Parecer PGFN - Efeitos Voto de Qualidade - 240415 - 111322
Parecer PGFN - Efeitos Voto de Qualidade - 240415 - 111322
Parecer PGFN - Efeitos Voto de Qualidade - 240415 - 111322
Diante do exposto, são apresentados alguns questionamentos a serem respondidos, nos limites das
pertinentes:
1. Situações em que apenas alguns dos capítulos da decisão se deram com base em voto de qualidade
1.1. A definição por voto de qualidade se estende aos outros capítulos? Qual o tratamento aplicável: (i)
caso se trate de capítulo afeto ao mérito da infração; (ii) caso se trate de questão preliminar de
especial do contribuinte por voto de qualidade quando a decisão da turma ordinária foi favorável à
Fazenda por maioria de votos? E quando a decisão da turma ordinária foi proferida com o voto de
qualidade, o débito foi mantido e então foi aplicada multa de mora, o contribuinte teria direito à
aplicação dos benefícios previstos na lei para afastar a multa sobre o débito, considerando que a multa
1.4. Qual o tratamento a ser dado caso a responsabilidade seja mantida por voto de qualidade?
sobre a multa? No caso de multa qualificada ou agravada, deve-se manter a multa integralmente,
2.2. Qual a solução a ser dada em caso de multa qualificada por dispositivo diverso do § 1º, do art. 44,
da Lei 9.430/1996, exemplificativamente, a multa prevista no artigo 18, caput e § 2º, da Lei
10.833/2003, c/c inciso I do caput do artigo 44 da Lei 9.430/96, que trata de DCOMP não homologada
em virtude de fraude, visto se tratar de previsão não alterada pelo § 9º-A introduzido pelo art. 2º da Lei
14.689/23?
2.3. Qual o tratamento a ser dado à multa qualificada quando a Câmara Superior de Recursos Fiscais
decidir, por maioria ou unanimidade, reformar julgamento da turma ordinária decidido por voto de
qualidade? Seria o caso de aplicar a nova previsão estabelecida pela Lei 14.689/23, que inseriu o §9º-A
2.4. Qual a solução a ser dada em caso de decisão por voto de qualidade sobre multa aduaneira?
2.5. Qual a solução a ser dada em caso de decisão por voto de qualidade sobre multa isolada?
2.6. Qual o tratamento a ser dispensado aos autos de infração já lavrados, com imposição de multa
qualificada, no que tange à interpretação do § 1º-C, I, acrescido ao art. 44 da Lei 9.430/96 pela Lei
14.689/23?
2.7. Qual a repercussão do § 1º-C, II, acrescido ao art. 44 da Lei 9.430/96 pela Lei 14.689/23 quanto à
tributário?
3.1.O que se entende por julgamento de processo administrativo fiscal resolvido definitivamente a
favor da Fazenda Pública pelo voto de qualidade? Qual o marco temporal para a contagem do prazo de
especial para a Câmara Superior de Recursos Fiscais quando o objetivo for apenas alterar o quórum do
4.2.Qual a consequência jurídica do acórdão proferido pela Câmara Superior de Recursos Fiscais por
maioria ou unanimidade que reforme uma decisão por voto de qualidade proferida pela turma
ordinária?
4.3. Qual o tratamento a ser dado em caso de decisão do CARF pelo não conhecimento de recurso
especial do contribuinte por voto de qualidade quando a decisão da turma ordinária foi favorável à
Fazenda por maioria de votos? E quando a decisão da turma ordinária foi proferida com o voto de
II
§ 9º-A. Ficam excluídas as multas e cancelada a representação fiscal para os fins penais de que trata o art.
83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, na hipótese de julgamento de processo administrativo
fiscal resolvido favoravelmente à Fazenda Pública pelo voto de qualidade previsto no § 9º deste artigo.
5. Antes de adentrar o exame das questões objeto de consulta, cabe registrar que a presente
manifestação não pretende exaurir as discussões originadas a partir da introdução §9º-A do art. 25 do
Decreto n.º 70.235/72 pela Lei n. 14.689/23. As repercussões do novo diploma emergirão à medida que a
norma for aplicada. A finalidade desta manifestação é fornecer vetores de orientação de caráter geral que
9. Nota-se que o conteúdo da norma não estabelece critérios a serem considerados na decisão,
mas sim estipula, aprioristicamente, os efeitos decorrentes do acórdão dotado das características previstas
em Lei (resultado alcançado por meio de voto de qualidade), independentemente do tipo de infração ou de
outros aspectos de direito material postos à apreciação do órgão julgador.
10. Uma vez configurado o antecedente – decisão por voto de qualidade –, impõe-se o
consequente: exclusão de multas, dispensando-se o órgão julgador de proferir qualquer juízo sobre os
pressupostos legais para a incidência de tais multas. Cabe ao órgão competente para liquidação do julgado
aplicar a regra.
11. Sobre a matéria, manifestou-se esta PGFN por meio do Parecer SEI n.º 3.407/23, ao
promover a análise jurídica do Projeto de Lei n.º 2.384, de 2023, o qual resultou na Lei n.º 14.689/23, ora
sob escrutínio:
“21. Em síntese, trata-se de regra que prevê, no contexto de decisões proferidas no âmbito do CARF, a
exclusão das multas incidentes sobre o crédito tributário, na hipótese de julgamento de processo
22. Verifica-se que, na hipótese de desempate do julgamento por voto de qualidade, a exclusão das
multas passou a ser um efeito automático decorrente da decisão, assim como o cancelamento da
13. Fixado tratar-se de norma processual, cujo conteúdo consiste em efeito automático
decorrente da decisão, passa-se a tratar dos consectários imediatos da natureza processual da inovação
legislativa.
15. Outrossim, sob o aspecto da Lei no tempo, a natureza processual da previsão importa
incidência imediata e prospectiva, conforme disposição do art. 14 do Código de Processo Civil – CPC/15,
cuja aplicação supletiva ao processo administrativo fiscal é prevista no art. 15 do CPC/15.
17. Para aferir a pendência de apreciação pela instância ordinária pressuposta à aplicação do art.
15 da Lei n.º 14.689/23, cumpre verificar se, no momento da publicação do ato legal – 20 de setembro de
2023 – o contribuinte já instaurara discussão judicial (pendência) atinente ao mérito do crédito tributário
(apreciação de mérito) de caso julgado pelo CARF. Cumpre, portanto, aferir se (i) havia ajuizado a ação ou
suscitado incidente para discutir o crédito quanto a aspecto definido pelo voto de qualidade no âmbito do
CARF e (ii) a discussão sobre o mérito ainda não se encerrara na mesma data.
20. Em contraposição, veja-se a regra veiculada pelo art. 8º da mesma Lei. A este dispositivo, que
alterou a quantificação da multa prevista no art. 44, §1º, da Lei n.º 9.430/96, cominando penalidade menos
severa, aplica-se o art. 106 do CTN, conforme conclusão do Parecer SEI n.º 3.950/2023.
21. Uma vez estabelecida a natureza jurídica da norma e definidos os consectários de caráter
geral decorrentes dessa definição, a continuidade da análise dos efeitos e a extensão do novel dispositivo
requer que se estabeleça o significado da expressão “julgamento de processo administrativo fiscal resolvido
favoravelmente à Fazenda Pública”.
22. Antes de iniciar o exame das disposições legais, insta estabelecer as premissas sobre as
técnicas de hermenêutica a serem utilizadas.
23. A interpretação promovida, como toda interpretação jurídica, ostenta índole pragmática, isto
é, além de estabelecer sentido, orienta-se a propiciar condições de decidibilidade diante de situações
concretas de dúvida ou conflito, ciente de que a hipótese do legislador racional é marcada pela limitação.
24. Na execução desse mister, invoca-se o auxílio das tradicionais lições do professor Tércio
Sampaio Ferraz Jr., segundo o qual os critérios de interpretação são a coerência, o consenso e a justiça.
26. Ampliando o exame, o método lógico enfoca a conexão da expressão normativa com as
demais do contexto, identificando eventuais inconsistências na busca do significado mais adequado. Nessa
etapa, se aplicam regras gerais como a inexistência de palavras supérfluas e a prevalência do especial sobre
o geral, mas também regras práticas para lidar com emergentes situações conflitivas.
“A primeira e mais importante recomendação, nesse caso, é de que, em tese, qualquer preceito isolado
deve ser interpretado em harmonia com os princípios gerais do sistema, para que se preserve a
coerência do todo. Portanto, nunca devemos isolar o preceito nem em seu contexto (a lei em tela, o
código: penal, civil etc) e muito menos em sua concatenação imediata (nunca leia um só artigo, leia
“Para o levantamento das condições históricas, recomenda-se ao intérprete o recurso aos precedentes
normativos, isto é, de normas que vigoraram no passado e que antecederam à nova disciplina para, por
comparação, entender os motivos condicionantes de sua gênese.”5
29. A abordagem é particularmente relevante na presente análise, que trata de disposições cujo
ingresso no ordenamento jurídico ocorreu em contexto político-econômico específico. Na esfera tributária
federal, como já mencionado, houve a restauração do voto de qualidade no âmbito do CARF após
interregno de excepcionalidade. A previsão de exclusão da multa correspondeu à medida contraposta a sua
reinstituição, resultando de negociação entre o Poder Executivo, o Poder Legislativo e setores econômicos.
Os relatórios e pareceres elaborados no curso do processo legislativo, adiante reproduzidos, evidenciam os
aspectos político, econômico e os valores jurídicos envolvidos na edição do normativo.
31. São metodologias que também se fundam na unidade sistemática, assim como aquelas que
concretizam o critério do consenso, porém enfocando as consequências da interpretação conferida à
norma, na busca por assegurar que sejam consentâneas com as finalidades e os valores que a instituíram.
32. Na aprovação da legislação em comento, a questão dos valores jurídicos assume elevada
relevância na investigação do sentido da norma. É consabido que, no contexto político-econômico em que
editada a Lei n.º 14.689/23, a previsão de exclusão da multa funda-se em critério de justiça, segundo o qual
os lançamentos tributários mantidos por decisão do CARF tomada pelo voto de qualidade são marcados
pela controvérsia – considerando a estrutura paritária do órgão – e, por consequente, merecem
tratamento mais benéfico. Dito de outro modo, entendeu-se que a imposição de multas demanda quórum
qualificado. Sem prejuízo de discussão sobre o critério de justiça adotado, verifica-se que a previsão
normativa encontra marcado fundamento axiológico, cujo reconhecimento deve orientar a interpretação
do dispositivo formalizado.
33. Estabelecida a natureza jurídica da norma e os efeitos dessa classificação, bem como o
34. O enunciado comporta duas expressões cuja elucidação é determinante para aplicação da
norma (i) julgamento resolvido e (ii) resolução favorável à Fazenda Pública. Inicia-se o exame pelo primeiro
deles.
35. O ato processual que julga a lide, assim resolvendo-a, é um ato decisório. Sobre tal ato,
cumpre fixar que, não obstante a manifestação do órgão competente seja, em sua forma, una, – uma
sentença, um acórdão –, ela se sujeita à decomposição, constituindo-se de partes decisórias que resolvem
pretensões distintas postas na relação jurídica processual. Os chamados "capítulos de sentença"
correspondem a cada uma dessas “unidades decisórias”, as quais são, em todo ou em parte, determinadas
pelos objetos do processo.
36. Barbosa Moreira denomina as sentenças “cujo dispositivo contém mais de uma decisão” ou
ainda “que se compõe(m) de mais de um capítulo” de sentenças objetivamente complexas6. Nessa linha, as
pretensões apresentadas não necessariamente serão julgadas no mesmo ato decisório. É possível, por
exemplo, que uma delas seja objeto de recurso à instância superior, enquanto, em relação à outra, as
partes permitam que se opere a preclusão. Dessa forma, haverá dois atos decisórios e, pois, dois momentos
distintos de resolução da(s) lide(s).
“São de notória relevância apenas os cortes feitos no decisório da sentença, mediante a identificação
e isolamento de capítulos portadores de preceitos concretos e de imperativa eficácia prática. Esses
sentido de que a cada um deles expressa uma deliberação específica; cada uma dessas deliberações é
distinta das contidas nos demais capítulos e resulta da verificação de pressupostos próprios, que não se
segmentos do decisório que residem critérios aptos a orientar diretamente a colisão dos diversos
problemas já arrolados, quer no tocante aos recursos, quer em todas as demais áreas de relevância já
38. A noção de capítulo da sentença é acolhida no Direito Processual brasileiro, podendo ser
identificada em diversos artigos do novo Código de Processo Civil, quando, dentre outros, referencia a
existência de partes nas decisões, prevê a interposição parcial de recurso. Destaca-se o art. 1.013, §1º, que
traz a redação “capítulo impugnado”. Cabe transcrever as previsões legais, por ilustrativas:
Art. 490. O juiz resolverá o mérito acolhendo ou rejeitando, no todo ou em parte, os pedidos
exigências legais.
Art. 1.002. A decisão pode ser impugnada no todo ou em parte.
Art. 1.008. O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a decisão impugnada no que tiver sido
objeto de recurso.
discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo
impugnado.
39. Dado que o Código Processo Civil não traz distinção quanto às partes da decisão suscetíveis
de impugnação, não diferenciando os elementos decisórios de mérito daqueles relativos a questões
processuais, é possível concluir, em linha com a doutrina citada, que o ordenamento processual brasileiro
adota a decomposição da decisão em questões, questões essas resolvidas na medida em que necessárias à
apreciação das pretensões apresentadas, sejam essas questões de mérito ou processuais.
41. Firmado que as decisões proferidas no bojo de um processo são estruturadas em capítulos,
inclusive para o fim de interposição de recursos, é de se reconhecer, como consequente, que cada um
desses capítulos irradia efeitos próprios. Assim, a aplicação da metodologia hermenêutica sistemática, que
43. Dessarte, é possível definir que o “julgamento resolvido” corresponde a cada uma das
unidades decisórias que definem, resolvendo, portanto, as pretensões apresentadas ao órgão julgador, e,
em consequência, os efeitos da §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 devem ser aferidos em relação
a cada uma dessas unidades.
45. Para tanto, cumpre, de início, definir a premissa de que são as decisões de mérito que
definem a exigência de tributos ou contribuições, conforme previsão do art. 25, caput, do Decreto n.º
70.235/72.
46. Em reforço, tem-se a previsão do próprio art. 1º do Decreto nº 70.235, de 1972, que define o
escopo do processo administrativo fiscal como a “determinação e exigência dos créditos tributários da
União”, afora o procedimento de consulta, que não assume relevância para a presente análise. O
"julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário" corresponde ao
controle de legalidade dos atos relacionados ao "procedimento administrativo tendente a verificar a
ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o
montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade
cabível" (art. 142 do CTN), vale dizer, ao julgamento da validade do lançamento tributário.
47. A aplicação do § 9º-A do art. 25 do Decreto nº 70.235/72 deve respeitar os limites impostos
pelo próprio caput do art. 25, além do art. 1º do Decreto, isto é, aplica-se ao julgamento de tributos e
contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal/créditos tributários da União.
49. Assim, a expressão “resolvido favoravelmente à Fazenda Pública” deve ser interpretada no
sentido de que as pretensões contrapostas do Fisco e do sujeito passivo tenham sido apreciadas pelo CARF.
50. Nessa linha, resgate-se a distinção feita na subseção antecedente entre as questões
51. Na dinâmica de julgamento, o exame das questões processuais antecede logicamente o das
questões materiais e desse exame podem advir duas espécies de decisões: (i) decisões que superam a
questão processual e permitem o exame do mérito, quando, então, será resolvida a respectiva questão em
capítulo próprio e (ii) decisões que não superam a questão processual e, pois, impedem a produção dos
capítulos decisórios atinentes ao mérito.
52. No primeiro caso, é evidente, os capítulos que apreciam pressupostos para exame do mérito
são eminentemente instrumentais e deles não dimana efeito extraprocessual, prestando-se,
exclusivamente, para definir o direito da parte ao pronunciamento do órgão julgador. No segundo caso, as
decisões que não superam a questão processual, além de não adentrarem o exame do processo de
determinação e exigência do crédito tributário, não operam efeitos substitutivos.
53. O efeito substitutivo dos recursos consiste na substituição da decisão recorrida, em relação
às matérias recorridas e conhecidas no mérito, pela decisão proferida pelo órgão ad quem (art. 1008 do
CPC/15). Nos capítulos recorridos e conhecidos, a decisão “não mais subsista(e) como norma individual e
concreta” (AgRg no AREsp n. 158.448/RJ, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em
20/11/2012, DJe de 18/12/2012.). Isto é, uma vez conhecido o mérito do recurso e reapreciada a questão
devolvida, será a nova decisão que permanecerá no ordenamento, mantenha ela o dispositivo da decisão
recorrida ou reforme-a.
54. Dessarte, cabe reconhecer que as decisões proferidas pelo CARF, nos capítulos atinentes às
questões processuais, sejam extintivas do processo, sejam antecedentes ao exame do mérito, não definem
a exigência de tributos ou contribuições (não resolvem as pretensões veiculadas pelas partes) e, portanto,
não podem repercutir os efeitos do preceptivo sob exame. Dito de outro modo, deve-se distinguir o
julgamento “em processo administrativo” do julgamento “do processo administrativo”. As deliberações
sobre as questões processuais são decisões no PAF mas não constituem decisões do PAF.
55. Ademais, a aplicação do § 9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 a capítulos decisórios
processuais seria uma interpretação admissível somente a partir da leitura isolada do dispositivo. As
técnicas de exegese lógico-sistemática, sociológico-histórica e a teleológico-axiológica, sobre as quais se
discorreu de forma extensa acima, conduzem à conclusão diversa.
56. Como exposto, as regras de hermenêutica recomendam que se considere a finalidade dos
57. Voltando a atenção para o processo legislativo que originou a norma em exame, aplicando-
se, pois, os métodos sociológico e histórico acima descritos, na busca do contexto no qual foi inserida a
norma no ordenamento, depreende-se, dos pareceres dos relatores, na Câmara dos Deputados e no
Senado Federal, que a exclusão das penalidades tributárias foi erigida à medida de justiça fiscal diante de
situações em que a manutenção do crédito tributário é reputada controversa, o que se caracteriza pela
decisão tomada pelo voto de qualidade. O Parecer de Plenário ao Projeto de Lei n.º 2.384/23 é claro nesse
sentido:
“A nosso ver, contudo, o atual modelo de aplicação do voto de qualidade pela Fazenda Pública não se
alinha adequadamente ao disposto no art. 112 do Código Tributário Nacional, segundo o qual a lei
tributária que define infrações ou comina penalidades deve ser interpretada de forma mais favorável ao
acusado, o que recomenda a previsão de concessão de desonerações relativas às parcelas acessórias
(...)
Portanto, nossa posição é a de que, nos casos de empate nos julgamentos realizados pelo CARF, a
Fazenda Pública deve dispor do voto de qualidade. Contudo, o crédito tributário constituído sob tal
condição deve receber um tratamento especial e favorecido”.
(Disponível em https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2298319)
o voto de qualidade lhe for contrário, devem ser ao menos afastadas as penalidades tributárias.
Esse entendimento está refletido no texto aprovado pela Câmara dos Deputados, mediante a exclusão
de multas e do cancelamento da representação fiscal para fins penais, na forma do art. 2º do PL, que
altera o Decreto nº 70.235, de 1972.
(...)
As disposições merecem acolhimento, pois, a um só tempo, impedem a continuidade dos prejuízos que
a Fazenda Nacional vem experimentando desde a extinção do voto de qualidade e mitigam os efeitos
encargo legal, caso o julgamento da controvérsia que levou à esfera administrativa se encerre com
empate resolvido favoravelmente à Fazenda Nacional pelo voto de qualidade. Além disso, pode
recorrer ao Poder Judiciário e, na hipótese de ter capacidade de pagamento, fica dispensado de
garantir o débito em juízo”.
(Disponível em https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/158907)
59. O recurso aos trabalhos legislativos revela a finalidade da norma ao mesmo tempo em que
ilustra o contexto de sua edição, reforçando a conclusão pela inaplicabilidade do dispositivo às decisões
sobre questões processuais, uma vez que estas não manifestam juízo sobre o crédito tributário, e, pois, não
podem evidenciar controvérsia sobre a obrigação tributária.
“25. Partindo para a interpretação teleológica do dispositivo, se a intenção do legislador era privilegiar
um suposto “princípio in dubio pro contribuinte”, é possível argumentar que não haveria sentido a sua
aplicação em questões nas quais o CARF está deliberando sobre a instrução do processo administrativo
ou corrigindo falhas técnicas existentes em um acórdão, por exemplo.
(...)
31. A emenda original previa o afastamento de determinadas penalidades, na hipótese do "processo
administrativo de determinação e exigência do crédito tributário resolver-se favoravelmente à Fazenda
Nacional, em virtude do voto de qualidade a que se refere o § 9º do artigo 25 do Decreto nº 70.235, de 6
de março de 1972." A redação original evidencia que o dispositivo sempre esteve vocacionado aos
julgamentos com conteúdo de mérito, que podem redundar na desqualificação ou na substituição da
multa de ofício. É que as decisões processuais não envolvem a discussão das multas previstas no art. 44
da Lei nº 9.430, de 1996 - que possuem natureza de crédito tributário -, o que confirma a
63. Uma vez fixada natureza da norma – norma processual – e definido o conteúdo e o alcance
da expressão “julgamento de processo administrativo fiscal resolvido favoravelmente à Fazenda Pública
pelo voto de qualidade”, passa-se ao exame dos questionamentos apresentados.
64. Os primeiros questionamentos a serem respondidos são aqueles contidos no item 1 da Seção
III da Consulta CAEJ, que traz indagações acerca da aplicação do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72
em caso de aplicação do voto de qualidade apenas a um dos capítulos da decisão.
65. Com base em todo o exposto acima, é possível responder ao item 1.1 da Consulente no
sentido de que, como regra geral, o §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 se aplica, autonomamente, a
cada um dos capítulos de mérito do julgado, não incidindo sobre questões decididas que possuam natureza
processual, eis que os capítulos que versam sobre essas questões não se pronunciam sobre pretensão sobre
a qual possam operar seus efeitos.
III
III.1.1 Das questões atinentes aos efeitos do recurso especial interposto em face de decisão que julgar,
por voto de qualidade, resolvendo o processo favoravelmente à Fazenda Nacional
III.1.1.1 Da extensão e alcance do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 quando o recurso especial do
contribuinte é conhecido pela Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF)
66. O item 4.2 dos questionamentos indagam sobre a situação em que o acórdão da Câmara
Superior de Recursos Fiscais (CSRF), reexaminando questão decidida pela Turma Ordinária por meio de
voto de qualidade, se manifesta por maioria ou unanimidade. O item 2.3 traz questionamento semelhante,
especificando a questão em relação ao julgamento da multa qualificada.
67. Quando a CSRF se pronuncia sobre questão de mérito apreciada pelas Turmas Ordinárias,
surgem dois cenários possíveis. O primeiro é a reforma da decisão que foi proferida pela Turma Ordinária
em favor da Fazenda Pública, situação em que não há que se falar em aplicação do §9º-A do art. 25 do
Decreto 70.235/72, pois não se configuram seus pressupostos, i.e., não há decisão favorável à Fazenda
Pública. O outro cenário é a manutenção da decisão da Turma Ordinária, o que pode se dar por voto de
qualidade ou por outro quórum de decisão.
69. O recurso à Câmara Superior de Recursos Fiscais apreciado no mérito, seja para reforma,
seja para manutenção do julgado, importa substituição da decisão proferida pela Turma Ordinária naquilo
que foi objeto de recurso conhecido, pelo acórdão da CSRF, obstando a atribuição de qualquer efeito à
decisão recorrida, pois não mais subsistente. Assim, a técnica lógico-sistemática responde à indagação. A
interpretação conjugada do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 com as regras processuais que
tratam da eficácia das decisões e dos efeitos dos recursos resulta em que somente a decisão meritória que
subsiste no sistema jurídico pode irradiar os efeitos introduzidos pela Lei n.º 14.689/23.
70. O pronunciamento original deixa de operar efeitos no mundo jurídico, ainda que haja
manutenção da decisão, passando a ser o acórdão da CSRF o julgamento a ser examinado para o fim de
verificar a aplicação do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72. Se a decisão da CSRF for também
atingida por meio de voto de qualidade, aplica-se o referido dispositivo. Caso o julgamento tenha ocorrido
por unanimidade ou maioria, a hipótese de incidência da regra não se configura.
73. Neste ponto, a questão é examinada sob o enfoque dos efeitos do recurso, aplicando-se as
conclusões já apresentadas nesta seção integralmente. Ademais, fixa-se que o julgamento sobre a
exasperação das multas é matéria atinente ao mérito e, portanto, os capítulos decisórios respectivos
atraem a incidência do §9º-A do art. 25 do Decreto.
74. Quando a decisão, na Turma Ordinária, se der por voto de qualidade quanto à manutenção
da multa em sua forma qualificada, o recurso do contribuinte pode ensejar a reforma do julgado, que
significará uma decisão favorável ao sujeito passivo, afastando-se tal decisão do campo de incidência do
§9º-A do art. 25 do Decreto.
75. A manutenção do acórdão recorrido pelo voto de qualidade não gera questionamentos, eis
que as decisões substituta e substituída repercutem os mesmos efeitos. O acórdão decidido por quórum
III.1.1.2. Esclarecimentos adicionais sobre o recurso do contribuinte desprovido pela CSRF em julgamento
definido por unanimidade ou maioria
76. A título adicional, importa esclarecer que a manutenção da decisão recorrida pelo
contribuinte com alteração do resultado da votação, que passa de qualidade para maioria, não caracteriza
reformatio in pejus.
77. Para além da regra geral da inaplicabilidade da vedação da reformatio in pejus ao processo
administrativo, em decorrência do dever de autotutela da Administração Pública, conforme reconhecido
pelo STJ8, verifica-se que a previsão de exclusão das multas em caso de decisão tomada pelo voto de
qualidade mostra-se alheia ao campo de incidência do instituto.
78. José Carlos Barbosa Moreira, em lição consagrada, afirma existir reformatio in pejus "quando
o órgão 'ad quem', no julgamento de um recurso, profere decisão mais desfavorável ao recorrente, sob o
ponto-de-vista [ sic], prático, do que aquela contra a qual se interpôs o recurso".9 A regra prescreve a
impossibilidade de uma nova decisão trazer desvantagem ao recorrente, na ausência de impugnação da
parte adversa (ou de outro legitimado) com pedido específico. Trata-se de decorrência do princípio
dispositivo, que por sua vez, se relaciona com a autonomia da vontade e a imparcialidade do julgador. Uma
vez que a contraparte não exerceu seu direito recursal, não lhe pode advir vantagem.
79. O postulado se direciona à decisão, as deliberações realizadas pelo órgão a quem devolvido
o conhecimento da matéria posta em recurso, proibindo-lhe de reformar a decisão recorrida de forma
contrária ao interesse jurídico do recorrente.
80. A expressão “do ponto de vista prático” reforça esta conclusão, pois presta-se a
circunscrever a vedação a mudanças no dispositivo da decisão, isto é, não há óbice ao conhecimento e
alteração dos fundamentos do julgamento.
81. O Código de Processo Civil incorpora a proibição ao refomatio in pejus, por exemplo, no art.
505, quando prevê recorribilidade parcial e no art. 515, quando vincula o tribunal ao pedido do recorrente.
82. Fixado o âmbito de abrangência da regra, isto é, os dispositivos da decisão, constata-se que a
previsão §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 lhe é estranha. A norma não diz respeito à matéria a ser
decidida pelos órgãos julgadores, mas sim estabelece efeito automático da decisão. Não se relaciona com o
instituto da reformatio in pejus, pois fora da alçada do órgão julgador definir sua aplicação. Dito de outro
modo, a incidência do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 não compõe o objeto do processo e,
portanto, não se aplicam as regras que delimitam o âmbito decisório do julgador.
“é qualitativa a diferença quando se substitui a providência jurisdicional por outra, de teor diverso,
praticamente menos vantajosa ainda para o recorrente. exemplo: (a) tício, condenado ao pagamento
de multa por suposta infração do contrato celebrado com caio, recorre, sozinho, sustentando a
inexistência da infração, e o órgão ad quem decreta a resolução do contrato. é quantitativa a diferença
quando se onera o recorrente com um plus, ou se lhe retira tudo ou algo do que lhe concedera o órgão
a quo. exemplos: (b) tício recorre, sozinho, contra a decisão que decretara a resolução do contrato, e o
órgão ad quem condena-o, mais, a pagar a caio perdas e danos; (c) tício, condenado ao pagamento de
“x”, recorre sozinho, e o órgão ad quem condena-o a pagar x + y; (d) caio, que em primeira instância
obtivera apenas x, recorre sozinho, para pleitear y, e o órgão ad quem nega-lhe tanto y quanto x.” 10
84. A leitura do excerto transcrito evidencia que, mesmo sob o aspecto quantitativo, a mudança
agravadora que é interdita é aquela que decorre de uma decisão. A mudança na situação prática vedada é
aquela que deriva de pronunciamento do órgão julgador, que, no exemplo acima ilustrado, condena o
recorrente a pagar outras quantias. A previsão do art. §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72, por
constituir efeito da decisão que independe de pronunciamento do julgador, não caracteriza alteração
gravosa do julgamento.
85. Sob outra perspectiva, cabe registrar que, por não constituir capítulo decisório, ou seja, por
não se sujeitar à deliberação do órgão julgador, a questão encontra-se fora do âmbito protetivo do
princípio da proteção da confiança11. Não há possibilidade de violação à segurança jurídica, pois se trata de
regra objetiva de incidência automática, isto é, o recorrente tem ciência do risco envolvido na interposição
de recurso contra decisão tomada pelo voto de qualidade, risco consistente na possibilidade de sua
manutenção por outro resultado de votação, que afastará a incidência do regramento instituído pelo art.
§9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72.
III.1.1.3. Interpretação do art. 25-A do Decreto n.º 70.235/72 e esclarecimentos adicionais sobre a
interpretação do § 9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72
87. A exegese proposta parecer partir do cotejo das literalidades do §9º-A do art. 25 e do art.
88. Verifica-se, de logo, que esbarra na literal previsão do art. 1.008 do CPC/15, eis que, como
acima exposto, em caso de recurso, a decisão individual e concreta que subsiste no ordenamento é a
derradeira decisão de mérito proferida no processo sobre a questão. O adágio de que a lei não contém
palavras inúteis não basta para superar a vulneração à expressa previsão legal e à própria lógica do sistema
recursal em que incorre a interpretação em tal sentido. Uma decisão que foi substituída não pode operar
qualquer efeito.
91. Se houver interposto recurso especial, por exemplo, deverá apresentar o competente pedido
de desistência, que será adequadamente processado, antes que busque usufruir do pagamento em
condições especiais. Imagine-se, outrossim, que, em face do acórdão, são opostos embargos declaratórios,
que são rejeitados ou conhecidos e providos, mas sem efeitos infringentes. Dado que sua apresentação
interrompe o prazo para interposição de recursos (art. 1.026 do CPC/15), salvo se manifestamente
incabíveis, a decisão de mérito se tornará definitiva somente quando findo o prazo recursal cujo início
ocorrer com a intimação sobre a decisão que apreciou os embargos.
92. A importância da fixação do momento a partir do qual será facultado ao sujeito passivo
apresentar seu pedido de adesão ao parcelamento instituído no art. 25-A do Decreto é evidente, pois o
dispositivo estabelece que a efetiva manifestação para o pagamento deve ocorrer no prazo de 90 (noventa)
dias, ou seja, a expressão definitivamente serve para fixar o termo a quo do referido prazo, que assume
relevância, mais uma vez, em razão da exclusão de juros de mora até “a data do acordo para pagamento”.
93. Por outro lado, uma vez compreendido o regime jurídico que trata dos efeitos dos recursos
no Processo Administrativo Fiscal, percebe-se que seria desnecessária a inclusão do termo
“definitivamente” no art. 25, §9º-A, pelo legislador. Como visto, o efeito substitutivo retira do
ordenamento a decisão reformada como norma individual e concreta. E, antes mesmo disso, o efeito
suspensivo do qual são dotados os recursos no âmbito do CARF inviabiliza que a decisão recorrida produza
os efeitos disciplinados pelo §9º-A do art. 25. Logo, a exclusão das multas e o cancelamento da
representação fiscal para fins penais somente podem decorrer da decisão de mérito definitiva.
95. Na mesma linha, deve ser afastado qualquer entendimento no sentido de que basta que um
dos capítulos decisórios seja resolvido pelo voto de qualidade para que a §9º-A do art. 25 do Decreto se
estenda aos demais. A proposta interpretativa não encontra amparo no direito processual civil e a previsão
isolada do §7º, do art. 25-A recém introduzido no Decreto n.º 70.235/72, que predica que o benefício se
aplica “exclusivamente à parcela controvertida, resolvida pelo voto de qualidade” não lhe serve de
fundamento.
96. A razão, mais uma vez, é a diversidade dos objetos tratados em cada um dos dispositivos.
Dado que o art. 25-A do Decreto cria modalidade de pagamento mais vantajosa, faz-se necessário
circunscrever as parcelas do crédito suscetíveis de inclusão no parcelamento e exclusão de juros,
estabelecendo-se, logicamente, que somente aquelas decididas pelo voto de qualidade são aptas a tal
enquadramento. Cabe observar a técnica redacional, o §7º do art. 25-A utiliza a expressão “parcela
controvertida”, evidenciando que faz referência à parcela do crédito tributário e não aos capítulos
decisórios, enquanto o §9º-A do art. 25 normatiza “julgamento de processo administrativo fiscal”.
97. Ademais, a ressalva acerca da “parcela controvertida” não se aplica ao §9º-A do art. 25
introduzido pela Lei n.º 14.689/72 por ser incompatível com a disposição. Por determinar a exclusão das
multas, cuja discussão pode estar contida no mesmo capítulo decisório do crédito principal ou em outros
capítulos da decisão, é esperado que, em determinados casos, a norma repercuta efeitos em outras
unidades decisórias. A questão pode ser esclarecida com um exemplo simples, a repercussão da decisão
pelo voto de qualidade na deliberação quanto à exigência do crédito tributário principal sobre o capítulo
decisório que trata da qualificação da multa. A relação de prejudicialidade entre essas duas questões
meritórias se traduz, em termos processuais, na dependência das unidades decisórias respectivas, razão
pela qual a referência à “parcela controvertida” não seria tecnicamente adequada, uma vez que o efeito
que o multicitado § 9º-A do art. 25 do Decreto atribui ao voto de qualidade, neste caso, transcende o
capítulo decisório específico.
III.1.1.4 Da extensão e alcance do §9º-A do art. 25 do Decreto 70.235/72 quando o recurso especial do
contribuinte não é conhecido pela Câmara Superior de Recursos Fiscais
98. O item 1.2 dos questionamentos indaga sobre o tratamento a ser dispensado em caso de
recurso especial do contribuinte, interposto contra decisão de Turma Ordinária favorável à Fazenda
Nacional, que não é admitido pela CSRF em decisão pelo não conhecimento proferida por voto de
qualidade.
Parecer 943 (41023314) SEI 10951.109547/2023-89 / pg. 19
99. A questão é respondida a partir das regras gerais estabelecidas na seção III.1.1.1 deste
Parecer.
100. Recordando o acima o exposto, a decisão que inadmite recurso especial é decisão que
examina questão preliminar de natureza processual e não a supera. Tais decisões, por não versarem sobre
o mérito, i.e., sobre a a determinação e exigência do crédito tributário/pretensão material das partes, não
repercutem os efeitos do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72.
101. Ademais, sob a perspectiva recursal, essa decisão, por não conhecer o mérito do recurso,
não substitui a decisão recorrida, subsistindo o acórdão recorrido plenamente eficaz. Por conseguinte, à
decisão de não conhecimento de recurso especial não se aplica o §9º-A do art. 25 do Decreto n.º
70.235/72, sendo indiferente, portanto, que tenha sido o acórdão proferido com base em voto de
qualidade.
102. Uma vez que a decisão sobre o não conhecimento do recurso especial não espraia efeitos
sobre o direito material, o suporte para análise que determina a aplicação do §9º-A do art. 25 do Decreto
n.º 70.235/72 continua a ser a decisão recorrida. Dessa forma, se essa decisão foi adotada pelo voto de
qualidade, o referido dispositivo se aplica. A contrario senso, não se cogita da exclusão da multa quando a
decisão recorrida foi alcançada por deliberação da maioria ou unanimidade, sendo, reitera-se, irrelevante o
quórum do acórdão da CSRF que concluir pela inadmissibilidade do recurso especial do contribuinte.
III.1.2 Das questões atinentes à extensão e alcance do §9º-A do art. 25 do Decreto 70.235/72 sobre as
multas julgadas no processo administrativo fiscal
104. Prefacialmente, consigna-se que não há capítulo próprio para as multas moratórias porque o
lançamento de ofício afasta sua incidência. Assim, estão fora do âmbito de incidência do §9º-A do art. 25
do Decreto 70.235/72, por inexistir fundamento legal para sua aplicação após a deflagração do lançamento
de ofício. Dito de outro modo, não há que se falar em exclusão pois não incidem nos casos aqui tratados.
105. Por oportuno, registra-se, ainda, que a exclusão da multa importa o afastamento dos juros
calculados sobre a penalidade pecuniária, visto guardarem os últimos com a primeira relação de
acessoriedade, que somente poderia ser desconstituída por expressa previsão legal em sentido contrário
ou outras situações excepcionais.
106. Com estas considerações iniciais, passa-se ao exame dos questionamentos apresentados.
107. O §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 prevê genericamente “ficam excluídas as
multas”, ensejando inquirições sobre o tratamento a ser dado aos diferentes tipos de multa imputados ao
sujeito passivo; questiona-se, ademais, qual o efeito da aplicação do dispositivo em caso de deliberação
pelo voto de qualidade para a multa qualificada.
108. Inicia-se o exame pelas multas de ofício, que constituem acessório ao crédito principal. Para
promovê-lo, cabe, de início, reproduzir as disposições da Lei n.º 9.430/96 que versam sobre o tema:
Art. 44. Nos casos de lançamento de ofício, serão aplicadas as seguintes multas:
I - de 75% (setenta e cinco por cento) sobre a totalidade ou diferença de imposto ou contribuição nos
casos de falta de pagamento ou recolhimento, de falta de declaração e nos de declaração inexata;
II - de 50% (cinqüenta por cento), exigida isoladamente, sobre o valor do pagamento mensal:
a) na forma do art. 8o da Lei no 7.713, de 22 de dezembro de 1988, que deixar de ser efetuado, ainda
que não tenha sido apurado imposto a pagar na declaração de ajuste, no caso de pessoa física;
(Redação dada pela Lei nº 11.488, de 2007)
b) na forma do art. 2o desta Lei, que deixar de ser efetuado, ainda que tenha sido apurado prejuízo fiscal
ou base de cálculo negativa para a contribuição social sobre o lucro líquido, no ano-calendário
correspondente, no caso de pessoa jurídica. (Redação dada pela Lei nº 11.488, de 2007)
§ 1º O percentual de multa de que trata o inciso I do caput deste artigo será majorado nos casos
previstos nos arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964, independentemente de
outras penalidades administrativas ou criminais cabíveis, e passará a ser de: (Redação dada pela Lei nº
14.689, de 2023)
(...)
VI – 100% (cem por cento) sobre a totalidade ou a diferença de imposto ou de contribuição objeto do
lançamento de ofício; (Incluído pela Lei nº 14.689, de 2023)
VII – 150% (cento e cinquenta por cento) sobre a totalidade ou a diferença de imposto ou de
contribuição objeto do lançamento de ofício, nos casos em que verificada a reincidência do sujeito
passivo. (Incluído pela Lei nº 14.689, de 2023)
§ 2o Os percentuais de multa a que se referem o inciso I do caput e o § 1o deste artigo serão
aumentados de metade, nos casos de não atendimento pela sujeito passivo, no prazo marcado, de
intimação para: (Redação dada pela Lei nº 11.488, de 2007)
110. O §1º, do art. 44, na redação inaugurada pela Lei n.º 14.689/23, passou a trazer duas
modalidades de multas qualificadas. O art. 44, §1º, VI, determinou a majoração da multa para o percentual
de 100% (cem por cento) se configurada uma das hipóteses previstas nos arts. 71, 72 e 73 da Lei nº
4.502/64.
111. O inciso VII do mesmo parágrafo, a partir de inovação trazida pela Lei nº 14.689/23, prevê
aumento do percentual de multa de ofício qualificada – passando de 100% (cem por cento) para 150%
(cento e cinquenta por cento) – em função da reincidência do sujeito passivo nas práticas enumeradas nos
arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502/64.
112. O parágrafo segundo prescreve aumento de metade para os casos de não atendimento a
intimações para prestação de esclarecimentos ou apresentação de documentação.
113. A técnica redacional adotada pelo legislador se baseia em estabelecer aumentos à multa,
referida sempre no singular. Não obstante, está a tratar de quatro hipóteses de incidência distintas. Dito
de outro modo, cuida de diferentes multas:
a) a multa acessória ao lançamento de ofício cuja incidência é automática;
c) multa majorada pela ocorrência de uma das hipóteses previstas nos arts. 71, 72 e 73 da
Lei nº 4.502/64 conjugada à verificação de reincidência do sujeito passivo;
114. Cada um das hipóteses de exasperação da multa de ofício constitui uma pretensão
autônoma, embora não necessariamente independente, da autoridade fiscal. Os pressupostos de
incidência “b”, “c” e “d” condicionam-se à prévia imposição da multa prevista no art. 44, I, da Lei n.º
9.430/96 (item "a") e a multa do item “c” depende do aperfeiçoamento do fato gerador da multa do item
“b”, acrescido da reincidência. As duas últimas guardam, entre si, relação de continência. Não obstante, o
juízo sobre a incidência de cada uma das multas/hipótese de majoração sujeita-se a exame de
materialidade própria pela autoridade fiscal, ou seja, análise autônoma.
116. A independência dos capítulos é ilustrada pelo fato de que se encontra na esfera de
disposição do sujeito passivo não impugnar todas as multas que lhe foram impostas. É possível que se
insurja tão somente quanto à qualificação da multa com fundamento no art. 44, §1º, VI, da Lei n.º 9.430/96
sem que apresente impugnação quanto ao mérito e, pois, da multa de ofício per se (art. 44, I). Do mesmo
modo, pode impugnar o lançamento no que toca à imputação de não atendimento às intimações (44, §2º,
da Lei n.º 9.430/96) sem se irresignar quanto às demais majorações/hipóteses de incidência. Assim,
refletindo a impugnação, que pode apresentar-se parcial em relação às imputações infracionais, a decisão
que examina a imposição de multas estrutura-se a partir de capítulos distintos para o exame de cada uma
delas.
118. A multa de ofício em seu percentual ordinário, aquele previsto no art. 44, I, da Lei n.º
9.430/96, por constituir consectário inexorável do lançamento, não configura questão autônoma em
relação ao crédito principal, sendo apreciada no mesmo capítulo decisório que trata da infração.
Consequentemente, quando a decisão quanto ao crédito principal for tomada pelo voto de qualidade, a
multa prevista no art. 44, I, da Lei n.º 9.430/96, será excluída pela aplicação do §9º-A do art. 25 do Decreto
n.º 70.235/72.
119. As hipóteses de majoração da multa de ofício (art. 44, §1º, VI e VII e §2º), serão julgadas em
capítulos autônomos e sucessivos, cabendo a aplicação do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72, em
separado, sobre cada um desses capítulo. Dessa forma, responde-se ao questionamento 2.1 nos seguintes
termos:
a) Caso aplicada a multa prevista no art. 44, §1º, VI, da Lei n.º 9.430/96, se a sua manutenção for
decidida em votação que resulte em voto de qualidade, deverá ser excluída a parcela da multa
correspondente à qualificação, remanescendo a multa de ofício ordinária (art. 44, I, da Lei n.º
9.430/96).
b) Caso aplicada a multa prevista no art. 44, §1º, VII, da Lei n.º 9.430/96, haverá duas deliberações
sucessivas. Primeiramente, se decidirá se houve a caracterização de uma das hipóteses previstas nos
arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502/64 e, em seguida, se julgará a caracterização de reincidência do
sujeito passivo. Se o julgamento pelo voto de qualidade se der já na primeira deliberação, a
qualificação será integralmente excluída, remanescendo a multa em seu percentual ordinário. Se
somente a segunda deliberação (reincidência) resultar de aplicação do voto de qualidade, a multa
respectiva deverá ser excluída, mantendo-se, outrossim, a multa qualificada prevista no art. 44, §1º,
VI, uma vez que a decisão pela qualificação em virtude da prática de das hipóteses previstas nos
arts. 71, 72 e 73, da Lei nº 4.502/64 não foi decidida pelo voto de qualidade.
c) Na hipótese de aplicação da multa prevista no art. 44, §2º, da Lei nº 9.430/96, a penalidade
121. Ademais, afrontaria a lógica interpretativa e a justiça fiscal, pois importaria em conferir à
conduta negativamente qualificada pelo CARF tratamento mais benéfico que àquele dado à conduta que
não recebeu qualificação negativa. Explica-se.
122. O julgamento que determina o afastamento da qualificação da multa, seja por voto de
qualidade, maioria ou unanimidade resulta apenas na supressão da qualificação, remanescendo a multa de
ofício em sua versão ordinária. Assim, admitir que a decisão, tomada por voto de qualidade, pela
manutenção da qualificação resulte na exclusão da totalidade da multa imposta importaria conferir
condição mais vantajosa a sujeito passivo em cuja conduta o Colegiado reconheceu prática dolosa,
fraudulenta ou conluio. Trata-se de interpretação que traz consequências manifestamente iníquas, caso se
trate de sujeitos passivos diversos, além de ilógicas, caso se trate do mesmo sujeito passivo, devendo,
portanto, ser repelida, pois a hermenêutica não tolera resultados absurdos.
123. Solução análoga se aplica ao capítulo decisório que examinar a multa prevista no art. 44, §2º,
da Lei n.º 9.430/96, que impõe o agravamento pelo não atendimento a intimações da fiscalização. Caso
esta majoração/hipótese de multa seja mantida pelo voto de qualidade, deve-se excluir a parcela agravada
correspondente ao art. 44, §2º, da Lei n.º 9.430/96.
124. O Poder Judiciário, até o presente momento, se manifestou sobre o ponto em uma
oportunidade. A decisão proferida no processo n.º 1069910-82.2021.4.01.3400, em curso na Seção
Judiciária do Distrito Federal adotou os seguintes fundamentos:
“A nova redação da lei, que se opõe à sanção determinada por meio do voto de qualidade, não pode
abarcar também o que o voto de qualidade não decidiu. A única dúvida dirimida por meio do voto de
qualidade foi a qualificação da multa, pois, mesmo sem o desempate, a multa de fundo, de ofício, foi
mantida.
A censura que a lei aplica à sanção firmada por meio do voto de qualidade deve abarcar, portanto,
apenas a qualificação da multa, não sua totalidade, pois o percentual de 75% foi chancelado por
unanimidade, integrando o mérito, o qual foi analisado sem socorro ao voto de qualidade.”
125. Em relação ao pronunciamento judicial, cabe destacar que, sob a perspectiva do direito
processual, em linha com a exposição deste Parecer, adota o entendimento de que os efeitos da legislação
se aplicam tão somente sobre os capítulos da decisão definidos por meio de voto de qualidade. Outrossim,
à luz do direito material, compreende a análise da multa de ofício de forma segmentada e sucessiva, sendo
126. Por oportuno, cabe registrar que as razões lançadas nesta seção aplicam-se, igualmente, seja
o capítulo referente à multa de ofício o único capítulo de mérito devolvido à apreciação do CARF, seja um
dentre outros capítulos que compõem o objeto do julgamento. Nas duas situações, os aspectos materiais e
processuais são os mesmos. As multas previstas no art. 44 da Lei n.º 9.430/96 caracterizam-se sempre
como multas acessórias a crédito principal lançado. A análise das multas, seja a ordinária (em conjunto com
o crédito principal), sejam as exasperações, corresponde, cada uma delas, a um capítulo decisório.
127. Por fim, registre-se que as razões lançadas nesta seção constituem orientação geral para
tratamento das multas de ofício, não se restringindo às multas prevista no art. 44, I, e parágrafos, da Lei n.º
9.430/1996. A título de exemplo, o disposto nesta seção se aplica à multa prevista no art. 80, caput, da Lei
n.º 4.502/64, que incide em caso de falta de lançamento do valor, total ou parcial, do imposto sobre
produtos industrializados na respectiva nota fiscal ou a falta de recolhimento do imposto lançado.
III.1.2.2 Da extensão e alcance do §9º-A do art. 25 do Decreto 70.235/72 sobre as multas isoladas
128. De início, deve-se reconhecer que a terminologia abrange diversas multas com
características diversas. A expressão multa isolada refere-se à multa prevista no 44, II, da Lei n.º 9.430/96,
que é aplicada pelo descumprimento do dever de recolhimento antecipado; às multas associadas às
declarações de compensação, previstas no art. 18 da Lei n.º 10.833/03 e art. 89, §10, da Lei n.º 8.212/91, e,
ainda, multas aplicadas pelo descumprimento de obrigações acessórias sem relação direta com a dimensão
pecuniária da obrigação tributária.
129. As multas isoladas em geral serão objeto da seção abaixo, a multa regulada no art. 44, II, da
Lei n.º 9.430/96 será tratada na seção subsequente, enquanto o exame das multas previstas no art. 18 da
Lei n.º 10.833/03 e art. 89, §10, da Lei n.º 8.212/91 se dará na seção atinente à compensação.
III.1.2.2.1 Da extensão e alcance do §9º-A do art. 25 do Decreto 70.235/72 sobre as multas isoladas em
geral
130. Esta seção trata das multas isoladas que não estão diretamente vinculadas ao lançamento de
tributo. Excluem-se de seu objeto as multas isoladas pelo recolhimento de estimativas, examinadas no item
subsequente, e as multas pelo descumprimento dos deveres relacionados a declarações de compensação, a
serem tratadas em seção própria mais adiante.
131. As multas isoladas são aplicadas, em regra, a partir do descumprimento de uma obrigação
acessória, conforme nomenclatura adotada no art. 113, §2º, do CTN, constituindo, por si, a obrigação
132. Em linha com o referencial hermenêutico exposto na seção II.2.1, inicia-se a análise do ponto
pela redação do dispositivo do art. 25, §9º-A, do Decreto n.º 70.235/72. Pede-se licença para transcrever o
enunciado mais uma vez:
§ 9º-A. Ficam excluídas as multas e cancelada a representação fiscal para os fins penais de
que trata o art. 83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, na hipótese de julgamento
de processo administrativo fiscal resolvido favoravelmente à Fazenda Pública pelo voto de
qualidade previsto no § 9º deste artigo.
133. A literalidade do enunciado, especialmente a referência à representação fiscal para fins
penais, indica que a previsão de exclusão de multas tem por objeto sanções pecuniárias que constituem
acessório ao crédito principal.
134. No que diz respeito à representação penal, verifica-se que ela se relaciona aos crimes contra
a ordem tributária previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, isto é crimes que
objetivam “suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório” (art. 1º) e eximir-se do
pagamento ou deixar de recolher tributo (art. 2º, I e II); mal uso de deduções de incentivo fiscal (art 2º, III e
IV), além de apropriação indébita previdenciária (art. 168-A do Decreto -Lei n.º 2.848/40) e sonegação e
contribuição previdenciária art. 337-A do referido Decreto-Lei).
136. Dado que, nos julgamentos sobre as incidência de multas isoladas, não há multa acessória ao
crédito principal (o qual corresponde à própria multa) a ser extirpada, resta autorizada a conclusão de que
não se configura o substrato fático-jurídico previsto no enunciado legal para que se aplique a previsão §9º-
A do art. 25 do Decreto.
139. A interpretação que afasta a incidência do novel dispositivo às multas isoladas permite
preservar âmbito de incidência mínimo ao §9º do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72, enquanto a aplicação
do §9º-A do art. 25 esvaziaria por completo o lançamento das multas isoladas, no caso de empate no
julgamento sobre multas isoladas, resultando em interpretação contra legem.
140. Observa-se, em reforço, que inexistiria qualquer modificação advinda da revogação do art.
19-E da Lei n.º 10.522/02, caso fosse aplicado o enunciado à multa de forma isolada. O resultado da
decisão da turma julgadora pelo voto de qualidade seria rigorosamente o mesmo resultado que adviria caso
não revogada a disposição do art. 19-E da Lei n.º 10.522/02. Dito de outro modo, não haveria voto de
qualidade para julgamento de multas isoladas, mantendo-se o desempate automático pró-contribuinte.
141. Tampouco se verifica critério dis n vo que fundamente restaurar o voto de qualidade para
os créditos tributários a nentes ao tributo e manter o desempate pró-contribuinte para as multas isoladas
– que também cons tuem obrigação principal autônoma –, especialmente uma manutenção que seria
tácita, pois não decorreria do critério expresso pelo legislador, mas sim de um efeito automático da
decisão.
142. Assim, a interpretação sistemática do §9º e do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72
permite concluir que não se configura subsunção do fato à norma na hipótese de julgamento de multa
isolada.
143. Caso fosse a vontade do legislador a extinção de multas aplicadas isoladamente em caso de
julgamento por voto de qualidade, deveria tê-lo feito expressamente. A ex nção do crédito tributário
principal mantido pelo CARF não pode decorrer de um efeito automático da decisão.
144. Outrossim, sob a perspectiva teleológica, a exclusão estaria em manifesta contrariedade com
a finalidade da norma, que busca beneficiar o contribuinte afastando o acréscimo pecuniário de caráter
sancionador.
147. No caso das multas isoladas tratadas nesta seção, como já visto, não há acessórios a serem
suprimidos. Ademais, o crédito tributário integralmente excluído torna-se insuscetível a gozo de
“tratamento favorecido”. Constata-se, assim, que o obje vo do legislador, que deve orientar a definição
da teleologia da norma, não é compatível com a exclusão do crédito tributário principal.
148. Em síntese, conduziria a resultado absurdo, e, portanto, repelido pela técnica hermenêutica,
aplicar a regra, que objetiva a exclusão de acessórios, para extinguir todo o crédito lançado.
149. Pode-se concluir, dessarte, que os métodos interpretativos baseados em análise lógico-
sistemática, – a relação entre os parágrafos 9º e 9º-A do art. 25 do Decreto e a ausência de penalidade
pecuniária a acompanhar as multas isoladas – e, ainda, os métodos histórico-sociológico e axiológico-
teleológico – os trabalhos legislativos evidenciam a finalidade de conferir aos contribuintes a exclusão de
acessórios pecuniários como prêmio em caso de controvérsia sobre o principal – são conducentes à
interpretação pela negativa de incidência do §9º-A do art. 25 do Decreto 70.235/72 caso o crédito principal
do processo seja uma multa isolada.
III.1.2.2.2 Da extensão e alcance do §9º-A do art. 25 do Decreto 70.235/72 sobre a multa prevista no 44,
II, da Lei n.º 9.430/96
150. Cabe, de início, trazer a redação do art. 44, II, da Lei n.º 9.430/96:
Art. 44. Nos casos de lançamento de ofício, serão aplicadas as seguintes multas:
(...)
II - de 50% (cinqüenta por cento), exigida isoladamente, sobre o valor do pagamento mensal:
a) na forma do art. 8o da Lei no 7.713, de 22 de dezembro de 1988, que deixar de ser efetuado, ainda
que não tenha sido apurado imposto a pagar na declaração de ajuste, no caso de pessoa física;
b) na forma do art. 2o desta Lei, que deixar de ser efetuado, ainda que tenha sido apurado prejuízo fiscal
ou base de cálculo negativa para a contribuição social sobre o lucro líquido, no ano-calendário
correspondente, no caso de pessoa jurídica.
Art. 2o A pessoa jurídica sujeita a tributação com base no lucro real poderá optar pela pagamento do
imposto, em cada mês, determinado sobre base de cálculo estimada, mediante a aplicação dos
percentuais de que trata o art. 15 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, sobre a receita bruta
deduzida das devoluções, vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos, observado o
disposto nos §§ 1o e 2o do art. 29 e nos arts. 30, 32, 34 e 35 da Lei no 8.981, de 20 de janeiro de 1995.
rendimentos e ganhos de capital que não tenham sido tributados na fonte, no País.
§ 1º O disposto neste artigo se aplica, também, aos emolumentos e custas dos serventuários da justiça,
como tabeliães, notários, oficiais públicos e outros, quando não forem remunerados exclusivamente
151. A leitura da disposição legal revela que, apesar da denominação multa isolada, cuida-se de
modalidade de multa que incide em decorrência do não pagamento do tributo devido sobre a base de
cálculo estimada, no caso de pessoas jurídicas optantes do lucro real, e, no caso de pessoas físicas, sobre os
rendimentos e ganhos de capital sujeitos ao chamado carnê-leão. O tributo correspondente, em regra, não
é lançado porque “após o encerramento do ano-calendário, é incabível lançamento de ofício de IRPJ ou
CSLL para exigir estimativas não recolhidas”, conforme Súmula CARF n.º82.
152. Assim como a sanção pecuniária prevista no art. 44, I, da Lei, a multa prevista no art. 44, II,
constitui o consectário do descumprimento de uma obrigação principal, na hipótese, o pagamento devido
em razão da sistemática de estimativas ou carnê-leão, ou seja, regimes jurídicos de antecipação do tributo.
Destarte, os efeitos do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 sobre a penalidade prevista no art. 44, II,
da Lei n.º 9.430/96, guardam similaridade com os efeitos sobre a multa prevista no art. 44, I, do mesmo
normativo, isto é, caso se decida que houve o descumprimento da obrigação de antecipar o tributo em
julgamento concluído pelo voto de qualidade, deve a multa ser excluída.
154. Deve-se ressaltar, entretanto, que a obrigação de antecipar o tributo não se confunde com a
obrigação apurada no ajuste anual. Seus fatos geradores e bases de cálculo são distintos. Nem mesmo o
fato de, eventualmente, no ajuste anual, inexistir saldo de tributo a ser recolhido, desnatura o
descumprimento da obrigação antecipatória.
156. Não se olvida que as duas infrações aqui tratadas podem originar-se a partir dos mesmos
fatos e negócios jurídicos, de forma a ensejar deliberações no mesmo sentido sobre aludidas questões.
Trata-se de exame a ser empreendido pela autoridade julgadora competente no exercício de suas funções.
157. Considerando o exposto nesta subseção, conclui-se que a multa prevista no art. 44, II, da Lei
n.º 9.430/96 deve ser afastada pela incidência do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72, introduzido
pela Lei n.º 14.689/23, quando o julgamento sobre a infração atinente à obrigação de antecipar o tributo -
sistemática de estimativas ou carnê-leão - se concluir com proferimento de voto de qualidade. Assim,
responde-se ao item 2.5 da Consulta.
III.1.2.2.3 Da extensão e alcance do §9º-A do art. 25 do Decreto 70.235/72 sobre as multas aduaneiras
159. A par das razões acima expostas, as multas decorrentes de infração aduaneira merecem
algumas considerações adicionais em razão de sua natureza.
160. O chamado Direito Aduaneiro corresponde à divisão didática para designar as normas que
disciplinam as relações entre Estado e cidadãos decorrentes do tráfego de bens e pessoas, com ou sem
conotação comercial. Encontra previsão constitucional no art. 237 da Constituição da República, enquanto
o art. 22, inciso VIII, da Carta atribui à União competência para criação de normas referentes ao comércio
exterior. O Decreto-lei n.º 37, de 18 de novembro de 1966, ainda é a principal normatização sobre matéria
aduaneira, tratando da fiscalização, do controle e da tributação das operações de comércio exterior,
enquanto o Decreto n.º 6.759/09, o Regulamento Aduaneiro, busca consolidar e sistematizar a legislação
sobre o tema.
161. A relação que guardam o Direito Tributário e o Direto Aduaneiro é objeto de debate.
Distinção é reconhecida pelo próprio direito positivo, a exemplo da Lei n.º 10.833/03, que trata da
legislação tributária no Capítulo II e da legislação aduaneira no Capítulo III. O Superior Tribunal de Justiça,
163. A partir do exposto, é possível identificar distinção entre os ramos do Direito Tributário e
Aduaneiro no que tange às respectivas finalidades. Enquanto o Direito Tributário é marcadamente
arrecadatório, com sopesamentos que buscam atender a valores e princípios albergados pelo ordenamento
e, eventualmente, operar efeitos extrafiscais, o objetivo do Direito Aduaneiro é regulatório, visando
disciplinar o comércio exterior sob diferentes aspectos, e, nesse mister, o Direito Aduaneiro protege
interesses públicos primários que não são contemplados pela legislação tributária.
164. O interesses públicos não patrimoniais que orientam a legislação aduaneira não foram
ponderados pelo legislador por ocasião das discussões que culminaram na introdução do § 9º-A do art. 25
do Decreto n.º 70.235/72, como se infere das manifestações acima reproduzidas, encontrando-se, pois,
fora da teleologia da norma introduzida pela Lei n.º 14.689/23. Outrossim, a defesa dos interesses outros
protegidos pelas normas aduaneiras, isto é, assegurar que atendam às finalidades de direção e indução de
comportamentos a que se destinam, requer que a imposição das multas seja efetiva, e, pois que a cobrança
das respectivas penalidades pecuniárias atinja o patrimônio dos infratores.
167. Por fim, deve-se registrar que, para os fins da presente manifestação, consideram-se
compreendidos na definição de Direito Aduaneiro os julgamentos que versem sobre de exigência de multas
aduaneiras e aqueles referentes à aplicação de direitos antidumping e de medidas compensatórias.
III.1.3 Da extensão e alcance do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 em relação a capítulo da
decisão que examinar a responsabilidade tributária
168. Neste ponto, primeiramente, necessário recordar alguns aspectos basilares acerca da
sujeição passiva tributária. Nos termos do art. 121 do CTN, a sujeição passiva, designativo de gênero,
compreende o contribuinte, quando há relação pessoal e direta com a situação que constitui o fato gerador
(art. 121, I, CTN) ou a condição de responsável tributário, cuja obrigação “decorre de disposição expressa
de lei” (art. 121, II, CTN).
169. Conforme exame empreendido no Parecer PGFN/CRJ/CAT n.º 55/2009, a doutrina de Rubens
Gomes de Souza define a responsabilidade tributária como hipótese de sujeição passiva indireta (em
contraposição à sujeição passiva direta do contribuinte) que abarca duas tipologias, a responsabilidade por
substituição e a responsabilidade por transferência. Na primeira, a obrigação tributária, desde seu
surgimento, é imposta ao substituto, a Lei imputa a terceiro não diretamente relacionado ao fato gerador o
dever do recolhimento do tributo; na transferência, a obrigação tributária surgiria em face do contribuinte
e seria, em decorrência de fato posterior, transmitida ao responsável tributário.
170. Tratando do tema, Sacha Calmon expõe que, na substituição, a pessoa que realiza a hipótese
de incidência é diversa daquela que figura no consequente da norma como sujeito passivo da obrigação.
Assim, o substituto é responsável por tributo próprio porém relacionado a fato gerador alheio. Já na
transferência, identifica-se uma obrigação preexistente que é transferida, assim o responsável obriga-se
por tributo alheio.13
171. O CTN não adota a classificação entre responsabilidade por substituição e por transferência,
mas é possível identificá-las. Quanto à responsabilidade por substituição, o art. 128 do Código Tributário,
em disposição que cumpre o papel de lei geral, enuncia os preceitos a serem observados pelo legislador
ordinário no exercício da competência que lhe confere, isto é, o Código Tributário não institui hipóteses de
173. Interessa à presente manifestação a chamada responsabilidade por transferência, eis que a
responsabilidade por substituição decorre de expressa disposição legal, em linha com o art. 128 do Código,
não constituindo objeto de discussão acessória à controvérsia sobre o próprio crédito tributário. Se houver
contencioso sobre o tema, ele dirá respeito à própria legitimidade passiva do autuado, portanto a matéria é
estranha ao objeto desta seção.
174. Passando ao exame da questão, cabe rememorar os elementos da regra matriz de incidência
tributária. O antecedente do juízo implicacional pressupõe o (i) o critério material (ii) o critério espacial, (iii)
critério temporal, enquanto seu consequente traz (iv) o critério pessoal e o (v) o critério prestacional.
175. Como acima visto, para que a discussão se estenda à transferência da obrigação tributária
surgida com a conjugação dos três elementos do antecedente, assume-se que se aperfeiçoaram e a
prestação foi imposta ao sujeito passivo originário. Ao mesmo tempo, caracterizou-se uma das hipóteses
legais de transferência e impôs-se a responsabilização do terceiro. Dado que há duas regras distintas em
operação, faz-se necessário definir se a segunda regra – a da responsabilização – atrai a incidência do art.
25, §9º-A, do Decreto n.º 70.235/72.
176. Neste ponto, é relevante notar que, embora, em muitos casos, a matéria atinente à
responsabilização seja apreciada no mesmo processo que controla o lançamento tributário, esta
concomitância não é compulsória. A responsabilização pode ser objeto de procedimento próprio, sendo
possível, ainda, seu reconhecimento posterior ao encerramento do processo administrativo, como ocorre,
corriqueiramente, no redirecionamento definido em sede de execução fiscal. Em tais casos, fica bem
ilustrado que a regra da imputação de responsabilidade é diversa da norma que institui a hipótese de
incidência do crédito tributário.
177. Assim, a questão que se põe é definir se a identificação do sujeito passivo, que é essencial à
determinação e exigência do crédito tributário, conforme interpretação conjunta dos artigos 142 do CTN,
1º e 25 do Decreto n.º 70.235/72, abrange apenas os sujeitos passivos originalmente previstos no
consequente da norma tributária ou se abarca aqueles inseridos no polo passivo por transferência da
obrigação, quando o exame da ampliação dos obrigados ocorre no bojo do mesmo processo administrativo
fiscal que controla o lançamento do crédito tributário.
178. A presente análise se deterá, primeiramente, no exame do art. 135, III, do CTN, por ser a
hipótese de responsabilização de maior recorrência no âmbito do CARF e, portanto, se prestará a esclarecer
“61. De tudo isso, é importante guardar que o “sócio-gerente”, de acordo com a jurisprudência hoje
aceita pelo STJ, torna-se responsável não por ser “sócio”, mas por ter cometido ato ilícito enquanto
relevantes para sua responsabilização: (a) ser administrador e (b) ter cometido ato ilícito nessa
posição. Por ser administrador e ter cometido infração à lei, pode o terceiro ser responsabilizado; não
por ser sócio. Dessarte, podemos afirmar com segurança que, segundo o entendimento firmado no STJ,
o administrador é chamado a pagar o crédito tributário da pessoa jurídica administrada em forma de
180. Os pressupostos legais interpretados pelo STJ evidenciam que a atribuição da condição de
sujeito passivo, com fundamento no art. 135, III, do CTN, decorre da condição de administrador conjugada
a cometimento de ato ilícito nessa posição.
181. A ilicitude não corresponde ao fato gerador do tributo, embora possa com ele relacionar-se.
A conduta ilícita não se inclui entre os elementos da regra matriz, o que permite concluir que está fora da
esfera do julgamento do crédito tributário e, portanto, fora do âmbito de aplicação do art. 25 do Decreto
n.º 70.235/72. Por conseguinte, não se aplica ao capítulo decisório atinente à responsabilização a previsão
do multicitado § 9º-A do art. 25 do Decreto.
182. Embora a discussão sobre a responsabilização perpasse a análise do fato gerador do tributo,
com ele não se confunde, pois são as condutas voltadas à prática ilícita, por exemplo, uma simulação, que
configuram a hipótese de incidência da norma de responsabilização, e não o aperfeiçoamento do fato
gerador do tributo. Dito de outro modo, a despeito de revolver o mesmo arcabouço probatório, a análise
fática para subsunção é diversa. A responsabilidade se dá, nas palavras de Sacha Calmon, por “fato gerador
alheio”.
183. Trata-se de dois paradigmas legais distintos e o paradigma para responsabilização não diz
respeito propriamente ao tributo, mas sim, à responsabilidade de um terceiro.
185. Em seguida, sobre o tema responsabilização, em razão de sua prevalência, impõe-se tratar
da previsão do art. 124, I, do CTN. O enunciado se insere no Capítulo IV, cujo objeto é o Sujeito Passivo, na
Seção II, da Solidariedade. O art. 124, I, obriga “as pessoas que tenham interêsse comum na situação que
constitua o fato gerador da obrigação principal”.
186. A amplitude do art. 124, I, do CTN foi examinada na Nota PGFN/CGD n.º 866/2010, que
tratou de grupo econômicos, e no Parecer PGFN/CAT n.º 1509 de 2011, manifestações cuja análise incluiu
apreciar a jurisprudência do STJ. Verifica-se que o STJ, embora tenha extensivamente debatido as hipóteses
em que se configura o interesse comum, não buscou enquadrar a sujeição passiva em uma tipologia
específica. Outrossim, o Parecer PGFN/CAT n.º 1510/2010 expôs que a solidariedade pode estabelecer-se
em relações entre contribuintes, entre responsáveis e entre contribuintes e corresponsáveis.
188. Diante da necessidade de fixar a questão para apresentar solução à consulta apresentada,
empreende-se, nesta seção, análise voltada especificamente a definir a aplicação do §9º-A, do art. 25 do
Decreto n.º 70.235/72.
190. A análise conjunta das manifestações anteriores desta Procuradoria permite concluir que a
191. Significa dizer que se trata de exame que não se confunde com a configuração do fato
gerador do crédito tributário para os fins do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72, embora os mesmos atos e
negócios jurídicos componham os elementos de prova subjacentes às duas análises. Outrossim, por se
cuidar de exame quanto à responsabilização, não resulta na imposição de qualquer multa, mas sim na
participação na relação jurídica tributária. Em síntese, por cuidar-se de imputação de responsabilidade
tributária por transferência, não há subsunção da questão ao §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72.
192. Assim, conclui-se esta seção respondendo ao questionamento 1.4 da Consulente no sentido
de que os capítulos decisórios atinentes às discussões sobre a responsabilização tributária previstas no art.
135, III, e 124, I, ambos do CTN, este último quando a imputação da responsabilidade deriva da
identificação de prática ilícita, não atraem a incidência do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72.
III.1.4 Extensão e alcance do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 em relação a capítulo da decisão
que examinar a decadência
193. Quanto à questão da extensão do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 no exame da
decadência, cumpre fixar como premissa primeira que a decadência constitui matéria preliminar de mérito.
194. Preliminar por se constituir em questão “cuja solução deve anteceder logicamente a de
outras” uma vez que influencia a solução de outras questões postas à apreciação do órgão julgador,
guardando as últimas com a primeira relação de subordinação ou dependência. Nesse sentido é a previsão
do art. 1.013, §4º, do CPC/15. Preliminar, e não prejudicial, porque as questões prejudiciais condicionam o
conteúdo das questões dependentes, o seu modo de ser, enquanto as preliminares determinam “seu
próprio ser; isto é, para aqueles que, conforme o sentido em que sejam resolvidas oponham ou, ao
contrário, removam um impedimento à solução de outras, sem influírem, no segundo caso, sobre o sentido
que estas outras hão de ser resolvidas” 15. De mérito, pois apta a decidir definitivamente a lide e as
relações jurídicas apresentadas, projetando os efeitos da coisa julgada material quando reconhecida na
esfera judicial (art. 487 do CPC/15).
195. A decadência, conforme tradicional lição do professor Agnelo Amorim Filho, diz respeito ao
“prazo estabelecido pela lei, ou pela vontade unilateral ou bilateral, quando prefixado ao exercício do direito
pelo seu titular”, aplicando-se aos direitos potestativos, que são “aqueles poderes que a lei confere a
determinadas pessoas de influírem, com uma declaração de vontade, sobre situações jurídicas de outras,
sem o concurso da vontade dessas”16.
197. Constitui questão meritória, relativa à exigência do crédito tributário, o que atrairia, a
princípio, a aplicação do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72. Não obstante, sob a perspectiva
histórico-sociológica, bem como teleológico-axiológica não encontra, no exame da decadência, o juízo
controvertido quanto à qualificação de determinados fatos ou negócios jurídicos como subsumíveis à
hipótese de incidência tributária.
199. Dado que inexiste, em tal julgamento, manifestação sobre a conduta do sujeito passivo,
circunstância que, inclusive, caracteriza a questão da decadência como questão preliminar em vez de
prejudicial como já dito, a evidenciar seu caráter externo à obrigação tributária, falta, na apreciação da
decadência, a controvérsia sobre eventual conduta infracional do contribuinte que determine a exclusão da
penalidade.
200. Sob outro viés, não se pode identificar uma penalidade pecuniária acessória ao
reconhecimento ou não da decadência. A consequência da superação da preliminar de decadência é
permitir o conhecimento dos aspectos relativos ao lançamento do crédito tributário.
201. Dessarte, por ausência de subsunção à hipótese legal do art. 25, §9º-A, do Decreto n.º
70.235/72, não pode decorrer a exclusão das multas tributárias da unidade decisória que examina a
decadência, pois exterior ao âmbito de incidência do normativo.
202. A exclusão das multas no capítulo atinente à decadência poderia, ademais, gerar situação
ilógica. Imagine-se caso em que parcela do lançamento é alvo da alegação de decadência, rejeitada por
decisão cujo resultado é alcançado por meio de voto de qualidade. A exclusão da multa, em tal hipótese,
significaria que parte do crédito tributário seria desacompanhada de qualquer multa, enquanto, em relação
à outra parcela, a multa poderia ser mantida. O tratamento díspar para a mesma conduta do contribuinte
seria manifestamente ilógico, o que reforça a conclusão pelo afastamento do art. 25, §9º-A, do Decreto n.º
70.235/72 na apreciação da decadência.
205. Uma análise mais detida dos preceitos legais e fatos que lhe são pressupostos afasta a
percepção inicial. Primeiramente, verifica-se que a discussão que envolve a aplicação do art. 150, §4º c/c
173, I, ambos do CTN, não diz respeito à regra matriz de incidência tributária, mas sim, a ulterior
caracterização de prática dolosa, fraudulenta ou simulatória voltada a ocultar ou alterar as características
do fato gerador do tributo. À semelhança da exposição feita na seção III.1.3 sobre as hipóteses de
responsabilidade por transferência, há duas regras incidentes, a primeira disciplina o fato gerador do
tributo, a segunda traz como antecedente determinadas práticas ilícitas, cuja identificação altera o termo a
quo do prazo decadencial aplicável (consequente da norma).
207. A resposta é negativa, pois o exame requerido pelo enunciado – identificação de dolo, fraude
ou simulação – não diz respeito à determinação ou exigência do crédito tributário, nos termos dos arts. 1º e
25 do do Decreto n.º 70.235/72 c/c art. 142 do CTN. Não envolve verificar materialidade do fato gerador,
quantificá-lo ou definir o sujeito passivo. Diz respeito, isto sim, à identificação de práticas ilícitas que, no
plano lógico, sucedem a configuração do fato gerador e são realizadas com o fim de turbar o trabalho
fiscalizatório. Um vez constatadas tais condutas, repercutem no aspecto temporal para exercício da
competência tributária e, somente indiretamente, podem afetar a exigibilidade do crédito. A apreciação
promovida no capítulo decisório da decadência, todavia, não diz respeito à obrigação tributária, mas às
práticas ilícitas.
209. Ante o exposto, conclui-se que, ainda que a determinação do termo a quo do prazo
decadencial revolva exame sobre dolo, fraude ou simulação, o capítulo decisório correspondente não se
subsome à hipótese de incidência do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72.
212. Na seção III.1.2.1 desta manifestação, atinente ao tratamento das diferentes multas de
ofício, restou estabelecido que a incidência do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 sobre o capítulo
decisório que mantém a qualificação da multa pelo voto de qualidade acarreta a exclusão da parcela da
multa correspondente à qualificação, permanecendo hígida a multa de ofício em seu percentual ordinário.
Assim, admitir que o afastamento da decadência, em discussão que envolva o art. 150, §4º, do CTN, exclua
a totalidade da multa de ofício importa em conferir tratamento díspar a situações similares.
213. Ante todo o exposto, conclui-se que o §9º-A do Decreto n.º 70.235/72 não incide sobre
capítulo decisório que examina a decadência por ausência de subsunção do fato à previsão normativa.
Assim, responde-se ao item 1.1 parte final.
III.1.5 Dos efeitos da decisão tomada por voto de qualidade quanto à existência de crédito de tributo
requerido em sede de compensação
214. O item 1.3 indaga sobre a situação em que o crédito do contribuinte correspondente a
tributo recolhido indevidamente ou a maior, pleiteado em sede de compensação, não foi reconhecido pelo
voto de qualidade e, consequentemente, houve a cobrança da obrigação tributária que se pretendeu
adimplir por meio de compensação.
215. Para responder ao questionamento, cabe distinguir duas discussões (i) o juízo sobre a
existência do crédito pretendido pelo contribuinte e (ii) o juízo sobre a obrigação tributária do contribuinte.
217. No tocante ao juízo sobre a existência do direito creditício, a análise empreendida em sede
de pedido de restituição e/ou compensação não corresponde aos artigos 1º e 25 do Decreto n.º 70.235/72,
ou seja, o processo de compensação não comporta exame sobre a exigência e determinação de crédito
tributário.
218. A utilização do procedimento regulado pelo Decreto n.º 70.235/72 decorre da previsão do
art. 74, §11, da Lei n.º 9.430, de 27 de dezembro de 1996, a qual determina que a manifestação de
inconformidade e correlatos recursos obedecerão ao rito processual do Decreto. Verifica-se, dessarte, que os
pedidos de compensação/restituição apenas tomam de empréstimo o rito do PAF, não constituindo matéria
que lhe é própria, pois tratam de direito creditício do contribuinte. Sobre o ponto, esta Procuradoria da
Fazenda já se manifestou por meio do Parecer n.º 6.898/2020/ME:
"4.2.5 A inovação legal em tela seria aplicável ao julgamento de recurso em face de despacho decisório
de redução (glosa) de restituição, ou não alcançaria casos como esse, por não tratar-se de “processo
administrativo de determinação e exigência do crédito tributário”? E diante da glosa de compensação em
GFIP, por exemplo, quando é feito lançamento tributário, não se aplicaria o voto de qualidade?"
46. A questão já foi solucionada nos itens anteriores. O art. 19-E da Lei nº 10.522, de 2002, não é
aplicável aos processos em que se discute o direito creditório do contribuinte (restituição,
ressarcimento, reembolso e compensação), que não se qualificam como processos de determinação e
exigência do crédito tributário. A submissão desses casos ao rito do Decreto nº 70.235 não implica a
modificação da sua natureza jurídica, vale dizer, um processo de restituição ou compensação não é
"transformado" em processo de determinação e exigência de crédito tributário por força do
julgamento segundo o Decreto nº 70.235, de 1972.
47. A seu turno, o lançamento decorrente da glosa de compensação em GFIP deflagra um processo de
exigência de crédito tributário, que estará subordinado ao disposto no art. 19-E da Lei nº 10.522, de
2002.”
219. Destarte, em relação aos processos em que se discute direito creditório do contribuinte, não
há que se falar em aplicação do § 9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72.
220. Note-se, ademais, que, a partir do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 796.939,
leading case do Tema de Repercussão Geral n.º 736, a aplicação da penalidade prevista no art. 74, §17 da
Lei n.º 9.430/96 restou afastada nos seguintes termos: “é inconstitucional a multa isolada prevista em lei
para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato
ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária”. Significa dizer que a não homologação
de pedido de compensação não mais constitui hipótese suficiente para atrair a incidência de penalidade
pecuniária.
221. Acerca da multa de mora em caso de declaração de compensação, sua hipótese de incidência
222. Com base no exposto nesta seção, responde-se ao questionamento do item 1.3, nos
seguintes termos: afasta-se o §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 nos processos que discutem
direito creditício do contribuinte, uma vez que (i) não há discussão sobre a constituição de crédito
tributário e, pois, a interpretação sistemática, bem como os métodos histórico-sociológico e teleológico-
axiológico afastam a subsunção do tema à hipótese prevista na referida norma e, ainda, que aplicável
fosse (ii) não haveria multa correlata ao crédito não homologado que fosse suscetível de exclusão, o que
torna impossível a incidência da norma.
224. Em relação a esses casos, deve restar claro que a discussão sobre o direito creditório do
contribuinte não se comunica com eventual discussão sobre o crédito da União, decorrente do lançamento
tributário. Serão resolvidas em capítulos decisórios distintos e a controvérsia sobre o direito creditório do
contribuinte não atrai a incidência do § 9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72.
225. O tópico compensação demanda, por derradeiro, exame sobre as multas previstas no artigo
18, §§2º e 4º, da Lei n.º 10.833/2003, bem como a multa prevista no art. 89, §10 da Lei n.º 8.212/91. Cabe
reproduzir as disposições:
229. Não se olvida, por outro lado, que as multas previstas no art. 18, §§2º e 4º, da Lei n.º
10.833/03 e art. 89, §10, da Lei n.º 8.212/91 guardam relação com o crédito compensado sob o aspecto
quan ta vo, uma vez que suas bases de cálculo partem do montante “do débito indevidamente
compensado”.
230. A relação de prejudicialidade no aspecto quan ta vo, todavia, não afeta a autonomia das
hipóteses de incidência das multas isoladas tratadas nesta seção, cabendo seu exame pelas autoridades
julgadoras no caso concreto, exame esse que não se confunde com a aplicação do § 9º-A do art. 25 do
Decreto n.º 70.235/72.
231. Ante o exposto, conclui-se que ao julgamento das multas isoladas previstas no artigo 18,
§§2º e 4º, da Lei n.º 10.833/2003 e no artigo 89, §10 da Lei n.º 8.212/91 não se aplica o § 9º-A do art. 25 do
Decreto n.º 70.235/72.
232. Para definir a viabilidade da interposição de recurso especial com o fim de alterar o quórum
233. O regular exercício do direito de recorrer depende de alguns pressupostos, que Barbosa
Moreira classifica em intrínsecos, quando dizem respeito à própria existência do poder de recorrer, os quais
compreendem (a) cabimento, (b) legitimação, (c) interesse e (d) inexistência de fato impeditivo ou extintivo
do poder de recorrer, e extrínsecos (e) tempestividade, (f) regularidade formal e (g) preparo17.
235. O interesse em recorrer conjuga o binômio: (a) utilidade, isto é, obtenção de situação mais
vantajosa que o resultado do recurso pode proporcionar ao recorrente, do ponto de vista prático, e (b)
necessidade de utilização do recurso para se obter tal resultado 18.
236. A necessidade do recurso, no caso sob exame, não oferece maiores discussões para sua
determinação. Não há margem para dúvida de que, para alterar o resultado numérico do julgamento, o
recurso que permita nova manifestação do órgão julgador, substituindo a decisão tomada pelo voto de
qualidade, é necessário.
em proporcionar ocasião para o debate de puras teses, sem consequências concretas para a fixação da
disciplina do caso levado à apreciação do juiz. Não pode a atividade do aparelho judiciário do Estado
servir de instrumento para a solução de questões acadêmicas. Por isso, não entra em linha de conta a
veleidade, que alguma das partes tenha, de obter satisfação psicológica com o acolhimento in totum,
pelo órgão ad quem, da argumentação utilizada na defesa do seu direito, se a decisão já assegura a
este tutela eficaz. (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil, 9. ed., v.
V, p. 300.)19
238. A chamada perspectiva prática traduz-se em situação mais favorável do ponto de vista do
direito material posto à apreciação e não apenas em relação a teses jurídicas, se alinhando com a questão
da irrecorribilidade dos fundamentos da decisã20, pois, ressalvadas as hipóteses expressamente previstas
em Lei, o recurso se direciona contra o dispositivo (art. 504, I, CPC/2015). O resultado prático, portanto, é
239. A utilidade relaciona-se, ainda, com a noção de sucumbência, isto é, desconformidade entre
o que a parte pretendia e aquilo que foi concedido21, situação que qualifica a parte vencida como legítima
para recorrer (artigos 499 e 996, caput do CPC/2015). Assim, vencida é a parte “quando a decisão lhe tenha
causado prejuízo, ou a tenha posto em situação menos favorável do que a de que ela gozava antes do
processo, ou lhe haja repelido alguma pretensão, ou acolhido a pretensão do adversário”.22
240. As lições tradicionais sobre o tema vem sendo objeto de debate, mormente após a
introdução do atual Código de Processo Civil, em 2015, para que se amplie o sentido de sucumbência,
adotando-se abordagem prospectiva. Nessa linha, ganha relevo a noção de sucumbência material, acolhida
pelo Superior Tribunal de Justiça:
"sucumbência formal" e "sucumbência material" para fins de aferição do interesse recursal das partes:
obtido em virtude do pedido formulado ao órgão jurisdicional. Nesse sentido será sucumbente
formal o autor se este não obtiver a procedência integral de seu pedido e o réu se não obtiver a
parte deixar de obter no mundo dos fatos tudo aquilo que poderia ter conseguido com o
processo. A análise nesse caso nada tem de processual, fundando-se no bem ou bens da vida que
a parte poderia obter em virtude do processo judicial e que não obteve em razão da decisão
também haverá sucumbência material, sendo presumível que, não obtendo processualmente
tudo o que o processo poderia lhe entregar, a parte também não obterá tudo o que poderia
obter no plano prático. É até possível estabelecer uma regra de que, sempre que exista
sucumbência formal, haverá também a material, mas essa vinculação entre as duas espécies de
sucumbência nem sempre ocorrerá, havendo casos excepcionais nos quais não haverá
sucumbência formal, mas ocorrerá a material. (...) (Daniel Amorim Assumpção Neves, in
"Manual de Direito Processual Civil", Vol. Único, 2ª ed., São Paulo: Ed. Método, 2011, págs.
620/622)
autor da demanda, quando obtido provimento jurisdicional em extensão inferior a tudo aquilo que se
almejava obter do ponto de vista prático. É o que ocorre nos casos de pretensão indenizatória calcada
por irrisório, porque inferior aos parâmetros jurisprudenciais ou ao pedido constante da inicial,
recursal.” ( REsp 1.102.479-RJ, Rel. Min. Marco Buzzi, Corte Especial, julgado em 4/3/2015, DJe
25/5/2015).
241. As premissas teóricas trazidas e o entendimento jurisprudencial sobre o tema permitem
identificar tendência à aceitação de sucumbência em acepção material, isto é, a caracterização de interesse
recursal ainda que a parte seja formalmente vencedora, nas situações em que o recurso é instrumento hábil
à obtenção de situação mais vantajosa. Essa mesma tendência pode ser identificada no art. 503, §1º, do
CPC, de 2015, quando prevê que a coisa julgada se opere sobre questão prejudicial, o que ensejaria o
interesse recursal para reforma da decisão quanto à questão prejudicial, ainda que a parte se tenha sagrado
vencedora. Note-se, ademais, que a legislação estaria a criar situação de interesse recursal para discussão
sobre fundamento da decisão, mitigando, assim, a lição tradicional quanto a sua irrecorribilidade.
242. Em uma análise formal, a correlação entre sucumbência e interesse recursal, conduz à
negativa quanto ao interesse recursal da Fazenda Nacional quando incide o § 9º-A, eis que a sua incidência
pressupõe êxito fazendário no julgamento. Parte sucumbente é o contribuinte.
243. A análise sob a perspectiva material, que busca situação prática mais favorável, por sua vez,
permitiria reconhecer a possibilidade de a Fazenda Nacional alcançar situação prática mais favorável nos
casos de julgamentos decididos mediante aplicação do voto de qualidade, vantajosidade consistente na
pretensão de restaurar a cobrança da multa excluída. Não obstante, o exame do precedente do STJ e a
doutrina evidenciam que a sucumbência, ainda que se acolha a acepção material, correlaciona-se à decisão,
mais precisamente ao dispositivo. Assim, a posição mais vantajosa almejada no caso sob exame não se
traduz em interesse recursal. Isso, porque a previsão do §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72, por
corresponder a efeito secundário da decisão, não é objeto de deliberação, não compondo a decisão, e, por
conseguinte, não é passível de reforma. Assim, não é possível reconhecer interesse recursal que viabilize
interposição de recurso especial para, exclusivamente, obter alteração do quórum do resultado de
julgamento, uma vez que inexiste capítulo decisório a ser reformado.
245. Ante o exposto, responde-se ao questionamento do item 4.1 de forma negativa, pela
ausência de interesse processual fundado exclusivamente na alteração de quórum de decisão resultante de
julgamento em que se aplicou voto de qualidade, ressalvada a possibilidade de caracterização de interesse
247. O cabimento relaciona-se ao regime jurídico positivado para o recurso, abarcando “as
hipóteses de sua interposição e sobre qual espécie de decisão determinado recurso é cabível”23.
Decompõe-se em dois fatores, a recorribilidade e a adequação, também chamada de propriedade24. A
adequação, além das disposições legais específicas sobre a espécie recursal, relaciona-se com outros
institutos recursais tais como a taxatividade, singularidade e fungibilidade. Em suma, o cabimento
desdobra-se em dois elementos, a previsão legal do recurso, e sua adequação, a significar que, uma vez
previsto o recurso em lei, cumpre verificar se ele é adequado a combater aquele tipo de decisão. Se for
positiva a resposta, revela-se, então, cabível o recurso.
248. A adequação, pelo que se infere da literatura sobre o tema, guarda relação com a
regularidade formal, pressuposto extrínseco, na classificação proposta por Barbosa Moreira. O pressuposto
da regularidade formal impõe que os atos do procedimento recursal respeitem as leis que os disciplinam,
sob pena de nulidade absoluta, nulidade relativa ou irregularidade do procedimento recursal25. A título de
exemplo, menciona-se que os embargos de declaração devem apontar erro, omissão ou obscuridade (art.
1.023 do CPC/2015), enquanto o recurso especial deve apresentar a exposição do fato e do direito; a
demonstração do cabimento do recurso; as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão
recorrida (art. 1.029, incisos I a III, e § 1º, do CPC/2015). Assim, o cotejo entre as noções de regularidade
formal - como atendimento às previsões legais - e adequação, como aptidão para combater a decisão,
revela sua correlação. Para definir se um determinado recurso é adequado e, pois, cabível, necessário
investigar os requisitos legais para sua válida interposição.
249. A apresentação do recurso especial no processo administrativo fiscal, cujo assento legal se
encontra no art. 37, §2º, II, do Decreto n.º 70.235/72 pressupõe interpretação divergente da legislação
tributária entre órgãos julgadores do CARF. Veja-se:
SEÇÃO VII
Art. 37. O julgamento no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais far-se-á conforme dispuser o
II – de decisão que der à lei tributária interpretação divergente da que lhe tenha dado outra Câmara,
turma de Câmara, turma especial ou a própria Câmara Superior de Recursos Fiscais. (Redação dada pela
Lei nº 11.941, de 2009)
Seção II
Do Recurso Especial
Art. 118. Compete à Câmara Superior de Recursos Fiscais, por suas Turmas, julgar recurso especial
interposto contra acórdão que der à legislação tributária interpretação divergente da que lhe tenha
dado outra Câmara, Turma de Câmara, Turma Especial, Turma Extraordinária ou a própria Câmara
(...)
§ 6º Na hipótese de que trata o caput, o recurso deverá demonstrar a divergência arguida indicando
251. A leitura das disposições legais evidencia que um dos pressupostos para o cabimento do
recurso especial no PAF é a divergência na interpretação da lei tributária, sendo a demonstração dessa
divergência, de forma analítica, ou seja, com indicação dos pontos divergentes entre arestos proferidos
pela Corte, requisito para válida interposição do recurso.
253. Dessarte, não existe, no atual paradigma legal, previsão de remédio recursal que permita
questionar o quórum de julgamento ou que permita exercer a pretensão de obter novo pronunciamento do
órgão julgador, sob mesmo capítulo da decisão, no mesmo sentido do recorrido, porém com resultado
alcançado por maioria ou unanimidade. Assim, responde-se negativamente ao questionamento 4.1
apresentado pela Consulente, reiterando-se, todavia, a ressalva sobre a possibilidade de, uma vez
aperfeiçoados os pressupostos processuais, reconhecer-se a possibilidade de identificar interesse recursal
para discussão sobre capítulos da decisão.
Parecer 943 (41023314) SEI 10951.109547/2023-89 / pg. 47
III.1.7 Considerações finais
254. Os questionamentos contidos nos itens 2.2, 2.6, 2.7, segunda parte do item 3.1 não se
compreendem na competência desta Coordenação, razão pela qual não serão objeto desta manifestação.
CONCLUSÕES
255. Ante todo o exposto nesta manifestação, as respostas às indagações formuladas pela
Consulente podem ser sintetizadas nos seguintes termos:
1) O §9º-A do art. 25 do Decreto n.º 70.235/72 somente incide sobre o capítulo da decisão julgado
mediante aplicação do voto de qualidade e apenas quando o capítulo tratar de questão de mérito,
conforme fundamentação exposta na seção II.2.2 deste opinativo. Assim responde-se o item 1.1 dos
questionamentos.
2) O proferimento de decisão pelo não conhecimento de recurso especial do contribuinte não atrai a
incidência do art. 25, §9º-A, do Decreto n.º 70.235/72, tornando irrelevante o quórum da decisão pelo não
conhecimento, vide razões vertidas na seção III.1.1.4 desta manifestação. Dessa forma, para o fim de
determinar a aplicação do indigitado dispositivo legal, prevalece como paradigma de análise a decisão
recorrida, conforme critério exposto no item 1 destas conclusões. Assim, respondem-se os
questionamentos 1.2 e 4.3.
3) A decisão proferida pela Câmara Superior de Recursos Fiscais que reforma ou mantém capítulo
decisório do acórdão recorrido opera efeitos substitutivos, passando a ser o paradigma de análise para o
fim de definir a incidência do art. 25, §9º-A, do Decreto n.º 70.235/72. Dessa forma, torna-se irrelevante o
quórum da decisão recorrida, conforme seção III.1.1.1 desta manifestação. Assim, responde-se aos
questionamentos 2.3 e 4.2.
4) Em relação aos efeitos do art. 25, §9º-A, do Decreto n.º 70.235/72 sobre a multa de ofício prevista
no art. 44, I, da Lei n.º 9.430/96 e as majorações enunciadas nos §§1º e 2º, conclui-se, respondendo aos
questionamentos do item 2.1 conforme seção III.1.2.1 deste opinativo:
4.a) A decisão favorável à Fazenda Nacional sobre o principal do lançamento, quando definida pelo voto
de qualidade, afasta a incidência da multa de ofício prevista art. 44, I, da Lei n.º 9.430/96.
4.b) A decisão favorável à Fazenda Nacional sobre a qualificação da multa prevista no art. 44, §1º, VI,
quando definida pelo voto de qualidade, afasta a incidência dessa mesma qualificação, persistindo a multa
de ofício em seu percentual ordinário, conforme disposição do art. 44, I, da Lei n.º 9.430/96.
4.c) A decisão favorável à Fazenda Nacional sobre a qualificação da multa prevista no art. 44, §1º, VII, da
Lei n.º 9.430/96 envolverá duas deliberações sucessivas. Primeiramente, se decidirá se houve a
caracterização de uma das hipóteses previstas nos arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502/64 e, em seguida, se
julgará a caracterização de reincidência do sujeito passivo. Se o julgamento pelo voto de qualidade se der já
4.d) A decisão favorável à Fazenda Nacional sobre o agravamento da multa prevista no art. 44, §2º, da
Lei n.º 9.430/96 quando definida pelo voto de qualidade, afasta a incidência desse agravamento,
persistindo a multa de ofício em seu percentual ordinário conforme disposição do art. art. 44, I, da Lei n.º
9.430/96.
5) O julgamento de multas isoladas não atrai a incidência art. 25, §9º-A, do Decreto n.º 70.235/72 por
ausência de subsunção do capítulo decisório à hipótese legal, conforme fundamentos apresentados na
seção III.1.2.2.1 desta manifestação. Assim, responde-se ao questionamento do item 2.5 da Consulta.
6) A multa prevista no art. 44, II, da Lei n.º 9.430/96, será afastada em caso de decisão tomada pelo
voto de qualidade no capítulo decisório atinente à infração que apena, conforme seção III.1.2.2.2 da
fundamentação, não sendo afastada em caso de aplicação do voto de qualidade no capítulo decisório
atinente ao crédito principal. Dessa forma, responde-se ao questionamento 2.5 da Consulta.
7) O julgamento das multas aduaneiras não atrai a incidência art. 25, §9º-A, do Decreto n.º 70.235/72
por ausência de subsunção do capítulo decisório à hipótese legal, conforme fundamentos apresentados na
seção III.1.2.2.3 desta manifestação. Assim, responde-se ao questionamento do item 2.4 da Consulente.
8) O julgamento do capítulo decisório que examina a responsabilização com fundamento no art. 135,
III, do CTN não atrai a incidência do art. 25, §9º-A, do Decreto n.º 70.235/72 por ausência de subsunção à
hipótese legal, conforme seção III.1.3 desta manifestação. Assim, responde-se ao questionamento 1.4 da
Consulta.
9) O julgamento do capítulo decisório que examina a responsabilização com fundamento no art. 124, I,
do CTN, quando a responsabilização é decorrente da identificação de prática de atos ilícitos, enquadra-se
na modalidade de responsabilidade por transferência, e, por conseguinte, submete-se a exame autônomo
em relação ao exame da constituição do crédito tributário, aplicando-se as mesmas razões e conclusões
vertidas sobre a responsabilidade prevista no art. 135, III, do CTN, conforme seção III.1.3 deste opinativo.
Dessa forma, responde-se à indagação 1.4 da Consulente.
10) O julgamento do capítulo decisório que examina a decadência não atrai a incidência do art. 25, §9º-
A, do Decreto n.º 70.235/72 por ausência de subsunção à hipótese legal, conforme seção III.1.4 desta
manifestação. Assim, responde-se ao item 1.1 “iii” dos questionamentos.
11) O julgamento acerca da existência de direito creditório do contribuinte não atrai a incidência do art.
25, §9º-A, do Decreto n.º 70.235/72 por ausência de subsunção à hipótese legal, conforme seção III.1.5
desta manifestação. Assim, responde-se ao item 1.3 dos questionamentos.
13) Sobre a possibilidade de apresentação de recurso especial à Câmara Superior de Recursos Fiscais
fundado exclusivamente na alteração do quórum de deliberação de decisão favorável à Fazenda Nacional
cujo resultado tenha sido alcançado mediante aplicação do voto de qualidade previsto no art. 25, §9º-A, do
Decreto n.º 70.235/72, conclui-se por sua negativa, conforme exposto na seção III.1.6 desta manifestação.
Assim, responde-se ao questionamento do item 4.1 da Consulente.
À consideração superior.
NOTAS
1. Ferraz Junior, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 3ª Ed. São Paulo: Atlas,
2001. p. 282
2. Op. cit., p. 284
3. Op. cit., p. 285