CARVALHO e PINHEIRO - Contribuições Da Pedagogia Griô Na EI

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Contribuições da Pedagogia griô na


educação Infantil: dialogando sobre os
valores civilizatórios, decolonialismo e
colonialidade do Curriculo Escolar

Elipaula Marques da Cruz Carvalho


Universidade do Estado da Bahia - UNIMAM

Josemare Pereira dos Santos Pinheiro


Universidade do Estado da Bahia - UNIMAM

10.37885/230111892
RESUMO

O ponto de partida para esta pesquisa situa-se no atual momento em que nos encontramos
na Educação Básica, especialmente na Educação Infantil, quando verificamos a necessidade
de rever pressupostos, processos e práticas de escolarização das crianças, ante o esgota-
mento de referências que já não respondem às questões da vida contemporânea, destaca-
damente aquelas relativas à identidade e constituição do humano. Nessa direção, tendo por
base o Objetivo: de discutir a Pedagogia Griô dentro da Educação Infantil, a partir valores
civilizatórios, decoloniais e a colonialidade do currículo escolar. Para tanto, para subsidiar a
presente investigação, utilizou-se o Método: da pesquisa bibliográfica e documental concer-
nente a Pedagogia Griô: Pacheco (2015); Ki-Zerbo (2011); Hampâté Ba (2011); os Valores
civilizatórios discutidos por: Brandão (2010); Trindade(1998; 2005); Mattos (2003) ; sobre a
Colonidade do currículo por meio de Quinjano (2005, 2007); Ribeiro (2017); Costard (2017);e
a Decolonidade a partir dos estudos de: Bernardino-Costa e Grosfoguel (2016); Quijano
(2005); Colaço (2012) e Reis e Andrade (2018).Resultados: a partir do pressuposto a pratica
Pedagogia Griô é possível transformar e ampliar o currículo para uma educação decolonial,
os quais devem privilegiar o combate ao racismo, a descriminação racial e fortalecer a cultura
e imagem da população negra de forma positiva ancorado no arcabouço de conhecimentos
sobre as tradições e memória cultuais e história afro-brasileira. Conclusão: A partir deste
estudo foi possivel reitera as discussões sobre estratégias e praticas de resistência cultural e
de combate ao racismo a partir do diálogo dentro da Educação Infantil, considerando valido
as tradições e das memórias dos saberes da sua cultura familiar e da comunidade do qual
faz parte, por meio da Pedagogia Griô.

Palavras-chave: Pedagogia Griô, Valores Civilizatórios, Decoloniedade.


INTRODUÇÃO

Este estudo busca, de modo ampliado, reunir um conjunto de elementos que possibili-
tem a construção de uma nova escola para as crianças negras, afrodescendentes, na qual
elas se reconheçam e sejam respeitadas em sua plenitude identitária.
São notórios os valores, as tradições, a dimensão religiosa, política, social e cultural
dos negros em nosso pais. Estes valores se tornam símbolo e identidade da cultura do
povo negro, uma vez que Cultura é um sistema de conhecimentos, modos de ser, agir, falar
e produzir dentro de uma sociedade. Assim sendo, percebe-se que a cultura africana é a
matriz de maior expressão na configuração da cultura brasileira, sem esquecer-se dos de-
mais povos indígenas, portugueses, entre outros, que também adentram essa configuração
(BRANDÃO, 2010).
É inegável o impacto da herança africana presente nas manifestações culturais de
todo o Brasil, seja no samba, na capoeira, nos trajes, na cozinha, na medicina, na religião,
nas danças e em suas histórias, nas memórias e tradições orais transmitidas de geração
a geração, o que ocorreu especialmente em Cachoeira, pelos aspectos já aqui referidos.
Apesar das diversas discussões, principalmente das dimensões da escola em relação
às etnias raciais, ainda faltam muitos aspectos a serem tratados sobre as questões étnico-
-raciais, principalmente na Educação Infantil. Nesse sentido, Ribeiro (2002, p. 150) afirma
que as “[...]crianças brasileiras, de todas as origens étnico-raciais, têm direito ao conheci-
mento da beleza, da riqueza e dignidade das culturas negro- africanas. Jovens e adultos
têm o mesmo direito”.
Tratar das questões sobre o pertencimento étnico-racial na Educação Infantil, atual-
mente considerada pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB, 2009) como primeira etapa da
educação básica, é buscar refletir sobre questões relativas à cultura e ao ambiente em que
se vive através do acervo de brinquedos, bonecas e bonecos negros, livros infantis com
imagens e personagens negros em posição de destaque; relacionar as atividades com per-
sonagens negros, valorizar as lendas, as histórias, as memórias e tradições africanas, são,
entre outras, afirmações da existência e valorização dos negros no país, dentro do espaço
escolar, (TRINDADE, 2010).
Neste cenário, percebe-se que a escola pouco tem privilegiado os conhecimentos e
tradições populares da comunidade da qual ela faz parte. São saberes das tradições, costu-
mes, ritos e conhecimentos específicos que poderiam ser valorizados em vista de um olhar
diferenciado, sobretudo, da aproximação das culturas afro-brasileiras no ambiente escolar.
Estas considerações aproximam-se do desenho deste estudo, que trata da Pedagogia
Griô na Educação Infantil, basicamente a partir valores civilizatórios, decoloniais e a colo-
nialidade do currículo escolar.

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A Pedagogia Griô tem como foco principal a transmissão oral de memórias dos ante-
passados, a qual retrata uma bibliografia cultural viva do meio em que está inserida, e tem
como base a transmissão oral de memória dos antepassados, o que traz uma nova ressig-
nificação acerca do contexto cultural histórico, com base na conservação identitária de uma
comunidade (PACHECO, 2015).

MÉTODOS

A partir da pesquisa bibliográfica foi possível recompor os principais estudos sobre o


tema concernente as seguintes categorias: Pedagogia Giô; Valores civilizatórios; Colonialidade
e Decolonidade do currículo. Sobre a Pedagogia Griô: Pacheco (2015); Ki-Zerbo (2011);
Hampâté Ba (2011) vem destacar a teoria e fundamentar esta prática pedagógica para ser
valorizada no ambiente escolar; os Valores civilizatórios discutidos por: Brandão (2010);
Trindade(1998; 2005); Mattos (2003) estes autores são apontados por abordar, reconhe-
cer e difundir a importância de tais conhecimentos para que se possa lançar mão destes
conceitos para instrumentalizar a prática pedagógica em sala de aula; sobre a Colonidade
do currículo, foi possível através dos estudos de: Quinjano (2005, 2007); Ribeiro (2017);
Mingolo (2005); Costard (2017)e a Decolonidade do currículo a partir: Bernardino-Costa e
Grosfoguel (2016); Quijano (2005); Colaço (2012) e Reis e Andrade (2018) desvelar o pro-
cesso da decolonialidade do poder e como esta se encontra presente na colonialidade do
Currículo escolar. Este tipo de pesquisa, tratado pela literatura científica, reune informações
que possam contribuir para elucidar alguns questionamentos e ampliar outras questões que
devem surgir com o passar do tempo. Para Morosini e Fernandes (2014), o estado da arte
consiste na identificação, registro, categorização que levem à reflexão e síntese a produção
científica de uma determinada área a qual o pesquisador tenha interesse em desvendar.
Portanto verificou-se por meio dos autores e publicações referente ao tema, foi possível dis-
cutir sobre as relações étnico - raciais e a cultura africana e afro-brasileiro podem e devem
estar presente não somente de a Educação Infantil. Neste sentido, por meio da pesquisa
bibliográfica e documental, o presente artigo problematiza e discute o ensino das relações
étnico-raciais na Educação Infantil.

RESULTADOS

Consideramos prioritário desvelar o contexto histórico-cultural que substancia e ainda


hoje impregna o cotidiano, a vida de negros e negras no Brasil, essencialmente quanto aos
valores civilizatórios demarcadores das condições objetivas de vivências e sobrevivência
dos negros, no que se incluem questões de gênero, racismo e preconceito, de colonialidade

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enquanto sistema perverso que orientou a escolarização e vinda forçada dos negros para o
Brasil, e que se expressa ainda hoje no currículo escolar, partindo de uma prática pedagógica
que dialoga com as tradições e valorização oral da memória dos antepassados
Encontrou-se, no cenário atual da Educação Infantil Brasileira, a inserção de práticas
que possam desvelar o arcabouço histórico da colonialidade do poder imposta dentro do cur-
rículo escolar e, para tanto, surge discussões que ampliam, diversificam e consolidam práticas
pedagógicas que valorizem e expressem a memória dos antepassados de forma positiva.
Mas para desvelar tais reflexões foi preciso compreender os conceitos da pedagogia
griô, dos valores civilizatórios, da colonidade no currículo escolar e decolonialismo.

PEDAGOGIA GRIÔ

A tradição africana utiliza da memória oral para manter viva a tradição cultural do
seu povo, transmitindo estes conhecimentos, passados de geração a geração de forma
oral, através de ritos, histórias, culinária, medicina, fatos, entre outros (HAMPÂTÉ BA). Ki-
Zerbo (2011) e Hampâté Ba (2011) concordam que a tradição oral de uma sociedade, não
reconhece apenas a fala enquanto comunicação, mas sim, como meio de preservação da
sabedoria do seu povo.
Hampâté Ba (1982, p. 167) afirma que esta tradição se apoia nessa “[...] herança de
conhecimentos de toda espécie, pacientemente transmitidos de boca a ouvido,”. A palavra
Griot tem origem francesa e se inspira nos músicos, genealogistas, poetas e comunicadores
sociais, mediadores da transmissão oral, bibliotecas vivas das histórias, lutas e glórias do seu
povo no noroeste da África – Império do Mali (PACHECO, 2015). Pacheco (2015), propôs o
conceito de “Griô” ou Mestre(a) de Tradição Oral, como uma forma escrita abrasileirada de
utilizar a associação da palavra francesa Griot, para aqueles cidadãos que são reconhecidos
por sua comunidade como herdeiros das tradições, e que por meio da palavra, da oralidade,
da corporeidade e das suas vivências dialoga, aprende e ensina, transmitindo os saberes
de geração a geração.
Contudo, para uma educação que privilegie a diversidade é necessário a inserção de
metodologias que favoreçam o conhecimento de diferentes culturas e povos. A pedagogia
Griô vê na sua prática pedagógica a transmissão, por meio da oralidade, um meio para valori-
zar e manter viva a cultura de determinado povo (PACHECO, 2015). Encontra-se, fundamen-
tada na Educação Biocêntrica, em que busca o conhecimento crítico, de forma teórico-prática,
através da conscientização por meio das falas, escutas e gestos e expressões do outro.
Considerando que este tipo de Educação propõe uma concepção de aprendizagem
de forma mais ampla, que vai deste a família, amigos, nas ruas, escolas, universidades,
ou até mesmo no local de trabalho (CAVALCANTE, 2008), quando inserida nos níveis de

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educação: Ensino Fundamental, Médio e Superior permite a aproximação do indivíduo com
suas raízes culturais afim de “ [...] construir estratégias pedagógicas de aceitação e res-
peito da presença do negro nos espaços escolares, de forma que a eles seja assegurado
ao ingresso à permanência e o avanço nos estudos da educação infantil a pós-graduação
stricto-sensu”( PACHECO, 2015, p.191).
Segundo Dias; Abreu (2021), ancorado no legado de Paulo Freire e Olrlando Borba, para
uma educação popular latino-americana, Mota Nero ( 2016) sem esgotar o assunto, discute
algumas indicações de práticas pedagógicas decoloniais entre elas estão a (1) Pedagogia
que requer educadores subversivos, os quais tenham consciência e práxis que busque por
lutar e atuar em uma sociedade de modo a conscientizar os sujeitos do processo educativo
em questão; (2) Pedagogia que parte de uma hipótese de contexto, a qual a prática educa-
tiva esteja ligada a vida do grupo em questão; (3) Pedagogias que valorizam as memórias
coletivas; (4) Pedagogia em busca de outras coordenadas epistemológicas; (5) Pedagogias
que se afirmam como utopia política.(DIAS; ABREU, 2021, p. 41-42).
Isto reforça a prática pedagógica Griô, ao trata de uma pedagogia que valorize as me-
mórias coletivas do ambiente a qual a criança faz parte. Neste sentido, o processo educativo
deve ser permeado de memórias dos seus ancestrais, como os indígenas e quilombolas,
que resistiram ao modelo capitalista e escravocrata, e que devem ser valorizados den-
tro do contexto das atividades pedagógicas juntos as crianças desde a Educação Infantil,
para que desta forma haja uma “[...] consciência docente e de membros da comunidade
quanto à subversão do paradigma moderno-colonial” (Dias; Abreu (2021, p.50) como um
movimento de resistência e luta, para dar possibilidade de um espaço identitário de valori-
zação da sua cultura.

VALORES CIVILIZATÓRIOS

O censo da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios contínua (PNAD, 2017, p.12)
mostrou que no Brasil neste mesmo ano, “[...] 56,4 milhões de pessoas frequentavam escola
ou creche. Entre as crianças de 0 a 3 anos a taxa de escolarização foi 32,7%, o equivalente
a 3,3 milhões de estudantes”. Entre outros fatores, pode-se evidenciar que houve uma pe-
quena queda perante aos anos de 2016. Contudo, a diferença de escolaridade entre raças
ainda é alta, visto que a maioria destas crianças são negras, e isso demonstra os reflexos
das questões de raça na sociedade brasileira. Para o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA):

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Entre 1995 e 2015, a população adulta negra com 12 anos ou mais de estudo
passou de 3,3% para 12%. Entretanto, o patamar alcançado em 2015 pelos
negros era o mesmo que os brancos tinham já em 1995. Já a população branca,
quando considerado o mesmo tempo de estudo, praticamente dobrou nesses
20 anos, variando de 12,5% para 25,9%(IPEA,2017, s/d).

Estas desigualdades entre crianças, jovens e adolescentes acabam refletindo em todo


o cenário educacional do país como na média de anos estudados, na evasão escolar e
também no acesso às universidades. Todavia, as ações afirmativas surgem na contramão
deste cenário, levantando estratégias para desfazer a estruturação social que fora imposta
“[...] dos cinco séculos de história, a partir do nosso ingresso involuntário no mundo moderno,
quase quatro séculos nós vivemos sob o jugo do regime escravista” (MATTOS, 2003, p. 31).
O cenário educacional no Brasil vem aos poucos buscando, por meio de estudos a
respeito desta cultura, romper com as concepções tradicionais e alterar o conteúdo edu-
cativo que nega perversamente a chegada forçada dos africanos que desembarcaram no
Brasil, que eram pessoas que no seu continente de origem pertenciam a diversos estratos
sociais, categorias profissionais, posições políticas etc, e que tanto os africanos quanto
seus descendentes sofreram e sofrem as mais variadas mazelas e violências, na tentativa
inclusive de apagá-los da história, impondo o modo de vida colonial, levando à sociedade
a considerar esta cultura como inferior perante a cultura branca (CUNHA JÚNIOR, 2005).

[...] nossa história através, principalmente, do trabalho de construção da nossa


memória social própria, em conjunto com a crítica da memória social que a
supremacia branca ocidental nos legou como herança, e que, na maioria das
vezes, reproduzimos com pouca consciência acerca das suas formas, conte-
údos e efeitos reiteradores de uma economia de relações raciais, calcada na
pressuposição da nossa inferioridade (MATTOS, 2003, p.30).

É necessário edificar a valorização de uma cultura política afrodescendente e afro-


-brasileira, através de um esforço intelectual e para isso podemos lançar mão ao retratar
os valores civilizatórios afro-brasileiros. É possível destacar a herança dos seus descen-
dentes, como também todo o legado cultural fundante para a construção do país. Estes
valores encontram-se inscritos na nossa memória, no nosso modo de ser, na nossa música,
na nossa literatura, na nossa ciência, arquitetura, gastronomia, religião, na nossa pele, no
nosso coração. Queremos destacar que, na perspectiva civilizatória, somos, de certa forma
ou de certas formas, afrodescendentes. E, em especial, somos o segundo país do mundo
em população negra (TRINDADE, 2005, p. 30).
Neste sentido, para não paralisar os conteúdos educativos diante do cenário que não
valoriza tal cultura, os aspectos civilizatórios afro-brasileiros devem estar presentes neste
processo (TRINDADE, 1998). Para Mattos (2003) há uma real necessidade de se configurar

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novas formas de discussão e interpretação das demandas do legado pré-colonial, por meio
de uma postura crítica e politicamente orientada sobre a história e experiências negras no
contexto brasileiro.
Este legado da perversa inexistência histórica deixou marcas profundas na forma como
são concebidas as experiências de vida, as memórias e negligencia a história e modificar
isso é “[...] abdicar da chance de formularmos nossas demandas políticas e culturais antir-
racistas com maior precisão e possibilidade de êxito” (MATTOS, 2003 p.31).
Com efeito, intencionamos por acreditar numa ponte que ligue o passado ao presente
africano, sem recriações e intermediação da herança escravocrata, do binômio escravidão-
-liberdade, e assim,

[...] identificar, no interior do complexo cultural brasileiro, sobretudo através da


interpretação dos significados mais amplos das manifestações hegemonizadas
numérica ou culturalmente pelas populações negras, recriações cosmológi-
cas herdadas de sociedades africanas pré-coloniais ou mesmo similares às
dimensões culturais mais profundas das sociedades africanas contemporâneas
(MATTOS, 2003 p 29).

Neste contexto, a tentativa que se faz nesta pesquisa é lançar novos olhares e signifi-
cados para a cultura, uma revisitação crítica e politicamente orientada sobre as experiências
negras em terras brasileiras, experiências de vida e valores civilizatórios (Figura 1).

Figura 1. Valores Civilizatórios Afro-Brasileiros.

Fonte: BRANDÃO (2010, p.14).

Assim, destacamos os valores civilizatórios afro-brasileiros como forma de tematizar


os conteúdos em sala, considerando:

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[...] as concepções diferenciais de morte e ancestralidade; o significado cosmo-
lógico da vida humana e da relação com a natureza; a oralidade como forma
privilegiada da comunicação e transmissão dos saberes, bem como o valor
da palavra e o caráter sagrado de todas as dimensões da existência humana
(MATTOS, 2003, p. 29)

Destacamos as dimensões mencionadas por Brandão (2010): a Energia Vital,


Circularidade, Oralidade, Musicalidade, Ludicidade e tantos outros, uma vez que

reconhecemos a importância do Axé, da ENERGIA VITAL, da potência de vida


presente em cada ser vivo, para que, num movimento de CIRCULARIDADE,
esta energia circule, se renove, se mova, se expanda, (...) e não hierarquize
as diferenças reconhecidas na CORPOREIDADE do visível e do invisível. (...)
Se estamos em constante devir, vir a ser, é fundamental a preservação da ME-
MÓRIA (...). É importante o respeito à ANCESTRALIDADE, também presente
no mundo de territórios diversos (TERRITORIALIDADE). Territórios sagrados
(RELIGIOSIDADE) porque lugares de memória, memória ancestral, memórias
a serem preservadas como relíquias, memórias comuns, coletivas, tecidas e
compartilhadas por processos de COOPERAÇÃO e COMUNITARISMO, por
ORALIDADES, pela palavra, pelos corpos diversos, singulares e plurais (...),
pela música (MUSICALIDADE) e, sobretudo, por que não, pelo prazer de viver
— LUDICIDADE.( BRANDÃO, 2010, p.14)

A diversidade destes temas dentro dos conteúdos escolares é fundamental, para a


construção de uma nova identidade e humanidade em que o diálogo, o respeito e a convi-
vência façam parte do contexto social. Para que isso se caracterize, no entanto, é preciso
problematizar o currículo escolar que ainda obedece a uma lógica colonial, que menospreza
e subalterniza a identidade negra e afro-brasileira.

A COLONIALIDADE DO CURRÍCULO ESCOLAR

A modernidade é apontada como um período histórico responsável por levar o desen-


volvimento, a ruptura com o passado arcaico e o avanço para aqueles povos considerados
primitivos da América, Ásia e África. Neste período, o modelo europeu econômico, social e
político, foi considerado promotor de tais avanços, tomando por premissa de que o desenvol-
vimento europeu tornou a civilização mais avançada e estabelecendo quais as formas de ser
e estar deveriam ser seguidas. Quijano (2007) destaca que além da colonialidade do poder
também acontece a colonialidade do saber e do ser que afirmam a superioridade masculina,
heterossexual e branca em detrimento “[...] da identidade indígena, negra, feminina, homosse-
xual, ou qualquer identidade transgressora do padrão estabelecido” (RIBEIRO, 2017, p.3114).
A colonialidade para Quinjano (2005), configura-se como padrão mundial de poder
capitalista, que divide o mundo em centro e periferia; desenvolvido e atrasado; moderno
e tradicional/obsoleto. Ribeiro (2017) destaca que esta colonialidade do poder, do saber e

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do ser que envolve este processo, é perceptível na história da América Latina, inclusive no
Brasil, que utiliza da intervenção desenvolvimentista para fazer parte da história linear da
humanidade, cujo modelo utilizado é o europeu e estadunidense, que renuncia toda forma
de organização social, cultural, dos saberes, experiências, modo de vida e de conhecimento
produzido por seus pares.
Neste sentido, os conhecimentos que são transmitidos indivíduo a indivíduo, na rua,
no ato de brincar, nas relações sociais, na universidade e principalmente no espaço esco-
lar, carregam a herança da modernidade/colonialidade que reforçam a hegemonia cultural,
econômica e política eurocêntrica, que decide “sobre quais são os saberes úteis e inúteis,
legítimos e ilegítimos, seguindo a lógica monocultural eurocêntrica” (RIBEIRO, 2017, p.
3116). E aqueles saberes, que são produzidos e originados dos grupos considerados subal-
ternos, são excluídos do debate acadêmico e nem aparecem no currículo escolar, mantendo,
desta forma, a colonialidade do saber, do ser e do poder.
No tocante às universidades, e principalmente nas licenciaturas, continuam a reproduzir
a lógica monocultural eurocêntrica. Ribeiro (2017) argumenta que para decolonizar a univer-
sidade é preciso transgredir, ir de encontro e se conectar às diversas formas e elementos
de conhecimento que fazem parte da vida cotidiana, do processo de tradução intercultural.

Consequentemente, observa-se que o currículo da educação básica, é um


território colonizado, pois seus [...] conhecimentos são oriundos, quase total-
mente, do Ocidente e da ciência moderna. Ao excluir os saberes de outras
culturas, a escola atua reforçando a opressão dos grupos sociais subalternos
e reproduz a colonialidade com a noção de conhecimentos superiores e infe-
riores (RIBEIRO, 2017, p.3117).

Deste modo, há de se perceber que

[d]iferentes formas culturais de conhecimento devem poder conviver no mes-


mo espaço universitário, sem o parcelamento do conhecimento e a recusa da
experiência [...] conferindo legitimidade a todos os conhecimentos ancestrais,
vistos como pré-históricos, começam a ser reconhecidos como iguais em um
diálogo de saberes (RIBEIRO, 2017, p.3117).

A escola, quase sempre, acaba por desqualificar a origem, a história dos seus alunos,
os grupos sociais, excluindo os conhecimentos populares e tudo aquilo que faz parte da
sua cultura, e deste modo, “a escola contribui para a reprodução da sociedade capitalista
ao transmitir, através das matérias escolares, as crenças que nos fazem vê-la como boa e
desejável” (SILVA, 1999, p. 32), e de forma perversa produz, segundo Santomè (2001, apud
Ribeiro 2017, p.3118), um currículo denominado pelo autor como turístico, em que predomina
a trivialização, o sentido de souvenir: desconectado, cheio de estereótipos e carregado de
tergiversão. Sendo,

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a) trivialização: estudar os grupos sociais diferentes dos majoritários com
grande superficialidade e banalidade; b) como souvenir: do total de unidades
didáticas a trabalhar na sala de aula, só uma pequena parte serve de souvenir
dessas diferentes culturas; c) desconectando as situações de diversidade da
vida cotidiana na sala de aula: uma única aula ou disciplina é voltada para
a problemática, mas no restante dos dias e disciplinas ela é ignorada e até
mesmo atacada; d) a estereotipagem: recorre-se a explicações que justificam
a situação de marginalização por meio dos estereótipos; e) a tergiversação:
o caso mais cruel de tratamento curricular, que constrói uma história certa na
medida para enquadrar e tornar naturais as situações de opressão. Santomè
(2001, apud RIBEIRO 2017, p.3118),

Decolonizar o currículo é, então, ir à oposição a tais práticas, buscando consolidar uma


proposta de educação que permita o diálogo entre os conhecimentos científicos e os saberes
ancestrais e a valorização das organizações sociais próprias que representam cada grupo,
seja indígena, negro, afrodescendente, entre outros.
Uma pedagogia decolonial, para Costard (2017), deve em todo momento decolonizar as
epistemologias e os processos de trabalho pedagógico, e isto é, “incluir, revitalizar e revalo-
rizar os saberes ligados aos grupos subalternizados” (p.173) e historicizar as diferenças e
as relações sociais. Deve utilizar o poder contra-hegemônico para explorar novas práticas
alternativas de conhecimento (RIBEIRO, 2017).
Esta pedagogia tem como objetivo refletir sobre os dispositivos de poder e questionar
as ausências da história dos grupos sociais nas narrativas da História da humanidade, e
para isso não “basta apenas “adicionar” essas culturas, como adornos de homenagem à
diferença, mas colocá-las em relação umas com as outras” (RIBEIRO, 2017, p.172), a fim
de questionar e incluir aqueles grupos considerados subalternos em uma epistemologia que
até então, não foi projetada para ser apresentada como grupos de agentes históricos que
têm dignidade, memória e conhecimentos que devem ser conhecidos e respeitado.
A pedagogia decolonial de Walsh, segundo Costard (2017), se apoia em Paulo Freire
e Frantz Fanon, na dimensão de uma pedagogia emancipatória, em que educar é um ato
político e de humanização que emancipa e transforma o indivíduo, “[...] a ideia é a de que
a humanização (que em Freire está relacionada com a ação consciente) pressupõe a de(s)
colonização (questão central em Fanon) (COSTARD, 2017, p.172). Para isso é necessário
ter um currículo crítico, que permita que o ser seja fundamentalmente transformado, pois o
indivíduo passa a se reconhecer de forma grandiosa dentro do processo da história da hu-
manidade e isso resulta em um novo ser que se apropria de uma nova linguagem, uma nova
humanidade, resultando em homens novos e legítimos que se libertam do efeito produzido
por séculos de colonização (COSTARD, 2017).
No entanto, não basta que um currículo crítico celebre as diferenças ─ “a igualdade não
se obtém simplesmente através da igualdade de acesso ao currículo hegemônico” (SILVA,

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1999, p. 90) ─, mas está para, além disso, busca e pensa a construção das diferenças e
dos efeitos sociais produzidos historicamente, através da compreensão e a transformação
da realidade que produz desigualdade. A efetivação desta realidade exige pensar no deco-
lonialismo, enquanto instrumento de desmonte da lógica que ainda hoje impera, amparada
por condições e situações coloniais.

DECOLONIALISMO

A decolonialidade pode ser interpretada como espelho dos estudos pós- coloniais, pois
reflete sobre a colonização como um grande evento prolongado historicamente que precisa
ser superado pelo pós-colonialismo, a partir da percepção de teóricos críticos de esquerda.
“A intenção é provocar um posicionamento contínuo de transgredir e insurgir. O decolonial
implica, portanto, uma luta contínua” (COLAÇO, 2012, p.8).
Objetivamente, busca problematizar e emancipar todos os tipos de opressão e domi-
nação, em um diálogo interdisciplinar com todos os níveis: cultural, político e econômico de
maneira que possa privilegiar os elementos epistêmicos locais em detrimento daquilo que
foi imposto pela colonização (REIS; ANDRADE, 2018).
Para Reis e Andrade (2018), o projeto da decolonialidade não é apenas um discurso
acadêmico, “consiste também numa prática de oposição e intervenção, que surgiu no mo-
mento em que o primeiro sujeito colonial do sistema mundo moderno/colonial reagiu contra
os desígnios imperiais que se iniciaram em 1492” (BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL,
2016, p.16-17), a fim de emergir à luz conhecimentos que não tiveram a chance de serem
apreciados, pois foram impostos pelo eurocentrismo.
A crítica decolonial, surge como um movimento, a fim de decolonizar a epistemologia la-
tino-americana e os seus cânones (BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL, 2016). O mesmo
ocorre com os estudos subalternos pós-coloniais, causando uma ruptura na “maneira como
a dominação das potências centrais em relação às periféricas está estruturada, através de
uma diferença étnica/racial/de gênero/de classe, que hierarquiza o dominador em relação
ao dominado, com o objetivo de controlar o trabalho, os recursos e os produtos em prol do
capital e do mercado”, ou seja, a relação do novo padrão do poder (QUINJANO, 2000, apud
ROSEVICS, 2017, p.189).
Com a expansão do colonialismo pelo resto do mundo, usou-se a elaboração teóri-
ca da ideia de raça, o que “significou uma nova maneira de legitimar as já antigas ideias
e práticas de relações de superioridade/inferioridade entre dominantes e dominados”
(QUIJANO, 2005, p.117).
O autor destaca que a raça se converteu no critério de classificação social e universal
de distribuição de uma população, e que passou a ser o modo mais durável de dominação

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social universal, além do intersexual ou de gênero, em que os povos conquistados e domi-
nados foram submetidos a uma situação, agora natural, de inferioridade tanto em relação
ao seu fenótipo, quanto suas constituições mentais e culturais. Como apontam Bernardino-
Costa e Grosfoguel (2016), trata-se na perspectiva decolonial de estabelecer um pensamen-
to de fronteira, que percebe que a modernidade e a tradição gnosiológica subalternizada
estão para além do provincialismo da epistemologia de homens brancos europeus e sim
como “[...] resposta epistêmica dos subalternos ao projeto eurocêntrico da modernidade”
(BERNARDINO-COSTA & GROSFOGUEL, 2016, p. 19).
O projeto político-acadêmico decolonial, tem como ponto central os diversos luga-
res, “[...] por exemplo, negros e ciganos nos Estados Unidos, paquistaneses e indianos na
Inglaterra, magrebinos no França, negros e indígenas no Brasil etc” (BERNARDINO-COSTA;
GROSFOGUEL (2016, p.20).
Trata-se, portanto, na perspectiva decolonial, de entender a relação de cada cultura
com o seu passado e com seu presente, indo de encontro à invisibilidade de outras expe-
riências históricas dos sujeitos que foram subordinados perante às condições de gênero,
sexo, raça ou cultura, abrindo um diálogo intercultural transmoderno e crítico, que busque
construir soluções para “[...] o patriarcalismo, o racismo, a colonialidade, o capitalismo”
(BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL, 2016, p. 22) entre outros. Um saber decolonial
deve ser aberto para o pluriversalismo, para os diversos contextos, para as diversas histórias
locais e diversas perspectivas epistêmicas (BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL, 2016).
No Brasil, as condições de gênero, raça/racismo e preconceito, são elementos bastante
expressivos da perspectiva colonial e por isso mesmo devem ser alvo da perspectiva contra
hegemônica decolonial.

DISCUSSÃO

Nos últimos tempos, graças a legislação em vigor sobre as relações étnico-raciais, dos
diversos movimentos sociais e dos debates acadêmicos, é possível ampliar a discussão e
implementação de ações que possam privilegiar a prática pedagógica do professor para
uma educação ante racista e da construção de um currículo decolonial.
A partir da obrigatoriedade da Lei nº 10.639/2003 e das Diretrizes Curriculares Nacionais
(DCN) que trata sobre a Educação das Relações Étnico-raciais e do Ensino de História e
Cultura Africana e Afro-brasileira, é possível abordar diversos contextos dentro deste enfoque
na sala de aula. Porém, quase sempre, é perceptível a falta de materiais que contemplem
a pratica pedagógica do professor mediante a diversidade e pluralidade cultural do Brasil, a
falta de formação continuada, entre outros aspectos.

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A legitimação da Lei nº 10.639/03 e as DCN vieram fortalecer o movimento negros,
as ações afirmativas dos intelectuais, e demais movimentos, que buscam pela superação
do racismo na sociedade e, em específico, no currículo escola. Para tanto o Ministério da
Educação (MEC) vem desenvolvendo materiais didático-pedagógicos, por meio de livros,
projetos e diversas formações continuada, que possam garantir ao professor subsídios para
a construção de uma educação antirracista e a construção de um currículo decolonial. E isto
deve começar pela Educação Infantil, para a criança de 0 a 5 anos, o qual deve enfocar a
construção de sua identidade e sua relação com o meio cultural do qual faz parte.
Por meio de práticas pedagógicas, como a Pedagogia Griô, é possível despertar nos
alunos da Educação Infantil, o interesse por conhecer e explotar sua cultura e sua ancestra-
liade, através de canções, histórias, cores, produções, dança, jogos, brinquedos e da arte,
é possível trabalhar a pluralidade cultural e o respeito do outro por meio do envolvimento da
família, da comunidade, dos alunos e da sociedade ao qual faz parte.
A pratica pedagogia Griô valorizar a cultura africana e afro-brasileira através da orali-
dade fazendo uso das contações de histórias, das tradições e histórias familiares, dos costu-
mes, da culinária, das medicações, dos festejos entre outros que podem ampliar o conceito
de ancestralidade, memória e da diversidade cultural Pacheco (2015); Dias; Abreu (2021).
Deste modo, a Pedagogia Griô abre um espaço propício para que ocorra a socialização
entre os alunos de seus conhecimentos, a transmissão de sua cultura e, dentro do contexto
escolar na Educação Infantil, vivenciar da melhor forma a autoestima através de atividades
pedagógicas diferenciadas por meio de dinâmicas, brincadeiras, jogos, brinquedos e pro-
duções coletivas. Para o MEC, a pratica pedagógica Griô,

[...] poderá contribuir para que os professores da Educação Infantil compre-


endam um pouco mais sobre o poder da oralidade na sociedade africana e
aprendam a explorá-la no contexto brasileiro e naquele em que as institui-
ções se encontram. Essa reflexão é importante para a orientação da relação
pedagógica com as crianças pequenas e suas famílias já que, nesta etapa
da educação básica, a oralidade se apresenta como uma forma marcante de
expressão, comunicação, transmissão de valores e ensinamentos. (BRASIL,
2014, p.36).

A prática pedagógica da Pedagogia Griô criou uma gama de possibilidades metodológi-


cas e didáticas para que a prática do professor possa avançar em uma educação decolonial
trabalhando questões sobre identidade, ancestralidade, cultura oral, tradição oral, memória
e sobre os saberes populares a partir dos valores civilizatórios discutidos por BRANDÃO
(2010,) e Costard (2017). Os DCN para a Educação das Relações étnico-raciais expressam
em seu artigo 2º, parágrafo 1º, § 1º:

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A Educação das Relações Étnico-Raciais tem por objetivo a divulgação e
produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que
eduquem cidadãos quanto à pluralidade étnicoracial, tornando-se capazes
de interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito
aos direitos legais e valorização de identidade, na busca da consolidação da
democracia brasileira (BRASIL, 2004, p.31).

Neste sentido praticas pedagógicas continuas, segundo COLAÇO (2012); QUIJANO,


(2005), que busque por transformar e ampliar o currículo para uma educação decolonial
devem privilegiar o combate ao racismo, a descriminação racial e fortalecer a cultura, ima-
gem e representatividade da população negra de forma positiva ancorado no arcabouço de
conhecimentos sobre as tradições cultuais e história afro-brasileira.
Gomes (2006) destaca que embora haja o avanço da lei, é necessário o avanço no
contexto político, das relações de poder, na organização, rotina e vivencias das práticas edu-
cativas que possam concretizar a incorporação legitima da função reguladora dos saberes,
dos valores, da cultua e da identidade. Para além de ações pontuais como momentos festivos
da escola, caso contrário estas ações são apenas “formas de ‘incorporação’, reproduzem e
não modificam a tradicional função reguladora do sistema sobre o que sejam concepções
legítimas de saberes, valores, cultura, identidade.” (ARROYO, 2010, p. 127).

CONCLUSÃO

O contexto educacional, das discussões sobre as questões afrobrasileiro basileiro dentro


da educação, tem alcançado uma expressiva reflexão quando utilizado para a construção
da história, da política e dos aspectos sociais sobre a desigualdade e o respeito a cada cul-
tura. As possibilidade de explorar e confrontar novas práticas, construir um novo currículo,
que possam fazer emergir novas práticas que para quebrar o silêncio, provocar mudanças
e despertar ações positivas sobre a cultura africana na escola e no ambiente educacional.
Neste sentido, percebe-se a necessidade de se discutir a prática pedagógica Griô des-
de a Educação Infantil, afim de inseri-la na construão da identidade da criança e da criança
negra, para que possam fortalecê-la, garantir estratégias de ações valorativas de saberes
sobre suas tradições, ancestralidades, saberes que levam ao combate ao racismo pelo viés do
conhecimento sobre os seus antepassados e da importância dentro da história da sociedade.
A partir deste estudo foi possível reiterar as discussões sobre estratégias e praticas
de resistência cultura e de combate ao racismo a partir da Educação Infantil, considerando
valido as tradições e das memórias dos saberes da sua cultura familiar e da comunidade
do qual faz parte, por meio da Pedagogia Griô.

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Agradecimentos

Agradeço às ciências humanas que se propõem a fazer a reparação históri-


ca do povo negro.

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