Resenha5 2

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 4

BAUMAN, Zygmunt.

Comunidade: a
busca por segurança no mundo atual. Rio
de janeiro, RJ: Jorge Zahar Ed. 2003.
ISBN: 85-7110-699-1

Daiana Stasiak**

Os desafios à Comunidade

Zygmunt Bauman apresenta em sua obra Comunidade: a busca


por segurança no mundo atual, a gênese do conceito de comunidade e
discorre acerca de sua permanência ao longo do tempo, desde a
“modernidade sólida” passando pela construção do Estado-nação até a
“modernidade líquida”. Para tanto, a obra faz uma retomada linear dos
acontecimentos que foram pontos de transformação da sociedade nos
últimos séculos e considera o conceito de comunidade em cada ambiente.
Nesse contexto, o aparecimento dos meios de transporte, o
desenvolvimento dos meios de comunicação e o conseqüente aumento da
velocidade dos fluxos de informações são as primeiras características que
colaboram, segundo o autor, para a tornar a unidade mais difícil de ser
concebida.
Antes de abordar outras alterações é coerente esclarecer algumas
definições do conceito de comunidade, Bauman resgata um estudo de
Rosemberg (2000), que a batizou como “círculo aconchegante” essa crença
na união humana formada por entendimentos compartilhados que se tornam
hábitos e são incorporados pelas pessoas. Além disso, caracteriza-a também
a partir de Robert Redfield (1971) que explora a comunidade como o local
fiel à sua natureza na medida em que é: distinta dos outros agrupamentos
humanos, pequena e auto-suficiente, sinteticamente é uma acomodação do
berço ao túmulo.

**
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Midiática da Universidade
Federal de Santa Maria UFSM. Graduada em Relações Públicas pela UFSM.
322 RILA, Santa Maria, RS, v.3, n. 2, jul./dez. 2006.
Desafios à Comunidade

Essas comunidades seriam homogêneas porém, as dificuldades


encontram-se quando algumas condições começam a desabar, como por
exemplo, o momento no qual as trocas entre o mundo exterior e o interior
passam a ser mais intensas do que as realizadas internamente.
Seguindo a linha dos acontecimentos que alteraram as sociedades
Bauman aponta a Revolução Industrial como o período que traz
modificações, principalmente devido a emancipação do indivíduo, este que
é massificado pelo capitalismo moderno e levado ao chão de fábrica onde
desmantela a concepção de sentido do trabalho. A separação entre o meio
de vida (trabalho) e o lar leva o indivíduo a uma rotina de controle que
transgride sua dignidade, os camponeses e artesãos até recebem propostas
de novas perspectivas de emprego (que na verdade eram tentativas
mascaradas para aumentar a produtividade) mas essas não trazem de volta
a dignidade perdida.
A questão da liberdade e segurança é o paradoxo da manutenção
da comunidade, afinal é quase impossível que estas duas práticas exerçam
seus papéis ao mesmo tempo. Pois, a segurança sempre requer o sacrifício
da liberdade enquanto essa só pode ser ampliada às custas da própria
segurança.
No contexto do surgimento do Estado-nação os traços são
homogeneizados, a oposição entre nacionalistas e liberais faz com que
Bauman reflita sobre as minorias que não possuem escolha: ou assimilam a
cultura imposta pelo Estado, ou são desmanteladas. Neste ponto o autor
chega a uma discussão pertinente sobre a globalização, para ele, há uma
transformação dos preceitos do Estado que abre mão do controle dos
processos e deixa-os nas mãos do mercado, caracterizando o vazio
institucional.
A transformação nos modos de interação, é relevante e explicativa,
pois o capitalismo traz a questão do vazio moral no qual, apesar de estarem
reunidas, as pessoas perdem o intercâmbio. O advento das tecnologias para
alguns serviços também transforma o ambiente social e o sentido das
comunidades torna-se cada vez mais dispensável, não há mais união das
forças para agir.
A conseqüência da industrialização é uma geração de bem-sucedidos
que já não debita mais sua confiança na comunidade, ao contrário, acreditam
que até mesmo podem perder recursos se inseridos nela. Assim, a nova elite
extraterritorial, com valores efêmeros de repulsa e fuga das outras vidas,

RILA, Santa Maria, RS, v.3, n. 2, jul./dez. 2006. 323


Daiana Stasiak

tem como endereço o e-mail e o número do celular. Apesar de fazerem


parte de vários territórios esses indivíduos não possuem uma cultura de
interatividade global, eles são cosmopolitas limitados pelo trabalho e acabam
exercendo uma fuga da comunidade.
Um traço relevante apontado por Geoff Dench (1986) é resgatado
na obra, o de que a comunidade exige a “obrigação fraterna”, assim, partilhar
vantagens não é sinônimo de lucros para os bem sucedidos, que consideram
os demais indivíduos fracos e deixam para trás as pontes que os fizeram
chegar à riqueza.
No contexto contemporâneo o texto traz uma definição das
comunidades estéticas fundadas em torno de assuntos superficiais como as
celebridades, por exemplo, essas são caracterizadas pela natureza transitória
dos laços que surgem entre os participantes através de vínculos sem
compromissos éticos.
O indivíduo e seus grupos necessitam de reconhecimento diante
dos demais para se manter, o pedido por reconhecimento ocorre quando
uma categoria sente-se prejudicada perante os outros. Porém, as mudanças
sociais trazem um indivíduo centrado na sua própria satisfação, assim Bauman
propõe que a injustiça mudou de sentido pois, hoje, é injustiçado quem é
deixado para trás em uma vida cheia de prazeres. Antes, a satisfação era
coletiva e justificava a comunidade e todas as suas obras. Agora, os problemas
são enfrentados e resolvidos solitariamente não cabendo mais o papel de
uma comunidade coletiva. Afinal, o indivíduo passa a ser o resultado de
seus esforços e de sua sorte.
Apesar dessas desintegrações a noção de lugar é ainda valorizada,
há necessidade de se pertencer a uma sociedade na qual as pessoas
desenvolvem valores como a lealdade, por exemplo. Em meio à insegurança
e ao descaso global as pessoas buscam abrigos.
Em contraponto, Bauman insere a moradias dos guetos de
humilhados e estigmatizados e os caracteriza como a pura impossibilidade
de comunidade criticando a utilização do multiculturalismo de forma
ambiciosa pelos detentores do poder, pois, muitas vezes o termo significa
um descaso com relação à diferença, ou melhor, um modo de ajustar o
papel das classes a uma rendição, como se proclamassem a elas que “sigam
seu próprio curso”, certamente isso só tem credibilidade em uma sociedade
de indiferenças.

324 RILA, Santa Maria, RS, v.3, n. 2, jul./dez. 2006.


Desafios à Comunidade

Em suas conclusões, Bauman questiona-se sobre a possibilidade de


ainda existir uma humanidade unida em meio a tantos isolamentos e acredita
que as culturas existem mas não compartilham o que pode levar à desunião.
Apesar do contexto globalizado, o autor acredita nos ideais de confiança e
cumplicidade entre as culturas, e lembra que quanto mais abertura houver
por parte da cultura que acolhe, maior será a probabilidade de um imigrante
tornar-se membro e colaborar com o novo país. Assim, estabelece-se uma
relação de segurança e superação da pluralidade cultural.
Portanto, a comunidade distancia-se de seu ideal quando são erguidos
muros tanto concretos quanto ideológicos de resistência e oposição às
culturas, e conseqüentemente não se completa no seu sentido mais coerente:
um grande abrigo que protege os indivíduos. Por isso, nesta época de
turbulências, em que as culturas são reconhecidas e coexistem, mas não se
relacionam, é importante que haja a união para que se superem as influências
da globalização que visa controlar as condutas dos indivíduos.

RILA, Santa Maria, RS, v.3, n. 2, jul./dez. 2006. 325

Você também pode gostar