Canto Coral INfantil 5 A 10 Anos

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

ESCOLA DE MÚSICA E ARTES CÊNICAS

CANTO CORAL INFANTIL

CRITÉRIOS PARA A ESCOLHA DE REPERTÓRIO NA FAIXA


ETÁRIA DE 5 A 10 ANOS

Sebastiana Benedita Coelho de Moraes Couteiro

Orientadora: Prof.ª Ms. Marília Álvares

Goiânia
2007
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SEBASTIANA BENEDITA COELHO DE MORAES COUTEIRO

CANTO CORAL INFANTIL

CRITÉRIOS PARA A ESCOLHA DE REPERTÓRIO NA FAIXA ETÁRIA


DE 5 A 10 ANOS

Monografia apresentada ao Curso de


Licenciatura, como requisito parcial para
a conclusão do Curso Educação Musical,
Licenciatura em Canto, da Escola de
Música e Artes Cênicas da Universidade
Federal de Goiás, sob orientação da
Prof.ª Ms. Marília Álvares.

Goiânia
2007
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SEBASTIANA BENEDITA COELHO DE MORAES COUTEIRO

CANTO CORAL INFANTIL

CRITÉRIOS PARA A ESCOLHA DE REPERTÓRIO NA FAIXA ETÁRIA


DE 5 A 10 ANOS

Monografia apresentada e aprovada em_______de___________________ de 2007, pela


banca examinadora:

_________________________________________________

Prof.ª Ms. Marília Álvares.

_________________________________________________

Prof.ª Ms. Denise de Almeida Felipe.

_________________________________________________

Prof.ª Dra. Ana Guiomar Rego.


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Dedico este trabalho à memória de meu amado pai e à vida de minha querida mãe, que me
ensinaram a amar e respeitar as pessoas; aos meus filhos, fontes de minha inspiração e
inquietação pela busca do saber; a meu marido, que é meu companheiro e incentivador; a
meus irmãos, sempre tão amorosos.
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AGRADECIMENTOS

À fonte de vida e amor maior, que está em cada um de nós, nos dá colo, nos deixa cair,
mas nos ajuda a levantar sempre, chamado de Deus, Brahma, Há, Tupã, Alah, não importa. É
a Ele que agradeço por toda a minha vida.

À professora Marília Álvares pela cuidadosa orientação e paciência, incentivando-me


e me mostrando caminhos.

Ao professor Ângelo Dias, meu primeiro professor em Goiânia, que esteve sempre
aberto para responder a meus questionamentos e dúvidas.

A meus amigos e colegas, que participaram comigo desta caminhada que não chegou
ao fim, mas apenas passou por uma de suas etapas.

Aos queridos alunos, com os quais, além de aprender mais sobre minha profissão,
aprendi a ter paciência, a observar, a brincar.

Aos professores Denise Felipe, Daniela de Souza e Altamiro da Fonseca, que


responderam prontamente à entrevista, necessária para complementar esta pesquisa.

À Dra. Cíntia, que realizou as imagens das pregas vocais infantis, para ilustrar este
trabalho.
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"O nascimento do pensamento é igual ao nascimento de uma criança: tudo começa com um
ato de amor. Uma semente há de ser depositada no ventre vazio. E a semente do pensamento é
o sonho. Por isso os educadores, antes de serem especialistas em ferramentas do saber,
deveriam ser especialistas em amor: intérpretes de sonhos.”
( Rubem Alves )
7

Índice

1. Introdução..............................................................................................................8
2. A Presença da Música nos Primeiros Anos de Vida..........................................11
3. O Aparelho Vocal Infantil....................................................................................13
3.1. Características...............................................................................................13
3.2. Muda Vocal....................................................................................................14
4. Produção da Voz....................................................................................................15
4.1. Laringe ........................................................................................................... 15
4.1.1 Pregas Vocais..............................................................................................16
4.2. Respiração........................................................................................................17
4.3. Ressonância......................................................................................................18
4.4. Articulação e Emissão.....................................................................................19
5. Qualidades Vocais...................................................................................................21
5.1. Extensão............................................................................................................21
5.2. Tessitura............................................................................................................21
5.3. Timbre...............................................................................................................22
6. Disfonia, Abuso e Higiene Vocais..........................................................................23
7. Desenvolvimento Cognitivo....................................................................................27
8. O Canto Coral Infantil...........................................................................................32
8.1. Cuidados na escolha e aplicação de repertório............................................32
8.1.1. Texto..........................................................................................................33
8.1.2. Tessitura....................................................................................................34
8.1.3. Intensidade................................................................................................35
8.1.4. Intervalo ...................................................................................................35
8.1.5. Andamento (Pulsação).............................................................................35
8.2. A Prática Coral – o que se observar em um ensaio....................................36
8.2.1. Concentração e Relaxamento ................................................................36
8.2.1.1. Exercícios de concentração e relaxamento.......................................36
8.2.1.2. Exercícios de relaxamento para os músculos faciais.......................37
8.2.2. Postura .....................................................................................................37
8.2.3 Exercícios respiratórios............................................................................38
8.2.4. Relaxamento da laringe..........................................................................38
8.2.4.1. Exercícios para o relaxamento da laringe........................................39
8.2.5. Aquecimento e desaquecimento vocal....................................................39
8.2.5.1. Vocalizes..............................................................................................40
8.2.6. Como ensinar uma canção......................................................................42
8.2.7. Desaquecimento Vocal.............................................................................42
8.2.7.1. Exercícios para o desaquecimento vocal..........................................42
9. O canto coral como instrumento da educação....................................................43
9.1 O canto em uníssono........................................................................................44
9.2 Repertório ........................................................................................................45
9.3. Demonstração de adaptações de canções......................................................46
10. Conclusão..............................................................................................................48
Referências Bibliográficas.........................................................................................50
Discografia...................................................................................................................52
Anexo...........................................................................................................................53
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1. Introdução

A voz é nosso primeiro e principal meio de comunicação, e com ela nasceu a palavra e
a música. A voz, fonte de emoção e expressividade, inspirou o homem na criação dos
instrumentos musicais.

Diferente dos instrumentos, porém, a voz é parte de nosso organismo, de nosso corpo
e merece cuidados especiais, uma vez que as nossas condições emocionais, físicas e
psicológicas influenciam em sua produção. Sendo ela nosso principal meio de comunicação e
instrumento usado no estabelecimento das relações sociais, de trabalho e lazer, sofre, muitas
vezes, abusos indevidos, ocasionando disfonias (alterações da voz), cansaço e mesmo danos
mais severos como nódulos e fendas vocais.

As crianças são as que mais realizam os chamados abusos vocais que, segundo Wilson
(p. 44), é o uso incorreto da voz, como o pigarrear, tomar gelado quando o corpo estiver
aquecido, competir vocalmente com o ambiente sonoro, gritar, imitar sons guturais, como
vozes de monstro, e outros. A maioria destes atos causa movimentos bruscos nas pregas
vocais e se continuados, podem ocasionar lesões nas mesmas.

Os profissionais que trabalham com crianças devem ter cautela no trato com o
aparelho vocal e entendimento do mesmo, além de conhecimento musical, cultural, e
preocupação na escolha do repertório a ser usado com cantores solistas infantis ou coros
infantis. De acordo com BRITO (2003), os cuidados envolvem tessitura apropriada à idade
infantil, intervalos musicais curtos e fáceis; conteúdo do texto apropriado à faixa etária do
grupo ou solista; peças que proporcionem acesso à cultura, dentre outros fatores. Wilson
(1972) ressalta que, os regentes que trabalham com coro infantil, devem estar muito atentos
na realização de seu trabalho e acompanhar o desenvolvimento vocal de cada criança.

Há alguns anos realizamos um trabalho de educação musical com crianças na faixa


etária de 2 a 14 anos. Também desenvolvemos atividades no canto coral infantil, tendo a
oportunidade de fazer cursos de extensão - voltados para o aquecimento vocal e corporal
infantil - com Thelma Chan, reconhecida profissional nesta área. Também, diversos cursos
na área de Educação Musical, entre eles, Ecologia Sonora, ministrado por Murray Schafer,
Método Dalcroze, por Iramar Rodrigues e Método Orff, com Enny Parejo; cursos de
fisiologia da voz cantada, com a fonoaudióloga Sílvia Pinho, cursos de técnica vocal e canto
com professores de reconhecida competência na área vocal, entre eles, Niza Tank, Leila
Farah e Edmar Ferretti. Participamos ativamente de trabalho voltado para a Educação
9

Musical Infantil em todos os aspectos, com crianças da periferia de São Paulo, sob
orientação de Teca Alencar de Brito e outros profissionais.

No decorrer de nosso trabalho percebemos, no entanto, que entre profissionais e leigos


envolvidos nas áreas citadas, há pouco conhecimento ou mesmo desconhecimento do
mecanismo fisiológico do aparelho vocal e do uso da técnica para o canto infantil. A falta de
bibliografia específica é um dos fatores que agrava este problema. Também há deficiência
de conhecimento na área de repertório, principalmente no que se refere à questão do
enfoque cultural, do ecletismo e de canções apropriados ao canto infantil. Observamos que
há pouco empenho dos professores em pesquisar o repertório infantil ou mesmo criá-lo, bem
como preparo insuficiente para a realização de um trabalho seguro e consciente que envolva
a técnica vocal, sentido estético, formação cultural, musicalidade, expressividade e criação
de canções. Entendemos que um trabalho dirigido e direcionado, baseado nos itens
colocados acima, proporciona o desenvolvimento da liberdade expressiva das crianças e as
incentiva a cantar com alegria e entendimento.

Observamos ainda, que, muitas vezes, o repertório não é coerente à idade em questão.
Ouvimos, então, crianças, cantando músicas com conotação sexual ou de apelo social, ficando
seu mundo imaginário - povoado de sonhos, duendes, animais, natureza, estórias
sobrenaturais fantasiosas - a perder seu lugar, a poesia e a leveza. O processo cognitivo no
qual a criança se encontra deve ser levado em consideração no momento da escolha de
repertório. A contextualização temática das canções é muito importante nesta fase do
desenvolvimento humano, pois a criança cantará com mais propriedade aquilo que faz parte
de sua realidade, de seu mundo e de seu entendimento.

Evite cantar nos extremos de sua tessitura, tanto em notas muito agudas como em
muito graves, para não forçar precocemente sua emissão. Trabalhe sobre um
repertório adequado as suas possibilidades e ao seu preparo. (Behlau; Rehder, 1997,
p.26)

Um outro aspecto muito importante é a preparação do corpo e da voz para se cantar.


Este momento antecede o ensaio das peças e deve ser feito de maneira cuidadosa, lúdica e
prazerosa, principalmente na faixa etária aqui focalizada, que requer movimento e energia. Há
exercícios muito divertidos e apropriados para esta idade, que abordaremos no decorrer deste
trabalho. Segundo Chan (2001) um corpo bem aquecido é uma certeira ferramenta para a boa
produção vocal.
10

A proposta desta pesquisa é focalizar a atividade coral realizada com crianças na faixa
etária de 5 a 10 anos, ressaltando-se que na realização de um trabalho com vozes tão jovens
devemos ter toda a cautela e procurar respeitar os limites individuais de cada aluno, pois seu
instrumento, ainda em fase de amadurecimento e fortalecimento, é mais frágil que o dos
adultos. “A voz infantil caracteriza-se pelo seu timbre claro, sem vibrato e extensão sem
graves. Aproxima-se da voz adulta feminina, mas é mais frágil.” (Canto, Canção, Cantoria:
como montar um coral infantil. São Paulo: SESC, 1997, p.57)
Para tanto, este trabalho traz em seu conteúdo assuntos relacionados à importância da
música para a formação de todo indivíduo; permeia aspectos da fisiologia da voz; mecanismos
necessários para o ato de cantar, entre eles respiração, ressonânica, articulação e emissão;
discorre sobre aquecimento e desaquecimento vocais, sobre higiene vocal; fornece os
cuidados que devemos adotar no momento de se escolher o repertório que desejamos trabalhar
com este grupo; sugere adaptações musicais a serem feitas para este uso, além de oferecer
partituras de algumas peças musicais e sugestões de Cds para pesquisa. Traz, ainda, o
resultado de entrevistas realizadas com profissionais da área de canto infantil, canto coral
infantil e pedagogia.

Acreditamos que a presente pesquisa contribuirá grandemente para a melhor


realização de um trabalho com crianças, não somente para professores de Canto Coral
Infantil, mas para professores de Educação Musical, Educação Infantil, compositores, pais,
diretores de escolas, interessados em fazer deste processo de conhecimento, socialização e
lazer um ato de responsabilidade para com o trato vocal das crianças, de respeito para com
suas capacidades intelectuais e afetivas, além de um instrumento de manutenção das
características folclóricas e culturais de nosso país. As crianças serão as maiores beneficiadas
neste processo.
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2. A Presença da Música nos Primeiros Anos de Vida


O som, o ritmo, a entonação são intrínsecos ao homem e fazem parte de nossas vidas.
Somos um corpo musical quando falamos ou cantamos, quando caminhamos, quando
percebemos as batidas do coração e os movimentos de nossos membros.
A música é uma constante em nossas vidas, talvez por ser a arte que mais diretamente
chega aos nossos corações. Ouvimos música durante as refeições, lendo, dirigindo,
escrevendo, namorando, na praia, na escola, em hospitais, no cinema. Antes mesmo de vir ao
mundo, a criança entra em contato com sons, música, ritmos e movimentos externos, além de
toda variedade sonora proveniente do funcionamento dos órgãos maternos. Ao nascer, o bebê
fica exposto às múltiplas manifestações sonoras ao seu redor – a voz da mãe que lhe fala e
canta, do pai e irmãos, da avó que lhe canta brinquedos de mão, parlendas, as vozes de
diferentes pessoas, os ruídos da natureza, dos eletrodomésticos - tudo colabora para a imersão
sensorial do bebê no mundo maravilhoso dos sons, da música. Mesmo antes de saber
pronunciar as primeiras palavras o bebê “canta” sons com alegria e espontaneidade, durante
suas brincadeiras e demonstra, com movimentos de corpo, gestos e sorrisos, que aqueles sons
são agradáveis.
BRITO (2003, p.35) afirma que “os bebês e as crianças interagem permanentemente
com o ambiente sonoro que os envolve”.
À medida que vai crescendo a criança recebe outros estímulos musicais:
Na TV: muitas vezes aqui ela não encontra a música própria para sua idade, pois, por
ser a TV um veículo de comunicação que visa o lucro, sua preocupação não é de
cunho didático ou cultural, mas sim comercial. As músicas usadas nas novelas e
programas de auditório, em sua grande maioria, não trazem formação ou linguagem
apropriada para uma criança.
No cinema: Os filmes dirigidos às crianças, geralmente, têm informação cultural,
linguagem adequada e a presença da música de maneira diferenciada e cuidadosa. Em
filmes como Fantasia e Fantasia 2000 a intenção de trazer a boa música ao universo
infantil é latente.
No rádio: o que se toca nas grandes rádios hoje em dia não tem a preocupação de
informar, formar, de levar cultura. Geralmente são músicas barulhentas, com harmonia
simples, escassez em conteúdo e de apelo sexual, totalmente inapropriadas às crianças.
Na escola: a música é um recurso muito usado na educação escolar. As crianças
cantam quando chegam, antes do lanche, durante as aulas. Em algumas há, ainda, aula
de música com professor especializado.
12

Hoje em dia, infelizmente, não vemos mais crianças nas ruas brincando de roda, um
brinquedo tão provedor de cultura, musicalidade e socialização. Apenas em poucas escolas, e
somente com as crianças menores, é que sabemos da presença desta atividade. O brinquedo de
roda era um dos melhores meios de diversão entre os familiares em outras épocas. Além de
manter a família reunida por um determinado tempo, ele estreitava o vínculo afetivo com
gestos de abraçar, beijar, apertar a mão e beliscar o nariz. Além disto, o brinquedo de roda
desenvolve a coordenação motora, a expressão corporal e a percepção auditiva, uma vez que a
maioria das brincadeiras pede movimentos com os pés, mãos, quadris, braços, rosto, o pular e
rodar, e o uso da voz.
Outro meio eficaz é o ambiente familiar. A família, por seu laço afetivo e diário com a
criança, tem o forte poder de trazer a música para dentro de casa. Em casa pode-se cantar e
ouvir música com as crianças, estimulando-as a dançar e se expressar com o corpo.
Em todos os veículos de acesso à música e nas brincadeiras a música cantada está
sempre presente. Portanto, o canto torna-se veículo primordial no desenvolvimento da
musicalidade da criança. Segundo FIGUEIREDO (2001) “o canto leva a diálogos e escritas
melhorados, mudanças no vocabulário e mudanças nas habilidades do pensamento criativo”.
Não podemos deixar de mencionar as crianças que trazem a música consigo de
maneira admirável, e por si só descobrem sons, constroem pequenos instrumentos e até
compõem pequenas canções. Assim, a música faz parte da vida e do crescimento de toda
criança. Seja ela de qualquer estilo ou época, de maneira didática ou não.
13

3. O Aparelho Vocal Infantil

3.1. Características
As pregas vocais de um bebê recém-nascido medem apenas três milímetros e
alcançam a freqüência de 3.000 Hz, pois a laringe está localizada muito acima do
posicionamento que atinge na idade adulta: na altura da terceira vértebra até a idade de cinco
anos, quando, então, gradativamente, ela desce até a altura da sétima vértebra. Segundo
DINVILLE (2001), “no nascimento a laringe se situa bem no alto e suas dimensões exteriores
são um terço das da laringe de uma mulher”. Ela desce muito lentamente, acompanhando o
desenvolvimento de todo organismo, até a puberdade.
SATALOFF e SPIEGEL (1989) relatam que:
o comprimento total das pregas na criança é de 6 a 10 mm, mas aumenta para 12-17
mm na mulher adulta, e para 17-23 mm no homem adulto. As dimensões de todos
os outros aspectos da laringe também aumentam.

As crianças de ambos os sexos apresentam pouco ou nenhuma diferença na altura de


suas vozes. Tanto meninas quanto meninos podem cantar na mesma altura, posto que seu
aparelho vocal ainda não passou pelas transformações que acarretarão no amadurecimento e
conseqüente diferenciação das tonalidades em que falarão ou cantarão, e de timbre.

A foto acima é das pregas vocais de uma criança de 7 anos e 8 meses, do sexo
feminino. Esta criança canta há 2 dois anos em um coro infantil, sob nossa responsabilidade e
não apresenta sinais de distúrbios.
14

3.2. Muda Vocal


Durante a puberdade tem início a muda vocal, que é o processo de transformação do
órgão vocal infantil para órgão vocal adulto, que acarretará em mudança na altura da voz. Este
processo acompanha o desenvolvimento das características sexuais, resultantes de mudanças
hormonais. De acordo com SATALOFF e SPIEGEL (1989) a puberdade acontece entre os 8 e
15 anos para o sexo feminino e entre os 9,5 e 14 anos para o sexo masculino.
Nas meninas a muda vocal quase não é percebida, pois as modificações são sutis. A
voz ganha amplitude, extensão e fica mais arredondada (DINVILLE, 2001). Já nos meninos o
processo é mais lento e acompanhado de uma instabilidade na freqüência e quebras na
sonoridade. A voz fica mais rouca e fraca. De acordo com TITZE (1990) isso se deve a um
crescimento rápido e desproporcional da laringe, desencadeado pela cartilagem tireóide,
popularmente conhecido como “pomo de Adão”, e ao comprimento das membranas das
pregas vocais.
Não há uma idade definida para o início desta muda e depende também de fatores
externos, como o clima do lugar onde vivemos.
Para os jovens de países de clima temperado o começo é mais tardio, por volta dos
12 a 13 anos, enquanto os de países tropicais apresentam-se um ou dois anos mais
cedo. Em geral o processo leva de 3 a 8 meses, sendo que o controle completo da
voz para uso artístico pode durar de 4 a 6 anos. (Costa e Andrada e Silva, 1998,
P.112)

A figura acima, retirada do livro Voz Cantada, COSTA e ANDRADA E SILVA


(1998), representa as laringes de criança (esquerda) e de um adulto (direita). O desenho de
cima mostra uma visão frontal da cartilagem tireóide e o de baixo uma vista superior de
ambas as laringes. Podemos observar que tanto a largura quanto a altura da cartilagem tireóide
aumentam, assim como o comprimento das pregas vocais e as dimensões da laringe.
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4. Produção Vocal
O som é produzido na laringe, a partir da vibração das pregas vocais provocada pela
passagem do ar que vem dos pulmões. Quando inspiramos as pregas vocais se abrem para que
o ar chegue aos pulmões, através da traquéia. Na expiração o ar volta pela traquéia e passa
pelas pregas vocais fazendo-as vibrar no ato da fala ou do canto. Segundo PINHO (2004)
“esse mecanismo ocorre de maneira similar à vibração do bocal de um balão de borracha
cheio de ar que, quando esticado, produz um som agudo (fino) como um “fffuimmm”.

Pregas vocais

4.1. Laringe
A laringe se situa na região média do pescoço, em direção onde se forma o famoso
“pomo de Adão”, em frente à parte mais baixa da faringe, logo acima da traquéia. É
constituída por inúmeros músculos e cartilagens ligados entre si. Seria como uma pequena e
complicada máquina formada por várias e pequenas peças, onde, o bom funcionamento de
uma acarretará no bom funcionamento da outra.
16

As membranas, os ligamentos e músculos laríngeos funcionam com o objetivo de


abaixar ou levantar a laringe, abrir (movimento de adução) ou fechar (movimento de abdução)
as pregas vocais, como também permitir sua mobilidade. A laringe é um órgão móvel, mas a
liberdade para a realização de sua mobilidade depende dos movimentos da mandíbula, da
língua, da articulação, da posição da cabeça, entre outros. É na laringe que se inicia a vibração
do som, proveniente do fluxo de ar passando pelas pregas vocais. Este som, no entanto, é
apenas o que conhecemos como som primário, sem qualquer qualidade ou beleza, e
amplificação; ele se assemelha a um ruído, como o de um barbeador. Continuando seu
caminho, o som primário atinge as cavidades de ressonância, isto é, faringe e cavidade oral,
principalmente, ganhando assim amplificação e cor própria ou qualidade sonora.

4.1.1 Pregas Vocais


As pregas vocais, popularmente conhecidas como cordas vocais, são duas
pregas formadas por músculos revestidos por membrana mucosa. Elas se encontram no
interior da laringe, em posição horizontal, paralelas ao chão e são formadas por camadas de
músculos, possuindo grande versatilidade funcional. Sua coloração, em estado normal, é
branca nacarada ou de cor rosa bem clara com extremidades esbranquiçadas. Quando nos
alimentamos, a epiglote abaixa em movimento de báscula, tampando a passagem entre as
pregas vocais, evitando que o alimento chegue aos pulmões. No momento da respiração, pelo
contrário, a epiglote levanta para que o ar passe entre as pregas vocais (glote), e havendo o
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intuito de fala ou canto, as pregas se fecham, provocando certa resistência à passagem do ar, o
que ocasiona a produção sonora vocal.
Acima das pregas vocais localizam-se as bandas ventriculares ou falsas cordas, assim
denominadas, pois não produzem som, mas exercem função valvular, cooperando com as
pregas verdadeiras na prevenção do escape de ar dos pulmões. Entre as pregas vocais
verdadeiras e as falsas encontramos o ventrículo de Morgagni ou ventrículo laríngeo, que age
como um filtro, e suas glândulas fornecem o muco que recobre as pregas vocais. Este muco
protege a prega vocal contra a fricção excessiva durante a fonação. A qualidade da mucosa
que reveste as pregas é essencial para um timbre bonito e uma boa produção vocal. Esta
mucosa pode ser prejudicada em estados gripais ou alérgicos devido a presença de secreção
nasal que escorre pela faringe até a laringe e se deposita nas pregas, e pelo edemaciamento
das pregas devido ao fator irritativo. Quando há mal uso e abuso vocais, a produção de muco
protetor também fica alterada, sendo produzida em maior quantidade e obtendo uma
viscosidade mais espessa. Além de excelente nível de hidratação corporal, tais estados
necessitam de tratamento medicamentoso e terapia vocal.

4.2. Respiração
A respiração é necessária tanto para o canto quanto para a fala. Na verdade ela é a base
para uma bela linha de canto, uma vez que é responsável pelo fluxo e continuidade do som.
Com as crianças devemos abordar este assunto de maneira simples, evitando o uso de termos
técnicos que poderão mais confundir que ajudar.
Segundo DINVILLE (1993) “aprender a cantar, é inicialmente aprender a respirar, ou
seja, treinar para obter uma respiração adaptada ao canto”. O canto exige um trabalho
respiratório mais elaborado que envolve principalmente a atuação dos músculos abdominais,
torácicos e o diafragma. A respiração deve ser realizada preferencialmente pelo nariz, pois
este tem a capacidade de filtrar, umidecer e aquecer o ar. A respiração pela boca pode
ocasionar o resfriamento da garganta, podendo levar a problemas nas vias aéreas superiores e
inferiores. O professor deve observar se a criança mantém a boca aberta com freqüência, isto
pode ser um sinal de problema alérgico ou de obstrução nasal, devendo encaminhá-la para um
otorrinolaringologista para realizar o tratamento indicado.
O objetivo maior do trabalho respiratório feito com crianças deve ser a
conscientização do uso da respiração costo-abdominal e nunca da peitoral, que é prejudicial
ao canto, causando tensão na região do pescoço e ombros. Além disto, a respiração alta
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(peitoral) não proporciona um melhor aproveitamento da capacidade pulmonar, já que a parte


de cima deste é mais estreita.
Nas crianças o ciclo respiratório (movimento de inspiração e expiração) é bem mais
freqüente, ou seja, elas respiram mais vezes em um curto intervalo de tempo, tanto na fala
quanto no canto, em conseqüência de seu bombeamento cardíaco ser mais acelerado.
Portanto, as frases musicais cantadas por elas devem ser curtas, pois seu tempo de vocalização
é menor do que o de um adulto.
Muitas vezes a falta de um bom controle respiratório é a causa de problemas de
afinação, de condução fraseológica e de emissão. Devemos, portanto, exercitar principalmente
o controle de ar na expiração, aonde o canto acontece. DINVILLE (1993) afirma que o cantor
deve aprender a controlar o ar durante a expiração, saber dosá-lo de acordo com as
necessidades musicais de altura, intensidade, duração, fraseado.

4.3. Ressonância
O som produzido em nível de pregas vocais (glote) não tem qualidade ou amplitude;
precisamos de cavidades de ressonância para amplificar e enriquecer este som original. Se
observarmos, todos os instrumentos criados pelo homem possuem uma caixa de ressonância,
imitando a voz humana.
Nossas principais cavidades de ressonância são a faringe e a cavidade oral. A faringe
se comunica com a laringe (hipo ou laringofaringe), com a cavidade oral (orofaringe) e com o
19

nariz (naso ou rinofaringe). Na cavidade oral está o palato que se constitui de uma parte óssea
(palato duro) e outra muscular (palato mole). O palato funciona tanto como ressoador quanto
como órgão articulador. As dimensões dos ressoadores e articuladores variam de acordo com
a constituição física de cada pessoa e, portanto, nenhuma voz é exatamente igual à outra.

4.4. Articulação e Emissão


Além do controle respiratório e ressonânica há dois outros importantes aspectos a
serem levados em consideração para uma boa produção sonora:

ü A articulação, que é a pronúncia das consoantes, sendo a parte mecânica da


palavra. Os articuladores, além do palato, são a língua, mandíbula, dentes e
lábios. A articulação é, muitas vezes, prejudicada no canto em detrimento do
som, pois alguns cantores, preocupados com a beleza e homogeneidade sonora,
esquecem que o público precisa entender o que se está cantando e em que
idioma.

ü A dicção, que é a maneira estética de falar, de dizer, seria, portanto, a arte de


falar, e segundo Phillips (1992) seu estudo envolve três setores: a pronúncia
(como uma palavra é falada), a enunciação (como uma vogal ou sílaba são
faladas) e a articulação. A articulação está à serviço da dicção, assim como a
dicção à interpretação. Sendo assim, uma boa articulação e enunciação
20

resultam em dicção de qualidade, e esta é um dos meios para se chegar a uma


boa interpretação. Por isto a importância dos vocalizes, onde usamos todas as
vogais (A, E, Ê, I, O, Ô, U) e todas as consoantes.

A articulação, portanto, é definida pelas consoantes, que devem ser bem pronunciadas.
Podemos fazer vários exercícios com as seguintes consoantes, principalmente: Z, J, V, B, F,
P, X, S. Estas são consoantes que possuem a vibração (Z, J, V, B) ou não (S, X, F, P,) das
pregas vocais em sua produção. O professor deve aproveitá-las para dar impulso ao som,
como uma alavanca. Mas o ideal é articular as sílabas sem exageros, como abrir
demasiadamente a boca.
A correta colocação das vogais também vai proporcionar uma produção vocal de
qualidade, uma vez que estas são o veículo do som, devendo o cantor manter a mandíbula
aberta de maneira relaxada e na posição vertical, observando-se, ainda, os contornos da boca,
que não deve estar frouxa, assim como a bochecha, pois a pele do rosto age como o couro de
um tambor: estando relaxada, ou seja, sem tonicidade, o som sairá frouxo. Se estivermos
atentos a estes aspectos a dicção será clara e correta, proporcionando qualidade sonora e
entendimento textual.
21

5. Qualidades Vocais
A voz humana apresenta várias características próprias, que são usadas para sua
definição e trabalho. Não abordaremos a classificação vocal, uma vez que ainda não houve a
muda da voz infantil para adulta na faixa etária enfocada nesta pesquisa.
Além da forma e volume das cavidades de ressonância e da espessura e comprimento
das pregas vocais, diferentes para cada indivíduo, há a extensão, a tessitura e o timbre.

5.1. Extensão
A extensão é toda a gama de sons que alcançamos ao vocalizar, abrangendo do som
mais grave ao mais agudo. A extensão é uma característica muito pessoal e varia de alcance
com o amadurecimento vocal e com o estudo do canto. Uma criança tem uma pequena
extensão, que aumenta, natural e gradativamente, com o passar do tempo. Uma pessoa que
estuda canto tem sua extensão vocal ampliada tanto para os graves quanto para os agudos.
Esta ampliação deve-se ao trabalho muscular e de alongamento que é feito na musculatura da
laringe e nas próprias pregas vocais durante os exercícios específicos, isto é, os vocalizes. Na
voz infantil, no entanto, não se deve exagerar na ampliação da extensão. Mesmo a voz de
crianças que demonstram uma facilidade para expandir sua extensão tanto para os graves
quanto para os agudos deve ser tratada com prudência, isto é, deve se conformar à média de
extensão da maioria das crianças (ver quadro abaixo), respeitando-se as peculiaridades do
órgão infantil, bem como preservando a saúde do mesmo.

5.2. Tessitura
A tessitura se refere a uma região, contida na extensão, onde cantamos com facilidade
e onde a voz “brilha” mais. Ela está relacionada ao conforto vocal e é bastante variável. Cada
pessoa apresenta uma tessitura que, com o trabalho técnico vocal, é ampliada. A tessitura
depende também da conformação anatômica do aparato vocal (dimensões e formato da
laringe e das pregas) e da idade.
Abaixo há um quadro demonstrativo da extensão e tessitura da voz infantil, na faixa
etária enfocada neste trabalho. Os dados nela contidos foram retirados do livro “Teaching
Kids to Sing”, de Phillips (1992, p. 50 a 64) e do resultado da comparação entre entrevista
(anexa) realizada com especialista da área e consulta bibliográfica. No entanto, devemos
compreender que tanto a extensão quanto a tessitura são muito pessoais, e este quadro não
deve ser seguido rigidamente, mas apenas como um parâmetro onde possamos nos basear.
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Idade Extensão Tessitura


Aproximada Aproximada

5 anos

6 anos

7 anos

8 anos

9 anos

10 anos

5.3. Timbre
O timbre é uma qualidade sonora que nos oferece a possibilidade de distingüir o som
dos instrumentos. É através dele que diferenciamos e reconhecemos a voz de cada pessoa, o
som de cada instrumento, pois ele é único para cada um. Quando ouvimos alguém dizer: “Que
bela voz!”, é ao timbre que a pessoa se refere. Em relação aos instrumentos - como o violino,
por exemplo - o tipo de madeira e a idade desta madeira são fatores que irão influenciar, entre
outros, na sua qualidade timbrística. Em relação ao instrumento voz, o que definirá o timbre
de cada pessoa, será sua anatomia fisiológica (forma e tamanho), a harmonia entre seu
aparelho fonador, suas caixas de ressonância e a qualidade da mucosa que reveste as pregas
vocais, além do uso que fará do mesmo.
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6. Disfonia, Abuso e Higiene Vocais


Disfonia diz respeito a alguma alteração fisiológica ou patológica no som vocal. Esta
alteração pode ser observada pela presença de rouquidão, soprosidade, hipernasalidade, voz
débil, lentidão na fala, entre outros.
Uma voz normal é essencial para uma boa comunicação oral e deve ter as seguintes
características: qualidade agradável, ressonâncias oral e nasal devidamente
equilibradas, intensidade adequada, nível de freqüência fundamental adequado para
a idade, tamanho e sexo, inflexões vocais apropriadas envolvendo altura e
intensidade. Segundo Wilson (1993).

Se as pregas vocais estão sadias seus movimentos vibratórios serão corretos e


produzirão um som limpo e claro. Uma vez que haja a presença de algum distúrbio, como
nódulos, fendas, e outros, o som será soproso, sem brilho e sem amplitude.
Alguns fatores que acarretam estes problemas podem ser de ordem clínica, como rinite e
sinusite; outros, provocados pelos abusos vocais. A seguir uma lista, citando os abusos vocais
e os respectivos cuidados que devemos adotar para ter uma boa higiene vocal, que é um
resumo adaptado da lista presente no livro “Manual de Saúde Vocal Infantil”, de PINHO
(2004):
ü Falta de uma boa hidratação do organismo: a criança precisa estar consciente da
importância da hidratação para o seu corpo. Um corpo bem hidratado resultará em
pregas vocais mais flexíveis e com melhor vibração, pois o muco protetor das mesmas
terá sua viscosidade diminuída. A ingestão de água e suco é o mais aconselhável, pois
refrigerantes dificultariam o trabalho do diafragma, uma vez que acarretariam a
presença de gases no estômago.
ü Gritar sem suporte respiratório: este é um dos recursos mais usados pelas crianças,
como maneira de chamar a atenção e impor sua opinião; é usado também durante suas
brincadeiras, no jogo de futebol, pega-pega, etc. O grito provoca a elevação da laringe
e, nesta situação, há um fechamento exagerado das pregas vocais, aumentando o atrito
entre elas. Portanto, elas devem ser orientadas para gritar com “técnica”, se o grito for
necessário, empurrando a barriga para dentro no momento de gritar.
ü Golpe de glote: acontece quando falamos de forma brusca; este ato provoca o golpe
de uma prega vocal contra a outra, retendo a passagem normal do ar entre a glote, que
é o espaço entre as pregas vocais. O golpe de glote acontece, geralmente, no início da
frase ou palavras começadas por vogais. É muito usado como recurso interpretativo,
na música popular. Se o som do som vocálico se parecer com uma tosse é porque há o
24

golpe de glote. A sugestão é de que se trabalhe o som inicial das palavras começadas
por vogais jogando um bafinho de ar nas mãos, suavemente.
ü Tossir ou pigarrear excessivamente: este é um hábito muito presente em todos nós
quando estamos com gripe ou tosse. Muitas vezes as crianças pigarreiam,
simplesmente, para imitar os adultos. No entanto, devemos observar com cautela, pois
o pigarro constante pode ser um sinal da presença de refluxo gástrico na laringe ou de
processos alérgicos, os quais necessitam de tratamento médico. O ato de tossir e
pigarrear causa atrito das pregas, golpeando-as uma contra a outra fortemente e
aumentando a produção de muco. Esta secreção, em excesso, atrapalha a emissão
vocal e faz com que a criança pigarreie novamente, gerando um ciclo. Deve-se
orientar a criança a evitar o pigarrear substituindo o hábito por inspirações profundas
seguidas de uma deglutição forte, e pela ingestão de líquidos, de preferência água,
aumentada.
ü Falar em ambientes ruidosos ou abertos: isto gera uma competição vocal e faz com
que aumentemos a intensidade de nossas vozes, ocasionando desgaste. Assim, o
recomendado é que articulemos melhor as palavras, projetando o som na “máscara”
(colocação do som mais frontalizada), e deixar o som mais metálico, procurando,
ainda, elevar discretamente a freqüência sonora, pois o tom de voz um pouco mais
agudo causa menos dano ao aparelho fonador. Em relação à criança que, com
facilidade gosta de elevar seu tom de voz, os pais e professores devem orientar sobre
os malefícios de se falar forte, ou gritar. Ao invés, a criança deve ser ensinada a
sinalizar com as mãos sobre sua vontade de falar, e então, com a atenção dos que a
cerca, falar mais pausadamente, articulando melhor, sem precisar forçar a voz.
ü Imitar ruídos e falar forte com voz soprosa: criança adora imitar sons de
personagens de desenho, animais agressivos, monstros, que exigem uma emissão mais
forte e tensa de seu delicado aparelho. O resultado desta brincadeira será a geração de
uma grande tensão na região do pescoço e um excesso de força no fechamento das
pregas vocais. Falar com voz soprosa, porém, também é prejudicial, pois há o
incompleto fechamento das pregas. O indicado é que se fale em tom normal, sem
exageros e esforço. O professor que reparar a criança com qualquer dificuldade vocal,
deve poupá-la nos ensaios, pedindo que ela não cante. Substituir o canto por outra
atividade musical é uma boa opção.
ü Utilizar tom grave ou agudo demais: devemos falar por volta do terceiro ou quarto
tom musical acima do tom mais grave que emitimos. A voz da criança é reflexo da voz
25

ou vozes que escuta em casa, isto é, ela, sem perceber, adquire o mesmo modo de falar
do ambiente familiar. Portanto, se os pais e irmãos falarem gritando, a criança repetirá
este mau hábito; se há alguém que fala mais fanhoso, ou anasalado, ou mais agudo, ou
ainda muito grave, a criança tenderá a falar da mesma forma. É interessante o
professor observar a qualidade da fala da criança e comparar com a dos pais, dos
irmãos, ou mesmo investigar sobre a qualidade vocal de babás. Havendo fator
comprometedor da fala, a família deve ser alertada a procurar ajuda para que assim a
criança também seja ajudada.
ü Falar excessivamente durante quadros gripais ou crises alérgicas: nestes períodos
é comum o aparecimento de rouquidão e obstrução nasal, decorrentes do ressecamento
e inchaço do tubo respiratório. A respiração oral, então, será adotada, mas favorecerá o
ressecamento das pregas vocais, causando atrito entre elas. Falar nesta situação é
muito danoso e pode causar danos irreversíveis à mucosa que reveste as pregas vocais.
O ideal é se manter um nível mínimo de fala, ou fala pausada, ou ainda repouso vocal.
A criança deve ser conduzida ao pediatra para que medicação adequada seja prescrita,
ajudando na diminuição e cura dos fatores causadores do problema nas vias aéreas.
ü Falar em ambientes secos, empoeirados ou de fumantes: o ambiente onde a criança
permanece deve estar livre de poeiras e outros causadores de alergias.
ü Praticar exercícios físicos falando: isto deve ser evitado porque quando praticamos
algum esforço físico há aumento do fechamento das pregas vocais. Orientar a criança
a evitar falar ou gritar durante o movimento das brincadeiras. Incentivá-las a
verbalizar quando estiverem paradas.
ü Falar demasiadamente: as pregas vocais são músculos e, como qualquer outro
músculo do corpo, tem limites e são fatigáveis. Crianças que gostam de falar muito,
geralmente apresentarão rouquidão depois de certo tempo de fala. A persistência do
hábito traz consequências nefastas para as pregas vocais das mesmas. Se o professor
constatar o cansaço vocal ou rouquidão frequentes, deve alertar os pais para que
procurem o otorrinolaringologista para que uma videolaringoscopia seja realizada, a
fim de que se constate a necessidade ou não de terapia vocal. A educação da voz
através do canto coral também pode ser de grande valia na orientação de como usar
bem a voz, seja de forma cantada ou falada.
ü Rir alto e chorar em excesso: agridem as pregas, gerando sobrecarga. As crianças
amam gargalhar; às vezes até forçam a gargalhada em certas brincadeiras. Outras, por
qualquer motivo, choram de forma exagerada, com acompanhamento de gritos
26

histéricos, como nos casos de birras. O professor de coro pode abordar a questão de
forma lúdica para explicar o que acontece com a voz nestes casos, se notar que no
grupo existem crianças com tais atitudes. Os pais também devem ser incentivados a
conversar instruindo a criança em casa, contribuindo assim para a mudança de atitude
da mesma.
ü Discutir com freqüência: nesta situação a criança perde completamente o controle
voluntário sobre aspectos vocais orientados. Esta situação é muitas vezes inevitável: a
discussão ou briga se instala em questão de segundos e a gritaria vem muito
rapidamente. Os pais e professores devem interferir de forma a acalmar as crianças,
separando uma(s) da(s) outra(s), promovendo um momento de relaxamento através de
respiração, gole de água, água no rosto, ou mesmo permitindo a criança extravasar sua
raiva através de choro solto, não reprimido, ou expiração mais forte acompanhada de
movimentos de luta – chutes, murros, tapas - no ar, em almofadas, ou qualquer outro
objeto que não cause ferimento na criança. Aos poucos a criança se acalma.
ü Cantar de forma inadequada ou abusivamente ou fazer parte de corais e teatro
sem preparo vocal: as aulas de canto são indicadas à saúde vocal infantil desde que
bem orientadas e que a criança não apresente qualquer problema nas pregas. O canto
sem preparo técnico pode ser extremamente prejudicial à saúde. O desenvolvimento
da percepção auditiva e os vocalizes são essenciais para a saúde vocal da criança
cantora. Muitas vezes, os coros infantis não oferecem o preparo vocal imprescindível e
a gritaria acontece. A utilização de exercícios de aquecimento e desaquecimento vocal
são de suma importância para a boa voz.
ü Alimentação: a alimentação deve ser balanceada rica em proteínas, carboidratos e
outras substâncias que proporcionem força muscular. Os alimentos pesados e
condimentados devem ser evitados. A maçã e o salsão são adstringentes, deixando a
saliva mais fina.
27

7. Desenvolvimento Cognitivo
Durante o processo de desenvolvimento humano nosso corpo passa por várias etapas
de maturação, sejam elas físicas, neurológicas, biológicas, etc. O período ou estágio de
maturação das estruturas cerebrais foi chamado por vários cientistas e pedagogos de
desenvolvimento cognitivo. Este diz respeito justamente à cognição (inteligência), e o
funcionamento destas estruturas internas do organismo é o que vai mediar o processo de
aprendizagem, de acordo com GOMEZ e SACRISTAN (1996).
Existem várias correntes de pensamento sobre o desenvolvimento cognitivo, mas não
abordaremos todas nesta pesquisa. Nosso enfoque será baseado no estudo de Jean Piaget,
biólogo suíço, que acreditava que nosso desenvolvimento passa por uma série de etapas
ordenadas e previsíveis. Piaget baseou grande parte de suas teorias estudando o
desenvolvimento de seus próprios filhos. Em sua visão a inteligência não é hereditária; o que
herdamos geneticamente são estruturas biológicas que se desenvolverão de maneira dialética.
As estruturas iniciais determinam a aprendizagem e esta provoca a modificação e
transformação das mesmas estruturas. Seu desenvolvimento depende da interação, da troca
entre a criança e o meio. Sendo que as estruturas mentais, herdadas geneticamente, vão
determinar a influência deste meio. De acordo com Piaget o professor é um instrumento no
ensino e não o detentor absoluto do saber, pois sua tarefa é proporcionar à criança ferramentas
para que ela possa construir seu conhecimento, por isto seu método é chamado de
Construtivismo, sendo o mais adotado nas escolas do mundo inteiro. Segundo GOMEZ e
SACRISTAN (1996), “os resultados teóricos de suas investigações são hoje em dia
imprescindíveis para compreender a complexidade da aprendizagem humana”.
Para ele há quatro fatores principais que irão interferir no desenvolvimento das
estruturas cognitivas:
ü Maturação: o desenvolvimento biológico dos órgãos; este desenvolvimento é essencial
para a alfabetização. Por exemplo, a criança precisa ter uma coordenação motora
desenvolvida e trabalhada, além de maturação neurológica, para conseguir escrever ou
mesmo segurar um lápis de maneira correta.
ü Experiência física: que levará à formação de hábitos. A possibilidade de andar ou o
domínio da fala vão proporcionar à criança experiências que ajudarão em seu
desenvolvimento.
ü Interação Social (meio): onde, através dos estímulos recebidos, o indivíduo irá adquirir
valores, desenvolver a linguagem, seus costumes, gostos culturais. A influência do
28

meio no qual a criança vive é determinado por suas estruturas mentais, mas seu
comportamento e conhecimento são resultados de construções adquiridas na troca de
experiências vividas cotidianamente, são conseqüências de suas interações com o
mundo á sua volta.
ü Equilíbrio: processo de auto-regulação do organismo, que busca equilíbrio depois de
cada desequilíbrio provocado por nova aquisição.

Piaget determinou quatro estágios teóricos do desenvolvimento. Abordaremos o 2º e 3º


estágios, que abrangem a idade focalizada nesta pesquisa.

1. Sensório-motor (0 a 2 anos de idade)


2. Pré-operacional (2 aos 7 anos)
3. Operacional Concerto (7 aos 11 anos)
4. Operacional formal (12 anos em diante).

No estágio pré-operacional o pensamento infantil é totalmente incoerente para os


padrões adultos. A criança é focada em si mesma (egocêntrica) e usa muito de símbolos para
representar pessoas, situações, objetos; são imagens visuais ou sonoras, necessárias para sua
percepção e entendimento do mundo. Nesta fase fantasiosa a criança cria personagens e
amigos, por isto a importância de se aproveitar este momento para textos mais lúdicos,
divertidos, o uso de lendas, fábulas, assim como, a importância da contextualização temática e
associação do texto com imagens ou situações para que ela decore a música com mais
facilidade.
No estágio operacional concreto ela obtém a capacidade de pensar de maneira lógica,
superando o egocentrismo anterior, e entender conceitos usados para viver em seu meio.
Neste período ela é mais independente, mais autônoma e capaz de relacionamentos de afeto
com outras pessoas, que não sejam seus pais, avós ou irmãos. Entende o que é certo ou errado,
começo e fim; é capaz de formar conceitos morais, entre eles, honestidade, respeito, justiça,
companheirismo. Podemos aproveitar esta fase para inserir canções que estimulem o amor e
respeito às pessoas, à natureza, que estimulem a amizade, etc.
O quadro a seguir é um demonstrativo dos padrões comportamentais da criança e o
que podemos usufruir deste desenvolvimento para o ensino musical; foi adaptado do original,
construído por Nye e Nye (1957) e aborda somente a faixa etária de 6 a 11 anos.
29

6 anos
Características do Desenvolvimento Normal Implicações para o Ensino de Música
Desenvolvimento Físico

O crescimento muscular e esquelético progride, mas Começam a cantar com pequenos motivos e frases:
lentamente, tornando as crianças mais fortes. repertório de melodias simples, bem aprendidas e
freqüentemente repetidas.
Olhos ainda não atingiram a maturidade total. Cantar de cor.
Enxergam melhor de longe.

O coração está em período de rápido crescimento. Deve ser breve o tempo destinado a atividades
vigorosas.
A maior capacidade do sistema respiratório e Apropriado para o uso dos brinquedos de roda e jogos
circulatório aumenta a resistência física, permitindo cantados.
saltar, correr e subir mais longe.
Reações Características
As crianças são ávidas por aprender, exuberantes, A música pode ser empregada para ações físicas, para
agitadas, super ativas e cansam facilmente. descanso ou para aliviar as tensões.
São auto-afirmativas; agressivas, querem ser as A criança gosta de canções que falam dela própria, do
primeiras. São menos cooperativas que aos 5 anos, que faz ou gosta.
extremamente competitivas e muito jactanciosas.
Períodos de concentração são relativamente curtos. Atividades musicais breves: 20minutos de atividades
variadas são suficientes.
As crianças precisam de oportunidade para escolher
Têm dificuldade em tomar decisões. canções e sugerir interpretações e dramatizações.
Necessidades Especiais
Encorajamento, elogios constantes, entusiasmo e Paciência por parte dos adultos, uma vez que as
muita paciência por parte dos adultos. crianças aprendem devagar.É necessário muita ajuda
no aprendizado de discriminação das alturas (notas) e
afinação.
Situações e atividades de aprendizado concretas. Canções concernentes ao já conhecido e ao imediato:
Participação direta. coisas, animais, pessoas, atividades.
Algumas responsabilidades, mas sem serem Liberdade para as crianças fazerem sugestões nas
pressionadas a tomar decisões, fazer escolhas, ou atividades musicais.
atingir expectativas muito altas.

7 anos
Características do Desenvolvimento Normal Implicações para o Ensino de Música
Desenvolvimento Físico
Crescimento lento e constante. Aumento no repertório de canções mais longas.
Coordenação olhos-mãos em melhores condições. Canções direcionadas para atividades específicas e jogos
Melhor uso da musculatura fina. cantados de maior complexidade.
Olhos ainda não atingiram a maturidade suficiente Continua ênfase sobre as canções decoradas.
para ver de muito perto.
Reações Características
Sensíveis aos sentimentos e atitudes dos Crianças que têm aulas particulares podem ser
coleguinhas e dos adultos. Especialmente convidadas a cantar para colegas (no mesmo nível) em
dependentes da aprovação dos adultos. certas ocasiões.
Cheias de energia, mas cansam com facilidade. Professores devem prover variedade de atividades
Freqüentemente sonhadoras e absortas. durante todo o programa diário com canções
direcionadas para atividades específicas e jogos
cantados para liberar a energia normal nessa idade.
Pensamentos abstratos ainda pouco desenvolvidos.
Aprendem com maior sucesso em termos concretos Ênfase continuada na audição ativa e no reconhecimento
(manipulação direta) e onde podem ser ativas de músicas ou intervalos.
30

enquanto aprendem.

Falantes exageradas, podem fazer disputas com Uso de canções com palavras absurdas, criação de novas
palavras em vez de lutar corporalmente. palavras para canções.
Gostam de canções, ritmos, contos de fadas, As crianças aprendem e criam canções e responsos
lendas, histórias sobre a natureza, comédias, rádio,
rítmicos mais complexos. Devem-se ensinar canções
cinema. que expressam as experiências, interesses e sentimentos
do dia-a-dia.
Entendimento rudimentar dos valores de tempo e Compreensão de valores de notas musicais simples
dinheiro através de identificação com respostas rítmicas
envolvendo o corpo.
Necessidades Especiais
Apoio em uma combinação equilibrada entre Continuada atenção por parte dos adultos a fim de
independência e encorajamento. ajudar as crianças com dificuldade em cantar.
Relações afetuosas, animadoras e amigáveis com Uma atmosfera de amizade que conduz à participação
os adultos. segura e livre em atividades musicais de todos os tipos.
Devem-se encorajar as crianças a cantarem sozinhas,
independentemente da voz do professor ou gravação.

8 anos

Características de Desenvolvimento Normal Implicações Para o Ensino de Música


Crescimento ainda lento e gradual. Braços e mãos Maior repertório de canções longas.
crescem em maior proporção.
Olhos agora aptos para a visão de perto e de longe. Cantar de cor e também com uso de partitura.
Pode desenvolver-se miopia este ano.
Pode-se desenvolver uma disposição de espírito Canções de atividades intercaladas durante o dia
nobre. reanimam da fadiga e podem auxiliar na disposição.
Reações características

Nova consciência de diferenças individuais. Devem-se planejar atividades musicais em função das
diferenças individuais. Há crianças aptas à cantar
cantigas de rodas e melodias populares, outras não.
Atividades voltadas à afinação continuam para alunos de
aprendizagem mais lenta.
Impulsivas, mais entusiasmadas do que Deve-se ter no repertório canções que enfatizam
conscientes. Alto índice de casualidade. segurança.
Melhores condições de fazer auto-avaliação. Aperfeiçoamento da qualidade tímbrica das crianças no
canto. Audição mais crítica: desenvolvimento maior,
discriminação e gosto musicais.
Responsivas em atividades em grupo, tanto Professores devem orientar as crianças na avaliação da
espontâneas quanto supervisionadas. sua própria expressão musical e na avaliação da
expressão musical dos colegas, levando ao respeito e
apreciação do trabalho dos outros.
Necessidades especiais

Orientação sábia e canalização dos interesses e Liberdade para experimentar e criar em termos de canto
entusiasmos em lugar de dominação ou padrões de tanto em grupo quanto individualmente.
crítica exagerados

9 anos
Características do Desenvolvimento Normal Implicações para o Ensino de Música
Desenvolvimento Físico

Pulmões quase maduros. Coração mais sujeito a Atividades físicas extenuantes devem ser ministradas em
tensão (força de hormônios do crescimento). períodos curtos.
Olhos quase do tamanho adulto, aptos para trabalhar Podem ser usados alguns solfejos com notação musical
com menos esforço. (leitura à primeira vista).
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Reações Características

Diferenças individuais distintas e claras. Deve-se prover as crianças de um programa musical


Habilidades aparentes. variado a fim de se adequar às diferenças individuais.
Atividades de afinação, se necessário.
Capazes de manter o interesse prolongadamente. Atividades musicais devem durar aprox. 30min.
Freqüentemente fazem planos e vão adiante com Partituras de canto simples devem ser introduzidas.
eles. Devem-se desenvolver experiências criativas em toda
espécie de atividades musicais.
Forte tendência a formarem grupos de um só sexo, Repertório deve conter canções onde meninos cantam
fechados, de curta duração e rotatividade alta. uma vez e as meninas respondem.
Perfeccionistas, querem desempenhar bem, mas Professor deve encorajar o desenvolvimento da
perdem o interesse se desencorajadas ou autonomia através da participação bem sucedida em
pressionadas. atividades individuais ou grupais.
Menor interesse em contos de fadas e fantasias. Repertório deve conter canções relacionadas à realidade
Maior interesse na comunidade, no seu país, em da vida (áreas com a vida social e linguagens artísticas).
outros países e pessoas.

10 e 11 anos
Características do Desenvolvimento Normal Implicações para o Ensino de Música
Desenvolvimento Físico
Características sexuais secundárias começam a se Enriquecimento de qualidade vocal, mas raramente uma
desenvolver. verdadeira transformação antes dos 12 anos.
Rápido crescimento muscular. Falta de coordenação motora. As relações de força e
movimento se alteram continuamente, levando a uma
falta de controle do próprio corpo.
Crescimento heterogêneo de várias partes do corpo. Desajeitamento quanto ao domínio da musculatura
respiratória. Problemas na produção de voz na laringe:
quebras, instabilidade vocal.
Reações Características
Crianças próximas da adolescência com freqüência As atividades musicais devem ser selecionadas de forma
se tornam supercríticas, inconstantes, rebeldes, não a possibilitar êxito a todas as crianças. Devem-se
cooperativas. selecionar alunos para assumir papéis de liderança. O
trabalho bem feito deve ser apreciado e reconhecido.
Necessidades Especiais
Conhecimento e compreensão das mudanças físicas
e emocionais que estão por vir.
Afeto e senso de humor por parte dos adultos, que
não devem implicar, falar de maneira impositiva ou
condenatória com os alunos.
Senso de pertencer e ser aceito por um grupo de Corais a 2 e 3 vozes.
“iguais”. Oportunidades progressivas de
independência.
32

8. O Canto Coral Infantil


Chamaremos aqui de canto coral infantil, qualquer trabalho vocal que seja feito com
um grupo de crianças, pois, mesmo que não tenha a pretensão de ser um coro, estará usando o
aparato vocal. As implicações que este uso acarretará devem ser observadas cuidadosamente,
pois qualquer mau uso da voz, realizado com freqüência, poderá desencadear distúrbios na
laringe. Além disto, há o caráter pedagógico e social que envolve o desenvolvimento
cognitivo e afetivo da criança.
Sabemos que nas escolas de Educação Infantil e Ensino Fundamental o canto é usado
como ferramenta de trabalho, socialização e lazer. Mas sabemos também que, em muitas
delas, quem faz este trabalho não é um professor de música especializado em voz, muitas
vezes nem especializado em música. Já pudemos presenciar apresentações, em escolas de
Educação Infantil, em que o coro de crianças canta acompanhando a gravação do CD, isto é,
acompanhando o artista que gravou a música, geralmente um adulto, em tom apropriado à sua
voz, grave demais para as crianças. Com a finalidade de orientação, daremos algum
embasamento e direcionamento para que estes professores possam se preparar mais
conscientemente para a realização deste trabalho.
Uma das primeiras atitudes do regente ou professor será conhecer um pouco sobre
cada criança que está sob sua responsabilidade, principalmente se o trabalho é realizado em
instituições que atendem crianças carentes. Conversar com cada uma, saber se está bem
fisicamente, se está alimentada, pois o canto precisa de energia para ser produzido com
qualidade. Uma simples dor de cabeça diminuirá a boa produção vocal, assim como
problemas emocionais ou estômago vazio. A relação afetiva é muito importante para o
aprendizado na educação infantil, a criança precisa ser amada e se sentir amada, ser
valorizada e estimulada em suas realizações e respeitada em seus limites e em seu tempo.

8.1. Cuidados na escolha e aplicação de repertório


Além dos itens enumerados abaixo, relacionados com a escolha e a aplicação de
repertório, o professor deverá avaliar as condições vocais das crianças, observando se as
mesmas apresentam dislalias (troca de letras na palavra), disfonias (rouquidão ou qualquer
som anormal) e outros problemas que recomendam uma terapia fonoaudiológica, para, assim,
encaminhá-las ao profissional indicado.
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Cada música escolhida para ser trabalhada deve ser administrada com consciência e
responsabilidade. É fundamental que o professor de coro estude cada uma das peças para
saber se a mesma é adequada ao grupo naquele momento, e mesmo para ter a nítida visão do
que é necessário trabalhar na peça. É bom se abordar diferentes aspectos da técnica vocal
(respiração, emissão, ressonância, articulação, dicção, tessitura, legato) e da linguagem
musical (intervalos, ritmos, pulso, afinação, etc.), mas não todos de uma vez. À medida que o
grupo demonstra qualquer problema relacionado com a técnica vocal e linguagem musical, o
professor deve abordar a questão com soluções objetivas a fim de não reforçar o erro, mas
pelo contrário, de vencê-lo, proporcionando melhor aproveitamento do som do grupo.

8.1.1. Texto
Ao procurar um repertório o professor deve levar em consideração o conteúdo textual,
para que seja apropriado à idade. O texto deverá oferecer informação útil e cultural, deverá ser
divertido, poético, lúdico, sem insinuações sexuais, pois precisa estar dentro do universo que
a criança conhece e vive, o que também facilitará a interpretação. Neste período do
desenvolvimento humano a mente infantil é fantasiosa, cheia de imaginação e criatividade. As
crianças gostam de inventar seus amiguinhos e com eles conversar e brincar. É preciso, pois,
usar uma linguagem apropriada a este momento tão especial.
Mesmo que o texto fale de culturas, costumes e crenças diferentes dos seus, de
conhecimentos que ele ainda não possui, o professor pode e deve introduzi-lo nestas questões
para, então, contextualizar, de forma didática, o que se está cantando. Esta contextualização
pode ser feita através de filmes, de livros, de pesquisas em livros ou internet, de fotos, de
entrevistas, visitas a museus, e outros.
A extensão da letra também deve ser observada, não podendo ser muito longa se o
trabalho for com crianças de 5 a 7 anos, que estão no período de alfabetização e precisarão
decorar o texto; já com as crianças de 8 a 10 anos, o mesmo poderá ser maior. Outro fator é o
entendimento: em texto longo a criança perde o desenvolvimento dos fatos.
PHILLIPS (1992, p. 28-29) escreve: “a memória auditiva parece ser afetada pela idade
e pela quantidade de material a ser lembrado de uma só vez. A capacidade de memorização
geralmente se desenvolve com o tempo”.
Letras que peçam gestos e sons onomatopéicos são muito bem-vindas pelas crianças,
que se divertem imitando os sons dos animais, da chuva, vento, jogando beijinhos, estalando a
língua, etc. Além disto, podemos usar estes recursos para exercitar a musculatura da língua,
lábios e bochechas de maneira lúdica e prazerosa.
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Como na canção O Mundo é Cheio de Sons, de Sabah Moraes:


“...do gatinho, miau, miau
do cachorrinho, au, au, au
...o vento sopra fuuuuu
A chuva cai chiiiii
Tem som agudo
Tem som grave...”

Ou na canção Brincando, de Thelma Chan:


“Para cantar bem eu abro a boca assim
Eu faço um bico assim
E uma bochecha assim
Estouro pipocas com a boca assim...”

8.1.2. Tessitura
Assim como a voz a tessitura é algo muito pessoal, ela varia de um indivíduo para
outro e se desenvolve com o estudo e o amadurecimento vocais. Devemos, portanto, levar em
consideração o grupo vocal e não o indivíduo, para que não haja prejuízo aos que
apresentarem menor tessitura. A tessitura deverá estar dentro de uma oitava - mais
precisamente do Dó 3 (central) ao Dó 4 - com as crianças de 5 a 8 anos; com as crianças de 9
e 10 anos esta tessitura pode ultrapassar de 1 tom para baixo e de 2 a 2,5 tons para cima (Si 2
a Mi 4 ou Fa 4). Isto não significa que com 7 ou 8 anos a criança não possa cantar além de
uma oitava. Há crianças que iniciam o trabalho vocal mais cedo, por volta dos 6 ou 7 anos -
um evento tanto quanto raro, principalmente no Brasil – levando vantagem, sobre outras
crianças, no desenvolvimento da extensão e tessitura vocais. Outras crianças, mesmo sem
estudar, podem apresentar facilidades vocais quanto à tessitura, mas no geral isto não
acontece e não é recomendável, pois, como já dissemos suas pregas e musculatura laríngea,
além de serem menores e mais frágeis, ainda estão em desenvolvimento e qualquer sobrecarga
e exigências reincidentes podem acarretar em algum trauma vocal.
Se houver uma música de qualidade que o professor deseja trabalhar com o grupo, mas
há dificuldade quanto à tessitura, o mesmo pode fazer pequenas adaptações musicais para que
seu uso seja possível. Se, porventura, não contar com o auxílio de um instrumento para cantar
com as crianças no tom definido, ele deve ter o cuidado para iniciar a música em um tom mais
agudo, pois, geralmente, cantamos em um tom apropriado à nossa voz e não à dos pequenos.
35

8.1.3. Intensidade
Se observarmos crianças brincando, principalmente em parques, clubes, ou no recreio
escolar, diremos que elas não têm limitação alguma quanto à intensidade vocal. Mas, sabendo
que as pregas vocais e os pulmões das crianças são bem menores que os dos adultos, é bom
estar atento, pois estas atitudes podem acarretar algum prejuízo ao seu trato vocal.
Já vimos que as pregas vocais de uma criança equivalem, praticamente, à metade das
pregas de um adulto. Por isso, não podemos exigir que as crianças cantem forte, pois seu
delicado aparelho não tem resistência para tal e elas só conseguirão um som equiparado ao de
um adulto através de um grande esforço na fonação. Além do mais, as caixas de ressonância
infantis não comportam um som tão grande.

8.1.4. Intervalo
Este é um item que deve ser estudado com cautela no momento de se escolher o
repertório. Intervalos grandes necessitam de maior domínio vocal e técnico, assim como de
uma musculatura mais fortalecida, mais atlética. Daí a importância de se fazer exercícios de
alongamento vocal, através de vocalizes específicos que trabalhem os músculos CT
(cricotiróideos), responsáveis pelo alongamento das pregas vocais. Em todo caso é
recomendável evitar intervalos que contenham saltos, como os de 6ª, 7ª e 8ª, quando se fizer
um trabalho com crianças menores, de 5 e 6 anos, por exemplo.
É recomendável que se use um repertório com notas em grau conjunto, em terças e,
gradativamente, acompanhando o ritmo do trabalho, vá se inserindo um repertório mais difícil
musical e vocalmente.

8.1.5. Andamento (Pulsação)


Se a música não for executada no tempo ideal para esta faixa etária poderá haver
prejuízo para a articulação. O tempo ideal deverá ser avaliado pelo professor, depois de um
contato maior com o grupo. Uma peça que contenha células rítmicas difíceis, com síncopas e
agilidade, deve ser trabalhada cuidadosamente em sua articulação e dicção para que não se
atropele as sílabas, prejudicando o entendimento textual. Assim como peças que contenham
notas longas em uma única sílaba não devem ser executadas em andamento lento demais, uma
vez que o tempo de vocalização das crianças é menor, por causa de sua respiração, como já
foi visto anteriormente.
36

8.2. A Prática coral – o que se observar em um ensaio


Depois de tomados todos esses cuidados, anteriores ao ensaio, chega o momento de
sua aplicação. Em um trabalho com crianças é preciso, sem perdermos nossa posição de
orientadores da aula, nos aproximar da espontaneidade e liberdade com que se manifestam
perante as pessoas e as coisas, e deixar a criança que existe em nós agir um pouco também,
isso os aproximará de nós. Tratá-los com carinho, alegria e respeito é fundamental para um
bom relacionamento.
Sugerimos como proceder, passo a passo, e que atividades devemos realizar durante
um ensaio, para obtermos um resultado de qualidade tanto musical, quanto social e humano.

8.2.1. Concentração e Relaxamento


A concentração é um dos elementos importantes para o aprendizado de qualquer
assunto. No caso de crianças, sabemos que têm a atenção mais dispersa e menor controle
sobre a concentração. Qualquer ruído ou interferência no ambiente faz seus olhos desviarem,
desencadeando, assim, uma série de outros movimentos e atitudes - mexer o corpo, rir,
conversar – que impedem a concentração para a atividade proposta. Deve-se considerar
também a correria do dia-a-dia: os pais envolvidos com o trabalho e problemas variados; as
próprias crianças que realizam muitas atividades diferentes. É recomendável, portanto, para
uma melhor produção musical, que façamos pequenos exercícios para desenvolver sua
concentração e trabalhar a escuta musical.

8.2.1.1. Exercícios de concentração e relaxamento


Eles podem se colocar em posição circular para a realização destes exercícios.
ü Olhos fechados, observando a respiração: respirar lentamente procurando sentir o
caminho que ar faz dentro de nós.
ü Escutar e sentir, com a palma da mão colocada sobre o coração, as batidas do mesmo.
ü Escutar os sons dentro da sala.
ü Escutar os sons fora da sala.
ü Movimentos da cabeça: para baixo e para cima, lentamente. Repetir algumas vezes.
ü Movimentos da cabeça para os lados, como se fosse olhar para o amigo. Repetir
ü Pendulares, como se deitasse a cabeça nos ombros.
ü Circulares, sempre bem lentamente;
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ü Movimento dos braços com as mãos unidas: para frente, para trás e esticando para
cima;
ü Movimento dos braços com as mãos soltas: para os lados (um de cada vez);
ü Levantar um ombro, como se fosse encostá-lo na orelha, relaxar. Fazer com o outro
ombro.
ü Tensionar os ombros para cima, como se estivesse dizendo: - não tô nem aí! Relaxar e
repetir.
ü Esticar uma das pernas, deixando a ponta dos pés para cima enquanto se toca o chão
com o calcanhar, como a de um palhaço, a outra está no mesmo lugar e flexionada.
Ficar na mesma posição e só mudar o movimento da ponta os pés, que irá tocar o
chão, como de uma bailarina. Fazer com a outra perna

8.2.1.2. Exercícios de relaxamento para os músculos faciais


ü Fazer caretas
ü Língua para fora e para dentro
ü Reter a língua no céu da boca e soltar
ü “Varrer” o céu da boca
ü Passar a língua nos dentes
ü Jogar beijinho
ü Estourar pipoca com os lábios

8.2.2. Postura
Uma postura correta é fundamental para uma boa produção vocal. O professor deve
observar se a criança está sentada de maneira que sua coluna esteja reta; se estiver em pé, suas
pernas deverão estar ligeiramente separadas uma da outra (alinhadas ao quadril), com um pé
logo à frente do outro, sem apoiar o corpo em uma só perna. Os joelhos precisam estar sempre
prontos a serem flexionados, nunca rígidos. O corpo precisa mostrar leveza, equilíbrio e
energia.
Tanto as crianças quanto os adultos têm o errôneo hábito de sentar-se escorregando
pela cadeira, ou de pernas cruzadas, ou, ainda, com a barriga pressionada por uma leve
inclinação do peito para a frente. Observamos esta postura e atitude até mesmo no momento
de se cantar. O professor atento indicará a posição correta e esteticamente bonita,
contribuindo, assim, para um melhor resultado sonoro.
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Postura correta na posição de pé Postura correta na posição sentada

8.2.3 Exercícios respiratórios


ü Encher devagar os pulmões. Podemos dizer às crianças que nossa barriga deve ser
como um balão e que é ali (na região do final das costelas) que o ar deve chegar.
Segurar rapidamente o ar e soltar, fazendo um “sss”, bem lentamente, como se
houvesse em sua frente uma flor, cujas pétalas não devem cair. Repetir algumas vezes.
ü Mandando a nuvem para o céu: dizemos às crianças que uma nuvem caiu do céu e
precisa de ajuda para voltar. Esta ajuda deve ser através do ar. Inspiramos, seguramos
o ar e empurramos a nuvem para cima, com ajuda dos braços, fazendo um “sss”.
Cuidado deve ser tomado para que a cabeça não se direcione para cima, o que poderia
causar alguma tensão no pescoço e prejudicar a passagem do ar na expiração.
ü Inspirar, segurar rapidamente e soltar o ar contando até dez, olhando para frente,
articulando bem as palavras, inspirar rápido, pelo nariz, e voltar a contar.
ü Quando for necessário se abordar a questão do apoio do som, o exercício de assoprar a
vela (fuuuu) ou de pedir silêncio (xiiiiii), realizado de forma rápida ou lenta, ajuda na
percepção da ação dos músculos abdominais (a barriga fica firme).
39

8.2.4. Relaxamento da laringe


A criança geralmente não apresenta problemas de tensão na laringe. No entanto, o
professor em seu primeiro momento de observação do canto do grupo deve detectar se o
problema existe. Se constatado que sim, antes de começar a vocalizar deve-se trabalhar o
abaixamento e relaxamento da laringe, pois sua posição elevada causa um fechamento
excessivo das pregas, causando um atrito que não é saudável, além de resultar em um som
duro e estridente. Os exercícios abaixo são sugestões de PINHO (2004).

8.2.4.1. Exercícios para o relaxamento da laringe


ü Pedir para que respirem como se estivessem sugando um espaguete ou fio de
macarrão, colocando a mão na região onde se encontra a laringe (no pescoço),
sentindo que a laringe baixa e, consequentemente o palato mole sobe, com esta
atitude. Em seguida fazer um “ho, ho, ho” do Papai Noel. Cuidado deve ser tomado
para que a emissão da rizada do Papai Noel não seja forte e concentrada dentro da
parte posterior da boca (som guturalizado). Lembrar ao grupo que o velhinho não quer
acordar as crianças para quem ele deixou o presente, e por isso ele ri baixinho e manda
o som de sua rizada para fora, para que ela embale o sono dos dorminhocos. Repetir
algumas vezes.
ü Fazer o “espaguete” e vibrar a língua, fazendo um bico, com um único som.
ü Exercícios de vibração de lábios (brrrrrrr) e língua (trrrrrr) são importantes e as
crianças gostam de fazê-los, e podem ser feitos com glissandos (quando vamos de uma
nota até a outra escorregando) também.
ü Fazer um bocejo.

8.2.5. Aquecimento e desaquecimento vocal


O aquecimento e desaquecimento vocais são momentos muito importantes para quem
usa a voz, profissionalmente ou não. Sendo as pregas vocais um músculo delicado, que
envolve todo um aparato muscular laríngeo e da região vizinha (pescoço e ombros),
necessários para a voz falada e mais ainda para a voz cantada, precisamos prepará-los para tal.
Assim como atletas preparam seu corpo para uma atividade física, aquecendo e alongando
seus músculos, aqueles que usam suas vozes, seja para dar aula, fazer locução, atuar ou cantar
devem fazer também alongamento e aquecimento vocais.
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Os vocalizes não são apenas para aquecer a voz. Há aqueles específicos para os
diferentes e variados músculos envolvidos na produção sonora que irão realizar o trabalho de
desenvolver e fortalecer o aparato vocal, esticando ou encurtando, fechando ou abrindo as
pregas vocais; vocalizes para trabalhar a ressonância e projeção do som, e outros. Os
vocalizes também são para trazer unidade e equilíbrio de som ao coro, possibilitando maior
rendimento ao grupo.
No final do ensaio não podemos nos esquecer de desaquecer a voz, ou seja, trazê-la
para o tom natural da voz falada.

8.2.5.1. Vocalizes
Há uma faculdade humana muito usada no canto, chamada propriocepção, que é a
capacidade de direcionar nossos movimentos, conduzir nossos músculos sem o apoio do
sentido da visão, usando nosso cérebro e sensação. Assim, no ato do canto, o professor lança
mão de imagens mentais, de sugestões, de sensações para que o aluno consiga realizar
determinado movimento sonoro, alcance a condução correta do som, entre outros aspectos,
por isto devemos ter muito cuidado em como falar e no quê falar para o aluno iniciante, pois
ele pode entender de maneira diferente da nossa.
É bom começar sempre com exercícios em b.c (boca chiusa) – lábios fechados por
fora e boca aberta por dentro, deixando e sentindo o som na pontinha do nariz – para trabalhar
a ressonância primeiramente. A cada frase, em todos os vocalizes, modulamos ½ tom acima,
vamos subindo, em direção aos agudos, gradativamente, depois descemos. A cada exercício
se aproveita a pausa para respirar, enquanto o professor modula. O aquecimento vocal em si
não deve ser longo, nesta faixa etária ele pode durar de 5 a 7 minutos.

( b.c.) m______________

É importante o professor conhecer algumas técnicas para obtenção de determinados


resultados, podendo explorá-las nos vocalizes. Para cobrir o som, deixando-o mais redondo, é
necessário que se levante a úvula, sem exageros para que o som não seja entubado. Com o
levantamento desta, o palato mole (parte de trás do céu da boca) também será levantado,
proporcionando mais espaço para o som quando a nota for mais aguda. Exercícios com as
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vogais “u” e “o” são recomendáveis e podem ser feitos em glissandos ascendentes e
descendentes. A vogal “o” é mais aconselhável, pois, pela sua natureza fonética, não ocasiona
entubamento ou escurecimento do som. Uma opção de exercício com a vogal “u” seria o uso
da imitação de uma sirene.
Para trabalhar a ressonância, sentindo a vibração do som na máscara (região do nariz e
maçãs do rosto) são sugeridos também os exercícios abaixo:

O próximo exercício foi retirado do livro Divertimentos de Corpo e Voz, de CHAN e


CRUZ (2001), indicado para trabalhar vibração de lábios e articulação:

O exercício abaixo é indicado para desenvolver os sons nasais, além da articulação e


do trabalho com as vogais, trabalhando, ainda, o ritmo:
42

8.2.6. Como ensinar uma canção


Como ensinar uma canção para crianças que não sabem ler e/ou não dominam a leitura
musical? A resposta para essa pergunta é conseqüência de nossa experiência pessoal,
embasada por cursos e leitura específica.
Devemos, depois de todo o aquecimento sugerido, cantar a música para as crianças
ouvirem; em seguida ler a letra ou poema da música; explicar o significado de palavras e
expressões que não sejam de seu conhecimento; fazer, junto com as crianças, uma breve
interpretação do texto; cantar a música mais uma vez e ensiná-la por frases musicais que as
crianças deverão repetir. Faz-se um processo acumulativo: aprendem uma frase, ensinamos a
próxima frase que elas repetem, junto com a primeira, até o fim da música. Podemos pedir pra
elas cantarem a música inteira em lá, lá, lá. Depois de aprendida a música e de haverem
entendido o conteúdo textual passamos ao trabalho de dinâmica e interpretação musicais,
onde daremos nuances diferentes, de acordo com o que a música ou a letra sugerirem.

8.2.7. Desaquecimento Vocal


Os mesmo exercícios usados para relaxamento da laringe podem ser usados para
desaquecer a voz, com pequenas variações.

8.2.7.1. Exercícios para o desaquecimento vocal


ü Pedir para que respirem como se estivessem sugando um espaguete, colocando a mão
na região onde se encontra a laringe (no pescoço), sentindo que a laringe baixa e,
consequentemente, o palato mole sobe com esta atitude. Em seguida fazer um “ho, ho,
ho” do Papai Noel e falar, poucas palavras, com a laringe a meio caminho. Pode-se
falar nome de frutas ou dias da semana, ex: segunda, terça, quarta ou banana, pêra,
uva. Repetir algumas vezes.
ü Fazer o “espaguete” e vibrar a língua, fazendo um bico, em glissando descendente.
ü Fazer um grande bocejo, aproveitando para emitir o som das vogais.
ü Suspirar lentamente na vogal “o”, em escala descendente.
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9. O canto coral como instrumento da educação


Como o ato de cantar é algo prazeroso podemos usufruir disto para educar de maneira
lúdica e natural. Um dos grandes benefícios do canto coral é a socialização, através dele as
crianças estão perto e precisam observar a voz do colega, para que haja maior igualdade
sonora, isto acarreta proximidade, cumplicidade. Durante o alongamento do corpo podemos
fazer brincadeiras, onde elas estejam em interação.
É através do texto das canções, principalmente, que traremos novos conhecimentos
para as crianças, educando, propiciando cultura, valores éticos e humanos. Sendo assim, letras
que falem sobre lendas, fatos históricos, que relatem a cultura e costumes de povos de outras
regiões do Brasil e do mundo, que tragam novas palavras e expressões, que falem de amor ao
próximo, de boas atitudes para com as pessoas, animais e a natureza, devem ser exploradas
intensamente.
O Brasil possui diversos gêneros musicais difíceis ritmicamente e que estão sempre
acompanhados de um trabalho de corpo. Este trabalho envolve a dança e é feito
acompanhando os instrumentos de percussão, sentindo o pulso da música. Assim, através de
danças como a ciranda e o maracatu, em Pernambuco; o côco, em Alagoas; o carimbó, no
Pará; o boi bumbá, no Maranhão; e outras manifestações (espalhadas por todo o Brasil), de
origem religiosa ou não, como os reisados, folias, maculelês, cordão de pássaros e congadas -
que trazem consigo uma história de significados e características muito próprias, refletindo
em toda a cultura popular - podemos trabalhar a expressividade e movimento corporais, a
teatralidade, a pulsação, a afinação, a coordenação motora, a alegria, a união do grupo, além
de oferecer acesso a estas culturas, sugerindo uma pesquisa sobre os locais onde elas se
manifestam, em que período do ano, indumentária, enredo, etc.
As cantigas de roda também são um excelente instrumento de educação musical e
geral. Com elas, além de darmos continuidade a um processo de manutenção e repasse da
cultura e folclores brasileiros - posto que se o folclore não é vivido e transmitido às outras
gerações ele se perderá – temos um repertório de canções que estão de acordo com as
capacidades vocais das crianças, proporcionando, igualmente, material educativo envolvendo
aspectos musicais, sociais, afetivos e culturais.
A canção Pra Ser Amigo é um exemplo para trabalhar a afetividade, entre outros
aspectos:
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“Pra espirrar eu faço como? Atchim!


Pra aplaudir eu falo assim
Um beijinho vou mandar
Pra sorrir ou gargalhar, há, há, há
E pra amar e ser amigo
Como vou fazer te digo
Vou olhar e ajudar
A bochecha apertar
Vou pegar a sua mão
E lhe dar um abração”

Para se abordar o imaginário folclórico, com suas lendas e crenças, exemplificamos


com a peça Música na Mata:

“O uirapuru cantou
Lá na mata ele canta meu bem
Eu quero ouvir, eu quero ouvir
o uirapuru também
A iara e o boto já têm seu lugar
Na platéia da mata, meu bem
Eles vão escutar com a matinta perêra,
o mapinguari, Macuxi, sabiá, caipora, saci...”

9.1 O canto em uníssono


Quando falamos em canto coral nos vem à mente um som grandioso, com várias vozes
caminhando para lados diferentes e se entrelaçando. Há peças escritas para coros a 2, 3, 4 e
até 8 vozes. Isto requer sonoridade e potência vocais dos cantores, para que cada voz seja
ouvida igualmente.
Nesta faixa etária, 5 a 10 anos, o canto uníssono é o mais recomendado, por fatores já
relatados aqui, sendo um deles a questão da intensidade. Com um grupo de crianças pequenas
não podemos solicitar um som denso e forte, pois, além de não possuírem capacidade torácica
para aumentar o fluxo de ar, geralmente elas confundem intensidade com grito. Se quisermos
mais volume, podemos consegui-lo pedindo que as palavras sejam melhor articuladas.
Segundo o maestro Altamiro, em entrevista concedida a esta pesquisa, o canto
uníssono faz parte de uma etapa do aprendizado e é importantíssimo para a qualidade sonora
do coro. Alcançar uma homogeneidade de som, uma afinação perfeita e articulação precisa é
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mais difícil no canto uníssono, e se este trabalho for bem realizado a aplicação do canto a
várias vozes será facilitado, quando de sua inserção.
9.2 Repertório
Neste capítulo sugerimos algumas peças (algumas com partitura em anexo) que
reconhecemos como adequadas para o uso com crianças, achamos que esta indicação é
importante, uma vez que este trabalho é direcionado a todos os profissionais que desenvolvem
atividades com crianças e estes, muitas vezes, não encontram referência para pesquisar. Além
disto, fazemos pequenas demonstrações de adaptações musicais, coerentes com as
possibilidades do aparelho vocal infantil.
Em relação ao universo do imaginário popular, de gêneros folclóricos, sugerimos as
músicas abaixo relacionadas:

ü Uirapuru (Waldemar Henrique) que pode ser cantada como chorinho ou baião, por
exemplo.
ü Lendas de Quintal (Ney Couteiro), maracatu
ü O Menino e o Mar (João Bá), xote
ü Tá Caindo Fulô (folclore), côco
ü Matinta Perêra (Waldemar Henrique)
ü A Lenda do Boto (Wilson Fonseca)
ü Murucututu (folclore amazônico)
ü Vai Ver Teu Ninho, Sabiá (folclore)

Para se trabalhar o legato e a musicalidade, aliados à poesia, sugerimos as seguintes


canções:

ü Colar de Carolina (Cecília Meireles/Diana Pequeno)


ü Meninos (Juraildes da Cruz)
ü O Caderno (Toquinho/Miltinho)
ü Eu Morava na Areia (folclore)
ü Ó, Bela Alice (folclore)
ü Marinheiro Encosta o Barco (folclore)
ü Sabiá lá na Gaiola (Hervé Cordovil e Mario Vieira)
ü O Tempo Gira (Sabah Moraes)
ü Leilão de Jardim (Cecília Meireles/Diana Pequeno)
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ü O Amor é Meu (folclore)


ü A Língua do Nhém (Cecília Meireles/Dércio Marques)
ü Joaninha (Luis Perequê)
ü Acalanto (Dorival Caymmi)
ü Canção Pra Sonhar (Sabah Moraes/Ney Couteiro)

9.3. Demonstração de adaptações de canções


A canção é Lendas de Quintal (Ney Couteiro) e tem um texto próprio para a idade em
questão - mais precisamente 8 a 10 anos. A música é adequada e traz ainda a possibilidade de
se inserir o maracatu no grupo - manifestação cultural muito importante no Recife - sendo,
então, um momento para se fazer pesquisa, aprender a dança, trabalhar a pulsação, sensação
do compasso quaternário, mas há alguns intervalos que ultrapassam a tessitura apropriada
para a faixa etária em questão:

Este é o tom original, Lá Maior, o professor deve subir o tom para Si ou Dó Maior, portanto, e
neste trecho sugerimos repetir a penúltima nota, mantendo o intervalo uníssono, assim não
precisará esforçar a laringe das crianças. Ficará assim:

Outro trecho que precisa de adaptação para o uso com crianças, já no tom de SiM:

Este intervalo de 5ª descendente ultrapassa a tessitura adequada, sugerimos esta adaptação:


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Ou na peça Canção Pra Sonhar (Ney Couteiro/Sabah Moraes), o tom é Dó Maior, sua tessitura
é confortável, dentro de uma oitava, mas há somente um intervalo que dificultaria o trabalho
com as crianças, pois elas precisariam cantar o sol 2, que é uma nota grave demais:

O professor ou maestro deve pensar em outro intervalo, apropriado em relação a tessitura.


Nossa sugestão é esta:

Em relação aos graus conjuntos e terças há o exemplo abaixo, retirado da canção O


Tempo Gira. Nesta peça o professor pode trabalhar o legato, a respiração, a interpretação, que
estão facilitados pela linha melódica. Podemos observar que a melodia caminha para a região
aguda suavemente:
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Conclusão
Conduzimos a presente pesquisa através da abordagem de assuntos pertinentes,
focalizando o aparelho vocal, sua constituição e seu uso consciente, além de permearmos a
questão do desenvolvimento cognitivo e suas implicações para o entendimento do que se está
cantando. Discursamos de maneira clara e objetiva sobre a muda vocal, laringe, as pregas
vocais, a respiração, as cavidades de ressonância, a emissão; sugerimos exercícios para
aquecimento e desaquecimento vocais, para relaxamento muscular, exercícios respiratórios,
vocalizes específicos para desenvolver a musculatura e a elasticidade dos músculos laríngeos,
assim como para trabalhar a ressonância e projeção sonora.
A preocupação principal deste trabalho é o cuidado que os profissionais - regentes,
professores de canto, professores de educação infantil, compositores - que trabalham com
grupos de crianças devem ter no momento de criar e escolher o repertório para trabalhar com
as mesmas. Ressaltamos também a importância de avaliar o conteúdo textual, a tessitura e os
intervalos, para esta escolha, além de observar, no momento de sua aplicação, o cuidado com
a intensidade e andamento solicitados; cuidados necessários pela delicadeza e imaturidade do
aparelho infantil, ainda em maturação e desenvolvimento.
Observamos, ainda, como os sons - provenientes de variados meios - a música e,
principalmente, o canto, estão presentes na vida de todo ser humano, desde antes de seu
nascimento, e como são importantes para sua formação como indivíduo a para sua formação
cultural, devendo os pais e educadores estar atentos para o que elas ouvem na TV e no rádio,
muitas vezes condutores de músicas inapropriadas para sua idade e sem preocupação com a
qualidade musical.
Demonstramos como fazer pequenas adaptações musicais para que determinadas
canções de texto educativo e que contenha em sua melodia várias características apropriadas
possam ser usadas pelo professor, sem danos à produção sonora das crianças.
Sugerimos, por final, uma lista com CDs e canções que consideramos dentro dos
padrões vocais e cognitivos enfocados, acompanhados de partituras de muitas delas.
Ressaltamos a importância do uso das canções de cunho folclórico - que estão dentro de suas
capacidades vocais e intelectuais – e como forma de que as características de preservação do
folclore, que é a sua passagem de geração para geração, sejam mantidas e continuadas, além
de levar toda esta gama cultural às crianças, que no modo de vida capitalista, globalizado e
informatizado vão endurecendo seu corpo e perdendo sua referência nacional.
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A principal dificuldade que encontramos para a realização deste trabalho foi a escassa
bibliografia sobre o assunto, em língua portuguesa. Verificamos que há uma boa bibliografia
sobre técnica vocal, canto lírico, fisiologia da voz, canto coral adulto, mas especificamente
sobre voz e canto infantil é praticamente inexistente. Uma das maneiras que encontramos para
solucionar este problema foi realizar entrevistas com profissionais da área e sistematizar nossa
própria experiência de anos de observação e trabalho com crianças. Acreditamos que esta
pesquisa poderá contribuir..............
50

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MEYERHOFF, Michael. Desenvolvimento Cognitivo e Social de um Recém-nascido.


http://saude.hsw.uol.com.br/compreendendo-o-desenvolvimento-cognitivo-e-social-de-um-
recem-nascido3.htm. Acesso em: 15 de setembro de 2007.

ZACHARIAS, Vera Lúcia Câmara.Piaget.


http://www.centrorefeducacional.com.br/piaget.html. Acesso em: 16 de setembro de 2007.
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Discografia

Abre a Roda Tindolelê, Lydia Hortélio.


Ó, Bela Alice, Lydia Hortélio.
Segredos Vegetais, Dércio Marques.
Anjos da Terra, Dércio Marques.
Trem Maluco e Outras Cantigas, Hélio Ziskind.
Sítio do Pica-pau Amarelo, 1ª gravação.
O Mundo é Cheio de Sons, Sabah Moraes.
Carrancas I e II, João Bá.
Coleção Disquinho, várias histórias.
Meninos, Juraildes da Cruz.
Quero Passear, Rumo.
Castelo Ra-tim-bum.
Brincadeiras de Rodas, Estórias e Canções de Ninar.
Cantigas, Danças e Toadas, do Cancioneiro Goiano, Fernando Santos e Juliana Alves.
Canções de Ninar, Palavra Cantada.
Canções de Brincar, Palavra Cantada.
Cantigas de Roda, Palavra Cantada.
Grupo de Tradições Marajoara, Cruzeirinho.
Fazer um Bem, Bia Bedran.
Dona Árvore, Bia Bedran.
Bia Conta e Canta, Bia Bedran.
O Gigante da Floresta, Hélio Ziskind.
Acalantos, Bia Bedran.
Corpo do Som, Barbatuques.
CD Plus, Mawaca.
Astrolábio Tucupira. Brasil.com, Mawaca.
Lira do Povo. Katya Teixeira.
Alumeia. Sons do Cerrado.
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ANEXO I
Entrevistas
Entrevista realizada com a prof. Ms. Denise Felipe, professora de canto infantil e
professora de canto e fisiologia da voz da UFG.

1) Sabe-se que a senhora trabalha com vozes infantis. Há quanto tempo?


R - Em 1992 comecei uma pesquisa direcionada à técnica vocal para a voz infantil, e em
1993 iniciei o trabalho de campo com crianças de seis até dez anos.

2) Por que se despertou a trabalhar com vozes infantis?


R - Durante a minha trajetória profissional tive a oportunidade de trabalhar com a
educação musical direcionada à criança, e muitas vezes me deparei com crianças que no
momento de escolherem um instrumento optavam pelo canto. Era difícil explicar a elas
que poderiam escolher o piano, a flauta, poderiam cantar em corais infantis, mas não
poderiam ter aulas de canto.

3) A senhora tem alguma pesquisa desenvolvida no assunto, ou adota algum tipo de


metodologia ou modelos baseados em bibliografia específica da área?
R - Venho desenvolvendo uma pesquisa há quase dez anos, já que este ainda é um tema
bastante polêmico. Apesar de ser a voz o instrumento inerente ao homem e, portanto, o
primeiro instrumento musical acessível à criança, a literatura encontrada, principalmente a
brasileira, é escassa e geralmente se limita a uma linha de abordagem: o canto coral para
crianças, sem um direcionamento mais específico à parte técnica. A literatura que trata da
voz falada da criança é bastante vasta, a maneira correta de utilizá-la, os problemas que
podem ocorrer com seu uso incorreto, as diversas técnicas para resolvê-los, são
encontrados em quantidade e qualidade, mas o mesmo não se pode dizer quando se trata
de um trabalho técnico direcionado ao desenvolvimento e domínio da voz cantada da
criança.

4) A partir de qual idade a senhora aconselha que o estudo do canto seja iniciado?
R - A partir do momento que a criança manifestar a vontade de aprender a cantar ela pode
iniciar o estudo do canto, mas é importante que o professor que vai lidar com a voz da
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criança conheça muito a fisiologia da voz infantil, tenha estudado canto e realmente saiba
orientar a criança respeitando seus aspectos psicológicos e cognitivos.

5) Em sua opinião, quais os principais cuidados que se deve ter no trato com vozes
infantis?
R - Como já disse, conhecer a fisiologia da voz da criança sabendo suas especificidades é
o primeiro requisito para um direcionamento seguro; outro importante requisito é estar
sempre atento para não cometer erros extrapolando o limite da voz. Mesmo que tenhamos
livros abordando as tessituras das vozes infantis uma observação atenta e cuidadosa é que
vai nos permitir um direcionamento eficiente e seguro. Em momento algum se pode
dissociar a criança de seu meio, e deve-se tomar muito cuidado para não pensar na criança
como um instrumento produtor de sons sujeito às nossas vontades, perspectivas, vaidades.
Não esquecer nunca que ela não é um adulto em miniatura, estar atento para não compará-
la a ninguém, ela é única com todo um universo a ser conhecido e respeitado.

6) Em relação à fisiologia do aparelho vocal, sabemos que ele está mais


amadurecido a partir de uma determinada idade. O estudo do canto pode antecipar
este amadurecimento, uma vez que trabalha os músculos da laringe?
R - Realmente não poderia dizer se algum amadurecimento físico acontece aos músculos
envolvidos na fonação, já que nos exames realizados com as crianças que faziam parte da
pesquisa nenhum otorrino se referiu a isso; o que posso dizer é que foi notada uma
musculatura mais fortalecida, “mais atlética”, segundo as palavras de um otorrino nos
exames realizados.

7) No trabalho de canto coral infantil com crianças de 5 a10 anos, quais os cuidados
que a senhora recomendaria ao profissional da área?
R - Muito dessa pergunta já está respondida no item quatro, mas eu acrescentaria, ainda,
que é de fundamental importância estar aberto para trocar a criança de naipe quantas vezes
se fizer necessário, uma classificação definitiva da voz infantil, em minha opinião, não é
positiva.

8) Qual a tessitura recomenda para esta faixa etária?


R - Não gostaria de determinar tessituras; livros que abordam o canto coral para crianças
sempre se referem a elas, mas minha experiência me leva a crer que o mais seguro é não
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generalizar, determinar, e estar sempre muito atento, realmente uma observação atenta e
um cuidado rigoroso na escolha do repertório é que vai nos nortear de forma mais
eficiente e segura. Crianças não devem cantar grave demais, eu diria que um La2 seria o
limite para as vozes mais graves, quanto a regiões mais agudas o professor deve observar
se a criança está forçando na hora da emissão. Mesmo que a criança tenha uma extensão
maior, o ideal é que ela cante na tessitura mais confortável possível. A voz de cabeça é
mais saudável na hora da emissão, pois dá um maior conforto laríngeo, mas não descarto e
acho positivo o trabalho com a voz de peito da criança, desde que ela não seja levada a
extremos e que seja feito sempre mais piano sem nenhum esforço.

9) A senhora acha que devemos levar em consideração o desenvolvimento cognitivo


da criança, em relação não só a parte musical, mas também ao texto da peça
escolhida? Por quê?
R - Não só acho como considero irresponsável o educador, se é que podemos chamá-lo
assim, que não leva em consideração o desenvolvimento cognitivo da criança em todos os
momentos de sua aula, e este é um aspecto fundamental para que não façamos da criança
que ama música um adulto que vai repudiá-la. Tanto a letra quanto a música têm que ter
um sentido concreto para a criança, fazer parte do seu mundo. Acho absurdo e revoltante
ouvir crianças cantando músicas com textos adultos, fazendo caras e movimentos que
nada têm a ver com sua faixa etária e, infelizmente, é o que mais vemos e ouvimos na
mídia televisiva.
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Entrevista realizada com o Maestro Altamiro Rodrigues da Fonseca, regente do Coro


Pequenas Vozes, da Escola de Artes Basileu França (Veiga Vale).

1) Há quanto tempo o senhor trabalha com coro infantil?


R - Há 22 anos, 20 destes com o coro Pequenas Vozes.

2) Tem alguma formação ou pesquisa na área? Se sim, quais os métodos, bibliografia, ou


modelos adotados?
R - Creio que não existe curso acadêmico específico para voz infantil. Mas fiz vários cursos
de extensão nas áreas de canto, regência e pedagogia. Usei métodos que aprendi com a
maestrina Dulce Leandro, que, na verdade, são práticas desenvolvidas por ela. Assimilei
pequenos detalhes de vários métodos e construí um próprio.
Fiz, também, curso com o americano Henry Leck que desenvolve um trabalho de estrutura,
que vai criando uma teia para buscar as possibilidades da criança. Ele trabalha com vozes a
partir dos 9 anos.

3) Qual a faixa etária do coral infantil regido pelo senhor? Quantos integrantes há?
R - A faixa etária vai dos 9 aos 14 anos e há 48 vozes.

4) Já trabalhou com coro na faixa etária de 5 a 10 anos?


R - Já, na faixa de 5 a 9 anos e, atualmente, trabalho com um de 7 a 12 anos, no SESC.

5) Há uma selecão de vozes para o ingresso da criança no coro Pequenas Vozes ou todas
que se voluntariam ou fazem matrícula são aceitas?
R - Há uma seleção, pois a procura é muito grande e este coro tem que cumprir
alguns programas, além do que precisamos verificar alguns requisitos.

6) Quais os requisitos para ser selecionado?


R - Primeiro há a etapa de aptidão musical, onde fazemos testes de memória e reprodução
musical. Depois verificamos se quem está entrando pode se manter no ritmo de quem já está
no coro, uma vez que realizamos concertos onde as crianças precisam ficar de pé por 1 hora,
cantando. Isto demanda energia e concentração.
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7) O que visa seu trabalho com coro infantil: educação musical em geral ou educação
vocal?
R - Educação musical.

8) Quais os critérios estabelecidos pelo senhor para escolha de repertório?


R - Eles variam, se não houver pressão externa, eu penso naquilo que vai ser motivador e
que dará alegria para eles cantarem. Além disto, tem que ser um repertório que eduque de
alguma forma.

9) O senhor analisa, além das questões musicais como tessitura, intervalos, a letra da
música, pensando no estágio cognitivo no qual as crianças se encontram?
R - Escolhendo peças que estejam fora de suas possibilidades eles cantarão mal e não será
bom para eles. Anos atrás nós cantamos peças que eram inadequadas para aquele
momento, como uma peça de Bach: a dificuldade na articulação do alemão dificultava
muito o canto. Hoje eu não repetiria isso, pois levo em consideração o desenvolvimento
cognitivo. É uma preocupação que existe.
No coral do SESC todas estas questões são primordiais, por não haver pressão externa e lá
não há teste para ingresso.

10) O senhor se preocupa em trabalhar mais a técnica ou a musicalidade, no sentido


da liberdade e alegria no ato de cantar?
R - Eu tento manter o equilíbrio dos dois. O trabalho técnico pode causar uma obsessão
pelo canto perfeito o que, num certo momento, fica cansativo para as crianças. Eu procuro
trabalhar a afinação de maneira que não tolha a criança, mesmo falando para ela que sua
nota está mais alta ou mais baixa, acho que como professor esta preocupação é
importante: ela saber e poder perceber que não está cantando a nota na altura certa.

11) Trabalhar com crianças, na faixa etária de 5 a 10 anos, um repertório onde não
haja divisão de vozes, mas que se privilegie a homogeneidade do som uníssono seria
aconselhável?
R – Mais do que aconselhável, o uníssono é a melhor forma de se trabalhar. Se você não
trabalhar primeiro o uníssono com as crianças pode estar queimando uma etapa.
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Entrevista realizada com a professora Daniela Rodrigues de Souza, mestre em


Pedagogia pela USP, professora do curso de pedagogia da UFG e diretora da Escola de
Educação Infantil Recriarte.

1) Em sua opinião quais características deve ter o texto de uma canção ensinada
para crianças na faixa etária de 5 a10 anos?
R. A principal característica é ter significado, ela precisa entender o que está cantando;
promover a aproximação entre as crianças (socialização) e possibilitar relaxamento e
concentração.

2) O tamanho do texto interfere no entendimento do mesmo, para as crianças nesta


faixa etária?
R. Interfere, inclusive não só o texto de música, mas livros literários também. Texto muito
longo faz a criança perder o fio da meada. Deve girar em torno de um tema só.

3) A contextualização é importante para uma melhor interpretação?


R. É muito importante! Saber a origem, a época, entender os significados. A linguagem
traz para a sala de aula coisas impossíveis de serem trazidas, como o mar, os costumes de
lugares diferentes.
É importante situar a criança no universo da música em questão. Contar e explicar a
história, inserir novo vocabulário, conhecer utensílios que não fazem parte de sua rotina.

4) Por que músicas que tragam no texto insinuações sexuais não devem ser
ensinadas às crianças?
R. Porque elas não têm, ainda, estrutura cognitiva para entender. O entendimento do corpo
humano, as reações de seu próprio corpo só serão abordadas a partir do 5º ano do Ensino
Fundamental. Ela não tem maturidade sexual pra esse contexto. Ela é uma vítima do meio.
O professor deve usar essas músicas como ponto de discussão em sala de aula.

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