Medicalização Na Aprendizagem

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1

Capítulo 1

MEDICALIZAÇÃO NA ESCOLA: UMA REVISÃO


INTEGRATIVA DO CONTEXTO BRASILEIRO

Arielle Galvão Ribeiro

Ingrid Mesquita Coelho

Daniel Cerdeira de Souza

Arielle Galvão Ribeiro

Ingrid Mesquita Coelho

Daniel Cerdeira de Souza

Medicalização na Escola:
uma revisão integrativa
do contexto brasileiro

DOI: 10.31560/pimentacultural/2023.96146.1
SUMÁRIO

Resumo:
O medicalizar consiste em interpretar assuntos de natureza pessoal, política,
econômica e social do ponto de vista médico, patologizando a vida cotidiana.
Nosso objetivo foi analisar a literatura publicada no formato de artigos cientí-
ficos publicados entre 2017-2021 sobre medicalização na escola no contexto
brasileiro. O estudo consiste em uma revisão integrativa, que analisou 25 arti-
gos coletados no Portal Periódicos CAPES e na Biblioteca Virtual de Saúde. Os
dados foram analisados a partir de um protocolo de revisão e posteriormente
pelo procedimento de Análise de Conteúdo. Os dados extraídos dos artigos
possibilitaram a construção de cinco categorias: 1) Medicalização no âmbito
escolar; 2) Caráter individual dos problemas escolares; 3) Medicalização como
salvação; 4) Fracasso escolar e o não-aprender; 5) Educação reducionista,
que discutiram que a escola usa da medicalização para justificar o fracas-
so escolar, sem se responsabilizar pela produção deste fenômeno, além de
que a medicalização parece assumir um papel salvacionista nos contextos
escolares. Concluímos que o ambiente escolar se encontra atravessado pelo
conhecimento científico da área da saúde e que busca no campo da medicina
a solução para os problemas de aprendizagem e comportamento, por fim, pro-
pomos a utilização do Desenho Universal para a Aprendizagem para romper
com práticas medicalizantes na escola.

Palavras-Chave: Medicalização; Fracasso escolar; Aprendizagem.

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INTRODUÇÃO

Segundo Collares e Moysés (1994, p. 25) “o termo medicali-


zação refere-se ao processo de transformar questões não-médicas,
eminentemente de origem social e política, em questões médicas” a
partir da percepção de saúde-doença focada no indivíduo, pautando-
-se a ideia organicista, ou seja, se procura no campo da medicina
as soluções para problemas de cunho social partindo do pressupos-
to de que apenas os indivíduos são os detentores da doença e da
cura. A medicalização reduz os conflitos sociais a fatores biológicos
individuais transformando questões políticas, econômicas e históricas
SUMÁRIO
que permeiam a sociedade, em um movimento reducionista pautado
em culpabilizar o indivíduo pelos seus problemas, reduzindo assim a
responsabilidade do sistema social que opera sobre a vida do sujeito
(COLLARES; MOYSÉS, 1994).

Ao isolar um indivíduo e buscar compreendê-lo partindo da con-


cepção de suas características como patologias, a medicalização o ro-
deia como um dispositivo que transforma não somente essas particula-
ridades, mas também os problemas de cunho político, sociais e culturais
em adversidades individuais que são passíveis de serem tratadas como
questões biológicas (CHRISTOFARI; FREITAS; BAPTISTA, 2015). No li-
vro ‘A expropriação da saúde: nêmesis da medicina’, Ivan Illich (1975)
adiciona que “não é preciso estar doente para se transformar num pa-
ciente”, o precursor da expressão medicalização, que se encontra no
centro desse trabalho, produziu diversos ensaios em tons críticos sobre
o saber médico operante na sociedade, além de propagar que as ideias
de prevenção são uma das formas de medicalização atuantes para o
controle médico, que é então exercido a pessoas saudáveis.

A globalização trouxe um padrão de ser e estar na sociedade


que é difundido diariamente no convívio com os pares. A rapidez do

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consumismo e da indústria impacta também na velocidade com que
os sentimentos circulam entre as pessoas, não tendo o tempo neces-
sário para a consolidação e entendimento das emoções, produzindo
sofrimentos que precisam ser rapidamente superados, pois não é per-
mitido adoecer em um sistema que necessita de produção em cadeia,
com isso, o indivíduo pode buscar o alívio imediato dos sintomas atra-
vés de intervenções medicamentosas (ROCHA et al., 2019).

Lemos (2014) traz a medicalização do ponto de vista de causa


e efeito, em que comportamentos desviantes são passíveis de serem
patologizados através da racionalidade simplista de práticas sociais.
Além disso, a autora ressalta que a medicalização não se resume ape-
SUMÁRIO nas às patologias, mas ela opera também pela promoção de saúde
que ampliam as habilidades e potencializam a produtividade, nesse
aspecto a lógica medicalizante executa pela normalização o controle
dos corpos para manter a ordem social.

A lógica operante em torno da saúde tem valores tão fortes na


sociedade que é difícil manter tais ideias fora dos muros das escolas,
estas que são os pilares da construção da aprendizagem e do conhe-
cimento. No campo educacional, a medicalização atua principalmente
no diagnóstico do fracasso escolar, centrando sua causa no aluno e
em algumas situações na culpabilização também da família, mas sem
questionar se as práticas pedagógicas vigentes têm alguma responsabi-
lidade no fracasso ou na aprendizagem, onde estes frequentemente são
relatados como processos individuais (COLLARES; MOYSÉS, 1994).

Para Ribeiro (2014) as escolas, muitas vezes pautadas pela me-


dicalização, acabam por fornecer um ambiente que não respeita as
particularidades e as diferenças dos alunos e produzem situações que
afastam os estudantes do interesse pelo aprender. Ao olharmos para as
práticas pedagógicas atuais, é necessário que se adote uma postura
crítica sobre os mecanismos que excluem e isolam os alunos do acesso
ao conhecimento. O desalinhamento do ensinar com os diferentes tipos

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de aprender se manifesta como um desafio para professores e alunos,
já que o sistema atuante procura em outras áreas do conhecimento (fora
das escolas), a solução da desarmonia dessa relação.

Quando no âmbito escolar os alunos não seguem o ritmo de


aprendizado esperado, ou quando este processo se apresenta distante
dos demais, os profissionais envolvidos desconfiam que existe um pro-
blema e se este for relacionado a performance nos estudos, comumente
gera a suposição de se tratar de um distúrbio que necessita de avaliação
especializada, diagnóstico e possivelmente medicação (RIBEIRO, 2014).

O fracasso escolar ainda se apresenta como tópico de frequen-


SUMÁRIO te pesquisa e investigação sobre as suas possíveis causas, que já
encontraram explicações na culpa da herança genética e no “atraso
cultural” dos mais pobres, até finalmente considerarem a participação
da escola como objeto de estudo (INSFRAN; LADEIRA; FARIA, 2020).
Ao passo que os profissionais da educação vão se encontrando cada
vez mais com casos de fracasso escolar, se torna compreensível como
a área da saúde entra com certa facilidade nas práticas pedagógi-
cas, onde o professor aceita os limites do seu saber e cede espaço
para aquele que se entende estar mais preparado. Por quais caminhos
então a medicalização consegue alcançar e manter o seu poder nas
escolas? Considerando o contexto histórico e social da atuação do
processo medicalizante na compreensão dos fenômenos escolares,
este trabalho tem como objetivo analisar a literatura publicada no for-
mato de artigos científicos sobre os principais fatores associados à
medicalização nas escolas brasileiras.

A necessidade de estudos como este encontra amparo pelo nú-


mero considerável de alunos que apresentam algum diagnóstico pa-
tológico no âmbito da psiquiatria e que podem ser vistos como dificul-
dades na aprendizagem ou como um empecilho para a mesma, como
nos mostra alguns estudos a seguir: Lopes et al. (2016) em um estudo
de base nacional escolar com adolescentes de 12 a 17 anos realizado

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em 2013-2014, com o objetivo de relatar a prevalência de transtornos
mentais comuns em estudantes, identificou uma prevalência de 30%
entre os jovens do estudo com algum tipo de transtorno mental co-
mum, além de uma forte prevalência no sexo feminino.

Fortes (2014), em uma pesquisa com crianças do segundo ano


escolar de quatro cidades de regiões diferentes do país, procurou ava-
liar a presença de transtorno específico de aprendizagem na amostra
e diagnosticaram taxas altas de Transtorno de Déficit de Atenção e
Hiperatividade (TDAH) diretamente relacionadas aos transtornos de
aprendizagem. A taxa de 7,6% foi encontrada para alunos com proble-
mas na aprendizagem nos aspectos gerais (leitura, escrita, aritmética).
SUMÁRIO
Itaborahy e Ortega (2013), também relatam por uma análise
bibliográfica que o uso do medicamento metilfenidato, o mais usado
para tratamento do TDAH, mostra que mais da metade dos artigos
sobre o tema analisado foram financiados de alguma forma pelos labo-
ratórios fabricantes, além disso, é relatado um número significativo de
publicações que abordam o excesso de prescrições médicas a crian-
ças e o aumento do consumo no país.

METODOLOGIA

O estudo consiste em uma revisão integrativa (RI), que trabalhou


com dados teóricos e empíricos, seguindo o proposto por Whittemore
e Knafl (2005), a partir dos seguintes passos:

1. Identificação do problema: O objetivo desta revisão foi analisar a


literatura publicada no formato de artigos científicos entre 2017-
2021 sobre medicalização na escola no contexto brasileiro.

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2. O segundo passo corresponde a coleta dos dados. Dessa for-
ma, os passos da coleta neste estudo iniciaram-se na definição
dos descritores de busca, sendo “medicalização” e “escola”,
validados nos Descritores da Biblioteca Virtual de Saúde (Dec’s
BVS). Os portais utilizados para coleta foi o Portal Periódicos
CAPES e a Biblioteca Virtual de Saúde – BVS, escolhidos porque
integram diversas bases de dados e proporcionam acesso pú-
blico aos artigos científicos, além do mais os portais apresentam
estudos interdisciplinares, considerando que o tema da revisão
pode ser estudado do ponto de vista da saúde e das ciências
humanas/sociais. A coleta foi realizada entre os dias 2 e 3 de
SUMÁRIO junho de 2022. Os critérios de inclusão adotados foram: Artigos
publicados em revistas indexadas sobre o tema da pesquisa
em contexto brasileiro, publicados em língua portuguesa, entre
janeiro de 2017 a dezembro de 2021. Como critérios de exclu-
são, removemos outras formas de publicação (artigos de jornal,
artigos de anais de eventos, artigos de jornais e outros veículos
midiáticos não científicos, livros, dissertações, tese, editoriais,
resenhas e afins). O total de resultados coletados foi de 355. No
Portal Periódicos CAPES foram coletados 338 resultados e na
Biblioteca Virtual de Saúde, foram obtidos 17 resultados. Todos
os resultados foram coletados.

3. O terceiro passo correspondeu a avaliação dos dados coleta-


dos. Assim, os 355 resultados coletados foram descritos em
uma planilha do Microsoft Excel para serem tratados e organiza-
dos inicialmente. Dessa maneira, nessa etapa, foram excluídos
os resultados que não estavam no formato de artigos científicos,
mas que estavam indexados nas bases. Assim, foram excluídos
aqui 22 resultados (10 dissertações de mestrado e 12 editoriais).
Restaram então 333 artigos. Após, foram excluídos os artigos
que estavam repetidos nas bases, onde foram excluídos 16 arti-
gos. Restaram então 317 artigos dos quais foram lidos os títulos

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e resumos para o terceiro recorte e exclusão daqueles que não
apontavam para o objetivo deste trabalho. Nessa etapa, 290 ar-
tigos foram excluídos.

4. A quarta etapa diz respeito à análise e interpretação dos dados:


Para essa etapa, restaram 27 artigos, os quais passaram por leitu-
ra completa. Para apoio na leitura, foi elaborado um instrumento,
chamado “protocolo de RI”, que nos auxiliou na análise descritiva
inicial dos artigos. Este protocolo baseia-se no estudo de Evans
e Pearson (2001) e conteve: a pergunta da revisão, os critérios de
inclusão e as estratégias de busca, assim descritos: i) a identifica-
ção (título do artigo, título da revista em que foi publicado o artigo,
SUMÁRIO área do periódico, base de dados, ano e autores e país da pu-
blicação); ii) metodologia do estudo; iii) as principais considera-
ções/resultados e pergunta da pesquisa e iv) um campo para que
se justifique caso o estudo seja excluído da amostra final. Após a
análise, o revisor deu seu parecer de “selecionado” ou “não se-
lecionado” para cada artigo, seguindo o critério de relevância do
estudo para a amostra e se ele contemplava a temática proposta
de forma integral. Nessa etapa foram excluídos 2 artigos, por não
contemplarem o tema deste estudo.

O universo final desta revisão foi composto por 25 artigos. Des-


tacamos que todos os estudos estavam em português e se localizam
em revistas do Brasil. Apenas 1 artigo, dos 25 selecionados na amos-
tra, era de uma revista Colombiana. Destacamos as revistas Psicologia
Escolar e Educacional com 5 artigos selecionados e a Revista Ibe-
ro-Americana de Estudos em Educação com 4 artigos selecionados,
Política & Sociedade com 2 e os demais periódicos com apenas 1
estudo presente. Quanto ao ano de publicação, temos 2 estudos do
ano de 2017, 10 periódicos lançados em 2018, 5 artigos de 2019, 4 em
2020 e 4 em 2021. Em relação ao método dos artigos, 10 apresenta-
vam o método qualitativo, e os restantes foram de estudos teóricos,

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sendo divididos assim em: 5 ensaios, 4 revisões integrativas, 2 revisões
narrativas, 3 estudos de caso e 2 revisões documentais. As principais
áreas dos periódicos escolhidos se encontram na área da Educação e
da Psicologia, com destaque para a Psicologia Educacional, além da
área da Saúde e Sociológica

Quadro 1 – Artigos analisados

Artigo Revista/Ano/País Método Autores


Produzindo Medicalização:
uma revisão bibliográfica Psicologia da Educação/ Revisão Geane da Silva Santos;
sobre encaminhamentos da 2021/Brasil integrativa Gisele Toassa
educação escolar à saúde
SUMÁRIO Debatendo sobre medica-
Psicologia Escolar e Maria Lúcia Cha-
lização com docentes em Qualitativo
Educacional/2021/Brasil ves Lima et al
escolas públicas e privadas
Luciana Jaramillo
A cultura medicalizante e os CES Psicologia/2019/ Revisão
Caruso Azevedo;
processos transgeracionais Colômbia Narrativa
Terezinha Féres Carneiro
Diálogos sobre medicaliza- Psicologia em Rudinei Luiz Beltra-
Revisão
ção da infância e educação: Estudos/2019/ me; Marivete Gesser;
integrativa
uma revisão de literatura Brasil Simone Vieira de Souza
Fonoaudiologia educacio- Distúrbios da Marta Cecilia
Revisão
nal: reflexões acerca da Comunicação/ Rabinovitsch Gertel;
Integrativa
medicalização da educação 2018/Brasil Ana Claudia Tenor
Medicalização da queixa Cristiane Moreira Da
escolar e o uso de psico- Estudos e Pesquisas Revisão Silva; Rafael Coelho
fármacos como resposta à em Psi/2018/Brasil Documental Rodrigues; Letícia
questões comportamentais Nascimento Mello
A formação inicial do peda- Vânia Aparecida
Psicologia Escolar e
gogo e o enfrentamento da Qualitativo Calado; Herculano
Educacional/2018/Brasil
medicalização na educação Ricardo Campos
Medicalização e educa- Análise Do-
ção: análise de pro- Psicologia Escolar e cumental/ Mariana Dias
cessos de atendimento Educacional/2018/Brasil estudo Benedetti et al
em queixa escolar de caso

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Artigo Revista/Ano/País Método Autores
Reificação, inteligência
Vivian Heringer
e medicalização: formas Psicologia Escolar e Revisão
Pizzinga; Henrique
históricas e atuais de Educacional/2018/Brasil Narrativa
Romero Vasquez
classificação na escola
Amanda da Silva
Efeitos da medicalização Revista de Psicologia/ Estudo
Moreira; Luciana
na travessia adolescente 2018/Brasil de caso
Gageiro Coutinho
Revista Espaço Acadê-
Escola, medicaliza- Ademir Henri-
mico/ Ensaio
ção e educação que Manfré
2018/Brasil
Discursivização so-
bre “doenças do não
Revista Ibero-Ameri-
aprender” no contexto Claudia Regina
SUMÁRIO educacional inclusivo: o
cana de Estudos em Qualitativo
Mosca Giroto et al;
Educação/2019/Brasil
que dizem os professores
de Educação Infantil?
Medicalização na George Saliba Manske;
Reflexão e Ação/2018/
escola e a produção Qualitativo Daniela Cristina
Brasil
de sujeitos infantis Rático de Quadros
Problemas escolares,
medicalização e singula-
ridades dos adolescentes: Educação Temática Estudo Luciana Renata
Contribuições para a Digital/2021/Brasil de Caso Moreira Fonseca et al
pesquisa/intervenção de
orientação psicanalítica
Moralização e medi-
Alonso Bezerra de
calização na escola: Laplage em Revista/
Ensaio Carvalho; Fabio-
reflexões para a educa- 2017/Brasil
la Colombani
ção contemporânea
Medicalização da aprendiza- Revista Ibero-Ameri-
Regina Lemes
gem e resiliência: significa- cana de Estudos em Qualitativo
Santos et al
ções produzidas na escola Educação/2018/ Brasil
A medicalização e sua Fabiola Colombani;
Revista Ibero-Ameri-
história: normalização Flavia Cristina Castilho
cana de Estudos em Ensaio
e disciplinamento por Carácio; Daniela Maria
Educação/2019/Brasil
meio da escola Maia Veríssimo

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Artigo Revista/Ano/País Método Autores
A medicalização da Rita de Cassia
educação: implicações Educação e Pesqui- Fernandes Signor;
Qualitativo
para a constituição do sa/2017/Brasil Ana Paula Berberian;
sujeito/aprendiz Ana Paula Santana
Entre o remédio e o
Política & Sociedade/
corpo inquieto: de qual Qualitativo Cristiana Carneiro
2021/Brasil
infantil falamos?
Cartografia da implantação
Daiane Kutszepa
e execução do Programa Educação em
Rambilla; KLEBA, Maria
Saúde na Escola (PSE): Revista/2020/ Qualitativo
Elisabeth Kleba; Márcia
implicações para o proces- Brasil
Luíza Pit Dal Magro
so de desmedicalização
Estudantes e o doping inte- Psicologia Escolar Emilia Suitberta de
SUMÁRIO lectual: vale tudo na busca e Educacional/ Qualitativo Oliveira Trigueiro; Maria
do sucesso no vestibular? 2020/Brasil Isabel da Silva Leme
Suzi Maria Nunes
Revista Ibero-Ameri- Cordeiro; Solange
Representações sociais so-
cana de Estudos em Qualitativo Franci Raimundo
bre TDAH e medicalização
Educação/2018/Brasil Yaegashi; Lucilia
Vernaschi de Oliveira
A influência do “modelo
centrado na doença”
Política & Sociedade/ Fabíola Stolf
no uso de medicamen- Ensaio
2020/Brasil Brzozowski
tos para problemas de
aprendizagem na escola
Da relação com o saber
Katálysis/2020/ Lara Beatriz Fuck;
medicalizante às práticas Ensaio
Brasil Fábio Machado Pinto
escolares em Florianópolis
Research, Society Tânia Marisa Lopes
Um olhar sobre a Revisão
and Development/ Chaves; Cristina
infância medicalizada Integrativa
2019/Brasil Saling Kruel

Fonte: Elaborado pelos autores a partir da revisão da literatura (2022).

Para analisar os dados extraídos dos artigos, foi utilizado o pro-


cedimento de Análise de Conteúdo. Esse procedimento organiza-se
em três fases, segundo Bardin (2011): I) Pré-Análise: É a organização
de todos os materiais utilizados na coleta dos dados (correspondente
à organização e leitura dos artigos no protocolo). II) Exploração do

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Material: que consiste nas operações de codificação em função das
regras que já foram previamente formuladas (após a leitura no protoco-
lo, criou-se as categorias). III) Tratamento dos resultados: É a fase de
análise propriamente dita, onde os resultados brutos serão tratados de
maneira a serem significativos. Apresentaremos a seguir, as categorias
de análise da revisão.

ANÁLISE E DISCUSSÃO
DOS RESULTADOS
SUMÁRIO Medicalização no âmbito escolar

A partir dos estudos analisados, podemos observar o papel


regulatório que o saber médico cumpriu e desenvolveu ao longo da
história sobre a saúde, a família e a sociedade até o momento em que
passa a exercer forte influência sobre a escola e os alunos. Com a mu-
dança na forma de interpretar a criança a partir do século XVII, buscou-
-se estabelecer um novo local para que elas pudessem se tornar sujei-
tos úteis e produtivos para a sociedade. Com isso, a escola passou a
ser um ambiente propício para o desenvolvimento dos futuros adultos
através de suas normas e dispositivos que eram atrelados ao sistema
político e econômico do Estado, buscando assim uma ordem social
(COLOMBANI; CARÁCIO; VERÍSSIMO, 2019; CHAVES, KRUEL, 2019).

O histórico da medicina na educação apresenta pontos racistas


e biologizantes principalmente quando olhamos para a relação des-
sas duas áreas no século XX e as ideias de raça que predominam no
ambiente social. O convívio com os negros, pobres, doentes e demais
indivíduos era fator preocupante. As transformações sociais ocorri-
das modificaram os vínculos familiares que passaram a sofrer com
a intervenção do conhecimento científico (BENEDETTI et al., 2018).

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O higienismo aqui surge com o intuito de reestruturar a família a partir
das normas disciplinares advindas do saber médico para formar cida-
dãos normatizados para o ambiente capitalista, assim estabelecendo
um controle sobre a vida (COLOMBANI; CARÁCIO; VERÍSSIMO, 2019).

Na construção da infância, o corpo adulto é tido como o princi-


pal ponto de diferenciação dessa etapa inicial da vida. O que interes-
sava para as ciências psicológicas ainda no início, era que o desenvol-
vimento infantil tinha como objeto ideal um adulto racional e maduro.
Em um ponto de vista evolutivo, abandona-se o ser que é considerado
animalesco e inferior para desenvolver uma pessoa ideal. Nesse mo-
mento, apesar de se dialogar para a melhoria da criança, ela ainda
SUMÁRIO não é voz ativa e nem de direito, quem exige e trabalha por ela são
os adultos com suas próprias interpretações da infância, contribuindo
na verdade para a invisibilidade desses indivíduos (CARNEIRO, 2021).

Manske e Quadros (2018) corroboram a ideia de infância como


condição atrelada a diversos saberes atuantes no meio social, familiar,
escolar e outros espaços que formam a concepção deste termo de acor-
do com os sentidos elaborados pela cultura e pela sociedade. Os au-
tores ainda discorrem sobre o papel da escola em gerar alunos dóceis
através do poder que ela exerce, no entanto, tal poder foi subtraído dian-
te dos marcadores biológicos que a medicina fortaleceu ao longo dos
anos na sociedade. Os saberes biomédicos avançaram para além da
área da saúde, estabelecendo uma relação com a educação e a escola.

Carvalho e Colombani (2017), ao apontarem sobre os ensina-


mentos da Ética e Moral nas escolas brasileiras reforçaram ainda o
caráter normatizador que o Estado possui de incluir nos ensinamentos
pedagógicos a imposição de valores e preceitos que os estudantes
têm por obrigação apreender. É necessário que o aluno siga uma car-
tilha de condutas proposta pela escola e pela sociedade, mas a plurali-
dade que deveria ser incentivada nesse ambiente é ignorada em nome
da universalidade dos saberes.

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Caráter individual dos problemas escolares

A partir da literatura analisada destaca-se predominantemente


que o aluno no ambiente escolar tem as suas dificuldades escolares
entendidas como um fator individual, característica encontrada em
mais da metade da literatura estudada (BELTRAME; GESSER; SOUZA
2019; BENEDETTI et al., 2018; BRZOZOWSKI, 2020; CALADO; CAM-
POS, 2018; CARNEIRO, 2021; CARVALHO; COLOMBANI, 2017; CHA-
VES; KRUEL, 2019; CORDEIRO; YAEGASHI; OLIVEIRA, 2018; FUCK;
PINTO, 2019; GERTEL; TENOR, 2018; GIROTO; ARAÚJO; VITTA, 2019;
LIMA et al., 2021; MANFRÉ, 2018; PIZZINGA; VASQUEZ, 2018; SAN-
SUMÁRIO
TOS; OLIVEIRA; BIANCHINI, 2018; SANTOS; TOASSA, 2021; SIGNOR;
BERBERIAN; SANTANA, 2017; SILVA; RODRIGUES; MELLO, 2018;
TRIGUEIRO; LEME, 2020).

É atrelado ao estudante a culpa pelas dificuldades escolares


que ele apresenta, principalmente quando este não se encaixa no pa-
drão da escola, assim como, a responsabilidade de solucionar esses
casos é delegada à área da saúde, que deve então devolver um aluno
que obedeça às regras (MANFRÉ, 2018; SANTOS, TOASSA, 2021).

O processo de medicalização de comportamentos, atrelado


principalmente ao lançamento dos manuais psiquiátricos como o
DSM, vem transformando em sintomas psicopatológicos comporta-
mentos e/ou acontecimentos muitas vezes passageiros ou transitórios
(SILVA; RODRIGUES; MELLO, 2018). Partindo desse aspecto, existe
uma banalização de diagnósticos ocasionados pela apropriação das
demandas biológicas da queixa escolar, que dessa maneira abandona
a possibilidade de alternativas de enfrentamento já que se mostra im-
possibilitado de trazer para análise as políticas educacionais.

Nesse sentido, Chaves e Kruel (2019) afirmam que a socieda-


de atual centrada no adulto não está sabendo lidar com as crianças.

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De igual forma, a escola não consegue considerar a subjetividade do
indivíduo e de que ele não apresenta um tempo comum a todos para
aprendizagem. Nem sempre o comportamento inquieto indica um trans-
torno, contudo, a visão individualizante torna o sujeito um objeto com
falhas e desconsiderado de sua história, seu contexto social e familiar.

Manske e Quadros (2018) apontam a medicalização como re-


ducionista, já que esta interpreta o sujeito como alguém reduzido a
processos cognitivos e ao cérebro. Ao se relacionar com a aprendiza-
gem, é difundido também nesse contexto o discurso da doença e do
doente, os alunos não aprendem devido a um problema no sistema
educacional mas, sim, porque são incapazes biologicamente devido
SUMÁRIO ao seu diagnóstico (FUCK; PINTO, 2019).

Portanto, a medicalização dos estudantes isenta a escola, fa-


mília, cenário social e político de se responsabilizar pelos problemas
dos alunos retomando a culpabilização destes frente às expectativas
criadas pelo próprio meio em que vive (BELTRAME; GESSER; SOUZA,
2019). Além disso, o processo de transformação dos processos sociais
em problemas biológicos também implica nos alunos uma desmotiva-
ção frente aos estudos uma vez que esses são rotulados no ambiente
escolar. As medidas adotadas para auxiliá-los podem ter o resultado
de constrangê-los devido ao discurso e tratamento diferenciado que
recebem diante dos outros colegas (FONSECA, ASSIS, SANTIAGO,
2021; SIGNOR, BERBERIAN, SANTANA, 2017).

Medicalização como salvação

A medicalização no contexto educacional é reforçada ainda


pela crença de que a solicitação de encaminhamentos para ou-
tros profissionais é a melhor forma de conseguir intervir e assim
solucionar qualquer que seja o problema, seja de aprendizagem

36
ou comportamental, garantindo que o ambiente continue norma-
lizado. Por conseguinte, nem sempre os professores e as famílias
conseguem visualizar o controle social atribuído aos estudantes pela
medicalização (MANSKE; QUADROS, 2018).

Quando as dificuldades escolares são interpretadas apenas


como problema de origem biológica, o medicamento se torna fator
principal para que o aluno consiga aprender (SANTOS; OLIVEIRA;
BIANCHINI, 2018). Para Beltrame, Gesser e Souza (2019), tanto pais
como professores relatam que o medicamento contribui para maior
concentração nos estudos e controle do comportamento assim, ren-
dendo mais. Trigueiro e Leme (2020), em pesquisa com estudantes
SUMÁRIO do último ano do Ensino Médio sobre o que acham do uso de medi-
camentos para melhorar a capacidade cognitiva, relataram que mais
da metade dos alunos enxergavam essa utilização de remédios como
algo positivo pois: ele ajudaria alunos a superarem dificuldades nos
estudos, aumentaria o desempenho, contribuiria para aqueles que tra-
balham e estudam e os que precisam passar no vestibular. Além disso,
esses estudantes que viam o medicamento como algo positivo tam-
bém foram os que mais afirmaram que os utilizavam ou os utilizariam.

Para os profissionais da educação, é através dos encaminha-


mentos que se soluciona os problemas escolares. Ao aceitarem os
limites do seu conhecimento e solicitarem os recursos de outra área
profissional, eles tendem a melhorar a qualidade de vida do aluno e
nesse sentido, os devidos encaminhamentos para a área da saúde se
mostram como alívio para os profissionais. Entretanto, ao evidenciarem
o despreparo para lidar com as dificuldades dos estudantes, a escola
acaba por segregar e reforçar as diferenças a partir dos diagnósticos
(SANTOS; TOASSA, 2021).

A partir do momento em que o aluno não consegue acompanhar


os outros estudantes da turma, eles passam a serem encaminhados
para a clínica e para o uso da medicação (BENEDETTI et al., 2018).

37
Essa busca no saber médico reduz a angústia dos professores frente
às dificuldades encontradas no campo pedagógico e gera a normali-
zação da medicalização que desresponsabiliza a escola e os professo-
res da tarefa de buscar soluções além da via clínica (MANFRÉ, 2018).

Dentre os medicamentos utilizados para as queixas escolares, en-


contramos o metilfenidato, o remédio mais utilizado para tratamento do
TDAH que “parece ter dois objetivos primários principais: a melhoria do
comportamento, relacionada com a disciplina, e a melhoria do desem-
penho, relacionada com um discurso de produtividade” (BRZOZOWSKI,
2020, p. 258). Ainda segundo a autora, o discurso em torno do medica-
mento em artigos científicos geralmente evidencia o bom resultado des-
SUMÁRIO te quando utilizado para melhorar o desempenho apesar das dúvidas
sobre o funcionamento a longo prazo. O uso deles para o tratamento de
questões comportamentais e de aprendizagem é naturalizada ao ponto
que a recusa em consumí-lo pode ser entendida como descaso.

Fracasso escolar e o não-aprender

Os problemas escolares relacionados a comportamento e apren-


dizagem se mostram como fator principal para a busca por atendimento
aos serviços de saúde amparados pela justificativa biológica dessas di-
ficuldades (SANTOS; TOASSA, 2021). Os educadores passam a ana-
lisar esses entraves com um olhar clínico para performance, ou seja,
as competências dos alunos são avaliadas de acordo com as metas
estabelecidas ou comportamentos esperados, já que a escola se apre-
senta como lugar de desenvolvimento de cidadãos e de seleção para as
universidades ou sucesso profissional (GERTEL; TENOR, 2018).

Os comportamentos desviantes e o baixo desempenho es-


colar são anunciados pela instituição como um problema que foge
às suas expectativas normatizadoras, contribuindo assim para que

38
a medicalização assuma a responsabilidade de melhorar o desempe-
nho e as condutas. Podemos observar que o fracasso escolar assume
características patologizantes a partir do momento em que se desta-
ca mais as disfunções biológicas do indivíduo sem procurar investigar
outros fatores que possam estar envolvidos (BENEDETTI et al., 2018;
GERTEL, TENOR, 2018; SILVA, RODRIGUES, MELLO, 2018).

Santos, Oliveira e Bianchini (2018), também trazem caracterís-


ticas associadas ao fracasso escolar e a sua medicalização e denun-
ciam sobre o alto uso do medicamento Ritalina comumente utilizado
por crianças e adolescentes que apresentam histórico de reprovação,
abandono escolar e/ou dificuldades de escolarização, muitas vezes
SUMÁRIO associados à indisciplina na sala de aula.

Conforme a compreensão das doenças do não-aprender pela


escola, a aprendizagem no ambiente escolar pode se tornar dificultosa
ao visualizar apenas os aspectos biológicos dos problemas escola-
res e se concentrando na doença pois, o alcance das potencialidades
dos estudantes é reduzido, visto que o processo do aprender envolve
diversos aspectos além dos vivenciados em sala de aula (GIROTO,
ARAÚJO, VITTA, 2019; MANFRÉ, 2018).

A ação cada vez mais comum de encaminhamentos e diagnós-


ticos é anunciada pela prática de ensino esvaziada de sentido com as-
pecto homogeneizador e visão reducionista do trabalho do educador
(GIROTO, ARAÚJO; VITTA, 2019). Assim, o processo educacional sofre
com a homogeneidade dos discursos empregados na instituição esco-
la, colocando o aluno em um estigma de doente, sendo frequente que a
escola procure na saúde mental a resposta para as manifestações dife-
rentes de apropriação do conhecimento (MOREIRA, COUTINHO, 2018).

39
Educação reducionista

A relação dos professores com o discurso medicalizante se mos-


trou diferente em alguns estudos, por vezes apontando para uma posi-
ção crítica sobre o assunto, mas permeado frequentemente pelo ceder
ao conhecimento médico, como nos demonstra os seguintes autores:
A investigação com professores realizada por Brambilla, Kleba e Magro
(2020) anuncia que muitos profissionais não citam a escola ou os limites
do trabalho pedagógico ao discutirem sobre a medicalização.

A falta de um diálogo mais próximo entre os educadores e os


SUMÁRIO profissionais da saúde também é denunciado em Cordeiro, Yaegashi e
Oliveira (2018), em um contexto em que muitos professores alegaram
discordar dos diagnósticos proferidos pelos profissionais por enten-
deram que a relação com os alunos em sala era diferente daquelas
relatadas na mídia e na literatura, porém, não manifestaram se tiveram
alguma ação para mudar a situação. Os autores inferem no fim que as
representações sociais sobre o TDAH são firmadas pelos conceitos
aprendidos na mídia, nos cursos e pela Saúde.

Lima et al. (2021) relata em sua observação sobre o tema que


ocorre uma ausência de posicionamento crítico a respeito da medica-
lização ou até mesmo o desconhecimento do termo pelos professores.
Contudo, os educadores conseguiram citar diversos casos de transtor-
nos e dificuldades demonstrando que conhecem o assunto mesmo que
não estejam familiarizados com a nomenclatura. Neste caso, aproximar a
discussão entre a escola e a saúde tanto pode expandir a discussão das
dificuldades, tanto pode favorecer a medicalização se não for discutida
com um posicionamento crítico (BRAMBILLA; KLEBA; MAGRO, 2020).

A falta de debate sobre esse objeto de estudo sugere obstácu-


los que profissionais enfrentam no âmbito social: a cobrança de prazos
exigidos pelas escolas, a falta de estrutura e espaço adequado para o

40
acolhimento dos alunos com dificuldades, falta de investimento para
formação dos professores. Tudo isso fortalece a naturalização da medi-
calização no campo educacional, levando os docentes a interpretarem
os problemas de aprendizagem como patologias (LIMA et al., 2021).

A educação atravessada pela medicalização produz ainda uma


visão reducionista do sujeito e suas capacidades, afetando a relação
que ele desenvolve com a aprendizagem (SIGNOR; BERBERIAN; SAN-
TANA, 2017). Dessa forma, conclui Azevedo e Carneiro (2019) em seu
estudo que não se deve restringir os problemas apresentados pela
criança à perspectiva médica, visto que a resposta sintomática da
criança tem a marca das suas construções enquanto sujeito, com as
SUMÁRIO suas respectivas responsabilidades e implicações.

DISCUSSÃO

Os conteúdos reunidos a partir da coleta de dados da RI nos


levam a analisar a medicalização dos processos educacionais e do con-
texto escolar atuante sob um ponto de vista crítico a respeito das condi-
ções sociais que viabilizam sua prática contínua. Na sociedade em que
vivemos divulga-se a existência dos direitos individuais e comunitários
como prática comum que atinge e protege a todos. No entanto, a igual-
dade social, que também inclui uma formação educacional que respeite
os aspectos individuais e sociais do sujeito por todos os atores envol-
vidos no processo que é a educação, ainda é distante (VIANA, 2016),
de modo que os projetos educacionais no Brasil foram guiados em sua
história pela influência das ideias liberais presentes na sociedade.

Até mesmo a prática psicológica que participava dos proces-


sos educativos atuava de forma descontextualizada da realidade so-
ciocultural promovendo sua participação com foco nos desempenhos

41
escolares e em ações de caráter psicométricos (OLIVEIRA; DIAS,
2016). O objetivo era buscar respostas que justificassem o fracasso
escolar e através desses diagnósticos atribuídos aos estudantes selar
a eles um destino escolar pautado pela incapacidade (SOUZA, 2020).

Nesse sentido, podemos compreender a escola como uma


instituição disciplinar, como defendido por Foucault (2014), que expli-
ca que no capitalismo a sociedade exerce poder sobre os corpos de
maneira a discipliná-los a se tornarem mais fáceis de serem governá-
veis (docilizados) e se tornem trabalhadores úteis economicamente.
Esse poder é exercido em instituições disciplinares, como a prisão
ou a escola, por exemplo. Assim, a violência passa a ser sutil e a ser
SUMÁRIO exercida não mais somente no corpo do sujeito condenado, mas na
subjetividade de todas as pessoas, de maneira a punir os corpos
para que esses sejam disciplinados. Dessa forma, a medicalização
pode funcionar como um mecanismo para disciplinar alunos que não
atendem às normas escolares de desempenho e comportamento, de
modo a socializá-los na escola para que se tornem “cidadãos aptos”
ao trabalho e convívio social.

Não obstante, as discussões obtidas através da revisão ainda


nos levam a pensar que a necessidade de explicar as dificuldades
de aprendizagem pelas vias do conhecimento médico ou científico
que não se encontram na sala de aula, continuam em pleno funcio-
namento. As justificativas permanecem centradas em identificar no
aluno a causa da sua dificuldade, o que aponta para o que Gesser (et
al, 2019) discute, quando os autores explicam que no Brasil, as dire-
trizes nacionais da educação (e inclusive da educação inclusiva) são
baseadas em estereotipias médicas, pois foram organizadas sobre o
outro e não com o outro.

Resgatando Foucault (2014), ele explica que o saber ‘médico-


-científico’ tem força na sociedade na medida em que individualiza
a processos biológicos questões sociais, de modo a ser mais uma

42
forma de exercer poder disciplinar sobre os corpos. Nesse sentido,
a revisão apontou para a tentativa de explicar os processos compor-
tamentais e de aprendizagem escolar via saber médico, de modo
a desconsiderar diversos outros fatores sociais que influenciam na
aprendizagem e desenvolvimento humano. Dessa forma, de acordo
com Bourdieu (1992), a escolarização amplia e legitima as desigual-
dades sociais por meio de mecanismos de eliminação que agem
durante todo o processo escolar, culminando no fracasso de alguns
alunos. Mas quais alunos seriam esses?

Patto (2000), procurou em seus estudos tecer uma análise sobre


a produção do fracasso escolar e revisitou diversas teorias atreladas
SUMÁRIO ao processo desse insucesso, desde as teorias que traziam à tona os
conceitos raciais, passando pela falta de acesso a bens culturais e prá-
ticas higienistas. No entanto, em sua maioria elas são atreladas quase
que exclusivamente às famílias mais pobres, de modo que a perpetua-
ção de estereótipos sobre as classes sociais mais baixas tende a levar
a submissão em vista da aceitação da inferioridade. Nas escolas esse
discurso se abate sobre os estudantes que refletem e internalizam o
olhar pessimista, por parte dos educadores, sobre suas competências
(SOUZA, 2020). Assim, a medicalização acaba por eximir a escola e os
profissionais da educação dos processos de insucesso escolar.

De acordo com Mantoan (2015), os sistemas escolares estão


divididos a partir do princípio da normalidade/anormalidade. Em uma
visão determinista e mecanicista, formalista e reducionista, própria do
pensamento científico moderno, que ignora o subjetivo, o afetivo, o
criador. Desse modo, ainda de acordo com a autora, a escola brasileira
é marcada pela evasão de uma parte significativa dos alunos que são
extremamente marginalizados e esse fracasso continua sendo culpa
do aluno, pois a escola continua a relutar em admiti-lo como seu. As
escolas atribuem aos alunos as deficiências do ensino ministrado e
não se avalia o que e como a escola ensina, pois, a escola brasileira se

43
encontra marcada pelo processo tradicional de ensino. De acordo com
Carraher (1991), o modelo educacional presente nas sociedades capi-
talistas (modelo tradicional de educação) trata o conhecimento como
conteúdo, coisas e fatos a serem transmitidos ao aluno e este, vai à es-
cola para “receber” educação. Dizer que ele aprenderá significa dizer
que ele saberá dizer ou mostrar aquilo que lhe foi ensinado. O conhe-
cimento é “consumido” pelo aluno, isto é, ele recebe o conhecimen-
to já pronto e organizado e seu único trabalho é “engolí-lo”. Algumas
características desse modelo: O professor tem um papel dominante,
é ele quem dirige a aprendizagem ao aluno; Há a ênfase apenas na
resposta correta; Noção de que o conhecimento consiste no acúmulo
SUMÁRIO de fatos e informações isoladas; utilização de problemas que não in-
centivam o aluno a pensar; Culpa ao aluno pelo fracasso escolar.

CONCLUSÃO

O presente trabalho, ao revisar o material produzido sobre medi-


calização nas escolas, reuniu um conteúdo que nos leva a pensar sobre
os impactos do saber médico e patologizante no cenário da educação.
A literatura nos mostrou diversos caminhos percorridos pela medicina no
controle dos aspectos sociais até chegar ao campo educacional. Já a es-
cola, enquanto instituição que se localiza em um contexto político, econô-
mico e social reproduz as normas medicalizantes vigentes que atuam na
manutenção dos corpos. O controle no ambiente escolar se traduz pelas
ideias que envolvem o fracasso escolar, o desempenho dos alunos nos
estudos, assim como questões relacionadas ao comportamento e que
são explicadas como características de responsabilidade do indivíduo.

Após a leitura dos artigos presentes na revisão integrativa,


os principais pontos que se destacaram como colaborativos para
a continuidade do pensamento medicalizante na instituição escola

44
e destacados nos resultados foram: a presença da medicina no âmbi-
to escolar oriunda da forte influência que já exerce na sociedade fora
das escolas; o caráter individual dos problemas escolares favorecidos
pelo aspecto biologizante que faz parte do processo medicalizante; a
medicalização vista como salvação pelos professores, pelos pais até
pelos alunos e influenciados pelo alto poder da indústria farmacêuti-
ca, por uma divulgação na mídia dos benefícios dos medicamentos e
pela naturalização do consumo de comprimidos; o fracasso escolar e
o não-aprender associados a doença; a educação reducionista que
não contribui para a produção do conhecimento crítico e que não leva
em consideração os diversos estímulos que estudantes recebem fora
SUMÁRIO da escola, tornando o processo educativo comum desestimulante.

Para romper com esse processo, Gesser (et al, 2019) discute o
chamado Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA), que orienta
a remoção de barreiras para a aprendizagem e antecipa possíveis ne-
cessidades educacionais de um maior número de estudantes. O DUA
revela um compromisso por justiça no contexto educacional, onde
busca-se possibilitar a todos os estudantes equidade de oportunida-
des para aprender a partir da oferta de recursos, estratégias e me-
todologias diversificadas, incluindo a antecipação das necessidades
apresentadas pelos estudantes a partir das diferenças nos modos de
aprender, sendo um conjunto de princípios para o desenvolvimento de
currículos que fornece a todos os indivíduos igualdade de oportunida-
des para aprender, de modo que se elimine barreiras desnecessárias
sem eliminar os desafios necessários ao desenvolvimento e aprendiza-
gem. Assim, o DUA mostra-se como uma possibilidade para se romper
com práticas medicalizantes na escola, de modo a propor diversas
possibilidades e contextos de aprendizagem.

A revisão buscou apenas elucidar a relação entre medicalização e


o contexto escolar sem ser um estudo definitivo sobre o tema que dada
a complexidade do assunto não conseguiu abordar todas as variáveis

45
e desdobramentos envolvidos. Como limitações do estudo, apresenta-
mos o fato de que não analisamos o impacto da medicalização escolar
nos corpos de alunos com deficiência, por entender que essa experiên-
cia requer estudos específicos, devido à complexidade do assunto.

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