Um Filho Surpresa para o Ceo

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1° edição – dezembro 2023

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS A ALINE PÁDUA


Edição: AAA Design
Ilustração: L. A. Designer
Revisão: Sônia Carvalho
SUMÁRIO
NOTA I
PLAYLIST
SINOPSE
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
Bônus
NOTA II
Torres-Reis-Kang-Esteves
UMA GRAVIDEZ INESPERADA
CEO INESPERADO – meu ex-melhor amigo
O BEBÊ INESPERADO DO COWBOY
FELIZ NATAL, TORRES
UMA FAMÍLIA INESPERADA PARA O VIÚVO
GRÁVIDA DO CEO QUE NÃO ME AMA
O CASAMENTO DO CEO POR UM BEBÊ
A FILHA DO VIÚVO QUE ME ODEIA
GRÁVIDA EM UM CASAMENTO POR CONTRATO
UM CASAMENTO DE MENTIRA PARA O CEO
GRÁVIDA DO COWBOY QUE NÃO ME AMA
UMA FILHA INESPERADA PARA O CEO
UMA FILHA INESPERADA NA MÁFIA
GRÁVIDA DO MAFIOSO QUE NÃO ME AMA
REJEITADA POR UM MAFIOSO
UMA FAMÍLIA INESPERADA PARA O MAFIOSO
UMA GRAVIDEZ INESPERADA PARA O MAFIOSO
Junqueira-Dias
UM NAMORO DE MENTIRINHA COM O CEO
UMA FAMÍLIA DE MENTIRINHA COM O COWBOY
UMA GRAVIDEZ DE MENTIRINHA COM O VIÚVO
UM CASAMENTO DE MENTIRINHA COM O COWBOY
REJEITADA & GRÁVIDA DO VIÚVO QUE NÃO ME AMA
NOTA I

Olá, minha gente!


Prontos para conhecer uma novo final, para quem sabe, um novo começo do
#ALINEVERSO?
Henrique Fontes apareceu como o único irmão Fontes que não teve sua história
contada, tendo como papel de secundário no livro da irmã mais velha (GRÁVIDA DO CEO
QUE NÃO ME AMA), do irmão mais velho (UM CASAMENTO DE MENTIRA PARA O
CEO) e na irmã caçula (UMA GRAVIDEZ INESPERADA PARA O MAFIOSO). Já Freya
Hansen, só apareceu para nós em pouquíssimo trechos da série da Família Kang, sem ter
realmente uma narrativa. Nesse livro aqui, trago para vocês a mistura que me pareceu tão certa:
FONTESxHANSEN.
Ressalto que não é necessário ler os livros anteriores para entender esse, mas com
certeza, se os tiver lido, terá um gostinho a mais em pegar as referências. Caso queira lê-los
depois também, deixarei todos listados abaixo.
Espero que Rique e F sejam uma surpresa nesse finalzinho de ano para vocês, como
foram para mim.

Boa leitura!
Com amor,
Aline
PLAYLIST

Posicione a câmera do seu celular para ler o QR Code e conheça um pouquinho das músicas que inspiraram este livro.
Caso não consiga ter acesso, clique aqui
Aos meus leitores e a Deus
Por sempre Me entregarem mais do que eu me sinto merecedora
Obrigada por tudo.
Obrigada por tanto.
SINOPSE

Ela, uma das herdeiras da máfia escandinava.


Ele, um homem comum, CEO de uma empresa no Brasil.
Eles se conheceram em uma praia.
Eles se apaixonaram nesse mesmo lugar.
Ela, simplesmente desapareceu.
Ele, descobre que ela pertence a máfia.
Ela, foi embora da vida dele, grávida.
Ele, depois de dois anos, tem uma surpresa ainda maior surpresa: o próprio filho.
“Sonhos alucinantes no silêncio da noite
Você sabe que eu peguei (oh, sim, você está certo, eu quero)
Mau, garoto mau, um brinquedo brilhante que tem um preço
Você sabe que eu comprei (oh, sim, você está certo, eu quero)”
Cruel Summer – Taylor Swift
PRÓLOGO

“E é nova, a forma do seu corpo


É triste, a sensação que eu tenho
E isso é, é um verão cruel
Tá tudo bem, é o que eu digo a eles
Sem regras no paraíso frágil

Mas é um verão cruel com você”[1]

FREYA

Eu costumava encarar a máfia como uma hierarquia perdida no próprio tempo, mesmo
que eu a respeitasse. O fato de ser a única mulher viva na família, com mais seis irmãos - todos
mais velhos e homens, me remetia a uma posição que sempre foi desfavorável. Contudo, eu a
tolerava. Porque eu tinha o que precisava, sempre. E eu lutava pelo que necessitava, sempre que
preciso.
Eu ainda era uma Hansen, mesmo que o meu poder de fato fosse conseguir tirar as
palavras menos esperadas das bocas mais estimadas. Sem precisar recorrer, na maioria das
vezes, ao que Loki riria e diria que eu sempre lhes livrava de trabalho sujo.
Contudo, eu sabia que eles tinham e muito.
Assim como, os nomes dos deuses que levávamos, tinham total influência em nossas
atuações. Em quem éramos.
Loki era conhecido por enganar e trapacear no que fosse necessário, e chegar a um
objetivo. A mentira era o seu segundo sobrenome, e com certeza, ninguém além de nós, saberia
dizer quando ele estava sendo sincero.
Tyr era um conciliador nato, mesmo que sempre estivesse preparado para estar à frente
de uma guerra. Todos o respeitavam, e se não o fizessem, um simples olhar dele, o faria.
Vidar era como um fantasma, que até mesmo nós, víamos pouco. Poderia contar nos
dedos das mãos, quantas vezes me encontrei pessoalmente com ele. Um verdadeiro rastro de
vingança que ele deixava, sempre que agia.
Thor era o que agia primeiro e perguntava depois. Pronto sempre para proteger a
qualquer um de nós, de quem fosse. Se alguém pensasse em dar uma olhada errada para algum
Hansen, o punho dele seria sua última lembrança. E ele não precisava de qualquer arma para ser
temido.
Baldur era o que investigava e mais aparecia. Amado e odiado na mesma intensidade
por quem fosse que passasse por seu caminho. A inteligência dele assustava muito mais do que
qualquer outra arma que pudesse ser usada.
Hella, de quem eu não tinha qualquer informação, a não ser que sofreu a mesma
perseguição que eu quando criança, mas seu destino foi traçado pelas mãos de nosso pai. Uma
irmã que com certeza, fazia falta em minha vida. E o fato de não estar ali, me mostrava o quanto
o sangue era importante para os Hansen.
E por fim, Odin... o mais velho de nós, e o chefe da máfia. Poderia ser facilmente
descrito como a definição do próprio deus nórdico que levava o nome, contudo, eu o via de
forma diferente. Odin era quem comandava toda a orquestra, e que a fazia funcionar, e ter algum
sentido.
Através dele, até eu, buscava algum sentido. Longe da própria definição de deusa da
magia ou do amor. Eu só queria, por algum tempo, poder ser eu. E ele tinha me concedido
aquilo, após mais um ótimo trabalho, que lhes poupou sangue, apenas porque eu consegui que
alguém importante falasse o que precisávamos.
Eu era boa com ervas, e fazer as pessoas falarem a verdade. Não foi difícil, e por mais
que muitos pensassem que eu o fazia envenenando ou seduzindo, era uma mistura das duas
coisas. Eu o conseguia, porque eu tinha aprendido, o jeito mais eficaz de trazer a verdadeira
personalidade de alguém à tona.
Porém, minhas ervas, táticas e histórias estavam de lado, pelo menos, era o que eu
queria. Sentada na beira de uma praia quase deserta, à noite, em um país que eu apenas tinha
ouvido falar, pela maneira como Baldur vivia estando nele.
O pouco que ele tinha compartilhado comigo, a mais nova de todos, em momentos
raros, quando parecia se lembrar, de que ainda tinha uma irmã. Ele falava de como adorava as
pessoas, os lugares, a vida que estava em cada canto, mesmo no mais escuro e silencioso.
E ali estava eu, em uma praia, com uma garrafa de cerveja em mãos, que eu testava,
enquanto encarava o que conseguia, do mar à minha frente. E foi exatamente no momento que
refletia sobre tudo aquilo, em uma folga inesperada, que eu vi algo brilhar não muito longe dali.
Um brilho sutil, que me chamou atenção. Não sabia por que, mas eu tinha me
levantado, deixando a garrafa para trás, e caminhado até a luz. A curiosidade me levando
consigo, e quanto mais eu me aproximava, mais eu desconfiava de que estava vendo coisas, já
que o brilho simplesmente sumiu.
Ouvi então o barulho alto das ondas batendo, e forcei minha visão, quando vi alguém
saindo de dentro delas, e caminhando para a areia. O que eu conseguia enxergar era pouco, mas
eu vi o que brilhou em sua orelha. Um brinco me fez abandonar a cerveja e vir até ali?
— Poucas pessoas vêm a essa praia à noite. — A voz soou, em um português que eu
assimilava aos poucos, mesmo tendo aulas sobre a língua há muitos anos. Era diferente da
realidade.
Eu já tinha praticado muitas das línguas que eu aprendi quando criança, porém, aquela
não muito.
— É um lugar bonito — consegui dizer, tentando não demonstrar tanto meu sotaque.
Ele então se aproximou, e consegui ter uma visão melhor de si. Ele claramente, tinha
uma descendência oriental, e tatuagens estavam espalhadas pelos braços e torso.
— Gringa?
— Acho que não devo responder isso a um desconhecido — respondi, me enrolando
um pouco, e talvez tivesse saído ligeiramente puxado para o espanhol.
— Henrique. — Ele então esticou a mão em direção à minha, se apresentando, enquanto
passava a outra pelos cabelos curtos, e tinha um sorriso no canto da boca.
— Freya. — Eu me vi respondendo, sem conseguir evitar meu instinto de querer saber
mais. Mais sobre ele.
— Então, agora que não somos desconhecidos — falou em inglês, e eu me surpreendi
pela forma como mudou rapidamente para outra língua. — Com certeza não é daqui.
— Bom, eu acho que... — calei-me, sem saber o que dizer.
Ele era tão alto e tão bonito. E eu já tinha a minha cota de caras com aquelas exatas
características, de todas as nacionalidades e descendências possíveis que eu tinha conhecido.
Contudo, algo me fez ficar presa ali, o olhando.
— Veio nadar ou apenas olhar para o mar?
— Olhar — respondi à pergunta que ele parecia ter retirado de dentro de minha mente.
— O mar é bonito, principalmente, à noite.
— Não acho que tem muito o que olhar, mas... eu gosto de estar nele — admitiu, e eu o
encarei. — É bom aqui.
E então, ele parou ao meu lado, cruzando os braços.
E por um segundo, eu me vi questionando, em que momento comecei a sentir um frio
na barriga, e uma ardência em cada parte de minha pele, como se um desespero incomum, que
ninguém chegou perto de me fazer sentir.
E depois de refletir e definir o que cada um na minha vida significava, eu estava me
indagando: o que um completo desconhecido, poderia ser?
CAPÍTULO 1

“Amigos se separam, amigos se casam


Estranhos nascem, estranhos são enterrados
Tendências mudam, boatos voam por novos horizontes

Mas eu estou exatamente onde você me deixou”[2]

Dois anos depois...

HENRIQUE

— Eu te disse que odeio isso, tin tin — falei enquanto suspirava, e arrancava a gravata
em meu pescoço. — Melhor coisa é Gael querer estar à frente da empresa da família, porque eu
não nasci para esse negócio de CEO.
— Você fez e faz isso tudo muito bem. — Ela elogiou e eu revirei os olhos. A verdade
fosse dita. Eu era apenas o filho do meio. Não tinha nada de especial em ser. Não existia um
ponto que eu me destacasse, fosse entre minha família, fosse analisando de fora.
E vendo de fora, eu realmente, era o irmão que parecia encostado em qualquer canto, e
tentando quebrar algum padrão, mesmo que dependendo da caçula. O quão patético poderia ser?
— Pelo menos desistiu da ideia de entrar para a máfia — ela falou, como se me
sondando, e eu apenas me vi ignorando e indo até meu sobrinho mais velho – que era Vitor.
Ele estava correndo pelo jardim, animado pela pirâmide de copos que ele e o pai tinham
feito e eu não podia imaginar, como ainda estava de pé.
— Ton Ton...
— Sim?
— Por que não me confirma, que desistiu dessa ideia maluca?
— Por que é tão maluca assim? — indaguei, mesmo que já se tivessem passado
praticamente dois anos, que eu insistia em estar próximo aos Kang.
Uma família poderosa e que era da máfia, mas que de um jeito ou de outro, estava
interligada à minha. Fosse pelo fato do meu irmão mais velho ter se casado com uma deles, que
não estava na parte da máfia, fosse pela nossa irmã caçula ser a esposa do chefe da máfia.
Eu não conseguia me conformar pelas coincidências da vida, ainda mais, pelo fato de
que Valéria, minha irmã mais velha, tinha como cunhada, uma das Kang, que também não
estavam ligadas à máfia e era brasileira, sem a descendência sul-coreana.
— Vai continuar indo para a Coreia do Sul? — ela insistiu, enquanto eu apenas desistia,
me voltava para ela e me sentava ao seu lado.
Como eu explicaria que meus motivos eram maiores do que seguir o que foi traçado
anos atrás? Eu não queria estar à frente da empresa da família. Tudo o que eu tinha lutado por
anos, foi para que pudesse ter a nossa família, de quatro irmãos de volta, que nossa tia se
recuperasse, e que nosso pai apodrecesse na cadeia, ou nos desse a sorte, de finalmente morrer.
A questão era que nós quatro estávamos juntos novamente, mesmo que não totalmente,
de forma geográfica. Contudo, eu tinha mais no que pensar, principalmente, na coincidência
maior que eu não sabia como ignorar.
Como eu poderia ter conhecido, ao acaso, uma herdeira de outra máfia, que, na verdade,
foi quem me encontrou no meio da noite, na praia?
Como eu poderia ignorar o fato de que Freya Hansen foi a primeira mulher por quem
me apaixonei, e que ela era mais do que apenas alguém que simplesmente desapareceu do dia
para a noite. Eu sabia que ela tinha como tê-lo feito, e aquilo me assustava.
— Sabe, pelo menos, o que eles fazem? — Val insistiu, e eu suspirei fundo.
— Nem mesmo Paola sabe, tin tin — rebati o óbvio. — Não é sobre ser da máfia, é
sobre... sobre ter um propósito.
— E qual o propósito em se tornar parte de uma máfia, se você pode apenas seguir a sua
vida, e ter cada um deles como seus parentes?
— Gael saiu de casa para conseguir a empresa da família de volta e ficou anos fora,
você foi praticamente obrigada a nos abandonar... Paola agora, já tem seu caminho, e eu... O que
restou para mim, Val?
— Uma vida, que você pode escolher — falou, trazendo sua mão para a minha. — E eu
sei que sempre teve medo de qualquer filme de terror, como vai simplesmente querer passar por
uma provação com os Kang?
— Eu só quero... quero fazer algo importante — assumi. — E sinto que tem que ser
com eles.
— Sabe que não é simples assim.
— Posso ganhar o chefe deles com a insistência — eu disse, forçando um sorriso e ela
revirou os olhos. — Tenho trinta anos, já tô perdido no personagem há muitos outros, Val. Eu só
quero ser algo importante.
Encontrar alguém importante, foi a parte que guardei e omiti.
— Fico feliz por saber que o que não tem de juízo em você, mesmo já nessa idade, deve
sobrar para os Kang, e para eles não te aceitarem dessa forma, de mão beijada.
— Eu já disse que sou irritante e insistente?
— Disso, com certeza, todos sabemos.
— Titio!
Um gritinho me fez levantar, e então senti um corpinho se jogando sobre mim. Ri de
Vitor e de como ele já estava grande. Eu tinha acompanhado a gravidez de minha irmã
praticamente desde o começo, e era maluco como o tempo voava, e agora, ele já era um ser
humaninho, que mal ficava no meu colo.
— Quando foi que parou de dormir e passou a gritar assim, coisinha?
— Eu sou uma coisinha mais bonita.
Ouvi a voz da minha sobrinha mais nova, que se aproximava no colo do pai, ela era
mais esperta do que qualquer um de nós. Sabia que Vitor estaria lascado em conseguir controlar
o que fosse sobre ela. Via-me nele, e via Paola nela.
— Então aqui estão as minhas coisinhas favoritas do mundo todo? — indaguei,
enquanto ela descia do colo do pai e vinha até mim, com uma expressão menos chateada. —
Juro, que apelido é esse, tin tin?
— Vai saber como é, quando tiver o seu — ela falou de repente, enquanto Tadeu ficava
ao seu lado, e ela o abraçava. — Apelidos cafonas são a parte número um de se tornar pai.
— Acho que estou bem com o papel de tio — eu disse, levantando Vida em meu colo, a
qual reclamou por demorar demais.
— Era o que eu dizia, até que... — então a voz de meu cunhado que geralmente era
calado, se tornou nada novamente. — Até conhecer sua irmã.
— Bom, eu não acredito que vou conhecer alguém dessa maneira, mas... quem sabe.
A realidade era que eu já tinha conhecido.
Eu conseguia imaginar como seria, perfeitamente, uma mistura dela e de mim. Os olhos
verdes dela, seus cabelos loiros quase brancos, espalhados em uma miniversão de nós.
Duvidava de como o amor acertava tão facilmente e irreversivelmente. Até que fui eu a
vítima. E eu ainda estava na praia, preso à lembrança dela, e de como eu gostaria, de poder voltar
para lá, e um dia, a reencontrar. Pelo menos, que algo tão bonito que começamos, ganhasse um
final digno.
Nós merecíamos.
Nós merecíamos mais.
CAPÍTULO 2

“E sei que isso foi há muito tempo


E aquela magia já não está mais aqui

E eu posso estar ok, mas não estou nada bem” [3]

FREYA

— É uma foto velha, né? — perguntei para o meu filho, que já se colocava para
engatinhar, e o fazia pelo tapete ao meu redor. — Por que não consigo parar de olhar para ela?
Por que não consigo parar de te mostrar?
Meu filho parecia completamente alheio, enquanto eu encarava a foto e então ele. Ele
tinha puxado todos os traços do pai, o que foi um alerta aceso na cabeça de meus irmãos, quando
o viram pela primeira vez. E agora, tudo o que eu tinha, o que sobrou para mostrar do homem
que era o pai do meu filho, e que foi o único que amei, era uma foto velha, quase 3x4, que eu
mantinha escondida em meu colar, e mostrava para meu filho, todo dia.
Eu nunca pensei que seria mãe. Nem mesmo que transformariam o meu lugar favorito
no mundo, em uma prisão. O que eu poderia fazer se eu tinha mentido? Talvez eu devesse ter
levado o nome de meu irmão mais velho, eu estava mais para Loki do que ele, de toda forma.
Eu era uma traidora a vista deles.
Eu era o motivo de eles estarem receosos por tudo.
— Sabe, deusinho... — olhei-o com cuidado, e seus olhos encararam os meus, quando
apenas se jogou de lado, e deixou as pernas para cima. — Seus tios ainda vão se arrepender, eu...
eu tenho certeza — falei, como se tentando convencer a mim mesma.
Meu filho merecia tanto mais do que aquilo. Eu merecia tão mais do que aquilo. Eu
sabia do peso que eu era. Sabia que desde o começo, a única mulher na máfia Hansen, seria algo
que eles gostariam de se livrar. Como nosso pai tanto desejou, e felizmente, não conseguiu o
fazer. Todos queriam se livrar de mim, me esconder... Me doía saber, que aqueles que eu mais
amava, optaram por fazê-lo, no momento mais frágil da minha vida.
Batidas na porta me fizeram fechar o medalhão em meu pescoço, e me levantei,
pegando Bjorn no colo e o levando comigo para perto da sacada.
— Freya...
A voz de um dos meus irmãos mais velho, e que eu tentava nem mesmo mais
diferenciar. Eles eram todos iguais agora. A não ser o fato, de que todos obedeciam ao chefe da
máfia.
— Chegou a Odin que você conseguiu tinta de cabelo, através de alguém do castelo e...
Foi então que ele mexeu na cortina que me separava de si, e eu levantei o meu olhar, o
encarando.
— Freya...
— O que, Loki? — rebati, e me doía, porque ele era o mais próximo de mim. O irmão
em quem eu mais confiava, o que sabia tudo de mim, mas que tinha se tornado um estranho.
Dois anos em que tudo desabou.
Dois anos em que eles simplesmente decidiram o que fariam por mim.
— Seus cabelos estão ruivos...
— Não acho que faz sentido, eu ser parte dessa família, se meu filho não é — contestei.
— Na verdade, eu não sou mais parte.
Os olhos dele eram assustados, por mais que todo o resto fosse inexpressivo. Eu sabia o
que estava fazendo, no exato momento em que tive acesso àquela tinta.
— O que realmente quer com isso?
— Que me deixem em paz — fui honesta. — Que nos deixem em paz.
— Freya, sabe muito bem as consequências de...
— Eu fiquei ruiva, sabendo disso.
Ele apenas piscou algumas vezes, e seu olhar parou em Bjorn, que levantou as
mãozinhas em sua direção, como se pedindo por ele. Vi a forma como Loki apenas se afastou,
engolindo em seco, e saindo em seguida.
Existia uma regra antiga na máfia Hansen. Os filhos tinham que ser puros, originários
da mesma terra, como o ditador de meu pai diria. Os cabelos loiros ou castanho-escuros, como os
dele, ou os da mãe. Nada diferente daquilo. A cor do nosso cabelo era uma maneira de mostrar
nossa descendência. Eu era uma das únicas que os cabelos loiros eram tão claros quanto os dele.
E mesmo assim, ele me odiou, e ainda deveria odiar-me, mesmo morto.
Eu ostentava aqueles cabelos por tantos anos, mostrando que era a mais forte dentre
todos. A única com a cor de cabelo de Ymir, um ditador mercenário e chefe da máfia Hansen por
anos. Era o que me restava dele, a única coisa que eu tinha realmente dele. E eu apenas não
queria mais. Se os cabelos lisos e pretos do meu filho não eram aceitos, por que eu continuaria a
ser aceita naquele lugar? Uma família que não me queria mais.
— Deveria dizer que ele é um Kang.
A voz de Loki estava mais longe, e só então percebi que ele ainda não tinha ido.
— Ele não é — falei, porque era a verdade. — Ele é filho de uma pessoa normal, mas
vocês não podem simplesmente aceitar isso — Doía-me cada palavra. — Por isso são todos tão
infelizes quanto Ymir.
— Odin vai aparecer, você sabe.
— Ele não vai porque não se importa. Assim como Baldur, Thor, Vidar, Tyr e... claro,
não vamos nos esquecer de Hella — soltei o ar com força. Falar sobre Hella era praticamente
proibido. Porém, não era algo com que eu me preocupava mais.
— Vou descobrir como conseguiu essa tinta, e espero que ela saia logo, antes que Odin
apareça.
— O que ele vai fazer? — Ri sem vontade. — Já tiraram minha liberdade, a liberdade
do meu filho... — neguei com a cabeça. — Não são nada diferentes de Ymir, e eu demorei muito
tempo para perceber isso. Claro, por que parei de ser quem vocês queriam, certo? Por que eu
amei alguém e não a família?
— Adeus, Freya.
Foi então que ouvi o barulho da porta sendo fechada, e soltei o ar com força.
— Ele era meu melhor amigo, deusinho — eu disse para o meu filho, que tinha os
olhinhos inocentes, e a cabeça deitada em meu ombro. — Dizem que Loki é o deus da trapaça ou
da mentira, o seu tio... ele não me parecia em nada com o nome que recebeu. Não comigo. Não
com a família. — Suspirei fundo. — Por isso te dei um nome mais comum, longe do que
qualquer expectativa poderia ter por isso... Seu pai teria escolhido um nome diferente, como da
cultura dele, talvez, até dois... Um em português e outro em coreano. — Ri sozinha. — Como
seria? Ter três nomes diferentes, hein?
Ele deu uma risadinha, como se me entendesse, e beijei sua testa.
— Acho que ia continuar como o meu deusinho, e só isso importa.
Suspirei fundo, encarando a vista para a praia, e por um segundo, sentindo-me voltar
para o lugar onde tudo tinha começado. Onde tudo parecia apenas simples, e eu... me lembrava
muito bem.
CAPÍTULO 3

“E lá estamos nós outra vez, quando ninguém precisava saber


Você me manteve como um segredo, mas eu te mantive como um juramento
Oração sagrada, e nós juramos

Que iríamos lembrar disso tudo muito bem, é”[4]

HENRIQUE

— Por que eu ainda tenho que ficar na cadeira de presidente, se você é o CEO da
empresa? — indaguei, enquanto meu irmão corria de um lado para o outro na grande sala, que
antes, apenas eu ficava.
— Porque você é o melhor de nós dois nisso.
— Na verdade, eu sou a melhor — minha cunhada, Talita, respondeu, e eu assenti,
tendo que concordar. — Os números do último mês foram ótimos, Henrique.
— Obrigada, cunhadinha Kang.
— Ainda na ideia de tentar conquistar os Kang pela chantagem emocional? —
provocou, e eu dei de ombros, enquanto ela passava a mão pela barriga já enorme. —
Honestamente, posso te fazer entrar, se quiser trocar fraldas, colocar para dormir e essas coisas,
assim que essa surpresinha nascer.
— Juro, vocês usando apelido cafona, Noona[5].
— Golpe baixo, rapaz — rebateu, e eu ri de lado.
Sabia que era algo na cultura de minha mãe. Ela nos fez aprender, desde cedo a língua
coreana, e mesmo que minhas lembranças com ela fossem poucas, eu ainda tinha guardado em
mim, o quanto seus braços eram quentes, sempre que eu a chamava por Omma[6].
— Só falta me chamar de Hyung[7] — Gael provocou, e me encarou.
— Apenas Ten Ten, vai ter que se contentar — rebati, conforme ele parecia finalmente
encontrar os papéis que procurava. — A não ser que concorde com a minha ideia e não surte por
eu ter um jantar do outro lado do mundo...
— Todos nós temos esse jantar. — Ele apontou um dedo em minha direção.
— Sou eu que vou ser babá dos gêmeos de Paola, que são filhos do chefe da máfia que
eu quero estar — sussurrei a última parte, e Talita riu alto, enquanto a expressão de meu irmão se
tornava assustadora.
— Juro, até quando vai ser o babá oficial de todos os seus irmãos? — ela perguntou,
como se tentando me salvar de ser enforcado pelo meu próprio irmão, ou jogado pela sacada.
— Tia Hellen adora as crianças, mas eu preciso dar um tempo para a coroa. Aguentou
demais toda essa insanidade do nosso pai, e o ódio da família por culpa dele... Vou para cuidar
deles e dela, também.
— São apenas alguns dias, Henrique — Gael falou e eu forcei um sorriso. — Não vá
pensar que está sendo aceito na máfia mais perigosa da porra do mundo só por ser a babá.
— Gostaria do cargo de babá na máfia, parece melhor do que todos que assisti em
filmes.
— Eu juro... — Talita riu alto. — Você, cunhadinho, deveria ser o comediante dos
Kang, sem dúvida.
— Chae me adora agora, depois de bom, quase me mandar inconsciente para o hospital
mais próximo.
— Ele não faria isso — Gael falou, com uma careta.
— Não fez porque você estava lá, e bom, porque o seguraram, senão... Acho que foi
uma péssima ideia, querer brigar contra a máfia mais perigosa do mundo, mas adivinha, quem
estava lá à frente de toda a baderna?
— Ton Ton...
— Acho que ele ganha no argumento, de todo jeito... — Talita sempre me defendia, o
que deixava Gael possesso. — Vão ser só alguns dias na Mansão Kang, o que pode acontecer
demais? Além de claro, de ele tentar descobrir algum segredo e os chantagear?
Aquela ideia não tinha me passado em mente.
— Não. — Ela pareceu ler meus pensamentos, assim que apontou um dedo em minha
direção. — Eles te expulsam, se tentar saber demais.
— Obrigada pela dica.
— Minha senhora grávida mais linda desse universo, pode por favor, ser contra o fato
do meu irmão caçula ter a ideia mais estúpida de entrar para a máfia da sua família, que nem
você faz parte?
— Eu sou contra — ela falou e deu de ombros, enquanto ele a envolvia em seus braços.
— Só não posso deixar de me divertir com a insistência de quase dois anos, do comediante dos
Fontes, em entrar para algo assim.
— Obrigado pela parte que me toca.
O meu celular tocou, notei ser uma chamada de vídeo, e era justamente, da nossa irmã
mais nova.
— Olha só, a senhora da máfia chamando — provoquei, e Talita praticamente escoltou
Gael para fora dali.
Sorri de lado, pensando em como as coisas tinham passado, depois de tanto tempo, para
mim e meus irmãos. Crescemos praticamente dentro de uma novela com roteiro de tragédia,
tínhamos tudo para odiar uns aos outros, mas felizmente, havíamos encontrado um caminho bom
para cada um.
Gael era o mais velho, e que teve que sacrificar tudo, até mesmo, estar perto de nós,
para poder voltar um dia, e recuperar o que foi tomado da nossa mãe. Ele era conhecido como o
próprio problema na alta sociedade, e não existia outra pessoa com coragem suficiente para se
casar com ele, do que Talita Kang.
Valéria era a segunda mais velha, do meio como eu, mas que tinha sacrificado tudo,
para poder nos deixar a salvo, mesmo que consistisse em deixar-nos acreditar que tinha nos
abandonado. Ela era a mais calma e com certeza, a que realmente conseguia colocar ordem em
nós.
Paola, a mais nova dos Fontes, que teve que ser mais forte que todos, pela culpa que lhe
foi jogada pela morte de nossa mãe em seu parto. Ela era uma patricinha de primeira, que
simplesmente tinha aceitado que se casaria por contrato para ajudar nas contas, até que todos
sofremos uma grande reviravolta quando Gael retornou às nossas vidas.
— Eu preciso dizer que sei que deve estar pensando demais, ton ton?
A voz dela soou no outro lado da linha. Os apelidos entre nós, como sempre, sendo
maiores do que qualquer outra coisa. Era bom ter voltado àquele lugar, mesmo que com Paola,
eu nunca tivesse saído. Nós dois tínhamos crescido e nos protegido juntos, enquanto os mais
velhos o faziam longe.
Tudo começou com a maneira como Valéria e Gael conversavam quando crianças.
Segundo eles, ela se enrolava para perguntar se ele tinha algo, falando “Ten Ten” no lugar de
“Você tem?”, e ficava feliz quando de fato o tinha, e gritava “Tin Tin” que seria “Sim Sim”. E
acabou pegando. E eles levaram para nós, as outras vogais, o meu sendo “Ton Ton”, e a última
para Paola, a caçula.
— Me enchendo numa hora dessas, Tun Tun?
— Nem mesmo se eu disser que Vincenzo parece ter uma proposta para você?
Arregalei os olhos, completamente incrédulo.
— Tá brincando comigo?
— Não entendi muito bem, mas... mas ele praticamente veio pedir minha permissão
para te chamar para algo, claro, me deixando saber que não teria que fazer nada com morte,
tortura e enfim...
— Por que será que ele vai me chamar?
— Não sei, mas se fosse você, viria antes do jantar, porque nossos mais velhos, com
toda certeza, vão ficar em cima.
— Já te disse que é a melhor irmã caçula do universo?
— Vou me lembrar disso quando reclamar que eu ligo no fuso errado.
Sorri, enquanto ele simplesmente desligava na minha cara, típico de Paola. Algo dentro
de mim se acendeu, apenas pela possibilidade de talvez, Vincenzo Kang tivesse alguma resposta
para o que tinha lhe pedido antes, sobre entrar na máfia.
Eu estava pronto? Talvez nunca.
Eu queria aquilo? Com toda certeza.
CAPÍTULO 4

“Socorro, eu ainda estou no restaurante


Ainda estou sentada em um canto que passei a assombrar
De pernas cruzadas na luz fraca

Eles dizem: Que visão triste” [8]

FREYA

— Eles estão investigando tudo, mas não acharam nada — Hella falou, e a encarei com
cuidado.
A irmã que eu tinha perdido por tantos anos, e que só aparecia nos pesadelos de Odin.
Pelo menos, era a história que eu sabia. Sabia que ela era a filha bastarda de Ymir, que ele nunca
quis, e que tinha apenas usado e dispensado, e logo depois a matado.
Ouvia boatos e histórias sobre ela, sem saber se realmente existia. Até que ela apareceu
no quarto do hospital, em que fui ter Bjorn, e foi quem segurou minha mão. Foi quando eu
percebi que ela sempre esteve lá. A sua presença, e principalmente, o seu cheiro, como de uma
manhã de chuva, em todos os momentos marcantes da minha vida.
Não sabia o que nosso pai realmente, tinha feito com ela, mas eu agora sabia o que ela
fazia por mim.
— Eu falei para Loki hoje, sobre o fato de ninguém aparecer, e principalmente, você —
comentei, enquanto ela tinha Bjorn montado em sua barriga, e fazia carinhos nos cabelos dele. —
Eles não têm ideia de que é você quem me ajuda.
— Eu posso te tirar daqui, mas seria arriscado demais — assumiu, e eu assenti. —
Bjorn ainda é muito novo, e eu acho que o melhor é esperarmos, até que eu consiga uma rota
melhor, sem que envolva um barco, já que não tenho acesso a aviões.
— É tão estranho, ter que fazer um plano para escapar da própria família.
— Bom, eu fui jogada fora — ela comentou, como sempre sem expressão. — Sempre
pareceu fácil para os Hansen, se livrarem de mulheres.
— Me dói imaginar que se Bjorn fosse filho de alguém da máfia, a história seria outra,
até mesmo, nem se importariam com a descendência dele.
— Sobre isso...
Olhei-a com interesse, e ela se calou no segundo seguinte. Antes que eu pudesse
raciocinar, apenas a senti colocar Bjorn em meu colo, e praticamente desaparecer pela janela. A
porta do meu quarto então se abriu, e eu levantei o olhar, tentando fingir normalidade.
Odin.
Meu irmão mais velho.
Ou melhor: o chefe da máfia Hansen.
— Chefe — falei, e me coloquei sentada mais próxima à cama, com Bjorn em meu
colo, que já estava sonolento. Hella tinha um poder calmante com bebês, que me assustava.
— Como pintou os cabelos?
— Oi, irmão! Quer dizer, chefe — corrigi-me. — Quanto tempo, não? Desde que me
trancafiaram aqui com meu recém-nascido, e me renegaram na família... Como está? Eu estou
péssima, obrigada por perguntar.
— Pare de brincar, Freya.
— Não estou. — Olhei-o profundamente, sem ceder a ordem clara em sua expressão. —
Pensei que Loki estava blefando sobre você aparecer. A que devo a honra?
— Não quer mais ser dessa família, por isso pintou os cabelos?
— Como cabelos podem ser importantes, hein... — ri alto, Bjorn reclamou, e então
aconcheguei-o melhor em meu ombro. — Desculpe, deusinho — sussurrei e beijei seus cabelos.
— Sabe, acho os cabelos de Bjorn, os mais bonitos que eu já vi... Porque são a mistura minha e
de alguém que eu amei... Não que você fosse entender o sentimento, Odin.
— Não estamos em um conto de fadas, Freya. Não é a porra de um livro ou música com
que você sonha acordada, é a realidade! O seu amado não vai aparecer na porta e simplesmente
te levar para serem uma família. Está na hora de acordar!
Bjorn chorou diante das palavras altas de meu irmão, e o encarei de forma assassina.
Odin mudou sua expressão, enquanto eu me levantava, e balançava meu filho, tentando o
acalmar.
— Ele nem sabe que é pai. — rebati baixo, ao mesmo tempo que levava Bjorn até o
berço, e felizmente, meu filho parecia exausto depois de brincar com a tia, a única real que ele
tinha, e se agarrou ao seu ursinho no berço, antes de apenas fechar os olhinhos.
Passei as mãos com cuidado por seus cabelos, enquanto ele pegava de vez no sono. Não
demorou muito, e eu apenas me afastei, indo com Odin em direção à saída para o corredor, e ele
me seguiu.
— Se gritar perto do meu filho novamente, eu tô pouco me fodendo se é o chefe da
máfia ou meu irmão mais velho, eu vou fazer você chorar também — falei, e levei um dedo até o
seu peito, o empurrando.
— Se fosse tão assustadora, não tinha terminado sozinha e isolada no meio do nada,
Freya.
— Eu não estou sozinha, e não é graça aos Hansen. — Olhei-o com escárnio. — É
graças a...
— Ao homem que amou? — ele apenas negou com a cabeça. — A porra de um
ninguém que você trouxe para a sua vida, em nome do amor? Onde achou que isso daria certo?
Você é uma herdeira dos Hansen, querendo ou não.
— A questão é que eu não tive escolha nisso, certo? — Dei de ombros. — Eu apenas
nasci, e me tornei o que queriam de mim, bastou não ser mais, para apenas me darem as costas, e
me trancarem... como Ymir fazia.
Foi ali que pela primeira vez, em anos, vi a expressão de surpresa no olhar de meu
irmão.
— Nada te faz menos que uma Hansen.
— O fato de meu filho e eu estarmos escondidos, faz. — Neguei com a cabeça. — Não
sei o que pretendem. Escondê-lo até que seja grande o suficiente, e desaparecer com ele, chamá-
lo de bastardo e ele se tornar um fantasma como Hella?
— Hella está morta.
— Então é isso? Pretendem que meu filho morra? — rebati, cada célula do meu corpo
com ódio.
— Apenas tire essa tinta do cabelo, Freya.
— Diga a verdade, Odin — exigi, olhando-o. — Por quê? Por que eu estou aqui? Por
que eu estou presa? Por que eu não posso...
— Quem é o pai do seu filho?
A pergunta que tanto pesou sobre mim, durante todos aqueles anos.
— Se tivesse apenas respondido isso, as coisas seriam mais fáceis, mas não, você se
nega a dizer...
— Ele não é da máfia, ele não tem por que lidar com toda a merda que querem contra
ele...
— Ele tem um filho com a herdeira dos Hansen — ele contestou, como se dando a
palavra final. — Acha mesmo que nunca vamos encontrá-lo?
— É isso, então? Querem achar o pai do meu filho e... e o quê?
— Deveria fazê-lo pagar, por todas as suas mentiras, Freya.
— Odin...
Ele apenas me deu as costas, e eu corri até ele, como se pudesse impedi-lo.
— Odin, o que...
— Tire essa tinta do cabelo e se recomponha. — Ele nem sequer me olhou, e eu engoli
em seco. — Você é uma Hansen, e vai continuar sendo.
Estava na hora, não estava?
Eu tinha protelado demais, certo?
— Eu renuncio.
Ele então parou, minhas mãos se afastando de suas costas.
— O seu filho ainda não fala e não pode renunciar ao sangue que tem... — foi ali que
ele me enrolou, mais uma vez. — Se renunciar, você vai e ele fica. É isso que quer?
— Eu nunca pensei que os odiaria, como eu odiava Ymir.
Então apenas me afastei, e fui de volta para a porta do meu quarto. Nada se resolveria
de uma forma simples. Nada, naqueles dois anos, tinha sido nem perto de simples. Como eu
poderia imaginar que uma renúncia o seria?
Eu nem sequer podia renunciar, pelo meu filho.
CAPÍTULO 5

“A espera é uma tristeza


Se tornando loucura

Ah, não, ah, não, não acaba nunca” [9]

HENRIQUE

Era engraçado pensar na primeira vez que estive de frente com aquela mansão no meio
de uma floresta. Por mais assustador que o caminho até ali poderia parecer, eu sabia, que assim
que as portas da casa se abriam, um lar se mostrava.
Por um momento, eu me indagava, se seria daquela maneira com os Hansen também.
Freya vivia em uma realidade parecida com as que eu via a família dos meus cunhados? Seria
possível, existir alguma semelhança entre as máfias, além de serem uma organização como
aquela?
Parei de frente para a porta, e antes que pudesse bater, uma Paola animada, junto com
dois outros pedacinhos dela, pularam sobre mim. As gêmeas já estavam com dois anos, andando
um pouco e prontas para serem desastradas como minha irmã.
— Titio! Oppa!
Era uma mistura de português com coreano, em uma língua ainda enrolada de bebês,
que me fazia rir.
— Boa tarde para a minha família também — falei, aceitando-as em meu abraço.
— Estão caindo de sono depois de quase acabarem com o pai delas na cama elástica —
Paola falou e eu arregalei os olhos, assim que me afastei.
Uma cena que realmente não imaginaria, se não viesse da realidade da minha irmã, era
que um chefe da máfia mais poderosa do planeta, ficava na cama elástica com as filhas.
— Estou velho para isso.
A voz dele adentrou o ambiente, que eu acabava de entrar, com as minhas sobrinhas
presas às minhas pernas, e Paola rindo da cena. Fiz um cumprimento em noventa graus, como
éramos ensinados na cultura coreana, e que parecia ter se perdido por um tempo em nossa
família, mas felizmente, voltava.
— Jura que não tem nenhuma gracinha para revidar? — Paola perguntou, me
analisando, enquanto eu me agachava, e ganhava um abraço forte das duas minicópias dela e de
Vincenzo.
A provocação estava na ponta da língua de: você sempre foi velho, Kang.
— Eu respeito seu marido, Paola — falei, piscando um olho para ela, que bufou alto.
— Vamos voltar para a cama elástica e... — as crianças simplesmente se desgarraram
de mim. — E comer sorvete depois... O que acham?
As meninas ainda pareciam assimilar muita coisa, mas correram até a mãe, sem parecer
pensar muito sobre. Vi o olhar que ela trocou com Vincenzo, e era clara a devoção que ele tinha
por ela, naquele simples movimento, assim como, era recíproco. Eles se entendiam, sem nem
sequer precisar falar. Era um nível de sentimento, que eu tinha encontrado, certeza vez.
Uma vez que nunca mais parecia ter volta.
— Ao meu escritório.
A voz dele soou baixa e firme, como sempre, sem qualquer expressão em seu rosto.
Caminhei com ele até o cômodo, e assim que adentrei, não demorou para ele se escorar sobre a
mesa grande de madeira, e cruzar os braços, como se me analisando.
— Paola te disse que eu tinha uma proposta, não é?
— É, e eu resolvi vir antes do jantar de família, e dos dias que vou ficar com as crianças
e tia Hellen, porque estava curioso.
— E quer esconder dos seus irmãos mais velhos, enquanto for possível.
— Também. — Fui honesto, à medida que ele me encarava. — Do que precisa de mim,
senhor Kang?
— Bom, tudo começou quando há quase dois anos Talita apareceu me dizendo que você
perguntou sobre Freya Hansen. — Pisquei algumas vezes, confuso. — E foi depois disso, que
você começou a querer ter interesse sobre estar na máfia. Estou errado?
— Não — respondi de imediato.
— Bom, eu não vou te colocar dentro de algo que não possa lidar, mas temos uma
reunião, que acontece de tempos em tempos, como uma conferência... — assentia,
acompanhando suas palavras ditas em um português carregado. — Só que as máfias aliadas
estarão nela, e acho que poderá entender melhor, como tudo acontece. Ou o que está
acontecendo.
— Eu... Por mim, qualquer coisa que quiser me incluir.
— Ser um Kang é uma escolha, viver na máfia é outra — falou, olhando-me. — Vamos
a esse jantar, e pode me dizer depois dele, se ainda vai querer estar envolvido com isso.
— Quer me assustar, senhor Kang?
— Não, quero te mostrar a verdade.
Poderia jurar que existia um duplo sentido em sua fala. Contudo, quando eu não sentia
que Vincenzo Kang falava sempre como se tivesse um enigma por trás?
Porém, tudo o que eu gostaria de saber, era de entender, o que seria aquele. E quem
sabe, Freya estivesse lá, e eu pudesse vê-la, nem que fosse, só mais uma vez.
CAPÍTULO 6

“Você já ouviu falar sobre a garota que vive em uma ilusão?


Términos acontecem todos os dias, não precisa enlouquecer
Ela ainda tem vinte e três anos dentro de sua fantasia

E você está sentado na minha frente”[10]

FREYA

Escorei-me contra a poltrona, enquanto assistia mais uma novela coreana. A da vez era
“A vingança do casamento perfeito”, e a cada minuto que se passava, do tratamento da família a
protagonista, me doía tão profundamente, que eu sentia que talvez estivesse seguindo aquele
caminho.
No entanto, ela teve uma segunda chance, para poder viver, de fato, a sua vida. Foi
quando eu encarei o pedacinho de gente que estava engatinhando de um lado para o outro do
quarto que compartilhávamos, e eu sentia que ele era a minha. Mesmo que eu ainda não tivesse
conseguido nos tirar dali. Um dia, eu o faria.
— Eu acho que quando você crescer vai me achar tão falante, e até se irritar... — sorri
para o nada, tentando focar na novela à minha frente, mesmo que falando com meu filho. — Mas
a verdade é que eu queria te contar tudo sobre o seu pai, sobre como a gente se conheceu, mas...
Eu quero tanto poder te mostrar, sabe? Tudo sobre ele, sobre como a gente era, sobre... sobre
como seríamos.
Ainda existia a possibilidade de sermos algo?
Suspirei fundo, pensando em como seria, se não tivessem me deslocado, logo depois de
Bjorn completar dois anos, para a o meu castelo favorito dos Hansen, que ficava a beira-mar.
Talvez, se eu ainda estivesse no castelo em que aconteciam as reuniões importantes, eu
conseguiria ter alguma abertura, para pedir ajuda a alguém de outra máfia.
Ou quem sabe, usar os meus próprios troques, para o fazer, mesmo que tivessem me
vetado todas as ervas e misturas.
Era frustrante, em uma vida que parecia cheia de liberdade, descobrir que nunca passou
de um simples fantoche, na mão daqueles que pensou que mais te amariam. Minha mente me
fazendo pensar, em como, a única vez que eu realmente poderia me considerar livre, não foi nem
um pouco perto da minha família.
Foi com ele.
Correndo pela areia, caindo sobre ela, nos jogando dentro do mar. Sempre achei que
histórias de amores de verão eram mentirosas. Por que elas não duravam para sempre? Por que
elas não poderiam durar? A realidade, era que eu não esperava, era que no futuro, eu estaria me
negando a aceitar um final para uma história de verão, porque eu me negava a aceitar o final
imposto a minha.
Minha mente vagava para longe, para tantos quilômetros de mar nos separando,
imaginando se ele ainda estaria pensando em mim, o tanto quanto, eu nunca consegui parar de
pensar sobre ele. Poderia jurar que era porque nosso filho era sua cópia... Porém, seria uma
mentira tão mal contada, porque eu guardava-o perto do meu coração, como se soubesse, que ele
foi o único a tratá-lo como merecia.
— Se pudesse fugir, para onde iria? — perguntou do nada, enquanto estava sentada
entre suas pernas, e minha cabeça escorada em seu pescoço. — Onde gostaria de estar agora?
— Aqui. — a resposta veio tão fácil, que me assustou. — Já estou em fuga, desde
quando cheguei aqui.
— Férias do trabalho? — indagou inocentemente, e eu assenti, porque era uma meia
verdade. — Tão ruim assim?
— Não ruim, mas... mas cansativo por estar presa a esse negócio da família desde ante
de nascer. — assumi, suspirando fundo. — Não gosto de reclamar, mas tenho certeza de que
preferia que essas férias durassem pela minha vida. — brinquei, mesmo que o fundo fosse de
total verdade.
— Bom, se quiser ficar, eu vou ficar... — sua fala me pegou de surpresa. — Se quiser
ir, eu vou com você. — parei, e me virei para encará-lo de frente. — Eu fugiria com você, se me
pedisse, Freya.
— Mal me conhece...
— Conheço o bastante, para saber que eu seria capaz de me afogar, no mar que você
escolhesse.
Levei uma mão para o seu rosto, e foi como se quisesse guardar cada detalhe dele,
prendê-lo em minha mente, assim como, ele já estava tatuado em meu coração.
— Vamos nos afogar juntos então.
Ele sorriu, sendo a pessoa que parecia me entender melhor do que eu mesma. Seus
lábios chegaram nos meus, e eu esqueci o meu nome, sobrenome e qualquer posição. Só me
importava, quem eu realmente era, e eu o sabia, quando estava com ele.
— Sinto falta dele, como se tivesse acontecido ontem... Será que ele também sente,
deusinho?
— Ma-ma...
Ele respondeu, sendo o melhor ouvinte que eu poderia encontrar. Que apenas me
encarava com a lembrança idêntica dos meus olhos favoritos, e me fazia pensar que um dia, eu
os encontraria novamente, e poderia fazer a pergunta diretamente a ele.
Quem sabe, a resposta não fosse a que eu esperava?
Era o que eu sonhava acordada, e enquanto brigava em meu sono. De que em algum
momento, eu teria como fazer todas as perguntas que tinha, sobre nós, e o que seríamos, para ele.
CAPÍTULO 7

“Eu não causo nenhum estrago


Fico na minha, se o nosso amor morreu jovem
Não posso testemunhar e já faz muito tempo
Mas se você alguma vez achar que errou

Eu estou exatamente onde você me deixou” [11]

HENRIQUE

— Obrigado por me deixar vir, hyung.


Vincenzo parou o passo, e eu engoli em seco. Era estranho o fato do marido da minha
irmã mais nova, ser tão mais velho que ela, e por aquilo, já ter sido um impedimento no passado,
principalmente, o fato de que ele era o chefe da máfia mais poderosa.
Vincenzo Kang era um problema, desde quando soube sobre aquilo. Porém, depois de
um tempo, eu tinha entendido, que não existia maneira alguma de evitar o que aconteceu entre
ele e Paola. Eles se amavam. E ele claramente, a idolatrava. O tipo de amor, que eu pensei ter
experimentado, mesmo que por um breve momento, mas que tinha se perdido, assim como, os
olhos mais bonitos que eu já tinha encontrado.
— Vou entender isso como sua bênção no relacionamento com sua irmã... — abri um
sorriso, enquanto ele voltava a andar. — Não que eu precise.
Filho da...
— É uma festa enrolada, com líderes de máfias que se respeitam, nada que possa levar
ao caos, mas... mas eu peço que tente se controlar.
— Por que eu interferiria, hyung?
Ele então parou de repente, e eu freei o passo, para não bater contra suas costas.
— Mesmo que não faça parte da máfia, você é um Kang. — Olhou-me profundamente.
— Eu os protejo, porque os Kang são acima de tudo, uma família... uma família que se escolheu.
— Não estou entendendo nada.
— Apenas tenha a cabeça fria, e faça o favor de subir as escadas, no momento que eu te
der um sinal para o fazer.
— Mas hyung...
Então ele apenas abriu as grandes portas que estavam à nossa frente, e encarei o local ao
nosso redor. Eu sabia por cima, sobre o que acontecia naqueles lugares. Sabia que era mais um
encontro anual que as máfias que não eram inimigas, se encontravam, e realinhavam alguns
detalhes. Ao menos, era o mínimo que Hinata, a irmã mais nova de Vincenzo, tinha me dito.
— Kang.
Ouvi uma salva de palmas, e notei de relance, um homem de cabelos pretos que mal se
mexia sobre a cadeira, e parecia extremamente incomodado.
— Como vão? — Vincenzo perguntou em inglês, sentando-se na ponta da grande mesa,
e indicando com a cabeça, para que eu ocupasse o seu lado, parado de pé. — Como estão todos?
— Curiosos... — o homem que se mantinha calado falou, e então o encarou. — Por que
Vincenzo Kang, que nunca aparece em reuniões como essas, pediu em pessoa para estar no
castelo dos Hansen, e discutir limites?
— Estava na hora — ele falou simplesmente.
— E esse é?
— Um Kang — Vincenzo falou, sem me encarar. — Podemos falar sobre o que houve
na América Latina?
O homem que parecia curioso sobre mim, apenas se levantou da cadeira, foi para perto
de uma porta, e pareceu dar algumas ordens a outro.
Foi naquele momento que Vincenzo fez um leve movimento, mexendo em seu relógio,
que eu nunca o vi fazer antes, e soube que era o sinal que ele tinha mencionado. Tão rápido
assim? Questionei internamente.
Os olhares estavam todos sobre ele, e assim que percebi onde ficavam as escadas, vi-me
indo para elas, a passos lentos e certos, sem alarmar nada.
Ele estava me testando?
Aquele era um teste pelo qual os Kang passavam?
Mas por que no Castelo dos Hansen?
Por que justamente os Hansen?
Suspirei fundo, tentando não deixar minha mente nublada com nada, e foquei no fato de
que cheguei ao primeiro andar. Caminhei pelo grande corredor, sem ter a mínima ideia do que
fazia ali, e foi quando ouvi barulhos às minhas costas. Corri até onde tinha uma fraca luz, e então
percebi um grande quadro de fotos. Peguei meu celular, tirei uma foto daquilo, e foi quando
meus olhos pousaram em uma em especial.
Olhos verdes, que eu tinha decorado cada pequeno brilho. Cabelos que antes eram
loiros, agora ruivos, e... Um sorriso que não lhe pertencia, por mais que ela soubesse fingir muito
bem para o retrato.
— Não deveria estar aqui, Kang.
— Desculpe, eu me perdi, procurando o banheiro — falei em inglês, virando-me para
um homem alto que pensei ser algum guarda, mas na verdade, percebi os mesmos olhos verdes
que Freya tinha. — Pode me indicar?
— Vou me arrepender disso.
Eu não sabia quem ele era.
Qual irmão, e nem mesmo sabia quantos irmãos Freya tinha, mas sabia que os Hansen
eram um tipo de família na máfia, totalmente diferente dos Kang, pelo que Vincenzo tinha me
contado no longo caminho que fizemos até ali. Eles nasceram naquele império. Eles eram
mafiosos, desde o nascimento. Eles não tinham qualquer escolha, a não ser, continuar o legado.
Quem era o Hansen à minha frente?
— A última porta à esquerda.
Pisquei algumas vezes, e não me mexi.
— Isso é um teste? É uma armadilha ou...
— Apenas vá, porra!
O homem então tinha uma arma em mãos, e apontou diretamente para minha cabeça.
— Vá até lá e não faça qualquer escândalo depois. — Olhei-o perdido. — É uma
ordem, Kang.
— Quem é você?
— Isso não importa, apenas... apenas vá.
Foi então que comecei a andar, sentindo a arma apontada às minhas costas, e abri a
porta que ele tinha indicado. No momento que entrei nela, não entendi por completo, pois era
claramente um quarto de bebê. Por que ele me mostraria um quarto de bebê?
Ainda mais, o que tinha a ver comigo?
A porta foi fechada atrás de mim, e pensei que talvez tivesse caído, de fato, em uma
armadilha. Porém, quando meu olhar parou na pintura sobre o pequeno berço, eu quase perdi as
forças nas pernas. Não era uma armadilha, nem mesmo uma cilada, era a verdade.
A verdade que eu nunca desconfiei.
Dei passos atrás, e abri a porta, pronto para perguntar, e então não tinha mais ninguém
ali. Chamei pelo sobrenome Hansen, mas nenhuma resposta. Vi-me descendo as escadas, e mal
conseguindo dar o próximo passo, para perto de Vincenzo, que parecia preso a uma conversa
sobre alvos. Suspirei fundo, parando ao seu lado, e vestindo uma máscara que há muitos anos, eu
não fazia parte.
Como se eu não tivesse visto Freya e um bebê, que tinha a mesma marca que eu,
próxima ao olho direito, em uma pintura. Tinha que ser apenas uma pintura... Não poderia... Ela
não...
Levantei meu olhar e encontrei o do homem sentado na cadeira, do outro oposto, que
parecia totalmente infeliz, olhando a todos como se pudesse pisá-los.
— Quem é você? — perguntei, sem pensar, e minha pergunta até mesmo saiu em
português, porque de repente, eu tinha perdido qualquer discernimento. — Quero dizer, que
Hansen é você? — indaguei em dinamarquês, e ele me encarou, como se me analisando.
— Por que eu te responderia?
— Sabe o porquê — falei, e olhei em direção às escadas.
— O que está insinuando, Kang?
— Estão dispensados — a voz de Vincenzo preencheu o lugar, e todos ao redor
pareceram chocados. — Podem esperar na saída do castelo, esse é um assunto entre os Hansen e
Kang.
Ninguém expressou nada, mesmo que claramente descontentes. As outras sete pessoas,
lideranças naquela sala, apenas se levantaram, e saíram. Deixando o silêncio perdurar por todo o
ambiente.
— Onde ela está?
— É por isso, Vincenzo? — O homem nem sequer me destinava o olhar. — É por isso
que fez toda essa cena?
— Preferiria que eu o deixasse à frente da verdade, e não desse tempo para processar,
acredite, teria consequências...
— Está me ameaçando, Kang?
— Estou te colocando limites, que deve ter esquecido. — Vincenzo falou, e eu mal
respirava. — Sabe que cruzaram uma linha que não deveria.
— Onde ela está? — indaguei novamente, fechando meus punhos. — Onde o meu filho
está? — a pergunta saiu tão naturalmente, mas com tanta raiva, que eu me vi em poucos
segundos à frente do homem sentado, que nem me olhou.
— Pensei que os Kang tinham padrões, mas vejo que agora...
— Filho da puta — xinguei, e dei dois passos atrás. — Acha que pode me atingir por
falar mal de onde venho ou quem sou... Tô pouco me fodendo para o que você pensa! Eu só
quero saber do meu filho!
— Eu sabia que seria ridículo, mas não tanto.
— É melhor dizer, Odin.
— Ou o quê, Vincenzo?
— Ou eu...
— Ou eu vou encontrá-los, você dizendo, querendo ou não... — falei, e olhei-o com
ódio. — E eu vou levar o que tiraram de mim.
— Está me ameaçando?
Então ele me encarou e eu ri de lado.
— Estou avisando...
O homem que agora eu sabia se chamar Odin, riu alto, e negou com a cabeça.
— É o melhor que pode treinar, Vincenzo?
Neguei com a cabeça, e dei as costas àquele homem.
— Se quiser uma guerra, você vai ter, Odin — Vincenzo falou, assim que passei por
ele, em direção à saída. — Está com alguém que pertence à minha família, e ele tem direitos.
— Tentem.
Senti então uma mão em meu ombro, andando a passos rápidos ao meu lado, e saindo
de lá. Vincenzo praticamente me escoltou até o carro, e eu percebi que mal respirava, quando
estava dentro dele.
— Respire, Henrique...
— O que... Freya não... O que... Por quê? Como? Como soube?
— Não consegui entender muitas coisas, mas eu soube do nascimento de um Hansen,
que não foi comunicado a ninguém, e Freya Hansen está incomunicável há quase dois anos.
— Hyung... Ele só pode ser meu filho.
— É o que eu temia — assumiu. — Mas eu precisava que você visse, para ter certeza.
— Algum Hansen me ajudou lá no primeiro andar, algum...
— Eles são muitos — assumiu. — Mas isso não importa agora, o que importa é que
precisamos...
— Preciso achar meu filho, para ontem.
— Vamos fazer isso, Henrique.
CAPÍTULO 8

“Me matando devagar, do lado de fora da janela


Eu estou sempre esperando que você esteja esperando lá embaixo
Demônios jogam os dados, anjos reviram os olhos

O que não me mata, me faz te querer mais”[12]

FREYA

— Não acredito que pode nadar no mar aberto.


— O mar aberto pode ser ainda mais tranquilo do que a realidade — ele falou, e pela
primeira vez, em toda minha vida, eu consegui me identificar tão facilmente com alguém.
Ele era completamente diferente de mim, externamente, mas quando falava, fosse o
mais simples, eu me via como uma mera expectadora, da minha própria vida. Querendo saber
mais. Querendo saber mais sobre o que ele era. Querendo saber mais sobre como nós
parecíamos.
— Quando penso em calma, penso no fundo do mar — admiti, e então seu olhar se
voltou para o meu.
Ele estava alguns passos à frente, os pés já molhados pelas ondas baixas, e até mesmo
a barra de sua calça.
— E o que está lá, e que não tem a mínima ideia do que seja? — indagou, esticou uma
das mãos para mim, e eu então me apressei a tirar as minhas botas de salto.
O mais diferente de toda a situação era que eu sequer deveria estar na areia de uma
praia, com um completo desconhecido, que me trazia uma paz ao peito, que nada e nem ninguém
antes conseguiu. E ele não me julgou. Ele apenas esticava a mão, enquanto eu me livrava dos
sapatos e caminhava para perto dele, a minha saia longa não parecendo tão importante, quando
senti a água do mar molhar meus pés.
— Ai, gelado — reclamei estremecendo, minha mão presa a dele, e vi meu corpo quase
se enrolar contra o dele.
Foi quando levantei o olhar e olhei diretamente para o dele. Um escuro tão bonito que
eu poderia mergulhar, fosse para descobrir o que tinha lá e voltar à superfície, fosse para me
afogar por completo.
— Acho que que tem, no fundo não importa muito — ele falou, como se lendo meus
pensamentos, e um sorriso se abriu no belo rosto.
Por um segundo, eu senti meu peito bater tão fortemente, que imaginei que ele sentiria.
Foi naquele exato segundo que eu soube, que estava condenada, pelo que fosse, a nunca
esquecer daquele momento. De nunca me esquecer, dele.

Um aperto no peito.
Tão forte que me fez acordar, e então ouvi o choro alto de Bjorn. Puxei-o com cuidado
para o meu colo, já que seu berço era acoplado à minha cama. Tentei acalmá-lo, conforme me
sentava, encostando-me contra a cabeceira estofada, e ao mesmo tempo, tentava controlar minha
respiração.
— Está tudo bem, deusinho — sussurrei e me vi levantando com ele, e caminhando
com o mesmo até a sacada.
Parecia ser madrugada, e quando encarei o grande relógio na mesa de cabeceira, às
quatro e cinco da manhã, me deixaram em alerta. Por que estávamos tão agitados justamente
naquele horário?
— Será que sabe que eu estava sonhando com seu pai? — perguntei para o meu filho,
pegando uma de suas cobertas e jogando-a ao seu redor, para sair com ele pela porta da varanda.
O frio me recebeu, e como sempre, pareceu um calmante natural para Bjorn. Ele se
ajeitou melhor no meu colo, e eu beijei sua testa. Olhei ao redor, parte do meu instinto apitando.
Aquela parte do castelo era geralmente quieta, mas às quatro da manhã, era um horário de troca
de soldados dos Hansen. Ao menos, algum barulho de carros que deveriam estar ali. Porém,
apenas nada.
As ondas batiam contra as pedras, o barulho que eu tanto adorava, mas que por um
segundo, me fez sentir o peito apertar ainda mais.
Porque me lembrava dele.
Ele ainda se lembrava de mim?
Ele ainda saberia sobre o que existe de nós?
Um barulho de pegada do lado de fora do quarto, me fez enrijecer o corpo, e corri para
dentro do quarto, prendi meu filho com ainda mais força contra o meu corpo, usando a coberta
para escondê-lo.
— Fica quietinho, meu deusinho — sussurrei, e me vi correndo para o que Hella havia
me dado, assim que começou a me visitar. Escondida dentro da mesa de cabeceira, preso acima
da gaveta, e retirei de lá – uma arma.
Quando a porta se abriu, eu já levantei a arma, sem pensar duas vezes, tudo ao meu
redor girando, e de repente, eu quase perdi meu equilíbrio. A mão que segurava a arma descendo,
enquanto a outra, que ajudava a esconder por completo Bjorn, estava ainda mais forte contra ele.
Os olhos que estavam em meus sonhos, tanto acordados quanto despertos.
Os olhos que me perseguiam todos os dias, porque eram os que eu encontrava no meu
filho.
Henrique estava ali.
O pai do meu filho, estava ali.
O homem que eu amava, estava ali.
Ele mal me encarou, e então olhou para o relógio, ao passo que eu tentava respirar
fundo.
— Temos quatro minutos e cinco segundos... — falou em inglês, e então me encarou.
— Vamos.
E mais uma vez, a mão dele estava esticada em minha direção e eu sequer pensei
quando levei a minha até ela, e aceitei.
— Nosso filho? — perguntou, e indicou com a cabeça, o amarrado de coberta preso por
minha outra mão em meu corpo.
— Ele está aqui.
Eu mal conseguia raciocinar. Em um momento, eu estava sonhando com ele, e
imaginando que nada nunca seria como o inimaginável, e agora, ele estava ali, me levando, junto
com o nosso filho.
Ele tinha vindo, por nós.
— Então vamos.
Ele segurou minha mão com força, saí com ele pelas portas, e eu segurava Bjorn como
se meu coração estivesse ali, e realmente, estava. Não demorou muito para descer as escadas, e
eu estranhava cada passo, por estar conseguindo sair pela porta da frente.
Ainda mais, de um lugar que era minha prisão por dois anos. Ainda mais, porque
Henrique não era da máfia, ele não...
Meus pensamentos se dissiparam, quando eu pisei fora da mansão, e vi toda a família
Kang do lado de fora, a postos, nos esperando. Eu os reconhecia bem, cada um deles. Eram
membros da máfia mais perigosa e respeitada do mundo, originários da coreia da Sul. Desde
Hinata, a mais nova, até Vincenzo Kang, o chefe da máfia, que estava parado à frente do carro
mais próximo, como se nos esperando.
— Esse é o carro de vocês, Chae vai dirigir — Vincenzo falou, e eu pisquei algumas
vezes. — Bem-vinda de volta, senhorita Hansen.
Pisquei confusa.
Por que Henrique estava com os Kang? Por que ele estava com todos eles, bem ali?
Ele sabia? Ele sabia quem eu era, desde o começo? Ele tinha vindo, por aquilo?
— Obrigada, eu acho — falei, e fiz uma reverência em agradecimento, sabendo que era
de sua cultura.
— Onde combinamos, Hyung?
A pergunta de Henrique, que veio com um acenar afirmativo de cabeça de Vincenzo
Kang, me deixou quase sem ar. Ele chamava o homem mais perigoso do planeta de irmão mais
velho, como se fossem íntimos.
O que estava acontecendo?
O que eu tinha perdido?
Apenas deixei meu corpo ser levado, pensando em como de repente, talvez eu estivesse
saindo de uma prisão para outra. No momento em que me sentei no banco do carro, tentei pensar
em todas as probabilidades.
Eu tinha simplesmente deixado a minha arma, e nem sequer pensei que precisaria me
defender. Como se eu estivesse esperando, aquele tempo todo, pelo homem que eu amava. Mas
agora, sentada do lado dele, no banco de trás, com nosso filho preso a mim, eu só conseguia
pensar, que eu deveria ter duvidado.
Quem ele era?
Por que ele estava ali?
Eram tantas perguntas, e cada uma delas, me levava a duvidar de minha própria
sanidade. Fazia-me duvidar dos meus próprios sentimentos.
CAPÍTULO 9

“Venha aqui, eu sussurrei no seu ouvido


No seu sonho, conforme você adormecia
Meu bem, já tinha acabado?

E já acabou agora?” [13]

HENRIQUE

Não demorou muito para o carro parar perto de uma pista de pouso improvisada, que os
Kang tinham preparado.
— Aos comandos do meu chefe e irmão... — Chae falou em coreano, me encarando. —
Vocês vão nesse avião, e direto para onde ficarão protegidos, eu vou com meus irmãos.
— Obrigado por tudo, de verdade — falei, e ele levou uma das mãos ao peito, como se
ofendido.
— Chama Vincenzo de hyung, e eu que ia quebrar a sua cara na frente da mansão Kang,
não recebo nada? — provocou, e eu ri de lado, mesmo que fosse um momento que toda a tensão
estivesse ao meu redor. — Vá logo com sua mulher e filho.
— Apenas meu filho — corrigi-o, ele revirou os olhos, e deu um leve aceno para Freya.
— Obrigado, hyung.
— Agora sim.
Foi quando eu me apressei a descer do carro, corri até o outro lado e abri a porta para
Freya, que nem sequer se mexeu.
— Temos que ir — falei em inglês, e estiquei a mão para ela, esperando que aceitasse.
— É um Kang? — perguntei, sua voz mal saindo, só que em coreano.
Assustei-me com o fato de que ela sabia aquela língua a tal ponto de estar falando.
— Eu preciso saber... — continuou em coreano, e vi-a ajeitar com cuidado o pacotinho
em seu peito. Que era o meu filho... o meu filho estava ali, com ela. — É da máfia?
— É mais complicado do que sim e não — admiti, e conseguia entender suas dúvidas.
— Prometo te explicar o que for necessário, quando estivermos em um lugar protegido.
— Meus irmãos não vão fazer nada, contra nenhum de vocês... — ela falou, soltando o
ar com força, como se incrédula. — Sãos os Kang, aqui, me levando, com eles...
Ela não aceitou minha mão, mas desceu do carro, ainda murmurando algumas palavras,
porém, seguiu em direção ao avião que estava na pista, nos esperando.
Não demorou muito para entrar atrás dela, vi-a desenrolar a coberta, e parecer querer
deixar mais confortável, enquanto se sentava. Foi quando eu consegui ver, pela primeira vez, os
cabelos do meu filho.
— Ele está dormindo. — A voz dela soou dentro do pequeno avião, que teve a porta
fechada, e anunciaram que levantaria voo. — Sempre tão bonzinho com a mamãe, não é? — A
voz dela mal saiu, falando em inglês com aquele tufo de cabelos, preso a ela, enquanto ela
fechava o cinto abaixo deles.
Sentei-me na fileira ao lado, que tinha duas poltronas. Foi quando consegui olhar de
verdade para ela, e ver que os cabelos antes longos e loiros, agora estavam completamente
ruivos. Ela parecia ainda mais magra do que antes, olheiras abaixo dos olhos, e um cansaço
estampado por toda sua face. Ela parecia ter perdido todo o seu brilho. Mas quando encarava o
pacotinho enrolado em si, notava que parte dele, parecia voltar, mesmo que por alguns segundos.
Engoli em seco, sem saber o que indagar, ou como perguntar por qualquer coisa. Prendi
meu cinto, enquanto o avião já levantava voo, e fechei os olhos por alguns segundos, pensando
em como seria dali para a frente. Porém, o mais importante se passava por minha cabeça: como
tinha sido para ela, até ali?
Tentei guardar aquelas perguntas, porque existia muito mais em jogo, do que minhas
próprias dúvidas naquele momento. Existia o nosso filho, que estava preso a ela, e que parecia
estar totalmente alheio e inocente ao que acontecia ao seu redor.
— Os Hansen não vão retalhar? — perguntei, no momento em que já estávamos no ar.
O silêncio foi minha resposta e eu me virei para encará-la, usando toda a coragem que
eu nem sabia que era necessária. Ela estava simplesmente dormindo, agarrada com as duas mãos
em nosso filho. O rosto dele já aparente, claramente ela tendo tirado quase toda a coberta do
rosto dele, e que fez meus olhos se encherem de lágrimas.
O meu filho estava ali.
Ele era uma cópia minha, tão pequeno e tão... precioso.
— Eu vou cuidar de você — sussurrei e suspirei fundo, o encarando, mesmo que ele
não pudesse ouvir e mesmo que o fizesse, não entenderia. — Eu vou cuidar, filho.
Não fazia ideia de que momento a adrenalina talvez tivesse passado e eu também tinha
caído no sono. Porém, ouvi o aviso que estávamos prontos para pousar, me ajeitei na poltrona, e
vi Freya ainda completamente apagada na sua. O que me chamou mais atenção, foi o fato de os
olhos de nosso filho estarem abertos, e as mãozinhas indo para o pescoço dela. Ele a admirava
como se fosse uma deusa.
— Filho...
Minha voz mal saiu, e foi quando o avião pousou. Naqueles poucos segundos, o meu
olhar preso ao dele, que me encarou como se curioso, e um quase sorriso no rosto. Era a feição
mais linda, que eu nem sabia dizer que precisava, até aquele momento.
Quando finalmente pousamos, eu retirei o cinto e me levantei. O meu celular tocou e vi
o contato de Vincenzo na tela.
— Está tudo como planejamos, e podem ficar tranquilos.
— Obrigado, por tudo, hyung.
Ele apenas desfez a chamada, ao passo que eu guardava o celular, e encontrei os olhos
de Freya abertos.
— Onde estamos?
— No Brasil — falei, e ela arregalou os olhos, como se surpresa. — Foi um bom tempo
até chegarmos.
— E eu dormi todo ele?
A pergunta parecia mais para si do que para mim.
Ela então se levantou, e vi-a desenrolar todo o cobertor, e então tive a visão inteira de
como o meu filho era. Minha mente virou, porque eu não sabia o nome dele. Raiva tomando
conta dos sentimentos que eu ainda tinha por ela. Mostrando-me que nem mesmo os meus olhos
favoritos poderiam me fazer esquecer, o que ela me fez perder.
— Oi, filho — falei, e então suas mãozinhas se levantaram, como se me pedindo.
— Ele quer seu colo — Freya falou, e o ajeitou no dela. — O papai está aqui, deusinho.
Olhei sem entender para ela, pelo apelido, mas guardei minhas palavras, no segundo em
que senti as mãozinhas de meu filho contra a minha pele pela primeira vez. Ele veio facilmente
para o meu colo, ainda tão pequeno, que me fez segurar as lágrimas que queriam descer.
O que eu tinha perdido?
O quanto eu tinha perdido?
— Papai está aqui agora — falei em coreano, contra seus cabelos, enquanto sentia suas
mãozinhas contra o meu pescoço. — Papai vai sempre estar aqui.
O meu olhar então parou no de Freya, que parecia feliz em ver aquela cena, mas no
fundo, eu sabia que ela era parte da culpa de eu não saber o nome do meu próprio filho. E eu
sabia que nós dois éramos algo quebrado, que não existia chance de consertar. A confiança que
se foi, junto com a omissão que ela escolheu, o que ela me tirou... tudo estava quebrado.
Éramos apenas eu e meu filho, nada e nem ninguém mais importava. Nem mesmo ela.
CAPÍTULO 10

“Ah, meu Deus, eu penso em pular


De coisas bem altas
Só pra você vir correndo

E dizer aquilo que eu estive querendo ouvir, mas não” [14]

FREYA

Eu não conhecia aquele lugar.


Apenas a parte da praia me parecia familiar, porque existia algo com o mar, que sempre
me lembrava de lar – de casa. Caminhei pela areia, seguindo Henrique que ainda tinha nosso
filho no colo, para perto de uma casa que ficava próxima às pedras, e parecendo isolada naquele
lugar. Deveria ser um lugar que os Kang pensaram que não correriam risco dos Hansen
descobrirem. Até mesmo Baldur, um dos meus irmãos, que era realmente próximo de uma deles.
— Por aqui.
Caminhei em direção à casa, que era o único ponto que Henrique poderia estar
mencionando, e sentia como se uma parte de mim, tivesse sido arrancada. Sabia que Bjorn estava
ali, com o pai, são e salvo, mas era diferente de tudo o que eu tinha passado, ficar, mesmo que
apenas alguns minutos, longe do meu filho, mesmo que tão perto.
No segundo que adentrei a casa, percebi que era um lugar bonito, com grandes janelas
de vidro e a vista do mar que ficava ali à frente. Caminhei na direção em que Henrique foi, e vi o
instante em que o chão da sala de estar começou a se tornar totalmente acolchoado. Era um lugar
que parecia reformado recentemente, e me indaguei internamente a quem ele pertencia.
— E aqui você vai poder brincar por muito tempo.
Henrique falava para o nosso filho, em português naquele momento, e eu apenas me vi
como uma expectadora. Depois de tanto tempo, me sentindo a personagem descartada de algum
livro, lutando para ter qualquer relevância, agora eu via um dos poucos sonhos que eu tinha, se
realizando: meu deusinho conhecendo o pai.
Enquanto as dúvidas apenas aumentavam em minha mente, sobre como ele tinha
conseguido tudo aquilo. Como ele tinha se infiltrado, junto aos Kang, para me tirar de um castelo
pertencente aos Hansen? Como ele sabia o que encontraria, quando foi me buscar? Ou ele não
sabia? Ele tinha ido por mim?
Eram tantas questões, que eu não conseguia silenciar minha mente, ao me contentar em
vê-lo com Bjorn no colo, que começava a reclamar, como se incomodado.
— O que foi?
Cheguei próxima ao meu filho, que então estendeu as mãozinhas para mim, claramente
pedindo ajuda, e eu o conhecia bem o suficiente, para saber que deveria ter feito cocô. Ele as
vezes abria um choro descomunal, se eu não percebesse que estava com a fralda suja. Um bebê
que odiava ficar sujo, daquela maneira, e eu o recebi em meus braços, fazendo um carinho em
sua cabeça.
— Ele faz manha e chora alto, quando faz cocô e precisa limpar na hora — expliquei,
enquanto Bjorn terminava de vir para os meus braços, e senti o leve toque dos dedos de Henrique
contra a minha pele. Uma parte de mim, reconhecendo-o, como se o certo fosse que ele
permanecesse ali, preso a ela. — Tem algum lugar que eu possa...
— Aqui.
Ele falou de repente, piscando algumas vezes, e me direcionou por um corredor. No
momento que abriu uma das portas, minha boca se abriu por completo, ao encontrar um quarto
de bebê enorme, totalmente decorado, e claramente equipado com tudo que era necessário.
E naquele momento, eu soube.
Foi por Bjorn que ele veio.
Foi pelo nosso filho.
Porém, como ele sabia? Como ele tinha conseguido descobrir?
Talvez Hella? Talvez os Kang?
Fui em direção ao trocador, e pareceu simplesmente automático. Com certeza o lugar
decorado por alguém que tinha total noção de como criar um bebê, porque tudo era de fácil
acesso, enquanto eu colocava Bjorn deitado e ele parecia mais calmo. Um bebê exigente, que me
fazia rir, da forma como já era decidido, mesmo tão novinho.
Eu pensava que nenhum homem conseguiria me enrolar, mas a verdade era que meu
filho me tinha enrolado em seu dedo, por completo.
— Pronto? — perguntei para ele, como sempre fazia, e então levei meu nariz ao dele,
num leve carinho, e ele riu alto, no momento em que eu tirava a fralda, e o limpava. — Deusinho
exigente — provoquei, e afastei meu nariz do seu.
Terminei de limpá-lo, e então coloquei a nova fralda. Surpresa por encontrar uma
imensidade de modelos e tamanhos, de todos os produtos que seriam necessários.
— Se quiser, eu posso dar banho nele, foi uma viagem longa e...
A voz de Henrique quebrou o momento, e só então percebi que como sempre, eu ficava
presa no meu mundo e de Bjorn, mas ninguém conseguia fazer parte dele ou estar perto sem que
eu percebesse, mas Henrique o fez.
Eu tinha me esquecido por completo, de que ele estava no mesmo cômodo que nós.
Como se fosse apenas mais um dia na minha vida, porém, nem de perto. Era o primeiro dia, de
uma vida em que ele estaria. Como eu conseguiria lidar com isso?
— Sabe dar banho em um bebê? — indaguei, um pouco incerta, e ele fez uma leve
careta.
— Eu tenho sobrinhos, que passam boa parte dos finais de semana comigo, e isso,
desde bebezinhos, então... — pisquei algumas vezes, surpresa com a informação. E foi quando
pareceu que ele tinha percebido, que falou demais. — Quer dizer, eu sei dar banho em bebês, e
cuidar, de qualquer coisa que seja.
— Certo, eu...
— Quer ir tomar um banho, enquanto eu dou um banho no...
Foi nesse momento que sua voz parou, e eu fiquei sem entender. Tentei juntar as peças
e li a clara desaprovação e raiva em seu rosto.
— Não sabe o nome do nosso filho?
— Isso é tão fodido... — negou com a cabeça, e pareceu culpado no momento seguinte.
— Desculpe, filho — falou e encarou o pequeno, que apenas parecia feliz em estar deitado no
trocador e limpo.
— Bjorn — falei, e o olhar de Henrique sequer chegou ao meu. — Não é um nome de
um deus ou gigante nórdico, e...
— Ele foi registrado? — perguntou de repente, e finalmente seu olhar parou no meu.
— Foi, mas...
— Mas sem o nome do pai?
— As coisas são mais complicadas do que parecem, Henrique — falei, o seu nome
saindo da minha boca depois de tantos anos, mas parecia apenas natural.
— Fontes — corrigiu-me, e fiquei estática. — Kang, se preferir.
— O que...
— Agora sabe o meu sobrenome, pode me chamar por ele. — Olhou-me de uma forma
que eu nunca tinha visto antes. Uma mágoa que parecia presente em cada traço dele. — Já que eu
nem sequer sabia o nome do meu filho, e muito menos que ele existia por todo esse tempo, por
que deveria me chamar pelo meu nome, Hansen?
Ele mal sabia que estava me insultando, ao me chamar pelo sobrenome da família que
eu nem reconhecia. Porém, eu tinha o meu orgulho ainda, poderia estar abalado e um pouco
gasto, mas não se desfez. Se ele queria me culpar. Se ele queria me machucar. Se ele queria que
fosse assim, seria.
Eu estava cansada de ter que me provar, para quem fosse, sobre a verdade. A verdade
sobre a minha própria vida. E agora, eu sabia que o único homem que eu amei entrava para
aquela lista.
— Como quiser, Fontes.
CAPÍTULO 11

“Eu soube desde o início


Que éramos um tiro no mais profundo escuro

Ah, não, ah, não, estou desarmada” [15]

FREYA

Talvez tivesse sido o banho mais rápido da minha vida. Tinha percebido que o meu
quarto, também parecia totalmente recente, com roupas na etiqueta e todos os produtos lacrados,
como as próprias toalhas. Era algo que se passava por minha mente, de que ele não era um cara
comum, como eu imaginava.
Quem faria algo assim pela mãe do filho, que sequer parecia querer ter uma conversa?
Porém, eu já tinha visto filmes como aqueles antes, na minha vida real. Já tinha visto
Baldur fazer coisas de tal porte, por um completa desconhecida que era considerado, pelo
próprio, uma traidora. Só que Baldur Hansen era pertencente à máfia. Quem Henrique Fontes ou
Henrique Fontes Kang era? Ele pertencia aos Kang? Desde quando? Como eu não sabia?
No instante que minha cabeça se enchia ainda mais, caminhei em direção à porta que
dividia meu quarto com o de Bjorn, e onde ficava seu banheiro também. E foi quando paralisei
na porta aberta do ambiente com azulejos.
Henrique estava ajoelhado à frente da banheira, a camisa branca totalmente encharcada,
assim como todo ele, enquanto ria baixinho, e esfregava os cabelos do nosso filho, que batia com
as mãozinhas na água, e ria alto.
Foi naquele instante, que conseguia realmente olhar para ele, e o observar. Os cabelos
negros estavam maiores, já praticamente cobrindo a nuca, e eu conseguia ver algumas tatuagens
novas que se escondiam por dentro da camisa branca, que estava quase transparente pela água
nela, e eu conseguia ver o quanto ele parecia maior em cada músculo. Minha mente se
perguntando: o que tinha acontecido naqueles dois anos, o que eu havia perdido?
O que nós tínhamos perdido?
Porém, quando colocou uma mecha dos cabelos para trás da orelha, eu consegui ver
algo que me fez viajar por completo ao passado. A orelha que tinha apenas um furo, agora
deveria ter quatro, pelo que minha visão permitia.
— Sabe o que me fez te ver de longe, mesmo na escuridão da noite na praia? —
perguntei, e ele me puxou ainda mais para o seu peito, um leve beijo em minha testa.
— Eu sou bonito até no escuro, eu sei...
Bati contra o seu peito, e ri de sua arrogância. Ele deu uma risadinha, e eu levei uma
das mãos até sua orelha esquerda, que tinha um pequeno pontinho brilhante.
— O brinco — falei, e senti a joia em meus dedos. — Sempre foi algo que achei normal
nas pessoas, mas no meio do nada, à noite, me fez ir até você.
— Então eu deveria fazer mais três aqui... — ele tocou meus dedos que estavam na sua
orelha. — E furar a outra, para que você consiga me achar, de todo jeito.
Eu sorri, completamente derretida, pela forma que ele não julgava, o mais simples do
meu ser, e sua boca encontrou a minha, como se pudesse assim, transmitir o que ele também
sentia. Foi naquele momento que eu soube, que se alguém poderia me amar, aquele alguém
seria ele.
— Sabe, a minha omma fazia isso — falou em português brasileiro, sua língua natal,
misturando com o honorífico que deveria chamar sua mãe. — Ela passava bastante xampu, fazia
topetes no meu cabelo, e tirava fotos... — sussurrou, como se fosse um segredo. — Vou te
mostrar um dia, mas acho que vai achar que é você, de tão parecidos que somos.
O dedo de Henrique passou sobre a marca de nascença que ele também tinha, e que não
deixava sombra de dúvida.
— Bjorn é um nome bonito — falou, enxaguando os cabelos do nosso filho com
cuidado, o qual estava concentrado em bater com força com as mãozinhas na água e se divertia.
— Acho que eu deveria te dar um nome coreano? Um nome brasileiro?
Ele parecia perguntar a si, e eu percebi que talvez estivesse adentrando um momento
apenas deles. Como tudo tinha mudado tão rapidamente, de eu estar me sentindo um tanto
intrusa em um momento que meu filho estava vivendo?
Éramos só nós dois, por cada dia daqueles dois anos.
E agora, eu olhava para ele sendo dois, com outra pessoa. E por mais que estivesse
doendo, lá no fundo, saber que Henrique presumia o pior de mim, eu estava feliz, pela maneira
como ele parecia apenas entregue a ser pai.
Pelo menos, um dos meus sonhos que pareciam impossíveis, sendo uma realidade – de
que Bjorn teria um pai que o queria.
Dei um passo com cuidado para trás, e bati na porta do banheiro, como se tivesse
acabado de chegar.
— Hansen — Henrique falou, e eu assenti, focando apenas em Bjorn, e em sua
animação. Tentando não pensar em nada que fosse diferente, do fato de que eu tinha saído da
prisão que me colocaram.
O meu medo, pensando que nem mesmo conhecia o homem à minha frente, sobre a sua
real origem, me assombrando. E se ele tivesse me tirado de uma prisão, para me colocar em
outra?
Eu precisava saber.
E nós precisávamos de uma conversa, que claramente, ele não queria ter. Encostei-me
contra o batente, ainda pisando em ovos em toda a situação. Não sabia como confiar na única
pessoa que um dia depositei toda a minha confiança, mesmo sendo um total desconhecido. Saber
quem ele era, no final, era pior do que quando não sabia.
Quando eu achava que sabia.

HENRIQUE

— Com fome, deusinho?


Freya perguntou balançando nosso filho no colo, e eu pensei em questionar se ela não
estava também. Quando o fiz, vi-a simplesmente mexer na alça de sua blusa, que parecia própria
para aquilo, e rapidamente, nosso filho já estava em seu peito.
Bjorn.
Era um nome tão bonito.
Era um nome que parecia combinar muito com a forma que ele era fofo.
— Eu sei que está — ela sussurrou, fazendo um leve carinho nos cabelos dele.
— Não quer se sentar, para ficar mais confortável? — indaguei, vendo-a mexer de um
lado para o outro, com ele mamando em seu peito.
— É o que pretendo — falou, e então a vi ir até a poltrona que tinha no canto do quarto
que era dele, bem à frente de uma grande cortina, que tampava a grande janela de vidro que tinha
ali, que dava para vista do mar. — Uma poltrona contra a parede, interessante — ela disse
baixinho, e seu foco se tornou nosso filho, tocando a mão dele com a dela.
— Na verdade...
Vi-me indo até as cortinas, puxando-as, e a visão do mar, já à noite, foi que os recebeu.
Bjorn pareceu nem ligar, concentrado em se alimentar, mas o olhar de Freya se iluminou por
completo.
E logo, o seu olhar estava no meu.
E eu não poderia dizer o que se passava pela mente dela, porém, tinha certeza do que se
passava pela minha. Sobre como ela amava o mar, como se fosse o seu show favorito, mesmo
depois de tantos que ela disse ter vivido.
— Nenhum artista, nenhum mesmo...
— Nem mesmo a sua cantora favorita? — brinquei, e ela assentiu.
— Nem mesmo Taylor Swift consegue me fazer sentir da maneira que o mar me faz —
confessou, levando as mãos à areia, e logo as soltando. — Tudo aqui, uma orquestra perfeita,
mesmo quando se acalma, mesmo quando se rebela... A praia é meu show favorito.
Meu celular tocou e eu estava completamente desacostumado com aquilo, mas estava
totalmente grato, porque era a motivação perfeita para me afastar. Saí do quarto de meu filho, um
sorriso no meu rosto, por pensar sobre aquele fato, e levei o aparelho à orelha.
— Onde você se enfiou? — o grito do outro lado da linha vinha do meu irmão mais
velho, e eu tive que afastar o telefone, e piscar algumas vezes, tentando me concentrar. — Eu
juro, Henrique Campos Fontes, que eu vou te achar e vou quebrar a sua cara!
— Não antes que eu quebre.
No momento que eu ouvi a voz da minha irmã mais velha, que sempre prezava pela
paz, e era a conciliadora entre os quatro irmãos, eu sabia que estava ferrado. Contudo, como eu
poderia contar algo, que nem eu mesmo entendia?
— Ten Ten, Tin Tin... — chamei-os pelos apelidos de criança, como se tentando
recordar que eu era o mais novo dos dois, e que talvez, poderiam me dar uma colher de chá. —
Eu prometo explicar com calma, e...
— Como vai explicar que está sumido há meses e só agora o seu celular tocou, e eu
duvido que não tenha nada a ver com aquela ideia absurda de estar com a máfia Kang? —
Valéria parecia realmente preocupada.
— Eu estou bem, eu só... eu não quero contar as coisas por telefone.
— Sobre o quê? Sobre como nos desobedeceu e simplesmente decidiu que vai ser um
mafioso
— Ele não faria isso, Gael. — A voz mais madura no fundo, que eu reconheceria em
qualquer lugar – nossa tia Hellen, que praticamente criou a mim e a nossa caçula. — Mas nos
deve uma explicação.
— Eu prometo que assim que as coisas se acalmarem, eu vou...
— Por que nada está calmo, afinal? — Gael rebateu, e eles me conheciam bem o
suficiente para pegar os detalhes. Por aquilo, eu tive que sumir, antes de realmente encontrar
Freya e meu filho.
— Eu confiei em você, Gael, mesmo quando se casou com Talita Kang, que mesmo que
não viva na máfia, trouxe todos eles para perto de nós. — falei, e ouvi seu suspirar no fundo. —
E você, Val, é cunhada de uma Kang de sangue, que não preciso dizer nada, mal falta querer
colocar um exército para nos proteger. Além de Paola, que é esposa do chefe da máfia, preciso
dizer mais?
— O que quer dizer, ton ton? — Val perguntou, parecendo mais calma.
— Só confiem em mim, um pouco mais — pedi. — Não vou sumir de novo, prometo.
— Nos passe seu endereço e vamos nos ver, o mais rápido possível. — A voz de Gael
soou ansiosa. — Sei que Paola está te acobertando, como ela também apenas não nos atende e
nos recebeu com a maior cara de sonsa do mundo.
— Confiança, por favor.
— Só atenda o telefone, todos os dias, ok? — parecia mais um pedido, do que uma
ordem, mas sabia que Valéria estava nervosa. — Nós odiamos fazer o papel dos irmãos mais
velhos insuportáveis, mas...
— Gael gosta desse posto — cortei-a, e ela riu baixinho, enquanto Gael soltou um
palavrão. — Eu juro que estou bem e que não estou na máfia, quer dizer... É mais complicado
que isso.
— Eu acho que quer que a gente te cace, é isso? — Gael perguntou, como se
inconformado e eu ri alto.
— Amo vocês, e prometo que vou os trazer para onde estou, logo menos.
— Também te amamos, Rique.
Minha tia falou, e pela forma como a ligação foi desfeita, eu sabia que ela deveria tê-lo
feito, para simplesmente não deixar que meus irmãos mais velhos deixassem a minha cabeça
mais cheia.
Abri o contato de Paola, a caçula dos Campos-Fontes, e agora, uma Kang, que não teria
como não saber o que estava acontecendo, por mais que tentasse. Ela era a única pessoa que
tinha Vincenzo Kang enrolado no seu dedo, como um anel, que ele tinha muito orgulho de ser.
Ela poderia não saber de tudo, mas com certeza, estava tentando me dar o tempo que precisava.

Obrigado, tun tun


Não levou um minuto e ela respondeu a mensagem, o que me fez rir novamente.

Obrigada o cacete! Na minha vez, me fez aquele vexame na frente da casa dos Kang, eu
deveria era tentar bater em Freya Hansen, e até mesmo, quebrar um carro do chefe da máfia
deles!

Também te amo.

Ela mandou uma figurinha, com um gatinho batendo em outro, e eu sabia que era a sua
forma de demonstrar o que também sentia.

— Eles parecem bons irmãos.


Uma voz me fez piscar algumas vezes, e então vi Freya adentrar minha visão, olhando-a
sobre o meu ombro. Ela era tão silenciosa, que não me surpreenderia, se ela estivesse ali por
muito tempo.
Ela era uma Hansen.
Uma mafiosa de nascença.
Como ela poderia ser menos do que silenciosa, certo?
— Eles são — apenas falei — Bjorn, ele...
— Dormiu no meu peito, como geralmente faz — comentou simplesmente, e eu
percebia que em pouco tempo, ela soltava informações sobre nosso filho sempre que podia. —
Eu acho que precisamos ter uma conversa, no fim disso.
— Vamos comer primeiro.
— Uma conversa, Fontes.
— Primeiro o jantar, Hansen.
Eu então me virei, e ela me encarou, como se pudesse me enfrentar daquela forma, para
sempre, se necessário. Uma determinação que eu não conhecia, um lado que era completamente
novo, porque não era a versão dela que eu tinha conhecido.
Afastei-me, e fui até a cozinha, para deixar tudo pronto, e vi-a nem sequer se mexer,
parada no lugar, enquanto eu me movimentava, e abria o freezer, onde percebi que tinha todo o
tipo de comida congelada.
Escolhi o que eu me lembrava de ela gostar, e separei, levando para o micro-ondas, para
descongelar, assim como a minha. Um silêncio caiu sobre o ambiente, que apenas não era tão
constrangedor, porque o aparelho elétrico fazia seu trabalho, mas ainda assim, era algo tão novo
e tão ruim entre nós, que eu não sabia como agir.
Os minutos se passaram, senti a tensão apenas aumentar, e sabia que seu olhar estava
nas minhas costas, viradas em direção ao eletrodoméstico. No momento que iria apitar, eu
cancelei, sabendo que nosso filho estava dormindo e um sorriso surgiu no meu rosto.
— Desde quando é um Kang? E desde quando sabe o que ser uma Hansen significa?
As perguntas dela fizeram o meu sorriso morrer e me virei, encontrando-a no mesmo
lugar, apenas me encarando. E eu sabia, que o silêncio talvez tivesse sido a melhor escolha, para
nós dois.
CAPÍTULO 12

“Quando o silêncio chegou


Estávamos tremendo, cegos e perdidos

Que inferno, como perdemos a visão do que éramos outra vez?” [16]

FREYA

Vi-o negar com a cabeça, como se inconformado. Não demorou para ele mexer em algo
mais na cozinha, e então aparecer com dois pratos em mãos, e caminhar em direção a uma mesa,
que ficava no lado oposto. Luzes sendo acesas, em um branco quente, como se tentando deixar
aconchegante, ou ao menos, nos permitisse enxergar para comer.
— Não tem o direito de fazer perguntas depois de dois anos, Freya. Dois anos! — falou,
seu tom baixo, mas totalmente frio.
— Então você quer que eu apenas aceite o que está acontecendo e finja que estou a par
de tudo? — rebati, e foi como me senti, no momento em que descobri a gravidez, e minha vida
foi moldada a partir daquele instante, por meus irmãos. Ou muito pior, de quando meus cabelos
loiros cresceram, e se tornaram uma marca que Ymir Hansen queria ostentar, e eu tive que ser
moldada por isso.
— Poderia, pelo menos, agradecer? — ele revidou, e o encarei perplexa. — Agradecer
por eu não ter aparecido e simplesmente tirado Bjorn de você, e sumido por dois malditos anos!
Senti um frio percorrer minha espinha.
— Você não faria...
— Por que não? — rebateu, e eu me vi em completo estado de alerta. — Não foi o que
você fez, me tirando ele?
Suas palavras me feriram mais do que qualquer coisa, e eu me vi rindo sem graça
alguma, por perceber que talvez, por todo aquele tempo, eu tivesse amado um homem que eu
desconhecia.
— Não tenho fome.
As três palavras saíram ácidas, enquanto eu me virava e caminhava de volta para o
quarto em que Bjorn dormia. Peguei-o com cuidado do berço, e o levei comigo, até a grande
cama que tinha no quarto, que parecia, ser destinado a mim. Não sabia, a quem, naquele
momento, minha vida pertencia.
Nem ao menos sabia se eu gostaria de saber.
Porém, sabia pelo que minha vida valia a pena. Encostei a cama na parede, e deixei meu
filho ao lado, à medida que me deitava. Aconcheguei-o ao meu lado, como já éramos
acostumados, e fiquei ali, encarando-o, e em seguida apertei o medalhão em meu pescoço.
O que eu tinha esperado?
O que eu estava esperando, afinal?
Suspirei fundo, e neguei com a cabeça, deixando uma lágrima descer. E não foi a
primeira vez, em dois anos, que eu estava ali, deitada ao lado do meu filho, e me neguei a deixar
outra lágrima descer.
Fiz uma retrospectiva, enquanto pensava no que deveria fazer. Minha mente toda
bagunçada e uma pessoa a quem eu me apeguei tanto, de um momento bom na minha vida, e que
agora, parecia só voltar para fazer parte do momento que eu queria esquecer.
Fechei os olhos, e me neguei a ficar presa nas lembranças com ele. Contudo, como
acontecia em todas as noites naqueles dois anos, os olhos escuros dele, eram os que estavam
iluminando os meus sonhos, assim que caí em um deles.

HENRIQUE

Eu estava sentado, encarando a comida à minha frente, tentando entender em que exato
segundo eu tinha perdido o controle de toda a situação. Como se eu o tivesse tido, em algum
momento.
Porém, como eu poderia esconder dele toda a minha dor e insatisfação? Por que ela
parecia tão machucada e acuada, com qualquer coisa que eu deveria estar?
Suspirei fundo, sentindo uma culpa que eu nem sabia ser possível estar sentindo
naquele segundo, me atingir. Levantei-me, perdendo totalmente a fome também, e caminhei até o
quarto do nosso filho. No momento que entrei nele, notei o berço vazio, mas a porta que dava
acesso ao quarto da sua mãe, estava aberta.
Parei à frente dela, sentindo-me tão errado pela dor em seu rosto, que não consegui
bater, e adentrar o ambiente. Eu sabia que ela deveria estar ali, com nosso filho com ela, e meu
coração estava cada vez menor, se encolhendo como se precisasse desaparecer por alguns
segundos. Levantei a mão uma, duas, três... dezenas de vezes, que acabei perdendo a conta, sem
coragem de bater contra a madeira.
Dei passos atrás e fui de volta para a sala de estar.
Eu não sabia que linha tinha ultrapassado com ela, todavia, sabia de todas as que ela
tinha feito comigo. Contudo, por que me doía tanto, ver a dor exposta em sua face?
Por que eu ainda me importava tanto?
Fechei os olhos por alguns segundos, e tomei a coragem necessária para ir até o seu
quarto, e não me surpreendi com a cena, de ela deitada ao lado de Bjorn, que dormia
pacificamente, sem saber a bagunça que estavam as vidas ao seu redor. Felizmente, não tinha
como ele ser atingido por nada daquilo ainda. E faria qualquer coisa, para que nunca fosse.
Levei meu olhar para Freya, que estava agarrada a uma parte do lençol, apertando-o
com força, e parecia claramente em um sonho.
— Freya... — sussurrei seu nome, no escuro do ambiente, e as palavras se perderam,
assim como, percebi que eu mesmo parecia me perder no meu próprio ser. — Hansen, precisa
acordar...
Respirei fundo, antes de levar uma das mãos até seu ombro e balançar com cuidado.
Não levou dois segundos para que a mão dela que estava no lençol, chegasse à minha, e meu
braço estava sendo virado com força. Mordi o lábio para não fazer barulho para acordar nosso
filho, mas a dor se alastrou por todo meu corpo.
— Henrique? — ela perguntou, como se perdida, mas ainda sem soltar o braço que ela
estava virando quase todo para trás. — Quer dizer, Fontes, o que...
— Precisa vir comer — falei, em meio a dor que sentia, e ela ainda parecia raciocinar
após o sonho. — Pode me ignorar se quiser, só não pode parar de comer.
Ela soltou meu braço, sentando-se com cuidado na cama, e encarando o chão por alguns
segundos.
— Eu vou colocar a comida para esquentar novamente, e vou te deixar comer a sós —
avisei, e seu olhar parou no meu. — Pode me odiar por estar querendo te odiar nesse momento,
mas não pode simplesmente não comer. Por ele, Hansen. — Apontei para o nosso filho, que
permanecia na mesma posição, dormindo.
— Eu sei o que devo ou não fazer — falou, e se levantou com cuidado, como se para
evitar acordá-lo. — Como sabe, tive dois anos para aprender sobre como ser mãe.
Suas palavras soavam tão dolorosas, que eu queria entender. Em que momento, eu tinha
a machucado, a ponto de estar esquecendo os meus próprios, que ela tinha causado?
— Não vou por qualquer caminho desse assunto, que não seja o que te leva direto para
a mesa para comer — confessei, e dei passos atrás. — Deve levar cinco minutos, no máximo,
para estar tudo na mesa, quente e, eu estarei no meu quarto, que fica do lado oposto do seu, na
outra porta que interliga ao quarto de Bjorn.
Ela não disse nada, e sequer demonstrou. Vi-me saindo a passos silenciosos, ainda a
encarando, e pelo menos, um pouco aliviado por talvez, ela ter concordado em comer.
Esquentei novamente as duas marmitas, e deixei o suco que eu sabia ser o favorito dela,
ao lado do prato agora novamente quente. Peguei o meu, uma água de coco, e segui para o meu
quarto. Deixei sobre a mesa de escritório, e voltei para a cozinha, para deixar um bilhete próximo
à comida.
Escrevi rapidamente e deixei o bilhete improvisado em um papel-toalha, ao lado do
prato dela. Voltei para o meu quarto e fechei a porta, sentindo um vazio me atingir, que eu só
tive, de fato, no momento em que percebi que eu não a veria – nunca mais.
Entretanto, ali estava ela, a poucos metros de mim, e nunca pareceu tão longe como
antes.
CAPÍTULO 13

“Eu te entendo, não importa o que aconteça

Os rubis que eu desisti” [17]

FREYA

Parei à frente da mesa, tentando entender como o que o Henrique dizia era o completo
oposto do que ele demonstrava. Era o meu prato favorito, quentinho me esperando, ao lado do
suco que era o que eu mais gostava. Por que ele fazia aquilo? Por que ele tinha tamanho
cuidado? Por que ele insistiria para eu comer?
Por que ele faria todas as coisas, mesmo as mais simples, pela pessoa que ele
claramente estava querendo machucar?
Suspirei fundo, me sentando, e então encarei sua caligrafia, em um papel-toalha, e
fiquei em choque. Em cada momento, eu me surpreendia ainda mais com o modo como ele
mostrava ser o mesmo de antes, mas as suas palavras eram de uma versão que eu acabava de
conhecer.
Tem tudo o que puder imaginar, na geladeira, nos armários... Sinta-se em casa, para
pegar e mexer no que quiser. Se precisar de mim, só bater na porta à direita, eu estarei lá.
Respirei fundo, com os olhos fechados, encarando o papel em minhas mãos. O cheiro
da comida, a minha barriga roncando, à medida que eu o deixava de lado, e focava em me
alimentar. Um gemido baixo saindo de minha boca, assim que o sabor do carbonara improvisado
se encontrava com minha língua.
Bebi um longo gole do suco de morango, e pareceu ser o momento em que as coisas
começaram a cair como um peso sobre minhas costas. Porém, tentei ignorá-las, enquanto comia
e até mesmo o sabor da refeição me remetia a quando eu e Henrique tivemos nosso primeiro
jantar juntos.
— Nunca comeu pastel? — ele parecia inconformado, ao se virar para mim, que estava
sentada na mesa de plástico, que ficava na beira do calçadão oposto da praia. — Você é algum
alienígena ou....
Ele então foi interrompido pela pessoa que o atendia, que lhe entregou os dois
salgados, que eram grandes, e tinham um formato retangular.
Ele se apressou em colocá-los em pratos que também eram de plástico, um estava à
minha frente, e outro na dele.
— Sempre tire uma pontinha, com cuidado, para sair um pouco do vapor, e não
queimar a boca quando for comer. — Deu a dica, fazendo-a à minha frente, e acabei repetindo o
processo. — Está realmente bem quente... Melhor esperarmos um pouco para começarmos a
comer.
— O cheiro é bom — comentei, sentindo o meu rosto pegar fogo, pela forma como ele
me analisava, descaradamente, como se pudesse até mesmo, ver a minha alma.
Diferente de tudo que eu conhecia. Diferente de todos aqueles que um dia eu persegui,
ou ainda pretendia perseguir. Era diferente em todas as nuances que eu poderia esperar de um
desconhecido, no meio da noite, na praia. Ele parecia apenas um presente, que o mar tinha me
entregado.
Era bom demais para ser verdade, desde os seus cabelos pretos, até o sorriso que
brilhava em seu rosto, e quase escondia seus olhos, fazendo-me querer sorrir também.
Como ele podia estar sob a minha pele de uma maneira tão rápida? E não da forma
como geralmente acontecia, nem um por cento perto do que eu identificava como o certo.
— Nunca ter comido um pastel deveria ser um crime — ele anunciou de repente. —
Tudo bem que tem um português carregado e claramente não é daqui, mas... Quer dizer, já
comeu coxinha de frango?
— Coxi... — parei um pouco, sem saber como completar. — O que é isso?
Ele parecia em choque.
— De onde você é? De Saturno? — perguntou, como se inconformado, e parecendo
testar se o salgado à sua frente estava menos quente.
— Na verdade, de uma pequena ilha na Escandinava — respondi, sem saber porque
dizia a verdade, e porque não tinha medo algum de admitir. — E você?
— Da capital desse estado, mas é capaz de nem saber o que é um estado no Brasil. —
Piscou os olhos algumas vezes, e deu uma mordida, parecendo feliz com o gosto. — Mas
primeiro, vamos comer e depois, eu tento descobrir quais maravilhas você esteve perdendo.
Então fiz como ele, testando o salgado, para ver se estava quente, e quando o mordi, a
temperatura estava agradável e o sabor de queijo explodiu por toda minha boca. Era realmente
muito bom. Contudo, eu sabia que não era aquilo que eu tinha perdido por todos os anos, até
pisar em um país como aquele.
Eu sabia que o que eu estava perdendo, tinha covinhas que apareciam enquanto ele
comia, e parecia tão bonito, até mesmo, durante o tempo em que compartilhávamos uma simples
refeição.
Minha mente em nosso passado eu finalizava a minha refeição, e gostaria de poder
viver um momento como aquele novamente. Suspirei fundo, após encarar o nada que restou à
minha frente, comprovando a fome que eu estava, mesmo que dormiria até o dia seguinte, pela
forma como me senti acuada.
Retirei o prato e o copo, assim como os talhares, e os lavei, deixando-os secar no
escorredor. Tantas partes daquele pequeno processo, me fazendo lembrar de quando o fiz, pela
primeira vez, com ele.
Eu tinha tido tantas primeiras vezes com ele, que foi como aprender a como viver de
fato, depois dos meus vinte anos. Totalmente inconformada por não existir tanto no mundo, que
apenas ele pareceu disposto a me mostrar. Ou quem sabe, ele deveria ser quem me mostraria.
Voltei para a mesa, peguei a jarra de suco, e a levei até a geladeira, a guardando lá.
Acabei não procurando por mais nada, nem mesmo um doce, que eu sempre gostava. Caminhei
de volta para a sala, e então encarei o escuro do mar, que tinha uma visão perfeita dali.
Abracei a mim mesma, no instante em que apreciava a vista, e mais uma vez, gostaria
de que as coisas tivessem sido diferentes. Que, de alguma forma, as pessoas que eu tanto amava
e confiava, tivessem feito o mesmo por mim. Olhando para a imensidão do mar à minha frente,
batendo contra as pedras, e parecendo um pouco revoltado, poderia definir como me sentia por
dentro.
Sentia-me na borda, quase me afogando, por estar há tanto tempo, presa a uma vida que
não era minha. E me questionando, em que momento, eu conseguiria tomar controle de mim
mesma, novamente?
Ouvi um mínimo barulho e a presença dele ainda era inconfundível. Sabia que ele me
observava, talvez próximo ao batente da porta que dava para o seu quarto, mas eu não me movi e
nem demonstrei que sabia. Por alguns minutos, que ele ficou ali, sendo o suficiente para que meu
corpo todo se acalmasse.
Era bom estar perto dele, mesmo no momento que eu mais gostaria de odiá-lo.
Enquanto encarava o mar, e todos os meus pensamentos pareciam completamente
divergentes, eu sabia que ele me encarava, e me questionei, sobre o que ele deveria estar
pensando.
Eu gostaria de ter aquela resposta?
Eu precisava dela para continuar?
Eu necessitava da maneira que cada parte de minha pele, acusava que eu fazia?
Mais perguntas, se juntando às que se misturavam em minha mente, e embaralhando
todos os sentimentos extremos que me tomavam. Contudo, fiquei ali, ainda o sentindo perto de
mim, mesmo que parecesse que na realidade, estivéssemos tão longe quanto antes.
CAPÍTULO 14

“Agora, estou andando de um lado pro outro em um terreno instável


Você acende um fósforo, então o apaga

Ah, não, ah, não, não é justo” [18]

HENRIQUE

Acordei um pouco atordoado. Olhei ao redor e não reconhecendo nada do local à minha
volta. Levei alguns minutos para entender que estava na casa da praia, que eu tinha comprado há
alguns anos, e que era o meu refúgio desde então. Para ser mais exato, o meu refúgio há dois
anos. Já tinha perdido a conta, de quantas vezes, fiquei parado à frente das grandes janelas e
encarando o mar, como se ele pudesse me trazer uma resposta, ou quem sabe, Freya de volta.
E ela estava ali agora, no quarto ao lado.
Olhei para o edredom bagunçado de minha cama, e sabia que nada tinha acontecido
como eu esperava. De forma alguma, que quando eu montei aquele lugar, imaginei que aquela
cama não seria nossa. Respirei fundo algumas vezes, e me levantei, indo até as cortinas e
puxando-as. O sol nascia no horizonte, e eu tinha uma visão privilegiada daquela praia privada.
Um dos únicos benefícios que o dinheiro da família Fontes me deu, poder ter aquele
lugar. Foi quando a minha visão captou, em um canto mais afastado, um pontinho ruivo, que
tinha os braços abertos, e os pés se aproximavam das ondas.
Saí do quarto de imediato, vestindo apenas a minha calça de moletom, e o rosto com
certeza amassado. Passei para o quarto de meu filho e vi que ele estava totalmente apagado,
agora dormindo em seu berço. Ele parecia ter sua própria rotina e Freya a conhecia muito bem.
Vi-me sem pensar muito, apenas ir até a parte de fora, e quando meus pés chegaram na
areia, pude ver o sol iluminá-la por completo, enquanto deixava a água molhar seus pés.
— Sei que está aí.
Ela falou de repente, e então se virou, encarando-me.
— Sou treinada para perceber, o mínimo movimento perto de mim, até mesmo, na
praia... — falou, e então cruzou os braços e respirou fundo. — O que faz aqui fora? — indagou,
o seu olhar pairando sobre meu rosto, mas notei o momento em que o passou rapidamente por
meu peitoral exposto.
— Te vi pela janela do meu quarto e...
Calei-me em seguida, e não sabia como continuar.
Por que eu tinha ido até ali?
Por que eu não conseguia fazer qualquer sentido?
— E sabe de algo sobre os Hansen? — perguntou de repente, afastando-se do mar, e
vindo para perto. — Sobre como repercutiu, o fato de ter me tirado de lá?
— Não me disseram nada. — Fui honesto. — Tudo o que eu sei, é que tinha que
achar... — engoli em seco. — Achar Bjorn.
Ela assentiu e pareceu pensar sobre algo.
— Posso pedir uma coisa? — indagou de repente, e a encarei. — Um celular para poder
ter contato com a única pessoa que me importa, e que se importou.
— Eu não sei o que realmente aconteceu com você e os Hansen, mas parece ruim —
acabei soltando sem pensar, e ela fez uma leve careta.
— Você poderia ter perguntado, e eu diria. — Negou com a cabeça em seguida. — Mas
presumiu o pior de mim, o que eu nunca imaginei que faria.
— O que quer dizer com isso?
— Que eu não tenho que dizer nada sobre mim, sobre os Hansen, sobre esses dois
anos... já que você, Fontes, escolheu por acreditar na sua própria dor, e ignorar a minha.
Suas palavras me acertaram por inteiro, e fiquei estático.
Assim que ela parou ao meu lado, olhei-a, e respirei fundo, tentando encontrar algo por
que lutar. Algo que faria sentido.
— Não sei como queria que eu agisse, honestamente — assumi, corrompido pela culpa
e mágoa. — Você tirou o meu filho de mim!
— Eles tiraram tudo de mim. — Seu olhar então parou no meu, tão frio que me
assustou. — Inclusive, você.
Ela deu passos para longe, e tudo em minha mente se embaralhou. Minha mão foi em
direção ao seu braço, mas antes que a alcançasse, o barulho de um carro estacionando, nos fez
mudar totalmente de objetivo.
Vi o brasão dos Kang, bem abaixo da placa da caminhonete, e logo Dove saiu do
veículo.
— Honestamente, o que vocês têm com praias? — ela perguntou de repente, e fiquei
um tanto confuso.
Ela era a terceira no comando da máfia Kang. Casada com um brasileiro e mãe de uma
adolescente, com sua própria história, que eu conhecia apenas o básico, que Paola acabou me
confidenciando certa vez. Porém, sabia desde que conhecia Dove Kang, de que ela era uma
mulher capaz de assustar qualquer um.
— E por favor, uma camiseta faria bem, Henrique.
— Como vai, Noona? — indaguei, enquanto se aproximava, olhando-me desconfiada.
— Não é que está mesmo nos considerando uma família agora? — indagou, como se
pronta para despejar toda a verdade ali, e eu travei. — Mas o que me interessa realmente, como
vai Freya?
— Um dia de cada vez, senhora Kang.
Freya fez uma leve reverência, enquanto Dove apenas me ignorou e foi até perto dela.
As duas deveriam se conhecer há muito tempo, pelo menos, era o que eu imaginava. Elas eram
do mesmo mundo.
— Posso conhecer Bjorn?
Freya assentiu, e lhe indicou o caminho para casa, o qual Dove seguiu. Enquanto eu
ficava parado na areia, sem entender absolutamente nada.
— Sabe, deveria se acostumar com isso.
Dei um pulo no lugar, ao sentir uma voz masculina próxima a mim.
— Respira, garoto! — Senti um leve aperto em meu ombro, e então virei-me para
encontrar Jeon Kang. — Parece que está bem na merda, certo?
Era o dia em que todos apareceriam?
— Por que estão aqui? — perguntei confuso, e ele se afastou, ficando à minha frente.
— Para sondar como está tudo, e dar informações aos Hansen, sobre a própria irmã.
— O que negociaram? — indaguei confuso, e preocupado.
— Ainda nada, mas evitamos uma guerra ao tirar Freya daquele castelo. — Fiquei ainda
mais perdido. — Não pense muito sobre isso, pelo menos, não até ela compartilhar sobre, se ela
o fizer... É pai de um Hansen, e provavelmente, eles vão aparecer. Estamos cuidando para que
estejamos preparados, se isso acontecer.
— O que eles podem fazer ou exigir?
— Nada... Tudo... — deu de ombros. — Máfias familiares de sangue como a deles são
mais complicadas do que imagina, mas estamos cuidando como podemos, para que seja mais
fácil.
— Eu não quero que... que eles se machuquem — falei por fim, assumindo o que me
corroía. — Não mais! E parece que foi exatamente o que os Hansen fizeram por esses dois anos.
Jeon me olhou de cima a baixo, como se me analisando.
— Agora eu entendi. — Ele sorriu de lado, como se compreendendo o que eu não tinha
ideia do que era. — Pensei que Hina era sonhadora demais, mas... mas foi por ela que pediu por
nós.
— Hyung...
— A maioria já desconfiava disso, mas não conversamos abertamente sobre suposições,
no entanto, agora ficou claro.
— Pode não dizer a ela? — indaguei, como se perdido.
— Não é algo que qualquer um de nós faria, fique tranquilo.
Assenti, tentando guardar aquele pedido, que agora, se tornava uma realidade, só que de
uma maneira que nunca imaginei. Éramos como dois estranhos, perdidos entre si, dentro de uma
história que nunca sonhamos em protagonizar.
E era apenas o segundo dia...
CAPÍTULO 15

“Estou sozinha em uma corda bamba


Seguro minha respiração um pouco mais

Já na porta, mas ela não se fecha” [19]

FREYA

Não me lembrava da última vez em que estive no mesmo ambiente que Dove Kang.
Ela era como uma lenda para a maioria das famílias da máfia. Uma mulher implacável,
fria e assertiva. Sabia que de todas as mulheres que tinham chegado perto de Odin, ela era a
única que ele respeitava. Porém, não me parecia um encontro da máfia ou algo parecido. Na
realidade, eu estava no escuro.
Então, vi-me parando à frente da porta, como se estivesse protegendo meu filho, e ela
me encarou.
— Henrique não te contou sobre nada, certo? — perguntou, sem qualquer enrolação. —
Não vamos te machucar e muito menos, o seu filho.
— Por quê? Por que me libertaram?
— Então era mesmo uma prisão? — rebateu, e eu engoli em seco, sabendo que tinha
soltado demais. — Não estou aqui para te julgar ou analisar, mas para te dizer que tem a nós.
Nós protegemos uns aos outros, é uma escolha. Se quiser que os Hansen nunca mais cheguem
perto de você, faremos isso acontecer.
Fiquei em choque com suas palavras.
Nunca imaginei alguém que poderia, de fato, entrar contra os Hansen, a não ser os
Kang. E vendo-me no meio do motivo para que aquilo estivesse acontecendo, me deixou
completamente assustada.
— Eles ainda são meus irmãos, mas... — suspirei fundo. — Eu preferiria não os ver,
por enquanto.
— Hella?
Pisquei algumas vezes, incrédula.
— Como...
— Acho que não é “como”, mas sim, “por que” estou perguntando sobre sua irmã que
deveria estar morta, mas nós duas sabemos que está totalmente viva e provavelmente, esteve ao
seu lado.
— Nem meus irmãos sabem.
— Talvez porque não mereçam saber — admitiu, e a encarei incrédula. — Ela me
procurou, por isso eu sei.
— Senhora Kang.
— Dove — corrigiu-me, e engoli em seco. — É parte de nós, e isso é real.
— Certo, Dove. — Suspirei fundo. — Eu gostaria de manter o contato com Hella, se
possível.
— Aqui. — Ela então tirou algo de dentro do sobretudo, e notei ser uma caixa lacrada
de um celular. — Está na caixa, mas já pronto para uso, todo configurado por Chae, e bom, vai
poder usar sem medo de ser encontrada ou algo assim.
— Parece até o som de uma vida normal.
— Bom, acho que normal está bem longe do que pessoas como nós poderão ter, mas...
mas a gente consegue encontrar um normal bom o bastante.
— Obrigada, de verdade.
— Não pelo mínimo. — Sua expressão era leve no rosto. — Qualquer coisa, o meu
contato está na lista, assim como, de todos os Kang. Claro, o número de Henrique e de Hella. Vai
identificar pelas iniciais, os contatos. Pode mudar, quando quiser.
— Eu nem sei o que dizer.
— Nem precisa, apenas... apenas se cuide. — Parecia mais como uma ordem. — Sei
que mulheres são subestimadas, subordinadas e até mesmo, desmerecidas nesse meio, mas você
é Freya Hansen. E pelo que já me disseram, é o peso do seu nome, ser quem inicia tudo.
Fiquei em silêncio, porque havia tanto tempo que o meu nome não tinha algum peso,
que agora, eu via uma mulher que admirei a vida toda, falar sobre, e pronta pra me proteger. Era
mais do que eu esperava, depois de tanto tempo sendo colocada para escanteio.
— Quer conhecer Bjorn? — indaguei, e então me afastei da porta, para abri-la.
— Se ficar à vontade com isso, com toda certeza.
Então, aquela era a sensação de poder se gabar e mostrar o filho para alguém, que
provavelmente se importava. O que eu gostaria de ter feito, com meus irmãos, mas que eles
mesmo se tiraram da história.
— Aliás, adorei os cabelos ruivos, combinaram muito — falou, assim que nos
aproximamos do berço, e os olhos de Bjorn estavam arregalados, enquanto ele tentava se colocar
de lado, mas falhava, ao forçar demais, e quase se levantar. — E você, uma pequena cópia do
Fontes mais chato.
Um sorriso se abriu em meu rosto, ao vê-la falar mais baixo e com um tom mais casual.
Percebi que ela parecia encantada com ele, e não demorou para ele estender as mãozinhas para
ela.
— Fácil= assim?
— Ele é — comentei, e incentivei-a a pegá-lo, assentindo com a cabeça. — Um
deusinho muito fácil — provoquei-o, o qual nem ligou, enquanto se aconchegava em Dove, e
tocava seu rosto, analisando-a.
— Um apelido à altura dele. — ela declarou e então me encarou
Senti meu rosto queimar, enquanto ouvia barulhos do lado de fora do quarto.
— Provavelmente Henrique, já que Jeon não vai ficar, mas ele disse que ainda viria
visitar o mais novo Kang — assenti, sentindo um pouco de vergonha em meu âmago.
Eu tinha perseguido tantos Kang, por tantos anos, porque era o melhor acordo de
casamento que eu poderia ter, e que seria benéfico para minha família. Usei de tudo o que podia,
desde a minha beleza até a minha inteligência, mas não tinha sido o bastante. E então, eu
carregava a culpa por ter tentado tanto, ser alguém que conseguiria prender algum deles, e quem
sabe, fazer um acordo bom para os Hansen.
Se eu soubesse, que no futuro, estaria com meu filho no colo de Dove Kang, dizendo
que ele era o mais novo Kang, jamais acreditaria. Ainda mais, pelo fato de que eu ainda não
entendia absolutamente nada, da relação deles com Henrique.

HENRIQUE

— Ele é adorável, diferente do pai.


— Noona...
— Eu só tinha que vir aqui e sondar como estavam as coisas, enfim, para motivos que
não vêm totalmente ao caso, não agora, mas... É claro que Freya não tem ideia do porquê os
Kang estão envolvidos, ou seja, ela não sabe da sua relação conosco.
— Não é algo que eu poderia admitir assim, do nada, Noona — admiti. — Como posso
confiar em alguém que sumiu por todo esse tempo, com um filho meu?
— Olha, odeio o papel de terapeuta da família, mas como uma das mais velhas, sempre
me colocam nessa... — ela parecia realmente chateada. — Acha mesmo que ela sumiu por que
quis? Se sim, por que então ficou insistindo tanto para fazer parte dos Kang, se seu objetivo era
encontrá-la?
— Não é bem assim, eu...
— Se não consegue admitir para si mesmo, quem dirá para ela — falou simplesmente, e
bateu em meu ombro. — Seja bom para ela, Henrique. Ela não merece nada diferente disso.
— Você a conhece melhor do que eu, pelo que parece.
— Não acho que esse seja o caso, mas eu conheço quando uma mulher é obrigada a cair
e se subtrair para poder caber, e eu sei que ela merece mais do que isso. Mais do que lhe deram
por dois anos.
Então, ela simplesmente se afastou e foi até o carro estacionado perto da entrada
escondida para aquela praia. Suspirei fundo, e fiquei sem saber o que fazer. No fundo, talvez a
minha culpa tivesse uma razão.
E a razão era que assim como eu a busquei por dois anos, ela talvez quisesse ser
encontrada por mim, por todo aquele tempo.
CAPÍTULO 16

“Então eu me perdi, assim como todo o meu potencial


E minhas palavras atiram para matar quando estou brava

Eu me arrependo bastante disso” [20]

FREYA

— E você já está com sono de novo? — indaguei, tampando meu seio, e fechando a
blusa com uma das mãos, enquanto segurava Bjorn com a outra. — Como pode mal ter acordado
e já ter sono, deusinho?
Ele se agarrou ao meu colo, e não parecia disposto a sair, enquanto eu ria baixinho, e
sentia-o perto de mim, de uma maneira que era nossa, de todos os dias. O mais estranho era que
não parecia apenas mais um dia, a ansiedade me corroendo por dentro, sem saber o que estava
prestes a acontecer.
Existia algo prestes a acontecer?
Batidas de leve na porta, me fizeram virar o olhar da janela à minha frente, e então
Bjorn se mexeu sobre meu ombro, claramente curioso. Se existia uma pessoa que não deixava
nada passar sem fuxicar, era ele.
Encontrei Henrique próximo à porta, e um sorriso sem graça no rosto. Uma expressão
totalmente nova nele, que me fez ficar em dúvida, sobre o que tinha acontecido no último dia.
Porém, a questão era, quando eu não estava daquela maneira nos últimos acontecimentos?
— Vim ver se precisam de mim.
— Ma... ma...
Bjorn falou, de um jeito que entendia como se ele estivesse me chamando, e sorri para
ele. Tão pequeno, mas tão esperto, que eu ficava cada vez mais enrolada em como ele era uma
parte minha fora do peito.
— Ele já fala? — Henrique perguntou, adentrando o ambiente, e eu meneei a cabeça.
— Algumas sílabas, gritinhos... não sei se conta muito. — Sorri de lado. — Mas ele diz
“mama” e sempre é sobre algo que ele quer de mim.
Então eu o vi me encarar, os olhinhos escuros como os de Henrique, e claramente ele
queria algo.
— O que, deusinho?
— Ma-ma...
Sabia que era provavelmente pelo seu sono, mas não tinha entendido o que ele queria.
Levantei-me com ele, e então fiquei de frente com Henrique, que permaneceu parado, nos
encarando. Então, as mãozinhas de Bjorn foram na direção dele.
— Você quer o seu pai? — perguntei, e ele insistiu com as mãozinhas, que Henrique
prontamente atendeu.
Nossas mãos se tocando no processo, e eu segurei um suspiro que quase saiu.
— Ele está quase dormindo de novo — comentei. — Pode ser a mudança de fuso, que o
esteja deixando ainda sonolento, mesmo sendo de manhã aqui.
— Eu... — Henrique se calou de repente. — Vou tentar fazê-lo dormir, então.
Assenti, me vi me afastando, e indo até o berço de Bjorn, para organizá-lo.
— Você gosta de canções para dormir? — ele perguntou, e eu foquei no que fazia, para
não tentar adentrar aquele momento. — Tem uma que eu gosto bastante, mesmo não sendo de
dormir...
— Ma-ma...
Sorri, da forma como Bjorn parecia querer continuar falando com ele, como se
entendendo tudo.
— Vou te mostrar todas elas, quando ficar mais velho... Vamos cantar juntos, que tal?
O silêncio que veio como resposta, me dizia que Bjorn já deveria estar parando de lutar
contra o próprio sono. Terminei de dobrar a coberta dele, e a coloquei do lado, organizando os
travesseiros ao redor do berço, e me vi pensando: o que eu faria ali?
Quando Bjorn dormia, eu tentava dormir também. Era o que eu tinha para fazer nos
últimos anos. Ou melhor, tinha acesso aos livros que Hella me trazia, que ela mesma
recomendava, e que eram ótimos para viver outras vidas além da minha. E até mesmo, quando
parava para assistir alguma novela coreana, e via mocinhos que eram tão parecidos com
Henrique, que me faziam duvidar se eu não o tinha criado em minha mente.
Só sabia que não, porque o resultado do nosso passado estava ali, em seu colo.
Contudo, agora eu me indagava se ele era mesmo aquele, pelo qual me apaixonei. E que eu tanto
guardava próxima ao meu coração, durante todo aquele tempo.
— Ele dormiu.
Pisquei algumas vezes e me virei para ver Henrique claramente perdido, com o nosso
filho no colo.
— Por que não coloca ele aqui? — perguntei, e ele se aproximou com Bjorn nos braços
e o colocou com todo cuidado no berço que eu acabava de arrumar. — Bom deusinho.
Vi-me parada, e escorada contra as proteções do berço, enquanto olhava para o meu
filho, e sentia outro olhar preso a mim. Foi quando encontrei Henrique parado ali, só que em vez
de olhar para o nosso filho, ele olhava para mim.
— Posso ter um minuto?
Sua pergunta soou baixa, e eu assenti, afastando-me do berço, e o seguindo para fora do
quarto. Ele já estava com uma camiseta, talvez pela dica de Dove, mas parecia totalmente
desconfortável, conforme eu o esperava me seguir até a sala.
— Quero me desculpar por ter agido como se precisasse te atacar para me proteger. —
Sua fala me pegou totalmente desprevenida.
— Não sei o que Dove falou, mas não precisa...
— Ninguém me disse nada, eu só... Eu sei, lá no fundo, que não sumiria por dois anos
com o nosso filho, sem me contar... Por mais rápido que tenha sido, eu te conheço. — Engoli em
seco, sem saber o que dizer. — E por te conhecer antes, eu quero pedir perdão por ter ameaçado
sobre o nosso filho, por ter pedido para que me chamasse pelo sobrenome, por ter agido como se
fosse uma estranha para mim. Como se precisasse me proteger de você.
— Ninguém, nunca me pediu desculpas. — Fui honesta. — É tudo muito novo para
mim, Fontes.
— Henrique, por favor — pediu, e eu tentei reorganizar meus sentimentos. Um
vislumbre de quem eu me apaixonei, à minha frente. — Eu sinto muito por ter agido assim, como
um babaca e cretino.
— Estúpido também — complementei, sem poder evitar, e ele me encarou, um sorriso
triste no canto de sua boca. — O que mais me doeu, foi nem sequer me dar a chance da dúvida.
— E nem me permiti que você me desse isso — assumiu. — Eu realmente sinto muito,
Hansen. Eu...
— Freya, você sabe — corrigi-o, e seu olhar parou no meu. — Não tenho orgulho desse
sobrenome há dois anos.
— Quer conversar sobre isso?
— Posso só... só tomar o meu tempo?
— Claro que sim, e... — ele então deu dois passos à frente, chegando mais próximo. —
Sei que a gente terminou de um jeito que nunca declaramos um fim, mas não é porque não
somos mais os mesmos de dois anos atrás que eu não estou aqui para você. Eu sempre vou estar,
Freya. É a mãe do meu filho e... — vi-o desviar o olhar, e então um sorriso discreto no rosto. —
Saiba que pode contar comigo, para o que for.
— Até mesmo, para encontrar um pão francês? — perguntei, e ele assentiu de imediato,
sua expressão mudando. — Faz tempo que não como nada do Brasil, por isso...
— Eu vou na padaria que tem aqui perto e já volto e...
No segundo que o vi pegar o celular jogado sobre o sofá, e ficar pronto para sair dali, eu
travei. Minha mão indo direto para o seu braço e o segurando.
— Eu... — suspirei fundo. — Pode só não me deixar sozinha?
— Freya...
— Por favor.
Seu olhar parou no meu, e ele levou uma das mãos à minha que segurava o seu braço,
um sorriso mais ameno no rosto e claramente preocupado.
— Vou pedir para entregarem, tudo bem?
Assenti, minha respiração voltando aos poucos.
— Eu não sei o que houve, mas eu sei que não quero ser aquele que vai te machucar
ainda mais... Eu nunca quis isso, nem mesmo com as palavras que disse ontem — assumiu, e
então eu afastei meu toque do seu. — Vou ligar na padaria.
Ele mostrou o celular e vi-o discar algo e logo levou o aparelho à orelha.
Engoli em seco, sabendo que ele estava entrando em camadas minhas, que ninguém
tinha conseguido durante aquele tempo. Porém, como eu poderia evitar, se ele era a luz a que eu
tinha me apegado por todo aquele tempo, e felizmente, ela pareceu se acender novamente.
CAPÍTULO 17

“Eu juro que tinha algo, porque eu não lembro de quem eu era

Antes de você pintar todas as minhas noites de uma cor que eu procuro desde então” [21]

HENRIQUE

O silêncio da noite anterior que era totalmente constrangedor, agora também o era, só
que por outra razão. Enquanto eu calculava em minha mente, tudo o que poderia dizer ou
perguntar ou iniciar uma conversa, e Freya parecia presa no programa que passava na televisão.
Aquele sofá enorme na sala, de repente, sendo um arrependimento, porque a deixava na ponta
contrária de mim, tão longe, que mesmo que pudesse deixá-la mais confortável, me fazia
indagar, se era o certo, para nós.
— Minha irmã mais velha adora isso — falei de repente, quando o programa
recomeçou. — Ela foi a Seoul no último ano, e acabou vendo vários grupos femininos e
masculinos de kpop.
— Dove?
— Não — respondi, lembrando-me de Val. — Somos em quatro, os Fontes. Gael é o
mais velho, depois vem Valéria, aí venho eu, e no final, entra Paola.
— Valéria foi a que foi à Coreia do Sul?
— Nossa descendência é de lá, como já deve ter notado, e... aos poucos, estamos
retomando o que nos foi tirado das origens de minha mãe.
— Eu também não conheci minha mãe — ela falou de repente, como se pudesse ler nas
entrelinhas, o que eu declarava. — A dor na sua fala, me lembrou da minha.
— Sinto muito.
Acabamos falando juntos e nossos olhares se encontraram.
— Eu jurava que era uma pessoa normal, quando te conheci, naquela noite — falou de
repente, e desviou o olhar. — Por mais que eu quisesse acreditar que um dia te reencontraria,
saber que era só um cara comum, era como uma declaração de que não seria possível.
— Só tenho parentes diferentes, se é isso que pode considerar — comentei, suspirando
fundo. — Eu não sabia o que os Hansen eram, quando me disse o seu sobrenome. Só fui saber,
quando pedi para que minha cunhada procurasse sobre você.
— Sua cunhada é uma Kang?
— Que não faz parte da máfia, mas sim... Ela é.
— Os Kang são tão diferentes dos Hansen nisso — admitiu de repente, e era como se
estivéssemos sentados, à beira da praia novamente, e apenas conversando sobre tudo, e às vezes,
sobre nada. Como se dois anos não tivessem se passado. — Os Kang têm escolha, o que não é o
nosso caso.
— É tão ruim assim?
— Eu não pensava assim, até que a realidade bateu na minha porta com um teste de
gravidez positivo — admitiu, suspirando fundo. — Acho que é a primeira vez em anos, que
comecei a tentar me curar disso, por ter saído daquele lugar... Eu... eu estou tentando, mas sabe
quando dói demais por vir daqueles que você mais ama e mais confiou?
— Um doador de esperma agressivo me ensinou isso da pior maneira, na verdade, da
pior para toda minha família — assumi. — Eu sou só o CEO suplente da empresa da família até
que meu irmão voltou, mas a verdade é que minha família esteve quebrada por muito tempo.
Ainda estamos todos, nos curando.
— O pior de tudo é querer acreditar que existe um motivo por trás de tudo isso, mas...
mas já aconteceu pior, com a minha irmã mais velha.
— Eu pensei que era a única Hansen.
— Hella, o nome dela — comentei por cima. — Ela nasceu logo depois de Odin, que é
o mais velho, mas foi condenada à morte pela família, por ser uma filha bastarda.
— O que...
— Não há escolhas para os Hansen — ela então voltou ao que tinha dito. — Por isso eu
tentei sair... Por isso eu dei um nome comum para o nosso filho... Por isso eu estou melhor aqui.
— O que quer dizer, Freya?
— Eu não quero que Bjorn seja um mafioso. — Olhou-me profundamente. — Eu quero
que ele tenha uma vida de escolhas, e não de imposições.
— Ele vai ter... — olhei-a profundamente. — E você também.
— Eu já sou condenada a isso, mas... mas me prometa que vai fazer o impossível para
que ele consiga, nem que seja preciso que eu fique longe, para que aconteça.
— Freya...
— Me prometa, Henrique.
— Nós vamos fazer isso acontecer, é uma promessa.
Olhei-a, sem lhe dar chance para tentar me fazer jurar de forma diferente, e seu olhar
sustentou o meu.
— Vamos fazer.
Ela então se abraçou, como se encolhendo em si, e era um lado seu que eu desconhecia
por completo. Tirando a venda da minha raiva, eu conseguia perceber o quanto ela parecia se
esconder, em pequenos movimentos, diferente do próprio vendaval que ela passou sobre mim,
quando nos conhecemos.
Eles a tinham quebrado.
Eu não sabia como, mas naquele instante, eu jurei outra coisa – que eles iriam pagar por
aquilo, e que nunca mais, os permitiria fazer novamente.

FREYA

— É estranho ter alguém com quem ele pode ficar, enquanto eu saio... — assumi de
repente. — É estranho sair, na verdade.
Henrique me encarou preocupado, e temi que pena fosse um sentimento envolvido em
toda aquela situação. A reviravolta de todos os acontecimentos, em poucas horas, ainda nos
deixando incertos um com o outro.
— Só preciso fazer essa ligação e...
— Pode ficar tranquila na praia, tome o seu tempo, o seu momento... Nós vamos te
observar daqui, e tem seguranças escondidos por todo lugar, então, está segura, Freya.
Eu queria mesmo acreditar naquilo, mas ainda assim, me deixava um pouco incerta.
— Dez minutos, ok?
— O quanto precisar — Henrique falou, enquanto Bjorn engatinhava à sua frente, e ele
sorria abertamente para o nosso filho. — Vou treinando com o seu deusinho.
— Nosso... — corrigi-o. — Bjorn é o nosso deusinho.
— Obrigado por isso.
Ele pareceu realmente feliz, e então me deu um leve aceno com a cabeça, voltando a
atenção para nosso filho. Saí da casa, e desci as escadas, já chegando na areia.
Encarei as iniciais no telefone HH. Só poderia ser Hella Hansen, ninguém mais.
Suspirei fundo, e cliquei em chamar, enquanto me afastava em direção às pedras, e pensava em
onde ela poderia estar.
— Como está a minha irmã favorita? — ela perguntou do outro lado da linha, e ouvia o
barulho de mar ao fundo, como se ondas batendo contra algo.
— Sou sua única irmã — rebati. — Desculpe o sumiço, eu...
— Eu sei, os Kang, Henrique Fontes... — fiquei sem saber o que dizer. — Eu sabia que
eles viriam, e bom, deixei uma oportunidade aberta para o fazerem.
— Como...
— Bom, que distração melhor do que a volta da filha morta dos Hansen, para que a
filha presa fosse libertada?
— Hella... O que...
— Apareci para Odin, e fiz o caos se instaurar. — Ela riu alto do outro lado da linha. —
Para ele descobrir que o caos verdadeiro era outro.
— Hella, não...
— Eu ia voltar, uma hora ou outra, e nada melhor do que no meio de uma quase
declaração de guerra dos Hansen, que precisavam que todos os quatro mais velhos
concordassem, e bom, eu não concordei.
— E agora? Onde está? Como está?
— Eu apareci, fodi com os planos de Odin, e agora estou nadando, no mar da antiga
casa.
— Eu nem sei o que dizer, irmã — confessei.
— Pode começar me dizendo por que eu não sabia que esse tal Henrique é um baita de
um gostoso? — senti meu rosto pegar fogo com sua pergunta. — Juro, eu recebi fotos dele, de
hoje cedo, e... Alto, grande, musculoso, todo tatuado, os cabelos longos... Como eu não sabia
disso?
— Eu acho que não tinha por que falar sobre ele ser um...
— Um grande gostoso, irmã. — Ela riu do outro lado da linha. — Aliás, antes que
pergunte, estamos em paz, a não ser, o inferno que deve estar a cabeça de Odin.
— Eles não vão... Eles vão vir até mim?
— Só se você permitir, e ele sabem disso agora. — Poderia imaginar o sorriso em seu
rosto. — Os Kang deram os limites que eles estavam precisando há muito tempo.
— Fico feliz, agora, por sermos a segunda máfia mais poderosa.
— E que tá com um gostoso da máfia mais poderosa, né?
— Hella, não... não estou com ele — assumi, e ela riu alto do outro lado da linha.
— A questão é “até quando não vai estar”?
— Nós dois só somos os pais de Bjorn, e isso é o suficiente para mim — assumi,
tentando me agarrar àquelas palavras. — Já fomos do ódio a uma trégua em poucas horas, não
tem como funcionar.
— Bom, eu torço para que seja meu cunhado, mas... fico feliz que você esteja livre
novamente. É o que realmente me importa, Freya.
— Obrigada por me ajudar, e por... por tudo, irmã.
— Bom, ainda vou ter que cobrar, um dia. — Eu ri de lado. — Somos maiores que eles,
Freya, por isso eles nos matam ou nos prendem. Somos mais fortes do que cada um deles, desde
Ymir.
Eu sabia daquilo.
Eu começava a enxergar de fato, ao saber o que Hella tinha feito e como aquilo havia
me impactado.
— Eu vou vê-los e vou foder com a cabeça deles também, Hella. —falei, deixando a
mágoa e a raiva para fora. — É uma promessa.
— Aí está a Freya que eu não via mais... Bem-vinda de volta, deusa da magia.
Eu sorri sozinha, enquanto a ouvi gritar com alguma onda, e o barulho de água do outro
lado da linha. Ela sempre desaparecia do nada, assim como aparecia. E de repente, eu sentia que
estava começando a aparecer novamente, um lado meu, que pareceu ter morrido junto com as
minhas esperanças – o lado de que eu era uma Hansen também.
Eu tinha poder, assim como cada um deles. E estava na hora de tomar o que tinham me
tirado.
CAPÍTULO 18

“Maravilhoso, você é tipo uma mansão com vista

As garotas de onde você mora te tocam como eu toco?” [22]

HENRIQUE
— Eu fui muito duro com a sua mãe, não é? — perguntei para o meu filho, que
engatinhava em minha direção, um sorriso no rosto e fazendo barulhos, repetindo mil vezes “ma-
ma”. — Eu acho que... Que talvez só queria um motivo para não gostar dela, porque ia doer
demais, saber que ela te tirou de mim. Que ela quis ir.
— Ma-ma...
Ele então terminou de engatinhar até mim, e se jogou em meu corpo, fazendo-me rir, e
o abraçar com força. Assim que o virei novamente no chão acolchoado, ele pareceu começar a
querer se colocar para engatinhar, mas de repente, firmou os pés, e simplesmente, começou a
ficar totalmente de pé.
Paralisei. Meus olhos arregalados. Minha respiração cessou. Eu não sabia o que fazer,
enquanto meu filho poderia estar prestes a dar o primeiro passo.
Olhei de relance para a praia, em busca de Freya, em algum canto de toda a vista que
tínhamos ali, porém, nenhum sinal dela. Bjorn parecia testar aos poucos, ainda em pé, sem
realmente dar o primeiro passo.
— Deusinho... — falei, em português, e mesmo não sabendo quais línguas a mãe falava
com ele, aquela parecia ser constante porque o olhar dele parou no meu.
Ele quase se desequilibrou, mas rapidamente se colocou novamente de pé.
O meu coração quase saindo pela boca.
— Espera desse jeito, a mamãe chegar e... — eu mal sabia o que dizer. — Quer dizer,
eu nem sei se você já deu o primeiro passo. — Acabei refletindo comigo mesmo, e soltei o ar
com força, uma leve tristeza me atingindo.
Fosse aquele o primeiro passo dele ou não na vida, era o primeiro que eu estaria vendo.
Porém, e se Freya não tivesse visto também?
— Meu Deus!
A voz dela surgiu logo atrás de mim, e Bjorn foi se virando por completo, ainda de pé.
Ele estava a poucos passos, até mesmo dele, de mim, mas o fato de ele simplesmente se virar de
pé, perfeitamente, sem sair, me deixou perplexo.
— Ele... — olhei-a levemente, caminhou devagar e se sentou ao meu lado, como se tão
surpresa quanto eu. — Ele nunca deu qualquer passinho?
— Não, nem ficou de pé assim, sozinho — ela falou, olhando-me e um sorriso
maravilhado no rosto. — Por que não vem até o seu papai, hein?
Bjorn levou uma das mãozinhas à outra, como se fosse bater uma palma, e eu não tinha
ideia de nada. Só percebi que estava nervoso, e quase suando, ao ver o meu filho de pouco mais
de um ano, prestes a dar o primeiro passinho dele.
— Eu vou gravar isso, como fiz quando ele engatinhou. — Freya sussurrou, e sorria
abertamente para ele. O celular agora à sua frente. — Por que não vem até a gente?
— Ma-ma... — ele falou, olhando para ela, que mandou um beijo, sorrindo e gravando-
o. E então, ele me encarou, os olhinhos idênticos aos meus, fazendo-me quase procurar algo para
me segurar, porque mesmo sentado, era como se eu fosse ter um treco a qualquer momento. —
Ma-Ma...
Então ele veio em minha direção, como se desse um impulso e os bracinhos abertos.
Antes que desse o último passo para me alcançar, acabou se desequilibrando, caindo sentado, e
um choro se espalhou por todo ambiente.
— Tá tudo bem, filho — falei, enquanto ele parecia determinado a chorar ainda mais
alto. — Vem cá. — Eu o trouxe para o meu colo, e tentei acalmá-lo. — Você deu os seus
primeiros passinhos e só caiu no último, não tem por que chorar. Foi incrível!
Ele ainda fungava em meu peito, e eu o balançava como conseguia, sentado no chão.
Foi quando notei, que Freya ainda nos filmava, conforme tudo acontecia, e percebi uma lágrima
descendo por seu rosto. Ela então parou, deixando o celular de lado e me encarou.
— Ele chorava quando não conseguia engatinhar direito também — falou, e seu olhar
estava longe, como se presa naquele momento. — E quando disse a primeira sílaba dele, fui eu
quem chorou — explicou, um sorriso no canto da boca, e mais lágrimas descendo por seu rosto.
Nesse momento, nosso filho se acalmava em meu peito.
— Eu queria ter gravado tudo, mas só conseguia quando tinha o celular da minha irmã,
por isso, algumas coisas, acabei não podendo registrar, e não vou poder te mostrar — falou, a sua
mão indo direto para o medalhão que eu só agora notava, que estava pendurado em seu pescoço.
— Você pode me contar — falei, enquanto Bjorn simplesmente decidia parar de chorar,
e querer se soltar de mim, para voltar para o chão. — Ele é sempre tão... decidido?
— Acho que puxou a mim e a você nisso — ela assentiu, sorrindo, as lágrimas
cessando. — Não tem como pará-lo quando quer algo. — Soltou o ar com força, e seu olhar
verde se voltou para o meu. — Você não parou até nos encontrar, não foi?
— Eu não acho que seja o momento para eu te dizer a verdade sobre isso... — confessei
com cautela. — Mas eu só soube há pouco tempo sobre Bjorn, e estava atrás de você desde
quando desapareceu, Freya.
— Meus irmãos se negaram a me deixar livre, se eu não dissesse quem era o pai do meu
filho... — falou de repente, seu olhar fugindo do meu. — Eu queria te proteger, e proteger a
Bjorn. Fui trancada assim que contei sobre a gravidez, e desde aquele dia, eu... eu só pensava em
como seria, quando fugisse.
— Por que eles fariam isso?
— Porque você é uma pessoa comum, que não tem ligação com a máfia, ao menos, arte
onde eu sabia, e... E bom, as ligações nos Hansen sempre foram baseadas no mesmo sangue,
sangue escandinavo e nada além. Só se misturaria se fosse alguém de uma máfia tão forte quanto
os Kang.
— Isso é tão ridículo — falei honesto, e ela deu de ombros.
— Era o certo na minha cabeça também, até que eu descobri que existia mais do que
um contrato de casamento para se viver, ou para agradar a sua família. Eu poderia amar alguém e
ser feliz com essa pessoa, mas por isso, a minha família me odiou. — Ela parecia respirar fundo,
como se precisasse de forças para dizer aquilo. — Quando Bjorn nasceu, e ele já tinha os seus
traços, era claro que ele possuía uma descendência coreana... Eu quase fui morta, quando
pequena, por duvidarem do fato de eu ser uma legítima Hansen, filha de Ymir e Frigga Hansen, e
minha mãe morreu no parto, então não tinha quem me defendesse. Não pensei que um dia olharia
para meus irmãos com o medo que eu olhava para o nosso pai, mas... Então eles me prenderam
com Bjorn, no castelo que era o meu favorito na infância, e eu sei que nos tornamos um segredo
que eles não deixariam vazar.
Ela estava quase sem fôlego quando terminou de falar, e por puro instinto, levei minha
mão à dela, como se esperando que ela a aceitasse, e ela o fez. Apertou com força a minha, como
se precisasse daquele contato, e eu sabia que não era o bastante para o que ela deveria ter vivido.
— Eu não sei no que acreditar, sabe? — Ela suspirou fundo. — Meus irmãos nunca
foram os mais carinhosos, mas eles sempre me protegeram. Eles o fizeram do nosso próprio pai,
antes de Ymir falecer. Sei que sou a primeira na família a se apaixonar, engravidar e ter um filho.
E claro, a única mulher e mais nova, mas... Por que renegariam meu filho? Bjorn é... É tudo para
mim. Não deveria ser para eles também?
— Eu sinto muito, Freya — falei, e levei minha outra mão à sua. — Sinto muito por
estar presa em dúvidas que só te machucam, das pessoas que mais ama. Eu... eu posso tentar
falar com eles. Tenho como fazer isso agora.
— Não quero que eles te aceitem, ou aceitem o nosso filho só porque agora sabem da
sua ligação com os Kang. — Sua voz soou fria e certeira. — Eu vou me encontrar com eles, até o
final dessa semana. Eu vou impor limites, que eu agora posso fazer. Tenho uma dívida eterna
com você e com os Kang, por me ajudarem a sair daquele lugar com Bjorn, antes do que eu
previa. Muito antes mesmo, e sem uma guerra. Eu vou fazer todo o esforço que os Kang
colocaram nisso, valer a pena.
— Eles, eu não sei, mas eu... eu só quero que seja feliz, Freya. — Olhei-a com pesar. —
Não se sinta presa a mim, por nada, a não ser por eu querer ver o seu brilho de volta.
Ela abriu um leve sorriso, e apertou a minha mão com a sua, que estava presa entre as
minhas.
— Eu prefiro estar presa a você, para ser honesta.
Fiquei sem saber o que dizer, a razão se esvaindo de minha mente, e seu olhar lendo-me
por completo. Se em algum momento, eu pensei que estava preparado para reencontrá-la, e saber
o que ela sentia, naquele, eu tinha certeza: não estava.
CAPÍTULO 19

“Espere pelo sinal e te encontrarei depois que escurecer

Me mostre os lugares onde os outros te deixaram com cicatrizes” [23]

FREYA
Poder colocar um pouco de tudo que me atingia, para fora, era algo que me fez
conseguir voltar a respirar fundo novamente. Não sabia que precisava tanto falar com alguém
sobre aquele peso em meu peito, até que o fiz, e me senti muito mais leve. Porém, não era a
solução para qualquer dor que eu carregava.
— Para você. — Um copo de suco de morango foi colocado à minha frente, e eu
assenti, enquanto Henrique se sentava na cadeira ao meu lado, com nosso filho junto a si,
praticamente agarrado nele. — Por favor, não cresça rápido como os meus sobrinhos, tá?
— Até ontem, ele era só um pacotinho no meu braço e agora, já está andando... — falei,
pegando o copo de suco em mãos. — Parece que foi ontem que descobri sobre a gravidez, e...
Agora ele já é um deusinho todo determinado.
— Aliás, por que deusinho e não ursinho? — ele perguntou, enquanto tomava sua
cerveja, e distraía Bjorn com um copo de água. — Fui pesquisar mais sobre o nome dele, e
ursinho cairia perfeitamente.
— Acho que eu nem pensei antes de dar o apelido, só aconteceu — confessei.
— Como disse que isso nunca aconteceu na sua família, devo te informar em primeira
mão que essa cafonice existe em todo lugar, desde a minha irmã que é brasileira, até os Kang que
são mafiosos e sul-coreanos. — Olhei-o curiosa. — Minha irmã mais velha chama os filhos de
“coisinha”, e isso acabou pegando, porque até eu chamo as crianças assim — contou e eu
arregalei os olhos.
— Pensei que eu fosse apenas romântica demais pelas novelas que vejo e por isso
acabei dando um apelido sem pensar. — Sorri de lado, feliz em saber daquilo. — Parece ligado a
eles, muito.
— Sou a babá oficial — comentou, ajudando nosso filho terminar de tomar água. — De
CEO da Distribuidora da minha família, os Fontes, para babá oficial dos meus irmãos. — Ele
parecia apenas feliz com aquilo. — Para ser sincero, eu odiei o tanto que lutei para estar à frente
de uma empresa que apenas separou a minha família por anos, e então, quando Gael retomou
tudo, eu só quis sumir.
— E encontrou nas crianças algo que te fez feliz? — perguntei interessada.
— Acho que isso eu já tinha te contado, quando ficamos bêbados, perto da praia em que
nos conhecemos. — Olhei-o sem entender. — Sobre o que ser um Fontes significava e eu
odiava:
Minha memória era boa, mas quando se tratava dele, eu me lembrava de cada pequeno
detalhe.
— “Homens Fontes compravam suas esposas. Mulheres Fontes eram vendidas como
esposas.”
Recitei o que ele tinha me dito, totalmente bêbado, ao passo que me dizia que não
queria comprar ninguém, mas que me compraria se fosse necessário. Aquela segunda parte, eu
apenas tentava não focar, porque era de um cenário totalmente diferente do atual.
— Exato — falou, e bebeu mais um pouco da cerveja. — Felizmente não somos mais
assim, e bom, nos livramos desse fardo.
— Seria bom, conseguir livrar Bjorn do fardo dos Hansen — assumi, suspirando fundo,
e encarando os dois, juntinhos, enquanto meu filho aceitava mais água do copinho colorido que o
pai tinha comprado, e mais interessado em brincar com aquilo do que qualquer outra coisa. —
Não sei muito sobre, mas sei que Hari Kang fez isso — falei, lembrando-me do meu irmão mais
velho, que tinha uma ligação forte com ela. — Ela saiu da máfia, e pelos boatos que correram
pelo corredor da minha família, ela teve um filho e não vai criá-lo na máfia.
— Ele é a gotinha dela, na verdade, ela agora tem duas gotinhas — Henrique falou, e o
encarei com atenção. — Tô falando, a cafonice é algo que toda mãe e pai deve ter, acho que
reprograma automaticamente quando se torna um.
— Sabe sobre a relação dela com Baldur? — perguntei, querendo ao menos, saber o
mínimo sobre quem poderia estar mais perto. — Ele é quem mais vem ao Brasil, sei que eram
amigos, mas depois que ela saiu da máfia, eu não ouvi mais nada sobre, a não ser sobre a
gravidez.
— Seus irmãos nunca te contam nada? — indagou, entregando o copo para Bjorn que já
tinha tomado por completo, e agora admirava os desenhos Assenti e neguei, ao mesmo tempo. —
Parecem os meus... — suspirou fundo, como se pensando sobre isso. — Não sou um Kang, por
mais que seja protegido como um, mas sei que nesse tempo, procurando sobre você, Baldur foi o
membro dos Hansen que conseguiram mais informações, por ser... por ser o padrinho do filho
primogênito de Hari Kang.
Fiquei estática por alguns segundos.
— Ele é... padrinho?
— Desculpe, eu acho que...
— Não precisa se desculpar por meus irmãos claramente se preocuparem mais com
qualquer pessoa, menos comigo e Bjorn. — Soltei o ar com força. — Eu era a princesinha da
família, sabe? Mimada por todos eles, mesmo os que não são tão carinhosos e gostam de
proximidade. Para descobrir que só fui isso, enquanto fui útil.
— Freya...
— É dolorido, mas vai passar... Vai ter que passar, uma hora ou outra. — Soltei o ar
com força. — Preciso só encará-los, cada um deles, e então... Então vou ser livre disso.
— Bom, eu estou aqui para te apoiar — falou, e o encarei. — Sei que não foi um bom
recomeço, quando te acusei, mas...
— O que, Fontes? — provoquei.
— Eu... eu...
Vê-lo gaguejar e no segundo seguinte suas orelhas ficarem vermelhas, me fizeram ter
que segurar um sorriso arrogante. Ver um homem daquele tamanho, não, ver o homem daquele
tamanho que um dia foi meu, reagir de tal forma, era como massagear o ego que eu pensei ter
perdido.
— Estou brincando — esclareci, com um sorriso. — Queria que as coisas fossem
simples, como a gente fez, de entender que os dois estão machucados, que cada um vai levar seu
tempo, mas que estamos nessa, pelo nosso filho.
— Estou aqui para você também — falou, e foi minha vez de ficar totalmente sem
graça. — Essa casa, esse lugar, tudo aqui, também é seu, Freya.
— Poderia me negar e dizer que vou procurar um lugar para Bjorn e eu, mas estou
quebrada no momento — confessei, e era bom ter o meu bom humor de volta, pelo menos,
quando estava com ele. — Vai ter que me aguentar aqui, até que eu consiga, pelo menos, a parte
do dinheiro que é meu por dinheiro nos Hansen.
— Tenho dinheiro para o resto das nossas vidas — ele falou, pegando-me de surpresa.
— Não posso pagar por um castelo, mas posso proporcionar uma vida boa para vocês. É o que eu
realmente quero fazer, Freya.
— Obrigada por isso — assumi, e foi minha vez de levar a mão sobre a mesa, como se
pedindo pela dele. Ele levou a dele, e apertou, como se cumprindo aquilo. Um toque, mas que
era o suficiente, para o que nós dois sempre soubemos – de que éramos inevitáveis. — Mas ainda
vou, pelo menos, arrancar o dinheiro que é meu.
— Freya...
— Tiraram dois anos da minha liberdade, e da liberdade de Bjorn... — neguei com a
cabeça, sentindo a mão de Henrique massagear a minha. — Eu não tenho o porquê apenas acenar
com a cabeça e aceitar, eu só quero o que é meu, e não os ver nunca mais.
Me doía dizer aquilo em voz alta, porque era o que mais me corroía por dentro.
Contudo, para as pessoas que me negavam a verdade por trás de suas razões, e que deveriam ser
aqueles que mais me amavam, eu não tinha mais forças para lutar contra a minha própria dor. Eu
só queria extingui-la.
HENRIQUE
Ela saiu, claramente para se recompor, e era clara sua dor em cada palavra que saía. Me
doía vê-la de tal maneira e não poder fazer nada para melhorar. De uma família que conheceu a
dor, desde muito novos, eu sabia, pelo menos, em partes, como ela se sentia. De não ter ideia do
que acontecia com os mais velhos ou o que eles de fato queriam. Se eles me odiavam, ou iriam
voltar. Porém, eu tive Paola por todo aquele tempo, como alguém que eu podia contar. E nada se
comparava a realidade que ela vivia.
O meu mundo era totalmente normal perto do dela.
— É, filho, vamos ter que cuidar da sua mamãe — falei para Bjorn, levantando-me com
ele, que ainda parecia encantado com o copinho colorido. Sem saber ele, que aquele fui um dos
que mais gostei, quando fui na loja procurar e pedir por tudo de bebês. — Certo, deusinho? Vai
me ajudar?
— Pa-pa...
Paralisei no passo, assim que as sílabas saíram de sua boca.
— Pa-pa...
Arregalei os olhos e girei com ele em meu colo, sem pensar muito, correndo até o
lavabo que Freya tinha entrado e batido na porta.
— Freya, Freya! — gritei animado, e rindo alto. — Freya! — Encontrei-a abrindo a
porta e me encarando assustada, olhando-me como se estivesse louco e sem cor. — Ele disse
“pa-pa”, ele...
Então a expressão dela normalizou e um sorriso se abriu em seu rosto.
— Pelo jeito, o meu deusinho é o garotinho do papai, hein?
— Pa-pa!
Ele repetia e eu girei com ele novamente no colo, rindo animado.
Nosso filho riu em meu colo, e assim que parei, pediu pelo dela, que o aceitou de
imediato. E foi quando percebi, que eu apenas esqueci tudo por um momento. Esqueci que nós
não éramos apenas nós, como antes. Que nós parecíamos estar recomeçando, mesmo que
nenhum tivesse dado um nome ao que acontecia.
Contudo, quando estávamos nós três, apenas ali, em nosso mundo, nada parecia capaz
de nos machucar. Não mais. E eu me certificaria de que ninguém o faria.
CAPÍTULO 20

“Quanto mais você fala, menos eu sei


Aonde quer que você vagueie, eu te seguirei

Estou implorando para você pegar minha mão” [24]

HENRIQUE
— Pensei que apareceria, hyung.
— Iremos, assim que Paola voltar a falar comigo — Vincenzo falou do outro lado da
linha e fiquei perplexo. — Ela não sabe sobre o que realmente aconteceu, mas está te
acobertando para os seus irmãos mais velhos, e bom, eu sei. Mas não é minha história para
contar.
— Obrigado e... desculpe por causar isso, hyung.
— Te conheço bem o suficiente para saber que está rindo da minha cara agora,
Henrique.
Pior era que eu estava. Um sorriso no meu rosto que eu não sabia como medir e muito
menos evitar.
— Desculpe, eu acho.
— Apenas espero o sinal seu ou de Freya, para que seus irmãos possam te encontrar.
— Acho que ela vai querer encontrar os Hansen primeiro — assumi. — Pode me dizer
se eles conseguem chegar até ela, mesmo vocês nos escondendo aqui?
— Não é impossível, mas só vai acontecer quando ela concordar que isso vaze —
assegurou. — Enquanto isso, tomem seu tempo.
— Não pode ser ruim para os Kang, estarem escondendo-a dessa forma, sendo que
Bjorn é parte deles... — suspirei fundo, com medo de sua resposta.
— Bom ou ruim, eles quem o tiraram de você primeiro — acusou. — Eles não podem
reclamar de nada, na verdade, deveriam agradecer por não serem condenados pelas nossas leis.
— Nesse momento, eu já sou realmente da máfia?
— Você é um Kang, isso é o que importa, não estar na máfia — falou simplesmente,
sem me dar chance de reclamar. — Precisam de algo?
— Está falando com ele... Eu sabia!
Ouvi a voz de minha irmã no fundo, e eu engoli em seco.
— Apenas avisem, quando quiserem.
Ele desfez a ligação e eu sabia que pelo menos, agora minha irmã mais nova, que era
sua esposa, voltava a falar com ele.
— Sabe, eu sempre gostei dos Kang.
Dei um pulo no lugar, quase caindo para trás na areia, e me virei para encontrar uma
mulher de cabelos escuros, e olhos verdes. Olhos que eu poderia reconhecer em qualquer lugar,
porque eram idênticos aos de Freya. Porém, quem era aquela Hansen à minha frente?
— Minha irmã tem um gosto bom. — Olhou-me de cima a baixo, os cabelos
balançando com o vento, e ela era tão baixa, que não entendia como ela conseguia me deixar
estático com o seu olhar. Algum poder inato nela, que eu já tinha visto antes, só que menos, em
Dove Kang.
— Hella Hansen? — indaguei perplexo, lembrando-me do que Freya tinha dito. — Mas
você... você não... não está morta?
— Acho que cheguei antes de Freya falar totalmente sobre mim, mas fico feliz que ela
falou um pouco — comentou, seus olhos presos aos meus. — Só vim para uma visita, como fiz
por todos esses anos, e vou relatar algumas falhas na segurança, pelo mar, que encontrei, ao vir
para cá. — Apontou para o mar, e percebi que escolhia bem as palavras a dizer, como se
acostumando com o inglês.
Até aquele momento, eu sabia pelo nosso passado que Freya era poliglota. Sua língua
materna era o dinamarquês, mas eu raramente a via o usando.
— Obrigado, eu acho. — Arrisquei o pouco que eu saiba do dinamarquês, e a mulher à
minha frente não sorriu, mas pareceu admirada.
— Sabia que deveria ser apaixonado por ela, mas aprender a língua materna da
família... algo que me surpreendeu, cunhado.
— Eu não... Quer dizer, senhora Hansen.
— Assim me ofende. — Negou com a mão. — Hella, apenas.
— Hella, eu...
— O que faz aqui?
A pergunta veio de longe, e eu sorri no momento em que vi o brilho que tomou conta de
Freya, enquanto ela caminhava até nós com Bjorn no colo.
— Resolvi fazer a minha visitinha de sempre, que estava perdendo...
— Bjorn deu os primeiros passos — Freya falou e a mulher de cabelos escuros pareceu
incrédula, e sua expressão era totalmente diferente da que usava comigo. — Eu gravei, vou te
mostrar...
— A que ponto chegamos? De eu não ser a que tem os vídeos dele... — reclamou,
batendo no ombro livre de Freya, e Bjorn já pedia o colo dela. — Sentiu minha falta, né, meu
deusinho favorito?
Elas falavam em inglês, felizmente, para o bom entendedor que eu era, da língua.
Pensando bem sobre as aulas que eu tive das línguas escandinavas, parecendo nulas, pelo medo
que eu sentia de elas falarem em qualquer uma delas.
Foi quando eu ouvi um barulho diferente no mar.
Levantei o olhar e encarei o mesmo, um tanto perplexo, ao ver um barco de
aproximando. Era um lugar privado, que apenas quem conhecia a região, conseguia acessar,
contudo, ali estava, o que parecia um grande iate se aproximando.
— Eu percebi falhas na segurança, enquanto vinha para cá... — Hella falou, segurando
meu filho com uma das mãos, e buscando algo na cintura com a outra. — O brasão H bem no
teto, tão ridículo que eu acho que mamãe os faria tirar na unha.
— Mas... — fui discar o contato de Vincenzo, e então uma mão segurou a minha, e
olhos verdes me encararam. — Ele disse que estava tudo seguro que só liberaria se algum de nós
dissesse ok, e...
— Eu disse — Freya confessou, encarando-me. — Mandei uma mensagem, para o
número que me deixaram de Vincenzo Kang, e pensei que demoraria mais para aparecerem,
mas...
— Por isso eu passei tão fácil pela máfia mais fodi... — Hella se calou, e olhou com
carinho para Bjorn. — Desculpe, deusinho.
— Pode confiar em mim? — Freya perguntou de repente, enquanto eu via o iate atracar
perto de algumas pedras, e suas mãos nas minhas.
— Sempre, Freya.
Ela me deu um sorriso de lado.
— Leve Bjorn para dentro e fique lá, até que eu entre novamente.
— Mas...
— Por favor, é algo que eu preciso resolver — insistiu. — Já fez muito, ao me tirar
daquele lugar, e arriscar tudo por nós... Confie em mim, sim?
Vi-me sem pensar duas vezes, a puxando para os meus braços, e dando um leve beijo
em sua testa, olhando-a por alguns segundos, querendo me negar a deixá-la. Porém, eu via no seu
olhar, que era o que ela precisava.
Afastei-me a contragosto e fui até Hella, que tinha Bjorn brincando com seus cabelos
presos em tranças, e o chamei.
— Vamos brincar, deusinho? — perguntei, e ele veio de bom grado, o que me doeu
ainda mais.
Não pude evitar andar de costas até a entrada da escada de casa, afastando-me de onde
as ondas batiam contra a areia. E então vi quatro homens descendo do iate, andando pelo mar
para chegar até a areia, já que com certeza não conseguiriam atracar tão perto.
— Pa-pa...
Olhei para o meu filho e entrei em casa, nos colocando rapidamente na sala, de frente
para as paredes de vidro, e imaginando o que estaria acontecendo por trás delas. Bjorn caminhou
até elas, nos seus passos ainda um pouco tortos, mas que eram mais firmes, e tocou o vidro com
as mãos, como se curioso como eu.
— Vamos confiar nela — falei, mais para mim do que para ele. — Ela precisa disso.
CAPÍTULO 21

“Aquela velha e familiar dor corporal


Os estalos das mesmas pequenas rupturas na sua alma
Você sabe

Quando é hora de ir” [25]

FREYA
Eu conhecia os passos que vinham em minha direção.
Senti a mão de Hella em meu ombro. Olhei-a, e notei que ela tinha uma expressão séria
e vazia, que eu desconhecia. Talvez fosse a que ela usava para com nossos irmãos. Eu ainda não
entendia nada da sua história, não profundamente, mas a respeitava. A dor que ela ainda sentia.
Mesmo sendo incomparável com a dela. Agora, nós tínhamos uma à outra.
Então, quatro dos meus seis irmãos mais velhos pararam na areia à minha frente. Notei
a maneira como Odin apernas fez uma negativa com a cabeça, como se dando uma ordem.
— Onde estão os outros dois? — perguntei, sem mais enrolar.
— Vidar está há alguns metros daqui, escondido entre as pedras, como se estivesse se
preparando para matar alguém... E Baldur, deve estar vindo de outra maneira, já que é um dos
poucos com algum cérebro.
— Hella...
— Como vai, Odin? — ela perguntou, mal o encarando. — Acho que ganhou algo me
perseguindo, o caminho rápido até Freya. Parabéns por essa sorte!
— Sorte que os Kang deram, porque eu pedi para que permitissem que passassem... —
olhei para o meu irmão mais velho. — O que quer aqui, Odin?
— O que você faz aqui, Freya? — ele rebateu. — Eu disse que deveria ter nos dito
quem o pai de seu filho era.
— Ele tem nome — corrigi-o. — Bjorn, Bjorn Hansen Fontes, e podem detestar o
quanto quiserem, mas ele é meu e de Henrique, então tem direito dos dois lados.
— Ele é parte dos Kang, F — Tyr falou de repente, puxando minha atenção para ele. —
Por que não nos disse, seria tão mais...
— Fácil? — complementei, negando com a cabeça. — Fácil por que daí ele teria um
sobrenome à altura dos Hansen? — olhei-o com pesar. — Não estou aqui para falar com nenhum
de vocês, a não ser Odin. Já que sejamos claro, são todos peões dele, e não importa o que fale
para cada um de vocês, continuarão seguindo-o, então...
— F, por favor — Tyr insistiu e eu neguei com a cabeça.
— O que querem aqui? Ou melhor, o que quer aqui, Odin? — perguntei, olhando
apenas para ele.
— Te levar para casa, te deixar segura...
— Me deixar presa, quer dizer? — corrigi-o. — Não, eu tenho um lugar agora, uma
casa, um pai pra o meu filho... Porque eu voltaria para a vida que vocês me colocaram, sem
explicar nada, como sempre.
— Sabe que nunca faríamos nada assim, sem ter alguma razão. — Loki entrou na
conversa, e me neguei a encará-lo. — Se tivéssemos falado a verdade, desde o começo, essa
merda toda não...
— Loki.
Uma palavra de Odin, e o silêncio do irmão que um dia foi o mais próximo de mim.
— Pode me odiar o quanto quiser, Freya — Odin falou. — Mas não pode negar quem é,
e que não a proteja.
— Os Kang me protegem agora, e eles são mais poderosos do que vocês, por que se
preocupar? — rebati, e notei o rosto cansado dele, mesmo que disfarçasse como ninguém, as
suas expressões.
— Olha, terapia de família não é o meu forte, mas com certeza, aparecer do nada depois
de prendê-la por dois anos e pedir para que volte a ficar presa... honestamente, que merda de
irmãos vocês são?
— Eu sou um merda.
A voz veio de trás de mim, e então me virei para encontrar Baldur, caminhando até nós,
pelo jeito, não tinha vindo pelo mar.
— Vim por terra, desculpem o atraso — falou, e então se aproximou, ficando à minha
frente. — Fui um merda por me preocupar com os problemas na máfia e não enxergar que
estávamos machucando quem mais precisava de nós, e não a protegendo.
— Baldur.
— Posso fazer meu papel na máfia sempre que quiserem, mas eu ainda sou irmão de
vocês... Sou seu irmão mais velho, Freya. — Olhou-me profundamente. — Eu deveria ter feito
mais, ou pelo menos, visto que precisava de mim.
— Mas estava ocupado sendo um amigo e padrinho para Hari Kang, certo? — indaguei,
toda minha mágoa saindo. — Por que não pode ser isso para mim, Baldur? Por quê?
Virei-me então, para olhar para cada um deles.
— Por que nenhum de vocês pôde ver que eu estava no momento mais delicado da
minha vida, e que fosse lá qual fosse o motivo, se ele existir, deveriam ter conversado e não me
trancado — rebati. — Por quê? Por quê? Por quê? Foi o que eu me perguntei, por cada dia desses
dois anos. E adivinhem, agora? Agora eu não quero mais saber.
— Freya, nós...
— Eu não quero mais contato com qualquer um de vocês — falei de uma vez, cortando
a fala de Thor. — Vidar deve estar ouvindo pela escuta na roupa de Loki, então, espero que fique
claro. Eu tenho apenas uma irmã, e ela se chama Hella. Vocês, todos vocês, eu não quero mais
na minha vida.
— Ainda é uma Hansen, Freya.
— Nunca disse que deixaria de ser, mas com certeza, não serei mais a irmã de vocês —
rebati, e olhei diretamente para Týr. — Não me procurem, não tentem entrar em contato, não
façam nada... Eu estou onde devo estar, e eu percebi, que não preciso de vocês.
— Agora que está com um Kang pode simplesmente nos descartar, irmã? — a voz de
Loki soou machucada e eu o encarei com escárnio.
— Vocês que me descartaram, e eu sou grata por isso... — olhei para cada um deles. —
Porque eu aprendi que não preciso mais fingir ou me forjar para qualquer um, muito menos, para
vocês.
— Quando ele cansar de brincar de casinha com você, vai voltar para casa — foi o que
Thor disse, claramente contrariado.
Antes que eu pudesse fazer ou falar alguma coisa, vi o exato momento em que Hella
derrubou nosso irmão com um soco. Ele simplesmente desligou, caindo na areia, e Týr correu
para segurá-lo.
— Eu deveria fazer mais, e socar a cara de cada um de vocês, mas honestamente, não é
como se isso fosse resolver o caráter duvidoso de proteção que vocês têm. Ou o que inventam em
sua mente.
— Podemos só nos acalmar e...
— Que diabos é isso aqui?
A pergunta veio em português, e então eu me virei, para encontrar três pessoas, que me
remeteram no momento em que as encarei, a Henrique.
— Quem são esses...
— Os irmãos de Henrique, eu dei uma carona e disse que poderiam descer depois de
alguns minutos, só para eu poder falar com minha irmã primeiro e...
— O que você pensa que está fazendo, Baldur?
— Deixando de ser um merda, irmão — ele rebateu para Odin, que parecia incrédulo
com a situação.
— Olha, eu ainda tô ligando os pontos, mas isso aqui é uma festa dos Hansen e eu não
tô sabendo? — a mulher que parecia mais nova indagou, e então me encarou. — Você deve ser
Freya, mais ruiva do que eu imaginava, mas agora eu sei porque Ton Ton sempre disse o quanto
era bonita. Eu sou...
— Pode apenas tirar essas pessoas antes que eu faça... — Thor ainda falou, acordando,
e Hella pareceu segurar tudo de si para não ir socar a cara dele novamente.
— Acho que devo me apresentar, sou Paola Fontes Kang, a esposa de Vincenzo Kang, e
que vai mandar chutar a bunda de vocês da propriedade privada do meu irmão mais velho, se não
tratarem de ter respeito.
— Chega!
Levantei o olhar, para encontrar Henrique vindo com Bjorn em seu colo, que estava
agasalhado com uma das várias roupinhas de ursinho que ele tinha, e que se tivesse planejado
não daria tão certo.
— Rique...
— Ton Ton...
— Irmão...
As reações dos irmãos de Henrique foram várias, mas rapidamente eles se aproximaram
dele, e pareciam encantados, mesmo que surpresos.
— Sabe, é isso... — falei em dinamarquês, olhando para os meus irmãos ali presentes.
— Era isso que eu esperava, que eu tanto queria... — olhei diretamente para Odin. — Mas não
puderam me dar nada, a não ser dor, quando tudo o que eu queria era algum sentimento bom dos
meus irmãos. Comigo, com o meu filho... Apenas vão embora e não apareçam mais. Eu não
preciso de vocês. Bjorn também não.
— Ouviram a dona do lugar, não ouviram? — Hella falou, e os encarou, fazendo um
sinal com a mão, para que saíssem.
Percebi a forma como Odin olhava para ela, como se querendo dizer mais, e em
seguida, fez o mesmo comigo. E enquanto os via se afastar, e voltar para o iate, e Baldur apenas
seguir em direção à saída, que eu mal conhecia direito, porque não tinha nem sequer saído de
casa nos últimos dias para conhecer a cidade em que estávamos, vi-me olhando para Hella, com
um agradecimento estampado.
— Eles vão se arrepender e voltar... — falou baixinho, na nossa língua. — E quem
sabe, algo faça sentido, em algum momento.
— Por agora, eu estou bem, longe deles...
— Vou com Baldur, e te vejo mais tarde, certo?
— Obrigada, irmã.
Ela então saiu, e eu a vi dar um leve aceno com a cabeça para as demais pessoas na
praia, e fiquei estática.
Eu estava prestes a conhecer a família por parte de pai do meu filho... como eu deveria
agir?
CAPÍTULO 22

“Me pergunte o que eu aprendi de todos esses anos

Me pergunte o que ganhei com todas essas lágrimas” [26]

FREYA
— Então, vamos recapitular...
A voz veio da mulher de cabelos ruivos, que estava sentada na poltrona à frente do sofá
em que eu e Henrique nos sentamos, um pouco longe um do outro. Um dos homens, que eu
achava que era seu irmão mais velho, estava parado em pé, com o olhar longe, parecendo pensar
em algo, e a mais nova, sentada no chão, enquanto Bjorn engatinhava e às vezes arriscava alguns
passos até ela.
— Você conheceu Freya por acaso, em uma praia não muito longe daqui, e acabaram se
envolvendo... — ela falou, enquanto eu tentava me distrair e encarar meu filho, uma falsa
expressão neutra em meu rosto.
Por que eu estava tão assustada?
Eu já tinha estado diante de tantas pessoas perigosas, realmente perigosas. Porém, o frio
na minha barriga e o medo era porque a irmã mais velha do cara que era meu primeiro amor e pai
do meu filho, estava revisitando a nossa história, para entender como era se tornar tia de repente.
— Só que quando ela descobriu a gravidez, os irmãos a trancaram e você só foi saber,
porque os Kang desconfiaram, e no fim, vocês a tiraram da própria família, a trouxeram para cá
com o seu filho, e agora estão aqui...
— Um bom resumo, tin tin.
A forma como Henrique a chamou, fez o meu coração se esquentar. Como seria, ter
uma relação como aquela, com os seus irmãos? Eu tinha uma vaga ideia, mas naqueles dois anos,
pareceu que apenas tinha criado pessoas e relações diferentes em minha mente.
— Por que os homens que estavam agora há pouco na praia, tirando Baldur, que acabou
por nos trazer até aqui, pareciam não muito felizes com isso? — o homem mais velho perguntou,
e seu olhar pairou sobre mim.
— Porque eu não sirvo a eles. — Olhei diretamente para os olhos parecidos com os de
Henrique. — São meus irmãos, tudo o que eu conhecia de família até dois anos atrás..., mas
depois de Bjorn, ele é a minha real família. Se eles não o aceitam, não me aceitam.
— Eu sinto muito.
A voz veio da mulher sentada no tapete, em que Bjorn estava um pouco escorado.
— Eu tive um breve momento em que minha família... — apontou para os dois homens
na sala, e notei o olhar envergonhado de Henrique. — Não aceitaram meu relacionamento,
justamente por Vincenzo ser quem é, e doeu. Doeu ver que poderiam não aceitar o que eu queria,
mas o faria mesmo assim. Não consigo nem imaginar como tem sido para você.
— Eles não queriam saber de Henrique, possivelmente porque ele era um cara normal?
— a ruiva me perguntou, como se ligando todos os pontos. Tinha que admitir, eles eram muito
rápidos com aquilo.
— Sim — assumi, um incômodo de sempre me lembrar da decepção em seus olhares
quando disse que não contaria sobre o pai. — Mas eu nunca contei quem era o pai de Bjorn, até
que ele apareceu... Não sabia da relação de Henrique com os Kang, e mesmo que soubesse, não
faria. Poderia até ser pior, eles quererem o obrigar a se casar comigo, a ser parte da máfia ou algo
ainda pior.
— Não é muito longe do que ele tentou fazer por esses dois anos — o irmão de
Henrique falou, apontando-o com a cabeça.
— Gael...
Henrique chamou sua atenção, como se estivesse nervoso. Aquele pequeno detalhe
ficando preso em minha mente.
— Eu saí de casa pronto para te socar a cara, depois de nos fazer ficar no escuro por
meses, e reaparecer por nada... para sua sorte, você fez tudo isso pelo seu filho, e eu vou guardar
o soco para outra oportunidade — o homem que agora me lembrava e sabia chamar Gael falou, e
então sua expressão se suavizou, enquanto olhava para Bjorn.
— Tia Hellen vai ter um treco — o mais nova comentou, rindo de lado. — Ainda bem
que só cabiam mais quatro no carro com Baldur.
— E quem deixou vocês pegaram uma carona com um completo desconhecido? —
Henrique pareceu se revoltar do nada. E eu não julgava por aquilo. — Ele é Baldur Hansen. —
Deu ênfase, e eu quase ri da forma como ele parecia preocupado.
Entendia o seu lado, porque se eu estivesse de fora, com toda certeza, era como ver
algum dos meus irmãos pegarem carona com Dove Kang, sem ter a mínima ideia de que ela era
quem era.
— Vincenzo me ligou e disse que poderíamos ir. — A mais nova o encarou e revirou os
olhos. — E eu já o tinha conhecido, não é como ser a esposa do chefe da máfia não traga
algumas informações privilegiadas.
— Mesmo assim, Paola. — Henrique parecia bravo. — Tudo bem que o hyung os
asseguraram, mas não podem simplesmente entrar em qualquer carro de alguém que diz que vai
nos trazer até mim.
— Para a sua informação... — ela apontou um dedo para ele. — Ele apareceu
praticamente como um motorista para a gente, então... Não pedimos carona a um estranho na
estrada, ton ton.
Ela revirou os olhos novamente, e era claro que os dois falavam a mesma língua, como
se conhecessem melhor do que qualquer um.
— Vocês dois... — Gael chamou atenção, e pareceu realmente tomar o lugar de mais
velho. — A propósito, acabei não me apresentando direito... Sou Gael Fontes — ele falava em
inglês agora, talvez por pensar que eu não falasse português.
— Verdade, nós não nos apresentamos e ficamos falando em português, sem saber se
você entendia... Sinto muito, sou Valéria — a ruiva falou, e me estendeu a mão dela também.
Apertei a mão de Gael primeiro e logo em seguida a dela.
— Ainda bem que eu já tinha me apresentado e feito isso em inglês sabe, eu tenho
senso... — Paola provocou, fazendo-me relembrar o nome que ela tinha dito na praia. Meu medo
desaparecendo aos poucos, e voltando a estar atenta.
— Está tudo bem, eu consigo entender o que dizem e falar bem sua língua — expliquei,
grata pela preocupação com algo que talvez outras pessoas nem se ligassem.
— Ela é poliglota — Henrique falou de repente, e percebi a forma animada como sua
voz saiu, e seu olhar veio para o meu. — Uma vez nós fomos contar quantas línguas ela sabia, e
acreditem, nos perdemos na conta.
Ele parecia admirado e orgulhoso, como se me mostrando para eles, como alguém
incrível. Era sincero e nítido, que ele o fazia, sem nem sequer pensar duas vezes.
— E você aí, quase morrendo e me matando para aprender dinamarquês nos últimos
dois anos — Paola falou, e meu olhar voltou rapidamente para ele. — Juro, que língua difícil...
Ele até ganhou um certificado, e eu até hoje estou presa nas primeiras aulas.
Notei que a irmã dele não parecia estar dizendo tudo por nada demais. Contudo, aquela
era a língua materna da minha família, e eu lhe tinha contado a respeito no passado. Parecia que
nada sobre mim, havia passado despercebido para ele.
Nem antes.
Nem agora.
— Vamos lá de novo... — ele falou, rindo alto, enquanto se jogava do lado na areia. —
Dinamarquês, sueco, holandês, alemão, espanhol, coreano, chinês, francês, italiano, japonês,
inglês...
— Português — complementei, conforme ele parecia buscar mais em sua memória, e
tudo o que eu conseguia fazer, era o admirar. Tão bonito ao meu lado, sendo um amigo que eu
não gostaria de parar de ver, e minhas mãos se coçavam para tocar.
— Por que está me olhando dessa maneira? — perguntou de repente, e foi só assim que
percebi o quanto deveria estar o admirando, sem disfarçar em nada. Sem pensar em fazê-lo.
— Porque é bom te olhar — admiti. — Me faz bem.
Então ele se sentou, e no próprio movimento, acabou ficando mais próximo de mim.
— Está pensando no mesmo que eu? — indagou, uma de suas mãos pousando na
minha, que estava livre sobre as minhas pernas dobradas.
— Que eu seria capaz de matar alguém só para beijar a sua boca? — rebati, sem
pensar duas vezes, e sua expressão mudou por completo. Os olhos ainda mais escuros, a tensão
sendo palpável entre nós, e naquele segundo, soube que não estava sentindo nada daquilo tudo
sozinha.
— Eu seria capaz de morrer agora, se eu não te beijar.
Então, a sua outra mão veio para o meu rosto, e eu fechei os olhos, tamanha a
sensação que me tomou.
Não percebi quem deu o primeiro movimento, mas eu sabia que no meio do meu, os
lábios dele encontraram os meus, e de repente, nada mais no mundo importava.

Lembranças de nós dois, permeando por cada canto meu, enquanto a sua família
conversava ao redor, e ele parecia tão perto, mas ainda assim, tão longe, que eu gostaria de pular
um lugar no estofado e ficar ao lado ele, com sua mão na minha, e relembrar, o quanto valiam a
pena os seus lábios.
Minha mente se perdendo no fato de que isso, um dia, fomos nós.
Hoje não éramos mais. No caso, eu seria capaz de matar alguém, para saber se ele
também pensava sobre nós, como eu fazia. Se ele o tinha feito, por todos aqueles anos. Porque eu
tinha... eu o tinha carregado não só no meu peito, ou como uma parte de nós, eu o levava
comigo, até o momento que fosse vê-lo, e quem sabe, tê-lo novamente.
Eu teria a chance?
CAPÍTULO 23

“É tão insuportável ver você pra baixo


Só quero te levantar e não te deixar ir
Essa luz da manhã ultravioleta abaixo
Me diz que esse amor vale a luta” [27]

HENRIQUE
Uma parte de mim, que eu ainda não tinha deixado aflorar, porque eu sabia que ela não
era importante. Na realidade, eu tinha a certeza de que só iria me atrapalhar. Se existia algo que o
nosso genitor foi capaz de fazer, foi ter ferrado a cabeça de cada um de nós, e provavelmente, o
faria com as nossas vidas, se não fosse por termos nos unido novamente.
Olhando para Bjorn, ainda tão pequeno e a maneira como a notícia da existência dele
veio até mim. Ou melhor, quando vi uma foto dele e eu soube que era pai, nada conseguiria me
fazer o entender, o porquê de o meu, nunca ter sido um. Porém, temia que aquele sentimento, em
algum momento, me dominasse.
O sentimento de: será que vou ser como ele? Será que vou conseguir quebrar o meu
ciclo de dor, sem o transferir para o meu filho? Será que...
— Não é como ele — a voz de Gael soou ao meu lado, enquanto ele se sentava no sofá.
— Nunca vai ser como ele.
— Como sabe que eu estava pensando nisso? — indaguei, e meu irmão mais velho deu
de ombros.
— Eu te conheço. — Bateu um dedo sobre minha testa. — Ou estaria pensando no
nosso genitor ou pensando na forma como Freya desconsiderou um casamento com você há dois
anos...
— Ten Ten...
Naquele momento, eu gostaria de me enfiar em um buraco e ficar nele. Como ele podia
estar enumerando o que se passava em minha mente, e eu tentava focar em meu pai, para não
parar tanto no fato de que o que Freya tinha dito, ficou marcado em cada parte minha?
— Ainda gosta dela... — olhou-me e deu um leve tapinha em minhas costas. — Na
verdade, considerando todas as suas atitudes nesses dois anos, até aqui, eu tenho certeza de que a
ama.
— Sou tão óbvio assim? — questionei, engolindo em seco e nervoso.
— Para quem quer enxergar — respondeu. — Acho que ela deve estar presa em
dúvidas sobre isso, assim como você. Quando a história é nossa, é tudo mais difícil de ver,
enfrentar ou dizer.
— Eu não posso simplesmente chegar e despejar nela, depois de tudo o que viveu e
ainda está passando, um sentimento que é meu e às vezes, estragar esse recomeço que estamos
tendo. E temos Bjorn agora, não é sobre nós dois.
— É sempre sobre os dois... — corrigiu-me. — No momento certo, você vai saber,
quando precisa dizer ou não, o que sente por ela. Só me prometa que não vai pensar sobre nosso
genitor ou nada sobre ele, isso não faz parte de você, e muito menos, será sobre o seu filho.
— Eu acho que só queria... queria que ela estivesse aqui — admiti, e seu olhar parou no
meu. — Omma ia gostar tanto de ter mais netos, e ver os filhos todos juntos, brigando e lutando
um pelos outros... Ela merecia tão mais, irmão.
— Bom, você carrega a marca dela, bem aqui — meu irmão mais velho falou, tocando a
minha marca de nascença. — E eu vi que Bjorn a tem também, e se me permitir dizer algo em
que acredito...
— Claro.
— Pode ser apenas a genética fazendo o que ela faz, mas... eu acredito que é nossa
omma dando sua bênção. — Olhei-o já com os olhos quase marejados. — Ela está em cada um
de nós, e vai continuar pelos nossos filhos, então...
— Enquanto a gente se lembrar, ela ainda estará viva.
A voz de Valéria chegou até nós, caminhando sozinha ao nosso encontro.
— As vezes é tão bom lembrar dela, ainda mais, quando pensamos em quão feliz ela
estaria... — comentou, sentando-se ao meu lado. — Mas ela está, eu sei que está, ton ton.
Sem me deixar pensar muito, Val me puxou para os seus braços e eu os aceitei,
deixando algumas lágrimas descerem. Senti Gael batendo levemente em minhas costas, como se
participando do momento, mas não sabendo exatamente como.
— Que traidores... nem me chamaram para... abraço em família! — Paola gritou
animada, só ouvi seus passos corridos, e então seu corpo praticamente se chocando contra o meu,
e o de Gael, forçando-o a nos abraçar. — Senti saudade.
Eu também, pensei comigo, preso a cada um deles.
Meu olhar vagou por um segundo, quando começaram a se afastar, e então encontraram
o de Freya, ainda na beira da porta do quarto em que estava com Bjorn, e com ele em seu colo
agora. Ela parecia tão emocionada com a cena, que poderia jurar, que pensou o mesmo que eu.
Que seria bom, se Bjorn tivesse o mesmo – a sorte de irmãos que estariam lá por ele,
independentemente de qualquer coisa.

FREYA
— Eu amei te conhecer, cunhadinha.
— Paola, por que não vai atormentar um pouco? — Henrique rebateu, enquanto ela
dava dois beijos em meu rosto. — Apenas vá, tun tun.
— Porque nós não estamos nos falando porque ele não falava sobre o que realmente
ajudou você... agora, eu vou perdoar ele por me esconder — respondeu simplesmente, e era claro
o sentimento dela por ele, em poucas palavras. — Aliás, por que não voltamos ao ritual de
família, em que agora, eu e Valéria, temos que tentar resgatar você, e sei lá, tentar jogar um carro
contra Freya?
Arregalei os olhos, sem entender absolutamente nada, porém, juntando mais uma peça
de vários detalhes que foram sendo ditos, sobre como foi caótico quando descobriram que Paola
se relacionava com Vincenzo Kang, um homem muito mais velho que ela, e claro, um chefe da
máfia.
— Eu poderia ter quebrado a cara de algum dos irmãos de Freya, mas a própria irmã
dela foi mais rápida, pelo que conseguimos ver, enquanto chegávamos... — Gael falou, e eu não
pude evitar o sorriso no canto de minha boca.
— A sua sorte, ton ton, é que Freya já ganhou todos nós, e na verdade, deveríamos te
arrebentar por ser tão lerdo para descobrir onde ela estava e trazê-los para nossa vida — Valéria
falou, e notei a surpresa no olhar de todos eles. Ela parecia a mais calma e centrada, mas então
um sorriso surgiu em seu rosto. — Brincadeirinha, mas... Espero vocês em casa, para conhecer
meus filhos, meu marido, e todo os Reis.
— Eu tenho uma mulher grávida prestes a dar à luz, vou demorar um pouco para poder
convidá-los, mas nada impede de que ela queira aparecer do nada — Gael complementou, e eu
assenti, animada com a delicadeza deles.
— A Mansão Kang está lá, para os dois. — Paola apontou um dedo, de Henrique até
mim, e por último para Bjorn. — Posso ser a tia do final de semana agora, sem problema —
falou, olhando com carinho para o nosso filho.
Ele já tinha estado no colo dos três, e mais ainda, adorado toda a atenção que lhe deram.
Era tão bom vê-lo esticar os seus bracinhos e os pedidos sempre atendidos, e mais, parecer que
todos ali, gostariam de um momento a mais com ele.
— Ti-Ti...
Bjorn falou do nada, e aquela era uma novidade. Olhei para ele em meu colo, que
apontou para eles, e repetiu.
— Te-Te... Tu-Tu...
Todos se encararam, e eu sorri para o meu filho.
— Já decorou até os apelidos internos dos seus tios, deusinho?
— Eu não sei se morro de amor por ele estar nos chamando, ou despenco de vez de
fofura com você o chamando assim, Freya — Paola falou animada. — Juro, não sei como
Henrique deu essa sorte.
— Paola...
— Cuida bem do seu pai, tá, neném lindo da tia Tu-Tu... — ela falou, e eu via o sorriso
no rosto de cada um deles. — Eu sou a tia favorita, não esqueça.
— Vai ter que brigar com Hella Hansen por isso.
Henrique entrou no meio, e eu o encarei surpresa.
— Não digo que não o faria... — ela piscou um olho e se afastou. — Aliás, se precisar
de babá, mesmo...
— Paola...
Gael quem chamou sua atenção, enquanto parecia notar a tensão que se formava, toda
vez que algum deles, minimamente deixava escapar sobre eu e Henrique sermos algo mais.
— Se cuidem, e nos liguem, a qualquer hora, pelo que for — Valéria falou, apertando a
minha mão livre, e eu sabia que era verdade, já que fez questão que eu salvasse o telefone de
cada um deles.
— Sem sumir, Henrique.
A voz de Gael soou mais firme, à medida que apontava um dedo para o irmão.
— Eu vou fazer com que ele atenda o telefone — eu me pronunciei, sem perceber o
quanto as palavras soaram fáceis.
— Obrigado, Freya.
Gael falou, e deu um leve aceno, afastando-se com as irmãs, em direção à parte que
sabia dar diretamente para um estacionamento privativo, dentre várias árvores, e depois, estariam
já na rua da pequena cidade.
— Baldur ainda está ali, e vai os levar...
Henrique falou, e eu assenti, caminhando até ele.
— Talvez outro dia — falei, sabendo que ele me contava aquilo, para que eu tivesse
uma escolha. Porém, era claro para mim, que a minha, naquele momento, era me manter longe
dos meus irmãos, que me machucaram. Eles levaram seu tempo para me machucar, eles
deveriam levar seu tempo para quererem ser meus irmãos de verdade, outra vez.
— Com fome?
Henrique então perguntou, e vi o momento que instintivamente pareceu querer levar a
mão até minha cintura, mas rapidamente recuou, como se caindo na realidade.
Ele estaria com os seus, divertidamente brigando, constantemente, assim como os
meus?
— Podemos comer, mas depois, posso te fazer uma pergunta? — indaguei de repente,
tentando talvez marcar aquilo, para que eu mesma não pudesse fugir de fazer.
— Quantas quiser, Freya.
Assenti, e segui-o para dentro de casa, parando só um instante, para encarar o sol que
estava um pouco escondido de trás das nuvens, e pensar que se alguém me perguntasse, onde eu
gostaria de estar, dois anos depois de ter recebido um teste de gravidez positivo, eu facilmente
diria, que era ali.
Bem ali.
Com meu filho nos braços.
Com o homem que eu ainda amava, pronta (ou não) para entender se ele sentia ou não o
mesmo.
CAPÍTULO 24

“Meu amor era tão cruel quanto as cidades em que vivi


Todos pareciam piores à luz
Há tantas linhas que eu cruzei sem perdão

Eu vou te dizer a verdade, mas nunca adeus” [28]

FREYA
Eu não tinha fugido da pergunta após comermos juntos, naquele dia, porém, eu não
tinha feito o que realmente queria. Era palpável a tensão que vinha de Henrique naquele
momento, ou talvez, fosse de mim, contudo, nada me permitiu ter a coragem de simplesmente
perguntar sobre o que estava preso em meu peito há tanto tempo.
— Ainda gosta de pastel?
A pergunta foi tão mal-elaborada, de repente, que felizmente, eu tinha relacionado com
algo do passado. Percebi que o ambiente ficou menos denso, e talvez, eu tivesse optado pelo
caminho certo.
Ele apenas continuou o assunto e me prometeu que no dia que tivesse a feira na cidade,
me levaria para comer o melhor pastel que ele já tinah experimentado. E bom, seria o meu
primeiro momento saindo da casa e da praia em que estávamos, que agora, era o meu lar.
Não sabia quem era pior. Eu por perguntar algo tão aleatório, claramente não sendo a
intenção. Ou ele, por responder, e ainda me dar corda a respeito daquilo.
Contudo, ali estava eu, dias depois, sentada no sofá, pronta para sairmos, enquanto
Henrique dava banho em Bjorn, e tomava o seu também. Tentando afastar os pensamentos,
acabei rolando a tela da agenda do meu celular, e finalmente parei para analisar todas as iniciais
que foram colocadas nele.
E eu sabia que os H das letras O, B, T, V, T e L, não eram nunca uma coincidência. Os
Kang tinham preparado uma sequência de números que incluía também, cada um dos meus
irmãos. Olhei para a alternativa de eles estarem a um toque de chamar, e então, o peso que antes
me prendia, no momento, parecia apenas um incômodo leve. Nada comparado como antes.
Era como se eu soubesse que não precisava deles, por mais que eu quisesse precisar.
Por mais que família, na minha mente, sempre foi precisar um do outro, e se ajudar. Contudo,
não era mais a minha prioridade, não depois de dois anos vivendo às cegas, e sem qualquer
mínimo de credibilidade.
Segurei com força o medalhão em meu pescoço, que tinha a foto do homem que se
tornou uma constante na minha vida. Que na realidade, transformava o dia a dia, a rotina que eu
nem sabia que gostaria de ter, em algo tão tranquilo, junto ao nosso filho, que aos poucos, me
fazia querer acreditar que a vida poderia ser assim também: leve.
— Estamos prontos...
Levantei meu olhar, para ver meu filho vestido todo de jeans, parecendo um mini
adultinho, e, antes que eu pudesse falar qualquer coisa, tive que segurar minhas reações, para o
homem vestido todo de preto, com parte da camisa aberta, mostrando suas tatuagens, e eu fiquei
perplexa, com os cabelos mais longos, só que penteados para trás, e os brincos nas orelhas,
completando o que eu já tinha contado: quatro em cada uma. E, as covinhas que contrastavam
perfeitamente com os braços que pareciam prestes a estourar a camisa dobrada até eles.
Como alguém consegue ficar ainda mais atraente depois de tanto tempo? Como alguém
conseguia entrar na minha mente, fazer morada, e agora, estar prestes a fazer o mesmo, apesar do
espaço já ser dele?
— Eu também.
Levantei-me, arrumando a barra do vestido, que era do jeito que eu gostava. Ele era
curto, colado ao corpo, mas se tornava fechado e gola alta em cima. Os saltos altos que eu
sempre adorei, ornando perfeitamente, e eu sabia que quem escolheu cada uma daquelas peças,
sabia cada numeração e tamanho meu.
— Não sei quem foi que escolheu essa roupa, mas eu amei.
Falei, e dei uma voltinha, animada, depois de muito tempo, para sair de casa. Leve,
porque eu estava vivendo uma vida, que eu tanto imaginei em minha mente por aqueles dois
anos. Mesmo que ela não estivesse exatamente como eu esperava.
Não ainda?
— Está linda — a voz de Henrique soou como um bálsamo e eu parei, o sorriso no
rosto, enquanto seus olhos se prendiam aos meus. — Na verdade, seria difícil dizer quando você
não está.
— Henrique...
— O quê? — perguntei, com ele ainda me encarando, como se perplexo.
— Não diga coisas assim, para uma mulher que esperou dois anos por você. — Soltei
de uma vez, e aproximei-me dele para pegar Bjorn, como se tentando apenas fugir do que
simplesmente deixei sair.
Eu era boa naquilo. Sempre fui.
Saber como seduzir ou o que falar para um homem, sempre foi uma das minhas
melhores habilidades. A diferença, era tentar ser sedutora para o homem com quem eu realmente
me importava... que eu ainda amava.
— O deusinho mais lindo...
Bjorn veio para o meu colo, e novamente, os dedos de Henrique se tocaram com os
meus, enquanto ele o passava para mim. Porém, ele permaneceu com uma das mãos no meu
braço, olhando-me profundamente.
— Não assuma isso para um homem que procurou por você por dois anos.
Sua voz era baixa e séria, mas eu conseguia perceber o peso por trás dela. Um sorriso
no canto da boca, de alguém que sabia que me tirava da própria mente, e com certeza, gostaria de
que eu fizesse o mesmo.
— Vamos levar a sua mãe para comer pastel, deusinho? — perguntou, soltando sua
mão do meu braço, e ficando ao meu lado. — E depois... e depois, tenho certeza de que ela vai
fazer as reais perguntas que quer.
Um sorriso surgiu em meu rosto, e caminhei atrás dele, até a porta de entrada de casa.
Da nossa casa. Como eu poderia prever que algo assim aconteceria, a não ser em um sonho?
Assim que chegamos na parte que tinham as pedras, que levavam para um caminho sem
areia da praia, ele se apressou a segurar Bjorn, e quando dei o primeiro passo com o salto alto,
uma de suas mãos segurou firmemente minha cintura, ajudando-me a ficar equilibrada ali,
mesmo que ele soubesse que eu conseguiria andar de salto até mesmo na areia, e não passaria
qualquer sufoco.
— Sabe que eu não vou cair.
— Sei, mas pode fingir que vai, para que eu te segure assim, todas as vezes.
Rebateu, e eu soltei uma risada, vendo que o meu Henrique estava de volta, pouco a
pouco. E eu sentia que a Freya, quem eu realmente era, também. E, de fato, era bom estar de
volta.
Não demorou muito para já estarmos fora da parte que a mata escondia e privava
completamente aquela praia, e então, notei um carro parado, há poucos metros dali. Eu sabia que
nós tínhamos seguranças, mas ainda assim, eu reconheceria o carro que pertencia a Baldur
Hansen, em qualquer lugar do mundo.
— Ele... ele vem aqui, todo dia — Henrique confessou, parando ao meu lado, próximo
ao que deveria ser o seu carro. — Eu pensei em te contar, mas eu sei que está ainda ponderando
muita coisa sua sobre sua família. E nada é do dia para a noite.
— Pode estar apenas seguindo ordens, Henrique — comentei, desviando o olhar do
carro, como se pudesse sentir o olhar de meu irmão mais velho, e saber que ele estava ali.
Ajudei Henrique a colocar Bjorn na cadeirinha, o que ele ainda estranhava, já que
aquela era a terceira vez que ele o fazia, e pelo jeito, não gostava de ficar sozinho no banco de
trás.
— Ma-ma, Pa-pa...
— Sem chantagem, deusinho — Henrique falou. — Não fica longe daqui, e... rapidinho
eu te tiro daí.
Henrique se sentava no banco do motorista, enquanto eu estava no do passageiro, e não
pude parar de pensar sobre o porquê colocariam Baldur ali. Por que ele?
— Eu não te contei antes, mais porque ainda não tinha certeza de qual Hansen era, mas
quando fui até o castelo dos Hansen, em que Vincenzo armou tudo, para que eu descobrisse por
mim mesmo o que acontecia, quem me guiou para dentro de um dos quartos, que tinham fotos de
Bjorn, foi um dos seus irmãos... — olhei-o incrédula diante daquilo. — Tive certeza na hora que
era um deles, porque eu sei exatamente como seus olhos verdes são, e depois, no dia que
apareceram, eu descobri que quem me deixou ver com meus próprios olhos Bjorn e depois
sumiu, foi Loki.
— Bom, ele era o irmão mais próximo de mim, e mais carinhoso... — suspirei fundo.
— Acho que eles têm como objetivo deixar as mulheres Hansen malucas, ou algo parecido.
Henrique sorriu, concentrando-se em dirigir.
— Às vezes, erramos demais ao tentar proteger quem amamos do que nada protege – a
verdade. Ela aparece, sempre — comentou, como se pensando sobre si, e assenti, concordando.
— Assim, pensando que seja algo nesse sentido, é complicado, pensar sobre o que seus irmãos,
na posição que estão, estariam fazendo pelo seu bem. — Respirou fundo. — Mas uma coisa, que
eu sempre quis saber, quando descobri sobre você ser da máfia... Como você é, como mafiosa?
De todas as perguntas que ele poderia me fazer, aquela era a que eu menos esperava,
porém, me tirou uma gargalhada que eu não dava há tempos. E ali estava ele, me fazendo voltar
há dois anos, quando tudo o que eu mais queria, era lhe falar o que o sobrenome Hansen
significava, e quem eu realmente era.
Eu não sabia o que fazer, ao ter que voltar às pressas para um trabalho e sequer
conseguir me despedir adequadamente de Henrique. Porém, o que estava em minha mente, era
que assim que finalizasse o que precisava, voltaria para vê-lo, e faria o impossível, para que
pudesse estar com ele, caso ele ainda quisesse estar comigo – mesmo eu sendo quem era.
Ele entenderia?
Como ele receberia a notícia?
Nunca pensei, em toda minha vida, que teria que parar e explicar para alguém, de onde
eu realmente vinha e o que eu fazia. Contudo, como eu poderia amar alguém, sem ser honesta
sobre quem ele estaria amando, caso me quisesse consigo?
— Jura? Isso? — perguntei, com a realidade sendo muito mais doce do que eu esperava.
— O quê? Eu cresci com a doideira da elite de quererem me fazer ser CEO e comprar
uma esposa, mas nada se compara com o que deve ser nascer na máfia. O seu normal é
totalmente fora do comum para todo mundo — enfatizou, e eu assenti.
— Bom, eu sou boa com ervas e em fazer as pessoas falarem... tem o peso de se
carregar o nome de um deus nórdico, em que você vai ter que se desenvolver em algo que o
próprio deus era.
— Eu li que Freya era uma deusa da magia... Espera, então você... Não sei se entendi.
— É mais complexo, mas mulheres não foram para a fogueira por simplesmente usarem
ervas ou misturas que eram benéficas para a saúde do próprio filho ou qualquer outra pessoa, e
daí, consideradas bruxas? — ele assentiu, e eu continuei. — Basicamente, o que eu sei fazer de
melhor, inebriar pessoas com cheiros ou comida, mexer na mente delas, e isso, as faz falarem
tudo o que eu preciso saber.
— Sem sangue, luta, briga, armas... — pareceu pensar mais sobre. — Não sei, coisas de
mafiosos que a gente assiste.
— Não vou dizer que nunca aconteceu de eu estar envolvida em momentos mais tensos,
principalmente, quando você tira a vida de alguém... — falei, e eu sabia que não tinha a
possibilidade de viver como eu vivia, sem que aquilo fosse uma realidade. — Você nasce com
esse peso, e vai ter que levá-lo. Não é uma comemoração sobre, a não ser que claro, seja alguém
que merecia, pelos nossos olhos, mas quando é uma fatalidade... é algo que vai levar.
Esperei pelo seu julgamento, o olhar de pesar ou de pena, até mesmo, o de ódio.
— Não me vai ver correr ou não te querer por isso — falou simplesmente, me
surpreendendo. — Eu sabia onde estava me metendo, principalmente, quando descobri quem
você era.
— E qual foi sua reação quando soube?
— Bom, há dois anos, na sala de estar da minha cunhada, eu simplesmente desmaiei —
confessou, e eu arregalei os olhos.
O silêncio recaiu sobre o carro e eu não pude evitar gargalhar alto, ao imaginar um
homem daquele tamanho, despencando, ao descobrir que se envolveu com uma herdeira da
máfia escandinava.
— Eu só conseguia pensar que eu tinha que aprender a atirar, mais lutas marciais, e sei
lá o que... — sorriu levemente, mesmo com as orelhas vermelhas de vergonha. — Saber disso
nunca me fez parar de ir até você, só me fez perder a consciência por alguns segundos, mas...
Aqui estamos.
Senti o peso de cada palavra, e então levei minha mão à sua, que estava livre sobre o
encosto de braço. Nenhum de nós disse nada, e nem precisávamos, porque de repente, o que
apenas fazia sentido, era que eu estivesse ali com ele, e que nós dois pudéssemos reviver aquilo
que perdemos, pouco a pouco.
CAPÍTULO 25

“Novos começos sagrados

Isso se tornou minha religião, escute” [29]

HENRIQUE
— Eu nem perguntei, quando chegamos, mas... Parece exatamente a mesma cidade, de
dois anos atrás, vendo de fora de onde fica nossa casa... — ela comentou, enquanto andávamos
pela feira, e Bjorn parecia encantado com cada barulho, luzinha e cores.
— Bom, e é. — respondi, um pouco sem graça.
Aquela mulher, linda como o próprio paraíso, mas pronta para levar qualquer um para o
inferno, por isso, estava praticamente me dissecando aos poucos. E eu estava tentando, de
alguma forma, não deixar tão evidente, o quanto eu era obcecado por ela.
Apegando-me àquela palavra, para não dizer outra, que parecia ser cedo demais. Dois
anos depois, como ainda poderia ser cedo demais?
— Então estou morando na cidade em que nos conhecemos e não me disse nada até
agora?
— Faz pouco mais de uma semana, então não pensei que... — ela negou com a cabeça,
um sorriso leve no rosto. — Que seria tão importante assim, para você.
A verdade era que as palavras dela, hora ou outra, estavam entrando em minha mente.
Fazendo-me indagar internamente se estava dando um tiro no escuro sozinho. Por mais que ela
ainda pudesse estar atraída por mim, e tivéssemos uma ligação eterna por conta do nosso filho,
não queria dizer que o sentimento que cultivei por aqueles anos, estivesse nela também.
— Por que parece receoso? — indagou, enquanto eu lhe indicava com a cabeça para
uma das barraquinhas de pastel que era minha favorita.
Ela se sentou na cadeira de plástico, e em seguida o fiz, com Bjorn ainda em meu colo.
Ele parecia mais interessado nas luzes piscando acima da sua cabeça, que decoravam aquela rua
principal, do que com qualquer coisa que a gente fazia.
— Não estou, eu só... — suspirei fundo, enquanto ela apenas me observava, como se
analisando cada detalhe meu. — Só não sei como agir.
— Então, eu faço. — Olhou-me com cuidado, e se levantou. — Você pediu pra gente,
há dois anos, eu peço agora...
Ela então simplesmente foi na barraquinha, e mal consegui ouvi-la fazendo os pedidos
pelo barulho de música e de outras pessoas em suas mesas.
— Pa-pa...
— Sim, deusinho? — perguntei, ajeitando-o sentado no meu colo.
— Ma-ma...
Ele falou e apontou para ela, que estava em pé, sorrindo e falando algo para o senhor
que a atendia. Os cabelos poderiam estar diferentes, mas a forma como seu olhar voltou a brilhar,
era como eu a tinha conhecido – e chutaria ainda, que estava mais. Então ela parou por um
momento, no meio de um sorriso, e olhou em nossa direção.
Eu estava, literalmente, pronto para estar de joelhos por aquela mulher, anos atrás.
Naquele instante, soube que eu não estava no exato momento, porque nosso filho estava no meu
colo.
Existia muito mais na beleza dela que me atraía, era absolutamente inexplicável, a
maneira como a simples forma de ela me olhar, me fazia querer pedir que ela o fizesse, sempre.
Vê-la ali, me fazia relembrar de como foi, literalmente, me sentir afogando quando me
apaixonei por ela anos atrás. Mal sabia eu, que eu não estava me afogando, mas na verdade, tinha
encontrado meu lugar favorito dentro do mar que era toda ela.
Não demorou muito para ela retornar à mesa, e então se sentou, com um sorriso menor
no rosto.
— Vai ter que crescer mais para poder experimentar pastel brasileiro, deusinho —
falou, e Bjorn parecia mais interessado em mexer nos sachês de catchup e maionese na mesa. —
Deve demorar um pouco pelo movimento, mas...
— Do que pediu o meu? — perguntei, tentando diminuir a ansiedade que me percorria
por dentro.
— Queijo, como há dois anos — falou e me encarou. — E sua cerveja favorita,
Heineken. — Olhei-a incrédulo. — “Coca é bom, mas uma Heineken... isso sim, é ótimo para
fechar o dia”.
— Você lembra... — minha voz mal saiu.
— Sei também que nunca passa de uma garrafa, mas fique tranquilo, que eu sou uma
mafiosa habilitada... — sussurrou a última parte, e eu tive que sorrir de lado. — Além do mais,
sei que adora a cor branco, mas se veste todo de preto, porque assim se sente mais “gostosão”. —
Fez aspas com as mãos, as suas palavras carregadas por estar usando o “ão” brasileiro.
— Eu não... — pisquei algumas vezes. — Eu disse isso?
— Sim., depois de tomar uma dose de tequila, e claramente, ficar bêbado de imediato...
— ela levou uma das mãos ao queixo, o segurando, e olhando para o nada, como se pudesse se
recordar. — Eu te ajudei a chegar no quarto de hotel que estava, e foi engraçado, porque foi o
caminho todo falando sobre cores...
— Qual a minha cor favorita? — indaguei, como se a investigando.
— Acha mesmo que estou inventando? — rebateu, levando a mão ao peito, como se
ofendida.
— Qual a cor, senhorita Hansen? — provoquei, e ela me deu um olhar afiado.
— Laranja, do pôr do sol, que só fica mais bonito quando está contra a água do mar. —
Pisquei consternado.
— Eu viro um poeta quando estou bêbado? — Pisquei confuso. — Não foram muitas
vezes que o fiz na vida, mas... Acho que tenho que te atualizar sobre minha cor.
— Por quê? — indagou, olhando-me interessada.
— Porque existia uma cor favorita antes de você, e existiu outra, após você... — olhei-a,
sem medo do que sentia, e na verdade, tomando coragem de fazer o que já deveria ter. — Verde.
Ela então também piscou algumas vezes, como se absorvendo o que eu disse.
— Como da floresta? — perguntou, como se precisando me dissecar por completo.
— Não, como os seus olhos — respondi, sem pensar duas vezes. — A cor que eu
procurei por esses dois anos.
— Henrique...
— Freya...
— Com licença... — a voz de uma terceira pessoa interrompeu o momento, e então eu
tratei de colocar um sorriso de cortesia no rosto, enquanto o nosso pedido era colocado sobre a
mesa. — Um pastel de queijo e uma cerveja... — levantei a mão, e a atendente colocou à minha
frente. — Um pastel de queijo, uma água e um suco de laranja. — Freya levantou a mão, e
agradeceu em seguida. — Bom apetite!
Sorri para a mulher, e voltei o olhar para a que realmente me fazia perder o foco, ou se
tornava ele por completo, quando se tratava dela. Vi-a começar a comer, e não soube fazer nada,
que não fosse apenas a observar, e não conseguir guardar um suspiro.
Seria uma longa noite.
CAPÍTULO 26

“Você beija meu rosto e nós dois estamos bêbados


Todos pensam que nos conhecem

Mas eles não sabem nada sobre” [30]

HENRIQUE
— Ele apenas capotou.
Segui com Bjorn para seu quarto, enquanto Freya fazia um leve carinho em seus
cabelos, ao meu lado.
— Eu vou colocá-lo no berço — falei e me virei para ela, que quase tropeçou em mim,
pela forma que parei, e deu uma risadinha. — Eu quem bebo e você que cai... — provoquei-a, e
ela deu um tapinha em minhas costas.
— Vou tomar água — falou e deu um beijo na testa de Bjorn. — Boa noite, deusinho da
mamãe.
Ela se afastou, e eu entrei no quarto de Bjorn, o colocando com cuidado no berço. Parei
um segundo, para apenas olhá-lo e pensando em como teria sido, se eu pudesse estar lá, em todos
os momentos. Se eu pudesse, de alguma forma, os compensar por não o ter feito.
Saí do quarto e segui para a cozinha, onde acreditava que Freya estaria, porém, a
encontrei parada de frente para as paredes de vidro, que mostravam apenas a escuridão do mar, e
que me fazia pensar, toda vez que olhava dali, no exato dia que a conheci.
— Desde que cheguei aqui, eu estou cheia de pergunta. — falou de repente, e percebi
que ela tinha um copo em mãos, provavelmente com água. — Mas acho que podemos fazer isso
de um jeito mais simples, com sim e não? — indagou, virando apenas o cabeça um pouco, para
me encarar sobre o ombro.
— Sim — respondi, sentando-me na poltrona que ficava de frente para ela, mas que o
grande tapete separava.
— Comprou essa casa e a reformou baseada em nós... sim ou não?
— Sim.
Minha voz saiu, finalmente libertando o que eu tanto escondia.
— Depois que eu desapareci e descobriu que eu era uma Hansen, tentou entrar para a
máfia Kang, para poder descobrir onde eu estava... sim ou não?
— Sim.
Minha voz mal saiu, porque ela poderia interpretar aquilo como um apelo de alguém
desesperado, ou a atitude de um homem obcecado. Para na realidade, ser apenas eu,
completamente apaixonado por ela.
Ela então voltou a cabeça para as paredes de vidro e senti o ar quase faltar.
— Tudo que está nessa casa, que é a respeito de mim, você quem comprou, sabendo os
meus tamanhos e gostos, pelos dias que tivemos no passado... sim ou não?
— Sim.
— Começou um curso de dinamarquês por ser a língua materna da minha família?
— Sim — respondi, sentindo meu rosto esquentar.
Como ela conseguiu perceber tudo tão rápido ou eu simplesmente era tão óbvio?
— Modificou o que pôde, assim que descobriu sobre Bjorn, tentando adaptar a casa
para o nosso filho... sim ou não?
— Sim.
Sorri, ao pensar em como corri com isso, enquanto os Kang ainda tentavam localizar
Freya, e tudo aconteceu simplesmente do nada.
— Está sorrindo agora, pensando em como as coisas aconteceram... sim ou não?
— Sim — respondi, meu sorriso desaparecendo.
Ela então se virou por completo e me encarou, quase encostada nos vidros.
— Não conseguiu estar com mais ninguém durante esses dois anos... — olhou-me
profundamente. — Sim ou não?
— Sim, Freya.
Ela então abriu um sorriso no canto da boca, deixou o copo de vidro sobre o sofá, e deu
passos até mim.
— Você ainda me quer, como queria há dois anos... sim ou não?
Ela parou bem à minha frente, e eu neguei com a cabeça.
— Não.
Seu olhar mudou e ela pareceu me analisar. Levantei-me, e levei uma das mãos até sua
cintura, a circulando, mas não a tocando... ainda.
— Eu te quero ainda mais, Freya. — Seu olhar preso ao meu. — Você também me
quer... sim ou não?
Ela sorriu, e apertou minha mão em sua cintura.
— Sim — confessou em dinamarquês, e então deixou nossos lábios quase colados.
Não pensei mais duas vezes, antes de tomar seus lábios com os meus. Tinha pensado
muitas vezes, de como seria, sentir o que apenas ela conseguiu fazer, anos atrás. Eu tinha
imaginado em como seria se sentir tão vivo, a ponto de perder sua mente, de tão inebriado e
imerso que estava. Porém, era diferente de qualquer paixão ou tesão. Era o mais puro desespero.
Porque quando eu senti o ar faltar, tendo sua boca na minha, foi quando consegui respirar
novamente.

FREYA
Se as lembranças das mãos dele em mim eram boas? A realidade, de tê-las novamente,
era completamente enervante.
Senti meu corpo ser levantado, e antes que eu pudesse pensar mais, eu estava sentada
sobre ele, que se sentou no sofá. O meu vestido subiu, e assim como sua mão, se espalhando por
minha pele, e a apertando com força.
— Sabe quantas vezes eu pensei em como seria te tocar de novo? — sussurrou, em
dinamarquês, o sotaque forte e puxado, fazendo-me gemer contra sua boca, não querendo perder
o seu beijo.
Ele puxou meus cabelos, fazendo-me parar de beijá-lo, obrigando-me a obedecê-lo, e
sua boca desceu por meu queijo, pescoço e colo. Sua mão livre passando pelo vestido, que de
repente, pareceu incômodo demais. Eu só queria que ele se cansasse da peça também.
— Tire para mim.
Levei a mão até a barra da peça, subindo-a com cuidado, enquanto as mãos dele, ia
subindo por cada canto da minha pele, e me segurando em si, todo e a qualquer movimento.
Quando terminei, e joguei o vestido do lado, apenas senti seus olhos queimando cada parte de
mim, a calcinha pequena que eu tinha escolhido, e o soutien preto, não sendo qualquer
empecilho. Porque segundos depois, eu senti as peças sendo simplesmente rasgadas, e gemi com
o ato, levando minha boca a dele.
— Eu amo o quanto você consegue ficar ainda mais linda, nua sobre mim — falou, e
então enrolou uma das mãos em meu cabelo, aproximando nossos lábios. — O que você quer,
Freya?
Sua boca estava tão próxima, e eu só queria que ele tomasse a minha novamente, mas
na verdade, tomasse tudo de mim. Levei então minha mão à sua calça, a abrindo, e tentando, de
alguma forma, tirá-la do caminho. Ele sufocou um gemido, enquanto eu sentia todo meu corpo
implorar por mais do dele.
— Preciso de você — assumi, e não pensei mais, antes de me posicionar sobre ele, e
deixar meu corpo assumir total controle do que acontecia, ao mesmo tempo que eu sentia que o
perdia por completo.
Henrique jogou a cabeça para trás, encostando-se ainda mais no sofá, enquanto eu
deixava minhas unhas quase rasgarem sua camisa, ao passo que me apoiava em seu peito, e
tomava cada parte dele. Suas mãos me ajudando, e me obrigando a fazê-lo devagar, por mais que
o quisesse de uma vez.
— Você... Você ainda é a minha morte, sabe disso, não é? — perguntou, ao me encarar,
e eu terminei de me sentar completamente sobre ele, gemendo baixinho. — Não vou sair daqui
nunca mais, Freya.
— É melhor se mexer, se quiser mesmo ficar aqui — provoquei, um sorriso cafajeste
surgindo em seu rosto, ao mesmo tempo que um de provocação, surgia no meu.
— Como a minha deusa quiser...
Gemi pela forma que me chamou, e então subi e desci novamente, agarrando-me aos
botões da sua camisa, tentando apenas tirá-la. Sem paciência alguma, quando finalmente a
arranquei, mesmo que custasse toda a costura.
Uma mão de Henrique firme em minha bunda, fazendo-me tomá-lo com ainda mais
força, e eu só conseguia gemer o seu nome, e me esquecer por completo do meu. Sabia que eu
ainda o desejava, mesmo depois de tanto tempo, mas nada me preparou, para a maneira como ele
poderia me deixar ainda mais necessitada dele.
Eu também não queria sair dali, nunca mais.
CAPÍTULO 27

“Está tudo bem eu ter dito tudo isso?


Será que ainda é muito cedo para fazer isto?
Porque eu sei que é delicado
Não é, não é, não é?
Não é?
Não é, não é, não é?

Não é delicado?” [31]

FREYA
— Incrível a maneira como o meu corpo consegue querer ser um tanque de guerra
quando se trata de você — assumiu, enquanto passava as mãos pela lateral do meu corpo. —
Faço corridas matinais na praia, totalmente na força do ódio e com alguma música me deixando
quase surdo, mas aqui estou eu, pronto para só tomar água e viver preso ao seu corpo por uma
semana...
Bati no seu peito, e ele riu de lado.
Estávamos enrolados em um cobertor que ficava sobre o sofá, e deitados sobre ele. Eu
passava os dedos pelas tatuagens de Henrique, tentando conhecer cada uma das novas que
existiam, e ainda, saber que eu tinha tentado decorar todas elas há dois anos.
— Isso é novo — falei, tocando o número treze que ele tinha bem próximo ao seu peito.
— Sabia que 13 é o número da deusa Freya?
— Eu sei que é o dia em que nos conhecemos, há dois anos... — sua resposta me deixou
perplexa. — E que eu decidi que seria o meu número da sorte, para um dia, poder te encontrar...
— O que mais vou descobrir sobre você, que vai me fazer surpresa por cada vez que me
deixa tão apaixonada? — perguntei de repente, sem pensar muito e mesmo com medo de deixar
tudo às claras. — Aqui...
Seu olhar mudou, enquanto eu lhe indicava o medalhão que ainda estava em meu
pescoço, e que nunca saía dali. Eu o abri, e deixei que ele o observasse.
— Eu mostrava para Bjorn, todos os dias, por todo esse tempo... Eu contava a ele que
esse era o papai e que... que era o homem que eu amava — confessei, e senti as mãos de
Henrique congelarem sobre a joia. — Eu te amo... Eu ainda te amo, Henrique.
Ele apenas me encarou e em seguida tudo o que pude ver foram suas costas. Não
entendi ao certo o que acontecia, mas ele se afastou rapidamente, puxando a cueca que eu nem
sabia que estava próxima, e se levantou. Fiquei incrédula, escorada contra meus cotovelos, e
pensando se eu tinha ido longe demais.
Eu tinha dito muito cedo?
Como aquilo poderia ser cedo, se parecia que ele me amava também?
O silêncio de outra pessoa nunca me doeu tanto quanto naquele instante. Suspirei fundo,
fechei o medalhão em meu pescoço, e fui buscar pelas minhas roupas, espalhadas por toda a sala.
Porém, no segundo seguinte, vi do escuro que dava para o corredor dos quartos, algo brilhando.
Novamente, algo brilhava e me fazia paralisar, enquanto me enrolava no cobertor e
desistia de tentar achar as roupas. Antes que eu precisasse ir até ele, eu apenas vi Henrique voltar
para o meu ponto de vista, e em suas mãos tinha uma caixinha aberta, com um par de brincos.
— Não me questionou sobre os meus novos brincos, mas acho que era mais do que
óbvio que os fiz, para que você pudesse me encontrar mais facilmente, em qualquer noite à beira
do mar... em qualquer lugar...
Eu respirei fundo, conforme ele se aproximava, e mal sabia o que pensar.
— Então enquanto comprava os meus, eu pensei, mas e para encontrá-la? Não seria
melhor, se ela os tivesse também? — perguntou, e então parou à minha frente, mostrando os
brincos de esmeralda, ornados com diamantes.
— Henrique...
— Eu te amei cada dia desses dois anos, Freya — assumiu, e de repente, ficou de
joelhos diante de mim, fazendo-me paralisar. — Eu ainda te amo, e é o que quero fazer, pelo
resto da minha vida. Sei que pode ser demais, e vai levar o tempo que for para pensar, mas eu
preciso fazer isso. Preciso que saiba que eu te amo, e que eu quero que a minha vida seja com
você... — olhou-me profundamente. — Então, Freya...
Eu caí de joelhos, presa ao cobertor e meus braços foram diretamente para o seu corpo.
As lágrimas vieram com força, e não me lembrava da última vez que me senti tão exposta à
frente de alguém, e não era em nada relacionado à minha nudez.
Eu o abracei com força, enquanto sentia seus braços me prenderem em si, como se para
me acalmar, e também para nunca mais me deixar ir.
— Nada é demais, Henrique. — Afastei-me para olhá-lo, as lágrimas ainda descendo, e
percebi que os olhos dele estavam marejados também. — A verdade é que eu sempre quis mais
de você, e... faça a pregunta, antes que eu vire uma bagunça chorona novamente — assumi,
quase que dando uma ordem, e ele riu de lado, tentando limpar as lágrimas de meu rosto, com a
mão sem a caixinha.
— Você quer se casar comigo... sim ou não?
Eu sorri em meio às lágrimas, e então levei as mãos até os meus cabelos, colocando-os
atrás das orelhas.
— Sim.
Vi o momento em que uma lágrima desceu por seu rosto, e então, ele tirou com as mãos
trêmulas, o primeiro brinco da caixinha, e o colocou com cuidado no único furo na orelha que eu
tinha. Apenas a luz baixa da cozinha, e as paredes de vidro, que davam para o mar, como a nossa
testemunha. O meu lugar favorito do mundo, sendo a testemunha de quando eu me apaixonei à
primeira vista por ele, e agora, de quando eu caía tão profundamente, por estar sendo amada por
ele.
Quando a segunda joia foi colocada em minha orelha, eu reprimi um gritinho e me
joguei contra o seu corpo com força, o que o fez cair para trás no tapete, e rir alto, que eu tive
que tampar rapidamente com as mãos.
— Ainda bem que eu deixei essa parte da casa acolchoada para o nosso filho... —
brincou, enquanto eu ainda era uma bagunça de sorrisos e lágrimas.
— Eu acho que vou me mudar de quarto... — falei, e ele sorriu tão lindamente, que eu
quase me derreti. — Sabe, por mais que seja meu estilo o que estou agora, eu acho que faz ainda
mais o meu tipo, uma cama dividida com você.
— Eu fiz o meu quarto, pensando no nosso quarto — confessou, e naquela altura do
campeonato eu já nem sabia como conseguia me surpreender de tal maneira. — Há um espaço
apenas seu lá, futura senhora Fontes.
Emocionei-me ainda mais, porque se ele entendesse ou não o que aquilo significava
para mim, era como se soubesse que um lar e família, não precisavam de imposição alguma,
poderiam ser sua escolha. E ele tinha sido a minha por todos aqueles dois anos, e eu queria que
fosse, pelo resto de todos eles, ao seu lado.
CAPÍTULO 28

“Mas os monstros, na verdade, eram apenas árvores

E quando o Sol nasceu, você estava olhando para mim” [32]

FREYA
Fiquei presa a ele por mais um tempo, sentindo seus lábios beijarem cada parte do meu
rosto, e em seguida, minhas orelhas. Sorri, querendo congelar aquele momento conosco, onde
tudo parecia estar exatamente onde deveria.
Um chorinho soou pelo ambiente, e eu me vi pulando do colo de Henrique, e naquele
instante, consegui encontrar rapidamente o meu vestido e colocá-lo de qualquer maneira,
enquanto ele corria em direção ao quarto, e eu o fazia no segundo seguinte.
— Ei, deusinho...
Ouvi-o falar, à medida que Bjorn chorava em seu sono, e eu sabia que acontecia poucas
vezes agora, mas ainda tinha os momentos em que ele acordava e queria apenas ficar no meu
colo e mamar. Henrique o tirou do berço, tentando acalmá-lo, e aproveitei o momento para correr
para o quarto em que tinham minhas roupas, e coloquei uma camisola. Voltei em poucos
segundos, e Bjorn parecia mais calmo, mas não demorou para levantar os bracinhos e pedir meu
colo.
— Vem aqui, deusinho da mamãe.
Apressei-me para me colocar com Bjorn sentada na poltrona, e de repente, ele apenas
ficou quietinho, como se tudo que precisasse, fosse do meu colo.
— No começo, ele acordava várias vezes com fome, ou com alguma cólica, ou
simplesmente querendo o meu colo... Ultimamente tem sido raro ele acordar assim, mas quando
faz, às vezes, fica no meu colo, e dorme novamente. Ou acaba mamando e dormindo enquanto o
faz — falei, tocando seus cabelos, e os olhos escuros já pequeninhos, claramente do seu sono que
o rondava.
— Eu queria estar lá...
Olhei para Henrique, que se sentou no chão à nossa frente, e nos observava.
— Queria ter visto cada fase de vocês... — assumiu. — Queria ter te ajudado e
aprendido como é a sensação de ser pai... — confessou. — Acho que é uma dívida que eu nunca
vou conseguir suprir.
— Não foi uma dívida que você fez. — Lembrei-o. — Não vou mentir e dizer que
também não gostaria disso... Todas as vezes, desde o teste de gravidez, quando eu descobri que
ele era um menino, quando ele se mexeu pela primeira vez, no dia do parto... — suspirei fundo,
sem saber como resumir cada momento, já que todos pareciam únicos e importantes. — Eu só
conseguia imaginar, quando não estava tão imersa no sentimento de ser a mãe de Bjorn, em
como seria, se o pai dele, estivesse ali comigo... Foi Hella quem segurou minha mão, enquanto
eu o trazia ao mundo, mas eu nenhum momento, eu deixei de querer, que fosse você lá... Só não
deixe que ela saiba sobre isso. — Pisquei um olho, brincando a respeito.
Ele deu uma leve risada, mas logo seu rosto voltou a ficar sério.
— Eu sinto tanto, Freya — confessou, e olhou-me profundamente. — Tanto por não ter
como recuperar esse tempo, e por toda a dor, que eu vejo que te foi causada.
— Dizem que a dor nos faz dar valor... — refleti sobre. — Eu acho que a dor poderia
ser dispensável, mas... mas sei que valeu a pena, porque estamos aqui agora.
— E está usando os brincos que combinam com os meus... — falou, suspirando em
seguida. — Sempre imaginei como seria te encontrar e não te assustar com tudo o que me fazia
sentir, para depois, em poucos dias, estar te pedindo em casamento... — riu de si mesmo, como
se incrédulo pelo fato de não ter hesitado.
— E eu disse “sim” sem precisar pensar uma vez sequer. — Olhei-o com todo meu
amor. — Quem além de nós pode saber o quanto precisávamos disso, Henrique?
— Sempre pensei que meus irmãos fossem malucos, pela maneira como olham para as
pessoas que amam... Até que eu me vi, olhando exatamente assim, para o meu reflexo no
espelho, sempre que me lembrava de você — assumiu. — Eu não te disse ainda, mas queria que
soubesse, o quanto sou grato por mesmo sozinha, e em meio a tanta dor, ter cuidado de Bjorn.
Ter cuidado da parte mais frágil de cada um de nós, que se tornou uma nova vida.
— Um deusinho — complementei, um sorriso no meu rosto, ao ver que ele já tinha
adormecido novamente. — Que foi quem me mostrou, que um lar e família, na verdade, são as
pessoas que você escolhe. E eu o escolhi, assim como escolhi você. — Olhei-o, pensando em
como nada chegava perto daquele sentimento de pura entrega.
— Eu sei que falamos muito sobre escolhas, mas a verdade é que eu não tive nenhuma,
desde quando te vi, ou melhor, te senti perto de mim, naquela praia, pela primeira vez... Eu sabia
que seria você, sem nem sequer pensar — assumiu. — Mas Freya, se eu pudesse escolher, não
seria diferente.
— Eu sei. — Sorri de lado. — Eu vejo em cada detalhe de tudo que construiu e fez por
nós, nesses dois anos... Eu vejo que, por mais magoado que estivesse, você se magoou ainda
mais, quando viu que estava me machucando.
— Fui um babaca, convenhamos — confessou, e eu ri baixinho, pronta para levantar-se
com nosso filho no colo. — Eu te ajudo — sussurrou, rapidamente estava de pé, e pegou Bjorn
com cuidado, e foi até o berço, o colocando com todo cuidado lá. — Obrigado por cuidar da sua
mamãe por esse tempo, filho.
Falou, enquanto eu me tornava uma mera expectadora, da cena com que eu tanto sonhei
e imaginei por aquele tempo, e que se concretizava à minha frente – a de que nós, nos
reencontraríamos, e então, tudo faria sentido, até mesmo, os piores momentos.
— Obrigada por me escolher, Henrique.
Ele então se virou e me encarou.
— Não... — aproximou-se e tocou meu rosto as duas mãos. — Nunca me agradeça por
escolher a melhor coisa que poderia me acontecer. — Um leve beijo foi depositado em meus
lábios, e eu sorri em seguida. — E agora... eu vou levar a minha futura esposa para o nosso
quarto, e ficar preso a ela em cada segundo do sono.
— Esqueceu da parte que nós não conseguimos simplesmente dormir grudados? —
rebati, e então, de repente, apenas senti meus pés fora do chão, e assimilei segundos depois, que
estava em seu colo, como uma noiva. — Henrique Fontes! — chamei sua atenção e ele apenas
sorriu de lado, caminhando comigo para a porta que dava para o seu quarto.
Depositou-me com cuidado na cama, se jogou ao meu lado, e passou um braço ao redor
da minha cintura, depositando seu peso ali.
— Vamos ter que testar isso, se realmente não conseguimos dormir enroscados um no
outro...
— Quanto tempo para ter certeza de que não conseguimos isso?
Provoquei, e ele riu de lado, os olhos escuros que poderiam iluminar até mesmo o mais
profundo do oceano. Então sua mão buscou a minha, e eu a aceitei, como sempre o fiz, e como
para sempre, o faria.
— Pelo resto das nossas vidas, Freya.
CAPÍTULO 29

“Tempo, tempo místico


Me ferindo, e depois me curando completamente

Havia pistas que eu não vi?” [33]

HENRIQUE
Andei pela praia, que era nosso lar, e que eu imaginava como seria para Bjorn, crescer
bem ali. No silêncio preenchido apenas pelo barulho das ondas, o cheiro da maresia, o bom dia
do sol no jardim de água. Ele iria gostar?
Não sabia exatamente como ele se sentiria, mas era claro que quando me sentei ao seu
lado, enquanto ele brincava dentro de uma piscininha, todo encapotado de uma roupa contra os
raios solares, um chapéu que tinha orelhas de urso, e batendo as mãos e sorrindo com a água, que
pelo menos, de piscina, ele deveria gostar.
Olhei de relance, para onde Freya conversava com a irmã mais velha, que aparecia de
vez em sempre, e na maioria das vezes, de surpresa. Não me incomodava nem um pouco, na
verdade, me alertava para o que aconteceria, assim que meus irmãos descobrissem sobre o nosso
casamento.
Eu as vi se abraçarem, e a maneira como Hella Hansen a encarou, parecendo como se
estivesse emocionada.
— É, deusinho... Família nunca deixa de ser complicado, mas... mas olha só, no final,
tem até gente da máfia quase chorando na praia... — sussurrei para ele, que deu um sorrio
grande, e eu acabei fazendo o mesmo.
— E-A... — falou de repente, e pisquei consternado, enquanto ele apontava para as
mulheres que se aproximavam. — E-A...
— O que o deusinho mais poderoso do mundo está dizendo?
— E-A... — repeti o que ele disse, então encarando Freya, que parecia a única que tinha
entendido.
— Hella. — Ela traduziu e nosso filho bateu com as palmas na água, sorrindo ainda
mais, sentadinho dentro da piscina. — Acho que ele sabe sobre o convite que fiz.
Então era aquilo?
— Eu nunca pensei que gostaria tanto de um significado, como é o de ser madrinha de
alguém... — Hella confessou, olhando-me. — Obrigada por concordar com isso, Henrique —
falou séria e claramente grata.
— É o mínimo, pela dívida que tenho com você, por ter cuidado deles, da maneira que
eu deveria, por todo esse tempo...
— Ele realmente é um gostoso cafona e romântico, né? — ela rebateu, olhando
diretamente para Freya, que riu de lado, e vi a forma como suas bochechas se avermelharam. —
E ainda consegue fazer Freya Hansen corar... eu não sei o que fez, mas tem sorte, cunhadinho.
— Eu tenho mais do que isso — admiti, enquanto colocava outros brinquedinhos na
água para Bjorn. — Isso tudo, para mim, é um significado.
— Juro, eu não gosto de homens, mas vou ser obrigada a tentar gostar de você — ela
falou, e se sentou do outro lado da piscininha de Bjorn, e negou com a cabeça. — Vai mimar
minha irmã, que ela merece, enquanto eu... Eu vou mimar o meu afilhado.
Assenti, pronto para me levantar, e ir até a mulher que eu amava, que me esperava bem
ali do lado. Contudo, reparei na forma como a mão dela estava esticada em direção à minha. Do
nosso jeito, sem nem sequer tentando fazer acontecer. Era como se eu soubesse, que por onde
tentasse ir, a mão dela estaria esperando para pegar a minha, e eu a dela.
E eu fui...
Assim como ela tinha aceitado a minha, anos atrás. Entrelacei nossos dedos e corri,
fazendo-a fazer o mesmo, enquanto se jogava sobre mim, eu a pegava no colo, e o mar nos
envolvia.
— Você ama mais a mim do que o mar... sim ou não? — provoquei, com ela em meus
braços, e em uma parte que as ondas apenas batiam um pouco abaixo das minhas costas, e ela
estava protegida.
— Não — respondeu simplesmente, e pulou do meu alcance, fazendo-me ficar ali,
paralisado por alguns instantes. — Vai ter que brigar por isso, Henrique.
— Por você, eu faço uma guerra até mesmo contra o oceano todo.
Ela então correu um pouco mais para o fundo, e eu a segui, rapidamente conseguindo
cercar sua cintura, e trazendo-a para os meus braços novamente.
— Nós vamos nos escolher todos os dias — falou de repente, e me encarou, enquanto
eu via o brilho dos seus brincos e o medalhão que agora eu sabia, tinha minha foto, brilhando
contra os raios solares, e tinha certeza de que os meus brincos faziam o mesmo. Esperei que ela
continuasse a fala, e fizesse a pergunta, mas não veio.
E então eu entendi, quando seus lábios chegaram nos meus, em um leve toque. De que
ela não precisava perguntar e muito menos se questionar, a resposta era simples: nós já o
fazíamos, mesmo longe um do outro, por todos aqueles anos, e nós o fazíamos agora, enquanto
estávamos presos no lar que escolhemos.
CAPÍTULO 30

“Dizem que o fim está próximo


Todos estão tramando algo

Eu me peguei correndo para casa, para as suas palavras doces” [34]

HENRIQUE
— Fontes... — o homem de cabelos escuros e olhos verdes me encarou, parado próximo
a um poste. — Esperei que saísse de casa sozinho, para poder lhe dizer algo.
— Que seria?
— Não importa se Freya me odeie, se negue a ser uma Hansen, não esteja mais na
máfia um dia... Mas eu te juro que se a machucar ou machucar meu sobrinho, eu vou tirar tudo
de você, Fontes. Vou tirar absolutamente tudo, e não vai te sobrar nada a não ser implorar para
morrer.
Pisquei algumas vezes, consternado.
— Eu deveria estar com medo? — rebati, mesmo que soubesse que o homem à minha
frente era de fato assustador. Talvez eu tivesse me acostumado com tantos Kang me cercando,
que no final das contas, fariam de tudo pela família. O que me surpreendia o fato de ele estar ali,
falando comigo, enquanto sua irmã estava magoada por suas ações, e ele nem sequer as
justificava.
— Fique como quiser, mas não a machuque. — Olhou-me profundamente, seu
português muito mais carregado do que o dela. — Isso é uma ordem, Fontes.
— Sinto desapontá-lo, mas o meu objetivo de vida é ser o melhor para ela e para Bjorn.
— Olhei-o, com toda a verdade que eu carregava. — A realidade é que não suporto vê-la
machucada, da maneira que seja. E eu a vejo assim, todos os dias, por conta de vocês.
— Ela está segura, não está? — indagou de repente, e eu assenti. — Isso é o que
realmente importa.
— Se é o que pensa, mas...
— Não vim pedir conselhos seus — cortou-me, e levantei a mão em rendição. — Não
diga a ela que eu apareci, e siga o que estou lhe falando.
— Primeiro, que eu não omito ou minto para ela. — Já fui claro. — E segundo, eu já o
faço, porque a amo, senhor Hansen.
Ele apenas me analisou e em seguida, vi-o seguir pela parte escura de um condomínio
que ficava mais à frente. Fiquei parado um tempo, com as mãos nos bolsos e pensando em como
parecia ter muito mais por trás da atitude deles. Eu deveria odiá-los por terem nos afastado,
contudo, a realidade era que eu não conseguia o fazer, porque já via Freya sofrer e lutar com
isso, e alimentar algo assim, não ajudaria em nada.
Vi-me dando uma volta, e indo em direção à minha casa, sem querer pensar mais
naquilo. Com certeza, teria que tocar no assunto, no momento em que notasse que Freya
estivesse querendo saber sobre eles. Contudo, a minha prioridade era manter um sorriso em seu
rosto, e lutaria para que esse permanecesse.
No segundo em que abri a porta, um pequeno corpinho correu em minha direção, e um
gritinho foi ouvido. As mãos se jogaram sobre mim, enquanto eu me agachava, e tudo foi tão
rápido, que eu só soube sorrir e aceitar cada partezinha do nosso filho.
— Ele resolveu que quer correr, mesmo caindo... — Freya falou, enquanto sorria, e
segurava uma grande caixa em mãos. — E chegou presente do Baldur, que tocou o interfone,
mas como não abri, apenas deixou aí na porta.
— Ele está tentando... — falei, e suspirei fundo. — Como está se sentindo sobre isso?
— perguntei, levantando Bjorn nos meus braços, e caminhando até ela.
— Indo... — admitiu. — Mas a insistência dele em estar aqui me fez questionar sobre
como ele está tanto no Brasil, se na realidade, ele deveria estar se casando... — olhei-a
interessado.
— Fofoca da máfia? — perguntei, enquanto Bjorn reclamou, e o desci do meu colo,
colocando-o no chão acolchoado. — Ok, deusinho, sempre ao seu dispor.
— Bom, faz alguns anos que isso está para acontecer, mas Baldur apenas posterga, só
que esse acordo tem um prazo, que deve estar perto de acabar, se ele não se casar, os Hansen
perdem sua palavra e... bom, isso é tudo quando se trata da máfia. — Olhei-a interessado. —
Como ele fica tanto no Brasil?
— Alguma máfia aqui? — rebati, indo para perto dela, que abraçou minha cintura,
enquanto eu passava as mãos pela dela.
— Não, aqui apenas os Kang ficam de olho, e tem outros tipos de interesse... — pareceu
pensar. — Só que tem uma coisa, a única que fez eu ver Baldur agir estranhamente, quer dizer,
até ficar vindo aqui na porta e tentar ser meu irmão novamente.
— Que seria?
— Uma vez, ele apareceu em casa com uma mulher que nenhum de nós esperava, e não
era de qualquer máfia ou algo parecido, ela era uma traidora, pelo que eu descobri e bom... ele a
exilou em uma das ilhas dele, e acabou nisso. — Olhei-a perdido. — Só que ela é brasileira. —
Ali, eu entendi o seu ponto. — E se ela estiver solta agora?
— De todas as histórias malucas que eu já assisti em dramas coreanos, essa está
entrando para o top 3. — Provoquei e ela bateu contra meu peito, encostando-se com a cabeça
nele. — Mas o que a gente pode esperar dos Hansen?
— Eu não sei — admitiu, e então suspirou fundo. — Só sei que tenho vontade de jogar
essa caixa na cabeça de Baldur, e depois perguntar se ele está vivendo alguma novela.
— Bom, já é um progresso... — provoquei mais uma vez, e ela riu contra o meu peito.
— Quem sabe um dia, as coisas serão melhores com eles, não é?
— Quem sabe, se eles aceitarem você e Bjorn... — levantou o olhar e encontrou o meu.
— Mas para mim, a gente se aceitar e se amar, me basta.
— Quem é a romântica agora, hein, futura senhora Fontes? — zombei, e encostei
nossos narizes.
— Eu nunca disse que não era.
Piscou um olho, e seus lábios quase chegaram aos meus, porém, um choro quebrou todo
o momento.
Do modo homem apaixonado, para o modo pai preocupado em segundos. Olhei de
relance, para logo estarmos os dois ao redor de Bjorn, que tinha caído sentado na parte em que o
chão já não estava mais acolchoado, e chorava alto, mesmo ela o pegando no colo e tentando
acalmá-lo. Olhei para eles, levando meus braços ao redor dos dois, e eu soube, que eu tinha o
meu mundo todo, bem ali, rodeado por mim.
E das surpresas que eu poderia ter, depois da primeira, que foi me apaixonar por ela, ter
a nossa família era a melhor delas.
Bônus

“E se eu te dissesse que nada foi por acaso?


E que na primeira noite que você me viu, nada iria me parar?
Eu preparei o terreno e, como o mecanismo de um relógio
Os dominós desabaram em fila
E se eu te dissesse que sou um mestre da manipulação?
E agora você é meu
Foi tudo calculado

Porque eu sou um mestre da manipulação” [35]

BALDUR
— Já está na hora, Baldur.
Eu sabia que estava.
Eu só não entendia como conseguia, ainda, estar tão reticente. A verdade, era que eu
sabia, mas não tinha como simplesmente aceitar.
— Eu sei da minha responsabilidade, Odin.
— Então por que não a está cumprindo? — rebateu, e eu queria simplesmente pular
aquela conversa. — Sabe que fomos adiando, adiando, mas temos um prazo nesse contrato.
— Eu sei.
— Então, pode fazer uma visita para os seus sogros e se casar?
— Eu...
— Ou é por algo que estava escondido na sua ilha?
Paralisei diante de sua pergunta.
— Estava?
— Não tem por que mantê-la como informante de algo que não tem nada a ver com ela,
não mais... Por que estava a mantendo lá, Baldur?
— Odin... o que você fez?
— Libertei uma inocente — rebateu, e o encarei incrédulo.
Suei frio e me vi quase caindo de joelhos. Não poderia, não naquele momento, fazer
algo assim. Eu sabia que eu não deveria ter feito, mas agora, era tarde demais.
— Você simplesmente mandou embora a mulher que é mãe do meu filho, Odin!
Vi meu irmão mais velho sem reação pela terceira vez na vida. Ele se levantou, bateu as
mãos na mesa e me encarou.
— Isso é uma piada de mau gosto, Baldur?
Não era.
Nem de perto.
Eu tinha engravidado a mulher que deveria odiar, e que no caso, me odiava também.

Continua?
NOTA II

E assim, encerramos os Fontes e quem sabe, começamos os Hansen?


Há muito para entendermos sobre eles, e principalmente, sobre suas escolhas. Sei de um
deles que tem uma pessoa que prendeu e exilou numa ilha por ser uma traidora e está de
casamento marcado com outra, mas... O que esperar das reviravoltas dos Hansen, não?
Se você gostaria de acompanhar a saga dos outros irmãos Hansen, entender mais sobre
toda a história e o que os levou até aqui, não esqueça de me contar.
Espero que esse primeiro contato tenha sido satisfatório, e claro, que a finalização dos
Fontes, tenha chegado nas suas expectativas. Assim claro, como revisitar alguns personagens.
Obrigada, de coração, por dar uma chance ao #ALINEVERSO. Espero que possamos
ter muito mais por aí...
Com amor,
Aline
Torres-Reis-Kang-Esteves

UMA GRAVIDEZ INESPERADA


Família Torres – Livro 1

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SINOPSE
Se no meio do caminho de algumas pessoas tem uma pedra, no meio do caminho de Maria Beatriz, sempre
teve Inácio. O herdeiro da fazenda que fica ao lado das antigas terras de sua família, tornou-se um homem bruto e fechado, que
quando aparece na sua frente, ela já sabe que só pode ser problema ou alguma proposta indecorosa. Maldito peão velho!
Inácio Torres é um homem de poucas palavras, mas que vê em uma mulher tagarela, a oportunidade perfeita. Mabi
precisa de dinheiro, ele o tem. Ele precisa de um casamento falso, e ela é a escolha perfeita. Porém, a única coisa que recebe de
Mabi, como sempre, é uma negativa. Maldita criança sonhadora!
No meio das voltas que a vida dá, uma noite de prazer os marca. E a consequência será muito maior que o
arrependimento: UMA GRAVIDEZ INESPERADA.
CEO INESPERADO – meu ex-melhor amigo
Família Torres – Livro 2

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SINOPSE
Se nem tudo que reluz é ouro, Júlio é apenas a melhor imitação de pedra preciosa em que Babi colocou os
olhos.
O seu ex-melhor amigo, a abandonou e quebrou seu coração quando eram adolescentes. Bárbara Ferraz jurou a si
mesma que nunca mais o deixaria ficar perto. Maldito CEO engomadinho!
Júlio Torres sabe que deixou uma parte de si para trás. Sua ex-melhor amiga o odeia e ele, muitas vezes, teve o mesmo
sentimento por si. Maldita sombra!
Júlio sabe que não pode mais ignorar, porque ele não quer apenas a sua melhor amiga de volta, ele a quer como sua.
Babi foge dele como o diabo foge da cruz. Entretanto, como fugir se depois do reencontro e finalmente os pratos
limpos, ela se descobre grávida do seu ex-melhor amigo?
O BEBÊ INESPERADO DO COWBOY
Família Torres – Livro 3

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SINOPSE
Se existe amor à primeira vista, Abigail Alencar e Bruno Torres compartilham o completo oposto. Abi o
detestou desde o primeiro momento, e com o passar dos anos, o sentimento permaneceu. Bruno é o típico cowboy cafajeste,
arrogante e popular, de quem ela não suporta a presença um segundo.
A cidade pequena sabe de seu desgosto e desinteresse no mais novo dos Torres, porém, ele sempre pareceu ficar ainda
mais animado em confrontá-la. Se existe algo sobre Bruno que ela conhece bem, é que ele não foge de um desafio.
Assim, quando Abi o encontra como babá da sua filha de apenas um ano, ela só consegue pensar que ele quer algo.
Bruno jura que está ali apenas para tirá-la do sério, como sempre, mas tudo acaba por mudar, naquele exato instante.
Existe uma linha tênue entre o amor e o ódio... eles estarão dispostos a cruzá-la?
FELIZ NATAL, TORRES
Família Torres – Livro Extra

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SINOPSE
O Natal parou de ser uma data festiva, e tornou-se dolorosa, assim que Maria Beatriz perdeu os pais. No entanto, nesse
ano, tudo mudou e ela vai lutar para que essa data seja ressignificada. Que ela possa sorrir, o tanto quanto, um dia fez, no
passado. Assim, ela precisa que tudo saia PERFEITO.
Uma árvore de Natal destruída, enfeites perdidos pela casa, a ceia que não vai chegar a tempo, um desmaio...
Será que ela terá o seu Feliz Natal ao lado dos Torres?
Esse é um conto natalino, narrado na visão de Mabi e Inácio (do livro Uma Gravidez Inesperada), onde você poderá
passar essa data tão especial ao lado da Família Torres.
UMA FAMÍLIA INESPERADA PARA O VIÚVO
Família Torres – Livro 4

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SINOPSE
Olívia Torres sempre teve em mente que para bom entendedor meia palavra bastava. Assim, quando se
apaixonou perdidamente e descobriu que o homem com o qual se envolveu era casado, o seu mundo perdeu o chão. Ela apenas
foi embora, sem olhar para trás.
Contudo, com Murilo, ela nunca pôde parar de olhar. Ainda mais, quando descobriu que estava grávida.
Murilo Reis perdeu tudo. Nunca pensou, que em algum momento, poderia voltar a sentir algo. Entretanto, bastou um
olhar para Olívia, para ele compreender que ainda existia uma chance. Chance essa, que se perdeu por completo, quando ela o
deixou.
Anos depois e uma coincidência do destino, Murilo descobre que não apenas as lembranças daquele amor de verão
permaneceram, mas sim, que ele tem uma filha.
Um amor de verão pode ser o amor para a sua vida?
GRÁVIDA DO CEO QUE NÃO ME AMA
Família Reis – Livro 1

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SINOPSE
O triste é que aquele velho ditado se tornou real em sua vida: Valéria que amava Tadeu, que amava Bianca,
que amava Murilo, que não amava ninguém. Desde que seus olhos pousaram em Tadeu Reis, Valéria se apaixonou. Não sabia
dizer se era pelo olhar escuro enigmático, o sorriso que ela queria tirar daqueles lábios cerrados ou o fato de ele ser tão atencioso
com quem amava.
Porém, Tadeu apenas tinha olhos para outra mulher, e Valéria escondeu aquele sentimento no fundo de sua alma,
tentando matá-lo durante os anos que se passaram. Uma coincidência do destino, os coloca frente a frente. Ela sabe que ele é
errado, mais do que isso, uma grande mentira, porém, seu corpo não resiste.
E uma noite com o homem errado não é o fim do mundo, certo?
Para ela, tornou-se um outro começo, já que terá uma parte dele consigo, para sempre. Valéria está grávida do homem
que não a ama. E não pretende deixá-lo descobrir.
O CASAMENTO DO CEO POR UM BEBÊ
Família Reis – Livro 2

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SINOPSE
Águas passadas não movem moinhos – era o que Lisa repetia a si mesma. Contudo, estar sempre tão próxima do
único homem que realmente se apaixonou, fazia com que ela quisesse voltar, e na verdade, se afogar com ele. Igor Reis era um
erro, e ela sempre soube.
Ainda assim, não podia evitá-lo para sempre, já que seus círculos de amizades eram tão próximos. Então, era apenas
isso: Igor era um amigo. Um ótimo fofoqueiro e uma pessoa para perder horas conversando – mesmo que quisesse perder muito
mais.
Todavia, quando ele bate na sua porta no meio da madrugada com um bebê a tiracolo, ela não sabe o que de fato está
acontecendo. Porém, nada é tão ruim que não possa piorar, e ele a pede em casamento.
Nas voltas que a vida dá, Lisa se vê com o sobrenome Reis, um bebê para chamar de seu e um contrato de casamento
por um ano com o homem que ama.
Até onde o casamento do CEO por um bebê será uma mentira?
A FILHA DO VIÚVO QUE ME ODEIA
Família Reis – Livro 3

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SINOPSE
Os opostos se atraem.
Carolina Reis queria jurar que isso estava errado, mas não pôde evitar a forma como seu corpo reagiu ao cowboy
bruto e grosso que, literalmente, atravessou o seu caminho. Franco era uma incógnita, com um chapéu de cowboy escuro e uma
expressão tão dura, que lhe fazia indagar se ele em algum momento sorria. Bruto insensível!
Franco Esteves não tinha tempo para perder, muito menos, com uma patricinha mimada que encontrou sozinha no
meio da estrada. Porém, não conseguia evitar ajudar alguém, mesmo que este parecesse ser no mínimo uma década mais novo,
com olhos claros penetrantes e um sorriso zombeteiro. Diacho de madame!
O que era para ser apenas um esbarrão no meio do nada, torna-se uma verdadeira tortura, quando Carolina assume, por
coincidência a função de tutora da filha do cowboy. Ele só quer evitá-la. Ela só quer irritá-lo. No meio do ódio e atração que lhes
permeiam, uma adolescente se torna um vínculo que eles não podem evitar.
Mas até onde ela será a única a uni-los?
GRÁVIDA EM UM CASAMENTO POR CONTRATO
Família Reis – Livro 4

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SINOPSE
Se no meio do caminho de algumas pessoas tem uma pedra, no meio do caminho
de Nero, sempre teve Verônica. A matriarca dos Reis era uma mulher que intimidava a
qualquer um, e ele nunca conseguiu entender uma reação dela. Quando ela estava à sua frente,
ele sabe que tudo o que deve fazer é correr para a direção oposta.
Verônica Reis é uma mulher que nunca demonstra o que sente. Sendo assim,
praticamente impossível desvendar o que se passa em sua cabeça, e muito menos, em seu
coração. Contudo, sempre lhe intrigou o fato de que Alfredo Lopes – ou apenas Nero para os
demais – parecia querer enfrentá-la em uma simples troca de olhares, e nunca a temer.
No meio das voltas que a vida dá, um contrato de casamento é o que os une. O que ela e
muito menos eles esperavam, era que no único momento que deixassem a guarda baixar, teriam
algo maior do que o arrependimento para lidar: UMA GRAVIDEZ EM UM CASAMENTO
POR CONTRATO.
UM CASAMENTO DE MENTIRA PARA O CEO
Família Fontes – Livro 1

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SINOPSE
Nas voltas que a vida dá, Talita e Gael se encontram dizendo “sim” no altar.
A rejeição à frente de várias pessoas foi o que Talita Kang vivenciou aos dezessete anos, quando Gael Fontes a
recusou e humilhou abertamente sobre o possível noivado dos dois.
Porém, como o carma nunca falha, tudo o que o herdeiro dos Fontes necessita quinze anos depois, quando retorna para
recuperar a empresa da família, é justamente um casamento por contrato.
O que ele não esperava era que justamente a mulher que quebrou seu coração seria a candidata perfeita, e mais, que
ela o escolheria novamente.
Ele a humilhou por um casamento por contrato.
Ele precisa dela agora, pelo mesmo motivo.
Talita se apegou a esse contrato pela sua família, e por uma promessa que apenas ela pode cumprir. Mas nada lhe
impede de se divertir com a infelicidade do homem que estará preso nessa mentira com ela. Entre o carma, uma rede de mentiras
e corações partidos, até que ponto um casamento por contrato significará apenas isso?
GRÁVIDA DO COWBOY QUE NÃO ME AMA
Família Esteves – Livro 1

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SINOPSE
Ter um ditado como aquele sendo uma realidade, depois de tanto tempo, apenas fazia Guta duvidar se
realmente queria tal casamento. Augusta que amava Juan, que amava Pâmela, que amava Franco, que amava Carolina,
que felizmente, o amava de volta.
Deixada sozinha em casa, após finalmente ter o homem que amava da forma que sempre desejou, Guta parou de se
questionar do que era necessário para que aquele casamento fosse real, e aceitou que o amor de Juan Esteves nunca seria seu.
Ela então o deixa para trás, e com ele, todo o sonho do primeiro amor que agora ela jurou que esqueceria. Contudo, o
que ela não esperava, depois de tanto tempo, era que criaria algum laço real com ele.
Guta apenas quer os papéis do divórcio e distância, mas se descobre grávida do cowboy que não a ama.
UMA FILHA INESPERADA PARA O CEO
Família Esteves – Livro 2

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SINOPSE
Júlia Medeiros sempre pensou que para bom entendedor, meia palavra bastava. Entretanto, ela não sabia o que
entender, quando o homem para o qual se declarou, a abandonou na cama, na companhia de um chapéu. Ela só não tinha ideia do
que mais acabou ficando para si.
Oscar Esteves sempre lutou por sua família, e seus irmãos eram seu mundo, contudo, os olhos bonitos da mulher que o
encantou desde que a encarou pela primeira vez, sempre vagavam em suas memórias.
Anos depois e uma coincidência do destino, Oscar descobre que aquele amor não resultou em apenas lembranças que
ele não conseguia tirar da mente, mas também, em uma filha.
UMA FILHA INESPERADA NA MÁFIA
Família Esteves – Livro 3

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SINOPSE
Se no meio do caminho de algumas pessoas tem uma pedra, no meio do caminho de Flávio, sempre teve Dove
Kang.
Ele, um cowboy de sorriso fácil e cheio de piadinhas.
Ela, uma mafiosa que sorri apenas de forma calculada.
Ele, não pode evitar a atração que sente.
Ela, adora ver a forma como o homem mais novo a teme.
O que nenhum deles imaginou é que no meio desse caminho que os une, surgiria uma filha inesperada.
GRÁVIDA DO MAFIOSO QUE NÃO ME AMA
Família Kang – Livro 1

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SINOPSE
O ditado que ela não queria ter como uma realidade, mas era: Hari que amava Kalel que amava Lea que não
amava ninguém.
Ele, conhecido com o diabo da máfia Kang.
Ela, a mulher apaixonada por ele desde os dezoito anos.
Ele, se apaixona por outra, mas acaba na cama dela no fim da noite.
Ela, acorda sozinha na cama, com a notícia de que ele abandonou a máfia.
Hari apenas quer seguir em frente após ser usada, porém se descobre grávida do mafioso que não a ama.
REJEITADA POR UM MAFIOSO
Família Kang – Livro 2

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SINOPSE
E quando você se apaixona por um mafioso?
Ele, o segundo no comando da máfia Kang.
Ela, dez anos mais nova e que não confia em ninguém.
Ele, tenta ajudá-la de todas as maneiras a se abrir.
Ela, tenta vê-lo apenas como um irmão, mas acaba falhando.
Hinata se apaixona por um mafioso, só não esperava que seria rejeitada por ele.
UMA FAMÍLIA INESPERADA PARA O MAFIOSO
Família Kang – Livro 3

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SINOPSE
Sara Hernández ficou viúva aos vinte e dois anos, com uma filha de quatro anos, e fará de tudo para protegê-la. Até
mesmo, se casar por contrato com um homem estrangeiro, que pertence à máfia mais respeitada e temida.
Chae Kang está no México por uma razão: se responsabilizar pela máfia da sua família e fazer o Cartel se reerguer.
Ele só não esperava encontrar algo além do seu objetivo e trabalho: uma família inesperada.
UMA GRAVIDEZ INESPERADA PARA O MAFIOSO
Família Kang – Livro 4

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SINOPSE
Se no meio do caminho de algumas pessoas tem uma pedra, no meio do caminho de Paola, sempre teve Vincenzo
Kang.
Ele, o chefe da máfia mais temida e respeitada.
Ela, à venda para um contrato de casamento desde que nasceu.
Ele, um homem que vive apenas para os irmãos e pelo seu legado.
Ela, uma mulher que tenta se livrar do fardo do seu sobrenome.
Nas brincadeiras que o destino lhes prega, os dois sempre se encontram. Porém, o que nenhum deles imaginava era
que em algum momento seriam de fato unidos, e ainda mais, que seria por UMA GRAVIDEZ INESPERADA.
Junqueira-Dias

UM NAMORO DE MENTIRINHA COM O CEO

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Sinopse
Iara Junqueira acreditou ter encontrado o cara certo. Porém, tudo muda de figura,
quando ela descobre que na verdade, não passou de uma aposta para ele. O que ela menos
imaginava era que naquele exato o momento, Caio Vieira, o homem que ela mais evitava e que
era seu inimigo número um, faria a proposta mais descabida possível para ajudá-la a se
vingar: um namoro de mentirinha.
UMA FAMÍLIA DE MENTIRINHA COM O COWBOY

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Sinopse

Helena Junqueira apenas aceitou que nunca encontraria o cara certo. Porém, tudo
muda de figura, quando ela viaja a trabalho para o interior e acaba sendo literalmente atropelada
por um garotinho em uma bicicleta. O que ela menos imaginava era que em algum momento, se
autointitularia a madrasta dele e a falsa namorada do seu pai, e eles formariam uma família de
mentirinha.
UMA GRAVIDEZ DE MENTIRINHA COM O VIÚVO

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Sinopse

Sabrina Junqueira tinha apenas um objetivo: cuidar e proteger suas irmãs. O que ela
menos imaginava era que em algum momento, estaria de frente com o único homem que
conseguiu chegar até o seu coração a ponto de quebrá-lo, e que após uma mentirinha de nada, ela
se descobriria grávida dele.
UM CASAMENTO DE MENTIRINHA COM O COWBOY

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Sinopse

O que todo casamento de verdade tem que ter?


Os noivos, claro. Quem se importa e amamos, para se celebrar. Surpresas especiais,
com toda certeza. E uma pequena confusão, para jamais ser esquecido.
Mas, é possível um casamento de mentirinha ter tudo isso?
REJEITADA & GRÁVIDA DO VIÚVO QUE NÃO ME AMA

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Sinopse

Quando uma noite com o cara que sempre sonhou se torna um pesadelo?
Eliana não acreditou, quando teve a chance de ter o homem que sempre desejou,
literalmente em suas mãos, mesmo que por poucas horas. Contudo, ela ficou ainda mais
incrédula, quando se descobriu grávida dele.
O que ela não esperava era que aquela história terminaria muito antes de qualquer
começo: com ela grávida e rejeitada pelo viúvo que não a ama.
[1] Cruel Summer – Taylor Swift
[2] right where you left me – Taylor Swift
[3] All Too Well 10 minute version – Taylor Swift
[4] All To Well 10 minute version – Taylor Swift
[5]
Oppa e Unnie são usados pelas mulheres para se referir a homens e mulheres mais velhos, enquanto Hyung e
Noona são utilizados com o mesmo propósito, mas pelos homens. Utilizado com pessoas que você tem intimidade, esses
honoríficos coreanos podem ser usados para se referir à sua irmã ou irmão mais velho, assim como a um(a) amigo(a) ou
namorado(a) mais velho(a). Fonte: <https://hallyubrasil.com/blog/lingua-coreana/honorificos-coreanos>
[6]
Mamãe em coreano.
[7]
Oppa e Unnie são usados pelas mulheres para se referir a homens e mulheres mais velhos, enquanto Hyung e
Noona são utilizados com o mesmo propósito, mas pelos homens. Utilizado com pessoas que você tem intimidade, esses
honoríficos coreanos podem ser usados para se referir à sua irmã ou irmão mais velho, assim como a um(a) amigo(a) ou
namorado(a) mais velho(a). Fonte: <https://hallyubrasil.com/blog/lingua-coreana/honorificos-coreanos>
[8] right where you left me – Taylor Swift

[9] Say Don’t Go – Taylor Swift


[10] right where you left me – Taylor Swift
[11]
right where you left me – Taylor Swift
[12]
Cruel Summer – Taylor Swift
[13]
Is It Over Now? – Taylor Swift
[14] Is It Over Now? – Taylor Swift
[15]
Say Don’t Go – Taylor Swift
[16]
Maroon – Taylor Swift
[17]
Maroon – Taylor Swift
[18] Say Don’t Go – Taylor Swift
[19]
Say Don’t Go – Taylor Swift
[20]
this is me trying – Taylor Swift
[21]
Question...? – Taylor Swift
[22] delicate – Taylor Swift
[23]
willow – Taylor Swift
[24]
willow – Taylor Swift
[25]
it's time to go – Taylor Swift
[26]
Karma – Taylor Swift
[27]
Afterglow – Taylor Swift
[28] Daylight – Taylor Swift
[29]
Cornelia Street – Taylor Swift
[30]
Dress – Taylor Swift
[31]
Delicate – Taylor Swift
[32]
Out Of the Woods – Taylor Swift
[33] invisible string – Taylor Swift
[34]
Sweet Nothing – Taylor Swift
[35]
Is It Over Now? – Taylor Swift

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