Artigo - Aula de Campo Uma Possibilidade de Investigação

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AULA DE CAMPO: UMA POSSIBILIDADE DE INVESTIGAÇÃO

Assis Leão da Silva


Luciano B. de Vasconcelos Jr
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AULA DE CAMPO: UMA POSSIBILIDADE DE INVESTIGAÇÃO

Assis Leão da Silva – Professor do Colégio Seleção


Luciano B. de Vasconcelos Jr – Professor do Colégio Seleção

Introdução

Nosso interesse pelo trabalho de pesquisa sobre o ensino de História


remonta, em parte, aos períodos finais de nosso curso de licenciatura, quando
cursávamos as disciplinas de Prática de Ensino de História, em parte, à nossa
experiência enquanto professor em turmas de Ensino Fundamental/Médio, em
escolas públicas e privadas.

Nesses dois estabelecimentos de Ensino realizamos atividades distintas. No


primeiro, trabalhamos com a aplicação de técnicas de Ensino que se utilizam de
novas linguagens para o Ensino de História1, valendo-nos dos recursos de que a
escola nos oferecia. Trabalhamos com análise de documentos históricos,
interpretação de imagens, textos e nos utilizamos dos livros didáticos oferecidos pela
escola aos alunos. No segundo, trabalhamos com Tecnologias de Informação e
Comunicação (TIC) aplicadas ao ensino, pois este nos oferecia recursos como
computadores, vídeos-cassete e TV, datashow.

Dois Modelos de Ensino de História

Uma das primeiras dificuldades encontradas pelos professores, iniciantes ou


não, quando assumem suas turmas, “parece ser a explicitação da razão de ser da
disciplina, buscando atender aos anseios de jovens que ardilosamente fazem
perguntas aparentemente inocentes, como ‘Por que estudar História? Por que o
passado, se o importante é o presente?’” (Bittencourt, 1998: p. 11). Quais serão as
razões da perda do interesse pela disciplina? Será que o modelo de ensino da

1
Sobre a utilização de diversas linguagens para o ensino de História, há uma discussão bastante
interessante em BITTENCOURT, Circe (org.): "O Saber histórico na sala de aula". São Paulo:
Contexto, 1998.
3

mesma empregado pelos(as) professores(as) influencia no processo de perda da


motivação pelo estudo da disciplina e no processo de aprendizagem da mesma?
Consideraremos aqui que os modelos de ensino de História são formados
pela junção dos conhecimentos específicos à disciplina e de teorias pedagógicas, ou
seja, dos conhecimentos historiográficos e dos conhecimentos pedagógicos. Sendo
assim, situaremos dois modelos de ensino de História que se fazem presentes nas
escolas e na prática pedagógica dos professores de História: o primeiro é o modelo
tradicional de ensino de História e o segundo o modelo que se baseia no paradigma
da Nova História2.
Ainda em meados da década de 1980, em sua dissertação de mestrado,
Jurema (1987), ao analisar o conteúdo dos livros didáticos de Estudos Sociais
utilizados no Município do Recife, e ao realizar várias entrevistas com
professores(as) – cerca de 66 entrevistas – da Rede Pública/Particular e vários
alunos(as) também dessas escolas [cerca de 155 alunos(as)] constatou que a
História que se ensinava era compartimentalizada, estática, desagregadora e
desestruturadora do pensamento dos alunos(as).

Essa concepção de Ensino de História acima citada é a que chamamos de


Tradicional. Tem suas raízes no Modelo Tradicional de educação, que “trata o
conhecimento como um conteúdo, como informações, coisas e fatos a serem
transmitidos ao aluno” (Carraher, 1998: p. 12) Consiste a mesma em uma forma de
ensinar a História que prega a memorização de datas, fatos e personagens
históricos considerados “importantes”. Considerava-se um bom aluno aquele que
conseguisse reproduzir o maior número de informações possíveis. A História
ensinada nos moldes tradicionais era linear, causal, evolutiva, política, com ênfase
nos vencedores, nos chamados “heróis”. Era um ensino alienante e acrítico,
baseado “na construção de um tempo histórico homogêneo, determinado pelo
eurocentrismo e sua lógica de periodização baseada no sujeito histórico Estado-
nação” (Bittencourt, 1998: 23). Os conteúdos eram transmitidos de forma oral, para

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Não encontramos sistematização sobre um modelo de ensino de História com base no paradigma
da Nova História, de forma que utilizaremos esse conceito considerando o modelo de ensino de
História que utiliza linguagens diversificadas (chamadas de novas linguagens para o ensino de
História) na sala de aula – ou fora dela (Filmes, textos, gravuras, documentos históricos, música,
excursões variadas, uso da informática, etc.) –, se aproxima das demais ciências sociais, e que preza
o despertar da consciência crítica e da capacidade de problematização de seus educandos,
descartando o ensino de História como uma mera memorização de datas, fatos e personagens
históricos ditos “mais importantes” (os heróis).
4

serem reproduzidos pelos(as) alunos(as) por meio de “questionários”, onde a


aprendizagem se verificava através da comparação das respostas dos(as)
alunos(as) com as respostas consideradas “corretas” de acordo com os manuais do
professor, e com provas bimestrais com base em questões de memorização.

Agregamos ainda ao modelo tradicional o ensino de História nos moldes do


pensamento estrutural marxista, pois a centralidade nos grandes heróis e suas
proezas dá lugar ao processo histórico e as categorias de análise tais como modos
de produção e classes sociais. Desconsidera-se a visão da História como uma
sucessão de acontecimentos. Mas mesmo assim, apesar de se enfatizar como
objeto central a luta de classes, sendo essa a responsável por conduzir a sociedade
a um estado sem exploração, o marxismo não rompeu com a pedagogia tradicional,
pois mesmo apesar de ter alterado o antigo esquema quadripartite3, não alterou sua
essência. Temos uma continuação da periodização por seqüências, etapas e a
presença de relações causas/efeitos como norteadoras dos acontecimentos (cf.
Caimi, 1999).
Na conclusão de seu trabalho de pesquisa, Jurema (1987) aponta para o fato
de que essa história, a qual a autora retira o “h”, nomeando-a de “istória”, ao invés
de construir nas crianças a visão caleidoscópica e dinâmica da História, contribuía
para a manutenção de uma consciência acrítica, impedindo que “o aluno pratique
um exercício de reflexão e muito menos produza uma reflexão de natureza histórica
que possa levá-lo, através do exercício da criação, a fazer reflexões de outras
naturezas em suas vidas” (p. 85).
No que concerne ao ensino de História, Bittencourt (1998) diz que vivemos
um momento onde "conteúdos e métodos estão sendo reelaborados conjuntamente"
(p. 12). Nos últimos anos surgiram novos paradigmas nos campos do ensino e da
produção de conhecimento histórico. Detendo-nos somente ao campo do
conhecimento histórico, constatamos o surgimento de uma História plural,
policêntrica, com novos métodos, novos objetos e novas perspectivas.4

Esse novo paradigma historiográfico: a Nova História surgiu no século XX, por
volta da década de 1970. “Uma boa parte dessa nova história é o produto de um

3
Idealizado pela historiografia francesa, dividia a História humana em quatro fases: Idade Antiga,
Idade Média, Idade Moderna e Idade contemporânea.
4
LE GOFF, Jacques & NORA, Pierre possuem uma coleção composta por três volumes tratando de
novos problemas, novos métodos e novas abordagens na historiografia.
5

pequeno grupo associado à revista Annales, criada em 1929” (Burke, 1997: p. 11),
que questionava as abordagens da historiografia tradicional. Nos anos contidos
entre 1946 e 1972, Braudel desenvolveu para os Annales um paradigma
reconhecido e maduro, bem como uma matriz disciplinar autônoma (cf. Reis, 1996).
Com o novo paradigma historiográfico, surge uma história mais ligada às
outras ciências sociais, de forma que se abrem novas fronteiras, novas perspectivas.
Buscam-se respostas de interesse do presente, diversificam-se as fontes históricas,
pluralizam-se os métodos de investigação. Adota-se a interdisciplinaridade. O tempo
histórico passa a ser tratado como de longa duração. Amplia-se a gama de objetos
de estudo e de horizontes temáticos, de forma que hoje o historiador tem bem mais
liberdade para trabalhar assuntos como sexualidade, infância, cotidiano, vida
privada, dentre outros. Vemos o surgimento de uma história multicultural, plural, que
se manifesta na sala de aula por meio de linguagens para o ensino da História como
a televisão, documentos, vídeos, músicas, visitas programadas a museus, teatros e
também por meio da informática (cf. Cunha, 2003).
Com o advento desse novo paradigma, surgiram na academia novas
indagações/reflexões sobre o Ensino de História. Apareceram várias sugestões de
renovação, de reinvenção, novas propostas curriculares. Ao analisar tais propostas,
surgidas a partir de 1985, Bittencourt afirma que um ponto de interseção a elas são
as “críticas comuns quanto ao que denominam de ensino tradicional de História”
(1998, p.16). Schmidt (1998) aponta a necessidade “de serem realizadas mudanças,
com o objetivo de se superar o ensino tradicional de História” (p. 54).
Emergiram então, a partir da década de 1980, diversas publicações da área,
em revistas especializadas, artigos e livros que tratam sobre o assunto, quando
surgiram várias propostas para a aplicação de novos métodos, novas técnicas e
estratégias de ensino, visando a utilização de novos recursos didáticos5.
Bittencourt (1998) aponta que “para a maioria das propostas curriculares, o
ensino de História visa contribuir para a formação de um ‘cidadão crítico’, para que o
aluno adquira uma postura crítica em relação à sociedade em que vive”. (p. 19) Tais
propostas apontam objetivos que não são novos: “formação de um pensamento
crítico” e “estudar o passado para compreender e transformar o presente”. Onde
estaria então a inovação? Na ênfase atual ao papel do ensino de História para a

5
Conforme Nota 2.
6

compreensão de que somos “sujeitos históricos” e na sua contribuição para a


constituição de um “cidadão crítico” (Bittencourt, 1998). A referida autora aponta
ainda que “o papel da História como disciplina encarregada da formação do cidadão
político não é velado ou implícito, como ocorre com as demais disciplinas
curriculares” (Idem: p. 20). Sintetiza assim a autora, o que consideramos ser o
objetivo do ensino de História nos moldes da Nova História.
Nosso trabalho parte então de uma visão de ensino de História que foge da
perspectiva tradicional de ensino da disciplina. Com o objetivo de fugir da prática
pedagógica que apenas reproduz o conhecimento, organizamos uma atividade com
os alunos da 5ª série do Ensino Fundamental, na escola onde somos professores,
visando tornar mais acessível o conhecimento que estava sendo trabalhado com os
referidos alunos.
Consideramos então – que ao trabalhar o conteúdo da pré-história – os
alunos encontravam dificuldades para compreensão do tema e decidimos realizar
uma atividade de campo, levando-os para conhecer o Museu de arqueologia
localizado na Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Consideramos tal
atividade como uma possibilidade de articular os saberes gerais prescritos no texto
didático com os saberes locais apresentados no Museu. Consideramos a visita como
uma atividade que privilegia a história local, que segundo Schimidt e Cainelli (2004),
“contribui para uma compreensão múltipla da História, pelo menos em dois sentidos:
na possibilidade de se ver mais um eixo histórico na história local e na possibilidade
da análise de micro-histórias, pertencentes a alguma outra história que as englobe e,
ao mesmo tempo, reconheça suas particularidades” (p. 113).
Estabeleceram-se os objetivos da atividade, seguindo o esquema abaixo:

A) GERAL

• Vivenciar um conteúdo ministrado no ambiente escolar através de uma aula de


campo, tornando-o acessível aos estudantes.

B) ESPECÍFICOS

• Conhecer e valorizar aspectos sócios culturais dos povos pré-históricos


brasileiros.
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• Comparar problemáticas atuais com a dos momentos pré-históricos na América.


• Situar os diversos momentos históricos da pré-história brasileira nos diversos
ritmos de duração e nas relações de sucessão e/ou de simultaneidade.
• Dotar o aluno da capacidade de produzir, expressar e comunicar suas idéias,
interpretando as produções materiais/culturais dos povos pré-históricos
brasileiros;

Como procedimentos metodológicos subseqüentes, inicialmente, foi exposto o


conteúdo em sala de aula para os alunos, de forma a oferecer a eles o subsídio para
debater, interpretar e questionar, os conteúdos vivenciados com as fontes primárias
analisadas.
Sendo assim, adotou-se como primeiro passo, a aula expositiva, utilizando-se
como recurso didático extra o datashow, para exibição de CD-ROM6 com aula sobre
pré-história brasileira. Após a aula foi exibido o Filme Guerra do Fogo, sendo
solicitado um relatório com as cenas do filme que mais chamaram a atenção dos
alunos.
Procedeu-se então com a excursão para o Museu de Arqueologia da
Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP).
Para a realização dessa atividade pedagógica tivemos a necessidade de
visitar o local com antecedência, estabelecendo os contatos e a marcação da aula
de campo. Logo em seguida, criamos atividades que visavam preparar os alunos
para o momento da aula de campo, organizando depois, juntamente com os alunos,
um roteiro de pesquisa que acabou resultando numa ficha de aula avaliativa, onde
os mesmos ressaltaram as impressões que tiveram no Museu, confrontando o que
havia sido trabalhado em sala de aula, com o que foi vivenciado no Museu.
Vale enfatizar, que antes da visita propriamente dita, foi realizada uma
orientação a respeito das condutas a serem estabelecidas quando em contato com o
patrimônio arqueológico do Museu.

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Mídia Educacional Água Marinha.
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Conclusões

Uma das maiores dificuldades encontradas foi a busca da relação, no


imaginário do aluno, entre a pré-história americana e a brasileira (tradição nordeste),
ou seja, o conteúdo geral com o conteúdo específico.
Outra dificuldade encontrada foi a construção da relação entre o tempo
cronológico e o tempo histórico, visto que os alunos sempre associam o tempo ao
calendário.
Encontramos ainda como dificuldade a ausência da noção de valorização do
patrimônio arqueológico.
Uma outra dificuldade encontrada foi a falta de afinidade, em nível de
discurso, entre o guia do Museu e o professor da disciplina, chocando assim, o
conhecimento geral do professor com o conhecimento específico do guia.
Como ponto positivo podemos apresentar a visualização das fontes primárias,
favorecendo o rompimento da reprodução do conhecimento histórico embasada
somente nos textos didáticos, possibilitando ao aluno a construção de um novo
saber.
Outro ponto a ser mencionado é a ampliação dos recursos do professor, visto
que o Museu coloca-se como um laboratório a ser explorado pelos alunos na
vivência dos conteúdos, rompendo com o esquema tradicional de ensino da História.
A excursão promoveu a socialização dos alunos, favorecendo o processo de
aprendizagem.
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Referências Bibliográficas

• BITTENCOURT, C. (org.). O Saber histórico na sala de aula. São Paulo:


Contexto, 1998.
• BURKE, P. A Escola dos Annales (1929 – 1989): a Revolução Francesa da
Historiografia. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997.
• CAIMI, F. E. Os Paradigmas da História. In: DIEHL, Astor Antônio (Org.). O livro
Didático e o Currículo de História em Transição. Passo Fundo: Ediupf, 1999.
• CARRAHER, D. W. Educação Tradicional e Educação Moderna. In:
CARRAHER, Terezinha Nunes (org.) Aprender Pensando – Contribuições
da Psicologia Cognitiva para a educação. Petrópolis: Vozes, 1998.
• CUNHA, A. V. C. S. O Impacto do Construtivismo e do Novo Paradigma
Historiográfico na Prática Pedagógica do professor de História. In: ANAIS
DO 16o EPENN: EDUCAÇÃO, PESQUISA E DIVERSIDADE REGIONAL.
Aracaju: 2003. 1 CD-ROM.
• JUREMA, A. C. L. A. A “istória”nos livros didáticos de Estudos Sociais. Recife:
UFPE, 1987. (Dissertação de Mestrado).
• REIS, José Carlos. A História entre a Filosofia e a Ciência. São Paulo, Ática,
1996.
• SCHMIDT, M. A. A Formação do Professor de História e o Cotidiano da Sala de
Aula. In: BITTENCOURT, C. (Org.). O Saber Histórico na Sala de Aula.
São Paulo: Contexto, 1998.
• SCHMIDT, M. A. & CAINELLI, M. Ensinar História. São Paulo: Scipione, 2004.

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