olho para fora onde meu carro está estacionado.
Marcelo me dá uns tapinhas no ombro e entra. A passos
rápidos vou para a caminhonete, assim que tomo o lugar
do motorista, respiro fundo. Me viro para Marina que tem
o o l h a r t e n s o , H e i t o r c o n t i n u a a d o r m i r.
— O q u e a c o n t e c e u ? — e l a p e r g u n t a i n d e c i s a . Ve j o
rastros de medo em seu olhar e fico confuso. — Não
conseguiu resolver?
— Não — balanço a cabeça e em seguida dou a
partida, saindo dali. — O narcotraficante que prendi vai
ser deportado e julgado no país dele. Uma palhaçada sem
tamanho.
— Sinto muito.
Me volto para ela e pego sua mão. Deixo um beijo
nela, Marina me sorri na hora.
— Va m o s p a r a c a s a .
Dirijo pela cidade com os dedos firmemente no
volante, desviando de carros e semáforos, tentando me
concentrar no caminho para casa, mas minha mente ainda
está presa àquela maldita decisão. Não posso acreditar
que o "Fantasma" pode simplesmente escapar pelas
brechas de um tratado. Respiro fundo novamente,
tentando afastar o pensamento.
Chegamos na rua de casa, e eu relaxo um pouco.
Dou uma olhada rápida para Marina, tentando mostrar
que estou mais calmo, mas algo no meu campo de visão
m e f a z p a r a r. U m c a r r o p r e t o , e s t a c i o n a d o d o o u t r o l a d o
da rua. As janelas escuras, ninguém à vista. Meus
sentidos acendem como se um alerta interno disparasse.
M e u s i n s t i n t o s g r i t a m p a r a n ã o p a r a r. P i s o n o
acelerador e passo direto pela casa. Sinto o olhar confuso
de Marina se voltar para mim.
— O que foi? — ela pergunta, tentando esconder a
preocupação na voz.
— Nada, só... — minha mente já está à mil. Um
carro desses, parado ali, não é coincidência. — Só vou
dar uma volta no quarteirão.
Ve j o a e x p r e s s ã o d e M a r i n a e n d u r e c e r, e l a s a b e q u e
não estou dizendo tudo, mas também sabe que não vou
d i z e r. P a s s o d i r e t o p e l a c a s a , o o l h a r f i x o n o r e t r o v i s o r,
avaliando qualquer movimento atrás de nós. O coração
bate um pouco mais rápido, cada fibra do meu corpo
p r o n t a p a r a r e a g i r.
Eu não gosto de surpresas, especialmente quando
elas aparecem na porta da minha casa.
Dou a volta na esquina, os olhos atentos a qualquer
sinal de que estamos sendo seguidos. O carro preto
p e r m a n e c e n o m e u r e t r o v i s o r, i m ó v e l . Te n t o m a n t e r a
c a l m a , m a s s i n t o a t e n s ã o n o m e u p e i t o c r e s c e r. A l g o n ã o
está certo.
— Diogo, o que está acontecendo? — Marina
insiste, agora a voz mais firme, a preocupação evidente.
O l h o r a p i d a m e n t e p a r a e l a , d e p o i s p a r a H e i t o r,
dormindo tranquilo no banco de trás. Preciso ser
cuidadoso. Não posso deixá-los em perigo. Respiro
fundo, mantendo o tom calmo.
— Te m u m c a r r o p a r a d o a l i n a r u a d e c a s a . . . n ã o
gosto de coincidências assim, ainda mais hoje.
E l a f r a n z e a t e s t a , o l h a p e l o r e t r o v i s o r, t e n t a n d o
ver o que eu vi.
— E se for só um vizinho? Ou alguém esperando?
— Ta l v e z s e j a — r e s p o n d o , m a n t e n d o o o l h a r n a r u a
à f r e n t e . — M a s e u n ã o v o u a r r i s c a r.
C o n t i n u o d i r i g i n d o d e v a g a r, f i n g i n d o q u e e s t o u
a p e n a s p r o c u r a n d o v a g a o u d a n d o u m a v o l t a . Vi r o à
direita na próxima esquina, e pego um caminho
alternativo, afastando-nos do carro preto. Meu cérebro
trabalha rápido, pensando em todas as possibilidades,
tentando calcular se é apenas paranoia ou se tem algo de
real nisso.
Marina respira fundo ao meu lado, sinto que ela
quer dizer algo, mas ela espera. Ela não está acostumada
com meus instintos, não sabe que, quando eu sinto que
a l g o e s t á f o r a d o l u g a r, g e r a l m e n t e e s t o u c e r t o . E n t ã o ,
talvez ache que não possa ser nada.
Dirijo por alguns minutos, fazendo curvas sem
direção definida, até ter certeza de que não estamos
sendo seguidos. Decido parar em um pequeno mercado.
P r e c i s o d e u m m o m e n t o p a r a p e n s a r, p a r a a v a l i a r a
situação.
— F i q u e n o c a r r o c o m o H e i t o r, v o u c o m p r a r á g u a
— d i g o , j á s a i n d o a n t e s q u e e l a p o s s a p r o t e s t a r.
Entro no mercado e finjo olhar as prateleiras, mas
meu foco está na entrada, nos carros lá fora. Respiro
fundo, tentando manter a calma enquanto penso em todas
a s o p ç õ e s . Vo l t a r p a r a c a s a a g o r a , s e m s a b e r q u e m e s t á
n a q u e l e c a r r o , é u m r i s c o q u e e u n ã o p o s s o c o r r e r.
Pego uma garrafa de água, pago rapidamente e volto
para o carro. Marina me encara, tentando ler meu rosto,
procurando respostas.
— E agora? — ela pergunta, enquanto coloco o
cinto de segurança. — A dona Herbertina está lá.
— Va m o s d a r m a i s u m a v o l t a a n t e s d e v o l t a r. Q u e r o
ter certeza de que não estamos trazendo problemas para
casa.
Ela apenas assente, confiando em mim. Aperto o
volante com força e tomo o caminho de casa, atento a
c a d a m o v i m e n t o a o r e d o r. Q u a n d o e n t r o n o v a m e n t e n a
rua, o carro preto já não está mais lá. Meu olhar varre
cada canto, cada sombra, procurando qualquer sinal de
ameaça. Nada.
Estaciono em frente à casa e aperto o controle do
p o r t ã o . O u ç o o s o m f a m i l i a r d o m o t o r, m a s n ã o b a i x o a
guarda. Minhas mãos ainda estão firmes no volante, os
olhos atentos a qualquer movimento suspeito. O portão se
abre lentamente, e avanço, parando apenas quando estou
dentro da garagem. Pressiono o botão novamente e vejo a
p o r t a c o m e ç a r a s e f e c h a r, c o b r i n d o - n o s c o m o u m e s c u d o .
— Tu d o b e m — m u r m u r o , m a s a i n d a n ã o s o l t o o a r
preso nos pulmões.
Marina desce do carro, hesitante, mas vai até o
banco de trás e pega Heitor com cuidado. Ele resmunga
um pouco, ainda sonolento, sem saber da tempestade que
passa pela minha cabeça. Olho para Marina, e a
acompanho.
Ela percebe minha tensão, sente o peso da incerteza
n o a r.
— Diogo, estamos seguros agora, não estamos? —
ela pergunta, com o tom mais suave, como se quisesse me
t r a n q u i l i z a r.
Assinto, mas meu olhar ainda vagueia pela
garagem, pelos cantos, por cada ponto cego.
— Sim, estamos em casa.
Uma sensação de alívio começa a se misturar com a
a d r e n a l i n a q u e a i n d a c o r r e e m m i n h a s v e i a s . Ta l v e z f o s s e
a p e n a s p a r a n o i a , m a s p r e f i r o e s t a r a l e r t a . Vo l t o p a r a
Marina, que já está com Heitor nos braços, acariciando
suavemente a cabeça dele enquanto me observa.
— Va m o s e n t r a r — d i g o , f i n a l m e n t e , t e n t a n d o
parecer mais calmo. Ela me segue de perto, sem fazer
perguntas.
Me recordo do rapaz que vi no shopping e franzo o
cenho. Seria ele que encontrou minha casa? Mas como?
Assim que entro na sala, Marina vai até Herbertina e se
senta ao seu lado. Não podemos mais ficar aqui, não até
que eu tenha certeza de que não estamos em real perigo.
A s d u a s c o m e ç a m a c o n v e r s a r, e u s o i s s o a o m e u f a v o r.
Ando até o meu quarto e quando e entro nele. Ligo o
c o m p u t a d o r, e a c e s s o o a p l i c a t i v o d a s c â m e r a s .
Minhas mãos se movem rápidas, digitando a senha
s e m h e s i t a r.
As imagens começam a aparecer na tela, uma após a
outra. Primeiro, a entrada da casa. Depois, a vista da rua.
As gravações se sucedem em sequência, e eu ajusto o
zoom assim que vejo o carro parado. Retrocedo as
imagens e no momento que o carro estaciona, foi quando
minutos antes saímos. Por isso eu não o vi ali quando
saímos.
Ninguém sai do carro e ele continua parado. Sem
demora pego a placa, e jogo nos sistemas e bancos de
dados que contêm informações sobre placas de veículos.
Nada é encontrado, e isso me faz soltar um suspiro
inquietante.

*** ***
Marina

— Vo c ê e s t á u m p o u c o a é r e a ? — a p e r g u n t a m e t r a z
de volta. Olho para dona Herbertina. — O que aconteceu
lá?
— Nada — dou de ombros, não quero preocupá-la
com isso. — Deu tudo certo.
A n t e s q u e e l a p o s s a m e r e s p o n d e r, n a t v o p l a n t ã o
de notícias nos chama a atenção.
O n a rc o t r a f i c a n t e p re s o n o c o m e ç o d e s s e m ê s n a
Operação Encruzilhada, foi assassinado hoje a caminho
d e u m h a n g a r p a r t i c u l a r. J u a n i t o , m a s c o n h e c i d o c o m o E l
Fantasma, seria deportado para o país de origem, para
que assim fosse julgado em seu país natal. Assim como
Juanito, o advogado Callion Hernandéz e mais três
agentes da imigração, também foram mortos. As
i n f o r m a ç õ e s p a s s a d a s é d e q u e d u a s v a n s p re t a s
c e rc a r a m o c a r ro q u e e s t a v a l e v a n d o o p re s o , e a t i r a r a m
com fuzis. A suspeita é de que tenha sido um acerto de
c o n t a s . J u a n i t o f o i p re s o p e l o a g e n t e F a r u k d a
Superintendência Regional da Polícia Federal do RJ, que
comandou a operação aqui no Rio. Juanito deveria ser
julgado aqui no Brasil, mas por conta de uma decisão do
Juiz Emílio Cavalcanti, o p re s o pôde usufruir
momentaneamente dessa liberade.
Pela visão periférica vejo Diogo se aproximar com
o olhar surpreso.
— Diogo?
Ele me olha ao mesmo tempo que seu celular toca.
O observo atender e ficar alguns minutos calado, apenas
ouvindo.
— Certo, pai. — Diogo afirma, mas sem tirar os
o l h o s d a T V.
Ajeito Heitor nos meus braços, ansiosa para saber o
q u e e l e t e m p a r a d i z e r.
— Então, meu filho! — dona Herbertina fala ao meu
lado. — O que foi?
Assim que ele encerra a ligação, ele nos olha. Algo
me diz que o carro preto estacionado na rua, não é uma
coincidência.
— Meu pai viu o que aconteceu e quer que fiquemos
na casa dele, até que tudo esteja bem. Ele sabe que eu
estava nesse caso.
— Como assim? — indago com a voz trêmula. —
Até que tudo esteja bem? O que está acontecendo, Diogo?
Ele suspira e se senta ao meu lado, sua mão pega a
minha.
— Não quero que se assuste — ele pede calmo —,
mas eu acho que estou sendo seguido e agora isso
aconteceu.
Meu coração acelera, e sinto uma onda de ansiedade
tomar conta de mim. Meus dedos apertam a mão dele, e o
olhar de Diogo se mantém firme no meu.
— Seguido? Por quem? — pergunto, tentando
manter a voz firme, embora o medo se instale no meu
peito.
Diogo passa a mão pelo rosto, claramente tentando
escolher as palavras certas.
— Não tenho certeza ainda, mas desconfio que seja
alguém ligado ao caso em que estava trabalhando — ele
confessa. — Meu pai acha que é mais seguro ficarmos
todos juntos na casa dele até que eu descubra quem é e o
que realmente está acontecendo.
Olho para Heitor em meus braços, seu rostinho
tranquilo, alheio a tudo. A ideia de estarmos sendo
seguidos e de estarmos em perigo me assusta
profundamente. Me forço a respirar fundo, tentando
manter a calma.
— E o que você vai fazer? — pergunto em um
sussurro, sentindo o pânico crescendo dentro de mim.
— Vo u d e s c o b r i r q u e m e s t á p o r t r á s d i s s o — D i o g o
responde com firmeza. — Mas, enquanto isso, preciso
garantir que vocês estejam seguros. Não quero arriscar
nada. — sinto o peso da situação. A seriedade em seus
olhos me faz entender que ele está levando tudo muito a
sério. — Nós vamos ficar bem, Marina — ele continua,
apertando minha mão. — Confie em mim.
Eu o encaro por um momento, tentando encontrar
u m a r e s p o s t a n o s e u o l h a r. A s s i n t o l e n t a m e n t e , s a b e n d o
que, apesar do medo, não tenho outra escolha senão
confiar nele.
— Está bem, Diogo — murmuro. — Eu confio em
você.
Dona Herbertina se levanta.
— Vo u a j u d a r a j u n t a r t u d o p a r a v o c ê s i r e m .
— O quê? — Diogo franze o cenho. — A senhora
vai também.
— Sua mãe e eu na mesma casa? — ela franze o
cenho. — Filho, não vai dar certo. Eu vou para a minha
casa e nada vai acontecer comigo.
— D o n a H e r b e r t i n a — t e n t o f a z e n d o - a m e e n c a r a r.
— A senhora não pode ficar sozinha.
— Então a senhora vai passar alguns dias na casa
da sua irmã — Diogo fala olhando diretamente para ela.
— Vo u p e d i r p a r a q u e u m a g e n t e v á c o m a s e n h o r a .
— Acha mesmo necessário?
— A senhora é importante para mim — ele fala, me
arranca um sorriso e um olhar emocionado de dona
Herbertina. — Eu não vou deixá-la desamparada.
Sem falar nada, dona Herbertina o abraça e ele
d e m o r a u n s s e g u n d o p a r a r e a g i r. M a s l o g o a a b r a ç a d e
volta. Assim que se separam, ela vai em direção ao
c o r r e d o r.
H e i t o r a b r e o s o l h i n h o s d e v a g a r, a i n d a s o n o l e n t o , e
faz um beicinho antes de soltar um suspiro. Passo a mão
suavemente pela sua cabeça, tentando acalmá-lo antes
que o choro comece de verdade.
— S h h h , m e u a m o r. . . — s u s s u r r o , b a l a n ç a n d o - o
levemente. — Está tudo bem.
Ele me olha com aqueles olhinhos curiosos, como
se estivesse tentando entender o que está acontecendo.
Sinto um aperto no peito ao pensar que, mesmo tão
p e q u e n o , e l e p o d e s e n t i r a t e n s ã o n o a r. Te n t o s o r r i r p a r a
ele, mostrando uma calma que, no fundo, estou longe de
s e n t i r.
Diogo observa a cena em silêncio, seus olhos
suavizando por um momento ao ver o meu bebê em meus
braços. Ele se aproxima e passa a mão no rostinho de
H e i t o r, q u e i m e d i a t a m e n t e o l h a e m s u a d i r e ç ã o .
— Eu sinto muito por ter que irmos para a casa do
meu pai — avisa e eu aceno. — Não quero ir para um
hotel, não é seguro. Não tenho outra casa, apenas essa e
dado as coisas que já aconteceram desde que assumi essa
operação... não pode ser coincidência. — eu concordo e
logo sinto um carinho na bochecha. — Hoje foi o carro
n a r u a , a m a n h ã p o d e r i a s e r a l g o p i o r.
— Eu fico com medo só de imaginar — comento
sincera. Diogo continua o carinho em mim, para em
seguida me beijar os lábios. — E se sua mãe falar para o
seu pai?
— E estragar o noivado do Felipe?
D e s v i o o o l h a r p a r a H e i t o r, e o c o l o c o e m p é . N ã o
ligo para Felipe, mas me preocupo com as consequências
da nossa mentira, não quero que Diogo saia prejudicado.
Solto um suspiro e beijo a cabeça do meu bebê.
— Heitor Arslan — falo em voz alta, olho para
D i o g o q u e s o r r i . — Vo c ê g o s t o u d o s e u s o b r e n o m e , m e u
bebê? Tão lindo e comportado, não chorou em nenhum
m o m e n t o . Vo c ê é o a m o r d a m i n h a v i d a , m e u b e b ê . —
minha voz é fofa e calma.
Os olhinhos grandes e verdes de Heitor parecem me
encarar com uma curiosidade inocente, como se ele
entendesse o que estou sentindo. Ele solta um sorriso
banguela, tão puro e sincero, que sinto meu coração se
aquecer de imediato. É incrível como um sorriso tão
simples pode me trazer tanta paz.
— Acho que ele entende o que você está falando —
Diogo comenta em um tom baixo, como se estivesse
compartilhando um segredo.
Passo os dedos pela bochechinha macia do meu
b e b ê , e m e u s o r r i s o c r e s c e a i n d a m a i s . To d o o m e d o e a
preocupação parecem diminuir um pouco diante daquele
pequeno ser que, mesmo sem palavras, me dá tanta força.
— Ele entende — murmuro, sem tirar os olhos do
m e u f i l h o . — D e v e r i a t e n t a r.
Diogo me encara um tanto confuso, e volta o olhar
p a r a o c o r r e d o r.
— Eu vou juntar as minhas roupas para irmos. —
e l e d i z e e u a c e n o . — Vo u f a z e r d e t u d o p a r a q u e e s s a
estadia não dure muito tempo.
— Tu d o b e m — r e s p o n d o e e l e n o v a m e n t e m e b e i j a
os lábios.
E l e s e a f a s t a c o m a q u e l e b r i l h o n o o l h a r, d e i x a n d o
um rastro de presença que parece preencher todo o
a m b i e n t e . Q u a n d o d e s a p a r e c e n o c o r r e d o r, f i c o a l i ,
tentando acalmar as borboletas que insistem em voar
dentro de mim. Meu coração bate acelerado, e a sensação
de estar apaixonada me envolve por completo, como se eu
estivesse flutuando em meio a uma nuvem de emoções.
Fico de pé e decido ir ajudar dona Herbertina.
Saber que Diogo foi seguido e que a qualquer momento o
que aconteceu com o preso, possa chegar em nós, me
deixa com o coração aos pulos de medo. Por um momento
esqueci completamente que o trabalho de Diogo é sim
perigoso, seus riscos diários, e voltar para a realidade me
deixa completamente perdida.
C a p í t u l o 1 9 – D i o g o

Ao descer da caminhonete, ainda sinto o leve


impacto do salto reverberar pelas minhas pernas.
Caminho em direção à casa com passos decididos, mas
não consigo deixar de me preocupar com tudo o que está
a c o n t e c e n d o . Ve r i f i c o r a p i d a m e n t e o b e r ç o , c h e c a n d o
mais uma vez se está bem preso, e sigo adiante,
atravessando a soleira da porta.
Lá dentro, encontro Marina no meio da sala,
segurando Heitor com um olhar apreensivo. Ela me
o b s e r v a e n q u a n t o e n t r o , e t e n t a s o r r i r, m a s s e i q u e e s t á
com medo. Dona Herbertina está por perto, ajeitando
algumas coisas em uma sacola, e dá um sorriso quando
me vê.
— Está tudo pronto? — Marina pergunta, com uma
leve preocupação na voz.
— Sim, está tudo pronto — confirmo, tentando soar
c a l m o e s e g u r o , a p e s a r d o n ó e m m e u e s t ô m a g o . — Va m o s
s a i r e m p o u c o s m i n u t o s . Vo u l e v a r a s e n h o r a e m c a s a , e
conseguir alguém que lhe leve até a sua irmã.
— Ainda acho que está se precipitando comigo —
ela fala e eu nego com a cabeça. — Se eles fossem fazer
alguma coisa comigo, já teriam feito assim que saiu. Eu
sou apenas a empregada.
— A senhora é muito mais que uma empregada para
mim — retruco rápido. — A senhora sempre cuidou de
mim e mesmo quando eu não era uma criança boa, nunca
foi rude e sempre me tratou bem. Até hoje cuida de mim.
A observo se aproximar e me tocar no rosto.
— Meu filho, eu sei disso — afirma e eu aceno. —
Mas eles não sabem. — dona Herbertina sorri, sinto sua
m ã o e n r u g a d a m e f a z e r u m c a r i n h o a c o l h e d o r. T ã o
conhecido por mim. — E você foi sim uma boa criança,
s e m p r e e d u c a d o , q u i e t o . . . e u e n t e n d o a s u a d o r, s e m p r e
entendi. Eu perdi a minha mãe quando tinha seis anos.
Foi difícil para mim, e sei que foi difícil para você.
Respiro fundo com a vontade de chorar e aceno.
— Obrigado.
— Eu amo cuidar de você. — ela me sorri de um
jeito doce. — E amo que queira cuidar de mim, mas dessa
vez vou ficar devendo.
— Dona Herbertina...
— Não se preocupe comigo — pede e olha para a
M a r i n a . — Vo c ê p r e c i s a c u i d a r d e l e s a g o r a . Tu d o b e m ?
Passo a mão nos cabelos e olho a porta aberta.
Ta l v e z e u p o s s a c o n s e g u i r q u e d o i s a g e n t e s v i g i e m e m
turnos a casa de dona Herbertina. Posso falar com
Marcelo e explicar a situação, ele não se oporia.
Sinto um toque em meu braço e volto para ela.
— Va i d a r t u d o c e r t o .
— Tu d o b e m — a c e n o a c e i t a n d o p o r o r a , m a s n ã o a
deixaria desamparada. Do bolso da calça eu tiro um
envelope que tirei do cofre, e entrego a Herbertina. —
Para ajudar a senhora por enquanto, e sabe que pode me
ligar a qualquer hora que vou ao seu socorro.
— Eu sei, meu filho.
Olho para Marina que mantém um pequeno sorriso.
E l a a o p e r c e b e r m e u o l h a r, f i c a d e p é e s e a p r o x i m a .
Engulo em seco enquanto encaro seus lindos olhos
verdes, sempre mantendo aquele brilho que me desarma.
É como se, em meio a toda essa confusão, ela fosse a
única coisa que me traz paz. Quando Marina chega mais
p e r t o , s i n t o o c a l o r d e s u a p r e s e n ç a e , s e m p e n s a r,
estendo a mão para segurar a dela.
— Coube tudo? — ela começa, a voz suave, quase
um sussurro.
— Tu d o , v o u s ó t r a n c a r a c a s a e p o d e m o s i r. —
Minha voz sai firme, mas por dentro, o medo de não
conseguir protegê-los como deveria me assombra. — A
senhora já está com tudo pronto?
— É melhor chamar um carro para mim — dona
Herbertina aconselha e vai até Marina, e a abraça. Heitor
recebe um beijo na cabeça. — Assim você segue direto
para a casa do seu pai.
Ela me olha daquele jeito que conheço, de quem
n ã o v a i d a r o b r a ç o a t o r c e r. A o f u n d o e s c u t o u m a b u z i n a
e vou até o painel. Igor está parado no portão, acena com
a mão rapidamente, então deixo que entre. O observo
e n t r a r a p a s s o s r á p i d o s e i r a t é a T V, e l e a l i g a e c o l o c a
no canal de notícias.
“Um dos agentes que participou da Operação
Encruzilhada, liderando um comboio aqui no estado de
A l a g o a s f o i m o r t o n o i n í c i o d e s s a t a rd e . A i n f o r m a ç ã o
chegou agora por meio de uma nota anônima, Antônio
Va re d a s , d e 3 9 a n o s , e r a a g e n t e h á m a i s d e v i n t e a n o s e
participou da maior Operação para coibir o tráfico no
nosso país. Lembrando que ação envolveu alguns dos
estados do Brasil.”
— Te m a l g u m j u d a s t r a b a l h a n d o c o m a g e n t e —
Igor fala voltando-se para mim. — Não tinha como
saberem isso, Diogo. — ele suspira e para na minha
frente. — Estão mandando um maldito recado para todos
nós.
R e s p i r o f u n d o e o l h o a T V, n ã o c h e g u e i a c o n h e c e r
pessoalmente Antônio, mas me recordo que sim dele nas
reuniões online.
— Estou indo ficar na casa do meu pai — aviso a
Igor que olha para Marina. — Quando cheguei tinha um
carro preto na rua.
— Caralho! — ele xinga e passa a mão no
cavanhaque. — Vão todos para lá, isso é bom.
— A dona Herbertina não quer ir — Marina retruca
f a z e n d o I g o r e n c a r a r H e r b e r t i n a . — E l a s e n e g a a i r, e s e
nega a ir ficar com a irmã.
— Como é que é tia HBT? — Igor franze o cenho
levando as mãos para a cintura. — Quer me matar do
coração, é isso? Ficando rebelde desse jeito?
— Eu não posso ir assim, Igor — ela responde
o l h a n d o d i r e t a m e n t e p a r a e l e . — Te m o B e r n a r d i n h o ,
minhas plantas, minha casa, não posso sair assim.
— Mas como é que não pode? — ele balança a
cabeça, me olha de relance, mas logo a encara de novo.
— Va i f i c a r c o m q u e m l á ?
— Eu e o Bernardinho.
— Te m o u t r o q u a r t o d i s p o n í v e l ? — I g o r q u e s t i o n a
interessado.
— Só o sofá.
— Serve para mim — afirma e eu o olho surpreso.
— Levo o meu travesseiro, cobertor e a senhora cozinha
para mim. Pode ser? — dona Herbertina sorri. — Ah,
minha viúva também vai comigo.
Dessa vez, ela cruza os braços. Já Marina o encara
confusa.
— Vo c ê t e m u m a v i ú v a ?
Igor concorda e do cós atrás da camisa, ele tira a
pistola.
— Ela nunca me deixou na mão, não posso deixá-la
sozinha.
Apoio minha mão no ombro de Igor e o olho de um
jeito agradecido. Ele ir com Herbertina, me deixa 100%
mais calmo, porque sei que ele vai cuidar dela como eu
cuidaria.
— Obrigado.
— P o r n a d a — e l e s o r r i e f i n g e s u s s u r r a r, m a s f a l a
alto. — Pode me agradecer me chamando para ser
padrinho do carinha de joelho. Ser padrinho tem mais
benefícios, tio é coisa de gente chata.
— E v o c ê m e c h a m a d e t i a H B T.
S o r r i o s e m s e g u r a r.
— A senhora é a melhor — Igor retruca a
a b r a ç a n d o . — Va m o s e m b o r a , v o u p a s s a r e m c a s a p a r a
pegar minhas coisas. — ela aponta para a bolsa dela no
chão e ele a pega. — E eu só disse isso para o convite
v i r, a s e n h o r a s a b e .
Encaro os dois irem e olho para Marina.
— Só um momento.
Ela acena, e rapidamente vou trancar a porta dos
fundos e todas as janelas da casa. Olho os quartos a
procura de alguma bolsa esquecida, e quando não
encontro, vou até Marina. A acompanho até a saída e do
lado de fora, ao lado da porta, aciono o alarme. Com
agilidade, ajudo a colocar Heitor na cadeirinha e com
tudo ok nos acomodamos nos assentos. Igor está saindo
com o carro e buzina em despedida, devolvo a buzinada e
saio da garagem. Espero a porta fechar e após isso tomo
o caminho do condomínio.

Ao chegar na portaria, somos rapidamente


a u t o r i z a d o s a e n t r a r. M a r i n a , a o m e u l a d o , s e r e m e x e n o
a s s e n t o , e p e r c e b o a t e n s ã o e m s e u o l h a r. A s s i m q u e
estaciono na calçada, avisto meu pai esperando por nós.
Ele está impecavelmente vestido com terno e gravata, o
distintivo pendurado no pescoço reluzindo ao fim da
tarde. O ambiente ao redor parece quase cerimonioso,
com a presença imponente do meu pai marcando o tom.

Ele nos cumprimenta com um aceno de cabeça e um


sorriso, mas seus olhos permanecem sérios e atentos.
Marina me dá um olhar preocupado, e eu sinto a
necessidade de acalmá-la, embora também esteja
inquieto. Espero que ela pegue o Heitor e juntos
caminhamos até meu pai.
— Oi, pai — digo, tentando manter a voz firme. —
O b r i g a d o p o r n o s d e i x a r f i c a r.
Meu pai estende a mão para Marina e a
cumprimenta com um aperto de mão firme, seu olhar
misturando acolhimento e preocupação. Então ele sorri
p a r a H e i t o r.
— Essa é sua casa também, filho — ele diz, com um
tom que reflete a seriedade da situação. — Não iria
deixar que vocês ficassem desamparados.
M a r i n a a c e n a e t e n t a s o r r i r, m a s a t e n s ã o a i n d a e s t á
evidente em seu rosto. Meu pai dirige um olhar atento
para o carro, onde o berço está visível. No entanto, logo
v o l t a p a r a H e i t o r.
— Posso segurá-lo? — indaga e Marina me olha,
mas permite. Meu pai com o maior cuidado do mundo,
segura Heitor contra o peito. Ele sorri, em seguida nos
o l h a . — Va m o s e n t r a r ! P r e p a r e i u m q u a r t o p a r a v o c ê s e
u m e s p a ç o e s p e c i a l p a r a o H e i t o r.
Entrelaço os dedos com os de Marina e seguimos
para dentro.
Enquanto caminhamos pelos corredores elegantes,
sinto a mão de Marina suada e levemente trêmula.
Subimos a escada e entramos no meu antigo quarto. Ele
está arrumado com cuidado, e um tanto surpreso, vejo um
berço ao lado da cama. Eu me viro para Marina e a
encontro observando a cena com uma mistura de alívio e
confusão.
— Eu comprei esse berço assim que você concordou
em vir para cá — meu pai fala sem jeito.
— Está tudo bem — eu digo. — Obrigado, pai.
— Tu d o b e m f i c a r e m n o m e s m o q u a r t o ? — e l e
pergunta e eu olho para Marina. Suas bochechas estão
vermelhas. — Eu a colocaria no de hóspedes, mas sua
mãe convidou a Amanda para passar uns dias até que elas
decidam sobre as coisas do casamento do Felipe. E o seu
irmão está no quarto dele, o apartamento que ele comprou
está sendo dedetizado, só falta isso para ele ir morar com
a Beatriz por lá.
Aceno e sutilmente olho para Marina, ela tem o
olhar na cama de solteirão.
— Tu d o b e m s i m , S r. H u m b e r t o — e l a r e s p o n d e c o m
um pequeno sorriso. — Muito obrigada.
— Podemos colocar o outro berço no quarto de
hóspedes ou no meu. Juro que não me importaria de
cuidar do meu neto. Heitor Macêdo. — meu pai fala e eu
sei o que ele está fazendo, então, após respirar fundo eu
o observo.
— Arslan — corrijo e ele me encara confuso. —
Heitor Arslan, eu o registrei hoje.
— E por que não colocou Macêdo?
— Arslan é o sobrenome da minha mãe.
Meu pai me observa por alguns segundos, mas então
acena e sorri.
— Tu d o b e m — d á d e o m b r o s c o m u m o l h a r
e m o c i o n a d o p a r a H e i t o r. — N ã o d e i x a d e s e r o m e u n e t o .
Concordo, o que é a mais pura verdade. Heitor pode
não ser meu filho de sangue, mas quero criá-lo como se
fosse o meu próprio bebê e estou bastante empenhado em
conquistar Marina.
— Eu vou pegar as nossas coisas — aviso a Marina
q u e c o n c o r d a . — Vo l t o j á .
— Vo u a j u d á - l o , f i l h o . — m e u p a i f a l a e n t r e g a n d o
Heitor a Marina. — A sua mãe está no quarto de cara
fechada, não me disse o que aconteceu e sinceramente
n ã o e s t o u q u e r e n d o s a b e r.
Solto um suspiro e saio deixando Marina.
Delicadamente coloco Heitor no berço e em seguida
me sento na beirada do colchão para tirar os saltos. Meus
pés estão me matando, pois desde que cheguei da rua, não
os tirei. Livres e com os pés doloridos, me deito e fico
uns bons minutos ali.
Abro os braços no colchão e percebo que a cama é
bem menor que a de casal de Diogo. Um sorriso nervoso
brinca nos meus lábios quando percebo que nos dois não
vamos caber na cama. A não ser que fiquemos bem
colados.
A porta se abre e Diogo junto com o pai entram no
quarto. As malas são colocadas no canto e Diogo
gesticula com a mão, me pedindo um minuto, então sai.
Me levanto e curiosa, vou até a janela que tem ali. Em
frente a ela, olho para baixo e após alguns minutos,
Diogo e o pai aparecem em meu campo de visão. Os dois
conversam, e mesmo ali, percebo Diogo com seu olhar
sério. Como se prestasse bastante atenção no que o pai
fala. Eles conversam por mais alguns minutos, e em
seguida, Diogo sobe na parte de trás da caminhonete.
— Vo c ê n ã o c o n s e g u i u ! — m e v i r o r á p i d o p a r a a
porta e vejo Adriana de roupão de cetim azul. — Eu não
vou sossegar até que você esteja longe das nossas vidas!
Vo c ê n ã o v a i e s t r a g a r o c a s a m e n t o d o m e u f i l h o c o m e s s e
b a s t a r d o ! Vo c ê p o d e t e r e n f e i t i ç a d o D i o g o , m a s a m i m
não vai!
Lentamente me aproximo do berço.
— Eu não quero estragar o casamento de ninguém
— falo sob o olhar raivoso. — E eu não enfeiticei
ninguém!
Adriana cruza os braços e me lança um olhar de
desprezo.
— Ele vai se tocar e ver que pode conseguir
mulheres melhores que você. — murmura e dá um sorriso
d e l a d o . — Va m o s v e r a t é q u a n d o v o c ê f i n g e .
Assim que fico sozinha no quarto, fico olhando a
p o r t a a b e r t a , s e m s a b e r o q u e f a z e r. O s r e s m u n g o s d e
Heitor me chamam de volta para a realidade, e levando
meu olhar até ele, percebo que sua chupeta está longe. A
pego e devolvo a ele. Solto um suspiro e decido me
familiarizar com o quarto.
O ambiente é elegante e bem decorado, com móveis
de madeira escura e detalhes clássicos. Há duas
prateleiras recheadas de livros de direito, organizados
por tamanho, e uma escrivaninha robusta com uma
cadeira de couro. A luz suave do fim de tarde atravessa
as cortinas semi-abertas, iluminando a superfície polida
da escrivaninha.
Meu olhar se fixa em uma porta do outro lado do
q u a r t o , e m e a p r o x i m o p a r a a b r i r. A o e m p u r r á - l a ,
descubro uma suíte bem equipada, com um chuveiro
espaçoso e acabamentos de mármore claro. Ao lado,
percebo um closet embutido, pequeno, mas organizado,
com espaço suficiente para acomodar nossas roupas.
Fecho a porta da suíte e volto para o quarto, onde
Diogo está sentado na cama.
— Deixamos o berço no quarto dos meus pais —
avisa e eu aceno incomodada. — Se eu soubesse que
haveria outro berço, tinha deixado do Heitor em casa.
— Tu d o b e m — f a l o e v o u a t é n o s s a s m a l a s . — E u
posso guardar nossas coisas no closet?
Diogo olha para mim e faz um gesto afirmativo com
a cabeça.
— Claro, fique à vontade. É só por um tempo, mas
p o d e m o s n o s a j e i t a r.
Vo u a t é a s m a l a s e c o m e ç o a a b r i - l a s . A s r o u p a s
estão dobradas, mas já começam a mostrar sinais de
estarem sendo arrumadas e desarrumadas várias vezes.
Respiro fundo e me levanto, carregando algumas peças
em direção ao closet embutido. Enquanto coloco as
roupas nas prateleiras e cabides disponíveis, escuto o
som suave de passos atrás de mim.
— Marina… — Diogo chama meu nome com uma
v o z b a i x a , q u a s e h e s i t a n t e . Vi r o - m e p a r a e l e , q u e a g o r a
está mais perto, seu olhar cheio de cuidado. — Eu sei que
isso tudo é um pouco demais..., mas quero que saiba que
estou aqui para você.
Eu aceno, tentando disfarçar o desconforto que
sinto.
— Eu estou bem — minto com um sorriso. — Só é
estranho estar na casa do seu pai, sob essas
circunstâncias.
Ele assente, entendendo, e cruza os braços,
pensativo.
— E u s e i . E é s ó a t é r e s o l v e r m o s e s s a s i t u a ç ã o . Vo u
garantir que você e o Heitor estejam seguros e que o
quanto mais rápido possível possamos voltar para casa.
Ao ouvir “voltar para casa”, sinto meu estômago se
r e v i r a r, m a s d e u m j e i t o q u e n ã o é r u i m — é u m m i s t o d e
ansiedade e esperança. Não sei se ele tem noção de como
a q u e l a s p a l a v r a s m e f a z e m s e n t i r, c o m o u m c a l o r
reconfortante se espalha pelo meu peito ao pensar que,
para ele, já somos uma família, que ele considera aquele
l u g a r, n o s s o l u g a r.
E l e f a z m e n ç ã o d e s a i r, m a s e u o a g a r r o p e l a
camisa. Diogo se volta para mim e se aproxima
lentamente até ficar na minha frente, suas mãos me tocam
o rosto e ele se inclina até os lábios tocarem o meu com
urgência. Sinto o calor do contato se espalhar por todo o
meu corpo, como uma chama acesa na noite fria. As
palavras dele se declarando ainda ecoam na minha mente,
misturando-se com os batimentos acelerados do meu
coração. Quero isso, quero ele — mas junto desse desejo,
há também uma pontada de medo, um sentimento estranho
q u e n ã o c o n s i g o d e c i f r a r.
Diogo aprofunda o beijo, e minhas mãos deslizam
por suas costas, sentindo a firmeza de seus músculos sob
o t e c i d o d a c a m i s a . Tu d o a o r e d o r p a r e c e d e s a p a r e c e r ;
não há perigo, não há incertezas, apenas nós dois.
Quando estou com ele, tudo parece tão natural, como se
sempre tivesse sido assim. Como se eu sempre tivesse
pertencido aos seus braços, ao seu cuidado.
Mas essa sensação de pertencimento também traz
um peso inesperado. Pergunto-me se é real, se é
duradouro, ou apenas algo momentâneo, uma ilusão
c r i a d a p e l o c a o s a o n o s s o r e d o r. N o e n t a n t o , q u a n d o e l e
murmura meu nome contra meus lábios, toda a incerteza
p a r e c e s e d i s s i p a r.
E u s e i q u e d e v e r i a p e n s a r, s e r r a c i o n a l , m a s , n e s s e
momento, tudo que quero é acreditar que isso é
verdadeiro. Que esse lugar é meu, que esses braços são
m e u l a r, e q u e D i o g o é a e s c o l h a c e r t a p a r a m i m e p a r a
H e i t o r.
— Marina… — ele sussurra com uma voz carregada
de sentimentos, e eu sinto um arrepio percorrer minha
espinha. — Quando me olha assim... parece que consegue
l e r a m i n h a a l m a . To d o s a o n o s s o a r r e d o r p a r e c e m
d e s a p a r e c e r.
F i c o s u r p r e s a e d e i x o u m s o r r i s o e s c a p a r.
— Eu me sinto do mesmo jeito — decido ser
honesta, já que seus olhos não mentem o que ele está
sentindo. — Há medo, mas sinto um sentimento diferente.
— Medo? — ele franze o cenho tocando meu rosto.
— E u n u n c a v o u t e m a c h u c a r, M a r i n a .
— Eu sei! — falo rápido nervosa. — Não esse medo
de que vá me bater — desvio o olhar envergonhada, mas
ele me toca o queixo exigindo minha atenção para ele. —
Tu d o e n t r e a g e n t e a c o n t e c e u t ã o r á p i d o , t e n h o m e d o d e
que isso acabe. Eu sei que há esse risco...
Diogo me beija lentamente, fazendo minhas pernas
ficarem bambas e meu coração quase explodir de emoção.
— Se você permitir — sua voz sai mais baixa e
rouca. — Eu quero conquistar você, Marina. Se eu não
fui claro com você, vou ser o mais transparente possível
agora. — ele avisa e aceno. — Eu quero você, quero ser o
p a i d o H e i t o r, c o m t o d o o m e u c o r a ç ã o ! — s e u s o l h o s
azuis transbordam um sentimento genuíno. — Quero ser o
homem que você possa confiar sempre. — ele pega minha
mão e leva até o peito. — Eu só quero uma oportunidade,
Marina. Apenas uma, e eu prometo que não vai se
a r r e p e n d e r.
Aceno com um pequeno sorriso, e pulo em seus
braços. Os dois braços apertam minha cintura e eu
retribuo o abraçando com mais afinco.
— O que vamos dizer para os seus pais? Ou a dona
Herbertina?
— Algo que me diz que a dona Herbertina já
desconfia que temos algo — ele fala e eu o encaro. — E
estamos tentando, é isso o que meu pai sabe e basta. —
concordo. — Eu vou tomar banho — avisa e eu aceno. —
Se quiser me fazer companhia, sinta-se convidada.
Diogo sorri de um jeito malicioso, um sorriso que
faz meu coração disparar e, ao mesmo tempo, me deixa
tímida. Nego com a cabeça, tentando esconder o rubor
que sinto subir às bochechas, e ele ri, aquele riso
d i v e r t i d o e p r o v o c a d o r q u e s ó e l e s a b e f a z e r. E l e s a i d o
closet, e eu o sigo com o olhar até que ele entra no
banheiro, meu peito apertado com uma mistura de
e m o ç õ e s q u e n ã o c o n s i g o c o n t r o l a r.
Ta l v e z a m i n h a i n s e g u r a n ç a t e n h a m a i s a v e r c o m a
m ã e d e l e d o q u e e u g o s t a r i a d e a d m i t i r. A d r i a n a s a b e a
verdade e deixou bem claro que não me acha boa o
suficiente para o filho. Suas palavras ainda ecoam na
minha mente, como se fossem uma sombra insistente que
m e p e r s e g u e , m e f a z e n d o d u v i d a r d o m e u v a l o r, d o q u e e u
realmente significo para Diogo.
Mas ele já me disse tantas vezes... Diogo afirmou,
m a i s d e u m a v e z , q u e s o u a ú n i c a q u e e l e q u e r. Q u e q u e r
ser pai do Heitor e construir algo comigo, que nenhuma
outra mulher mexeu com ele como eu mexo. Ele fala com
t a n t a c o n v i c ç ã o q u e p a r e c e i m p o s s í v e l d u v i d a r. E , a i n d a
assim, a voz dela me corrói por dentro, me fazendo
questionar se é possível que eu seja o bastante para ele.
Eu respiro fundo, tentando afastar esses
pensamentos que me atormentam.
C a p í t u l o 2 0 – D i o g o

Passo alguns minutos embaixo do chuveiro,


deixando a água quente escorrer pelo meu corpo enquanto
tento afastar as preocupações da mente. O calor relaxa
meus músculos tensos, e por um momento, sinto-me em
paz, como se a água estivesse lavando não apenas o
cansaço físico, mas também os pensamentos inquietos.
Quando finalmente termino, desligo o chuveiro e
começo a me secar na toalha felpuda. O tecido macio
contra a pele traz uma sensação de conforto momentâneo.
Olho meu reflexo no espelho embaçado, vendo as
gotículas de água escorrerem pelo vidro. Seco o
suficiente, enrolo a toalha na cintura e saio do banheiro.
Paro no batente da porta e observo Marina de costas para
mim, ajeitando as roupas na parte livre do closet. Não
c o n s i g o e v i t a r, m e u s o l h o s q u e d e s c e m l e n t a m e n t e p e l a s
curvas dela, apreciando cada detalhe.
— Preciso pegar uma roupa limpa na mala — aviso,
e e l a s e v i r a p a r a m e o l h a r. S e u s l i n d o s o l h o s v e r d e s
percorrem meu corpo como uma carícia, e vejo suas
bochechas ficarem coradas. Não consigo evitar um
sorriso. — Pensei em pedir nosso jantar aqui no quarto.
Vo c ê j á p a s s o u p o r m u i t a c o i s a h o j e , e n ã o q u e r o q u e
minha mãe seja desagradável com você.
M a r i n a d e s v i a o o l h a r, b a l a n ç a a c a b e ç a , a i n d a
corada.
— Por mim, tudo bem, Diogo — responde
suavemente. Eu me aproximo, sentindo a tensão leve no
a r. — A c h o q u e s u a m ã e n u n c a v a i g o s t a r d e m i m .
Abro minha mala e vou direto ao compartimento das
cuecas. Percebo que Marina continua me olhando, mas
sem dizer nada. Pego uma cueca e um short, e quando
faço o movimento de pegar uma camiseta, sua voz suave
me interrompe.
— Eu posso ver? — levanto o olhar para ela,
confuso por um momento. Ela quer ver minha cueca? — O
seu distintivo — esclarece, apontando para o bolso
interno da mala. Dou uma olhada para o local onde está
fixado o distintivo, junto com um par de algemas. Pego o
distintivo e o entrego a ela. — Ele é muito bonito — ela
elogia, examinando-o com cuidado. — Se eu tivesse um,
andaria sempre com ele.
Sorrio com o comentário dela e, sem tirar os olhos
d e l a , t i r o a t o a l h a p a r a v e s t i r a c u e c a . Ve j o o m o m e n t o
exato em que ela engole em seco, os olhos caindo sobre
meu comprimento. Há desejo contido nos lindos olhos
verdes, e um lindo rubor em seu rosto.
— Na verdade, não gosto que saibam sobre minha
p r o f i s s ã o — f a l o f a z e n d o - a m e e n c a r a r. — Q u e s t ã o d e
segurança. Pego casos complicados.
— Entendo, e você tem razão — ela me devolve, e
olha para as algemas. — Posso? — assinto observando-a
s e a b a i x a r e p e g á - l a s . — Vo c ê a s u s a s e m p r e ?
— Essas são novas — respondo enquanto visto o
short. — O Igor perdeu a minha.
A s s i m q u e t e r m i n o d e f a l a r, e a i n d a c o m a t o a l h a
em mãos. Noto o olhar interessado de Marina na algema,
em seguida seus olhos estão em mim descendo lentamente
por meu corpo. Arqueio uma sobrancelha e cruzo os
braços. Então minha mente formula cenas onde Marina
está em minha cama, algemada e implorando...
— No que está pensando? — sua voz me traz de
volta para a realidade.
Engulo em seco, em seguida nego com a cabeça.
— Nada demais— murmuro e recebo um aceno. —
Vo u d e s c e r e p e d i r n o s s o j a n t a r.
Marina sorri e eu me abaixo para pegar uma
camiseta e um short. Em sequência devolvo a toalha para
o gancho do banheiro e rapidamente saio dali. No quarto,
v o u a t é o b e r ç o e s o r r i o p a r a H e i t o r. E l e e s t á a c o r d a d o ,
mexe os bracinhos e perninhas. Sem conseguir me
s e g u r a r, o p e g o e o b e i j o n a c a b e ç a .
— Marina? — a chamo e ela logo aparece na porta.
— Vo u c o m e l e a t é a c o z i n h a .
— Tu d o b e m .
Devolvo o sorriso e com o meu pequeno nos braços,
deixo o quarto. Desço as escadas com cuidado, o som dos
meus passos ecoando suavemente pela casa. Quando
chego à cozinha, a cena que vejo me faz parar por um
segundo. Minha mãe está parada, de braços cruzados,
com um olhar severo, enquanto a cozinheira a observa
com um misto de nervosismo e curiosidade. As outras
ajudantes estão ocupadas na pia, mas o ambiente está
carregado com uma tensão silenciosa.
Não demora muito para que percebam minha
presença.
— Boa noite — cumprimento, mantendo a voz
educada e firme. Minha mãe permanece em silêncio, seus
olhos fixos em mim com um misto de desaprovação e
desafio. A cozinheira, por outro lado, responde com um
s o r r i s o e d u c a d o , q u e b r a n d o u m p o u c o d a t e n s ã o n o a r. —
A senhora pode separar o jantar para duas pessoas e levar
até o meu quarto? — peço, mantendo o tom cortês.
A cozinheira acena rapidamente, dando um passo à
frente.
— Claro, senhor Diogo.
Dou um breve sorriso em agradecimento, enquanto
m i n h a m ã e c o n t i n u a a m e o b s e r v a r, s e m d i z e r u m a
palavra.
— Não vai se juntar a sua família à mesa? — minha
mãe pergunta finalmente e seu olhar desce até Heitor em
meus braços. — Parece que você já tomou o lugar de pai.
— Mãe...
— Não vamos falar isso na frente das empregadas
— minha mãe interrompe, se aproximando. Seus olhos
passeiam por Heitor e, então, vejo-a soltar um suspiro
l e n t o . — E l e n ã o s e p a re c e n a d a c o m v o c ê — c o m e n t a e m
voz baixa, como se fosse uma constatação inevitável. —
Nem com o Felipe.
Heitor resmunga nos meus braços, inquieto, como
s e r e c o n h e c e s s e a t e n s ã o n o a r. S e u s o l h i n h o s c u r i o s o s
buscam a dona da voz, e eu o envolvo protetoramente e
lanço um olhar para as empregadas.
— Vo u e s p e r a r n o q u a r t o . O b r i g a d o .
A n t e s d e s a i r, e n c a r o m i n h a m ã e p o r u m b r e v e
momento. Há um misto de frustração e tristeza em seu
rosto, mas também algo mais profundo, talvez uma
i n c o m p r e e n s ã o q u e e l a n ã o c o n s e g u e d i s f a r ç a r. N ã o d i g o
nada, apenas deixo o silêncio preencher o espaço entre
n ó s a n t e s d e m e v i r a r e s u m i r n o c o r r e d o r, d e c i d i d o a
manter Marina e Heitor longe de qualquer desconforto
q u e e l a p o s s a c a u s a r.
Meu pai, depois de me ajudar com as malas e o
b e r ç o d e H e i t o r, s a i u p a r a r e s o l v e r a l g o u r g e n t e n o
departamento dele. Felipe, Beatriz e Amanda também não
estão por perto. Pelo que soube, eles saíram juntos e
ainda não voltaram.
Solto um suspiro, lembrando do último jantar com
Amanda presente. A forma como ela mentiu
d e s c a r a d a m e n t e , s e m n e m p i s c a r, m e r e v o l t a . E o p i o r d e
tudo é que minha mãe parece incentivar isso. Não
consigo entender como ela pode apoiar um
comportamento desses, especialmente quando está claro
que só serve para gerar mais conflitos e complicações. É
um peso que carrego comigo, essa sensação de estar
sempre no meio de um jogo de interesses em que eu
n u n c a q u i s p a r t i c i p a r.
Entro no quarto e noto a porta do banheiro fechada.
Me sento na cama, ainda segurando Heitor e sorrio.
— Quando você vai começar a falar? — pergunto
p a r a e l e q u e m e o l h a . Ti r o s u a c h u p e t a e o o b s e r v o
e s f r e g a r a m ã o z i n h a n o r o s t o . — Vo c ê c o n s e g u e m e
e n t e n d e r, n ã o é ? H e i n ? — s o r r i o e o t o c o n o q u e i x o . P a r a
a minha surpresa, ele sorri banguela. Meu peito enche de
e m o ç ã o . — Vo c ê p r e c i s a s o r r i r p a r a o I g o r, a s s i m e l e n ã o
vai mais te chamar de cara de joelho. — continuo
conversando. Heitor resmunga formando um bico. — A
sua mãe também não gosta desse apelido.
— Não gosto mesmo — olho para o lado, só para
ver Marina com uma camisola.
Ela está encostada no batente da porta do banheiro,
os cabelos soltos e ainda úmidos, caindo em ondas suaves
sobre seus ombros. A camisola é simples, mas de alguma
forma parece muito mais sensual nela. Por um momento,
m e p e r c o e m s u a f i g u r a a n t e s d e l e m b r a r d e r e s p o n d e r.
— É um apelido carinhoso — falo, enquanto
balanço Heitor levemente em meus braços.
Marina caminha até mim, um sorriso divertido
brincando nos lábios.
— "Cara de joelho"? Nem um pouco — responde,
p a r a n d o a o m e u l a d o e o l h a n d o p a r a o H e i t o r, s e u s o l h o s
brilhando com um carinho que aquece meu coração. —
Ele tem o rosto mais lindo que eu já vi.
Heitor olha para ela, ainda fazendo um biquinho, e
e u s i n t o u m a o n d a d e t e r n u r a m e a t r a v e s s a r.
— O seu também — digo baixinho, quase sem
p e r c e b e r.
Ela ri, um som leve e alegre. Alguns fios caem por
seu lindo rosto, e eu os coloco atrás da orelha.
— Eu ouvi sem querer a sua conversa com ele —
informa tímida, os lábios rosados repuxados em um lindo
sorriso. — E sinto muito em dizer que vai demorar um
pouco até que ele fale.
— E se ensinarmos? — indago. Marina sorri mais
balançando a cabeça.
— Ele ainda é muito bebê. — profere e eu apenas
aceito. — Eu vou dar de mamar a ele.
Enquanto entrego Heitor para Marina, observo o
jeito como ela o segura, com todo o cuidado e ternura
q u e u m a m ã e p o d e r i a t e r. E l e s e a n i n h a c o n t r a e l a , e v e j o
como seus olhinhos se fecham lentamente, como se já
soubesse que está em segurança. Marina se ajeita na
cama, encostando-se na cabeceira com um suspiro suave.
Ela posiciona Heitor com cuidado no colo, ajustando a
camisola de forma que ele possa mamar com conforto.
Fico onde estou, observando o pequeno rosto de
Heitor relaxar enquanto começa a sorver afoito. O quarto
está silencioso, exceto pelo som ritmado da respiração
dele. Marina olha para mim, um sorriso tranquilo
brincando em seus lábios. Eu me aproximo um pouco
mais, incapaz de desviar o olhar da cena que me deixa
com uma estranha mistura de calma e alegria.
— Quer que eu te dê privacidade? — questiono
quando noto um tom rosado em suas bochechas.
— N ã o ! P o d e f i c a r. — d e i x a . S e u s d e d o s t o c a m c o m
delicadeza a bochecha rechonchuda. — O Igor falou
alguma coisa?
— Ele mandou uma mensagem mais cedo quando eu
estava com o meu pai. — respondo e faço um carinho
agora em seu rosto. É tão difícil deixar minhas mãos
longe dela. — Ele já está na casa com a dona Herbertina.
Fico mais aliviado assim.
Ela concorda e mordisca levemente o lábio. Parece
i n d e c i s a s o b r e o q u e q u e r f a l a r, f i c o n o a g u a r d o c u r i o s o
c o m o q u e p o d e s e r.
— Foi importante você se abrir com ela — murmura
com os olhos em mim. — Eu fiquei feliz.
E n g u l o e m s e c o e d e s ç o m e u o l h a r p a r a H e i t o r.
— Eu sei que não sou de falar muito, mas é o meu
jeito.
Sinto um carinho na barba e me pego encarando os
lindos olhos de Marina.
— Eu sinto muito por tudo o que aconteceu com
você na infância.
— Está tudo bem — dou de ombros. — Não me
afeta mais.
Mas assim que as palavras saem, percebo que estou
tentando mentir para mim mesmo. A verdade é que ainda
há cicatrizes que não se fecharam, e o meu descontrole
na última conversa com minha mãe prova isso. Ainda não
superei algumas coisas.
O que me dói mais é ouvir aquelas palavras da
mulher que sempre chamei de mãe, como se o fato de eu
ser um pai para Heitor não fosse o bastante só porque ele
não carrega o meu sangue. É um pensamento amargo,
d i f í c i l d e i g n o r a r, e m e f a z q u e s t i o n a r a t é q u e p o n t o
realmente fui um filho para ela.
— Se você precisar conversar sobre isso — Marina
fala e me toca a mão. — Estou aqui para você.
Heitor vira o rostinho e resmunga, fazendo Marina
ajustar a camisola enquanto o coloca de pé e dá tapinhas
leves em suas costas. Assim que finaliza, ela se levanta e
o coloca deitado no meio do colchão, fico ali para
garantir que ele não caia. A passos calmos, Marina vai
p a r a o b a n h e i r o e e s c u t o a á g u a c a i r.
Ao voltar para o quarto, ela avisa que vai dar um
banho nele.
Aquele momento em que a ajudo, me traz paz.
M a r i n a é c u i d a d o s a e s e m p r e c o n v e r s a c o m H e i t o r. A
auxilio no que posso, e quando terminamos, escuto
baterem na porta do quarto. Caminho até lá e a abro,
encontrando a cozinheira com uma bandeja grande nas
mãos. Rapidamente, pego a bandeja e agradeço antes de
colocá-la com cuidado sobre a escrivaninha. Levanto a
tampa de inox e vejo dois pratos bem servidos,
acompanhados de dois copos de suco.
Vo l t o m e u o l h a r p a r a M a r i n a q u e e m b a l a H e i t o r c o m
cuidado. Ela sorri para ele, e aquilo me deixa desarmado,
com o coração aos pulos. Não consigo desviar o olhar
dela, e posso até imaginar como minha expressão está:
c o m o u m h o m e m c o m p l e t a m e n t e b o b o a p a i x o n a d o . Tr a v o
com tal pensamento e engulo em seco, enquanto meus
olhos não saem dela.
— O jantar está cheirando tão bem — ela comenta
se aproximando da cama. — O que disse aos seus pais?
Sobre comermos aqui?
Percebo seu olhar curioso e apenas dou de ombros.
Estou muito focado no fato de estar apaixonado por
ela. Assim, tão certo como dois mais dois são quatro.
Então, é assim estar apaixonado?
— O que foi? — Marina questiona quando me vê
calado. — Eu disse alguma coisa errada?
— Não — balanço a cabeça e ela parece mais
aliviada. — Quer ajuda para trocá-lo?
— Vo c ê b e m p o d e r i a a p r e n d e r — e l a b r i n c a e m e
chama, rapidamente vou até ela. — Dona Herbertina vai
f i c a r m u i t o o r g u l h o s a q u a n d o e u c o n t a r.
— Tu d o b e m — d o u d e o m b r o s , f a z e n d o - a s o r r i r. —
O que preciso fazer?
— Vo c ê p r e c i s a p a s s a r u m p o u c o d e c r e m e d e
assaduras nele, limpar o umbigo, colocar a fralda e vestir
a roupinha. — Marina avisa e me observa. — Eu termino
bem rápido.
Arqueio uma sobrancelha e abro a bolsa que ela
coloca em cima da cama. Analiso tudo o que tem ali. Há
várias coisinhas de bebê que eu comprei, e sinceramente,
não sei para onde vai. Me volto para Marina, que sorri
s a p e c a , t a l v e z p e r c e b e n d o q u e n ã o s e i o q u e f a z e r.
— Creme de assaduras?
— E s t á a í — a p o n t a e s e d e i t a a o l a d o d e H e i t o r.
M a r i n a s o r r i e t o c a b o c h e c h a g o r d u c h a d e H e i t o r. — E e u
te dei uma colher de chá falando todos os procedimentos.
Concordo e começo a procurar tudo. Pego uma
caixa comprida e retiro uma pomada, leio para que serve
e em seguida cheiro. Franzo o cenho com o cheiro forte e
mostro a Marina. Assim que ela concorda, pego um pouco
e p a s s o e m H e i t o r. E l e s e r e m e x e e r e s m u n g a . F a ç o t u d o e
em seguida olho o umbigo com aquele troço pendurado.
Ta l v e z p e r c e b e n d o , M a r i n a f i c a d o m e u l a d o e l i m p a
aquela parte. Quando termina e coloca a fralda em
H e i t o r, p r e c i s o d a r o b r a ç o a t o r c e r q u e M a r i n a é
realmente bem ágil.
C o m H e i t o r l i m p o e p r o n t o p a r a d o r m i r. G u a r d o
tudo na bolsa e a coloco em cima da cômoda.
— O olhando assim nem parece que acorda na
madrugada querendo mamar — ela me sorri e vai até o
berço. Com cuidado coloca o pequeno, em seguida se
volta para mim. — Estou morrendo de fome.
Aponto para a cadeira da escrivaninha e a observo
s e s e n t a r.
Pego meu prato e me sento no chão próximo a ela.
M a r i n a c o m e ç a a c o m e r, s e u o l h a r p e n s a t i v o m e f a z
querer saber o que a aflige nesse momento. São tantas
coisas possíveis. Comemos em silêncio, mas Heitor está
e m p e n h a d o a s o l t a r b a l b u c i o s d o b e r ç o . Te r m i n a m o s d e
jantar e fico encarregado de levar até a cozinha.
Enquanto subo as escadas, noto que o corredor
permanece quieto e deserto, o que me traz um pouco de
alívio. Ao passar pela porta do quarto do meu irmão,
percebo que o silêncio reina ali, indicando que ele não
está por perto. Sinto um misto de alívio e inquietação;
embora sua ausência me traga um pouco de paz, ainda
não estou confortável em estar sob o mesmo teto que ele,
sabendo de tudo o que está em jogo.
Te n h o q u e c o l o c a r m i n h a c a b e ç a n o l u g a r e f o c a r n o
que precisa ser feito agora. Preciso conversar com todos
que participaram da operação, esclarecer a situação e
garantir que todos estejam cientes do que está
acontecendo.
Entro no quarto e vejo Marina saindo do banheiro,
ainda enxugando as mãos depois de escovar os dentes. A
cama já está desforrada, e noto que ela organizou tudo
para a noite. Fecho a porta atrás de mim e sigo para o
banheiro, lá faço minha higiene e após alguns minutos
saio. Marina está sentada na cama, o berço fica do lado,
então me encaminho até a luz na parede e a apago. O
quarto é iluminado pela luz do abajur no móvel, e do luar
que invade a fresta da janela.
— Diogo — Marina me observa enquanto me deito
ao seu lado. A cama é pequena para nós. — Sobre o preso
que foi morto, o seu colega de trabalho e o carro preto na
rua... — ela começa indecisa, mas logo continua: — Há
mesmo a possibilidade de ser sobre o seu trabalho? —
solto um suspiro. — Eu sei que é confidencial, você
disse, mas e se for uma coincidência?
— Poderia ser — respondo e retiro a camisa. —
Mas o agente que foi morto em Alagoas, eles saberem que
o Antônio chefiou a operação de lá... não pode ser
c o i n c i d ê n c i a . Tu d o e r a c o n f i d e n c i a l , s ó s a b e r i a m s e
tivesse um infiltrado. — murmuro e quando a vejo baixar
o o l h a r, c o n t i n u o : — M a s n ã o q u e r o q u e s e p r e o c u p e c o m
isso.
— Não tem como não me preocupar — ela retruca
m e o b s e r v a n d o f i c a r d e i t a d o . — Vo c ê v a i t o m a r c u i d a d o ,
né?
— Sempre tomo.
Marina respira fundo e vai até o berço, em seguida
se aconchega no colchão ao meu lado. Ela desliga a luz
d o a b a j u r, e a n t e s q u e s e d e i t e , e u a b r o o s b r a ç o s e m u m
convite. Com um sorriso tímido, ela aceita meu abraço.
— Mal cabemos aqui — sua voz soa brincalhona. —
Diogo?
Ajeito o travesseiro atrás de mim, e a encaro. O
rosto tão delicado e de pele macia, me instiga a tocá-lo e
assim o faço.
— Sim? — respondo, ainda sentindo o calor do
corpo dela contra o meu. Marina hesita por um instante,
seus dedos traçando um caminho lento pelo meu peito. —
Sabia que você é a mulher mais linda que já conheci?
Primeiro ela me olha confusa, mas então vem
aquele sorriso que deixa meu peito aquecido e
i n e v i t a v e l m e n t e , u m a v o n t a d e d e r e t r i b u i r.
— Só me promete que vai tomar cuidado.
— Eu prometo, Marina — digo, e ela sorri para
mim. — Eu nunca ando desarmado, então eles não vão me
pegar desprevenido. Se fui mais cauteloso hoje, foi
porque vocês estavam comigo. A sua segurança e a do
Heitor são minha prioridade.
Marina se aconchega mais em meu peito, sua cabeça
repousando na curva do meu ombro. Sinto o calor do seu
corpo contra o meu, e a sensação é reconfortante, apesar
d a t e n s ã o q u e a i n d a p a i r a n o a r.
— Sei que você faria qualquer coisa para nos
proteger — ela murmura, sua voz soando um pouco mais
tranquila agora. — Mas... só não quero que você se
coloque em perigo por nossa causa.
Passo a mão pelos seus cabelos, sentindo a
suavidade entre os dedos.
— N ã o s e p r e o c u p e c o m i s s o . S e i m e c u i d a r, e j á
estive em situações bem piores.
Ela me olha com aqueles grandes olhos verdes,
ainda com uma sombra de preocupação.
— Mesmo?
— Mesmo — confirmo tocando em sua bochecha. —
Já precisei cumprir mandado em um local bem
complicado e no começo da minha carreira, já fui para o
México e fiquei trabalhando por duas semanas.
— No México? — ela pergunta, curiosa. — O que
você estava fazendo lá?
Dou um pequeno sorriso, lembrando-me daquela
operação arriscada.
— Estávamos atrás de um traficante que tinha
conexões importantes por lá. Fui com uma equipe para
levantar informações e ajudar nas negociações com as
autoridades locais. — Pauso, escolhendo as palavras com
cuidado. — Foram duas semanas tensas, sem saber se
voltaríamos inteiros, mas conseguimos o que
precisávamos e voltamos. Espero nunca mais ter que
voltar lá.
— Por quê?
— Senti que eles não gostam de receber ajuda de
estrangeiros — respondo me lembrando. — Eles são
desconfiados.
— Azar o deles então — Marina dá de ombros e se
senta sobre as pernas. Sua atenção está focada em mim.
— Me fala mais sobre você o seu trabalho?
— Não está com sono?
A s s i m q u e t e r m i n o d e p e r g u n t a r, e l a a p o i a a s m ã o s
nas coxas desnudas.
— Vo c ê q u e r d o r m i r, n ã o é ? — a p e r g u n t a v e m s e m
jeito e eu rapidamente nego com a cabeça. — Então me
fala — pede e dessa vez, busca minha mão. — Como
conheceu o Igor?
Sorrio e fico observando nossas mãos juntas. A
minha é bem maior que a de Marina.
— Foi no trabalho mesmo. Entramos na mesma
é p o c a , m a s c o m a t r i b u i ç õ e s d i f e r e n t e s . Vo c ê j á p e r c e b e u
o jeito dele — murmuro e ela acena com um sorriso. —
No início não dei muita conversa para ele, talvez fosse a
personalidade dele ou pelo fato de na época não confiar
muito nas pessoas.
— Então ele te conquistou?
Marina continua com o carinho em minha mão, seu
tom foi de brincadeira.
— Ele salvou a minha vida — respondo, deixando-a
muda. — Eu quase fui baleado em uma dessas operações
disfarçadas. Depois disso foi como se nos conhecêssemos
há tempos.
— Ele é um grande amigo.
— Meu único amigo. — reforço fazendo-a
c o n c o r d a r. — E v o c ê ? Te m a m i g o s ?
— Não — sua resposta me deixa um pouco surpreso,
e talvez notando isso ela continua: — Eu tinha, mas me
afastei deles. — Seu sorriso é triste, noto que ela desvia
o olhar o do meu. — Eu fiquei um bom tempo sem
c e l u l a r, m a s c o m a g r a v i d e z . . . e u p r e c i s e i t e r.
Constato seu desconforto, como se estivesse
escolhendo com cuidado as palavras a serem ditas. Então
percebi.
— Felipe pegou o seu celular e só entregou porque
estava grávida? — indago e demora um pouco, mas ela
acena. — Eu sinto muito.
— Tu d o b e m , j á p a s s o u e e u n ã o q u e r o m a i s f a l a r
dele. — avisa e eu concordo. — Sei que vai ser difícil
estando aqui, mas quero esquecer o que passei naquele
apartamento.
Te n t o c o n t r o l a r m i n h a r e s p i r a ç ã o , n ã o q u e r o
imaginar o que ela passou. No entanto, conhecendo a
personalidade do Felipe, consigo entender a gravidade da
situação, e isso só aumenta minha fúria.
— Sem problemas, Marina — digo, minha voz
saindo mais rouca do que o normal. — Não quero de
forma alguma que você lembre disso.
— Obrigada — ela responde, e seu sorriso delicado
me aquece o coração. Com carinho, levo minha mão ao
seu rosto. A pele macia sob meu toque me deixa
confortado, e sinto uma onda de proteção e amor crescer
dentro de mim. — Desculpa o que vou perguntar agora —
pede e eu concordo —, mas e a família da sua mãe? Não
tem contato?
— Não, não conheci ninguém — murmuro e
lentamente toco sua coxa. — Éramos somente, eu, minha
mãe que estava grávida e o meu pai. Não morávamos
nessa cidade, mas quando meu pai Humberto soube, ele
f o i m e b u s c a r.
— Como ele soube?
— Não faço ideia — dou de ombros sincero. — Ele
só chegou e me trouxe, não morávamos nessa casa.
— Nunca teve curiosidade de saber? — nego
subindo minha mão por sua coxa. Marina observa a minha
mão e mordisca o lábio. Em seguida me olha nos olhos.
— Eu também não estou com sono. — após dizer isso, se
aproxima mais de mim e sensualmente joga os cabelos
para o lado. — Se tudo bem para você... podemos fazer
algo.
Sorrio e concordo, ela rapidamente sorri e tenta
puxar meu short, mas a impeço.
— Mas dessa vez vai me deixar tocá-la.
Marina arfa e fica confusa.
— Eu não posso agora...
— Eu sei — falo rápido e me sento. — E por mais
que ter você me tocando é prazeroso, quero retribuir de
alguma forma. — sob a penumbra do quarto, percebo que
e l a f i c a s e m c o m p r e e n d e r. — P o s s o t o c á - l a d e u m o u t r o
jeito?
— Nos seios? — pergunta e eu nego. — Então
como...? — a pergunta morre em seus lábios, e quando
noto seu lindo rosto vermelho, seguro a vontade de
s o r r i r. M a r i n a s e m j e i t o é r e a l m e n t e a d o r á v e l . — Vo c ê
q u e r m e t o c a r. . . l á ?
— Só se você deixar — sorrio maliciosamente.
Consigo perceber a guerra interna em seus olhos. — Só
meus dedos vão te tocar lá, por enquanto.
— M-Mas... lá é sujo — ela engole em seco. — Eu
nunca fiz nada lá.
Coloco uma mecha atrás da orelha dela e beijo seus
lábios. Apenas um selinho.
— Só foi uma ideia, Marina — murmuro para deixá-
l a m a i s c a l m a . — S ó v o u f a z e r o q u e q u i s e r e p e r m i t i r.
Ela fica uns segundos olhando em meus olhos e
q u a n d o p e n s o q u e e l a v a i n e g a r, r e c e b o u m a c e n o .
— Só deixa eu ir ao banheiro primeiro? — afirmo e
a observo correr para o banheiro. Aquilo me arranca mais
um sorriso.
Me deito na cama, colocando os braços atrás da
c a b e ç a . E s c u t o a p o r t a d o b a n h e i r o s e f e c h a r, e n ã o
consigo evitar o sorriso que se forma nos meus lábios.
Marina tem esse jeito tímido, mas ao mesmo tempo
confiante, que sempre me surpreende e me faz querer
explorar cada faceta dela. Enquanto espero, fico perdido
nos pensamentos sobre como minha vida mudou depois
que ela apareceu.
Realmente me sinto vivo e parte de alguma coisa.
A expectativa aumenta, e a sensação de antecipação
faz meu corpo responder de imediato. Olho para baixo e
vejo minha ereção sob o short. A ideia de estarmos
juntos, de explorar esse lado mais íntimo, aquece meu
sangue e acelera meu coração. Mas ao mesmo tempo, me
faz lembrar da promessa que fiz a mim mesmo: respeitar
o tempo dela, as suas vontades, e garantir que cada
m o m e n t o e n t r e n ó s s e j a o q u e e l a d e s e j a , o q u e e l a q u e r.
Ouço o som de água caindo e imagino Marina se
preparando. Cada pequeno detalhe do que está por vir se
torna mais nítido na minha mente, e eu me pego sorrindo
novamente, ansioso e ao mesmo tempo sereno, sabendo
que, independentemente do que aconteça, o mais
importante é estarmos juntos, sem pressões, aproveitando
cada momento.
Fico pensando em como ela mexe comigo de um
jeito que nenhuma outra conseguiu. O simples fato de ela
estar aqui, comigo, me dá uma sensação de completude
que há muito tempo eu não sentia. E, acima de tudo, me
f a z q u e r e r s e r u m h o m e m m e l h o r, p o r e l a , p o r n ó s .
M a r i n a s a i d o b a n h e i r o d e v a g a r. E l a p a r a n a p o r t a
por um segundo, como se estivesse reunindo coragem,
antes de vir até a cama. Seus passos são leves, quase
hesitantes, mas seu olhar está fixo em mim. A observo
subir no colchão e se aproximar de mim. Sensualmente
ela se inclina em minha direção, e nos beijamos.
— Diogo... — ela geme baixinho após encerrar o
beijo. — A minha calcinha é de vovó.
Sorrio e a abraço. Em um movimento rápido a faço
deitar e fico por cima. Os cabelos castanhos se espalham
no travesseiro e sem dúvidas aquela é a imagem mais
l i n d a p a r a m i m . S i n t o s u a r e s p i r a ç ã o a c e l e r a r, e o b r i l h o
de diversão e desejo em seus olhos faz meu peito se
a q u e c e r. E u s o r r i o , b a i x a n d o m e u r o s t o a t é o d e l a ,
deixando nossos narizes quase se tocarem.
— Não importa a calcinha — murmuro contra seus
l á b i o s . — Vo c ê s a b e q u e e u q u e r o v o c ê , d o j e i t o q u e f o r.
Marina ri suavemente, o som ecoando baixinho
entre nós como uma melodia. Deslizo uma mão pelo seu
braço até a cintura, sentindo sua pele arrepiar sob meu
toque. Seus olhos se fecham lentamente enquanto eu
continuo a explorar cada curva, memorizando cada
detalhe do seu corpo como se fosse a primeira vez. Ela é
tudo que eu preciso, e isso nunca foi tão claro.
Abaixo minha cabeça até seu pescoço, depositando
beijos suaves ao longo de sua pele macia, e sinto suas
mãos irem até os meus cabelos, entrelaçando-se neles.
— Vi r a d e l a d o e e m p i n a p a r a m i m — s u s s u r r o
contra sua pele, quase implorando. Marina me encara com
aqueles olhos que sempre me desarmam, mas ela sorri
levemente, mordendo o lábio de forma quase tímida.
E l a s e m o v e d e v a g a r, v i r a n d o - s e a t é f i c a r d e l a d o .
Respiro fundo ao ver suas costas arqueadas, o contorno
das suas curvas que me fascinam. Deslizo minha mão por
sua coluna, desde a nuca até o final das costas, sentindo
a firmeza e a suavidade de cada centímetro.
Ela solta um pequeno suspiro, e vejo seus dedos
apertarem a travesseiro. A visão dela assim, tão entregue,
me faz perder o fôlego. Me posiciono atrás dela, minhas
mãos firmes na sua cintura, e sinto seu corpo responder
ao meu toque. Inclino-me para frente, beijando sua nuca,
meu peito encostando nas suas costas.
— S ó p r e c i s a r e l a x a r. — f a l o e s i n t o s e u c o r p o
tremer levemente, como uma reação instintiva ao que está
p o r v i r.
Sorrio e lentamente subo sua camisola até que ela
fica embolada em sua cintura. Meus lábios trabalham em
sua nuca, e como reação, Marina empina mais esfregando
o traseiro em mim. Ouço seu breve gemido e preciso
respirar fundo para me manter controlado.
Desço meus lábios pela linha da mandíbula dela,
traçando um caminho lento e provocante. Marina vira o
rosto para mim, seus olhos fechados, entregando-se à
sensação de cada toque. Sinto a pele dela se arrepiar sob
m e u s l á b i o s , e i s s o s ó m e i n c e n t i v a a c o n t i n u a r.
Nos beijamos e enquanto isso, puxo sua calcinha
deixando-a nua para mim. Me separo e sob o olhar dela,
lambuzo meus dedos de saliva e os posiciono em seu
b u r a q u i n h o a p e r t a d o . To c o e m m o v i m e n t o s c i r c u l a t ó r i o s ,
apenas sentindo. Marina disse que nunca fez nada ali,
então é meu dever proporcionar momentos inesquecíveis
para ela. Com carinho seguro em sua coxa e a faço subir
a perna para me dar mais liberdade.
Vo l t o a t o c á - l a e m s e u b u r a q u i n h o r o s a d o , e
p e r c e b o q u e s ó c o m i s s o e l a e s t á e x c i t a d a . Ve j o s e u
d e s e j o b r i l h a r e n t r e o s l á b i o s p e q u e n o s e r ó s e o s . Vo l t o a
me deitar colado com ela, e deixo que a ponta do meu
dedo do meio a penetre lentamente. Ela morde o lábio
i n f e r i o r, t e n t a n d o c o n t e r u m g e m i d o .
Desço meus beijos pelo seu pescoço, tomando meu
tempo para explorar cada pedaço de pele macia que
encontro pelo caminho, até que alcanço sua clavícula.
Dou uma leve mordida ali, arrancando um suspiro mais
alto de Marina.
— Tu d o b e m ? — i n d a g o s u s s u r r a n d o e n q u a n t o
continuo meu trajeto, meus lábios agora se movendo em
direção ao seu ombro. Ela solta um gemido suave, sua
respiração se tornando mais irregular e então confirma
com a cabeça.
Lentamente, empurro meu dedo a penetrando e só
paro quando ela segura a minha mão. Marina tem o cenho
franzido, mas assim que abre seus lindos olhos, recebo
u m s o r r i s o . Vo l t o a m o v i m e n t a r e m u m v a i e v e m l e n t o ,
s e n t i n d o m e u d e d o s e r a p e r t a d o e m s e u c a l o r. F a ç o q u e
vou retirar o dedo, mas assim que ele chega na borda, eu
posiciono mais um dedo em seu buraquinho.
Ela inclina a cabeça para trás, oferecendo os lábios
para mim, e eu aproveito, exigindo um beijo ardente. O
beijo é profundo e intenso, cheio de desejo. Com dois
dedos eu a penetro e retomo os movimentos.
— Diogo! — ela geme rente aos meus lábios. —
Mais...
— Mais? — indago com um sorriso de lado. — Está
sendo gulosa?
Marina me olha com aquele sorriso inocente, mas
ao mesmo tempo decidido, enquanto passa o braço para
trás e agarra minha ereção com firmeza. Minha respiração
fica entrecortada, mas continuo movendo os dedos,
mantendo o ritmo: lento, mas firme, explorando cada
reação dela.
Seus olhos brilham com uma mistura de surpresa e
p r a z e r, e s i n t o s e u c o r p o r e s p o n d e r a o s m e u s t o q u e s , o
calor dela envolvendo os meus sentidos. Cada suspiro,
cada pequeno som que ela faz, me faz querer ir mais
fundo, me conectar ainda mais com ela.
Aumento o ritmo, sentindo os músculos dela se
contraírem em volta dos meus dedos, apertando-os a cada
movimento. O corpo dela se curva levemente,
entregando-se ao ritmo que estabeleço, e posso ouvir sua
r e s p i r a ç ã o a c e l e r a r, u m r e f l e x o i n v o l u n t á r i o d o p r a z e r
crescente.
Marina morde o lábio, seu olhar se tornando mais
intenso, e eu me aproximo, capturando sua boca com a
minha, nossos beijos se misturando ao compasso do que
estamos criando juntos. Involuntariamente, começo a
acompanhar com o quadril a carícia que recebo na ereção.
Minha respiração fica entrecortada, e quando observo
meus dedos sumirem dentro dela e voltarem no meu ritmo
imposto.
Não consigo controlar meus pensamentos.
A ideia do meu pau estar no lugar dos meus dedos,
de senti-la completamente em volta de mim, faz meu
s a n g u e f e r v e r. M e a p r o x i m o m a i s , n o s s o s c o r p o s q u a s e
colados, e sussurro em seu ouvido, sentindo minha voz
rouca pelo desejo:
— P o s s o c o l o c a r s ó a c a b e c i n h a d e n t ro ?
Ela abre os olhos lentamente, um brilho de
antecipação neles, e me dá um leve aceno de cabeça, o
sorriso tímido se transformando em algo mais ousado.
— C-Com cuidado — pede e eu aceno, tirando
minha ereção do confinamento da cueca. — A-Acha que
vai caber?
Levo os dedos novamente a língua e recolho mais
saliva. Esfrego em minha glande deixando-a babada e
com a mão dela, a faço segurar um lado do traseiro.
Ficando bem aberta para mim.
— Va i c a b e r, s i m — m u r m u r o , a v o z m a i s r o u c a d o
que pretendia. Meu olhar se fixa no dela, buscando
qualquer sinal de dúvida. Marina mantém o sorriso, agora
mais confiante, mas ainda hesitante.
A p r o x i m o - m e d e v a g a r, m a n t e n d o m e u c o n t r o l e c o m
esforço. Seguro minha ereção e a guio até o lugar quente
e estreito. Ela respira fundo e morde o lábio, suas mãos
apertando a cama, e eu paro por um momento, deixando
a p e n a s a g l a n d e a l i , s e n t i n d o o c a l o r.
— R e s p i r a f u n d o , re l a x a p a r a m i m . . . — s u s s u r r o ,
tentando acalmá-la. Ela faz o que eu peço, os olhos
fechando brevemente, antes de me olhar de novo, como se
p e d i s s e p a r a c o n t i n u a r. E n t ã o , c o m o m á x i m o d e
delicadeza, começo a avançar lentamente, só a cabecinha,
como prometi.
O a r a o n o s s o r e d o r p a r e c e p a r a r, e s i n t o m e u c o r p o
todo em alerta, tomando cuidado para não ir além do que
e l a q u e r, p a r a d a r o t e m p o q u e p r e c i s a . M a r i n a s o l t a u m
suspiro trêmulo, e eu sinto o calor envolvente apertar
contra a glande. Ela morde o lábio, o corpo tenso sob o
meu, mas não há hesitação em seus olhos, apenas
expectativa.
— Está tudo bem? — pergunto, quase sem fôlego,
e n q u a n t o c o m e ç o a m e m o v e r, p a r a n d o a s s i m q u e v e j o o
menor sinal de desconforto. Ela assente, respirando
fundo, os dedos apertando o lençol.
— Va i d e v a g a r. . . — s u a v o z é s u a v e , q u a s e u m
sussurro, e eu a obedeço, mantendo meus movimentos
lentos e controlados.
Olho para baixo e reprimo um gemido, Marina fecha
os olhos e arqueia as costas levemente, e isso me faz
sentir ainda mais conectado a ela, como se cada
movimento meu fosse uma resposta ao desejo dela.
Delicadamente, seguro minha ereção e saio, para logo em
seguida entrar novamente.
— Posso assim? — pergunto, a voz carregada de
preocupação e desejo.
Ela abre os olhos lentamente, um sorriso pequeno e
satisfeito se formando em seus lábios.
— Perfeito... — responde, e sua mão desliza até
meu rosto, puxando-me para outro beijo, um que é menos
urgente, mas cheio de intimidade. — Quando me entregar
à você... completamente... vai ser assim?
— Va i s e r m e l h o r — a f i r m o e e l a m e e n c a r a
ansiosa. — Está sendo difícil me controlar — murmuro e
ela geme formando um “o” perfeito com os lábios quando
forço mais um pouco. — Meu desejo é meter com força.
Sinto seu quadril mover lentamente em minha
direção, e eu fico ali, imóvel, apenas sentindo o calor
d e l a a o m e u r e d o r. U m g e m i d o b a i x o e s c a p a d e s e u s
lábios, e isso é tudo o que preciso para começar a me
mover também, mantendo o ritmo lento e cuidadoso,
apenas o suficiente para fazê-la sentir cada movimento.
Para mim está sendo insuportavelmente prazeroso.
Sinto a pressão em minha glande e um arrepio percorrer
por meu corpo. Marina geme mais alto, e eu rapidamente
passo um braço por baixo de seu pescoço e tampo seus
lábios. Sinto meu pau ser apertado e não consigo conter o
meu gemido.
Minhas investidas continuam, cada vez mais lentas,
m a i s i n t e n s a s , e s i n t o M a r i n a a p e r t a r - s e a o m e u r e d o r,
seu corpo se enrijecendo e estremecendo. Ela geme
abafadamente contra minha mão, e posso ver em seu rosto
a mistura de prazer e entrega total.
Sinto o calor se i n t e n s i f i c a r, um arrepio
percorrendo minha coluna. Cada vez que entro nela, sinto
minha glande ser envolvida por aquela pressão
insuportavelmente deliciosa, o prazer crescendo de forma
avassaladora.
— Diogo... — ela murmura com a voz abafada,
quase um pedido, e isso me faz perder o pouco controle
que ainda tenho.
O corpo dela se arqueia, e sinto suas contrações ao
redor de mim, apertando-me com uma intensidade que me
faz gemer alto. Marina treme, e posso sentir cada onda de
prazer que a atravessa. Ela alcança o clímax, seu corpo
se contorcendo em êxtase.
N ã o c o n s i g o m a i s s e g u r a r. M e u s m ú s c u l o s s e
retesam, o prazer me atravessa como uma corrente
elétrica, e eu me entrego ao momento, gemendo contra o
p e s c o ç o d e l a e n q u a n t o g o z o e m s e u c a l o r. O m u n d o
parece sumir por alguns segundos, e só restam nós dois,
ofegantes, em meio ao calor desse momento, nossos
corpos unidos na mais pura satisfação.
C a p í t u l o 2 1 – M a r i n a

Um mês.
Já tem um mês que estou com o meu bebê e Diogo,
morando na casa dos pais dele. Para a minha surpresa,
Felipe desde que soube da nossa vinda para cá, não se
dirigiu em nenhum momento ou se quer tentou falar
comigo. Mas seus olhares, quando percebo que
direcionados a mim, me faz sentir um arrepio de medo.
É como se ele estivesse à espreita, esperando um
m o m e n t o p a r a a g i r, p a r a d i z e r o u f a z e r a l g o q u e m e f a ç a
questionar ainda mais minha segurança aqui. Por um
lado, é um alívio não ter que lidar com ele diretamente,
m a s , p o r o u t r o , o s i l ê n c i o d e l e é p e r t u r b a d o r. A a u s ê n c i a
de palavras pode ser tão ameaçadora quanto a presença
delas.
Com um suspiro, busco meu bebê no berço, e em
seguida pego a bolsa dele. Hoje temos consulta e Diogo,
q u e e s t á n o t r a b a l h o , p r o m e t e u v i r n o s b u s c a r. D e s d e q u e
voltou ao departamento, ele está empenhado a resolver
logo a situação para que possamos voltar para casa. Pelo
q u e s a i u n a T V, o t a l t r a f i c a n t e f o i m o r t o p o r i n i m i g o s
q u e s a b i a m q u e e l e s e r i a t r a n s f e r i d o . Ta l v e z u m a c e r t o d e
contas, ou queima de arquivos como Igor falou na semana
passada.
E l e e d o n a H e r b e r t i n a v i e r a m n o s v i s i t a r, a p e s a r d a
mãe do Diogo não gostar de ver Herbertina, evitou ficar
por perto.
Saio do quarto e com cuidado desço as escadas.
A s s i m q u e c h e g o n a s a l a , v e j o Te r e z a — a c o z i n h e i r a —
passar em direção a cozinha. Ela me sorri educada e eu
retribuo. Me sento no sofá da sala e sorrio para o meu
bebê que já está maiorzinho e mais esperto. Acho incrível
q u a n d o D i o g o c h e g a , c h a m a p o r H e i t o r, e e l e f i c a
procurando com os olhos. Só falta falar de felicidade. O
beijo nos cabelinhos pretos e o posiciono em meu colo.
— Boa tarde, Marina — levanto meu olhar e
observo Amanda descer as escadas. Está impecável com
um salto, calça jeans e uma blusa de alfaiataria verde. Já
faz alguns dias que ela é hóspede, também evita falar
comigo e pelo que soube, hoje é alguma prova de algo do
casamento. Ela para próxima a mim, percorre o olhar por
m i n h a r o u p a e d á u m s o r r i s i n h o d e l a d o . — Va i s a i r ?
É t ã o n í t i d o o d e s d é m e m s e u o l h a r.
— Boa tarde — respondo educada e posiciono meu
b e b ê p a r a m a i s p e r t o d e m i m . — Te m o s c o n s u l t a s .
— Ah — Amanda cruza os braços. — Esperando o
Uber?
— D i o g o — r e s p o n d o f a z e n d o - a s o r r i r. — E s t á
q u a s e n a h o r a d e l e c h e g a r.
Ela se aproxima mais e sorri para o meu bebê.
— Acho bonito o Diogo ir te levar — comenta e eu
apenas a observo. — Mas se bem que deve ser mais
c a n s a t i v o p a r a e l e . I r t r a b a l h a r, p e g a r a q u e l e t r â n s i t o
horrível, te levar para a consulta, depois voltar para te
t r a z e r, v o l t a r p a r a o t r a b a l h o — e l a r i b a l a n ç a n d o a m ã o .
— Realmente, muito trabalho assim. Ele não reclama? Ele
sai bem cedo, né? Não sei como ele aguenta.
F r a n z o o c e n h o e q u a n d o p e n s o e m r e s p o n d e r,
escutamos um carro estacionando em frente. Olhamos ao
mesmo tempo para a entrada e em questões de segundos,
Diogo aparece em nosso campo de visão. Ele está usando
um terno, seu olhar encontra o meu e enquanto se
aproxima, ignora Amanda.
— Desculpe a demora — pede e eu fico de pé. — O
trânsito estava horrível.
Assim que ele fala aquilo, olho para Amanda que
me sorri como se dissesse “eu te disse”.
— Tu d o b e m — d o u d e o m b r o s e n q u a n t o e l e p e g a a
b o l s a d e H e i t o r, e o t o c a n a b o c h e c h a c o m c a r i n h o . —
Tc h a u A m a n d a .
— A h , D i o g o ! — e l a o c h a m a f a z e n d o - o s u s p i r a r.
Seu olhar muda para um mais sério. — Será que tem
como me deixar na avenida principal?
— Não — nega colocando uma mão em minhas
costas, indicando a saída. — Eu não vou pela avenida
p r i n c i p a l . P o d e c h a m a r u m U b e r, m a s v a i t e r q u e e s p e r a r
na portaria. Carros desconhecidos não entram.
— Posso ficar em qualquer parte que puder me
deixar naquelas redondezas. — Amanda tenta de novo. —
A c h o q u e o U b e r i r i a d e m o r a r, n ã o q u e r o c h e g a r a t r a s a d a .
— Então talvez devesse ter saído mais cedo — ele
r e s p o n d e e t e n t o s e g u r a r m e u s o r r i s o . — Va m o s i n d o ? —
pergunta para mim, rapidamente aceno.
— Tu d o b e m , D i o g o . F i c a p a r a u m a p r ó x i m a . —
Amanda responde e mesmo não vendo seu rosto, sei que
ela não gostou da resposta.
Ando com Diogo para fora da casa, e quando
estamos ao lado da caminhonete, olho para seu rosto. Ele
a o n o t a r m e u o l h a r, s o r r i e s e c u r v a p a r a m e b e i j a o s
lábios. Em seguida abre a porta traseira, ele pega Heitor
dos meus braços e sorri carinhoso. Enquanto conversa
baixinho com o meu bebê, o coloca na cadeirinha.
Cada movimento dele é cuidadoso, quase como se
estivesse manuseando algo extremamente precioso. A
forma como seus olhos suavizam quando ele olha para o
meu bebê me faz perceber o quanto Diogo está
comprometido em ser o pai que Heitor precisa.
Enquanto ele ajusta as correias da cadeirinha e
verifica se tudo está seguro, meu coração se enche de
uma mistura de gratidão, admiração e algo mais. Heitor
solta um pequeno resmungo, e Diogo responde com um
sussurro suave, acariciando-o no rostinho.
Depois de garantir que Heitor está confortável, ele
fecha a porta traseira com cuidado e, em um gesto que já
se tornou natural para nós, estende a mão para mim. Eu a
aceito, sentindo o calor de sua palma contra a minha.
— O que foi? — Diogo pergunta adotando um tom
carinhoso. — Não estamos tão atrasados — murmura e
logo desliza os dedos por meu rosto. — Demorei a sair
porque estava em uma reunião.
— Não estou te atrapalhando, né?
Diogo me encara confuso e nega com a cabeça.
— Nem você ou o Heitor me atrapalham — afirma e
carinhosamente me beija novamente. — Então não
pensem nisso.
Sorrio e quando Diogo se inclina para me beijar
mais uma vez. Preciso conter as borboletas em meu
estômago que estão agitadas. Esse tempo que passamos
j u n t o s , e v e r a f o r m a c o m o e l e m e t r a t a e t r a t a H e i t o r, m e
trouxe a certeza de que estou apaixonada por Diogo.
Afinal, esse sentimento forte só pode ser isso. Aquela
necessidade de estar ao lado dele, de contar os minutos
p a r a e l e c h e g a r, d o s b e i j o s , d o s t o q u e s . . . de vê-lo
c o n v e r s a n d o e s o r r i n d o p a r a H e i t o r. . .
Sinto a barba de Diogo roçar minha pele
novamente, e é como se uma corrente elétrica percorresse
meu corpo, cada célula reagindo ao toque dele. Aperto
meus dedos em sua nuca, puxando-o para mais perto,
como se isso fosse suficiente para acalmar o fogo que me
consome por dentro.
Os últimos dias foram uma mistura de emoções
intensas e o que mais se sobressaiu foi o desejo. Parecia
que cada toque dele trazia uma nova onda de sensações,
cada vez mais profundas, cada vez mais irresistíveis.
Diogo tem sido paciente, sempre respeitando meus
limites, mas seu toque sempre foi um lembrete de que ele
está ali, ao meu lado, disposto e carinhoso.
Nunca imaginei que me encontraria ansiando tão
desesperadamente pelo toque de um homem, mas com
Diogo, é diferente. Ele não é apenas um homem; ele é o
homem que me fez redescobrir partes de mim que eu
tinha esquecido, o homem que, mesmo nas piores
tempestades, se tornou meu porto seguro.
Encerro o beijo com muito custo e apoio minhas
mãos em seu peito. Seu perfume me deixa totalmente
inebriada, louca para encontrar seu calor novamente,
sentir a textura da sua pele sob minhas mãos. O coração
b a t e a c e l e r a d o n o m e u p e i t o , e é d i f í c i l m e a f a s t a r,
mesmo por um momento. Os olhos de Diogo me observam
atentamente, um misto de desejo e ternura que me deixa
ainda mais apaixonada. Respiro fundo, tentando controlar
a agitação que se instalou dentro de mim.
— Melhor irmos agora — falo e ele concorda
a j e i t a n d o a p o s t u r a . — Vo c ê f i c a m u i t o b o n i t o d e t e r n o .
— Obrigado — Diogo sorri e abre a porta do
p a s s a g e i r o p a r a m i m . — Vo c ê t a m b é m e s t á m u i t o b o n i t a
com esse vestido.
Passo a mão no tecido e ajeito a regulagem na parte
da cintura. Deixei o salto de lado e calcei uma sapatilha
que estava bem guardada na mala. Me sinto bonita, mas
preciso admitir que ver Amanda toda elegante, me deixou
um pouco sem confiança e por um momento lembro das
qualidades que Adriana disse sobre Amanda.
Acomodo-me no assento e observo Diogo correr
para o lugar do motorista.
Enquanto coloco o cinto, noto Amanda sair da casa
e ir a passos rápidos para a portaria. Olho para Diogo que
mantém a atenção no caminho, e quando finalmente
saímos, eu solto um suspiro.
— O que foi?
— Nada. — sorrio, mas ele continua esperando uma
resposta decente. — Só sinto saudades de ser apenas a
gente.
— Eu entendo — fala voltando a olhar para a pista.
— Eu verifiquei as câmeras de seguranças da casa, e não
achei nada de diferente — avisa e eu o encaro. — Mesmo
assim não me sinto confortável de deixar você, Heitor e
dona Herbertina sozinhos lá. O condomínio é mais
seguro.
— Não pensou em morar no condomínio?
— Não até agora — confidencia e olha rápido para
mim. — Me mudar para longe foi o meio que achei
m e l h o r. M i n h a m ã e é u m a p e s s o a d i f í c i l .
Concordo, então franzo o cenho com o detalhe que
ele disse.
— Quantas câmeras têm na casa?
— Na parte da frente e trás são três, totalizando
seis — responde com o olhar pensativo. — Na área de
dentro, e no quintal também tem câmeras. Na sala, e nos
quartos.
— Na sala? — questiono sentindo meu rosto pegar
fogo. — Mas... fizemos aquilo na sala. — meu olhar é
assustado. — Mais alguém viu?
— Não — ele nega rápido com o semblante sério. —
Eu instalei as câmeras e apenas eu tenho o acesso delas.
N ã o e r a a i n t e n ç ã o g r a v a r, m a s n ã o s e p r e o c u p e , n i n g u é m
vai ver aquilo.
— Vo c ê vai apagar? — minha voz sai quase
sussurrada.
— Já apaguei — avisa e eu solto um suspiro calmo.
Ele busca a minha mão e a beija. — Não se preocupe.
Sorrio agradecida e encosto minha cabeça na janela,
mas as lembranças nublam minha mente. Na sala da casa
dele, foi a primeira vez que dei prazer a Diogo e quase
f i q u e i c o m m e d o d e n ã o c o n s e g u i r. Ve r e p e g a r e m s e u
pau enorme, foi realmente uma surpresa para mim, mas
e u d e v e r i a d e s c o n f i a r. D i o g o é b e m a l t o , e n t ã o e r a ó b v i o
que seu tamanho também seria proporcional.
— Qual a sua altura?
Ele me olha confuso, mas logo responde.
— 1,90.
— E q u a n t o c a l ç a ? — s e u o l h a r v o l t a a m e p r o c u r a r,
então ele sorri. — Não é nada disso que está pensando. —
minto, fazendo-o sorrir mais.
— Eu não pensei em nada — se justifica ainda
sorrindo. — 45. E você?
— 36, e tenho 1,67 — falo reprimindo um sorriso.
— São quase 1,70 se você reparar bem.
— Claro! Quase uma gigante — debocha em um
tom risonho. — Nem parece que preciso me curvar todo
p a r a t e b e i j a r.
Cruzo os braços achando-o lindo sorrir desse jeito
brincalhão.
— Isso saiu como uma reclamação — comento e
arqueio a sobrancelha. — Por acaso está reclamando?
— Longe de mim. — Diogo para no sinal, então
encosta o braço na janela fechada. — Hoje foi um dia
estranho.
— Como assim?
— Igor estava calado demais — ele fala e me olha
dando de ombros. — Ele não é de ficar calado. Sempre
p e r g u n t a p e l o H e i t o r, c o m o e s t á a c o n v i v ê n c i a n a c a s a
dos meus pais..., mas hoje ele pareceu um tanto disperso.
— E você perguntou o que aconteceu?
— Perguntei se a dona Herbertina estava bem —
responde. — Ele disse que sim.
— Mas perguntou se ele estava?
Diogo para por um minuto e me olha de relance.
— Ele sabe que pode se abrir comigo.
— Ou talvez ele precise saber que você está aqui
para ele. — murmuro e ele me olha. — As vezes é preciso
falar o óbvio.
Diogo fica uns minutos calado, então concorda.
Te r m i n a m o s o t r a j e t o e e s p e r o D i o g o e s t a c i o n a r n a v a g a
d i s p o n í v e l d o h o s p i t a l . A n t e s d e d e s c e r, o o b s e r v o
abotoar o terno e colocar o distintivo por dentro do
paletó, escondendo-o parcialmente.
— Va m o s ? — e l e m e p e r g u n t a , o l h a n d o d i r e t a m e n t e
nos meus olhos.
— Va m o s . — r e s p o n d o , e r e t i r o o c i n t o .
Diogo rapidamente desce e dá a volta até parar ao
meu lado, ele abre a porta para mim, e eu desço da
caminhonete. Ao meu lado, ele ajeita a gravata com uma
das mãos enquanto a outra abre a porta traseira. Diogo
l o g o p e g a a b o l s a d e H e i t o r, e n q u a n t o e u p e g o o m e u
bebê com carinho. Olho para o lado, só para ver Diogo
o l h a r a t e n t o a o r e d o r. S u a m ã o e n c o s t a n a b a s e d a s
m i n h a s c o s t a s , e n t ã o c o m e ç a m o s a a n d a r.
Ao entrarmos no hospital, o cheiro de antisséptico e
o som baixo de murmúrios me atingem. Paramos na
r e c e p ç ã o e D i o g o s e i n f o r m a q u a l a n d a r p r e c i s a m o s i r.
C o m t u d o e s c l a r e c i d o , v a m o s a t é o e l e v a d o r. A m i n h a
c o n s u l t a f i c a n o t e r c e i r o a n d a r. H e i t o r r e s m u n g a e D i o g o
o toca na mãozinha, falando com ele de forma fofa.
Aquilo me arranca um sorriso, algum dia eu conseguiria
olhar aquela cena sem sentir meu peito aquecer com
aquele sentimento forte?
S a í m o s d o e l e v a d o r e c a m i n h a m o s p e l o c o r r e d o r.
Nas cadeiras próximas posso ver algumas mamães
esperando, algumas sozinhas e outras acompanhadas.
Diogo aponta para uma cadeira e assim que me sento, ele
vai até a recepção. Duas enfermeiras estão conversando,
mas ao terem a presença de Diogo perto, se calam.
Ele fala brevemente e em seguida volta para o meu
lado.
— Ela está atendendo, quando saírem, será a nossa
v e z . — a v i s a e o l h a a o r e d o r, m a s l o g o v o l t a a m e
e n c a r a r. — Q u e r q u e e u e n t r e c o m v o c ê ?
— Quero — afirmo e sorrio. Heitor resmunga mais
uma vez, e dessa vez Diogo o pega. — Que dengoso.
— O papa... — Diogo trava e engole em seco,
p e r c e b o s e u o l h a r v i r e m m i m , m a s l o g o d e s v i a r. — E u
não ligo de você ser dengoso.
Meu coração acelera ao perceber o que Diogo
e s t a v a p r e s t e s a d i z e r. " P a p a i " . E r a i s s o q u e e l e i r i a
f a l a r, e d e n t r o d e m i m , e u d i g o u m v i b r a n t e " s i m ! " D i o g o
já protege e cuida de Heitor como se fosse seu, mas ouvir
isso em voz alta, reconhecido em palavras, é algo muito
m a i s p r o f u n d o . Ta l v e z e u p r e c i s e d a r u m e m p u r r ã o z i n h o
para que ele perceba que já o aceito plenamente, tanto
c o m o p a i d o H e i t o r, q u a n t o c o m o m e u h o m e m .
Ele o balança suavemente nos braços, um sorriso se
formando lentamente em seus lábios.
— Claro que o papai não liga por você ser dengoso
— falo com a voz suave e carinhosa. Encaro Diogo e vejo
sua surpresa; seus olhos brilham de um jeito que faz meu
c o r a ç ã o a c e l e r a r. — E l e a d o r a d a r a i n d a m a i s d e n g o a
e s s e b e b ê l i n d o . — S o r r i o p a r a H e i t o r, q u e m e r e t r i b u i
com um grande sorriso banguela. — É sim, meu bebê.
Muito dengo.
Ainda sorrindo, volto meu olhar para Diogo. Ele me
toca a bochecha, o toque é suave, mas cheio de
significado.
— Obrigado — ele murmura, a voz baixa e
emocionada.
Balanço a cabeça, minha mão alcança sua barba. É
impossível não notar a felicidade em seu rosto, e isso
também me deixa feliz.
Depois de alguns minutos de espera, um casal sai
do consultório, e somos chamados. Seguro a mão de
Diogo, sentindo o calor e a firmeza de seus dedos,
enquanto entramos juntos. A médica nos recebe com um
sorriso atencioso e começa a examinar Heitor com
cuidado, verificando seu peso, altura e saúde geral. Ela
consulta o calendário de vacinação e olha para nós.
— Hoje vamos aplicar a segunda dose da vacina
contra Hepatite B, tudo bem? — explica ela, de forma
gentil.
Assinto, segurando a mão de Diogo com um pouco
mais de força. Ele olha para mim, e seu aperto
reconfortante me faz sentir segura.
— Va i s e r r á p i d o , m e u a m o r. — m u r m u r o p a r a
H e i t o r, t e n t a n d o c o n f o r t á - l o e n q u a n t o a m é d i c a s e
aproxima com as seringas.
Heitor resmunga, e eu fico apenas observando
enquanto a médica instrui Diogo sobre como segurá-lo
corretamente para a aplicação da vacina. Diogo segue as
instruções, ajustando Heitor em seus braços com
delicadeza, mas firmeza. Ele faz isso com tanta
n a t u r a l i d a d e q u e s i n t o u m a o n d a d e t e r n u r a m e i n v a d i r.
— Muito bem, agora é só manter a calma — a
m é d i c a c o n t i n u a p r e p a r a n d o a s e r i n g a . — Va i s e r r á p i d o ,
prometo.
Heitor se contorce um pouco, mas Diogo o segura
com cuidado, sua expressão focada, mas afetuosa.
— Tu d o b e m , p e q u e n i n o , o p a p a i e s t á a q u i — e l e
murmura suavemente, e meu coração acelera ao ouvir
suas palavras.
A médica aplica a vacina com rapidez e eficiência.
Heitor solta um grande choro, e Diogo começa a balançá-
lo enquanto conversa baixinho com ele.
— Pronto, já acabou — a médica diz, sorrindo. — A
mamãe está quase chorando — comenta e me sorri. — Ele
foi um campeão!
Olho para Diogo e vejo o orgulho em seus olhos.
Não posso deixar de sorrir também em meio a emoção,
tocando suavemente seu braço.
— E agora?
A médica nos entrega alguns papéis, explicando
sobre os cuidados após a vacinação e o cronograma das
próximas doses. Ela sorri gentilmente para nós,
claramente percebendo a conexão especial que formamos
ali.
— Lembrem-se de observar se ele terá alguma
reação — orienta. — Um pouco de febre ou irritação é
normal, mas se notarem algo diferente, não hesitem em
m e l i g a r.
— Obrigado, doutora — Diogo responde, ainda
embalando Heitor em seus braços. Sua voz é calma, mas
tem um toque de gratidão genuína.
— D e n a d a . Vo c ê s s ã o u m a l i n d a f a m í l i a — e l a
comenta com um pequeno sorriso. — Agora é sua vez
mamãe. Me conte como passou o resguardo?
R e s p i r o f u n d o e p e n s o n o q u e v o u d i z e r. S u t i l m e n t e
olho para Diogo, então ele dá um sorriso e fica de pé.
— Vo u t e e s p e r a r l á f o r a — f a l a e s e g u r a a b o l s a d e
H e i t o r. — O b r i g a d o m a i s u m a v e z d o u t o r a .
Assim que ficamos apenas nós, me volto para a
doutora e dou um pequeno sorriso.
— Foi um mês um pouco intenso — confesso,
ajeitando-me na cadeira. — Mas acho que estou me
recuperando bem. O Diogo é bem cuidadoso comigo e o
nosso bebê.
A médica sorri com compreensão, anotando algumas
coisas em seu prontuário.
— É normal se sentir assim — ela diz com
gentileza. — O resguardo é um período delicado, tanto
física quanto emocionalmente. Mas fico feliz em saber
que você tem apoio. E como está se sentindo agora?
Paro um momento, consigo perfeitamente sentir
meu rosto queimando de vergonha, mas preciso ser
franca.
— Doutora, posso perguntar algo mais pessoal? —
começo, um pouco hesitante. A médica acena com a
c a b e ç a , i n c e n t i v a n d o - m e a c o n t i n u a r. — É s o b r e . . . s e x o .
Quando posso voltar a ter?
Ela sorri compreensiva, como se já esperasse essa
pergunta.
— Claro, Marina. Essa é uma pergunta muito
comum. Geralmente, recomendamos esperar pelo menos
seis semanas após o parto, o que coincide com o período
d e r e s g u a r d o . M a s c a d a c a s o é ú n i c o . Vo c ê t e v e a l g u m
desconforto ou complicação durante o resguardo?
— Não, nada significativo. Estou me sentindo bem
— respondo, um pouco mais aliviada.
— Isso é um ótimo sinal — ela comenta, anotando
algo no prontuário. — Se você está se sentindo pronta e
confortável, pode voltar a ter relações sexuais. Só se
lembre de que é importante que ambos se sintam à
vontade. E, se sentir qualquer dor ou desconforto, é
melhor dar um tempo e voltar aqui.
— Entendi. Obrigada, doutora. Isso me tranquiliza
bastante.
Ela sorri de volta.
— F i c o f e l i z e m a j u d a r. O m a i s i m p o r t a n t e é q u e
você esteja se sentindo bem e que essa retomada aconteça
de forma natural para você e para o seu parceiro. E
lembre-se, que se não quiserem mais um bebê por agora,
precisam usar camisinha. Caso faça uso de um
contraceptivo, pode voltar a usá-lo, ele não interfere na
amamentação.
Sorrio, me sentindo mais segura.
— Obrigada novamente.
Ela se levanta junto comigo e me acompanha até a
porta.
— Se tiver qualquer dúvida ou preocupação, estou
a q u i p a r a a j u d a r.
Ao abrir a porta, vejo Diogo do lado de fora, ele
está sentado enquanto Heitor dorme tranquilo em seus
braços. No instante que me vê, sorri, mas está atento.
— Tu d o c e r t o ? — e l e p e r g u n t a , e s t e n d e n d o a m ã o
para mim.
— Tu d o c e r t o — r e s p o n d o , s o r r i n d o d e v o l t a . —
A g o r a , p o d e m o s i r.
Pego a bolsa de Heitor e andamos para fora. Minha
mente ansiosa formula imagens nossas, e só com isso
sinto meu corpo vibrar em antecipação. Eu não tenho uma
calcinha sensual que seja nova, a maioria é estilo vovó
por serem mais confortáveis. E pensando bem, não quero
ter a minha primeira vez com Diogo no quarto dele na
casa dos pais. Pensar isso me traz um sorriso nervoso,
sou totalmente hipócrita. Afinal, já me entreguei de
outras formas mais intensas para Diogo.
Mas não é errado querer tornar essa primeira vez,
depois do resguardo, de um jeito diferente. E assim como
ele, eu também preciso me entregar completamente a ele.
Q u a n d o c o m e ç a m o s a n o s b e i j a r, é q u a s e i m p o s s í v e l p a r a r
e i r d o r m i r. P o s s o c o n t a r n o s d e d o s , a s v e z e s q u e t i v e
vontade de montar Diogo e senti-lo bem fundo em mim.
Especialmente quando ele me toca com os dedos, ou
propõe de um jeito safado colocar só a cabecinha. Sorrio
nervosa.
— Está tudo bem? — ele pergunta quando estamos
chegando na caminhonete. — Bem pensativa.
— Nada demais — dou de ombros e paro ao lado da
porta traseira. — Diogo, poderíamos sair para jantar? —
e l e m e o l h a p o r a l g u n s s e g u n d o s . — Q u e r d i z e r, s e p u d e r,
sei que está sendo cauteloso.
Ele abre a porta de trás e deposita com cuidado
H e i t o r.
— Acho que podemos sim — fala e me olha, mas
volta a verificar meu pequeno. — Não quero que se sinta
presa de forma alguma.
— Não me sinto — retruco rápido. — É que, eu
quero sair com você. Um segundo encontro.
Diogo se vira para mim e me sorri.
— Tu d o b e m p o r m i m — c o n c o r d a , d a n d o - m e u m
b e i j o r á p i d o . — Vo u t e l e v a r e j á v o u p r o v i d e n c i a r n o s s a
volta para casa. Não gosto nem um pouco de estar lá, nem
de deixar você na mesma casa que minha mãe, Felipe e
Amanda. — Ele suspira, passando a mão pela barba. —
Sinto muito por tudo isso.
— Não, está tudo bem — dou de ombros. — No
início, fiquei com medo de o Felipe ou sua mãe falarem a
verdade, mas depois percebi que eles não fariam nada. Só
fico preocupada com a possibilidade de você se
p r e j u d i c a r.
Então, sinto um longo carinho no rosto. Os olhos
azuis de Diogo parecem ler minha alma, e como me sinto
nesse exato momento.
— Não recaindo em você e no Heitor — murmura
carinhoso. — Eu enfrento qualquer coisa por vocês.
C a p í t u l o 2 2 – M a r i n a

Diogo me deixa na porta da casa dos pais e antes de


i r, b e i j a H e i t o r n a c a b e ç a e e m s e g u i d a e m m e u s l á b i o s .
Só o fato dele dizer que voltaríamos para casa, me deixa
ainda mais feliz. Estar ali é muito estranho. Adriana
t e n t a d i s f a r ç a r, m a s a c a b a s e n d o t r a n s p a r e n t e , d e i x a n d o
claro que não me aceita na família e nem o fato de Diogo
s e r u m p a i p a r a H e i t o r.
Solto um suspiro e ando para dentro. Heitor em
meus braços resmunga constantemente, e tenho o cuidado
de não tocar onde ele foi vacinado. Subo as escadas e
quando finalmente entro no quarto, fecho a porta, deixo a
bolsa em cima da cômoda e vou até o berço.
— Prontinho, meu amor — murmuro e
delicadamente toco em seu rosto. — A mamãe precisa de
um banho.
Ajeito a chupeta do Heitor e sorrio observando-o
d o r m i r.
Caminho até o banheiro, mas antes que eu possa
chegar lá, escuto baterem à porta.
— S i m ? P o d e e n t r a r.
A porta lentamente se abre e paralisada vejo Felipe
e n t r a r. Minha respiração fica alterada e mais ainda
quando ele tranca a porta. Seus olhos percorrem o meu
corpo e é inevitável não sentir medo.
— Por um momento — ele começa dando um passo
em minha direção. — Eu me perguntei se você era
diferente e eu estar errado, mas como sempre, minha
intuição não falha.
— Felipe... por favor! Me deixe em paz!
Seu sorriso aumenta e ele leva a mão aos cabelos.
— Te d e i x a r e m p a z ? — s u a v o z s e t o r n a a i n d a m a i s
ameaçadora, um misto de raiva e incredulidade. — Eu
m a n d e i v o c ê e m b o r a ! E o q u e v o c ê f a z ? Va i e s e e n v o l v e
com o meu irmão? Feito uma maldita puta no cio?
Engulo em seco, sentindo o medo se acumular em
meu peito. Como eu pude um dia me sentir atraída por
ele? Meus olhos vão instintivamente para o berço onde
Heitor está dormindo, e percebo que Felipe também o
n o t a . P a r a o m e u h o r r o r, e l e c o m e ç a a s e a p r o x i m a r d o
berço, seus passos lentos, mas carregados de uma
intenção assustadora.
Meu instinto maternal assume o controle, e eu
corro, tentando colocar meu corpo entre Felipe e meu
filho.
— Se você não sair daqui agora... — começo a
f a l a r, m i n h a v o z t r ê m u l a , t e n t a n d o s o a r f i r m e , m a s m i n h a
ameaça só parece inflamar ainda mais a sua fúria.
Antes que eu consiga terminar a frase, sinto o
impacto repentino e ardente de sua mão contra o meu
rosto. O estalo do tapa reverbera pelo quarto, fazendo-me
cambalear para trás. O gosto metálico de sangue invade
minha boca, mas a dor é ofuscada pelo desespero de
p r o t e g e r H e i t o r.
— Se eu não sair o que vai acontecer? — ele indaga
e agarra os meus cabelos com muita força, me
chacoalhando. — Esqueceu quem é que manda aqui? —
pergunta com a face distorcida em fúria. — Ou preciso te
lembrar como você tem que me respeitar? Hein?!
Va g a b u n d a ! M e r e s p o n d e !
— Por favor! Me solta! — imploro, sentindo o
pânico se apoderar de mim.
— Calada! — ele exclama, sua voz carregada de
fúria, usando aquele tom que faz meu corpo tremer de
medo. As lembranças ruins inundam minha mente, me
paralisando por um instante. — Eu esperei o momento
certo! Minha mãe e as duas chatas estão fora, resolvendo
qualquer merda desse maldito casamento. Meu pai no
trabalho e o idiota do Diogo não está aqui. Foi um
presente você vir para cá.
S i n t o m e u c o r a ç ã o d i s p a r a r, a a d r e n a l i n a c o r r e n d o
e m m i n h a s v e i a s . Te n t o m e s o l t a r d e l e , n a e s p e r a n ç a d e
p e g a r H e i t o r, c o n s e g u i r c h e g a r a o b a n h e i r o e t r a n c a r a
porta, mas Felipe é mais rápido. Com um movimento
brusco, ele me segura com força, seus dedos apertando
meus braços como garras. De propósito ele me empurra
para trás, fazendo-nos cair sobre o colchão.
— Não! — minha voz sai embargada, e o desespero
transborda.
Rapidamente Felipe tampa os meus lábios com força
com a mão, e com a outra puxa a alça do vestido
arrebentando-a.
— É impressão minha... Ou você está mais gostosa?
Sinto os lábios dele descendo pelo meu pescoço, a
aspereza de sua barba por fazer roçando contra a minha
p e l e . M i n h a v o n t a d e d e c h o r a r c r e s c e , s u f o c a n t e . Te n t o
l u t a r, m e d e b a t e r, m a s e l e é f o r t e d e m a i s . M e u c o r p o s e
c o n t o r c e , t e n t a n d o e n c o n t r a r u m a m a n e i r a d e e s c a p a r, o
m e d o t o m a n d o c o n t a d e c a d a f i b r a d o m e u s e r.
— Eu quero você caladinha! Para quê lutar? — ele
i n d a g a b e m p e r t o d o m e u r o s t o . — Vo c ê s e m p r e g o s t o u d e
me dar essa bocetinha... Qual o problema agora? Se
fazendo de difícil? Aposto que já deu para o Diogo!
Enquanto me contorço sob o peso dele, consigo
soltar uma das minhas mãos. Com um gesto rápido e
preciso, arranho o rosto de Felipe, deixando marcas
vermelhas em sua pele. Ele me solta por um breve
i n s t a n t e , s u r p r e s o p e l a d o r, e e u n ã o p e r c o t e m p o . C o m
t o d a a f o r ç a q u e c o n s i g o r e u n i r, o c h u t o e n t r e a s p e r n a s ,
sentindo meu pé acertar o alvo.
Ele solta um grunhido de dor e cambaleia para o
lado, me dando a abertura que eu precisava. Empurro-o
com força, fazendo-o perder o equilíbrio e cair de lado
n a c a m a . Te n t o m e l e v a n t a r r a p i d a m e n t e , o c o r a ç ã o
batendo descontrolado, enquanto meus olhos buscam
d e s e s p e r a d a m e n t e o b e r ç o d e H e i t o r.
Vo u a t é o b e r ç o n u m i m p u l s o e , c o m a s m ã o s
trêmulas, pego meu bebê. Corro para o closet o mais
rápido que consigo, sentindo o coração martelar no peito.
Assim que entro, fecho a porta com um movimento
rápido, trancando-a. Encosto-me na última prateleira,
ainda sem fôlego, e aperto Heitor contra o meu peito. Ele
c o m e ç a a r e s m u n g a r, t a l v e z s e n t i n d o a t e n s ã o d o m e u
a b r a ç o a p e r t a d o d e m a i s . Te n t o c o n t r o l a r a r e s p i r a ç ã o ,
acariciando suas costas suavemente para acalmá-lo,
enquanto meus ouvidos estão atentos a qualquer som lá
fora.
— Marina! — ele fala mais alto, então vejo a
m a ç a n e t a g i r a r, e m s e g u i d a e s c u t o a p a n c a d a n a p o r t a . —
Sua vadia do caralho! Abra a porta!
— Eu vou começar a gritar se você não for embora!
— Desgraçada! — Felipe me xinga e soca a porta
me fazendo pular de medo.
B a l a n ç o H e i t o r, e n q u a n t o m i n h a s l á g r i m a s c a e m d e
medo. Meu pensamento vai em Diogo, e me xingo por não
t e r u m c e l u l a r, o u s e p e l o m e n o s t i v e s s e s a í d o d a q u i .
Poderia conseguir chegar até a portaria, ou não sei,
Felipe poderia ter me alcançado. Os minutos passam, não
e s c u t o n a d a , m a s n ã o t e n h o c o r a g e m d e s a i r. E n t ã o , f e i t o
uma medrosa, me sento no chão com meu bebê nos
braços.

Te r m i n o d e d i g i t a r u m r e l a t ó r i o e o l h o p a r a o l a d o ,
pela parede de vidro, consigo ver Igor lendo uma
papelada. O conselho de Marina me vem a mente, e após
um suspiro me levanto da cadeira e saio da sala. Assim
que paro em sua frente, ele me olha esperando o que
t e n h o a d i z e r. P i g a r r e i o e a n t e s d e f a l a r, o l h o a o r e d o r,
nossos colegas estão ocupados demais em seus afazeres.
— Vo c ê s a b e q u e é m e u m e l h o r a m i g o — f a l o e e l e
me olha surpreso. — Então se algo está acontecendo e
você precisar de ajuda, sabe que pode falar comigo.
Igor se encosta na cadeira e dessa vez me sorri.
— Eu sei — afirma cruzando os braços. — Agora
por que isso?
Me sento na cadeira em frente a ele.
— Vo c ê e s t á c a l a d o , s é r i o d e m a i s . . . — c o m e n t o e
ele inclina o corpo para frente. — Não é você.
E l e r e s p i r a f u n d o e o l h a a o r e d o r. D e m o r a u n s
segundos, então balança a cabeça.
— É que eu vi uma coisa quando estava vindo —
fala baixinho. — Me deixou pensativo.
— O quê?
I g o r a b r e a b o c a p a r a f a l a r, m a s p a r a a b r u p t a m e n t e .
Olho para trás e vejo Marcelo se aproximar com um
pequeno sorriso.
— Papeando, não é? — nosso chefe pergunta, mas
logo sorri. — Estou brincando. Eu quero aquele relatório
q u e t e p e d i o n t e m , M o n t a g n e r.
— Claro! — observo meu amigo abrir uma gaveta e
pegar uma pasta. — Aqui.
— Obrigado — Marcelo nos encara, faz que vai
embora, mas logo nos olha. — Vão amanhã ao jantar do
Emílio Cavalcanti?
— Jantar? — indago confuso, mas então me lembro
que meu pai mencionou ele há dois dias. — A celebração
da aposentadoria dele. — comento recebendo um aceno.
— Soube, só não lembrei que é amanhã.
— Espero que vá, Diogo. — seu olhar está em mim.
— Muitas pessoas importantes estarão por lá. Pense em
como isso seria bom para a sua carreira.
C o n c o r d o e o o b s e r v o i r. M e v o l t o p a r a I g o r q u e
tem a atenção em Marcelo, mas não dura muito.
— Ele tem razão.
— O que você viu? — pergunto curioso, fazendo
I g o r s u s p i r a r. — S a b e q u e p o d e c o n f i a r e m m i m .
Ele assente com a cabeça. Então me encara.
— Estou vindo por um caminho diferente, por estar
na casa da tia HBT — fala e eu concordo. — Então, no
semáforo na avenida da praça histórica, eu vi uma moto
parar ao lado do carro do Marcelo, ele entregou um
envelope e o garupa entregou um pacote. No fim os dois
apertaram as mãos e cada um pegou destino diferente.
— O quê? — franzo o cenho. — Um envelope e
pacote?
— Pois é — afirma me olhando nos olhos. — Foi
algo bem rápido e suspeito. Enquanto uns morrem, outros
são perseguidos... ele recebe um presente misterioso?
— I s s o é u m a a c u s a ç ã o g r a v e , I g o r.
— E você acha que eu não sei? — ele indaga e
posso ver a sinceridade em seus olhos. Ele está
visivelmente perturbado com isso. — Só comentei com
você. Por que sinceramente? Não consigo confiar em
mais ninguém aqui.
Ficamos nos encarando por alguns minutos, então
eu fico de pé.
— Va m o s p o r p a r t e s — p e ç o e r e c e b o u m a c e n o . —
P o d e t e r s i d o u m a e n c o m e n d a q u a l q u e r.
— Sendo entregue no semáforo? — Igor cruza os
braços com o olhar descrente. — Se fosse algo banal, por
que não ser entregue aqui? Ou na casa dele? Isso está
muito estranho. — ele olha para a tela do notebook em
cima da mesa, em seguida para mim. — Poderíamos
i n v e s t i g a r. S ó a g e n t e .
— Se estivermos errados... — murmuro para ele. —
Podemos perder nosso emprego.
— Inferno! — Igor pragueja e fica de pé. — Preciso
de um cafezinho. O que vai fazer hoje?
— Eu pensei em voltar para casa — comento
enquanto andamos lado a lado. — Nada mais aconteceu,
verifiquei as câmeras e tudo está normal. Um mês é
tempo demais naquela casa, Marina fica praticamente no
quarto, só sai pela manhã quando estou em casa.
— E o seu irmão? Aprontou?
— Ele não para em casa, mal o vejo por lá —
respondo e o observo parar em frente a mesa de café. —
Soube por alto que a Beatriz está redecorando o
apartamento. Minha mãe convidou a Amanda para passar
uns dias por lá. Parece ter sido de propósito.
— Amanda — ele repete com o cenho franzido. —
Já tive o desprazer de conhecê-la há alguns anos, chata.
É muito bonita, mas a Marina é mais. — assim que ele
f a l a a q u i l o e u t e n t o n ã o l i g a r. — A M a r i n a t e m a q u e l e
j e i t o d o c e d e s o r r i r, e d u c a d a , l i n d o s o l h o s , l i n d o
sorriso... Realmente muito bonita. — travo a mandíbula
morrendo de ciúmes, e talvez notando isso, meu amigo
c o m e ç a a r i r. — E n t ã o v o c ê s e s t ã o f i r m e s m e s m o ? O u s ó
fingindo?
— Ela está comigo! — esclareço fazendo-o balançar
a cabeça. — E o Heitor já me chamou de papai.
— Agora isso é mentira! — Igor ri alto. — O cara
de joelho nem dente tem ainda. Como que vai falar?
O observo encher uma caneca de café e seguida dar
um gole.
— Estou apaixonado por ela — aviso abruptamente,
e i s s o o f a z m e o l h a r. — C o m o n u n c a e s t i v e a n t e s . —
quando ele se mantém calado, eu continuo sem ligar se
estou parecendo um bobo. — Eu me sinto nervoso quando
estou perto dela, mas é um nervosismo bom, um calor que
m e a b r a ç a o p e i t o e m e f a z q u e r e r s o r r i r. . . q u e r e r e s t a r
c o m e l a , c o m o H e i t o r. N ã o p r e c i s a m o s f a z e r n a d a , s ó o
fato de ela estar perto, já me traz um sentimento bom.
C o m o s e f i n a l m e n t e e u p u d e s s e r e s p i r a r, d e p o i s d e m u i t o
tempo. Antes de nos mudarmos, eu fiquei com medo.
Medo deles se machucarem. Só essa possibilidade me tira
o chão.
Igor bebe mais um pouco do café e me olha com o
cenho franzido. Seu olhar vasculha o meu, como se
e s t i v e s s e p e n s a n d o n o q u e d i z e r. E e u f i c o a l i , a p e n a s
esperando uma reação.
— Isso não é paixão, meu amigo. — ele nega com
convicção. — Pode até sido antes — fala rápido quando
eu abro a boca para retrucar —, mas agora é outro
s e n t i m e n t o . Vo c ê s e v ê q u a n d o f a l a i s s o ? S e u s o l h o s a t é
brilharam. Sabe quando eu te vi assim? Quando fui com a
t i a , v i s i t a r v o c ê s . Vo c ê e s t a v a s o r r i n d o c o m o c a r a d e
joelho nos braços. Onde está o carrancudo que não tem
paciência com ninguém? — Igor ri e me bate o ombro. —
Vo c ê a m a e s s a m u l h e r, a m a o n o s s o b e b ê c o m c a r a d e
j o e l h o , e n e m a d i a n t a n e g a r.
P e n s o e m r e t r u c a r, m a s s u a s p a l a v r a s p a r e c e m f a z e r
sentido para mim. Então esse sentimento é amor? Isso me
pega de surpresa, e por um momento fico com receio. Ela
também me ama?
— I g o r. . . — o c h a m o , e e l e m e e n c a r a . — N ã o
chame o Heitor de cara de joelho. — falo e ele leva a
mão ao quadril. — A Marina não gosta.
— A mulher e o seu dom em mandar no homem —
ele fala e sorri. — Eu sinto muito por ela, mas o carinha
de joelho e eu, temos uma conexão forte de tio/padrinho
q u e v o c ê s n ã o v ã o e n t e n d e r.
— Ela é a mãe.
— E...? — Igor termina de beber o café e cruza os
b r a ç o s . — Q u a n d o e l e c r e s c e r, v o u c o n t a r d e s s a o p r e s s ã o
que estão fazendo comigo, e ele com certeza vai ficar do
meu lado. — ele olha rapidamente o horário no celular e
s o r r i . — F a l t a m d e z m i n u t o s p a r a l a r g a r, m e l h o r e u j u n t a r
m i n h a s c o i s a s . Va i m e s m o s e m u d a r h o j e ? S e q u i s e r p o s s o
t e a c o m p a n h a r.
— Acho que a Marina vai ficar feliz — falo e busco
o c e l u l a r. S ã o 1 8 h 5 0 . — N ã o p r e c i s a , a d o n a H e r b e r t i n a . . .
— Está morrendo de saudades do C.Jota.
— D e q u e m ? — f r a n z o o c e n h o s e m c o m p r e e n d e r.
— O cara de joelho.
Reviro os olhos recebendo um sorriso e volto para a
minha sala. Marina com certeza não iria gostar desse
n o v o a p e l i d o , m a s p e l o m e n o s f i z a m i n h a p a r t e e m p e d i r.
Na minha sala, pego meu paletó, chaves da caminhonete e
a carteira. Encerro as atividades do computador e guardo
na gaveta o novo caso que me foi passado.
Ainda me sinto inconformado como tudo ocorreu em
questão da operação encruzilhada. Mesmo tendo as
características de um assassinato, Marcelo decidiu
arquivar temporariamente esse caso por achar as provas
insuficientes, já que Juanito morreu. Ele que sabia de
quem estava por trás, e infelizmente tudo isso aconteceu.
Então aquilo que Igor me confidenciou vem a minha
mente. Seria o Marcelo o traidor? Igor havia sido firme
ao sugerir essa possibilidade, e, embora me custasse
a c r e d i t a r, e r a d i f í c i l i g n o r a r a f o r m a c o m o a s p e ç a s
p a r e c i a m s e e n c a i x a r. S e m f a l a r q u e o v i c o c h i c h a n d o
com o advogado de Juanito naquela tarde. Um agente
morto, uma operação sigilosa, e agora um arquivo
t e m p o r á r i o q u e n i n g u é m p a r e c i a q u e r e r r e a b r i r.
A ideia de ser Marcelo me deixava inquieto.
Levo a mão à nuca e a massageio.
— Vo u c o m v o c ê — I g o r a v i s a c o m a j a q u e t a e m
m ã o s . — Te a j u d o c o m a m i n i m u d a n ç a .
— Te m c e r t e z a ?
— Já avisei a dona Herbertina — fala andando ao
meu lado. — Ela ficou contente.
Balanço a cabeça e tomo o lugar do motorista,
enquanto meu amigo vai até o próprio carro estacionado
ao lado. Assim que dou a partida, meu pensamento vai até
M a r i n a e e u s o r r i o . Vo l t a r p a r a c a s a e t e r n o v a m e n t e a
privacidade com ela, me tira um sorriso malicioso. Estou
indo dormir de pau duro quase todas as noites, e só eu sei
o q u ã o d i f í c i l é m e c o n t r o l a r. Te r o c o r p o d e M a r i n a
colado ao meu, naquela cama pequena, e não poder tomá-
la com fúria.
Igor rapidamente passa por mim e buzina, vou logo
atrás.
P e g o o c e l u l a r e s u s p i r o . Vo u p r o v i d e n c i a r u m
celular para Marina, sempre quando estou no trabalho,
me pego pensando nela e que poderíamos conversar pelo
dia.
O caminho até que é rápido, chegamos quase ao
mesmo tempo na portaria e eu informo que Igor está
comigo. Entramos e Igor estaciona atrás de mim. Abro a
porta e meu amigo vai até o sofá e se senta.
— Tr a z o m e u s o b r i n h o / a f i l h a d o , p o r f a v o r — I g o r
manda enquanto se esparrama no sofá. — Saudades do
C.Jota.
— A Marina vai brigar com você — falo me
dirigindo as escadas. — E eu vou ficar do lado dela.
— Melhor amigo, hein? — ele debocha de braços
cruzados.
Sorrio e apresso o passo até o quarto. Chego no
corredor e franzo o cenho ao ver a porta aberta, Marina
sempre a mantém fechada. Adentro o quarto e fico
confuso ao vê-lo vazio, Heitor não está no berço, mas a
bolsa dele está na cômoda.
— Marina? — a chamo e vou até o banheiro. Abro a
porta o encontrando vazio, então tento a porta do closet.
Está trancada. — Marina?
— Diogo? — a voz soa baixinho, um pouco trêmula.
— Cheguei — aviso e olho para o quarto, estou
confuso. — O que faz aí? O Heitor está com você?
Demora uns segundos, mas ela logo abre a porta.
Assim que meus olhos batem em seu rosto, vejo o lábio
inferior cortado e um hematoma em sua bochecha. Meu
sangue ferve instantaneamente. Dou um passo à frente,
mas ela recua, ainda segurando Heitor com força contra o
peito. Meu olhar percorre seu rosto, procurando alguma
explicação.
— O que aconteceu? — pergunto, tentando manter a
calma, mas minha voz sai carregada de raiva e
preocupação.
Marina treme ligeiramente, os olhos se enchem de
l á g r i m a s e n q u a n t o d e s v i a o o l h a r. M e u c o r a ç ã o s e a p e r t a ,
e uma mistura de medo e fúria toma conta de mim.
— Diogo...
— Foi o Felipe? — pergunto mais firme, e ela me
olha como se tivesse sido pega em flagrante. Só isso já
me dá a resposta.
E l a a s s e n t e , b a i x i n h o . S i n t o m e u c o r p o e n r i j e c e r, a
adrenalina correndo em minhas veias. Não vou deixar
i s s o a s s i m . S e m m e c o n t e r, l h e d o u a s c o s t a s s a i n d o f e i t o
um furacão. No entanto, ela segura o meu braço, me
parando.
— Diogo, não... — ela pede, a voz embargada de
medo. — Ele já foi... não me deixa aqui sozinha.
Respiro fundo, tentando controlar a raiva que
a m e a ç a t r a n s b o r d a r. P u x o - a p a r a p e r t o d e m i m ,
e n v o l v e n d o - a n u m a b r a ç o p r o t e t o r. E n t ã o q u a n d o m i n h a
mão passa por seu ombro, percebo- desnudo-o, diferente
do outro lado. Lentamente eu seguro a alça que está
pendurada, e noto que ela está arrebentada.
— Desgraçado! — meu coração dispara. O que mais
ele fez? Marina se encolhe em meus braços, e eu sinto
uma onda de raiva, misturada com uma preocupação
q u a s e s u f o c a n t e . — M a r i n a , e l e . . . — c o m e ç o a p e r g u n t a r,
mas minha voz falha.
Não sei se quero ouvir a resposta. Não sei se estou
p r o n t o p a r a s a b e r o q u e m a i s e l e f o i c a p a z d e f a z e r. E l a
balança a cabeça, os olhos cheios de lágrimas, enquanto
segura minha camisa branca com força.
— Ele tentou... — sua voz é apenas um sussurro. —
M a s e u c o n s e g u i e s c a p a r. M e t r a n q u e i n o c l o s e t , f i q u e i
com medo dele estar lá fora, então fiquei até agora.
A sensação de alívio é momentânea, logo
substituída pela fúria pura e crua. Seguro o rosto dela,
meu polegar acariciando sua bochecha machucada.
— Me desculpe! — peço deixando-a confusa. Então
saio em disparada, Marina me chama, mas não paro.
Vo u a t é o q u a r t o d e F e l i p e , e n a r a i v a a c a b o
chutando a porta. Ela se abre violentamente, mostrando o
quarto vazio.
— Diogo! — Marina me chama, e eu a ignoro.
Vo u p a r a a e s c a d a e a d e s ç o c e g o d e ó d i o . I g o r a o
me ver alterado fica de pé, em alerta.
— Leve a Marina e o Heitor para a minha casa —
mando enquanto puxo do bolso as chaves. — Eu vou
encontrá-los lá!
— O quê? O que aconteceu? — ele pergunta
segurando meu braço. Então Marina desce as escadas,
ainda segurando Heitor nos braços. — O que houve
caralho?!
— E l e a a g r e d i u ! — r u j o f o c a d o e m I g o r. — E l e a
agrediu e tentou estuprá-la.
A expressão de Igor muda instantaneamente, seus
olhos se arregalam e o rosto endurece.
— Desgraçado... — Igor murmura entre os dentes, e
posso ver a mesma raiva crescendo dentro dele.
— I g o r, p o r f a v o r. . . — M a r i n a c o m e ç a , s u a v o z
trêmula. — Não deixe que ele saia assim!
Ve j o m e u a m i g o e n g o l i r e m s e c o , e s o l t a r o m e u
braço. Igor acena com a cabeça, embora seu olhar
permaneça fixo em mim. Ele sabe que eu não vou
descansar até encontrar Felipe. Não vou deixar passar o
que ele fez.
— Eu vou levá-los.
— O q u ê ? — o u ç o M a r i n a e x c l a m a r, H e i t o r c h o r a r,
mas não paro para olhá-la.
Rapidamente me afasto deles, meu corpo inteiro
treme de raiva. Saio pela porta da frente, determinado.
F e l i p e n ã o v a i e s c a p a r.
Ele vai pagar pelo que fez.
C a p í t u l o 2 3 – D i o g o

Acelero a caminhonete com força, o motor rugindo


enquanto passo por ruas estreitas e cheias de curvas. As
luzes dos postes passam em flashes pela janela, e a chuva
fina que começa a cair deixa o asfalto escorregadio, mas
não me importo. Preciso chegar até Felipe. Meus dedos
apertam o volante com tanta força que sinto a dor
percorrer pelos ossos, mas ignoro.
Minha mente está em chamas, com imagens de
Marina machucada, seu lábio cortado, a alça do vestido
rasgada. A fúria cresce em mim como um incêndio
d e s c o n t r o l a d o . E l e v a i p a g a r. F e l i p e v a i p a g a r p o r t u d o .
Passo por um sinal vermelho sem pensar duas
vezes, desviando de um carro que buzina furiosamente.
Não me importo. Nada mais importa agora a não ser
e n c o n t r á - l o . S e i e x a t a m e n t e o n d e e l e v a i e s t a r. A q u e l e
bar imundo que ele sempre frequenta, como se fosse dono
d o l u g a r. É l á q u e e u o e n c o n t r a r e i .
O limpador de para-brisas luta contra a chuva
c r e s c e n t e , m a s m a n t e n h o m e u o l h a r f i x o n a e s t r a d a . Vi r o
em uma esquina com tanta rapidez que as rodas derrapam,
e a caminhonete quase perde o controle, mas corrijo a
direção imediatamente, apertando o acelerador ainda
mais.
As árvores passam como borrões enquanto subo uma
ladeira. Estou perto. Meus olhos se fixam na entrada do
b a r, u m b u r a c o m a l i l u m i n a d o n o m e i o d e u m b e c o .
Estaciono de qualquer jeito, praticamente saltando da
caminhonete antes que ela pare por completo. Sinto o
vento frio da noite bater no meu rosto, mas o calor da
raiva me mantém aquecido.
P a s s o p e l a s p o r t a s d o b a r s e m h e s i t a r, e m p u r r a n d o -
as com força. A música alta, o cheiro de cigarro e álcool
m e a t i n g e m d e u m a v e z . M e u s o l h o s v a r r e m o l u g a r,
procurando por ele. Não demora muito para vê-lo,
sentado no balcão, de costas para mim, conversando com
o barman como se não tivesse feito nada. Como se tudo
fosse normal.
M i n h a v i s ã o s e e s t r e i t a . S i n t o m e u s a n g u e f e r v e r.
— Felipe! — grito, minha voz ecoando acima do
barulho.
Ele se vira, surpreso, e vejo seu rosto se contorcer
de pavor por um breve instante. Sem dar chance,
atravesso o bar a passos largos, empurrando cadeiras e
clientes para o lado. Felipe se levanta, mas antes que ele
p o s s a r e a g i r, m i n h a s m ã o s e s t ã o n o c o l a r i n h o d a c a m i s a
dele.
— Vo c ê a c h a q u e p o d e f a z e r i s s o c o m e l a e s a i r
impune?! — rosno, empurrando-o contra o balcão com
tanta força que as garrafas balançam. — Seu desgraçado!
Maldito!
E l e t e n t a s o r r i r, a q u e l e s o r r i s o c í n i c o , m a s v e j o o
medo em seus olhos.
— Diogo, olha só... — ele tenta, mas eu já não ouço
nada. Minha mão se fecha em um punho, e, antes que ele
p o s s a t e r m i n a r, e u o a c e r t o c o m f o r ç a n o r o s t o , f a z e n d o - o
c a m b a l e a r.
O barulho no bar diminui, como se todos estivessem
p a r a d o s p a r a a s s i s t i r. F e l i p e c a i c o n t r a u m a m e s a ,
d e r r u b a n d o c o p o s , m a s e u n ã o p a r o . Av a n ç o s o b r e e l e ,
puxando-o pelo colarinho mais uma vez.
— Eu vou quebrar a sua maldita cara! — grito,
minha voz saindo rouca de ódio. — Eu disse o que iria
acontecer com você!
— Aquela puta teve exatamente o que mereceu! —
ele cospe as palavras e sorri com o rosto ensanguentado.
— Na verdade, não! Ela merecia apanhar mais! Pra
o b e d e c e r, s ó a s s i m p r a e l a a n d a r n a l i n h a !
Com o meu corpo repleto de fúria, eu o jogo contra
o chão, e a dor em minha mão esquerda me diz que
machuquei os dedos, mas não me importo. Meu punho já
está voando antes que eu perceba, indo direto para o
rosto dele. Sinto o impacto nos ossos dos meus dedos
quando atinge o queixo do Felipe. O som é seco, um
estalo, e vejo a cabeça dele virar para o lado com a força
do golpe.
L e v a n t o o b r a ç o p a r a c o n t i n u a r, e n t ã o s i n t o b r a ç o s
me segurarem.
Felipe cambaleando se senta e cospe sangue
misturado com saliva. O maldito sorriso ainda está ali.
Te n t o m e s o l t a r, p o r é m m a i s b r a ç o s m e s e g u r a m .
— Essa é a última vez que aviso a você, Felipe. —
minha respiração sai alterada. — Esqueça a Marina! Não
pense nela! Não ouse encostar nela! Ou pode ter certeza,
que eu vou esquecer que é meu irmão... e dá próxima vez,
a nossa mãe vai ter que visitá-lo no hospital! — me solto
com um safanão, os homens do bar me olham cautelosos.
— Por mim... — ele para secando o sangue do
n a r i z . — Vo c ê , e l a e o b a s t a r d o q u e s e f o d a m ! —
institivamente aperto a mão em punho. — A sorte dela...
foi ter se trancado no closet.
Te n t o a v a n ç a r, m a s s o u i m p e d i d o e e m p u r r a d o c o m
força.
— Va i e m b o r a d a q u i ! — o b a r m a n v o c i f e r a p a r a
mim. — Ou vou chamar a polícia!
Dou as costas e saio batendo a porta com força.
Entro na caminhonete e fico uns minutos ali, tentando me
a c a l m a r, m a n t e r m i n h a m e n t e n o l u g a r. O l h o p a r a o s m e u s
nódulos das mãos e vejo os machucados. Esfrego na calça
e seguida arranco dali.
Aquilo é culpa minha!
Minha por ter cogitado ficar naquela casa! Eu
confiei que na casa dos nossos pais, Felipe não faria nada
e isso custou a proteção de Marina. Soco o volante
repetidas vezes e paro no meio fio da avenida. Não posso
voltar agora, não quando ainda tenho esse sentimento de
fúria em meu peito. Sinto meu celular vibrar no bolso da
calça e o ignoro. Eu só preciso, colocar minha cabeça no
l u g a r, a n t e s d e v o l t a r e s e r o a p o i o q u e M a r i n a p r e c i s a .

Ando de um lado para o outro na sala, meus passos


soam nervosos no piso de cerâmica. Cada vez que me
aproximo da porta, olho para fora, esperando ouvir o
c a r r o d e D i o g o v o l t a r. M e u c o r a ç ã o b a t e d e s c o m p a s s a d o ,
e s i n t o u m a a n s i e d a d e q u e m a l c o n s i g o c o n t r o l a r. H e i t o r
está dormindo tranquilamente no quarto, e saber que ele
e s t á s e g u r o n ã o f a z o m e u m e d o d e s a p a r e c e r.
O l h o p a r a I g o r, s e n t a d o n o s o f á c o m u m a e x p r e s s ã o
grave. Ele parece tão calmo e sereno, mas isso só
aumenta meu pânico. Cada minuto que passa sem notícias
de Diogo é um tormento. Ele simplesmente não atende,
não liga e nem responde a nenhuma mensagem que
m a n d e i d o c e l u l a r d o I g o r.
Não consigo parar de pensar no que pode estar
acontecendo lá fora. O que se passa na cabeça de Diogo
agora? O que ele fará quando encontrar Felipe? E se algo
sair errado? E se ele se machucar? For preso? O que ele
vai explicar aos pais? Será dessa vez que a mãe dele vai
abrir o jogo?
— I g o r, n ã o e r a p a r a v o c ê t e r d e i x a d o e l e i r — f a l o ,
a voz tremendo um pouco. — Na verdade, eu devia ter
insistido e fazer com que ficasse… — sussurro, passando
a mão pelo cabelo. Me sinto impotente. — Eu não posso
f i c a r a q u i , I g o r. N ã o a s s i m , s e m s a b e r o q u e e s t á
acontecendo.
— Marina, ele sabe o que está fazendo — Igor diz,
t e n t a n d o m e a c a l m a r, m a s a t e n s ã o e m s u a v o z d e n u n c i a
que ele também está preocupado. — Diogo é cabeça
q u e n t e , m a s e l e s a b e q u a n d o p a r a r.
Ele levanta os olhos para mim, e vejo a
preocupação escondida por trás de sua expressão
controlada.
B a l a n ç o a c a b e ç a , t e n t a n d o c o n c o r d a r, m a s o n ó n a
m i n h a g a r g a n t a m e i m p e d e d e f a l a r. A s p a l a v r a s d e l e
d e v e r i a m m e t r a n q u i l i z a r, m a s s ó f a z e m a u m e n t a r o m e u
medo. Imagino Diogo agindo por impulso, movido pela
raiva. Ele saiu daqui com os olhos ardendo, como se
estivesse prestes a explodir a qualquer momento.
— Va i a t r á s d e l e , I g o r ! P o r f a v o r ! N ã o a g u e n t o
ficar sem notícias.
— Marina, calma… — Igor levanta, se aproximando
d e m i m . — D i o g o v a i v o l t a r. E e l e v a i v o l t a r i n t e i r o .
Dou um suspiro, tentando acreditar nele, tentando
acalmar o meu coração que está disparado. A imagem de
Diogo volta à minha mente, o jeito como ele saiu, cheio
de raiva, e eu quase posso sentir o cheiro dele, sua
presença forte, protetora. Fecho os olhos, desejando com
todas as forças que ele volte logo para casa, que ele
esteja bem.
E enquanto espero, a cada segundo que passa, sinto
o medo crescendo, se enroscando ao redor do meu peito
como um nó que não sei se algum dia vou conseguir
d e s a t a r. E l e f a z c o m q u e m e s e n t e e v a i a t é a c o z i n h a .
Nervosamente, passo as mãos pela saia do vestido — um
outro — e torço o tecido.
Então eu escuto quando a caminhonete estaciona, o
portão se abre lentamente e eu fico de pé.
Igor volta para a sala com um copo d’água, mas
minha atenção está em Diogo que passa pela porta. O
terno está em suas mãos, a gravata frouxa, então percebo
suas mãos machucadas, os nós dos dedos inchados e
manchados de sangue. Ele para e me encara, balanço a
cabeça e vou até ele. Puxo-o para um abraço apertado,
colando meu corpo ao dele, querendo apagar qualquer
r e s q u í c i o d e r a i v a , d e d o r.
Ele hesita por um segundo, como se estivesse
t e n t a n d o s e c o n t r o l a r, e e n t ã o s e u s b r a ç o s m e e n v o l v e m
c o m f o r ç a , c o m o s e t i v e s s e m e d o d e m e s o l t a r. M e u
coração acelera ainda mais, uma mistura de alívio por ele
estar de volta e de pavor pelo estado em que ele se
encontra.
— Está tudo bem! — sussurra para mim. — Eu
estou aqui. — Diogo fala a voz grave e firme, mas
consigo perceber o cansaço e a fúria nela.
M e a f a s t o l e n t a m e n t e p a r a o l h á - l o . To c o e m s e u
rosto, não tem nenhum machucado.
— O que aconteceu?
Ele não responde de imediato. Seus olhos estão
sombrios, intensos, como se ainda estivesse preso
naquela explosão de raiva que o levou a sair daqui. Sinto
o calor de sua respiração pesada enquanto ele tenta se
a c a l m a r, s e u p e i t o s u b i n d o e d e s c e n d o r á p i d o .
— Conversei com ele.
— Diogo...
— Ele não está morto.
Vo l t o a a b r a ç á - l o c o m f o r ç a .
— Não faz mais isso — murmuro contra o seu peito,
a voz abafada. — Não sai assim... Eu fiquei apavorada.
Ele solta um suspiro, sua respiração quente roçando
meu cabelo. Diogo me afasta um pouco, segurando meu
rosto delicadamente com aquelas mãos machucadas, os
olhos encontrando os meus com uma mistura de
arrependimento e algo mais, algo que não consigo
d e c i f r a r.
— Eu sinto muito, Maria. A culpa foi minha! — Ele
f a l a d e v a g a r, c a d a p a l a v r a c a r r e g a d a d e i n t e n s i d a d e . —
Me perdoe por tudo isso.
— Não foi sua culpa, Diogo! Não pense assim.
Sinto as lágrimas se formando, mas me contenho.
Balanço a cabeça, tentando transmitir tudo o que sinto:
toda a preocupação, o medo, e o amor que está crescendo
por esse homem que faria qualquer coisa para me
p r o t e g e r.
Então eu travo...
A verdade me atinge como um choque. Amo Diogo.
E a ideia de perdê-lo, de vê-lo machucado ou em perigo,
me apavora. Não sei quando isso aconteceu, mas está
claro como nunca antes. Olho para ele, tentando
encontrar as palavras certas, mas só consigo apertar suas
mãos com mais força em meu rosto, como se isso pudesse
i m p e d i r q u a l q u e r m a l d e s e a p r o x i m a r.
— Só quero você seguro também — sussurro, com a
voz embargada. — Por nós.
E u m a l c o n s i g o r e s p i r a r. M e u c o r a ç ã o p a r e c e q u e
vai sair do peito, mas ao mesmo tempo, sinto uma espécie
de paz tomando conta de mim. Diogo assente, e me puxa
para mais perto de novo, e eu sei que ele entendeu. E,
por um momento, o mundo parece mais calmo.
— Obrigado por ter trazido os dois, Igor — escuto
D i o g o f a l a r.
— Não por isso — ele responde, então me viro em
sua direção. — Eu só não consegui trazer o berço.
— Não tem problema — dá de ombros e estende a
mão ao amigo. — Muito obrigado.
Ainda abraçada a Diogo, eu observo Igor me acenar
c o m a c a b e ç a e i r. F i c a m o s a p e n a s n ó s a l i n a s a l a , o s d o i s
perdidos em pensamentos.
— Eu trouxe todas as nossas coisas — aviso e me
afasto, mas ainda abraçada a ele. — A sua mãe e as
meninas chegaram quando estávamos saindo.
— Elas falaram algo?
— Não, mas a sua mãe pareceu aliviada — dou um
s i n g e l o s o r r i s o p a r a d e s c o n t r a i r.
Diogo solta um suspiro e toca meu rosto com
carinho.
— Nunca mais vou deixar que ninguém te faça mal
— promete e me beija sutilmente. — Nem a você, ou ao
nosso bebê.
Sorrio emocionada. Diogo me abraça com força,
seus braços me envolvendo, e eu me sinto pequena,
protegida e completa ao mesmo tempo. Suas mãos
deslizam suavemente pelas minhas costas, e sinto o calor
do seu corpo contra o meu, o ritmo da sua respiração se
acalmando aos poucos.
— É melhor você ir tomar banho — murmuro e pego
s u a s m ã o s m a c h u c a d a s . — Ti r a r e s s a r o u p a e c u i d a r
desses ferimentos.
— E o Heitor?
— Eu o deixei na cama — respondo e o guio até o
c o r r e d o r. — C o l o q u e i a l g u m a s a l m o f a d a s n a s b e i r a d a s .
Paramos em frente ao quarto, e eu abro a porta.
Heitor está do mesmo jeito que deixei, dormindo
tranquilamente.
— Eu quero isso, Marina. — ele fala e eu me viro
confusa. — Essa vida com vocês, eu quero.
Meu sorriso se abre, e eu concordo. Eu também
quero, e estou disposta a conquistá-lo, para que um dia
eu possa dizer o que sinto e quem sabe, ouvir de volta.
Diogo se curva e me beija os lábios, em seguida vai para
o quarto. Com Diogo protegido em casa, fico mais
tranquila e vou até as roupas que preciso organizar
novamente em suas gavetas.
As horas se passam, e quando termino tudo, vou
para a cozinha. Como não temos comidas prontas, Igor
pediu uma pizza, por ser mais prático. Paro em frente a
mesa, e escuto ao fundo Diogo fechar a porta do quarto.
Assim que me viro para ele, permito que meu olhar
percorra seu peitoral definido. Ele usa apenas um short.
Os braços enormes sempre me chamam a atenção.
Sinto um arrepio percorrer minha espinha quando
v e j o D i o g o s e a p r o x i m a r, s e u c o r p o r e l a x a d o , m a s a i n d a
assim emanando aquela força que sempre me impressiona.
Ele parece tão à vontade em sua própria pele, e eu não
consigo evitar o sorriso que se forma em meus lábios.
— Que foi? — ele pergunta com um meio sorriso,
como se já soubesse o que estou pensando.
Ele já está mais calmo.
— Nada — murmuro, desviando o olhar por um
segundo, mas meus olhos logo voltam para ele. — Só
estava... admirando a vista.
Diogo ri baixinho, um som profundo e rouco que
faz meu estômago se revirar de uma forma boa. Ele se
aproxima e para bem na minha frente, seus dedos roçando
levemente meu braço.
— A vista, é? — ele provoca, inclinando a cabeça.
— Sou todo seu.
Sinto minhas bochechas queimarem e desvio o olhar
de novo, mas a verdade é que adoro quando ele me olha
desse jeito, como se eu fosse a única coisa que importa.
— Está tentando me deixar sem graça? — pergunto,
mas não consigo esconder o sorriso no canto dos lábios.
Ele se aproxima ainda mais, e sinto o calor de seu
corpo tão perto do meu.
— S e e u e s t i v e r, e s t á f u n c i o n a n d o ? — e l e s u s s u r r a ,
sua voz um pouco rouca, e posso sentir a intensidade de
seu olhar fixo no meu.
— Um pouco — admito, rindo, enquanto ele ergue a
mão e toca meu rosto suavemente, traçando o contorno da
m i n h a m a n d í b u l a c o m o p o l e g a r. S e u o l h a r v a i a t é o
hematoma em meu rosto, ele fica em silêncio. — Isso
some e nem está doendo.
D i o g o r e s p i r a f u n d o e d e s v i a o o l h a r. M e a p o i o e m
seus ombros e o faço sentar na cadeira, em seguida me
sento em seu colo. Seu braço logo rodeia minha cintura,
enquanto sua outra mão me faz um carinho no rosto.
— Eu não suporto saber que ele te bateu — ele
murmura antes de abaixar a cabeça e capturar meus lábios
num beijo lento, mas cheio de promessas. — Eu sinto
muito, Marina.
— Diogo...
— E eu não me arrependo de ter socado a cara dele
— ele me interrompe com o cenho franzido. — Mas Deus
sabe que eu senti vontade de...
Rapidamente eu o interrompo com minha mão em
s e u s l á b i o s . E u n ã o q u e r o o u v i r, n ã o p o r p e n a d e F e l i p e ,
mas por receio, as palavras têm poderes. Concordo
olhando em seus olhos e desço minha mão por seu rosto,
pescoço e peitoral.
— Va m o s e s q u e c e r o F e l i p e , p o r f a v o r — p e ç o e e l e
concorda. Olho para a mesa, mas logo me volto para os
olhos azuis. — O jantar de hoje é pizza. Não tem nada na
geladeira, e eu não estava com cabeça de preparar nada.
Desculpa.
— Não, não se desculpe — pede me tocando a
bochecha. Sempre que ele me toca assim, sinto um
comichão no baixo ventre e um delicioso arrepio percorre
p o r m e u c o r p o . — Vo c ê n ã o p r e c i s a m e p e d i r d e s c u l p a
por nada.
Me inclino e beijo seus lábios. A barba por estar
m a i o r, m e f a z c ó c e g a s , m a s é a l g o q u e m e i n s t i g a a e x i g i r
mais. A mão desce por minhas costas, e
involuntariamente quando chega em minha bunda, eu
empino para ele. A língua esfrega lentamente na minha, e
e u s i n t o q u e n ã o p o s s o m a i s e s p e r a r. N ã o a g o r a q u e e u j á
sei que posso me entregar a ele.
— Diogo — murmuro baixinho, ele separa para me
o l h a r. — E u c o n v e r s e i c o m a d o u t o r a — a v i s o e e l e
p a r e c e a t e n t o , a c e n a m e i n c e n t i v a n d o a c o n t i n u a r. — E l a
liberou.
— Liberou o quê? — franze o cenho, e em meio ao
meu desejo, sorrio. — O quê?
— Ela disse que tudo bem — comento, mas dessa
vez contenho meu sorriso. Diogo realmente não entendeu.
— S o b r e s e x o . P o d e m o s f a z e r, m a s c a u t e l o s o .
L e n t a m e n t e e l e c o m e ç a a s o r r i r, e c o m u m
movimento rápido fica de pé, eu me agarro em seu
pescoço soltando um gritinho de surpresa. Diogo me
segura com firmeza enquanto anda em direção ao quarto.
Seus olhos transbordando promessas silenciosas, que só
aumentam minhas expectativas. Assim que entramos no
quarto, Diogo me puxa para um beijo.
O beijo é intenso, quase desesperado, e eu me
entrego a ele sem reservas, sentindo o calor de nossos
corpos se misturando. Minhas mãos se agarram aos seus
cabelos enquanto ele me puxa para mais perto pela
cintura, eliminando qualquer distância entre nós. O
desejo que compartilho com ele é palpável, uma corrente
elétrica que passa entre nossos corpos.
Sem interromper o beijo, Diogo me guia até a cama,
deitando-me sob ele com um movimento firme, mas cheio
de cuidado. Sinto o peso de seu corpo sobre o meu, e o
calor de sua pele contra a minha é quase insuportável de
tão bom.
Com cuidado ele se afasta minimamente e puxa meu
vestido. Seus olhos percorrem por meus seios
descobertos, os bicos intumescidos de desejo e assim que
os olhos caem na minha calcinha de vovó, ele me olha
com um sorriso de lado.
— Ela é confortável — aviso e em seguida mordisco
o lábio. — E ela é bonita.
— Com certeza — ele afirma e a puxa lentamente.
Finalmente livre dela, sinto minha pele arrepiar em
ansiedade e desejo. Olho para Diogo que lambe os lábios,
para logo abrir minhas pernas e descer o corpo no
colchão.
— Diogo... — minha voz sai num sussurro trêmulo.
— E u p re c i s o c h u p a r e s s a b o c e t a — s e u s u s s u r r o é
q u a s e u m a c a r í c i a e m m i n h a p e l e . — E s p e re i m u i t o p o r
i s s o . . . v á r i a s n o i t e s i n d o d o r m i r d e p a u d u ro , s ó
imaginando esse momento.
Em expectativa, apoio meus cotovelos no colchão e
olho por entre minhas pernas. Meu gemido sai alto
quando a língua esfrega lentamente por toda a minha
intimidade, parando em meu clitóris. Como se estivesse
c o n h e c e n d o m e u s a b o r, D i o g o s o r r i e v o l t a a m e l a m b e r,
intercalando entre chupadas longas e intensas. Meu corpo
ondula só com aquilo, mas logo as mãos firmes seguram
em minhas coxas, impossibilitando que me mexa.
— Vo c ê é d e l i c i o s a , M a r i n a . — e l e m e e l o g i a , s e u s
dedos começam a esfregar com extrema lentidão em meu
clitóris. — Gostosa...
Me contorço como posso em sua cama, e sem me
c o n t e r, l e v o a s m ã o s a t é o c a b e l o d e l e e o p u x o c o m
força. A sensação da barba esfregando na minha
intimidade sensível é deliciosamente intensa, arrancando
de mim um gemido baixo e involuntário. Meu corpo reage
a cada movimento dele, a cada toque, e eu sinto um calor
crescente tomando conta de mim.

Diogo parece perceber meu desespero e redobra


seus esforços, a língua deslizando em carícias precisas e
lentas, enquanto suas mãos me seguram com firmeza.
Aperto os olhos, perdendo-me na sensação, no prazer que
me consome. É quase insuportável de tão bom.
Meus quadris começam a se mover por conta
própria, seguindo o ritmo que ele impõe. As mãos de
Diogo apertam minha pele com mais força, mantendo-me
n o l u g a r, c o m o s e e l e q u i s e s s e c o n t r o l a r c a d a m í n i m o
movimento, cada reação. A barba roça em mim
novamente, o atrito provocando ondas de prazer que me
deixam sem fôlego.
Eu arqueio as costas, tentando puxá-lo ainda mais
para perto, meus dedos se enredando em seus cabelos,
enquanto seus lábios trabalham habilmente. Cada
d e s l i z a r, c a d a c h u p a d a m e f a z t r e m e r.
— Diogo... — murmuro, minha voz soando rouca,
carregada de necessidade. Ele responde apenas com um
gemido satisfeito contra mim, sua língua acelerando, e eu
sei que ele está tão perdido quanto eu. A sensação é
a v a s s a l a d o r a . M e u c o r p o t o d o p a r e c e v i b r a r, e e u s i n t o o
clímax se aproximando rápido, tão intenso que mal
c o n s i g o c o n t r o l a r.
Aperto ainda mais seu cabelo, e ele aumenta o
ritmo, sem me dar um segundo de descanso. Quando
finalmente a onda me atinge, é como uma explosão que
me toma por completo, fazendo-me gemer alto e longo,
meu corpo se arqueando contra o colchão.
Minhas pernas tremem, e cada respiração se torna
u m d e s a f i o e n q u a n t o m e u c o r p o é c o n s u m i d o p e l o p r a z e r.
Diogo não para. Continua, insistente, provocando-me até
a ú l t i m a o n d a d e ê x t a s e m e d o m i n a r. S i n t o c o m o s e
estivesse derretendo sob o toque dele, cada músculo do
meu corpo tenso e ao mesmo tempo entregue, rendido ao
prazer que ele me proporciona.
— Isso... — ele murmura contra minha pele, a voz
rouca, um sorriso de pura satisfação em seus lábios. —
Quero sentir você assim, sempre.
Ainda ofegante, eu puxo-o para cima, nossas bocas
se encontrando em um beijo intenso, cheio de tudo o que
ainda resta entre nós. Nossas respirações misturadas,
nossos corpos colados, e a certeza de que não há nada
que eu queira mais no mundo do que estar aqui, com ele,
desse jeito.
Diogo me envolve em seus braços, seu peito
subindo e descendo rapidamente, e eu sinto o quanto ele
também está entregue a isso.
Ele rompe o beijo apenas por tempo suficiente para
nos posicionarmos, e logo estou olhando nos olhos dele,
que agora brilham com uma intensidade que faz meu
c o r a ç ã o d i s p a r a r. M e u s o l h o s d e s c e m p a r a s e u s h o r t , q u e
rapidamente é tirado e jogado de lado, quando vejo a
ereção apontar para mim, não consigo reprimir meu
gemido dengoso. Da ponta eu vejo o líquido incolor sair
e sinto vontade de recolher com a língua. Ao sentir os
dedos esfregarem em minha abertura, em uma carícia
lenta, eu gemo mais alto. Sem desviar os olhos dos meus,
Diogo leva os dedos aos lábios e os chupa.
— Diogo...
Ele segura minhas coxas trêmulas e as abre,
posicionando-se entre elas, e a antecipação faz meu
c o r p o i n t e i r o v i b r a r. A e x c i t a ç ã o n o a r é p a l p á v e l , e
quando ele esfrega a glande em meus pequenos lábios,
sinto um arrepio de expectativa percorrer minha espinha.
Então eu me lembro.
— A d-doutora disse que eu posso engravidar —
a v i s o f a z e n d o - o p a r a r. — M e s m o a m a m e n t a n d o .
Ele olha para o móvel do lado e se curva até abrir a
gaveta.
— D ro g a !
Q u a n d o n o t o q u e e l e v a i s e a f a s t a r, e u o a g a r r o p e l o
pau e o puxo para mais perto.
— Mas não vamos parar — peço em um tom
s u p l i c a n t e . — Vo c ê g o z a f o r a — p r o p o n h o t í m i d a e m e
olha com um sorriso malicioso. — Amanhã você compra.
Enquanto ele pensa, começo a fazer movimentos de
vai e vem observando-o soltar curtos gemidos. Então com
um movimento lento, mas determinado, o sinto forçar até
que a glande entra. A sensação é avassaladora, fazendo-
m e a r q u e a r a s c o s t a s e s o l t a r u m g e m i d o d e p u r o p r a z e r.
Diogo fecha os olhos, murmurando meu nome em um tom
rouco, enquanto começa entrar aos poucos. Bêbada de
desejo, fecho os meus olhos e finco minhas unhas em
seus braços.
Sinto com perfeição sua ereção, centímetro por
c e n t í m e t r o m e p r e e n c h e r. P o r u m b r e v e m o m e n t o e u o
paro, e ele acaricia minhas coxas. Abro novamente os
olhos e aceno, permitindo que ele continue.
Diogo apoia os braços ao redor da minha cabeça e
bem próximo dos meus lábios, ele sussurra:
— Estou te machucando?
— N-Não — nego e o abraço pelo pescoço. — É tão
gostoso, Diogo!
A p ó s s o r r i r, e l e m e b e i j a e c o m e ç a a s e m o v e r
dentro de mim, cada estocada enviando ondas de prazer
pelo meu corpo.
O ritmo que ele estabelece é firme, mas cheio de
cuidado, como se quisesse prolongar esse momento o
máximo possível, aproveitando cada segundo da nossa
primeira vez. Eu o acompanho, movendo meu corpo ao
ritmo do dele, sentindo a conexão profunda que
compartilhamos se intensificar a cada movimento.
Interrompo o beijo apenas para deixar escapar um
gemido, mas Diogo não me dá trégua, voltando a
reivindicar meus lábios com uma intensidade que me
d e i x a s e m a r, s e m c h ã o . E l e p r e s s i o n a o c o r p o p e s a d o
contra o meu, nos juntando ainda mais, como se quisesse
eliminar qualquer espaço entre nós. Sinto o peso dele,
sólido e firme, me prendendo à cama, e um arrepio
percorre minha espinha ao perceber o quanto ele me
domina com sua presença, o quanto sou pequena sob seu
corpo.
O a g a r r o p e l a b a r b a e o a f a s t o p a r a p o d e r r e s p i r a r,
Diogo sorri, sua respiração quente e ofegante, o timbre
r o u c o q u e f a z m e u c o r p o t r e m e r.
Retribuo o sorriso, amando as sensações que ele
está me causando. Lascivamente, ofereço minha língua
para ele, provocando, e Diogo não perde tempo.
Rapidamente, ele a captura com a sua, aprofundando o
b e i j o c o m u m a u r g ê n c i a q u e f a z m e u c o r a ç ã o d i s p a r a r.
Sinto sua mão grande deslizar pelas minhas costas, me
puxando ainda mais para ele, nossos corpos já tão
próximos que quase posso sentir o ritmo do seu coração
batendo contra o meu.
Ele domina cada movimento, cada investida, e eu
me perco nesse momento, nesse desejo que nos consome.
Meu corpo se arqueia de encontro ao dele, um convite
silencioso, e suas mãos deslizam para minha cintura,
segurando-me com firmeza enquanto o beijo se torna mais
intenso, mais faminto.
— Vo c ê é v i c i a n t e . . . — D i o g o m u r m u r a c o n t r a m e u s
lábios, a voz rouca de desejo, e um arrepio delicioso
percorre minha espinha. Eu sorrio contra sua boca, os
dedos cravando em seus ombros largos, querendo senti-lo
m a i s , q u e r e r t u d o o q u e e l e t e m p a r a m e d a r.
Ele se ajusta sobre mim, encaixando nossos corpos
de forma perfeita, e eu sinto o calor que emana dele,
queimando minha pele. A pressão de seu corpo, sua força,
tudo nele me faz querer mais, muito mais. E eu sei que,
com ele, vou além de qualquer limite que já conheci.
O calor se espalha por cada célula do meu corpo,
meus dedos deslizam por suas costas largas, sentindo
cada músculo tenso. Ele pressiona o quadril contra o
meu, sua urgência pulsando em mim, arrancando de mim
um novo gemido.
— D i o g o . . . — t e n t o s u s s u r r a r, a v o z f r a c a p e l a
mistura de desejo e necessidade. — Eu sou sua...
completamente sua.
Ele para por um instante, os olhos fixos nos meus, e
vejo algo feroz, quase primitivo, em sua expressão.
Então, seus lábios se curvam num sorriso antes de ele
v o l t a r a m e b e i j a r, i n t e n s o , p r o f u n d o , m e f a z e n d o
e s q u e c e r d o m u n d o a o r e d o r.
Tu d o o q u e i m p o r t a a g o r a é e s s e m o m e n t o , o c a l o r
entre nós, a certeza de que somos apenas ele e eu, juntos,
entregues um ao outro.
A pressão dentro de mim cresce, e o prazer se
a c u m u l a a t é q u e e u s i n t o q u e n ã o p o s s o m a i s a g u e n t a r.
Meus gemidos se tornam mais altos, mais urgentes,
enquanto Diogo continua, seus movimentos ficando mais
rápidos e mais intensos. Quando finalmente alcanço o
clímax, é como se uma onda de calor me consumisse por
i n t e i r o , f a z e n d o m e u c o r p o e s t r e m e c e r d e p r a z e r.
Diogo me acompanha logo em seguida, soltando um
gemido baixo e profundo enquanto sai de mim e goza por
minha intimidade. Ele continua a se esfregar em meu
clitóris, mais lento agora, prolongando a sensação até
que ambos estamos completamente saciados.
Por fim, ele desaba ao meu lado, e me puxa para me
aconchegar nele. Ainda me segurando com força, como se
n ã o q u i s e s s e m e s o l t a r. M i n h a s m ã o s a c a r i c i a m
suavemente seu peitoral enquanto recuperamos o fôlego,
nossos corpos ainda entrelaçados, o suor e o calor de
nossa paixão se misturando.
Ficamos ali, em silêncio, apenas aproveitando o
conforto de estarmos juntos, o barulho das nossas
respirações misturadas preenchendo o quarto. Sinto uma
p a z p r o f u n d a m e e n v o l v e r, c o m o s e n a d a m a i s i m p o r t a s s e
além desse momento, além do fato de que, de alguma
forma, tudo o que passamos nos levou até aqui, nos
braços um do outro.
— Eu também sou completamente seu, Marina —
ele fala após alguns segundos, então eu o encaro. —
Como nunca fui de ninguém. — Sorrio e o beijo
lentamente. Diogo tem seus olhos azuis em mim, percorre
por todo o meu rosto. Ele parece indeciso com algo, há
a l g o e m s e u o l h a r q u e n ã o c o n s i g o c o m p r e e n d e r. — C a s a
comigo?
C a p í t u l o 2 4 – D i o g o

Assim que as palavras saem pela minha boca, vejo


Marina me olhar surpresa. Seu rosto ainda está corado
pelos momentos de paixão de segundos atrás, mas sua
expressão é de puro espanto. Sinto o peso do silêncio que
se segue, e, por um momento, me pergunto se fui
p r e c i p i t a d o . Ta l v e z e u d e v e s s e t e r e s p e r a d o , t a l v e z
devesse ter escolhido outro momento, com menos
u r g ê n c i a , m e n o s c a l o r. M a s n ã o p u d e e v i t a r — a v o n t a d e
de tê-la ao meu lado para sempre, de protegê-la e ao
H e i t o r, é a v a s s a l a d o r a .
Meu coração bate rápido no peito, e minha mente
corre em todas as direções.
Marina ainda parece processar o que ouviu. Estou
preparado para qualquer resposta dela, embora o medo de
ter avançado demais me incomode. A respiração dela
acelera um pouco, os lábios entreabertos, enquanto os
olhos procuram os meus.
Ela engole em seco, e então eu vejo um brilho
diferente em seus olhos. Será um "sim" ou um "não"?
Te n t o n ã o p a r e c e r a n s i o s o , m a s t u d o q u e s o u g r i t a p a r a
ela dizer algo, qualquer coisa. Então ao fundo escuto
Heitor começar o choro. Marina parece despertar e desvia
o olhar para fora.
— Eu vou me limpar — murmuro, aceitando que
talvez ela não me responda agora. — Eu...
Paro confuso e apenas saio da cama.
— Diogo...
— Não precisa me responder agora — falo parado
ao lado da cama. Ela apoia as mãos no colchão, os seios
descobertos, os fios longos caindo por seus ombros.
Marina é linda. — Devo ter pegado você de surpresa.
Então, não se sinta obrigada a falar algo agora.
Dou as costas a ela e entro no banheiro, me
escondendo feito um maldito covarde. Apoio minhas mãos
na pia, o peso do meu corpo sobre o mármore frio, e
encaro o meu reflexo no espelho. Estou suado, o cabelo
um pouco desgrenhado, e a expressão no meu rosto me
diz tudo o que já sei: estou em pânico.
O que eu estava pensando? Pedir Marina em
casamento assim, sem nenhum aviso, sem nenhuma
preparação… como se fosse apenas mais uma decisão no
meio do caos que virou nossas vidas. Sinto meu coração
martelar no peito, a respiração presa na garganta, e fecho
o s o l h o s , t e n t a n d o m e a c a l m a r.
Mas a imagem dela, tão surpresa, tão confusa, me
assombra. E se eu tiver estragado tudo? E se agora ela
decidir que é demais, que eu sou demais?
Abro os olhos e vejo minhas próprias mãos
tremendo. Não consigo acreditar que, depois de tudo que
já passei, isso — o medo de perdê-la — seja o que me
f a ç a f r a q u e j a r. P o r u m m o m e n t o , l e m b r o o q u e I g o r m e
falou no trabalho, sobre eu ter mudado. O antigo Diogo
nem se preocuparia com isso, pois, não corria o risco de
me envolver com ninguém. Sentir esse sentimento forte e
incontrolável.
Com um suspiro entro no box e paro embaixo do
chuveiro.
Permito que a água caia em minha cabeça, na
intenção de lavar esse meu medo para longe. Esfrego as
mãos no rosto e me viro para a porta, encontrando Marina
com a minha blusa.
— Não se arrependeu de ter pedido, né? — ela
indaga e eu desligo o chuveiro. Nego com a cabeça, de
onde ela tirou isso? — Eu fiquei surpresa, mas eu já
tenho a minha resposta.
Paro na entrada do box e a observo ansioso.
— Va i m e f a z e r i m p l o r a r p a r a s a b e r ? — p e r g u n t o e
tento dar um sorriso, mas estou muito nervoso.
— Na verdade — Marina retira a minha camisa e
completamente nua se aproxima de mim —, eu esperei
q u e a l g o a s s i m s a í s s e e m u m j a n t a r. A m i n h a i d e i a e r a
jantarmos em algum lugar e eu te dizer que estamos
liberados para o sexo.
Estendo a mão em sua direção e ela logo a segura.
A puxo para mim e ficamos embaixo do chuveiro. Me
curvo até que meus lábios encontram os seus.
— Quer jantar comigo nesse fim de semana? —
pergunto e ela me sorri. — Amanhã eu tenho um jantar
p a r a i r. É d o E m í l i o C a v a l c a n t i , e l e e s t á s e a p o s e n t a n d o .
— Tu d o b e m — M a r i n a s o r r i e d e d i l h a m e u p e i t o r a l .
— E u p o s s o e s p e r a r a m i n h a v e z e q u a n d o v o c ê v o l t a r,
estarei o esperando aqui.
Franzo o cenho e a puxo para mais perto.
— Espero que vá comigo nesse jantar — falo e ela
fica surpresa. — Eu não posso chegar sozinho, fica feio
para mim.
Os olhos verdes e lindos de Marina parecem
indecisos.
— Va i t e r m u i t a g e n t e ? — q u e s t i o n a , e e u s o u
s i n c e r o a a c e n a r. — E u a c h o q u e n ã o s e i m e c o m p o r t a r
e m u m j a n t a r a s s i m — m u r m u r a , e n t ã o m e o l h a . — Va i
ficar do meu lado, né?
— É ó b v i o — a f i r m o e a v e j o s o r r i r. — Q u e r i a
apresentá-la como minha noiva — tento fazendo-a sorrir
m a i s . — M a s v o c ê n ã o q u e r m e d i z e r.
— Eu quero que seja mais especial — sua voz soa
sincera e eu sorrio. — Me entregar a você foi sim
especial, mas eu sempre sonhei como nos filmes. Um
jantar a luz de velas, um lugar agradável, comemos e
então você me leva para um lugar mais íntimo, onde
n i n g u é m p o s s a n o s i n t e r r o m p e r. . . E a í , s i m , v o c ê s e
ajoelha e faz o pedido, daquele jeito que faz meu coração
quase sair pela boca. — ao perceber meu olhar intenso
ela continua: — É bobo, eu sei… — ela ri baixinho, um
pouco sem jeito. — Mas eu sempre imaginei assim.
Ela termina com um riso tímido, como se estivesse
revelando um segredo guardado desde sempre. Me
aproximo dela, segurando seu queixo delicadamente, e
nossos olhares se cruzam. Acho lindo como ela descreve
o q u e q u e r, o b r i l h o n o s s e u s o l h o s e n q u a n t o f a l a . É o
tipo de coisa que me faz querer dar a ela o mundo
inteiro, se pudesse.
— N ã o é b o b o , e s e é c o m o q u e r. . . — m u r m u r o ,
m i n h a v o z b a i x a , c a r r e g a d a d e e m o ç ã o . — Vo u t e p e d i r
como você merece, então. À moda antiga, com direito a
j a n t a r, v e l a s e t o d a s a s f o r m a l i d a d e s q u e q u i s e r. —
Marina sorri, seu olhar brilhando de uma forma que me
faz querer pegar o mundo e colocar aos seus pés. —
Então, até lá, a gente deixa essa surpresa guardada? —
pergunto, meus dedos roçando sua pele macia.
— Combinado — ela sussurra, sua mão envolvendo
a minha. — E, Diogo...
— Sim?
— Não precisa ter pressa... eu não vou a lugar
algum.
Um calor se espalha pelo meu peito, e eu a puxo
para um abraço apertado, sentindo que tudo está se
encaixando.

Seguro o Heitor com cuidado, ajustando-o em meus


braços enquanto ele olha para mim com aqueles olhos
curiosos. Sorrio para ele, sentindo um calor no peito que
sempre me invade quando estou com o meu filho.
— P a p a i — d i g o , p r o n u n c i a n d o a p a l a v r a d e v a g a r,
quase em um sussurro, como se estivesse revelando o
maior segredo do mundo para ele. Heitor apenas me olha,
b a l a n ç a n d o a s m ã o z i n h a s . — Va m o s l á , H e i t o r, t e n t a .
Papai.
Ele emite um som, algo entre um balbucio e um
r e s m u n g o , e n ã o p o s s o e v i t a r r i r. B e i j o s u a t e s t a e , p o r
um instante, fico só observando a expressão tranquila
dele, que parece estar tentando entender o que estou
dizendo.
— Vo c ê v a i c o n s e g u i r, c a m p e ã o — m u r m u r o ,
balançando-o suavemente. — Papai está aqui, sempre.
Do outro lado da cozinha, escuto Marina mexendo
em algo na dispensa. Ela está preparando o café da manhã
com o que encontrou por lá, e o aroma suave do café
recém passado já começa a tomar conta do ambiente.
— O que está preparando aí? — pergunto, curioso,
m a s s e m t i r a r o s o l h o s d o H e i t o r.
Marina sorri por sobre o ombro, enquanto corta
algumas fatias de pão.
— Ainda não sei — responde, o tom leve. — Mas
temos café pronto.
Ela me olha e sorri.
— E v o c ê ? Va i t e n t a r d i z e r ' m a m ã e ' d e p o i s , H e i t o r ?
— questiono, concentrado nele.
Ele emite outro som, ainda sem sentido, mas que
para mim soa como música. Marina se aproxima, ainda
s o r r i n d o , e p a s s a a m ã o p e l o s c a b e l o s d e H e i t o r.
— Vo c ê s a b e q u e e l e s ó t e m u m m ê s , n é ? — e l a
p r o v o c a . — Va i d e m o r a r u m p o u q u i n h o p a r a e l e c o n s e g u i r
f a l a r.
— Ainda acho que se ensinar ele aprende — olho
para ele que mantém os olhos focados em Marina. — Está
olhando a mamãe? — aponto para Marina que sorri. — Eu
— volto estralando os dedos para mim. Heitor acompanha
meus movimentos. — Papai. Sua vez.
E s c u t o M a r i n a r i r e p r e s t e s a r e t r u c a r, e s c u t o
buzinarem na calçada. Me levanto e sob o olhar de
M a r i n a , v o u a t é o p a i n e l . Ve j o d o n a H e r b e r t i n a e I g o r
parados, rapidamente permito a entrada deles e gesticulo
para Marina. Assim que eles passam pela porta, dona
Herbertina é a primeira a vir me abraçar e beijar na
bochecha. Ela me entrega algumas sacolas e percebo ser
mantimentos.
— Quantas saudades eu estava desse bebê lindo —
sua voz é terna e quando ela pega Heitor nos braços,
c u m p r i m e n t o I g o r. — M a r i n a , q u e s a u d a d e s d e v o c ê . N e m
parece que nos encontramos um dia desses.
Observo as duas se abraçarem.
— A tia HBT insistiu muito para vir — Igor fala
indo para a cozinha. — Estava preocupada com o bebê
dela — comenta e se senta à mesa. — Ah, e estava
preocupada com o C.Jota e você Marina.
Sem jeito me aproximo com as sacolas e as coloco
em cima da pia. Marina me sorri, mas não fala nada. Já
dona Herbertina balança a cabeça com um sorriso, seu
o l h a r e s t á e m I g o r.
— C i u m e n t o — o a c u s a e s o r r i . — Vo c ê s a b e q u e n o
meu coração cabem todos. Porque amo todos iguais.
— Sem critério algum, né? — Igor brinca e puxa a
cadeira para ficar perto dela. — E você C.Jota? Com
saudades do titio/padrinho?
— C.Jota? — Marina se aproxima com o cenho
franzido. — O que isso quer dizer?
— É um apelido carinhoso — responde e pega o
H e i t o r. — J á q u e f u i p r o i b i d o d e c h a m á - l o d e c a r a d e
joelho.
— C.Jota é um bom apelido — ela fala inocente e
eu prendo o sorriso. Já Igor ri concordando. — Cara de
joelho é muito feio, e meu bebê é lindo.
— Está certíssima, Marina — Igor afirma, fazendo-
a s o r r i r. M e u a m i g o m e o l h a e e u n e g o c o m a c a b e ç a . —
Então, amigo, como foi a noite sem o berço para o
Heitor? — seu tom é sério, e enquanto fala, gesticula
com a sobrancelhas em direção a Marina. — Se quiser
que eu vá com você ou que eu vá sozinho buscar o berço,
é s ó d i z e r.
Entendo o que ele está fazendo, mas não posso
fugir do que aconteceu. Então, caso meus pais reclamem
o u F e l i p e q u e i r a d e n u n c i a r, e s t o u p r o n t o p a r a o q u e d e r e
v i e r.
— Tu d o s o b c o n t r o l e — m u r m u r o e e l e c o n c o r d a . —
Te v e u m a h o r a d a n o i t e q u e e l e d o r m i u c o m a g e n t e n a
cama.
Igor arqueia as sobrancelhas e sorri de lado. Dona
Herbertina se vira para mim e em seguida olha para
Marina que está ao seu lado em frente a pia.
— Humm, com a gente na cama? — Igor repete e
sorri para Heitor enquanto o coloca em pé. — C.Jota?
Va m o s c o m b i n a r q u e d o r m i r n a c a m a c o m o p a p a i e a
mamãe não dá né? — ele fala com uma voz estranhamente
fofa, Heitor sorri banguela. — Quando você crescer eu
vou jogar isso na sua carinha de... — ele trava e olha
para Marina, ela mantém a atenção nele. — De bebê
esperto e lindo que você é.
Reviro os olhos e cruzo os braços, tentando
e s c o n d e r o s o r r i s o q u e a m e a ç a s u r g i r. A p e s a r d e t u d o , é
bom tê-los ali, saber que não estamos sozinhos nessa
bagunça toda. A certeza de que tenho tudo o que preciso
ali naquela cozinha, me deixa com um sentimento bom.
— M a r i n a — a c h a m o t e n d o s u a a t e n ç ã o . — Vo u
passar aqui no meu horário de almoço — aviso e ela fica
confusa. — Para o jantar de hoje a noite, vamos precisar
de roupas novas.
— Eu posso te encontrar lá.
— N ã o — n e g o r á p i d o . — E u v e n h o t e b u s c a r.
— Por que ela não pode ir? — Igor questiona, mas
s e u o l h a r e s t á e m H e i t o r. — Q u e c o n t r o l a d o r.
Franzo o cenho e fico em silêncio. Não é que eu
q u e i r a s e r c o n t r o l a d o r, e u s ó e s t o u t e n t a n d o p r o t e g ê - l a .
Olho para Marina que me observa com um sorriso de
lado. Suspiro e por fim aceno.
— Se você quiser ir até lá não tem problema — falo
tentando soar sincero. O que posso fazer se tenho medo
de algo acontecer? — Mas se quiser que eu venha te
b u s c a r, e u v e n h o s e m p r o b l e m a s .
— Eu vou te encontrar — ela sorri e me oferece um
prato com o meu café da manhã. — Ou não é seguro?
Respiro fundo e analiso o que respondo. Eu sei que
não posso baixar a guarda, mas não quero que ela fique
com medo. Já faz um bom tempo que nada aconteceu, e
talvez não aconteça.
— N ã o p r e c i s a s e p r e o c u p a r, M a r i n a — é o I g o r q u e
responde. — O caso que estávamos trabalhando foi
a r q u i v a d o , e s e a l g o f o s s e a c o n t e c e r, j á t e r i a a c o n t e c i d o .
Mesmo a contragosto, aceito que ela vá me
encontrar no trabalho. Peço para que me ligue quando
estiver pronta, assim consigo pedir o carro do meu
aplicativo. Assim saberia exatamente onde ela está.
Quando terminamos de tomar café, Igor se despede
e avisa que volta a noite comigo para ficar de companhia
com dona Herbertina. Me aproximo de Marina e a beijo
lentamente nos lábios, faço um carinho em seu rosto e me
afasto encarando seus olhos verdes.
Ela sorri e me beija uma última vez.
Minha vontade é de ficar em casa, me trancar com
Marina no quarto e fazer amor loucamente com ela mais
u m a v e z . A g o r a q u e e x p e r i m e n t e i s e u s a b o r, é u m
m a r t í r i o m e s e p a r a r. M e d e s p e ç o t a m b é m d e H e i t o r c o m
um beijo em sua cabeça, e aceno para dona Herbertina.
Quando dá o horário de almoço de Diogo, me
arrumo e verifico se a maquiagem cobriu bem o
hematoma em meu rosto. Olho mais uma vez no espelho,
garantindo que a base esteja uniforme. A marca ainda
está ali, escondida, mas sinto a dor de tudo o que
aconteceu pulsando sob a pele. Respiro fundo, colocando
um sorriso no rosto, e saio do quarto.
Vo u a t é a s a l a , o n d e D o n a H e r b e r t i n a e s t á
b r i n c a n d o c o m H e i t o r, q u e b a l a n ç a o s b r a c i n h o s e d á
pequenas gargalhadas. A cena aquece meu coração, e me
a p r o x i m o d e v a g a r, s e m f a z e r m u i t o b a r u l h o .
— Como ele está? — pergunto em voz baixa.
— Uma alegria só, menina — dona Herbertina
responde com um sorriso. — Parece que o pequenino está
feliz hoje.
— É, acho que está mesmo — murmuro, tocando a
mãozinha dele e sentindo o calor da sua pele.
A n t e s q u e e u p o s s a m e v i r a r, o s o m d a c a m p a i n h a
ecoa pela casa. Instintivamente, olho para o painel na
parede ao lado da porta e vejo a imagem de Humberto,
saindo do carro, e parando na entrada com as mãos na
cintura. Respiro fundo e me aproximo do painel. Olho
para dona Herbertina que me sorri.
A p e r t o o b o t ã o q u e a b r e a p o r t a e o v e j o v i r. A s s i m
que ele passa pela porta, ele sorri educado e em seguida
fita meu bebê.
— Bom dia, Marina. — Ele me olha de cima a
b a i x o , n o t a n d o m i n h a r o u p a a r r u m a d a . — Va i s a i r ?
— Vo u m e e n c o n t r a r c o m o D i o g o . Va m o s p r o c u r a r
nossas roupas para o jantar de hoje — explico
rapidamente. — Ele me convidou para acompanhá-lo.
Ele sorri de forma contida e acena com a cabeça.
— Claro! — Humberto afirma. — É muito bom você
o acompanhá-lo, é um jantar importante para ele. Muitas
pessoas conhecidas do nosso meio. — eu confirmo
s e n t i n d o m e u n e r v o s i s m o a u m e n t a r. — E u c h e g u e i o n t e m
do trabalho e vocês tinham voltado para cá. Sem avisar a
ninguém.
— É que...
— Vo c ê f o i d e s t r a t a d a p o r l á ? — i n d a g a e e u f i c o
em silêncio. — Eu sei que a Adriana é difícil, mas ela
não é má pessoa. Então, espero que se ela tenha feito
algo... você possa perdoá-la.
Aceno e cruzo os braços.
— S ó q u e r í a m o s v o l t a r p a r a c a s a , S r. H u m b e r t o .
Recebo uma concordância e mantenho um sorriso.
— Eu trouxe o berço dele — avisa e eu fico
a l i v i a d a . — E s e q u i s e r, p o s s o t e l e v a r a t é o m e u f i l h o .
Hesito por um segundo, mas então percebo que é
uma oferta genuína. Humberto pode ser um pouco severo
às vezes, mas sempre demonstrou respeito.
— Se não for incomodo, aceito, sim. Obrigada.
— D e j e i t o n e n h u m , M a r i n a . Vo u c o l o c a r o b e r ç o
p a r a d e n t r o e p o d e m o s i r.
A p ó s a v i s a r, e l e v a i a t é o p a i n e l e a b r e a g a r a g e m .
Cruzo os braços e espero pacientemente quando ele
coloca o carro para dentro, só para pegar o berço e
c o l o c á - l o n o q u a r t o d o H e i t o r. S o r r i o a o p e n s a r n i s s o ,
mas não dura muito, logo Humberto volta e saímos.
Me acomodo no banco do passageiro e coloco o
cinto.
— Eu também queria conversar com você — ele
avisa enquanto sai com o carro. Observo a porta da
g a r a g e m f e c h a r, e n t ã o s a í m o s . — Vo c ê s s e c o n h e c e m h á
bastante tempo, tanto que você teve o meu neto.
Desvio o olhar para as minhas mãos.
— Eu sei que não esperavam — respondo sem
c o m p r e e n d e r. — O D i o g o n ã o t e v e c u l p a p o r n a d a , e u
praticamente apareci grávida.
Humberto concorda com a cabeça e então me olha.
— Eu vejo que você é uma boa moça — isso me
deixa surpresa. — E eu não quero me intrometer na vida
de vocês, mas você sabe que o Diogo quer ser um
delegado. Não pega bem para ele, essa situação.
— C o m o a s s i m ? — i n d a g o a i n d a s e m e n t e n d e r. — O
senhor quer que eu vá embora?
— Não! Não quero isso, eu só quero que pense em
u m c a s a m e n t o . Vo c ê s j á t ê m u m f i l h o j u n t o s , o q u e m a i s
precisam?
Solto um suspiro mais calma. Diogo tinha razão,
fico imaginando se ele soubesse que meu bebê é do
Felipe. Demoro uns segundos, mas respondo.
— Na verdade, o Diogo me pediu em casamento
ontem — aviso, Humberto me olha sorridente. — Eu
ainda não respondi, mas vou.
— Espero que uma resposta positiva — ele insiste e
eu sorrio. — Isso nunca aconteceu na minha família, e
admito que fiquei muito decepcionado com Diogo.
Sempre ensinei a meus filhos a serem bons homens, com
c a r á t e r.
— Mas ele não teve culpa — afirmo olhando-o de
p e r f i l . — E l e n ã o s a b i a d o H e i t o r, e o D i o g o é u m h o m e m
maravilhoso, com o coração mais bondoso que eu já
conheci.
Humberto respira fundo e continua olhando para
frente.
— Mas agora já está tudo encaminhado.
Cruzo os braços. É muito injusto o pai dele falar
essas coisas, e por um momento penso em contar a
verdade, mas com certeza acabaria mal. Então, apenas
aceito o silêncio. Não demora muito e chegamos
finalmente. Ele estaciona em frente ao departamento e me
olha.
— Quer que eu te acompanhe?
— Não precisa — nego com um sorriso educado. —
Obrigada.
Desço rapidamente e tomo o caminho da entrada.
Assim que entro na recepção, tem algumas pessoas
sentadas aguardando. Me aproximo do balcão e sorrio.
— Oi, poderia avisar ao Diogo Macêdo que estou
aqui?
— Te m h o r a m a r c a d a ? — o r e c e p c i o n i s t a p e r g u n t a
s e m t i r a r o s o l h o s d o c o m p u t a d o r.
— Não, é que...
— Só um momento — me pede e eu concordo. Após
uns segundos falando com alguém no telefone, ele volta a
m e o l h a r. — E l e e n t r o u e m r e u n i ã o . A s e n h o r a p o d e
a g u a r d a r.
Olho para os assentos encostados à parede.
— Vo c ê p o d e r i a d i z e r q u e a M a r i n a e s t á a q u i ?
— S e n h o r a — e l e m e o l h a m a i s u m a v e z . — Vo u
pedir para que aguarde, quando ele sair vou ver o que
p o s s o f a z e r.
— Tu d o b e m , o b r i g a d a .
Me sento próximo e curiosamente observo a cada
um que está ali. São todos com horários marcados? Cruzo
as pernas e fico a espera. Passados dez minutos, eu me
levanto e vou até o balcão. O atendente me olha
impaciente.
— Desculpa incomodar — falo em um tom educado,
não quero soar grosseira. — Mas, se você disser o meu
nome...
— Senhora, minhas ordens são se não tem horário
m a r c a d o , n ã o p o d e p a s s a r.
— Eu não quero passar — respondo um pouco mais
s é r i a . — S ó q u e r o q u e a v i s e q u e e s t o u a q u i , p o r f a v o r.
— Marina? — Igor aparece descendo a escada ao
n o s s o l a d o . — O D i o g o l i g o u p a r a c a s a e a Ti a d i s s e q u e
você veio com o Humberto? Por que não pediu para
avisar?
Solto um suspiro e olho de relance para o
recepcionista que nos observa.
— Eu pedi, mas fui informada que o Diogo está em
reunião.
— É, lá no primeiro andar — murmura confuso,
então seu olhar vai direto para o recepcionista. — Não
avisou lá em cima?
— Ela não tem horário marcado.
Igor ri e se escora no balcão. Bem baixinho, só para
o r e c e p c i o n i s t a o u v i r, e l e f a l a :
— Está sabendo que ela é a noiva do Diogo
Macêdo, né? — nesse instante vejo o olhar do homem
a r r e g a l a r. — E e l e e s t á l á e m c i m a s o l t a n d o f o g o p e l o
nariz.
— S e n h o r. . .
— Da próxima vez — Igor o interrompe com um
p e q u e n o s o r r i s o . — Vo c ê a v i s a , p o d e r i a s e r a l g o m a i s
grave, né? — o vejo acenar com a cabeça e liberar o meu
a c e s s o . — Vo u t e l e v a r a t é a s a l a d e l e , M a r i n a .
Seguro minha bolsa e passo pela catraca. Olho para
Igor e lhe endereço um sorriso.
— Obrigada por isso.
— Que nada — ele dá de ombros e me olha. —
A g o r a v o c ê m e d e v e u m f a v o r.
— É mesmo? — pergunto em meio a sorriso. —
Qual?
— Va i t e r q u e m e d e i x a r c h a m a r n o s s o b e b ê d e c a r a
de joelho.
Nego com a cabeça ainda sorrindo, Igor finge
p r a g u e j a r, m a s s e i q u e e s t á b r i n c a n d o . E n q u a n t o
a v a n ç a m o s n o c o r r e d o r, a l g u m a s p e s s o a s m e o b s e r v a m ,
umas curiosas, outras confusas.
— Aqui — Igor abre a porta e eu entro. — Pode
esperar aqui, a reunião foi de última hora. Eu vim buscar
café, só assim para aturar o que se passa lá em cima.
— É algo ruim?
— Não, só estou precisando me aposentar —
responde e eu acho graça. — Falo sério, eu sofro. —
a v i s a , m a s l o g o s o r r i . — Vo u l á , f i c a a v o n t a d e a í .
Ele fecha a porta atrás de si, e eu coloco minha
bolsa sobre a cadeira. A sala é espaçosa, organizada de
forma prática, mas com um toque pessoal de Diogo. Na
parede esquerda, há uma estante de ferro com alguns
livros e pastas, que devem guardar detalhes de operações
passadas. Atrás da grande cadeira de couro, que parece
confortável, há outra estante, esta com prateleiras que
exibem livros e alguns troféus. Penso em como essa sala
reflete o homem que estou conhecendo cada vez mais.
— Olá! — Ouço uma voz e me viro para a entrada.
Um homem alto, de pele clara e olhos azuis intensos,
entra na sala, tem uns papéis em mãos. O corte de cabelo
dele é baixo, típico de quem mantém um estilo prático.
Ele veste uma camiseta preta com o símbolo da Polícia
Federal e calça também preta, de um tecido reforçado.
Percebo o coldre preso em sua coxa, o mesmo tipo de
acessório que Diogo costuma usar quando está armado.
Seus olhos me analisam com curiosidade, mas o sorriso é
amistoso. Sinto meu corpo enrijecer de leve, imaginando
o que ele deve estar pensando ao me ver ali. — Entrei na
sala certa?
— Não sei — respondo de braços cruzados. — Não
trabalha aqui?
— Tr a b a l h o — a f i r m a e m e o l h a p o r i n t e i r a . — J á
você não. Aqui é a sala do Diogo.
— É, o Igor me trouxe. Estou esperando o Diogo.
Ele afirma com a cabeça, então sorri e estende a
mão.
— Sou Afonso e você?
Olho para a sua mão e quando volto para o seu
rosto, percebo Diogo logo atrás dele. Está com a camisa
social branca, braços cruzados, está aborrecido isso é
visível.
— P o s s o t e a j u d a r, A f o n s o ?
Afonso se vira e sorri um tanto sem jeito.
— Eu trouxe o relatório que pediu.
Diogo o pega e da uma verificada rápida.
— Era só isso? — indaga, e quando Afonso afirma,
Diogo sai da frente da porta. — Obrigado.
Quando ficamos sozinhos, Diogo fecha as cortinas e
a porta. Em seguida se aproxima de mim e me puxa para
um beijo. Seus lábios encontram os meus com urgência, e
imediatamente sinto a intensidade de seus sentimentos. O
beijo é profundo, carregado de emoção, como se
estivéssemos longe há muito tempo. Minhas mãos se
movem automaticamente, enlaçando seu pescoço,
puxando-o para mais perto. Diogo desliza uma das mãos
pelas minhas costas, me apertando contra ele, enquanto a
outra se embrenha em meus cabelos, prendendo-os com
firmeza.
A sensação de seus dedos entrelaçados nos meus
cabelos faz um arrepio delicioso percorrer meu corpo.
Sinto seu peito subir e descer acelerado contra o meu,
como se quisesse roubar cada segundo desse momento.
Me deixo perder no calor do seu toque, na segurança que
ele me traz. Quando finalmente nos afastamos, estamos
sem fôlego, mas nossos olhos ainda estão conectados,
compartilhando um silêncio carregado de palavras não
ditas.
— Eu precisava disso — ele diz baixinho, a testa
encostada na minha.
— Eu também — respondo, tentando controlar o
ritmo do meu coração. — Senti sua falta.
Ele sorri, o polegar acariciando minha bochecha.
— Estava me preparando para sair quando Marcelo
convocou uma reunião — avisa ainda agarrado a mim. —
O Igor não me explicou direito, você chegou e ficou do
lado de fora?
— Na recepção — respondo, mas logo nego com a
c a b e ç a . — F u i u m m a l - e n t e n d i d o , n ã o i m p o r t a . Va m o s ?
Diogo me olha indeciso, mas no fim apenas assente.
Pego minha bolsa e o observo ir até o paletó na cadeira.
Assim que saímos da sala, percebo que alguns dos
colegas de Diogo param para nos observarem. Fico um
pouco tímida, já Diogo parece não ligar para os olhares
curiosos e entrelaça nossos dedos. Antes de sairmos,
aceno para Igor que está papeando com uma colega.
No lado de fora, sinto o vento forte bagunçar os
meus cabelos e sorrio quando Diogo abre a porta do
passageiro para mim. A cada dia mais sinto amor por ele,
e e s t o u d e c i d i d a d e q u e n o n o s s o j a n t a r, v o u m e d e c l a r a r
e s e j a o q u e D e u s q u i s e r.
C a p í t u l o 2 5 – M a r i n a

Após providenciamos nossas roupas de hoje a noite,


aproveitei e fui em busca das peças íntimas perfeitas.
U m a p a r a o j a n t a r, e o u t r a p a r a s e r u s a d a n o q u a r t o c o m
Diogo. Pensar nisso me arranca um sorriso sincero.
Estou no provador da loja, segurando dois modelos
de calcinha nas mãos e tentando decidir qual deles vai
causar mais impacto. Uma é de renda vermelha, fina e
delicada, com tiras que mal cobrem o essencial. A outra é
preta, com detalhes em transparência e um recorte ousado
na parte de trás. Ambas são perfeitas, mas de jeitos
diferentes. Quero algo que faça o coração de Diogo
a c e l e r a r, q u e o f a ç a p e r d e r o f ô l e g o q u a n d o m e v i r.
Respiro fundo, colocando os dois pares sobre o
b a n c o d o p r o v a d o r e m e o l h o n o e s p e l h o . Te n t o i m a g i n a r
a reação dele. Diogo está a poucos metros daqui, em uma
l o j a d o m e s m o c o r r e d o r, c o m p r a n d o a l g o q u e e l e d i s s e s e r
essencial. Sorrio, me perguntando o que poderia ser mais
essencial do que a visão dele ao me ver vestindo uma
dessas peças.
Coloco a calcinha vermelha na frente do meu corpo,
a n a l i s a n d o o e f e i t o . Ve r m e l h o s e m p r e p a r e c e u m a e s c o l h a
segura para esse tipo de provocação. Mas, ao mesmo
tempo, a preta com a transparência parece ter aquele
toque extra de mistério. Deixo a vermelha de lado e pego
a preta. Já consigo imaginar o olhar dele ao ver esse
detalhe, a expressão de desejo tomando conta de seu
rosto.
Ouço o som de passos se aproximando e logo uma
b a t i d a s u a v e n a p o r t a d o p r o v a d o r.
— Marina? — a voz dele é baixa, mas
inconfundível. — Está tudo bem aí?
— Estou quase pronta — respondo, sorrindo para o
espelho.
— P re c i s a d e a j u d a ? — D i o g o p e r g u n t a c o m u m
tom que mistura provocação e seriedade.
— Ta l v e z — b r i n c o , s e n t i n d o m e u c o r a ç ã o b a t e r
mais rápido.
Seguro a calcinha preta com mais firmeza, tomada
pela decisão. Quero ver o lado dele que ainda não
conheço. Quero sentir toda a sua intensidade, o seu
desejo sem reservas. Ontem foi perfeito, mas sei que
Diogo pode ser muito mais do que isso. E, no fundo,
quero provocar exatamente essa reação nele.
Passo a calcinha pelo meu corpo e olho no espelho
novamente. A renda preta abraça minhas curvas de um
jeito provocante, e o recorte na parte de trás é ainda mais
ousado do que imaginei. Sorrio, satisfeita com minha
escolha. Sei que vai deixá-lo louco, e eu estou mais do
que preparada para isso.
— Marina? — ele chama de novo, a voz agora um
pouco mais impaciente, como se sentisse a minha
provocação através da porta.
— Pode entrar — digo, me virando para a porta com
u m s o r r i s o t r a v e s s o n o s l á b i o s . Q u e r o v ê - l o r e a g i r. Q u e r o
sentir aquele calor que ele sempre provoca em mim.
Quando ele abre a porta, seus olhos encontram os
meus por um breve segundo antes de descerem pelo meu
corpo. A expressão de Diogo muda imediatamente, de
curiosidade para um desejo faminto. Ele engole em seco,
os olhos queimando com uma intensidade que me faz
sentir um arrepio delicioso.
— Vo c ê … — e l e c o m e ç a , a v o z r o u c a , d a n d o u m
p a s s o p a r a d e n t r o d o p r o v a d o r. — E s t á t e n t a n d o m e
e n l o u q u e c e r, n ã o e s t á ?
Sorrio, me deliciando com a reação dele.
— Ta l v e z . — m i n h a v o z é s u a v e , m a s c h e i a d e
malícia. — Acho que estou conseguindo, não é?
Ele se aproxima de mim, sem tirar os olhos do meu
corpo, e posso sentir a tensão crescendo no pequeno
e s p a ç o d o p r o v a d o r.
— Vo c ê n ã o f a z i d e i a . . . — D i o g o m u r m u r a , a n t e s d e
fechar a porta atrás de si e me puxar contra ele, os lábios
capturando os meus em um beijo faminto que deixa claro
o quanto ele está disposto a me mostrar seu lado mais
selvagem.
O empurro lentamente, sinto as mãos descerem por
meu corpo.
— Deixei que entrasse só para você ver — aviso
entre excitada e com medo de alguém nos pegar ali. — Já
pensou se alguém nos pega assim?
— Quer que eu saia de pau duro? — indaga, meu
olhar desce para frente da calça social. Ele claramente
está começando a ficar duro. — Ou é melhor darmos um
jeito nisso?
Mordisco o lábio e o toco por cima da tecido.
— Se alguém ouvir?
O ar entre nós fica ainda mais carregado de desejo
quando Diogo desabotoa a calça com uma agilidade quase
impaciente, e a cueca desce junto, revelando sua ereção.
Meu coração dispara no peito, e um calor se espalha pelo
meu corpo inteiro.
Seus olhos não saem dos meus, e há um brilho neles
que mistura fome e uma necessidade quase primitiva.
S i n t o m e u c o r p o r e a g i r, m i n h a s p e r n a s s e a p e r t a m
instintivamente, e um arrepio percorre minha espinha.
Diogo se aproxima ainda mais, e seu corpo encosta no
m e u , f a z e n d o c o m q u e m i n h a r e s p i r a ç ã o f i q u e i r r e g u l a r.
— Eu preciso de você agora, Marina — ele murmura
com a voz rouca, as mãos já segurando minha cintura e
puxando meu quadril contra o dele.
Meus dedos encontram seus ombros, e eu me seguro
neles, sem saber se para mantê-lo perto ou para me
equilibrar diante da onda de desejo que me domina. Sua
pele é quente sob minhas mãos, e o calor dele parece me
queimar através da roupa. Ele desliza uma das mãos pela
lateral do meu corpo até minha coxa.
— Só não faz barulho — peço sentindo a adrenalina
percorrer minha pele.
— Uma pena eu não poder rasgar essa calcinha
agora... — Diogo confessa, com um sorriso travesso nos
lábios, enquanto os dedos exploram a borda da calcinha
que escolhi. — Mas teremos oportunidades.
Eu mordo meu lábio, tentando conter o gemido que
a m e a ç a e s c a p a r. C o m u m m o v i m e n t o r á p i d o e d e c i d i d o ,
me vira para a parede. Suas mãos são firmes e precisas,
uma delas em meu ventre, puxando-me para cima, me
fazendo arquear as costas e empinar para ele. Meu
coração bate acelerado, e sinto um misto de antecipação e
desejo tomar conta de mim.
— Assim... — ele murmura contra minha orelha, sua
voz baixa e cheia de intensidade.
Meus dedos encontram a parede, e eu me apoio
nela, sentindo a textura fria contrastar com o calor que
emana de nossos corpos. Diogo não perde tempo, suas
mãos firmes exploram meu corpo, me prendendo contra
ele de uma forma que me faz sentir totalmente à mercê do
seu desejo.
Minha respiração está ofegante, e cada movimento
dele me faz sentir uma mistura de prazer e necessidade.
Ele segura meu quadril com força, e a sensação de
controle que ele tem sobre mim é inebriante.
Então, ele afasta a calcinha para o lado e sem
qualquer aviso, força a glande em minha intimidade até
entrar por completo, e um gemido escapa dos meus
lábios. A intensidade do momento me faz apertar os olhos
e morder o lábio com força, tentando processar todas as
sensações que me dominam.
— Diogo... — sussurro, perdida na onda de prazer
que ele provoca.
Ele responde com um movimento firme e decidido,
cada vez mais profundo, e eu mal consigo segurar os sons
que saem da minha garganta. A sensação é avassaladora,
me consumindo completamente, e tudo o que consigo
fazer é me entregar a ele, ao seu ritmo, ao seu domínio.
Diogo me puxa ainda mais contra ele, e com a mão
tampa meus lábios. A força de seus movimentos me faz
perder o fôlego. Cada toque, cada investida, me leva para
mais perto do limite, e eu posso sentir que ele também
está à beira de perder o controle.
— Vo c ê é m i n h a , M a r i n a . . . s ó m i n h a — e l e
murmura com intensidade, como se estivesse fazendo uma
promessa, e eu me derreto em seus braços, completamente
s u b j u g a d a p e l o p r a z e r.
A sensação é intensa fazendo meu corpo reagir por
inteiro, um tremor passando por mim. Agarro sua mão e
f e c h o o s o l h o s s e n t i n d o m e u p r a z e r a u m e n t a r, m e l e v a n d o
ao pico. Enquanto isso, sua boca encontra meu pescoço e
ele me beija com um desejo insaciável.
— Senhora?! — paramos e com dificuldade me viro
para Diogo. Ele tem os olhos em mim. — Está tudo bem?
— S-Sim! — respondo e pigarreio. — Eu vou ficar
com as duas que peguei. Eu saio já!
— Tu d o b e m s e n h o r a , m e c h a m o O l i v i a . Vo u e s p e r á -
l a n a re c e p ç ã o .
Aceno, mesmo que ela não possa ver e remexo o
quadril voltando os movimentos. Diogo permite que eu
comande por alguns segundos, mas logo suas mãos
deslizam por minha cintura, me segurando com firmeza,
enquanto ele mantém o ritmo, intenso e profundo. Minha
respiração se acelera ainda mais, e meu corpo responde a
cada movimento dele, uma onda de prazer crescente, que
me envolve por inteiro.
Cada palavra que ele sussurra em meu ouvido faz
meu corpo estremecer e meu coração bater ainda mais
forte.
— Diogo... — gemo, meu corpo começando a tremer
com a intensidade de tudo que estou sentindo.
Ele me puxa para mais perto, seus lábios roçando
minha orelha, e sinto o calor de sua respiração contra
minha pele. Seus movimentos se tornam mais rápidos,
mais desesperados, como se ele também estivesse à beira
do abismo. Meus dedos se agarram na parede, procurando
apoio, enquanto sinto meu corpo se apertar ao redor dele,
em um turbilhão de sensações.
De repente, tudo explode dentro de mim. Meu corpo
se arqueia, e sinto uma onda avassaladora de prazer
tomar conta de mim, me levando a um lugar que nunca
imaginei. Diogo continua me segurando firme, guiando-
me através de cada segundo dessa sensação indescritível,
até que finalmente, com um gemido rouco, ele se entrega
junto comigo.
Nosso ritmo diminui, nossos corpos ainda tremem, e
por um momento, o mundo ao nosso redor desaparece.
Ficamos ali, ofegantes, abraçados um ao outro, nossos
corações batendo em sincronia. O calor do corpo dele é
meu refúgio, e sinto como se nada mais importasse.
Ele beija meu ombro com carinho, seus lábios
quentes contra minha pele ainda arrepiada.
— Vo c ê n ã o s a b e o q u e f a z c o m i g o , M a r i n a … —
assim que ele se afasta, sinto algo escorrer minha perna.
— Desculpe...
— Não, tudo bem — o interrompo e uso minha
c a l c i n h a p a r a m e l i m p a r. E u n ã o e n g r a v i d a r i a s ó c o m
aquela vez. — Agora vou ter que ficar sem calcinha, por
sua culpa.
Diogo franze o cenho e me observa vestir a calça.
— Ainda bem que você não está de vestido. —
comenta e eu sorrio. — Eu vou sair e te esperar lá fora.
Isso é para você — aponta, e só agora percebi que em
c i m a d e u m b a n q u i n h o d e n t r o d o p r o v a d o r, t e m u m a
sacola com alguma coisa dentro. Quando cheguei não
tinha nada ali. — Queria fazer surpresa, mas a sua foi
m i l v e z e s m e l h o r.
O observo sair rapidinho e fechar a porta. Me curvo
e b u s c o a s a c o l a , é u m c e l u l a r. S o r r i o e v o l t o a v e s t i r a
roupa. Recomposta, saio do provador e vou em direção a
r e c e p ç ã o . D i o g o t e n t a p a g a r, m a s s o u m a i s r á p i d a . S i n t o
os meus seios pesados e se não fosse os tampões no sutiã,
com certeza teria vazado.
Saímos da loja e antes de ir para a caminhonete,
D i o g o d e c i d e q u e v a m o s a l m o ç a r.
Sou guiada até um restaurante na praça de
alimentação, nossas mãos entrelaçadas me arrancam um
sorriso sincero. Estou vivendo tudo aquilo que sonhei e
mais ainda. Assim que chegamos no restaurante, o garçom
nos leva até uma mesa disponível. Me sento de frente
para Diogo.
— Estou morrendo de fome — ele avisa pegando o
cardápio. — O que vai pedir?
— O mesmo que você — falo e ele me olha. —
Ta m b é m e s t o u f a m i n t a .
Diogo me sorri e chama o garçom. Ele faz o pedido
com firmeza, a voz grave ecoando no ambiente, e eu me
perco nos detalhes do seu rosto. A maneira como suas
sobrancelhas se arquearam enquanto ele fala com o
garçom, o jeito que seus lábios se movem, cheios de
autoridade e calma ao mesmo tempo. É hipnotizante.
Seu corte de cabelo, sempre impecável, realça suas
feições fortes e marcadas. A barba, que já está maior do
que o habitual, dá um toque ainda mais intenso ao seu
semblante. Eu adoro o jeito que ela fica um pouco
desalinhada nas bordas, uma mistura de selvagem e
sofisticado que é tão característica dele.
Q u a n d o e l e t e r m i n a d e f a l a r, e l e s e v i r a p a r a m i m , e
pego-o me observando com aquele olhar que sempre faz
meu coração bater mais rápido. Ele sorri, aquele sorriso
que mexe tanto comigo, e seus olhos se suavizam, como
se pudesse ler todos os pensamentos que passam pela
minha cabeça.
— O que foi? — ele pergunta, divertido,
inclinando-se um pouco na direção da mesa.
Eu balanço a cabeça, um sorriso tímido escapando
dos meus lábios.
— N a d a . . . Vo c ê é m u i t o l i n d o . — a d m i t o , s e n t i n d o
um leve calor tomar conta do meu rosto.
Ele se aproxima um pouco mais, seus olhos fixos
nos meus, e posso ver um brilho de satisfação em seu
o l h a r.
— Vo c ê é a m u l h e r e m ã e m a i s l i n d a q u e e u j á
conheci — ele murmura, sua voz baixa e rouca, enquanto
suas mãos deslizam pela mesa e tocam as minhas. O
toque é quente, reconfortante, e sinto um arrepio
percorrer minha pele.
Não posso evitar o sorriso bobo que surge nos meus
lábios, completamente encantada por esse homem que, de
t o d a s a s m a n e i r a s p o s s í v e i s , c o n s e g u i u m e c o n q u i s t a r.
Quando finalmente nosso almoço chega,
desfrutamos de uma refeição agradável e descontraída. O
garçom traz nossos pratos, e eu não posso deixar de me
sentir aliviada ao ver a comida sendo servida. Comemos,
c o n v e r s a m o s e r i m o s , e o t e m p o p a r e c e v o a r.
Após terminarmos, pedimos sobremesa: duas taças
de sorvete, uma de morango para mim e uma de baunilha
para Diogo. Enquanto saboreamos o doce refrescante,
Diogo, que está mais relaxado agora, volta a falar sobre o
trabalho.

— A reunião de última hora foi bem estranha — ele


comenta com o cenho franzido. — Marcelo parecia
disperso, o que não é comum. Ele normalmente é tão
focado.
— Ta l v e z s e j a d i f í c i l c o m a n d a r u m d e p a r t a m e n t o —
m u r m u r o e l a m b o m i n h a c o l h e r. — D e q u e m é o j a n t a r
mesmo?
— Emílio Cavalcanti, é um amigo do meu pai. —
fala e eu concordo com o olhar no sorvete. — Pai da
Amanda e Beatriz.
Eu o olho, surpresa.
— Então, seus pais, Amanda... O Felipe e a Beatriz
estarão lá?
Diogo dá um suspiro e se recosta na cadeira.
— O Felipe, eu não sei — dá de ombros. — Mas as
filhas sim, e meus pais também. — concordo mexendo na
m a s s a g e l a d a c o m a c o l h e r. — Va i f i c a r t u d o b e m ,
prometo que não vamos demorar lá.
— Obrigada — agradeço aliviada.
N ã o s e i c o m o s e r á e s s e j a n t a r, m a s e s p e r o q u e n a d a
de ruim aconteça. Mas só em pensar que estarei em um
local fechado com pessoas desconhecidas e outras que
claramente não gostam de mim, sinto um aperto no peito.
C a p í t u l o 2 6 – D i o g o

A luz suave do quarto é perfeita para a última


conferida no espelho. Estou ajustando a gravata com um
foco meticuloso, tentando garantir que cada detalhe
esteja impecável. O terno está alinhado, os sapatos
polidos e a gravata, bem, precisa estar exatamente no
l u g a r. C a d a p e q u e n o a j u s t e p a r e c e c r u c i a l p a r a a n o i t e
que se aproxima.
O som da porta do quarto se abrindo me faz olhar
para cima. E ali está Marina, deslumbrante e graciosa,
como um sonho que ganha vida. O vestido azul escuro
q u e e l a u s a é e l e g a n t e e s e d u t o r, c o m u m c o r t e q u e v a i
até um pouco acima dos joelhos, destacando suas pernas
esguias com uma sofisticação refinada. Seus cabelos
castanhos estão presos de forma impecável, com apenas
duas mechas soltas emoldurando seu rosto, o que realça
ainda mais sua beleza e elegância.
A sandália de salto alto é a mesma do primeiro
jantar com meus pais, e, embora o vestido e os acessórios
sejam diferentes, o salto faz com que ela pareça ainda
mais deslumbrante.
— Uau... — a palavra sai quase em um sussurro,
completamente cativado pela sua presença.
Marina sorri, um toque de nervosismo nos olhos
enquanto ela faz uma pequena pose, girando ligeiramente
para mostrar o vestido em toda sua plenitude.
— Espero que esteja ao seu gosto. — ela se
aproxima, o sorriso nervoso se transformando em um de
confiança ao ver minha reação.
Deixo a gravata borboleta de lado e me aproximo
dela, sentindo a admiração e o orgulho transbordando.
— Vo c ê e s t á a b s o l u t a m e n t e d e s l u m b r a n t e , M a r i n a .
— d i g o , c o m s i n c e r i d a d e . — Vo c ê s e m p r e m e s u r p r e e n d e .
Ela cora levemente, o olhar brilhando com um misto
de alegria e ansiedade.
— Obrigada, Diogo. Só queria que tudo fosse
perfeito, e eu estivesse linda para aparecer ao seu lado.
Com um gesto suave, toco em seu rosto sentindo o
calor de sua pele.
— Não precisa se preocupar com nada — falo
observo seu batom vermelho, desenhando perfeitamente
o s l á b i o s q u e a m o b e i j a r. — Vo c ê é m u i t o l i n d a . A c h o q u e
v o u t e r p r o b l e m a s , c a s o a l g u m A f o n s o q u e i r a t e p a q u e r a r.
Marina ri e balança a cabeça.
— Ele não me paquerou. — Marina diz, desviando o
olhar para mim com um sorriso brincalhão enquanto se
aproxima da cama.
— Não? — franzo o cenho, observando-a ir até a
gravata e parar em frente à cama. — Aquele abusado
nunca leva os relatórios que eu peço, então hoje ele quis?
— Ve m — e l a c h a m a , a i n d a s o r r i n d o . — S e n t a a q u i .
Obedeço e me sento na beira da cama, abrindo as
pernas para que ela possa se aproximar mais. Sinto um
toque suave quando Marina começa a ajustar a gravata.
Não que eu precise, mas ter as mãos dela em mim é um
sonho realizado.
— Pensei em sair mais cedo do jantar —
confidencio. Marina me olha. — Quero te levar para um
l u g a r.
— Qual lugar? — pergunta terminando de ajeitar
minha gravata.
— S u r p r e s a ! — r e s p o n d o f i c a n d o d e p é . — Va m o s ?
— N ã o a c r e d i t o q u e v a i m e d e i x a r s e m s a b e r. — e l a
c o m e n t a , u m t o m d i v e r t i d o n a v o z . — Vo c ê s i m , é
malvado.
Sorrio e verifico os pulsos do paletó, em seguida
encosto em suas costas a guiando para fora. Já no
c o r r e d o r c o n s e g u i m o s o u v i r I g o r f a l a n d o c o m H e i t o r,
assim que chegamos na sala, vejo o pequeno nos braços
de dona Herbertina. Meu amigo fica logo de pé e ajeita o
terno que está usando. Ele tinha dito que não iria, mas
p o r f i m d e s i s t i u e c o n c o r d o u e m i r.
— Va m o s l o g o a c a b a r c o m i s s o .
Marina me olha com um pequeno sorriso antes de se
afastar e ir até dona Herbertina, que está com Heitor em
seus braços. Parado, fico observando enquanto ela se
inclina para beijar a bochecha do nosso filho, com um
c a r i n h o q u e f a z m e u p e i t o s e a q u e c e r.

Seus movimentos são graciosos, a forma como seus


dedos deslizam suavemente sobre sua pele macia. É um
gesto tão simples, mas carregado de um amor que sinto
cada vez mais forte entre nós.
Ela se vira para dona Herbertina, trocando algumas
palavras, e vejo a expressão carinhosa em seu rosto, a
f o r m a c o m o e l a c u i d a d e t u d o e d e t o d o s a o s e u r e d o r.
I s s o m e f a z s o r r i r, m e f a z s e n t i r u m a p a z q u e h á m u i t o
tempo eu não conhecia.
Heitor sorri para ela, aquele sorriso banguela que
i l u m i n a q u a l q u e r l u g a r, e M a r i n a r i s u a v e m e n t e , u m s o m
que enche a sala e o meu coração. Eu me aproximo,
incapaz de ficar longe por muito tempo.
— To d o b a b ã o — I g o r m u r m u r a p a r a m i m , m a s
Marina escuta e olha para ele. — O quê? Eu não menti.
Vo c ê d e i x o u o m e u a m i g o q u e a n t e s e r a u m a f e r a
enjaulada, em um gatinho carente.
C r u z o o s b r a ç o s e l a n ç o u m o l h a r s é r i o p a r a I g o r.
— Cala a boca, Igor — resmungo.
Marina ri mais uma vez, e o som da sua risada é
como música para os meus ouvidos. Igor sempre soube
c o m o m e p r o v o c a r, m a s d e s s a v e z e l e e s t á c e r t o . E u m e
sinto um idiota, completamente rendido, mas não me
importo. Quando ela está por perto, tudo parece certo.
— Um gatinho carente? — Marina repete, se
divertindo com a situação. — Gosto da ideia.
Igor ajeita mais uma vez o terno.
— Vi u s ó ? A t é e l a c o n c o r d a .
— É melhor você parar por aí — aviso sorrindo,
mas agora com um toque de seriedade na voz.
Marina se aproxima de mim, seus olhos ainda
brilhando, e coloca uma mão suave em meu braço.
— Va m o s i n d o — e l a m e e n l a ç a o b r a ç o .
Eu a puxo levemente para mais perto, sem me
i m p o r t a r c o m a p r o v o c a ç ã o d e I g o r.
— Dona Herbertina, o meu celular vai estar comigo
o tempo todo — comunico para ela que concorda. —
E n t ã o , c a s o p r e c i s e , p o r f a v o r p o d e m e l i g a r.
— Não se preocupem — ela sorri colocando Heitor
no carrinho. — Agora vão e divirtam-se, fique de olho no
I g o r.
Igor é o primeiro a sair falando qualquer coisa que
não escuto, já Marina me encara e por um segundo,
p a r e c e q u e t o d o o r e s t o d e s a p a r e c e . A s p i a d a s d e I g o r, o
n e r v o s i s m o d o j a n t a r q u e e s t á p o r v i r, t u d o s e d i s s o l v e ,
deixando apenas nós dois ali, naquele momento.
— S e j a o q u e D e u s q u i s e r n e s s e j a n t a r.
Confirmo, posso imaginar como ela está se
sentindo. Meu pai, minha mãe, não sei se meu irmão vai
a p a r e c e r, m a s d u v i d o m u i t o . P r o v a v e l m e n t e i r e m o s s e n t a r
j u n t o s e i s s o é r e a l m e n t e a l g o q u e e u g o s t a r i a d e e v i t a r,
mas não posso.
Assim que chegamos na caminhonete, Igor está
escorado no capô.
— Eu estava pensando — murmura enquanto vai até
o banco traseiro. — Acho que quero um bebê.
— O quê? Um bebê? — Marina pergunta já
a c o m o d a d a n o b a n c o d o c a r o n a . — Vo c ê t e m n a m o r a d a ?
— Posso arrumar uma — responde colocando o
cinto. — Um bebezinho bem fofinho.
— Com cara de joelho? — indago fazendo Marina
me olhar com um pequeno sorriso.
— Não, meu amigo. Eu sou muito bonito para o meu
bebê nascer com cara de joelho. — Assim que ele fala,
Marina ofendida vira o corpo em direção dele. — Eu sou
feio?
— E eu sou?
— Eu acho que você quer que o Diogo bate em mim
— Igor brinca endereçando um sorriso de lado.
To c o n a c o x a d e M a r i n a , e e l a r i v i r a n d o - s e p a r a
frente.
Abro a garagem e saio. Automaticamente meu olhar
p e r c o r r e o s d o i s l a d o s d a r u a , p e l o r e t r o v i s o r, v e j o I g o r
m e i m i t a r. E s p e r o o p o r t ã o d e s c e r, p a r a l o g o s e g u i r
destino.

Quando saímos da caminhonete, noto que Marina


o l h a a o r e d o r, s e u s o l h o s s e a r r e g a l a n d o l i g e i r a m e n t e
enquanto observa a entrada do hotel. Por um momento,
e l a p a r e c e h e s i t a r, s u a r e s p i r a ç ã o s e t o r n a n d o u m p o u c o
mais rápida. Eu sigo seu olhar e, então, percebo. Claro.
O hotel. O mesmo lugar onde tudo começou.
Ela vira o rosto para mim, surpresa estampada em
sua expressão.
— Diogo... — ela começa, sua voz um pouco
tremida. — Esse é o hotel... onde você me encontrou.
Assinto, mantendo meus olhos fixos nos dela.
— É, eu sei. — minha voz é baixa, mas firme. — Se
v o c ê n ã o s e s e n t i r c o n f o r t á v e l , p o d e m o s v o l t a r.
— E u s u p e r v o u e n t e n d e r, M a r i n a — d e s s a v e z é
Igor que fala.
Ela respira fundo, olhando ao redor mais uma vez,
como se estivesse absorvendo tudo de novo. Seu olhar vai
p a r a I g o r, m a s l o g o r e t o r n a p a r a m i m , u m m i s t o d e
emoções refletido em seus olhos.
— N ã o , n ã o v a m o s v o l t a r. E u s ó . . . n ã o e s p e r a v a —
ela admite, uma leve tensão ainda presente em sua voz.
— Foi um dia tão... intenso. E agora estar aqui de novo...
Seguro sua mão, apertando-a com firmeza, mas de
maneira tranquilizadora.
— Sei que foi difícil, Marina, mas agora é
diferente. Hoje estamos juntos, estou aqui com você. —
t e n t o s o r r i r, e s p e r a n ç o s o d e q u e ela entenda o que quero
d i z e r. — Va m o s t r a n s f o r m a r i s s o em uma nova lembrança.
Ela parece considerar minhas palavras por um
segundo, e então finalmente sorri, um sorriso que me traz
um alívio imediato.
— C e r t o . Va m o s l á — e l a d i z , s e u t o m m a i s c a l m o
agora, com um toque de determinação.
Saio do carro e ando rápido para abrir a porta para
ela. A ajudo a descer e juntos a conduzo em direção à
entrada. A noite está fresca, e as luzes do local brilham
intensamente, destacando a fachada imponente do prédio.
Igor se mantém alguns passos atrás, dando-nos um pouco
de espaço, enquanto seguimos para o saguão iluminado.
Olho para trás só para ver manobrista levar a
caminhonete. À medida que nos aproximamos, sinto
Marina se endireitar ao meu lado, pronta para enfrentar o
que quer que venha. E eu também. Seguimos luxuoso hall
do hotel até um local mais reservado, porém bastante
espaçoso.
O som da música e das conversas animadas nos
recebe assim que passamos pela entrada do salão
principal. A decoração é elegante, com luzes suaves e
arranjos de flores discretos, mas refinados. Consigo
sentir Marina ficar um pouco tensa ao meu lado, seus
olhos varrendo o ambiente.
Um dos organizadores se aproxima, confirmando
nossos nomes, e nos guia até a mesa reservada para
minha família. Lá estão apenas meus pais, Humberto e
Adriana, já sentados e conversando. Assim que nos
aproximamos da mesa, percebo que o sorriso de minha
mãe, Adriana, desaparece ao ver Marina.
Ela força uma expressão neutra, mas conheço bem
aquele olhar que ela lança, uma mistura de desagrado e
d e s a p r o v a ç ã o . M a r i n a , s e m p e r c e b e r, m a n t é m o s o r r i s o
educado enquanto cumprimento meu pai com um aperto
de mão firme.
— Vo c ê s c h e g a r a m — d i z e l e , c o m u m t o m f o r m a l .
— Chegamos, sim — respondo, puxando a cadeira
para que Marina se sente.
Minha mãe dá um leve aceno de cabeça para
Marina, sem esboçar qualquer sorriso.
— Marina, você está... diferente hoje — comenta
ela, de maneira que não consigo definir se é um elogio ou
uma crítica. O tom é seco, e fica claro que a presença de
Marina não é exatamente o que ela esperava para esta
noite.
Respiro fundo e me sento ao lado de Marina. Eu não
sei o que mais preciso fazer para que minha mãe respeite
Marina.
— Obrigada, dona Adriana. — diz educada. — A
senhora está muito bonita.
— Estou — minha mãe responde, breve. Seus olhos
passeiam pela sala como se procurasse qualquer desculpa
para mudar de assunto. — O seu irmão não veio, Diogo,
ele está de repouso. Machucaram ele.
— Adriana... — meu pai murmura recolhendo a mão
dela para si. — Felipe está em casa, e bem. Está sendo
cuidado pela Beatriz.
— E o que aconteceu com ele? — Igor pergunta
dissimulado sentado ao lado de Marina.
— Se envolveu uma discussão — a voz do meu pai
me chama a atenção. — E da discussão ele foi agredido,
mas não foi nada fatal. Ele toma de lição para não se
envolver em brigas.
Enquanto o garçom nos oferece as bebidas, Marina
segura minha mão sob a mesa e aperta com um gesto de
apoio. Retribuo o aperto, tentando transmitir todo o
conforto e a segurança que sinto por ela estar ao meu
lado. Olho para seu rosto e vejo um leve sorriso, embora
ela esteja claramente nervosa.
— Vo u f i c a r s ó c o m á g u a — M a r i n a d i z , a o r e c e b e r
o cardápio do garçom. — Não posso beber nada
alcoólico.
— Perfeito, então vou acompanhar a Marina —
digo, pedindo uma água para mim também, apesar de
estar tentado a pedir algo mais forte para relaxar um
pouco.
Minha mãe ainda observa o cenário com um olhar
crítico, enquanto meu pai tenta manter a conversa fluindo
com um tom mais neutro.
— O Heitor parece que deu um pulo no crescimento
— meu pai fala, tentando iniciar uma conversa mais leve.
— Já consigo imaginá-lo correndo na nossa fazenda.
R e c e n t e m e n t e e u a d q u i r i u m a f a z e n d a , e m Va s s o u r a s .
E s t a v a p o r u m p r e ç o m u i t o b o m . Vo c ê j á e s t e v e e m u m a
fazenda, Marina?
— Na verdade, sim. Eu venho de uma cidade do
i n t e r i o r.
— Deve ser muito bom morar no rural — ele
c o n t i n u a f a z e n d o M a r i n a c o n c o r d a r. — P e n s o q u e q u a n d o
m e a p o s e n t a r, v o u p r e f e r i r f i c a r i s o l a d o .
O garçom retorna com as bebidas, e antes que o
jantar comece a ser servido, o anfitrião, Emílio
Cavalcanti se dirige ao palco improvisado ao fundo do
s a l ã o . H á u m m i c r o f o n e e m s u a m ã o e e l e c o m e ç a a f a l a r,
capturando a atenção de todos os convidados.
— Boa noite a todos! — ele inicia com um sorriso
caloroso. Está com um terno impecável, ao lado dele está
sua esposa. — É um grande prazer receber todos vocês
aqui para esta celebração especial.
O salão murmura em aprovação, e as conversas
diminuem enquanto todos voltam a atenção para o palco.
O anfitrião continua:
— Hoje é um momento de grande significado para
mim. Após anos de trabalho árduo e dedicação como juiz,
chegou o momento de me despedir dessa jornada e iniciar
uma nova fase na vida.
A plateia aplaude de forma entusiástica, e eu
percebo um sorriso de satisfação no rosto de meus pais.

— Quero aproveitar esta oportunidade para


expressar minha sincera gratidão a todos que estiveram
ao meu lado durante esses anos — Emílio continua. —
Sem o apoio de minha família, colegas e amigos, essa
jornada não teria sido a mesma.
Enquanto ele fala, os garçons começam a servir os
p r a t o s d o j a n t a r. O a r o m a d e l i c i o s o d a c o m i d a c o m e ç a a
se espalhar pelo salão, mas a atenção de todos continua
focada no palco. O anfitrião conclui seu discurso com um
agradecimento final, e o salão estoura em aplausos.
— Agora que o jantar está servido, vamos
aproveitar a noite e celebrar este momento especial
juntos. — ele encerra, com um sorriso satisfeito.
O jantar começa e a atmosfera se torna um pouco
mais descontraída, mas a tensão entre Marina e minha
m ã e a i n d a p a i r a n o a r. E n q u a n t o o g a r ç o m s e a f a s t a ,
aproveito para me concentrar em tornar a noite agradável
para Marina e fazer com que ela se sinta o mais
confortável possível.
Marina come pouco e isso me chama a atenção.
— Pensei que aqui seria mais agitado — Igor
c o m e n t a a s s i m q u e t e r m i n a d e c o m e r. — E e n g r a ç a d o q u e
comi, mas continuo com fome.
— Nunca aprendeu a ter modos, Igor — minha mãe
fala alfinetando-o. — Por isso ainda está sozinho.
Meu amigo se inclina na mesa e sorri para ela.
— Ainda estou sozinho, porque eu nasci para ser
um cachorrão solteiro — reprimo um sorriso, e olho para
o meu pai que mantém uma sobrancelha arqueada. — Não
vou privar as mulheres de ter a oportunidade de me
c o n h e c e r, n ã o é m e s m o ? E u s i n t o q u e D e u s n ã o i r i a
g o s t a r.
— I g o r, I g o r. . . — m e u p a i r i b u s c a n d o a t a ç a d e
champanhe. — Não tem medo de pagar com a língua?
Vo c ê é u m b o m r a p a z .
Marina ri ao meu lado, então quando olho para
f r e n t e , v e j o E m í l i o s e a p r o x i m a r.
Educadamente me levanto, sendo seguido por todos.
Ele cumprimenta meus pais primeiro, para em seguida me
s o r r i r.
— D i o g o ! Vo c ê v e i o ! — e l e f a l a c o m u m b r i l h o n o s
o l h o s . — M u i t o b o m e m t e v e r.
— Parabéns pela aposentadoria — falo e aperto sua
mão, mas vejo sua atenção ir para Marina. — Essa é a
Marina, minha futura noiva. Marina, esse é Emílio
Cavalcanti.
— M u i t o p r a z e r, s e n h o r.
Ela sorri e estende a mão para apertar a mão dele.
No entanto, percebo seu olhar surpreso. Emílio fica
estático.
— Futura noiva? — ele repete, mas logo sorri. —
Bom, estou surpreso. Mas é um prazer conhecê-la,
Marina.
O clima fica um pouco estranho, mas após
c u m p r i m e n t a r I g o r, E m í l i o v a i e m b o r a . N o s s e n t a m o s , e
olho para Marina lhe endereçando um sorriso.
— Futura noiva? — a voz da minha mãe chama a
nossa atenção. — O que é isso Diogo? Realmente quer
seguir com isso?
— Mãe!
— Diogo! — ela vocifera.
Nos encaramos até que ela desvia o olhar de braços
cruzados. Passo a mão na barba e decido que já deu de
j a n t a r, e n ã o a c h o q u e s e j a p o s s í v e l a l g u m d i a m i n h a m ã e
aceitar Marina. Olho para o meu pai que solta um suspiro
e em seguida esfrega a têmpora.
— Meu Deus do céu, Adriana. Estamos em um
j a n t a r d e u m a m i g o n o s s o , p o d e r i a p o r f a v o r, n ã o
começar nada?
— Diogo — Marina me chama, rapidamente a
encaro. — Eu vou ao banheiro.
— Eu vou com você.
— Agora além de tudo andam grudados?
Ao meu lado, Marina se levanta e passa por mim.
Olho zangado para minha mãe, que ainda está com uma
expressão indiferente, e penso em ir atrás dela, mas antes
que eu possa dar um passo, duas figuras importantes
entram em meu caminho.
— Diogo Macêdo, lembra-se da gente?
Solto um suspiro enquanto observo Marina sumir
e m u m c o r r e d o r.
Sinto uma inquietação crescente no meu estômago,
u m m e d o p e r s i s t e n t e q u e n ã o c o n s i g o i g n o r a r. A
cerimônia está em pleno andamento, com os convidados
conversando e rindo, mas estou absorvida por uma
preocupação profunda. A mãe de Diogo insiste em querer
trazer o assunto da paternidade à tona, e sinto que a
qualquer momento ela possa falar tudo. Sei que Diogo já
disse que vai ficar do meu lado, mas não quero que ele se
afaste dos pais por isso. Mesmo a mãe dele sendo
intragável, não quero ser a causadora disso.
Decido dar uma volta pelo hotel para tentar acalmar
m e u s p e n s a m e n t o s . Ta l v e z u m a b r e v e p a u s a m e a j u d e a
processar o que estou sentindo.
C a m i n h o p e l o c o r r e d o r, t e n t a n d o m e d i s t r a i r e
respirar profundamente. Encontro o banheiro e entro,
fechando a porta atrás de mim. Lavo as mãos, e fico
p a r a d a o b s e r v a n d o m e u r e f l e x o . Te n t o m e r e c o m p o r, m a s
o desconforto persiste. Saio do banheiro com um
sentimento de inquietação, sentindo que não posso
simplesmente ignorar a tensão que sinto.
Enquanto caminho pelos corredores, o barulho das
conversas e da música parece distante. Passo por uma
porta entreaberta e um som de discussão baixa me chama
a atenção. Curiosa e temerosa, me aproximo
d i s c r e t a m e n t e p a r a o u v i r, m e s m o s a b e n d o q u e n ã o d e v o .
Através da brecha da porta, vejo Marcelo, com uma
roupa preta que parece uma mistura de terno e uniforme,
com uma arma visível na cintura. Ele está em uma
conversa tensa, e reconheço o juiz Emílio, que está
sentado atrás de uma mesa, a expressão carregada.
Marcelo fala com uma voz baixa e cortante, quase
como um sussurro ameaçador:
— Vo c ê n ã o e n t e n d e , E m í l i o ? N ó s j á r e c e b e m o s , e
se não fizermos pode ter certeza de que eles vêm atrás da
gente.
O juiz Emílio, visivelmente desconfortável,
responde:
— Eu não quero me envolver nisso mais do que já
estou. Eu dei a oportunidade, o resto é com você! O risco
é alto demais e não podemos garantir que tudo sairá
conforme o planejado. Precisamos de uma solução rápida
e eficiente.
Marcelo revira os olhos, claramente frustrado:
— E eu preciso que você faça a sua parte. Se não
c o l a b o r a r, tudo pode ser comprometido, e você sabe o
que isso significa. Chame o Diogo para um local
reservado, e deixe o resto comigo.
— Eu não vou ser a última pessoa que foi vista com
ele! — Emílio retruca com fúria. — Eu já fiz essa
palhaçada de comemoração! Então se livre dele você!
Assustada, observo Marcelo colocar alguma coisa
no bico da arma. E quando finalmente entendo o que
estão falando, o pânico aumenta dentro de mim. Quando
c o m e ç o a m e a f a s t a r, t e n t a n d o m a n t e r a c a l m a , a p o r t a d o
escritório se abre abruptamente e Marcelo me vê. Seu
olhar se transforma em um brilho perigoso, e ele avisa o
j u i z E m í l i o q u e m e o l h a c o m p e s a r.
— Parece que temos uma visita não autorizada —
Marcelo murmura.
D e s e s p e r a d a , c o m e ç o a c o r r e r p e l o c o r r e d o r,
tentando me afastar dos dois homens que agora me
seguem furiosos. Escuto passos apressados atrás de mim,
e quando olho percebo que apenas Marcelo corre atrás de
mim sacando uma arma. Meu coração dispara.
Quando finalmente chego à entrada do salão, eu
vejo Diogo vir na minha direção, ele para confuso por me
ver correndo. Mas a expressão rapidamente se
transforma.
Então de repente, um tiro.
C a p í t u l o 2 7 – D i o g o

Os diretores ainda falam comigo, mas não consigo


focar no que estão falando. Impaciente fico de pé e peço
l i c e n ç a , c o n s i g o o u v i r m e u p a i m e c h a m a r, m a s n ã o p a r o .
Meus passos são apressados, seguindo o caminho que
Marina fez há alguns minutos. Passo por Igor que está
c o n v e r s a n d o c o m u m a m u l h e r, e t a l v e z n o t a n d o m e u
estado de espírito, o escuto pedir licença.
— Diogo? — ele me chama atrás de mim, mas o
ignoro.
Então, minha visão se cruza com Marina. Ela está
correndo em minha direção, seu rosto pálido e cheio de
pânico. O coração acelera e a adrenalina toma conta de
m i m , m a s , e m u m i n s t a n t e d e h o r r o r, v e j o M a r c e l o a t r á s
dela, a arma na mão.
Tu d o p a r e c e d e s a c e l e r a r e m u m f i l m e a n g u s t i a n t e .
Ve j o M a r c e l o l e v a n t a r a a r m a e d i s p a r a r. O s o m d o t i r o
e c o a p e l o c o r r e d o r, e o t e m p o p a r e c e s e e s t i c a r e m u m
lento pesadelo. A bala atinge Marina, e seu corpo se
dobra antes de cair no chão com um som abafado.
— Não! — meu grito é uma explosão de desespero,
e corro em direção a ela. A cena diante de mim se
desdobra em um turbilhão de emoções, o pânico se
mistura com a necessidade desesperada de chegar a ela.
Eu me ajoelho ao lado de Marina, seu corpo caído
no chão, então escuto mais um tiro e me projeto em cima
de Marina para protegê-la. Escuto Igor xingar alto e
passar por mim com uma arma em punho. Meu coração
está acelerado, e minhas mãos tremem enquanto tento
analisar o ferimento de Marina.
Meus dedos estão ensopados de sangue enquanto
aplico pressão na ferida de Marina. A visão do buraco de
bala em sua barriga me faz sentir uma angustiante
s e n s a ç ã o d e i m p o t ê n c i a e t e r r o r. C a d a v e z q u e e u t e n t o
controlar a situação, o desespero toma conta de mim.
— Marina! Fique comigo, por favor! — minha voz é
um sussurro urgente, tentando manter a calma enquanto a
d o r e o m e d o a m e a ç a m m e c o n s u m i r. — A l g u é m c h a m a
uma ambulância! — grito descontrolado, consigo
p e r c e b e r p e s s o a s a o m e u r e d o r, b u r b u r i n h o s . P o r é m m e u
olhar está focado no rosto desacordado de Marina. —
Não, por favor!
Meus olhos se enchem de lágrimas e sinto meu
corpo pesado. Alguém me empurra e dois homens
verificam Marina. Não sei quantos segundos se passaram,
ou minutos, mas logo paramédicos chegam e começam a
trabalhar em Marina.
— Meu filho! — ouço a voz do meu pai ao longe,
seu tom de preocupação é abafado pela minha
concentração total no que está acontecendo com Marina.
Sinto sua presença quando ele tenta me segurar pelo
braço, mas a necessidade de seguir Marina é mais forte.
Eu me solto de seu aperto e sigo os paramédicos, meus
passos são apressados e desordenados.
Eu observo enquanto eles a colocam na maca e a
levam para fora, a angústia me consumindo a cada
movimento. Meus pensamentos são uma confusão de medo
e desespero, e a única coisa que eu consigo pensar é que
preciso estar ao lado dela, não importa o que aconteça.

Com as mãos juntas em prece, espero pacientemente


por alguma notícia de Marina. Minhas lágrimas correm
livremente, sem que eu me importe com quem possa me
ver assim. A dor em meu peito é quase insuportável, e o
vazio na minha mente só é preenchido pela cena dela
sendo atingida.
Sentado no chão, encostado contra a parede fria do
corredor do hospital, minha postura é uma combinação de
exaustão e desespero. A espera se arrasta, e a única coisa
que consigo fazer é deixar a cabeça baixa, tentando não
p e n s a r n o p i o r. O b a r u l h o d o s p a s s o s a p r e s s a d o s d o s
médicos e enfermeiros, e o murmúrio contínuo dos outros
pacientes e familiares, cria um pano de fundo caótico
para meu sofrimento.
O t e m p o p a r e c e d e s a c e l e r a r, c a d a m i n u t o s e
arrastando em uma eternidade angustiante. Eu me esforço
para manter a esperança, mas cada vez que a porta das
salas de cirurgia se abre, meu coração dá um salto,
apenas para afundar novamente quando não vejo Marina
sendo trazida para fora.
Ouço passos se aproximarem e olho para o lado e
vejo minha mãe. Solto um suspiro e volto para o meu
e s t a d o d e t e r r o r.
— Filho — minha mãe me chama, mas eu não o
olho. — O seu pai está na delegacia — ela pausa e
quando penso que vai ficar calada, ela continua: — O
Igor conseguiu acertar um tiro no Marcelo, foi na perna.
Ele recebeu os atendimentos e está preso.
Nego com a cabeça frustrado.
Acho pouco provável dar em algo.
— Vo c ê t e v e a l g u m a n o t í c i a d e l a ?
Com aquela pergunta, sinto meus olhos arderem
mais fazendo novas lágrimas caírem.
— A senhora se importa? — pergunto olhando
diretamente para ela. Minha mãe engole em seco, mas
p e r c e b o q u e h á a l g o e m s e u s o l h o s . — P o r f a v o r, m ã e . . .
Eu não quero ser grosso com você. Só... — suspiro
derrotado. — Só me deixa em paz.
Escuto os passos dela pelo chão do corredor vazio,
e levanto a cabeça para vê-la se afastando. Mas para a
minha surpresa, ela se senta na cadeira e fica em
silêncio.
O tempo passa e sinceramente, não sei quantas
horas fiquei ali esperando. Minha mãe continua sentada,
parece perdida em pensamentos. Então finalmente, depois
de uma eternidade de espera angustiante, um médico
a p a r e c e n a e n t r a d a d o c o r r e d o r. E l e t e m u m a e x p r e s s ã o
grave e cansada, e eu me levanto instantaneamente, com
o coração batendo acelerado. Espero que ele me dê a
notícia que eu mais temo, ou talvez a esperança que eu
desesperadamente preciso.
O médico se aproxima e seu olhar é gentil, mas
carregado de um peso que só aumenta minha ansiedade.
Ele limpa as mãos em um avental e se dirige a mim com
um olhar sério.
— Diogo — ele começa, e sua voz tem uma calma
q u e e u q u a s e n ã o c o n s i g o s u p o r t a r.
Sinto o coração disparar ainda mais, e meu
estômago se contrai em um nó. Minha respiração é rápida
e irregular enquanto aguardo a notícia. O médico toma
u m a r e s p i r a ç ã o p r o f u n d a a n t e s d e c o n t i n u a r.
— Marina está em coma. Foi um tiro grave e a bala
causou danos significativos. Estamos fazendo tudo o que
podemos para estabilizá-la, mas o estado dela é crítico.
Precisamos monitorá-la e fazer mais exames para
determinar a extensão dos danos e como ela reagirá ao
tratamento.
As palavras caem como uma pedra pesada sobre
mim. O medo e a desesperança tomam conta, mas eu me
esforço para manter a compostura.
— Ela vai acordar? — pergunto, minha voz rouca e
tremendo.
O médico olha para mim com um olhar
compreensivo e um pouco de tristeza.
— Não podemos prever com certeza. Precisamos
aguardar e ver como ela responde ao tratamento. Neste
momento, o mais importante é que ela tenha a melhor
c h a n c e p o s s í v e l d e r e c u p e r a ç ã o . Vo c ê p o d e f i c a r c o m e l a
por um tempo, mas o estado dela é delicado.
N e s s a h o r a , m e u c o r p o p a r e c e d e s a b a r, a f o r ç a q u e
e u e s t a v a t e n t a n d o m a n t e r c o m e ç a a s e e s v a i r. F e c h o o s
olhos por um momento, tentando absorver a gravidade da
situação.
— Posso vê-la agora? — pergunto, a voz quase um
sussurro.
O médico acena com a cabeça.
— Sim, pode. Mas lembre-se de que ela ainda está
s o b c u i d a d o s i n t e n s i v o s . P o r f a v o r, m a n t e n h a a c a l m a e
evite o contato físico até que os médicos deem o aval.
Sigo o médico pelos corredores até a unidade de
terapia intensiva. Cada passo parece um desafio, e a
pressão em meu peito é quase sufocante. Ao chegar à
sala, vejo Marina deitada na cama, conectada a vários
aparelhos que monitoram suas funções vitais.
Meu coração se parte ao vê-la dessa forma, mas me
aproximo, mantendo o olhar fixo em seu rosto pálido. Me
sento ao lado da cama e seguro sua mão com gentileza,
tentando transmitir todo o amor e apoio que sinto por ela.
— Estou aqui com você — murmuro, as lágrimas
e s c o r r e n d o p e l o m e u r o s t o . — Vo u e s t a r a o s e u l a d o ,
Marina. Não importa o que aconteça, eu vou estar aqui e
q u a n d o a c o r d a r. . . — p a r o t r ê m u l o d e m e d o . — Q u a n d o
v o c ê a c o r d a r, v a m o s d i r e t o p a r a a i g r e j a .
Enquanto permaneço ao lado dela, a esperança de
que ela possa ouvir minhas palavras e sentir minha
presença é a única coisa que me dá alguma paz em meio a
essa tormenta.
— Senhor? — me viro só para ver a enfermeira me
indicar a saída.
Beijo a mão pálida de Marina e com muito custo
fico de pé.
Assim que sou guiado para fora, minha mãe está
parada me olhando.
— Eu amo a Marina, mãe... — choro novamente. —
Eu não posso viver sem ela...
Sem falar nada, minha mãe me abraça e sinto sua
mão me acariciar as costas.
— Va i d a r t u d o c e r t o , m e u f i l h o — e l a s u s s u r r a
agarrada a mim. — Ela vai ficar bem.
Choro me sentindo acolhido por minha mãe, pela
primeira vez na vida. A abraço mais, e ficamos ali por um
bom tempo. Sua presença é um consolo inesperado, um
porto seguro em meio à tempestade emocional que me
atinge.
Minhas lágrimas vão diminuindo aos poucos, e
embora o peso da situação ainda esteja presente, o apoio
silencioso da minha mãe me dá uma nova perspectiva.
— Eu não sei como vou passar por isso — digo,
com a voz ainda embargada, meus braços ao redor dela.
Ela dá um leve suspiro e me afasta um pouco,
olhando diretamente nos meus olhos.
— Vo c ê v a i p a s s a r p o r i s s o , D i o g o . Vo c ê é m a i s
forte do que imagina.
Seus olhos estão cheios de compreensão e um amor
que transcende palavras. Eu nunca tinha visto aquele
olhar em minha mãe. Ela me dá um beijo suave na testa e
eu sinto uma onda de gratidão e amor por ela.
— Vo u f i c a r c o m e l a — d i g o . — N ã o i m p o r t a
quanto tempo leve, eu estarei lá.
Ela sorri para mim, um sorriso triste, mas
e n c o r a j a d o r.
— Eu sei que você vai. — sua voz soa calma. —
Mas não se esqueça... — ela suspira, então continua: —
Não se esqueça do seu filho. — percebo que é difícil para
ela me olhar nos olhos, talvez por culpa? — Ela está
s e n d o b e m c u i d a d a . . . Vo c ê p r e c i s a t r o c a r e s s a r o u p a c h e i a
de sangue, tomar um banho.
Olho para as minhas mãos trêmulas e noto o sangue
seco, assim como em minha camisa branca. Mas não
c o n s i g o m e a f a s t a r, e n t ã o a p e n a s , b a l a n ç o a c a b e ç a e
volto a olhar a janela de vidro. Onde o amor da minha
vida, está deitada em uma cama com vários fios e um
tubo em sua boca.
— Eu vou ficar mais um pouquinho. — murmuro
com aquela visão na mente. — A senhora pode ir se
q u i s e r.
Sinto sua mão em meu braço.
— Eu vou ligar para a Herbertina — comunica e eu
concordo. — Não sei se ela já ficou sabendo.
Minha mãe sai buscando o celular na bolsa, e eu
aceno, me sentindo completamente devastado. Eu disse
que a protegeria, mas me sinto como se tivesse falhado,
como se não tivesse feito o suficiente. Encosto a testa no
vidro e fecho os olhos, fazendo uma oração breve, mas
sincera. Cada respiração é uma luta, e a sensação de
culpa é esmagadora.
A oração é um murmurinho quase inaudível, um
p e d i d o d e f o r ç a p a r a e n f r e n t a r o q u e v e m a s e g u i r, u m
apelo para que Marina encontre a força que eu não sei se
tenho. A dor e o medo estão presentes em cada fibra do
m e u s e r, m a s e s t o u a q u i , a o l a d o d e l a , p r o n t o p a r a l u t a r
com tudo o que tenho para garantir que ela acorde.
Quando finalmente me afasto do vidro, os olhos
vermelhos e inchados, tenho a sensação de estar um
p o u c o m a i s p r e p a r a d o p a r a e n f r e n t a r o q u e v i e r. C a m i n h o
de volta para a sala de espera, onde espero por qualquer
notícia, qualquer sinal de que Marina está lutando para
voltar para nós.
C a p í t u l o 2 8 – I g o r

Já se passaram duas semanas desde que Marina


entrou em coma, e cada dia parece uma eternidade para
Diogo. Em meio ao turbilhão de emoções e incertezas,
algo de bom surgiu na terceira semana: o quadro de saúde
d e M a r i n a c o m e ç o u a m e l h o r a r. E s s a n o t í c i a f o i u m a l í v i o
momentâneo, um vislumbre de esperança em meio à
escuridão que tem sido nossas vidas desde a tentativa de
assassinato.
Diogo não sai de perto dela. Ele está sempre ao seu
lado, seja na UTI ou na sala de espera. O olhar de
preocupação constante em seu rosto reflete a intensidade
de seu amor e seu medo. A devoção dele é admirável, mas
t a m b é m d o l o r o s a d e s e o b s e r v a r. E l e e s t á t e n t a n d o s e r
f o r t e , t e n t a n d o a c r e d i t a r q u e M a r i n a v a i a c o r d a r, q u e
tudo vai voltar ao normal. E eu... eu estou aqui, tentando
ser o amigo que ele precisa, o ombro que ele pode usar
p a r a s e a p o i a r.
Enquanto isso, a situação do Marcelo tomou um
rumo fatal. No segundo dia de sua prisão, ele foi morto
no presídio. As notícias sobre sua morte não foram bem
recebidas por todos, mas para Diogo, foi um pequeno
alívio. Marcelo pagou por seus crimes, e embora Marina
ainda esteja em coma, é um alívio saber que ele não
causará mais danos.
E a surpresa mais chocante veio com a descoberta
de que Emílio Cavalcanti também estava trabalhando com
os inimigos. O juiz, que parecia ser um pilar de justiça,
havia recebido propina para liberar Juanito. A traição é
uma ferida profunda, um golpe em um sistema que
deveria proteger a todos nós. Saber que alguém em quem
confiávamos estava envolvido com a corrupção e o crime
é d e v a s t a d o r.
Os dias passam lentos e pesados, mas cada pequena
melhoria no estado de Marina dá a Diogo uma nova
esperança. Como agora que ela está no quarto, todos
aqueles fios de antes, sendo substituído por um pregador
no dedo, um acesso no braço e o respirador em seu nariz.
As horas na sala de espera são preenchidas com
conversas baixas e olhares preocupados. Cada pequeno
progresso é comemorado como uma vitória, e cada atraso
é uma nova fonte de angústia. Estou aqui para garantir
que Diogo saiba que não está sozinho, mesmo que as
sombras de desespero ainda pairam sobre nós.
E n q u a n t o m e s e n t o n a c a d e i r a d o c o r r e d o r, m e u
olhar vai até Diogo que está com Heitor nos braços. Ele
conversa com Marina, como faz todos os dias, mas dessa
v e z H e i t o r f o i p e r m i t i d o f i c a r. Ti a H B T e s t á n a c a n t i n a ,
desde cedo estamos aqui e apesar disso, não sinto fome.
Solto um suspiro e esfrego o rosto. Meu olhar vai
a t é o c o m e ç o d o c o r r e d o r, e n t ã o v e j o u m c a s a l s e
aproximando. Me levanto colocando as mãos no quadril.
A mulher é quase uma cópia de Marina, então percebo
que aquela é a mãe dela.
— Boa tarde! — a mulher me sorri e eu aceno. —
Eu estou procurando o quarto da minha filha, Marina
Ribeiro.
— Igor Montagner — me apresento apertando as
mãos dos dois. — Eu sou um amigo dela.
— Qual o endereço que meu neto está? — o homem
p e r g u n t a e e u f r a n z o o c e n h o . — Vi e m o s l e v á - l o .
Diogo que está ao lado, de porta aberta, vira em
nossa direção e com a expressão confusa, se aproxima.
D i o g o e s t á c o m a b a r b a b e m m a i o r, a s s i m c o m o o s
cabelos, e as olheiras. Noto quando a mulher sorri para
H e i t o r, q u e j á e s t á m a i s g r a n d i n h o , e e s t e n d e o s b r a ç o s
para pegá-lo. Rapidamente me coloco na frente, assim
como Diogo se afasta.
— Não vão levar o meu filho!
A mulher engole em seco e encara o marido.
— A minha filha não tem condições de cuidar do
b e b ê — e l a v o l t a a f a l a r. — N ã o s a b e m o s n e m s e v a i
a c o r d a r.
— Vão embora daqui! — Diogo manda com a voz
g r a v e , o q u e a s s u s t a H e i t o r q u e c o m e ç a a c h o r a r. —
Shhh... Calma campeão...
— Se ela acordar — o pai de Marina fala. — Ela
sabe muito bem onde moramos.
— P e r a , l á , m e u s e n h o r ! — e x c l a m o s e m a c r e d i t a r.
— Vo c ê s v i e r a m d e n ã o s e i d a o n d e , n ã o p e r g u n t a m s o b r e
o estado da Marina e ainda com essa banca toda, querem
levar C.Jota?
— Ele é nosso neto!
— E o foda-se fica como? — solto sem querer
nervoso, os dois me olham assustados. Me viro para
D i o g o q u e c o n s e g u i u f a z e r o p e q u e n o p a r a r d e c h o r a r. —
Va i f i c a r c o m a M a r i n a , e u c u i d o d i s s o . — D i o g o a c e n a e
entra no quarto fechando a porta. — O negócio é o
s e g u i n t e . Vo c ê s n ã o v ã o l e v a r o n o s s o b e b ê , n ã o t e m
nenhum direito aqui e não vou admitir que trate a Marina
como se ela não estivesse mais aqui! Ela está! E vocês
deveriam se envergonhar disso.
— Olhe aqui seu moleque! — o pai dela vocifera
p a r a m i m . — Vo c ê n o s r e s p e i t e !
— Escuta aqui seu velho! — retruco, mas logo me
lembro que talvez Marina possa ficar chateada comigo. —
Seu decrépito! A Marina não está mais desamparada.
Quando ela precisou da ajuda de vocês lá atrás, vocês
ajudaram? Não, né? Então se retirem. O Heitor está com
o pai e a família paterna. E só para vocês saberem, eu me
encaixo como tio/padrinho dele. Agora vão embora!
Cruzo os braços com a feição séria e observo os
dois se retirarem, a mãe de Marina ainda me olha, mas
segue o marido. Sinto meus ombros caírem e me sento
novamente na cadeira. Após alguns segundos, tia HBT
chega, tem um pedaço de bolo e um copo de suco. Para
minha surpresa, Adriana está ao seu lado e também tem
um pedaço de bolo com suco.
— Aqui, filho — tia me entrega o lanche. — E o
Diogo?
— Lá dentro. — aviso e observo Adriana ficar
p a r a d a . — O s p a i s d a M a r i n a a c a b a r a m d e s a i r.
— Eles vieram? — tia indaga e eu concordo. — Mas
eles não ficaram?
— Eles queriam levar o Heitor — falo em
desagrado. — Já tratam a Marina como se ela já estivesse
m o r t a . M a n d e i e m b o r a , s e n ã o q u e r e m a j u d a r, e n t ã o n ã o
atrapalhem.
Ti a s e s e n t a d o m e u l a d o e m e d á u m t a p i n h a n o
braço.
— Te m r a z ã o . A g o r a c o m a — m a n d a c o m o t o m
sério. — Quer competir com Diogo quem desmaia
primeiro?
Mesmo sem vontade, dou uma mordida na fatia e
fico olhando a porta do quarto. Quando dá o horário de
t i a H B T i r c o m H e i t o r, é u m a l u t a . E u p e r c e b o q u e D i o g o
f i c a d i v i d i d o e n t r e i r e f i c a r. M a s p o r s a b e r q u e o c a r i n h a
de joelho vai ser bem cuidado, ele acaba aceitando. Me
despeço do pequeno e observo as três irem. Pelo que
n o t e i , A d r i a n a v e m s e a p r o x i m a n d o d o H e i t o r, e a t é
peguei um momento em que ela o estava ensinando a
chamar vovó.
Que loucura.
Adriana precisou de um choque de realidade para
ser uma pessoa mais amável.
Olho o horário no meu celular e fico de pé,
sentindo o peso de cada minuto que passa. Me aproximo
da janela na porta do quarto e observo a cena que se
desenrola lá dentro. Diogo está deitado ao lado de
Marina, com a cabeça apoiada no colchão. Sua mão
segura a dela, como se aquele simples toque fosse
suficiente para mantê-la ligada ao mundo.
Ele não dorme, apenas descansa os olhos por alguns
instantes, mas nunca solta a mão dela. Aquele quarto se
tornou o centro do universo dele, e é difícil ver meu
amigo, sempre tão forte e determinado, tão vulnerável.
M e a p o i o n a p o r t a , s e m q u e r e r i n t e r r o m p e r, m a s
t a m b é m s e m c o n s e g u i r d e s v i a r o o l h a r. A l e a l d a d e e o
amor que ele tem por Marina são palpáveis, e isso só
torna tudo ainda mais doloroso. Ninguém deveria ter que
passar por isso, especialmente alguém como Diogo, que
já enfrentou tanta coisa na vida.
Mas aqui estamos, presos nesse limbo de espera,
onde cada segundo parece uma eternidade. Não há nada
que eu possa fazer para aliviar a dor dele, exceto estar
presente, vigiar junto, e esperar por algum sinal de que
t u d o i s s o v a i m e l h o r a r.
Com um suspiro pesado, saio de perto da porta e
v o l t o a m e s e n t a r. A g u a r d a n d o , a s s i m c o m o e l e , q u a l q u e r
mudança no silêncio pesado do hospital.
C a p í t u l o 2 9 – D i o g o

Meus olhos pesam, e por mais que eu lute contra o


sono, ele me vence de vez em quando. É inevitável. Sinto
o corpo dolorido pela posição na poltrona desconfortável,
mas não me importo. Quando o cansaço se torna
insuportável, acabo cochilando por alguns minutos, com
o coração ainda apertado.
A luz do dia já invadiu o quarto, mas a claridade
não traz nenhum alívio. Já tem algumas semanas que
mudamos para esse quarto. Mudamos, porque estou
praticamente morando aqui. Não fui mais ao meu trabalho
e sinceramente não estou preocupado com ele. Meus
dedos estão entrelaçados aos dela, e a suavidade de sua
pele me traz um tipo de conforto amargo.
Me ajeito na poltrona, tentando aliviar o peso nas
costas, e encaro o rosto sereno de Marina. Ela parece tão
frágil, tão quieta… Como se estivesse em algum lugar
distante, fora do meu alcance.
— Marina... — murmuro baixinho, como se minha
voz pudesse alcançá-la nesse lugar onde ela se encontra.
— P o r f a v o r, v o l t a p r a m i m . . .
Não sei quantas vezes repeti essas palavras, mas
c o n t i n u o . Ta l v e z e l a p o s s a o u v i r. Ta l v e z , d e a l g u m a
forma, ela saiba o quanto precisamos dela de volta. A
cada momento que passa, o desespero me corrói, mas não
posso deixar de ter esperança.
— Eu devia ter dito que te amo — falo e em
seguida beijo sua mão. — Não entendo por que não disse
antes... é amor o que sinto por você, Marina. Eu te amo,
mais do que tudo. Amo você e o nosso Heitor — sorrio e
l h e a c a r i c i o o r o s t o . — Vo c ê d i s s e q u e C . J o t a é u m b o n i t o
apelido, mas ele quer dizer cara de joelho. — não
c o n s i g o s e g u r a r o m e u r i s o . — C o i s a d o I g o r. — e n g u l o
em seco. — Eu preciso confessar que uma vez, sem
q u e r e r, t a m b é m c h a m e i o n o s s o f i l h o a s s i m . C u l p a d o
I g o r.
Observo seu rosto lindo, ela parece estar apenas
dormindo de um jeito suave. Respiro fundo e fico de pé,
preciso esticar as pernas, mas me sinto relutante em
soltar sua mão. Mesmo assim, deixo meus dedos
deslizarem lentamente dos dela, como se estivesse me
despedindo por um breve instante.
Dou alguns passos para o lado, sentindo o sangue
voltar a circular pelos meus músculos tensos, mas meu
olhar nunca se afasta de Marina.
Ando até a janela e olho para o movimento lá fora,
vendo as pessoas indo e vindo, vivendo suas vidas,
e n q u a n t o a q u i d e n t r o o t e m p o p a r e c e t e r p a r a d o . Tu d o é
tão silencioso, tão solitário. Respiro fundo, tentando
aliviar o aperto no meu peito.
Vo l t o p a r a p e r t o d e l a , a j e i t a n d o o l e n ç o l e m v o l t a
de seu corpo. O som das máquinas é o único ruído no
quarto. Me inclino e beijo suavemente sua testa, sentindo
o calor da sua pele.
— Eu estou aqui... — sussurro. — E vou ficar até
v o c ê a c o r d a r, m e u a m o r.
Enquanto permaneço ao lado dela, ouço a porta do
quarto se abrir suavemente. Levanto o olhar e vejo Igor
e n t r a r, c o m u m o l h a r c a n s a d o e p r e o c u p a d o . E l e a c e n a
c o m a c a b e ç a e s e a p r o x i m a d e v a g a r, c o m o s e t e m e s s e
quebrar o silêncio do quarto.
— Como ela está? — ele pergunta, embora já saiba
a resposta.
— Ainda sem mudanças… — respondo em um tom
baixo, tentando não demonstrar o desespero que sinto por
dentro. — Os médicos disseram que a melhora dela foi
um bom sinal, mas ainda não sabemos quando... ou se...
e l a v a i a c o r d a r.
Igor suspira e coloca a mão no meu ombro, me
oferecendo um conforto silencioso.
— Vo c ê p r e c i s a s e c u i d a r t a m b é m . — e l e d i z
suavemente. — Marina vai precisar de você forte quando
a c o r d a r.
Aceno, mas é difícil pensar em mim mesmo
enquanto ela está assim, tão vulnerável. Não consigo
sequer imaginar deixar seu lado.
— E o Emílio?
— Está preso da última vez que vi. — Igor
responde. — A família dele saiu do país, incluindo seu
irmão.
Balanço a cabeça.
— O Emílio não pode escapar disso. — murmuro,
m a i s p a r a m i m m e s m o d o q u e p a r a I g o r. — E u v o u
garantir isso... por ela.
Igor concorda, apertando meu ombro um pouco
mais.
— To d o s n ó s v a m o s , D i o g o . To d o s n ó s .
Igor se afasta um pouco, mas seus olhos continuam
firmes em mim, cheios de preocupação e amizade. Ele
sabe o peso que estou carregando, a luta interna entre
esperança e desespero. Respiro fundo, tentando me
r e c o m p o r.
— Diogo, você precisa sair daqui um pouco. — ele
i n s i s t e . — N e m q u e s e j a p r a p e g a r u m p o u c o d e a r. E u
fico com ela.
Olho para Marina, meu coração se aperta ao vê-la
tão frágil. Estou exausto, física e emocionalmente, mas a
ideia de me afastar me assusta.
— Só um pouco. — Igor continua. — Ela vai
continuar aqui, e eu vou estar bem aqui, ao lado dela.
Vo c ê p r e c i s a d e f o r ç a p r a c o n t i n u a r, e M a r i n a v a i
precisar disso de você.
Eu sei que ele está certo. Sei que é importante me
manter forte por Marina, por nosso filho, por tudo que
ainda temos pela frente. Então, finalmente, concordo.
— Certo. — digo baixinho, sem desviar os olhos do
r o s t o d e l a . — M a s s e a l g u m a c o i s a m u d a r, q u a l q u e r
coisa, você me chama.
Igor sorri levemente.
— C l a r o , D i o g o . Va i t o m a r u m a r.
E u m e l e v a n t o d e v a g a r, s o l t a n d o a m ã o d e l a c o m
relutância. Cada passo para longe da cama dela parece
u m a t r a i ç ã o , m a s f o r ç o m e u c o r p o a s e m o v e r. S a i o d o
quarto, sentindo o peso do cansaço em meus ombros, e
respiro fundo assim que passo pela porta.
Lá fora, o corredor do hospital parece vazio e
silencioso. As paredes brancas e o cheiro de antisséptico
me envolvem enquanto caminho sem destino definido.
Sinto um nó na garganta, a tensão acumulada dos últimos
dias se transformando em uma onda de emoções que
a m e a ç a m e c o n s u m i r.
Sem conseguir ir muito longe, eu volto e fico
parado na entrada. Minhas mãos tremem. O suor frio
desce pela minha nuca. O silêncio do hospital é
i n t e r r o m p i d o p o r u m t o q u e d e c e l u l a r, e n t ã o v e j o I g o r
pegar do bolso e desligar rápido. Como se não quisesse
incomodar Marina.
— Se precisar atender — eu falo fazendo-o me
n o t a r a l i . — P o d e i r.
Igor suspira e se aproxima de mim.
— Q u a n d o e l a a c o r d a r, e u v o u f a l a r s o b r e s u a
teimosia.
Ele me sorri e retribuo. Igor sai, e volto a ficar ao
l a d o d e M a r i n a . Ta l v e z f o s s e o c a n s a ç o , m a s a s s i m q u e
escorei o rosto com a mão, eu adormeci.

Minha cabeça parece pesada, como se eu estivesse


e m e r g i n d o d e u m s o n h o p r o f u n d o e d e n s o . Te n t o a b r i r o s
olhos, mas eles estão pesados, e o brilho suave da luz no
teto me faz piscá-los algumas vezes. O cheiro de hospital
me envolve, um misto de álcool e algo esterilizado. Eu
escuto o som de um bip constante, um ruído rítmico que
aos poucos começa a fazer sentido. Minha mente está
enevoada, como se estivesse tentando se lembrar de algo
importante, algo que eu preciso segurar antes que escape.
Finalmente, consigo abrir os olhos de verdade, e a
primeira coisa que vejo é Diogo. Ele está sentado ao meu
lado, na cadeira desconfortável de hospital, com o rosto
apoiado na mão e os olhos fechados. Sua cabeça está
caída para o lado, em um ângulo que deve estar lhe
c a u s a n d o d o r n o p e s c o ç o , m a s e l e n ã o p a r e c e s e i m p o r t a r.
Ele está dormindo, com a camisa um pouco
amassada e os cabelos bagunçados. Há olheiras profundas
embaixo de seus olhos. Parece tão cansado… tão perdido.
Meu coração aperta ao vê-lo assim. Ele está aqui,
comigo. Meu corpo parece tão frágil, e me sinto um
pouco perdida, sem saber exatamente onde estou ou
q u a n t o t e m p o s e p a s s o u . Te n t o m e m e x e r, s i n t o m e u s
dedos se contraírem levemente. Uma pontada de dor
percorre meu corpo, mas ao mesmo tempo, a sensação de
estar acordada, de estar viva, é forte demais.
— Diogo… — tento chamá-lo, mas minha voz sai
fraca, quase um sussurro.
Ele não se mexe, então tento novamente, desta vez
com um pouco mais de força.
— Diogo…
Seus olhos se abrem num instante, confusos no
início, mas depois, quando ele me vê, algo neles muda.
Ele parece despertar por completo, como se tivesse sido
atingido por um raio. Seus olhos se arregalam e a boca se
abre, num misto de surpresa e alívio.

— Marina? — ele sussurra, como se estivesse com


m e d o d e a c r e d i t a r. E l e s e i n c l i n a p a r a a f r e n t e , s e g u r a n d o
m i n h a m ã o c o m u m a d e l i c a d e z a q u e q u a s e m e f a z c h o r a r.
— M e u D e u s . . . ! Vo c ê e s t á . . . — e l e r e s p i r a f u n d o , o s
o l h o s b r i l h a n d o c o m l á g r i m a s q u e a m e a ç a m c a i r.
— Estou aqui... — sussurro, minha voz ainda fraca,
mas firme o suficiente para ver o alívio inundar o rosto
dele. A emoção em seus olhos é tão intensa que mal
consigo segurar as lágrimas. — Eu... eu estou aqui.
O riso de Diogo é puro, tão verdadeiro que sinto
m e u c o r a ç ã o s e a q u e c e r. E l e m e e n v o l v e e m s e u s b r a ç o s
c o m t a n t a f o r ç a q u e s o l t o u m p e q u e n o g e m i d o d e d o r, m a s
não quero que ele me solte. Não agora. O toque dele é o
que me ancora à realidade, me fazendo sentir viva,
pulsante. Eu fecho os olhos, absorvendo seu cheiro, seu
c a l o r, c a d a s e g u n d o d e s s e m o m e n t o .
— Não! — uma voz ao fundo me faz abrir os olhos,
r e c o n h e ç o q u e é I g o r. S u a v o z s o a t e n s a , u r g e n t e .
Lentamente, subo minha mão pela camisa de Diogo e eu
m e a g a r r o n e l e . — E l a a c o rd o u , p o r r a !
Diogo se afasta ligeiramente, apenas o suficiente
para me olhar nos olhos. Há lágrimas em seus olhos, um
brilho de emoção que nunca vi antes. Ele me beija,
suave, como se tivesse medo de que eu pudesse
d e s a p a r e c e r. S e u b e i j o a p e s a r d e s e r u m s e l i n h o , é u m a
promessa, um reencontro, um alívio.
Quando ele se afasta, por um breve segundo, penso
q u e e l e v a i m e s o l t a r, m a s e l e v o l t a a m e a b r a ç a r c o m a
mesma intensidade de antes.
— Eu não acredito… — ele murmura contra meu
c a b e l o . — A c h e i q u e i a t e p e r d e r, M a r i n a .
Sinto meus próprios olhos se encherem de lágrimas.
Passo a mão pela camisa dele, tentando segurá-lo ainda
mais perto de mim.
— Estou aqui, Diogo… — respondo, minha voz
embargada. — Não vou a lugar nenhum.
— Eu te amo, Marina! Amo muito e não vou correr
o risco de não te dizer isso! — ele fala urgente e eu fico
tonta com toda intensidade, mas sorrio. — Eu te amo!
Não sei viver sem você!
— D i o g o — t o c o s e u r o s t o f a z e n d o - o c a l a r. — E u
também te amo.
Diogo suspira profundamente, como se estivesse
libertando um peso enorme de dentro dele. Ele sorri
novamente, com aquele sorriso que me faz sentir que
tudo ficará bem. No fundo, ouço Igor resmungar alguma
coisa, provavelmente emocionado também, mas tudo ao
m e u r e d o r s e t o r n a a p e n a s r u í d o . Tu d o o q u e i m p o r t a é
que estou aqui, e ele também.
Após todos os abraços emocionados, o médico e os
e n f e r m e i r o s v i e r a m m e v e r. E l e s p a r e c i a m s u r p r e s o s a o
me ver desperta e comunicativa, como se não esperassem
que eu acordasse tão cedo. Eu apenas conseguia pensar
em Heitor e no desejo desesperado de voltar para casa.
Antes de receber alta, fui mantida algumas horas em
observação, refiz alguns exames, e os médicos avaliaram
minha condição.
A cicatriz na minha barriga estava cicatrizando
bem, mas só de ouvir o que me aconteceu, um medo
profundo tomou conta de mim.
Quando finalmente me deram alta, já no final da
tarde, senti um misto de alívio e ansiedade. Diogo me
ajudou a me levantar com cuidado, a tomar banho no
banheiro do quarto, me vestiu e seguimos para o carro.
Ele me abraçou no banco de trás, sua mão firme na
minha, como se precisasse garantir que eu estava ali,
viva e ao seu lado.
Igor dirigia, lançando olhares rápidos pelo espelho
r e t r o v i s o r, p a r e c e n d o p r e o c u p a d o e a l i v i a d o a o m e s m o
tempo.
O caminho até em casa pareceu mais longo do que
nunca. Cada quilômetro era uma lembrança do que quase
perdi, mas também uma celebração silenciosa de uma
n o v a c h a n c e . O b r a ç o d e D i o g o a o m e u r e d o r, m e
mantendo perto, era o conforto de que eu precisava. Senti
o calor do seu corpo, sua respiração calma, e percebi o
quanto ele também estava exausto, mas firme,
d e t e r m i n a d o a n ã o m e s o l t a r.
— Va m o s p a r a c a s a , m e u a m o r — D i o g o s u s s u r r a , e
eu encosto minha cabeça em seu peito.
Sinto um beijo no topo da minha cabeça, e fecho os
meus olhos. Igor continua dirigindo, tentando manter uma
conversa leve para quebrar o silêncio tenso que ainda
p a i r a n o a r. A n o i t e c o m e ç a a c a i r, e s i n t o q u e e s t o u i n d o
para onde pertenço: ao lado daqueles que amo.
Quando chegamos em casa, Diogo me pega nos
braços com cuidado e me leva para dentro. Assim que
entramos fico surpresa ao ver vários balões rosas
espalhados pela casa, e mais ainda por ver Adriana
sorridente, e ao lado de dona Herbertina? Olho para
Diogo, que parece perceber minha indagação silenciosa,
ele apenas sorri e me beija os lábios.
— Bem-vinda, Marina! — ela fala e parece tão
sincera. — Quando o Igor nos avisou, resolvemos colocar
esses enfeites. — seu olhar vai para os balões. — Pelo
menos Herbertina disse que ficaria bonito.
— Mas está bonito — dona Herbertina retruca e se
a p r o x i m a d e m i m . M e t o c a o r o s t o . — B e m - v i n d a ! Te m
um bebezinho que está sentindo muito a sua falta!
Só a menção do meu bebê faz meus olhos se
encherem de lágrimas. O medo de não poder mais vê-lo,
só faltou me consumir por inteira. Me tirando do
devaneio, Diogo me leva para o quarto dele, e me coloca
em cima da cama. Ele se senta bem perto, e com um
pequeno sorriso, agarro sua barba enorme. Em seguida
toco seu rosto cansado, aquelas olheiras enormes...
— Não dormiu? — indago e recebo um beijo na
m ã o . — Vo c ê t a m b é m e s t á m a i s m a g r o .
— S a b e o p o rq u ê , M a r i n a ? — I g o r e n t r a n o q u a r t o
apontando para Diogo. — Não comeu, não dormiu, nem
tomou banho. Ele não queria sair de perto de você. — ao
falar ele cruza os braços. — Que bom que já acordou, só
assim para colocá-lo nos eixos.
S o r r i o p a r a I g o r, m a s l o g o f i x o m e u o l h a r e m
D i o g o . Ve j o a i n t e n s i d a d e n o s o l h o s d e l e , a q u e l a c h a m a
que nunca se apaga.
— Agora que está tudo bem — murmuro, sentindo-
m e m a i s c a l m a . — Tu d o v a i d a r c e r t o .
Ele segura minha mão com mais firmeza, e sua
expressão é séria, quase urgente.
— Eu quero me casar com você amanhã — Diogo
diz de repente, e eu rio, achando que ele está brincando.
Mas o olhar dele permanece firme. — É sério.
Meu coração acelera e, antes que eu possa
r e s p o n d e r, a p o r t a s e a b r e l e n t a m e n t e .
— Licença, mamãe — ouço a voz suave de
Herbertina, e meus olhos se enchem de lágrimas quando
vejo meu bebê nos braços dela. Heitor está mais crescido,
e seu olhar curioso me encara. Emocionada, estico meus
braços para pegá-lo, mal acreditando que finalmente
estou aqui, com ele.
— Ele está um pouquinho pesado — Herbertina
comenta com um sorriso, entregando-o para mim com
cuidado.
Sinto o calor de seu corpinho, o cheiro familiar e
maravilhoso que só um bebê tem. Heitor se aconchega em
mim, e sinto meu coração quase explodir de felicidade.
— Isso é só amor acumulado — brinco, segurando
meu pequeno contra o peito.
Diogo observa a cena, e posso ver seus olhos
brilhando. Ele passa a mão levemente pelos cabelos de
H e i t o r, e n q u a n t o n o s s o s o l h a r e s s e e n c o n t r a m m a i s u m a
vez.
— Va m o s n o s c a s a r a m a n h ã , M a r i n a . E u q u e r o i s s o
mais do que tudo — ele insiste, e desta vez percebo a
s e r i e d a d e e m s u a v o z . N ã o h á d ú v i d a s , a p e n a s a m o r.
— Na igreja? — indago confusa. Afinal, como ele
quer casar na igreja faltando um dia apenas?
— Amanhã no civil e daqui a um mês na igreja. —
seu tom de voz é serio. — Eu não quero esperar um
m i n u t o a m a i s p a r a m e c a s a r c o m v o c ê , M a r i n a . Vo c ê t e m
o meu coração.
— Tu d o b e m ! E u a c e i t o ! E r a a m i n h a r e s p o s t a p a r a
a sua pergunta — sorrio feliz e tento levantar Heitor dos
meus braços, mas não tenho forças. Notando isso, Diogo
o coloca em pé nos meus braços. — Acho que ainda estou
bem molenga. Ele comeu?
— Sim, comprei algumas fórmulas para ele —
D i o g o r e s p o n d e e s e g u r a H e i t o r. — P o r c o n t a d a s u a
condição, não poderíamos usar o seu leite.
— Entendo... — beijo Heitor em sua bochecha
gorducha. — Ele é tão lindo.
— E u v o u t r a z e r a l g o p a r a v o c ê c o m e r, M a r i n a . S ó
soro na veia, não tem como.
Igor que estava encostado à parede, se despede e
vai atrás da dona Herbertina, já Adriana fica parada na
e n t r a d a . Ta l v e z p e r c e b e n d o , D i o g o c o l o c a H e i t o r n o s
braços e sai do quarto. Fico um pouco sem jeito com ela
a l i , m a s e s t o u p r e p a r a d a p a r a o q u e d e r e v i e r. Ta l v e z , e l a
tenha apenas fingido na frente do filho e...
— Me desculpe, Marina. — pede e eu fico em
silêncio a observando. — Eu admito que fui uma pessoa
amargurada no início. Eu só sou uma mãe que quer cuidar
dos filhos, apesar do Diogo não entender o meu lado...
talvez eu seja um pouco incompreendida — ela suspira,
parece um pouco triste. — Agora eu entendo o dele e
percebi que você não é a interesseira que eu achei que
fosse.
Adriana me olha nos olhos, aguardando ansiosa por
uma resposta. Pelo pouco que sei dela, e pelo que já ouvi
f a l a r, r e c e b e r u m p e d i d o d e d e s c u l p a s d a p a r t e d e l a é
algo raro, quase extraordinário. Suas mãos tremem
l e v e m e n t e , e e l a m a n t é m o o l h a r f i x o , s e m d e s v i a r.
P o s s o s e n t i r o p e s o d o m o m e n t o , a t e n s ã o n o a r. E l a
está tentando, abrindo uma porta para algo novo, e de
alguma forma, isso me atinge com força. Me pergunto o
quanto foi difícil para ela chegar a esse ponto, admitir
que errou, que não me deu uma chance justa desde o
começo.
— Eu... — começo, tentando encontrar as palavras
certas. — Agradeço por isso. De verdade.
Seus ombros relaxam um pouco, como se ela
estivesse segurando a respiração até esse momento.
— Eu vi como Diogo ficou quando você foi atingida
— ela diz, a voz um pouco mais suave, mas ainda
c a r r e g a d a d e e m o ç ã o . — Ta l v e z e u n ã o s a i b a d e m o n s t r a r
muito bem, mas eu só procuro fazer o que é certo para a
minha família.
— Eu entendo. — confirmo, porque realmente
entendo. Ela fica alguns segundos calada, apenas me
o l h a n d o . E n g u l o e m s e c o e t e n t o s o r r i r. — P o d e m o s
r e c o m e ç a r s e a s e n h o r a q u i s e r.
— Seria perfeito — ela afirma e passa as mãos nos
cabelos escuros. — Eu vou deixar que descanse. O
Humberto está trabalhando, está empenhado em fazer
justiça. Foi um baque para nós.
Balanço a cabeça, Adriana acena e sai do quarto.
Sozinha, dou um pequeno sorriso, sentindo um
m i s t o d e a l í v i o e c o m p r e e n s ã o . Ta l v e z , f i n a l m e n t e ,
possamos começar a entender uma à outra. Não demora
muito e dona Herbertina volta com uma bandeja com um
prato de comida e um copo de suco. Apesar de me sentir
cansada, eu como. Feliz demais por estar em casa, e por
finalmente estar cercada pelas pessoas que amo.
Cada mordida é uma pequena vitória, um lembrete
de que consegui superar um dos momentos mais difíceis
da minha vida. Herbertina observa de perto, com um
sorriso maternal que sempre me conforta. Ela se
aproxima e ajeita o travesseiro atrás de mim, como se
quisesse garantir que estou o mais confortável possível.
Da porta, eu escuto uns balbucios e quando olho,
s o r r i o p a r a D i o g o e H e i t o r.
— Va i p r e c i s a r d e f o r ç a p a r a l i d a r c o m e s s e s d o i s ,
hein? — ela brinca. Dou uma risadinha, sentindo o
cansaço pesar em meus olhos, mas determinada a
aproveitar esse momento.
Diogo se aproxima e se senta na beira da cama, toca
em meu rosto com cuidado.
— Está se sentindo bem? — ele pergunta baixinho,
como se temesse me sobrecarregar com qualquer coisa.
— Estou ótima, só um pouco cansada, mas muito
feliz — respondo, tocando sua mão, para em seguida
f a z e r u m c a r i n h o e m H e i t o r. — E a n s i o s a p a r a e s t a r d e
volta ao normal... nossa vida de volta ao normal.
Ele sorri arqueando uma sobrancelha.
— Va i f i c a r t u d o b e m , M a r i n a . A g e n t e t e m t o d o o
tempo do mundo agora.
E, pela primeira vez em muito tempo, acredito
nisso.
C a p í t u l o 3 0 – M a r i n a

Me olho no espelho e quase não reconheço a mulher


refletida ali. O vestido branco se ajusta perfeitamente ao
meu corpo, como se tivesse sido feito para mim. Sinto o
tecido macio em contato com a pele, e o véu leve que cai
pelos meus ombros. Respiro fundo, tentando conter a
ansiedade e o nervosismo que borbulham dentro de mim.
É engraçado pensar que há apenas um mês eu estava
lutando pela minha vida em um hospital, e agora, estou
aqui, pronta para me casar novamente, dessa vez na
igreja.
Minha mente volta para aquele dia, logo após sair
do hospital. Diogo estava tão determinado... Eu nem
tinha recuperado todas as minhas forças, mas ele não quis
e s p e r a r. N ó s n o s c a s a m o s n o c i v i l n o d i a s e g u i n t e , n u m a
c e r i m ô n i a s i m p l e s , m a s c h e i a d e a m o r. I g o r e D o n a
H e r b e r t i n a f o r a m n o s s a s t e s t e m u n h a s . I g o r, s e m p r e c o m
aquele sorriso travesso, fez questão de brincar que nunca
pensou que viveria para ver Diogo sorrindo tanto em uma
sala de casamento. Eu lembro de ter rido, sentindo a mão
d e D i o g o s e g u r a n d o a m i n h a c o m f i r m e z a e a m o r.
Saio do devaneio com dona Herbertina ajeitando o
meu vestido, seus dedos ágeis cuidando de cada detalhe.
Adriana, a mãe de Diogo, observa em silêncio. Desde que
se desculpou, sua presença tem sido constante, mas
tranquila.
H e i t o r, n o s s o p e q u e n o , e s t á d e i t a d o n o c a r r i n h o a o
meu lado, dormindo profundamente. Olho para ele e
s o r r i o , s e n t i n d o u m a o n d a d e g r a t i d ã o m e i n v a d i r. Tu d o o
que passei me trouxe até aqui. Respiro fundo, tentando
m e a c a l m a r, e v o l t o a m e o l h a r n o e s p e l h o .
Dona Herbertina sorri para mim através do espelho.
— Está linda, querida — ela diz com doçura.
Adriana se aproxima, sua expressão é de ternura.
— D i o g o v a i f i c a r s e m p a l a v r a s q u a n d o t e v e r.
Sorrio de volta, sentindo o nervosismo dar lugar a
uma felicidade tranquila.
— Já está na hora de ir? — pergunto mais uma vez,
contando com aquela, essa era a sétima vez que faço a
mesma pergunta. Adriana cruza os braços e olha para
Herbertina. — Acho melhor irmos, se o trânsito estiver
muito horrível?
— Impaciente feito o Diogo — Adriana fala e sorri.
— Eu vou chamar o Igor e então vamos.
A observamos ir e eu logo olho para dona
Herbertina.
— Quem diria que a sua chegada também amansaria
o coração dela — brinca e eu sorrio. — Na verdade, tudo
o que aconteceu foi uma chamada, para cada um de nós.
Mas que graças a Deus, tudo deu certo no fim.
C o n c o r d o e r e s p i r o f u n d o . To d o s o s d i a s , a s s i m q u e
me acordo ao lado de Diogo, me sinto grata por estar
a q u i . Vi v e n d o o a m o r q u e s e m p r e q u i s , c u i d a n d o d o m e u
bebê e até mesmo fazendo os exercícios na sala de
m u s c u l a ç ã o c o m D i o g o . Ta l v e z d e s s e ú l t i m o e u n ã o g o s t e
m u i t o , s ó d a s v e z e s q u e e l e p r e c i s a m e a j u d a r. S o r r i o
s e n t i n d o m e u r o s t o q u e i m a r. D o n a H e r b e r t i n a m e s o r r i
também, mal sabendo o que estou pensando.
— A senhora tem razão — respondo e seguro suas
mãos. — Obrigada por sempre estar do nosso lado.
— Não precisa agradecer — ela me sorri carinhosa.
— Desde a primeira vez que te vi, senti que tudo iria
m u d a r.
N o s a b r a ç a m o s e s e g u r o p a r a n ã o c h o r a r. A s s i m q u e
nos afastamos, escutamos uma batida leve na porta. Igor
entra, impecavelmente vestido em seu terno escuro, com
um sorriso brincalhão nos lábios.
— Posso entrar ou é território proibido para homens
lindos e nervosos? — ele brinca, seus olhos brilhando de
diversão.
Dona Herbertina ri baixinho, e Adriana logo atrás
dele revira os olhos com uma expressão divertida.
— P o d e e n t r a r, I g o r. E s t a m o s p r o n t a s ! O D i o g o
deve estar impaciente com essa demora. — digo,
ajeitando a barra do meu vestido com um leve
nervosismo.
— Eu demoraria mais — ele afirma. — E você,
minha cara amiga, está deslumbrante — comenta,
aproximando-se e me dando um sorriso. — Diogo vai ter
u m a t a q u e q u a n d o t e v e r. N ã o v a i a c r e d i t a r n a p r ó p r i a
sorte.
— É, espero que não fuja — brinco, tentando
esconder o tremor na minha voz.
Igor sorri mais amplamente e balança a cabeça.
— Ele nunca faria isso. Não depois de tudo. Ele te
a m a d e m a i s , M a r i n a . Vo c ê s a b e d i s s o .
Sinto meu coração se aquecer com suas palavras, e
d o u u m s u s p i r o p r o f u n d o p a r a m e a c a l m a r. O l h o p a r a
H e i t o r, q u e c o n t i n u a d o r m i n d o t r a n q u i l a m e n t e , e d e p o i s
v o l t o m e u o l h a r p a r a I g o r.
— Va m o s ? — p e r g u n t o , t e n t a n d o m a n t e r m i n h a v o z
firme.
— Va m o s ! — e l e c o n f i r m a , o f e r e c e n d o o b r a ç o .
Adriana caminha até Heitor com cuidado e o pega
no colo. Ele acorda com um leve resmungo, mas logo
relaxa nos braços dela. Sorrio ao ver a cena.
Saímos do quarto, e meus olhos observam tudo
transformado. Há flores por todos os lados, arranjos
delicados e perfumados que combinam com a decoração
clássica da casa. Os empregados estão ocupados,
cuidando dos últimos detalhes, ajustando toalhas,
alinhando cadeiras, e carregando bandejas de aperitivos.
Igor segura minha mão com firmeza, atento aos
meus passos. Ao chegarmos na caminhonete que Diogo
deixou, a porta traseira é aberta e com cuidado eu subo.
Em seguida observo dona Herbertina se sentar no carona
e Adriana se sentar do outro lado. Com sua ajuda prendo
Heitor na cadeirinha e com tudo certo, Igor dá a partida.
Finalmente, chegamos à igreja. Igor para a
caminhonete suavemente em frente à entrada principal, e
percebo o quão majestosa ela parece, com suas portas
imponentes e vitrais iluminados. Respiro fundo.
Igor sai primeiro, contornando o carro rapidamente
para abrir a porta para mim. Quando saio, a brisa suave
toca meu rosto e meu véu balança levemente. Ajusto o
v e s t i d o c o m c u i d a d o , e , d e b r a ç o s d a d o s c o m I g o r, s u b o
os degraus lentamente. Paro e vejo Humberto me sorrir e
descer os restantes até ficar em minha frente.
— Vo c ê e s t á m u i t o l i n d a , M a r i n a .
— O b r i g a d a , S r. H u m b e r t o — e l e m e o f e r e c e o
braço e eu aceito.
No fundo, gostaria que fosse meu pai, mas
infelizmente não temos mais contato. E após descobrir o
que eles pretendiam, senti que não tinha como tentar me
aproximar mais.
D o n a H e r b e r t i n a , I g o r e A d r i a n a , j u n t o c o m H e i t o r,
entram na igreja.
Assim que atravesso a porta, sou recebida pelo som
suave do órgão tocando uma melodia tranquila, e a visão
da igreja decorada com flores brancas me enche os olhos.
A s p e s s o a s v i r a m - s e p a r a m e o l h a r, p a r e n t e s d a f a m í l i a
Macêdo, mas só consigo focar em uma coisa: Diogo.
D i o g o e s t á n o a l t a r, e m e u c o r a ç ã o q u a s e p a r a a o
vê-lo. Ele está mais bonito do que nunca. Desde que
voltei do hospital, percebi que ele retomou os treinos
c o m u m a i n t e n s i d a d e a i n d a m a i o r. S e u s o m b r o s p a r e c e m
ainda mais largos, os músculos do peito e dos braços
preenchem o smoking escuro com uma firmeza que faz o
tecido se ajustar perfeitamente ao seu corpo. O corte do
smoking, feito sob medida, destaca sua postura ereta, o
queixo forte e a barba cerrada que sempre adorei.
Seu cabelo está penteado de um jeito impecável,
dando um toque sofisticado ao seu visual normalmente
mais rústico. O brilho nos olhos de Diogo é intenso, e há
uma seriedade em seu olhar que contrasta com o pequeno
sorriso em seus lábios. É um homem forte, decidido, mas
com uma vulnerabilidade que só quem o conhece bem
p o d e v e r. E l e p a r e c e u m m o n u m e n t o d e e l e g â n c i a e f o r ç a ,
e e u n ã o c o n s i g o d e s v i a r o o l h a r.
Sua mandíbula está mais definida, e o jeito como
ele segura as mãos atrás das costas, me esperando com
paciência, demonstra uma confiança inabalável. Ele exala
p o d e r, s e g u r a n ç a e b e l e z a d e u m a m a n e i r a q u e f a z m e u
coração bater mais rápido.
A o p a r a r m o s e m f r e n t e a o a l t a r, s o r r i o p a r a D i o g o ,
e ele retribui com aquele olhar que sempre faz meu
c o r a ç ã o a c e l e r a r. O p a i d e l e , c o m u m a e x p r e s s ã o
emocionada, aperta sua mão firme, e então me entrega a
Diogo.
Antes mesmo de virarmos para o padre, Diogo, num
gesto inesperado, se inclina e me beija suavemente nos
lábios. Fico surpresa, não pelo beijo em si, mas pela
intensidade do momento. O mundo parece parar por um
instante, como se fôssemos os únicos ali, cercados por
uma bolha de amor e cumplicidade. Sinto meu rosto
a q u e c e r, e u m s o r r i s o t í m i d o s e f o r m a e m m e u s l á b i o s
quando nos afastamos. O calor do toque dele permanece,
e tudo ao nosso redor parece vibrar com a mesma energia
que compartilhamos.
Diogo apenas sorri de volta, aquele sorriso
tranquilo e confiante, enquanto seguramos as mãos um do
outro e nos viramos para o padre. A cerimônia mal
começou, mas já sinto que nada poderia ser mais
perfeito.
O padre sorri com uma leve surpresa no olhar e
comenta, com bom humor:
— Parece que o noivo não aguentou esperar nem até
o final da cerimônia para roubar um beijo. — as risadas
suaves dos convidados ecoam pela igreja, e eu sinto
minhas bochechas corarem, enquanto Diogo mantém seus
olhos em mim, sem o menor sinal de arrependimento. —
Mas vamos seguir em frente, já que o amor não espera!
O padre prossegue, seu tom de voz reconfortante
enchendo o ambiente.
Diogo aperta suavemente minha mão, e olho para
ele, sentindo a força da sua presença. O padre continua,
mas não consigo focar 100% no que ele fala. Passam os
minutos, então quando finalmente o padre nos pede para
repetir os votos tradicionais e pede as alianças. Sinto a
a n s i e d a d e a p a r e c e r.
Diogo retira do bolso interno uma caixinha preta
aveludada e a abre.
Com a minha aliança em mãos, Diogo me encara
com intensidade, seus olhos fixos nos meus, e sua voz
soa firme e segura ao repetir as palavras de compromisso
enquanto coloca o anel em meu dedo. Quando chega a
minha vez, minhas mãos tremem levemente, mas minha
voz sai clara e forte, refletindo toda a certeza que sinto
no coração.
— Eu, Marina, recebo você, Diogo, como meu
esposo. — coloco o anel grosso dourado em seu dedo. —
Prometo amá-lo, respeitá-lo, e estar ao seu lado, na saúde
e na doença, na alegria e na tristeza, por todos os dias da
n o s s a v i d a . — S i n t o a s l á g r i m a s a m e a ç a n d o c a i r, m a s
mantenho meu olhar no dele, percebendo a emoção em
seus olhos também.
O padre sorri e, em seguida fala:
— Então, pelo poder investido em mim, eu os
d e c l a r o m a r i d o e m u l h e r. P o d e b e i j a r a n o i v a . . .
novamente. — o padre termina com uma piscadela
divertida.
Diogo não perde tempo. Ele me puxa para perto e
me beija, um beijo cheio de paixão e alegria, selando
nosso amor diante de todos. Os convidados aplaudem e
v i b r a m a o n o s s o r e d o r, e n q u a n t o s i n t o m e u c o r a ç ã o
explodir de felicidade.

Estou sentado em uma das cadeiras no imenso


quintal dos meus pais, longe do burburinho da festa, com
uma taça de champanhe na mão. A noite está fresca, e o
céu está coberto de estrelas, como um cobertor brilhante.
Já tirei o smoking há algum tempo, a gravata borboleta
f o i a p r i m e i r a a s a i r, e a g o r a e s t o u s ó c o m a c a m i s a
b r a n c a , s e n t i n d o a b r i s a s u a v e p a s s a r. D e p o i s d e t a n t a s
fotos e cumprimentos, só quero um momento para
r e s p i r a r.
Minha atenção se fixa em Marina, que está alguns
metros à frente, conversando com minha mãe e uma tia
distante, o tipo de parente que só aparece em ocasiões
especiais. Ela segura Heitor nos braços, o nosso filho,
que está aconchegado contra seu peito, um bracinho
minúsculo repousando sobre o ombro dela. A visão me
desarma.
O vestido de Marina se ajusta perfeitamente ao
corpo, realçando cada curva com elegância. E mesmo
carregando o nosso pequeno, ela parece incrivelmente à
v o n t a d e , s e u s o r r i s o i l u m i n a n d o t u d o a o s e u r e d o r. A c a d a
movimento, a cada risada suave, meu coração parece
bater um pouco mais forte.
Ela acaricia a cabeça de Heitor enquanto conversa,
os dedos passeando pelos fios macios de seu cabelo, e
noto o brilho em seus olhos. O jeito que ela equilibra ser
mãe e esposa me deixa orgulhoso, faz com que eu sinta
uma mistura de gratidão e reverência. Como se ela fosse
uma obra de arte viva, que nunca me canso de
c o n t e m p l a r.
Dou um gole no champanhe, deixando o líquido
esfriar minha garganta. Olhar Marina assim, com o nosso
filho nos braços, parece um sonho do qual nunca quero
a c o r d a r. H e i t o r s o l t a u m r e s m u n g o b a i x o , e e l a l h e d á u m
beijo na testa, aconchegando-o mais perto. É um
momento pequeno, quase imperceptível para os outros,
mas para mim, é tudo.
Minha esposa. Meu filho. Minha família.
E u a a m o . D e u m j e i t o p r o f u n d o , g e n u í n o . Vo u
passar cada segundo da minha vida mostrando isso para
ela.
C o m o s e s e n t i s s e o m e u o l h a r, e l a s e v i r a e m e
encontra. Seus olhos brilham quando nossos olhares se
cruzam, e um sorriso suave se abre em seus lábios,
aquele sorriso que faz meu coração bater mais rápido. Ela
sabe o efeito que tem em mim, e o jeito que seus olhos se
suavizam ao me ver me faz sentir que estou exatamente
o n d e d e v e r i a e s t a r.

Levanto a taça em um brinde silencioso, e ela ri,


uma risada leve, quase inaudível para os outros, mas que
eu consigo captar perfeitamente. Ela balança a cabeça de
leve, um gesto de reprovação divertida, e vejo seus
lábios formando um "bobo" sem emitir som. Eu apenas
sorrio de volta, me sentindo o homem mais sortudo do
mundo.
Ela volta a atenção para minha mãe e a tia distante,
mas seus olhos retornam a mim. Marina me observa por
um momento, então sussurra algo para minha mãe e se
aproxima com Heitor nos braços. Seus movimentos são
graciosos, mesmo carregando nosso filho, e eu não
consigo tirar os olhos dela. Cada passo que dá em minha
direção parece lento, quase em câmera lenta, como se o
tempo estivesse conspirando para nos dar um momento só
nosso.
Ela chega até mim e, sem dizer uma palavra, coloca
Heitor no meu colo primeiro, com todo o cuidado do
mundo. Eu o seguro com uma mão, mantendo-o perto de
mim, sentindo o calorzinho do seu corpinho e o cheirinho
familiar que sempre me acalma. Com a outra mão coloco
a taça na mesa.
Q u a n d o M a r i n a t e n t a s e a f a s t a r, e u a p u x o
suavemente de volta para o meu colo, abraçando-a com
u m c a r i n h o p r o t e t o r. U m p o u c o e n v e r g o n h a d a p e l a c e n a
í n t i m a e p ú b l i c a , e l a o l h a a o r e d o r.
— Não precisa se afastar — digo, meu tom de voz
suave e insistente. — Fique aqui, com a gente.
Ela hesita por um momento, mas meu olhar e a
segurança em meus braços parecem convencê-la. Marina
se acomoda novamente, permitindo que eu a mantenha
perto de mim. Seu corpo relaxa contra o meu, e eu posso
sentir sua respiração tranquila enquanto a mantenho nos
meus braços.
— Meu coração parece que vai sair pela boca —
confesso, enquanto olho para Heitor no meu colo e a
envolvo com o outro braço. — Eu amo você, Marina. Sou
grato por você me deixar ter essa família.
— Não precisa agradecer — ela me sorri, e tira uma
mecha do rosto. — Eu que tenho que agradecer — seus
d e d o s m e t o c a m a b a r b a . — Vo c ê m e d e u o q u e e u m a i s
q u e r i a , D i o g o . M e a c e i t o u , a c e i t o u o H e i t o r.
— Meu filho. — afirmo e ela confirma. Seus lábios
me beijam delicadamente. — Eu nunca pensei em ser pai,
mas depois que te conheci — murmuro e ela arqueia a
sobrancelha. — Poderíamos pensar em mais um filho?
Tr ê s n o t o t a l .
Marina ri, mas vejo que analisa a proposta.
— Podemos conversar sobre — sua resposta me faz
sorrir abertamente. — Aproveitando que estamos
s o z i n h o s a q u i . — e l a o l h a a o r e d o r, o s o m a m b i e n t e
m a n t é m n o s s a c o n v e r s a b e m p a r t i c u l a r. — S o b r e a n o s s a
lua-de-mel...
— Estavam se escondendo? — olhamos para frente,
só para ver Igor sem o paletó e ao seu lado dona
H e r b e r t i n a . E l a r i s e g u r a n d o - o p e l o b r a ç o . — Ti a e s t a v a
atrás do C.Jota.
— Quero ver se ele está com fome ou precisando
trocar a fralda.
Concordo e permito que ela o pegue. Igor ao ver
minha taça, a pega e termina de beber meu champanhe.
Em seguida levanta o polegar e sai. Me volto para Marina
que sorri, mas seu olhar rápido me encontra. A puxo pela
cintura para mais perto, e esfrego meu nariz no dela.
Te n t o m e c o m p o r t a r, p o r q u e s e i o n d e e s t a m o s , m a s é
quase impossível. Sinto sua mão subir até os cabelos da
minha nuca e puxá-los.
— Sobre a nossa lua-de-mel...? — incentivo, e ela
sorri, um brilho brincalhão em seus olhos. — O que iria
dizer?
— Se lembra que conversamos sobre nossa lua-de-
mel ser em casa? — indaga e eu concordo. Esperaríamos
Heitor ficar maiorzinho para podermos viajar juntos. — A
dona Herbertina vai passar essa noite aqui, para nos dar
privacidade...
— E s t o u c u r i o s o p a r a s a b e r o n d e i s s o v a i d a r.
Ela não diz nada, seu olhar varre mais uma vez ao
r e d o r. E n t ã o c o m o s e f o s s e u m s e g r e d o , e l a s u s s u r r a r e n t e
a minha orelha.
— E u q u e r i a q u e v o c ê e s t i v e s s e f a rd a d o e m e
algemasse. Estou imaginando isso desde que vi aquelas
suas algemas.
Um sorriso lento e cheio de malícia se forma nos
meus lábios enquanto sinto o arrepio de sua respiração
quente contra minha orelha. A ideia de Marina tão ousada
e com desejos tão claros me surpreende, e ao mesmo
tempo desperta algo primal dentro de mim. Minha mão se
aperta levemente em sua cintura, segurando-a mais perto.
— Ah, é? — murmuro, minha voz rouca, carregada
de provocação. — Então, a senhora Arslan está pedindo
para ser presa?
Ela dá uma risadinha nervosa, suas bochechas
corando levemente, mas seus olhos continuam fixos nos
meus, desafiando e brincando ao mesmo tempo. Marina
não recua, e isso só f a z m e u d e s e j o c r e s c e r.
— Ta l v e z e u e s t e j a . . . — e l a r e s p o n d e , m o r d e n d o o
l á b i o i n f e r i o r d e u m j e i t o q u e m e d e i x a l o u c o . — Vo c ê
sabe, Diogo, às vezes sou uma mulher bem má.
Desobedeço às regras...
Eu rio, um som baixo e gutural que escapa da minha
garganta.
— Quais?
Marina ri.
— Ontem mesmo deixei você esperando na cama
enquanto eu tomava banho, só para te provocar — ela
murmura com um sorriso travesso, os olhos brilhando
com aquela mistura de inocência e malícia que só ela
s a b e f a z e r.
Sinto um arrepio percorrer minha espinha com o
toque da unha dela na minha nuca. Minha risada se
aprofunda, um som grave que reverbera no fundo da
minha garganta.
— Ah, então é isso? — sussurro, apertando sua
cintura com mais firmeza, trazendo-a ainda mais para o
meu colo. — E acha que vai escapar impune por esse
crime?
Ela se inclina, seu rosto tão perto do meu que posso
sentir o calor de sua respiração contra os meus lábios.
— Vo u r e c e b e r a v i s i t a d o a g e n t e F a r u k ? — d i z , s u a
voz baixa e provocante. — Estou contando com as
consequências.
Meu sorriso se alarga, meu olhar se intensifica.
— Nesse caso, vou garantir que você saiba
exatamente o que significa desobedecer às regras. Mas
vou avisando, o agente Faruk é pouco...
— Um pouco...?
— Bruto e exigente — falo e ela arfa, mas logo
sorri. — Será que você está preparada?
Ela ri, um som leve, quase uma provocação, e antes
que eu perceba, ela sela nossos lábios num beijo rápido e
atrevido. Então, ela desce do meu colo e me puxa com a
mão. A expectativa estampada em seus olhos, e há uma
determinação suave em seu sorriso, como se estivesse
conduzindo o momento exatamente como queria.
— Pois eu quero mais que tudo — afirma e
a p r o x i m a n o s s o s r o s t o s . — Va m o s n o s d e s p e d i r d a d o n a
Herbertina, e estou ansiosa para ser punida.
Marina me puxa, guiando-me pelo caminho para
dentro de casa, longe do burburinho da festa. E, naquele
instante, sei que nossa lua-de-mel vai ser tudo, menos
convencional.
C a p í t u l o 3 1 – M a r i n a

Nos despedimos de todos, mas quando chega a vez


de me despedir do meu bebê, meu coração aperta. Abraço
Heitor e beijo sua bochecha com um carinho demorado,
sentindo o calor suave da sua pele contra a minha. Dona
Herbertina se aproxima com um sorriso tranquilizador e
s u s s u r r a : " Vo u c u i d a r b e m d e l e , n ã o s e p r e o c u p e . " Te n t o
r e l a x a r, c o n f i a n d o e m s u a s p a l a v r a s , e n q u a n t o o l h o a o
redor e vejo Bernardinho, o neto dela, concentrado em
devorar um pedaço de bolo no sofá, com o rosto cheio de
migalhas.
Aceno para o menino, que me devolve o gesto com
uma alegria inocente, e então volto minha atenção para
Diogo, que está conversando com os pais. Seu olhar cruza
o meu por um breve momento, e um pequeno sorriso de
canto surge em seus lábios, como se apenas nós dois
compartilhássemos um segredo.
A expectativa do que está por vir faz meu coração
a c e l e r a r, e , p o r u m i n s t a n t e , t u d o a o n o s s o r e d o r p a r e c e
d e s a p a r e c e r.
Antes de irmos, Igor aparece e abraça Diogo.
Sorrio, e em seguida recebo um abraço.
— D i v i r t a m - s e ! Vo u f i c a r p o r a q u i .
Após um último aceno, saímos juntos. Corremos até
a caminhonete, e Diogo me ajuda a subir no carona.
Coloco rápido o cinto e espero com um sorriso meu
marido dar a volta para tomar o lugar do motorista.

Assim que chegamos em casa, já na garagem, Diogo


me pega nos braços e me leva para dentro. Sem conseguir
m e s e g u r a r, e u o p u x o p a r a u m b e i j o q u e n t e e
aprofundado. Nossos lábios se encontram com urgência, e
sinto o calor percorrer meu corpo enquanto Diogo me
aperta contra si, sua respiração se misturando com a
minha. Ele sorri em meio ao beijo, aquele sorriso que me
faz perder o fôlego, e eu rio suavemente, sentindo o
coração bater rápido demais.
— Não vai nem me deixar te levar até o quarto? —
ele murmura, a voz rouca e carregada de desejo.
— Acho que podemos começar por aqui mesmo… —
sussurro de volta, minha mão enlaçando seu pescoço
enquanto sinto o peso do seu corpo contra o meu.
Diogo caminha pelo corredor sem interromper o
beijo, suas mãos firmes me segurando como se eu fosse a
coisa mais preciosa do mundo. Ele me leva até a sala,
onde nos viramos e ele encosta meu corpo contra a
parede. Sinto o frio do contato da parede e o calor dele,
criando um contraste que só me deixa ainda mais ansiosa.
Seus dedos se movem de maneira habilidosa,
explorando cada curva do meu corpo, e eu suspiro,
perdida na sensação.
Diogo sorri com aquele olhar faminto e aproxima os
lábios do meu pescoço, beijando com firmeza, a barba
roçando suavemente minha pele e provocando arrepios
por todo o meu corpo. Minha cabeça pende para trás, e
fecho os olhos, saboreando o calor que irradia de onde
seus lábios tocam. Suas mãos deslizam pelas minhas
costas, encontrando o zíper do meu vestido e, com um
movimento lento, o puxam para baixo, revelando minha
pele aos poucos.
— Hoje não vou te deixar dormir — ele sussurra
entre beijos. — Eu vou fazer cada segundo dessa noite
valer a pena.
Meu vestido cai aos meus pés, e sinto o ar frio da
casa contra a minha pele, me fazendo tremer levemente,
mas logo o calor de Diogo me envolve novamente. Suas
mãos exploram com cuidado e desejo, traçando o
contorno dos meus seios. Cada toque dele é como um
despertar para os sentidos, uma lembrança do quanto sou
dele e do quanto ele é meu.
— Diogo… — murmuro, puxando-o mais para perto,
sentindo meu corpo se moldar ao dele, sentindo o desejo
nos envolver como um abraço apertado. Seus olhos estão
fixos nos meus, intensos e ardentes.
Ele me ergue de novo nos braços, com facilidade, e
sem aviso, nos leva para o quarto. Entramos rapidamente,
e ele fecha a porta com o pé, me colocando devagar na
cama. Aquele sorriso malicioso ainda em seus lábios, ele
tira a camisa, revelando os músculos definidos, seu corpo
forte, e a cada movimento me sinto mais hipnotizada.
— Agora é a minha vez de explorar — sussurra ele,
inclinando-se sobre mim, seu olhar percorrendo cada
parte do meu corpo.
S i n t o s e u t o q u e m e i n c e n d i a r, a s m ã o s f i r m e s e a o
mesmo tempo gentis deslizando por cada centímetro da
minha pele. Cada beijo dele me faz sentir mais viva, mais
entregue a este momento que é só nosso, onde o mundo lá
fora desaparece e só restamos nós dois, juntos.
— Espera! — o empurro e ele me olha confuso. —
Eu comprei uma lingerie nova. Um conjunto.
As mãos apoiam ao lado da minha cabeça, seus
braços musculosos me chamam a atenção.
— E u q u e r o v e r.
— Va m o s f a z e r a s s i m — m u r m u r o e m e s e n t o n o
colchão. — Eu vou até o outro quarto, tomo um banho e
c o l o c o m i n h a l i n g e r i e . Ta l v e z o a g e n t e F a r u k p o s s a
a p a r e c e r. . . ?
— Me quer de farda e algema?
— E com aquela máscara — peço fazendo-o sorrir
malicioso.
Diogo se inclina mais perto, seus olhos brilhando
de expectativa e desejo.
— S e é i s s o q u e v o c ê q u e r, e n t ã o é i s s o q u e v o c ê
v a i t e r, s e n h o r a A r s l a n — e l e m u r m u r a , s u a v o z r o u c a e
cheia de promessas.
M e a f a s t o d e v a g a r, s e n t i n d o m e u c o r a ç ã o a c e l e r a r
enquanto me dirijo ao outro quarto. Fecho a porta atrás
de mim e solto uma risada nervosa e empolgada.
Rapidamente entro no banheiro e fecho a porta atrás de
mim, respirando fundo enquanto o calor do momento
ainda pulsa em minha pele. Após alguns minutos, desligo
o chuveiro e começo a me secar com uma toalha macia.
Vo u a t é a b o l s a o n d e g u a r d e i o c o n j u n t o d e l i n g e r i e
que comprei especialmente para essa noite. É de renda
p r e t a , c o m d e t a l h e s d e l i c a d o s , s e x y s e m s e r v u l g a r, e
p e r f e i t o p a r a o q u e e u t e n h o e m m e n t e . Vi s t o - m e
rapidamente e me olho no espelho. A peça encaixa
perfeitamente, destacando minhas curvas de um jeito que
s e i q u e D i o g o v a i a d o r a r.
Sorrio para o meu reflexo, uma mistura de
ansiedade e excitação me invadindo. Pego um robe de
seda e o amarro frouxamente ao redor da cintura. Antes
de sair do quarto, passo os dedos pelo meu cabelo,
tentando ajeitar as ondulações, e dou uma última olhada
p a r a g a r a n t i r q u e t u d o e s t á n o l u g a r.
Entro no, agora nosso quarto, e estranho por não o
v e r. A p o r t a d o b a n h e i r o e s t á t r a n c a d a , o q u e d á a
entender que ele está lá. Me sento na cama, em posição
de índio e apoio minhas mãos no colchão. Demora um
pouco, e quando penso em chamá-lo, ele aparece na porta
do quarto.
O coração dispara ao vê-lo. Diogo está ali,
imponente em sua farda de agente da Polícia Federal, que
parece ter sido feita sob medida para ele. A camisa de
tecido grosso e escuro molda seus ombros largos e seus
braços musculosos, deixando evidente o trabalho árduo
de seus treinos.
O tecido esticado contra o peito, movendo-se com
cada respiração profunda, revela a força que se esconde
por baixo. O distintivo brilha preso no colete que ele
usa, adicionando um ar de autoridade que só aumenta a
t e n s ã o n o a r.
Ele usa a calça da farda perfeitamente ajustada, que
abraça suas pernas longas e fortes, acentuando sua altura
de 1,90 de pura presença. As botas pesadas completam o
visual, batendo no chão com um peso que faz meu
coração tremer um pouco mais forte.
A máscara de pano cobre parcialmente seu rosto,
deixando apenas seus olhos intensos, de um azul
profundo, brilhando com uma mistura de desejo e
divertimento. Há algo de provocante naquele sorriso
malicioso, quase escondido pela máscara, que me faz
perder o fôlego por um segundo.
Seu olhar percorre meu corpo lentamente, com uma
intensidade que me faz sentir como se estivesse
completamente despida diante dele, mesmo envolta na
minha lingerie nova. Ele cruza os braços, fazendo os
músculos se destacarem ainda mais sob a farda, como se
e s t i v e s s e d e l i b e r a d a m e n t e t e n t a n d o m e p r o v o c a r.
É um jogo de sedução que ele domina com maestria,
e não consigo evitar o sorriso que surge nos meus lábios.
Diogo dá um passo à frente, e meu coração parece
pular para a garganta. Há uma confiança no jeito como
ele se move, como se estivesse acostumado a ter o
controle da situação.
— Senhora — ele murmura, a voz grave
reverberando no ambiente, enquanto se aproxima. — Sou
o agente Faruk, do Comando das Operações Táticas... —
seu olhar encontra o meu, quase felino. — Soube que
anda tendo uns problemas em respeitar regras?
Fico de joelhos no colchão e sorrio trêmula.
— Ta l v e z e u t e n h a d e s o b e d e c i d o u m a o u d u a s
ordens, agente... — respondo, com um tom provocante,
enquanto meu olhar percorre seu corpo. Sinto o calor
subir pelo meu rosto, uma mistura de excitação e
expectativa.
Ele se aproxima mais, cada passo faz meu coração
bater mais rápido, a camisa justa ao torso forte, os
músculos se movendo sob o tecido. Para na beira da
cama, abaixando-se um pouco para ficar à minha altura.
Minha respiração acelera, e uma onda de
eletricidade percorre meu corpo. Sinto o peso do seu
olhar sobre mim, como se ele pudesse ler todos os meus
pensamentos, cada um dos meus desejos.
— Eu diria que... — começo, tentando manter a voz
firme, mas falhando ao final da frase. — Eu mereço uma
punição severa, agente.
Percebo que ele sorri, aquele sorriso torto que eu
conheço bem, mas que, dessa vez, tem um toque de
perigo. Com um movimento rápido, ele alcança as
algemas no cinto e as segura entre nós, o metal frio
refletindo a luz suave do quarto.
— Va m o s c o m e ç a r, m a s p r i m e i r o t i r e o r o b e —
manda, e lentamente eu retiro revelando minha lingerie
nova. Diogo percorre com o olhar feito uma carícia. —
Agora vira de costa, e sem reclamar — ele diz. Sinto
minha intimidade reclamar em ansiedade para senti-lo.
Faço o que ele exige, então sinto suas mãos agarrarem as
minhas, prendendo meus pulsos juntos com um clique
a u d í v e l . — E v a m o s v e r s e a p r e n d e a o b e d e c e r.
Meus pulsos agora presos, e um calor indescritível
se espalha por mim. A expectativa faz meu coração bater
mais rápido enquanto ele inclina a cabeça, os lábios a
milímetros da minha orelha, a promessa de algo
e l e t r i z a n t e n o a r.
— Vo u g a r a n t i r q u e v o c ê n u n c a m a i s s e e s q u e ç a d a s
regras, Marina — ele sussurra, antes de tirar a máscara e
capturar meu pescoço com fome. Em seguida, ele me vira
e me toma os lábios com os dele em um beijo intenso,
profundo, que me faz esquecer de tudo, menos de como é
bom estar ali, nas mãos dele, completamente entregue.
O beijo se aprofunda, e eu me perco cada vez mais
na intensidade do momento. As algemas apertam meus
pulsos, o metal frio contrastando com o calor dos nossos
corpos. De repente, sinto a mão firme de Diogo deslizar
para a minha nuca, seus dedos entrelaçando-se nos meus
cabelos com uma mistura de força e cuidado que me faz
a r f a r.
— Diogo...
— Faruk! — ele exclama a voz grave e carregada
de desejo, enquanto seus lábios traçam um caminho lento
e i n c a n d e s c e n t e p e l o m e u p e s c o ç o . — Vo c ê v a i f a z e r
e x a t a m e n t e o q u e e u m a n d a r.
— Sim... — respiro, quase sem fôlego. — Sim,
s e n h o r.
Ele puxa meus cabelos com mais firmeza,
inclinando minha cabeça para trás, e o movimento, apesar
da dor sutil, só aumenta a eletricidade entre nós. Seus
olhos encontram os meus, um brilho de pura devoção e
posse queimando neles, sinto meu corpo inteiro vibrar em
resposta.
— Ótima resposta — diz ele, uma risada baixa e
provocante escapando de seus lábios. Seus dedos
permanecem firmes em meus cabelos, como se não
q u i s e s s e m e d e i x a r i r, c o m o s e q u i s e s s e m e m a n t e r
exatamente onde estou.
Completamente entregue a ele.
Com um movimento controlado e deliberado, ele
começa a soltar o cinto com uma precisão quase cruel,
cada centímetro de couro deslizando por seus dedos. Há
u m a s e n s a ç ã o d e e x p e c t a t i v a n o a r, a l g o p r o n t o p a r a
explodir a qualquer segundo.
Ele se inclina mais uma vez, aproximando seus
lábios cobertos dos meus, tão perto que posso sentir sua
respiração quente tocando a minha pele.
— A primeira lição é essa — fala, sua voz baixa e
i n t e n s a , u m a p r o m e s s a d e t u d o q u e a i n d a e s t á p o r v i r. —
Q u e r o q u e m o s t r e o q u a n t o e s t á d i s p o s t a a o b e d e c e r.
E u s ó c o n s i g o a c e n a r, s e m p a l a v r a s , s e n t i n d o m e u
c o r p o i n t e i r o i m p l o r a r p o r e l e . P r o n t a p a r a o q u e v i e r,
desde que seja com ele, com essa conexão selvagem e
indomada que temos. Diogo abre um pouco as pernas e
me faz ajoelhar em sua frente. A mão ainda está em meus
cabelos, enquanto a outra desce a calça junto da cueca.
Com água na boca, sinto o pau bater em meu rosto e
com a respiração ofegante abro os lábios para envolve-lo
com a língua. Meu coração está disparado, sinto o frio
das algemas nos pulsos e a sensação de estar
completamente submissa a Diogo.
Ele está de pé, imponente e intenso, sua presença
dominadora preenchendo o espaço. O olhar dele é feroz e
cheio de desejo, uma mistura de comando e promessas.
Sua mão ainda agarra meus cabelos com força.
Com as algemas apertadas, a sensação de submissão
é avassaladora e excitante. Beijo a glande suavemente,
sentindo o gosto intenso de Diogo em minha língua.
Lentamente, começo a chupá-lo, cada movimento é cheio
de propósito e desejo. O pré-gozo que recolho com a
l í n g u a é c o m o u m n é c t a r, e e u m e p e r c o n a d e l i c i o s a
combinação de prazer e controle.
Os gemidos dele se misturam com as batidas do meu
coração.
Olho para cima, só para ver os azuis fixados em
mim, e sua mão guiando-me com precisão. Com um puxão
de cabelo, eu me afasto mordiscando meu lábio.
— Estire a língua — manda e eu obedeço sem
p e s t a n e j a r. — I s s o . . .
Ele esfrega a glande em minha língua repetidas
vezes, para em seguida guiar a ereção para dentro da
minha boca. Consigo acolher alguns centímetros, e
quando a vontade de vomitar vem, ele se afasta. Saliva
escorre pelo canto dos meus lábios, meus olhos cheios de
lágrimas, mas estou empenhada a acolher mais dele.
Diogo avança novamente, fico alguns segundos com ele
entre os lábios, mas logo ele me solta.
Por livre e espontânea vontade, recomeço a chupá-
lo. Diogo sorri, puxando a máscara até a testa para
revelar um sorriso malicioso. Seus olhos brilham com
uma mistura de desejo e carinho enquanto ele observa
cada movimento meu. Com um gesto ágil, ele retira o
colete à prova de balas, jogando-o ao chão.
— Ve m c á — e l e m e p u x a e m d i r e ç ã o a c a m a e m e
f a z d e i t a r d e b r u ç o s . M e u s c a b e l o s c a e m a o m e u r e d o r, e
com um movimento, consigo deixá-los de lado. Olho com
um sorriso safado para ele. — Quero você de quatro e
bem aberta para mim.
Diogo me ajuda a subir na cama e ficar na posição.
Esfrego meu rosto no lençol e sem pudor algum, me
arreganho para ele. Mesmo com dificuldade, eu viro para
observá-lo e gemo manhosamente ao sentir um tapa no
traseiro. Diogo ri, um som rouco e baixo que ecoa pelo
quarto.
Seu olhar é feroz e faminto enquanto ele me
observa, suas mãos apertando minha cintura com firmeza,
prendendo-me em um aperto que é tanto possessivo
quanto desejoso.
— Que calcinha indecente — ele murmura,
enquanto sua mão desliza pela minha pele, criando uma
trilha de calor em cada toque. Sinto o peso da sua
respiração contra minha pele, e meu corpo responde
automaticamente, se arqueando mais, oferecendo-se a ele.
Ele me puxa um pouco mais, de forma que meus
joelhos quase perdem o contato com a cama, mantendo-
me apenas pela força de suas mãos firmes. Seu toque é
firme, porém cuidadoso, misturando a força e a ternura
de uma forma que só Diogo consegue. Quando ele desliza
os dedos pela borda da minha calcinha, o mundo inteiro
parece parar por um momento.
Meu coração acelera e um arrepio percorre minha
espinha. Sinto um calor subir pelo meu corpo, e tudo que
consigo fazer é e s p e r a r, ansiosa, pelo próximo
movimento dele.
Diogo se inclina, os lábios quase tocando minha
orelha, e sussurra:
— Está completamente molhada — afirma com sua
voz rouca, como resposta eu rebolo lentamente sob seu
toque. — Safada! — me acusa e em seguida me dá um
forte tapa.
Seu tom é de pura provocação, um misto de desejo e
c o n t r o l e q u e m e f a z a r r e p i a r. E l e d e s l i z a o s d e d o s p e l a
lateral da minha calcinha, puxando o tecido com cuidado,
provocando uma fricção deliciosa contra a minha pele.
Sinto sua respiração pesada enquanto ele explora meu
corpo, sem pressa, como se quisesse me torturar com a
antecipação.
— Indeciso? — pergunto com um sorriso, e o olho
enquanto remexo sensualmente para ele. — Ou não dá
conta?
Minhas palavras saem como um suspiro
entrecortado.
Sem que eu espere, sinto seu toque firme arrancar a
pequena peça de renda de mim, deixando-me
completamente exposta. Ele passa o dedo do meio entre
meus lábios pequenos, um toque firme que envia ondas de
calor pelo meu corpo, enquanto espalha meu desejo por
toda a minha intimidade. Sinto seus dedos escorregarem
suavemente, explorando, até que ele finalmente me
penetra com um dedo.
— Muito respondona para alguém que está
algemada.
Gemo assim que mais um dedo me penetra e ele
começa os movimentos severos. Me contorço sobre a
cama, sentindo o prazer se alastrar por todo o meu corpo.
A tensão no ar é palpável, cada segundo se arrasta como
se o tempo tivesse parado. Sinto que estou quase, só com
aquilo, mas talvez notando isso os movimentos param e
Diogo se afasta.
— P o r f a v o r. . . ! — i m p l o r o e s i n t o o s d e d o s b a t e r e m
em minha entrada.
Diogo ri, um som baixo e rouco que faz minha pele
a r r e p i a r. E l e s e g u r a m e u s q u a d r i s com firmeza,
mantendo-me no lugar enquanto seus dedos traçam
círculos preguiçosos contra minha pele quente,
provocando-me sem piedade.
— Quer mais, Marina? — ele pergunta, o sorriso
ainda brincando em seus lábios. — Diga o quanto você
q u e r. . .
Eu mordo o lábio, tentando controlar o tremor que
corre por todo o meu corpo. Sua voz, tão perto do meu
ouvido, me faz tremer de ansiedade e desejo.
— Quero... — minha voz sai num sussurro, quase
suplicante. — Quero tudo de você.
Sinto um toque mais firme, seus dedos finalmente
adentrando com intensidade, e um gemido escapa dos
meus lábios antes que eu possa contê-lo. Ele se inclina,
beijando a curva do meu pescoço, sua respiração quente
na minha pele, enquanto continua a me torturar com
movimentos lentos e ritmados.
— Boa menina... — ele murmura, os dedos
aumentando a pressão, deslizando mais fundo a cada
investida. — Agora, implore mais...
Seus dedos aprofundam-se, explorando cada canto
de mim, enquanto seu corpo pressiona o meu, e eu sinto o
peso dele, a presença dominante que me faz ceder
completamente.
— P o r f a v o r, a m o r. . . — g e m o , m i n h a v o z e m b a r g a d a
de necessidade. — Não pare... me dá mais...
Ele sorri contra minha pele, os lábios roçando meu
ombro. Seus dedos aceleram o ritmo, e a fricção
crescente faz meu corpo se curvar para ele, buscando
mais contato, mais dele.
— Assim que eu gosto — ele murmura, quase em um
r o s n a d o . — Vo c ê , t o t a l m e n t e m i n h a . . .
Seus dedos saem de mim, e antes que eu possa
p r o t e s t a r, s i n t o - o s e p o s i c i o n a n d o a t r á s d e m i m .
Mordisco o lábio, e meu corpo se arqueia
involuntariamente em expectativa. Ele se inclina mais
perto, sussurrando ao meu ouvido:
— Prepare-se para o que vem agora, senhora
Arslan... porque eu não vou ser gentil.
Então, ele avança, me invadindo de uma só vez,
arrancando um grito de prazer dos meus lábios. Seus
movimentos são intensos e impiedosos, e eu me entrego a
cada investida, cada momento, sabendo que estou
exatamente onde devo estar: com ele, na mais pura
rendição e entrega.
Diogo se move com uma intensidade bruta,
segurando minha cintura com firmeza enquanto aumenta o
r i t m o , c a d a e s t o c a d a m e l e v a n d o a o l i m i t e d o p r a z e r.
Meus gemidos ecoam pelo quarto, misturados ao som da
nossa respiração ofegante, enquanto meus dedos se
prendem desesperadamente entre eles. A cada momento
q u e t e n t o m e s o l t a r, a a l g e m a a p e r t a m a i s .
Ele me puxa mais para perto, quase me ergue do
colchão, como se quisesse me ter ainda mais próxima,
ainda mais dele. Sua mão livre desliza pela curva da
minha coluna até o pescoço, segurando-me com uma
mistura de força e desejo. Sinto o calor irradiar por todo
o meu corpo, como se cada célula estivesse queimando de
dentro para fora.
— Vo c ê é m i n h a . . . — e l e s u s s u r r a c o n t r a m i n h a
orelha, a voz rouca e possessiva. — Apenas minha.
A s p a l a v r a s d e l e m e f a z e m t r e m e r d e p r a z e r, e
minha cabeça cai para trás enquanto fecho os olhos,
completamente perdida na sensação, no momento. Diogo
acelera ainda mais, cada movimento se torna mais
urgente, mais primitivo, e o mundo ao nosso redor
desaparece, deixando apenas nós dois e essa conexão que
não pode ser quebrada.
Minha respiração falha, e eu sinto o clímax se
aproximando, crescendo dentro de mim como uma onda
p r o n t a p a r a q u e b r a r. D i o g o p e r c e b e e a p e r t a a i n d a m a i s
seus dedos em meu quadril, guiando meus movimentos ao
encontro dos seus, controlando o ritmo, prolongando a
a g o n i a d e l i c i o s a q u e f a z m i n h a p e l e a r r e p i a r.
Então, num último impulso profundo, sinto meu
corpo explodir em mil sensações. Eu grito o nome dele,
completamente perdida na onda de prazer que toma conta
de mim, enquanto ele segue me preenchendo, me
p o s s u i n d o , a t é f i n a l m e n t e s e d e r r a m a r, j u n t o c o m i g o , e m
um clímax compartilhado que parece não ter fim.
Ele permanece ali, ofegante, os lábios pressionados
contra minha pele suada, enquanto nossos corações batem
e m d e s c o m p a s s o . Tr ê m u l a e s u a d a e m c i m a d a c a m a , s i n t o
quando as mãos de Diogo seguram as minhas e logo a
algema é tirada. Estico meus braços na cama e sorrio.
Com uma preguiça gostosa, eu me viro no colchão, só
para ver Diogo se despir com pressa.
— Nada de dormir — ele fala e eu engulo em seco.
A ereção ainda está presente. — Ainda estou duro por
você.
Diogo se deita ao meu lado e eu sorrio enquanto o
monto com cuidado. Apoio minhas mãos em seu peito
enorme e suado. Sinto cada músculo dele se mover sob
minhas mãos, a firmeza do seu peito se ergue e desce em
um ritmo ofegante. Ele me observa com aquele olhar
p r e d a d o r, o s o r r i s o e n v i e s a d o q u e m e f a z s e n t i r u m a o n d a
de calor percorrer meu corpo inteiro.
Começo a me mover lentamente, sentindo-o mais
fundo, saboreando cada centímetro. A mão dele desliza
pela minha coxa até meu quadril, segurando-me no lugar
enquanto me guia para aumentar o ritmo. O prazer pulsa
em cada nervo do meu corpo, e meus gemidos se
intensificam conforme ele me leva mais fundo.
A sensação de poder e vulnerabilidade se mistura,
me fazendo querer mais, desejando tudo o que ele pode
m e d a r. M i n h a s u n h a s c r a v a m e m s u a p e l e e n q u a n t o m e
inclino para frente, meu cabelo cai ao redor do nosso
rosto, criando um mundo só nosso.
— Que delícia é ter você me cavalgando com força
— ele murmura, a voz baixa e rouca de desejo, enquanto
suas mãos se movem pelas minhas costas, segurando-me
firme.
— Safado! — respondo ofegante, inclinando-me
para beijá-lo, devorando seus lábios com fome. — Eu
a m o o j e i t o c o m o v o c ê m e f a z s e n t i r.
Ele sorri contra minha boca, puxando-me para mais
perto, e acelera o ritmo de nossas investidas, levando-me
ao limite novamente, enquanto a conexão entre nós se
intensifica. Eu me perco na sensação, na intensidade, na
paixão pura que emana de nós dois, sentindo que não há
lugar melhor para estar do que aqui, agora, com ele.
Nossos movimentos se tornam mais urgentes, o
ritmo aumenta enquanto o calor em nossos corpos cresce,
a t e n s ã o s e a c u m u l a n d o c o m o u m a o n d a p r e s t e s a r o m p e r.
Diogo me segura com mais força, os dedos apertando
minha pele, guiando-me a cada investida com precisão e
intensidade.
S i n t o m e u c o r p o t r e m e r, o s m ú s c u l o s s e c o n t r a i n d o
com o prazer que se aproxima. Meus gemidos ficam mais
altos, e eu me perco na mistura de sensações que ele
provoca. Cada toque, cada beijo, cada sussurro de
incentivo só me leva mais perto do clímax.
— Diogo... — suspiro, quase como um grito
sufocado, enquanto ele me puxa para mais perto, colando
nossos corpos ainda mais juntos.
— Ve m c o m i g o , M a r i n a … — e l e m u r m u r a c o n t r a
meus lábios, a voz grave e carregada de desejo.
Num último movimento, nossos corpos se
encontram em perfeita sintonia. Sinto a explosão de
prazer começar no meu ventre e se espalhar por cada
parte do meu corpo. Meu clímax chega como uma onda,
forte e incontrolável, e eu grito o nome dele, perdida na
euforia do momento.
Ele se junta a mim no ápice, o rosto contorcido em
p r a z e r, e e u s i n t o o c a l o r d e l e s e d e r r a m a r d e n t r o d e m i m .
Suas mãos apertam meus quadris com força, e ele geme
meu nome como se fosse uma oração. Por um momento, o
mundo para, e só existe a sensação crua e pura de
estarmos juntos, no ápice, conectados de um jeito que vai
além do físico.
Quando finalmente descemos do nosso êxtase, eu
desabo em seu peito, ofegante, meu coração ainda
martelando contra o dele. Ele me abraça, beijando minha
testa suavemente, e eu sinto o amor e a segurança
naquele toque.
— E u . . . p r e c i s o d e s c a n s a r. . . — s o l t o c o m u m a
respiração sôfrega.
Diogo ri, e me abraça apertado.
— Tu d o b e m — s u s s u r r a c a r i n h o s o . — P o d e m o s
d e s c a n s a r, n ã o v o u s e r t ã o m a l a s s i m .
Com um último resquício de força, eu apoio as
mãos em seu peito novamente e sorrio. Completamente
t o m a d a d e a m o r.
— Eu te amo, Diogo — minha voz sai baixinha, mas
ele escuta.
S e u o l h a r é c h e i o d e a m o r, e s e i q u e e l e e s t á
sentindo exatamente o mesmo sentimento.
— Eu também te amo — responde, a voz suave
agora, enquanto afaga meu cabelo.
Ainda sorrindo, me aninho contra ele. Nenhuma
palavra é dita, mas no silêncio, há a certeza de que
estamos onde devemos estar — juntos, agora e sempre.
E p í l o g o – D i o g o

Acordo com a luz suave do amanhecer entrando


pelas cortinas do quarto, o calor do corpo de Marina
ainda colado ao meu lado. Ela está de costas para mim, o
cabelo solto espalhado pelo travesseiro, e eu sorrio,
admirando o jeito que o sol toca sua pele. Há quatro
anos, eu jamais imaginaria que minha vida se tornaria
isso – completa.
Vi r o a c a b e ç a p a r a o t e t o e s o l t o u m s u s p i r o ,
d e i x a n d o o a r e s c a p a r d e v a g a r. M e s i n t o r e a l i z a d o ,
completo de uma forma que, se alguém tivesse me
contado antes, eu jamais acreditaria. É uma felicidade
simples e profunda, construída aos poucos, com
momentos com minha família. Escuto um gemido baixo
vir do meu lado, e interessado olho para Marina.
Lentamente ela se empina toda, ainda dormindo, e
sobe a perna direita.
Inevitavelmente, meu olhar vai para a calcinha que
ela está usando. Uma peça pequena e bem sensual que
destaca ainda mais sua beleza. Sem m e c o n t e r, m e v i r o
em sua direção e a abraço, sentindo a textura suave da
sua pele contra a minha. O calor de seu corpo e o
perfume suave que ela exala são quase intoxicantes.
— Bom dia, meu amor — murmuro, minha voz
rouca de sono, enquanto inclino minha cabeça para dar
um beijo suave em seu pescoço. Cada pequeno detalhe
dela, desde a calcinha até o sorriso que começa a formar
em seus lábios, faz meu coração bater mais rápido.
— Já precisamos levantar? — ela indaga com a voz
manhosa, o que me arranca mais um sorriso.
— Aposto que daqui a cinco minutos — digo,
sentindo Marina se esfregar em mim. — O Heitor vai nos
c h a m a r. . .
— Mamãe! — a voz dele soa atrás da porta, e
Marina se vira para mim, sorrindo.
— Vo c ê s e m p r e a c e r t a — d i z e l a , c o m u m t o m s u a v e
e afetuoso. Em seguida, se senta na cama, seus cabelos
caindo em ondas soltas sobre seus ombros. — Pode
e n t r a r, m e u a m o r.
A p o r t a s e a b r e l e n t a m e n t e , r e v e l a n d o H e i t o r, c o m
seus olhos brilhantes, um pijama de carros e um sorriso
que ilumina o quarto. Ele corre até a cama, e o ritmo da
manhã já está em movimento. Olho para Marina, que
parece ainda mais radiante à medida que nosso dia
começa, e sinto um profundo senso de gratidão e amor
por tudo o que construímos juntos.
Heitor sobe na cama, pulando ao lado de Marina
com uma energia contagiante. Ele se agarra a ela,
enquanto seu olhar curioso e animado se volta para mim.
— Papai! — ele exclama, os olhos brilhando de
expectativa. — Eu acordei primeiro, a Lily também, mas
eu sei sair da cama.
Marina o abraça e o beija na bochecha.
— Vo c ê a c o r d o u s u a i r m ã ? — p e r g u n t a e e l e n e g a
com o olhar assustado. — Bom menino, não pode mesmo
acordar a sua irmãzinha.
— Mamãe! — Heitor fica de pé começando a pular
na cama. — Eu quero ficar com a vovó, e comer bolo, e
c o r r e r, e b r i n c a r c o m o p a p a i .
Sorrio, Marina me encara.
— Já planejou o dia, então — comento para ele, que
concorda.
H e i t o r, c o m s e u s c a b e l o s p r e t o s e l i s o s c o m o o s d e
Marina, e aqueles olhos verdes claros que sempre me
surpreendem, é uma versão em miniatura dela, mas com
uma energia que parece não ter fim. Ele para de pular por
um instante e se vira para mim com um sorriso largo no
rosto.
— Papai, a gente vai correr no quintal, né? — ele
pergunta, cheio de expectativa.
— Claro, campeão, vamos correr sim — respondo,
tentando não rir ao ver sua empolgação.
Marina cruza os braços e me lança um olhar
cúmplice, um sorriso suave nos lábios. Ela sabe que, uma
vez que Heitor decide algo, é difícil desviá-lo do plano.
— Acho que nosso dia vai ser bem agitado — ela
c o m e n t a , o l h a n d o p a r a m i m d e l a d o . — Vo u t o m a r b a n h o ,
vai dar uma olhada na Lily? — pede, e eu aceno. —
O b r i g a d a , a m o r.
Recebo um rápido beijo nos lábios, e ela logo sai
da cama indo para o banheiro.
Me volto para Heitor que me olha sorridente, sorrio
e em um movimento rápido o pego nos braços de cabeça
para baixo. Saio da cama, enquanto ele ri adorando a
f a r r a . A s s i m q u e c h e g o n o c o r r e d o r, o c o l o c o n o c h ã o e
levo os dedos aos lábios em um pedido de silêncio. Ele
concorda e anda a passos silenciosos até o quarto da
irmã.
Ando pelo corredor da nossa nova casa, Heitor para
ao lado da porta.
Abro a porta e olho para dentro do quarto rosa.
Sentada dentro do berço, vestida com um pijama de
florezinhas, está a minha princesinha de 1 ano. Ao me
v e r, e l a s e l e v a n t a n o b e r ç o , a g a r r a n d o a s g r a d e s c o m
suas pequenas mãos. Seus olhos verdes brilham ao me
r e c o n h e c e r, e e l a a b r e u m s o r r i s o l a r g o , m o s t r a n d o s e u s
dentinhos ainda pequenos.
— Pápá! — ela chama, com sua voz doce e
a n i m a d a . S o r r i o , s e n t i n d o m e u p e i t o a q u e c e r, e m e
aproximo enquanto ela gesticula “vem” com a mãozinha
pequena, impaciente para sair dali.
— Bom dia, princesa — murmuro, pegando-a no
colo e sentindo aquele calor familiar que só os filhos
c o n s e g u e m p r o p o r c i o n a r. E l a e n v o l v e o s b r a c i n h o s e m
volta do meu pescoço, e sinto o cheirinho doce dos seus
cabelos.
Aliso os fios loiros e baixo o olhar procurando
H e i t o r. O e n c o n t r o m e x e n d o n a c o r d i n h a d a p e r s i a n a ,
estralo os dedos chamando sua atenção e ele me encara.
— Va m o s c o m e r ?
— Eu quero c o r r e r, papai — avisa me
acompanhando para fora. — Lily! — assim que ele a
c h a m a , t e m s u a a t e n ç ã o . — Vo c ê q u e r c o r r e r t a m b é m ?
Ainda agarrada ao meu pescoço, Alina concorda.
S o r r i o p a r a o s d o i s e e s t e n d o a m ã o p a r a H e i t o r p e g a r. A
forma como eles se entendem, brincam e interagem é um
testemunho do laço especial que têm. Eles vivem juntos,
brincam juntos e sempre estão um ao lado do outro.
Ve r e s s e c a r i n h o e n t r e o s i r m ã o s m e e n c h e d e
orgulho e felicidade.
Heitor se senta em sua cadeira, batendo os pés
ansioso, enquanto eu coloco minha princesa na cadeira de
refeição que Igor lhe deu de presente. Ela se ajeita,
segurando os brinquedos pendurados com as mãos
pequenas.
Vo u a t é a g e l a d e i r a e b u s c o a c a i x a d e l e i t e . A o
a b r i r, o a r o m a f r e s c o e d o c e p r e e n c h e o a m b i e n t e , e m e
volto para servir uma quantidade generosa para os dois.
Enquanto despejo o leite em seus copos, escuto Heitor
f a l a n d o s o b r e q u e r e r v i s i t a r a v o v ó Ti n a e s e u a m i g o
Bernardinho.
Esse já está entrando na fase adolescente, mas não
se importa de conversar e ser como um irmão mais velho
p a r a H e i t o r.
Olho para o corredor e vejo Marina se aproximando,
agora com um semblante fresco e revitalizado, depois de
um banho. Seu cabelo está ainda úmido e cai em ondas
suaves sobre seus ombros. Ela usa um vestido leve e
confortável, que destaca sua beleza natural.
Quando nossos olhares se encontram, um sorriso
genuíno se forma em seu rosto.
— Bom dia, de novo — falo para Marina enquanto
se aproxima e beija a testa de Alina, que imediatamente
começa a reclamar e esticar os bracinhos em busca do
colo da mãe.
— P o d e i r s e a r r u m a r, D r. D e l e g a d o — e l a f a l a
claramente orgulhosa.
Sorrio ao ouvir a forma como ela me chama, um
título que carrego com muito orgulho desde que passei no
concurso de delegado do departamento há quatro anos.
Levanto-me da mesa e vou até o banheiro, onde
rapidamente me preparo para o dia. No quarto, termino de
m e a r r u m a r, quando escuto ao fundo Heitor gritar
eufórico.
Ajusto o coldre da cintura, meu terno, e coloco meu
distintivo, agora de delegado.
Saio do quarto e para minha zero surpresa, vejo
Igor sentado à mesa. Dona Herbertina está com ele.
— Bom dia, amigo — ele abre os braços ainda
s e n t a d o . — Vi m t r a z e r a Ti a H B T, e l a m e p e d i u p a r a
trazê-la em segurança.
— Vo c ê q u e q u e r i a v i r c o m e r, I g o r — n e g a c o m a
cabeça. — Chegou cedo na minha casa e como não tinha o
que você queria, me trouxe como desculpa.
Igor leva a mão ao peito, forçando a surpresa, mas
assim que Marina coloca a xícara de café em sua frente,
ele sorri.
— Se eu não soubesse que a senhora me ama — Igor
fala, com aquele tom provocativo que lhe é típico,
enquanto seus olhos buscam os dela. — Diria que isso foi
uma reclamação. — Ele levanta a xícara e dá um gole,
deixando o silêncio preencher o espaço por um instante.
E m s e g u i d a , o l h a p a r a H e i t o r, q u e e s t á c o n c e n t r a d o n o
que Marina está fazendo. — E aí, C.Jota, o que aconteceu
de bom por aqui?
Heitor levanta os olhos, pensando por um segundo
antes de responder:
— Eu acordei.
Igor dá uma risada abafada, inclinando a cabeça de
leve.
— Mesmo? — Sua voz é risonha, mas seus lábios
mal se curvam. — Se você não me fala isso, juro que não
saberia.
O pequeno ergue as sobrancelhas, como se estivesse
dando uma informação de extrema importância.
— A Lily também acordou — ele comenta, todo
sério. — Ela anda, sabia?
Igor finge surpresa, abrindo os olhos de propósito.
— Ela está aprendendo a dar uns passos —
acrescento, meu tom suave, olhando com ternura para a
L i l y, q u e e s t á s e n d o p a p a r i c a d a p o r d o n a H e r b e r t i n a . —
Logo, logo vai estar correndo pela casa.
Igor balança a cabeça, observando Lily por um
momento.
— É verdade, meu amigo. Logo logo ela cresce e
v a i t r a z e r o n a m o r a d o p a r a v o c ê c o n h e c e r. E u j á d e i x o
claro que vou odiar todos na sua frente, mas vou ficar do
lado da minha afilhada. — diz, e eu o encaro soltando um
suspiro. Por que ele é assim? — Esse é o meu papel nessa
família.
Heitor faz uma careta engraçada, pensativo.
— E eu tio?
— Espero que você seja bem namorador — assim
que ele fala, Marina dá um tapa no ombro dele. —
Quando você terminar a faculdade, e a sua irmã também.
Solto um suspiro e vou até Marina, a abraço pela
cintura e a beijo na curva do pescoço. Mesmo com a
plateia, viro minha esposa nos meus braços e a beijo nos
lábios. Ao fundo escuto Igor soltar alguma piada, dona
Herbertina brigar com ele e Heitor perguntar alguma
coisa Marina.
Me afasto dela que sorri de um jeito genuíno, e
busco uma xícara de café para assim poder começar o dia.
Meu olhar vai para à mesa e eu sorrio com um
sentimento de paz. Essa é a vida que sempre sonhei —
simples, cheia de amor e momentos que valem mais do
que qualquer outra coisa.
A g r a d e c i m e n t o s

Chegar ao fim desta história é, para mim, mais do


que concluir um livro: é realizar um sonho que carrego
há muito tempo. Quero agradecer de coração a todos que
fizeram parte dessa jornada.
Aos meus leitores, que mergulharam nesta trama e
dedicaram seu tempo e emoção às minhas palavras. Aos
novos leitores que deram uma chance a essa história.
Cada um de vocês é parte disso.
Obrigada as minhas amigas e a minha assessora
Va n e s s a , q u e e s t á m e a u x i l i a n d o b a s t a n t e n e s s a m i n h a
etapa de carreira.
Este livro é para todos que acreditam em recomeços
e na força de um amor que ultrapassa qualquer obstáculo.
Obrigada a todos que caminharam comigo até aqui.
S o b r e a a u t o r a

T h a t y a n n e Te n ó r i o , nascida em 1997, mora


atualmente no nordeste do Brasil com suas duas gatas. A
escritora é formada no curso técnico em enfermagem, já
trabalhou como designer gráfico na produção de capas
para algumas editoras e colegas de profissão de forma
independente.
No entanto, hoje trabalha escrevendo romances
intensos com histórias únicas e envolventes. O amor por
leitura aconteceu em 2012-2013 quando conheceu pela
primeira vez as fanfics que a deixou encantada com esse
novo mundo. Em seguida foi a vez de dar uma chance
para romances de autores best-sellers como Nicholas
Sparks, Agatha Christie e sua escritora preferida J.R.
Wa r d .
Apaixonada pelo K-POP e por toda a cultura
asiática, faz das próprias histórias os seus próprios
dramas.

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