Relatorio 2970 131596
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RELATÓRIO FINAL
CURITIBA
2024
RESUMO
Este estudo visa analisar a qualidade da gasolina em três postos Shell de Curitiba,
usando análises físico-químicas e comparando os resultados com a Resolução nº 807
de 2020 da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Além disso, foram realizados ensaios de adulteração com aguarrás para avaliar a
eficácia das análises na detecção desse adulterante. As amostras foram testadas
quanto à densidade, teor de etanol, destilação fracionada e espectroscopia UV-Vis. A
amostra do posto Z foi selecionada para os ensaios de adulteração, nos quais foram
adicionadas 0,5%, 1%, 5% e 10% de aguarrás. Todas as amostras atenderam ao
estipulado pela norma vigente para a densidade, mas a amostra do posto X excedeu
o limite de etanol, registrando 56,1 ± 4,0%. Na destilação fracionada, todas as
amostras, incluindo as adulteradas, mantiveram as temperaturas de ebulição dentro
dos parâmetros normatizados para as frações evaporadas de 10%, 50% e 90% do
volume. As amostras adulteradas mostraram um aumento na densidade com a
concentração de aguarrás, ainda dentro dos limites permitidos, dificultando a
detecção da adulteração apenas por esse parâmetro. No entanto, a destilação
fracionada revelou desvios significativos nas amostras adulteradas com 5% e 10% de
aguarrás, principalmente entre 60% e 70% de volume evaporado. A espectroscopia
UV-Vis indicou um aumento na largura das bandas entre 250 e 330 nm, associadas
a compostos aromáticos como BTX, típicos da aguarrás. Concluiu-se que, embora
densidade e destilação fracionada não sejam suficientes para detectar a adulteração
segundo a Resolução n° 807 de 2020, as curvas de destilação e os espectros UV-Vis
mostraram-se eficazes na identificação de aguarrás em concentrações de 5% e 10%.
1. INTRODUÇÃO
O petróleo e seus derivados são parte majoritária da matriz energética mundial.
Os combustíveis automotivos são alguns dos mais conhecidos produtos provenientes
do petróleo, estando presentes no cotidiano das pessoas. A gasolina, que abastece
os carros utilizados por bilhões de pessoas, é obtida por meio da destilação do
petróleo nas refinarias. Em seguida, nos distribuidores de combustíveis ocorre a
formulação da gasolina comum, que contém 27% de etanol; da gasolina premium,
com 25% de etanol; e da gasolina aditivada, que recebe detergentes e dispersantes
(ANP, 2020a; TAKESHITA et al., 2008).
O aumento dos preços dos combustíveis pode incentivar os distribuidores a
adicionarem substâncias menos taxadas de forma ilegal, de modo a aumentar o lucro.
A adição de tais compostos é chamada de adulteração e pode ser definida como a
introdução de componentes que não estão em conformidade com os requisitos e
especificações do produto. A adulteração dos combustíveis provoca mudanças em
suas propriedades físico-químicas e, portanto, diversos problemas no funcionamento
dos motores e danos nas peças dos automóveis (FADAIRO et al., 2020; GOUVEIA,
2012). Desta forma, uma rígida legislação foi estritamente necessária para o controle
de qualidade dos combustíveis. No território brasileiro, a distribuição e a
comercialização dos combustíveis líquidos são regulamentadas pela Agência
Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, cuja finalidade é
estabelecer os parâmetros de qualidade dos combustíveis, fiscalizar e monitorar
essas atividades (ANP, 2012, ANP, 2020b).
Este trabalho visa analisar a qualidade da gasolina de três postos de
combustíveis da bandeira Shell, da cidade de Curitiba, por meio de análises físico-
químicas e comparar os resultados com a Resolução n° 807 de 2020 da ANP. Além
disso, o estudo se propõe a realizar ensaios de adulteração com um solvente
industrial, a aguarrás, de modo a verificar a eficácia das análises na detecção do
adulterante.
2. REVISÃO DA LITERATURA
A gasolina é um combustível automotivo formado por compostos orgânicos,
em sua maioria hidrocarbonetos com 5 a 12 átomos de carbono, e possuem uma
pequena taxa de compostos sulfurados, nitrogenados e oxigenados. A formulação da
gasolina possui grande complexidade e é estabelecida de acordo com a capacidade
da obtenção das frações leves do petróleo da refinaria, cuja composição é definida
pelos produtos intermediários, principalmente a nafta leve (NETO, 2008).
A gasolina obtida através dos processos de refino é chamada do tipo A, e
posteriormente, nos distribuidores de combustíveis, o EAC (etanol anidro
combustível) é adicionado à gasolina do tipo A, atualmente com uma quantidade de
27% e é reclassificada como gasolina do tipo C (BOAMAR, 2010). Cada distribuidor
de combustível elabora uma Ficha de Informações de Segurança de Produto Químico
(FISPQ), onde é possível encontrar todas as informações a respeito da empresa
responsável, fornecedor, distribuidor, características físico-químicas do produto,
composição química, perigos relacionados e as devidas medidas de manuseio e
controle (FISPQ: Gasolina C, 2011).
A adulteração é o ato de adicionar inconsequentemente compostos aos
combustíveis, fora dos padrões estabelecidos pela norma que regulamenta o
respectivo combustível. A principal justificativa pelo ato são as cargas tributárias
aplicadas aos derivados do petróleo destinados para serem utilizados como
combustíveis. Desta forma, a adição de solventes petrolíferos menos taxadas
diminuem os preços nos postos de combustíveis, sem deixar qualquer vestígio de
irregularidade (GOUVEIA, 2012). Devido à falta de fiscalização da ANP e à impostura
de postos de combustíveis, ainda hoje são relatados casos de adulteração (NETO,
2024). A adição de compostos adulterantes provoca intensas mudanças nas
propriedades físico-químicas do combustível, o que pode provocar danos no veículo.
Por exemplo, a gasolina com excesso de etanol anidro provoca alterações no
desempenho do motor e o aumento do consumo de combustível. A adição de
solventes como o tolueno provoca a deterioração de tubos e mangueiras de borracha,
diminuindo a potência do motor nos casos em que necessite vencer obstáculos como
rampas e ladeiras (OLIVEIRA et al., 2004). Se a gasolina for adulterada com
querosene, a combustão interna no motor se torna mais difícil, levando a emissões
de material particulado oriundo da combustão incompleta deste adulterante. Caso a
gasolina seja adulterada com diesel, os mesmos efeitos gerais são observados
(KANAUJIA, 2015). Para Lima e colaboradores (2019), a adulteração causa
problemas tanto no sistema mecânico de motores quanto na saúde do consumidor,
levando a doenças cardiovasculares e respiratórias, além de provocar distúrbios
neurodegenerativos.
O trabalho desenvolvido por Oliveira e colaboradores (2013) realizou análises
de bancada para observar as alterações nas características físico-químicas do teor
de etanol na gasolina a partir das normas vigentes em 2013. O método da picnometria
foi utilizado para determinar a massa específica das amostras de gasolina. Através
dos resultados obtidos, os autores notaram que a massa específica da gasolina
alterava conforme o teor de etanol. Tal comportamento é observado devido a
densidade do EAC, maior que a densidade da gasolina.
Mota e colaboradores (2013) analisaram o teor de etanol na gasolina,
distribuída nos postos de combustíveis da cidade de Pontes e Lacerda – MT, através
da norma ABNT NBR 13992. As normas vigentes no ano de 2013 estabeleciam que
o teor de etanol na gasolina era de 25%. O trabalho revelou inconformidades nas
amostras de alguns postos em relação ao padrão estabelecido pela norma,
observando a mudança no preço do volume de gasolina cobrado nos postos.
Um solvente comumente utilizado para adulteração da gasolina é a aguarrás,
utilizada na indústria como solvente para formulação de tintas e diluentes. A nafta
hidrodessulfurizada pesada (corte C8-C10) e o querosene fazem grande parte da sua
formulação (FISPQ: 1001657, 2019). Este produto é dificilmente detectado no
combustível, pois sua composição química e suas características físico-químicas são
muito similares àqueles observados na gasolina. Porém, em grande quantidade, seu
odor é característico. Ainda, são encontrados muitos hidrocarbonetos aromáticos em
sua composição química como o benzeno e o tolueno (FISPQ: P901, 2011).
O estudo apresentado por Dias e colaboradores (2007), avaliou os efeitos da
adição de aguarrás à gasolina comum nas concentrações de 10, 20, 30, 35 e 40% e
as suas respectivas misturas segundo as especificações da resolução nº 36 de 2006
da ANP. Os autores analisaram a curva de destilação, massa específica, octanagem
e teor de hidrocarbonetos. Notou-se que a adição de aguarrás afetou de maneira
significativa a curva de destilação nos pontos de 10 e 50% de evaporados, nas
concentrações superiores a 35%, superando as temperaturas de 65 e 80ºC nos
respectivos pontos. A massa específica variou de 761,23 kg/m3 a 765,60 kg/m3, entre
a gasolina tipo C e a gasolina adulterada com 40% de aguarrás respectivamente, o
que se explica pela elevada massa específica. O teste de octanagem MON e IAD não
expressaram resultados satisfatórios. Quanto ao teor de hidrocarbonetos, observou-
se uma diminuição na concentração, com o aumento da presença de aguarrás, devido
à diluição. Em contrapartida o teor de saturados aumentou, o que se esperava pois a
aguarrás é um solvente alifático.
Almeida (2002) observou os efeitos de diferentes adulterantes na qualidade da
gasolina automotiva, como o óleo diesel, querosene, aguarrás, tiner, rafinado e
metanol. As análises realizadas foram a curva de destilação e um procedimento
analítico por infravermelho para determinar a octanagem. Os efeitos observados pela
adição de aguarrás resultaram em uma modificação na curva de destilação, no
aumento de constituintes aromáticos e na diminuição da octanagem da gasolina.
Estes efeitos são explicados pela faixa de destilação que está compreendida entre
150 e 220 °C e pela riqueza de compostos aromáticos no solvente. No entanto,
observou-se que não depende apenas da quantidade de solvente adicionado, mas
também da composição da gasolina, para que a adulteração ultrapasse os limites
estabelecidos pelas especificações.
3. MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa foi realizada no laboratório de pesquisa PETROLAB e no
laboratório de ensino de química, ambos localizados no bloco C do Setor de
Educação Profissional e Tecnológica – SEPT da Universidade Federal do Paraná –
UFPR.
As amostras de gasolina foram coletadas em pontos estratégicos da cidade de
Curitiba – PR, de modo a proporcionar uma cobertura de área analisada. Os locais
de amostragem não serão identificados para conservar a ética profissional. As
amostras foram identificadas como postos X, Y e Z. Todas as amostras foram
pertencentes a postos da bandeira Shell
As amostras foram analisadas de acordo com as normas vigentes da ANP, as
quais são baseadas mediante o emprego das Normas Brasileiras (NBR) da
Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), das normas da Sociedade
Americana de Testes e Materiais – ASTM (do inglês, American Society for Testing
and Materials) e das normas da Organização Internacional para Padronização – ISO
(do inglês, International Organization for Standartization).
No início das atividades, preparou-se as amostras e as vidrarias necessárias
para as análises. Lavou-se 21 frascos âmbar para armazenamento das amostras e
fez-se a etiquetagem dos mesmos, lavou-se os tubos de ensaio com tampa, o sistema
de destilação e 10 provetas de 10 mL.
Para a determinação do teor de etanol na gasolina, primeiramente executou-
se a calibração das provetas. O método consistiu em utilizar a densidade da água
(nas condições do ambiente) para calcular o volume real das provetas. Com uma
balança de precisão de 0,0001 g, colocou-se uma proveta e logo em seguida a
balança foi tarada. A água utilizada na calibração apresentava uma temperatura de
22,29 °C que, seguindo valores tabelados da variação da densidade com a
temperatura, determinou-se o valor da densidade da água como igual a 0,99765 g
mL-1. Portanto teoricamente, uma proveta de 50 mL deveria conter 49,8825 g de água.
Posteriormente adicionou-se água até a medida de 50 mL com aferição do menisco,
em seguida anotou-se a medida da massa e com estes dados calculou-se o volume
de água presente nas provetas, como um método gravimétrico. Para a análise,
utilizou-se o método de extração líquido-líquido, utilizando uma solução 10% (m v-1)
de cloreto de sódio. Foi colocado 25 mL da amostra de gasolina em uma proveta de
50 mL com tampa esmerilhada, e em seguida adicionou-se 25 mL da solução de
cloreto de sódio completando o volume da proveta. Pelo caráter polar da solução, o
etanol hidratado combustível é extraído da gasolina. Como a extração foi feita em
uma proveta, foi possível comparar a diferença nos volumes de cada fase. Esta
análise foi realizada em triplicata.
Na determinação da densidade da gasolina por picnometria, primeiramente foi
necessário realizar a calibração do instrumento, que foi realizado de forma análoga
ao método de calibração das provetas. Para a análise das amostras, pesou-se o
picnômetro com a amostra e anotou-se sua massa. A diferença entre essa massa e
a massa do picnômetro vazio permitiu determinar a massa do combustível. Como o
volume do combustível corresponde ao volume do picnômetro determinado durante
a calibração, a densidade foi determinada dividindo-se a massa pelo volume. Esta
análise foi realizada em triplicata.
Em sequência, executou-se a destilação fracionada das amostras. A norma
utilizada como referência para esta análise foi a ASTM D86 que trata da destilação
de derivados de petróleo à pressão atmosférica. O procedimento consistiu em
observar a temperatura de ebulição de cada parcela de 10% de destilado do
combustível. Foram adicionados 100 mL de gasolina em um balão de fundo redondo
que foi acoplado ao sistema de destilação e as provetas de 10 mL, previamente
lavadas, foram utilizadas para medir as frações de destilado. Conforme a análise foi
realizada, os dados respectivos à temperatura de ebulição e ao volume de destilado
foram anotados. Esta análise foi realizada em duplicata.
O último procedimento experimental realizado foi a obtenção de espectros na
região do ultravioleta e visível (UV-Vis) das frações destiladas da gasolina com o
espectrofotômetro UV-Vis modelo NOVA 1600UV. Executou-se a varredura na faixa
de 190 a 500 nm.
A amostra de gasolina do posto Z foi escolhida para os ensaios de adulteração.
Com uso de provetas, balões volumétricos, frascos shott e erlenmeyers, as
adulterações foram realizadas nas concentrações 0,5, 1, 5 e 10% v v-1 de aguarrás,
sendo as amostras chamadas de A0,5, A1, A5 e A10, respectivamente. Para o
preparo das amostras adulteradas, foram considerados os volumes que cada análise
demandaria, com acréscimo para possíveis imprevistos. Desta forma, na destilação
foram contabilizados 200 mL, somados a 45 mL para determinação da densidade por
picnometria, o que resultou em 245 mL, mas por conveniência e praticidade foram
preparados 250 mL para cada adulteração.
Posteriormente, as amostras adulteradas foram analisadas mesmos pelos
métodos utilizados para as amostras dos postos X, Y e Z para a determinação da
densidade, destilação fracionada e a varredura das frações destiladas com um
espectrofotômetro UV-Vis.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Quanto ao aspecto e cor da gasolina, as três amostras apresentaram-se
homogêneas, límpidas e isentas de impurezas, seguindo os parâmetros
estabelecidos pela resolução n° 807/2020 da ANP.
Os resultados obtidos para a determinação do teor de etanol e a densidade
das amostras dos postos X, Y e Z estão mostrados na Tabela 1.
10 53 30 47
20 62 55 51
30 69 53 64
40 72 65 67
50 74 70 69
60 76 72 75
70 76 46 69
80 76 130 140
90 77 143 77
5. CONCLUSÃO
Os resultados das análises físico-químicas das amostras de gasolina do tipo
C, de três postos (X, Y e Z) da cidade de Curitiba, todos da bandeira Shell, revelaram
a não conformidade expressiva do posto X, que apresentou um teor de etanol acima
do estipulado pela legislação vigente. As amostras dos postos Y e Z apresentaram
resultados semelhantes nas demais nas análises (densidade e destilação fracionada
a pressão atmosférica), sendo a amostra de gasolina do posto Z escolhida para os
ensaios de adulteração.
As amostras de gasolina adulteradas com aguarrás mostraram um aumento
nos valores de densidade com o aumento na quantidade de aguarrás, mas ainda
dentro dos limites permitidos, dificultando a detecção da adulteração apenas por esse
parâmetro. A destilação fracionada revelou desvios significativos nas amostras
adulteradas com 5% e 10% de aguarrás, principalmente entre 60% e 70% de volume
evaporado. A espectroscopia UV-Vis indicou um aumento na largura das bandas
entre 250 e 330 nm, associadas a compostos aromáticos como BTX, típicos da
aguarrás.
Ademais, embora a densidade e destilação fracionada (segundo a Resolução
n° 807 de 2020) não sejam suficientes para detectar a adulteração, as curvas de
destilação e os espectros UV-Vis mostraram-se eficazes na identificação de aguarrás
em concentrações de 5% e 10%.
Portanto, denota-se a importância da análise da curva de destilação fracionada
associada com a utilização da espectroscopia UV-Vis. Porém o emprego deste
método em conjunto a outras formas de análise pode apresentar resultados
potencializados e com maior precisão.
6. REFERÊNCIAS