Oliveira Custodia
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CADEIA DE CUSTÓDIA:
admissibilidade e valoração da prova pericial de DNA
Tese de Doutorado
Orientador: Professor Titular Dr. Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró
CADEIA DE CUSTÓDIA:
admissibilidade e valoração da prova pericial de DNA
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA:
Professor(a):
Instituição: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
Assinatura: ____________________________________________
Professor(a):
Instituição: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
Assinatura: ____________________________________________
Professor(a):
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Professor(a):
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Aos meus filhos, João e Helena.
Ao meu amor, Luiza.
Aos meus pais, irmãs e avó.
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus filhos, João e Helena, e à minha esposa, Luiza, pela
paciência que tiveram para aguentar, ao longo de meses, o meu mau humor, as minhas
ausências aos finais de semana e as constantes dúvidas acadêmicas que, inadequadamente,
compartilhava com eles à mesa de jantar. A falta que eu sentia da acolhedora companhia de
vocês sempre foi a minha principal motivação para fazer e acabar este trabalho. Durante todo
o caminho, vocês me fizeram companhia dentro do meu coração e me deram carinho sempre
quando estávamos juntos. Agora, de volta por inteiro aos amores da minha vida, terei a
felicidade de retribuir tudo o que fizeram por mim.
Também agradeço aos meus pais, Andrea e Marcelo, às minhas irmãs, Mariana
e Carolina, e à vovó Terezinha, por terem permanecido ao meu lado por toda a vida, sempre
me dando apoio para seguir estudando. O amor que sempre me dedicaram fez com que eu
chegasse até aqui.
No plano acadêmico, agradeço ao meu orientador, Professor Gustavo Henrique
Righi Ivahy Badaró, pela atenção, paciência e dedicação com que sempre recebeu e
esclareceu as minhas dúvidas. O seu profundo conhecimento e a enorme admiração que
nutro pelo senhor deixaram o árduo trabalho de produção da tese de doutorado mais
prazeroso.
Agradeço ainda à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo,
nomeadamente aos Professores Antonio Magalhães Gomes Filho, Maurício Zanoide de
Moraes, Maria Thereza Rocha de Assis Moura, José Raul Gavião de Almeida, Marcos
Alexandre Coelho Zilli, Marta Cristina Cury Saad Gimenes, André de Carvalho Ramos,
Heitor Vitor Mendonça Sica, Susana Henriques da Costa e Enrique Ricardo Lewandowski,
pelas aulas ministradas na pós-graduação, que contribuíram decisivamente para a minha
formação jurídica e desenvolvimento do pensamento crítico.
Aos amigos e companheiros de escritório, João Pedro Vidal, Julia Moraes e
Marcela Otero, agradeço pela disposição em auxiliarem na revisão do texto e também por,
na minha ausência, cuidarem com muito zelo e qualidade do trabalho diário da nossa
advocacia criminal.
Estendo os meus agradecimentos aos amigos Claudia Bernasconi, Renato
Marques Martins, Alberto Toron, Guilherme Paiva Corrêa da Silva, André Pinho Ribeiro,
Renato Villaça Di Dio, Cristina Alencar, Renato Stanziola Vieira, Danyelle Galvão e Felipe
Campana pelo necessário apoio, psicológico ou jurídico, que me dedicaram, cada um ao seu
tempo e modo, sempre quando solicitados.
Por fim, agradeço à Biblioteca do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais
(IBCCRIM), nas pessoas de Anderson Fernandes Campos, Natalí de Lima Santos e Simone
Camargo Pinheiro Meneguetti Nogueira, pela ajuda na busca por livros e artigos,
economizando-me muito do tempo necessário para a realização dessa tarefa.
RESUMO
The purpose of this document is to establish links in the chain of custody for DNA
identification expertise and the consequences arising from it being disregarded. To reach this
objective, the research touched on concepts related to overall expert evidence, its legal
approach and the specifics on the adversarial procedure for this method of proof. Next,
fundamental issues related to the chain of custody were explored, including its
conceptualization, assumptions, requirements, links, burden of records, limits and legal
framework. From this point forward, an analysis was performed on the consequences that
the breach of the chain of custody has on the admissibility of the evidence, determining the
criteria to be verified in each case in order to define whether the lack of the records that
authenticate the identity and the completeness of the element or source of evidence precludes
it from being admitted into the case or whether these deficiencies should be considered at
the time the judge assesses the evidence. Lastly, by addressing the key genetic and technical
issues related to DNA identification expertise, the concepts and conclusions previously
established concerning the chain of custody and the consequences of its breakdown were
applied to this evidentiary activity.
OLIVEIRA, Rafael Serra. Catena di custodia: ammissibilità e valutazione della perizia per
l'identificazione tramite DNA. 2020. 300 f. Tesi (Dottorato) – Facoltà di Diritto, Università
di São Paulo, São Paulo, 2020.
Il presente lavoro ha lo scopo di stabilire gli anelli della catena di custodia della perizia per
l'identificazione tramite DNA e le conseguenze derivanti dalla sua inosservanza. Al fine di
raggiungere questo obiettivo, nel corso della ricerca sono stati elaborati concetti relativi alla
prova peritale in generale, al suo trattamento legale e alle specificità del contraddittorio
mediante tale mezzo di prova. Successivamente, sono state sviluppate le questioni essenziali
relative alla catena di custodia, tra cui la sua concettualizzazione, i presupposti, i requisiti,
gli anelli, l’onere di registrazione, i limiti e il trattamento legale. Fatto ciò, si è passati ad
analizzare le conseguenze che la rottura della catena di custodia ha sulla ammissibilità della
prova, stabilendo i criteri da verificare in ogni caso, per stabilire se la mancanza dei registri
che autentichino l'identità e l'integrità dell'elemento o fonte di prova ne precludono l'entrata
nel processo o se tali lacune debbano essere prese in considerazione al momento della
valutazione della prova da parte del giudice. Infine, nell'affrontare le principali questioni
genetiche e tecniche relative alla perizia per l'identificazione tramite DNA, sono stati
applicati a questa attività probatoria i concetti e le conclusioni precedentemente stabiliti sulla
catena di custodia e le conseguenze della loro rottura.
Parole chiave: Processo penale. Catena di custodia. Perizia. Identificazione tramite DNA.
Ammissibilità.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 19
4.1. Perícia de identificação por DNA para fins penais ..................................... 199
4.1.1. Introdução às questões genéticas e matemáticas relacionadas ao exame
de identificação por DNA ............................................................................ 199
4.1.2. Procedimento de identificação por polimorfismos STR (short tandem
repeats ou repetições curtas consecutivas ou microssatélites) ...................... 203
4.1.2.1 A técnica de RFLP (restriction fragment length polymorphism) 204
4.1.2.2 A técnica de PCR (polymerase chain reaction ou reação em cadeia
polimerase) .......................................................................................... 208
4.1.3. Identificação pelo método SNPs (single nucleotide polymorphism) .... 214
INTRODUÇÃO
1
A relação entre processo penal e verdade está desenvolvida ao longo do trabalho, especialmente no item 2.1,
infra. Contudo, desde já, cabe a advertência de Jorge de Figueiredo Dias: “naturalmente que essa verdade
não é a narrativa construída pela acusação e a defesa, dita «verdade formal». Mas também não é
integralmente a factualidade (a «facticidade») histórica do real acontecido, mesmo que na sua relevância
para as exigências normativas do caso: é sim esta facticidade combinada com as – e por consequência
condicionada e limitada pelas – exigências impreteríveis de garantia dos direitos das pessoas face ao Estado.
(…). A verdade que se procura, mesmo através da actuação do princípio da investigação oficial é (…) a
verdade processualmente válida, hoc sensu, a verdade judicial” (DIAS, Jorge de Figueiredo. Acordos sobre a
sentença em processo penal: o fim do Estado de Direito ou um novo “princípio”? Porto: Conselho Distrital do
Porto da Ordem dos Advogados, 2011. p. 49).
2
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2003. p. 37.
3
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 159; MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes.
Garantias constitucionais na produção probatória e o descaso com a cadeia de custódia. Revista de Direito
Constitucional e Internacional: Cadernos de direito constitucional e ciência política, São Paulo, v. 26, n. 106,
p. 243.
4
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 140.
5
Nesse sentido: PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons,
2019. p. 39; EDINGER, Carlos. Cadeia de custódia, rastreabilidade probatória. Revista Brasileira de Ciências
Criminais. São Paulo, v. 24, n. 120, p. 237-257, mai./jun. 2016. p. 241); MACHADO, Vitor Paczek. JEZLER
JÚNIOR, Ivan. A prova eletrônico-digital e a cadeia de custódia das provas: uma (re) leitura da Súmula
Vinculante 14. Boletim IBCCrim. v. 24, nº 288. São Paulo: nov., 2016. p. 08.
6
PRADO, Geraldo. Ainda sobre a “quebra da cadeia de custódia das provas”. Boletim IBCCrim, n. 262, São
Paulo: set. 2014. p. 16-17.
20
7
LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In.
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015,
p. 22.
8
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza Rocha
de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2008. p. 275; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique
Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências
Criminais, São Paulo, v. 15, n. 65, p. 175-208., mar./abr. 2007. p. 195.
9
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza Rocha
de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2008. p. 274.
10
LOPES JR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da. A importância da cadeia de custódia para preservar a prova
penal. Revista Consultor Jurídico, 16 jan. 2015. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2015-jan-
16/limite-penal-importancia-cadeia-custodia-prova-penal>. Acesso em: 27 nov. 2019
11
FIGUEROA NAVARRO, Carmen. La cadena de custodia de las muestras biológicas. In: FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015, p. 108.
12
ROSELLÓ, Francesc Torralba. Preguntas éticas que suscitan las pruebas genéticas. In: MASIÁ CLAVEL,
Juan. Pruebas genéticas: genética, derecho y ética. Bilbao: Universidad Pontificia Comillas / Desclée De
Brouwe, 2004. p. 130.
21
elemento de prova em juízo. Dessa forma, as partes e o juiz poderão ter informações
suficientes para verificar a relevância, pertinência e legalidade da prova.
Para tanto, o trabalho terá início com a abordagem dos principais aspectos da
prova pericial em geral. Após, será estabelecida uma matriz conceitual sobre o tema da
cadeia de custódia com a qual se trabalhará no decorrer da pesquisa. Serão abordadas, ainda,
as consequências da inobservância da cadeia de custódia na admissibilidade e valoração da
prova. Ao fim, esses conhecimentos previamente construídos serão aplicados
especificamente ao exame de identificação por DNA.
Assim, o primeiro capítulo trabalhará os conceitos relacionados à prova pericial
em geral e a sua disciplina no Código de Processo Penal. Haverá destaque para a análise das
especificidades desse meio de prova para o exercício do contraditório nos casos de exames
renováveis e não renováveis.
Na sequência, será adotado um modelo de processo penal epistêmico orientado
à busca da verdade como premissa para o estudo da cadeia de custódia. A partir dessa
perspectiva, o segundo capítulo trará o conceito de cadeia de custódia, bem como os seus
pressupostos, requisitos, etapas, ônus de demonstração, limites e, finalmente, a sua disciplina
no Código de Processo Penal.
A partir da concepção de cadeia de custódia desenvolvida no capítulo dois, o
terceiro capítulo será dedicado à análise dos reflexos da falta de registro da cadeia de
custódia nos requisitos lógicos e políticos de admissibilidade da prova. Serão estabelecidas
as diretrizes para que se avalie, nos casos concretos, se a falta de informação para a
autenticação do elemento ou fonte de prova impedirá a sua utilização no processo ou se
deverá ser considerada pelo magistrado no momento de valoração da prova.
Por fim, o quarto capítulo tratará das questões genéticas e técnico-
procedimentais necessárias para a compreensão da perícia de identificação por DNA.
Abordará, em seguida, as etapas a serem observadas para a adequada manutenção da sua
cadeia de custódia, finalizando com a identificação e apontamento dos elos que, se faltantes,
culminarão na inadmissibilidade da prova.
23
O termo prova não está limitado ao estudo do direito, sendo também relevante
em outras áreas de conhecimento, como a epistemologia, a psicologia e outras ciências.14
Mesmo restringindo, neste estudo, à sua acepção jurídica, a palavra prova não possui
tratamento legal e doutrinário uniforme, sendo constantemente utilizada com diferentes
significados,15 em especial como sinônimo da atividade probatória, dos meios de prova ou
do resultado da prova.16
Na definição de Moacir Amaral Santos, prova é “a soma dos fatos produtores
da convicção, apurados no processo”17. No mesmo sentido, Magalhães Noronha define
13
Nesse sentido, em obra dedicada a fazer muitos desses enfrentamentos, Vázquez: “[a] conhecida como prova
pericial gera muitos problemas diversos suscetíveis de intensas discussões: quem é o experto que pode atuar
como perito; o rol de perito e a atividade do julgador frente a este; o tipo de julgador para valorar o
conhecimento do experto; os critérios jurídicos relacionados a admissão, produção e valoração da dita
informação; múltiplas questões próprias das muitas áreas de conhecimento e o seu impacto na prova jurídica;
os custos dessa atividade probatória e as possibilidades econômicas das partes em juízo ou inclusive o
emprego de recursos estatais para isso, etecetera” (VÁZQUEZ, Carmen. De la prueba científica a la prueba
pericial. Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 26/27, tradução nossa)
14
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016. p. 385.
15
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 41.
16
Conforme Vázquez, “[o] termo ‘prova’ é ambíguo. Com ele podemos fazer referência aos elementos de
prova, à atividade probatória e ao resultado probatório” (VÁZQUEZ, Carmen. De la prueba científica a la
prueba pericial. Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 27, tradução nossa). No mesmo sentido: BADARÓ, Gustavo
Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 157.
17
SANTOS, Moacyr Amaral. Prova Judiciária no Cível e Comercial. Vol. 1. 2ª ed. corr. e atual. São Paulo:
Max Limonad, 1952. p. 21.
24
prova como a demonstração que o acusador faz da pretensão punitiva e o acusado da sua
defesa.18 Como se observa, os dois autores reduzem o conceito de prova ao seu resultado.
Diferentemente, Tornaghi adota o conceito procedimental da prova ao defini-la
como “a atividade probatória, isto é, conjunto de atos praticados pelas partes, por terceiros
(testemunhas, peritos etc.) e até pelo juiz, para averiguar a verdade e formar a convicção
deste último (julgador)”19.
As diversas acepções juridicamente dadas ao termo prova se mantêm mesmo
quando se restringe a análise à prova pericial.
Ao definir perícia como a “prova destinada a levar ao juiz elementos instrutórios
sobre normas técnicas e sobre fatos que dependam de conhecimento especial”20, Frederico
Marques apresenta um conceito de prova pericial com significado correspondente ao da
informação obtida no exame realizado.
Com o mesmo sentido, na legislação brasileira, o artigo 529 do Código de
Processo Penal (CPP) estabelece prazo para o oferecimento de “queixa com fundamento em
apreensão e em perícia”, ou melhor dizendo, no conteúdo resultante da perícia. Da mesma
forma, a doutrina penal sustenta a necessidade de prova pericial para a constatação do crime
de tráfico de drogas, referindo-se, no caso, à conclusão da perícia.
Por outro lado, o mesmo Código de Processo Penal faz uso do termo “prova
pericial” com o significado de atividade probatória, na redação do artigo 481, parágrafo
único, ao regulamentar a hipótese em que a “diligência consistir na produção de prova
pericial”. O artigo 159, §5º, do CPP, elenca, ainda, uma série de atos “permitidos às partes,
quanto à perícia”, utilizando o termo como substitutivo da atividade probatória desenvolvida
pelas partes no processo judicial.21
18
NORONHA, E. Magalhães. Curso de direito processual penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1973. p. 86.
19
TORNAGHI, Hélio. Curso de processo penal. 4 ed., rev. e aum. vol. 1. São Paulo: Saraiva, 1987. p. 265.
20
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas:
Millennium, 2009. p. 350.
21
Apesar da adoção de exemplos extraídos do Código de Processo Penal brasileiro, a diversidade de
significados do termo prova é verificada nos ordenamentos jurídicos em geral, conforme Vázquez: “as normas
sobre a prova em um sistema jurídico atente ao objeto que regula: regras sobre os meios de prova, regras
sobre a produção das provas admitidas e regras sobre o resultado das provas admitidas e produzidas”
(VÁZQUEZ, Carmen. De la prueba científica a la prueba pericial. Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 27, tradução
nossa).
25
22
Conforme Gomes Filho e Badaró, a falta de clareza sobre o tema pode resultar “em inúmeras confusões e
desentendimentos [...], sobretudo no âmbito do processo judicial, em que a atividade probatória tem como
objetivo a persuasão do julgador sobre a realidade dos fatos em que se fundamentam as pretensões das partes”
(GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de
prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-
208, mar./abr. 2007. p. 117).
23
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016. p. 438.
24
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, vol. 3. 32 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva,
2010. p. 273.
25
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 274.
26
DUMOULIN, Laurent. L'expert dans la justice: de la genèse d´une figure à ses usages. Paris: Economica,
2007, p. 16-17.
26
As fontes de prova são tudo que for idôneo para se extrair informações com a
finalidade de comprovar os fatos alegados no processo. Conforme explica Badaró,
“[o]corrido o fato, tudo aquilo que puder servir para esclarecer alguém sobre a existência
desse fato pode ser considerado como fonte de prova daquele fato”27.
No mesmo sentido, Taruffo reconhece que “muitas são as coisas que podem ser
usadas como fontes de prova” 28, desde que “tenha[m] algum significado ou certa utilidade
para a busca da verdade dos fatos em litígio”29.
No caso da perícia, por se tratar de uma prova técnica, as fontes de prova estão
restritas às coisas ou pessoas que detenham conteúdo cuja obtenção dependa de
conhecimento especializado, diverso do jurídico.
As fontes de prova são classificadas em pessoais (testemunhas, vítima e acusado)
e reais (dados, objetos, material genético, etc.).30 No âmbito da prova pericial, é exemplo de
fonte de prova pessoal o indivíduo submetido a exame de lesão corporal (art. 168 do CPP).
Por sua vez, são fontes de prova reais periciáveis o material genético encontrado no local do
crime, a arma de fogo e o projétil utilizados na prática do delito ou, ainda, substâncias
entorpecentes apreendidas.
Se a fonte de prova é o próprio corpo de delito (e.g. a pessoa no exame de lesão
corporal, o corpo da vítima no exame necroscópico no homicídio), a perícia é classificada
como intrínseca, ao passo que, se a fonte de prova for pessoa ou coisa que sirvam como
prova do crime (e.g. perícia em dispositivos eletrônicos apreendidos, exame grafotécnico em
documentos apreendidos), a perícia será extrínseca.31
27
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 165. No mesmo sentido: TONINI, Paolo. A prova no processo penal italiano. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2002. p. 52.
28
TARUFFO, Michele. A prova. Tradução de João Gabriel Couto. Madrid: Marcial Pons, 2014. p. 57.
29
TARUFFO, Michele. A prova. Tradução de João Gabriel Couto. Madrid: Marcial Pons, 2014. p. 57.
30
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Notas sobre a terminologia da prova: reflexos no processo penal
brasileiro. In: YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São
Paulo: DPJ, 2005. p. 308.
31
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 443.
27
32
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 166.
33
Neste sentido, Badaró: “[e]m suma, o sistema acusatório, quanto à atividade probatória, deve reconhecer o
direito à prova da acusação e da defesa, podendo ainda o juiz ter poderes para, em caráter subsidiário ou
suplementar, determinar ex officio a produção de provas que se mostrem necessárias para o acertamento do
fato imputado” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed., ver. e atual. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2018. p. 104). Em sentido contrário, admitindo a atividade instrutória do juiz apenas a
favor do acusado e desde que “moderada”, Prado conclui: “[o] juiz é o destinatário da prova e, sem dúvida
alguma, sujeito de conhecimento. Quando, porém, se dedica a produzir provas de ofício se coloca como ativo
sujeito do conhecimento a empreender tarefa que não é neutra, pois sempre deduzirá a hipótese que pela prova
pretenderá ver confirmada. Como as hipóteses do processo penal são duas: há crime e o réu é responsável ou
isso não é verdade, a prova produzida de ofício visará confirmar uma das duas hipóteses e colocará o juiz,
antecipadamente, ligado à hipótese que pretende comprovar” (Sistema Acusatório: A conformidade
constitucional das leis processuais penais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. p. 141).
34
De acordo com Badaró, “[o] direito à prova envolve cinco momentos distintos: (1) investigação; (2)
propositura; (3) admissão; (4) produção; (5) valoração” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo
penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. p. 404).
35
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 86.
36
Acerca da atividade defensiva na produção de provas no curso do inquérito policial, Marta Saad sustenta que
“não pode a autoridade policial negar o requerimento de diligência formulado pelo acusado, desde que guarde
importância e correlação com o esclarecimento dos fatos e a defesa do acusado” (SAAD, Marta. O direito de
defesa no inquérito policial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 351). Badaró, por sua vez, ressalta “a
necessidade de uma disciplina legal do direito de investigação particular” (BADARÓ, Gustavo Henrique
Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. p. 405).
37
De acordo com Badaró, “[p]artindo da distinção entre fontes de provas e meios de prova, percebe-se,
facilmente, que perigo para a imparcialidade está no juiz que é um pesquisador, um ‘buscador’ de fontes de
provas. Já o juiz que, diante da notícia de uma fonte de prova, como a informação de que uma certa pessoa
presenciou os fatos, determina a produção do meio de prova necessário – o testemunho – para incorporar ao
processo as informações contidas na fonte de prova, não está comprometido com uma hipótese prévia, não
colocando em risco a sua posição de imparcialidade. Ao contrário, o resultado da produção daquele meio de
prova pode ser em sentido positivo ou negativo, quanto à ocorrência do fato” (BADARÓ, Gustavo Henrique
Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 119/120).
28
ensina Gomes Filho, o artigo 156 do CPP, ao prever os poderes instrutórios do magistrado,
“não atribui poderes de investigação ao juiz penal”.38
Isso porque, conforme Zilli, “toda e qualquer iniciativa instrutória pressupõe o
atendimento dos requisitos relativos a um juiz natural, independente e imparcial”39. Ocorre
que, adverte Gomes Filho, “é difícil imaginar que um juiz ativo na fase de investigação possa
ser, ao mesmo tempo, um magistrado imparcial no momento da decisão”40.
Nas palavras de Badaró, “o que não parece adequado é que o juiz saia
averiguando e buscando fontes, pois, neste caso, transformar-se-ia em juiz instrutor, ao
mesmo tempo em que seria o julgador da causa, com seríssimos riscos de perda da
imparcialidade”41.
Isso não impede, por outro lado, que, caso uma nova fonte de prova seja revelada
no curso do processo pelas partes ou na produção de algum meio de prova, o juiz determine
a produção desta prova pelo seu meio legal.42 Nessa hipótese, como é evidente, o magistrado
deverá se atentar aos pressupostos de toda excepcional atividade instrutória do juiz, a saber:
ação supletiva, complementar, independente, imparcial, motivada e com respeito ao devido
processo penal na produção da prova.43
No que se refere à perícia, tal distinção é importante porque impede que o
magistrado, de ofício, determine diligências que tenham como finalidade a obtenção de
fontes de prova para submissão à perícia. Assim, na hipótese da falta de material genético
de um investigado para identificação por DNA por comparação com o material encontrado
no local do crime, o juiz não poderá atuar de ofício para determinar a apreensão de objetos
descartados pelo investigado para obtenção de fontes de DNA.44
38
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 260.
39
ZILLI, Marcos Alexandre Coelho. A iniciativa instrutória do juiz no processo penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 182.
40
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 260.
41
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 168.
42
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 168.
43
ZILLI, Marcos Alexandre Coelho. A iniciativa instrutória do juiz no processo penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 181/182.
44
Na hipótese de diligência conduzida exclusivamente por determinação da autoridade policial, o Superior
Tribunal de Justiça reconheceu a licitude da apreensão de objetos descartados pelo investigado para realização
de perícia de identificação por DNA. Na oportunidade, o Tribunal declarou que tal diligência não viola a
garantia do nemo tenetur se detegere, mesmo que o investigado tenha se negado anteriormente a fornecer
29
material genético: “[...] no presente caso - material biológico do paciente obtido pela autoridade policial,
após o descarte de um copo e uma colher de plástico, para que o Estado investigasse a autoria delitiva -, não
há que falar em violação à intimidade, já que o indivíduo, no momento em que dispensou o copo e a colher,
deixou de ter o controle sobre o que outrora lhe pertencia (saliva que estava em seu corpo); não podia mais,
assim, evitar o conhecimento de terceiros. (...). Nessa perspectiva, quanto à suposta violação do direito do
paciente à não autoincriminação ("nemo tenetur se detegere"), ressai das decisões, em que pese a não
concordância do paciente na coleta de material biológico (e-STJ fls. 1662 e 1667/1668), que o exame do DNA
é permitido mesmo sem o seu consentimento quando o objeto investigado (saliva) já está fora de seu corpo e
foi abandonado por seu titular, ou seja, o que não se permite é o recolhimento do material genético à força
(violência moral ou física), o que não ocorreu na espécie, em que o copo e a colher de plásticos utilizados pelo
paciente já haviam sido descartados” (HC n º 354.068, 5ª T., Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe
21.03.2018).
45
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal comentado: arts. 1º a 393º. 14. ed. São
Paulo: Saraiva, 2012. p. 78.
46
Em complemento, especificamente para o exame de local, o artigo 169 do CPP prevê que, “[p]ara o efeito
de exame do local onde houver sido praticada a infração, a autoridade providenciará imediatamente para que
não se altere o estado das coisas até a chegada dos peritos, que poderão instruir seus laudos com fotografias,
desenhos ou esquemas elucidativos”.
30
não são percepcionados por qualquer AJ (Autoridade Judiciária) ou OPC (Órgão de Polícia
Criminal), mas sim por peritos”47.
Percebe-se, então, que é justificável o cuidado legal na preservação das fontes
de prova periciáveis, pois, como ressaltam Pacelli e Fischer, “se se trata de prova técnica é
preciso resguardar todas as circunstâncias relevantes para a apuração dos fatos.
Evidentemente”48.
Considerando que, “para o êxito de uma investigação criminal, a conservação
do local de crime e do estado das coisas ali encontradas é de vital importância”49, a
autoridade policial tem, assim, o dever legal de isolar o local do crime, conservando o estado
das fontes de prova lá existentes até a chegada e liberação pelos peritos,50 devendo, ainda,
registrar eventuais violações praticadas “por outros funcionários do Estado (ou mesmo
particulares), que poderão, a seu devido tempo, responder pelo ato praticado”51, até mesmo
criminalmente (art. 347 do CP)52.
Por fim, as fontes de prova relacionadas à materialidade do crime são
denominadas “corpo de delito”53 e, nos termos do artigo 158 do CPP, deverão ser submetidas
à perícia sempre que a infração deixar vestígios.
47
VALENTE, Manuel Monteiro Guedes. Processo penal, t. 1. Coimbra: Almedina, 2004. p. 308.
48
PACELLI, Eugenio; FISCHER, Douglas. Comentários do Código de Processo Penal e sua
jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 413.
49
CHOUKR, Fauzi Hassan. Código de processo penal: comentários consolidados e crítica jurisprudencial. vol.
1. 7. ed. Belo Horizonte: D'Plácido, 2017. p. 129.
50
Nesse sentido, dispõe o artigo 158-B, II, do CPP: “isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas,
devendo isolar e preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime”.
51
CHOUKR, Fauzi Hassan. Código de processo penal: comentários consolidados e crítica jurisprudencial. vol.
1. 7. ed. Belo Horizonte: D'Plácido, 2017. p. 129.
52
Nesse sentido, dispõe o artigo 158-B, §2º, do CPP: “É proibida a entrada em locais isolados bem como a
remoção de quaisquer vestígios de locais de crime antes da liberação por parte do perito responsável, sendo
tipificada como fraude processual a sua realização”.
53
Na definição de Frederico Marques, corpo de delito são “os elementos do corpus criminis e o corpus
instrumentorum”, abrangendo, portanto, “a) os sinais da atividade do delinquente; b) o resultado ou produto
da infração; c) o corpus instrumentorum, ou meios empregados pelo delinquente” (MARQUES, José
Frederico. Elementos de direito processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas: Millennium, 2009. p. 360). Em
igual sentido, Tourinho Filho define corpo de delito de seguinte forma: “nada mais representa senão o conjunto
dos vestígios materiais deixados pela infração: num crime de dano, os vestígios se reúnem na própria coisa
danificada; num homicídio, são o próprio cadáver; num furto com arrombamento da janela, os vestígios estão
na janela arrombada etc.” (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal
comentado: arts. 1º a 393º. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 597).
31
fórmula, um procedimento para poder introduzir esse dado ao processo penal. Essa é a
função que cumpre um meio de prova”54.
Entretanto, a separação entre os conceitos de fonte de prova e meios de prova
nem sempre foi destacada pela doutrina nacional, que costumeiramente tratava dentro do
conceito de meios de prova também o conceito de fontes de prova. Pontes de Miranda, por
exemplo, definiu meios de prova como “as fontes probantes, os meios pelos quais o juiz
recebe os elementos ou motivos de prova”55.
Na doutrina italiana, por outro lado, a distinção é comumente feita, conforme se
extrai do ensinamento de Tonini: “meio de prova é o instrumento por meio do qual o
processo adquire um elemento que serve para a decisão (por exemplo, uma prova
testemunhal)”56.
Por influência da doutrina italiana,57 a doutrina nacional também passou
distinguir entre fontes de prova e meios de prova, restringindo o conceito de meio de prova,
de acordo com Gomes Filho, aos “instrumentos pelos quais as informações sobre os fatos
são introduzidas no processo”58. Também para Badaró, “meios de prova são os instrumentos
pelos quais se leva ao processo um elemento de prova apto a revelar ao juiz a verdade de
um fato”59.
Assim, como já antecipado, a perícia é um meio de prova na medida em que
representa o instrumento pelo qual as partes e o juiz extraem informações das fontes de prova
e as inserem no processo, com a finalidade de revelarem a verdade sobre os fatos discutidos
em juízo.
Destaca-se que essa característica de interdependência da perícia com a pré-
existência de uma fonte de prova é um dos fatores que a distingue daquilo que a doutrina
classifica como meios de pesquisa de prova, também chamados de meios de investigação ou
54
CHAIA, Rubén A; HAIRABEDIÁN, Maximiliano. La prueba en el proceso penal: proceso acusatorio,
juicio oral, carga probatoria, prueba ilegal, medios de prueba, construcción de la verdad, valoración-
arbitrariedad, motivación de la sentencia, jurisprudencia vinculada. Buenos Aires: Hammurabi, 2010. p. 89,
tradução nossa.
55
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil, vol. 2, 1 ed., Rio
de Janeiro, Forense, 1947. p. 155. No mesmo sentido, MARQUES, José Frederico. Elementos de direito
processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas: Millennium, 2009. p. 270.
56
TONINI, Paolo. A prova no processo penal italiano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 52.
57
Badaró reconhece a influência da doutrina italiana ao apresentar, em sua obra, a distinção entre fontes de
prova e meios de prova (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2018. p. 390, nota de rodapé 17).
58
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 41.
59
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 392.
32
60
Gomes Filho se refere ao mesmo conceito com as terminologias “meios de pesquisa ou de investigação da
prova” (GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Notas sobre a terminologia da prova: reflexos no processo penal
brasileiro. In: YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São
Paulo: DPJ, 2005. p. 309).
61
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Notas sobre a terminologia da prova: reflexos no processo penal
brasileiro. In: YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São
Paulo: DPJ, 2005. p. 309.
62
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 391.
63
Ao contrário do que ocorre, por exemplo, na legislação portuguesa, em que o Código de Processo Penal
disciplina os “meios de prova” no Título II, precisamente entre os artigos 128 e 170, ao passo que os “meios
de obtenção de prova” estão previstos no Título III, entre os artigos 171 e 190.
64
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 393.
65
Na interceptação telefônica, por exemplo, o artigo 9º da Lei nº 9.296/96 prevê que “[a] gravação que não
interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante o inquérito, a instrução processual ou após
esta, em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada”.
33
66
Para além do exame de corpo de delito e perícias em geral (arts. 158 a 184), o CPP prevê os seguintes meios
de prova: interrogatório (arts. 185 a 196), confissão (arts. 197 a 200), depoimento do ofendido (art. 201),
testemunhas (arts. 202 a 225), reconhecimento de pessoas e coisas (arts. 226 a 228), acareação (art. 229 a 230),
documentos (arts. 231 a 238) e indícios (art. 239). Não obstante a busca e apreensão esteja também no Título
VII do CPP, entende-se, como será demonstrado abaixo, que tal medida cautelar probatória é meio de obtenção
de prova, razão pela qual não foi aqui incluída. A inclusão do interrogatório como meio de prova é questionada
por parte da doutrina, como Badaró (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e
atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 388) e Gomes filho (GOMES FILHO, Antonio Magalhães.
Notas sobre a terminologia da prova: reflexos no processo penal brasileiro. In: YARSHELL, Flávio
Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: DPJ, 2005. p. 309), que
sustentam ser o ato um meio de defesa, em decorrência da previsão constitucional do direito ao silêncio (art.
5º, LXIII). Por outro lado, corrente diversa, encabeçada por Magalhães Noronha (NORONHA, E.
Magalhães. Curso de direito processual penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1973, p. 104) e Frederico Marques
(MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas: Millennium,
2009.p. 318), defende ter o interrogatório natureza mista, sendo tanto um meio de prova, como de defesa.
Aderimos a esta última posição. O interrogatório, de fato, não será meio de prova quando o réu se mantiver em
silêncio, não prestando qualquer informação que poderá ser utilizada na comprovação de fatos alegados. Não
se pode negar, por outro, que caso o réu se manifeste, a acusação poderá se utilizar das declarações para
comprovar as alegações feitas na denúncia, sendo, nessa hipótese, meio de prova. Assim como Badaró,
entendemos inadequada a inclusão da confissão entre os meios de prova pelo CPP, uma vez que tal ato é apenas
uma manifestação de vontade do réu que será levada ao processo por documento produzido extrajudicialmente
ou, em juízo, no curso do interrogatório, sendo estes dois últimos os instrumentos (meios de prova) para a
entrada da informação no processo (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e
atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 388).
34
67
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Notas sobre a terminologia da prova: reflexos no processo penal
brasileiro. In: YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São
Paulo: DPJ, 2005. p. 314.
68
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 395.
69
Ao tratar especificamente da reprodução simulada dos fatos, Gomes Filho e Badaró destacam que “em
relação a tal meio de prova há, apenas, sua nominação no CPP. Não há, porém, disciplina legal do
procedimento probatório a ser adotado na realização da ‘reprodução simulada dos fatos’. Neste último
sentido, pois, trata-se de uma prova atípica, ao menos quanto ao seu procedimento”. A leitura isolada desse
trecho pode conduzir à conclusão de que os autores entendem ser atípica a reprodução simulada dos fatos.
Entretanto, na sequência do mesmo texto, Gomes Filho e Badaró afirmam que “[e]m se entendendo que o meio
de prova atípico é aquele que não está previsto no ordenamento jurídico e para o qual não há um procedimento
específico, diante do quadro acima exposto, parece difícil mencionar um meio de prova atípico que possa ser
utilizado no processo penal brasileiro” (GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique
Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências
Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-208, mar./abr. 2007. p.182 /183). Percebe-se, portanto, que os
autores não incluíram a reprodução simulada dos fatos entre os meios de prova atípicos, apesar de
reconhecerem a atipicidade procedimental. Por conta desta constatação, entendeu-se necessário adotar uma
classificação que inclua entre os meios de prova típicos aqueles que não têm o rito procedimental previsto em
lei, mas diferenciando-os daqueles que os têm. Com posição diversa, Guilherme Madeira Dezem sustenta que
“[e]mbora não seja comum, às vezes o ordenamento indica apenas o meio de prova, mas não o procedimento
probatório. Tem-se aqui situação de prova atípica” (DEZEM, Guilherme Madeira. Da prova penal: tipo
processual, provas típicas e atípicas. Campinas: Millennium, 2008. p. 147).
70
SOUZA, Diego Fajardo Maranha Leão de. Busca e apreensão digital: prova penal atípica. Boletim
IBCCRIM, São Paulo, vol. 15, n. 181, p. 14-15., dez. 2007. Disponível em:
<http://201.23.85.222/biblioteca/index.asp?codigo_sophia=64376>. Acesso em: 29 nov. 2019.
35
Há, ainda, o meio de prova típico por analogia,71 consistente nas hipóteses em
que a lei, ao nomear um meio de prova, expressamente adota o procedimento probatório
previsto para outro meio de prova. É o que se verifica no artigo 227 do CPP, caso em que
prevê que o reconhecimento de objetos seguirá a disciplina procedimental prevista no artigo
226 do CPP para o reconhecimento de pessoas, “no que for aplicável”.72
Por fim, classifica-se como meio de prova atípico “aquele que não está previsto
no ordenamento jurídico e para o qual não há um procedimento probatório específico”73.74
A despeito de o Código de Processo Penal fazer expressa referência a
determinados meios de prova e seus ritos, o rol legislativo não é taxativo,75 admitindo-se a
adoção de outros meios de provas,76 com a ressalva de que a sua admissibilidade está
condicionada à adoção de meios legais e moralmente legítimos.77
71
SOUZA, Diego Fajardo Maranha Leão de. Busca e apreensão digital: prova penal atípica. Boletim
IBCCRIM, São Paulo, vol. 15, n. 181, p. 14-15., dez. 2007. Disponível em:
<http://201.23.85.222/biblioteca/index.asp?codigo_sophia=64376>. Acesso em: 29 nov. 2019.
72
Nesse sentido, Gomes Filho e Badaró destacam que “[...] quanto ao reconhecimento de coisas há previsão
específica de tal procedimento probatório no CPP, sem haver, contudo, uma disciplina específica. [...] Há um
aproveitamento, parcial e adaptado, do procedimento probatório do reconhecimento pessoal” (GOMES
FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de prova no
processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-208,
mar./abr. 2007. p. 182).
73
GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de
prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-
208., mar./abr. 2007. p. 183.
74
Conforme explica Guilherme Madeira Dezem, “[a] ideia de atipicidade probatória é vista, pela doutrina
italiana majoritária, de maneira intimamente ligada à ausência de previsão legal da fonte de prova que se
quer utilizada no processo” (DEZEM, Guilherme Madeira. Da prova penal: tipo processual, provas típicas e
atípicas. Campinas: Millennium, 2008. p. 144). Entretanto, com precisão, o autor explica que “não parece
admissível a posição”, pois “a limitação da atipicidade probatória tão-somente às fontes de prova afasta a
própria possibilidade de existência das provas atípicas no sistema: é que dada a definição deste termo [...],
são fontes de prova as pessoas ou as coisas sobre as quais recairá a atividade probatória. Ora, nesta situação,
difícil imaginar algo que não seja pessoa ou coisa e que possa ser fonte de prova atípica” (DEZEM, Guilherme
Madeira. Da prova penal: tipo processual, provas típicas e atípicas. Campinas: Millennium, 2008. p. 150/151).
75
Afirmando não ser taxativo, GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi
Ivahy. Prova e sucedâneos de prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São
Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-208., mar./abr. 2007. p. 180. Aury Lopes Jr. entende que “[c]omo regra, sim, é
taxativo. Entendemos que, excepcionalmente e com determinados cuidados, podem ser admitidos outros meios
de prova não previsto no CPP” (LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva,
2019. p. 380).
76
Apesar de não haver previsão expressa no CPP para a admissão da prova atípica, o artigo 396 do Código de
Processo Civil, aplicável por analogia ao processo penal (art. 3º do CPP), prevê que “[a]s partes têm o direito
de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste
Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na
convicção do juiz”.
77
De acordo com Tourinho Filho, “[o] veto às provas que atentam contra a moralidade e dignidade da pessoa
humana, de modo geral, decorre de princípios constitucionais, por isso que não pode ser olvidado”
(TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, vol. 3. 32 ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010.
p. 239). Da mesma forma, para Lopes Jr., na produção da prova atípica deve-se atentar para ter “todo o cuidado
necessário para não violar os limites constitucionais e processuais da prova, sob pena de ilicitude ou
ilegitimidade dessa prova”, de modo que somente serão admissíveis “contanto que sua aquisição não viole
36
Nesse mesmo sentido segue a legislação italiana que, nos termos do artigo 189
do Codice di procedura penale, ao tratar da admissão da prova atípica, expressamente prevê
que o juiz pode admiti-la se for “idônea para assegurar o acertamento dos fatos e não
prejudicar a liberdade moral da pessoa”.
Portanto, os ordenamentos jurídicos brasileiro e italiano fixaram uma posição
intermediária entre a liberdade e a taxatividade dos meios de provas, pois permitem a
introdução no processo de prova não disciplinada na lei, desde que atendidas as condições
legais para a sua admissibilidade, isto é, desde que seja idônea para verificação dos fatos e
não prejudique a liberdade moral da pessoa.78
Na hipótese da aceitação de meio de prova atípico, explica Laronga, apoiando-
se em Grevi, “será tarefa do juiz definir em concreto o procedimento para sua realização,
ouvindo-se as partes, a fim de acordar, se possível, sobre os prazos”79.
A partir destes conceitos, classifica-se a perícia como meio de prova típico, pois,
mesmo reconhecendo que “no campo da prova pericial, em razão dos meios tecnológicos,
têm surgido diversas modalidades de perícias não previstas ou disciplinadas pelo CPP”80,
há regras gerais que devem ser seguidas para a realização de qualquer exame pericial.
Nesse sentido, o artigo 159, caput, do CPP, é expresso ao estender os
procedimentos gerais previstos para “outras perícias”. Como explica Hassan Choukr, “[o]
artigo em comento abre a possibilidade de realização de outras perícias que não as
previstas expressamente no Código, medida que é salutar diante dos avanços
tecnológicos”81.
Dessa forma, a tipicidade do meio de prova pericial decorre do fato de que para
“todas estas perícias sem procedimento probatório específico, seguem-se as regras gerais
do CPP, em especial aquelas sobre o exame de corpo de delito”82.
proibições explícitas ou decorrentes do sistema de garantias” (LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual
penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 380/381). Aliás, a própria lei, ao admitir a prova atípica, faz expressa
ressalva no sentido de deverem ser observados “os meios legais” e “moralmente legítimos” (art. 396 do CPC).
78
Neste sentido: LARONGA, Antonio. Le prove atipiche nel processo penale. Padova: CEDAM, 2002. p. 5,
tradução nossa.
79
LARONGA, Antonio. Le prove atipiche nel processo penale. Padova: CEDAM, 2002. p. 6, tradução nossa.
80
GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de
prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-
208., mar./abr. 2007. p. 181.
81
CHOUKR, Fauzi Hassan. Código de processo penal: comentários consolidados e crítica jurisprudencial. vol.
1. 7. ed. Belo Horizonte: D'Plácido, 2017. p. 479.
82
GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de
prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-
208., mar./abr. 2007. p. 182.
37
83
DOMINIONI, Oreste. In tema di nuova prova scientifica. In: Diritto penale e processo. Mensile di
giurisprudenza, legislazione e dottrina, n. 9, Milao: IPSOA, 2001. p. 1061, tradução nossa.
84
DOMINIONI, Oreste. In tema di nuova prova scientifica. In: Diritto penale e processo. Mensile di
giurisprudenza, legislazione e dottrina, n. 9, Milao: IPSOA, 2001, p. 1063, tradução nossa.
85
Artigo 189 do Codice di procedura penale italiano.
86
Nesse sentido: STJ, HC nº 269.873, decisão monocrática, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe 11.10.2017.
38
87
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Provas atípicas e provas anômalas: inadmissibilidade da
substituição da prova testemunhal pela juntada de declarações escritas de quem poderia ser testemunha. In:
YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: DPJ,
2005. p. 344. No mesmo sentido: LARONGA, Antonio. Le prove atipiche nel processo penale. Padova:
CEDAM, 2002. p. 13, tradução nossa
88
Exemplo de prova irritual é o reconhecimento pessoal, prova típica prevista no artigo 226 do CPP, realizado
sem atenção às formalidades procedimentais dispostas nos seus incisos I, II e IV, a saber: “a pessoa que tiver
de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida”. Na sequência,
“a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem
qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la”. Ao final “do ato de
reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para
proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais”.
89
FERRARI, Francesca. La prova migliore: una ricerca di diritto comparato. Milano: Giuffrè, 2004. p. 338,
nota de rodapé 145, tradução nossa.
90
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Provas atípicas e provas anômalas: inadmissbilidade da
substituição da prova testemunhal pela juntada de declarações escritas de quem poderia ser testemunha. In:
YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: DPJ,
2005. p. 344.
91
Na definição de Badaró, prova anômala “é uma prova típica, utilizada ou para fins diversos daqueles que
lhes são próprios, ou para fins característicos de outras provas típicas” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi
Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. p. 395). No texto “[p]rovas atípicas e
provas anômalas: inadmissibilidade da substituição da prova testemunhal pela juntada de declarações
escritas de quem poderia ser testemunha”, Badaró desenvolve em detalhes o exemplo da substituição do
depoimento pessoal em juízo pela declaração escrita. Nesse caso, a prova que deveria ingressar no processo
por meio testemunhal, acaba ingressando documentalmente (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy.
Provas atípicas e provas anômalas: inadmissbilidade da substituição da prova testemunhal pela juntada de
declarações escritas de quem poderia ser testemunha. In: YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à
Professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: DPJ, 2005).
39
previamente realizado, não sendo admissível que a oitiva substitua o exame em si. Essa
substituição produziria prova anômala na medida em que o elemento de prova pericial seria
produzido pelo meio de prova típico previsto para prova testemunhal, com evidente prejuízo
à qualidade da prova, pois as conclusões do perito não estariam fundadas no exame da coisa
ou da pessoa, mas sim na percepção que teria acerca das informações que receber sobre a
coisa ou pessoa.92
Pelo mesmo motivo, como adverte Nucci, “não nos parece correta a posição
daqueles que sustentam tratar-se de exame de corpo de delito indireto a prova testemunhal
(art. 167, CPP)”93. Isso porque as “testemunhas não são peritos e depõem informalmente
sobre o que viram e sabem. Inexiste qualquer espécie de exame ou verificação técnica. Logo,
não há perícia alguma”94. O que se tem, portanto, não é a aceitação de prova anômala, mas
apenas a aceitação legal de que “a prova da existência da infração penal foi conseguida de
maneira alternativa à ideal: à falta de possibilidade de perícia, conforme recomendação
legal (art. 158, CPP), realiza-se por meio de prova testemunhal (art. 167, CPP)”95.
Portanto, por ser típico, o meio de prova pericial deve seguir as regras gerais e,
quando houver, as regras especiais previstas no código para a realização dos exames, não se
admitindo a prática irritual do procedimento. Soma-se a isso o fato desse meio de prova
abranger incontáveis métodos e modalidades de exames (que só crescem com o avanço
tecnológico), tornando necessária a observância das regras de admissão da prova atípica, no
que se refere às perícias que não tenham procedimento específico legalmente previsto,
exigindo a verificação, no caso concreto, do uso de meios legais e moralmente legítimos.
92
Nada impede que, sendo possível em razão do objeto e do método, o perito faça o exame da coisa ou pessoa
em audiência e apresente as suas conclusões, se entender que já possui condições para tanto. Conforme destaca
Eduardo Espínola Filho, ainda que não tratando especificamente da audiência, “na hipótese dos peritos
poderem formar logo um juízo seguro, fornecendo, imediatamente, as suas conclusões, e desde que o façam
por ocasião da diligência [...], não há necessidade de laudo escrito, fazendo-se constar do próprio auto da
diligência [...] o seu parecer, que poderá ser ditado na ocasião” (ESPINOLA FILHO, Eduardo. Código de
processo penal brasileiro anotado. comentários aos arts. 63-184. vol. 2. 3. ed., Rio de Janeiro: Borsoi, 1956.
p. 509). No entanto, neste caso, não houve substituição do meio de prova pericial pelo testemunhal, apenas
realizou-se o exame em juízo, na presença das partes.
93
NUCCI, Guilherme de Souza. Provas no processo penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p.
66.
94
NUCCI, Guilherme de Souza. Provas no processo penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p.
66.
95
NUCCI, Guilherme de Souza. Provas no processo penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p.
66.
40
96
VÁZQUEZ, Carmen. De la prueba científica a la prueba pericial. Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 33,
tradução nossa.
97
VÁZQUEZ, Carmen. De la prueba científica a la prueba pericial. Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 33,
tradução nossa.
98
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 250.
99
MARQUES, José Frederico. Tratado de direito processual penal. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 1980. p. 194.
100
GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de
prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-
208, mar./abr. 2007. p. 193.
101
Nesse sentido, Marta Saad, apoiando-se em Eduardo Espínola Filho, destaca que “[...] as diligências
solicitadas podem influenciar o deslinde da persecução: ‘pode ser importante o material colhido por meio de
41
produção dos elementos de informação colhidos no inquérito policial não traz prejuízo
duradouro. Com exceção das provas irrepetíveis, cautelares e antecipadas, todos os atos
voltados à coleta de informações relevantes para a reconstrução dos fatos deverão ser
refeitos, em contraditório, no curso da ação penal.
Nesse sentido, Aury Lopes Jr. sustenta que “as provas repetíveis ou renováveis,
enquanto inquisitoriais, têm valor meramente informativo – os chamados atos de
investigação –, não podendo servir de base ou sequer apoiar subsidiariamente o veredicto
condenatório”102.
Contudo, no que se refere ao meio de prova pericial, o problema se coloca de
maneira diversa, pois, como reconhece Gomes Filho, “sempre houve dificuldade para um
exercício pleno do contraditório em relação à prova pericial”103, já que “as perícias são
realizadas, na sua grande maioria, na fase do inquérito policial, em que ainda não existe a
participação da defesa”104.
A situação se agrava, no que se refere ao déficit de contraditório, quando se
verifica que, com relação à “prova pericial produzida durante o inquérito policial, tem sido
aceito, com tranquilidade, a possibilidade de o juiz valorá-la no momento da sentença”105,
pois, com respaldo nas exceções dispostas no artigo 155 do CPP, sustenta-se “que se trata
de uma prova cautelar, produzida antecipadamente, tendo em vista que, na maioria dos
casos, deve ser realizada desde logo, diante do risco de perecimento dos objetos a serem
diligências solicitadas pela defesa, por exercer influência no caminhar da investigação ou nas avaliações dos
órgãos encarregados de formular ou de admitir a acusação. Um aspecto novo revelado por tais diligências
pode conduzir a autoridade a alterar o rumo de sua apuração. O acréscimo trazido ao conjunto dos dados
antes coletados pode fazer com que não haja acusação ou, se existente, que não seja acolhida’” (SAAD,
Marta. O direito de defesa no inquérito policial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 345/346).
102
LOPES JÚNIOR, Aury. Sistemas de investigação preliminar no processo penal. 2. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2003. p. 205.
103
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 250.
104
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 275. No mesmo sentido: GOMES FILHO, Antonio Magalhães;
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de prova no processo penal brasileiro. Revista
Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-208, mar./abr. 2007. p. 195.
105
GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de
prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-
208. mar./abr. 2007. p. 195.
42
examinados”106, motivo pelo qual, “[n]este caso, na fase judicial, a perícia será submetida
ao contraditório diferido”107.
Entretanto, a prova pericial não pode ser alijada da compreensão geral de que o
“contraditório é verdadeira condição de existência da prova”108. Pelo contrário, conforme
Gomes Filho, é “indeclinável a necessidade de que a prova pericial, como qualquer outra,
seja produzida e discutida com a observância da garantia do contraditório”109.
Daí porque Taruffo, mesmo ao diferenciar “os mecanismos processuais para
apresentação das provas periciais” daqueles exigidos para outras provas, destaca que é
“orientação geral [...] que as garantias do devido processo legal, também no contexto das
provas periciais, devem ser asseguradas”110.
Diante desta aparente dicotomia, é preciso aprofundar a análise do tema para
buscar a devida composição da necessidade cautelar que, por vezes, impõe a realização da
perícia a curto prazo, com o direito das partes de participarem, em contraditório, da produção
da prova.111
Nesta tarefa, é necessário distinguir as três hipóteses possíveis: (i) perícias
renováveis; (ii) perícias não renováveis realizadas quando não se sabia quem era o
investigado; (iii) perícia não renovável realizada quando já se sabia quem era o investigado.
106
GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de
prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-
208, mar./abr. 2007. p. 195.
107
GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de
prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-
208, mar./abr. 2007. p. 195.
108
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 250.
109
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 250.
110
TARUFFO, Michele. A prova. Tradução de João Gabriel Couto. Madrid: Marcial Pons, 2014. p. 94.
111
Nesse sentido, Nucci expõe a necessidade de “compor os interesses de efetivação do laudo em curto espaço
de tempo e de participação dos interessados na discussão do seu conteúdo [...]” (NUCCI, Guilherme de
Souza. Código de Processo Penal comentado. 18 ed., rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 462).
43
[A] participação das partes processuais deve ser realizada sempre no mesmo
momento em que se desenvolve a atividade processual de formação dos dados
probatórios, ou seja, o contraditório é essencial para a prova, com consequência
de que, sem ele, a informação não pode servir para o julgamento; em outras
palavras, não há prova. Já na segunda hipótese, a função de controle assegurada
112
TALAMINI, Eduardo. Prova emprestada no processo civil e penal. Revista de Informação Legislativa n.
140, vol. 35, p- 145-162. Out. dez. 1998. p. 146.
113
TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal: estudo
sistemático. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 181. No mesmo sentido, Fernandes (FERNANDES,
Antonio Scarance. Processo penal constitucional. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 65).
114
TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal: estudo
sistemático. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 181.
115
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 398.
116
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 398.
117
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 398.
118
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Limites ao compartilhamento de provas no processo penal. Revista
Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 24, n. 122, p. 43-61., ago. 2016. p. 51. Disponível em:
<http://201.23.85.222/biblioteca/index.asp?codigo_sophia=131333>. Acesso em: 29 nov. 2019.
44
[A] regra segundo a qual a prova deve se formar em contraditório vale somente no
processo, ou seja, para as provas constituendas, que propriamente são criadas no
processo; já para as outras provas, isto é, as pré-constituídas, o importante é que
seja garantido o contraditório, não para a formação da prova, mas para a sua
valoração. Neste caso, basta que as provas pré-constituídas sejam submetidas ao
contraditório, antes da decisão judicial.121
119
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Limites ao compartilhamento de provas no processo penal. Revista
Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 24, n. 122, p. 43-61., ago. 2016. p. 51. Disponível em:
<http://201.23.85.222/biblioteca/index.asp?codigo_sophia=131333>. Acesso em: 29 nov. 2019.
120
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova emprestada no processo penal e a utilização de elementos
colhidos em Comissões Parlamentares de Inquérito. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol.
22, n. 106, p. 157-179, jan./fev. 2014. p. 168. Disponível em:
<http://201.23.85.222/biblioteca/index.asp?codigo_sophia=103185>. Acesso em: 29 nov. 2019.
121
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova emprestada no processo penal e a utilização de elementos
colhidos em Comissões Parlamentares de Inquérito. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol.
22, n. 106, p. 157-179, jan./fev. 2014. p. 169/170. Disponível em:
<http://201.23.85.222/biblioteca/index.asp?codigo_sophia=103185>. Acesso em: 29 nov. 2019.
122
Admitindo que o contraditório diferido é fraco, Pacelli e Fischer: “[é] que, em tais situações, o contraditório
é diferido, ou seja, é adiado – da fase de investigação para a fase de instrução – permitindo-se que a defesa
levante objeções técnicas, do ponto de vista jurídico ou tecnológico, àquele material realizado sem o controle
judicial. Por certo que a qualidade das objeções é reduzida, na medida em que se cuida de questionamentos
pos factum, sem o alcance das percepções imediatas, em tempo real” (PACELLI, Eugenio; FISCHER,
Douglas. Comentários do Código de Processo Penal e sua jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p.
347).
45
123
GOMES FILHO, Antonio Magalhães; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e sucedâneos de
prova no processo penal brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 15, n. 65, p. 175-
208, mar./abr. 2007. p. 195/196.
124
Tais perícias, apesar de necessárias, não são cautelares, pois não há qualquer risco de perecimento da fonte
de prova com o passar do tempo. Conforme Grinover, Fernandes e Gomes Filho, serão cautelares “os casos
em que há urgência, seja porque há risco de desaparecerem os sinais do crime, seja porque é impossível ou
difícil conservar a coisa a ser examinada [...]” (GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio
Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. 10 ed., rev. e atual. São
Paulo: Revista dos tribunais, 2007. p. 144/145).
125
Em sentido contrário sobre esse ponto específico, Grinover, Fernandes e Gomes Filho: “[m]as, se a perícia
não for necessária na fase indiciária, porque inexiste perigo de que desapareçam os sinais do crime ou de que
se dispersem outros elementos probatórios, ou porque servirá ela para justificar a instauração do processo,
deve ser realizada na fase processual, mediante contraditório prévio e com a participação do juiz” (grifo
nosso) (GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio
Magalhães. As nulidades no processo penal. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 145).
126
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas:
Millennium, 2009. p. 304.
47
Desde que o elemento de prova resultante seja relevante para a reconstrução dos fatos (o que
se presume, já que, em não sendo, mesmo a perícia da fase policial não deveria ser admitida
como prova), o pedido, em conformidade com a regra prevista em lei, é justificável em si
mesmo.
Ademais, caso seja exigida uma justificativa da parte, o único apontamento que
possivelmente poder-se-ia fazer seria o de um eventual erro na perícia, conforme, aliás,
defende Greco Filho: “é válida a prova pericial realizada na fase de inquérito policial, por
determinação da autoridade policial, desde que, em juízo, possa ser impugnada e, se estiver
errada, possa ser refeita”127.
O problema é que tal exigência, para além de criar exceção extralegal à regra de
produção da prova em contraditório, acaba por exigir que as partes atuem contra os seus
próprios interesses processuais, inviabilizando, na prática, essa alternativa. Isso porque, de
duas uma: (i) se o pedido for da acusação, por ser hipótese de perícia obrigatória para o
recebimento da denúncia, o pedido fundado na demonstração do erro resultaria na admissão
de que a prova, desde o início, não era idônea para sustentar a acusação oferecida; soma-se
a isso, a circunstância de que qualquer alteração fática demandaria o oferecimento de nova
denúncia; por outro lado, (ii) se o pedido for da defesa, a exigência da demonstração do erro
equivaleria ao acusado ser obrigado a demonstrar falhas na acusação que pesa contra si, para,
somente assim, poder se defender. Neste caso, se o erro é evidente a ponto de ser percebido
pela simples análise diferida do laudo, melhor seria apontar tais erros apenas em memoriais
finais, com a instrução encerrada, principalmente em decorrência do princípio do in dubio
pro reo.
Por fim, destaca-se que sequer é objeto de debate, ante a obviedade, o fato de
que as declarações da testemunha e o reconhecimento pessoal feito por ela devem ser
repetidos em juízo,128 inclusive – e principalmente, aliás – caso sejam os únicos elementos
de informação que fundamentam a denúncia.
Tratando-se também de prova constituenda, estando disponível a fonte de prova
para a renovação do exame, não há qualquer fundamento legal ou lógico para dar à perícia
tratamento diverso do que é dado aos demais meios de prova.
127
GRECO FILHO, Vicente. Tutela Constitucional das Liberdades. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 111.
128
Nesse sentido, Frederico Marques destaca: “[a]s provas pessoais colhidas no inquérito, quando não
renovadas em juízo, de quase nada valem, a não ser para reforço e esclarecimento de indícios e elementos
circunstanciais do fato delituoso e respectiva autoria. É que, nessa fase preparatória de investigação, as
provas são produzidas sem publicidade, e de maneira não contraditória e unilateral” (MARQUES, José
Frederico. Elementos de direito processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas: Millennium, 2009. p. 304).
48
129
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas:
Millennium, 2009. p. 352.
130
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas:
Millennium, 2009. p. 352.
131
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Editorial dossiê “Prova penal: fundamentos epistemológicos e
jurídicos”. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, 2018. p. 51. Disponível em:
<http://www.ibraspp.com.br/revista/index.php/RBDPP/article/view/138>. Acesso em: 29 nov. 2019.
132
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 155.
133
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 155.
134
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 156.
49
135
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 252.
136
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 253.
50
137
Destaca-se que a necessidade de fazer esta diferenciação já era exaltada por Antonio Sacarance Fernandes:
“[r]essurge, entre nós, na direção de tendência manifestada em outros países, preocupação em distinguir atos
próprios de investigação, para cuja efetivação não há como exigir prévia intimação do suspeito a fim de
acompanhá-la, de atos outros, em relação aos quais é possível permitir a participação do indiciado. Assim,
não tem sentido intimar previamente o suspeito para acompanhar ato de investigação consistente em
interceptação de suas ligações telefônicas ou em ato de busca e apreensão a ser feito de surpresa para
localizar objeto importante guardado em residência do próprio suspeito. Nada impede, entretanto, que se
possibilite ao indiciado estar presente em ato de inquirição de testemunha” (FERNANDES, Antonio
Scarance. Processo penal constitucional. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 72).
138
Nesse ponto, deve-se destacar o posicionamento de Badaró no sentido de que até mesmo para os meios de
pesquisa de prova, quando a surpresa não for essencial para o seu sucesso, o contraditório deverá ser observado:
“[a] urgência também costuma estar ligada aos meios de obtenção de prova que, também, necessitam da
surpresa para o seu êxito. É o caso, por exemplo, das interceptações telefônicas ou buscas e apreensões.
Impossível, em tais casos, um contraditório prévio ou o contemporâneo à obtenção do meio. Mas, a urgência
também não é característica indefectível dos meios de obtenção de prova. É possível que uma decisão que
afaste o sigilo bancário ou fiscal, seja precedida de contraditório das partes. Como em tais meios de obtenção
de prova, os dados a serem obtidos não podem ser acessados, alterados ou destruídos pelo investigado, já que
estão armazenados com terceiros, a regra é que se produzam em contraditório de partes” (BADARÓ, Gustavo
Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. p. 429/430).
51
uma desnecessária repetição da referência à prova cautelar, tanto na forma do gênero como
também da espécie antecipada.
No entanto, tal entendimento não se coaduna com uma interpretação sistemática
do texto legal. O CPP não só prevê um procedimento geral de produção de prova antecipada
(art. 156, I), como também trata especificamente da possibilidade de antecipação da prova
testemunhal (art. 225), em contraditório e perante o juiz.139
Além das provas cautelares e antecipadas, o artigo 155 do CPP ainda admite o
elemento de informação colhido na fase inquisitória, sem contraditório, quando irrepetível.
Entretanto, conforme sustenta Badaró, “a irrepetibilidade que autoriza a valoração judicial
do elemento de prova colhido sem contraditório é aquela que decorre de fatores
imprevisíveis, quando da sua obtenção”140. Ou seja, como acrescenta Gomes Filho,
“[s]omente quando tiver sido imprevisível a impossibilidade de renovação da prova será
viável utilizar os elementos anteriormente obtidos sem o contraditório”141.
Assim, diferentemente das provas cautelares e antecipadas, em que a
impossibilidade de renovação judicial da prova é previamente conhecida, na prova
irrepetível o não refazimento da prova deriva de fator externo, posterior e imprevisível.
Nesse sentido, explica Badaró, “[n]a prova irrepetível, não houve contraditório
na sua produção e não poderá mais haver, porque a fonte de prova, por fatores
imprevisíveis, não mais está disponível. Já na prova antecipada, fatores previsíveis de risco
e indisponibilidade da fonte de prova justificaram a sua produção antecipada, mas em
contraditório de partes e perante um juiz”142.
Com essas considerações, retomando a análise da prova pericial não renovável,
podemos concluir que, salvo raras exceções (e.g. incêndio que destrua a fonte de prova em
depósito), a perícia não poderá ser classificada como irrepetível, pois o risco de
desaparecimento dos sinais do crime ou a impossibilidade de conservação da coisa são
previsíveis.143
139
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 430/431.
140
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 430.
141
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 254.
142
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 431.
143
Em sentido contrário, Antonio Scarance Fernandes sustenta que a irrepetibilidade da prova pode decorrer
de sua característica natural, o que resulta na aceitação de uma prova irrepetível decorrente de evento
52
previsível: “[a] irrepetibilidade de um elemento informativo, permitindo a sua utilização como prova, sujeita
a contraditório diferido, pode ser de duas espécies: uma irrepetibilidade natural e uma irrepetibilidade
resultante de fato posterior” (FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional. 7. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 73/74). Contudo, ao dar exemplos de provas naturalmente irrepetíveis,
o autor cita a interceptação telefônica e a busca e apreensão, meios de pesquisa de prova que têm na surpresa
requisito de validade. Como já desenvolvido, não entendemos que estes meios de pesquisa de prova sejam
irrepetíveis, no significado dado a este termo pelo artigo 155 do CPP.
144
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 253.
145
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 429.
53
146
Conforme Nucci, “[a]s provas antecipadas advêm do novel instituto, criado pela Lei 11.690/08 (art. 156,
I, CPP), possibilitando-se à parte interessada que solicite ao magistrado (e este, de ofício, faça o mesmo) a
produção de determinada prova, cuja coleta seria feita, como regra, durante a instrução do processo”
(NUCCI, Guilherme de Souza. Provas no processo penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p.
29).
147
LOPES JÚNIOR, Aury. Sistemas de investigação preliminar no processo penal. 2. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2003. p. 207.
54
148
Com esse exemplo, Badaró: “[a]ssim, por exemplo, no caso de uma testemunha presencial de um crime que
seja muito idosa ou esteja acometida de grave e irreversível doença [...], não é possível aguardar o término
do inquérito policial, o oferecimento da denúncia, a citação e resposta do acusado e, por fim, a designação de
audiência de instrução e julgamento para, só então, ouvir tais pessoas que tem relevantes informações sobre
os crimes” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2018. p. 430). Também entende do mesmo modo Nucci: “[a]ssim, exemplificando, pode-se colher
o depoimento de uma testemunha muito idosa, de forma antecipada, ainda na fase investigatória, em razão da
urgência requerida pelo caso concreto” (NUCCI, Guilherme de Souza. Provas no processo penal. 3. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 29).
149
NUCCI, Guilherme de Souza. Provas no processo penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p.
44.
150
Nesse sentido, Murillo ressalta que, segundo o Código Nacional de Processo Penal Mexicano, "quando for
realizada uma perícia sobre objetos consumidos quando analisados, a primeira análise não será permitida,
exceto pela quantidade estritamente necessária, a menos que sua existência seja escassa e os especialistas não
podem expressar sua opinião sem consumir completamente”, “neste último casos ou qualquer outro
semelhante que impeçam que posteriormente se pratique uma perícia independente, deverá ser notificado o
Ministério Público e o defensor do imputado, se este já tiver designado um ou a defensoria pública, para que,
se julgar necessário, os assistentes técnicos de ambas as partes pratiquem conjuntamente o exame ou, para
que o assistente da defesa testemunhe a realização da opinião de especialistas” (MURILLO, José Daniel
Hidalgo. Cadena de custodia. Ciudad de México: Flores, 2017. p. 18, tradução nossa).
151
LOPES JÚNIOR, Aury. Sistemas de investigação preliminar no processo penal. 2. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2003. p. 207.
55
Ressalta-se, por fim, que a prova antecipada deverá ser utilizada apenas em
situações excepcionais, quando presentes as exigências cautelares, sendo sempre preferível
aguardar a instrução judicial, se possível. Como destaca Badaró, mesmo na produção de
prova antecipada “pode haver restrições – em graus variados – ao contraditório”152,
principalmente quando feita na fase de inquérito policial, porque antes do oferecimento da
denúncia “os fatos poderão ainda não estar perfeitamente delimitados, ainda que já haja
um investigado indiciado [...]”153.
Desta forma, caso seja previsível a impossibilidade de renovação da perícia em
contraditório judicial, faz-se necessária sua produção antecipada, desde que o tempo
necessário para a intimação das partes não afete as características da fonte de prova e desde
que o investigado já seja conhecido.
152
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 430.
153
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 431.
154
Adota-se aqui o entendimento de que o objeto da prova não são os fatos em si, mas sim a afirmação que as
partes fazem sobre os fatos. Nesse sentido, Gomes Filho: “[a]firma-se, em geral, que o objeto de prova (thema
probandum) são os fatos que interessam à solução de uma controvérsia submetida à apreciação judicial. Com
isso, pretende-se colocar em especial evidência a circunstância de que a atividade probatória não se destina
a informar o juiz sobre as normas de direito positivo, mesmo porque tal conhecimento pelo juiz é presumido
(iura novit curia). Mas essa ideia traduz apenas uma visão parcial e aproximada daquilo sobre o que,
efetivamente, verte a atividade probatória judicial. Em primeiro lugar, a prova não objetiva simplesmente
reconstruir uma realidade fática como tal, mas na medida em que os fatos a serem provados constituam
pressupostos para a aplicação judicial do direito. Para o processo (e particularmente para a atividade
probatória) o próprio fato é determinado, segundo a sua idoneidade para produzir consequências jurídicas.
Em síntese, como adverte Taruffo, é o direito que define e determina aquilo que no processo constitui o fato.
Sob outro aspecto, também não é exato dizer que a prova destina-se a obter o conhecimento sobre um fato,
pois, antes disso, o que se apura no processo é a verdade ou a falsidade de uma afirmação sobre o fato. É que
o fato, como fenômeno do mundo real, somente poderia ser constatado no próprio momento em que se verifica;
não é possível, portanto, provar um acontecimento passado, mas somente demonstrar se uma afirmação sobre
este é ou não verdadeira. Disso resulta que, na verdade, o thema probandum é determinado pelas proposições
representativas do fato juridicamente relevante, e colocadas pelas partes como base da acusação ou da defesa,
ou mesmo como como fundamento de eventual pesquisa judicial.” (GOMES FILHO, Antonio Magalhães.
Notas sobre a terminologia da prova: reflexos no processo penal brasileiro. In: YARSHELL, Flávio
Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: DPJ, 2005. p. 316/317). Com
igual posição, Badaró, “[o]s fatos são acontecimentos históricos que existiram ou não existiram. Assim, os
fatos ou existem ou são imaginários. O que pode ser verdadeiro ou falso e, portanto, passível de prova, são as
afirmações quanto à existência do fato” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed.,
rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 399). Em sentido contrário, Frederico Marques
conceitua objeto da prova como “a coisa, fato, acontecimento, ou circunstância que deve ser demonstrado no
processo”. Ao assumir tal posição, de fato, como destacado por Gomes Filho, percebe-se a preocupação de
56
sua vez, produz informações extraídas das fontes de prova, que servirão de substrato para
futura apreciação judicial em relação às afirmações das partes sobre os fatos juridicamente
relevantes. O conteúdo proveniente da atividade probatória judicial, ainda não apreciado
pelo juiz, é o que constitui o elemento de prova.
Assim, de acordo com Gomes Filho, elemento de prova é “cada um dos dados
objetivos que confirmam ou negam uma asserção a respeito de um fato que interessa à
decisão da causa”155. No mesmo sentido, Badaró entende que “elemento de prova é o dado
bruto que se extrai da fonte, ainda não valorado pelo juiz”156.
Em outras palavras, o elemento de prova é a informação extraída de uma fonte
de prova ou revelada por um meio de pesquisa de prova, que tem a finalidade de demonstrar,
no processo e ao juiz, a veracidade sobre um fato alegado.
Por esse aspecto, o elemento de prova é o dado por meio do qual se busca atingir
o que Tourinho Filho chama de “objetivo da prova”, isto é, a informação colhida com a
finalidade de “formar a convicção do Juiz sobre os elementos necessários para a decisão da
causa”157.
No caso das perícias, o elemento de prova é o resultado do exame realizado, que
normalmente é apresentado em juízo na forma de laudo escrito.158 A depender da perícia, o
elemento de prova pode (i) estar limitado à descrição de um fato ou objeto (perícia
percipiendi), como acontece nos exames de nível de poluição sonora de um local ou que
indicam a data de validade disposta na embalagem dos produtos, sem analisar se estão ou
não impróprios para o consumo; ou (ii) conter a declaração conclusiva sobre o fato ou objeto
Frederico Marques de distinguir prova do fato e do direito: “como o juiz se presume instruído sobre o direito
a aplicar, os atos instrutórios só se referem à prova das quaestiones facti”, com exceção do direito estrangeiro
e consuetudinário, que podem ser objeto de prova (MARQUES, José Frederico. Elementos de direito
processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas: Millennium, 2009. p. 254). Também Tourinho Filho entende
que objeto de prova “são todos os fatos, principais ou secundários, que reclamem apreciação judicial e exijam
comprovação” (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, vol. 3. 32 ed., rev. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2010. p. 233).
155
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Notas sobre a terminologia da prova: reflexos no processo penal
brasileiro. In: YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São
Paulo: DPJ, 2005. p. 307.
156
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016. p. 386.
157
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, vol. 3. 32 ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,
2010. p. 232.
158
Conforme Eduardo Espínola Filho, “não há necessidade de laudo escrito, fazendo-se constar do próprio
auto da diligência [...] o seu parecer, que poderá ser ditado na ocasião” (ESPINOLA FILHO,
Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. comentários aos arts. 63-184. vol. 2. 3. ed., Rio de
Janeiro: Borsoi, 1956. p. 509). No mesmo sentido: NORONHA, E. Magalhães. Curso de direito processual
penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1973. p. 98.
57
examinado (perícia deducendi), comum nas perícias ambientais que indicam ou não a
existência de dano, ou na constatação se o projétil foi disparado por uma determinada arma
de fogo.159
O elemento de prova decorrente das perícias deducendi merece particular
atenção porque, ao contrário do conteúdo obtido através dos demais meios de prova, fornece
ao juiz não somente uma informação sobre os fatos alegados pelas partes, mas também um
juízo de valor sobre a questão controvertida.160 Isto é, ao passo que a testemunha assume
postura passiva, respondendo às indagações das partes de acordo com as observações que
teve dos fatos, os peritos, nas perícias deducendi, analisam a fonte com a consequente
emissão de uma opinião técnica sobre a matéria. 161 Assim, como destaca Badaró, “enquanto
a prova testemunhal se decompõe em observação e declaração, a perícia é constituída por
observação, avaliação e declaração”162, de modo que a “característica fundamental da
perícia é que o perito emite um juízo de valor sobre os fatos”163.164
Em decorrência desta especificidade, aliás, desenvolveu-se por parte da doutrina
a noção de que, conforme entende Tourinho Filho “a perícia é mais que um meio de prova
e que, na verdade, pelo menos no nosso jus positum, o legislador não considerou o perito
como simples sujeito de prova, mas como auxiliar do Juiz”165.
159
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas:
Millennium, 2009. p. 234. No mesmo sentido: BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4.
ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 439. Ainda, de acordo com Vázquez, as “inferências
feitas pelo perito em um processo judicial podem ser sobre os fatos particulares do caso, mas também pode
simplesmente enunciar conhecimentos gerais totalmente independentes do caso ou uma espécie mesclada, isto
é, a instanciação do caso concreto em uma generalização” (VÁZQUEZ, Carmen. De la prueba científica a la
prueba pericial. Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 44, tradução nossa).
160
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016. p. 438/439.
161
Apesar de extrapolar os limites deste trabalho, vale destacar a problematização feita por Vázquez sobre o
fato de o perito emitir opinião sobre um assunto especializado: “[o]utra pergunta relevante é como
identificamos o experto, é através de suas credenciais, isto é, seus títulos acadêmicos? através de outros
expertos? [...] Uma coisa são os elementos da expertise, outra distinta é como identificamos o experto”
(VÁZQUEZ, Carmen. De la prueba científica a la prueba pericial. Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 44, tradução
nossa).
162
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016. p. 438.
163
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016. p. 438.
164
Em decorrência do juízo de valor feito pelo perito, pontua Fierro-Mendez Heliodoro: “a doutrina tem
alertado que o encargo do perito requer três funções, a saber: a preparação técnica; moralidade e discrição.
Não se pode ser um bom perito se falta alguma dessas condições. O dever de um perito é dizer a verdade; mas
para isso é necessário: primeiro saber encontrar a verdade, e depois querer dizê-la. O primeiro é um problema
científico e o segundo é um problema moral” (HELIODORO, Fierro-Mendez. La Prueba em el Derecho Penal.
Sistema acusatório. Bogotá: Leyer, 2006, p. 191, tradução nossa).
165
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, vol. 3. 32 ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva,
2010. p. 274.
58
166
LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 424.
167
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 155.
168
ESPINOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. comentários aos arts. 63-184.
vol. 2. 3. ed., Rio de Janeiro: Borsoi, 1956. p. 572.
59
169
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 8 ed., rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2008. p. 575. No mesmo sentido: José Frederico Marques ressalta que “o perito deve atuar com
imparcialidade e perfeita exação, visto que lhe cabem tarefas de suma importância para perfeito
esclarecimento do thema probandum” (MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual
penal: vol. 2. 3.ed. atual Campinas: Millennium, 2009. p. 325); Ainda: NORONHA, E. Magalhães. Curso de
direito processual penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1973. p. 95.
170
GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As
nulidades no processo penal. 10 ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos tribunais, 2007. p. 175. Nesse ponto,
apesar da discordância sobre a classificação da perícia como meio de prova, tanto Tourinho Filho (TOURINHO
FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, vol. 3. 32 ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 286), como
Gomes Filho (GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria
Thereza Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 275), Espínola Filho (ESPINOLA FILHO, Eduardo. Código
de processo penal brasileiro anotado. comentários aos arts. 63-184. vol. 2. 3. ed., Rio de Janeiro: Borsoi,
1956. p.280/281) e Aury Lopes Jr. (LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 16. ed. São Paulo:
Saraiva, 2019. p. 322) convergem.
171
E. Magalhães Noronha, ao tratar do tema, afirma: “[c]om efeito, presta ele serviços de relevo e de suma
importância cuidando, então, a lei de ditar normas que afastam a suspeita de parcialidade de sua atuação,
estendendo-lhes incompatibilidades e impedimentos relativos a pessoas que dirigem ou movem o processo, ou
nele intervêm” (NORONHA, E. Magalhães. Curso de direito processual penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1973.
p. 96). Nesse mesmo sentido: BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 439, nota de rodapé 142; GRINOVER, Ada Pellegrini;
FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. 10
ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos tribunais, 2007. p. 175.
60
172
Nesse sentido, Grinover, Fernandes e Gomes Filho (GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio
Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. 10 ed., rev. e atual. São
Paulo: Revista dos tribunais, 2007. p. 138), e Badaró (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo
penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. p. 450). Ainda, E. Magalhães Noronha afirmar que “[o]
laudo não obriga o juiz. Caso contrário, seria o perito, em última análise, o julgador” (NORONHA, E.
Magalhães. Curso de direito processual penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1973. p. 96).
173
Nesse ponto, apesar da discordância sobre a classificação da perícia como meio de prova, concordam tanto
Tourinho Filho (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, vol. 3. 32 ed., rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2010. p. 92), como Gomes Filho (GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas: Lei 11.690,
de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza Rocha de. (coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis
de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 274), Espínola Filho
(ESPINOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. comentários aos arts. 63-184.
vol. 2. 3. ed., Rio de Janeiro: Borsoi, 1956. p. 569) e Aury Lopes Jr. (LOPES JÚNIOR, Aury. Direito
processual penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 424).
174
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016. p. 386.
175
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Notas sobre a terminologia da prova: reflexos no processo penal
brasileiro. In: YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São
Paulo: DPJ, 2005. p. 308.
176
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Notas sobre a terminologia da prova: reflexos no processo penal
brasileiro. In: YARSHELL, Flávio Luiz. Estudos em homenagem à Professora Ada Pellegrini Grinover. São
Paulo: DPJ, 2005. p. 308.
177
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016. p. 387.
61
178
MAY, Richard. Criminal evidence. 2 ed., Londres: Sweet & Maxwell, 1990, p. 4.
179
CAMPBELL, Henry B. Black's Law Dictionary. 6 ed., St. Paul, Minn, West Group, 1990, p. 1215.
180
GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As
nulidades no processo penal. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 138.
181
GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As
nulidades no processo penal. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 138.
182
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 155.
183
Rechaçando esta possibilidade, Magalhães Noronha afirma: “[o] laudo não obriga o juiz. Caso contrário,
seria o perito, em última análise, o julgador” (Curso de direito processual penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva,
1973. p. 98).
62
científico, de forma que se garanta que a perícia efetivamente se presta a demonstrar o que
se diz capaz.
A segunda consequência acima apontada, por sua conexão mais próxima com a
quebra da cadeia de custódia, será aprofundada nos capítulos seguintes. Vale pontuar, desde
logo, que, independentemente do juízo prévio de admissibilidade da perícia, cabe ao
magistrado analisar os elementos de prova de acordo com a diretriz estabelecida na
exposição de motivos do Código de Processo Penal, segundo a qual “[t]odas as provas são
relativas; nenhuma delas terá, ex vi legis, valor decisivo, ou necessariamente maior
prestígio que outra”184.
Assim, conforme explica Aury Lopes Jr., deve-se cuidar para que o sedutor
discurso científico não cegue o juiz,185 por mais encantador ou “evidente” que seja o seu
resultado, pois “o evidente cega, impede a discussão, seda os sentidos e mata o
contraditório”186. Com isso, conclui o autor que “uma prova pericial como essa demonstra
apenas um grau, maior ou menor, de probabilidade de um aspecto do delito, que não se
confunde com a prova de toda a complexidade que constitui o fato”187.188
No mesmo sentido, Gascón Abellán alerta para que:
[A] importância das provas periciais na prática processual não tem sido
acompanhada de um processo de cautelas e controles em relação às mesmas. Há
acontecido o contrário. Principalmente pelo fato de se apresentaram como
‘científicas’ (e porque na maioria das vezes - pelo menos na Europa - proverem de
laboratórios oficiais da polícia científica) estas provas vem sido acompanhadas de
uma áurea de infalibilidade que interrompe (quando não claramente impede)
184
CAMPOS, Francisco. Exposição de motivos do código de processo penal. 1941. Disponível em:
<http://honoriscausa.weebly.com/uploads/1/7/4/2/17427811/exmcpp_processo_penal.pdf>. Acesso em: 29
nov. 2019.
185
Em trecho de Pacelli e Fischer sobre a prova pericial, temos a exata noção da maior representatividade com
que este elemento de prova é recebido, até mesmo para quem nega ser “superior às demais”: “[n]ão há,
portanto, hierarquia de prova. Mas especificidade dela, não temos dúvidas! E por especificidade da prova
entendemos o meio técnico especializado que permite maior compreensão do significado da prova, bem como
de suas possíveis interpretações. A prova técnica não é uma prova superior às demais. Mas é, sim, uma prova
uma prova especial, quanto ao conteúdo da interpretação de um meio de prova” (PACELLI, Eugenio;
FISCHER, Douglas. Comentários do Código de Processo Penal e sua jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Atlas,
2016. p. 393).
186
LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 439.
187
LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 439.
188
Na mesma linha, Neuburger, apesar de reconhecer a importância de o juiz “abandonar [...] uma ‘teoria
autoritária’ do livre convencimento em favor da busca de pesquisa científica para embasar sua própria
decisão”, ressalta o risco de a prova pericial gerar “atitudes judiciais submissas e renunciadas, indulgentes
com a recepção acrítica”, para, então, concluir que cabe ao juiz “assumir o papel do ‘domínio real do processo
de tomada de decisão’, do ‘pesquisador diligente e atento à verdade através da consciência e do escrutínio
crítico de uma emergência fática útil’” (NEUBURGER, Luisella de Cataldo. La prova scientifica nel processo
penale. Padova: CEDAM, 2007. p. 508).
63
qualquer tentativa de revisão ou reflexão crítica sobre elas, com o resultado de que
sua validade e valor probatório são geralmente assumidos como dogmas de fé.189
189
ABELLÁN, Marina Gáscon. Prueba científica. un mapa de retos. In: VÁZQUEZ, Cármen. Estándares de
prueba y prueba científica: ensayos de epistemología jurídica. madrid: marcial pons, 2013. p. 182, tradução
nossa.
190
Apesar da predileção pelo exame de corpo de delito direto ou indireto, o artigo 167 do CPP permite que
“[n]ão sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal
poderá suprir-lhe a falta”. Assim, “O CPP estabelece uma ordem de sucessão quanto aos meios de prova da
materialidade delitiva e uma regra de exclusão. Em regra, realiza-se o exame de corpo de delito direto. Não
sendo este possível, por ter desaparecido o corpo do delito, mas havendo outros dados que possam ser
analisados pelos peritos, realiza-se o exame de corpo de delito indireto. Por último, não sendo possível o
exame de corpo de delito direto, nem o exame de corpo de delito indireto, a prova testemunhal poderá
comprovar a materialidade delitiva. De outro lado, em nenhuma hipótese, a prova da materialidade delitiva
poderá ser feita por meio da confissão” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. p. 447). A existência da regra de exclusão proibindo a prova da
materialidade pela confissão é explicada por Tourinho Filho: “[...] as razões são óbvias: muitas e muitas vezes,
o réu confessa um crime que efetivamente não cometeu. O amor paternal, o amor filial, a paixão, a vontade
de ganhar algum dinheiro, o desejo de encontrar, na cadeia, um lugar para dormir e comer, distúrbios mentais,
eis alguns motivos que podem levar um homem a confessar um crime que efetivamente não cometeu”
(TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal comentado: arts. 1º a 393º. 14. ed. São
Paulo: Saraiva, 2012. p. 599/600).
191
Sobre isso, Badaró explica: “[e]fetivamente, trata-se de uma regra não encontrada em outros sistemas
processuais penais. Melhor seria que se exigisse uma fundamentação adequada que demonstrasse,
efetivamente, com base em que elementos o juiz racionalmente optou por uma afirmação fática como sendo a
que encontra elementos que a corroborem no grau suficiente para o standard probatório exigido, no caso do
processo penal, prova além de qualquer dúvida razoável. Num sistema que funcionasse corretamente, nos
casos em que um crime tivesse deixado vestígio e houvesse uma dúvida razoável sobre sua ocorrência, cuja
demonstração demandasse conhecimentos técnicos, certamente o juiz não conseguiria justificar uma escolha
racional pela hipótese acusatória sem que estivesse amparada em uma perícia sobre o corpo de delito. Porém,
quando a motivação não é levada a sério, a manutenção da regra da obrigatoriedade de exame de corpo de
delito é um antídoto a um livre convencimento que foi deturpado em um livre arbítrio judicial” (BADARÓ,
Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. p. 445/446).
192
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal: vol. 2. 3.ed., atual Campinas:
Millennium, 2009. p. 362.
64
alcançadas por perito que, em tese, possui maior conhecimento sobre a área de expertise
exigida pelo objeto da perícia realizada.193
Nesse sentido, Echandía qualifica como “absurdo” “ordenar ao juiz que aceite
cegamente as conclusões dos peritos”194, na medida tal medida “desvirtua as funções
daquele [juiz]”195 e transforma os peritos “nos juízes da causa”196, contudo, finaliza o autor,
“[n]aturalmente, a rejeição pelo juiz do parecer dos peritos deve basear-se em razões sérias,
numa análise crítica”197.
Nesse ponto, até mesmo para auxiliar o juiz nessa tarefa, é essencial que o
contraditório tenha sido efetivamente exercido pelas partes, principalmente no que se refere
aos conhecimentos e métodos técnicos que envolvem o exame específico, que poderão ser
contrariados, com maior rigor e precisão, por assistente técnico. Isso porque, também
gozando da capacidade técnica necessária para o exame realizado, o assistente técnico
poderá demonstrar equívocos metodológicos no procedimento, apontar circunstâncias,
objetos ou fatos essenciais para o resultado do exame que foram ignorados pelo perito no
exame, entre outras possíveis falhas ou lacunas que colocam em dúvida o juízo de valor
emitido pelo perito.198
A melhor qualidade da prova técnica produzida em contraditório, ao exigir o
conhecimento de outros campos da ciência, permitirá o aprofundamento da discussão,
conduzindo o processo na direção de um pronunciamento judicial mais qualificado, já que o
193
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2016. p. 446; TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal comentado: arts.
1º a 393º. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 629. Por sua vez, Pacelli e Fischer defendem que “o juiz, por
não se qualificar como expert, não pode arvorar-se em censor dos peritos e dos assistentes técnicos”. Por isso,
entendem que, antes de rejeitar integral ou parcialmente o laudo, o juiz deve primeiro determinar “a
complementação, o esclarecimento ou até mesmo a elaboração de um novo laudo oficial, recorrendo, se
necessário, a outros peritos ou profissionais com conhecimento na matéria” (PACELLI, Eugenio; FISCHER,
Douglas. Comentários do Código de Processo Penal e sua jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p.
420).
194
ECHANDÍA, Hernando Devis. Compendio de La Prueba Judicial, Tomo II, Santa Fé: Rubinxal-Vulzoni,
2007. p. 112.
195
ECHANDÍA, Hernando Devis. Compendio de La Prueba Judicial, Tomo II, Santa Fé: Rubinxal-Vulzoni,
2007. p. 112.
196
ECHANDÍA, Hernando Devis. Compendio de La Prueba Judicial, Tomo II, Santa Fé: Rubinxal-Vulzoni,
2007. p. 112.
197
ECHANDÍA, Hernando Devis. Compendio de La Prueba Judicial, Tomo II, Santa Fé: Rubinxal-Vulzoni,
2007. p. 113.
198
Conforme Pacelli e Fischer, “[...] o papel dos assistentes técnicos será de suma importância, na medida em
que poderão apontar defeitos nos laudos oficiais, demonstrando ao juiz a incompletude do laudo, sobretudo
quando não esclarecidas as dívidas em audiência” (PACELLI, Eugenio; FISCHER, Douglas. Comentários do
Código de Processo Penal e sua jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 419).
65
juiz “terá o dever de valorar o parecer técnico, em especial, confrontando-o com o laudo
do perito oficial, fundamentando as razões pelas quais deu mais valor a este ou àquele”199.
Salienta-se, por fim, que a aceitação da perícia não se confunde com a sua
admissão como prova – realizada em etapa anterior e tratada no capítulo 3, infra –, pois o
que se aceita ou rejeita é a conclusão, o juízo de valor do perito, não o elemento de prova
introduzido no processo. Assim, somente após a validação dos critérios de admissão da prova
pericial no processo, o juiz irá valorar o seu conteúdo para aceitar ou rejeitar o laudo.
Também não se pode confundir como sendo rejeição da perícia a conclusão do
magistrado no sentido de o laudo não ter revelado elemento de prova suficiente para
demonstrar a veracidade de um fato alegado no processo. Nesse caso, as conclusões da
perícia foram integralmente aceitas, mas o elemento de prova, quando analisado em conjunto
com os outros do processo, não foi conclusivo para convencer o juiz. Pode-se exemplificar
essa situação com os laudos que atestam a data da validade dos produtos vencidos que, apesar
de aceitos, podem não formar a convicção do juiz sobre a impropriedade daqueles produtos
para o consumo.200 Diferente é a situação de um laudo que concluiu pela existência de dano
em superfaturamento da obra, em que a análise do perito desconsiderou os custos com uma
etapa preliminar da obra também contratada, razão pela qual o juiz rejeitará a conclusão, isto
é, a equivocada afirmação sobre a existência do dano.
Portanto, como se demonstrou, o resultado da prova envolvendo o elemento de
prova pericial possui particularidades que devem ser observadas no momento processual
adequado, principalmente pelo magistrado na formação da sua livre convicção motivada.
199
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 450. Em sentido contrário, Pacelli e Fischer sustentam que sobre “os laudos produzidos pelos assistentes
técnicos [...] sequer é preciso que o juiz fundamente, em maior extensão, a razão pela qual preferiu seguir o
laudo oficial” (PACELLI, Eugenio; FISCHER, Douglas. Comentários do Código de Processo Penal e sua
jurisprudência. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 419).
200
Nesse sentido tem decidido o Superior Tribunal de Justiça: “a materialidade do crime descrito art. 7º, inciso
IX, da Lei n. 8.137/1990 apenas se perfaz com a realização da perícia constatando a nocividade ao consumo
humano, não bastando mera irregularidade na embalagem ou validade vencida” (REsp nº 1.792.212/SP, 5ª
T., Min. Rel. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 21.03.2019). Com o mesmo entendimento: RHC 97.335/SC,
5ª T., Min. Rel. Joel Ilan Paciornik, DJe 28.03.2019.
67
201
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Editorial dossiê “prova penal: fundamentos epistemológicos e
jurídicos". Revista brasileira de direito processual penal, Belo Horizonte, vol. 4, n. 1, p. 43-80., 2018. p.
44. Disponível em: <http://www.ibraspp.com.br/revista/index.php/RBDPP/article/view/138>. Acesso em: 05
dez. 2019.
202
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 222.
203
Reconhecendo a dupla vinculação epistêmica e constitucional da cadeia de custódia, Edinger: “[...] tratarei,
em sequência, dos fundamentos do constrangimento epistemológico no processo, para, então conceituar a
cadeia de custódia sob essa luz. Após, farei a subsunção do conceito de cadeia de custódia aos fundamentos
constitucionais que o albergam, em verdadeiro raciocínio silogístico” (EDINGER, Carlos. Cadeia de custódia,
rastreabilidade probatória. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, vol. 24, n. 120, p. 237-257,
mai./jun. 2016. p. 238).
68
dizer qual a solução correta para tais problemas”204. Dessa forma, sem qualquer intenção
de incorrer na denunciada pretensão, passa-se a estabelecer o modelo de processo que servirá
de premissa para o desenvolvimento do estudo da cadeia de custódia.
Conforme Grinover, a regularidade do processo e a justiça das decisões são
fatores legitimantes do exercício da jurisdição.205 Também neste sentido, Scarance
Fernandes afirma que “[é] mediante o processo que o juiz, como órgão soberano do Estado,
exerce a sua atividade jurisdicional e busca, para o caso, a solução mais justa”206.Verifica-
se, assim, que a busca por decisões justas é fator legitimante da própria jurisdição,
compreendida, no processo penal, como o exercício do poder de punir.207
Partindo-se dessa premissa, o Estado, na tarefa jurisdicional de verificação da
hipótese acusatória, deve buscar a correta reconstituição dos fatos históricos,208 pois, como
afirma Taruffo, “nenhuma norma é aplicada de maneira correta a fatos errados”209. O
correto juízo fático somente poderá ser perseguido por meio de um processo penal orientado
pela busca da verdade, no qual “a apuração da verdade dos fatos correspondentes ao assim
chamado suporte fático abstrato regulado pela norma é uma condição necessária para a
correta aplicação da norma no caso concreto”210. Caso contrário, se a verdade fosse
204
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Editorial dossiê “prova penal: fundamentos epistemológicos e
jurídicos". Revista brasileira de direito processual penal, Belo Horizonte, vol. 4, n. 1, p. 43-80., 2018. p. 46.
Disponível em: <http://www.ibraspp.com.br/revista/index.php/RBDPP/article/view/138>. Acesso em: 05 dez.
2019.
205
GRINOVER, Ada Pellegrini. O processo constitucional em marcha: contraditório e ampla defesa em cem
julgados do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo. São Paulo: Max Limonad, 1985. p. 9.
206
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
1999. p. 31.
207
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Editorial dossiê “prova penal: fundamentos epistemológicos e
jurídicos". Revista brasileira de direito processual penal, Belo Horizonte, vol. 4, n. 1, p. 43-80., 2018. p. 45.
Disponível em: <http://www.ibraspp.com.br/revista/index.php/RBDPP/article/view/138>. Acesso em: 05 dez.
2019.
208
Nesse sentido, Badaró sustenta que “o resultado do processo penal somente será justo e legítimo, caso
sejam respeitados três fatores concorrentes: um correto juízo fático, com vistas à reconstrução histórica dos
fatos imputados; um correto juízo de direito, com uma acertada interpretação da lei e aplicação da norma aos
fatos; e, por fim, o funcionamento do instrumento processual, respeitando direitos e garantias das partes, com
estrita observância do rito legal. Em suma, uma decisão justa necessita do bom exercício de atividades
epistêmica e hermenêutica, desenvolvidas sob o devido processo legal” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi
Ivahy. Editorial dossiê “prova penal: fundamentos epistemológicos e jurídicos". Revista brasileira de direito
processual penal, Belo Horizonte, vol. 4, n. 1, p. 43-80, 2018. p. 45/46. Disponível em:
<http://www.ibraspp.com.br/revista/index.php/RBDPP/article/view/138>. Acesso em: 05 dez. 2019).
209
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 140.
210
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 140.
69
indiferente ao processo, seria mais rápido e menos custoso retomar o sistema de ordálias ou
decidir por meio do lançamento de dados.211
A vinculação do processo penal com a verdade também decorre da justificativa
ético-social da aplicação da sanção penal. Adotando-se a concepção de Taruffo, a verdade
como vetor orientador do processo deriva da compreensão de “um quadro de uma situação
sociopolítica”, em que “a verdade constitui um valor basilar de referência a um standard”,
ao qual devem se conformar Estado e particulares.212 Uma vez estabelecido este cenário de
organização social, segue Taruffo, “seria, por assim dizer, um tanto paradoxal imaginar um
sistema democrático, inspirado no valor da verdade, no qual, entretanto, a administração
da justiça não se inspirasse em tal valor”213.
Outrossim, partindo de uma análise teleológica da busca pela verdade no
processo penal, Ferrer Beltrán destaca que somente a aplicação de sanção com fundamento
na comprovação da verdade sobre o fato permite ao Estado ter êxito na tarefa de
direcionamento das ações dos destinatários da norma. Caso a punição, pois, não estivesse
atrelada à verdadeira ocorrência do fato tipificado, atingindo randomicamente a todos
independentemente do seu comportamento, não haveria razão para que os cidadãos
deixassem de praticar determinada conduta.214
Dessa forma, adotando-se as concepções processual, filosófica e teleológica
acima apontadas, a busca pela verdade se estabelece como fator legitimador do poder de
punir,215 materializando-se no processo por meio da busca pela correta reconstituição do fato
enunciado na hipótese acusatória.
Não se ignora, contudo, que, apesar de desejável, a verdade absoluta é
inatingível. O que se persegue, portanto, é a verdade relativa, isto é, a maior aproximação
211
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Editorial dossiê “prova penal: fundamentos epistemológicos e
jurídicos". Revista brasileira de direito processual penal, Belo Horizonte, vol. 4, n. 1, p. 43-80., 2018. p. 46.
Disponível em: <http://www.ibraspp.com.br/revista/index.php/RBDPP/article/view/138>. Acesso em: 05 dez.
2019.
212
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 120. Para o detalhamento, ver p. 95/120.
213
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 120/121.
214
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 30.
215
No mesmo sentido, SANTORO, Antonio Eduardo Ramires; TAVARES, Natália Lucero Frias; GOMES,
Jefferson de Carvalho. O protagonismo dos sistemas de tecnologia da informação na interceptação telefônica:
a importância da cadeia de custódia. In. Revista brasileira de direito processual penal, Belo Horizonte, vol. 3,
n. 2, p. 605-632, 2017, p. 610.
70
possível entre a reconstrução dos fatos no processo e o fato histórico ocorrido no mundo
real, sendo certo que este existe e deve servir de medida para a formatação daquela.216
Conforme Badaró, “ainda que não possamos saber, com absoluta certeza,
quando um enunciado fático é verdadeiro, podemos saber quando, com base em uma
probabilidade lógica prevalecente, um enunciado é preferível ao outro”217.
Dessa forma, ainda que se busque orientar o processo pela verdade, a afirmação
de que a proposição sobre o fato está provada não corresponde a dizer que o fato é
verdadeiro.218 Isso porque a prova da proposição de um fato é proveniente da existência de
elementos de provas que ofereçam a um enunciado maior probabilidade quando confrontado
com outro, bem como a sua falsidade na hipótese da falta ou da insuficiência de elementos
a seu favor. Disso decorre, inclusive, a possibilidade de se considerar provado judicialmente
um fato falso.219 Apesar dessas necessárias ressalvas acerca do que se entende por verdade
e fato provado, como reconhece Prado, “a exigência de busca da verdade dos fatos desponta
como condição de veracidade, validade e aceitação da decisão judicial”220.
Nesta esteira, até para que se atinja a maior correspondência possível entre a
reconstrução do fato no processo e o evento histórico, é necessário que “a averiguação da
verdade seja o objetivo fundamental da atividade probatória no processo judicial”221. No
âmbito penal, a sanção dependerá da comprovação da alegação do fato222 imputado pela
acusação, de forma que a decisão não é um pronunciamento judicial isolado e desconectado
216
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 518.
217
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Editorial dossiê “prova penal: fundamentos epistemológicos e
jurídicos". Revista brasileira de direito processual penal, Belo Horizonte, vol. 4, n. 1, p. 43-80., 2018. p. 49.
Disponível em: <http://www.ibraspp.com.br/revista/index.php/RBDPP/article/view/138>. Acesso em: 05 dez.
2019.
218
FERRER BELTRÁN, Jordi. Prova e verità nel diritto. trad. de Valentina Carnevale. Bologna: Il Mulino,
2004. p. 69.
219
FERRER BELTRÁN, Jordi. Prova e verità nel diritto. trad. de Valentina Carnevale. Bologna: Il Mulino,
2004. p. 69.
220
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 40.
221
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 31,
tradução nossa.
222
Taruffo distingue os “fatos materiais” da alegação das partes sobre os fatos. Conforme explica o autor, os
fatos materiais aconteceram ou não aconteceram no mundo real, sendo desarrazoado discutir sobre se são ou
não verdadeiros. O que se debate no processo penal é se o enunciado sobre um fato apresentado pela parte
possui ou não correspondência nos fatos materiais ocorridos no mundo real. Em caso positivo, a proposição é
verdadeira; em caso negativo, é falsa. Assim, a expressão “verdade do fato” é a maneira elíptica de dizer
verdade sobre uma alegação que tem como correspondência um fato (TARUFFO, Michele. La prueba de los
hechos. Madrid: Trotta, 2002. p. 117).
71
dos demais atos processuais. Ao contrário, está atrelada aos fatos reconstruídos pelas partes
em juízo.223
Desta forma, da aceitação de um processo penal orientado à busca da verdade
decorre a exigência de métodos que imponham esse valor na atividade probatória de busca
e determinação dos fatos alegados, isto é, a definição de “uma função epistêmica do
processo, considerando-o um conjunto estruturado de atividades com o fim de obter
elementos de conhecimento verídicos sobre os fatos relevantes para a solução da
controvérsia”224.
A estreita conexão entre a operatividade da verdade no processo penal e a criação
de um sistema de controles epistêmicos é reconhecida também por Prado, para quem a
reorientação do dispositivo processual “demanda a introdução de métodos e práticas
probatórios de verificação dos fatos que possam ser efetivamente confrontados em
contraditório e testados relativamente ao seu potencial de explicação da realidade”225.
Na construção do que chamou de epistemologia garantista – em contraponto com
uma epistemologia inquisitiva –, Ferrajoli destaca que o “cognitivismo processual na
determinação concreta do desvio punível” demanda a existência de “procedimentos que
permitem tanto a verificação como a refutação” das hipóteses acusatórias.226
223
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 36.
224
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 159. No mesmo sentido, Margraf e Pesch afirmam que: “[e]m um
processo penal legitimado pela verdade processual, deve vigorar providências que resguardem efetivamente
o caráter cognitivo da persecução penal, que não se justifica juridicamente quando baseada em impressões
pessoais, sentimentos ou valores pré-concebidos, dispensando a incidência e operação de elementos
informativos obtidos de forma ilícita” (MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes. Garantias
constitucionais na produção probatória e o descaso com a cadeia de custódia. Revista de Direito Constitucional
e Internacional: Cadernos de direito constitucional e ciência política, São Paulo, vol. 26, n. 106, p. 225-246.
p. 243).
225
PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p. 39.
No mesmo sentido, Moraes que, após afirmar que somente os atos de prova são capazes de fundamentar a
sentença, em detrimento dos atos de investigação, conclui que “[e]ssa garantia implica na verdade processual,
e não verdade real, com fundamento no devido processo legal, o que justifica a adoção de um rigoroso sistema
de controles epistêmicos” (MORAES, Ana Luisa Zago de. Prova penal: da semiótica à importância da cadeia
de custódia. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 25, n. 132, p. 117-138, jun. 2017. p.
129). Também Santoro, Tavares e Gomes afirmam que “[n]ão se pode ignorar que seja possível [...] diante
da formação da convicção judicial a partir de dados colhidos sem passar pelo filtro do contraditório, admitir
que exista alguma compatibilidade empírica da decisão com dos dados. O problema está exatamente na
idoneidade dos dados” (SANTORO, Antonio Eduardo Ramires; TAVARES, Natália Lucero Frias; GOMES,
Jefferson de Carvalho. O protagonismo dos sistemas de tecnologia da informação na interceptação telefônica:
a importância da cadeia de custódia. Revista brasileira de direito processual penal, Belo Horizonte, vol. 3, n.
2, p. 605-632., 2017. p. 609).
226
FERRAJOLI, Luigi et al. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2010. p. 40.
72
227
EDINGER, Carlos. Cadeia de custódia, rastreabilidade probatória. Revista Brasileira de Ciências
Criminais. São Paulo, vol. 24, n. 120, p. 237-257, mai./jun. 2016. p. 240.
228
PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p. 95.
No mesmo sentido, LOPES JR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da. A importância da cadeia de custódia para
preservar a prova penal. Revista Consultor Jurídico, 16 jan. 2015. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2015-jan-16/limite-penal-importancia-cadeia-custodia-prova-penal>. Acesso
em: 27 nov. 2019. Ainda no mesmo sentido: MORAES, Ana Luisa Zago de. Prova penal: da semiótica à
importância da cadeia de custódia. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 25, n. 132, p.
117-138, jun. 2017, p. 133; MENEZES, Isabela Aparecida de; BORRI, Luiz Antonio; JUNIOR SOARES,
Rafael. A quebra da cadeia de custódia da prova e seus desdobramentos no processo penal brasileiro. Revista
brasileira de direito processual penal, Belo Horizonte, vol. 4, n. 1, p. 277-300., 2018. p. 283-284. Também
Edinger afirma que “[...] a regulamentação da atividade probatória se trata de um constrangimento
epistemológico, que diz respeito tanto ao aspecto demonstrativo quanto ao aspecto persuasivo da prova”
(EDINGER, Carlos. Cadeia de custódia, rastreabilidade probatória. Revista Brasileira de Ciências Criminais.
São Paulo, vol. 24, n. 120, p. 237-257, mai./jun. 2016. p. 240).
229
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 180.
73
230
PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p. 39.
Também Edinger deixa claro que “[...] um desses limites à atividade probatória é a necessidade de sua
rastreabilidade, consubstanciada na cadeia de custódia” (EDINGER, Carlos. Cadeia de custódia,
rastreabilidade probatória. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, vol. 24, n. 120, p. 237-257,
mai./jun. 2016. p. 241). No mesmo sentido, ainda, MACHADO, Vitor Paczek; JEZLER JUNIOR, Ivan. A
prova eletrônico-digital e a cadeia de custódia das provas: uma (re)leitura da súmula vinculante 14. Boletim
IBCCRIM, São Paulo, vol. 24, n. 288, p. 08-09, nov. 2016. p. 08.
231
Ressalte-se, no entanto, que a documentação da cadeia de custódia representa apenas um dos métodos de
controle epistêmico no processo penal. Como destaca Prado, a preservação da cadeia de custódia é apenas
“uma das modalidades pelas quais se constata a idoneidade do procedimento probatório” (PRADO, Geraldo.
A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p. 134). No mesmo sentido,
Dallagnol e Câmara destacam que a cadeia de custódia “constitui um possível método de autenticar uma dada
prova, que não prejudica a possibilidade de que a autenticação se dê por muitos outros diferentes métodos”
(DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 533). Para outros métodos epistêmicos no
processo penal, ver: BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Um modelo de epistemologia judiciária: o
controle lógico e racional do juízo de fato no processo penal. 2018. Universidade de São Paulo, São Paulo,
2018. Disponível em: <https://repositorio.usp.br/item/002933836>. Acesso em: 17 dez. 2019.
232
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 154.
233
MUÑOZ CONDE, Francisco. La búsqueda de la verdad en el proceso penal. 3. ed. Buenos Aires:
Hammurabi, 2007. p. 155, tradução nossa.
234
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 98.
74
inverídica dos fatos, mas também haverá injustiça se o processo não se desenvolver segundo
os cânones constitucionais e legais”235.
Nessa perspectiva, dentro dos parâmetros que serão desenvolvidos ao longo
deste capítulo, a manutenção da cadeia de custódia também assume a função de manter
registros suficientes “para rastrear a legalidade da atividade persecutória, pois de outra
maneira não haveria como identificar provas ilícitas”236. Sob essa concepção, explica Pérez,
será o exame de “cada ato que integra a cadeia de custódia que determinará a correção
jurídica da prova”237.
Portanto, relacionando processo penal, verdade, epistemologia e direitos
fundamentais, o estudo da cadeia de custódia se desenvolve dentro da concepção de processo
penal que pede “uma verdade fática passível de verificação por procedimentos probatórios
que não elimine a liberdade moral e física dos investigados, nem que esteja sujeita a
falsificações que lhe diminuam a qualidade de credibilidade”238.
Assim, conforme sintetiza Figueroa Navarro, com a manutenção da cadeia de
custódia “os órgãos jurisdicionais podem concluir se as informações aportadas ao processo
são provas contundentes e inequívocas para acreditar os fatos delitivos que se imputam ao
acusado e, especialmente, se foram obtidas com plena regularidade constitucional e
legal”239.
Dessa forma, adotadas as premissas de que a busca da verdade, limitada por
critérios políticos de proteção a direitos fundamentais, é elemento legitimador do processo
penal, e que a sua perseguição somente é possível por meio da correta reconstrução fática,
passa-se ao estudo da cadeia de custódia como mecanismo necessário para auxiliar na
235
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 166.
236
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 41. No mesmo sentido,
MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes. Garantias constitucionais na produção probatória e
o descaso com a cadeia de custódia. Revista de Direito Constitucional e Internacional: Cadernos de direito
constitucional e ciência política, São Paulo, vol. 26, n. 106, p. 225-246. p. 241.
237
PÉREZ, Marta del Pozo. Diligencias de investigación y cadena de custodia. Madrid: Sepín, 2014. p. 150,
tradução nossa.
238
MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes. Garantias constitucionais na produção probatória
e o descaso com a cadeia de custódia. Revista de Direito Constitucional e Internacional: Cadernos de direito
constitucional e ciência política, São Paulo, vol. 26, n. 106, p. 225-246. p. 242/243.
239
FIGUEROA NAVARRO, Carmen. El aseguramiento de las pruebas y la cadena de custodia. In. La ley
penal: revista de Derecho penal, procesal y penitenciário, Madri, vol. 8, n. 84, p.5-14, jul./ago., 2011, p. 12,
tradução nossa.
75
obtenção processual de um grau ideal de conhecimento dos fatos, sem perder de vista a
verificação dos limites à atividade probatória impostos por garantias fundamentais.240
240
PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p. 39.
241
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 522.
242
MURILLO, José Daniel Hidalgo. Cadena de custodia. Ciudad de México: Flores, 2017. p. 1/2.
243
PÉREZ, Marta del Pozo. Diligencias de investigación y cadena de custodia. Madrid: Sepín, 2014. p. 150,
tradução nossa.
244
Nesse sentido, afirma Gutiérrez Sanz: “[o]s efeitos que a cadeia de custódia tem no âmbito processual não
devem nos fazer esquecer que, antes de tudo, a cadeia de custódia é, de início, um mecanismo, uma
engrenagem concatenada de atos de manipulação de vestígios da atividade criminal” (SANZ, María Rosa
Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016. p. 25, tradução nossa).
245
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 524.
76
Como consequência, a não ser que cadeia de custódia seja entendida como a
elipse de documentação da cadeia de custódia, 246 trata-se de imprecisão terminológica falar
em violação ou quebra da cadeia de custódia, pois, seguindo ainda o exemplo acima, a fonte
de prova foi ou não foi coletada e o perito teve ou não teve contato com a fonte de prova
para análise laboratorial. O que pode faltar, contudo, são os registros desses contatos,
impedindo a posterior verificação da sucessão desses fatos que, independentemente da
documentação, aconteceram.247
Superada essa necessária distinção terminológica, Steen conceitua a “limpa
cadeia de custódia” 248 como “registros escritos e testemunhas documentando a ordem de
possessão desde o momento em que a evidência foi localizada, coletada, transportada,
armazenada, e finalmente apresentada à Corte”249. Por sua vez, conceituando cadeia de
custódia como um procedimento, Cervantes afirma: “a cadeia de custódia é um
procedimento penal, consistente no acompanhamento contínuo feito pela autoridade
investigadora, sobre as evidências físicas e/ou fontes de provas materiais, com a finalidade
de preservá-las desde seu descobrimento até a sua apresentação em juízo [...]”250.
Assim, de acordo com Figueroa Navarro, o registro da cadeia de custódia pode
ser entendido como a “rota da prova”, pois permite comprovar “o rastro seguido pelos
elementos e fontes de prova, as condições adotadas para a sua salvaguarda e as pessoas
encarregadas da sua custódia”251.
246
Como se verá abaixo (item 2.6), apesar de a concomitante documentação dos atos ser o principal e mais
seguro meio para a demonstração da cadeia de custódia, admite-se, dependendo das características do elemento
ou fonte de prova, que essa demonstração seja feita também por outros meios.
247
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 524.
248
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 12, tradução nossa.
249
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 12, tradução nossa.
250
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 22, tradução nossa. No mesmo sentido, Gutiérrez Sanz, conceitua cadeia de
custódia como “[...] a concatenação de atos de recolhimento, custódia e analise dos vestígios obtidos no
desenvolvimento de uma investigação pena [...]” (SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el
proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016. p. 30, tradução nossa).
251
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 7, tradução nossa. No mesmo sentido, Moraes conceitua a cadeia de custódia
como: “[...] um processo usado para manter e documentar a história cronológica da evidência, e deve resultar
em documentação formal no interior do processo” (MORAES, Ana Luisa Zago de. Prova penal: da semiótica
à importância da cadeia de custódia. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 25, n. 132, p.
117-138, jun. 2017. p. 132).
77
No mesmo sentido, Lopes Jr. e Morais da Rosa entendem que “[a] cadeia de
custódia exige o estabelecimento de um procedimento regrado e formalizado,
documentando toda a cronologia existencial daquela prova, para permitir a posterior
validação em juízo”252.
Da mesma forma, Prado define cadeia de custódia como “os elos entre as
diversas atividades que compõem o procedimento probatório para aferir o valor probatório
da informação obtida”253.
Para que, na prática, se realize a demonstração da cadeia de custódia, exige-se
“a documentação ininterrupta, desde o encontro da fonte de prova, até a sua juntada no
processo, certificando onde, como e sob a custódia de quais pessoas e órgãos foram
mantidos tais traços, vestígios ou coisas, que interessam à reconstrução histórica dos fatos
no processo”254.
Como detalha Edinger, a partir do primeiro elo da cadeia, que corresponde à
documentação da localização e coleta do vestígio, “para que se tenha o desenvolvimento de
uma cadeia de custódia da maneira correta, o registro deles [...] deve conter os três
seguintes elementos: quem manejou o vestígio, o que fez com ele, e como fez isso”255.
Assim, conforme Eberhardt, “ao exemplo de um vestígio recolhido, todos os atos
desde a coleta, transporte, entrega, recebimento, armazenamento e futura análise deverão
ser sempre registrados e documentados até o final do processo”256.
Tratando especificamente da prova pericial, Espindula conceitua a “cadeia de
custódia como sendo a sequência de proteção e guarda dos elementos materiais encontrados
252
LOPES JR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da. A importância da cadeia de custódia para preservar a prova
penal. Revista Consultor Jurídico, 16 jan. 2015. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2015-jan-
16/limite-penal-importancia-cadeia-custodia-prova-penal>. Acesso em: 27 nov. 2019. No mesmo sentido,
Margraf e Pesch definem a cadeia de custódia como: “um processo utilizado para manter e documentar a
história cronológica da evidência, devendo resultar como produto na documentação formal do processo”
(MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes. Garantias constitucionais na produção probatória
e o descaso com a cadeia de custódia. Revista de Direito Constitucional e Internacional: Cadernos de direito
constitucional e ciência política, São Paulo, vol. 26, n. 106, p. 225-246. p. 242).
253
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 81.
254
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 523.
255
EDINGER, Carlos. Cadeia de custódia, rastreabilidade probatória. Revista Brasileira de Ciências
Criminais. São Paulo, vol. 24, n. 120, p. 237-257, mai./jun. 2016. p. 242.
256
EBERHARDT, Marcos. Provas no processo penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015. p. 222.
78
257
ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed.
Campinas: Millennium, 2013. p. 185.
258
Nesse sentido, Tabuenca ressalta “[...] a especial transcendência que tem a cadeia de custódia das
amostras, restos e vestígios para que se possa obter o resultado pretendido com a prática da prova pericial”
(LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In.
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015.
p. 22. tradução nossa).
259
SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 26, tradução nossa.
260
MURILLO, José Daniel Hidalgo. Cadena de custodia. Ciudad de México: Flores, 2017. p. 1, tradução
nossa.
261
Conforme Dallagnol e Câmara, “[a] prova da cadeia de custódia, neste sentido, não deixa de ser uma prova
de segundo grau ou metaprova, pois é uma prova sobre uma prova” (DALLAGNOL, Deltan Martinazzo;
CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende;
QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador:
JusPODIVM, 2019. p. 530).
262
LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In.
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015.
p. 22, tradução nossa). No mesmo sentido, destacando a natureza instrumental da documentação da cadeia de
custódia, SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi,
2016. p. 40/41; FIGUEROA NAVARRO, Carmen. El aseguramiento de las pruebas y la cadena de custodia.
In. La ley penal: revista de Derecho penal, procesal y penitenciário, Madri, vol. 8, n. 84, p.5-14, jul./ago., 2011,
p. 10.
263
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 86.
79
cadeia. Por outro lado, a falta de registro de atividade com potencial de causar alteração na
fonte ou no elemento de prova, que impeça a posterior verificação do ato, configura quebra
da cadeia de custódia.
Portanto, compreende-se como a cadeia de custódia cumpre com a sua função
epistêmica de aproximar ao máximo o fato reconstruído processualmente do fato ocorrido
no mundo real, bem como a maneira que desempenha a sua função política de adequação da
atividade probatória aos limites impostos por direitos fundamentais. A documentação da
cadeia de custódia, pois, ilumina todo o percurso da prova, muitas vezes obscuro porquanto
desenvolvido em inquérito policial de raiz inquisitiva, criando registros sobre a rota e
eventuais alterações do elemento ou fonte de prova, que, posteriormente, poderão ser
revisados pelas partes em juízo.
264
Nesse sentido Grinover, Gomes Filho e Scarance Fernandes, que, embora tratassem das formas dos atos
processuais, podem ser interpretados à luz da manutenção da cadeia de custódia: “[o] que deve ser combatido,
nessa matéria, é o excessivo formalismo, que sacrifica o objetivo maior de realização da justiça em favor de
solenidades estéreis e sem nenhum sentido. É que existem no ordenamento formas completamente inúteis,
destituídas de qualquer finalidade. Trata-se do formalismo inócuo, residual, sem explicação lógica,
sobrevivente de fases superadas do direito processual penal. Mas as formas só devem ser respeitadas na
medida e nos limites em que sejam necessárias para atingir sua própria finalidade: conferir segurança às
partes e objetividade ao procedimento” (GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance;
GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. 11. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2009. p. 17). Nesse sentido, também cabe citar a decisão do Tribunal Supremo Espanhol, no recurso
nº 10714/2015, em que se alegava quebra da cadeia de custódia porque havia “disparidade de alguns dados
(ata de recepção em comparação com o informe de análise) [...]”, e os julgadores afastaram essa alegação
afirmando que: “[a] cadeia de custódia não é uma espécie de liturgia formalizada na qual qualquer falha
resultaria na perda de toda eficácia” (Tribunal Supremo. Sala de lo Penal. n. do recurso 10714/2015. Nº de
resolución 277/2016, tradução nossa).
265
Compreendido aqui, conforme detalhado no capítulo anterior, como o resultado da atividade probatória
realizada na fase judicial, com exceção das provas cautelares, antecipadas e irrepetíveis.
266
Sobre ser o contraditório elemento indispensável de validade da prova, ver, supra, capítulo 1, item 1.3.2.
267
Nesse sentido, Tabuenca: “[c]onvém começar fazendo um apontamento terminológico, sob a expressão
‘aseguramento de la prueba’ que, em sentido amplo, se incluem tanto aquelas atividades desempenhadas na
80
fase de investigação tendente à prática de atos probatórios quando se prevê a impossibilidade de que se possa
realizar ou reproduzir em juízo (caso da prova antecipada e da prova pré-constituída), como as que perseguem
conservar as fontes de prova ao longo de todo o processo penal” (LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena
de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La
cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 21, tradução nossa).
268
A distinção entre as provas constituendas e pré-constituídas foi feita no capítulo 1, item 1.3.2.
269
Relacionando a inexistência de contraditório na produção da prova e a exigibilidade da cadeia de custódia
nesses casos, Oliveira Vasconcelos e Azevedo: “[n]o lugar da antes preponderante prova testemunhal, os
documentos e objetos passaram a representar maior importância para as decisões penais[...]. Os mencionados
elementos probatórios serão submetidos ao contraditório por ocasião do seu ingresso no processo. No entanto,
sua existência independe de qualquer intermediação judicial. Por isso, no que tange ao exame de DNA e a
interceptação telefônica, por exemplo, provas extraprocessuais, é indispensável a existência da cadeia de
custódia” (OLIVEIRA VASCONCELOS, Caroline Regina; AZEVEDO, Yuri. Ensaios sobre a cadeia de
custódia das provas no processo penal brasileiro. Florianópolis: Empório do Direito, 2017. p. 194/195). No
mesmo sentido, Knijnik afirma que a “cadeia de custódia é extremamente importante” nos casos em que os
elementos de prova são “produzidos à margem do contraditório, no seio de medidas cautelares inaudita altera
parte, sujeitas a contraditório diferido” (KNIJNIK, Danilo. Prova pericial e seu controle no direito
processual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p.170/171).
270
Neste ponto, importante o destaque feito por Moraes: “[...] no campo dos métodos ocultos de investigação,
as inovações tecnológicas introduzidas parecem capazes de realizar os objetivos perseguidos pela filosofia da
consciência. As interceptações, assim com (sic) a coleta de material genético, têm pretensão de ‘evidência’,
verdadeiros atalhos para obtenção da tão almejada (e ilusória) ‘verdade’, que sedam os sentidos e têm a
pretensão de bastar-se por si só [...]” (MORAES, Ana Luisa Zago de. Prova penal: da semiótica à importância
da cadeia de custódia. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 25, n. 132, p. 117-138, jun.
2017. p. 131). No mesmo sentido, Menezes, Borri e Soares afirmam que “[a] cadeia de custódia da prova
encontra fundamento em diversos dispositivos constitucionais [...] especialmente em relação aos meios de
obtenção de prova levados a cabo valendo-se do fator ‘surpresa’ (ex. interceptação telefônica e busca e
apreensão), ou ainda elementos produzidos na fase inquisitorial, desde que sejam provas cautelares, não
repetíveis e antecipadas” (MENEZES, Isabela Aparecida de; BORRI, Luiz Antonio; JUNIOR SOARES,
Rafael. A quebra da cadeia de custódia da prova e seus desdobramentos no processo penal brasileiro. Revista
brasileira de direito processual penal, Belo Horizonte, vol. 4, n. 1, p. 277-300, 2018. p. 285-286).
271
Próximo é o entendimento de Margraf e Pesch que, após estabelecerem que cabe ao processo “evitar o
contágio da evidência” (MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes. Garantias constitucionais
81
Por sua vez, os meios de pesquisa de prova, assim como os elementos de prova
pré-constituídos, por apresentarem natureza cautelar e irrepetível, devem ter a cadeia de
custódia documentada. Em regra, tais atividades não são realizadas em contraditório e, por
isso, também devem ser submetidas ao controle de autenticação do seu caminho, identidade
e conteúdo.272
Aspecto importante relacionado à manutenção da cadeia de custódia dos meios
de pesquisa de prova está na sua estreita relação com a os limites políticos da atividade
probatória. Os meios de pesquisa de prova, de forma geral, envolvem alguma restrição de
direitos fundamentais do investigado e, por isso, dependem de prévia autorização judicial
para definição dos limites para a sua execução.273
Por ter caráter instrumental e, com isso, não se confundir com a atividade
probatória em si, a manutenção da cadeia de custódia não está relacionada com a verificação
de prévia decisão judicial autorizadora do meio de pesquisa de prova. A violação da reserva
de jurisdição, pois, representa a inobservância de requisito do próprio procedimento
probatório. Entretanto, como explica Prado, o “controle de legalidade que o juiz exercita
sobre os métodos ocultos de investigação se estende à execução concreta das medidas
deferidas judicialmente, não podendo ficar restrito ao exclusivo exame da legalidade da
própria decisão”274.
275
Nesse sentido, ensina Badaró: “[t]ambém se poderá pensar na cadeia de custódia nos casos de ‘coleta’ ou
‘apreensão’ de elementos ‘imateriais’ registrados eletronicamente, como o conteúdo de conversas telefônicas,
ou transmissão de e-mails, mensagens de voz, fotografias digitais, filmes armazenados na internet etc.”
(BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI,
Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo
Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 522).
276
Incluindo as fontes imateriais dentro do gênero “prova documental”, compreendida como “aquela
estruturada em um papel escrito ou registro eletrônico”, Espindula sustenta que “todos os elementos que darão
origem às provas periciais ou documentais necessitam dos cuidados para resguardar a sua idoneidade ao
longo de todo o processo de investigação e trâmite judicial. Necessitam, portanto, dos indispensáveis
procedimentos de garantia da cadeia de custódia” (ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão
geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed. Campinas: Millennium, 2013. p. 186).
277
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 522.
278
Nesse sentido, DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia
de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova
do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 539.
83
279
A correspondência entre os conceitos de autenticação e “mesmidade” é comum na doutrina. De acordo com
Bautista, a “Lei da mesmidade” decorre do “princípio universal de autenticidade da prova” (BAUTISTA, Juan
Carlos Urazán. La cadena de custodia en el nuevo código de procedimiento penal. Faceta Juridica, Bogotá,
jan. 2005. Disponível em: <https://fundacionluxmundi.com/custodia.php#1>. Acesso em: 06 dez. 2019). Nesse
mesmo sentido, PRADO, Geraldo. Ainda sobre a “quebra da cadeia de custódia das provas”. Boletim do
IBCCrim, n. 262, São Paulo: set, 2014. p. 16. Assim, já nos trabalhos de Bautista e Prado, os termos
autenticação e “mesmidade” são correspondentes no que se refere à cadeia de custódia. Essa indicação se faz
importante porque, por influência espanhola, na doutrina nacional, sobressaiu-se a utilização do termo
“mesmidade”. Como explica Badaró, na “doutrina espanhola desenvolveu-se a ideia de ‘mesmidade’ da prova,
expressão que acabou sendo consagrada pelo Tribunal Supremo espanhol, na Sentença de 10 de fevereiro de
2010: ‘es a través de la cadena de custodia como se satisface la garantía de la mismidad de la prueba’”
(BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI,
Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo
Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 525). Entretanto, ao originariamente adotar o termo “mesmidade” no Brasil,
Prado esclareceu que empregou “o termo em sua forma aproximada à língua espanhola, porque não há
correspondente adequado em português, não se tratando de ‘mesmice’, pois que em português o uso coloquial
desta palavra remete a outro significado”. Na mesma oportunidade, o autor considerou a utilização da palavra
“identidade”, mas ponderou que “igualmente não resolveria a questão, embora talvez seja mais propício que
‘mesmice’”. De fato, concordamos com Geraldo Prado sobre a não correspondência dos significados de
“mesmidade”, da forma como adotado na doutrina espanhola, e identidade. A incompletude se dá porque, como
se desenvolverá ao longo do texto, a “mesmidade” é composta pela identidade e integralidade conjuntamente.
Com estas ressalvas, por entendermos que o termo “autenticação” oferece uma melhor compreensão sobre o
tema ao mesmo tempo que soluciona o problema linguístico já antecipado por Geraldo Prado, este foi adotado
para o desenvolvimento deste trabalho, ao invés de “mesmidade”.
280
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 522.
281
Com algumas alterações e acréscimos neste texto, muito em decorrência das diferenças dos sistemas
processuais mexicano e brasileiro, mas com a mesma essência, este conceito foi desenvolvido por Aguirre:
“[a] cadeia de custódia pode ser vista como um sistema que pode contribuir para garantir a autenticidade ou
mesmidade dos dados e meios de provas coletados desde a investigação (ou em flagrante delito) e que serão
apresentados perante um juiz de controle, que verificará a legalidade de sua obtenção (elemento ou fonte de
prova) para possivelmente se tornar parte das provas que serão valoradas na fase de julgamento”
(HERNÁNDEZ AGUIRRE, Christian Norberto. La cadena de custodia, su regulación y límites en el sistema
penal acusatorio mexicano. Iter Criminis: revista de ciencias penales, México, 6ª Época, n. 16, p. 49-80,
jan./mar. 2017. p. 55). No mesmo sentido, Figueroa Navarro, para quem o objetivo de manutenção da
documentação da cadeia de custódia é “assegurar que aquilo se apresenta ao Tribunal como evidência ou
prova é a mesma coisa que foi encontrada na cena do crime” (FIGUEROA NAVARRO, Carmen. El
aseguramiento de las pruebas y la cadena de custodia. In. La ley penal: revista de Derecho penal, procesal y
penitenciário, Madri, vol. 8, n. 84, p.5-14, jul./ago., 2011, p. 07). Ainda no mesmo sentido, LADRÓN
TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In. FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 21.
282
Conforme Dallagnol e Câmara: “[o] ponto de partida para entendermos a finalidade da prova da cadeia
de custódia é sua compreensão no direito norte-americano, de onde foi importada a discussão. A
demonstração da cadeia de custódia entra no contexto do estudo da evidência ou direito probatório, que, em
território estadunidense, goza de autonomia em relação aos procedimentos civil e penal. Mais
84
especificamente, a prova da cadeia de custódia é uma das possíveis técnicas utilizadas naquilo que lá se chama
de ‘autenticação da prova’” (DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa.
A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.).
A prova do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 532). No mesmo
sentido: GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications, p. 447-465, 1996, p. 447. Disponível
em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 07 jan. 2020.
283
Federal rules of evidence, from title 28 – appendix. United States Code. dez. 2019. Disponível em
<https://uscode.house.gov/view.xhtml?path=/prelim@title28/title28a/node218&edition=prelim>. Acesso em:
20 dez. 2019.
284
Federal rules of evidence, from title 28 – appendix. United States Code. dez. 2019. Disponível em
<https://uscode.house.gov/view.xhtml?path=/prelim@title28/title28a/node218&edition=prelim>. Acesso em:
20 dez. 2019.
285
GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications. 1996. p. 447, tradução nossa. Disponível
em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 07 jan. 2020. Em idêntico sentido, Dallagnol e Câmara: “[o] problema da autenticação da prova
reduz-se a uma questão: é esse item de evidência, esta prova, o que o seu proponente diz que é?”
(DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 532).
286
ANDERSON, Michael B. Chain of custody requirements in admissibility of evidence. Montana Law
Review. vol. 37, Issue 1, Winter, 1976. p. 147, tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarship.law.umt.edu/mlr/vol37/iss1/7/>. Acesso em: 19 dez. 2019.
85
os mesmos que foram recolhidos no lugar dos fatos no momento em que se iniciava a
investigação criminal”287.
No mesmo sentido seguiu o ordenamento jurídico colombiano, no qual a
exigência de autenticação da prova fundamentou a inclusão das regras sobre a cadeia de
custódia no código processual. Como destaca Bautista, ao tratar da reforma processual penal
na codificação colombiana, a cadeia de custódia é “um sistema fundamentado no princípio
universal da autenticidade da evidência (lei da mesmidade) que determina que o ‘mesmo’
que se encontrou na cena do crime é o ‘mesmo’ que se está utilizando para tomar uma
decisão judicial”288.
Ainda tratando do sistema Colombiano, Muñoz Neira reconhece que “a
evidência física não está isenta do requisito da autenticação e é justamente aí que tem um
papel decisivo a cadeia de custódia”289, que consiste justamente no dever de “mostrar que
o objeto que oferece como evidência é o mesmo que foi apreendido”290.
Também no México, conforme explica Aguirre, os registros da cadeia de
custódia foram implementados “com a finalidade de certificar a autenticidade e indenidade
do que foi recolhido diante de um possível crime”291.
Destaca-se que o uso do termo “autenticidade”, por autores como Bautista e
Aguirre, acima referidos, consiste em imprecisão terminológica, possivelmente derivada de
equivocada tradução das Federal Rules of Evidence norte-americanas. Isso porque,
conforme destacam Dallagnol e Câmara, “é imperioso ressaltar que ‘autenticação’ e
‘autenticidade’, nesse contexto, não se confundem. Uma prova que passa pelo teste de
autenticação pode não ser autêntica”292, já que, “a acusação pode oferecer como prova um
287
LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In.
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015.
p. 21, tradução nossa).
288
BAUTISTA, Juan Carlos Urazán. La cadena de custodia en el nuevo código de procedimiento penal. Faceta
Juridica, Bogotá, jan. 2005, tradução nossa. Disponível em:
<https://fundacionluxmundi.com/custodia.php#1>. Acesso em: 06 dez. 2019.
289
NEIRA, Orlando Muñoz. Sistema penal acusatorio de Estados Unidos: fundamentos constitucionales.
Panorama procesal. Principio de oportunidade. Juicios por jurado. Pincipales diferencias con el derecho
colombiano. Bogotá: Legis, 2006. p. 361, tradução nossa.
290
NEIRA, Orlando Muñoz. Sistema penal acusatorio de Estados Unidos: fundamentos constitucionales.
Panorama procesal. Principio de oportunidade. Juicios por jurado. Pincipales diferencias con el derecho
colombiano. Bogotá: Legis, 2006. p. 361, tradução nossa.
291
HERNÁNDEZ AGUIRRE, Christian Norberto. La cadena de custodia, su regulación y límites en el sistema
penal acusatorio mexicano. Iter Criminis: revista de ciencias penales, México, 6ª Época, n. 16, p. 49-80,
jan./mar. 2017. p. 50/51, tradução nossa.
292
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 533.
86
documento falso apreendido com o réu, que passa no teste de autenticação, porque é o que
a acusação diz ser, mas não passa no teste de autenticidade por ser falso”293.
Portanto, feita essa ressalva, conclui-se que a manutenção da cadeia de custódia
tem a finalidade de autenticação da prova, isto é, de demonstrar que as fontes ou elementos
de prova, quando da sua apresentação em juízo, são o que o proponente diz ser e possuem
exatamente as mesmas características, individualidade e conteúdo que tinham no instante
imediatamente anterior à sua obtenção.
Em decorrência de seu caráter instrumental (item 2.2, supra), a autenticação da
prova poderá ser positiva quando a manutenção da cadeia de custódia demonstrar a correção
na obtenção, preservação, manuseio da fonte de prova e produção do elemento de prova, ou
negativa, nas hipóteses em que os registros demonstrarem irregularidade em alguma etapa
da atividade probatória.
Sobre esse ponto, é importante destacar a impropriedade de tratar como violação
da cadeia de custódia do elemento ou fonte de prova as situações em que todos os registros
foram devidamente feitos e, justamente por conta dessas informações, tornou-se possível
identificar uma falha na atividade probatória.294
Nesses casos não há violação da cadeia de custódia. Ao contrário, a correta
manutenção dos registros serviu ao seu propósito de autenticar, ainda que negativamente, o
elemento ou fonte de prova. Tal circunstância deverá ser resolvida no processo, a depender
da ilegalidade, pelas normas que disciplinam a ilicitude e a ilegitimidade da prova.295
Com esse esclarecimento, portanto, conclui-se que a documentação da cadeia de
custódia consiste em método epistêmico de autenticação, positiva ou negativa, do elemento
ou da fonte de prova no processo penal. Em ordem de cumprir com tal finalidade, contudo,
os registros atinentes ao caminho percorrido pela fonte de prova, real ou imaterial, ou
293
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 533.
294
Assim, por exemplo, entendemos que não constitui violação da cadeia de custódia o exemplo dado por
Edinger, pois a falta de todos os áudios captados foi detectada justamente pela existência dos registros do
histórico da prova, realizando-se uma autenticação negativa: “[p]rimeiro caso: você é réu de uma ação penal.
A ação se baseia, principalmente, em interceptações telefônicas. Certo de que possibilitaria o exercício da
constitucionalmente estabelecida ampla defesa, com base na Súmula vinculante 14, o seu procurador
constituído requer acesso à integralidade das interceptações feitas. Todavia, apesar de ter sido franqueado o
acesso aos autos, parte das provas obtidas a partir da interceptação foi extraviada, ainda na polícia, e o
conteúdo dos áudios telefônicos não foi disponibilizado da forma como captado, havendo descontinuidade nas
conversas e na sua ordem, com a omissão de alguns áudios” (EDINGER, Carlos. Cadeia de custódia,
rastreabilidade probatória. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, vol. 24, n. 120, p. 237-257,
mai./jun. 2016. p. 237/238).
295
Sobre isso, ver capítulo 3, em especial item 3.2.
87
elemento de prova obtido sem contraditório devem conter informações suficientes para
verificação de dois requisitos de autenticação: (i) identidade e (ii) integralidade.296
296
Nesse sentido, Figueroa Navarro: “[d]este modo, as provas devem aportar no processo criminal com todas
as garantias, podendo verificar se, no percurso dos elementos probatórios, desde a sua primeira localização
até sua incorporação em juízo, foram cumpridos os requisitos regulatórios necessários para garantir sua
plena identidade e integridade” (FIGUEROA NAVARRO, María del Carmen. El aseguramiento de las pruebas
y la cadena de custodia. La ley penal: revista de derecho penal, procesal y penitenciario, Madrid, vol. 8, n. 84,
p. 5-14., jul./ago. 2011. p. 9, tradução nossa). No mesmo sentido, referindo-se aos requisitos da identidade do
item e conservação de sua substância (utilizado no sentido de manutenção de sua integridade): ANDERSON,
Michael B. Chain of custody requirements in admissibility of evidence. Montana Law Review. vol. 37, Issue
1, Winter, 1976. p. 147/149. Disponível em: <https://scholarship.law.umt.edu/mlr/vol37/iss1/7/>. Acesso em:
19 dez. 2019.
297
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 525.
298
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 525.
299
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 537.
300
Como já dito acima, o conceito de “mesmidade” engloba tanto o requisito da identidade como o da
integralidade, de forma que corresponde ao que se denominou, na classificação adotada neste trabalho, por
autenticidade.
88
301
LOPES JR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da. A importância da cadeia de custódia para preservar a prova
penal. Revista Consultor Jurídico, 16 jan. 2015. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2015-jan-
16/limite-penal-importancia-cadeia-custodia-prova-penal>. Acesso em: 27 nov. 2019.
302
Para Dallagnol e Câmara, tratando-se da coisa infungível “dispensa-se a comprovação da cadeia da sua
custódia porque ela tem características que a identificam”. Na sequência, no entanto, os autores sustentam que
“[s]e o agente policial que efetuou a apreensão da arma anotou o seu número de registro e se o perito que
nela realizou os testes registrou a numeração da arma no laudo, esta evidência (o laudo e o termo de apreensão
indicando a sua numeração) é suficiente para a sua autenticação” (DALLAGNOL, Deltan Martinazzo;
CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende;
QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador:
JusPODIVM, 2019. p. 536). Ao que parece, portanto, apesar da afirmarem a desnecessidade da cadeia de
custódia, os autores adotam uma cadeia de custódia simplificada para os itens infungíveis, decorrente das suas
características individualizantes. A mesma contradição também é vista em: KNIJNIK, Danilo. Prova pericial
e seu controle no direito processual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 172/173.
303
Anderson admite a possibilidade de um item fungível ser identificado por outras circunstâncias do caso
concreto que não as suas próprias características. Para tanto, apresenta, como exemplo, a possibilidade de
“demonstrar que uma distinta caixa azul mudou de mãos e que a maconha foi encontrada dentro da caixa”,
sugerindo que a rastreabilidade e distinção da caixa azul se estende à maconha, que estava no seu interior. Com
isso, conclui que “pode não ser significativo que o item seja fungível, desde que sejam de alguma forma
identificáveis” (ANDERSON, Michael B. Chain of custody requirements in admissibility of evidence.
Montana Law Review. vol. 37, Issue 1, Winter, 1976. p. 4, tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarship.law.umt.edu/mlr/vol37/iss1/7/>. Acesso em: 19 dez. 2019).
89
para diferenciar entre itens fungíveis torna a identificação positiva impossível de ser feita
isoladamente por observação”304.
Nos casos de amostras de sangue, por exemplo, o material coletado deve ser
guardado em recipiente lacrado, com numeração de identificação, de modo a evitar a
abertura e a substituição do conteúdo.305 Além disso, as informações sobre a fonte do sangue
devem constar no documento vinculado ao recipiente, por meio da referência expressa ao
número de identificação do lacre: se pessoal, com a identificação do indivíduo; se real,
também deve haver, em relação ao objeto, a sua apreensão, guarda em embalagem e lacração
com numeração de identificação. No mesmo documento, ainda, é necessário que se informe
o local, o dia e a hora em que foi feita a coleta, bem como a pessoa que a realizou, que
também tem que ser devidamente identificada.
Ademais, para que se mantenha a identidade do item fungível ao longo de todo
o curso da prova, o mesmo procedimento de individualização acima transcrito deve ser
repetido sempre que o invólucro contendo o item for aberto. Nestes casos, impõe-se,
adicionalmente, a manutenção de todos os registros anteriores e a expressa identificação do
lacre rompido, pois somente assim será possível manter a sequência exata da custódia do
item desde a sua coleta até a sua autenticação.306
Por fim, em se tratando de meio de pesquisa de prova, a apresentação do seu
resultado em juízo pressupõe que a sua obtenção se deu dentro dos limites definidos na
autorização judicial que restringiu o direito fundamental do investigado. Dessa forma, para
que o elemento ou fonte de prova seja o que a parte diz ser, obrigatoriamente tem que ter
sido obtido dentro dos limites da decisão judicial.
Nesses casos, portanto, o cumprimento do requisito da identidade abrange
também a existência de registros suficientes para que as partes e o juiz consigam verificar se
304
GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications. 1996. p. 451, tradução nossa. Disponível
em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 19 dez. 2019.
305
Em situação análoga, Dallagnol e Câmara explicam que “quando a droga é apreendida, deve ser embalada
(se já não estiver), lacrada e identificada” (DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de
Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo
Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p.
536).
306
Para Dallagnol e Câmara, “exemplificativamente, quando o saco plástico contendo a droga é lacrado e há
eventual rompimento do lacre para colheita de amostra, seguido de nova lacração, sendo todas essas etapas
formalizadas em termos que indicam o número do saco e o rompimento do lacre com a assinatura do
responsável em tais termos” (DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa.
A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.).
A prova do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 537).
90
aquilo que foi apresentado em juízo é, de fato, produto obtido dentro dos limites impostos
pelo juiz ao excepcionar determinado direito fundamental do investigado.
Isso porque a vinculação entre o resultado do meio de obtenção de prova e o
direito fundamental excepcionalmente restringido exige “satisfação sobre a maneira como
concretamente será afetado o direito durante uma investigação criminal”307, pois, nada
obsta que, “ainda que a decisão judicial esteja formalmente correta, a execução da medida
possa descambar para abusos ou ocultar interesses reprováveis por trás de pronunciamento
judicial legítimo”308.
Assim, utilizando-se como exemplo a interceptação telefônica, ainda que a
prévia autorização judicial seja matéria atinente ao procedimento probatório em si e não à
cadeia de custódia, uma vez existente a decisão, os suportes técnicos necessários para
relacionar o diálogo captado ao período de 15 (quinze) dias de duração da restrição a direito
fundamental integram os registros exigidos ao cumprimento do requisito da identidade para
a autenticação da prova.
A falta dos suportes técnicos impede que determinado diálogo seja autenticado
como o que a parte diz ser, isto é, o produto de captação judicialmente autorizada. A
inexistência desses registros possibilitaria que um diálogo captado no 16º dia de
interceptação, já fora dos limites da autorização judicial, fosse inserido no processo como
parte das captações obtidas dentro do prazo de 15 (quinze) dias.309
Nesse sentido, reconhece Prado, “[o]s suportes técnicos que resultam da
operação, portanto, devem ser preservados”310, pois “[s]em esse rastreamento, a
identificação do vínculo eventualmente existente entre uma prova aparentemente lícita e
outra, anterior, ilícita, de que a primeira é derivada, dificilmente será revelado”311.
307
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 68.
308
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 68.
309
A importância da manutenção desses registros técnicos para a manutenção da cadeia de custódia da
interceptação telefônica é destacada por Prado que, ao final, conclui: “[o]s suportes técnicos, pois, têm uma
importância para o processo penal que transcende a simples condição de ferramenta de apoio à polícia para
a execução de ordens judiciais” (PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles
epistêmicos: a quebra da cadeia de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons,
2014, p. 79). No mesmo sentido, MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes. Garantias
constitucionais na produção probatória e o descaso com a cadeia de custódia. Revista de Direito Constitucional
e Internacional: Cadernos de direito constitucional e ciência política, São Paulo, vol. 26, n. 106, p. 225-246.
p. 241.
310
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 79.
311
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 79. No mesmo sentido,
91
MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes. Garantias constitucionais na produção probatória e
o descaso com a cadeia de custódia. Revista de Direito Constitucional e Internacional: Cadernos de direito
constitucional e ciência política, São Paulo, vol. 26, n. 106, p. 225-246. p. 241.
312
Nesse sentido, Giannelli sustenta que a “alteração de um item pode reduzir ou negar o seu valor
probatório”, razão pela qual “antes de um objeto material ser admissível como evidência, o proponente deve
estabelecer que mantem ‘substancialmente as mesmas condições que tinha quando o crime foi cometido’”
(GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications. 1996. p. 447, tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 19 dez. 2019).
313
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 525. No mesmo sentido, Margraf e Pesch afirmam que “[c]adeia de
custódia é o termo dado ao dispositivo que pretende garantir a integridade dos elementos probatórios” e que,
em se tratando de obtenção de fontes de prova, um dos aspectos mais importantes é “a preservação da
idoneidade do todo o trabalho que tende a ser feito sigilosamente, em um ambiente de reserva que, caso não
seja respeitado, compromete o conjunto de informações que venham a ser obtidos dessa maneira, tratando-se
de evitar a quebra da cadeia de custódia” (MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes.
Garantias constitucionais na produção probatória e o descaso com a cadeia de custódia. Revista de Direito
Constitucional e Internacional: Cadernos de direito constitucional e ciência política, São Paulo, vol. 26, n. 106,
p. 225-246. p. 241).
314
FIGUEROA NAVARRO, María del Carmen. El aseguramiento de las pruebas y la cadena de custodia. La
ley penal: revista de derecho penal, procesal y penitenciario, Madrid, vol. 8, n. 84, p. 5-14., jul./ago. 2011. p.
7, tradução nossa.
92
ocorreu adulteração da evidência e que ela não foi contaminada, tanto pelas outras
evidências armazenadas proximamente, como pela embalagem na qual está
armazenada”315.
Assim, nas fontes de prova que estão sujeitas a contaminação, além do
armazenamento, a correta documentação da integridade da prova exige o registro do
procedimento adotado para a sua coleta e, posteriormente, para a sua análise laboratorial (cf.
itens 2.5.1 e 2.5.5, infra). A integralidade da amostra de sangue coletada para exame de
alcoolemia, por exemplo, estará em risco caso seja utilizado álcool na assepsia do local de
extração,316 de modo que tal informação é fundamental para a futura autenticação da perícia
realizada.
Os exemplos são muitos e as exigências variam de acordo com as próprias
características da fonte de prova, mas o que não se altera é a necessidade de documentar
todas as informações necessárias para posterior autenticação da prova. No que se refere
especificamente à preservação da integridade da prova, esse procedimento de documentação
significa registrar as informações de coleta, transporte, depósito e manuseio que demonstrem
que tais práticas não alteraram as características e a composição da coisa.
Ressalta-se, contudo, que as alterações sofridas pela fonte de prova em
decorrência do procedimento técnico-pericial em si não atentam contra o requisito da
integralidade,317 desde que tais modificações e o procedimento adotado para isso sejam
devidamente documentados.318
315
DORAN, Robert A. Exploring the Links in the Chain of Custody. Disponível em:
<https://pt.scribd.com/document/66568187/Exploring-the-Links-in-the-Chain-of-Custody>. Acesso em: 31
dez. 2019. tradução nossa.
316
Conforme Martins e Oliveira, “[n]os casos de indivíduos vivos, as amostragens de sangue em veia no
antebraço devem ser realizadas após a limpeza do local da introdução da agulha com produtos que não
contenham etanol na formulação” (MARTINS, Bruno Spinosa de; OLIVEIRA, Marcelo Firmino de. Exame
do teor alcoólico em acidentes de trânsito. In: BRUNI, Aline Thaís; VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA,
Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática da química que soluciona crimes.
Campinas: Millennium, 2012. p. 114).
317
Nesse sentido, ao tratar da necessidade da manutenção da integridade do objeto, Mestre Delgado sustenta
que “devem ser cumpridas uma série de garantias formais na custódia e tratamento dos elementos, a fim de
evitar qualquer troca ou alteração neles e garantir que o que se apresenta finalmente perante o órgão judicial
é o mesmo (e – salvo as imprescindíveis deteriorações que derivem da realização técnica das análises que
foram preciso ser feitas – com sua mesma composição, natureza e conteúdo)que foi recolhido no começo da
investigação” (DELGADO, Esteban Mestre. La cadena de custodia de los elementos probatorios obtenidos de
dispositivos informáticos y electrónicos.In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia
en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 49/50).
318
Conforme Bautista, é fator da cadeia de custódia da fonte de prova a manutenção do “estado original, isto
é, que não tenha sofrido modificações e, se sofreu, que seja registrada” (BAUTISTA, Juan Carlos Urazán. La
cadena de custodia en el nuevo código de procedimiento penal. Faceta Juridica, Bogotá, jan. 2005. tradução
nossa. Disponível em: <https://fundacionluxmundi.com/custodia.php#1>. Acesso em: 06 dez. 2019).
93
Deve-se ter especial atenção aos casos em que a natureza da fonte de prova ou
as alterações nela causadas pelo procedimento pericial inviabilizem a renovação da prova
em juízo. Nessas hipóteses, far-se-á também necessário registrar as informações suficientes
para a futura verificação da integralidade do elemento de prova.
Tratando-se de elemento de prova não renovável, a integralidade da fonte de
prova, apesar de necessária, não será suficiente para a autenticação da prova, principalmente
quando a atividade probatória envolver determinado exame técnico-científico e, entre os
métodos possíveis e existentes para a sua realização, existirem alguns não validados
cientificamente ou que apresentem potencial de extrair da fonte de prova informação
alterada.
Existindo discussão científica sobre a possibilidade de a técnica adotada alterar
o resultado do exame, o registro do método pelo qual se produziu o elemento de prova se
torna necessário elo da cadeia de custódia para a verificação da integralidade da informação
introduzida no processo. Somente assim as partes e o juiz poderão conferir o potencial de se
ter extraído da fonte de prova informação diversa da que nela existia quando da sua coleta.
Outro ponto a ser realçado, é o fato de o requisito da integralidade não se prestar
a garantir o impossível, de modo que não pode ser exigida a manutenção de uma fonte de
prova perecível até a sua apresentação no processo. Nessas hipóteses, o que se faz necessário
é o registro da cadeia de custódia da fonte de prova até a produção da prova irrepetível,
permitindo que, posteriormente, autentique-se que a fonte de prova submetida à perícia
preservava, no momento do exame, a mesma composição e características que tinha no
instante imediatamente anterior à sua coleta.
Como exemplo, podemos adotar a perícia para análise da (im)propriedade para
consumo de um alimento. Para a sua realização, é imprescindível que os alimentos tenham
sua custódia documentada, desde a sua apreensão até a sua submissão ao exame laboratorial,
com destaque para as condições do seu armazenamento. Dessa forma se permitirá futura
verificação de que eventual constatação da impropriedade do consumo resulta de
característica do alimento como foi encontrado no momento da apreensão, e não de
características assumidas posteriormente, em decorrência de alterações sofridas pelo
incorreto armazenamento.
Salienta-se, ainda, que, para o requisito da integralidade, não há fundamento na
diferenciação entre itens fungíveis e não fungíveis. As exigências para manutenção das
mesmas características e composição estão mais relacionadas às especificidades do objeto
do que a sua fungibilidade.
94
A demonstração disso pode ser feita pelo mesmo exemplo da arma de fogo
registrada, anteriormente mencionado para demonstrar a menor necessidade de
documentação para registrar a sua individualidade. A preservação da integralidade da arma
de fogo é essencial para a apuração de eventual delito de posse ilegal de arma de fogo, pois
o seu não funcionamento implicaria na atipicidade da conduta.319 Portanto, não seria possível
admitir uma alteração do funcionamento da arma após sua apreensão decorrente de incorreto
manuseio ou armazenamento – ou ainda, no limite, que a arma quebrada seja consertada.
Portanto, a manutenção da sua integralidade exige o registro de todas as pessoas que tiveram
acesso à arma, indicando data, hora, motivo e procedimento adotado para o manuseio.320
Assim, ainda sobre o exemplo da arma de fogo registrada, apesar da sua
preservação em recipiente lacrado não ser necessária para o cumprimento do requisito da
identidade, tal procedimento é necessário para atender ao requisito da integralidade. Somente
assim se poderá autenticar a manutenção das características da arma desde a sua apreensão
até a sua apresentação em juízo.321
Destaca-se que a realização de perícia na arma de fogo na fase de investigação
não é suficiente para que se deixe de registrar a custódia da arma, pois o teste de disparo é
repetível, de modo que deve ser refeito, em contraditório, na presença das partes e do juiz,
sempre que solicitado (cf, capítulo 1, item 1.3.2, supra).
319
Nesse sentido, posiciona-se o Superior Tribunal de Justiça: “PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS
CORPUS. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM A NUMERAÇÃO RASPADA. INEFICÁCIA DA
ARMA ATESTADA POR LAUDO PERICIAL. AUSÊNCIA DE POTENCIALIDADE LESIVA. CRIME
IMPOSSÍVEL. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ABSOLVIÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. 1. A Terceira
Seção desta Corte pacificou entendimento no sentido de que o tipo penal de posse ou porte ilegal de arma de
fogo cuida-se de delito de mera conduta ou de perigo abstrato, sendo irrelevante a demonstração de seu efetivo
caráter ofensivo. 2. Na hipótese, contudo, em que demonstrada por laudo pericial a total ineficácia da arma de
fogo (inapta a disparar), deve ser reconhecida a atipicidade da conduta perpetrada, diante da ausência de
afetação do bem jurídico incolumidade pública, tratando-se de crime impossível pela ineficácia absoluta do
meio. 3. Ordem concedida.” (HC nº 445.564, 6ª T., v.u., Rel. Min. Maria Thereza Assis Moura, DJe
24/05/2018).
320
O requisito da integralidade, portanto, não admite que a simples identificação da arma permita o seu repasse
entre agentes públicos sem qualquer registro, como defendem Dallagnoll e Câmara: “[...] para que se prove
que uma arma apresentada diante do júri é a mesma que foi apreendida quando do flagrante por homicídio e
é a mesma que foi periciada, basta a referência nesses atos ao número de registro da arma. Essa arma
percorreu um caminho por repartições públicas nas quais vários agentes tiveram contato com ela. Mesmo
assim, dispensa-se a comprovação da cadeia da sua custódia porque ela tem características que a identificam,
como número de registro” (DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa.
A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.).
A prova do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 536).
321
Nesse sentido, Imwinkelried explica: “[a] teoria da pronta identificação do objeto tem um valor probatório
limitado: esta teoria prova a identidade do objeto, mas não assegura sua manipulação correta entre o
momento da apreensão e o momento da análise pelo Tribunal” (IMWINKELRIED, Edward J. The methods of
attacking scientific evidence. Virginia: The Michie Company, 1982. p. 84, tradução nossa).
95
322
BAUTISTA, Juan Carlos Urazán. La cadena de custodia en el nuevo código de procedimiento penal. Faceta
Juridica, Bogotá, jan. 2005. tradução nossa. Disponível em:
<https://fundacionluxmundi.com/custodia.php#1>. Acesso em: 06 dez. 2019.
323
Este equívoco pode ser visto em: DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa
Rosa. A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de
(Orgs.). A prova do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 536.
96
324
GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications. 1996. p. 453, tradução nossa. Disponível
em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 19 dez. 2019).
325
Sobre este debate doutrinário e jurisprudencial, explicam Mirabete e Fabbrini: “[n]a doutrina e na
jurisprudência predominava o entendimento de que o emprego de arma simulada (ou de brinquedo), por ser
meio idôneo a intimidar a vítima, desconhecedora desta circunstância, constituía a qualificadora prevista no
art. 157, §2º, inciso I, o que levou o STJ a editar a Súmula 174, com a seguinte redação: ‘No crime de roubo,
a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena”. Ponderável corrente não aceitava
tal orientação, uma vez que, embora o instrumento utilizado seja idôneo para intimidar, não é apto a causar
danos à integridade física da vítima. De qualquer forma, em sessão de 24-10-2001, o STJ, ao julgar o REsp
213.954-SP, revogou a Súmula 174, conforme publicação no DOU de 6-11-2001” (MIRABETE, Julio
Fabbrini; FABBRINI, Renato N. Código penal interpretado. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 1192/1193).
Contudo, apesar da revogação da Súmula pelo STJ, há julgados posteriores, de outros Tribunais, aplicando a
causa de aumento de pena em hipótese de simulacro de arma de fogo, como os seguintes precedentes do TJSP:
“Reconhecimento da arma de brinquedo simulacro para fins de reconhecimento da majorante prevista no art.
157, §2º, I, do Código Penal. Cabimento. O Código Penal, no caso sob luzes, reclama que a grave ameaça
decorra do emprego de "arma" e nas circunstâncias do caso concreto, ainda que se aceite que a arma de fogo,
confessadamente usada pelo réu, fosse de brinquedo, não se pode negar que ela assumiu o conceito de "arma",
que é todo instrumento que, sob o ponto de vista da pessoa para quem ele é mostrado, pode produzir-lhe mal,
pode feri-la, ainda que apenas sob o critério subjetivo, no caso, da vítima, que desconhece tratar-se, como no
caso presente, de simulacro de arma de fogo” (Apelação Criminal nº 0013023-93.2004.8.26.0609, 1ª Câmara
Criminal Extraordinária, Rel. Des. Airton Vieira, j. 10/03/2014. Disponível em:
<http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=7417876&cdForo=0>. Acesso em: 17 dez. 2019). Da
mesma forma, parte da doutrina continua sustentando a possibilidade de o simulacro de arma de fogo
fundamentar a majorante. Neste sentido, Fernando Capez: “[o] fundamento dessa causa de aumento é o poder
intimidatório que a arma exerce sobre a vítima, anulando-lhe a sua capacidade de resistência. Por essa razão,
não importa o poder vulnerante da arma, ou seja, a sua potencialidade lesiva, bastando que ela seja idônea a
infundir maior temor na vítima e assim diminuir a sua possibilidade de reação. Assim, a arma de fogo
descarregada ou defeituosa ou o simulacro de arma (arma de brinquedo) configuram a majorante em tela,
pois o seu manejamento, não obstante a ausência de potencialidade ofensiva, é capaz de aterrorizar a vítima”
(CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal Parte Especial. vol. 2.. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 470).
97
caso em que o funcionamento da arma é discussão relevante no processo, vez que a sua
inaptidão poderá resultar na atipicidade do fato.
Então, também por conta disso, justamente por não poder prever qual será o
conteúdo futuro da hipótese acusatória que o elemento ou fonte de prova sustentará, uma
correta manutenção da cadeia de custódia não deve deixar margem de apreciação para o
agente custodiante no que se refere ao que registrar ou não.
Para evitar lacunas irreparáveis na documentação em decorrência de espaços de
subjetividade dos agentes custodiantes, os registros da cadeia de custódia devem seguir
rígido procedimento de registro, preservando, em qualquer hipótese, tanto a identidade
quanto a integralidade do item custodiado, de modo que todas as informações necessárias
para futuro rastreamento e autenticação do elemento e da fonte de prova estejam disponíveis
às partes e ao juiz.
Dessa forma, a correta documentação procedimental deve registrar as diversas
etapas da cadeia de custódia, cujo passo a passo será melhor detalhado adiante (item 2.5),
mas que, desde já, pode-se indicar as seguintes fases: descrição da coleta; identificação do
item; individualização em embalagem lacrada e numerada; descrição do estado, composição
e características originais do item; condições de preservação e guarda, lugares de
permanência; transportes; alterações de órgão ou agente custodiante; modificações no estado
original em decorrência de procedimentos necessários; descrição do motivo e do
procedimento adotado sempre que alguém tiver contato com o item; data, hora e agente
responsável por todos os eventos anteriormente listados.326
Por fim, o elemento custodiado deve sofrer a menor quantidade de movimentos
e manuseio possível, para que se minimize a interferência nas características originais do
elemento ou fonte de prova. Conforme explica Bautista, “[a] cadeia de custódia deve ser
composta pelo menor número de custódias que se puder: o menor número faz com que o
326
Nesse sentido, Bautista sustenta: “[o]s fatores da cadeia de custódia se consagram para estabelecer a
histórico fidedigno do elemento. Esse histórico fidedigno é o que dá segurança às decisões judiciais. Os fatores
da cadeia de custódia são: identidade, isto é, se o elemento é o ‘mesmo’; estado original, isto é, não ter sofrido
modificações e, se tiver, o seu registro; condições de coleta, em outras palavras, forma como o elemento foi
incorporado; preservação, em outro sentido, como ele é mantido; embalagem, leia-se para efeito, recipientes
e colocação dos elementos nestes; envio, isto é, transporte; locais de permanência; datas desses, ou seja,
período; mudanças que o custodiante fez, que nem sempre ocorrem, mas que se observam de acordo com a
natureza do elemento e das análises; nome, identificação e cargo da pessoa que tenha tido contado com o
elemento, para deduzir a responsabilidade” (BAUTISTA, Juan Carlos Urazán. La cadena de custodia en el
nuevo código de procedimiento penal. Faceta Juridica, Bogotá, jan. 2005. Disponível em:
<https://fundacionluxmundi.com/custodia.php#1>. Acesso em: 06 dez. 2019, tradução nossa).
98
elemento seja menos manipulado; a menor manipulação faz com que se exponha menos; a
menor exposição protege, defende, o elemento”327.
Nas hipóteses em que a busca e a coleta de fontes de prova ocorrem numa cena
de crime, a manutenção da cadeia de custódia deve ter início com a preservação do local, a
partir da chegada dos responsáveis por conduzirem a investigação.330 Tal medida é
327
BAUTISTA, Juan Carlos Urazán. La cadena de custodia en el nuevo código de procedimiento penal. Faceta
Juridica, Bogotá, jan. 2005. tradução nossa. Disponível em:
<https://fundacionluxmundi.com/custodia.php#1>. Acesso em: 06 dez. 2019.
328
Gutiérrez Sanz conclui pela existência de um conteúdo mínimo comum à cadeia de custódia ao afirmar:
“[s]omos conscientes de que não pode ser idêntico o tratamento que se outorga a uma amostra biológica
daquele aplicado a substâncias estupefacientes, porém, em essência, são comuns os requisitos básicos de
atuação e as possíveis irregularidades que se podem cometer em cada um destes estágios” (SANZ, María
Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016. p. 62, tradução
nossa).
329
Nesse sentido, sustenta Chorres: “a cadeia de custódia se inicia ou se põe em funcionamento no mesmo
lugar dos fatos, com a polícia ou outra autoridade que esteja primeiro no local, continuando com os peritos
que recolhem as fontes de prova, logo os que participam ativamente do seu translado e trabalho pericial, e
finaliza com o juiz” (CHORRES, Hesbert Benavente. Comentarios y estudio del acuerdo general número
01/2010, del procurador general de justicia del estado de México (con cadena de custodia). Azcapotzalco:
Flores, 2011. p. 102, tradução nossa).
330
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 24.
99
necessária para evitar a alteração ou contaminação do estado original da fonte de prova antes
mesmo de sua coleta.331
Em todos os demais casos, a manutenção da cadeia de custódia inicia-se com a
etapa de documentação da coleta da fonte de prova (i.e. segunda etapa). Nesse sentido,
explica Steen, “a primeira pessoa a fisicamente coletar a evidência e removê-la da cena do
crime inicia o registro da cadeia de custódia”332.
Tratando conjuntamente dessas duas etapas, Sanz sustenta que a manutenção da
cadeia de custódia começa com “as diligências tendentes à proteção das evidências e a
colheita material dos diversos vestígios”333. No mesmo sentido, Tabuenca ressalta a
importância da “cadeia de custódia como um aspecto do asseguramento das fontes de
prova”334, pois “a validez do meio de prova em concreto que se poderá chegar a praticar
dependerá de que a fonte de prova tenha permanecido inalterada durante o tempo”335.
De fato, a malsucedida coleta, que altere a fonte de prova, modificará também o
resultado do elemento de prova dela derivado.336 Por isso, é essencial que esse processo de
preservação do local e coleta da fonte de prova seja “realizado pelos próprios peritos da
331
De acordo com Santiago, “[a]lgumas medidas de segurança são extremamente necessárias para que a
cadeia de custódia efetive-se sem vícios. Uma delas diz respeito à preservação do local de crime, que tem por
objetivo impedir a alteração e a eliminação das evidências remanescentes no local, mantendo-as incólumes”
(SANTIAGO, Elizeu. Criminalística comentada: exposição e comentários de temas periciais e assuntos
correlatos. Campinas: Millennium. 2014. p. 22). Assim, complementa González, “[o] primeiro respondente
deve evitar que outras pessoas entrem ao lugar dos fatos, que manipulem as evidências, que toquem no
cadáver, que descartem objetos relacionados com o caso” (GONZÁLEZ, Rubén Darío Angulo. Cadena de
custodia en criminalística. 4 ed. Bogotá: Doctrina y ley, 2016. p. 3, tradução nossa).
332
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 14, tradução nossa.
333
SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 62, tradução nossa.
334
LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In.
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015.
p. 21, tradução nossa.
335
LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In.
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015.
p. 21, tradução nossa.
336
Nesse sentido, tratando da perícia de identificação por DNA, Bonaccorso sustenta que “a integridade e a
preservação dessas amostras constituem-se em fatores essenciais à consecução de perfis genéticos bem
caracterizados e definidos, pré-requisito para a produção de laudos periciais de excelente nível técnico-
científico” (BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes.
Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 53.
Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
100
Polícia Científica”337, pois “somente estes são verdadeiramente qualificados para garantir
que o procedimento de coleta não vai alterar a integridade das análises”338.
Além disso, para que futuramente seja possível averiguar se o próprio
procedimento de coleta alterou ou modificou as características da fonte de prova, o registro
do momento de coleta “exige a individualização da pessoa autorizada a fazê-lo e o modo
técnico ou científico para realizá-lo”339.
Dependendo das circunstâncias do crime, do local em que a evidência foi
encontrada e das características próprias da fonte de prova, a obtenção de imagens do local
também integra a documentação da cadeia de custódia. Como explica Steen, “[f]otografias
não só mostram o item como ele foi coletado, mas também mostram o contexto no qual foi
encontrado. Por isso, é altamente recomendado que as evidências sejam claramente
fotografadas antes de serem coletadas”340.
Por certo que a coleta de fonte de prova em ambiente controlado não necessita
de imagens, como, por exemplo, no caso da obtenção de amostra de sangue, para exame de
alcoolemia, por médico devidamente habilitado e em ambiente propício. Contudo, serão
úteis para a autenticação da fonte de prova, seja no que se refere à sua integração na dinâmica
dos fatos, seja para análise de fontes de contaminação, fotografias da cena do crime que
indiquem a localização, o estado e o ambiente em que uma amostra de sangue foi coletada
para ser periciada.
337
SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 66, tradução nossa.
338
SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 66, tradução nossa. Acerca dessa relevante questão técnica, exemplifica Moreno Salas: “[c]om respeito aos
indícios biológicos, o levantamento deve ser com equipe adequada para seu correto manuseio, que dependerá
do estado físico da fonte de prova, pois podemos encontrar em estado sólido ou líquido, úmido ou seco, por
exemplo o sague, o qual podemos encontrar tanto na forma líquida, coagulada ou em crosta, em superfícies
lisas ou absorventes. Isto implica na utilização de diferentes técnicas de levantamento, que vão desde uma
esfregar, quando o sangue se encontra em uma superfície absorvente, incluindo, se o sangue está seco, o uso
de isotônico. Se a quantidade encontrada é considerável, como no caso de uma poça de sangue, se usam
pipetas, cotonetes, seringas, fragmentos de tela de algodão, dependendo do caso. Se se trata de fragmentos de
tecido se podem usar pinças, ou algum objeto parecido, como pauzinhos” (SALAS, Jorge Alberto Moreno.
Cadena de custodia y metodología aplicada al lugar del hallazgo o de los hechos. Azcapotzalco: Flores, 2015.
p. 75, tradução nossa).
339
GONZÁLEZ, Rubén Darío Angulo. Cadena de custodia en criminalística. 4 ed. Bogotá: Doctrina y ley,
2016. p. 16, tradução nossa. Sobre isto, exemplifica Moreno Salas ao tratar das amostras de sangue: “[d]eve-
se cuidar para que os instrumentos não estejam contaminados para garantir a preservação das fontes de
prova. A embalagem poderá ser de vidro, papel ou papelão, evitando-se o uso de embalagens de plástico, pois
favorecem a umidade e com isso a produção de fungos ou bactérias que podem degradar a fonte de prova ou
contaminá-la” (SALAS, Jorge Alberto Moreno. Cadena de custodia y metodología aplicada al lugar del
hallazgo o de los hechos. Azcapotzalco: Flores, 2015. p. 75/76, tradução nossa).
340
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 14, tradução nossa.
101
341
CHORRES, Hesbert Benavente. Comentarios y estudio del acuerdo general número 01/2010, del
procurador general de justicia del estado de México (con cadena de custodia). Azcapotzalco: Flores, 2011. p.
102, tradução nossa.
342
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 14, tradução nossa.
343
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019.p. 14/15, tradução nossa. No mesmo sentido, Chorres: “[a] cadeia (assim chamada porque
não deve romper-se ou interromper-se em nenhum momento) se inicia no instante em que se recolhe a amostra,
com a cadeia de custódia externa mediante anotação de data e hora, classe da amostra, lugar da coleta,
condições e circunstâncias da coleta, do empacotamento e do acondicionamento [...]” (CHORRES, Hesbert
Benavente. Comentarios y estudio del acuerdo general número 01/2010, del procurador general de justicia
del estado de México (con cadena de custodia). Azcapotzalco: Flores, 2011. p. 102, tradução nossa).
344
Conforme Espindula, “imediatamente ao colocar na embalagem própria, deve ser fechada e devidamente
lacrada. O lacre deve ter numeração, a fim de facilitar os respectivos controles e protocolos de
encaminhamentos [...]. Em cada tipo de embalagem já deve ter impresso em uma de suas faces um espaço
para o preenchimento de dados relativos ao objeto acondicionado e sobre a ocorrência em andamento”
(ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed.
Campinas: Millennium, 2013. p. 189).
102
de prova recolhidas no local do delito para que sobre as mesmas não se produza nenhum
tipo de alteração ou contaminação”345.
Para atender à dupla exigência de preservação da identidade e integralidade,
explica Pérez, “cada amostra deve ser embalada de forma isolada e individualizada,
separando umas das outras em um recipiente apropriado para sua conservação [...], com
etiqueta de referência”346.
Ressalta-se, ainda, que a “embalagem deve ser específica para cada tipo de
vestígio, dependendo da sua condição”347, pois “o acondicionamento em embalagem
inapropriada [...] pode acarretar em modificação das condições daquele vestígio”348.
Ademais, como adverte Moreno Salas, a etiquetagem da fonte de prova deve
acontecer logo após a sua embalagem, cuidando para que “a etiqueta nunca vá sobre a fonte
de prova, mas sim sobre o recipiente, de tal maneira que não afete a sua preservação”349.
Por fim, é importante se atentar para as características individuais da fonte de
prova coletada, pois, em alguns casos, circunstâncias específicas deverão atrasar ou acelerar
o procedimento de empacotamento. Por exemplo, “uma roupa ensanguentada não deve ser
empacotada até estar devidamente seca”350, de modo que é preciso atrasar o procedimento
ao “enrolá-la em um papel limpo e transportá-la a um local de secamento. Somente quando
suficientemente seca, o material poderá ser embalado”351. Ao contrário, em fontes de prova
biológicas “suscetíveis de entrar em estado de putrefação”352, é preciso acelerar o processo
para que o seu “transporte seja o mais rápido possível”353.
345
SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 66, tradução nossa. No mesmo sentido, Santiago sustenta ser necessário “providenciar para que as
evidências sejam registradas e coletadas, obedecendo às normas e critérios técnicos exigidos, embalando-as
corretamente para que não se contaminem” (SANTIAGO, Elizeu. Criminalística comentada: exposição e
comentários de temas periciais e assuntos correlatos. Campinas: Millennium, 2014. p. 23, tradução nossa).
346
PÉREZ, Marta del Pozo. Diligencias de investigación y cadena de custodia. Madrid: Sepín, 2014. p. 147,
tradução nossa.
347
ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed.
Campinas: Millennium, 2013. p. 189.
348
ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed.
Campinas: Millennium, 2013. p. 189.
349
SALAS, Jorge Alberto Moreno. Cadena de custodia y metodología aplicada al lugar del hallazgo o de los
hechos. Azcapotzalco: Flores, 2015. p. 76, tradução nossa.
350
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 14, tradução nossa.
351
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 14, tradução nossa.
352
SALAS, Jorge Alberto Moreno. Cadena de custodia y metodología aplicada al lugar del hallazgo o de los
hechos. Azcapotzalco: Flores, 2015. p. 76, tradução nossa.
353
SALAS, Jorge Alberto Moreno. Cadena de custodia y metodología aplicada al lugar del hallazgo o de los
hechos. Azcapotzalco: Flores, 2015. p. 76, tradução nossa.
103
2.5.3 Transporte
354
GONZÁLEZ, Rubén Darío Angulo. Cadena de custodia en criminalística. 4 ed. Bogotá: Doctrina y ley,
2016. p. 16.
355
SALAS, Jorge Alberto Moreno. Cadena de custodia y metodología aplicada al lugar del hallazgo o de los
hechos. Azcapotzalco: Flores, 2015. p. 82/83, tradução nossa. No mesmo sentido, Chorres: “toda transferência
de custódia deverá ser registrada em formulário, indicando data, hora, nome e assinatura de quem recebe e
de quem entrega” (CHORRES, Hesbert Benavente. Comentarios y estudio del acuerdo general número
01/2010, del procurador general de justicia del estado de México (con cadena de custodia). Azcapotzalco:
Flores, 2011. p. 102, tradução nossa).
356
TORRES, Pilar García de Yébenes; ALBERICH, Pilar Gascó. La cadena de custodia de muestras
relacionadas con presuntos ilícitos contra el medio ambiente. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La
cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 134, tradução nossa.
357
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 16, tradução nossa.
358
Como explicam Torres e Alberich, as características individuais que influenciam no transporte podem estar
vinculadas à demora ou às condições do translado. Assim, “dado que as análises de amostras meio-ambientais
requerem um tempo mínimo entre a coleta da amostra e a realização de provas pelo laboratório, assim como
a adequação de alíquotas para determinação de certos parâmetros, é fundamental que as amostras sejam
recebidas pelo laboratório o quanto antes. No caso concreto das análises microbiológicas, as amostras devem
chegar em recipientes estéreis e em um período inferior a 24 horas desde a coleta das amostras. Este requisito
também é imprescindível para realizar a análise de certos parâmetros como é o caso da Demanda Bioquímica
de Oxigênio. Em ocasiões, a própria natureza das amostras requer que se enviem o quanto antes e refrigeradas
ao laboratório por serem amostras perecíveis que podem ser inadequadas se o transporte não é o correto,
104
2.5.4 Armazenamento
como é o caso das amostras de peixes, pela degradação biológica que podem sofrer” (TORRES, Pilar García
de Yébenes; ALBERICH, Pilar Gascó. La cadena de custodia de muestras relacionadas con presuntos ilícitos
contra el medio ambiente. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso
penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 134, tradução nossa).
359
GARCÍA, Coronel José Martínez; MÁRQUEZ, Nicomendes Expósito; JIMÉNEZ, Emilio Rodrígues.
Servicio de criminalística de la guardia civil. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de
custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 158/159, tradução nossa.
360
PÉREZ, Marta del Pozo. Diligencias de investigación y cadena de custodia. Madrid: Sepín, 2014. p. 147,
tradução nossa.
361
RODRÍGUEZ, Antonio del Amo; VILLARREAL, Gema Barroso; GARCÍA, Jefe Ana Isabel Fernández.
Comisaría general de policía científica. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia
en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 150.
362
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 26, tradução nossa.
363
SUÁREZ, Berly Gustavo Cano. La cadena de custodia en el código procesal peruano. In. FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 233,
tradução nossa.
364
GARCÍA, Coronel José Martínez; MÁRQUEZ, Nicomendes Expósito; JIMÉNEZ, Emilio Rodrígues.
Servicio de criminalística de la guardia civil. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de
custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 160, tradução nossa.
105
“todas as anomalias que observem, tanto do ponto de vista formal (número de vestígios,
descrição, etc.) como técnico”365.
Na sequência, a pessoa encarregada “tomará oportunamente as medidas para a
preservação e armazenamento apropriado dos vestígios e/ou amostras recebidas, com base
na natureza das mesmas, sendo responsável por sua custódia”366.
Assim, no que se refere às condições de armazenamento, é preciso
compatibilizar a situação do local com as características da fonte de prova, pois, como
adverte Sanz, “se o lugar é de tal natureza que permite que o material recolhido sofra algum
tipo de contaminação, destruição ou confusão com outro, teremos que concluir que foi
descumprido o dever de custódia da evidência”367.
Além disso, são necessários cuidados com segurança do local e manutenção de
registro de acesso, de modo que, como destaca González, a fonte de prova deve ficar sob os
cuidados “de uma entidade e/ou pessoa idônea, guardada em um lugar seguro e acessível
somente a pessoas autorizadas”368.
Dessa forma, “toda vez que a evidência for removida do local seguro de
armazenamento, a pessoa que faz a remoção torna-se parte da cadeia de custódia”369,
motivo pelo qual deverá se identificar, registrando dia e hora da retirada e da devolução, bem
como o motivo pelo qual precisou ter contato com a fonte de prova.
365
GARCÍA, Coronel José Martínez; MÁRQUEZ, Nicomendes Expósito; JIMÉNEZ, Emilio Rodrígues.
Servicio de criminalística de la guardia civil. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de
custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 160, tradução nossa.
366
GARCÍA, Coronel José Martínez; MÁRQUEZ, Nicomendes Expósito; JIMÉNEZ, Emilio Rodrígues.
Servicio de criminalística de la guardia civil. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de
custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 160, tradução nossa.
367
SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 73, tradução nossa. No mesmo sentido, García, Márquez e Jiménez atestam que as fontes de prova devem
ser mantidas “a todo momento sob controle e nas condições de armazenamento mais adequadas para evitar
qualquer deterioração ou contaminação, de origem externa ou entre elas” (GARCÍA, Coronel José Martínez;
MÁRQUEZ, Nicomendes Expósito; JIMÉNEZ, Emilio Rodrígues. Servicio de criminalística de la guardia
civil. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer,
2015. p. 160, tradução nossa). Também González sustenta que se deve ter em conta “a temperatura e demais
condições de armazenamento para cumprir com os protocolos da cadeia de custódia” (GONZÁLEZ, Rubén
Darío Angulo. Cadena de custodia en criminalística. 4 ed. Bogotá: Doctrina y ley, 2016. p. 30/31, tradução
nossa).
368
GONZÁLEZ, Rubén Darío Angulo. Cadena de custodia en criminalística. 4 ed. Bogotá: Doctrina y ley,
2016. p. 18, tradução nossa. No mesmo sentido, Suárez salienta que a fonte de prova deve ser “guardada em
uma cabine ou ambiente de armazenamento dotado de segurança até que seja designada ao analista ou perito
competente” (SUÁREZ, Berly Gustavo Cano. La cadena de custodia en el código procesal peruano. In.
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015
p. 233, tradução nossa).
369
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 16, tradução nossa.
106
2.5.5 Manuseio
370
Conforme Sanz, “[n]esta etapa da cadeia de custódia se faz a recepção das amostras ou vestígios pelo
técnico que levará a cabo a análise, portanto, a primeira coisa que se deve avaliar e documentar é o estado
da evidência no momento quando foi recebido e o aspecto da embalagem. Tudo isso deveria refletir no
chamado documento de recepção” (SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal
español. Navarra: Aranzadi, 2016. p. 76, tradução nossa). No que se refere ao registro da data e horário, Steen
explica: “[s]empre que a evidência for removida do seu local seguro de armazenamento, o profissional que
fizer a remoção deve [...] escrever na embalagem o horário, a data e o motivo para abri-lo” (STEEN, Michael
C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals. Columbia, 2019. p. 17,
tradução nossa).
371
TORRES, Pilar García de Yébenes; ALBERICH, Pilar Gascó. La cadena de custodia de muestras
relacionadas con presuntos ilícitos contra el medio ambiente. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La
cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 135, tradução nossa.
372
TORRES, Pilar García de Yébenes; ALBERICH, Pilar Gascó. La cadena de custodia de muestras
relacionadas con presuntos ilícitos contra el medio ambiente. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La
cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 151, tradução nossa.
373
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 26, tradução nossa. No mesmo sentido, González: “[m]omento de
processamento. Exige identificar a pessoa autorizada para ordenar as atividades periciais sobre a evidência,
a identificação do perito, e o procedimento científico e técnico utilizado” (GONZÁLEZ, Rubén Darío Angulo.
Cadena de custodia en criminalística. 4 ed. Bogotá: Doctrina y ley, 2016. p. 16, tradução nossa). Também,
Gutiérrez Sanz, ao descrever a fase da análise e exame dos indícios, afirma que “[a] validade probatória do
informe pericial dependerá de sua correta realização por pessoa qualificada, fazendo uso da tecnologia
apropriada [...]” (SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra:
Aranzadi, 2016. p. 78, tradução nossa).
374
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 16, tradução nossa. No mesmo sentido, García, Márquez e Jiménez: “[n]o informe
elaborado com o motivo das análises dos vestígios/amostras, se fará constar o estado final destas” (GARCÍA,
Coronel José Martínez; MÁRQUEZ, Nicomendes Expósito; JIMÉNEZ, Emilio Rodrígues. Servicio de
criminalística de la guardia civil. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el
proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 161, tradução nossa).
107
375
GARCÍA, Coronel José Martínez; MÁRQUEZ, Nicomendes Expósito; JIMÉNEZ, Emilio Rodrígues.
Servicio de criminalística de la guardia civil. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de
custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015.p. 161, tradução nossa.
376
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 17.
377
SALAS, Jorge Alberto Moreno. Cadena de custodia y metodología aplicada al lugar del hallazgo o de los
hechos. Azcapotzalco: Flores, 2015. p. 4. No mesmo sentido: MURILLO, José Daniel Hidalgo. Cadena de
custodia. Ciudad de México: Flores, 2017. p. 57.
378
Essa diferenciação é feita por Badaró em: BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia
e sua relevância para a prova penal. In: SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da
investigação preliminar no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 533/535.
379
Nesse sentido, esclarecem Menezes, Borri e Soares: “[...] necessário se faz que o detentor da fonte de prova,
na maioria das vezes o Estado-acusação, tenha o devido cuidado na coleta, manipulação e transporte do
objeto que, posteriormente, será um elemento probatório, a fim de preservar a cadeia de custódia e garantir
a integridade da prova” (MENEZES, Isabela Aparecida. BORRI, Luiz Antonio. SOARES, Rafael Junior. A
quebra da cadeia de custódia da prova e seus desdobramentos no processo penal brasileiro. In. Revista
brasileira de direito processual penal. Belo Horizonte, vol. 4, n. 1, p. 277-300, 2018. p. 284).
108
380
GONZÁLEZ, Rubén Darío Angulo. Cadena de custodia en criminalística. 4 ed. Bogotá: Doctrina y ley,
2016. p. 17, tradução nossa.
381
CHORRES, Hesbert Benavente. Comentarios y estudio del acuerdo general número 01/2010, del
procurador general de justicia del estado de México (con cadena de custodia). Azcapotzalco: Flores, 2011. p.
100, tradução nossa.
382
SUÁREZ, Berly Gustavo Cano. La cadena de custodia en el código procesal peruano. In. FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 228,
tradução nossa.
383
SUÁREZ, Berly Gustavo Cano. La cadena de custodia en el código procesal peruano. In. FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 228,
tradução nossa.
384
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 534.
109
385
Neste sentido, sustenta Aguirre: “[a] responsabilidade da cadeia de custódia será das pessoas que se
encontrarem em contato direto com evidências [...], tanto pelos órgão de segurança pública, como demais
pessoas que intervenham (por exemplo, ainda que não seja o ideal, as fontes de prova ou as evidências que
tenham sido encontradas, fornecidas e até guardadas por uma vítima, ofendidos ou testemunhas), então a
cadeia de custódia pode começar no momento e lugar em que as evidências são encontradas e entregues por
um particular e recebidas ou guardadas posteriormente por uma autoridade competente” (HERNÁNDEZ
AGUIRRE, Christian Norberto. La cadena de custodia, su regulación y límites en el sistema penal acusatorio
mexicano. Iter Criminis: revista de ciencias penales, México, 6ª Época, n. 16, p. 49-80, jan./mar. 2017.p.
70/71, tradução nossa).
386
GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications. 1996. p. 453, tradução nossa. Disponível
em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 19 dez. 2019.
387
SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 36, tradução nossa.
110
de modo que “a documentação aparece, portanto, como pressuposto para poder dirimir as
dúvidas que no processo possam surgir sobre a ‘mesmidade’ da fonte de prova”388.
Não por outra razão, ordenamentos jurídicos que adotam sistemas de controle
das fontes e elementos de prova dispõem de formulários a serem preenchidos, pelos agentes
custodiantes de cada ato, com as informações relevantes para garantir a identidade e
integralidade do item naquela etapa específica.389
Entretanto, como alerta Cervantes, “não se pode ignorar que a cadeia de
custódia é em essência um fato, não o registro deste fato”390, sendo que “uma das formas
que pode ser provado este fato é mediante o testemunho”391.
No mesmo sentido, após “definir a cadeia de custódia como o procedimento
documentado”392, Tabuenca reconhece que “nada impede que os eventuais defeitos na
acreditação ou documentação da cadeia de custódia possam ser corrigidos mediante a
prática de outros meios de prova em audiência, como o testemunho dos agentes [...] ou
outras pessoas que participaram de qualquer dos estágios temporais da cadeia de
custódia”393.
Esse entendimento, inclusive, sedimentou-se na jurisprudência espanhola,
conforme reconhece Sanz:
Os tribunais têm considerado que a documentação não é a única forma pela qual
se pode excluir as suspeitas sobre a ausência de integridade da cadeia. Assim, abre-
388
SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 36, tradução nossa.
389
Na Colômbia, por exemplo, o formulário de registro da cadeia de custódia pode ser visualizado no Manual
do Sistema de Cadeia de Custódia (Manual del sistema de cadena de custodia. Fiscalía General de La Nación,
2018. p. 57/58. Disponível em: <https://www.fiscalia.gov.co/colombia/wp-content/uploads/MANUAL-DEL-
SISTEMA-DE-CADENA-DE-CUSTODIA.pdf>. Acesso em: 06 nov. 2019). Da mesma forma, no caso do
México, os formulários de registro da cadeia de custódia podem ser visualizados nos Protocolos de Cadeia de
Custódia desenvolvido pela PGR (Protocolos de cadena de custodia – Dos grandes etapas: preservación y
procesamiento. Servicios Periciales PGR México, 2 ed., 2012. p. 39/42, 44/45 e 47. Disponível em:
<http://www.inacipe.gob.mx/stories/publicaciones/descargas_gratuitas/ProtocolosdeCadenadeCustodia.pdf>.
Acesso em: 06 nov. 2019).
390
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 29, tradução nossa.
391
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 29, tradução nossa.
392
LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In.
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015.
p. 23, tradução nossa.
393
LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In.
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015.
p. 26.
111
394
SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 37, tradução nossa. No entanto, há jurisprudência espanhola em sentido contrário, como a SAP Madri
18/2014, em que se afirmou que “[...] a cadeia de custódia exige que conste sempre nos protocolos de
conservação as assinaturas tanto dos policiais que ocupam, transportam, entregam ao Comissário, guardam,
conservam e depositam a substância apreendida, quanto as assinaturas de quem em cada uma das sequências
recebem [...]” (Audiencia Provincial Madri, nº do recurso 16/2012; nº de resolución 18/2014, tradução nossa).
395
Federal rules of evidence, from title 28 – appendix. United States Code. dez. 2019, tradução nossa.
Disponível em
<https://uscode.house.gov/view.xhtml?path=/prelim@title28/title28a/node218&edition=prelim>. Acesso em:
20 dez. 2019.
396
Nesse sentido, ao comentar um caso julgado pela Sala Penal do Tribunal Supremo espanhol em que se
discutia a acreditação do conteúdo de um disquete, contendo informações contábeis do investigado, entregue
pelo querelante sem qualquer registro da cadeia de custódia para assegurar a integralidade das informações
nele contidas, Mestre Delgado explica que o Tribunal admitiu a prova porque “‘a totalidade da prova praticada
no processo penal’ (que no caso eram os depoimentos de testemunhas e peritos, assim como documentos e
anotações manuscritas dos extratos bancários) permitiu concluir que as informações contidas nos disquete
correspondiam com as da empresa e, consequentemente, respaldavam a realidade do seu conteúdo”
(DELGADO, Esteban Mestre. La cadena de custodia de los elementos probatorios obtenidos de dispositivos
informáticos y electrónicos. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso
penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 75/76, tradução nossa).
397
People v. McGee - 49 N.Y.2d 48, 424 N.Y.S.2d 157, 399 N.E.2d 1177 (1979). tradução nossa. Disponível
em: <https://www.nycourts.gov/judges/evidence/9-AUTHENTICITY/9.01_IN%20GENERAL.pdf>. Acesso
em: 06 dez. 2019.
398
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 28, tradução nossa.
112
“quanto mais raro ou singular é um indício, menos rigorosa deve ser a cadeia de custódia
para que uma testemunha possa reconhece-lo”399.
Deve-se destacar, ainda, que nos casos em que as características do elemento ou
fonte de prova permitirem a autenticação por prova testemunhal ou outro meio, a
demonstração da cadeia de custódia deve trazer informações específicas sobre os eventos
não documentados. Como explica Steen, as testemunhas devem estar preparadas para
“explicarem como reconhecem a evidência que estão autenticando, i.e., distinguindo
características, números de série, iniciais no formulário de cadeia de custódia, etc.”400.
Também para Edinger, “caso se tente suprir a cadeia de custódia com
testemunhos, devem eles ser corretos e exatos; testemunhos vagos não devem ser levados
em consideração, uma vez que não contam com efetivo valor probatório”401.
Desta forma, a possibilidade de autenticação da prova por meios diversos da
documentação dependerá das especificidades do caso. Tratando-se de itens fungíveis, por
exemplo, o requisito da identidade dificilmente será atendido por qualquer outro meio que
não o registro documental, já que não possuem elementos individualizadores que
potencialmente poderiam ser descritos por uma testemunha para diferenciá-los de outros.
Por outro lado, no caso da prática de um crime com a utilização de um objeto que tenha
característica próprias bem definidas, pode-se cogitar a possibilidade de sua identificação
ser feita por uma testemunha ou pela vítima.
As exigências de detalhamento dos elos da cadeia de custódia, contudo, não se
estendem às violações leves à sua manutenção,402 isto é, às falhas que não colocam em risco
a qualidade do resultado do elemento de prova produzido ou, tratando-se da fonte de prova,
a ser produzido.403
399
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 28, tradução nossa.
400
STEEN, Michael C. A chain of custody guide for american and mexican law enforcement professionals.
Columbia, 2019. p. 25, tradução nossa.
401
EDINGER, Carlos. Cadeia de custódia, rastreabilidade probatória. Revista Brasileira de Ciências
Criminais. São Paulo, vol. 24, n. 120, p. 237-257, mai./jun. 2016. p. 250.
402
De acordo com Giannelli, “‘prestar constas’ de todos os elos da cadeia de custódia não necessariamente
significa que todos estes elos devem ser demonstrados em juízo” (GIANNELLI, Paul C. Chain of custody.
Faculty Publications. 1996. p. 457, tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 19 dez. 2019).
403
Nesse sentido, Tabuenca: “[q]uestão distinta que se convêm abordar é se as irregularidades leves que
podem ter havido ao longo do procedimento de custódia e realização da perícia (como poderia ser a
insuficiências ou defeituosa documentação de algum ato concreto), impediria também a eficácia deste meio
de prova. Em nossa opinião não deve ser assim, podendo surtir plena eficácia sempre e quando a anomalia
que pode ter se produzido no curso do procedimento e atuações seguintes não afetarem os aspectos
fundamentais do objeto da perícia” (LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena de custodia en el proceso penal
113
Destaca-se, por fim, que, como será detalhado ao longo do capítulo 3, não
obstante seja ônus da parte proponente da prova manter o registro da sua cadeia de custódia,
esse dever não se confunde com o ônus de sempre demonstrar a higidez da cadeia de custódia
como requisito necessário para a sua admissão no processo.
Isso porque, ainda que alguns elementos e fontes de prova exijam um debate
aprofundado acerca da sua admissibilidade – principalmente quando a falha na cadeia de
custódia tiver relação com a pertinência, relevância e garantias fundamentais (v. capítulo 3)
–, deve-se trabalhar no processo penal com um regime de inclusão de provas (cf. capítulo 3,
item 3.1.1.2, infra),404 de modo que não se impõe às partes o ônus de demonstrar a cadeia de
custódia da prova para a sua admissão no processo.
Contudo, como será aprofundado no capítulo 3, a falha no registro da cadeia de
custódia poderá ser objeto de questionamento pela parte contrária e/ou pelo juiz quando for
suficiente para colocar dúvidas sobre a relevância ou pertinência do elemento ou fonte de
prova para o processo, ou ainda, sobre violações a garantias fundamentais do acusado.
Nesses casos, então, os elos sequenciais e ininterruptos do caminho da prova
deverão ser apresentados pela parte proponente da prova até atingir o standard exigido para
a demonstração de sua pertinência ou relevância,405 além da sua legalidade.
Ressalta-se que, mesmo sendo possível essa demonstração por meios de provas
diversos da documentação, a manutenção da cadeia de custódia não poderá se fiar
exclusivamente na boa-fé objetiva dos agentes públicos.406 Isso porque, a discussão sequer
é pautada por ser a ação do agente custodiante boa ou ruim – aliás, se isto estiver registrado
español: revisión normativa. In: FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso
penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 26, tradução nossa). Com o mesmo entendimento: BADARÓ, Gustavo
Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI, Ricardo; LOPES,
Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo Horizonte:
D’Plácido, 2017. p. 535.
404
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 311/314.
405
Conforme detalhado no capítulo 3, item 3.1.1.2, infra, o standard de admissibilidade da prova por seus
critérios lógicos de pertinência e relevância exige que a prova tenha maior probabilidade de ser o que diz ser
do que não ser, diferente do standard necessário para condenação de prova além da dúvida razoável. Assim,
uma prova com falha na cadeia de custódia pode ser, ao mesmo tempo, admitida e insuficiente para
fundamentar uma condenação.
406
Nesse sentido, Dallagnol e Câmara sustentam: “[c]onquanto a presunção de boa-fé ou regularidade da
prova não se revista de caráter absoluto, se não demonstrada má-fé, supõe-se a integralidade da evidência,
sob pena de subverter toda a lógica do sistema jurídico. Existe uma expectativa legítima de lealdade na
conduta das pessoas, com base na boa-fé objetiva que regula a conduta de indivíduos em relações – inclusive
relações processuais –, e é a partir dessa premissa que os comportamentos dos polos de um processo devem
ser examinados” (DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia
de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova
do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 543).
114
pela cadeia de custódia, nem de quebra será possível falar –, mas sim na incredulidade que
a falha na cadeia de custódia trouxe sobre o potencial de uma prova influenciar no
esclarecimento do fato alegado ou, ainda, por impedir o exercício ou a verificação de garantia
fundamental.
Assim, ainda que se defenda uma presunção de veracidade nos atos praticados
por agentes públicos, em matéria de prova penal, tal presunção encontra limites claros nos
critérios lógicos e políticos de admissibilidade da prova (cf. capítulo 3, item 3.1.1, infra), os
quais, aliás, já partem de uma presunção de admissibilidade do material aportado aos autos
ao se colocarem como exceções de um sistema de inclusão da prova.
Disso conclui-se que, se por um lado o registro da cadeia de custódia não é
requisito indispensável para admissibilidade da prova, a parte proponente deve cuidar da sua
manutenção, já que a sua ausência poderá levantar questionamentos que podem culminar na
sua inadmissibilidade, pois, nos termos dos artigos 157, caput, e 400, §1º, ambos do CPP,
não são admissíveis as provas irrelevantes ou impertinentes e as produzidas com violação a
direito fundamental de natureza processual ou material.407
407
O balanceamento destes dois aspectos que envolvem o elemento e a fonte de prova quando houver lacuna
na demonstração da cadeia de custódia é objeto de análise no capítulo 3.
408
Esse problema é identificado por Sanz: “[s]eja por indeterminação legislativa, seja pela dificuldade de
isolar que atuações são próprias da cadeia de custódia, a realidade nos mostra que em algumas ocasiões as
impugnações contra a regularidade da cadeia de custódia, na realidade, se dirigem contra diligências que,
ainda que se realizam sobre as evidências ou elementos que se encontrem no lugar do delito, não são
propriamente atividades que devam enquadrar-se propriamente no que denominamos cadeia de custódia”
(SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016.
p. 28/29, tradução nossa).
115
409
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 525.
410
NIEVA-FENOLL, Jordi. Algunas sugerencias acerca de la práctica y valoración de la prueba del perfil de
ADN. La ley penal: revista de derecho penal, procesal y penitenciario, Madrid, vol. 9, n. 93, p. 17-26., mai.
2012. p. 19, tradução nossa.
411
A inadmissibilidade da prova falsa não é objeto de controvérsia doutrinária, podendo derivar tanto de sua
origem ilícita (e.g. a apresentação de um documento material ou ideologicamente falso), como da sua
irrelevância para demonstrar a veracidade dos fatos alegados em juízo, uma vez que informações falsas não
auxiliam no esclarecimento das hipóteses discutidas em juízo.
412
Interessante o caso nº 147/2012 julgado pela SAP Santa Cruz de Tenerife, na Espanha, no qual não existem
registros de como os policiais encontraram as substâncias entorpecentes dentro do veículo, o que motivou os
magistrados a afirmarem: “[...] resulta evidente que a reiterada denúncia que efetuam as defesas acerca do
encontro de cocaína e haxixe no painel de controle do veículo [...] nada tem a ver com a cadeia de custódia
que começa desde que essas substâncias são recolhidas pelos agentes policiais [...] e finaliza quando as
mesmas chegam, neste caso, às dependências de Sanidade da Subdelegação do Governo de Canarias para sua
definitiva custódia e análise [...]” (Sala de Audiência Provincial, Santa Cruz de Tenerife, Sección 5, nº do
recurso 147/2012, p. 21, tradução nossa). O caso foi citado por Gutiérrez Sanz, que concluiu não se tratar de
um problema de cadeia de custódia (SANZ, María Rosa Gutiérrez. La cadena de custodia en el proceso penal
español. Navarra: Aranzadi, 2016. p. 30). Ressalte-se, no entanto, que referido caso tratava tão somente da
ausência de informação sobre como os policiais chegaram ao local, mas também da ausência de informação
sobre como as substâncias foram apreendidas (Diz o caso: “[...] ainda podendo ser certo que não se realizou
116
uma reportagem fotográfica ou uma ata in situ das manobras desenvolvidas pelos agentes para o
descobrimento das diferentes substâncias e sua apreensão [...]”), o que, conforme será detalhado abaixo, faz
parte dos procedimentos obrigatórios da documentação da cadeia de custódia.
413
Tal equívoco é verificado em Dallagnol e Câmara quando, para sustentarem que “o ônus probatório em
matéria de cadeia de custódia [...] cabe à defesa”, fazem uso do argumento de que seria impossível para a
acusação demonstrar “que a prova apresentada não é fruto de falsidade ou engano” (DALLAGNOL, Deltan
Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel
de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed.
Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 546/547). Contudo, como se explica acima, a cadeia de custódia não é método
para identificação da falsidade da fonte de prova, sendo, portanto, equivocado o exemplo adotado para sustentar
as conclusões dos autores.
117
pessoas diferentes e, no momento do exame, troque uma pela outra, mas documente a
informação de que examinou a amostra correta.
Dessa forma, a má-fé do agente custodiante e o erro procedimental se colocam
como o segundo limite para o alcance da autenticação da prova por meio da documentação
da cadeia de custódia.
Apesar disso, a correta manutenção da cadeia de custódia é importante meio
para, aliado a outros métodos, auxiliar na identificação de eventuais ilícitos praticados no
manuseio e na preservação da fonte de prova ou de erros procedimentais.
Com o avanço tecnológico das últimas décadas, não há mais qualquer empecilho
para que se faça o registro em áudio e vídeo dos ambientes de depósito, abertura e manuseio
das fontes de prova. Aliás, o monitoramento ambiental por câmeras de vídeo é expediente
comum na sociedade atual, inclusive em órgãos públicos. Na hipótese de existirem essas
gravações, a correta documentação da cadeia de custódia, com a identificação de dia, local
e hora, do manuseio de determinada fonte de prova, permitirá que as partes e o juiz façam a
efetiva verificação da existência de erro ou má-fé dos agentes custodiantes.
Percebe-se, portanto, que, mesmo quando encontra o seu limite, a documentação
da cadeia de custódia mantém a sua importância por conter informações necessárias para,
em adição a outros métodos, permitir a autenticação do elemento ou da fonte de prova.
414
ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed.
Campinas: Millennium, 2013. p. 188.
118
Na análise dos artigos 158-A, 158-B, 158-C, 158-D, 158-E, 158-F incluídos no
Código de Processo Penal pela Lei nº 13.964/19, de início, devemos apontar o equívoco de
incluir a disciplina da cadeia de custódia em conjunto com os procedimentos específicos
para a produção da prova pericial,418, pois se de fato a manutenção da cadeia de custódia do
elemento e fonte de prova pericial tem destacada importância nesta área por conta dos
aspectos técnicos e científicos envolvidos, não se pode excluir a indispensabilidade de se
manter os registros da história da prova obtida por outros meios, como interceptação
telefônica, busca e apreensão, agente infiltrado, entre outros, principalmente porque são
executados longe do controle do juiz e do contraditório das partes.
A partir dessa observação, é possível concluir sobre a inadequação do conceito
de cadeia de custódia disposto no artigo 158-A: “o conjunto de todos os procedimentos
utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais
415
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 527.
416
Conforme Badaró, “[e]mbora no Código de Processo Penal brasileiro não haja uma regra expressa
determinando, como princípio geral, a preservação da cadeia de custódia, tal necessidade pode ser extraída
de uma interpretação sistemática” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua
relevância para a prova penal. In: SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da
investigação preliminar no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 526).
417
BRASIL. Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019. Aperfeiçoa a legislação penal e processual penal.
Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 dez. 2019. Edição Extra. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13964.htm>. Acesso em: 29 dez. 2019.
418
De acordo com a Lei: “Capítulo II Do exame de corpo de delito, da cadeia de custódia e das perícias em
geral”.
119
ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento
até o descarte”.
A restrição do conceito de cadeia de custódia aos vestígios encontrados “em
locais ou em vítimas de crimes” equivocadamente exclui a necessidade de se manter os
registros sobre fontes de prova colhidas em qualquer outro ambiente que não o local do crime
ou na vítima em si. Assim, para além de excluir todos os outros meios de prova que não o
pericial – como já criticado acima –, tal conceituação limita até mesmo a aplicação da cadeia
de custódia à prova pericial. A redação legal não abrange, por exemplo, a coleta de fontes
de prova obtidas do próprio investigado (e.g. a apreensão de drogas em sua posse em
flagrante delito,419 a coleta de sangue), em locais públicos (como apreensão de material
descartado pelo investigado)420, entre outros.421
No que se refere ao período da preservação da cadeia de custódia, o Art. 158-A,
§ 1º, define que o seu início “dá-se com a preservação do local de crime ou com
procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio”,
devendo ser mantida, conforme Art. 158-A, parte final, “até o descarte”.
O artigo 158-B, por sua vez, lista as etapas a serem seguidas para a adequada
manutenção da cadeia de custódia.
A primeira fase inclui o “reconhecimento”, “isolamento” e “fixação”, que
consiste no “ato de distinguir um elemento como de potencial interesse para a produção da
prova pericial” (inciso I), evitando-se “que se altere o estado das coisas, devendo isolar e
preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime” (inciso
II).422 Por fim, antes que se proceda a coleta, essa etapa deve ser concluída com o que a lei
419
A situação se agrava nas hipóteses análogas ao caso Jalloh c. Alemanha, julgado pela Corte Europeia de
Direitos do Homem, no qual se entendeu possível a realização de procedimentos médicos no investigado,
mesmo contra a sua vontade, para obtenção de fonte de prova (Case of Jalloh v. Germany (Application n.
57810/00). European Court of Human Rights. Disponível em:
<https://hudoc.echr.coe.int/eng#{%22itemid%22:[%22001-76307%22]}>. Acesso em: 06 dez. 2019).
420
Hipótese de obtenção de fonte de prova permitida pelo Superior Tribunal de Justiça: “5. No caso, entretanto,
não há que falar em violação à intimidade já que o investigado, no momento em que dispensou o copo e a
colher de plástico por ele utilizados em uma refeição, deixou de ter o controle sobre o que outrora lhe pertencia
(saliva que estava em seu corpo). 6. Também inexiste violação do direito à não autoincriminação, pois, embora
o investigado, no primeiro momento, tenha se recusado a ceder o material genético para análise, o exame do
DNA foi realizado sem violência moral ou física, utilizando-se de material descartado pelo paciente, o que
afasta o apontado constrangimento ilegal. Precedentes” (HC nº 354.068/MG, 5ª T., Rel. Min. Reynaldo Soares
da Fonseca, DJe 21.03.2018).
421
Destaca-se que o § 3º, do artigo 158-A, apresenta o conceito do termo “vestígios” utilizado em seu caput,
evidenciando que ficam excluídas da manutenção da cadeia de custódia as fontes de provas imateriais:
“[v]estígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à
infração penal”.
422
A violação desta fase, de acordo com o previsto no artigo 158-C, § 2º, pode caracterizar crime: “[é] proibida
a entrada em locais isolados bem como a remoção de quaisquer vestígios de locais de crime antes da liberação
por parte do perito responsável, sendo tipificada como fraude processual a sua realização”.
120
[...] procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado de forma
individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e biológicas,
para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou a
coleta e o acondicionamento.
seu conteúdo” (§ 2º); (iv) “[o] recipiente só poderá ser aberto pelo perito que vai proceder
à análise e, motivadamente, por pessoa autorizada” (§ 3º); (v) “[a]pós cada rompimento de
lacre, deve se fazer constar na ficha de acompanhamento de vestígio o nome e a matrícula
do responsável, a data, o local, a finalidade, bem como as informações referentes ao novo
lacre utilizado” (§ 4º); e, por fim, (vi) “[o] lacre rompido deverá ser acondicionado no
interior do novo recipiente” (§ 5º).
A quarta etapa prevista é a de “transporte” e “recebimento”, para a qual se
determina que no “ato de transferir o vestígio de um local para o outro”, deve-se utilizar
“as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a
garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse”
(inciso VI, art. 158-B). Chegando-se ao local de recebimento, exige-se que o “ato formal de
transferência da posse do vestígio” seja “documentado com, no mínimo, informações
referentes ao número de procedimento e unidade de polícia judiciária relacionada, local de
origem, nome de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame,
tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação de quem o recebeu” (inciso VII, art.
158-B).
A quinta etapa de “armazenamento” impõe a “guarda, em condições adequadas,
do material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou
transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente” (inciso IX, art. 158-B).
Para o adequado cumprimento dessa etapa de manutenção da cadeia de custódia, o artigo
158-E prevê que “[t]odos os Institutos de Criminalística deverão ter uma central de custódia
destinada à guarda e controle dos vestígios, e sua gestão deve ser vinculada diretamente ao
órgão central de perícia oficial de natureza criminal” (caput), nas quais é preciso manter
“os serviços de protocolo, com local para conferência, recepção, devolução de materiais e
documentos, possibilitando a seleção, a classificação e a distribuição de materiais, devendo
ser um espaço seguro e apresentar condições ambientais que não interfiram nas
características do vestígio” (§ 1º), de modo a controlar “a entrada e a saída de vestígio [...]
consignando-se informações sobre a ocorrência no inquérito a que eles se relacionam” (§
2º) e “[t]odas as pessoas que tiverem acesso ao vestígio”, que “deverão ser identificadas e
deverão ser registradas a data e a hora do acesso” (§ 3º).
Assim, sumariza o § 4º do artigo 158-E, “[p]or ocasião da tramitação do
vestígio armazenado, todas as ações deverão ser registradas, consignando-se a
identificação do responsável pela tramitação, a destinação, a data e horário da ação”.
122
423
Reconhecendo o problema da tipificação processual penal do procedimento da cadeia de custódia em razão
do avanço tecnológico, Badaró sustenta: “[r]essalte-se, por fim, que não há que se exigir que o legislador
estabeleça no Código de Processo Penal uma disciplina específica sobre os elementos a serem documentados
na cadeia de custódia de cada uma das possíveis fontes de prova reais que poderão interessar ao processo.
Principalmente no caso das provas periciais, em que os avanços da prova científica têm sido constantes, seria
algo praticamente impossível. O tema da prova científica deve ser tratado não apenas pelo direito, mas pela
própria ciência, estabelecendo os seus métodos e padrões para a produção válida da prova científica”
(BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI,
Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo
Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 527).
424
Reconhecendo o princípio da mínima intervenção: PRADO, Geraldo. Ainda sobre a “quebra da cadeia de
custódia das provas”. Boletim do IBCCrim, n. 262, São Paulo: set., 2014. p. 17.
425
Reconhecendo que este dispositivo legal tem conteúdo voltado à manutenção da cadeia de custódia, ver:
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI,
Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo
Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 526.
124
contato de qualquer pessoa com objetos existentes na cena do crime se dará somente “após
liberados pelos peritos criminais”426.
Da leitura conjunta dos aludidos incisos pode-se extrair, de um lado, a
preocupação de se evitar a contaminação de potenciais fontes de prova pela presença de
pessoas no local – para o que somente o isolamento seria suficiente. Mas também é possível
constatar, por outro, a exigência legal de que a coleta e guarda da fonte de prova seja feita
por perito, isto é, por pessoa com conhecimento técnico qualificado para extrair e empacotar
a fonte de prova por meio do procedimento adequado, evitando trocas e/ou contaminações
que afetem a identidade ou a integralidade da prova.427
Nessa tarefa, no que se refere às perícias, conforme determina o artigo 169,
parágrafo único, do CPP, os peritos deverão registrar eventuais “alterações do estado das
coisas” existentes no local do delito, incluindo nessas coisas as fontes de prova lá
disponíveis.
Ainda, como explicado anteriormente (item 2.5.1), o registro de imagens do local
e da fonte de prova integram a manutenção da cadeia de custódia da prova pericial nas
hipóteses em que as condições do ambiente puderem, de alguma forma, trazer informações
relevantes acerca da identidade e integridade da fonte de prova. Nesse sentido, também
integram a manutenção da cadeia de custódia os dispositivos legais dos artigos 164, 165, 169
e 170, todos do CPP, que preveem a necessidade do registro fotográfico do cadáver na
posição em que foi encontrado, das suas lesões externas e dos vestígios deixados no local,
bem como da possibilidade de instruir o laudo de corpo de delito, do exame do local e do
exame laboratorial com fotografias, desenhos ou esquemas ilustrativos.
O armazenamento das fontes de prova também é objeto de previsão legal.
Conforme expressamente previsto no artigo 159, §6º, do CPP, para garantir a realização de
426
Tem igual conteúdo o artigo 169 do CPP: “[p]ara o efeito de exame do local onde houver sido praticada a
infração, a autoridade providenciará imediatamente para que não se altere o estado das coisas até a chegada
dos peritos, que poderão instruir seus laudos com fotografias, desenhos ou esquemas elucidativos”.
427
Sobre isso, especificamente acerca da fonte de prova pericial, ver capítulo 1, item 1.2, supra.
125
contraprova e/ou nova perícia,428 o órgão oficial manterá sempre a guarda429 do material
probatório que serviu de base para a perícia “salvo se for impossível a sua conservação”430.
Destaca-se que a única exceção à regra de guarda do material para contraprova
é a impossibilidade de sua conservação. Essa hipótese se restringe à deterioração da fonte de
prova em decorrência das suas características naturais,431 não sendo admissível a perda da
identidade ou integralidade da coisa em razão da sua má conservação decorrente da
ineficiência ou incapacidade do Estado de armazenar adequadamente a fonte de prova.
Esse dispositivo legal tem particular importância porque, sendo possível a
preservação da fonte de prova, o meio de prova pericial será repetível, sendo certo que, nos
termos do artigo 155 do CPP, somente será admissível como elemento de prova quando
realizada em contraditório judicial (cf. capítulo 1, item 1.3.2, supra).
Assim, a adequada manutenção da custódia da fonte de prova deve ser objeto de
atenção por parte dos órgãos estatais de investigação e acusação, pois o desaparecimento ou
deterioração do estado da coisa, em razão das más condições de armazenamento, impedirão
a realização da contraprova e, por conseguinte, a utilização como elemento de prova de
eventual resultado de perícia realizada na fase policial, sem contraditório.432
428
Para exames de laboratório, o artigo 170 do CPP prevê expressamente a guarda de material com a finalidade
de nova perícia: “[n]as perícias de laboratório, os peritos guardarão material suficiente para a eventualidade
de nova perícia. Sempre que conveniente, os laudos serão ilustrados com provas fotográficas, ou
microfotográficas, desenhos ou esquemas”.
429
Nesse ponto, vale trazer a ressalva de Gomes Filho: “[a] expressão ‘sempre sua guarda’ empregada pelo
legislador pode ensejar o entendimento que a conservação desses objetos seja indefinida. Mas isso deve ser
lido à luz do sistema do Código de Processo Penal, que no art. 118 prevê textualmente: ‘Antes de transitar em
julgado a sentença final, as coisas apreendidas não poderão ser restituídas enquanto interessarem ao
processo’. Assim, com o trânsito em julgado da sentença final, cessa essa obrigação para o órgão oficial.
Mesmo antes disso, será possível que o juiz, depois de ouvir os eventuais interessados na realização de exames
pelos assistentes técnicos, verifique que a conservação dos referidos objetos é dispensável” (GOMES FILHO,
Antonio Magalhães. Título VII: da prova. In: GOMES FILHO, Antonio Magalhães; TORON, Alberto
Zacharias; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy (coord.). Código de Processo Penal Comentado. 2. ed.
São Paulo: Thomson Reuters, 2018. p. 425).
430
Conforme dispõe o artigo 159, §6º, do CPP: “[h]avendo requerimento das partes, o material probatório
que serviu de base à perícia será disponibilizado no ambiente do órgão oficial, que manterá sempre sua
guarda, e na presença de perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for impossível a sua
conservação”.
431
Conforme Nucci, haverá impossibilidade de guarda, “por exemplo, com o cadáver, que precisa ser
sepultado” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 18. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2019. p. 459).
432
Para Choukr, “[a] impossibilidade de realização do laudo com o material mencionado neste artigo pode
acarretar a nulidade processual. Situação neste sentido foi apreciada no julgado contido na RJTACrim
23/405, no qual se analisou a seguinte situação fática, ligada a crime contra as relações de consumo: ‘[...]
Trata-se de infração que deixa vestígios sendo, portanto, indispensável o exame de corpo de delito [...]. No
caso, dentro do prazo legal, requereu o impetrante a realização de perícia de contraprova (...). Ocorre que a
Divisão de Bromatologia e Química do Instituto Adolfo Lutz, em ofício encaminhado à 1ª Delegacia do
DECON – Departamento Estadual de Polícia do Consumidor, informou não ser possível a realização da
contraprova, em face da inutilização das amostras colhidas’, acarretando, assim, o trancamento da ação penal
126
com a consequente concessão da ordem” (CHOUKR, Fauzi Hassan. Código de processo penal: comentários
consolidados e crítica jurisprudencial. v. 1. 7. ed. Belo Horizonte: D'Plácido, 2017. p. 487/488).
433
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 18. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2019. p. 466.
434
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Título VII: da prova. In: GOMES FILHO, Antonio Magalhães;
TORON, Alberto Zacharias; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy (coord.). Código de Processo Penal
Comentado. 2. ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2018. p. 487.
127
Outrossim, o artigo 6º, §2º, da Lei nº 9.296/96, traz idêntica previsão legal para
o procedimento de interceptação telefônica ao determinar que autoridade policial lavre “auto
circunstanciado”, que deverá “conter o resumo das operações realizadas”, isto é, “o modus
operandi, quanto tempo demorou, qual foi o telefone interceptado, qual foi o resultado
obtido [...]”435.
A partir desse mesmo dispositivo legal também é possível extrair a exigência de
serem registrados e preservados “os suportes técnicos que resultam da operação”436, pois
estes dados não só integram o modus operandi da interceptação telefônica, como também
indicam qual foi o telefone interceptado que permitiu a gravação das conversas, bem como
o dia e a hora dos diálogos.
Assim, como destaca Prado, esses suportes técnicos compõem os registros da
cadeia de custódia da interceptação telefônica, já que “apenas dessa maneira é possível
assegurar à defesa, oportunamente, o conhecimento das fontes de prova”437. A análise dos
registros do suporte técnico é extensível também ao juiz, para quem tais informações são
essenciais na tarefa de verificar se a interceptação telefônica foi conduzida pela autoridade
policial dentro dos limites da decisão proferida.
Percebe-se, portanto, que, apesar de a sistematização específica da cadeia de
custódia estar limitada à prova pericial, a legislação processual brasileira abarca uma ampla
regulamentação esparsa sobre a sua manutenção para outros meios de prova, além de trazer
complementos para circunstâncias especiais exigidas para determinadas perícias.
Assim, para além da prova pericial, há regras sobre a necessidade de registro,
seja em relatórios, seja em auto circunstanciado, do procedimento realizado, fornecendo às
partes e ao juiz informações suficientes para que autentiquem o elemento de prova produzido
fora do juízo e sem contraditório, como nos casos dos meios de pesquisa de prova da busca
e apreensão e interceptação telefônica.
Apesar disso, é fundamental que o regramento específico estabelecido para a
manutenção da cadeia de custódia das perícias seja estendido às fontes e aos elementos de
prova dos outros meios de prova e meios de pesquisa de prova, para os quais a sua
observância seja também importante para a acreditação epistêmica e legal da prova.
435
GOMES, Luiz Flávio; MACIEL, Silvio Luiz. Interceptação telefônica e das comunicações de dados e
telemáticas. 4. ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2018. p. 191.
436
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 79.
437
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia
de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 79.
128
438
A disciplina está prevista nos artigos 169-A, 169-B e 169-C, dispostos na p. 133 do Relatório Parcial
(PEREIRA JÚNIOR, Rubens. Relatório Parcial no Projeto de Lei n. 8.045, de 2010. p. 133. Disponível em:
<https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1574897&filename=PRP+3+PL
804510+%3D%3E+PL+8045/2010>. Acesso em: 06 dez. 2019).
439
PEREIRA JÚNIOR, Rubens. Relatório Parcial no Projeto de Lei n. 8.045, de 2010. p. 20. Disponível em:
<https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1574897&filename=PRP+3+PL
804510+%3D%3E+PL+8045/2010>. Acesso em: 06 dez. 2019.
440
Cf. Relatório Parcial da 10ª Relatoria-Parcial: Da Prova e das Ações de Impugnação, elaborado pelo
Deputado Federal Hugo Leal (LEAL, Hugo. Relatório Parcial no Projeto de Lei n. 8.045, de 2010 – 10 relatoria-
parcial: da prova e das ações de impugnação. p. 9. Disponível em:
<https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1829180&filename=PRP+9+PL
804510+%3D%3E+PL+8045/2010>. Acesso em: 06 dez. 2019).
441
A redação dos artigos consta da p. 49 Relatório Parcial da 10ª Relatoria-Parcial: Da Prova e das Ações de
Impugnação, elaborado pelo Deputado Federal Hugo Leal (LEAL, Hugo. Relatório Parcial no Projeto de Lei
n. 8.045, de 2010 – 10 relatoria-parcial: da prova e das ações de impugnação. Disponível em:
<https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1829180&filename=PRP+9+PL
804510+%3D%3E+PL+8045/2010>. Acesso em: 06 dez. 2019).
129
442
Destaca-se a necessidade de ler o artigo 169-C, caput, em conjunto com o 169-A, caput, em razão da má
redação daquele. Isso porque, não obstante o artigo 169-A corretamente preveja a observância da “cadeia de
custódia na aquisição e preservação das fontes e meios de prova”, o artigo 169-C, caput, prevê que “[a]
aplicação da cadeia de custódia é de responsabilidade dos servidores públicos que tiverem contato com os
elementos probatórios materiais”. Ao usar o termo “elementos probatórios materiais”, a leitura isolada deste
artigo levaria à errônea conclusão que estão fora do âmbito da cadeia de custódia as fontes de prova, ou, ainda
que se queira dar uma interpretação mais favorável à redação utilizada para englobar no gênero elemento de
prova as fontes que levaram à sua obtenção, ficariam de fora as fontes de prova “imateriais”.
130
Apesar desse dispositivo legal vir inserido no artigo que disciplina o ônus de
manutenção da cadeia de custódia, a sua redação evidencia a preocupação de criar meios
para aplicar eventuais sanções que venham a ser cominadas pela falha na cadeia de custódia
também a particulares que prestam serviço público.
Tal iniciativa é totalmente desnecessária. Do ponto de vista penal material, os
artigos 327 e 347, ambos do Código Penal, cumprem essa função. Do ponto de vista
processual, como já dito ao se tratar do assunto acima (item 2.8.1), as consequências da
quebra da cadeia de custódia independem da função pública ou privada do agente.
Aliás, naquilo que deveria regular, isto é, o ônus de manter a cadeia de custódia,
melhor seria incluir nessa tarefa todos os particulares, o que, como já dito (item 2.8.1, supra),
é indispensável em razão do crescimento da investigação privada, compliance de empresas
etc.
Por fim, o artigo 169-A, § 2º, dispõe que “[o]s órgãos policiais e periciais
deverão regulamentar a cadeia de custódia, adaptando-a anualmente aos avanços técnico-
científicos”. Trata-se de uma norma processual penal em branco que exige complementação
por parte de portarias ou normativas de órgão técnicos especializados nas multimatérias que
envolvem, principalmente, as perícias.
Como se vê, portanto, a sistemática prevista no Projeto de Lei é menos detalhada
e possui menor qualidade técnica do que o tratamento atualmente recebido pela matéria no
Código de Processo Penal. Assim, na hipótese de o novo Código avançar no Congresso, é
desejável que o legislador se inspire na legislação já vigente sobre cadeia de custódia, para
adotá-la fazendo os ajustes necessários apenas para suprir as lacunas existentes (cf.
demonstrado no item 2.8.1, supra).
Como exemplo de previsão do projeto que seria importante para suprir lacuna
da legislação atual, destaca-se o artigo 169-A, § 2º, do Projeto que, ao contrário do vigente
Código de Processo Penal, protege a disciplina da cadeia de custódia de prováveis
defasagens decorrentes dos rápidos avanços técnicos-científicos impostos pela tecnologia,
pois estas inovações poderão ser rapidamente – e com maior nível de conhecimento –
131
443
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 169.
444
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 31,
tradução nossa.
445
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 77,
tradução nossa.
446
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 91.
447
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 77,
tradução nossa.
448
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 171.
134
449
Expressão utilizada por Badaró. Ver: BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 5 ed. rev.
atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 406.
450
Conforme Gomes Filho, “[e]sses limites probatórios podem ter fundamentos extra-processuais (políticos),
como ocorre em relação à proibição de introdução de provas obtidas com violação de direitos fundamentais,
ou processuais (lógicos, epistêmológicos), quando se excluem, por exemplo, as provas impertinentes,
irrelevantes, ou que possam conduzir o julgador a uma avaliação errônea” (GOMES FILHO, Antonio
Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 93).
451
PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p.
135.
452
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 532.
135
dos fatos penalmente relevantes. Com isso, os elementos apreendidos não podem ser
empregados validamente como fonte ou meio de prova. Traduzem-se em prova ilícita”453.
No mesmo sentido, Aury Lopes Jr. entende que a consequência da quebra da
cadeia de custódia “[s]em dúvida deve ser a proibição de valoração probatória com a
consequente exclusão física dela e de toda a derivada. É a ‘pena de inutilizzabilità’
consagrada pelo direito italiano”454.
Com uma posição intermediária, Badaró defende que “as irregularidades da
cadeia de custódia não são aptas a causar a ilicitude da prova, devendo o problema ser
resolvido, com redobrado cuidado e muito maior esforço justificativo, no momento da
valoração”455, ressalvando que, “no caso de vícios mais graves, em que se tenha dúvidas
sobre a autenticidade ou integralidade da fonte de prova, em que haja uma probabilidade
de que a mesma tenha sido adulterada, substituída ou modificada, isso enfraquecerá o seu
valor, cabendo ao julgador, motivadamente, fazer tal análise”456.
Por fim, com posicionamento mais restritivo, Dallagnol e Câmara entendem que
“o rompimento na demonstração da cadeia de custódia em uma ou mais das suas conexões
(links), ainda que gere lacunas, não ensejará no Brasil, jamais, a inadmissibilidade da
prova, mas deverá ser objeto de análise no âmbito da valoração do peso daquela prova”457.
Não obstante os posicionamentos dos autores divirjam, todos têm em comum o
foco na verificação da ilicitude ou ilegalidade da prova, isto é, nas regras de exclusão que
compõem a segunda etapa de verificação da admissibilidade da prova, posteriores à
avaliação dos critérios lógicos de relevância e pertinência.
Dessa forma, fazendo expressa ressalva no sentido de ser necessário tratamento
legal específico à matéria que leve em consideração a especificidade de a fiabilidade ser a
“prova sobre a prova”, Geraldo Prado posiciona-se ressaltando que “enquanto não houver
regra a respeito, a violação do devido processo legal e do processo equitativo pela via da
453
PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p.
135.
454
LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 414.
455
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 535.
456
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 535.
457
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 552.
136
458
PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p.
128.
459
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 535. A mesma conclusão pode ser extraída do seguinte trecho: “[n]o caso
de violação da cadeia de custódia, em tese, duas soluções seriam possíveis: a primeira, considerar que a prova
se torna ilegítima, não podendo ser admitida no processo; a segunda, superar o problema de admissão da
prova e resolver o problema do vício da cadeia de custódia dando menor valor ao meio de prova produzido a
partir de fontes de prova cuja cadeia de custódia tenha sido violada” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi
Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra
(orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p.
532/533).
460
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 566.
461
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 538.
462
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 154. No mesmo sentido: FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la
prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 69.
137
463
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 535.
464
PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p.
128.
138
465
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 180.
466
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 168.
467
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 155.
468
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 168.
469
Não se ignora que a lei também prevê o indeferimento das provas protelatórias. Contudo, apesar de estar
prevista no mesmo dispositivo legal, não é limite lógico da prova, pois tem relação com limites políticos, tais
como a celeridade e a economia processual.
470
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 156.
139
471
Conforme destacado por Badaró, apesar de “desde meados do século passado”, ser “comum encontrar na
jurisprudência nacional referência a indeferimento de requerimentos probatórios que fossem impertinentes ou
irrelevantes”, somente na “reforma de 2008, tais critérios lógicos foram expressamente adotados” (BADARÓ,
Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos de pertinência
e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em homenagem ao
prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 299/300).
472
Para profundo detalhamento histórico das divergências doutrinárias sobre o tema, ver: BADARÓ, Gustavo
Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos de pertinência e
relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em homenagem ao
prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015.
473
O tratamento dos termos como sinônimos é perceptível em Ferrer Beltrán: “[o] legislador espanhol e a
jurisprudência usam frequentemente o termo ‘pertinência’ para referir-se ao que aqui denomino ‘relevância’
(Veja, por exemplo, o STC 51/1985, de 10 de abril). Tratando-se, não obstante, de um filtro de caráter
epistemológico, resulta mais comum o uso do termo ‘relevância’, que prefiro” (FERRER BELTRÁN, Jordi. La
valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 68, nota de rodapé 13, tradução nossa).
474
De acordo com Badaró, “[a] exclusão do objeto da prova dos fatos impertinentes e irrelevantes foi feita, ao
que se acredita, pela primeira vez, por Lopes da Costa” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à
prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah
H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo:
Empório do direito, 2015. p. 301).
475
LOPES DA COSTA, Alfredo Araújo. Direito Processual Civil Brasileiro. vol. 2. 2 ed. Rio de Janeiro: José
Konfino, 1947. p. 222.
476
No mesmo sentido, também no processo penal, Hassan Choukr considera irrelevante “a postulação da prova
cuja qualidade não apresenta importância para o deslinde da causa” e impertinente “a postulação da
produção da prova não relacionada ao assunto tratado, despropositada em relação a ele” (CHOUKR, Fauzi
Hassan. Código de processo penal: comentários consolidados e crítica jurisprudencial. vol. 2. 7. ed. Belo
Horizonte: D'Plácido, 2017. p. 98).
477
MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal: vol. 2. 1 ed. Campinas: Bookseller,
1998. p. 254.
140
478
TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. 3.ed. rev São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2009. p. 166.
479
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os
conceitos de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo:
estudos em homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 301.
480
DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. vol. 3. 6 ed. São Paulo:
Malheiros, 2009. p. 66.
481
DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. vol. 3. 6 ed. São Paulo:
Malheiros, 2009. p. 66.
141
482
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 131.
483
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 131.
484
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 131.
485
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 315/316.
486
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 315.
487
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 315.
142
488
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015.p. 314/315.
489
Distinguindo os conceitos, mas em sentido diverso do aqui adotado, Nucci sustenta: “não há que se deferir
a realização de qualquer espécie de prova considerada irrelevante (desnecessária para a apuração da verdade
relacionada à imputação), impertinente (desviada do foco principal da causa, embora possa ser importante
para outros fins)” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 18. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2019. p. 1016).
490
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 315.
491
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 315.
492
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 69.
493
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 71,
tradução nossa.
143
relação lógica entre o thema probandum”494, isto é, tenha “aptidão de demonstrar um fato
que se relaciona com o thema probandum, seja diretamente (materiality, no conceito anglo-
americano), ou mesmo indiretamente (relevancy, no conceito de common law), mas de
forma a logicamente poder influenciar no resultado do processo”495.
Assim, não obstante as diversas denominações que possa receber (relevância,
pertinência etc.), exige-se que o elemento de prova que se pretende produzir tenha
potencialidade de influenciar no resultado do processo, de modo que o elemento ou fonte de
prova somente será “relevante para decisão sobre a prova de um enunciado fático se, e
somente se, permite fundar nele (por si só ou conjuntamente com outros elementos) uma
conclusão sobre a verdade de um enunciado fático a provar”496.
Sob essa perspectiva do filtro do critério lógico de admissão da prova é que se
deve analisar, inicialmente, as repercussões da quebra da cadeia de custódia para um
elemento ou fonte de prova, principalmente nas situações em que a quebra afetar o requisito
da identidade.
494
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 311.
495
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 311.
496
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 71,
tradução nossa.
144
497
Como explica LaRocca Jr., “[q]ualquer item oferecido como prova de que supostamente tem uma
associação com um indivíduo, hora ou local deve ser vinculado a esse indivíduo, hora ou local antes ou no
momento da sua admissão”. Assim, exemplifica o autor, “quando uma faca encontrada na cena de um crime
é oferecida como prova contra X, o proponente deve primeiro mostrar que a faca era de propriedade de X ou
estava sob seu controle” (LAROCCA JR., Nicholas F. Authentication, Identification, and the Best Evidence
Rule. Louisiana Law Review, vol. 36, 1975, p. 186, tradução nossa. Disponível em
<https://digitalcommons.law.lsu.edu/lalrev/vol36/iss1/14>. Acesso em: 20 out. 2019).
498
Ainda que não se referindo especificamente aos critérios lógicos de admissão da prova, é isto que se pode
concluir quando Figueroa Navarro aponta que, no julgamento STS 308/2013, o Tribunal espanhol assentou
que “[h]á que valorar se essa irregularidade (não menção de algum dado que é obrigado a consignar;
ausência de documentação exata ou completa de algum dos passos...) é idônea para gerar dúvidas sobre a
autenticidade ou indenidade da fonte de prova” (FIGUEROA NAVARRO, Carmen. La cadena de custodia de
las muestras biológicas In: FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso
penal. Madri: Edisofer, 2015, p. 113, tradução nossa). O mesmo entendimento é sustentado por: GUTIÉRREZ
SANZ, María Rosa. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016, p. 38.
145
decorrente da suspeita que pairava contra alguém nos casos em que, incialmente, tiveram
efetivo acesso a potencial informação incriminadora perdida. Afora esse aspecto psíquico –
que não é relevante do ponto de vista jurídico ou epistêmico –, a falta de potencial de
influenciar no julgamento será a mesma de quando não se sabe a origem ou se, entre a origem
e o destino, perdeu-se o registo do caminho.
Não por outra razão, no tratamento dado à matéria pelo ordenamento jurídico
norte-americano, a “autenticação e a identificação representam um aspecto especial da
relevância”499, cuja exigência se sustenta na necessidade lógica que é inerente à admissão
da prova.500 Ou seja, a autenticação e a identificação da prova realizada pelo método da
manutenção da cadeia de custódia constitui uma das etapas do procedimento de admissão da
prova que Gomes Filho denomina de “teste de relevancy”501.
Nesse sentido, LaRocca Jr. explica que a “evidência somente se torna admissível
com a demonstração da sua conexão com o fato sobre o qual a sua relevância depende, por
isso a autenticação e a identificação têm sido referidas como ‘aspecto especial da
relevância’”502.
Assim, sustenta Giannelli, a regra da cadeia de custódia no ordenamento jurídico
norte-americano busca “assegurar que a evidência é relevante”503, de modo que “se a
relevância de um objeto depende do seu uso em um crime, a parte proponente deve
estabelecer, pela cadeia de custódia ou de outra forma, a conexão entre o objeto e o
crime”504.
A preocupação com a falta de nexo entre o fato discutido em juízo e a prova
apresentada também é utilizada como fundamento de exclusão da prova pelos tribunais
499
MILLER, David, W. LEACH, Thomas J.; UHRIG, Emily Garcia. Federal & California Evidence Rules.
Nova Iorque: Wolters Kluwer, 2018-2019. p. 640, tradução nossa.
500
Nesse sentido, “Wigmore descreve a necessidade de autenticação como ‘uma necessidade lógica inerente’”
(MILLER, David, W. LEACH, Thomas J.; UHRIG, Emily Garcia. Federal & California Evidence Rules. Nova
Iorque: Wolters Kluwer, 2018-2019. p. 641, tradução nossa).
501
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 131.
502
LAROCCA JR., Nicholas F. Authentication, Identification, and the Best Evidence Rule. Louisiana Law
Review, vol. 36, 1975. p. 186, tradução nossa. Disponível em
<https://digitalcommons.law.lsu.edu/lalrev/vol36/iss1/14>. Acesso em: 20 out. 2019.
503
GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications. 1996. p. 452, tradução nossa. Disponível
em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 25 nov. 2019.
504
GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications. 1996. p. 452/453, tradução nossa. Disponível
em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 25 nov. 2019.
146
505
Estado de Nova Iorque contra Alfred Jones, Caso nº 1914/2003, julgado em 12 de fevereiro de 2004: “[p]ara
que o povo decida prima facie sobre um caso criminal de posse ilegal de arma, considerado de média
lesividade, é necessário estabelecer se a arma era operável e se estava carregada com munição” (tradução
nossa).
506
Estado de Nova Iorque contra Alfred Jones, Caso nº 1914/2003, julgado em 12 de fevereiro de 2004,
tradução nossa.
507
GUTIÉRREZ SANZ, María Rosa. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi,
2016, p. 26, tradução nossa.
147
508
STS nº 491/2016, Rel. Candido Conde-Pumpido Touron, 8 jun. 2016. Tradução nossa.
509
STS nº 491/2016, Rel. Candido Conde-Pumpido Touron, 8 jun. 2016. Tradução nossa.
510
STS nº 491/2016, Rel. Candido Conde-Pumpido Touron, 8 jun. 2016. Tradução nossa.
148
de precisar que a fonte de prova tem conexão com o fato a torna irrelevante para a decisão
sobre a sua ocorrência.
Da maneira como entendemos, portanto, a avaliação da cadeia de custódia deve
passar inicialmente pelo filtro lógico da relevância e pertinência para a admissibilidade da
prova, pois a sua violação, em muitos casos, poderá retirar o potencial do elemento ou fonte
de prova de influenciar na apreciação dos fatos alegados.
Com a constatação da influência da cadeia de custódia na admissão da prova,
torna-se importante averiguar se o filtro com os critérios lógicos de pertinência e relevância
deve ser aplicado a partir de um regime de inclusão ou exclusão, isto é, se a análise parte da
premissa de que toda prova deve ser admitida, salvo demonstração em contrário (inclusão),
ou se a regra é a inadmissibilidade até que seja demonstrada a sua pertinência ou relevância
(exclusão).
511
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os limites lógicos de sua admissão: os conceitos
de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H. (coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em
homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório do direito, 2015. p. 314.
512
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 84.
513
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 84.
149
514
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 167.
515
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 167.
516
Nesse sentido, Chaia sustenta que “a decisão sobre a procedência ou improcedência de um meio de prova
resulta fundamental para determinar o curso do processo, razão pela qual a rejeição deve ser excepcional e
fundamentada, pois se se excluir uma prova decisiva, sem dúvida se estará violando o direito de defesa em
juízo e colocando em cheque o princípio do contraditório” (CHAIA, Rubén A. La prueba en el proceso
penal: proceso acusatorio, juicio oral, carga probatoria, prueba ilegal, medios de prueba, construcción de la
verdad, valoración-arbitrariedad, motivación de la sentencia, jurisprudencia vinculada. Buenos Aires:
Hammurabi, 2010. p. 72, tradução nossa).
517
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 55, nota
de rodapé 40, tradução nossa.
518
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 169, tradução nossa.
150
fundamentada, que expresse claramente os motivos da rejeição, de maneira tal que seja
possível verificar se houve arbitrariedade na negativa”519.
Para além da exigência de fundamentação, há também que se buscar maximizar
o resultado da conflitante relação existente entre, de um lado, a garantia do direito à prova e
a entrada de conhecimentos úteis para a apuração verídica dos fatos e, de outro, a exigência
da superação da presunção de inocência do acusado para a condenação.
O caminho para tanto é diferenciar o standard necessário para a admissão da
prova, na análise da sua pertinência e relevância, daquele exigido para a condenação.
Portanto, no que se refere ao critério lógico de admissibilidade, a prova deve ser
admitida quando “atende a um requisito muito menos exigente, de mera preponderância de
evidência (normalmente traduzido como uma exigência de probabilidade de 50%)”520.
Nesse sentido se organiza o sistema norte-americano, conforme se depreende da
regra 401 (a) da Federal Rules of Evidence que estabelece como relevante a evidência que
“tem qualquer tendência de tornar o fato mais ou menos provável do que seria sem ela”521.
Destaca-se que a adoção do standard de “probabilidade na linguagem da regra
tem a virtude adicional de evitar confusão entre questões de admissibilidade e questões de
sufficiency sobre a evidência”522.
Portanto, a adoção de diferentes standards para a admissão da prova e para a
condenação523 conduz à necessária conclusão de que uma mesma prova pode transpor a
519
CHAIA, Rubén A. La prueba en el proceso penal: proceso acusatorio, juicio oral, carga probatoria, prueba
ilegal, medios de prueba, construcción de la verdad, valoración-arbitrariedad, motivación de la sentencia,
jurisprudencia vinculada. Buenos Aires: Hammurabi, 2010. p. 75, tradução nossa.
520
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 535.
521
“Regra 401. Teste de relevância da evidência: a evidência é relevante se: (a) tende a tornar um fato mais
ou menos provável do que seria sem a evidência.” (tradução nossa).
522
MILLER, David, W. LEACH, Thomas J.; UHRIG, Emily Garcia. Federal & California Evidence Rules.
Nova Iorque: Wolters Kluwer, 2018-2019. p. 300, tradução nossa. Entende-se por sufficiency, conforme Baker,
o standard estabelecido pela Suprema Corte norte-americana para a condenação: “Jackson estabeleceu o
padrão de que uma condenação deve se basear em evidências suficientes, que a Corte definiu como a evidência
necessária para persuadir o júri dos fatos sem que restem dúvidas da existência dos elementos essenciais do
crime. Id. at 316. O Tribunal de Jackson declarou que se restasse qualquer dúvida, a condenação não poderia
ser mantida” (BAKER, Robert L. Tibbs v. Florida: a dubious distinction between weight and sufficiency of
evidence in the double jeopardy context. DePaul Law Review. Vol. 32, Issue 3, Spring, 1983. p. 663, nota de
rodapé 4, tradução nossa. Disponível em:
<https://via.library.depaul.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=2282&context=law-review>. Acesso em: 13 dez.
2019.
523
De acordo com Badaró, “o standard de prova no processo penal, para que haja uma condenação deve ser:
a) há elementos que confirmam, com elevadíssima probabilidade, todas as proposições fáticas que integram
a imputação formulada pela acusação; e, b) não há elementos de prova que tornem viável ter ocorrido fato
concreto diverso de qualquer proposição fática que integre a imputação” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi
Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. p. 259)
151
barreira da admissibilidade, por ser considerada pertinente ou relevante, mas ser insuficiente
para, isoladamente, fundamentar a condenação do acusado.
Também no ordenamento jurídico italiano, o artigo 190 do CPP adota o sistema
de inclusão da prova ao prever que somete as provas “manifestamente” irrelevantes terão
sua produção inadmitidas pelo juiz.524 Assim, segundo Tonini, “compete às partes somente
demonstrar a provável relevância e, na dúvida, o requerimento das partes deve ser deferido.
Dessa forma, o quantum de prova imposto à parte requerente é baixo”525.
Portanto, como conclui Badaró, sob o ponto de vista dos critérios lógicos de
admissão da prova, “somente quando o meio de prova requerido for manifestamente
impertinente ou irrelevante, a prova deve ser indeferida”526.
Dessa forma, não obstante a quebra da cadeia de custódia do elemento ou fonte
de prova possa resultar na sua inadmissão por conta da irrelevância e impertinência, a
avaliação deverá ser feita sob a perspectiva de um regime de inclusão da prova, de modo que
deverão ser aceitas aquelas que tenham maior probabilidade de serem o que a parte diz que
são.
524
Nesse sentido, Badaró: “[o] Codice di procedura penale italiano – assim como o projeto de Código de
Processo Penal brasileiro – se vale do advérbio manifestamente, para qualificar a condição da irrelevância
do meio de prova. Consequência disso é que os motivos lógicos de exclusão das provas somente justificarão o
indeferimento em casos extremos, de evidente ausência de conexão entre o fato a ser demonstrado pelo meio
de prova requerido e o thema probandum” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito à prova e os
limites lógicos de sua admissão: os conceitos de pertinência e relevância. In: KHALED JR., Salah H.
(coord.). Sistema penal e poder punitivo: estudos em homenagem ao prof. Aury Lopes Jr. São Paulo: Empório
do direito, 2015. p. 312).
525
TONINI, Paolo. A prova no processo penal italiano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 84.
526
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 166.
527
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 171.
152
528
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 171. Apesar de apresentar essa classificação e reconhecer que “a
prevenção de erros de valoração é um aspecto importante de qualquer procedimento orientado à descoberta
da verdade” (TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor
de Paula RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 171), Taruffo defende que “o problema da correção de tal
decisão [...] poderia, talvez, ser formulado de maneira mais eficaz e menos paradoxal se fosse posto fazendo-
se referência a outros aspectos da disciplina das provas, ou seja, sob o prisma das modalidades de produção
e de controle da confiabilidade das provas, bem como sob o da qualidade do sujeito ou órgão que atua com
trier of fact” (TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor
de Paula RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 177). Assim, conclui, “[a] preocupação epistêmica de
assegurar uma correta valoração das provas não pode, por conseguinte, exprimir-se em normas que eliminam
a produção de provas relevantes, e muito menos pode exaurir-se na aplicação de normas contraepistêmicas.
Ao contrário, essa deve ser mantida, para ser satisfeita, em todos os outros momentos do procedimento
probatório” (TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor
de Paula RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 178).
529
Importante destacar, conforme Badaró, que “a aceitação de tais regras, ditas epistemológicas, é objeto de
controvérsia. Isso porque, para muitos autores, tais limites legais são antiepistêmicos, ao impedir o ingresso
e valoração de elementos relevantes para o convencimento judicial” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi
Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. p. 178).
530
Destaca-se, conforme Badaró, que “a regra de exclusão de hearsey admite um grande número de exceções,
nas quais se considera que o testemunho indireto é confiável o bastante para ser admitido. As Federal Rules
of Evidence apresentam um complexo regramento, com quase três dezenas de exceções à regra geral”
(BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 180/181).
531
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 171.
532
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007.p. 31.
533
GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As
nulidades no processo penal. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 122.
153
Da mesma forma, Badaró afirma que “a busca da verdade não é ilimitada e não
representa um fim que possa ser atingido a qualquer custo. No processo e, principalmente,
na atividade probatória, os fins são tão importantes quanto os meios”534.
Exatamente sob essa perspectiva, Beling, precursor do estudo das proibições
probatórias no direito europeu continental, desenvolveu sua doutrina sobre o tema para,
como reconhece, “manifestar que existem limitações à averiguação da verdade dentro da
investigação no processo penal”535.
Reconhecendo também a vocação das proibições probatórias de estabelecer
limites ao poder de punir do estado, Guerrero afirma que, justamente por isso, esse “é, talvez,
o campo em que se manifesta com maior afinco a tensão entre os direitos fundamentais do
imputado e a efetividade da administração da justiça penal”536.
Também dentro dos sistemas da common law,537 notadamente no direito norte-
americano, Costa Andrade aponta a “experiência das exclusionary rules, um conjunto de
princípios, normas e práticas jurisprudenciais susceptível de ser referenciado como ‘o
sistema’ americano das proibições de prova”538.
Entretanto, ainda que do ponto de vista epistêmico seja possível separar as regras
de exclusão nesses dois grandes grupos de limites epistêmicos ou políticos, ao se aprofundar
no estudo comparado do que chamou de “classes de prova ilícita” existentes em variados
sistemas jurídicos, Armenta Deu concluiu que a diversidade de perspectivas e diferentes
conotações sociopolíticas que envolvem a matéria levaram a “um conceito de prova ilícita
que não é unívoco, servindo para incorporar problemas jurídicos em ocasiões notavelmente
diversas”539.
534
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 411.
535
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 59,
tradução nossa.
536
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 153,
tradução nossa.
537
De acordo com Gomes Filho, o regramento de exclusão/proibição de prova “é mais evidente no sistema da
common law, dada sua longa elaboração, mas que igualmente existe nos ordenamentos de tradição
continental” (GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1997. p. 95).
538
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 133.
539
DEU, Teresa Armenta. La prueba ilícita: un estudio comparado. Madrid: Marcial Pons, 2009. p. 31,
tradução nossa.
154
540
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 170.
541
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 114.
542
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 114.
543
O principal fator assinalado pelo referido autor, para na sequência concluir pela impossibilidade de se ter
um único tratamento legal e doutrinário sobre a matéria, é a inevitável necessidade de considerar os aspectos
do caso concreto para decidir sobre a (in)admissibilidade da prova. Nas palavras de Costa Andrade, “[a]
necessária e permanente referência ao caso concreto impõe naturalmente balizas à reflexão sobre as
proibições da prova e os princípios fundamentais do seu regime. Não pode, nomeadamente, aspirar-se à
definição de uma qualquer malha de enunciados normativos, capazes de enquadrar, como premissas de um
rígido programa condicional, as pertinentes expressões da vida. Terá, pelo contrário, de optar-se por um
discurso marcado pela plasticidade e abertura à surpresa do caso concreto” (ANDRADE, Manuel da
Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra Editora, 2006. p. 116).
544
GÖSSEL, Karl Heinz. La búsqueda de la verdad en el proceso penal: aspectos jurídico-constitucionales y
político-criminales. Cuadernos de política criminal, Madrid, n. 45, p. 673-693, 1991. p. 673, tradução nossa.
545
Com concepção diversa de Costa Andrade, Gössel atribui, o que chamou de obscuridade acerca do tema,
ao fato de ser uma matéria escassamente investigada: “[q]uem quiser estudar, ou ao menos, se informar sobre
a ‘proibição da prova’ se encontra diante de um dilema: terá escolhido um objeto de exame que permanece
obscuro, e que pertence a uma matéria escassamente investigada” (GÖSSEL, Karl Heinz. La búsqueda de la
verdad en el proceso penal: aspectos jurídico-constitucionales y político-criminales. Cuadernos de política
criminal, Madrid, n. 45, p. 673-693., 1991. p. 673, tradução nossa).
155
546
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 534.
547
A escolha dos dois sistemas para comparação foi feita por Costa Andrade em razão da primazia do estudo
do tema nesses países. Nesse sentido, explica o autor: o estudo das proibições de prova “aconselha a sua
projeção sobre o panorama do direito comparado. Um exercício que nós podemos ensaiar privilegiando uma
referência abreviada às experiências americana e alemã. Já por representarem os dois paradigmas
tipologicamente mais consistentes e estabilizados de compreensão das proibições de prova” (ANDRADE,
Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra Editora, 2006. p. 133).
548
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 140.
549
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 172.
156
O sistema norte americano de exclusão da prova deve ser analisado sob duas
perspectivas diversas, distinguindo-se entre as exclusionary rules of intrinsic policy e as
exclusionary rules of extrinsic policy.
A doutrina classifica como exclusionary rules of intrinsic policy as regras de
exclusão que detêm fundamento epistêmico, isto é, voltadas para a exclusão de “provas que
poderiam levar o julgador a uma reconstituição inexata dos fatos”550. Dentro dessas regras
de exclusão estão, por exemplo, as regras de competence, que proíbem o testemunho de
pessoas cuja confiabilidade é duvidosa, como crianças e doentes mentais,551 bem como a
vedação ao testemunho de ouviu dizer (hearsey rule).
Também compõem as exclusionary rules of intrinsic policy as regras atinentes
às provas científicas, técnicas ou que demandem um conhecimento especializado, exigindo-
se que as provas estejam fundadas em princípios e métodos cientificamente confiáveis.552
Como será detalhado adiante (item 3.2.4.1, infra), a jurisprudência norte-americana atribui
ao juiz papel ativo no controle da admissibilidade da prova científica, para que leve em
consideração, no caso concreto, “a confiabilidade da teoria científica ou da técnica, que
deve ser passível de testes, a revisão da teoria pela comunidade científica, a existência de
publicações da teoria, a existência de um percentual de erros conhecidos ou potenciais e a
aceitação geral da comunidade científica”553.
Por sua vez, são classificadas pela doutrina como exclusionary rules of extrinsic
policy554 as “regras que afastam elementos dotados de valor probatório, para salvaguardar
outros valores não conexos com a busca da verdade”555.
550
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 95.
551
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 96.
552
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 155 e 178/196.
553
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 192.
554
Conforme Gomes Filho, as exclusionary rules of extrinsic policy são as que “preveem a exclusão de provas
cuja prática possa representar um atentado à integridade física ou psíquica, à dignidade, à liberdade ou à
privacidade das pessoas, à estabilidade das relações sociais, à segurança do próprio Estado, etc.” (GOMES
FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
p. 99).
555
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 155.
157
556
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 136.
557
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 136.
558
TURNER, Jenia Iontcheva; WEIGEND, Thomas. The Purposes and Functions of Exclusionary Rules: A
Comparative Overview. p. 256, tradução nossa. Disponível em
<https://link.springer.com/content/pdf/10.1007%2F978-3-030-12520-2_8.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019.
559
Nesse sentido, Turner e Weigend: “[n]a grande maioria dos sistemas processuais, a maior parte do
trabalho de investigação é realizada por policiais, e normalmente são eles que quebram as regras relativas à
aquisição de provas. O aspecto da integridade do processo criminal é, portanto, mais vulnerável no nível
policial” (TURNER, Jenia Iontcheva; WEIGEND, Thomas. The Purposes and Functions of Exclusionary
Rules: A Comparative Overview. In: GLESS, Sabine; RICHTER, Thomas (eds.). Do exclusionary rules ensure
a fair trial? A comparative perspective on evidentiary rules. Baltimore: Springer Open, 2019. p. 259, tradução
nossa. Disponível em: <https://link.springer.com/content/pdf/10.1007%2F978-3-030-12520-2.pdf>. Acesso
em: 13 dez. 2019).
560
Nesse sentido, Madden: “[d]e acordo com a lógica dissuasiva, as evidências obtidas em violação dos
direitos fundamentais de um indivíduo devem ser excluídas dos julgamentos criminais, a fim de impedir que
os funcionários do Estado violem de maneira semelhante os direitos de outros no futuro” (MADDEN, Mike.
A model rule for excluding improperly or unconstitutionally obtained evidence. Berkeley Journal of
International Law. vol. 33, Issue 2, 2015. p. 447, tradução nossa. .Disponível em:
<https://scholarship.law.berkeley.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1509&context=bjil>. Acesso em: 16 dez.
2019). Em idêntico sentido, Turner e Weigend: “[a]o excluir a evidência que o policial havia adquirido em
violação à lei e, assim, reduzindo drasticamente as chances de condenação, os tribunais esperam convencer
os policiais a cumprir a lei no futuro” (TURNER, Jenia Iontcheva; WEIGEND, Thomas. The Purposes and
Functions of Exclusionary Rules: A Comparative Overview. In: GLESS, Sabine; RICHTER, Thomas (eds.).
Do exclusionary rules ensure a fair trial? A comparative perspective on evidentiary rules. Baltimore: Springer
Open, 2019. p. 259, tradução nossa. Disponível em: <https://link.springer.com/content/pdf/10.1007%2F978-
3-030-12520-2.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019).
158
interrogatório sem ter sido informado dos seus direitos de constituir advogado e permanecer
em silêncio, confessou a prática do crime.561
Apesar da maior repercussão do caso Miranda, o precedente da Suprema Corte
norte-americana que primeiro tratou das regras de exclusão foi Weeks v. Estados Unidos
(1914). Na oportunidade, decidiu-se pela não admissão de documentos apreendidos pela
polícia na residência do acusado, sem ordem judicial, por violação à IV emenda da
Constituição.562
Pode-se acrescentar aos exemplos das exclusionary rules of extrinsic policy os
denominados privileges, que disciplinam, entre outras coisas, a manutenção dos sigilos
profissionais (client-attorney privilege, journalist´s source privilege) e o depoimento de
pessoas que possuam relações conjugais (marital privilege).563
Contudo, cabe ressaltar que, não obstante o sistema norte-americano de exclusão
de prova com finalidade extrínseca tenha se sedimentado como instrumento de sanção
processual contra as violações procedimentais praticadas pelo chamado police
misconduct,564 “originalmente a exclusão da prova foi adotada porque entendeu-se
necessária para efetivar as garantias previstas nas quarta, quinta e sexta emendas”565.
561
Nesse sentido, Turner: “[e]m sua famosa decisão em Miranda v. Arizona, a Suprema Corte dos EUA
estendeu ainda mais o alcance do privilégio e sustentou que o ambiente coercitivo de interrogatórios em
prisões preventivas contituem um tipo de constrangimento que tem o potencial de interferir na vontade do
acusado. Para eliminar esse efeito coercitivo, antes do interrogatório, os policiais devem alertar os suspeitos
detidos de seu direito de ficar em silêncio, do risco de que qualquer declaração poderá ser usada como prova
contra eles, do direito de consultar um advogado, e do direito de ter um advogado nomeado caso não possam
pagar por um. Após receber os avisos, os suspeitos podem optar por renunciar ao direito de permanecer
calado e de ter um advogado presente durante o interrogatório. A renúncia deve, no entanto, ser consciente,
clara e espontânea” (TURNER, Jenia Iontcheva. Regulating interrogations and excluding confessions in the
United States: Balancing individual rights and the search for truth. In: GLESS, Sabine; RICHTER, Thomas
(eds.). Do exclusionary rules ensure a fair trial? A comparative perspective on evidentiary rules. Baltimore:
Springer Open, 2019. p. 103, tradução nossa. Disponível em:
<https://link.springer.com/content/pdf/10.1007%2F978-3-030-12520-2.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019).
562
LIZCANO BEJARANO, Jesús Eduardo. La cláusula de exclusión. Bogotá: Nueva Jurídica, 2013. p. 13.
563
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 100.
564
Nesse sentido, Turner: “[n]a maioria das vezes, no entanto, o Tribunal justificou a exclusão com o
argumento de que ajuda a desencorajar a má conduta dos policiais” (TURNER, Jenia Iontcheva. Regulating
interrogations and excluding confessions in the United States: Balancing individual rights and the search for
truth. In: GLESS, Sabine; RICHTER, Thomas (eds.). Do exclusionary rules ensure a fair trial? A comparative
perspective on evidentiary rules. Baltimore: Springer Open, 2019. p. 103, tradução nossa. Disponível em:
<https://link.springer.com/content/pdf/10.1007%2F978-3-030-12520-2.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019).
565
TURNER, Jenia Iontcheva. Regulating interrogations and excluding confessions in the United States:
Balancing individual rights and the search for truth. In: GLESS, Sabine; RICHTER, Thomas (eds.). Do
exclusionary rules ensure a fair trial? A comparative perspective on evidentiary rules. Baltimore: Springer
Open, 2019. p. 103, tradução nossa. Disponível em: <https://link.springer.com/content/pdf/10.1007%2F978-
3-030-12520-2.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019.
159
566
MADDEN, Mike. A model rule for excluding improperly or unconstitutionally obtained evidence. Berkeley
Journal of International Law. vol. 33, Issue 2, 2015. p. 451, tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarship.law.berkeley.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1509&context=bjil>. Acesso em: 16 dez.
2019.
567
Nesse sentido, explicam Kamisar et. al: “[o]s tribunais inferiores haviam desenvolvido a doutrina de que
um réu não tinha ‘legitimidade’ para contestar as provas apreendidas em violação dos direitos constitucionais
de terceiros” (KAMISAR, Yale et al. Modern criminal procedure: cases, comments and questions. 11 ed.
USA: Thonson West, 2005. p. 891, tradução nossa).
568
Cf. Elkins v. United States, 364 US 206, 217 (1960): KINPORTS, Kit. Culpability, deterrence, and the
exclusionary rule. William & Mary Bill of Rights Journal. vol. 21, n. 821, 2013. p. 822, tradução nossa.
Disponível em: <https://elibrary.law.psu.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1169&context=fac_works>. Acesso
em: 16 dez.
569
KAMISAR, Yale et al. Modern criminal procedure: cases, comments and questions. 11 ed. USA: Thonson
West, 2005. p. 891, tradução nossa.
570
DEU, Teresa Armenta. La prueba ilícita: un estudio comparado. Madrid: Marcial Pons, 2009. p. 30,
tradução nossa.
160
571
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 180/181.
572
Nesse sentido, Turner: “[m]ais recentemente, o Tribunal superou o entendimento sobre o efeito dissuasivo,
de que a regra de exclusão deveria ser usada apenas quando dissuadisse efetivamente os agentes da lei de
violarem a lei no futuro. Se o potencial de dissuasão da regra for muito insignificante ou forem superados
amplamente pelos custos da regra de exclusão, então a exclusão não deverá ser imposta” (TURNER, Jenia
Iontcheva. Regulating interrogations and excluding confessions in the United States: Balancing individual
rights and the search for truth. In: GLESS, Sabine; RICHTER, Thomas (eds.). Do exclusionary rules ensure a
fair trial? A comparative perspective on evidentiary rules. Baltimore: Springer Open, 2019. p. 104, tradução
nossa. Disponível em: <https://link.springer.com/content/pdf/10.1007%2F978-3-030-12520-2.pdf>. Acesso
em: 13 dez. 2019).
573
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 145.
574
Nesse sentido, Turner e Weigend: “[a] posição majoritária é de que se um oficial agiu de ‘boa fé’, não há
espaço para discussão. Por exemplo, se o oficial confiou em um estatuto ou decisão judicial posteriormente
considerada inconstitucional ou se equivocou inocentemente sobre fatos relevantes, ele não pode ser
responsabilizado por ter violado a lei e não há nenhuma conduta da qual ele precise ser dissuadido. A
necessidade de ‘punir’ um policial por má conduta é, portanto, ausente ou pelo menos fortemente reduzida se
ele agiu sem culpa ou foi apenas ligeiramente negligente durante a investigação do crime. Se, por outro lado,
o policial violou a lei de forma deliberada ou imprudente, esse é o tipo de má conduta que merece ser excluído
das evidências, porque o policial deve aprender a respeitar a norma legal no futuro” (TURNER, Jenia
Iontcheva; WEIGEND, Thomas. The Purposes and Functions of Exclusionary Rules: A Comparative
Overview. In: GLESS, Sabine; RICHTER, Thomas (eds.). Do exclusionary rules ensure a fair trial? A
comparative perspective on evidentiary rules. Baltimore: Springer Open, 2019. p. 267, tradução nossa.
Disponível em: <https://link.springer.com/content/pdf/10.1007%2F978-3-030-12520-2.pdf>. Acesso em: 13
dez. 2019).
161
A good faith exception foi inicialmente adotada no caso United States v. Leon,
quando a Suprema Corte Americana considerou que a sanção de exclusão da prova não terá
qualquer consequência dissuasória nos atos policiais futuros quando penalizar a atividade de
um agente que tinha fundadas razões para acreditar que agia de maneira legal, pois não se
pode evitar a prática de um ato ilegal nos casos em que o ator não tem como saber da violação
que está praticando.
Com base na exceção da good faith, a jurisprudência norte-americana tem feito
frequentes ponderações para manter a admissibilidade da prova. No precedente Herring v.
United States, por exemplo, o policial de um condado recebeu a informação de um policial
de outro condado no sentido de que havia um mandado de busca e apreensão contra Herring.
Em razão disso, realizou-se a busca e foram apreendidas armas e drogas com o investigado.
Pouco depois, verificou-se que o outro condado havia se enganado e que nunca houvera
autorização para a realização da busca e apreensão. Entretanto, a prova foi admitida por se
entender que o erro cometido foi resultado de uma negligência isolada, sendo que somente
devem ser excluídas as provas “para dissuadir condutas deliberadamente imprudentes ou
muito negligentes, ou em algumas circunstâncias em que a negligência é recorrente ou
sistêmica”575.
A ponderação também é feita pela jurisprudência norte-americana para admitir
provas em decorrência do menor custo social causado pela violação na sua obtenção quando
comparado com o crime praticado, fazendo, nas palavras de Turner e Weigend, uma análise
do custo-benefício da prova para decidir sobre a sua exclusão.576
A consideração sobre o desproporcional custo da exclusão da prova foi adotada
como mecanismo de ponderação para manutenção da prova no processo, por exemplo, no
julgamento Hudson v. Michigan. No caso, a defesa questionava a admissibilidade das provas
colhidas em busca e apreensão realizada sem que o policial tivesse batido na porta e
anunciado a medida antes de entrar no local (knock and announce before entry), o que
575
BRADLEY, Craig M. Is the exclusionary rule dead?. Jornal of Criminal Law and Criminology. vol. 102,
Issue 1, Winter, 2012. p. 5, tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.northwestern.edu/cgi/viewcontent.cgi?referer=&httpsredir=1&article=7416&
context=jclc >. Acesso em: 13 jun. 2018.
576
TURNER, Jenia Iontcheva; WEIGEND, Thomas. The Purposes and Functions of Exclusionary Rules: A
Comparative Overview. In: GLESS, Sabine; RICHTER, Thomas (eds.). Do exclusionary rules ensure a fair
trial? A comparative perspective on evidentiary rules. Baltimore: Springer Open, 2019. p. 260. Disponível em:
<https://link.springer.com/content/pdf/10.1007%2F978-3-030-12520-2.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019.
162
constitui violação à quarta emenda.577 Nesta circunstância, contudo, a Corte decidiu que as
regras de exclusão somente são aplicáveis nos casos “em que os seus benefícios dissuasores
superam substancialmente os seus custos sociais”578.
Os diversos precedentes que ampliavam a abrangência dos mecanismos de
ponderação das exclusionary rules of extrinsic policy levaram a Suprema Corte norte-
americana a estabelecer novos critérios – mais restritivos – para a exclusão da prova em
decorrência de violações na sua obtenção ou produção. Ao jugar o caso Davis v. United
States579 definiu-se:
577
BRADLEY, Craig M. Is the exclusionary rule dead?. Jornal of Criminal Law and Criminology. vol. 102,
Issue 1, Winter, 2012. p. 3. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.northwestern.edu/cgi/viewcontent.cgi?referer=&httpsredir=1&article=7416&
context=jclc >. Acesso em: 13 jun. 2018.
578
BRADLEY, Craig M. Is the exclusionary rule dead?. Jornal of Criminal Law and Criminology. vol. 102,
Issue 1, Winter, 2012. p. 4, tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.northwestern.edu/cgi/viewcontent.cgi?referer=&httpsredir=1&article=7416&
context=jclc >. Acesso em: 13 jun. 2018.
579
A hipótese colocada em julgamento nesse caso era a seguinte: “[e]m Davis, a polícia de Greenville,
Alabama, conduziu uma parada rotineira de trânsito que acabou resultando na prisão do motorista por dirigir
embriagado e Davis, o passageiro, por dar um nome falso à polícia. Depois que os presos foram algemados e
colocados na traseira dos carros da patrulha, a polícia revistou o compartimento do passageiro do veículo e
encontrou um revólver dentro do bolso da jaqueta de Davis. Davis foi preso e condenado por posse ilegal de
uma arma de fogo. É indiscutível que a busca sem suspeita do incidente de carro até a prisão se manteve com
o precedente do Décimo Primeiro Circuito, que foi por sua vez baseado na decisão da Suprema Corte em Nova
York v. Belton. No entanto, após a prisão de Davis, Belton foi essencialmente anulado por Arizona v. Gant.
Gant exigiu que, antes que a polícia pudesse revistar um incidente de carro para prender, quando os suspeitos
estivessem sob seu controle, eles deveriam ter motivos para acreditar que as evidências do crime pelo qual o
réu foi preso seriam encontradas no carro. Essa ‘razão de acreditar’ não estava presente em Davis. Portanto,
a questão era se as evidências deveriam ser excluídas quando a polícia seguisse a lei existente, que
posteriormente seria anulada. Uma maioria de sete a dois concluiu que não deveria” (BRADLEY, Craig M.
Is the exclusionary rule dead?. Jornal of Criminal Law and Criminology. vol. 102, Issue 1, Winter, 2012. p. 8,
tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.northwestern.edu/cgi/viewcontent.cgi?referer=&httpsredir=1&article=7416&
context=jclc >. Acesso em: 13 jun. 2019).
580
BRADLEY, Craig M. Is the exclusionary rule dead?. Jornal of Criminal Law and Criminology. vol. 102,
Issue 1, Winter, 2012. p. 8, tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.northwestern.edu/cgi/viewcontent.cgi?referer=&httpsredir=1&article=7416&
context=jclc >. Acesso em: 13 jun. 2019.
163
581
A transcrição da íntegra da palestra está disponível em: BELING, Ernst Von; GUERRERO, Oscar Julián.
Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 3/56.
582
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 136.
583
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 140.
584
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 141.
585
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 141.
164
586
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p.
64/65, tradução nossa.
587
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 64.
588
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p.
64/65.
589
GUERRERO, Oscar Julián. Las prohibiciones de prueba en el proceso penal colombiano. In: BELING,
Ernst Von; GUERRERO, Oscar Julián. Las prohibiciones probatorias. Bogotá: Temis, 2009. p. 156.
590
GÖSSEL, Karl Heinz. La búsqueda de la verdad en el proceso penal: aspectos jurídico-constitucionales y
político-criminales. Cuadernos de política criminal, Madrid, n. 45, p. 673-693., 1991. p. 693, tradução nossa.
591
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 65.
165
592
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009.p. 67.
No mesmo sentido: GÖSSEL, Karl Heinz. La búsqueda de la verdad en el proceso penal: aspectos jurídico-
constitucionales y político-criminales. Cuadernos de política criminal, Madrid, n. 45, p. 673-693., 1991p. 693.
593
Conforme reconhece Kai Ambos, “[p]ara realmente alcançar uma proibição do uso de evidências, é
necessário uma disposição legal expressa (no caso de proibições no uso de provas escritas [...]) ou uma base
teórica (no caso das proibições de uso não escrito) com fundamento na doutrina das proibições sobre o uso
de evidências” (AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In:
BELING, Ernst Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá:
Temis, 2009. p. 68, tradução nossa).
594
DEU, Teresa Armenta. La prueba ilícita: un estudio comparado. Madrid: Marcial Pons, 2009. p. 49,
tradução nossa.
595
DEU, Teresa Armenta. La prueba ilícita: un estudio comparado. Madrid: Marcial Pons, 2009. p. 68.
596
Conforme consta de decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que analisou a alegação de
admissão de prova pelo Estado alemão com violação à Convenção, destacou-se: “[o] Código de Processo
Penal alemão não contém regras gerais sobre a admissibilidade de provas, além do artigo 136a, que
estabelece que confissões obtidas por tortura, tratamento desumano ou degradante ou coação ilegal não
devem ser usadas como prova contra o réu” (Case of K.S. and M.S. v. Germany (Application nº. 33696/11).
European Court of Human Rights, tradução nossa Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/europa-
prova-ilegal-sonegacao-busca.pdf.>. Acesso em: 20 jul. 2018).
597
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 68.
166
598
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p.
70/72.
599
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 105.
600
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 104.
601
Dando especificamente este exemplo, ver: GUERRERO, Oscar Julián. Las prohibiciones de prueba en el
proceso penal colombiano. In: BELING, Ernst Von; GUERRERO, Oscar Julián. Las prohibiciones
probatorias. Bogotá: Temis, 2009. p. 169/170.
602
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 104.
167
violação do processo com uma proibição de valoração é questão que terá de ter
uma resposta normativa, encontrada a partir da consideração do interesse concreto
da perseguição penal, da gravidade da violação da lei, bem como da dignidade de
tutela e da carência de tutela do interesse lesado.603
603
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p.143.
604
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 110,
tradução nossa.
605
GÖSSEL, Karl Heinz. El derecho procesal penal en el estado de derecho: obras completas Tomo I. Buenos
Aires: Rubinzal-Culzoni, 2007. p. 203, tradução nossa.
606
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 111,
tradução nossa.
607
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 112,
tradução nossa.
608
DEU, Teresa Armenta. La prueba ilícita: un estudio comparado. Madrid: Marcial Pons, 2009. p. 51,
tradução nossa.
168
609
ROXIN, Claus. Por uma proibição de valorar a prova nos casos de omissão do dever de informação
qualificada. Revista Liberdades, São Paulo, n. 4, p. 44-50, mai./ago. 2010. p. 47/48, tradução nossa.
610
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 105,
tradução nossa.
611
GÖSSEL, Karl Heinz. La búsqueda de la verdad en el proceso penal: aspectos jurídico-constitucionales y
político-criminales. Cuadernos de política criminal, Madrid, n. 45, p. 673-693., 1991. p. 686/687.
612
GUERRERO, Oscar Julián. Las prohibiciones de prueba en el proceso penal colombiano. In: BELING,
Ernst Von; GUERRERO, Oscar Julián. Las prohibiciones probatorias. Bogotá: Temis, 2009. p. 168/169. No
mesmo sentido: GÖSSEL, Karl Heinz. La búsqueda de la verdad en el proceso penal: aspectos jurídico-
constitucionales y político-criminales. Cuadernos de política criminal, Madrid, n. 45, p. 673-693., 1991. p.
685/686.
169
constatação de que o direito ao silêncio integra o núcleo de direitos que compõem o devido
processo legal.613
Aliás, é justamente neste complexo balanceamento que pendula o estudo da
proibição da prova no direito germânico. Conforme Gössel, “[o] problema da proibição de
prova encontra-se na encruzilhada entre os interesses do Estado a um processo criminal
efetivo, enquanto comunidade jurídica, e os interesses do indivíduo na proteção de seus
direitos pessoais”614.
Não obstante sua primazia no sistema europeu-continental, a complexa
construção do direito alemão refletiu simplificadamente em outros ordenamentos jurídicos.
Na Espanha, por exemplo, o artigo 11.1 Ley Orgánica del Poder Judicial determina que
“[n]ão surtirão efeito as provas obtidas, direta ou indiretamente, violando direitos ou
liberdades fundamentais”.
Apesar disso, sob a alegação de ser uma previsão legal genérica, a doutrina
majoritária e a jurisprudência espanhola têm distinguido entre os direitos fundamentais de
natureza material e processual.615 A partir desta distinção, “ao juízo do Tribunal
Constitucional”, “provocam ilicitude da prova as lesões a direitos constitucionais que não
sejam de âmbito processual”616, ao passo que a exclusão da prova em decorrência de
violações a direitos fundamentais processuais dependerá do reconhecimento da nulidade dos
atos praticados, devido ao potencial prejuízo à defesa.617
Como se percebe, ao menos com relação aos direitos fundamentais de natureza
processual, a previsão de exclusão de prova no ordenamento espanhol também impõe um
juízo de ponderação ao exigir a verificação, no caso concreto, de um prejuízo à defesa do
acusado.
Por sua vez, o ordenamento jurídico italiano denomina de inutilizzabilità a
previsão legal que, em comparação com o sistema alemão, ao mesmo tempo disciplina a
proibição de produção e de utilização de uma prova. Conforme explica Tonini, o termo
613
Cf. ROXIN, Claus. Por uma proibição de valorar a prova nos casos de omissão do dever de informação
qualificada. Revista Liberdades, São Paulo, n. 4, p. 44-50, mai./ago. 2010. p. 47/48.
614
GÖSSEL, Karl Heinz. La búsqueda de la verdad en el proceso penal: aspectos jurídico-constitucionales y
político-criminales. Cuadernos de política criminal, Madrid, n. 45, p. 673-693., 1991. p. 675, tradução nossa.
615
DEU, Teresa Armenta. La prueba ilícita: un estudio comparado. Madrid: Marcial Pons, 2009. p. 48.
616
DEU, Teresa Armenta. La prueba ilícita: un estudio comparado. Madrid: Marcial Pons, 2009. p. 48,
tradução nossa.
617
Nesse sentido, ao tratar das infrações a normas processuais, Armenta Deu explica que “[a] obtenção de
provas não implicaria em ilicitude de provas em sentido estrito, mas apenas uma infração processual que
determinaria a nulidade dos procedimentos, devido à impossibilidade de produção de provas” (DEU, Teresa
Armenta. La prueba ilícita: un estudio comparado. Madrid: Marcial Pons, 2009. p. 48, tradução nossa).
170
inutilizzabilità “descreve dois aspectos do mesmo fenômeno. Por um lado, indica o ‘vício’
que pode conter um ato ou um documento; por outro lado, ilustra o ‘regime jurídico’ ao
qual o ato viciado é submetido, ou seja, a não possibilidade de ser utilizado como
fundamento de uma decisão do juiz”618.
Assim, a sanção de “inutilizabilidade” da prova exerce um limite ao livre
convencimento do juiz, uma vez que “exclui alguns elementos de prova do material
utilizável pelo juiz para decidir e fundamentar seu entendimento”619.
Destaca-se que, ao contrário do sistema germânico de exclusão de prova que se
desenvolveu pela proteção material-substantiva dos direitos fundamentais – e demonstrando
que esta não é uma característica intrínseca ao direito europeu continental –, o sistema
italiano partiu da proteção de violações processuais no procedimento de obtenção e produção
da prova, prevendo expressamente, sob a expressão “provas ilegitimamente adquiridas”, a
proibição da utilização do elemento de prova como consequência da violação de uma regra
de produção (art. 191 do CPP italiano).620
Apesar desse foco inicial nos aspectos processuais das violações concernentes à
prova, como observa Gomes Filho:
618
TONINI, Paolo. A prova no processo penal italiano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 76.
619
TONINI, Paolo. A prova no processo penal italiano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 79.
620
O aspecto processual da exclusão da prova tem tamanho relevo na sistemática italiana, em que parte da
doutrina sustenta a impossibilidade de aplicação da inutilizzabilità às violações de direito material. Nesse
sentido, Tonini afirma: “[a] proibição idônea a gerar a inutilizabilidade é somente aquela prevista por uma
norma processual. Isso pode ser extraído do nomen iuris do art. 191 do CPP, que se refere às provas
ilegitimamente adquiridas. Se a proibição tivesse como objeto a violação de uma lei penal substancial, teria
sido utilizada a expressão ‘prova ilicitamente adquirida’. Em contrapartida, o nomen iuris do art. 191 refere-
se às provas ‘ilegitimamente adquiridas’. Portanto, as provas obtidas por meio de violação de uma norma da
lei penal substancial (denominadas provas ilícitas) são, em regra, utilizáveis” (TONINI, Paolo. A prova no
processo penal italiano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 77/78).
621
GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Provas – Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de Assis. As reformas no processo penal: as novas leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2008. p. 264.
622
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 173.
171
623
TONINI, Paolo. A prova no processo penal italiano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 78/79.
624
Essa distinção, feita em comparação ao direito alemão, é destacada por Alaor Leite: “[o] processo alemão
não trabalha, em matéria de prova, com as nossas categorias de nulidade ou invalidade, e sim com a noção
da possibilidade de valorar uma prova, isso é, de que o juiz se reporte a ela para fundamentar o seu
conhecimento” (Nota do autor In: ROXIN, Claus. Por uma proibição de valorar a prova nos casos de omissão
do dever de informação qualificada. Revista Liberdades, São Paulo, n. 4, p. 44-50., mai./ago. 2010. p. 45).
625
A alteração do Código de Processo Penal promovida pela Lei nº 11.690/2008 alterou o caput do art. 157 do
diploma legal para prever que “[s]ão inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas
ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”. Como se vê, a lei incluiu
no conceito das provas ilícitas também aquelas produzidas com violação a normas processuais. Entretanto,
como critica Gomes Filho, “[n]ão parece ter sido a melhor, assim, a opção do legislador nacional por uma
definição legal de prova ilícita, que, longe de esclarecer o sentido da previsão constitucional, pode levar a
equívocos e confusões, fazendo crer, por exemplo, que a violação de regras processuais implica ilicitude da
prova e, em consequência, o seu desentranhamento do processo” (GOMES FILHO, Antônio Magalhães.
Provas – Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis. As reformas no processo
penal: as novas leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 266).
626
GRINOVER, Ada Pellegrini. Provas ilícitas, interceptações e escutas. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013. p.
135.
627
GRINOVER, Ada Pellegrini. Provas ilícitas, interceptações e escutas. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013. p.
135.
628
GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Provas – Lei 11.690, de 09.06.2008. In: MOURA, Maria Thereza
Rocha de Assis. As reformas no processo penal: as novas leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2008. p. 266.
172
629
Nesse sentido, Grinover, Gomes Filho e Scarance Fernandes: “[c]om relação aos atos nulos, cumpre ainda
distinguir os casos de nulidade absoluta e nulidade relativa: nos primeiros, a gravidade do ato viciado é
flagrante e, em regra, manifesto o prejuízo que sua permanência acarreta para a efetividade do contraditório
ou para a justiça da decisão; o vício atinge o próprio interesse público de correta aplicação do direito; por
isso, percebida a irregularidade, o próprio juiz, de ofício, deve decretar a invalidade; já nas hipóteses de
nulidade relativa, o legislador deixa à parte prejudicada a faculdade de pedir ou não a invalidação do ato
irregularmente praticado, subordinando também o reconhecimento do vício à efetiva demonstração do
prejuízo sofrido” (GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio
Magalhães. As nulidades no processo penal. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 19).
630
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 140.
631
ANDRADE, Manuel da Costa. Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 2006. p. 144.
173
[...] tanto na doutrina de common law quanto entre os autores alemães, temas
eminentemente processuais, como a vedação do testemunho de ouviu dizer ou a
proibição de obrigar o acusado a produzir prova contra si mesmo, são tratados no
conjunto das exclusionary rules e das proibições de prática de provas [...].636
632
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 99.
633
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 95.
634
GÖSSEL, Karl Heinz. El derecho procesal penal en el estado de derecho: obras completas Tomo I. Buenos
Aires: Rubinzal-Culzoni, 2007. p. 203, tradução nossa. No mesmo sentido: AMBOS, Kai. Las prohibiciones
de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst Von; AMBOS, Kai; GUERRERO,
Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 112. Também reconhecendo a proteção
a direitos processuais: DEU, Teresa Armenta. La prueba ilícita: un estudio comparado. Madrid: Marcial Pons,
2009. p. 51; ROXIN, Claus. Por uma proibição de valorar a prova nos casos de omissão do dever de informação
qualificada. Revista Liberdades, São Paulo, n. 4, p. 44-50, mai./ago. 2010. p. 47/48.
635
ROXIN, Claus. Por uma proibição de valorar a prova nos casos de omissão do dever de informação
qualificada. Revista Liberdades, São Paulo, n. 4, p. 44-50, mai./ago. 2010.. p. 46.
636
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 175.
174
que impedem a valoração da prova, como são os casos acima tratados de Espanha, Itália e
Brasil.
Dessa forma, ainda que não exista um tratamento uniforme acerca da exclusão
da prova, cada sistema, a sua maneira, em maior ou menor extensão, disciplina meios para
proibir a valoração de provas produzidas com violação a direitos fundamentais, incluindo os
processuais.
Destaca-se, ainda, que os diferentes sistemas também convergem ao preverem
mecanismos de ponderação para decisão sobre a aplicação da sanção de não valoração da
prova, quando obtida por meio de alguma violação a direitos.
A jurisprudência norte-americana vem ampliando sistematicamente o escopo da
good faith exception para limitar as regras de exclusão de provas decorrentes de erros formais
na sua produção. Tal modificação jurisprudencial, inclusive, tem como fundamento
doutrinário o tratamento dado à matéria no direito germânico, como explica Bradley:
637
BRADLEY, Craig M. Is the exclusionary rule dead? Jornal of Criminal Law and Criminology. vol. 102,
Issue 1, Winter, 2012. p. 22, tradução nossa. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.northwestern.edu/cgi/viewcontent.cgi?referer=&httpsredir=1&article=7416&
context=jclc >. Acesso em: 13 jun. 2018.
175
italiana e na prova ilícita brasileira, pois todos impedem a valoração da prova obtida com
violações às proibições estabelecidas em cada ordenamento. Da mesma forma, há evidente
proximidade entre as exclusionary rules of extrinsic policy, as proibições de utilização de
provas não escritas e o sistema de nulidades, já que a proibição de valorar a prova obtida
com violação aos respectivos direitos protegidos estará sujeita, em maior grau, aos
mecanismos de ponderação de cada ordenamento (good faith exception, demonstração de
prejuízo etc.).
Assim, independentemente de se analisar as violações procedimentais por um
ponto de vista preponderantemente de tutela do direito material ou por um viés mais
processual, atualmente a diferença se encontra muito mais no campo do fundamento teórico
para aplicação da proibição de utilização ou exclusão da prova, do que no campo prático-
jurídico.
Não por outra razão, ao menos no que se refere ao regramento da matéria no
ordenamento jurídico brasileiro, Badaró sustenta que, mais importante do que distinguir
entre nulidade e inadmissibilidade, é prever a proibição de valorar a prova produzida com
violação a direitos fundamentais, incluindo os de conteúdo material e os de natureza
processual. 638
Por fim, ainda que seja possível perceber origens distintas para as proibições de
prova e para as exclusionary rules, há em comum a característica de serem instrumentos
legais limitadores da busca da verdade no processo penal, em proteção a valores políticos e
epistêmicos relevantes para a sociedade.
638
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo penal. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018.
p. 411/416.
176
A primeira hipótese de incidência das regras de exclusão terá lugar caso a falha
na documentação da cadeia de custódia impedir que as partes exerçam, adequadamente, o
seu direito fundamental no curso do processo.
A discussão ganha particular relevo nas novas provas científicas, principalmente
nos casos em que a admissibilidade da prova estiver relacionada com a verificação da
idoneidade do método utilizado na sua produção, mas a quebra da cadeia de custódia impedir
a identificação do método científico utilizado.
Desde 1923, em decorrência do julgamento do caso Frye v. Estados Unidos, a
jurisprudência norte americana estabeleceu como requisito de admissão de provas a
preocupação com a idoneidade do conhecimento científico adotado na sua produção. Na
ocasião, a Corte de Apelação do Distrito de Columbia não admitiu o testemunho de um perito
639
Nesse sentido, afirma Gutiérrez Sanz: “[c]ertamente, nada tem a ver com a integridade ou não da cadeia
de custódia, o fato de que a fonte de prova tenha sido obtida mediante a infração direta ou indireta de direitos
fundamentais, o que daria lugar a uma prova proibida” (GUTIÉRREZ SANZ, María Rosa. La cadena de
custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016. p. 90, tradução nossa). No mesmo sentido
segue a jurisprudência do Tribunal Supremo Espanhol: “[...] a irregularidade da cadeia de custódia não
constitui, por si só, vulneração de direito fundamental algum [...]” (STS 1349/2009, nº de recurso 881/2009,
p. 02, tradução nossa).
177
que havia submetido o acusado a um teste da verdade, que consistia em medir a pressão
sanguínea das suas sístoles, enquanto ele respondia a perguntas, como meio para descobrir
se falava a verdade ou mentia.
Com base neste precedente, as Cortes norte-americanas definiram que “para ser
admissível, uma nova técnica científica ‘deve ser suficientemente estabelecida a ponto de
ter obtido aceitação geral no campo particular a que pertence’”640.
O Frye standard de admissão da prova científica perdurou até 1993, quando a
Suprema Corte norte-americana julgou o caso Daubert v. Merrell Dow Pharmaceuticals,
fixando um novo padrão a ser seguido dali em diante.
Até chegar na Suprema Corte, a tentativa da família Daubert de provar em juízo
que os danos congênitos em seus dois filhos foram causados pelo uso do medicamento
Bendectin durante a gestação foi frustrada, pois o depoimento de 8 (oito) peritos por eles
arrolados não foram admitidos pelo juiz e pela Corte de Apelação sob o fundamento de que
estavam baseados em uma posição sobre epidemiologia que não gozava de aceitação geral
da comunidade científica, isto é, não atendia ao Frye standard.641
Para reformar a decisão, a Suprema Corte inicialmente ressaltou que o critério
de aceitação geral pela comunidade científica adotado no caso Frye era mais rigoroso do que
as regras vigentes de admissão de prova dispostas nas Federal Rules of Evidence, que
preveem, de modo geral, a admissibilidade de todas as provas relevantes (regras 401 e 402)
e, especificamente com relação às provas técnicas e científicas, a confiabilidade do método
(regra 702).642
640
DOUGHERTY, John Caleb. Beyond People v. Castro: A New Standard of Admissibility for DNA
Fingerprinting. Journal of Contemporary Helth Law & Policy. vol. 7, Issue 1, 1991. p. 272, tradução nossa.
Disponível em: <http://scholarship.law.edu/jchlp/vol7/iss1/18>. Acesso em: 13 dez. 2019.
641
Nesse sentido: KNIJNIK, Danilo. Prova pericial e seu controle no direito processual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2017. p. 55/57; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova
penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. p. 186/187.
642
Sobre este ponto, explica Watkins: “[o] Tribunal, através do juiz Blackmun, foi o primeiro a declarar que
o teste de Frye havia sido superado pela adoção do Regulamento Federal de Evidência. O Tribunal iniciou
sua análise com as Regras Federais de Evidência 401 e 402, a fim de contrastar o padrão de relevância liberal
das Regras Federais com o teste de admissibilidade de Frye, muito mais rigoroso da lei comum. Embora o
direito comum, como Frye, em certas circunstâncias possa servir como um auxílio à aplicação das Regras,
nesse caso, a coexistência da Regra 702 e Frye é impossível, pois os dois padrões são incompatíveis entre si.
A regra 702 não estabelece ou exige ‘aceitação geral’ como pré-requisito absoluto para a admissibilidade no
texto da regra ou na história legislativa da regra [...] A exigência de conhecimento científico da regra 702
vai, portanto, à confiabilidade da técnica” (WATKINS, Harlan. Daubert v. Merrell Dow Pharmaceuticals,
Inc.: General Acceptance Rejected. Santa Clara High Technology Law Journal.vol. 10, Issue 1, Jan., 1994,
tradução nossa. Disponível em
<https://digitalcommons.law.scu.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1160&context=chtlj >. Acesso em: 13 dez.
2019).
178
Então, partindo da premissa de que o Frye standard havia sido superado pela
disciplina da matéria contida nas Federal Rules of Evidence, a Suprema Corte atribuiu ao
juiz o papel de gatekeeper na avaliação da entrada da prova científica no processo,643
indicando, ainda que expressamente afirmando não ser esta uma checklist,644 a necessidade
de se observar 4 (quatro) critérios: (i) testabilidade, (ii) revisão pelos pares e publicações,
(iii) taxa de erro e (iv) aceitação geral.645
Esses critérios estabelecidos no caso Daubert foram, posteriormente, refinados
pela jurisprudência norte-americana, com destaque para o caso General Eletric v. Joiner,646
em que a Suprema Corte norte americana definiu que, na admissibilidade da prova científica,
“o juiz deve valorar o âmbito de ‘analitical gap’ entre as premissas (data) e as conclusões
(opinion) apresentadas pelos peritos, para determinar se há entre eles uma correlação
suficientemente estreita que permita considerar a perícia elemento de prova confiável”647.
Posteriormente, em Kumho Tires Co v. Carmichael,648 a Suprema Corte norte-
americana acrescentou que “os fatores Daubert se aplicam ao testemunho de engenheiros e
outros peritos que não são cientistas”649. Do ponto de vista epistêmico, como reconhece
Badaró, trata-se de importante avanço “porque o que importa é saber se o testemunho é
confiável, e não se é científico”650.
Aliás, como deixam expressos os precedentes da Suprema Corte norte-
americana, há evidente preocupação epistêmica na adoção de critérios para a entrada da
643
O papel central do juiz no controle da admissibilidade da prova estabelecida em Daubert resolveu a crítica
até então feita ao Frye standard, no sentido de que o critério da aceitação geral pela comunidade cientifica
delegava o juízo de admissibilidade da prova aos cientistas, conforme DOMINIONI, Oreste. La prova penal
scientifica: gli strumenti scientifico-tecnici nuovi o controversi e di elevata specializzazione. Milano: Giuffrè,
2005. p. 118.
644
Daubert et ux.,individually and as guardians ad litem for Daubert, et al. v. Merrell Dow Pharmaceuticals,
Inc. Certiorari to the United States Court of Appeals for the Ninth Circuit. Jun., 1993. Disponível em:
<https://cdn.loc.gov/service/ll/usrep/usrep509/usrep509579/usrep509579.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019.
645
Conforme explica FOURNIER, Lisa R. The daubert guidelines: usefulness, utilization, and suggestions for
improving quality control. Journal of Applied Research in Memory and Cognition. vol. 5, Issue 3,
Whashington, set. 2013. p. 307/308 Disponível em:
<https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S2211368116300596>. Acesso em: 16 dez. 2019.
646
Na íntegra: General Electric CO. et al. v. Joiner et ux. Certiorari to the United States Court of Appeals for
the Eleventh Circuit. Dez., 1997. Disponível em:
<https://cdn.loc.gov/service/ll/usrep/usrep522/usrep522136/usrep522136.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019.
647
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 190.
648
Para o resumo dos fatos envolvendo o caso, ver: KNIJNIK, Danilo. Prova pericial e seu controle no direito
processual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 98, nota de rodapé 191.
649
Kumho Tire CO., LTD., et al. v. Carmichael et al. Certiorari to the United States Court of Appeals for the
Eleventh Circuit. Março, 1999. p. 138, tradução nossa. Disponível em:
<https://cdn.loc.gov/service/ll/usrep/usrep526/usrep526137/usrep526137.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2019.
650
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 191.
179
prova científica no processo penal, pois estes têm a finalidade de “excluir a expertise que é
falsa e ciência que é ruim”651.
Como explica Taruffo, no processo penal epistêmico orientado à busca da
verdade “é necessário distinguir a ‘ciência boa’ da ‘ciência ruim’, ou da pseudociência (ou
junk science), ou seja, métodos e noções dotados de efetiva validade científica de métodos
ou noções apresentados como dotados de dignidade científica que não são cientificamente
validados”652.
Para além do direito norte-americano, diversos sistemas processuais europeus-
continentais reconhecem a necessidade de certificação do método técnico científico adotado
na realização da perícia.
Na Espanha, como identifica Muñoz Conde, o processo penal moderno convive
com o crescimento da produção de provas periciais que, pela exigência de determinados
conhecimentos científicos, “só podem ser resolvidas aplicando uma determinada
metodologia empírica universalmente admitida e com alto grau de fiabilidade”653.
Por sua vez, Gössel, ao tratar das investigações genéticas como meios de prova
na Alemanha, salienta que o termo engloba apenas a “análise de genoma” e “impressão
genética”, pois “outras investigações genéticas, até o momento não suficientemente
credenciadas, não estão sujeitas a exame a fim de sua eventual relevância jurídico-
processual penal”.654
Tratando do ordenamento argentino, Chaia e Hairabedián sustentam que “por
meio da impugnação da perícia” pode-se buscar “restringir, limitar ou excluir a validez das
651
Conforme expressamente reconhecido no julgamento do caso General Electric CO. et al. v. Joiner et ux.
Certiorari to the United States Court of Appeals for the Eleventh Circuit. Dez., 1997. p. 159, tradução nossa.
Disponível em: <https://cdn.loc.gov/service/ll/usrep/usrep522/usrep522136/usrep522136.pdf>. Acesso em: 13
dez. 2019.
652
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 245.
653
MUÑOZ CONDE, Francisco. La búsqueda de la verdad en el proceso penal. 3. ed. Buenos Aires:
Hammurabi, 2007. p. 89, tradução nossa. Alerta Gutiérrez Sanz que “[a] ciência se modifica de forma contínua
e os standards que, em certo momento se deram como certos, por indiscutíveis, são rapidamente substituídos
por novas investigações que contradizem o anterior. Assim, o resultado de uma perícia fica condicionado pela
ratio de erro da ciência que faz com que não seja infalível. É certo que, se as provas científicas são realizadas
segundo os standards científicos homologados pela comunidade científica neste momento, seus resultados
alcançam um grau elevado de fiabilidade, porém em nenhum caso pode ser considerado como verdade
absoluta embora como verdade processual [...]” (GUTIÉRREZ SANZ, María Rosa. La cadena de custodia
en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016. p. 34, tradução nossa).
654
GÖSSEL, Karl Heinz. El derecho procesal penal en el estado de derecho: obras completas Tomo I. Buenos
Aires: Rubinzal-Culzoni, 2007. p. 296, tradução nossa.
180
conclusões do perito, seja por motivos formais, ou bem com questões substanciais,
vinculadas ao método, à prática ou aos resultados obtidos”.655
Já o sistema processual italiano aborda as perícias como novas ciências sob o
regime de provas atípicas, cuja produção depende de um juízo prévio de admissibilidade, a
ser realizado em contraditório entre as partes.656
Deve-se ressaltar que, muito embora haja consenso sobre a necessidade de se
analisar a idoneidade do método utilizado na produção da prova, há grande divergência sobre
os reflexos que a desconfiança sobre a técnica utilizada terá na prova, isto é, se implicará a
sua inadmissibilidade ou se deverá ser algo a ser sopesado pelo juiz no momento da
valoração.657
655
CHAIA, Rubén A; HAIRABEDIÁN, Maximiliano. La prueba en el proceso penal: proceso acusatorio,
juicio oral, carga probatoria, prueba ilegal, medios de prueba, construcción de la verdad, valoración-
arbitrariedad, motivación de la sentencia, jurisprudencia vinculada. Buenos Aires: Hammurabi, 2010. p.
561/562, tradução nossa. Da mesma forma, acerca do ordenamento argentino, sustentam Laura Deanesi e
Augustín Varela: “[e]m conclusão, é necessário exigir, pelo menos, que os depoimentos dos peritos tenham
como base teorias admitidas como confiáveis em sua área e que, além disso, os peritos utilizem procedimentos
e uma metodologia adequada para alcançar o resultado no caso” (DEANESI, Laura; VARELA, Agustín. Los
problemas de la prueba de reconocimiento de personas desde la perspectiva de la psicología del testimonio y
la admisibilidad de la intervención del perito en esos casos. In: ORDÓÑEZ, Pablo. Medios de prueba en el
proceso penal 1: reconocimiento de personas. vol. 1 Buenos Aires: Hammurabi, 2018. p. 175, tradução nossa).
656
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 194.
657
Sabendo-se o método, a inadmissibilidade pode ser resolvida pela irrelevância ou impertinência, pois
“pseudociências não têm aptidão de provar a verdade ou de influenciar o julgador” (BADARÓ, Gustavo
Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. p. 195).
Transposta a barreira da pseudociência, a discussão torna-se mais complexa e, seja para sustentar que a que o
assunto deve ser resolvido na admissibilidade, seja para defender se é matéria para valoração, na maioria das
vezes, o debate envolve comparações e diferenciações entre os sistemas da civil law e da common law, como
se verifica da análise feita por Vázquez (VÁZQUEZ, Carmen. La prueba pericial en la experiencia
estadounidense: el caso Daubert. Revista peruana de ciencias penales, Lima, vol. 23, n. 30, p. 223-248,
ago./dez. 2016, p. 240/245, tradução nossa). Diferenciando os sistemas para sustentar que a análise deve ser
reservada para a valoração, Dallagnol e Câmara: “[n]os Estados Unidos, a falta de alguma indicação de
autenticação da prova impede que a prova seja admitida, mas isso decorre de uma peculiaridade de seu
sistema jurídico, o que torna impossível a ‘importação’ acrítica dessa tese de inadmissibilidade para o Brasil.
De fato, causas cíveis e criminais, no direito norte-americano, são julgadas pelo júri. O juiz togado, lá, exerce
um relevante papel de filtrar aquilo que é submetido ao júri, um tribunal formado por leigos. Assim, mesmo
provas relevantes podem ser excluídas pelo juiz quando seu valor probatório for superado, de modo
substancial, por risco de gerar preconceito, confusão ou atrasos injustificados e de perda de tempo, dentre
outros fatotes [...] Contudo, afigura-se importante estabelecer, desde logo, que a autenticação no Brasil, onde
não há sistema de júri e filtro prévio pelo juiz togado, é feita junto com a valoração da prova [...]”
(DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 534/535). Em sentido contrário, Jurs sustenta
que “[p]ara os Tribunais canadenses, contudo, essa função se mantém importante na fase de admissão. A
razão pela qual ela se mantém importante, mesmo na ausência de um júri, é o objetivo ao qual tal função
serve”, já que “apenas provas confiáveis serão admissíveis, a prova pericial é concebida para auxiliar no
atingimento de uma decisão correta, baseada no atual estado da ciência. A prova destituída de confiabilidade
é excluída, então, para assegurar que não induza o processo de estabelecimento dos fatos com conclusões
inválidas” (JURS, Andrew W. Balancing Legal Process with Scientific Expertise: Expert Witness
Methodology in Five Nations and Suggestions for Reform of Post-DaubertU.S. Reliability Determinations.
181
Marquette Law Review. vol. 95, Issue 4, Summer, 2012. p. 1368/1369, tradução nossa. Disponível em:
<http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.818.1859&rep=rep1&type=pdf >. Acesso em: 15
dez. 2019). Por sua vez, Knijnik sustenta que, seja na admissão, seja na valoração, a verificação o Daubert
Standard se faz ainda mais importante do que na common law: “[n]a realidade, pode-se até assinalar que, na
civil law, o problema é mais agudo, porque, contrariamente ao seu congênere norte-americano, o perito é
considerado um auxiliar da justiça, operando sob o manto da imparcialidade, o que lhe confere,
aprioristicamente, superior poder persuasivo, haja vista seu maior aspecto de oficialidade em face dos
assistentes técnicos e em face dos peritos eleitos pelas partes no sistema norte-americano” (KNIJNIK,
Danilo. Prova pericial e seu controle no direito processual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017p. 69/70).
Ainda sobre esta discussão, adotando posição que admite a realização de um contraditório prévio para a
admissão da prova, ver: BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova
penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. p. 192/196. Ainda sobre o tema: TARUFFO, Michele. Uma simples
verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p.
246/449. Como se vê, contudo, em todos os casos, parte-se do pressuposto de que se tem conhecimento do
método utilizado, o que não acontece nos casos em que há, neste ponto, a quebra da cadeia de custódia.
658
TARUFFO, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Tradução de Vitor de Paula
RAMOS. Madrid: Marcial Pons, 2012. p. 248.
659
TARUFFO, Michele. Conoscenza scientifica e decisione giudiziaria: profili generali. In: Decisione
giudiziaria e verità scientifica. Milano: Giuffrè, 2005. p. 8.
182
660
VÁZQUEZ, Carmen. De la prueba científica a la prueba pericial. Madrid: Marcial Pons, 2015. p. 86,
tradução nossa.
661
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 196.
662
Prado adverte para o equívoco de se dar maior valor epistêmico à prova científica produzida sem o devido
contraditório, principalmente nos meios de pesquisa de prova: “[e]ssa diferenciação entre meios de
investigação e meios de prova, no entanto, sofre a pressão das agências responsáveis pela repressão penal,
que atuam a partir de uma subjetividade dirigida a construir discursivamente a verdade sobre os fatos no
processo criminal valendo-se das evidências que são obtidas através dos meios de investigação. A tendência
dominante no âmbito das agências encarregadas de reprimir as infrações penais consiste em dissipar a
diferença entre os citados meios. A rigor neste plano a distinção, por exemplo, entre a informação obtida por
meio da interceptação telefônica colhida unilateralmente, em um contexto de supressão do nemo tenetur, e
outros elementos informativos filtrados pelo contraditório judicial consistiria no fato de a primeira ser em tese
de qualidade epistêmica superior. Esse raciocínio resulta no fato de que, no campo dos métodos ocultos de
investigação, as inovações tecnológicas introduzidas parecerem capazes de realizar os objetivos perseguidos
pela filosofia da consciência: assegurar o acesso à realidade como objeto autônomo de conhecimento
totalmente desvinculado do sujeito. Algo como ter acesso << à verdade como ela é>>, << à verdade real>>
ou ao << fato puro>>. Por este ângulo equivocado o contraditório judicial seria motivo de contaminação da
<<verdade>>, veículo de impurezas a assegurar a impunidade do agente.” (PRADO, Geraldo Luiz
Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia de custódia das provas
obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 69)
663
GIACOMOLLI, Nereu José; AMARAL, Maria Eduarda Azambuja. Possíveis intersecções entre
neurociência e a prova pericial no processo penal: abordagem crítica. Revista Brasileira de Ciências
Criminais, São Paulo, vol. 27, n. 157, p. 247-284., jul. 2019. p. 254.
183
664
Conforme se extrai do relatório: “[f]requentemente em processos criminais e litígios civis, evidências
forenses são utilizadas como suportes para conclusões sobre ‘individualização’ (às vezes referida como
‘compatibilidade’ entre um espécime e um indivíduo em particular ou outra fonte) ou sobre a classificação da
fonte do espécime em uma das várias categorias. Com exceção da análise do núcleo do DNA, no entanto,
nenhum método forense mostrou rigorosamente ter a capacidade de consistentemente, e com alto grau de
certeza, demonstrar a conexão entre a evidência e um específico indivíduo ou fonte” (Committee on Identifying
the Needs of the Forensic Sciences Community, National Research Council. Strengthening Forensic Science
in the United States: A Path Forward. Washington: The National Academies Press, 2009. p. 29, tradução nossa.
Disponível em: <https://www.ncjrs.gov/pdffiles1/nij/grants/228091.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2019).
665
Nesse sentido, Tonini explica a derrocada da filosofia positivista que sustentava ser a ciência ilimitada,
completa e infalível: “[p]or volta de 1995, Popper e outros estudiosos questionaram essa concepção.
Constatou-se que a ciência é limitada, pois de um fenômeno é possível extrair um número limitado de aspectos
e representá-los por meio de uma lei científica. A ciência é incompleta, pois, quando outros aspectos do mesmo
fenômeno são conhecidos, a lei científica deve ser ampliada para representar também esses outros aspectos.
A ciência é falível, ou seja, toda lei científica tem uma margem de erros que deve ser pesquisada e, ademais,
o conhecimento da margem de erros é o índice de que uma teoria foi testada seriamente. Portanto, hoje é
difundida a concepção da filosofia da ciência denominada pós-positivista” (TONINI, Paolo. Direito de defesa
e prova científica: novas tendências do processo penal italiano. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São
Paulo, vol. 12, n. 48, p. 194-214, mai./jun. 2004. p. 199)
666
TONINI, Paolo. Direito de defesa e prova científica: novas tendências do processo penal italiano. Revista
Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, vol. 12, n. 48, p. 194-214, mai./jun. 2004. p. 200/201.
667
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 89.
184
668
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997. p. 89.
669
MAIER, Julio B. J. Derecho procesal penal I: fundamentos, vol. 1. 2. ed. Buenos Aires: Del Puerto, 2004.
p. 577, tradução nossa.
670
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 197.
671
Sobre isso, ver item 3.2.2, supra.
672
Conforme Kappler, a quebra da cadeia de custódia impedirá a valoração da prova “sempre que se alegue e
prove que causou um prejuízo efetivo e real ao exercício da defesa que a parte deverá justificar, pois o prejuízo
à defesa é requisito essencial para a nulidade dos atos processuais” (KAPPLER, Susana Álvarez de Neyra.
La cadena de custodia em matéria de tráfico de drogas. In: FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena
de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015, p. 106, tradução nossa).
673
Como ressalta Badaró, de um modo geral, a discussão acerca da metodologia utilizada não abrange
“qualquer conhecimento científico, mas apenas os conhecimentos científicos novos ou modernos, que exigem
técnicas ou métodos de grande especialização, que se enquadram na chamada ‘nova ciência’” (BADARÓ,
Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2019.
p. 183). De fato, as novas ciências trouxeram atenção para um problema até então pouco estudado na civil law,
185
675
Relacionando os suportes técnicos da interceptação telefônica com a verificação da licitude da prova:
PRADO, Geraldo Luiz Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia de
custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 79. No mesmo sentido,
MARGRAF, Alencar Frederico; PESCH, Natália Mendes. Garantias constitucionais na produção probatória e
o descaso com a cadeia de custódia. Revista de Direito Constitucional e Internacional: Cadernos de direito
constitucional e ciência política, São Paulo, vol. 26, n. 106, p. 225-246. p. 241.
676
Disponíveis, em inglês, em: <https://www.gesetze-im-internet.de/englisch_stpo/englisch_stpo.html>.
677
Nesse sentido, tratando da Alemanha, Grinover aduz: “[a] interceptação somente pode ser determinada
quando, de outra maneira, torne-se impossível ou extremamente difícil apurar os fatos. A faculdade de ordená-
la cabe ao juiz ou, em caso de urgência, ao membro do Ministério Público, o qual, entretanto, deve submetê-
la à convalidação judicial – condição de sua eficácia – no prazo de três dias. A forma e o conteúdo do
provimento são minuciosamente predispostos, inclusive no que concerne ao prazo de validade da autorização
da interceptação. Faltando tais pressupostos, ou quando a documentação eventualmente colhida não se
demonstrar necessária à investigação, deve ser ela destruída” (GRINOVER, Ada Pellegrini. Provas ilícitas,
interceptações e escutas. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013. p. 282).
678
AMBOS, Kai. Las prohibiciones de utilización de pruebas en el proceso penal alemán. In: BELING, Ernst
Von; AMBOS, Kai; GUERRERO, Óscar Julián. Las prohibiciones probatórias. Bogotá: Temis, 2009. p. 90.
679
TONINI, Paolo. A prova no processo penal italiano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 252.
680
MELLADO, José María Asencio; PÉREZ ARROYO, Miguel. La prueba prohibida y prueba preconstituida
en el proceso penal: fundamentos dogmático-procesales y de derecho comparado para la aplicación de la
prueba prohibida en el proceso penal acusatorio. Lince (Peru): Instituto Peruano de Criminologia y Ciencias
Penales, 2008. p. 160.
187
obtidos da diligência de investigação praticada pelo Ministério Fiscal ou pela polícia [...]
serão inutilizados por constituírem, em si mesmo, prova proibida”681.
Outrossim, o sistema da common law norte-americano impõe como requisito da
admissão da interceptação telefônica a prévia autorização judicial. No julgamento Katz v.
Estados Unidos, a Suprema Corte concluiu que “a atividade do Governo de ouvir
eletronicamente e gravar as palavras do peticionário viola a privacidade que
justificadamente confiava ter ao usar o telefone e isso constitui uma ‘busca e apreensão’
contida no significado da quarta emenda”682, determinando, por isso, a exclusão da prova
por falta de “mandado, que é pressuposto constitucional para este tipo de vigilância
eletrônica”683.
Apenas sete meses após Katz, o Título III da Lei Omnibus de Controle de Crime
e Ruas Seguras passou a regular a interceptação telefônica, prevendo, entre outra coisas, uma
exclusionary rule para que “nenhuma parte do conteúdo de qualquer comunicação
interceptada em violação ao estatuto ‘pode ser admitida como evidência em julgamento,
oitiva ou outro procedimento na ou perante qualquer corte, grand jury [...]’ ou qualquer
autoridade federal ou estadual”684.
Também no Brasil, o art. 5º, caput, XII, da CF, fixa a prévia autorização judicial
como linde obrigatório a ser seguido para a excepcional quebra do sigilo das comunicações
telefônicas,685 sendo que a sua inobservância maculará a prova de ilicitude.686
681
MELLADO, José María Asencio; PÉREZ ARROYO, Miguel. La prueba prohibida y prueba preconstituida
en el proceso penal: fundamentos dogmático-procesales y de derecho comparado para la aplicación de la
prueba prohibida en el proceso penal acusatorio. Lince (Peru): Instituto Peruano de Criminologia y Ciencias
Penales, 2008 p. 142, tradução nossa.
682
Katz v. United States. Certiorari to the United States Court of Appeals for the Ninth Circuit. Dez., 1967,
tradução nossa. Disponível em:
<https://cdn.loc.gov/service/ll/usrep/usrep389/usrep389347/usrep389347.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019.
683
Katz v. United States. Certiorari to the United States Court of Appeals for the Ninth Circuit. Dez., 1967,
tradução nossa. Disponível em:
<https://cdn.loc.gov/service/ll/usrep/usrep389/usrep389347/usrep389347.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2019.
684
KAMISAR, Yale et al. Modern criminal procedure: cases, comments and questions. 11 ed. USA: Thonson
West, 2005. p. 474, tradução nossa. Sobre o tema, Grinover expõe: “[...] o Supremo americano tem adotado a
tese de que é sempre necessária a prévia autorização da autoridade judiciária, mesmo nos casos
excepcionalmente previstos [...]. Quanto à eficácia probante da interceptação telefônica, feita contrariamente
à lei, o art. 1.215 determina a inadmissibilidade, como prova em juízo, da comunicação, bem como a
inadmissibilidade das provas que dela derivem” (GRINOVER, Ada Pellegrini. Provas ilícitas, interceptações
e escutas. Brasília: Gazeta Jurídica, 2013. p. 276).
685
GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As
nulidades no processo penal. 10 ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos tribunais, 2007. p. 211.
686
Conforme ensinam Grinover, Gomes Filho e Scarance Fernandes: “[c]onstituem, assim, provas ilícitas as
obtidas com violação do domicílio (art. 5.º, XI, da CF) ou das comunicações (art. 5.º, XII, da CF); as
conseguidas mediante tortura ou maus-tratos (art. 5.º, III, da CF); as colhidas com infringência à intimidade
(art. 5º, X, da CF)” (GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO,
Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. 10 ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos tribunais,
188
2007. p. 159). No mesmo sentido, especificamente sobre a interceptação telefônica integrar o núcleo de reserva
de jurisdição, Vilares: “[...] a própria Constituição Federal, na redação dada ao inciso XII do artigo 5º
condiciona o afastamento do sigilo telefônico a uma decisão judicial. Isso significa que temos uma cláusula
de reserva de jurisdição constitucional expressa, a qual não pode ser desrespeitada em nenhuma hipótese”.
Por isso, continua a autora, “[n]ão se pode olvidar ser caracterizada como criminosa a conduta de realizar
interceptação telefônica, informática ou telemática sem autorização judicial ou fora das hipóteses legais.
Nesse caso, estaremos diante de prova ilícita, a qual não poderá ser admitida no processo [...]” (VILARES,
Fernanda Regina. Processo penal: reserva de jurisdição e CPIs. São Paulo: Ônixjur, 2012. p. 148).
687
Conforme reconhece Badaró, “[...] é evidente que a necessidade de identificação do interlocutor decorre
da própria natureza da medida, que demanda identificação do número da linha telefônica interceptada”
(BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI,
Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo
Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 530).
189
688
Em sentido diverso: PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da prova no processo penal. São Paulo: Marcial
Pons, 2019. p. 11.
689
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 529.
690
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 531/532.
190
3.3. Valoração
Conforme desenvolvido ao longo dos itens 3.1 e 3.2, supra, não aderimos à
parcela da doutrina que nega qualquer relação entre a quebra da cadeia de custódia e a
admissibilidade da prova.691 Contudo, dentro do regime de inclusão de provas com o qual
trabalhamos (item 3.1.1.2., supra), não é possível desconsiderar os casos em que os
elementos ou fontes de prova entrarão no processo apesar das falhas nos registros de todos
os elos necessários para a sua completa autenticação.692
691
Sustentando que a quebra da cadeia de custódia não afeta a admissibilidade da prova: BADARÓ, Gustavo
Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI, Ricardo; LOPES,
Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo Horizonte:
D’Plácido, 2017. p. 535/536; DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa.
A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.).
A prova do enfrentamento à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 552; GONZÁLEZ,
Rubén Darío Angulo. Cadena de custodia en criminalística. 4 ed. Bogotá: Doctrina y ley, 2016. p. 111/115.
692
Dessa forma, também não aderimos à parcela da doutrina que defende que a quebra na cadeia de custódia
refletirá sempre na sua admissibilidade, como fazem: PÉREZ, Marta del Pozo. Diligencias de investigación y
191
cadena de custodia. Madrid: Sepín, 2014. p. 148/153; KNIJNIK, Danilo. Prova pericial e seu controle no
direito processual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 178/179, em especial nota de rodapé nº 209;
EDINGER, Carlos. Cadeia de custódia, rastreabilidade probatória. Revista Brasileira de Ciências Criminais.
São Paulo, vol. 24, n. 120, p. 237-257, mai./jun. 2016. p. 252/255; PRADO, Geraldo. A cadeia de custódia da
prova no processo penal. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p. 135; LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual
penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 414.
693
State of Maine v. Kevin Lobozzo, tradução nossa Disponível em
<https://www.courts.maine.gov/opinions_orders/opinions/documents/98me228l.htm>, acesso em 26.12.2019.
694
VALMAÑA OCHAITA, Silvia. La regulación normativa de la cadena de custodia en Estados Unidos,
Europa e Hispanoamérica. In: FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso
penal. Madri: Edisofer, 2015, p. 175, tradução nossa.
695
GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications. 1996. p. 460. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 07 jan. 2020.
696
GIANNELLI, Paul C. Chain of custody. Faculty Publications. 1996. p. 460. Disponível em:
<https://scholarlycommons.law.case.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1344&context=faculty_publications>.
Acesso em: 07 jan. 2020.
697
CERVANTES, Esteban Augustín. La cadena de custodia en el procedimento penal mexicano. Ciudad de
México: Tirant lo Blanch, 2016. p. 57, tradução nossa.
698
GONZÁLEZ, Rubén Darío Angulo. Cadena de custodia en criminalística. 4 ed. Bogotá: Doctrina y ley,
2016. p. 113, tradução nossa.
192
699
DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa Rosa. A cadeia de custódia da
prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (Orgs.). A prova do enfrentamento
à macrocriminalidade. 3. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019. p. 566. No mesmo sentido: BADARÓ, Gustavo
Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI, Ricardo; LOPES,
Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo Horizonte:
D’Plácido, 2017. p. 535/536.
700
De acordo com Gomes Filho, “[s]uperada essa fase prévia de seleção daquilo que pode servir de base à
formação de convencimento judicial, e depois de efetivamente produzidas as provas admissíveis, pertinentes
e relevantes (o momento heurístico a que se refere Ubertis), o procedimento probatório chega a seu momento
final e mais importante, o da valoração, no qual cabe ao juiz analisar os elementos obtidos e deles extrair as
suas conclusões quanto às afirmações sobre os fatos da causa” (GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A
motivação das decisões penais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 126/127).
193
701
GUTIÉRREZ SANZ, María Rosa. La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi,
2016, p. 108, tradução nossa.
702
Conforme consta da decisão, “[r]awlins argumenta que a cadeia de custódia das drogas apreendidas a
cada dia foi quebrada porque não há evidências conectando as drogas que foram colocadas em armários de
evidência com as que foram recebidas e testadas pelo DEA. Nós concordamos. Com relação à cocaína
apreendida em 8 de novembro, o químico da DEA Craig testemunhou que ‘pegou a evidência do cofre
principal’, mas Craig estava na Cidade de Nova York, enquanto o agente Benwell testemunhou que ele colocou
as drogas na sala de provas de Newark. Nunca foi estabelecido se Craig retirou, ela mesma, a cocaína de
Newark ou se essas drogas foram em algum momento transferidos de Newark ao que Craig chamou de ‘cofre
principal’ em Nova York” (Robert Rawlins v. United States of America. United States Court of Appeals for the
Third Circuit. n. 08-2948, mai. 2010, tradução nossa. Disponível em:
<https://www.govinfo.gov/content/pkg/USCOURTS-ca3-08-02948/pdf/USCOURTS-ca3-08-02948-0.pdf>.
Acesso em: 20 nov. 2019).
703
Robert Rawlins v. United States of America. United States Court of Appeals for the Third Circuit. n. 08-
2948, mai. 2010, tradução nossa. Disponível em: <https://www.govinfo.gov/content/pkg/USCOURTS-ca3-08-
02948/pdf/USCOURTS-ca3-08-02948-0.pdf>. Acesso em: 20 nov. 2019.
704
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 203.
194
705
Referindo-se especificamente ao primeiro momento da valoração, Gomes Filho explica que “o passo inicial
do procedimento de valoração consiste numa nova seleção das provas já reputadas admissíveis, pertinentes e
relevantes, agora com a finalidade de determinar-lhes a credibilidade racional” (GOMES FILHO, Antonio
Magalhães. A motivação das decisões penais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 127).
706
Para a análise completa do contexto da valoração, ver: FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional
de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 91 e ss; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi
Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. p. 200 e ss; GOMES
FILHO, Antonio Magalhães. A motivação das decisões penais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2013. p. 126 e ss.
707
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A motivação das decisões penais. 2. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2013. p. 127.
708
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 125,
tradução nossa.
709
FERRER BELTRÁN, Jordi. La valoración racional de la prueba. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 125,
tradução nossa.
710
Como ressalta Tonini, “[g]eralmente, não existe somente uma prova, mas muitas provas. Os ‘resultados
probatórios’ relativos devem ser valorados pelo juiz com o objetivo de reconstruir o fato a ser provado”
(TONINI, Paolo. A prova no processo penal italiano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 64).
711
Neste sentido, Badaró sustenta: “[a] primeira vantagem é deixar claro que o processo de valoração consiste
em verificar provas que confirmem os fatos. Isto é, parte-se das provas para os fatos já imputados. Portanto,
o standard é formulado em termos de provas que justifiquem, a partir da inferência probatória, os fatos
afirmados. As formulações anteriormente analisadas partiam das hipóteses para sugerir em que medida elas
estariam justificadas por provas. O segundo aspecto positivo é quanto ao critério de gradação do suporte que
as provas dão às hipóteses fáticas. Sugere-se expressão que, de modo mais simples e direto, remete a um
195
significado mensurável: ‘elevadíssima probabilidade’, em vez de expressões que nãos são unívocas em, mais
comumente se referem a propriedades não escalonáveis, como razoabilidade ou plausibilidade. Esclareça-se
que, de acordo com as premissas do trabalho, trata-se de probabilidade não matemáticas ou quantificável em
números. Exige-se uma elevadíssima probabilidade lógica (baconiana), a partir da força de confirmação da
hipótese imputada e da eliminação das hipóteses rivais” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi
Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. p. 259/260).
712
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 536.
197
713
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 28.
714
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 37.
715
SWANSON, C.R.; CHAMELIN N.C.; TERRITO, L. Criminal Investigation. 8 ed. Boston: McGraw-Hill,
2003. p. 33, tradução nossa. No mesmo sentido, conforme Geraldo Prado, “[a] cadeia de custódia nada mais
é que um dispositivo dirigido a assegurar a fiabilidade do elemento probatório, ao colocá-lo sob a proteção
de interferências capazes de falsificar o resultado da atividade probatória” (PRADO, Geraldo Luiz
Mascarenhas. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia de custódia das provas
obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 86).
716
PRADO, Geraldo. Ainda sobre a “quebra da cadeia de custódia das provas”. In: Boletim do IBCCrim, n.
262, setembro de 2014, p. 16-17.
198
exaltam sua “especial relevância” na produção daquelas “que sedam os sentidos e tem a
pretensão de bastar-se por si só, de serem autorreferenciadas, tais como [...] o DNA”717.
Com a mesma percepção, Figueroa Navarro denuncia “sentenças que outorgam
à prova de DNA um caráter técnico e identificador de superior valor ao resto das provas”718,
fato substancialmente agravado pela constatação de Roselló, dando conta de que, “com
frequência, tomam-se decisões sem considerar que fiabilidade tem um teste”719.
Ocorre que, conforme doutrina especializada em genética forense, o exame de
identificação por DNA terá condições de revelar perfis “quando todas as etapas, isto é,
coleta e preservação do material biológico, extração de DNA, genotipagem de marcadores
polimórficos, e análises estatísticas para a obtenção de índices e probabilidades, são
conduzidos de acordo com padrões de qualidade rigorosos”720, sendo “imprescindível que
seja estabelecida uma cadeia de custódia sólida e bem documentada, de forma que a
evidência se sustente no tribunal”721.
Assim, mesmo que se considere que “as provas genéticas, em termos de
identificação, são as mais seguras que se tem conhecimento”722, é inegável, como será
tratado ao longo desse capítulo, que “as análises de DNA não podem ser tidas como uma
prova plena porque não são infalíveis”723.
A relação entre o forte poder de persuasão da prova de identificação por DNA e
as possíveis – e muitas vezes desconsideradas – incertezas que o seu resultado pode conter,
traz relevo para a análise dos aspetos da cadeia de custódia desse elemento de prova,
especialmente para verificar, desde a localização e coleta das fontes de prova, até o método
717
LOPES JR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da. A importância da cadeia de custódia para preservar a prova
penal. Revista Consultor Jurídico, 16 jan. 2015. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2015-jan-
16/limite-penal-importancia-cadeia-custodia-prova-penal>. Acesso em: 27 nov. 2019.
718
FIGUEROA NAVARRO, Carmen. La cadena de custodia de las muestras biológicas. In: FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015, p. 108,
tradução nossa.
719
ROSELLÓ, Francesc Torralba. Preguntas éticas que suscitan las pruebas genéticas. In: MASIÁ CLAVEL,
Juan. Pruebas genéticas: genética, derecho y ética. Bilbao: Universidad Pontificia Comillas / Desclée De
Brouwe, 2004. p. 130, tradução nossa.
720
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 194.
721
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 194.
722
NICOLITT, André Luiz; WEHRS, Carlos Ribeiro. Intervenções corporais no processo penal e a
identificação criminal: lei 12.654/2012. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 73.
723
NICOLITT, André Luiz; WEHRS, Carlos Ribeiro. Intervenções corporais no processo penal e a
identificação criminal: lei 12.654/2012. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 73.
199
Os desdobramentos dos estudos sobre genética vão muito além da sua influência
no direito, afetando também áreas como a medicina (e.g. células tronco para cura de doenças,
medicina preventiva com base na predisposição genética de desenvolver doenças), a biologia
(e.g. plantas geneticamente modificadas), psicologia (e.g. traços da personalidade definidos
geneticamente), entre outros.725
O presente trabalho, contudo, restringirá o seu escopo à análise das descobertas
científicas relacionadas ao genoma humano que permitem o seu uso na identificação de
pessoas pelo DNA para fins penais, seguindo-se para a descrição dos métodos periciais
utilizados com essa finalidade.
No que interessa para a identificação de pessoas, o DNA é composto por duas
longas linhas paralelas às quais estão presas milhões de bases nitrogenadas, denominadas de
adenina (A), timina (T), guanina (G) e citosina (C).726 Ao longo de toda a extensão do DNA,
724
Neste ponto, Gutiérrez Sanz afirma: “[o] certo é que atacar a valoração da prova científica se converteu
em uma missão extremamente complexa, e o próprio legislador, através de alguns de seus preceitos aumenta
esta dificuldade. Porém, se isso é assim, ao menos o que se deve garantir é que essa prova científica, à qual
se confere valor capital no processo, seja realizada sobre evidências que foram colhidas no lugar do delito
sem que tenha ocorrido alteração, destruição ou modificação. Essa é a finalidade perseguida ao garantir a
integridade das diversas ligações que conformam a cadeia de custódia” (GUTIÉRREZ SANZ, María Rosa.
La cadena de custodia en el proceso penal español. Navarra: Aranzadi, 2016. p. 34-35, tradução nossa).
725
Conforme Jobim et at.: “[o] avanço tecnológico nas ferramentas e metodologias para o estudo do DNA faz
com que a genotipagem de SNP fosse amplamente utilizada em diversas áreas: farmacogenômica e
farmacogenética, agricultura e pecuária, doenças genéticas, evolução humana e evolução genômica e também
na área da identificação humana” (JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz
Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-
legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 198).
726
A composição completa do DNA nuclear, conforme Eisele, Campos e Vanrell, é a seguinte:
“[e]struturalmente os ácidos nucleicos encontram-se constituídos por polímeros, isto é, longas cadeias de
nucleotídeos ligados entre si por um enlace 3´-5´-fosfo-diester. Cada um destes nucleotídeos quando isolados
é formado por um grupo fosfato, sob a forma pirofosfato, e um nucleosídeo. O nucleosídeo, pela sua vez, está
integrado por um carboidrato (pentose) e uma base nitrogenada. As pentoses que se encontram nos ácidos
nucleicos são a ribose [no RNA] e a desoxirribose. As bases nitrogenadas podem pertencer ao grupo das
pirimidinas – timina e citosina – as duas bases pirimidínicas presentes no DNA, ou ao grupo das purinas –
guanina e adenina –, sendo as duas bases púricas que se encontram em todo o tipo de ácido nucléico”
(EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 116).
200
uma base nitrogenada presa à primeira linha sempre estará conectada (pareada) a uma base
nitrogenada presa à segunda linha, de maneira não aleatória, pois a adenina sempre fará par
com a timina (A com T), enquanto a guanina sempre estará conectada à citosina (G com C).
Essas ligações são denominadas de pares de bases.727
Os seres humanos possuem 46 dessas fitas duplas que formam o DNA,
organizadas em uma estrutura chamada cromossomo. Ao todo, portanto, são 46
cromossomos, organizados em 23 pares homólogos,728 sendo que, em cada dupla, um
cromossomo foi recebido do pai e o outro da mãe.
As fitas de DNA dispostas possuem, individualmente, uma grande variedade de
informações genéticas organizadas de forma sequencial, denominando de loco (do latim
locus, plural loci) cada um destes trechos.729 Como os cromossomos pareados possuem os
mesmos trechos de informações genéticas, um de cada genitor, as pessoas terão duas
informações genéticas para um mesmo loco.
Dentro de um mesmo loco, portanto, a informação genética também pode variar,
sendo que “cada possível variação é chamada de alelo. Geralmente, existem entre seis e
dezoito alelos para cada loco. Cada pessoa herdou dois destes alelos, um de cada pai, e o
par destes alelos em um determinado locus constitui o genótipo”730. No caso em que o
indivíduo recebe de cada um dos pais o mesmo alelo, é chamado de homozigoto para aquele
loco, já quando os alelos são diferentes, será heterozigoto.
Por meio do projeto genoma humano desenvolvido em escala global entre os
anos de 1990 e 2003, conforme documento publicado pelo Centro de Pesquisa sobre o
Genoma Humano e Células-tronco da Universidade de São Paulo, conseguiu-se “determinar
a sequência dos cerca de 3,2 bilhões de pares de bases que compõem o genoma do Homo
727
Nesse sentido, explica Bianca Carvalho: “[a]s quatro bases nitrogenadas presentes no DNA são: duas
purinas – A (Adenina) e G (Guanina); e duas pirimidinas – C (Citosina) e T (Timina). Entre as duas cadeias
complementares ocorre o pareamento entre adenina e timina (formando duas pontes de hidrogênio), e entre
guanina e citosina, formando três pontes de hidrogênio, sendo, portanto, um pareamento mais estável”
(CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia e
revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 290).
728
JOBIM, Luiz Fernando et al. DNA e crime. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís
Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação
pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 225.
729
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 88.
730
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 241,
tradução nossa. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em:
11 dez. 2019.
201
sapiens”,731 isto é, listar cada uma das cerca de 3,2 bilhões combinações “A com T” ou “C
com G” existentes no DNA humano.
Essa tarefa somente foi possível porque, apesar da visível diversidade fenotípica
dos seres humanos, a “sequência do genoma humano é 99,9% exatamente a mesma em todas
as pessoas”732. Em outras palavras, 99,9% da sequência de 3,2 bilhões de combinações “A
com T” ou “C com G” é mesma em todo ser humano.733
Com tamanha similaridade na codificação do DNA de todas as pessoas,
conseguiu-se determinar o padrão da sequência de bases nitrogenadas que deve se repetir em
todas as pessoas e, além isso, identificar quais são as bases nitrogenadas correspondentes ao
0,1%, que podem diferir nos indivíduos, isto é, os fragmentos potencialmente polimórficos
do DNA humano.
A codificação de um genoma humano comum a todos foi essencial para o
desenvolvimento da identificação por DNA. Somente com essa fonte primária de
comparação, tornou-se possível identificar os casos em que duas amostras apresentam as
mesmas diferenças em relação ao 99,9% de semelhança do sequenciamento modelo. Por
terem sofrido a mesma mutação, as amostras são iguais entre si, mas diferentes do DNA
humano padrão.
Da mesma forma, mas pela lógica inversa, pode-se averiguar a identidade entre
duas amostras de DNA procurando por igualdade entre elas nos trechos correspondentes ao
0,1% do sequenciamento do genoma humano com potencial polimórfico, ou seja, procurar
igualdade nos trechos em que são comuns as variações.
Portanto, a identificação por DNA é feita pela análise dos trechos de
polimorfismos do genoma humano, isto é, pela comparação “das regiões de variabilidade
genética que serve como base para a distinção entre indivíduos”734. Assim, na hipótese de
731
O Projeto Genoma Humano. Centro de Pesquisa da Universidade de São Paulo. Disponível em:
<http://genoma.ib.usp.br/sites/default/files/projeto-genoma-humano.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
732
O Projeto Genoma Humano. Centro de Pesquisa da Universidade de São Paulo. Disponível em:
<http://genoma.ib.usp.br/sites/default/files/projeto-genoma-humano.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
733
Conforme Michelin, Freitas e Kortmann, “[a] ordem das bases do DNA humano já foi decifrada através do
projeto genoma humano, finalizado em 2003, que mostrou que a sequência das bases no nosso DNA como um
todo é extremamente semelhante em todos os indivíduos. Menos de 1% da sequência é variável, e boa parte
das diferenças residem em sequências repetitivas, que não codificam proteínas” (MICHELIN, Kátia;
FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos. In: VELHO, Jesus
Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de crime. Campinas:
Millennium, 2013. p. 87).
734
EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 124.
202
735
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 88.
736
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 88.
737
Conforme tabela disponível em: JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz
Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-
legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p.189.
738
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 81. Disponível em:
203
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
739
Como explica Mário Sérgio Sobrinho, a falta desses dados é um dos principais problemas para a
identificação por DNA: “[u]ma das maiores dificuldades para a implementação do método do DNA na
identificação de suspeitos da autoria de crimes violentos, além do elevado custo, reside na escassez de base
de dados para comparação” (SOBRINHO, Mario Sérgio. A identificação criminal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. p. 39).
740
Nesse sentido: JOBIM, Luiz Fernando et al. DNA e crime. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 225.
741
Nesse sentido: JOBIM, Luiz Fernando et al. DNA e crime. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 225.
742
O Projeto Genoma Humano. Centro de Pesquisa da Universidade de São Paulo. Disponível em:
<http://genoma.ib.usp.br/sites/default/files/projeto-genoma-humano.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
743
O Projeto Genoma Humano. Centro de Pesquisa da Universidade de São Paulo. Disponível em:
<http://genoma.ib.usp.br/sites/default/files/projeto-genoma-humano.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
744
O Projeto Genoma Humano. Centro de Pesquisa da Universidade de São Paulo. Disponível em:
<http://genoma.ib.usp.br/sites/default/files/projeto-genoma-humano.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
745
EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 121.
204
[...] os loci dos microssatélites, ou STRs (short tandem repeats), possuem 100 a
350 pares de bases de comprimento, com uma unidade de core repeat de 2 a 5
pares de bases. Os loci dos minissatélites, por sua vez, ou LTRs (long tandem
repeats), possuem 400 a 1500 pares de base, com uma unidade de core repeat de
16 até 70 pares de bases.748
Para cada uma destas sequências RFLP e STR foi desenvolvida uma técnica
específica de análise laboratorial,749 fazendo-se necessário abordá-las individualmente.
746
JOBIM, Luiz Fernando et al. O DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato
da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA.
2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 178.
747
JOBIM, Luiz Fernando et al. O DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato
da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA.
2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 178.
748
EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 121. Com pequena divergência, Mendes Júnior sustenta
que “os SRTs são caracterizados por uma pequena unidade de 2 a 6 pares de base que se repetem in tandem,
isto é, as unidades são arranjadas consecutivamente” (MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas
à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís; VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo
Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática da química que soluciona crimes. Campinas:
Millennium, 2012. p. 192).
749
Apesar das especificidades, conforme reconhece Bonaccorso, há quatro passos básicos comuns a qualquer
análise de DNA, independentemente da técnica: “[o]s procedimentos básicos incluem: 1) o isolamento do
DNA da amostra que contém DNA de origem desconhecida e, geralmente mais tarde, o isolamento da amostra,
por exemplo, sangue de um indivíduo conhecido; 2) o processamento do DNA para que os resultados do teste
possam ser obtidos; 3) a determinação dos resultados do teste ou tipagem de regiões específicas do DNA; e
4) a comparação e interpretação dos resultados dos testes, da amostra de origem biológica desconhecida
(amostra questionada) e da amostra de origem conhecida (amostra-referência), para determinar se o
indivíduo conhecido está excluído (não é) como a fonte do DNA ou está incluído como a possível fonte do DNA
encontrado na amostra questionada” (BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na
elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São
Paulo, 2005. p. 43. Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
750
JOBIM, Luiz Fernando et al. O DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato
da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA.
2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 178.
205
751
Nesse sentido: CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO,
Domingos. Datiloscopia e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI.
Campinas: Millennium, 2012. p. 291.
752
Conforme Jobim et al., as sequências de microssatélites são “repetidas em números diferentes em cada
indivíduo, dando-lhe uma característica única” (JOBIM, Luiz Fernando et al. O DNA. In: JOBIM, Luiz
Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-
legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 178). São esses
polimorfismos que, segundo Eisele, Campos e Vanrell, são utilizados na análise por RFLP: “[o] polimorfismo
tradicional baseado na análise do comprimento dos fragmentos resultantes da ação das enzimas de restrição
(restriction fragment length polymorphism ou RFLP) é largamente utilizado na pesquisa de DNA em
criminalística, e implica, nos fragmentos cortados (restriction fragments) que incluem loci (regiões internas
dos VNTR) que, consequentemente, são variáveis no comprimento dos fragmentos” (EISELE, Rogério Luiz;
CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina forense e odontologia
legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 119).
753
EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 119.
754
Como explicam Jobim et al.: “[o]s testes iniciam pela extração química do DNA; a seguir essa molécula é
cortada com enzimas de restrição (Hinf-I ou Hae) em inúmeros pedaços, sendo realizada posteriormente a
eletroforese desses fragmentos. Esse procedimento possibilita que os pedações do DNA de cada pessoa a ser
testada, depositados em um orifício perfurado no gel de agarose (espécie de gelatina), sejam posteriormente
dispersos linearmente ao longo do comprimento do gel, carregados pela corrente elétrica aplicada durante
cerca de 18 horas. Os fragmentos do DNA distanciam-se do local de aplicação, mais ou menos de acordo com
o seu peso molecular. Bandas mais pesadas migram menos, e as mais leves ficam mais distantes” (JOBIM,
Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís
Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação
pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 183).
206
após o descolamento. Depois, a membrana é inserida em uma incubadora com “probes”, que
são pedaços conhecidos de minissatélites com fósforo radioativo, que se conectarão apenas
com os minissatélites contidos na membrana de nylon com os quais são compatíveis.755
Por fim, a membrana é exposta ao raio-x para revelação dos pontos com
radioatividade, que aparecem como linhas pretas denominados bandas, sendo que cada uma
destas marcas correspondem à localização na membrana de nylon dos locus de VRTN
selecionados, indicando, assim, a distância percorrida por cada um dos fragmentos e,
consequentemente, os seus tamanhos, já que, quanto maior o fragmento, menor será o seu
deslocamento.756
Como a unidade de core repeat é conhecida (4 pares de bases, por exemplo), o
tamanho total do loci de VRTN dependerá exclusivamente do número de repetições desta
combinação inicial, de modo que será a quantidade de repetições que determinará se aquele
fragmento de VRTN percorrerá um caminho mais ou menos longo.
Fazendo-se este procedimento, paralelamente, com diversos loci de VRTN que,
previamente, sabe-se serem propícios a apresentarem diferentes tamanhos (repetições) nas
pessoas (polimórficos), a combinação dos locais finais de deslocamento dos VRTNs
marcadas na fita pelo raio-x representa o perfil genético do indivíduo757 ou, em outra
palavras, a impressão digital do seu DNA (DNA fingerprint).
755
De acordo com Patton, “[o]s fragmentos de DNA são então inseridos num filtro de nitrocelulose exatamente
na mesma posição em que estão no gel, em um processo conhecido como ‘Southern Blotting’. O padrão dos
comprimentos dos fragmentos de DNA só terá valor se puder ser visível. A visibilidade se alcança através da
ligação de moléculas chamadas ‘probes’ aos fragmentos. As ‘probes’ são na verdade comprimentos curtos de
DNA de fita simples (metade da dupla hélice) com uma ‘etiqueta’ radioativa anexada. O ‘blotter’ é lavado
com uma solução de muitas moléculas da ‘probe’ e as ‘probes’ se ligam ou ‘hibridizam’ com fragmento de
DNA no ‘blotter’ que possui uma sequência de bases complementar ao padrão de bases da ‘probe’. Todo o
excesso de material da ‘probe’ é então lavado. Como apenas alguns fragmentos de DNA terão uma sequência
de bases que complementa uma determinada ‘probe’, a ‘probe’ se unirá apenas em determinados locais no
blotter” (PATTON, Stephen M. DNA Fingerprinting: The Castro Case. Harvard Journal of Law &
Technology. Vol. 3, Spring Issue, 1990. p. 226/227. Disponível em:
<http://jolt.law.harvard.edu/articles/pdf/v03/03HarvJLTech223.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019).
756
Patton explica este procedimento: “[p]ara ver os locais onde a ‘probe’ se uniu, um pedaço de filme
fotográfico é colocado em contato com o ‘blotter’ e exposto à radioatividade das moléculas da ‘probe’. Esse
filme é então revelado e pontos ou barras pretas aparecem nos locais em que uma ‘probe’ esteja ligada a um
fragmento de DNA. Essas áreas pretas que mostram a presença de ‘alelos’ ou variações de ‘gene’ são
conhecidas como ‘bandas’. O próprio filme fotográfico é conhecido como 'autoradiografia' ou 'autorad'”.
(PATTON, Stephen M. DNA Fingerprinting: The Castro Case. Harvard Journal of Law & Technology. Vol.
3, Spring Issue, 1990. p. 227, tradução nossa Disponível em:
<http://jolt.law.harvard.edu/articles/pdf/v03/03HarvJLTech223.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019).
757
De acordo com Eisele, Campos e Vanrell, “[o] tamanho destes fragmentos é extremamente variável de uma
pessoa para outra, em razão do número variável de repetições em sequência (VNTR) que se encontra em cada
fragmento. Observando séries de diferentes locações (loci) de VNTS, pode-se traçar o perfil do indivíduo”
(EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 120).
207
Ao final do exame, “cada indivíduo estudado terá a sua amostra localizada lado
a lado com os demais participantes da perícia, possibilitando a comparação dos padrões
obtidos”758.
Nesse ponto, é importante destacar que a exata correspondência entre duas
amostras deve ser considerada, a princípio, apenas uma possibilidade de identificação, uma
vez que, como já dito, 99,9% do código genético das pessoas é idêntico, de modo que a
realização de um exame que utilize “probos” que se fixem a fragmentos do DNA que
compõem esse 99,9% do genoma resultará em fitas idênticas para quaisquer dois seres
humanos.759
Dessa forma, para que a correspondência entre duas amostras analisadas tenha
qualquer valor para a identificação, é necessária a demonstração do polimorfismo dos
fragmentos de VRTNs analisados, isto é, apresentar “estatísticas especificando a raridade
da ocorrência daquelas bandas na população em geral”760, permitindo que seja “calculada
as chances de aleatoriamente aparecerem cada uma das bandas”761 que constam do
resultado do exame.
Outro ponto de atenção é o procedimento adotado pelo perito, pois a técnica
RFLP pode ser aplicada em uma amostra pela análise individual de cada um dos
minissatélites selecionados em sequência ou de vários ao mesmo tempo. Ocorre que,
conforme Jobim et al., “de uma maneira geral, aceita-se internacionalmente que os testes
de DNA mais informativos em investigação de individualidade humana sejam os que
analisam os minissatélites individualmente, com reagentes ou sondas sintéticas específicas
758
JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 183.
759
Nesse sentido, alerta Patton: “[d]uas amostras extraídas da mesma pessoa sempre terão idênticos padrões
de banda, mas o fato de duas amostras serem compatíveis não significa que vieram da mesma pessoa, já que
pode haver muitas pessoas que tenham bandas similares. Como exemplo extremo, existem probes para
indicarem regiões do DNA humano não polimórficas, que são comuns a todas as pessoas e produzem bandas
que não variam muito de pessoa para pessoa” (PATTON, Stephen M. DNA Fingerprinting: The Castro Case.
Harvard Journal of Law & Technology. Vol. 3, Spring Issue, 1990. p. 227, tradução nossa. Disponível em:
<http://jolt.law.harvard.edu/articles/pdf/v03/03HarvJLTech223.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019).
760
PATTON, Stephen M. DNA Fingerprinting: The Castro Case. Harvard Journal of Law & Technology. Vol.
3, Spring Issue, 1990. p. 228, tradução nossa. Disponível em:
<http://jolt.law.harvard.edu/articles/pdf/v03/03HarvJLTech223.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
761
PATTON, Stephen M. DNA Fingerprinting: The Castro Case. Harvard Journal of Law & Technology. Vol.
3, Spring Issue, 1990. p. 228, tradução nossa. Disponível em:
<http://jolt.law.harvard.edu/articles/pdf/v03/03HarvJLTech223.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019
208
para cada loco”762, ao passo que as “sondas multilocais que analisam vários locos ao mesmo
tempo estudam um grande polimorfismo na mesma reação, mas podem confundir o técnico
pela quantidade exagerada de bandas de DNA existentes”763.
Por essa razão, concluem os autores, os testes com análise simultânea de vários
minissatélites “têm sido pouco utilizados e devem ser acompanhados de estudos com outros
marcadores, para servirem como prova confiável, de acordo com as normas
internacionais”764.
Destaca-se, contudo, que a identificação por DNA pelo método RFLP demanda
uma grande quantidade de amostra de boa qualidade para a sua realização, o que inviabiliza
a sua utilização em diversos casos.765 De acordo com Eisele, Campos e Vanrell, “há uns 20%
de casos em que, devido às quantidades de DNA de alto peso molecular serem exíguas (<
de 100 nanogramas), pode ocorrer uma análise de RFPL insuficiente, e um perfil incompleto
das amostras”766.
762
JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 182.
763
JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 184.
764
JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 184.
765
Nesse sentido, explicam Jobim et al.: “[a]s limitações dos testes com minissatélites são decorrentes da
necessidade de utilização de amostras com concentrações elevadas de DNA, assim como da dificuldade de
análise de material parcialmente degradado” (JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In:
JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação
humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas:
Millennium, 2012. p. 184).
766
EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 120.
209
767
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 195.
768
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 298. No mesmo sentido, afirma Bonaccorso: “[a] qualidade e a quantidade de DNA contido nos
vestígios oriundos de locais de crime ou de atos exumatórios podem ser fatores limitantes à análise. O advento
da PCR, do inglês Polymerase Chain Reaction, aumentou significativamente a possibilidade de análise das
variações gênicas nestes tipos de vestígios, tornando-se técnica de eleição nos laboratórios forenses”
(BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 69. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
769
EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 121.
770
JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 184.
771
EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 121.
772
Bonaccorso destaca que, antes de se iniciar o procedimento, deve-se realizar a denominada “quantificação
do DNA extraído”, que tem basicamente duas funções: “[...] assegurar uma diluição adequada para os
extratos concentrados de DNA de modo a adequá-los a concentrações compatíveis para a reação de PCR e
eliminar extratos que contenham apenas traços de DNA que falhariam na etapa de amplificação. Obviamente,
dos ensaios de quantificação também se obtêm informações relevantes para a escolha do tipo de marcador a
ser utilizado na amplificação frente à concentração de DNA aferida” (BONARCCORSO, Norma Sueli.
Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito).
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 67. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
210
773
Esclarece Bonaccorso que “[o] aquecimento aumenta a agitação térmica das moléculas propiciando a
quebra das pontes de hidrogênio” (BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na
elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São
Paulo, 2005. p. 70. Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
774
A denominação “etapa de anelamento” é utilizada em: CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e
impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia e revelação de impressões
digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium, 2012. p. 299. No mesmo
sentido, BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005.
Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 69.
Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
775
De acordo com Mendes Júnior, a ampliação por PCR ocorre da seguinte forma: “[n]este procedimento,
tubos contendo uma mistura de reação que inclui o DNA genômico (molde), um par de indicadores (primers)
específicos que flanqueiam a região polimórfica a ser amplificada, dNTPs (desoxirribonucleosídeo trifosfatos)
e DNA polimerase termoestável, são acondicionadas em um equipamento termociclador. Este equipamento é
programado para executar um regime de temperaturas caracterizado por três etapas: desnaturação,
pareamento e extensão. Cada uma das etapas tem duração variando de 15 a 60 segundos, dependendo da
composição de bases e do tamanho da região a ser amplificada. Na etapa de desnaturação, a temperatura é
elevada a cerca de 94°C, permitindo que haja o rompimento das ligações de hidrogênio que mantém unidos
os filamentos da dupla-hélice de DNA. Na etapa de pareamento, a temperatura é reduzida a valores inferiores
a 65°C a fim de permitir a hibridação (pareamento) dos primers com o DNA molde; a temperatura exata
atingida nesta etapa é calculada em função da composição de bases dos primers incluídos na reação. Na etapa
de extensão, a temperatura é elevada a cerca de 72°C, permitindo com que o DNA polimerase catalise a união
de nucleotídeos tomando como base a sequência de DNA molde, gerando um novo filamento de DNA”
(MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 195). No mesmo sentido: JOBIM, Luiz
Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato
da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA.
2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 185/186; CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais.
In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano
Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium, 2012. p.298/299 e BONARCCORSO, Norma Sueli.
Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito).
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 70. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
211
776
Nesse sentido: JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA,
Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 186. Por sua vez, Mendes Júnior,
sustenta que “[e]ste ciclo de temperaturas se repete por 25 a 35 vezes, sendo que o produto gerado em um
ciclo atua como molde no ciclo seguinte. Deste modo, aproximadamente 2n moléculas de DNA são produzidas
a partir de uma única molécula de DNA molde ao final de n ciclos, sendo que aproximadamente 2n – 2n
apresentam o tamanho desejado” (MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense
de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís; VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de
química forense: uma análise prática da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 195).
Ainda, conforme Carvalho, “estes ciclos podem repetir-se inúmeras vezes. Em média, a maioria dos ‘Kits’
comerciais recomenda a utilização de 28 ciclos” (CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões
digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia e revelação de impressões digitais. Coordenação de
Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium, 2012. p. 299).
777
EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual de medicina
forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 123.
778
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 196.
779
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 196.
780
JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 186.
212
781
Por isso, advertem Jobim et al., “[a] amplificação de diversos STR no mesmo tubo de ensaio denomina-se
multiplex. Essa metodologia de amplificação múltipla depende de que a temperatura de anelamento dos
primers seja idêntica e o tamanho dos alelos diferente, para que possam ser analisados no mesmo gel de
poliacrilamida, corado com prata” (JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz
Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-
legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 187).
782
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 196.
783
Nesse sentido: EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual
de medicina forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 121; MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira.
Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís; VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA,
Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática da química que soluciona crimes.
Campinas: Millennium, 2012. p. 196; JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz
Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-
legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 187/188.
784
De acordo com Eisele, Campos e Vanrell, fluoróforos são “marcadores químicos que fluorescem quando
expostos a diferentes comprimentos de onda, transformando-se no instrumento apto a distinguir entre
diferentes nucleotídeos e, assim, ‘ler’ a sequência do DNA”, pois, “[...] cada locus, após uma corrida de
eletroforese, pode ser marcado por um fluoróforo colorido diferente, facilitando assim o reconhecimento, com
auxílio de laser, em tempo real” (EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge
Paulete. Manual de medicina forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 121 e 123).
785
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 196.
786
Ao tratar dos dois métodos de identificação, Bonaccorso esclarece que: “[a]tualmente, dado o grande
volume de análises nos laboratórios forenses, mormente os sistemas multiplex são analisados e tipificados
pela utilização de analisadores automáticos. Para facilitação do processo analítico, tem-se optado pela
escolha de sistemas de eletroforese capilar com multicanais para detecção e que são combinados, nos
laboratórios de grande porte, com sistemas robotizados e sistemas de gerenciamento de informações,
incluindo código de barra das amostras para reduzir erros de operação” (BONARCCORSO, Norma Sueli.
Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito).
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 79. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
213
Por fim, destaca-se que, não obstante a identificação pelo método PCR sustente
consideráveis vantagens em relação ao RFLP, principalmente por conseguir analisar
simultaneamente uma maior quantidade de polimorfismos, numa amostra menor e em menor
tempo, é preciso destacar que os STRs amplificados pela técnica PCR “não possuem o
polimorfismo dos locos de minissatélites”787. Portanto, para que se tenha o mesmo nível de
discriminação de uma análise pelo método RFLP, é preciso analisar de 4 a 8 fragmentos de
STR amplificados pela técnica PCR.788
Nos Estados Unidos, para uniformizar as análises e garantir que os STRs
utilizados nos exames sejam aqueles que estatisticamente tenham alto grau de polimorfismo
na população,789 o FBI estabeleceu inicialmente 13 fragmentos padrões para serem
verificados na identificação por DNA, número aumentado para 20 locus de STR em 2017.790
791
A lista de Kits aprovados consta do: National DNA Index System (NDIS) Operational Procedures Manual.
FBI Laboratory. Version 8, 1 maio 2019. p. 86/87. Disponível em: <https://www.fbi.gov/file-repository/ndis-
operational-procedures-manual.pdf/view>. Acesso em: 27 nov. 2019.
792
JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 198.
793
Conforme Carvalho, “[o]s SNPs (single nucleotide polymorphism) são polimorfismos de base única dentro
de um genoma” (CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO,
Domingos. Datiloscopia e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI.
Campinas: Millennium, 2012. p. 292).
794
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 193.
795
JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 198.
215
796
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 192.
797
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 193. Da mesma forma, Jobim et al. aponta
com uma das vantagens dos SNPs o fato de que permitem a “amplificação de fragmentos muito pequenos de
DNA” (JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr
da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 198).
798
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 193.
799
Nesse sentido, Jobim et al. sustenta que “[a] presença de somente dois alelos por loco e a distribuição
altamente específica nas populações representam uma desvantagem no uso destes marcadores, mas isso pode
ser compensado pela análise de um número maior de locos” (JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação
laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação
humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas:
Millennium, 2012. p. 198).
800
De acordo com Mendes Júnior, “entre 50 e 100 SNPs são necessários para alcançar o poder de
discriminação dos 13 STRs (CODIS) convencionalmente analisados pelo Federal Bureau of Investigation
(FBI)” (MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline
Thaís; VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise
prática da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 193). Vale ressaltar, como já dito
acima, que em 2017 o FBI ampliou a sua base de análise para 20 STRs. Já conforme Jobim et al. “[o] estudo
de investigação de paternidade pode ser realizado com aproximadamente 50 locos de SNP, o que pode ser
comparado ao poder discriminatório de 10 a 15 locos de STR” (JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação
laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação
humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas:
Millennium, 2012. p. 198).
801
Nesse sentido, Jobim et al.: “[n]a identificação humana, uma das grandes vantagens do estudo do SNP é
na investigação de paternidade envolvendo exumação e identificação de corpos carbonizados, onde utilizamos
como amostra os ossos ou dentes do indivíduo. Normalmente o DNA encontra-se muito degradado, permitindo
216
Assim, em cada caso, a melhor técnica para a identificação por DNA depende
da quantidade e qualidade da amostra que se pretende examinar, sendo que as melhores
amostras poderão ser analisadas por qualquer um dos métodos descritos, inclusive de
maneira conjugada, se necessário, ao passo que a degradação ou a pouca quantidade
restringirá as possibilidades.802
Destaca-se, por fim, que, apesar de atualmente a identificação por DNA ser feita
pela comparação de duas amostras para verificação da sua compatibilidade, é possível
conceber que os avanços tecnológicos e o maior entendimento das funções individuais ou
conjugadas de pares de bases codificantes permitirá que, “no futuro, a análise de SNPs
presentes em genes que já se demonstraram relevantes para a determinação de
características físicas venha a contribuir para a determinação do ‘retrato falado’
biomolecular de um criminoso”803, quando for encontrado o seu material genético no local
do crime ou na vítima.804
somente a análise de fragmentos muito pequenos de DNA. Nestes casos, a amplificação de diversos SNP em
forma de multiplex pode ser muito útil tanto como metodologia única ou complementar ao estudo dos STR”
(JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 199).
802
Nesse sentido: EISELE, Rogério Luiz; CAMPOS, Maria de Lourdes B.; VANRELL, Jorge Paulete. Manual
de medicina forense e odontologia legal. Curitiba: Juruá, 2010. p. 122.
803
MENDES JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 193.
804
Ainda que não para a elaboração de um “retrato falado”, as características físicas de uma pessoa reveladas
pelos SNPs foram utilizadas com sucesso para encontrar o autor, até então desconhecido, de uma série de
estupros e homicídios praticados em 2001 nas proximidades da Louisiana State University, no caso conhecido
popularmente como “The Baton Rouge Serial Killer”. A investigação estava sendo conduzida “sem sucesso
até que, em outubro de 2003, foi realizada a análise de um conjunto de 71 SNPs cujos alelos alternativos
apresentavam frequências bastante distintas entre populações pertencentes aos diferentes grupos étnicos
principais. Esta característica faz com que SNPs deste tipo sejam conhecidos como AIMs (Ancestru
Informative Markers). Enquanto que os STRs permitem a reconstrução de um perfil genético exclusivo a um
único indivíduo, equivalente a uma “impressão digital de DNA” (DNA fingerprint) única, os AIMs levam à
reconstrução de perfis menos informativos, uma vez que tais perfis apresentam maior probabilidade de serem
compartilhados por indivíduos não-relacionados. Por outro lado, análises estatísticas que consideram os
genótipos do indivíduo em conjunto com as distribuições de frequências alélicas dos AIMs nos diferentes
grupos étnicos podem conduzir a inferências precisas sobre ancestralidade individual, o que não é obtido
satisfatoriamente com os dados de SRTs. A análise deste conjunto de 71 AIMs, que compõem o sistema
multiplex DNAWitnessTM 1.0 (DNAPrint), a partir de amostras de DNA provenientes de material biológico
do agressor, recuperado das vítimas ou dos locais de crime, levou a estimativas de ancestralidade bastante
precisas, porém incompatíveis com as descrições do suspeito baseadas em relatos testemunhais: o cenário
mais provável indicava que o agressor apresentaria grande ancestralidade atribuída à África subsaariana
(85%), associada a uma contribuição secundária nativo-americana (15%); a probabilidade de que o agressor
apresentasse alguma parcela de ancestralidade europeia era muito baixa. Com base nestes dados, o foco das
investigações foi redirecionado para a busca por indivíduos que apresentassem pele mais escura e outras
características antropométricas que caracterizam os afro-americanos. Com isso, dois meses após este
redirecionamento, Derrick Todd Lee, que já havia sido preso em outras ocasiões por roubos e outros pequenos
delitos, além de ter sido considerado com suspeito em homicídio anterior, foi intimado judicialmente a
conceder material biológico para análise. A análise de STRs na amostra de DNA de Derrick Lee foi priorizada
217
Conforme detalhado no item 4.1, supra, o exame de identificação por DNA tem
se aperfeiçoado com o desenvolvimento tecnológico, permitindo que, atualmente, a
quantidade da ordem de picogramas (10-12g) de material genético seja constantemente
utilizada para exames de identificação por DNA.
Entretanto, as técnicas e análises periciais relacionadas aos exames de amostras
complexas, de baixa quantidade, qualidade ou misturadas, têm demonstrado potencial de
afetar o resultado da identificação perseguido e, consequentemente, a informação que será
inserida no processo como elemento de prova.
Da mesma forma, a alta sensibilidade das amostras com pouco DNA tornam as
fontes de prova mais suscetíveis à contaminação, inibição ou degradação, já que picogramas
de outro material genético, abundandes em pessoas e objetos não esterelizados, são
suficientes para prejudicar ou impedir a análise laboratorial.805
Assim, a cadeia de custódia da perícia de identificação por DNA deve manter
informações suficientes para permitir que as partes e o juiz percorram o caminho da prova
para verificarem que a fonte de prova mantém as características de quando foi encontrada,
sendo necessário registrar, etapa a etapa, os diversos cuidados específicos no trato do
material genético, iniciando-se com a sua localização e estendendo-se por todas as fases
seguintes de coleta, empacotamento, transporte, manuseio e armazenagem. 806
no laboratório, e houve compatibilidade perfeita entre o perfil de Derrick e os de várias amostras coletadas
nas cenas de crimes. Em outubro de 2004 Derrick Lee foi condenado e sentenciado à morte por injeção letal.
Atualmente ele se encontra no corredor da morte aguardando a execução. Este caso representou o primeiro
em que análise de ancestralidade genômica auxiliou na resolução de uma investigação criminal” (MENDES
JÚNIOR, Celso Teixeira. Técnicas aplicadas à análise forense de DNA. In: BRUNI, Aline Thaís; VELHO,
Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática da
química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 204/205).
805
MARTINS, Bruno Spinosa de; OLIVEIRA, Marcelo Firmino de. Exame do teor alcoólico em acidentes de
trânsito. In: BRUNI, Aline Thaís; VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de
química forense: uma análise prática da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 107.
806
Bonaccorso afirma que “[...] é imperativo que os centros forenses mantenham a cadeia de custódia de
amostras, através de registros que possam acompanhá-las desde a coleta até sua disposição final, de forma a
comprovar que tomou todas as precauções para prevenir a falsificação, quebra, perda ou contaminação das
amostras” (BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005.
Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 54.
Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019). Interessante notar que a autora, em momento algum, afirma que a documentação da cadeia de custódia
evitará falsificações ou contaminação das fontes de prova, mas somente que comprovará que foram tomadas
as devidas precauções. Isto porque, na esteira do que já foi esclarecido no capítulo 2, a documentação da cadeia
218
de custódia comporta limites, entre os quais a má-fé daqueles que tiveram contato com a fonte ou elemento de
prova.
807
Segundo Bonaccorso: “[...] [o]s registros da cadeia de custódia devem também indicar dados sobre o
tratamento a que foi submetido o vestígio imediatamente após a coleta, identificação dos lacres utilizados para
sua embalagem, detalhes sobre sua preparação para os testes a que foi submetido [...]” (BONARCCORSO,
Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade
de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 55. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
808
De acordo com Bonaccorso, “[...] os vestígios que podem ser submetidos à análise de DNA são apenas
aqueles de natureza biológica como sangue e sêmen, in natura ou em manchas ou crostas; tecidos, células,
ossos, dentes e órgãos; pelos e cabelos; urina, saliva e outros fluidos corpóreos [...]” (BONARCCORSO,
Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade
de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 44. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
219
809
Por conta disso, antes de se extrair o DNA do sangue encontrado no local do crime, é preciso fazer a
diferenciação entre sangue humano e sangue de animais que habitem o local do crime, conforme explicam
Michelin, Freitas e Kortmann: “[n]os locais de crime onde há a presença de outros animais, frequentemente
são encontrados vestígios de sangue, os quais precisam ser coletados pelo perito criminal para diferenciação
entre sangue humano e não humano [...], faz-se necessária a distinção daquelas que contém sangue humano
para posterior extração de DNA [...]” (MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN,
Gustavo Lucena. Vestígios biológicos. In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO,
Clayton Tadeu Mota. Locais de crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 97).
810
Nesse sentido: MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios
biológicos. In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais
de crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 107.
811
De acordo com Michelin, Freitas e Kortmann, “[a] reação PCR é suscetível a uma ampla gama de agentes
inibidores, que podem ou não ser removidos com sucesso na etapa de extração e afetam a análise em graus
variados, até mesmo inviabilizando-a em alguns casos. Ao lado dos inibidores conhecidos, como o ácido
húmico do solo, a hemoglobina e o corante índico, existem muitos outros que podem estar mascarados na
composição do suporte do vestígio, como corantes e pigmentos presentes em tecidos e tintas, por exemplo”
(MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos. In:
VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 108).
812
Nesse sentido: MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios
biológicos. In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais
de crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 108.
220
813
FIGUEROA NAVARRO, Carmen. La cadena de custodia de las muestras biológicas. In: FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015, p. 108,
tradução nossa.
814
FIGUEROA NAVARRO, Carmen. La cadena de custodia de las muestras biológicas. In: FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015, p. 108,
tradução nossa.
815
Nesse sentido, sustenta Espindula: “[a] análise do perfil genético de vestígios relacionados a locais de
crime deve, sempre que possível, ser feita mediante comparação com padrões coletados da(s) vítima(s) e/ou
suspeito(s) envolvido(s). A simples análise do DNA de amostras coletadas em local de crime geralmente não
dá condições para a conclusão de uma investigação, inquérito ou processo judicial, mas a comparação desta
amostra com o DNA dos envolvidos pode reforçar sobremaneira suas conclusões, ou mesmo reorientar uma
linha de investigação” (ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários
da perícia. 4. ed. Campinas: Millennium, 2013. p. 372).
816
Sintetizando a importância da manutenção da cadeia de custódia da fonte de prova biológica ao longo de
todas as etapas, Bonaccorso afirma: “[s]e o vestígio não for apropriadamente documentado, coletado,
embalado e preservado, ele poderá não cumprir os requisitos científicos e legais para ser admitido como prova
perante a justiça. Se o vestígio que deu origem ao exame de DNA não for apropriadamente documentado antes
da coleta, sua origem pode ser questionada. Se não for bem coletado, sua atividade biológica pode ser perdida.
Se for inapropriadamente embalado, pode ocorrer contaminação exógena ou cruzada e, se não for
apropriadamente preservado, pode ocorrer decomposição e degradação. Qualquer destes efeitos poderá
afetar seriamente a tipagem do DNA” (BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na
elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São
Paulo, 2005. p. 45. Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
817
Nesse sentido, sustenta Figueroa Navarro: “[...] são vários os problemas que podem se colocar durante o
procedimento de coleta, manutenção e envio das amostras biológicas, que podem chegar a comprometer a
221
análise de DNA”. (FIGUEROA NAVARRO, Carmen. La cadena de custodia de las muestras biológicas. In:
FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015,
p. 112, tradução nossa).
818
JOBIM, Luiz Fernando et al. Amostras biológicas para DNA forense. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA,
Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 261.
819
JOBIM, Luiz Fernando et al. Amostras biológicas para DNA forense. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA,
Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 261.
820
Como salienta Espindula, “[c]abe destacar nesta parte, a questão das dificuldades que existem para a
coleta dessas amostras nos locais de crime. Essa é, talvez, a maior dificuldade que teremos para respaldar um
exame correto e idôneo, tendo em vista a sensibilidade do material e o grande risco de contaminação dessas
amostras até chegar ao laboratório” (ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para
peritos e usuários da perícia. 4. ed. Campinas: Millennium, 2013. p. 372/373).
821
Conforme Yoshida: “[u]m dos principais problemas encontrados na prática para a resolução de crimes é
a preservação da cena. Infelizmente a não preservação da cena até o desfazimento do local é muito comum na
realidade do Brasil. Isso ocorre, geralmente, por meio de situações que podem ser acidentais ou propositais.
O lapso temporal entre o cometimento do ilícito e a chegada dos primeiros policiais pode ser suficiente para
que curiosos adentrem na cena e deixem ali seus próprios vestígios, que não exatamente têm correlação com
o fato. Este é um exemplo de modificação acidental. Além dessa, o próprio criminoso pode fazer alterações de
objetos e outros vestígios com o objetivo de confundir a perícia”. (YOSHIDA, Ricardo Luís. Análise de
vestígios latentes em locais de crimes. In: BRUNI, Aline Thaís; VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo
Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática da química que soluciona crimes. Campinas:
Millennium, 2012. p.175)
822
JOBIM, Luiz Fernando et al. Amostras biológicas para DNA forense. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA,
Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 262. Nesse sentido é a orientação
do Procedimento operacional padrão (POP) nº 2.2. de Genética Forense do Ministério da Justiça, que, em seu
item 4 “Procedimentos”, afirma: “[o] perito criminal deve adotar medidas para impedir que pessoas estranhas
à equipe pericial manipulem os vestígios biológicos presentes no local” (Procedimento operacional padrão:
perícia criminal. Secretaria Nacional de Segurança Pública. Brasília: Ministério da Justiça, 2013. Disponível
em: <http://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica/senasp-1/pops-de-per_cia-vers_o-para-
internet.pdf>. Acesso em: 23 dez. 2019).
222
823
JOBIM, Luiz Fernando et al. Amostras biológicas para DNA forense. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA,
Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 262.
824
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 107.
825
Esta é a recomendação do Procedimento operacional padrão (POP) nº 2.2. de Genética Forense do
Ministério da Justiça de 2013, que diz, em seu item 4.1: “[t]odas as informações que sejam relevantes para a
investigação ou para futuros exames, como o possível contaminação dos vestígios após o delito, devem ser
solicitadas pelo perito criminal às testemunhas ou aos policiais que se encontrem preservando o local do
crime” e continua o documento determinando, em seu item 5, que devem ser identificados “possíveis
contribuidores eventuais, tais como as de policiais que tiveram acesso ao local do crime ou as de qualquer
outras pessoas sabidamente não relacionadas ao delito, mas que possam ter eventualmente deixado material
biológico no local do crime” (Procedimento operacional padrão: perícia criminal. Secretaria Nacional de
Segurança Pública. Brasília: Ministério da Justiça, 2013. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/sua-
seguranca/seguranca-publica/senasp-1/pops-de-per_cia-vers_o-para-internet.pdf>. Acesso em: 23 dez. 2019).
Nesses casos em que há interferência de terceiros, caso a fonte de material genético tenha sido efetivamente
coletada por um terceiro, o perito não poderá registrar esta coleta como sua, podendo, no máximo, registrar o
ocorrido no relatório de exame de local e recomendar a entrega do item à autoridade policial, como explica
Espindula: “[é] comum os peritos chegarem a um local de morte violenta e serem abordados por partes
envolvidas, terceiros e até policiais, portando objetos que supostamente estariam no local e que foram
recolhidos para que fossem preservados na sua integridade. Exemplo disso ocorre com o recolhimento de
projéteis e das próprias armas de fogo, facas, documentos da vítima, etc., que são recolhidos por outros na
intenção de que o perito registre como se tal objeto estivesse em determinado lugar e/ou posição. Jamais
poderão registrar dessa forma, pois os peritos somente consignarão os vestígios por eles constatados. Nesses
casos, os peritos não devem receber tais corpos de delito, orientando para que sejam encaminhados pela
Delegacia da área, via ofício, ao Instituto de Criminalística, constando-se o tipo de exame que a autoridade
policial julgue necessário. Os peritos podem e devem somente registrar no seu croqui os objetos que lhe forem
apresentados, identificando-os e depois os fazendo constar no laudo pericial respectivo, no item de outros
elementos, relatando ali as circunstâncias que tais objetos lhes foram apresentados, sem, no entanto, entrar
no mérito da análise pericial em si. Caso a autoridade policial encaminhe tais objetos antes de concluído o
laudo do local e, no ofício de encaminhamento, constar quesitos ou exames que possam ser correlacionados
com o local, então os peritos podem assim discutir em seu laudo, sempre fazendo menção do trâmite e origem
desses objetos” (ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da
perícia. 4. ed. Campinas: Millennium, 2013. p. 202).
826
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 51. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
223
827
Conforme Jobim et al., “[o] pessoal encarregado de colheita de indícios biológicos e de amostras para
identificação humana deve ter formação e experiência para o desempenho das funções. Cursos de formação e
treinamento devem acontecer para a qualificação profissional desses indivíduos” (JOBIM, Luiz Fernando et
al. Amostras biológicas para DNA forense. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA, Luís
Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais; identificação
pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 261). No mesmo sentido, Espindula: “[...] é preciso todo um
treinamento e esclarecimentos adequados aos peritos que realizam as perícias de local de crime, a fim de
garantir a adequada coleta, identificação e transporte até o laboratório de DNA” (ESPINDULA,
Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed. Campinas:
Millennium, 2013. p. 373).
828
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 107.
829
JOBIM, Luiz Fernando et al. Amostras biológicas para DNA forense. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA,
Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 262.
830
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 95.
831
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 95.
832
Conforme destacam Michelin, Freitas e Kortmann, “[a] obtenção de DNA de objetos tocados[...], ampliou
muito o número de vestígios que podem ser analisados para a identificação genética. Passaram a ser
corriqueiras análises em vestígios que antes eram sequer considerados para exames de DNA, como volantes
de carro, ferramentas e maçanetas. As próprias impressões papilares, quando sem qualidade para o confronto
224
contato era feita pelas mesmas técnicas utilizadas para a localização de impressões digitais.
Entretanto, na prática, verificou-se que “das amostras de impressão digital previamente
reveladas com pós branco e preto, em apenas 47% destas foi possível obter perfil genético
completo”833, sendo ainda pior a consequência do uso de “pó metálico, que inibiu a reação
PCR”834.
Por outro lado, na busca por vestígio de sangue oculto, por exemplo, a
“utilização de luminol não interfere com exames mais sofisticados, como por exemplo, com
a análise de DNA”835.
papiloscópico, passaram a ser utilizadas para a identificação genética” (MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge
Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos. In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA,
Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 91).
833
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 296.
834
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 296.
835
YOSHIDA, Ricardo Luís. Análise de vestígios latentes em locais de crimes. In: BRUNI, Aline Thaís;
VELHO, Jesus Antonio; OLIVEIRA, Marcelo Firmino. Fundamentos de química forense: uma análise prática
da química que soluciona crimes. Campinas: Millennium, 2012. p. 183.
836
ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed.
Campinas: Millennium, 2013. p. 373.
225
caso seja tocado um determinado objeto do local do crime que contenha material
biológico de um indivíduo, e um segundo objeto é manuseado com o mesmo par
de luvas, pode haver transferência de material genético de um objeto para outro e
o perfil gerado pode ser a mistura de material genético de dois indivíduos que
dificultará ou inviabilizará a interpretação dos resultados.840
837
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 47-48. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
Próximas são as determinações feitas pela Resolução SSP nº 194/99, nas disposições preliminares do ANEXO,
que diz: “IV. Cada vestígio eleito para coleta deverá ser fotografado, ter sua origem descrita em relatório
individual de identificação, indicando a data e a natureza da ocorrência; o local, a forma e as condições da
coleta; o horário em que foi coletado, consignando-se, quando possível, o tempo aproximado após o crime;
bem como a forma utilizada para acondicionamento e preservação”. No mesmo sentido é o Procedimento
operacional padrão (POP) nº 2.2. de Genética Forense do Ministério da Justiça, que, em seu item 4.1 “Ações
Preliminares”, afirma: “[a]o ter acesso ao local do crime, o perito criminal realizará o reconhecimento a fim
de localizar os pontos prováveis que contenham materiais biológicos pertinentes ao caso, identificar a
dinâmica do evento, quando possível, e tomar providências para a manutenção da preservação dos vestígios
ali presentes. Recomenda-se que, antes da coleta, os vestígios sejam fotografados na posição em que foram
encontrados, com e sem o uso de escala” (Procedimento operacional padrão: perícia criminal. Secretaria
Nacional de Segurança Pública. Brasília: Ministério da Justiça, 2013. Disponível em:
<http://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica/senasp-1/pops-de-per_cia-vers_o-para-
internet.pdf>. Acesso em: 23 dez. 2019).
838
ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed.
Campinas: Millennium, 2013. p. 373.
839
ESPINDULA, Alberi. Perícia criminal e cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 4. ed.
Campinas: Millennium, 2013. p. 373. Ressalte-se que, de acordo com o §1º do art. 3º da Resolução SSP nº
194/99: “[f]icam impedidos de proceder às análises de laboratório os Peritos que efetuaram a coleta de
material em local”.
840
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 302.
226
Dessa forma, “a troca de luvas a cada novo vestígio coletado é muito importante
para evitar a contaminação cruzada”841.
Mesmo com esses cuidados, 842 suspeitando-se de contaminação da amostra com
material genético do agente coletor “por manipulação inadequada”843, isto é, quando houver
indícios de “contaminação do vestígio com material biológico do manipulador (testemunha
contaminante), deverá ser coletada amostra-referência deste, para que se conheça seu perfil
genético”844.
No que tange aos instrumentos utilizados para a coleta de vestígios biológicos,
todos deverão ser previamente esterelizados845 não só para “a destruição de micro-
organismos que, sob certas condições, podem se proliferar no material coletado e
fragmentar o DNA, mas principalmente, a eliminação de DNA humano eventualmente
presente no material que será um importante contaminante de vestígio coletado”846.
Destaca-se que nem toda técnica de esterilização é capaz de eliminar a presença
de DNA humano dos instrumentos. Por essa razão, com relação aos itens descartáveis (e.g.
841
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 107. No mesmo sentido, Bonaccorso afirma: “[a] contaminação por
contato físico pode ser evitada pela utilização de máscaras e luvas pelo coletor que deverá manipular as
amostras com pinças. Os manipuladores devem trocar as luvas sempre que estas tenham sido contaminadas
[...]” (BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005.
Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 53.
Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019). A utilização de luvas descartáveis é também determinação expressa da Resolução SSP nº 194/99, nas
disposições preliminares do ANEXO, que diz: “[d]urante qualquer coleta de material biológico é
imprescindível a utilização de luvas descartáveis, para que se evite contaminação exógena”.
842
Apesar da adoção dos procedimentos previstos, a contaminação do material genético é um dos pontos
considerados críticos pelo Procedimento Operacional Padrão (POP) nº 2.2. de Genética Forense do Ministério
da Justiça, de 2013, que determina, em seu item 5, que “o perito oficial deve tomar todo o cuidado para evitar
a deposição acidental do seu próprio material biológico sobre o vestígio, não devendo, portanto, manipular
ou se encostar no mesmo sem luva, nem falar, espirrar ou tossir sobre ou próximo do mesmo sem máscara”
(Procedimento operacional padrão: perícia criminal. Secretaria Nacional de Segurança Pública. Brasília:
Ministério da Justiça, 2013. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-
publica/senasp-1/pops-de-per_cia-vers_o-para-internet.pdf>. Acesso em: 23 dez. 2019).
843
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 51. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
844
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 51. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
845
Esta é uma determinação expressa da Resolução SSP nº 194/99, nas disposições preliminares do ANEXO,
que diz: “II. Todos os instrumentos e materiais utilizados na colheita deverão ser estéreis”.
846
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 109.
227
suabes, potes, lâminas), é necessário se certificar de que foram produzidos por técnicas que
resultam em material livre de DNA.847 Conforme Carvalho, “esta questão é importante, pois
já foi relatado na Alemanha e Áustria a detecção de um perfil genético único em swabs
apenas estéreis (não DNA-free), o que levou a Polícia a conectar erroneamente 40 crimes
(incidente chamado de Phantom of Heilbronn), devido à contaminação durante o processo
de manufatura dos swabs”848. Da mesma forma, os instrumentos permanetes (e.g. pinças,
tesoura, cabo de bisturi) devem ser submetidos a descotaminação após cada uso por técnicas
capazes de eliminarem o DNA, como o calor úmido sob pressão em autoclaves e a exposição
ao hipoclorito de sódio.849
Com a adoção destas cautelas para não causar dano irreversível ao material
biológico, deve-se coletar o vestígio pela técnica mais adequada, levando-se em
consideração o local em que está depositado o material biológico, o seu estado e
característica.850 Destaca-se que, quando a técnica utilizada coletar outras substâncias
conjuntamente com o material biológico pretendido (como, por exemplo, na raspagem da
madeira contendo mancha de sangue seca),851 deve-se colher em paralelo uma amostra
isolada do material não biológico (amostra controle), para que, na eventualidade de futura
847
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 109.
848
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 302.
849
De acordo com Michelin, Freitas e Kortmann, “[e]studos realizados no laboratório de DNA da Polícia
Federal corroboram que a autoclavagem a 121°C por 20 minutos é suficiente para eliminar DNA em solução
da superfície tratada, enquanto o DNA desidratado é eliminado de forma mais eficiente após autoclavagem a
132°C por 30 minutos. Já a exposição ao hipoclorito de sódio na concentração de 2% por 10 minutos foi
suficiente para eliminar totalmente o DNA da superfície tratada” (MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge
Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos. In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA,
Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 110).
850
Por exemplo, fluidos líquidos em grande quantidade podem ser coletados por meio de seringa, ao passo
que, estando em menor quantidade, a coleta deverá ser feita com suabe. Ainda, se a quantidade for exígua, a
melhor técnica é a do duplo suabe. Por outro lado, se a superfície em que está depositado o vestígio fluido ou
epitelial for absorvente, como madeira, concreto e asfalto, faz-se a coleta por raspagem. Já os vestígios sólidos
de pequeno tamanho são coletados com pinça. Por fim, o material genético sob as unhas pode ser coletado por
espátulas. Tratando detalhadamente de cada uma das técnicas: MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo
de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos. In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves;
DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 112/113.
851
Nesse sentido, a coleta por raspagem é “utilizada quando o fluido biológico ou vestígio epitelial estiver
muito impregnado em superfícies altamente absorventes tais como concreto, asfalto e madeira. Devem ser
utilizadas sempre lâminas de bisturi estéreis e uma folha de papel (de preferência pré-dobrada como envelope
primário) para coletar os fragmentos raspados. A coleta é facilitada fixando-se a folha de papel com fita
adesiva. Nas coletas por raspagem o substrato sempre será coletado misturado à amostra, por isso é
necessário coletar uma amostra-controle” (MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN,
Gustavo Lucena. Vestígios biológicos. In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO,
Clayton Tadeu Mota. Locais de crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 112).
228
inibição da reação de PCR, seja possível tentar identificar a substância que está impedindo
a amplificação do DNA e extraí-la da amostra examinada.852
852
De acordo com Michelin, Freitas e Kortmann, as amostras-controle “são amostras do suporte do vestígio
(terra, tecido, parede), coletadas em uma região onde não é observado o material biológico. Serve para que
o laboratório possa identificar um possível inibdor em caso de falha da reação de amplificação e trabalhe da
melhor forma para removê-lo. É importante que a amostra-controle seja coletada e acondicionada
separadamente da amostra questionada e seja claramente identificada como tal” (MICHELIN, Kátia;
FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos. In: VELHO, Jesus
Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de crime. Campinas:
Millennium, 2013. p. 108).
853
Este é outro ponto considerado crítico pelo Procedimento operacional padrão (POP) nº 2.2. de Genética
Forense do Ministério da Justiça, de 2013 que determina, em seu item 5, que “sempre que possível, os vestígios
úmidos devem ser secos à temperatura ambiente, protegidos da luz solar e encaminhados à unidade de
custódia ou de exames. Quando não for possível sua secagem, devem ser encaminhados em um prazo inferior
a 48 horas ou congelados antes do envio” (Procedimento operacional padrão: perícia criminal. Secretaria
Nacional de Segurança Pública. Brasília: Ministério da Justiça, 2013. Disponível em:
<http://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica/senasp-1/pops-de-per_cia-vers_o-para-
internet.pdf>. Acesso em: 23 dez. 2019). No mesmo sentido é a Resolução SSP nº 194/99, nas disposições
preliminares, item VII, do ANEXO.
854
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 108. No mesmo sentido, esclarece Bonaccorso que “[é] fundamental
que os vestígios úmidos sejam secos à temperatura ambiente, protegidos da luz solar e do calor [...] As
amostras de sangue líquido devem ser conservadas e transportadas sob refrigeração a 4 º C. Tecidos moles e
órgãos devem ser congelados [...]” (BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na
elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São
Paulo, 2005. p. 47. Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
855
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 108.
229
usar plástico sempre que possível”856. Isso porque “materiais de embalagem em papel ou
papelão são os mais apropriados, pois não abafam o vestígio e permitem que os fluidos
biológicos sequem”857. Contudo, nos casos em que forem coletadas grandes quantidades de
fluido ou objeto umidificado por material biológico (camisa úmida de sangue, por
exemplo858), “podem ser usados recipientes plásticos ou outros materiais que resistam ao
congelamento sem vazar ou quebrar”859.
Por conta do risco de contaminação química, verificada, por exemplo, na
“conservação em formol, fixadores ou corantes usados com outros fins”860, deve-se evitar o
uso dessas substâncias nas embalagens de acondicinamento. Quando houver necessidade,
contudo, é necessário o registro do produto químico utilizado. No caso de sangue líquido,
por exemplo, o conhecimento acerca do anticoagulante é importante, uma vez que “o DNA
pode ser afetado pelo uso de heparina, devendo-se evitar a sua utilização, preferindo-se o
EDTA”861.
Para evitar a degradação causada pela luz do sol são recomendadas embalagens
opacas, preferencialmente “envelopes próprios para embalagem de vestígios biológicos,
com revestimento aluminizado para proteção da luz e agentes dessecantes em seu
interior”862.
856
JOBIM, Luiz Fernando et al. Identificação humana pelo DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr
da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 262.
857
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 109.
858
Nesses casos, assim que possível, é recomendável a troca por uma embalagem de papel, conforme Jobim et
al.: “[r]oupas e outros objetos podem conter indícios úmidos, geralmente manchas de sangue ou esperma.
Nesses casos, devemos acondicionar as amostras em uma bolsa de plástico para o transporte até o laboratório
onde se deixará secar sobre uma superfície limpa. Após, será possível acondicionar em envelope de papel”
(JOBIM, Luiz Fernando et al. Amostras biológicas para DNA forense. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA,
Moacyr da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 265/266).
859
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 109. No mesmo sentido, é a determinação da Resolução SSP nº 194/99,
em seu item VI das disposições preliminares do ANEXO.
860
JOBIM, Luiz Fernando et al. Identificação humana pelo DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr
da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 262.
861
JOBIM, Luiz Fernando et al. Identificação humana pelo DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr
da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 262.
862
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 110.
230
863
JOBIM, Luiz Fernando et al. Identificação humana pelo DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr
da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 263. Esta é uma determinação
expressa da Resolução SSP nº 194/99, nas disposições preliminares do ANEXO, que diz: “V. Qualquer
material que se destine à análise forense de DNA deverá, desde sua coleta até seu encaminhamento final, ser
acondicionado isoladamente e devidamente identificado, através de relatório preceituado no item anterior”.
No mesmo sentido, determina o Procedimento operacional padrão (POP) nº 2.2. de Genética Forense do
Ministério da Justiça, de 2013, em seu item 5 (Procedimento operacional padrão: perícia criminal. Secretaria
Nacional de Segurança Pública. Brasília: Ministério da Justiça, 2013. Disponível em:
<http://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica/senasp-1/pops-de-per_cia-vers_o-para-
internet.pdf>. Acesso em: 23 dez. 2019).
864
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 110.
865
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 110.
866
Conforme Jobim et al., é recomendável manter “informações de inspeção ocular; documentação adicional
sobre a localização das amostras ou indícios biológicos, desenhos, filmes, fotografias” (JOBIM, Luiz
Fernando et al. Identificação humana pelo DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da; COSTA,
Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 363).
231
colheita das amostras, que deverá certificar que nada de anormal aconteceu ou relatar a
anormalidade.867
Além disso, “cada tubo de sangue ou swab bucal deve ser identificado no
momento de sua colheita, devendo ser mostrado para as partes e receber um visto da pessoa
que se submeteu à flebotomia. Dessa maneira, fica afastada a hipótese de ter havido trocas
de sangue durante a colheita, pois as próprias partes estão atentas e rubricam os tubos”868.
Entretanto, nos casos de localização e coleta de amostra referência existente em
item descartado pelo investigado, o agente deve adotar cuidados extras para registrar
informações suficientes que permitam relacionar o material coletado ao seu provedor.
Conforme explica Armengot Vilaplana, nestas situações é preciso “reforçar as garantias
para acreditar que a amostra voluntariamente abandonada pelo suspeito pertencia ao
mesmo (testemunho da polícia; possíveis câmeras de vídeo)”869.
867
JOBIM, Luiz Fernando et al. Identificação humana pelo DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr
da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 269.
868
JOBIM, Luiz Fernando et al. Identificação humana pelo DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr
da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 269/270.
869
VILAPLANA, Alicia Armengot. La obtención de muestras biológicas para la determinación del ADN. La
situación legal y jurisprudencial tras las últimas reformas. La ley penal: revista de derecho penal, procesal y
penitenciario, Madrid, v. 14, n. 128, 32 set./out. 2017. p. 7, tradução nossa.
870
Segundo Michelin, Freitas e Kortmann, “[a] refrigeração temporária de vestígios pode ser feita em caixa
térmica com unidades de gelo reciclável. Se necessário o transporte desse material por períodos mais longos
poderá ser feito utilizando gelo seco” (MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN,
Gustavo Lucena. Vestígios biológicos. In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO,
Clayton Tadeu Mota. Locais de crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 121).
871
JOBIM, Luiz Fernando et al. Identificação humana pelo DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr
da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 270.
232
Assim como é exigível para qualquer fonte de prova, o material biológico deve
ser recebido “de acordo com procedimentos de custódia, anotando-se o nome da pessoa que
recebeu as amostras, tipo de transporte, integridade da caixa, indicar um número de
referência da amostra, fotografar caso necessário”872.
Com relação ao armazenamento, é preciso diferenciar os procedimentos
necessários para os materiais biológicos secos – incluindo aqueles que estão inicialmente
úmidos, mas que devem ser deixados em ambiente livre de contaminação para secagem antes
do armazenamento873 – e aqueles que não podem passar pelo procedimento de secagem sem
perder o conteúdo necessário para o exame.
Assim, quando “completamente secos, os itens deverão ser acondicionados em
embalagens de papel e mantidos em temperatura ambiente, que idealmente não deve exceder
24°C e 60% de umidade relativa do ar”874, sendo que, “em condições em que a temperatura
e umidade ambientes excedem constantemente esses limites, recomenda-se o uso de
condicionadores de ar”875.
Por outro lado, na impossibilidade de serem secos, “tais como tecidos orgânicos,
ossos e dentes com tecidos aderidos, vômito e fluidos absorvidos no solo e líquidos diluídos
tais como urina ou sangue diluído em água, entre outros”876, os materiais biológicos devem
ser “congelados em temperatura igual ou inferior a 20°C negativos assim que possível”877.
Por fim, o armazenamento de pelo para identificação por DNA é um caso
especial, pois, mesmo sendo um material seco, por conter pouco DNA, “recomenda-se que
872
JOBIM, Luiz Fernando et al. Identificação humana pelo DNA. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr
da; COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias
odontolegais; identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 270.
873
Nesse sentido, sustentam Michelin, Freitas e Kortmann: “[s]uportes contendo fluidos biológicos úmidos
precisam estar secos antes do armazenamento. Importante: a secagem de suportes contendo vestígios
biológicos deve ser feita em ambiente protegido da luz, de contaminações e do calor excessivo. Qualquer fonte
de calor como fornos e secadores de cabelo não são instrumentos próprios para a secagem de vestígios
biológicos” (MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios
biológicos. In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais
de crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 120).
874
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 120.
875
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 120.
876
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 121.
877
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 121.
233
o armazenamento de médio e longo prazo seja feito sob congelamento em temperatura igual
ou inferior a 20°C negativos em embalagem plástica”878.
878
MICHELIN, Kátia; FREITAS, Jorge Marcelo de; KORTMANN, Gustavo Lucena. Vestígios biológicos.
In: VELHO, Jesus Antonio; COSTA, Karina Alves; DAMASCENO, Clayton Tadeu Mota. Locais de
crime. Campinas: Millennium, 2013. p. 120.
879
De acordo com Carvalho, “[é] recomendável que as áreas de trabalho e que os equipamentos sejam
irradiados com ultravioleta durante 4 horas, diariamente. Além disso, os tubos de reação, ponteiras e pipetas
devem ser submetidos à radiação ultravioleta pelo período mínimo de 1 hora antes do uso” (CARVALHO,
Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia e revelação de
impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium, 2012. p. 303).
880
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 303.
881
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 303. Para um esquema ilustrativo desta separação em um laboratório, ver: BONARCCORSO, Norma
Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de
Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 107. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
882
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 303.
883
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 303.
234
Destaca-se, ainda, que além das pesssoas e dos instrumentos necessários para o
exame, é possível que os reagentes utilizados ao longo do procedimento PCR contenham
DNA humano capaz de contaminar a amostra a ser examinada. Por isso, “no momento da
extração, sempre deve ser feito um controle negativo (sem amostra biológica), para
assegurar que os reagentes utilizados estão livres de contaminantes”884.
Para certificar-se de que o laboratódio mantém “rígidos e idôneos controles de
qualidade (CQ)”885, é necessário a realização de um controle externo de “garantia de
qualidade (GQ)”, isto é, “o monitoramento e documentação do desempenho laboratorial
através de testes de qualidade e auditorias regulares”886.
Por fim, aplicando-se a todas as etapas do caminho da fonte de prova para
identificação por DNA, o registro da identidade de cada um que teve contato com o material
genético é essencial para eventual detecção da origem da contaminação da amostra de DNA.
De acordo com Carvalho, referindo-se à reação PCR, “[a] alta sensibilidade da técnica pode
fazer com que quantidades mínimas de DNA exógeno sejam amplificadas a um nível
detectável”887, sendo que, em havendo contaminação, “todo o pessoal do laboratório
envolvido na manipulação e processamento das amostras deve ter o seu perfil genético
determinado, além daqueles envolvidos na coleta dos vestígios no local de crime”888, para a
detecção da fonte.
884
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 303.
885
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 101. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
886
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 101. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
887
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 303.
888
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 303/304.
235
889
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 81. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
890
National DNA Index System (NDIS) Operational Procedures Manual. FBI Laboratory. Version 8, 1 maio
2019. p. 81. Disponível em: <https://www.fbi.gov/file-repository/ndis-operational-procedures-
manual.pdf/view>. Acesso em: 27 nov. 2019.
236
Nos casos em que a amostra de DNA a ser examinada contém material genético
de um só indivíduo e está disponível em grande quantidade, as técnicas de identificação se
provaram meios confiáveis de análise.891
Contudo, a identificação por DNA enfrenta problemas quando uma destas
condições não é preenchida, o que, particularmente para as perícias penais, tornou-se
relevante, na medida em que, como sustenta Bieber, “cada vez mais, os laboratórios
criminais estão sendo requisitados para analisarem DNA de baixa qualidade, pouca
quantidade e contendo misturas complexas”892.
Como demontrado anteriormente (item 4.1.2.2, supra), a técnica de PCR
representou importante avanço tecnológico ao permitir a realização de exames de
identificação em amostras pequenas de DNA, tornando-se a técnica mais divulgada e
utilizada nos laboratórios forenses.893
891
Nesse sentido, Thompson sustenta que os cálculos que apontam para baixíssimas probabilidades de
repetição aleatória de um perfil genético “se aplicam apenas para os casos ideais, nos quais os laboratórios
encontram combinações entre duas amostras de DNA completas e não misturadas” (THOMPSON, Willian C.
Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon; GRUBER, Jeremy (org.). Genetic
explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 241, tradução nossa. Disponível em:
<https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em: 11 dez. 2019). Também Dror e
Hampikian, ao tratarem da subjetividade e enviesamento nas análises dos resultados de identificação por DNA,
afirmam: “[é] preciso enfatizar, contudo, que estes efeitos foram observados na análise de DNA misturado.
Pesquisas anteriores feitas em identificação forense indicam que a influência do contexto é mais forte quando
a amostra é ambígua, complexa e a ‘hard call’. Quando os dados são claros e as decisões são simples, a
influência do contexto é diminuída.” (DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic
DNA mixture interpretation. Science and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 205, tradução nossa.
Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019).
892
BIEBER, Frederick R. et al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for evaluation,
interpretation, and statistical calculations using the combined probability of inclusion. BMC Genetics. 2016. p.
2, tradução nossa. Disponível em:
<https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso
em: 27 nov. 2019. No mesmo sentido, Bonaccorso esclarece que, diferentemente das amostras-referência, que
normalmente são colhidas em boa quantidade e sem contaminação, as amostras questionadas não. Assim, “nas
amostras questionadas, uma avaliação preliminar é vital para determinar o melhor método de processamento,
porém a automação é mais dificultosa porque a qualidade e a quantidade de DNA são variáveis e também
porque misturas são frequentemente encontradas, bem como perfis anômalos provenientes de mutações podem
também aparecer, complicando a interpretação [...]” (BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame
de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2005. p. 80. Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
893
Nesse sentido, explica Pinheiro: “[a] PRC (polymerase Chain Reaction) é a técnica mais divulgada e
utilizada na grande maioria dos laboratórios que efetuam este tipo de análise, tendo possibilitado a obtenção
de grandes êxitos na resolução de casos forenses. [...]. Por se tratar de uma técnica extremamente sensível é,
teoricamente, possível estudar o perfil genético de um pelo ou de qualquer outro tipo de amostra que tenha
uma quantidade exígua de DNA” (PINHEIRO, M. Fátima. Contribuição do estudo do DNA na resolução de
casos criminais. Revista do Ministério Público de Lisboa, Lisboa, v. 19, n. 74, p. 145-153., abr./jun. 1998. p.
151).
237
894
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 300.
895
Picograma (pg) é unidade de massa. 100pg corresponde a 10-10g.
896
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 299. No mesmo sentido Bieber et al.: “a comunidade forense está utilizando métodos que aumentam
a sensibilidade de detecção por melhorias na técnica de extração do DNA, dos kits multiplex e pelo aumento
do número de ciclos de PCR (ou outras manipulações) que permitem a análise de amostras complexas e
desafiadoras” (BIEBER, Frederick R. et al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for
evaluation, interpretation, and statistical calculations using the combined probability of inclusion. BMC
Genetics. 2016. p. 2, tradução nossa. Disponível em:
<https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso
em: 27 nov. 2019).
897
BUCKLETON, John S.; BRIGHT, Jo-Anne; TAYLOR, Duncan. Forensic DNA evidence interpretation. 2ª
ed. Boca Raton: CRC Press, 2016. p. 198, tradução nossa.
898
Conforme explica Carvalho: “[o] método mais comum de aumentar a sensibilidade da PCR na amplificação
de DNA traço é o aumento do número de ciclos da reação, de 28 (que é o padrão) para 34 ciclos. Esse processo
é chamado de low copy number ou LCN e foi positivamente demonstrado por vários pesquisadores. Gill et al.
(2000) demonstraram, pela primeira vez, que é possível obter perfis genéticos completos por meio de LCN
(aumentando o número de ciclos para 34), a partir de apenas 5 a 10 células (30 a 60 pg). Kloosterman e
Kersbergen (2003), além de usarem 34 ciclos, adicionaram mais aq polimerase à reação, após o 28º ciclo”
(CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia e
revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 299).
238
alelo e as suas repetições naquele fragmento de STR. Como consequência dessas alterações,
o resultado final do exame pode não detectar um alelo existente em determinado STR, bem
como errar na determinação do tamanho das repetições de um alelo, ou, ainda, indicar a
presença de alelos que não existem.899
O aumento dos efeitos estocásticos na amplificação das amostras com baixa
quantidade de DNA pode ser demonstrado por meio da submissão de duas amostras, de uma
mesma pessoa conhecida, simultaneamente aos procedimentos de PCR e LCN. Com a
realização dos dois exames em parelelo, aplicando-se o procedimento mais confiável à
primeira amostra para que sirva de base de comparação, é possível identificar eventuais
diferenças que apareçam no resultado do segundo exame, feito pela técnica LCN, que, pela
unicidade da fonte, não deveriam existir.900
A partir desses estudos comparativos, de acordo com Gill, Guiness e Iveson,
concluiu-se que os efeitos estocáticos “tipicamente observados nos baixos níveis de DNA,
são desbalanço heterozigótico, allele drop-out e allele drop-in”901.
O efeito dropout corresponde à falha no resultado do exame que deixou de
reconhecer os existentes alelos em determinado STR (locus dropout)902 ou que reconheceu
apenas um alelo dos dois existentes numa amostra heterozigótica, dando aparência de
homozigose (allelic dropout).903 Conforme explica Stevens, o allelic dropout “é um
899
Nesse sentido, explica Bieber et.al.: [p]equenas quantidades de DNA vão apresentar randômicos
(estocásticos) efeitos durante a amplificação do DNA no resultado do teste STR que podem levar à falha na
detecção de alguns ou todos os alelos do verdadeiro doador (i.e., allele drop-out). (BIEBER, Frederick R. et
al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for evaluation, interpretation, and statistical
calculations using the combined probability of inclusion. BMC Genetics. 2016. p. 2, tradução nossa. Disponível
em: <https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>.
Acesso em: 27 nov. 2019.
900
De acordo com Gill, Guiness e Iveson, a ciência forense identifica os efeitos estocásticos “comparando o
perfil questionado com o perfil do indivíduo conhecido” (GILL, Peter; GUINESS, June; IVESON, Simon. The
interpretation of DNA evidence (including low-template DNA). FSG – 202. 2012. p. 10, tradução nossa.
Disponível em: <https://pdfs.semanticscholar.org/a73b/61f0d520dd9c85819ecef2252a906c99ad53.pdf>.
Acesso em: 27 nov. 2019).
901
GILL, Peter; GUINESS, June; IVESON, Simon. The interpretation of DNA evidence (including low-
template DNA). FSG – 202. 2012. p. 12, tradução nossa. Disponível em:
<https://pdfs.semanticscholar.org/a73b/61f0d520dd9c85819ecef2252a906c99ad53.pdf>. Acesso em: 27 nov.
2019.
902
De acordo com Buckleton, Bright e Taylor, o “locus dropout descreve o evento quando nenhum alelo é
observado em um locus” (BUCKLETON, John S.; BRIGHT, Jo-Anne; TAYLOR, Duncan. Forensic DNA
evidence interpretation. 2ª ed. Boca Raton: CRC Press, 2016. p. 199, tradução nossa).
903
Como explica Stevens et al., “para um organismo diploide, a falha na amplificação de um alelo pode
resultar em alelo dropout (ADO), causando a aparência de homozigose” (STEVENS, Aaron J. et al. Allelic
Dropout During Polymerase Chain Reaction due to G-Quadruplex Structures and DNA Methylation Is
Widespread at Imprinted Human Loci. G3 (Bethesda). Vol. 7, mar. 2017. p. 1019, tradução nossa. Disponível
em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5345703/>. Acesso em: 27 nov. 2019). Da mesma
forma, para Carvalho, classifica-se como “allele drop-out quando ocorre a amplificação preferencial de um
dos alelos em um ou mais loci heterozigoto” (CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais.
239
problema insidioso de difícil reconhecimento porque o PCR aparenta correto, mas metade
da informação genética está faltanto”904. Ressalta-se que este problema se intensifica no
caso do locus dropout, quando se perde toda a informação genética daquele fragmento
STR.905
Conforme explica Carvalho, o efeito dropout “é uma característica que se torna
mais frequente à medida que a quantidade de DNA molde diminui”906. Assim, quanto mais
ciclos de PCR se faz, maiores são as chances de o resultado ser alterado por esse efeito
estocástico, já que a cada nova ampliação surgem mais DNA cópia, que diluem a quantidade
inalterável de DNA molde da amostra original.
Outro conhecido efeito estocástico é denominado de desbalanço das bandas em
fragmento STR heterozigótico, que acontece quando o resultado do exame indica que os
alelos daquele trecho de DNA selecionado possuem tamanhos diferentes, quando deveriam
ser idênticos.907 Conforme explica Leclair et al., o “desbalanço pode ser causado pelo efeito
estocástico quando se amplia pouco DNA ou DNA degradado ou pela inabilidade de
remover inibidores de PCR durante a extração de DNA”908.
Por fim, a técnica LCN pode causar o denominado allelic drop-in, quando os
resíduos dos produtos da reação de amplificação, chamados de stutters,909 aparecem no
resultado do exame, dando a falsa impressão de haver um alelo em determinado STR,
quando não há.910 Apesar de a aparição dos stutters ser comum na técnica PCR, estes
“normalmente aparecem como picos de até 15% da altura do pico que lhe originou e
posicionan-se 4 nucleotídeos antes deste”911. Entretanto, o aumento do ciclo de amplificação
pode causar o aumento da produção de stutters, que serão representados no resultado numa
porcentagem maior do que a esperada em comparação ao risco do verdadeiro alelo, podendo
levar o intérprete a ler equivocadamente o resultado por acreditar erroneamente que o stutters
é um outro alelo.
A ocorrência de allelic drop-in poderá influenciar negativamente no resultado,
por exempo, de um fragmento de DNA homozigótico, pois a interpretação de um stutters
como alelo levará à conclusão falsa de uma amostra heterozigótica; outra situação também
problemática é efeito do drop-in num fragmento heterozigótico, já que, nesse caso, a leitura
do stutters como um terceiro alelo induzirá à equivocada conclusão de que a amostra está
contaminada por outro DNA,912 já que ninguém tem três alelos num mesmo locus.913
Esses mesmos problemas decorrentes dos efeitos estocáticos são agravados na
análise de amostra contendo mistura de DNA, isto é, material genético de mais de uma
909
Como explicam Buckleton, Bright e Taylor, os “stutters surgem durante o PCR e produzem pequenos picos,
normalmente uma repetição em menor tamanho do que o pico do alelo correspondente” (BUCKLETON, John
S.; BRIGHT, Jo-Anne; TAYLOR, Duncan. Forensic DNA evidence interpretation. 2ª ed. Boca Raton: CRC
Press, 2016. p. 199, tradução nossa).
910
De acordo com Leclair et al., “os picos de stutter são normalmente picos menores de uma unidade, menores
que os picos dos alelos a que são correspondentes e causados pela derrapagem de produtos durante a
amplificação” (BENOÎT, Leclair et al. Systematic analysis of stutter percentages and allele peak height and
peak area ratios at heterozygous STR loci for forensic casework and database samples. Journal of Forensic
Sciences. Vol. 49, set. 2004. p. 1, tradução nossa. Disponível em:
<https://projects.nfstc.org/workshops/resources/literature/Systematic%20Analysis%20of%20Stutter%20Perc
entages%20and.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019).
911
CARVALHO, Bianca de Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia
e revelação de impressões digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium,
2012. p. 300.
912
Nesse sentido, Carvalho: “[o]s stutters são normalmente gerados pela derrapagem da taq polimerase
durante o processo de amplificação do DNA. Assim, a dificuldade na identificação dos stutters pode complicar
a definição do número de contribuintes para o material genético analisado” (CARVALHO, Bianca de
Almeida. DNA e impressões digitais. In: TOCCHETTO, Domingos. Datiloscopia e revelação de impressões
digitais. Coordenação de Adriano Roberto da Luz FIGINI. Campinas: Millennium, 2012. p. 300).
913
Com o explica Bieber et al., “[d]epois da análise STR, a presença de três ou mais picos de alelos em dois
ou mais loci genéticos [...] indica que múltiplos doadores contribuíram para aquela amostra de DNA testada”
(BIEBER, Frederick R. et al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for evaluation,
interpretation, and statistical calculations using the combined probability of inclusion. BMC Genetics. 2016. p.
2, tradução nossa. Disponível em:
<https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso
em: 27 nov. 2019.
241
pessoa.914 Esse ponto é particularmente relevante para a identificação penal, pois, conforme
Leclair et al., a “evidência biológica coletada na cena do crime normalmente consiste numa
mistura de substâncias corporais originadas de mais de um indivíduo, de modo que perfis
de STR misturados são normalmente encontrados nas investigações criminais”915.
Numa análise de uma amostra contendo, por exemplo, fragmentos de DNA de
duas pessoas misturados, espera-se que para cada fragmento selecionado sejam encontrados
de 2 a 4 alelos, a depender dos indivíduos serem homozigóticos ou heterozigóticos.
Tomando-se como exemplo o efeito drop-in, uma amostra com dois DNAs homozigóticos
deveria apresentar o total de 2 alelos, um para cada indivíduo. Entretantanto, os picos
causados por stutters podem sugerir a existência de mais um ou até dois outros falsos alelos,
levando à conclusão de que, ao invés de os DNAs pertecerem a dois indivíduos
homozigóticos, são de duas pessoas heterozigíticas.
Além disso, numa amostra misturada, normalmente há maior proporção do
material genético de uma pessoa do que de outra. Numa situação como essa, a diferença de
proporção refletirá no tamanho dos picos indicadores da presença de alelos naquele
fragmento STR analisado, sendo que o material genético em maior quantidade terá picos
maiores. Nesse cenário, “o alelo do perfil menor pode potencialmente não ser detectado se
estiver co-localizado no cromatograma com o pico de stutter correspondente ao alelo do
perfil maior”916.
Da mesma forma, o desbalanço heterozigótico também afeta negativamente a
análise de amostra com DNA misturados,917 pois a menor altura de um pico desbalanceado
914
Conforme explica Bieber et. al., “[a] mistura de DNA se refere à amostra biológica originada de dois ou
mais doadores” (BIEBER, Frederick R. et al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for
evaluation, interpretation, and statistical calculations using the combined probability of inclusion. BMC
Genetics. 2016. p. 1, tradução nossa. Disponível em:
<https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso
em: 27 nov. 2019).
915
BENOÎT, Leclair et al. Systematic analysis of stutter percentages and allele peak height and peak area ratios
at heterozygous STR loci for forensic casework and database samples. Journal of Forensic Sciences. Vol. 49,
set. 2004. p. 1, tradução nossa. Disponível em:
<https://projects.nfstc.org/workshops/resources/literature/Systematic%20Analysis%20of%20Stutter%20Perc
entages%20and.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
916
BENOÎT, Leclair et al. Systematic analysis of stutter percentages and allele peak height and peak area ratios
at heterozygous STR loci for forensic casework and database samples. Journal of Forensic Sciences. Vol. 49,
set. 2004. p. 1, tradução nossa. Disponível em:
<https://projects.nfstc.org/workshops/resources/literature/Systematic%20Analysis%20of%20Stutter%20Perc
entages%20and.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
917
Cf. BENOÎT, Leclair et al. Systematic analysis of stutter percentages and allele peak height and peak area
ratios at heterozygous STR loci for forensic casework and database samples. Journal of Forensic Sciences.
Vol. 49, set. 2004. p. 1. Disponível em:
242
pode levar à equivocada conclusão de que esse alelo pertence ao outro indivíduo também
originador do material genético coletado.
A comunidade científica tem buscado desenvolver novos meios para analisar
amostras complexas com mais de dois doadores deconhecidos, como é o caso do método
CPI (combined probability of inclusion).918 Contudo, “nos Estados Unidos, os protocolos de
interpretação de misturas de DNA utilizando o método CPI tem sido criticados quando
aplicados para as misturas foreses, por não ser adequado para esta finalidade”919.
Ademais, ainda que fosse admissível para uso forense, o desenvolvimento dessa
nova técnica de análise do resultado não afastou as consequências negativas que os efeitos
estocásticos podem causar no resultado. Tanto é assim que, com relação ao método CPI de
análise, adverte Bieber et al.: “se o perfil de DNA do crime é de baixo nível, a possibilidade
do alelo drop-out deve ser considerada. Se o alelo drop-out é uma explicação razoável para
o resultado do DNA analisado, então a estatística do método CPI não pode ser nos loci em
que este fenômeno pode ter ocorrido”920.
Como se vê, portanto, as técnicas de identificação por DNA apresentam
importantes problemas nos casos de amostras complexas, que influem diretamente no
conteúdo do elemento de prova produzido.921 Não por outra razão, Stevens et al. adverte
<https://projects.nfstc.org/workshops/resources/literature/Systematic%20Analysis%20of%20Stutter%20Perc
entages%20and.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
918
De acordo com Bieber et al., “[o] CPI se refere à proporção de uma dada população que deve ser esperada
para ser incluída como potencial contribuidora para a mistura de DNA observada” (BIEBER, Frederick R. et
al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for evaluation, interpretation, and statistical
calculations using the combined probability of inclusion. BMC Genetics. 2016. p. 2, tradução nossa. Disponível
em: <https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>.
Acesso em: 27 nov. 2019).
919
BIEBER, Frederick R. et al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for evaluation,
interpretation, and statistical calculations using the combined probability of inclusion. BMC Genetics. 2016. p.
1, tradução nossa. Disponível em:
<https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso
em: 27 nov. 2019.
920
BIEBER, Frederick R. et al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for evaluation,
interpretation, and statistical calculations using the combined probability of inclusion. BMC Genetics. 2016. p.
1, tradução nossa. Disponível em:
<https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso
em: 27 nov. 2019.
921
Não por outra razão Bonaccorso destaca que, ao elaborar o laudo de exame de DNA, no tópico dos exames
“devem ser indicadas as metodologias empregadas, com as respectivas referências bibliográficas, das
seguintes etapas do exame: a. extração de DNA, indicando as diferentes metodologias empregadas de acordo
com o tipo de material biológico analisado; b. quantificação de DNA, indicando a metodologia e aparelhagem
utilizadas; c. amplificação das regiões polimórficas de DNA, citando os reagentes empregados, seus
fabricantes e data de validade; o tipo de termociclador e o programa empregado na amplificação; d. detecção
dos alelos dos loci amplificados, explicando resumidamente o ensaio eletroforético empregado e a forma
aplicada para evidenciar alelos, citando o equipamento utilizado para leitura dos perfis genéticos”
(BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
243
para o fato de que, “apesar da otimização extensiva e do uso quase onipresente, a PCR ainda
é propensa a falhas em determinadas circunstâncias”922.
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
922
STEVENS, Aaron J. et al. Allelic Dropout During Polymerase Chain Reaction due to G-Quadruplex
Structures and DNA Methylation Is Widespread at Imprinted Human Loci. G3 (Bethesda). Vol. 7, mar. 2017.
p. 1019, tradução nossa. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5345703/>. Acesso
em: 27 nov. 2019.
923
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 247,
tradução nossa. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em:
11 dez. 2019.
924
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 247,
tradução nossa. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em:
11 dez. 2019.
244
925
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 241,
tradução nossa. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em:
11 dez. 2019.
926
Nesse sentido, Thompson apresenta o seguinte estudo: “[a]pesar de este perfil ser encontrado somente em
1 em 250 bilhões de indivíduos não relacionados, a probabilidade de achar este perfil em parentes do doador
é muito maior: 1 em 14 bilhões para um primo de primeiro grau; 1 em 1.4 bilhões para sobrinho, sobrinha,
tio ou tia; 1 em 38 milhões para pais ou filhos e 1 entre 81.000 para irmãos” (THOMPSON, Willian C.
Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon; GRUBER, Jeremy (org.). Genetic
explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 242, tradução nossa. Disponível em:
<https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em: 11 dez. 2019).
927
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 245.
Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em: 11 dez. 2019.
245
pessoa, elegida ao azar, apresentar estas características genéticas é de 11,4 milhões entre
a população espanhola”928.
Da mesma forma, na Inglaterra, em caso que apontava uma frequência
probabilística menor do que a aceita para condenação no exemplo espanhol, o teste de 6 loci
indicou que a probabilidade de haver outra pessoa com a mesma combinação dos perfis
genéticos da cena do crime e do indivíduo reportado pela base de dados de DNA era de 1
em 37 milhões. Contudo, em razão da debilidade física da pessoa indicada pela base de dados
e a dificuldade que teria para, nestas condições, praticar o crime investigado, realizou-se um
novo exame em loci adicionais, que resultou na exclusão da pessoa como a fonte do material
genético encontrada no local do crime, comprovando, assim, que o falso positivo inicial era
uma coincidência derivada do exame feito em perfil parcial.929
Da mesma forma, nos Estados Unidos, a combinação positiva dos perfis da cena
do crime e do banco de dados produzida com 6 loci apontou Steven Myers como o autor do
crime, com uma frequência de repetição genética de 1 para 1,6 milhões, levando-o a prisão
por 7 (sete) meses. Como a fonte de prova obtida no local do crime ainda estava disponível,
foi realizado um novo exame em outros loci, que demonstrou a incompatibilidade entre os
perfis.930
Outrossim, assim como infringe problemas às técnicas utilizadas, a qualidade da
amostra examinada, principalmente quando há mistura de materiais genéticos, é outra
circunstância desconsiderada pelas estatísticas das bases de dados de frequência
populacional que interfere no resultado do exame.
928
ARANGUREN, Arturo Muñoz. La valoración judicial de la prueba de ADN: estadística y verdad procesal:
a propósito de la STS Nº 607/2012, de 9 de julio de 2012. Revista Aranzadi de derecho y proceso
penal, Navarra, n. 30, p. 277-308., jan./abr. 2013. p. 282, tradução nossa.
929
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 244.
Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em: 11 dez. 2019.
930
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 245.
Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em: 11 dez. 2019.
246
931
Na hipótese de uma amostra com dois doadores de DNA, o conhecimento prévio do perfil genético de um
deles facilita a análise, conforme explica Bieber et al., “(misturas) que envolvam somente dois contribuintes e
um deles (ex., no caso de estupro, o material genético da vítima [...]) é sabido, a parte remanescente da mistura
dos perfis de DNA que pode ser inferida como tendo originado da segunda pessoa”, ou seja, “[q]uando o DNA
de um indivíduo conhecido é razoavelmente esperado de estar presente, a contribuição conhecida pode ser
‘extraída’” (BIEBER, Frederick R. et al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for evaluation,
interpretation, and statistical calculations using the combined probability of inclusion. BMC Genetics. 2016. p.
2, tradução nossa. Disponível em:
<https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso
em: 27 nov. 2019).
932
BENOÎT, Leclair et al. Systematic analysis of stutter percentages and allele peak height and peak area ratios
at heterozygous STR loci for forensic casework and database samples. Journal of Forensic Sciences. Vol. 49,
set. 2004. p. 1, tradução nossa. Disponível em:
<https://projects.nfstc.org/workshops/resources/literature/Systematic%20Analysis%20of%20Stutter%20Perc
entages%20and.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2019.
933
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 241,
tradução nossa. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em:
11 dez. 2019.
934
DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic DNA mixture interpretation. Science
and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 203, tradução nossa. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019.
247
935
DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic DNA mixture interpretation. Science
and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 203. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019
936
DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic DNA mixture interpretation. Science
and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 203/204. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019.
937
DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic DNA mixture interpretation. Science
and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 205, tradução nossa. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019.
938
DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic DNA mixture interpretation. Science
and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 205, tradução nossa. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019.
248
da análise excluía o suspeito como um dos contribuintes para a amostra misturada, ao passo
que 4 examinadores entenderam ser o resultado inconclusivo.939
Assim, revelou-se que “os examinadores não foram consistentes nas suas
conclusões, o que, por si só, sugere que há um elemento de subjetividade na interpretação
de DNA”940, pois “se fosse totalmente objetivo, todos os examinadores teriam chegado à
mesma conclusão, especialmente porque todos [...] seguem as mesmas orientações para
interpretação”941.942
Além disso, ao comparar o grande contraste entre a análise feita pelos peritos do
caso e a conclusão diferente e conflitante da vasta maioria dos examinadores independentes
consultados, o estudo sustenta ser possível que o conhecimento sobre o contexto fático do
crime, irrelevante para o exame de DNA, tenha enviesado a conclusão a que chegaram os
experts que trabalharam no caso.943
939
DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic DNA mixture interpretation. Science
and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 205. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019.
940
DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic DNA mixture interpretation. Science
and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 205, tradução nossa. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019.
941
DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic DNA mixture interpretation. Science
and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 205, tradução nossa. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019.
942
Revelando a subjetividade na análise dos resultados, Bonaccorso cita a necessidade do uso de “estratégias
para interpretação”: “[...] a automação é mais dificultosa porque a qualidade e a quantidade de DNA são
variáveis e também porque misturas são frequentemente encontradas [...]” sendo que “[...] para lidar com ela
são necessárias determinadas estratégias para interpretação”. Diferentemente das amostras complexas,
contudo, “a qualidade do DNA oriundo de amostras referência é geralmente boa e isto faz com que a
automação da tipagem e da identificação sejam relativamente simples” (BONARCCORSO, Norma Sueli.
Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação de mestrado (Faculdade de Direito).
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 80. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez.
2019).
943
DROR, Itiel E.; HAMPIKIAN, Greg. Subjectivity and bias in forensic DNA mixture interpretation. Science
and Justice. Vol. 51, Issue 4, dez. 2011. p. 205. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/publication/51849266_Subjectivity_and_bias_in_forensic_DNA_mixture_int
erpretation>. Acesso em: 27 nov. 2019.
249
para a adequada autenticação da prova em juízo, conforme visto no capítulo 3. Não obstante
isso, a impossibilidade de produzir ou valorar uma prova não é consequência automática da
falta de manutenção da cadeia de custódia.
Partindo das premissas já estabelecidas até aqui ao longo do trabalho, faz-se
necessário definir quais quebras da cadeia de custódia da fonte ou elemento de prova na
identificação por DNA poderão resultar na impossibilidade de sua produção ou valoração,
seja pelos critérios lógicos de admissão, seja pela exclusão decorrente da vulneração da
proteção legal a direito fundamental.
pessoas que tiveram contato com o vestígio, número do processo e do lacre, entre outras
informações relevantes para relacionar a amostra com a pessoa (referência) ou com o local
de coleta (questionada).
Salienta-se, ainda, que o procedimento de embalo e etiquetagem deve ser
repetido todas as vezes que alguém tenha contato com a fonte de prova, sendo certo que, nos
manuseios posteriores à coleta, será necessário também documentar, na nova embalagem ou
em relatório anexo, as condições do pacote, o estado da fonte de prova e o número de
referência do lacre da amostra existentes antes da sua abertura (cf. itens 4.2.1.3 e 4.2.1.5,
supra).
Não obstante esta etapa da cadeia de custódia seja comum a todas as fontes de
prova, torna-se particularmente importante para os materias genéticos colhidos com a
finalidade de indentificação, pois, como sustenta Thompson, uma “potencial causa para a
falsa compatibilidade de DNA é o erro de etiquetamento”.944
No que se refere à etiquetagem, a quebra na cadeia de custódia pode decorrer da
(i) falta de informações na etiqueta; (ii) troca de etiqueta entre duas amostras; (iii) troca entre
as amostras em si. Ainda que as três hipóteses possam ser atribuídas a erros dos agentes,
todas podem ser evitadas ou reveladas pela correta manutenção da cadeia de custódia, ao
passo que a falta destes registros impede que as partes e o juiz rastreiem o caminho da fonte
de prova para a sua necessária vinculação com o fato objeto do processo.
A hipótese de falta de informação na etiqueta de identificação será facilmente
resolvida quando a amostra disponibilizada às partes e ao juiz não contiver qualquer
informação que permita relacioná-la ao fato objeto do processo (amostra questionada) ou ao
fonecedor (amostra referência), pois será impossível vincular a fonte de prova com qualquer
alegação de fato que se queira provar.
Destaca-se que a quebra da cadeia de custódia que vulnere o necessário vínculo
entre a fonte de prova e o objeto fático do processo pode ocorrer em qualquer etapa da sua
manutenção. Assim, ainda que num primeiro momento a atiquetagem tenha sido feita
corretamente, a perda da sua restreabilidade em etapas subsequentes, como a de
reembalagem após a abertura, também resultará na sua inadmissibilidade.
944
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 230,
tradução nossa. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em:
11 dez. 2019.
251
945
State of Maine v. Vinsdon D. Mangos. Maine Supreme Judicial Court. Reporter of Decisions. 29 mai. 2009.
Disponível em:
<https://www.courts.maine.gov/opinions_orders/opinions/2008%20documents/08me150ma.pdf>. Acesso em:
25 nov. 2019.
946
State of Maine v. Vinsdon D. Mangos. Maine Supreme Judicial Court. Reporter of Decisions. 29 mai. 2009.
Disponível em:
<https://www.courts.maine.gov/opinions_orders/opinions/2008%20documents/08me150ma.pdf>. Acesso em:
25 nov. 2019.
252
poderá levar à equivocada conclusão de que o DNA encontrado no local A, por exemplo, era
o que estava sob as unhas da vítima, prejudicando a correta reconstrução dos fatos e
potencialmente incriminando falsamente alguém. Outrossim, na hipótese do crime de
estupro, a troca decorrente da falta de informações suficientes na etiquetagem poderá levar
à absolvição de alguém reconhecido pela vítima, mas que o falso negativo demonstrou a
incompatibilidade genética com o agressor.
Ainda acerca da falta de informações na etiquetagem, as amostras coletadas em
material descartado pelo investigado, por constiuir amostra referência, deverão estar
inequivocamente vinculadas a ele. Assim, para que seja admitida como pertinente para o
esclarecimento do fato, o agente público deverá apresentar informações suficientes para
demonstar que aquele item específico foi, de fato, utilizado e descartado por aquela pessoa
a quem se deseja relacionar o material genético.
No que se refere às hipóteses de troca da etiqueta ou da amostra, conforme já
tratado, os vestígios de material genético devem ser trabalhados isoladamente, para evitar
troca ou contaminação. A correta adoção desse procedimento poderá ser facilmente
verificada com a inclusão do dia, hora e local da coleta da amostra ou, no caso de manuseio
posterior, com o registro do dia e hora de abertura e reembalamento. Cada amostra deverá
conter horários diferentes e não sobrepostos, indicando, assim, por meio da cadeia de
custódia, que a identidade de cada uma das amostras foi mantida, já que não havia outra
sendo trabalhada simultaneamente para possibilitar a troca da etiqueta ou da amostra em si.
Apesar da dificuldade de identificação desses erros quando não há manutenção
da cadeia de custódia – o que, aliás, reforça a sua necessidade –, há casos em que, por
circunstânias aleatórias, as falhas foram descobertas, demonstrando a importância de se
manter adequadamente esses registros.
Na investigação de um roubo ocorrido em Las Vegas, as amostras de dois
suspeitos foram trocadas durante a análise comparativa com o DNA encontrado na cena do
crime. Um dos suspeitos “deve ter se envolvido com o roubo – o seu perfil de DNA era
comparível com a amostra da cena do crime. Por causa da troca das amostras, contudo,
este suspeito foi equivocadamente excluído, enquanto o segundo homem foi falsamente
relacionado ao crime”947.
947
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p.
230/231, tradução nossa. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>.
Acesso em: 11 dez. 2019.
253
948
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 231.
Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em: 11 dez. 2019.
949
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 231,
tradução nossa. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em:
11 dez. 2019.
950
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 231.
Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em: 11 dez. 2019.
254
951
Como explica Ladrón Tabuenca, quando não houver “garantia suficiente de que a fonte de prova da qual
se pretende extrair um resultado probatório tenha permanecido inalterada e incólume deste a sua obtenção”,
tampouco será possível “garantir que a perícia realizadas nestes elementos possa ser decisiva e,
consequentemente, admitir a sua eficácia no processo”. Por isso, conclui a autora, nestes casos o resultado da
prova pericial “não pode ser admitido como meio de prova válido” (LADRÓN TABUENCA, Pilar. La cadena
de custodia en el proceso penal español: revisión normativa. In. FIGUEROA NAVARRO, Carmen (Dir.). La
cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015. p. 25/26, tradução nossa).
952
Neste sentido, Mestres Naval e Vives-Rego: “[a] informação conseguida a respeito da identificação de um
suspeito pode também ser útil para inferir circunstâncias adicionais de valor criminalístico. Por exemplo, se
a identificação se faz a partir do sangue ou pele associada à arma do homicídio, pode inferir que a pessoa
esteve em contato com a arma. Outro caso seria quando, ao identificar o sêmen encontrado na vítima, pode-
se inferir que o suspeito teve relação sexual. Entretanto, de um ponto de vista pericial, cremos que a evidência
baseada no DNA deve ser acompanhada de outras evidências adicionais que convençam o juiz ou jurados de
que o portador da informação genética foi quem praticou o crime” (NAVAL, Francesc Mestres; VIVES-
REGO, Josep. La utilización forense de la huella genética (secuencia del ADN o ácido desoxirribonucleico):
aspectos científicos, periciales, procesales, sociales y éticos. La ley penal: revista de derecho penal, procesal y
penitenciario, Madrid, v. 6, n. 61, p. 46-61., jun. 2009. p. 53, tradução nossa).
255
registros da cadeia de custódia não apontarem para esse risco. Neste caso, não sendo possível
individualizar e identificar outro perfil genético, o valor probatório da perícia será zero.
Deste exemplo pode-se extrair o cuidado com que deve ser feita a valoração da
prova nos casos em que a quebra na cadeia de custódia esconder informações importantes
sobre a preservação da integralidade da fonte de prova, pois, nestes casos, serão maiores os
riscos de o resultado apresentado como elemento de prova não refletir aquilo que existia no
local do crime.953
Assim, na hipótese acima descrita em que houve quebra da cadeia de custódia e
o resultado do exame apontou o perfil genético de pessoa que convivia com a vítima no local
dos fatos, não obstante fosse impossível antecipar esse resultado e excluir desde logo o
potencial de influenciar no julgamento dos fatos, é certo que o peso a ser atribuído a esta
prova deverá ser baixo, sendo insuficiente para isoladamente suportar uma condenação.
953
Após reconhecer que nos “chamados sistemas de civil law, houve uma profunda degeneração do livre
convencimento”, que “se transformou, acriticamente, em um método discricionário de valoração da prova”,
Badaró sustenta que, “[m]esmo com tais riscos”, o problema deve “ser resolvido, com redobrado cuidado e
muito maior esforço justificativo, no momento da valoração” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A
cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In: SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.).
Temas atuais da investigação preliminar no processo penal. Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 535)
954
BONACCORSO, Norma Sueli. Elaboração de laudos e relatórios de análises de exames DNA realizados
pelo Instituto de Criminalística de São Paulo. Arquivos da Polícia Civil: revista tecno-científica, São Paulo, n.
46, p. 59-80., 2001. p. 69, nota de rodapé 20.
955
ARANGUREN, Arturo Muñoz. La valoración judicial de la prueba de ADN: estadística y verdad procesal:
a propósito de la STS Nº 607/2012, de 9 de julio de 2012. Revista Aranzadi de derecho y proceso
penal, Navarra, n. 30, p. 277-308, jan./abr. 2013. p. 284, tradução nossa.
257
corretamente a informação. Não por outra razão, salienta Muñoz Aranguren, “a comunidade
científica tem advertido incesantemente sobre o perigo de incorrer neste tipo de erro nos
processos penais”956.
Um exemplo do uso equivocado da estatística em processo penal aconteceu no
caso R. v. Sally Clark, no qual uma mãe estava sendo acusada de matar os seus dois filhos
recém-nascidos por asfixia. Na falta de provas contra a mãe, a acusação ouviu como perito
um renomado pediatra que, “de maneira enfática, afirmou durante o julgamento que a
probabilidade de uma morte súbita de dois bebês – por causas naturais –, em elas sendo de
uma mesma família, dar-se-ia, estatisticamente, 1 vez em 73 milhões”957. Por conta disso, os
jurados a condenaram à prisão perpétua.
Contudo, a estatística apresentada pelo médico-perito considerava a
probabilidade de dois eventos independentes acontecerem, sem levar em conta que “quase
certamente no caso de morte súbita de bebês influem fatores genéticos ou ambientais”958.
Além disso, apesar de esse dado não ter sido apresentado aos jurados, “estatisticamente era
muito mais improvável que uma mãe houvera assassinado os seus dois filhos, do que a causa
de falecimento de ambos fora natural”959, para ser exato, 17 vezes menos provável.
Somente com o surgimento de novas provas anos depois, demonstrando que as
mortes dos bebês se deram por causas naturais, conseguiu-se a revisão da condenação, para
absolver Sally Clark, oportunidade em que a Corte de Apelação para Inglaterra e Gales
expressamente referiu-se à influência negativa da estatística apresentada pelo perito aos
jurados.960
Enquanto o equivocado uso da estatística no caso R. v. Sally Clark pode ser
atribuído à ação individual de um médico-perito, os exames de identificação por DNA para
fins criminais estarão sempre suscetíveis aos dados estatísticos utilizados, já que, em
956
ARANGUREN, Arturo Muñoz. La valoración judicial de la prueba de ADN: estadística y verdad procesal:
a propósito de la STS Nº 607/2012, de 9 de julio de 2012. Revista Aranzadi de derecho y proceso
penal, Navarra, n. 30, p. 277-308., jan./abr. 2013. p.284, tradução nossa.
957
ARANGUREN, Arturo Muñoz. La valoración judicial de la prueba de ADN: estadística y verdad procesal:
a propósito de la STS Nº 607/2012, de 9 de julio de 2012. Revista Aranzadi de derecho y proceso
penal, Navarra, n. 30, p. 277-308., jan./abr. 2013. p. 284, tradução nossa.
958
ARANGUREN, Arturo Muñoz. La valoración judicial de la prueba de ADN: estadística y verdad procesal:
a propósito de la STS Nº 607/2012, de 9 de julio de 2012. Revista Aranzadi de derecho y proceso
penal, Navarra, n. 30, p. 277-308., jan./abr. 2013. p. 286, tradução nossa.
959
ARANGUREN, Arturo Muñoz. La valoración judicial de la prueba de ADN: estadística y verdad procesal:
a propósito de la STS Nº 607/2012, de 9 de julio de 2012. Revista Aranzadi de derecho y proceso
penal, Navarra, n. 30, p. 277-308., jan./abr. 2013. p. 286, tradução nossa.
960
ARANGUREN, Arturo Muñoz. La valoración judicial de la prueba de ADN: estadística y verdad procesal:
a propósito de la STS Nº 607/2012, de 9 de julio de 2012. Revista Aranzadi de derecho y proceso
penal, Navarra, n. 30, p. 277-308., jan./abr. 2013. p. 286.
258
961
BAJO, María José Cabezudo. Es infalible la prueba pericial de ADN: planteamiento de la cuestión. Revista
de derecho y genoma humano, Bilbao, Especial, p. 331-339., 2014. p. 338, tradução nossa.
962
De acordo com Cabezudo Bajo, os cálculos são feitos da seguinte forma, com o uso do “Teorema de Bayes”:
“dada uma coincidência entre perfis, dito teorema calcula a probabilidade de que o sujeito cujo perfil
(identificado) tenha resultado coincidente seja efetivamente o titular da amostra (não identificada)” (BAJO,
María José Cabezudo. Es infalible la prueba pericial de ADN: planteamiento de la cuestión. Revista de derecho
y genoma humano, Bilbao, Especial, p. 331-339, 2014. p. 336).
259
Sutton pode ser esperado de ocorrer em 1 de 694.000 pessoas entre a população negra”963.
Entretanto, após problemas envolvendo o laboratório criminal da polícia de Houston,
diversos casos foram revisados, inclundi Sutton, quando se verificou que o resultado
apresentado decorreu do uso equivocado das estatísticas populacionais e de cáculos
matemáticos para estipular a sua frenquência, pois foram considerados números e fórmulas
adequadas para verificação de amostras únicas, não para amostras misturadas, como era no
caso.964 Após a revisão dos cálculos, foi revelado que a verdadeira frequência de incidência
era de 1 em 15 pessoas.965
Ressaltando a relevância destas informações para a validação do resultado,
Bonaccorso afirma a necessidade de o laudo pericial de identificação por DNA informar,
detalhadamente, as regiões polimórficas analisadas, os cálculos estatísticos empregados e a
base de dados utilizada:
[n]os casos em que se alcança êxito, nas hipóteses de inclusão, devem ser indicadas
as frequências dos alelos obtidos, os cálculos estatísticos empregados e o banco
de dados utilizado. Se for caso de exclusão, devem ser destacados o embasamento
para este resultado e a informação que a análise foi repetida por equipes
independentes do laboratório.966
963
GARRET, Brandon L.; NEUFELD, Peter J. Invalid forensic Science testimony and wrongful convictions.
Virgia Law Review, vol. 95, mar. 2009. p. 65, tradução nossa.
964
GARRET, Brandon L.; NEUFELD, Peter J. Invalid forensic Science testimony and wrongful convictions.
Virgia Law Review, vol. 95, mar. 2009. p. 65.
965
THOMPSON, Willian C. Forensic DNA evidence: the myth of infallibility. In: KRIMSKY, Sheldon;
GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 246.
Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em: 11 dez. 2019.
966
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 99. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
967
BAJO, María José Cabezudo. Es infalible la prueba pericial de ADN: planteamiento de la cuestión. Revista
de derecho y genoma humano, Bilbao, Especial, p. 331-339, 2014. p. 338, tradução nossa.
260
repetível, torna desnecessária essa discussão –, a análise com as devidas garantias é aquela
que registra todas as informações necessárias para o exercício do contraditório diferido.
Nas hipóteses em que a análise pericial esgota a fonte de prova ou quando a
própria natureza do objeto impede a sua conservação, deve-se garantir que a técnica utilizada
na extração da informação existente na fonte de prova não altere o seu conteúdo, permitindo
que se verifique se o que foi levado ao processo como elemento de prova reproduz
exatamente a informação que existia na fonte de prova (cf. capítulo 3, item 3.2.4.1).
Assim, nas perícias laboratoriais irrepetíveis, a autenticação do elemento de
prova não se satisfaz com a conservação da identidade e integridade da fonte de prova, pois
ela jamais ingressará no processo. Nesses casos, para além dos registros da manutenção da
cadeia de custódia da fonte de prova até a sua análise, é preciso também registrar o
procedimento pericial para permitir a verificação da técnica utilizada, pois somente assim
será possível garantir que o elemento de prova introduzido no processo reproduz aquilo que
realmente existia na fonte de prova, isto é, que o método utilizado na extração da informação
não alterou o conteúdo ali existente.
Em se tratando de perícia de alta complexidade técnico-científica, não se pode
ignorar a potencial influência da técnica utilizada no resultado da prova, pois, como destaca
Reis, “dependendo dos materiais, dos tipos de perícia e dos exames, fica definida a
metodologia a ser empregada, ou seja, a que melhor se adequa aos resultados
esperados”968, sendo certo que, “não se realizam exames, sejam eles de que espécie for, se
não existirem equipamentos e técnicas específicas para tal”969.
Por isso, inclusive, a admissibilidade das provas produzidas por meio de novas
técnicas científicas tem sido objeto de amplo debate doutinário e jurispudencial, que, nos
Estados Unidos, culminou na fixação dos Doubert Standards, que servem de orientação para
que se avalie a validade da metolologia adotada no exame realizado (cf. capítulo 3, item
3.2.4.1, supra).
No que se refere especificamente à acreditação da perícia de identificação por
DNA, antes mesmo da fixação dos Doubert Standards para as provas científicas em geral,
968
REIS, Albani Borges dos. Metodologia científica em perícia criminal: um crime não é esclarecido pelo
poder da polícia, mas pelo poder da metodologia científica. 2. ed. Campinas: Millennium, 2011. p. 172.
969
REIS, Albani Borges dos. Metodologia científica em perícia criminal: um crime não é esclarecido pelo
poder da polícia, mas pelo poder da metodologia científica. 2. ed. Campinas: Millennium, 2011. p. 171.
261
970
DOUGHERTY, John C. Beyond People v. Castro: A New Standard of Admissibility for DNA
Fingerprinting. In Journal of Contemporary Health Law & Policy, v. 7, 1991. p. 294. Disponível em
<http://scholarship.law.edu/jchlp/vol7/iss1/18>.
971
Conforme já tratado anteriormente (capítulo 3, item 3.2.4.1, supra), a partir do julgamento do caso Frye em
1923, as Cortes americanas condicionaram a utilização judicial de uma nova tecnologia cientifica à sua
aceitação geral entre os cientistas da área específica: “[f]rye fixou que para ser admissível uma nova técnica
científica ‘deve ser suficientemente demonstrado que tem aceitação geral dentro do campo específico a que
pertence’” (DOUGHERTY, John C. Beyond People v. Castro: A New Standard of Admissibility for DNA
Fingerprinting. In Journal of Contemporary Health Law & Policy, v. 7, 1991. p. 272, tradução nossa.
Disponível em <http://scholarship.law.edu/jchlp/vol7/iss1/18>. Acesso em: 13 jan. 2020).
972
DOUGHERTY, John C. Beyond People v. Castro: A New Standard of Admissibility for DNA
Fingerprinting. In Journal of Contemporary Health Law & Policy, v. 7, 1991. p. 294, tradução nossa.
Disponível em <http://scholarship.law.edu/jchlp/vol7/iss1/18>. Acesso em: 13 jan. 2020.
973
PATTON, Stephen M. DNA Fingerprinting: The Castro Case. Harvard Journal of Law & Technology. V.
3, Spring Issue, 1990. p. 229. Disponível em:
<http://jolt.law.harvard.edu/articles/pdf/v03/03HarvJLTech223.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2020).
262
974
PATTON, Stephen M. DNA Fingerprinting: The Castro Case. Harvard Journal of Law & Technology. V.
3, Spring Issue, 1990. p. 229. Disponível em:
<http://jolt.law.harvard.edu/articles/pdf/v03/03HarvJLTech223.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2020.
975
Conforme Mestres Naval e Vives-Rego: “[n]este sentido, não podemos deixar de mencionar que o
European Network of Forensic Science Institutes (ENFSI) e seu DNA Working Group tem facilitado o
intercâmbio de técnicas, dados e informações para tornar acessível e colocar em prática a identificação
através do DNA com o máximo nível possível de fiabilidade. Também trabalham este tema a Interpol e a
EDNAP (European DNA Profiling Group)” (NAVAL, Francesc Mestres; VIVES-REGO, Josep. La utilización
forense de la huella genética (secuencia del ADN o ácido desoxirribonucleico): aspectos científicos, periciales,
procesales, sociales y éticos. La ley penal: revista de derecho penal, procesal y penitenciario, Madrid, v. 6, n.
61, p. 46-61., jun. 2009. p. 54, tradução nossa).
976
Indicando uma série de normativas no âmbito europeu, Alonso cita, entre outros, os seguintes aspectos: “(1)
os critérios de acreditação e medidas de garantia de qualidade, (2) recomendações sobre estudos de validação
interna, (3) controles anti-contaminação e caracterização do efeito drop-in, (4) critérios de análise e
interpretação de perfis de DNA mesclados e (5) valoração estatística” (ALONSO, Antonio. ADN y proceso
penal en España. La labor de la comisión nacional para el uso forense del ADN. In: COLOMER, Juan-Luis
Gómez (coord.). La prueba de ADN en el proceso penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 2014. p. 282/283).
977
Quality Assurance Standards for Forensic DNA Testing and DNA Testing Laboratories. FBI Laboratory,
set. 2011. p. 01, tradução nossa. Disponível em <https://www.fbi.gov/file-repository/quality-assurance-
standards-for-forensic-dna-testing-laboratories.pdf/view>. Acesso em: 11 dez. 2019.
978
Com relação ao equipamento, uma lista de kits aprovados para a realização do exame de DNA consta do
National DNA Index System (NDIS) Operational Procedures Manual. FBI Laboratory. Version 8, 1 maio
2019. p. 86/87. Disponível em: <https://www.fbi.gov/file-repository/ndis-operational-procedures-
manual.pdf/view>. Acesso em: 27 nov. 2019.
263
da 3ª LECRIM) e respeitando a cadeia de custódia”979, que inclui, além dos “passos prévios
à análise pericial”980 (e.g. coleta, transporte), “a análise que se realiza no laboratório
conforme as técnicas médicas aconselhdas”981 e a “interpretação das provas biológicas”982.
A preocupação com os aspectos procedimentais, nos casos das provas por exame
de DNA, justifica-se porque, conforme adverte Nieva-Fenoll, “o erro do agente na operação
pode contaminar a amostra com outros restos biológicos [...] ou inclusive com os produtos
químicos ou bioquímicos”983 utilizados na análise, sendo que a “burocracia e condições de
segurança da ‘cadeia de custódia’ tentam prevenir que isso ocorra”984.
No mesmo sentido, Mestres Naval e Vives-Rego, após apontar as especiais
dificuldades dos exames de identificação por DNA em amostras de baixa quantidade,
qualidade ou misturadas, ressalta que “existem diferentes procedimentos técnicos para
solucionar estas dificuldades”985, sendo que, nessas situações problemáticas, o método e a
análise “são cruciais para se chegar a uma identificação satisfatória do ponto de vista
biológico e judicial”986.
979
COLOMER, Juan-Luis Gómez . Los retos del proceso penal ante las nuevas pruebas que requieren
tecnología avanzada: El análisis de ADN. In: COLOMER, Juan-Luis Gómez (coord.). La prueba de ADN en
el proceso penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 2014. p. 49, tradução nossa.
980
COLOMER, Juan-Luis Gómez . Los retos del proceso penal ante las nuevas pruebas que requieren
tecnología avanzada: El análisis de ADN. In: COLOMER, Juan-Luis Gómez (coord.). La prueba de ADN en
el proceso penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 2014. p. 49, tradução nossa.
981
COLOMER, Juan-Luis Gómez . Los retos del proceso penal ante las nuevas pruebas que requieren
tecnología avanzada: El análisis de ADN. In: COLOMER, Juan-Luis Gómez (coord.). La prueba de ADN en
el proceso penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 2014. p. 50, tradução nossa.
982
COLOMER, Juan-Luis Gómez . Los retos del proceso penal ante las nuevas pruebas que requieren
tecnología avanzada: El análisis de ADN. In: COLOMER, Juan-Luis Gómez (coord.). La prueba de ADN en
el proceso penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 2014. p. 51, tradução nossa.
983
NIEVA-FENOLL, Jordi. Algunas sugerencias acerca de la práctica y valoración de la prueba del perfil de
ADN. La ley penal: revista de derecho penal, procesal y penitenciario, Madrid, v. 9, n. 93, p. 17-26, mai. 2012.
p. 20, tradução nossa.
984
NIEVA-FENOLL, Jordi. Algunas sugerencias acerca de la práctica y valoración de la prueba del perfil de
ADN. La ley penal: revista de derecho penal, procesal y penitenciario, Madrid, v. 9, n. 93, p. 17-26., mai. 2012.
p. 20, tradução nossa. No mesmo sentido, Mestres Naval e Vives-Rego reconhecem ser necessário “tomar
todas as precauções para que a amostra não se contamine com células ou DNA do agente que colha a amostra
ou do técnico que a manipule em laboratório” (NAVAL, Francesc Mestres; VIVES-REGO, Josep. La
utilización forense de la huella genética (secuencia del ADN o ácido desoxirribonucleico): aspectos científicos,
periciales, procesales, sociales y éticos. La ley penal: revista de derecho penal, procesal y penitenciario,
Madrid, v. 6, n. 61, p. 46-61, jun. 2009. p. 52, tradução nossa).
985
NAVAL, Francesc Mestres; VIVES-REGO, Josep. La utilización forense de la huella genética (secuencia
del ADN o ácido desoxirribonucleico): aspectos científicos, periciales, procesales, sociales y éticos. La ley
penal: revista de derecho penal, procesal y penitenciario, Madrid, v. 6, n. 61, p. 46-61, jun. 2009. p. 53, tradução
nossa.
986
NAVAL, Francesc Mestres; VIVES-REGO, Josep. La utilización forense de la huella genética (secuencia
del ADN o ácido desoxirribonucleico): aspectos científicos, periciales, procesales, sociales y éticos. La ley
penal: revista de derecho penal, procesal y penitenciario, Madrid, v. 6, n. 61, p. 46-61, jun. 2009. p. 53, tradução
nossa.
264
987
BONACCORSO, Norma Sueli. Elaboração de laudos e relatórios de análises de exames DNA realizados
pelo Instituto de Criminalística de São Paulo. Arquivos da Polícia Civil: revista tecno-científica, São Paulo, n.
46, p. 59-80, 2001. p. 59.
988
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 96. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
265
989
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 96. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
990
BONARCCORSO, Norma Sueli. Aplicação do exame de DNA na elucidação de crimes. 2005. Dissertação
de mestrado (Faculdade de Direito). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. p. 96. Disponível em:
<https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-15092010-
145947/publico/DISSERTACAO_MESTRADO_NORMA_BONACCORSO.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2019.
991
JOBIM, Luiz Fernando et al. Investigação laboratorial. In: JOBIM, Luiz Fernando; SILVA, Moacyr da;
COSTA, Luís Renato da Silveira. Identificação humana: identificação médico-legal; perícias odontolegais;
identificação pelo DNA. 2. ed. Campinas: Millennium, 2012. p. 182.
992
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GRUBER, Jeremy (org.). Genetic explanations: sense and nonsene. Harvard University Press, 2013. p. 246,
tradução nossa. Disponível em: <https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2214379>. Acesso em:
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993
BIEBER, Frederick R. et al. Evaluation of forensic DNA mixture evidente: protocol for evaluation,
interpretation, and statistical calculations using the combined probability of inclusion. BMC Genetics. 2016. p.
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<https://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/29407641/5007818.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso
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994
BONACCORSO, Norma Sueli. Elaboração de laudos e relatórios de análises de exames DNA realizados
pelo Instituto de Criminalística de São Paulo. Arquivos da Polícia Civil: revista tecno-científica, São Paulo, n.
46, p. 59-80, 2001. p. 60.
995
BONACCORSO, Norma Sueli. Elaboração de laudos e relatórios de análises de exames DNA realizados
pelo Instituto de Criminalística de São Paulo. Arquivos da Polícia Civil: revista tecno-científica, São Paulo, n.
46, p. 59-80, 2001. p. 59.
267
996
CARRACEDO, Ángel. ADN: la genética forense y sus aplicaciones en investigación criminal. In:
COLOMER, Juan-Luis Gómez (coord.). La prueba de ADN en el proceso penal. Valencia: Tirant lo Blanch,
2014. p. 364/365, tradução nossa.
268
obtenção do elemento de prova a ser apresentado em juízo, por ser informação essencial ao
exercício do contraditório das partes e necessária à sua valoração pelo juiz, deverá resultar
na exclusão da prova, impedindo a sua valoração (cf. desenvolvido no capítulo 3).
Nos casos de perícia por identificação por DNA, diferentemente dos meios de
pesquisa de prova que devem ser executados dentro dos limites que excepcionam direitos
fundamentais, o elemento de prova é produzido em laboratório, sem oferecer risco aos
direitos fundamentais materiais do investigado (sob a perspectiva das garantias processuais,
a possibilidadae de restrição ao contraditório foi abordada no item 4.3.3, supra).
Dessa forma, a análise dessa possibilidade de exclusão da prova por quebra da
cadeia de custódia para a identificação por DNA se restringe à localização e obtenção das
fontes de prova.
Contudo, mesmo para as fontes de prova, a possibilidade de exclusão da prova
por esse critério será bastante restrita. A sua escassa incidência resulta do fato de a perícia
de identintificação por DNA depender de ao menos duas fontes de prova: uma
obrigatoriamente relacionada ao local do crime ou presente na vítima (questionada); e outra
inequivocamente pertencente ao investigado (referência). Assim, o desconhecimento das
informações sobre a sua obtenção – que poderia encobrir violação a direito fundamental –
refletirá, de modo geral, diretamente na irrelevância ou impertinência das fontes de prova
em razão da impossibilidade de conectá-las ao fato histórico e ao investigado,
respectivamente (cf. item 4.3.1, supra).
Diante desse cenário, a hipótese que permite a incidência desse critério de
exclusão de prova pela quebra da cadeia de custódia é o desconhecimento sobre a localização
e coleta de objeto relacionado ao crime que, por suas características individualizantes,
permitem vinculá-lo ao fato delituoso, estabelecendo a potencial pertinência do material
genético nele encontrado.
Podemos ilustrar a hipótese com a apreensão do instrumento do crime contendo
DNA da vítima ou do agressor, nos casos em que foi levado pelo autor do local do delito
para a sua casa. Tratando-se de uma arma de fogo, por exemplo, as informações sobre a sua
localização e coleta são desnecessárias para relacioná-la ao crime, já que a vinculação pode
269
ser estabelecida por uma perícia que aponte a compatibilidade das ranhuras marcadas no
projétil. Outra possibilidade é a arma do crime ser um objeto de características próprias e
reconhecido, em detalhes, por testemunhas.
Nesses casos, contudo, a inviolabilidade do domicíclio do investigado exige
prévia obtenção de autorização judicial para a busca e apreensão (art. 5º, XI, da CF).997
Entretanto, eventual ausência de decisão judicial para realização da busca e apreensão pode
ser escondida pela falta de registro sobre a sua localização e coleta, levando à
impossibilidade de utilização de eventual material genético colhido nesse instrumento do
crime.998
Por fim, não obstante um dos temas mais complexos e de ampla discussão
doutrinária envolvendo a prova de identificação por DNA esteja relacionado à obtenção da
amostra referência em caso de não consentimento do investigado e a preservação da sua
integridade física,999 esse debate não interfere no estudo da cadeia de custódia.1000 Isso
porque, caso seja mantido o registro demonstrando a violação a direito fundamental do
acusado na coleta da amostra referência, apesar da ilegalidade praticada na sua obtenção, a
cadeia de custódia terá sido mantida, ao passo que, na falta do registro, será impossível
relacionar a amostra referência ao investigado, tornado-a impertitente para ser periciada em
confronto com a amostra questionada.
997
Ao tratar da identificação por DNA, Gomes Filho destaca que, para a “admissibilidade dos mencionados
testes, à vista do que estabelece a Constituição Federal (art, 5º, inc. LVI), torna-se indispensável ressaltar que
na obtenção do material a ser examinado não podem ser desprezados os direitos fundamentais do investigado
ou acusado, como integridade corporal, a intimidade, a honra, a imagem, etc., até porque ninguém pode ser
compelido a fazer prova contra si mesmo” (GOMES FILHO, Antonio Magalhães. O teste de DNA como prova
criminal. Boletim IBCCRIM, São Paulo, n. 18, jul. 1994. p. 1).
998
Conforme Gil Hernández, “dado que a análise do DNA sempre vai acontecer sobre uma série de indícios
físicos coletados no local dos fatos ou da vítima, assim como do suspeito, ainda que se tenha realizado uma
investigação cientificamente correta, evitando os problemas de contaminação e degradação, posteriormente
poderíamos nos deparar com uma nulidade probatória devido a defeitos jurídico-processuais no estrito
cumprimento das garantias legais na hora de obter os ditos indícios” (HERNÁNDEZ, Angel Gil. La
investigación genética como medio de prueba en el proceso penal. Actualidad Penal, Madrid, v. 2, 16/48, p.
865-911, semanal. 1996. p. 886, tradução nossa).
999
Sobre esse tema, ver: MESQUITA, Paulo Dá. A prova em processo penal e a identificação de perfis de
ADN - da recolha para comparação direta entre amostra problema e amostra referência às inserções e
interconexões com a base de dados. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Coimbra, v. 24, n. 4, p. 551-575.,
out./dez. 2014; VASCONCELLOS, Vinícius Gomes de. Novas tecnologias e antigos clamores punitivos na
justiça criminal: considerações em busca de critérios para a utilização de exames genéticos no processo
penal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 22, n. 110, p. 329-366., set./out. 2014;
GONÇALVES, Manuel. Recolha de amostras de DNA para fins de investigação criminal: suspeito. Revista do
Ministério Público de Lisboa, Lisboa, v. 34, n. 136, p. 199-222., out./dez. 2013; GIL HERNÁNDEZ, Angel.
La investigación genética como medio de prueba en el proceso penal. Actualidad Penal, Madrid, v. 2, 16/48,
p. 865-911., semanal. 1996.
1000
Apesar disso, é importante ressaltar que a Resolução SSP nº 194/99, em seu art. 6º, g, exige a lavratura de
um termo de coleta de amostra referência contendo, entre outras coisas, a “declaração do doador de que está
fornecendo o material de livre e espontânea vontade”.
270
4.3.5. Valoração
1001
DOUGHERTY, John C. Beyond People v. Castro: A New Standard of Admissibility for DNA
Fingerprinting. Journal of Contemporary Health Law & Policy, vol. 7, Issue 1. p. 269-306. 1991. p. 294.
Disponível em: <http://scholarship.law.edu/jchlp/vol7/iss1/18>. Acesso em: 09 jan. 2020
1002
No capítulo 3, item 3.3, supra, a matéria foi tratada amplamente, sem especificar a identificação por DNA.
1003
Chris P. Frazier v. Gregory F. Zoeller; Joseph Y. Ho. Court of Appeals of Indiana.. Memorandum Decision.
27 fev. 2014. Disponível em: <https://cases.justia.com/indiana/court-of-appeals/49a04-1307-cr-
360.pdf?ts=1462346171>. Acesso em: 09 jan. 2020.
1004
Conforme sustenta Sérgio Souza: “[e]mbora o sistema adotado como regra no ordenamento processual
penal brasileiro seja o da livre convicção motivada, onde o juiz não se encontra previamente vinculado ao
maior ou menor valor de um meio probatório, podendo analisar livremente a prova dos autos e formar seu
convencimento a partir de argumentos lógicos extraídos de seu prudente raciocínio, há na verdade uma
resistência natural à refutação daqueles provas de natureza científica, pois soa estranho ao senso comum a
possibilidade, por exemplo, de, no confronto entre testemunhas e o resultado de um exame de DNA, o órgão
julgador acolher a versão daquelas e desconsiderar este último” (SOUZA, Sérgio Ricardo de. Manual da
prova penal constitucional – pós-reforma de 2008, atualizado de acordo com as Leis 11.689/08 e 11.690/08.
Editora Juruá. Curitiba: 2008. p. 114).
271
1005
SILVA, Emílio de Oliveira e. Identificação genética para fins criminais: análise dos aspectos processuais
do banco de dados de perfil genético implementado pela Lei n. 12.654/2012. Belo Horizonte: Del Rey, 2014.
p. 132
1006
De acordo com Gomes Filho, “[...] em primeiro lugar, o autor da decisão leva em consideração todas as
provas regularmente introduzidas no processo e que sejam relevantes para o estabelecimento dos fatos, não
sendo racional se utilizar apenas daquelas que confirmem uma conclusão pré-estabelecida, simplesmente
desconsiderando outras que poderiam invalidar um resultado que se quer a todo custo alcançar” (GOMES
FILHO, Antonio Magalhães. A motivação das decisões penais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2013. p. 130). No mesmo sentido, Badaró: “[...] a atividade de valoração exige que o juiz analise todas as
provas produzidas. Em relação a cada hipótese fática em que pode ser decomposta a imputação, deverá
valorar tanto as provas que lhe dão suporte, isto é, que confirma a veracidade do fato afirmado, quanto as
provas contrárias, que poderiam refutar este resultado. Se o juiz ignorar um segmento de prova, porque ele
vai contra uma hipótese já previamente escolhida como preferível, isso implicará uma grave quebra da
imparcialidade, indicando que o resultado do processo não foi fruto de uma atividade de verificação
desinteressada da prova” (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova
penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. p. 201/202).
1007
BAJO, María José Cabezudo. Es infalible la prueba pericial de DNA: planteamiento de la cuestión. Revista
de derecho y genoma humano, Bilbao, Especial, p. 331-339., 2014. p. 338, tradução nossa.
1008
Diferenciando o resultado negativo dos demais, Pérez Marín sustenta que “[...] a falta de coincidência dos
polimorfismos das amostras de DNA exclui, de maneira induvidosa, a autoria, a coincidência não supõe
nenhuma certeza absoluta a respeito do cometimento de um delito, somente proporciona ao juiz uma
probabilidade” (PÉREZ MARÍN, Maria Ángeles. El ADN como método de identificación en el proceso
penal. Revista do Ministério Público de Lisboa, Lisboa, v. 33, n. 132, p. 127-163., out./dez. 2012. p. 156,
tradução nossa).
1009
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 258-259.
272
tese do acusado derrubar “a hipótese acusatória com ela incompatível, basta a prova dos
fatos afirmados pela defesa, ainda que em intensidade menor”1010.
Ocorre que, para admitir a prova na análise dos critérios lógicos de admissão do
exame de identificação por DNA, o juiz já considerou previamente que a falha na
manutenção da cadeia de custódia não retirou o potencial de o resultado da perícia influenciar
no julgamento, entendendo que há maior probabilidade de a prova ser o que parte diz ser, do
que não ser.
Dessa forma, considerando o standard probatório necessário para a condenação
e a existência de uma prova pericial defensiva que apoia a tese do acusado de negativa de
autoria em um patamar em que há maior probabilidade de o seu conteúdo ser o que a defesa
diz que é, a hipótese acusatória de que o réu praticou o delito não terá resistido à tese
defensiva, ainda que a quebra da cadeia de custódia tenha diminuído o peso do resultado do
exame de identificação por DNA.
Em situação análoga, o Tribunal Espanhol, ao julgar o caso STS 792/2009,
“acabou absolvendo ao previamente condenado por estupro, já que a prova pericial de DNA
determinou que não foi o autor do fato, apesar do reconhecimento efetuado pela vítima, que
assegurava que o agressor era o acusado e que sua voz era a mesma da pessoa que a
atacou”1011.
Por outro lado, nos casos em que o exame for positivo ou inconclusivo, o peso
atribuído ao resultado da identificação por DNA servirá para definir o grau de influência que
terá no segundo momento da valoração, quando “[o] juiz deverá analisar todas as provas
produzidas para verificar se a hipótese posta em julgamento com a formulação da acusação
foi ou não provada”1012, bem como “verificar se hipóteses fáticas diversas ou contrárias,
geralmente alegadas pela defesa, encontram suporte na prova dos autos”1013.
1010
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 258-259.
1011
FIGUEROA NAVARRO, Carmen. La cadena de custodia de las muestras biológicas. In: FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015, p. 108,
tradução nossa.
1012
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 200.
1013
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: Thomson
Reuters, 2019. p. 200.
273
Por certo que, nesta tarefa, será indispensável ao juiz fazer a justificação1014 da
influência que a falha na manutenção da sua identidade ou integralidade teve no peso
atribuído ao resultado do exame de identificação por DNA.1015
Assim, no caso de um resultado positivo utilizado de apoio empírico à hipótese
de autoria acusatória, o juiz deverá apontar outros elementos de prova que também sustentem
a sua decisão, com destaque para aquelas que supram satisfatoriamente as dúvidas levantadas
pela quebra da cadeia de custódia sobre a fiabilidade da identificação por DNA realizada.
Entretanto, no caso de o exame ser considerado isoladamente para a formação da convicção
do julgador,1016 será imprescindível detalhar as razões pelas quais, mesmo com as incertezas
sobre a identidade e integralidade da prova, foi possível considerá-la à altura do standard
probatório exigível para a condenação.
Por sua vez, independentemente da quebra na cadeia de custódia, o resultado
inconclusivo não servirá de apoio à hipótese acusatória, pois, ainda que não a infirme,
também não a afirma, sendo insuficiente para atingir o standard condenatório.
Por outro lado, nos casos em que o ônus de manutenção da cadeia de custódia
for do Estado, a prova inconclusiva do exame de DNA poderá suportar a hipótese defensiva
quando a impossibilidade de identificação decorrer de contaminação, inibição ou degradação
causada pela falha na cadeia de custódia. Nesses casos, o resultado inconclusivo deverá ser
considerado pelo magistrado como apoio à alegação do acusado de que a prova de sua
inocência só não foi obtida pela negligência do estado, dando a essa prova um peso maior
ou menor de acordo com a influência que a quebra da cadeia de custódia teve na inexatidão
do exame, para, então, confrontá-la com outras provas que sustentem a hipótese acusatória.
1014
Tratando amplamente da valoração das provas científicas, nas quais se enquadra a perícia de identificação
por DNA, Gomes Filho sustenta: “diante da crescente utilização da chamada prova científica, que o emprego
desses conhecimentos especializados no processo não pode dispensar uma atividade justificativa do juiz capaz
de traduzir aos destinatários da motivação, notadamente o homem comum, as informações obtidas por esse
tipo de prova e que tenham sido utilizadas na formação do convencimento” (GOMES FILHO, Antonio
Magalhães. A motivação das decisões penais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 135).
1015
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A cadeia de custódia e sua relevância para a prova penal. In:
SIDI, Ricardo; LOPES, Anderson Bezerra (orgs.). Temas atuais da investigação preliminar no processo penal.
Belo Horizonte: D’Plácido, 2017. p. 536.
1016
Apesar de extrapolar o objeto de estudo proposto neste trabalho por não ter relação com cadeia de custódia,
é importante frisar a impropriedade de utilizar a identificação por DNA como única prova de autoria, conforme
exemplifica Emílio de Oliveira e Silva: “[...] o fato de ter sido encontrado material biológico do investigado
na pessoa que se diz violentada sexualmente não prova o estupro, porque tal exame não revela a ausência de
consentimento da suposta vítima para praticar a relação sexual” (SILVA, Emílio de Oliveira e. Identificação
genética para fins criminais: análise dos aspectos processuais do banco de dados de perfil genético
implementado pela Lei n. 12.654/2012. Belo Horizonte: Del Rey, 2014. p. 135).
274
1017
Conforme Figueroa Navarro: “[p]or isso se adverte que ‘são de vital importância as circunstâncias
concretas que rodeiam um vestígio biológico para a sua valoração como prova pelo órgão julgador’”
(FIGUEROA NAVARRO, Carmen. La cadena de custodia de las muestras biológicas. In: FIGUEROA
NAVARRO, Carmen (Dir.). La cadena de custodia en el proceso penal. Madri: Edisofer, 2015, p. 110,
tradução nossa).
275
CONCLUSÃO
integralidade da prova a ponto de permitir concluir pela elevadíssima probabilidade dos fatos
afirmados pela acusação.
283
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