CARVALHO e PINHEIRO - Contribuições Da Pedagogia Griô Na EI
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10.37885/230111892
RESUMO
O ponto de partida para esta pesquisa situa-se no atual momento em que nos encontramos
na Educação Básica, especialmente na Educação Infantil, quando verificamos a necessidade
de rever pressupostos, processos e práticas de escolarização das crianças, ante o esgota-
mento de referências que já não respondem às questões da vida contemporânea, destaca-
damente aquelas relativas à identidade e constituição do humano. Nessa direção, tendo por
base o Objetivo: de discutir a Pedagogia Griô dentro da Educação Infantil, a partir valores
civilizatórios, decoloniais e a colonialidade do currículo escolar. Para tanto, para subsidiar a
presente investigação, utilizou-se o Método: da pesquisa bibliográfica e documental concer-
nente a Pedagogia Griô: Pacheco (2015); Ki-Zerbo (2011); Hampâté Ba (2011); os Valores
civilizatórios discutidos por: Brandão (2010); Trindade(1998; 2005); Mattos (2003) ; sobre a
Colonidade do currículo por meio de Quinjano (2005, 2007); Ribeiro (2017); Costard (2017);e
a Decolonidade a partir dos estudos de: Bernardino-Costa e Grosfoguel (2016); Quijano
(2005); Colaço (2012) e Reis e Andrade (2018).Resultados: a partir do pressuposto a pratica
Pedagogia Griô é possível transformar e ampliar o currículo para uma educação decolonial,
os quais devem privilegiar o combate ao racismo, a descriminação racial e fortalecer a cultura
e imagem da população negra de forma positiva ancorado no arcabouço de conhecimentos
sobre as tradições e memória cultuais e história afro-brasileira. Conclusão: A partir deste
estudo foi possivel reitera as discussões sobre estratégias e praticas de resistência cultural e
de combate ao racismo a partir do diálogo dentro da Educação Infantil, considerando valido
as tradições e das memórias dos saberes da sua cultura familiar e da comunidade do qual
faz parte, por meio da Pedagogia Griô.
Este estudo busca, de modo ampliado, reunir um conjunto de elementos que possibili-
tem a construção de uma nova escola para as crianças negras, afrodescendentes, na qual
elas se reconheçam e sejam respeitadas em sua plenitude identitária.
São notórios os valores, as tradições, a dimensão religiosa, política, social e cultural
dos negros em nosso pais. Estes valores se tornam símbolo e identidade da cultura do
povo negro, uma vez que Cultura é um sistema de conhecimentos, modos de ser, agir, falar
e produzir dentro de uma sociedade. Assim sendo, percebe-se que a cultura africana é a
matriz de maior expressão na configuração da cultura brasileira, sem esquecer-se dos de-
mais povos indígenas, portugueses, entre outros, que também adentram essa configuração
(BRANDÃO, 2010).
É inegável o impacto da herança africana presente nas manifestações culturais de
todo o Brasil, seja no samba, na capoeira, nos trajes, na cozinha, na medicina, na religião,
nas danças e em suas histórias, nas memórias e tradições orais transmitidas de geração
a geração, o que ocorreu especialmente em Cachoeira, pelos aspectos já aqui referidos.
Apesar das diversas discussões, principalmente das dimensões da escola em relação
às etnias raciais, ainda faltam muitos aspectos a serem tratados sobre as questões étnico-
-raciais, principalmente na Educação Infantil. Nesse sentido, Ribeiro (2002, p. 150) afirma
que as “[...]crianças brasileiras, de todas as origens étnico-raciais, têm direito ao conheci-
mento da beleza, da riqueza e dignidade das culturas negro- africanas. Jovens e adultos
têm o mesmo direito”.
Tratar das questões sobre o pertencimento étnico-racial na Educação Infantil, atual-
mente considerada pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB, 2009) como primeira etapa da
educação básica, é buscar refletir sobre questões relativas à cultura e ao ambiente em que
se vive através do acervo de brinquedos, bonecas e bonecos negros, livros infantis com
imagens e personagens negros em posição de destaque; relacionar as atividades com per-
sonagens negros, valorizar as lendas, as histórias, as memórias e tradições africanas, são,
entre outras, afirmações da existência e valorização dos negros no país, dentro do espaço
escolar, (TRINDADE, 2010).
Neste cenário, percebe-se que a escola pouco tem privilegiado os conhecimentos e
tradições populares da comunidade da qual ela faz parte. São saberes das tradições, costu-
mes, ritos e conhecimentos específicos que poderiam ser valorizados em vista de um olhar
diferenciado, sobretudo, da aproximação das culturas afro-brasileiras no ambiente escolar.
Estas considerações aproximam-se do desenho deste estudo, que trata da Pedagogia
Griô na Educação Infantil, basicamente a partir valores civilizatórios, decoloniais e a colo-
nialidade do currículo escolar.
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A Pedagogia Griô tem como foco principal a transmissão oral de memórias dos ante-
passados, a qual retrata uma bibliografia cultural viva do meio em que está inserida, e tem
como base a transmissão oral de memória dos antepassados, o que traz uma nova ressig-
nificação acerca do contexto cultural histórico, com base na conservação identitária de uma
comunidade (PACHECO, 2015).
MÉTODOS
RESULTADOS
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enquanto sistema perverso que orientou a escolarização e vinda forçada dos negros para o
Brasil, e que se expressa ainda hoje no currículo escolar, partindo de uma prática pedagógica
que dialoga com as tradições e valorização oral da memória dos antepassados
Encontrou-se, no cenário atual da Educação Infantil Brasileira, a inserção de práticas
que possam desvelar o arcabouço histórico da colonialidade do poder imposta dentro do cur-
rículo escolar e, para tanto, surge discussões que ampliam, diversificam e consolidam práticas
pedagógicas que valorizem e expressem a memória dos antepassados de forma positiva.
Mas para desvelar tais reflexões foi preciso compreender os conceitos da pedagogia
griô, dos valores civilizatórios, da colonidade no currículo escolar e decolonialismo.
PEDAGOGIA GRIÔ
A tradição africana utiliza da memória oral para manter viva a tradição cultural do
seu povo, transmitindo estes conhecimentos, passados de geração a geração de forma
oral, através de ritos, histórias, culinária, medicina, fatos, entre outros (HAMPÂTÉ BA). Ki-
Zerbo (2011) e Hampâté Ba (2011) concordam que a tradição oral de uma sociedade, não
reconhece apenas a fala enquanto comunicação, mas sim, como meio de preservação da
sabedoria do seu povo.
Hampâté Ba (1982, p. 167) afirma que esta tradição se apoia nessa “[...] herança de
conhecimentos de toda espécie, pacientemente transmitidos de boca a ouvido,”. A palavra
Griot tem origem francesa e se inspira nos músicos, genealogistas, poetas e comunicadores
sociais, mediadores da transmissão oral, bibliotecas vivas das histórias, lutas e glórias do seu
povo no noroeste da África – Império do Mali (PACHECO, 2015). Pacheco (2015), propôs o
conceito de “Griô” ou Mestre(a) de Tradição Oral, como uma forma escrita abrasileirada de
utilizar a associação da palavra francesa Griot, para aqueles cidadãos que são reconhecidos
por sua comunidade como herdeiros das tradições, e que por meio da palavra, da oralidade,
da corporeidade e das suas vivências dialoga, aprende e ensina, transmitindo os saberes
de geração a geração.
Contudo, para uma educação que privilegie a diversidade é necessário a inserção de
metodologias que favoreçam o conhecimento de diferentes culturas e povos. A pedagogia
Griô vê na sua prática pedagógica a transmissão, por meio da oralidade, um meio para valori-
zar e manter viva a cultura de determinado povo (PACHECO, 2015). Encontra-se, fundamen-
tada na Educação Biocêntrica, em que busca o conhecimento crítico, de forma teórico-prática,
através da conscientização por meio das falas, escutas e gestos e expressões do outro.
Considerando que este tipo de Educação propõe uma concepção de aprendizagem
de forma mais ampla, que vai deste a família, amigos, nas ruas, escolas, universidades,
ou até mesmo no local de trabalho (CAVALCANTE, 2008), quando inserida nos níveis de
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educação: Ensino Fundamental, Médio e Superior permite a aproximação do indivíduo com
suas raízes culturais afim de “ [...] construir estratégias pedagógicas de aceitação e res-
peito da presença do negro nos espaços escolares, de forma que a eles seja assegurado
ao ingresso à permanência e o avanço nos estudos da educação infantil a pós-graduação
stricto-sensu”( PACHECO, 2015, p.191).
Segundo Dias; Abreu (2021), ancorado no legado de Paulo Freire e Olrlando Borba, para
uma educação popular latino-americana, Mota Nero ( 2016) sem esgotar o assunto, discute
algumas indicações de práticas pedagógicas decoloniais entre elas estão a (1) Pedagogia
que requer educadores subversivos, os quais tenham consciência e práxis que busque por
lutar e atuar em uma sociedade de modo a conscientizar os sujeitos do processo educativo
em questão; (2) Pedagogia que parte de uma hipótese de contexto, a qual a prática educa-
tiva esteja ligada a vida do grupo em questão; (3) Pedagogias que valorizam as memórias
coletivas; (4) Pedagogia em busca de outras coordenadas epistemológicas; (5) Pedagogias
que se afirmam como utopia política.(DIAS; ABREU, 2021, p. 41-42).
Isto reforça a prática pedagógica Griô, ao trata de uma pedagogia que valorize as me-
mórias coletivas do ambiente a qual a criança faz parte. Neste sentido, o processo educativo
deve ser permeado de memórias dos seus ancestrais, como os indígenas e quilombolas,
que resistiram ao modelo capitalista e escravocrata, e que devem ser valorizados den-
tro do contexto das atividades pedagógicas juntos as crianças desde a Educação Infantil,
para que desta forma haja uma “[...] consciência docente e de membros da comunidade
quanto à subversão do paradigma moderno-colonial” (Dias; Abreu (2021, p.50) como um
movimento de resistência e luta, para dar possibilidade de um espaço identitário de valori-
zação da sua cultura.
VALORES CIVILIZATÓRIOS
O censo da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios contínua (PNAD, 2017, p.12)
mostrou que no Brasil neste mesmo ano, “[...] 56,4 milhões de pessoas frequentavam escola
ou creche. Entre as crianças de 0 a 3 anos a taxa de escolarização foi 32,7%, o equivalente
a 3,3 milhões de estudantes”. Entre outros fatores, pode-se evidenciar que houve uma pe-
quena queda perante aos anos de 2016. Contudo, a diferença de escolaridade entre raças
ainda é alta, visto que a maioria destas crianças são negras, e isso demonstra os reflexos
das questões de raça na sociedade brasileira. Para o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA):
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Entre 1995 e 2015, a população adulta negra com 12 anos ou mais de estudo
passou de 3,3% para 12%. Entretanto, o patamar alcançado em 2015 pelos
negros era o mesmo que os brancos tinham já em 1995. Já a população branca,
quando considerado o mesmo tempo de estudo, praticamente dobrou nesses
20 anos, variando de 12,5% para 25,9%(IPEA,2017, s/d).
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novas formas de discussão e interpretação das demandas do legado pré-colonial, por meio
de uma postura crítica e politicamente orientada sobre a história e experiências negras no
contexto brasileiro.
Este legado da perversa inexistência histórica deixou marcas profundas na forma como
são concebidas as experiências de vida, as memórias e negligencia a história e modificar
isso é “[...] abdicar da chance de formularmos nossas demandas políticas e culturais antir-
racistas com maior precisão e possibilidade de êxito” (MATTOS, 2003 p.31).
Com efeito, intencionamos por acreditar numa ponte que ligue o passado ao presente
africano, sem recriações e intermediação da herança escravocrata, do binômio escravidão-
-liberdade, e assim,
Neste contexto, a tentativa que se faz nesta pesquisa é lançar novos olhares e signifi-
cados para a cultura, uma revisitação crítica e politicamente orientada sobre as experiências
negras em terras brasileiras, experiências de vida e valores civilizatórios (Figura 1).
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[...] as concepções diferenciais de morte e ancestralidade; o significado cosmo-
lógico da vida humana e da relação com a natureza; a oralidade como forma
privilegiada da comunicação e transmissão dos saberes, bem como o valor
da palavra e o caráter sagrado de todas as dimensões da existência humana
(MATTOS, 2003, p. 29)
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do ser que envolve este processo, é perceptível na história da América Latina, inclusive no
Brasil, que utiliza da intervenção desenvolvimentista para fazer parte da história linear da
humanidade, cujo modelo utilizado é o europeu e estadunidense, que renuncia toda forma
de organização social, cultural, dos saberes, experiências, modo de vida e de conhecimento
produzido por seus pares.
Neste sentido, os conhecimentos que são transmitidos indivíduo a indivíduo, na rua,
no ato de brincar, nas relações sociais, na universidade e principalmente no espaço esco-
lar, carregam a herança da modernidade/colonialidade que reforçam a hegemonia cultural,
econômica e política eurocêntrica, que decide “sobre quais são os saberes úteis e inúteis,
legítimos e ilegítimos, seguindo a lógica monocultural eurocêntrica” (RIBEIRO, 2017, p.
3116). E aqueles saberes, que são produzidos e originados dos grupos considerados subal-
ternos, são excluídos do debate acadêmico e nem aparecem no currículo escolar, mantendo,
desta forma, a colonialidade do saber, do ser e do poder.
No tocante às universidades, e principalmente nas licenciaturas, continuam a reproduzir
a lógica monocultural eurocêntrica. Ribeiro (2017) argumenta que para decolonizar a univer-
sidade é preciso transgredir, ir de encontro e se conectar às diversas formas e elementos
de conhecimento que fazem parte da vida cotidiana, do processo de tradução intercultural.
A escola, quase sempre, acaba por desqualificar a origem, a história dos seus alunos,
os grupos sociais, excluindo os conhecimentos populares e tudo aquilo que faz parte da
sua cultura, e deste modo, “a escola contribui para a reprodução da sociedade capitalista
ao transmitir, através das matérias escolares, as crenças que nos fazem vê-la como boa e
desejável” (SILVA, 1999, p. 32), e de forma perversa produz, segundo Santomè (2001, apud
Ribeiro 2017, p.3118), um currículo denominado pelo autor como turístico, em que predomina
a trivialização, o sentido de souvenir: desconectado, cheio de estereótipos e carregado de
tergiversão. Sendo,
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a) trivialização: estudar os grupos sociais diferentes dos majoritários com
grande superficialidade e banalidade; b) como souvenir: do total de unidades
didáticas a trabalhar na sala de aula, só uma pequena parte serve de souvenir
dessas diferentes culturas; c) desconectando as situações de diversidade da
vida cotidiana na sala de aula: uma única aula ou disciplina é voltada para
a problemática, mas no restante dos dias e disciplinas ela é ignorada e até
mesmo atacada; d) a estereotipagem: recorre-se a explicações que justificam
a situação de marginalização por meio dos estereótipos; e) a tergiversação:
o caso mais cruel de tratamento curricular, que constrói uma história certa na
medida para enquadrar e tornar naturais as situações de opressão. Santomè
(2001, apud RIBEIRO 2017, p.3118),
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1999, p. 90) ─, mas está para, além disso, busca e pensa a construção das diferenças e
dos efeitos sociais produzidos historicamente, através da compreensão e a transformação
da realidade que produz desigualdade. A efetivação desta realidade exige pensar no deco-
lonialismo, enquanto instrumento de desmonte da lógica que ainda hoje impera, amparada
por condições e situações coloniais.
DECOLONIALISMO
A decolonialidade pode ser interpretada como espelho dos estudos pós- coloniais, pois
reflete sobre a colonização como um grande evento prolongado historicamente que precisa
ser superado pelo pós-colonialismo, a partir da percepção de teóricos críticos de esquerda.
“A intenção é provocar um posicionamento contínuo de transgredir e insurgir. O decolonial
implica, portanto, uma luta contínua” (COLAÇO, 2012, p.8).
Objetivamente, busca problematizar e emancipar todos os tipos de opressão e domi-
nação, em um diálogo interdisciplinar com todos os níveis: cultural, político e econômico de
maneira que possa privilegiar os elementos epistêmicos locais em detrimento daquilo que
foi imposto pela colonização (REIS; ANDRADE, 2018).
Para Reis e Andrade (2018), o projeto da decolonialidade não é apenas um discurso
acadêmico, “consiste também numa prática de oposição e intervenção, que surgiu no mo-
mento em que o primeiro sujeito colonial do sistema mundo moderno/colonial reagiu contra
os desígnios imperiais que se iniciaram em 1492” (BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL,
2016, p.16-17), a fim de emergir à luz conhecimentos que não tiveram a chance de serem
apreciados, pois foram impostos pelo eurocentrismo.
A crítica decolonial, surge como um movimento, a fim de decolonizar a epistemologia la-
tino-americana e os seus cânones (BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL, 2016). O mesmo
ocorre com os estudos subalternos pós-coloniais, causando uma ruptura na “maneira como
a dominação das potências centrais em relação às periféricas está estruturada, através de
uma diferença étnica/racial/de gênero/de classe, que hierarquiza o dominador em relação
ao dominado, com o objetivo de controlar o trabalho, os recursos e os produtos em prol do
capital e do mercado”, ou seja, a relação do novo padrão do poder (QUINJANO, 2000, apud
ROSEVICS, 2017, p.189).
Com a expansão do colonialismo pelo resto do mundo, usou-se a elaboração teóri-
ca da ideia de raça, o que “significou uma nova maneira de legitimar as já antigas ideias
e práticas de relações de superioridade/inferioridade entre dominantes e dominados”
(QUIJANO, 2005, p.117).
O autor destaca que a raça se converteu no critério de classificação social e universal
de distribuição de uma população, e que passou a ser o modo mais durável de dominação
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social universal, além do intersexual ou de gênero, em que os povos conquistados e domi-
nados foram submetidos a uma situação, agora natural, de inferioridade tanto em relação
ao seu fenótipo, quanto suas constituições mentais e culturais. Como apontam Bernardino-
Costa e Grosfoguel (2016), trata-se na perspectiva decolonial de estabelecer um pensamen-
to de fronteira, que percebe que a modernidade e a tradição gnosiológica subalternizada
estão para além do provincialismo da epistemologia de homens brancos europeus e sim
como “[...] resposta epistêmica dos subalternos ao projeto eurocêntrico da modernidade”
(BERNARDINO-COSTA & GROSFOGUEL, 2016, p. 19).
O projeto político-acadêmico decolonial, tem como ponto central os diversos luga-
res, “[...] por exemplo, negros e ciganos nos Estados Unidos, paquistaneses e indianos na
Inglaterra, magrebinos no França, negros e indígenas no Brasil etc” (BERNARDINO-COSTA;
GROSFOGUEL (2016, p.20).
Trata-se, portanto, na perspectiva decolonial, de entender a relação de cada cultura
com o seu passado e com seu presente, indo de encontro à invisibilidade de outras expe-
riências históricas dos sujeitos que foram subordinados perante às condições de gênero,
sexo, raça ou cultura, abrindo um diálogo intercultural transmoderno e crítico, que busque
construir soluções para “[...] o patriarcalismo, o racismo, a colonialidade, o capitalismo”
(BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL, 2016, p. 22) entre outros. Um saber decolonial
deve ser aberto para o pluriversalismo, para os diversos contextos, para as diversas histórias
locais e diversas perspectivas epistêmicas (BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL, 2016).
No Brasil, as condições de gênero, raça/racismo e preconceito, são elementos bastante
expressivos da perspectiva colonial e por isso mesmo devem ser alvo da perspectiva contra
hegemônica decolonial.
DISCUSSÃO
Nos últimos tempos, graças a legislação em vigor sobre as relações étnico-raciais, dos
diversos movimentos sociais e dos debates acadêmicos, é possível ampliar a discussão e
implementação de ações que possam privilegiar a prática pedagógica do professor para
uma educação ante racista e da construção de um currículo decolonial.
A partir da obrigatoriedade da Lei nº 10.639/2003 e das Diretrizes Curriculares Nacionais
(DCN) que trata sobre a Educação das Relações Étnico-raciais e do Ensino de História e
Cultura Africana e Afro-brasileira, é possível abordar diversos contextos dentro deste enfoque
na sala de aula. Porém, quase sempre, é perceptível a falta de materiais que contemplem
a pratica pedagógica do professor mediante a diversidade e pluralidade cultural do Brasil, a
falta de formação continuada, entre outros aspectos.
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A legitimação da Lei nº 10.639/03 e as DCN vieram fortalecer o movimento negros,
as ações afirmativas dos intelectuais, e demais movimentos, que buscam pela superação
do racismo na sociedade e, em específico, no currículo escola. Para tanto o Ministério da
Educação (MEC) vem desenvolvendo materiais didático-pedagógicos, por meio de livros,
projetos e diversas formações continuada, que possam garantir ao professor subsídios para
a construção de uma educação antirracista e a construção de um currículo decolonial. E isto
deve começar pela Educação Infantil, para a criança de 0 a 5 anos, o qual deve enfocar a
construção de sua identidade e sua relação com o meio cultural do qual faz parte.
Por meio de práticas pedagógicas, como a Pedagogia Griô, é possível despertar nos
alunos da Educação Infantil, o interesse por conhecer e explotar sua cultura e sua ancestra-
liade, através de canções, histórias, cores, produções, dança, jogos, brinquedos e da arte,
é possível trabalhar a pluralidade cultural e o respeito do outro por meio do envolvimento da
família, da comunidade, dos alunos e da sociedade ao qual faz parte.
A pratica pedagogia Griô valorizar a cultura africana e afro-brasileira através da orali-
dade fazendo uso das contações de histórias, das tradições e histórias familiares, dos costu-
mes, da culinária, das medicações, dos festejos entre outros que podem ampliar o conceito
de ancestralidade, memória e da diversidade cultural Pacheco (2015); Dias; Abreu (2021).
Deste modo, a Pedagogia Griô abre um espaço propício para que ocorra a socialização
entre os alunos de seus conhecimentos, a transmissão de sua cultura e, dentro do contexto
escolar na Educação Infantil, vivenciar da melhor forma a autoestima através de atividades
pedagógicas diferenciadas por meio de dinâmicas, brincadeiras, jogos, brinquedos e pro-
duções coletivas. Para o MEC, a pratica pedagógica Griô,
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A Educação das Relações Étnico-Raciais tem por objetivo a divulgação e
produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que
eduquem cidadãos quanto à pluralidade étnicoracial, tornando-se capazes
de interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito
aos direitos legais e valorização de identidade, na busca da consolidação da
democracia brasileira (BRASIL, 2004, p.31).
CONCLUSÃO
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Práticas Educativas Antirracista: desafios, perspectivas e estratégias em pesquisa - ISBN 978-65-5360-284-7 - Vol. 1 - Ano 2023 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.com.br
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