O Direito Administrativo em Moçambique

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Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância

Licenciatura em Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

O PODER ADMINISTRATIVO NO ORDENAMENTO JURÍDICO MOÇAMBICANO

Nome: Domingos Tentura Guambe

O tutor: Dr.

Março, 2019
2

Conteúdo
INTRODUÇÃO............................................................................................................................3
A sujeição da administração pública a regras distintas do direito privado...................................6
Os poderes.....................................................................................................................................7
O poder da decisão........................................................................................................................8
Decisão administrativa como uma técnica de governança eficaz.................................................8
O poder decisório unilateral..........................................................................................................8
O Princípio da Separação dos Poderes..........................................................................................9
O Poder Administrativo..............................................................................................................10
Manifestações do Poder Administrativo.....................................................................................10
O poder de execução...................................................................................................................10
Os processos judiciais.................................................................................................................10
O Poder de execução forçada......................................................................................................11
As decisões individuais de natureza administrativa e/ou financeira...........................................15
As decisões individuais de natureza administrativa....................................................................16
As decisões individuais de natureza financeira...........................................................................17
A protecção contra as acções em responsabilidade.....................................................................18
A protecção contra as injúrias e violências.................................................................................18
Decisões administrativas e sujeições...........................................................................................19
CONCLUSÃO............................................................................................................................20
Bibliografia..................................................................................................................................21
3

O PODER ADMINISTRATIVO NO ORDENAMENTO JURÍDICO MOÇAMBICANO

INTRODUÇÃO

O direito administrativo é um ramo autónomo, dentro do direito público interno, que se


concentra basicamente no estudo da Administração Pública e na actividade de seus membros. O
objecto desta disciplina são os órgãos, entidades, agentes e actividades públicas, e seu objectivo
é a sistematização dos fins desejados pelo Estado, ou seja, o interesse público, regido pelo
princípio da legalidade. Tudo o que se refere ao instituto de Administração Pública e à relação
jurídica entre ele e os administradores e seus servidores é regulamentado e estudado pelo
Direito Administrativo.

O Direito Administrativo faz parte do ramo do direito público, cuja principal característica é a
desigualdade jurídica entre as partes envolvidas. Por um lado, a Administração Pública defende
interesses colectivos; por outro, o particular. Se houver conflito entre esses interesses,
prevalecerá a comunidade colectiva, representada pela Administração Pública. Em Direito
Público, a Administração Pública estará sempre em um nível superior ao privado,
diferentemente do que é visto no Direito Privado.

Direito Administrativo: sintetiza-se no conjunto harmónico de princípios jurídicos que regem


os órgãos, os agentes e as actividades públicas tendentes a realizar concreta, directa e
imediatamente os fins desejados pelo Estado

Administração Pública é sujeita ao controlo dos tribunais comuns e às leis ordinárias como
qualquer cidadão e só eles actuam em relação com os particulares com prévia intervenção do
Poder judicial.

Nesta perspectiva, o direito é "um", no sentido de que, em princípio são as mesmas regras que
regem todas as relações jurídicas dentro de um mesmo Estado, qualquer que seja a natureza
dessas relações jurídicas.

Para ser mais rigoroso, isto não quer dizer que não existe um "Direito Administrativo" nos
países anglo-saxónicos. Em bom rigor, em todos os Estados, quaisquer que sejam, existe
necessariamente, do ponto de vista material, um conjunto de regras que se chama "Direito
Administrativo", que rege a organização e as competências das autoridades administrativas e
define os direitos e as garantias dos administrados quando eles sofrem um prejuízo em relação
às essas autoridades. O que não existe nesses países é um “modelo europeu” e, sobretudo, um
“modelo francês” de Direito Administrativo.
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Todavia, as diferenças entre o regime administrativo de tipo francês e o "regime anglo-


americano" residem menos nas realidades do que nas formulações que lhe exprimem.

FRANCIS-PAUL BÉNOIT demonstrou perfeitamente que as diferenças consistem no que "as


regras administrativas específicas, apesar do seu número e importância, são apresentadas como
sendo um carácter excepcional e derrogatório do direito comum que seria o direito privado; e
que este, apesar de que ele regula muito pouco a actividade da Administração Pública, é
apresentado como o direito comum da sua acção. Pois, trata-se, antes de tudo, de uma questão
de hábito face às necessidades e inevitáveis regras administrativas específicas".

Na prática, pode-se verificar, de uma maneira geral, que, apesar das diferenças que subsistem
entre os dois sistemas, os direitos administrativos dos países anglo-saxónicos continuam a se
desenvolver e distinguir-se de uma maneira mais clara dos princípios do Direito Privado.

Os Estados que têm um regime administrativo apresentam caracteres diferentes

Por um lado, todas as funções administrativas são fortemente centralizadas e confiadas a um


poder único; por outro lado, esse poder, enquanto jurídico, isto é, enquanto que encarregado de
estabelecer as normas jurídicas que regularão a sua própria actividade e actuação, não é o Poder
judicial, mas o Poder Executivo.

Resultam dessa situação várias consequências: os agentes administrativos não estão sob a
autoridade directa dos tribunais comuns e das leis gerais, mas sim sob a autoridade hierárquica
de superiores que pertencem ao Poder Executivo e a sua actuação é regulada por leis e
regulamentos especiais; as autoridades administrativas gozam do "privilégio da execução
prévia", e as suas decisões gozam de "executoriedade" sem que seja necessário nenhuma
autorização prévia do Poder judicial; os agentes administrativos processados em
responsabilidade têm, até um determinado ponto, uma garantia administrativa; não existe só
uma espécie de jurisdição, mas uma dualidade de jurisdições, isto é, há uma jurisdição
administrativa ao lado da jurisdição comum, e essas duas ordens de jurisdições são
constitucionalmente separadas.

A função do Direito Administrativo é conferir poderes de autenticidade à Administração


Pública, de modo a que ela possa fazer sobrepor o interesse colectivo aos interesses privados
(“green light theories”); ou a função do Direito Administrativo é reconhecer direitos e
estabelecer garantias em favor dos particulares frente ao Estado, de modo a limitar
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juridicamente os abusos do poder executivo, e a proteger os cidadãos contra os excessos da


autoridade do Estado (“ red light theories”).

A função do Direito Administrativo não é, por consequência, apenas “autoritária”, como


sustentam as green light theories, nem é apenas “liberal” ou “garantística”, como pretendem
as red light theories. O Direito Administrativo desempenha uma função mista, ou uma dupla
função: legitimar a intervenção da autoridade pública e proteger a esfera jurídica dos
particulares; permitir a realização do interesse colectivo e impedir o esmagamento dos
interesses individuais; numa palavra, organizar a autoridade do poder e defender a liberdade
dos cidadãos.

No regime administrativo, existe um conjunto de regras próprias aplicáveis às actividades


administrativas e distintas das que regem os particulares nas relações entre eles, que constituem
um direito diferente do Direito Privado: o Direito Administrativo.

Assim, “A definição do regime administrativo resume-se na ideia de uma centralização das


funções administrativas sob a autoridade jurídica do Poder Executivo e, a seguir, de uma
separação das atribuições entre o Poder Executivo e o Poder Judicial no que

diz respeito à própria administração do Direito”.

Por outras palavras, o que é original no sistema de administração executiva ou regime


administrativo, é "a ideia do serviço público lutou com o poder executivo no interior de uma
vasta organização instituída, mantida fechada pelo princípio da separação de poderes. A ideia
do serviço público existe em todos os países; o próprio do sistema (…) é de ter conduzido o
poder executivo, graça a esta organização engenhosa, a limitar-se objectivamente pela realizar
melhor".

Praticamente, para diagnosticar se um Estado possui ou não um regime administrativo,


“convém”, escreve MAURICE HAURIOU, “verificar um duplo critério, o de uma jurisdição
administrativa que tem uma competência geral separada da jurisdição comum e de uma
jurisdição dos conflitos exercida, quer pelo governo, ele próprio, quer por um tribunal de
conflitos à justiça delegada, porque apenas essas instituições são o signo que a administração
do direito foi partilhada entre o poder judicial e o poder executivo”.

A análise da referida questão, numa perspectiva histórica, permite responder pela afirmativa à
pergunta da existência de um regime administrativo em Moçambique. Com efeito, a política de
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assimilação das colónias portuguesas, em geral, e da de Moçambique, em particular, ao regime


da organização administrativa da metrópole fez com que as colónias tenham sido consideradas
como simples províncias do reino — províncias ultramarinas — a que se aplicavam com
ligeiras alterações as leis feitas para o continente, os critérios de administração e os planos de
governo estabelecidos e traçados para a metrópole.

O território colonial português era dividido em seis províncias. As províncias dividiam-se em


distritos e estes em concelhos. Em Moçambique havia um Governador-Geral e nos distritos
governadores subalternos. Junto ao Governador-geral existiam: o Conselho de Governo
constituído pelos principais funcionários da administração central da colónia e pelo presidente
da Câmara Municipal da capital. Havia ainda um Conselho de Província, que era um tribunal
administrativo.

Assim, nascerem as estruturas administrativas que deviam sustentar o desenvolvimento do


sistema de administração executiva em Moçambique. Várias reformas da administração
colonial entraram em vigor posteriormente, mas nenhuma tinha posto em causa a ratio do
sistema que continuou a ser norteado pelos princípios organizativos do regime administrativo.

Moçambique torna-se independente no dia 25 de Junho de 1975. A primeira Constituição


Moçambicana aprovada no dia 25 de Junho de 197521instituiu uma democracia popular que
tem como objectivos fundamentais "a edificação (...) e a construção das bases material e
ideológica da sociedade socialista". Assim, a referida opção política concretizou-se na total
subordinação da sociedade civil ("o povo") ao Estado, e deste ao partido FRELIMO, partido
único, cujo papel dirigente é consagrado sem equívocos pela Constituição de 1975.25; o que é
totalmente conforme à concepção do Estado na ideologia marxista-leninista.

A sujeição da administração pública a regras distintas do direito privado

Apesar de constituir, segundo a fórmula de PROSPER WEIL, "um direito político" cuja
existência "... é em alguma medida o resultado de um milagre" - o Governo é o único que
detém directamente a força pública. - Pode-se dizer que o Direito Administrativo é um direito
ao serviço exclusivo do Poder Público e da Administração Pública.

JEAN RIVERO deixou claro que: "Por um lado, as regras do direito administrativo diferem das
regras do direito privado, conferindo poderes aos órgãos públicos que não existiam nas relações
entre os indivíduos: são todas as prerrogativas do poder público. Mas, pelo contrário, o direito
administrativo impõe muitas vezes à administração obrigações muito mais restritas do que as
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do direito privado, que, por exemplo, escolhem livremente o fim das suas actividades, enquanto
a administração se dedica ao exercício exclusivo do interesse geral. Eles escolhem livremente
seus empreiteiros, enquanto que para a Administração essa escolha resulta em grande parte de
processos de designação automáticos, seria possível multiplicar os exemplos dessas excepções
à lei comum, o que torna a Administração não mais poderosa, mas ligada, do que indivíduos
privados. Quase todas as regras do direito administrativo podem remontar a uma ou outra
destas derrogações ao direito privado - derrogações para re derrogações por menos - ambas as
quais podem ser explicadas pelas necessidades do interesse geral e, por vezes, pelas
necessidades do serviço público. "

Assim, é a luz destes parâmetros que analisarão o Direito Administrativo moçambicano, isto é,
um direito que confere à Administração prerrogativas sem equivalentes nas relações privadas
(A) e um direito que impõe as disciplinas da Administração mais estritas que as que são
indivíduos submetidos. As prerrogativas da administração moçambicana à luz da lei em vigor
Um dos princípios estruturantes do regime administrativo é que a Administração deve ter os
privilégios e poderes para desempenhar com eficiência as tarefas e tarefas que lhe são
atribuídas de interesse público. As prerrogativas da administração moçambicana podem ser
classificadas em duas grandes categorias. Em primeiro lugar, a Administração Pública tem
poderes sobre os indivíduos (a); em segundo lugar, a administração pública goza de protecções
especiais que lhes são concedidas pela ordem legal contra a acção privada.

Os poderes

A Administração Pública Moçambicana tem poderes de decisão e de execução. Por outras


palavras, o que caracteriza o Direito Administrativo Moçambicano na ordem das prerrogativas,
como, regra geral, em qualquer outro sistema de administração executiva, é a faculdade que lhe
é conferida de tomar decisões juridicamente executórias (1) e de garantir a sua execução
material (2); como fundamentou PROSPER WEIL: “... Para satisfazer às necessidades do
serviço, a administração deve dispor dos meios de acção necessários. Daí a noção de
prerrogativas de direito público ou de meios exorbitantes do direito comum.

Enquanto na vida privada os direitos e obrigações só se criam por via contratual, a


administração, no interesse do serviço público, deve poder impor obrigações aos particulares
unilateralmente e sem primeiro passar pelo juiz; e a sua decisão deve ser considerada
juridicamente válida enquanto o interessado não a tenha feito anular pelo juiz”.
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O poder da decisão

Lato senso a decisão é um ato jurídico pelo qual uma autoridade administrativa modifica a
ordem jurídica. O termo está expressamente consagrado na Constituição da República no que
diz respeito à determinação do alcance do conhecimento do Tribunal Administrativo.

Sob a lógica do regime administrativo ou sistema de gestão executiva, a decisão administrativa


é concebida como uma técnica de governança eficaz (1.1.) Com um conteúdo abrangente.

Decisão administrativa como uma técnica de governança eficaz

No regime administrativo, a Administração Pública tem privilégios ao aprovar decisões. Pode


ser dispensado ao mesmo tempo do consentimento de terceiros e do tribunal. Nesta perspectiva,
a administração moçambicana tem duas técnicas: o poder de decisão unilateral (1.1.1.) E o
privilégio de execução prévia.

O poder decisório unilateral

O poder de decisão unilateral pode ser definido como o poder de modificar unilateralmente o
sistema legal por autoridade exclusiva e sem a necessidade de obter o acordo da parte
interessada.

Este poder importante pode ser exercido em dois níveis.

Em primeiro lugar, a nível regulamentar, com a possibilidade de a Administração aprovar actos


que se aplicam a uma categoria inteira de indivíduos (por exemplo, quando o Conselho de
Ministros aprova as Regras de Expedição Comercial ou o Regulamento de Sociedades de
Segurança Privada ou quando o Ministro da Saúde, Por ordem, aprova o Regulamento de
Cessão de Casas aos profissionais de saúde) ou todos eles (por exemplo, qualquer indivíduo
que deseje realizar uma actividade comercial estará sujeito ao Regulamento de Licenciamento
de Actividades Comerciais).

Segundo, no nível individual, com a possibilidade de tomar decisões que se aplicam em casos
individuais e concretos. É o caso, por exemplo, quando o Ministro da Mulher e Acção Social
delega poderes ao Director de Recursos Humanos do seu ministério, nomeadamente quando o
Primeiro-ministro anula um prémio ou quando o Ministro do Interior emite uma ordem de
expulsão. Cidadão estrangeiro.
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O Princípio da Separação dos Poderes

Este princípio consiste numa dupla distinção: a distinção intelectual das funções do Estado, e a
política dos órgãos que devem desempenhar tais funções – entendendo-se que para cada função
deve existir um órgão próprio, diferente dos demais, ou um conjunto de órgãos próprios.

No campo do Direito Administrativo, o princípio da separação de poderes visou retirar aos


Tribunais a função administrativa, uma vez que até aí, havia confusão entre as duas funções e
os respectivos órgãos. Foi a separação entre a Administração e a Justiça.

São três os corolários do princípio da separação dos poderes:

a) A separação dos órgãos administrativos e judiciais: Isto significa que têm de existir
órgãos administrativos dedicados ao exercício da função administrativa, e órgãos dedicados ao
exercício da função jurisdicional. A separação das funções tem de traduzir-se numa separação
de órgãos.

b) A incompatibilidade das magistraturas: não basta porém, que haja órgãos diferentes: é
necessário estabelecer, além disso, que nenhuma pessoa possa simultaneamente desempenhar
funções em órgãos administrativos e judiciais.

c) A independência recíproca da Administração e da Justiça: a autoridade administrativa é


independente da judiciária: uma delas não pode sobrestar na acção da outra, nem pode pôr-lhe
embaraço ou limite. Este princípio, desdobra-se por sua vez, em dois aspectos: (a)
independência da Justiça perante a Administração, significa ele que a autoridade administrativa
não pode dar ordens à autoridade judiciária, nem pode invadir a sua esfera de jurisdição: a
Administração Pública não pode dar ordens aos Tribunais, nem pode decidir questões de
competência dos Tribunais. Para assegurar este princípio, existem dois mecanismos jurídicos: o
sistema de garantias da independência da magistratura, e a regra legal de que todos os actos
praticados pela Administração Pública em matéria da competência dos Tribunais Judiciais, são
actos nulos e de nenhum efeito, por estarem viciados por usurpação de poder (art. 133º/2 CPA).
(b) independência da Administração perante a Justiça, que significa que o poder judicial não
pode dar ordens ao poder administrativo, salvo num caso excepcional, que é o do habeas corpus (art. 31º
CRP).
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O Poder Administrativo

A Administração Pública é um poder, fazendo parte daquilo a que se costuma chamar os


poderes públicos. A Administração Pública do Estado corresponde ao poder executivo: o poder
legislativo e o poder judicial não coincidem com a Administração Pública.

Falar em poder executivo, de modo a englobar nele também as autarquias locais e outras
entidades, não é adequado. Assim, preferível usar a expressão poder administrativo, que
compreende de um lado o poder executivo do Estado e das outras as entidades públicas
administrativas não estaduais. A Administração Pública é, efectivamente, uma autoridade, um
poder público – é o Poder Administrativo.

Manifestações do Poder Administrativo

O poder de execução

Todas as decisões administrativas são executórias por si mesmas. Em particular, o “Acto


administrativo definitivo e executório” constitui uma “decisão com força obrigatória e dotada
de exequibilidade sobre um determinado assunto, tomada por um órgão de uma pessoa
colectiva de direito público”. Quando o particular aceita espontaneamente executar a decisão,
não há dificuldade; mas no caso em que existe uma resistência por parte do administrado, ao
cumprimento da referida decisão, um conflito objectivamente aparece que suscita a questão de
saber como a decisão será materialmente executada.

A Administração dispõe de duas vias para garantir o cumprimento material das suas decisões:
uma via que se pode considerar de “comum” no sentido de que a Administração como o
particular pode recorrer ao juiz para fazer cumprir a sua decisão (2.1); a segunda é mais
original, é a própria Administração que, sem a intervenção prévia de qualquer autoridade
judicial, procede ela própria, à execução material das suas decisões: é o Poder de execução
forçada (2.2.).

Os processos judiciais

Estes processos são essencialmente de natureza penal. Se um particular recusa cumprir com
uma decisão administrativa, ele poderá ser processado perante a jurisdição penal e condenado a
penas de multas e de prisão consoante a gravidade da infracção cometida. Esta situação
11

subsume-se no conceito de “Desobediência” previsto no Artigo 188.° do Código Penal que


estabelece que: “Aquele que (...) faltar à obediência devida às ordens ou mandados legítimos da
autoridade pública ou agentes dela, será condenado a prisão até três meses, se por lei ou
disposição de igual força não estiver estabelecida pena diversa.

1.° - Compreendem-se nesta disposição, aqueles que infringirem as determinações de editais da


autoridade competente, que tiverem sido devidamente publicados...”.

Na prática, numerosos diplomas prevêem sanções penais pela violação de normas


administrativas; é o caso, em particular, das sanções penais estabelecidas pelo Código da
Estrada ou pela legislação tributária.

O Poder de execução forçada

De acordo com a alínea f) do Artigo 1 do Decreto n.º 30/2001, de 15 de Outubro, entende-se


por “Poder de execução forçada” a “capacidade legal de executar actos administrativos
definitivos e executórios, mesmo perante a contestação ou resistência física dos destinatários”.
Este poder constitui uma garantia da Administração Pública. É possível porque a
Administração, que toma a decisão, dispõe, ao mesmo tempo, da força pública e
consequentemente, da força material necessária para fazer cumpri-la. Mas a Administração não
pode proceder ao cumprimento forçado das suas decisões sem respeitar os trâmites processuais
legalmente previstos que constituem garantias administrativas para os particulares.

Não existe no ordenamento jurídico moçambicano normas jurídicas que regulam, de forma
geral, a execução forçada. Pelo contrário, são vários diplomas que estabelecem, caso a caso, o
regime aplicável num determinado sector.

Administração deve tomar o cuidado de verificar se existe efectiva e objectivamente uma


situação factual contrária aos requisitos previstos na regulamentação vigente considerados
como essenciais para garantir o interesse público lato senso. Assim, a demolição tem lugar
quando o prosseguimento das obras for irremediavelmente incompatível com o projecto
aprovado, com a segurança de pessoas ou bens, com os instrumentos de planeamento territorial
ou com a legislação sobre terras, ambiente e construção. Além disso, a demolição pode também
ter lugar quando, por razões de interesse público, os direitos de uso e aproveitamento da terra
hajam sido revogados ou as propriedades revertidas para o Estado, ou ainda quando as
construções se desenvolvam ilegalmente em zona de reserva.

As principais manifestações do poder administrativo são quatro:


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a) O Poder Regulamentar:

A Administração Pública, tem o poder de fazer regulamentos, a que chamamos “poder


regulamentar” e outros autores denominam de faculdade regulamentaria.

Estes regulamentos que a Administração Pública tem o Direito de elaborar são considerados
como uma fonte de Direito (autónoma).

A Administração Pública goza de um poder regulamentar, porque é poder, e com tal, ela tem o
direito de definir genericamente em que sentido vai aplicar a lei. A Administração Pública tem
de respeitar as leis, tem de as executar: por isso ao poder administrativo do Estado se chama
tradicionalmente poder executivo. Mas porque é poder, tem a faculdade de definir previamente,
em termos genéricos e abstractos, em que sentido é que vai interpretar e aplicar as leis em
vigor: e isso, fá-lo justamente elaborando regulamentos.

b) O Poder de Decisão Unilateral, art. 100º CPA:\

Enquanto no regulamento a Administração Pública nos aparece a fazer normas gerais e


abstractas, embora inferiores à lei, aqui a Administração Pública aparece-nos a resolver casos
concretos.

Este poder é um poder unilateral, quer dizer, a Administração Pública pode exercê-lo por
exclusiva autoridade sua, e sem necessidade de obter acordo (prévio ou à posteriori) do
interessado.

A Administração, perante um caso concreto, em que é preciso definir a situação, a


Administração Pública tem por lei o poder de definir unilateralmente o Direito aplicável. E esta
definição unilateral das Administração Pública é obrigatória para os particulares. Por isso, a
Administração é um poder.

Por exemplo: é a Administração que determina o montante do imposto devido por cada
contribuinte.

A Administração declara o Direito no caso concreto, e essa declaração tem valor jurídico e é
obrigatória, não só para os serviços públicos e para os funcionários subalternos, mas também
para todos os particulares.
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Pode a lei exigir, e muitas vezes exige, que os interessados sejam ouvidos pela Administração
antes desta tomar a sua decisão final.

Pode também a lei facultar, e na realidade faculta, aos particulares a possibilidade de


apresentarem reclamações ou recursos graciosos, designadamente recursos hierárquicos, contra
as decisões da Administração Pública.

Pode a lei, e permite, que os interessados recorram das decisões unilaterais da Administração
Pública para os Tribunais Administrativos, a fim de obterem a anulação dessas decisões no
caso de serem ilegais. A Administração decide, e só depois é que o particular pode recorrer da
decisão. E não é a Administração que tem de ir a Tribunal para legitimar a decisão que tomou:
é o particular que tem de ir a Tribunal para impugnar a decisão tomada pela Administração.

c) O Privilégio da Execução Prévia (art. 149º/2 CPA):

Consiste este outro poder, na faculdade que a lei dá à Administração Pública de impor
coactivamente aos particulares as decisões unilaterais que tiver tomado. O recurso contencioso
de anulação não tem em regra efeito suspensivo, o que significa que enquanto vai decorrendo o
processo contencioso em que se discute se o acto administrativo é legal ou ilegal, o particular
tem de cumprir o acto, se não o cumprir, a Administração Pública pode impor coactivamente o
seu acatamento.

O privilégio de execução prévia é definido pela alínea g) do Artigo 1 do Decreto n.º 30/2001,
de 15 de Outubro como “poder ou capacidade legal de executar actos administrativos
definitivos e executórios, antes da decisão jurisdicional sobre o recurso Interpostos pelos
interessados”. Este privilégio constitui, de acordo com a alínea a) do Artigo 16 do referido
Decreto uma garantia da Administração Pública; como estabeleceu a Primeira Secção no
Acórdão WACKENHUT MOÇAMBIQUE, LIMITADA, de 30 de Outubro de 2007, os
principais atributos que caracterizam o acto administrativo são: “... a imperatividade, que
consiste na prerrogativa que tem a Administração Pública de fazer valer a sua autoridade,
tornando obrigatório o conteúdo do seu acto para todos aqueles a quem mesmo se dirige, os que
têm de o acatar, no caso dos particulares; e a exigibilidade/auto- executoriedade, em virtude dos
quais, em face do não acatamento ou incumprimento da decisão, pelos particulares, a
Administração Pública, em consequência do privilégio de execução prévia de que goza, pode
impor e mandar cumprir, coactivamente e por meios próprios, as obrigações criadas pelo acto
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por si expedido, sem necessidade de recorrer a outros poderes, nomeadamente, ao judiciário”.


O privilégio da execução prévia resulta da possibilidade que a Administração tem de tomar
decisões executórias, isto é, a Administração é dispensada, para realizar os seus direitos, do
prévio recurso a um tribunal. Por outras palavras, o privilégio da execução prévia significa que
o acto é revestido de uma presunção de legalidade que obriga o seu destinatário a executá-lo
antes de qualquer contestação. Esta situação atribui à Administração, pelo menos, duas
vantagens. Primeiro, no âmbito do processo administrativo contencioso, o recurso contencioso
não tem efeito suspensivo da eficácia da decisão impugnada, isto é, o facto de que o particular
recorre do acto administrativo não impede este de ser executado e a Administração poderá
executar este acto apesar de ter um recurso deste pendente perante o juiz. Segundo, no caso em
que um particular contesta as pretensões da Administração, é ele que deverá recorrer ao juiz;
por outras palavras, como esclarece ANDRÉ DE LAUBADÉRE, “... Com o privilégio de
execução prévia, a Administração constrange o administrado a tomar no processo a posição
desfavorável de recorrente”. Assim, a posição da Administração é bastante vantajosa porque,
perante o juiz, é o recorrente que deverá provar a ilegalidade da decisão recorrida. O particular
estará, pois, numa situação desfavorável em relação à Administração.

É importante realçar que esta prerrogativa de execução prévia está sujeita a uma obrigação: a
Administração não pode renunciar neste privilégio. Com efeito, as prerrogativas da
Administração Pública não lhes são atribuídas nem no seu próprio interesse, e nem no interesse
dos funcionários, mas, pelo contrário, pela prossecução do interesse geral. Assim, a
Administração não pode renunciar ao privilégio de execução prévia, mesmo se desejá-lo.

Isto quer dizer, portanto, que a Administração dispõe de dois privilégios:

 Na fase declaratória, o privilégio de definir unilateralmente o Direito no caso concreto, sem


necessidade duma declaração judicial;
 Na fase executória, o privilégio de executar o Direito por via administrativa, sem qualquer
intervenção do Tribunal. É o poder administrativo na sua máxima pujança: é a
plenitude protestastes.

d) Regime Especial dos Contractos Administrativos:

Um contracto administrativo, é um acordo de vontades em que a Administração Pública fica


sujeita a um regime jurídico especial, diferente daquele que existe no Direito Civil.
15

E de novo, nesta matéria, como é próprio do Direito Administrativo, esse regime é diferente
para mais, e para menos. Para mais, porque a Administração Pública fica a dispor de
prerrogativas ou privilégios de que as partes nos contractos civis não dispõem; e para menos,
no sentido de que a Administração Pública também fica sujeita a restrições e a deveres
especiais, que não existem em regra nos contractos civis.

A prestação forçada pode ter, também, um carácter temporário. É o caso, em particular, quando
a Administração, pelas necessidades impostas pela execução de uma obra pública, ocupa,
temporariamente, o terreno de um particular e isto, mesmo se este não concorda com esta
medida.

Em segundo lugar, a Administração possui um poder de sanção para reprimir comportamentos


contrários a regulamentação vigente. Assim, sanções administrativas podem ser infligidas pelo
cometimento de infracções relativas à regulamentação do licenciamento da actividade industrial
(multas, encerramento de estabelecimento.

Em terceiro lugar, o regime da função pública integra numerosos actos unilaterais que a
Administração realiza desde o ingresso do agente na função pública até a sua reforma (por
exemplo, despachos de despromoção, demissão ou expulsão).

Finalmente, no âmbito das relações contratuais, a Administração pode, em algumas


circunstâncias, infligir penalidades a seu co-contratante, nomeadamente, no caso de atraso na
execução de obras ou quando ocorrem infracções às obrigações assumidas pelo co-contratante.
Ela pode, também, impor modificações unilaterais do contrato, tais como um aumento ou
redução do volume das obras.

Por exemplo, o Governo aprovou na base do referido fundamento, o Regulamento do Consumo


e Comercialização do Tabaco, o Regulamento de Cobrança da Taxa de Passageiros ou o
Regulamento sobre a Biossegurança relativa à Gestão de Organismos Geneticamente
Modificados (O.G.M.).

Assim, a Administração tem a possibilidade de tomar medidas que podem se impor a toda uma
categoria de particulares ou a todos eles.

As decisões individuais de natureza administrativa e/ou financeira

A Administração possui, igualmente, poderes de decisão individual de natureza administrativa


(1.2.2.1.) e/ou financeira (1.2.2.2.).
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As decisões individuais de natureza administrativa

Os poderes de natureza administrativa são numerosos e variados; alguns exemplos práticos


demonstrarão a importância desses poderes.

Em primeiro lugar, a Administração pode estabelecer unilateralmente prestações a cargo de


terceiros. Trata-se de medidas pelas quais a Administração pode impor a um particular o
fornecimento de bens, de serviços ou de actividades, unilateralmente, sem obter previamente o
seu consentimento num quadro contratual predeterminado.

Esta prestação pode ter um carácter definitivo. É o caso, em particular, numa situação

de cessão forçada como é o caso da expropriação em que a Administração pode obrigar um


particular a ceder lhe um bem de natureza imobiliária. É também, o caso, no procedimento de
alinhamento que permite à Administração fixar o limite entre a via pública e os prédios urbanos
construídos à beira e, consequentemente, impor aos proprietários de prédios urbanos
construídos fora do alinhamento de obrigar os proprietários a recuá-los ou avança-los em
relação à via pública; é uma obrigação imposta pela Administração a quem pretenda licença
para edificar ou reedificar em terrenos confinantes com ruas ou outros lugares públicos. Do
mesmo modo, há cessão de propriedade quando há requisição forçada de bens alimentícios.

A prestação forçada pode ter, também, um carácter temporário. É o caso, em particular, quando
a Administração, pelas necessidades impostas pela execução de uma obra pública, ocupa,
temporariamente, o terreno de um particular e isto, mesmo se este não concorda com esta
medida.

Em segundo lugar, a Administração possui um poder de sanção para reprimir comportamentos


contrários a regulamentação vigente. Assim, sanções administrativas podem ser infligidas pelo
cometimento de infracções relativas à regulamentação do licenciamento da actividade industrial
(multas, encerramento de estabelecimento.

Em terceiro lugar, o regime da função pública integra numerosos actos unilaterais que a
Administração realiza desde o ingresso do agente na função pública até a sua reforma (por
exemplo, despachos de despromoção, demissão ou expulsão).

Finalmente, no âmbito das relações contratuais, a Administração pode, em algumas


circunstâncias, infligir penalidades a seu co-contratante, nomeadamente, no caso de atraso na
execução de obras ou quando ocorrem infracções às obrigações assumidas pelo co-contratante.
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Ela pode, também, impor modificações unilaterais do contrato, tais como um aumento ou
redução do volume das obras.

As decisões individuais de natureza financeira

A Administração Pública tem, também, poderes de natureza financeira. Primeiro, a

Administração como “sujeito activo da relação tributária” pode cobrar impostos ou seja, a
Administração é “titular de direito de exigir o cumprimento das obrigações tributárias” quando
autorizada por lei enquanto é vedado a um particular exercer um poder tributário sobre um
outro particular.

Segundo, quando um particular é devedor da Administração, esta pode emitir um título


executivo para cobrança coerciva ou uma certidão de dívida que constitui uma decisão
financeira que pode ser executada jurídica e materialmente. Neste caso, o particular tem a
obrigação a ordem de pagamento da quantia de dinheiro estabelecida pelo título. Além disso, a
administração tributária, em particular, pode, nos termos da lei, tomar providências cautelares
para garantia dos créditos tributários em caso de fundado receio de frustração da sua cobrança
ou de destruição ou extravio de documentos ou outros elementos necessários ao apuramento da
situação tributária dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários. As providências
cautelares consistem na apreensão de bens, direitos ou documentos ou na retenção, até à
satisfação dos créditos tributários, de prestações tributárias a que o sujeito passivo tenha direito.

As protecções

A segunda vertente das prerrogativas administrativas é constituída pelas “protecções” especiais


que beneficiam à Administração. Entende-se que em razão das missões e tarefas que a
Administração desempenha, esta deve-se beneficiar de algumas “protecções” que lhes
permitem realizar eficazmente essas.

Nesta perspectiva, pode-se distinguir dois tipos de protecção: a dos seus agentes (A); e a dos
seus bens (B).

A protecção dos agentes da Administração

Os funcionários das administrações públicas dispõem de uma protecção particular que lhe é
garantida, não apenas no seu interesse, mas, também, no interesse da administração.

Dois pontos de vista podem ser analisados para ilustrar esta protecção. Primeiro do ponto de
vista civil, os funcionários beneficiam de uma protecção contra as acções em responsabilidade
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(a); segundo, do ponto de vista estatutário, os funcionários beneficiam de uma protecção contra
injúrias e violências a eles dirigidas (b).

A protecção contra as acções em responsabilidade

Regra geral, caso um funcionário cause danos decorrentes de um facto ilícito culposo não é ele
próprio que deverá reparar o prejuízo causado, mas a própria Administração, o que constitui, ao
mesmo tempo, uma prerrogativa, ou seja, a protecção dos funcionários, e uma sujeição porque
a Administração deverá indemnizar a entidade prejudicada no lugar do funcionário causador do
prejuízo.

Sendo o facto ilícito praticado pelo agente no exercício das suas funções e por causa desse
exercício, a responsabilidade compete a Administração ou seja, pelos danos produzidos é
responsável a pessoa colectiva de direito público a que pertença o agente; no caso contrário,
isto é, se o funcionário excedeu os limites das suas funções – os “actos e decisões (...) não
forem praticados dentro da sua competência legal, com observância das formalidades essenciais
estabelecidas na lei e para os fins desta” - responsabilidade compete exclusivamente aos
titulares dos órgãos e aos agentes da pessoa colectiva de direito público, ou seja, pelos danos
produzidos é responsável, única e exclusivamente, a pessoa do seu autor.

Todavia, a “imunidade” do funcionário não é total; a administração tem um direito de regresso


contra o seu agente para pedir-lhe o reembolso das indemnizações pagas à entidade
prejudicada.

A protecção contra as injúrias e violências

No plano estatutário, uma protecção é reconhecida aos funcionários contra injúrias e violências
de que podem ser vítimas no exercício das suas funções. Esta protecção é expressamente
afirmada no Estatuto Geral dos Funcionários e Agentes do Estado (alíneas c) e k) do Artigo 42)
e mais particularmente, no Código Penal. Com efeito, o Artigo 182.° do referido Código prevê
que: “O crime declarado no artigo precedente, cometido contra algum agente da autoridade ou
força pública (...) no exercício das respectivas funções, será punido com prisão até três meses”
e que: “Se as ofensas corporais, de que trata o artigo antecedente, forem praticadas contra as
pessoas designadas no artigo 182.°, Serão punidas com as penas estabelecidas para as ofensas
corporais nos artigos 359.° e seguintes, mas sempre agravadas”. Do mesmo modo a coacção
contra empregado público é punido nos termos do Artigo 187.° do Código Penal.
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Decisões administrativas e sujeições

Numerosas sujeições enquadram o regime jurídico das decisões da Administração dentro das
quais se pode destacar o princípio de intangibilidade das decisões individuai constitutivas de
direitos (1.1.), o princípio de publicidade da actividade administrativa (1.2.) o princípio de
prossecução do interesse público (1.3.).

a) O princípio de intangibilidade das decisões individuais constitutivas de direitos A


decisão individual constitutiva de direitos, torna-se, em princípio, intangível desde que
tenha produzido efeitos e a Administração já não a pode revogar, mesmo sendo ilegal.

O princípio da intangibilidade das decisões individuais constitutivas de direitos é uma das


construções mais originais do regime administrativo.

b) O princípio de publicidade da actividade administrativa

As decisões, quer regulamentares quer individuais, são oponíveis aos particulares depois de
terem sido levadas ao seu conhecimento pela publicação ou pela notificação.

No Acórdão ENTREPOSTO COMERCIAL DE MOÇAMBIQUE, a Primeira Secção do


Tribunal Administrativo teve a ocasião de explicitar o princípio da seguinte forma: “De acordo
com um princípio geral de Direito Administrativo que é aplicável aos diversos órgãos da
Administração Pública, o acto administrativo, para ser válido e produzi efeitos jurídicos
pretendidos, tem de ser complementado com actos e formalidades que lhe vão conferir eficácia,
sem os quais ele não produzirá tais efeitos. De entre as formalidades essenciais, e para o caso
em análise, a publicidade do acto constitui um passo indispensável, na medida em que o
despacho recorrido tem com consequência extinguir ou diminuir os direitos da recorrente
Entreposto Comercial de Moçambique, SARL, ao pretender desanexar, por essa via, uma das
parcelas do talhão 10 anteriormente concedida à recorrente por despacho de 8.6.90 da mesma
entidade.

Do nascimento da justiça administrativa em Moçambique à aprovação da Reforma


Administrativa Ultramarina (1856-1932)

A influência profunda do direito francês está na origem da recepção do sistema de


administração executiva em Portugal e, por via de consequência, na Província de Moçambique,
o que originará o surgimento de uma justiça administrativa. A aprovação da Portaria Provincial
n.º 395, de 18 de Fevereiro de 1856, marca – formalmente - a data do nascimento de uma
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justiça administrativa em Moçambique, no sentido moderno da palavra, e consequentemente,


de um Direito Processual Administrativo Contencioso. A referida portaria vai mandar
“considerar em vigor o Código Administrativo de 18 de Março de 1842, menos no que for
contrário ao disposto nos artigos 5.º e 8.º do decreto de 7 de Dezembro de 1836” e, assim,
introduzir, na província ultramarina, as novas regras relativas à organização administrativa,
formação e atribuições dos corpos administrativos, magistrados administrativos, tribunais
administrativos, administração paroquial, disposições especiais, gerais e penais sob reserva dos
artigos 5.º e 8.º do Decreto de 7 de Dezembro de 1836.

CONCLUSÃO

Não se pode esquecer, parafraseando PROSPER WEIL que: “... A conquista do Estado pelo
direito é relativamente recente e não está ainda terminada em toda a parte. Os lentos progressos
da organização internacional revelam-nos, num outro aspecto, esta repugnância de qualquer
“soberania” em admitir outro julgamento além do seu”. O Direito Administrativo materializa o
processo de autolimitação do Poder Público através do que MAURICE HAURIOU chamava a
“instituição administrativa”.

“Fruto de um milagre”, como assevera PROSPER WEIL, “o direito administrativo só subsiste,


de resto, por um prodígio cada dia renovado. Nenhuma força pode constranger de facto o
executivo a submeter-se à norma de direito e à sentença do juiz, mas o Estado pode, pelo
menos em teoria, pôr termo, quando o desejar, à autolimitação que consentiu. Para que o
milagre se realize e se prolongue devem ser preenchidas diversas condições que dependem da
forma do Estado, do prestígio do direito e dos juízes, do espírito do tempo”.

Não se deve esquecer do cumprimento permanente dessas condições em Moçambique para


consolidar o movimento de crescimento do Direito Administrativo desde a independência do
país para que se realiza e prolongue o “milagre” do Direito Administrativo.
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Bibliografia

HAURIOU M., Précis de Droit Administratif et de Droit Public, Paris, Recueil Sirey, 11ª ed.,
1927, p. 1.

MITCHELL J.D.B., "L'absence d'un système de droit administratif au Royaume-Uni: Ses


causes et ses effets", E.D.C.E., 1964, fas. N.º 18, pp. 211-225

LAWSON F.H., "Le droit administratif anglais", RIDC, 1951, pp. 412-426

RODRIGUES QUEIRÓ A., Lições de Direito Administrativo, Vol. I, Coimbra - 1976, p. 140

BARDONNET D., "La juridiction administrative à Madagascar", AJDA 1962, p. 399.

CISTAC G., Manual de Direito das Autarquias Locais, Ed. Faculdade de Direito da UEM -
Imprensa Universitária, 2001.

WEIL P., O Direito Administrativo, op. cit., pp. 22-23.

MAHOMED HANIF ARUN AGIGE, de 18 de Novembro de 1999, Proc. 29/94-1ª, em,


CISTAC G., jurisprudência Administrativa de Moçambique, Volume 1 (1994-1999), Maputo,
Ed. Tribunal Administrativo – 2003, p. 746.

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