DCV Tese de Láurea - Chang Tsu Li
DCV Tese de Láurea - Chang Tsu Li
DCV Tese de Láurea - Chang Tsu Li
Chang Tsu Li
6245241
SÃO PAULO
2021
FACULDADE DE DIREITO DO LARGO SÃO FRANCISCO
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Chang Tsu Li
6245241
Orientador:
Prof. Dr. Eduardo Tomasevicius Filho
SÃO PAULO
2021
2
RESUMO
Com o advento da Lei Geral de Proteção de Dados, houve uma mudança de paradigmas
em termos de respeito à privacidade das pessoas no meio físico e digital. Dentre os
campos mais afetados por essa nova disciplina jurídica, destaca-se a área da saúde. Na
profissão médica, temas relacionados à privacidade dos pacientes e ao tratamento de seus
dados não são nada novos, sendo o sigilo médico, ou sigilo profissional, seu principal
exemplo. Desse modo, o presente estudo tem como objetivo realizar uma análise
comparativa entre o regramento de tratamento de dados inaugurado pela LGPD e o
regramento já existente relativo ao sigilo médico. Assim, pretende-se averiguar em que
medida as mudanças operadas pela LGPD irão afetar o regramento do sigilo médico, e
quais seriam as consequências desse novo paradigma. Para isso, serão feitas
considerações a respeito dos impactos da LGPD na área da saúde de forma geral, mas
sempre com o foco central direcionado à questão do sigilo médico – objeto principal deste
trabalho.
3
SUMÁRIO
4
I. INTRODUÇÃO
1.1. Introdução:
Nos últimos anos, o debate sobre proteção de dados pessoais ganhou força no
cenário internacional, especialmente após o caso da Cambridge Analytica1. Leis como a
RGPD (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) na Europa e a Lei Federal 13.709,
de 14 de agosto de 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD), trouxeram um novo
paradigma sobre essa disciplina. A amplitude da LGPD atinge pessoas naturais e pessoas
jurídicas de direito público ou privado, bem como afeta uma ampla variedade de
mercados e relações jurídicas. Esse marco regulatório indica a adaptação do sistema
jurídico a características emergentes da sociedade da informação. Sobre isso, BIONI2
assevera que o desenvolvimento da sociedade, passando de uma perspectiva agrícola em
que a riqueza advinha da terra, e por uma perspectiva industrial (produção fabril) e pós-
industrial (serviços), promoveu o sugimento de uma a nova mola propulsora social: a
informação. Esta, sedimentada pelas últimas evoluções tecnológicas, avocou para si um
papel central na sociedade. Protagonismo que teria imprimido “uma completa alteração
do padrão em que se estruturam as relações sociais”.
1
O referido caso consistiu em um escândalo relacionado à utilização de informações de mais de 50 milhões
de pessoas sem seu consentimento, na plataforma do Facebook, pela empresa americana Cambridge
Analytica. [Acesso 15 out. 2021]. Disponível em:
https://g1.globo.com/economia/tecnologia/noticia/entenda-o-escandalo-de-uso-politico-de-dados-que-
derrubou-valor-do-facebook-e-o-colocou-na-mira-de-autoridades.ghtml.
2
BIONI, Ricardo. Proteção de dados pessoais: a função e os limites do consentimento. Rio de Janeiro:
Forense, 2019. p. 33.
5
experiência de Portugal no âmbito do sigilo médico, bem como as melhores práticas de
proteção de dados e privacidade.
A seguir, será exposta uma análise sobre em que medida a LGPD se adequa nesse
já estabelecido debate sobre sigilo médico, e quais perguntas e respostas ela trouxe. Por
essa linha, pretendemos demonstrar que a LGPD pode contribuir para o estabelecimento
de novas e mais bem elaboradas justificativas para a relativização da privacidade do
paciente.
Por fim, tem-se que a tese deste trabalho é demonstrar que, apesar de criar diversas
obrigações de compliance sobre o modo que os agentes de tratamento de dados de saúde
devem tratar os dados, como medidas técnicas e administrativas de segurança, os
fundamentos e princípios da LGPD não mudam a interpretação dos fundamentos e
princípios da ética médica de privacidade e autodeterminação informativa do paciente
6
II: SIGILO MÉDICO
Uma pessoa doente irá recorrer a um hospital ou a um médico para tratar sua
enfermidade e, nesse processo, será necessário revelar suas informações pessoais, para
que o médico possa ter conhecimento de seu paciente e, assim, oferecer uma abordagem
adequada e efetiva para a resolução dessa enfermidade.
De acordo com FRANÇA, o sigilo médico seria o mais antigo e universal princípio
da tradição médica6, estando presente em um dos mais importantes documentos históricos
3
FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. 12ª Ed. Rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense,
2014. p. 173.
4
ANDRADE, Manuel da Costa. Direito Penal médico: SIDA: testes arbitrários, confidencialidade e
segredo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais; Portugal: Coimbra Editora, 2008, p. 14.
apud SANTIAGO, Louise Cerqueira Fonseca. O sigilo médico e o Direito Penal. Direito UNIFACS –
Debate Virtual, Salvador, n. 128, 2011.
5
CUPIS, Adriano de. Os Direitos da personalidade. Lisboa: Livraria Morais Editora, 1961, p. 159.
apud LIMA, Carlos Vital Tavares Corrêa. O sigilo médico. Revista do Médico Residente, Paraná, vol. 12,
n. 2, 2010.
6
Idem.
7
da medicina: o Juramento de Hipócrates7.
O Juramento de Hipócrates, grego que viveu no século 460 a.C. e não raro
considerado um dos pais da medicina, corresponde a um dos textos mais conhecidos pela
comunidade médica, responsável por difundir importantes princípios éticos. No Brasil, é
comum os formandos de medicina e os médicos presentes na cerimônia de formatura
fazerem o juramento hipocrático. Um importante trecho do juramento hipocrático
engloba princípios éticos e do sigilo profissional:
7
Disponível em: https://www.ipebj.com.br/docdown/_a4247.pdf.
8
FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. 12ª Ed. Rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense,
2014, p. 34.
9
ALMEIDA, Marcos de; MUNHOZ, Daniel Romero. O princípio e as razões do segredo médico. Revista
IMESC, São Paulo, n.1, dez, 1998.
8
Através da razão utilitária, existiria a confiança mútua entre o médico e o paciente:
aquele teria a segurança de que seu paciente irá relatar tudo aquilo que for necessário,
sem omissão de informação, e este confiaria no seu médico em não espalhar o que foi
dito. Assim, seria possível a busca do paciente por ajuda ao médico sem hesitação e,
também, a adesão ao tratamento e a autonomia de suas escolhas.
9
2.2. Disciplina jurídica do sigilo médico e legislação pertinente
Segundo FRANÇA10, as leis brasileiras não fizeram do sigilo médico uma forma
particular de segredo, mas pela sua natureza e circunstância está sujeita a uma forma mais
rígida de exigências, em virtude das tradições e costumes da profissão.
“I – O presente Código de Ética Médica contém as normas que devem ser seguidas pelos
médicos no exercício de sua profissão, inclusive no exercício de atividades relativas ao
ensino, à pesquisa e à administração de serviços de saúde, bem como no exercício de
quaisquer outras atividades em que se utilize o conhecimento advindo do estudo da
Medicina”.
No caso do Conselho Federal de Medicina, este é instituido pela Lei n.º 3.268, de
30 de setembro de 1957, na forma de autarquia, sendo um ente dotado de personalidade
jurídica de direito público, com autonomia administrativa e financeira (art. 1º).
10
FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. 12ª Ed. Rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense,
2014, p. 34.
11
Conselho Federal de Medicina. Código de Ética Médica. [Acesso 8 mar. 2019]. Disponível em
http://www.portalmedico.org.br/novocodigo/integra_4. asp.
10
A efetivação de tais atribuições, por parte do Conselho, estão no art. 22 da Lei,
que estabelece as penas disciplinares aplicáveis aos profissionais:
“Art . 22. As penas disciplinares aplicáveis pelos Conselhos Regionais aos seus membros
são as seguintes:
a) advertência confidencial em aviso reservado;
b) censura confidencial em aviso reservado;
c) censura pública em publicação oficial;
d) suspensão do exercício profissional até 30 (trinta) dias;
e) cassação do exercício profissional, ad referendum do Conselho Federal”.
Desse modo, pode-se perceber que, apesar de soft law, as disposições normativas
do Conselho para os profissionais da saúde são bastante importantes, principalmente em
função da gravidade com que a autarquia pode punir os seus membros – conforme se
observa no caso extremo da cassação do exercício profissional (art. 22, “e”).
“Capítulo IX.
Sigilo Profissional.
É vedado ao médico:
Art. 73. Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão,
salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.
Parágrafo único. Permanece essa proibição:
a) mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido;
b) quando de seu depoimento como testemunha. Nessa hipótese, o médico comparecerá
perante a autoridade e declarará seu impedimento;
c) na investigação de suspeita de crime o médico estará impedido de revelar segredo que
possa expor o paciente a processo penal”.
12
FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. 12ª Ed. Rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense,
2014, p. 174.
11
conhecimento deste segredo, em virtude de função, ofício, ministério ou profissão; iii)
ausência de justa causa; iv) possibilidade de dano a outrem; e v) existência de dolo. Poder-
se-ia mencionar ainda um quarto elemento, que, é claro, está pressuposto: a revelação
propriamente dita (sendo este o ato nuclear da infração).
O caput do artigo autoriza a revelação de fato por motivo justo, ou seja, da “justa
causa”. Nos termos da norma, há justa causa quando a revelação for o único meio de
evitar perigo atual ou iminente e injusto para si e para outro. Considerando-se exemplos
de "justa causa":
13
FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. 12ª Ed. Rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense,
2014, p. 174.
12
a) Para evitar casamento de portador de defeito físico irremediável ou
moléstia grave e transmissível por contágio ou herança, capaz de pôr em risco
a saúde do futuro cônjuge ou de sua descendência, casos suscetíveis de
motivar anulação de casamento, em que o médico esgotará, primeiro, todos
os meios idôneos para evitar a quebra do sigilo;
O dever legal, por sua vez, deriva não da vontade de quem o confia a outrem, mas
de condição profissional, em virtude da natureza dos deveres que, no interesse geral, são
impostos aos profissionais. Seguem abaixo exemplos de hipóteses normativas em que se
percebem tais encargos legais:
13
divulgação de assuntos médicos em meios de comunicação em geral, mesmo
com autorização do paciente”.
14
do paciente, revelar o conteúdo do prontuário ou da ficha médica”. Segundo COSTA14,
o prontuário médico, “além de servir como instrumento de memória para o médico,
também tem a função de instrumento de comunicação com os demais profissionais
envolvidos na atençaõ ao paciente e a preservação da continuidade dos tratamentos,
evitando interrupções ou sobreposições deletérias”. Inclusive, há no campo da saúde o
sisteme de prontuário eletrônico do paciente (“PEP”), que consiste no principal sistema
de manipulação de dados clínicos, conforme assevera KITAKE15. De acordo com esse
autor, embora os profissionais da saúde estejam acostumados ao conceito de prontuário,
pelos códigos de ética de seus conselhos profissionais (como o CEM), “não existe a
mesma familiaridade com a tecnologia e controles de segurança”. Antes mesmo da
existência da LGPD, FRANÇA já apontava para o impacto das transformações
tecnológicas no que concerne o prontuário médico:
Além disso, tem-se que no art. 2º da resolução mencionada acima, percebe-se uma
previsão específica daquilo que seria uma justificativa para a quebra do sigilo médico em
razão de dever legal:
14
COSTA, José Augusto Fontoura. Tratamento e transferência de dados de saúde: limites ao
compartilhamento de dados sensíveis. In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de
Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 3.
15
KITAKE, Luis Gustavo Gasparini. Sistemas de prontuário eletrônico e digitalização: impacto da LGPD.
In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de Campos (coord.). LGPD na Sáude. São
Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 19.
15
comunicar tal fato à autoridade competente, sendo proibida a remessa do
prontuário médico do paciente”.
O sigilo médico em Portugal tem como base o ordenamento jurídico do seu Direito
Constitucional, Penal, Civil, do trabalho, na legislação de direito da saúde, nas suas
normas dos Códigos Deontológicos e nas Cartas de Direito dos Pacientes.
16
2.3.1. Direito Constitucional
“1 - Todos os cidadãos têm o direito de acesso aos dados informatizados que lhes digam
respeito, podendo exigir a sua rectificação e actualização, e o direito de conhecer a finalidade
a que se destinam, nos termos da lei.
2 - A lei define o conceito de dados pessoais, bem como as condições aplicáveis ao seu
tratamento automatizado, conexão, transmissão e utilização, e garante a sua protecção,
designadamente através de entidade administrativa independente.
3 - A informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a convicções
filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem
étnica, salvo mediante consentimento expresso do titular, autorização prevista por lei com
garantias de não discriminação ou para processamento de dados estatísticos não
individualmente identificáveis.
4 - É proibido o acesso a dados pessoais de terceiros, salvo em casos excepcionais previstos
na lei.
(...)
Por fim, a CRP contém também um artigo que beneficia o sigilo médico, prevista
no seu art. 18.°:
16
Consituição da República Portuguesa (CRP). [Acesso 27 out. 2021]. Disponível em http://
https://www.ministeriopublico.pt/iframe/constituicao-da-republica-portuguesa.
17
Originado do direito geral de personalidade, enunciado pelo Tribunal Constitucional Alemão na decisão
de 15 de dezembro de 1983, que caracterizou como a “faculdade de o indivíduo, a partir da
autodeterminação, decidir basicamente sobre si mesmo quando e dentro de que limites pode revelar situação
referentes à sua vida” e que se trata de “um direito fundamental que garante ao indivíduo a competência
para em princípio ser ele próprio a decidir sobre a utilização e divulgação dos seus dados pessoais.”
17
essencial dos preceitos constitucionais.”
Quanto ao Direito Penal, a doutrina penalista portuguesa adota a doutrina das três
esferas ou dos três degraus (Dreistufentheorie18), devendo distinguir: i) a esfera da
intimidade; ii) a esfera da privacidade; e iii) a esfera da vida normal da relação. De acordo
com MONIZ19, o dever de confidencialidade, com a finalidade de proteger a privacidade
em sentido material, aplicado em toda a sua extensão, esfera da privacidade stricto senso,
e não somente na esfera da intimidade.
18
No primeiro degrau, estão as intervenções mais leves, que tratam somente do modo como deve ser
exercida determinada profissão - sem restringir, portanto, o acesso à atividade profissional em si. O segundo
degrau, que interessa mais propriamente a este processo, contém as intervenções que preveem requisitos
subjetivos para a escolha de uma profissão, a exemplo da exigência de qualificação prévia ou obtenção de
algum diploma. No terceiro degrau, por fim, se incluem as restrições objetivas à escolha profissional,
impondo obstáculos ao acesso a determinada profissão que não dependem de qualquer atividade do
particular para que sejam superados.
19
MONIZ, Helena. Segredo Médico, Acórdão da Relação de Coimbra de 5 de julho de 2000 e Acórdão da
Relação do Porto de 20 de setembro de 2000. In: Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 10, Fasc.
4.º, outubro – dezembro, 2000, p. 636.
18
das pessoas, designadamente a intimidade da vida familiar ou sexual:
a) Interceptar, gravar, registar, utilizar, transmitir ou divulgar conversa,
comunicação telefónica, mensagens de correio electrónico ou facturação detalhada;
b) Captar, fotografar, filmar, registar ou divulgar imagem das pessoas ou de objectos ou
espaços íntimos;
c) Observar ou escutar às ocultas pessoas que se encontrem em lugar privado; ou
d) Divulgar factos relativos à vida privada ou a doença grave de outra pessoa;
é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 240 dias.”
Na esfera cível, o direito ao sigilo médico está dentro dos direito de personalidade,
sendo absolutos e que impõem uma obrigação passiva universal e dever de respeito.
19
e estigmatização de pessoas num ambiente laboral. O Código do Trabalho português
possui uma subseção dedicada aos direitos de personalidade:
20
2.3.5. Legislação de direito da saúde
20
Código Deontológico da Ordem dos Médicos. Preâmbulo. [Acesso 28 out. 2021]. Disponível em
https://ordemdosmedicos.pt/.
21
O sigilo médico abrange todas informações dadas pelo paciente, seja diretamente
ou por outro indivíduo a seu pedido, ou por terceiros com quem teve contato durante a
prestação dos serviços médicos ou por causa dela, abrangendo também os fatos
identificados pelo médico, consequentes ou não da sua avaliação clínica ou de terceiros e
os fatos informados por outros profissionais.
“1 — O segredo médico impõe -se em todas as circunstâncias dado que resulta de um direito
inalienável de todos os doentes.
2 — O segredo abrange todos os factos que tenham chegado ao conhecimento do médico no
exercício da sua profissão ou por causa dela e compreende especialmente:
a) Os factos revelados diretamente pela pessoa, por outrem a seu pedido ou por terceiro com
quem tenha contactado durante a prestação de cuidados ou por causa dela;
b) Os factos apercebidos pelo médico, provenientes ou não da observação clínica do doente
ou de terceiros;
c) Os factos resultantes do conhecimento dos meios complementares de diagnóstico e
terapêutica referentes ao doente;
d) Os factos comunicados por outro médico ou profissional de saúde, obrigado, quanto aos
mesmos, a segredo.
3 — A obrigação de segredo médico existe, quer o serviço solicitado tenha ou não sido
prestado e quer seja ou não remunerado.
4 — O segredo médico mantém -se após a morte do doente.
5 — É expressamente proibido ao médico enviar doentes para fins de diagnóstico ou
terapêutica a qualquer entidade não vinculada ao segredo médico.”
Por fim, temos as Cartas de Direitos dos Pacientes, que são documento que
sintetizam de maneira clara e objetiva os direitos que todos os pacientes possuem.
21
Direcção-Geral da Saúde: Carta dos Direitos e Deveres dos Doentes, Lisboa, 1998.
22
profissional, a respeitar por todo o pessoal que desenvolve a sua actividade nos serviços de
saúde.”
22
Direcção-Geral da Saúde; Direcção de Serviços de Prestação de Cuidados de Saúde, Lisboa, 2005.
23
III: LGPD
Como se pode ver, a LGPD contém alguns fundamentos bastante similares aos
fundamentos que amparam o sigilo médico, tais como a privacidade, a intimidade, honra,
imagem e os direitos humanos. Contudo, a abrangência da LGPD alcança também
importantes questões econômicas, como a livre concorrência, desenvolvimento
econômico e inovação, temas que não são diretamente relacionados com o propósito
jurídico do sigilo médico.
“Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos
meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público
ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade
e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa
natural”. [ênfase acrescentada]
23
COSTA, José Augusto Fontoura. Tratamento e transferência de dados de saúde: limites ao
compartilhamento de dados sensíveis. In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de
Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 3.
24
A partir desse dispositivo pode-se delinear com mais precisão o objeto da LGPD,
que consiste no tratamento de dados pessoais por pessoa natural ou jurídica. Porém, o ato
de “tratar” dados, nos termos dessa disciplina, possui um conteúdo bastante amplo24.
Nos termos do art. 5º, X, da LGPD, o tratamento de dados reflete toda “operação
realizada com dados pessoais, como as que se referem a coleta, produção, recepção,
classificação, utilização, acesso, reprodução, transmissão, distribuição, processamento,
arquivamento, armazenamento, eliminação, avaliação ou controle da informação,
comunicação, transferência, difusão ou extração”.
24
COSTA, José Augusto Fontoura. Tratamento e transferência de dados de saúde: limites ao
compartilhamento de dados sensíveis. In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de
Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 3.
25
pode ser tanto pessoa natural quanto jurídica (assim como o controlador), é quem realiza
efetivamente o tratamento, mas em nome do controlador.
26
sigilo médico. Afinal, no caso da saúde, também há uma finalidade bastante clara para o
tratamento de dados, que consiste no próprio tratamento médico do paciente.
Há também os princípios do livre acesso, que permite aos titulares acesso livre e
gratuito aos seus dados; da transparência, com premissas similares; da segurança, que
visa a proteger os dados dos titulares contra acessos não autorizados ou situações
acidentais. Tais princípios dão verdadeiros direitos aos titulares de dados, impactando
sobremaneira a dinâmica entre agentes de tratamento e titulares.
“Art. 7º O tratamento de dados pessoais somente poderá ser realizado nas seguintes hipóteses:
I - mediante o fornecimento de consentimento pelo titular;
II - para o cumprimento de obrigação legal ou regulatória pelo controlador;
III - pela administração pública, para o tratamento e uso compartilhado de dados necessários
à execução de políticas públicas previstas em leis e regulamentos ou respaldadas em
contratos, convênios ou instrumentos congêneres, observadas as disposições do Capítulo IV
desta Lei;
IV - para a realização de estudos por órgão de pesquisa, garantida, sempre que possível, a
anonimização dos dados pessoais;
V - quando necessário para a execução de contrato ou de procedimentos preliminares
relacionados a contrato do qual seja parte o titular, a pedido do titular dos dados;
VI - para o exercício regular de direitos em processo judicial, administrativo ou arbitral, esse
último nos termos da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996 (Lei de Arbitragem) ;
VII - para a proteção da vida ou da incolumidade física do titular ou de terceiro;
VIII - para a tutela da saúde, em procedimento realizado por profissionais da área da saúde
ou por entidades sanitárias;
VIII - para a tutela da saúde, exclusivamente, em procedimento realizado por profissionais
de saúde, serviços de saúde ou autoridade sanitária;
IX - quando necessário para atender aos interesses legítimos do controlador ou de terceiro,
exceto no caso de prevalecerem direitos e liberdades fundamentais do titular que exijam a
proteção dos dados pessoais; ou
X - para a proteção do crédito, inclusive quanto ao disposto na legislação pertinente.”
25
COSTA, José Augusto Fontoura. Tratamento e transferência de dados de saúde: limites ao
compartilhamento de dados sensíveis. In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de
Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 3.
27
O consentimento no âmbito do sigilo médico é focado para a guarda dos dados.
Na LGPD, apesar de tal circunstância não estar explícita, o tratamento de dados engloba,
naturalmente o compartilhamento de informações, porém, conforme dispõe o diploma, o
tratamento de dados envolve um escopo muito mais amplo, que vão desde a coleta dos
dados a sua difusão.
Retomando o art. 7º da LGPD, percebe-se que nos seus incisos VII e VIII, que a
proteção da vida e a tutela da saúde foram positivamente estabelecidos como hipóteses
de tratamento de dados. Dessa forma, tem-se, de forma categórica, que dados pessoais da
saúde são abarcados pela LGPD. E mais do que isso, nos termos do art. 5º, II, da LGPD
são considerados dados pessoais sensíveis:
“II - dado pessoal sensível: dado pessoal sobre origem racial ou étnica,
convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de
caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida
sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa
natural”.
Nesse ponto, de acordo com COSTA26 não se pode dizer que há uma definição
precisa do que é um dado pessoal sensível, mas apenas uma definição abstrata ou geral,
sendo a sua delimitação realizada através de uma categorização taxativa. O autor destaca,
sobre essa característica, que qualquer informação que possibilite a dedução de dado
sensível também o será, como a referência a uso habitual de véu, pois em determinados
contextos possibilitará inferir que a pessoa é muçulmana, sendo assim um dado sensível
por remeter a religião.
26
COSTA, José Augusto Fontoura. Tratamento e transferência de dados de saúde: limites ao
compartilhamento de dados sensíveis. In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de
Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 3.
27
KUNG, Angela Fan Chi; AUN, Nicole Recchi. Conservação, Anonimização e Eliminação de Dados na
Área da Saúde: Obrigação Legal e Regulatória, Viabilidade Técnica e Observância da LGPS. In:
DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo:
Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 4.
28
também externa, na medida em que mesmo os controladores e operadores podem ser
demandados a cumprir tais direitos a qualquer tempo. Nesse ínterim, destacam-se os
direitos de anonimização e eliminação dos dados (art.17, IV da LGPD).
A eliminação, por sua vez, consiste na eliminação dos dados pessoais do banco de
dados, o que representa o ciclo final de vida dos dados pessoais29. As hipóteses previstas
na LGPD para eliminação dos dados ocorrem: (i) quando alcançada a finalidade do
tratamento, ou cessando a necessidade e adequação; (ii) quando encerrado o período do
tratamento; (iii) quando comunicada revogação do consentimento pelo titular; ou ainda
(iv) pela autoridade nacional decorrente de descumprimento da LGPD.
Ademais, no seu Capítulo III, a LGPD, mais precisamente no art. 18, confere ao
titular de dados o direito de obter do controlador: a confirmação da existência de
tratamento (inciso I); acesso aos dados (inciso II); correção de dados incompletos,
inexatos ou desatualizados (inciso III), anonimização, bloqueio ou eliminação de dados
desnecessários ou em desconformidade com a Lei (inciso IV); portabilidade de dados a
outro fornecedor, mediante requisição expressa (inciso V), eliminação dos dados pessoais
tratados com o consentimento do titular (inciso VI), inter alia. Segundo o art. 18, §1º, o
titular terá direito de peticionar em relação aos seus dados contra o controlador.
28
KUNG, Angela Fan Chi; AUN, Nicole Recchi. Conservação, Anonimização e Eliminação de Dados na
Área da Saúde: Obrigação Legal e Regulatória, Viabilidade Técnica e Observância da LGPS. In:
DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de Campos (coord.). LGPD na Sáude. São
Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 4.
29
Idem.
29
3.3. Análise comparativa entre LGPD e Sigilo Médico.
“Art. 73. Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão,
salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.
Parágrafo único. Permanece essa proibição: a) mesmo que o fato seja de conhecimento
público ou o paciente tenha falecido; b) quando de seu depoimento como testemunha. Nessa
hipótese, o médico comparecerá perante a autoridade e declarará seu impedimento; c) na
investigação de suspeita de crime o médico estará impedido de revelar segredo que possa
expor o paciente a processo penal.”
30
KITAKE, Luis Gustavo Gasparini. Sistemas de prontuário eletrônico e digitalização: impacto da LGPD.
In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de Campos (coord.). LGPD na Sáude. São
Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 19.
31
Art. 5º, inciso X.
32
COSTA, José Augusto Fontoura. Tratamento e transferência de dados de saúde: limites ao
compartilhamento de dados sensíveis. In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de
Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 3.
30
acesso, reprodução, inter alia. Contudo, no que diz respeito à intersecção entre LGPD e
o sigilo médico (parte específica do campo da saúde), a restrição do foco de análise aos
modos de compartilhamento de informações se faz necessária.
33
COSTA, José Augusto Fontoura. Tratamento e transferência de dados de saúde: limites ao
compartilhamento de dados sensíveis. In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de
Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 3.
31
Já a hipótese de “motivo justo”, no âmbito do sigilo médico, pode ser equiparada
ao “legítimo interesse” do controlador, no âmbito da LGPD. Nesse sentido, o art. 10 da
Lei prevê que o legítimo interesse do controlador poderá fundamentar tratamento de
dados para finalidades legítimas, “consideradas a partir de situações concretas, que
incluem, mas não se limitam a:[...]. II – proteção, em relação ao titular, do exercício
regular de seus direitos ou prestação de serviços que o beneficiem, respeitadas as
legítimas expectativas dele e os direitos e liberdades fundamentais”. O inciso IX do art.
7º da LGPD também permite o tratamento “quando necessário para atender aos
interesses legítimos do controlador ou de terceiro, exceto no caso de prevalecerem
direitos e liberdades fundamentais do titular que exijam a proteção dos dados pessoais”.
Outra questão digna de nota pode ser encontrada no inciso III. Nesse sentido,
vejamos o que dispõem:
“Art. 7º O tratamento de dados pessoais somente poderá ser realizado nas seguintes hipóteses:
(...) III - pela administração pública, para o tratamento e uso compartilhado de dados
necessários à execução de políticas públicas previstas em leis e regulamentos ou respaldadas
34
VIOLA, Mario; TEFFÉ, Chiara Spadaccini de. Tratamento de dados pessoais na LGPD: estudo sobre as
bases legais dos artigos 7° e 11. In: DONEDA, Danilo [et al] (coord.). Tratado de Proteção de Dados
Pessoais. Rio de Janeiro: Forense, 2021. Cap. 6.
35
BIONI, Ricardo. Proteção de dados pessoais: a função e os limites do consentimento. Rio de Janeiro:
Forense, 2019. p. 324.
32
em contratos, convênios ou instrumentos congêneres, observadas as disposições do Capítulo
IV desta Lei;”
A LGPD, por sua vez, contém seção específica apenas para esse tema (Seção III
– Do Tratamento de Dados Pessoais de Crianças e Adolescentes). Contudo, os dois
regimes posseum diferenças significativas no escopo da regulação. Enquanto o sigilo
médico é sucinto, estabelecendo um dever geral de sigilo das informações relacionadas
ao menor, inclusive aos pais, com apenas duas exceções (quando o menor não tiver
discernimento ou quando a não revelação puder lhe causar dano), a LGPD estabelece
critérios mais detalhados. Nessa linha, o caput do art. 14 dispõe que o tratamento de dados
relacionados a crianças e adolescentes “deverá ser realizado em seu melhor interesse, nos
termos desse artigo e da legislação pertinente”. E ainda, conforme o §1º desse
dispositivo, “[o] tratamento de dados pessoais de crianças deverá ser realizado com o
consentimento específico dado por pelo menos um dos pais ou pelo responsável legal”.
De se notar que o §1º menciona apenas crianças, deixando de fora o termo “adolescentes”.
Percebe-se nesse ponto uma aproximação entre o CEM e a LGPD, porquanto a não
exigência de consentimento dos pais, no caso do tratamento de dados dos adolescentes,
segue o mesmo espírito da dispensa dessa mesma salvaguarda nos casos em que o
paciente possui algum discernimento.
33
De todo modo, a proteção das crianças e adolescentes se justifica em ambos os
diplomas pela sua condição de maior vulnerabilidade. Nesse sentido, HENRIQUES,
PITA e HARTUNG36:
“[...]. crianças e adolescentes compõem o grupo mais vulnerável de pessoas cujos dados
pessoais circulam na ubiquidade de meios informátivos. Por estarem vivenciando um período
peculiar de desenvolvimento, tanto físico quanto cognitivo, psicológico e social, de acordo
com as respectivas idades, muitas vezes não têm condições de compreender a complexidade
da sociedade de ingormação – ou dos conhecimentos -, quanto menos defenderem-se dos
abusos que nela são perpetrados. São, com efeito, meos conscientes tanto dos modelos quanto
das consequências e ameaças do processamento de seus dados.”
36
HENRIQUES, Isabella; PITA, Marina; HARTUNG, Pedro. A proteção de dados pessoais de crianças e
adolescentes. In: DONEDA, Danilo [et al] (coord.). Tratado de Proteção de Dados Pessoais. Rio de
Janeiro: Forense, 2021. Cap. 6.
34
O art. 77 do CEM trata do relacionamento do médico com as seguradoras no
âmbito do sigilo médico, vedando àquele prestar informações sobre as circunstâncias da
morte do paciente sob seus cuidados, para além das informações contidas na declaração
de óbito. A execeção a essa regra consiste na expressa autorização do representante legal
do falecido. Por sua vez, a LGPD não fornece regras específicas em relação ao tratamento
de dados de pessoas falecidas. Entretanto, cumpre destacar que a LGPF contém
importantes disposições sobre o tratamento de dados na saúde, senão vejamos:
“Art. 11. O tratamento de dados pessoais sensíveis somente poderá ocorrer nas seguintes
hipóteses: [...].
37
PALHARES, Felipe. Vantagem econômica no compartilhamento de dados de saúde: interpretação do
artigo 11, §4°, da LGPD. In: DALLARI, Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de Campos
(coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. Cap. 17.
35
Os últimos dois artigos do Capítulo IX do CEM, sobre sigilo médico, tratam da
necessidade de orientação pelo médico de seus auxiliares e alunos para que respeitem e
zem pelo sigilo profissional (art. 78), e da necessidade de se manter o sigilo mesmo
quando da cobrança de honorários por meio judicial ou extrajudicial (art. 79).
Com relação ao art. 78, sobre o orientação dos auxiliares e alunos, há semelhança
com a LGPD. Isso porque, esta norma serve como um verdadeiro marco de compliance
para as emrpesas. Além disso, ao criar a figura do “encarregado”, a LGPD atribuiu a este,
dentre outras atividades, justamente a de “orientar os funcionários e os contratados da
entidade a respeito das práticas a serem tomadas em relação à proteção de dados
pessoais”.
36
responsabilização mais marcante no campo do Direito Administrativo, conforme se
observa do já mencionado art. 22 da Lei n. 3.268/57 (Lei dos Conselhos de Medicina).
“Art. 325 - Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva
permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, se o fato não constitui
crime mais grave.”
“[...] vale destacar que a LGPD não inaugurará um regime geral de responsabilidade civil
sobre dados na área da saúde, pelo simples fato de que, como apontado anteriormente, boa
parte das atividades relativas à saúde consiste em tratamento de dados, existindo, portanto,
nessa área, uma normatização consolidada em termos de proteção da pessoa humana quanto
aos seus direitos fundamentais, entre os quais a vida, a integridade física, como também a
privacidade, intimidade, sigilo, honra e imagem.”
38
TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. Responsabilidade civil na LGPD na área da saúde. In: DALLARI,
Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2021. Cap. 10.
39
Idem.
37
Além disso, conclui que o advento da LGPD apenas complementou o arcabouço
legislativo em proteção de dados pessoais em uma perspectiva diversa. Nesse sentido,
menciona que a LGPD estabeleceu duas regras gerais de responsabilidade civil, que
complementam as normas de regime geral de responsabilidade civil na área, sendo a
primeira dessas regras aquela prevista no art. 42 da LGPD, caput40:
A segunda regra, por sua vez, está presente no art. 44, parágrafo único41:
40
TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. Responsabilidade civil na LGPD na área da saúde. In: DALLARI,
Analluza Bolivar; MONACO, Gustavo Ferraz de Campos (coord.). LGPD na Sáude. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2021. Cap. 10.
41
Idem.
42
Idem.
38
escopo mais restrito. Evidência disso é a circunstância de o sigilo médico regular os
direitos do paciente de forma indireta, por estabelecer verdadeiras obrigações de cuidado
por parte dos profissionais médicos. É claro que em alguma medida esse tipo de proteção
também pode ser observado no âmbito da LGPD, porém essa disciplina é muito mais
expressa no estabelecimento e positivação de direitos aos titulares de dados.
39
IV - CONCLUSÃO
Ex positis, vemos que a LGPD promoveu uma série de mudanças de paradigmas
no direito brasileiro, com impacto significativo no setor da saúde. Essa nova disciplina,
em várias de suas disposições, implementa um novo regime de compliance a ser seguido
pelas empresas – e em especial, as empresas da área da saúde.
Já no que tange ao sigilo médico, foco do presente estudo, vemos que o estado da
arte da regulação já estabelecia um regramento bastante consolidado sobre o tema. Para
efeito comparativo, o sigilo médico em Portugal também é resguardado por diversas
normativas além do seu Código Deontológico.
Porém, a LGPD possui escopo muito mais amplo, e atua em dimensões diferentes.
A título de recordação, vimos que a LGPD atua sobre uma série de operações envolvendo
dados pessoais, enquanto o sigilo médico restringe-se ao compartilhamento, ou revelação,
de dados – confidenciais - obtidos no exercício da atividade profissional médica.
40
consideravelmente mais extenso e abrangente de tratamentos. Como resultado disso, o
sigilo médico, enquanto tipo de tratamento irregular, recebe da LGPD um novo arcabouço
interpretativo, bem como novos efeitos e consequências jurídicas, sem prejuízo das já
existentes.
41
BIBLIOGRAFIA
FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. 12ª Ed. Rev., atual. e ampl. – Rio de
Janeiro: Forense, 2014
LGPD na Saúde. Coord. Analluza Bolivar Dallari, Gustavo Ferraz de Campos Mônaco.
1ª Ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021.
Tratado de Proteção de Dados Pessoais. Coor: Danilo Doneda [et al]. Rio de Janeiro:
Forense, 2021
42