Impressao
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AULA 3
CONTEXTUALIZANDO
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no mundo contemporâneo. Tradicional ou moderno? Cultura popular ou de
massa? Ou se trata, como muitos autores veem chamando, de cultura híbrida?
(Canclini, 1990). Seja como for, o desafio está lançado: como e quando a
publicidade deve apropriar-se dos procedimentos da cultura popular? Quanto à
expressividade, o que ela ganha com isso? Ao fim desta aula, esperamos ter
respondido a essas perguntas.
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final de desaparecimento do folclore’, desintegram o patrimônio e fazem os
povos [...] ‘perderem sua identidade’” (Canclini, 1990, p. 213-214).
Mas a separação mais decisiva é aquela que mencionamos no início deste
tema: a oposição entre a cultura da classe dominante e a da classe
subalterna. Esta, ainda por cima, tinha que ser conservadora, ao contrário
daquela, que poderia – e deveria – ser transgressora. Os artistas
populares/pobres deveriam se repetir, manter a tradição e deixar para os artistas
das elites a liberdade de botar para quebrar. Ideia forte que se preservou até há
pouco tempo.
Atualmente, olhando mais de perto, nem sempre distinguimos muito bem
essa separação. O sertanejo universitário: é urbano, é rural, é tradicional, é
moderno e é ligado à indústria cultural. Ou seja, a cultura, segundo a definição
de Canclini (1990), é mais bem pensada como híbrida. Segundo ele, a produção
cultural é atravessada por esses três campos: tradicional, moderno e
midiático: “Nem a modernização exige abolir as tradições, nem o destino fatal
dos grupos tradicionais é ficar de fora da modernidade” (Canclini, 1990, p. 239).
Vamos começar, então, a ver como essas modalidades de cultura se
manifestam em gêneros chamados ainda de populares, mas que, a partir de
agora, vamos pensá-los como manifestações culturais híbridas.
Começaremos, no Tema 2, por um gênero rural que logo se misturou com o
urbano, no Nordeste: a cantoria, que desembarcou na poesia de folheto, mais
conhecida hoje como cordel.
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para assistir ao seu tema de abertura:
<https://www.youtube.com/watch?v=ZknAYOvvGzA> (Tema, 2011).
Eis um exemplo de cultura híbrida em que um grande veículo de
comunicação absorve a linguagem de um gênero dito popular e o recria com
base na linguagem da dramaturgia televisiva. Isso mostra como o campo da
comunicação não se esquece dessas formas e volta e meia as adapta, as recria,
reinventando os seus próprios meios expressivos, como foi o caso dessa
telenovela (Cordel, 2011).
Mas essa história começa mesmo é na voz dos cantadores. São eles que
vão gestar e gerar as formas e temas que estão na base de vários gêneros
populares ou híbridos como o desafio, o folheto e o cordel. Vamos ouvi-los
melhor.
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desafio, forma improvisada (nem sempre) em que, com base em um tema
(mote), os poetas desenvolvem versos disputando a melhor habilidade poética
entre si. A disputa só acaba quando um deles erra. Se acompanhado de viola ou
rabeca, o desafio é chamado de repente; se acompanhado de pandeiro, é
conhecido como embolada. Esta já pertence a um período posterior, quando a
cantoria chega às cidades litorâneas, onde se preferiu o pandeiro à viola ou à
rabeca (Quintela, 2005).
Os primeiros registros desses versos populares ocorrem no século XIX,
por meio de cópias escritas à mão e impressas. Os impressos foram chamados
de folhetos. O primeiro folheto registrado é de 1865: “Testamento que faz um
macaco especificando suas gentilezas, gaiatices, sagacidade, etc.” (Silva, 2010,
p. 74). São muitos os temas cantados: fábulas satíricas em que as personagens
principais eram animais, feitos de bois bravos na lida com vaqueiros, histórias de
princesas e cavaleiros medievais e fatos jornalísticos, entre outros.
No início do século XX, surgiram as primeiras tipografias tocadas por
poetas ou cantadores. Ao contrário do que se pode pensar, essas tipografias
deram lucros a muitos dos seus donos (Melo, 2019, p. 248). As mais famosas
foram as de João Martins de Athayde (fundada em 1909), de Leandro Gomes de
Barros (de 1910) e de Francisco das Chagas Batista (de 1913) (Melo, 2019).
Com o aumento da produção, os cantadores e poetas vendiam os seus
folhetos em praças, mercados e feiras. Enquanto os impressos eram expostos
em mesas – chamadas de bancadas ou tabuleiros – ou em cordéis, os poetas
interpretavam as histórias oralmente, como forma de capturar o leitor e ganhar
um comprador. Assim, o intercâmbio entre a oralidade e a escrita permanece
sem que uma modalidade se sobreponha à outra.
O Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) define a literatura de
cordel como uma variação escrita do repente (desafio), que se espalhou pelos
estados nordestinos primeiro e depois foi levado para o Norte com as sucessivas
levas de trabalhadores que foram para lá, assim como para o Sudeste e o
Centro-Oeste. Em todas essas regiões há poetas de cordel, leitores, editoras e
instituições que abrigam suas produções (Melo, 2019, p. 257). Só para você ter
uma ideia, a sede atual da Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC)
fica no Rio de Janeiro.
Chamar o folheto de uma variação escrita do repente ou do desafio é
circunscrevê-lo a essa modalidade da língua. Seria melhor pensar que o folheto
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impresso permitiu “[...] a renovação da cantoria após o declínio da hegemonia
cultural exercida pelo cantador do sertão” (Quintela, 2005, p. 280). Ou seja, com
o deslocamento da poesia oral do meio rural para as áreas urbanas – que ocorre
à medida que a sociedade brasileira se industrializa e requer mão de obra para
os polos industriais, de construção civil e de serviços –, os assuntos, os temas e
o público se atualizam e renovam o cordel, seja na modalidade de cantoria, seja
na escrita, por meio dos folhetos. Com isso, o cordel ou o folheto permanecem
ativos sem desaparecer, como se pensou que ia acontecer na década de 1980.
Agora, vamos conhecer as formas pelas quais a poética do folheto ou
cordel se organizou e traçar alguns paralelos seus com a linguagem da
publicidade.
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Assista a uma roda de rima ou freestyle com Arnaldo Tifu, Emicida, Max
B.O., Rincon Sapiência acompanhados pelo DJ KL Jay, no link
<https://www.youtube.com/watch?v=c8hzo6LjH4U&list=PLYbmLcLU_-_HD_En-
tgiwaw0bHtoUsHxF&index=204> (Roda, 2014).
Como leitura obrigatória, leia a primeira parte do artigo A linguagem
musical rap: expressão local de um fenômeno mundial, de Iolanda Macedo
(2011, p. 261-275), acessando o link <http://e-
revista.unioeste.br/index.php/temposhistoricos/article/view/5708>.
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TEMA 5 – RAP E EXPRESSÃO
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em crespo e pele, que repercute no /b/, em cabelo, que é sua contraparte
sonora. E há a assonância da vogal /e/ que corre por essas três palavras.
Esses mesmos recursos aparecem nos versos de Homem na estrada, de
Mano Brown (1993, grifos nossos): “Equilibrado num barranco incômodo, mal
acabado e sujo / Porém seu único lar, seu bem e seu refúgio”. Além da rima
entre sujo e refúgio e as internas equilibrado/acabado; porém/bem, há a
aliteração do som [b] no primeiro verso, que ressoa no /p/ e no /b/ do segundo
(Garcia, 2004, p. 169).
Repare, na letra (Brown, 1993), que não há preocupação com a métrica.
No rap há uma relação entre a acentuação das palavras e o breakbeat. As rimas
acompanham a batida típica do rap: bum-clap-bum-clap, no compasso de quatro
tempos. Mas esse esquema não é rígido, pois
Agora, vamos ver como o rap e o hip hop aparecem nos gêneros
publicitários.
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5.3 Tô na luta
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agência. Observe a mesma aliteração da nasal [e͂] nas sílabas fortes de sente,
fazendo e diferença. Por fim, há uso do slogan “Então, vem”, que resgata o
antigo e icônico “Vem pra Caixa você também, vem”, que se incorpora à música
cantada pelos sete rappers no último vídeo da campanha (Então, 2016).
A repercussão dessa campanha foi muito grande: o site teve mais de 1
milhão de acessos e contribuiu para a aproximação da marca com o público das
periferias, a quem a empresa quis atingir.
Nas próximas aulas, começaremos a tratar da expressividade no campo
escrito, iniciando com a poesia e terminando com a prosa, sempre associando
seus meios expressivos aos meios expressivos da propaganda e da publicidade.
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TROCANDO IDEIAS
NA PRÁTICA
FINALIZANDO
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REFERÊNCIAS
_____. Negro drama. In: RACIONAIS MC’S. Nada como um dia após o outro
dia. São Paulo: Cosa Nostra, 2002. 1 CD.
DIVERSO: rap repente – bloco 02. Diverso, 13 jun. 2014. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=SekKOVmmCuc>. Acesso em: 23 jan.
2021.
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ENTÃO vem: #SonsDaConquista (clipe oficial). Edi Rock, 3 ago. 2016.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=FlRD6WWHVbw>. Acesso
em: 23 jan. 2021.
KAROL Conka: Tô na luta (clipe oficial) Joice Silva. Don Pablo Videoclipes, 21
jun. 2016. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=6I7cqrxF95c>.
Acesso em: 23 jan. 2021.
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STYCER, M. “Cordel encantado” apresenta qualidades que faltam a outras
tramas da grade global. UOL, 13 abr. 2011. Disponível em:
<http://televisao.uol.com.br/critica/2011/04/13/cordel-encantado-apresenta-
qualidades-que-faltam-a-outras-tramas-da-grade-global.jhtm>. Acesso em: 23
jan. 2021.
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