Retratos Da Psicologia

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D E N I S E D E M ATO S M A N O E L S O U Z A

F E L I P E M AC I E L D O S S A N TO S S O U Z A
O RGA N I Z A D O R E S

Práticas e Saberes no Brasil


RETRATOS DA PSICOLOGIA
Práticas e Saberes no Brasil
AVALIAÇÃO, PARECER E REVISÃO POR PARES
Os textos que compõem esta obra foram avaliados por pares e indicados para publicação.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Bibliotecária responsável: Maria Alice Benevidez CRB-1/5889

Retratos da Psicologia: práticas e saberes no Brasil [recurso


eletrônico] / [orgs.] Denise de Matos Manoel Souza. Felipe
Maciel dos Santos Souza. – 1.ed. – Curitiba-PR
Editora Bagai, 2023.

Recurso digital.

Formato: e-book

Acesso em www.editorabagai.com.br

ISBN: 978-65-5368-172-9

1. Ciência. 2. Profissão. 3. História.


I. Souza, Denise de Matos Manoel. 2. Souza,
Felipe Maciel dos Santos.
10-2023/04 CDD 150

Índice para catálogo sistemático:


1. Psicologia 150

https://doi.org/10.37008/978-65-5368-172-9.02.01.23
R

Proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização prévia da Editora BAGAI por qualquer processo, meio
ou forma, especialmente por sistemas gráficos (impressão), fonográficos, microfílmicos, fotográficos, videográficos, repro-
gráficos, entre outros. A violação dos direitos autorais é passível de punição como crime (art. 184 e parágrafos do Código
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Lei dos Direitos Autorais).

Este livro foi composto pela Editora Bagai.

www.editorabagai.com.br /editorabagai
/editorabagai [email protected]
Denise de Matos Manoel Souza
Felipe Maciel dos Santos Souza
Organizadores

RETRATOS DA PSICOLOGIA
Práticas e Saberes no Brasil
1.ª Edição - Copyright© 2023 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Bagai.

O conteúdo de cada capítulo é de inteira e exclusiva responsabilidade do(s) seu(s) respectivo(s) autor(es). As normas
ortográficas, questões gramaticais, sistema de citações e referencial bibliográfico são prerrogativas de cada autor(es).

Editor-Chefe Cleber Bianchessi

Revisão Os autores

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Capa Alexandre Lemos

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Dra. Andréia de Bem Machado – UFSC
Dra. Andressa Graziele Brandt – IFC - UFSC
Dr. Antonio Xavier Tomo - UPM - MOÇAMBIQUE
Dra. Camila Cunico – UFPB
Dr. Carlos Alberto Ferreira – PORTUGAL
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Dr. Rogério Makino – UNEMAT
Dr. Reiner Hildebrandt-Stramann - Technische Universität Braunschweig - ALEMANHA
Dr. Reginaldo Peixoto – UEMS
Dr. Ricardo Cauica Ferreira - UNITEL - ANGOLA
Dr. Ronaldo Ferreira Maganhotto – UNICENTRO
Dra. Rozane Zaionz - SME/SEED
Dra. Sueli da Silva Aquino - FIPAR
Dr. Tiago Tendai Chingore - UNILICUNGO – MOÇAMBIQUE
Dr. Thiago Perez Bernardes de Moraes – UNIANDRADE/UK-ARGENTINA
Dr. Tomás Raúl Gómez Hernández – UCLV e CUM – CUBA
Dra. Vanessa Freitag de Araújo - UEM
Dr. Willian Douglas Guilherme – UFT
Dr. Yoisell López Bestard- SEDUCRS
SUMÁRIO

O PAPEL DO CAPS-I E DAS AÇÕES INTERSETORIAIS NAS


POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL PARA O CUIDADO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE....................................................... 9
Beatriz Brezinski Soares | Magda do Canto Zurba

LUTO INFANTIL E SUAS CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS.19


Andressa Ivanez Freitas | Denise de Matos Manoel Souza

SER ADOLESCENTE E LGBT+: TENSÕES FRENTE AO


DESENVOLVIMENTO NÃO HETERONORMATIVO................. 31
João Ricardo dos Santos Rocha | Jose Valdeci Grigoleto Netto

ATENDIMENTO PSICOLÓGICO ON-LINE: DESAFIOS ATUAIS


DA PSICOLOGIA BRASILEIRA......................................................... 45
Cintia Paloma Lopes Lima | Paulo Yoo Chul Choi | Francisco Diógenes Lima de Assis

“NO PRINCÍPIO, ERA O VERBO (...)”: A PRODUÇÃO BRASILEIRA


SOBRE ANÁLISE DO COMPORTAMENTO E RELIGIÃO........ 59
José Américo Dinizz Júnior | Felipe Maciel dos Santos Souza

A IMPORTÂNCIA DA PSICOLOGIA JURÍDICA NA ADOÇÃO.73


Robério Gomes dos Santos | Narcelyanne Maria Alves de Morais Teixeira |
Rosimeire Alves Bezerra | Antônia Gabrielly Araújo dos Santos

SOBRE OS ORGANIZADORES......................................................... 88
ÍNDICE REMISSIVO............................................................................. 89
APRESENTAÇÃO

O ano de 2022 foi especial. Neste ano, foram comemorados


os 60 anos de regulamentação da profissão de Psicologia no Brasil,
as psicólogas e psicólogos exerceram a cidadania e defenderam a
democracia brasileira nas eleições dos Conselhos Regional e Federal
de Psicologia além das escolhas para Deputado(a) Estadual, Federal,
Senador(a), Governador(a) e Presidente da República.
Com a publicação da obra “Retratos da Psicologia: Práticas e
Saberes no Brasil” apresenta-se um documento em que se celebra o
esforço das psicólogas e dos psicólogos para o fortalecimento da Psi-
cologia brasileira como espaço de atuação técnica, científica e política
de promoção de cuidado à saúde e da dignidade humana. Os capítulos
compilados são resultados de pesquisas realizadas em diversas Insti-
tuições de Ensino Superior do Brasil, a saber: Centro Universitário da
Grande Dourados (UNIGRAN), Centro Universitário UniFatecie,
Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal da Grande
Dourados (UFGD) e Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
No contexto brasileiro, crianças e adolescentes são reconhecidos
como sujeitos de direitos a partir da criação do Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA). No primeiro capítulo, Beatriz e Magda
discorrem acerca das políticas públicas de saúde mental a crianças e
adolescentes, focando no papel da intersetorialidade e no protagonismo
do Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPS-i).
Embora a morte e o luto sejam temas difíceis de serem com-
preendidos; no capítulo 2, Andressa e Denise discorrem sobre o luto
infantil e suas consequências psicológicas. As autoras defendem que
quando o processo de luto é vivenciado por crianças, tende a ser mais
complexo, ainda mais quando a morte acontece no contexto familiar,
com a perda de um dos genitores ou de ambos.
O Brasil é um país extremamente preconceituoso, onde os índices
de assassinatos de LGBT+’s são os maiores do mundo. Sabendo que
a adolescência é uma construção social, João Ricardo e José elucidam,
no capítulo três, de quais maneiras a adolescência de pessoas LGBT+
é diferente da de pessoas heterossexuais, apresentando quais são os
aspectos que fazem com que a experiência da adolescência em pessoas
não heterossexuais apresente particularidades.
A pandemia causada pela Covid-19 e suas variantes impactou
significativamente no âmbito da saúde, atingiu de diferentes formas
os profissionais da saúde e a população geral. Considerando a necessi-
dade de se oferecer o atendimento psicológico clínico com respeito às
medidas de segurança sanitárias, Cintia, Paulo e Francisco discorrem,
no quarto capítulo, sobre o atendimento psicológico on-line, caracte-
rizando-o como um desafio atual da Psicologia brasileira.
No quinto capítulo, José Américo e Felipe apresentam a pro-
dução brasileira sobre Análise do Comportamento e Religião. Os
autores consideram que a religião como elemento do desenvolvimento
e realizaram um levantamento de dissertações e teses defendidas
no Brasil e de artigos publicados nas principais revistas brasileiras
da área. Por fim, no capítulo seis, Robério, Narcelyanne, Rosimeire
e Gabrielly destacam a importância da Psicologia Jurídica na ado-
ção, ressaltando que durante o processo de adoção, o(a) psicólogo(a)
aplica entrevistas, seja individualmente ou com todas as partes juntas,
com vista a entender a dinâmica familiar, a motivação para adotar,
bem como, os medos, angústias, dúvidas, expectativas da criança/
adolescente e os futuros pai/mãe.
Por fim, no quinto capítulo, José Américo e Felipe apresentam a
produção brasileira sobre Análise do Comportamento e Religião. Os
autores consideram que a religião como elemento do desenvolvimento
e realizaram um levantamento de dissertações e teses defendidas no
Brasil e de artigos publicados nas principais revistas brasileiras da área.
Sabe-se que os capítulos apresentados, neste momento, não
cobrem todas as práticas e todos os saberes da Psicologia no Brasil,
mas podem refletir sobre o compromisso da Psicologia, enquanto como
ciência e profissão, de transformação social. Espera-se que o material
possa ser acessível a acadêmicos e profissionais de Psicologia, bem
como a interessados no processo de consolidação da área enquanto
ciência e profissão no Brasil.

Ma. Denise de Matos Manoel Souza


Dr. Felipe Maciel dos Santos Souza
(Organizadores)
O PAPEL DO CAPS-I E DAS AÇÕES
INTERSETORIAIS NAS POLÍTICAS DE
SAÚDE MENTAL PARA O CUIDADO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Beatriz Brezinski Soares1


Magda do Canto Zurba2

A adolescência foi, durante muitos anos, compreendida como um


estágio do desenvolvimento caracterizado pela instabilidade, conflito e
crise. De modo alternativo, também surgiram teorias que buscaram com-
preender o adolescente a partir de sua interação social, histórica, biológica
e institucional, caracterizando-o em uma etapa de mudança de identidade
atrelada ao contexto em que está inserido (OLIVEIRA, 2006).
No contexto brasileiro, crianças e adolescentes passaram a ser
reconhecidos como sujeitos de direitos a partir da criação do Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA), conceituando-os como seres em
desenvolvimento e “por vir” que necessitam de proteção e valorização para
que possam realizar-se em total potência (CASSOL; ZURBA, 2022).
Dessa forma, é dever do Sistema Único de Saúde (SUS) promover políticas
públicas e sociais que garantam a promoção, proteção e recuperação de
saúde para essa população (BRASIL, 2004).
A partir da perspectiva dos “determinantes sociais da saúde” (DA
ROS, 2006) que norteia as políticas públicas de saúde mental, com-
preende-se que os serviços ofertados no SUS têm o objetivo de ir além
do tratamento puramente físico, devendo pautar-se em ações de escuta,
acolhimento, emancipação e enfrentamento de estigmas, considerando a
singularidade do indivíduo e agindo em caráter territorial. Nessa direção,
o Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPS-i) constitui-se
1
Graduanda em Psicologia UFSC). Colaboradora de projetos em CAPS-i.
CV: http://lattes.cnpq.br/1333743680620312
2
Pós-doutorado em Psicologia Social (PUC-SP). Doutorado em Educação (UFSC). Professora Titular
do Departamento de Psicologia (UFSC). CV: http://lattes.cnpq.br/6389120640892981
9
como um serviço de atenção diária da Rede de Atenção Psicossocial
(RAPS) destinado a atender crianças e adolescentes em sofrimento psí-
quico intenso ou transtornos mentais graves e persistentes.
Considerando as características desenvolvimentais da adolescên-
cia e o acolhimento como um instrumento de efetivação do SUS, este
capítulo tem o objetivo de discorrer acerca das políticas públicas de saúde
mental a crianças e adolescentes, focando no papel da intersetoriali-
dade e no protagonismo do CAPS-i.

A REDE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL E O LUGAR DA


INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA

De maneira geral, compreende-se que o movimento das reformas


psiquiátricas tem seu ponto de partida em diversos países após a Segunda
Guerra Mundial, a qual pôs em destaque as condições desumanas a que
estavam submetidos os pacientes internados nos hospícios da época, tra-
zendo contestações ao modelo biomédico vigente (SCHNEIDER, 2015).
Amarante (2007), para fins didáticos, divide as principais experiências
que ocorreram nesses países em grupos: o da Comunidade Terapêutica
e Psicoterapia Institucional, que preconiza modificações nos moldes da
instituição hospitalar; o da Psiquiatria de Setor e Psiquiatria Preven-
tiva, que propõe o desmonte do modelo hospitalar a partir de serviços
assistenciais de cuidado terapêutico; e o da Antipsiquiatria e Psiquiatria
Democrática, que se contrapõe ao modelo científico psiquiátrico como um
todo, buscando a superação do manicômio tanto em termos de estrutura
física quanto das práticas fundadas no isolamento, segregação e pato-
logização da experiência humana.
De acordo com Tenório (2002), a experiência das Comunidades
Terapêuticas chegou ao Brasil na década de 1960, com o objetivo de
remodelar as relações existentes entre pacientes, profissionais e instituição
nos hospitais psiquiátricos, pautando-se em um modelo psicanalítico
discursivo e organizacional. O autor destaca que essa tentativa se limitou
à superfície da questão, sem transformações profundas no modo de cui-
10
dado, sendo que foi absorvida pelo conservadorismo dos manicômios.
Posteriormente, o movimento da Psiquiatria Preventiva e Comunitária
buscou inserir a ideia de promoção de saúde mental a partir da organização
social e comunitária para a prevenção da doença, em contraposição ao
asilo como um fim para as pessoas doentes. Tal perspectiva também teve
suas limitações, em função do caráter eugenista e de normatização social
a qual recai a partir da ideia de intervir na comunidade para ajustar os
indivíduos à normalidade e à saúde mental.
Ainda que tais experiências não tenham se configurado como
exitosas, influenciaram de modo importante o movimento de reforma
psiquiátrica que se consolidou no Brasil a partir da segunda metade da
década de 1970. Schneider (2015) aponta a Antipsiquiatria e a Psiquiatria
Democrática italiana, a partir dos movimentos de Franco Basaglia, como
influência importante na formação da Reforma Psiquiátrica Brasileira.
Sobre esse período, Amarante (2007) sustenta que as experiências de
diversos países foram incorporadas ao processo brasileiro, de modo que
um novo cenário político foi configurado, com expressiva participação
social na construção do campo da saúde mental e atenção psicossocial.
Tenório (2002) demonstra que é no contexto de redemocratiza-
ção do país que a Reforma Psiquiátrica Brasileira ganha espaço, a partir
das críticas à política ineficiente de saúde e as denúncias de fraudes no
financiamento dos serviços e de violência e maus-tratos aos pacientes
internados nos hospícios. Nesse sentido, iniciou-se o movimento sanitário
que apostava na ideia de uma gestão competente dos recursos públicos
para transformar o sistema e melhorar a assistência em saúde. Já em 1987,
a I Conferência Nacional de Saúde Mental marca o início do caráter de
desinstitucionalização do movimento, estabelecendo, além das mudanças
no sistema de saúde, a preocupação com a relação à sociedade e à cultura
da loucura, questionando as práticas psiquiátricas a partir da perspectiva
de “cidadania do louco” e inserindo também a participação dos usuários e
familiares no processo da Luta Antimanicomial. Dessa forma, a reforma

11
psiquiátrica idealizou novos dispositivos de cuidado que fossem diversi-
ficados, abertos e de natureza territorial.
Nesse contexto, a criação das políticas públicas parte do modo
psicossocial de cuidado, compreendendo que o fenômeno saúde/doença
possui uma dimensão sociocultural indissociável do processo de sofrimento
psíquico, tendo como temas centrais a articulação em rede, a territoriali-
dade e a acolhida (SCHNEIDER, 2015). Um importante marcador da
composição da rede de atenção à saúde mental foi a criação dos Centros de
Atenção Psicossocial (CAPS), que possuíam papel estratégico de assistência
direta à população, regulação e assessoria da rede de serviços de saúde,
fazendo retaguarda aos Agentes de Saúde, e articulação com recursos de
outras redes (jurídica, educacional, entre outras) (BRASIL, 2004).
A partir do papel estratégico que o CAPS desempenhava na rede de
saúde mental e diante da necessidade de que esta estivesse articulada com
outras instituições para garantir sua efetividade, Schneider (2015) aponta
o surgimento da necessidade de cuidado integral do sujeito pelo Sistema
de Saúde, o que exigiu a integração dessa rede de saúde mental ao Sistema
Único de Saúde. Nesse sentido, iniciaram-se ações de inserção desta na
Atenção Básica e na Estratégia de Saúde da Família, incluindo em 2003
o apoio matricial das equipes de Saúde Mental à Atenção Básica, com o
objetivo de compartilhar saberes entre os profissionais para um cuidado
de saúde integral. Já em 2008, houve a criação dos Núcleos de Apoio à
Saúde da Família (NASF), contribuindo para a descentralização da rede
de saúde mental e, por fim, a integração da rede de saúde com a saúde
mental, resultando na criação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) a
partir da Portaria nº 3.088 de 2011. A partir disso, observa-se o desenho
de uma rede interligada e horizontal com diferentes pontos de atenção,
que se conecta também à Rede de Atenção em Saúde.
A RAPS, portanto, prevê a criação, a ampliação e a articulação
de pontos de atenção à saúde para pessoas com sofrimento, transtorno
mental e necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas no
âmbito do SUS. Entre seus objetivos gerais, destaca-se a ampliação do
12
acesso à atenção psicossocial, a vinculação da população aos pontos de
atenção e a integração desses pontos no território, com cuidado a par-
tir do acolhimento, acompanhamento contínuo e atenção às urgências
(BRASIL, 2014). Ela é composta da Atenção Básica em Saúde, Atenção
Psicossocial Estratégica, Atenção de Urgência e Emergência, Atenção
Residencial de Caráter Transitório, Atenção Hospitalar, Estratégias de
Desinstitucionalização e Estratégias de Reabilitação Psicossocial.
No âmbito da Atenção Psicossocial Estratégica, os Centros de
Atenção Psicossocial (CAPS) possuem equipe multiprofissional que
atua de maneira interdisciplinar e realiza o atendimento de pessoas com
sofrimento psíquico ou transtornos mentais graves e persistentes, atuando
de maneira territorial e configurando-se como um serviço de porta aberta,
capaz de receber a demanda espontânea da população que busca o serviço
(BRASIL, 2014). Existem diversas modalidades que diferem de acordo
com a população do território e o público a que se destinam: CAPS I (entre
20 mil e 70 mil habitantes), CAPS II (entre 70 mil e 200 mil habitantes),
CAPS III (acima de 200 mil habitantes, com funcionamento 24 horas,
CAPSad (acima de 100 mil habitantes, para transtornos decorrentes
do álcool e drogas e CAPSi (acima de 200 mil habitantes, destinado a
crianças e adolescentes) (BRASIL, 2004).
O CAPS caracteriza-se como um modelo substitutivo às interna-
ções hospitalares, que busca atender a população do território a partir do
acompanhamento clínico e da reinserção social dos usuários a partir do
lazer, direitos civis e fortalecimento de vínculos comunitários. O aten-
dimento nesse dispositivo é feito a partir de encaminhamento de outros
serviços ou a partir da demanda espontânea. Ao chegar no CAPS, o
indivíduo é acolhido por um profissional da equipe. O acolhimento tem
o objetivo de compreender a situação atual desse indivíduo e estabelecer
um vínculo terapêutico com os profissionais, a fim de dar continuidade
ao acompanhamento (BRASIL, 2004).
O acolhimento é uma das diretrizes da Política Nacional de Huma-
nização do SUS, constituindo-se como uma ferramenta de escuta, cons-
13
trução de vínculo e garantia de acesso aos serviços, pautado na respon-
sabilização e resolutividade. Ele se constitui no encontro com o outro
e implica em um compartilhamento de saberes e angústias, no qual o
profissional toma a responsabilidade de escutar a queixa, avaliar os riscos
e acolher a avaliação do próprio usuário. Na medida em que implica em
responsabilidade, o acolhimento não é pontual, mas se estende para outros
processos do serviço (NEVES; ROLLO, 2006).
No contexto infanto juvenil, a preferência é de que crianças e ado-
lescentes sejam atendidos nos serviços específicos a esse público quando
existentes na região. Desse modo, o acolhimento das necessidades e as
intervenções deve considerá-los como sujeitos de direitos em sua singu-
laridade, reconhecendo a voz e a escuta de cada um. Em casos em que a
demanda acolhida não possa ser acompanhada pelo serviço em questão,
faz-se necessário o encaminhamento para o serviço da rede mais adequado
à situação, de maneira implicada e responsável, permanecendo com o
acompanhamento até a inclusão no outro serviço (BRASIL, 2014).

O ACOLHIMENTO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES


NA RAPS: ENTENDENDO O PROTAGONISMO DO
CAPS-i

O público de crianças e adolescentes com sofrimento agravado


é o foco dos serviços dos CAPS-i. Estudos demonstram que grande
parte destas pessoas contam com algum tipo de diagnóstico baseado
em códigos CID-Código Internacional de Doenças (OMS, 2022), tais
como como transtorno de comportamento, transtornos emocionais e
transtornos do desenvolvimento.
Observa-se que o próprio SUS requer, em seu preenchimento de
formulários dos serviços CAPS, que a população atendida conte com algum
diagnóstico e código CID para o devido cumprimento das atividades
no serviço. Por outro lado, Delfini et al. (2009) descrevem que muitos
encaminhamentos ocorrem em função de queixa escolar, como dificul-
dade aprendizagem, falta de rendimento, inadequação comportamental;
14
comportamentos de agressividade, problemas sociocomportamentais
(como rebeldia, mentiras, envolvimento em brigas, heteroagressão e falta
de limites). Outra parcela de casos aparece com problemas de ansiedade,
isolamento, falta de interação social ou angústia. Além destes, são comuns
também o comprometimento da fala, a vivência de situações de violência,
abusos e maus tratos. Nesse sentido, reitera-se o preconizado pelo Minis-
tério da Saúde, configurando o CAPS como um dispositivo de atenção
às pessoas com sofrimento psíquico agravado.
No contexto de um CAPS infanto-juvenil, a entrada da criança ou
adolescente se dá através do acolhimento. No processo do acolhimento,
é realizada a avaliação de risco do usuário, com o objetivo de compreen-
der a gravidade do sofrimento psíquico e avaliar se esta é uma demanda
para o serviço. Quando considerado que a demanda deve ser atendida
no CAPSi, o caso é discutido pela equipe do serviço, a fim de elaborar o
Projeto Terapêutico Singular (PTS) da criança ou adolescente no local.
O projeto terapêutico é construído em conjunto com a família e com o
usuário, sendo definido pelas atividades que serão realizadas no CAP-
S-i ou em outros pontos da rede. O PTS costuma ser dinâmico, sendo
modificado no decorrer da trajetória do usuário no serviço.
É importante ressaltar que, por se tratar de um trabalho multipro-
fissional e interdisciplinar, a elaboração do PTS busca inserir o usuário em
diversas atividades do serviço para que crie vínculos com toda a equipe,
com outros usuários e compareça ao CAPS com frequência, configurando
a intensificação dos cuidados. Nesse sentido, além dos atendimentos indi-
viduais com médico psiquiatra ou psicólogo, os usuários são convidados a
participar de grupos e oficinas terapêuticas com diferentes temas.
A intensificação de cuidados é compreendida como:
tecnologias terapêuticas e sociais que visam o fortaleci-
mento e a potencialização dos vínculos do indivíduo com
seu grupo social, além do estabelecimento de novas relações
que o fortaleçam na sociedade. Desse modo, o cuidado
intensivo requer investimento humano e coloca-se como
15
a alternativa à internação em casos graves de sofrimento
psíquico” (SILVA 2007, p. 40 apud SILVA et al., 2010).

Além do cuidado integral à criança e ao adolescente, o manejo com


os cuidadores e responsáveis também é importante para o acompanha-
mento. Desse modo, a equipe também realiza atendimentos familiares e
individuais com os responsáveis. Neste sentido, há a possibilidade de ofici-
nas e grupos específicos com os cuidadores, recurso que tem se mostrado
muito eficaz para a construção de estratégias de manejo, comunicação e
proteção às crianças e adolescentes.
Enfim, as ações de CAPS-i na atenção à saúde mental infantoju-
venil devem sempre se somar a várias outras, em um processo de diálogo
intersetorial permanente, como apontam vários autores, tais como Zanini
e Luzio (2014). A intersetorialidade é um aspecto fundamental neste
contexto, pois o projeto terapêutico singular também inclui a articulação
da equipe com a rede de atenção psicossocial e instituições de assistência
social, justiça, educação e cultura. Tal articulação ocorre por meio de
reuniões de discussão ou visitas a esses locais, bem como formas variadas
que são criadas nos diferentes municípios do contexto brasileiro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A atenção à saúde mental na infância tem sido um dos maiores


desafios contemporâneos. Grande parte das teorias psicológicas apon-
tam a importância dos primeiros anos de vida na organização psíquica
da vida adulta, seja pela concepção de estrutura psíquica da psicanálise;
seja pela noção de desenvolvimento contínuo na relação consciência-
-objeto apontada nas teorias de bases fenomenológicas (gestalt-terapia,
existencialismo sartreano, psicodrama, entre outras); seja pela ênfase nas
primeiras aprendizagens vividas conforme as teorias cognitivas e de base
comportamental. Ou seja, existe um importante consenso em saúde mental
sobre a relevância do cuidado à infância e adolescência.
Acrescido a isto, trata-se também de um direito da criança e do
adolescente ter acesso ao cuidado em saúde mental, embora na maior parte
16
das vezes não seja este pequeno e jovem usuário do SUS a buscar pelo
atendimento. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) aponta algu-
mas diretrizes importantes sobre esse direito, mas não pode mesmo assim
assegurar a qualidade destas proposições no tumultuado cotidiano brasileiro,
pois cada Município e Estado trata de forma diferente as prioridades de
implantação dos dispositivos da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS).
Somente o fortalecimento das instituições públicas de saúde, acom-
panhada das ações intersetoriais, pode aumentar o acesso ao acolhimento
e a garantia de direitos infantojuvenil. Haja visto o que vivemos no Brasil
nos duros anos de COVID-19, período no qual tivemos o amplo fecha-
mento das escolas no país, vimos os índices de violência doméstica contra
crianças e adolescentes aumentar assombrosamente (MATOS, 2021).
Neste sentido, embora o CAPS-i seja o protagonista principal nesta
rede de cuidados, não é potente o suficiente para solucionar sozinho os
problemas de enorme complexidade que chegam. Isto ocorre porque,
mesmo que o SUS exija um Código Internacional de Doenças (CID)
(OMS, 2022) para prosseguir com os atendimentos no âmbito dos CAPS,
o trabalho multiprofissional nunca estará focado apenas no diagnóstico,
mas na pessoa, nas suas redes de cuidado e proteção, nas suas formas de
subjetivação na cidade, na família, na escola e nas principais instituições
que o rodeiam. E esta é justamente a potência da atenção psicossocial:
escapar dos rótulos impostos pelos transtornos e focar na capacidade de
saúde das pessoas em sofrimento, ampliando consciência sobre as possi-
bilidades de ser e existir no mundo contemporâneo.

REFERÊNCIAS
AMARANTE, P. Saúde mental e atenção psicossocial. SciELO-Editora FIOCRUZ, 2007.
BRASIL; MINISTÉRIO DA SAÚDE. Atenção psicossocial a crianças e adolescentes no SUS:
tecendo redes para garantir direitos. Brasília, 2014. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/
bvs/publicacoes/atencao_psicossocial_criancas_adolescentes_sus.pdf. Acesso em: 20 out. 2022.
BRASIL; MINISTÉRIO DA SAÚDE. Saúde mental no SUS: os centros de atenção psicos-
social. Brasília, 2004. Disponível em: http://www.ccs.saude.gov.br/saude_mental/pdf/sm_sus.
pdf. Acesso em: 30 set. 2022.
17
CASSOL, M.S. & ZURBA, M.C. Políticas públicas de saúde mental no cuidado a crianças e
adolescente no Brasil: das fragilidades às intencionalidades. In: GUILHERME, W.D. Política
em foco: debates e embates. Curitiba: Bagai, 2022, p. 115-128.
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18
LUTO INFANTIL E SUAS CONSEQUÊNCIAS
PSICOLÓGICAS

Andressa Ivanez Freitas3


Denise de Matos Manoel Souza4

INTRODUÇÃO

O Luto é um processo que acontece após a morte de alguém, as


pessoas próximas ao indivíduo falecido, como familiares e amigos tendem
a sentir diversas emoções e sentimentos após a perda desse alguém que era
próximo, podendo causar um impacto no seguimento da vida dessas pessoas.
A morte e o luto são temas difíceis de serem compreendidos, pois
são muito particulares e podem ser vivenciados de maneiras diferentes.
Quando o processo de luto é vivenciado por crianças, tende a ser mais
complexo, ainda mais quando a morte acontece no contexto familiar,
com a perda de um dos genitores ou de ambos.
Para Franco e Mazorra (2007), a morte de um genitor é uma das
experiências mais impactantes que a criança pode vivenciar, pois estará
diante da ausência irreversível da pessoa a qual ela possuía um vínculo
provedor de sustentação. Diante disso, a criança se depara com sentimentos
profundos de desamparo e impotência, não entendendo como ficará sua vida.
Com a perda de um dos pais, a criança perde o mundo que
já conhecia, no qual o genitor podia se afastar e ao qual retornava.
Com o seu “mundo” enlutado, torna-se difícil lidar com todos os
sentimentos que surgem e que parecem desmoronar seu ambiente
familiar. Sendo assim, o luto é um processo de reorganização e recons-
trução, sendo um desafio emocional e cognitivo do qual ela precisará
lidar (FRANCO; MAZORRA, 2007).
3
Acadêmica do curso de Psicologia (UNIGRAN). CV: http://lattes.cnpq.br/2698592006401873
4
Mestra em Psicologia (UCDB). Professora do curso de Psicologia (UNIGRAN).
CV: http://lattes.cnpq.br/6413714296568114
19
O contexto da morte é um ponto a ser levado em consideração.
Entende-se que a morte repentina de um genitor, por exemplo, dife-
rencia-se em seu impacto sobre a vida e sobre toda estrutura emo-
cional da criança, em relação às mortes que já possam ser esperadas
ou compreendidas com mais facilidade como resultado do ciclo vital,
tais como morte de avós e pais já idosos, quando o filho está numa
fase de idade adulta (ANTON; FAVERO, 2011).

O PROCESSO DE LUTO

O Luto é comumente associado ao processo após a morte de


um ente querido, porém, para Ramos (2016, p. 1) “quando estamos
perante o término de uma relação amorosa ou a perda de um membro
do nosso corpo após um acidente ou após uma cirurgia, ou quando
perdemos um animal de estimação, estamos igualmente a falar de luto”.
O processo de luto possui uma definição complexa, pois, cada
pessoa irá vivenciá-lo de uma forma diferente, seja pela cultura, pela
religião, pela proximidade com a pessoa ou até mesmo pelo contexto
da morte, esses e muitos outros motivos podem influenciar na maneira
que o indivíduo vai encarar o luto (RAMOS, 2016).
Para Kovács (2008), a morte é um tema sobre o qual se discute
sem nada poder se afirmar com certezas e verdades absolutas. A morte,
quando pronunciada, desperta curiosidade, mas, também, provoca
desconforto e vem sempre acompanhada de muitas dúvidas e emoções.
O processo de luto vivenciado por crianças pode ser diferente,
dependendo da idade, ela não terá conhecimento de que a morte é algo
irreversível e tampouco terá dimensão das mudanças que poderão ocor-
rer na sua vida com a perda de um ente (ANTON; FAVERO, 2011).
Até os quatro anos de idade a criança não consegue perceber o
conceito da morte, apesar de sentir a perda, nessa fase é importante
deixar muito claro para a criança que a pessoa morreu, para ela não criar
esperanças de um retorno. Entre os cinco e sete anos a criança já entende
20
e pode receber uma explicação mais concreta e detalhista do que ocorreu.
A partir dos oito anos a criança já entende a morte como algo perma-
nente, porém para ela não será algo natural, podendo causar distorções
e fazendo com que a criança se sinta culpada ou punida, neste caso um
adulto responsável deve auxiliá-la. Por fim, aos nove anos a criança já
entende a morte como algo que acontecerá com todos, sendo capaz de
compreender as conversas entre a adultos (ANTON; FAVERO, 2011).
Muitos fatores implicam o processo de luto para a criança, por
exemplo: qual a relação que a criança tinha com o ente que partiu,
como é a relação com o responsável que permanece, como avisaram a
criança da morte, e principalmente a dinâmica familiar antes e depois
da perda, entre outros fatores (FRANCO; MAZORRA, 2007).
Em decorrência das mudanças e desorganização que a morte de
alguém próximo e importante traz a vida das pessoas enlutadas, bem como
a dificuldade que pode ser o manejo do luto, se faz importante identificar as
consequências que esse processo pode causar no desenvolvimento da criança,
entendendo se podem surgir prejuízos psicológicos em dado momento.

MATERIAIS E MÉTODOS

A metodologia utilizada para a realização do capítulo foi a pesquisa


bibliográfica exploratória, que para Gil (2002) é baseada na análise de
material já elaborado, em forma principalmente de livros e artigos cientí-
ficos, mas, também pode-se incluir trabalhos apresentados em congressos,
teses, dissertações, relatórios etc. Esse tipo de pesquisa tem por objetivo
saber se já existem respostas para a pergunta central do trabalho, o que
já é conhecido, o que ainda carece de pesquisa e coisas semelhantes.
As buscas foram realizadas na biblioteca Virtual em Saúde
BVS-Psi que é uma ferramenta da área da Psicologia que reúne fon-
tes de informações, apoiando o acesso livre e aberto à informação, a
SciELO que é outra biblioteca virtual de revistas científicas em formato
eletrônico, também, foram utilizados o Google Acadêmico e livros.

21
A pesquisa foi realizada de agosto a novembro de 2022, partindo da
pergunta-problema do trabalho foram realizadas as buscas nas plataformas
de bibliotecas virtuais e em livros, utilizando os termos e/ou descritores
“luto”, “infância”, “genitores”,” luto infantil”, combinados com operadores
booleanos. Após a identificação desses materiais, foi feita a leitura dos resu-
mos, no caso de artigos, e do sumário, no caso de livros, essa leitura foi reali-
zada para verificar se os materiais eram pertinentes aos objetivos da pesquisa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Inicialmente, com a utilização dos descritores nas bibliotecas


virtuais foram encontrados 80 artigos na BVS-Psi e 266 na SciELO,
totalizando 346 artigos. Foram excluídos artigos em línguas estrangeiras
e, após a leitura dos resumos, excluídos os que não possuíam nenhuma
relação com o contexto de luto infantil. Ao término da seleção, foram
incluídos 10 artigos científicos para compor os resultados deste trabalho.

Quadro 1 – Apresentação dos artigos


TÍTULO AUTORES(AS) ANO
Experiências de Perda e de Luto em
DOMINGOS; MALUF 2003
Escolares de 13 a 18 Anos
Criança e luto: Vivências fantasmáticas
FRANCO; MAZORRA 2007
diante da morte do genitor
Luto e perdas repentinas: Contribuições
BASSO; WAINER 2011
da Terapia Cognitivo- Comportamental
Morte repentina de genitores e Luto
infantil: Uma revisão da literatura em ANTON; FAVERO 2011
periódicos científicos brasileiros
Concepção de morte na infância SENGIK; RAMOS 2013
O Processo de Luto RAMOS 2016
A Patologização do luto: uma revisão
dos manuais diagnósticos e estatísticos VENÂNCIO; OLIVEIRA 2018
de transtornos mentais
Luto Infantil RONCATTO 2019

22
A clínica do luto e seus critérios diagnós-
MICHEL; FREITAS 2019
ticos: Possíveis contribuições de Tatossian
Terapia Cognitivo-Comportamental
e suas contribuições para a abordagem SANTOS; SOARES 2022
do luto infantil
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2022.

A morte costuma ter o poder de provocar a imaginação da huma-


nidade, seus pensamentos sobre o que acontece após, fantasias, algumas
ideias, sentimento e sonhos sobre a morte, tudo isso faz parte da vida
psíquica em todas as fases da existência humana, da infância até a velhice.
Cada indivíduo tem uma disposição particular para encarar o “problema da
morte”, que decorre de dois fatores: experiências da própria história de vida
do indivíduo e ideias e práticas sociais predominantes no lugar e na época
em que se vive. Existem ainda, inúmeras maneiras para lidar com a morte,
pode envolver religião, crenças em alguma outra vida (KOVÁCS, 2008).
As crianças no curso normal da vida, encontram exemplos da
morte, seja por um pássaro, uma borboleta ou qualquer bicho que ela
tenha visto morto, imóvel e não reagindo a nada do que lhe é feito,
este fenômeno se mostra intrigante para a criança, que comumente
irá pedir explicação a um adulto ou a outra criança, e é a partir dessas
explicações que ela desenvolve suas próprias ideias. A resposta dada
à criança pode sofrer grandes variações em decorrência do ambiente
cultural que ela está inserida (BOWLBY, 2004).
As experiências de luto vivenciados por adolescentes foram ana-
lisadas por Domingos e Maluf (2003), contribuindo com informações
relevantes acerca da temática. A pesquisa contou com a participação de 25
escolares brasileiros e residentes da cidade de São Paulo, os participantes
tinham idades entre 13 e 18 anos, e haviam perdido um ente querido
na infância ou na própria adolescência. Os familiares perdidos pelos
adolescentes do estudo não eram apenas os genitores, mas de diferentes
graus de parentesco, como avós, pais, irmãos, tios e primos. Entretanto,
o referido estudo é relevante, visto que traz informações importantes
23
de como foi para os participantes, ainda quando crianças saberem da
morte do familiar, o que sentiram, de que maneira isso ainda se expressa
na adolescência e também como a reação pode ser diferente quando se
leva em conta o motivo da morte e os contextos sociais.
Durante a pesquisa de Domingos e Maluf, foram verificadas 38
perdas entre os participantes, sendo que 21 destas foram por morte
repentina, sobre a informação da perda, a maioria soube do acontecimento
e pôde vivenciar o luto, mas, 11 dos participantes só souberam tardia-
mente, o que segundo as entrevistas, causou revolta e má compreensão
por não terem sido avisadas. As reações as perdas foram diversas, mas as
respostas com relação a perdas repentinas foram mais intensas do que
a reação por perdas já esperadas de familiares que estavam doentes ou
internados. O suporte da família foi avaliado pelos participantes como
pouco eficaz, os adolescentes reconhecem que houve suporte, mas,
que este poderia ter sido melhor caso o ambiente familiar fosse mais
acolhedor. Com relação ao suporte no ambiente escolar, a maioria dos
participantes relataram ter tido um suporte satisfatório de professores
e colegas, mas alguns relataram que obtiveram o contrário, pontuando
que não tiveram apoio da escola e nem dos colegas, por estarem em um
momento difícil e talvez mais afastados. Os adolescentes pontuaram,
também, que sentem dificuldades em compartilharem sobre a perda e
de expressar seus sentimentos. (DOMINGOS; MALUF, 2003).
No que se refere ao ambiente escolar, Paiva (2011) apresenta
uma experiência prática, propondo que as escolas abordassem sobre o
tema da morte com crianças e adolescentes, através do uso da literatura
infantil e biblioterapia. Após passar por escolas, a autora pôde constatar
que poucos os profissionais de escolas públicas e privadas concordaram
em falar sobre o tema com seus alunos, mesmo que através de livros e
histórias, alguns profissionais participantes da pesquisa diziam ser um
assunto muito pesado e que não seria ideal falar a respeito nas aulas, em
contrapartida alguns profissionais disseram ser um assunto necessário,
visto que é um tema importante e que pode fazer parte da vida de
24
qualquer indivíduo e a qualquer momento. A escola ocupa um lugar
essencial no desenvolvimento de crianças e adolescentes, isso porque
ela faz parte da rotina da maioria da população, é nesse ambiente que
geralmente serão realizados os primeiros vínculos fora do âmbito
familiar da pessoa. É um lugar de aprendizado e também de histórias.
Segundo Paiva (2011), embora se evite falar do tema morte nas
escolas, o tema se faz presente de maneira simbólica. Podem ser vistas
como mortes simbólicas quando a criança muda de uma série para outra,
quando muda de escola, de professores, dos amigos, perdas financeiras e
também processos de separação, para a autora ainda que essas perdas não
se tratem de uma morte concreta, elas eliciam sentimentos semelhantes, e
são as elaborações dessas pequenas perdas que vão colaborar para a elabo-
ração de perdas maiores, no entanto elas costumam ser pouco valorizadas.
Domingos e Maluf (2003) afirmam existir implicações do luto
no processo de ensino-aprendizagem, interferindo na atenção e con-
centração, devido à ansiedade, como também em fatores relacionados a
afetividade nos processos de escolarização. O que enfatiza que a escola
se preocupe também com as necessidades emocionais dos alunos e não
só em transmitir os conhecimentos obrigatórios, visto que a cognição
e as emoções são inseparáveis no desenvolvimento psicológico.
Ao falar sobre a morte do outro, um ponto importante a ser
enfatizado é a questão do vínculo e os diversos sentimentos que podem
estar presentes nessa situação. É extremamente relevante que crian-
ças e adolescentes vivenciem o luto, que elas participem dos rituais
fúnebres e que tenham liberdade para perguntar e falar sobre a pessoa
falecida. Excluir a criança do luto a deixando alheia à situação, pode
bloquear esse processo (RAMOS, 2016).
Diante da perda, sentimentos como vulnerabilidade e incapa-
cidade, são os grandes causadores da desorganização das pessoas que
perderam um familiar próximo. Dentre todas as dificuldades que surgem
neste momento, a aceitação é uma delas, é muito difícil para a pessoa
aceitar que não terá mais a outra em sua vida, tendo que preencher o
25
vazio. A elaboração de perdas anteriores ou crenças relativas à morte,
podem ser fatores que também interferem (BASSO; WAINER, 2011).
Através das pesquisas realizadas, é notório que a maneira como as
pessoas lidam com a morte frente a criança é uma questão que pode causar
muitas confusões de sentimentos e pensamentos na criança. Apesar dos
responsáveis se verem em uma situação complexa, de medo e também
enlutas, é preciso que conversem, que falem a verdade a respeito do que
aconteceu, afinal, a criança tem o direito de saber que perdeu alguém
importante a ela. Usar termos como “foi morar no céu e quando sarar
volta”, ou “virou uma estrelinha” pode fazer com que a criança não tenha
noção da real permanência de uma morte (SENGIK; RAMOS, 2013).
Bowlby (2004) descreve algumas condições para que o luto infantil
siga um curso favorável. Algumas dessas condições são: que a criança
tenha mantido um relacionamento seguro com os pais, antes da perda,
que receba informações imediatas do que aconteceu, que possa fazer
qualquer pergunta e receber respostas sinceras e que não seja excluída do
pesar familiar, participando dos ritos fúnebres se assim quiser, quando há
ausência de uma ou mais dessas condições o processo tende a ser diferente.
O luto leva tempo e costuma ser vivenciado com base nos signifi-
cados que as pessoas lhe atribuem, significados que foram ensinados ou
observados. A fase do choque pode durar de horas a dias, sendo caracteri-
zada por desespero, irritabilidade e isolamento. Estes sentimentos podem
se manifestar em atitudes emocionais muito fortes, quando o indivíduo
consegue aceitar esses sentimentos, a perda é afirmada, o que permite
que o luto seja vivenciado de uma forma mais saudável (RAMOS, 2016).
Para Bowlby (2004) um ponto de relevância no luto vivenciado
por crianças que perdem um dos genitores é auxiliar o genitor sobre-
vivente a ajudar os filhos. O autor cita a confusão resultante da notícia
da morte para a criança. A principal tarefa para o clínico é oferecer ao
genitor sobrevivente uma relação de apoio, para que ele se sinta livre
para refletir sobre como ocorreu e porque ocorreu, podendo expressar
todos os sentimentos e impulsos que se fazem necessário para que
26
o luto prossiga de forma sadia. Quando a figura sobrevivente supera
essa barreira, ela terá menos dificuldades em incluir os filhos neste
processo, podendo responder às perguntas, abrindo espaço para que
juntos eles possam expressar seu pesar, sua raiva e também sua saudade.
No caso da criança, a psicoterapia é um recurso muito eficiente
para ajudá-la na compreensão e na maneira com a qual ela lidará com
o que está sentindo. Técnicas lúdicas, como brincadeiras e contação de
histórias auxiliam o profissional, ainda mais no caso de crianças mais
novas, com três ou quatro anos (SENGIK; RAMOS, 2013).
Com relação as abordagens terapêuticas, todas podem ser úteis e
contribuir para que o curso do luto seja saudável. Pontuando a Terapia
Cognitivo-Comportamental, nela o objetivo é identificar os recursos
disponíveis da pessoa, bem como das redes de apoio disponíveis e
analisar as preocupações que o enlutado leva, para que possa auxiliá-lo
na tomada de decisões. Diante da fragilidade que um paciente em
luto se encontra, o profissional terá que construir alternativas para
a redução das alterações emocionais, fisiológicas e comportamentais
causadas pela perda (SANTOS; SOARES, 2022).
Alguns autores entendem que o luto durante a infância, tra-
balhado de forma errada, pode provocar várias dificuldades inclusive
na vida adulta, alguns desses problemas pode ser o aparecimento de
sintomas físicos que surgem sem fundamento clínico, além de se
tornarem pessoas hostis e com facilidade em fazer inimizades, por-
que agem com truculência, sem se preocupar se suas atitudes podem
magoar outra pessoa (RONCATTO, 2019).
Sobre as diferentes reações acerca da morte de alguém próximo,
Ramos (2016) destaca que a investigação recente aponta para o fato de
muitas famílias, após a perda de um ente querido, continuarem a viver,
enquanto outras ficam tão perturbadas, que a morte afeta o desenvol-
vimento de todos os seus membros. Para o autor, um luto não resolvido
numa família pode, não só indicar o tipo de patologia existente na mesma,
mas também contribuir para relações patológicas ao longo das gerações.
27
Algumas pesquisas levantam a questão referente à patologização
do luto, visto que alguns estudos já apontaram que um luto mal ela-
borado pode se tornar prolongado e patológico, se caracterizando por
pessoas que passam um longo tempo enlutadas, com sintomas intensos
e que prejudicam o seguimento da sua vida. Venâncio e Oliveira (2018)
buscaram realizar uma revisão nos manuais diagnósticos e estatísticos
de transtornos mentais para ver se o luto estaria presente e por que
razões. Foi constatado que até o DSM II, a palavra luto não aparecia
nos manuais, mas, a reação diante da perda era remetida a uma patolo-
gização desde o primeiro manual, que associava à depressão como uma
reação à perda. No DSM III era discutido sobre a possibilidade de o
luto ser um episódio depressivo maior, até o DSM IV, o luto aparece
como um critério de exclusão do episódio depressivo maior (EDM),
porém com a ressalva de que o diagnóstico de EDM poderia ser dado
em casos de sintomas mais severos e duradouros de indivíduos em luto.
O DSM-V, que é a última edição, tem em seu capítulo “Condições
para estudos posteriores” o Transtorno do Luto Complexo Persistente,
como um diagnóstico que ainda não é reconhecido oficialmente, necessi-
tando, portanto, de mais estudos. De acordo com Michel e Freitas (2019),
a distinção entre luto normal e complicado teria como critério o tempo
cronológico. Depois de doze meses (seis meses, no caso de crianças) em
que se apresenta um conjunto de sintomas persistentes do luto.
Venâncio e Oliveira (2018) em seus estudos pelos manuais diag-
nósticos e estatísticos de transtornos mentais, levantam a questão de
que a patologização do luto deve ser melhor estudada, pois o processo
é muito singular, não obtendo consenso de um tempo exato ao qual
cada pessoa vai “superar” uma perda.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base na pesquisa realizada, pôde ser constatado que o


processo de luto pode ser mais complexo na infância em decorrência
da criança a depender de sua idade não ter recursos para entender
28
a permanência da morte. Um dos pontos mais levantados é sobre o
manejo do luto, que é um aspecto relevante quando se trata do luto
infantil, isto porque muitos adultos acreditam que a criança não precisa
saber a verdade nesses casos. Muitos familiares ou pessoas próximas
usam termos subjetivos e religiosos, quando não, dizem que a pes-
soa está viajando ou dormindo, o que mesmo não sendo de maneira
intencional, pode causar uma confusão na criança, que vai esperar
pelo retorno da pessoa querida.
Em todos os achados os autores pontuaram que a criança pre-
cisa saber a verdade e que o adulto deve sempre se atentar a idade da
criança, para saber o que dizer e como vai dizer, mas, a comunicação
se faz essencial, mesmo que de maneira lúdica por contação de his-
tórias, por exemplo, para que essa criança tenha com quem conversar,
com quem tirar suas dúvidas sobre o luto, bem como alguém que ela
possa se expressar, falar sobre o que está sentindo, para que não haja
dúvidas e nenhum retraimento de emoções.
Portanto, ter alguém que acolha a criança e se comunique com
ela, é um ponto essencial do processo de luto na infância. Muitas vezes
os adultos responsáveis não se encontrarão em condições emocionais
de fazer um acolhimento correto, justamente por também estarem
enlutadas, em decorrência disso o auxílio psicológico se mostrou
uma das melhores alternativas quando a rede de apoio não conseguir
se comunicar com a criança ou perceberem que a mesma está tendo
grandes dificuldades no curso do luto.
No que se refere às consequências de um luto mal elaborado na
vida da criança, a pesquisa se mostrou carente, fazendo-se necessário
pesquisas que acompanhem a adolescência e vida adulta de indivíduos
com perdas na infância. Com relação as causas, mortes repentinas foram
apontadas como mais dificultosas de serem aceitas do que mortes já
esperadas como de pessoas com doenças graves.
Apesar de inúmeros materiais disponíveis relacionados ao tema,
as pesquisas acerca do luto infantil possuem muitas lacunas, sendo per-
29
tinente que novas pesquisas sejam realizadas, em diferentes contextos
e causas, principalmente pesquisas de campo e no âmbito nacional.

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30
SER ADOLESCENTE E LGBT+: TENSÕES
FRENTE AO DESENVOLVIMENTO NÃO
HETERONORMATIVO

João Ricardo dos Santos Rocha5


Jose Valdeci Grigoleto Netto6

INTRODUÇÃO

Pessoas LGBT+’s (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transse-


xuais, entre outras formas de manifestação de gênero e/ou sexualidade)
nem sempre foram perseguidos(as) e/ou considerados(as) portadores de
patologias para a sociedade (TONIETTE, 2006). Ao longo da história,
segundo Andrade (2018), na Grécia antiga era comum o relaciona-
mento sexual entre homens adolescentes (eromenos) e adultos (erastes).
Em nosso país, antes da invasão dos Portugueses, a homossexualidade
também fazia parte da cultura indígena (FERNANDES, 2017).
Segundo Borrillo (2010), a homofobia tem suas origens na tra-
dição judaico-cristã, que declara o homossexual um pecador e que por
consequência disso deve ser queimado e, logo, morto. O autor também
define que a homofobia é a hostilidade contra homossexuais, logo, um
surgimento sem lógica para designar o outro como inferior e irregular.
O Brasil é um país extremamente preconceituoso, onde os índices
de assassinatos de LGBT+’s são os maiores do mundo (GGB, 2022).
Conforme aponta Bento (2011), na cultura heteronormativa de nosso
país, LGBT+’s tem sua personalidade censurada por adultos a sua volta
com a justificativa de que isso não é adequado para o seu gênero, por
exemplo: isso não é coisa de homem fazer, etc.

5
Discente em Psicologia (UniFatecie). CV: http://lattes.cnpq.br/3293609826600242
6
Mestrando em Psicologia (UEM). Docente e supervisor de estágios curriculares no curso de graduação
em Psicologia (UNIFATECIE). CV: http://lattes.cnpq.br/2661321527310427
31
Nesta trilha, como objetivo geral, o presente trabalho tem o
intuito de elucidar de quais maneiras a adolescência de pessoas LGBT+
é diferente da de pessoas heterossexuais. Dentre os objetivos específicos,
podemos citar: delimitar quais são os aspectos que fazem com que a
experiência da adolescência em pessoas não heterossexuais apresente
particularidades e realizar um levantamento bibliográfico acerca do
tema adolescência e pessoas LGBT+.
No presente trabalho será utilizada a abordagem de pesquisa
social, que pode ser definida por Gil (2008) como um processo que
possibilita a obtenção de novos conhecimentos no campo da realidade
social, através da metodologia científica. O método de investiga-
ção empregado neste trabalho é a pesquisa qualitativa, que segundo
Minayo, Deslandes e Gomes (2007) pode ser utilizado nas ciências
sociais, buscando dados que não pode (ou não deve) ser colocada em
números. Logo, isso faz com que seja trabalhado apenas com signi-
ficados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes. Para a coleta
de dados, utilizaremos a pesquisa bibliográfica, que para Gil (2008)
pode ser definida como pesquisa de material já produzido, constituída
majoritariamente de livros e artigos científicos.

ADOLESCÊNCIA E DESENVOLVIMENTO

A adolescência é uma construção social (PAPALIA, FELDMAN


e MARTORELL, 2013), que tem especificidades individuais para cada
sujeito (ABERASTURY e KNOBEL, 1981), e pode ser definida como
o período de mudanças físicas, cognitivas e psicossociais, ocorridas entre
a infância e a fase adulta, tendo seu início entre 11 ou 12 anos e seu
término em volta de 20 anos (PAPALIA, OLDS e FELDMAN, 2006).
Este período possibilita o aumento da competência cognitiva e
social, autonomia, autoestima e início de intimidade (PAPALIA, OLDS
e FELDMAN, 2006). Além disso, nessa fase é iniciada uma nova relação
com seus pais e com a sociedade (ABERASTURY e KNOBEL, 1981).

32
A criança que agora é um adolescente tende a entrar em uma
nova esfera: a esfera do adulto e, com isso, podem surgir proble-
mas para se adaptar a essa fase, sendo um deles a confusão (ABE-
RASTURY e KNOBEL, 1981). Os adultos à sua volta (especial-
mente os pais) também podem ter conflitos para lidarem com esse
estágio de vida da pessoa que até então consideravam como uma
criança (ABERASTURY e KNOBEL, 1981).
Os estudos de Aberastury e Knobel (1981) mostram que a agres-
sividade do adolescente com sua família, em especial seus cuidadores,
e a sociedade a sua volta, vem em forma de descrença, já que ele tem
o pensamento de que os adultos que o rodeiam não irão entendê-lo.
O adolescente não aceita ser chamado de “criança” ou ser cuidado/
mantido como uma, já que ele reconhece isso como algo desrespei-
toso (ABERASTURY e KNOBEL, 1981).
Uma característica importante desta fase é a dualidade de ser
dependente de seus cuidadores e ao mesmo tempo querer ser inde-
pendente, que será solucionada quando o adolescente aprender a lidar
com isso de forma que ele reconheça a dependência e ache formas
de ser independente (ABERASTURY e KNOBEL, 1981). Para os
autores, não é incomum que os cuidadores acabem utilizando como
vantagem o fato de que os adolescentes dependem financeiramente
deles, o que gera um efeito contrário do planejado.
Na adolescência se inicia a menstruação para as meninas e o
sêmen para os meninos (ABERASTURY e KNOBEL, 1981; PAPA-
LIA, FELDMAN e MARTORELL, 2013). Agora, os principais
órgãos que têm relação com a procriação crescem e tornam-se maduros
(PAPALIA, FELDMAN e MARTORELL, 2013). É nessa fase da
vida que o indivíduo pode se descobrir como homossexual, bissexual ou
heterossexual e experienciar suas primeiras relações sexuais, geralmente
entre 15 e 17 anos, sendo esse processo imprescindível para a construção
sexual do indivíduo (PAPALIA, FELDMAN e MARTORELL, 2013).

33
LGBTFOBIA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Para Ícaro (2021), orientação sexual é um conceito composto de


vários fatores, como desejo sexual, comportamento sexual, identidade
sexual e interesse romântico e, inclusive, é algo natural e saudável. Os
autores Ícaro (2021) e Papalia, Feldman e Martorell (2013) concordam
que não existem provas cientificamente comprovadas que as pessoas
sejam LGBT+’s por algum evento anormal, como por exemplo vio-
lência sexual ou problemas de relacionamento de seus pais.
Existe uma naturalização de que o modelo “normal” dos seres
humanos é o heterossexual, e que, como consequência, LGBT+’s aca-
bam sendo vítimas de discriminação (TAGLIAMENTO, et al. 2021).
Logo, constata-se que “Como as relações sociais forjam a identidade do
indivíduo em torno da heteronormatividade, qualquer orientação sexual
que saia desse padrão resulta em conflitos pessoais, familiares e também
profissionais.” (SOUZA, PÁTARO e MEZZOMO, 2022, p. 35).
É inegável que a partir do nascimento, são impostos às crianças
papéis de gênero aos quais elas devem seguir, e caso elas afastem-se
disso, é provável que elas sejam reprimidas para voltarem ao que
foi colocado a elas desde o início (FRY e MACRAE, 1985). Mui-
tas pessoas seguem essa linha de raciocínio, inclusive o Presidente
da República Jair Messias Bolsonaro, que esteve na gestão 2019-
2022, que em uma entrevista declarou: “Se o filho começa a ficar
assim, meio gayzinho, [ele] leva um couro e muda o comportamento
dele.” (BOLSONARO, 2010, p. 1).
Neste sentido, para Borrillo (2010), a homofobia pode ser defi-
nida como a atitude de hostilidade contra homossexuais, sejam eles
homens ou mulheres. Ainda segundo o autor, a homofobia pode
ser comparada com o racismo e a xenofobia, já que reduz, inferio-
riza e ainda trata o outro como anormal. Em algum momento de
sua vida, LGBT+’s sofrerão preconceito devido a homofobia enrai-

34
zada em nossa sociedade (SOUZA, PÁTARO e MEZZOMO,
2022; SIMÕES e FACCHINI, 2009).
Apesar de inicialmente ter sido utilizado apenas para discri-
minação contra homossexuais, o termo “homofobia” passou a ser
designado para preconceito com outras pessoas LGBT+’s (BOR-
RILLO, 2010). Hoje, no entanto, ampliamos e acrescentamos outros
termos a fim de abordar especificamente atitudes de discrimina-
ção e fobia à outras pessoas não heterossexuais, como por exemplo:
lesbofobia, transfobia, bifobia.
Homossexuais que performam um papel de gênero que diverge
do que foi imposto pela sociedade (isto é, homens “afeminados” e
mulheres “masculinizadas”) sofrem um tipo específico de preconceito,
denominado de afeminofobia, segundo a pesquisa de Silva, Pereira e
Pontes (2021). Segundo a pesquisa, afeminofobia é a fobia e/ou aversão
contra o indivíduo que desvia de seu papel de gênero; aqui discutido
mais sobre o homem gay afeminado.
O trabalho de Silva, Pereira e Pontes (2021) mostra que a afe-
minofobia é um tipo de preconceito, que inclusive frequentemente
é reproduzido por outros LGBT+’s com base na heteronormativi-
dade de nossa sociedade, ou seja, o homem deve comportar-se como
“homem” (mesmo que seja homossexual). Dentro da comunidade,
um dos motivos que fortalecem isso é o medo de ser exposto como
LGBT+ e também de não se encaixar na heteronormatividade da
sociedade em que vivemos (SILVA, PEREIRA e PONTES, 2021).
No quesito de sexualidade, para Simões e Facchini (2009),
o Brasil é exposto tanto como um “paraíso” quanto um “inferno”,
visto que este país é ligado intensamente ao erotismo e sensualidade.
Simões e Facchini (2009) afirmam que em algum momento de sua
vida, LGBT+’s do Brasil já passaram por algum tipo de preconceito,
seja ele uma insinuação, uma ofensa verbal, agressão (ou ameaça de
agressão) entre outros. Inclusive, o Brasil lidera o ranking mundial de

35
assassinatos de LGBT+’s; segundo o Relatório do GGB - Grupo Gay
da Bahia (2022), em 2021, 276 LGBT+’s foram vítimas de homicídio.
Atualmente, independente do lugar (escolas, estádios de futebol,
programas de TV, etc.), é possível observar que ainda existem humi-
lhações, xingamentos e ofensas contra pessoas que rompam com a
heterossexualidade (SIMÕES e FACCHINI, 2009). Somando a este
pensamento, os estudos de Souza, Pátaro e Mezzomo (2022) mostram
que muitos LGBT+’s costumam se retrair em vários espaços (entre
eles: igrejas, escolas, trabalho, em casa e em lugares focados em lazer).
Podemos recorrer ao trabalho de Grigoleto Netto e Mos-
chetta (2022) que expõe a tentativa de uma ação coletiva para criar
um conselho de Direitos LGBT+ na cidade de Maringá, localizada
no Estado do Paraná. Os autores mostram que o conselho tinha
como finalidade extinguir a discriminação de pessoas que rompem
com a cisheteronormatividade.
Grigoleto Netto e Moschetta (2022) relatam que o projeto do
conselho foi arquivado após grupos religiosos e grupos que se dizem
a favor da família se manifestarem contra a criação do conselho.
Disseminaram fake news; vídeos de figuras de autoridade religiosas
falando sobre os “malefícios” para a família caso um conselho com
essa finalidade chegasse a ser criado; além de outras formas para
prejudicar a realização do projeto.
Com tanta violência e preconceito, existem grandes chances dessa
parte da população desenvolver uma homofobia internalizada devido
às situações de LGBTfobia que passaram durante sua vida (SOUZA,
PÁTARO e MEZZOMO, 2022). Mesmo com o preconceito ainda
presente nos tempos atuais, Simões e Facchini (2009) afirmam que é
menos angustiante ser LGBT+ atualmente do que no passado; já que
atualmente é possível ser LGBT+ (e expressar isso) mesmo que ainda
existam tensões, porém agora mais baixas do que em tempos passados.

36
INTERSECÇÃO ENTRE ADOLESCÊNCIA E
LGBTFOBIA

Na adolescência, pessoas cisheterossexuais costumam a ter seus


primeiros relacionamentos e experiências sexuais, já que contam com
aceitação e/ou apoio social e também recebem instruções da sociedade
para como realizar tais feitos (HARDIN, 2000). Para o autor, infeliz-
mente a sociedade não tem a mesma atitude em relação a LGBT+’s,
já que geralmente essas pessoas não têm aprovação social ou recebem
instruções em relação a sua sexualidade, tendo que ser seus próprios
guias nessa fase de descobertas.
Sendo assim, é comum que as pessoas que rompam com a hete-
ronormatividade evitem pensar e lidar com seus sentimentos sobre
atração pelo mesmo gênero (HARDIN, 2000). O autor também mostra
que além da falta de apoio, LGBT+’s podem sofrer preconceito e em
casos mais extremos, até violência.
Ao contrário de pessoas cisheterossexuais, é comum que LGBT+’s
só se descubram como gay ou lésbica (por exemplo) tempos após a
adolescência; já que não foram estimuladas a explorar sua sexualidade,
sendo muitas vezes desencorajadas por meio de mensagens negativas
(HARDIN, 2000). Um exemplo disso seria um indivíduo na faixa
dos 40 anos se descobrir gay e outro indivíduo também se descobrir
gay, porém na faixa dos 20 anos; apesar da diferença de idade, ambos
podem ter as mesmas dúvidas sobre essa descoberta (HARDIN, 2000).
Colaborando com as ideias do autor, é possível (e necessário)
dizer que é na adolescência que as pessoas começam a descobrir mais
sobre sua sexualidade, e por conta da homofobia presente na sociedade,
esse processo é prejudicado muitas vezes ao extremo. Com tantas
mensagens negativas recebidas, o medo de não se encaixar na norma
cishetero acaba fazendo com que essas pessoas diminuam o ritmo ou
até mesmo cessem esse processo de autoconhecimento.

37
O decurso de revelar a identidade sexual e/ou de gênero para a
família é singular para cada indivíduo, pois é um processo difícil para
a família e para o indivíduo (SOUZA, PÁTARO e MEZZOMO,
2022). Os autores mostram que algumas famílias acreditam que
isso é uma forma de desonestidade com relação a cultura da famí-
lia, incluindo a sua religião.
Agregando ao pensamento dos autores Souza, Pátaro e Mez-
zomo (2022) e Tagliamento, et al. (2021), ao revelar a sua orientação
sexual e/ou identidade de gênero para sua família, (que pode ser sua
principal rede de apoio), o indivíduo entrará em uma nova esfera, que
pode ser de acolhimento ou de desprezo. Como a família irá lidar
com essa notícia influenciará na vida e na saúde mental do indivíduo.
Indivíduos têm receio em revelar sua identidade sexual para per-
manecerem em harmonia com sua família e religião, e por isso acabam
escondendo sua sexualidade (SOUZA, PÁTARO e MEZZOMO,
2022). Além disso, nesse processo, o indivíduo se invalida e é invalidado
pelas pessoas a sua volta (SOUZA, PÁTARO e MEZZOMO, 2022).
Caso o indivíduo mantenha sua identidade sexual visível, é pos-
sível que ele seja alvo de LGBTfobia dentro de sua esfera familiar, que
em casos mais extremos chegam a rejeitá-los e expulsá-los de casa por
não se encaixar no modelo cisheteronormativo (SOUZA, PÁTARO e
MEZZOMO, 2022). Segundo Souza, Pátaro e Mezzomo (2022, p. 37):
Há casos em que a família, por meio da violência psi-
cológica, faz a tentativa de que o indivíduo se ade-
que à norma sexual hegemônica, o que resulta em
grande sofrimento psíquico e consequências emocio-
nais, principalmente pela dificuldade em se fazer um
enfrentamento.

O fato dos pais não “aceitarem” um filho que rompa com a


cisheterossexualidade pode fazer com que eles cortem relações por um
pequeno período ou, em casos mais graves, o rompimento definitivo
(SOUZA, PÁTARO e MEZZOMO, 2022). Para os autores, nesse
38
processo de revelar a identidade sexual (seja para si mesmo ou para
os outros), é indispensável o apoio e acolhimento de amigos e/ou da
família. Caso o indivíduo se depare com a falta de apoio, existem grandes
chances de ele começar a fazer uso de substâncias ilícitas, desenvolver
depressão, ter ideações, tentativas ou até mesmo cometer suicídio.
É comum que homossexuais ajam de forma “discreta” ou
escondem sua sexualidade para serem aceitos pela igreja (dentro ou
fora dela); pois essa aceitação vem de seguir a heteronormatividade
imposta pela sociedade em geral (CARMO, 2022; HARDIN, 2000).
Complementando a fala dos autores, quando o sujeito omite a própria
sexualidade é como se ele se reduzisse para caber nessa sociedade que
utiliza a cisheterossexualidade como uma norma.
No contexto escolar, a pesquisa de Oliveira e Peixoto (2022)
mostra que frequentemente essa parcela da população sofre precon-
ceito na escola por conta de sua sexualidade e/ou identidade de gênero.
Agregando ao pensamento dos autores, a escola muitas vezes também é
o local que os alunos utilizam para fazer amizades, e, isso é dificultado
com a LGBTfobia presente também nesses espaços.
De acordo com Hardin (2000, p. 94), “Muitos professores e
orientadores escolares continuam ignorantes ou são homofóbicos
e encorajam as mesmas visões estereotipadas da homossexualidade
propagadas pela sociedade mais ampla.”. Complementando este pen-
samento, Louro (2003, p. 68) ressalta que:
A negação dos/as homossexuais no espaço legitimado
da sala de aula acaba por confiná-los às “gozações” e
aos “insultos” dos recreios e dos jogos, fazendo com
que, deste modo, jovens gays e lésbicas só possam se
reconhecer como desviantes, indesejados ou ridículos.

Os estudos de Pereira, Varela e Silveira (2016) falam sobre o


bullying homofóbico (caracterizado por desprezo a LGBT+’s) presente
no contexto escolar, e que infelizmente essa prática é muito comum,
independente da faixa etária dos alunos. A pesquisa também mostra que
39
não são somente LGBT+’s sofrem esse tipo de violência, já que caso uma
pessoa seja enquadrada por seu “bully” (agressor) como LGBT+, mesmo
que ela seja heterossexual, ela também sofrerá esse tipo de intimidação.
Um exemplo de bullying homofóbico no contexto escolar foi
dado por Pabllo Vittar (2017):
Uma vez eu estava na fila da merenda e um menino me
jogou uma sopa quente, um prato de sopa quente, ele
virou a sopa na minha cara, porque eu estava falando
com a minha amiga. E ele se virou pra mim e jogou
aquele prato de sopa quente em mim, porque na cabeça
dele eu tinha que agir igual homem, falar com voz de
homem, ser homem.

Ainda segundo a pesquisa de Pereira, Varela e Silveira (2016),


muitos professores não veem essa forma de bullying como violência;
sendo as consequências dele depressão, ansiedade, etc. Sendo assim,
adolescentes LGBT+’s têm maiores chances de tentarem suicídio ou
até mesmo de se suicidarem, devido a várias situações de LGBTfobia
que enfrentam (PAPALIA, FELDMAN e MARTORELL, 2013).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O levantamento de dados mostra que LGBT+’s têm uma grande


diferença de experiências na adolescência, se comparado à adolescência
de pessoas cishetero. Essa diferença é fruto de um preconceito enrai-
zado em nossa sociedade, um preconceito que dificulta um processo
que deveria ser comum e simples a todo ser humano.
Adolescentes que rompem com a heteronormatividade correm
o risco de sofrerem LGBTfobia por parte de amigos, da família, de
sua religião (caso façam parte de uma), dentre outros lugares. Con-
siderando isso, uma das formas que essas pessoas encontram para
participar desses grupos sem sofrerem preconceito é escondendo sua
orientação sexual e/ou identidade de gênero.

40
A LGBTfobia é capaz de levar os cuidadores a mudarem a
postura e carinho que tem por seus filhos, fazendo com que o mesmo
não consiga se sentir feliz com sua sexualidade. O resultado disso,
como foi apontado anteriormente, é pessoas LGBT+’s terem medo de
sua própria sexualidade, deixando como algo a ser resolvido somente
tempos depois, como na fase adulta, por exemplo.
Atualmente, ainda é possível constatar que muitas religiões não
aceitam que seus seguidores sejam LGBT+’s. Levando isso em consi-
deração, o adolescente que não se encaixa no modelo heteronormativo
corre o risco de ser rejeitado por outros membros de sua religião, gerando
um sentimento de não pertencimento do indivíduo neste ambiente.
Na escola, assim como em outros lugares, não é ensinado (ou não
é ensinado corretamente) sobre esse assunto, deixando espaço para o
senso comum espalhar informações incorretas a respeito de LGBT+’s
e suas particularidades. Inclusive, a escola pode ser um lugar perigoso
ao LGBT+, já que o bullying homofóbico ainda é muito presente nas
instituições de ensino. Além disso, é comum que o profissional da
educação não saiba lidar corretamente com essas situações, em alguns
casos, agravando ainda mais a situação.
Como foi exemplificado anteriormente por Pabllo Vittar, a
LGBTfobia pode acontecer como reação até pela forma como o
indivíduo se comporta, independentemente de estar tendo algum tipo
de contato sexual com outra pessoa no momento em que acontece.
Não importando se o indivíduo está em uma escola, em uma festa,
em casa ou em um templo religioso.
Uma forma de tentar mudar essa realidade é a oferta de aulas
de educação sexual no ensino médio, para que os adolescentes se
conscientizem de que pessoas LGBT+’s não são uma anormalidade e;
aprendam a respeitar e apoiar as todas as diferentes formas de mani-
festação de sexualidade e/ou identidade de gênero. Além disso, que
os próprios LGBT+’s aprendam com a ciência sobre sua sexualidade/

41
identidade de gênero, que ela não é qualquer tipo de desordem mental,
diferente do que o senso comum transmite a eles.
Apesar de não resolver o problema de todos os LGBT+’s (adoles-
centes ou não), medidas como essa podem ser importantes para definir
o futuro das próximas gerações, já que com o devido conhecimento,
as pessoas estarão mais propensas a entender as diferentes formas de
manifestação da sexualidade do ser humano; e, com isso, passarão a
respeitar mais essas diferenças, diminuindo a LGBTfobia; e, consequen-
temente, a homofobia internalizada dos indivíduos e a afeminofobia.
A psicoterapia afirmativa também pode ser uma poderosa aliada
no processo para diminuir a homofobia internalizada e a afeminofobia
sofrida por parte de indivíduos LGBT+, já que ambas são frutos de
uma sociedade extremamente preconceituosa. Entendemos que, com a
devida intervenção, LGBT+’s podem desenvolver uma boa autoestima
e exaurir o preconceito com si mesmo e com outros LGBT+’s que
destoam de seu papel de gênero imposto pela sociedade.

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44
ATENDIMENTO PSICOLÓGICO ON-
LINE: DESAFIOS ATUAIS DA PSICOLOGIA
BRASILEIRA

Cintia Paloma Lopes Lima7


Paulo Yoo Chul Choi8
Francisco Diógenes Lima de Assis9

INTRODUÇÃO

A pandemia causada pela Covid-19 e suas variantes impactou


significativamente no âmbito da saúde, atingindo de diferentes formas
os profissionais da saúde e a população geral. A categoria de profis-
sionais psicólogas foi uma que precisou se readequar para continuar
realizando seus serviços de forma a respeitar as medidas de segurança
sanitárias. A medida utilizada foi realizar os atendimentos, que eram
possíveis, de maneira on-line mediada por tecnologias.
Esses serviços já eram possibilitados pelo Conselho Federal de
Psicologia por meio da Resolução CFP 02/1995, possuindo altera-
ções a partir das Resoluções CFP 03/2000, 12/2005, 11/2012, e, a
mais recente CFP 11/2018. A modalidade virtual sofreu alterações
em sua regulamentação por meio dessas resoluções. As principais
atualizações desde a primeira resolução até a atual foram relacionadas
ao paradigma da prestação dos serviços, que inclui quantidade de
sessões, tecnologias e ferramentas utilizadas, formação dos profissio-
nais, os serviços que podem ser ofertados, questões éticas e tecnoló-
gicas implicadas, entre outros.

7
Doutoranda em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano (USP).
CV: http://lattes.cnpq.br/9180470134430642
8
Doutorando em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano (USP).
CV: http://lattes.cnpq.br/3314456502798241
9
Mestrando em Psicologia Clínica (USP). CV: http://lattes.cnpq.br/3799150119834572
45
Atendimento psicológico on-line é um termo que possui inú-
meros outros conceitos relacionados, como teleatendimento, teleco-
municação, entre outros. No entanto, o que se trata neste trabalho
como atendimento psicológico on-line é o preconizado pela Resolução
CFP 11/2018. Segundo essa resolução que regulamenta a presta-
ção de serviços psicológicos por meio de Tecnologia de Informação
e Comunicação (TICs), são autorizados quatro serviços psicoló-
gicos por meio da TICs, a saber:
Art. 2º - São autorizadas a prestação dos seguintes
serviços psicológicos realizados por meios tecnológicos
da informação e comunicação, desde que não firam as
disposições do Código de Ética Profissional da psicó-
loga e do psicólogo a esta Resolução:
I. As consultas e/ou atendimentos psicológicos de dife-
rentes tipos de maneira síncrona ou assíncrona;
II. Os processos de Seleção de Pessoal;
III. Utilização de instrumentos psicológicos devida-
mente regulamentados por resolução pertinente, sendo
que os testes psicológicos devem ter parecer favorável
do Sistema de Avaliação de Instrumentos Psicológicos
(SATEPSI), com padronização e normatização espe-
cífica para tal finalidade;
IV. A supervisão técnica dos serviços prestados por
psicólogas(os) nos mais diversos contextos de atuação.
(CONSELHO FEDERAL DE PSICOLO-
GIA, 11/2018).

Desta forma, o atendimento e as consultas psicológicas on-line


podem ocorrer de forma síncrona e/ou assíncrona, sendo esses serviços
caracterizados como o grupo de procedimentos sistemáticos por meio
do uso de técnicas e métodos psicológicos, nos diferentes campos de
atuação da Psicologia, com objetivos de avaliar, orientar e/ou intervir
em processos individuais e/ou grupais.
A modalidade síncrona pode ser conceituada como o atendi-
mento que ocorre em sua maioria em tempo real, isto é, de forma
46
simultânea entre profissional e cliente. Podendo ocorrer por meio de
videochamadas, ligações telefônicas, entre outros. Já a modalidade
assíncrona possui um intervalo de tempo entre o envio da mensa-
gem, o recebimento e a resposta, dessa forma, o atendimento assín-
crono possui uma comunicação com intervalo de tempo maior. Por
exemplo, por meio de recursos de bate papo, mensagens de texto e/
ou voz, fóruns, e-mail, entre outros ( JOINT TASK FORCE FOR
THE DEVELOPMENT OF TELEPSYCHOLOGY GUIDE-
LINES FOR PSYCHOLOGISTS, 2013).
O que a profissional psicóloga precisa refletir ao escolher a
modalidade – síncrona ou assíncrona – é qual o objetivo do serviço
psicológico prestado, suas competências técnicas e éticas para atuar
na modalidade escolhida, o que inclui capacidade nas ferramentas
tecnológicas e estar em dia com as obrigações no seu conselho de
classe, bem como, se essa modalidade é acessível ao usuário do seu
serviço e se seria benéfico para o mesmo.
O atendimento psicológico on-line assíncrono possui ainda
algumas particularidades, como por exemplo, a duração do atendi-
mento pode ultrapassar o tempo do atendimento síncrono padrão - 50
minutos semanais -, se o profissional não delimita com o cliente a
duração e a frequência dos atendimentos. Há ainda profissionais que
atuam de forma mista com as duas modalidades, sendo bem comum
utilizar recursos síncronos e assíncronos nos atendimentos.
Este capítulo possui como objetivo apresentar a bibliografia
sobre a temática do atendimento psicológico on-line relacionando
com experiências da prática clínica em psicologia.

ATENDIMENTO PSICOLÓGICO ON-LINE: DOMÍNIOS


ESSENCIAIS PARA O USO DAS TECNOLOGIAS EM
CONSULTAS ON-LINE

Os quatro domínios para consultas on-line apresentados nesta


seção, foram consolidados pela pesquisadora Nara Helena Lopes
47
Pereira da Silva em seu pós-doutorado pela Universidade de São
Paulo, sob supervisão do professor Andrés Eduardo Aguirre Antúnez.
Segundo os autores, houve a necessidade de realizar um levantamento
que orientasse os atendimentos on-line, principalmente após o início
da pandemia por Covid-19. Desta forma, a pesquisadora apresenta
quatro domínios essenciais para o uso das tecnologias em consultas
e atendimentos on-line, a saber: domínio ético, domínio tecnológico,
domínio clínico e domínio cultural (ANTÚNEZ; SILVA, 2020).

DOMÍNIO ÉTICO

Os aspectos éticos são a base para fundamentar e regulamentar


qualquer profissão, na psicologia não é diferente. Tanto no âmbito
presencial, quanto on-line, as psicólogas são embasadas eticamente pelo
Código de Ética Profissional do Psicólogo (CEPP) e pelas resoluções
criadas para dar conta das demandas surgidas.
Para o atendimento psicológico on-line há alguns pontos que
merecem destaque no campo ético, a saber: a profissional psicóloga
precisa respeitar e cumprir as normas éticas existentes, como o CEPP
e as resoluções, respeitando privacidade e sigilo das pessoas que são
atendidas. Para isso, é necessário prestar serviços que forneçam aos
usuários todas as informações sobre o processo de atendimento para
aquele usuário, de tal forma que este esteja consciente sobre o pro-
cesso e possa optar pela forma de atendimento que melhor o benefi-
cie, atendimento presencial ou on-line. Estas informações precisam
ser fornecidas de forma escrita, preferencialmente em um contrato
terapêutico, sendo fornecidas todas as explicações pertinentes para
o melhor entendimento dos usuários (ANTÚNEZ; SILVA, 2020).
Esse contrato terapêutico, que pode ser chamado de contrato
de prestação de serviços ou termo de consentimento, pode ser elabo-
rado apresentando a natureza do atendimento on-line, especificando
se é síncrono, assíncrono ou misto, como se dará o armazenamento
das informações e as medidas de segurança, como senha e antivírus,
48
o tempo de resposta da profissional para atendimentos assíncronos e
quais recursos utilizados (ANTÚNEZ; SILVA, 2020).
Ainda no contrato deve-se frisar a importância do sigilo pela
profissional e como ela pretende garantir esse sigilo, bem como a corres-
ponsabilidade pelo usuário. Também precisa informar qual o ambiente
adequado para os atendimentos, os honorários, as faltas e desmarcações
e outras informações que sejam necessárias para o funcionamento dos
atendimentos. Necessário conter ainda os dados de localização física do
profissional e o contato de pessoas localizadas geograficamente próxi-
mas, para caso ocorra alguma emergência (ANTÚNEZ; SILVA, 2020).
É importante que a profissional apresente quais alternativas
em caso de o cliente sentir desconforto com as tecnologias, sempre
deixando claro que esse pode optar por encerrar os atendimentos. A
responsabilidade e garantia do sigilo, da confidencialidade e intimidades
dos atendimentos são da profissional, no entanto, em atendimentos
on-line o usuário também precisa realizar alguns cuidados para pre-
servá-los. Cabe a profissional orientar e ajudar neste ponto.
Outro aspecto deste domínio é a formação e capacitação da
profissional para ofertar serviços na modalidade on-line, desta forma,
a profissional precisa ter conhecimentos e dominar as ferramentas e
tecnologias empregadas, conhecendo seus riscos e benefícios terapêu-
ticos para cada intervenção. Cabe a profissional avaliar qual a melhor
modalidade para o atendimento, se seria o síncrono ou assíncrono.
Para que a psicóloga possa atender na modalidade on-line é
necessário realizar o cadastro no website Cadastro e-Psi (Cadastro
Nacional de Profissionais para Prestação de Serviços Psicológicos por
meio de TICs), considerando a inscrição principal da(o) profissional,
isto é, a região em que se encontra inscrita.
Este domínio ainda precisa ser analisado segundo o tipo de ser-
viço, público ou privado, uma vez que os cuidados éticos em ambientes
públicos precisam ser amplificados por causa da rotatividade de pro-
fissionais e fluxo de pessoas. O atendimento on-line de modo geral
49
não é totalmente seguro, sendo a segurança dos dados ainda um fator
de desafio para os profissionais. Portanto, os usuários precisam ter
conhecimentos sobre isso para analisarem o interesse em iniciar ou
manter atendimentos nessa modalidade (SPENCER; PATEL, 2019).

DOMÍNIO TECNOLÓGICO

O domínio tecnológico versa sobre a formação tecnológica da


profissional e sua capacidade tecnológica, bem como do usuário do
serviço. Para tal, a profissional deve escolher os recursos tecnológicos que
melhor beneficie as intervenções, relacionando com os aspectos éticos.
Mas como escolher as ferramentas digitais? Segundo Antúnez
e Silva (2020), o primeiro passo é a escolha da capacidade de banda
larga adequada para a prestação de serviços, de forma a garantir a
qualidade dos serviços. A utilização de dois provedores também é
essencial, como forma de prevenir oscilação ou queda de conexão.
Deve-se ainda analisar se os aparelhos utilizados suportam todos os
aplicativos que serão necessários, bem como possuir um excelente
antivírus e senhas para proteger seus dados.
Sobre esse último, é importante que as plataformas e aplicativos
atendam a segurança e confidencialidade requeridas pelos serviços -
termos de condições e tratamentos dos dados coletados, armazenamento
das informações e formas possíveis de destruição destas em caso de
perda de segurança ou solicitação (MELO et al., 2020).
O usuário precisa dispor de recursos tecnológicos adequados
para os atendimentos, como por exemplo um aparelho celular ou
Notebook, ou mesmo acesso a conexão satisfatória. Aliado a isto, o
profissional deve avaliar a capacidade tecnológica do usuário, se este
possui habilidades para utilizar as tecnologias como saber usar um
aplicativo específico, por exemplo.
Para o atendimento on-line assíncrono, a profissional precisará de
aplicativos de e-mail, mensagem de texto e/ou voz, fóruns de prevenção
50
e orientação, entre outros, sendo estes de fácil acesso aos usuários. As
características das intervenções podem mudar dependendo do foco,
da quantidade de participantes e do tipo de serviço. A psicóloga deve
zelar pelo armazenamento das conversas nesses aplicativos e orientar
que os usuários façam o mesmo (ANTÚNEZ; SILVA, 2020).
Os aspectos técnicos e de segurança são essenciais, mas é neces-
sário ainda que tais escolhas de ferramentas e tecnologias sejam feitas
com respaldo teórico científico, que comprove a eficácia de tais recursos
para as intervenções propostas pela profissional, sempre pensando na
melhor forma de beneficiar os usuários.

DOMÍNIO CLÍNICO

O domínio clínico possui relação com os aspectos éticos e as


tecnologias, estando associado à postura do terapeuta, isto é, a forma
que a profissional se posiciona frente a vida digital. Essa postura da
profissional pode facilitar ou comprometer o desenvolvimento do
tratamento na modalidade on-line.
Segundo Antúnez e Silva (2020), deve-se partir do seguinte
questionamento: como eu me relaciono com as tecnologias na minha
vida? A forma que o terapeuta se relaciona com as tecnologias no seu
cotidiano, pode auxiliar na conduta do atendimento, ou mesmo preju-
dicar se o terapeuta não possui uma boa relação com as tecnologias. Ou
seja, os profissionais que não gostam de certos aspectos da era digital,
ou mesmo só usa por obrigação, talvez não seja o mais recomendado
a realizar atendimentos por meio de tecnologias.
A identidade digital do profissional é importante para preservar
e diferenciar seu uso pessoal do profissional, dessa forma, é recomen-
dado que ele possa estabelecer limites com as pessoas que atende,
indicando os horários disponíveis e possuindo contatos diferenciados
para uso pessoal e profissional.

51
O profissional deve ainda avaliar os hábitos e motivações do
cliente para o atendimento on-line e uso das tecnologias, pois clientes
que possuem dependência das tecnologias ou um controle exagerado
podem ser prejudicados em atendimentos nessa modalidade.
Outro ponto importante deste domínio é o setting terapêutico,
uma vez que no atendimento on-line o espaço é dividido entre pro-
fissional e cliente. Dessa forma, o que há é o setting ampliado, em que
o cliente é corresponsável pelo ambiente terapêutico, devendo ambos
promover um espaço propício para os atendimentos de forma aco-
lhedora, segura, de confiança e particular. Algumas estratégias devem
ser tomadas para garantir tais características, como o uso de fones de
ouvido, iluminação satisfatória, redução de ruídos externos, a forma
da escrita, entre outros (MELO et al., 2020).
O vínculo terapêutico ou relação terapêutica é outro fator essen-
cial do domínio clínico, uma vez que existe a preocupação que estes
aspectos não sejam tão promovidos na modalidade on-line em com-
paração com a modalidade presencial ou face a face.
Com o atendimento on-line assíncrono é ainda mais questio-
nado a relação terapêutica, principalmente para atendimentos que são
totalmente assíncronos. Já que este tipo de atendimento não inclui
interações simultâneas. No entanto, as pesquisas de Pieta (2014) e
Prado e Meyer (2006), apontaram que atendimentos assíncronos são
formados e se mantém com características semelhantes as demais
modalidades, sendo possível sim, estabelecer um clima produtivo entre
terapeutas e clientes. As pesquisadoras ainda confirmam que a relação
terapêutica é central para a psicoterapia e possibilitada via internet, o
que indica que é possível existir psicoterapia on-line.
O profissional precisa avaliar os riscos que o ambiente on-line
pode oferecer aos usuários, como dependência tecnológica, anonimato
perante a vida, isolamento decorrente de fobias, quadro depressivos,
violências de diferentes tipos, como violência doméstica, psicológica,
física, entre outros. Esses riscos devem ser analisados em todos os
52
atendimentos e não somente nas primeiras consultas. Identificadas
situações de risco, as mesmas devem ser apresentadas ao cliente e
planejadas ações de enfrentamento (ANTÚNEZ; SILVA, 2020).

DOMÍNIO CULTURAL

Este domínio aborda as transformações socioculturais e sua


inserção com as tecnologias na vida, as formas que se relacionam com
características sociais, econômicas e específicas. Os meios digitais pos-
sibilitaram a ampliação da acessibilidade de diferentes serviços, como o
psicológico. Populações que antes não tinham acesso a terapia por razões
geográficas ou por falta de profissionais especializados, passaram a ter
acesso a estes serviços de forma on-line (ANTÚNEZ; SILVA, 2020).
No entanto, alguns cuidados precisam ser tomados no que se
refere esse domínio. A diversidade cultural das populações, isto é, as
diversas realidades que possuem as pessoas, seus valores culturais –
como as formas de falar do profissional e/ou cliente -, compreensão
política e religiosa, entre outros, são fatores que podem implicar no
vínculo terapêutico ou causar algum tipo de desconforto se houver falta
de respeito por alguma das partes, como rir de sotaque. Com relação a
fala por exemplo, se o terapeuta atende alguém de uma realidade muito
diferente da sua pode não entender suas gírias e isso impactaria na
comunicação assíncrona, já que ela ocorre de maneira escrita ou verbal.
Ao avaliar o domínio cultural é necessário que o profissional
verifique todos os domínios anteriores, como a regulamentação para
atuação em regiões distintas e/ou países. Buscando conhecer regula-
mentações éticas e tecnológicas do local em que a pessoa atendida
está aceitando e acolhendo suas crenças e valores, bem como promo-
vendo segurança aos atendimentos.

53
EXPERIÊNCIAS NO ATENDIMENTO PSICOLÓGICO
ON-LINE

A modalidade on-line é relativamente nova para a psicologia


brasileira, o que implica em diversas dificuldades para a categoria,
desde as diretrizes éticas implicadas para iniciar os atendimentos
nessa modalidade, até a melhor forma de conduzir os casos e suas
especificidades. Isso ocorre principalmente porque falta orientações
mais bem desenvolvidas pelos órgãos competentes, o Conselho Fede-
ral e Regionais de Psicologia.
Na experiência dos psicólogos autores deste capítulo, as principais
dificuldades perpassam todos os quatro domínios abordados, pois há
a escassez de cursos de formação e capacitação sobre a temática, bem
como sobre quais ferramentas tecnológicas usar. As limitações atraves-
sam ainda o estabelecimento da relação de confiança do terapeuta e do
usuário. A relação de confiança é construída no decorrer do processo,
dessa forma, os primeiros contatos são de extrema importância para
o progresso das sessões subsequentes.
Se por um lado, no atendimento presencial existe a possibilidade
de contato, na modalidade on-line o contato físico é vencido pela bar-
reira das lentes da tecnologia. Neste sentido, percebemos a necessidade
de também dar ênfase a este aspecto, pois é necessário dispor de um
bom equipamento tecnológico, que assegure no mínimo, internet,
áudio e imagem de qualidade. Acreditamos que esses requisitos sejam
realmente importantes para estabelecer um vínculo favorável que gere
conforto e segurança ao usuário.
A disponibilidade do terapeuta em manejar os primeiros minutos
da sessão demonstrando segurança e conforto diante do usuário ajuda
a quebrar a barreira da distância e faz com que o mesmo possa ficar
mais à vontade. Comunicar de forma tranquila a uma pessoa incrédula
que a qualidade do atendimento on-line e o efeito da terapia não
mudam, ajudam o usuário a desarmar-se e ir aos poucos quebrando
54
suas armaduras. De certo modo, a mesma regra vale para as pessoas
que demonstram mais timidez ou são mais ansiosas.
Para tentar sanar essas complexidades, foi necessário se dedicar em
estudos e capacitações específicas para realizar os atendimentos on-line,
e ainda assim, a atuação trouxe experiências para as quais não havia res-
paldo pela teoria e pelos profissionais mais atuantes nesta modalidade.
Outros desafios enfrentados se relacionavam ao público atendido,
uma vez que o público infantojuvenil era considerado mais difícil de
atender na modalidade on-line. Já que crianças e adolescentes neces-
sitam de um atendimento mais específico e com recursos lúdicos que
sejam adaptados para o meio digital, sendo imprescindível o conheci-
mento de tecnologias que possibilitem a interação usuário-profissional.
Com relação ao público há ainda a limitação tecnológica por
parte de alguns usuários, pois o atendimento on-line exige um mínimo
de aparatos eletrônicos como celular e/ou Notebook, bem como de
acesso a internet que muitas vezes não é disponível a todos. O setting
terapêutico também se apresentou como um fator limitante, pois alguns
usuários não puderam continuar os atendimentos por não dispor de
um local silencioso e que preservasse o sigilo.
Apesar das dificuldades apresentadas o atendimento on-line
possui algumas vantagens. Para a profissional psicóloga é possível
atender a qualquer usuário do país ou mesmo fora do Brasil, não
havendo a restrição regional do seu Conselho, como é o caso de aten-
dimentos presenciais. Para usuário há o benefício da flexibilidade e
conveniência, uma vez que não há a necessidade de enfrentar trânsito
para se deslocar até o consultório.
Para alguns usuários o atendimento on-line é a forma mais
rápida de ser atendido por um especialista, especialmente para quem
mora em localidades distantes e de difícil acesso, como também pes-
soas com dificuldade de locomoção, acamadas ou doentes. Em alguns
casos o usuário se sente mais confortável com esse tipo de comunica-

55
ção, como são os casos de pessoas tímidas que preferem interagir de
forma digital a presencialmente.
Dessa forma, assegurando que o enquadre terapêutico perma-
nece o mesmo do acompanhamento presencial no que diz respeito ao
cuidado, ética, sigilo, duração das sessões e confirmação dos horários,
tudo isso auxilia na construção de um ambiente virtual acolhedor e
seguro para aqueles que estão se abrindo para esse processo. Essas são
questões que precisam ficar claras, a fim de que o usuário entenda a
preservação da sua história de vida.
Vale ressaltar que cada caso é específico, a avaliação da per-
manência no atendimento on-line vai depender muito das queixas
principais trazidas durante o atendimento, bem como do histórico da
pessoa. Esse fator pode ser apontado como um limite do atendimento
on-line, tendo em vista que existem casos nos quais exigem realmente
o contato presencial, pois o próprio fator do usuário sair de casa, pode
ajudá-lo na melhora da demanda verbalizada. Ou seja, uma pessoa
que se encontra sozinha, isolada e sem uma rede de apoio estabe-
lecida, pode sentir-se melhor pelo simples fato de ter um encontro
presencial com o seu terapeuta.
Assim, a experiência do profissional e o olhar cuidadoso contam
muito para dar o direcionamento necessário. Sempre que possível é
importante alternar entre o atendimento on-line e presencial, isso
ajuda o terapeuta a ter parâmetros entre os atendimentos. E ajuda a
pessoa a perceber de forma concreta o seu processo.
Os resultados no formato on-line são tão satisfatórios quanto
no presencial, isto é comprovado por diversas pesquisas recentes
(SIEGMUND; LISBOA, 2015; RIBEIRO; COSTA; ESPÍN-
DULA, 2020; ALMEIDA et al., 2020; DA SILVA, 2022; TORRES
et al., 2022) e também pela atuação prática experienciada na clínica
privada e em serviços públicos.
Com a pandemia os usuários que realizavam psicoterapia pre-
sencialmente foram convidados a ingressarem na modalidade on-line,
56
após a retomada das atividades presenciais quase todos os usuários
optaram por continuar com atendimento on-line, por todas as vantagens
já apresentadas. Este é um indicador da funcionalidade e eficiência
do atendimento psicológico on-line.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O atendimento psicológico on-line é uma modalidade de atua-


ção permitida pelo Conselho Federal de Psicologia que cresceu a
partir da pandemia de Covid-19. Apesar de ser um formato novo
e que possui muitas dificuldades e limitações, principalmente para
o profissional que está iniciando, essa modalidade se desenvolveu
entre a categoria por todas as vantagens que apresenta em compara-
ção com o atendimento presencial.
Obviamente o atendimento on-line ultrapassou barreiras,
trouxe um além-fronteiras possível para que muitas pessoas pudes-
sem ter acesso ao acompanhamento com profissionais de qualquer
lugar do mundo. Isso é um ponto positivo, pois possibilita a per-
manência de estar com o mesmo profissional em casos de pessoas
que mudaram de cidade ou país.
A psicoterapia on-line ainda possui muitos desafios a serem
enfrentados pela categoria de psicólogas, fica nítido que essa moda-
lidade não poderá ser praticada por todos os profissionais, dado as
exigências aos domínios apresentados. Mas é uma área de atuação
que estar se expandindo e vem se consolidando pelos profissionais e
usuários, com resultados satisfatórios e benefícios evidentes.

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LÓGICA ONLINE EM TEMPOS DE PANDEMIA. Revista Extensão & Cidadania,
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57
DA SILVA, R. M. Experiência de atendimento psicológico on-line com pacientes diagnos-
ticados com HTLV na bahia: uma análise qualitativa a partir dos relatórios de atendimento
durante a pandemia de COVID-19. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências
e Educação, v. 8, n. 5, p. 2258-2276, 2022.
JOINT TASK FORCE FOR THE DEVELOPMENT OF TELEPSYCHOLOGY
GUIDELINES FOR PSYCHOLOGISTS. Guidelines for the practice of telepsychology.
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MELO, B. D. et al. Saúde mental e atenção psicossocial na pandemia COVID-19: reco-
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PRADO, O. Z.; MEYER, S. B. Avaliação da relação terapêutica na terapia assíncrona via
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meios tecnológicos de comunicação a distância, o atendimento psicoterapêutico em cará-
ter experimental e revoga a Resolução CFP N.º 12/2005. Brasília, DF: Conselho Federal
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Resoluxo_CFP_nx_011-12.pdf
RESOLUÇÃO CFP Nº 11, de 11 de maio de 2018. Regulamenta a prestação de serviços
psicológicos realizados por meios de tecnologias da informação e da comunicação e
revoga a Resolução CFP N.º 11/2012. Brasília, DF: Conselho Federal de Psicologia, 2018.
Recuperado de https://epsi.cfp.org.br/resolucao-cfp-no-11-2018/
RIBEIRO, E. C. S.; COSTA, R. C. M.; ESPÍNDULA, J. A. G. Relato de experiência: o
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SIEGMUND, G.; LISBOA, C. Orientação Psicológica On-line: Percepção dos Profissionais
sobre a Relação com os Clientes. Psicologia Ciência e Profissão, v. 35, n. 1, p. 168–181, 2015.
SPENCER, A.; PATEL, S. Applying the Data Protection Act 2018 and General Data
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London, England: 1994), v. 26, n. 1, p. 34–40, 2019.
TORRES, M. S., et al. Potencialidades e Desafios do Atendimento Psicológico Online
durante a Pandemia da Covid-19 na Perspectiva dos Profissionais. Cadernos de Psicologia,
p. 12-12, 2022.

58
“NO PRINCÍPIO, ERA O VERBO (...)”: A
PRODUÇÃO BRASILEIRA SOBRE ANÁLISE
DO COMPORTAMENTO E RELIGIÃO

José Américo Dinizz Júnior10


Felipe Maciel dos Santos Souza11

A Psicologia está localizada em uma área que se dedica à escuta


e fala qualificadas. Dentro desse universo plural e ao mesmo tempo
particular, no qual se constitui a área clínica, encontra-se a pessoa do
profissional psicólogo, quel se reveste ou é revestida por um manto
semântico que lhe outorga um status quase sagrado, atribuindo a esta,
diversas qualidades que expressam confiança, compreensão, confiden-
cialidade, escuta atenta, orientações precisas, constituindo assim para
quem o procura, além de uma fonte de suposto saber e imparcialidade,
também uma esperança de ajuda qualificada que possibilite a melhora
e ou superação do estado que a mesma se encontra e ou atravessa.
Enquanto uma área do conhecimento, a Psicologia convive com
a diversidade e a multiplicidade de teorias (SOUZA, 2015). A diver-
sidade de objetos da Psicologia é explicada pelo fato de este campo
do conhecimento ter-se constituído como área do conhecimento
científico só muito recentemente, final do século 19, a despeito de
existir há muito tempo na Filosofia enquanto preocupação humana
(BOCK, FURTADO, TEIXEIRA, 1999).
Dentre as diversas teorias psicológicas tem-se a Análise do
Comportamento. A definição mais básica para a teoria é proposta
por Teixeira Júnior e Souza (2006, p. 18), em que se caracteriza como
uma “área de investigação conceitual, empírica e aplicada do com-

Mestrando em Psicologia (UFGD). CV: http://lattes.cnpq.br/6268329310343237


10

11
Doutorado em Psicologia (PUC-SP). Professor permanente do Programa de Pós-graduação em
Psicologia (PPgPsi – UFGD). CV: http://lattes.cnpq.br/5514957741890083
59
portamento”. Tal definição parece enfatizar mais as suas funções do
que o seu significado, o que não deixa de ser uma forma de defini-la.
Conforme Todorov (2019, p.10-12), a Análise do Comporta-
mento “não é uma área da Psicologia, mas uma maneira de estudar
o objeto da Psicologia”, e ainda que a mesma “não se limita à análise
experimental do comportamento”, mas se desenvolveu “como uma
linguagem da psicologia, aperfeiçoou métodos de estudo para questões
tradicionais da psicologia, abriu novos campos de pesquisa e gerou
tecnologias em uso por toda parte”.
Enquanto área que privilegia as interações comportamento-
-ambiente, pode-se observar através de fatos históricos, o desenvol-
vimento da Análise do Comportamento enquanto ciência, que tem
seus princípios, métodos e instrumentos. Nessa perspectiva, pode-se
compreender a mesma como sendo uma abordagem da Psicologia,
e, ao mesmo tempo, como uma ciência distinta, isto é, uma forma
peculiar e única de se abordar o comportamento.
A forma como behavioristas radicais lidam com as questões
religiosas e com suas crenças a respeito, foi objeto de uma pesquisa
realizada por Souza (2004) com 30 participantes, sendo estes, pro-
fessores, mestrandos, doutorandos, mestres e doutores em Análise
do Comportamento na cidade de Brasília – DF. O estudo traz, entre
outros achados, o dado de que, ainda que no campo teórico as diferenças
entre esses distintos saberes sejam grandes, a maioria dos participantes
relatou que consegue conciliar a religião com a filosofia behaviorista na
prática. Assim, os behavioristas entrevistados na pesquisa, constituem,
segundo Souza (2004, p. 41) “indivíduos que acreditam em um Deus
ou em uma força superior transcendental por contingências de reforço
ou punição, ao mesmo tempo em que, racionalmente, concordam e
defendem os pressupostos do Behaviorismo Radical”.
O trabalho de Souza (2004) deixa um caminho aberto para
ampliação da pesquisa no sentido de averiguar para além das crenças
dos behavioristas a respeito da religião e sua influência, quais seriam
60
os preditores comportamentais específicos que no fazer cotidiano
destes se fazem presentes, observáveis e que podem ser mensuráveis
de forma mais objetiva possível.
Duque, Socci e Corrêa (2017), ao desenvolverem um levanta-
mento sobre o comportamento religioso, apontam que dentre os 86
trabalhos encontrados nas bases de dados SciELO, PePSIC, LILACS e
ABPMC sobre a temática, entre os anos de 1996 e 2016, apenas 5 resul-
tados tinham enfoque behaviorista, o que demonstrou, segundo eles,
um atraso da Análise do Comportamento no tratamento desse assunto.
Dando continuidade na análise dessa temática envolvendo Aná-
lise do Comportamento e comportamento religioso, Duque, Socci
e Raggi (2018), realizaram uma pesquisa de levantamento com 137
participantes, os quais utilizavam de referenciais teóricos behavioris-
tas e se denominavam Analistas do Comportamento. O objetivo da
pesquisa foi, segundo os mesmos, “investigar a importância atribuída
por Analistas do Comportamento ao Comportamento Religioso”
(p. 1). O dado interessante extraído pela pesquisa foi de que em um
universo de 137 participantes, apesar de apenas 10 declararem total
desinteresse pelo tema, do restante apenas 5 desenvolviam estudos a
respeito. Nesse sentido, Duque, Socci e Raggi (2018, p. 3) concluem
que “o diminuto número de publicações nacionais está diretamente
relacionado, não por não considerar importante, mas sim pelo empe-
nho ao desenvolvimento de outras tecnologias nesta ceara teórica”.
Deve-se salientar, a respeito do trabalho de Duque, Socci e
Raggi (2018), que em termos de considerações finais, um dado a ser
pontuado nessa análise, é sobre a necessidade de ser levada em con-
sideração a qualificação na área de estudos da religião, o que pode vir
a constituir uma possível lacuna no repertório comportamental dos
entrevistados, conduzindo assim a um interesse não-ativo no sentido
de desenvolver novos estudos sobre o tema.
Considerando a religião como elemento do desenvolvimento
humano (BERNADI; CASTILHO, 2016), com esta pesquisa preten-
61
de-se discutir, a partir da perspectiva da Análise do Comportamento,
o comportamento religioso. Assim, busca-se analisar, pesquisas em
Análise do Comportamento que abordem o comportamento religioso
no Brasil, de modo a caracterizar a produção nacional sobre o tema.

PERCUSOS METODOLÓGICOS

DOCUMENTOS

Tendo em vista que tudo pode ser documento, desde que seja
assumido como tal, uma vez os documentos não existem como tais antes
que a curiosidade do pesquisador intervenha (PROST, 2008), para fins
desta pesquisa, foram utilizados, como documentos: (1) Dissertações e
teses de Análise do Comportamento e (2) artigos publicados até julho
de 2022 em três periódicos nacionais de Análise do Comportamento.

FONTES

O exame de publicações acerca do envolvimento do analista


do comportamento com o comportamento religioso foi realizado a
partir da leitura de artigos, dissertações e teses disponíveis no Banco
de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES), na Revista Brasileira de Tera-
pia Comportamental e Cognitiva (RBTCC), na Revista Brasileira
de Análise do Comportamento (REBAC) e na Revista Perspecti-
vas em Análise do Comportamento.
O Banco de teses e dissertações da CAPES é um sistema que
permite a pesquisa de metadados e/ou texto completo de dissertações
e teses vinculadas à programas de pós-graduação reconhecidos e ava-
liados pelas CAPES (MANOEL; SOUZA, 2019).
A seleção das três últimas fontes foi feita considerando a rele-
vância do material para a área da Análise do Comportamento, sendo
revistas que se apresentam como de publicação específica dessa abor-
62
dagem. A escolha, no entanto, se deveu apenas ao fato de serem as
únicas brasileiras específicas à área: representam a comunidade de
analistas do comportamento no país, ainda que seus membros possam
(e devam) publicar em outros periódicos.
A RBTCC é o periódico da Associação Brasileira de Ciências
do Comportamento (ABPMC) e passou a ser publicada em 1999,
tendo por objetivo, segundo Saab, Souza, Franco, Ghellere, Bor-
toletto e Borri et al. (2022), divulgar artigos de abordagem Com-
portamental e Cognitiva, em que se utilize o método experimental,
conceitos desenvolvidos a partir de observações sistemáticas e análises
comportamentais. Além disto, com a RBTCC pretende-se informar
sobre métodos da clínica comportamental e cognitiva e da Análise
do Comportamento e suas aplicações.
A REBAC, segundo Saab et al. (2022), é uma publicação semes-
tral que visa divulgar a Análise do Comportamento no Brasil e no
exterior. Desde 2005, são publicados textos originais em português e
em inglês nas formas de artigo teórico, análise conceitual, relato de
pesquisa e comunicação breve de pesquisa. A revista publica também
artigos que contribuam para a preservação da história da Análise
do Comportamento e do Behaviorismo Radical e a tradução para o
português de artigos clássicos.
A Revista Perspectivas em Análise do Comportamento, segundo
Saab et al. (2022), é uma publicação editada e financiada pelo Núcleo
Paradigma desde 2010, de publicação virtual, tendo como objetivo publi-
car artigos originais, relacionados ao Behaviorismo Radical, e à Análise
do Comportamento, com destaque para análises sobre desenvolvimento
histórico, filosófico, conceitual, metodológico, e tecnológico da área.

PROCEDIMENTO DE COLETA E ANÁLISE

As palavras de busca utilizadas para seleção dos documentos


foram: “religião”, “religioso”, “comportamento religioso”, “análise do
comportamento e religião”, “análise do comportamento e religiosidade”.
63
A busca de teses e dissertações no Banco de dados da CAPES.
O banco foi acessado por meio do endereço eletrônico específico.
Na página inicial foi acessado o campo “Buscas”. Ao proceder a
uma busca nesse campo outra janela é aberta, contendo primeiros
resultados e que podem ser refinados pelos seguintes delimitadores:
“Tipo”, “Ano”, “Autor” e “Orientador”, “Banca”, “Grande área Conhe-
cimento”, “Área Conhecimento”, “Área Avaliação”, “Área Concentra-
ção”, “Nome Programa”, “Instituição”, “Biblioteca”. As palavras de
busca foram postas, uma por vez, no campo “Busca” e, finalmente, a
opção “Buscar” foi selecionada.
Todas as dissertações e teses que foram encontradas com as
palavras de busca tiveram os títulos e os resumos lidos, e foram selecio-
nadas aquelas cujo foco de investigação era comportamento religioso
sob a perspectiva da Análise do Comportamento, isto é, que tiverem
evidenciadas no título e/ou no resumo, termos técnicos da Ciência do
Comportamento, de sua filosofia (Behaviorismo Radical), ou concei-
tos produzidos por ambas (MICHELETTO; GUEDES; CÉSAR;
PEREIRA, 2010). Foram excluídas aquelas cujo referencial teórico
explícito fosse outro que não o da Análise do Comportamento (por
exemplo, psicobiologia, cognitivismo, etc.).
Realizou-se uma primeira busca dos termos selecionados, uti-
lizando os sistemas de pesquisas disponíveis das fontes, nos sítios em
que estão hospedadas. Quando alguma palavra ou expressão-chave
estava contida no corpo do texto, mas não era o objeto principal do
estudo, o estudo era descartado. No entanto, como forma de diminuir
possíveis inconsistências derivadas do sistema de busca dos indexadores,
como exclusão de resultados relevantes, e visando a possibilidade de
inclusão de novas palavras ou expressões pertinentes à pesquisa, foi
realizada a leitura do sumário e resumo (quando disponível) de toda a
produção dos periódicos. Dessa forma, poderiam ser incluídos artigos
que, apesar de não possuírem palavras ou termos-chave da lista citada
anteriormente, possuíam palavras que se relacionavam diretamente com
64
algum dos descritores listados anteriormente ou que eram derivados
gramaticalmente de alguma palavra-chave.
Para o estudo, foram coletadas e organizadas em uma planilha
do Microsoft Excel 2007 as seguintes informações:
(1) Autor: nome completo do autor do material (artigo, disser-
tação, tese).

(2) Título: título completo do material (artigo, dissertação, tese).

(3) Instituição: nome completo da instituição referida no material.

(4) Ano: ano de defesa da dissertação/tese ou ano de publicação


no caso de artigo.

(5) Orientador: nome completo do orientador, no caso de


dissertação/tese

(6) Resumo: resumo completo apresentado em material (artigo,


dissertação, tese)

(7) Tipo de pesquisa: As pesquisas foram classificadas em básica,


aplicada e histórico-conceitual (BAER; WOLF; RISLEY, 1968;
TOURINHO; SÉRIO, 2010).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Através da busca pelos termos selecionados na pesquisa, realizada


nos sítios online das fontes descritas anteriormente, foram localiza-
dos e analisados quatro documentos, publicados entre 2016 e 2022,
como se representa no Gráfico1.

65
Gráfico 1: Por fonte, percentual de trabalhos que foram localizados e analisados.

Fonte: Autores.

A partir do Gráfico, verifica-se que, a maioria dos documentos


analisados são artigos (75%, n= 3) e há, somente, uma dissertação.
Deve-se ressaltar que não foi localizado material na REBAC. As
informações (título, autores e anos de publicação) dos documentos
analisados estão apresentadas no Quadro 1, a seguir.

Quadro 1: Informações sobre materiais publicados e que compuseram o corpus


documental deste capítulo.
TÍTULO AUTOR(ES) TIPO ANO
O comportamento religioso:
Análise da religião e da reli-
SAMPAIO, P. H. F. Dissertação 2016
giosidade sob uma perspec-
tiva behaviorista radical
Um diálogo entre a análise
do comportamento e a psi-
cologia evolucionista sobre
LUIZ, A.; KNAUT, J. F. F. Artigo 2017
a influência da filogênese no
surgimento do comporta-
mento religioso

66
Racismo religioso na escola:
ORLANDI, P. H. A.; REIS,
projeto de delineamento cul- Artigo 2022
T. S.
tural para seu enfrentamento
Relação entre Cultura
e Religião na Emissão PADILHA, F. M. G.;
d e C o m p o r t a m e n t o s FAZZANO, L. H.; GALLO, Artigo 2022
LGBTfóbicos p o r A. E.
Psicólogas(os) Clínicas(os)
Fonte: Autores.

Inicialmente, deve-se apontar que não se estabeleceu nenhum


recorte temporal para a coleta de dados, ressaltando-se que o primeiro
documento localizado e analisado data de 2016, e os últimos de são
de 2022. Ou seja, os documentos foram produzidos há menos de 10
anos, o que pode demonstrar um interesse recente da comunidade
brasileira de Análise do Comportamento sobre o tema.
Tendo em vista, somente, o número de dissertação analisado
(n=1) é possível afirmar que a produção analítico-comportamental
é irrisória, uma vez que Nóbrega (2015) ao pesquisar sobre como os
conceitos da Análise do Comportamento foram aplicados em con-
textos educacionais, analisou 45 dissertações e teses produzidas entre
2005 e 2015. Ao se considerar o número de artigos analisados (n=3),
novamente, tem-se uma baixa produção, uma vez que Maluf (2003),
ao estudar como a discussão sobre eventos privados em artigos de
revistas científicas, analisou 107 artigos.
O baixo número de documentos analisados corrobora a hipótese
de Dias (2017), de que os analistas do comportamento não tiveram
especial interesse pelo comportamento religioso, suas pesquisas nesta
área ocorreram em paralelo a outras pesquisas que realizavam. Skinner
(1978), por sinal, observou instituições sociais do comportamento,
evidenciando a religião como um reforçador/inibidor de atitudes por
meio das promessas de prêmios ou ameaças de punições eternas.

67
Quanto às instituições dos autores, percebe-se que, entre elas,
não há instituição das regiões Norte e Nordeste do Brasil. As ins-
tituições são das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Ressalta-se
que no Brasil, há enorme heterogeneidade espacial das atividades
de pesquisa científica, onde o padrão regional da distribuição das
publicações e dos pesquisadores é altamente concentrado na região
Sudeste, com destaque às capitais dos estados (SIDONE; HAD-
DAD; MENA-CHALCO, 2016). Tal fato pode ser atribuído a três
aspectos, as regiões Sudeste e Sul são favorecidas pela concentração
de universidades e institutos de pesquisa historicamente consolidados
(SUZIGAN; ALBUQUERQUE, 2011) e pela maior disponibilidade
de recursos humanos (ALBUQUERQUE et al., 2002) e financeiros
devido a políticas implementadas por importantes agências de fomento.
Considerando os critérios de Baer, Wolf e Risley (1968) e Tou-
rinho e Sério (2010), todos os trabalhos podem ser classificados como
histórico-conceituais. Ao analisar religião e da religiosidade sob uma
perspectiva behaviorista radical, Sampaio (2016) destaca que o com-
portamento religioso tem papel central na vida de muitas pessoas. Ele
está presente em todo o mundo, atravessa toda a história humana e
sabemos que a orientação religiosa de um indivíduo ajuda a compor
o modo como vê o mundo, como vê a si mesmo, como interage com
outros, os seus valores morais e até suas decisões políticas. A despeito
disso, segundo o autor, o comportamento religioso tem sido pouco
estudado por behavioristas radicais.
A fim de investigar o papel de alguns conceitos comportamentais
em sua origem e manutenção, Sampaio (2016) apresenta um breve
panorama do estudo contemporâneo do comportamento religioso,
buscando estabelecer se o conceito de comportamento supersticioso
pode auxiliar na compreensão do comportamento religioso, qual o
papel do reforçamento social no comportamento religioso e, por fim,
se poderia haver no comportamento religioso elementos do que o
behaviorismo radical classifica como mentalismos.
68
Com o objetivo de discorrer sobre os aspectos filogenéticos e
sua possível influência sobre o surgimento do comportamento reli-
gioso, Luiz e Knaut (2017) promovem um diálogo entre a Análise do
Comportamento e a Psicologia Evolucionista. Segundo os autores, a
filogênese está intimamente ligada ao processo de aprendizagem do
comportamento religioso devido à espécie humana ter desenvolvido
um aparato biológico que permite exercer atribuições animistas sobre
o ambiente sendo, muitas vezes, reforçadas por aumentar a probabili-
dade de sobrevivência da espécie. Sendo assim, pode-se teorizar que
o comportamento religioso surgiu por meio da associação de outras
funções comportamentais ligadas à sobrevivência da espécie e não
à própria religiosidade e desenvolveu-se devido a uma capacidade
biológica da espécie do comportamento ser reforçado.
É sabido que os casos de intolerância religiosa registrados no país
ocorrem principalmente contra religiões de matriz africana, mesmo
havendo leis que criminalizem estes atos. Segundo, Orlandi e Reis
(2022), na literatura analítico-comportamental não se encontram
trabalhos que tratem de racismo religioso, tampouco das variáveis
antecedentes que controlam os comportamentos de intolerância.
Tendo em vista que intervir sobre o racismo religioso na escola
é de extrema urgência e um dever do psicólogo e especialmente do
analista do comportamento, que deve ter uma prática em prol da justiça
social, Orlandi e Reis (2022), teorizaram um projeto de intervenção
baseado na Análise Comportamental da Cultura com aplicação no
contexto escolar contra o racismo religioso, utilizando para isso o Guia
Orientador para delineamentos culturais. Na elaboração do guia, os
autores discutiram variáveis controladoras da prática cultural do racismo
religioso na escola e um projeto de intervenção foi planejado para
eliminar tal prática e instalar uma nova, incompatível com a primeira.
Por fim, a relação entre cultura e religião na emissão de compor-
tamentos LGBTfóbicos por psicólogas(os) clínicas(os) foi analisada
por Padilha, Fazzano e Gallo (2022). Neste trabalho os autores(a)
69
procuraram evidenciar a ocorrência do preconceito contra populações
LGBTQIA+ que ocorrem dentro da clínica psicológica, enfatizando o
comportamento religioso como sendo um dos principais constituintes
na manutenção dessas ocorrências.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No contexto brasileiro, pode-se reconhecer a importância da


religião, da religiosidade e da espiritualidade na constituição de com-
portamentos. Neste sentido, compreende-se que tanto a religião quanto
a Análise do Comportamento transitam num campo comum, qual
seja, o da produção de comportamento, entendendo ser fundamental
o estabelecimento de um diálogo entre esses conhecimentos.
Tem-se, assim, um reforço ao diálogo como caminho de interação
entre as áreas, o interesse e a confluência dentro de um campo comum
a ambas: a previsão e controle de comportamentos. Por último, vale
ressaltar que esse diálogo, essa interação entre os saberes, mediada de
forma ética, permite um avanço nos estudos acadêmicos em torno
de temáticas em comum, contribuindo assim para um enriqueci-
mento teórico e prático pautado por métodos, procedimentos e ins-
trumentos específicos a cada área.
Sendo assim, com esta pesquisa apresentou-se pesquisas em
Análise do Comportamento que abordem o comportamento religioso
no Brasil, de modo a caracterizar a produção nacional sobre o tema.
Ao final, percebe-se que, apesar da importância do tema na população
brasileira, analistas do comportamentos brasileiros produziram pouco,
devendo-se destacar as regiões Sul, Sudeste e Centro-oeste como
origens dos estudos analisados.
Apesar do pequeno número de artigos analisados, ressalta-se
que os mesmos são, relativamente, recentes (2016 e 2022), e ambos
são artigos históricos-conceituais, contribuindo para o fomento da
discussão o tema na Análise do Comportamento. Por fim, ressalta-se
que ao se recorrer às revistas RBTCC, REBAC e Perspectivas, a análise
70
ficou restrita às revistas ativas de AC do Brasil. Julga-se necessário e
importante que pesquisam futuras considerem analisar revistas de Reli-
gião e Psicologia, além de revistas que não circulam mais. Além disto,
publicações organizadas pelas ABPMC, como Sobre Comportamento
e Cognição e Comportamento em Foco, podem ser novas fontes.

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72
A IMPORTÂNCIA DA PSICOLOGIA JURÍDICA
NA ADOÇÃO

Robério Gomes dos Santos12


Narcelyanne Maria Alves de Morais Teixeira13
Rosimeire Alves Bezerra14
Antônia Gabrielly Araújo dos Santos15

INTRODUÇÃO

A psicologia jurídica é uma área da psicologia que dialoga com


o direito, na medida que o(a) psicólogo(a) atua junto as diversas áreas
do universo jurídico, almejando com isso, que demandas deste setor,
como as questões de família, a exemplo da adoção, possam ser melhor
compreendidas pelo(a) operador(a) do direito, contribuindo para a
resolutividade de tais demandas.
As crianças e os adolescentes, durante o processo de adoção,
vivenciam inúmeros sentimentos, que precisam ser analisados(as)
pela equipe interprofissional, e valorados(as) pelos(as) juízes(as), pro-
motores(as) e advogados(as), sendo assim, salutar é a contribuição
da(o) profissional psicóloga(o) neste momento, pois ela(e) poderá
dar visibilidade para as questões, que nem sempre estão bem claras e
resolvidas pelos(as) sujeitos(as), pois, se não bem trabalhadas, podem
influenciar negativamente na adoção,
O interesse pelo assunto, se deve em razão do conhecimento de
milhares de crianças e adolescentes à espera de adoção e de candidatos
a adotar no Brasil, o que gera nestes(as) sujeitos(as) questões emocio-
12
Discente do Curso de Direito (UNIVS). CV: http://lattes.cnpq.br/8413222910151719
13
Pós-graduanda em Psicologia Social (FAVENI). Psicóloga (FVS) - CRP 11/17494. Analista de
Recursos Humanos. CV: http://lattes.cnpq.br/8389733363130588
14
Pós-graduada em Psicologia Escolar e Educacional (FAVENI). Psicóloga (UNIVS) - CRP 11/17447.
CV: http://lattes.cnpq.br/4246485091970636
15
Mestre em Desenvolvimento Regional Sustentável (UFCA). Docente (UNIVS e URCA).
CV: http://lattes.cnpq.br/0808270205480899
73
nais que afetam sua vida, e que durante o processo adotivo precisam
ser trabalhadas para que não prejudiquem ou mesmo impeçam o
sucesso da adoção, fazendo com que ela(e)s se frustrem pela adoção,
e especialmente que os adotandos não sofram mais uma rejeição,
caso não seja efetivada a adoção.
O objetivo geral do trabalho é discutir a importância da psicologia
jurídica na adoção, e os objetivos específicos são: apresentar brevemente
o contexto histórico da psicologia jurídica no brasil; identificar os
aspectos emocionais vivenciados pelos adotantes e adotandos na adoção
e verificar a importância da(o) psicóloga(a) no processo de adoção. A
metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica de artigos diversos
sobre adoção, emoções na adoção, psicóloga(o) na adoção, psicologia
jurídica e adoção, caracterizando-se assim, como uma investigação
qualitativa, descritiva e exploratória (GIL, 2019).
O trabalho está dividido em três partes, a primeira apresenta
de maneira breve o contexto histórico da psicologia jurídica no Bra-
sil, apresentando seus campos de atuação; a segunda parte descreve
as emoções que perpassam as crianças/adolescentes e os adotantes
durante o processo de adoção, como elas afetam os(as) mesmos(as),
influenciando no sucesso ou insucesso da adoção; e a última parte,
disserta sobre a importância da(o) psicóloga(o) na adoção, debatendo
seu papel, suas funções, dificuldades enfrentadas na prática no judi-
ciário, dentre outros aspectos.

PSICOLIGIA JÚRIDICA NO BRASIL: CONTEXTO


HISTÓRICO E CAMPOS DE ATUAÇÃO

O direito está ligado a imposição de regras de comportamento


social, já a psicologia busca compreender o comportamento humano.
O direito e a psicologia são ciências que dialogam muitas questões,
como: crime e comportamento criminoso, adoção, alienação parental,
só para citar algumas problemáticas que fazem necessário a atuação de

74
ambas as profissões para uma melhor solução dos casos que surgem
na sociedade (RAMOS; ZIELAK; TAVARES, 2015).
Sendo assim, ao nos referirmos ao surgimento da psicologia
jurídica no Brasil, observa-se que não existe uma versão única da sua
inserção no país, podendo assim, variar conforme a concepção de
cada autor. Uma destas versões traz que, sua origem no país se deu
pouco tempo depois da psicologia ser reconhecida como profissão no
país em 1962, sendo inserida tal área psicológica no final da presente
década (RODRIGUES et al, 2016).
Se por muitos séculos o(a) indivíduo(a) “louco(a)”, foi relega-
do(a) da sociedade, somente com o transcurso de muitos anos foi que
a forma como o sujeito era visto, até então, pelo sistema de justiça
brasileiro mudou, passando a vê-lo de maneira mais humana. E o
percurso histórico da psicologia jurídica em nosso país, dentro das
penitenciárias, por exemplo, é possível perceber que inicialmente estava
baseada na avalição das pessoas criminosas, de presos com doenças
mentais, marcada pela realização de laudos que na maioria dos casos,
reforçava a estigmatização, discriminação e marginalização dos(as)
sujeitos(as) avaliados(as), em nada contribuindo para uma mudança
social, estando, pois, a psicologia a serviço do sistema social excludente
e repressivo da época. Somente após a lei de execução penal em 1984,
é que esta atuação no sistema penitenciário é reconhecida legalmente
(RAMOS; ZIELAK; TAVARES, 2015).
No início do trabalho da(o) psicóloga(o) no judiciário, os psico-
diagnósticos aplicados pela mesma(o), eram vistos como uma “verdade
absoluta” sobre os(as) sujeitos(as), com precisão matemática, sendo
assim, o fazer psicológico neste setor era basicamente a realização de
exames e avaliações, fazendo com que o profissional fosse conhecido
como “testólogo” a época. Diferente pois, da contemporaneidade, na
qual a(o) psicóloga(o) tem os testes como uma das opções de trabalho,
fazendo uso de avaliações mais delimitadas (LAGO et al, 2009).

75
Dentre as áreas do direito nos quais a(o) psicóloga(o) é comu-
mente convocado a atuar, estão o direito civil, direito penal, direito
do trabalho, direito da criança e do adolescente. No direito de família
que faz parte do direito civil, o mesmo traz consigo as demandas de
separação e divórcio, que na maioria das vezes é litigioso, precisando da
intervenção da(o) psicóloga(o); como mediador(a), buscando um acordo
nos casos de litígios; regulamentação de visitas, quando dos casos de
separação de casais com filho(a)s, onde está presente muitos conflitos,
precisando pois, da avaliação da(o) psicóloga(o), que compreenderá a
dinâmica da família; a disputa de guarda, onde se fará uso da perícia
psicológica, buscando analisar qual genitor(a) tem melhor condição
para ter a guarda da criança (RAMOS; ZIELAK: TAVARES, 2015).
A(O) psicóloga(o) no judiciário pode trabalhar com adolescentes
que cometeram algum ato infracional, que se encontram protegidos
pela legislação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), onde
a(o) psicóloga(o) terá como objetivo, que estes(as) sujeitos(as) possam
superar o estado de exclusão pelo qual passam, buscando com que
possam construir valores positivos na sociedade, com o envolvimento
da família e as demais pessoas de seu convívio ( JUNG, 2014).
Segundo Lago et al (2009) podemos mencionar ainda, outros
campos de atuação da psicologia jurídica que vem demandando o
trabalho da(o) psicóloga(o), como exposto a seguir:
Vitimologia: objetiva a avaliação do comportamento
e da personalidade da vítima. Cabe a(o) psicóloga(o)
atuante nessa área traçar o perfil e compreender as
reações das vítimas perante a infração penal.
Psicologia do testemunho: as(os) psicólogas(os) podem
ser solicitados a avaliar a veracidade dos depoimentos
de testemunhas e suspeitos, de forma a colaborar com
os operadores da justiça (...) Uma área recente e rela-
cionada à psicologia do testemunho que vem ganhando
espaço é o depoimento sem dano, que objetiva proteger
psicologicamente crianças e adolescentes vítimas de
76
abusos sexuais e outras infrações penais que deixam
graves sequelas no âmbito da estrutura da personalidade
(Lago et al, p. 489, 2009).

Se no início à atuação da psicologia jurídica tinha como função


dizer sobre a verdade, sobre a existência de um fato, como uma forma
de instigar a(o) juiz(a) na sua decisão, hoje, a(o) psicóloga(o) ainda
desempenha a função de auxílio nos processos judiciais através do laudo
psicológico, parecer, perícia, avaliações (SILVA; TOKUDA, 2018).
Deste modo, faz-se necessário identificar os aspectos emocio-
nais vivenciados pelos adotantes e adotandos durante o processo de
adoção, é o que veremos a seguir.

OS SENTIMENTOS DA CRIANÇA/ADOLESCENTE
E DOS ADOTANTES FRENTE AO PROCESSO DA
ADOÇÃO

Falar em adoção é discutir sobre um processo atravessado por


diferentes afetos, que se dá na relação estabelecida na convivência entre
a pessoa que adota e aquele(a)que almeja ser adotado(a) e perten-
cente a uma família. Oliveira e Rocha (2014) pontuam uma “tríplice
rejeição” que possivelmente a criança experiencia, uma vez que, há
um sentimento de rejeição da mãe de origem, que independente do
motivo do abandono, a(o) infante teme não ser aceita(o) pelos novos
pais; além do reflexo, muitas vezes presente nos pais adotivos, por
terem receio de não serem aceitos pela(o) filha(o). Para os referidos
autores a solução para esse sentimento de rejeição que se manifesta
se encontra na convivência afetiva na primeira infância.
Na adoção estão presentes perspectivas sociais, psíquicas, legais
e normativas. A perspectiva social, por exemplo, diz respeito ao con-
texto social no qual todos estão inseridos, tanto a criança/adolescente,
quanto os adotantes. Estes possuem sua visão de mundo, uma con-
dição financeira, uma psiquê própria que irá influenciar na adoção.
Já a perspectiva psicológica, diz respeito a criança/adolescente, a qual
77
possui uma singularidade, é um(a) sujeito(a) em formação, em pleno
desenvolvimento sócio-psico-emocional, necessitando, pois, ser ouvido,
respeitado e valorado (OLIVEIRA, 2013).
Quando ocorre o rompimento da relação entre adotantes e
adotandos mediante o processo de adoção, poderá surgir na expe-
riência da criança dificuldades em criar novos laços afetivos. Pois
ficará com a percepção que logo irão desistir dela, podendo surgir
sentimento de rejeição, perda de confiança, pelo quesito da decepção
sofrida, apresentando também sentimento de culpa, podendo pensar
que a desistência ocorreu por alguma coisa que fez, que não é boa o
suficiente para eles, situação essa, que pode refletir negativamente
em seu desenvolvimento, fragilizando a formação de novos vínculos
afetivos (OLIVEIRA; ROCHA, 2014).
Além disso, trazem consigo o medo de não mais ser adotada
futuramente, sendo estigmatizada em razão de ter sido devolvida, o
que pode interferir em uma posterior adoção. A família que adota
geralmente apresenta dificuldades de adaptação com a criança, de suprir
suas necessidades, que pode ser causada por questões do próprio casal,
por exemplo, que se sentem frustrados, inseguros, podendo prejudicar
o sucesso da adoção (RODRIGUES; CARDOSO, 2017).
Quando se leva a discussão para as crianças maiores, que
passaram por longos períodos em instituição de acolhimento, veri-
fica-se que esses lugares passam a ocupar na vivência desses ado-
táveis um conceito de lar, que quando adotadas, esse processo de
reconstrução de um novo lar pode ser bastante árdua e dolorosa
(MACHADO; FERREIRA E SERON, 2015).
Por conseguinte, é relevante destacar o vínculo entre filhos(as)
e pais na adoção, pois esta filiação é uma escolha, não é determinada
biologicamente, estando assim, relacionada ao afeto, na hipótese de
não haver sido construído o vínculo entre eles, ou se este vínculo
não estiver completamente formado, terá grandes chances do pro-

78
cesso de adoção não se concretizar, levando a frustações de ambas as
partes (OLIVEIRA; ROCHA, 2014).
Caso não se concretize a adoção, verifica-se a devolução, que se
dá quando a criança ou adolescente não responde ao esperado pelos
pais, ao que imaginavam como filha(o) ideal, acabando por trata-la(o)
como um produto passível de devolução por não suprir o desejado,
onde muitas vezes culpabilizam a criança/adolescente pelo fracasso
da adoção, desconsiderando o sofrimento gerado àquela(e) que foi
novamente devolvida(o) (BERTONCINI; CAMPIDELLI, 2018).

A IMPORTÂNCIA DA(O) PSICÓLOGA(O) NA ADOÇÃO

O campo do judiciário se configura como um campo de traba-


lho com forte presença de sofrimento humano, na medida em que,
chegam a esse espaço inúmeras demandas sociais, que até então não
foram solucionadas pelas pessoas que a procuram, e que assim, buscam
solução para suas questões, marcadas por diversas afetações, que podem
gerar, sentimento de medo, a raiva, culpa, dentre outros.
Neste espaço permeado por diversos conflitos é cabível a pre-
sença da(o) profissional da psicologia para que seja ofertado para as
pessoas um espaço favorável de acolhimento e escuta qualificada. Sendo
assim, a população almeja que seja realizada a “justiça”, mediante uma
perspectiva individualista, ficando assim, para os(as) operadores(as) do
direito o desafio de se realizar justiça, quando temos em ambos os pólos,
indivíduos(as) que concebem a sua questão como a mais importante.
Desde o surgimento do ECA em 1990, que se faz cabível a
presença da(o) psicóloga(o) nos processos de adoção, que se dá por
meio do estabelecimento de parâmetros de atuação para a melhor
condução dos processos. Deste modo, tal profissional, atua nas varas de
infância e juventude, de várias formas, através da utilização de teorias
e técnicas, sendo que, em algumas situações torna-se necessário sua
atuação, em outras é facultativa sua presença, sendo, pois, preciso o
pedido do(a) juiz(a) (SILVA, 2016).
79
A psicologia jurídica na área de direito de família é de suma
importância, visto que a intervenção da(o) psicóloga(o) nos casos de
adoção, por exemplo, não se reduz unicamente a verificação das con-
dições básicas de sobrevivência da criança, como ao direito à moradia,
saúde, alimentação e do acesso à educação, mais também, analisando
questões mais amplas, analisando se ela está ou não se adaptando
ao novo lar, como está sendo construída a relação pai/mãe/filha(o),
do adotando(a) com os(as) filhos(as) da família adotiva, buscando a
melhor integração entre ambos(as), para que o processo de adoção
tenha efetivo sucesso (OLIVEIRA; ROCHA, 2014).
É relevante salientar que a(o) psicóloga(o) saiba qual a ideia que
a criança tem sobre família e a acompanhá-la durante todo o processo,
estando atento à sua idade, fase de desenvolvimento, como também, sua
história de vida. Para isto é necessário analisar a condição biopsicossocial
dos adotantes, através de entrevista e somente através da aprovação é
que seguirá para a segunda fase do processo (FREITAS, 2017).
O período de adaptação dos pais e da criança no processo de
adoção é essencial, pois durante este período eles passam por altera-
ções em sua vida, sendo preciso que ambos estejam abertos para esta
nova realidade, o pai/mãe terá um(a) novo(a) integrante na família,
que tem sua subjetividade, tendo que abdicar de um pouco de sua
individualidade, passando a pensar na(o) outra(o), no seu filho(a), que
no início lhe é estranha(o), porém, com o transcurso da convivência,
do afeto construído será vencido as dificuldades (OLIVEIRA, 2013).
Na lei de adoção está previsto o estágio de convivência que é
direcionado as crianças maiores, com intuito de verificar se o casal e a
criança são compatíveis, quais as chances de sucesso na adoção. Se não
houver uma adaptação entre a(o) adotante e a(o) adotanda(o), pode
ocorrer a devolução da criança (BRASIL 2009). É o que confirma o
art. 46 do ECA: “A adoção será precedida de estágio de convivência
com a criança ou adolescente, pelo prazo máximo de 90 (noventa) dias,

80
observadas a idade da criança ou adolescente e as peculiaridades do caso
(Redação dada pela Lei n° 13. 509, de 2017)” (BRASIL, p. 1, 1990).
No entanto, um aspecto negativo com relação ao estágio de
convivência é que ele acaba gerando expectativas na criança, ante uma
possível família que ela ganhará; então, quando a criança recebe a visita
acaba gerando um vínculo com os pretendentes. Quando esta adoção
não se concretiza fica na criança a frustação pelos pais que não ganhou.
Durante o período do estágio de convivência a criança poderá
apresentar comportamentos diferentes do esperado para sua idade, que
comumente ela não tem, como enurese noturna, gestos de birra como
forma de testar o casal, fala infantilizada, não querer receber visita, ter
atos de agressividade. Com a presença de um acompanhamento psico-
lógico durante este processo possibilitará ao casal compreender que tais
atitudes da criança são comuns em situações de adoção, e também, como
poderão resolver da melhor forma tal problemática (SILVA, 2016).
Quando a escolha pela adoção decorre em razão do casal não
poder gerar filhos, cabe investigar como esta esterilidade é concebida
por cada um, e na relação do casal, ou seja, como eles elaboraram o
fato da esterilidade no relacionamento, o contexto sociocultural dos
pretendentes, pois precisam assumir esta esterilidade em sua vida,
senão, poderá acontecer de um dos cônjuges querer colocar a “culpa”
na(o) parceira(o), podendo interferir na relação do casal. Sendo assim,
é preciso por parte da(o) psicóloga(o) avaliar como eles vivenciaram
este processo da esterilidade, suas angústias, decepções, tentativas,
todo o percurso até saberem em definitivo que não poderiam gerar
um(a) filha(o) (SILVA, 2016).
Conforme Campos (2010), na impossibilidade de não ter um(a)
filha(o) pela via biológica, é necessário que vivam o processo de luto. O
luto deve ocorrer até mesmo quando os adotantes já tiverem filhas(os)
genéticos e quando há dificuldade de gerar ou gestar mais um(a)
filho(a) e que esta seja o principal motivo da adoção. Ressalta ainda,
que o luto pela(o) filha(o) biológica(o) é vivenciada(o) pela(o) indiví-
81
dua(o) com frequente eclosão e misturas de sentimentos como raiva,
vergonha, culpa e impotência.
Dentre os muitos problemas relatados referentes a ruptura dos
vínculos afetivos da criança ante sua família de origem, identifica-se:
déficits de atenção, dificuldades na aprendizagem, carência afetiva, difi-
culdades nas relações sociais (ALVARENGA; BITTENCOURT, 2013).
Sendo assim, necessita-se que a(o) psicóloga(o) dê atenção as
vivências anteriores que a criança passou, ante situações de abandono,
sentimento de rejeição, inferioridade, com forte componentes de sofri-
mento emocional, que geraram danos emocionais na mesma, pois, se
não trabalhado com as famílias e a criança dificultará a boa relação
desta nova família (OLIVEIRA; ROCHA, 2014).
No trabalho psicológico serão verificadas as fantasias que os
pretendentes a adoção têm com relação a(o) filha(o) esperada(o),
pois é comum o casal idealizar a criança, ou seja, criar um perfil de
filha(o) que não corresponderá a realidade, um(a) “filha(o) perfei-
ta(o)”. Fazendo com que, muitas vezes a criança adotada passe a
reproduzir os papéis esperados pelos pais, perdendo a sua subjetivi-
dade que é negada, apresentando sentimentos de angústia por não
corresponder ao esperado pelos pais, contribuindo para que a adoção
não se concretize (SILVA, 2016).
Caso os pretendentes a adoção e as crianças não tenham o devido
acompanhamento psicológico na adoção, acarretará na criança à per-
manência de comportamentos agressivos, problemas de aprendizagem
que pode levar os pais a pensar que é decorrente de um problema de
ordem escolar, quando na verdade, se deve a uma resposta inconsciente
da criança por não saber sobre sua história, acreditando que não precisa
aprender mais nada, bem como, a baixa autoestima que poderá ocasio-
nar nela. Já a criança que tem uma adoção bem acompanhada, poderá
ter um desenvolvimento satisfatório, que proporcionará condições de
lidar com os desafios da sua vida com maturidade (SILVA, 2016).

82
Propõe-se que a paternidade oriunda da adoção não deva ser
tratada de forma inferior, de menor importância, frente a paternidade
biológica, em razão de ter a mesma relevância, é composta pelo mesmos
objetivos, que são dar afeto, amor e carinho a(ao )filha(o). Cabendo citar
que na paternidade gerada pela adoção existem aspectos que precisam
ser valorados pelos adotantes. Até porque, a adoção além de ser um
ato que gera responsabilidade aos pais, também é o surgimento de um
filho para a família (MACHADO; FERREIRA E SERON 2015).
No âmbito jurídico, a(o) psicóloga(o) pode atuar como perita(o)
ou assistente técnica(o). A(O) perita(o) é aquela(e) que auxilia a(o)
juiz(a), não tendo ligação com as partes, ou advogadas(os), ele existe
sem a necessidade da(o) assistente técnica(o), o inverso não ocorre; já
a(o) assistente técnica(o), é aquela(e) que é contratada(o) pelas partes,
sendo seu parecer o documento que servirá de instrumento de defesa
da(o) advogada(o) (SILVA, 2016).
A(O) psicóloga(o) perita(o), que atua no judiciário é um(a)
profissional de confiança do juiz, em virtude do seu conhecimento
técnico, de sua índole, sendo que, os(as) profissionais que trabalham
nos setores de psicologia dos foros e tribunais de justiça dos Estados
geralmente são concursados(a), passaram deste modo, por um pro-
cesso de seleção, estando inseridos(as) como servidores públicos do
poder judiciário (SILVA, 2016).
Segundo Silva (2016) no transcurso do processo de adoção, a(o)
psicóloga(o) aplica entrevistas, que sugere-se sejam no mínimo de qua-
tro, onde deve-se realiza-las tanto com o casal, quanto individualmente
com os mesmos. Os filhos biológicos, caso existam, também devem
participar de entrevista individual e também com toda a família. Além
disso, podem-se fazer uso de testes projetivos, que será adotado con-
forme a abordagem de cada psicóloga(o), que contenham os critérios
da configuração geracional da família de origem do casal adotante,
bem como, as fotos da família atual e de origem dos adotantes e etc.

83
O papel da(o) psicóloga(o) é importante não somente antes e
durante a adoção, mais também, após a concretização da adoção, pois,
surgem novas demandas no dia a dia da nova família, os quais não
estão preparados para lidar, necessitando pois, de um acompanhamento
contínuo por parte da(o) psicóloga(o) para que possam compreender
as novas dúvidas e sentimentos que surgirem, buscando o melhor
convívio da família (OLIVEIRA, 2013).
Mostra-se como fundamental o acompanhamento tanto dos ado-
tantes quanto dos adotandos institucionalizados, cabe a(o) psicóloga(o)
assessorar os operadores de justiça no processo de adoção em conjunto
com assistentes sociais, se aprofundando nas relações afetivas e avaliando
se o ambiente familiar é compatível para a adoção (MACHADO, 2015).
Para tanto, é imprescindível que a(o) psicóloga(o) que atua no
judiciário esteja em constante formação e atualização, através de cursos,
palestras, eventos científicos, para estar melhor preparada(o) para as
demandas que surgem nesta área, auxiliando nas políticas públicas de
cidadania e direitos humanos, bem como, na prevenção de violência,
como a violência contra a mulher etc. (SILVA; TOKUDA, 2018).
Cabe uma reflexão ao trabalho da psicologia, haja vista, que
as condições nas quais ela(e)s encontram no serviço público, não
permitem uma efetiva privacidade em sua atuação, nem ser plena-
mente imparcial em seu relatório, pois, há uma forte interferência da
instituição judiciária no que tange a exigência de um parecer que seja
conclusivo, numa visão reducionista sobre o ser humano, como ser
fosse possível prever toda uma vida de alguém por meio de um laudo
psicológico (RODRIGUES, 2005).
Aos profissionais presentes na habilitação da adoção como o
ministério público, psicóloga(o) e assistente social se faz necessário
verificar qual a motivação do candidato a adotar, pois, é preciso que
haja motivos plausíveis para querer adotar um(a) filho(a), em virtude
de ser um ato que gera consequências na vida de todos os envolvidos,
principalmente a criança, o que tornará a adoção um fracasso, devendo
84
ser respeitado o melhor interesse da criança, pois, não deve-se adotar
com interesses egoísticos, como uma forma de substituir alguma
carência afetiva, etc. (OLIVEIRA, 2013).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente artigo, foi possível compreender o percurso histórico


da psicologia jurídica no Brasil, onde no início as(os) indivíduas(os)
objeto de seu trabalho, as pessoas presas, as quais não eram vistas como
sujeitos(as) de direitos, nem de dignidade, fruto do contexto ditatorial
vivenciado à época. Sendo assim, era notório que sua atuação acabava
reforçando a estigmatização destes(as) indivíduos(as). Foi somente em
meados de 1984, com a LEP, que a atuação da psicologia no âmbito
dos presídios passa a ser mais humana, ética e acolhedora
Quanto mais, verificamos que a(o) profissional psicóloga(o)
que atua na área jurídica tem um amplo leque de campos de atuação,
haja vista, que podem atuar na área penal, do trabalho, psicologia do
testemunho, psicologia forense, na seara da família, sendo que nesta
última, podem atender demandas diversas como: divórcio, adoção,
guarda, regulamentação de visitas, etc.
Durante o processo de adoção, o(a) psicólogo(a) aplica entrevistas,
seja individualmente ou com todas as partes juntas, com vista a entender
a dinâmica familiar, a motivação para adotar, bem como, os medos,
angústias, dúvidas, expectativas da criança/adolescente e os futuros pai/
mãe. Sendo cabível a realização de cursos de preparação dos candidatos
a dotar, no qual junto com outros candidatos, em grupo poderão com-
partilhar seus sentimentos, preconceitos, tabus, desconstruir suas visões
idealizadas, permitindo “gestar” simbolicamente o processo de adoção.
Logo, mostra-se como importante que todos, e não somente as
partes, mais também, os(as) operadores(as) do direito, deem o devido
valor no processo da adoção, para termos uma boa resolutividade da
questão. Além disso, é necessário que o judiciário ofereça melhores
condições de trabalho para os(as) psicólogos(as), com salas individuais
85
para os(as) mesmos(as), com material físico e equipe de servidores
para poder ser ofertado as partes profissionais mais capacitadas(os) e
valorizados(as), contribuindo assim, para a prestação de um trabalho
psicológico mais efetivo e eficaz.

REFERÊNCIAS
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Nota: capítulo adaptado do original publicado na revista Brazilian Journals of Development,


v.8, n. 9, p. 64948-64968, set., 2022.

87
SOBRE OS ORGANIZADORES

DENISE DE MATOS MANOEL SOUZA


Possui graduação em Psicologia pelo
Centro Universitário da Grande Dourados
(UNIGRAN), Dourados – MS. Mestra
em Psicologia pela Universidade Católica
Dom Bosco (UCDB), Campo Grande –
MS. Professora no curso de graduação de
Psicologia da UNIGRAN.

FELIPE MACIEL DOS SANTOS SOUZA


Possui graduação em Psicologia pela
UNIGRAN. Mestre e Doutor em
Psicologia Experimental: Análise do
Comportamento (PUC-SP), São Paulo
– SP. Professor do curso de Psicologia e do
Programa de Pós-graduação em Psicologia
(PPgPsi) da Universidade Federal da
Grande Dourados (UFGD), Dourados
– MS.

88
ÍNDICE E Preconceito 34-37, 39, 40, 42, 70

REMISSIVO Emergência 13, 49 Processo 11, 12, 15, 16, 19-22,


25-30, 32, 33, 37-40, 42, 48, 54,
Estatuto da Cr ianç a e do 56, 69, 73, 74, 77, 78, 80, 81, 83-87
Adolescente 9, 17, 76, 86
Profissional 13, 14, 27, 41, 46-53,
Ética 46, 48, 56, 58, 70, 85 55-59, 73, 75, 79, 83, 85
A Experiência 10, 18, 24, 32, 54, 56, Psicoterapia 10, 27, 42, 52, 56-58
Adolescente 9, 15-18, 31, 33, 41, 76, 58, 78
77, 79-81, 85, 86 R
F
Adolescência 9, 10, 16, 18, 23, 24, Religião 20, 23, 38, 40-42, 44, 59-61,
29, 32, 33, 37, 40, 42 Família 12, 15, 17, 24, 27, 33, 36, 63, 66-72
38-40, 73, 76-78, 80-87
Adulto 21, 23, 29, 33 Resolução 45, 46, 58
G
Análise do Comportamento 59-64, Revistas 18, 21, 62, 67, 70, 71
66, 67, 69-72, 88 Genitor 19, 20, 22, 26, 30, 76
S
Assistência 11, 12, 16 Gênero 31, 34, 35, 37-44
Saúde Mental 9-12, 16-18, 38, 44,
Assíncrona 46, 47, 53, 58 H 57, 58

Atendimento 13, 17, 45-52, 54-58 Homofobia 31, 34-37, 42 Sexual 31, 33, 34, 38-41, 43, 44

Atenção Básica 12, 13 Homossexual 31, 33, 35, 43 Sexualidade 31, 35, 37-39, 41-44

Atuação 46, 53, 55-57, 74-77, 79, I Sistema Único de Saúde, SUS 9, 10,
84-87 12-14, 17 9, 12
Identidade 9, 18, 34, 38-44, 51
B Social 9, 11, 13, 15, 16, 32, 37, 43,
Infantil 19, 22-24, 26, 29, 30 68, 69, 73-75, 77, 84, 86
Behaviorismo Radical 60, 63, 64, 68
Infância 10, 16, 22, 23, 27-30, 32, Sociedade 11, 15, 30-33, 35, 37, 39,
Brasil 9-14, 17, 18, 31, 35, 43, 55, 62, 77, 79, 87 40, 42, 75, 76
63, 68, 70, 71, 73-75, 80, 81, 85-87
Internet 52, 54, 55, 58 Síncrona 46, 47
C T
L
COVID-19 17, 45, 48, 57, 58
LGBT+ 31, 32, 34-37, 39-43 Tecnologia 46, 54
Centro de Atenção Psicossocial,
CAPS 9, 12-15, 17, 18 LGBTFOBIA 34, 36-42, 44 Terapia Cognitivo-comportamental
23, 27, 30
Ciência 18, 41, 58, 60, 64, 72 Luto 19-30, 81, 86
V
Clínica 23, 30, 45, 47, 56, 59, 63, 70 M
Violência 11, 15, 17, 18, 34, 36-38,
Comportamento 14, 34, 59-64, Modalidade 45-47, 49-52, 54-57 40, 52, 84
66-72, 74, 76, 88
Morte 19-27, 29, 30 Virtual 21, 45, 56, 63
Comunidade 10, 11, 35, 63, 67
O Vínculo 13, 14, 19, 25, 52-54, 78,
Conceito 20, 34, 68, 78 81, 86, 87
On-line 45-58, 86
Conselho Federal de Psicologia,
CFP 45, 46, 57, 58 P
Coordenação de Aperfeiçoamento Pandemia 18, 45, 48, 56-58
de Pessoal de Nível Superior,
CAPES 62, 64 Perspectiva 9, 11, 43, 58, 60, 62, 64,
66, 68, 71, 72, 77, 79
Criança 9, 15-17, 19-23, 25-30, 33,
76-82, 84-87 Pesquisa 21-24, 28-30, 32, 35, 39,
40, 43, 60-65, 68, 70, 71, 74, 86
Cultura 11, 16, 20, 31, 38, 67, 69, 72
Pessoa 17, 19, 20, 25, 27-29, 33, 40,
D 41, 43, 53, 54, 56, 59, 77
Desenvolvimento 9, 14, 16, 18, 21, Política 11, 13, 18, 53
25, 27, 31, 32, 43, 45, 51, 60, 61, 63,
71, 73, 78, 80, 82 População 9, 12-14, 25, 36, 39, 45,
70, 79
Documentos 62, 63, 65-67
89
ISBN 978-65-5368-172-9

9 786553 681729 >

Este livro foi composto pela Editora Bagai.

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